Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo [2 ed.] 9788530982645


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Apresentação
Apresentação da 2ª edição
Material Suplementar
Índice Sistemático
PARTE I: NOÇÕES GERAIS
Capítulo I: HISTÓRICO DO MANDADO DE SEGURANÇA
1. Antecedentes
2. O mandado de segurança no regime constitucional
3. Direitos e garantias fundamentais
4. Tutela jurisdicional aos direitos fundamentais
5. Natureza da ação de mandado de segurança
6. A elevada importância do mandado de segurança no plano das garantias constitucionais
PARTE II: COMENTÁRIOS À LEI Nº 12.016/2009, ARTIGO POR ARTIGO
Capítulo II: TUTELA PARA AS VÍTIMAS DE ILEGALIDADE E ABUSO DE PODER POR ATO DE AGENTE PÚBLICO
7. Introdução
8. Conceito legal
8.1. Princípio da legalidade e submissão do Poder Público ao controle judicial
8.2. Ilegalidade e abuso de poder
8.3. Injuridicidade no plano do procedimento
8.4. Cabimento do mandado de segurança em caso de ato administrativo praticado com desrespeito à garantia do contraditório e ampla defesa
8.5. Mandado de segurança e a teoria do fato consumado
9. Mandado de segurança repressivo e mandado de segurança preventivo
9.1. Mandado de segurança preventivo e lei em tese
9.2. Mandado de segurança preventivo em matéria tributária
9.3. Mandado de segurança contra ato normativo de efeito concreto
10. Sumariedade do procedimento
10.1. Razão de ser da sumariedade do mandado de segurança
11. Natureza mandamental da ação
12. Pressupostos processuais e condições da ação: noções gerais
12.1. Pressupostos processuais e condições da ação em mandado de segurança
12.2. Pressuposto especial do mandado de segurança: direito líquido e certo
12.3. O direito líquido e certo é condição da ação ou mérito do mandado de segurança?
12.4. Momento da avaliação do direito líquido e certo
12.5. O direito líquido e certo e o concurso público
12.6. A jurisprudência do STF
13. Mandado de segurança contra ato omissivo
14. Livre disponibilidade da tutela mandamental
15. Competência para o mandado de segurança
15.1. Regras legais sobre a competência para o mandado de segurança
16. Mandado de segurança em matéria penal
17. O mérito da ação de mandado de segurança
17.1. Julgamento do mérito e lei superveniente
18. Partes na ação de mandado de segurança
18.1. Legitimação ativa
18.2. Legitimação ordinária
18.3. Legitimação extraordinária para o mandado de segurança
18.4. Direito comum a diversos titulares
18.5. Legitimação passiva
18.6. Autoridade coatora
18.7. Pessoa jurídica interessada
18.8. Legitimidade recursal
18.9. Caracterização de autoridade
18.10. Erro na nomeação da autoridade coatora
19. Equiparações legais de autoridade coatora
20. Mandado de segurança contra ato de colegiado
21. Sociedades de economia mista e empresas públicas
21.1. Atos de gestão comercial
21.2. Concessionários e permissionários
22. Assistência e intervenção de terceiro
23. Intervenção de amicus curiae no mandado de segurança
24. Intervenção da União em mandados de segurança em que figurem, como par tes, entidades da Administração Pública Federal indireta (Lei nº 9.469)
Capítulo III: AUTORIDADE COATORA FEDERAL
25. A autoridade coatora federal. Competência da Justiça Federal
26. Autoridade coatora em geral e autoridade coatora federal
27. Ausência de efeitos patrimoniais para a União
28. A jurisprudência sobre os concessionários de serviço público federal e a com petência para o mandado de segurança
29. Uma ponderação de ordem constitucional sobre a regra do art. 2º da Lei do Mandado de Segurança e a garantia do “juiz natural”
29.1. Corolário da tese jurisprudencial relativa a segurança contra ato de con cessionária de serviço público federal
30. Situações de conflito em torno da competência da Justiça Federal
Capítulo IV: SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL
31. Legitimação de terceiro interessado: substituição processual
32. Outro caso de legitimação extraordinária (parcial)
33. Requisitos da substituição processual
34. Notificação do legitimado originário
35. O prazo da notificação e o prazo de decadência da ação mandamental
Capítulo V: MANDADO DE SEGURANÇA EM REGIME DE URGÊNCIA
36. Impetração do mandado de segurança por meio eletrônico
37. Notificação e intimação por meio eletrônico
Capítulo VI: RESTRIÇÕES AO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA
38. Restrições de origem constitucional
39. Ato praticado em processo administrativo
40. Mandado de segurança contra decisão judicial
41. Ato judicial omissivo
42. Decisão judicial transitada em julgado
43. O esvaziamento do cabimento do mandado de segurança contra ato judicial
44. Prazo para impetração da segurança contra ato judicial: ato jurisdicional e ato administrativo do Poder Judiciário
45. Julgados dos Juizados Especiais
45.1. Mandado de segurança contra decisão interlocutória nos Juizados Especiais
46. O problema da competência para processar o mandado de segurança contra decisões dos Juizados Especiais
47. Mandado de segurança do terceiro prejudicado por decisão judicial
48. Mandado de segurança contra órgão fracionário de tribunal
49. Ato disciplinar
50. Atos “interna corporis”
Capítulo VII: A PROPOSITURA DO MANDADO DE SEGURANÇA
51. A importância da petição inicial
52. Petição inicial defeituosa ou incompleta
53. A petição inicial e seus requisitos
54. Os requisitos da inicial e as características do mandado de segurança
55. Alguns detalhes da petição inicial do mandado de segurança: o sujeito passivo da ação
56. Inexistência de litisconsórcio entre coator e pessoa jurídica interessada
57. Autoridade coatora, na concepção legal
57.1. Correção da nomeação equivocada da autoridade coatora
57.2. Autoridade coatora e a teoria da encampação
57.3. Autoridade coatora, nos casos das equiparações do § 1º, do art. 1º, da Lei nº 12.016
58. Especificação das provas a produzir. Exibição de documentos em poder do coator ou de terceiro
58.1. Documentos indispensáveis à instrução da petição inicial
58.2. Instrumento do mandato do advogado do impetrante
59. Petição inicial por meio eletrônico
60. Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido
61. O pedido
61.1. Descabimento de pedido que transforme o mandado de segurança em ação de cobrança
62. Valor da causa
63. Denegação do mandado de segurança, sem resolução do mérito
64. Renovação do pedido de mandado de segurança
65. Desistência do mandado de segurança
Capítulo VIII: DESPACHO DA PETIÇÃO INICIAL
66. O procedimento sumário do mandado de segurança
67. A natureza da notificação da autoridade coatora
68. As informações requisitadas da autoridade coatora
69. A ciência da pessoa jurídica interessada
70. Cientificação no caso de organismo autônomo não personalizado
71. Tutela antecipada: suspensão liminar do ato impugnado
71.1. A importância da tutela de segurança alcançável por meio da liminar
72. Requisitos da liminar do mandado de segurança
73. Momento processual da liminar
74. O caráter mandamental e não discricionário da medida liminar
75. Dimensões da liminar
76. Direito à liminar e exigência de caução
77. Duração dos efeitos da liminar
78. Recurso contra a decisão relativa à liminar do mandado de segurança
79. Vedações à liminar
80. Limite temporal dos efeitos da liminar: inexistência
80.1. Tramitação preferencial do mandado de segurança
81. O mandado de segurança e o Código de Processo Civil
Capítulo IX: PEREMPÇÃO OU CADUCIDADE DA LIMINAR
82. Revogação e cassação da liminar
83. Revogação tácita
84. Perempção ou decadência da liminar
Capítulo X: PROVIDÊNCIAS ADMINISTRATIVAS
85. Medidas Administrativas preparatórias da defesa da pessoa jurídica
86. Providência administrativa a cargo da autoridade coatora
87. Prazo para a manifestação da pessoa jurídica interessada nos autos
88. Representação judicial da pessoa jurídica afetada pelo mandado de segurança
Capítulo XI: INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL
89. Indeferimento da petição inicial
90. Recurso contra o indeferimento da petição inicial
91. Litisconsórcio ativo superveniente
Capítulo XII: DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DOS ATOS DE COMUNICAÇÃO PROCESSUAL
92. Documentação processual da notificação da autoridade coatora e da citação
Capítulo XIII: MINISTÉRIO PÚBLICO
93. Participação do Ministério Público
94. O Ministério Público como impetrante do mandado de segurança
95. O representante do Ministério Público como autoridade coatora
Capítulo XIV: EXECUÇÃO DA SENTENÇA
96. Autoexecutividade da sentença do mandado de segurança
97. A forma de comunicação e cumprimento do mandado de segurança
98. Cumprimento da sentença que defere o mandado de segurança
99. Alguns expedientes utilizáveis para conferir efetividade ao cumprimento da sentença do mandado de segurança
Capítulo XV: RECURSOS
100. O sistema recursal da Lei do Mandado de Segurança
101. Apelação contra a sentença do mandado de segurança
101.1. Atribuição excepcional de efeito suspensivo à apelação
101.2. Prazo para interposição da apelação
102. Duplo grau de jurisdição necessário
103. Recurso da autoridade coatora
104. Execução imediata (provisória) da sentença do mandado de segurança
105. Efeito da sentença denegatória da segurança
106. Verbas remuneratórias de servidores públicos reclamáveis por meio de mandado de segurança
107. Recursos particulares ilegalmente apropriados pela Administração
Capítulo XVI: SUSPENSÃO DA SEGURANÇA
108. Suspensão cautelar da segurança
109. Natureza jurídica
110. Cabimento do incidente
111. Legitimidade para promover o incidente
112. Competência
113. Procedimento
114. Oportunidade e eficácia do incidente
115. Reiteração do pleito e agravo interno
116. Recurso contra a decisão do pedido de suspensão da segurança
117. Expansão dos efeitos da suspensão a outros processos
Capítulo XVII: MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS
118. Mandado de segurança de competência originária de Tribunal
119. Sustentação oral
120. Recorribilidade da decisão do relator sobre a liminar do mandado de segurança
121. O agravo interno
Capítulo XVIII: NOTAS TAQUIGRÁFICAS DAS SESSÕES DE JULGAMENTO
122. Substituição do acórdão pelas notas taquigráficas
Capítulo XIX: RECURSOS EM MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS
123. Sistema recursal aplicável ao mandado de segurança
124. Recursos para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça
125. Recurso ordinário
126. Conceito de denegação da segurança
127. Prazo do recurso ordinário e reexame necessário
128. Julgamento do recurso ordinário
Capítulo XX: MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO COMUM
129. A sentença do mandado de segurança
130. Coisa julgada formal e material em mandado de segurança
131. Coisa julgada formal em mandado de segurança
132. Rescindibilidade da sentença no mandado de segurança
133. Coisa julgada e relações jurídicas continuativas
Capítulo XXI: TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA DO MANDADO DE SEGURANÇA
134. Processamento em caráter preferencial do mandado de segurança
135. Procedimento célere nos tribunais
Capítulo XXII: MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
136. O mandado de segurança como instrumento de tutela coletiva
137. A tutela coletiva e a substituição processual
138. Direitos difusos, direitos coletivos e direitos individuais homogêneos
139. Mandado de segurança e ação civil pública
140. Requisitos do mandado de segurança coletivo
141. Direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo
141.1. Identificação dos direitos sob tutela do mandado coletivo
141.2. Direitos defendidos pelo mandado de segurança coletivo: os controvertidos “direitos difusos”
141.3. Da pequena relevância da tese que insiste em estender o mandado de segurança coletivo aos direitos difusos
141.4. A defesa dos direitos difusos por meio do mandado de segurança coletivo
141.5. Impossibilidade prática de isolar os direitos coletivos dos direitos difusos
141.6. Mandado coletivo e direitos difusos: um falso problema
142. Partidos políticos
142.1. Os partidos políticos e sua destinação institucional
142.2. Alguns problemas da legitimação dos partidos políticos, após a Lei nº 12.016/2009
143. Organização sindical e entidade de classe
144. Associações
144.1. Relação dos associados da entidade impetrante
145. Pessoas jurídicas de direito público
146. Legitimação do Ministério Público para o mandado de segurança coletivo
147. Legitimação passiva do mandado de segurança coletivo
148. Competência
149. O procedimento do mandado de segurança coletivo
Capítulo XXIII: COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
150. O regime da coisa julgada nas ações coletivas, anteriores ao mandado de segurança coletivo
151. O regime da coisa julgada nas ações de mandado de segurança coletivo
152. Substituição processual e coisa julgada no mandado de segurança coletivo: uma última palavra
153. Inocorrência de litispendência entre mandado de segurança coletivo e as ações individuais
154. Desistência do mandado de segurança individual
155. Restrições à liminar no mandado de segurança coletivo
156. Particularidades da sentença do mandado de segurança coletivo
Capítulo XXIV: DECADÊNCIA DO DIREITO AO MANDADO DE SEGURANÇA
157. Prazo para impetrar o mandado de segurança
157.1. Justificativa constitucional do prazo decadencial estabelecido para o mandado de segurança
158. Natureza do prazo para impetração do mandado de segurança
159. Contagem do prazo decadencial da segurança
160. Algumas situações particulares, em tema do prazo decadencial aplicável ao mandado de segurança
Capítulo XXV: LITISCONSÓRCIO
161. Litisconsórcio no mandado de segurança
162. Litisconsórcio passivo
163. Casos de litisconsórcio passivo necessário
164. Litisconsórcio ativo
165. Litisconsórcio ativo superveniente
166. Assistência no mandado de segurança
Capítulo XXVI: EMBARGOS INFRINGENTES E SUCUMBÊNCIA
167. Os embargos infringentes e o mandado de segurança
168. Honorários de advogado e encargos sucumbenciais
169. Litigância de má-fé
Capítulo XXVII: DESCUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA
170. O cumprimento do mandado de segurança
171. Responsabilidade penal da autoridade coatora: crime de desobediência
172. Crime de responsabilidade e sanções administrativas
173. Outras sanções
Capítulo XXVIII DISPOSIÇÕES FINAIS
174. Reflexos da Lei do Mandado de Segurança
175. A vigência da Lei nº 12.016/2009 e o direito intertemporal
176. Leis revogadas
BIBLIOGRAFIA
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Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo [2 ed.]
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■ Capa: Danilo Oliveira ■ Produção digital: Ozone ■ Fechamento desta edição: 04.09.2018

■ CIP – BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE. SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. T289L Theodoro Júnior, Humberto Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo / Humberto Theodoro Júnior. – [2. ed.]. – Rio de Janeiro : Forense, 2019. Inclui bibliografia ISBN 978-85-309-8264-5 1. Brasil. [Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009]. 2. Mandado de segurança – Brasil. I. Título. 18-51112

Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária CRB-7/6439

CDU: 347.951(81)

APRESENTAÇÃO Quando adveio a Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, publicamos um estudo sobre o mandado de segurança renovado, cujo objetivo não foi o de produzir um ensaio amplo e exaustivo sobre a ação constitucional, mas apenas cotejar as novas regras com as revogadas, a fim de clarear os rumos que o importantíssimo instituto processual assumira. Nosso propósito, então, não era mais do que facilitar, na aplicação prática, a compreensão do novo ordenamento instrumentalizador de uma das mais relevantes garantias fundamentais, no plano dos direitos do homem, em nosso moderno Estado Democrático de Direito. Já no quinto ano de vigência do diploma normativo, o panorama jurisprudencial e doutrinário se alargou com as luzes do impacto da lei com as exigências do quotidiano, numa aplicação legal recorrente e rica de variações, que só os casos concretos são capazes de fomentar. É nessa quadra que nos sentimos atraídos pelo projeto de voltar à análise do mandado de segurança, por meio de comentários mais detidos, artigo por artigo, da Lei nº 12.016/2009, já então com os olhos voltados para uma perspectiva exegética mais aprofundada sobre o papel do writ constitucional em causa. Desafiaram-nos as posições não uniformizadas que insistem em manter polêmicas, tanto nos tribunais como na literatura doutrinária, em torno de questões, às vezes, de grande relevância; outras vezes, fruto de puro academicismo. Duas grandes premissas presidiram os comentários ora divulgados: (a) a necessidade de abordar o instituto sempre valorizando seu papel e seus fundamentos na ordem constitucional; e (b) o reconhecimento de que o direito como um todo e, particularmente, o direito processual exigem do jurista e do aplicador contemporâneos uma análise cada vez menos estrutural e conceitual, e que se ocupe cada vez mais da funcionalidade dos institutos normativos. Ou seja, o que hoje se impõe – na lição de Norberto Bobbio – não é apenas saber como o direito é feito, mas, sobretudo, saber para que serve o direito, operação que quebra o isolamento da ciência jurídica e força sua maior aproximação com outras ciências sociais. Tudo isto em uma tentativa de promover maior aderência social à estruturação jurídica, a partir de uma análise funcional do direito1. Os presentes comentários, em síntese, procuram colocar sempre em primeiro plano exegético a supremacia da ordem constitucional em tudo que se relacione com a interpretação e aplicação da disciplina do mandado de segurança. E, na ordem prática procedimental, o critério invariavelmente valorizado é o funcional, consistente em escolher, entre os entendimentos conflituosos, aquele que se aproxime, de maneira mais útil e adequada, da função que a Constituição atribui ao remédio jurídico em causa. Nunca nos passou pela cabeça dar uma palavra final sobre qualquer dos institutos que a legislação do mandado de segurança regula e que ainda ensejam dissídio entre os doutos. Nosso

propósito não foi além do esforço de apenas contribuir com modestos adminículos para o prosseguimento do debate instalado, sugerindo a avaliação de alguns enfoques ainda não de todo exauridos, seja no campo pretoriano, seja no doutrinário. O Autor Junho/2014

1

BOBBIO, Norberto. Dalla strutura alla funzione: nuovi studi di teoria del dirito. Bari: Editori Laterza, 2007, p. 48-54.

APRESENTAÇÃO DA 2ª EDIÇÃO O mandado de segurança é, a um só tempo, uma garantia fundamental contra o exercício abusivo do poder pelas autoridades públicas e um remédio processual estruturado para dar realidade, efetividade e eficiência à tutela engendrada constitucionalmente entre os Direitos do Homem. Pela infinidade de situações conflituosas que, no concreto da convivência entre as pessoas e a Administração Pública, não cessam de acontecer, cada vez com mais diversa roupagem fáticojurídica, a doutrina e principalmente a jurisprudência se veem na contingência de construir e reconstruir teses adequadas à almejada função do mandamus. Daí o propósito da presente reedição destes comentários à Lei do Mandado de Segurança, focado sobretudo nas questões que, nos últimos tempos, agitaram os tribunais, envolvendo a aplicação do importantíssimo instituto constitucional. No plano legislativo, apenas uma alteração se registrou no texto da Lei nº 12.016/2009, e se ocupou de melhorar a disciplina da defesa oral nos julgamentos de mandado de segurança nos tribunais, tema que vinha ensejando sérias divergências. A novidade normativa introduzida pela recente Lei nº 13.676/2018 foi objeto de abordagem nos novos comentários ao caput do art. 16 da Lei do Mandado de Segurança. O Autor Setembro/2018

Material Suplementar Para acessar o material suplementar entre em contato conosco através do e-mail ([email protected]).

ÍNDICE SISTEMÁTICO PARTE I NOÇÕES GERAIS Capítulo I HISTÓRICO DO MANDADO DE SEGURANÇA 1.

Antecedentes

2.

O mandado de segurança no regime constitucional

3.

Direitos e garantias fundamentais

4.

Tutela jurisdicional aos direitos fundamentais

5.

Natureza da ação de mandado de segurança

6.

A elevada importância do mandado de segurança no plano das garantias constitucionais PARTE II COMENTÁRIOS À LEI Nº 12.016/2009, ARTIGO POR ARTIGO

Capítulo II TUTELA PARA AS VÍTIMAS DE ILEGALIDADE E ABUSO DE PODER POR ATO DE AGENTE PÚBLICO 7.

Introdução

8.

Conceito legal 8.1. Princípio da legalidade e submissão do Poder Público ao controle judicial 8.2. Ilegalidade e abuso de poder 8.3. Injuridicidade no plano do procedimento 8.4. Cabimento do mandado de segurança em caso de ato administrativo praticado com desrespeito à garantia do contraditório e ampla defesa 8.5. Mandado de segurança e a teoria do fato consumado

9.

Mandado de segurança repressivo e mandado de segurança preventivo 9.1. Mandado de segurança preventivo e lei em tese 9.2. Mandado de segurança preventivo em matéria tributária 9.3. Mandado de segurança contra ato normativo de efeito concreto

10. Sumariedade do procedimento

10.1. Razão de ser da sumariedade do mandado de segurança 11. Natureza mandamental da ação 12. Pressupostos processuais e condições da ação: noções gerais 12.1. Pressupostos processuais e condições da ação em mandado de segurança 12.2. Pressuposto especial do mandado de segurança: direito líquido e certo 12.3. O direito líquido e certo é condição da ação ou mérito do mandado de segurança? 12.4. Momento da avaliação do direito líquido e certo 12.5. O direito líquido e certo e o concurso público 12.6. A jurisprudência do STF 13. Mandado de segurança contra ato omissivo 14. Livre disponibilidade da tutela mandamental 15. Competência para o mandado de segurança 15.1. Regras legais sobre a competência para o mandado de segurança 16. Mandado de segurança em matéria penal 17. O mérito da ação de mandado de segurança 17.1. Julgamento do mérito e lei superveniente 18. Partes na ação de mandado de segurança 18.1. Legitimação ativa 18.2. Legitimação ordinária 18.3. Legitimação extraordinária para o mandado de segurança 18.4. Direito comum a diversos titulares 18.5. Legitimação passiva 18.6. Autoridade coatora 18.7. Pessoa jurídica interessada 18.8. Legitimidade recursal 18.9. Caracterização de autoridade 18.10.Erro na nomeação da autoridade coatora 19. Equiparações legais de autoridade coatora 20. Mandado de segurança contra ato de colegiado 21. Sociedades de economia mista e empresas públicas 21.1. Atos de gestão comercial 21.2. Concessionários e permissionários

22. Assistência e intervenção de terceiro 23. Intervenção de amicus curiae no mandado de segurança 24. Intervenção da União em mandados de segurança em que figurem, como par tes, entidades da Administração Pública Federal indireta (Lei nº 9.469) Capítulo III AUTORIDADE COATORA FEDERAL 25. A autoridade coatora federal. Competência da Justiça Federal 26. Autoridade coatora em geral e autoridade coatora federal 27. Ausência de efeitos patrimoniais para a União 28. A jurisprudência sobre os concessionários de serviço público federal e a com petência para o mandado de segurança 29. Uma ponderação de ordem constitucional sobre a regra do art. 2º da Lei do Mandado de Segurança e a garantia do “juiz natural” 29.1. Corolário da tese jurisprudencial relativa a segurança contra ato de con cessionária de serviço público federal 30. Situações de conflito em torno da competência da Justiça Federal Capítulo IV SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL 31. Legitimação de terceiro interessado: substituição processual 32. Outro caso de legitimação extraordinária (parcial) 33. Requisitos da substituição processual 34. Notificação do legitimado originário 35. O prazo da notificação e o prazo de decadência da ação mandamental Capítulo V MANDADO DE SEGURANÇA EM REGIME DE URGÊNCIA 36. Impetração do mandado de segurança por meio eletrônico 37. Notificação e intimação por meio eletrônico Capítulo VI RESTRIÇÕES AO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA 38. Restrições de origem constitucional 39. Ato praticado em processo administrativo

40. Mandado de segurança contra decisão judicial 41. Ato judicial omissivo 42. Decisão judicial transitada em julgado 43. O esvaziamento do cabimento do mandado de segurança contra ato judicial 44. Prazo para impetração da segurança contra ato judicial: ato jurisdicional e ato administrativo do Poder Judiciário 45. Julgados dos Juizados Especiais 45.1. Mandado de segurança contra decisão interlocutória nos Juizados Especiais 46. O problema da competência para processar o mandado de segurança contra decisões dos Juizados Especiais 47. Mandado de segurança do terceiro prejudicado por decisão judicial 48. Mandado de segurança contra órgão fracionário de tribunal 49. Ato disciplinar 50. Atos “interna corporis” Capítulo VII A PROPOSITURA DO MANDADO DE SEGURANÇA 51. A importância da petição inicial 52. Petição inicial defeituosa ou incompleta 53. A petição inicial e seus requisitos 54. Os requisitos da inicial e as características do mandado de segurança 55. Alguns detalhes da petição inicial do mandado de segurança: o sujeito passivo da ação 56. Inexistência de litisconsórcio entre coator e pessoa jurídica interessada 57. Autoridade coatora, na concepção legal 57.1. Correção da nomeação equivocada da autoridade coatora 57.2. Autoridade coatora e a teoria da encampação 57.3. Autoridade coatora, nos casos das equiparações do § 1º, do art. 1º, da Lei nº 12.016 58. Especificação das provas a produzir. Exibição de documentos em poder do coator ou de terceiro 58.1. Documentos indispensáveis à instrução da petição inicial 58.2. Instrumento do mandato do advogado do impetrante 59. Petição inicial por meio eletrônico 60. Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido

61. O pedido 61.1. Descabimento de pedido que transforme o mandado de segurança em ação de cobrança 62. Valor da causa 63. Denegação do mandado de segurança, sem resolução do mérito 64. Renovação do pedido de mandado de segurança 65. Desistência do mandado de segurança Capítulo VIII DESPACHO DA PETIÇÃO INICIAL 66. O procedimento sumário do mandado de segurança 67. A natureza da notificação da autoridade coatora 68. As informações requisitadas da autoridade coatora 69. A ciência da pessoa jurídica interessada 70. Cientificação no caso de organismo autônomo não personalizado 71. Tutela antecipada: suspensão liminar do ato impugnado 71.1. A importância da tutela de segurança alcançável por meio da liminar 72. Requisitos da liminar do mandado de segurança 73. Momento processual da liminar 74. O caráter mandamental e não discricionário da medida liminar 75. Dimensões da liminar 76. Direito à liminar e exigência de caução 77. Duração dos efeitos da liminar 78. Recurso contra a decisão relativa à liminar do mandado de segurança 79. Vedações à liminar 80. Limite temporal dos efeitos da liminar: inexistência 80.1. Tramitação preferencial do mandado de segurança 81. O mandado de segurança e o Código de Processo Civil Capítulo IX PEREMPÇÃO OU CADUCIDADE DA LIMINAR 82. Revogação e cassação da liminar 83. Revogação tácita 84. Perempção ou decadência da liminar

Capítulo X PROVIDÊNCIAS ADMINISTRATIVAS 85. Medidas Administrativas preparatórias da defesa da pessoa jurídica 86. Providência administrativa a cargo da autoridade coatora 87. Prazo para a manifestação da pessoa jurídica interessada nos autos 88. Representação judicial da pessoa jurídica afetada pelo mandado de segurança Capítulo XI INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL 89. Indeferimento da petição inicial 90. Recurso contra o indeferimento da petição inicial 91. Litisconsórcio ativo superveniente Capítulo XII DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DOS ATOS DE COMUNICAÇÃO PROCESSUAL 92. Documentação processual da notificação da autoridade coatora e da citação Capítulo XIII MINISTÉRIO PÚBLICO 93. Participação do Ministério Público 94. O Ministério Público como impetrante do mandado de segurança 95. O representante do Ministério Público como autoridade coatora Capítulo XIV EXECUÇÃO DA SENTENÇA 96. Autoexecutividade da sentença do mandado de segurança 97. A forma de comunicação e cumprimento do mandado de segurança 98. Cumprimento da sentença que defere o mandado de segurança 99. Alguns expedientes utilizáveis para conferir efetividade ao cumprimento da sentença do mandado de segurança Capítulo XV RECURSOS 100. O sistema recursal da Lei do Mandado de Segurança 101. Apelação contra a sentença do mandado de segurança

101.1.Atribuição excepcional de efeito suspensivo à apelação 101.2.Prazo para interposição da apelação 102. Duplo grau de jurisdição necessário 103. Recurso da autoridade coatora 104. Execução imediata (provisória) da sentença do mandado de segurança 105. Efeito da sentença denegatória da segurança 106. Verbas remuneratórias de servidores públicos reclamáveis por meio de mandado de segurança 107. Recursos particulares ilegalmente apropriados pela Administração Capítulo XVI SUSPENSÃO DA SEGURANÇA 108. Suspensão cautelar da segurança 109. Natureza jurídica 110. Cabimento do incidente 111. Legitimidade para promover o incidente 112. Competência 113. Procedimento 114. Oportunidade e eficácia do incidente 115. Reiteração do pleito e agravo interno 116. Recurso contra a decisão do pedido de suspensão da segurança 117. Expansão dos efeitos da suspensão a outros processos Capítulo XVII MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS 118. Mandado de segurança de competência originária de Tribunal 119. Sustentação oral 120. Recorribilidade da decisão do relator sobre a liminar do mandado de segurança 121. O agravo interno Capítulo XVIII NOTAS TAQUIGRÁFICAS DAS SESSÕES DE JULGAMENTO 122. Substituição do acórdão pelas notas taquigráficas Capítulo XIX

RECURSOS EM MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS 123. Sistema recursal aplicável ao mandado de segurança 124. Recursos para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça 125. Recurso ordinário 126. Conceito de denegação da segurança 127. Prazo do recurso ordinário e reexame necessário 128. Julgamento do recurso ordinário Capítulo XX MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO COMUM 129. A sentença do mandado de segurança 130. Coisa julgada formal e material em mandado de segurança 131. Coisa julgada formal em mandado de segurança 132. Rescindibilidade da sentença no mandado de segurança 133. Coisa julgada e relações jurídicas continuativas Capítulo XXI TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA DO MANDADO DE SEGURANÇA 134. Processamento em caráter preferencial do mandado de segurança 135. Procedimento célere nos tribunais Capítulo XXII MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO 136. O mandado de segurança como instrumento de tutela coletiva 137. A tutela coletiva e a substituição processual 138. Direitos difusos, direitos coletivos e direitos individuais homogêneos 139. Mandado de segurança e ação civil pública 140. Requisitos do mandado de segurança coletivo 141. Direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo 141.1.Identificação dos direitos sob tutela do mandado coletivo 141.2.Direitos defendidos pelo mandado de segurança coletivo: os controvertidos “direitos difusos” 141.3.Da pequena relevância da tese que insiste em estender o mandado de segurança coletivo

aos direitos difusos 141.4.A defesa dos direitos difusos por meio do mandado de segurança coletivo 141.5.Impossibilidade prática de isolar os direitos coletivos dos direitos difusos 141.6.Mandado coletivo e direitos difusos: um falso problema 142. Partidos políticos 142.1.Os partidos políticos e sua destinação institucional 142.2.Alguns problemas da legitimação dos partidos políticos, após a Lei nº 12.016/2009 143. Organização sindical e entidade de classe 144. Associações 144.1.Relação dos associados da entidade impetrante 145. Pessoas jurídicas de direito público 146. Legitimação do Ministério Público para o mandado de segurança coletivo 147. Legitimação passiva do mandado de segurança coletivo 148. Competência 149. O procedimento do mandado de segurança coletivo Capítulo XXIII COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO 150. O regime da coisa julgada nas ações coletivas, anteriores ao mandado de segurança coletivo 151. O regime da coisa julgada nas ações de mandado de segurança coletivo 152. Substituição processual e coisa julgada no mandado de segurança coletivo: uma última palavra 153. Inocorrência de litispendência entre mandado de segurança coletivo e as ações individuais 154. Desistência do mandado de segurança individual 155. Restrições à liminar no mandado de segurança coletivo 156. Particularidades da sentença do mandado de segurança coletivo Capítulo XXIV DECADÊNCIA DO DIREITO AO MANDADO DE SEGURANÇA 157. Prazo para impetrar o mandado de segurança 157.1.Justificativa constitucional do prazo decadencial estabelecido para o mandado de segurança 158. Natureza do prazo para impetração do mandado de segurança 159. Contagem do prazo decadencial da segurança

160. Algumas situações particulares, em tema do prazo decadencial aplicável ao mandado de segurança Capítulo XXV LITISCONSÓRCIO 161. Litisconsórcio no mandado de segurança 162. Litisconsórcio passivo 163. Casos de litisconsórcio passivo necessário 164. Litisconsórcio ativo 165. Litisconsórcio ativo superveniente 166. Assistência no mandado de segurança Capítulo XXVI EMBARGOS INFRINGENTES E SUCUMBÊNCIA 167. Os embargos infringentes e o mandado de segurança 168. Honorários de advogado e encargos sucumbenciais 169. Litigância de má-fé Capítulo XXVII DESCUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA 170. O cumprimento do mandado de segurança 171. Responsabilidade penal da autoridade coatora: crime de desobediência 172. Crime de responsabilidade e sanções administrativas 173. Outras sanções Capítulo XXVIII DISPOSIÇÕES FINAIS 174. Reflexos da Lei do Mandado de Segurança 175. A vigência da Lei nº 12.016/2009 e o direito intertemporal 176. Leis revogadas BIBLIOGRAFIA

Parte I NOÇÕES GERAIS

Capítulo I HISTÓRICO DO MANDADO DE SEGURANÇA 1.

ANTECEDENTES

No Império e nos primórdios da República, salvo no tocante à liberdade de locomoção, o direito brasileiro não dispunha de remédio jurisdicional próprio para proteção dos indivíduos em face dos abusos de poder praticados pelos agentes públicos1. Coube a RUI BARBOSA defender o cabimento dos interditos possessórios, pelo caráter expedito de seu procedimento, para propiciar o enfrentamento dos males advindos da ilegalidade cometida pela Administração, em prejuízo dos cidadãos. Recorria o grande jurista à tese da existência de posse não só sobre coisas corpóreas, mas também sobre direitos pessoais. Registra, contudo, CELSO BARBI, que o tradicional conceito de posse impediu que o esforço de aplicar os interditos saísse vitorioso na doutrina e na jurisprudência2. Sem resultados práticos significativos, as Leis nºs 221, de 20.11.1894, e 1939, de 28.08.1908, instituíram a ação com pedido anulatório de ato da administração, aplicável, de início, na esfera da União, e, posteriormente, estendido às autoridades municipais e estaduais. Podem essas leis, no entanto, ser vistas como iniciadoras do movimento legislativo que iria, mais tarde, desaguar na implantação do mandado de segurança3. Conquanto a ação sumária decorrente da Lei nº 221/1894 tenha institucionalizado o controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário, não logrou obter a pretendida eficácia, porque, segundo ARNOLDO WALD, sua tramitação era muito lenta. De tal sorte que acabou, no dizer de PONTES DE MIRANDA, “desaparecendo da vida jurídica sem que nela se tivesse consolidado”4. Quando, em 1926, GUDESTEU PIRES defendia, na Câmara dos Deputados, seu Projeto de Lei destinado a implantar o mandado de segurança, teve a oportunidade de observar que “a ação sumária especial, criada pela Lei n. 221, de 1894, foi um ensaio no sentido de alargar a defesa dos direitos individuais; no entanto, a natureza desse processo e especialmente a fórmula de seus recursos deram lugar a que a chicana abusasse dos prazos, transformando-lhe o rito sumário em interminável sucessão de defesa e deploráveis delongas”5. Outro antecedente do mandado de segurança, na luta para coibir os abusos administrativos contra os particulares, se deu pela ampliação da doutrina do habeas corpus, ensaiada no sentido de proteger, por seu intermédio, outros direitos individuais além da liberdade de locomoção. Fundavase a denominada “doutrina brasileira do habeas corpus” no fato de que a Constituição Republicana de 1891 garantia o aludido remédio processual em prol do indivíduo sempre que sofresse ou se

achasse na iminência de sofrer violência ou coação “por ilegalidade ou abuso de poder”, sem se limitar, de maneira expressa, ao “direito de ir e vir”. Embora a jurisprudência tenha, sem maior ênfase, acatado eventualmente essa tese, sua sobrevivência foi breve e frágil, porque uma Reforma Constitucional de 1926 interferiu na Carta de 1891 para declarar que o habeas corpus somente se destinava a tutelar o direito de locomoção6.

2.

O MANDADO DE SEGURANÇA NO REGIME CONSTITUCIONAL

Coube à Constituição de 1934 a criação do mandado de segurança no ordenamento jurídico brasileiro, ao prever que: “Dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito, certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo de habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa jurídica de direito público interessada. O mandado de segurança não prejudica as ações petitórias competentes” (art. 113, § 33). A Lei nº 191, de 16.01.1936, disciplinou o processo do mandado de segurança, deixando claro que em seu campo de atuação não se incluíam as questões puramente políticas, os atos disciplinares, a liberdade de locomoção e os atos impugnáveis por recurso administrativo, independentemente de caução, fiança ou depósito. A Constituição de 1937 não contemplou, em seu bojo, o mandado de segurança, relegando-o ao plano da legislação ordinária. O Decreto-Lei nº 6, de 16.11.1937, retratando o regime ditatorial então implantado, vedou o mandado de segurança contra atos do Presidente da República, dos Ministros de Estado, dos Governadores e interventores. O Código de Processo Civil de 1939 previu, entre os procedimentos especiais, o do mandado de segurança (arts. 319 a 331). O status constitucional do mandado de segurança foi reconquistado por meio da Carta democrática de 1946. A Lei nº 1.533, de 31.12.1951, revogou os dispositivos do CPC, cuidando em disciplina extravagante, de maneira ampla, do regime do mandado de segurança, tanto formal como materialmente. A Lei nº 1.533 vigorou, com algumas alterações pontuais, até 2009, quando adveio a Lei nº 12.016, de 07.08.2009, atualmente em vigor. Nesse meio tempo, surgiu a Constituição de 1967, seguida pela Emenda nº 1, de 1969, restando mantido o caráter constitucional do mandado de segurança restabelecido desde a Carta de 1946. A redemocratização do País, operada pela Constituição de 1988, não alterou esse regime. Os detalhes relevantes relativos ao mandado de segurança, durante esse processo das renovações constitucionais, se situaram nos termos da conceituação do remédio heroico: (i) o art.

141, § 24, da Constituição de 1946, falava em proteção a “direito líquido e certo não amparado por habeas corpus”, excluindo, assim, a antiga exigência de “inconstitucionalidade e de ilegalidade manifestas”, como requisito do mandado de segurança; (ii) a Constituição de 1967 falava em proteção de “direito individual líquido e certo não amparado por habeas corpus” (art. 153, § 21); (iii) a Emenda nº 1, de 1969, excluiu a expressão “individual”, de maneira a restabelecer a conceituação da Carta de 1946; e (iv) a Constituição de 1988 inovou em três aspectos o regime do mandado de segurança: a) permitiu sua impetração também contra atos de agentes de pessoa jurídica privada nas funções do Poder Público (art. 5º, LXIX); b) admitiu a impetração coletiva (art. 5º, LXX), além da individual; e c) reconheceu que a tutela mandamental tanto pode ser invocada para a proteção de direitos individuais como de direitos coletivos (art. 5º, LXIX, c/c o inc. XXXV)7. Depois de quase meio século de vigência da Lei nº 1.533/1951, adveio a Lei nº 12.016, de 07.08.2009, que teve o propósito de unificar a regulamentação do mandado de segurança, levando em conta as diversas inovações legislativas supervenientes, tanto no plano constitucional como no infraconstitucional, bem assim a necessidade de incorporar ao ordenamento jurídico positivo as teses consagradas pela jurisprudência sedimentada em súmulas dos tribunais8. Essa nova lei, então, revogou a Lei nº 1.533 e toda a legislação que, desde a época da Constituição de 1946, vinha regendo o acesso ao mandado de segurança.

3.

DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Sem distinguir os que seriam direitos e os que seriam garantias, a Constituição, no art. 5º, proclama e garante a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no País “a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, nos termos dos 78 itens em que o dispositivo se desdobra. Embora seja tecnicamente possível distinguir entre direito e garantia, a Constituição não cuida de fazê-lo no arrolamento dos direitos e garantias fundamentais, certamente porque, na ordem prática, não se chega a efeitos distintos significativos para uns e outros. Com efeito, a quem se outorga um direito, há sempre de garantir o respectivo exercício; e a quem se confere uma garantia, reconhece-se, ipso facto, o direito de usufruí-la. Há, pois, garantia na própria declaração de um direito fundamental, como há direito fundamental na instituição de determinado instrumento garantidor do exercício do direito da espécie9. Adverte, a propósito, JOSÉ AFONSO DA SILVA, que, embora se procure distinguir direitos e garantias a partir das no-ções de declaração e assecuração, não é decisivo, “em face da Constituição, afirmar que os direitos são declaratórios e as garantias assecuratórias, porque as garantias em certa medida são declaradas e, às vezes, se declaram os direitos usando forma assecuratória”10. Os direitos fundamentais, nessa ordem de ideias, são faculdades e prerrogativas que a Constituição reconhece como inerentes à natureza humana, são os clássicos “direitos do homem”,

correspondentes aos atributos essenciais de sua individualidade, cujo respeito não pode faltar na convivência social e civilizada11. O direito constitucional moderno, porém, se encarrega não apenas de prever e proclamar os direitos fundamentais do homem, mas também de instituir meios ou instrumentos que lhe assegurem a eficácia, perante os excessos e desmandos praticados, às vezes, pelos detentores do Poder Público12. Dessa maneira, a distinção teórica entre direitos e garantias fundamentais se faz da seguinte forma: (i) “os direitos são bens e vantagens conferidos pela norma”, enquanto (ii) “as garantias são meios destinados a fazer valer esses direitos, são instrumentos pelos quais se assegura o exercício e o gozo daqueles bens e vantagens”13. São inseparáveis dos direitos a que servem, já que, na qualidade de cláusulas tutelares, só se extinguem quando os próprios direitos protegidos se extinguirem14.

4.

TUTELA JURISDICIONAL AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Nos moldes de um Estado Democrático de Direito como o Brasil, a garantia dos direitos fundamentais é realizada por meio da tutela jurisdicional. A Constituição, por isso, ao declarar os direitos fundamentais, faz inserção, no respectivo rol, também dos remédios processuais destinados a protegê-los, de modo a assegurar--lhes a plena eficácia. É assim que, v.ġ., o art. 5º da Constituição prevê ações como o habeas corpus, o habeas data, o mandado de injunção e o mandado de segurança15. Mas, em sua essência e origem, esses remédios não podem se caracterizar como meras ações, que se exaurem dentro dos princípios da teoria geral do processo, “mas sim como garantias constitucionais destinadas a cercear a ilegalidade ou o abuso praticado pelo Poder Público e às vezes por particulares, não podendo ser abolidos ou limitados pelo legislador ordinário, e nem mesmo por emenda constitucional, tendo sua criação e limites impostos pelo próprio poder constituinte originário”16. Enfim, o mandado de segurança, que pode ser individual ou coletivo (CF, art. 5º, LXIX e LXX), é a ação constitucional concebida para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso do poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público17. O enraizamento do mandado de segurança no terreno constitucional dos direitos e garantias fundamentais exige, antes de tudo, que sua disciplina seja tratada à luz da “verdadeira grandeza e amplitude do instituto, bandeira da manutenção, conservação e desenvolvimento do Estado Democrático de Direito brasileiro”18. Por isso, o procedimento e a própria essência do mandado de segurança devem impor uma compreensão e interpretação, bem como uma aplicação, sempre “a partir da Constituição”19. Dessa origem constitucional, todavia, não decorre uma natureza instrumental diversa da que é

própria dos remédios processuais utilizados pela jurisdição estatal. É, pois, o mandado de segurança – na lição de BARBOSA MOREIRA – “uma ação, uma espécie de gênero bem conhecido e familiar, cujas peculiaridades, sem dúvida dignas de nota, não a desligam do convívio das outras espécies, não a retiram do contexto normal do ordenamento jurídico, não a condenam a degredo em ilha deserta. À semelhança do que acontece com as figuras congêneres, o mandado de segurança está contido no âmbito normativo do processo civil e submete-se aos respectivos princípios e normas, sem prejuízo de regulamentação especial constante das leis que a ele especificamente dizem respeito”20. Não será, de tal sorte, fora da principiologia e sistemática do direito processual que se conseguirá descobrir soluções para problemas como aqueles que gravitam em torno da competência, do objeto litigioso, das condições da ação, dos pressupostos processuais, da legitimidade das partes, da natureza da ação e do provimento judicial, dos recursos, da coisa julgada, da execução forçada, e assim por diante.21 A fixação da natureza processual do mandado de segurança, todavia, em nada reduz a importância fundamental de uma ação nascida na Constituição, com função nela definida e voltada para objetivo institucional que vai muito além da simples composição judicial de conflito jurídico. É ele, em si, uma das garantias constitucionais fundamentais, como se deduz de sua sede normativa: o art. 5º da Carta Magna, que o institui, o arrola, expressamente, entre os “direitos e garantias fundamentais, conferindo-lhe toda nobreza e relevância próprias dessa transcendental categoria jurídica”22. Qualquer ensaio, portanto, que se proponha a identificar e avaliar o papel do mandado de segurança, haverá de fazê-lo a partir do enfoque constitucional, dentro do qual assume, a um só tempo, a estrutura de remédio processual e garantia constitucional. Essa natureza complexa e multiforme do instituto faz com que em seu estudo predominem as indagações de ordem constitucional sobre aquelas de aspecto meramente procedimental. Portanto, nenhum princípio, nenhuma técnica e nenhuma regra processuais podem influir, de maneira restritiva, no cabimento e nas dimensões do mandado de segurança, cuja admissão haverá sempre de se dar “de forma amplíssima, tendo-se por ilegítimo tudo que amesquinhe, tal parâmetro”, na lição de SÉRGIO FERRAZ23 e de ARRUDA ALVIM24. Aliás, não se pode esquecer que, em matéria de direito constitucional, vigora, com ênfase, o princípio da máxima efetividade, que, segundo CANOTILHO, se apresenta como “um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais”, mas que se aplica, sobretudo, no âmbito dos direitos fundamentais, e que pode assim ser formulado: “a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê”. De tal sorte, deve-se evitar interpretações restritivas, e “no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais”25. É nessa ótica que se preconiza ao legislador ordinário e aos tribunais evitar medidas regulamentares ou entendimentos interpretativos que reduzam a garantia constitucional do mandamus, impondo-lhe requisitos e limites não cogitados pela regra constitucional, que o disciplina como garantia fundamental.

5.

NATUREZA DA AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA

Segundo, pois, a teoria geral do processo, o mandado de segurança, na atualidade, não enseja dúvida quanto à sua natureza processual: trata-se de uma ação de conhecimento, sujeita a rito especial, merecendo de PONTES DE MIRANDA26 a qualificação de mandamental, por ensejar a expedição de “uma ordem ou comando à autoridade pública e à pessoa jurídica interessada”. Essa peculiaridade, todavia, não lhe retira a natureza, ora de ação constitutiva, ora declaratória, ora condenatória, conforme o seu conteúdo27. Em se tratando de ação de conhecimento, “nela pode a parte autora pedir que o órgão jurisdicional condene a outra a um fazer ou a um abster-se (ação condenatória), crie, modifique ou extinga uma relação jurídica (ação constitutiva), declare que ocorreu ou não um fato, ou que um documento é ou não autêntico (ação simplesmente declaratória – CPC, art. 4º), ou ordene à outra parte que realize uma certa conduta, devendo esta empreender especificamente o que lhe foi determinado (ação mandamental)”28. Em suma:

6.

a)

No plano constitucional, “o mandado de segurança está inserido no rol das garantias constitucionais fundamentais específicas, exercendo, ao lado do habeas corpus, do habeas data, do mandado de injunção, da ação civil pública, da ação popular, do dissídio coletivo etc., uma função extremamente importante para a proteção e efetivação dos direitos, especialmente os constitucionais, no Brasil”29;

b)

No plano processual, “o provimento no mandado de segurança poderá ser condenatório, declaratório ou constitutivo, conforme o caso; porém, no plano da eficácia, o seu provimento concessivo da segurança pretendida será sempre mandamental”, ou seja: importará na expedição de ordem “para a prática ou abstenção de determinado comportamento por parte da autoridade coatora e do órgão por ela defendido”30.

A ELEVADA IMPORTÂNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA NO PLANO DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS

No ambiente das instituições básicas do Estado Democrático de Direito, o que é mais importante não é analisar o mandado de segurança a partir de sua natureza de mecanismo processual, ao lado das diversas formas de ação exercitáveis para obtenção da tutela do Poder Judiciário. O que releva descobrir e avaliar é a função que, por meio do instrumento concebido pelo art. 5º, LXIX, da Constituição, o Estado Democrático moderno confiou à Justiça. Há um empenho evidente na estruturação do Poder Público e na regulação de seu

relacionamento com os cidadãos, a fim de implantar, na vivência ideal dentro da organização do Estado Democrático – sob o qual se agrupam não mais os súditos do estado autoritário, e sim os cidadãos do atual Estado ético e solidário –, mecanismos práticos e eficientes, tendo como missão principal e primordial a tutela e realização efetiva dos direitos fundamentais. Esse Estado Democrático de nosso tempo afasta-se dos padrões outrora predominantes no constitucionalismo primitivo, que se declarava democrático, mas mantinha uma estrutura voltada para assegurar a supremacia do chamado interesse público (que mais não era que o interesse hegemônico do Poder Público) sobre o privado. O novo Estado, que aspira ser realmente democrático, elimina o velho modo de atuar da Administração, que importava um relacionamento desequilibrado entre o Estado e o particular, no qual prevalecia um vínculo entre senhor e súdito, e, por consequência, o interesse do Poder Público deveria prevalecer sempre sobre o dos súditos. O centro do universo constitucionalmente organizado, entretanto, se coloca, hoje, em torno do indivíduo e dos direitos fundamentais a ele atribuídos, e cujo respeito haverá de ser mantido e garantido em nome da dignidade da pessoa humana. As relações entre Administração e cidadãos (não há mais súditos, mas cidadãos), por isso, não mais podem se manter na posição de desequilíbrio hierárquico do passado. Têm elas de ser vistas e tratadas como paritárias, de modo que nenhuma das partes seja juridicamente superior à outra. Nem a Administração, nem o particular. Como, no entanto, a Administração enfeixa em suas mãos grandes porções da força do Poder Público, é preciso garantir o cidadão contra o risco dos eventuais abusos a que se sentem tentados os detentores da autoridade administrativa. Numa quadra democrática como a atual, é impossível ignorar ou desprezar, tampouco minimizar, o papel desempenhado pela instituição constitucional do mandado de segurança. Os direitos e garantias constitucionais exigem mecanismos práticos e eficientes de proteção, diante da reconhecida insuficiência da mera proclamação de superioridade normativa da Constituição. Daí a criação do mandado de segurança, por obra da própria Constituição, vocacionado por excelência, nas perspectivas relacionais democráticas entre o Poder Público e o cidadão, à proteção deste contra os abusos administrativos31. É o mandado de segurança uma ação, mas não apenas mais uma ação no universo das ações judiciais. Em vista de sua figura de garantia constitucional, atua como um remédio destinado a desenvolver uma “tutela diferenciada”32, não só pelo rito todo particular, como pela força extraordinária do provimento que é capaz de gerar, mas, sobretudo, pela natureza constitucional “não só do instrumento, mas dos direitos que objetiva proteger”33. Trata-se, em suma e acima de tudo, de “expressiva garantia contra a ilegalidade praticada pelo Poder Público”, com aptidão para “preveni-la, ou obstar a produção de seus efeitos”34, tudo com a máxima singeleza e efetividade35.

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ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 30. BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 31. BARBI. Op. cit., p. 31-32. WALD, Arnoldo. Do mandado de segurança na prática judiciária. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1968. p. 14. PIRES, Gudesteu. Avulso da Câmara dos Deputados, n. 148, p. 43, apud CAVALCANTI, Themístocles Brandão. Do Mandado de Segurança. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1957. p. 73; ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de Segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010. p. 19. No direito comparado, já existia, antes da instituição do nosso mandado de segurança, remédios que viriam influenciar na sua concepção no futuro direito constitucional brasileiro, como o juicio de amparo da Constituição Mexicana de 1857 e os writs do direito anglo-americano (BULOS, Uadi Lammêgo. Ċonstituição Federal anotada. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 298; BARBI, Celso Agrícola. Op. cit., p. 19-22; ALMEIDA, Gregório Assagra, et al. Op. cit., p. 32). ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de segurança, cit., p. 37-38. Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto Legislativo nº 125/2006, que se converteu na Lei nº 12.016, de 07.08.2009, que vem a ser a atual “Lei do Mandado de Segurança”. Para Ruy Barbosa, uma coisa são os direitos, outra, as garantias, e, por isso, devemos separar, “no texto da lei fundamental, as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos; estas, as garantias: ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração do direito” (BARBOSA, Ruy. República: teoria e prática (Textos doutrinários sobre direitos humanos e políticos consagrados na primeira Constituição da República). Petrópolis/Brasília: Vozes/Câmara dos Deputados, 1978. p. 121 e 124). Porém, como destaca Sampaio Doria, não são nítidas as linhas divisórias entre direitos e garantias, pois “os direitos são garantias, e as garantias são direitos”, ainda que se procure distingui-las (SAMPAIO DORIA, Antonio Roberto. Direito Constitucional. São Paulo: Max Limonad, 1960, v. II, p. 57). SILVA, José Afonso da. Ċurso de direito constitucional positivo. 15. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998. p. 189. Anota o autor que “a Constituição, de fato, não consigna regra que aparte as duas categorias, nem sequer adota terminologia precisa a respeito das garantias. Assim é que a rubrica do Título II enuncia: ‘Dos Direitos e Garantias Fundamentais’, mas deixa à doutrina pesquisar onde estão os direitos e onde se acham as garantias” (...). Às vezes, “ela se vale de verbos para declarar direitos que são mais apropriados para enunciar garantias. Ou talvez melhor diríamos, ela reconhece alguns direitos garantindo-os” (Op. cit., loc. cit.). BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 16. “Além do reconhecimento da existência dos direitos fundamentais, é necessário que esses direitos sejam também garantidos por instrumentos e mecanismos que os tornem eficazes, ao terem de se defrontar com o próprio Estado e com as instituições estatais previstas na Constituição” (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo:

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Saraiva, 2009. nº 2.6, p. 16). SILVA, José Afonso da. Ċurso de direito constitucional positivo. 15. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998. p. 413. CASTRO NUNES, José de. Do mandado de segurança e de outros meios de defesa contra atos do poder público. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p. 253. “Diante do conceito de ação com o direito de pleitear e obter prestação da tutela jurisdicional de mérito, pelo Estado, seja de que conteúdo for, é fácil ver que o mandado de segurança é verdadeira ação, porquanto também, nesse instituto, há o direito de pleitear do Poder Judiciário um tipo de tutela jurisdicional visando proteger direito líquido e certo ameaçado de lesão ou violado por ato de autoridade” (AURELLI, Arlete Inês. O juízo de admissibilidade na ação de mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 18-19). REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., nº 2.6, p. 17-18. Idem, op. cit., nº 3.5, p. 42. Lei nº 12.016/2009, art. 1º. Segundo HELY LOPES MEIRELLES, o mandado de segurança é o “meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 21. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000. p. 21-22). BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 3-4. CAVALCANTI, Marcos de Araújo. A legitimidade passiva para o mandado de segurança: uma proposta de interpretação da Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 108, p. 69. BARBOSAMOREIRA,JoséCarlos.Darecorribilidadedasdecisõesinterlocutóriasnoprocesso do mandado de segurança. Temas de direito processual. 6ª série. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 212. Para outro acatado processualista, “talvez já tenha passado a hora de os processualistas voltarem seus olhos e mentes para o mandado de segurança enquanto procedimento especial, analisando-o de acordo com a teoria geral do processo” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. Natureza jurídica das informações da autoridade coatora no mandado de segurança. Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança – 51 anos depois. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 367-368). VICENTEGRECOFILHO,comprecisão,ensinaque“apesardeterembasamentoconstitucional, o mandado de segurança é uma verdadeira ação e deve ser estudado dentro da teoria geral do processo. Trata-se de um pedido de atuação da jurisdição e, por conseguinte, classifica-se como ação e como processo” (GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil brasileiro: processo de execução a procedimentos especiais. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3. p. 324). “A estatura constitucional do mandado de segurança, enquanto ação e garantia individual e coletiva, projeta-o duplamente como instrumento garantidor e garantia em si mesmo. É instrumento garantidor porque se presta – em inumeráveis situações – para proteger o indivíduo ou a coletividade de violação ou potencial violação de direitos fundamentais elencados

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constitucionalmente (como a própria garantia à legalidade) e também é garantia fundamental em si mesmo na exata medida em que seu manejo pelos tutelados não pode ser reduzido, impedido ou turbado nem mesmo pela própria lei” (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 495). FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 1992. p. 16. “Assim, não é lícito ao legislador ordinário angustiar as dimensões do remédio constitucional”, a pretexto de regulamentá-lo. Não pode o legislador ordinário alterar-lhe “as características propriamente definidoras, pois, desta forma, estaria disciplinando somente, de forma nominal, o mandado de segurança, que tem sede e dimensão constitucionais” (ARRUDA ALVIM, José Manoel. Tratado de direito processual civil. São Paulo: Ed. RT, 1990. v. I, p. 251). Há de se ter em mente que, no Estado Democrático de Direito, a ordem constitucional impõe à Administração não apenas o dever de não violar as posições subjetivas do cidadão, pois passa a “condicionar positivamente a Administração, que deve atuar no sentido de permitir a máxima satisfação dos direitos fundamentais” (CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. p. 139). CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, s/d. p. 1.187. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Ċomentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1974. v. VIII, p. 206; BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança, cit., p. 45. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010. p. 16; BARBI, Celso Agrícola. Op. cit., p. 46. Segundo KAZUO WATANABE, o mandado de segurança é “uma espécie de ação com provimento reforçado e com procedimento simplificado e célere, de modo que a tutela dos direitos seja pronta, eficaz e adequada” (WATANABE, Kazuo et al. Código brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. p. 836). DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009. nº 2, p. 16 (o art. 4º citado pelo autor é do CPC/1973, correspondente ao art. 19 do CPC/2015). Entende o autor que, “tocante às quatro modalidades de ação de conhecimento – condenatória, constitutiva, declaratória ou mandamental –, o mandado de segurança pode assumir feições combinadas de ação condenatória e mandamental ou constitutiva e mandamental, podendo também ser exclusivamente mandamental. Prepondera, todavia, no mandado de segurança, o caráter de ação mandamental, exatamente porque lhe é inerente que a autoridade apontada como coatora, em caso de procedência do mandado de segurança, deva atender precisamente ao que na sentença lhe for determinado” (Op. cit., p. 17-18). A sentença é vista como mandamental pela circunstância de o comando judicial exigir cumprimento imediato sem depender de “processo de execução ex intervallo” (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 302; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Ċomentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. atualizada por Sérgio Bermudes. Rio de Janeiro: Forense, 1995. t. I, p. 111). O fato, porém, de, no caso da ação mandamental, dispensar-se a ação de execução, não retira à sua sentença o caráter condenatório, “até porque toda sentença

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em que haja uma ordem é condenatória a uma conduta” (PISTILLI, Ana de Lourdes Coutinho Silva. Mandado de segurança e coisa julgada. São Paulo: Atlas, 2006. p. 30). O que varia, na espécie, é apenas a forma de executar o comando sentencial, e não a essência do provimento. A mandamentalidade, portanto, é eficácia que se passa no plano executivo, não no da substância da sentença. Dessa maneira, a ação de segurança, por ser mandamental, não deixa de produzir condenação em sua sentença. ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de segurança, cit., p. 46. Idem, p. 49. ANDRADE, Érico. O mandado de segurança: a busca da verdadeira especialidade (proposta de releitura à luz da efetividade do processo). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010. p. 361. “Troppo spesso la tensione ideale verso l’effettività costituzionale è stata identificata con l’esigenza di una tutela differenziata dei diritti e delle libertà costituzionalmente garantiti” (MAGRI, Marco. La legalità costituzionale dell’amministrazione: ipotesi dottrinali e casistica giurisprudenziale. Milano: Giuffrè, 2002. p. 21-22). ANDRADE, Érico. Op. cit., loc. cit. WALD, Arnoldo. A nova lei do mandado de segurança (Lei 12.016, de 07.08.2009). Revista dos Tribunais, 894/12. ANDRADE, Érico. Op. cit., loc. cit. “A previsão legal de que a petição inicial de mandado de segurança deve atender às exigências dos arts. 282 e 283 do CPC pode passar à primeira leitura a ideia de que se trata de uma ação cível, apenas com um rito procedimental distinto, mas tal sugestão é de todo equivocada, pois não se deve esquecer que se trata de um remédio ou de uma medida constitucional de excepcional aptidão e valia para conjurar, com eficiência e presteza, abusos e ilegalidades, ofensas e ameaças de ofensas a direitos subjetivos, o que certamente o faz inconfundível com o clássico conceito de ação civil comum” (MAIA FILHO, Napoleão Nunes. Sobre a petição inicial do mandado de segurança. Comentários críticos ao art. 6º da Lei nº 12.016/09. Revista CEJ, Brasília, ano XIII, n. 47, p. 12). Os artigos destacados pelo autor são do CPC/1973, correspondentes aos arts. 319 e 320 do CPC/2015.

Parte II COMENTÁRIOS À LEI Nº 12.016/2009, artigo por artigo

Capítulo II TUTELA PARA AS VÍTIMAS DE ILEGALIDADE E ABUSO DE PODER POR ATO DE AGENTE PÚBLICO Art. 1º. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. § 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. § 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. § 3º Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança. Referências legislativas: CF, art. 5º, LXIX: conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por “habeas corpus” ou “habeas data”, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Súmulas: Súmula 266/STF: Não cabe mandado de segurança contra lei em tese. Súmula 270/STF: Não cabe mandado de segurança para impugnar enquadramento da Lei 3.780, de 12/7/1960, que envolva exame de prova ou de situação funcional complexa. Súmula 474/STF: Não há direito líquido e certo, amparado pelo mandado de segurança, quando se escuda em lei cujos efeitos foram anulados por outra, declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Súmula 510/STF: Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial. Súmula 604/STF: O mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público. Súmula 625/STF: Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança. Súmula 627/STF: No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do presidente da república, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento. Súmula 631/STF: Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário. Súmula 701/STF: No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo. Súmula 42/STJ: Compete à justiça comum estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento.

Súmula 177/STJ: O Superior Tribunal de Justiça é incompetente para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de órgão colegiado presidido por Ministro de Estado. Súmula 206/STJ: A existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das leis de processo.

Comentários ao art. 1º 7.

INTRODUÇÃO

O mandado de segurança é uma instituição jurídica, e, como tal, há de ser conceituado e analisado, a partir dos dados constantes da norma legal que o prevê e disciplina. Do art. 1º da Lei nº 12.016/2009 podem ser extraídos sua conceituação, sua natureza jurídica, sua função, seus requisitos de validade e eficácia, bem como seus elementos essenciais objetivos e subjetivos. Serão, portanto, todos esses aspectos da ação constitucional em foco o objeto da análise que a seguir se intentará realizar por meio da interpretação do primeiro dispositivo da Lei do Mandado de Segurança. Embora o estatuto legal básico da ação mandamental se concentre na Lei nº 12.016/2009, é fora de dúvida que a ela também se aplique, subsidiariamente, a disciplina geral constante do Código de Processo Civil (sobre esse tema, ver, adiante, o nº 81).

8.

CONCEITO LEGAL

Mandado de segurança é o remédio processual constitucional, manejável contra ato de qualquer autoridade pública1, que cometa ilegalidade ou abuso de poder, tendo como objetivo proteger o titular de direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data (CF, art. 5º LXIX)2. Como o habeas corpus assegura a liberdade pessoal (direito de ir e vir) (CF, art. 5º, LXVIII) e o habeas data, a possibilidade de conhecer e controlar as informações pessoais constantes de arquivos públicos (CF, art. 5º, LXXII), a conclusão é que a cobertura do mandado de segurança é a mais ampla possível.3 Compreende todo e qualquer direito subjetivo que, não alcançado pelos dois remédios já referidos, se enquadre na configuração de direito líquido e certo4. Trata-se, dentro da função constitucional a que se acha destinado a cumprir, não de singelo procedimento de jurisdição especial contenciosa. Mais do que isso, por força do art. 5º, inc. LXIX, da Carta Política, é ele verdadeira garantia fundamental, de modo que a prerrogativa de manejá-lo equipara-se aos mais importantes direitos do homem reconhecidos pelo Estado Democrático de Direito, “a exemplo da vida, liberdade, igualdade, intimidade e liberdade de expressão”5. Por meio da declaração constitucional, proclama-se o direito fundamental do homem de não ser violado em sua esfera jurídica pelos agentes do Poder Público, ao mesmo tempo em que se institui uma garantia especialíssima para blindá-lo contra as ilegalidades e abusos de poder praticados em

nome do Estado.6 A garantia do mandado de segurança é, a um só tempo, um direito cívico dos cidadãos em sentido lato e um limite dos poderes conferidos aos agentes estatais. Embora seja o mandado de segurança, do ponto de vista funcional, um procedimento especial para o exercício do direito de ação (direito à tutela jurisdicional devida pelo Poder Judiciário), não fica o titular do direito líquido e certo sujeito a fazer uso apenas dele, para a defesa do direito lesado ou ameaçado pela autoridade pública. Cabe-lhe a faculdade de postular a tutela jurisdicional pela via expedita do mandado de segurança ou, se preferir, pelo procedimento civil comum, segundo as próprias conveniências7. A disciplina procedimental específica do mandado de segurança consta da Lei nº 12.016, de 07.08.2009, que revogou a Lei nº 1.533, de 31.12.1951, e toda a legislação que, desde a época da Constituição de 1946, vinha regendo o acesso a esse remédio processual.

8.1.

Princípio da legalidade e submissão do Poder Público ao controle judicial

A garantia de um remédio constitucional capaz de proteger a todos contra a prepotência dos agentes do Poder Público é algo que decorre diretamente do Estado Democrático de Direito. Não se concebe um Estado de Direito sem que se dê estrito cumprimento ao princípio da legalidade, princípio que impõe a submissão ao ordenamento jurídico tanto aos particulares como aos próprios órgãos estatais8. Isto porque, são características desse tipo de Estado constitucional: a) a submissão do Estado à jurisdição; b) a jurisdição só há de ser exercida mediante aplicação da lei preexistente; c) a jurisdição há de ser exercida por meio do juiz natural, ou seja, por órgão de uma magistratura imparcial, independente, cercada de todas as garantias; e d) incumbe ao Estado submeter-se à jurisdição em condições de igualdade com qualquer outra parte9. É diante de tal realidade que, na estrutura constitucional brasileira, as vias de acesso à jurisdição assumem a qualidade de direito fundamental do cidadão à realização do próprio Estado de Direito, naquilo em que se manifesta “seu ponto mais vigoroso e mais eficiente”10. Daí que, se a última palavra cabe ao Poder Judiciário, no controle da legalidade sobre os atos administrativos, fácil é avaliar “o lugar preeminente que assume a garantia constitucional do mandado de segurança dentro do Estado de Direito”11.

8.2.

Ilegalidade e abuso de poder

Esses dois temas – a ilegalidade e o abuso de poder – exigem compreensão fundada na teoria do direito administrativo, que a partir do século XX vem sofrendo acentuada evolução em suas concepções básicas. Numa visão liberal (e superada), a ilegalidade estaria ligada à prática dos atos vinculados, enquanto o abuso de poder relacionar-se-ia com os denominados atos discricionários. A vinculação da administração seria completa à lei, de maneira que somente poderia fazer aquilo que

a lei determinava e pelos meios também previstos na lei. O princípio da legalidade, segundo a velha fórmula de ZANOBINI, consagrada entre nós por HELY LOPES MEIRELLES, incidia de forma diversa em relação ao cidadão e à Administração. “No que diz respeito ao cidadão, o princípio da legalidade atuaria como limite externo, de modo que o privado poderia fazer tudo aquilo que a lei não vedasse. Ao contrário, em relação à Administração, a valência do princípio seria diversa, traduzindo limite interno: a Administração só poderia fazer aquilo que a lei expressamente determina ou prevê”12. Daí que, na opinião clássica difundida por ZANOBINI e seus seguidores, seria contaminado de ilegalidade qualquer ato administrativo que não fosse expressamente autorizado pela lei13. A ideia de abuso de poder, ainda dentro da doutrina tradicional, foi construída para ser aplicada àqueles atos qualificados como “discricionários”, porque a lei que os autorizava conferia ao administrador maior margem de liberdade para apreciar os motivos, os elementos ou a finalidade a ser atingida. À luz da clássica visão do direito administrativo, haveria o abuso ou desvio de poder quando o manejo de uma competência, ainda que instituída legalmente, fosse feito “em descompasso com a finalidade em vista da qual foi instituída”14. A notável evolução recente do direito administrativo, cujo início se deveu à doutrina italiana, se deu no rumo de anular a distinção de critérios adotada classicamente para a aplicação do princípio da legalidade aos atos da Administração e aos atos dos particulares. Num Estado Democrático de Direito, o princípio constitucional da legalidade é um só, seja para o Poder Público, seja para os particulares. Nessa perspectiva, o vínculo de todos, inclusive o Estado, não é com a lei em sentido estrito, mas com o direito lato sensu, que modernamente reconhece força de norma também aos princípios, além de adotar, o direito positivo, com grande desenvoltura, normas forjadas por meio de cláusulas gerais, e com emprego de conceitos abertos ou indeterminados. Com esse espírito, a Constituição não se limita a vincular os atos da Administração à legalidade estrita, mas os sujeita a um complexo de princípios preconizados como fundamentais: “A administração pública direita e indireta (...) – dispõe o art. 37 da CF – obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. A valorização dos princípios constitucionais na seara do direito administrativo teve como consequência o afastamento da rigidez da subordinação da Administração à lei em sentido estrito, visto que a característica básica do princípio em direito é a flexibilidade da norma que o consagra15. A sujeição da Administração diretamente aos princípios constitucionais lhe confere, de certa forma, muito mais liberdade, permitindo-lhe atuar sob o limite da legitimidade, sem as amarras da legalidade clássica. Mas, enquanto se amplia a atividade discricionária da Administração, aumentase, também, a possibilidade de controle da sociedade sobre o exercício da atividade administrativa16.

O mesmo princípio moderno que flexibiliza a discricionariedade administrativa enseja também “maior controle do exercício da discricionariedade, que passa a ser objeto de uma investigação judicial, cada vez mais ampla”17. Com isso, “o temor em torno dos abusos ou arbitrariedades no exercício do poder discricionário diminui e a doutrina atual perde o antigo ‘medo’ com que era tratado o tema: os princípios constitucionais permitem ampla sindicabilidade judicial do atuar discricionário, de modo a prevenir e corrigir abusos”18. Portanto, na moderna concepção jurisprudencial, “‘as disposições do edital inserem-se no âmbito do poder discricionário da Administração, o qual não está, porém, isento de apreciação pelo Poder Judiciário, se comprovada ilegalidade ou inconstitucionalidade nos juízos de oportunidade e conveniência, como na espécie, em que não há previsão legal para a exigência do teste de aptidão física’ (AgRg no RMS 34.676/GO, Rel. Ministro Castro Meira, 2ª T, DJe 15/04/2013)”19. Superado o tabu da insindicabilidade do mérito do ato administrativo pelo judiciário20, perde significado o esforço para distinguir entre ilegalidade e abuso de poder, em relação ao atuar da Administração. Tudo, enfim, se reduz a atuar em desconformidade com o direito, como um todo. Tanto a ilegalidade como o abuso de poder se traduzem no mesmo conceito atual de ilegitimidade, de sorte que, para o cabimento do mandado de segurança, podem praticamente ser vistos como uma só fonte de invalidação do ato administrativo.21 Tanto quando o administrador viola manifestamente um preceito de lei em sentido estrito, como quando, no exercício de um poder discricionário, “vai além do que a lei lhe permitia”, a ilegitimidade do ato, na verdade, deriva de uma ofensa à legalidade, no dizer de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO22. No entanto, há de se controlar a flexibilidade da gestão pública principiológica, admitindo-a mais amplamente quando se tratar de atos administrativos que não atinjam a esfera jurídica do particular e mais restrita quando tenham força de afetar aquela esfera. Assim, é importante distinguir o campo autoritário do não autoritário, entendido este como o de atuação interna da Administração, e aquele como o de atuação em face do particular, restringindo-lhe ou suprimindo-lhe direitos subjetivos. Quando a Administração atua fora do campo autoritário, a apuração e controle da legitimidade do ato administrativo, não mais se limitam ao exame de legalidade estrita. São levados em consideração os princípios constitucionais e o ordenamento jurídico como um todo23. Quando, porém, o administrador exerce o “poder de autoridade”, para invadir a esfera dos direitos subjetivos do particular, não pode deixar de ser observado o princípio da legalidade estrita. Só a lei pode definir quando o direito de um cidadão pode ser restringido ou suprimido24. Isto não quer dizer que a Administração fique submissa apenas e tão somente à literal autorização de lei em sentido estrito. Também a Constituição e as normas de conteúdo aberto (cláusulas gerais) interferem, de modo a permitir uma visão da juridicidade, principalmente no campo da interpretação, que não seja, por completo, rígida ou inflexível. Mas, de qualquer forma, a permissão do ato de autoridade haverá de

partir de lei em sentido estrito (que pode ser até mesmo a Constituição), a qual determinará o objeto, a finalidade, os limites da invasão da esfera privada, e definirá o procedimento a ser obrigatoriamente observado. Uma das situações que ensejam a acusação de ilegalidade ocorre no exercício do poder regulamentar, que a autoridade administrativa só pode usar respeitando os limites da lei regulamentada. Respeitar a lei, na espécie, porém, não equivale a exigir que a regulamentação se limite a “repetir, palavra por palavra, o que está na lei”, desde que observados “seus limites, principiologia, estrutura e objetivos”25.

8.3.

Injuridicidade no plano do procedimento

Dentre as garantias fundamentais, que protegem a propriedade e os direitos subjetivos em geral contra as ilegalidades e os abusos de autoridade, está a de que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (CF, art. 5º, LIV), e esta garantia se completa com a de que, no processo administrativo, tal como no judicial, “são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (CF, art. 5º, LV). Portanto, além do princípio da legalidade, a Constituição consagra, também, o princípio do devido processo legal, que se impõe tanto nos processos judiciais como nos administrativos (CF, art. 5º, II, XXII, XXIV, LIV e LV). Com tal opção, institui-se, no plano constitucional, um eficiente sistema de controle do poder administrativo e um poderoso mecanismo de defesa do particular contra os abusos de poder: se a administração se acha legalmente autorizada, em determinados casos, a invadir a esfera dos direitos subjetivos dos cidadãos, só haverá de fazê-lo mediante a observância de um procedimento que corresponda ao padrão do “processo justo”, assegurado como “direito fundamental” pela Constituição, sob o nome de “devido processo legal”. Nessa perspectiva, a ilegalidade e o abuso de poder (que também é uma forma de ilegalidade) poderão ser configurados por prática administrativa que viole direitos subjetivos tanto na substância, como na forma de prejudicá-los, sendo que, principalmente no campo dos atos autoritários, o procedimento legal funciona como garantia fundamental dos particulares em face da Administração Pública26. E como adverte MARIA JOÃO ESTORNINHO, parece “absolutamente indispensável afirmar, de forma clara e inequívoca, que a Administração Pública em caso algum deixa de estar sujeita ao seu regime de vinculação aos direitos fundamentais”27. Com efeito, presta-se o procedimento administrativo a dar transparência à formação do ato administrativo, da qual participará o particular interessado, de forma direta, como coadjuvante. Mediante a ciência prévia do projeto da Administração e a garantia de diálogo e defesa, a atividade administrativa se torna, de fato, mais transparente28. Permitir-se-á, por meio do procedimento, o conhecimento fiel das razões e finalidades do ato administrativo, com o que o controle de legalidade se tornará mais viável e efetivo, caso o prejudicado pelo abuso de poder tenha de recorrer ao

judiciário para se proteger. Assim, com a sujeição da Administração Pública ao devido e justo processo afinado com os princípios constitucionais, consegue-se reduzir a “discricionariedade administrativa”29 e inibir os desvios de poder, ao mesmo tempo em que se instrumentaliza o cidadão interessado para buscar e viabilizar uma tutela judicial mais eficaz, justamente em razão da transparência do modus procedendi, com que se ultimou o ato a impugnar. No controle jurisdicional, portanto, se logrará “reconstruir o caminho decisório da autoridade”, desvendando-lhe os eventuais defeitos e abusos30. É nesse sentido que, perante os atos de autoridade, o procedimento se apresenta “como garantia dos cidadãos contra o atuar arbitrário da Administração”31. Da reconhecida relevância da garantia do devido procedimento nos atos administrativos, conclui-se que as ofensas perpetradas contra as regras que lhe dizem respeito podem, conforme a gravidade do caso, invalidar o ato de autoridade. É claro, porém, que não se deve valorizar a forma pela forma, simplesmente, mas pela função essencial por ela desempenhada diante da necessidade de oferecer meios efetivos de defesa ao direito subjetivo ameaçado pelo autoritarismo da Administração. Simples infrações de rito, sem maiores repercussões sobre o direito ao contraditório e à ampla defesa, não comprometem, em princípio, a validade do ato de autoridade. Para que este se torne inválido, é preciso que o ultraje à garantia do procedimento legal tenha causado lesão grave ao direito do cidadão de participar da formação do ato administrativo e de se defender amplamente da pretensão administrativa contrária a seus interesses. Aplica-se, também, ao procedimento administrativo, o princípio da instrumentalidade das formas, construído pelo direito processual civil, segundo o qual não se decreta nulidade se, mesmo inobservando o procedimento legal, o seu objetivo foi alcançado (CPC/2015, arts. 277, 282, § 1º, e 283, parágrafo único32). São frequentes, na jurisprudência, os exemplos de violação grave e de efeitos perniciosos, ao procedimento administrativo, como aqueles ocorridos na apelidada “expropriação administrativa”, e nos procedimentos de concorrência pública para realização de obras públicas ou para admissão de funcionários públicos. O mandado de segurança cumpre, nesses e muitos outros casos de quebra da igualdade entre os concorrentes, ou de arbitrariedade no apossamento de bens particulares, a importante missão constitucional de pôr fim à ilegalidade ou abuso de poder, no campo da atividade administrativa.

8.4.

Cabimento do mandado de segurança em caso de ato administrativo praticado com desrespeito à garantia do contraditório e ampla defesa

A garantia fundamental ao contraditório e ampla defesa aplica-se não apenas ao processo judicial, mas também aos procedimentos administrativos que possam afetar direitos subjetivos

públicos ou privados (CF, art. 5º, LIV e LV). Revogado, restringido ou negado a alguém um direito subjetivo qualquer, por ato administrativo, sem respeitar a referida garantia constitucional, a reação do titular alcançado pela ilegalidade pode, perfeitamente, se dar por meio do mandado de segurança. O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de apreciar caso em que o CNJ, em procedimento administrativo, considerou nulos todos os atos de nomeação de servidores de determinado tribunal de justiça porque realizados após expiração do prazo de validade do respectivo concurso. A decisão administrativa fundou-se na inconstitucionalidade das portarias do tribunal que haviam prorrogado o referido prazo. O CNJ, entretanto, chegou à sua deliberação sem convocar os servidores interessados para participarem do “processo de controle administrativo”, o que motivou a impetração de segurança perante o STF, com o fito de invalidar a decisão que ordenara a exoneração dos impetrantes. O fundamento do writ imputava ao acórdão do CNJ violação do “direito líquido e certo à manifestação em processo que lhes poderia ser prejudicial”. A segurança foi concedida pelo Pleno do STF, para “anular o acórdão atacado e para que o CNJ possa notificar os impetrantes acerca da existência do PCA e de seu direito de serem ouvidos”. Em respeito à garantia constitucional do contraditório e ampla defesa, assentou a Suprema Corte que “sempre que antevista a existência razoável de interessado na manutenção do ato atacado, com legítimo interesse jurídico direto, o CNJ está obrigado a dar-lhe ciência do procedimento de controle administrativo”. Advertiu, ainda, que, “identificado o legítimo interesse de terceiro, o acesso ao contraditório e à ampla defesa independem de conjecturas acerca da efetividade deste para produzir a defesa do ato atacado”33. Os servidores, na espécie, não eram simples concursados na expectativa do ato administrativo discricionário de sua nomeação. Eram servidores já nomeados e no pleno exercício dos respectivos cargos públicos. Invalidar, portanto, suas nomeações implicava privá-los dos direitos atuais correspondentes a uma situação jurídica já adquirida. Cabe lembrar que a Constituição garante, no rol dos direitos fundamentais, que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (art. 5º, LIV). Garante, ainda, como consectário do devido processo legal, o “contraditório e ampla defesa” a todos os litigantes, seja “em processo judicial ou administrativo” (art. 5º, LV). Não pode, obviamente, um servidor público perder o seu cargo, seja qual for o motivo, sem que a Administração lhe proporcione a oportunidade do contraditório e ampla defesa. É paradigmático o seguinte aresto do STF: “Restrição de direitos e garantia do ‘due process of law’. O Estado, em tema de punições disciplinares ou de restrição a direitos, qualquer que seja o destinatário de tais medidas, não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da

legitimidade ético-jurídica de qualquer medida estatal – que importe em punição disciplinar ou em limitação de direitos – exige, ainda que se cuide de procedimento meramente administrativo (CF, art. 5º LV), a fiel observância do princípio do devido processo legal. A jurisprudência do STF tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina”34. Não basta a observância do contraditório entre a Administração e o seu agente responsável pelo ato a invalidar. É indispensável que a garantia de defesa se estenda a todos aqueles que detenham legítimo interesse nascido de direitos reflexamente gerados pelo ato administrativo em vias de desconstituição. É o que tem acentuado, reiteradamente, o STF: “Tratando-se da anulação de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no campo de interesses individuais, a anulação não prescinde da observância do contraditório, ou seja, da instauração de processo administrativo que enseje a audição daqueles que terão modificada situação já alcançada (...)”35. Enfim, nenhum ato administrativo pode ser invalidado pelo Poder Público sem que todos os alcançáveis pela invalidação, direta ou reflexamente, tenham tido oportunidade de se defender, segundo a garantia constitucional do devido processo legal e do contraditório.36 A infringência dessas garantias franqueia aos prejudicados o recurso ao mandado de segurança, como remédio idôneo e adequado para o combate à ilegalidade e ao abuso de poder cometido, in casu, por meio do ato administrativo.

8.5.

Mandado de segurança e a teoria do fato consumado

Em nome do princípio constitucional da segurança jurídica, a jurisprudência construiu a teoria do fato consumado, que, diante de uma conjuntura não apoiada na legalidade, acabou por estabilizar uma situação jurídica cujo desfazimento tardio não se compatibilizaria com uma solução justa e equitativa, principalmente porque o respectivo titular, de longa data, teria incorporado em sua esfera jurídica um aparente direito adquirido. A demora no julgamento do mandado de segurança, assim, colocaria o juiz numa condição que não lhe permitiria denegar a segurança e cassar a liminar que perdurou por um período tão longo que o impetrante pode concluir a aquisição definitiva de outros direitos, fundados na força da medida judicial provisória. Pense-se no caso do aluno que consegue matrícula por liminar e, quando a segurança pudesse ser denegada no mérito, já estaria graduado e no

exercício da profissão para a qual se titulou. Em nome do fato consumado, e em respeito à boa-fé, à confiança e à segurança jurídica, o Poder Judiciário, nas circunstâncias apontadas, fica autorizado a deferir o mandamus, sem embargo da ausência do direito líquido e certo. Esse requisito fundamental do mandado de segurança restou substituído pelo fato consumado. É claro que isso jamais será admissível se a procrastinação da marcha processual tiver sido causada por manobras ou expedientes maliciosos engendrados pelo próprio impetrante. Eis um caso, apreciado pelo STJ, no qual bem se analisou a referida “teoria do fato consumado”: “Administrativo – Exame da Ordem – Em regra não cabe ao Poder Judiciário revisar os critérios adotados pela banca examinadora – Legítima consolidação da situação fática – Teoria do fato consumado. 1. O Poder Judiciário não pode substituir a banca examinadora na análise do mérito das questões em concurso público, salvo se a questão impugnada pelo candidato apresentar-se dissociada dos pontos constantes do edital ou teratológica. 2. Todavia, ainda que a instância ordinária incida em desacerto, a Primeira Seção desta Corte Superior tem entendido que as situações consolidadas pelo decurso de tempo devem ser respeitadas, sob pena de se causar à parte excessivo prejuízo. Trata-se da aplicação da teoria do fato consumado, que privilegia o princípio da segurança jurídica e a estabilidade nas relações sociais. 3. A teoria do fato consumado, contudo, não pode ser aplicada indiscriminadamente sem uma análise sobre as particularidades de cada caso. Há situações onde o princípio da boafé objetiva impõe o seu afastamento. A título de exemplo, não se poderia considerar consolidada uma situação de fato resultado de conduta antijurídica premeditada. O Direito não pode premiar a torpeza. 4. İn casu, todavia, não há elementos no acórdão que permitam a conclusão de que o recorrido violou o princípio da boa-fé objetiva, nem de que se valeu de meios espúrios para forçar a sedimentação de uma situação de fato, com o fim de obter, posteriormente, o benefício da aplicação da teoria do fato consumado. Recurso especial improvido”37. Outro caso significativo em que a aplicação da teoria do fato consumado foi adotada pelo STJ referiu-se a uma irregularidade na nomeação de desembargador integrante do quinto constitucional, investidura essa que se apoiara em liminar de mandado de segurança:

“Processo civil – Embargos de declaração – Efeito da sentença ou acórdão concessivo de segurança – Omissão. 1. A decisão concessiva de segurança tem efeito ex tunc por ser de índole declaratória. 2. O efeito, entretanto, não impede que se consolidem situações fáticas que se tornam definitivas e inevitáveis, como ocorre com as nomeações para o serviço público, se não houver o resguardo por liminar. 3. Nomeação de desembargador que se consolidou, mesmo sem obediência ao critério do quinto. 4. Direito dos advogados superado com o aumento do número de membros do Tribunal de Justiça. 5. Embargos de declaração acolhidos”38. O STF, contudo, já decidiu ser inaplicável a teoria do fato consumado para manutenção em cargo público de candidato não aprovado no concurso: “1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado. 2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere. 3. Recurso extraordinário provido”.39 Releva destacar decisão da Primeira Seção do STJ ao analisar caso em que a servidora foi nomeada sob amparo de decisão judicial liminar, apesar de não ter sido aprovada no concurso, exercendo o cargo até se aposentar, teve, posteriormente, sua nomeação tornada sem efeito e, consequentemente, sua aposentadoria. Aquela Corte decidiu que, não obstante a impossibilidade de a impetrante permanecer no cargo em razão da posterior denegação da segurança que buscava sua aprovação no certame, não poderia ser cassada sua aposentadoria, uma vez que o vínculo previdenciário havia se consolidado: “2. Ao contrário do que sustenta a impetrante, a existência da Ação Ordinária, que acabou por transitar em julgado favoravelmente a ela, não lhe asseguraria o direito de permanecer

no cargo, pois esta Ação era dependente do resultado do Mandado de Segurança anterior, em que buscava sua aprovação no concurso. 3. Transitada em julgado a decisão desfavorável no Mandado de Segurança pela qual ela buscou realizar a 2ª etapa do concurso, considera-se que ela não foi aprovada, e perde o objeto a pretensão de nomeação tratada na Ação Ordinária. 4. O Supremo Tribunal Federal, em julgado realizado sob a égide da repercussão geral, deu pela inaplicabilidade da teoria do fato consumado para manutenção em cargo público de candidato não aprovado em concurso (STF, RE 608.482, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 7/8/2014, Repercussão Geral – Mérito, DJe-213 p. 30/10/2014). 5. Assim, se a impetrante estivesse exercendo o cargo, não haveria nenhuma irregularidade no seu afastamento deste depois do trânsito em julgado da decisão judicial desfavorável a ela que lhe permitiu prosseguir no concurso após a primeira etapa. SITUAÇÃO EXCEPCIONALÍSSIMA DE CONSOLIDAÇÃO FÁTICO-JURÍDI-CA NO CASO CONCRETO – APOSENTADORIA. 6. Não obstante a compreensão acima exarada, constata-se que a impetrante, nomeada sob amparo de decisão judicial liminar, exerceu o cargo até o momento de sua aposentadoria, ocorrida vários anos antes da decisão final do Mandado de Segurança originalmente impetrado por ela para prosseguir no concurso. 7. Embora o vínculo de trabalho fosse precário, o vínculo previdenciário, após as contribuições previdenciárias ao regime próprio, consolidou-se com a reunião dos requisitos para a concessão de aposentadoria. 8. A legislação federal estabelece a cassação da aposentadoria apenas nos casos de demissão do servidor público e de acumulação ilegal de cargos (arts. 133, § 6º, e 134 da Lei 8.112/1990), não havendo, portanto, respaldo legal para impor a mesma penalização quando o exercício do cargo é amparado por decisões judiciais precárias e o servidor se aposenta por tempo de contribuição durante esse exercício após legítima contribuição ao sistema. 9. Precedente específico: MS 18.002/DF, Relator Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 21/11/2016 (acórdão aguardando publicação) CONCLUSÃO 10. Segurança parcialmente concedida para manter a aposentadoria da impetrante”.40

9.

MANDADO DE SEGURANÇA REPRESSIVO E MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO Na previsão constitucional o mandado de segurança é apontado como remédio destinado a

“proteger direito líquido e certo” contra ilegalidade ou abuso de poder cometido por agente do Poder Público (CF, art. 5º, LXIX). Não se faz referência expressa ao caráter preventivo que acaso possa assumir essa garantia fundamental. Não obstante, não se pode entender que a previsão da Constituição exclua o emprego do writ em função preventiva. Isto porque outra garantia, também fundamental, assegura o pleno acesso à tutela jurisdicional, seja nos casos de lesão ou de ameaça a direito (CF, art. 5º, XXXV). Logo, sendo o mandado de segurança uma ação (remédio jurídico para propiciar o acesso à tutela jurisdicional), claro que pode ser usado tanto para combater lesão já praticada como para impedir que a ameaça de lesão se consuma. Basta que se conjuguem os dois incisos do art. 5º da Constituição aludidos, para se concluir que o remédio processual em causa tem força repressiva e preventiva, dentro de suas próprias raízes constitucionais. A regulamentação pela lei ordinária, por sua vez, é claríssima: o mandado de segurança será concedido sempre que o titular de direito líquido e certo “sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade...” (Lei 12.016, art. 1º, caput). Donde a irrecusável aptidão da ação constitucional, explicitada pelo legislador, tanto para reprimir violação de direito como para prevenir contra a ameaça a direito41. O mandado de segurança preventivo – como reconhece a jurisprudência do STJ – “está expressamente previsto na lei”42, não havendo lugar para questionar seu cabimento. Classifica-se, portanto, o writ em (i) mandado de segurança repressivo e (ii) mandado de segurança preventivo: é repressivo quando se volta contra ato ilegal ou abusivo já praticado pela autoridade coatora; é preventivo se o impetrante se sente diante de “justo receio” de sofrer violação em sua esfera jurídica43, de modo que o mandado de segurança visa a impedir que o ato ilegal ou abusivo da autoridade seja consumado44. A tutela obtida por via do mandado de segurança é sancionatória, quando seu objetivo é desfazer o ato ilegítimo impugnado ou livrar o impetrante dos seus injurídicos efeitos; é inibitória, quando o objetivo da impetração é proibir, por intermédio da Justiça, a prática iminente de certo ato da autoridade ou de delegado de atividade do Poder Público45. Em outras palavras: se o ato ilegal ou abusivo já se consumou, a segurança objetivará apagar os seus indevidos efeitos; se o plano é o da ameaça de ato da espécie, o objetivo da segurança será proibir sua prática46.

9.1.

Mandado de segurança preventivo e lei em tese

Numa visão positivista, o STF consolidou sua jurisprudência, sumulando o entendimento de que “não cabe mandado de segurança contra lei em tese” (Súmula nº 266). A literalidade com que esse enunciado tem sido utilizado, frequentemente, pelos Tribunais – é bom que se diga – acaba por reduzir ou amesquinhar a garantia fundamental de que o acesso à tutela jurisdicional é assegurado tanto para os casos de lesão como para os de ameaça a direito subjetivo (CF, art. 5º, XXXV). A Súmula nº 266 não merece censura, desde que a compreensão de seu alcance seja feita de

forma coerente com a função constitucional da jurisdição. De fato, se a ação de mandado de segurança foi instituída, na matriz constitucional, como remédio jurisdicional destinado a “proteger direito subjetivo”, não é mesmo possível utilizar aquele writ diante de simples norma de lei abstrata e genérica. É que se a lei ainda não incidiu no plano fático, “não se pode cogitar de direito subjetivo”47: ex facto ius oritur. Logo, a lei que ainda não incidiu não pode ter entrado no campo do direito subjetivo, e, por si só, não pode se apresentar como objeto de ataque por meio de mandado de segurança, como é óbvio. O equívoco recorrente na jurisprudência tem consistido em negar a incidência da lei enquanto a autoridade coatora não aplicá-la na prática de algum ato administrativo, seja de forma consumada, seja por meio de ameaça concreta de aplicá-la contra os interesses do impetrante. Nessa linha equivocada, o STJ tem negado aos consumidores de energia elétrica mandado de segurança preventivo para impedir a aplicação da lei acoimada de inconstitucional que institui alíquotas seletivas para o ICMS incidente sobre o fornecimento da energia. E o argumento invocado para inadmissão do writ tem sido o de que a impetração “encerra impugnação contra lei em tese”, segundo “expressa orientação firmada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo”48. Ora, se os impetrantes se colocam na situação concreta de consumidores de energia elétrica, como dizer que a lei majoradora do tributo incidente sobre dita energia não incidiu ainda, mantendose no plano da lei em tese? O caso, data venia, é típico de “justo receio” de o impetrante sofrer dano por parte da autoridade pública arrecadadora do tributo impugnado. Não é a notificação ou o aviso expedido pela autoridade que configurariam a ameaça de lesão ao direito subjetivo do contribuinte. É a circunstância de encontrar-se ele dentro do quadro fático sobre o qual a taxação ilegal ou inconstitucional obrigatoriamente incidirá que o legitima à tutela do mandado de segurança preventivo. É da maior relevância a correta lição de HUGO DE BRITO MACHADO sobre a distinção necessária entre mandado de segurança contra lei em tese e mandado de segurança preventivo.49 In verbis: “Há quem entenda ‘como lei em tese aquelas normas abstratas que, enquanto não aplicadas por ato concreto de execução, são incapazes de acarretar lesão a direito individual’50. Na verdade, porém, a lei deixa de ser em tese no momento em que incide”51. E quando uma lei incide? Seria preciso ato concreto de aplicação da lei por parte da autoridade coatora para que a respectiva incidência ocorresse e a ameaça de lesão justificasse o cabimento do mandado de segurança preventivo? É claro que não. O “justo receio” que a Lei nº 12.016, art. 1º,

toma como fundamento justificador do mandado de segurança preventivo nem sempre reclama ato concreto da autoridade coatora. Explica, ainda, HUGO DE BRITO MACHADO, com maestria, que uma lei incide: “no momento em que ocorrem os fatos na mesma descritos (g.n.), e que, por isto mesmo, nasce a possibilidade de sua aplicação (g.n.). Não é o ato de aplicar a lei, mas a ocorrência de seu suporte fático, que faz com que a lei possa ser considerada já no plano concreto. Mandado de segurança contra lei em tese é mandado de segurança contra lei que não incidiu. De outro modo, diz-se que há impetração contra lei em tese, se esta ocorre sem que esteja configurada a situação de fato em face da qual pode vir a ser praticado o ato tido como ilegal, contra o qual se pede a segurança”52. Segundo o princípio da legalidade, que condiciona a Administração, a lei, em regra, não pode deixar de ser observada e aplicada pelos seus agentes. Daí configurar-se o “justo receio” do particular de que a norma havida como ilegal venha a ser aplicada sobre ele, já que o suporte fático suficiente para a incidência já existe53. O que autoriza o mandado de segurança preventivo não é apenas o sentido que uma norma legal possa ter abstratamente, mas aquela que a autoridade pode adotar diante dos elementos fáticos que, in concreto, lhe permitem interpretar os atos praticados pelo impetrante. “Não é o ato de aplicar a lei, mas a ocorrência de seu suporte fático que faz com que a lei possa ser considerada já no plano concreto”54. Quando a lei, por sua própria força, tem o potencial de produzir efeitos diretos e imediatos em relação ao impetrante, como o de impor-lhe proibições ou encargos já exigíveis na sua situação fática atual, cabível será o mandamus preventivo para combater o “potencial lesivo do ato normativo – lei ou decreto – que se pretende atacar”55. Embora adotada por alguns acórdãos do STJ, é completamente equivocada a aplicação da Súmula nº 266 do STF, no sentido de se vedar o mandado de segurança, sob o rótulo de ataque à “lei em tese”, se a administração ainda não a colocou concretamente em prática, mediante “atos que possam violar a esfera individual”56. Em síntese, o mandado de segurança é preventivo, e não contra lei em tese, “quando, já existente ou em vias de surgimento a situação de fato que ensejaria a prática do ato considerado ilegal, tal ato ainda não tenha sido praticado, existindo apenas o justo receio de que venha a ser praticado pela autoridade impetrada. É preventivo porque destinado a evitar a lesão ao direito, já existente ou em vias de surgimento, mas pressupõe a existência da situação concreta na qual o impetrante afirma residir ou dela decorrer o seu direito cuja proteção, contra a ameaça de lesão, está

a reclamar do Judiciário”57. É de se estranhar que, diante da sólida doutrina já construída sobre o mandado de segurança preventivo com base nos direitos fundamentais, ainda ocorram decisões de tribunais que restringem indevidamente o alcance do mandado de segurança preventivo, só o admitindo quando exista ato concreto de ameaça por parte de autoridade, de aplicar norma ilegal ou inconstitucional58. O alento encontra-se na circunstância de que tal posicionamento não é unânime, nem mesmo majoritário, no Superior Tribunal de Justiça, pois não faltam acórdãos da mesma Corte lastreados na correta diferenciação entre o mandado de segurança preventivo e o mandado de segurança contra a lei em tese59. Um exemplo significativo de aplicação do mandado de segurança preventivo, na jurisprudência do STJ, pode ser visto no seguinte acórdão: “Mandado de segurança preventivo em matéria tributária – A lei instituidora de tributo que o contribuinte considere inexigível constitui ameaça suficiente para a impetração de mandado de segurança preventivo, na medida em que deve ser obrigatoriamente aplicada pela autoridade fazendária”60. Ademais, o mandado de segurança nunca ataca a lei, como norma geral, pois seu objetivo é proteger a situação concreta do impetrante que se acha sob ameaça de sofrer prejuízo diante da iminência de aplicação da referida lei. O ato normativo, portanto, figura apenas na fundamentação do mandamus, nunca no seu objeto61, pois é certo que a ação mandamental não pode substituir ação direta de inconstitucionalidade62. Tem, contudo, força para evitar a aplicação concreta da lei inconstitucional, em caráter repressivo ou preventivo, quando esta “já nasce ferindo direito subjetivo”63. Em todos os casos de impetração da segurança contra ato normativo de efeito concreto, o coator não é aquele que o editou, mas a autoridade administrativa a quem toca dar-lhe cumprimento64. Finalmente, é de se ter em conta que por norma em tese, para o fim de excluir o mandado de segurança, deve-se entender não apenas a lei em sentido estrito, mas também todo e qualquer ato normativo, proveniente de qualquer setor da Administração Pública (executivo, legislativo ou judiciário), que não produza efeito concreto imediato, a exemplo das portarias65, decretos66, resoluções67, pareceres68, circulares69 etc.

9.2.

Mandado de segurança preventivo em matéria tributária

Embora seja admissível o manejo do mandado de segurança em caráter preventivo em defesa de qualquer direito subjetivo, é, principalmente no campo do direito tributário, que essa modalidade de tutela constitucional tem ocorrido, com maior frequência, na prática dos tribunais. Em geral, na defesa preventiva, via mandado de segurança, a dificuldade reside na necessidade

de o impetrante comprovar que não age impulsionado por receio de um dano previsto apenas em seu subjetivismo, mas, sim, em decorrência de um perigo provindo de uma ameaça concreta de lesão partida de autoridade. Por isso, nem sempre o surgimento de uma lei nova, mesmo contaminada de inconstitucionalidade, justifica, só por si, a impetração da segurança preventiva pelo potencial destinatário da norma lesiva, antes que alguma autoridade manifeste, in concreto, o propósito de fazê-la atuar70. Quando, porém, a lei cria ou majora tributo, ou impõe sanções tributárias ao contribuinte, a objetividade do perigo ameaçado, na área de sua incidência, torna-se evidente. Basta que o contribuinte comprove estar na situação de fato sobre a qual a lei nova irá forçosamente incidir. Daí a facilidade com que se propõe o mandado preventivo e com que se obtém sua acolhida em juízo, sem se exigir a prova concreta do lançamento ou mesmo de algum ato preparatório partido da autoridade fiscal71. O fundamento que conduz a essa conclusão apoia-se na premissa de que a autoridade administrativa não tem a liberdade de aplicar ou deixar de aplicar a lei tributária em vigor, ainda que nela se possa entrever algum aspecto de inconstitucionalidade.

Se a aplicação da norma legal é, para a autoridade, inevitável e necessária, a ameaça de aplicação ao contribuinte deixa de ser mero receio subjetivo para se apresentar como ameaça concreta de lançamento iminente. A ameaça está contida na própria lei, tendo em vista sua incidência imediata sobre a esfera jurídica do contribuinte72. Daí o cabimento, neste caso, do mandado de segurança preventivo. Seu objetivo – advirta-se – não será, à evidência, a pura e singela declaração de invalidade da própria lei, mas sim que o provimento judicial acolha o pedido de impor, à autoridade competente para o lançamento, a vedação de promovê-la73. Não se voltará contra o autor da lei ou do regulamento, mas contra a autoridade administrativa que tem o poder e a obrigação de aplicar a norma lesiva ao direito subjetivo do impetrante. É contra o executor obrigatório da lei inconstitucional ou do regulamento ilegal que o mandado de segurança será deferido, na forma de um comando judicial que lhe imponha a abstenção de aplicar a norma impugnada em prejuízo do impetrante74. Abundantes são os precedentes jurisprudenciais que aplicam a orientação ora exposta aos mandados de segurança no campo do direito tributário, como serve de exemplo o seguinte acórdão do STJ: “Processo Civil. Mandado de segurança preventivo em matéria tributária. A lei instituidora de tributo que o contribuinte considere inexigível constitui ameaça suficiente para a impetração de mandado de segurança preventivo, na medida em que deve ser obrigatoriamente aplicada pela autoridade fazendária (CTN, artigo 142, parágrafo único).

Recurso especial não conhecido”75. Todavia, não se ignora – mas se lamenta a incoerência jurisprudencial – a existência de acórdãos esporádicos, que, mesmo em relação tributária, exigem do impetrante a comprovação de medidas de ameaça concreta partidas da autoridade fazendária, para justificar o mandado de segurança preventivo76. O mais intrigante é que o tema, de início controvertido entre a 1ª e a 2ª Turma do STJ, tornou-se pacífico, em virtude de vários acórdãos de uniformização de jurisprudência, por meio de embargos de divergência, todos decididos pela 1ª Seção do STJ há mais de dez anos. E o entendimento adotado como uniformizador foi aquele que sempre prevalecera na 1ª Turma, qual seja, o de que, em matéria de direito tributário, a lei nova incide na esfera jurídica do contribuinte desde que sua situação fática concreta se subsuma na previsão normativa. E, uma vez ocorrida tal incidência, legitimado fica o contribuinte a impetrar o mandado de segurança preventivo, independentemente de lançamento ou de qualquer ato preparatório do lançamento, por parte da autoridade fazendária. Passados esses longos anos, reabriu-se, infelizmente, a discussão entre as referidas Turmas, ressuscitando uma divergência que fora superada e sepultada em passado remoto. A nosso ver, a interpretação correta é, sem dúvida, aquela assentada na antiga uniformização da jurisprudência do STJ, que conta com o apoio da melhor doutrina especializada, já exposta nos presentes comentários.

9.3.

Mandado de segurança contra ato normativo de efeito concreto

É tradicional o entendimento na doutrina e na jurisprudência de que o ato violador do direito que desafia mandado de segurança não se localiza nos diplomas normativos (leis, decretos, regulamentos etc.), mas na aplicação da norma ilegal ou inconstitucional. Por isso, reitera-se com frequência a afirmação de que não cabe mandado de segurança contra lei em tese, ou qualquer outro ato que seja realmente normativo77. Ressalva-se, porém, o caso de ato normativo de efeitos concretos, hipótese em que sua incidência é imediata sobre a situação concreta do impetrante, o qual não tem como deixar de cumprir, desde logo, o mandamento legal. A propósito do tema, está consolidado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça “o entendimento de que é cabível o mandado de segurança impetrado em face de efeitos concretos decorrentes diretamente de ato normativo”78, efeitos esses que, na prática, equivalem a resultados de verdadeiros atos administrativos; por isso é que podem ser impugnados pelo writ, se atingem direitos subjetivos líquidos e certos79. Sobre a matéria, são abundantes os precedentes80, e farta a lição doutrinária. Por leis e decretos de efeitos concretos – segundo a lição clássica de HELY LOPES MEIRELLES – “entendem-se aqueles que trazem em si mesmos o resultado específico pretendido, tais como as leis que aprovam planos de urbanização, as que fixam limites territoriais, as que criam

municípios ou desmembram distritos, as que concedem isenções fiscais, as que proíbem atividades ou condutas individuais; os decretos que desapropriam bens, os que fixam tarifas, os que fazem nomeações e outros dessa espécie”81. Esse elenco de leis e decretos de efeito concreto, ainda conforme o mesmo magistério, não compreenderia, em verdade, atos normativos; corresponderia a atos que usariam a forma imprópria de lei ou decreto por exigências administrativas. Seriam, isto sim, atos de efeitos concretos, porque não conteriam mandamentos genéricos e nem apresentariam qualquer regra abstrata de conduta; atuariam “concreta e imediatamente como qualquer ato administrativo de efeitos específicos, individuais ou coletivos, razão pela qual se expõem ao ataque pelo mandado de segurança”82. A jurisprudência, todavia, acabou por adotar – não sem alguma resistência – uma visão ampliativa da lei de efeito concreto. Mesmo contendo mandamentos genéricos e regras abstratas de conduta, uma lei eventualmente pode, por sua eficácia imediata, incidir de plano sobre situações concretas atuais, como de ordinário ocorre no direito tributário e no direito administrativo, em relação, por exemplo, às posturas municipais, ao regime dos servidores públicos, à disciplina da circulação de veículos etc. Aqui, o que justifica o cabimento do mandado de segurança não é o fato de o ato normativo se endereçar concretamente apenas a uma pessoa ou a um grupo limitado de pessoas. A lei, sem deixar de ser genérica (oponível erga omnes), pode, em muitos casos, incidir, de imediato, sobre situações concretas, dada a circunstância de os interessados não terem como escapar de seus comandos imperativos83. Os exemplos mais evidentes de leis de efeito concreto ocorrem no direito tributário, quando se cria ou se amplia imposto, ou se extinguem isenções. Quem se acha na situação fática configuradora do fato gerador ou da titularidade do benefício fiscal suprimido sofre, de plano, a incidência concreta do comando normativo. A lei é genérica para todos, mas é de efeito concreto para aqueles que se acham sujeitos à sua imediata incidência. Daí a possibilidade de impetração do mandado de segurança, mesmo antes do lançamento ou dos atos preparatórios do lançamento, em caráter preventivo, portanto84. Não são, entretanto, somente as leis tributárias que se enquadram na categoria de normas de efeito concreto. De maneira geral, “as leis, decretos e demais atos proibitivos são sempre de efeitos concretos, pois atuam direta e imediatamente sobre seus destinatários”85. Pense-se na lei que proíbe a importação ou a comercialização de determinado produto. Os importadores e comerciantes que negociam com tais mercadorias ficam, imediata e diretamente, vedados de continuar na prática de seu negócio, abrindo, por isso, oportunidade para se socorrer do mandado de segurança, se a interdição incorrer em ilegalidade ou inconstitucionalidade86. O importante a observar nas hipóteses ora cogitadas é que a autoridade coatora, para o mandado de segurança, “não é, todavia, quem editou o ato normativo, e sim aquela que tem o dever funcional de responder pelo seu cumprimento”87.

10. SUMARIEDADE DO PROCEDIMENTO Desde sempre o direito processual tem se preocupado com a celeridade da prestação jurisdicional e com a adequação da tutela que por seu intermédio se proporciona ao direito material envolvido em litígio. Ao mesmo tempo em que se estabelecem garantias para a correta discussão e defesa dos interesses conflitantes, criam-se mecanismos capazes de acelerar a composição do litígio ou de garantir, por antecipação, a justiça e eficiência do futuro provimento definitivo, ou de mérito. Ao lado do procedimento comum, com que se aprecia e soluciona o conflito deduzido em juízo de maneira plena e exauriente, o direito processual se vale, em circunstâncias especiais, da técnica da sumariedade, que às vezes se passa no campo apenas do procedimento (forma) e outras vezes se relaciona com a própria cognição sobre o conteúdo material da contenda (mérito). Existem, portanto, ações substancialmente sumárias e ações procedimentalmente sumárias. No primeiro caso, a ação é sumária porque a lei permite ao juiz tomar rápidas decisões sem exigir das partes uma completa informação probatória. Diante da urgência do caso concreto, o provimento judicial se contenta com a verossimilhança das alegações relativas ao suporte fático da pretensão. É o que ocorria, por exemplo, com as medidas e ações cautelares, que exigiam providências imediatas contra o perigo de dano, incompatíveis com o aguardo do desenrolar completo do procedimento comum ou ordinário88. Nessas circunstâncias, o juiz limitava-se a uma averiguação superficial do suporte fático da pretensão, ou seja, levava em conta sua plausibilidade, em vista da aparência verossímil dos eventos afirmados pela parte. A consequência desse procedimento sem maior aprofundamento na avaliação da verdade era a inadequação do processo para formar a coisa julgada89. Atualmente, as tutelas cautelares preservam a utilidade e eficiência do futuro e eventual provimento, as satisfativas permitem à parte, antes do julgamento definitivo de mérito, usufruir, provisoriamente, do direito subjetivo resistido pelo adversário, e as da evidência se apoiam em comprovação suficiente do direito material da parte para deferir, provisória e sumariamente, os efeitos da futura sentença definitiva de mérito. As decisões de urgência são, por isso, exemplos de julgamentos sumários sujeitos a modificação ou revogação a qualquer tempo, enquanto não decidido o litígio por meio de julgamento definitivo e exauriente, lastreado em cognição plena (CPC/2015, art. 29690). Diverso é o procedimento sumarizado apenas em função de diminuir e simplificar a tramitação da causa em juízo, mas sem redução no acertamento em torno da veracidade de todo o suporte probatório. A cognição será plena, sem embargo da simplificação dos atos formadores do procedimento. Já a singeleza formal, realizada sem prejuízo para o contraditório e ampla defesa, não evitará que, afinal, se aperfeiçoe a coisa julgada. É o que se passava, v.ġ., com o procedimento sumário previsto no art. 275 do CPC de 1973, que, contudo, foi extinto pelo CPC/2015. As duas hipóteses ensejam tutelas diferenciadas, no sentido de propiciar provimentos em circunstâncias e sob condições diferentes daquelas reclamadas pelos procedimentos comuns ou

ordinários91. A ação constitucional de mandado de segurança proporciona tutela jurisdicional diferenciada, mas sem prejuízo da profundidade do acertamento em torno do mérito da causa. O procedimento é sumário, porque, em nome da celeridade necessária para cumprir eficazmente a garantia fundamental prometida pela Constituição, os atos por meio dos quais se desenvolve o iter processual são reduzidos. Não há, por isso, fase destinada à instrução probatória, nem ocorre a audiência para debate e julgamento da causa92. Toda instrução probatória tem de ser feita por via documental, no estágio destinado à postulação, seja por parte do impetrante, seja pelo sujeito passivo. O autor terá de comprovar suas alegações mediante prova documental pré--constituída, cuja produção ocorrerá junto com a petição inicial. Da mesma forma, a contraprova do demandado somente poderá consistir em documentos juntados à respectiva resposta. Além disso, a liminar que antecipa, de plano, a suspensão do ato público impugnado, longe de ser uma eventualidade, é objeto de avaliação necessária exigida pela função desempenhada pelo procedimento especial. Sem embargo da extrema simplificação procedimental, o mandado de segurança permite acertamento pleno e julgamento definitivo com aptidão para formar coisa julgada material. Se a prova documental, a única legalmente permitida, não for suficiente para o completo esclarecimento das alegações do impetrante, a denegação da segurança por insuficiência de prova não se revestirá da autoridade da coisa julgada, não impedindo que a pretensão material seja renovada em outro processo, no qual se viabilize investigação probatória mais ampla. O julgamento não terá ultrapassado o nível das condições de procedimento na via especial da ação mandamental. É o que se deduz do art. 19 da Lei nº 12.016/2009. Dentro, porém, da força de convencimento extraível da prova documental produzida, a cognição será verticalmente plena, sempre que permitir ao juiz reconhecer a existência, ou não, do direito do autor, assim como da ocorrência da ilegalidade ou abuso de direito praticados pelo agente do Poder Público. Em tais condições, o julgamento será de mérito e a coisa julgada material se configurará, tanto na acolhida como na rejeição da impetração. Impedida, portanto, restará a renovação da demanda, tanto por via do mandado de segurança como por qualquer outro processo93.

10.1.

Razão de ser da sumariedade do mandado de segurança

O que a Constituição visou com o mandado de segurança foi a instituição de uma ação em que se conjugam o rito sumário com a cognição plena, de modo a proporcionar uma proteção judicial, enérgica e pronta, para atuar no campo civil, de forma análoga ao habeas corpus, na seara do direito criminal. Com essa perspectiva, a regulamentação processual da ação concebeu um procedimento extremamente célere – tal como o do habeas corpus –, que propicie ao impetrante obter do juiz, quanto antes, ordem mandamental que proíba ou ordene a prática de certo ato por parte de autoridade

ou de quem atue em nome do Poder Público94. Para que se cumpra, com presteza, a garantia constitucional contra a ilegalidade, consumada ou ameaçada, no plano da administração pública, é que a ação só pode ser eficazmente ajuizada com base em prova documental pré-constituída, sem ulterior dilação para produção de outros elementos probatórios, e sem ensejo a incidentes, como a assistência e as intervenções de terceiro previstas para as ações comuns. A sumariedade do mandado de segurança não impede, contudo, um acertamento judicial pleno acerca da violação ou ameaça ao direito subjetivo do impetrante. O provimento com que se reprime a ilegalidade ou abuso de autoridade, no entanto, não vai além da proibição do ato temido ou da supressão dos efeitos do ato consumado. Justamente em razão do compromisso procedimental com a solução mais urgente possível para a repressão da ofensa ilegalmente imposta ao impetrante é que não se comporta, no âmbito da ação mandamental, a reparação pecuniária do prejuízo causado. Para que não haja procrastinação no alcance da efetiva proteção prevista no art. 5º, XXXV, da Constituição, a eventual pretensão reparatória deverá ser pleiteada em ação ordinária95. É, pois, recorrente e correta a afirmação da jurisprudência de que o mandado de segurança não pode ser visto como uma ação de cobrança ou de indenização. A sumariedade com que o mandado de segurança é concebido impõe a presunção de que seu destino é tutelar situações jurídicas que reclamam solução urgente, pronta ou imediata. Somente o caráter de medida jurisdicional de urgência é capaz de justificar a redução da atividade probatória e a consequente limitação do contraditório e ampla defesa previstos como requisitos do devido processo legal, também na categoria de direitos fundamentais, pela Constituição. É por isso que se justificam o estabelecimento de um prazo legal dentro do qual se faz possível a impetração do mandado em foco. Se o interessado, portanto, deixa de utilizar o writ dentro do referido termo, decai do direito de se defender em juízo por seu intermédio (Lei nº 12.016, art. 23). É que sua longa inércia autoriza o reconhecimento de que o litígio existente entre ele e o agente do Poder Público não se reveste da urgência justificadora do procedimento sumário, e, assim, pode ser submetido ao regime comum do processo civil, sem maiores prejuízos para os litigantes (sobre o tema, v. os comentários ao art. 23, especialmente, os itens 157 e 157.1, infra).

11. NATUREZA MANDAMENTAL DA AÇÃO O mandado de segurança não é um simples processo de conhecimento para declaração de direitos individuais, nem se limita à condenação para preparar futura execução forçada contra o Poder Público. É procedimento especial com imediata e implícita força executiva contra os atos administrativos impugnados. Acolhida a segurança impetrada, o juiz vai além da simples declaração e condenação. Expede ordem de autoridade para cumprimento imediato. Fala-se, por isso, em ação mandamental96.

Não cabe à autoridade coatora resistir ao cumprimento do mandado judicial. Ter-se-á na hipótese desobediência à ordem legal de autoridade competente, sujeitando o descumpridor às penas administrativas e criminais correspondentes à desobediência (Lei nº 12.016, art. 26). O juiz poderá valer-se de todos os instrumentos do Poder Público tendentes a submeter a autoridade coatora à ordem de segurança, inclusive a prisão do infrator, em casos extremos, já que, como visto, a resistência, na espécie, corresponde ao crime de desobediência, tipificado no art. 330 do Código Penal97.

12. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS E CONDIÇÕES DA AÇÃO: NOÇÕES GERAIS A prestação jurisdicional realizada por meio do processo e em resposta à ação não é dispensada à parte como simples assessoramento consultivo ou acadêmico; pressupõe, ao contrário, uma situação concreta litigiosa a dirimir, em que o manejador do direito de ação tenha realmente interesse tutelável. Sendo um método ou sistema, o processo subordina-se a requisitos e condições indispensáveis à sua própria existência e eficácia. Nessa ordem é que se fala em preliminares processuais e em mérito da causa, aquelas, como requisitos da relação processual, e este, como o seu objeto. Não se pode alcançar, como é óbvio, a prestação jurisdicional mediante qualquer manifestação de vontade perante o órgão judicante. Tem-se, primeiro, que observar os requisitos de estabelecimento e desenvolvimento válidos da relação processual, como a capacidade da parte, a representação por advogado, a competência do juízo e a forma adequada do procedimento. A requisitos dessa natureza atribui-se a denominação de pressupostos processuais. Sem sua presença não se estabelece relação processual válida. Portanto, inatendidos esses pressupostos, não haverá viabilidade de desenvolver--se regularmente o processo, que, assim, não funcionará como instrumento hábil à composição do litígio ou ao julgamento do mérito da causa. Os pressupostos processuais atuam, pois, no plano da validade da relação processual. Entretanto, para que o processo seja eficaz para atingir o fim buscado pela parte, não basta, ainda, a simples validade jurídica da relação processual regularmente estabelecida entre os interessados e o juiz. Para atingir-se a prestação jurisdicional, ou seja, a solução do mérito, é necessário que a lide seja deduzida em juízo com observância de alguns requisitos básicos, ligados ao direito material controvertido, sem cuja presença o órgão jurisdicional não estará em situação de enfrentar o litígio e dar às partes uma solução que componha definitivamente o conflito de interesses. É que, embora abstrata, a ação não é genérica, de modo que, para obter a tutela jurídica, é indispensável que o autor demonstre uma pretensão idônea, no plano do direito material, a ser objeto

da atividade jurisdicional do Estado. Vale dizer: a existência da ação depende de alguns requisitos constitutivos que se chamam “condições da ação”, cuja ausência, de qualquer um deles, leva à “carência de ação”98, e cujo exame deve ser feito, em cada caso concreto, preliminarmente à apreciação do mérito, em caráter prejudicial. Advirta-se, desde logo, que as condições da ação não foram instituídas para que o juiz pudesse, com base nelas, afirmar ou negar o direito material que a parte pretende fazer atuar em juízo, mas apenas para cumprir uma etapa cognitiva intermediária entre a propositura válida do processo e o final provimento judicial. Este, sim, destinado a compor o conflito de direito material travado entre os litigantes e que constitui o mérito da causa. Nessa ordem de ideias, condições ou requisitos da ação, como os conceitua ARRUDA ALVIM, “são as categorias lógico-jurídicas, existentes na doutrina e, muitas vezes na lei (como é claramente o caso do direito vigente), mediante as quais se admite que alguém chegue à obtenção da sentença final”99. As condições da ação, de tal sorte, operam no plano da eficácia da relação processual. Por conseguinte, à falta de uma condição da ação, o processo será extinto, prematuramente, sem que o Estado dê resposta ao pedido de tutela jurisdicional do autor, isto é, sem julgamento de mérito (CPC/2015, art. 485, nº VI100). Haverá ausência do direito de ação ou, na linguagem corrente dos processualistas, ocorrerá carência de ação. Fala-se, portanto, em ausência ou carência de ação no sentido técnico de falta do direito ao provimento de mérito. Isto, no entanto, não quer dizer que, pelo fato do decreto de carência de ação, não tenha havido processo e exercício da função jurisdicional. O autor provocou a jurisdição e foi ouvido em juízo. Por não concorrerem as condições técnicas para a tutela pretendida, foi que o órgão judicial encerrou prematuramente a relação processual – que era válida, mas não eficaz –, antes de enfrentar o mérito da causa. Este pronunciamento, entretanto, já era, em si, um ato de jurisdição, pois ao processo compete não só propiciar instrumento à realização da tutela jurisdicional, como, também, de controle da necessidade ou cabimento da tutela efetivamente pretendida pela parte, segundo as regras técnicas do devido processo legal. Deve ficar certo, enfim, que pressupostos processuais e condições da ação não são a mesma coisa e que cada uma dessas categorias processuais tem conceito e função própria. Enquanto os pressupostos processuais se apresentam como requisitos para a validade da relação processual, as condições da ação atuam como requisitos a observar, depois de estabelecida regularmente a relação processual, para que o juiz possa solucionar o mérito da causa (lide). Por isso, se diz que são requisitos de sua eficácia. “Os pressupostos, portanto, são dados reclamados para análise de viabilidade do direito de ação sob o ponto de vista estritamente processual. Já as condições da ação implicam o cotejo do direito de ação concretamente exercido com a viabilidade abstrata da pretensão de direito material.”101 Os pressupostos, em suma, põem a ação em contato com o direito processual, e as

condições de procedibilidade põem-na em relação com as regras do direito material102. Doutrinariamente, os pressupostos processuais costumam ser classificados em: a)

pressupostos de existência (ou, mais adequadamente, pressupostos de constituição válida), que são os requisitos para que a relação processual se constitua validamente; e

b)

pressupostos de desenvolvimento, que são aqueles a serem atendidos, depois que o processo se estabeleceu regularmente, a fim de que possa ter curso também regular, até a sentença de mérito ou a providência jurisdicional definitiva103.

Os pressupostos de existência válida ou de desenvolvimento regular do processo são, por outro lado, subjetivos e objetivos. Os subjetivos relacionam-se com os sujeitos do processo: juiz e partes. Compreendem: a)

a competência do juiz para a causa;

b)

a capacidade civil das partes;

c)

sua representação por advogado.

Além de competente, isto é, de estar o juiz investido na função jurisdicional necessária ao julgamento da causa, não deve haver contra ele nenhum fato que o torne impedido ou suspeito (CPC/2015, arts. 144 e 148104). Os objetivos relacionam-se com a forma procedimental e com a ausência de fatos que impeçam a regular constituição do processo, segundo a sistemática do direito processual civil. Compreendem: a)

a demanda do autor e a citação do réu, porque nenhum processo pode ser instaurado sem a provocação da parte interessada (CPC/2015, art. 2º)105; de modo que, na demanda, se tem um pressuposto causal necessário106; e porque a citação do réu é ato essencial à validade do processo (art. 239107)108;

b)

a observância da forma processual adequada à pretensão (CPC/2015, arts. 16 e 318109);

c)

a existência nos autos do instrumento de mandato conferido a advogado (art. 103110)111;

d)

a inexistência de litispendência, coisa julgada, convenção de arbitragem, ou de inépcia da petição inicial (arts. 485, V e VII, e 330, I112);

e)

a inexistência de qualquer das nulidades previstas na legislação processual (arts.276 a 283113).

Para aqueles que entendem que a ação não é o direito concreto à sentença favorável, mas o poder jurídico de obter uma sentença de mérito, isto é, sentença que componha definitivamente o conflito de interesses de pretensão resistida (lide), as condições da ação costumam ser classificadas

em: a)

interesse de agir;

b)

legitimidade de parte.114

É bom destacar, porém, o acerto da posição adotada pelo Código de 2015 ao excluir a possibilidade jurídica do pedido do rol das condições da ação. Pela possibilidade jurídica do pedido, indicava-se a exigência de que devia existir, abstratamente, dentro do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pedia por meio da ação115. Esse requisito, de tal sorte, consistia na prévia verificação que incumbia ao juiz fazer sobre a viabilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte em face do direito positivo em vigor. O exame realizava-se, assim, abstrata e idealmente, diante do ordenamento jurídico116. Predominava na doutrina o exame da possibilidade jurídica sob o ângulo de adequação do pedido ao direito material a que eventualmente correspondesse a pretensão do autor. Juridicamente impossível seria, assim, o pedido que não encontrasse amparo no direito material positivo. Allorio, no entanto, demonstrou o equívoco desse posicionamento, pois o cotejo do pedido com o direito material só poderia levar a uma solução de mérito, ou seja, à sua improcedência, caso conflitasse com o ordenamento jurídico, ainda que a pretensão, prima facie, se revelasse temerária ou absurda.117 Em verdade, a preocupação com a conceituação da impossibilidade jurídica, como condição da ação, perdeu por completo a primitiva relevância. Sua inserção nessa categoria processual se deveu, sobretudo, à doutrina de LIEBMAN. Acontece que, nas reedições de sua obra, a impossibilidade jurídica acabou sendo afastada, concentrando-se a categoria apenas na legitimidade e no interesse118. Na verdade, a dificuldade prática e teórica para encontrar casos de impossibilidade puramente processual conduziu à conclusão de que a figura se confundiria sempre ou com a improcedência do pedido (mérito) ou com a falta de interesse (condição de procedibilidade). De fato, não há razão séria para tratar fora do mérito da causa questão como a cobrança de dívida de jogo ou a disputa sobre herança de pessoa viva. Por outro lado, a impropriedade da via processual eleita, que às vezes se utilizava como exemplo de impossibilidade jurídica do pedido (v.ġ., uso de mandado de segurança para defesa de direito subjetivo não revestido do requisito da liquidez e certeza), configura situação que perfeitamente pode ser tratada como pertinente à condição do interesse, não havendo justificativa para encerrá-la numa espécie própria. Daí por que foi correto o caminho utilizado pela nova codificação que limita as condições da ação apenas às figuras do art. 17, ou seja, o interesse e a legitimidade. Deixa-se de lado, por inútil, a condição da possibilidade jurídica, que ou se confunde com o mérito ou se subsume no interesse. O interesse processual e a legitimidade de parte podem ser assim identificados:

a)

O interesse processual (interesse ad agendum), a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial.

b)

A legitimidade como condição da ação (legitimatio ad causam) corresponde à titularidade ativa e passiva da ação, na linguagem de LIEBMAN119. “É a pertinência subjetiva da ação”120.

Destarte, legitimados ao processo são os sujeitos da lide, isto é, os titulares dos interesses em conflito. A legitimação ativa caberá ao titular do interesse afirmado na pretensão e a passiva, ao titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão121. Essa legitimação, que corresponde à regra geral do processo civil, recebe da doutrina a denominação de legitimação ordinária. Sua característica básica é a coincidência da titularidade processual com a titularidade hipotética dos direitos e obrigações em disputa no plano do direito material122. De par com a legitimação ordinária, ou seja, a que decorre da posição ocupada pela parte como sujeito da lide, prevê o direito processual, em casos excepcionais, a legitimação extraordinária, que consiste em permitir-se, em determinadas circunstâncias, que a parte demande em nome próprio, mas na defesa de interesse alheio. Ressalte-se, porém, a excepcionalidade desses casos, que, doutrinariamente, se denominam “substituição processual”, e que podem ocorrer, por exemplo, com o marido na defesa dos bens dotais da mulher, com o Ministério Público na ação de acidente do trabalho, ou na ação civil de indenização do dano ex delicto, quando a vítima é pobre etc.123 A não ser, portanto, nas exceções expressamente autorizadas, em lei, a ninguém é dado pleitear, em nome próprio, direito alheio (art. 18124).

12.1.

Pressupostos processuais e condições da ação em mandado de segurança

Em relação aos pressupostos processuais, não há destaque significativo a ser feito quanto aos requisitos básicos de formação e desenvolvimento válidos do processo no mandado de segurança, que, tal como nas ações comuns, concernem à capacidade da parte, à representação por advogado, à competência do órgão judicial e à forma adequada do procedimento. Quanto às duas condições da ação, a que alude o art. 17125 do CPC – legitimidade e interesse –, podem ser assim enfocadas, de forma específica, na ação especial do mandado de segurança: a)

Legitimação ativa: para o mandado de segurança, segundo a garantia do art. 5º, LXIX, da Constituição, a legitimação ativa cabe a quem aja como titular de direito líquido e certo, acusando lesão ou ameaça decorrente de ilegalidade ou abuso de poder cometido por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

De acordo com o art. 1º da Lei 12.016/2009, essa legitimação pode recair sobre “qualquer pessoa física ou jurídica”. Embora os diretos fundamentais, entre os quais figura a garantia do mandado de segurança, refiram-se, originariamente, às pessoas naturais (“direitos do homem”), há muito tempo passaram a beneficiar também as pessoas jurídicas, e, em alguns casos, até entidades despersonalizadas. Se já houve no passado alguma dúvida sobre a matéria, a atual lei do mandado de segurança, na esteira da unanimidade da doutrina e da jurisprudência, categoricamente confere a legitimação para o mandado de segurança tanto às pessoas naturais como às pessoas jurídicas. Sem embargo de o art. 5º da CF, em seu caput, estender a garantia dos direitos fundamentais aos “estrangeiros residentes no País”, a previsão constitucional não tem sido entendida como cláusula de exclusão dos “não residentes” do espectro tutelar do mandado de segurança. Os direitos do homem são protegidos em função da natureza do ser humano, independentemente de nacionalidade e residência. Assim, mesmo aquele que não tenha residência entre nós pode se valer do mandado de segurança se algum direito seu vier a ser violado ou ameaçado por autoridade brasileira.126 O STF já teve oportunidade, como autoridade máxima na interpretação da Constituição, de declarar que “ao estrangeiro, residente no exterior, também é assegurado o direito de impetrar mandado de segurança, como decorre da interpretação sistemática do art. 153, caput, da Emenda Constitucional de 1969 e do art. 5º, LXIX, da Constituição atual”127. Entre as pessoas jurídicas nacionais, a legitimação compreende tanto as de direito privado como as de direito público128. O STF vai além das pessoas jurídicas de direito público, para reconhecer, também aos titulares de função pública e aos órgãos coletivos não personalizados, a possibilidade de manejar o mandado de segurança “para defesa do exercício de suas competências e do gozo de suas prerrogativas”.129 Nessa categoria a Suprema Corte inclui, por exemplo, o Procurador-Geral da República em conflito com o Presidente da República130 e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso em confronto com o Governador daquele Estado131. b)

Legitimação passiva: embora o impetrante ataque ato da autoridade coatora, tal ato é sempre praticado em nome e sob responsabilidade da pessoa jurídica à qual o agente se acha vinculado, circunstância que se revela fundamental para a definição do sujeito passivo da ação de mandado de segurança.

Por isso, a Lei nº 12.016 exige que a petição inicial do mandado de segurança indique não só a autoridade coatora, mas também a pessoa jurídica que irá suportar a repercussão patrimonial do ato impugnado, pessoa jurídica essa que deverá ser intimada (citada) na pessoa do respectivo representante judicial, para apresentar defesa, querendo (art. 7º, II). Não é, portanto, a autoridade coatora o sujeito passivo da ação mandamental.132 Trata-se, na espécie, apenas de alguém que está sujeito a colaborar com a justiça, prestando informações e esclarecimentos a respeito do ato impugnado, e cumprindo os comandos que, a respeito deste, vierem

a ser expedidos pelo órgão judicial133. O STJ já entendeu que a autoridade coatora não é parte do mandado de segurança: “1. No mandado de segurança, a legitimação passiva é da pessoa jurídica de direito público a que se vincula a autoridade apontada como coatora, já que os efeitos da sentença se operam em relação à pessoa jurídica de direito público, e não à autoridade”.134 Em julgados recentes, no entanto, chegou a tratar a autoridade coatora como parte. Mas, embora reconhecendo a qualidade de parte à autoridade coatora, conferiu interesse recursal apenas à pessoa jurídica de direito público interessada, aquela que suportará o ônus da sentença: “Não obstante ser a autoridade coatora parte no processo, o interesse para recorrer é da pessoa jurídica de direito público interessada, que suportará o ônus da sentença”.135 c)

Interesse de agir: avalia-se o interesse de agir, em caráter geral, por meio de aferição da necessidade e adequação da tutela pleiteada pelo autor, tendo em consideração os termos com que a petição inicial descreve o pedido e a causa de pedir.

No caso do mandado de segurança, essa condição da ação apresenta-se como um requisito específico de uma ação especial, que vem a ser a necessidade de o autor arguir um direito líquido e certo como sendo aquele que foi objeto da ofensa imputada à autoridade coatora. Se o autor não consegue fundar sua pretensão em prova pré-constituída do direito subjetivo que afirma violado ou ameaçado, faltará uma condição de procedibilidade, pela via especial do mandado de segurança. O processo será extinto sem julgamento do mérito. O provimento acontecerá no plano da preliminar de carência de ação. Não haverá, de tal sorte, coisa julgada material e o pleito poderá ser renovado por meio de ação ordinária. Ter-se-á reconhecido apenas a inviabilidade de solucionar o conflito por meio do procedimento especial indevidamente escolhido pelo autor (Lei nº 12.016, art. 19).

12.2.

Pressuposto especial do mandado de segurança: direito líquido e certo

Quando a Constituição endereça o mandado de segurança à defesa do direito líquido e certo, “está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano”136. A exigência de prova pré--constituída constitui uma condição da ação especial de mandado de segurança, de modo que sua falta acarreta a extinção do processo, “sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC [CPC/2015, art. 485, IV]”137. O direito que se protege por meio do mandado não é o direito objetivo, presente genérica e abstratamente no ordenamento jurídico; é o direito subjetivo, que só existe quando fatos concretos lhe dão origem, mediante subsunção à hipótese prevista, genérica e abstratamente, na norma do

direito objetivo. Daí que, quando se cogita de direito líquido e certo, para fins do mandado de segurança, o que se considera não é a norma a aplicar, mas a possibilidade imediata de comprovação dos fatos de que o direito subjetivo se originou138. Pode-se, por conseguinte, dizer que há direito líquido e certo quando o titular dispõe de documentos para provar, de plano, a situação fática que lhe permite invocar o direito objetivo ofendido ou ameaçado139. O que importa não é a maior ou menor complexidade da tese jurídica, mas a prova préconstituída (documental) do seu suporte fático140. Se a demonstração do direito do impetrante estiver na dependência de investigação probatória, ainda a ser feita em juízo, o caso não será de mandado de segurança. Terá de ser resolvido pelas vias ordinárias141. O procedimento do mandamus é sumário e não contém fase para coleta de outras provas que não as documentais, imediatamente exibíveis. Enfim, “o que se exige é prova pré-constituída das situações e fatos que embasam o direito invocado pelo impetrante”142. Por isso mesmo, a controvérsia acaso existente apenas sobre a matéria de direito, por complexa que seja, não impedirá a concessão do mandado de segurança (STF, Súmula nº 625). Interpretar, definir e aplicar o direito é função técnica e dever institucional do órgão judicial, de que não pode eximir-se a pretexto de dificuldades exegéticas143. É possível, entretanto, fundamentar-se o mandado de segurança em documento que se acha em poder de repartição pública ou de terceiro. Há um incidente próprio para obtenção de certidão ou exibição do próprio original, que é regulado pelos §§ 1º e 2º do art. 6º da Lei nº 12.016 (ver, adiante, os comentários ao referido artigo).

12.3.

O direito líquido e certo é condição da ação ou mérito do mandado de segurança?

Para a doutrina e a jurisprudência dominantes, a liquidez e certeza do direito a ser protegido por meio do mandado de segurança é uma condição especial dessa ação constitucional, tanto assim que, quando o autor não satisfaz tal requisito, a sentença que denegar a impetração não fará coisa julgada, não impedindo que a mesma pretensão de direito material seja renovada pelas vias ordinárias, ou até mesmo por outra ação mandamental, se não consumado o prazo decadencial respectivo (Lei nº 12.016, arts. 6º, § 6º, e 19)144. ALEXANDRE FREITAS CÂMARA, todavia, insiste em se opor ao entendimento majoritário, para classificar a liquidez e certeza do direito subjetivo, no caso particular do mandado de segurança, como matéria de mérito, a pretexto de que só se pode considerar condição da ação aquilo que o juiz examina prima facie, à luz da simples afirmação feita pelo demandante na petição inicial (teoria da asserção). Como à liquidez e certeza, ou à sua negação, só se chega por meio de exame da prova produzida pelo impetrante, ultrapassado – para o processualista – estaria o terreno das condições da ação, e penetrado o do meritum causae145.

A tese, porém, parte de uma premissa falha, a de que a condição da ação nunca pode ser aferida por meio de exame de prova. Entretanto, condição da ação, em essência, é apenas um requisito para que o processo prossiga até o julgamento de mérito, entendido este como a resolução do litígio, que, por sua vez, se retrata no conflito de interesses estabelecido no plano do direito material. Se, em regra, a aferição das condições da ação, in concreto, não exige considerações em torno da prova das alegações do autor, em muitos casos é a própria lei material que cria medidas prémonitórias ou requisitos documentais para o tratamento de certas questões substanciais em juízo. Quando isto se dá, cabe ao juiz, antes mesmo de citar o réu, verificar se o autor está ingressando em juízo com base na documentação necessária ao regular exercício do direito de ação. Não se trata de fazer um julgamento preliminar sobre a procedência do pedido, mas de verificar uma condição mínima de progresso da marcha processual rumo ao provimento judicial de mérito. Por isso, embora feita a análise à luz de prova trazida pelo autor, não se refere ela, de forma alguma, ao mérito da causa, mas apenas a uma condição da ação, geralmente ligada ao interesse de agir (adequação do pedido ao remédio processual pretendido). Se, no geral – repita-se –, a aferição das condições se contenta com exame das alegações formuladas na petição inicial, o certo é que essas condições não são reclamadas apenas no momento da propositura da ação, pois devem ser mantidas e avaliadas durante todo o curso do processo146. Sujeitando-se a alterações e perdas a qualquer tempo, o juiz será chamado, não raras vezes, a se pronunciar sobre inovações de referidas condições, e só poderá fazê-lo mediante análise de prova dos eventos que as determinaram. Imagine-se a petição inicial que, numa ação de busca e apreensão de bem gravado de alienação fiduciária, foi ajuizada sem o comprovante do protesto pré-monitório, ou a que, numa ação de despejo por denúncia vazia, deixou de ser instruída com a notificação para pôr fim à relação ex locato: em diligência, o autor teria juntado, ou deixado de juntar, o documento requisitado pelo juiz. A decisão a ser tomada, no sentido de dar ou não seguimento ao processo será, naquela altura, um pronunciamento de avaliação de condição da ação, que, uma vez reconhecida, corresponderá à ordem de prosseguimento do processo, sem, entretanto, prejulgar o mérito. Apenas se terá, na decisão interlocutória, reconhecido o interesse do autor na ação proposta. Pense-se, outrossim, na parte pessoa natural que falece antes da sentença de mérito, ou na pessoa jurídica que se extingue por fusão, incorporação ou cisão. A admissão dos sucessores para substituir os legitimados originários dar-se-á mediante exame dos documentos comprobatórios da sucessão, exame esse que se desenvolverá, como é óbvio no terreno das condições da ação, sem avançar sobre o mérito da causa pendente. Por outro lado, sempre que a preliminar de falta de interesse ou de legitimidade de parte for alegada na contestação do demandado, e ao autor for facultada a sanação do defeito processual, nos termos do art. 321147 do CPC/2015, haverá decisão sobre configuração ou ausência de condição da ação, embora tomada com fundamento em prova dos autos. Daí que, a nosso sentir, não procede a

afirmação de que a apuração das condições da ação nunca pode resultar do exame de provas. O importante nessa matéria é saber se o juiz, ao pronunciar-se, cuidou do cabimento da ação proposta, ou da existência (ou não) do direito subjetivo material em jogo, sendo pouco relevante se o decisório está fundado no texto da inicial ou em outras peças e documentos dos autos. O que se deve ter em mente é que o autor, quando ingressa em juízo, formula dupla pretensão perante o órgão judicial: (i) em primeiro lugar, pede um remédio processual (um procedimento comum ou especial), que julga apto para tutelar seu direito subjetivo material em conflito com o demandado; (ii) em segundo lugar, pede que o remédio processual, uma vez formado e desenvolvido válida e regularmente, resulte num provimento judicial, que acolha a pretensão de direito material formulada, à qual o demandado opõe resistência, e que configura o mérito da causa. A primeira pretensão é a que se pode denominar de pretensão processual ou formal; e a segunda, é a pretensão material ou substancial. As condições da ação ficam de permeio às duas pretensões, assumindo o papel de questões prejudiciais (requisitos lógico-jurídicos), diante do esperado provimento de acolhida ou rejeição do pedido contido na pretensão de direito material. Se alguma ou algumas dessas condições falham, o processo não chegará ao provimento de mérito, e se encerrará por uma solução meramente formal. O autor será declarado carecedor da ação proposta, ficando sem avaliação a procedência ou improcedência do pedido, em torno do qual se formou o objeto do processo. Perante esse quadro sistemático do processo civil, pouco importa se foi pela simples leitura da petição inicial, ou pelo cotejo de seus termos com o os documentos que a instruíram, que o juiz reconheceu a falta de legitimidade ou de interesse do autor para conduzir o processo até o provimento de mérito. Se, a certa altura da marcha procedimental, ocorre a constatação de que falta condição da ação, o julgamento que haverá de pôr fim ao processo não será de mérito, será de sua extinção sem resolução de mérito. É dizer, não será de procedência ou de improcedência do pedido, em seu alcance material. Não se pode aceitar, com o devido respeito à opinião contrária, que a rejeição da pretensão formal de tutela processual pela via do mandado de segurança seja a solução do mérito da causa deduzida em juízo, se, para tanto, não concorreu nenhuma razão de direito substancial, mas apenas a inobservância de um requisito de ordem instrumental. Advirta-se que o direito líquido e certo não é, em essência, um direito novo e distinto daquele que o respectivo titular pode pleitear pelas vias ordinárias. É apenas aquele cuja comprovação o titular tem condições formais de comprovar liminarmente. A principal consequência de distinção entre a sentença terminativa (lastreada em falta de condição da ação) e a sentença definitiva (de acolhida ou rejeição do pedido) reside na circunstância, valorizada por lei, de que a primeira (a de carência de ação) só faz coisa julgada formal (isto é, dentro do processo em que a decisão foi proferida), enquanto a segunda (a de mérito,

a que acolhe ou rejeita a pretensão de direito substancial) faz coisa julgada material (dentro e fora do processo). A primeira, por força de lei, não impede que a mesma lide volte a ser discutida em outro processo (CPC, art. 486148), ao passo que a segunda projeta seus efeitos no plano do direito material, tornando imutável e indiscutível a situação substancial definida pela sentença (CPC, art. 502149). Encarado o processo como instrumento destinado preponderantemente à composição e pacificação de conflitos substanciais, não soa razoável aceitar que se torne imutável e indiscutível uma sentença que apenas extingue o mandado de segurança, sem chegar ao mérito da divergência de direito material que motivou o ingresso dos litigantes em juízo. A se aceitar a tese de que faria coisa julgada material a sentença de denegação do mandado de segurança por insuficiência de prova150, estar-se-ia, em última análise, reduzindo sem maior justificação uma garantia constitucional (CF, art. 5º, LXIX e LXX), que, segundo a hermenêutica aplicável aos direitos fundamentais, deve sempre ser interpretada e aplicada da maneira mais ampla possível, e nunca de forma restritiva, ou seja, com redução de seu alcance151. É que, por mera falha formal, o impetrante ficaria definitivamente privado do direito de defender seu direito subjetivo por meio do mandamus, ainda que, após denegação da tentativa frustrada, viesse a dispor da prova documental de tal direito, revestindo-o, portanto, da necessária liquidez e certeza exigida para o acesso à garantia constitucional. Não se nos afigura, diante de tal tese restritiva, que a solução preconizada seja compatível com os desígnios do moderno processo justo, e muito menos com a dimensão reclamada por uma tutela constitucional, como a que cabe à ação de mandado de segurança realizar. O certo, portanto, é que, extinto o processo por falta de prova documental do direito do autor, nada impedirá que, conseguindo posteriormente a documentação necessária, volta ele a impetrar o mesmo mandado de segurança. Demonstração evidente que a extinção do primitivo mandamus não enfrentou o mérito da ação mandamental.

12.4.

Momento da avaliação do direito líquido e certo

A liquidez e certeza do direito subjetivo do impetrante, como já se observou, decorre da prova documental pré-constituída com que a petição inicial demonstra os fatos determinantes de sua origem. Lembra CARREIRA ALVIM, com propriedade, que, “no fundo, o conceito de direito líquido e certo se prende a um elevado grau de probabilidade de que, dos fatos alegados (acontecimentos fáticos) pelo impetrante, resultem os efeitos jurídicos moldados pelo direito (subjetivo) invocado, fazendo nascer para seu titular o direito a uma tutela pronta e eficaz em sede jurisdicional, sem a necessidade de dilação probatória”152. A avaliação a respeito desse requisito legal do writ é feita, pelo juiz, em duas oportunidades significativas: ao despachar a inicial e ao proferir a sentença:

a)

b)

12.5.

Se as provas juntadas à inicial revelam grande probabilidade de serem verdadeiras as alegações de existência de um direito subjetivo lesado ou ameaçado, o juiz tem condições de deferir a liminar; se o grau de convencimento emergido da avaliação preliminar não for suficiente para um imediato juízo de verossimilhança, a liminar não será deferida, e o juiz passará a aguardar as informações da autoridade coatora e a eventual resposta da pessoa jurídica interessada, para completar a formação de seu convencimento153. Completado o contraditório, o juiz estará em condições de sentenciar, e, mais uma vez, voltará a avaliar as provas documentais trazidas pelas partes. Se estas o conduzirem à certeza da existência do direito do impetrante, ou de sua inexistência, proferirá uma sentença de mérito, que deferirá ou indeferirá o pedido constante da inicial. Se, por outro lado, o direito do impetrante não assumir o grau de liquidez e certeza, devido à baixa força de convencimento da prova disponível, a denegação da segurança se dará sem julgamento do mérito, o processo será extinto por carência de ação, já que terá falhado uma condição especial de procedibilidade, indispensável na via da ação constitucional intentada.154

O direito líquido e certo e o concurso público

A aprovação em concurso público – segundo antiga jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – não gera, por si só, o direito subjetivo líquido e certo à nomeação para o cargo público a que o candidato concorreu. O caso é apenas de expectativa de direito, razão pela qual não cabe o mandado de segurança para forçar o Poder Público à respectiva nomeação, que, em princípio, corresponde a um ato administrativo discricionário, e não vinculado155. A omissão da autoridade administrativa pode ser causa para o mandado de segurança156, mas é – segundo a mesma jurisprudência – necessário que o impetrante seja titular de um direito líquido que tenha sido afrontado ou obstaculado pela conduta omissiva da autoridade. Em outros termos, cabe o mandado de segurança para forçar a autoridade a praticar o ato a que o impetrante tem, efetivamente, direito, direito esse que está sendo violado pela inércia abusiva da autoridade157. Não é o caso da omissão do ato de nomeação do candidato aprovado em concurso de acesso ao serviço público, já que lhe falta o direito líquido e certo à pretendida investidura. O Supremo Tribunal Federal, todavia, tem adotado entendimento um pouco diferente do que vinha prevalecendo no Superior Tribunal de Justiça, a respeito do tema, como se noticiará no item subsequente. Em razão da posição do Supremo Tribunal Federal, o STJ modificou seu posicionamento, para entender que “a regular aprovação em concurso público em posição classificatória compatível com as vagas previstas em edital confere ao candidato direito subjetivo à nomeação e posse dentro do período de validade do certame”.158 Da mesma forma “ainda, que a classificação e aprovação do candidato, ainda que fora do número mínimo de vagas previstas no edital do concurso, confere--lhe o direito subjetivo à nomeação para o

respectivo cargo se, durante o prazo de validade do concurso, houver o surgimento de novas vagas, seja por criação de lei ou por força de vacância”159. Este último entendimento, contudo, não é sedimentado, visto que existem julgados, amparados por entendimento do STF, no sentido de que a abertura de vagas, por si só, não transforma em líquido e certo o direito do candidato aprovado fora do número de vagas constantes do edital: “1. É firme o entendimento do STJ de que os candidatos classificados além das vagas inicialmente oferecidas pelo Edital não têm direito líquido e certo à nomeação, não sendo a criação de vagas por lei e, tampouco o reconhecimento da necessidade de preenchimento dos cargos pela Administração Pública, motivo suficiente para convolar a mera expectativa de direito em direito líquido e certo. Nesse sentido: AgInt. nos EDcl no RMS 37.559/DF, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 26.8.2016. 2. Este entendimento acompanha a tese firmada pelo STF, em repercussão geral, segundo a qual, o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital. (...) a publicação de novo Edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro anteriormente realizado não caracteriza, por si só, a necessidade de provimento imediato dos cargos. É que, a despeito da vacância dos cargos e da publicação do novo Edital durante a validade do concurso, podem surgir circunstâncias e legítimas razões de interesse público que justifiquem a inocorrência da nomeação no curto prazo, de modo a obstaculizar eventual pretensão de reconhecimento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados em colocação além do número de vagas. Nesse contexto, a Administração Pública detém a prerrogativa de realizar a escolha entre a prorrogação de um concurso público que esteja na validade ou a realização de novo certame (RE 837.311-RG/PI, Rel. Min. LUIZ FUX, TRIBUNAL PLENO, DJe 18.4.2016)”160. Outra é a situação do candidato que se sente frustrado em sua expectativa diante de nomeação irregular de outrem para o cargo para o qual foi aprovado. A jurisprudência do STJ tem assentado, reiteradamente, que nem mesmo se exige a nomeação formal para violar o direito do concursado. Basta que, estando vago o cargo objeto do concurso, seja feita, pela Administração, a designação de servidor público para exercê-lo, em lugar de nomear o candidato aprovado. Esse comportamento abusivo do administrador público, praticado dentro do prazo de validade do concurso, transforma – segundo o STJ – a mera expectativa em direito líquido e certo, diante da flagrante preterição da ordem de classificação dos candidatos aprovados no concurso público. Em se tratando de preenchimento irregular do cargo efetivo e essencial ao serviço público, não se pode cogitar de discricionariedade da Administração para preenchê-lo, ainda que em caráter provisório ou

transitório. O mandado de segurança, na espécie, deve ser concedido para determinar a imediata nomeação e posse do impetrante no cargo para o qual foi aprovado161. Já se decidiu, também, naquele Tribunal, caber mandado de segurança contra o ato que nomeia o candidato para cargo diferente daquele para o qual fora aprovado162. No entanto, entendeu a mesma Corte que não há preterição de candidato aprovado, em expectativa de nomeação, dentro do cadastro de reserva, quando o cargo vago é preenchido precariamente mediante cessão de servidores municipais, porque então o ato não seria da autoria da autoridade coatora, integrante de outra área do Poder Público. Em tal conjuntura, a segurança impetrada contra o órgão público que promoveu o concurso foi denegada pelo STJ163. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que os candidatos aprovados, além do número de vagas existentes, podem ficar no chamado “cadastro de reserva” para aproveitamento no caso de vacância posterior. Não são, por isso, titulares de direito ao cargo, tendo apenas “expectativa de direito à nomeação”. Seguindo orientação do STF, o STJ entende que, surgindo eventuais vagas, ainda durante o período de validade do concurso, mesmo assim não nasce para eles o direito líquido e certo de serem nomeados. Cabe à Administração decidir sobre a forma de gestão sobre as vagas, “podendo, inclusive, extingui-las conforme juízo de conveniência e oportunidade”164. Não pode, todavia, preenchê-las com preterição dos aprovados que se acham no “cadastro de reserva”, durante o prazo de validade do concurso165. Não se considera no “cadastro de reserva” o candidato que, concorrendo a número certo de vagas, não é admitido à fase subsequente destinada a curso de formação, nos termos previstos no edital do concurso166. É admissível, outrossim, o mandado de segurança durante o processamento do concurso, por iniciativa do candidato que se veja excluído do certame por ato da autoridade que o preside, uma vez considerado líquido e certo o seu direito167. Nesse caso, é dispensável a formação do litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos concorrentes no concurso público, uma vez que não possuem direito conflitante com o do impetrante, mas apenas expectativa de direito a nomeação futura168. Diversa é a situação do mandado de segurança impetrado depois que ocorreu nomeação ilegítima em detrimento do direito do impetrante. Se o mandado de segurança é movido porque o candidato se considera prejudicado pela nomeação indevida de outro, ou outros, em desrespeito às regras do concurso, não se poderá deixar de incluir no polo passivo da ação mandamental aqueles que, já sendo funcionários nomeados, poderão ser afetados em sua situação jurídica pelos eventuais efeitos da sentença. É inevitável o litisconsórcio passivo in casu entre a pessoa jurídica interessada e tais funcionários. É que “o litisconsórcio necessário, à conta da relação jurídica, tem lugar se a decisão da causa propende a acarretar obrigação direta para o terceiro, a prejudicá-lo ou a afetar seu direito subjetivo”169.

12.5.1. Questões interessantes de mandado de segurança em concurso público Analisando o critério etário de desempate utilizado em concurso público de remoção para outorga de Cartório de Protestos, o STF decidiu não ser aplicável o Estatuto do Idoso (Lei n.º 10.741/03), que prevê apenas a admissão em concurso público em termos gerais, quando há lei especial cuidando de concurso de remoção. Na situação analisada, a Corte Superior decidiu ser correto adotar-se o critério de maior tempo de serviço público: “ 5. A Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso) cuida apenas da admissão em concurso público em termos gerais, de modo que, quando em referência concurso de remoção, não deve ser seguida, ante a existência de lei especial (lex specialis derogat legi generali). 6. In casu, o acórdão impugnado do Conselho Nacional de Justiça, ao negar a aplicação da Lei n° 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), privilegiando o que estabelece a Lei Estadual n° 14.594/2004, agiu acertadamente, resolvendo o conflito aparente de normas segundo a boa técnica jurídica. 7. O tempo anterior na titularidade do serviço para o qual se realiza o concurso público não pode ser utilizado como critério de desempate por violar o princípio da razoabilidade, segundo a jurisprudência do STF (Precedente: ADI nº 3.522, rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 24/11/2005, DJ 12.05.2006). 8. Destarte, na forma da Lei estadual nº 14.594/2004, deve-se adotar o critério de maior tempo de serviço público para desempatar o concurso de remoção para a outorga do 6º Cartório de Protestos da Capital, exatamente nos termos em que proferido o acórdão impugnado do Conselho Nacional de Justiça”170. Outra questão interessante relativa a mandado de segurança em concurso público foi analisada pelo STJ, quando houve modificação na ordem de aplicação das provas previstas no edital. Entendeu o Tribunal Superior que a simples alteração das provas, divulgada com antecedência e nos termos admitidos pelo edital, não viola direito líquido e certo dos candidatos: “3. Não houve ilegalidade na alteração da ordem das provas porque o instrumento convocatório previa, em cláusula específica, a divulgação de data, horário e local das provas por meio de edital complementar, divulgado ‘com antecedência mínima de dez dias da aplicação’, prazo que foi efetivamente respeitado. 4. A simples alteração na ordem de aplicação de provas de teste físico, desde que anunciadas com antecedência e nos termos admitidos pelo edital do certame, não viola direito líquido e certo dos candidatos, pois respeita os princípios constitucionais da publicidade e da razoabilidade, previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal e nos

arts. 2.º parágrafo único, incisos I a VIII e XIII, 26 e 28 da Lei Federal n. 9.784/1999, que esta Corte tem por aplicável aos Estados que não disponham de norma própria para regular processos administrativos. 5. O objetivo dos concursos públicos de provas ou provas e títulos, previstos nos incisos I a IV do art. 37 da Constituição Federal é assegurar a observância do princípio constitucional da isonomia para ingresso nos quadros efetivos da Administração Pública. Essa é a razão pela qual alterações na ordem de aplicação das provas integrantes do teste físico, divulgada com antecedência e aplicada igualmente a todos os candidatos inscritos, não viola tal princípio, não se apresentando, igualmente, nem ilegal, nem abusiva”171.

12.6.

A jurisprudência do STF

O entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca do direito do candidato aprovado em concurso para vaga certa prevista no edital sofreu evolução recente, que o distancia da tese inicialmente consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, e que se acha bem exposto no seguinte aresto: “Agravo regimental no recurso extraordinário. Concurso público. Revogação de nomeação de candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital. Possibilidade. Precedentes. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido que os candidatos aprovados em concurso público dentro do número de vagas previstas no edital possuem direito subjetivo à nomeação para posse. 2. Entretanto, este Supremo Tribunal Federal também reconhece a possibilidade da recusa, pela Administração Pública, da nomeação de aprovados que passaram dentro do número de vagas previstas no edital, desde que devidamente motivada, sendo que tal motivação é suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário. 3. Agravo regimental não provido”172. Como se vê, para o STF, o aprovado em concurso, dentro das vagas enunciadas no edital, tem mais do que mera expectativa de nomeação, tem direito a ela. No entanto, também o Poder Público tem o contradireito de recusar a nomeação, condicionado, porém, a uma justificação fundada em interesse de ordem pública, justificação essa que não escapará da apreciação do Poder Judiciário.

13. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO OMISSIVO Não são apenas os atos comissivos que podem lesar direitos subjetivos. A autoridade que deixa de cumprir dever legal, e com isso ofende direito subjetivo de alguém, enseja manejo de mandado de segurança pelo prejudicado173. Para que, entretanto, seja regular o uso do mandado de segurança, na

espécie, é necessário que a omissão na prática do ato administrativo represente violação de dever legal a direito subjetivo líquido e certo do impetrante174. Eis alguns casos em que a jurisprudência reconhece o cabimento do mandado de segurança contra ato omissivo de autoridade: a)

não fornecimento de certidão requerida pela parte175;

b)

não apreciação de questão arguida em juízo para prevenir contradição com outro julgamento176;

c)

não apreciação de mandado de segurança preventivo, em matéria fiscal, diante do justo receio de fiscalização e autuação, com imposição de penalidades tributárias, hipótese em que a omissão do dever de prestar a jurisdição “ofende ao princípio da inafastabilidade desta (CF, art. 5º, XXXV)”177;

d)

omissão do juiz na apreciação de liminar relativa a custódia de estrangeiro com idade provecta e saúde combalida178;

e)

omissão da autoridade na apreciação de recurso administrativo regularmente apresentado, sem justificativa razoável179;

f)

omissão do Ministro da Defesa, consistente em não dar cumprimento àPortaria concessiva de anistia180;

g)

omissão injustificada de Ministro do Planejamento que, provocado administrativamente, silencia-se a respeito de concessão e pagamento de gratificação funcional181;

h)

omissão de autoridade em relação a reajuste de proventos de servidor público aposentado em relação aos da ativa182.

14. LIVRE DISPONIBILIDADE DA TUTELA MANDAMENTAL O uso do mandado de segurança é um direito individual assegurado entre as garantias fundamentais proclamadas pela Constituição. O recurso a essa especial tutela não é, porém, uma imposição que exclua outras vias processuais disponíveis. O ofendido por ilegalidade ou abuso de poder cometidos por autoridade tem a opção de se defender tanto pelas vias ordinárias como pelo remédio excepcional previsto no art. 5º, LXIX, da CF. E se lançar mão do writ constitucional, não estará jungido a mantê-lo até a exaustão do processo. É que se trata de feito sujeito às limitações de sua estrutura sumária, que às vezes não será adequada à melhor tutela dos interesses do impetrante, como de início se pensava. Segundo jurisprudência consolidada do STF, as peculiaridades do mandado de segurança fazem com que o impetrante possa desistir da ação “em qualquer tempo e grau de jurisdição”, até mesmo “em sede extraordinária”, sem depender da anuência da outra parte183.

Mesmo depois de proferida a decisão de mérito, continua possível a desistência184, desde, é claro, que ainda não tenha se firmado a coisa julgada185. “Esse entendimento – ainda na ótica do STF, deve ser aplicado mesmo quando a desistência tenha sido apresentada após o julgamento do recurso extraordinário, mas antes de sua publicação”186.

15. COMPETÊNCIA PARA O MANDADO DE SEGURANÇA Não é pela matéria discutida que se define a competência para o mandado de segurança. “É em razão da autoridade da qual emanou o ato, dito lesivo, que se determina qual o juízo a que deve ser submetida a causa”187. E o dado relevante, acerca dessa autoridade, é a sua sede funcional, pois no foro dessa sede é que deverá tramitar o mandamus. Além disso, é também relevante a hierarquia funcional, que pode determinar, em casos especiais, a competência originária de tribunal (foro privilegiado)188, de tal modo que se pode afirmar que “a competência para processar e julgar mandado de segurança é determinada pela natureza e hierarquia funcional da autoridade coatora”189. Segundo o entendimento do STJ, a competência para o mandado de segurança é absoluta: “Em se tratando de mandado de segurança, a competência para processamento e julgamento da demanda é estabelecida de acordo com a sede funcional da autoridade apontada como coatora e a sua categoria profissional, o que evidencia a natureza absoluta e a improrrogabilidade da competência, bem como a possibilidade de seu conhecimento ex officio”.190 Há casos de competência originária de tribunais, que vêm determinados pela Constituição Federal, como, v.ġ., a do STF para o mandado de segurança contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador da República e do próprio Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, d). Competência originária também é atribuída ao STJ para os mandados de segurança contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, b).191 Prevê, ainda, a Constituição recurso ordinário para o STF (art. 102, II, a) e para o STJ (art. 105, II, a), no caso de denegação da segurança em processo de competência originária de tribunais superiores ou locais, respectivamente. À Justiça Federal de 1º grau compete o mandado de segurança contra autoridade federal não compreendida na competência de Tribunal determinada pela Constituição192. No âmbito da justiça comum, a competência dos juízes e tribunais é determinada pela Constituição Estadual e pela Lei de Organização Judiciária local. É bom lembrar, porém, que essa legislação não tem força de alterar regras de competência de foro traçadas pela legislação

processual federal. Assim, se a lei de organização judiciária cria varas para a Fazenda Pública Estadual no foro da Capital, sua competência somente prevalecerá para os mandados de segurança contra autoridades sediadas na capital. Para as demais autoridades do Estado que não se sediem no território da Capital, o mandado de segurança terá de ser processado normalmente nas comarcas da respectiva sede funcional (STJ, Súmula nº 206). Duas observações importantes: a) ao STF e ao STJ, a competência originária em matéria de mandado de segurança restringe-se aos casos enumerados taxativamente pela Constituição, de maneira que, fora deles, não lhes cabe conhecer de impetração contra atos dos tribunais locais. O mandado de segurança, na espécie, deve ser impetrado perante o próprio tribunal em que o ato impugnado aconteceu193; b) em relação aos atos dos Juizados Especiais, não há competência do STF, nem tampouco do STJ ou dos Tribunais locais. O mandado de segurança há de ser impetrado perante a Turma Recursal, inclusive quando o ato tenha sido por ela mesma praticado194. Registre-se, por fim, que a competência dos juízes de primeiro grau, em qualquer das Justiças, será definida por critério residual, ou seja, a eles tocará processar e julgar os mandados de segurança que não forem atribuídos a foros privilegiados, ou seja, não se acharem incluídos em competência originária de algum tribunal195. E, quando a competência para o mandamus for do juízo de primeiro grau, seja na

Justiça Federal, seja na Estadual, “a competência territorial se determinará pelo local em que a autoridade coatora exerce sua função”, sendo absoluta a competência se houver, na comarca, vara privativa da Fazenda Pública, em razão da regra de competência territorial.196 Tema de controvérsia tem sido a competência para o mandado de segurança em relação aos atos de administradores das instituições de ensino superior, que será mais detalhadamente abordado nos comentários ao art. 2º. Desde já, no entanto, pode-se ter como representativo da jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça, em relação às universidades particulares, o acórdão do REsp 1.295.790/ PE, assim ementado: “(...) 3. A Primeira Seção do STJ, no CC n. 108.466/RS, de Relatoria do Exmo. Ministro Castro Meira, julgado em 10 de fevereiro de 2010, nos processos que envolvem o ensino superior, fixou regras de competência em razão da natureza do instrumento processual utilizado. Portanto, em se tratando de mandado de segurança, a competência será federal, quando a impetração voltar-se contra ato de dirigente de universidade pública federal ou de universidade particular; ao revés, será estadual quando o mandamus for impetrado contra dirigentes de universidades públicas estaduais e municipais, componentes do sistema estadual de ensino. Em outro passo, se forem ajuizadas ações de conhecimento,

cautelares ou quaisquer outras de rito especial, que não o mandado de segurança, a competência será federal quando a ação indicar no polo passivo a União ou quaisquer de suas autarquias (art. 109, I, da CF/88); será de competência estadual, entretanto, quando o ajuizamento voltar-se contra entidade estadual, municipal ou contra instituição particular de ensino. 4. A competência para o julgamento de causas relativas a instituição de ensino superior particular, nos casos que versem sobre questões privadas relacionadas ao contrato de prestação de serviços firmado entre a instituição de ensino superior e o aluno (por exemplo, inadimplemento de mensalidade, cobrança de taxas, matrícula), em se tratando de ação diversa à do mandado de segurança, é, via de regra, da Justiça comum, não havendo interesse da União no feito, o que afasta a sua legitimidade para figurar na ação. 5. Recurso especial parcialmente provido”197. Ainda em relação à competência para o julgamento do writ, o STJ já decidiu competir à Justiça Eleitoral decidir a causa “em que a análise da controvérsia é capaz de produzir reflexos diretos no processo eleitoral, a exemplo da hipótese em que se questiona a validade da convenção partidária na qual são escolhidos os candidatos ao pleito, com posterior registro de candidatura”198. Entretanto, é de se destacar que “compete à justiça estadual o processo e julgamento das causas em que membros de partido político discutem a respeito da validade de atos internos”, uma vez que “a competência da justiça eleitoral só se caracteriza após o início do procedimento eleitoral”199.

15.1.

Regras legais sobre a competência para o mandado de segurança

É em função da autoridade coatora que tanto a Constituição Federal, como as Constituições Estaduais e a Lei do Mandado de Segurança definem a competência para a ação especial assegurada pelo art. 5º, LXIX, da Lei Maior. E o critério se explica pelo fato de ter sido aquela autoridade quem praticou o ato impugnado e quem terá de cumprir a ordem judicial200. Ao estruturar o Poder Judiciário, a Constituição Federal estabeleceu quando o mandado de segurança será da competência originária do Supremo Tribunal Federal201, do Superior Tribunal de Justiça202e dos Tribunais Regionais Federais203. São disciplinadas por lei infraconstitucional as competências originárias do Tribunal Superior do Trabalho (CF, art. 111-A, § 1º), dos Tribunais Eleitorais (CF, art. 121)204 e dos Tribunais Regionais do Trabalho (CF, art. 113)205, bem como a dos Tribunais e Juízes Militares (CF, art. 124, parágrafo único)206. Cabe às Constituições dos Estados dispor sobre os casos de competência originária para os mandados de segurança a cargo dos Tribunais de Justiça (CF, art. 125, § 1º). Na área da Administração Federal, portanto, excluídas as competências originárias dos

Tribunais, os mandados de segurança serão processados e julgados pelos juízes federais de primeiro grau de jurisdição – ora pelos juízes da Justiça Federal, ora pelos da Justiça Eleitoral, ora pelos da Justiça do Trabalho –, tudo conforme a natureza do direito subjetivo discutido e seu enquadramento na esfera de atribuições de cada um dos ramos de atuação dos órgãos jurisdicionais federais. O STF, em sede de repercussão geral no recurso extraordinário, decidiu ser de competência da Justiça Federal o mandado de segurança impetrado contra dirigente de sociedade de economia mista.207 Não estando a autoridade coatora inserida no âmbito jurisdicionado pelas Justiças da União, nem estando acobertada por foro privilegiado de tribunal, o mandado de segurança deverá sempre ser aforado perante juiz de primeiro grau dos quadros da justiça comum dos Estados208. A observação que se impõe diz respeito ao critério geral da lei adotado para definição da competência para a ação de mandado de segurança. Ao contrário da lei processual comum, que tem como regra básica o domicílio do réu para determinar a competência, a lei especial da ação de segurança toma como critério os dados relacionados com a autoridade coatora, e não os da pessoa jurídica que ocupa a posição de sujeito passivo do processo. Assim, “a competência para julgar mandado de segurança define-se pela categoria da autoridade coatora e pela sua sede funcional”209.

16. MANDADO DE SEGURANÇA EM MATÉRIA PENAL O mandado de segurança, segundo a fonte constitucional, foi instituído para combater o abuso cometido no seio da Administração. De seu alcance ficaram excluídos os atos de autoridade atacáveis por meio do habeas corpus, o que leva à conclusão imediata de que a matéria penal não se apresenta ordinariamente como tema abordável no mandado de segurança210. Na praxe forense, todavia, surgiram situações excepcionais em que a jurisprudência se viu forçada a reconhecer o cabimento do mandamus, mesmo acerca de matéria criminal. É o caso, por exemplo, dos processos penais em que a condenação se limita à pena de multa, já que o STF assentou na Súmula nº 693 que “não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativa a processo em curso por infração penal em que a pena pecuniária seja a única cominada”. É claro que, em tais processos, não sendo utilizável o habeas corpus, as ilegalidades eventualmente praticadas, contra as quais não seja oponível recurso com efeito suspensivo, desafiarão a tutela do mandado de segurança. Muitos outros casos ligados ao direito penal e ao processo penal poderão ser lembrados como não afetos à liberdade de locomoção e que, portanto, poderão ser tratados em mandado de segurança, como eficácia de recursos, apreensão de mercadorias, fechamento de estabelecimento, arbitramento de fiança, direito de visitas etc.211 O problema que comumente se põe é o da competência, porque às vezes se atribui o

processamento do mandado de segurança, em matéria penal, aos juízos cíveis, outras vezes aos criminais. A solução mais razoável é tomar em consideração a natureza do ato. Se se trata de ato genuinamente penal, como os praticados pela autoridade policial para preparar a ação penal, a segurança deverá ser processada no juízo criminal, em primeiro e segundo grau de jurisdição. O mesmo se pode dizer dos abusos cometidos no processamento da fiança ou nos atos de preparação do julgamento pelo júri. Sendo, porém, o caso de medida apenas administrativa praticada pela polícia, como o fechamento de estabelecimento comercial, por perturbação do sossego público, a segurança deverá ser atribuída à competência do juízo cível. Em suma, é pela natureza da matéria, e com o poder de tratá-la em juízo, que se logrará definir a competência para o mandado de segurança em questões ligadas ao direito criminal. Se a autoridade pratica ato puramente administrativo, mesmo atuando em procedimento ligado a atividade repressiva de delito, há de prevalecer a competência civil. Se o ato está dentro do procedimento específico do juízo criminal, de modo que sua abordagem seria naturalmente desempenhada pelo juiz criminal, com revisão, nos Tribunais, por câmara também criminal, o mandado de segurança, sem embargo de ser ação civil, deverá submeter-se à competência jurisdicional penal212. Vale dizer: o mandado de segurança é, por sua origem e destino, uma ação civil213. Basta lembrar que foi instituído para atacar atos administrativos e a seu procedimento especial aplica-se subsidiariamente o Código de Processo Civil. Nada obstante, os atos da autoridade criminal, quando não abordáveis pelo habeas corpus, e, portanto, atacáveis pelo mandado de segurança, deverão ser tratados em juízo pelos órgãos jurisdicionais penais, se são estes os que, processualmente, teriam a competência natural para revê-las, pelos remédios recursais previstos no direito processual penal. Entre os legitimados à impetração do mandado de segurança contra ato judicial praticado no âmbito criminal figura, além do acusado, o representante do Ministério Público, parte na relação jurídica processual. O STF reconheceu que o promotor de justiça pode usar o remédio constitucional “quando o ato atacado emana de juiz de primeiro grau de jurisdição”214; e o STJ, que o terceiro prejudicado pode impetrar a segurança contra ato de apreensão de bens de sua propriedade ocorrida no juízo criminal215.

17. O MÉRITO DA AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA O mérito de uma ação se concentra no pedido do autor e seu fundamento (causa de pedir), que, com os acréscimos adicionados pela defesa do réu, retratam o objeto da prestação jurisdicional a ser alcançada no final do processo. É, em outras palavras, o litígio trazido pelas partes ao juízo, a res in iudicium deducta. No caso do mandado de segurança, o mérito da causa consiste na pretensão de invalidar ou impedir o ato de autoridade que, ilegal ou abusivamente, tenha violado algum direito subjetivo do impetrante, ou que o tenha ameaçado de lesão.

A ilegalidade e o abuso de poder imputados pelo autor à autoridade coatora integram o mérito da ação mandamental216, como fundamento da pretensão deduzida em juízo. Portanto, o julgamento de mérito, na ação de mandado de segurança, se dá quando o órgão judicial procede à certificação da existência do direito subjetivo do impetrante e reconhece a lesão, ou ameaça de lesão, em relação àquele direito, por ato ilegal ou abusivo da autoridade coatora. Com isso, a ordem pleiteada é deferida por sentença de mérito. É também um julgamento de mérito o que denega a ordem, por reconhecer a sentença que o impetrante não tem o direito subjetivo alegado, ou, mesmo tendo tal direito, não sofreu ele o dano ou a ameaça afirmada na petição inicial. É que nas duas situações a resolução da controvérsia terá proporcionado uma definitiva composição do litígio deduzido em juízo, terá dado resposta completa ao pedido formulado pelo autor217. Em contrapartida, não será julgamento de mérito aquele em que o órgão judicial denegar a ordem por considerar que o impetrante não provou suficientemente os fatos de que decorre o direito subjetivo, para cuja tutela o mandado de segurança foi manejado. É que a prova completa da alegação do fundamento do pedido de segurança é uma condição de procedibilidade218. Faltando tal prova, o caso não é de rejeição do pedido, mas de extinção do processo por carência da ação especial intentada219.

17.1.

Julgamento do mérito e lei superveniente

Dispõe o art. 493 do CPC/2015 que “se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão”220. É certo que o fato novo, na espécie, tanto pode se referir ao plano fático propriamente dito, como ao plano do direito, no caso de inovação legislativa221. Para o STJ, esse dispositivo aplica-se ao mandado de segurança222, enquanto para o STF não teria aplicação, no julgamento do mandamus, a lei superveniente à impetração223. A divergência, todavia, é apenas aparente, porque os acórdãos cogitaram de situações concretas muito diversas. O STJ, quando admitiu a aplicação do art. 462 do CPC/1973224, determinando fosse observada a inovação superveniente capaz de afetar o direito subjetivo do impetrante, o fez em mandado de segurança preventivo. Inexistia ato concreto da Administração, mas apenas se temia que dito ato viesse a ser praticado. Logo, se, antes da medida judicial preventiva, lei nova suprimiu o direito para o qual se buscava resguardo, impossível seria deferir a segurança diante da atual situação jurídica do impetrante. Obviamente, a sentença somente poderia ser prolatada segundo os padrões da lei de seu tempo. Imperiosa, portanto, a observância da regra do art. 462 do CPC/1973. O julgado do Supremo Tribunal, de outro lado, referia-se a mandado de segurança contra ato administrativo consumado, o qual, portanto, tinha sua legalidade subordinada apenas à lei vigente no momento de sua prática. A autoridade dita coatora, ao concluí-lo, não apreciou a legislação

superveniente pela simples razão de que “ela então não existia”. Se assim foi, “o ato evidentemente não pode ser caracterizado como ilegal ou abusivo em decorrência de lei futura”. Daí por que não teria aplicação o art. 462 do CPC/1973. Em suma: se o mandado é contra ato lesivo consumado, a sentença mandamental não examinará senão a lei que o fundamentou, ficando afastada a observância do referido art. 462. Se, porém, o ato administrativo não havia sido ainda praticado, porque a segurança era preventiva, a lei superveniente, sendo inovadora, terá de ser levada em conta, para definir se a proibição da medida temida pode, ou não, ser decretada, mostrando-se pertinente a observância da regra do prefalado art. 462.

18. PARTES NA AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA O processo engendra uma relação processual que envolve as partes e o juiz, cujo objeto é a controvérsia (lide ou litígio) a ser solucionada sob a autoridade do Estado. Partes são aqueles colocados em posições contrapostas na relação processual, e que manifestam pretensões diferentes, cada um na expectativa de ser a sua afirmada posição jurídica a acolhida pelo órgão judicial, na definição do litígio. Na visão objetiva, puramente processual, basta a situação de estar alguém em juízo na condição de quem postula a prestação jurisdicional ou de quem se sujeita a suportar dita prestação, para se qualificar como parte do processo. Na linguagem corrente, parte, portanto, é aquele que pede ou em face de quem se pede algo em juízo225. Parte, no sentido processual, apresenta-se como um dos elementos da ação. Sem a integração das partes não se implanta a relação processual dentro da qual se formará e desenvolverá o procedimento necessário à construção do provimento jurisdicional. Mas, para que a atividade do litigante possa atingir a meta do processo, exige a lei, do litigante, algo mais: exige sua legitimidade para postular a prestação jurisdicional, qual seja, a solução do litígio configurador do mérito da causa. A legitimação ad causam, assim, corresponde a uma condição da ação, sem a qual o processo, ainda que válido como relação jurídica, não tem aptidão para alcançar a solução do mérito do processo, localizado no plano do direito material em jogo. A configuração da legitimidade da parte reclama uma análise que não se limita à sua posição no âmbito da situação jurídica material invocada, pois se terá também de levar em conta a posição do sujeito passivo. A parte, destarte, só será legitimada ao processo se for, materialmente, o titular da pretensão e se, também, a outra parte for quem, substancialmente, esteja sujeito a satisfazê-la. O liame da legitimidade reclama análise múltipla, a enfocar relacionamento entre um sujeito, um objeto e outro sujeito. É, como se vê, do plano do direito material que se extrai a legitimidade de parte (dita legitimatio ad causam)226. Procede-se, no processo, à transformação da titularidade da relação de direito material em “realidade processual”227, ainda que isto se dê por meio de uma avaliação perfunctória e superficial, à luz apenas das alegações contidas na petição inicial,

provisoriamente havidas como reveladoras da relação substancial controvertida228. A decisão do juiz não é de afirmação ou negação do direito da parte, mas de análise da respectiva alegação apenas. E, com base na situação jurídica substancial afirmada, reconhecer-se-á ou não a legitimação para discuti-la em juízo. Nesse momento processual não se vai além disso.

18.1.

Legitimação ativa

A legitimação para o processo se diz ordinária quando o autor ingressa em juízo para defesa de direito subjetivo próprio; e, extraordinária, quando o faz excepcionalmente para defender direito alheio, o que somente a lei, em casos especiais, pode autorizar (CPC/2015, art. 18229). Em relação ao mandado de segurança, a lei própria cuida de ambas as modalidades de legitimação.

18.2.

Legitimação ordinária

O mandado de segurança, conforme prevê o art. 1º da Lei nº 12.016 – e como já estava consagrado pela doutrina e jurisprudência anteriores –, é manejável indiferentemente, para o exercício da garantia outorgada pelo art. 5º, LXIX e LXX, por pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira, de direito público ou privado230. De tal sorte, qualquer pessoa pode lançar mão do mandado de segurança para corrigir o ato abusivo de agente do Poder Público, que lhe tenha ofendido direito líquido e certo. Não importa se pessoa física ou jurídica, de direito privado ou de direito público, se brasileiro ou estrangeiro231. Até mesmo entidades sem personalidade jurídica, mas dotadas de personalidade formal ou processual, se incluem entre os legitimados ao manejo do writ. O STJ reconhece, por exemplo, legitimidade ao Ministério Público para impetrar mandado de segurança em defesa de suas prerrogativas institucionais: “2. O entendimento de que o Ministério Público Especial tem sua atuação restrita ao âmbito do Tribunal de Contas não exclui a possibilidade de tal Parquet especial atuar fora de tais cortes em defesa de suas (Ministério Público de Contas) prerrogativas institucionais, que é exatamente a hipótese dos autos. 3. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência pacificamente reconhecem a legitimidade até mesmo para determinados órgãos públicos, entes despersonalizados e agentes políticos dotados de prerrogativas próprias, para impetração de writ em defesa de sua atuação funcional e atribuições institucionais, razão pela qual não há razão para excluir a legitimação para o Ministério Público de Contas em tais casos”232. O STJ reconheceu, também, legitimidade a Diretor Presidente de Fundação de Natureza

Privada, que serve de apoio a Universidade Federal, para impetrar mandado de segurança contra ato do Ministro de Estado da Educação. No julgamento, a Corte entendeu que “as fundações de apoio às instituições federais de ensino superior, que podem ser de natureza pública ou privada, surgiram com a finalidade de facilitar a flexibilização das tarefas acadêmicas, nas dimensões de ensino, pesquisa, extensão e gestão”. Assim, embora o ato tido por ilícito e apurado no Processo Administrativo Disciplinar tenha sido praticado em uma fundação de apoio de natureza privada, não estando necessariamente vinculado com o exercício do cargo público, a “relação intrínseca entre a UnB e a FEPAD” implicaria “a observância dos deveres impostos ao servidor público”, estivesse ele “exercendo atividade na universidade federal ou na própria fundação de apoio, concomitantemente ou não, de forma que eventuais irregularidades praticadas no ente de apoio irão refletir necessariamente na universidade federal, causando dano ao erário”233. Logo, os dirigentes de tais fundações podem figurar tanto como impetrante como impetrado de mandado de segurança. Para a Lei nº 1.533/1951, o mandado de segurança seria concedido sempre que “alguém” sofresse, em sua esfera jurídica, violação ou ameaça por parte de autoridade (art. 1º). A lei atual preferiu substituir o “alguém” por “qualquer pessoa física ou jurídica”. Isto levou a uma crítica de certa doutrina que via na nova nomenclatura legal uma restrição que só permitia o recurso ao writ às entidades que pudessem configurar tecnicamente “pessoas”, deixando de fora instituições não personificadas. Ter-se-ia, dessa maneira, reduzido o alcance da garantia fundamental prevista no art. 5º, LXIX, da Constituição, sem qualquer limitação quanto ao ente titular do direito protegido. A norma, todavia, não pode merecer uma interpretação puramente literal, sob pena de incompatibilizarse com a regra maior editada em nível constitucional, de alcance já interpretado largamente em sede doutrinária e pretoriana. É que o fato de mencionar a Lei nº 12.016 a possibilidade de o mandado de segurança ser impetrado por pessoa física ou jurídica não pode, nem deve, de forma alguma, ser interpretado como um retrocesso sobre a concepção, já solidamente consagrada sob o regime da legislação pretérita, de que a garantia prevista na Carta Magna também se estende a entes despersonalizados, a que o próprio direito constitucional e infraconstitucional reconhece personalidade formal ou processual. É o caso, por exemplo, da Presidência da República, da Câmara dos Deputados, do Prefeito e da Câmara de Vereadores, do Governador, da Assembleia, dos Tribunais, do Ministério Público, da Mesa da Câmara Federal ou do Senado etc.234, instituições a que a lei outorga legitimidade para demandar em juízo, muito embora não sejam pessoas jurídicas, no sentido técnico, inclusive na seara do mandado de segurança, sempre que estejam em jogo questões ligadas às suas funções e prerrogativas institucionais. Outra interpretação não há de prevalecer, visto que, em matéria de direitos fundamentais, vigora o princípio da proibição do retrocesso235. Há, ainda, de ser observado o princípio de hermenêutica, que impõe sejam as normas constitucionais entendidas sempre de forma a conferir-lhes a máxima efetividade, vedados os critérios restritivos236.

Também, fora do âmbito do direito público, entidades despersonalizadas, como o espólio, a massa falida e o condomínio, legitimam-se, quando dotadas de personalidade formal para o processo, ao exercício do mandado de segurança, se o patrimônio que representam vier a ser ofendido por abuso de autoridade. Em suma, a expressão “qualquer pessoa física ou jurídica” do art. 1º da Lei do Mandado de Segurança abrange, histórica e necessariamente, também as “pessoas formais” ou “processuais”.

18.3.

Legitimação extraordinária para o mandado de segurança

No caso do habeas corpus, existe uma ampla permissão de substituição processual, de modo a legitimar qualquer pessoa a impetrá-lo, mesmo em favor de terceiro (CPP, art. 654). O mesmo não se passa com o mandado de segurança, uma vez que, em regra, a legitimação para pleiteá-lo somente existe em relação a quem se apresente como titular do direito líquido e certo apontado como violado ou ameaçado237. Os casos excepcionais em que o impetrante da segurança pode agir, em nome próprio, na defesa de direito de outrem, são apenas aqueles autorizados pela própria lei do mandado de segurança e que serão abordados a seguir.

18.4.

Direito comum a diversos titulares

Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, não se impõe um litisconsórcio ativo necessário para sua tutela em juízo, por via do mandado de segurança. Qualquer um dos cotitulares poderá impetrá-lo singularmente. Se resolverem fazê-lo em conjunto, o litisconsórcio ativo será apenas facultativo (Lei nº 12.016, art. 1º, § 3º). Um exemplo dessa legitimação plúrima encontra-se na Súmula nº 268 do STF: “Integrante de lista de candidatos a determinada vaga da composição de tribunal é parte legítima para impugnar a validade da nomeação de concorrente”238. O afastamento do litisconsórcio necessário na hipótese de direito comum, segundo EDUARDO TALAMINI, não produzirá substituição processual, nos moldes do art. 18 do CPC. O cotitular impetrante provocaria sentença com efeito sobre os demais, sem, entretanto, revesti-lo da autoridade da coisa julgada. Ou seja, qualquer outro cotitular poderia tomar a iniciativa de propor outra ação, com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, sem que o inibisse o resultado adverso da primitiva demanda239. Diverso, porém, é o entendimento esposado pelo STJ, para o qual não se pode deixar de ver, em semelhante conjuntura, uma verdadeira substituição processual reconhecida pela lei em favor do cotitular do direito comum, que agiria em nome próprio, mas em defesa de um direito que também pertence a outros titulares. Destarte, a coisa julgada assim formada teria de atingir os demais colegitimados, na condição de substituídos240. Pensamos que mais consentâneo com os objetivos do direito processual moderno e com a

própria ideia de litisconsórcio é a exegese do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, se o direito litigioso é o mesmo, não se lograria segurança alguma com a coisa julgada restrita somente àquele cotitular que o defendeu. Uma única e só relação jurídica material não pode ser resolvida em juízo, senão mediante solução que valha para todos os seus sujeitos. É importante considerar que não se está cogitando de direitos similares ou iguais, mas de um só direito cuja titularidade é plúrima. O litisconsórcio acaso formado em torno dela seria facultativo, mas necessariamente teria de ser unitário, de modo a alcançar solução única perante todos os sujeitos da relação, que, por natureza, não se mostra fracionável. É assim que a legitimação conferida excepcionalmente a um só dos cotitulares do mesmo direito material haverá de produzir efeitos de coisa julgada não apenas para quem impetrou a segurança, mas igualmente para todos que, junto com ele, ocupavam a titularidade comum do direito disputado em juízo. A não ser assim, correr-se-á o risco de implantar, em vez da segurança, o caos entre os múltiplos sujeitos da relação jurídica controvertida. Imagine-se um concurso ou uma licitação em que o resultado homologado contaminou-se de vício capaz de prejudicar o conjunto dos concorrentes não classificados. Como poderia ocorrer invalidação do mesmo certame perante uns e validação perante outros candidatos? Não importa quem o trouxe à decisão judicial. Se quem o fez tinha legitimidade para fazê-lo como titular de um direito comum a vários interessados, só será válida, eficaz e segura a sentença se a coisa julgada dela emergente for oponível a todos os seus sujeitos, tenham ou não participado do mandado de segurança manejado por um deles segundo a autorização do art. 1º, § 3º, da Lei nº 12.016241. Se nem todos os titulares do direito comum confiam na conduta processual do impetrante, o remédio será a intervenção dos insatisfeitos na causa proposta, por meio de assistência litisconsorcial, antes que a sentença de mérito seja pronunciada (CPC/2015, art. 124242), nunca o aforamento, depois da coisa julgada, de outra ação com pedido e causa de pedir iguais ao da demanda fracassada. Poder-se-á até cogitar de ação rescisória, nunca, todavia, ignorar pura e simplesmente a existência da res iudicata.

18.5.

Legitimação passiva

Para propor a ação de mandado de segurança, o autor tem de identificar o ato impugnado, imputando-o a uma autoridade e a uma pessoa jurídica de direito público (ou a uma pessoa jurídica de direito privado, a que se tenha atribuído atividade própria do poder público). Cumpre, pois, determinar qual o papel que, na relação processual, desempenhará cada um desses sujeitos. Em caso de concurso público, importante ressaltar que, se o candidato prejudicado ajuíza ação ordinária questionando sua eliminação do certame, o STJ entende que a legitimidade passiva será da

entidade responsável pelo concurso, e não da banca examinadora243. Esse mesmo critério pode ser estendido ao Mandado de Segurança.

18.6.

Autoridade coatora

Como dispõe o art. 1º da Lei nº 12.016, o mandado de segurança é concedido contra ato de autoridade que tenha cometido ilegalidade ou abuso de poder em detrimento de direito líquido e certo do impetrante. Exige, no entanto, que este, na petição inicial, identifique não só a autoridade coatora como também a pessoa jurídica a que o agente do ato impugnado se acha integrado (art. 6º). Por autoridade coatora, in casu, se deve entender qualquer agente da administração pública direta ou que exerça atos próprios do Poder Público, ou que, por lei, sejam a estes equiparados. Como tal a Lei nº 12.016 considera tanto o que tenha praticado o ato impugnado pelo mandado de segurança, como aquele que tenha ordenado sua prática (art. 6º, § 3º). Nunca será, porém, o mero executor material do ato, mas sempre o que detém poder e competência para decisão a seu respeito244. Pacífico, pois, é o entendimento, doutrinário e jurisprudencial, de que “autoridade coatora é aquela que tem competência para a prática do ato ou sua correção no momento da impetração do mandado de segurança”245. O mandado de segurança é proposto, diretamente, em face da autoridade que praticou o ato abusivo, a quem se determinará, em lugar da tradicional contestação, a prestação de informações no prazo da lei.246 Com isso, há quem entenda que o sujeito passivo, na espécie, seria a própria autoridade, e não a pessoa jurídica de direito público em cujo nome se praticou o ato impugnado, isto é, a União, o Estado, o Município etc. Essa visão, todavia, é equivocada e acha-se completamente superada no atual estágio da doutrina do mandado de segurança. De forma alguma se dá a convocação do agente público coator para contestar a ação mandamental, mas apenas para prestar “informações” sobre o ato que praticou, como órgão da pessoa jurídica interessada, ou seja, a ré da ação (Lei nº 12.016, art. 7º, I). Salvo a excepcional situação de legitimação extraordinária (que não ocorre, em princípio, no caso do mandado de segurança individual), a parte legítima para qualquer ação se identifica pela titularidade da relação material deduzida em juízo como objeto do processo. Essa relação, no mandado de segurança, evidentemente não se trava entre o impetrante e o coator, mas entre aquele e a pessoa jurídica, da qual este é apenas um órgão ou agente. Assim, o provimento que se procura obter, por meio da ação mandamental, destina-se a produzir efeito diretamente sobre a esfera jurídica da referida pessoa jurídica, mesmo porque nenhum direito subjetivo do coator é colocado sob discussão em juízo. Sendo assim, é inegável que a legitimidade passiva ordinária para a demanda de mandado de segurança só pode ser, mesmo, da pessoa jurídica que a autoridade coatora integra247. Nem mesmo se poderia entrever uma legitimação extraordinária, porque a Lei do Mandado de Segurança faz a pessoa jurídica interessada integrar-se ao processo desde sua origem, mediante

citação do respectivo órgão de representação judicial. Como, então, cogitar de um substituto processual de um litigante já integrado pessoalmente à relação processual?

18.7.

Pessoa jurídica interessada

Na verdade, a melhor exegese sempre foi a que atribui à autoridade coatora apenas a legitimidade formal para informar e esclarecer sobre sua participação no evento controvertido que envolve a pessoa jurídica de direito público em cujo nome atuou na prática do ato discutido no mandamus. Com efeito, a repercussão do processo operará toda sobre os poderes e interesses daquela pessoa pública, e não apenas sobre a autoridade notificada. Não há como, portanto, ignorar a participação substancial da entidade no processo248. A atual Lei do Mandado de Segurança segue, explicitamente, esse entendimento, pois determina que, concomitantemente, se proceda à notificação à autoridade coatora e se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (Lei nº 12.016, art. 7º, I e II)249. A autoridade coatora, portanto, não é incluída no processo como ré, mas como órgão da pessoa jurídica em cujo nome praticou o ato impugnado, e sobre cuja esfera jurídica irá incidir o provimento judicial a ser pronunciado em solução ao pedido do autor250. Nem mesmo se pode cogitar de um litisconsórcio entre o coator e a pessoa jurídica interessada. A autoridade responsável pelo ato impugnado não é um ente distinto da pessoa jurídica, é um órgão dela, uma “parte integrante daquela”251. O agente da pessoa jurídica responsável pelo ato impugnado pode e deve defendê-lo, agindo, pois, no processo, como órgão especial da pessoa jurídica em cujo nome atuou252. Essa atuação processual, porém, não exclui a legitimidade da pessoa jurídica para ocupar o polo passivo da ação e tampouco para, querendo, nela intervir, por meio de seu órgão institucional de representação judicial. Se isto acontecer, duas entidades poderão atuar paralelamente na defesa do ato impugnado: o coator e o procurador da pessoa jurídica. O réu, contudo, será apenas a pessoa jurídica interessada, apresente ou não defesa nos autos. À autoridade coatora, porém, nem mesmo caberá contestar a ação em nome da pessoa jurídica demandada, mesmo porque não dispõe, em regra, sequer do jus postulandi (capacidade técnica) para fazê-lo em suas informações. Apenas em sentido figurado se pode aceitar que faça a “defesa do ato impugnado” como às vezes se diz na jurisprudência. O que realmente lhe compete é tão somente “prestar informações” a seu respeito (Lei nº 12.016, art. 7º, I). Para não deixar dúvida quanto à posição da pessoa jurídica dentro da relação processual, a Lei nº 12.016 exige do impetrante que indique qual é, no caso deduzido em juízo, a pessoa jurídica a que a autoridade coatora se acha integrada (art. 6º), ordenando, outrossim, que “o órgão de representação judicial” dessa pessoa jurídica seja intimado da impetração, abrindo-lhe oportunidade para contestála (art. 7º, II). Além disso, determina a lei que o coator, tão logo receba a notificação judicial

relativa à impetração do mandado de segurança, deverá fornecer à pessoa jurídica, à qual se vincula, as informações e os elementos necessários à formulação da defesa cabível, por meio do respectivo órgão de representação judicial (art. 9º). Isso, porém, não leva à constituição de um litisconsórcio entre o coator e a pessoa jurídica. O coator é apenas um órgão da pessoa jurídica, de maneira que não são duas entidades distintas que figuram no polo passivo da ação. Há simplesmente possibilidade de dois órgãos diferentes da mesma pessoa jurídica atuarem em seu nome, em caráter eventual, e por pura conveniência do único sujeito passivo da ação. É por isso que o primeiro órgão recebe notificação e o segundo é cientificado (citado) da impetração.

18.8.

Legitimidade recursal

No regime da Lei nº 1.533/1951 existia entendimento jurisdicional que vedava à autoridade coatora a possibilidade de recorrer da sentença proferida na ação de segurança, restando sua participação no processo limitada à prestação de informações. O recurso, por isso, somente seria manejável pela pessoa jurídica interessada253. A Lei nova, embora reconheça a posição de parte à pessoa jurídica, tanto que seu representante judicial deve ser cientificado da impetração, não retira do coator a legitimidade para recorrer da sentença contrária à posição adotada no ato questionado em juízo (Lei nº 12.016, art. 14, § 2º). Continua, é bom esclarecer, pertencendo à pessoa jurídica o direito originário de recorrer da sentença que defere a segurança postulada, pois são direitos, poderes e interesses seus que, fundamentalmente, estão em jogo no processo. O que a nova lei faz é estender, também, à autoridade coatora o direito de recorrer, como aliás se lê no § 2º do citado art. 14 da Lei nº 12.016. Dessa maneira, tanto pode recorrer um ou outro dos legitimados, ou até mesmo ambos, conforme o caso e os interesses em jogo. Pode até mesmo haver interesse próprio de um dos legitimados que não seja compartilhado pelo outro. Por exemplo: o representante judicial da pessoa jurídica não recorre porque pensa ter havido mesmo abuso de autoridade, enquanto o coator tem interesse próprio em demonstrar que não cometeu dito abuso e, sim, atuou dentro da legalidade. Daí por que a atitude recursal de um não deve, necessariamente, prejudicar a do outro. Assim, o coator não recorre, propriamente, como parte, mas como terceiro interessado (CPC, art. 996, caput). Apenas a pessoa jurídica impetrada é que, na verdade, poderá recorrer como parte vencida254.

18.9.

Caracterização de autoridade

Por outro lado, para figurar na ação de segurança não basta ser funcionário ou agente envolvido na prática do ato abusivo. Para ocupar legitimamente a posição de autoridade, exige-se do agente que tenha poderes para decidir sobre a prática do ato impugnado255. Quem apenas o realizou em

cumprimento de ordens de outrem não chega a configurar a autoridade coatora de que fala a lei. Só quem dispõe de poder para ordená-lo e revogá-lo deixa de ser mero executor material para assumir, na esfera do mandamus, a condição de autoridade coatora256. Dentro da complexidade da organização administrativa, não raro o impetrante não tem como descobrir, com precisão, quem foi o principal responsável pelo ato impugnado. Para contornar essa dificuldade, o art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016 permite que o writ indique como autoridade coatora tanto aquela que tenha praticado o ato impugnado como aquela da qual emanou a ordem para praticálo257. Não é, outrossim, coator, para efeito do mandado de segurança, quem apenas exerce o poder normativo, por meio da edição de lei, decreto, regulamento, portaria etc. Não cabe o writ, em princípio, contra lei em tese258, salvo se se tratar de ato normativo de efeitos concretos, capazes de afetar imediatamente situação jurídica individual259. Não prevalece mais, pelo menos em toda linha, a jurisprudência que não considerava autoridade coatora aquele que cumpria decisão de superior hierárquico, na prática do ato questionado no mandamus. Segundo o art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016, como já observado, considerase autoridade coatora tanto “aquela que tenha praticado o ato impugnado” como aquela “da qual emane a ordem para sua prática”. A nova Lei, portanto, adotou o modelo semelhante ao que é utilizado para definição de autoridade previsto no art. 1º, § 2º, III, da Lei Federal 9.784/1999, que regulamenta o procedimento administrativo na esfera federal. “(...) com esta redação buscou o legislador facilitar o acesso ao mandado de segurança eis que muitas vezes, diante do complexo organograma dos órgãos públicos, é notória a dificuldade de se identificar com clareza o agente coator no caso concreto”260. “Ciente dessa dificuldade, o STJ, acolhendo lições doutrinárias, consagrou a teoria da encampação. Por esta, o feito não pode ser extinto, se o agente indicado [equivocadamente] pelo impetrante pertence à mesma pessoa de direito público a qual se vincula o legitimado correto. Mais ainda quando houver a possibilidade de defesa do ente público, sem qualquer prejuízo. Assim, pode-se concluir que a nova lei buscou conferir maior celeridade à ação constitucional minimizando a possibilidade de erro na indicação da autoridade coatora”261. Critica SCARPINELLA BUENO o recuo na técnica legislativa, que teria atingido mais de 70 anos, por ter retornado à definição de autoridade coatora que vigorou antes do CPC de 1939. Todavia, não procede tal censura, visto que a autoridade coatora não é parte, mas apenas fonte de informação. Parte é a pessoa jurídica à qual se vincula a autoridade coatora. Se a pessoa jurídica está corretamente indicada, o erro na identificação da autoridade coatora é mera irregularidade, sanável, até mesmo de ofício, pelo juiz. Pas de nullité sans grief. Se as informações e a defesa da

pessoa jurídica foram satisfatoriamente produzidas, não há relevância a atribuir ao erro do impetrante. No entanto, a expressão da lei quando identifica a autoridade coatora com aquele que tenha praticado o ato impugnado não pode ser entendida como se referindo a qualquer tipo de executor material. Para se configurar “autoridade” é óbvio que o agente do Poder Público tem de possuir capacidade decisória, ainda quando esteja cumprindo deliberação de outra autoridade. O que a lei quis dizer foi simplesmente que, entre “duas autoridades” ligadas a um só ato, o impetrante pode se voltar, em juízo, contra qualquer uma delas. É claro que, por exemplo, um simples motorista, que cumpre ordem do chefe da repartição para dirigir ilegalmente veículo de terceiro em depósito administrativo, não pode ser tratado pelo proprietário como autoridade coatora. Nenhuma força de decisão lhe cabia na espécie, de sorte que apenas o chefe da repartição administrativa há de ser tratado como praticante de ilegalidade ou abuso de poder, para os fins do mandado de segurança. Nessa mesma linha, tampouco, se pode atribuir a qualidade de autoridade coatora ao oficial de justiça que se limita a cumprir mandado expedido pela autoridade judicial. Mesmo após o advento da Lei nº 12.016, deve-se continuar fazendo, como recomenda HELY LOPES MEIRELLES, a necessária distinção entre autoridade pública e simples agente público. Para alguém ser havido como autoridade pública haverá de deter, na ordem hierárquica, “poder de decisão” e “competência para praticar atos administrativos decisórios”. Quem responde a mandado de segurança, pois, é quem exerce o poder de decisão, e não aquele que, na qualidade de mero agente público, se limita a atuar como simples “executor de ordem superior”262.

18.10. Erro na nomeação da autoridade coatora Há posições radicais na jurisprudência que não toleram o erro cometido pelo impetrante na nomeação da autoridade coatora, considerando inviável o prosseguimento do feito por ilegitimidade passiva ad causam se o autor não corrigir a petição inicial em tempo hábil. Ao magistrado não seria lícito substituir a autoridade coatora ex officio. O problema, entretanto, deve ser enfrentado com certa flexibilidade. Se do contexto narrado na petição inicial se revela possível entrever quem seria a verdadeira autoridade coatora, não há impropriedade na determinação, pelo juiz, de sua notificação, desde que se considere como adequada a teoria de que a verdadeira parte do mandamus é a pessoa jurídica de direito público e não o agente que o representa em juízo263, como, aliás, o faz a Lei nº 12.016, nos arts. 6º, caput, 7º, II, e 13, caput. Não merece prevalecer a jurisprudência não unânime de que, diante do erro do impetrante na indicação da autoridade coatora, “deve o juiz extinguir o processo sem julgamento de mérito”, na forma do art. 485, VI,264 do CPC/2015, por ser “vedada a substituição do polo passivo”265. “Trata-se de jurisprudência contraditória com entendimento já firmado pela própria Corte

Superior, que reconhece, tão somente, a legitimidade passiva da pessoa jurídica para a causa. A alteração da autoridade coatora não modifica o elemento subjetivo da demanda, exatamente porque ela não é a parte passiva do processo. Não incide, de tal sorte, a restrição do art. 264, do CPC [CPC/2015, art. 329, II]. A estabilização da demanda atinge apenas as partes, ou seja, o impetrante e a pessoa jurídica. Essa alteração pode ser feita, inclusive, de ofício pelo juiz, tendo em vista que cabe a ele determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis, como estabelece o art. 130 do CPC [CPC/2015, art. 370]” (g.n.)266. A propósito, convém relembrar que a intervenção da autoridade coatora, no mandado de segurança, se dá basicamente para esclarecer os fatos que envolveram o ato impugnado, o que se insere no plano investigatório das alegações do autor, terreno em que a iniciativa do juiz é assegurada por lei. Nesse sentido, correta foi a decisão do Superior Tribunal de Justiça que assentou: “Processual civil. Mandado de segurança. Indicação errônea da autoridade coatora. Ausência de alteração da competência. Possibilidade de emenda à petição inicial. A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de que é possível que haja a emenda da petição do feito mandamental para retificar o polo passivo da demanda, desde que não haja alteração da competência judiciária, e se as duas autoridades fizerem parte da mesma pessoa jurídica de direito público. Agravo regimental improvido”267. “1. O art. 6º, § 3º, da Lei 12.016/2009 permite ao julgador, pela análise do ato impugnado na exordial, identificar corretamente o impetrado no mandado se segurança, não ficando restrito à eventual literalidade de equivocada indicação. Desde que, pela leitura da inicial e exame da documentação anexada, seja viável a identificação correta da autoridade responsável pelo ato impugnado no writ, nada obsta que o julgador determine que a notificação seja adequadamente direcionada ou que possibilite ao impetrante oportunidade para emendar a inicial, sanando a falha, corrigindo-se, nessas hipóteses, equívoco facilmente perceptível”268. Com o Código de Processo Civil de 2015, aplicável também ao mandado de segurança, é possível a correção dos vícios sanáveis em relação à legitimidade passiva, pela emenda da inicial ou pela correção do polo passivo da ação (arts. 338 e 339). Nesse sentido, os enunciados 488 e 511 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Enunciado 488: no mandado de segurança, havendo equivocada indicação da autoridade

coatora, o impetrante deve ser intimado para emendar a petição inicial e, caso haja alteração de competência, o juiz remeterá os autos ao juízo competente. Enunciado 511: A técnica processual prevista nos arts. 338 e 339 pode ser usada no que couber para possibilitar a correção da autoridade coatora, bem como da pessoa jurídica, no processo de mandado de segurança”. De duas maneiras é possível superar, por iniciativa judicial, o erro cometido pelo impetrante na identificação da autoridade coatora: a)

A primeira é pela atividade saneadora do juiz que, de ofício, ordenará a notificação do agente responsável pelo ato impugnado, se os próprios elementos da petição inicial revelam o equívoco cometido pelo impetrante e apontam qual deve ser a autoridade apta a prestar as informações necessárias. Isto, de forma alguma, representará alteração do sujeito passivo da ação, já que este é, efetivamente, a pessoa jurídica identificada na inicial, e esta não estará sofrendo alteração pelo juiz. O que não se tolera é a substituição do coator, de ofício, quando essa mudança importa substituir a pessoa jurídica contra quem o autor aforou a ação, ou quando a verdadeira autoridade coatora, a ser notificada, se encontra fora da competência funcional do juiz da causa269.

b)

A segunda maneira de superar o erro de definição da autoridade coatora é aquilo que a jurisprudência designa por teoria da encampação e que se dá quando o superior hierárquico não praticou o ato impugnado, mas o defende nas informações, chancelando aquilo que, de fato, foi realizado pelo agente subalterno270.

Situação peculiar é a do procedimento administrativo em torno dos lançamentos tributários. Estes são passíveis de recursos que são solucionados pelos Conselhos de Contribuintes, colegiados estes que, todavia, não têm competência para executar suas próprias deliberações. Por isso, o entendimento que acabou sendo sumulado pelo antigo Tribunal Federal de Recursos foi no sentido de que: “A autoridade fiscal de primeiro grau que expede a notificação para pagamento do tributo está legitimada passivamente para a ação de segurança, ainda que sobre a controvérsia haja decisão, em grau de recurso, de Conselho de Contribuintes” (Súmula nº 59-TFR)271. Diferente é a situação dos tribunais administrativos que têm força para emitir decisões exequíveis coercitivamente, seja no próprio âmbito da Administração, seja por meio de título exequível por via jurisdicional. Assim, nos casos de decisão de órgão colegiado, como os Tribunais de Conta, o ato do agente administrativo que se encarrega de promover-lhe o cumprimento não é, em

princípio, ato de autoridade coatora, para efeito de impetração do mandado de segurança. O entendimento observado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é o de que o ato impugnável, em verdade, é a própria decisão do Tribunal de Contas. Daí que, no mandamus, a autoridade a ser notificada é o representante do órgão colegiado, isto é, o seu Presidente, a quem competirá prestar as informações acerca do ato qualificado de ilegal ou abusivo pelo impetrante272. Contudo, é importante distinguir se o que se impugna é aquilo que o colegiado realmente decidiu ou se é a forma com que a deliberação é posta em prática pelo executor. Na primeira situação, o writ tem de ser oposto ao órgão colegiado, e, no segundo, à autoridade administrativa responsável pelo ato executivo. Impende registrar que a Lei nº 12.016/2009 adotou nova orientação quanto à identificação, na petição inicial, da autoridade coatora, que deverá sempre figurar ao lado da pessoa jurídica a que ela se vincula, passando a igualar aquela que tenha praticado o ato impugnado com a que expediu a ordem para sua prática (art. 6º, § 3º). Nada obstante, o STJ continua mantendo firme sua jurisprudência no sentido de que “o executor material de decisão de caráter impositivo do Tribunal de Contas não é a autoridade legitimada a figurar como impetrada em mandado de segurança visando a atacar o referido ato”273. Talvez a insistência do STJ em seguir uma orientação que não se amolda bem ao art. 6º, § 3º, da nova Lei de Mandado de Segurança se justifique pela diversidade de pessoa jurídica atrás do ato executado, bem como de divergência de competência, derivada do mesmo problema. É bom lembrar, por exemplo, que o mandado de segurança contra atos do Tribunal de Contas da União se sujeita a foro privilegiado, figurando entre as causas de competência originária do STF (CF, art. 102, I, d).

19. EQUIPARAÇÕES LEGAIS DE AUTORIDADE COATORA O mandado de segurança foi originariamente concebido para o fim imediato de controlar o comportamento abusivo ou ilegal de autoridade pública, ou seja, de agentes investidos de poder dentro dos órgãos da Administração Pública direta. A Constituição atual, no entanto, ao configurar o mandado de segurança, o destinou à impugnação de atos abusivos ou ilegais praticados por “autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público” (art. 1º, LXIX). O espectro da tutela mandamental, destarte, estendeu-se para muito além dos atos da Administração Pública direta. Em consonância com a perspectiva constitucional, a Lei nº 12.016 equiparou à autoridade coatora, para fins do mandamus, “os representantes ou órgãos dos partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do Poder Público”, mas somente “no que disser respeito a essas atribuições” (art. 1º, § 1º).

O sistema legal brasileiro, portanto, admite tratar como “autoridade coatora”, em ação de mandado de segurança: a)

Os investidos em cargos ou funções na Administração Pública primária, em qualquer esfera dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;

b)

Os dirigentes ou administradores das entidades autárquicas federais, estaduais, distritais ou municipais;

c)

Os representantes ou órgãos dos partidos políticos;

d)

Os dirigentes de pessoas jurídicas, mesmo de direito privado, que se achem no exercício de atribuições do Poder Público;

e)

Pessoas naturais no exercício de atribuições do Poder Público.

É relevante observar, porém, que a equiparação dos entes de direito privado às autoridades públicas só prevalece, para a Lei nº 12.016, enquanto se acharem no exercício de atribuições próprias do Poder Público. Quando estiverem praticando os atos normais de gestão econômica, segundo sua destinação empresarial e de acordo com o direito privado, não poderão ser tratados como “autoridade pública”, ficando, assim, os seus atos jurídicos excluídos do alcance do mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 1º, § 2º)274. Vale dizer, o mandado de segurança somente será admissível contra essas pessoas enquanto disser respeito às atribuições delegadas ou quando estiverem exercendo atribuições do Poder Público.275 Também aqui o sujeito passivo da ação de segurança é o partido político, a autarquia e a pessoa jurídica delegatária de atribuições do Poder Público, e não o funcionário, dirigente ou órgão que praticou o ato impugnado. No caso de o delegatário ser pessoa natural, as duas posições de coator e sujeito passivo da segurança se confundem numa só pessoa. Note-se, outrossim, que a Lei nº 12.016 – ao nomear os entes equiparados a autoridade pública – suprimiu a expressão (da Lei nº 1.533) “com funções delegadas do Poder Público” e a substituiu por “no exercício de atribuições do poder público”. Dessa maneira, “não se pode mais imaginar que seriam autoridades apenas aquelas pessoas físicas ou jurídicas que exerceriam funções delegadas”, e sim todas aquelas que se achem praticando “atribuição do poder público”, não importa a que título276.

20. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DE COLEGIADO É frequente a formação, dentro da Administração Pública, de Colegiados, cujos atos, como as demais deliberações administrativas, são passíveis de impugnação por mandado de segurança quando ilegal ou abusivamente violarem ou ameaçarem direito subjetivo. Nesses casos, o coator é o ente coletivo, mas sua representação no mandado de segurança ficará a cargo do respectivo

presidente. Dessa maneira, “em se tratando de órgãos colegiados, o seu Presidente, além de responder por atos de sua competência própria (oportunidade em que se manifestará, se for o caso, como agente individual), tem também a representação externa do próprio órgão que preside. Assim, quando o mandado de segurança visa a atacar ato praticado pelo colegiado, o Presidente é chamado a falar, não como agente individual, mas em nome e em representação da instituição”277. A regra aplica-se não apenas aos colegiados de natureza administrativa, mas também aos tribunais judiciários. Sendo possível que a impetração se volte contra decisão de algum colegiado (comissão, conselho etc.), o mandamus, em tal situação, haverá de ser proposto contra o órgão, mas a notificação para prestar informações será endereçada ao seu presidente. A Lei nº 12.016 cuidou de clarear esta circunstância dispondo que: “considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática”. Por isso é que, não sendo do presidente o ato impugnado, a sua participação no processo não será a título de coator, mas de representante dele. O mandado de segurança contra ato de colegiado tem ensejado algum problema na área da competência, geralmente em razão de ser ele presidido por autoridade que goze de foro privilegiado. Uma vez, porém, que o ato administrativo é do colegiado, e não de seu presidente, não tem incidência à espécie o privilégio de foro, devendo a impetração ser processada segundo as regras ordinárias de competência. Sobre o tema há posição consolidada da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “o STJ é incompetente para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de órgão colegiado presidido por Ministro de Estado” (Súmula nº 177 do STJ). Dessa forma, o foro privilegiado previsto pelo art. 105, I, b, da CF, para os mandados de segurança contra ato de Ministro de Estado, não prevalece quando este apenas preside um colegiado. A regra é aplicável, outrossim, a qualquer outra autoridade contemplada com foro privilegiado pela Constituição. O STJ, contudo, teve de enfrentar uma situação totalmente anômala em que o ato impugnado no writ era de um Colegiado Administrativo e mesmo assim teve de fazer prevalecer o foro privilegiado de Ministro de Estado, pela razão especialíssima de que o órgão coletivo colocado na posição de coator era formado em sua totalidade por Ministros do Governo Federal (Câmara de Comércio Exterior), formada pelos Ministros do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Chefe da Casa Civil, Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão, Relações Exteriores, Agricultura, Pecuária e Abastecimento278. O entendimento jurisprudencial foi endossado pela doutrina de ALEXANDRE FREITAS CÂMARA279. De tal sorte, pode-se concluir que: (i) a regra geral é no sentido de que a competência para o mandado de segurança impetrado contra Conselho presidido por Ministro de Estado cabe ao Juiz Federal de primeiro grau, segundo entendimento pacificado do STF e do STJ; (ii) excepcionalmente, prevalecerá o foro privilegiado se o Colegiado se compuser apenas de

Ministros de Estado, segundo jurisprudência do STJ.

21. SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA E EMPRESAS PÚBLICAS A Lei nº 12.016 estende, para efeito de mandado de segurança, a noção de “autoridade coatora”, de modo a abranger, também, os dirigentes de sociedades de economia mista e empresas públicas, quando praticarem “atribuições do Poder Público”, e não meros “atos de gestão comercial” (art. 1º, §§ 1º e 2º). Analisando caso de licitação promovida por sociedade de economia mista com base na Lei nº 8.666/1993, o Superior Tribunal de Justiça estatuiu como se deve tratar o conceito de “autoridade”, nos domínios do mandado de segurança, in verbis: “1. É cabível mandado de segurança para impugnar ato de comissão de licitação de sociedade de economia mista. 2. Ao conceito de ‘autoridade’, para fins da impetração, a Corte tem conferido um sentido amplo, abrangendo também os atos praticados pelos dirigentes de sociedade de economia mista quando sujeitos às normas de Direito Público, o que ocorre com a licitação regida pela Lei 8.666/93. Precedentes: REsp 533.613/ RS, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 03/11/2003; REsp 299.834/RJ, 1ª T., Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 25/02/2002; REsp 202.157/PR, 1ª T., Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 21/02/2000”280. Segundo o referido aresto, não se pode considerar “mero ato de gestão” o contrato firmado por sociedade de economia mista (e o argumento vale também para a empresa pública) mediante “prévio procedimento licitatório”, já que in casu se trata indubitavelmente de “espécie de ato administrativo”. Raciocínio contrário “conspiraria contra a ratio essendi do art. 37 da Constituição, e da Lei nº 8.666/93”281. Também a jurisprudência do STJ exclui do campo dos atos de gestão, no âmbito das sociedades de economia mista, os concursos públicos para admissão de pessoal: “2 – A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de que os atos praticados por dirigentes de sociedades de economia mista para fins de contratação de pessoal não podem ser considerados como atos de mera gestão, razão pela qual os dirigentes de tais sociedades estão legitimados a figurar como autoridade coatora na ação mandamental (AgRg no Ag 1.113.000/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 18.8.2011, DJe 2.9.2011; AgRg no Ag 1.402.890/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 9.8.2011, DJe 16.8.2011)”282.

Portanto, para efeito de mandado de segurança, considera a jurisprudência que o “dirigente de sociedade de economia mista, ao praticar atos em certame público, desempenha ato típico de Direito Público, impugnável pelo remédio constitucional”283.

21.1.

Atos de gestão comercial

Quando as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as concessionárias de serviço praticarem “atos de gestão comercial”, a seu respeito não terá cabimento o recurso ao mandado de segurança (Lei 12.016, art. 1º, § 2º). É que quando os entes públicos interferem na atividade econômica, o regime jurídico a que se sujeitam é o do direito privado, e não o da administração pública (CF, art. 173, § 1º, II). É claro que, nesse passo, a lei do mandado de segurança refere-se aos atos praticados pelas empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias de serviço público “no exercício das suas atividades-meio”. Há, porém, muita dificuldade na separação prática entre as atividades-meio e as atividades-fim, sempre que se intenta, no plano concreto, qualificar as operações das entidades paraestatais. Como há, em muitos casos, execução de atividades tidas como meio, mas que na verdade correspondem ao “exercício de função pública delegada e deve ser orientada de acordo com os princípios da Administração Pública”, em relação a elas torna-se cabível o mandado de segurança284. Sendo assim, o disposto no § 2º do art. 1º da Lei nº 12.016 “deve ser interpretado adequadamente, de modo a se afastar o cabimento da impetração exclusivamente nas hipóteses em que o ente pode atuar tal como um particular, submetendo-se exclusivamente ao direito privado. Isso abrange apenas as hipóteses em que o ato praticado inequivocamente não implique o exercício de função pública e não se submeta aos princípios da Administração Pública”285. É, por exemplo, o que ocorre na contratação e execução de empréstimos por banco controlado pelo governo, ou a aquisição de matéria-prima e revenda de produtos industrializados por empresa pública que forneça insumos para estimular a produção rural, ou, ainda, entre outras hipóteses, a responsabilidade por danos oriundos de falha nos serviços e produtos fornecidos por sociedade de economia mista ou empresa pública que pratica atividade econômica em concorrência com a iniciativa privada. Portanto – na ótica do STJ –, não se trata de ato de autoridade, mas, sim, de ato de gestão, aquele praticado no interesse exclusivo da sociedade de economia mista, “atuando como empregador, em nada se identificando com as específicas funções delegadas pelo Poder Público, tal qual resulta da letra do artigo 21, inciso XII, alínea ‘b’, da Constituição da República”. Não pode se considerar, nessa ordem de ideias, como ato de autoridade, o que é praticado pelo “Gerente de Departamento de Recursos Humanos de Companhia Energética, em que se faculta a seus empregados que recebem benefício de aposentadoria por tempo de serviço a opção pela manutenção do vínculo empregatício, mediante a suspensão do pagamento do benefício junto ao INSS, ou, ainda, a

preservação do recebimento do benefício, mediante a extinção do contrato de trabalho”286. Em outro caso, o STJ, apreciando mandado de segurança que cuidava de multa prevista em contrato de prestação de serviço, pertinente a instalações elétricas de agência bancária, ajustado com a Caixa Econômica Federal, decidiu que “a imposição de multa decorrente de contrato ainda que de cunho administrativo não é ato de autoridade, posto inegável ato de gestão contratual”. Aduziu, mais, que “atos de gestão são os que a Administração pratica sem usar de sua supremacia sobre os destinatários. Tal ocorre nos atos puramente de administração dos bens e serviços públicos e nos negociais com os particulares, que não exigem coerção sobre os interessados”287. Em outras palavras: se o ato de gestão da empresa foi praticado sob regência exclusiva de normas do direito privado, estará fora do alcance do mandado de segurança. Se, porém, estiver, como nas licitações de empresas públicas ou sociedades de economia mista, disciplinado por regras do direito público, poderá ser questionado por meio do mandamus288. Acerca do tema, a jurisprudência não deixa margem a dúvida: “Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública” (Súmula nº 333/STJ).

21.2.

Concessionários e permissionários

Quando se trata de agente delegado, como nas concessões administrativas, a legitimidade passiva, para o mandado de segurança, é do concessionário289. O mesmo, porém, não se passa com o simples permissionário, porque nem sempre chega a assumir a qualidade de autoridade no desempenho da atividade permitida290. Um caso frequente de pessoa natural delegatária de função pública é o do particular que dirige instituição de ensino291. De maneira geral, nas delegações de função pública, a autoridade coatora, para fins de mandado de segurança, é sempre o delegatário, e não o delegante292. Para efeito do mandado de segurança importa distinguir as figuras de direito administrativo da concessão, da permissão e da autorização. Pela concessão, delega-se a execução de serviço público, de modo que o serviço efetuado pelo concessionário continua sendo “serviço do Poder Público, apenas executado por particular em razão da concessão”293. Por meio dessa delegação, “o poder concedente não transfere propriedade alguma ao concessionário, nem se despoja de qualquer direito ou prerrogativa pública. Delega apenas a execução do serviço, nos limites e condições legais ou contratuais, sempre sujeita a regulamentação e fiscalização do concedente”294. Por isso, a Lei do Mandado de Segurança equipara o concessionário a autoridade coatora, enquanto no exercício das atribuições do Poder Público (art. 1º, § 1º). Nas permissões administrativas, as atividades permitidas ao particular nem sempre se referem a serviços públicos, podendo tratar de meros serviços de utilidade pública. O ato administrativo, na espécie, não estende ao permissionário as prerrogativas dos concessionários, a não ser aquelas que lhe forem expressamente atribuídas. O serviço permitido é executado em nome do permissionário,

“por sua conta e risco”, embora deva se sujeitar às condições e aos requisitos preestabelecidos pela Administração permitente. Em regra, o permissionário não atua como agente do Poder Público, não podendo sujeitar-se ao mandado de segurança. Quando, porém, os termos da permissão se referirem a serviços públicos, e não apenas a serviços de utilidade pública, os permissionários poderão ser vistos como delegatários de função própria do Poder Público, “e, nessas condições, tornam-se passíveis de mandado de segurança”, naquilo que praticarem atos lesivos de direito líquido e certo295. A autorização, por sua vez, “é o ato administrativo discricionário e precário pelo qual o Poder Público torna possível ao pretendente a realização de certa atividade, serviço ou utilização de determinados bens particulares ou públicos, de seu exclusivo ou predominante interesse, que a lei condiciona à aquiescência prévia da Administração, tais como o uso especial de bem público, o porte de arma, o trânsito por determinados locais etc.”296. Os serviços autorizados não se enquadram na categoria de “atos administrativos” e os seus executores “não são agentes públicos”, mas simples praticantes de “serviço de interesse da comunidade”, motivo pelo qual são eles contratados com os usuários numa “relação de direito privado, sem participação ou responsabilidade do Poder Público”297. Disso decorre a inaplicabilidade do mandado de segurança contra o executor de serviços apenas autorizados pela Administração. O cabimento do mandado de segurança, no caso dos concessionários, só alcança os atos que envolvam atividade de Poder Público, ficando deles excluídos os atos normais de gestão empresarial. As licitações para aquisição de bens ou contratação de empregados são consideradas atos administrativos, no caso das sociedades de economia mista e empresas públicas, uma vez que decorrem de imposição legal. Quando praticadas por concessionárias, não ultrapassam o terreno dos atos de gestão, configurando atos típicos de direito privado, porque decorrem de deliberação própria, e não de mandamento de lei administrativa. Logo, não se sujeitam a impugnação por mandado de segurança298.

22. ASSISTÊNCIA E INTERVENÇÃO DE TERCEIRO A jurisprudência, liderada pelo Supremo Tribunal Federal, repudia tradicionalmente o cabimento de intervenção de terceiro ad coadjuvandum no mandado de segurança. Não seria possível, segundo a Lei Especial que regula o mandamus, a inserção no processo de outros interessados além do impetrante e do impetrado, a não ser na qualidade de litisconsorte (Lei nº 1.533/1951, art. 19; Lei nº 12.016/2009, art. 24).299 De fato, muito se discute em doutrina sobre o cabimento ou não da assistência na ação de mandado de segurança.300 Na jurisprudência dos tribunais superiores predomina o entendimento de que não é compatível com o procedimento especial do mandamus a aludida figura de intervenção de terceiro.

A posição já afirmada do Supremo Tribunal Federal, retratada em decisão de seu Pleno, é clara e se fixa pela inadmissão da assistência na esfera do mandado de segurança pelos seguintes fundamentos: (i) o caráter sumário do mandado de segurança confere-lhe especialidade procedimental que repele a aplicação subsidiária de normas do CPC, que lhe contrariem regras expressas; (ii) o incidente de intervenção do art. 120301 do CPC/2015 – que possibilita contraditório, com eventuais recursos, é de todo incompatível com o rito especial da ação mandamental; (iii) diversamente, o litisconsórcio, admitido no mandado de segurança, não é forma de intervenção de terceiro, podendo ser reconhecido de plano, até porque concernente à regularidade subjetiva do processo; (iv) a Lei nº 1.533/1951 [e também a Lei nº 12.016/2009, que a substituiu], por ser manifestamente excepcional, não poderia ter ampliado o seu alcance302. Convém lembrar que, sendo por demais conhecido o debate em torno da assistência ao tempo da Lei nº 1.533/1951, e tendo a atual Lei do Mandado de Segurança mantido a previsão da participação de terceiros apenas no regime do litisconsórcio (Lei nº 12.016/2009, art. 24), tudo conspira a revelar a vontade legislativa de não inovar em relação à jurisprudência formada, perante a lei velha, segundo a qual a assistência não tem lugar dentro do procedimento especial da ação de segurança. Pensamos, todavia, que a restrição se limita a assistência simples, uma vez que o assistente litisconsorcial, isto é, aquele que tem direito em jogo no objeto do processo, atua não como simples coadjuvante da parte assistida, mas como seu litisconsorte (CPC/2015, art. 124303). Logo, sua admissão no processo de mandado de segurança encontraria apoio no art. 19 da antiga Lei nº 1.533/1951, bem como no art. 24 da nova Lei nº 12.016/2009. Quanto às demais modalidades interventivas previstas no Código de Processo Civil, arts. 682 a 686304 e 125 a 132305, são realmente incompatíveis com as características da ação mandamental, em que prevalecem a sumariedade do procedimento e a vedação às dilações probatórias306.

23. INTERVENÇÃO DE AMICUS CURIAE NO MANDADO DE SEGURANÇA Na esteira da vedação de assistência e outras formas de intervenção de terceiro no mandado de segurança, o Supremo Tribunal Federal307 e o Superior Tribunal de Justiça308 têm, em geral, vedado, também, a participação de amicus curiae no entanto, aresto do STJ que a admitiu309. ALEXANDRE FREITAS CÂMARA e CASSIO SCARPINELLA BUENO, entre outros doutrinadores, entendem que não se deva excluir, de forma categórica, a intervenção do amicus curiae nas ações de segurança. É que, não raras vezes, as demandas da espécie envolvem conflitos, cujos resultados envolvem teses que ultrapassam os interesses subjetivos das partes. Basta lembrar os casos, não só dos mandados coletivos, como os individuais que se relacionam com concursos públicos, com direitos e vantagens de servidores públicos, com matérias tributárias, e tantos outros que sabidamente interessam à coletividade, ou a numerosos grupos, além dos litigantes.

Nesses mandados de segurança, destinados a gerar precedentes com potencialidade de influir em futuras decisões, seria razoável ouvir alguém que pudesse falar sobre os interesses transindividuais, ampliando o contraditório, e tornando mais democrática a formação dos precedentes310. A propósito, é bom lembrar a tendência do direito processual civil contemporâneo de se preocupar com a uniformização dos julgados repetitivos e dos recursos condicionados à demonstração de repercussão geral, o que conspira para facilitar a presença do amicus curiae, que, aliás, é amplamente prevista no CPC de 2015, considerando “a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia” (art. 138). O momento, pois, é propício a uma revisão jurisprudencial que possa resultar numa abordagem mais liberal acerca do papel do amicus curiae, além das hipóteses de controle de constitucionalidade de lei. Merece, contudo, registro e acatamento a ponderação e advertência feitas por ALEXANDRE CÂMARA, acerca da cautela com que a medida haverá de ser admitida, a fim de não comprometer nem desnaturar o procedimento necessário a garantir a sumariedade e a presteza exigidas da tutela constitucional reservada ao mandado de segurança: “No processo do mandado de segurança deve-se observar um procedimento concentrado, expedito, muito sumário. A não ser assim, frustrar-se-ão muitos dos objetivos constitucionalmente estabelecidos para esse tipo de processo. Em razão disso, impõe-se que a participação do amicus curiae no processo de mandado de segurança se dê com respeito às regras procedimentais e às características processuais desse instituto. Significa isso dizer que o amicus curiae não poderá, no processo do mandado de segurança, produzir provas (a não ser os documentos que acompanharão sua manifestação nos autos, o amicus curiae brief)311. Qualquer interferência indevida no desenvolvimento do procedimento do mandado de segurança será intolerável. Dito de outro modo, o procedimento do mandado de segurança não poderá ser desvirtuado pela intervenção do amicus curiae”312. Com efeito, essa é a posição do CPC/2015, ao prever que a intervenção do amicus curiae não irá alterar a competência, nem autorizará “a interposição de recursos”, ressalvada a oposição de embargos de declaração e o recurso contra decisão que julgar o incidente de resolução e demandas repetitivas (§§ 1º e 3º, art. 138).

24. INTERVENÇÃO DA UNIÃO EM MANDADOS DE SEGURANÇA EM QUE FIGUREM, COMO PARTES, ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL INDIRETA (LEI Nº 9.469)

Prevê a Lei nº 9.469/1997, art. 5º, caput, a possibilidade de “a União intervir nas causas em que figurem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais”, regra cuja possibilidade de aplicação se estenderia, também aos mandados de segurança, segundo certo posicionamento doutrinário313 (destaque-se, desde logo, que a cogitada Lei não faz qualquer referência às ações em que as concessionárias ou permissionárias são parte). De qualquer modo – embora seja duvidoso o cabimento dessa medida no procedimento sumário do mandado de segurança –, essa intervenção anômala, que prescinde do interesse jurídico da União, e se contenta com o simples interesse econômico, não se confunde com a assistência propriamente dita (CPC/2015, art. 119 e ss.), como ressalta a jurisprudência do STJ. Daí que, “embora permitida essa peculiar modalidade de intervenção da União e de outras pessoas de direito público, quando constatada a potencialidade de eventual lesão econômica, a admissão do ente público não traz comando suficiente a modificar a competência originária para julgamento da demanda”314.

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Equiparam-se às autoridades, para os efeitos do mandado de segurança, “os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições” (Lei nº 12.016, art. 1º, § 1º). HELY LOPES MEIRELLES o define como “o meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica... para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça” (Mandado de Segurança. 29 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 21-22). DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES ressalta: sempre que a pretensão do autor não se exaurir na exibição de dados ou na liberdade de ir e vir, mas representar um meio de instrumentalizar outro direito, o mandado de segurança será admissível. É a hipótese do art. 6º, §§ 1º e 2º da Lei 12.016/2009, que prevê a exibição de documentos pela autoridade, caso em que “a pretensão do autor não se exaure na exibição, que servirá tão somente como meio a instrumentalizar outra pretensão, buscada em sede principal pelo mandado de segurança”; ou, utilizando um exemplo de Barbosa Moreira, quando “o advogado é impedido de ingressar em estabelecimento prisional para comunicar-se com seu cliente, que, nesse caso, vale-se do direito de ir e vir somente como meio para o exercício de sua profissão” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013. p. 113-114). “Dada a previsão constitucional do mandado de segurança, não pode haver dúvida quanto à circunstância de ele ser mecanismo apto a coibir qualquer atividade ilícita em suas mais diversas formas de manifestação por qualquer um que exerça função pública. Qualquer interpretação relativa ao mandado de segurança não pode se desviar dessa ideia central, e que decorre direta e

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inequivocamente da Constituição: é ele mecanismo de defesa do cidadão contra a prepotência do Estado ou de quem produza atos ou fatos jurídicos em nome do Estado” (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 5). SODRÉ, Eduardo. Mandado de Segurança. In: DIDIER JR., Fredie (coord.). Ações constitucionais. Salvador: Juspodivm, 2006, p. 94. Embora seja, em última análise, um procedimento especial, não fica o titular do direito líquido e certo sujeito a fazer uso apenas dele, para a defesa do direito lesado ou ameaçado pela autoridade pública. Cabe-lhe a faculdade de postular a tutela jurisdicional, pela via expedita do mandado de segurança, ou, se preferir, pelo procedimento civil comum, segundo as próprias conveniências (Cf. SODRÉ, Eduardo, op. cit., p. 95). “Além de não ser tutelável pelo habeas data e pelo habeas corpus, para ser cabível o mandado de segurança, é indispensável a prática de ato ou de omissão por parte da autoridade”, que, “necessariamente deve ser praticado por um agente público (Administração direta e indireta), bem como por particular no exercício de função pública em decorrência de delegação” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais, cit., p. 114). Cf. SODRÉ, Eduardo. Op. cit., p. 95. “O Estado de Direito é aquele em que, governantes e governados, desde que estabelecida a regra jurídica, com o consentimento destes, a ela estão obrigados (...). O Estado de direito, e o seu aprimoramento, sob a égide da Justiça, é um dos elementos importantes, se não o mais importante, de todos os valores que são caros e indispensáveis à nossa civilização” (ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel de. Tratado de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1990, v. I, p. 167). ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Ed. RT, 1985. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 140. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de Segurança cit., n. 2.3, p. 28. ANDRADE, Érico. O Mandado de Segurança: a busca da verdadeira especialidade (proposta de releitura à luz da efetividade do processo). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010, p. 254. CASSESE, Sabino. Le basi del diritto amministrativo. 6. ed. Milano: Garzanti Editore, 2000, p. 441. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998, p. 792, apud BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 15-16. “A administração se liberta, de certa forma, da concepção tradicional, teórica, fantasiosa e inviável da legalidade como parâmetro para todo e qualquer atuar administrativo e passa a se submeter ao direito em geral. A legalidade passa a ser entendida, nesse aspecto, como legalidadeendereço: o endereço, ao qual se submete a Administração, não é só aquele da lei, em sentido estrito, mas um endereço mais amplo, do direito em geral. A nova ideia de juridicidade acaba por redefinir o Estado, partindo-se para o Estado Constitucional, em que o culto à constitucionalidade se sobrepõe ao da legalidade, pura e simples” (ANDRADE, Érico. O mandado de segurança, cit., p. 259).

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“Os princípios constitucionais interagem com a legalidade, para temperá-la, suavizá-la, permitindo um atuar administrativo mais maleável para realizar não só as finalidades legais, mas também as finalidades constitucionais da Administração” (ANDRADE, Érico. O mandado de segurança, cit., p. 266. Nesse sentido: CORSO, Guido. Manuale di diritto amministrativo. 3. ed. Torino: G. Giappichelli, 2006, p. 40-41. ANDRADE, Érico. Mandado de segurança, cit., p. 266. Nesse sentido: SORACE, Domenico. Promemoria per una nuova ‘voce’ “atto amministrativo”. In: Scritti in onore di Massimo Severo Giannini. Milano: Giuffrè, 1988, v. III, p. 760. ANDRADE, Érico, op. cit., p. 267. Como destaca LUÍS FILIPE COLAÇO ANTUNES, “a importância do controle de discricionariedade é tema crucial do direito administrativo” (Para um direito administrativo de garantia do cidadão e da administração: tradição e reforma. Coimbra: Almedina, 2000, p. 54). STJ, 6ª T., AgRg no REsp 772.833/RR, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, ac. 05.11.2013, DJe 21.11.2013. “... o que prevalece hoje em doutrina e, cada vez mais, também em jurisprudência é que a discricionariedade administrativa (e, pois, a prática de atos abusivos) não significa uma incontrastabilidade a priori do ato pelo Judiciário. Muito pelo contrário, só pode significar a viabilidade (e a necessidade, friso) de um controle eficaz quanto aos contornos da legalidade em sentido amplo da prática do próprio ato para que se verifique se eventual margem de liberdade do administrador foi ou não exercida de acordo e em atenção aos fins, aos padrões e, pois, aos limites jurídicos, sejam constitucionais ou legais. Só assim, de resto, realiza-se concretamente o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV)” (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança, cit., p. 17). “Ilegal é tudo o que não se submete à lei (em sentido amplo) e aos princípios cardeais do ordenamento jurídico vigente” (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de Segurança. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 30-31). Curso cit., p. 797; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança, cit., p. 16. No caso, por exemplo, de demissão de funcionário público, o entendimento do STJ é o seguinte: “1. No caso de demissão imposta a servidor público submetido a processo administrativo disciplinar, não há falar em juízo de conveniência e oportunidade da Administração, visando restringir a atuação do Poder Judiciário à análise dos aspectos formais do processo disciplinar. Nessas circunstâncias, o controle jurisdicional é amplo, no sentido de verificar se há motivação para o ato demissório, pois trata-se de providência necessária à correta observância dos aludidos postulados. (...) 7. Não há prova cabal de: (i) má-fé, deslealdade ou desonestidade; (ii) dano ao erário, porque os serviços contratados e pagos foram efetivamente realizados, sem arguição quanto a superfaturamento; (iii) corrupção; ou (iv) que tenha decorrido benefício ilícito para o Impetrante ou em favor de terceiros. 8. Segurança concedida. Prejudicado o agravo regimental interposto contra a decisão que negou a liminar” (STJ, 3ª Seção, MS 13.520/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 14.08.2013, DJe 02.09.2013). ANDRADE. Érico. O mandado de segurança, cit., p. 307-308. ANDRADE, Érico. Op. cit., p. 308. “No Direito brasileiro, os chefes do Poder Executivo podem regulamentar a lei por meio de

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Decreto, facultando-se, ademais, à autoridade administrativa editar atos normativos administrativos gerais – como Portarias e Resoluções – com o intuito de disciplinar e instrumentalizar a boa aplicação da legislação que lhes é superior. Em ambos os casos as normas administrativas editadas não precisam repetir, palavra por palavra, o que está na lei, desde que respeitem seus limites, principiologia, estrutura e objetivos” (STJ, 2ª T., REsp 1.048.317/ PR, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 12.05.2009, DJe 30.09.2010). CASSESE, Sabino. Le basi del diritto amministrativo, cit., p. 324. ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o direito privado: contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1999, p. 370. CASSESE. Op. cit., loc. cit. FERRARA, R. La pubblica amministrazione fra autorità e consenso: dalla “specialità” amministrativa a un diritto amministrativo di garanzia? Diritto Amministrativo – Rivista Trimestrale, Milano, v. V, n. 2, 1997, p. 261. FERRARA. Op. cit., loc. cit. ANDRADE, Érico. O mandado de segurança, cit., p. 308. CPC/73, arts. 244, 249, § 1º, e 250, parágrafo único. STF, Pleno, MS 27154/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, ac. un. de 10.11.2010, DJe 08.02.2011. “Assiste ao interessado, mesmo em procedimentos de índole administrativa, como direta emanação da própria garantia constitucional do due processo of law (CF, art. 5º, LIV) – independentemente, portanto, de haver previsão normativa nos estatutos que refém a atuação dos órgãos do Estado –, a prerrogativa indisponível do contraditório e da plenitude de defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (CF, art. 5º, LV)” (STF, 2ª T., MS 32.559 AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 03.03.2015, DJe 09.04.2015). STF, 2ª T., Ag no Ag 241.201/SC, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 27.08.2002, RTJ 183, p. 371-372. STF, 2ª T., RE 158.543/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 30.08.1994, RTJ 156/1.042. Nesse sentido, o STF já decidiu ser nula, por ofensa ao contraditório e à ampla defesa, “a notificação apenas por edital da pessoa identificada como beneficiária direta de ato objeto de questionamento em procedimento de controle administrativo no âmbito do Conselho Nacional do Ministério Público” (STF, 2ª T., MS 26.419/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 27.10.2015, DJe 11.12.2015). STJ, 2ª T., REsp 1.130.985/PR, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 17.12.2009, DJe 19.02.2010. STJ, 2ª T., EDcl no RMS 11.062/MS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 16.08.2001, DJU 29.10.2001, p. 189. STF, Pleno, RE 608.482/RN, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 07.08.2014, DJe 30.10.2014. STJ, 1ª Seção, MS 20.558/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 22.02.2017, DJe 31.03.2017. “Por fim, o art. 1º, caput, da Lei 12.016/2009 prevê que o mandado de segurança é admissível tanto antes como depois da prática do ato impugnado. Significa dizer que é possível a obtenção de tutela inibitória por meio do mandado de segurança, evitando-se a prática ilegal ou praticada com abuso de poder” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais, cit., p. 114). STJ, 1ª T., REsp 93.492/RN, Rel. Min. José Delgado, ac. 22.08.1996, DJU 14.10.1996, p. 38.949.

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Segundo o STJ, “o mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora, não bastando o risco de lesão a direito líquido e certo, baseado em conjecturas por parte do impetrante, que, subjetivamente, entende encontrar-se na iminência de sofrer o dano” (STJ, 1ª T., RMS 19.217/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 03.03.2009, DJe 26.03.2009). A ameaça deve ser “real, concreta e efetiva, não bastando, para tanto, a alegação de que o autor está sujeito a risco de lesão a direito líquido e certo” (STJ, 2ª T., AgInt. no REsp. 1.597.405/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 18.10.2016, DJe 25.10.2016). Para o STJ, é razoável admitir que o mandado de segurança preventivo seja utilizado para assegurar “a deflagração do direito constitucional de greve”. Todavia, aduziu que “a não comprovação da regularidade na deflagração da greve acarreta a ausência de direito líquido e certo para a concessão da segurança, pois inexiste a prova pré-constituída de que a greve é legal, por preencher os requisitos da Lei n. 7.783/89” (STJ, 1ª Seção, MS 15.339/DF, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 29.09.2010, DJe 13.10.2010). “O mandado de segurança repressivo dirige-se contra ato já praticado pela autoridade coatora e tem por finalidade evitar que seus efeitos atinjam irremediavelmente a esfera jurídica do particular (...). O mandado de segurança preventivo em matéria tributária [por exemplo] visa evitar que a autoridade fiscal venha a praticar ato de lançamento, auto de infração ou ato de fiscalização, calçado em norma jurídica tida como ilegal ou inconstitucional” (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 499). Diante do art. 5º, XXXV, da CF, e do art. 1º, caput, da Lei 12.016/2009, é fácil concluir que, “no plano Constitucional e legal, a forma preventiva [do mandado de segurança] é amplamente reconhecida” (DIAS, Jean Carlos. O Mandado de segurança preventivo e a lei em tese: desfazendo um equívoco persistente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a partir da teoria do direito. Revista Dialética de Direito Processual, n. 115, p. 46). No mesmo sentido: GRECO FILHO, Vicente. O novo mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 12; MARINS, James, Op. cit., p. 499. MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de segurança preventivo. Revista Dialética de Direito Processual, n. 118, p. 47. STJ, 1ª T., AgRg no RMS 34.007/SC, Rel. Min. Bendito Gonçalves, ac. 28.08.2012, DJe 05.09.2012. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no RMS 39.647/RJ, Rel. Min. Humbeto Martins, ac. 17.10.2013, DJe 25.10.2013. A distinção foi bem elucidada no voto do Ministro César Asfor Rocha, no MS 3696/DF: “o mandado de segurança preventivo não se confunde com o mandado de segurança contra lei em tese. Neste, pede-se a segurança quando inexistente a situação fática necessária a incidência da lei autorizadora da prática do ato tido como ilegal. Naquele evidencia-se a configuração da situação de fato ensejadora da prática do ato supostamente ilegal, dispondo o impetrante de justo receio, autorizador do mandado de segurança preventivo, de que o ato venha a ser praticado. O writ é preventivo porque busca, obviamente, evitar a prática de ato lesivo ao direito, conquanto pressuponha situação concreta ameaçada de lesão” (STJ, 1ª Seção, MS 3.696/DF, Rel. Min Cesar Asfor Rocha, ac. 13.12.1994, DJU 20.02.1995, p. 3.095). SCHMIDT JÚNIOR, Roberto Eurico. Mandado de segurança. Curitiba: Juruá, 1993, p. 41.

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MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de segurança preventivo, cit., p. 42. MACHADO, Hugo de Brito. Op. cit., loc. cit. Especialmente em direito tributário, em que a atividade administrativa de lançamento “é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”, as leis novas quase sempre justificam o recurso do contribuinte ao mandado de segurança preventivo, se se encontra na situação fática sobre a qual a lei nova incide, gerando possibilidade de cobrança indevida do tributo inovado, de imediato. “Em tais situações, é viável a impetração de mandado de segurança preventivo. Não terá o contribuinte de esperar que se concretize tal cobrança. Nem é necessária a ocorrência de ameaça desse cobrança” (MACHADO, Hugo de Brito. Op. cit., p. 45). NEVES,FernandoC.Queiroz.Mandadodesegurançapreventivo.In:ALVIM,EduardoArruda et al (coords.). O novo mandado de segurança. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 185. É preciso, porém, que o mandado preventivo se volte contra fatos certos, ainda que não consumados, pois tal modalidade de writ não se destina a obter “provimento genérico aplicável a todos os casos futuros de mesma espécie” (STJ, 2ª T., REsp 1.064.434/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 14.06.2011, DJe 21.06.2011). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp. 1.594.374/ GO, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 20.04.2017, DJe 05.05.2017. FUX, Luiz. Mandado de segurança. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 43-44. DIAS, Jean Carlos. O mandado de segurança preventivo e a lei em tese, cit., p. 48. Explica o autor: “O mandado de segurança é preventivo em relação a quais termos está o agente público autorizado pela norma a aferir os fatos e por isso fazer incidi-la. É preventivo apenas aos atos de concreção” (Op. cit., p. 49). MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de segurança em matéria tributária. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 270. “Esses julgados, contudo, parecem exóticos (tem partido de pressupostos claramente equivocados e por isso chegado a soluções juridicamente inconsistentes... incompatíveis com... a proteção aos direitos fundamentais...), dada a existência de decisões do próprio Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário, reconhecendo corretamente o problema e dando--lhe solução mais adequada, considerando os elementos essenciais antes analisados” (DIAS, Jean Carlos. O mandado de segurança preventivo e a lei em tese, cit., p. 51). Eis dois arestos significativos do STJ em que o tema foi muito bem enfocado: I – “Deveras, não se pode confundir mandado de segurança preventivo com mandado de segurança contra lei em tese. Isto porque a natureza preventiva do mandamus decorre da constatação da incidência da norma jurídica, uma vez ocorrente seu suporte fático, sendo o direito ameaçado por ato coator iminente. Por seu turno, no writ dirigido contra lei em tese, a situação de fato, que enseja a incidência da norma jurídica, ainda não restou configurada (...). A superveniência de legislação que determine a incidência de ISS sobre serviços de registros públicos cartorários e notariais, prestados pela impetrante, fundamenta o justo receio do sujeito passivo de que a Administração Fiscal venha a praticar ato considerado ilegal, revestindo o mandamus de caráter preventivo” (STJ, 1ª T., REsp 860.538/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 18.09.2008, DJe 16.10.2008). II – “Admite-se o mandado de segurança quando a impugnação não se dirige contra a lei em tese, mas contra os efeitos concretos derivados do ato normativo, o qual restringe o direito do contribuinte de efetuar o creditamento do ICMS” (STJ, 2ª T., RMS 31.714/ MT, Rel. Min. Castro Meira, ac. 03.05.2011, DJe 19.09.2011).

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STJ, 2ª T., REsp 105.250/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 16.03.1999, DJU 14.02.2000, p. 23. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, EREsp 18.424/CE, Rel. Min. Humberto de Barros, ac. 05.12.1995, DJU 04.03.1996, p. 5.330; “Se existe ameaça atual e traduzida por atos, e não meras conjecturas, justifica-se a impetração de mandado de segurança. No campo do direito tributário, caracterizada a situação fática sobre a qual deverá incidir a lei atacada, cabe a impetração preventiva do mandamus” (STJ, 1ª T., RMS 11.351/RN, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 07.06.2001, DJU 20.08.2001, p. 350). “Mandado de segurança. (...). Situação concreta e lei em tese. (...). No caso, entretanto, a norma impugnada constitui mero fundamento do pedido e não seu objeto, havendo, portanto, indicação de situação individual e concreta a ser tutelada” (STJ, 1ª T., REsp 779.200/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 03.11.2009, DJe 13.11.2009). “O mandado de segurança não se qualifica como sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade, não podendo ser utilizado, em consequência, como instrumento de controle abstrato da validade constitucional das leis e dos atos normativos em geral” (STF, Tribunal Pleno, MS 23.785 AgR-QO/MG, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 05.09.2002, DJU 27.10.2006, p. 31). No mesmo sentido, entendimento do STJ: “No pertinente a impetração de ação mandamental contra lei em tese, a jurisprudência desta Corte Superior embora reconheça a possibilidade de mandado de segurança invocar a inconstitucionalidade da norma como fundamento para o pedido, não admite que a declaração de inconstitucionalidade, constitua, ela própria, pedido autônomo, tal como aqui formulado na inicial” (STJ, 1ª Seção, REsp. 1.119.872/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 13.10.2010, DJe 20.10.2010). No mesma direção: STJ, 1ª T., AgInt. no RMS 36.682/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, ac. 26.09.2017, DJe 09.10.2017. STJ, 2ª T., REsp 1.200.324/MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 15.03.2011, DJe 22.03.2011. STJ, 2ª T., RMS 15.258/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 23.11.2004, DJU 14.02.2005, p. 144. “A jurisprudência das Turmas de Direito Público do STJ perfilhou o entendimento de que, em se tratando de mandado de segurança que ataca ato normativo de efeitos concretos, a parte passiva legítima será a autoridade a quem compete a aplicação concreta da norma” (STJ, 1ª T., RMS 22.499/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 16.10.2008, DJe 03.11.2008). “Administrativo. Mandado de segurança. Portaria normativa MEC 1, de 14/1/11. Ato coator. Lei em tese. Súmula 266/STF. Processo extinto sem resolução do mérito. (...). 2. A impetrante não indicou qual o ato de efeitos concretos da autoridade impetrada teria violado direito líquido e certo seu. Apenas se insurge contra a publicação da Portaria Normativa MEC 1, de 14/1/11, norma genérica e abstrata, que dispõe sobre as regras para obtenção do financiamento do FIES em 2011” (STJ, 1ª Seção, MS 16.682/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 28.09.2011, DJe 06.10.2011). Em contrapartida, cabe mandado de segurança se intentado “para impugnar portaria ministerial, que contém, em si mesma, medida coercitiva, podendo, independente de ato de aplicação, em concreto, da regra nela expressa, produzir efeito lesivo ao direito do impetrante. Inaplicabilidade da Súmula 266” (STF, 2ª T., RE 81.847/RS, Rel. Min. Leitão de Abreu, ac. 17.10.1978, DJU 20.11.1978, p. 9.236). (...) “I – Se o decreto consubstancia ato administrativo, assim de efeitos concretos, cabe contra ele o mandado de segurança. Todavia, se o decreto tem efeito normativo, genérico, por isso mesmo

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sem operatividade imediata, necessitando, para a sua individualização, da expedição de ato administrativo, então contra ele não cabe mandado de segurança, já que, admiti-lo, seria admitir a segurança contra lei em tese, o que e repelido pela doutrina e pela Jurisprudência (Súmula n. 266). II – Mandado de segurança não conhecido” (STF, Tribunal Pleno, MS 21.126/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 08.11.1990, DJU 14.12.1990, p. 15.109). Em sentido contrário, cabe mandado de segurança se o ato administrativo é dotado de efeitos concretos: (...) “O Decreto Estadual 16.720/95, que fixou o teto remuneratório dos servidores do Estado do Amazonas, pode ser impugnado na via do mandamus, porquanto produz efeitos concretos nas esferas jurídica e patrimonial dos servidores” (STJ, 5ª T., REsp 453.080/AM, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 17.08.2006, DJU 25.09.2006, p. 297). “(...) Concluindo que o ato impugnado na impetração é, em última análise, a própria Resolução CS-AGU nº 1/03, o mandado de segurança não é via própria para atacá-lo, pois a Resolução é norma de natureza geral e abstrata” (STJ, 3ª Seção, MS 12.349/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 22.09.2010, DJe 15.10.2010). Entendendo inadmissível mandado de segurança contra Resoluções publicadas pelo Presidente do BACEN: STJ, 1ª Seção, MS 21.526/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 14.12.2016, DJe 19.12.2016. “(...) É inviável impetração de mandado de segurança contra parecer administrativo, por se tratar de peça meramente opinativa, sem nenhum efeito concreto enquanto não homologado pela autoridade impetrada” (STJ, 5ª T., RMS 19.369/PI, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 12.09.2006, DJU 09.10.2006, p. 315). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 1.587/GO, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 04.08.1993, DJU 23.08.1993, p. 16.567; STJ, 2ª T., REsp 73.940/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 20.02.2003, DJU 24.03.2003, p. 164. “Mandado de segurança. (...). Aviso-circular. O ato administrativo meramente recomendatório não atinge direito individual líquido e certo, descabendo a impetração” (STJ, 1ª Seção, MS 16.552/DF, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 08.02.2012, DJe 15.02.2012). “Tratando-se de mandado de segurança preventivo, este somente será viável se houver a demonstração concreta de que virá a ser praticado ato, cuja realização importará em ofensa a direito líquido e certo. Simples receio ‘difuso’, de índole meramente subjetiva, não decorrente de fatos concretos, de que o direito pudesse vir a ser violado, não acompanhado de demonstração de que efetivamente se planeja praticar o ato que, se ocorrido, ofenderá tal direito, não justifica a propositura do mandado de segurança” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 24). “A lei, decreto ou qualquer ato normativo que implique exigência tributária considerada inexigível pelo contribuinte constituem ameaça suficiente para a impetração de mandado de segurança preventivo, na medida em que devem ser obrigatoriamente aplicados pela autoridade fazendária (CTN, art. 142, parágrafo único)” (STJ, 1ª T., RMS 44.021/TO, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 19.11.2013, DJe 22.11.2013). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no RMS 34.015/RR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 02.04.2013, DJe 09.04.2013. Mas, para evitar a ocorrência de mandado de segurança contra lei em tese, é preciso que o impetrante demonstre achar-se numa situação concreta de sujeição à lei tributária inovadora, que corresponda objetivamente à possibilidade de “vir a ser violado direito líquido e certo” (STJ, 1ª T., REsp 401.717/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.11.2003, DJU 09.12.2003, p. 214. No mesmo sentido: STJ, 1ª

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T., RMS 36.868/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 18.12.2012, DJe 04.02.2013). É o caráter de atividade vinculada da autoridade fiscal que justifica o cabimento do mandado de segurança preventivo, diante da lei tributária (STJ, 1ª T., REsp 768.523/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 02.10.2007, DJe 28.05.2008). Esse é, também, o entendimento da doutrina: “Com efeito, a Administração deve proceder ao lançamento, que é ato administrativo vinculado, sob pena de responsabilidade funcional (art. 142 do CTN), de tal modo que, configurada a situação de fato, apta a desencadear os efeitos previstos na lei posta em discussão, é mais do que evidente o cabimento do mandado de segurança preventivo” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de Segurança, cit., p. 145). DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 26. Para evitar que a impetração seja havida como manifestação contra lei em tese, o pedido formulado na petição inicial tem de ser explícito no sentido de pretender a ordem judicial que imponha à autoridade fazendária a “abstenção de praticar o lançamento temido pelo demandante”. A autoridade coatora, no mandado preventivo sobre lei tributária, é a autoridade fazendária; “não é, todavia, quem editou o ato normativo, e sim aquela que tem o dever funcional de responder pelo seu cumprimento” (STJ, 1ª T., RMS 44.021/TO, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 19.11.2013, DJe 22.11.2013). STJ, 2ª T., REsp 80.304/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 20.10.1997, DJU 17.11.1997, p. 59.479; STJ, 2ª T., REsp 84.598/SC, Rel. Min. Ari Pagendler, ac. 24.03.1998, DJU 06.04.1998, p. 73; STJ, 1ª Seção, EREsp 18.426/PE, Rel. Min. Milton Luiz Pererira, ac. 05.12.1995, DJU 26.02.1996, p. 3.912; STJ, 2ª T., REsp 14.950/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 06.12.1995, DJU 26.02.1996, p. 3.982; STJ, 2ª T., REsp 72.580/SP, Rel. Min. Helio Mosimann, ac. 05.02.1996, DJU 26.02.1996, p. 3.996; STJ, 1ª Seção, EREsp 18.432/PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 05.12.1995, DJU 04.03.1996, p. 5.330; STJ, 1ª T., RMS 11.351/RN, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 07.06.2001, DJU 20.08.2001,p.350;STJ,2ªT.,REsp946.762/GO,Rel.Min.MauroCampbellMarques,ac.21.09.2010, DJe 08.10.2010; STJ, 1ª T., RMS 19.217/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 03.03.2009, DJe 26.03.2009. STJ,1ªT.,RMS36.868/SP,Rel.Min.ArnaldoEstevesLima,ac.18.12.2012, DJe04.02.2013.Oacórdão invoca como precedente da mesma turma o RMS 19.217 (Rel. Min. Luiz Fux, DJe 26.03.2009). O curioso, porém, é que, numa passagem, o precedente afirma que “o mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora”. Estranhamente, no entanto, o fundamento doutrinário arrolado no acórdão não cogita de ameaça do coator, mas da existência da “situação de fato sobre a qual incide a lei questionada” (MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de Segurança em matéria tributária. 6. ed. São Paulo: Ed. Dialética, 2006, p. 255-257). O mais estranho foi, ainda, a conclusão do acórdão que concedeu a segurança preventiva sem se referir a ato algum da autoridade coatora que contivesse a ameaça efetiva de aplicar a lei inconstitucional impugnada pelo impetrante. Concluiu-se que, em face do decurso do tempo e da existência de precatórios inadimplidos em favor do impetrante, “coadjuvados pela norma local que proíbe compensação em contravenção à Carta Magna, torna legítima a tutela preventiva, e a fortiori inibitória de autuações”. Reconheceu-se, basicamente, que a situação concreta em que se achava o contribuinte lhe assegurava a compensação de débitos fiscais com os créditos representados pelos precatórios

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expedidos e não pagos pelo Estado até dezembro de 2007. A ordem preventiva constou, portanto, em ordenar a não aplicação da lei que vedava a compensação sobre a esfera jurídico-tributária do impetrante. Não se exigiu prova de ameaça concreta de aplicação da lei inconstitucional pela autoridade coatora, mas, afinal se levou em conta apenas sua incidência imediata sobre a esfera jurídica do impetrante. É firme a jurisprudência do STF e do STJ no sentido de que “não cabe mandado de segurança contra lei em tese” (Súmula nº 266 do STF). “Descabe mandado de segurança para promover declaração de inconstitucionalidade de lei” (STJ, 4ª T., RMS 11.484/MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 18.05.2006, DJU 26.06.2006, p. 147). No entanto, é de observar-se que se a lei inconstitucional for daquelas que geram efeitos concretos, é possível o mandado de segurança, não para simplesmente declarar a inconstitucionalidade, mas para fazer cessar ou impedir os efeitos ilícitos da lei. A inconstitucionalidade funcionará como causa petendi, e não como objeto da ação mandamental. STJ, 1ª T, AgRg no Ag 1.302.289/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 26.10.2010, DJe 08.11.2010. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 31.714/MT, Rel. Min. Castro Meira, ac. 03.05.2011, DJe 19.09.2011. Em caso de lei local que considerou fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de uma filial para outra da mesma empresa, o Supremo Tribunal Federal admitiu a procedência do mandado de segurança, com o seguinte enunciado: “I. Mandado de segurança: admissibilidade. Não se caracteriza o ‘mandado de segurança contra lei em tese’, se – como reconheceu no caso o acórdão recorrido –, a norma legal questionada é de ‘eficácia concreta, direta e imediata’, capaz, assim, de lesar direito líquido e certo do impetrante” (STF, 1ª T., AI 271.528 AgR/PA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 14.11.2006, DJU 07.12.2006, p. 44, RT 859/166). Ainda sobre ICMS, o STJ decidiu, adotando a mesma tese do Supremo Tribunal Federal, também a propósito de inovação legislativa em matéria de ICMS, que “as leis e decretos autoaplicáveis, (...) não se confundem com a lei em tese, regra abstrata de conduta, não atacável por mandado de segurança” (STJ, 2ª T., EDcl no REsp 40.055/SP, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac.08.05.1997, DJU 09.06.1997, p. 25.494). STJ, 2ª T., REsp 710.211/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 18.10.2007, DJU 31.10.2007, p. 306; STJ, 2ª T., RMS 24.608/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 21.10.2008, DJe 21.11.2008; STJ, 1ª T., REsp 860.538/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 18.09.2008, DJe 16.10.2008; STJ, 2ª T., REsp 1.017.381/GO, Rel. Min. Castro Meira, ac. 27.05.2008, DJe 06.06.2008; STJ, 1ª T., RMS 20.031/RJ, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 17.05.2007, DJU 04.06.2007, p. 298; STJ, 2ª T., REsp 503.676/SP, Rel. Min. Franciulli Netto, ac. 17.06.2004, DJU 18.10.2004, p. 220. MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandadode segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 37. Idem, ibidem. Para EDUARDO ARRUDA ALVIM, “na hipótese de mandado de segurança contra lei de efeitos concretos, impugna-se, isto sim, o ato administrativo veiculado pela lei, e que, travestido sob sua roupagem, não se reveste do caráter de generalidade e abstração que caracteriza a lei. Por isso, fala-se em lei ‘de efeitos concretos’, ou seja, para o caso ou casos especificados na lei, não para outros” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança, cit., p. 153). Nesses casos, “o impetrante busca a tutela concreta de sua situação jurídica, para evitar que sofra

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danos. Não se trata de eliminar, em abstrato, a lei do ordenamento jurídico, como ocorre na ação direta de inconstitucionalidade. Trata-se de impedir sua incidência para evitar o atingimento do direito subjetivo do impetrante, razão pela qual não se pode opor o entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal nesse caso. Se ocorre a situação de fato prevista em abstrato na lei como hábil a gerar os efeitos concretos nela previstos, o impetrante já pode se valer da impetração preventiva, exatamente para evitar a incidência que irá ocasionar a lesão a seu direito” (ANDRADE, Érico. O mandado de segurança, cit., p. 436-437). “O ataque que se faz na via do writ é apenas contra o seu [da lei] efeito concreto, no caso do impetrante, e nunca em caráter genérico contra a própria norma abstrata” (ANDRADE, Érico. Op. cit., p. 436, nota 326). “O mandamus invalidará apenas o ato hostilizado [a incidência da lei inconstitucional na esfera jurídica do impetrante], deixando íntegra a norma tida como ilegal ou inconstitucional” (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Mandado de segurança: uma visão de conjunto. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Org.). Mandados de segurança e de injunção. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 123; ANDRADE, op. cit., p. 436, nota 325). MEIRELLES, Hely Lopes; et al., op. cit., loc. cit. Alguns exemplos são paradigmáticos para a compreensão do que se pode ter como lei de efeito concreto, principalmente no campo do direito tributário, em que a aplicação pelas autoridades fiscais é imperativa, de modo que o contribuinte se vê sob ameaça de sofrer a exigência legal, como decorrência da própria edição do ato normativo. Doutrina e jurisprudência entendem, nessa perspectiva, que a imposição, por lei, de um tributo é um exemplo típico de norma legal que “gera efeitos concretos quando é publicada”, e, “ferindo direito subjetivo, é o mandado de segurança via adequada para impugná-la” (RMS 18.971/MT, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU 14.11.2005). O acórdão que adotou semelhante tese cogitava de lei estadual que alterava o regime de benefício fiscal, em detrimento dos contribuintes. Em outro julgado, o mesmo Tribunal considerou lei de efeito concreto a que instituiu a sujeição da atividade de serviços cartorários e notariais ao imposto municipal sobre serviços (ISS), justificando o cabimento do mandado de segurança, em caráter preventivo, ao argumento de que o ato da autoridade questionado no mandamus impetrado seria “a iminente tributação a se concretizar pelo Fisco com supedâneo legal, suscetível de causar prejuízos ao contribuinte”. Aduziu, ainda, o aresto que “o objetivo precípuo (...), veiculado no mandado de segurança, não é a simples declaração de inconstitucionalidade da exigência do ISS sobre os serviços de registros públicos, cartorários e notariais”, mas a necessidade de omitir-se na exigência da indevida cobrança da exação com base na legislação local impugnada, vinculante à atuação do Fisco. Declarou o julgado, por fim, que a espécie “não configura hipótese de impugnação à lei em tese prescrita na Súmula 266/STF (...)” (STJ, 2ª T., REsp 1.017.381/GO, Rel. Min. Castro Meira, ac. 27.05.2008, DJe 06.06.2008). STJ, 1ª T., RMS 44.021/TO, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 19.11.2013, DJe 22.11.2013. O CPC/2015 eliminou a dualidade de regime processual, dispondo que tanto a tutela conservativa como a satisfativa são tratadas, em regra, como objeto de mero incidente processual, que pode ser suscitado na petição inicial ou em petição avulsa. Destarte, não há que se falar em ação sumária. “Nos processos sumários cautelares e não cautelares, a sumariedade da cognição abrange o próprio mérito da causa. Entre a perfeição e a celeridade, o legislador procurou privilegiar este último, mas em contrapartida deixou de conferir a autoridade de coisa julgada material ao

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conteúdo declaratório assentado em cognição sumária” (WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo: Ed. RT, 1987, n. 24, p. 108). CPC/1973, arts. 273, § 4º, e 807. “... por mais que se consiga reduzir à expressão mínima as formalidades do processo comum e por melhor que seja a organização judiciária, haverá sempre direitos, pretensões materiais e interesses legítimos que, pela sua natureza, sua simplicidade ou pela urgência da tutela em razão da iminência de dano irreparável, exigirão processos diferenciados, seja em termos de procedimentos de cognição plena e exauriente ajustados às peculiaridades das situações substanciais controvertidas, seja em forma de procedimentos de cognição sumária, que atendam os reclamos de extrema rapidez na concessão do provimento jurisdicional” (WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, cit., n. 25, p. 110). “Recurso ordinário em mandado de segurança (...). II. Inocorrência de direito líquido e certo, que pressupõe fatos incontroversos apoiados em prova pré-constituída. Não se admite, pois, dilação probatória. III. Precedentes. IV. Recurso improvido” (STF, 1ª T., RMS 25.736/DF, Rel. p/ ac. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 11.03.2008, DJe 18.04.2008). “Decidindo-se o mérito do mandado de segurança, seja para reconhecer a lesão ou a ameaça reclamada pelo impetrante, seja para negá-la, na há mais possibilidade de a mesma questão, esgotadas as vias recursais (transitada materialmente em julgado a decisão final, portanto), vir a ser reapreciada perante o Judiciário, em mandado de segurança ou em qualquer outro ‘processo’” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, n. 50, p. 115). “A definição do instituto, como meio de defesa dos interesses individuais e coletivos, explica-se pela sua evolução histórica, que tem como marco inicial a necessidade de serem amparadas situações não mais abrangidas pelo habeas corpus, em virtude da reforma constitucional de 1926, mas que, pela sua relevância, mereciam igual proteção” (WALD, Arnoldo. A nova Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016 de 07.08.2009). Revista dos Tribunais, 894/13). WALD, Arnoldo. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., RT 894/13. “Por sua própria natureza de recurso de efeito imediato, cuja sentença há de ser cumprida incontinenti, o mandado de segurança não comporta a apuração da extensão do dano” (Ministro Cunha Vasconcelos Filho, no prefácio da 1ª edição de: WALD, Arnoldo. O mandado de segurança, hoje em 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 15-16). “Parece não haver maiores dúvidas na doutrina a respeito da natureza mandamental da decisão de procedência do mandado de segurança, de forma que, acolhido o pedido do impetrante, o juízo expede uma ordem dirigida à autoridade coatora, responsável por seu cumprimento” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 181). “O art. 26 da Lei 12.016/2009 prevê expressamente que o crime será de desobediência [art. 330, CP], sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei 1.079/1950” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op. cit., p. 182). LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile. Ristampa da 2. ed. Milano: A. Giuffrè, 1966, v. I, n. 14, p. 40. Arruda Alvim NETTO, José Manoel de. Ċódigo de Processo Civil comentado. São Paulo: Ed.

RT, 1975, v. I, p. 315. 100 CPC/1973, art. 267, VI. 101 “Pelos seus liames e nexos com a pretensão deduzida no pedido é que as condições da ação se distinguem dos pressupostos processuais. Ambos constituem espécie dos pressupostos de admissibilidade da tutela jurisdicional. Mas, enquanto os pressupostos processuais incidem sobre a relação processual, as condições da ação promanam da viabilidade do pedido que o autor deduz quando propõe a ação” (MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. at. p/ Vilson Rodrigues Alves, Campinas: Bookseller, 1997, v. I, n. 141, p. 240 (grifamos). 102 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de Direito Processual Civil. 59. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, v. I, n. 87, p. 147. Nesse sentido: ZANZUCCHI, Marco Tullio. Diritto Processuale Civile. 4. ed. Milano: Giuffrè, 1946, v. I, p. 68. 103 Para COMOGLIO, FERRI e TARUFFO, a rigor, só há um pressuposto de existência do processo, que vem a ser a presença de um “verdadeiro e próprio juiz” como destinatário da pretensão de tutela jurisdicional. Somente aí é que, sendo a demanda formulada perante um “não juiz”, se poderia cogitar propriamente de um processo inexistente. Todos os demais pressupostos conhecidos, no dizer dos referidos autores, diriam respeito à validade e não à existência (Lezioni sul processo civile portanto, classificar os pressupostos processuais em “pressupostos de constituição válida do processo” e de “desenvolvimento regular do processo”, como, aliás, consta do nosso Código (CPC/2015, art. 485, IV; CPC/1973, art. 267, IV). 104 CPC/1973, arts. 134 e 138. 105 “O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei”. 106 Comoglio, Luigi Paolo; et al. Lezioni cit., I, p. 238. 107 CPC/1973, art. 214. 108 “Para a validade do processo é indispensável a citação inicial do réu ou do executado” (CPC/2015, art. 239; CPC/1973, art. 214); mas “o comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação” (CPC/2015, § 1º do art. 239; CPC/1973, art. 214, § 1º). 109 CPC/1973, art. 2º, in fine. 110 CPC/1973, art. 36. 111 “A parte será representada em juízo por advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. É lícito à parte postular em causa própria quando tiver habilitação legal” (CPC/20015, art. 103, caput; CPC/1973, art. 36). 112 CPC/1973, arts. 267, V e VII, e 295, I. 113 CPC/1973, arts. 243 a 250. 114 A antiga possibilidade jurídica do pedido não foi repetida pelo Código de Processo Civil de 2015 (CPC/1973, art. 267, VI). 115 BUZAID, Alfredo. Agravo de Petição no sistema do Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1956, n. 39, p. 88; LIEBMAN, Enrico Tullio. Op. cit., I, n. 14, p. 45. 116 Arruda Alvim NETTO, José Manoel de. Ċódigo de Processo Civil comentado. São Paulo: Ed.

RT, 1975, v. I, p. 316. A “possibilidade jurídica do pedido consiste na admissibilidade em abstrato da tutela pretendida, vale dizer, na ausência de vedação explícita no ordenamento jurídico para a concessão do provimento jurisdicional” (STJ, 4ª T., REsp. nº 220.623/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, Quarta Turma, ac. 03.09.2009, DJe 21.09.2009). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., REsp. nº 254.417/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 01.12.2008, DJe 02.02.2009. 117 Allorio, Enrico. Problemas de Derecho Procesal. Buenos Aires: EJEA, 1963, v. II, p. 270. 118 “As condições da ação há pouco mencionadas são o interesse de agir e a legitimação. Como ficou dito, eles são os requisitos de existência da ação, devendo, por isso, ser objeto de investigação no processo, preliminarmente ao exame do mérito” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de Direito Processual Civil. Tradução da 4. ed. italiana por DINAMARCO, Cândido Rangel. Rio de Janeiro: Forense, 1984, v. I, n. 74, p. 153-154). 119 Liebman, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile. Ristampa da 2. ed. Milano: A. Giuffrè, 1966, v. I, n. 14, p. 42. 120 Buzaid, Alfredo. Op. cit., n. 39, p. 89. 121 Amaral Santos, Moacyr. Primeiras linhas de Direito Processual Civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1977, v. I, n. 129, p. 146. 122 Para MARCO TULLIO ZANZUCCHI, “legitimados para agir ou contestar a respeito de uma determinada relação jurídica material são os sujeitos titulares da própria relação” (Diritto Processuale Civile. 4. ed. Milano: Giuffrè, 1946, v. I, p. 114). 123 A Lei nº 7.347/1985 instituiu a ação civil pública, reconhecendo legitimidade excepcional de associações civis e outras entidades para, na defesa de direitos que não são próprios, demandar em juízo a responsabilidade por danos ao meio ambiente, ao consumidor e aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. O CDC (Lei nº 8.078/1990) criou novos casos de substituição processual para ações coletivas de defesa dos direitos individuais homogêneos (arts. 91 a 100). 124 CPC/1973, art. 6º. 125 CPC/1973, art. 3º. 126 “Embora a ordem jurídica limite-se por um caráter espacial – territorial -, este não impede a atuação para o resguardo do direito violado quando o indivíduo não viver sob as fronteiras do território, muito embora tenha sido atingido pelo ato violador, havendo inclusive previsões específicas de extraterritorialidade na legislação processual (art. 23 do CPC/2015)” (ZAMPARI JÚNIOR, José Américo. Alguns aspectos do juízo de admissibilidade no mandado de segurança. Revista de Processo, São Paulo, n. 273, ano 42, p. 345, nov. 2017). 127 STF, 1ª T., RE 215.267/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 24.04.2001, DJU 25.05.2001, p. 19. 128 SIDOU, J. M. Othon. “Habeas data”, mandado de injunção, “habeas corpus”, mandado de segurança, ação popular. As garantias ativas dos direitos coletivos, segundo a nova Constituição. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989, p. 205; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança. Comentários às Leis nºs 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 31; FERRAZ, Sergio. Mandado de segurança (individual e coletivo). Aspectos polêmicos. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1993, p. 27-28. 129 Para Daniel Amorim, “ainda que não haja previsão expressa nesse sentido, pessoas formais são

também legitimadas ativas, tais como o espólio, o condomínio, a massa falida, bem como os entes despersonalizados, que, apesar de não terem personalidade jurídica, tem personalidade judiciária, tais como os corpos legislativos” (Ações Constitucionais, cit., p. 134). 130 STF, Pleno, MS 21.239/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.06.1991, DJU 23.04.1993, p. 6.920, RTJ 147/104. Reconhecendo legitimação do Ministério Público para o mandado de segurança em defesa de suas prerrogativas, há vários acórdãos do STJ (RMS 7.322/MG, 1ª T., Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 13.03.1997, DJU 22.04.1997, p. 14.373; REsp 168.881/DF, 4ª T., Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 21.05.1998, DJU 14.09.1998, p. 80; RMS 1.446/SP, 5ª T., Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, ac. 03.06.1997, DJU 04.08.1997, p. 34.784; REsp 700.206/ MG, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, ac. 09.03.2010, DJe 19.03.2010; RMS 27.455/DF, 5ª T., Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 03.11.2011, DJe 21.11.2011. 131 STF, Pleno, MS 21.450/MT, Rel. Min. Octávio Gallotti, ac. 08.04.1992, DJU 05.06.1992, p. 8429, RTJ 140/818. 132 A doutrina diverge sobre a questão. Cassio Scarpinella Bueno entende que a autoridade coatora seria parte na ação, em litisconsórcio passivo necessário com a pessoa jurídica de direito público (A nova lei do mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 44-45). Arlete Inês Aurelli, por sua vez, aduz ser “o poder público a verdadeira parte passiva na ação de mandado de segurança” (O juízo de admissibilidade na ação de mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 32). No mesmo sentido: BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 154; CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Do mandado de segurança. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Barros, 1957, p. 260. 133 Por isso, a autoridade coatora “não entra no processo como parte, não entra como legitimada, não entra como substituta processual, ela entra apenas como pessoa sujeita ao poder estatal, mais nada” (MESQUITA, José Ignácio Botelho de, et al. Mandado de Segurança. São Paulo: AASP/IIDPE, 1977, p. 66, apud BUENO, Cássio Scarpinella. (Para) Sempre o mandado de segurança: uma homenagem ao Professor José Ignácio Botelho de Mesquita. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério, et al (Coords.). Processo civil. Homenagem a José Ignácio Botelho de Mesquita. São Paulo: Ed. Quartier Latin, 2013, p. 180). 134 STJ, 2ª T., REsp. 846.581/RJ, Rel. Min. Castro Meira, ac. 18.08.2008, DJe 11.09.2008. 135 STJ, 6ª T., AgInt no AgRg no RMS 28.902/PB, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, ac. 04.10.2016, DJe 19.10.2016. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no AgRg no AREsp. 105.969/ BA, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 21.08.2012, DJe 27.08.2014. 136 MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandadode segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 37. Direito líquido e certo na conceituação jurisprudencial é aquele que provém de fato certo, e por fato certo deve--se entender aquele que se demonstra de plano, por meio de documento de teor inequívoco (STJ, 2ª T., RMS 202/PA, Rel. Min. Hélio Mosimann, ac. 19.06.1991, RSTJ 27/140; STJ, 3ª Seção, MS 6.964/DF, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac. 28.03.2001, RSTJ 147/386; STJ, 2ª T, RMS 10.491/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 05.03.2002, RSTJ 154/150; STF, 1ª T, RE 79.257/BA, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 06.09.1977, RTJ 83/130; STF, 1ª T., RE 80.444/PB, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 08.11.1977, RTJ 83/855; STJ, 3ª Seção, MS 10.265/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 10.08.2005, DJU 24.08.2005, p. 119). “O mandado de segurança é ação de rito especial em que se exige do

impetrante a comprovação de plano do direito líquido e certo violado, não sendo admitida dilação probatória” (STJ, 2ª T., REsp. 1.172.088/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 07.10.2010, DJe 21.10.2010). 137 STJ, 4ª T., RMS 39.298/MG, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 20.08.2013, DJe 28.08.2013. 138 “Em outras palavras, e dadas as limitações probatórias existentes no procedimento especial do mandado de segurança, através deste remédio processual só se pode proteger o direito subjetivo se seu fato constitutivo puder ter sua veracidade demonstrada em juízo através de prova exclusivamente documental e pré-constituída” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 93). “Segundo a melhor doutrina, a liquidez e a certeza do direito exigidas ao mandado de segurança referem-se, exclusivamente, aos fatos, que, por essa razão, deverão ser provados de maneira incontestável e clara pelo impetrante” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 125). 139 MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 498. Segundo o autor, desde que não haja necessidade de dilação probatória, a complexidade dos fatos reproduzidos nos documentos e as dificuldades hermenêuticas apresentadas pelas normas a aplicar “não podem servir de obstáculo ao cabimento do mandado de segurança” (op. cit., loc. cit.). Igual tese é defendida, entre outros, por Hely Lopes Meirelles (Mandado de segurança cit., 32. ed., p. 35) e Eduardo Arruda Alvim (Perfil atual do Mandado de Segurança. In: SUNDFELD, Carlos Ari e BUENO, Cassio Scarpinella (Coords.). Direito processual público – a Fazenda Pública em juízo. São Paulo: Malheiros Editores, 2000, p. 121). Nesse sentido é também a jurisprudência: “A complexidade dos fatos não exclui o caminho do mandado de segurança, desde que todos se encontrem comprovados de plano” (STF, 2ª T., RE 100.411/ RJ, Rel. Min. Francisco Rezek, ac. 04.09.1984, RTJ 111/1280). Mas é necessário que da petição inicial e dos documentos que a acompanham resulte a demonstração convincente do direito subjetivo que se afirma violado. Por isso, acerca do direito de obter certidões junto à Administração Pública, a jurisprudência é no sentido de que “não há direito líquido e certo à obtenção de informações na hipótese em que o pedido formulado à Administração Pública carece de especificidade e motivação. O recurso encontra óbice no pedido genérico, inapto a demonstrar o direito líquido e certo do impetrante à obtenção dos documentos pleiteados” (STJ, 2ª T., AgRg no RMS 33.185/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 15.03.2011, DJe 01.04.2011). “Esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento de que o pedido aos órgãos públicos de informações para a defesa de direitos deve estar devidamente fundamentado, não bastando, para tanto, a simples alegação genérica de que tais informações poderão vir a ser utilizadas para futura instrução de ação popular. Precedentes: RMS nº 32.877/RJ, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe 1º/12/2010 e RMS nº 20.412/PR, Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, in DJe 25/3/2008. Agravo regimental improvido” (STJ, 1ª T., AgRg no RMS 33.724/RJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 12.04.2011, DJe 25.04.2011). 140 Súmula nº 625 do STF: “Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança”. Porém, “não cabe mandado de segurança contra lei em tese” (Súmula nº 266 do STF), nem “contra decisão judicial com trânsito em julgado” (Súmula nº 268 do STF). 141 “O direito que dependa de dilação probatória está excluído do âmbito do writ” (STJ, 2ª T., REsp 89.988/MG, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 07.05.1998, RSTJ 110/142). Ver, porém, o art. 6º, § 1º,

da Lei nº 12.016. 142 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança cit., p. 35. 143 Súmula nº 625 do STF: “Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança”. Nesse sentido, a lição de Daniel Amorim Assumpção Neves: “Por mais tormentosa que seja a questão jurídica no caso concreto a esse respeito, jamais se retirarão essas características do direito do impetrante quando os fatos estejam devidamente comprovados. Compreende-se que, por mais intricada a questão de direito e por mais dúvidas que tal questão possa gerar no julgador, se a fundamentação fática da pretensão for demonstrada por prova documental, o direito alegado será líquido e certo, bastando ao julgador decidir se ele existe ou não existe” (Ações constitucionais, cit., p. 125-126). 144 Nessa ordem de ideias, “a ausência de direito líquido e certo haverá de levar à carência do mandado de segurança. Isto porque o direito ‘líquido e certo’ configura verdadeira condição do mandado de segurança (estabelecida na Carta Constitucional)” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. GZ, 2010, p. 103). Insere-se tal condição na categoria do interesse de agir, uma vez que a ausência de prova documental capaz de conferir liquidez e certeza ao direito subjetivo do impetrante afasta-o da tutela obtenível pela via processual da ação de mandado de segurança (cf. GAJARDONI, Fernando da Fonseca; FERREIRA, Olavo A. Vianna Alves. In: GAJARDONI, Fernando da Fonseca, et. al. Comentários à nova Lei de Mandado de Segurança. São Paulo: Método, 2009, p. 24). No mesmo sentido, na jurisprudência: STJ, 5ª T., AgRg no RMS 3.389/CE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 04.12.2009, DJe 01.02.2010; STF, Pleno, MS 25.116/DF, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, ac. 08.09.2010, DJe 10.02.2011). 145 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 102-105. 146 LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di diritto processuale civile. 5. ed. Milano: Giuffrè, 1992, v. I, p. 144; CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 368. 147 CPC/1973, art. 284. 148 CPC/1973, art. 268. 149 CPC/1973, art. 467. 150 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 230-231. 151 É o próprio defensor da tese criticada que, em outra passagem de sua obra, invoca a lição de Canotilho, para afirmar que, “sendo o mandado de segurança coletivo uma garantia fundamental, deve ele ser interpretado segundo o princípio da máxima efetividade (...). No caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Op. cit., p. 360). 152 CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 27. 153 No momento inicial, o juízo possível é sempre de probabilidade, porque o sujeito passivo ainda não se defendeu, nem a autoridade coatora prestou os necessários esclarecimentos acerca do ato impugnado. 154 Lembra Carreira Alvim o ensinamento de Lúcia Valle Figueiredo de que, a propósito do mandado de segurança, “fala em dois momentos processuais diferentes, sendo que, no primeiro momento, há

plausibilidade da existência do direito líquido e certo, e, no segundo de cognição completa; se a plausibilidade se infirmar, o processo se extingue sem resolução de mérito, e, se se confirmar, a segurança é concedida” (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de Segurança. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 21-22; CARREIRA ALVIM, op. cit., p. 28, nota 60). No mesmo sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do Mandado de Segurança, cit., p. 95; FERRAZ, Sérgio. Mandado de Segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 42-43; WALD, Arnoldo. Do mandado de segurança na prática judiciária. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 131. 155 “A jurisprudência desse Superior Tribunal é firme no sentido de que o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas no edital, possui expectativa de direito à nomeação no período de validade do certame” (STJ, 6ª T., AgRg no RMS 26.723/RS, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 20.08.2013, DJe 06.09.2013). Assim, não há direito líquido e certo a ser amparado pelo mandado de segurança, mas “apenas expectativa de direito à nomeação” (STJ, 6ª T., AgRg no REsp 772.833/RR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, ac. 05.11.2013, DJe 21.11.2013). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 43.960/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 03.12.2013, DJe 10.12.2013; STJ, 1ª T., AgRg no RMS 38.854/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 25.06.2013, DJe 02.08.2013; STJ, 6ª T., EDcl no AgRg no REsp. 757.872/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, ac. 17.11.2015, DJe 30.11.2015. 156 “A ilegalidade ou abuso de poder que resulte na omissão indevida na prática de determinação do ato pode ser também corrigida pela via do mandado de segurança” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança cit., n. 5.3.1, p. 107). É de se ressaltar que, segundo o STF, “a existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandado de segurança contra a omissão de autoridade” (Súmula 429/STF). 157 “Sempre que houver direito marcado pelo signo da liquidez e certeza, que esteja sob ameaça decorrente de omissão da autoridade pública, ou que haja sido por ela comprometido, tem cabimento o aforamento do mandado de segurança” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, n. 4.3, p. 39). 158 STJ, 2ª T., AgInt no RMS 46.865/DF, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 16.11.2017, DJe 22.11.2017. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp. 1.666.688/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 26.09.2017, DJe 09.10.2017; STJ, 1ª T., AgRg no AREsp. 690.625/RO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 04.04.2017, DJe 18.04.2017. 159 STJ, 2ª T., AgInt no RMS 46.865/DF, cit. 160 STJ, 1ª T., AgInt. no RMS 41.962/GO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 21.11.20017, DJe 06.12.2017. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., RMS 53.506/DF, Rel. Min. Regina Helena Costa, ac. 26.09.2017, DJe 29.09.2017. Entendendo, porém, que somente não haverá direito líquido e certo à nomeação dos aprovados fora do número de vagas com a criação de novas vagas, “desde que motivadamente e em caso da ocorrência de situação caracterizada pela superveniência, pela imprevisibilidade, pela gravidade e pela necessidade”, como a demonstração de ser impossível a nomeação em razão “da ausência de dotação orçamentária e de recursos financeiros, o que poderia ensejar a violação à Lei de Responsabilidade Fiscal”, o RMS 39.167/DF, 2ª T., Rel. p/acórdão Min. Mauro Campbell Marques, ac. 05.08.2014, DJe 12.08.2014. 161 STJ, 2ª T., RMS 31.847/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 22.11.2011, DJe 30.11.2011.

Decidiu o STJ, invoncando o julgamento do STF, em caso qualificado como de “repercussão geral” (STF, Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 03.10.2011), que a expectativa de direito é transformada em direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado se, no decorrer do prazo de validade do edital, houver a contratação precária de terceiros para o exercício dos cargos vagos, salvo situações exepcionais plenamente justificadas pela Administração, de acordo com o interesse público. Na hipótese apreciada, esgotado o número de vagas previsto no edital, surgiram novas vagas para o mesmo cargo, no período de vigência do concurso, “as quais foram ocupadas, em caráter precário, por meio de designação de servidores do quadro funcional do Poder Judiciário Estadual”. Fato como este, para o STJ, transforma a mera expectativa em direito líquido e certo, em flagrante preterição a ordem de classificação dos candidatos aprovados em concurso público. Vários precedentes, do STF e do STJ, foram invocados. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., RMS 20.565/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 15.03.2007, DJU 21.05.2007, p. 595; STJ, 6ª T., RMS 22.908/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 28.09.2010, DJe 18.10.2010. “Por outro lado, o STJ possui entendimento sedimentado de que a contratação de servidor em caráter temporário em detrimento de candidato aprovado em concurso público para provimento definitivo gera o direito líquido e certo à nomeação deste” (STJ, 1ª Seção, MS 18.685/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 08.02.2017, DJe 09.08.2017). 162 STJ, 2ª T., RMS 37.248/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 27.08.2013, DJe 04.09.2013. 163 STJ, 1ª Seção, MS 17.886/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 11.09.2013, DJe 14.10.2013. 164 STJ, 1ª Seção, MS 17.886/DF, cit. 165 “... deve ser reconhecido o direito subjetivo a nomeação aos candidatos aprovados fora das vagas em concurso público se, no prazo de validade do certame, suceder contratação precária para o preenchimento de vagas existentes no órgão, em nítida preterição dos aprovados, como ocorreu no caso dos autos” (STJ, 1ª T., AgRg no AREsp 315.313/ES, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 15.08.2013, DJe 22.08.2013). No mesmo sentido: STF, 1ª T., ARE 649.047/MA, Rel. Min. Rosa Weber, ac. 25.06.2013, DJe 16.08.2013; STJ, 6ª T., AgRg no REsp. 1.168.473/ PE, Rel. Min. Nefi Cordeiro, ac. 05.05.2015, DJe 14.05.2018. 166 “Dispondo o edital que os candidatos que não se classificassem dentro do número de vagas previsto em edital, não seguindo à fase subsequente de curso de formação, estariam automaticamente reprovados, não há invocar-se direito líquido e certo para uma nova convocação a esse curso de formação apenas porque, depois de encerrado o certame, abriram-se novas vagas em decorrência da exoneração de servidores” (STJ, 2ª T., AgRg no RMS 40.747/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 07.11.2013, DJe 18.11.2013). No mesmo sentido: STJ, 1ª T., AgRg no RMS 44.171/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 28.04.2015, DJe 15.05.2015. 167 STJ, 2ª T., AgRg no AgRg no REsp 1.270.179/AM, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 15.12.2011, DJe 03.02.2012. Precedentes: STJ, 1ª T., AgRg no Ag 1.402.890/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 09.08.2011, DJe 16.08.2011; STJ, 2ª T., REsp 1.071.424/RN, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.08.2009, DJe 08.09.2009; STJ, 1ª T., AgRg no AREsp. 248.455/SE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 17.11.2015, DJe 26.11.2015; STJ, 2ª T., REsp. 1.523.483/RN, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 26.05.2015, DJe 30.06.2015. 168 STJ, 2ª T., AgRg no AgRg no REsp 1.270.179/AM, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 15.12.2011, DJe 03.02.2012; STJ, 1ª T., AgRg no AREsp 20.530/PI, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac.

06.10.2011, DJe 13.10.2011; STJ, 2ª T., AgRg no AREsp. 679.011/GO, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 19.05.2015, DJe 26.05.2015. 169 STF, 2ª T., RE 100.411/RJ, Rel. Min. Francisco Resek, ac. 04.09.1984, RT 594/248. No mesmo sentido: STJ, 2ª Seção, CC 118/DF, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 14.06.1999, RSTJ 2/279. 170 STF, 1ª T., MS 33.046/PR, REl. Min. Luiz Fux, ac. 10.03.2015, DJe 18.05.2015. 171 STJ, 1ª T., RMS 36+064/MT, Rel. Min. Sérgio Kukina, ac. 13.06.2017, DJe 22.06.2017. 172 STF, 1ª T., RE 466.543 AgR/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, ac. 03.04.2012, DJe 07.05.2012. 173 BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, n. 99, p. 94. 174 REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, n. 6.3.4, p. 212. “A omissão para o mandado de segurança não é a simples falta de ação, mas o ato da inação. O não agir é um ato porque envolve a conduta humana, ainda que omissiva. A autoridade deveria praticar o ato e não o praticou. Houve, pois, o ato de não praticar o ato. Assim é que a omissão tem de ser vista e interpretada” (FRANCAVILLA, Enrico. Mandado de segurança, teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 90). 175 TJSP, Pleno, MS 12.326-0, Rel. Des. Márcio Bonilha, ac. 27.02.1991, RT 673/50; STJ, 2ª T., RMS 424/RS, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 22.08.1990, DJU 01.10.1990, p. 10.437; STJ, 4ª T., RMS 10.310/DF, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, ac. 07.02.2006, DJU 20.03.2006, p. 272. A Lei nº 9.051/1995 regulamentou a expedição de certidões para defesa de direitos e esclarecimentos de situações. Fixou o prazo improrrogável de 15 dias, contados do protocolo do pedido, para o fornecimento do documento (art. 1º). Exigiu, porém, que do requerimento constem esclarecimentos relativos aos fins e razões do pedido (art. 2º). Portanto, “Inexiste direito líquido e certo à obtenção de informações quando formulado à Administração Pública pedido genérico e imotivado. Precedente desta Corte no RMS 18.564/RJ (Rel. Min. Francisco Falcão)” (STJ, 2ª T., RMS 20.412/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 06.03.2008, DJe 25.03.2008). 176 STJ, 1ª T., REsp 38.772/GO, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 13.12.1995, DJU 04.03.1996, p. 5.358, RSTJ 82/63. 177 TRF, 3ª R., 4ª T., AMS 180.037, Rel. Juiz Andrade Martins, ac. 24.09.1997, DJ 18.11.1997, sec. 2, p. 98.278. 178 TRF, 2ª R, 4ª T., MS 95.02.30028-9-RJ, Rel. Des. Ney Fonseca, DJU 18.04.1996, RJ 225/127. 179 STF, Pleno, MS 24.167/RJ, Rel. Min. Joaquim Barbosa, ac. 05.10.2006, DJU 02.02.2007, p. 75. 180 STJ, 3ª Seção, MS 14.186/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, ac. 13.11.2013, DJe 20.11.2013. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, MS 23.203/DF, Rel. Min. Og Fenandes, ac. 26.04.2017, DJe 03.05.2017. 181 STJ, 3ª Seção, MS 11.564/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 09.10.2013, DJe 18.10.2013. 182 STJ, 6ª T., AgRg no RMS 17.638/MS, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 03.09.2013, DJe 11.10.2013. 183 STF, 2ª T., AgRg no AgRg no RE 231.671-8, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 28.04.2009, RT 886/140; STF, 1ª T., AgRg no AgRg no RE 301.851, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 17.09.2002, DJU 14.11.2002, p. 21; STF, Pleno, RE 167.263-ED-EDV/MG, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 09.09.2004, DJU 10.12.2004, p. 22.

STF, 2ª T., RE 231.671-8 cit. 185 STF, 2ª T., RE 318.281-AgRg/SP, Rel. Min. Eros Grau, ac. 14.08.2007, DJe 21.09.2007; STF, 1ª T., AI 419.258-AgRg/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 25.06.2007, DJe 17.08.2007; STF, Pleno, MS 24.584-AgRg/DF, Rel. p/ ac. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 09.08.2007, DJe 20.06.2008. 186 STF, 2ª T., RE 231.671-8/DF, AgRg no AgRg, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 28.04.2009, RT 886/141; STF, 2ª T., RE 228.751-AgRg-AgRg-AgRg/RS, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 18.02.2003, DJU 04.04.2003, p. 603; STF, 2ª T., AI 377.361-AgRg-ED/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 08.03.2005, DJU 08.04.2005, p. 36. 187 STJ, 3ª Seção, CC 17.438-MG, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 24.09.1997, DJU 20.10.1997, p. 52.969. No mesmo sentido: “A competência para julgamento de Mandado de Segurança é estabelecida em razão da função ou da categoria funcional da autoridade apontada como coatora” (STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 104.730/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 25.08.2010, DJe 15.09.2010); STJ, 1ª Seção. AgRg no CC 131.715/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 08.10.2014, DJe 10.12.2014. 188 “A competência judiciária para o mandado de segurança está assentada em dois princípios: a) o da qualificação da autoridade como federal ou local (do que depende a discriminação no dualismo jurisdicional do regime, Justiça Federal e Justiça comum ou local); b) o da hierarquia, isto é o da graduação da autoridade, para o efeito da competência no mecanismo das instâncias em cada um daquelas jurisdições. É uma competência ratione autoritatis, isto é, em razão do cargo ou função da autoridade contra a qual se requer o mandado” (CASTRO NUNES, José de. Do mandado de segurança e de outros meios de defesa contra atos do Poder Público. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1961, p. 277). 189 STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 15.774/DF, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 23.02.2011, DJe 07.04.2011. 190 STJ, 2ª T., AgRg no AREsp. 253.007/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.12.2012, DJe 12.12.2012. No mesmo sentido: STJ, 4ª T., AgRg no REsp. 1.078.875/RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 03.08.2010, DJe 27.08.2010. 191 Cumpre observar que o STF já decidiu pela sua incompetência para julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente do BACEN, do Tribunal Regional Federal da Quarta Região e de Magistrada relatora de apelação cível do TRF 4ª Região, visto que “a competência do Supremo Tribunal Federal, por revestir-se de índole constitucional, está sujeita a regime de direito estrito, que se revela incompatível com qualquer ensaio de interpretação que culmine por ampliar o âmbito de atuação desta Corte Suprema em sede originária” (voto do Min. Relator na Ag. Reg. na MC no MS 33.851/RS, 2ª T., Rel. Min. Celso de Mello, ac. 08.03.2016, DJe 29.03.2016). 192 Para efeito de competência, “considerar-se-á federal a autoridade coatora se as consequências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada” (Lei nº 12.016, art. 2º) (v.ġ., empresas públicas, sociedades de economia mista, ou entidades equiparadas, no tocante ao controle). Há, portanto, uma regra excepcional de competência, em relação às empresas de direito privado integrantes da Administração Pública Federal indireta: (a) nas ações comuns, a competência é da Justiça Estadual; (b) nos mandados de segurança, a competência é da Justiça Federal. 184

Súmula nº 248 do STF: “É competente, originariamente, o Supremo Tribunal Federal, para mandado de segurança contra ato do Tribunal de Contas da União”; Súmula nº 330 do STF: “O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer de mandado de segurança contra atos dos Tribunais de Justiça dos Estados”; Súmula nº 623 do STF: “Não gera por si só a competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer do mandado de segurança com base no art. 102, i, ‘n’, da Constituição, dirigir-se o pedido contra deliberação administrativa do Tribunal de origem, da qual haja participado a maioria ou a totalidade de seus membros”; Súmula nº 624 do STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais”; Súmula nº 41 do STJ: “O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de outros tribunais ou dos respectivos órgãos”; Súmula nº 177 do STJ: “O Superior Tribunal de Justiça é incompetente para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de órgão colegiado presidido por ministro de estado”; Súmula nº 376 do STJ: “Compete a Turma Recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial”. 194 STF, Pleno, Edcl no MS 25.087/SP, Rel. Min. Carlos Britto, ac. 21.09.2006, DJe 11.05.2007, p. 48. No mesmo sentido: STF, 2ª T., Ag.R no MS 32.627/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 05.08.2014, DJe 25.08.2014. 195 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 66. 196 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 132. 197 STJ, 2ª T., REsp 1.295.790/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.11.2012, DJe 12.11.2012. 198 STJ, 2ª Seção. CC 148.693/BA, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, ac. 14.12.2016, DJe 19.12.2016. 199 STJ, 1ª Seção, CC 19.689/RS, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 10.09.1997, DJU 06.10.1997, p. 49.845. No mesmo sentido: “A matéria debatida nos autos refere-se à dissolução de diretório municipal de partido político determinada por comissão executiva regional. Trata-se, portanto, de questão concernente à validade de ato deliberativo, de natureza interna corporis, sendo competente para o julgamento o Juízo Comum estadual, na linha de precedentes da Corte” (STJ, 2ª Seção, CC 36.258/MT, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac. 10.12.2003, DJU 08.03.2004, p. 166). 200 STJ, 1ª T., RMS 1790/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 02.05.1994, DJU 23.05.1994, p. 12.550. 201 Ao STF cabe processar e julgar, originariamente, o mandado de segurança contra “atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal” (CF, art. 102, I, d). Caberá, ainda, ao STF julgar originariamente as ações contra o CNJ e o CNMP, entre as quais se inclui, obviamente, o mandado de segurança (CF, art. 102, I, r). Não se inclui na competência originária do Supremo Tribunal Federal, nem na do Superior Tribunal de Justiça, julgar mandados de segurança contra atos de quaisquer outros Tribunais, conforme jurisprudência sumulada naquelas duas Cortes: Súmula nº 330 do STF: “O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer de mandado de segurança contra atos dos Tribunais de Justiça dos Estados”. Súmula nº 624 do STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal 193

conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros Tribunais”. Súmula nº 41 do STJ: “O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de outros Tribunais ou dos respectivos órgãos”. 202 Ao STJ cabe processar e julgar, originariamente, o mandado de segurança contra “ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal” (CF, art. 105, I, b). 203 Aos Tribunais Regionais Federais compete processar e julgar, originariamente, os mandados de segurança contra “ato do próprio Tribunal ou de juiz federal” (CF, art. 108, I, c). 204 Código Eleitoral: “Art. 22. Compete ao Tribunal Superior: I – Processar e julgar originariamente: (...) e)... mandado de segurança, em matéria eleitoral, relativos a atos do Presidente da República, dos Ministros de Estado e dos Tribunais Regionais...”. “Art. 29. Compete aos Tribunais Regionais: I – processar e julgar originariamente: (...) e)... mandado de segurança, em matéria eleitoral, contra ato de autoridades que respondam perante os Tribunais de Justiça por crime de responsabilidade e, em grau de recurso, os denegados ou concedidos pelos juízes eleitorais...”. “Art. 35. Compete aos juízes: (...) III – decidir (...) mandado de segurança, em matéria eleitoral, desde que essa competência não esteja atribuída privativamente a instância superior”. 205 CLT: “Art. 678. Aos Tribunais Regionais, quando divididos em Turmas, compete: I – ao Tribunal Pleno, especialmente: (...) b) processar e julgar originariamente: (...) 3) os mandados de segurança (...)”. De acordo com a Constituição, a Justiça do Trabalho só tem competência para o mandado de segurança “quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição” (art. 114, IV). Quanto à competência do TST, o próprio Tribunal decidiu que, consoante sua jurisprudência, “(...) à Justiça do Trabalho compete, tão somente, processar e julgar ‘mandamus’ aviado em desfavor de ato praticado por seus próprios agentes, no exercício da função jurisdicional ou administrativa”. Desse modo não lhe competiria apreciar atos de autoridade outra, que não atuasse como agente da Justiça do Trabalho (TST, SDI-II, ROAG 57116-2002-900-01-00, Rel. Min. José Simpliciano Fernandes, v.u., DJU 06.06.2003, disponível em: ). Seguindo a mesma linha de entendimento, decidiu o STJ: “1. O julgamento de mandado de segurança impetrado contra atos de Delegados Regionais do Trabalho, consistentes na fiscalização e aplicação de sanções administrativas, não é da competência da Justiça Trabalhista, pois não se relaciona à demanda entre empregado e empregador. Portanto, compete à Justiça Federal apreciá-lo e julgá-lo (...)” (STJ, 1ª Seção, CC 40.216/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 23.06.2004, DJU 02.08.2004, p. 278). 206 A Lei nº 8.457/1992, em seu art. 6º, I, d, dispõe sobre competência do Superior Tribunal Militar, em matéria de mandado de segurança. 207 STF, Pleno, RE 726.035/SE, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 24.02.2014, DJe 02.05.2014. 208 “Do exposto, se infere, segundo o melhor entender da jurisprudência, que se o ato é praticado por funcionário não sujeito à jurisdição originária do Tribunal de Justiça, não cabe a este julgá-lo, mas ao juiz de primeiro grau” (BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1989, v. I, n. 143, p. 227). Por outro lado, “em se tratando de autoridade estadual, municipal ou distrital, o exame deve iniciar-se pelas Constituições dos Estados, passando às leis de organizações judiciárias locais, incluindo o Regimento Interno dos Tribunais de Justiça” (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 35).

STJ, 1ª Seção, CC 18.894/RN, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac. 28.05.1997, DJU 23.06.1997, p. 29.033. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, CC 60.560/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 13.12.2006, DJU 12.02.2007, p. 218. 210 “O mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público” (Súmula 604/STJ). 211 Em caso de pedido de restituição de bem apreendido em ação penal, o STJ reconheceu ser lícito o mandado de segurança contra ato judicial, por quem não seja parte, “por ter o direito potestativo de se insurgir contra o referido decisum e almejar a restituição do veículo que alegadamente lhe pertence”. No entanto, por não haver prova suficiente da propriedade, e por estar a alegação do impetrante a carecer de maior dilação probatória, não comportável no procedimento mandamental, decidiu que caberia “ao terceiro de boa-fé ingressar com procedimento de restituição de coisas apreendidas, previsto no artigo 118 e seguintes do Código de Processo Penal, haja vista a necessidade de demonstrar-se a forma de aquisição dos bens” (STJ, 5ª T., AgRg no RMS 37.429/MS, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 06.08.2013, DJe 13.08.2013; STJ, 6ª T., RMS 20.042/AM, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 10.11.2009, DJe de 30.11.2009). 212 ARAÚJO, José Henrique Mouta. Mandado de segurança em matéria penal: algumas variáveis. Revista Dialética de Direito Processual, nº 100, p. 54-55: “Um entendimento razoável é o de que a competência para apreciá-lo será determinada de acordo com a matéria discutida e a câmara com poder de rever o ato”. 213 “O mandado de segurança não perde a natureza de ação civil, ainda que impetrado no âmbito do processo penal (Precedentes do STF e STJ)” (STJ, 5ª T., REsp 299.684/SC, Rel. Min. Félix Ficher, ac. 16.10.2001, DJU 19.11.2001, p. 308). 214 STF, 1ª T., HC 66.794, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 15.12.1988, DJU 07.04.1989, p. 4.909. 215 STJ, AgRg no MS 37.429/MS, cit. 216 ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 84. 217 “Haverá resolução de mérito: I – quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção” (CPC/2015, art. 487; CPC/1973, art. 269). 218 “Entre os requisitos específicos da ação mandamental está a comprovação mediante prova préconstituída, do direito subjetivo líquido e certo do impetrante. A deficiente comprovação dos fatos impede o exame da existência do alegado direito líquido e certo, o que impõe a extinção do processo sem julgamento do mérito” (STJ, 1ª Seção, MS 8.439/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 11.02.2004, DJU 25.02.2004, p. 90). “O direito invocado deve ser comprovado de plano, sem o quê, por ser questão prévia, o mérito da segurança não deverá ser apreciado” (STJ, 1ª Seção, MS 13.190/DF, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 22.10.2008, DJe 10.11.2008). 219 “O juiz não resolverá o mérito quando:... VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual” (CPC/2015, art. 485, VI; CPC/1973, art. 267, VI). Jurisprudência: “O ‘direito líquido e certo’, pressuposto constitucional de admissibilidade do mandado de segurança, é requisito de ordem processual atinente à existência de prova inequívoca... e não... matéria de mérito” (STF, Pleno, AgRg no MS 21.243; STF, 1ª T., RE 117.936/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 20.11.1990, DJU 07.12.1990, p. 14.641). 209

CPC/1973, art. 462. 221 “Já é antigo o entendimento do STJ no sentido de que ‘as normas legais editadas após o ajuizamento da ação devem levar-se em conta para regular a situação posta na inicial’ (EDcl nos EDcl no REsp 18443/SP, 3ª T., Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 09.08.1993). Dessa forma a aplicação do direito superveniente, no julgamento da apelação, não caracteriza julgamento ultra petita” (STJ, 1ª T., REsp 665.683/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 26.02.2008, DJe 10.03.2008). 222 “Processo civil. Mandado de segurança preventivo. Decadência. Questões novas. Arts. 303, I e 462 do CPC. Aplicam-se ao mandado de segurança os arts. 303, I, e 462 do Código de Processo Civil” (STJ, 1ª T., REsp 39.023/RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 23.05.1994, DJU 20.06.1994, p. 16.059). 223 “Em mandado de segurança não se aplica preceito de lei superveniente à impetração. O ato impugnado tem como parâmetro obrigatório a legislação em vigor ao tempo de sua expedição” (STF, 2ª T., RE 457.508 AgR/PI, Rel. Min. Eros Grau, ac. 14.08.2007, DJU 21.09.2007, p. 39). 224 Essa era a legislação em vigor à época do julgamento. Entretanto, o entendimento não será alterado, haja vista que o artigo foi repetido pelo 493 do CPC/2015. 225 BUENO, Cassio Scarpinella. Partes e terceiro no processo civil brasileiro. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1990, p. 330. 226 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 6. ed. São Paulo: Ed. RT, 2007, p. 57. 227 BUENO, Cassio Scarpinella. Partes e terceiro, cit., p. 32; BOCALON, João Paulo. Legitimado passivo da multa coercitiva contra pessoa jurídica de direito público. Revista Dialética de Direito Processual, n. 111, p. 72 e 81. 228 Kazuo Watanabe lembra a teoria de Walter Eduardo Baethgen, segundo a qual as condições da ação são vistas como “pressupostos relativos à pretensão e ao modo de sua inserção no processo”. A decisão sobre tais “condições” não se preocupa com os pressupostos de fato “senão enquanto constitui ele mera ‘afirmação’”. Como mera aferição da possibilidade de o processo prosseguir até o julgamento do mérito, a decisão em torno das “condições da ação” toma como objeto “apenas a afirmação” do autor. A essa altura não se pode ainda formular um juízo sobre a correspondência entre a pretensão e o modelo legal que lhe corresponde. Não há, portanto, julgamento de mérito, o que só será possível mais tarde, desde que se reconheçam presentes as condições da ação. Em suma, “a finalidade do julgamento sobre as ‘condições da ação’ é, assim, a de constatar se a ‘pretensão processual’ foi inserida, como objeto, na relação processual, de modo a possibilitar o futuro exame de sua concordância – o seu ‘encaixe’ – com o modelo legal” (WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo: Ed. RT, 1987, n. 16.2, p. 62). Coerente com tal visão que coordena o fenômeno “direito-processo”, conclui o autor que “as ‘condições da ação’ são aferidas no plano lógico e da mera asserção do direito, e a cognição a que o juiz procede consiste em simplesmente confrontar a afirmativa do autor [na petição inicial] com o esquema abstrato da lei. Não se procede, ainda, ao acertamento do direito afirmado” (Op. cit. n. 17, p. 69). 229 CPC/1973, art. 6º. 220

Na hipótese do inciso LXIX, a legitimação para o mandado individual é, em regra, ordinária, e cabe indistintamente a pessoas naturais ou jurídicas e até a entidades não personalizadas, mas dotadas de legitimação formal. Na hipótese do inciso LXX, a legitimação para o mandado de segurança coletivo é extraordinária e cabe a restrito grupo de pessoas jurídicas identificadas pela própria Constituição. 231 STF, 1ª T., RE 215.267/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 24.04.2001, DJU 25.05.2001, p. 977, RTJ 177/965; STF, 1ª T., RE 215.267/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 24.04.2001, DJU 25.05.2001, p. 19, RT 792/199. A Lei nº 12.016 tornou explícita, em seu art. 1º, a possibilidade do uso do mandado de segurança tanto pelas pessoas físicas como jurídicas. 232 STJ, 2ª T., RMS 52.741/GO, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 08.08.2017, DJe 12.09.2017. 233 STJ, 1ª Seção, MS 21.669/DF, Rel. Min. Gurgel de Faria, ac. 23.08.2017, DJe 09.10.2017. 234 STF, Pleno, MS 21.239/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.06.1991, DJU 23.04.1993, p. 237, RTJ 147/104. 235 ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de Segurança cit., n. 3.1, p. 74. 236 O princípio da máxima efetividade é atualmente um dos mais relevantes na hermenêutica constitucional, impondo-se sua aplicação a todas as normas da Lei Maior e sobretudo no âmbito dos direitos fundamentais, de tal maneira que, “no caso de dúvidas, deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais” (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Ed. Almedina, s/d, p. 1.187). 237 “Aplica-se ao mandado de segurança o princípio que não admite que alguém pleiteie em juízo a proteção a direito de outrem” (TALAMINI, Eduardo. Partes e os terceiros no mandado de segurança individual à luz de sua nova disciplina – Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 80, p. 33, nov. 2009). Prevalece, portanto, a regra do art. 18 do CPC/2015, segundo a qual somente por previsão legal se pode reconhecer que a parte pleiteie, em nome próprio, direito alheio. No caso do mandado de segurança, essa excepcional autorização é dada para a situação identificada no art. 3º da Lei nº 12.016. 238 Fala-se, na espécie, de uma hipótese de legitimação extraordinária concorrente e disjuntiva, na medida em que todos aqueles que se encontrem atingidos pelo ato de ameaça ou de violação, poderão pleitear o acesso ao Poder Judiciário por meio do mandamus (MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 45). 239 TALAMINI, Eduardo. Op. cit., Revista Dialética de Direito Processual, n. 80, p. 36-37. 240 STJ, 4ª T., REsp 44.925, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 21.06.1994, DJ U 15.08.1984, p. 20.339. 241 A situação é análoga àquela que, no direito privado, ocorre em relação aos acionistas minoritários diante das decisões assembleares ilegítimas. Qualquer um deles tem legitimidade para demandar a anulação da assembleia (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, t. L, § 5.332, p. 409-410; CAR-VALHOSA, Modesto. Ċomentários à Lei das Sociedades Anônimas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v. IV, t. II, p. 468-469), sem a obrigatoriedade de formar um litisconsórcio que envolva todos os 230

colegitimados. Embora “facultativo” o litisconsórcio ativo, na espécie, o resultado será necessariamente “uno e único”, configurando a situação que se pode definir como “ação única plurissubjetiva” ou como “litisconsórcio unitário” (MANDRIOLI, Crisanto. Corso di diritto processuale civile. 8. ed. Torino: Giappichelli, 1991, v. I, p. 304). Porque, em virtude da natureza do direito material em litígio, não se pode cindi-lo entre os colegitimados, tem-se de reconhecer sua sujeição a “um desenvolvimento formal e substancialmente único”, no dizer de MANDRIOLLI; e, em consequência, “a decisão da controvérsia não pode ser senão uniforme” (ZANUTTIGH, Loriana. Verbete “Litisconsorzio” in: Digesto. Discipline privatistiche. Sezione civile. 4. ed. Torino: UTET, 1996, v. 11, p. 42). 242 CPC/1973, art. 54. 243 “1. Em ação ordinária na qual se discute a exclusão de candidato em concurso público, a legitimidade passiva toca à entidade responsável pela realização, regulamentação e organização do certame, que, in casu, é o Estado do Espírito Santo. 2. A causa de pedir do Recorrente referese exclusivamente à atuação do órgão responsável pela elaboração do edital, não se enquadrando nas hipóteses de atuação da banca examinadora” (STJ, 1ª T., REsp. 1.425.594/ ES, REl. Min. Regina Helena Costa, ac. 07.03.2017, DJe 21.03.2017). 244 “A autoridade coatora, para fins de impetração de mandado de segurança, é aquela que pratica ou ordena, de forma concreta e específica, o ato ilegal, ou, ainda, aquela que detém competência para corrigir a suposta ilegalidade. Inteligência do art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016/2009” (STJ, 5ª T., AgRg nos EDcl no RMS 23.429/PA, Rel. Min. Jorge Mussi, ac. 20.03.2012, DJe 09.04.2012). 245 STF, 2ª T., RMS 28.193/DF, Rel. Min. Eros Grau, ac. 11.05.2010, DJe 04.06.2010. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 69. No mesmo sentido: STJ, 3ª Seção, MS 15.104/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 25.04.2012, DJe 14.05.2012; STJ, 5ª T., RMS 28.213/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 22.11.2011, DJe 01.12.2011; STF, 1ª T., RMS 30.536/RJ, Rel. Min. Carmen Lúcia, ac. 30.08.2011, DJe 22.09.2011. 246 “A autoridade coatora é, portanto, a que presta as informações no mandado de segurança, já que somente ela saberá os detalhes, de fato, do ato ao qual se atribui a violação ao direito líquido e certo do impetrante. Deverá, porém, cumprir a decisão judicial proferida no mandado de segurança, por ser atribuição sua praticar o ato determinado” (CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. Comentário ao art. 1º da Lei 12.016. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários a nova Lei do Mandado de Segurança. 4 ed., São Paulo: RT, 2015. p. 55). 247 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 57. No mesmo sentido: “parte passiva, de acordo com a doutrina prevalecente, é a pessoa jurídica (de direito público, as mais das vezes) em cujos quadros se insere a autoridade dita coatora” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Direito processual civil – Ensaios e pareceres. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, p. 241); TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Mandado de segurança: uma visão em conjunto. Mandado de Segurança e de Injunção. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 111. 248 “O coator é notificado para prestar informações. Não tem ele legitimidade para recorrer da decisão deferitória do mandamus. A legitimação cabe ao representante da pessoa pública interessada” (STF, 1ª T., RE 97.282, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 03.09.1982, RTJ 105/404) (a Lei n.º 12.016/2009 estendeu a possibilidade de recurso, mas não como parte, e sim como terceiro eventualmente interessado). “A parte passiva no mandado de segurança é a pessoa jurídica de

direito público a cujos quadros pertence a autoridade apontada como coatora” (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense 1993, p. 154). “A autoridade coatora participa do mandamus como parte no sentido formal, enquanto a pessoa jurídica de direito público interno, destinatária dos efeitos da decisão, participa no capítulo material” (STJ, 1ª T., REsp 179.818/CE, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 24.04.2001, DJU 04.02.2002, p. 293. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 132.024/CE, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 19.10.2000, DJU 12.03.2001, p. 95). 249 (...) “4. A pessoa jurídica de direito público a suportar os ônus da sentença proferida em mandado de segurança é parte legítima para figurar no polo passivo do feito, por ter interesse direto na causa. 5. Recurso especial conhecido e desprovido” (STJ, 1ª T., REsp 547.235/ RJ, Rel. Min. José Delgado, ac. 18.12.2003, DJU 22.03.2004, p. 237). “Aplica-se a teoria da encampação quando a própria pessoa jurídica de direito público a quem competia suportar os ônus da sentença proferida em mandado de segurança apresenta defesa manifestando-se quanto ao mérito do writ” (STJ, 5ª T., AgRg no Ag 963.292/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 18.03.2008, DJe 19.05.2008). 250 “A autoridade coatora titulariza um órgão público e, enquanto tal, atua a vontade da pessoa a que pertence. As consequências do ato que pratica são diretamente imputadas à referida pessoa que arca com os seus ônus em face do impetrante” (BASTOS, Celso Ribeiro. Ċomentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1989, v. 2, p. 340). Por isso, “a parte passiva no mandado de segurança é a pessoa jurídica de direito público a cujos quadros pertence a autoridade coatora (...) o ato do funcionário é ato da entidade pública a que ele se subordina” (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 154-155). 251 “A jurisprudência desta Corte Superior é uníssona no sentido de que, na ação de mandado de segurança, não há que se falar em litisconsórcio passivo necessário entre a pessoa jurídica de direito público e a autoridade coatora, porquanto esta já é parte integrante daquela” (STJ, 1ª T., AgRg no REsp 255.902/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 18.03.2004, DJU 17.05.2004, p. 109). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp. 647.371/MA, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 16.11.2004, DJU 09.02.2005, p. 19. 252 “A verdade, no entanto, é que o coator é chamado a juízo como representante da pessoa jurídica de direito público. É porque nessa qualidade agiu mal, que a medida se impetra. Por ela não fica em jogo a pessoa do agente, mas sim, a pessoa pública por ele encarnada no exercício da representação, ou como órgão” (SEABRA FAGUNDES, Miguel. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1957, p. 338). 253 Por isso entendia-se que “a legitimidade para recorrer em mandado de segurança é da pessoa jurídica de direito público atingida por seus efeitos e não da autoridade coatora” (TJRS, 2ª CC, AI 70009346305, Rel. Des. Leila Vani Pandolfo Machado, ac. 19.10.2004, Revista Dialética de Direito Tributário, 113/176). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 553.959/PE, Rel. Min. Castro Meira, DJU 01.02.2003, p. 342. O entendimento fixado pela Corte Especial do STJ era no sentido de que a autoridade coatora só teria legitimidade para recorrer da sentença concessiva do mandado de segurança quando seu recurso objetivasse, não a defesa da pessoa jurídica, mas a de “interesse próprio da dita autoridade” (STJ, 6ª T., REsp 264.632/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 04.09.2007, DJU 19.11.2007, p. 298). Tal recurso, portanto, quando admitido,

seria de “terceiro prejudicado”, e não recurso de parte da ação mandamental (CPC/2015, art. 996; CPC/1973, art. 499). 254 Esse, como já visto, era o entendimento do STJ, adotado ainda ao tempo em que vigorava a Lei nº 1.533/1951 (STJ, 6ª T., REsp 264.632/SP, cit.). 255 “Mandado de segurança. Certidão negativa de débito. Recusa. Ilegitimidade passiva ad causam rejeitada. Violação do art. 1º da Lei 12.016 (...). Afigura-se legítima a autoridade apontada como coatora, pois a legitimidade é definida na pessoa que pratica ou ordena concreta e especificamente a execução do ato impugnado, como na hipótese vertente” (STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.366.994/CE, Rel. Min. Castro Meira, ac. 16.05.2013, DJe 24.05.2013). 256 STJ, Corte Especial, MS 3.313/DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac. 26.05.1994, RSTJ 77/22; STJ, 1ª T., REsp 128.752/RS, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 07.11.1997, RSTJ 110/85. Nesse sentido, dispõe o § 3º, do art. 6º, da Lei 12.016: “Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática”. “O ato administrativo geral, abstrato e impessoal não enseja mandado de segurança. Equipara-se, porque espécie, à lei em tese. Cumpre ser concreto, incidente em relação jurídica determinada. Só assim resta configurado dano ou perigo a direito público subjetivo. Impõe-se, pelo menos, probabilidade de prejuízo. Não basta a mera possibilidade” (STJ, 1ª Seção, MS 551/ DF, Rel. Min. Vicente Cernichiaro, ac. 11.12.1990, DJU 04.03.1991, p. 1.958). “Considera-se autoridade coatora: quem ordena manifestamente, ainda que incompetente para a sua prática (RSTJ 96/376) ou omite a prática do ato impugnado, e não o superior que recomenda ou baixa normas para sua execução (STJ, 1ª T., REsp 62.174, Min. Demócrito Reinaldo, j. 7.6.95, DJU 14.8.95; RJTJESP 90/229, JTJ 142/283)” (NEGRÃO, Theotônio, et alĊódigo de Processo Civil e legislação processual em vigor. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 1.287). É autoridade coautora “aquela que detenha poderes para corrigir a suposta ilegalidade cometida” (STJ, 3ª T., RMS 17.555/PI, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 16.03.2004, DJU 22.02.2005, p. 317). 257 “Pode-se, então, concluir que a Lei nº 12.016/2009 solucionou a questão, ao prever como autoridade coatora primária legitimada passiva do pedido de segurança aquela que pratica objetiva e imediatamente o ato coator ou, em segunda legitimação (alternativa), a que tenha determinado a prática desse mesmo ato” (MAIA FILHO, Napoleão Nunes. Sobre a petição inicial do mandado de segurança. Comentários críticos ao art. 6º da Lei nº 12.016/09. Revista CEJ, Brasília, ano XIII, n. 47, p. 18). 258 Súmula nº 266 do STF; STF, Pleno, AgRg no MS 21.881, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 03.03.1994, RTJ 158/103; STF, Pleno, AgRg no MS 22.035/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 21.10.1994, RTJ 161/164; STJ, 1ª Seção, MS 119/DF, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 13.06.1989, RSTJ 04/1.432. 259 STJ, 1ª T., REsp 72.751/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 13.06.1996, RSTJ 90/78; STJ, 2ª T., ROMS 775/SP, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 18.11.1991, RSTJ 27/212; STF, Pleno, MS 21.126/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 08.11.1990, RTJ 133/1126; STF, Pleno, MS 21.274/ DF, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 10.02.1994, RTJ 158/72. 260 MONNERAT, Carlos Fonseca; VERÍSSIMO, Marcos Neves. Primeiras impressões sobre o novo mandado de segurança – Lei 12.016/2009. Rev. de Processo, n. 182, p. 218. 261 Idem, ibidem.

MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandadode segurança e ações constitucionais. 32. ed. atualizada de acordo com a Lei nº 12.016/2009. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 31: “Exemplificando: o porteiro é um agente público, mas não é autoridade; autoridade é o seu superior hierárquico, que decide naquela repartição pública. O simples executor não é coator em sentido legal; coator é sempre aquele que decide, embora muitas vezes também execute sua própria decisão, que rende ensejo à segurança. Atos de autoridade, portanto, são os que trazem em si uma decisão, e não apenas execução” (op. cit., loc. cit.). 263 A jurisprudência, por exemplo, releva a impropriedade da inicial quando o correto responsável pelo ato administrativo só vem a ser revelado nas informações da autoridade dita coatora (STJ, 2ª T., AgRg no Ag 55.002-8/MS, Rel. Min. Antônio Pádua Ribeiro, ac. 17.10.1994, DJU 14.11.1994, p. 30.951). Isto também se dá no caso em que a autoridade nomeada pelo impetrante nega sua participação no ato impugnado, mas como superior hierárquico do verdadeiro agente defende o ato deste, encampando-o nas informações prestadas em juízo (STJ, 5ª T., RMS 9.504/CE, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac. 16.09.1999, RSTJ 132/504). 264 CPC/1973, art. 267, VI. 265 STJ, 2ª T., REsp 1.190.165/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 15.06.2010, DJe 1º.07.2010. No Mesmo sentido: STJ, 2ª T., EDcl no AREsp 33.387/PR, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 07.02.2012, DJe 13.02.2012 (Falou-se no acórdão em erro grosseiro). 266 CAVALCANTI, Marcos de Araújo. A legitimidade passiva para o mandado de segurança: uma proposta de interpretação da Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, n. 108, 2012, p. 76. 267 STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 368.159/PE, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 01.10.2013, DJe 09.10.2013. Ainda no regime da lei anterior, o STJ já tinha pronunciamentos no mesmo sentido: “Mandado de segurança (recurso ordinário). Autoridade coatora (indicação errônea). Emenda da inicial (possibilidade)” (STJ, 6ª T., RMS 20.193/DF, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 03.08.2006, DJU 05.02.2007, p. 381). Jurisprudência antiga do STF, no entanto, era “firme (...), no sentido de não admitir que o Juiz, ou Tribunal, entendendo incorreta a indicação da autoridade coatora, pelo impetrante, corrija o equívoco deste, ‘ex officio’, indicando, ele próprio, a autoridade apontável como coatora” (STF, 1ª T., RMS 22.496/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, ac. 20.08.1996, DJU 25.04.1997, p. 15.217). 268 STJ, 4ª T., RMS 45.495/SP, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 26.08.2014, DJe 20.10.2014. 269 Justifica-se a correção pelo juiz da autoridade coatora, quando cabível, pela situação de ser a parte passiva do mandado de segurança a pessoa jurídica em cujo nome o ato foi praticado. E pelo reconhecimento de que, estando correta a nomeação desta, na maioria das vezes, “não é possível reclamar da parte o conhecimento da complexa estrutura da Administração Pública, de forma a precisar quem será a pessoa investida de competência para corrigir o ato coator” (STJ, 1ª T, REsp 547.235/RJ, Rel. Min. José Delgado, ac. 18.12.2003, DJU 22.03.2004, RP 118/267 e RP 129/196; STF, Pleno, MS 21.268/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.12.1991, RTJ 139/133). 270 STF, 2ª T., RE 76.159/SP, Rel. Min. Leitão de Abreu, ac. 23.09.1975, RTJ 76/506; STJ, 1ª Seção, MS 8.446/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 09.10.2002, DJU 19.05.2003, p. 116; STJ, 3ª Seção, MS 11.727/DF, Rel. Min. Maria Thereza, ac. 27.09.2006, DJU 30.10.2006, p. 238. “São três os requisitos para a aplicação da teoria da encampação no mandado de segurança: 262

existir vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; não haver modificação de competência estabelecida na Constituição Federal; e ter havido manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas. Precedente da Primeira Seção: MS 10.484/DF” (STJ, 2ª T., RMS 22.383, Rel. Min. Castro Meira, ac. 09.09.2008, DJe 29.10.2008; STJ, 1ª T., RMS 21.809/DF, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 11.11.2008, DJe 15.12.2008. 271 Há jurisprudência sobre a Súmula nº 59 na RTFR 79/235. Embora não haja completa identidade entre as duas situações, a orientação que prevalece em face das deliberações dos Conselhos de Contribuintes recebe, em matéria de mandado de segurança, tratamento semelhante ao dos atos normativos das autoridades fiscais, qual seja: deve-se considerar autoridade coatora, para efeito de mandado de segurança, quem ordena manifestamente (ainda que incompetente) a prática do ato, “e não o superior que recomenda ou baixa normas para sua execução” (STJ, 1ª T., REsp 62.1747/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 07.06.1995, DJU 14.08.1995); ou, mais especificamente, aquele que, em matéria tributária, “pratica o ato considerado lesivo ao direito do contribuinte, não aquele que expediu Resolução de caráter genérico e abstrato” (STJ, 2ª T., REsp 1.485/RJ, Rel. Min. Hélio Mosimann, ac. 06.03.1991, DJU 08.04.1991, p. 3.869). 272 No RMS 29.733/DF, a 5ª Turma do STJ manteve a tese de que prevalece naquela Corte a compreensão de que, estando em discussão ato a ser praticado pela Administração em consequência de decisão de Tribunal de Contas, o mandado de segurança deve indicar como autoridade coatora o seu Presidente, e não o mero executor material da determinação acoimada de ilegal (STJ, 5ª T., RMS 29.733/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, ac. 20.10.2009, DJe 02.08.2010). No mesmo sentido decidiu a 6ª Turma: STJ, AgRg no RMS 20.175/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 24.11.2009, DJe 14.12.2009; STJ, 6ª T., RMS 27.666/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 06.08.2009, DJe 07.12.2009; STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 16.270/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 10.10.2012, DJe 19.10.2012; STJ, 1ª T., AgInt no REsp. 1.293.431/DF, Rel. Min. Regina Helena Costa, ac. 19.09.2017, DJe 27.09.2017. 273 STJ, 1ª T., AgRg no Ag 1.397.677/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 23.04.2013, DJe 26.04.2013. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., AgRg no RMS 28.860/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, ac. 19.09.2013, DJe 25.09.2013. 274 Por exemplo, banco estatal pode sujeitar-se ao mandado de segurança se o ato praticado puder ser considerado próprio de Poder Público (licitação, arrecadação de tributo etc.). Já na contratação das operações bancárias comuns, não incidiria o mandado de segurança (AL-MEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 91). 275 “Súmula 510, STF: Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial”. 276 CRUZ, Luana Pedroso de Figueiredo. Comentário ao art. 1º da Lei 12.016. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários a nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: RT, 2009. p. 31. No mesmo sentido, lição de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO: “com relação às entidades particulares cabe mandado de segurança quando atuem por delegação e nos limites da delegação; quando exerçam atividades que nada têm a ver com essa delegação, não cabe o mandado de segurança. Além disso, se exercem atividades autorizadas, com base no poder de

polícia do Estado, que não se inserem entre as atividades próprias do Poder Público, também não cabe essa medida. É o que ocorre com os serviços de táxi, hospitais particulares, estabelecimentos bancários, companhias de seguro” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 861). 277 STJ, 1ª T., RMS 32.880/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.09.2011, DJe 26.09.2011. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 40.367/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.08.2013, DJe 13.08.2013. Nesse sentido, decidiu o STF que o mandado de segurança impetrado contra ato do Conselho Curador do FGTS presidido pelo Ministro do Trabalho não era da competência do STJ, e sim do Juízo Federal de Primeira Instância (STF, Pleno, RMS 21.560/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 24.11.1992, DJU 18.12.1992, p. 24.375). 278 STJ, 1ª Seção, Rcl 1.887/ES, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 22.11.2006, DJU 18.12.2006, p. 280. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, MS 14.670/DF, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 09.12.2009, DJe 18.12.2009. 279 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 72. 280 STJ, 1ª T., REsp 789.749/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 17.05.2007, DJU 04.06.2007, p. 310. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 683.668/RS, Rel. p/ ac. Min. Luiz Fux, ac. 04.05.2006, DJU 25.05.2006, p. 161; STJ, 1ª T., AgRg no REsp. 1.055.631/RN, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 04.09.2008, DJe 15.09.2008. 281 O mandado de segurança apreciado no REsp 789.749/RS tinha como objetivo a licitação para compra de aparelhagem de “um sistema de gravação digital de voz multicanal”, ato que foi qualificado como “ato de império”, consubstanciando, pois, “ato administrativo sujeito às normas do direito público”. Aliás, arrematou o acórdão, “essa é a ratio essendi da jurisprudência pacífica da Turma que equipara, para fins de improbidade administrativa, atos de particular” (STJ, REsp 789.749/RS, cit.). 282 STJ, 2ª T., AgRg no AgRg no REsp 1.270.179/AM, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 15.12.2011, DJe 03.02.2012. 283 STJ, 2ª T., EDcl no AgRg no REsp 1.195.927/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 17.03.2011, DJe 04.04.2011. 284 KLEIN, Aline Lícia. Mandado de segurança contra omissão e contra ato de gestão. İnformativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 30, ago. 2009. Disponível em: . Acesso em: 2 set. 2009; Sumula nº 333 do STJ: “Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública”. 285 KLEIN, Aline Lícia. Op. cit., loc. cit. 286 STJ, 6ª T., REsp 278.052/PR, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 26.02.2002, DJU 15.04.2002, p. 269. 287 STJ, 1ª T., REsp 1.078.342/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 09.02.2010, DJe 15.03.2010. 288 “O dirigente de empresa pública ou sociedade de economia mista (pessoas qualificadas como de Direito Privado), ainda quando sejam elas meramente exploradoras de atividade econômica, também pode ser enquadrado como ‘autoridade’ no que concerne a atos expedidos para cumprimentos de normas de Direito Público (grifamos) a que tais entidades estejam obrigadas,

como exempli gratia, os relativos às licitações públicas que promovam” (STJ, 2ª T, REsp 533.613/RS, Rel. Min. Franciulli Netto, DJU 03.11.2003, p. 312. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 598.534/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac 01.09.2005, DJ 19.09.2005, p. 264). Em doutrina, ver CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. Op. cit., p. 36-37; MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Ċurso de direito administrativo. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998. p. 339-340; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 114-115. 289 Súmula nº 510 do STF: “Praticado o ato por autoridade no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial”; STJ, 1ª T., REsp 400.902/GO, Rel. Min. José Delgado, ac. 26.03.2002, RSTJ 157/129. 290 Cumpre distinguir a atividade delegada da atividade autorizada pelo Poder Público. “Diz-se que a atividade é delegada quando a Administração atribui ao particular um serviço, por natureza, público; será atividade autorizada aquela que, por natureza, é atividade privada, mas que, por ser de interesse público, está sob fiscalização. Contra ato de atividade autorizada não cabe mandado de segurança, porquanto é ela, na verdade, particular, por exemplo, contra bancos privados nessa condição” (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. III, nº 80, p. 308). 291 O representante judicial, a ser citado nos casos de atos praticados por exercentes de funções delegadas pelo Poder Público, não é o órgão representativo da entidade pública, porque no mandado de segurança a parte passiva será o concessionário ou o delegatário que houver praticado o ato impugnado, e não o poder público (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, n. 159, p. 155). “Compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato de dirigente de instituição particular de ensino superior no exercício de suas funções, uma vez que se trata de ato de autoridade federal delegada” (STJ, 2ª T., REsp. 661.404/DF, Rel. Min. Carlos Fenando Mathias, ac. 21.02.2008, DJe 01.04.2008). 292 STJ, 1ª Seção, CC 7.308/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 26.04.1994, DJU 23.05.1994, p. 12.532. 293 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000. p. 350. 294 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 351. 295 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 367. 296 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 177. 297 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 368-369. 298 STJ, 1ª T., REsp 429.849/RS, Rel. p/ ac. Teori Albino Zavascki, ac. 09.09.2003, DJU 10.11.2003, p. 159. 299 “Inteligência do art. 19 da Lei n.º 1.533/51. Não se admite assistência em processo de mandado de segurança” (STF, Pleno, MS 24.414/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 03.09.2003, DJU 21.11.2003, p. 9). Por isso, não se tolerando “a intervenção voluntária de terceiro, ‘ad coadjuvandum’, na condição de assistente no processo de mandado de segurança” (STF, Pleno, MS 26.552, AgAgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 22.11.2007, DJe 16.10.2009), também não será

admissível a intervenção de “amicus curiae” (STF, Pleno, RE 575.093, AgR/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 09.12.2010, DJe 11.02.2011). “É majoritário o entendimento dos Tribunais Superiores no sentido de que não cabe ingresso de terceiro na qualidade de assistência simples em mandado de segurança” (STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 15.321/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 28.08.2013, DJe 03.09.2013). No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, EREsp 278.993/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 09.06.2010, DJe 30.06.2010. 300 Mantovanni Colares Cavalcante é daqueles que afastam o cabimento da assistência no procedimento do mandado de segurança (CAVALCANTE, Mantovani Colares. Mandado de segurança. São Paulo: Dialética, 2002, p. 192-193). Pelo cabimento, entretanto, é a corrente doutrinária majoritária: CARNEIRO, Athos Gusmão. Mandado de segurança, assistência e amicus curiae. Revista Forense, n. 371, p. 73-78, jan/ 2004; FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 132; MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 31. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 72-74; BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 246; BUENO, Cassio Scarpinella. Mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 167-170. Em posição intermediária, defendendo o cabimento pelo menos da assistência litisconsorcial, porque equiparada ao litisconsórcio: TEIXEIRA, Guilherme Freire de Barros. A assistência e a nova Lei do Mandado de Segurança. Revista de Processo, n. 183, p. 239-256, maio/ 2010. 301 CPC/73, art. 51. 302 STF, Pleno, MS 24.414/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 03.09.2003, DJU 21.11.2003, p. 9. 303 CPC/73, art. 54. 304 CPC/73, arts. 56 a 61. 305 CPC/73, arts. 70 a 80. 306 “Mandado de segurança. Intervenção de terceiro. Ante o objeto limitado do mandado de segurança, presente interesse subjetivo peculiar, é inadmissível a intervenção de terceiro na relação processual” (STF, RE 575.093 AgR, cit.). 307 “Não se revela juridicamente possível a invocação da Lei nº 9.868/99 (art. 7º, § 2º) para justificar o ingresso de terceiro interessado, em mandado de segurança, na condição de ‘amicus curiae’” (STF, Pleno, MS 26.552 AgR AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 22.11.2007, DJe 16.10.2009). 308 “Recurso ordinário em mandado de segurança. Julgamento. Intervenção de amicus curiae Descabimento” (STJ, 1ª Seção, AgRg no RMS 29.475/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 26.10.2011, DJe 08.11.2011). 309 “Comporta acolhimento o pleito de ingresso de terceiro no processo sob a perspectiva do instituto do amicus curiae, quando a medida tiver respaldo em precedente do STF” (STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 12.459/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 24.10.2007, DJU 03.12.2007, p. 249). 310 CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 8586. 311 Cf. BUENO, Cássio Scarpinella. Amicus curiae no processo civil brasileiro – um terceiro enigmático. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 508. 312 CÂMARA, Alexandre Freitas. Op. cit., p. 86.

DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 154. O parágrafo único do referido artigo estende a possibilidade interventiva em questão a todas as pessoas jurídicas de direito público. 314 STJ, 1ª Seção, AgRg nos EDcl no CC 89.783/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 09.06.2010, DJe 18.06.2010. No mesmo sentido: “A jurisprudência desta Corte considera imperiosa a demonstração da presença de interesse jurídico da União para fins de deslocamento da competência para a Justiça Federal, pois, para tanto, não se mostra suficiente o mero interesse econômico” (STJ, 1ª T., AgInt no REsp. 1.361.769/CE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 20.10.2016, DJe 08.11.2016). 313

Capítulo III AUTORIDADE COATORA FEDERAL Art. 2º. Considerar-se-á federal a autoridade coatora se as consequências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada. Referências legislativas: CF, Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente (...) d) o “habeas corpus”, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o “habeas data” contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal. CF, Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I – processar e julgar, originariamente: (...) b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal. CF, Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais; I – processar e julgar, originariamente: (...) c) os mandados de segurança e os “habeas data” contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal. CF, Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) VIII – os mandados de segurança e os “habeas data” contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais. CF, Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (...) IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição. CF, Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça. Código Eleitoral, Art. 22. Compete ao Tribunal Superior: I – Processar e julgar originariamente: (...) e) o habeas corpus ou mandado de segurança, em matéria eleitoral, relativos a atos do Presidente da República, dos Ministros de Estado e dos Tribunais Regionais; ou, ainda, o habeas corpus, quando houver perigo de se consumar a violência antes que o juiz competente possa prover sobre a impetração. Código Eleitoral, Art. 29. Compete aos Tribunais Regionais: I – processar e julgar originariamente: (...) e) o habeas corpus ou mandado de segurança, em matéria eleitoral, contra ato de autoridades que respondam perante os Tribunais de Justiça por crime de responsabilidade e, em grau de recurso, os denegados ou concedidos pelos juízes eleitorais; ou, ainda, o habeas corpus quando houver perigo de se consumar a violência antes que o juiz competente possa prover sobre a impetração. Súmulas: Súmula nº 248/STF: É competente, originariamente, o Supremo Tribunal Federal, para mandado de segurança contra ato do tribunal de contas da união. Súmula nº 330/STF: O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer de mandado de segurança contra atos dos tribunais de justiça dos estados. Súmula nº 433/STF: É competente o tribunal regional do trabalho para julgar mandado de segurança contra ato de seu presidente em execução de sentença trabalhista. Súmula nº 510/STF: Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial.

Súmula nº 511/STF: Compete à Justiça Federal, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas entre autarquias federais e entidades públicas locais, inclusive mandados de segurança, ressalvada a ação fiscal, nos termos da Constituição Federal de 1967, art. 119, § 3º (CF/1988, art. 109, I). Súmula nº 623/STF: Não gera por si só a competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer do mandado de segurança com base no art. 102, I, “n”, da Constituição, dirigir-se o pedido contra deliberação administrativa do tribunal de origem, da qual haja participado a maioria ou a totalidade de seus membros. Súmula nº 624/STF: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais. Súmula nº 627/STF: No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do presidente da república, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento. Súmula nº 736/STF: Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores. Súmula nº 41/STJ: O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de outros tribunais ou dos respectivos órgãos. Súmula nº 177/STJ: O Superior Tribunal de Justiça é incompetente para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de órgão colegiado presidido por ministro de estado. Súmula nº 206/STJ: A existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das leis de processo. Súmula nº 333/STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública.

Comentários ao art. 2º 25. A AUTORIDADE COATORA FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL O objetivo da regra contida no art. 2º da Lei nº 12.016 é o de delimitar a competência da Justiça Federal em matéria de mandado de segurança, e, para tanto, procedeu à definição do que seria “autoridade federal coatora”, como ponto de partida para a definição do juízo a que seria atribuído o processamento e julgamento do referido writ. De início, o que se deduz, facilmente, do artigo sub examine é que quem sempre suporta as consequências da ilegalidade ou do abuso de poder, atacados pelo mandado de segurança, “é a pessoa jurídica e não a pessoa física que exerce função pública em seu nome”. Desse modo, “sendo a responsabilidade de pessoa jurídica federal, a autoridade é federal”1. Esse dado é muito importante, porque, em se tratando de mandado de segurança, a competência é sempre definida em função da autoridade que praticou o ato impugnado. Logo, é com apoio na qualificação da autoridade que se firmará a competência da Justiça Federal, ou da Justiça Estadual, ou, ainda, de alguma Justiça especializada. Há, porém, casos em que a regra geral da competência em função da autoridade coatora cede

perante a existência de foro especial ou privilegiado conferido ao impetrante. Assim, está definido pelo Supremo Tribunal Federal que prevalece a competência constitucional da Justiça Federal estabelecida para todas as causas em que sejam parte a União e suas autarquias, mesmo que o caso seja de mandado de segurança contra autoridade estadual ou municipal. A jurisprudência da Suprema Corte consta do enunciado de sua Súmula nº 511: “Compete à Justiça Federal, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas entre autarquias federais e entidades públicas locais, inclusive mandados de segurança...”2.

26. AUTORIDADE COATORA EM GERAL E AUTORIDADE COATORA FEDERAL Em dois momentos a Lei nº 12.016 cuida de definir a autoridade coatora3, dado de significado importante, visto que é em função dele que se define, como já ressaltado, o juízo competente para o processamento do mandado de segurança: a)

No art. 1º, caput, identifica-se a autoridade coatora em termos amplos, ou seja, como autoridade pública, “seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”. Além dos agentes da administração pública direta, o § 1º equipara, à autoridade primária, “os administradores das entidades autárquicas,” bem como os dirigentes das pessoas de direito privado que exerçam atribuições do poder público, como as empresas públicas, as sociedades de economia e as concessionárias de serviço público, mas apenas nos limites das atribuições delegadas.

b)

No art. 2º, define-se a autoridade coatora federal como sendo aquela que pratica o ato impugnado cujas consequências “houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada”.

Observa-se, desde logo, uma diferença entre a conceituação genérica da autoridade coatora feita pelo art. 1º e §§ e a da autoridade coatora federal formulada pelo art. 2º: (i) Para a configuração genérica dos equiparados à autoridade pública (a ser observada no âmbito da Administração estadual, distrital e municipal), basta que o ato impugnado tenha se passado no âmbito das “atribuições do poder público” conferidas ao ente da administração indireta (art. 1º, § 1º). (ii) Já para configurar a autoridade federal, o ato do administrador da entidade com atribuições do poder público, para determinar a competência da Justiça Federal para conhecer do mandado de segurança, deverá gerar consequências patrimoniais a serem suportadas “pela União ou entidade por ela controlada” (art. 2º)4. O que se pode deduzir das duas regras legais é que não basta que o concessionário ou delegatário tenha recebido a outorga de poderes da União; a autoridade coatora somente será federal

se houver repercussão patrimonial do ato impugnado a ser suportada pela União ou entidade por ela controlada (autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação federal)5. Esse requisito, todavia, não é o único. Para que o mandado de segurança se torne cabível perante a Justiça Federal é preciso que, antes, se refira a ato praticado, por administrador de pessoa jurídica não integrante da administração pública direta, dentro das atribuições públicas que lhe foram confiadas. O art. 1º, § 1º, aplica-se, nesse passo, tanto no terreno da Administração da União, como no dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Em síntese: a)

Contra os atos de empresas de direito privado, só cabe mandado de segurança, em relação aos praticados no exercício de atos do poder público. Fora do âmbito federal, a lei não exige que o ato impugnado resulte, obrigatoriamente, em efeitos patrimoniais para as pessoas jurídicas de direito público. A competência será, naturalmente, da justiça estadual, para o processamento do mandado de segurança de qualquer empresa privada que exerça atividade de poder público, ou delegação ou concessão.

b)

Contra atos de instituições ligados à Administração Federal, só se configurará ato de autoridade federal, e consequente competência da Justiça Federal, se os efeitos patrimoniais houverem de ser suportados pela União ou por entidade por ela controlada6. O concessionário de um serviço público federal, por exemplo, não será tratado, para efeito do mandado de segurança, como autoridade federal, se a invalidação do ato impugnado se limitar a produzir efeitos sobre a esfera patrimonial do impetrado, sem reflexo algum sobre a União ou entidade por ela controlada. A competência, portanto, será da Justiça Estadual, e não da Justiça Federal7. Mas, se o serviço público federal for delegado a uma sociedade de economia mista ou a uma empresa pública controlada pela União, o mandado de segurança se incluirá na competência da Justiça Federal, muito embora se trate de pessoas jurídicas de direito privado, jurisdicionadas, nas ações comuns, pela Justiça Estadual.

c)

Em todos os casos de administrador de pessoas jurídicas e de pessoas naturais equiparados legalmente à autoridade pública, para efeito de mandado de segurança, o remédio constitucional só será cabível, seja na Justiça Federal, seja na estadual, se o ato impugnado se contiver nos limites da atividade de poder público conferida, nunca se estendendo aos atos de gestão comercial regidos exclusivamente pelo direito privado (art. 1º, § 2º).

27. AUSÊNCIA DE EFEITOS PATRIMONIAIS PARA A UNIÃO Como já afirmado, o art. 2º da Lei nº 12.016 só considera autoridade coatora federal, para fins de competência da Justiça Federal em matéria de mandado de segurança, no caso em que os efeitos

patrimoniais do ato atacado devam ser suportados pela União ou por entidade por ela controlada. Disso decorre que é indiferente a fonte de concessão de serviço público à pessoa jurídica de direito privado. Se o impetrante questiona ato cuja repercussão patrimonial fica restrita à concessionária, a competência não será da Justiça Federal, e sim da Justiça Estadual. Em caso, por exemplo, de mandado de segurança contra concessionária da União, de serviços de distribuição de energia elétrica, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a impugnação do ato que determinou o corte no fornecimento por falta de pagamento não tem o condão de repercutir patrimonialmente na esfera da União, e, consequentemente, não induz competência da Justiça Federal. Eis a conclusão do arresto: “Considera-se federal, nos termos do art. 2º da Lei n. 1.533/51 [correspondente ao art. 2º da nova Lei do Mandado de Segurança], a autoridade coatora quando as possíveis consequências de ordem patrimonial, advindas da anulação do ato atacado pelo mandamus, houveram de ser suportadas pela União Federal ou pelas entidades autárquicas federais. Inexistindo, na hipótese, referidos efeitos patrimoniais, a competência para processar e julgar o mandado de segurança é da Justiça estadual”8. Como se vê, em matéria de concessionária não importa se a concessão foi feita pela União. O mandado de segurança somente se incluirá na competência da Justiça Federal se o ato da concessionária tiver repercussão patrimonial na esfera da União ou de alguma entidade por ela controlada (autarquia, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação federal).

28. A JURISPRUDÊNCIA SOBRE OS CONCESSIONÁRIOS DE SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL E A COMPETÊNCIA PARA O MANDADO DE SEGURANÇA Desde a Lei nº 1.533/1951 (art. 2º), o conceito legal de autoridade pública federal, para efeito de determinação da competência para o mandado de segurança, é feito a partir das consequências patrimoniais que do ato impugnado possam advir para a União ou as entidades autárquicas federais. A Lei nº 12.016/2009 (art. 2º) manteve esse critério de relacionar a competência do writ às referidas consequências patrimoniais, mas, em lugar de vinculá-las às autarquias federais, o fez em face da União “ou entidade por ela controlada”. Antiga jurisprudência do STJ, formada em torno das concessionárias de serviços federais de energia elétrica e de telefonia, considerava que os mandados de segurança, in casu, seriam da competência da Justiça Estadual (e não da Federal), justamente porque não se divisava “comprometimento patrimonial no âmbito da União em caso de eventual procedência do pedido”9, e, por isso, inocorria a “hipótese do art. 109, I, da CF”. Em outras palavras, entendia-se que o mandado

de segurança contra concessionária federal deveria ser apreciado pela justiça local, uma vez que de seu julgamento nenhum reflexo decorreria sobre direito da União10. No entanto, a certa altura, o posicionamento daquela Corte mudou de rumo, passando a tratar como “autoridade federal” também “o agente de empresa concessionária de serviços públicos de energia elétrica, quando pratica o ato no exercício de função federal delegada”. O critério que passou a prevalecer (em lugar dos “efeitos patrimoniais”) foi o do poder concedente, de modo que, tendo sido o serviço concedido pela União, o mandado de segurança teria de ser atribuído à Justiça Federal11. Com todo o respeito que merece a tese firmada pelo STJ, não vemos como compatibilizá-la com a definição legal de “autoridade federal” (Lei nº 12.016, art. 2º), tampouco com a jurisprudência sumulada do STF (Súmula nº 510). Se a empresa concessionária é uma pessoa jurídica de direito privado, que exercita em nome próprio o serviço público delegado, e o faz sob sua inteira responsabilidade, sem que seus atos produzam reflexos patrimoniais a serem suportados pela União ou seus entes da administração indireta, não há como enquadrar tal delegatária na categoria de “autoridade federal”, tal como a define o art. 2º da Lei do Mandado de Segurança. Além do mais, se o Supremo Tribunal define que, nos casos de competência delegada, o mandado de segurança deve ser movido contra o delegatário, e não contra o delegante (Súmula nº 510/STF), como atribuir uma qualidade de quem (o delegante) não é sujeito do processo (a título algum) àquele que realmente é o agente vinculado à ação mandamental (o delegatário), e que, de forma alguma, se acha submetido ao controle administrativo do concedente? A lei, quando definiu a “autoridade federal”, para determinar a competência do mandado de segurança, não o fez em função do serviço público desempenhado pelo praticante do ato impugnado, mas, textualmente, se reportou, com exclusividade, aos necessários reflexos na esfera patrimonial da União ou de entidade por ela controlada. Ora, a invalidação ou desconstituição de um ato praticado pela concessionária não tem aptidão alguma para gerar efeitos patrimoniais a serem suportados pela União; e a entidade de direito privado, que praticou o ato – e que haverá de suportar todas as consequências da eventual sentença do mandado de segurança –, não se acha sob controle jurídico do poder concedente. Não há, enfim, como subsumir a concessionária na conceituação legal de “autoridade federal”. E se não é possível o seu enquadramento na definição do art. 2º da Lei nº 12.016, não será, data venia, pelo serviço delegado que se poderá defini-la como “autoridade federal”, submetendo-a à jurisdição da Justiça Federal. É ainda de se lembrar que a competência da Justiça Federal deriva de regra da Constituição, que a define ratione personae e a delimita às “causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes” (CF, art. 109, I). Se a concessionária (sujeito passivo do mandado de segurança) não é “entidade

autárquica”, nem “empresa pública federal”, e tampouco gera, com seus atos, responsabilidade patrimonial para a União, parece evidente que lhe falta legitimidade para ser demandada no foro da Justiça Federal, seja pela regra básica da Constituição, seja pela equiparação permitida pela Lei do Mandado de Segurança. Se o art. 2º da Lei nº 12.016 permite que uma empresa de direito privado responda por mandado de segurança na Justiça Federal, não é por ser delegatária de serviço público concedido pela União, mas porque do ato impugnado haverá de resultar efeitos patrimoniais a serem suportados pela União. Sem tais reflexos, o ato da concessionária estará sob a jurisdição da Justiça Estadual, seja a impugnação feita pelas vias ordinárias, seja por meio do mandado de segurança. A jurisprudência atual do STJ, a propósito do mandado de segurança contra ato de concessionária de serviço público federal, não é coerente com outros posicionamentos que adota em relação a delegações e repasses feitos por meio de convênios da União com Estados e Municípios, em que a competência da Justiça Federal é negada por falta de interesse direto da União na gestão local sobre os recursos federais repassados12. Nestes e em casos semelhantes, o interesse da União seria apenas reflexo, o que a jurisprudência do STJ corretamente considera insuficiente para justificar a competência da Justiça Federal13. Esse conflito jurisprudencial instalado no seio do STJ reclama por um melhor equacionamento. Deve-se levar em conta que a concessão de serviço público é modalidade de delegação de atividade do Poder Público e que as delegações podem ocorrer em níveis diferentes. Como ensina THEMÍSTOCLES CAVALCANTI, há delegações plenas e delegações com reserva. No primeiro caso, o delegatário assume por inteiro o serviço público delegado e contrai toda a responsabilidade dele derivada. Nas delegações limitadas, o poder delegante, embora permita o exercício de atividade pública por estranho a seu quadro funcional, o faz reservando para si o controle hierárquico sobre o delegatário e contraindo responsabilidade pelos seus atos14. Pense-se no caso dos serviços notariais e registrais, que são naturalmente públicos, e que são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público (CF, art. 236). Eis aí um exemplo de delegação plena, em que o delegatário exerce com ampla autonomia a atividade delegada, isentando o Estado de responsabilidade por seus atos, embora se trate, sem dúvida, de atos próprios do Poder Público15. A jurisprudência do STF reconhecia a autonomia do delegatário e a ausência de responsabilidade do Poder Público16. Entretanto, posteriormente, o entendimento foi alterado no sentido de que “o Estado responde objetivamente pelos atos dos notários que causem dano a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa”17. Em razão da divergência, em 2014, o STF reconheceu a existência de repercussão geral a respeito da questão constitucional suscitada, para que se decida o caráter primário, solidário ou subsidiário da responsabilidade estatal na espécie.18 O Ministro Relator, Luiz Fux, explicou a repercussão geral, nos seguintes termos:

“O thema decidendum versado nos autos diz respeito, em síntese, a saber qual a extensão da responsabilidade civil dos tabeliães e oficiais de registro por danos causados a terceiros no exercício de suas funções: se direta ou subsidiária, e se subjetiva ou subjetiva [sic]. É salutar que se pacifique, no âmbito desta Corte, a controvérsia sobre qual a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados pelos seus delegatários. Com efeito, é preciso definir, à luz dos arts. 37, § 6º, e 236 da CRFB/88, qual o tipo de responsabilidade civil que rege a atuação dos tabeliães e notários (se objetiva ou subjetiva), além de saber se o Estado membro aos quais estes agentes se acham vinculados deve responder em caráter primário, solidário ou subsidiário em relação aos delegatários”. Embora reconhecida a repercussão geral, a questão constitucional ainda não foi decidida pelo STF. Em relação ao tema, atualmente, o STJ vem entendendo subsidiária a responsabilidade do ente estatal: “Vencida a preliminar, no mérito verifica-se que a tese recursal é procedente. Com efeito, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, nos casos de danos resultantes de atividade estatal delegada pelo Poder Público, há responsabilidade objetiva do notário, nos termos do art. 22 da Lei 8.935/1994, e apenas subsidiária do ente estatal. Precedentes: AgRg no AREsp 474.524/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 18/06/2014; AgRg no AgRg no AREsp 273.876/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24/5/2013; REsp 1.163.652/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1º/7/2010”19. Já quando se trata de delegação federal, como no caso da taxa rodoviária única, cuja cobrança era feita pelo Estado, embora se tratasse de tributo da União, a competência para o mandado de segurança se conservava na Justiça Federal20. Por outro lado, há inúmeros serviços públicos terceirizados, como os de transporte de funcionários, os de manutenção e operação de sistema eletrônico de comunicação e processamento de dados, os de limpeza e segurança de edifícios públicos, os de conservação e reparos da frota de veículos, os de saúde, e tantos outros, sobre os quais o Poder Público exerce controle direto e pelos quais se mantém responsável, sem embargo de serem prestados por entidades estranhas ao serviço público oficial21. Quanto às delegações plenas, não se mantém a competência do mandado de segurança vinculada à autoridade delegante, como reconhece a jurisprudência: “A competência originária do STJ, quando a autoridade é Ministro de Estado”, desaparece se o caso é de delegação de função: “ato praticado

por delegatário não atrai a competência do STJ”22. As concessionárias de serviço público, obviamente, não se enquadram na espécie de delegações sob reserva, visto que exercem, com autonomia, a atividade pública que lhes foi transferida, e, de forma alguma, acarretam, por seus atos, a responsabilidade do Poder Público. O quadro jurídico é, pois, similar ao da delegação dos serviços notariais e registrais. Logo, o sujeito passivo do mandado de segurança acaso impetrado contra ato de delegatário dos serviços cartorários como do concessionário de serviços públicos em geral nunca será o Poder concedente. A autoridade coatora só poderá ser o titular do cartório ou administrador da empresa concessionária23. Se essas pessoas não atuam em nome do Estado, mas sim em nome do ente em cuja direção se acham, não há como qualificá-las como autoridade vinculada a alguma pessoa jurídica de direito público. Se o Poder concedente for a União ou alguma autarquia federal – pouco importa –, não poderão ser elas classificadas como autoridade federal, pela dupla razão de que não atuam em nome e sob o comando do Poder concedente, e não geram, por seus atos autônomos, responsabilidade alguma que possa ser exigida diretamente da entidade pública delegante. A jurisprudência do STJ, portanto, ao considerar o dirigente de pessoa jurídica de direito privado concessionária de serviço público federal, nas relações com os usuários, como “autoridade federal”, só pode ser acatada quando, in concreto, existir cláusula na concessão que mantenha sob controle hierárquico do concedente a atividade delegada e que o faça responsável pelos atos praticados no exercício dos serviços concedidos à empresa privada. Aí, sim, no caso de mandado de segurança contra ato do administrador da concessionária de serviço público federal, se poderá divisar uma atuação de “autoridade federal”, visto que os efeitos da ação mandamental, se acolhida, redundarão em responsabilidade patrimonial para a pessoa jurídica de direito público da Administração Federal que efetuou a respectiva delegação. A jurisprudência mais antiga do STJ é que estava coerente com a Lei do Mandado de Segurança e com os limites da competência traçados pela Constituição para a Justiça Federal. Urge restaurá-la, a fim de que a aplicação do art. 2º da Lei nº 12.016/2009 se dê de maneira fiel à previsão da Constituição. Se o mandado de segurança contra ato de administrador de concessionária de serviço público continuar a ser atribuído à Justiça Federal, sem que do ato impugnado possa advir sujeição para o patrimônio da União ou de algum ente federal da administração indireta, estar-se-á diante de um quadro de inconstitucionalidade. Vale dizer, a pessoa jurídica federal, sem ter interesse direto no objeto litigioso, estaria determinando a competência da Justiça Federal, mesmo não sendo parte, nem interessada, no sentido jurídico, na relação processual. Trata-se de uma hipótese que não foi prevista no art. 2º da Lei do Mandado de Segurança, e muito menos no art. 109 da Constituição. do Poder Público (art. 1º, § 1º). Nesse caso, “a autoridade coatora consiste na pessoa física que ordena ou omite a prática do ato impugnado, ou seja, aquela que, ao executar o

ato, materializa-o” (STJ, 1ª T., AgRg no REsp 642.055/PE, Rel. Min. José Delgado, ac. 16.11.2004, DJU 01.02.2005, p. 437). Como essa “autoridade” se acha vinculada à pessoa jurídica da concessionária e não à pessoa jurídica de direito público concedente, caberá a posição de sujeito passivo da ação mandamental àquela pessoa de direito privado, e não à de direito público. Onde, pois, encontrar a presença do Poder concedente dentro da ação? Onde detectar sua sujeição patrimonial aos efeitos da sentença? Onde entrever seu interesse jurídico no mandamus disputado entre o usuário do serviço e a concessionária desse mesmo serviço?

29. UMA PONDERAÇÃO DE ORDEM CONSTITUCIONAL SOBRE A REGRA DO ART. 2º DA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA E A GARANTIA DO “JUIZ NATURAL” Um dos pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito – senão o primeiro e mais relevante dos direitos do homem – é a garantia de igualdade de todos perante a lei, de que decorre o repúdio a todo e qualquer privilégio e a todas as discriminações, que não sejam aqueles, excepcionalmente, instituídos pela própria constituição. Dentre as consequências do princípio da isonomia, estatui a Constituição a garantia do devido processo legal24 (CF, art. 5º, LIV), que assegura a todos, indistintamente, um só procedimento para solução dos litígios, ao qual se submeterão tanto os cidadãos como o próprio Estado. Essa garantia fundamental se desdobra em várias outras, inclusive na do juiz natural, também único, como regra25, e do qual somente a própria Constituição estabelece as exceções. É ela, portanto, a única fonte das regras capazes de afastar uma pessoa de direito público ou privado do juízo universal previsto constitucionalmente para desempenhar o papel do juiz natural, na estrutura do Poder Judiciário do Estado Democrático de Direito. É assim que a Constituição se encarrega de instituir Justiças Especiais e os poucos foros privilegiados, delimitando rigorosamente os casos em que os litigantes serão forçados a se privar do juízo natural universal e a se submeter a um juízo especial e privilegiado, definido constitucionalmente ratione personae ou ratione materiae. Um desses juízos, que escapam da universalidade do juízo natural comum, é o da Justiça Federal, que, por previsão constitucional, constitui um juízo à parte para as causas em que a União, suas autarquias ou empresas públicas “forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes” (CF, art. 109, I). Prevê, ainda, a Constituição, dentre as competências especiais da Justiça Federal, a dos mandados de segurança “contra ato de autoridade federal” (art. 109, VIII). E o faz justamente porque atrás do ato de autoridade figura necessariamente uma pessoa jurídica de direito público, em cujo

nome e interesse o ato impugnado foi praticado. De tal sorte, o sujeito passivo do mandado de segurança é a pessoa jurídica interessada, e não a autoridade coatora, cuja função, nessa ação constitucional, é apenas a de identificar quem se legitimará a ocupar o polo da relação processual reservado para o réu ou demandado26. A regra, portanto, do inc. VIII do art. 109 da Constituição não amplia a competência da Justiça Federal estabelecida no inciso primeiro daquele mesmo dispositivo. Apenas o explicita, no que diz respeito ao mandado de segurança, quando envolve pessoa jurídica participante do Poder Público Federal. Coerente com os limites constitucionais da competência atribuída à Justiça Federal, o art. 2º da Lei nº 12.016/2009 prevê que, no mandado de segurança, se deverá considerar “autoridade federal” aquela cujo ato impugnado, uma vez acolhida a demanda, redundará em consequências patrimoniais “a serem suportadas pela União ou entidade por ela controlada”. Vale dizer: a Lei do Mandado de Segurança, nesse passo, se manteve estritamente dentro da previsão constitucional de que à Justiça Federal compete processar e julgar as causas em que a União e as demais pessoas de direito público por ela controladas forem parte (CF, art. 109, I). O que, dessa forma, torna competente a Justiça Federal é serem a União ou as entidades públicas a ela subordinadas, a parte passiva do mandado de segurança, a parte sobre a qual reverterão os efeitos patrimoniais da demanda. Pretender estender a competência especial da Justiça Federal, apenas porque o sujeito passivo do mandado de segurança é uma concessionária de serviço público federal, corresponde a submeter uma causa entre particulares à justiça privativa do Poder Público Federal, sem que nenhum ente da Administração da União seja parte no processo. A prevalecer tal entendimento estar-se-á alargando uma competência especial ou privilegiada para além dos limites que a Constituição traçou para a atuação jurisdicional da Justiça Federal. E tal jurisprudência, em linha de princípio, não se tolera: “A competência fixada no art. 109 da CF não se dá em razão da matéria discutida na demanda, mas se firma ratione personae, de modo que o deslocamento do feito para a Justiça Federal somente se justifica ante a presença na lide de alguma das pessoas elencadas naquele dispositivo constitucional, o que não é o caso dos autos”27. “A competência da Justiça Federal, fixada na Constituição, somente pode ser ampliada ou reduzida por emenda constitucional, contra ela não prevalecendo dispositivo legal hierarquicamente inferior”28. É certo que, mesmo não sendo parte, nem tendo interesse jurídico para justificar a assistência, a Lei nº 9.469/1997 permite a intervenção da Justiça Federal em causas em que figurem como parte autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais (art. 5º).

Essa intervenção, que ocorre fora dos padrões do art. 109 da Constituição, definidores da competência especial para as causas da União, “não traz comando suficiente a modificar a competência originária para o julgamento da demanda. E isso porque a lei ordinária não tem a força de ampliar a enumeração taxativa da competência da Justiça Federal estabelecida no art. 109, I, da Constituição Federal, razão pela qual o deslocamento da competência para a Justiça especializada somente se verificaria se configurado o efetivo interesse jurídico da União ou de outro ente federal”29. Daí nosso posicionamento diverso daquele que vem sendo observado, atualmente, no STJ, no sentido de que bastaria a qualidade do coator de representante de empresa concessionária de serviço público para determinar a competência da Justiça Federal nas ações de mandado de segurança, mesmo que a União não figurasse como sujeito passivo do processo e não estivesse sujeita aos efeitos patrimoniais decorrentes do julgamento da causa. Para nós, esse entendimento, data maxima venia, não condiz com os limites constitucionais da competência da Justiça Federal e, por isso, viola a garantia fundamental do devido processo legal e, principalmente, descumpre a garantia do juiz natural. Impõe-se, todavia, reconhecer que, salvo um ou outro acórdão esporádico, a jurisprudência atual do STF e do STJ tem adotado o entendimento firme de qualificar a autoridade como “federal”, nos casos de concessão ou permissão de serviço público, levando em conta a origem da delegação, e não a responsabilidade patrimonial da União pelos atos do delegatário. Pouco importa, para tal concepção, que a União não seja, ou não possa ser, parte no mandado de segurança, nem tenha de suportar as consequências patrimoniais da impetração; o que, a nosso ver, é de difícil equacionamento com as regras de competência da Justiça Federal traçadas pela Constituição (art. 109) e pela Lei nº 12.016/2009 (art. 2º), como já tentamos demonstrar30.

29.1.

Corolário da tese jurisprudencial relativa a segurança contra ato de concessionária de serviço público federal

O direito não é uma ciência exata, que cuide do ser e que tenha como objetivo revelar o falso e o verdadeiro a seu respeito. É uma ciência em torno do plano normativo, que tem como objetivo analisar e compreender as normas criadas pelo próprio homem para regular e tornar viável a convivência em sociedade. Como ciência do dever ser, não aspira a estabelecer o falso e o verdadeiro, mas simplesmente descobrir o melhor e mais adequado sentido atribuído às normas jurídicas. Seu plano, portanto, não é o da lógica matemática, mas o da dialética, em que se observa a argumentação, presidida sempre pela lógica do razoável. Quer isto dizer que a compressão e a interpretação das normas do direito nunca são completas e acabadas, permitindo sempre, no mundo acadêmico e filosófico, o surgimento de novos argumentos capazes de superar velhos entendimentos e de formular novas conceituações, dentro da dinâmica do próprio sistema normativo.

Entretanto, uma coisa é a especulação acadêmica, outra é a realidade do direito positivo, criado e aplicado pelo Poder Público, por meio de seus órgãos de pacificação dos litígios e de manutenção do império da lei. A segurança jurídica, que é a garantia de que a convivência social realmente será presidida pela ordem legal, tem seus próprios meios de sustentação. É assim que a lei fundamental, isto é, a Constituição, confia a guarda e interpretação de suas regras e princípios ao Supremo Tribunal Federal; e, quanto ao direito infraconstitucional, a uniformidade de interpretação e a garantia de autoridade da lei federal são confiadas ao Superior Tribunal de Justiça. Portanto, quando essas Cortes Superiores têm posição firme e consolidada acerca da compreensão de alguma norma de direito positivo, é sua tese que haverá de prevalecer, enquanto elas mesmas não adotarem concepção diversa. Não é razoável, por conseguinte, que doutrinadores, em obra de exegese do direito positivo, adotem tese contrária àquela assentada pelos intérpretes constitucionais. É claro que nenhum jurista ficará impedido de advogar a conveniência de uma interpretação diferente. Deverá fazê-lo, entretanto, com a ressalva honesta de que seu ponto de vista não é o que prevalece na visão dos intérpretes institucionais do direito positivo. Deverá, também, revelar qual é a interpretação oficial e quais são os argumentos que a sustentam, para que os leitores possam ter acesso ao direito vivo, isto é, ao direito que vige e é efetivamente aplicado em juízo. Admitidas essas premissas, é de ter-se como firme e consolidado o entendimento do STF e do STJ de que, à luz do art. 109, VIII, da Constituição e do art. 2º da Lei nº 12.016/2009, o dirigente de empresa ou entidade concessionária ou delegatária de serviço público federal será sempre havido, para efeito de cabimento do mandado de segurança, como “autoridade federal”, enquanto achar-se no “exercício das atribuições do poder público” que lhe foram atribuídas. A contrario sensu, não serão tratadas como “autoridade” (seja federal ou local) quando praticarem atos que não sejam próprios da delegação de poderes recebida por meio da concessão federal. Fora da esfera das atribuições federais de poder, praticarão os denominados “atos de gestão”, aos quais se aplicarão as normas de direito privado pertinentes aos vínculos obrigacionais, negociais ou legais (Lei nº 12.016, art. 1º, § 2º). Logo, as concessionárias de serviço federal nunca responderão por mandado de segurança perante a Justiça dos Estados, pois, fora do âmbito da delegação de poderes recebida da União ou de suas autarquias, nunca atuarão como “autoridade pública”. Vale dizer: segundo a tese atualmente adotada pelas Cortes Superiores de Justiça, “havendo mandado de segurança contra ato de entidade privada com função delegada ao Poder Público Federal, mostra-se logicamente inconcebível hipótese de competência estadual”. Isto porque, à luz do entendimento pretoriano, “de duas uma: ou há, nesse caso, ato de autoridade (caso em que se tratará necessariamente de autoridade federal delegada, sujeita à competência federal), ou há ato de particular, e não ato de autoridade (caso em que o mandado de segurança será incabível)”31. Não é, ressalvamos, a tese que pessoalmente defendemos, mas é, releva registrar, a que se acha

consolidada, no atual estágio da jurisprudência das Cortes Superiores de Justiça.

30. SITUAÇÕES DE CONFLITO EM TORNO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL Várias situações concretas têm produzido conflitos de competência, entre a Justiça Federal e outras Justiças, em relação ao mandado de segurança, provocados principalmente por problemas de litisconsórcio e de cumulação de ações, além dos que derivam, naturalmente, dos foros especiais ou privilegiados. Apontaremos, a seguir, a título exemplificativo, algumas dessas situações acompanhadas das soluções jurisprudenciais encontradas: A) FORO PRIVILEGIADO x FORO COMUM A regra geral é de que a competência da Justiça Federal, no primeiro grau de jurisdição, é definida em função da presença, num dos polos do processo, da União, autarquia ou empresa pública federais (CF, art. 109, I). Há regra especial na Lei nº 12.016 para o mandado de segurança, segundo a qual a Justiça Federal será a competente quando a autoridade coatora for “autoridade federal” (art. 2º). Ressalvam-se, porém, as regras constitucionais que criam competência originária de tribunais (foro privilegiado) para determinadas autoridades coatoras (CF, arts. 102, I, d, 105, I, b, e 108, I, c). O primeiro problema surge quando o ato atacado pelo writ envolve várias autoridades, sujeitas a competências distintas. O STJ, diante de tal concurso de autoridades, adota o entendimento de que, se do ato coator participaram diversas autoridades de diferentes níveis hierárquicos, e, “caso uma delas tenha foro privilegiado, determinará a competência”, para o mandado de segurança32. O foro privilegiado de uma das autoridades prevalecerá sobre o foro comum das demais. Aliás, o que se acha assentado na jurisprudência daquela Corte é que a preferência do foro privilegiado supera até mesmo a competência em razão da matéria33. B) JUSTIÇA ESTADUAL x SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Prevê a Constituição a competência originária do STF para processar e julgar “as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta” (art. 102, I, f). O STF já teve oportunidade de apreciar o problema surgido da impetração de mandado de segurança pela Ordem dos Advogados (autarquia federal) contra ato de Tribunal de Justiça estadual, tendo adotado posições diferentes: (i) em caso mais antigo, em que se questionava o critério de preenchimento do “quinto constitucional”, a competência originária do STF foi reconhecida34; (ii), mais recentemente, tratando de mandado de segurança contra ato administrativo praticado pelo

Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, a decisão do STF foi no sentido de não reconhecer o “conflito federativo” capaz de deslocar a competência para a Suprema Corte, nos moldes do art. 102, I, f, da Constituição35. As diferentes posições do STF parecem fundar-se na diversidade de matéria abordada nas duas ações de mandado de segurança. Na primeira, por tratar o mandamus de questão ligada à formação do “quinto constitucional” de um Tribunal estadual, entendeu a Suprema Corte que a demanda envolveria disputa sobre as “atribuições constitucionais” do ente federativo, por parte de autarquia federal (OAB). Por isso, o julgado teve como configurada “controvérsia jurídica relevante sobre demarcação dos âmbitos materiais de competência dos entes que compõem a Federação, que atrai a competência originária do Supremo Tribunal (CF, art. 102, I, f)”. Vários precedentes foram invocados, entre eles, o MS 21.239 (RTJ 147/104) e o MS 22.042-QO (RTJ 164/122). No caso mais recente, não estava em jogo questão institucional demarcada pela Constituição, como no julgado em torno do “quinto constitucional”. Daí ter o STF, diante de impugnação de mero “ato administrativo” do Presidente do Tribunal local impugnado pela autarquia federal (OAB), decidido que não era admissível vislumbrar o “conflito federativo”. Por isso, fez prevalecer a competência do Tribunal de Justiça para julgar a impetração contra o ato administrativo de seu presidente, sem embargo de ter sido o writ proposto por ente autárquico integrante da esfera da União. C) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: MANDADO DE SEGU-RANÇA CONTRA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA Não há dúvida de que as sociedades de economia mista, destinadas às práticas de mercado, se regem pelas regras comuns aplicáveis às empresas privadas (CF, art. 173, § 1º, II), por isso responderá, pelos litígios em torno de seus atos, perante a Justiça comum dos Estados36. Mas, quando se trata de mandado de segurança, os atos de seus administradores, não sendo de mera “gestão comercial”37, são qualificados como atos de “autoridade federal”, se obviamente for o caso de sociedade de economia controlada pela União (Lei 12.016/2009, art. 1º, § 2º)38. Nesse sentido, é tranquila a jurisprudência do STJ: “Processual civil. Agravo regimental no conflito negativo de competência. Sociedade de economia mista. Concurso público da Petrobrás. Mandado de segurança. Conflito conhecido. Competência da Justiça Federal. 1. Cinge-se a controvérsia acerca da definição de qual o Juízo competente para processar e julgar mandado de segurança interposto contra ato de dirigente de Sociedade de Economia Mista visando a seleção e contratação de empregado público. 2. A jurisprudência dominante no âmbito da Primeira Seção do STJ tem-se manifestado no

sentido de que, em mandado de segurança, a competência é estabelecida em função da natureza da autoridade impetrada (ratione auctoritatis), considerando, para esse efeito, aquela indicada na petição inicial. Desse modo, será da competência federal quando a autoridade indicada como coatora for federal (CF, art. 109, VIII), assim considerado o dirigente de pessoa jurídica de direito privado que pratica ato no exercício de delegação do poder público federal. Nesse sentido: CC 37.912/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 15/9/2003. 3. Considerando-se que a eliminação de candidato a processo seletivo público é ato imputado ao Presidente da Comissão de Concursos da Petrobras, autoridade pertencente à sociedade de economia mista, investida na função delegada federal, o mandado de segurança deverá ser processado e julgado pela Justiça Federal. Precedentes: AgRg no CC 112.642, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 16/2/2011 e CC 94.482/PA, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 16/6/2008. 4. Agravo regimental não provido”39. Igual orientação tem sido adotada pelo STJ em relação ao Banco do Amazonas40 e ao Banco do Brasil41, entre outras sociedades de economia mista, da administração indireta federal42. D) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA DO TRABALHO Em matéria de mandado de segurança contra órgão de fiscalização do trabalho, não tem sido uniforme o posicionamento do STJ quanto à competência nos casos de mandado de segurança. A 1ª Seção, por exemplo, já decidiu pela competência da Justiça do Trabalho, como se vê no seguinte acórdão: “Conflito negativo de competência. Mandado de segurança. Visando a impedir aplicação de penalidade por órgão fiscalizador das relações de trabalho. Competência da justiça do trabalho. 1. A pretensão deduzida no mandado de segurança é a de impedir que as autoridades impetradas promovam qualquer medida judicial ou extrajudicial que possa importar a aplicação de penalidade por descumprimento da obrigação de contratar empregados reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, nos termos previstos no artigo 93 da Lei 8.213, de 24 de Julho de 1991. 2. Com as alterações do art. 114 da CF/88, introduzidas pela Emenda Constitucional 45/04, à Justiça do Trabalho foi atribuída competência para apreciar e julgar ‘as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho’ (inciso VII), inclusive, portanto, os mandados de segurança

visando a impedir que a autoridade impetrada promova a aplicação das referidas penalidades. 3. Conflito conhecido, declarando-se a competência da Justiça do Trabalho”43. A 3ª Seção, por sua vez, decidiu pela competência da Justiça Estadual, embora tenha reconhecido que o Conselho Fiscalizador ostenta personalidade de direito público, o que seria suficiente para enquadrá-la na forma de autarquia federal. Eis como ficou a ementa do CC 107.107/SC: “Conflito de competência. Justiça federal e trabalhista. Ação mandamental contra ato de dirigente de conselho regional de fiscalização. Natureza pública. Declaração de inconstitucionalidade do art. 58 da Lei 9.649/98. Competência da Justiça Comum Estadual. 1. A competência para conhecer e julgar da ação de Mandado de Segurança é definida em razão da categoria profissional a que pertence a autoridade coatora e a localidade de sua sede funcional. 2. Os Conselhos Federais e Regionais detêm personalidade de Direito Público, com autonomia administrativa e financeira, e exercem atividade de fiscalização tipicamente pública, preenchendo, portanto, os requisitos do art. 5º do Decreto--Lei 200/67 (Estatuto da Reforma Administrativa Federal) para se enquadrarem na forma de autarquias (declaração de inconstitucionalidade do art. 58 da Lei 9.649/98, que previa a natureza privatística dos Conselhos, pelo Pretório Excelso). 3. A competência para conhecer de ação mandamental contra ato de dirigente de Conselho Fiscalizador não é da Justiça Federal, em face da taxatividade do art. 109 da CF, nem da Justiça do Trabalho, por força da natureza da entidade, submetida às normas de Direito Público, remanescendo, portanto, a competência da Justiça Comum. 4. Conflito conhecido para determinar a competência a distribuição do feito a uma das Varas de Direito da Comarca de Florianópolis/SC”44. Em outro aresto, a 1ª Seção tratou da competência para o mandado de segurança contra ato da Polícia Federal relacionado com a presença de trabalhadores estrangeiros no País, e a atribuiu à Justiça Federal, in verbis: “Conflito negativo de competência. Justiça Federal e Justiça do Trabalho. Mandado de segurança visando à anulação de auto de infração lavrado pela Polícia Federal. Falta de visto temporário de trabalhadores estrangeiros. Artigos 13, V, e 125, VI e VII, do Estatuto do Estrangeiro. Competência da Justiça Comum Federal. 1. Compete à Justiça Federal processar e julgar mandado de segurança visando à anulação

de auto de infração lavrado pela Polícia Federal, no exercício do poder de polícia administrativa de controle do ingresso e permanência de trabalhadores estrangeiros no país, com base no Estatuto do Estrangeiro. 2. Conflito conhecido e declarada a competência da Justiça Federal”45. Ainda sobre a competência da Justiça do Trabalho em matéria de mandado de segurança, merece ser lembrada a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual “é competente o Tribunal Regional do Trabalho para julgar mandado de segurança contra ato de seu presidente em execução de sentença trabalhista” (Súmula nº 433). Também deve refletir sobre o mandado de segurança a orientação contida na Súmula nº 736 do STF: “Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores”. Essa visão mais ampla da Suprema Corte sobre a competência da Justiça do Trabalho, para nela incluir a atividade administrativa das relações laborais, pode contribuir para a superação das divergências internas da jurisprudência do STJ. E) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ELEITORAL Para se definir a competência no caso de mandado de segurança contra ato praticado no âmbito da Justiça Eleitoral, é preciso analisar o seu conteúdo, para definir se sua natureza é eleitoral ou administrativa. O STJ já decidiu que “a competência dos Tribunais Regionais Eleitorais não vai além da matéria eleitoral. Excepcionalmente, julgam seus próprios atos, de seu presidente, ou de câmara, turma ou seção, inclusive os de natureza administrativa, quando atacados por mandado de segurança”46. Quando, porém, o ato impugnado nada tem a ver com o direito eleitoral, como, v.ġ., o praticado em procedimento de licitação, não há de se pensar em competência da Justiça Eleitoral: “(...) 2. No caso, não se trata de mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal ou de seu presidente, mas contra ato de comissão de licitação, na figura do pregoeiro, autoridade eminentemente administrativa, que não tem prerrogativa de foro. 3. A Primeira Seção, no julgamento do CC 23.976/MG, Relator o Ministro Ari Pargendler, decidiu que a competência para julgar mandado de segurança impetrado contra ato de comissão de licitação de TRE é da Justiça Federal de primeira instância. 4. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 22ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais, o suscitado”47. Exemplo típico de mandado de segurança sobre direito eleitoral é o da impetração contra ato de

perda de cargo eletivo, em virtude de desfiliação partidária não justificada: “Direito eleitoral. Conflito negativo de competência. Mandado de segurança. Desfiliação partidária sem justa causa. Perda do cargo eletivo. Resolução n. 22.610/2007 do TSE. Constitucionalidade. Competência. Justiça Eleitoral. – O Tribunal Superior Eleitoral, regulando a matéria, editou a Resolução n. 22.610/2007, a qual dispõe sobre o processo de perda de cargo eletivo e a justificação de desfiliação partidária, a fim de dar cumprimento ao que decidiu o Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Segurança n. 26.602, 26.603 e 26.604, bem como com base no art. 23, XVIII, do Código Eleitoral. – O STF, no julgamento da ADI 3.999-7/DF (relator Ministro Joaquim Barbosa), decidiu pela constitucionalidade da aludida norma, como instrumento assecuratório da observância do princípio da fidelidade partidária, em caráter excepcional e transitório até pronunciamento do Poder Legislativo. – A quaestio posta em debate, no caso concreto, consiste na eventual desfiliação partidária sem justa causa, a caracterizar ‘infidelidade partidária’, de vereador, em período posterior (2009) à data da vigência da norma em debate (30.10.2007). Ademais, tanto nos autos do mandado de segurança impetrado na Justiça comum (fls. 2042) quanto na Ação de Decretação de Perda de Mandato Eletivo ajuizada na Justiça Eleitoral (fls. 76-85), o fundamento do pedido é a desfiliação do 1º Suplente de Vereador – João Pedro Merenda Neto –, supostamente sem justa causa, do Partido Verde, o que implica a impossibilidade de assumir cargo declarado vago. – Compete à Justiça Eleitoral o julgamento das demandas a teor do art. 2º da Resolução n. 22.610/2007 do Tribunal Superior Eleitoral. Conflito conhecido para julgar competente o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e declarar a nulidade da liminar proferida pelo TJ/SP nos autos do Agravo de Instrumento em Mandado de Segurança n. 006344342.2011.8.26.0000. Prejudicado, por conseguinte, o agravo regimental de fls. 293-686, interposto contra a liminar deferida às fls. 167-172”48. F) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: SERVIÇO SOCIAL AUTÔNOMO (SESI, SENAI) Os Serviços Sociais são entidades privadas, mas que exercem função delegada pelo Poder Público Federal. Para definir a competência em torno da impugnação judicial a um ato do SESI ou SENAI, há de ser pesquisada a sua natureza, para definir se seu objeto se insere, ou não, no âmbito da delegação federal. No CC 122.713/SP, o tema foi bem explorado pelo STJ, in verbis:

“Conflito de competência. Justiças Estadual e Federal. Mandado de segurança que impugna ato de dirigente de serviço social autônomo (SENAI). Competência da Justiça Federal. 1. Esta Seção, ao julgar o CC 35.972/SP (Rel. p/ acórdão Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 7.6.2004, p. 152), firmou o entendimento de que, havendo mandado de segurança contra ato de entidade privada com função delegada do Poder Público Federal, mostra-se logicamente inconcebível hipótese de competência estadual. É que, de duas uma: ou há, nesse caso, ato de autoridade (caso em que se tratará necessariamente de autoridade federal delegada, sujeita à competência federal), ou há ato de particular, e não ato de autoridade (caso em que o mandado de segurança será incabível). 2. No caso, trata-se de mandado de segurança impetrado por contribuinte em face de ato do Diretor Administrativo e Financeiro do SENAI, visando a impugnar Notificação de Débito relativa à contribuição adicional de que trata o art. 6º do Decreto-Lei nº 4.048/42. Embora a fiscalização e a arrecadação da contribuição adicional em questão tenham sido atribuídas diretamente à entidade privada destinatária da dita contribuição (cf. art. 10 do Decreto n. 60.466/67), ainda assim se trata de tributo instituído pela União e exigível mediante lançamento, atribuição típica de autoridade administrativa federal (art. 142 do CTN), que acabou por constituir crédito tributário relativo à contribuição adicional de que trata o art. 6º do Decreto-Lei n. 4.048/42. Portanto, compete ao Juízo Federal, ora suscitado, processar e julgar o mandado de segurança. 3. Conflito conhecido para anular a sentença proferida na Justiça Estadual e declarar a competência da Justiça Federal”49. Sem embargo da posição criticada do STJ a propósito do mandado de segurança, aquela Corte, em se tratando de ação ordinária de cobrança de contribuição federal movida pelo SESI, adotou entendimento diverso em solução de conflito jurisprudencial, reconhecendo a competência da Justiça Estadual, com os seguintes fundamentos: “VI. Consoante reconhecido na decisão agravada, compete à Justiça Estadual processar e julgar ações de cobrança, nas quais sejam autoras as entidades paraestatais, tais como SESI, SEBRAE, SESC, SENAI, dentre outras, dada a sua personalidade jurídica de direito privado. Nesse sentido dispõe a Súmula 516/STF (‘O Serviço Social da Indústria (SESI) está sujeito à jurisdição da Justiça estadual’). Precedente do STJ: CC 95.723/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 22/09/2008. VII. O entendimento adotado pela Primeira Seção do STJ, no CC 122.713/SP (Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 14/08/2012), não se aplica ao presente caso, porquanto aqui não se trata de mandado de segurança contra ato de autoridade federal ou a ela equiparada.

VIII. In casu, no qual se trata de ação ordinária, ajuizada pelo SESI contra empresa, para cobrança da contribuição de que trata o art. 3º, § 1º, do Decreto-lei 9.403/46, ainda que a contribuição cobrada seja espécie de tributo federal, o SESI é pessoa jurídica de direito privado não integrante da Administração Pública direta ou indireta, não incidindo, na espécie, o art. 109, I, da Constituição Federal, sendo competente para o processo e o julgamento do feito a Justiça Estadual”50. G) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: ÓRGÃOS DE DEFESA DO CONSUMIDOR DA ESFERA FEDERAL Diante da multiplicidade de órgãos encarregados da defesa dos consumidores, pode ocorrer que o fornecedor venha a ser punido administrativamente mais de uma vez por agentes diversos, num intolerável bis in idem. Esse conflito pode envolver entidades federais, estaduais e municipais. É ilegal e abusiva a pretensão de cada um dos órgãos de manter isoladamente a multa aplicada. O mandado de segurança pode ser acolhido para impedir o bis in idem, assegurando ao impetrante o direito de ver o conflito de competência solucionado na via administrativa, pelos mecanismos do direito consumerista: “Administrativo. Processual Civil. Recurso especial. Mandado de segurança. Código de Defesa do Consumidor. Violação do artigo 535 do CPC não configurada. Procedimentos administrativos instaurados por órgãos federal e estadual de proteção e defesa do consumidor. Competência concorrente. Aplicação de multas pela mesma infração. Impossibilidade. Poder punitivo do Estado. Princípio da razoabilidade e da legalidade. Artigo 5º, parágrafo único, do Decreto n. 2.181/97. 1. Caso em que são aplicadas multas administrativas pelo DPDC e pelo Procon-SP a fornecedor, em decorrência da mesma infração às normas de proteção e defesa do consumidor. (...) 3. No mérito, não assiste razão à recorrente, não obstante os órgãos de proteção e defesa do consumidor, que integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, serem autônomos e independentes quanto à fiscalização e controle do mercado de consumo, não se demonstra razoável e lícita a aplicação de sanções a fornecedor, decorrentes da mesma infração, por mais de uma autoridade consumerista, uma vez que tal conduta possibilitaria que todos os órgãos de defesa do consumidor existentes no País punissem o infrator, desvirtuando o poder punitivo do Estado. 4. Nos termos do artigo 5º, parágrafo único, do Decreto n. 2.181/97: ‘Se instaurado mais de um processo administrativo por pessoas jurídicas de direito público distintas, para apuração de infração decorrente de um mesmo fato imputado ao mesmo fornecedor,

eventual conflito de competência será dirimido pelo DPDC, que poderá ouvir a Comissão Nacional Permanente de Defesa do Consumidor – CNPDC, levando sempre em consideração a competência federativa para legislar sobre a respectiva atividade econômica.’ 5. Recurso especial não provido”51. H) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: UNIVERSIDADES E OUTRAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO Vários problemas de competência surgem quando o ato impugnado por meio de mandado de segurança se volta para instituições de ensino. Se a Universidade é federal, nenhuma dúvida há em matéria de competência: a instituição tem a natureza de autarquia, o que a submete à competência da Justiça Federal, seja nas ações comuns, seja nos mandados de segurança52. Quando, porém, se trata de Universidade municipal ou estadual, a autonomia desses entes os desvincula da competência da Justiça Federal, mesmo que a autorização de funcionamento tenha provindo da União, principalmente quando instituídas por Estado. Quando se trata, entretanto, de estabelecimento particular, não se reconhece sua desvinculação da esfera da União53. Em caso de disputa judicial por matrícula em “instituição estadual de ensino superior”, o STJ, por exemplo, decidiu, diante de um conflito de competência entre a Justiça Federal e a Justiça Estadual, que: “(...) 2. A partir do julgamento do Conflito de Competência 35.972/SP, a Primeira Seção decidiu que o critério definidor da competência da Justiça Federal é, em regra, ratione personae, isto é, leva em consideração a natureza das pessoas envolvidas na relação processual. 3. ‘As universidades estaduais gozam de total autonomia para organizar e gerir seus sistemas de ensino (CF/88, art. 211), e seus dirigentes não agem por delegação da União. A apreciação jurisdicional de seus atos é da competência da Justiça Estadual.’ (CC 45.660/PB, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJ de 11.4.2005). 4. Conflito de Competência conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 3ª Vara Cível de Criciúma-SC. 5. Agravo Regimental não provido”54. No AgRg no REsp 1.274.304/RS, a 2ª Turma do STJ fez uma importante distinção entre a competência para as ações comuns e para o mandado de segurança. O caso em julgamento dizia respeito à negativa de expedição de diploma por entidade particular de ensino superior, e a distinção se fez da seguinte maneira: se o litígio é objeto de ação ordinária, a competência é da Justiça

Estadual, mas se se trata de mandado de segurança, a competência será da Justiça Federal, porque a instituição particular de ensino superior exerce atribuição delegada do Poder Público federal. Apresenta-se, nos termos do art. 2º da Lei nº 12.016, como “autoridade federal”, para fins do mandado de segurança55. Eis o aresto do STJ: “(...) 2. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do CC 38.130/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 13.10.2003, firmou entendimento no sentido de que, em se tratando de ação diversa à do mandado de segurança, a competência para o seu processamento e julgamento, quando se discute a matrícula de aluno em entidade de ensino particular, é da Justiça Estadual, portanto inexistentes quaisquer dos entes elencados no art. 109 da CF/88. 3. Sendo a hipótese de ação ordinária contra instituição estadual de ensino superior, e não integrando a lide nenhum ente federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, a competência para processar e julgar a demanda é da Justiça Estadual”56. A propósito de segurança relativa à questão de matrícula, o STJ tem decidido que, “versando a causa sobre o indeferimento de matrícula em estabelecimento particular de ensino superior, este estará no exercício de função delegada da União, devendo a ação ser ajuizada perante a Justiça Federal”57. O STF já se ocupou, no passado, ao tempo em que vigia a Lei nº 1.533/1951, da matéria para assentar que o mandado de segurança contra ato de diretor de estabelecimento superior de ensino particular é da competência da Justiça Federal, tendo em vista tratar-se de exercício de atividade delegada pela União58. O problema, finalmente, encontrou amplo equacionamento pela jurisprudência recente do STJ: “3. A Primeira Seção do STJ, no CC n. 108.466/RS, de Relatoria do Exmo. Ministro Castro Meira, julgado em 10 de fevereiro de 2010, nos processos que envolvem o ensino superior, fixou regras de competência em razão da natureza do instrumento processual utilizado. Portanto, em se tratando de mandado de segurança, a competência será federal, quando a impetração voltar-se contra ato de dirigente de universidade pública federal ou de universidade particular; ao revés, será estadual quando o mandamus for impetrado contra dirigentes de universidades públicas estaduais e municipais, componentes do sistema estadual de ensino. Em outro passo, se forem ajuizadas ações de conhecimento, cautelares ou quaisquer outras de rito especial, que não o mandado de segurança, a competência será federal quando a ação indicar no polo passivo a União ou quaisquer de suas autarquias (art. 109, I, da CF/88); será de competência estadual, entretanto, quando o ajuizamento voltar-se contra entidade estadual, municipal ou contra instituição particular

de ensino. 4. A competência para o julgamento de causas relativas a instituição de ensino superior particular, nos casos que versem sobre questões privadas relacionadas ao contrato de prestação de serviços firmado entre a instituição de ensino superior e o aluno (por exemplo, inadimplemento de mensalidade, cobrança de taxas, matrícula), em se tratando de ação diversa à do mandado de segurança, é, via de regra, da Justiça comum, não havendo interesse da União no feito, o que afasta a sua legitimidade para figurar na ação”59. É, a nosso ver, estranha essa tese de definir a autoridade federal no caso de diretor de entidade universitária particular em função de se tratar de atividade delegada pela União, quando é antiga e consolidada a jurisprudência de que, para efeito do mandado de segurança, a autoridade coatora é o delegatário e não o delegante (Súmula nº 510/STF), sendo, por isso, “irrelevante, para fixação de competência, a matéria a ser discutida em Mandado de Segurança, posto que é em razão da autoridade da qual emanou o ato, dito lesivo, que se determina qual o Juízo a que deve ser submetida a causa”60. É mais estranha, ainda, essa jurisprudência de remeter os mandados de segurança contra estabelecimentos particulares de ensino para a competência da Justiça Federal, quando se sabe perfeitamente que a União não será o sujeito passivo da relação processual, nem poderá nela intervir como litisconsorte ou assistente litisconsorcial. Outrossim, caberá responder, por inteiro, pelo resultado do acolhimento da segurança, apenas a entidade particular demandada. Difícil, portanto, é conciliar esse conceito de “autoridade federal” com aquele previsto no art. 2º da Lei do Mandado de Segurança, que toma como base, para ter-se a autoridade coatora como federal, a circunstância de as consequências patrimoniais da impugnação a seu ato “houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada”. Enfim, está aparentemente consolidada a tese jurisprudencial de que o mandado de segurança contra ato de dirigente de estabelecimento particular de ensino superior é da competência da Justiça Federal, salvo apenas os atos de mera atividade administrativa que não envolvam o acesso propriamente dito àquele ensino, como, por exemplo, os relacionados à cobrança de mensalidades61. Já com referência às universidades estaduais e municipais, a posição da jurisprudência é bem diferente, caso em que não se divisa lugar para a competência da Justiça Federal, dada a autonomia com que regulam e comandam o sistema do ensino superior a seu cargo. Por essa razão, os seus dirigentes não agiriam por delegação da União, cabendo à Justiça Estadual apreciar jurisdicionalmente os respectivos atos62. Por motivo semelhante, o mandado de segurança contra ato relativo ao ensino de 1º e 2º graus e exames supletivos é da competência da Justiça Estadual, ressalvado, é claro, o caso de estabelecimento secundário federal63. I) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: INTERESSE DE AUTARQUIA FEDERAL

NÃO RECONHECIDO Tendo sido aforado mandado de segurança contra a autoridade municipal que recusara aprovar projetos de determinados técnicos, a entidade sindical impetrou mandado de segurança em defesa da categoria afetada pelo ato impugnado. Admitindo a possibilidade de interesse do Conselho Regional de Engenharia, o processo foi remetido à Justiça Federal, que solucionou o incidente, reconhecendo a inocorrência de interesse da autarquia federal no feito. O STJ, em grau de conflito de competência, o definiu em favor da Justiça Estadual: “(...) 2. Na hipótese, o Juízo Federal suscitado, com respaldo na sua competência para deliberar acerca da existência ou não de interesse de ente federal, concluiu pela inexistência de interesse do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de São Paulo – Crea/SP para integrar o polo passivo da impetração, razão pela qual não há como afastar a competência estadual, a teor do que enunciam as Súmulas 150 e 254 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Conflito de competência conhecido para declarar a competência do Juízo Estadual, o suscitante”64. J) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: AUTARQUIA FEDERAL CONTRA ATO DE JUIZ ESTADUAL Uma autarquia federal impetrou mandado de segurança para impugnar decisão de juiz estadual, do que surgiu conflito de competência entre a Justiça Federal e a Estadual. Discutia-se se deveria prevalecer a competência absoluta da Justiça Federal para apreciar as causas em que sejam partes a União e suas autarquias (CF, art. 109, I), ou a regra da Lei nº 12.016/2009, que define a competência para o mandado de segurança em função da autoridade coatora. O STJ, invocando precedente do Supremo Tribunal, solucionou o conflito, firmando a competência da Justiça Federal e, mais especificamente, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Vale a pena rever os argumentos do aresto da 1ª Seção do STJ: “Conflito de competência. Mandado de segurança impetrado por Autarquia Federal contra ato de Juiz Estadual. Arts. 108, I, ‘c’, e 109, I, da Constituição Federal. Competência do Tribunal Regional Federal. Princípios da hierarquia e simetria. Orientação do Pretório Excelso. 1. O art. 109, I, da Constituição Federal, que estabelece regra de competência ratione personae, atrai a competência para a Justiça Federal inclusive nas hipóteses de mandado de segurança impetrado pela União, entidade autárquica ou empresa pública federal contra entidade pública local, consoante a previsão do enunciado da Súmula 511/STF: ‘Compete

à Justiça Federal, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas entre autarquias federais e entidades públicas locais, inclusive mandado de segurança, ressalvada a ação fiscal, nos termos da Constituição Federal de 1967, art. 119, § 3º’. 2. Apesar da existência de respeitável corrente doutrinária e jurisprudencial em sentido contrário, o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 176.881/RS, Relator para acórdão o Ministro Ilmar Galvão, publicado no DJ de 6.3.1998, sufragou o entendimento de que o art. 109, I, da Constituição Federal, aplica-se inclusive aos casos de mandado de segurança impetrado por entidade federal contra ato de Juiz Estadual. 3. Além disso, firmou-se a orientação de que é imperiosa a análise do mandamus, nesses casos, pelo Tribunal Regional Federal, e não por um juiz federal. Isso porque, em razão do princípio da hierarquia, os mandados de segurança impetrados contra atos praticados por juízes federais, nos termos do art. 108, I, ‘c’, da Carta Magna, são processados e julgados originariamente pelos Tribunais Regionais Federais. Desse modo, em respeito ao princípio da simetria, as ações mandamentais impetradas contra ato de Juiz Estadual também devem ser processadas e julgadas originariamente pela Corte Regional. 4. Evidencia-se, portanto, a competência da Justiça Federal para processar e julgar o mandado de segurança em questão, nos termos do art. 109, I, da Carta Magna. Registre-se, entretanto, que a demanda deverá ser julgada pelo Tribunal Regional Federal, e não pelo Juízo Federal Suscitante, com fundamento no art. 108, I, ‘c’. 5. Conflito conhecido para declarar a competência do Tribunal Regional Federal da 5ª Região”65. Não foi diferente o entendimento adotado em antigo acórdão do Supremo Tribunal Federal, ainda na vigência da Lei nº 1.533/1951. İn verbis: “Mandado de segurança impetrado por autarquia federal contra ato de Juiz de direito. Competência. Em princípio, qualquer ação proposta pelos entes relacionados no inc. I do art. 109 da Constituição é de competência da Justiça Federal. Tratando-se, entretanto, de mandado de segurança, que, em nosso sistema jurídico-processual, se rege também pelo princípio da hierarquia, prevê o inc. VIII do mesmo dispositivo a competência dos tribunais federais, obviamente, em razão do respectivo grau hierárquico. Em relação aos juízes federais, a competência é dos tribunais regionais federais (art. 108, I, c, da Carta da República), regra que, por simetria, é de aplicar-se aos juízes de direito. Acórdão que, por encontrar-se orientado no sentido exposto, não merece reparo. Recurso extraordinário não conhecido”66.

K) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU) Como oriundos de organismo público federal, os atos do Tribunal de Contas da União, quando impugnados por meio de mandado de segurança, incluem-se, em regra, na competência da Justiça Federal67. Há, porém, duas situações distintas a considerar: (i) a primeira refere-se aos atos impositivos, em que o próprio TCU determina prestações, sanções ou comportamentos a serem cumpridos pelos destinatários de seus provimentos; é, por exemplo, o que ocorre com decisão que altera a aposentadoria concedida pela Administração direta ou por autarquia; (ii) a segunda corresponde aos atos que traduzem decisões normativas, a serem observadas e implantadas pela Administração, na gestão de seus serviços. Se o TCU decide rever contrato administrativo ou ato de aposentadoria de servidor público, a autoridade coatora, para fins de mandado de segurança, é o próprio Tribunal de Contas, e não o administrador que executou a decisão. Assim, se, por exemplo, gestor da Universidade Federal procede à execução do ato impositivo que cancelou ou modificou a aposentadoria de um servidor da autarquia, o coator será o TCU e não aquele que se limitou à atividade puramente executiva. Eis um acórdão do STJ que bem retrata esse entendimento: “(...) Mandado de segurança. Servidor público. Aposentadoria por invalidez. Alteração determinada pelo Tribunal de Contas. Ilegitimidade passiva da Universidade Federal. Mero executor da ordem. 1. A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que o executor material de decisão de caráter impositivo do Tribunal de Contas não é a autoridade legitimada a figurar como impetrada em mandado de segurança visando a atacar o referido ato. Precedentes: AgRg no MS 16.270/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 19/10/12; AgRg no RMS 33.019/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 3/2/12; AgRg no AgRg no REsp 1.056.503/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 19/4/11; REsp 884.390/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJe 25/8/08. 2. Agravo regimental não provido”68. Bem diferente é a decisão normativa, em que o TCU não julga um processo administrativo individualizado acerca de um caso concreto, mas procede ao estabelecimento de recomendações gerais, de caráter normativo ou regulamentar. Já, então, coator não será o TCU, será, isto sim, o administrador que decidiu praticar ato concreto, observando a recomendação contida nas aludidas disposições normativas. O STJ tem ampla jurisprudência sobre o tema:

“Recurso ordinário em mandado de segurança. Autoridade coatora. Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e territórios. Legitimidade passiva. 1. A autoridade coatora no mandado de segurança não é somente aquela que emitiu determinação ou ordem para certa providência administrativa a ser implementada por outra autoridade, mas, também, a que executa diretamente o ato. Precedentes. 2. Na hipótese, a presente impetração não se volta contra o entendimento firmado na orientação normativa eficaz exarada pelo TCU, mas sim em desfavor de ato da competência do Presidente do Tribunal Distrital. 3. Cabe ao Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios responder como autoridade coatora em mandado de segurança no qual se questiona a supressão de vantagem (VRD). Precedentes. 4. Agravo regimental improvido”69. No mesmo sentido, voltou o STJ a decidir em caso de alteração de aposentadoria de servidor do Tribunal de Justiça, ordenada pelo Presidente da Corte local, seguindo orientação do TCU: “1. Cuida-se de mandado de segurança voltado contra ato do Presidente do TJDFT, que determinou a supressão da Verba Remuneratória Destacada (VRD), em cumprimento à decisão emanada do Tribunal de Contas da União, que concluiu pela ilegalidade da acumulação da referida vantagem com o valor da remuneração do cargo efetivo, incluída a Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – VPNI. 2. Autoridade coatora no mandado de segurança é o agente que tem competência para ordenar a prática do ato impugnado e não os meros executores da ordem, razão por que não têm legitimidade passiva para figurar como autoridades coatoras no presente writ o Secretário-Geral, o Secretário de Recursos Humanos e a Subsecretária de Pagamento de Pessoa do TJDFT. 3. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que o Presidente do TJDFT possui legitimidade para figurar no polo passivo de ação mandamental voltada contra ato que suprimiu vantagem financeira de servidor inativo. Precedentes”70. Enfim, não há como considerar autoridade coatora a que cumpre decisão de outro órgão, sem ter poderes para reformá-la ou para negar-lhe execução, ou seja: “(...) Enquadramento do regime único dos servidores civis da União. Anulação determinada pelo TCU. Ministro de Estado da Defesa. Ilegitimidade passiva ad causam (...).

1. Mandado de segurança em que a impetrante, ora agravante, insurge-se contra ato do Tribunal de Contas da União que importou na anulação de anterior ato administrativo de enquadramento no Regime Jurídico Único dos Servidores Civis da União, sob o fundamento de que, quando da prolação do julgamento, em março de 2001, já teria ocorrido a decadência administrativa. 2. ‘A jurisprudência do STF e do STJ se firmou no sentido de que o executor material de decisão de caráter impositivo do Tribunal de Contas não é a autoridade legitimada a figurar como impetrada em mandado de segurança visando a atacar o referido ato’ (AgRg no RMS 33.019/PE, Rel. p/ Ac. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 3/2/12). 3. Manutenção da decisão agravada, que reconheceu a ilegitimidade passiva ad causam do Ministro de Estado da Defesa, uma vez que este não tem competência para rever decisões proferidas pelo Tribunal de Contas da União. Questões de fundo prejudicadas”71. L) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: PRESIDENTE DA SECCIONAL DA OAB A Ordem dos Advogados do Brasil, sem embargo de sua independência frente à Administração Pública Federal, se enquadra numa categoria única dentro das atividades públicas, o que, na seara do mandado de segurança, a coloca sob o regime da “autoridade federal”, nos termos do art. 2º da Lei nº 12.016. No acórdão do AgRg no REsp 1.255.052, a Segunda Turma do STJ bem precisou essa posição institucional da OAB. İn verbis: “Administrativo e processual civil. Ausência de violação do art. 535 do CPC. Mandado de segurança contra Presidente de subseção da OAB. Competência. Justiça Federal. 1. Em regra, a competência para o processamento do mandado de segurança é identificada perquirindo-se a natureza da autoridade impetrada. Se for autoridade federal, a competência será da Justiça Federal; se estadual, do Poder Judiciário estadual. 2. Há situações em que a autoridade apontada como coatora exerce funções em entidades que, ou são de direito privado, ou não integram os quadros da administração pública direta ou indireta. No caso da OAB, o STF entende que se trata de um serviço público independente, categoria única no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. 3. Nesse contexto, a natureza da pessoa jurídica não será o elemento chave para a identificação da competência para o processamento do mandado de segurança. O que deverá ser observado, nessas situações, é a origem da função que foi delegada à autoridade. 4. As funções atribuídas à OAB pelo art. 44, I e II, da Lei n. 8.906/94 possuem natureza federal. Não há como conceber que a defesa do Estado Democrático de Direito, dos

Direitos Fundamentais, a regulação da atividade profissional dos advogados, dentre outras, constituam atribuições delegadas pelos Estados Membros. 5. Portanto, o presidente da seccional da OAB exerce função delegada federal, motivo pelo qual a competência para o julgamento do mandado de segurança contra ele impetrado é da Justiça Federal. Precedente: (EREsp 235.723/SP, Rel. Min. Fontes de Alencar, Corte Especial, julgado em 23.10.2003, DJ 16.8.2004, p. 118.) Agravo regimental improvido”72. M) JUSTIÇA FEDERAL x JUSTIÇA ESTADUAL: INSTITUIÇÕES DE PRE-VIDÊNCIA SOCIAL Dispõe a Constituição Federal, em seu art. 109, VIII, § 3º, que “serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal...”. Trata-se, à evidência, de norma de exceção e, por isso, de interpretação e aplicação restritivas, que não elimina a competência da Justiça Federal, por inteiro, já que o recurso da decisão da Justiça Estadual será sempre para o Tribunal Regional Federal (CF, art. 109, § 3º). Sua incidência, outrossim, restringe-se às causas previdenciárias comuns, não interferindo na regra especial enunciada no inc. VIII do mesmo dispositivo constitucional, que estatui a competência absoluta da Justiça Federal para os mandados de segurança contra ato de autoridade federal. Segundo velha e firme jurisprudência do STF, o disposto no art. 109, VIII, da Constituição prevalece sobre a previsão do § 3º da referida norma73, entendimento que foi prestigiado por súmula do antigo TRF74 e mantido pelo STJ75. Assim, é certo que a competência excepcional concebida constitucionalmente para autorizar julgamentos de causas da previdência social não se aplica aos mandados de segurança contra a autarquia federal previdenciária.

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BUENO, Cassio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 33. A competência da Justiça Federal, prevista na Súmula nº 511 do STF, aplica-se aos mandados de segurança impetrados por ou contra empresa pública federal, mesmo sendo a parte contrária entidade estadual ou municipal (STF, 2ª T., RE 89.910/ES, Rel. Min. Djaci Falcão, ac. 02.10.1979, RTJ 95/795; STJ, 1ª Seção, CC 4.394/PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 25.05.1993, DJU 02.08.1993, p. 14.160). “O conceito de autoridade, para fins de mandado de segurança, abrange toda pessoa física integrante de órgão público (personalizado ou não personalizado), ente público ou entidade pública, com poder de praticar atos decisórios, por força de competência originária ou delegada,

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em qualquer esfera de poder (Legislativo, Executivo e Judiciário), bem assim, por equiparação legal, o representante de partido político, o dirigente de entidade autárquica ou o dirigente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público no que disser respeito com essas atribuições” (CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 58). Para NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, “quando a autoridade coatora não pertencer aos quadros da União Federal, nem a entidade por ela controlada, mas as consequências patrimoniais do ato coator ou da sentença que vier a ser proferida no mandamus tiverem de ser suportadas pela União ou por entidade por ela controlada a competência para processar e julgar o MS será da Justiça Federal” (Constituição Federal comentada, 3. ed. São Paulo: Editora RT, 2013, p. 1.494). (...) “Mandado de segurança. Investidura. Petrobras. Sociedade de economia mista. Legitimidade passiva. Competência da Justiça Federal. (...). 3. Em Mandado de Segurança, a competência ratione autoritatis (em função da natureza da autoridade impetrada) impõe que o writ seja julgado pela Justiça Federal” (STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 39.578/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 01.03.2012, DJe 12.04.2012). Na lei anterior, a autoridade federal era identificada, para o mandado de segurança, em função de o ato impugnado redundar em consequências a serem suportadas pela União ou pelas “entidades autárquicas federais” (Lei nº 1.533/1951). Ficavam de fora da competência da Justiça Federal os mandados de segurança contra administradores de sociedade de economia mista. Com a nova redação do art. 2º, da lei atual, será a autoridade federal o administrador de qualquer entidade controlada pela União, o que inclui, portanto, os gestores das sociedades de economia mista federais, que ordinariamente se sujeitam à competência da Justiça Estadual, mas que no caso do mandado de segurança, por lei especial, passam para o foro da Justiça Federal. Também os serviços sociais autônomos (SESI, SENAI) foram considerados, para efeito de mandado de segurança, pelo STJ, como “entidades privadas com função delegada do Poder Público Federal”, o que afasta a competência estadual e fixa a da Justiça Federal (STJ, 1ª Seção, CC 35.972/SP, Rel. p/ ac. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 10.12.2003, DJU 07.06.2004, p. 152; STJ, 1ª Seção, CC 122.713/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 08.08.2012, DJe 14.08.2012). Nota-se que os arestos em questão não abordaram a exigência do art. 2º da Lei nº 12.016, que qualifica a autoridade como federal, quando o mandado de segurança sobre seu ato tenha efeitos a serem suportados “pela União ou entidade por ela controlada”. Sendo os serviços sociais autônomos, a inclusão de seus dirigentes na categoria de autoridade federal dependeria de serem eles “entidade controlada” pela União ou por alguma outra entidade federal da administração indireta. Se não houver dito controle no caso SESI/SENAI, não há como deslocar a competência do mandado de segurança, de acordo o art. 2º da Lei nº 12.016. E ao que consta não é o caso dos serviços sociais autônomos, que são entidades de direito privado controladas pelas Confederações Nacionais respectivas, também entidades privadas. A própria jurisprudência do STJ reconhece que “o SENAI [como os demais serviços sociais autônomos] tem natureza jurídica de direito privado, e não integra a Administração Pública direta ou indireta” (STJ, 2ª T., AgRg no Ag 590.050/MG, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 17.08.2006, DJU 12.09.2006, p. 299). Se assim é, não há como enquadrar o dirigente do SESI ou SENAI como autoridade federal, nos moldes do art. 2º da Lei do Mandado de Segurança, uma vez que não há controle, in casu, nem da União, nem de entidade por

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ela controlada. Lei nº 12.016/2009, art. 2º. STJ, 1ª Seção, CC 10.511/RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 13.09.1994, DJU 10.10.1994, p. 27.058. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 175, nota 29, com referência ao CC 13.253-3, do STJ, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJU 05.06.1995, p. 16-611. “Conflito de competência. Mandado de segurança. Concessionária de serviço público. Telefonia celular. Competência da Justiça Estadual” (STJ, 1ª Seção, CC 20.648/RS, Rel. Min. Hélio Mosimann, ac. 16.12.1997, DJU 25.02.1998, p. 11). STJ, 1ª Seção, CC 16.409/RS, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 26.06.1996, DJU 26.08.1996, p. 29.617. STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.034.351/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 23.04.2009, DJe 19.05.2009. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, CC 33.837/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 13.03.2002, DJU 08.04.2002, p. 120; STJ, 1ª Seção, CC 54.854/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 22.02.2006, DJU 13.03.2006, p. 172; STJ, 1ª Seção, CC 46.740/CE, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 14.12.2005, DJU 17.04.2006, p. 163; STJ, 1ª Seção, CC 48.635/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 28.05.2008, DJe 12.08.2008; STJ, 1ª Seção, CC 71.843/PE, Rel. para acórdão Min. Teori Albino Zavascki, ac. 11.06.2008, DJe 17.11.2008. STJ, 1ª Seção, CC 64.869/AL, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 13.12.2006, DJU 12.02.2007, p. 219; STJ, 1ª Seção, CC 142.351/BA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 23.09.2015, DJe 30.09.2015; STJ, 1ª Seção, CC 34.521/MA, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 27.05.2002, DJU 23.09.2002, p. 218. Essa é, também, a jurisprudência do STF, que, igualmente, não considera o interesse reflexo da União, nos repasses de recursos para Estados e Municípios, para justificar o deslocamento das ações contra o delegatário para a competência da Justiça Federal (STF, 1ª T., HC 90.174/GO, Rel. Min. Menezes Direito, ac. 04.12.2007, DJe 14.03.2008). Daí a conclusão doutrinária de que, na interpretação do art. 2º da Lei nº 12.016, “o interesse que justifica a competência da Justiça Federal é não apenas aquele reflexo, na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça” (CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. Comentários ao art. 2º da Lei 12.016. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel, et alĊomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 39). CAVALCANTI, Themístocles Brandão. Voto de Relator no STF, MS 18.555/DF, ac. 14.06.1968, DJU 13.09.1968. “Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais de direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro”. “Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso”. (Lei nº 8.935, de 18.11.1994). “Em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade objetiva é do notário, no que assume posição semelhante à das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos – § 6º do artigo 37 também da Carta da

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República” (STF, 2ª T., RE 201.595/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 28.11.2000, DJU 20.04.2001, p. 138). STF, 2ª T., RE 518.894 Agr/SP, Rel. Min. Ayres Britto, ac. 02.08.2011, DJe 22.09.2011. STF, Pleno, RE 842.846 RG/SC, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 06.11.2014, DJe 17.11.2014. STJ, 2ª T., EDcl no REsp. 1.655.852/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 05.12.2017, DJe 19.12.2017. O entendimento é seguido pela doutrina: “Entendemos que, considerando o regime de delegação e a percepção integral de emolumentos pelos titulares de serventias não oficializadas, inexiste, a princípio, responsabilidade direta do Estado por atos desses agentes delegados. A responsabilidade do ente estatal delegante deve ser tão somente subsidiária, no caso de insolvência do agente delegado, este – sim – diretamente responsável” (BENÍCIO, Hercules Alexandre da Costa; LEMOS, Raphael Abs Musa de. A responsabilidade civil de notários e registradores. In: ROSELVAND, Nelson; MILAGRES, Marcelo. Responsabilidade Civil novas tendências, Indaiatuba: Editora Foco, 2017, p. 531). TFR, ac. in RTFR 104/177, apud NEGRÃO, Theotônio; et al, cit., p. 1.825; e TFR, ac. in RDA 160/220. Também, no caso em que a execução de serviço federal é delegada a funcionário estadual ou municipal, não resta descaracterizada a sua natureza, sendo, por isso, competente a Justiça Federal para processar e julgar as ações com ele relacionadas (STF, RTJ 98/345). O mesmo ocorre com as delegações informais: “o ato praticado ‘de ordem’ resulta de delegação administrativa informal. Compete à Justiça Federal de primeiro grau conhecer de mandado de segurança contra ato de delegado regional, praticado ‘de ordem’ do Ministro de Estado” (STJ, RSTJ 81/37). “‘O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações’ (Enunciado 331, item IV, do TST)” (STJ, 2ª T., REsp 916.334/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 25.08.2009, DJU 31.08.2009). “Acidente de trânsito ocorrido com veículo de firma individual, contratada para transportar, coletar e entregar as mercadorias de empresa de fabricação e comercialização de bebidas, ostentando publicamente a marca notória da empresa contratante. Responsabilidade civil pelos danos causados pela contratada na execução dos serviços terceirizados” (STJ, 4ª T., AgRg no Ag 1.413.358/BA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, ac. 11.12.2012, DJe 01.02.2013). STJ, 3ª Seção, MS 3.039/DF, Rel. Min. Vicente Cernicchiaro, ac. 16.09.1993, DJU 22.11.1993, p. 24.873. É importante ter em conta que, segundo a própria Lei do Mandado de Segurança, se considera coator o representante ou administrador das pessoas naturais ou jurídicas com funções delegadas Constituição Federal: Art. 5º (...) “LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Constituição Federal: Art. 5º (...) “LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. “A pessoa jurídica de direito público a suportar os ônus da sentença proferida em mandado de segurança é parte legítima para figurar no polo passivo do feito, por ter interesse direto na causa” (STJ, 1ª T., REsp 547.235/RJ, ac. 18.12.2003, DJU 22.03.2004, p. 237).

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STJ, Corte Especial, EREsp 936.205/PR, ac. 04.02.2009, DJe 12.03.2009. STJ, 2ª Seção, CC 14.464/PR, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 14.02.1996, RSTJ 92/157. STJ, 1ª Seção, EDcl no AgRg no CC 89.783, Rel. Min. Mauro Campbell, ac. 09.06.2010, DJe 18.06.2010. No mesmo sentido: STJ, 1a T., AgInt no Resp. 1.361.769/CE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 20.10.2016, DJe 08.11.2016. Registramos, também, que a doutrina, de maneira geral, não tem questionado a orientação dos tribunais superiores no tocante ao reconhecimento da competência da Justiça Federal firmada em função do exercício de delegação federal, mesmo que não haja reflexo jurídico--econômico do mandamus em sua esfera (conferir, por exemplo, MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 76). STJ, 1ª Seção, CC 122.713/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 08.08.2012, DJe 14.08.2012. Precedente: STJ, 1ª Seção, CC 35.972/SP, Rel. p/ ac. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 10.12.2003, DJU 07.06.2004, p. 152. STJ, 3ª Seção, MS 4.167/DF, Rel. Min. Anselmo Santiago, ac. 25.06.1997, DJU 1º.09.1997, p. 40.720. “A competência para processar e julgar o mandado de segurança é funcional e territorial, valendo dizer que se define pela categoria da autoridade coatora e, ainda, pelo local onde esta exerce suas funções. Em qualquer situação, a competência é absoluta, não devendo ser modificada nem prorrogada”. Quando, porém, na própria Constituição há uma competência privilegiada em função da autoridade e outra em relação a matéria sobre que versa o mandamus, “o critério da categoria da autoridade deve prevalecer sobre o critério da matéria” (STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 8.909/DF, Voto do Rel. p/ ac. Min. Castro Meira, ac. 27.02.2008, DJe 29.09.2008). STF, Pleno, MS 25.624-QO/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 03.11.2005, DJU 10.08.2006, p. 20. STF, 1ª T., MS 31.396-AgR/AC, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 26.02.2013, DJe 14.05.2013. “Compete à Justiça Estadual, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas em que for parte o Banco do Brasil S.A.” (Súmula nº 508 do STF). Contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores das empresas públicas e das sociedades de economia mista não cabe mandado de segurança (Lei 12.016, art. 1º, § 2º). “Ora, em se tratando de ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista federal, a autoridade que o pratica é federal (e não estadual, distrital ou municipal)” (STJ, 1ª Seção, CC 71.843/PE, Rel. p/ ac. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 11.06.2008, DJe 17.11.2008). STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 97.899/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 08.06.2011, DJe17.06.2011. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 112.642/ES, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 09.02.2011, DJe 16.02.2011. STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 118.872/PA, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 23.11.2011, DJe 29.11.2011. STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 109.584/PE, Rel. Min. Arnaldo Esteves, ac. 25.05.2011, DJe 07.06.2011. Segundo a Súmula nº 508 do STF, “compete à Justiça Estadual, em ambas as

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instâncias, processar e julgar as causas, em que for parte o Banco do Brasil S.A.”. Isso prevalecerá, no entanto, enquanto não se tratar de mandado de segurança que envolva ato do Banco, praticado no exercício de atribuições do poder público federal (art. 1º, § 1º, c/c art. 2º) (cf. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 60). “As sociedades de economia mista só têm foro na Justiça Federal quando a União intervém como assistente ou opoente” (Súmula nº 517 do STF). STJ, 1ª Seção, CC 120.890/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 13.06.2012, DJe 19.06.2012. No mesmo sentido: STJ, 2ª Seção, CC 129.193/MT, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 28.10.2015, DJe 27.11.2015. STJ, 3ª Seção, CC 107.107/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 26.05.2010, DJe 11.06.2010. STJ, 1ª Seção, CC 121.021/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 30.05.2012, DJe 05.06.2012. O acórdão faz referência ao antigo Estatuto do Estrangeiro, lei essa já revogada e substituída pela atual Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017). STJ, 1ª Seção, CC 112.372/MG, Rel. Min. Castro Meira, ac. 22.09.2010, DJe 05.10.2010. STJ, 1ª Seção, CC 112.372/MG, cit. STJ, 1ª Seção, CC 118.163/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 25.04.2012, DJe 04.05.2012. STJ, 1ª Seção, CC 122.713/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 08.08.2012, DJe 14.08.2012. Essa jurisprudência, data venia, não se harmoniza com a atual exigência do art. 2º da Lei nº 12.016, que para a configuração de competência em mandado de segurança exige que os efeitos do writ sejam suportados pela União ou entidade por ela controlada. Como o SENAI é entidade de direito privado, que não integra nem a administração direta, nem a indireta, nem é controlado pela União, ou por entidade da administração indireta, não se vê como o mandado de segurança na espécie possa ser atribuído à Justiça Federal. STJ, 1ª Seção, AgInt no CC 152.104/PR, Rel. Min. Assusete Magalhães, ac. 27.09.2017, DJe 06.10.2017. STJ, 1ª T., REsp 1.087. 892/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 22.06.2010, DJe 03.08.2010. “1. A competência para julgamento de mandado de segurança é fixada em razão do cargo ocupado pela autoridade apontada como coatora, sendo irrelevante a natureza jurídica da questão a ser apreciada no mandamus. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 2. No caso dos autos, a candidata impetrou ação mandamental para impugnar a correção de prova de concurso público, apontando como autoridade coatora o Presidente da Comissão de Processos Vestibulares da Universidade Federal de Campina Grande, órgão responsável pela realização do certame. 3. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo Federal da 6ª Vara de Campina Grande – SJ/PB, ora suscitante” (STJ, 3ª Seção, CC 103.883/PB, Rel. Min. Jorge Mussi, ac. 09.02.2011, DJe 21.02.2011). “Compete à Justiça Federal julgar mandado de segurança contra ato que diga respeito ao ensino superior, praticado por dirigente de estabelecimento particular” (Súmula nº 15/TRF). “No exercício das atividades relativas a ensino superior, age o agente do corpo docente como delegado do Poder Público, sendo competente para o exame judicial de tais atos a Justiça

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Federal” (STJ, 1ª Seção, CC 22.473/MG, Rel. Min. Eliana Calmon. ac. 22.09.1999, DJU 08.11.1999, p. 69). No mesmo sentido: STF, 1ª T., RE 102.642/SP, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 14.08.1984, RTJ 111/452; STF, 2ª T., RE 101.110/SP, Rel. Min. Djaci Falcão, ac. 28.06.1984, RTJ 111/779; STJ, 1ª Seção, CC 2.488/GO, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 20.04.1993, RSTJ 48/45; “7. Permanece inalterado o critério definidor da competência para o julgamento de mandado de segurança, em que se leva em conta a natureza das pessoas envolvidas na relação processual, ratione personae, sendo irrelevante, para esse efeito e ressalvadas as exceções mencionadas no texto constitucional, a natureza da controvérsia sob o ponto de vista do direito material ou do pedido formulado na demanda. 8. Nos processos em que envolvem o ensino superior, são possíveis as seguintes conclusões: a) mandado de segurança – a competência será federal quando a impetração voltar-se contra ato de dirigente de universidade pública federal ou de universidade particular; ao revés, a competência será estadual quando o mandamus for impetrado contra dirigentes de universidades públicas estaduais e municipais, componentes do sistema estadual de ensino; b) ações de conhecimento, cautelares ou quaisquer outras de rito especial que não o mandado de segurança – a competência será federal quando a ação indicar no polo passivo a União Federal ou quaisquer de suas autarquias (art. 109, I, da Constituição da República); será de competência estadual, entretanto, quando o ajuizamento voltar-se contra entidade estadual, municipal ou contra instituição particular de ensino” (STJ, 1ª Seção, CC 108.466/RS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 10.02.2010, DJe 01.03.2010). STJ, 1ª Seção, AgRg no CC 109.231/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 28.04.2010, DJe 10.09.2010. CARREIRA ALVIM. Ċomentários à nova Lei do Mandado de segurança, cit., p. 61. STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.274.304/RS, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 17.04.2012, DJe 25.04.2012. STJ, 1ª Seção, CC 40.512/SC, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 10.03.2004, DJU 05.04.2004, p. 190. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, CC 39.973/PB, Rel. Min. José Delgado, ac. 11.02.2004, DJU 08.03.2004, p. 164; STJ, 1ª Seção, CC 108.466/RS, cit. STF, 2ª T., RE 101.110-6/SP, Rel. Min. Djaci Falcão, ac. 28.06.1984; STF, 1ª T., RE 102.642-21/SP, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 14.08.1984. Apud REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 339. STJ, 2ª T., REsp 1.295.790/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.11.2012, DJe 12.11.2012. STJ, 3ª Seção, AgRg no CC 27.105/RJ, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 13.09.2000, DJU 16.10.2000, p. 282. No mesmo sentido: STJ, 3ª Seção, CC 4.489/MG, Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, ac. 28.08.1996, DJU 14.10.1996, p. 38.922. Costuma-se, no entanto, preservar a competência da Justiça Estadual, quando o mandado de segurança é contra ato do diretor do estabelecimento superior de ensino, de natureza meramente administrativa, “que não diga respeito à atividade delegada pelo poder público federal” (STJ, 1ª Seção, CC 9.418/GO, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 23.08.1994, DJU 12.09.1994, p. 23.700). Nessa categoria inclui-se a causa relativa a mensalidades escolares cobradas pelos estabelecimentos particulares, hipótese em que a competência é da Justiça Estadual e não da Federal (Súmula nº 34/STJ).

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STJ, 1ª Seção, CC 40.679/SC, Rel. Min. Castro Meira, ac. 11.02.2004, RSTJ 178/66; STF, Pleno, RE 95.722/SP, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 17.03.1982, RTJ 105/303. STJ, 2ª Seção, CC 1.622/DF, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 27.02.1991, DJU 25.03.1991, p. 3.207. STJ, 1ª Seção, CC 91.264/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 28.10.2009, DJe 06.11.2009. STJ, 1ª Seção, CC 46.512/RN, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 10.08.2005, DJU 05.09.2005, p. 198. No mesmo sentido foi decidido conflito de competência em torno de mandado de segurança impetrado pela Caixa Econômica Federal contra decisão de Juiz estadual (STJ, 1ª Seção, CC 45.709/SP, Rel. p/ ac. Min. Luiz Fux, ac. 23.08.2006, DJU 18.09.2006, p. 247); ou mandado de segurança impetrado pelo IBAMA contra decisão de juiz estadual (STJ, 3ª Seção, CC 129.174/DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, ac. 09.09.2015, DJe 16.09.2015). STF, Pleno, RE 176.881/RS, Rel. p/ ac. Min. Ilmar Galvão, ac. 13.03.1997, DJU 06.03.1998, p. 18. De acordo com o art. 102, I, d, da CF, o mandado de segurança contra ato do Tribunal de Contas da União inclui-se na competência originária do Supremo Tribunal Federal: “é competente, originariamente, o Supremo Tribunal Federal para o mandado de segurança contra ato do Tribunal de Contas da União” (Súmula nº 248 do STF). STJ, 1ª T., AgRg no Ag 1.397.677/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 23.04.2013, DJe 26.04.2013. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., AgRg no AREsp. 444.257/MA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 23.09.2014, DJe 02.10.2014 STJ, 5ª T., AgRg no RMS 29.564/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, ac. 03.03.2011, DJe 14.03.2011. STJ, 5ª T., AgRg no RMS 28.860/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, ac. 19.09.2013, DJe 25.09.2013. STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 16.270/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 10.10.2012, DJe 19.10.2012. Ver, no mesmo sentido: STJ, 1ª T., AgRg no RMS 33.019/PE, Rel. p/ ac. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 08.11.2011, DJe 03.02.2012; STJ, 6ª T., AgRg no RMS 20.175/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 24.11.2009, DJe 14.12.2009. STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.255.052/AP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 06.11.2012, DJe 14.11.2012. STF, 1ª T., RE 75.323/RS, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, ac. 27.04.1973, RTJ 66/286; STF, 1ª T., RE 79.846/RS, Rel. Min. Antônio Neder, ac. 23.05.1978, RTJ 86/831. “Compete à Justiça Federal processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato de autoridade previdenciária, ainda que localizada em comarca do interior” (Súmula nº 216/TRF). STJ, 1ª Seção, CC 3.224/SP, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 20.04.1993, DJU 17.05.1993, p. 9.267.

Capítulo IV SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL Art. 3º. O titular de direito líquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro poderá impetrar mandado de segurança a favor do direito originário, se o seu titular não o fizer, no prazo de 30 (trinta) dias, quando notificado judicialmente. Parágrafo único. O exercício do direito previsto no caput deste artigo submete-se ao prazo fixado no art. 23 desta Lei, contado da notificação.

Comentários ao art. 3º 31. LEGITIMAÇÃO DE TERCEIRO INTERESSADO: SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL Às vezes o direito da parte é violado indiretamente, porquanto o ato abusivo ou ilegal da autoridade atinge o direito de outrem, do qual depende o do impetrante notificar o titular do direito originário para que este impetre o mandado de segurança em prazo razoável1. Se, apesar de notificado, este não tomar a providência, o terceiro prejudicado ficará autorizado a requerer a segurança em nome próprio, como substituto processual (Lei nº 12.016, art. 1º, § 3º)2. Explicam José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo que “o art. 3º da Lei nº 12.016/2009 procura tutelar a expectativa legítima do terceiro de boa-fé que não pode ser obliterado em sua posição jurídica pela inação do titular”. É que pode ocorrer “que o ato coator praticado provoque efeito reflexo ou direto sobre a posição jurídica do terceiro, o qual dependerá da postulação ativa do titular para defesa quanto ao ato ilegal ou abusivo”. Assim é que “a dinâmica das relações sociais permite que o terceiro possa se antecipar ao próprio titular da pretensão e ajuizar o mandado de segurança”3. Sua legitimação é extraordinária e só se configurará depois de notificado o real titular do direito de ação (aquele cujo direito foi violado pelo coator) e ultrapassado o prazo de 30 dias. O terceiro não estará defendendo seu próprio direito na ação de segurança, mas sim o daquele que permaneceu inerte diante da prática ilegal ou abusiva da autoridade pública. E o fará somente porque seu direito próprio, que não está em jogo no processo, tem sua eficácia na dependência do resultado favorável do writ em favor daquele que não cuidou tempestivamente de repelir o ato ilegal ou abusivo. A ação do terceiro, de tal sorte, corresponderá a uma substituição processual, ou seja, pleiteará, em nome próprio, direito alheio, por expressa autorização de lei (CPC/2015, art. 184).

Um traço característico da substituição processual, quando autorizada em lei, reside na possibilidade de o substituto exercer a ação “sem anuência do substituído, independentemente de sua vontade e até contra sua vontade”5. O que for decidido sobre o mérito do mandado de segurança impetrado em situação de substituição processual gerará efeito recoberto da autoridade de coisa julgada perante o substituto e o substituído, seja a decisão de deferimento ou denegação do mandamus. Por isso mesmo, tem o substituído legitimação para interferir, a qualquer tempo, no processo, já que, afinal, o direito em discussão é de sua titularidade. Recebê-lo-á, porém, no estado em que estiver, passando a atuar, ao lado do impetrante, como litisconsorte ativo superveniente6. A notificação exigida pela Lei nº 12.016, art. 1º, § 3º, não amplia o prazo decadencial de 120 dias para a impetração do mandamus (art. 23). O terceiro terá de diligenciar para que a notificação se dê a tempo de ingressar em juízo com a ação de segurança, antes de ocorrida a decadência do direito de promovê-la7.

32. OUTRO CASO DE LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA (PARCIAL) O § 3º do art. 1º da Lei nº 12.016 também permite uma substituição processual, quando, diante de lesão ou ameaça a direito que cabe a várias pessoas, dispensa a formação de litisconsórcio ativo, permitindo que qualquer dos cotitulares possa impetrar o mandado de segurança. O impetrante, na espécie, age singularmente, sem depender de mandato ou autorização dos demais interessados. Age em nome próprio, mas defende não só seu direito, como também o de terceiros. Por isso, a substituição processual se dá apenas em parte, ou seja, na parcela do direito defendido que toca aos outros cotitulares8. Impende ressaltar que as legitimações extraordinárias, a título de substituição processual só podem ocorrer nos casos expressamente previstos em lei (CPC/2015, art. 18). Não há substituição convencional ou voluntária, fora das exceções legais. Nessa linha, decidiu o STJ, por exemplo, que “a pessoa jurídica não tem legitimidade extraordinária para impetrar mandado de segurança buscando anular a inscrição do nome de seus sócios na dívida ativa em consequência de irregularidades praticadas por eles em outro grupo societário, e não em razão de seus próprios débitos fiscais. Não se confunde a personalidade jurídica da empresa com a de seus sócios”9. A partir dessa mesma perspectiva, o Supremo Tribunal Federal entende que “o autor da ação de mandado de segurança individual não pode pleitear, em nome próprio, a tutela jurisdicional de direito público subjetivo alheio, salvo quando autorizado por lei (CPC, art. 6º) [NCPC, art. 18]”. Por consequência, decidiu que “o impetrante do mandado de segurança individual, por não dispor de legitimação extraordinária para agir, não pode invocar a proteção jurisdicional do Estado em favor da generalidade dos participantes de um determinado concurso público”10.

O dispositivo da Lei do Mandado de Segurança em comento, todavia, não se presta a legitimar o impetrante individual para postular tutela de direito difuso ou coletivo, uma vez que, se tal lhe fosse facultado, estaria, na verdade, transformando o mandado em coletivo, sendo certo que a legitimação para ação da espécie é confiada a entidades especificamente definidas na Constituição e na Lei nº 12.01611.

33. REQUISITOS DA SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL A norma do art. 3º da Lei nº 12.016 pressupõe a intervinculação entre dois direitos subjetivos: um originário e outro derivado. Sem a manutenção do primeiro, não subsistirá o segundo. Daí que, violado aquele por ato ilegal de autoridade, sem que o respectivo titular o defenda, surgirá a legitimação extraordinária do titular do direito derivado, para impetrar o mandado de segurança em defesa de direito que não lhe pertence, mas do qual depende o direito próprio. Como a defesa, em nome próprio, de direito alheio se dará pela via especial do mandado de segurança, exige a lei que ambos os direitos (o do substituto e o do substituído) se revistam das características reclamadas para a tutela mandamental.

CELSO BARBI12, em face disso, arrola os seguintes requisitos, para viabilizar a substituição processual, que já era prevista pelo art. 3º da Lei nº 1.533, e que foi mantida pela Lei nº 12.016: a)

O direito do substituto processual deve ser decorrente do direito do substituído (por exemplo: o terceiro alugou um prédio comercial recém-construído, cuja utilização depende do “habite-se”, que o dono já requereu, mas a Prefeitura, absurdamente, não o expede); essa subordinação entre os dois direitos subjetivos é que configura o interesse processual do substituto, para justificar a impetração do mandado de segurança em defesa de um direito que não lhe pertence.

b)

Ambos os direitos devem ser líquidos e certos, isto é, hão de se encontrar em condição de comprovação imediata por meio de prova documental pré--constituída.

c)

Deve o titular do direito originário ter sido notificado judicialmente a impetrar a segurança, não o tendo feito no prazo de direito (30 dias, segundo o art. 3º da Lei nº 12.016).

É importante ressaltar que, uma vez admitida e exercida a substituição processual, a sentença da ação manejada pelo substituto, resolvendo o mérito da causa, fará coisa julgada material perante o impetrante e o substituído13. Note-se, outrossim, que a impetração da segurança pelo substituto processual não impede que, a

qualquer tempo, o substituído ingresse no processo14, visto que, afinal, é ele o legítimo titular do direito subjetivo em litígio. Entretanto, se o titular do direito originário impetra mandado de segurança, “cessa o interesse do terceiro (fato superveniente – art. 462 do CPC) [CPC/2015, art. 493], com a extinção do anterior mandado de segurança e o prosseguimento da discussão naquele sob a responsabilidade do real titular do direito”15.

34. NOTIFICAÇÃO DO LEGITIMADO ORIGINÁRIO Para que o legitimado extraordinário se credencie à propositura do mandado de segurança previsto no art. 3º da Lei nº 12.016, deverá, previamente, proceder à notificação do legitimado originário, dando-lhe o prazo de 30 dias para que afore a impetração. Essa notificação terá de ser judicial, e só depois de ultrapassados os 30 dias, sem que o substituído tenha proposto o writ, é que o substituto processual poderá fazê-lo. Ocorrendo manifestação expressa, em documento firmado pelo titular do direito originário, de que não irá propor a ação mandamental, não haverá necessidade de notificá-lo. Sua declaração de vontade supre a notificação. O substituto poderá impetrar a segurança sem formalizar a notificação judicial. Também não haverá necessidade de aguardar o transcurso de 30 dias se, antes do respectivo termo, o notificado declarar documentalmente que não irá ajuizar a ação mandamental. Em todos esses casos, o substituto processual terá de comprovar, por documentos juntados à inicial, o direito subjetivo originário e o derivado, a notificação judicial ou a declaração do legitimado primitivo de que não irá propor o mandado de segurança.

35. O PRAZO DA NOTIFICAÇÃO E O PRAZO DE DECADÊNCIA DA AÇÃO MANDAMENTAL O art. 3º da Lei nº 12.016 estipula dois prazos a serem observados pelo substituto processual: (i) o de 30 dias após a notificação feita ao titular do direito lesado ou ameaçado pela autoridade coatora (caput do art. 3º); e (ii) o de 120 dias previsto no art. 23, “contado da notificação” (parágrafo único do art. 3º). Há quem interprete o dispositivo legal como autorizador da contagem do prazo de decadência do mandado de segurança a partir do momento em que a notificação se fez ao titular do direito de ação (o substituído)16. A melhor exegese, no entanto, é a que se faz teleologicamente, respeitando o sistema da Lei nº 12.016, como um todo. A caducidade refere-se ao direito do substituído, e não do substituto processual. Este não está exercendo direito próprio, está defendendo, em nome próprio, direito alheio. Se se dispõe a fazê-lo, é lógico que tenha de se sujeitar aos termos e condições em que o titular do direito defendido poderia exercitá-lo.

O que o art. 3º, parágrafo único, quis dizer foi que, além de observar o prazo do art. 23, o substituto processual tem, também, de cumprir o prazo da notificação.

Terá, portanto, de proceder à notificação, de modo que os 30 dias nela estipulados corram antes da expiração do prazo decadencial a que se acha exposto o direito do substituído. Supor que a notificação, a qualquer tempo, teria o condão de reabrir o prazo do art. 23, equivaleria a ampliar ou protelar um termo fatal, o que é incompatível com a natureza das caducidades legais17. Portanto, o prazo decadencial para propositura do mandado de segurança continua a ser contado da ciência do ato da autoridade coatora “pelo interessado”, isto é, pelo titular do direito subjetivo que dito ato lesou ou ameaçou. Observa CARREIRA ALVIM, com propriedade, que esse modo de contagem do prazo em questão só se aplica aos mandados de segurança que atacam atos comissivos da Administração, visto que para os omissivos não há incidência de prazo extintivo18. Assim é porque a violação do direito, em tais casos, é continuativa e perdura enquanto durar a omissão da autoridade.

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A Lei nº 12.016 fala em 30 dias como sendo o prazo mínimo necessário para autorizar o terceiro a propor o mandado de segurança, em lugar do inerte. A lei anterior não exigia notificação do substituído, na espécie, como reconhecia a jurisprudência do STJ (5ª T., RMS 3.033/MA, Rel. Min. José Dantas, ac. 27.10.1993, DJU 29.11.1993, p. 25.896). O STF, todavia, preconizava que a substituição processual em questão dependia da inércia do substituído, depois de notificado a impetrar a segurança (STF, Pleno, MS 21.632/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 12.05.1993, DJU 06.08.1993, p.14.902). Prevaleceu na Lei 12.016, art. 3º, a orientação do STF. Observa Eduardo Talamini que “o dispositivo em questão dá uma solução bastante razoável para o impasse que se tem quando o interesse concreto e a legitimidade ativa para a medida judicial não recaem sobre o mesmo sujeito. Não é algo incomum na prática (pense-se nas habituais disputas, em direito tributário, acerca da legitimidade e interesse processual do ‘contribuinte de fato’ e do ‘contribuinte de direito’)” (Nota sobre as partes e os terceiros no mandado de segurança individual, à luz de sua nova disciplina (Lei 12.016). Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n.º 29, ago. 2009, disponível em: , acesso em: 8 set. 2009). O mesmo trabalho pode ser encontrado na Revista Dialética de Direito Processual n. 80, p. 33-51 (v. especialmente o item 2.2, p. 33). DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES exemplifica a situação do segundo colocado em concurso público que, diante da inércia do primeiro colocado, impetra mandado de segurança contra a convocação do terceiro colocado no certame (Ações constitucionais, cit., p. 136). MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e

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coletivo. Comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: RT, 2009, p. 66. CPC/1973, art. 6º. ARAUJO CINTRA, Antônio Carlos de. Estudo sobre a substituição processual no direito brasileiro, RT, 438/28, abr./1972; CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; et al. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 118. TALAMINI, Eduardo. Partes e os terceiros no mandado de segurança individual à luz de sua nova disciplina – Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 80, nov. 2009, p. 34 (v., adiante, os itens 91 e 166). No mesmo sentido: NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 137. CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. Comentário ao art. 1º da Lei 12.016. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários a nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 45-46. No mesmo sentido: NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 138. ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Op. cit., p. 93; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 31. STJ, 2ª T., REsp 535.630/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 12.12.2006, DJU 08.02.2007, p. 308. STF, 1ª T., RMS 21.045/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 29.03.1994, DJU 30.09.1994, p. 26.169. No mesmo sentido: STF, ARE 730.230/MS, Rel. Min. Rosa Weber, dec. mon. de 11.02.2013, DJe 25.02.2013. “(...) 4. A autora – pessoa jurídica fabricante de refrigerante – não defende direito individual ou próprio. Na verdade, apresenta interesse meramente econômico ao pretender retirar do mercado produto de empresa concorrente. 5. Improcede o argumento de que a impetrante estaria atuando na defesa da ‘saúde física e mental da população brasileira’. Com efeito, o Mandado de Segurança não é sucedâneo de Ação Popular ou de Ação Civil Pública. 6. A inexistência de direito individual a ser protegido por Mandado de Segurança conduz ao reconhecimento da ilegitimidade ativa da impetrante e da inadequação da via eleita. 7. Mandado de Segurança extinto, sem exame do mérito” (STJ, 1ª Seção, MS 10.530/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 14.10.2009, DJe 23.10.2009). BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, n. 147, p. 147. No mesmo sentido: DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 93. ARMELIN, Donaldo. Tutela jurisdicional diferenciada. Rev. de Processo, n. 65, p. 45; CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel; et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 44; CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 120; BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança, cit., n. 149, p. 148. BARBI, Celso Agrícola. Op. cit., loc. cit. CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo. In: GOMES JUNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à Lei

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do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 75. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 267. CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança, cit., p. 123. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 70.

Capítulo V MANDADO DE SEGURANÇA EM REGIME DE URGÊNCIA Art. 4º. Em caso de urgência, é permitido, observados os requisitos legais, impetrar mandado de segurança por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada. § 1º Poderá o juiz, em caso de urgência, notificar a autoridade por telegrama, radiograma ou outro meio que assegure a autenticidade do documento e a imediata ciência pela autoridade. § 2º O texto original da petição deverá ser apresentado nos 5 (cinco) dias úteis seguintes. § 3º Para os fins deste artigo, em se tratando de documento eletrônico, serão observadas as regras da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil.

Comentários ao art. 4º 36. IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA POR MEIO ELETRÔNICO Em caso de urgência, a impetração do mandado de segurança poderá acontecer por meio eletrônico, como telegrama, radiograma, fax etc. É necessário, contudo, que se observem os requisitos legais para que o emprego dessas modalidades de comunicação seja processualmente válido. Vale dizer: é preciso que a Justiça disponha de recursos para comprovar a autenticidade da petição enviada eletronicamente. O uso do telefone, por exemplo, está previsto no Código de Processo Civil de 2015 para a transmissão de carta precatória urgente, desde que sejam observadas as cautelas dos parágrafos do seu art. 2651, destinadas à autenticação da origem. Tais providências são facilmente observáveis entre secretarias judiciais. Não são praticáveis, no entanto, entre o impetrante e o juízo, cuja secretaria dificilmente teria como certificar a autenticidade de telefonema oriundo de particular. Já o emprego do fax é de ocorrência constante nas petições forenses. Há legislação cuidando da matéria, na qual se prevê que a origem da petição se comprovará por meio de entrega, posterior, dos originais, dentro do prazo de cinco dias, contados na forma do art. 2º da Lei nº 9.800/1999. A Lei nº 12.016 também adota a comprovação de autenticidade a posteriori, por meio da apresentação em juízo do original da petição, nos cinco dias seguintes ao envio da mensagem eletrônica (art. 4º, § 2º). Trata-se de medida observável não só em relação ao fax, mas a todos os veículos eletrônicos2. Excluem-se, porém, as petições endereçadas segundo as regras do

procedimento informatizado, sujeito ao regime previsto no § 3º do art. 4º, sob comento. Nos juízos em que o processo eletrônico já se achar implantado, a internet será o meio eletrônico mais singelo e eficiente para o ajuizamento de mandado de segurança urgente. O art. 1933 do CPC/2015 admite que todos os atos processuais sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico, atentando-se à implantação do processo eletrônico no ordenamento jurídico pátrio. Os arts. 194 a 199 do CPC/2015 regulam e disciplinam a prática eletrônica dos atos processuais. A Lei nº 11.419/2006, que continua sendo aplicável mesmo após o CPC/2015, por sua vez, regula o uso desse meio na tramitação dos processos judiciais e na transmissão de peças processuais. A Lei nº 12.016 também acolhe o documento eletrônico como útil e válido para o processamento do mandado de segurança. A autenticação, na espécie, dar-se-á pela observância das regras da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP- Brasil (Lei do Mandado de Segurança, art. 4º, § 3º). Dito sistema compreende a “expedição de certificados digitais, que congrega uma entidade-raiz e outras destinadas à certificação e ao registro, todas envoltas em diversas e complexas atividades, sob normas e princípios próprios”4. Nesse contexto – adverte SIDNEY PALHARINI JÚNIOR –, “para se admitir a impetração do mandado de segurança por meio eletrônico de autenticidade comprovada, deverá o impetrante, previamente, realizar cadastro e obter o seu certificado digital perante uma Autoridade Certificadora (AC), além de assegurar que o destinatário também possua sua chave privada para decriptografar a mensagem”5.

37. NOTIFICAÇÃO E INTIMAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO Não é só a impetração que pode ser efetuada por meio eletrônico. Também o juiz, em caso de urgência, pode usar os veículos de comunicação eletrônica para proceder à notificação da autoridade coatora e à intimação do representante judicial da pessoa jurídica, pela mesma via (art. 4º, § 1º), no entender de CARREIRA ALVIM6. Pensamos, porém, que a notificação da autoridade coatora por via eletrônica se prende à preocupação da lei com o cumprimento imediato da liminar, tanto que o § 1º do art. 4º limitou-se a permitir a medida apenas no tocante àquela autoridade. Silenciando-se sobre a ciência a ser dada ao representante da pessoa jurídica interessada, que configura a citação do sujeito passivo da ação mandamental, sua forma solene ficou restrita à prevista no art. 7º, inc. II: remessa de “cópia da inicial sem documentos”. É bom lembrar que “as citações e as intimações serão nulas, quando feitas sem observância das prescrições legais” (CPC/2015, art. 2807)8. Ademais, não haveria, praticamente, economia processual significativa, visto que a recepção da intimação pela pessoa jurídica por meio eletrônico teria de ser confirmada, de alguma forma, o que não seria fácil para o juízo. Apenas no processo informatizado, portanto, é que uma intimação ou citação eletrônica se tornaria realmente útil.

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CPC/73, art. 207. Para DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, se não houver o protocolo do original no prazo de cinco dias, “como não se pode afirmar pela intempestividade do mandado de segurança”, como ocorre nos recursos interpostos via fax, o writ, provavelmente, “será extinto sem a resolução do mérito por vício formal” (Ações constitucionais cit., p. 150; KLIPPEL, Rodrigo; NEFFA JR., José. Ċomentários à Lei de Mandado de Segurança. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 75). CPC/73, art. 154, § 2º. CALMON, Petrônio. Ċomentários à lei de informatização do processo judicial. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 31. “Dessa forma, a certificação digital da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil garante a identificação das pessoas em ambiente digital, protege o sigilo dos documentos e das comunicações, viabiliza a assinatura digital, conferindo ao destinatário a segurança de que o documento ou a mensagem transmitida teria sido elaborada pelo remetente e implementa o não repúdio, que é a ‘impossibilidade de que aquele que apôs sua assinatura digital e enviou o documento eletrônico negue ter adotado tais atitudes’” (PALHARINI JÚNIOR. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4.ed. São Paulo: Ed. RT, 2015,p. 84; SACCO NETO, Fernando. Nova execução de título extrajudicial – Lei 11.382/2006 comentada artigo por artigo. São Paulo: Método, 2007, p. 175). PALHARINI JÚNIOR, Sidney. Op. cit., loc. cit. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 74. CPC/73, art. 247. “Sabe-se que as citações e intimações são atos processuais solenes, havendo cominação expressa de nulidade quando realizados sem observância das prescrições legais, conforme dispõe o art. 247 do CPC” (TJMG, AI 1.0443.04.018408-9/002, 12ª Câmara, Rel. Des. Alvimar de Ávila, ac. 29.10.2009, DJ 16.11.2009).

Capítulo VI RESTRIÇÕES AO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA Art. 5º. Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: I – de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; II – de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; III – de decisão judicial transitada em julgado. Parágrafo único. (VETADO) Súmulas: Súmula nº 101/STF: O mandado de segurança não substitui a ação popular. Súmula nº 267/STF: Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição. Súmula nº 268/STF: Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado. Súmula nº 269/STF: O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança. Súmula nº 330/STF: O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer de mandado de segurança contra atos dos Tribunais de Justiça dos Estados. Súmula nº 429/STF: A existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandado de segurança contra omissão da autoridade. Súmula nº 624/STF: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais. Súmula nº 733/STF: Não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no processamento de precatórios. Súmula nº 202/STJ: A impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona a interposição de recurso. Súmula nº 376/STJ: Compete a turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial.

Comentários ao art. 5º 38. RESTRIÇÕES DE ORIGEM CONSTITUCIONAL Como toda ação, o mandado de segurança tem o seu cabimento subordinado a determinadas condições de procedibilidade. Algumas decorrem de sua própria origem constitucional, outras são definidas pela legislação ordinária que o regulamentou e, finalmente, há aquelas que a jurisprudência deduziu do próprio sistema processual em que o mandado de segurança se inseriu. Assim é que a Constituição, ao instituir essa especial medida judicial de proteção contra as ilegalidades e abusos de poder cometidos pelas autoridades, já o fez de modo a excluir de seu

alcance os direitos subjetivos amparados por habeas corpus ou por habeas datas (CF, art. 5º, LXIX). Portanto, ficam, desde logo, excluídos da tutela mandamental as violações ou ameaças sanáveis por meio das duas outras ações constitucionais aludidas. Porque protegida especificamente pelo habeas corpus, a liberdade de locomoção, quando violada ou ameaçada, não encontrará proteção no mandado de segurança. Sempre, pois, que o direito de ir, vir ou permanecer for ofendido ou ameaçado por ato ilegal ou abusivo de alguma autoridade pública, “o mecanismo jurisdicional a ser empregado para sua garantia ou restabelecimento será o habeas corpus, sendo incabível, em tais casos, o emprego do mandado de segurança”1. Por sua vez, o habeas data garante ao interessado o direito subjetivo de conhecer as informações relativas à sua pessoa, existentes em banco de dados de caráter público, ou de obter a retificação de tais dados, quando errôneos ou incompletos (CF, art. 5º, LXXII)2. Logo, “se a proteção pedida pelo impetrante se refere à busca de informações relativas a sua pessoa constantes de registro ou banco de dados de entidade governamental, o instrumento processual adequado é o habeas data, não cabendo o uso do mandado de segurança como seu sucedâneo (art. 5º, LXIX, da CF)”3. No direito infraconstitucional, a Lei nº 12.016/2009 arrola, em seu art. 5º, três casos de inadmissibilidade do mandado de segurança, que correspondem a: (i) ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; (ii) decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; (iii) decisão judicial transitada em julgado. No âmbito da jurisprudência, também se reconhece o descabimento do mandado de segurança em alguns casos, como no de impetração contra lei em tese, contra o mérito do ato administrativo ou contra as deliberações interna corporis. De maneira geral, todas as restrições arroladas prendem-se à falta de interesse de agir, na modalidade de inadequação do remédio processual à pretensão do impetrante. Não correspondem a uma denegação de acesso à Justiça, porque outras vias de obtenção da tutela jurisdicional estariam à disposição da parte. Uma advertência, todavia, é de ser feita: as restrições ao cabimento do mandado de segurança devem ser aplicadas com ponderação, certo de que, em se tratando de garantia fundamental, o princípio que domina a hermenêutica, e que há de condicionar a atividade do intérprete e aplicador, é o da máxima eficiência das normas constitucionais, mormente no campo dos direitos fundamentais4. Quer isto dizer que não se pode praticar, na espécie, interpretação restritiva na compreensão da garantia fundamental, e tampouco se há de adotar interpretação ampliativa na aplicação de normas que, excepcionalmente, limitam tais garantias. Cumpre, pois, aos juízes e tribunais evitar exegeses apegadas excessivamente ao formalismo e ao tecnicismo processual exacerbado. O compromisso com as normas e princípios constitucionais é com a efetividade delas na tutela e realização do direito material. O instrumentalismo puro das regras

formais não pode subverter a funcionalidade substancial e finalística das garantias fundamentais. Tome-se por exemplo a restrição ao cabimento do mandado de segurança para proteger a liberdade de locomoção. Se o impetrante comprovar que está sofrendo uma prisão ilegal, de modo a evidenciar a liquidez e certeza de seu direito de se libertar do constrangimento ilícito a que se acha exposto, seria puro formalismo estéril decretar a extinção do processo sem resolução de mérito, apenas porque a parte aforou mandado de segurança em vez de habeas corpus. É importante ressaltar que o habeas corpus, pela relevância extrema da garantia fundamental de liberdade, pode ser concedido pelo juiz, até mesmo de ofício, sem sequer ter sido requerido com as formalidades do writ constitucional5. Logo, se é possível deferir a garantia em tela, sem forma nem figura de juízo, por que não se permitirá fazê-lo no bojo de um mandado de segurança, inadequadamente proposto em lugar do habeas corpus? Raciocínio igual pode ser feito em relação ao uso do mandado de segurança em lugar do habeas data. Se o writ reúne todos os requisitos e condições substanciais para o exame da pretensão própria de habeas data, seria puro formalismo injustificável a recusa de julgar o mérito da impetração em virtude apenas de inadequação formal. Essa denegação de garantia fundamental constante dos dois exemplos dados implica redução injustificável da tutela assegurada pela Constituição, devendo, por isso, ser evitada pelos juízes e tribunais, dentro do princípio, já referido, da máxima eficiência das regras e princípios constitucionais.

39. ATO PRATICADO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO Segundo o inciso I do art. 5º da Lei nº 12.016, não se concederá mandado de segurança contra ato “do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução”. Se a intenção do legislador foi condicionar o uso do mandado de segurança ao esgotamento da via administrativa, a restrição terá sido incompatível com o acesso à justiça assegurado a todos diante de lesão ou ameaça a direito (CF, art. 5º, XXXV). A interpretação do dispositivo, destarte, haverá de ser feita não no sentido de impor o exaurimento das instâncias administrativas, mediante o uso de todos os recursos legalmente previstos, mas de verificar se, in concreto, o ato administrativo está, ou não, representando uma lesão ou uma ameaça atual ao direito subjetivo da parte. Se do ato administrativo nenhum efeito nocivo adveio para o interessado, que o neutralizou mediante o efeito recursal suspensivo, não há, no momento, interesse de agir para justificar a impetração da segurança6. Se, entretanto, o ato decisório é de natureza negativa, em face de uma autorização administrativa necessária ao exercício do direito individual, pouco importa o efeito que tenha o recurso. A lesão ou ameaça já estará configurada, e a parte não terá, de forma alguma, de

aguardar o julgamento do recurso interposto na esfera administrativa; poderá desde logo ingressar em juízo com o pleito de mandado de segurança, se dispuser dos elementos exigidos para manejar eficazmente o writ. A propósito do tema, a Súmula nº 429 do STF prevê que “a existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandado de segurança contra omissão de autoridade”. De fato, só se pode suspender a ação, já que é impossível suspender a omissão. O certo, porém, é que ninguém está adstrito a esgotar a via administrativa antes de recorrer ao mandado de segurança ou a qualquer ação judicial7. Mesmo que esteja disponível o recurso administrativo, com efeito suspensivo, e sem a exigência legal de caução8, o titular do direito afetado pelo ato de autoridade poderá abrir mão da faculdade de manejá-lo, para preferir sua impugnação em juízo. Ainda quando o recurso tenha sido interposto, dele poderá a parte desinteressar-se, a qualquer tempo, passando a pleitear a tutela a que faz jus por meio do mandado de segurança. O que não é razoável é a insistência do interessado em prosseguir na pretensão dupla e simultânea de impugnação do ato lesivo, pelas vias administrativas e judiciais9. Portanto, ao decidir pelo mandado de segurança, o impetrante deverá abster-se de recorrer administrativamente, ou, se já o fez, deverá desistir do recurso interposto10. Mas, ainda que não tenha desistido, não será o caso de inadmitir sumariamente o writ. A impetração, por si só, importará “renúncia ao recurso administrativo, interposto ou não”11. À administração é que, cientificada da impetração, caberá encerrar o processo administrativo, havendo como extinto o recurso acaso interposto, por desistência tácita12. Mas, para evitar polêmica em torno da falta de interesse13, o recomendável é mesmo a cautela de desistir, previamente, do recurso já interposto na via administrativa, para em seguida aforar o mandado de segurança14.

40. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO JUDICIAL Em princípio, não cabe mandado de segurança contra decisão judicial, porque o modo de impugná-la já consta do próprio procedimento observado em juízo. É, pois, pelo recurso que se sana o erro ou o abuso cometido pela autoridade judiciária, no bojo dos processos15. Entretanto, se o ato do juiz é insuscetível de recurso16, ou se o recurso interponível não é dotado de efeito suspensivo, capaz de evitar a consumação do ato abusivo, não há como excluí-lo da área garantida pelo mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 5º, II). O mesmo é de se dizer do ato judicial teratológico, isto é, aquele que destoa do objeto do processo e ultrapassa a legalidade e os próprios poderes do juiz17. Como teratológica pode-se dizer, por exemplo, a decisão judicial proferida fora do processo ou em processo já findo e extinto, para resolver questão de mérito nova ou alterar o julgamento definitivo antes assentado; ou, ainda, aquela pronunciada pelo juiz que já não mais detém a jurisdição, ou seja, depois de ter sido aposentado ou a qualquer título afastado do cargo judicial. A teratologia da sentença está sempre ao alcance do mandado de segurança, dada a

impossibilidade de o decisório, assim pronunciado, passar em julgado. Adverte, porém, a jurisprudência que para aplicar a excepcionalidade do mandado de segurança contra decisão judicial e, assim, afastar o óbice da Súmula nº 267/STF, “cabe à parte demonstrar nos autos ter agido de modo diligente e responsável, não dando causa, sob nenhuma perspectiva, aos danos eventualmente decorrentes da decisão tida por ilegal ou teratológica”18. De qualquer forma, a reação contra a decisão teratológica depende das circunstâncias do caso concreto, que deverão evidenciar não apenas a grave anomalia jurídica, mas, ainda, a inexistência de recurso disponível para impugná-la, bem como a ocorrência de dano insuscetível de reparação pelas vias recursais19. Da jurisprudência pode-se ainda extrair um outro exemplo de decisão judicial teratológica corrigível por via do mandado de segurança, mesmo quando a parte tenha perdido a possibilidade de interpor o recurso adequado. Trata-se da ordem de penhora de bem absolutamente impenhorável cuja ilegalidade é completa e insuscetível de preclusão, podendo ser, assim, corrigida pela ação mandamental20. A jurisprudência do STJ, diante dessa situação, afirma ser possível a impetração de Mandado de Segurança, já que o ato jurisdicional contém manifesta ilegalidade, revestindo-se de teratologia, e com isso ofende direito líquido e certo do impetrante, capaz de causar-lhe dano irreparável ou de difícil reparação21. No entanto, desde 1995, o Código Processual de 1973 autoriza, em seu art. 558, o relator, em agravo e apelação, a suspender a decisão recorrida, sempre que houver risco de lesão grave e de difícil reparação e a fundamentação do recurso se mostrar relevante. O Código de 2015 repetiu a disposição em seu art. 1.019, I, admitindo a atribuição de efeito suspensivo ao agravo, ou o deferimento, em antecipação de tutela, da pretensão recursal. Do mesmo modo, o art. 1.012, § 4º, possibilita, naquelas situações em que a apelação é recebida apenas no efeito devolutivo, que o relator suspenda a eficácia da sentença, caso demonstrado risco de dano grave ou de difícil reparação (art. 1.012, § 4º). Assim, forçoso é reconhecer que em tal conjuntura não se terá mais condições de admitir o mandado de segurança. Somente, pois, aos terceiros que foram atingidos pela decisão judicial sem serem partes no processo e às partes que se virem diante de decisões teratológicas, em que a via recursal seja insuficiente para impedir a imediata lesão de direito líquido e certo, é que estará franqueada a reação fora do sistema recursal e pelo remédio extremo do mandado de segurança.22 O STJ considerou teratológica a decisão pronunciada numa ação de declaração de ausência que recalculou o valor do financiamento habitacional concedido por instituição financeira, que não era parte do processo. Em consequência, decidiu: “Tal determinação atinge a esfera de direitos materiais subjetivos da ora impetrante, contratualmente estabelecidos, em ação na qual não tem participação alguma, figurando, destarte, na condição de terceiro prejudicado, estando legitimada, como acima explicitado, a utilizar a via do mandado de segurança”. Aduziu, ainda, que era aplicável a Súmula nº 202/STJ, segundo a qual “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se

condiciona à interposição de recurso”23 Nem mesmo a coisa julgada é empecilho ao uso do mandado de segurança pelo terceiro prejudicado, visto que a res iudicata opera perante as partes, “não prejudicando terceiros” (CPC/2015, art. 506). Enfim, para a simples finalidade de atribuir efeito suspensivo ao agravo ou à apelação, o mandado de segurança não é mais remédio processual utilizável, diante da sistemática adotada pelo Código processual, a não ser que o relator do Tribunal se recuse a impedir liminarmente o abuso cometido pela decisão recorrida24. O importante, na realidade, não é a existência ou não de efeito suspensivo do recurso manejado contra decisão judicial. O que é decisivo é avaliar a eficiência do meio impugnativo disponibilizado pela lei processual à parte prejudicada por decisão judicial. Se tal meio é dotado de mecanismos suficientes para proteger o recorrente dos efeitos da decisão impugnada, enquanto pendente sua impugnação, faltará interesse para justificar a impetração do mandado de segurança contra o ato judicial25. A posição consolidada em doutrina e jurisprudência, ao tempo da Lei nº 1.533, e que deverá se manter sob a vigência da Lei nº 12.016, está muito bem sintetizada por CÁSSIO SCARPINELLA BUENO: “Cabíveis os recursos indicados no sistema processual e desde que a ilegalidade ou a abusividade que fundamenta sua interposição não tenha aptidão para produzir qualquer efeito imediato em prejuízo do recorrente, não cabe o mandado de segurança”26. Em síntese: a jurisprudência, para admitir mandado de segurança contra decisão judicial, exige a presença de três requisitos: I) inexistência de instrumento recursal idôneo para a necessária defesa do direito lesado ou ameaçado; II) inocorrência de coisa julgada; e III) ocorrência de teratologia na decisão impugnada27. A exegese, embora assentada sobre o direito revogado, mantém-se compatível com o direito novo. Sendo assim, a atual regra de que não cabe mandado de segurança contra decisão judicial sujeita a recurso dotado de efeito suspensivo (art. 5º, II) conduz à manutenção das mesmas teses consagradas antes da Lei nº 12.016, podendo-se afirmar que, acerca do tema, a nova legislação, mesmo usando linguagem diversa, nada alterou quanto ao posicionamento jurisprudencial consagrado ao tempo da Lei nº 1.533. Os mais recentes pronunciamentos do Superior Tribunal de Justiça proclamam que a regra geral é o não cabimento do mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso (Súmula nº 267/STF), de maneira que não basta o recurso manejável não ter efeito suspensivo. Se, mesmo privado de tal eficácia, o recurso se revela suficiente e adequado à proteção do direito subjetivo da parte, não há interesse para justificar a impetração da segurança. Na exegese do art. 5º, II, da Lei nº

12.016/2009, prevalece “pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que a impetração de mandado de segurança contra ato judicial somente é admitida em hipóteses excepcionais”, de forma que, além da “manifesta ilegalidade ou abuso de poder”, exige-se que o ato judicial seja capaz de produzir “danos irreparáveis ou de difícil reparação à parte impetrante”28. Inexistindo esse risco de prejuízo imediato, a parte terá de procurar a defesa contra a ilegalidade contida na decisão judicial por meio do recurso previsto em lei, e não por intermédio do mandado de segurança, cuja impetração, diante do processo civil, se apresenta sempre como remédio excepcional29. Enfim, o que tem prevalecido na jurisprudência é que não cabe o mandado de segurança como medida destinada simplesmente a substituir o recurso previsto na lei processual30. A contrario sensu, se não cabe recurso contra a decisão judicial, não se pode recusar à parte prejudicada o acesso ao mandado de segurança, desde que seja o ato teratológico ou manifestamente abusivo, conforme jurisprudência consolidada do STJ31. A propósito de decisão proferida após sentença transitada em julgado, e em fase de execução, decidiu a mesma Corte que, não sendo o ato impugnável por agravo, e por nenhum outro recurso, “é cabível o mandado de segurança”32. Com semelhante fundamentação, admitiu o STJ que “é cabível a impetração de mandado de segurança contra a decisão de Relator que converte o Agravo de Instrumento em retido, nos termos do artigo 527, II, do Código de Processo Civil, por ser irrecorrível essa decisão, conforme dispõe o parágrafo único do mesmo dispositivo legal, com redação dada pela Lei n. 11.187/05, vigente ao tempo da impetração”33.

41. ATO JUDICIAL OMISSIVO Um dos grandes males, suportados por aqueles que têm o gozo de seus direitos subjetivos pendente de decisão judicial, decorre da não cogência dos prazos legais estipulados para a prática dos atos processuais a cargo dos juízes. Fala-se, por isso, em “prazos impróprios”, já que de sua inobservância não decorre preclusão, nulidade processual, nem outra sanção imediata. CÁSSIO SCARPINELLA BUENO insurge-se contra essa complacência com a irresponsabilidade do juiz moroso, principalmente em processos que por natureza reclamam tramitação célere, como o mandado de segurança. Preconiza a necessidade de revisão do tema, tendo em conta a garantia constitucional de duração razoável do processo e de emprego, pela autoridade judicial, de meios conducentes à rápida solução do litígio (CF, art. 5º, LXXVIII)34. Lembra, a propósito, que CALMON DE PASSOS, em obra antiga, mas de atualidade e autoridade incontestes, recriminava a ausência de repressão enérgica e eficaz às omissões ilícitas dos magistrados. Defendia, o grande processualista, o uso do mandado de segurança como remédio cabível para a defesa do lesado pela inércia judicial35. Isto porque “a omissão do juiz apresenta-se como a primeira espécie de violação do seu dever formal de agir, consequentemente, como a primeira espécie de ilegalidade por ele praticada. E uma das modalidades de violação in omittendo,

pelo juiz, da lei processual, é a do excesso do prazo que lhe é deferido para pronunciar--se”. Daí que “é ele expressão de inequívoca e irrecusável quebra do dever formal de agir do magistrado, importando em ilegalidade capaz de justificar o mandado de segurança, em tese”36. Diante da moderna constitucionalização do processo, com a institucionalização do direito fundamental de acesso à tutela jurisdicional por meio de um processo justo e efetivo, é muito oportuna a convocação de CÁSSIO SCARPINELLA BUENO para reviver e atualizar a lição de CALMON DE PASSOS sobre o cabimento do mandado de segurança contra os atos omissivos do juiz. Com efeito, tendo o litigante “direito” ao ato judicial tempestivo, toca ao magistrado o “dever legal de agir” para satisfazê-lo, sob pena de cometer – nos retardamentos injustificáveis – ilegalidade ou abuso de poder, contra direito fundamental do jurisdicionado. Nesses atos omissivos do juiz violadores do direito fundamental da parte ao processo justo, inclui-se, no entender de CALMON DE PASSOS, o “excesso do prazo que lhe é deferido para pronunciar-se”37. Adotada a orientação de CALMON DE PASSOS e SCARPINELLA BUENO, deferida a ordem de segurança pelo tribunal, o juiz estaria jungido a praticar, imediatamente, o ato omitido de maneira injusta, sob pena de cometer o crime de desobediência. Se a ordem mandamental não for cumprida pelo juiz impetrado, o tribunal, além de submetê-lo a procedimento disciplinar e criminal, poderia designar outro magistrado para substituí-lo, na prolação do decisório omitido.

42. DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO A imutabilidade e indiscutibilidade da sentença revestida da autoridade de coisa julgada (CPC/2015, art. 50238) torna-a insuscetível, em princípio, de ataque pelo mandado de segurança39. Somente nos casos de sentenças inexistentes ou teratológicas é que se haverá de admitir o mandamus, mesmo após a res iudicata40. Contra a sentença de mérito transitada em julgado não há outro remédio impugnativo que não seja a ação rescisória (CPC/2015, art. 96641)42. Elemento essencial à segurança jurídica, a coisa julgada se inclui nas garantias fundamentais, e sua proteção é assegurada constitucionalmente, inclusive contra a própria lei, a quem se veda qualquer inovação normativa que possa invalidar ou restringir a situação jurídica tornada imutável e indiscutível pela aquisição, da decisão judicial, da autoridade derivada do respectivo trânsito em julgado (CF, art. 5º, XXXVI). Deve-se registrar, porém, que nem toda sentença que põe fim ao processo, com resolução de mérito, adquire a autoridade da res iudicata. Há aquelas que apenas aparentemente se apresentam como portadoras dessa autoridade, como é a hipótese da sentença absolutamente nula por ter sido pronunciada sem o fundamento de uma relação processual válida, cujo vício se estende a todos os atos judiciais dela oriundos, inclusive o decisório que pretendeu dar composição definitiva ao litígio. Ocorre situação dessa natureza, por exemplo, quando a sentença é dada em processo a que faltou a citação válida do réu, e que correu à sua revelia, ou que se desenvolveu sem a participação

de litisconsorte necessário. Julgamento dado em tal conjuntura não exige ação rescisória para ser invalidado. Pode ser atacado pelas vias processuais comuns (querela nullitatis), até mesmo em simples incidente suscitado em impugnação ao cumprimento da sentença (CPC/2015, art. 525, § 1º, I43), sem que a res iudicata seja ofendida, pela simples razão de que não se formou, a seu respeito, a coisa julgada material. Logo, se, in casu, qualquer ação pode ser usada para impugnar a sentença aparentemente passada em julgado, também o mandado de segurança terá cabimento, se reunidos os seus requisitos constitucionais. Também a sentença passada em julgado não é embaraço ao uso do mandado de segurança se o impetrante que a impugna se apresenta como terceiro prejudicado por um ato judicial que não lhe é oponível44. De fato, por força de lei, a sentença só faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros (CPC/2015, art. 50645). Quem não foi parte, embora possa usar a rescisória para desconstituir a sentença (CPC/2015, art. 967, II46), não está obrigado a fazê-lo, podendo, por isso mesmo, lançar mão de qualquer ação ou do mandado de segurança. Em face de uma reintegração de posse, em que o legítimo possuidor do imóvel disputado se viu alcançado pela execução da sentença pronunciada em processo do qual não participara, o Superior Tribunal de Justiça acatou a impetração do mandado de segurança, in verbis: “O terceiro que não integrou anterior processo pode investir, pela via do mandado de segurança, contra a decisão decorrente de sentença transitada em julgado, para impedir violação a seu direito líquido e certo. Afeta o princípio da ampla defesa o despojamento da posse de bens adquiridos por justo título, nas circunstâncias da espécie, porque ‘ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal’. Recurso conhecido e provido”47.

43. O ESVAZIAMENTO DO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL O ponto alto da evolução jurisprudencial em torno do cabimento do mandado de segurança como instrumento manejável contra decisão judicial se deu no momento em que o STF, que antes o vedava nos termos enérgicos da Súmula nº 26748, passou a entender que, em caráter excepcional, seria admissível o aludido writ, desde que o recurso previsto fosse desprovido de efeito suspensivo e que o ato judicial impugnado causasse à parte prejuízo imediato irreparável ou de reparação muito difícil49. A partir de então, o uso do mandado de segurança tornou-se corriqueiro para obter judicialmente o efeito suspensivo para o recurso legalmente desprovido de semelhante eficácia, reduzindo a ação constitucional, muitas vezes, ao papel de mera medida cautelar50, principalmente em face dos agravos de instrumento manejados contra decisões interlocutórias51. O grande esvaziamento do mandado de segurança se deu a partir da Lei nº 9.139/1995, que

alterou o art. 558 do CPC de 197352, para permitir fosse atribuído efeito suspensivo ao gravo de instrumento mediante ato do relator, de modo que não mais haveria necessidade de usar o mandado de segurança para tal fim. Bastaria uma simples petição endereçada ao relator para alcançar o efeito suspensivo buscado pela parte53. Tendo sido igual possibilidade estendida, também, à apelação naqueles casos em que esta não dispõe do natural efeito suspensivo (CPC/1973, art. 558, parágrafo único54), ocorreu o completo esvaziamento do mandado de segurança, na sua função de atribuir a eficácia suspensiva a impugnação recursal, para evitar o perigo de dano grave ou de difícil reparação55. Firmou-se, enfim, a jurisprudência do STJ no sentido de que, “desde o advento da Lei nº 9.139/95, o mandado de segurança, para imprimir efeito suspensivo a decisão judicial, só é admissível após o impetrante formular e ver indeferido o pedido a que se refere o art. 558 do Código de Processo Civil [1973] (...). Em tal circunstância, desaparece o interesse em obter o mandado de segurança”56. Mais esvaziado ainda fica o mandado de segurança contra decisão judicial se se levar em conta que o atual art. 1.019, I57, do CPC de 2015 permite ao relator não só atribuir efeito suspensivo ao agravo, mas também “deferir, em antecipação de tutela, total e parcialmente, a pretensão recursal”. O regime implantado pela jurisprudência, ao tempo da Lei nº 1.533/1951, para o ataque à decisão judicial por intermédio do mandado de segurança, subsiste após o advento da Lei nº 12.016/2009, e deve ser visto a partir da consideração de que os recursos são o instrumental impugnativo natural em face das decisões judiciais, e o writ é apenas “mecanismo complementar, preenchendo as lacunas e deficiência deste sistema”58. Outro fator que muito contribuiu para reduzir o cabimento do mandado de segurança no campo do processo foi a própria instituição da antecipação de tutela, que pode ser obtida, internamente, durante o curso do processo, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição (CPC/1973, art. 27359). A proteção ao direito líquido e certo ameaçado pela demora do processo, em muitos casos, pode ser tutelada pelo mecanismo da tutela antecipada, afastando a necessidade de recorrer ao mandado de segurança, pelo menos de modo imediato60. O entendimento também prevalece em razão do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que repetiu aquelas regras da legislação de 1973 em relação à possibilidade de o relator conferir efeito suspensivo aos recursos dele desprovidos e à antecipação de tutela (arts. 932, III; 1.012, § 4º; 1.019, I; 1.026, § 1º; 1.029, § 5º). Sem embargo das deficiências da literalidade do art. 5º, II, da nova Lei do Mandado de Segurança, o ataque ao ato judicial por meio do mandamus não mais se vincula, necessariamente, à superação da falta de efeito suspensivo atribuído ao recurso utilizável no caso concreto, mas à impotência do sistema recursal para impedir, em certas circunstâncias, que o direito líquido e certo da parte sofra injusta violação, cuja superação não pode aguardar a solução final da prestação

jurisdicional. Não pode, obviamente, ser visto e tratado como mera panaceia para todos os males, que afaste ou dispense o uso dos recursos processuais ordinários, a critério da parte. Como adverte KAZUO WATANABE, em lição que se conserva sempre atual, o mandado de segurança não pode ser manejado simplesmente “como remédio alternativo à livre opção do interessado, e, sim, como instrumento que completa o sistema de remédios organizados pelo legislador processual, cobrindo as falhas neste existente no que diz com a tutela de direitos líquidos e certos”61.

44. PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DA SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL: ATO JURISDICIONAL E ATO ADMINISTRATIVO DO PODER JUDICIÁRIO Cumpre reconhecer que os agentes do Poder Judiciário não praticam apenas atos judiciais em sentido próprio, isto é, atos jurisdicionais. Nas relações com os seus servidores públicos e com os próprios magistrados, ocorrem constantemente atos e decisões de natureza puramente administrativa. Em relação a estes, o regime de aplicação do mandado de segurança em nada difere do referente aos atos da Administração Pública. Na verdade, a autoridade judicial atua como agente da Administração em sentido amplo. As decisões e os recursos acaso cabíveis observam as regras e princípios do procedimento administrativo, do que decorre: (i) o mandado de segurança será admissível se o recurso interponível, na via administrativa, não tiver efeito suspensivo, independentemente de caução62; mas (ii) a parte não está obrigada a esgotar a via recursal administrativa, de modo que, mesmo havendo previsão de recurso com efeito suspensivo, não existe a obrigação de utilizá-lo. O que não deve ocorrer é o exercício simultâneo do recurso administrativo e do mandado de segurança63; (iii) a decisão administrativa, não fazendo coisa julgada material, mesmo depois de encerrado definitivamente o procedimento, não impedirá a parte interessada de recorrer ao mandado de segurança, dentro dos 120 dias seguintes à decisão final da Administração ou, mais precisamente, da data da publicação da decisão que rejeitou o pedido ou o recurso do interessado64. Um exemplo de ato administrativo praticado no âmbito do Poder Judiciário, com relevante presença na esfera jurídica da parte, é o das decisões do Presidente do Tribunal, no procedimento instaurado para a requisição de pagamento devido pelo Poder Público, dentro do regime de precatório (CPC/2015, art. 535, § 3º, I65)66. Em consequência da sua natureza administrativa, mesmo havendo reapreciação do ato do Presidente pelo Colegiado do tribunal, por via recursal, não se formará a coisa julgada material. Caberá, portanto, mandado de segurança contra a decisão administrativa do Colegiado, e o prazo decadencial do art. 23 da Lei nº 12.016 terá início “com a publicação do respectivo acórdão”67. O problema do prazo decadencial assume feições diferentes quando o mandado de segurança se volta contra ato judicial propriamente dito, isto é, contra decisões pronunciadas dentro da atividade

jurisdicional. É que nesse terreno vigora um sistema impugnativo específico e obrigatório, que, salvo razões excepcionais, não pode ser substituído pelo mandado de segurança, por simples conveniência da parte. Além disso, existe o efeito da coisa julgada, que constitui barreira intransponível para o manejo do mandamus contra decisões jurisdicionais definitivas (Lei nº 12.016, art. 5º, III). Contra, portanto, decisão de mérito irrecorrível, não cabe à parte impetrar mandado de segurança, pela simples razão de consolidar-se a coisa julgada tão logo ocorra a respectiva publicação. Só se haverá de cogitar do remédio constitucional se, por vício grave do processo, restar impossível a própria formação da coisa julgada. A dificuldade maior está no caso de decisão interlocutória declarada por lei irrecorrível. Nessa hipótese enquadrava-se, por exemplo, a decisão que convertia o agravo de instrumento em retido68. Tentando equacionar o problema, a Terceira Turma do STJ alvitrou a seguinte solução69: a)

“Segundo precedentes do STJ, é cabível a impetração de mandado de segurança contra decisão judicial irrecorrível, desde que antes de gerada a preclusão ou ocorrido o trânsito em julgado, o que, à primeira vista, soa paradoxal, porquanto, a princípio, a decisão irrecorrível torna-se imutável imediatamente à publicação”;

b)

“A decisão que converte o agravo de instrumento em retido é irrecorrível. Ainda assim, será sempre admissível, em tese, a interposição de embargos de declaração, a fim de que o relator possa sanar vício de omissão, contradição ou obscuridade quanto aos motivos que o levaram a decidir pela ausência do risco de causar à parte lesão grave ou de difícil reparação, cuja existência ensejaria o processamento do agravo de instrumento”;

c)

“Na ausência de interposição de embargos, terá a parte o prazo de cinco dias para a impetração do writ, sob pena de tornar-se imutável o decisum, e, portanto, inadmissível o mandado de segurança, nos termos do art. 5º, III, da Lei nº 12.016/2009 e da Súmula 268/STF”;

d)

“Acaso interpostos os aclaratórios, esse prazo fica interrompido, considerando que o mandamus é utilizado como sucedâneo recursal”.

A solução é engenhosa, mas não se sustenta, com a devida vênia àquela alta Corte, porque parte de premissas falhas e conduz a resultado incompatível com a natureza constitucional do mandado de segurança, da qual resultam prazos e procedimentos distintos daqueles estatuídos pela lei processual comum. A primeira premissa insustentável é a de que a preclusão impede que a decisão judicial seja atacada por mandado de segurança. Esse entendimento foi construído ao tempo em que a principal utilização do mandado de segurança era feita para atribuir efeito suspensivo a recurso que, por lei, não o tinha. Nessa perspectiva, era lógica a exigência de o recurso ter sido tempestivamente

interposto, a fim de justificar a posterior impetração da segurança visando conferir-lhe força de suspender a decisão recorrida. Esse emprego do mandado de segurança, conforme já se demonstrou, perdeu lugar no direito processual contemporâneo, uma vez que a lei instituiu, dentro da sistemática normal dos recursos, mecanismos adequados para obtenção cautelar da suspensão de efeitos da decisão recorrida (CPC/2015, art. 1.019, I). Superada essa função anômala antigamente atribuída à ação mandamental, é impertinente a pretensão de condicionar o seu cabimento à inocorrência de preclusão em torno do objeto tratado em decisão interlocutória. A razão é simples: o fenômeno da preclusão opera no interior do processo, impedindo que se volte a discutir e decidir, nos mesmos autos, sobre questões neles já resolvidas. O mandado de segurança, todavia, não faz parte do procedimento dentro do qual se deu a decisão que se quer impugnar, de sorte que, sendo ação autônoma, exterior ao processo em referência, não pode sofrer o impacto da preclusão operada dentro deste. A coisa julgada, sim, é um evento a que a lei reconhece a força de impedir o mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 5º, III), porque, pondo fim definitivo ao processo, torna inviável, por imposição legal, a rediscussão do que nele se decidiu, seja por recurso, seja por via mandamental. O cabimento, porém, do mandado de segurança contra decisão judicial interlocutória nada tem a ver com o fenômeno da preclusão. Sua ratio essendi situa-se na inaptidão do recurso disponível para impedir a lesão grave e imediata a que o direito subjetivo do litigante se acha exposto diante de uma decisão ilícita ou abusiva da autoridade judiciária, ou na inexistência de qualquer recurso processual com que tal direito possa ser tutelado dentro da dinâmica do processo em curso. Configurados os requisitos constitucionais da ação de mandado de segurança, seu manejo contra decisão judicial não se sujeita às restrições dos prazos recursais, mas ao prazo que a lei especial lhe atribui, pois se trata – repita-se – de ação autônoma, e não de sucedâneo de qualquer recurso. O acórdão em análise, para concluir que, passados cinco dias dos embargos declaratórios, a decisão interlocutória tornar-se-ia imutável e, por isso mesmo, inatacável por mandado de segurança, procurou fundamento no art. 5º, III, da Lei nº 12.016/2009 e na Súmula nº 268/STF. Acontece, todavia, que tanto o dispositivo de lei como o enunciado sumular não cogitam da preclusão, mas da coisa julgada70, não sendo, por isso, aplicáveis a decisões interlocutórias que nenhuma aptidão têm para se revestir da autoridade de res iudicata. Dir-se-á que seria inconveniente manter aberta a oportunidade de questionar uma decisão interlocutória pelo longo prazo de 120 dias previsto no art. 23 da Lei nº 12.016. Mas não se pode cotejar o prazo em referência com aqueles de menor duração estabelecidos para os recursos processuais propriamente ditos. A ação mandamental não se compara com os recursos, porque não decorre de simples sucumbência, nem de mero propósito de obter rejulgamento de questão já decidida no processo pendente. A função institucional do mandamus lhe confere uma dignidade muito superior à dos recursos, e, por outro lado, exige da parte a satisfação de requisitos muito mais

rígidos. Assim, o mandado de segurança contra decisão judicial se apresenta como remédio processual extraordinário, que só ficará ao alcance da parte quando esta estiver, por deficiência do sistema recursal ordinário, submetida ao risco imediato de ter um direito líquido e certo sujeito a violação grave e de difícil reparação, por abuso ou ilicitude praticada pela autoridade judiciária. De forma alguma se haverá de entrever uma ruptura inconveniente com o sistema preclusivo e com a dinâmica recursal do processo comum. O que a Justiça tem de evitar – e isto tem sido observado pela jurisprudência recorrente – é o abuso na prática do mandado de segurança contra decisões judiciais, tornando-o, de maneira indevida, um novo e mero recurso, ao arrepio de suas funções constitucionais. Essa questão relativa a decisão interlocutória irrecorrível persiste com a sistemática do Código de Processo Civil de 2015. A sistemática procedimental do agravo de instrumento continua sendo a mesma do Código de 1973. Mas, embora o processamento ainda se dê diretamente no tribunal, surgiu um novo problema: o agravo de instrumento não é mais admissível perante todas as decisões interlocutórias, já que o regime da nova legislação é o do casuísmo, em numerus clausus. Fora das hipóteses expressamente enumeradas pela lei, as decisões interlocutórias não são impugnáveis, senão depois da sentença, por meio de preliminar ou contrarrazões da apelação (art. 1.009, § 1º 71). Não há, pois, nesses casos, recurso capaz de atacar, de imediato, a ilegalidade ou o abuso de poder praticado em decisão interlocutória. Uma vez que a Lei nº 12.016/2009 permite a impetração do mandado de segurança contra ato judicial em face do qual não caiba recurso com efeito suspensivo (art. 5º, II), parece irrecusável o enquadramento das decisões não agraváveis nesse permissivo da lei especial. De fato, se o recurso manejável (a apelação) é remoto e problemático, a conclusão é de que o decisório, na verdade, não se apresenta como passível de suspensão imediata pela via recursal. Logo, estando demonstrada a lesão de direito líquido e certo da parte, causada pela decisão interlocutória não agravável, o remédio com que o lesado pode contar será mesmo o mandado de segurança, nos termos do art. 5º, II, da Lei nº 12.016/2009.72 Não será admissível, dentro do processo justo e efetivo, garantido pela ordem constitucional, deixar desamparado o titular de direito líquido e certo ofendido por ato judicial abusivo ou ilegal. Daí o cabimento do mandamus, nos termos do direito fundamental assegurado pelo art. 5º, LXIX, da Constituição. Se é imperioso conter o emprego do writ dentro de sua função fundamental, também não se pode tolerar que lhe sejam impostas barreiras e restrições injustificáveis, quando reunidas se encontrarem todas as condições constitucionais de admissibilidade.

45. JULGADOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS Uma situação muito especial é a dos julgados dos Juizados Especiais, contra os quais a legislação própria não admite ação rescisória (Lei nº 9.099/1995, art. 59). Como direito líquido e

certo da parte vencida pode ter sido flagrantemente violado, e como não lhe é dado se valer da ação rescisória, deve-se admitir que a lesão grave, in casu, seja remediada, mesmo após a res iudicata, pelo mandado de segurança. Afinal, trata-se de uma garantia constitucional que não pode ser recusada a quem se sinta numa situação de vítima de grave ilegalidade, para cuja defesa não tenha acesso ao remédio judicial comum73. O STF, já antes da Lei nº 12.016, assentara que o mandado de segurança não é sucedâneo da ação rescisória (Súmula nº 268). É bom lembrar que a Lei nº 9.099/1995 proíbe, expressamente, a ação rescisória nas causas submetidas aos Juizados Especiais Cíveis (art. 59). Assim, nas graves situações arroladas pelo art. 966 do CPC/2015, quando configuradas em processo dos Juizados Especiais, diante da vedação da rescisória, não há outro caminho para coibir ilegalidades e abusos de poder que não o mandado de segurança. Pelas mesmas razões que justificam o mandado de segurança contra decisão judicial, por deficiência do recurso disponível para impedir a lesão imediata do direito do recorrente, também se deve admitir o mandamus nos Juizados Especiais para suprir a inadmissibilidade da ação rescisória em face dos seus julgamentos. Nestas condições, entende SIDNEY PALHARINI JÚNIOR, com acerto, que o mandado de segurança não esteja sendo usado como “sucedâneo da ação rescisória”, mesmo porque não se pode pensar em substituir alguma coisa que não existe ou não está ao alcance da parte. O papel do mandado de segurança, em tal conjuntura, é, em realidade, “um meio de controle das decisões transitadas em julgado, porque não se desfaz de seus próprios requisitos de admissibilidade”74. Afinal, não pode prevalecer mera violação a direito subjetivo líquido e certo simplesmente porque a Lei dos Juizados Especiais não permite o uso da ação rescisória75. Fora do ataque à sentença transitada em julgado, foi aceita pacificamente a possibilidade de se recorrer ao mandado de segurança contra decisões dos Juizados Especiais, nas mesmas condições em que o writ é cabível contra atos judiciais da justiça comum (Lei 12.016, art. 5º, II). A controvérsia se estabeleceu apenas quanto à competência, já que na ordem constitucional o mandado de segurança de atos de juízes se inclui nos processos atribuídos originariamente aos tribunais de segundo grau (CF, art. 108, I, c). Como os Tribunais de Justiça não têm jurisdição para rever as decisões dos Juizados Especiais, a quem atribuir a competência para julgar mandado de segurança impetrado contra julgamentos destes órgãos especializados? Depois de muita controvérsia nas instâncias locais, o Supremo Tribunal Federal assentou que a competência, na espécie, não seria do Tribunal de Justiça, mas da

Turma Recursal integrante do próprio sistema dos Juizados Especiais76. O Superior Tribunal de Justiça, que vinha atribuindo a competência aos Tribunais de Justiça, acatou a nova posição preconizada pelo STF, e passou também a decidir que os mandados de segurança contra atos de primeiro grau dos Juizados Especiais deveriam

ser julgados pela Turma Recursal. Tem ressalvado, porém, que há uma hipótese em que o mandamus não pode ficar confinado à esfera exclusiva da Turma Recursal. Trata-se do caso em que a decisão da própria Turma exorbita de sua competência e invade a da justiça comum, caso em que não se pode recusar ao Tribunal da Justiça comum o poder de controle sobre os limites da jurisdição confiada aos Juizados Especiais. O mandado de segurança, que tenha tal objetivo, deve ser inserido na competência dos Tribunais de segundo grau da Justiça comum (Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, conforme reiterada jurisprudência do STJ)77. Em outra oportunidade, o STJ reconheceu que, embora autônomos frente ao Tribunal de Justiça, os Juizados Especiais não podem fazer prevalecer sua autonomia quando se põe em jogo sua própria competência para conhecer das causas que lhes são submetidas. Embora possam existir outras formas do referido controle, a Corte Especial do STJ reconheceu que “a forma mais adequada é a do mandado de segurança, por dois motivos: em primeiro lugar, porque haveria dificuldade de utilização, em alguns casos, da Reclamação ou da Querela Nullitatis; em segundo lugar, porque o mandado de segurança tem historicamente sido utilizado nas hipóteses em que não existe, no ordenamento jurídico, outra forma de reparar lesão ou prevenir ameaça de lesão a direito”78. Teve a Corte Especial o cuidado de esclarecer que “o entendimento de que é cabível a impetração de mandado de segurança [perante Tribunais da Justiça comum] nas hipóteses de controle sobre a competência dos juizados especiais não altera o entendimento anterior deste Tribunal, que veda a utilização do writ para o controle do mérito das decisões desses juizados”79, fora das Turmas Recursais. Dessa maneira, o STJ dividiu a solução do problema em duas vertentes: (i) se o mandado de segurança ataca o mérito de decisão de Juizado Especial, deve ser julgado pela Turma Recursal; (ii) se o mandado de segurança versa sobre ultrapassagem da competência legalmente fixada para os Juizados Especiais, deverá ser apreciado e julgado pelos Tribunais da Justiça comum de segundo grau.

45.1.

Mandado de segurança contra decisão interlocutória nos Juizados Especiais

A Lei nº 9.099/1995, que disciplina atualmente o procedimento nos Juizados Especiais Cíveis da Justiça dos Estados, não prevê recurso interponível contra as decisões interlocutórias. Seria, portanto, o caso de admitir-se, contra essas decisões irrecorríveis, o mandado de segurança, para coibir eventuais abusos e ilegalidades. No entanto, o STF adotou entendimento contrário: “1. Não cabe mandado de segurança das decisões interlocutórias exaradas em processos

submetidos ao rito da Lei n. 9.099/95. 2. A Lei n. 9.099/95 está voltada à promoção de celeridade no processamento e julgamento de causas cíveis de complexidade menor. Daí ter consagrado a regra da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, inarredável. 3. Não cabe, nos casos por ela abrangidos, aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, sob a forma do agravo de instrumento, ou o uso do instituto do mandado de segurança. 4. Não há afronta ao princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV da CB), vez que decisões interlocutórias podem ser impugnadas quando da interposição de recurso inominado. Recurso extraordinário a que se nega provimento”80. Lembra, porém, ALEXANDRE CÂMARA, que há decisões interlocutórias, nos referidos juizados, que podem causar gravames sérios à parte, cuja reparação não permite aguardar a solução da apelação contra a futura sentença. Tanto isso é verdade que a legislação posterior, editada para regular os Juizados Especiais Federais (Lei nº 10.259/2001) e os Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei nº 12.153/2009), passou a autorizar recurso (agravo) contra as interlocutórias pronunciadas nesses novos Juizados Especiais. É certo que, de ordinário, as decisões interlocutórias, pelo menos durante a fase de cognição, podem ser relegadas para reexame e impugnação ao ensejo do recurso contra a sentença, sem que isso represente uma quebra dos princípios do duplo grau de jurisdição e do contraditório e ampla defesa. Mas, quando se trata da decisão posterior à sentença, como a que recusa receber a apelação, bem como daquelas proferidas nos incidentes da fase de execução, não há como deixar a parte sem um mecanismo impugnativo, para combater as violações sofridas por seu direito. Releva notar que a gravidade das lesões verificáveis no estágio executivo do processo é, em regra, maior do que a decorrente das sentenças, porque afetam, de imediato, a integridade da esfera patrimonial do litigante. Correto, por isso, o entendimento de ALEXANDRE CÂMARA, acerca da necessidade de ser revista a posição adotada pelo STF no citado RE 576.847, para reconhecer “como juridicamente possível a demanda de mandado de segurança como meio de impugnação de decisões interlocutórias proferidas nos processos que tramitam perante os Juizados Especiais em pelo menos duas hipóteses: (a) decisão que não recebe a apelação; (b) decisões interlocutórias proferidas em sede de execução”81. Uma solução prática, melhor do que o mandado de segurança, seria aplicar, por analogia, o regime das Leis nº 10.259 e 12.153 também aos Juizados Especiais Cíveis dos Estados, uma vez que, afinal, os três Juizados existentes integram um mesmo microssistema processual, não havendo razão para persistir a admissibilidade do agravo em alguns deles e não em todos. Estendida a aplicação desse recurso às decisões interlocutórias proferidas nos Juizados regidos pela Lei nº 9.099/1995, desapareceria todo o problema criado em torno do mandado de segurança, na espécie. Havendo recurso à disposição da parte, inexistiria interesse jurídico para justificar o uso do mandamus.

46. O PROBLEMA DA COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR O MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÕES DOS JUIZADOS ESPECIAIS Não podem, como é óbvio, ficar excluídos da garantia do mandado de segurança os atos judiciais praticados pelos órgãos dos Juizados Especiais. A dificuldade enfrentada pela jurisprudência situou-se na definição do órgão a que caberia a competência, na espécie, já que a legislação especial que regula o processo aplicável às causas que correm perante os Juizados Especiais não trata da matéria. Nem a Constituição tem regra pertinente ao caso. Quando a Constituição se refere ao mandado de segurança, no âmbito da Justiça Federal, o critério adotado é o de que aos tribunais de 2º grau de jurisdição compete processar o mandado contra as decisões do próprio tribunal e dos juízes de primeiro grau a ele subordinados (CF, art. 108, I, c). Por simetria, essa é a regra que se deve observar na Justiça Estadual, em relação aos Tribunais de Justiça e aos Juízes de Direito. A dificuldade, em face dos Juizados Especiais, decorre da sua não sujeição hierárquica ao Tribunal de Justiça, quanto aos seus julgamentos. O segundo grau de jurisdição se realiza dentro do próprio sistema organizacional dos Juizados Especiais, cabendo a uma Turma Recursal (formada de um grupo de juízes da própria primeira instância)82. A primeira posição adotada pelo STJ foi a de reconhecer que o Tribunal de Justiça não teria competência para julgar mandado de segurança impetrado contra decisão do Juizado Especial. Entretanto, não seria aceitável que o Tribunal de Justiça se limitasse, in casu, a simplesmente extinguir o processo. Caber-lhe-ia, segundo o STJ, o dever de “indicar o órgão jurisdicional competente e fazer o envio respectivo dos autos”83. Na sequência, o Supremo Tribunal enfrentou o problema e o solucionou definindo que “a competência originária para conhecer de mandado de segurança contra coação imputada a Turma Recursal dos Juizados Especiais é dela mesma, e não do Supremo Tribunal Federal”84. Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça procedeu à definição pertinente ao writ manejado contra ato de primeiro grau do Juizado Especial, assentando, em súmula, que “compete à Turma Recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial” (Súmula nº 376/STJ). A jurisprudência sumulada não provocou, todavia, a supressão total da competência dos Tribunais de Justiça, já que os conflitos de competência entre os juizados especiais e os juízes de direito não poderiam ficar fora do controle do Tribunal de Justiça. Reconheceu, portanto, o STJ que sua jurisprudência consolidada na Súmula nº 376 só se referia aos mandados de segurança que atacassem o mérito da decisão do Juizado Especial. Coube ao STJ fazer a distinção85: a)

“Não se admite, consoante remansosa jurisprudência do STJ, o controle, pela justiça comum, sobre o mérito das decisões proferidas pelos juizados especiais”;

b)

“A autonomia dos Juizados Especiais, todavia, não pode prevalecer para a decisão acerca de sua própria competência para conhecer das causas que lhe são submetidas”; donde a possibilidade de a questão da competência dos Juizados Especiais ser levada, por meio de mandado de segurança, ao julgamento do Tribunal de Justiça.

Se, porém, a impetração envolver o mérito do julgado do Juizado Especial, seu julgamento haverá de caber à Turma Recursal do sistema de juizados especiais.

47. MANDADO DE SEGURANÇA DO TERCEIRO PREJUDICADO POR DECISÃO JUDICIAL O mandado de segurança impetrado por parte do processo contra decisão judicial é admitido pela lei e pela jurisprudência, sob regime de excepcionalidade, devendo respeitar a prevalência do sistema recursal e não podendo afrontar a coisa julgada. O terceiro prejudicado, isto é, aquele que, não sendo parte no processo, sofre violação em direito subjetivo próprio por decorrência de ato do juiz, desfruta de um regime de acesso ao mandado de segurança muito mais amplo86. Assim é que, para impetrar a segurança contra decisão judicial em processo alheio: (i) não se sujeita ao uso do recurso de terceiro prejudicado87, nem (ii) encontra empecilho na coisa julgada formal ou material, visto que esta só opera entre as partes em relação às quais a sentença foi dada, não prejudicando terceiros (CPC/2015, art. 50688)89. Casos há em que, mesmo não figurando no processo, o terceiro não pode se prevalecer dessa circunstância para recorrer ao mandado de segurança contra decisão judicial nele proferida. Assim é, por exemplo, a situação do terceiro adquirente, cessionário de coisa ou direito litigioso, visto que “deve se sujeitar aos efeitos da sentença proferida na demanda principal travada entre as partes originárias (art. 42, caput e § 3º, CPC) [CPC/2015, art. 109, caput e § 3º]”90. Trata-se, na verdade, de um sucessor inter vivos da parte em litígio, cuja situação é muito diversa daquela em que o estranho comparece em juízo para defender, contra o ato judicial dado inter alios, direito subjetivo originário. Este sim, não estando ao alcance da sentença, tem inegável direito de usufruir da tutela do mandado de segurança, desde que configurados todos os seus requisitos, independentemente de sujeitar-se ao regime processual dos recursos (Súmula nº 202/STJ). Também não pode se valer do mandado de segurança contra ato judicial quem, de alguma forma, foi incluído no processo e sofreu diretamente os efeitos da decisão proferida contra seus interesses, como, v.g., a empresa sucessora da demandada, chamada a assumir a responsabilidade pela obrigação da parte sucedida91. Outro caso de descabimento do mandado de segurança de terceiro ocorre com o sócio convocado para responder por dívida da sociedade, por meio do incidente da desconsideração da personalidade jurídica (Código Civil, art. 50). “A decisão que defere requerimento de

desconsideração da personalidade jurídica é passível de impugnação mediante a utilização dos instrumentos processuais adequados, previstos no CPC”, entre os quais não figura o mandado de segurança92.

48. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ÓRGÃO FRACIONÁRIO DE TRIBUNAL Estabelece o art. 105, I, b, da Constituição Federal, a competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar, originariamente, os mandados de segurança contra atos do próprio Tribunal. Embora as Turmas, as Seções e até mesmo a Corte Especial sejam todas órgãos fracionários, que prestam a jurisdição em nome do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica a jurisprudência da referida Corte, no sentido de ser incabível a impetração de mandamus contra decisão proferida por seus órgãos fracionários93. À primeira vista, soa estranha a afirmação de que, sendo o Tribunal competente para julgar mandado de segurança contra seus próprios atos, não possa fazê-lo em relação aos atos de seus órgãos fracionários, que afinal de contas não atuam senão em nome do Tribunal. O fundamento, entretanto, do posicionamento do STJ, que nem sempre vem explícito em seus arestos, mas que consta do precedente que lhe serviu de paradigma, é o de que das decisões dos referidos órgãos fracionários “podem ser interpostos recursos extraordinário ou ordinário, conforme o caso, para o Supremo Tribunal Federal”. Dessa maneira, a razão para considerar tais decisões insuscetíveis de impugnação por meio da segurança não é, simplesmente, o fato de se originarem de órgão fracionário; mas a circunstância de que, a se admitir o writ, sem antes interpor o recurso adequado, dar-se-ia a conversão da segurança “em recurso com o prazo privilegiado de cento e vinte (120) dias”94. E é tranquilo, na lei e na jurisprudência do STF e do STJ que, em princípio, não se permite o uso do mandado de segurança contra ato judicial sujeito a recurso. Ademais, a liberalização do remédio constitucional na conjuntura tratada acabaria por anular “as vantagens da divisão do trabalho, que retornaria, todo ele, a seu Plenário”95, em última análise. Colocada a questão nesses termos, ao Tribunal, qualquer que seja ele, e não apenas o STJ, não cabe conhecer de mandado de segurança contra decisão recorrível pronunciada por seus órgãos fracionários. Todavia, se a hipótese for de ato irrecorrível, claro é que, nos termos da previsão constitucional, a ação mandamental se tornará cabível e a competência será do Tribunal a que se achar integrado o órgão julgador.

49. ATO DISCIPLINAR Contra o ato que aplica sanção disciplinar a servidor público, a Lei nº 1.533/1951 somente admitia o mandado de segurança se houvesse incompetência da autoridade ou inobservância de

formalidade essencial (art. 5º, III)96. A restrição decorria da ausência de poder da Justiça para rever o mérito do ato administrativo. Em se tratando, porém, de uma garantia fundamental, a restrição sempre foi acolhida com moderação e flexibilidade, de modo a não permitir que, mesmo no processo administrativo disciplinar, não restasse sem repressão a violação a direito líquido e certo do servidor97. Assim, tem sido admitido o remédio mandamental, por exemplo, contra a aplicação de pena não autorizada por lei98 ou quando esta estiver lastreada em arguição fundada apenas em matéria de direito, cuja revisão da legalidade prescinda do reexame dos fatos e provas99, como no caso de falta de motivação ou de tipicidade da infração100. Nunca, porém, será lícito ao juiz rever o mérito da decisão administrativa disciplinar, no que diz com a conveniência, oportunidade e graduação da sanção101. A Lei nº 12.016 não repetiu a restrição ao mandado de segurança antes feita pela Lei nº 1.533. Andou bem, pois, se era o mérito do ato disciplinar que se pretendia preservar da revisão judicial, isto diz respeito a todo e qualquer ato de autoridade, e não apenas aos disciplinares. Subsiste, portanto, a orientação jurisprudencial consolidada ao tempo da Lei nº 1.533. A supressão da restrição ao mandado de segurança, que constava da Lei nº 1.533, e que o afastava do controle dos atos disciplinares, autoriza a conclusão de que a Lei nº 12.016 passou a permitir tal controle, em regra. Isto, obviamente, não quer dizer que o Poder Judiciário possa se superpor aos demais Poderes, de forma indiscriminada e completa. Há de se respeitar a independência assegurada pela Constituição, para vigorar na partilha de atribuições estabelecida entre os órgãos da soberania nacional, o que redunda na proibição ao Judiciário, em princípio, de rever o mérito do ato administrativo, no que diz respeito à análise de sua oportunidade e conveniência. Esse núcleo da decisão administrativa cabe com exclusividade ao agente da Administração, por força das normas e princípios estabelecidos pela Constituição. Assim como o controle de legalidade exercitado pelo Poder Judiciário não pode ultrapassar os limites impostos pela Constituição, também a discricionariedade confiada à Administração há de respeitar os limites que lhe são traçados pela Lei Maior. De tal sorte, o melhor entendimento extraído da nova Lei do Mandado de Segurança é o que permite o uso do mandado de segurança, inclusive para o controle do ato disciplinar, como regra. Isto será feito com atenção aos limites decorrentes da própria Constituição Federal, de modo que sejam controladas tanto a competência da autoridade praticamente do ato, como a observância das formalidades essenciais e, também, com a possibilidade de reprimir a ilegalidade do ato, aferida, neste aspecto, segundo o princípio da proporcionalidade e razoabilidade102. Dessa forma, a moderna visão do mandado de segurança não condiz com a vedação absoluta ao controle do mérito do ato administrativo, pois, a partir do critério da razoabilidade e da proporcionalidade, é possível avaliar a ilegalidade ou abusividade cometidas no exercício dos

poderes discricionários. Pela ordem constitucional, o guardião dos direitos e garantias fundamentais do cidadão “é o Poder Judiciário que inclusive por força das normas constitucionais não poderá deixar de analisar, apreciar, os fatos que são levados ao seu conhecimento em princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário”103 (CF, art. 5º, XXXV). É assim que, no regime constitucional vigente, a jurisprudência, inclusive do STJ, reconhece ao Poder Judiciário a competência para “analisar o mérito do ato administrativo para evitar que o administrado, civil ou militar, tenha que suportar injustiças ou mesmo a prática de atos que se afastem dos princípios que foram enumerados no art. 37, caput, da Constituição...”104. E dessa análise, que se faz necessária para restabelecer os direitos violados pela Administração, não pode ser excluído o mérito do ato administrativo, qualquer que seja ele, disciplinar ou não disciplinar. A submissão do mérito, do ato administrativo, ao exame do Judiciário, nos limites do necessário controle da legalidade e do respeito aos princípios constitucionais, “em nenhum momento significa uma violação ao princípio da independência dos poderes, mas apenas e tão somente o cumprimento do preceito constitucional de que nenhuma lesão ou ameaça a direito deixará de ser apreciada pelo Poder Judiciário”105. Andou, pois, muito bem a Lei nº 12.016/2009 quando suprimiu a velha regra da Lei nº 1.533/1951106, que vedava o uso do mandado de segurança contra ato administrativo disciplinar107.

50. ATOS “INTERNA CORPORIS” Em se tratando de atos interna corporis, como aqueles praticados pelos órgãos internos do Poder Legislativo (eleições internas, cassações de mandatos, elaboração de regimento, constituição de comissões etc.), não cabe impugná-los por meio de mandado de segurança, até mesmo porque, no sistema democrático de divisão de poderes, não cabe, em linha de princípios, à Justiça revê-los, nem mesmo pela via ordinária108. Nessa linha de orientação, é reiterada a jurisprudência do STF que “não tem admitido mandado de segurança contra atos do presidente das casas legislativas, com base em regimento interno delas, na condução do processo de feitura de leis”109. A Suprema Corte tem por certo que, “por se tratar de matéria interna corporis que só pode encontrar solução no âmbito do poder legislativo, não [se] sujeita à apreciação do poder judiciário”110, quando não infringe a “disciplina constitucional”111. Não é outro o entendimento adotado pelo STJ112.

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DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 196. Lembra o autor, com acerto, que a inaptidão do

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mandado de segurança para proteger o direito da livre locomoção aplica-se, inclusive, nas hipóteses de prisão civil, como a dos devedores de alimentos (CF, art. 5º, LXVII), de modo que, sendo ilegais, desafiarão habeas corpus e não mandado de segurança (op. cit., loc. cit.). O procedimento do habeas data regula-se pela Lei nº 9.507/1997. STJ, 3ª Seção, MS 8.196/DF, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 26.03.2003, DJU 28.04.2003, p. 170. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, s/d, p. 1.187. Código de Processo Penal: “Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público (...). § 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal”. Para justificar o mandado de segurança é preciso que o ato administrativo seja operante e exequível. Não se pode recorrer administrativamente e ao mesmo tempo impetrar o mandado de segurança, porque o efeito suspensivo do recurso priva o ato de sua exequibilidade (STJ, 2ª T., REsp 916.334/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 25.08.2009, DJe 31.08.2009). STJ, Corte Especial, MS 5.865/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 19.05.1999, DJU 07.05.2001, p. 126; STJ. 5ª T., RMS 4.289/MS, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 03.05.2001, DJU 14.06.2001, p. 185; STJ, 6ª T., RMS 13.893/MS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 26.02.2008, DJe 24.03.2008. Segundo a Súmula nº 373 do STJ, “é ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso administrativo”. “A jurisprudência desta Corte é clara no sentido de ser inadmissível a impetração do writ na pendência de recurso administrativo com efeito suspensivo” (STJ, 1ª T., REsp 844.538/MG, Rel. Min. José Delgado, ac. 21.11.2006, DJU 14.12.2006, p. 300). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 195.744/SP, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 18.10.2001, DJU 05.08.2002, p. 221. “Todavia, permite-se a impetração do mandamus quando, após ter obtido decisão denegatória de seu pedido na esfera administrativa, o administrado-impetrante desiste expressamente do recurso administrativo ou deixa de apresentá-lo no prazo legal, porquanto, a partir daí, surge seu interesse processual de agir para a impetração” (STJ, 1ª T., REsp 781.914/PA, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 15.05.2007, DJU 11.06.2007, p. 270). No mesmo sentido: STJ, 5ª T., AgRg no RMS 31.048/BA, Rel. Min. Moura Ribeiro, ac. 24.09.2013, DJe 30.09.2013. PALHARINI JÚNIOR, Sidney. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 90. Entretanto, há entendimento em sentido contrário: “Não parece ser correto o entendimento de que a interposição do mandado de segurança sempre importa renúncia ao direito administrativo ou desistência de recurso já interposto e pendente de julgamento. Já havendo recurso administrativo interposto, o impetrante, diante da ausência de interesse de agir, terá seu mandado de segurança rejeitado; não é possível que a interposição acarrete a desistência tácita do recurso administrativo, porque, se o impetrante não reúne as condições da ação, o mandado de segurança não tem como seguir adiante” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 116).

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Para Pedro Roberto Decomain, entretanto, a parte deve aguardar o escoamento do prazo do recurso administrativo, para só depois disso impetrar a segurança, para escapar à vedação do art. 5º, I, da Lei 12.016 (Mandado de segurança, cit., p. 203). “Na pendência de recursos administrativos com efeito suspensivo sem que se exija caução – aliás, a caução não pode ser exigida, a lume da Constituição de 1988, por força do texto constitucional (art. 5º, LV) do devido processo legal – não há possibilidade de impetração de mandado de segurança. Não porque a lei proíba, mas pelo estado do ato. É só examinarmos o ato para verificar que, submetido a recurso administrativo com efeito suspensivo, não haveria condições de o ato constranger alguém (...). Deveras, se o ato tem efeito suspensivo, a parte não pode buscar a proteção do Judiciário, a não ser que desista do recurso, pois não existe qualquer ato a constrangêla indevidamente. Destarte, não haveria interesse processual” (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de segurança. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 22). “(...) 2. O art. 5º, I, da Lei 1.533/51 [equivalente ao art. 5º, I, da Lei 12.016/2009], veda somente a impetração de mandado de segurança quando ainda se encontrar pendente recurso administrativo com efeito suspensivo. É essa simultaneidade que fica impedida. Todavia, permite-se a impetração do mandamus quando, após ter obtido decisão denegatória de seu pedido na esfera administrativa, o administrado-impetrante desiste expressamente do recurso administrativo ou deixa de apresentálo no prazo legal, porquanto, a partir daí, surge seu interesse processual de agir para a impetração” (STJ, 1ª T., REsp 781.914/PA, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 15.05.2007, DJU 11.06.2007, p. 270). Súmula nº 330 do STF: “O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer de mandado de segurança contra atos dos Tribunais de Justiça dos Estados”; Súmula nº 624 do STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais”; Súmula nº 44 do STJ: “O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de outros tribunais ou dos respectivos órgãos”; Súmula nº 376 do STJ: “Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de Juizado Especial”. “Processo civil. Conversão em retido do agravo de instrumento. Decisão irrecorrível. Mandado de segurança. Cabimento. Prazo para a impetração. Incidência da Súmula 268/STF. Art. analisado: 5º, III, da Lei 12.016/2009” (STJ, 3ª T., RMS 43.439/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 24.09.2013, DJe 01.10.2013). “É cabível a impetração de mandado de segurança contra a decisão de Relator que converte o Agravo de Instrumento em retido, nos termos do artigo 527, II, do Código de Processo Civil [1973], por ser irrecorrível essa decisão, conforme dispõe o parágrafo único do mesmo dispositivo legal, com redação dada pela Lei n. 11.187/05, vigente ao tempo da impetração” (STJ, 3ª T., RMS 26.733/MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 28.04.2009, DJe 12.05.2009). “A utilização da ação mandamental contra ato judicial é aceita quando o mesmo seja manifestamente ilegal ou revestido de teratologia” (STJ, 5ª T., RMS 18.438/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 03.02.2005, DJU 07.03.2005, p. 286). STJ, Corte Especial, AgRg no MS 12.633/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 15.08.2007, DJU 11.09.2007, p. 205. “Excepcionalmente, em situações teratológicas, abusivas, que possam gerar dano irreparável, o

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recurso previsto não tenha ou não possa obter efeito suspensivo, admite-se que a parte se utilize do mandamus, levando-se em conta, ainda, que a Constituição Federal – art. 5º, LXIX – não faz restrição quanto a seu uso, desde que presentes os seus pressupostos. O caso concreto, todavia, é que revelará, bem ponderados os seus contornos, se deve prevalecer tal regra ou a sua exceção” (STJ, 1ª T., RMS 29.217/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 28.09.2010, DJe 13.10.2010). STJ, 4ª T., RMS 29.391/GO, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac 20.05.2010, DJe 27.05.2010. STJ, 3ª T., RMS 26.937/BA, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 07.10.2008, DJe 23.10.2008. O terceiro nem mesmo tem de provar risco de lesão grave e de difícil reparação, para se livrar do ato judicial abusivo por meio do mandamus (STJ, Súmula nº 202: “A impetração de segurança por terceiro contra ato judicial não se condiciona à interposição de recurso”). No mesmo sentido: STJ, 3ª T., RMS 6.317/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, ac. 22.04.1996, DJU 03.06.1996, p. 19.246, RSTJ 84/177; STJ, 3ª T., RMS 4.847/MG, Rel. Min. Cláudio Santos, ac. 12.12.1994, DJU 20.03.1995, p. 6.110, RSTJ 75/155; STJ, 2ª T., RMS 6.389/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 21.03.1996, RSTJ 83/92; STJ, 4ª T., REsp 13.484/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 22.11.1994, RT 715/270; STJ, 1ª T., RMS 6.422, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 10.12.1996, RSTJ 95/53. Ao terceiro cabe reagir por meio do mandado de segurança, sem ter usado previamente de recurso, até mesmo contra a sentença transitada em julgado, se esta houver violado direito líquido e certo de sua titularidade (STJ, 4ª T., RMS 7.087/MA, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 24.03.1997, DJU 09.06.1997, p. 25.540, RSTJ 97/227). O mesmo se pode reconhecer também àquele que, sendo parte passiva do processo, não foi citado regularmente, e dele não participou de forma espontânea: “A jurisprudência deste STJ caminha no sentido de admitir a utilização do mandado de segurança para desconstituir sentença prolatada em processo que se desenvolve sem a citação”. Na verdade, sem integração do réu ao processo pela citação válida, não se completa e aperfeiçoa a relação processual, de modo que a própria coisa julgada não ocorre (STJ, 6ª T., RMS 8.807/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 03.12.2001, DJU 06.05.2002, p. 312; STJ, 4ª T., RMS 6.487/PB, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 24.09.1996, DJU 04.11.1996, p. 42.475). Enfim, o réu não citado e não integrado ao processo, em relação à sentença, equivale a um terceiro, a quem se franqueia o mandado de segurança, sem condicionamento a prévia impugnação por via recursal (STJ, 6ª T., AgRg no RMS 19.358/SP, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 13.11.2007, DJU 11.02.2008, p. 1; STJ, 4ª T., RMS 14.132/GO, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 16.08.2007, DJU 08.10.2007, p. 282). STJ, 4ª T., RMS 31.950/SP, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 16.05.2013, DJe 22.08.2013. A Corte Superior também considerou teratológica decisão judicial que “deferiu, contra terceiro estranho à lide, sem o mínimo de contraditório, pedido de restituição de valores sem sequer cogitar de ouvir a instituição financeira impetrante acerca da origem e titularidade dos ativos financeiros reclamados, contrariando os princípios do contraditório, da ampla defesa e da motivação, corolários do devido processo legal”. Assim, permitiu a impetração do writ por terceiro (STJ, 4ª T, RMS 49.020/SP, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 10.11.2015, DJe 26.11.2015). STJ, 1ª T., RMS 7.246/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 05.09.1996, RSTJ 90/68; STJ, 4ª T., REsp 299.433/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 09.10.2001, RSTJ 156/369. PALHARINI JÚNIOR, Sidney. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 91. BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e

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5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 47. SODRÉ, Eduardo. Mandado de Segurança. In: DIDIER JR., Fredie (coord.). Ações constitucionais. Salvador: JusPodivm, 2006, p. 111. STJ, 2ª T., AgRg no RMS 34.654/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 27.08.2013, DJe 04.09.2013. “Quando a ilegalidade deriva de ato judicial, o cabimento do writ restringe-se a situações excepcionais” (STJ, Corte Especial, AgRg no MS 19.402/DF, Rel. Min. Castro Meira, ac. 01.02.2013, DJe 18.02.2013). No mesmo sentido: STJ, 1ª T., RMS 27.501/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 20.11.2008, DJe 03.12.2008. “(...) Inadmissível o mandado de segurança impetrado como substitutivo de recurso” (STJ, 6ª T., AgRg no RMS 19.358/SP, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 13.11.2007, DJU 11.02.2008, p. 1). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., RMS 14.132/GO, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 16.08.2007, DJU 08.10.2007, p. 282; STF, 1ª T., RMS 27.241/MT, Rel. Min. Carmen Lúcia, ac. 22.06.2010, DJe 13.08.2010. “(...) 1. Interpretando a contrario sensu o art. 5º, II, da Lei 1.533/51 e a Súmula 267/STF, consolidou-se na jurisprudência desta Corte o entendimento no sentido de ser cabível mandado de segurança contra ato judicial quando este não está sujeito a recurso e é teratológico ou manifestamente abusivo (Precedentes: MS 9.304/SP, Corte Especial, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de 18.02.2008; AgRg no MS 12.954/DF, Corte Especial, Min. Eliana Calmon, DJ de 26.11.2007; RMS 21.565/SP, 1ª Turma, Min. José Delgado, DJ de 28.05.2007). 2. No caso, embora não sujeito a recurso, o ato judicial (que converteu agravo de instrumento em agravo retido) não pode ser qualificado de teratológico ou manifestamente abusivo (...)” (STJ, 1ª T., RMS 26.693/AM, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 17.06.2008, DJe 30.06.2008). STJ, 2ª T., RMS 30.832/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 06.05.2010, DJe 17.05.2010. STJ, 3ª T., RMS 26.733/MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 28.04.2009, DJe 12.05.2009. Outro exemplo de decisão irrecorrível é aquela do Relator, no STF, que, a propósito da repercussão geral do recurso extraordinário, determina a devolução dos autos ao Tribunal de origem, com base no art. 328, parágrafo único, do RISTF, para que seja observado o disposto no art. 543-B, do CPC [de 1973; art. 1.036, CPC/2015] (STF, 1ª T., ARE 761.320 AgR/PR, Rel. Min. Luis Roberto Barroso, ac. 12.11.2013, DJe 06.12.2013). Situação interessante foi enfrentada pelo STJ em caso no qual o Relator, por sucessivas decisões monocráticas, impedia “o julgamento colegiado do agravo regimental, em contraste com o disposto no art. 557, § 1º, do CPC” [de 1973; art. 1.021, § 2º, CPC/2015]. A solução adotada foi a de admitir o mandado de segurança como cabível, para propiciar o julgamento do writ obstaculizado pelo relator (STJ, 3ª T., RMS 26.867/RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, ac. 15.10.2009, DJe 23.11.2009). No mesmo sentido: STJ, 3ª T., EDcl no AgRg nos EDcl no RMS 24.722/RN, Rel. Min. Massima Uyeda, ac. 23.04.2009, DJe 06.05.2009. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança, cit., p. 74. Idem, ibidem. CALMON DE PASSOS, J. J. Mandado de segurança contra ato judicial. Ċomentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Ed. RT, 1984, v. X, t. I, p. 257. Para o STJ, para ser admissível “a impetração do mandado de segurança para o combate de comportamentos omissivos, a ilegalidade

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digna de correção deve advir do não cumprimento de um dever” (STJ, 2ª T., RMS 32.639/RN, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 06.04.2017, DJe 17.04.2017). BUENO, Cássio Scarpinella. Op. cit., loc. cit.; CALMON DE PASSOS, J. J. Op. cit., loc. cit. CPC/1973, art. 467. Súmula nº 268 do STF: “Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado”. “A jurisprudência mais recente, a nosso ver com razão, tem afastado a incidência desta Súmula [a de nº 268 STF] no caso de sentenças juridicamente inexistentes (por exemplo, mandado de segurança impetrado por aquele que deveria figurar como litisconsorte necessário no processo, ou por réu não citado regularmente, cf. Súmula 202 do STJ), bem como nos ‘casos de decisões judiciais teratológicas ou flagrantemente ilegais’” (MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 80). CPC/73, art. 485. “Não cabe mandado de segurança contra decisão transitada em julgado (Súmula 268/STF), sendo o pleito mandamental hipótese de ação rescisória” (STJ, 2ª T., RMS 27.505/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 12.05.2009, DJe 29.05.2009). CPC/73, art. 475-L, I. “O terceiro prejudicado por decisão judicial, prolatada em processo do qual não foi parte, pode impetrar mandado de segurança para defender direito violado, mesmo que a decisão tenha transitado em julgado, vez que o processo judicial transcorreu sem o seu conhecimento” (STJ, 1ª T., RMS 14.554/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 28.10.2003, DJU 15.12.2003, p. 181). No mesmo sentido, STJ, 1ª T., REsp 1.107.263/SP, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 05.11.2009, DJe 27.11.2009. CPC/73, art. 472. CPC/73, art. 487, II. STJ, 4ª T., RMS 7.087/MA, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 24.03.1997, DJU 09.06.1997, p. 25.540, RSTJ 97/227. Súmula nº 267 do STF: “Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição”. O leading case foi o RE 76.909 (Pleno, ac. 05.12.1973, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, RTJ 70/515. Cf. FLAKS, Milton. Mandado de segurança – pressupostos da impetração. Rio de Janeiro: Forense, 1980, p. 183; BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1989, v. I, p. 136-150; MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data, ação direta de inconstitucionalidade, ação declaratória de constitucionalidade e arguição de descumprimento de preceito fundamental. 23. ed. atual. por Arnaldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 42-43). ARRUDA ALVIM, Teresa. Mandado de segurança contra ato judicial. São Paulo: Ed. RT, 1989, p. 38. MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, cit., p. 44.

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CPC/2015, art. 1.019, I. PACHECO, José da Silva. O mandado de segurança e outras ações constitucionais típicas. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 191; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 9. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 816. “Hoje [após a Lei 9.139/95] não há mais que se falar em writ para conferir efeito suspensivo a recurso, nem em mandado de segurança como sucedâneo de recurso sem efeito suspensivo. Em suma, o mandado de segurança voltou ao seu leito natural, deixando de ser a panaceia de outrora. Precedente: RMS 5.854/PE” (STJ, 2ª T., RMS 8.516/RS, Rel. Min. Adhemar Maciel, ac. 04.08.1997, DJU 08.09.1997, p. 42.435). CPC/2015, art. 1.012, § 4º. Hoje, “(...) incumbe ao agravante ou apelante, quando pretenda dar ao recurso o efeito suspensivo, negado pelo juízo, pedir ao relator, no tribunal, que lhe empreste, também, este efeito” (CARREIRA ALVIM. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 84). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 1.095.319/PR, Rel. Min. Herman Benjamim, ac. 20.08.2009, DJe 27.08.2009; STJ, 3ª T., REsp 917.763/PE, Rel. Min. Sidney Beneti, ac. 25.08.2009, DJe 05.10.2009. STJ, 1ª T., RMS 6.959/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 05.09.1996, DJU 21.10.1996, p. 40.200. CPC/73, art. 527, III. FACCI, Lúcio Picanço. Retrocesso legislativo quanto às hipóteses de cabimento do mandado de segurança contra atos jurisdicionais: considerações críticas sobre o art. 5º, II, da Lei nº 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 108, p. 55. CPC/2015, art. 300. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança, cit., p. 316-317. WATANABE, Kazuo. Controle jurisdicional (princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional no sistema jurídico brasileiro) e mandado de segurança contra ato jurisdicional. São Paulo: Ed. RT, 1980, p. 106. No mesmo sentido: ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 320. Lei nº 12.016, art. 5º, I. STJ, 2ª T., REsp 916.334/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 25.08.2009, DJe 31.08.2009. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., RMS 23.194/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 22.02.2011, DJe 14.03.2011. STJ, 1ª T., RMS 1.170/ES, Rel. Min. César Rocha, ac. 16.12.1992, RSTJ 46/510; STJ, 2ª T., RMS 25.112/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 15.04.2008, DJe 30.04.2008. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 19.205/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 11.11.2015, DJe 16.11.2015. CPC/73, art. 730. “Os atos do Presidente do Tribunal que disponham sobre processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional” (STJ, Súmula nº 331); “(...) são de natureza administrativa” (STJ, 1ª T., RMS 11.524/RS, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 07.05.2002, DJU 03.06.2002, p. 142). Por isso, “não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no

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processamento de precatórios” (STF, Súmula nº 733), e tampouco cabe recurso especial (STJ, 1ª T., AgRg no Ag 721.024/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 12.09.2006, DJU 16.10.2006, p. 296). STJ, 1ª T., RMS 33.490/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 01.09.2011, DJe 08.09.2011. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 31.663/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 05.10.2010, DJe 02.02.2011. STJ, 5ª T., REsp 1.032.924/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 02.09.2008, DJe 29.09.2008. STJ, 3ª T., RMS 43.439/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 24.09.2013, DJe 01.10.2013. Lei nº 12.016/2009: “Art. 5º Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: (...) III – de decisão judicial transitada em julgado”. Súmula nº 268 do STF: “Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado”. CPC/73, sem correspondente. “Não havendo previsão de medida eficiente contra o ato ilegal, deverá ser admitido o mandado de segurança. Deve-se admitir o mandado de segurança como sucedâneo do agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas em 1º grau de jurisdição, à luz do Código de Processo Civil de 2015, sempre que se demonstrar a inutilidade do exame do ato acoimado de ilegal apenas por ocasião do julgamento da apelação” (MEDINA, José Miguel de Garcia. Direito processual civil moderno. 2. ed. São Paulo: RT, 2016, p. 1.334). “Assim, pelas mesmas razões que outrora o mandado de segurança era utilizado para suprir as deficiências do sistema recursal, ainda que com parcimônia, deve o mandado de segurança ser admitido nos juizados especiais cíveis, para suprir a deficiência pela inadmissibilidade da ação rescisória, se a sentença ferir direito líquido e certo, que pudesse albergar-se numa das hipóteses do art. 485, do CPC [de 1973]. Nestas condições, não nos parece seja o mandado de segurança sucedâneo da ação rescisória, mas efetivamente, um meio de controle das decisões transitadas em julgado, porque não se desfaz de seus requisitos de admissibilidade” (grifamos) (PALHARINI JÚNIOR, Sidney et al.Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 65). PALHARINI JÚNIOR, Sidney. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 65. Importa ressaltar posicionamento doutrinário contrário: “A opção do legislador foi clara ao prever no art. 59 da Lei 9.099/1995 o não cabimento de ação rescisória no âmbito dos Juizados Especiais, preferindo prestigiar a segurança advinda da coisa julgada à justiça que poderia ser perseguida por meio de tal espécie de ação. Simplesmente defender o cabimento de mandado de segurança como forma de superar a expressa vedação legal significa contrariar de forma manifesta a vontade do legislador, que, adequada ou equivocada, deve ser respeitada, já que não cabe ao intérprete ‘mudar a lei na marra’, mas simplesmente interpretá-la dentro dos limites de razoabilidade” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 124). “(...) Mandado de segurança (...) Decisão de Juiz Federal no exercício de jurisdição do Juizado Especial Federal (...). I – As Turmas Recursais são órgãos recursais ordinários de última instância relativamente às decisões dos Juizados Especiais, de forma que os juízes dos Juizados Especiais estão a elas vinculados no que concerne ao reexame de seus julgados. II – Competente a Turma Recursal para processar e julgar recursos contra decisões de primeiro grau, também o é para

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processar e julgar o mandado de segurança substitutivo de recurso (...)” (STF, Pleno, RE 586.789/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 16.11.2011, DJe 27.02.2012). No mesmo sentido: STF, 1ª T., AI 666.523 AgR/BA, Rel. p/ ac. Min. Marco Aurélio, ac. 26.10.2010, DJe 03.12.2010. “3. ‘A Corte Especial do STJ, no julgamento do RMS 17.524/BA, firmou o posicionamento de que é possível a impetração de Mandado de Segurança com a finalidade de promover controle da competência dos Juizados Especiais.’ (RMS 26.665/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 21/8/2009). 4. Decisão recorrida que se mostra contrária à orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça. Competência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região para processar e julgar o Mandado de Segurança ajuizado pelo INSS. 5. Recurso Ordinário provido” (STJ, 2ª T., RMS 37.959/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 17.10.2013, DJe 06.12.2013). STJ,CorteEspecial,RMS17.524/BA,Rel.Min.NancyAndrighi,ac.02.08.2006, DJU 11.09.2006, p. 211. No mesmo sentido: “A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RMS 17.524/BA (Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 11.9.2006), firmou entendimento no sentido de que é possível a impetração de mandado de segurança para promover o controle de competência nos processos em trâmite nos Juizados Especiais” (STJ, 1ª T., AgRg no RMS 28.085/SC, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 14.04.2009, DJe 07.05.2009). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., RMS 37.775/ES, Rel. Min. Marcio Buzzi, ac. 06.06.2013, DJe 02.09.2013. RMS 17.524/BA, cit. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no RMS 42.818/RS, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 30.10.2013, DJe 14.10.2013. STF, Pleno, RE 576.847/BA, Rel. Min. Eros Grau, ac. 20.05.2009, DJe 07.08.2009. No mesmo sentido: STF, 2ª T., AT 857.811 AgR/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 16.04.2013, DJe 26.04.2013. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 149; ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 318, nota 10. Lei nº 9.099/1995, art. 41, § 1º. STJ, 4ª T., RMS 14.891/BA, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 06.11.2007, DJU 03.12.2007, p. 305. STF, Pleno, MS-QO 24.691/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 04.12.2003, DJU 24.06.2005, p. 5. No mesmo sentido: STF, Pleno, MS-QO 24.674/MG, Rel. p/ ac. Min. Carlos Velloso, ac. 04.12.2003, DJU 26.03.2004, p. 6. STJ,CorteEspecial,RMS17.524/BA,Rel.Min.NancyAndrighi,ac.02.08.2006, DJU11.09.2006, p. 211. Cumpre, apenas, observar que o terceiro, na hipótese de ter sofrido constrição ou ameaça de constrição por decisão judicial poderá optar entre a impetração do mandado de segurança ou a oposição de embargos de terceiro (CPC/2015, art. 674). A opção é do terceiro: “É lícito ao terceiro prejudicado requerer Mandado de Segurança contra ato judicial, em lugar de interpor, contra ele, embargos de terceiro” (STJ, 3ª T., RMS 24.293/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 23.10.2007, DJU 05.11.2007, p. 263). A dificuldade em se impetrar o mandado de segurança, nessas hipóteses, reside no fato de ser necessária a dilação de provas para solucionar a

pretensão do terceiro. Se, entretanto, o terceiro dispuser de prova documental plena da violação cometida contra o seu direito líquido e certo, ou quando a questão em debate for puramente de direito, não há razão para se impedir o mandamus. 87 “O terceiro prejudicado por ato judicial pode impugná-lo por mandado de segurança, mesmo que não tenha interposto o recurso cabível (...). Isto porque, a escolha, nesta hipótese, é faculdade do interessado (...)” (STJ, 4ª T., RMS 14.995/PR, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac. 26.10.2004, DJU 06.12.2004, p. 312). 88 CPC/1973, art. 472. 89 STJ, 1ª T., RMS 14.554/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 28.10.2003, DJU 15.12.2003, p. 181. No mesmo sentido: STJ, 4ª T., AgRg no RMS 37.985/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, ac. 03.09.2015, DJe 11.09.2015. 90 STJ, Corte Especial, AgRg no MS 16.400/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 12.05.2011, DJe 06.06.2011. 91 STJ, 1ª T., RMS 14.481/MG, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 18.06.2002, DJU 07.10.2006, p. 173. 92 STJ, 3ª T., AgRg no RMS 36.370/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 28.08.2012, DJe 31.08.2012. Entre outros óbices de natureza institucional, o acórdão lembrou que o deslinde da questão relacionada com a desconsideração da personalidade jurídica envolve matéria controvertida, cuja compreensão plena depende de dilação probatória, inexistente no procedimento do mandado de segurança. 93 STJ, Corte Especial, AgRg no MS 9.757/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 18.08.2004, DJU 17.12.2004, p. 387; STJ, Corte Especial, AgRg no MS 9.955/SC, Rel. Min. Franciulli Netto, ac. 25.10.2004, DJU 21.03.2005, p. 201; STJ, Corte Especial, AgRg no MS 12.054/DF, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 19.12.2006, DJU 05.03.2007, p. 244. 94 STJ, Corte Especial, MS 4.784/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 05.03.1997, DJU 14.04.1997, p. 12.674. 95 STJ, Corte Especial, AgRg no MS 19.748/DF, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 17.04.2013, DJe 29.04.2013. 96 STJ, 3ª Seção, MS 9.477/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 28.09.2005, DJU 16.11.2005, p. 190. 97 STJ, 5ª T., REsp 743.411/AL, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 04.10.2005, DJU 14.11.2005, p. 398. 98 TJSP, Sessão Plenária, MS 3.109-0/SP, Rel. Des. Octávio Stucchi, jul. 16.05.1984, RJTJESP 90/405. 99 STF, Pleno, MS 21.001/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, ac. 30.11.1989, RTJ 130/1.042. 100 STF, 2ª T., RE 100.750/PE, Rel. Min. Djaci Falcão, ac. 11.10.1983, RTJ 108/1.317; STF, 2ª T., RE 94.859/DF, Rel. Min. Decio Miranda, ac. 10.11.1981, RTJ 100/1.381; STJ, 3ª Seção, MS 8.184/DF, Rel. Min. Paulo Medina, ac. 10.03.2004, RSTJ 181/343. 101 STJ, 6ª T., RMS 15.037/BA, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 27.05.2008, DJe 16.06.2008. 102 No sentido do texto, conferir PALHARINI JÚNIOR, Sidney. İn: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4.

ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 96. Reconhece-se, é verdade, que a doutrina administrativa clássica construiu “a teoria segundo a qual a análise do mérito do ato administrativo não cabe ao Poder Judiciário”. Mas não se pode deixar de reconhecer que “este Poder por força da CF de 1988 poderá analisar o mérito do ato praticado pela Administração Pública quando o ato não tiver observado o princípio da proporcionalidade ou mesmo o da razoabilidade” (ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Análise do mérito do ato administrativo disciplinar militar pelo Poder Judiciário em face da Constituição Federal de 1988. Amagis Jurídica, ano IV, n. 8, p. 79, jan.-jun. 2013). 103 ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Op. cit., p. 87. 104 ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Op. cit., loc. cit. 105 Idem, ibidem. 106 “É cabível a impetração de mandado de segurança contra ato administrativo que impôs sanção disciplinar de demissão ao servidor, porquanto os atos administrativos comportam controle jurisdicional amplo. Nesses casos, o controle não se limita aos aspectos legais e formais do procedimento. Deve o Poder Judiciário examinar a razoabilidade e a proporcionalidade do ato, bem como a observância dos princípios da dignidade da pessoa humana, culpabilidade e da individualização da sanção. Precedentes do STJ” (STJ, 5ª T., RMS 17.735/MT, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 12.11.2013, DJe 25.11.2013). No mesmo sentido: STJ, 3ª Seção, MS 13.520/ DF, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 14.08.2013, DJe 02.09.2013. 107 “A proibição original evidentemente desbordava do comando constitucional na medida em que inexistia justificativa jurídica plausível para se limitar o cabimento do mandado de segurança contra ato disciplinar apenas aos vícios formais (autoridade incompetente ou formalidade essencial). Isto porque, muitas vezes, teremos atos formalmente perfeitos, porém materialmente carregados de ilegalidade ou abusividade, hipótese em que a proteção constitucional do mandado de segurança deve incidir em toda sua plenitude” (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 504). 108 MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 32-33. Observam os autores que, nos atos do Legislativo, são interna corporis as “deliberações do Plenário, das Comissões ou da Mesa que entendem direta e exclusivamente com as atribuições e prerrogativas da Corporação”. Advertem, porém, que não é todo e qualquer “ato desses órgãos” que constituem “interna corporis vedado à apreciação judicial”. Isto porque “atos e deliberações do Legislativo existem regrados pela Constituição, pela lei e pelo Regimento e, nestes casos, pode – e deve – o Judiciário decidir sobre sua legitimidade” (Op. cit., p. 33). 109 STF, Pleno, MS 21.374/DF, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 13.08.1992, DJU 02.10.1992, p. 16.843. No mesmo sentido: STF, Pleno, MS 33.558 AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 25.11.2016, DJe 18.03.2016. 110 STF, Pleno, MS 22.503/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 08.05.1996, DJU 06.06.1997, p. 24.872. 111 STF, Pleno, MS 25.588/DF, Rel. Min. Menezes Direito, ac. 02.04.2009, DJe 08.05.2009, p. 350. 112 “1. As fases de tramitação dos projetos legislativos (emenda constitucional) são considerados como atos ‘interna corporis’ praticados pelo poder legislativo, pelo que insuscetíveis, em tese, de controle pelo poder judiciário” (STJ, 1ª T., RMS 7.662/RS, Rel. Min. José Delgado, ac.

26.06.1997, DJU 01.09.1997, p. 40.744). “I – A votação da lei e a respectiva sanção não constituem atos suscetíveis de controle através Mandado de Segurança” (STJ, 1ª T., RMS 10.121/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 10.08.1999, DJU 13.09.1999, p. 41). “Os atos interna corporis imunes à apreciação judicial abarcam, além daqueles emanados das casas legislativas, os oriundos dos tribunais de contas ou mesmo dos órgãos jurisdicionais no exercício da atípica função legiferante” 9STJ, 1ª T., AgInt no RMS 52.187/BA, Rel. Min. Gurgel de Faria, ac 16.02.2017, DJe 08.03.2017); STJ, 2ª T., RMS 23.107/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 24.03.2009, DJe 23.04.2009.

Capítulo VII A PROPOSITURA DO MANDADO DE SEGURANÇA Art. 6º.

A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições. § 1º No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à segunda via da petição. § 2º Se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria coatora, a ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação. § 3º Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. § 4º (VETADO) § 5º Denega-se o mandado de segurança nos casos previstos pelo art. 267 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. § 6º O pedido de mandado de segurança poderá ser renovado dentro do prazo decadencial, se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito.

Comentários ao art. 6º 51. A IMPORTÂNCIA DA PETIÇÃO INICIAL A petição inicial é a peça processual por meio da qual o autor exerce o direito de ação in concreto, o direito de agir em juízo, em busca da prestação jurisdicional, que, no processo de conhecimento, culminará com o provimento judicial cujo conteúdo consistirá na resolução do litígio existente entre as partes. Trata-se de elemento de importantíssimo significado, pois lhe cabe retratar o pedido e a causa de pedir, dados concretizadores do objeto do processo, sobre o qual o órgão judicial poderá e deverá atuar, sem excessos e sem reduções (CPC/2015, arts. 141 e 4921). A sentença, assim, é a resposta do juiz ao pedido da parte, de sorte que a lide haverá de ser solucionada, pelo mérito, quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido (CPC/2015, art. 487, I2). É, ainda, sob imediato exame

dos termos da petição inicial, que o juiz verificará se se acham presentes, na propositura da ação, os requisitos de formação válida e desenvolvimento regular do processo; e, também, se concorrem as condições impostas legalmente para que ocorra o julgamento do mérito da causa (CPC/2015, art. 173)4. Sem, portanto, a presença na petição inicial dos pressupostos processuais e das condições da ação, o processo estará fadado à prematura e imediata extinção, sem resolução do litígio que provocou o ingresso dos interessados na justiça (CPC/2015, art. 485, IV e VI5). Essa função da petição inicial – de permitir a instauração da relação jurídica processual válida, e de assegurar a legitimidade e regularidade do processo para atingir a resolução do litígio – é que evidencia a particular relevância dessa peça dentro da dinâmica e eficiência processuais.

52. PETIÇÃO INICIAL DEFEITUOSA OU INCOMPLETA Vigora no regime comum do direito processual civil uma regra básica de que as nulidades, quando sanáveis, não podem ser acolhidas de plano, sem se ensejar oportunidade à parte de suprilas, salvando, sempre que possível, o processo, cuja destinação primordial é a solução do mérito da causa. Por isso, a petição inicial nunca deve ser indeferida, sem antes cumprir-se a diligência determinada pelo art. 3216 do CPC/2015, qual seja, a abertura de prazo para o autor emendá-la ou completá-la. Não é diferente o tratamento a ser dispensado à petição inicial do mandado de segurança, conforme a melhor doutrina e a jurisprudência dominante: o juiz, na análise da petição inicial do mandamus, verificará a ocorrência ou não de todos os seus requisitos, para concluir sobre a viabilidade da ação, e, se constatar nela vício sanável ou falta de documento essencial, determinará sua emenda na forma do art. 321 do CPC7. O STJ, em mais de uma oportunidade, tem ressaltado que o mandado de segurança não foge a essa regra8. Particularmente no REsp 783.165/SP, o tema foi abordado com largueza, in verbis: “Processual civil. Mandado de segurança. Juntada de documento para fins de comprovação da legitimidade ativa. Emenda da inicial. Aplicação do art. 284, do CPC. Possibilidade. Precedentes. 1. A petição inicial do mandado de segurança é passível de emenda, na forma do art. 284, do CPC, aplicado subsidiariamente à lei do writ, na parte compatível com a ratio do remédio heroico. 2. Controvérsia gravitante em torno da possibilidade de, em sede de mandado de segurança, admitir-se a emenda da inicial para fins de comprovação de sua legitimidade ativa. 3. A nulidade processual que deve conduzir à nulificação do processo com a sua extinção

sem resolução do mérito, deve ser deveras significativa de modo a sacrificar os fins de justiça do processo. É que o processo é instrumento de realização de justiça e não um fim em si mesmo, por isso que não se justifica, em prol da questão meramente formal, sacrificar a questão de fundo e deixar ao desabrigo da coisa julgada o litígio, fator de abalo da paz e da ordem social. 4. O princípio se exacerba no campo dos remédios heroicos de defesa dos direitos fundamentais, como soe ser o Mandado de Segurança, no qual a parte veicula lesão perpetrada por autoridade pública, que a engendra calcada na premissa da presunção de legitimidade de seus atos. 5. Consectariamente, a análise de questões formais não deve obstar a perquirição do abuso da autoridade que caracteriza esse remédio extremo. 6. Sob esse enfoque, admite-se, em sede de mandado de segurança, muito embora a sumariedade de seu rito procedimental, que seja oportunizado ao impetrante a emenda da inicial, para fins de juntada de documentos comprobatórios da liquidez e certeza do direito alegado, nos termos do art. 284, do CPC. 7. Precedentes: REsp 629381/MG; Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 20.02.2006; AgRg no REsp 486648/CE; Rel. Min. HÉLIO QUAGLIA BARBO-SA, DJ de 06.02.2006; REsp 722264/PR; Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ 01.07.2005. 8. In casu, deveria o juízo a quo ter determinado a emenda da inicial do writ para fins de comprovação da legitimidade ativa da impetrante com a juntada da certidão de propriedade do imóvel sobre o qual recaiu a exação cuja legitimidade pretende ver afastada por meio do mandamus. 9. Recurso especial provido”9. A jurisprudência, ainda do STJ, não admite seja a petição inicial do mandado de segurança indeferida com base em questões ligadas ao mérito, considerando ofensivo ao devido processo legal indeferimento liminar que não seja fundado em falta insuprível de pressuposto processual ou de condição da ação10. Em regra, apenas nos casos de decadência ou prescrição é que, com base no art. 332, §1º 11, do CPC/2015, a petição inicial do writ será indeferida, com abordagem de matéria ligada ao mérito12. Aventa-se, ainda, a possibilidade de improcedência prima facie da segurança na hipótese do art. 33213 do CPC/201514.

53. A PETIÇÃO INICIAL E SEUS REQUISITOS Exige o art. 6º da Lei nº 12.016 que a impetração do mandado de segurança se dê por meio de petição inicial que observe “os requisitos legais”. Acham-se estes enumerados nos arts. 319 e 32015

e, ainda, nos arts. 103 e 10616, todos do Código de Processo Civil. São eles: a)

Segundo o art. 319, deverão constar da petição inicial:

I – o juiz a que a petição é dirigida; II – o nome e qualificação de ambas as partes; III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV – o pedido, com suas especificações; V – o valor da causa; VI – as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; b)

Segundo o art. 320, a petição inicial deverá ser instruída com “os documentos indispensáveis à propositura da ação”.

c)

Segundo o art. 103, o demandante, se não for advogado legalmente habilitado (que atue em causa própria), deverá postular mediante representação por alguém que detenha tal habilitação. Por isso, a petição inicial terá de ser firmada por advogado e instruída com o “instrumento de mandato”.

d)

Segundo o art. 106, I, o advogado do autor (ou o próprio autor, quando atua como “advogado em causa própria”) deverá “declarar, na petição inicial (...), o endereço em que receberá intimação e seu número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil e o nome da sociedade de advogados da qual participa”.

É esse o quadro que retrata aquilo que o art. 6º da Lei do Mandado de Segurança denomina de “requisitos estabelecidos na lei processual” para o exercício, por meio da petição inicial, do direito de agir em juízo. À falta, ou deficiência, de qualquer um deles, é causa de indeferimento da petição inicial, que, no entanto, não será decretado de imediato. Caberá ao juiz, diante do defeito detectado, ensejar oportunidade ao autor para emendar a inicial, no prazo de quinze dias (CPC/2015, art. 321), providência que somente não será observada se o defeito for insanável17. Ofende, portanto, o art. 321 do CPC – segundo jurisprudência do STJ – a decisão “que declara extinto o processo, por deficiência da petição inicial, sem dar ao autor oportunidade para suprir a falha”18. Mesmo no caso de falta de documentos indispensáveis à propositura da ação, “deve o juiz determinar o suprimento e, não, indeferir de plano a inicial”19. A jurisprudência dominante é no sentido de que a intimação para emendar ou completar a petição inicial, determinada pelo art. 321 do CPC, é de ser feita ao autor, na pessoa de seu advogado, não se exigindo que seja feita pessoalmente à parte, tal como se exige nas hipóteses de abandono da causa (CPC/2015, art. 485, II e III20)21.

54. OS REQUISITOS DA INICIAL E AS CARACTERÍSTICAS DO MANDADO DE SEGURANÇA É fora de dúvida que a inicial do mandado de segurança tem de se sujeitar aos requisitos gerais determinados pelo CPC para legitimar o acesso à Justiça. Deve-se ter em conta, todavia, que se trata de meros requisitos formais para a tramitação do pedido e sua correta apreciação em juízo. Não devem, por excessivo apego ao formalismo, transformar-se em restrições injustas à proteção constitucional, que haverá de ser, antes de tudo, efetiva e plena. Todo esforço terá de ser feito pelo órgão judicial para evitar que a forma procedimental ocupe lugar superior ao reservado para o mérito da causa, que, no caso, gira em torno dos direitos fundamentais. Mais que um algoz que pune irremediavelmente os erros formais do impetrante, cabe-lhe orientá-lo, dirigindo-o para o caminho que lhe permita sanar ou superar os vícios formais da inicial e, assim, assegurar que o pleito seja apreciado e julgado pelo mérito.

55. ALGUNS DETALHES DA PETIÇÃO INICIAL DO MANDADO DE SEGURANÇA: O SUJEITO PASSIVO DA AÇÃO Exige o art. 6º, caput, que o autor (dito “impetrante”) nomeie tanto (i) a “autoridade coatora” (isto é, o agente que praticou, in concreto, o ato impugnado) como (ii) a “pessoa jurídica”, que a referida autoridade “íntegra”, ou à qual “se acha vinculada”, ou da qual “exerce atribuições”. O mandado de segurança é, constitucionalmente, um remédio processual (uma ação) concebida para proteger o titular de um direito subjetivo contra ato de autoridade, que o tenha violado ou o ameace de violação, em situação configuradora de ilegalidade ou de abuso de poder. O poder, do qual o coator se prevalece para atingir a esfera jurídica do impetrante, não é algo que lhe pertença originariamente. É o cargo ou função – que exerce em nome ou por delegação de uma pessoa jurídica de direito público ou de direito privado a que se tenha conferido exercer atribuições do poder público – que enseja à autoridade coatora a prática do ato contra o qual se volta o impetrante da segurança. Esse ato, na verdade, não é, em essência, um ato pessoal do coator, mas um ato da pessoa jurídica do qual é órgão de atuação no plano do direito. Por isso, a petição inicial do mandado de segurança não pode deixar de nomear a pessoa jurídica que, afinal, é quem suportará as consequências jurídico-patrimoniais do ato impugnado e os consequentes efeitos do julgamento da ação mandamental. A autoridade coatora é nomeada na impetração, porque é por seu meio que se identifica o ato discutido em juízo. Cabe-lhe, por isso mesmo, o dever de informação e esclarecimento a ser cumprido no processo, parar permitir ao juiz a certificação do suporte fático sobre o qual se apoia a pretensão do impetrante.

Sua presença em juízo não se dá para defender os interesses da pessoa jurídica, de que é agente ou órgão de atuação. A finalidade para que é convocada é apenas “prestar informações”, como já se demonstrou, com mais vagar, nos comentários ao art. 1º. Quem é intimado para exercer o direito de defesa, no contraditório processual, não é a autoridade coatora, e, sim, o “órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada” (art. 7º, II).

56. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO ENTRE COATOR E PESSOA JURÍDICA INTERESSADA Determina o art. 6º da Lei nº 12.106/2009 que o impetrante indique na petição inicial não só a autoridade coatora, mas também a pessoa jurídica a que ela se acha integrada. Evidencia o dispositivo legal ter sido consagrada a tese, já adotada pela jurisprudência dominante, de que a legitimidade passiva no mandado de segurança cabe à pessoa jurídica interessada22. Fala-se, às vezes, em litisconsórcio entre a autoridade coatora e a pessoa jurídica impetrada, a pretexto de que ambas têm legitimidade reconhecida para interpor recurso (cf. art. 14, § 2º, da Lei nº 12.016). Não há, porém, possibilidade de configurar litisconsórcio algum, na espécie, porque a relação de direito material (objeto do processo do mandado de segurança) só vincula o impetrante e a pessoa jurídica em cujo nome atuou a autoridade dita coatora23. A legitimidade de parte nasce das raízes ou vínculos existentes na situação jurídica de direito material discutida no processo: “Autor e réu são legitimados se inseridos na relação jurídica que constitui o fundamento da pretensão”, como ensina BEDAQUE24. Deve-se ter em conta que, segundo a própria Lei do Mandado de Segurança, é a pessoa jurídica, e não a autoridade coatora, quem, no plano do direito material, suporta o ônus financeiro do processo (art. 2º da Lei nº 12.016). Por isso, só a pessoa jurídica é sujeito passivo da ação de mandado de segurança: “Apenas a pessoa jurídica é quem possui legitimidade para atuar no polo passivo da demanda. Consequentemente, se a autoridade coatora não é parte, insustentável se torna a tese do litisconsórcio passivo necessário”25.

57. AUTORIDADE COATORA, NA CONCEPÇÃO LEGAL Para o § 3º do art. 6º, da Lei nº 12.016, a autoridade coatora é aquela que “tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática”. Havia uma dificuldade na aplicação da lei anterior, na identificação da autoridade coatora, uma vez que a jurisprudência tradicional não considerava como tal quem apenas ordenara a prática do ato administrativo, mas somente quem o

cumprira efetivamente. Diante da complexidade do organograma de funções dentro da hierarquia administrativa, o impetrante muitas vezes não conseguia distinguir, com precisão, quem era, de fato, o responsável pelo ato impugnado. Para fugir desse dilema, o art. 6º, § 3º, da lei atual equiparou, para o efeito de identificação do coator, o executor e o expedidor da ordem de que derivou o ato questionado no mandado de segurança. Assim é que, diante da Lei nº 12.016, o STJ passou a decidir que “A autoridade no Mandado de Segurança não é somente aquela que emitiu a determinação ou a ordem para a prática do ato, mas também a que o executa diretamente, conforme orienta o art. 6º, § 3º da nova Lei do Mandado de Segurança”26. Com isso, o impetrante passou a ter uma faculdade legal de escolher, para o manejo do writ, entre apontar como coator o superior hierárquico ou o agente executor, o que simplifica bastante o trabalho de endereçar o pleito. Por outro lado, a relação processual não fica prejudicada pela opção do autor, porquanto a lei em vigor deixa muito claro que o sujeito passivo da ação mandamental não é o coator, e sim a pessoa jurídica à qual este se vincula. O que tem de ser indicado com precisão é o demandado, com relação ao qual não se tolera erro do demandante, visto que redundará em demanda contra parte ilegítima. Já o equívoco relacionado ao agente executor é de menor significado, podendo ser corrigido, se for o caso, durante a tramitação e saneamento do processo. Enfim, agora, não se pode duvidar de que, “para fins de mandado de segurança, autoridade coatora é aquela que pratica, ordena ou omite a prática do ato impugnado e tem poderes para refazê-lo”27. De qualquer maneira, deve-se identificar uma autoridade, seja na prática, seja na ordem, para a prática do ato impugnado. O mandado de segurança, como já resultou demonstrado nos comentários ao art. 1º, nunca é contra ato de mero funcionário público. Se este não dispuser de “poder de decisão”, no tocante à prática do referido ato, não reunirá atributo para configuração de “autoridade pública”, para figurar como “autoridade coatora” no processo de mandado de segurança28. Nessa categoria não entra quem se comporta como mero executante de ato ordenado por outrem, ainda que aja na qualidade de servidor público. Jamais se poderia ter, nessa ordem de ideias, como autoridade coatora, por exemplo, o policial que cumpre o mandado de prisão do condenado, ou oficial de justiça que cumpre o mandado judicial de busca e apreensão, de despejo ou de reintegração de posse. Para o mandado de segurança, a autoridade coatora “é o funcionário ou autoridade que tem poder para determinar o cumprimento e ao mesmo tempo para determinar a suspensão do ato comissivo ou omissivo impugnado”, não aquele que se limita à pratica de “meros atos executórios, mesmo que integrante da Administração Pública”29. Assim como o simples executor do ato não pode ser tratado como autoridade coatora, também não entra nessa categoria, para os fins do mandado de segurança, a autoridade pública que apenas traçou as normas genéricas para a prática de certa conduta administrativa. Não é contra a norma, mas contra o ato praticado em conformidade com ela, que se pode impetrar o mandado de segurança30.

Há situações interessantes sobre a autoridade coatora, que foram objeto de súmulas do STF: a)

Competência delegada: “Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial” (Súmula nº 510/STF)31. A razão de ser dessa legitimação processual decorre de que no exercício da função delegada, quem a exerce o faz em nome próprio, salvo se o delegante reservar para si a responsabilidade pelos atos do delegatário, caso em que estes serão praticados em nome do delegante, não ocorrendo, portanto, uma verdadeira delegação, mas apenas um credenciamento para atos de rotina. Não é a essa simples autorização para agir em nome da autoridade que se refere a Súmula nº 510/STF. O seu enunciado se aplica quando não existe a questionada reserva, na delegação, e o poder delegante transfere também para o seu delegado o poder decisório, assim como a jurisdição própria para conhecer dos seus atos. Assim, nas delegações de poder, o ato é de quem o pratica, ou seja, se a transferência de competência é feita sem reserva, como de costume ocorre, fica o delegado “responsável pela solução administrativa, e aplicação da lei”32.

b)

Ato do Presidente da República: “No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do Presidente da República, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento” (Súmula nº 627/STF).

Merecem consideração, igualmente, algumas situações particulares, destacadas pela doutrina e jurisprudência, como: a)

Órgãos colegiados: com relação a estes órgãos, o coator, embora não seja o respectivo presidente, a ele cabe representar, no mandado de segurança, o ente coletivo, este sim o responsável pelo ato ilegal ou abusivo praticado contra o impetrante33.

b)

Atos complexos: como tais compreendem-se os atos administrativos que se formam “pela conjugação de vontades de mais de um órgão administrativo”34, como ocorre, por exemplo, na nomeação de Ministro do Superior Tribunal de Justiça, a qual reclama, primeiro, a formação de uma lista tríplice no Tribunal e, finalmente, a escolha e nomeação por Decreto do Presidente da República; ou a nomeação de Ministro do Supremo Tribunal Federal, cuja escolha é ato do Presidente da República, mas o Decreto de nomeação somente ocorre depois do ato de aprovação do Senado. A autoridade coatora, nesses atos administrativos complexos, será a última que atuou na sua prática, ou seja, aquela que ultimou o ato em vias de impugnação mandamental35. Há quem, todavia, entenda que todos os que atuaram na formação do ato complexo deveriam figurar no mandado de segurança como coatores36. A jurisprudência, todavia, prestigia o primeiro entendimento (isto é, o de que o coator será

aquele que concluiu a prática do ato complexo), o que, a nosso ver, parece mais consentâneo com o papel reservado à autoridade coatora no processo do mandado de segurança37. Pense-se na impetração contra a nomeação de Ministro do STJ ou do STF: as informações requisitadas ao Presidente da República, que expediu o ato administrativo final, são o suficiente para o processamento do mandamus, a nosso ver, e, aliás, conforme jurisprudência sumulada do STF38. c)

Atos compostos: correspondem estes a sucessivos atos, distintos entre si, mas que se unem “para produzir um só efeito”, como, v.ġ., o ato de aposentadoria praticado pela autoridade administrativa competente e que se submete a posterior aprovação do Tribunal de Contas. Em face do ato composto, a autoridade coatora será a que houver praticado o ato principal, e não a que apenas o aprovou ou homologou39.

d)

Atos de procedimento administrativo: será coatora a autoridade que preside o procedimento40.

e)

Avocação de ato por autoridade superior: será coatora a autoridade superior que houver avocado o ato praticado por inferior hierárquico41.

f)

Decisão de Conselho de Contribuintes: será coatora a autoridade que der cumprimento à decisão, porque o Conselho não tem poder de execução42.

g)

Delegação da Lei do Imposto de Renda em favor dos Estados e Municípios para que arrecadem e se apropriem do tributo descontado em folha de pagamento: o mandado de segurança, na espécie, será contra a unidade política arrecadadora, figurando como coator o agente local responsável pela arrecadação. A competência, portanto, será da Justiça Estadual e não da Justiça Federal, sem embargo de tratar-se de um tributo federal43.

h)

Delegação de serviço federal a funcionário estadual ou municipal: o STF já decidiu que o ato do funcionário local continua pertinente ao serviço federal, de modo que o mandado de segurança permaneceria vinculado à Justiça Federal44. Mas, para que isso ocorra, é necessário que o ato do servidor local se conserve vinculado à responsabilidade da Administração Federal. O agente estadual ou municipal seria, na verdade, mero preposto do órgão delegante. Assim, seria tratado, para efeito do mandado de segurança, como “autoridade federal”, pois as consequências do mandado de segurança, se deferido, terão de ser suportadas pela União. Afasta-se a Súmula nº 510 do STF e aplica-se a regra do art. 2º da Lei nº 12.016.

57.1.

Correção da nomeação equivocada da autoridade coatora

O § 4º do art. 6º da Lei nº 12.016, vetado pelo Presidente da República, continha permissão para o impetrante emendar a petição inicial, em dez dias, quando fosse suscitada, pela autoridade

coatora, sua ilegitimidade. Certamente, pesou no veto o injustificado entendimento jurisprudencial que considerava alteração do sujeito passivo do processo a correção da inicial, no tocante à indicação do coator. Essa concepção, no entanto, envolve equívoco técnico em relação à posição processual da autoridade coatora no mandado de segurança. Trata-se, ela, de uma fonte de “informação” e de um instrumento para “execução” dos atos mandamentais do juiz, e não de um sujeito da relação processual45. Logo, sua substituição, ainda que posterior às “informações” prestadas, não repercute sobre a estabilização subjetiva do processo. Antes e depois da emenda da inicial, a demandada continua sendo a mesma, isto é, a pessoa jurídica nomeada na petição inicial, como aquela a que se vincula o praticante do ato impugnado. Esta é que não pode ser substituída, depois de estabilizada a relação processual, objetiva e subjetivamente, pelo transcurso do tempo de resposta à demanda46. Irrelevante, portanto, foi o veto ao § 4º do art. 6º, uma vez que defeitos da inicial que não afetem o pedido, a causa de pedir ou as partes, se acham sob o regime do art. 321 do CPC: mesmo que o prazo de defesa tenha sido ultrapassado, e o réu tenha contestado a ação, o juiz não poderá deixar de conceder o prazo de quinze dias para que o autor corrija o defeito sanável detectado na petição inicial47. Sendo, como efetivamente é, perfeitamente sanável o erro cometido na indicação do agente coator, já que sua correção não afeta os elementos subjetivos do processo, continuará viva a regra vetada, não por força dela própria, mas pelo art. 321do CPC, cuja aplicação subsidiária ao mandado de segurança é inconteste48. Aliás, a aplicação subsidiária do art. 321 ao mandado de segurança tem sido admitida pelo STJ, frequentemente, para complementação de documentação faltante à inicial49.

Não são, porém, apenas as falhas documentais que se sanam, por meio do regime do art. 321, mas “toda e qualquer irregularidade visível prima facie, inclusive, pois, o equívoco cometido no tocante à nomeação da autoridade coatora, ‘inobstante o veto ao § 4º, do art. 6º sob comentário’”50. 57.2.

Autoridade coatora e a teoria da encampação

A jurisprudência construiu a chamada “teoria da encampação” para superar os equívocos de impetração de segurança, quando o ato atacado é de autoria de uma autoridade subalterna e o mandado é requerido em face de seu superior hierárquico, que não participou, in concreto, do objeto da causa. Segundo essa construção pretoriana, se a autoridade superior encampar o ato de seu inferior hierárquico – que seria o legitimado para figurar na posição processual de “autoridade coatora” –, promovendo, em juízo, sua defesa, passará a ocupar dita posição, daí em diante. Ao encampar o ato de seu subalterno, a autoridade superior faz com que tenha sido irrelevante o

equívoco cometido na petição inicial51. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para que a “teoria da encampação” seja aplicada, exigem-se os seguintes requisitos: “a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; b) ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal; e, c) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas”52. A mesma teoria aplica-se ao caso em que na ação de segurança ocorre a defesa do ato impugnado pela pessoa jurídica que haverá de suportar os efeitos da sentença, uma vez que é a ela que corresponde a posição de sujeito passivo da relação processual, e porque, nessa qualidade, teria encampado o ato de seu agente53. Na verdade, a autoridade coatora nem é parte do processo e somente é chamada a prestar informações sobre o ato impugnado. Portanto, tendo sido essas informações prestadas, por meio da resposta do próprio sujeito passivo do processo, superado se acha o equívoco do impetrante na nomeação da autoridade coatora. O estranho é que a jurisprudência tem, frequentemente, valorizado mais o efeito negativo do erro cometido na nomeação da autoridade coatora do que a superação desse erro pela teoria da encampação. Tem alguma razoabilidade a recusa de aplicação da referida teoria no caso em que provocaria criação de uma competência originária de tribunal em lugar daquela que ordinariamente haveria de prevalecer em função do ato impugnado e de sua autoria. De fato, sendo a competência do mandado de segurança definida, ex lege, com base na autoridade coatora, não seria razoável admitir que pudesse o impetrante ensejar, com seu erro, deslocamento do writ para um foro excepcional e privilegiado, como são aqueles previstos para certas autoridades de elevado nível hierárquico54. O que não merece estímulo é a orientação pretoriana que, diante da recusa de aplicar a teoria da encampação, se prevalece do erro na nomeação da autoridade coatora pelo impetrante, para proceder ao imediato decreto de extinção do processo por ilegitimidade de parte, e às vezes com o argumento de não ser possível ao tribunal permitir a substituição do demandado55. Sendo a parte passiva do mandado de segurança a pessoa jurídica interessada, e não a autoridade coatora, o equívoco a respeito desta não pode ser tratado como acarretador de ilegitimidade de parte. Pode influir na competência, como já se observou. Isto, contudo, não é causa de extinção do processo, mas de deslocamento para o juízo competente, reconhecido a partir da identificação correta do coator. Tudo não passa de regras formais, cuja inobservância não pode, em princípio, ser causa de recusa da tramitação do processo rumo à solução de mérito, destino maior da prestação jurisdicional devida a qualquer que seja o titular de direito subjetivo ameaçado ou violado.

57.3.

Autoridade coatora, nos casos das equiparações do § 1º, do art. 1º, da Lei nº 12.016

A Lei do Mandado de Segurança, no § 1º do art. 1º, equipara à autoridade pública, para fins da tutela mandamental, dois entes estranhos aos quadros da Administração Pública: (i) os representantes ou órgãos de partidos políticos; e (ii) os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais que se achem no exercício de atribuições do Poder Público. O dispositivo legal inclui entre as equiparações “os administradores de entidades autárquicas”. Na verdade, sendo as autarquias meros desdobramentos da pessoa jurídica de direito público, efetuados no propósito de atender às conveniências da gestão dos serviços públicos, não há de se pensar em equiparação de seus representantes às autoridades. Eles são autoridades tanto quanto os agentes primários do Poder Público, visto que uns e outros desempenham função pública da mesma natureza, dentro da Administração. A ampliação da abrangência do mandado de segurança, feita pela Constituição e pela Lei que o regulamentou, consistiu na permissão para que o writ pudesse ser manejado não só contra as pessoas jurídicas de direito público, mas também contra pessoas de direito privado, equiparando-as à autoridade pública, quando praticarem ato típico do Poder Público. Não basta, porém, que a pessoa jurídica de direito privado, ou a pessoa natural, seja uma delegatária de atividade pública; para caber o mandado de segurança é preciso que o ato impugnado tenha sido realmente praticado no exercício da atividade pública56. Excluem-se, portanto, da área de cabimento do mandado de segurança, os atos de gestão comercial57. A autoridade coatora, a ser notificada, no caso de mandado de segurança contra as pessoas jurídicas no exercício de atividade do Poder Público, é o administrador que praticou o ato impugnado. Mas, é de se verificar seus poderes de gestão, pois um simples empregado ou funcionário da empresa, sem poderes de decisão, não pode ser tratado como “autoridade coatora”. É preciso procurar quem realmente tenha poderes de autoridade dentro da empresa para enquadrá-lo na situação jurídica de responsável pelo ato atacado pelo mandado de segurança. Quanto à intimação (citação) do representante judicial da pessoa jurídica que ocupará o polo passivo da ação mandamental, sua identificação se dará segundo a norma do art. 75, VIII58, do CPC/201559. No caso de a delegação da atividade pública haver sido feita em favor de pessoa física ou natural, as figuras da autoridade coatora e do sujeito passivo da ação mandamental se confundirão numa só pessoa. A notificação para prestar informações e a citação (intimação) para se defender se praticarão por meio de um só instrumento.

58. ESPECIFICAÇÃO DAS PROVAS A PRODUZIR. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS EM PODER DO COATOR OU DE TERCEIRO O requisito da especificação de provas, em regra, não tem maior significado, quando se trata da petição inicial do mandado de segurança. Isto porque não há dilação probatória no curso desse procedimento especial. A prova das alegações do impetrante é documental e deve, em princípio, ser previamente constituída e juntada à petição inicial. Pode ocorrer, todavia, que os documentos necessários à sustentação do pleito deduzido em juízo pelo impetrante estejam fora de seu alcance imediato. Acham-se em poder da própria autoridade coatora, de outro órgão público, ou de terceiro. Aí, sim, cabe à parte especificar quais são esses documentos, requerendo, na inicial do mandado de segurança, a ordem do juiz, em preliminar, para que sejam exibidos em juízo em original ou em cópia autêntica, no prazo de dez dias (Lei nº 12.016, art. 6º)60. Não cabe ao impetrante omitir-se na procura da documentação indispensável ao seu pleito, acomodando-se no recurso ao juízo para a requisição prevista no referido dispositivo legal. Segundo orientação jurisprudencial, “é de responsabilidade da impetrante a juntada dos documentos comprobatórios de seu alegado direito líquido e certo, só se determinando sua apresentação pela autoridade coatora em caso de recusa injustificada, a teor do disposto no art. 6º, parágrafo único, da Lei nº 1.533, de 31/12/1951”61. O art. 6º, § 1º, da nova Lei de Mandado de Segurança mantém o mesmo regime da lei anterior, qual seja, o de condicionar a exibição por intervenção judicial aos casos de recusa da autoridade, de tal maneira que, não havendo “qualquer elemento nos autos que comprove a eventual recusa da Autoridade indicada como coatora”, não suprirá o juiz a inércia da parte62. A diligência, uma vez deferida, será cumprida de duas formas distintas: a)

se o documento está em poder de outro órgão administrativo (que não o coator), ou de terceiro, a ordem de exibição será feira diretamente ao detentor, caso em que o andamento da segurança ficará no aguardo do cumprimento da diligência preliminar (art. 6º, § 1º);

b)

estando em poder da autoridade coatora, a ordem de exibição será incluída no próprio instrumento da notificação para prestar informações sobre o ato impugnado (art. 6º, § 2º)63.

Apenas em tal situação é que se pode ver utilidade de uma especificação, na petição inicial do mandado de segurança, de provas a serem produzidas pelo autor, posteriormente ao ajuizamento da ação. Segundo DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, esse dispositivo estabelece como regra o contraditório diferido, quando deveria este ser excepcional, conferindo “à hipótese ora analisada uma presunção absoluta de urgência, de forma que sempre o juiz antes ordenará a exibição e, no

prazo de dez dias desta, caberá ao terceiro apresentar defesa que o exima do dever de exibir”64. O juiz deveria, em não havendo urgência, primeiro ouvir a parte contrária (ou o terceiro) para somente depois determinar a exibição do documento, se ainda entender cabível a pretensão exibitória.

58.1.

Documentos indispensáveis à instrução da petição inicial

Uma vez que o mandado de segurança, segundo previsão do art. 5º, LXIX, da Constituição, só se destina a proteger direito subjetivo líquido e certo, a prova documental de sua existência é indispensável à instrumentalização da petição inicial, nos termos do art. 32065 do CPC/2015. Não contendo o procedimento sumário da ação mandamental, em seu curso – como já restou demonstrado –, uma dilação para instrução, toda a atividade probatória do impetrante deve, em regra, exaurir-se no próprio momento do ingresso em juízo, e isto será feito por meio de elementos documentais préconstituídos. Registre-se que “os documentos indispensáveis (...), no caso do mandado de segurança, serão aqueles capazes de dar credibilidade ao argumento de liquidez e certeza do direito invocado [pelo autor], o que resulta claro da exigência expressa, de estabelecer desde logo a relação entre a verdade dos fatos e o documento que a contenha”66. Há, contudo, duas exceções a essa imediata e categórica exigência dos documentos do autor necessários à sustentação do seu pleito: (i) quando tais documentos se acham em poder da Administração, ou de terceiro, caso em que, em preliminar, poderão ser objeto de requisição judicial (Lei 12.016, art. 6º, §§ 1º e 2º); e (ii) quando as informações da autoridade coatora ou a resposta da pessoa jurídica interessada (parte passiva da ação) vierem acompanhadas de outros documentos, caso em que o impetrante, pela garantia do contraditório, terá direito à contraprova por meio também de novos documentos, se isto lhe for possível (CPC/2015, art. 43567)68.

58.2.

Instrumento do mandato do advogado do impetrante

Dentre as ações constitucionais, apenas o habeas corpus pode ser impetrado em juízo sem a atuação de advogado (Lei nº 8.906/1994, art. 1º, I e § 1º). O impetrante de mandado de segurança tem, pois, de se fazer representar por advogado legalmente habilitado69. Se assim é, a petição inicial do mandado de segurança haverá de ser acompanhada, necessariamente, da procuração outorgada pelo autor ao advogado que a subscreve (CPC/2015, art. 104). Na eventualidade, porém, dos casos de urgência ressalvados pela segunda parte do art. 104 do CPC, ao advogado do impetrante será permitido ingressar em juízo, sem a exibição imediata do instrumento do mandato ad judicia, cabendo-lhe apresentá-lo posteriormente, no prazo de 15 dias (prorrogável por mais 15 dias, por despacho judicial) (CPC, art.104, 1º), sob pena de, não o

fazendo, reputarem-se “ineficazes” os atos praticados em nome da parte (CPC, art. 104, § 2º). A declaração de ineficácia do ato de impetração da segurança, por falta de tempestiva exibição da procuração pelo advogado, acarreta extinção do processo sem resolução de mérito, por ausência de pressuposto processual (CPC/2015, art. 485, IV). Configura, portanto, sentença terminativa, a desafiar recurso de apelação, nos moldes do art. 33170 do CPC/2015, por equivaler a um indeferimento da petição inicial.

59. PETIÇÃO INICIAL POR MEIO ELETRÔNICO Se, nos casos de urgência, o impetrante usar telegrama, fax ou outro meio eletrônico, para formulação e aforamento da petição inicial, tal como previsto no art. 4º da Lei nº 12.016, também os documentos que a instruírem deverão ser remetidos, por cópia e pela mesma via, junto com a notificação à autoridade coatora. Em tal conjuntura, os originais (da inicial e dos documentos) serão apresentados em juízo, dentro dos cinco dias úteis seguintes, na forma prevista no § 2º do referido art. 4º 71.

60. OS FATOS E OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PEDIDO Todo direito subjetivo nasce de um fato que se correlaciona com uma norma jurídica que lhe define os efeitos. No caso do mandado de segurança, o impetrante tem de identificar não só o direito subjetivo para o qual invoca a tutela mandamental, mas também de demonstrar como ele nasceu no plano fático. Tem, outrossim, de descrever os fatos, imputados à autoridade coatora, que violaram ou ameaçam violar seu direito subjetivo. Tudo isso deve vir relacionado com um demonstrativo documental, porque protege direito líquido e certo, ou seja, direito demonstrável prima facie, mediante prova documental préconstituída.

61. O PEDIDO O mandado de segurança pode ser utilizado para fins preventivos ou repressivos. No primeiro caso, o pedido será de uma ordem judicial que proíba a Administração de praticar o ato ilegal ou abusivo, temido pelo impetrante. O mandado de segurança repressivo é o que se volta contra ato já consumado pela autoridade coatora, que, por sua vez, pode ser comissivo ou omissivo. Na primeira hipótese, a tutela pleiteada pode ser meramente declaratória, o pedido, então, compreenderá o pleito de uma sentença que declare a nulidade do ato impugnado. Poderá o pedido ser, também, de natureza condenatória, caso em que se pleiteará a ordem para que, não só se desconstitua o ato ilegal (efeito constitutivo), como

ainda pratique outro, que corresponda ao direito líquido e certo reconhecido ao impetrante. Por exemplo: o pedido pode ser de anulação de uma nomeação de servidor e da prática de outra nomeação, desta vez, a do impetrante. Nos casos de atos omissivos, como o de não deferimento de benefício tributário, ou de não fornecimento de certidão, o pedido será de mandado que ordene a prática do ato omitido. Ainda, em relação ao ato administrativo que tenha negado verba remuneratória, o pedido pode pleitear a desconstituição do ato denegatório e a condenação da Administração a promover o respectivo pagamento. Quando se tratar de verba a ser percebida continuamente, o pedido pode consistir na respectiva inclusão na folha de pagamento. Em todos os casos em que a obrigação questionada é de natureza continuada ou repetitiva, é muito importante que o pedido seja claro quanto à extensão do pleito. Não havendo explicitação de que o mandado de segurança seja concedido de forma continuativa, pode a coisa julgada se formar apenas em relação ao objeto restrito do ato impugnado. Por deficiência do pedido formulado, a parte, mesmo sendo vitoriosa, se verá na contingência de ter de renovar a ação mandamental a cada ato sucessivo, dentro da cadeia da obrigação duradoura72.

61.1.

Descabimento de pedido que transforme o mandado de segurança em ação de cobrança

Está assente na jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal que “o mandado de segurança não é substitutivo da ação de cobrança” (Súmula nº 269/STF). Os precedentes que sustentam esse enunciado sumular se lastrearam em mandados de segurança relacionados com a remuneração de funcionários públicos, mas é possível estender seu alcance também aos créditos de particulares perante o Poder Público. A explicação, que a doutrina encontra para que seja vedado o uso do mandado de segurança em tal situação, reside na regra constitucional que submete o credor da Fazenda Pública ao regime de execução por meio dos precatórios, cujo cumprimento, fundado em sentença judiciária, ficará na dependência de inclusão da competente verba no orçamento do exercício seguinte à apresentação da requisição judicial; e a Administração terá prazo para efetuar o pagamento até o final do referido exercício (CF, art. 100 e § 1º). Sendo assim, o mandado de segurança não se compatibiliza, como instrumento judicial, com o regime constitucional de realização dos débitos da Fazenda Pública. Com efeito, a característica da ação mandamental é a produção de provimento judicial que resulte numa ordem a ser cumprida de imediato e “nos exatos termos do que contido na decisão”73. Demonstra DECOMAIN, com propriedade, que “se no mandado de segurança houvesse a condenação da autoridade coatora (rectius: da pessoa jurídica a que ela se vincula) a providenciar o

pagamento da dívida do impetrante, reconhecida na sentença, deveria acontecer o pagamento imediato, por se tratar de mandado de segurança. Esse cumprimento imediato da sentença, todavia, encontraria obstáculo no mínimo nessa sistemática constitucional de pagamento dos débitos da Fazenda Pública reconhecidos em sentença judicial”74. Entretanto, essa vedação de cobrança de obrigações financeiras por via do mandado de segurança tem encontrado temperamentos, por parte da jurisprudência e da própria Lei nº 12.016. Voltaremos a tratar da matéria nos comentários ao art. 14 da Lei do Mandado de Segurança.

62. VALOR DA CAUSA Tal como se passa com qualquer ação civil, é necessário que o autor atribua, na petição inicial do mandado de segurança, um valor à causa, levando em conta, em princípio, a expressão econômica do pleito. Para se cumprir essa exigência legal (CPC, art. 291)75, a regra básica é que, possuindo o direito, para cuja proteção se invocou a segurança, uma expressão avaliável financeiramente, o valor da causa corresponderá ao proveito econômico perseguido na ação76. Nos casos em que não se possa avaliar economicamente a pretensão deduzida em juízo, o valor do mandado de segurança será objeto de estimativa por parte do impetrante77.

63. DENEGAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO Dispõe o § 5º do art. 6º que o mandado de segurança será denegado nos casos previstos pelo art. 267 do CPC [CPC/2015, art. 485]. Esse dispositivo legal é o que, no direito processual civil comum, prevê quando o processo se extinguirá, prematuramente, sem alcançar a resolução do mérito da causa. Melhor seria o enunciado se substituísse o verbo “denegar” por “extinguir”, pois assim se amoldaria, com exatidão, à linguagem do Código de Processo Civil. Denegar, em sentido léxico, corresponde a “negar” ou “indeferir”, o que ocorre, com mais precisão, quando a sentença nega acolhimento ao pedido, ou seja, quando o mérito é enfrentado e resolvido de maneira contrária à pretensão do autor. Nesse sentido, o CPC/2015 prevê, no seu art. 487, I78, que “haverá resolução de mérito quando o juiz: acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção”. Já o caso de falta de requisitos de formação regular do processo, ou de condições legais para que o objeto litigioso seja examinado em juízo, é que conduz à extinção do processo, nos termos do art. 485 do CPC. Todavia, é antigo e consolidado na linguagem da lei e da jurisprudência o emprego da expressão

“denegar a segurança”, de forma a abranger indistintamente os casos de resolução de mérito (sentenças definitivas), assim como aqueles fundados na ausência de requisitos do julgamento do mérito da causa (sentenças terminativas)79. Daí a preocupação do § 5º do art. 6º, da Lei nº 12.016, em prever a denegação do mandado de segurança nos casos do art. 485, esclarecendo em seguida que o pedido formulado no processo extinto poderá ser renovado “se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito” (art. 6º, § 6º). Com isso, fica evidente que a denegação prevista no § 5º não se refere a um desacolhimento do pedido (mérito), mas a uma extinção do processo “sem resolução de mérito”, exatamente como regula o art. 485 do CPC. As questões preliminares que, segundo o art. 485 do CPC, conduzem à extinção do processo sem resolução de mérito são assim configuradas, no elenco do Código: “II – o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes; III –por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias; IV –verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V – reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada; VI – verificar a ausência de legitimidade ou de interesse processual; VII – acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juiz arbitral reconhecer sua competência; VIII – homologar a desistência da ação; IX – em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e X – nos demais casos prescritos neste Código”. A denegação do mandado de segurança, nos casos do art. 485 do CPC/2015, se a falha detectada for sanável, não deverá ser pronunciada pelo juiz sem antes ensejar oportunidade ao impetrante de emendar ou completar a petição inicial, no prazo de quinze dias, como permite o art. 321 do CPC/2015. Somente não se facultará o suprimento dos requisitos de procedibilidade faltantes quando os vícios da postulação forem irremediáveis. É o caso, por exemplo, de iliquidez do direito subjetivo para o qual se pretende a tutela mandamental, evidenciada pelos próprios documentos que instruem a inicial; de impetração contra lei em tese; de decadência do direito de se valer da ação de segurança. Em situações como estas, o indeferimento liminar da petição inicial se impõe sem maiores delongas80. É bom lembrar, outrossim, que o art. 485 do CPC inclui, entre os casos de extinção do processo sem resolução de mérito, o indeferimento da petição inicial (inc. I). E o art. 332, § 1º 81, do mesmo

Código, inovando em relação ao Código de 1973, dispôs que, nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição. É lógico, portanto, que se tal for o motivo da denegação da segurança, não incidirá a regra do § 6º do art. 6º, que permite a renovação da ação mandamental, se não esgotado o prazo decadencial do art. 23. É que, malgrado ter a decisão denegatória ocorrida in limine litis, envolveu ela uma solução de mérito, segundo previsto no art. 332, § 1º, do CPC82. E, havendo sentença de mérito, a consequência inevitável será a formação da coisa julgada material, cuja força é impedir definitivamente que a lide volte a ser discutida em juízo (CPC, art. 50283). Diante disso, torna-se necessário discriminar os casos de indeferimento da petição inicial, para se definir quando há, e quando na há, coisa julgada, e, assim, definir a incidência, ou não, do permissivo do § 6º, do art. 6º, da Lei nº 12.01684.

64. RENOVAÇÃO DO PEDIDO DE MANDADO DE SEGURANÇA Ocorrendo a denegação do mandado de segurança, por meio de decisão fundada nas preliminares processuais do art. 485 do CPC/2015, cabe, em regra, a renovação da demanda mandamental (Lei nº 12.016, art. 6º, § 6º). No entanto, para que a repropositura do pedido de mandado de segurança seja admitida, há dois requisitos legais a observar: a)

o prazo decadencial do direito à tutela mandamental, previsto no art. 23 da Lei nº 12.016, não pode ter se consumado; e

b)

a decisão denegatória da segurança não pode ter apreciado o mérito da causa.

Como restou destacado no tópico anterior, há situações em que o pedido pode ser julgado liminarmente improcedente, previsto no art. 332 e §1º, do CPC/2015, envolvendo apreciação de mérito da demanda. Assim, quando, por exemplo, a denegação liminar se deu por falta ou insuficiência de prova, ou por outro defeito ligado aos pressupostos processuais ou às condições da ação, certo é que a renovação do pedido de mandado de segurança se apresenta admissível; desde, é claro, que a deficiência da primitiva demanda tenha sido superada e que ainda seja tempestivo o recurso ao mandado de segurança. A ressalva do referido § 6º, de que a repropositura da ação mandamental não será cabível, tem plena justificação, pois, se a denegação liminar da segurança, houver se fundado, v.ġ., em prescrição ou decadência do direito subjetivo do impetrante (CPC/2015, art. 332, §1º), a extinção do processo terá se dado “com resolução de mérito” (CPC, art. 487, II). Em resumo:

a)

a inexistência de direito líquido e certo, por deficiência ou falta de prova documental adequada, é causa de extinção do processo de mandado de segurança, por inépcia da petição inicial85; a liquidez e certeza do direito, no mandado de segurança, é uma “condição da ação”, nada tendo a ver com o mérito86;

b)

se a petição inicial foi indeferida ou se o processo foi extinto sem julgamento do mérito, “em virtude da insuficiência probatória ou por outro motivo [ligado às preliminares processuais], nova ação de mandado de segurança poderá ser proposta”87, se ainda tempestivo for o recurso a esse tipo de tutela especial;

c)

haverá coisa julgada material – e, portanto, não será admissível a renovação do pedido de mandado de segurança – quando a extinção do processo houver se baseado em decadência ou prescrição88.

Importante ressaltar, por oportuno, que a extinção do mandado de segurança com resolução do mérito impede não apenas a renovação do pedido do writ como também o ajuizamento de qualquer outra ação: é que, “em mandado de segurança, se a sentença denegatória apreciou o mérito da causa, há coisa julgada sobre a matéria, não podendo, no caso, a mesma questão ser reapreciada em ação de repetição de indébito”89. Pode acontecer, outrossim, que a denegação da segurança tenha se fundado em razões múltiplas: uma parte da demanda foi rejeitada por improcedência do pedido, e outra por insuficiência de prova. Se esta for a situação concreta, a coisa julgada impedirá a renovação do mandado de segurança, ou até mesmo a propositura de ação ordinária, em torno daquilo que foi apreciado pelo mérito. A parte da pretensão, todavia, que foi rejeitada por deficiência de prova, não ficará excluída de novo julgamento pelas vias ordinárias, nem mesmo por meio de novo mandado de segurança90. Observe-se que há possibilidade de duas hipóteses de decadência no plano do mandado de segurança: (i) a que diz respeito apenas ao uso do mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 23); e (ii) a que se relaciona com a extinção do próprio direito subjetivo material, para cuja tutela se impetra a segurança (Código Civil, art. 207). A primeira, quando reconhecida, não faz coisa julgada material, de modo que não impede a discussão da lide pelas vias ordinárias; a segunda importa res iudicata, impedindo não só a repropositura de mandado de segurança, como também o manejo de ação comum sobre a mesma lide.

65. DESISTÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA Entre os casos de extinção do processo, sem resolução de mérito, previstos no art. 485 do CPC/2015, e que a Lei nº 12.016 manda aplicar ao mandado de segurança, figura a desistência da ação pelo autor. A regra geral é a liberdade reconhecida ao autor de desistir da ação enquanto não oferecida a

contestação. Ultrapassado esse termo, a desistência dependerá de consentimento da parte contrária, segundo dispõe o art. 485, § 4º, do CPC/2015. Assim, na sistemática do direito processual comum, a desistência da ação ora se apresenta como ato unilateral, ora como ato bilateral, dependendo da fase processual em que o ato dispositivo é praticado. Argumenta-se – para justificar o regime do CPC – com o caráter linear da relação processual no primeiro estágio (que vai da propositura da ação até a defesa do demandado), daí a liberdade reconhecida à única parte presente em juízo para encerrar o processo no nascedouro. Uma vez, porém, ultrapassada a fase inicial, a relação torna-se bilateral entre as partes, de sorte que o direito à resolução do litígio passa a pertencer tanto ao autor como ao réu. O demandante, por isso, dependerá do consentimento do demandado para pôr fim ao processo, por meio de desistência da ação (CPC/2015, art. 485). É que este pode ter mais interesse em uma decisão de improcedência do pedido (que faz coisa julgada material) do que numa decisão apenas terminativa, sem enfrentamento do mérito (que apenas faz coisa julgada formal) e que, portanto, não impede futura reproposição da demanda91. A anuência exigida pelo art. 485 do CPC, todavia, não precisa ser expressa, podendo manifestar-se por meio do silêncio do réu, como se reconhece na jurisprudência: “é válida a homologação da desistência da ação requerida pelo autor, após o prazo para resposta, na hipótese em que o réu, devidamente intimado para se manifestar a respeito do pedido de desistência formulado, deixa transcorrer in albis o prazo assinalado”92. Todavia, a desistência da ação, mesmo com o assentimento do réu – segundo clássica posição doutrinária e jurisprudencial –, só é possível enquanto não pronunciado o julgamento do mérito da causa. Definido o direito material pela sentença, não cabe desistir do pleito que provocou o provimento jurisdicional. Nessa altura, o que se apresenta possível é a renúncia ao direito já reconhecido pelo Poder Judiciário93. Discute-se se a desistência do mandado de segurança seguiria, ou não, o mesmo regime traçado pelo Código de Processo Civil, tendo em conta que a Lei nº 12.016/2009 (tal como a Lei nº 1.533/1951) não dispensa tratamento específico para a matéria. Se a desistência do mandamus ocorre antes da notificação da autoridade coatora e da citação da pessoa jurídica interessada, é certo que a dispensa de consentimento da parte contrária opera, exatamente, como previsto no art. 485 do CPC. Quando, no entanto, se dá posteriormente, o tratamento jurisprudencial tem sido diferente daquele adotado na lei processual comum, em nome da natureza constitucional da ação, como se deduz do seguinte aresto do STJ: “Mandado de segurança – Desistência – Anuência da parte impetrada – Desnecessidade – Art. 267, § 4º – Inaplicável. 1. Este Tribunal, em outras oportunidades, já se manifestou no sentido de que a desistência da ação de mandado de segurança pode ocorrer a qualquer tempo, independente da

concordância da pessoa jurídica impetrada. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, alicerçada em sintonia com julgados do Excelso Supremo Tribunal Federal, assentou que ‘o pedido de desistência de mandado de segurança há de ser homologado independentemente da anuência da autoridade impetrada, ainda que em fase recursal’. (AROMS 12.394/MG, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU 25.2.2002). Agravo regimental improvido”94. Embora se admita a desistência do mandado de segurança a qualquer tempo, com ou sem anuência do sujeito passivo, vinha prevalecendo o limite temporal da sentença de mérito, de modo que, a exemplo das causas comuns, também “após a prolação de sentença em mandado de segurança, incabível [seria] a homologação de pedido de desistência da ação”95. Em outros termos: “O pedido de desistência do mandado de segurança, sem a anuência da parte adversa, somente é possível antes da prolação da sentença. Após, cabível é apenas a desistência unilateral do recurso, nos termos do art. 501, do CPC [CPC/2015, art. 998], que também se aplica, nesse caso, ao recurso especial. (REsp 550.770-CE, DJ 4.12.2006) Agravo regimental provido”96. Esse regime amplamente observado pelo Superior Tribunal de Justiça prevalecia, também, no Supremo Tribunal Federal97. É bom registrar, todavia, que tanto o STF

como o STJ, nos últimos tempos, têm ampliado o tempo útil para a desistência do mandado de segurança, de sorte a permiti-la até mesmo depois do julgamento de mérito98. E no STF, o tema já foi objeto, até, de julgamento com o rótulo de “repercussão geral”, tornando-se, portanto, paradigma a decisão no sentido da possibilidade de desistência do mandado de segurança, a qualquer tempo, mesmo após a decisão de mérito, e independentemente de anuência da parte contrária99. Se assim entendem as Cortes Superiores, malgrado a resistência doutrinária100, o único limite ao livre exercício do direito de desistir do mandado de segurança passou a ser o trânsito em julgado da sentença de mérito que o rejeitou.

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CPC/73, arts. 128 e 460. CPC/73, art. 269, I. CPC/73, art. 3º. É de se ter em mente que há condições de agir em juízo que são gerais e se acham enunciadas pelo Código de Processo Civil como requisitos exigíveis para qualquer ação; e há condições específicas, exigidas por lei para ações especiais, como é o caso da ação de mandado de

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segurança, que só é franqueada àquele que ingressa em juízo demonstrando, prima facie, a liquidez e certeza de seu direito. É por isso que, para se chegar ao julgamento de mérito em favor do impetrante, é indispensável que a petição inicial venha acompanhada de prova documental préconstituída, capaz de demonstrar, desde logo, a veracidade das alegações nela formuladas, bem como da agressão ou ameaça imputada à autoridade dita coatora (MAIA FILHO, Napoleão Nunes. Sobre a petição inicial do mandado de segurança. Comentários críticos ao art. 6º da Lei nº 12.016/09, Revista CEJ, Brasília, Ano XIII, n. 47, p. 12). CPC/73, art. 267, IV e VI. CPC/73, art. 284. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 153. STJ, 5ª T., REsp 480.211/ES, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 09.03.2004, DJU 31.05.2004, p. 346. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., RMS 32.918/MS, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 17.04.2012, DJe 27.04.2012. STJ, 1ª T., REsp 783.165/SP, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 27.02.2007, DJU 15.03.2007, p. 271. STJ, 6ª T., AgRg no RMS 30.409/RS, Rel. Min. Og Fernandes, ac 02.08.2011, DJe 17.08.2011; STJ, 5ª T., RMS 2.239/MG, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 18.02.1999, DJU 29.03.1999, p. 192. CPC/73, art. 295, IV. STJ, 1ª T., RMS 32.710/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 02.12.2010, DJe 16.12.2010. CPC/73, art. 285-A. BUENO, Cássio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 93-94; CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual de mandado de segurança, cit., p. 154155. CPC/73, arts. 282 e 283. CPC/73, arts. 36 e 39. STJ, 1ª T., REsp 827.242/DF, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 04.11.2008, DJe 01.12.2008. “O prazo do art. 284 do CPC é dilatório, e não peremptório, ou seja, pode ser reduzido ou prorrogado por convenção das partes ou por determinação do juiz” (STJ, 3ª T., REsp 871.661/RS, Rel. Nancy Andrighi, ac. 17.05.2007, DJU 11.06.2007, p. 313). STJ, 1ª T., REsp 114.092/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 19.02.1998, DJU 04.05.1998, p. 81. STJ, 4ª T., REsp 83.751/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 19.06.1997, RSTJ 100/197. “O indeferimento sumário [sem a diligência do art. 284] destrói a esperança da parte e obstaculiza o acesso à via judicial, constituindo desprestígio para o Judiciário” (STJ, 1ª T., REsp 170.202/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 09.06.1998, DJU 24.08.1998, p. 29, RSTJ 110/96). “Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, a petição inicial de mandado de segurança é passível de emenda, razão pela qual o magistrado deve abrir prazo para que a parte promova a juntada dos documentos comprobatórios do direito líquido e certo, sendo que somente após o descumprimento da diligência poderá indeferir a inicial” (STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 271.545/SP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 12.03.2013, DJe 21.03.2013). CPC/73, art. 267, II e III.

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STJ, 3ª T., REsp 80.500/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, ac. 21.11.1997, DJU 16.02.1998, p. 86; STJ, 5ª T., REsp 392.519/SC, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 19.03.2002, DJU 22.04.2002, p. 245. CAVALCANTI, Marcos de Araújo. A legitimidade passiva para o mandado de segurança: Uma proposta de interpretação da Lei 12016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 108, p. 65. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A fazenda pública em juízo. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 481. Reconhece-se a existência de controvérsia sobre o papel do coator na ação de mandado de segurança. “É claro que se deve ter como afastada a hipótese de essa indicação da pessoa jurídica visar a formação de litisconsórcio passivo entre a autoridade impetrada e o ente que por seu intermédio se apresenta na relação processual” (MAIA FILHO, Napoleão Nunes. Op. cit., p. 14). BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 289. CAVALCANTI, op. cit., p. 67. Não se pode falar em litisconsórcio entre quem é parte e quem não é parte no sentido jurídico. Daí a conclusão categórica: “A triangularização da relação processual [no mandado de segurança] dá-se com a citação da pessoa jurídica e não com a notificação do coator”, de sorte que “o coator não é sujeito passivo da relação processual do mandado de segurança” (SOUZA, Gelson Amaro de. Ainda sobre a situação jurídica da autoridade coatora no mandado de segurança. Revista dos Tribunais, v. 888, p. 47. out./2009). “O ato que a autoridade coatora pratica, no exercício de suas funções, vincula a pessoa jurídica de direito público a cujos quadros ela pertence; é ato do ente público e não do funcionário (g ” (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 152). “Assim, não se pode falar em ‘litisconsórcio necessário’ entre a pessoa jurídica (Estado) e o órgão coator. Precedentes do STJ e do STF” (STJ, 6ª T., REsp 31.525/GO, Rel. Min. Adhemar Maciel, ac. 29.06.1993, DJU 13.09.1993, p. 18.581). “No mandado de segurança, a pessoa jurídica de direito público não é considerada litisconsórcio passiva necessária da autoridade coatora, pois esta age na qualidade de substituta processual daquela” (STJ, 5ª T., REsp 94.243/PA, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 24.11.1998, DJU 01.02.1999, p. 220). “Inexiste litisconsórcio entre a autoridade coatora e a pessoa jurídica de direito público, por isso que esta é parte legítima para recorrer da sentença concessiva da ordem impetrada” (STJ, 2ª T., REsp 86.030/AM, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 15.04.1999, DJU 28.06.1999, p. 75). “Inviável, portanto, o litisconsórcio entre a autoridade apontada como coatora e a pessoa jurídica a cujos quadros ela pertence” (CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A fazenda pública em juízo, cit., p. 488). STJ, 3ª T., MS 15.040/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 10.08.2011, DJe 10.02.2012. STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 15.852/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 23.05.2012, DJe 06.06.2012. “A autoridade coatora desempenha duas funções no mandado de segurança: a) uma, internamente, de natureza processual, consistente em defender o ato impugnado (...); b) outra, externamente, de natureza executiva, vinculada à sua competência administrativa; ela é quem cumpre a ordem judicial. A legitimação da autoridade coatora deve ser aferida à base das duas funções acima descritas; só o órgão capaz de cumpri-las pode ser a autoridade coatora” (STJ, 1ª T., RMS 38.735/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 12.11.2013, DJe 19.12.2013).

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ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 87. BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 19. “Mandado de segurança. Não pode prosperar quando voltado contra a lei em tese, assim entendido o Decreto que estabelece normas caracterizadas pela abstração e pela generalidade (Decreto nº 92.571, de 18 de abril de 1986). Súmula 266” (STF, Pleno, MS 20.590/DF, Rel. Min. Francisco Rezek, ac. 25.02.1987, RTJ 121/959). “Ademais, estando a impetração claramente voltada contra o processo legislativo e contra o texto do art. 6º, parágrafo único, da Lei Municipal 507/2010, incide o óbice da Súmula 266/STF, nestes termos: ‘Não cabe Mandado de Segurança contra lei em tese’” (STJ, 2ª T., RMS 37.955/AM, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 22.10.2013, DJe 05.12.2013). No mesmo sentido: STJ, 1ª T., RMS 32.880/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.09.2011, DJe 26.09.2011. No mesmo sentido: “Processual Civil. Mandado de segurança. Autoridade coatora. Ato delegado. Pelo ato da autoridade delegada, não responde a autoridade delegante” (STJ, 3ª Seção, MS 4.003/DF, Rel. Min. José Dantas, ac. 25.06.1997, DJU 04.08.1997, p. 34.645). “Ato do Ministro de Estado praticado por delegação. Art. 83, parágrafo único da Constituição e art. 11 da L. 200, de 1967. Transferência da competência, em razão da autoridade que praticou a função delegada. Mandado de segurança. Competência do Tribunal Federal de Recursos” (STF, Pleno, MS 18.555/DF, Rel. Min. Themistocles Cavalcanti, ac. 14.06.1968, DJU 13.09.1968). Diante da delegação de função e do ato lesivo praticado pelo delegatário, “aquele que se sinta lesado (ou ameaçado de lesão) poderá, por óbvio, impetrar mandado de segurança, mas neste caso a autoridade coatora será a delegatária, e não a delegante, a quem não se pode imputar a responsabilidade por atos que não praticou” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 71). Processual civil. Administrativo. Mandado de segurança. Ato do Conselho Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Autoridade coatora. Presidente do órgão colegiado. (...) “Assim, quando o mandado de segurança visa a atacar ato praticado pelo colegiado, o Presidente é chamado a falar, não como agente individual, mas em nome e em representação da instituição” (...) (STJ, 2ª T., RMS 40.367/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.08.2013, DJe 13.08.2013). No mesmo sentido: STJ, 1ª T., RMS 32.880/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.09.2011, DJe 26.09.2011. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 167. “O ato complexo só se aperfeiçoa com a integração da vontade final da Administração, e a partir deste momento é que se torna atacável por via administrativa ou judicial” (MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., loc. cit.). CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 73. “Administrativo. Processo civil. Mandado de segurança. Autoridade coatora. Aposentadoria. Ato complexo. Ilegalidade do ato de aposentação afirmada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal. Ilegitimidade passiva ad causam do Secretário de Administração do Distrito Federal” (STJ, 6ª T., REsp 223.670/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 19.04.2007, DJU

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28.05.2007, p. 403). Súmula nº 627/STF: “No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do Presidente da República, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento”. “Recurso em mandado de segurança. Aposentadoria. Desconstituição. Tribunal de Contas. O ato administrativo complexo constitui-se pela manifestação de vontade de mais de um órgão. O ato administrativo composto forma-se pela atuação de um órgão, todavia torna-se exequível com a aprovação de outro. A cassação de aposentadoria, assemelhada a demissão, é da competência da autoridade que efetiva a nomeação. O tribunal de contas, na espécie, posteriormente, manifesta aprovação” (STJ, 2ª T., RMS 693/PR, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 28.11.1990, DJU 25.02.1991, p. 1.455). O acórdão reconheceu que o ato principal atacado era o da autoridade que cassou a aposentadoria, e não o Tribunal de Contas que o homologou. “A autoridade fiscal de primeiro grau que expede a notificação para pagamento de tributo está legitimada passivamente para a ação de segurança, ainda que sobre a controvérsia haja decisão em grau de recurso, de Conselho de Contribuintes” (Súmula nº 59 do antigo TFR). A doutrina registra que, “nos procedimentos administrativos, autoridade que preside a sua realização” é aquela que no mandado de segurança haverá de ocupar a posição de “autoridade coatora” (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 305; MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 68). “É cabível mandado de segurança para impugnar ato de comissão de licitação de sociedade de economia mista” (STJ, 1ª T., REsp 789.749/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 17.05.2007, DJU 04.06.2007, p. 310). (Lei 8.666/1993), caso em que a impetração deverá se endereçar ao dirigente da empresa responsável pela licitação e contratação. “Além da manifestação acerca do mérito do mandamus por parte da autoridade apontada coatora, exige-se, para fins da aplicação da ‘teoria da encampação’, vínculo hierárquico imediato entre aquela autoridade e a que deveria, efetivamente, ter figurado no feito” (STJ, 5ª T., AgRg no RMS 24.116/AM, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 05.08.2008, DJe 02.06.2008). “Estabelece a Súmula nº 59, do saudoso Tribunal Federal de Recurso: ‘a autoridade fiscal de primeiro grau que expede a notificação para pagamento do tributo será legitimada passivamente para a ação de segurança, ainda que sobre a controvérsia haja decisão, em grau de recurso, de Conselho de Contribuintes’” (STJ, 1ª T., AgRg no REsp 323.351/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 21.08.2001, DJU 01.10.2001, p. 168). STJ, 1ª Seção, CC 10.108-5/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 30.08.1994, RSTJ 74/28. STF, 2ª T., RE 101.109/PR, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 09.10.1984, RTJ 113/309. “... em sede de mandado de segurança, o papel do constritor é, a despeito de ferrenhas e autorizadas vozes em sentido contrário, de mero informante anômalo acerca do ato colimado de abusivo” (g.n.) (SOUZA, Gelson Amaro de; RODRIGUES, Daniel Gustavo de Oliveira Colnago. Ainda sobre a situação jurídica da autoridade coatora no mandado de segurança. Revista dos Tribunais, vol. 888, 2009, p. 53). Corretíssima a lição de Luana Pedrosa de Figueiredo Cruz, de que a correção da nomeação do

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coator não atrita com o art. 329, II do CPC/2015 (CPC/73, art. 264), que não contém imposição de uma estabilidade absoluta do processo, pois seu próprio enunciado ressalva “as substituições permitidas por lei”. A regra, portanto, que enseja a substituição da autoridade coatora inicialmente apontada pela impetração, “em nada fere a estabilização da demanda (...)”. E “continuar entendendo, como fazem alguns tribunais”, que extinguem o mandado de segurança sem permitir a correção da errônea nomeação do coator, por entenderem que “impetrante é obrigado a fazer verdadeira ‘investigação administrativa prévia’ para saber quem é, legalmente a autoridade coatora, para fins processuais, é um retrocesso”, e um apego intolerável ao formalismo desnecessário repudiado pelas modernas técnicas do direito processual (CRUZ, Luana Pedroso de Figueiredo et al. Comentários à Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 114). Sendo a parte passiva, sem dúvida, a pessoa jurídica a que pertence o coator, e não este, “eventual indicação errônea do coator não deve ensejar a extinção do processo pela carência da ação, mas sim a possibilidade de emenda do mandado, por defeito da inicial, tão somente” (SOUZA e RODRIGUES, op. cit., loc. cit.). 1. Nas lacunas da lei especial, “nada impede e até se faz necessário que seja aplicado o Código de Processo Civil, pois é certo que tal diploma se aplica subsidiariamente às normas do mandado de segurança” (STJ, 6ª T., REsp 201.111/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 08.03.2007, DJU 26.03.2007, p. 291. No mesmo sentido: STJ, 6ª T., REsp 691.988/RJ, Rel. p/ ac. Min. Haroldo Rodrigues, ac. 15.04.2010, DJe 29.11.2010; STJ, 2ª T., REsp 1.189.139/ RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 18.05.2010, DJe 01.07.2010). “O art. 284 aplica-se subsidiariamente à Lei do Mandado de Segurança, impedindo o magistrado de indeferir a petição inicial sem antes intimar o impetrante para que traga aos autos os documentos probatórios apontados. Precedentes do STJ: REsp 8.634/AM, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, 3ª Turma, DJ de 04.10.1993; REsp 722.264/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Turma, DJ de 01.07.2005; REsp 238.719/PR, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, 1ª Turma, DJ de 14.10.2002; AgRg no Ag 64.528/MA, Rel. Min. Jesus Costa Lima, 5ª Turma, DJ de 19.06.1995” (STJ, 1ª T., REsp 629.381/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 07.02.2006, DJU 20.02.2006, p. 208. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 639.214/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 04.11.2008, DJe 28.11.2008). BUENO, Cássio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança, 2. ed., cit., p. 30; CIANCI, Mirna. Mandado de segurança, cit., p. 180. MACIEL, Adhemar Ferreira. Mandado de segurança. Revista de Direito Público, São Paulo, v. 25, n. 100, p. 167, out.-dez./1991. STJ, 2ª T., RMS 3.960/SP, Rel. Min. Américo Luz, ac. 22.03.1995, DJU 08.05.1995, p. 12.356. STJ, 2ª T., AgRg no RMS 27.578/RS, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 04.08.2009, DJe 17.08.2009. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., AgRg no RMS 33.189/PE, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 15.02.2011, DJe 24.02.2011; STJ, 2ª T., RMS 22.383/DF, Rel. Min. Castro Meira, ac. 09.09.2008, DJe 29.10.2008; STJ, 1ª Seção, MS 12.149/DF, ac. 27.08.2008, DJe 15.09.2008; STJ, 2ª T., RMS 53.710/GO, Rel. Min. Assusete Magalhães, ac. 07.12.2017, DJe 15.12.2017. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 303. “(...) O Secretário de Fazenda do Estado de Pernambuco é parte ilegítima para figurar no polo

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passivo de mandado de segurança em que se discute auto de infração lavrado em decorrência do não pagamento de ICMS (...). Inaplicabilidade da teoria da encampação, pena de ampliação indevida da competência originária do Tribunal de Justiça, que não abrange a competência para julgar mandado de segurança impetrado em face de ato do Diretor de Administração Tributária” (STJ, 1ª T., AgRg no RMS 33.189/PE, cit.). “Em sede de mandado de segurança, ‘a autoridade coatora é aquela que ordena a prática do ato impugnado ou se abstém de realizá-lo. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça firmou entendimento no sentido de que, havendo erro na indicação da autoridade coatora, deve o juiz extinguir o processo sem julgamento do mérito, pela ausência de uma das condições da ação, sendo vedada a substituição do polo passivo da relação processual’ (AgRg no Ag 428.178/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de 20/6/2005)” (STJ, 1ª T., AgRg no AREsp 188.954/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 18.12.2012, DJe 04.02.2013). “Portanto, o ato impugnado deverá ser ato de império praticado no exercício de atribuições próprias do Poder Público” (ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 90). Não pode ser ato mercantil ou qualquer outro ato regido exclusivamente pelo direito privado. Assim, a empresa pública que contrata uma operação bancária comum não se sujeita ao mandado de segurança, mas às ações ordinárias. Submeter-se-á ao mandado de segurança, porém, nos atos relacionados com as licitações de obras e serviços públicos e com os concursos públicos (STJ, 1ª T., REsp 202.157/PR, Rel. Humberto Gomes de Barros, ac. 18.11.1999, DJU 21.02.2000, p. 95). Uma universidade particular, quando promove o concurso público de acesso dos alunos à educação, pratica ato de autoridade, não, porém, quando cobra mensalidades atrasadas ou quando contrata a compra de livros ou material didático (MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 49-50). CPC/73, art. 12, VI. CPC: “Art. 75. Serão representados em juízo, ativa e passivamente: (...) VIII – a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou, não havendo essa designação, por seus diretores”. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 326. STJ, 3ª Seção, MS 12.939/DF, Rel. Min. Paulo Gallotti, ac. 28.11.2007, DJe 10.03.2008. STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 10.314/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 28.09.2005, DJU 17.10.2005, p. 173. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 34.715/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 23.08.2011, DJe 30.08.2011. A rigor, não cabe deferir a petição inicial, ordenando a citação do réu para se defender, quando falta documento essencial à propositura da ação, como se passa no caso da prova pré--constituída necessária, no mandado de segurança, para demonstração da liquidez e certeza do direito e alegações do impetrante. A regra geral é primeiro completar-se a petição inicial, para depois citar-se o réu (CPC/2015, art. 321). No entanto, a lei, por economia processual, admite o expediente do § 2º, do art. 6º da LMS, permitindo que o deferimento da notificação à autoridade coatora se dê para concomitantemente apresentar os documentos reclamados pelo impetrante e

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prestar as informações sobre o ato impugnado. Isto, porém, não prejudica a apreciação ulterior das condições da ação, e da possível extinção do processo por iliquidez do direito do impetrante, caso os documentos requisitados não se mostrem suficientes para comprovar o requisito básico da ação mandamental. Afinal, as condições da ação não precluem, podendo e devendo ser fiscalizadas e avaliadas a qualquer tempo (CPC/2015, art. 485, § 3º). NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 152-153. CPC/73, art. 283. CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 177-178. CPC/73, art. 397. CPC: “Art. 435. É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, ou para contrapô--los aos que foram produzidos nos autos”. SIDOU, J. M. Othon. “Habeas data”, mandado de injunção, “habeas corpus”, mandado de segurança..., cit., p. 223; DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 332-333. CPC/73, art. 296. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 327. É muito comum nas relações tributárias continuativas o entendimento de que a sentença em favor do contribuinte só alcança o exercício em que a impugnação se deu. Isto decorre justamente da circunstância de o demandante não ter sido preciso quanto ao caráter duradouro e continuativo da tutela jurisdicional postulada. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 231-232. DECOMAIN, Pedro Roberto. Op. cit., p. 232. CPC/2015: “Art. 291. A toda causa será atribuído um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível”. “1. Este Tribunal consolidou o entendimento de que o valor da causa, inclusive em mandado de segurança, deve corresponder ao conteúdo econômico da demanda, é dizer, ao benefício econômico que se pretende auferir, não sendo possível atribuir-lhe valor aleatório. Precedentes. 2. Recurso especial improvido” (STJ, 2ª T., REsp 754.899/RS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 06.09.2005, DJU 03.10.2005, p. 227). No mesmo sentido: STJ, 3ª T., REsp 436.203/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 10.12.2002, DJU 17.02.2003, p. 273; STJ, 1ª T., REsp 743.595/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 14.06.2005, DJU 27.06.2005, p. 297; STJ, 2ª T., AgRg no REsp. 639.729/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.10.2009, DJe 15.10.2009. MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 134. ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 176-177. “Admite-se o valor da causa para efeitos meramente fiscais em razão do próprio procedimento do mandamus que não comporta valor certo e determinado” (STJ, 1ª T., REsp 638.353/RS, Rel. Min. José Delgado, ac. 19.08.2004, DJU 20.09.2004, p. 208). CPC/73, art. 269, I.

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Exemplo desse emprego do verbo denegar em sentido mais amplo que o usual, quando se cuida do mandado de segurança, encontra-se na Súmula nº 304 do STF: “Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria”. Evidente, portanto, que, para o STF, a segurança pode ser denegada sem fazer coisa julgada, o que somente ocorre quando a sentença não resolve o mérito da causa. Fica claro, nessa perspectiva, que a denegação fará coisa julgada se o pedido for resolvido, mediante declaração de sua improcedência, e não a fará, quando puser fim ao processo sem solucionar o pedido, limitando-se a apreciar questões preliminares. BUENO, Cassio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 63. CPC/73, art. 295, IV. CPC/2015: “Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: II – decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição”. CPC/73, art. 467. A Lei do Mandado de Segurança, “ao utilizar a expressão ‘decisão denegatória’, abrange tanto a improcedência do pedido (relativamente ao mérito) quanto o decreto que resolve apenas matérias processuais” (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de Segurança Individual e Coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 291). Consigna, ainda, o autor, que, em regra, o indeferimento da petição inicial ou a extinção do processo sem julgamento do mérito, não fazendo coisa julgada, permite que o mandado de segurança seja novamente proposto, “a menos que o indeferimento ou a extinção se tenham baseado na decadência” (Op. cit., p. 292). FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1997, p. 18. MACIEL, Adhemar Ferreira. Mandado de segurança: direito líquido e certo. Revista Ajuris, Porto Alegre, v. 73, p. 39. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de Segurança Individual e Coletivo, cit., p. 292. Aplica--se a Súmula nº 304 do STF: “Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria”; regra que vale para a rediscussão em ação ordinária ou em outro mandado de segurança. Idem, ibidem. STJ, 1ª T., REsp. 308.800/RS, Rel. Min. José Delgado, ac. 24.04.2001, DJU 25.06.2001, p. 130. No mesmo sentido: “Em mandado de segurança, se a sentença denegatória apreciou o mérito da causa, há coisa julgada sobre a matéria, não podendo a mesma questão ser reapreciada em ação ordinária. Não aplicação da Súmula 304/STF” (STJ, 3ª Seção, AR 1220/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 09.04.2008, DJe 28.05.2008); STJ, 1ª T., REsp. 842.838/SC, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 16.12.2008, DJe 19.02.2009. “Mandado de segurança – Quando a denegação não impede a ação própria. Se o mandado de segurança foi concedido apenas em parte, não fica o Impetrante impedido, em princípio, de usar da ação própria na parte em que não foi atendido” (STF, Tribunal Pleno, RE 74.058 EDv/GB, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, ac. 12.04.1973, DJU 08.06.1973, p. 4.076; STF, 1ª T., RE 74.058/RJ, Rel. Min. Luiz Gallotti, ac. 16.06.1972, DJU 01.09.1972, p. 5.720, RTJ 64/442); REMÉDIO, José

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Antônio, op. cit., loc. cit. ARAÚJO, José Henrique Mouta. A desistência do mandado de segurança e a boa-fé processual. Revista Dialética de Direito Processual, n. 129, p. 58. Mas a recusa de consentimento do réu, segundo a jurisprudência, deve ser fundamentada, não se admitindo seja fruto apenas de capricho: “1. Após a contestação, a desistência da ação pelo autor depende do consentimento do réu porque ele também tem direito ao julgamento de mérito da lide. 2. A sentença de improcedência interessa muito mais ao réu do que a sentença de extinção do processo sem resolução do mérito, haja vista que, na primeira hipótese, em decorrência da formação da coisa julgada material, o autor estará impedido de ajuizar outra ação, com o mesmo fundamento, em face do mesmo réu. 3. Segundo entendimento do STJ, a recusa do réu deve ser fundamentada e justificada, não bastando apenas a simples alegação de discordância, sem a indicação de qualquer motivo relevante. 4. Na hipótese, a discordância veio fundada no direito ao julgamento de mérito da demanda, que possibilitaria a formação da coisa julgada material, impedindo a propositura de nova ação com idênticos fundamentos, o que deve ser entendimento como motivação relevante para impedir a extinção do processo com fulcro no art. 267, VIII, e § 4º do CPC [CPC/2015, art. 485, VIII e § 4º]. 5. Recurso especial provido” (STJ, 3ª T., REsp 1.318.558/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 04.06.2013, DJe 17.06.2013). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., AgRg no REsp. 1.520.422/DF, Rel. Min. Marco Buzzi, ac. 23.06.2015, DJe 01.07.2015. STJ, 3ª T., REsp 1.036.070/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 05.06.2012, DJe 14.06.2012. “Processual civil. Recurso especial. Desistência da ação após decisão definitiva do juiz. Impossibilidade. 1. A desistência da ação é faculdade processual conferida à parte que abdica, momentaneamente, do monopólio da jurisdição, exonerando o Judiciário de pronunciar-se sobre o mérito da causa, por isso que não pode se dar, após a sentença de mérito. 2. Realmente, a doutrina do tema é assente no sentido de que ‘O mesmo princípio que veda a mutatio libeli após o saneamento impede, também, que haja desistência da ação após a decisão definitiva do juiz. Nessa hipótese, o que é lícito às partes engendrar é a transação quanto ao objeto litigioso definido jurisdicionalmente, mas, em hipótese alguma lhes é lícito desprezar a sentença, como se nada tivesse acontecido, de sorte a permitir, após a desistência da ação que potencialmente outra ação seja reproposta’ (in FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, pg. 438)” (STJ, 1ª T., REsp 1.115.161/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 04.03.2010, DJe 22.03.2010). STJ, 2ª T., AgRg no REsp 510.655/MG, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 18.08.2009, DJe 23.10.2009. O regime de desistência livre do mandado de segurança é defendido com o argumento pretoriano de que se trata não de uma ação comum, mas de uma “ação constitucional” (ARAÚJO, José Henrique Mouta. Op. cit., p. 62-63). STJ, 2ª T., REsp 550.770/CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 24.10.2006, DJU 04.12.2006, p. 278. STJ, 2ª T., AgRg no REsp 291.059/PR, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 21.06.2007, DJU 24.09.2007, p. 271. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., AgRg no REsp 543.698/BA, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 27.04.2004, DJU 31.05.2004, p. 198; STJ, 2ª T., AgRg no AgRg no REsp 1.197.471/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 22.03.2011, DJe 09.06.2011. STF, 2ª T., AI 221.462 AgR-AgR/SP, Rel. Min. Cézar Peluso, ac. 07.08.2007, DJU 24.08.2007, p.

73; STF, 1ª T., RE 451.289 AgR/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 22.02.2011, DJe 15.03.2011. 98 “1. Em mandado de segurança, a homologação do pedido de desistência não está condicionada à anuência da autoridade impetrada e pode ocorrer em qualquer fase do processo, ainda que já prolatada sentença de mérito. Precedentes da Primeira Seção: AgRg nos EREsp 389.638/ PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJU de 25.06.07; Pet 4.375/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU de 18.09.07. 2. ‘A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite a desistência do mandado de segurança, sem anuência da parte contrária, mesmo quando já proferida a decisão de mérito’ (STF, RE 167.263 ED-EDv/MG, Rel. p/ acórdão Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 10.12.04)” (STJ, 2ª T., REsp 992.757/AL, Rel. Min. Castro Meira, ac. 07.10.2008, DJe 05.11.2008). No mesmo sentido: STF, 1ª T., RE 411.477 AgR-AgR/PI, Rel. Min. Eros Grau, ac. 18.10.2005, DJU 02.12.2005, p. 9; STJ, 2ª T., REsp 1.405.532/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 10.12.2013, DJe 18.12.2013; STJ, 6ª T., AgRg no REsp. 1.127.391/DF, Rel. Min. Assusete Magalhães, ac. 11.02.2014, DJe 11.03.2014. 99 “Agravo regimental no recurso extraordinário. Mandado de segurança. Desistência a qualquer tempo. Possibilidade. 1. A matéria teve sua repercussão geral reconhecida no RE nº 669.367, de relatoria do Ministro Luiz Fux, com julgamento do mérito em 2/5/13. Na assentada, o Tribunal reafirmou a assente jurisprudência da Corte de que é possível desistir-se do mandado de segurança após a sentença de mérito, ainda que seja favorável ao impetrante, sem anuência do impetrado. 2. Agravo regimental não provido” (STF, 1ª T., RE 550.258/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, ac. 11.06.2013, DJe 27.08.2013). 100 ARAÚJO, José Henrique Mouta. Op. cit., p. 66-67.

Capítulo VIII DESPACHO DA PETIÇÃO INICIAL Art. 7º. Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: I – que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando--lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações; II – que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito; III – que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. § 1º Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observado o disposto na Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. § 2º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. § 3º Os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença. § 4º Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento. § 5º As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei nº 5.869, de 11 janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. Referências legislativas: Lei nº 2.770/1956, Art. 1º: Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente importe na entrega da mercadoria, bem ou coisa. Súmulas: Súmula nº 405/STF: Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária. Súmula nº 213/STJ: O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária. Súmula nº 460/STJ: É incabível o mandado de segurança para convalidar a compensação tributária realizada pelo contribuinte. Súmula nº 464/STJ: A regra de imputação de pagamentos estabelecida no art. 354 do Código Civil não se aplica às hipóteses de compensação tributária.

Comentários ao art. 7º

66. O PROCEDIMENTO SUMÁRIO DO MANDADO DE SEGURANÇA O procedimento do mandado de segurança é o mais singelo possível, já que não há a fase destinada à instrução probatória. A propositura se dá por meio de petição inicial, redigida em duas vias e acompanhada obrigatoriamente da prova pré-constituída a respeito da causa petendi. Também os documentos serão anexados por cópia à segunda via da inicial. Estando o documento necessário em poder de repartição ou autoridade pública que se recuse a fornecer certidão a seu respeito, o impetrante pode requerer do juiz a expedição liminar de ofício para ordenar a exibição do original ou de cópia por certidão, em prazo certo1. A possibilidade de indeferimento da inicial acha-se regulada pelo art. 10 da Lei nº 12.016. O decisório desafia apelação, quando a segurança é impetrada perante juiz de primeiro grau (§ 1º), e agravo interno, quando se trata de decisão de relator em ação de competência originária de tribunal (§ 1º, in fine). Estando em ordem a petição inicial, o juiz, ao despachá-la, ordenará as seguintes providências: a)

a notificação do coator, a fim de que, no prazo de dez dias, preste as informações;

b)

a intimação (“ciência”) do representante judicial da pessoa jurídica interessada, mediante remessa de cópia da inicial, para que, querendo, ingresse no feito;

c)

a suspensão liminar do ato impugnado, se configurados os requisitos do inc. III do artigo 7º, da Lei nº 12.016.

A citação do sujeito passivo da ação, que é a pessoa jurídica interessada, é feita por meio da ciência que é dada, ao seu representante judicial, na forma do inc. II do art. 7º. Quem representa a demandada não é a autoridade coatora. Sua notificação é apenas para prestar informações sobre o ato que praticou em nome da pessoa jurídica a que está vinculada. Está superada a antiga tese, acolhida por boa parte da jurisprudência anterior à Lei nº 12.016, de que a autoridade coatora atuava no processo do mandado de segurança como um representante especial ou anômalo da pessoa jurídica interessada2. Sob influência de tal entendimento pretoriano, e do pesado acatamento que lhe dava uma forte corrente doutrinária3, chegamos a pensar que a nova Lei do Mandado de Segurança continuava a tratar a autoridade coatora como a representante da pessoa jurídica interessada, e, consequentemente, teria a sua notificação para informações a natureza de citação4. Todavia, depois de passados vários anos de vigência e análise da nova legislação, não há mais lugar para insistir na velha e superada concepção. Aliás, mesmo sob o regime da lei anterior, o STF já vinha recusando ao coator a qualidade de representante processual da pessoa jurídica interessada no ato atacado pelo mandamus5. A notificação e a intimação se cumprem por meio de ofício, do qual será colhido recibo de

entrega (Lei nº 12.016, art. 11). Em caso de urgência, pode-se usar telegrama, fax ou outro meio eletrônico de autenticação comprovada, sempre com observância dos requisitos legais pertinentes a tais meios de comunicação processual (idem, art. 4º). O prazo das informações da autoridade coatora está expressamente fixado pelo art. 7º, I, em dez dias. Não se fez, porém, explicitação do prazo para a resposta do representante judicial da pessoa jurídica interessada. Não há, entretanto, razão para que seja outro que não o do inciso I do referido art. 7º. Se a pessoa jurídica é a verdadeira ré da ação, não é aceitável que inexista um prazo certo para a sua defesa. Na técnica processual, lastreada no sistema de preclusões, é da essência da citação a determinação de prazo certo para o exercício do direito de resposta do demandado. Como as duas diligências iniciais do contraditório (a notificação da autoridade coatora para as informações e a intimação da ré para ingressar no processo) estão aglutinadas na regulamentação de um só dispositivo legal, é de se presumir que o único prazo constante do art. 7º seja observável nos dois atos de comunicação processual, de realização simultânea6. Dessa maneira, é conveniente e prático entender-se que o prazo de dez dias estipulado no art. 7º seja aquele a prevalecer tanto na prestação de informações do coator, como na eventual resposta da pessoa jurídica interessada. Uma vez que as comunicações processuais são feitas por meio de ofícios endereçados ao coator e ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (art. 11 da Lei nº 12.016), o prazo comum de dez dias (art. 7º) será contado a partir da juntada aos autos dos comprovantes da realização das duas diligências, com observância das regras do art. 231, I e II e § 1º 7, do CPC/2015, e, particularmente, do art. 11 da Lei do Mandado de Segurança. Como oberva CARREIRA ALVIM, a juntada dos comprovantes das comunicações processuais feitas ao coator e ao representante judicial da pessoa jurídica, além da função de documentação da diligência, tem “o propósito de marcar o termo a quo (termo inicial) para a fluência do prazo para prestação de informações e apresentação da defesa, e, consequentemente, o termo ad quem (termo final)”8. Pela natureza da ação constitucional não se aplicam ao writ os efeitos usuais da revelia9. O juiz decide a causa, com ou sem a resposta da autoridade coatora, mas formulará sua sentença apenas segundo a prova realmente produzida e o direito aplicável à espécie. Afinal, somente os direitos líquidos e certos merecem a tutela especial do mandamus; e direitos da espécie não podem se afirmar com base em ficções ou presunções. Hão de ser cabalmente provados por meio de documentos (prova pré-constituída). Sem tal prova, a segurança haverá de ser denegada, ainda que a demanda não tenha sido contestada. A participação do Ministério Público é obrigatória (Lei nº 12.016, art. 12), cabendo-lhe opinar no prazo improrrogável de dez dias. E o juiz terá 30 dias para, em seguida, proferir a sua sentença, tenha ou não o órgão ministerial apresentado seu parecer (art. 12, parágrafo único).

67. A NATUREZA DA NOTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA

A definição da natureza da notificação, que, segundo o art. 7º, I, deve ser feita, na abertura do processo, à autoridade coatora, depende da prefixação: (i) de quem ocupa a posição da parte passiva na ação de mandado de segurança; e (ii) da natureza das informações requisitadas ao coator. Modernamente, como já restou demonstrado, não se pode pôr em dúvida que o réu da ação de mandado de segurança é a pessoa jurídica a que o coator se integra, como órgão de atuação no plano jurídico. É o interesse e os poderes daquela entidade que serão afetados pelo provimento judicial que emergirá do processo, caso o pedido do impetrante seja acolhido (Lei 12.016, art. 2º). Não é por outro motivo que, paralelamente à notificação do coator para prestar as devidas informações, será realizada a intimação (rectius: a citação) da pessoa jurídica interessada (art. 7º, II). No passado, a distinção entre as funções processuais desempenhadas pela autoridade coatora e pela pessoa jurídica de direito público envolvida no ato impugnado era muito mais nítida no tratamento legislativo dispensado ao procedimento aplicável ao mandado de segurança. Ao tempo que este era disciplinado pelo CPC de 1939, a previsão legal era expressa no sentido de que o coator deveria ser notificado a prestar informações (art. 322, I) e de que seria citado o representante judicial da pessoa jurídica de direito público interessada na ação (art. 322, II)10. Claro era o papel de cada um desses entes: um deveria prestar informações e o outro deveria defender a pessoa jurídica demandada. Foi a Lei nº 1.533/1951 que ensejou a grande polêmica sobre a natureza da atuação processual da autoridade coatora, porque, ao contrário do que determinava o CPC de 1939, a nova lei somente previa a notificação do coator. Sem a citação da pessoa jurídica interessada, a corrente majoritária passou a reconhecer à autoridade coatora a função extraordinária de representar a pessoa jurídica, cujos interesses se discutiam na ação mandamental11. Ainda durante a vigência da Lei nº 1.533/1951, e diante da inconveniência de manter-se o alheamento em que se achava o principal interessado no destino do ato impugnado, adveio a Lei nº 4.348/1964 (emendada pela Lei nº 10.910/2004), tornando obrigatória a intimação pessoal, por ato do juiz, dos representantes das pessoas jurídicas de direito público, acerca do deferimento da segurança, ensejando--lhes oportunidade para eventual pleito de “suspensão da decisão e defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo de poder”12. Essa posição inovadora da legislação, se, de um lado, reafirmava a tese de que o sujeito passivo da ação de segurança era a pessoa jurídica interessada, de outro, não retirava da autoridade coatora o papel de representante processual, extraordinário e temporário, da Fazenda Pública, porque a intimação do representante judicial desta somente aconteceria depois de deferida a segurança. Eis a inteligência que o STJ mantinha a respeito do tema: “... II – De acordo com a nova redação conferida pela Lei nº 10.910/2004 ao art. 3º da Lei nº 4.348/64 (...), não pairam mais dúvidas acerca da necessidade de intimação do ente

público da sentença mandamental para fins de interposição recursal (...) (g.n.). III – Tal entendimento compatibiliza-se com aqueloutro no sentido de que, em mandado de segurança, até a prolação da sentença, a comunicação dos atos processuais deve ser feita à autoridade impetrada, quem detém a obrigação legal de prestar informações, em observância à opção do legislador de manter a celeridade da ação mandamental. A partir da sentença, todavia, a intimação deve ser endereçada à pessoa jurídica de direito público a quem está vinculada a autoridade, já que é o ente público que suportará os efeitos da condenação e que possui legitimidade para recorrer. (...)”13. Queria isto dizer que, antes da sentença ou da liminar, a autoridade coatora continuava a representar a Fazenda Pública interessada e que sua notificação inicial correspondia, ainda, a uma citação, cabendo às suas informações o papel de resposta (contestação) da pessoa jurídica interessada14. A Lei nº 12.016 teve o propósito de eliminar as imperfeições e dúvidas registradas no regime anterior, quando impôs ao juiz determinar, no nascedouro do processo mandamental, que, simultaneamente, fossem promovidas a notificação da autoridade coatora e a intimação do representante judicial da pessoa jurídica interessada (art. 7º, I e II). Não há mais espaço para entrever duas representações sucessivas da Fazenda Pública, no mesmo processo. A inserção da pessoa jurídica interessada na relação processual se dá originariamente, por meio de ato citatório decorrente do próprio despacho da petição inicial. Vale dizer, a pessoa jurídica, verdadeiro sujeito passivo da relação processual, integra-se a ela ab initio, sem deixar oportunidade ao coator para atuar como seu representante em juízo, em momento algum. A notificação, portanto, jamais poderá ser tratada como ato de citação para que a pessoa jurídica demandada responda à ação do impetrante. Essa resposta, quando houver, terá que partir do representante judicial legalmente credenciado para tanto, e não do coator. A notificação da autoridade coatora não tem outra função que a de veículo para obtenção de dados fáticos capazes de esclarecer, em juízo, as alegações relacionadas com o ato impugnado. Estando o coator na situação de agente do poder público que participou do ato, que se tornou objeto da ação, incumbe-lhe o dever de colaborar com a apuração judicial da verdade, a fim de que o litígio seja resolvido de forma legal e justa. A ordem expedida à autoridade coatora pelo juiz é mandamental, criando-lhe o dever, e não apenas a faculdade, de prestar as informações requisitadas15. Sua natureza jurídica não pode, definitivamente, ser vista como a de um ato de defesa do sujeito passivo da ação16. É no plano dos atos instrutórios ou probatórios que se devem colocar tais informações. Portanto, a natureza da notificação, in casu, é a de diligência de instrução processual17.

68. AS INFORMAÇÕES REQUISITADAS DA AUTORIDADE COATORA O que se requisita à autoridade coatora são “informações” acerca do conteúdo da petição inicial (Lei nº 12.016, art. 7º, I). Não é ela convocada a se defender da ação proposta, mas apenas a fornecer esclarecimentos, já que, como agente da pessoa jurídica interessada, participou do ato impugnado. É bom de ver que a todos a lei incumbe o “dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade” (CPC/2015, art. 37818). Desse dever de colaboração não se exclui, obviamente, a autoridade coatora, frente à impetração do mandado de segurança contra ato de sua autoria. É no plano da prova, isto é, da apuração da veracidade das alegações do impetrante, que se há de visualizar a participação da autoridade coatora no mandado de segurança19. É, pois, como fonte de prova (i.e., pessoa da qual se pode obter informações úteis para a análise e avaliação das alegações do autor) que a autoridade coatora participa do processo de mandado de segurança, segundo se pode deduzir do magistério de CÂNDIDO DINAMARCO20. Ao contrário do que se passa com a ré (“pessoa jurídica interessada”, que responde ao mandado de segurança, “querendo”, nos termos do art. 7º, II, da Lei nº 12.016), o coator, como já afirmado, não tem liberdade de prestar, ou não prestar, as informações requisitadas pelo juiz. Tem o dever legal de prestá-las, de forma adequada. O comando, in casu, é mandamental (CPC/2015, art. 77, IV21). Por outro lado, tais informações, partindo de autoridade pública, “gozam da presunção juris tantum de veracidade”, conforme decide o Supremo Tribunal Federal. Delas discordando, caberá ao impetrante, em consequência, ao arguir a nulidade do respectivo processo administrativo – ainda no entendimento daquela Corte –, “proceder à comprovação, mediante elementos documentais inequívocos, idôneos e pré-constituídos, dos vícios de caráter formal por ele alegados”22.

69. A CIÊNCIA DA PESSOA JURÍDICA INTERESSADA O fato de a Lei nº 12.016 prever, a um só tempo, a dupla comunicação da propositura do mandado de segurança, determinando a notificação da autoridade coatora e a cientificação da pessoa jurídica interessada, criaria, segundo CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, um litisconsórcio passivo necessário. O coator seria citado para defender o ato que praticou e foi impugnado pelo autor; e a pessoa jurídica seria cientificada da impetração para, facultativamente, defender ou não, em seu nome, o ato do coator23. Se hoje não se pode recusar à pessoa jurídica interessada a qualidade de parte passiva da ação mandamental, já que é em sua esfera jurídica que recairão os efeitos da sentença que acolher a impetração, não há, concessa venia, como admitir a formação de um litisconsórcio necessário e eventual entre o titular do direito litigioso e seu agente administrativo.

Não há, no objeto litigioso do mandado de segurança, direito subjetivo algum do coator. O ato impugnado foi praticado em nome de um órgão da pessoa jurídica, a que dito agente se acha vinculado. O direito e o interesse em jogo não pertencem a ninguém mais além daquela pessoa jurídica. Se o direito litigioso não é do coator e se os efeitos da sentença não deverão recair sobre ele, mas apenas sobre a pessoa jurídica interessada, não sobra espaço para construir um litisconsórcio passivo necessário, in casu. Pelo fato de a Lei nº 12.016 falar em cientificação da pessoa jurídica para ingressar, querendo, no feito, não se cria, para ela, uma faculdade de ser, ou não, parte do processo. A facultatividade entrevista na regra legal diz respeito à resposta ou à defesa. A citação tem dupla função: a primeira é a integração do réu na relação processual; e a segunda é a abertura do contraditório, mediante a outorga da faculdade da resposta, ou defesa. Não cabe ao demandado aceitar ou recusar sua inserção na relação processual, já que esta ocorre ipso iure como efeito necessário da citação. A defesa, porém, corresponde a um direito facultativo. Ninguém, nem mesmo o Poder Público, tem a obrigação ou o dever de responder ou de se defender em juízo. Por isso, quando o art. 7º, II, da Lei nº 12.016 manda que seja dada ciência da impetração à pessoa jurídica interessada, para ingressar, querendo, no feito, está apenas dizendo aquilo que ocorre com toda e qualquer citação: o réu é alcançado pela relação processual instaurada pelo autor e fica investido na faculdade de contestar, ou não, o pedido que o autor deduziu em juízo24. Enfim, o objeto de um processo é a relação ou situação jurídica material afirmada ou negada pelo autor. Se esta, no mandado de segurança, somente diz respeito à pessoa jurídica cientificada, e se sua citação ocorre in limine litis, não há lugar para que o coator venha a ser tratado, também, como parte, e muito menos como litisconsorte. Ora, se o direito material controvertido é todo da pessoa jurídica, não há título jurídico para que sua defesa seja feita, ou possa ser feita, por duas partes distintas, isto é, pelo coator e pela pessoa jurídica já integrada ao processo, desde o nascedouro. Portanto, aquilo que no passado era possível de ser reconhecido – a representação extraordinária da Fazenda Pública pelo coator –, hoje não se mostra mais admissível. A razão, então justificadora de tal representação anômala, só se justificava porque a relação processual se aperfeiçoava apenas com a notificação do coator, e a intimação da pessoa jurídica de direito público somente se dava depois do julgamento que deferisse a segurança. Se na vigência da lei atual a citação do sujeito passivo legítimo ocorre in limine litis, quem tem poder para responder à ação mandamental só pode ser o seu representante judicial, e nunca o coator, que funciona, no processo, apenas como fonte de informação, ou como meio de instrução processual. Só há, no processo especial do mandado de segurança, um único sujeito passivo e, portanto, somente um ato citatório – que é aquele que a Lei nº 12.016 denomina de cientificação da pessoa jurídica interessada. Dessa forma, a conclusão que se impõe é a seguinte:

a)

a notificação do coator tem a função instrutória do processo, e não a de integrá-lo à relação processual quer como parte demandada, quer como representante da parte demandada, quer como seu litisconsorte; b) a cientificação da pessoa jurídica é, para os devidos efeitos processuais, a citação, que a integra ao polo passivo do processo, e lhe abre a oportunidade para o exercício facultativo do direito de defesa.

70. CIENTIFICAÇÃO NO CASO DE ORGANISMO AUTÔNOMO NÃO PERSONALIZADO Não há citação da pessoa jurídica de direito público quando o ato impugnado tenha sido praticado por agente de organismo autônomo do Poder Público, como Tribunal de Contas, Ministério Público, Mesa do Senado ou da Câmara, Juízes e Tribunais, Câmaras Municipais, Prefeituras etc. Em tais casos a notificação é feita ao coator, o qual, em regra, representa também a própria entidade autônoma, que participa do processo como pessoa apenas formal. Um só ato de comunicação processual, por isso, cumpre as duas diligências previstas no art. 7º, I e II. No caso do TCU, por exemplo, o mandado de segurança cumpre a integração do sujeito passivo ao processo, mediante apenas a notificação do Presidente da instituição. No caso do mandado contra ato judicial, o coator e o sujeito passivo são um só: o juiz ou o tribunal (este será, v.ġ., representado pelo seu Presidente). Quando o ato impugnado é ato singular de um membro de Tribunal Judiciário ou de Tribunal de Contas, a notificação se endereçará ao autor do ato impugnado e a cientificação (citação) será feita ao órgão colegiado, na respectiva presidência. Se a impetração for contra ato singular de representante do Ministério Público, este figurará como coator e, nessa qualidade, prestará as devidas informações. A cientificação da impetração será feita à Procuradoria-Geral. Quanto aos atos de juiz de primeiro grau, a situação é sui generis: o Tribunal requisitará as informações ao coator e não haverá cientificação à instituição autônoma, pois será o próprio órgão de segundo grau que irá julgar a impetração, como causa de sua competência originária. As entidades formais autônomas, quando for o caso, responderão à ação mandamental por meio das Procuradorias institucionais. Se não as houver, terão de constituir advogado, já que os titulares dos órgãos administrativos normalmente não dispõem do jus postulandi. As informações de autoridade coatora podem ser praticadas sem a representação advocatícia, não a contestação à demanda. Outra situação particular é a dos representantes do Ministério Público e de seus órgãos colegiados. A eles competirão tanto a prestação de informações, como a defesa de seus interesses em jogo nos mandados de segurança, sem depender das procuradorias das pessoas jurídicas de direito público. É que lhes cabe, originariamente, o direito de postular em juízo.

71. TUTELA ANTECIPADA: SUSPENSÃO LIMINAR DO ATO IMPUGNADO A tutela de urgência tornou-se, dentro do processo concebido pelo Estado Democrático de Direito, não uma faculdade do órgão jurisdicional, mas um dever inerente à função fundamental do Poder Judiciário, que consiste em não deixar sem tutela efetiva o titular de direito subjetivo lesado ou ameaçado (CF, art. 5º, XXXV). Não basta julgar e executar as sentenças de mérito. Diante do risco de dano grave e de difícil reparação, cujo afastamento imediato se impõe, sob pena de anular os efeitos práticos da futura decisão definitiva da causa, o processo tem de contar com a possibilidade de provimentos emergenciais e provisórios, que podem ser conservativos ou satisfativos, mas que sempre haverão de assegurar a justiça e efetividade do resultado final da prestação devida aos litigantes pelo Poder Judiciário. Nos procedimentos comuns, as tutelas de urgência25 constituem eventualidades a serem implementadas nas situações especificadas pelo CPC/2015 nos arts. 30026 (medidas satisfativas ou cautelares antecipatórias ou medidas incidentalmente requeridas) e 29727. Há, porém, procedimentos especiais que, historicamente, incluem em sua estrutura a medida liminar, sem se preocupar, a rigor, com o objetivo de eliminar o perigo concreto de dano iminente ou imediato. É o que, v.ġ., se passa com os interditos possessórios, com a nunciação de obra nova e com os embargos de terceiro, todos caracterizados pela reação enérgica e imediata contra o esbulho, e outras situações ilegítimas cuja persistência é, sobremaneira, injusta e intolerável. É, também, o que sempre se observou na disciplina legal do mandado de segurança, cuja tônica é a repulsa, urgente quanto possível, à ilegalidade e ao abuso de poder no seio da Administração Pública. Já antes de o art. 273 do CPC de 1973 (na redação da Lei nº 8.952/1994) ter introduzido a antecipação de tutela em caráter geral no direito processual brasileiro, a Lei nº 1.533/1951 previa que o juiz, no despacho da inicial do mandado de segurança, ordenaria que se suspendesse o ato impugnado sempre que o fundamento da impetração fosse relevante e que, da persistência dos efeitos do questionado ato, pudesse resultar a ineficácia da tutela mandamental, no caso de seu deferimento pela sentença de mérito (art. 7º, II). O procedimento atual, definido pelo art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009, conserva a previsão de liminar, nos mesmos termos da lei anterior. Disso decorre que a natureza do expediente procedimental tem requisitos específicos, decorrentes da natureza constitucional da ação, que fazem da liminar um provimento antecipatório (satisfativo), e não simplesmente cautelar (conservativo)28. Não é, porém, pelos requisitos do art. 300 do CPC/2015 que se defere a liminar do mandado de segurança. A lei, que instituiu um procedimento especial para a ação mandamental, estabeleceu, igualmente, requisitos particulares para que o impetrante possa conseguir o provimento liminar de suspensão dos efeitos do ato de autoridade impugnado.

Por falar a lei em suspender o ato impugnado, a doutrina antiga tratava a liminar do mandado de segurança como medida cautelar, com força apenas de conservar as condições de eficácia da futura sentença de mérito. Explica, porém, TEORI ZA-VASCKI, que as medidas de antecipação de tutela não consistem em prejulgamento do pedido, mas em antecipação de algum efeito que se poderia esperar da situação jurídica material tutelada pela sentença de acolhida do pedido do autor29. E a suspensão do ato dito ilegal ou abusivo tem mais que a força de conservar bens e direitos na iminência de dano; tem a força de proporcionar ao impetrante, antecipadamente, efeitos satisfativos no plano de direito substancial, permitindo-lhe, desde logo, manter-se no exercício do direito subjetivo ilegalmente ameaçado pelo coator. É esse, sem dúvida, o efeito principal esperado do julgamento final de mérito, de sorte que a liminar entra no campo da promoção de efeitos antecipados da esperada resolução definitiva da causa. Daí sua adequada conceituação como medida de urgência satisfativa, ou seja, medida destinada a antecipar efeito, no plano material, daquilo que, no todo ou em parte, se espera possa advir da sentença final de mérito30.

71.1.

A importância da tutela de segurança alcançável por meio da liminar “Na atual linha evolutiva da tutela de urgência – destaca ÉRICO ANDRADE –, o importante é deixar claro, para a concretização da efetividade do processo, que é preciso, sempre, haver medida de urgência à disposição da parte, a fim de combater os efeitos nocivos do tempo de duração da relação processual para atuar o direito material que constitui o seu objeto”31.

Não se pode prescindir, hoje – ainda segundo a mesma lição –, das medidas de urgência (tutela cautelar ou tutela antecipatória) para a realização dos valores constitucionais do justo e efetivo processo: “Dentro da configuração constitucional do justo processo, em qualquer situação de perigo, em qualquer momento processual, o direito material deve ser garantido por uma medida de urgência, seja ela cautelar ou antecipatória”32. Se isto é verdadeiro em relação ao comum das ações, maior é o vulto da liminar no mandado de segurança, já que, na qualidade de pronto remédio contra as ilegalidades e abusos de poder dos agentes públicos, exige uma supereficácia e uma efetividade plena que, quase nunca, se consegue sem o remédio enérgico de um provimento in limine litis.

72. REQUISITOS DA LIMINAR DO MANDADO DE SEGURANÇA Dois são os requisitos a serem atendidos para que o impetrante obtenha, liminarmente, a

suspensão do ato impugnado (art. 7º, III, da Lei nº 12.016): a)

o fundamento relevante da impetração; e

b)

a possibilidade de ineficácia da sentença final que venha a deferir a segurança, em caráter definitivo.

A relevância dos fundamentos do pedido – como adverte ARRUDA ALVIM – não deve ser confundida com a mera aparência do bom direito (fumus boni iuris), como se passa com as medidas cautelares. O mandado de segurança somente pode ser concedido mediante prova documental capaz de evidenciar a liquidez e certeza do direito do impetrante. Assim, o juiz, para antecipar os efeitos da tutela definitiva, tem que se fundar na prova que acompanha a inicial e que, em princípio, é a única que a parte irá apresentar para sustentar seu pedido33. Caber-lhe-á, portanto, para enfrentar o requerimento de liminar, verificar se o autor exibe documentos adequados e suficientes para a comprovação do suporte fático de sua pretensão: Ainda que o faça de maneira provisória, e sem tempo para um juízo exauriente e definitivo, o juiz tem de formar um convencimento sobre a impetração que o credencie a antever a possibilidade séria de concessão definitiva da segurança. Esse juízo não pode ainda ser definitivo, mesmo no plano fático-probatório, porque o sujeito passivo ainda não foi ouvido e, portanto, ainda não apresentou sua versão em torno do ato impugnado, nem produziu, ainda, os documentos que, eventualmente, possa contrapor aos do impetrante. Para se ter, então, como relevante a fundamentação do pedido de segurança, é necessário que a plausibilidade da pretensão deduzida em juízo se revele prima facie. Não é a certeza do direito que, nessa altura, se reclama. Isto se exigirá, afinal, quando da concessão definitiva da tutela34. Mas não é qualquer aparência de direito que o autor terá de revelar, é a verossimilhança extraída da prova documental pré-constituída, já que esta será condição sine qua non para a concessão da tutela jurisdicional, e na espécie deverá apresentar-se completa desde o ingresso da impetração em juízo35. Quanto ao segundo requisito da medida liminar do mandado de segurança, sua aferição não se faz, como na tutela cautelar, por meio da apuração do risco de um dano grave e de difícil reparação. A tutela prometida constitucionalmente para ser realizada por meio do mandado de segurança se destina a assegurar a indenidade do direito subjetivo lesado ou ameaçado por autoridade pública, de forma ilegal ou abusiva. O remédio processual haverá de ser capaz de realizar, não qualquer tutela indenizatória ou compensatória, mas uma tutela que se traduza em proteção in natura do direito subjetivo. A liminar, portanto, na ação mandamental, se justifica de maneira própria e diversa daquela prevista para as medidas cautelares. O que a determina é a constatação, desde logo, de que, não sendo suspenso, de imediato, o ato impugnado, a concessão da segurança pela sentença não seria

capaz de proteger, com efetividade, o direito in natura36. O argumento da reparabilidade econômica do dano temido não prevalece no caso da liminar do mandado de segurança. A garantia constitucional realizável por seu intermédio tem de ser a garantia do próprio direito subjetivo do impetrante, e nunca a de uma prestação substitutiva37. Corretíssima a conclusão a que chega ARRUDA ALVIM, no sentido de que o periculum in mora que justifica a liminar na ação mandamental há de ser identificado a partir do risco que a não concessão da medida possa acarretar “à eficácia da segurança como meio de concessão da garantia in natura ao impetrante”38. Vale dizer: o objetivo da liminar, no caso do mandado de segurança, deve ser sempre o de assegurar a produção dos efeitos práticos que garantam a tutela específica do direito subjetivo do impetrante. Nenhuma eficácia prática, por exemplo, teria a concessão de segurança que reconhecesse o direito de matrícula do impetrante em determinado estabelecimento de ensino, se o julgado vier a ser pronunciado muito tempo depois que o acesso pretendido tiver utilidade. O mesmo se diga do enfermo que necessita de liminar para se submeter a cirurgia inadiável, ou do candidato que depende de igual provimento para participar de um concurso já em vias de início das respectivas provas. Em todos esses casos, como na generalidade dos mandados de segurança, o remédio tutelar só cumprirá sua função tutelar se garantir, tempestivamente, o exercício in natura do direito subjetivo do impetrante. Daí a função fundamental que cabe à liminar, já que sem ela a garantia constitucional perderia todo o seu significado e tornar-se-ia impotente para realizar, com efetividade, a tutela prometida à vítima das ilegalidades e abusos de poder cometidos por agentes da Administração.

73. MOMENTO PROCESSUAL DA LIMINAR A medida liminar, no mandado de segurança individual, é sempre deferível inaudita altera parte, isto é, sua concessão ocorre no despacho da inicial, antes, pois, da notificação e resposta da autoridade coatora. Não é assim no mandado de segurança coletivo, já que, nesse tipo de writ, o juiz somente pode conceder a suspensão liminar do ato impugnado “após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas” (Lei nº 12.016, art. 22, § 2º). Não há empecilho, porém, para que a deliberação em torno da liminar ocorra em outra fase do procedimento, se o juiz, por exemplo, só se convencer da necessidade de suspender o ato impugnado depois de melhor convicção formada ao longo do curso do processo, o que se pode dar em consideração de fatos novos ou de avaliação das informações do coator e da eventual resposta da pessoa jurídica interessada. Não se descarta, inclusive, a possibilidade de retratação, pelo juiz da causa, na hipótese de agravo contra a decisão denegatória da liminar. Pode haver, ainda, a suspensão dos efeitos do ato em discussão por decisão do tribunal, em grau de recurso.

74. O CARÁTER MANDAMENTAL E NÃO DISCRICIONÁRIO DA MEDIDA LIMINAR O juiz, ao deferir a liminar do mandado de segurança, não condena a autoridade a realizar a suspensão do ato impugnado, ou a eliminar os efeitos de sua execução, se já praticado. Expede verdadeira ordem, que o coator tem que acatar imediatamente, sob pena de incorrer em responsabilidade criminal e disciplinar. Nisso consistem os provimentos, definitivos ou provisórios, pronunciados no processo especial do mandado de segurança. Não há um procedimento formal de execução de sentença. A ordem é consequência da decisão, que é expedida de plano, para ser, também de plano, cumprida pelo destinatário. Qualquer omissão ou resistência do coator será contornada pelos amplos poderes executivos de que é dotado o juiz, na espécie, e que lhe permitirão conceber e praticar os expedientes idôneos a alcançar os resultados práticos equivalentes àqueles correspondentes à prestação determinada para ser cumprida pela autoridade coatora, a exemplo do que se acha previsto pelo art. 49739 do CPC/2015, para a execução específica das obrigações de fazer em geral. Aliás, ao determinar a suspensão do ato impugnado, o juiz estará, necessariamente, ordenando à autoridade coatora que não o execute, ou que dele não extraia quaisquer consequências, até que sobrevenha a sentença definitiva40. No caso em que a impetração se dá em caráter preventivo, a liminar assume a forma de uma proibição, resultando numa ordem para que a autoridade não pratique o ato temido pelo impetrante41. Nem sempre a simples suspensão do ato impugnado será suficiente para que a liminar assegure a efetividade da sentença definitiva do mandado de segurança. Muitas vezes, providências positivas, como aquelas autorizadas pelos arts. 536, §1º e 53742, CPC/2015, terão de ser adotadas, para que a segurança cumpra, com fidelidade, a sua função constitucional. Não se pode esquecer que o CPC (inclusive e especialmente, o disposto em seus arts. 300 e 497) se aplica subsidiariamente ao mandado de segurança, e que, muitas vezes, sua eficácia ficaria seriamente comprometida “se o juiz não pudesse tomar as medidas de urgência adequadas a cada caso concreto, para preservar o objeto processual e garantir a máxima efetividade da tutela pretendida”43. Entre as medidas atípicas para concretização da tutela liminar, terão cabimento, conforme o caso, medidas sub-rogatórias, como impedimento de atividade, remoção de pessoas ou coisas, etc., e medidas de apoio, como a imposição de multa, entre outras44. Por outro lado, embora não faltem julgados e autores que afirmem a discricionariedade da decisão judicial que defere a liminar45, o certo, porém, é que, sendo pressuposto da efetividade do próprio mandado de segurança, a liminar não pode, de maneira alguma, ser tratada como faculdade discricionária do juiz. Trata-se de um direito do impetrante, desde que reunidos os seus requisitos legais. Não há lugar, in casu, para o juízo livre sobre conveniência e oportunidades de determinação da suspensão do ato impugnado46. Assim como não pode o juiz deixar de deferir, na sentença, a

segurança cujos requisitos restarem comprovados no processo, também não lhe é dado denegar a liminar, uma vez presentes os dois requisitos arrolados pelo art. 7º, III, da Lei nº 12.016. Nesse sentido é a corrente largamente majoritária da doutrina47. Na jurisprudência, é expressivo o aresto do STJ que reconheceu ser cabível novo mandado de segurança contra a decisão judicial que negou a liminar, não obstante a presença dos requisitos do art. 7º, III, da Lei do Mandado de Segurança, porque, em tal conjuntura, “a concessão da liminar é imperativa, independentemente de qualquer condição”48. Afinal, “a concessão – ou não – da liminar em mandado de segurança não pode ser compreendida como simples liberalidade da justiça. É direito do impetrante. Estando presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, a sua concessão é forçosa, sem que isso resulte na emissão de qualquer juízo discricionário do magistrado. No mesmo sentido, não restando configurados os pressupostos da liminar, o seu indeferimento é inevitável, não havendo qualquer outra opção para o magistrado”49.

75. DIMENSÕES DA LIMINAR Deve-se ter em conta que, no deferimento da liminar do mandado de segurança, o poder do juiz não está limitado à suspensão do ato impugnado. Pode determinar, também, providências ativas, dentro do conceito moderno de antecipação de tutela (CPC/2015, art. 300). Sempre que tal se revelar indispensável para assegurar a efetividade do acesso à justiça e da tutela a que tenha direito o impetrante50. Na verdade, o que autoriza o art. 7º, III, da Lei nº 12.016 é um provimento de urgência de largo espectro que tanto pode configurar medida cautelar, medida de antecipação de tutela, como, ainda, medida satisfativa, capaz de esgotar até mesmo o objeto do pedido, a exemplo do que excepcionalmente se dá com a ordem de fornecimento de medicamentos51. Aliás, neste ponto é preciso, com DECOMAIN, salientar que a interpretação ampliativa do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009 conduz também a outra conclusão: “Pode o magistrado, em mandado de segurança repressivo, suspender os efeitos que do ato decorrerão, isto é, determinar que o ato não se cumpra, até que o mandamus seja decidido. Já no mandado de segurança preventivo, poderá determinar que o ato nem seja praticado, até que sobrevenha eventual decisão final de improcedência da ação. Assim, a expressão ‘suspender o ato impugnado’ pode perfeitamente ter três significados: (a) no mandado de segurança repressivo, suspensão dos efeitos ou do cumprimento do ato, até decisão final; (b) no preventivo, suspensão da prática do próprio ato; e (c) no mandado de segurança contra omissão, determinação de que o ato indevidamente omitido seja praticado”52.

76. DIREITO À LIMINAR E EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO Pondo fim a uma polêmica antiga, a atual lei do mandado de segurança dispõe que ao juiz é facultado (não obrigatório) exigir, no caso de deferimento da liminar, prestação de caução, fiança ou depósito, “com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica”, caso ocorra a denegação da segurança (art. 7º, § 3º, in fine). É preciso, obviamente, usar com cautela e moderação essa medida de contracautela. A banalização do expediente contraria a índole do remédio constitucional e provoca o risco, mesmo, de anular um direito fundamental. A exigência de caução, portanto, deve ser adotada como expediente excepcional, somente justificável, em nome do interesse público, em casos extremos. Às vezes fala-se que a liminar seria “ato de livre arbítrio do juiz” e se inseriria na sua “livre convicção e prudente arbítrio”53. No entanto, as medidas de urgência, sejam cautelares ou antecipatórias, integram a tutela jurisdicional como condição de sua efetividade. A parte, quando presentes os requisitos legais, tem direito subjetivo a elas, como parcelas integrantes do direito cívico de ação54. Não é por favor ou benemerência do juiz que ditas providências são deferidas, mas porque correspondem a direito do litigante, que o órgão jurisdicional não pode ignorar e muito menos denegar55. Na verdade, verificados os pressupostos inscritos no art. 7º da Lei nº 1.533/1951, impõe-se ao juiz conceder, de imediato, a garantia constitucional pleiteada, de maneira que nem mesmo se admite que, presentes os requisitos da suspensão liminar do ato impugnado, venha o juiz a subordinar sua eficácia à prestação de caução56. Aliás, é bom lembrar que, antes da Lei nº 12.016, a jurisprudência do STJ se inclinava para a não aceitação da exigência de garantia para deferimento de liminar em mandado de segurança, como se pode ver no seguinte aresto: “Mandado de segurança. Liminar. Exigência de deposito judicial das quantias tributarias discutidas. Impossibilidade. 1 – Apresentando-se íntegros os pressupostos legais para a concessão da liminar, em mandado de segurança, tais condições são elevadas a categorias de direito subjetivo da parte impetrante, pelo que a concessão não pode ser subordinada a qualquer garantia não prevista expressamente em lei. 2 – A garantia de mandado de segurança, por ser de índole constitucional, não admite qualquer amesquinhamento. 3 – Recurso da fazenda nacional improvido”57. O STF, em ADI aforada contra a Medida Provisória nº 1.570, de 1997, considerou, por escassa maioria, inconstitucional a exigência, em caráter obrigatório, de caução nos casos de liminar, ou de

qualquer medida de caráter antecipatório deferida contra pessoa jurídica de direito público. O fundamento foi o de que essa imposição dificultava o amplo acesso à justiça assegurado constitucionalmente58. A verdade é que o dispositivo decretado inconstitucional cuidava de regra que impunha a caução em caráter absoluto. Agora, a Lei nº 12.016 apenas institui uma possibilidade, deixando a critério do juiz decidir sobre a necessidade ou não de condicionar a liminar a algum tipo de garantia, quando se deparar, in concreto, com um risco de prejuízo para o Poder Público. Esse risco seria o de não ressarcimento pelo dano decorrente da liminar, caso a segurança viesse a ser denegada na sentença59. Anota CARREIRA ALVIM que esse tipo de exigência cautelar não é criação do direito brasileiro, pois o amparo mexicano, fonte inspiradora de nosso mandado de segurança, também tolera a caução de reparação do dano ou de indenização dos prejuízos que a suspensão do ato coator causar, na hipótese de ser negado o amparo60. Sem embargo da forte resistência doutrinária à orientação adotada pelo art. 7º, III, da nova Lei do Mandado de Segurança, não faltam vozes a defender sua compatibilidade constitucional. Assim, por exemplo, DECOMAIN não vê na exigência de caução para a liminar um “obstáculo ao acesso à Justiça”, porque as condições de acesso à tutela de mérito nem sempre são as mesmas aplicáveis à tutela antecipatória, já que esta, por sua provisoriedade, nem sempre se convolará na solução definitiva do litígio. Haverá sempre um certo risco de que tal não ocorra. O que, a seu ver, pode acontecer é que tal risco seja mal avaliado e a exigência da caução, por isso, não se apresente razoável ou justificável. Isso corresponderia a uma incorreta aplicação do mecanismo da contracautela, sem que, entretanto, a medida entrasse irremediavelmente em conflito com a Constituição. Assim, dois riscos podem se confrontar: o risco da demora em alcançar a solução de mérito em favor do impetrante e o risco de impor encargos e sacrifícios à Administração, fundados em juízo sumário e provisório. Daí a conclusão de DECOMAIN de que será da ponderação de ambos os riscos, “levando em conta a maior ou menor intensidade do fundamento invocado para a concessão da segurança e também do maior ou menor risco de dano para a Administração ou terceiro, se, concedida a antecipação, vier finalmente o mandado de segurança a ser julgado improcedente, e que resultará a decisão do magistrado acerca da exigência ou não da garantia”61. CARREIRA ALVIM também não chega a qualificar como inconstitucional a exigência de caução, na espécie. Teme, porém, o alcance que, na prática, o dispositivo possa vir a ter, em face da tendência que se nota entre os juízes em transformar a possibilidade ensejada por lei em dever legal de impor a garantia, dificultando ou impedindo, em alguns casos, o acesso à efetividade da segurança. Daí sua advertência: “É preciso que essas garantias (caução, fiança, depósito) facultadas pela lei tenham em

conta a natureza da liminar, porque, dependendo dela, não há nenhuma necessidade de serem exigidas”62. Exemplifica com o caso do mandado de segurança para obter matrícula de estudante numa Universidade, hipótese em que não teria sentido exigir caução para a liminar, porque a eventualidade de denegação do pleito pela sentença não redundaria em maior prejuízo para os cofres públicos. O correto será o juiz orientar-se pelo princípio da proporcionalidade, efetuando uma ponderação dos direitos ou bens jurídicos em jogo, de modo a decidir evitando que o prejuízo causado a uma das partes seja maior do que o benefício proporcionado à outra. “Assim, se da concessão da liminar puder resultar maior prejuízo, para a pessoa jurídica impetrada, do que benefício ao impetrante, deve o juiz denegá-la, mas se da denegação da liminar, puder resultar, para o impetrante, maior prejuízo do que benefício para a pessoa jurídica impetrada, deve concedê-la”. É desse juízo de ponderação que “não fica afastada, também, a hipótese de vir o juiz a exigir, quando necessário, eventual garantia para a concessão da medida liminar (LMS, art. 7º, III, in fine), não podendo, no entanto, erigi-la em obstáculo ao fornecimento da prestação jurisdicional”63. Historicamente, merece registro que, ao tempo em que HELY LOPES MEIRELLES escreveu seu trabalho clássico sobre mandado de segurança, não havia regra legal que permitisse ou vedasse a exigência de caução para o cumprimento da medida liminar. Era comum, no entanto, que os juízes, conforme o caso concreto, principalmente em matéria tributária, condicionassem a suspensão do ato impugnado à prestação de garantia. Como a opinião dominante era, então, a de que a própria liminar tinha a natureza de medida cautelar, não era de se estranhar que, dentro do poder geral de cautela, o juiz da ação mandamental usasse da faculdade de exigir contracautela, uma vez reconhecida a bilateralidade do risco de dano entre as duas partes do processo (CPC/73, arts. 798, 799 e 804). Por isso, o autor não chegou a questionar a praxe que se adotava, com maior frequência, nas liminares dos mandados de segurança em matéria tributária, muito embora a jurisprudência do STJ já ensaiasse vedar a imposição de contracautela, na espécie64. Depois do advento da Nova Lei do Mandado de Segurança, os atualizadores da obra de HELY LOPES MEIRELLES – Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes – não impugnaram a norma inovadora que, contrariando a jurisprudência do STJ, instituiu, de maneira expressa, a faculdade, para o juiz, de exigir caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o eventual ressarcimento à pessoa jurídica interessada e ao litisconsorte passivo necessário (art. 7º, III). Ao contrário, entenderam que o condicionamento da concessão da liminar à prestação de garantia não lhes pareceu inconstitucional, “embora, no passado, tenha havido decisão dos Tribunais Superiores dispensando-a”. Esclareceram, outrossim, que, “embora teoricamente o reconhecimento de direito líquido e certo não deva ser condicionado a uma contragarantia por parte do impetrante, há casos nos quais tal

procedimento se justifica no interesse de ambas as partes, podendo o titular do direito lesado exercêlo de imediato e tendo a autoridade uma garantia de pleno ressarcimento no caso de modificação final da decisão proferida”. O importante, todavia, é a advertência que fizeram no sentido de que a faculdade conferida ao juiz haverá de ser utilizada, no tocante à fixação do montante e da forma da garantia, com a adequada ponderação, “a fim de não inviabilizar a utilização do recurso”65. Mais importante, ainda, é ver, na contracautela em questão, uma providência excepcional, e nunca uma regra a ser generalizada, indiscriminadamente, para todos os casos de liminar em mandado de segurança. Por fim, é muito importante o exame da capacidade financeira do impetrante, como último dado a ser apreciado para aplicação da garantia permitida pelo art. 7º, III, da Lei nº 12.016. Principalmente nas demandas em que estiverem em jogo direitos de natureza alimentar ou equiparados, a hipossuficiência econômica do impetrante, sendo evidente a liquidez e certeza de seu direito, assim como o risco de ineficácia da futura sentença, não lhe poderá ser impedido o acesso à liminar, apenas em função da falta de uma garantia que não tem condições de prestar. Em tal conjuntura, a denegação da liminar, por falta de caução, redundará, sim, em negativa de acesso à tutela de urgência assegurada constitucionalmente66. Já na vigência da Lei nº 12.016, o STJ considerou inexigível a caução nos casos de liminar em processos administrativos de caráter disciplinar, ressaltando que “a caução, fiança ou depósito de que cuida o inciso III do artigo 7º da Lei nº 12.016/2009 é uma faculdade do juiz, relativa às hipóteses em que haja dano irreparável ou de difícil reparação ao erário, obviamente inexistente em processo administrativo disciplinar”67.

77. DURAÇÃO DOS EFEITOS DA LIMINAR A regra contida no § 3º do art. 7º da Lei nº 12.016 estatui que os efeitos produzidos pela medida liminar durarão até a prolação da sentença, salvo se for revogada ou cassada. O fenômeno é comum a todos os casos de execução baseados em títulos provisórios. Se este é confirmado em título definitivo, a medida antecipada se torna também definitiva. Se a medida provisória sofre as consequências de uma decisão definitiva que com ela não se compatibiliza, estará cessada sua eficácia provisional. A eficácia da sentença do mandado de segurança, concedendo ou negando o writ, desafia recurso de apelação, sem efeito suspensivo68. No entanto, é de entendimento sumulado do STF que, “denegado o mandado de segurança pela sentença ou no julgamento do agravo dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária” (Súmula nº 405). Argumenta-se, em prol da tese sumulada, que, a não se reconhecer a eficácia imediata da sentença definitiva contra a força da medida liminar, esta, nascida de uma cognição sumária, acabaria por ter mais força do que a concedida pelo decisório final, em grau de cognição plena69. “A liminar,

nos termos do art. 7º, § 3º, mantém sua eficácia só até a sentença. A partir daí, vale a sentença (...) a sentença ‘mata’, como regra, a liminar”70, quer ocupando o seu lugar, quer invalidando-a. Importante ressaltar, outrossim, que vários doutrinadores, seguindo a posição de HELY LOPES MEIRELLES, questionam a rigidez dessa Súmula, argumentando que “caberia ao juiz expressamente tratar da vigência da liminar em sua sentença, avaliando, segundo o caso concreto, a situação que melhor trouxesse eficácia ao provimento jurisdicional e efetividade do direito que estava sendo discutido”71. O próprio STJ já atenuou a aplicação da Súmula, reconhecendo ser certo “que existe o enunciado do Pretório Excelso que dá eficácia retroativa à revogação superveniente de liminar em mandado de segurança”, mas, a despeito disso, “é de se admitir excepcionalmente o emprego dos conceitos jurídicos indeterminados do fato consumado ou da boa-fé objetiva no recebimento de valores pagos em caráter alimentar”72. Para ARNOLDO WALD e RODRIGO DE OLIVEIRA KAUFMANN, a utilização pura e simples da Súmula 405 não é a melhor opção, em razão, principalmente, da estabilidade jurídica. Segundo os autores, “parece razoável supor que o problema jurídico da validade ultra ativa da liminar em mandado de segurança remete mais à análise de princípios como o da segurança jurídica e da boa-fé do que de premissas lógico-formais de natureza estritamente processual”73. Assim, concluem: “é fácil perceber que se a liminar deferida em mandado de segurança não tiver caráter conservativo, a tendência é que o juiz, ao proferir a sentença denegatória, casse sua decisão anterior, salvo se verificar, do exame do caso concreto, indícios de que a cassação poderá trazer jurídica e processualmente mais ameaças e riscos ao impetrante”74. Destarte, a forma de manter a liminar em vigência, mesmo depois do recurso sem efeito suspensivo contra a denegação da segurança em julgamento final do mérito, consiste em buscar, cautelarmente, a atribuição do efeito que ordinariamente o recurso não tem. Esse pleito seria manejável por meio de agravo contra a decisão que houver recebido a apelação apenas com eficácia devolutiva, ou, por via de tutela cautelar requerida ao tribunal competente para o julgamento de segundo grau, desde que se lograsse demonstrar o periculum in mora e a relevância da fundamentação do recurso pendente75. Na verdade, não é mais necessário que a parte mova outro recurso (agravo) para obter o efeito suspensivo que permita a subsistência da tutela liminar. O CPC de 2015 ampliou as funções do relator, tanto nos recursos quanto nas ações de competência originária do Tribunal, permitindo-lhe, portanto, “apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos” (art. 932, II) deferindo-a diante da situação em que se verifique risco de lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, “faculdade essa aplicável também em sede mandamental, para manter a higidez da medida liminar, até que seja julgada a apelação”76. Nesse sistema, basta uma petição simples para provocar o relator a apreciar a possibilidade de suspender os efeitos da sentença denegatória da segurança.

78. RECURSO CONTRA A DECISÃO RELATIVA À LIMINAR DO MANDADO DE SEGURANÇA É certo que, antes da legislação atual, o clima era de muita controvérsia e enorme resistência jurisprudencial à recorribilidade da decisão de primeiro grau pronunciada em relação à liminar de suspensão do ato impugnado em mandado de segurança. A razão do dissídio localizava-se na falta de previsão na Lei nº 1.533/1951 de qualquer meio impugnativo para oposição ao referido ato judicial. O STF, a propósito dos mandados de competência originária de tribunal, chegou a sumular o entendimento de que não cabia “agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança” (Súmula nº 622/STF). A doutrina, porém, não se curvava a esse entendimento e, com base na aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, defendia o cabimento do agravo de instrumento, visto que o caso, sem dúvida, configurava decisão interlocutória77. Aos poucos, também a jurisprudência do STJ pendeu para o mesmo rumo, passando a decidir, mesmo sem dispositivo expresso da Lei nº 1.533/1951, que “a decisão que defere ou indefere a liminar em mandado de segurança é interlocutória, e, como tal, agravável”78. A Lei nº 12.016, portanto, ao dispor, expressamente, no art. 7º, § 1º, que “da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento”, nos termos do CPC, eliminou, definitivamente, qualquer resquício de dúvida que, a propósito do tema, ainda pudesse subsistir79. Também na instância superior, registrava-se séria resistência ao cabimento de recurso contra a decisão do relator quanto à liminar nos casos de mandado de segurança de competência originária dos tribunais80. Da mesma maneira que o fez em relação à liminar de primeiro grau de jurisdição (art. 7º, § 1º), a Lei nº 12.016 previu o cabimento do agravo interno quando a suspensão do ato impugnado for decidida, no tribunal, pelo relator (art. 16, parágrafo único). Em nenhuma hipótese, portanto, a decisão sobre a liminar em mandado de segurança ficará imune à impugnação recursal81. O STJ tem considerado “erro grosseiro, que inviabiliza a aplicação do princípio da fungibilidade recursal”, a interposição de agravo de instrumento contra decisão de relator, em lugar do agravo interno82.

79. VEDAÇÕES À LIMINAR Há casos em que a lei veda a concessão de liminar nas ações de segurança83. Estão eles elencados no § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016 e compreendem (i) a compensação de créditos tributários; (ii) a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior; (iii) a reclassificação ou equiparação de servidores públicos; (iv) a concessão de aumento ou extensão de vantagens; (v) o pagamento de qualquer natureza84. A propósito, convém registrar que a jurisprudência anterior à Lei

nº 12.016 já estava consolidada no sentido de que “A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipatória” (STJ – Súmula nº 212). E as demais vedações já eram objeto de previsões legais, que apenas foram consolidadas pela lei atual85. Convém ressaltar que a vedação de compensação tributária afeta apenas a medida liminar (STJ – Súmula nº 212), o que não impede vir a compensação a ser declarada ou autorizada pela sentença do mandado de segurança. Nesse sentido é a jurisprudência sumulada do Superior Tribunal de Justiça: “o mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária” (STJ – Súmula nº 213)86. O que, com efeito, é incompatível com a liminar é a antecipação de tutela para, in limine litis, declarar a extinção do crédito tributário, com base em cognição sumária do direito do impetrante à compensação. Diversa é a liminar em que se pede reconhecimento de que certos débitos podem ser compensados, e como e quando essa compensação haverá de ser feita, segundo a lei aplicável à espécie. O que importa não é negar, pura e simplesmente, a compensação em liminar do mandado de segurança. Na verdade, a vedação que veio da Súmula nº 212, e foi incorporada pelo § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, deve ser interpretada da seguinte maneira: “A compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar de cunho satisfativo que pretenda extinguir o crédito tributário. Este crédito não se extingue, porque a extinção seria um efeito insuscetível de antecipação, por ser jurídica”87. No entanto, nada impede que a liminar assegure e garanta, na ação de mandado de segurança, “o direito de que a legislação seja cumprida, reservando-se expressamente à autoridade fazendária o direito, também inalienável, de fiscalizar se a compensação será efetuada adequadamente”. Pode, ainda, o juiz, na liminar, “dizer quais são índices aplicáveis” ou quais são as normas jurídicas tributárias invocadas ou criadas pela Fazenda que são “incompatíveis com sistema jurídico, por exemplo”88. Em conclusão, a norma que emerge das Súmulas nºs 212 e 213, bem como do § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, não impede que o regime jurídico da compensação tributária seja tratado em medida liminar de mandado de segurança. O que não é compatível com medida de antecipação de tutela é o decreto sumário de extinção de crédito tributário em decisão liminar. Esta, contudo, poderá, se necessário, decidir como essa compensação será feita, dentro do procedimento administrativo adequado. Estabelece, outrossim, o § 5º do art. 7º da Lei nº 12.016 que as vedações estabelecidas para a concessão de liminares de mandado de segurança aplicam-se também à tutela antecipada a que se referem os arts. 300 e 497 do Código de Processo Civil/2015. Não havia necessidade de semelhante dispositivo, porque a mesma vedação já constava do art. 1º da Lei nº 9.494/1997, que não se incluiu

entre as revogações previstas no art. 29 da Lei nº 12.016. O que, afinal, pretendeu a nova lei foi deixar claro que aquilo que não se permite alcançar pela liminar do mandado de segurança também não poderá ser pleiteado sob a forma de tutela antecipada, nos moldes da legislação processual comum.

80. LIMITE TEMPORAL DOS EFEITOS DA LIMINAR: INEXISTÊNCIA A lei atual não repetiu a previsão da Lei nº 4.348/1964 de que a liminar deveria subsistir por 90 dias, prorrogáveis por mais 30. Já se entendia que essa caducidade não era condizente com o regime de antecipação de tutela introduzido supervenientemente na legislação processual civil brasileira (CPC/73, art. 273). A Lei nº 12.016 foi sensível a essa argumentação e dispôs que “os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença” (art. 7º, § 3º). Sujeita-se, porém, a liminar a extinção por perempção ou caducidade, decretável de ofício ou a requerimento do Ministério Público, sempre que, concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do processo ou deixar de promover, por mais de três dias úteis, os atos e as diligências que lhe cumprirem (Lei nº 12.016, art. 8º). Trata-se de provimento judicial de repressão à litigância de má-fé ou à conduta temerária adotada por quem se beneficiou de medida emergencial e não cuidou de assegurar ao processo a marcha regular e célere imposta pela lei. A liminar, como toda medida da espécie, representa, quase sempre, uma antecipação de tutela, em caráter provisório e temporário. Seus efeitos, portanto, não duram além da sentença de solução do mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 7º, § 3º). Proferida a sentença, se é de procedência da demanda, o decisório definitivo substitui o provimento liminar. Se é de denegação da segurança, extingue-se o provimento provisório, por incompatibilidade lógica com o objeto do julgado definitivo89. O limite da duração dos efeitos da liminar, portanto, é a superveniência da sentença, qualquer que seja ela.

80.1.

Tramitação preferencial do mandado de segurança

Prevê a Lei nº 12.016 que, uma vez deferida a liminar, o processo terá “prioridade para julgamento” (art. 7º, § 4º). Dá a impressão, o dispositivo, de que o tratamento prioritário, in casu, seria em atenção ao sujeito passivo da demanda, a fim de não o submeter indefinidamente a uma medida restritiva de caráter provisório. Na verdade, porém, o curso do mandado de segurança, segundo a própria Lei nº 12.016, é sempre prioritário, com ou sem medida liminar (art. 20)90. O mandado de segurança, por si só, tem curso preferencial sobre todos os demais processos, exceção apenas do habeas corpus (art. 20 da Lei nº 12.016). O § 4º do art. 7º, porém, estabelece uma nova preferência aplicável, particularmente, às ações mandamentais, após o deferimento da liminar. Essa nova prioridade é ampla e há de prevalecer até mesmo sobre os outros mandados de

segurança em que não tenha ocorrido a suspensão liminar do ato impugnado.

81. O MANDADO DE SEGURANÇA E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Como se passa com todo procedimento especial, sua disciplina específica nunca se exaure na lei que o institui. Não seria razoável, nem mesmo possível, prever na legislação especial todo o mecanismo processual a ser observado ao longo do iter de qualquer procedimento que se afasta dos padrões ordinários da disciplina codificada. Por isso, é na própria lei geral que vem predeterminada a submissão dos procedimentos especiais, em caráter subsidiário, ao “procedimento comum” (CPC/2015, art. 318, parágrafo único91), ou seja, o sistema comum do Código alcança os procedimentos especiais, para completar sua disciplina e preencher todas as inevitáveis lacunas das disposições que lhe são próprias e para harmonizá-los com o sistema geral em torno do qual se acha implantado o direito processual positivo. Desse modo, não é necessário que a lei especial declare a incidência subsidiária do Código de Processo Civil dentro da área de sua regulamentação. Isso decorrerá por força do próprio sistema. Por exemplo: como definir os elementos da petição dos recursos de agravo e apelação, quando manejados dentro do processo de mandado de segurança? Como saber que função desempenham o escrivão e o oficial de justiça na prática dos atos de comunicação processual? Como saber que conteúdo obrigatório deve apresentar a sentença? E o mandato judicial conferido ao advogado do impetrante? Quais são os poderes e deveres do juiz e das partes? Como punir as infrações do litigante temerário ou de má-fé? Tudo isso, e muito mais, acontece ou pode acontecer dentro da ação mandamental e desafia solução a ser encontrada por meio da aplicação das regras gerais do Código de Processo Civil. O afã de destacar o caráter especialíssimo do remédio processual constitucional leva o legislador do mandado de segurança, em alguns passos, a adotar linguagem ou nomenclatura que se afasta dos termos usuais no processo civil. Assim, v.ġ., em lugar de falar em autor e réu, a Lei nº 12.016 (como já acontecia com a lei antiga) fala em impetrante, de um lado, e de autoridade coatora e pessoa jurídica interessada, de outro; em vez de citação e intimação, fala em notificar a autoridade coatora para prestar informações e dar ciência da impetração à pessoa jurídica interessada. Na verdade, porém, a mudança de nomenclatura não altera a natureza da coisa. Se os atos praticados durante o procedimento especial têm a mesma função daqueles previstos no procedimento comum, há substancial identidade entre eles, motivo pelo qual se submetem à mesma disciplina processual, no tocante aos requisitos e efeitos. Do ponto de vista técnico e geral, citação é “o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual” (CPC/2015, art. 23892). Sua função básica é a de

integrar à relação processual o réu ou executado, pois sem a citação ela não se completa, e o processo não se desenvolve validamente (CPC/2015, art. 23993). Sendo assim, a Lei do Mandado de Segurança, na sua versão antiga, quando previa a notificação da autoridade coatora para prestar suas informações sobre o ato impugnado pelo impetrante (autor), outra coisa não fazia além de regular a convocação do sujeito passivo (réu) da ação para se defender. Ou seja: o ato de comunicação processual era substancialmente o mesmo que o Código chama de citação, e o seu papel era aquele mesmo previsto pela lei geral, qual seja, o de completar a relação processual pela inserção do sujeito passivo (o réu, que na espécie é a pessoa jurídica a que se acha vinculada a autoridade coatora notificada). Da mesma forma, quando a lei especial atual ordena que seja dada ciência da impetração ao representante judicial da pessoa jurídica interessada (art. 7º, II), embora tenha sido evitado o termo citação, o que de fato está sendo ordenada é a citação, dentro do sistema geral do Código de Processo Civil. Intimação ocorre quando a autoridade coatora é notificada a prestar informações, nos moldes da nova Lei do Mandado de Segurança, e segundo a decisão proferida no deferimento da petição inicial respectiva. Com efeito, intimação, para a lei geral, vem a ser precisamente “o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e dos termos do processo” (CPC/2015, art. 26994). E é justamente isso o que ocorre quando o escrivão notifica ao coator a decidido pelo juiz. E relevante, de tal sorte, é a circunstância de a Lei do Mandado de Segurança ter evitado falar, no art. 7º, II, em intimação da pessoa jurídica interessada. Para todos os efeitos de direito, é citação o ato previsto na referida disposição legal. Quanto às partes, sob o rótulo de impetrante, a Lei nº 12.016 nomeia o autor (sujeito ativo) da ação de segurança; e, sob a denominação pessoa jurídica interessada, identifica o réu (sujeito passivo da relação processual). A autoridade coatora, porém, figura não como sujeito passivo, mas como órgão do verdadeiro réu, isto é, daquela pessoa que deverá suportar, em sua esfera jurídica, os efeitos substanciais do processo, e que será cientificada simultaneamente com a notificação do coator a prestar as informações ordenadas pelo juiz. Por fim, merece lembrar que a doutrina, na primeira leitura da Lei nº 12.016, vem reconhecendo pontos em que a chamada Nova Lei do Mandado de Segurança teria sido mais tímida do que as reformas ocorridas do Código de Processo Civil de 1973. Em matéria, por exemplo, de antecipação de tutela e de força executiva da sentença, há maior efetividade da prestação jurisdicional naquele sistema codificado do que nas regras especiais do mandamus renovado. Não corresponde à garantia do processo justo, tampouco à natureza constitucional do mandado de segurança, a interpretação que o inferiorize à dinâmica do processo comum. Daí por que assiste razão àqueles que preconizam a observância na tramitação do mandado de segurança de todas as conquistas de efetividade alcançadas pela legislação processual civil, ainda que não constantes da lei especial. A aplicação subsidiária do Código, na espécie, não contrariaria a lei própria do

mandamus; a completaria, enriquecendo-a pela técnica da aplicação supletiva ou subsidiária. Sobretudo, encontraria inspiração e justificação nos princípios constitucionais aplicáveis aos direitos fundamentais e que serviram de base à modernização da codificação processual civil operada nos últimos tempos. A respeito, por exemplo, da execução de sentença de segurança relativa a vencimentos e vantagens dos servidores públicos, a Lei nº 12.016 só a prevê, de maneira expressa, no tocante às prestações vencidas após o ajuizamento do writ (art. 14, § 4º). Acontece que, se foi o ato abusivo de autoridade, objeto da segurança, a causa de supressão ilícita do direito do impetrante, não há como negar o efeito da sentença sobre a recuperação das prestações abusivamente a eles sonegadas. Caberia, in casu, como bem observa Cássio Scarpinella Bueno, aplicar-se a força executiva do julgado, prevista no art. 515 do CPC/201595, em que se admite a qualidade de título executivo a qualquer sentença em que se reconheça uma obrigação em seus elementos essenciais, seja ela representativa de prestação de dar, fazer, não fazer ou de pagar quantia, sem depender de um expresso comando condenatório. Da aplicação subsidiária dessa regra no caso do mandado de segurança, o efeito executivo de sua sentença não poderia ficar restrito às prestações futuras; teria de alcançar também as pretéritas, a partir do ato impugnado e desconstituído, por violar direito líquido e certo do servidor impetrante96.

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Lei nº 12.016, art. 6º: “A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições. § 1º No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à segunda via da petição. § 2º Se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria coatora, a ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação”. Dessa maneira, “a lei do mandado de segurança assegura ao impetrante o direito de requerer ao magistrado a requisição de documentos necessários à prova do alegado, se a autoridade recusar-se a fornecê-los ou a fornecer certidão equivalente” (STJ, 2ª T., AGA 15.602/MG, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac. 12.02.92, RSTJ 30/22). “A notificação válida no mandado de segurança tem a natureza de citação do processo de conhecimento, possuindo o efeito de interromper o curso do prazo prescricional” (STJ, 2ª T., REsp 400.352/BA, Rel. Min. Paulo Medina, ac. 1º.10.2002, DJU 10.03.2003, p. 155. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., REsp 491.332/SC, Rel. Min. José Arnaldo, ac. 25.05.2004, DJU 28.06.2004, p. 385). “Na sistemática do mandado de segurança (Lei n. 1.533/51, art. 7º, I), a ‘notificação’ do

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órgão (autoridade coatora) equivale à ‘citação’ da pessoa jurídica (ré)” (STJ, 6ª T., REsp 31.525/GO, Rel. Min. Adhemar Maciel, ac. 29.06.1993, DJU 13.09.1993, p. 18.581). Entre muitos, o acatado tratadista do mandado de segurança, Celso Barbi, ensinava que “a parte passiva do mandado de segurança é a pessoa jurídica de direito público a cujos quadros pertence a autoridade apontada como coatora”. Por isso, sua notificação equivaleria à citação da pessoa jurídica, no ato representada pelo coator, dispensando novo ato citatório realizado diretamente em relação a esta última (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 193). Nesse mesmo sentido era a lição de Scarpinella Bueno, para quem, nas pegadas de Celso Barbi, a desnecessidade de citação da pessoa jurídica se explicava pela representação legal atribuída à autoridade coatora, no processo do mandado de segurança (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 232, apud CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 112, nota 315). THEODORO JÚNIOR, Humberto. O mandado de segurança segundo a Lei 12.016, de 07 de agosto de 2009. Rio de Janeiro: Forense, 2009. n. 10-a, p. 21. “Mandado de segurança. Legitimidade para recorrer. – O coator e notificado para prestar informações. Não tem ele legitimidade para recorrer da decisão deferitória do ‘mandamus’. A legitimação cabe ao representante da pessoa jurídica interessada” (STF, 1ª T., RE 97.282/ PA, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 03.09.1982, DJU 24.09.1982, p. 9.446). Há opiniões, contudo, de que no procedimento da Lei nº 12.016 não haveria prazo para que a pessoa jurídica interessada ingressasse no feito, podendo ocorrer a qualquer tempo, mesmo depois da sentença, na fase recursal (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 341), mesmo porque seria facultativo tal ingresso (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 38; CERQUEIRA, Luis Otávio Sequeira de. In: CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo et al., Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 86). Certo que a pessoa jurídica interessada pode ingressar a qualquer tempo no processo, mas o receberá no estado em que se encontrar. Se, todavia, pretender contestar a ação mandamental, deverá fazê-lo no decênio seguinte à citação. CPC/73, art. 241, I, II e III. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 232. Nesse sentido, a jurisprudência do STI: “A intempestividade das informações prestadas pela autoridade apontada coatora no mandado de segurança não induz a revelia, uma vez que ao impetrante cumpre demonstrar, mediante prova pré-constituída dos fatos que embasam a impetração, a ocorrência do direito líquido e certo” (STJ, 1ª T., RMS 26.170/RO, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 04.12.2008, DJe 15.12.2008). Dispunha, ainda, o § 1º do art. 322, II, do CPC/1939 que “Quando a pessoa do coator se confundir com a do representante judicial, ou legal da pessoa jurídica de direito público interessada na causa, a notificação, feita na forma do n. I deste artigo, produzirá também os efeitos da citação”. “O coator é citado – esclarecia CELSO BARBI – como ‘representante’ daquela pessoa [i.e., a pessoa jurídica interessada], como notou SEABRA FAGUNDES e não como parte” (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. nº 157, p. 154155; SEABRA FAGUNDES, Miguel. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário.

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3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1957. p. 338). CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 163. STJ, 1ª T., REsp 105.188-6/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 19.08.2008, DJe 01.09.2008. Precedentes: REsp 833.394/SP, 1ª T., Rel. Denise Arruda, ac. 20.03.2007, DJU 23.04.2007, p. 235; STJ, 2ª T., REsp 649.037/MA, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 07.02.2006, DJU 06.03.2006, p. 318. “1. No processo de mandado de segurança, a relação processual trava-se entre o impetrante e a pessoa jurídica a cujo organismo pertence a chamada ‘autoridade coatora’. 2. A ‘autoridade coatora’ é simples órgão a que se outorga, excepcionalmente, competência para receber citação pelo estado e, em nome dele, responder” (STJ, 1ª T., Pet. 321/BA, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 16.11.1992, DJU 17.05.1993, p. 9.292). A autoridade coatora “é obrigada a prestar informações, como todos são obrigados a colaborar com a justiça, com a particularidade de esta obrigação ter sido particularizada pelo legislador, o que pode implicar punição penal por prevaricação (...). Como autoridade pública que é, está a autoridade coatora submetida a dizer a mais estrita verdade, pois suas informações são revestidas de presunção de legitimidade dos atos administrativos, circunstância que, por si, já afastaria a concepção das informações como ato de defesa” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. Recurso de terceiro prejudicado: juízo de admissibilidade. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2005. p. 155). DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES explica que as informações prestadas pela autoridade coatora “não têm natureza jurídica de contestação. Como entendo que ré é a pessoa jurídica de direito público, a contestação deve ser por ela apresentada, cabendo à autoridade coatora simplesmente prestar as informações como fora de indicar subsídios ao juízo na formação de seu convencimento” (Ações constitucionais, cit., p. 164). QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 215; DIDIER JÚNIOR, Fredie. Recurso de terceiro, cit., p. 153. CPC/73, art. 339. DIDIER JÚNIOR, Fredie. Natureza jurídica das informações da autoridade coatora no mandado de segurança. In: BUENO, Cassio Scarpinella; ARRUDA ALVIM, Eduardo; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim (coords.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança – 51 anos depois. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 370-371. “Fontes do prova são pessoas ou coisas das quais se possam extrair informações capazes de comprovar a veracidade de uma alegação” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros Editores, 2001. v. III, nº 804, p. 86). CPC/73 art. 14, V. STF, Pleno, MS 20.882/MA, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 23.06.1994, DJU 23.09.1994, p. 25.326. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 38. De fato, o art. 7º, II, da Lei nº 12.016 determina que a pessoa jurídica interessada será cientificada (rectius: citada) da impetração, “para que, querendo, ingresse no feito”. Isto, porém, não deixa a

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critério de dita pessoa jurídica fazer ou não parte do processo. A sua vinculação, como acontece com qualquer demandado, não é uma faculdade parte passiva da relação processual. O que é facultativo, em qualquer processo, é a resposta (contestação) que o réu produz, se lhe convier (“querendo”). É nesse sentido que a lei dispõe que o representante judicial da pessoa jurídica interessada será intimado (rectius: citado) “para que, querendo, ingresse no feito” (Lei nº 12.016, art. 7º, II). É o que determina, aliás, o CPC/2015, em seu art. 238, ao dispor que “a citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual”. Não há, como se vê, obrigatoriedade de apresentar defesa, apenas de integrar a relação processual. O CPC/2015 extinguiu o procedimento cautelar. Na sistemática atual, as tutelas provisórias – baseadas na urgência ou na evidência –, cautelares ou satisfativas, são requeridas pela parte interessada em caráter antecedente ou incidental. CPC/73, art. 273. CPC/73, art. 798. “Sérgio Ferraz ensina que a medida liminar tem ‘a natureza de uma providência antecipadora dos efeitos que se busca obter através da sentença’, destacando que o que se busca por intermédio do writ é a reparação específica do direito que foi ameaçado ou lesado, e não a reparação de natureza subsidiária ou a tutela substitutiva” (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 373-374; FERRAZ, Sérgio. Cinquenta anos de mandado de segurança. Porto Alegre: Fabris Editor, 1986. p. 9 e ss.). ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 192-193. “Haverá, em qualquer hipótese, satisfação de um direito mediante uma decisão exarada em sede de cognição sumária, já que um provimento pode proporcionar satisfação concreta independente de ser provisório ou definitivo” (QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança, cit., p. 226). “Não há dúvida que a liminar em mandado de segurança constitui típica hipótese de antecipação da tutela, semelhante à prevista no art. 273, I, do Código” (ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, cit., p. 192-193). Para se ter uma antecipação de tutela, na perspectiva daquele que demanda a tutela jurisdicional para seu direito lesado ou ameaçado, “o que vale é a ‘tutela do direito’, pouco importando se esta é concedida por meio de uma decisão de cognição sumária ou mediante uma decisão de cognição exauriente e definitiva” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo cautelar. São Paulo: Ed. RT, 2007. p. 37). O STJ tem reconhecido, frequentemente, o caráter de antecipação de tutela à liminar do mandado de segurança (STJ, 4ª T., ED no REsp 369.527/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Jr., ac. 09.12.2003, DJU 15.03.2004, p. 274; STJ, 1ª T., AgRg no Ag 842.866/MT, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 12.06.2007, DJU 03.09.2007, p. 127; STJ, 3ª T., RMS 18.848/AP, Rel. Min. Menezes Direito, ac. 19.04.2005, DJU 13.06.2005, p. 286). ANDRADE, Érico. O mandado de segurança: a busca da verdadeira especialidade (proposta de releitura à luz da efetividade do processo). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010, p. 528. Idem, ibidem. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 168.

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Para JAMES MARINS, a liquidez e certeza do direito do impetrante é, na verdade, um requisito exigível para a concessão definitiva do mandado de segurança. Para o deferimento da liminar, os requisitos são aqueles enumerados no art. 7º da Lei nº 12.016/2009, os quais se contentariam com a verossimilhança das alegações do impetrante e com o risco de se tornar ineficaz a segurança, quando do deferimento definitivo (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 499). “(...) tanto no caso da liminar em mandado de segurança, como no caso da liminar concedida no seio da medida cautelar, há cognição sumária; porém, na hipótese de liminar em mandado de segurança, essa ‘cognição sumária’ dá-se à luz do material probatório dado por completo e exauriente (ainda que esse juízo provisório sobre a suficiência da prova possa ser alterado ao final quando da sentença)” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança, cit., p. 168). “(...) o mandado de segurança é um instrumento (uma garantia constitucional) destinado a assegurar uma prestação in natura ao impetrante. O perigo na demora significa que, se não concedida a ordem liminar pleiteada, a sentença será inútil como instrumento capaz de assegurar ao impetrante a garantia in natura pleiteada. Pouco importa que, da eventual anulação do ato impugnado, decorra o direito de recuperação do pagamento indevido que ele provocou. O direito do impetrante, tutelado pelo mandamus, era o de impedir o efeito do ato abusivo. Negada a suspensão liminar, portanto, a sentença não terá sido instrumento suficientemente apto a outorgar ao contribuinte a garantia in natura pleiteada” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 169-170). “Não deve ser, de conseguinte, o argumento da reparabilidade em pecúnia de eventual dano que o impetrante possa vir a sofrer com a não concessão da liminar, motivo para a sua denegação, como não raro se vê no dia a dia da militância forense. Mesmo porque direito à reparação em pecúnia o interessado teria, de uma forma ou de outra, independentemente do uso do mandado de segurança” (ARRUDA ALVIM, Mandado de Segurança, cit., p. 170). ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 171. CPC/73, art. 461. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 273. DECOMAIN, Pedro Roberto. Op. cit., p. 276. CPC/73, §§ 4º e 5º, do art. 461. WLADECK, Felipe Scripes. Apud QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de. CIANCI, Mirna, QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 241. TALAMINI, Eduardo. Apud QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de. CIANCI, Mirna, QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 240-241. CRETELLA JÚNIOR, José. Ċomentários às leis do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1979. p. 191; MACIEL, Adhemar Ferreira. Observações sobre a liminar do Mandado de Segurança. Revista dos Tribunais, v. 547, p. 22 e 26. Na jurisprudência: STJ, 1ª T., RMS 361/ SP, Rel. Min. Pedro Acioli, ac. 17.12.1990, RT 674/402; STJ, 1ª T., RMS 1.239/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 12.08.1992, DJU 23.03.1992, p. 3.429. “Liminar não é uma liberalidade... é o pressuposto básico que possibilita a satisfação in natura do direito invocado pelo impetrante”, no mandado de segurança (ATENIENSE, Aristóteles. Jornal do

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advogado OAB integração MG, fev./mar. 1994, p. 9). Por todos, BUENO, Cássio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança. Um tema com variações. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1999, p. 130. STJ, 1ª T., RMS 271/SP, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 28.11.1990, DJU 18.03.1991, p. 2.769. STJ, Corte Especial, EREsp 471.513/MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves, Rel. p/ ac. Min. Gilson Dipp, ac. 02.02.2005, DJU 07.08.2006, p. 196. “Nesse sentido, pensa-se, deve ser posto o tema: presentes os requisitos, a antecipação deve ser concedida e não pode ser negada” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 282). No mesmo sentido: ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança, cit., p. 174; MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Mandado de segurança contra denegação ou concessão de liminar. Revista de Direito Público, nº 92, p. 55. STJ, 2ª T, REsp 249.647/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 13.11.2001, DJU 18.02.2002, p. 298; WLADECK, Felipe Scripes. As medidas de urgência na nova Lei do Mandado de Segurança. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, nº 30, ago. 2009. Disponível em: . Acesso em: 2 set. 2009. MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Ċomentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 119. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 277. STJ, 1ª T., RMS 361/SP, Rel. Min. Pedro Acioli, ac. 17.12.1990, RT 674/402; STJ, 1ª T., ROMS 1.239/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 12.02.1992, DJU 23.03.1992, p. 3.429. No entanto, “como ocorre com todas as decisões judiciais, por exigência constitucional (CF, art. 93, IX), o deferimento da liminar deve ser fundamentado, não bastando a mera afirmação genérica de estarem presentes seus requisitos, sob pena de nulidade: STJ, RMS 25.462/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 20.10.2008” (MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 86). “A liminar não é uma liberalidade da justiça; é medida acauteladora do direito do impetrante, que não pode ser negada quando ocorrem seus pressupostos como, também, não deve ser concedida quando ausentes os requisitos de sua admissibilidade” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, cit., p. 72). STJ, 1ª T., REsp 249.627/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 12.12.2000, DJU 19.03.2001, p. 75; STJ, 2ª T., REsp 70.884/MG, Rel. Min. Peçanha Martins, ac. 17.09.1998, DJU 22.03.1999, p. 159. STJ, 1ª T., REsp 83.893/MG, Rel. Min. José Delgado, ac. 07.03.1996, DJU 15.04.1996, p. 11.503. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 3.586/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 06.09.1995, DJU 02.10.1995, p. 32.343; STJ 2ª T., REsp 272.485/SP, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 12.08.2003, DJU 22.09.2003, p. 282; STJ, 2ª T., REsp 279.352/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 13.11.2001, DJU 18.02.2002, p. 326. STF, Pleno, ADI 1.576 MC/UF-União Federal, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 16.04.1997, DJU 06.06.2003, p. 29. “... a caução agora é facultativa, o que de nenhum modo obsta o acesso à tutela de urgência. Muito ao contrário, cuida-se de providência com nítida função cautelar (contracautela), com específica

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função de assegurar eventuais prejuízos que sejam causados à parte adversa com a efetivação da liminar” (QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança, cit., p. 245). CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 180; BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança, cit., p. 18. DECOMAIN, Pedro Roberto. Op. cit., p. 286. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 182. CARREIRA ALVIM, J. E. Op. cit., p. 184-185. STJ, 1ª T., RMS 273/SP, Rel. Min. Armando Rolemberg, ac. 03.09.1990, DJU 05.11.1990, p. 12.416; STJ, 1ª T., RMS 269/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 27.10.1993, DJU 22.11.1993, p. 24.890; STJ, 1ª T., REsp 83.893/MG, Rel. Min. José Delgado, ac. 07.03.1996, DJU 15.04.1996, p. 11.503. MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 87. MEDINA e ARAÚJO defendem a inexigibilidade da caução nas causas alimentares, mediante invocação analógica das regras da execução provisória constantes do art. 520 do CPC/2015 [CPC/73, art.475-O] (Mandado de segurança individual e coletivo: comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, cit., p. 126-127). “A caução passa a ser exigível, nos termos da lei, todavia, não pode ser imposta àquele que comprovadamente não possui condições de satisfazê-la já que neste caso estaria sendo violado seu acesso à jurisdição” (MONNERAT, Carlos Fonseca; VERÍSSIMO, Marcos Neves. Primeiras impressões sobre o novo mandado de segurança – Lei 12.016/2009. Revista de Processo, nº 182/223). A esse entendimento adere RITA QUARTIERI, op. cit., p. 247-248. STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 15.271/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 29.09.2010, DJe 13.10.2010. Nesse sentido, o STJ entende que, revogada a liminar que suspendeu a exigibilidade do crédito tributário, o lapso prescricional para o Fisco é imediatamente retomado: “4. A concessão de liminar em mandado de segurança é causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, IV, do CTN). (...) 5. Na hipótese dos autos, considerando que a liminar que suspendeu a exigibilidade do crédito tributário foi revogada definitivamente em 26/11/1998 e que os recursos especiais e extraordinários interpostos pela ora recorrente foram desprovidos de eficácia suspensiva, o reconhecimento do transcurso do prazo prescricional a que se refere o art. 174, caput, do CTN, é medida que se impõe, já que a execução fiscal foi ajuizada somente em 4/11/2009, ou seja, após o transcurso do prazo de 5 anos” (STJ, 1ª Seção, EAREsp. 407.940/RS, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 10.05.2017, DJe 29.05.2017). MEDINA, José Miguel Garcia; ARAUJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Ċomentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 129. No mesmo sentido é a jurisprudência do STJ: “A sentença substitui a medida liminar, de modo que, prolatada aquela, esta fica sem efeito, qualquer que seja o teor do julgado; se concedido o mandado de segurança, a tutela judicial passa a resultar da sentença, que é de execução imediata, à vista do efeito meramente devolutivo da apelação; se denegado, o provimento liminar não subsiste, cedendo àquele proferido à base de cognição completa. Recurso ordinário não provido” (STJ, 2ª

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T., RMS 7.845/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 04.08.1998, DJU 08.09.1998, p. 38). ANDRADE, Érico. O mandado de segurança: a busca da verdadeira especialidade (proposta de releitura à luz da efetividade do processo). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010, p. 530. WALD, Arnoldo; KAUFMANN, Rodrigo de Oliveira. A Súmula 405 do STF e a segurança jurídica. Revista do Tribunal Regional Federal da Primeira Região. v. 28, n 7/8, p. 67, jul.-ago. 2016; MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. 26. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 84-85. STJ, 2ª T., REsp. 944.325/RS, Rel. Min. Humberto Matins, ac. 04.11.2008, DJe 21.11.2008. Em julgamento anterior, aquela Corte já ressaltara: “a aplicação da súmula n. 405 do S.T.F. enseja ressalvas, porquanto se apoia em precedentes julgados anteriormente a vigência do atual Código de Processo Civil, que deu nova sistemática e dimensão às cautelares, e não considerou a legislação superveniente relativa a matéria. III – a regra, a ser observada, é a de que a eficácia da liminar pode ser suspensa, revogada ou mesmo restabelecida, tendo em conta o caso concreto e os parâmetros legais de regência” (STJ, 2ª T., RMS 2.438/MS, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac. 29.11.1993, DJU 07.02.1994, p. 1.152). WALD, Arnoldo; FAUFMANN, Rodrigo de Oliveira. A Súmula 405 do STF e a segurança jurídica, cit., p. 78. Op. cit., loc. cit. MEDINA, José Miguel Garcia; ARAUJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 129. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à Nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 204. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2007. p. 610. STJ, 1ª T., REsp 213.716/RJ, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 10.08.1999, DJU 20.09.1999, p. 42. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 139.276/ES, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 05.04.2001, DJU 19.11.2001, p. 232; STJ, Corte Especial, EREsp 471.513/MG, Rel. p/ ac. Min. Gilson Dipp, ac. 02.02.2005, DJU 07.08.2006, p. 196; STJ, Corte Especial, EREsp 150.086/PR, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 19.06.2006, DJU 21.08.2006, p. 217. Diante da Lei nova do Mandado de Segurança, o STJ, aplicando o § 1º de seu art. 7º, já teve oportunidade de assentar que a regra expressa trazida por aquele dispositivo tornou direito positivo o que já se achava pacificado na jurisprudência consolidada daquela Corte (STJ, 2ª T., REsp 1.124.918/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 17.11.2009, DJe 07.12.2009). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp. 1.190.520/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 26.10.2010, DJe 10.11.2010. “Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança” (STF – Súmula nº 622). “Mandado de segurança – Liminar – Recurso. Ante a nova Lei do Mandado de Segurança, explicitou-se o cabimento de recurso contra decisão monocrática que implique o deferimento ou o indeferimento da liminar, havendo o Plenário declarado, na apreciação do Agravo Regimental na Medida Cautelar no Mandado de Segurança nº 28.177/DF, a insubsistência do Verbete nº 622”

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(STF, Pleno, MS 25.563 AgR/DF, Rel. Marco Aurélio, ac. 09.12.2010, DJe 10.02.2011). STJ, 1ª Seção, Ag no MS 18.376/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 26.09.2012, DJe31.10.2012; STJ, 1ª Seção, PET no MS 20.133/DF, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 28.08.2013, DJe 09.09.2013; STJ, 1ª T., AgRg no AREsp 93.780/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 06.11.2012, DJe 13.11.2012. Há na doutrina vozes que censuram esse privilégio conferido ao Poder Público, qualificando como inconstitucional o dispositivo (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 186-187; BUENO, Cassio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 45-46). Tem--se notícia de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil contra tal dispositivo (ADI 4.296). “As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil” (art. 7º, § 5º, da Lei nº 12.016). Os artigos do CPC de 1973 correspondem aos arts. 300 e 497 do CPC de 2015. A Lei nº 4.348/1964 dispunha que “não será concedida a medida liminar de mandado de segurança impetrado visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens” (art. 5º). A Lei nº 5.021/1966 também vedava a concessão de “medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias” (art. 1º, § 4º). Segundo o CTN, “é vedada a compensação mediante aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial” (art. 170-A). A liberação de mercadorias ou bens de procedência estrangeira por meio de liminar de mandado de segurança era vedada pela Lei nº 2.770, de 04.05.1956. As Súmulas nº 212 e 213 mereceram interpretação adequada de JAMES MARINS: (i) “O que o Superior Tribunal de Justiça diz, na Súmula nº 212, é, em última análise, o seguinte: em cognição sumária o juiz não pode aferir liquidez de crédito oriundo de débito tributário, isto é, que o pedido que se pode fazer em mandado de segurança que visa à compensação de crédito tributário só pode dizer respeito ao reconhecimento do direito in natura do contribuinte à compensação, eventualmente com o expurgo de normas infralegais incompatíveis com as normas legais que angustiem o direito à compensação, desde cláusulas de correção monetária, por exemplo, ou condicionamentos incompatíveis com a legislação, em específico, do regime da Lei 8.383/91”. (ii) Uma vez que a Súmula nº 213 do STJ afirma ser o mandado de segurança “ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária”, o que se quer dizer com a Súmula nº 212 é que a liminar não pode assumir “caráter satisfativo e antecipativo de um efeito jurídico da sentença”. Ou seja: “Sendo a compensação meio de extinção do crédito tributário de natureza inquestionavelmente satisfativo, não pode ser reconhecida em medida liminar” (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 524-525). MARINS, James. Op. cit., p. 525. MARINS, James. Op. cit., loc. cit. Súmula nº 405 do STF: “Denegado o mandado de segurança pela sentença ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária”.

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Lei nº 12.016, art. 20: “O processo de mandado de segurança e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus”. CPC/73, art. 272, parágrafo único. CPC/73, art. 213. CPC/73, art. 214. CPC/73, art. 234. CPC/73, art. 475-N. Com apoio no regime do CPC, o valor das prestações ilicitamente sonegadas pelo ato da autoridade coatora seria liquidado e executado no regime do art. 535, §3º, I do CPC/2015 [art. 730, CPC/73], como recomenda CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, observando-se, dessa maneira, as regras codificadas em complementação às da lei especial (A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 89-91).

Capítulo IX PEREMPÇÃO OU CADUCIDADE DA LIMINAR Art. 8º.

Será decretada a perempção ou caducidade da medida liminar ex officio ou a requerimento do Ministério Público quando, concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do processo ou deixar de promover, por mais de 3 (três) dias úteis, os atos e as diligências que lhe cumprirem.

Comentários ao art. 8º 82. REVOGAÇÃO E CASSAÇÃO DA LIMINAR Antes de cogitar da perempção ou decadência da liminar, é interessante relembrar as noções de cassação e revogação no plano dos atos judiciais. É o que faremos a seguir. A Lei nº 12.016 prevê que a medida do mandado de segurança pode se extinguir mediante revogação ou cassação (art. 7º, § 3º), o que naturalmente ocorre com todas as medidas de urgência, sejam cautelares ou antecipatórias, dentro do sistema do Código de Processo Civil: “A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada” (CPC/2015, art. 2961). A revogação é ato desconstitutivo praticado pela própria autoridade judicial que antes deferira a medida de urgência (revogar, lexicamente, é “voltar atrás”, “tornar sem efeito” um ato ou decisão). Ċassar também é anular um ato decisório, retirando-lhe a eficácia, ou seja, impedindo-o de produzir efeito. No âmbito judiciário, a cassação é, em regra, utilizada, na via recursal, para identificar o ato do tribunal superior que invalida a decisão do órgão de grau inferior. A liminar, portanto, é revogada quando o juiz do mandado de segurança volta atrás e põe fim a seus efeitos. É cassada quando, julgando o agravo interposto de seu deferimento, o tribunal a invalida. Num caso e noutro, o resultado é o mesmo: extin-gue-se a medida de urgência, provisoriamente decretada. Essa invalidação, porém, qualquer que seja a autoridade judicial que a promova, não pode ser fruto de puro arbítrio. Haverá sempre de ser juridicamente fundamentada, o que vale dizer: terá de ser fundada em fatos idôneos a justificar a revogação ou cassação, segundo a lei. A revogação, por exemplo, pode decorrer dos fatos e alegações novos trazidos pelas informações do coator ou pela resposta da pessoa jurídica, quando tenham aptidão para alterar a convicção do juiz sobre a relevância do fundamento do pedido ou do risco de ineficácia da medida

definitiva2. A cassação, por sua vez, se tornará possível sempre que o recorrente demonstrar que o juiz da causa deferiu a liminar sem se atentar para as exigências do art. 7º, III, da Lei nº 12.016.

83. REVOGAÇÃO TÁCITA Com a regra do § 3º do art. 7º, a Lei nº 12.016 criou, na esteira da Súmula nº 405 do STF3, uma hipótese de revogação tácita da liminar: os efeitos da liminar somente duram “até a prolação da sentença”, na dicção do referido dispositivo legal. Logo, se a sentença de mérito denega a segurança, extingue-se ipso facto a liminar. Não importa o efeito em que a apelação seja recebida. De acordo com o § 3º do art. 7º, e nos termos da Súmula nº 405, a liminar não se sustenta, pois a eficácia legal que a lei conferiu à sentença do mandado de segurança é a de produzir, por si só, o termo final de vigência da suspensão liminar do ato impugnado. Segundo a voluntas legis, respaldada na jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal, não há dúvida de que a sentença de denegação do mandamus tem a força de revogar, de imediato, com apenas sua prolação, a medida liminar que favorecia ao impetrante. Não há necessidade de declaração, a respeito, na sentença. A eficácia extintiva opera ipso iure4.

84. PEREMPÇÃO OU DECADÊNCIA DA LIMINAR Segundo o art. 8º da Lei nº 12.016, a liminar pode se extinguir, por perempção ou caducidade, em duas circunstâncias: a)

quando, após a concessão da liminar, “o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do processo”; ou

b)

quando “deixar de promover, por mais de três dias úteis, os atos e diligências que lhe cumprirem”.

Perempção ou caducidade são empregadas pela lei com o mesmo sentido, qual seja, o de perda de eficácia da decisão, por ter sido ultrapassado o prazo em que o beneficiário deveria agir, e não o fez, “deixando de praticar um ato processual, com o propósito de tirar proveito da sua própria omissão”5, ou adotando, de má-fé, conduta que embarace o andamento do processo. O propósito do art. 8º da Lei nº 12.016 é evidente: evitar e sancionar a conduta incompatível com o princípio da boa-fé e lealdade, por meio da qual o impetrante, após beneficiar-se da suspensão liminar do ato impugnado, passa a criar óbices à marcha regular, fugindo do risco de um julgamento definitivo, que talvez lhe possa ser adverso. O decreto de perempção ou decadência limita-se à extinção da medida liminar, não afetando a

subsistência do processo, de sorte que não impedirá o prosseguimento de sua marcha rumo à sentença de mérito. Entretanto, DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES entende que “uma vez cassados os efeitos da liminar por conduta inapropriada do impetrante, não caberá a repetição do pedido liminar”, a menos que consiga “demonstrar a ocorrência de novas circunstâncias, quando poderá fazer um novo pedido liminar, o que é diferente de renovar o primeiro pedido”6. A decisão judicial de extinção da liminar poderá ser deliberada ex officio pelo juiz, ou ser provocada por requerimento do Ministério Público, na dicção do referido art. 8º da Lei do Mandado de Segurança. Se pode ser decretada de ofício, nada impede que seja, também, provocada por requerimento da pessoa jurídica demandada, muito embora se silencie, a lei, a respeito. A natureza do ato judicial que “decreta a perempção ou decadência da liminar” é a de decisão interlocutória. Em cumprimento às dimensões modernas do contraditório, não deverá ocorrer a extinção da liminar sem prévia intimação do impetrante, conclamando-o à prática do ato omitido, ou exigindo justificativa para os embaraços criados, e assinando-lhe prazo curto7 para a diligência. Findo esse, sem providências ou sem explicações razoáveis, é que o juiz estará habilitado ao decreto de perempção8. Releva notar que a perempção, no caso, é uma pena, e não é admissível que seja aplicada sem respeitar o direito de defesa de quem haverá de suportá-la9.

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CPC/73, arts. 276, § 4º, e 807. “A chamada ‘medida liminar’, por definição, é proferida com base com cognição menos profunda do que a sentença (...). As ‘informações’ e a eventual manifestação do órgão ou pessoa jurídica de direito público a que pertence a autoridade coatora são elementos aptos a conduzir o magistrado ao aprofundamento de sua cognição” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 52). “Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária” (Súmula nº 405 do STF). Restou superada, vez por todas, a velha lição de HELY LOPES MEIRELES, “no sentido de que anterior liminar não revogada expressamente pela sentença deveria prevalecer (... Mandado de Segurança, p. 84)” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 52-53). CAREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à Nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 210-211. Há várias críticas sobre o emprego das expressões “perempção” e “decadência,” pela Lei nº 12.016, fora do significado que se costuma lhes dar. Para DECO-MAIN, por exemplo, “não se cuida efetivamente nem de situações de caducidade e nem de perempção... Nos dois casos focados no dispositivo, o que se apresenta, portanto, em última análise, são situações peculiares que devem conduzir à revogação da liminar, como sanção processual (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei

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12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 311). Não se tratando, porém, de vocábulos de sentido único, o importante é reconhecer que a lei é clara quanto ao objetivo por ela visado, com o seu emprego: extinguir a eficácia da liminar, nas condições arroladas, por meio de verdadeira revogação, isto é, através de decreto judicial (decisão interlocutória). NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 189. DECOMAIN sugere o prazo de 48 horas, a exemplo do que prevê o art. 267, § 1º, do CPC, para a extinção do processo por abandono da causa (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 312-313). CARREIRA ALVIM, op. cit., p. 212; DECOMAIN, op. cit., p. 312; CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 261 (com apoio em Celso Agrícola Barbi): “A propósito convém acrescentar que, mesmo cabível a atividade oficiosa do juiz, há que, por rigoroso atendimento ao contraditório, antes ouvir o impetrante, para somente depois, se ainda assim convencido da imputação, aplicar a penalidade legal” (CIANCI, op. cit., p. 267). Para DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, trata-se de penalidade imposta ao impetrante, para ele bastante salutar, por serem “válidas outras técnicas procedimentais que sancionem a parte que protela o andamento do processo que não seja a multa, ainda mais quando a parte se encontra na confortável situação de ser beneficiada por uma tutela de urgência satisfativa” (Ações constitucionais, cit., p. 190).

Capítulo X PROVIDÊNCIAS ADMINISTRATIVAS Art. 9º. As autoridades administrativas, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas da notificação da medida liminar, remeterão ao Ministério ou órgão a que se acham subordinadas e ao Advogado-Geral da União ou a quem tiver a representação judicial da União, do Estado, do Município ou da entidade apontada como coatora cópia autenticada do mandado notificatório, assim como indicações e elementos outros necessários às providências a serem tomadas para a eventual suspensão da medida e defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo de poder.

Comentários ao art. 9º 85. MEDIDAS ADMINISTRATIVAS PREPARATÓRIAS DA DEFESA DA PESSOA JURÍDICA Uma das maiores queixas dos órgãos de representação judicial do Poder Público refere-se à dificuldade de obtenção, junto aos órgãos burocráticos da Administração, dos dados e informações necessários à preparação da defesa dos atos administrativos, quando questionados em juízo. A estipulação de prazos processuais mais dilatados para a Fazenda Pública tem sido, entre outras, medida de adequação dos procedimentos às dificuldades e contingências do serviço público. O regime de presteza e eficiência da tutela realizada por meio do mandado de segurança não condiz com prazos alongados e entraves burocráticos de toda sorte. No interesse dos impetrantes, as dilações temporais devem ser breves. No interesse, porém, das pessoas jurídicas de direito público, devem seus procuradores contar com os informes dos agentes administrativos a tempo de defender, de forma útil e eficiente, os direitos e os poderes da Administração Pública. Para minimizar os entraves existentes, a Lei nº 12.016 cuidou de estabelecer prazos não só para a atuação no processo dos representantes judiciais das pessoas jurídicas de direito público, mas também para as comunicações internas da Administração entre os serviços burocráticos e os procuradores ou advogados que deverão atuar em juízo, na defesa dos interesses do Poder Público. Assim, tendo em vista o pequeno prazo processual disponível para interferir na marcha do processo do mandado de segurança, bem como a urgência evidente de que se reveste a defesa da Administração, principalmente quando ocorre a suspensão liminar do ato administrativo impugnado, o art. 9º da Lei nº 12.016 cria uma dinâmica específica a ser observada pelas autoridades administrativas. Consiste essa dinâmica no seguinte: uma vez deferida a liminar (art. 7º, III), a autoridade

coatora remeterá, no prazo máximo de 48 horas, ao órgão administrativo superior a que se acha subordinada, bem como ao órgão de representação judicial do Poder Público pertinente, informações e elementos necessários às providências a serem tomadas, (i) seja “para a eventual suspensão da medida”, (ii) seja para a defesa do ato atacado pelo impetrante (Lei nº 12.016, art. 9º)1. Tais providências independem de requisição, devendo ser tomadas, prontamente, por iniciativa da autoridade coatora, que diligenciará para que seus subordinados preparem os informes e elementos necessários, de modo que sejam levados, tempestivamente, ao conhecimento da procuradoria ou advocacia-geral a que estiver afeta a defesa do ato impugnado.

86. PROVIDÊNCIA ADMINISTRATIVA A CARGO DA AUTORIDADE COATORA O art. 9º da Lei nº 12.016, a exemplo do que já era preconizado pela Lei nº 4.348/1964, cria, para a autoridade coatora, um dever a ser cumprido na esfera administrativa, após ser ela notificada da medida liminar que suspendeu o ato impugnado. Trata-se, como já afirmado, da remessa, ao órgão administrativo a que o coator se acha vinculado e ao representante judicial da pessoa jurídica interessada, de peças e dados relacionados com o processo. Tal remessa – como já observado – é feita com o objetivo de municiar o representante judicial de informações e elementos “necessários às providências a serem tomadas para a eventual suspensão da medida e defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo” (art. 9º, in fine). A providência deverá ser tomada pelo coator nas 48 horas seguintes ao recebimento da notificação da medida liminar e compreenderá: (i) remessa de cópia autenticada do mandado notificatório; e (ii) fornecimento de indicações e elementos necessários à reação da entidade pública demandada contra a liminar e em defesa do ato impugnado. O art. 9º da Lei nº 12.016 tem sido criticado por criar, na via administrativa, uma segunda e desnecessária cientificação do mandado de segurança ao representante judicial da pessoa jurídica de direito público interessada, uma vez que o órgão judicial já se acha obrigado a realizar idêntica intimação, por força do art. 7º, II, da mesma lei2. A censura, todavia, não procede, porquanto as duas diligências têm objeto e finalidade distintos, ou seja: a)

a citação, determinada pelo art. 9º, II, se faz mediante remessa apenas de “cópia da inicial sem documentos”, tal como ocorre com qualquer ato citatório, cujo conteúdo não passa de resumida notícia da propositura da ação, acompanhada, geralmente, de simples cópia da petição inicial, e cujo objetivo fundamental é a abertura do prazo para contestação, ou resposta, do réu;

b)

a comunicação administrativa ordenada pelo art. 9º, por sua vez, tem como foco principal não o ajuizamento do mandado de segurança, e sim a concessão da liminar que suspendeu o

ato administrativo impugnado: compreende a remessa de cópia do mandado de notificação (recebido pelo coator), relativo à liminar, às esferas administrativas superiores e aos órgãos de representação judicial da pessoa jurídica; é este o objetivo imediato da diligência a ser cumprida pela autoridade coatora. Enquanto a cientificação judicial (citação) se contenta em dar notícia do ajuizamento do mandado de segurança, a comunicação da liminar, feita pela autoridade coatora, se faz acompanhar de todas as informações, de todos os esclarecimentos e de todos os elementos necessários à defesa do ato administrativo impugnado, e, sobretudo, à reação contra a liminar e em busca de suspensão imediata de seus efeitos, como deixa claro o art. 9º, in fine. Outrossim, deve-se levar em conta que a diligência do art. 9º não envolve ato judicial ou processual. Desenvolve-se no interior da Administração e, numa analogia prática, equivale aos contatos entre cliente e advogado, nos momentos de preparação da defesa a ser oportunamente produzida em juízo. Por fim, é interessante notar que, embora o decreto de suspensão do ato administrativo impugnado esteja, em regra, programado para o despacho da petição inicial, é perfeitamente possível (e ocorre com frequência) que se dê em fases ulteriores do processo, até mesmo em segundo grau de jurisdição. É claro, portanto, que, não estando a pessoa jurídica representada no processo (porque não se interessou, de início, pela defesa do ato praticado pelo coator), não receberá ela intimação judicial alguma, relativamente à notificação feita apenas à autoridade responsável, a quem cabe cumprir a medida liminar. Vê-se que, em casos como estes, avulta o significado do dever de proceder à comunicação e remessa de dados previstos no art. 9º da Lei nº 12.016.

87. PRAZO PARA A MANIFESTAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA INTERESSADA NOS AUTOS É ainda importante destacar que, não sendo a diligência praticada pela autoridade coatora um ato judicial, mas simples expediente interno da própria Administração, não serve como termo inicial de prazo para a eventual defesa que o representante judicial da pessoa jurídica interessada queira produzir no processo. A intimação que abre o prazo de resposta para o sujeito passivo da ação mandamental é aquela ordenada pelo art. 7º, II, e que é feita judicialmente ao respectivo representante judicial3.

88. REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA PESSOA JURÍDICA AFETADA PELO MANDADO DE SEGURANÇA Determina o art. 9º da Lei n 12.016 que a remessa da cópia da notificação da medida liminar

seja feita “a quem tiver a representação judicial” da pessoa jurídica de direito público interessada. Cumpre, pois, definir quem seja esse representante da entidade figurante no polo passivo da ação mandamental. A propósito da União Federal, sua representação em juízo está atribuída, pela Constituição, à Advocacia-Geral da União (CF, art. 131). É também a Constituição que prevê a representação judicial dos Estados e do Distrito Federal, pelos Procuradores, que se organizam em carreira, formando Órgãos especializados e permanentes (CF, art. 132). Quanto aos Municípios, o Código de Processo Civil determina que serão representados pelo Prefeito ou por seus Procuradores, no caso de inexistir Procuradoria institucionalizada (CPC/2015, art. 75, III4). As autarquias e as fundações de direito público representar-se-ão por seus dirigentes ou por seus procuradores institucionais, segundo a legislação própria. Quando pessoas jurídicas de direito privado se acharem no exercício de atividades do Poder Público, poderão ser sujeito passivo de mandado de segurança. Sua representação judicial, como dispõe o art. 75, VIII5, do CPC, caberá a quem “os respectivos atos constitutivos designarem”, ou, não os designando, aos “seus diretores”. É bom esclarecer que, nas concessões de serviços públicos e nas delegações de atribuições do Poder Público, o sujeito passivo do mandado de segurança não será o órgão concedente ou delegante, mas a entidade concessionária ou delegatária. É a esta, portanto, que será feita a comunicação do deferimento da liminar, cabendo a seus dirigentes a representação em juízo. Deve-se advertir, a propósito do assunto em foco, que a representação judicial, cogitada nos arts. 7º e 9º, não se confunde com aquela conferida ao advogado. Nos casos da União, dos Estados e do Distrito Federal, o representante judicial reúne as credenciais de órgão da pessoa jurídica de direito público e de procurador ad judicia. Porém, os municípios que se acham representados pelo Prefeito, e as pessoas jurídicas de direito privado, representadas por seus diretores, só podem praticar atos processuais mediante constituição de mandato em favor de advogado legalmente habilitado. Uma coisa, portanto, é ser o representante em juízo da pessoa jurídica, outra coisa é o poder de postular em juízo em defesa da pessoa jurídica. Na primeira hipótese, o representante age como órgão da pessoa jurídica; na segunda, como mandatário, dotado legalmente do jus postulandi. Dessa maneira, para que seja bem compreendida e aplicada a regra do art. 9º da Lei nº 12.016, nas hipóteses em que inexistam procuradorias institucionais, cabe à autoridade coatora cientificar a medida liminar à pessoa jurídica, e a esta competirá outorgar mandato judicial a quem irá postular, em seu nome, no processo. Não se admite, na espécie, que a intimação se faça diretamente ao advogado, porque este não é o órgão da pessoa jurídica que exerce função de agente público, mas apenas um prestador de serviços profissionais técnicos, de livre escolha do administrado público6.

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“A regra da necessária comunicação interna entre órgãos da Administração (a autoridade apontada como coatora e os órgãos de representação) passa a ser um imperativo do Estado de Direito, que deve internamente colher os elementos para sustentar o ato reputado ilegal ou reforçar os argumentos que lhe deram causa” (FONTES, André R. C. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.). Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 89). “O fato é que, diante da regra inequívoca do art. 7º, II, da Lei n. 12.016/2009, pela qual o órgão ou pessoa jurídica de direito público a que pertence a autoridade coatora será ‘cientificado’ da impetração, o art. 9º ora comentado torna-se regra realmente desnecessária, supérflua verdadeiramente” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 61). O dever da autoridade coatora, decorrente do art. 9º, de “encaminhar para a pessoa jurídica interessada cópia do mandado notificatório da decisão liminar revela, tão somente, um trâmite interno da administração pública” (PALHARINI JÚNIOR, Sidney. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 137-138). Por isso, nenhuma influência poderá ter sobre “o prazo para manifestação nos autos”. CPC/73, art. 12, II. CPC/73, art. 12, VI. CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 282.

Capítulo XI INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL Art. 10. A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração. § 1º Do indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau caberá apelação e, quando a competência para o julgamento do mandado de segurança couber originariamente a um dos tribunais, do ato do relator caberá agravo para o órgão competente do tribunal que integre. § 2º O ingresso de litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da petição inicial.

Comentários ao art. 10 89. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL Contém o art. 10 da Lei nº 12.016 três normas: (i) uma sobre o indeferimento liminar da petição inicial do mandado de segurança (caput); (ii) outra sobre o recurso manejável contra o referido indeferimento (§ 1º); e (iii) ainda outra sobre o ingresso de litisconsorte ativo no mandado de segurança, após o ajuizamento da causa. Analisando a primeira norma, verifica-se que o dispositivo sob apreciação determina o imediato indeferimento da petição inicial em três circunstâncias: a)

“quando não for o caso de mandado de segurança”;

b)

quando “lhe faltar algum dos requisitos legais”;

c)

“ou quando decorrido o prazo legal para a impetração”.

Em qualquer das hipóteses, exige o caput do art. 10 que a decisão seja “motivada”, determinação, aliás, óbvia, uma vez que é de preceito constitucional que todas as decisões do Poder Judiciário serão fundamentadas, “sob pena de nulidade” (CF, art. 93, IX). O que, com certeza, quis o legislador foi destacar que o indeferimento da inicial do mandado de segurança não é um simples despacho, mas uma autêntica sentença, e que, por isso, tem de se submeter à observância dos requisitos formais que são próprios dos atos judiciais da espécie (CPC/2015, art. 489, II1). O indeferimento, por não ser “o caso de mandado de segurança”, refere-se à condição do interesse de agir, que se manifesta de duas maneiras para viabilizar o acesso ao julgamento de mérito: pela necessidade e pela adequação da tutela judicial pleiteada2.

Não há, por exemplo, necessidade da tutela mandamental quando o direito subjetivo do impetrante não foi lesado por ato de autoridade, nem se acha ameaçado por parte de agente do Poder Público. É o que se passa com o mandado de segurança contra lei em tese, quando o impetrante não reúne, em torno de si, os elementos fáticos sobre os quais deverá incidir a norma legal impugnada3. Não há, outrossim, adequação do mandado de segurança quando o impetrante, mesmo tendo sofrido lesão ou ameaça em sua esfera jurídica, se acha numa daquelas situações em que o mandado de segurança não é a ação cabível para a composição do litígio descrito na inicial4. Por exemplo, o mandado de segurança não se presta a exercer a função de cobrança5, nem é remédio processual para tutelar direitos subjetivos não demonstráveis por meio de prova documental pré-constituída. Sem a comprovação liminar de liquidez e certeza do direito arguido pelo impetrante, ocorre a carência de ação, no tocante à via mandamental eleita. Nesses dois exemplos, o indeferimento da petição inicial não redunda em negação definitiva de acesso do impetrante à Justiça. O mérito de sua pretensão de direito material não é examinado. Apenas se recusa a apreciá-lo na via inadequada do mandado de segurança. Não haverá coisa julgada e a parte terá assegurada a possibilidade de renovar o mesmo pedido por meio de ação comum (Lei nº 12.016, art. 19)6. Para o STJ, deve-se aplicar subsidiariamente o Código de Processo Civil ao mandado de segurança, razão pela qual a ausência de requisito legal para o indeferimento da petição inicial alcançará as situações previstas na lei processual: “A regra inscrita no art. 8º da Lei 1.533/51 não afasta a possibilidade de indeferimento da petição inicial do mandado de segurança de acordo com o Código de Processo Civil. De fato, não apenas quando desprovido de algum dos requisitos da Lei 1.533/51 é possível o indeferimento da inicial do mandamus. Se presente alguma das hipóteses preconizadas no art. 295 do CPC também cabe a extinção do feito”7. O terceiro caso de indeferimento da petição inicial do mandado de segurança é o decurso do “prazo legal para a impetração”, que se acha definido no art. 23 da Lei nº 12.016 (120 dias contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado). O CPC/73 considerava a decadência do direito do autor razão para indeferimento da inicial. O CPC/2015, ao contrário, considera a decadência razão para julgar liminarmente improcedente o pedido, julgando o próprio mérito da ação, o que ocorre antes mesmo da citação do réu (art. 332, § 1º 8). Há, contudo, uma diferença profunda entre o tratamento do prazo decadencial pela Lei do Mandado de Segurança e o adotado pelo Código de Processo Civil. A decadência que leva à improcedência liminar do pedido, de acordo com o art. 332, § 1º, do CPC, diz respeito ao direito material do autor, de maneira que a decisão extintiva do processo, embora liminar, fará coisa julgada e impedirá renovação do pedido em qualquer outro processo. Já a decadência aludida nos arts. 23 e 10 da Lei nº 12.016 limita-se ao direito de usar a tutela do mandado de segurança. Não impede, por isso mesmo, que idêntico pedido, depois da caducidade do mandado de segurança, seja renovado pelas vias processuais ordinárias. Aqui, por conseguinte, tudo se passa no plano processual das

condições da ação. Salvo no caso de prescrição ou decadência (CPC/2015, art. 332, § 1º) e nas outras hipóteses do art. 332 do mesmo Código9, a interpretação jurisprudencial é no sentido de que não cabe indeferimento da petição inicial por razões de mérito da impetração10. No regime da lei anterior, havia divergência quanto a poder, ou não, o relator indeferir, pelo mérito, o mandado de segurança. O STF admitia essa possibilidade11, e o STJ decidia pelo não cabimento de indeferimento pelo relator12. Na lei atual, esse indeferimento está implicitamente previsto no art. 10, § 1º, em que se estabelece o recurso de agravo interno para o Colegiado, quando a inicial for indeferida pelo Relator, tendo sido adotada a orientação tradicional do STF. O indeferimento da petição inicial ocorre no limiar do processo, antes mesmo da citação do demandado, e o recurso cabível é a apelação, visto que configura sentença o ato que põe fim ao processo, com ou sem apreciação do mérito. A particularidade da apelação nesse caso consiste na sua subida imediata ao Tribunal, sem intimação da parte contrária para responder ao recurso (CPC, art.331, § 1º 13). É que o indeferimento ocorre, em regra, antes da angularização da relação processual, ou seja, em momento no qual essa relação se trava apenas entre o autor e o juízo14.

90. RECURSO CONTRA O INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL A regra do art. 10, § 1º, da Lei nº 12.016, de que cabe apelação da decisão que indefere a petição inicial do mandado de segurança, afina-se com o sistema comum do Código de Processo Civil. Com efeito, o processo se extingue sempre por sentença, seja ela terminativa (sem exame do mérito) ou definitiva (com resolução do mérito) (CPC, art. 1.00915)16. Há, contudo, um regime particular para a apelação no caso de indeferimento da petição inicial: ao juiz a lei faculta, no prazo de 5 dias, a possibilidade de reformar sua decisão (art. 331,caput, do CPC/2015). Se tal ocorrer, esvazia-se o recurso, por perda de objeto, podendo o processo retomar seu curso normal, por meio da citação do demandado. Quanto aos mandados de segurança de competência originária dos tribunais, o dispositivo legal sob exame preenche uma lacuna da legislação passada, ao instituir o agravo interno como recurso manejável contra a decisão singular do relator que decreta o indeferimento da inicial. Era, aliás, o que já previam, em regra, os regimentos internos dos Tribunais, para contornar a antiga falta de regulamentação legal para o caso, com o beneplácito da jurisprudência17. O relator, como é natural, também disporá da faculdade de retratar o indeferimento, da mesma forma que se passa com o juiz de primeiro grau.

91. LITISCONSÓRCIO ATIVO SUPERVENIENTE Há uma praxe, nos casos em que o direito discutido é igual para numerosos interessados (como,

v.ġ., se passa com vantagens de servidores públicos), de outras pessoas nas mesmas condições jurídicas do impetrante requererem sua admissão ao mandado de segurança já proposto. Enquanto a causa ainda não tiver se definido subjetivamente, não há empecilho a que, com o consentimento dos impetrantes primitivos, outros interessados venham consorciar-se com eles. Mas a Lei nº 12.016 cuidou de disciplinar a formação dessa modalidade de litisconsórcio facultativo superveniente, vedando o acesso de novos impetrantes após o despacho da inicial (art. 10, § 2º). Portanto, só se pode pensar em alargar o polo ativo do mandado de segurança antes que o juiz tenha deferido a inicial e ordenado a notificação da autoridade coatora. A admissão do litisconsórcio ativo facultativo, em caráter superveniente, no mandado de segurança, sempre foi tratada com muita cautela e resistência, porque por seu intermédio pode o aderente escolher o juízo que melhor lhe convenha, escapando da livre distribuição que deve presidir a fixação do juiz natural. Antes da regra do art. 10 da Lei nº 12.016, a jurisprudência procurava minimizar essa manobra, impedindo que a adesão ocorresse após as informações da autoridade coatora18. A nova Lei do Mandado de Segurança foi mais rigorosa e só a permitiu enquanto não proferido o despacho da petição inicial19. O que com essa intervenção litisconsorcial facultativa se alcança não é uma assistência em processo alheio. Aqui o que se prevê é uma inserção de terceiro no polo ativo do mandado de segurança como parte, ao lado dos impetrantes primitivos. É, pois, a ampliação de um dos polos da relação processual, no qual todos os figurantes exercitam o direito de ação, com pretensões próprias individualizadas e apenas similares. Por isso, é necessário que o direito de impetrar o mandado de segurança seja atual para cada um dos litisconsortes aderentes, ou seja, a admissão ao processo já em curso só será permitida se ainda não se esgotou o prazo decadencial previsto no art. 23 da Lei nº 12.01620. A intervenção no processo alheio de natureza singular ou individual deve, a nosso sentir, ser precedida de assentimento do impetrante, ou impetrantes originários, porque, quer queira quer não, o acréscimo de pretensões individuais aumentará o volume de atos procedimentais e do tempo de duração do processo21. De qualquer maneira, a lei restringiu bastante o ensejo temporal da ampliação subjetiva da impetração, limitando-a até o “despacho da petição inicial”. No entender de CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, “trata-se de alternativa eleita pela lei para inviabilizar em última análise, que o litisconsorte tardio ‘escolha’, dentre os vários juízos igualmente competentes para apreciar o seu pedido, aquele que, mercê de anterior concessão de medida liminar, já demonstrou ter se sensibilizado com a tese jurídica do impetrante originário. É solução que quer se afinar com o princípio do juízo natural, de estrutura constitucional”22. Também na jurisprudência a possibilidade de ingresso de litisconsortes supervenientes, sem qualquer limitação temporal, é de ser impedida “para que se preserve a garantia do juiz natural”23.

Sem dúvida, justifica-se seja curto o tempo para a inserção de litisconsortes ativos sucessivos, para evitar incidentes e novos debates que, à margem do pedido inicial, por certo alongarão o tempo de aguardo do provimento definitivo, comprometendo a garantia de duração razoável do processo e de obtenção rápida da solução do litígio (CF, art. 5º, LXXVIII).

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CPC/73, art. 458, II. “O interesse processual, a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial. Mesmo que a parte esteja na iminência de sofrer um dano em seu interesse material, não se pode dizer que exista o interesse processual, se aquilo que se reclama do órgão judicial não será útil juridicamente para evitar a temida lesão. É preciso sempre ‘que o pedido apresentado ao juiz traduza formulação adequada à satisfação do interesse contrariado, não atendido, ou tornado incerto’” (MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1990, v. I, n. 137, p. 176; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 59. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, v. I, n. 97, p. 167). “Não cabe mandado de segurança contra lei em tese” (Súmula nº 266 do STF). Lei nº 12.016/2009, art. 5º. “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança” (Súmula nº 269 do STF). Entre os casos de não cabimento do mandado de segurança, que levam ao indeferimento da petição inicial, pode ser arrolada a impetração contra ato de gestão comercial praticado por administrador de sociedade de economia mista, empresa pública ou concessionária de serviço público (Lei nº 12.016, art. 1º, § 2º). Não justificam o imediato indeferimento os defeitos ou deficiências formais da petição inicial, nem tampouco a falta ou insuficiência de documentos que deveriam instruí-la. Esses vícios, quando sanáveis, não ensejam o indeferimento da inicial, senão depois de dada oportunidade à parte para a emenda ou complementação daquela peça, tendo transcorrido in albis o prazo assinalado (CPC/2015, art. 321). STJ, 5ª T., AgRg nos EDcl no RMS 23.998/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 11.11.2008, DJe 01.12.2008. CPC/73, art. 295, IV. O Código anterior considerava a decadência motivo para indeferimento da inicial. “O indeferimento liminar da inicial do mandado de segurança pode ocorrer tanto pela não observância das regras processuais para o processamento do feito – ensejando a denegação do mandamus sem apreciação do mérito – como também pelo reconhecimento da decadência e pela aplicação do art. 285-A, do CPC, resultando no julgamento liminar de mérito. Aplica-se, subsidiariamente, o Código de Processo Civil ao procedimento previsto para a ação mandamental” (STJ, 2ª T., RMS 31.585/PR, Rel. Min. Castro Meira, ac. 06.04.2010, DJe 14.04.2010).

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“Indeferida liminarmente a petição inicial do mandado de segurança, não cabe ao Tribunal, no julgamento de recurso de apelação, ingressar no mérito do writ, pois não há falar em causa madura se a autoridade apontada como coatora não foi, em nenhum momento, notificada para prestar informações” (STJ, 5ª T., EDcl no REsp 723.426/PA, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 19.08.2008, DJe 20.10.2008). “Nos termos do art. 205 do Regimento Interno do STF, pode o Relator julgar monocraticamente pedido que veicule pretensão incompatível com a jurisprudência consolidada desta Corte, ou seja, manifestamente inadmissível. IV – Agravo regimental improvido” (STF, Pleno, MS 27.236 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 25.03.2010, DJe 30.04.2010). O acórdão foi pronunciado segundo o antigo texto do art. 205, modificado posteriormente pela Emenda Regimental n. 28/2009. A alteração, contudo, não modificou o poder do relator na parte aplicável ao caso decidido no acórdão. “É nula a decisão do relator que indeferiu liminarmente a segurança, escorada em razões de mérito” (STJ, 1ª T., RMS 12.532/DF, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 11.06.2002, DJU 23.09.2002, p. 224). No mesmo sentido: STJ, 5ª T., RMS 14.946/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 03.09.2002, RSTJ 169/487. CPC/73, art. 296, parágrafo único. “Em se tratando de indeferimento da inicial do mandado de segurança – portanto anteriormente à formação da relação processual –, aplica-se, por analogia, a regra do art. 296 do CPC, que não mais exige a citação da parte contrária para responder no recurso de apelação” (STJ, 2ª T., EDcl no RMS 15.750/RJ, Rel. Min. Castro Meira, ac. 09.03.2004, DJU 31.05.2004, p. 252). CPC/73, art. 513. “O dispositivo deve ser aplicado na hipótese de indeferimento total da petição inicial, porque, havendo o indeferimento apenas parcial, caberá o recurso de agravo de instrumento, já que a doutrina majoritária entende que esse pronunciamento judicial é uma decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 161). Segundo o CPC/2015, o agravo de instrumento, nessa hipótese, justifica-se pelo art. 1.015, II. STJ, 4ª T., RMS 11.994/GO, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac. 05.10.2004, DJU 29.11.2004, p. 340; STJ, 2ª T., RMS 14.810/DF, Rel. Min. Franciulli Netto, ac. 03.04.2003, DJU 04.08.2003, p. 246. “O litisconsórcio ativo só e admissível na instauração da lide ou, dependente do caso concreto, no decêndio das informações, evitando ofensa ao princípio da livre distribuição e como óbice a parte de escolher juiz certo para processar e julgar a ação” (STJ, 1ª T., AgRg no RMS 706/DF, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 18.11.1992, DJU 07.12.1992, p. 23.285). No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 7.307/DF, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 29.11.2001, DJU 25.03.2002, p. 163. Aliás, era jurisprudência também do STF a impossibilidade de aditamento ao pedido constante da inicial do mandado de segurança “depois que as informações já foram devidamente prestadas” (STF, 2ª T., RMS 27.920/DF, Rel. Min. Eros Grau, ac. 06.10.2009, DJe 04.12.2009; STF, 1ª T., RE 71.791/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 15.08.1972, DJU 01.09.1972, p. 5.720; STF, 1ª T., RE 73.800/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 18.08.1972, DJU 01.09.1972, p. 5.720). Em doutrina, Alexandre Freitas Câmara é mais rigoroso com o tratamento do litisconsórcio ativo superveniente, considerando como inadmissível sua formação “após a distribuição da petição

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inicial”. Explica o autor: é que, a prevalecer a permissão do § 2º, do art. 10, “ter-se-á criado a possibilidade de o interveniente, após a distribuição (e, portanto, já sabendo quem será o juiz da causa, o que lhe permitirá verificar a conveniência de se submeter à sua decisão ou não), decidir se ingressa ou não na relação processual. O § 2º do art. 10 da Lei 12.016/2009, então, viola aquilo que no direito alemão ficou conhecido como Willkürverbot, o ‘princípio da proibição da escolha do juiz’, o qual é um corolário do princípio do juiz natural. É, pois, inconstitucional este § 2º do art. 10 da Lei 12.016/2009, não se podendo admitir a intervenção de litisconsortes ativos após a impetração do mandado de segurança” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 78-79). São apontados como defensores do mesmo entendimento: ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 41; REDONDO, Bruno Garcia; OLIVEIRA, Guilherme Peres de; CRAMER, Ronaldo. Mandado de segurança. São Paulo: Método, 2009, p. 117; NEIVA, José Antonio Lisbôa. Mandado de segurança individual e coletivo. Lei 12.016/2009 comentada. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de. (coord). 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 95. Nesse sentido já decidiu o STJ: “Inadmissível a formação de litisconsórcio facultativo ativo após a distribuição do feito, sob pena de violação ao Princípio do Juiz Natural, em face de propiciar ao jurisdicionado a escolha do juiz. Precedentes do STJ” (STJ, 2ª T., AgRg no REsp. 1.022.615/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 10.03.2009, DJe 24.03.2009). “Litisconsortes facultativos. Só podem ingressar nos autos no prazo de impetração do mandado de segurança. Recurso extraordinário conhecido e provido, para denegar o mandado de segurança” (STF, 2ª T., RE 116.206/AM, Rel. Min. Carlos Madeira, ac. 17.06.1988, DJU 05.08.1988, p. 18.632, RTJ 127/1178). “Opera-se a decadência em relação ao impetrante, litisconsorte ativo facultativo, que postula seu ingresso na relação processual após o decurso do prazo de 120 dias da intimação no Diário Oficial do ato impugnado” (STJ, 1ª Seção, MS 8.957/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 14.11.2007, DJU 10.12.2007, p. 275). TFR, Pleno, AgRg no MS 110.899, Rel. Min. Gueiros Leite, ac. 12.12.1987, DJU 19.05.1988. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 67. STJ, 2ª T., REsp 1.221.872/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 16.08.2011, DJe 23.08.2011.

Capítulo XII DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DOS ATOS DE COMUNICAÇÃO PROCESSUAL Art. 11. Feitas as notificações, o serventuário em cujo cartório corra o feito juntará aos autos cópia autêntica dos ofícios endereçados ao coator e ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, bem como a prova da entrega a estes ou da sua recusa em aceitá-los ou dar recibo e, no caso do art. 4º desta Lei, a comprovação da remessa.

Comentários ao art. 11 92. DOCUMENTAÇÃO PROCESSUAL DA NOTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA E DA CITAÇÃO O art. 11 a Lei nº 12.016 deixa claro que a forma legal de notificar o coator para a prestação de informações sobre o ato impugnado, e para intimar (rectius: citar) a pessoa jurídica interessada para responder à ação, é o ofício expedido pelo juízo e entregue diretamente ao destinatário, seja por via postal ou por meio do escrivão ou do oficial de justiça. Não basta, porém, certificar nos autos a expedição do ofício; é necessário que a comprovação da entrega ao destinatário, ou de sua recusa em aceitá-lo ou de dar recibo, também fique certificada nos autos. Essa última certificação será feita pela juntada do “aviso de recepção”, se o ofício foi enviado por via postal; ou por juntada de recibo, se foi o escrivão quem entregou o ofício; ou por certidão do oficial de justiça, se foi ele quem portou o ofício notificatório, ou cumpriu a diligência por meio de mandado. Deve-se reconhecer, porém, que a juntada dos comprovantes dos atos de comunicação processual, na espécie, tem uma função maior do que a simples documentação da diligência. É por meio dela que se marca o termo a quo (termo inicial) para a fluência do prazo para prestação de informações e apresentação da resposta da pessoa jurídica interessada, em defesa do ato impugnado1. No caso das comunicações urgentes previstas no art. 4º, por meio eletrônico, o prazo fluirá, independentemente da juntada de comprovante de recepção da mensagem, bastando que seja comprovada a respectiva expedição (art. 11, in fine)2.

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CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 232; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova lei do Mandado de Segurança, cit., p. 69. “Assim, em caso de urgência, as notificações serão feitas por telegrama, radiograma ou outro meio que assegure a autenticidade do documento e a imediata ciência pela autoridade (§ 1º) e a comprovação de remessa será documento suficiente, muito embora essa providência tenha que assegurar o recebimento pelo destinatário” (CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 307).

Capítulo XIII MINISTÉRIO PÚBLICO Art. 12. Findo o prazo a que se refere o inciso I do caput do art. 7º desta Lei, o juiz ouvirá o representante do Ministério Público, que opinará, dentro do prazo improrrogável de 10 (dez) dias. Parágrafo único. Com ou sem o parecer do Ministério Público, os autos serão conclusos ao juiz, para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em 30 (trinta) dias. Súmulas: Súmula nº 99/STJ: O Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como fiscal da lei, ainda que não haja recurso da parte.

Comentários ao art. 12 93. PARTICIPAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO O Ministério Público atua, necessariamente, no mandado de segurança, a título de custos legis (fiscal da lei), de sorte que pode livremente opinar, tanto pela concessão da ordem impetrada, como por sua denegação, segundo o seu convencimento diante das circunstâncias do caso dos autos. A lei marca o prazo de dez dias para a emissão do parecer do representante do Ministério Público. Não se trata de um prazo preclusivo, de modo que será admitido aos autos, mesmo quando emitido além do termo final1. Serve, porém, dito prazo, para permitir ao juiz, no caso de descumprimento, ordenar a intimação para que devolva os autos ao cartório, em prazo assinado, sob pena de busca e apreensão2. De qualquer maneira, não fica a solução do processo na pendência do parecer do Ministério Público. Deixa claro o parágrafo único do art. 12 da Lei nº 12.016 que, “com ou sem o parecer do Ministério Público, os autos serão conclusos ao juiz, para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em trinta dias”3. Nos casos de indeferimento liminar da segurança, fato que pode ocorrer por decisão do juiz da causa, em primeiro grau de jurisdição, ou do relator nos processos de competência originária de tribunal, entende o STF que a deliberação independe de prévia intervenção do Ministério Público4. O Ministério Público, intervindo como fiscal da lei no mandado de segurança, disporá basicamente dos mesmos poderes conferidos às partes (i.e., impetrante e impetrada)5. Poderá, nessa qualidade, por exemplo, recorrer, ainda que a parte não haja recorrido6.

94. O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO IMPETRANTE DO MANDADO DE SEGURANÇA O art. 12 da Lei nº 12.016 cuida da atuação do Ministério Público como fiscal da Lei. Mas é certo que sua atuação no processo civil não se limita à de custos legis, pois são numerosos os casos em que age, ou pode agir, como titular do direito de ação. E quando se coloca em tal situação terá evidentemente legitimidade para o mandado de segurança. Nessa linha de entendimento, pode-se reconhecer legitimidade do Ministério Público para impetrar mandado de segurança, nas seguintes hipóteses: “a) para a tutela de direitos individuais indisponíveis (art. 127, caput, c/c o art. 5º, LXIX, ambos da CF; art. 82 do CPC [CPC/2015, art. 178]), situação em que ele atua como legitimado extraordinário; b) para a tutela de direitos coletivos ‘lato sensu’ (arts. 127, caput, e 129 c/c art. 5º, LIX, todos da CF; art. 5º da LACP e arts. 82, 83 e 91 do CDC etc.), sendo que nesta situação ele atuaria, em regra, como legitimado autônomo para a condução do processo; c) contra atos jurisdicionais omissivos ou comissivos na área penal ou não, hipótese em que a sua legitimidade será, em regra, idêntica à que justifica a sua atuação no processo que originou a decisão judicial que deu ensejo à impetração do mandado de segurança; d) e a preservação das garantias, prerrogativas e atribuições da própria instituição ou de seus órgãos de execução – nesta hipótese, o Ministério Público estará atuando como legitimado ativo ordinário no mandado de segurança”7. Na jurisprudência, vários são os precedentes dos Tribunais Superiores que reconhecem, em diversas situações, a legitimidade da impetração de mandado de segurança, como, por exemplo, na tutela dos direitos e interesses coletivos8 e na garantia de cumprimento de políticas sociais, como a educação pública9, na impugnação de decisões judiciais nos processos em que atua, na área penal ou civil10, e, ainda, na defesa de garantias e prerrogativas da própria função institucional11.

95. O REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMO AUTORIDADE COATORA O Ministério Público é instituição pública sem personalidade jurídica, pelo que, em regra, não terá legitimidade para ser parte passiva em mandado de segurança. Em casos, porém, de atrito entre o Ministério Público (no exercício de suas funções) e outras instituições também públicas, é possível cogitar-se da personalidade formal ou processual, podendo, assim, ocupar tanto o polo ativo como o passivo da ação mandamental.

No exercício normal de suas funções, em processo civil ou penal, nos inquéritos civis ou penais, é perfeitamente possível configurar-se, em detrimento de pessoas jurídicas privadas ou pessoas naturais, atos ilegais ou abusivos, prejudiciais a direitos subjetivos líquidos e certos. Configurados os requisitos legais da tutela mandamental, o prejudicado poderá impetrar o mandado de segurança, colocando o representante do Ministério Público como autoridade coatora12.

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“Em mandado de segurança, o prazo para a manifestação do Ministério Público como custos legis (art. 12 da Lei 12.016/098) não tem a mesma natureza dos prazos das partes, denominados próprios, cujo descumprimento acarreta a preclusão (art. 183 do CPC) [CPC/2015, art. 223]. Trata-se de prazo que, embora improrrogável, é impróprio, semelhante aos do juiz e seus auxiliares, a significar que a extemporaneidade da apresentação do parecer não o invalida, nem inibe o julgamento da demanda” (STJ, 1ª T., RMS 32.880/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.09.2011, DJe 26.09.2011). CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 235. Não prevalece, diante dos termos do parágrafo único do art. 12 da nova Lei do Mandado de Segurança, a antiga jurisprudência do STJ de que, “em sede de mandado de segurança, deve haver o efetivo pronunciamento do Ministério Público, não sendo suficiente a sua intimação, sob pena de nulidade” (STJ, 1ª T., REsp 541.199/MG, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 08.06.2004. DJU 28.06.2004, p. 195). Segundo a lei atual, ultrapassado o prazo marcado para emissão do parecer do Ministério Público, o juiz sentenciará, com ou sem o referido parecer. “Não é obrigatória a intervenção do Ministério Público se o mandado de segurança é indeferido de plano. Agravo regimental não provido” (STF, Pleno, MS 23.514 AgR/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 03.11.1999, RTJ 173/511). CPC/2015: “Art. 179. Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público: I – terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo; II – poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer. (...) Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica”. “Assim, poderá o órgão do Ministério Público: alegar as preliminares do art. 301 do CPC [art. 337 do CPC/2015], compatíveis com o mandado de segurança; alegar questões prejudiciais, inclusive sobre constitucionalidade de lei ou ato normativo...; requerer a concessão de medidas incidentais acautelatórias...; recorrer das decisões interlocutórias ou finais” (AL-MEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 333). “O Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como fiscal da lei, ainda que não haja recurso da parte” (Súmula nº 99 do STJ). ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 311. STJ, 1ª T., REsp 586.307/MT, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 14.09.2004, DJU 30.09.2004, p. 223.

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STJ, 2ª T., REsp 503.028/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.04.2004, DJU 16.08.2004, p. 191. “No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo” (Súmula nº 701 do STF). STF, Pleno, MS 21.239-0/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.06.1991, DJU 23.04.1993, p. 6.920; STJ, 1ª Seção, MS 8.349/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 09.06.2004, DJU 09.08.2004, p. 162. O problema tem sido o de definir a competência, se do juízo originário dos Tribunais, ou do juízo de primeiro grau de jurisdição. O STF já decidiu que a competência seria do TRF, se a coação fosse atribuída ao Procurador da República, e ao Tribunal de Justiça, se o ato impugnado fosse do Promotor de Justiça (STF, 2ª T., RE 141.211-9/SP, Rel. Min. Néri da Silveira, ac. 26.05.1992, DJU 24.08.1992, p. 13.456; ALMEIDA, Gregório Assagra de. Op. cit., p. 320: “É o que tem prevalecido na doutrina e na jurisprudência, existindo decisão nesse sentido inclusive do STF”). Observa, porém, o mesmo autor, que o STJ já decidiu que a competência seria do juízo federal de primeiro grau, quando o coator for membro do Ministério Público do Trabalho, atuando em mediação coletiva (STJ, 1ª Seção, CC 38.667/SE, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 10.12.2003, DJU 16.12.2003, p. 200).

Capítulo XIV EXECUÇÃO DA SENTENÇA Art. 13. Concedido o mandado, o juiz transmitirá em ofício, por intermédio do oficial do juízo, ou pelo correio, mediante correspondência com aviso de recebimento, o inteiro teor da sentença à autoridade coatora e à pessoa jurídica interessada. Parágrafo único. Em caso de urgência, poderá o juiz observar o disposto no art. 4º desta Lei.

Comentários ao art. 13 96. AUTOEXECUTIVIDADE DA SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA A ação que a Constituição concebeu como garantia de todos contra as ilegalidades e abusos de poder das autoridades públicas não corresponde a um simples processo de conhecimento para declaração de direitos individuais. Nem se limita, conforme já demonstrado, a produzir uma condenação preparatória de futura execução forçada contra o Poder Público. É, sabidamente, um procedimento especial, que foge aos padrões usuais do direito processual civil, e adota, para suas decisões, uma imediata e implícita força executiva contra os atos administrativos viciados. Acolhida a impetração, o juiz vai muito além da simples declaração e condenação. Expede, diretamente, ordem ao coator e à pessoa jurídica a que este se acha vinculado, para cumprimento imediato1. É, por isso, que se fala, na espécie, em ação mandamental. No tocante à autoridade coatora, a ordem emanada do juiz da ação mandamental não se destina, necessariamente, à pessoa física do agente público que praticou o ato impugnado. Se a função, no curso do processo, foi transferida ou delegada a outro titular do organismo público, “a decisão do judiciário será dirigida ao delegatário”2 ou sucessor. O que importa, na espécie, é o cargo ou função, e não o funcionário que os ocupe. A forma de intimar e fazer cumprir a sentença é sui generis, como se depreende do art. 13 da Lei nº 12.016. O mandado é encaminhado, pessoalmente, à autoridade coatora, a quem não cabe modalidade alguma de impugnação ou embargo. Qualquer tipo de resistência ao pronto cumprimento da ordem judicial sujeitará o recalcitrante a penas disciplinares e criminais, correspondentes à desobediência (Lei nº 12.016, art. 26). O juiz, tal como se passa com a execução das obrigações de fazer em geral (CPC/2015, art.

4973), poderá valer-se de todos os instrumentos coercitivos do Poder Público tendentes a sujeitar a autoridade coatora à efetivação da ordem de segurança. Não se descarta nem mesmo a prisão em flagrante, uma vez que, conforme já afirmado, a resistência, no caso, corresponde ao crime de desobediência, tipificado no art. 330 do Código Penal.

97. A FORMA DE COMUNICAÇÃO E CUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA De acordo com o art. 13 da Lei nº 12.016, a forma de comunicar o deferimento do mandado de segurança não segue a sistemática comum das intimações de sentença civil. Tão logo concedido o mandado, o próprio juiz se encarrega da devida comunicação à autoridade coatora e à pessoa jurídica interessada (iė., aquela entidade a que se acha vinculado o coator). Essa comunicação, que vale como ato intimatório e executório, é feita por meio de correspondência (ofício), firmada pelo magistrado, e que será encaminhada: (i) por intermédio de oficial de justiça; ou (ii) pelo correio, mediante registro com aviso de recepção. A comprovação de cumprimento da diligência, nos autos, far-se-á por meio do recibo colhido pelo oficial de justiça, ou por certidão dele, se houver recusa em firmar o recibo. No caso de remessa postal, o “Aviso da Recepção” será o comprovante a ser juntado dos autos. A previsão legal de intimação por meio de ofício não exclui a opção do juízo de usar a via comum do mandado a cargo de oficial de justiça, se essa via, nas circunstâncias do caso, se revelar mais cômoda e eficiente. Adotada, porém, a execução da sentença por ofício, dispensado estará o mandado de intimação4. Em casos de urgência, a comunicação pode ser efetuada por meio eletrônico, conforme autoriza o parágrafo único do art. 13, desde que viabilize a comprovação de autenticidade do ato judicial (art. 4º)5. Qualquer que seja o meio utilizado para a comunicação da sentença deferidora da segurança, o que quer a lei é sua consumação urgente quanto possível, a fim de que os destinatários acatem e cumpram, de imediato, a ordem contida no provimento judicial. Por isso, o sistema de comunicação processual específico da Lei nº 12.016 afasta o regime comum do Código de Processo Civil. O impetrado, por exemplo, não tem de aguardar a publicação da sentença no Diário Oficial para darlhe cumprimento, e o prazo para recurso também flui a partir da intimação pessoal cumprida nos moldes do art. 13 sub examine6. Observar-se-á, naturalmente, quanto ao dies a quo da contagem do prazo recursal, o disposto no art. 231 do CPC7. Contudo, para fluência do prazo recursal, não basta intimação de autoridade coatora. É necessária a comunicação pessoal ao representante judicial da pessoa jurídica interessada, pois é esta o verdadeiro sujeito passivo da ação de mandado de segurança. A Súmula nº 392 do STF, no regime da Lei nº 1.533/195, que só previa a comunicação pessoal

da sentença à autoridade coatora, determinava que o prazo de recurso deveria ser contado da publicação oficial da sentença, e não da anterior ciência ao coator para cumprimento da decisão8. Agora, o sistema de comunicação da sentença é outro: a intimação pessoal se faz, após a sentença, tanto à autoridade coatora, como à pessoa jurídica interessada, sem depender de publicação na imprensa oficial. É necessário, no entanto, que a cientificação da pessoa jurídica se dê em seu representante judicial, caso contrário não se pode cogitar de curso do prazo do recurso, ato que só ele tem legitimidade para praticar9. Note-se, por último, que o regime especial de intimação pessoal só foi instituído para o caso de sentença concessiva da segurança, e só se aplica à autoridade coatora e à pessoa jurídica a que aquela se vincula. Por conseguinte: (i) não se aplica ao impetrante, que será intimado sempre pelos meios processuais comuns; (ii) não será observado, tampouco em relação aos impetrados (coator e pessoa jurídica interessada), quando a sentença for de denegação ao mandado de segurança, hipótese em que, também, a intimação, tanto do sujeito ativo como do passivo, observará o sistema da legislação comum10. Contra o descumprimento da ordem judicial expedida nos termos da sentença do mandamus, não cabe recurso em sentido técnico, mas apenas o requerimento de diligências do juízo para sujeitar a autoridade coatora e a pessoa jurídica interessada ao comando da decisão concessiva da segurança. No âmbito da competência do STJ, tem sido decidido reiteradamente que a reclamação (CF, art. 105, I, f) é o veículo adequado para garantir o cumprimento de decisão daquela Corte proferida em mandado de segurança, “sujeitando o funcionário contumaz às penas definidas na legislação pertinente”11.

98. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA QUE DEFERE O MANDADO DE SEGURANÇA O ato de comunicação regulado pelo art. 13 da Lei nº 12.016 não se resume a uma simples intimação de sentença. Sua maior função, e primeira finalidade, é intimar o coator e a pessoa jurídica interessada ao cumprimento, ou execução, da ordem deferida em favor do impetrante. A sentença concessiva do mandado de segurança, para cumprir a função que a Constituição lhe reserva, “tem eficácia plena e imediata”, de sorte que a única maneira de impedir seu pronto cumprimento “é pela obtenção (pela pessoa jurídica de direito público) de sua suspensão, como prevê o art. 15 da Lei nº 12.016/2009, ou pela obtenção de efeito suspensivo a recurso de apelação eventualmente interposto nos termos do parágrafo único do art. 558 do Código de Processo Civil”12. Atribuiu-se um plus à sentença que concede a segurança, em relação às demais sentenças, uma vez que, diante destas, as partes são apenas intimadas de sua prolação, enquanto a mandamental, “por conter uma ordem ou comando (e não apenas uma condenação) dirigido à autoridade impetrada e à

pessoa jurídica interessada, é transmitida por ofício, em seguida à sua prolação, para que seja imediatamente cumprida”13. E para que esse cumprimento seja realmente completo e efetivo, a intimação da sentença se faz tanto ao coator como à pessoa jurídica a que ele se acha vinculado, de modo que o alcance da medida tutelar deferida ao impetrante possa repercutir não só na esfera de atribuições da autoridade coatora, mas também da pessoa jurídica impetrada, se outras consequências deverão ser cumpridas ou suportadas pela entidade.

99. ALGUNS EXPEDIENTES UTILIZÁVEIS PARA CONFERIR EFETIVIDADE AO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA A ordem expedida em função do deferimento da segurança pode compreender ações ou omissões impostas à impetrada das mais variadas naturezas, como, entre outras, as de entregar coisa, pagar quantia certa, ou fazer ou desfazer algum ato administrativo, ou ainda, simplesmente, deixar de praticá-lo. Nos casos de cumprir prestação pecuniária ou de entrega de coisa, a execução, quando descumprida a ordem, seguirá o procedimento previsto no Código de Processo Civil para o cumprimento de sentenças contra o Poder Público. Tratando-se de condenação relacionada com as obrigações de fazer ou não fazer, aplicam-se à sentença do mandado de segurança as regras executivas previstas pelo CPC nos arts. 497 e seguintes, sendo de ressaltar que o comando emergente do writ contém, quase sempre, a imposição ao impetrado de um facere ou um non facere. Por isso, têm cabimento as medidas de coerção e apoio elencadas na referida disposição codificada, dentre as quais a multa por atraso no cumprimento da decisão judicial (art. 53714), sem prejuízo da multa de litigante de má-fé prevista no art. 77, § 2º a 6º 15, do mesmo Código16. Segundo o disposto no caput da norma processual em referência, o juiz, ao julgar procedente o pedido, “determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente” da obrigação a cargo do demandado. Dentre os meios sub--rogatórios utilizáveis, o próprio Código de Processo Civil cataloga um, que a doutrina reconhece como aplicável ao cumprimento da sentença mandamental: (i) o do art. 50117, ou seja: “na ação que tenha por objeto a emissão de declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o pedido, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida”; e o Código Civil, outro, aplicável à obrigação de celebrar contrato definitivo: (ii) o do art. 464, no qual se prevê que: “esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação”. DECOMAIN dá dois exemplos interessantes em que a sentença do mandado de segurança pode adotar esses mecanismos de cumprimento forçado do writ:

a)

O primeiro é o da sentença (ou da liminar) que ordena a expedição de certidão negativa de débitos tributários. Não sendo cumprida a ordem judicial, o juiz poderá fazer com que sua própria decisão substitua a certidão não expedida no prazo assinalado. Para tanto, o impetrante poderá obter certidão do órgão judicial, retratando o decisório que atribuiu a si mesmo a força de valer como a certidão sonegada pela autoridade coatora. A certidão judicial, dessa forma, fará as vezes da certidão administrativa18.

b)

O segundo exemplo é o da sentença que defere a segurança para ordenar a assinatura de um contrato a que o impetrante tem direito, em razão de certame licitatório no qual saiu vitorioso, e, não obstante, a administração está ilicitamente adjudicando a obra ou serviço a outro concorrente. A sentença, acolhendo a impetração, anulará o contrato indevido e ordenará sua pactuação com o impetrante. A autoridade coatora será notificada a celebrar o contrato devido, sob pena de, ultrapassado o prazo assinalado judicialmente, a própria sentença substituir o contrato não ultimado19.

Uma vez que o exercício da jurisdição se acha condicionado e limitado pelo pedido da parte – ne procedat iudex ex officio (CPC, art. 2º) –, para que a substituição autorizada pelo art. 501 do CPC/2015 e 464, do CC ocorra no caso concreto, é necessário que o impetrante faça constar a respectiva pretensão cominatória da petição inicial do mandado de segurança, evitando, assim, o risco de arguição de decisão ultra petita, ao tempo do julgamento da causa ou do cumprimento da sentença. O STJ reconhece a possibilidade de o juiz, no mandado de segurança, adotar medidas excepcionais para que se alcance o resultado prático equivalente. Entretanto, tratando-se de mandado de segurança para fornecimento de medicamento, é essencial que esteja presente o risco de grave comprometimento da saúde do impetrante: “1. Dispõe o art. 461 do Código de Processo Civil [CPC/2015, art. 497] que, na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer, o juiz poderá aplicar multa diária ou mesmo determinar o bloqueio de bens para assegurar o resultado prático equivalente ao adimplemento da tutela concedida. 2. Nesse sentido, este Superior Tribunal, sob o regime do art. 543 -C do CPC [CPC/2015, art. 1.036], entendeu que, ‘tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe ao Juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo, se necessário, determinar até mesmo, o sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação’ (REsp 1.069.810/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 6/11/2013). 3. No entanto, o STJ considera que o citado procedimento é medida excepcional, que só é legítima ‘para o fim de garantir o fornecimento de medicamento à pessoa que dele

necessite, quando houver o risco de grave comprometimento da saúde do demandante’ (RMS 35.021/GO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 28/10/2011). 4. Na espécie, contudo, inexiste demonstração de justificado receio de ineficácia da ordem mandamental, isto é, de que o Estado de Goiás não esteja cumprindo o aresto recorrido. Inviável, portanto, a adoção da providência pleiteada”20.

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Por isso que “a intimação da autoridade coatora já é o suficiente para a decisão se tornar eficaz, considerando-se ser a ela dirigida a ordem contida na sentença concessiva do mandado de segurança” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 165). STJ, 3ª Seção, MS 2.837/DF, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 19.08.1993, DJU 21.02.1994, p. 2.089. CPC/73, art. 461. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 268-269. “Tem sido comum também o encaminhamento mediante telegrama ou mesmo leitura por telefone diante de eventos ocasionais como a ausência de Oficiais de Justiça no local, bem como carente de serviços postais. No mesmo sentido, procede-se quando a decisão é proferida em regime de plantão, em horário noturno ou em sábados, domingos e feriados. Nesses casos, deve-se certificar o corrido nos autos físicos ou virtuais” (NASCIMENTO FILHO, Firly. Mandado de segurança individual e coletivo. Lei 12.016/2009 comentada. İn: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de. (coord). 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 103-104). É da intimação do representante judicial da pessoa jurídica interessada, feita nos termos do art. 13 da Lei nº 12.016, que fluirá o prazo de recurso contra a sentença deferidora do mandado de segurança. “A lei, nesse sentido, parece querer excepcionar a regra do Código de Processo Civil, de que as intimações, inclusive as para fins recursais, dependem de publicação na imprensa oficial. Aqui, a exigência da intimação pessoal... prevalece sobre a regra geral” (BUENO, Cassio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 76). CPC/73, art. 241. CPC/2015: “Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo: I – a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação ou intimação for pelo correio; II – a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou intimação for por oficial de justiça; §1º: Quando houver mais de um réu, o dia do começo do prazo para contestar corresponderá à última das datas a que se referem os incisos I e VI do caput”. “O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade para cumprimento da decisão” (Súmula nº 392 do STF). STJ, 2ª T., REsp 1.186.726/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 11.05.2010, DJe 21.05.2010.

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“Registre-se que o enunciado da Súmula 392 do Supremo Tribunal Federal, ao estabelecer que o prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade coatora para cumprimento da decisão, está superado, considerando-se que os sujeitos que têm legitimidade recursal serão pessoalmente intimados e o início para a contagem do prazo não deverá mais ser contado da publicação da decisão no Diário Oficial” (NEVES, Daniel Assumpção Amorim. Ações constitucionais, cit., p. 165). CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à Nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 240; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 77. ALEXANDRE CÂMARA, todavia, entende que, por razões práticas, se deva fazer a comunicação por ofício, da sentença tanto concessiva, como denegatória, também ao impetrante e ao coator, porque ambos podem ter interesse no seu rápido cumprimento, em circunstâncias como a da cessação de efeitos da medida liminar (Manual do mandado de segurança, cit., p. 269-270). STJ, 1ª Seção, Rcl 131/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 18.05.1993, RSTJ 50/63; STJ, 2ª T., REsp 134.547/DF, Rel. Min. Franciulli Netto, ac. 06.04.2000, RSTJ 134/186; STJ, 3ª Seção, MS 2.904/DF, Rel. Min. Adhemar Maciel, ac. 07.10.1993, DJU 22.11.1993, p. 24.872. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 76. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à Nova Lei do Mandado de Segurança, cit, p. 238. CPC/73, art. 461, §§ 4º e 5º. CPC/73, art. 14, parágrafo único. CÂMARA, Alexandre Freitas. Mandado de segurança, cit., p. 274-275. CPC/73, art. 466-A. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 560. DECOMAIN, Pedro Roberto. Op. cit., p. 560-561. Observa o autor que “os dois dispositivos do CPC, aos quais se aludiu, podem representar, portanto, se oportunamente aplicados em âmbito de mandado de segurança, instrumentos a mais no sentido do reforço da eficácia deste remédio constitucional contra ações ou omissões ilegais ou abusivas do Estado, que violam ou ameaçam violar direito líquido e certo de qualquer pessoa” (Op. cit., p. 561). STJ, 2ª T., AgRg no RMS 44.502/GO, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 18.06.2014, DJe 25.06.2014.

Capítulo XV RECURSOS Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação. § 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição. § 2º Estende-se à autoridade coatora o direito de recorrer. § 3º A sentença que conceder o mandado de segurança pode ser executada provisoriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar. § 4º O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial. Súmulas: Súmula nº 271/STF: Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria. Súmula nº 626/STF: A suspensão da liminar em mandado de segurança, salvo determinação em contrário da decisão que a deferir, vigorará até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração. Súmula nº 45/STJ: No reexame necessário, é defeso, ao tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.

Comentários ao art. 14 100. O SISTEMA RECURSAL DA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA Ao tempo da Lei nº 1.533, o legislador se comportou com extrema avareza na disciplina do sistema recursal do mandado de segurança. Praticamente só cuidou, de forma explícita, do recurso contra a sentença pronunciada no primeiro grau de jurisdição. Essa atitude conduziu a jurisprudência a sérias divergências em torno da aplicabilidade, ou não, do CPC, em caráter subsidiário ao processo da ação mandamental, mormente em relação às decisões de liminar, tanto no juízo de primeira instância como nas ações de competência originária dos tribunais. A Lei nº 12.016 optou por uma política bem diferente e instituiu sistema detalhado para as diversas possibilidades recursais dentro do procedimento do mandado de segurança. Seguindo linha afinada com as sugestões formuladas pela doutrina e prestigiada por significativas correntes jurisprudenciais, foram previstos os seguintes recursos:

a)

agravo de instrumento, manejável tanto contra o indeferimento como contra o deferimento da medida liminar por ato do juiz de primeiro grau (art. 7º, § 1º)1;

b)

agravo interno, manejável nos mandados de segurança de competência originária de tribunal, contra decisão singular do relator que indefira a inicial (art. 10, § 1º)2;

c)

agravo interno, contra decisão do relator que conceda ou denegue a medida liminar (art. 16, parágrafo único)3;

d)

agravo interno, contra decisão do presidente do tribunal que suspende a execução da liminar ou da sentença (art. 15, caput)4; e) recurso especial e recurso extraordinário das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pelos tribunais, nos casos legalmente previstos (art. 18)5;

f)

recurso ordinário, quando, em causa de competência originária de tribunal, a ordem for denegada (art. 18, in fine);

g)

apelação da sentença do juiz de primeiro grau que denegue ou conceda o mandado (art. 14)6;

h)

apelação contra o indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau (art. 10, § 1º)7.

A par do recurso de apelação, a sentença de primeiro grau que conceder a segurança ficará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição (art. 14, § 1º), sem que isto, porém, prejudique sua execução provisória (art. 14, § 3º)8. Os embargos infringentes foram taxativamente vedados no processo de mandado de segurança (art. 25)9. Prestigiou-se, dessa maneira, a jurisprudência consolidada do STF10 e do STJ11.

101. APELAÇÃO CONTRA A SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA A sentença que concede ou denega o mandado de segurança desafia recurso de apelação, tal como ocorre no regime geral do Código de Processo Civil (Lei nº

12.016, art. 14, caput). Não é, porém, apenas contra o julgamento de mérito que o referido recurso é manejável. Comportam apelação todas as modalidades de sentença, sejam definitivas ou terminativas, sejam liminares ou finais, desde que ponham fim ao processo, resolvendo ou não o mérito da causa. É apelável, portanto, decisão que indefere a petição inicial, nos casos do art. 485 do CPC/2015 (Lei nº 12.016, art. 6º, § 5º), e nas hipóteses de petição inicial inepta, nos termos do art. 10, caput, e § 1º, da Lei nº 12.016, além do julgamento final e definitivo do mandado de segurança, em primeiro grau de jurisdição (Lei nº 12.016, art. 14)12.

Tratando-se de indeferimento da petição inicial, o recurso de apelação tem uma particularidade: enseja o juízo de retratação pelo juiz da causa, de maneira que, em vez de determinar a subida dos autos, o prolator da sentença pode revogá-la, ordenando o prosseguimento do feito (CPC/2015, art. 331). Não há previsão na Lei do Mandado de Segurança acerca dos efeitos em que a apelação deve ser recebida. Fica implícito, todavia, que o recurso não tem efeito suspensivo, porque o § 3º do art. 14 prevê a exequibilidade imediata da sentença, como regra geral. Não se trata, outrossim, de sistema eficacial aplicável apenas às sentenças concessivas da segurança. Todas as sentenças – tanto as que deferem como as que denegam a ordem – produzem efeito imediato, haja ou não a interposição de recurso13. Nesse sentido é a doutrina mais atualizada: “a ausência de efeito suspensivo predomina tanto para a sentença concessiva como para a sentença denegatória que cassa a liminar anteriormente concedida (Súmula 405/STF)”14. Há, contudo, um caso em que a apelação da sentença, mesmo concessiva, tem eficácia suspensiva, que ocorre quando o mandado de segurança se enquadra nas hipóteses em que a lei impede a concessão de liminar (Lei nº 12.016, art. 14, § 3º, e art. 7º, § 2º). O intuito da lei, in casu, é evidentemente o de impedir a execução provisória, deixando claro que, sempre que a medida liminar estiver vedada, a sentença só será exequível depois de transitada em julgado15.

101.1. Atribuição excepcional de efeito suspensivo à apelação Admite o art. 1.012, § 3º 16, do CPC/2015, que, tendo sido a apelação recebida apenas com efeito devolutivo, possa a parte requerer a concessão do efeito suspensivo ao tribunal ou ao relator – dependendo se o recurso já houver sido distribuído no tribunal ou não. Para que isso ocorra, exige a lei dois requisitos que deverão ser comprovados pelo recorrente: (i) o risco de lesão grave e de difícil reparação, caso se dê cumprimento imediato à sentença (periculum in mora), e (ii) a relevância da fundamentação do recurso (fumus boni iuris) (art. 1.012, § 4º). A jurisprudência17 e a doutrina18 estão acordes em que o regime do art. 1.012 do CPC é aplicável à apelação quando interposta no processo do mandado de segurança. Havia acórdãos, à época do CPC de 1973, no sentido de que a pretensão de alterar os efeitos com que a apelação foi recebida deveria ser manifestada por meio de agravo de instrumento, e não de medida cautelar19. Desde, porém, a Lei nº 9.139/1995, que deu redação nova ao parágrafo único do art. 558 do CPC/1973, a obtenção de efeito suspensivo para apelação independia tanto de agravo como de medida cautelar. Bastava um simples requerimento endereçado ao Relator para que, comprovados os requisitos apontados no caput daquele artigo, fosse suspenso o cumprimento da decisão recorrida20. Esse continua sendo o método no Código atual, nos termos do art. 1.012, §§ 3º e 4º.

Da decisão do relator não cabe recurso, com efeito suspensivo, in casu. Logo, não obtido o efeito suspensivo requerido, o caso será, em tese, de admissibilidade do mandado de segurança, se, naturalmente, se fizerem presentes os requisitos desse remédio constitucional21.

101.2. Prazo para interposição da apelação Ao tempo de vigência da Lei nº 1.533/1951, a Súmula nº 392/STF previa que o prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança seria contado da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência da autoridade para cumprimento da decisão. Essa orientação não pode prevalecer no regime atual decorrente da Lei nº 12.016/2009, porque, agora, há previsão expressa de expedição de ofício intimatório do órgão de representação judicial da pessoa jurídica demandada (arts. 7º, II, e 13), ou seja, daquela que ocupa o polo passivo da ação mandamental. Assim, o prazo da apelação contra o deferimento da segurança flui a partir da entrega do ofício a seu destinatário, sendo o dies a quo da contagem fixado em função da juntada do respectivo comprovante aos autos (CPC/2015, arts. 231, I e II, e 1.00322). Para o impetrante, o prazo recursal observa inteiramente o regime do CPC, isto é, não corre da ciência pessoal da sentença dada à parte, mas da intimação de seu advogado, feita de ordinário por meio da publicação da sentença no Diário Oficial23. Não havendo disposição especial na Lei do Mandado de Segurança, a apelação sujeitar-se-á ao prazo de 15 dias estatuído pelo art. 1.003, § 5º 24 do CPC/2015, cuja contagem será em dobro para as pessoas jurídicas de direito público e para o Ministério Público (art. 18025 do CPC/2015)26.

102. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO NECESSÁRIO O reexame necessário, ou duplo grau de jurisdição obrigatório, se impõe diante de toda sentença que conceda a segurança (Lei nº 12.016, art. 14, § 1º). Segundo o CPC, o reexame necessário se apresenta como “condição legal de eficácia da sentença”. Ou seja: quando a lei o impõe, a sentença não produz efeito “senão depois de confirmada pelo tribunal” (CPC, art. 496, caput27). Por isso, tal confirmação independe de recurso ou requerimento da parte: “não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á” (art. 496, § 1º). Dentro do regime do duplo grau de jurisdição obrigatório, a sentença não transita em julgado enquanto não for confirmada em segunda instância. O CPC submete uma causa ao duplo grau de jurisdição, levando em conta a parte vencida, que haverá de ser pessoa jurídica de direito público (art. 496, I e II). A Lei nº 12.016 estabelece a obrigatoriedade de reexame, não em função das pessoas, mas do objeto do processo e da natureza da sentença. Assim, sendo a sentença concessiva da segurança, caberá o duplo grau, mesmo quando o

sujeito passivo for pessoa jurídica de direito privado, no exercício de atividade própria do Poder Público. Não se impõe o reexame necessário em relação a todas as sentenças do mandado de segurança, mas apenas às que deferem a ordem. Não cabe essa providência processual quando a decisão é denegatória, nem quando se trata de deferimento de liminar por meio de decisão interlocutória28. Em doutrina, há quem defenda a não aplicação do duplo grau de jurisdição ao mandado de segurança nos casos em que o CPC o dispensa (art. 495, §§ 3º e 4º), ou seja, quando o valor econômico em jogo não ultrapassar, a depender do ente público, 1.000 (mil), 500 (quinhentos) ou 100 (cem) salários mínimos, ou quando a concessão da ordem se fundar em súmula, acórdão ou entendimento do STF, STJ ou do Tribunal Superior competente29. A jurisprudência, todavia, tem seguido, majoritariamente, o entendimento de que as restrições do CPC (art. 496) não se estendem ao mandado de segurança, visto achar-se o seu procedimento sob regime normativo especial onde tais limitações não se acham previstas30.

103. RECURSO DA AUTORIDADE COATORA A Lei do Mandado de Segurança não coloca a autoridade coatora no polo passivo da ação, que é ocupado apenas pela pessoa jurídica a que o coator se vincula. Sua participação no processo se dá como órgão da administração, que se acha obrigado a prestar informações sobre o ato que, nessa qualidade, tenha praticado. Está, ainda, obrigado legalmente a dar cumprimento à ordem de segurança que o juiz expedir, muito embora tal comando não interfira em sua esfera jurídica, e sim na da pessoa jurídica impetrada. Antes da Lei nº 12.016, a jurisprudência do STF limitava a legitimidade para recorrer da sentença do mandado de segurança ao ente público ocupante do polo passivo da ação, negando-a, de maneira expressa, à autoridade coatora31. No STJ, registravam-se pronunciamentos que, na esteira do STF, entendiam que “a legitimidade para interpor recurso contra decisão proferida em sede de mandado de segurança pertence à pessoa jurídica de direito público a que se vincula a autoridade apontada como coatora, e que suportará o ônus da sentença”32. A corrente majoritária, todavia, reconhecia ao coator legitimidade para o recurso de terceiro prejudicado33. A Nova Lei do Mandado de Segurança supriu a lacuna que a respeito existia na Lei nº 1.533/1951 e estendeu, de forma expressa, à autoridade coatora, a possibilidade de recorrer da sentença concessiva da segurança (§ 2º do art. 14). Há quem qualifique o coator não como parte substancial do mandado de segurança, mas como parte formal, e seria nessa qualidade que se apoiaria a sua legitimidade recursal. Seu interesse na causa se explicaria pela circunstância de achar--se sujeito a cumprir as ordens mandamentais, sob

pena de incorrer em crime de desobediência. Acontece que a autoridade coatora não tem direito algum envolvido no objeto litigioso, todo ele girando em torno de relação substancial travada entre o impetrante e a entidade pública, em cujo nome o coator praticou o ato impugnado. O interesse em se resguardar de sanções disciplinares ou criminais manifesta--se de maneira reflexa, e não como consequência direta da resolução do litígio. Não cogita o pedido, e tampouco a sentença, dos interesses do coator, os quais somente entrarão em linha de preocupação depois de encerrado o processo do mandado de segurança. Não servem, de tal sorte, para conferir-lhe a qualidade processual de parte na ação mandamental, nem mesmo como litisconsorte passivo: se pode, o coator, ser atingido de alguma forma, será como terceiro prejudicado, por manter com a parte vencida uma relação não litigiosa intervinculada, por dependência, com aquela objeto da impetração, tal como se prevê no art. 99634 do CPC. Correta, portanto, a tese de que, não tendo o coator exercitado o direito de ação no mandado de segurança, nem ativa nem passivamente, não pode o seu recurso ser havido como recurso de parte. É, por isso, como terceiro eventualmente prejudicado, que lhe cabe o recurso previsto no § 2º do art. 14 da Lei nº 12.01635. No sistema da legislação atual, como se vê, não mais se pode questionar sobre a legitimação para recorrer da sentença do mandado de segurança. Podem recorrer tanto a pessoa jurídica como a autoridade coatora. Não se trata, contudo, de uma faculdade processual que se possa exercitar pessoalmente. As informações, o coator pode prestar ao juízo sem assistência de advogado. O mesmo não ocorre no caso de recurso. Se tencionar interpô-lo, terá de constituir advogado36.

104. EXECUÇÃO IMEDIATA (PROVISÓRIA) DA SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA A execução da sentença que concede a segurança tem duas características, que bem a distinguem das sentenças comuns: (i) é imediata, e (ii) específica ou in natura, sem possibilidade de realizar-se sob a forma de execução substitutiva ou subsidiária (i.e., não se tolera a substituição da prestação devida pelo substitutivo econômico)37. Diante da primeira característica, a força mandamental da decisão não se suspende, em regra, pela interposição de recurso, e se cumpre, de plano, sem depender do procedimento da ação de execução. Tudo se resolve por meio de um ofício do juiz endereçado ao coator e à pessoa jurídica a que ele se acha vinculado. Não cabe aos destinatários embaraçar o cumprimento imediato da ordem judicial, seja por embargos, impugnação ou recurso. A apelação, se interposta, será processada sem efeito suspensivo, de modo que não impedirá a execução provisória, como prevê o art. 14, § 3º. Apenas em um caso a lei abre exceção para atribuir efeito suspensivo à apelação: é quando o objeto da impetração for daqueles em que é vedada a concessão de liminar (§ 3º, in fine).

Enquadrado o mandado de segurança numa das hipóteses do § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016, a execução da sentença concessiva da ordem mandamental só será admissível após o respectivo trânsito em julgado38. Não se incluem nos efeitos executivos da sentença do mandado de segurança a exigência das perdas e danos acarretados pelo ato administrativo impugnado, nem a de efeitos financeiros injustamente acarretados pelo referido ato, vencidos anteriormente à impetração. Nesse sentido é a jurisprudência sumulada do STF: “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança” (Súmula nº 269). O STJ entende, no entanto, ser cabível o mandado de segurança para cobrar o pagamento das reparações econômicas concedidas pelo Ministério da Justiça relacionadas à anistia política de Militares que, se não forem pagas de uma só vez, devem ser cobradas por meio de precatórios: “1. É iterativa a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de que: (a) não há a decadência do direito à impetração quando se trata de comportamento omissivo da autoridade impetrada, que se renova e perpetua no tempo; (b) é cabível a impetração de Mandado de Segurança postulando o pagamento das reparações econômicas concedidas pelo Ministério da Justiça relacionadas à anistia política de Militares, no caso de descumprimento de Portaria expedida por Ministro de Estado, tendo em vista não consubstanciar típica ação de cobrança, mas ter por finalidade sanar omissão da autoridade coatora; (c) a sucessiva e reiterada previsão de recursos, em leis orçamentárias da União Federal, para o pagamento dos efeitos financeiros das anistias concedidas, dentre elas a do impetrante, bem como o decurso do prazo previsto no § 4º do art. 12 da Lei 10.559/2002 constituem o direito líquido e certo ao recebimento integral da reparação econômica; e (d) inexistindo os recursos orçamentários bastantes para o pagamento, em uma só vez, dos valores retroativos ora pleiteados, cabível será a execução contra a Fazenda Pública, por meio de precatórios, nos termos do art. 730 do CPC/1973. 2. Esta Corte fixou a lição segundo a qual não prospera a alegação de que o pagamento dos retroativos está cingido à reserva do possível, porquanto o caso se refere à existência de direito líquido e certo à percepção dos retroativos, nos termos do direito vigente (MS 17.967/DF, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 30.5.2012). 3. O direito líquido e certo amparável na via mandamental, no caso concreto, res-tringe-se ao reconhecimento da omissão da autoridade impetrada em providenciar o pagamento das parcelas pretéritas da reparação econômica, conforme valor nominal previsto na Portaria 1.058, de 21.6.2011. Sendo assim, a fixação de juros e correção monetária poderá ser buscada em ação própria, dada a impossibilidade da cobrança de valores em sede de Mandado de Segurança, consoante enunciado da Súmula 269/STF”39.

E a “concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria” (Súmula nº 271). O § 4º do art. sub examine, todavia, permite, no caso de supressão ilegal de vencimentos e vantagens pecuniárias de servidores públicos, que a sentença mandamental possa compreender a respectiva ordem de pagamento. A condenação, no entanto, ficará restrita às verbas posteriores à impetração, nos termos do aludido dispositivo legal (sobre o tema, ver, retro, o item nº 61.1)40. Sobre as razões que impedem, ordinariamente, o uso do mandado de segurança como ação de cobrança, vejam-se os comentários feitos no item nº 106. A imediatidade, outrossim, do cumprimento, seja da liminar, seja da sentença concessiva do mandado de segurança, decorre da própria natureza da garantia constitucional, que, por seu intermédio, se realiza. O sistema mandamental, determinado pela Constituição, exige rito específico, que inclui a pronta executividade das decisões e “repele o efeito suspensivo e protelatório de qualquer de seus recursos”. Uma simples notificação é, por isso, suficiente para impor aos impetrados o imediato cumprimento da segurança. “Sem esta presteza na execução ficaria invalidada a garantia constitucional de segurança”, instituída para tutelar, energicamente, o titular de direito líquido e certo contra ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública41. Pelas mesmas razões de origem constitucional, não é exigível caução para a execução provisória e imediata da sentença concessiva da segurança. Além disso, o cumprimento normal da sentença, na espécie, envolve satisfação de obrigação de fazer, ou não fazer (CPC/2015, art. 497), e não de obrigação por quantia certa, hipótese a que não se aplica o disposto no art. 520, IV42, do mesmo Código43. Se houver risco extraordinário e intolerável para o Erário, no plano das finanças públicas, o cumprimento provisório da sentença pode ser obstado ou prevenido, não pela exigência de caução, mas pelo incidente de suspensão da segurança previsto no art. 15 da Lei nº 12.016. É possível, ainda, diante de risco realmente grave, cogitar-se da atribuição de efeitos suspensivos extraordinários ao recurso, valendo-se da regra do art. 1.012, §§ 3º e 4º, do CPC.

105. EFEITO DA SENTENÇA DENEGATÓRIA DA SEGURANÇA Como já visto (nº 101, retro), também a sentença que denega a segurança tem efeito imediato, liberando prontamente o impetrado das restrições acaso impostas por medida liminar44. Aqui, como no caso da sentença concessiva da ordem, o recurso de apelação não dispõe de efeito suspensivo. Portanto, se a sentença denega a impetração, “o provimento liminar não subsiste, cedendo àquele proferido à base de cognição completa”45.

106. VERBAS REMUNERATÓRIAS DE SERVIDORES PÚBLICOS RECLAMÁVEIS POR MEIO DE MANDADO DE SEGURANÇA A respeito das prestações em dinheiro, a lei não confere ao mandado de segurança força de uma ação de cobrança46. Prestações vencidas não podem figurar como objeto de ação. Aquelas, porém, que correspondem a pagamento de vencimentos e vantagens que vierem a ser assegurados pela sentença deferidora da segurança a servidor público, serão exigíveis em execução judicial. Limitarse-ão, todavia, “às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial” (Lei nº 12.016, art. 14, § 4º)47. Em face do caráter dos vencimentos do servidor público, o STJ tem abrandado o rigor legal para conferir, excepcionalmente, o efeito ex tunc ao deferimento do mandamus, quando o servidor é privado de sua remuneração por ato ilegal ou abusivo de autoridade48. Seria sumamente injusto exigir do servidor público que propusesse ação ordinária para haver a prestação alimentar que a sentença do mandado de segurança já lhe reconheceu. Assim, tudo aquilo de que o impetrante foi ilegal ou abusivamente privado, por efeito imediato do ato invalidado pela sentença do mandamus, deve ser-lhe proporcionado como efeito necessário do próprio deferimento da ordem judicial impetrada. Pouco importa que a remuneração tenha se tornado exigível antes do ajuizamento do mandado de segurança. O que é relevante é a circunstância de que o não pagamento se apresenta como efeito imediato do ato impugnado, de modo que, invalidado este, tem de ser assegurado o direito à prestação que o mesmo ato embaraçara ou suprimira49. Afinal, foi justamente a recusa ou suspensão ilegal do pagamento da vantagem devida a causa motivadora da impetração da segurança.

Logo, a consequência do deferimento da segurança haverá de ser precisamente a ordem para que, afastada a ilegalidade, se dê o restabelecimento do direito violado, desde o momento em que o ato ilícito da autoridade coatora se consumou50. Sendo certo que a lei admite a condenação, no mandamus, pelo menos das prestações vencidas após a impetração, resta saber como será executada essa modalidade de condenação: por mandado de pagamento ou pelo regime de precatório? A Lei nº 12.016 não cuidou de disciplinar a matéria, que sempre foi polêmica, nunca logrando solução unívoca na jurisprudência51. Dentro do Superior Tribunal de Justiça subsistem correntes nos dois sentidos, ou seja, há julgados que reclamam a execução pelos padrões habituais dos precatórios52 e outros que defendem a imediata exequibilidade sob forma de mandado de pagamento53. Para o STF, entretanto, a questão foi resolvida, em sede de repercussão geral, entendendo aquela corte que os valores devidos entre a data da impetração e a implementação da ordem concessiva se submetem ao regime de precatórios54. Segundo o acórdão: “é assente a jurisprudência desta Corte no sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública estão adstritos ao sistema

de precatórios, nos termos do que dispõe o artigo 100 da Constituição Federal, o que abrange, inclusive, as verbas de caráter alimentar, não sendo suficiente a afastar essa sistemática o simples fato de o débito ser proveniente de sentença concessiva de mandado de segurança”. Assim, concluiu: “se nem o caráter alimentar do crédito contra a Fazenda Pública tem força suficiente a afastar o rito dos precatórios, com muito menos razão o teria a circunstância acidental de ser o crédito derivado de sentença concessiva de mandado de segurança”. Em que pese o entendimento daquela Corte Superior, pensamos que, no silêncio da lei, o melhor entendimento é o daqueles que, como EDUARDO TALAMINI, defendem não ser compatível com a estrutura constitucional do mandado de segurança um procedimento lerdo e ineficiente como o da execução contra a Fazenda Pública disciplinada pelos arts. 534 e53555, do CPC/2015. Se a Lei nº 12.016 qualifica como crime de desobediência o não acatamento imediato do comando da sentença prolatada na ação constitucional sub examine, realmente não se mostra razoável a tese da submissão da execução, in casu, ao regime comum dos precatórios56. Entendem, no entanto, JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA e FÁBIO CALDAS DE ARAÚJO que o regime de cumprimento do comando judicial das verbas condenatórias da sentença de segurança seguirá o rito previsto pelo art. 534 do CPC/201557. Para JOSÉ ANTÔNIO REMÉDIO, a exegese da legislação anterior, especialmente da Lei nº 5.021/1966, deveria ser feita da seguinte maneira: a) prestações vencidas a contar do ajuizamento do mandado de segurança seriam cumpridas dentro do sistema mandamental, ou seja, seriam pagas independentemente de precatório (art. 1º, caput, da Lei nº 5.021); b) as vencidas antes do ajuizamento teriam sua liquidação e execução sujeitas às normas do art. 100 da CF e do art. 534 do CPC58. De qualquer modo, não seria exigível do servidor a propositura de uma nova ação de cobrança após a sentença do mandado de segurança. As prestações compreendidas entre o ato impugnado e o ajuizamento do mandamus seriam apenas liquidadas e executadas, nos moldes do art. 534 do CPC. Ainda ao tempo da Lei nº 1.533/1951, o rigor da Súmula nº 269 do STF sofreu abrandamento no tocante aos valores devidos a servidores públicos, cujo pagamento tenha sido, ilegal ou abusivamente, recusado pela autoridade administrativa. É que a Lei nº 5.021/1966, editada justamente para disciplinar a matéria, dispôs, em seu art. 1º, que “o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público federal, da administração direta ou autárquica, e a servidor público estadual e municipal, somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial”. É esse dispositivo que foi absorvido pelo art. 14, § 4º, da Lei nº 12.016/2009 (atual Lei do Mandado de Segurança). Com isto, restou certo que, em nosso ordenamento jurídico, o mandado de segurança é, realmente, remédio processual utilizável, ao menos pelo servidor público, para reclamar pagamento

de verbas remuneratórias devidas pela Administração. A estes credores, portanto, não se aplica a vedação da Súmula nº 269 do STF. A abertura da lei atual não foi completa, porque, mesmo no caso de remuneração do servidor público, a utilização do mandado de segurança para a respectiva cobrança só foi autorizada para os valores vencidos ou vincendos a partir do ajuizamento da ação (Lei nº 12.016, art. 14, § 4º). Em relação aos vencidos antes da impetração, continua tendo o servidor que se valer da ação de cobrança59. Permanece, no entendimento jurisprudencial, válida a tese da Súmula nº 271 do STF, segundo a qual a “concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”. Admitir o contrário, ou seja, incluir vencimentos anteriores à impetração na força do mandado de segurança representaria “violação do art. 1º, da Lei 5.021/66 [correspondente hoje ao art. 14, § 4º, da Lei 12.016]” e “afronta à Súmula 271-STF”60. ALEXANDRE FREITAS CÂMARA resume a solução do problema em foco, apontando a existência no direito atual de três regimes de cumprimento da sentença de mandado de segurança com efeitos financeiros em favor de servidor público: (i) valores vencidos após a impetração e antes da sentença serão exequíveis no regime de precatório; (ii) valores vincendos, exigíveis após a sentença, serão pagos mediante inclusão na folha de pagamento; (iii) prestações definidas como de pequeno valor (CF, art. 100, §§ 2º a 4º) serão cumpridas mediante requisição. Para as verbas pretéritas, assim entendidas as vencidas anteriormente à impetração da segurança, a respectiva cobrança só será possível pelas vias administrativas ou por meio de ação ordinária61. O esquema organizado por ALEXANDRE CÂMARA corresponde, em linhas gerais, ao regime executivo atualmente em vigor para cumprimento de sentença de mandado de segurança com efeitos financeiros. No entanto, é preciso distinguir entre (i) a simples falta de pagamento de vencimentos e (ii) a supressão de pagamento deles em virtude de sanção ilegalmente aplicada pela Administração ao servidor. Para que o mandamus incorra na proibição de substituir ação de cobrança, e assim se submeter às restrições das Súmulas nº 269 e 271 do STF, é preciso levar em conta a causa de pedir. Se se cobram vencimentos pretéritos apenas com fundamento na mora da Administração, realmente não é o caso de mandado de segurança. “Diferente, entretanto, se a causa de pedir for ilegalidade da sanção administrativa aplicada. No caso, concedida a segurança, repõe-se a situação jurídica anterior, em consequência, também o pagamento do que fora ilegalmente suspenso. A prestação jurisdicional cumpre ser exaustiva, no sentido de repor, às inteiras, quanto possível, o direito reconhecido”62. Essa jurisprudência, nascida ao tempo da legislação antiga, mantém-se no STJ sob o regime da Lei nº 12.016/2009: “Processual civil e administrativo. Mandado de segurança. Reintegração de servidor público. Vencimentos retroativos a partir da data da demissão ilegal. 1. É pacífico o

entendimento desta Corte no sentido de que, em se tratando de mandado de segurança objetivando reintegração de servidor público demitido ilegalmente, são devidos os vencimentos e eventuais vantagens financeiras ao impetrante, desde a data do ato impugnado. 2. Recurso especial não provido”63.

107. RECURSOS PARTICULARES ILEGALMENTE APROPRIADOS PELA ADMINISTRAÇÃO O Superior Tribunal de Justiça, a exemplo do que fez com relação às verbas remuneratórias de servidores públicos, admite também que no mandado de segurança se incluam verbas pertencentes a particulares objeto de apropriação ilegal por agente da Administração Pública, sem que se incida na transformação do remédio constitucional em ação de cobrança. A propósito de apropriação ilegítima, pelo Banco Central, de recursos depositados por instituição bancária, aquela Corte Superior decidiu da seguinte maneira: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO PELO BACEN DE RECURSOS DEPOSITADOS POR INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. NULIDADE DO ATO. DEVOLUÇÃO. CABIMENTO. MANDADO DE SE-GURANÇA. VIA PROCESSUAL ADEQUADA. ARTIGO 158, DO CÓDIGO CIVIL. I – O mandado de segurança é via processual adequada para pleitear a devolução de valores apropriados com mão-própria, quando decorrente de ato administrativo ilegal, afastado o teor das súmulas 269 e 271, do STF, uma vez não se tratar de ação de cobrança. II – Demonstrada a pertinência da anulação do ato administrativo ilegal, remanesce de rigor a aplicação do artigo 158, do Código Civil, com o desfazimento dos efeitos decorrentes, ou seja, a devolução dos valores apropriados. III – Recurso especial provido”64. Ainda fora do âmbito do interesse dos servidores públicos, o STJ tem admitido que o mandado de segurança seja manejado contra a Administração Pública para submetê-la ao pagamento de juros e correção monetária plena, sem se limitar apenas às prestações futuras. No caso, por exemplo, dos títulos da dívida agrária (TDA’s), a jurisprudência daquela Corte assim se firmou: “1. Esta Corte tem admitido o cabimento da via mandamental para a declaração do direito à correção monetária plena e à incidência de juros compensatórios e moratórios sobre o valor de TDA’s. 2. A contagem do prazo de 120 dias, previsto no artigo 18 da Lei 1.533/51, tem início a partir da data em que os títulos foram resgatados sem os consectários pretendidos.

3. Na atualização dos Títulos da Dívida Agrária, devem ser computados os percentuais de 6,81% e 13,89%, referentes à inflação efetivamente apurada pelo IPC/ IBGE por ocasião dos planos econômicos denominados ‘Bresser’ e ‘Collor II’, respectivamente, sendo de se aplicar, ainda, a partir do vencimento, juros moratórios e compensatórios no percentual de 6% ao ano. 4. A autoridade coatora deve se abster de efetuar o pagamento de TDA’s com vencimentos posteriores aos das impetrantes, antes de consumado o resgate destes. 5. Segurança concedida”65. Do exposto, pode-se concluir que a sonegação de verbas a que tem direito líquido e certo tanto os servidores públicos, como os particulares, quando decorre de atitude ilegal da Administração, pode encontrar solução pela via do mandado de segurança, sem que isto, na ótica do STJ, incorra nos óbices das Súmulas nº 269 e 271 do STF.

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No regime da Lei nº 1.533/1951, não havia previsão a respeito, e na jurisprudência era frequente o entendimento de ser irrecorrível a decisão pertinente a medida liminar do mandado de segurança. A Lei nº 1.533/1951 não previa expressamente esse recurso, mas a jurisprudência o admitia, regularmente. Restou, portanto, superada a Súmula nº 622 do STF, que não admitia o cabimento de agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança. Agora o art. 16, parágrafo único, da Lei nº 12.016 é taxativo: cabe agravo, na espécie. Prevaleceu a tese adotada pelo STJ: “cabe agravo regimental da decisão que indefere liminar em mandado de segurança” (STJ, Corte Especial, AgRg no MS 1.622/DF, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 09.04.1992, DJU 15.06.1992, p. 9.212). O agravo em questão já era admitido pela Lei nº 4.348/1964, art. 4º. O prazo de interposição, porém, foi reduzido de dez para cinco dias (Lei nº 12.016, art. 15, caput). Súmula nº 392 do STF: “O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade para cumprimento da decisão”. Esse entendimento não mais prevalece com a nova lei (art. 13). Igual previsão contava do art. 12 da Lei nº 1.533/1951. Igual previsão contava do art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 1.533/1951. Embora não preveja a Lei nº 12.016 os efeitos em que a apelação deverá ser recebida, a ausência do efeito suspensivo é uma decorrência necessária da garantia de execução provisória da sentença do mandado de segurança, constante no art. 14, § 3º. Cumpre ressaltar que essa figura recursal foi eliminada pelo CPC atual, adotando, ao invés, um sistema inovador para a hipótese de julgamento não unânime de apelação, ação rescisória e agravo de instrumento (art. 924). Esse sistema, que não é um recurso, mas sim um quórum maior para

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aperfeiçoar o julgamento não unânime da apelação, pode ser aplicado no processo do mandado de segurança, visto que não tem a forma nem a natureza dos antigos recursos de embargos de divergência. Súmula nº 597 do STF: “Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de segurança decidiu, por maioria de votos, a apelação”. Súmula nº 169 do STJ: “São inadmissíveis embargos infringentes no processo de mandado de segurança”. Não se deve descartar a possibilidade de julgamento liminar de indeferimento do mandado de segurança, com resolução de mérito, na hipótese do art. 332 do CPC, que ocorre “nas causas que dispensem a fase instrutória”, cujo pedido contrariar enunciado de súmula do STF ou STJ; acórdão proferido pelo STF ou STJ em julgamento de recursos repetitivos; entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou assunção de competência; ou enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local. O julgamento, in casu, se dá antes mesmo da citação do réu, e o recurso de apelação segue o rito especial dos §§ 1º a 3º, no qual figura a possibilidade de juízo de retratação. É por isso que a Súmula nº 405 do STF prevê a perda do efeito da liminar, tão logo ocorra a sentença de denegação da segurança. QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna, QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 349; MEDINA, José Miguel Garcia; ARAUJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 169. STJ, 2ª T., REsp 787.051/PA, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 03.08.2006, DJU 17.08.2006, p. 345. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 235. CPC/73, sem correspondente. STJ, REsp 798.993/SP, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 14.08.2007, DJU 24.09.2007, p. 253. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 234. STJ, 2ª T., REsp 775.548/RJ, Rel. Min. Castro Meira, ac. 18.10.2005, DJU 07.11.2005, p. 246; STJ, 1ª T., REsp 423.214/SP, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 18.06.2002, DJU 19.08.2002, p. 149. STJ, 2ª T., AgRg no REsp 918.502/RJ, Rel. Min. Castro Meira, ac. 19.06.2007, DJU 01.08.2007, p. 444; STJ, 4ª T., REsp 178.072/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 01.09.1998, DJU 03.11.1998, p. 167. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Ċódigo de Processo Civil comentado e legislação extravagante CPC/73, arts. 241, I e II, 242. CÂMARA, Alexandre Freitas. Mandado de segurança, cit., p. 270. CPC/73, art. 508. CPC/73, art. 188. STF, 1ª T., RE 98.816/RJ, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 05.06.1984, DJU 29.06.1994, p. 10.751; STJ, 1ª T., REsp 37.312/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 09.03.1994, DJU 25.04.1994, p. 9.204.

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CPC/73, art. 475, caput. QUARTIERI, Rita. Op. cit., p. 352. BUENO, Cássio Scarpinella. Mando de Segurança, cit., p. 159. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2006, p. 49. No sentido da não aplicação do art. 475 e §§, do CPC, à sentença do mandado de segurança: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 122. “A jurisprudência da 1ª Seção é no sentido de que as restrições ao reexame necessário previstas no art. 475, § 2º, do CPC (introduzidas pela Lei 10.352/01) não são aplicáveis à sentença proferida no mandado de segurança, que se regem por disciplina própria (EREsp 647.717/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 25.02.2008)” (STJ, 1ª T., REsp 924.286/MT, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 17.06.2008, DJe 26.06.2008. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 655.958/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 09.11.2004, DJU 14.02.2005, p.185; STJ, 1ª T., REsp 654.837/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 14.02.2006, DJU 06.03.2006, p. 177; STJ, Corte Especial, EREsp 654.837/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 15.10.2008, DJe 13.11.2008; STJ, 2a T., REsp. 1.274.066/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 01.12.2011, DJe 09.12.2011). STF, 2ª T., RE 412.430-AgR/MS, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 13.12.2005, DJU 17.03.2006, p. 40. STJ, 5ª T., REsp 1.047.037/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 15.10.2009, DJe 16.11.2009. STJ, Corte Especial, EREsp 180.613/SE, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 17.11.2004, DJU 17.12.2004, p. 388; STJ, 6ª T., REsp 264.632/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 04.09.2007, DJU 19.11.2007, p. 298; STJ, 5ª T., AgRg no REsp 901.794/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 18.09.2008, DJe 03.11.2008. CPC/73, art. 499. DIDIER JÚNIOR, Fredie. Recurso de terceiro prejudicado: juízo de admissibilidade. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2005, p. 33; BUENO, Cássio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 80. A extensão – à autoridade coatora – do direito de recorrer da sentença do mandado de segurança, “não faz dela parte passiva da demanda. Na verdade, a intenção da lei foi a de incorporar o entendimento jurisprudencial no sentido de que a autoridade coatora pode recorrer na condição de terceiro prejudicado, nos termos do art. 499, § 1º, do Código de Processo Civil, a fim de evitar eventual penalidade administrativa, penal, ou, até mesmo, ação de regresso da pessoa jurídica” (CAVALCANTI, Marcos de Araújo. A legitimidade passiva para o mandado de segurança: uma proposta de interpretação da Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, n. 108, p. 75, 2012). Também Alexandre Freitas Câmara considera o recurso da autoridade coatora como “recurso de terceiro”, lembrando, ainda, que, nessa qualidade, pode recorrer não apenas da sentença, mas de qualquer outra decisão ocorrida durante a marcha do processo de mandado de segurança (CÂMARA, Alexandre Freitas. Mandado de segurança, cit., p. 83). Entretanto, para Daniel Amorim Assumpção Neves, a autoridade coatora não recorre como terceiro prejudicado, pois o art. 14, § 2º da Lei cria uma legitimação extraordinária, razão pela qual ela “passa recorrer em nome próprio na defesa da pessoa jurídica de direito público, o que naturalmente a dispensa de provar a existência de um interesse jurídico seu na solução do processo” (Ações constitucionais, cit., p. 170). Mas, se o representante

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institucional da pessoa jurídica interpuser o recurso em nome da parte passiva do writ, a que título se justificaria o recurso da autoridade coatora autorizado pela Lei n.º 12.016? O Presidente do Tribunal de Justiça, por exemplo, quando figura como autoridade coatora nos termos da impetração, não terá jus postulandi “para interpor recurso em processo de mandado de segurança requerido contra a Corte. Recurso firmado por ele não pode ser conhecido” (STJ, 1ª T., Pet 321/BA, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 16.11.1992, DJU 17.05.1993, p. 9.292). Não tendo capacidade postulatória, o coator deverá recorrer por meio de advogado, e não pessoalmente (CAVALCANTI, Marcos de Araújo. Op. cit., loc. cit.). No mesmo sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Op. cit., p. 83. MEIRELLES, Hely Lopes; et al. Mandado de Segurança e ações constitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, n. 16, p. 108. De acordo com o § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016, “Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza”. São estes, portanto, os casos em que a apelação contra a sentença concessiva da segurança não terá efeito suspensivo e não permitirá a execução provisória. STJ, 1ª Seção, MS 20.426/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 13.12.2017, DJe 18.12.2017. “Consoante a jurisprudência do STJ, o pagamento de verbas atrasadas em sede de mandado de segurança restringe-se às parcelas existentes entre a data da impetração e a concessão da ordem” (STJ, 3ª Seção, Rcl 2.017/RS, Rel. Min. Jane Silva, ac. 08.10.2008, DJe 15.10.2008. No mesmo sentido: STJ, 1ª Seção, Pet. 2.604/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 12.05.2004, DJU 30.08.2004, p. 196). O STF já decidiu, em sede de repercussão geral, que a execução desses valores deve seguir o rito dos precatórios (CF, art. 100) (STF, Pleno, RE 889.173 RG/MT, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 07.08.2015, DJe 14.08.2015). No item nº 106, registramos e comentamos a existência de jurisprudência que, em caráter excepcional, admite eficácia retroativa dos efeitos financeiros resultantes da concessão do mandado de segurança (exemplo: STJ, 3ª Seção, MS 12.397/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 09.04.2008, DJe 16.06.2008). MEIRELLES, Hely Lopes; et al. Mandado de Segurança e ações constitucionais, cit., nº 16, p. 112. CPC/73, art. 475-O, III. MEIRELLES, Hely Lopes; et al. Op. cit., loc. cit. Observa RITA QUARTIERI que “a caução é exigida na execução provisória para atos que importem alienação de domínio e levantamento de depósitos em dinheiro. Em mandado de segurança a execução adapta-se ao modelo previsto no art. 461 do CPC quando a condenação comportar o cumprimento de deveres; ou ao formato dos arts. 730 e 731 do CPC quando a sentença contiver condenação ao pagamento de soma (prestações pecuniárias a partir da impetração). E, nesse caso, não haverá a prática de atos de expropriação (alienação do domínio) e sim execução específica contra a Fazenda Pública, que não admite em seu iter atos sub-rogatórios” (QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna, QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 349; MEDINA, José Miguel Garcia; ARAUJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo.

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Ċomentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 361). “A decisão denegatória da segurança ou cassatória da liminar produz efeito liberatório imediato quanto ao ato impugnado, ficando o impetrado livre para praticá-lo ou prosseguir na sua efetivação desde o momento em que for proferida”. A intimação, na espécie, não é para impor cumprimento de ato do impetrado, é apenas “para fluência do prazo para recurso” (MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 112). STJ, 2ª T., RMS 7.845/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 04.08.1998, DJU 08.09.1998, p. 38. Súmula nº 269 do STF “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”. Súmula nº 271 do STF: “Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”. “O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que os efeitos financeiros da concessão da segurança estão limitados à data da impetração, em atenção ao disposto nas Súmulas 269 e 271/STF” (STJ, 3ª Seção, EDcl no MS 13.356/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 11.12.2013, DJe 19.12.2013). “Na hipótese em que o servidor público deixa de auferir seus vencimentos, parcial ou integralmente, por ato ilegal ou abusivo da autoridade impetrada, os efeitos patrimoniais da concessão da ordem em mandado de segurança devem retroagir à data da prática do ato impugnado, violador de direito líquido e certo. Inaplicabilidade das Súmulas 269/STF e 271/ STF. A alteração no texto constitucional que excluiu do regime de precatório o pagamento de obrigações definidas em lei como de pequeno valor aponta para a necessidade de revisão do alcance das referidas súmulas e, por conseguinte, do disposto no art. 1º, da Lei n. 5.021/1996, principalmente em se tratando de débitos de natureza alimentar, tal como no caso, que envolve verbas remuneratórias de servidores públicos” (STJ, 3ª Seção, MS 12.397/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 09.04.2008, DJe 16.06.2008). Nesse sentido, em doutrina: Luiz Manoel Gomes Júnior, para quem “não há qualquer sentido em obrigar a parte interessada a ingressar com nova demanda quando o seu direito já foi reconhecido em sede de mandado de segurança. Os efeitos do mandado de segurança devem ser ex tunc, com o afastamento do ato ilegal e abusivo e recomposição do direito violado, ainda que o mesmo tenha natureza financeira” (GOMES JÚNIOR. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 182). “2. Quanto aos efeitos patrimoniais da tutela mandamental, sabe-se que, nos termos das Súmulas 269 e 271 do STF, caberia à parte impetrante, após o trânsito em julgado da sentença concessiva da segurança, ajuizar nova demanda de natureza condenatória para reivindicar os valores vencidos em data anterior à impetração do pedido de writ; essa exigência, contudo, não apresenta nenhuma utilidade prática e atenta contra os princípios da justiça, da efetividade processual, da celeridade e da razoável duração do processo, além de estimular demandas desnecessárias e que movimentam a máquina judiciária, consumindo tempo e recursos públicos, de forma completamente inútil, inclusive honorários sucumbenciais, em ação que já se sabe destinada à procedência. 3. Esta Corte Superior, em julgado emblemático proferido pelo douto Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, firmou a orientação de que, nas hipóteses em que o Servidor Público deixa de auferir seus vencimentos, ou parte deles, em face de ato ilegal ou abusivo do Poder Público, os efeitos financeiros da concessão de ordem mandamental devem retroagir à data do ato impugnado,

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violador do direito líquido e certo do impetrante, isso porque os efeitos patrimoniais do decisum são mera consequência da anulação do ato impugnado que reduziu a pensão da Impetrante, com a justificativa de adequá-la ao sub-teto fixado pelo Decreto 24.022/2004, daquela unidade federativa” (STJ, Corte Especial, EREsp. 1.164.514/AM, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 16.12.2015, DJe 25.02.2016). No caso, por exemplo, da anistia, os efeitos financeiros do mandado de segurança foram aplicados de forma retroativa, desde a CF de 1988, superando-se a restrição da Lei nº 5.021/1996 (STJ, 1ª Seção, MS 300/DF, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 17.04.1990, DJU 06.08.1990, p. 7.312). É bom de ver que, quando se trata de obrigações de “pequeno valor”, a execução da sentença contra a Fazenda Pública não observará o regime dos precatórios, por mandamento de regra constitucional (CF, art. 100, § 3º, com a redação da Emenda Constitucional nº 62/2009. A Lei nº 10.259/2001, no âmbito federal, definiu o “pequeno valor” como sendo o que insere a causa na competência do Juizado Especial Federal Cível (art. 17, § 1º), ou seja, obrigação de valor até sessenta salários mínimos (art. 3º, caput). Os demais entes da Federação poderão sujeitar-se a limites diferenciados. O art. 87 do ADCT (Emenda Constitucional nº 37/2002) estabeleceu parâmetros provisórios a vigorar enquanto as Fazendas dos Estados, Distrito Federal e Municípios não criarem seus próprios limites. “No âmbito do STJ, afirmam a necessidade de execução e expedição de precatório, entre outros, os seguintes arestos: AgRegMS 11.840, 3ª S., Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 23.04.2008, DJe 03.11.2008; AgRegREsp 761.877, 6ª T., Rel. Des. Conv. Celso Limongi, ac. 16.06.2009, DJe 01.07.2009; AgRegAI 1.034.316, 6ª T., Rel. Min. Nilson Naves, ac. 11.09.2008, DJe 10.11.2008” (PEREIRA, Cesar A. Guimarães. A eficácia da sentença do mandado de segurança segundo a Lei n.º 12.016/09. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, nº 30, ago. 2009, disponível em: , acesso em 2 set. 2009). “Em sentido oposto, afirmando que a execução da sentença do mandado de segurança independe (no todo ou em parte) da expedição de precatório, confiram-se os seguintes julgados do STJ: REsp 862.482, 5ª T., Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 17.3.2009, DJe 13.4.2009; REsp 904.699, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 4.12.2008, DJe 2.2.2009; REsp 929.819, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, ac. 7.10.2008, DJe 3.11.2008” (PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Op. cit., loc. cit.). STF, Pleno, RE 889.173 RG/MT, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 07.08.2015, DJe 14.08.2015. CPC/73, arts. 730 e 731. PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Op. cit., loc. cit. MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Ċomentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 171. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 502. “A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, conforme disposto no artigo 1º da Lei nº 5.021/66, concedido o mandado de segurança, o pagamento de vantagens pecuniárias devidas a servidor público “será efetuado relativamente às prestações que se venceram a contar da data do ajuizamento da inicial” (STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 48.959/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 22.11.2011, DJe 01.12.2011). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no REsp. 1.189.211/TO, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 18.12.2012, DJe 08.02.2013. É o que já vinha

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decidindo aquela Corte antes da Lei atual do mandado de segurança: “1 – Não cabe, em sede de mandado de segurança, determinar o pagamento de parcela de vencimentos anteriores ao ajuizamento da ação, sob pena de violação ao art. 1º, da Lei nº 5.021/66 e de afronta à súmula 271 – STF. Precedentes. 2 – Recurso conhecido e provido” (STJ, 6ª T., REsp 296.413/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, ac. 26.03.2001, DJU 16.04.2001, p. 122). Em doutrina, cf. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 200, p. 234. STJ, REsp 296.413/SP cit. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 276-278. STJ, 6ª T., REsp 29.950-4/SP, Rel. Min. Vicente Cernecchiaro, ac. 14.12.1992, DJU 01.03.1993, p. 2.537, RSTJ 55/172. No mesmo sentido: “1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que o mandado de segurança impetrado contra ato que indefere pedido de conversão de licença-prêmio em pecúnia não configura substituto de ação de cobrança. Os efeitos patrimoniais são mera consequência do reconhecimento da ilegalidade do ato praticado pela Administração. 2. Recurso especial conhecido e improvido” (STJ, 5ª T., REsp 747.676/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 22.05.2007, DJU 11.06.2007, p. 354). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 51.515/MS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 18.08.2016, DJe 09.09.2016. “1. Ante a retenção indevida de valores, o mandado de segurança é a via processual adequada para pleitear a devolução desses recursos, quando decorrente de ato administrativo ilegal. Não incidência das Súmulas 269 e 271 do Supremo Tribunal Federal. 2. Recurso não conhecido” (STJ, 6ª T., REsp 571.856/PR, Rel. Min. Paulo Medina, ac. 17.02.2004, DJU 15.03.2004, p. 312). STJ, 2ª T., REsp 1.199.257/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 15.02.2011, DJe 24.02.2011. STJ, 1ª T., REsp 410.371/DF, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 02.10.2003, DJU 03.11.2003, p. 248. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., AgRg no RMS 24.685/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 05.02.2013, DJe 15.02.2013. STJ, 1ª Seção, MS 8.599/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 26.02.2003, DJU 24.03.2003, p. 133.

Capítulo XVI SUSPENSÃO DA SEGURANÇA Art. 15. Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso suspender, em decisão fundamentada, a execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à sua interposição. § 1º Indeferido o pedido de suspensão ou provido o agravo a que se refere o caput deste artigo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário. § 2º É cabível também o pedido de suspensão a que se refere o § 1º deste artigo, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere este artigo. § 3º A interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movidas contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julgamento do pedido de suspensão a que se refere este artigo. § 4º O presidente do tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar se constatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão da medida. § 5º As liminares cujo objeto seja idêntico poderão ser suspensas em uma única decisão, podendo o presidente do tribunal estender os efeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamento do pedido original. Referências legislativas: Lei nº 8.437/1992, Art. 4º, caput: Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. § 1º Aplica-se o disposto neste artigo à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado. § 2º O Presidente do Tribunal poderá ouvir o autor e o Ministério Público, em setenta e duas horas. § 3º Do despacho que conceder ou negar a suspensão, caberá agravo, no prazo de cinco dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte a sua interposição. § 4º Se do julgamento do agravo de que trata o § 3º resultar a manutenção ou o restabelecimento da decisão que se pretende suspender, caberá novo pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário. § 5º É cabível também o pedido de suspensão a que se refere o § 4º, quando negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a liminar a que se refere este artigo. § 6º A interposição do agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movidas contra o Poder Público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julgamento do pedido de suspensão a que se refere este artigo. § 7º O Presidente do Tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar, se constatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão da medida. § 8º As liminares cujo objeto seja idêntico poderão ser suspensas em uma única decisão, podendo o Presidente do Tribunal

estender os efeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamento do pedido original. § 9º A suspensão deferida pelo Presidente do Tribunal vigorará até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal (Dispositivo legal com as alterações da Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001). Súmula: Súmula nº 506/STF: O agravo a que se refere o art. 4º da Lei 4348, de 26/6/1964, cabe, somente, do despacho do presidente do Supremo Tribunal Federal que defere a suspensão da liminar, em mandado de segurança; não do que a “denega” (Súmula cancelada; cf. § 1º do art. 15 da Lei nº 12.016/2009).

Comentários ao art. 15 108. SUSPENSÃO CAUTELAR DA SEGURANÇA A suspensão da segurança – medida de urgência que se aplica também a outras ações movidas contra o Poder Público – foi introduzida no direito brasileiro pela Lei nº 191, de 16.01.1936, que regulou a ação mandamental, instituída pela Constituição de 1934, e tem se mantido nos sucessivos diplomas legais editados sobre a referida garantia fundamental. Esteve presente no art. 328 do CPC de 1939, no art. 13 da Lei nº 1.533/1951, no art. 4º da Lei nº 4.348/1964 e no art. 25 da Lei nº 8.038/1990 (lei que sofreu os impactos da Medida Provisória nº 2.180-35, e que foi revogada pela atual Lei do Mandado de Segurança)1. A suspensão cautelar dos efeitos da segurança é hoje disciplinada pelo art. 15 da Lei nº 12.016/2009, que a autoriza “para evitar grave lesão à ordem pública, à saúde, à segurança e à economia públicas”. Deve ser requerida por pessoa jurídica de direito público ou pelo Ministério Público, cabendo sua concessão ao Presidente do Tribunal ao qual competir o conhecimento do recurso contra a decisão concessiva da segurança (Lei nº 12.016, art. 15, caput). Com tal provimento de urgência, não se anula nem se cassa a ordem de segurança. Apenas se consegue, excepcionalmente, uma suspensão dos efeitos da segurança, até que se chegue a uma solução definitiva com a autoridade de coisa julgada. Embora nunca tenha merecido censura do Supremo Tribunal Federal, nos longos anos de vigência no direito brasileiro, há várias vozes na doutrina que qualificam como inconstitucional a suspensão da segurança, por importar redução, pelo legislador ordinário, de uma garantia constitucional2.

109. NATUREZA JURÍDICA A suspensão da segurança não tem a natureza de recurso, visto que o ato judicial que a defere não desconstitui a decisão concessiva do mandado, nem tampouco a substitui, a reforma ou a cassa. Nela não se depara sequer com uma revisão do que antes se decidiu sobre o cabimento da

segurança3. A medida tem a natureza jurisdicional, não redundando, porém, em cassação ou reforma da liminar ou da sentença4. Acarretando apenas a suspensão de sua eficácia, “enquanto se discute o mérito da impetração”, sua natureza é, de fato, a de “um incidente processual, apto a decidir uma questão que surge no processo”5. É algo similar, processualmente, a um conflito de competência, a uma impugnação do valor da causa, a uma tutela cautelar ou antecipatória, a uma concessão de assistência judiciária, e tantos outros incidentes que se registram com frequência nos processos civis. Essa questão incidental é aquela “que se manifesta por uma defesa impeditiva (exceção em sentido estrito) que o Poder Público dirige ao Presidente do Tribunal competente visando obter [apenas] a suspensão da eficácia de uma decisão para evitar risco de grave lesão a um interesse público”6. Segundo o STF, nessa mesma linha de entendimento, o pedido de suspensão da segurança “não se destina a refutar ou a reformar o provimento cautelar, mas apenas a sustar seus efeitos”7, “sendo defeso ao ente público dele se utilizar como simples via de atalho para reforma de decisão que lhe é desfavorável”8.

110. CABIMENTO DO INCIDENTE Não é só no mandado de segurança que a lei permite o incidente cogitado no art. 15, caput, da Lei nº 12.016. Também na ação civil pública, na ação popular e nas medidas cautelares é admitida a suspensão de efeitos da liminar e da respectiva sentença (Lei nº 8.437/1992, art. 4º, § 1º). Embora o caput do art. 15 da Lei do Mandado de Segurança só cogite da suspensão de sentença, não se discute sobre a possibilidade de ser a medida aplicada também aos efeitos de acórdão de tribunal, quando a concessão da ordem for deliberada em instância superior. Os §§ 1º e 2º do referido artigo fazem certa essa possibilidade, ao tratarem dos julgamentos de agravo de instrumento interposto de decisão de primeiro grau, que tenha julgado o pedido de liminar. Há previsão até de competência do Presidente do STF ou do STJ para suspender efeitos de acórdão locais, conforme seja cabível recurso extraordinário ou recurso especial (§ 1º). A suspensão em foco é cabível a qualquer tempo, enquanto não houver julgamento definitivo na instância recursal própria. Como não se trata de recurso com potencial de cassação ou reforma da decisão concessiva da segurança, o incidente só se apresenta possível enquanto tal decisão não tiver sido executada9. Se, por exemplo, a liminar ou a sentença assegurou a participação do impetrante num concurso público, ou autorizou a demolição de um edifício, ou garantiu uma cirurgia de urgência em hospital público, é lógico que não se teria como suspender os efeitos da decisão da segurança depois que o concurso, a demolição ou a cirurgia já se realizaram. Há, porém, casos em que a segurança se refere a fatos continuativos ou de efeitos repetitivos. Quando isto ocorrer, a execução produz efeitos imediatos e efeitos protelados para o futuro. Em relação aos efeitos já consumados, não há como pensar em sua suspensão, não, porém, quanto àqueles pendentes. Numa relação

tributária continuativa, por exemplo, o imposto calculado e recolhido segundo a segurança não se suspende, mas os supervenientes podem ser excluídos dos benefícios do mandamus, temporariamente, por força do incidente autorizado pelo art. 15 da Lei nº 12.016. De qualquer maneira, deve-se ter presente que dita suspensão representa restrição a uma garantia fundamental, razão pela qual só pode ser interpretada e aplicada com extrema parcimônia, a título de excepcionalidade e segundo interpretação restritiva e jamais ampliativa. O que se interpreta ampliativamente são os direitos e garantias fundamentais e nunca as normas que as limitam. Daí a correta advertência de que os presidentes de tribunais, no uso do poder que o art. 15 da Lei nº 12.016 lhes confere, devem “atuar com extremado grau de cautela quando suscitadas a se pronunciarem no bojo desse procedimento anômalo, examinando em caráter difuso a possibilidade de inconstitucionalidade do pedido suspensivo”10. Para se evitar que o deferimento da suspensão, in concreto, entre em atrito com a dignidade constitucional do mandado de segurança, “somente as hipóteses verdadeiramente teratológicas, de liminar ou sentença causadoras de lesão ostensivamente grave à economia pública, podem ser objeto da cassação anômala”11 [rectius: suspensão anômala]. Tanto maior deve ser o zelo dos aplicadores do art. 15 da Lei nº 12.016, porque, de um lado, está uma garantia fundamental valorizada pela Constituição, e, de outro, uma perigosa restrição à eficácia dessa garantia, baseada em cláusula geral enunciada mediante “conceitos vagos de difícil preenchimento semântico, particularmente no que se refere à noção de ‘grave lesão à economia’, frequentemente invocada nas suspensões de liminares em matéria tributária”12. Para que a suspensão em tela não se desmande em ilegítima negação da tutela fundamental por que responde o mandado de segurança, é importante ressaltar que a excepcional medida restritiva somente é cogitada pela lei quando se faça necessário “evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas” (art. 15, caput, da Lei nº 12.016)13. A grave lesão, além disso, não pode ser vista como ameaça ao interesse estatal, ou ao interesse do governo, no plano fazendário ou político. O interesse que se propõe tutelar é o comum do povo ou da nação. É “o interesse público primário”14, visto que “não é compatível com o Estado de Direito que o Poder Público possa fazer prevalecer seus interesses sobre os direitos dos cidadãos reconhecidos ou declarados pelo Poder Judiciário”15. O STJ, no entanto, já reconheceu ser cabível a suspensão de segurança, porque a contratação de mão de obra em regime de cooperativa contrariava Termo de Acordo entre o MP do Trabalho e Advocacia-Geral, pelo qual a União se absteria desse tipo de contratação, visto haver o risco de pagar em duplicata, na justiça, a remuneração em causa16. O caso, entretanto, se nos afigura de mero risco econômico da Administração, e não de interesse público primário.

111. LEGITIMIDADE PARA PROMOVER O INCIDENTE

O art. 15 da Lei nº 12.016 confere, de maneira expressa, legitimidade para requerer a suspensão da segurança (i) à pessoa jurídica de direito público interessada e (ii) ao Ministério Público17. Pessoas jurídicas de direito público interno são aquelas que integram o conceito de Fazenda Pública e que, segundo o art. 41 do Código Civil, compreendem: I – a União; II – os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; III – os Municípios; IV – as autarquias, inclusive as associações públicas; V – as demais entidades de caráter público criadas por lei. Entre as entidades de caráter público criadas por lei podem ser lembradas as agências reguladoras (ANATEL, ANEEL, ANP, ANA, ANAC etc.), todas elas revestidas da forma de “autarquias de regime especial, exatamente em razão da intenção do legislador de conferir-lhes maior autonomia perante o Poder Executivo, comparativamente às demais autarquias, sujeitas ao regime geral do Decreto-Lei nº 200/1967”18. Todas elas, portanto, estão legitimadas a formular o pedido de suspensão da segurança19. Por não constituírem pessoas jurídicas de direito público, mas de direito privado (Cód. Civil, art. 41, parágrafo único), as sociedades de economia mista e as concessionárias de serviço público não estão, em princípio, autorizadas a pleitear a suspensão de segurança. A regra, todavia, é de aplicação rigorosa apenas aos casos em que essas instituições atuam “na defesa de interesses particulares”20. Isso porque o Superior Tribunal de Justiça construiu jurisprudencialmente a tese de que também as pessoas jurídicas de direito privado, integradas à administração pública indireta, “possuem, excepcionalmente, legitimidade para formular pedido de suspensão de decisão ou de sentença nesta e. Corte Superior apenas quando buscarem tutelar bens relacionados, diretamente, ao interesse público”21. É o que se passa, v.ġ., com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, entre outras pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da administração pública indireta: “Agravo regimental. Suspensão de liminar. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. Legitimidade. As empresas públicas e as sociedades de economia mista, nos termos da jurisprudência desta Corte, têm legitimidade para ingressar com pedidos de suspensão de liminar e de segurança, quando na defesa de interesse público decorrente da delegação. A agravante, no caso presente, busca defender interesses privados, o que afasta a sua legitimidade. Agravo regimental improvido”22.

Até mesmo às concessionárias de serviço público se estende, excepcionalmente, a faculdade prevista no art. 15 da Lei do Mandado de Segurança, a teor da construção jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça23. O Supremo Tribunal Federal segue a mesma linha de entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no que diz respeito a estender a legitimação para o pleito de suspensão da segurança também às pessoas jurídicas de direito privado, como é o caso da Caixa Econômica Federal e da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. O importante é discernir qual o interesse que a empresa de direito privado defende quando pretende a suspensão da segurança: se é um interesse público ou apenas um interesse particular. Se se tratar realmente de um interesse público primário, a sociedade de economia mista, a empresa pública ou a concessionária de serviços públicos estarão equiparadas às pessoas jurídicas de direito público para pleitearem a medida franqueada pelo art. 15 da Lei do Mandado de Segurança. Mas se se tratar de interesse que se relaciona particularmente apenas com as atividades e os negócios das referidas empresas, não terão elas autorização para requerer suspensão de liminar ou de segurança24. Quanto aos órgãos públicos não personalizados – Câmara Municipal, Prefeito Municipal, Tribunal de Contas, Assembleia Legislativa, Procuradoria-Geral, etc. –, o STF lhes reconhece, a despeito de não serem pessoas jurídicas, a legitimação para postular mandado de segurança, em defesa de sua autonomia e do complexo de suas competências, âmbito em que, na qualidade de impetrados, igualmente, lhes cabe o direito de pleitear a suspensão de liminar e de segurança, por equiparação com as pessoas jurídicas de direito público25. Já as organizações não governamentais de defesa de interesses públicos (ONGs), por não integrarem a denominada Administração Pública Indireta, nem mesmo como delegatárias, não se legitimam ao pedido de suspensão em análise. Da mesma forma, descabe tal legitimação às associações civis, ainda quando não tenham fins lucrativos e sejam reconhecidas como de utilidade pública26.

112. COMPETÊNCIA Cabem o conhecimento e o julgamento do pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente para o recurso oponível à decisão cujo efeito se busca suspender (Lei nº 12.016, art. 15, caput). Se se trata de decisão de juiz de direito, a suspensão será julgada pelo Presidente do Tribunal de Justiça; se a decisão questionada for de juiz federal, a competência será do Presidente do Tribunal Regional Federal. A suspensão, quando se referir a acórdão de tribunal de segundo grau, será decidida pelo presidente de um dos Tribunais Superiores, levando-se em conta a matéria em discussão: se o fundamento for constitucional, a suspensão será decidida pelo Presidente do Supremo Tribunal

Federal; se infraconstitucional, pelo Presidente do Superior Tribunal de Justiça (Lei nº 8.038/1990, art. 25, caput)27.

113. PROCEDIMENTO A suspensão de liminar ou da segurança é pleiteada em petição endereçada ao Presidente do Tribunal competente, na qual deverá constar a demonstração do risco, criado pela decisão questionada, de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. O STJ entende necessária, também, a comprovação da plausibilidade jurídica do direito, razão pela qual é permitido um juízo de delibação sobre a questão de fundo da demanda28. Entretanto, em sede de suspensão de segurança em ação popular, aquela Corte entendeu que o Poder Judiciário não poderia, em sede liminar, suspender o aumento das tarifas cobradas de usuários da integração entre metrô, trens e ônibus municipais, uma vez que a suspensão demandaria instrução probatória, já que o reajuste é manifestação de política tarifária do Poder Público, o que é mais do que simples delibação sobre a matéria de fundo: “2. Na via suspensiva, por vezes, para que se verifique a violação de um dos bens tutelados na legislação de regência (Leis n. 8.437/92, 9.494/97, 12.016/09), faz-se necessário proceder a um ‘juízo mínimo de delibação sobre a matéria de fundo da contracautela’ (STF, SS n.º 5.049/BA-AgR-ED, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – Presidente –, Tribunal Pleno, julgado em 20/4/2016, DJe de 13/5/2016). Todavia, em análise de controvérsia sobre estipulação de remuneração pelo uso de transporte coletivo, o Supremo Tribunal Federal consignou que ‘o reajuste de tarifas do serviço público é manifestação de uma política tarifária, solução, em cada caso, de um complexo problema de ponderação entre a exigência de ajustar o preço do serviço às situações econômicas concretas do seguimento social dos respectivos usuários ao imperativo de manter a viabilidade econômico-financeiro do empreendimento do concessionário’ (RE n.º 191.532/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 27/5/1997, DJ de 29/8/1997). (...) 4. Assim, a evidente sofisticação da demanda ventilada na causa principal impede que a Presidência do Superior Tribunal de Justiça julgue questões relativas ao mérito do reajuste determinado pelo Poder Público - notadamente para concluir sobre discriminação ou injustiça na fixação de preço para uso de transporte público. O incidente suspensivo, por sua estreiteza, é vocacionado a tutelar tão somente a ordem, a economia, a segurança e a saúde públicas, não podendo ser analisado como se fosse sucedâneo recursal, para que se examinem questões relativas ao fundo da causa principal. 5. A interferência judicial para invalidar a estipulação das tarifas de transporte público

urbano viola gravemente a ordem pública. A legalidade estrita orienta que, até prova definitiva em contrário, prevalece a presunção de legitimidade do ato administrativo praticado pelo Poder Público (STF, RE n.º 75.567/SP, Rel. Min. DJACI FALCÃO, Primeira Turma, julgado em 20/11/1973, DJ de 19/4/1974, v.ġ.) - mormente em hipóteses como a presente, em que houve o esclarecimento da Fazenda estadual de que a metodologia adotada para fixação dos preços era técnica. 6. A cautela impediria a decisão de sustar a recomposição tarifária estipulada pelo Poder Público para a devida manutenção da estabilidade econômico-financeira dos contratos de concessão de serviço público. Postura tão drástica deveria ocorrer somente após a constatação, estreme de dúvidas, de ilegalidade – desfecho que, em regra, se mostra possível somente após a devida instrução, com o decurso da tramitação completa do processo judicial originário. (...) 9. Eventual intento político da medida não poderia ensejar a invalidação dos critérios tarifários adotados, tout court. Conforme leciona Richard A. Posner, o Poder Judiciário esbarra na dificuldade de concluir se um ato administrativo cuja motivação alegadamente política seria concretizado, ou não, caso o órgão público tivesse se valido tão somente de metodologia técnica. De qualquer forma, essa discussão seria inócua, pois, segundo a doutrina Chenery – a qual reconheceu o caráter político da atuação da Administração Pública dos Estados Unidos da América -, as cortes judiciais estão impedidas de adotarem fundamentos diversos daqueles que o Poder Executivo abraçaria, notadamente nas questões técnicas e complexas, em que os tribunais não têm a expertise para concluir se os critérios adotados pela Administração são corretos (Economic Analysis of Law. Fifth Edition. New York: Aspen Law and Business, 1996, p. 671). Portanto, as escolhas políticas dos órgãos governamentais, desde que não sejam revestidas de reconhecida ilegalidade, não podem ser invalidadas pelo Poder Judiciário”29. Se houver necessidade de prova das alegações, será feita por meio de documentos juntados, desde logo, à petição, pois não haverá ulterior dilação probatória30. A complementação da documentação faltante observará o preceito do art. 321 do CPC/2015, não sendo compatível com o processo justo o indeferimento da inicial, sem ensejar ao requerente a emenda da petição. Por força de garantia constitucional, o contraditório é de observância obrigatória (CF, art. 5º, LV). Se, entretanto, o caso for de extrema urgência, o Presidente do Tribunal poderá receber o pedido com efeito suspensivo, impedindo cautelarmente a execução da decisão questionada (Lei nº 12.016, art. 15, § 4º). Trata-se, porém, de provimento provisório, que não dispensará a audiência, em seguida, do impetrante, nem impedirá seu reexame após a resposta da parte contrária. Observar-se-á o princípio da proporcionalidade, de maneira a harmonizar a garantia da efetividade da tutela jurisdicional com a garantia do contraditório. Um não elimina o outro, mas pode alterar a ordem com

que incidirão no caso concreto31. Diante disso, a petição inicial do incidente de suspensão da segurança poderá ser despachada pelo Presidente do Tribunal de uma das seguintes maneiras: (i) determinação de emenda; (ii) denegação liminar do pedido; (iii) ordem de intimação do autor da demanda originária, para apresentar suas razões em setenta e duas horas (Lei nº 8.437/1992, art. 4º, § 2º); (iv) deferimento liminar de efeito suspensivo, em caso de urgência, para impedir, de plano, a execução temida (Lei nº 12.016, art. 15, § 4º)32.

114. OPORTUNIDADE E EFICÁCIA DO INCIDENTE A suspensão da segurança é pleiteável a qualquer tempo, enquanto não transitada em julgado a decisão que a concedeu33. “A simples alegação de que extenso o lapso temporal decorrido entre a decisão que confirmou a liminar e o efetivo pedido de suspensão não afasta, por si só, os pressupostos justificadores da medida, quando verificado que a decisão impugnada se prolonga no tempo, continuando a implicar lesão aos valores sociais tutelados pela norma específica”34. Quando se referir à liminar da segurança, a suspensão deveria, em regra, durar enquanto vigorasse a medida cujos efeitos foram obstados. Julgado o mandado por sentença definitiva, extinta estaria a medida liminar, substituída que foi pelo decisório de mérito. Assim, DINAMARCO entende que à pessoa jurídica interessada caberia renovar o requerimento de suspensão, se houver razão para tanto, tendo agora como objeto a sentença concessiva do mandado de segurança35. Entretanto, a antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acha-se sumulada no sentido de que nem sempre será necessária a renovação do pedido de suspensão nas aludidas circunstâncias: “A suspensão da liminar em mandado de segurança, salvo determinação em contrário da decisão que a deferir, vigorará até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração” (Súmula nº 626 do STF)36. Divergindo de DINAMARCO, há uma corrente doutrinária que dispensa a reiteração do pleito, e há uma que considera “lógico e coerente o entendimento sumular, à medida que privilegia a celeridade, evitando sucessivo pedido de suspensão enquanto presentes as mesmas condições fáticas, ou seja, enquanto ainda em vigor os pressupostos que autorizam a excepcional medida”37. Se, pois, o quadro fático e jurídico que levou à suspensão da liminar não se alterou com a sentença definitiva de concessão do mandado de segurança, devem persistir os efeitos daquela primitiva suspensão. Igual posicionamento é adotado por LEONARDO JOSÉ CARNEIRO DA CUNHA, para quem, “deferida a suspensão pelo Tribunal Superior, qualquer decisão que vier a ser proferida, antes do trânsito em

julgado, fica sujeita à sua jurisdição e competência, mantendo-se, bem por isso, suspensa a ordem e qualquer outra que lhe ratificar”38. É claro que essa eficácia da suspensão da liminar que ultrapassa a sentença de mérito pressupõe identidade entre um e outro julgamento. Se a sentença definitiva, por exemplo, denegou a segurança, ou a deferiu mediante ordem diferente daquela emitida por ocasião da liminar, não se poderá insistir na vigência da primitiva medida. A Súmula nº 626 do STF, por isso, tem sido aplicada pelo STJ, com a devida ressalva, ou seja: “A vigência temporal da decisão da suspensão de segurança, quando o objeto da liminar deferida é idêntico ao da impetração, deve ser entendido de acordo com o art. 4º, § 9º, da Lei nº 8.437/1992, ou seja, até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal. Exegese condensada no verbete nº 626 da Súmula do Pretório Excelso”39. É importante relembrar que a suspensão da segurança não é um recurso, mas, sim, um incidente que tem vida própria e não interfere no julgamento da causa principal. Por isso, as novas decisões que, no processo principal, sobrevenham à liminar, não têm o condão de alterar ou revogar o julgado do incidente. Se as razões da suspensão se conservam, pouco importa que a sentença e o acórdão ulteriores tenham voltado a infirmar o ato administrativo suspenso pela liminar. Exigir que se renove o pedido de suspensão da segurança pelos mesmos motivos já acolhidos para a suspensão da liminar não seria razoável, dentro da sistemática do devido processo legal, modernamente comprometido com a efetividade da prestação jurisdicional e com a economia processual. É reconhecidamente firme e reiterada a jurisprudência do STJ, lastreada na pré-citada Súmula do STF, que considera a suspensão de liminar de segurança vigorante “até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração”40. Na aplicação da tese que veio a ser incorporada na Súmula nº 626, o STF é bastante incisivo no sentido de que “o posterior deferimento da segurança, por si só, não afeta a continuidade dos efeitos da suspensão de liminar, que se determinou”41. Da forma com que a própria Suprema Corte a aplica, extrai-se da inteligência da referida Súmula que “a ultra-atividade somente subsistirá acaso a decisão subsequente seja proferida sob as mesmas condições de fato e de direito”. De sorte que, “mantendo-se idênticas tais condições, a suspensão da liminar perdura até o trânsito em julgado do processo”42. Se se conserva o quadro fático-jurídico em que ocorreu a suspensão da liminar, é irrelevante o órgão que veio a deferir a segurança, em julgamento de mérito. “A ultra-atividade dos efeitos da tutela jurisdicional suspensiva, nestas hipóteses, decorre, como visto, da própria causa que justifica a existência do instituto”43.

Em conclusão, diante das razões que sustentam as firmes posições jurisprudenciais adotadas pelo STF e pelo STJ, pode-se ter como certo que “a decisão concessiva de suspensão de segurança produz efeitos até o trânsito em julgado do feito principal [rectius: trânsito em julgado do provimento de mérito do processo principal]44, resultando da orientação pretoriana, portanto, que com o termo final do processo não há mais lugar para feitura do pedido de suspensão, sob pena de este assumir contorno rescisório, fato que desvirtuaria a finalidade do instituto”45.

115. REITERAÇÃO DO PLEITO E AGRAVO INTERNO A rejeição do pedido de suspensão pelo Presidente do Tribunal de segundo grau de Jurisdição não põe fim, de forma definitiva, ao incidente do art. 15 da Lei nº 12.016. O requerente poderá interpor agravo interno, em cinco dias, para o colegiado (art. 15, caput) ou formular o mesmo pleito perante o Presidente do Tribunal Superior, a que caiba conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário (art. 15, § 1º). A escolha entre os dois possíveis destinatários do incidente – o Presidente do STJ ou o Presidente do STF – dependerá da matéria a ser debatida no âmbito do pedido de suspensão: sendo constitucional, o pedido renovado de suspensão será encaminhado ao STF; se se tratar de ofensa à norma infraconstitucional, a competência se fixará no STJ46. O problema mais complicado a resolver refere-se à simultaneidade ou sucessividade entre as duas possibilidades de superação do indeferimento do pedido de suspensão na esfera do Tribunal de segundo grau de jurisdição. Há quem pense que o requerente da suspensão, diante do indeferimento, teria duas opções: agravar internamente ou renovar o pedido perante o STF ou o STJ. Mas isto decorre de uma leitura apressada do art. 15 da Lei nº 12.016. Quando o § 1º do aludido artigo fala em cabimento de novo pedido nos Tribunais Superiores e se refere às hipóteses de indeferimento da suspensão ou de provimento do agravo interno, de forma alguma está criando uma alternatividade de vias para o Poder Público. Seguindo-se a ordem lógica dos dispositivos, ver-se-á que o caput prevê, em primeiro lugar, o recurso de agravo interno, que poderá ser manejado pelas partes, qualquer que seja a decisão, de deferimento ou indeferimento do pedido de suspensão. Se foi de deferimento, só poderá agravar o autor da impetração da segurança. A pessoa jurídica de direito público só se legitimará ao agravo no caso de indeferimento, hipótese em que ainda não terá interesse legítimo para renovar o pedido de suspensão perante o STJ ou o STF, pois o caminho impugnativo imediato que lhe aponta o caput do art. 15 é o agravo interno para o Colegiado do Tribunal local. Por outro lado, ao impetrante, no caso de deferimento da suspensão pelo Presidente, abre-se

oportunidade, também, de manejar o agravo interno, surgindo, daí, a eventualidade de revogação, pelo Colegiado, da suspensão inicialmente deferida. É em vista dessa segunda hipótese de insucesso para o pedido da pessoa jurídica que o § 1º do art. 15 traça a regra de cabimento da renovação do pedido de suspensão perante o STF ou o STJ, tanto para o caso de (i) indeferimento do pedido, como para o de (ii) provimento do agravo interno. Quando, então, o dispositivo legal fala em “indeferimento”, não se refere ao ato singular do Presidente, mas àquele que, em última instância local, lhe negou a suspensão, em confirmação ao decidido originariamente (o seu agravo, portanto, teria sido improvido). Quando fala em “provimento ao agravo previsto no caput”, está cogitando do caso em que a pessoa jurídica de direito público já obtivera a suspensão, mas esta veio a ser cassada pelo Colegiado. Em nenhum momento, portanto, a pessoa jurídica de direito público se deparará com a oportunidade de escolher, a seu puro critério, o remédio processual a usar para se desembaraçar do indeferimento da suspensão da segurança: se este decorreu de provimento do Presidente do Tribunal, terá de recorrer por via do agravo interno, ao Colegiado, para tentar a reforma da decisão monocrática recorrida, e só depois de mantido o indeferimento pelo órgão coletivo local é que terá condição de legitimar-se à renovação do pedido de suspensão perante o STF ou o STJ. Se foi o provimento do agravo do impetrante que cassou a suspensão, a partir do decisório coletivo já estará credenciada a impetrada a renovar o pleito nos Tribunais Superiores. Não há, de maneira alguma, possibilidade de um pedido de suspensão julgado pelo STF, ou pelo STJ, per saltum47.

116. RECURSO CONTRA A DECISÃO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DA SEGURANÇA O art. 15 da Lei nº 12.016 prevê, em seu caput, o recurso de agravo interno contra a decisão do Presidente do Tribunal que suspende cautelarmente os efeitos da liminar ou da sentença do mandado de segurança. Não há referência expressa ao recurso manejável contra a decisão que denega o pedido de suspensão. A lacuna, porém, está preenchida pela Lei nº 8.473/1992, cujo art. 4º, § 3º, prevê o recurso de agravo, indistintamente, para a decisão que conceder ou negar a suspensão de liminar em qualquer ação contra o Poder Público, inclusive, pois, o mandado de segurança. Tanto pela regra da Lei nº 12.016/2009 como da Lei nº 8.473/1992, o agravo interno deverá ser interposto no prazo de cinco dias, e o recurso “será levado a julgamento na sessão seguinte a sua interposição”.

117. EXPANSÃO DOS EFEITOS DA SUSPENSÃO A OUTROS PROCESSOS O art. 15, § 5º, da Lei do Mandado de Segurança incorpora regra que já constava da Lei nº 8.437/1992 (art. 4º, § 8º), segundo a qual é permitido ao Presidente do Tribunal reunir e apreciar,

numa só decisão, várias liminares cujo objeto seja idêntico, de modo a resolver englobadamente a suspensão de todas elas. Autoriza-se, ainda, no mesmo dispositivo, a extensão dos efeitos da suspensão já deferida para outras liminares iguais supervenientes, “mediante simples aditamento do pedido original”. Esse efeito dito “expansivo” é explicado por MEDINA e ARAÚJO como “um mecanismo de controle coletivo das liminares concedidas sobre um mesmo objeto”. Por meio dele a lei procura “facilitar a defesa da pessoa jurídica de direito público, que poderá, inclusive, aditar o pedido de suspensão inicialmente formulado, para incluir outras liminares supervenientes. Há um autêntico efeito erga omnes, que não é automático, mas que depende exclusivamente de mera indicação e comprovação de identidade de objeto quanto ao pedido formulado pelo impetrante já prejudicado com a suspensão”48. O STF reconhece o “efeito multiplicador” da suspensão da segurança quando existe “grave lesão à ordem econômica e economia públicas”49. Adverte, porém, CÁSSIO SCARPINELLA BUENO que a aplicação da decisão paradigmática a cada caso concreto não poderá ser feita sem respeitar-se a garantia do contraditório50. Se há urgência na medida, o Presidente pode, liminarmente, atribuir efeito suspensivo ao pedido de extensão do provimento a outras liminares supervenientes. Não haverá, todavia, de deixar de intimar os interessados e de ouvir suas eventuais razões e defesas oponíveis à expansão decretada. O STJ – é bom registrar – tem acolhido e estimulado o efeito expansivo, “a teor do art. 15, § 5º, da Lei nº 12.016, de 2009”. E já assentou que “as liminares cujo objeto seja idêntico poderão ser suspensas em uma única decisão, podendo o Presidente do Tribunal estender os efeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamento do pedido original”51. Ocorrendo, porém, disparidade entre as liminares, o caso será de pedido autônomo de suspensão, e não de simples extensão de efeitos da medida anterior52.

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RODRIGUES, Marcelo Abelha. Apresentação e crítica de alguns aspectos que tornam a suspensão de segurança um remédio judicial execrável. Interesse Público, Belo Horizonte: Fórum, nº 45, set./out. 2007, p. 39-56. TOVAR, Leonardo. O pedido de suspensão de segurança: uma sucinta sistematização. Revista de Processo, n. 224, p. 210-211. Defendem a tese da inconstitucionalidade, entre outros, MARINONI, Luiz Guilherme (O direito à adequada tutela jurisdicional: o caso da proibição da concessão das liminares e da execução provisória da sentença nas ações cautelares e no mandado de segurança. Revista dos Tribunais, v. 663, p. 246, jan. 1991), BUENO, Cássio Scarpinella (A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 94-95) e REMÉDIO, José Antônio (Mandado de segurança, cit., p. 506). BUZAID, no entanto, é de opinião que não ocorre inconstitucionalidade, na espécie (BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 266-267). CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O pedido de reconsideração e suas hipóteses de cabimento.

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Revista Dialética de Direito Processual, v. 4, p. 101, 2003; NORTHFLEET, Elen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Revista de Processo, v. 97, p. 183-184, jan. 2000; TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança: uma sucinta sistematização. Revista de Processo, n. 224, p. 212. “A Suspensão de Segurança não se presta como sucedâneo recursal” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.473/AC, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 29.06.2005, DJU 19.09.2005, p. 174). “A via estreita da suspensão de decisão proferida na tutela antecipada contra a pessoa jurídica de direito público não comporta apreciação do mérito da controvérsia principal, matéria que deve ser apreciada na via recursal adequada” (STJ, Corte Especial, AgRg na STA 67/PE, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 18.08.2004, DJU 20.09.2009, p. 171). Ou seja: “Na suspensão de segurança não se aprecia o mérito do processo principal, mas tão somente a ocorrência dos aspectos relacionados à potencialidade lesiva do ato decisório em face dos interesses públicos relevantes consagrados em lei, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia pública” (STF, Pleno, AgRg na SS 2.504/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 17.03.2008, DJe 02.05.2008) QUARTIERI, Rita. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna, QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 369. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão da Segurança. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2005, p. 104, apud QUARTIERI, op. cit., loc. cit. STF, Pleno, SS 2.255 AgR/AM, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 24.03.2004, DJU 30.04.2004, p. 30. “A via da suspensão de segurança não se destina à impugnação ou à reforma da cautelar, mas apenas à suspensão de seus efeitos, se verificada a lesão aos valores que a Lei 4348/64 visa resguardar” (STF, Pleno, SS 2208 AgR/PA, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 14.04.2004, DJU 30.04.2004, p. 30). STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.540/CE, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 20.03.2006, DJU 10.04.2006, p. 98. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança: sustação da eficácia de decisão judicial proferida contra o Poder Público. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2005, p. 167; ALMEIDA, Úrsula Ribeiro de. A suspensão e o conflito de interesses públicos. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 122. MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 512. Idem, ibidem. Idem, ibidem. “Agravo regimental na suspensão de liminar e de sentença. Risco de grave lesão à segurança pública. Existência. Pedido de suspensão deferido. Agravo regimental desprovido. (...). Na hipótese dos autos, pode causar grave lesão à segurança pública – com risco à integridade física dos envolvidos na operação – a decisão que determina a retirada de 60 (sessenta) famílias acampadas no imóvel objeto da desapropriação” (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS 1.799/SP, Rel. Min. Félix Ficher, ac. 16.10.2013, DJe 23.10.2013). “Evidente o alegado risco à saúde pública quando ameaçado o próprio funcionamento de serviço essencial, no caso o abastecimento de água e esgoto da municipalidade” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.581/ PB, Rel. Min.

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Edson Vidigal, ac. 20.03.2006, DJU 10.04.2006, p. 100). (...) “o sobrestamento do processo licitatório com vistas à aquisição de gases medicinais para diversas Unidades de Saúde da Secretaria de Estado de Goiás, essenciais ao funcionamento de centros cirúrgicos e unidades de terapia intensiva, configura risco de grave lesão à saúde e à economia públicas” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.550/GO, Edson Vidigal, ac. 20.03.2006, DJU 10.04.2006, p. 98). “A grave lesão à economia pública não está relacionada tão somente com o montante do débito, mas sim com os danos que a decisão judicial possa causar na ordem jurídica, no ponto em que privilegia o interesse particular em detrimento do público” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 546/CE, Rel. Min. Bueno de Souza, ac. 10.12.1996, DJU 28.06.1999, p. 41). DINAMARCO, Cândido Rangel. Processo civil empresarial. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 121. ALMEIDA, Úrsula Ribeiro de. A suspensão e o conflito de interesses públicos, cit., p. 123. Para a autora, essa limitação à tutela dos “bens jurídicos relevantes que integram o ‘interesse público primário’”, e não ao interesse estatal ou do governo, “é a única forma de compatibilizar esse instituto [a suspensão da segurança] fruto de um regime ditatorial e depois modificado por medidas provisórias para atender interesses políticos específicos”. Com acerto, a mesma autora ainda discorda da velha lição de HELY LOPES MEIRELLES, mantida pelos atualizadores de sua obra, segundo a qual a suspensão teria a finalidade de resguardar a “ordem pública”, que conceituava como “o regular andamento das obras públicas, o devido exercício das funções da Administração pelas autoridades constituídas” (MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 33. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 103-104). A se admitir tal entendimento, isso – para ÚRSULA RIBEIRO DE ALMEIDA – seria “o mesmo que negar o efetivo acesso à justiça contra a Administração Pública” (op. cit., loc. cit.). STJ, AgRg na SS 1.352/RS, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 07.11.2004, DJU 09.02.2005, p. 165. “Em razão da expressa previsão legal, não tem legitimidade para a arguição da suspensão da segurança a autoridade coatora, que, embora tenha sido notificada para a apresentação de informações, não é parte no processo, de forma que um eventual pedido de suspensão de segurança teria que ser feito com justificativa na legitimidade de terceiro prejudicado, mas essa é um a legitimidade recursal, não se aplicando para o incidente processual que caracteriza o pedido de suspensão de segurança” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 191-192). ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. Niterói: Impetus, 2007, p. 32. TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança, cit., p. 215, nota 5. “São partes legítimas para pleitear suspensão de liminar ou de sentença proferidas contra o Poder Público ou seus agentes o Ministério Público ou a pessoa jurídica de direito público interessada (Lei nº 8.437/1992, art. 4º). A concessionária de serviço público, atuando na defesa de interesses particulares, não tem legitimidade para pedir a suspensão de liminar (precedentes). Agravo não provido” (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS 313/CE, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 23.11.2006, DJU 05.02.2007, p. 170). “Agravo regimental. Suspensão de segurança. Concessionária de serviço público. Disputa relativa ao aumento de frota em transporte urbano de passageiros.

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Ausência de legitimidade” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 2176/RJ, Rel. p/ ac. Min. Wilson Gonçalves, ac. 16.06.2010, DJe 03.08.2010). STJ, Corte Especial, AgRg na SS 2.660/SP, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 16.09.2013, DJe 26.09.2013: “In casu, a recorrente, pessoa jurídica de direito privado, busca tutelar interesse particular próprio, não relacionado diretamente com a prestação do serviço público de transporte coletivo, o que inviabiliza o conhecimento do excepcional pedido suspensivo. Agravo regimental desprovido”. Em outro aresto ficou assentado que: “1 – São partes legítimas para pleitear suspensão de execução de decisão, nas ações movidas contra o Poder Pública ou seus agentes, o Ministério Público ou a pessoa jurídica de direito público, nos termos da Lei nº 4.348/64, art. 4º. 2 – A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem admitido também o ajuizamento da excepcional medida por entidades de direito privado no exercício de atividade delegada da Administração Pública, como as sociedades de economia mista e as concessionárias prestadoras de serviço público, quando na defesa de interesse público, naturalmente. 3 – Tal construção jurisprudencial tem a finalidade de assegurar a preservação do interesse público, evitando-se a sobreposição do interesse privado” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.277/DF, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 25.10.2004, DJU 06.12.2004, p. 174). STJ, Corte Especial, AgRg no AgRg nos EDcl na SLS 771/SC, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 30.06.2009, DJe 24.08.2009. “O art. 4º da Lei nº 8.437/92 dispõe que o Ministério Público ou a pessoa jurídica de direito público são partes legítimas para pleitear suspensão de execução de liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, entretanto a jurisprudência tem admitido também o ajuizamento da excepcional medida por sociedades de economia mista e concessionárias prestadoras de serviço público, quando na defesa do interesse público. Agravo improvido” (STJ, Corte Especial, AgRg na Pet 1.827/RJ, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 16.06.2003, DJU 22.09.2003, p. 248, RSTJ, vol. 172, p. 41). STJ, Corte Especial, AgRg na SS 2.660/SP, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 16.09.2013, DJe 26.09.2013. “A exemplo de que se consolidou com relação ao mandado de segurança, e de reconhecer-se a legitimação, para requerer-lhe a suspensão, ao órgão público não personificado quando a decisão questionada constitua óbice ao exercício de seus poderes ou prerrogativas” (STF, Pleno, SS 936 AgR/PR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 07.12.1995, DJU 23.02.1996, p. 3.625). No mesmo sentido: “Entidades da Administração indireta, revestidas de personalidade de direito privado, estão legitimadas a postular [suspensão de segurança], quando em causa o interesse público de que sejam titulares. Mesmo as pessoas jurídicas particulares, quando concessionárias de serviço público e quando afetada a própria atividade que lhes foi, por concessão ou permissão, confiada pelo Poder Público, e que, embora desempenhada por sua conta e risco não perde a natureza de origem, têm interesse e legitimidade que se fundam na ratio, do preceito (DJ, 10.11.87, p. 24.698)” (STJ, Pleno, SS 444 AgR/MT, Rel. Min. Sydney Sanches, ac. 20.05.1992, DJU 04.09.1992, p. 14.088, RTJ 141/380). Sobre a legitimação do Ministério Público, ver CUNHA, Leonardo Carneiro. A Fazenda Pública em juízo. São Paulo: Dialética, 2007, p. 440. “Agravo regimental. Suspensão de liminar e de sentença. Associação civil sem fins lucrativos. Ilegitimidade ativa. Associação civil, ainda que sem fins lucrativos, não possui legitimidade ativa

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para o manejo da medida excepcional prevista no art. 4º da Lei 8.437/1992. Agravo regimental improvido” (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS 946/RJ, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 01.04.2009, DJe 07.05.2009). O caso decidido no acórdão referia-se a um convênio de serviços de saúde, entre associação civil, município e fundação, no âmbito do governo municipal, e relacionava-se com repasse de verba pública. Segundo o acórdão, a suspensão da liminar, na espécie, somente poderia ser pleiteada pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica de direito público interessada. BUENO, Cássio Scarpinella. O Poder Público em juízo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 5354; ALMEIDA, Úrsula Ribeiro de. A suspensão e o conflito de interesses públicos, cit., p. 125. Na jurisprudência, é interessante destacar o seguinte acórdão: “1. Concedida a liminar, a respectiva suspensão compete ao Presidente do Tribunal ao qual couber o respectivo recurso (Lei nº 4.348/64, art. 4º). Competência da Presidência do Superior Tribunal de Justiça para decidir pedido de suspensão de decisão de Desembargador Federal, membro do Tribunal Regional Federal da 2ª Região que se reconhece e declara. 2. As funções do Ministério Público Federal junto ao Superior Tribunal de Justiça são exercidas por titular do cargo de Subprocurador-Geral da República (LC 75/93, art. 47, § 1º), não lhes faltando, pois, competência ou legitimidade para aqui requerer a drástica medida de suspensão” (STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.045/ RJ, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 04.08.2004, DJU 30.08.2004, p. 198). “Por tratar-se a suspensão de contracautela vinculada aos pressupostos de plausibilidade jurídica do pedido e do perigo da demora, não há prejulgamento do mérito da controvérsia quando no pedido de suspensão exerce o Presidente um Juízo mínimo de deliberação indispensável à aferição de existência ou não de fumus boni iuris” (STJ, CE, AgRg na SS 1.404/DF, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 25.10.2004, DJU 06.12.2004, p. 177). No mesmo sentido: STJ, CE, AgInt na SS 2.900/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 119.12.2017, DJe 06.02.2017. STJ, Corte Especial, AgInt no AgInt na SLS 2.240/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 07.06.2017, DJe 20.06.2017. NORTHFLEET, Ellen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Revista de Processo, nº 97, p. 188; TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança. Revista de Processo, nº 224, p. 223. Os direitos fundamentais não são absolutos, mas relativos, dentro do seu universo, “no sentido de que a tutela deles encontra, em certo ponto, um limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas concorrente” (BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 42; TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança, cit., p. 225, nota 19). Nesse último caso, o impetrante da segurança e o Representante do Ministério Público serão intimados depois da concessão da liminar (BUENO, Cássio Scarpinella. O Poder Público em Juízo. 5. ed., cit., p. 28-29; ALMEIDA, Úrsula Ribeiro de. A suspensão e o conflito de interesses públicos, cit., p. 127). Para obtenção da suspensão da segurança não há necessidade de esgotamento das instâncias ordinárias (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS 855/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 29.05.2008, DJe 12.06.2008). No mesmo sentido: STJ, CE, AgRg na SLS 1.078/MT, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 18.08.2010, DJe 10.09.2010.

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STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.045/RJ, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 04.08.2004, DJU 30.08.2004, p. 194. DINAMARCO, Cândido Rangel. Mandado de suspensão do mandado de segurança pelo Presidente do Tribunal. Apud QUARTIERI, Rita et al. Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 384. No mesmo sentido: GRINOVER, Ada Pellegrini. Mandado de segurança: Tutela preventiva inibitória e específica. A suspensão da segurança. In: DONNINI, Rogério; CARRAZA, Roque Antônio (coords.). Temas atuais de direito. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 26. STJ, Corte Especial, AgRg na SS 1.021/SC, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 29.08.2002, DJU 26.05.2003, p. 241. QUARTIERI, Rita. Op. cit., p. 384. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo, cit., 7. ed., p. 534. STJ, Corte Especial, AgRg na Rcl 3.503/PI, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 07.10.2009, DJe 29.10.2009. No mesmo sentido: STJ, Corte Especial, AgRg na Rcl 5.037/MS, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 29.08.2012, DJe 06.09.2012. STJ, 1ª T., RMS 20.986/MG, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 16.12.2008, DJe 18.02.2009. STF, Pleno, AgRg na SS 780/PI, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.06.1996, DJU 20.09.1996, p. 34.542. TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança, cit., p. 227. Para a Suprema Corte, “a eficácia da decisão do Presidente do Supremo Tribunal Federal, proferida no exercício do poder de contracautela (Lei nº 4.348/64, art. 4º), não obstante inicialmente limitada à suspensão de liminar mandamental, também paralisa, por efeito da prospectividade que lhe é inerente, todas as consequências jurídicas decorrentes da ulterior concessão do mandado de segurança, desde que o conteúdo daquele provimento liminar revele-se idêntico ao do acórdão que deferiu o ‘writ’ constitucional. Esse efeito prospectivo – que inibe a produção da carga eficacial resultante do deferimento do mandado de segurança – perdurará até que sobrevenha o trânsito em julgado do acórdão que concedeu a ordem mandamental. Precedente” (STF, Pleno, Rcl 718/PA, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 30.04.1998, DJU 03.10.2003, p. 10). BEZERRA, Isabel Cecília de Oliveira. Suspensão de tutelas jurisdicionais contra o Poder Público. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 268. Mantida a identidade de objeto entre a liminar e a sentença de mérito, a vigência temporal da suspensão da medida inicial perdura “até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal”, nos exatos termos da Súmula nº 626 do STF (STJ, Corte Especial, Rcl 3.503/ PI, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 07.10.2009, DJe 29.10.2009). TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança, cit., p. 229. QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança, cit., p. 381; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, nº 41, p. 98. A jurisprudência é precisa: “Pedido de suspensão de medida liminar. Causa com fundamento constitucional. Competência do Supremo Tribunal Federal. Se a causa petendi é de natureza constitucional, nada importa a dimensão infraconstitucional que lhe tenha dado o juiz ou o tribunal local, nem o fundamento do pedido de suspensão; a vocação dela é a de ter acesso ao Supremo Tribunal Federal. Agravo

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regimental não provido” (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS 1.372/ RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 15.06.2011, DJe 23.09.2011). Eis uma decisão monocrática do Min. Ayres Brito, proferida em 21.05.2012, que bem define o regime de renovação do pedido de segurança cogitado pelo art. 15 da Lei nº 12.016: “A renovação somente é permitida após o julgamento proferido no agravo interno. Ainda que rejeitado o pedido de suspensão, a Fazenda Pública não poderá, desde logo, renová-lo ao Tribunal Superior. Deverá, antes disso, interpor o agravo interno e aguardar seu julgamento. Confirmada, no julgamento do agravo interno, a rejeição do pedido da suspensão, caberá, somente a partir daí, sua renovação para o Presidente do respectivo Tribunal Superior” (TOVAR, Leonardo Zehuri. O pedido de suspensão de segurança, cit., p. 234). MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 182. No dizer de LEONARDO ZEHURI TOVAR, “trata-se de verdadeira medida de economia processual, porquanto se permite que, através de uma decisão, que o Presidente do Tribunal suspenda, várias liminares de conteúdo igual, fazendo-se com que tal pronunciamento alcance novas liminares que venham a ser concedidas ulteriormente, evitando-se, em uma só tacada, que pronunciamentos de conteúdo diverso tenham eficácia” (O pedido de suspensão de segurança, Revista de Processo, v. 224, p. 235). STF, Pleno, SS3.652 AgR/AM, Rel. Min. Gilmar Mendes, ac. 01.07.2009, DJe 20.08.2009. BUENO, Cássio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança, cit., nº 44, p. 103. STJ,PExtnaSS2.351/BA,Min.AriPargendler,decisãomonocrática14.01.2011, DJe01.02.2011. STJ, Corte Especial, AgRg na SS 2543/BA, Rel. Min. Ari Pargendler, Rel. p/ ac. Min. Presidente do STJ, ac. 15.02.2012, DJe 09.03.2012.

Capítulo XVII MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS Art. 16. Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a instrução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julgamento do mérito ou do pedido liminar (Redação dada pela Lei nº 13.676/2018). Parágrafo único. Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar caberá agravo ao órgão competente do tribunal que integre. Súmula: Súmula nº 622/STF: Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança (superada pela Lei nº 12.016).

Comentários ao art. 16 118. MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DE TRIBUNAL Os mandados de segurança que se processam originariamente nos Tribunais são definidos, em relação ao STF, ao STJ e aos Tribunais Federais, pela Constituição Federal. Em relação aos Tribunais de Justiça, a matéria é tratada pelas Constituições Estaduais e pela legislação de organização judiciária local. Em todos os casos, o critério empregado para a instituição desse foro privilegiado leva sempre em conta a autoridade apontada, na impetração, como coatora. O art. 16 da Lei nº 12.016 cuida de particularizar, no procedimento do mandado de segurança de competência dos tribunais, as atividades processuais atribuídas ao relator. São elas resumidas na expressão “instrução do processo”, que nos juízos colegiados compreende não só a coleta das provas, como também os atos de ordenamento e preparo do feito, para o julgamento coletivo. Assim, compete ao relator, em primeiro lugar, verificar se está regular a petição inicial. Detectados vícios, deficiências ou omissões, determinará a intimação do impetrante para emendá-la ou complementá-la, se o defeito for sanável (CPC/2015, art. 321). Configurada a inépcia da inicial, insanável ou não sanada em tempo hábil, o relator a indeferirá, extinguindo o processo no nascedouro, sem apreciação do mérito da causa (Lei nº 12.016, art. 10, § 1º). Estando em ordem a petição inicial, o relator a despachará, ordenando as diligências previstas

no art. 7º da Lei do Mandado de Segurança, quais sejam: (i) a notificação do coator, para prestar as informações necessárias; (ii) a cientificação (rectius: citação) do feito à pessoa jurídica a que se acha vinculada a autoridade coatora, para responder, querendo, à ação; (iii) a suspensão do ato impugnado, quando for relevante o fundamento da impetração e houver risco de ineficácia da segurança, se tiver de aguardar a sentença; e (iv) a exigência de caução, quando cabível. Colhidas as manifestações do coator e do representante judicial da pessoa jurídica interessada, dará vista ao impetrante para cumprir-se o contraditório assegurado pela Constituição (art. 5º, LV), e ao representante do Ministério Público, para opinar como fiscal da lei. O ato final do relator, de preparo para o julgamento, é o relatório, que resumirá as manifestações das partes e demais intervenientes no processo e historiará os eventos processuais relevantes ocorridos até então.

119. SUSTENTAÇÃO ORAL Levado o mandado de segurança à sessão de julgamento coletivo, o relator procederá à leitura do relatório, ficando assegurado, em seguida, o debate oral da causa entre os litigantes (Lei nº 12.016, art. 16, caput, in fine). A lei não especificava em quais julgamentos do processo mandamental haveria o debate oral, mas também não o restringia àqueles destinados à resolução do mérito. Correto, portanto, se me afigurava a exegese de CÁSSIO SCARPINELLA BUE-NO, no sentido de que restou assegurada a sustentação oral em todas as sessões de julgamento, em colegiado, de mandado de segurança, inclusive, pois, às do agravo interno manejado contra o ato de relator que denega liminarmente a segurança ou que decide acerca da suspensão liminar do ato impugnado. É que, versando a norma sobre o devido processo legal e o contraditório, temas erigidos à categoria de direitos e garantias fundamentais, a interpretação terá sempre de ser feita de maneira ampliativa, e nunca restritiva1. A lacuna da Lei do Mandado de Segurança foi suprida pela Lei nº 13.676/2018, que alterou o disposto no caput do art. 16 para explicitar que a defesa oral será assegurada tanto na sessão de julgamento do mérito como na do pedido liminar. Em decorrência da garantia de sustentação oral, torna-se obrigatória a prévia inserção do feito em pauta de julgamento publicada na imprensa oficial, com intimação dos advogados das partes2.

120. RECORRIBILIDADE DA DECISÃO DO RELATOR SOBRE A LIMINAR DO MANDADO DE SEGURANÇA Ao estatuir, o parágrafo único do art. 16 da Lei nº 12.016, que “da decisão do relator que

conceder ou denegar a medida liminar caberá agravo ao órgão competente do tribunal que integre”, a nova Lei do Mandado de Segurança reagiu, frontalmente, contra a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal. Com efeito, sob o regime da Lei nº 1.533/1951, o STF consolidara, no Enunciado nº 622 de sua Súmula, a tese que negava, peremptoriamente, o cabimento de recurso contra a decisão do relator que concedesse ou indeferisse medida liminar em mandado de segurança3. Diante da inovação normativa da Lei nº 12.016, reconheceu o próprio Supremo Tribunal Federal que sua Súmula nº 622 não mais subsiste4. Resta agora categoricamente assegurado, em lei, o direito de recorrer da decisão do relator, nos mandados de segurança de competência originária de tribunal, tanto quando defira como quando indefira a liminar5.

121. O AGRAVO INTERNO O agravo interno (diz-se “interno” porque não se endereça a outro tribunal, mas àquele de que o relator é órgão) é previsto não apenas para a decisão do relator sobre a liminar de suspensão do ato impugnado (art. 16, parágrafo único), mas também para o ato de indeferimento liminar da própria segurança (art. 10, I). Há, ainda, autorização do mesmo tipo de agravo nos casos de suspensão dos efeitos da liminar ou da segurança (art. 15). O art. 16, parágrafo único, da Lei nº 12.016 não explicita qual o prazo em que o agravo interno poderá ser interposto. Aplica-se, portanto, a regra geral para suprimento de lacunas legislativas, em torno de prazos, ou seja, não havendo previsão legal, será de cinco dias o prazo para a prática de ato processual a cargo da parte (CPC, art. 218, § 3º 6)7. Na contagem do prazo em questão, admite-se a duplicação prevista nos arts. 180 e 2298 do CPC/2015, para a Fazenda Pública e o Ministério Público, assim como para os litisconsortes com diferentes procuradores9. É razoável que assim se pense, porque o prazo do agravo interno, in casu, não é regido por regra especial da Lei do Mandado de Segurança, mas por aplicação subsidiária do CPC.

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BUENO, Cássio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança, cit., n. 46, p. 108. MIRNA CIANCI, todavia, discorda do entendimento de CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, de estender o debate oral também ao julgamento do agravo interno, contra decisão do relator, mencionado no parágrafo único do art. 16 da Lei nº 12.016/2009, que não se refere ao julgamento do mandado de segurança, mas apenas do incidente de suspensão liminar do ato do coator (CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança.

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São Paulo: Saraiva, 2011, p. 390). STJ, 3ª T., RMS 5.783/RS, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac. 20.11.2001, DJU 18.02.2002, p. 402; STJ, 5ª T., RMS 7.143/RJ, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 16.04.1998, DJU 29.06.1998, p. 232. Registra EDUARDO ARRUDA ALVIM que, embora fosse rigorosa a aplicação da Súmula nº 622 nos processos de competência originária do STF, aquela própria Corte reconhecia que outros tribunais não estavam impedidos de admitir agravo interno contra decisão de relator em sede de liminar em mandado de segurança, com base em seus regimentos internos (STF-Pleno, Rcl 5.082 AgR/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 19.04.2007, DJU 04.05.2007, p. 30; STF-Pleno, RcL 1.616/PE, Rel. p/ ac. Min. Maurício Corrêa, ac. 28.04.2003, DJU 13.06.2003, p. 11). “Mandado de segurança – Liminar – Recurso. Ante a nova Lei do Mandado de Segurança, explicitou-se o cabimento de recurso contra decisão monocrática que implique o deferimento ou o indeferimento da liminar, havendo o Plenário declarado, na apreciação do Agravo Regimental na Medida Cautelar no Mandado de Segurança nº 28.177/DF, a insubsistência do Verbete nº 622” (STF, Pleno, AgRg no MS 25.563/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 09.12.2010, DJe 10.02.2011). Mesmo antes da entrada em vigor da lei atual, o STJ já vinha decidindo pela não aplicabilidade da Súmula nº 622 do STF, para admitir o agravo regimental contra a decisão do relator que concedesse ou negasse a liminar do mandado de segurança (STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 9.945/DF, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 10.11.2004, DJU 13.12.2004, p. 198; STJ, Corte Especial, AgRg no MS 11.961/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 16.05.2007, DJU 19.11.2007, p. 177; STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 13.407/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 28.05.2008, DJe 02.02.2009). CPC/73, art. 185. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., nº 47, p. 109. Por analogia com o art. 557, § 1º, do CPC [de 1973], MIRNA CIANCI chegava à mesma conclusão de ser de cinco dias o prazo a que se submete o agravo interno regulado pela art. 16, parágrafo único, da Lei nº 12.016/2009 (CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de et al. Mandado de Segurança, cit., p. 391). Raciocínio que também é adotado por PEDRO ROBERTO DECOMAIN (Mandado de Segurança, (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 414). CPC/73, arts. 188 e 191. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 109.

Capítulo XVIII NOTAS TAQUIGRÁFICAS DAS SESSÕES DE JULGAMENTO Art. 17.

Nas decisões proferidas em mandado de segurança e nos respectivos recursos, quando não publicado, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data do julgamento, o acórdão será substituído pelas respectivas notas taquigráficas, independentemente de revisão. Súmula: Súmula nº 392/STF: O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade para cumprimento da decisão.

Comentários ao art. 17 122. SUBSTITUIÇÃO DO ACÓRDÃO PELAS NOTAS TAQUIGRÁFICAS Prevê o art. 17 da Lei nº 12.016 a possibilidade de o acórdão, que não é publicado nos 30 dias seguintes do julgamento, ser substituído pelas respectivas notas taquigráficas. A regra aplica-se ao mandado de segurança de competência originária do tribunal e aos recursos de qualquer mandado, seja ou não de competência originária. A razão de ser da medida decorre da sumariedade da ação e da imperiosidade de sua tramitação e conclusão dentro da maior brevidade possível1. É sabido que, no sistema processual vigente, não se consegue a eficácia dos julgamentos de colegiado, na maioria das vezes, sem que o acórdão seja submetido à publicação em sessão do tribunal e na imprensa oficial. Assim, a burocracia e deficiência do serviço forense pode protelar e até anular a autoridade e oportunidade do julgamento do mandado de segurança. Não se trata apenas da expedição da ordem deferida contra a autoridade coatora, pois esta, a Lei nº 12.016 permite seja expedida de imediato, sem depender da solenidade da publicação (art. 13, e seu parágrafo único); mas de qualquer ato que a parte queira praticar em função daquilo que restou decidido no acórdão do tribunal, como, vġ., os embargos de declaração, o levantamento de caução, o manejo de recurso contra o deferimento ou o indeferimento da segurança etc. Entretanto, é bom advertir para o fato de que as notas taquigráficas não são, via de regra, juntadas imediatamente aos autos. Acham-se elaboradas, como é comum, em linguagem cifrada ou constam, no todo ou em parte, de outras formas de gravação eletrônica, sendo tais registros conservados nas secretarias para servir de base à redação do acórdão2. Portanto, para se valer da

medida autorizada pelo art. 17 da Lei nº 12.016, a parte interessada deverá requerer a tradução das referidas notas ou gravações e sua juntada ao processo, para, em seguida, fundar-se nelas a fim de extrair o efeito desejado. Não se há de pensar que apenas o transcurso de 30 dias da sessão de julgamento seja suficiente para produzir a substituição do acórdão pelas notas taquigráficas. O que não se acha nos autos, não existe para o processo (quod non est in actis non est in mundo). Se tal pudesse acontecer, a regra excepcional do art. 17, em vez de proteger a parte, acabaria por desservi-la ou prejudicá-la. Como, por exemplo, recorrer sem conhecer, nos autos, o teor do decisório a impugnar? O prazo para recurso, portanto, somente começará a fluir quando a parte tiver conhecimento da juntada, a seu requerimento, da transcrição das notas taquigráficas nos autos. Só dessa maneira a garantia de ampla defesa será cumprida, diante da substituição anômala do acórdão pelas notas taquigráficas3. Uma das virtudes da nova regra contida no art. 17 da Lei nº 12.016 é a de encerrar a polêmica, criada por certa jurisprudência dos Tribunais Superiores, que não admitia a interposição de recurso antes da publicação dos acórdãos ou das decisões singulares, valendo-se de uma estranha equiparação entre recurso prematuro e recurso intempestivo4. Aliás, o CPC/2015 também tomou posição clara a respeito da matéria, dispondo, expressamente, que “será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo” (art. 218, § 4º). Assim, sepultada restou a jurisprudência velha que considerava intempestiva a interposição do recurso antes da publicação da decisão impugnada.

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“O preceito em comento, inspirado na EC 45/2004, que inseriu o inc. LXXVIII no art. 5º, da CF/1988, imprime maior celeridade ao mandado de segurança, substituindo o acórdão, pelas notas taquigráficas, independente da revisão, de molde a produzir os efeitos jurídicos--processuais, antes alinhados, autorizando o interessado a adotar as providências que entenda pertinente ultrapassado o prazo de trinta dias da data do julgamento” (DYRLUND, Poul Erik. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.). Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 133). Como se depreende do art. 103, § 3º, do RISTJ, as notas da sessão de julgamento não vão diretamente para os autos. São encaminhadas, naquele Tribunal, como de resto na maioria das Cortes Judiciárias, ao Gabinete do Ministro (ou do Desembargador), que as revisará e rubricará, devolvendo-as à secretaria no prazo de 20 dias (CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de et al. Mandado de Segurança, cit., p. 393). A substituição do acórdão se dá independentemente de revisão das notas pelos julgadores, mas não prescinde da respectiva juntada aos autos. “Não se trata, segundo a previsão legal, de mero paliativo para específicos fins recursais, mas, bem diferentemente, de documentação suficiente daquela decisão a partir das notas de julgamento sobre ela existentes. Assim, passados trinta dias do proferimento da decisão, pode ter início a execução (no sentido amplo de efetivação ou de

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realização prática do quanto decidido) independentemente de sua publicação. Para tanto, também devem ser apresentadas, a pedido das partes, do Ministério Público e de eventuais terceiros, as notas taquigráficas respectivas” (g.n.) (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2009, p. 110). “É intempestivo o apelo especial interposto antes da publicação do v. acórdão recorrido” (STJ, 5ª T., AgRg no Ag 497.986/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 18.09.2003, DJU 28.10.2003, p. 337). Em sentido contrário: “Tempestivo o recurso oferecido antes da intimação do ato recorrido” (STJ, 2ª T., AgRg no Ag 655.610/MG, Rel. Min. Castro Meira, Relator p/ ac. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 05.04.2005, DJU 01.08.2005, p. 399). O CPC posicionou-se no sentido da última tese (art. 218, § 4º), pondo fim à antiga controvérsia.

Capítulo XIX RECURSOS EM MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS Art. 18. Das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pelos tribunais cabe recurso especial e extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso ordinário, quando a ordem for denegada. Referências legislativas: CF, Art. 102: Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) II – julgar, em recurso ordinário: a) O habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. CF, Art. 105: Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) II – julgar, em recurso ordinário: (...) b) Os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão; III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004); c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal. Súmulas: Súmula nº 272/STF: Não se admite como ordinário recurso extraordinário de decisão denegatória de mandado de segurança. Súmula nº 281/STF: É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada. Súmula nº 299/STF: O recurso ordinário e o extraordinário interpostos no mesmo processo de mandado de segurança, ou de “habeas corpus”, serão julgados conjuntamente pelo tribunal pleno. Súmula nº 319/STF: O prazo do recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal, em “habeas corpus” ou mandado de segurança, é de cinco dias (Súmula superada). Súmulas nº 392/STF: O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade para cumprimento da decisão.

Comentários ao art. 18 123. SISTEMA RECURSAL APLICÁVEL AO MANDADO DE SEGURANÇA Ao contrário da Lei nº 1.533/1951, que era bastante lacunosa no tratamento dos recursos, a Lei nº 12.016/2009 se ocupou, amplamente, de instituir um sistema recursal, aplicável tanto às decisões

de primeiro grau de jurisdição como às dos tribunais. Só se omitiu em relação aos embargos de declaração, o que, de modo algum, pode ser interpretado como uma vedação ou restrição ao seu uso no procedimento do mandado de segurança1. A existência e indispensabilidade de tal recurso em todo e qualquer procedimento judicial decorre de um imperativo lógico da própria natureza dos provimentos processuais. A resolução das questões deduzidas em juízo exige respostas claras, precisas e completas. Ao proferir sentença ou acórdão, exige a lei, como requisito essencial do decisório, que o órgão judicial resolva as questões que as partes lhe submeteram (CPC/2015, art. 489, III2). E, para que essa resolução cumpra o dever estatal de prestação de tutela jurisdicional plena (CF, art. 5º, XXXV) e fundamentada (CF, art. 93, IX), o CPC impõe ao julgador decidir o mérito “nos limites propostos pelas partes” (art. 1413), proferindo decisão “certa”, ainda quando decida relação jurídica condicional (art. 492, parágrafo único4). Os julgamentos judiciais são incompatíveis com a dúvida e incompletude. Sentença incerta é sentença inexequível e potencialmente nula5. Por isso, e para evitar que essa invalidez se consuma, é que existem os embargos de declaração (CPC/2015, art. 1.0226), os quais permitem à parte pedir ao juiz ou tribunal prolator da decisão que “afaste obscuridade, supra omissão ou elimine contradição existente no julgado ou corrija erro material”7. Nessa perspectiva, “qualquer decisão judicial comporta embargos declaratórios, porque, como destaca BARBOSA MOREIRA8, é inconcebível que fique sem remédio a obscuridade, a contradição ou a omissão existente no pronunciamento jurisdicional. Não tem a mínima relevância ter sido a decisão proferida por juiz de primeiro grau ou tribunal superior, em processo de conhecimento, de execução ou cautelar, nem importa que a decisão seja terminativa, final ou interlocutória”9. Não se pode, de tal sorte, pôr em dúvida o cabimento dos embargos de declaração em face de decisões obscuras, omissas ou contraditórias pronunciadas no curso da ação de mandado de segurança. Feitas essas observações, pode-se estabelecer o seguinte quadro de recursos manejáveis no processo do mandado de segurança: a)

agravo de instrumento, manejável tanto contra o indeferimento como contra o deferimento da medida liminar por ato do juiz de primeiro grau (art. 7º, § 1º)10;

b)

agravo interno, manejável nos mandados de segurança de competência originária de tribunal, contra decisão singular do relator que indefira a inicial (art. 10, § 1º)11;

c)

agravo interno, contra decisão do relator que conceda ou denegue a medida liminar (art. 16, parágrafo único)12;

d)

agravo interno, contra decisão do presidente do tribunal que suspende a execução da liminar ou da sentença (art. 15, caput)13;

e)

recurso especial e recurso extraordinário das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pelos tribunais, nos casos legalmente previstos (art. 18)14;

f)

recurso ordinário, quando, em causa de competência originária de tribunal, a ordem for denegada (art. 18, in fine)15;

g)

apelação da sentença do juiz de primeiro grau que denegue ou conceda o mandado (art. 14)16;

h)

apelação contra o indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau (art. 10, § 1º)17;

i)

embargos de declaração, manejáveis em todos os graus de jurisdição contra qualquer decisão que apresente obscuridade, lacuna ou contradição (CPC, art. 1.022).

Sobre o sistema recursal exposto, ver, ainda, os nºs 96 a 100, que tratam, também, do duplo grau de jurisdição necessário no caso de sentença concessiva da segurança por juiz de primeira instância (Lei nº 12.016, art. 14, § 1º)18.

124. RECURSOS PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Quando o Tribunal conhece do mandado de segurança, no exercício do segundo grau de jurisdição, a recorribilidade para o STF e para o STJ é a mesma que se observa nas causas cíveis em geral: o recurso extraordinário para o STF cabe nas hipóteses do art. 102, III, da CF19, e o recurso especial para o STJ é admissível nas hipóteses do art. 105, III, também da CF20. A particularidade lembrada pelo art. 18 da Lei nº 12.016 é que, nos termos da Constituição, as decisões dos tribunais de segundo grau em mandados de segurança podem chegar aos Tribunais Superiores, ora por recurso extraordinário e especial, ora por recurso ordinário. Cumpre, pois, destacar quando cabe este último recurso, já que seu emprego foge do sistema comum de acesso recursal ao STF e ao STJ.

125. RECURSO ORDINÁRIO O recurso ordinário, em primeiro lugar, tem seu cabimento previsto apenas para os mandados de segurança de competência originária dos tribunais. Além disso, sua admissibilidade só se dá, em tais ações, “quando a ordem for denegada” (Lei nº 12.016, art. 18, in fine)21. Quando, pois, a ordem for deferida, pouco importa se em grau recursal, ou em instância única, o recurso não será o ordinário, mas o extraordinário (se o tema for constitucional) ou o especial (se infraconstitucional for o debate). Tanto o STF como o STJ não toleram o erro da parte que interpõe recurso extraordinário ou especial em face de acórdão que concede (e não denega) a ordem. Recusam a aplicação do princípio da fungibilidade recursal por qualificar de erro grosseiro o

cometido pelo recorrente22. Segundo a jurisprudência, há erro grosseiro tanto quando se usa o recurso especial contra acórdão que denega a segurança23, como quando se interpõe o ordinário contra o que concede a ordem24.

126. CONCEITO DE DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA O cabimento do recurso ordinário, na dicção da Constituição, só ocorre quando a decisão do tribunal é denegatória do mandado de segurança (CF, arts. 102, II, a, e 105, II, a). De início, houve discussão doutrinária quanto a ser denegatória apenas a decisão que indeferisse a segurança pelo mérito, ou se também mereceria igual qualificativo a que indeferisse a impetração sem apreciação do mérito. A doutrina majoritariamente se inclinou pelo sentido mais amplo25, visto que o recurso ordinário integra a tutela fundamental que a Constituição programou para todo aquele que faz jus ao mandado de segurança. O recurso ordinário, portanto, sendo orientado a beneficiar o impetrante, por seu maior espectro e alcance26, há de ser interpretado e aplicado segundo o princípio da máxima eficiência de todas as regras constitucionais, principalmente as que cuidam dos direitos fundamentais27. O mesmo se passa com a jurisprudência28.

127. PRAZO DO RECURSO ORDINÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO Não há na Lei nº 12.016 definição do prazo para interposição do recurso ordinário. Seria o caso de observar-se, portanto, o prazo geral de cinco dias, que é aquele previsto para preencher as omissões do legislador processual civil (CPC/2015, art. 218, § 3º). No STF havia, ao tempo da legislação velha, solução em sua Súmula jurisprudencial: “o prazo do recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal, em habeas corpus ou mandado de segurança, é de cinco dias” (Súmula nº 319). Jurisprudência mais nova, todavia, o fixa em 15 dias, “consoante aplicação analógica, art. 33 da Lei n. 8.038/90”29. Quanto ao duplo grau de jurisdição obrigatório, à falta de previsão na Constituição e na Lei do Mandado de Segurança, não se aplica a regra do reexame necessário ao julgado, em processo de competência originária de tribunal, que conceda a ordem impetrada. İn casu, o acesso ao STF ou ao STJ somente será viável por meio dos recursos voluntários30. Note-se, por último, que a contagem do prazo para o recurso ordinário se conta segundo a intimação e as regras do CPC, inclusive nos casos de duplicação previstos nos arts. 180 e 229 daquele Código. A autoridade coatora, todavia, não sendo nem litisconsorte, nem se identificando com a Fazenda Pública, não faz jus à contagem do prazo em dobro31.

128. JULGAMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO O recurso ordinário aplicável ao julgamento denegatório de mandado de segurança, processado originariamente por tribunal, tem as mesmas dimensões de uma apelação32. Diante disso, o STJ vinha decidindo que se aplica ao recurso ordinário, no caso de denegação da segurança por preliminar processual, a regra do art. 1.013, § 3º 33, do CPC/2015, que permite ao Tribunal ad quem entrar na apreciação do mérito, se cassar a sentença terminativa recorrida34. Entretanto, recentemente mudou o posicionamento para dizer que: “jurisprudência dominante do Tribunal no sentido de não ser possível aplicar, no julgamento de recurso ordinário em mandado de segurança, o § 3º do art. 515 do Código de Processo Civil”35 (o dispositivo arrolado pelo acórdão é do CPC/1973, que corresponde ao art. 1.013, § 3º, do CPC/2015). O STF também adota a tese de que a regra do art. 1.013, § 3º, do CPC é de aplicação restrita às sentenças do primeiro grau de jurisdição, não se aplicando aos recursos ordinários processados entre tribunais de 2º grau e os Tribunais Superiores (STJ e STF). Assim, o STF, ao prover o recurso ordinário contra acórdão do tribunal inferior que se limitou a analisar questões preliminares, não vai além da cassação do aresto recorrido. Operada a reforma do julgado, os autos são restituídos ao tribunal de origem, para que este enfrente, em novo julgamento, o mérito da impetração36. Os atualizadores da obra de HELY LOPES MEIRELLES (Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes) preferem a tese inicial do STJ à do STF, no sentido de aplicar, também ao recurso ordinário do mandado de segurança, a regra do art. 1.013, § 3º, do CPC, de modo a franquear ao tribunal superior, desde logo, o julgamento da lide, que a decisão recorrida não chegara a enfrentar37.

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“A omissão legislativa, entretanto, não agasta o cabimento dos embargos de declaração contra qualquer decisão proferida em sede de mandado de segurança” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 169). CPC/73, art. 458, III. CPC/73, art. 128. CPC/73, art. 460, parágrafo único. AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Max Limonad, 1973, v. III, nº 654, p. 45- 46; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 59. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, v. I, nº 770, p. 1.099. CPC/73, art. 535. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 51. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, vol. III, nº 799, p.1.120; AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas, cit., III, nº 761, p. 169-170.

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BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Ċomentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. V, nº 298, p. 544. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., loc. cit. No regime da Lei nº 1.533/1951, não havia previsão a respeito, e na jurisprudência era frequente o entendimento de ser irrecorrível a decisão pertinente a medida liminar do mandado de segurança. A Lei nº 1.533/1951 não previa expressamente esse recurso, mas a jurisprudência o admitia, regularmente. Restou, portanto, superada a Súmula nº 622 do STF, que não admitia o cabimento de agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança. Agora o art. 16, parágrafo único, da Lei nº 12.016 é taxativo: cabe agravo, na espécie. Prevaleceu a tese adotada pelo STJ: “cabe agravo regimental da decisão que indefere liminar em mandado de segurança” (STJ, Corte Especial, AgRg no MS 1.622/DF, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 09.04.1992, DJU 15.06.1992, p. 9.212). O agravo em questão já era admitido pela Lei nº 4.348/1964, art. 4º. O prazo de interposição, porém, foi reduzido de dez para cinco dias (Lei nº 12.016, art. 15, caput). Súmula nº 392 do STF: “O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficial de suas conclusões, e não da anterior ciência à autoridade para cumprimento da decisão”. Aplica-se, também, ao recurso ordinário, a Súmula nº 392 do STF. Igual previsão contava do art. 12 da Lei nº 1.533/1951. Igual previsão contava do art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 1.533/1951. Os embargos infringentes (CPC/1973, art. 530) são excluídos, expressamente, do âmbito do mandado de segurança pelo art. 25 da Lei nº 12.016/2009. Esse recurso, entretanto, foi abolido pelo CPC/2015, substituindo-o um sistema de quórum maior para aperfeiçoar o julgamento não unânime da apelação. Esse sistema pode ser aplicado ao mandado de segurança, visto que não tem a forma nem a natureza do antigo recurso de embargos de divergência. CF: “Art. 102. Compete ao Superior Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) III – Julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal”. CF: “Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) III – Julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”. CF, Art. 102: “Compete ao Supremo Tribunal Federal (...) II – Julgar, em recurso ordinário: a) (...) o mandado de segurança e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão”. CF, Art. 105: “Compete ao Superior Tribunal de

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Justiça: (...) II – Julgar, em recurso ordinário: a) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Direito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão”. “Não se admite como ordinário recurso extraordinário de decisão denegatória de mandado de segurança” (Súmula nº 272 do STF). “Tendo sido a segurança denegada originariamente pelo Tribunal de Justiça estadual, cabível era o recurso ordinário. A interposição de recurso extraordinário, mesmo que a causa esteja adstrita a questões constitucionais, é inadmissível e configura evidente erro grosseiro. Incabível a postulação alternativa de conversão do recurso extraordinário em ordinário e na remessa do mesmo para o Superior Tribunal de Justiça. Inescusável o erro grosseiro, não há como aplicar-se o princípio da fungibilidade. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF, 1ª T., AI 145.553-AgRg/PI, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 09.02.1993, DJU 26.02.1993, p. 2.359, RTJ 147/327). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., RMS 993-0/GO, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 02.09.1992, RSTJ 43/144; STJ, 2ª T., RMS 5900/PR, Rel. Min. José de Jesus Filho, ac. 09.03.1994, LEX-JSTJ 60/76; STJ, 2ª T, AgInt no Ag 1.433.829/MG, Rel. Min. Assusete Magalhães, ac. 26.09.2017, DJe 04.10.2017. “Considera-se erro grosseiro e inescusável a interposição de recurso especial no lugar de recurso ordinário constitucionalmente previsto, razão pela qual não há como ser aplicado o princípio da fungibilidade. Recurso especial não conhecido” (STJ, 5ª T., REsp 784.695/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 26.05.2009, DJe 29.06.2009). “Logo, é inadmissível recurso ordinário interposto contra acórdão que concedeu a segurança almejada (...) a interposição equivocada pelo impetrante configura erro grosseiro, pois injustificada a dúvida quanto à irresignação cabível e insuscetível de aplicação do princípio da fungibilidade recursal (...)” (STJ, 1ª T., RMS 27.961/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 25.08.2009, DJe 03.09.2009). Por outro lado, “a interposição de recurso ordinário contra acórdão prolatado em apelação em mandado de segurança, em que não há dúvida objetiva acerca de qual recurso seria cabível, configura erro grosseiro, o que afasta a aplicação do princípio da fungibilidade. Agravo regimental improvido” (STJ, 6ª T., AgRg no RMS 15.126/ SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 18.12.2008, DJe 16.02.2009). DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 468; ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2008, p. 658; BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O novo processo civil brasileiro. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 158; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2009, p. 112; ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de Segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 366. “Com efeito, o recurso ordinário permite o reexame amplo (o efeito devolutivo dessa modalidade recursal é o mais largo possível, tal qual sucede com o recurso de apelação) pelos Tribunais Superiores (STJ e STF) das decisões proferidas em grau de competência originária pelos tribunais locais, em julgamento de mandado de segurança, quando denegatória a ordem” (ARRUDA ALVIM. Op. cit., p. 364). CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 1.187. “A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que contra Acórdão proferido em única instância por Tribunais Regionais Federais, dos Estados, do Distrito Federal e Territórios que

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denega, não conhece, extingue ou, de alguma outra forma, deixa de conceder o mandado de segurança, cabe a interposição do recurso ordinário previsto no art. 105, item II, alínea b), da Constituição Federal” (STJ, 3ª T., AgRg no Ag 184.024/SP, Rel. Min. Menezes Direito, ac. 06.12.1999, DJU 08.03.2000, p. 105). No mesmo sentido: STF, AI 743.539/AM, decisão monocrática da Min. Carmen Lúcia, 03.03.2009, DJe 12.03.2009; STJ, 6ª T., RMS 6.566/SP, Rel. Min. Anselmo Santiago, ac. 01.04.1997, DJU 22.04.1997, p. 14.455, RSTJ 94/362. STF, 1ª T., RMS 21.421/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 14.04.1992, DJU 19.06.1992, p. 9.520. No mesmo sentido: STF, 2ª T., RMS 22.295/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 30.05.2000, DJU 30.06.2000, p. 90. Cf., também, Hely Lopes Meirelles et al. Mandado de segurança e ações contitucionais. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, p. 114, nota 241; LIMA, Arnaldo Esteves. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord). Mandado de segurança individual e coletivo. Lei 12.016/2009 comentada 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 139. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., n. 49, p. 113. STJ, 6ª T., REsp 264.632/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 04.09.2007, DJU 19.11.2007, p. 298. STJ, RMS 6.566/SP, Rel. Min. Anselmo Santiago, RSTJ 94/362. CPC/73, art. 515, § 3º. “Aplica-se, por analogia, o art. 515, § 3º, do CPC, ao recurso ordinário em mandado de segurança, viabilizando, por conseguinte, a apreciação do mérito do writ, desde que este não tenha sido instruído com complexo conjunto de provas, a exigir detalhado exame” (STJ, 3ª T., RMS 25.462/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 02.10.2008, DJe 20.10.2008). No mesmo sentido: STJ, 1ª T., RMS 15.877/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 18.05.2004, DJU 21.06.2004, p. 163; STJ, 5ª T., AgRg no RMS 23.777/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima, ac. 08.05.2008, DJe 23.06.2008; STJ, 2ª T., RMS 17.126/ES, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 15.04.2008, DJe 25.04.2008; STJ, 3ª T., RMS 21.683/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 20.03.2007, DJU 16.04.2007, p. 180. STJ, 5ª T., EDcl no RMS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 06.08.2013, DJe 12.08.2013. No mesmo sentido: STJ, 6ª T, RMS 27.493/RN, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 27.03.2012, DJe 11.04.2012; STJ, 3ª T., RMS 25.553/SP, Rel. Min. Massami Uyeda, ac. 03.08.2010, DJe 25.11.2010. STF, 1ª T., ED-RMS 24.309/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 17.02.2004, DJU 30.04.2004, p. 49; STF, 1ª T., RMS 24.789/DF, Rel. Min. Eros Grau, ac. 26.10.2004, DJU 26.11.2004, p. 25, RTJ 192/692; STF, 1ª T., RMS 22.180-5/DF, Rel. Min. Eros Grau, ac. 22.06.2005, DJU 12.08.2005, p. 11; STF, 1ª T., RE 621.473/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 23.11.2010, DJe 23.03.2011. MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais, cit., 32. ed., p. 114.

Capítulo XX MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO COMUM Art. 19. A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais. Súmula: Súmula nº 304/STF: Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria.

Comentários ao art. 19 129. A SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA A sentença é o provimento típico do processo de conhecimento, aquele em que o objetivo da tutela pleiteada é, precipuamente, o acertamento (definição) de uma relação ou situação jurídica conflituosa (uma lide ou litígio). Com a sentença, o órgão judicial responde, afirmativa ou negativamente, ao pedido formulado pelo autor na petição inicial. Dessa maneira, o direito de ação, no processo de conhecimento, não é necessariamente o direito de ver seu direito subjetivo material reconhecido e protegido pelo Poder Judiciário. Tal direito é autônomo e abstrato, em relação à pretensão deduzida pelo autor em juízo, de sorte que o direito de ação será eficaz, não pela tutela dada à situação de vantagem que o autor quis fazer prevalecer em face do réu, mas pela resposta jurisdicional que resolva o litígio existente entre as partes. Entretanto, para se obter essa composição, há alguns requisitos técnicos, como a formação de uma relação jurídica processual válida (pressupostos processuais)1 e, além disso, a satisfação de outros requisitos que, dentro da relação válida, devem ser atendidos para que ela se desenvolva até alcançar o provimento dito de mérito (condições da ação)2. Assim, o encerramento da atividade jurisdicional cognitiva pode acontecer prematuramente, quando faltarem requisitos de ordem técnica, para desenvolvimento válido e regular, ou condições legais para solucionar o litígio, e então se diz que o processo se extinguiu sem resolução de mérito, por falta de pressupostos processuais ou de condições da ação. A sentença, então, é apenas terminativa, porque não compôs o litígio, limitando-se a declarar a falta de condições técnicas para que o conflito fosse enfrentado e solucionado, de maneira efetiva e definitiva (CPC/2015, art. 485, IV e VI).

Quando, porém, todos os pressupostos processuais de validade do processo se acham presentes, e todas as condições da ação foram atendidas, e, afinal, a sentença acolhe ou rejeita o pedido formulado pelo autor na inicial, então terá sido composto (ou resolvido) o litígio, ainda que nem sempre o seja da forma desejada pelo promovente do processo. Esse provimento jurisdicional, que acolhe ou rejeita o pedido do autor, que dá razão ao autor ou ao réu, é o que se chama sentença de mérito (CPC/2015, art. 487, I). O mandado de segurança é, basicamente, um procedimento que se integra no âmbito do processo de conhecimento, tendo sua sentença aptidão para proporcionar resolução de mérito dentro do conflito de direito material trazido a juízo pelo impetrante. Contudo, nem sempre a sentença que põe termo à ação de segurança enfrenta o mérito da causa. Como se trata de remédio processual especial, seu acolhimento pressupõe a satisfação de requisitos que não são apenas os pressupostos e condições reclamados para as ações em geral. Dessa forma, o mandado de segurança pode ser denegado tanto por não ter o impetrante o direito material invocado ou não ter sido ilegal o ato praticado pela autoridade dita coatora, como por não ter sido comprovada a liquidez e certeza do direito subjetivo deduzido em juízo3.

130. COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL EM MANDADO DE SEGURANÇA O processo provoca o surgimento de uma relação jurídica de direito público, que é complexa (porque se forma e se desenvolve à base de uma cadeia de atos jurídicos) e dinâmica (porque exige um movimento constante no rumo de alcançar o provimento jurisdicional, que haverá de resolver o conflito jurídico existente entre as partes). Para que esse provimento pacificador seja alcançado em tempo razoável, como exige o art. 5º, LXXVIII, da CF, e para que o litígio não se eternize, o processo se acha organizado segundo o mecanismo da preclusão, que provoca um caminhar, sempre para frente, sem permitir retrocesso, às partes e ao juízo, aos estágios procedimentais já superados. É nessa perspectiva que o CPC dispõe que, salvo as exceções de lei, “nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide” (art. 5054); e que “é vedado à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão” (art. 5075). Essa sucessão de preclusões acontece ao longo da cadeia dinâmica dos atos processuais, por etapas, até que a sentença ponha fim à relação processual, de modo que a ela cabe provocar a última preclusão, qual seja, a que, extinguindo o processo pelo esgotamento das vias recursais, impedirá, tanto às partes como ao juiz, de prosseguir discutindo e decidindo a lide, objeto do processo definitivamente findo, ou extinto. A essa derradeira preclusão, que aniquila a ação e encerra a prestação jurisdicional, atribui-se

o nomen iuris de coisa julgada, que se manifesta, ordinariamente, em dois planos: um interno, o do processo ultimado; e outro externo, que se projeta para além do processo findo, impedindo que a situação jurídica definida pela sentença volte a ser discutida e rejulgada em qualquer outro processo entre as mesmas partes. A indiscutibilidade do decisório, dentro do processo em que ele foi pronunciado, configura aquilo que na linguagem do direito processual vem a ser coisa julgada formal. Em outros termos, essa res iudicata “interna” faz imutável o ato processual contido na sentença, nos limites do processo findo, impedindo qualquer recurso ou expediente processual destinado a impugná-la, “de modo que naquele processo, nenhum outro julgamento se fará” – como ensina CÂNDIDO DINAMARCO6. Muito mais amplo é o fenômeno da coisa julgada material, visto que a imutabilidade e indiscutibilidade da sentença por ela acobertada “transcende a vida do processo e atinge a das pessoas”, dentro e fora do processo, gerando, rigorosamente, a “intangibilidade das situações jurídicas criadas ou declaradas, de modo que nada poderá ser feito por elas próprias, nem por outro juiz, nem pelo próprio legislador, que venha a contrariar o que foi decidido”7. Toda sentença produz coisa julgada formal, uma vez preclusas todas as possibilidades recursais. Todavia, somente ultrapassa o plano da coisa julgada formal, para alcançar a categoria da coisa julgada material, a sentença que compõe a demanda no mérito, ou seja, aquela que acolhe ou rejeita o pedido do autor, declarando-o, em outras palavras, procedente ou improcedente (CPC/2015, art. 487, I)8. A coisa julgada formal pode aperfeiçoar-se isoladamente, e subsistir por si própria, naqueles processos em que a extinção ocorre sem resolução do mérito, nos termos do art. 485 do CPC (salvo na hipótese de improcedência liminar do pedido, fundada em reconhecimento da decadência ou da prescrição – CPC, art. 332, §1º). Já o mesmo não se passa com a coisa julgada material, uma vez que esta sempre pressupõe a coisa julgada formal como antecedente lógico e necessário. Com efeito, somente após ter a sentença se tornado imodificável dentro do processo em que foi pronunciada é que terá condições de assumir a imutabilidade e indiscutibilidade, também fora dele, isto é, em qualquer outro processo9. Na verdade, a diferença entre a coisa julgada material e a formal é apenas de grau de um mesmo fenômeno, que inicialmente se manifesta dentro do processo, para, em seguida, projetar sua eficácia para o exterior dele10. Os dois fenômenos – a coisa julgada formal e a coisa julgada material – ocorrem, obviamente, no processo do mandado de segurança. Ou seja: quando se defere a segurança, procede-se, sem dúvida, a um julgamento de mérito, que irá em seguida produzir a coisa julgada material, nos moldes da lei processual (CPC, art. 502 e ss.). Da mesma forma, ter-se-á igual res iudicata se a segurança for denegada com o reconhecimento da inexistência do direito subjetivo material discutido. Sendo, contudo, a denegação atribuída à falta ou insuficiência de prova, o caso será de iliquidez e incerteza

do direito, submetendo-se, então, apenas aos efeitos da coisa julgada formal11. É que a falta terá ocorrido no plano das condições de procedibilidade, apenas, na via especial do mandado de segurança. O impetrante, por isso, não ficará inibido de renovar, por meio de ação ordinária, pretensão igual à deduzida no mandamus frustrado (Lei nº 12.016, art. 19)12. Se não esgotado o prazo decadencial do art. 23 da Lei nº 12.016, a parte poderá, até mesmo, renovar a propositura do mandado de segurança que antes fora denegado por iliquidez de direito. Bastará que exiba novas e adequadas provas, como se deduz do § 6º do art. 6º da atual Lei do Mandado de Segurança. Cumpre, por fim, ressaltar, que a sentença concessiva do mandado de segurança não afasta a possibilidade de ajuizamento de ação própria para cobrança de valores anteriores à impetração, por força da Súmula 271/STF: “concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”13. A jurisprudência do STJ adota a Súmula do STF: “os efeitos financeiros da segurança concedida devem retroagir à data de sua impetração, sendo inviável a cobrança de valores pretéritos no mesmo mandamus, nos termos do 14, § 4º, da Lei n. 12.016/2009”14.

131. COISA JULGADA FORMAL EM MANDADO DE SEGURANÇA Segundo o art. 19 da Lei nº 12.016, a decisão que denegar a segurança, sem decidir o mérito, não impedirá o requerente de pleitear seu direito e os respectivos efeitos patrimoniais, por ação própria. Consagrou a lei, portanto, o entendimento antigo do STF: “Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria” (Súmula nº 304/ STF), a que sempre prestou adesão a jurisprudência do STJ15. Trata-se de evidente caso de sentença terminativa, que tem aptidão para gerar coisa julgada apenas formal, já que não terá ultrapassado o plano dos pressupostos processuais e das condições da ação, caso em que o CPC, expressamente, resguarda à parte o direito de interpor de novo a ação (art. 48616). É claro, porém, que a repropositura da demanda terá de ocorrer, para ser eficaz, depois de superadas as deficiências que acarretaram a extinção do primitivo processo sem resolução de mérito. De qualquer forma, a denegação da segurança, de que cogita o art. 19, tem de acontecer de maneira a que não se negue o direito subjetivo material afetado pelo ato da autoridade coatora. O caso mais comum é aquele em que a sentença conclui pela falta ou insuficiência de prova do direito do impetrante. Sendo o mandado de segurança uma ação que somente tutela direito líquido e certo, a respectiva prova se apresenta como uma condição da ação17. Reconhecer, portanto, que a prova adequada não foi produzida pelo impetrante não quer dizer que ele não tenha o direito alegado, mas apenas que, nas condições deficitárias da documentação produzida, não é possível cogitar de sua

eventual tutela pela via especial do mandado de segurança18. Tudo se resolve, pois, por um decreto de carência de ação, vício processual que prejudica o cabimento do mandamus, sem, entretanto, fechar, para o impetrante, a oportunidade de procurar a defesa de seu possível direito por ação própria, em cuja instrução terá oportunidade de ampliar a produção de provas, que não conseguiu completar na sumariedade do mandado de segurança19. A insuficiência da prova reconhecida como causa de denegação da segurança não só permite que a mesma demanda seja renovada por “ação própria”, como até mesmo por outra ação de mandado de segurança, desde que a parte consiga novos documentos para completar a comprovação de suas alegações, e ainda não tenha se escoado o prazo decadencial do art. 23 da Lei nº 12.016. Entretanto, se a sentença denegatória da segurança se der sob o fundamento de que o impetrante não tem o direito alegado na impetração, a coisa julgada não mais será formal, e sim material. Por consequência, não lhe será lícito pleitear sua defesa por meio de outro mandado de segurança, nem por qualquer outra ação20.

132. RESCINDIBILIDADE DA SENTENÇA NO MANDADO DE SEGURANÇA Com a sentença de mérito, que é aquela que defere a segurança, reconhecendo o direito substancial do impetrante ou proclamando sua inexistência, uma vez esgotada a possibilidade de revisão pela via recursal, forma-se a coisa julgada material, que, daí em diante, somente ensejará ataque pelo remédio excepcional da ação rescisória, nos estritos casos do art. 96621 do CPC/2015. Salvo a hipótese de erro de cálculo, ou inexatidões materiais, que se podem corrigir, a qualquer tempo, em embargos à execução ou em impugnação ao cumprimento de sentença, nos termos do art. 494,22 I, do CPC/2015, somente se poderá “desconstituir a coisa julgada no mandado de segurança por meio da competente ação rescisória, prevista no art. 485 do mesmo diploma processual”23. Por outro lado, não há de se cogitar de ação rescisória se a denegação da segurança não se fez com base no mérito da causa, gerando apenas coisa julgada formal. É o que ocorre, por exemplo, “quando o mandado de segurança está baseado em direito cuja existência ainda dependa de decisão judicial advinda de processo cognitivo”, caso em que seu indeferimento se dá “por faltar-lhe pressupostos de admissibilidade (arts. 1º e 8º da Lei n. 1.533/51)”24. Somente a coisa julgada material justifica o cabimento da ação rescisória (CPC, art. 966). Diante da coisa julgada formal não se concebe tenha a parte interesse jurídico na rescisão da sentença, não apenas pela inadequação da ação rescisória, como pela desnecessidade dela para encontrar solução em juízo para o conflito que não chegou a ser objeto de julgamento de mérito em qualquer processo25. Ao interessado estariam, assim, abertas as vias ordinárias de acesso à jurisdição, nada justificando a pretensão de se valer do remédio excepcionalíssimo da ação do art. 966 do CPC.

133. COISA JULGADA E RELAÇÕES JURÍDICAS CONTINUATIVAS Discute-se, em teoria, se seria possível admitir um mandado de segurança que, em sentido preventivo, produzisse coisa julgada sobre uma sucessão futura de atos da mesma espécie. Duas premissas, de início, devem ser levadas em conta: (i) é induvidoso que o mandado de segurança pode ter eficácia tanto sancionatória como preventiva (Lei nº 12.016, art. 1º), o que leva a ter-se, em princípio, como possível seu emprego contra ameaça de lesão futura; e (ii) o fenômeno da coisa julgada convive, perfeitamente, com as relações jurídicas continuativas, somente perdendo sua autoridade, em face das prestações futuras, quando sobrevém “modificação no estado de fato ou de direito” (CPC/2015, art. 505, I26). Se a relação obrigacional é a mesma, e gera prestações que se repetem periodicamente, ao longo do tempo em que o vínculo jurídico se mantém, é perfeitamente possível que o litígio trazido à composição judicial seja solucionado, de uma só vez, para as prestações já vencidas e para as que, só de futuro, se tornarão exigíveis. A coisa julgada estenderá sua eficácia tanto para as prestações atuais, como para as futuras, desde que se mantenha a mesma relação obrigacional e que a norma jurídica reguladora da espécie se conserve inalterada. Em matéria de relação tributária, terreno propício à configuração de situações jurídicas duradouras, de efeitos repetitivos e similares, abundantes são os exemplos de correta aplicação do mandado de segurança, com aptidão para definir as prestações atuais, bem como as futuras, de origem comum. O importante, em tais casos, é conceituar o que realmente é uma relação tributária continuativa e o que é apenas uma eventual repetição de fatos geradores iguais, mas não vinculados à mesma relação básica. HUGO DE BRITO MACHADO ensina que em alguns tributos a situação do contribuinte é tão estável e duradoura que o fisco o insere num cadastro e o faz vincular a um controle permanente, por meio de uma autêntica conta-corrente. É o que se passa, por exemplo, com o ICMS e com o IPI. Em tal conjuntura, a impetração de segurança que tenha por objeto a composição das obrigações repetitivas não pode ser vista como tratando de simples “relação futura”. O caso é típico de “uma relação continuativa já instaurada”27. Se o mandado de segurança, na conformidade com o pedido do impetrante, declara que, dentro dessa situação jurídica, duradoura, não é cabível certa exigência fiscal, “a ordem é permanente”, não se limita ao presente, e durará “enquanto não alterado o substractum”, enquanto não sobrevenha outra lei que incida, de maneira diferente, sobre a relação continuativa28. O que é decisivo é o pedido da parte, isto é, o objeto da ação, pois a sentença é sempre uma resposta a ele. Se o pedido se reportou a um fato gerador isolado, ainda que ligado a uma situação jurídica duradoura, a coisa julgada não incidirá senão sobre aquele fato: a sentença, que julga uma lide (um pedido), “tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida” (CPC/2015, art. 50329). Aplica-se, portanto, a Súmula nº 239 do STF, que afirma que

“decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores”. Muito diferente é o caso em que o impetrante formula pedido extensivo a uma exigência tributária formulada pelo Fisco para atingir, de maneira constante e repetitiva, a situação jurídica já instalada entre o autor e a Fazenda Pública. Diante de pedido como esse, o STF já decidiu que o pedido, formulado em sede de mandado de segurança, pode ser atendido, tanto no que concerne a operações pretéritas, como futuras30. A doutrina demonstra que, tal como se passa nas relações obrigacionais comuns, podem existir relações tributárias instantâneas, como acontece no caso de venda eventual de um imóvel, assim como relações continuativas, como se passa com os contribuintes do ICMS, por exemplo. “No primeiro caso, o fato tributável é autônomo, isto é, nele residem todos os elementos de que se necessita para determinar o valor do tributo a ser pago, e o pagamento extingue não apenas o crédito tributário respectivo, mas a própria relação obrigacional fisco-contribuinte. No segundo caso, o fato tributável não é autônomo, no sentido de que, embora produza, isoladamente, o efeito de criar a obrigação tributária, ele se insere em um conjunto de outros fatos relevantes para a composição da relação jurídica fisco-contribuinte”31. O que fundamentalmente distingue as relações tributárias instantânea e continuativa é a eventualidade do fato gerador, no primeiro caso, e a continuatividade das ocorrências tributáveis, no segundo caso, de maneira a formar “uma atividade mais ou menos duradoura”, levando os sujeitos passivos a serem inscritos em “cadastro específico”. Tal cadastro se faz necessário “precisamente em virtude da continuidade dos acontecimentos relevantes do ponto de vista tributário”32. EDUARDO ARRUDA ALVIM reporta-se aos ensinamentos de BRITO MACHADO para ressaltar que, no campo do direito tributário, a coisa julgada não pode, em regra, se projetar “indefinidamente para situações futuras”, mas, de outro lado, deve-se ponderar que “uma relação tributária continuativa já instaurada não pode ser confundida com uma situação futura”; para concluir, em seguida, que: “O cadastro de contribuintes do ICMS, por exemplo, é um elemento a indicar claramente que, na verdade, a relação tributária do contribuinte de ICMS para com o Fisco estadual é a mesma, renovada a cada período de apuração”33. Na jurisprudência atual do STJ é esse o entendimento dominante, de sorte que se devem distinguir “relações apenas sucessivas” – cuja solução judicial se restringe aos “fatos já ocorridos” – e as autênticas “relações continuativas”, cuja composição em juízo se projeta duradouramente, sobre a cadeia dos eventos já consumados, perdurando sobre os que dão continuidade à mesma situação jurídica. “(...) há certas relações jurídicas sucessivas que nascem de um suporte fático complexo,

formado por um fato gerador instantâneo, inserido numa relação jurídica permanente. Ora, nesses casos, pode ocorrer que a controvérsia decidida pela sentença tenha por origem não o fato gerador instantâneo, mas a situação jurídica de caráter permanente na qual ele se encontra inserido, e que também compõe o suporte desencadeador do fenômeno de incidência. Tal situação, por seu caráter duradouro, está apta a perdurar no tempo, podendo persistir quando, no futuro, houver a repetição de outros fatos geradores instantâneos, semelhantes ao examinado na sentença. Nestes casos, admite--se a eficácia vinculante da sentença também em relação aos eventos recorrentes. Isso porque o juízo de certeza desenvolvido pela sentença sobre determinada relação jurídica concreta decorreu, na verdade, de juízo de certeza sobre a situação jurídica mais ampla, de caráter duradouro, componente, ainda que mediata, do fenômeno de incidência. Essas sentenças conservarão sua eficácia vinculante enquanto se mantiverem inalterados o direito e o suporte fático sobre os quais estabeleceu o juízo de certeza”34. Em síntese, e como esclarece DECOMAIN, “as relações jurídicas tributárias, embora para cada fato gerador nasça obrigação distinta, podem e devem ser assimiladas às continuativas. Se os fatos são semelhantes e abrangidos pela mesma Lei, decidido que esta não se aplica a eles, pouco importa que se trate de fatos pretéritos, presentes ou mesmo futuros. Enquanto as normas são as mesmas, a decisão que afirmou não incidir em relação a eles o tributo questionado aplica-se a todas as situações futuras idênticas, enquanto não se modificarem os preceitos considerados na sentença”35. A coisa julgada formada em mandado de segurança diante de relação tributária continuativa só não alcançará os eventos futuros, inerentes à mesma relação, quando o próprio impetrante houver formulado pedido restrito a fato gerador isolado36. Aí, sim, terá aplicação a Súmula nº 239 do STF: “decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores”.

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No sistema do CPC/2015 são pressupostos processuais a capacidade jurídica das partes (CPC, arts. 70 e 71), a capacidade postulatória do representante processual dos litigantes (CPC, art.103), a competência do juízo (CPC, art. 42) e a forma adequada do procedimento eleito (CPC, arts. 188 e 319), entre outros requisitos legais (art. 485, IV). As condições da ação, para o CPC/2015, são a legitimidade das partes e o interesse de agir (CPC/2015, arts. 485, VI, e 17). O Código de 2015 não incluiu, nas condições da ação, a possibilidade jurídica do pedido. A Lei nº 12.016, em seu art. 6º, § 5º, prevê, de forma explícita, a possibilidade de denegação do mandado de segurança, sem apreciação do mérito da causa, nos casos do art. 267 do CPC [de 1973; CPC/2015, art. 485] (falta de pressuposto ou condição da ação).

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CPC/73, art. 471. CPC/73, art. 473. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 297. DINAMARCO, Instituições, cit., III, p. 301-302. LIEBMAN, Enrico Tullio. Ėficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 60; DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança, (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 517. PORTO, Sérgio Gilberto. Ċoisa julgada civil. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2006, p. 64. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de direito processual civil, 59. ed., cit., v. I, nº 800, p. 1.146. Vale dizer: “A coisa julgada material só pode ocorrer de par com a coisa julgada formal, isto é, toda sentença para transitar materialmente em julgado deve, também, passar em julgado formalmente” (Op. cit., loc. cit.). Súmula nº 304 do STF: “Decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria”. Se, porém, a sentença (ou acórdão), ao denegar a segurança adentrou no mérito da questão, impedida estará sua “rediscussão na via ordinária”, por ter operado “a coisa julgada material” (STJ, 5ª T., 735.307/ RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves, ac. 18.10.2007, DJU 05.11.2007, p. 346). STF, Súmula nº 304: “A denegação do writ em virtude da ausência de liquidez e certeza do direito, porém, não impede que se busque, na via própria, novamente, a satisfação do direito” (STJ, 5ª T., REsp 225.787/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 26.10.1999, RSTJ 140/539). Nesse sentido: NEIVA, José Antonio Lisbôa. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.) et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014,p. 141; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 176. Explicita o autor que “ocorre, entretanto, que, havendo decisão de mérito transitada em julgado no mandado de segurança, concessiva ou denegatória, deve-se trabalhar com a eficácia positiva da coisa julgada, o que vincula o juiz no processo de conhecimento condenatório à decisão proferida no mandado de segurança já protegida pela coisa julgada material” (ob. cit., loc. cit.) STJ, 1ª T., AgInt no AREsp. 487.692/TO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 20.09.2016, DJe 16.11.2016. No mesmo sentido: STJ, 1a T., AgRg no RMS 40.369/ES, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 04.06.2013, DJe 21.06.2013. “Processual civil. Coisa julgada. Mandado de segurança. Decisão de mérito. Renovação do pedido. Concurso público. Nomeação. I – A decisão denegatória do mandado de segurança somente faz coisa julgada, impedindo a posterior demanda na via ordinária, quando negado, à luz da legislação, que houve a violação ao direito reclamado pelo impetrante. A denegação do writ em virtude da ausência de liquidez e certeza do direito, porém, não impede que se busque, na via própria, novamente, a satisfação do direito. Súmula 304/STF. II – Hipótese em que, anteriormente à ação ordinária, foram impetrados dois mandamus. No primeiro, denegou-se a segurança por ausência de demonstração, pelos candidatos, de que obtiveram a pontuação exigida para a prova;

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no segundo, porém, reconheceu-se que os candidatos não tinham direito a continuar no certame porque não foram aprovados numa das fases. Na ação, buscam os autores rediscutir a questão da aprovação no concurso, já decidida anteriormente no mandamus, razão pela qual se reconhece o acerto da decisão que extinguiu o processo sem julgamento do mérito em face da coisa julgada. Recurso não conhecido” (STJ, 5ª T., REsp 225.787/DF, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 26.10.1999, DJU 22.11.1999, p. 187). CPC/73, art. 268. É claro, porém, para a jurisprudência tanto do STF como do STJ que “a decisão que denega a segurança, se aprecia o mérito do pedido e entende que o impetrante não tem direito algum (e não que apenas lhe falta direito líquido e certo), faz coisa julgada material, impedindo a reapreciação da controvérsia em ação ordinária” (NEGRÃO, Theotônio; et. al. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1.805). Inúmeros precedentes são arrolados, dentre eles: STF, 1ª T., RE 78.119/RJ, Rel. Min. Rodrigues Alckmin, ac. 08.08.1975, RTJ 75/508; STF, 2ª T., RE 81.423/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 19.09.1975, RTJ 75/633; STF, 1ª T., RMS 21.504/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 29.03.1994, RTJ 158/846; STJ, 1ª T., REsp 4.157/RJ, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 04.10.1993, DJU 25.10.1993, p. 22.454. Os motivos pelos quais o mandado de segurança pode ser considerado meio inadequado à composição do litígio são: “(a) falta de liquidez e certeza do direito, o que não significa afirmativa de que este não existe; (b) não se tratou de ato de autoridade, do que se conclui que o mandamus não é modalidade processual adequada para que a lide seja solvida; e (c) o direito deveria ser defendido não por mandado de segurança, mas sim por habeas corpus ou habeas data” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança, cit., p. 522). Diante do art. 19 da Lei nº 12.016, “a questão, vale frisar, não é de entender que o mandado de segurança, em si mesmo considerado, não prejudica tais ‘ações’ [aquelas consideradas ‘ações próprias’], mas que a decisão de mérito que, por hipótese, afirmar inexistir o direito reclamado é que prejudica” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, nº 51, p. 116-117). BUENO, Cássio Scarpinella. Op. cit., p. 117; DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança, cit., p. 521. CPC/73, art. 485. CPC/73, art. 463, I. STJ, 6ª T., AgRg no REsp 1.081.429/DF, Rel. Min. Vasco Della Giustina, ac. 10.04.2012, DJe 07.05.2012. O artigo a que o acórdão faz referência é do CPC de 1973. No mesmo sentido: STF, Pleno, AR 767/SP, Rel. Min. Thompson Flores, ac. 18.05.1972, RTJ 62/287; STF, 1ª T., RE 73.579/GO, Rel. Min. Amaral Santos, ac. 30.05.1972, RTJ 63/505; STJ, 1ª T., REsp 4.157/ RJ, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 04.10.1993, DJU 25.10.1993, p. 22.454. STJ, 4ª T., RMS 17.713/AC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 23.09.2008, DJe 28.10.2008. O CPC/2015 arrola dois casos em que se torna possível a rescisória de sentença passada em julgado apenas formalmente (art. 966, § 2º). São, entretanto, hipóteses excepcionalíssimas, que não admitem interpretação extensiva ou ampliativa.

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CPC/73, art. 471, I. MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de segurança em matéria tributária. 2.ed. São Paulo: Ed. RT, 1995, v. I, p. 206. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Direito tributário – coisa julgada – mandado de segurança. RDA 117/403-404. CPC/73, art. 468. STF, EDcl no RE 116.731/RJ, Rel. Min. Célio Borja, ac. 11.11.1988, RTJ, v. 129, p. 914-915 (Voto do Relator). MACHADO, Hugo de Brito. Op. cit., 1995, p. 207. Idem, ibidem. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 306. “Realmente, no IPI, como no ICMS, o valor a ser pago, em cada período, é apurado em função de uma conta-corrente na qual são registrados débitos, relativos às saídas de mercadorias ou produtos, e créditos, relativos às entradas de mercadorias ou de matérias-primas e outros insumos, no período de apuração respectivo. Havendo saldo devedor, este constituirá o valor devido no período. Havendo saldo credor, será este transferido para o período seguinte, somandose aos créditos daquele para efeito de nova apuração, e assim sucessivamente. Os fatos relevantes para esta determinação do valor do tributo devido entrelaçam-se de tal modo que tornam evidente a existência de uma relação continuativa” (g.n.) (MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de segurança em matéria tributária, cit., 1995, p. 207-208). STJ, 1ª T., AgRg no REsp 703.526/MG, Rel. p/ ac. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 02.08.2005, DJU 19.09.2005, p. 209. DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 545. No mesmo sentido: MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 535-536. “A sentença proferida em Mandado de Segurança, desonerando o contribuinte impetrante do adimplemento de obrigação tributária prevista em lei, somente surte efeitos em relação a período determinado, mencionado no bojo da ação mandamental” (STJ, 1ª T., REsp 545.637/ GO, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 14.12.2004, DJU 02.05.2005, p. 159).

Capítulo XXI TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA DO MANDADO DE SEGURANÇA Art. 20. Os processos de mandado de segurança e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus. § 1º Na instância superior, deverão ser levados a julgamento na primeira sessão que se seguir à data em que forem conclusos ao relator. § 2º O prazo para a conclusão dos autos não poderá exceder de 5 (cinco) dias.

Comentários ao art. 20 134. PROCESSAMENTO EM CARÁTER PREFERENCIAL DO MANDADO DE SEGURANÇA O art. 20 da Lei nº 12.016 assegura ao mandado de segurança e respectivos recursos prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo apenas o habeas corpus. Observe-se que a prioridade não se restringe ao julgamento, compreendendo, também, os atos de tramitação do processo, em todos os seus estágios. É nesse sentido que se deve entender a expressão legal “prioridade sobre todos os atos judiciais”1.

Também os processos eleitorais são de curso prioritário, na sua preferência não prevalece sobre o habeas corpus e o mandado de segurança (Lei nº 4.410/1964, art. 1º). Confere a lei uma superpreferência ao mandado de segurança em que se tenha deferido a medida liminar, determinando que o seu julgamento se dê com prioridade, privilégio que prevalecerá em relação a todos os processos (que não sejam os de habeas corpus), inclusive outros mandados de segurança, nos quais não ocorreu liminar. Trata-se, portanto, de uma preferência sobre preferência. Deve-se lembrar outras preferências no sistema, que devem ser observadas, tais como a dos idosos e portadores de doenças graves que tenham impetrado mandado de segurança. Nesse sentido, o art. 1.048 do CPC/2015: “terão prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais: I – em que figure como parte ou interessado pessoa com idade igual ou

superior a sessenta anos ou portadora de doença grave”.

135. PROCEDIMENTO CÉLERE NOS TRIBUNAIS Na instância superior (isto é, nos tribunais de qualquer grau de jurisdição), os mandados se segurança e respectivos recursos deverão ser submetidos a julgamento na primeira sessão que seguir à data em que forem conclusos ao relator (Lei nº 12.016, art. 20, § 1º). A norma é de difícil aplicação prática, porque falta o controle do Presidente do Tribunal sobre os relatores. Isto se debita, porém, ao déficit organizacional da justiça como um todo, e não apenas dos serviços dos tribunais. Quando forem implantadas regras modernas de administração aos órgãos do Judiciário, poder-se-á pensar na eficiência que a Constituição exige de todos os “serviços públicos”, não havendo como deixar de cumpri-la o Poder Judiciário. Ainda, na tramitação procedimental célere e prioritária do mandado de segurança na instância superior, a lei fixa o prazo máximo de cinco dias para que a secretaria faça os autos conclusos ao relator (art. 20, § 2º). Trata-se de prazo máximo, pois, havendo urgência, como no caso de medida liminar, terá de ser abreviado, de modo a compatibilizá-lo com as exigências do caso concreto. É bom lembrar que, nos processos comuns de curso no primeiro grau de jurisdição, o escrivão tem apenas um dia para fazer os autos conclusos ao juiz (CPC/2015, art. 228, I2).

1

2

CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 20; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2009, n. 52, p. 118. CPC/73, art. 190, I.

Capítulo XXII MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Art. 21. O

mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial. Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser: I – coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica; II – individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante. Referências legislativas: CF, Art. 5º (...) LXX – o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados; (...). Súmulas: Súmula nº 629/STF. A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes. Súmula nº 630/STF. A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria.

Comentários ao art. 21 136. O MANDADO DE SEGURANÇA COMO INSTRUMENTO DE TUTELA COLETIVA Dentro da linha de economia processual e da tutela aos direitos coletivos ou de grupo, o mandado de segurança, segundo a Constituição de 1988, pode ser manejado não só singularmente, mas também de forma coletiva. O regime processual do mandado de segurança coletivo, previsto na Constituição entre os direitos fundamentais, acha-se regulado pela Lei nº 12.016, arts. 21 e 22. Não se trata, porém, de simples remédio para defesa de interesses coletivos. Baseando-se na liquidez e certeza do direito ofendido pelo abuso de autoridade, é preciso que o writ coletivo se

volte para a tutela de concretos direitos subjetivos, demonstráveis por prova pré-constituída, ainda que pertençam a grupos ou categorias de pessoas e se apresentem como transindividuais e indivisíveis (Lei nº 12.016, art. 21, parágrafo único). É, assim, uma “espécie de mandado de segurança, voltado à tutela de direito transindividual líquido e certo violado ou ameaçado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou de quem exerça função pública”1. Não é, contudo, ação que o ente coletivo possa utilizar para demandar na defesa individual de um ou outro membro ou associado. O objeto de mandado de segurança coletivo deve corresponder a direito que pertença a uma coletividade ou categoria representada por partido político, por organização sindical, por entidade de classe ou por associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano (CF, art. 5º, LXX, a e b)2, embora não se exija que a tutela envolva sempre a totalidade da categoria ou do grupo (Lei nº 12.016, art. 21, caput).

137. A TUTELA COLETIVA E A SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL O mandado de segurança coletivo é, em suma, o mesmo mandado de segurança concebido primitivamente para a proteção dos direitos individuais3. Só que,

na perspectiva da tutela coletiva, visa a proteger os direitos individuais que sejam comuns a toda uma coletividade, por meio de instituição de uma legitimação anômala atribuída a entidades que possam pleitear, em nome próprio, a defesa de direito de outrem4. O caso é, nessa ordem, uma substituição processual (CPC/2015, art. 18, in fine)5. Atende-se, também, ao princípio da economia processual, resolvendo numa única decisão um grande número de pretensões individuais6. Segundo o parágrafo único do art. 21 da Lei nº 12.016, os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo são os coletivos e os individuais homogêneos, o que, dessa maneira, o aproxima do mesmo gênero a que pertencem a ação civil pública, a ação popular e a ação coletiva de defesa dos consumidores.

138. DIREITOS DIFUSOS, DIREITOS COLETIVOS E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS A Lei nº 8.078, de 11.09.1990 (CDC), distingue os direitos coletivos dos direitos difusos. Ambas as categorias representam direitos transindividuais e indivisíveis. Mas, enquanto os coletivos pertencem a um grupo determinado de pessoas que mantêm uma “relação jurídica básica” com a parte contrária, os difusos pertencem, indistintamente, a toda a comunidade, ou a uma porção anônima dela, formada de pessoas indeterminadas e ligadas apenas por circunstâncias de fato. A Lei

nº 12.016, ao definir o mandado de segurança coletivo, limitou o seu objeto à proteção apenas dos direitos coletivos. Não o estendeu aos direitos difusos. Certamente o fez por entender que, sem uma relação jurídica básica bem definida a unir a coletividade à autoridade coatora, seria sempre muito difícil submeter os direitos difusos à exigência constitucional de liquidez e certeza de que se deve obrigatoriamente revestir o direito subjetivo tutelado pelo mandado de segurança7. Com efeito, nascendo de puras circunstâncias de fato, sem uma predeterminada e específica relação jurídica a unir os sujeitos ativos e passivos, seria sempre muito difícil à entidade impetrante do mandado de segurança coletivo apresentar a prova documental pré-constituída indispensável à propositura das ações mandamentais. É bom de ver que a liquidez e certeza do direito violado – repita-se – é uma imposição que figura na própria definição constitucional do mandado de segurança (CF, art. 5º, LXIX). A vedação da utilização do mandado de segurança para a tutela de interesses difusos parte de um pressuposto proclamado por vários doutrinadores, qual seja, o de que “é incabível assegurar um direito subjetivo líquido e certo para um grupo indeterminado de pessoas”8. Sem embargo disso, há forte corrente doutrinária e jurisprudencial defendendo que a Lei nº 12.016 não teve força de reduzir a dimensão constitucional do mandado coletivo, de sorte que sua aplicação à tutela dos direitos difusos seria irrecusável, desde que demonstrada sua liquidez e certeza9. Exploraremos o tema mais profundamente nos itens 141.2 a 141.6.

139. MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO CIVIL PÚBLICA Ademais, os direitos difusos contam com a tutela do Ministério Público, que os defende, com eficiência, por meio do inquérito civil e da ação civil pública (Lei nº 7.347, de 24.07.1985). Essa tutela talvez tenha sido considerada pela Lei nº 12.016 como adequada e suficiente para a defesa particular, modalidade de direito transindividual. Por isso não os incluiu no âmbito do mandado de segurança coletivo. Tão iguais são o mandado de segurança coletivo e a ação civil pública, quando contenham o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, que doutrina e jurisprudência reconhecem a possibilidade de ocorrer litispendência entre as duas ações coletivas10.

140. REQUISITOS DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO A Constituição, ao conceber o mandado de segurança coletivo, não criou regras que fossem diversas daquelas antes estabelecidas para o mandado individual, a não ser no tocante à legitimação ativa. Portanto, ao estatuir norma puramente processual, ligada a uma condição da ação – legitimatio ad causam11 –, o dispositivo constitucional (inc. LXX, do art. 5º) deixou claro que os requisitos de direito material e as demais exigências de ordem processual reclamados para o mandado de

segurança individual “devem estar igualmente presentes na hipótese de mandado de segurança coletivo, referindo-se, o inc. LXIX, tanto a uma como a outra modalidades”12. Em consonância, pois, com o requisito básico do inc. LXIX do art. 5º da CF, não será qualquer direito coletivo que recairá sob a tutela do mandado de segurança coletivo, mas apenas aqueles que se qualificarem como líquidos e certos. Daí a previsão do art. 21 da Lei nº 12.016 de que o mandado de segurança coletivo, observada a legitimação especial definida na Constituição, será impetrado por entidade associativa: a)

em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou parte, dos respectivos membros ou associados, na forma de seus estatutos13;

b)

desde que sejam pertinentes às finalidades do ente associativo legitimado14.

Tratando-se, pois, de mandado de segurança, individual ou coletivo, é indispensável a liquidez e certeza do direito do impetrante, em função da sumariedade com que o writ é processado, não havendo, em seu curso, dilação probatória. Em outros termos, para a utilização do mandado de segurança coletivo, a exigência é a mesma do mandado de segurança individual: “a existência de prova documental exauriente acostada à petição inicial”15. Além disso, é pressuposto da admissibilidade do mandado de segurança coletivo que: a)

o direito a tutelar seja coletivo ou individual homogêneo (Lei nº 12.016, art. 21, parágrafo único); e

b)

esteja sendo lesado ou ameaçado por ilegalidade ou abuso de poder por ato de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público (CF, art. 5º, LXIX; Lei nº 12.016, art. 1º, caput e § 1º)16.

Em síntese, os requisitos do mandado de segurança coletivo são definidos a partir da constatação de que “a Constituição, ao criar a figura do mandado de segurança coletivo, inovou apenas quanto à legitimidade, de tal sorte que o ‘mandado de segurança coletivo é o mesmo mandado de segurança do inc. LXIX do art. 5º da CF/88, somado à peculiaridade de que a legitimatio ad processum para sua impetração é conferida a entidades e partidos políticos com representação no Congresso Nacional, isto é, com uma legitimação não individual para a causa’17. Assim, os demais requisitos para o cabimento do mandado de segurança coletivo são os mesmos que aqueles exigidos para o cabimento do mandado de segurança individual”18.

141. DIREITOS PROTEGIDOS PELO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO

O mandado de segurança coletivo é um dos instrumentos previstos constitucionalmente para proporcionar a tutela jurisdicional coletiva, ao lado da ação popular, da ação civil pública e da ação coletiva de defesa do consumidor. Diversamente do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a tutela para “interesses ou direitos” difusos, coletivos ou individuais homogêneos, a Lei nº 12.016 destina a proteção do mandado de segurança coletivo aos “direitos coletivos” e aos “direitos individuais homogêneos”. Evita a Lei do Mandado de Segurança falar em tutela de interesses, certamente em razão de que, depois da normatização dos direitos coletivos, não há mais razão para tratar como entidades distintas os direitos e os interesses coletivos. No passado, a ideia de direito subjetivo ligava-se necessariamente ao interesse de algum sujeito tutelado pela lei. O interesse se apresentava como uma situação favorável de uma pessoa ao acesso de um bem da vida. Quando esse interesse era amparado pela lei (ou pela ordem jurídica) é que se configurava o direito, ou seja, o titular do interesse se tornava titular do direito ao bem da vida. Esses direitos (interesses legalmente tutelados) tanto poderiam pertencer ao particular como ao Poder Público, mas correspondiam sempre a um poder atribuído à titularidade de alguém (pessoa natural ou jurídica)19. Uma vez, porém, que ao Poder Público sempre incumbiu não só o exercício dos próprios direitos e obrigações, mas também a proteção e o desempenho de atividades em prol de interesses gerais da comunidade, admitia-se a presença, na esfera de atuação da Administração, de direitos públicos e de interesses públicos. Os direitos públicos eram autênticos direitos que o Estado exercitava perante outrem, como o direito de arrecadar tributos, de administrar os serviços públicos, de contratar pessoal e de exigir a respectiva prestação de serviço, de contratar obras e serviços, de expropriar bens do domínio privado para fins de utilidade pública etc. Já os interesses públicos não pertenciam à titularidade individualizada de ninguém, nem mesmo do Estado. À falta de um titular personalizado, eram tratados como interesses legítimos da comunidade postos sob tutela da Administração Pública. Era, por exemplo, o que se passava com o meio ambiente, as tradições culturais, a segurança pública etc.20 Num determinado momento, todavia, se compreendeu que os direitos não necessitavam de um titular individualizado, e que era possível, também, atribuí-los à comunidade como um todo ou a grandes grupos sociais. Bastava que se criassem órgãos capazes de representar esses titulares transindividuais para que os interesses coletivos fossem visualizados como direitos, para todos os fins jurídicos. Nessa altura passaram a coexistir os antigos direitos públicos e privados com a nova geração dos direitos coletivos. A estes correspondia a configuração de direitos transindividuais, insuscetíveis de divisão e de usufruição do indivíduo, fora do grupo a cuja titularidade pertenciam. Os antigos interesses coletivos ou públicos se tornaram, portanto, direitos coletivos, afetados não à

titularidade plúrima de várias pessoas, e, sim, à titularidade única da comunidade, ou de uma parte dela. Encarados dessa maneira, o particular não se credencia a usufruí-los individualmente, mas apenas coletivamente, ou seja, enquanto membro da comunidade que o exercita a bem de todos os seus participantes. Quando, pois, a legislação consumerista fala em direitos ou interesses coletivos, emprega as duas expressões como sinônimos, à luz da moderna concepção que transformou os antigos interesses coletivos em direitos coletivos, colocando-os de permeio aos direitos privados e aos direitos públicos. Correta, nesse enfoque, a Lei nº 12.016/2009, quando, ao identificar o objeto do mandado de segurança coletivo, abstém-se de falar em direitos ou interesses, para tratar o bem jurídico tutelado, in casu, apenas como os direitos coletivos e os direitos individuais homogêneos (art. 21, parágrafo único, I e II). A visão do novo diploma legal é mais simples e mais consentânea com a perspectiva em que se coloca a tutela jurisdicional coletiva de nosso tempo. É muito melhor do que a do Código do Consumidor, que leva o intérprete e aplicador à dificuldade de equiparar ou distinguir direitos coletivos e interesses coletivos21. Diante dos termos com que a legislação atual aborda a tutela dos interesses ou direitos coletivos, uns e outros são colocados no status de direitos, o que faz desaparecer razão prática ou teórica para buscar a diferenciação entre ambos, como acertadamente conclui KAZUO WATANABE22. CARREIRA ALVIM, embora reconheça que as consequências jurídicas da defesa dos interesses legítimos, de forma direta, e a defesa dos direitos subjetivos, de forma indireta, se equivalem, insiste em que, do ponto de vista teórico-científico, há substancial distinção entre direitos e interesses. Enquanto a proteção jurídica aos direitos (subjetivos) é direta, no caso dos interesses, a proteção só reflexamente alcança os direitos23. Acontece que o direito é uma ciência empírica, eminentemente voltada para a prática da convivência intersubjetiva. A especulação há de ser feita a partir, antes de tudo, das normas que dão forma e conteúdo ao ordenamento jurídico positivo. Quando este se ocupa de uma categoria jurídica de forma unitária, de modo a resumir numa única figura jurídica o que, idealmente, poderia ser desdobrado em várias espécies, a insistência em decompor o que a ordem jurídica unificou não se justifica, nem do ponto de vista prático, nem mesmo do ponto de vista científico. As classificações são importantes instrumentos de distinção e compreensão da natureza das coisas. Mas, quando se classifica por classificar, sem que das distinções decorram resultados concretos ou práticos, o exercício classificatório é inútil e não se justifica, nem mesmo no plano teórico-acadêmico. Pode ter relevância para compreensão do pretérito e da evolução por que passou o direito (principalmente, o direito positivo). Não corresponderá, todavia, nem mesmo a um esforço teórico-científico justificável se, voltado para o direito atual, não logra alcançar distinções relevantes, seja no plano normativo, seja no plano eficacial e prático. É nesse enfoque que, à base da lição de KAZUO WATANABE, se deve concluir que, no direito

positivo brasileiro, e no que toca à tutela coletiva, não há razão alguma para tratar como entidades distintas os interesses e os direitos coletivos. E assim se deverá proceder entre os direitos tutelados por meio do mandado de segurança coletivo. Se o mandado de segurança, singular ou coletivo, se destina a proteger direitos líquidos e certos, não há como afirmar que simples interesses, porque coletivos, possam figurar entre aquilo que constitui o objeto do mandado de segurança. A Lei nº 12.016 deixa claro que a proteção do mandado de segurança coletivo se endereça aos direitos coletivos e aos direitos individuais homogêneos (art. 21, parágrafo único). Nem haveria de ser diferente, porquanto a ação do mandado de segurança – na lição de CRETELLA JÚNIOR – não pode proteger meros interesses, mas apenas direitos24.

141.1. Identificação dos direitos sob tutela do mandado coletivo O sistema de proteção coletiva de direitos compreende, em nosso ordenamento jurídico, três modalidades de direitos subjetivos, que cumpre bem identificar, para que o mandado de segurança, na sua feição coletiva, seja bem manejado. São elas: a)

Os direitos difusos, que a Lei nº 12.016 não inseriu, pelo menos de forma expressa, no rol daqueles que as entidades associativas podem defender por meio do mandamus coletivo, e que se acham definidos no art. 81, parágrafo único, inc. I, do CDC, são “os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”. Sua titularidade não pode ser atribuída separadamente a qualquer indivíduo, pois cabe diretamente à coletividade ou a uma parte dela (o grupo). “O que caracteriza os direitos difusos é, justamente, a impossibilidade de se determinar, ‘com precisão, quem seja o seu titular ou beneficiado, já que se trata de um direito que (...) transcende a um indivíduo, podendo ser exercitado em conjunto em razão de elementos comuns (circunstâncias de fato). As pessoas, aqui, são indeterminadas’”25.

Casos, como o direito ao meio ambiente sadio e à preservação dos monumentos históricos, são exemplos típicos de direitos difusos, que tocam a um conjunto formado de pessoas, sem uma relação básica que as una, a não ser a situação fática de viverem na mesma comunidade. b)

Os direitos coletivos, em sentido estrito, são os que, para os efeitos do mandado de segurança coletivo, a Lei nº 12.016 define como “os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica” (art. 21, parágrafo único, al. I).

Como decidiu o STF, a diferenciação que separa o direito difuso do coletivo está na base sobre

que se assenta o grupo titular do mesmo interesse: “As fronteiras dos dois interesses estão definitivamente delimitadas, sendo difuso o interesse que abrange número indeterminado de pessoas unidas pelo mesmo fato, enquanto interesses coletivos seriam aqueles pertencentes a grupos ou categorias de pessoas determináveis, possuindo uma só base jurídica. Portanto, a indeterminidade seria a característica fundamental dos interesses difusos, e a determinidade daqueles interesses que envolvem os coletivos” (g.n.)26. Portanto, seriam, v.g., difusos os direitos da comunidade a um serviço de saúde eficiente, e coletivos, os direitos dos alunos de um estabelecimento público de educação a um ensino ministrado segundo as normas e os princípios traçados pelo Ministério da Educação. São coletivos, ainda, os de uma categoria profissional defendidos por um determinado sindicato. São, outrossim, difusos os que se relacionam com a repressão à propaganda enganosa, lesiva aos interesses anônimos dos consumidores. c)

Os direitos individuais homogêneos, defensáveis por meio do mandado de segurança coletivo, são, segundo a Lei nº 12.016/2009, “os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante” (art. 21, parágrafo único, al. II).

Os difusos e os coletivos são naturalmente coletivos, enquanto os individuais homogêneos, em sua essência, são direitos individuais, que apenas acidentalmente recebem tratamento jurídico processual coletivo. Mesmo que, no momento da abertura da ação coletiva, ainda não estejam identificados todos os indivíduos que se beneficiarão da demanda, eles, sem dúvida, são passíveis de identificação. O tratamento desse conjunto de interessados numa ação única decorre de dois fatores: o grupo se acha vinculado a uma relação jurídica básica que unifica os interesses dos integrantes perante a parte contrária; e existe um ente associativo que se acha em condição de defender o feixe de interesses individuais agrupados, atuando como substituto processual. Não se trata de um litisconsórcio formado entre os vários titulares dos direitos individuais homogêneos. A parte em juízo não é formada pelos indivíduos cointeressados, mas pelo ente associativo que defende, em nome próprio, os direitos de origem comum, dos diversos substituídos. Um exemplo interessante: enquanto se teme um dano ambiental, o interesse é de toda a comunidade afetada. O direito é coletivo, porque é, ainda, indivisível entre os habitantes da localidade. Depois, entretanto, que o dano se consumou, cada uma das vítimas tem direito individual a ser reparada do prejuízo próprio que já suportou. Perante o causador do dano, as vítimas poderão

ser defendidas em ações singulares ou em ação coletiva, e nesta última hipótese ter-se-á uma demanda unificada de direitos individuais homogêneos, visto que sua base será um fato jurídico comum. É preciso, por fim, que a reunião dos direitos individuais não ocorra apenas de um fato comum qualquer, e sim de um fato que unifique a pretensão e seu fundamento, tornando-os, realmente, “coletivos”. É indispensável, como demonstra ADA PELLEGRINI GRINOVER, para configurar uma ação de defesa de direitos individuais homogêneos, que haja a prevalência dos “aspectos coletivos” frente aos “individuais”27.

141.2. Direitos defendidos pelo mandado de segurança coletivo: os controvertidos “direitos difusos” A Constituição, ao instituir o mandado de segurança coletivo, como uma das garantias fundamentais, não cuidou de enumerar quais os direitos a cuja tutela se endereçaria o novo writ. Limitou-se a estatuir a legitimação para movê-lo, desdo-brando-a, no inciso LXX do art. 5º, em dois grupos: a)

no primeiro, arrolaram-se os partidos políticos; e

b)

no segundo, as organizações sindicais, as entidades de classe e as associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.

Em relação aos partidos políticos, nada se dispôs acerca do objeto por eles tutelável, o que conduziu à fácil conclusão de que todos os direitos da comunidade compatíveis com a finalidade institucional da entidade político-partidária poderiam ser protegidos por meio do mandado coletivo. Tanto os difusos como os coletivos em sentido estrito contariam com o remédio constitucional, e não apenas os pertinentes aos membros do partido. Bastaria que os direitos transindividuais envolvessem os valores fundamentais enumerados no art. 17 da Constituição e reafirmados no art. 1º da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei nº 9.069/1995), e pudessem ser comprovados liminarmente, de modo a conferir-lhes o caráter de liquidez e certeza. Dentro de tal perspectiva, a interpretação do texto constitucional, efetuada pelo Supremo Tribunal Federal, foi no sentido de o preceito da lei fundamental (art. 5º, LXX, a) legitimar o uso do mandado de segurança coletivo, pelo partido político com representação no Congresso Nacional, tanto para a proteção de direitos coletivos como difusos: “A previsão do art. 5º, LXX, da Constituição objetiva aumentar os mecanismos de atuação dos partidos políticos no exercício de seu mister, tão bem delineado na transcrição supra28, não podendo, portanto, ter esse campo restrito à defesa de direitos políticos, e sim de

todos aqueles interesses difusos e coletivos que afetam a sociedade. A defesa da ordem constitucional pelos partidos políticos não pode ficar adstrita somente ao uso do controle abstrato das normas. A Carta de 1988 consagra uma série de direitos que exigem a atuação destas instituições, mesmo em sede de controle concreto. À agremiação partidária, não pode ser vedado o uso do mandado de segurança coletivo em hipóteses concretas em que estejam em risco, por exemplo, o patrimônio histórico, cultural ou ambiental de determinada comunidade. Assim, se o partido político entender que determinado direito difuso se encontra ameaçado ou lesado por qualquer ato da administração, poderá fazer uso do mandado de segurança coletivo, que não se restringirá apenas aos assuntos relativos a direitos políticos e nem a seus integrantes”29. Embora aplicável à tutela de direitos difusos da comunidade, no todo ou em parte, não está o mandado de segurança coletivo, quando manejado pelo partido político, excluído da necessidade de “atendimento dos requisitos formais previstos nos estatutos dos partidos”, tampouco da sujeição “aos pressupostos de cabimento do mandado de segurança”, como a demonstração de liquidez e certeza do direito a tutelar30. Já no que diz respeito às entidades associativas arroladas na alínea b, do inciso LXX, do art. 5º – organização sindical, entidade de classe ou associação –, a Constituição restringiu a legitimação para o mandado coletivo aos casos de “defesa dos interesses de seus membros ou associados”. Logo, não foi atribuído a tais entes o uso da segurança coletiva fora dos direitos ou interesses dos seus integrantes. Vale dizer: in casu, os direitos tutelados não são os difusos (pertencentes a toda a comunidade), mas apenas os coletivos, em sentido estrito, limitados ao grupo que gira em torno da entidade associativa e do vínculo estabelecido entre seus objetivos estatutários e os interesses de seus membros ou associados. Ao regulamentar o dispositivo constitucional, a Lei nº 12.016 enumerou, sem distinguir expressamente os casos dos partidos políticos, que os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser: I – os coletivos31; e II – os individuais homogêneos32. A conceituação legal de uns e outros foi praticamente a mesma utilizada pelo Código de Defesa do Consumidor (art. 81, incisos II e III). Intencionalmente, portanto, a Lei do Mandado de Segurança excluiu da tutela mandamental coletiva os direitos difusos, que o CDC define como “os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato” (art. 81, parágrafo único, inciso I). Em outros termos, os direitos difusos pertencem à comunidade em geral ou a grupos anônimos dela, sem vínculos jurídicos entre si ou com a parte contrária, e sem possibilidade de divisão entre os membros da coletividade que os detém. A limitação da lei regulamentadora do mandado coletivo aos direitos individuais homogêneos e

aos direitos coletivos em sentido estrito apresenta-se, de certa forma, coincidente com a garantia fundamental do art. 5º, LXX, b, da Constituição33. Não pode, todavia, ser aplicada ao remédio constitucional quando a impetração for praticada por partido político, não só porque a Constituição não limitou sua legitimidade a uma ou outra espécie de direito coletivo, como também, e principalmente, aos partidos políticos se conferiu função tutelar que vai muito além dos interesses do grupo de seus membros, abrangendo valores essenciais para o Estado Democrático de Direito e para os direitos fundamentais (direitos do homem). De tal arte, a restrição que limita o mandado de segurança coletivo aos direitos individuais homogêneos e coletivos em sentido estrito, constante do parágrafo único do art. 21 da Lei nº 12.016/2009, só pode ser aplicada aos entes associativos aludidos no inciso LXX, alínea b, do art. 5º da Constituição. Aliás, a própria lei regulamentadora, ao tratar da legitimação dos partidos políticos, no caput do art. 21, deixou claro que o mandado de segurança coletivo, quando manejado por agremiações político-partidárias, pode tutelar não só os interesses dos seus membros, como também os relacionados “à finalidade partidária”. Como a finalidade institucional dos partidos políticos compreende necessariamente interesses ou direitos de toda a comunidade, fica claro que a Lei nº 12.016 não excluiu do alcance do writ coletivo os direitos difusos, sempre que compreendam os valores essenciais consagrados pela ordem constitucional e por esta confiados à guarda das instituições político--partidárias, e, ainda, satisfaçam os requisitos específicos da ação mandamental no tocante à liquidez e certeza.

141.3. Da pequena relevância da tese que insiste em estender o mandado de segurança coletivo aos direitos difusos No caso do mandado de segurança coletivo promovido pelos partidos políticos, é evidente que a tutela abrange, também, e principalmente, os direitos difusos inerentes aos valores constitucionais assegurados a toda a comunidade e cuja guarda a Constituição confiou àquelas entidades partidárias. Pelo próprio teor do art. 21, caput, da Lei nº 12.016, é fácil concluir, como já demonstramos, que não são apenas os direitos dos membros da corporação político-partidária que se protegem pelo mandamus coletivo, na espécie. Quanto ao mandado de segurança coletivo manejado por entidades associativas – sindicatos, entidades de classe e associações –, o objetivo da Lei nº 12.016 foi muito claro em limitar a cobertura mandamental apenas aos direitos coletivos e individuais homogêneos, excluindo, por conseguinte, os direitos difusos (art. 21, parágrafo único). É bom lembrar que a tríplice diferenciação entre direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos não é uma novidade que tenha surgido com a regulamentação do mandado de segurança. Trata-se de uma categorização que veio da doutrina e se consolidou no direito positivo, por obra do Código de Defesa do Consumidor, que, por sua vez, a fez expandir para todo o microssistema das

ações coletivas, justamente aquele que motivou o legislador constituinte a conceber o mandado de segurança coletivo como uma variante do tradicional writ, de longa data inserido entre as garantias fundamentais. Assim, quando a Lei nº 12.016 regulou o mandado de segurança coletivo, já eram por demais conhecidos em nosso ordenamento jurídico os três modelos de direitos defensáveis coletivamente. Se o legislador optou por destinar sua aplicação a duas das categorias de direitos coletivos lato sensu, não é dado ao intérprete afirmar que também a terceira omitida intencionalmente permaneça sob tutela da ação mandamental coletiva. Para que isso ocorresse, ter-se-ia de admitir que a restrição intencionalmente praticada teria atritado com a previsão constitucional relativa ao mandado de segurança coletivo34. Mas não é isso que se pode concluir em face do inc. LXX, do art. 5º, da Carta Magna. Ali, o writ coletivo foi tratado de maneira diferente, conforme sua impetração fosse exercida pelos partidos políticos (al. a) ou pelas entidades associativas (al. b). No primeiro caso, não há qualquer restrição da Constituição, de modo que o partido político foi legitimado a utilizar o mandado de segurança em defesa de qualquer direito transindividual passível de figurar dentro dos seus objetivos institucionais ou programáticos. Contudo, no caso do mandado coletivo atribuído aos entes associativos, a própria Constituição limitou seu emprego para a “defesa dos interesses de seus membros ou associados” (art. 5º, LXX, b). Ora, identificar, o legislador ordinário, tais interesses com os “direitos coletivos” e os “individuais homogêneos” não corresponde a diminuir a garantia constitucional, mas, sim, a definir o que vêm a ser os “interesses” dos associados tuteláveis pela via especial da segurança coletiva. Afirmam, os defensores da inclusão dos direitos difusos na área de proteção do mandado coletivo, que sua exclusão não poderia ser feita de antemão, e que somente caberia ser aplicado, no caso concreto, quando não fosse possível atender às exigências específicas da ação mandamental, no tocante à comprovação da liquidez e certeza do direito transindividual a defender35. Certo, de lege ferenda, teria sido melhor que a solução de serem ou não tuteláveis os direitos difusos ficasse relegada para o exame do caso concreto, ocasião em que, segundo as características da pretensão e dos elementos probatórios pré--constituídos, poder-se-ia, com melhor proveito, concluir, ou não, pela adequação do pleito judicial aos requisitos de procedibilidade pela via especial do mandamus. Caberia, ao legislador, adotar tal critério, e não o fez, e, a nosso modo de ver, pode ser tecnicamente criticado, mas não pode ser condenado por inconstitucionalidade36.

Vários são os remédios tutelares previstos pela própria Constituição para resguardar os direitos individuais ou coletivos das ilegalidades ou abusividades cometidas pelas autoridades públicas. Se o legislador não abre oportunidade para o uso de um deles, nem sempre cometerá inconstitucionalidade, se outro remédio, também enérgico e eficiente, permanecer resguardado à vítima da violação cometida por agente do Poder

Público. Os direitos difusos, nessa ordem de ideias, não restam esquecidos e desamparados, pelo fato de a Lei nº 12.016 não lhes propiciar defesa por meio do mandado de segurança coletivo. Há a ação civil pública que, com igual força, pode tutelá-los, e até com maior amplitude, visto que sua defesa, na via da aludida ação, conta com muito maior oportunidade de demonstração e prova, além de propiciar medida liminar antecipatória, de força mandamental equivalente a de igual medida tomada no bojo do mandado de segurança. Há, ainda, a ação popular, que, segundo a Súmula 101, do STF, não pode ser substituída pelo Mandado de Segurança37. Tão problemática será, na maioria dos casos, a comprovação de liquidez e certeza do direito difuso, por meio probatório pré-constituído documentalmente, que raramente se logrará prosseguir, com êxito, na busca da tutela mandamental coletiva. LÚCIA VALLE FIGUEIREDO, em estudo anterior à Lei nº 12.016, entendia que o inc. LXX do art. 5º da Constituição não proibia, propriamente dito, que os direitos difusos fossem protegidos pelo mandado de segurança coletivo (como, v.ġ., os relativos ao meio ambiente). Isso, contudo, estaria sempre condicionado à viabilidade da prova de plano. Diante das naturais dificuldades de que tal ocorresse, sua conclusão era no sentido de que os direitos difusos são muito menos confortados pelo mandado de segurança coletivo, “pelo que a sua tutela, no mais das vezes, far--se-á de maneira muito mais tranquila por meio da ação civil pública”38.

141.4. A defesa dos direitos difusos por meio do mandado de segurança coletivo O STF, como já se informou, vinha admitindo, antes da Lei nº 12.016, que os direitos difusos poderiam ser defendidos pelos partidos políticos, por meio do mandado de segurança coletivo, desde que envolvessem objeto compatível com os fins institucionais das agremiações políticopartidárias, e fossem atendidos os requisitos processuais da tutela mandamental, ligados à exigência de prova pré-constituída da liquidez e certeza do direito a tutelar39. O STJ – já depois da Lei nº 12.016/2009, e a pretexto de reconhecer legitimidade ao Ministério Público para defender os direitos transindividuais por meio de qualquer ação coletiva – tem reconhecido a ampla compatibilidade da proteção aos direitos difusos com todas as ações constitucionais previstas como garantias fundamentais, de caráter coletivo, inclusive, portanto, o mandado de segurança coletivo (CF, art. 5º, LXX). Eis um exemplo desse posicionamento do STJ: “1. O Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos. 2. A Carta de 1988, ao evidenciar a importância da cidadania no controle dos atos da

Administração, com a eleição dos valores imateriais do art. 37, da CF/1988 como tuteláveis judicialmente, coadjuvados por uma série de instrumentos processuais de defesa dos interesses transindividuais, criou um microssistema de tutela de interesses difusos referentes à probidade da administração pública, nele encartando-se a Ação Cautelar Inominada, a Ação Popular, a Ação Civil Pública e o Mandado de Segurança Coletivo, como instrumentos concorrentes na defesa desses direitos eclipsados por cláusulas pétreas. 3. Deveras, é mister concluir que a nova ordem constitucional erigiu um autêntico ‘concurso de ações’ entre os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais e, a fortiori, legitimou o Ministério Público para o manejo dos mesmos. 4. Sob esse enfoque, a Carta Federal outorgou ao Ministério Público a incumbência de promover a defesa dos interesses individuais indisponíveis, podendo, para tanto, exercer outras atribuições previstas em lei, desde que compatível com sua finalidade institucional (CF/1988, arts. 127 e 129)”40. Em outro aresto, a mesma Corte reafirmou – desta vez em face de direitos individuais homogêneos de repercussão social – a tese do “concurso de ações” instituído pela ordem constitucional entre todos os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais (ação civil pública, ação popular, mandado de segurança coletiva, ação de improbidade administrativa etc.), para decidir que o aludido concurso de ações legitimou o Ministério Público para o manejo de todos os remédios processuais que o compõem. İn verbis: “4. O novel art. 129, III, da Constituição Federal habilitou o Ministério Público à promoção de qualquer espécie de ação na defesa de direitos difusos e coletivos não se limitando à ação de reparação de danos. 5. Hodiernamente, após a constatação da importância e dos inconvenientes da legitimação isolada do cidadão, não há mais lugar para o veto da legitimatio ad causam do MP para a Ação Popular, a Ação Civil Pública ou o Mandado de Segurança coletivo. 6. Em consequência, legitima-se o Parquet a toda e qualquer demanda que vise à defesa dos interesses difusos e coletivos, sob o ângulo material ou imaterial. 7. Deveras, o Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos. 8. Nas ações que versam interesses individuais homogêneos, esses participam da ideologia das ações difusas, como sói ser a ação civil pública. A despersonalização desses interesses está na medida em que o Ministério Público não veicula pretensão pertencente a quem quer que seja individualmente, mas pretensão de natureza genérica, que, por via de prejudicialidade, resta por influir nas esferas individuais.

9. A assertiva decorre do fato de que a ação não se dirige a interesses individuais, mas a coisa julgada in utilibus pode ser aproveitada pelo titular do direito individual homogêneo se não tiver promovido ação própria. 10. A ação civil pública, na sua essência, versa interesses individuais homogêneos e não pode ser caracterizada como uma ação gravitante em torno de direitos disponíveis. O simples fato de o interesse ser supraindividual, por si só já o torna indisponível, o que basta para legitimar o Ministério Público para a propositura dessas ações”41. A prevalecer a tese prestigiada pelo STJ e pelo STF, restará reconhecido que a Lei nº 12.016/2009, ao ter apontado os direitos coletivos e os individuais homogêneos como os que podem ser defendidos por meio do mandado de segurança coletivo, bem como ao enumerar os legitimados ativos da referida ação constitucional, não teria enunciado rol taxativo, mas apenas exemplificativo, podendo outros direitos e outros legitimados ser identificados dentro do sistema tutelar coletivo idealizado pela Constituição e pelas leis que o instrumentalizam. A tese encontra respaldo na hermenêutica constitucional, que tem como um dos seus princípios básicos o da máxima eficiência, segundo o qual há de se valer o aplicador da Constituição da interpretação que amplie, e não que restrinja, as respectivas normas, principalmente no âmbito dos direitos fundamentais. Entretanto, é preciso ter em mente o perigo que o uso indiscriminado do princípio pode representar para o próprio sistema constitucional, já que, a pretexto de interpretação ampliativa, se pode chegar a contrariar a própria vontade do constituinte, exercida no sentido de bem delimitar o alcance de seus institutos. Urge evitar que, por meio de operações hermenêuticas, o Poder Judiciário venha a exorbitar da área de atribuições que lhe foi demandada, invadindo, por exemplo, a do Poder Legislativo. A liberdade de interpretação não deve, por isso, chegar a uma jurisprudência exageradamente criativa, capaz de desprezar a regra criada regularmente (sem ofensa à Constituição), editada pelo Legislativo, e de impor, de maneira primária, norma diversa, de origem exclusivamente pretoriana. Por isso que, não estando o Ministério Público no rol constitucional dos legitimados ao exercício do mandado de segurança coletivo, melhor seria que agisse por meio da ação civil pública, remédio útil e adequado à defesa dos direitos coletivos, tanto quanto o mandado coletivo, e que, aquele sim, foi atribuído ao Parquet, pela Lei Maior, de maneira expressa (CF, art. 129, III). Por igual fundamento, tendo a Lei nº 12.016/2009 restringido a tutela do mandado de segurança, por intermédio das entidades associativas, aos direitos coletivos e individuais homogêneos, melhor seria que os direitos difusos, relacionados com seus membros ou associados e correlacionados com os fins estatutários ou institucionais da corporação, fossem também defendidos por meio de ação civil pública ou outra ação coletiva como a prevista para defesa dos consumidores, pela legislação

própria. coletivo que, na ótica do STF, legitima o Ministério para agir nas ações coletivas, independe do conceito fixado por lei ordinária, pois “é conceito de Direito Constitucional, na medida em que a Carta Política dele faz uso para especificar as espécies de interesses que compete ao Ministério Público defender (CF, art. 129, III)”. Daí ter a Suprema Corte reconhecido legitimidade do MP do Trabalho para mover ação coletiva de direitos individuais homogêneos de natureza trabalhista (STF, 2ª T., RE 213.015/DF, Rel. Min. Néri da Silveira, ac. 08.04.2002, DJU 24.05.2002, p. 69). Em nada sairia diminuída a tutela coletiva programada pela Constituição e regulada pelo legislador infraconstitucional, e não se correria, em nível algum, o risco de abusos interpretativos, eventualmente comprometedores do espírito da Lei Maior e da partilha dos poderes soberanos do Estado Democrático de Direito. Inegável, contudo, o reconhecimento da tendência que vem sendo imprimida, de maneira ampliativa, e não restritiva, à interpretação doutrinária e jurisprudencial, na espécie, muito embora ainda sem unanimidade42.

141.5. Impossibilidade prática de isolar os direitos coletivos dos direitos difusos O propósito evidente da Lei nº 12.016, revelado no parágrafo único do art. 21, foi, sem sombra de dúvida, excluir, da tutela do mandado de segurança coletivo, os direitos difusos, restringindo-a aos direitos coletivos em sentido estrito e aos direitos individuais homogêneos. Esse intento, todavia, não foi alcançado, em primeiro lugar, na esfera dos partidos políticos, que, institucionalmente, não funcionam como associação de defesa dos direitos individuais ou coletivos apenas dos filiados; e tampouco a filiação dos partidários se faz em função de interesse que se resuma à participação nos pleitos eleitorais, mas numa adesão e identificação dos interessados com os fins programáticos e institucionais da agremiação. Como esses, por força da Constituição e da Lei Orgânica dos Partidos, referem-se a valores e direitos fundamentais pertencentes a todos, o mandado coletivo que o partido político está autorizado a impetrar pelo art. 5º, inc. LXX, da Carta Magna, compreende quase sempre direitos difusos, no sentido do art. 81 do CDC (direitos que dizem respeito a toda a comunidade, e não apenas aos membros do partido, isoladamente). No tocante às associações, pode-se pensar que a Lei nº 12.016 realmente tenha conseguido restringir o mandado de segurança coletivo aos direitos coletivos stricto sensu e aos direitos individuais homogêneos, ambos limitados ao grupo formado pelos respectivos associados. Todavia, apenas no plano teórico e abstrato é possível entender que semelhante restrição se deu de maneira efetiva. Na prática, será frequente a defesa de direitos coletivos dos associados, cuja tutela

necessariamente ultrapassará o grupo dos membros da entidade impetrante. É que aquilo que, analisado na ótica do ente associativo e de sua finalidade estatutária, configuraria um direito coletivo, quando se muda o enfoque para a comunidade, se apresentará, não raro, como direito ou interesse de toda a comunidade ou de grupos ou categorias muito maiores do que os formados dentro do ente associativo. Na verdade – como advertem EDUARDO ARRUDA ALVIM e ANGÉLICA ARRUDA ALVIM –, “um mesmo evento (poluição do rio) pode render ensejo a um pedido versando a repercussão difusa do mesmo, bem como a outro pedido versando a repercussão específica de determinada pessoa por ele afetado”43. Não só os direitos difusos podem se confundir com os individuais homogêneos, na origem comum, como também, “da ocorrência de um mesmo fato, podem originar pretensões difusas, coletivas e individuais”, como ensina NELSON NERY JUNIOR44. De tal sorte, mesmo demonstrando, o impetrante, que atua na defesa de direitos ou interesses de seus membros, não se poderá afirmar que a tutela pretendida envolverá apenas direitos coletivos “stricto sensu”. Com efeito, a separação entre a configuração dos direitos difusos e dos direitos coletivos, feita por obra da legislação consumerista, é sutil, não se refere à essência de tais direitos e não se apresenta como absoluta e intransponível, o que gera polêmicas doutrinárias infindáveis e efeitos na jurisprudência, cuja tônica se manifesta mais na aproximação ou assimilação do que no afastamento das duas espécies jurídicas transindividuais. O esforço para distinguir os direitos coletivos dos interesses difusos tem sido desenvolvido no Brasil mais do que em outros países. No direito estrangeiro, quase sempre as expressões difusos e coletivos são empregadas como sinônimas. Em Portugal, por exemplo, a ação popular é destinada à tutela entre outros dos direitos difusos ou coletivos e a legislação regulamentadora não faz distinção entre uns e outros. Utilizam-se as duas expressões praticamente como sinônimas, atribuindo aos “direitos coletivos”, tout court, uma configuração que comportaria, sem dificuldade, as duas espécies identificadas pelo CDC brasileiro45. Na legislação latino-americana, de um modo geral, se cogita genericamente de direitos coletivos, sem diferenciar os direitos difusos. Se bem atentarmos para nossa legislação consumerista (CDC, art. 81), veremos que há mais similitude do que desigualdade entre aquilo que a lei chama de direito difuso e o que qualifica como direito coletivo. Um e outro são, em comum, configurados por duas qualidades fundamentais: a transindividualidade e a indivisibilidade. Ambos se apartam dos direitos individuais, pela titularidade essencialmente plúrima, contraposta à titularidade singular ou individualizada que dá identidade ao comum dos direitos subjetivos patrimoniais. Os direitos difusos e coletivos pertencem necessariamente a grupos que assumem identidade social sem se revestirem de personalidade jurídica46. Os direitos em questão, sejam havidos como difusos ou coletivos, não pertencem aos membros do grupo, senão enquanto a ele integrados. São indivisíveis, porque, fática e juridicamente, não são suscetíveis de partilha em cotas individuais entre os cointeressados. Sua existência e

usufruição obrigatoriamente haverão de ocorrer no grupo, e em benefício do grupo. É impossível pensar em dar solução aos conflitos que os envolvam senão de forma unitária e incindível, por exigência da própria natureza de tais direitos47. O único traço diferenciador entre direito difuso e direito coletivo, para o CDC, residiria no interior do grupo, ou seja, no vínculo que une seus membros, pois enquanto nos coletivos haveria uma relação jurídica base, nos difusos a comunidade se interliga apenas por circunstância de fato. Entretanto, a razão de ser da concepção jurídica desses direitos transindividuais e indivisíveis não está na maneira com que os grupos se formam, e, sim, na instituição de mecanismos tutelares condizentes com seu caráter coletivo ou grupal. O núcleo comum e relevante dessa modalidade de direito está na sua transindividualidade e indivisibilidade, núcleo esse que não sofre abalo algum se a comunidade se formar à base de vínculo jurídico ou de fato. Nesse quadro, e em razão desse núcleo fundamental, é que se admite a existência de direitos titularizados por grupos, em defesa dos quais se estabelecem remédios processuais necessariamente preparados para instrumentalizá-los em sua característica unitariedade48. Para afirmar-se a existência de duas espécies de direitos coletivos lato sensu, recorre-se a um dado secundário, fora da essência deles. Vale-se de um elemento externo, pois diz respeito ao titular, e não ao direito possuído. A distinção feita pelo CDC equivaleria, grosso modo, a considerar existentes duas espécies de propriedade, conforme o titular fosse uma pessoa física ou uma pessoa jurídica, o que obviamente contrariaria a natureza das coisas, visto que, em sua essência ou conteúdo, não se detecta elemento algum que, por exemplo, faça diferente a propriedade de um imóvel atribuída a um homem daquela que uma pessoa jurídica venha a ter sobre o mesmo bem. Um exemplo dado como típico de ofensa a direito difuso é o da propaganda enganosa, porque alcançaria perniciosamente uma multidão incalculável de pessoas49. No entanto, se a mesma propaganda enganosa fosse feita por um concessionário de serviço público de telefonia para convencer seus assinantes a aderir a um novo plano de serviço, não mais se poderia divisar uma ofensa a direito difuso, uma vez que o universo dos assinantes da mesma concessionária pode ser numeroso, mas nunca será indefinido ou indefinível. Vê-se, pois, quão sutis são as diferenças que separam, uma da outra, essas duas categorias imaginadas pelo direito positivo brasileiro, e dessa sutileza decorrem inúmeras e intrincadas complicações que os tribunais e a doutrina têm de enfrentar, na interpretação e aplicação prática das tutelas pertinentes. É o que ocorre, por exemplo, com o mandado de segurança coletivo, que a Lei nº 12.016 quer que só seja aplicado aos direitos coletivos, e, com grande frequência, os tribunais e os juristas têm de reconhecer, não sem enormes controvérsias, que, de alguma forma, deve ser aplicado também a situações que envolvam direitos difusos, ou a direitos aparentemente coletivos, mas cuja tutela acarreta emanações e reflexos que, necessariamente, atingirão comunidades ou grupos muito maiores do que o congregado pelos membros ou associados da entidade impetrante.

Imagine-se a associação dos moradores de um bairro, sobre o qual recaem as consequências deletérias de uma poluição provocada pelo serviço público de captação de lixo sobre o manancial de água que serve à população. Em defesa do direito dos seus associados, é impetrado o mandado coletivo visando fazer cessar a prática administrativa geradora da intolerável poluição. Mas a associação não congrega todos os moradores do bairro, nem a poluição se restringe ao bairro, já que, envolvendo as águas captadas nas proximidades, atingirá todos os habitantes da cidade e até mesmo aqueles que não o habitam, mas por ela têm de transitar. Se assim é – dir-se-á –, o caso é de tutela de direito difuso, logo, não se acha sob proteção do mandado de segurança coletivo, destinado que é apenas à defesa de direitos coletivos e individuais homogêneos. No entanto, se se analisar a situação jurídica da associação impetrante, chegar-se--á à inevitável conclusão de que seus associados formam um grupo, cujos participantes se acham ligados juridicamente pelo vínculo que, como consumidores do serviço de água, mantêm com o município, responsável pela poluição. Na exata definição do CDC (art. 81) e da própria Lei do Mandado de Segurança (art. 21, parágrafo único, inc. I), não poderão deixar de receber o tratamento de titulares de direitos coletivos. Os exemplos são muitos, principalmente no campo dos servidores públicos: uma associação regional de funcionários da União, v.ġ., impugna a supressão indevida de uma verba remuneratória, a que legalmente fazem jus todos os integrantes do universo de servidores federais: o mesmo direito seria coletivo em relação aos associados e difuso para a comunidade geral do funcionalismo. Imagine-se a dificuldade prática que o tribunal haveria de enfrentar para qualificar o direito em disputa e sua harmonização com a disciplina da ação mandamental coletiva50. É oportuno invocar, a propósito, a lição, inteiramente procedente, de ANTONIO GIDI, sobre os inconvenientes e a desnecessidade da divisão entre direitos difusos e direitos coletivos: “En nuestra opinión, la categoria de derechos colectivos no tiene utilidad prática porque dependiendo del caso concreto, la situación puede ser encuadrada en el concepto de derechos difusos o en derechos individuales homogéneos”51. A dificuldade prática de joeirar os direitos difusos para restringir o uso do mandado de segurança apenas aos casos de direitos coletivos surge com um complicador, visto que, se a diferença é praticamente inócua no campo da ação civil pública, assume relevância no que diz respeito à ação mandamental. Os embaraços classificatórios, todavia, não devem ser solucionados em detrimento do impetrante, já que, em se tratando de uma garantia fundamental, a regra básica de hermenêutica é a da máxima efetividade das normas constitucionais, que repugna as interpretações restritivas e prestigia as ampliativas. Disso resulta que, na dúvida, não se qualifica o direito transindividual como difuso, mas como coletivo, e, assim, obtém-se, por meio de interpretação benéfica para o impetrante, a eficiência máxima para o remédio constitucional, figurante no inc. LXX

do art. 5º da Constituição. Toda essa celeuma, criada pela Lei nº 12.016, derivou da preocupação de evitar que o mandado coletivo se tornasse banalidade no mundo das ações coletivas, ocupando o espaço das ações civis públicas, em que os direitos difusos encontram terreno mais adequado para sua discussão e tutela. No entanto, não precisava ter o legislador criado essa barreira preventiva, haja vista que, por sua própria natureza e fluidez objetiva e subjetiva, sempre será muito difícil que um direito difuso possa, in limine litis, satisfazer o requisito da liquidez e certeza, sem o qual o mandado de segurança, seja individual ou coletivo, não é admitido. O condicionamento vem da própria Constituição (art. 5º, inc. LXIX) e é ressaltado pela Lei nº 12.016 (art. 1º). Portanto, nunca haverá, ao que se pensa, o uso imoderado ou inadequado do mandado de segurança coletivo, ainda quando se opte por flexibilizar sua aptidão para tratar, extensivamente, de algum direito difuso, em circunstância especial. O freio natural será estabelecido, sempre, pela sumariedade procedimental da ação de mandado de segurança, cuja tramitação só será admitida depois de cumprido o requisito de a petição inicial se fazer instruída por prova documental pré-constituída, capaz de comprovar de plano o direito e as alegações do impetrante.

141.6. Mandado coletivo e direitos difusos: um falso problema A incompatibilidade entre o mandado de segurança coletivo manejado por ente associativo e os direitos difusos não foi imposta pela Lei nº 12.016/2009. Tampouco há distinção substancial ou ontológica entre o que seja direito difuso e direito coletivo. Como já restou demonstrado, a diferença é superficial ou periférica, já que, em essência, ambos são direitos transindividuais e indivisíveis. A diferença feita pela lei tem o objetivo apenas de delimitar a maior ou menor dimensão do grupo que titulariza o direito transindividual. Assim, se um mesmo direito dessa natureza é enfocado dentro de uma grande coletividade, cuja identificação e individualização dos respectivos componentes é impossível de ser feita, para efeito de obtenção da tutela judicial, sua qualificação será na categoria de direito difuso; de modo que sua defesa em juízo poderá ser feita, por meio de ação coletiva exercitável, preferencialmente, por órgãos institucionais, como, v.ġ., o Ministério Público e outras entidades criadas para tutela dos direitos e interesses universais da sociedade. Se, porém, os mesmos direitos transindividuais são violados, com repercussões diretas e imediatas sobre a esfera de um grupo, cujos membros sejam individualizáveis e identificáveis, seu tratamento em juízo poderá, perfeitamente, dar-se sob o regime dos direitos coletivos stricto sensu, porque, estando os componentes do grupo ligados entre si pelo vínculo associativo, seus direitos comuns, enquanto tratados nos limites do grupo, enquadram-se na definição de coletivos, e não de difusos. O que importa é saber como a tutela dos direitos transindividuais é postulada em juízo: se no interesse de toda a comunidade ou se no interesse do grupo formador de um ente associativo criado

para a defesa dos direitos e interesses comuns dos respectivos associados. Quando a lei, portanto, define que o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por entidade associativa em defesa de direitos coletivos pertinentes a seus membros, de forma alguma está impedindo que nessa categoria se incluam os direitos difusos, definidos como tais para os efeitos da ação civil pública ou da ação coletiva do direito do consumidor. Está apenas delimitando a legitimação dos entes associativos – sindicato, entidade de classe e associação –, os quais apenas poderão manejar o mandado de segurança coletivo dentro da esfera dos direitos coletivos lato sensu ligados aos “seus membros ou associados”. O importante não é definir se o direito transindividual é, em si, atribuível a toda a comunidade, mas sim verificar se o grupo dos membros da associação tem ou não interesse em jogo no ato administrativo violador do interesse coletivo, in concreto. Uma associação de moradores de uma cidade ou bairro pode legitimar-se a defender o direito difuso ao meio ambiente sadio, enquanto seus membros estiverem sendo afetados diretamente pelos efeitos poluidores gerados pelo ato impugnado. Não terá legitimidade, todavia, se tal ato produziu malefícios a outras cidades ou outros bairros, sem atingir os membros da associação, que congrega os moradores de certa localidade distinta da que efetivamente foi prejudicada. É a própria Constituição que, ao instituir o mandado de segurança coletivo, o atribui às entidades associativas, para “defesa dos interesses de seus membros ou associados” (CF, art. 5º, LXX, b). A Lei nº 12.016, em seu art. 21, não teve outro objetivo senão o de cumprir o preceito constitucional, no sentido de delimitar o uso do mandado de segurança coletivo à tutela dos direitos transindividuais de seus membros ou associados. Não é, nessa ordem de ideias, a possibilidade abstrata de classificar um direito como difuso que o excluirá da tutela alcançável por meio do mandado coletivo. É a ausência de interesse dos associados no caso deduzido em juízo que descredenciará o ente associativo ao manejo do mandamus coletivo. É preciso, portanto, para aplicar o remédio constitucional do art. 5º, LXX, que o direito transindividual em jogo pertença, de alguma forma (que não necessita ser exclusiva), ao grupo defendido pela associação. Presente o interesse legítimo dos componentes do ente associativo, configurado estará o interesse coletivo, de que cuidam a Constituição e a Lei nº 12.016, e possível será sua defesa por meio do mandado de segurança coletivo. O que não se quis foi permitir às entidades associativas a defesa, por meio do mandamus, de qualquer direito difuso, fora e além do campo dos interesses dos respectivos membros ou associados. Uma vez atingidos tais interesses, o direito a ser tutelado haverá de ser tratado como coletivo stricto sensu, desde que a pretensão da entidade impetrante se empenhe em demonstrar que age na busca de tutela de direitos e interesses do grupo cuja defesa lhe compete. Em suma, todo e qualquer direito transindividual pode se caracterizar como coletivo em sentido estrito, desde que relacionado, in concreto, a um grupo certo de pessoas (in casu: os associados ou membros do ente

associativo). Se é essa a leitura que se deve fazer do art. 5º, LXX, b, da Constituição, e do art. 21 da Lei nº 12.016, o problema criado doutrinariamente em torno de caber, ou não, a tutela dos direitos difusos pela via do mandado de segurança coletivo, na verdade, não existe. Qualquer direito coletivo em sentido lato – difuso ou coletivo stricto sensu – merecerá defesa por meio da questionada ação constitucional, bastando que se respeitem os limites da legitimação traçada pela própria norma constitucional, quais sejam, os de atuar o ente associativo sempre “em defesa dos interesses de seus membros ou associados”.

142. PARTIDOS POLÍTICOS O art. 21, caput, da Lei nº 12.016 foi explícito: os partidos políticos com representação no Congresso Nacional estão legitimados a impetrar mandado de segurança coletivo, “na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária”. Para os partidos políticos, à luz dos próprios termos da previsão constitucional, é intuitiva a legitimação no que se refere aos filiados e aos direitos políticos. Mas, mesmo além dos interesses dos filiados e do âmbito dos direitos políticos, há outros temas que podem se vincular aos fins institucionais dos partidos e, assim, justificar sua atuação no campo do mandado de segurança coletivo. Uma vez que o art. 5º, LXX, a, não exige mais do que a existência legal do partido e a representação no Congresso, não há razão para limitar sua legitimação aos direitos políticos e aos interesses de seus filiados. Nesse sentido, JOSÉ DA SILVA PACHECO enumera como temas também comportáveis na tutela coletiva patrocinada pelos partidos políticos: a) direitos vinculados ao objeto social, constante do estatuto, especialmente no concernente a seus fins e propósitos, bem como o programa de ação; b) direitos vinculados à soberania, cidadania, regime democrático, pluripartidarismo, dignidade humana, valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa, liberdade, ordem econômica e social, política urbana, agrícola, educação e meio ambiente52. A Lei nº 12.016, ao regulamentar o texto constitucional relativo ao mandado de segurança coletivo, seguiu a orientação que vinha sendo preconizada pela doutrina e jurisprudência dominantes. Assim, dispõe que o remédio constitucional em causa “pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária” (art. 21, caput)53. Antes da Lei nº 12.016, havia quem defendesse, perante a regra aberta do art. 5º, LXX, a, da CF, a tese de que os partidos políticos poderiam defender, por meio do mandado de segurança coletivo, quaisquer direitos, mesmo que não relacionados com seus filiados e não afetos a questões políticas relacionadas à agremiação54. Agora, a nova Lei do Mandado de Segurança não deixa lugar a dúvidas, pois somente admite o mandamus coletivo por partido político para a defesa dos interesses relacionados aos seus integrantes, ou à finalidade partidária, “pelo que resta excluído do âmbito de

potencial tutela por tais entes pela via mandamental outros direitos ou interesses a ele não vinculados diretamente, a exemplo dos interesses dos consumidores, dos portadores de deficiências, dos investidores no mercado de valores imobiliários etc.”55. Há, porém, fins institucionais dos partidos políticos cuja constatação decorre da própria função que a ordem constitucional lhes confere e que, portanto, podem justificar o manejo do mandado de segurança coletivo, independentemente de previsão expressa nos respectivos estatutos. Prevalece, nesse sentido, válida a lição já invocada de JOSÉ DA SILVA PACHECO, na qual se arrolam vários direitos vinculados aos valores políticos constitucionais que podem e merecem ser tutelados pelos partidos políticos, de forma coletiva, por dizerem respeito a instituições e bens cuja manutenção e defesa são, por natureza, inerentes à missão atribuída a qualquer instituição política. Mas será preciso que configurem direitos coletivos ou individuais homogêneos, na esfera do grupo partidário, já que não teriam sido incluídos no âmbito da tutela da segurança coletiva os direitos difusos, entre os quais figurariam os interesses gerais indiscriminados da comunidade. O problema, porém, está na restrição das finalidades partidárias como se fossem legalmente limitadas aos interesses dos membros da entidade56. Essas finalidades, na verdade, ultrapassam tais interesses e, por força da Constituição e da lei que define o papel dos partidos, compreendem amplos e significativos interesses de toda a coletividade, como os relacionados com a cidadania, a democracia, a separação dos poderes e a defesa dos direitos fundamentais. Se tais direitos coletivos são violados ou ameaçados pelo Poder Público, irrecusável é a legitimidade do partido político para invocar a tutela do mandado de segurança coletivo, o qual, em tais circunstâncias, não haverá de ficar confinado à esfera apenas dos membros do partido57.

142.1. Os partidos políticos e sua destinação institucional Dispõe a Lei dos Partidos Políticos que tais instituições se apresentam como pessoa jurídica de direito privado que se destina a “assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal” (Lei nº 9.096/1995, art. 1º)58. Assim, da dúplice finalidade que toca ao partido político cumprir no Estado Democrático de Direito – garantia da “autenticidade do sistema representativo” e defesa dos “direitos fundamentais” –, não é lícito acatar literalmente a previsão do art. 21 da Lei nº 12.016, de que sua legitimação para o mandado de segurança coletivo se limite à defesa dos “interesses legítimos relativos a seus integrantes”. O papel reservado ao partido político, na estrutura do Estado Democrático de Direito, não é, sabidamente, o de uma associação de defesa de seus filiados, mas o de uma entidade que enseja a soma do esforço conjunto de um grupo aberto a todos que comunguem do ideário compilado no respectivo estatuto. Por isso os direitos coletivos ou difusos, em cuja defesa o partido político se

empenha, não são direitos de seus filiados, mas de toda a comunidade a que a instituição se destina a servir, política e socialmente59. De forma alguma a disposição do art. 21, caput, da atual Lei do Mandado de Segurança pode ser lida e compreendida como uma limitação rígida à sua atuação nas vias do mandado coletivo, de modo a impedir que o partido político ultrapasse a esfera dos interesses dos seus integrantes60. É certo que os interesses apenas dos membros do partido podem ser coletivamente defendidos por meio de mandado de segurança impetrado pela entidade partidária, como, aliás, ocorre com qualquer entidade associativa. Nunca serão, porém, os únicos tuteláveis por dita via processual, já que a legitimação do partido político é muito mais ampla quando se trata de mandado de segurança coletivo. Na verdade, tomando-se a expressão “legítimos interesses relativos a seus integrantes”, dentro da vida político-partidária, o seu alcance não pode ser outro senão o do ideário do partido, o qual os membros abraçaram ao filiarem-se à agremiação. Nessa linha de entendimento, o interesse dos integrantes, no sentido coletivo, não é, obviamente, o de concorrer aos cargos de representação popular, mas somente pode ser o de defender, de maneira difusa ou geral, a autenticidade do sistema representativo e os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal. O art. 21, caput, da Lei nº 12.016 não pode ser lido de maneira a isolar a expressão “interesses legítimos dos integrantes” do restante da norma, ou seja, sem fazer conotação alguma com “a finalidade partidária”. Não foi por mero acaso que a referida norma evitou falar em “direitos” dos integrantes do partido, preferindo apontar para os seus “interesses legítimos”. É que, no âmbito do mandado de segurança coletivo, a tutela jurisdicional não se fixa em direitos que sejam pertencentes apenas aos membros do partido político, e sim em direitos transindividuais cuja titularidade é de toda a comunidade. O interesse do grupo partidário se manifesta, indiretamente, como caminho para se alcançar uma tutela que o ultrapassa e incide, na realidade, sobre direitos indivisíveis de todos os membros da sociedade politicamente organizada, indistintamente. A doutrina formada à luz da Constituição, antes da Lei nº 12.016/2009, sobre as amplas dimensões do mandado de segurança coletivo manejável pelo partido político, deve prevalecer, sem embargo da literalidade do art. 21 da lei nova, aparentemente restritiva. Essa doutrina acha-se espelhada na lição clara e precisa de TEORI ALBINO ZAVASCKI, in verbis: “No que respeita à legitimação dos partidos políticos, em suma, a pretensão do mandado de segurança coletivo não está limitada aos interesses particulares de seus filiados. Tal limitação implicaria não apenas o desvirtuamento da natureza da agremiação partidária – que não foi criada para satisfazer interesses dos filiados – como também a eliminação, na prática, da faculdade de impetrar segurança coletiva. Assim, há de se entender que o partido político está legitimado a impetrar mandado de segurança coletivo com objetivos

mais abrangentes, com a única limitação de estarem situados no âmbito de sua finalidade institucional e do seu programa”61. Mesmo após o advento da Lei nº 12.016/2009, a boa doutrina continua defendendo, majoritariamente, a mesma tese: “O partido político deve efetivamente poder promover a defesa coletiva de direitos outros, que não aqueles simplesmente da titularidade dos seus próprios filiados. Assim, direitos difusos podem ser defendidos pelo caminho do mandado de segurança coletivo aforado por partido político, desde que marcados pelo signo da liquidez e certeza”62. Cabendo ao partido político, segundo o próprio texto do art. 21 da Lei nº 12.016, aforar o mandado de segurança coletivo para defesa da “finalidade partidária”, deve-se ter em conta que “por finalidade partidária certamente que não haverá de ser entendido apenas o propósito inerente a todo partido político, consistente na conquista de mandatos eletivos que lhe permitem a implementação de seu programa de governo e de sua ideologia partidária”63. “A expressão – segundo esclarece DECOMAIN – necessita, aqui, de interpretação mais abrangente, feita de modo sistemático, conjugando-se o art. 21 da Lei nº 12.016/09 com o art. 1º da Lei nº 9.096/1995: finalidade de todos os partidos é também assegurar a autenticidade do sistema representativo e, mais que isso, assegurar a efetiva observância dos direitos fundamentais definidos na Constituição”64 (g.n.). Na jurisprudência, é bom registrar que a tese de que os direitos fundamentais podem ser protegidos pelos partidos políticos por meio do mandado coletivo, sem se restringir ao plano dos seus integrantes, já foi adotada pelo STJ: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. (...) EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS DO INTERESSE DA COLETIVIDADE. ART. 5º, XXXIII, DA CF. 1. Dentre os Direitos e Garantias Fundamentais capitulados no art. 5º da Constituição Federal está inserido o de que ‘todos têm direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo em geral, que serão prestados no prazo de lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado’ (inciso XXXIII). 2. Inequívoco que os documentos cuja exibição foi requerida pelos impetrantes não estão protegidos pelo sigilo prescrito no art. 38 da Lei 1.595/64, sendo sua publicidade indispensável à demonstração da transparência dos negócios realizados pela

Administração Pública envolvendo interesses patrimoniais e sociais da coletividade como um todo. 3. Recurso ordinário conhecido e provido para, reformando o acórdão impugnado, conceder a segurança nos termos do pedido formulado pelos recorrentes”65. Sem embargo da resistência jurisprudencial, pode-se ter como amplamente vitoriosa na doutrina a tese do cabimento irrestrito do mandado de segurança coletivo, por iniciativa de partido político, sempre que os objetivos visados pela impetração “guardem correspondência com os valores que devem ser tutelados pelos partidos políticos, estampados, esses, no caput do art. 17 da CF/88”66. Nessa dimensão, o mandado de segurança coletivo “pode perfeitamente envolver interesses que transcendam o universo dos filiados ao partido impetrante” – como destaca EDUARDO ARRUDA ALVIM, com procedência67. Os requisitos de admissibilidade do mandado de segurança coletivo por intermédio de partido político não reclamam a tutela direta de interesses dos filiados68 e se concentram em: a) uma correlação da pretensão com as finalidades, que devem ser perseguidas pela entidade política, e que se acham delineadas pela Constituição Federal (art. 17) e explicitadas pela Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei 9.096/1995, art. 1º); b) na exigência de que, embora difusos ou coletivos, os direitos a defender se revistam da qualidade de “líquidos e certos”69.

142.2. Alguns problemas da legitimação dos partidos políticos, após a Lei nº 12.016/2009 Não reconhecia o STF, pelo menos à unanimidade, a legitimação dos partidos políticos para defender os interesses da comunidade, em seu todo, e muito menos para tutelar direitos individuais homogêneos70. A Lei nº 12.016 enfrentou o problema e o solucionou de modo diferente daquele que prevalecera no entendimento majoritário do STF: ficou expressamente assentado que o partido político, dentro de sua finalidade institucional (“finalidade partidária”), “poderá impetrar mandado de segurança coletivo, inclusive para a tutela de direitos individuais homogêneos de não filiados”71, nos termos do seu art. 21, caput. Ao limitar, porém, o alcance da tutela dos direitos individuais homogêneos aos “interesses” dos integrantes do partido, teria a Lei nº 12.016 – segundo ALEXANDRE DE MORAES – incorrido em inconstitucionalidade, visto que tal restrição à atuação dos partidos políticos, na área do mandado de segurança coletivo, não consta do inc. LXX, al. a, do art. 5º, da Constituição, no qual não figura outro requisito além da representação no Congresso Nacional72. A dúvida, porém, se soluciona se o propalado “interesse” dos integrantes do partido for

dissociado dos “direitos individuais” deles, para serem compreendidos como interligados à “finalidade partidária”. Assim, os direitos individuais homogêneos, inclusive os dos não filiados ao partido, cairiam sob sua tutela coletiva, desde que possam ser associados aos objetivos institucionais da agremiação. Dessa maneira, chegar-se-á a uma interpretação conforme a Constituição, fugindo à restrição que a literalidade do questionado art. 21 sugere, à primeira vista73. Condicionou, a Lei nº 12.016, a legitimação do partido político para o mandado de segurança coletivo ao requisito de representação no Congresso Nacional. Não poderia deixar de fazê-lo, porque tal requisito decorre diretamente de imposição constitucional (CF, art. 5º, LXX, a)74. A partir da exigência constitucional de representação do partido no Congresso Nacional, algumas questões têm sido levantadas pela doutrina. A primeira delas relaciona-se com a perda superveniente da aludida representação, como, por exemplo, quando, em eleição posterior ao ajuizamento da segurança coletiva, o partido não lograr eleição de membro algum, seja para o Senado ou para a Câmara. Uma vez que as condições de procedibilidade devem se manter durante todo o curso do processo, o caso será de extinção do feito, sem resolução do mérito, nos termos do art.485, VI75, do CPC/201576. Outra questão aventada refere-se ao partido com representação em assembleia estadual, mas não no Congresso Nacional. Poderia manejar o mandado de segurança na sua esfera local de poder? A resposta é negativa, tendo em vista que a raiz da legitimação do partido político para o mandado de segurança coletivo está na Constituição, a qual a vincula, expressamente, à representação no Congresso Nacional77. A entidade sindical ou de classe pode defender, por mandado coletivo, toda a categoria por ela representada, ou apenas parte dela78. O art. 21 da Lei nº 12.016 é expresso nesse sentido. Não deve, contudo, haver conflito interno de interesses entre a parcela defendida e outros membros da mesma categoria79. A mesma restrição se aplica ao mandado coletivo impetrado por entidade de classe, isto é, falta legitimidade à instituição classista para defender interesses em conflito dentro da classe ou categoria que representa80.

143. ORGANIZAÇÃO SINDICAL E ENTIDADE DE CLASSE As organizações sindicais estruturam-se em vários níveis – sindicatos81, federações82, confederações83 e centrais sindicais84 – e assumem a natureza jurídica de “associações civis”, de finalidade especial, congregando tanto os trabalhadores quanto os empregadores, sempre tendo em mira a defesa dos interesses de seus membros ou associados. Na verdade, embora se organize sob o regime de pessoa jurídica de direito privado85, o nível de atuação da entidade sindical vai, por força da Constituição, além da defesa de seus associados, alcançando todos os integrantes da categoria

profissional, associados ou não a ela (CF, art. 8º, III). Portanto, o mandado de segurança coletivo impetrado por entidade sindical beneficia toda a categoria, cujos interesses foram defendidos, de maneira que, por exemplo, a empresa que pretende se valer da vantagem reconhecida na sentença em que saiu vitoriosa a impetração coletiva tem que demonstrar, não necessariamente que é associada à instituição que figurou no polo ativo do mandamus, mas apenas que “pertence ao grupo, à categoria ou à classe que se beneficiou do writ coletivo”86. A existência e criação do ente sindical não dependem de lei e tampouco de prévia autorização do Poder Público (CF, art. 8º, I)87. Sua constituição se dá sob o regime do Código Civil, como modalidade que é das associações civis, segundo reconhecimento doutrinário e jurisprudencial, consolidado após a Carta de 198888.

Entretanto, o STF e o STJ acabaram por alterar o seu entendimento para exigir que a organização sindical tenha registro no MT para obter legitimidade para a impetração do writ89. Diversamente das associações comuns, não age o sindicato (ou qualquer entidade sindical) na defesa apenas de interesses dos seus associados, mas dos interesses da categoria a que a instituição se refere, seja ela composta de trabalhadores ou de empregadores. Nessa função, por isso mesmo, a entidade sindical independe de autorização dos associados para impetrar o mandado de segurança coletivo90. Mas os interesses defendidos por meio do mandado coletivo haverão sempre de ter “ligação com o objeto da entidade sindical”, e, pois, “com o interesse jurídico desta”91. O mesmo se pode dizer das entidades de classe, criadas por lei, dentro do regime autárquico do direito público, como, v.ġ., a Ordem dos Advogados do Brasil, o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura e outras ordens profissionais. Também essas ordens, ou instituições de defesa profissional, geralmente de autônomos liberais, legitimam-se a atuar em defesa ampla da categoria a que correspondem, e não apenas dos seus associados92. Tal como os sindicatos, as entidades de classe podem manejar o mandado de segurança coletivo, sem que dependa de autorização dos respectivos associados93. Mas aqueles, assim como estas, terão, segundo o art. 21 da

Lei nº 12.016, de atuar na impetração coletiva, em consonância com suas finalidades institucionais, para que independam da anuência dos interessados diretamente94. A hipótese, em qualquer um dos casos do art. 21, não é de representação dos titulares dos interesses defendidos pela entidade associativa, mas de legitimação extraordinária para atuar, em nome próprio, na defesa de interesse de outrem (o fenômeno processual, portanto, é aquele que se costuma identificar como

“substituição processual”). Daí a desnecessidade de anuência dos substituídos95. O STJ, a propósito do tema, já decidiu que a dispensa da autorização dos associados em assembleia-geral, para impetração do mandado coletivo, depende de existir previsão dessa anuência nos estatutos: “Não fazendo o estatuto da recorrente qualquer menção, de forma clara e expressa, sobre a defesa de seus associados em juízo como um de seus objetivos institucionais, não há como reconhecer-lhe legitimidade ativa automática”96. A exigência pode ser pensada, em relação às associações comuns, se não houver conexão entre o direito individual dos sócios e a finalidade estatutária. Não pode ser aceita, de forma alguma, quando se tratar de entidade sindical ou de classe, visto que a finalidade de tais instituições é, obviamente, a defesa dos direitos dos integrantes da categoria ou classe a que correspondem. Observe-se que há entidades de classe instituídas por lei, como a Ordem dos Advogados do Brasil, que têm a natureza de autarquia (pessoa jurídica de direito público). Pode-se, também, instituí-las por convenção, caso em que assumem a natureza de uma associação civil97. Mesmo nessa hipótese, o fim institucional da entidade é o da defesa de uma classe ou categoria, de modo que o mandado de segurança coletivo por ela impetrado pode compreender “toda a categoria”, indo, pois, além dos seus associados98.

144. ASSOCIAÇÕES Congregam as associações, segundo o Código Civil, pessoas que se unem em uma organização destinada a cumprir “fins não econômicos” (art. 53). Para adquirirem personalidade jurídica de direito privado, devem ter seu ato constitutivo inscrito no registro competente (art. 45), que é aquele destinado ao registro das pessoas jurídicas de direito privado. Para que uma associação se legitime a impetrar mandado de segurança coletivo, exige a Lei nº 12.016 que esteja “legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano”. Não basta, pois, sua inscrição no registro de pessoas jurídicas de direito privado, sendo exigível, ainda, seu efetivo funcionamento pelo tempo mínimo da lei99. Por outro lado, o mandado de segurança coletivo proposto por associação terá de cumprir mais alguns requisitos, relacionados com o objeto da impetração: a)

deverá pretender a defesa de direito líquidos e certos da “totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados”;

b)

deverá corresponder à “forma dos estatutos”; e

c)

os direitos tutelados deverão ser “pertinentes às suas finalidades” (i.e., às finalidades estatutárias)100.

Cumpridas essas exigências legais, o mandado de segurança coletivo poderá ser impetrado pela associação, sem depender de autorização especial dos associados (art. 21, in fine)101. Não havendo previsão estatutária de que a associação se proponha à defesa de direitos coletivos ou individuais homogêneos, necessária se fará a autorização assemblear. Em qualquer caso, a pertinência temática se impõe, ou seja, os direitos coletivos dos associados a defender que deverão estar em consonância com os fins estatutários da agremiação. Não se exige, contudo, que correspondam a todos os associados. O art. 21 da Lei nº 12.016, na esteira da Súmula nº 630 do STF, admite que a instituição tenha legitimidade para a segurança coletiva, ainda quando os direitos a tutelar pertençam a “parte dos seus membros ou associados”102. Há duas previsões na Constituição de ações manejadas por associações, em defesa de direitos dos associados: (i) a do inc. XXI do art. 5º, relativa a ações comuns, para as quais se exige a autorização dos membros, que pode constar dos estatutos ou de deliberação assemblear; e (ii) a do inc. LXX, do mesmo artigo, referente ao mandado de segurança coletivo, no qual não se repete a exigência da aludida autorização. A explicação para essa diversidade de tratamento constitucional decorre das diferentes posições processuais que a associação pode assumir: no mandado de segurança coletivo ocorre substituição processual, de modo que a associação demanda, por autorização de lei, em nome próprio (embora defenda direito alheio); já nas outras ações, isto é, naquelas previstas no inc. XXI do art. 5º da CF, o que há é “representação dos associados”, o que, obviamente, pressupõe, de alguma forma, uma delegação de poderes, ou seja, uma autorização emitida pelos representados em favor do representante. Portanto, no mandado coletivo, a associação é parte, nas demais ações, ela é representante da parte. Contudo, os interesses que a entidade associativa pode legitimamente defender, por meio do mandado de segurança coletivo, são apenas aqueles que dizem respeito aos seus membros ou à categoria que estes integram. É o que evidencia o art. 21, caput, ao prever que esse remédio constitucional da tutela coletiva será impetrável pelas entidades associativas – sindicatos, entidade de classe ou associação – “em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados”. Daí que, já assentou a jurisprudência, não compete, por exemplo, à entidade associativa defender, em mandado de segurança coletivo, direitos ou interesses de pessoas jurídicas de direito público, dado que jamais poderiam se filiar às associações de direito privado103. A exigência de um tempo mínimo de constituição da associação, que consta da Constituição (art. 5º, LXX, b) e da Lei nº 12.016 (art. 21, caput), não fez ressalva à possibilidade de dispensa judicial, tal como ocorre em outras disposições, a exemplo da Lei da Ação civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor, em relação a outras ações coletivas. Há, porém, uma forte corrente doutrinária que defende a possibilidade de tal dispensa, pelas mesmas razões de alta relevância que têm servido à aplicação do favor legal nos casos de ação civil pública e defesa coletiva dos consumidores. Deve-se, com efeito, ampliar e facilitar o exercício das garantias constitucionais e não

as restringir de forma inflexível104. O STJ, por sua Segunda Turma, já se pronunciou favorável à dispensa do prazo mínimo de funcionamento da associação, também no campo do mandado de segurança coletivo, “quando evidenciado o interesse público”105. A exemplo do assentado na jurisprudência do STJ, para as ações coletivas em geral106, LUIZ MANOEL GOMES JÚNIOR e ROGÉRIO FAVRETO entendem que se deva considerar a “relevância do bem jurídico a ser protegido”, para fins de excepcional dispensa do tempo mínimo de constituição da associação, também em matéria de mandado de segurança coletivo, entre outros, os seguintes fatos: “a) questões envolvendo matéria relacionada com a saúde da população, remédios danosos ou sem efeitos comprovados, por exemplo; b) quantidade considerável de beneficiados, de modo a justificar a tutela coletiva, sob pena de ser necessário o ajuizamento de quantidade elevada de ações individuais; c) danos de bagatela, pois o custo para o ajuizamento de demandas individuais não justificaria o benefício isoladamente considerado; d) direitos pertencentes a pessoas com pouco acesso ao sistema judiciário (instrução deficiente ou dificuldade de acesso)”. Cabe aqui a lição de KAZUO WATANABE, formulada a propósito da ação coletiva do consumidor, mas que se amolda também ao mandado de segurança coletivo quando manejado por associação: “O requisito da pré-constituição foi estabelecido para o fim de coibir os abusos consistentes em constituição ad hoc, não raro por razões políticas, de associações para a propositura de certas ações coletivas. Semelhante perigo, porém, deixa de existir quando, pela ‘dimensão ou característica do dano’, ou pela ‘relevância do bem jurídico a ser protegido’, avaliação a ser feita no caso concreto, consiga o magistrado detectar ‘manifesto interesse social’ na admissão em juízo de associação constituída há menos de um ano pela sua representatividade e aptidão como órgão veiculador dos interesses transindividuais”107.

144.1. Relação dos associados da entidade impetrante O parágrafo único, do art. 2º-A, da Lei nº 9.494/1997108, nas ações coletivas contra as pessoas jurídicas de direito público, impõe às entidades associativas promoventes dois requisitos a serem cumpridos no momento do ajuizamento da causa: a petição inicial será obrigatoriamente instruída (i) com a ata da assembleia que houver autorizado a demanda coletiva em defesa de direitos dos

associados; e (ii) com a relação nominal dos seus associados, com os respectivos endereços. Todavia, tais exigências não se aplicam ao mandado de segurança coletivo, pela simples razão de que a Lei nº 12.016, na esteira do que já vinha decidindo o Supremo Tribunal Federal109, dispõe, textualmente, não necessitar a entidade associativa de autorização especial, desde que o mandado em favor dos associados se apresente, na forma dos estatutos, como pertinente às suas finalidades (art. 21, in fine). Além do mais, a entidade associativa, ao tutelar direitos coletivos ou difusos, atua como substituto processual, demandando em nome próprio a defesa de direitos que pertencem à comunidade ou a um grupo dela, ultrapassando, quase sempre, o universo de seus associados. Daí a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que no mandado de segurança coletivo é desnecessária a apresentação pela entidade de classe, não só da autorização assemblear, como também da relação nominal dos associados110. Embora a maioria dos acórdãos dos Tribunais Superiores se refira a mandados de segurança coletivos impetrados por entidades sindicais, o Supremo Tribunal Federal já decidiu, em caráter mais amplo, que a exigência constante do art. 2º-A da Lei nº 9.494/1997 não se aplica ao mandado de segurança coletivo111.

145. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO Os legitimados para impetrar o mandado de segurança coletivo acham-se arrolados, de forma expressa, pela Constituição (art. 5º, LXX) e confirmados pela Lei nº 12.016/2009 (art. 21, caput). Nesse rol não figuram as pessoas jurídicas de direito público, nem mesmo aquelas primárias na formação do Estado Republicano, como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. O Supremo Tribunal Federal, no caso em que um Estado-Membro impugnou ato da Presidência da República qualificado de prejudicial aos interesses da população governada pelo ente político impetrante, assentou: “MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO: QUESTÃO DE LEGITIMIDADE EXTRAORDINÁRIA DE ESTADO-MEMBRO EM DEFESA DE INTERESSE DA SUA POPULAÇÃO. Ao Estado-membro não se outorgou legitimação extraordinária para a defesa, contra ato de autoridade federal no exercício de competência privativa da União, seja para a tutela de interesses difusos de sua população – que é restrito aos enumerados na Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) –, seja para a impetração do mandado de segurança coletivo, que é objeto de enumeração taxativa do art. 5º, LXX, da Constituição. Além de não se poder extrair mediante construção ou raciocínio analógicos, a alegada legitimação extraordinária não se explicaria no caso, porque, na estrutura do Federalismo, o Estado-membro não é órgão de gestão, nem de representação dos interesses de sua população, na órbita da

competência privativa da União”112.

146. LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA O MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO A Constituição, que foi expressa sobre a matéria pertinente aos legitimados à propositura do mandado de segurança coletivo, não incluiu o Ministério Público no rol daqueles autorizados a impetrá-lo (CF, art. 5º, inc. LXX)113. Nada obstante, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que o sistema de tutela dos direitos transindividuais, a que se acha vinculado o Ministério Público, o legitima para todas as ações coletivas integradas ao referido sistema, o qual teria implantado um “autêntico concurso de ações”, voltado para um objetivo comum114. Sobre o tema, ver, ainda, o item seguinte.

147. LEGITIMAÇÃO PASSIVA DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO A autoridade coatora, na segurança coletiva, é definida nos mesmos moldes da segurança individual: “Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática” (Lei nº 12.016, art. 6º, § 3º). Em determinadas circunstâncias, porém, pode acontecer de os associados da entidade promotora do mandado de segurança coletivo, cujos direitos individuais foram ofendidos, estarem submetidos a autoridades locais diferentes. Para que o mandado de segurança coletivo, em tais circunstâncias, seja eficaz e compreenda toda a coletividade substituída pelo ente coletivo, necessário será aforar a ação constitucional em face da autoridade hierárquica superior, cujas atribuições abranjam todos os interessados, mesmo que não tenha dita autoridade praticado todos os atos que atingiram os diversos associados. É de se lembrar, outrossim, que a identificação da autoridade coatora é relevante para a definição do juízo competente, mas não é dita autoridade a parte passiva da ação mandamental. Essa posição processual cabe à pessoa jurídica de direito público à qual se acha vinculado o órgão coator.

148. COMPETÊNCIA Já antes da regulamentação baixada pela Lei nº 12.016, se entendia que, em matéria de competência, o mandado de segurança coletivo nada inovara, subme-tendo-se, portanto, às mesmas regras editadas para o mandado individual115. A nova Lei do Mandado de Segurança adotou a mesma orientação, já que não editou regra alguma que alterasse o entendimento anteriormente firmado

quanto à uniformidade da competência entre o mandado individual e o coletivo. A característica dessa competência – que a torna diferente daquela ordinariamente definida pelo Código de Processo Civil – é que o foro da ação mandamental não se define em função do domicílio do réu (pessoa jurídica interessada, no caso), mas da sede de seu agente, apontado como autoridade coatora, pelo impetrante. Há, porém, algumas particularidades que se registram com maior frequência no mandado coletivo do que no individual, como a pluralidade de autoridades que concorreram para a prática do ato impugnado. Se os pretensos coatores se acharem sob jurisdição improrrogável de juízos distintos, não será possível o mandado de segurança contra todos no foro de apenas um deles. O caso será de ajuizamento limitado apenas contra um deles, ou contra aqueles sujeitos à competência do mesmo juízo116. Também, não pode uma justiça especializada conhecer de mandado de segurança, que envolva matéria diversa daquela correspondente às suas atribuições: não cabe, por exemplo, à Justiça Eleitoral conhecer de segurança que não verse sobre direito eleitoral, nem à Justiça do Trabalho, de questão que não corresponda a litígio entre empregado e empregador117, e tampouco à Justiça Estadual, de questão que envolva pessoa jurídica de direito público federal118.

149. O PROCEDIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Enquanto não regulamentado o texto constitucional sobre mandado de segurança coletivo, sua aplicação em juízo seguia as regras tradicionais do mandado de segurança singular. A Lei nº 12.016 cuidou de tal regulamentação e, quanto ao processo, editou as seguintes regras específicas, para diferenciar o regime do mandado coletivo do singular: a)

a sentença, no mandado de segurança coletivo, “fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante” (art. 22, caput);

b)

“o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais” (art. 22, § 1º), ou seja, a ação coletiva proposta pela entidade representativa do grupo ou categoria não inibe que algum membro prefira defender-se individualmente, por meio de ação singular;

c)

entretanto, a coisa julgada obtida no mandado de segurança coletivo não beneficiará o que permaneceu tocando seu writ individual paralelamente ao coletivo. Para se prevalecer de tal benefício, é indispensável que desista da impetração individual no prazo de 30 dias a contar da ciência comprovada da impetração do writ coletivo (art. 22, § 1º, in fine)119;

d)

“no mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar

no prazo de 72 (setenta e duas) horas” (art. 22, § 2º). Já antes do advento da Lei nº 12.016 se entendia que, salvo as questões relacionadas com a coisa julgada e com a medida liminar, o mandado de segurança coletivo não apresentava novidade no tocante ao procedimento, que, em linhas gerais, era o do writ individual. A inovação, em termos de liminar, consistiu em submeter, no mandado coletivo, sua concessão à prévia audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público interessada (Lei nº 12.016, art. 22, § 2º). Quanto à força da sentença do mandado coletivo, já se entendia, mesmo antes da nova Lei do Mandado de Segurança, que o regime a observar, em face da coisa julgada, seria o das ações coletivas, tal como definido pelo art. 103, II, da Lei nº 8.078/1990, ou seja, a coisa julgada operaria erga omnes dentro do grupo, categoria ou classe representados pela entidade autora, se o provimento fosse de deferimento da impetração. Se, entretanto, a ordem fosse denegada por insuficiência de prova, não seriam os associados atingidos individualmente pela força da coisa julgada120. A nova lei, que veio regulamentar o mandado de segurança, inclusive na sua feição coletiva, seguiu realmente aquela doutrina, pois o que restou disposto no seu art. 22 foi justamente que a sentença do mandado de segurança coletivo faz coisa julgada em face de todos os membros do grupo ou categoria substituídos pela entidade impetrante (caput), salvo em relação àquele que optar por manejar mandado de segurança individual (§ 1º). Confirmou-se, portanto, a previsão de que o mandado de segurança coletivo, instituído pela Constituição de 1988 (art. 5º, LXX), era um remédio jurisdicional autoaplicável (não dependia de regulamento em lei ordinária), e que deveria ser manejado segundo as disposições da lei já existente, relativa ao mandado individual, no que respeitava ao rito procedimental, em matéria de petição inicial, notificação da autoridade coatora, informações, intervenção do Ministério Público, legitimidade passiva, competência, sentença, recursos, execução etc.121 As diferenças são apenas aquelas decorrentes do próprio caráter coletivo do mandado autorizado pelo inc. LXX, do art. 5º, da Constituição, e que se manifestam na legitimidade ativa, no litisconsórcio ativo, na litispendência, na liminar e na coisa julgada122. De tal sorte, pode-se afirmar que, tirando o que é imposto pela sua essência coletiva, “ao mandado de segurança coletivo se aplicam todas as demais regras da Lei 12.016/2009, no que não forem com ele incompatíveis”123.

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CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 351. “No nosso entender, o mandado de segurança coletivo só se presta a defender direito líquido e certo da categoria, não de um ou de outro membro da entidade representativa” (MEIRELLES, Hely

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Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 21. ed. atualizada por Arnoldo Wald. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 36). “Por fim, é de se salientar que a previsão constitucional do mandado de segurança coletivo não exigiu, para a sua utilização, regulamentação específica, sendo aplicável, desde então, as normas atinentes ao mandado de segurança individual, no que fossem cabíveis, inclusive em termos procedimentais. Isso não significa dizer que as regras previstas para o mandado de segurança individual fossem totalmente suficientes para aclarar todas as questões pertinentes ao instituto coletivo. Pelo contrário, o ordenamento brasileiro continua necessitando de um tratamento mais sistematizado para os processos coletivos em geral e também para os procedimentos específicos, como o do mandado de segurança. Infelizmente, a Lei 12.016 foi extremamente tímida na regulamentação do mandado de segurança coletivo” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.) et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 150-151). SANTOS, Ernane Fidelis dos. Manual de Direito Processual Civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 3, p. 229; CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 350. SODRÉ, Eduardo. Mandado de Segurança. In: DIDIER JR., Fredie (coord.). Ações constitucionais. Salvador: JusPodivm, 2006, p. 103. STJ, 1ª Seção, MS 5.187/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 24.09.1997, DJU 26.09.1998, p. 4. “O legislador deixou de fazer referência aos direitos difusos. Trata-se de ‘silêncio eloquente’, considerando que o supremo já havia se manifestado no sentido de reputar cabível o ajuiza- mento de mandado de segurança coletivo para defender direitos difusos (RE 196.184/AM)” (AMARAL, Paulo Osternack. O novo perfil do mandado de segurança coletivo. İnformativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n.º 30, ago. 2009. Disponível em: . Acesso em: 2 set. 2009). MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Ċomentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 208; TUCCI, José Rogério Cruz e. “Class action” e mandado de segurança coletivo. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 40-41; BULOS, Uadi Lamêgo. Mandado de segurança coletivo: em defesa dos partidos políticos, associações, sindicatos, entidades de classe. São Paulo: RT, 1996. p. 64-65. O cabimento do mandado de segurança coletivo em defesa de direitos difusos era realmente controvertido na doutrina anterior à Lei nº 12.016 (cf. CARNEIRO, Daniel Zanetti Marques. Op. cit., Revista Dialética de Direito Processual, nº 80, p. 20). BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 171; CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 360-361; GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4.ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p.248-249; REDONDO, Bruno Garcia; OLI-VEIRA, Guilherme Peres de; CRAMER, Ronaldo. Mandado de segurança. Comentários à Lei 12.106/2009. São Paulo: Método, 2009, p. 152. CALDEIRA,Adriano. Processocoletivo: umaanálisesistemáticaacercadalitispendência.SãoPaulo: Ed. LTr, 2012. p. 105-106; CÂMARA Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 400; STJ, 2ª T., REsp 1.168.391/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.05.2010, DJe 31.05.2010;

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STJ, 1ª T., AgInt no REsp. 1.580.394/RS, Rel. Min. Sérgio Kikuna, ac. 20.02.2018, DJe 05.03.2018. NERY JÚNIOR, Nelson. Parecer. Revista de Processo, vol. 57, p. 155. ARRUDA ALVIM, Eduardo; ARRUDA ALVIM, Angélica. Coisa julgada no mandado de segurança coletivo e a Lei nº 12.016/09. Revista Forense, vol. 409, p. 222, maio-jun. 2010. No mesmo sentido: FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de segurança. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 30. Em regra, a entidade associativa pode impetrar mandado de segurança em defesa apenas de parte de seus membros (STF, Pleno, MS 21.070/DF, Rel. Min. Célio Borja, ac. 08.11.1990, RTJ 134/666). Não poderá fazê-lo, porém, quando houver conflito de interesses entre os associados (STJ, 2ª T., RMS 15.311/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.03.2003, DJU 14.04.2003, p. 205; STJ, 6ª T., RMS 13.131/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 25.11.2003, DJU 02.02.2004, p. 363). A aferição da legitimidade ativa, no mandado de segurança coletivo, impõe que o direito coletivo dos membros ou associados a ser tutelado esteja em consonância com as finalidades estatutárias da entidade associativa impetrante, segundo se depreende do inc. LXX, al. b, do art. 5º da CF, e do art. 21, caput, da Lei nº 12.016/2009. É de previsão legal, portanto, que “os direitos tutelados pelo mandado de segurança coletivo devem guardar relação com os fins institucionais do órgão impetrante” (WAMBIER, Luiz Rodrigues; VASCONCELOS, Rita de Cássia Corrêa de. O mandado de segurança na disciplina da Lei 10.016, de 07.08.2009. Revista de Processo, nº 177, p. 201). ARRUDA ALVIM, Eduardo; ARRUDA ALVIM, Angélica. Op. cit., p. 223. TUCCI, José Rogério Cruz e. Class action e mandado de segurança coletivo. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 39. NERY JÚNIOR, Nelson. Parecer cit., p. 153. ARRUDA ALVIM, Eduardo; ARRUDA ALVIM, Angélica. Op. cit., p. 223-224. Segundo CRETELLA JÚNIOR, “interesse é uma pretensão do indivíduo. Todas as pessoas têm interesses, mas direito é a preensão protegida pela norma jurídica. O interesse é gênero de que o direito é espécie” (CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Lei do Mandado de Segurança. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 61). “A necessidade de estar o direito subjetivo sempre referido a um titular determinado ou ao menos determinável impediu por muito tempo que os ‘interesses’ pertinentes, a um tempo, a toda uma coletividade e a cada um dos membros dessa mesma coletividade, como, por exemplo, os ‘interesses’ relacionados ao meio ambiente, à saúde, à educação, à qualidade de vida etc., pudessem ser havidos por juridicamente protegíveis. Era a estreiteza da concepção tradicional do direito subjetivo, marcada profundamente pelo liberalismo individualista, que obstava a essa tutela jurídica” (WATANABE, Kazuo. Ċódigo brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 740). No Código do Consumidor, “os termos ‘interesses’ e ‘direitos’ foram utilizados como sinônimos, certo é que, a partir do momento em que passam a ser amparados pelo direito, os ‘interesses’ assumem o mesmo status de ‘direitos’, desaparecendo qualquer razão prática, e mesmo teórica, para a busca de uma diferenciação ontológica entre eles” (WATANABE, Kazuo. Código brasileiro

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de defesa do consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto, cit., p. 739). WATANABE, Kazuo. Op. cit., loc. cit. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 330. CRETELLA JÚNIOR, José. Ċomentários à Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 61. GOMES JÚNIOR, Luis Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 247; BITTAR, Carlos Alberto. Interesses difusos. Revista dos Tribunais, 782/743. STF, Pleno, RE 163.231/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 26.02.1997 (voto do relator), DJU 29.06.2001, p. 55; GOMES JÚNIOR, Luis Manoel et al. Op. cit., p. 249. Apud GOMES JÚNIOR, Luis Manoel et al. Op. cit., p. 251. Não seria uma ação coletiva, mas uma ação litisconsorcial, aquela proposta por um sindicato reclamando do mesmo empregador direitos trabalhistas diferentes para cada um dos empregados (horas extras, para uns, férias para outro, e repouso remunerado, para um terceiro), em virtude do fato comum, que teria sido a dispensa de todos por encerramento da empresa. A diversidade de causa petendi individual impediria a configuração de uma ação coletiva, em sentido próprio. Numa causa da espécie, a variação admissível apenas pode ser quantitativa e nunca qualitativa, para ter-se a tutela de direitos individuais homogêneos de “origem comum”, como quer a lei (ARRUDA ALVIM, José Manuel; ARRUDA ALVIM, Thereza; ARRUDA ALVIM, Eduardo; MARINS, James. Ċódigo do Consumidor comentado. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1995. p. 380). O acórdão se refere ao voto do Min. Celso de Mello proferido na ADIMC 1.096 sobre o papel institucional dos partidos políticos delineado pela ordem constitucional. STF, Pleno, RE 196.184/AM, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 27.10.2004, DJU 08.11.2004, p. 159173. RE 196.184, cit. Para efeito da Lei do Mandado de Segurança, direitos coletivos são “os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica” (Lei nº 12.016/2009, art. 21, parágrafo único, inciso I). Para a mesma lei, são direitos individuais homogêneos os “decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante” (Lei nº 12.016/2009, art. 21, parágrafo único, inciso II). No entender de uma corrente doutrinária, “os direitos difusos não são passíveis de serem protegidos por mandado de segurança coletivo. O art. 21, parágrafo único, incs. I e II, da Lei 12.016/2009 é expresso ao restringir o objeto do mandado de segurança coletivo aos direitos coletivos stricto sensu e aos direitos individuais homogêneos” (AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de segurança coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 103). Sobre essa limitação, nosso entendimento está, mais amplamente, exposto nos itens 141.3, 141.4 e 141.5. Entretanto, parte da doutrina pátria não concorda com a limitação da lei: “A limitação não encontra amparo, todavia, no texto constitucional e, também, não se coaduna como o sistema

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processual vigente. (...) Portanto, nos casos em que o mandado de segurança é o instrumento processual adequado, inclusive para os direitos ou interesses difusos, não pode o legislador infraconstitucional afastar arbitrariamente o cabimento do mandado de segurança. Deve-se concluir, assim, pela possibilidade do cabimento do mandado de segurança coletivo em geral para a defesa dos direitos coletivos em sentido amplo, abrangendo, desse modo, os direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.) et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 170). ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito processual coletivo brasileiro. Um novo ramo do direito processual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 284-285; GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em evolução. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996. p. 101-102; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, nº 57, p. 127-132. “Pode-se questionar a funcionalidade das categorias com que o ordenamento jurídico disciplina os direitos transindividuais. Contudo, tendo em vista sua positivação, ignorá-las é procedimento metodologicamente incorreto e concretamente perigoso. Nesse contexto, considerando que o ordenamento jurídico brasileiro classifica os direitos transindividuais em três categorias – difusos, coletivos e individuais homogêneos – e que o art. 21, parágrafo único, incs. I e II, não menciona os direitos difusos, conclui-se que o mandado de segurança coletivo não pode tutelálos” (AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de segurança coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 97). Súmula 101, STF: “O mandado de segurança não substitui a ação popular”. Nesse sentido, também, já julgou o STJ: “1. Evidenciado o caráter difuso da impetração, fulcrada, essencialmente, na defesa dos interesses dos usuários das rodovias federais – universo de pessoas passíveis de ser atingidas pelos supostos efeitos nefastos do ato coator, impõe-se o reconhecimento da incapacidade postulatória do sindicato autor. 2. É vedada a utilização do mandado de segurança como substitutivo da ação popular (Súmula n. 101/STF)” (STJ, 1ª Seção, MA 11.399/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 13.12.2006, DJU 12.02.2007, p. 216). FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de segurança. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 33; apud CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, cit., p. 335. STF, Pleno, RE 196.184/AM, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 27.10.2004, DJU 08.11.2004, p. 159173. STJ, 1ª T., AgRg no Ag 1.249.132/SP, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 24.08.2010, DJe 09.09.2010. STJ, 1ª T., REsp 700.206/MG, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 09.03.2010, DJe 19.03.2010. Registre-se que é antiga a posição do STJ em prol da legitimidade do Ministério Público para defender interesses individuais homogêneos, que envolvam “interesse social relevante”, como se passa com os usuários do “serviço público de saúde”: “1. É cedido na Corte que o Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos, desde que esteja configurado interesse social relevante (precedentes). (...) 5. Hodiernamente, após a constatação da importância e dos inconvenientes da legitimação isolada do cidadão, não há mais lugar para o veto da legitimatio ad causam do MP para a Ação Popular, a Ação Civil Pública ou o Mandado de Segurança coletivo. 6. Em consequência, legitima-se o Parquet a toda e qualquer

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demanda que vise à defesa dos interesses difusos e coletivos, sob o ângulo material (perdas e danos) ou imaterial (lesão à moralidade)” (STJ, 1ª T., REsp 637.332/RR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 24.11.2004, DJU 13.12.2004, p. 242). O interesse Exemplo desse entendimento é dado por Luis Manoel Gomes Júnior e Rogério Favretto, para quem qualquer direito, seja individual, coletivo ou difuso, pode ser líquido e certo, desde que conte com adequado suporte probatório. Logo, não havendo, no caso concreto, necessidade de “ampla dilação probatória, não se verifica qualquer óbice legal ou fático a impedir a impetração de mandado de segurança coletivo, ainda que se almeje a defesa de direito difuso” (Comentários ao art. 21 da Lei 12.016/2009. In: GOMES JÚNIOR, Luis Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2015, p. 249). O problema, porém, não está na possibilidade lógica, mas na possibilidade legal, já que não se pode ignorar a opção exercida pelo legislador em restringir aos direitos coletivos e individuais homogêneos o alcance do mandado de segurança coletivo, quando manejado por entidades associativas. ARRUDA ALVIM, Eduardo; ARRUDA ALVIM, Angélica. Coisa julgada no mandado de segurança coletivo e a Lei nº 12.016/09. Revista Forense, v. 409, maio-jun. 2010, p. 210. NERY JÚNIOR, Nelson. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 922. Esclarece o autor que o erro geralmente cometido se refere à qualificação do caráter do direito coletivo ou difuso em função do evento que o gerou, quando, na verdade, esse caráter se manifesta nas pretensões possíveis, por meio do indivíduo, ou de entidades que congregam grupos de pessoas ou que representam a comunidade. Assim, “a pedra de toque do método classificatório é o tipo de pretensão material e de tutela jurisdicional que se pretende quando se propõe a competente ação judicial”. Cita como exemplo um desastre de navegação, do qual pode decorrer uma ação de vítima pelos prejuízos individuais (direito individual), uma ação de obrigação de fazer, no interesse do setor econômico da navegação (direito coletivo) e, ainda, uma ação do Ministério Público, em defesa da segurança das pessoas que utilizam o meio de transporte envolvido no acidente (direito difuso). Daí a conclusão do autor de que não é o tipo de evento, mas “o tipo de pretensão é que classifica um direito ou interesse como difuso, coletivo ou individual” (op. cit., loc. cit.). A propósito da distinção entre direitos difusos e coletivos, “Importante realçar, desde logo, que em Portugal, apesar de identificada a sistematização em foco, não há dispositivo legal que faça a diferenciação entre os direitos supraindividuais, não obstante a doutrina examinar a questão com posição muito próxima ao disposto na nossa legislação” (MAZZEI, Rodrigo Reis. Tutela colectiva em Portugal: uma breve resenha. Verbojuridico.net/9. Disponível em: . Acessoem: 30 jan. 2014). GIDI, Antonio. Derechos difisos, colectivos e individuales homogéneos. In: GIDI, Antonio; MACGREGOR, Eduardo Ferrer (coord.). La tutela de los derechos difusos, colectivos e individuales homogéneos. México: Porrúa, 2003. p. 32. Seriam coletivos, por exemplo, o direito dos contribuintes de um mesmo tributo, os direitos dos alunos da mesma escola pública etc. Perante os direitos da espécie, “é impossível satisfazer o direito ou o interesse de um dos membros da coletividade sem ao mesmo tempo satisfazer o direito ou o interesse de toda a

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coletividade e vice-versa: não é possível rejeitar a proteção sem que essa rejeição afete necessariamente a coletividade como tal” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Ações coletivas na Constituição Federal de 1988. Revista de Processo, nº 61, jan.-mar. 1991, p. 188). É o que se passa, v.ġ., com a situação dos moradores de uma região ou os consumidores de um mesmo produto etc. LEAL, Márcio Flávio Mafra. Notas sobre la definición de interesses difusos, colectivos e individuales homogéneos en el código modelo de procesos colectivos para Iberoamérica. In: GIGI, Antonio; MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer (coord). La tutela de los derechos difusos, colectivos e individuales homogeneos: hacia un codigo modelo para iberoamerica. México DF: Porrua, 2003, p. 40. WATANABE, Kazuo. Acciones colectivas: cuidados necesarios para la correcta fijación del objeto litigioso del proceso. In: GIDI, Antonio; MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer (coord.). La tutela de los derechos difusos, colectivos e individuales homogéneos, cit., p. 4. “Fixadas as principais características das espécies de direitos tutelados pelo processo coletivo brasileiro, é necessário que se destaque no plano da prática, nem sempre – ou melhor, quase nunca – estas categorias vão se apresentar da forma pura e esquemática prevista pela lei. Deste modo, não se mostra adequado atrelar, de antemão, cada espécie de direito a um tema ou assunto abstrato (ex.: direito ao meio ambiente = direito difuso, direito do consumidor = coletivo stricto sensu), eis que, não raro, um mesmo fato pode acarretar ofensa a diversas das categorias de direitos passíveis de tutela pelo processo coletivo” (VIDIGAL, Isabela Campos. Tutela coletiva aos direitos individuais homogêneos: os limites da legitimidade das associações civis (dissertação de mestrado). Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 2014, p. 60). Anota HUGO NIGRO MAZZILLI que é errôneo supor que, em ação coletiva, “só se possa discutir, por sua vez, uma só espécie de interesse transindividual (ou somente interesses difusos, ou somente coletivos ou somente individuais homogêneos). Nessas ações, não raro se discutem interesses de mais de uma espécie” (MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 50-51). GIDI, Antonio. Derechos difusos, colectivos e individuales homogêneos, cit., p. 34-35. Para ZAVASCKI, deve-se ter em mente que, como os direitos difusos e coletivos stricto sensu são igualmentecaracterizadospela transindividualidadeepela indivisibilidade,eventualimprecisão na identificação da categoria presente no caso concreto não trará maiores consequências sob o ponto de vista processual, já que o gênero dos direitos essencialmente coletivos é tutelado pelos mesmos instrumentos processuais (cf. ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011. p. 38). A situação se tornou mais complicada no terreno do mandado de segurança coletivo, porque o legislador optou por aplicá-lo apenas aos direitos coletivos stricto sensu, deixando de fora os direitos difusos. PACHECO, José da Silva. O mandado de segurança e outras ações constitucionais típicas. 4. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 338. Também ADA PELLEGRINI GRINOVER (Revista de Processo, 57/96), CELSO AGRÍCOLA BARBI (Revista de Processo, 57/7) e ERNANE FIDÉLIS DOS SANTOS (Ajuris, 45/25) defendem a tese de que o partido político deve apenas satisfazer o requisito previsto no art. 5º, de representação no Congresso. Para outra corrente, a que se filia Carlos Mário da Silva Velloso, o direito a ser pleiteado deve ser de natureza política ou referente

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ao partido, e limitado aos filiados ao partido impetrante (VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Temas de direito público. Belo Horizonte: Del Rey, 1994. p. 217). “Falta a partido político legitimatio ad causam para impetrar mandado de segurança coletivo, se este não tem por objetivo direitos subjetivos ou interesses atinentes à finalidade partidária” (g.n.) (STJ, 1ª Seção, MS 1.235/DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, ac. 17.12.1991, RSTJ 32/159). Cf. OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Mandado de segurança e controle jurisdicional. São Paulo: Ed. RT, 1992. p. 212. No STF, embora vencidos, registraram-se votos no sentido da larga dimensão da legitimidade dos partidos políticos de modo a tutelar em mandado de segurança coletivo toda a comunidade (v.g., RE, 1ª T., 196.184/AM, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 27.10.2004, DJU 18.02.2005, p. 6, voto vencido do Min. Marco Aurélio). No STJ, também, predominava a compreensão, não unânime, de que a Constituição autorizaria o partido político a defender, por mandado de segurança coletivo, apenas seus filiados, em questões políticas, de modo que, nesse âmbito, não se comportava a tutela de toda a população (STJ, 1ª Seção, MS 197/DF, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 08.05.1990, DJU 20.08.1990. No mesmo sentido: MS 1.252/DF, 1ª Seção, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 17.12.1991, DJU 13.04.1992, p. 4.968; RMS 1.348/MA, 2ª T., Rel. Min. Américo Luz, ac. 02.06.1993, DJU 13.12.1993, p. 27.424; RMS 2.423/PR, 6ª T., Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 27.04.1993, DJU 22.11.1993, p. 24.974). CARNEIRO, Daniel Zanetti Marques. Mandado de segurança: considerações pontuais sobre a recém-editada Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 80, p. 22. Para DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “por finalidade partidária encontra-se fundamentalmente o ‘bem comum’, sendo esse o objetivo de todo o partido político a se colocar entre a sociedade e o Estado” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 199). CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 302-303. Constituição Federal: “Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: I – caráter nacional; II – proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes III – prestação de contas à Justiça Eleitoral; IV – funcionamento parlamentar de acordo com a lei. § 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária. § 2º Os partidos políticos, após adquirirem personalidade jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral. § 3º Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei. § 4º É vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar”. Não há como confinar o mandado de segurança coletivo à tutela dos interesses dos filiados ao partido político. A Constituição, ao definir os legitimados do mandado de segurança coletivo, trata os partidos políticos de maneira distinta dos demais legitimados; e a Lei, regulamentando a função dos partidos, atribui-lhes, dentre outras, a “defesa dos direitos fundamentais” (Lei nº 9.096/1995,

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art. 1º). Seu papel, in casu, envolve muito mais que a tutela dos interesses dos respectivos membros (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 367). “Por outro lado, a natureza dos partidos políticos não se coadunaria com o estabelecimento de uma atuação limitada ou preferencialmente voltada apenas para a defesa dos próprios filiados. Isso porque os partidos políticos não são grupos fechados e voltados apenas para a consecução de atividades internas dos seus membros. É da essência do partido político com representação no Congresso Nacional, por mais hermético que seja, a atuação política voltada para a sociedade, no sentido de granjear apoio e adesão às suas ideias ou líderes, disputando eleições e angariando adeptos. A possibilidade de participação no cenário judicial se coadunaria, assim, com essa atuação mais ampla, voltada para a defesa dos valores sociais contidos no seu programa” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.) et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 154). ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. Tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 197. Explica o autor que “esse elo de relação e de compatibilidade entre o direito tutelado e os fins institucionais ou programáticos do partido político, além de representar o marco limitador do campo de abrangência da legitimação, constitui também requisito indispensável à configuração do interesse de agir em juízo” (Op. cit., p. 198). Comungavam do reconhecimento da ampla legitimação dos partidos políticos para manejo do mandado de segurança coletivo dos direitos difusos ou coletivos de toda a sociedade, entre outros, Gregório Assagra de Almeida (Direito processual coletivo brasileiro. Um novo ramo do direito processual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 286-287), Alexandre de Moraes (Direito constitucional. 18.ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 149), Uadi Lammêgo Bulos (Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 596) e José Afonso da Silva (Curso de direito constitucional positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 459). Em suma, “a legitimidade dos partidos políticos para o mandado de segurança coletivo – no pensamento de Uadi Lammêgo Bulos – compreende a possibilidade da defesa de tudo quanto esteja relacionado ao regime democrático, à tutela dos direitos humanos fundamentais e à autenticidade do regime representativo (Mandado de segurança coletivo. São Paulo: Ed. RT, 1996, p. 49-50)” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 99, nota 27). Em outras palavras: “os partidos políticos, desde que representados no Congresso Nacional, têm legitimação ampla, podendo proteger quaisquer interesses coletivos ou difusos ligados à sociedade” (MORAES, Alexandre de. Op. cit., loc. cit.). DECOMAIN, Pedro Roberto. Op. cit., p. 98. No mesmo sentido: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 428; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 124; MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Mandado de segurança individual e coletivo. Comentários à Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Ed. RT, 2009, p. 214; GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 230; REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 565-568.

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DECOMAIN. Op. cit., p. 99. Idem, ibidem. CARREIRA ALVIM observa que, “tendo a Constituição, no seu art. 5º, LVV, a, concedido legitimação ao partido político com representação no Congresso Nacional para impetrar mandado de segurança, tout court, é questionável a limitação imposta pela Lei 12.016/09, de restringir essa proteção aos seus integrantes, porque, tratando-se de interesse legítimo, beneficiam-se da sentença todos os que tenham um interesse individual coligado a ele, sejam, ou não, integrantes do partido...”. Com efeito, o inc. I, do parágrafo único, afirma serem coletivos os direitos transindividuais, de natureza indivisível, de maneira que “não pode a proteção ser dividida, para ser outorgada apenas aos integrantes ou partidários de determi- nado partido político” (CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à Nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 310). Deve-se lembrar, todavia, que o STJ adotava, antes da Lei nº 12.016, interpretação que restringia o mandado de segurança coletivo aos interesses dos membros do partido político (STJ, 1ª Seção, MS 197/DF, Rel. p/ ac. Min. Garcia Vieira, ac. 08.05.1990, RSTJ 12/215; STJ, 1ª Seção, MS 1.235/DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, RSTJ 32/159; STJ, 2ª T., RMS 1.348/MA, Rel. Min. Américo Luz, ac. 02.06.1993, Revista Lex-JSTJ/TRF, 56/70). STJ, 2ª T., RMS 10.131/PR, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 07.11.2000, DJU 18.02.2002, p. 279. O STF, porém, já decidiu que “partido político não tem legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança coletivo ‘se este não tem por objetivo direitos subjetivos ou interesses atinentes à finalidade partidária’...” (STF, 1ª T., RE 196.184/AM, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 27.10.2004, DJU 18.02.2005, p. 6). A tese, todavia, estará correta, se os direitos coletivos tutelados não figurarem na esfera da finalidade partidária, nem consistirem em direitos fundamentais definidos na Constituição, porque a proteção destes, por sua própria natureza, se integra sempre na finalidade de todo e qualquer partido político, como proclama o art. 1º da Lei nº 9.096/1995. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 400. No mesmo sentido, esclarece Ivan Lira de Carvalho que o importante, no cabimento do mandamus coletivo pelo partido, reside no liame entre o programa partidário e o direito material ofendido. É daí que “surge a legitimação extraordinária excepcionada na parte final do art. 6º do Código de Processo Civil e conferida ao substituto processual” (in casu, o partido político, na defesa em nome próprio de direitos da coletividade) (CARVALHO, Ivan Lira de. Mandado de segurança coletivo e partidos políticos. Revista Trimestral de Direito Público, n. 06, p. 218). ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 401. Em igual linha de pensamento, Lúcia Valle Figueiredo ensina que “tudo que transcender o individual, pois de reflexo para toda a coletividade, apresentar-se com caráter de liquidez e certeza e, ainda, tiver em vista o Estado Democrático de Direito e os direitos fundamentais traduzidos, lato sensu, nas liberdades públicas poderá ser objeto de mandado de segurança coletiva impetrado por Partido Político” (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Mandado de segurança. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 44). No mesmo sentido: CARNEIRO, Athos Gusmão. Anotações sobre o mandado de segurança coletivo. AJURIS, n. 54, 1992, p. 61. Não existe, enfim, na disciplina constitucional do mandado de segurança coletivo a necessidade de que haja adequação entre o objeto do writ e os interesses dos membros do partido político impetrante (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 402). A defesa é dos valores que,

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constitucionalmente, “devem ser perseguidos pelos partidos políticos” e que vão além dos interesses dos filiados, “pois existem para propagar determinada concepção de Estado, de sociedade e de governo, que intentem consubstanciar pela execução de um programa” (SILVA, José Afonso da. Ċurso de direito constitucional positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 400). ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 375, 401 e 402; FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Op. cit., loc. cit. STF,Pleno,RE196.184-8/AM,Rel.Min.EllenGracie,ac.27.10.2004(maioria), DJU08.11.2004, p. 6. O caso referia-se a aumento de IPTU, tendo o acórdão adotado, por maioria, a tese de que os direitos individuais homogêneos não deveriam ser defendidos pela via do mandado de segurança coletivo. AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de Segurança Coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 90. MORAES, Alexandre de. A inconstitucionalidade parcial do caput do art. 21 da Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009). Revista de Direito Administrativo, nº 252, set./dez. 2009, p. 14. “O partido político – na ótica de Cássio Scarpinella Bueno – tem legítimo interesse para a impetração de mandado de segurança coletivo tanto que o direito (interesse) a ser tutelado coincida com suas finalidades programáticas, amplamente consideradas, independentemente de a impetração buscar a tutela jurisdicional de seus próprios membros. Só pode ser esta e nenhuma outra, sob pena de violação do ‘modelo constitucional do mandado de segurança’, a compreensão da ‘pertinência temática’ do mandado de segurança coletivo impetrado pelos partidos políticos” (BUENO, Cássio Scapinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 124). À luz do dispositivo constitucional, a representação não precisa ser numerosa, nem ocorrer nas duas Casas do Congresso, basta uma cadeira em qualquer uma delas. “Em outras palavras, a representação não precisa ocorrer no Senado e na Câmara, bastando a eleição de um deputado federal ou de um senador, para que se caracterize a possibilidade jurídica na impetração” (AMARAL e SILVA. Mandado de Segurança Coletivo, cit., p. 91). CPC/73, art. 267, VI. Não haverá, porém, perda de representação no Congresso quando ocorrer migração dos representantes para outra legenda, ou renúncia de mandato, pois o mandato, na interpretação do STF, pertence ao partido e não ao parlamentar (STF, Pleno, MS 29.988 MC/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, ac. 09.12.2010, DJe 03.02.2011). Também não afetarão o mandado de segurança coletivo pendente a fusão entre partidos ou a incorporação de um deles por outro. O caso será de sucessão processual, devendo o novo legitimado assumir a posição do partido extinto na segurança em curso (AMARAL e SILVA, op. cit., p. 90). Idem, ibidem. Alexandre Freitas Câmara, porém, entende que se deva reconhecer legitimidade aos partidos com representação apenas nas assembleias estaduais, desde que o mandado coletivo verse somente sobre questões locais (Manual do mandado de segurança, cit., p. 368). Não é preciso que o interesse defendido por meio do mandado de segurança coletivo impetrado por entidade sindical seja de “todos os integrantes da categoria” (CÂMARA, Alexandre Freitas.

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Manual do mandado de segurança, cit., p. 371; STJ, 6ª T., RMS 7.104/AM, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 19.08.2003, DJU 22.09.2003, p. 384; STJ, 5ª T., RMS 19.278/GO, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 06.03.2007, DJU 16.04.2007, p. 216). Nesse sentido, inclusive, a Súmula 630 do STF: “a entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria”. “Na hipótese, onde eventual concessão da ordem impetrada por entidade sindical possa trazer prejuízo para uma parcela dos sindicalizados, é de ser confirmada a decisão que extinguiu o feito por ilegitimidade ativa” (STJ, 5ª T., RMS 19.935/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 15.09.2005, DJU 17.10.2005, p. 321). No mesmo sentido: “se eventual concessão da ordem puder trazer prejuízo para uma parcela dos sindicalizados, não há falar em legitimidade da entidade de classe para impetrar Mandado de Segurança Coletivo, ante a existência de nítido conflito de interesses” (STJ, 2ª T., RMS 41.395/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 11.04.2013, DJe 09.05.2013); STJ, 2ª T., AgRg no AREsp. 793.537/SP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 01.03.2016, DJe 08.03.2016. CÂMARA, Alexandre Freitas. Op. cit., p. 372; STJ, 6ª T., RMS 23.868/ES, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 17.08.2010, DJe 30.08.2010. O sindicato “é uma associação livre de empregados ou de empregadores ou de trabalhadores autônomos para a defesa dos interesses profissionais respectivos” (GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Ċurso de direito do trabalho. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 547). “As federações são entidades sindicais de segundo grau, que representam a maioria absoluta de um grupo de atividades ou profissões idênticas, similares ou conexas. Na estrutura sindical brasileira, estão entre o sindicato e a confederação que representa determinada categoria” (KALIL, Renan Bernardi. As entidades sindicais no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 13 jan. 2014). “As confederações são entidades sindicais de terceiro grau, que representam categorias profissionais, econômicas ou profissionais liberais. Na estrutura sindical brasileira ocupam o maior grau. Sua criação deve contar com, pelo menos, três Federações com registro sindical da categoria que pretende representar. Ademais, é importante destacar a exigência legal da sede da confederação ser na capital do país, ou seja, em Brasília (DF)” (KALIL, Renan Bernardi. As entidades sindicais no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 13 jan. 2014). “As centrais sindicais, instituídas pela Lei n. 11.648, de 31 de março de 2008 no ordenamento jurídico brasileiro, são entidades de representação geral dos trabalhadores, de abrangência nacional, e possuem como atribuição a coordenação da representação dos trabalhadores e como prerrogativa a participação de negociações em diálogo social de composição tripartite, onde haja interesse dos trabalhadores. Elas não estão inseridas no sistema confederativo, que é composto pelos sindicatos, federações e confederações. Daí não se falar do grau das centrais sindicais. Entretanto, fazem parte da estrutura sindical brasileira e possuem uma relação de conexidade e de vinculação estreita com o sistema confederativo” (KALIL, Renan Bernardi. As entidades sindicais no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 13 jan. 2014). Segundo Amauri Mascaro Nascimento, “não há como negar a relação entre as Centrais e as organizações sindicais que estão abaixo delas nem entre os trabalhadores sócios dos

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sindicatos no território nacionais e as Centrais. Daí ser possível dizer que as Centrais são organizações conexas ao sistema confederativo, pela sua natureza, atribuições e finalidade. São associações supracategoriais, mas o seu embrião forma-se na estrutura sindical que as suporta” (NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Ċompêndio de direito sindical. 6. ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 267). “Na tradição cultural democrática, hoje preponderante no Ocidente, compreende-se, desse modo, que a natureza jurídica dos sindicatos é de associação privada de caráter coletivo, com funções de defesa e incremento dos interesses profissionais e econômicos de seus representados, empregados e outros trabalhadores subordinados ou autônomos, além de empregadores” (DELGADO, Maurício Godinho. Ċurso de direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 1.350). Por isso, “o Sindicato adquire personalidade jurídica com o registro no Cartório de Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Jurídicas, sendo mera formalidade a exigência do registro junto ao Ministério do Trabalho e Emprego – MTE” (STJ, 2ª T., REsp 373.472/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 19.09.2002, DJU 21.10.2002, p. 339). STJ, 1ª T., AgRg no Ag 435.851/PE, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 06.05.2003, DJU 19.05.2003, p. 130; STJ, 6ª T., AgRg no REsp. 910.410/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 14.02.2012, DJe 29.02.2012. Constituição Federal: “Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: I – a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical”. Para manejo do mandado de segurança coletivo, por isso, a entidade sindical não depende do respectivo registro no Ministério do Trabalho. Basta que “esteja constituída em forma associativa para o exercício das atividades próprias dessas entidades (basicamente, CF/88, art. 8º, III), na forma da lei civil” (DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança, cit., p. 102, nota 31). Vale dizer: “A partir da nova ordem constitucional, o sindicato detém personalidade jurídica com o correspectivo registro civil no competente cartório, independentemente de estar registrado no Ministério do Trabalho. Iterativos precedentes da Seção de Direito Público. Recurso especial conhecido e provido” (STJ, 2ª T., REsp 544.294/DF, Rel. Min Franciulli Netto, ac 09.09.2003, DJU 19.12.2003, p. 431). “A orientação firmada nessa Corte é no sentido de ser o registro do Sindicato no Ministério do Trabalho e Emprego o ato que o legitima à representação de determinada categoria” (STF, 1ª T., AI 820.650 Agr/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, ac. 04.09.2012, DJe 26.09.2012). No mesmo sentido: STF, 2ª T. AgRg no AgRE 697.852, Rel. Min. Cármen Lúcia, ac. 30.10.2012, Dje 21.11.2012.“Independentementedadiscussãoacercadomomentoemquesurgeapersonalidade jurídica do sindicato, a legitimação ativa da entidade para atuar como substituta processual no mandado de segurança coletivo pressupõe que ela esteja regularmente constituída e em funcionamento, o que não se admite quando não há o registro no Ministério do Trabalho e, mais ainda, quando não se obedece ao princípio da unicidade sindical. Precedentes do STF e do STJ” (STJ, 2ª T., RMS 41.881/MS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 18.06.2013, DJe 28.03.2013). Súmula nº 629 do STF: “A impetração do mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes”.

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STF, 2ª T., RE 157.234/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 12.06.1995, RTJ 162/386. ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 431. O STF, por sua vez, já decidiu que, para efeito de legitimação à ação direta de inconstitucionalidade, “não se caracteriza como entidade de classe a simples associação de empregados de determinada empresa, por não congregar uma categoria de pessoas intrinsecamente distinta das demais, mas somente agrupadas pelo interesse contingente de estarem a serviço de determinado empregador” (STF, Pleno, ADIn 34-9 MC/DF, Rel. Min. Octávio Gallotti, ac. 05.04.1989, DJU 28.04.1989, p. 6.293). A restrição, a nosso ver, não se estende ao mandado de segurança coletivo, uma vez que, para essa ação constitucional coletiva, se admite a propositura até mesmo por simples “associação”, desde que “legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano” (Lei nº 12.016, art. 21, caput). Súmula nº 629/STF. “O objeto da impetração coletiva, no caso, deve relacionar-se com as finalidades institucionais do impetrante, razão primeira de ser do elo associativo” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 126-127). Não se deve, no entanto, entender que à entidade sindical ou de classe seja vedado defender direitos outros dos associados que não se compreendam estritamente nas finalidades estatutárias, e que, por serem particulares de algum filiado, não correspondam a interesses da categoria. Poderá fazê-lo, mas essa “tutela individual”, que de alguma forma terá alguma pertinência temática com seus “fins institucionais”, dependerá, aí sim, da autorização expressa de que cogita o art. 5º, XXI da Constituição – segundo Gregório Assagra de Almeida (Mandado de Segurança, cit., p. 431). O autor, contudo, reconhece que esse entendimento não tem sido prestigiado pelo STJ, para o qual não se deve admitir a impetração do mandado de segurança coletivo para “a defesa de interesse particular do associado” (STJ, 1ª Seção, MS 2.016/DF, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 14.09.1993, DJU 11.10.1993, p. 21.272). Também defendem a mesma tese restritiva Hely Lopes Meirelles, Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes (Mandado de Segurança e ações constitucionais. 32. ed. atualizada de acordo com a Lei nº 12.016/2009, São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 122). DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de Segurança, cit., p. 106; ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo, cit., p. 214. Nesse sentido: STF, 1ª T., RE 141.733/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 07.03.1995, DJU 01.09.1995, p. 27.384; STF, Pleno, RE 181.438, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJU 04.10.1996, p. 37.111; STF, Pleno, MS 22.132/RJ, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 21.08.1996, DJU 18.10.1996, p. 39.848; STJ, 1ª T., RMS 11.954/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 20.02.2001, DJU 02.04.2001, p. 253; STJ, 2ª T., RMS 7.846/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 12.03.2002, DJU 22.04.2002, p. 182; STJ, 5ª T., RMS 13.247/PB, Rel. Min. Jorge Scartizzini, ac. 04.02.2003, DJU 10.03.2003, p. 247. STJ, 5ª T., RMS 11.365/RO, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 13.09.2000, DJU 09.10.2000, p. 165; STJ, 5ª T., RMS 15.325/RJ, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 08.04.2003, DJe 12.05.2003. No aspecto convencional, pode-se definir a entidade de classe como uma “associação de pessoas, naturais ou jurídicas, que em essência representa o interesse comum de determinada categoria social, econômica ou profissional” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 374). STJ, 5ª T., RMS 4.821/RJ, Rel. Min. Edson Vidigal, ac. 04.05.1999, DJU 31.05.1999, p. 155.

“A prova da regularidade da constituição da associação e de seu funcionamento há pelo menos um ano correspondem a requisitos para o manejo do mandado de segurança coletivo pela entidade associativa, são, pois, ‘condição de legitimidade’ para a referida ação constitucional” (STF, 1ª T., MS 21.098/PA, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 20.08.1991, RTJ 137/663). 100 Em se tratando de mandado de segurança coletivo, a associação de classe não depende de autorização especial outorgada em assembleia para postular em favor de seus membros, “bastando a constante do estatuto”, segundo a jurisprudência do STF. “Mas como é próprio de toda substituição processual, a legitimação para agir esta condicionada à defesa dos direitos ou interesses jurídicos da categoria que representa” (STF, 1ª T., RE 141.733/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 07.03.1995, DJU 01.09.1995, p. 27.384). 101 “Além da desnecessidade de autorização dos associados, a Corte Suprema já estabeleceu, também, que as entidades não precisam apresentar o rol de associados ou substituídos acompanhando a petição inicial” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 157). No mesmo sentido, a jurisprudência do STF: “1. É pacífica a jurisprudência desta Corte de que as associações, quando impetram mandado de segurança coletivo em favor de seus filiados, atuam como substitutos processuais, não dependendo, para legitimar sua atuação em Juízo, de autorização expressa de seus associados, nem de que a relação nominal desses acompanhe a inicial do mandamus, consoante firmado no julgamento do MS nº 23.769/BA, Tribunal Pleno, Relatora a Ministra Ellen Gracie” (STF, 1ª T., RE 501.953 AgR/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, ac. 20.03.2012, DJe 26.04.2012). Também o STJ: 1ª T., AgRg no Resp. 1.030.488/PE, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 03.11.2009, DJe 25.11.2009. 102 “A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria” (Súmula nº 630 do STF). O STJ, antes da Lei nº 12.016, chegou a decidir que não teria a associação legitimidade para manejar o mandado coletivo, mas apenas quando parte da categoria tivesse interesse antagônico com o de outra parte (STJ, 2ª T., RMS 15.703-RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 18.03.2003, DJU 04.03.2005, p. 296). 103 STJ, 1ª T., RMS 34.270/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 25.10.2011, RT 916/686. Em contrapartida, também não tem o Estado-membro legitimidade para impetrar mandado coletivo contra autoridade federal, em defesa de interesses econômicos de sua população (STF, Pleno, MS 21.059/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.09.1990, RTJ 133/653). 104 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 286, apud GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova lei do Mandado de Segurança, cit., 2009, p. 185, nota 50; ARRUDA ALVIM, Thereza et al. Código do Consumidor comentado. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 387 e 389; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações constitucionais, cit., p. 200. Não adota a mesma orientação Alexandre Freitas Câmara, para quem, em se tratando de exigência constitucional formulada sem ressalva, não pode o intérprete dispensá-la (Manual do mandado de segurança, cit., p. 380). 105 STJ, 2ª T., RMS 15.311/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.03.2003, DJU 14.04.2003, p. 205. 106 GOMES JUNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários, cit., 2015, p. 243. Advertem os autores, porém, que “as situações apontadas podem servir de referência, obviamente sem qualquer intenção de afastar a possibilidade de ser justificável a dispensa do requisito da pré-constituição em outras 99

nas quais seja aconselhável tal opção” (op. cit., loc. cit.). 107 WATANABE, Kazuo. Comentários ao art. 81 do CDC. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 762. 108 O dispositivo foi acrescido pela Medida Provisória nº 2.180-35/2001. 109 “Mandado de segurança coletivo. Impetração por associação de classe. Legitimação ativa. Art. 5º, incs. XXI e IXX, b, da Constituição Federal. A associação regularmente constituída e em funcionamento, pode postular em favor de seus membros ou associados, não carecendo de autorização especial em assembleia-geral, bastando a constante do estatuto” (STF, 1ª T., RE 141.733/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 07.03.1995, DJU 01.09.1995, p. 27.384). A jurisprudência, enfim, foi sumulada: “A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes” (STF, Súmula nº 629). 110 STJ, 5ª T., REsp 780.660/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 06.09.2007, DJU 22.10.2007, p. 353; STJ, 1ª T., REsp 624.340/PE, Rel. Min. José Delgado, ac. 29.06.2004, DJU 27.09.2004, p. 260; STJ, 2ª T., REsp 253.607/AL, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 04.06.2002, DJU 09.09.2002, p. 189. 111 “Não aplicação, ao mandado de segurança coletivo, da exigência inscrita no art. 2º-A da Lei nº 9.494/97, de instrução da petição inicial com a relação nominal dos associados da impetrante e da indicação dos seus respectivos endereços. Requisito que não se aplica à hipótese do inciso LXX do art. 5º da Constituição. Precedentes: MS nº 21.514, Rel. Min. Marco Aurélio, e RE nº 141.733, Rel. Min. Ilmar Galvão” (STF, Pleno, MS 23.769/BA, Rel. Ellen Gracie, ac. 03.04.2002, DJU 30.04.2004, p. 33). Na doutrina, cf. ARRUDA ALVIM, Eduardo. Op. cit., p. 398; DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança, cit., p. 111; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança, cit., p. 35. Alexandre Freitas Câmara comunga do entendimento consagrado pela jurisprudência de que o art. 2º-A da Lei nº 9.494/1997 não se aplica ao mandado de segurança coletivo, de sorte que a entidade associativa que o impetra não está obrigada a relacionar seus associados, nem a eficácia do writ fica limitada aos sócios que o eram na data da impetração (Manual de mandado de segurança, cit., p. 378-379). 112 STF, Pleno, MS 21.059/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.09.1990, DJU 19.10.1990, p. 11.486; RTJ 133/652. 113 A doutrina se acha dividida: (i) “O mandado de segurança coletivo somente poderá ser impetrado pelos entes legitimados constantes do art. 5º, LXX, da Constituição, cujo rol, em essência, foi reproduzido no art. 21 da Lei 12.016/2009. Com isso, o Ministério Público não terá legitimidade para propor mandado de segurança coletivo. Caso exista um direito metaindividual carente de tutela, o parquet poderá, dentro de suas atribuições institucionais, lançar mão da ação civil pública” (AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de segurança coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 103). No mesmo sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 383. O STF, por seu lado, já decidiu que a enumeração dos legitimados para o mandado de segurança coletivo, constante do art. 5º, LXX da CF, é taxativa, não admitindo ampliação por “construção ou raciocínio analógicos” (STF, Pleno, MS 21.059/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 05.09.1990, DJU 19.10.1990, p.

11.486); (ii) “O silêncio do art. 21, caput, da Lei nº 12.016/2009 não afasta a legitimidade ativa do Ministério Público para impetração do mandado de segurança coletivo. Ela, embora não seja prevista expressamente pelo inciso LXX do art. 5º da Constituição Federal, decorre imediatamente das finalidades institucionais daquele órgão tais quais definidas pelos arts. 127 e 129, III, da mesma Carta e, infraconstitucionalmente, pelo art. 6º, VI, da Lei Complementar nº 75/1993, para Ministério Público da União, e no art. 32, I, da Lei nº 8.625/1993, para o Ministério Público dos Estados” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009. n. 56, p. 127). No mesmo sentido: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 158. 114 STJ, 1ª T., REsp 700.206/MG, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 09.03.2010, DJe 19.03.2010; STJ, 1ª T., AgRg no Ag 1.249.132/SP, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 24.08.2010, DJe 09.09.2010. 115 SODRÉ, Eduardo. Mandado de segurança. In: DIDIER JÚNIOR, Fredie (coord.). Ações constitucionais. Salvador: Juspodivm, 2006. p. 105. 116 REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 578. 117 Mandado de segurança coletivo manejado entre sindicatos ou seus associados e agentes do Poder Público não é da competência da Justiça do Trabalho, justamente “por não se tratar de litígio entre empregado e empregador (CF, art. 114)” (TRF, 4ª Região, 2º Grupo de Turmas, MS 31/89, Rel. Mauro Augusto Breton Viola, ac. 17.01.1989; REMÉDIO, op. cit., p. 589). 118 “Compete à Justiça Federal julgar mandado de segurança coletivo impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil em favor de seus membros, a despeito de a autora não postular direito próprio, por ser ela autarquia federal de regime especial” (REMÉDIO, op. cit., loc. cit.). Nesse sentido: STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.255.052/AP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 06.11.2012, DJe 14.11.2012. A propósito, é bom lembrar que a competência da Justiça Federal é absoluta e fixada ratione personae. De modo que, sendo o mandado de segurança coletivo impetrado contra ou por agente da União, de suas autarquias ou das empresas públicas federais, prevalecerá a competência em função da parte (autor ou réu), em lugar daquela ordinariamente definida com base na autoridade coatora, ou na titularidade do direito material disputado. In casu, a OAB (autarquia federal) defende direito dos seus membros, mas é a autarquia que, na qualidade de substituta processual, figura como autora da ação mandamental. Daí a prevalência da competência da Justiça Federal, mesmo quando o coator for agente estadual ou municipal. 119 O § 1º do art. 22, para estender o benefício da coisa julgada do mandado coletivo para o autor de segurança individual, exige a desistência em 30 dias de sua ação singular. Dessa forma, sem maiores justificativas, a Lei nº 12.016 é mais rigorosa do que a Lei das Ações Coletivas (CDC e ACP), em que apenas se exige que o autor da ação individual requeira, para igual benefício, a suspensão de sua ação, enquanto aguarda a solução da ação coletiva (CDC, art. 104). 120 SODRÉ, Eduardo. Op. cit., p. 105. 121 REMÉDIO, op. cit., p. 546. 122 Idem, ibidem. 123 CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 347. Quanto ao seu caráter de ação coletiva, lembra o autor que, “ao mandado de segurança [coletivo], aplicam-se, subsidiariamente, as normas das Leis 8.078/90 (CDC), 7.347/85 (ação civil pública)

e Lei 9.507/97 (habeas data), no que forem compatíveis com o mandamus” (op. cit., p. 347, nota 1.007).

Capítulo XXIII COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Art. 22. No mandado de

segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante. § 1º O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva. § 2º No mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas. Referências legislativas: Lei nº 8.437/1992, Art. 2º: No mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será concedida, quando cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas.

Comentários ao art. 22 150. O REGIME DA COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS, ANTERIORES AO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO A coisa julgada no direito processual comum é a autoridade de que se reveste uma sentença, contra a qual não haja mais possibilidade de impugnação recursal, tornando imutável e indiscutível a situação jurídica por ela definitivamente acertada (CPC/2015, art. 502). Atingido o nível da coisa julgada, as partes não poderão voltar a discutir a mesma lide, nem ao juiz será permitido rejulgá-la, no mesmo ou em outro processo que tenha como objeto a mesma lide e as mesmas questões. Nisso consiste o fenômeno da coisa julgada. Não é o direito da parte que se torna imodificável, é a definição dele e de seus elementos que não mais poderá ser alterada, revista ou discutida em outros processos entre as mesmas partes. O direito subjetivo material reconhecido na sentença e as obrigações por ela impostas, referindo-se a direitos disponíveis, é claro que podem ser voluntariamente alterados, porque se acham sob o domínio da autonomia da vontade. Renunciar a tal direito ou consentir em modificá-lo, no que toca às prestações por ele geradas, de maneira alguma representa alteração ou rediscussão da situação definitivamente acertada e composta pela sentença passada em julgado. Tais inovações decorrerão de fato jurídico novo e não daquele que foi objeto da

resolução judicial passada em julgado1. A coisa julgada material, aquela que opera dentro do processo findo e se projeta para qualquer outro processo futuro, está sujeita a limites objetivos e subjetivos. Segundo o Código de Processo Civil, a força de lei assumida pela decisão revestida da res iudicata opera “nos limites da questão principal expressamente decidida” (art. 5032) e se manifesta perante as partes “entre as quais é dada, não prejudicando terceiros” (art. 5063). A ratio essendi do importante instituto processual, que conta com a tutela da ordem constitucional, reside no objetivo de evitar a eternização dos litígios, contribuindo, assim, para a paz social e a segurança jurídica4. Com o advento das ações coletivas no direito moderno, reconheceu o legislador que, nessa modalidade de demandas, não era possível manter (ou pelo menos não era conveniente fazê-lo), em relação à nova conformação dos direitos transindividuais, as mesmas condições e limites até então vigentes para as ações individuais. Idealizou-se, então, a partir da ação popular (a primeira ação de defesa de direitos coletivos introduzida em nosso ordenamento jurídico), o sistema apelidado de coisa julgada “secundum eventum litis”, que pode ser assim sintetizado: a)

a sentença de mérito tem eficácia erga omnes (não fica limitada às partes do processo); mas

b)

no caso de ser a ação julgada improcedente por deficiência de prova, não fará coisa julgada material, de modo que “qualquer cidadão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova” (Lei nº 4.717/1965, art. 18).

No regime superveniente das ações coletivas, unificado pelo Código de Defesa do Consumidor, para ser observado tanto na Ação Civil Pública como na Ação Coletiva do Consumidor, adotou-se o mesmo tipo de coisa julgada da antiga ação popular, qual seja, o de não formação da coisa julgada material, quando a demanda for julgada improcedente por falta de prova. Assim, o sistema de coisa julgada secundum eventum probationis foi o adotado, a partir do CDC, para todas as espécies de direitos coletivos, i.e., tanto os difusos, como os coletivos stricto sensu, seja no âmbito das ações fundadas nos direitos do consumidor, seja no dos direitos protegidos pela ação civil pública (CDC, art. 103). Quando, porém, a ação coletiva for julgada improcedente por negativa do direito material pleiteado (difuso ou coletivo), haverá coisa julgada em prejuízo da entidade que promoveu a causa, assim como de todos os demais que teriam legitimidade para a ação coletiva. A repropositura da demanda coletiva não será permitida nem àquele que a promoveu infrutiferamente, nem a qualquer outro legitimado que poderia tê-la intentado. Procedente a ação, os efeitos da sentença transitada em

julgado serão erga omnes, beneficiando toda a comunidade, se for o caso de direito difuso (CDC, art. 103, I). Se a ação improcedente cogitava de direitos coletivos, em sentido estrito, o efeito ultra partes da sentença transitada em julgado operará limitadamente, dentro da categoria, grupo ou classe, em cuja defesa atuou a entidade autora da ação coletiva. Todavia, não haverá coisa julgada material, como já observado, se a improcedência decorreu de prova insuficiente (CDC, art. 103, II). A procedência, por sua vez, não se limitará à entidade que promoveu a ação coletiva, beneficiando a todos que se incluam na categoria, grupo ou classe interessados. No plano dos direitos individuais homogêneos, o regime da coisa julgada é diferente daquele previsto para os direitos difusos e coletivos. A procedência da demanda é de eficácia erga omnes, beneficiando a todos que se acham na situação jurídica comum defendida no processo, inclusive seus sucessores. No caso de improcedência, não importa se foi ou não por insuficiência de prova, a sentença da ação coletiva fará coisa julgada, mas não impedirá o ajuizamento posterior de ações individuais (CDC, art. 103, III, § 2º). A coisa julgada só operará no plano coletivo5.

151. O REGIME DA COISA JULGADA NAS AÇÕES DE MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Para a Lei nº 12.016, “no mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante” (art. 22). A propósito da forma com que a coisa julgada opera sobre os direitos individuais de cada membro do grupo ou categoria envolvidos com o mandado coletivo, existem duas correntes de pensamento: (i) a dos que aceitam que os efeitos da coisa julgada coletiva em face dos substituídos apenas ocorrem quando a sentença lhes for benéfica, ou seja, quando o pedido for acolhido; e (ii) a dos que entendem que, no mandado coletivo, a coisa julgada se impõe a todos os integrantes da classe ou grupo interessado, seja a sentença de procedência ou de improcedência da impetração. Para os defensores da tese, malgrado o texto expresso do art. 22 – que aplica aos legitimados ativos do mandado de segurança coletivo o regime da substituição processual e, por isso mesmo, dispõe que a coisa julgada operará sobre “os membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante” –, ainda continuaria aplicável ao mandamus coletivo o sistema de coisa julgada limitada aos efeitos benéficos da sentença. Ou seja, no caso de denegação da segurança coletiva, a exemplo do previsto no art. 103 do CDC, para a ação civil pública, não restariam impedidos os integrantes do grupo ou categoria de aforar ações individuais, inclusive mandados de segurança individuais6. Para os que se colocam em posição oposta, a tese defendida pelos primeiros tinha fundamento quando a lei era omissa, de sorte que a lacuna normativa havia de ser suprida pela aplicação analógica do Código de Defesa do Consumidor7. Agora que a Lei Especial do Mandado de

Segurança cuidou de forma expressa do tema, e adotou regime próprio para a coisa julgada no mandado coletivo, é inadmissível que essa disciplina específica seja desprezada, mediante aplicação de regra de lei diversa, que, efetivamente, não teria sido acolhida pela nova legislação do mandado de segurança8. No modo de ver da segunda corrente, o que a própria lei afirma, de maneira clara e irrecusável, é que a atuação do impetrante do mandado de segurança coletivo se dá seguindo o regime da substituição processual e que a coisa julgada formada em tal ação se faz perante os substituídos (i.e., os membros da impetrante). Ora, é justamente este o mecanismo tradicionalmente atribuído a essa modalidade de legitimação extraordinária, caracterizada pela permissão legal a que alguém litigue em nome próprio na defesa de direito de outrem9. Desdobrando a tese, destacam que os direitos coletivos ou individuais homogêneos defendidos pelos organismos sindicais ou associações não lhes pertencem, mas, sim, aos associados ou membros da categoria em cuja defesa atuam. A procedência ou improcedência da ação mandamental, por isso, teria de estender seus efeitos perante os titulares respectivos. Poderia ser diferente, se a lei própria tivesse adotado, para o mandado coletivo, a mesma regra antes aplicada às ações coletivas reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor. Mas não foi isso que o legislador fez. Tendo em vista, portanto, o regime diferenciado instituído pelo art. 22 da Lei nº 12.016/2009, a regra vigente para o mandado de segurança não se confundiria com a do art. 103 do CDC, e tampouco poderia ser substituída por esta. Segundo o dispositivo próprio da Lei do Mandado de Segurança, o alcance subjetivo da sentença do mandado coletivo se define mediante indagação de a benefício de quem teria sido ele impetrado. Daí que “aqueles que, segundo resulte da causa de pedir e do pedido, sejam abrangidos pela impetração, é que serão alcançados pelo que nela for decidido. E isso tanto na hipótese em que o mandamus seja julgado procedente, quanto naquelas em que a decisão haja sido de improcedência10”. Por conseguinte, e em razão do regime expressamente adotado pelo art. 22 da Lei nº 12.016, duas conclusões se imporiam: a)

serão beneficiados pela concessão da segurança coletiva aqueles que foram, ex vi legis, substituídos pelo impetrante;

b)

serão prejudicados pela denegação da segurança coletiva os mesmos substituídos no processo pela entidade que a impetrou, os quais, diante da decisão de mérito que lhes negou os pretensos direitos subjetivos, “não poderão aforar novos mandados de segurança individuais, com o mesmo pedido”, nem outras ações com idêntico objeto11.

A nosso modo de ver, não é pela aplicação direta do art. 103 do CDC no mandado de segurança coletivo que se chegará à conclusão de que os efeitos da sentença de improcedência não devem

atingir os direitos individuais dos membros do grupo defendido coletivamente. É pelo reconhecimento de que a própria Lei nº 12.016 distingue o direito tratado coletivamente do direito individual defendido singularmente por parte de cada um daqueles que formam o grupo ou classe substituído pela entidade promotora do writ coletivo. Com efeito, o mesmo dispositivo que define o alcance subjetivo da coisa julgada aperfeiçoada no mandado de segurança coletivo – aplicando-a ao grupo ou categoria cujos membros foram substituídos pela entidade impetrante (art. 22, caput) –, ressalva, de maneira expressa e clara, que “o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais” (art. 22, § 1º). Ora, litispendência e coisa julgada se identificam, no plano dos pressupostos processuais negativos, pelos mesmos elementos e pela identidade de objetivo, qual seja, a de impedir repetição de ações iguais entre as mesmas partes (CPC/2015, arts. 485, V, e 337, § 1º 12). Como impedimento à formação válida de um segundo processo sobre o mesmo objeto litigioso (CPC, art. 485, V), o Código define em conjunto a litispendência e a coisa julgada num mesmo dispositivo, levando em conta os mesmos elementos, ou seja: “Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada” (art. 337, § 1º). E a conceituação legal se completa com a explicitação de que “uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido” (art. 337, § 2º). Portanto, se a Lei nº 12.016/2009 dispõe que inexiste litispendência entre o mandado de segurança coletivo e as ações individuais, é porque não reconhece identidade entre essas ações. E, não ocorrendo a litispendência, ipso facto não se formará coisa julgada no processo coletivo capaz de inibir o exercício da ação individual daquele que não participou pessoalmente da demanda coletiva. Ainda que não contenha a Lei nº 12.016 dispositivo igual ao art. 103, §§ 1º e 2º, do CDC – no sentido de que os efeitos da coisa julgada no caso de improcedência da ação coletiva não impedirão os interessados que nela não participaram como litisconsortes de propor ação de indenização a título individual –, a regra aplicável ao mandado de segurança coletivo não pode ser outra. Isso porque, não sendo ações iguais identificadas pelos mesmos elementos – tanto que legalmente não se reconhece litispendência capaz de impedir a coexistência de mandado coletivo e mandado individual –, não pode, lógica e juridicamente, a sentença negativa de um prejudicar a solução do outro13. O que não se admite é que o participante direto (litisconsorte) do mandado de segurança coletivo improcedente venha a intentar ação individual com objetivo igual ao da demanda coletiva fracassada. Tendo sido parte dela, não terá como escapar da coisa julgada coletiva. Da mesma forma, aquele que, quando já existia mandado coletivo pendente, preferiu defender individualmente sua pretensão, não poderá se valer dos benefícios da coisa julgada formada pela sentença de procedência

da ação mandamental coletiva. A opção pela ação individual, in casu, importou exclusão voluntária do grupo defendido coletivamente pelo substituto processual impetrante do mandado coletivo (Lei nº 12.016, art. 22, § 1º). Em suma: (i) a extensão dos efeitos benéficos da procedência do mandado coletivo aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante está claramente autorizada pelo § 1º, 2ª parte, do art. 22 da Lei do Mandado de Segurança14; e (ii) a inexistência de vedação às ações individuais, após a denegação do mandado coletivo, decorre da não configuração de litispendência entre este e aquelas, proclamada literalmente pelo mesmo dispositivo legal (Lei nº 12.016, § 1º, 1ª parte, do art. 22)15. Resta saber o que ocorrerá quando a denegação da segurança coletiva se der por insuficiência ou falta de prova. Nesse caso, não acontecerá a formação da coisa julgada, porque a extinção do processo terá se fundado em falta de condição especial da ação de mandado de segurança. É que, só podendo ser objeto de defesa por meio dessa ação constitucional os direitos líquidos e certos, tal não se configurará quando o impetrante não conseguir produzir prova completa de seu direito. A decisão de denegação do writ, em tal caso, “rigorosamente, não é de improcedência, mas de carência, o que não obsta a repropositura da ação, seja no sistema do CPC (art. 268) [CPC/2015, art. 486], seja pela própria Lei do Mandado de Segurança (art. 6º, § 6º)”16.

152. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL E COISA JULGADA NO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO: UMA ÚLTIMA PALAVRA Critica-se a previsão de substituição processual adotada pelo art. 22, caput, da Lei nº 12.016, ao argumento de que a sentença do mandado de segurança coletivo nem sempre é oponível aos membros do grupo, cujos interesses foram tutelados no processo coletivo. LUIZ MANOEL GOMES JÚNIOR e ROGÉRIO FAVRETO preferem falar em “legitimação processual coletiva” em vez de “substituição processual”. Reportando-se a TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER, a substituição, in casu, ficaria desfigurada, porque os entes legitimados defenderiam direitos próprios, já que teriam sido “criados para tal finalidade”17. Pensamos, todavia, que o direito material em jogo não é da entidade de classe ou da associação. Esses entes atuam processualmente em nome próprio, mas defendem direito material que é dos membros da comunidade ou categoria. Têm legitimidade para propor ação e, portanto, podem ser partes, mesmo defendendo direito material de outrem. Quanto a nem sempre a coisa julgada no mandado coletivo ser oponível individualmente aos membros do grupo ou categoria, isto não desnatura, necessariamente a substituição processual; apenas lhe dá uma feição particular no caso do mandado de segurança coletivo. Mas é bom lembrar que o CPC/2015, quando autoriza a substituição processual no seu art. 18, não está preocupado com a dimensão que a coisa julgada virá a ter. O que o dispositivo põe em jogo é apenas a legitimação extraordinária para alguém demandar, em nome

próprio, a defesa de direito alheio, por expressa autorização de alguma lei especial. O fato de, no mandado de segurança coletivo, a coisa julgada apresentar dimensões diferentes daquelas que ordinariamente se verificam no regime das ações singulares do Código de Processo Civil decorre da natureza da ação coletiva, e não da criação de outras figuras de coisa julgada e substituição processual. Essas figuras processuais não são rígidas e imodificáveis. Como todas as categorias processuais, são flexíveis e adaptáveis à variedade dos direitos materiais litigiosos. Por outro lado, se há dificuldade técnica para identificar uma autêntica substituição processual na ação de defesa de direitos difusos e coletivos, é irrecusável que o legitimado atua em nome próprio na defesa de direitos alheios quando se trata de direitos individuais homogêneos18. Ademais, pouco importa ao direito processual moderno o excesso de classificações e a multiplicidade de categorizações, quase sempre de mais interesse acadêmico do que prático. O processo contemporâneo é dominado, precipuamente, pela efetividade, pela capacidade de produzir resultados concretos na tutela dos direitos materiais; é dominado pela funcionalidade, e não pelas estruturas. Daí por que não tem relevância distinguir, no caso do mandado de segurança coletivo, “substituição processual” de “legitimação processual coletiva”. Se o problema é definir a extensão da coisa julgada, a própria lei cuidou de fazê-lo, seguindo orientação diversa daquela adotada no CPC. Nem por isso se haverá de dizer que não há coisa julgada no mandado coletivo, pela simples razão de não se reproduzirem na lei especial todos os atributos do instituto similar previstos no CPC. Não é diferente o problema da substituição processual: o fenômeno ocorre, tanto no processo singular quanto no coletivo, pelo mero fato de que, tanto naquele como neste, uma pessoa, que não é a titular do direito material em jogo, tem legitimidade para, em nome próprio, defendê-lo em juízo. Em suma: o art. 22 da Lei nº 12.016 tem todos os elementos para caracterizar e dimensionar, no plano funcional, a substituição processual e a coisa julgada nos domínios do mandado de segurança coletivo19.

153. INOCORRÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA ENTRE MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO E AS AÇÕES INDIVIDUAIS Dispõe, textualmente, o § 1º do art. 22 da Lei nº 12.016 que “o mandado de segurança não induz litispendência para as ações individuais”. Para haver litispendência, o CPC exige, entre duas ou mais ações, a tríplice identidade de partes, pedido e causa de pedir (art. 337, § 2º). Assim, “o mandado de segurança coletivo não induz à existência de litispendência com o mandado de segurança individual, especialmente por haver diversidade de partes no polo ativo, ainda que com o mesmo pedido, causa de pedir e parte passiva”20. A parte ativa, todavia, não coincide nas duas causas21.

A litispendência, nos casos em que ocorre22, funciona como um pressuposto processual negativo, isto é, impede a concomitância de ações iguais entre as mesmas partes para eliminar o risco de sentenças contraditórias23. Verificada a reiteração de demandas iguais entre dois processos, o segundo será extinto sem apreciação do mérito (CPC, art. 485, V). A solução legal para o problema criado com a permitida concorrência de mandado de segurança coletivo e ações individuais consistiu em atribuir uma dimensão subjetiva especial à coisa julgada coletiva. Em regra, a sentença do mandado coletivo faz coisa julgada para “os membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante” (art. 22, caput). Mas, se um desses membros preferir defender seu direito em ação individual, a coisa julgada coletiva não o beneficiará (art. 22, § 1º). Em termos práticos, pode-se afirmar que, em tal situação, o impetrante de mandado de segurança individual será considerado, para efeitos da coisa julgada, como excluído do grupo ou categoria em favor dos quais a segurança coletiva foi impetrada. Com isso, não se corre o risco de o mesmo direito subjetivo ser objeto de sentenças diversas. Ainda que as sentenças cheguem a resultados diferentes, na ação coletiva e na ação individual, não ocorrerá contradição no plano da coisa julgada, uma vez que o direito subjetivo disputado na ação individual não estava em jogo na ação coletiva. Se não há possibilidade de litispendência entre o mandado de segurança coletivo e as ações individuais intentadas pelos membros do grupo ou categoria defendidos pelo impetrante, o mesmo não se passa entre o mandado coletivo e as demais ações coletivas. Não importa que o substituto processual seja diferente nas diversas ações coletivas, se o grupo interessado é o mesmo e o pedido formulado contra o mesmo demandado se funda na mesma causa de pedir. Tratando-se de ações coletivas, a identidade de partes não se faz por meio da entidade promovente, mas das pessoas por ela substituídas, pois é o direito delas que está sendo disputado em juízo. Para a jurisprudência, é possível identificar-se a litispendência entre o mandado de segurança coletivo e outra demanda também coletiva (como a ação popular e a ação civil pública), porque, não obstante sejam distintas as vias processuais eleitas, as partes serão as mesmas – ao menos do ponto de vista substancial, ainda que distintos os legitimados extraordinários que tenham ajuizado as demandas –, e os mesmos serão o pedido e a causa de pedir24. Desse modo, “tratando-se de ações coletivas, para efeito de aferição de litispendência, a identidade de partes deverá ser apreciada sob a ótica dos beneficiários dos efeitos da sentença, e não apenas pelo simples exame das partes que figuram no polo ativo da demanda”25.

154. DESISTÊNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL Se o membro de um grupo ou categoria afetado por ato ilegal ou abusivo de autoridade lança

mão do mandado de segurança individual, já sabedor da existência do mandado coletivo, é evidente seu propósito de se excluir do alcance da tutela coletiva. Pode acontecer, no entanto, que o mandado de segurança individual tenha sido aforado quando a entidade associativa ainda não tinha tomado a iniciativa da demanda coletiva. Nesse caso, o impetrante individual, para se candidatar aos efeitos da coisa julgada do superveniente mandado de segurança coletivo, terá de requerer desistência do seu mandado singular, no prazo de 30 dias contados “da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva”26 (Lei nº 12.016, art. 22, § 1º, in fine). Sem embargo da clareza do texto da Lei nº 12.016/2009, que exige a desistência do mandado de segurança individual para que o impetrante se valha das vantagens do mandado coletivo, entende CASSIO SCARPINELLA que se deva manter o regime do CDC, de preferência ao regulamento da ação mandamental, de maneira a permitir que seja suficiente apenas a suspensão da ação individual27. Diversamente do que se dá nas ações coletivas regidas pelo CDC, a Lei do Mandado de Segurança não se contenta apenas com a suspensão da segurança individual. Se o interessado não puser fim à sua impetração por meio de desistência da ação, no prazo legal, estará irremediavelmente excluído do grupo ou categoria a ser beneficiado pela coisa julgada do mandado de segurança coletivo28. Nada obstante, há quem interprete a norma do art. 22, § 1º, da Lei do Mandado de Segurança, afastando sua literalidade para compreender na desistência nela prevista a mesma suspensão genericamente aplicável a todas as ações coletivas, por força do art. 104 do CDC29. A tese envolve grande intento de equidade, mas, a nosso ver, importa negativa de vigência de regra clara e expressa da lei especial que regula o mandado de segurança coletivo.

155. RESTRIÇÕES À LIMINAR NO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO A medida liminar no mandado de segurança coletivo sujeita-se aos mesmos requisitos previstos na regulamentação do mandado de segurança individual, quais sejam, a relevância dos fundamentos da impetração e o risco de ineficácia da segurança caso tenha de aguardar-se o seu deferimento em sentença (Lei nº 12.016, art. 7º, II)30. No entanto, a Lei nº 12.016 só permite ao juiz, em segurança coletiva, suspender os efeitos do ato impugnado, depois de ensejar oportunidade à pessoa jurídica impetrada de manifestar-se em 72 horas31. A medida de urgência não é vedada, mas não deve ser deferida inaudita altera parte. Uma vez que se veda a concessão de liminar no mandado de segurança coletivo sem prévia audiência da pessoa jurídica de direito público interessada, o juiz, diante de pleito da espécie, determinará, no despacho da inicial, dois atos intimatórios distintos: (i) a notificação da autoridade coatora para prestar as informações que lhe competem, em dez dias; e (ii): a intimação do

representante judicial da pessoa jurídica interessada, para que se manifeste em 72 horas, acerca da liminar requerida. Os destinatários e prazos das duas diligências são diferentes: uma se volta contra o agente responsável pelo ato impugnado (a autoridade coatora), e a outra contra a pessoa jurídica de direito público à qual se acha vinculado o autor do ato questionado. Sobre a liminar, a intimação recairá sobre o procurador ou outro órgão que legalmente exerça a representação da pessoa jurídica em juízo. Ressalte-se que a prévia audiência imposta pelo art. 22, § 2º, da Lei nº 12.016 somente diz respeito às pessoas jurídicas de direito público. Quando, portanto, o mandado de segurança for impetrado contra ato de pessoa natural ou agente de pessoa jurídica de direito privado no exercício de serviços concedidos pelo Poder Público, o deferimento da liminar não ficará sujeito à diligência em tela, mesmo que a ação mandamental seja coletiva. A deliberação judicial, in casu, poderá ocorrer inaudita altera parte, conforme previsto na regra geral do art. 7º, III, da Lei nº 12.01632. Embora a disposição legal seja rigorosa na exigência de prévia audiência da pessoa jurídica de direito público para se obter a liminar, a jurisprudência, já antes da Lei nº 12.016, vinha relativizando sua aplicação – que decorria, então, de imposição legal antiga –, para que o juiz, diante das características do caso concreto, pudesse suspender o ato impugnado sem aguardar dita manifestação. Com efeito, na concepção da efetividade da tutela jurisdicional e da plenitude da garantia constitucional do mandado de segurança, não se deve apegar a exigências, ainda que legais, que possam reduzir ou anular a tutela dos direitos fundamentais. Quando, pois, o direito líquido e certo estiver sob risco imediato, e o dano dele oriundo não puder ser remediado pela tardia medida cautelar, não há outra saída senão a de deferir de pronto a liminar, afastando-se momentaneamente a regra do art. 22, § 2º, da Lei nº 12.016, em nome dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. É o que já fez, por exemplo, o STJ em caso de repressão inadiável a improbidade administrativa33. A exigência de que a concessão de liminar no mandado de segurança coletivo seja antecedida de audiência da autoridade coatora (Lei nº 12.016, art. 22, § 2º) se justifica pelo interesse público, ampliado, na espécie, pelos largos reflexos que a liminar pode provocar, pela natureza mesma dos direitos coletivos, sobre o exercício das funções do Poder Público34. A suspensão cautelar da medida liminar, pelo Presidente do Tribunal Superior do órgão que a concedeu (Lei nº 12.016, art. 15), é cabível no processo do mandado de segurança coletivo, se o cumprimento da medida “gerar o comprometimento ou a suspensão de serviço essencial da comunidade, com vulneração da ordem pública e prejuízo direto do interesse comunitário, interesse esse que deverá prevalecer em confronto com o interesse particular”, como já decidiu o TJ de São Paulo35.

156. PARTICULARIDADES DA SENTENÇA DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Atrás dos direitos coletivos e individuais homogêneos defendidos pelo impetrante do mandado de segurança coletivo, existem situações jurídicas individuais que sofrerão, de alguma forma, os efeitos do julgamento do writ. Mas é importante ressaltar, desde logo, que as particularidades dos direitos e interesses individuais não podem ser deduzidas prematuramente no bojo da ação coletiva, e muito menos serão levadas em conta na respectiva sentença. O objeto do processo a ser composto coletivamente resume-se na tese geral aplicável a todos os direitos subjetivos reunidos para a tutela única; é somente aquilo que se apresenta em todos eles, e que permite tratá-los como homogêneos. Dessa maneira, o mandado de segurança coletivo, como todas as ações da espécie, não comporta “exame de situações particulares dos substituídos”36, do que resulta, afinal, uma sentença genérica, limitada tão somente à declaração da tese comum a ser aplicada na posterior solução das pretensões individuais dos membros do grupo ou categoria beneficiados pelo julgamento coletivo. Será em ação própria, ou em liquidação de sentença individualizada, que o titular dos direitos subjetivos obterá a aplicação da tese geral fixada na sentença coletiva e discutirá as particularidades de sua situação jurídica pessoal. A sentença coletiva, em seu conteúdo genérico, exerce a autoridade da coisa julgada. A incidência, porém, sobre a situação particular de cada membro do grupo ou categoria interessados, bem como as dimensões dessa incidência, será objeto de novo acertamento a ser promovido, individualmente, pelos interessados, para, então, formar-se o título executivo, que cada um terá condições de fazer atuar contra o sujeito passivo vencido na ação coletiva.

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Por exemplo, quem, por sentença passada em julgado, teve reconhecido seu direito de propriedade sobre determinado bem, diante de reivindicação de terceiro, revestiu de indiscutibilidade a existência do seu direito real. Nunca mais o reivindicante vencido, nem por si nem por sucessores, poderá reabrir discussão sobre o reconhecimento da propriedade em questão. Nem por isso, o titular da propriedade declarada de modo imutável e indiscutível estará impedido de aliená-la, nem mesmo de doá-la ao próprio reivindicante frustrado, ou de simplesmente renunciar a seu direito. Mas nada disso destruirá a declaração de certeza que, um dia, a sentença estabeleceu a respeito da situação jurídica disputada em juízo. Nisso consistiu a coisa julgada estabelecida sobre a disputa outrora travada entre reivindicante e reivindicado, nunca na imodificabilidade do direito subjetivo por ato ou negócio voluntário posterior. CPC/73, art. 468. CPC/73, art. 472. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de Direito Processual Civil. 59. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, vol. I, n. 802, p. 1.150-1.151. “Entende ARRUDA ALVIM que o legislador, propositadamente, valorizou os direitos difusos e

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coletivos, de modo que em se tratando de direitos individuais homogêneos, haverá coisa julgada, mesmo no caso de insuficiência probatória, mas, apenas no plano coletivo, permitindo o ajuizamento das ações individuais, se for o caso” (ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel de, apud GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 261). Só não poderá propor ação individual o interessado que interveio no processo como litisconsorte (CDC, art. 103, III, § 2º). “Ora, se a disciplina da coisa julgada no mandado de segurança coletivo deve ser extraída do Código de Defesa do Consumidor, como já tivemos oportunidade de observar anteriormente, temos que a improcedência do mandado de segurança coletivo, verse ele interesses difusos ou coletivos stricto sensu, levará à formação da coisa julgada no plano das ações coletivas (...). Caso o mandado de segurança verse interesses individuais homogêneos, aplicar-se-á a sistemática do art. 103, III, do Código de Defesa do Consumidor. Em caso de procedência, a coisa julgada operará efeito erga omnes; em caso de improcedência, ações individuais, inclusive o mandado de segurança individual (se dentro dos 120 dias de que trata o art. 23 da Lei nº 12.016), não serão obstadas, a menos que o interessado tenha atuado no mandado de segurança coletivo como litisconsorte (art. 103, § 2º)” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 416. No mesmo sentido: ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 458-481). Antes da Lei nº 12.016/2009, essa era a posição do STJ: “1. O mandado de segurança coletivo, embora mantendo objeto constitucional e sumariedade de rito próprios do mandado de segurança individual, tem características de ação coletiva, a significar que a sentença nele proferida é de caráter genérico, não comportando exame de situações particulares dos substituídos e nem operando, em relação a eles, os efeitos da coisa julgada, salvo em caso de procedência (...)” (STJ, 1ª T., REsp 707.849/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 06.03.2008, DJe 26.03.2008). O entendimento, porém, hoje está superado, diante da disposição expressa do art. 22 da Lei nº 12.016 de que a sentença no mandado de segurança coletivo, qualquer que seja ela, fará coisa julgada “aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante”. Não se pode mais continuar afirmando que a denegação só faz coisa julgada para a entidade impetrante, sem ofender literalmente a lei especial que rege o mandado de segurança coletivo. “Ainda, o caput do art. 22 da Lei nº 12.016/09 contém hipótese de coisa julgada erga omnes, independentementedoresultadodomandadodesegurançacoletivo.Trata-sedenormaespecial e posterior acerca da coisa julgada no mandado de segurança coletivo, que prevalece sobre a norma geral contida no art. 103 do CDC” (AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de Segurança Coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 103). Só a lei pode criar situações de substituição processual. “Não existe, no direito processual civil brasileiro, a chamada substituição processual voluntária, i.e., aquela que decorreria de convergência da vontade, entre o substituído e o substituto, redutível a um negócio jurídico e a essa finalidade circunscrito” (ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel de. Notas atuais sobre a figura da substituição processual. Informativo Incijur, nº 64, nov/2004, p. 1). Além disso, “não se concebe que a um terceiro seja reconhecido o direito de demandar acerca do direito alheio, senão quando entre ele e o titular do direito exista algum vínculo jurídico especial. Sempre, pois, que a

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substituição processual se mostre possível perante a lei, ocorrerá o pressuposto de uma conexão de interesse entre a situação jurídica do substituto e do substituído”. Por último, “uma consequência importante da substituição processual, quando autorizada por lei, passa-se no plano dos efeitos da prestação jurisdicional: a coisa julgada forma-se em face do substituído, mas, diretamente recai também sobre o substituto” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de Direito Processual Civil, cit., 59. ed., v. I, n. 185, p. 281; ARRUDA ALVIM, José Manoel. Op. cit., loc. cit.). Cf. também ARRUDA ALVIM NETTO, José Manoel de. Substituição processual. Revista dos Tribunais, v. 426, p. 28, abr. 1971. Na jurisprudência: “Os efeitos da sentença e a autoridade da coisa julgada, nas hipóteses de substituição processual, estendem-se de forma a atingir o terceiro cujos interesses foram representados em juízo, sobretudo quando o juízo é de procedência” (STJ, REsp 983.357/RJ, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 03.09.2009, DJe 17.09.2009). DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei 12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009, p. 533. “Assim, a conclusão a extrair [do art. 22 da Lei nº 12.016] é no sentido de que qualquer que seja a decisão, ficam vinculados a ela todos os integrantes do grupo ou categoria defendidos pelo impetrante. Desta sorte, se procedente a impetração, todos se beneficiam. Em caso contrário, a sentença de improcedência também faz coisa julgada ultra partes em face de todos, de maneira que já não mais poderão aforar mandados de segurança individuais para postular o mesmo que foi requerido no coletivo” (DECOMAIN, op. cit., p. 535). CPC/73, art. 301, § 1º. O pedido da ação coletiva nunca é o mesmo da ação individual, embora a causa de pedir possa ser a mesma. É por isso que a Lei nº 12.016, a exemplo da Lei da Ação Civil Pública e do Código do Consumidor, não reconhece litispendência entre o mandado coletivo e as ações individuais (cf. ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: Ed. RT, 2006. p. 190-191). E é, ainda, por isso, que a sentença de improcedência do mandado de segurança coletivo sobre direitos individuais homogêneos não pode “prejudicar os titulares dos interesses individuais” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 390). “Por outro lado, a coisa julgada coletiva do mandado de segurança opera--se secundum eventum litis nos tocante à sua relação com as pretensões individuais. Significa que, julgado improcedente o mandado de segurança coletivo, por qualquer fundamento, a coisa julgada não vincula o indivíduo (a coisa julgada material coletiva só se opera in utilibus), que poderá livremente – desde que dentro do prazo decadencial de 120 dias – ingressar com mandado de segurança individual, ou qualquer outra ação judicial postulando a tutela de seu direito individual” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2013, p. 203). No mesmo mandado de segurança coletivo, a coisa julgada “a todos aproveita, seja aos filiados à entidade associativa impetrante, seja aos que integram a classe titular do direito subjetivo” (STJ, 1ª T., AgRg no Ag 435.851/PE, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 06.05.2003, DJU 19.05.2003, p. 130). “3. A indivisibilidade do objeto da ação coletiva, muitas das vezes, importa na extensão dos efeitos favoráveis da decisão a pessoas não vinculadas diretamente à entidade classista, que na verdade, não é a titular do direito, mas tão-somente a substituta processual dos integrantes da categoria, a

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quem a lei conferiu legitimidade autônoma para a promoção da ação. 4. Irrelevante o fato de a totalidade da categoria ou grupo interessado e titular do direito material não ser filiado à entidade postulante, uma vez que os efeitos do julgado, em caso de acolhimento da pretensão, estendem-se a todos aqueles que se encontram ligados pelo mesmo vínculo jurídico, independentemente da sua vinculação com a entidade (Sindicato ou Associação)” (STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 13.505/DF, REl. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 13.08.2008, DJe 18.09.2008). Procedente a impetração, a coisa julgada no mandado coletivo se formará em benefício de todos os integrantes da categoria ou classe defendida pelo impetrante. Denegada a impetração coletiva, a coisa julgada se formará apenas no plano coletivo, ou seja, sobre a “não existência de interesses individuais homogêneos a tutelar”. Isto, porém, não equivalerá à declaração de que “não possa existir algum interesse individual, que, isoladamente, seja digno de proteção” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 389). Entretanto, o STJ já decidiu que há vinculação também na improcedência do mandado de segurança: “A incompatibilidade do regime de substituição processual de pessoa de direito público por entidade privada se mostra particularmente evidente no atual regime do mandado de segurança coletivo, previsto nos artigos 21 e 22 da Lei 12.016/90, que prevê um sistema automático de vinculação tácita dos substituídos processuais ao processo coletivo, podendo sujeitá-los inclusive aos efeitos de coisa julgada material em caso de denegação da ordem” (STJ, 1ª T., RMS 34.270/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 25.10.2011, DJe 28.10.2011). ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança, cit., p. 416. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Apontamentos sobre as ações coletivas. Revista de Processo, n. 75, p. 279; GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel; FAVRETO, Rogério. Comentários ao art. 22 da Lei n.12.016. In: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel, et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2015, p. 262. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 389. “A Lei nº 12.016 efetivamente consagrou hipótese autônoma e específica de formação da coisa julgada material para o mandado de segurança coletivo. Para tanto, basta que a sentença seja de mérito e transitada em julgado. Por oportuno, entendemos que não se sustenta o posicionamento que, mesmo a luz da legislação vigente, reputa aplicável ao mandado de segurança coletivo o regime mais benéfico da coisa julgada coletiva prevista no CDC. O caput do art. 22 da Lei nº 12.016/2009 contém norma especial e posterior acerca do mandado de segurança coletivo. Logo, não há dúvida de que tal regramento específico e mais recente prevalece sobre a norma geral anterior prevista no art. 103 do CDC” (AMARAL, Paulo Osternack; SILVA, Ricardo Alexandre da. Mandado de segurança coletivo. Revista Dialética de Direito Processual, nº 105, p. 98). “A coisa julgada, disposta para o mandado de segurança coletivo, é sempre erga omnes pro et contra, porém limitada aos membros da entidade impetrante” (RE-DONDO, Bruno Garcia; OLIVEIRA, Guilherme Peres de; CRAMBER, Ronaldo. Mandado de segurança. Ċomentários à Lei 12.106/2009. São Paulo: Método, 2009. p. 153). Ainda: GRECO FILHO, Vicente. O novo mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 59. No sentido de aplicabilidade do regime da coisa julgada do CDC ao mandado de segurança coletivo, mesmo após a vigência da Lei nº 12.016/2009: CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. 8. ed. (revista, ampliada e atualizada com a Emenda Constitucional 62 e com as Leis 12.016 e 12.153). São

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Paulo: Malheiros Editores, 2010, p.474; ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010, p. 415-416. GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel e FAVRETO, Rogério. Op. cit., 2015, p. 263. “Segundo o referido dispositivo, o mandado de segurança coletivo não induz litispendência com os mandados de segurança individuais, propostos pelos membros da entidade impetrante. Todavia, o impetrante individual, se quiser se beneficiar dos efeitos da coisa julgada do mandado de segurança coletivo, deverá desistir de seu mandado de segurança, no prazo de 30 dias, contados da ciência da impetração do writ coletivo” (REDONDO, Bruno Garcia, et al. Mandado de segurança, cit., p. 154-155). “1. A litispendência é verificada quando se repete ação anteriormente ajuizada, cujo decisum não esteja acobertado pelo manto da coisa julgada, com identidade de partes, mesma causa de pedir e pedido, nos moldes dos §§ 2º e 3º do art. 301 do CPC” [CPC/2015, art. 337, §§ 1º e 3º] (STJ, 1ª Seção, MS 13.273/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 13.05.2009, DJe 01.06.2009). “Não existe litispendência na hipótese em que os substituídos pela entidade sindical não são os mesmos da primeira ação” (STJ, 3ª Seção, EDcl no MS 8.266/DF, Rel. Min. Vicente Leal, ac. 13.11.2002, DJU 09.12.2002, p. 281). “Outrossim, não há identidade entre este writ e o MS nº 4.000/DF, de minha Relatoria, já que as partes são distintas, porquanto naquele figura um Sindicato Estadual (Sindicato dos Fiscais de Contribuições Previdenciárias do Estado do Rio Grande do Sul – SINDIFISP/RS) e neste uma Associação de Nível Nacional, que engloba todas as entidades do setor. Assim, inexiste litispendência se as partes não são as mesmas, sendo idênticos somente a causa de pedir e o objeto (arts. 267, parág. 3º e art. 301, parág. 3º, ambos do CPC) [CPC/2015, art. 485, §3º e 337, parágrafo 3º]” (STJ, 3ª Seção, MS 6.864/DF, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac.13.11.2002, DJU 17.02.2003, p. 217). STJ, 1ª Seção, AgRg no MS 15.865/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 23.03.2011, DJe 04.04.2011; CÂMARA, Alexandre Freitas, Mandado de segurança, cit., p. 400. Reconhece--se a litispendência, também entre dois mandados de segurança coletivos, impetrados por entidades sindicais distintas, mas em defesa de interesses da mesma categoria (STJ, 5ª T., RMS 24.196/ES, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 13.12.2007, DJU 18.02.2008, p. 46). STJ, 2ª T., REsp 1.168.391/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.05.2010, DJe 31.05.2010. No mesmo sentido: STJ, 1a T., AgInt no REsp. 1.580.394/RS, Rel. Min. Sérgio Kikuna, ac. 20.02.2018, DJe 05.03.2018 O prazo de trinta dias referido no artigo “começará a fluir a partir da comprovação da ciência, pelo autor da demanda individual, da existência do mandado de segurança coletivo” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.), et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 173). BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 136-139. A nosso modo de ver, todavia, não há como aplicar uma regra geral do CDC para as ações coletivas, ao caso do mandado de segurança, uma vez que a norma que o regula é especial e posterior à geral. Se a especial preferiu se afastar da geral, é aquela e não esta que haverá de prevalecer no âmbito de sua incidência. Justamente por isso, PAULO ORTERNACK AMARAL e RICARDO ALEXANDRE DA SILVA concluem que “a regra geral consistente na opção pela suspensão da ação individual, enquanto se aguarda o desfecho da ação coletiva não se aplica ao

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mandado de segurança coletivo” (Mandado de segurança coletivo, cit., p. 103). CARREIRA ALVIM faz uma interessante observação a respeito do alcance do § 1º do art. 22, destacando que a imposição de desistência ali contida se refere, expressamente, apenas ao “mandado de segurança individual”, nada dispondo acerca de outras “ações de conhecimento” que, obviamente, também podem coexistir sobre o mesmo objeto litigioso. A solução alvitrada pelo autor é a da “interpretação restritiva, pelo que inclusio unius, exclusio alterius, devendo ser aplicado subsidiariamente o art. 104 do CDC”. Ou seja, o autor de ação comum não estaria obrigado a desistir dela, bastaria requerer a suspensão do processo individual, como permite o dispositivo do CDC aludido (CARREIRA ALVIM, J. E. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 343). Pensam diversamente BRUNO GARCIA REDONDO, et al, para quem a exigência de desistência da ação cogitada no § 1º do art. 22 não fica restrita literalmente ao mandado de segurança individual, mas alcança também “qualquer ação individual que possa gerar, para o indivíduo, o mesmo resultado do mandado de segurança coletivo” (REDONDO, Bruno Garcia, et al. Mandado de segurança, cit., p. 155). Também interpretando o dispositivo para ampliá-lo à qualquer ação individual, ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES (Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 173). O que, a nosso ver, parece a compreensão mais razoável da normal legal em questão. CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 398-399. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 583. A intimação para manifestar-se, em 72 horas, sobre o pedido de liminar é da Pessoa Jurídica de Direito Público, por meio de seu representante judicial (STJ, 1ª T., REsp 88.583/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 20.10.1996, DJU 18.11.1996, p. 44.847). No mesmo sentido, STJ, 2ª T, REsp. 220.082/GO, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 17.05.2005, DJU 20.06.2005, p. 182. Essa audiência prévia é obrigatória, não só no mandado de segurança coletivo, mas também na ação civil pública (Lei nº 8.437/1992, art. 2º) (STF, Pleno, AgRg Pet 2.066/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 19.10.2000, DJU 28.02.2003, p. 7). A exigência do § 2º do art. 22 só se refere a pessoa jurídica de direito público, “que não inclui as pessoas jurídicas privadas no exercício de atribuições do pode público” (CARREIRA AL-VIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 346). Também PAULO OSTERNACK AMARAL e RICARDO ALEXANDRE DA SILVA entendem que “A exigência da audiência prévia à apreciação de medidas urgentes restringe-se aos mandados de segurança impetrados contra ato de pessoa jurídica de direito público e pode ser mitigada ou afastada de acordo com as circunstâncias do caso concreto” (Mandado de segurança coletivo, cit., p. 103). STJ, 2ª T., REsp 1.018.614/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 17.06.2008, DJe 06.08.2008. Também em doutrina defende-se igual tese: “Admitir o contrário, com uma natureza absoluta para a limitação, restaria violado o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional (art. 5º, XXV, da CF/1988)” (GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel e FAVRETO, Rogério. Op. cit., 2015, p. 268. Nesse sentido: CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança, cit., p. 391393; BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 182-183; CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.), et al. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 176; STF, Pleno, Pet. 2.066 AgR/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 19.10.2000,

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DJU 28.02.2003, p. 7). GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel e FAVRETO, Rogério. Op. cit., p. 268. Em face de tal exigência, que não é nova, pois já constava da Lei nº 8.437/1992 (art. 2º), o STJ tem considerado nula a liminar deferida na ação coletiva sem audiência prévia do representante judicial da pessoa jurídica de direito público afetada (STJ, 2ª T., REsp 220.082/GO, Rel. Min. João Otávio Noronha, ac. 17.05.2005, DJU 20.06.2005, p. 182). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp. 667.939/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 20.03.2007, DJe 13.08.2007. Essa mesma Corte, porém, já decidiu pela mitigação da exigência: “a jurisprudência do STJ tem mitigado, em hipóteses excepcionais, a regra que exige a oitiva prévia da pessoa jurídica de direito público nos casos em que presentes os requisitos legais para a concessão de medida liminar em ação civil pública (art. 2º da Lei 8.437/92). Precedentes do STJ” (STJ, 2ª T., REsp. 1.018.614/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 17.06.2008, DJe 06.08.2008). REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 584. STJ, 1ª T., REsp 707.849/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 06.03.2008, DJe 26.03.2008. No mesmo sentido: “Em sede de mandado de segurança coletivo é necessário que os apontados direitos guardem certa comunhão de suporte fático, sob pena de tornar necessário ao órgão julgador, para concluir pela legitimidade passiva da autoridade coatora e pela existência de direito líquido certo, que examine de forma particularizada a situação de cada substituído, providência inviável em sede de ação coletiva. Precedente” (STJ, 1ª Seção, MS 14.474/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 28.10.2009, DJe 10.11.2009).

Capítulo XXIV DECADÊNCIA DO DIREITO AO MANDADO DE SEGURANÇA Art. 23. O

direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado. Súmulas Súmula nº 430/STF: Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para o mandado de segurança. Súmula nº 631/STF: Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário. Súmula nº 632/STF: É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança.

Comentários ao art. 23 157. PRAZO PARA IMPETRAR O MANDADO DE SEGURANÇA Prevê, o direito positivo brasileiro, um prazo para impetração do mandado de segurança, desde a primeira lei que o regulamentou, após sua criação pela Constituição de 1934 (Lei nº 191/1936, art. 3º), e que se manteve, sucessivamente, pelo Código de Processo Civil de 1939 (art. 331), pela Lei nº 1.533/1951 (art. 18) e pela atual Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009, art. 23). A regra atual, que reproduz ipsis litteris o texto do art. 18 da lei velha, estatui: “o direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado”. Com isso estabelece-se um prazo para o exercício de uma modalidade especial de ação, e não para a extinção do direito material protegido pela referida ação1. Dito prazo prevalece para todos os mandados de segurança, sejam os individuais, sejam os coletivos. Durante esses longos anos de vigência do mandado de segurança, sempre houve na doutrina vozes que, inconformadas com a limitação temporal criada pelo legislador ordinário, a consideravam inconstitucional, por impor restrição a uma garantia fundamental deferida pela Constituição, sem qualquer conotação com prazo de exercício2. Os tribunais, liderados pelo STF, porém, nunca acataram a pecha de inconstitucionalidade imputada doutrinariamente ao dispositivo de lei sub examine3. O Supremo Tribunal Federal, guardião institucional da Constituição, e seu intérprete máximo, sempre repeliu a referida arguição de inconstitucionalidade4, e, para pôr termo à discussão, o Supremo Tribunal Federal inseriu em sua Súmula de Jurisprudência o enunciado nº 632, in verbis:

“É constitucional lei que fixa prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança”. Tollitur quaestio! Nesta altura só uma pura vaidade acadêmica pode justificar a insistência daqueles que continuam a acusar de inconstitucionalidade uma disposição legal octogenária, como a do art. 23 da Lei do Mandado de Segurança.

157.1. Justificativa constitucional do prazo decadencial estabelecido para o mandado de segurança O mandado de segurança, no plano constitucional, se acha inserido entre os direitos e garantias fundamentais, terreno em que as normas se caracterizam por acentuado feitio principiológico, exigindo do intérprete e aplicador a observância de critérios hermenêuticos especiais. Com efeito, os princípios, sem embargo de obrigarem como as regras preceptivas, se apresentam dotados de uma fluidez de limites que pode chegar às raias da indeterminação. Ao intérprete e aplicador cumpre, à vista disso, conviver com inevitáveis superposições e colisões entre os princípios, mesmo quando se trate de direitos e garantias a que a Constituição confere o status de fundamentais. No caso do mandado de segurança, a garantia de um remédio constitucional sumário e de excepcional capacidade coercitiva colide, de certa forma, com outras garantias, também fundamentais, consagradas pelo sistema processual preconizado pela Constituição. Isso porque, ao sujeitar o mandamus a rigorosos limites de indagação probatória, e de sumariedade na discussão e defesa dos interesses em conflito, o instituto processual reduz – em nome da necessidade de pronta cessação do abuso do poder público – a incidência da garantia do pleno acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV) e limita a do contraditório e ampla defesa (CF, art. 5º, LV), assim como a da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput). Colisões como estas, no âmbito das garantias fundamentais, não têm o poder de fazer com que um princípio constitucional anule os demais, para prevalecer isoladamente, como se se tratasse de norma absoluta. Daí vigorar, entre as técnicas de hermenêutica constitucional, a da razoabilidade e proporcionalidade. Trata-se de exigir do intérprete a tarefa de aproximar, cotejar e harmonizar os princípios em aparente conflito, de forma que, in concreto, se torne possível definir até onde incidirá, na aplicação prática, cada um deles. de mandado de segurança também não viola o dispositivo da Constituição que garante a tal impetração” (MACHADO, Hugo de Brito. O prazo para impetração do mandado de segurança em matéria tributária. Revista de Processo, v. 19, nº 74, abr./jun. 1994, p. 5053). Assentadas essas premissas, não é difícil aceitar a necessidade de estabelecimento, pelo

legislador ordinário, de um prazo dentro do qual será razoável à vítima de ilegalidade ou abuso de poder cometidos por autoridade pública defender-se segundo a forma enérgica e sumária proporcionada pela ação especial do mandado de segurança. Afinal, não seria razoável (justo) que o ofendido ou ameaçado ficasse liberado para usar um procedimento que foge, em boa parte, dos padrões gerais do devido processo legal e da garantia plena do contraditório e ampla defesa, por um tempo indeterminado ou muito longo, como soe ser o previsto, v.ġ., para a prescrição e decadência dos direitos materiais. O próprio fato de o titular do direito subjetivo não reagir em sua defesa, de imediato, induz a conclusão razoável de que não se trata de um conflito de interesses que justifique sua composição em juízo fora dos padrões comuns do devido processo legal e da garantia do contraditório e ampla defesa em sua plenitude. Razoável, portanto, se afigura o estabelecimento do prazo de 120 dias para que seja facultada a impetração do mandado de segurança, como, aliás, tem prevalecido em nosso direito positivo por meio de longa tradição legislativa. Com semelhante critério normativo, chega-se a uma proporcional e razoável harmonização entre todos os princípios constitucionais incidentes sobre o caso, evitando a indesejável supremacia absoluta de uma garantia constitucional sobre as demais que com ela concorrem, dentro do âmbito do acesso à justiça, segundo o devido e justo processo idealizado pela Lei Maior.

158. NATUREZA DO PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA Muita divergência já se registrou na doutrina sobre a natureza do prazo legal estabelecido para o ajuizamento do mandado de segurança, havendo desde aqueles que o qualificam como preclusivo até os que o consideram decadencial, passando por outros que lhe negam tanto o caráter preclusivo como o decadencial e prescricional, para atribuir-lhe a natureza de um prazo simplesmente extintivo. Uma coisa é certa: todos concordam que o direito de impetrar mandado de segurança se extingue, definitivamente, quando ultrapassado o termo final dos 120 dias assinalados pela lei. Os que afirmam tratar-se de um caso de preclusão, e não de decadência ou prescrição, argumentam com o fato de dito prazo não afetar o direito subjetivo material da parte. Os que falam em prazo extintivo apegam-se ao conceito histórico de preclusão que só a vê como a perda de faculdade operada internamente, em processo já existente, circunstância inocorrente na extinção do direito ao mandado de segurança, a qual se dá antes mesmo da existência de qualquer processo. A discórdia não tem fim, mas não conduz a resultados práticos, visto que, qualquer que seja a posição esposada, o que se reconhece, à unanimidade, é o fato de se tratar de um prazo peremptório ou fatal, não podendo ficar sujeito às intempéries de suspensões e interrupções5. Nesse sentido, é paradigmático o entendimento de BUZAID no sentido de que se estaria diante de um prazo extintivo,

ou seja, aquele que torna temporário o direito a ele sujeito, por lei. Assim, o direito de impetrar o mandado de segurança extingue-se, pura e simplesmente, “pelo decurso do prazo legal”, sem que isso prejudique o direito material da parte lesada, “que poderá pleiteá--lo por ação própria”6. Ora, se se trata de uma perda ou extinção de direito, verificável antes da existência da relação processual, a figura extintiva que mais se aproxima da espécie é a decadência, ainda que esta tenha sido concebida originariamente para o campo do direito material. Mas, se o que prevê a lei do mandado de segurança é a extinção ou a perda do direito de manejá-lo, tudo conspira para igualar o evento àquele que, de maneira típica, ocorre com a decadência no plano dos direitos materiais. Ao marcar, a lei, um tempo útil ou determinado para que o direito de impetrar mandado de segurança possa ser exercido, teria estipulado um termo especial de decadência para um direito subjetivo processual7. Por isso, a doutrina predominante qualifica dito prazo como decadencial, não havendo, na atualidade, discordância séria a respeito8. E não discrepa a jurisprudência, em cujo seio prevalece, também, o entendimento de que o prazo de 120 dias previsto por lei para o aforamento do mandado de segurança possui natureza decadencial9. A propósito, a consolidação da jurisprudência do STF na Súmula nº 632 teve dupla virtude: pôs fim, de vez, à questão em torno da constitucionalidade do prazo legal para impetração do mandado de segurança, e definiu, categoricamente, a natureza decadencial de dito prazo, afastando, assim, “a celeuma anteriormente debatida pela doutrina”10.

159. CONTAGEM DO PRAZO DECADENCIAL DA SEGURANÇA Dispõe o art. 23 da Lei nº 12.016 que o prazo legal para ajuizamento do mandado de segurança será contado da ciência, pelo interessado, do ato impugnado. Trata-se de um dies a quo que pode sofrer muitas variações, conforme as particularidades do caso concreto. Os atos de autoridade às vezes são praticados dentro de procedimentos, com mecanismos variados de intimação (pessoal, postal, pela imprensa etc.). Outras vezes são omissivos, nada havendo que se possa qualificar como notícia ou intimação oficial ao interessado. Em síntese, não há como estabelecer, in genere, uma regra única para definir o dies a quo, na espécie. Caso a caso, haverá de ser perquirido o momento em que, real e eficazmente, a parte teve ciência do ato a impugnar. Se há uma divulgação oficial11, é da respectiva publicação que se contará dito prazo12. Se não há, ter-se-á de apurar, no mundo fático, o momento em que, realmente, o interessado tomou conhecimento do ato a ser atacado por meio da ação mandamental. O problema de maior relevância é a forma com que se deva contar o prazo, já que a lei especial não tem regra própria, nem remete a outra fonte normativa para supri-la. Sendo decadencial e fluindo antes da existência de qualquer processo, poderia ser ele tratado como de direito processual? Ou teria de ser analisado como prazo de direito material?13.

Não há muitas divergências entre as regras básicas de contagem de prazos do Código Civil e do Código de Processo Civil, já que em ambos os regimes o cálculo deve ser feito com exclusão do dia de começo e inclusão do dia de vencimento, devendo este, no caso de recair em feriado, ser prorrogado para o primeiro dia útil subsequente. A única diferença relevante é que, no regime processual, nenhum prazo começa a ser contado em dia não útil (CPC/2015, art. 224, § 3º 14), enquanto no Código Civil inexiste regra equivalente. A doutrina predominante é pela observância das regras processuais, recomendando CELSO BARBI que, havendo dúvida, quanto ao início do prazo, deve-se resolvê-la em favor do impetrante, conforme jurisprudência do STF15. No STJ, há acórdãos que admitem16 e que não admitem17 a prorrogação do prazo de ajuizamento do mandado de segurança quando o vencimento recair em dia feriado. No entanto, a jurisprudência atual firmou-se no sentido de admitir a prorrogação para o primeiro dia útil subsequente ao vencimento em feriado18. No STF tem prevalecido o entendimento da prorrogabilidade para o primeiro dia útil subsequente, se o vencimento coincidir com feriado ou dia em que não haja expediente forense19. Mesmo nos casos de decadência – cuja característica é a não sujeição a interrupções e suspensões, e, em consequência, a improrrogabilidade do vencimento –, “há uma tendência a considerar tempestiva a inicial ajuizada no primeiro dia útil subsequente ao término do prazo, se neste o fórum esteve fechado, inclusive durante férias”20. Em outras palavras: “o prazo decadencial considera-se fatal, porque não sujeito a prorrogações. Assim, as regras acerca da data do início e do término do prazo, quando coincidir com domingos e feriados, isto é, postergando o início ou adiando o término, não se aplicariam à decadência. A orientação dos tribunais, porém, consolidou-se no sentido contrário, de que nos prazos decadenciais observam-se aquelas regras de prorrogação. Tal entendimento tem apoio no art. 184 do Código de Processo Civil [CPC/2015, art. 224], que se refere a contagem de prazos, sem distinguir a natureza deles”21, pouco importando, pois, que sejam preclusivos, prescricionais, decadenciais ou meramente extintivos. Perante as divergências doutrinárias, nosso entendimento se afina com a corrente majoritária, acolhida pela jurisprudência, também de maneira acentuada pelos tribunais: deve, por isso, ser contado o prazo de 120 dias a que alude o art. 23 da Lei do Mandado de Segurança, segundo o regime do art. 224, e seus parágrafos, do Código de Processo Civil, ou seja, a contagem será iniciada no primeiro dia útil seguinte ao do conhecimento, pelo impetrante, do ato impugnado, e fluirá de forma contínua, dia a dia, sem interrupções e suspensões, até atingir o 120º dia, inclusive; recaindo este em dia feriado, ou sem expediente forense, estender-se-á o termo final para o dia útil imediatamente seguinte22. Cumpre ressaltar, por oportuno, entendimento esposado pelo STJ no sentido de que, havendo regime de plantão em feriado ou dia sem expediente forense, não se prorroga o prazo: “Habitual o

plantão determinado pelo Tribunal, se o termo final ocorreu em dia feriado, não se adia o vencimento do prazo decadencial para a impetração de segurança”23. Optamos por essa concepção pelos seguintes fundamentos: é a que tem prevalecido no Supremo Tribunal Federal e a que se revela mais benéfica para o destinatário da garantia fundamental, que é o mandamus do inc. LXIX do art. 5º da Constituição. Valhamo-nos, assim, da regra básica de hermenêutica constitucional, que preconiza a necessidade de superar as dúvidas interpretativas sempre por meio do critério ampliativo, e nunca restritivo, quando se trata de normas da Constituição, mormente aquelas definidoras dos direitos fundamentais (princípio da máxima eficiência, ou da efetividade). Todo prazo, em direito processual, funciona como limitação ou restrição de direito24, de sorte que, ocorrendo dúvida a seu respeito, a interpretação haverá de ser aquela que favoreça ao titular do direito ou da faculdade assegurada em lei25.

160. ALGUMAS SITUAÇÕES PARTICULARES, EM TEMA DO PRAZO DECADENCIAL APLICÁVEL AO MANDADO DE SEGURANÇA Na jurisprudência, encontram-se solucionadas várias questões interessantes em que se acha envolvida a contagem do prazo legal fixado para a impetração do mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 23), como os exemplos que seguem: a)

“Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para o mandado de segurança” (Súmula nº 430 do STF). “O enunciado é aplicável, também, aos recursos administrativos em geral”26. O tratamento jurídico é diferente, se o pedido de reconsideração é previsto em lei: nesse caso, embora sob rótulo de pedido de reconsideração, com prazo determinado, corresponde a um verdadeiro recurso, o que afasta a aplicação da Súmula nº 430, interrompendo, portanto, o prazo para o mandado de segurança27;

b)

“Eventual reiteração integral de decisão supostamente lesiva a direito líquido e certo não tem o condão de abrir novo prazo para a impetração de mandado de segurança”. Desde a ciência do impetrante acerca da primeira decisão, já teria iniciado o prazo decadencial do art. 23 da Lei do Mandado de Segurança28;

c)

É pacífico o entendimento de ser descabida a aplicação do prazo decadencial do art. 23 da Lei do Mandado de Segurança, quando se trata de impetração de caráter preventivo. A razão é simples: o impetrante ainda não sofreu a violação em seu direito líquido e certo29, de modo que, enquanto persistir a situação de perigo, o mandado de segurança poderá ser interposto a qualquer tempo30;

d)

“Nas hipóteses de atos de trato sucessivo, o prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança renova-se mês a mês”31. O entendimento, todavia, prevalece apenas enquanto a questão não for enfrentada por decisão administrativa. Havendo recusa inequívoca ao pleito do impetrante, por parte da autoridade coatora, fluirá a partir de então o prazo de 120 dias para a impetração da segurança contra essa recusa32;

e)

“A jurisprudência predominante nos tribunais tem feito a distinção entre ato administrativo único, mas com efeitos permanentes, e atos administrativos sucessivos e autônomos, embora tendo como origem norma inicial idêntica33. Na primeira hipótese, o prazo do art. 18 da Lei do Mandado de Segurança [hoje, art. 23 da Lei 12.016] deve ser contado da data do ato impugnado, na segunda, porém, cada ato pode ser atacado pelo writ e, assim, a cada qual corresponderá prazo próprio independente”34;

f)

“O prazo decadencial não flui em se tratando de ato omissivo, isto é, quando a autoridade coatora, devidamente provocada, não responde à solicitação do requerente, renovando-se a omissão enquanto não houver resposta à pretensão deduzida”35. A situação é outra quando há, na lei, definição de prazo para a prática do ato do coator: “Tratando-se de impetração contra ato omissivo da Administração, o prazo decadencial de cento e vinte dias começa a contar a partir do momento em que se esgotou o prazo legal estabelecido para a autoridade impetrada praticar o ato cuja omissão se ataca. Precedente do STF. II – Não se trata, in casu, de ato omissivo continuado em que este E. STJ já pacificou entendimento que o prazo decadencial renova-se periodicamente”36;

g)

No caso de ato normativo de efeito concreto, como a lei que fixa ou majora vencimentos dos servidores públicos, e o que decreta a utilidade pública de um imóvel particular para efeito de desapropriação, o prazo legal para interposição do mandado de segurança tem a sua contagem iniciada na data em que ocorre a publicação do ato impugnado no Diário Oficial37;

h)

Já se decidiu que, para cumprir o prazo decadencial, não basta que a segurança seja levada à distribuição, sendo necessário que a petição inicial seja despachada pelo juiz, deferindo a requisição das informações do coator38. O entendimento, todavia, não é merecedor de adesão. Cabe ao autor, para respeitar a tempestividade do mandamus, simplesmente propor a respectiva ação; e, pela lei processual civil, “considera-se proposta a ação, quando a petição inicial for protocolada” (CPC/2015, art. 31239). Vale dizer: onde funciona o serviço forense de distribuição das ações, estas são legalmente havidas como propostas, desde o momento em que são apresentadas àquele ofício judiciário40. A jurisprudência fiel à lei e que tem prevalecido no STF é aquela firmada no sentido de que “o prazo decadencial, no mandado de segurança, é de ser aferido em face da data em que originariamente foi protocolado o ‘writ’, mesmo quando tenha ocorrido perante juízo

incompetente41, não se exigindo o despacho da inicial, podendo a entrega deste ocorrer até o último instante do expediente normal do órgão judiciário, nos termos do art. 172 do Código de Processo Civil [CPC/2015, art. 212]”42. É a mesma tese adotada pelo STJ43;

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É firme a jurisprudência do STJ, em matéria de concurso público, “no sentido de que o termo a quo para a fluência do prazo decadencial no tocante às regras do edital que tratam do limite de idade deve ser contado do ato que determina a eliminação do candidato e não da mera publicação do respectivo edital”44;

j)

Nos atos complexos, como o de aposentadoria, o prazo decadencial só começa a contar depois do ato final de aperfeiçoamento, que no exemplo aventado ocorreria com o registro perante o Tribunal de Contas45. Do mesmo modo, nos atos de concessão de pensão por morte, o prazo decadencial para que a administração anule seus próprios atos, pelo poder de autotutela, também começa a fluir somente do registro perante o Tribunal de Contas46;

k)

Sobre o prazo aplicável particularmente ao mandado de segurança contra ato judicial47, ver os comentários ao art. 5º, III.

A lei atual, como a anterior, ressalva expressamente que a denegação do mandado de segurança “não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais” (Lei nº 12.016, art. 19). “Deve-se ressaltar que ocorre, no caso, ao contrário do que se dá no âmbito da ação rescisória, a decadência do direito à impetração do mandado de segurança, e não do direito que se está postulando” (CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.), et al. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 177). Cf. FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 222-227; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança, cit., p. 142-144. Ainda na vigência da Lei nº 1.533/1951, era copiosa a jurisprudência da Suprema Corte no sentido de que a norma legal que estipula prazo para a impetração do mandado de segurança “não ofende a Constituição” (STF, 1ª T., RMS 21.467/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 16.06.1992, DJU 04.09.1992, RTJ 145/186; STF, 2ª T., RMS 21.364/RJ, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 23.06.1992, RTJ 142/161; STF, 1ª T., Ag Rg em AI 145.395/SP, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 29.03.1994, RTJ 158/976, etc.). “A estipulação, em sede legal, de prazo para a oportuna impetração do mandado de segurança não tem o condão de ofender a natureza constitucional desse remedium juris, cuja relevante função processual consiste em viabilizar, desde que tempestivamente utilizado nos termos em que o disciplina a lei, a pronta, eficaz e imediata recuperação a direitos líquidos e certos eventualmente lesados por comportamento arbitrário da Administração Pública. A circunstância de ser omissa a Constituição da República quanto à fixação de prazos para o ajuizamento da ação de mandado de segurança não protrai, indefinidamente no tempo, a possibilidade de interessado valer-se, em qualquer momento, do writ mandamental que, essencialmente idêntico a outros meios processuais,

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constitui instrumento de efetivação e de concretização do direito material invocado pelo impetrante. O prazo decadencial referido na norma legal em questão não tem o caráter de penalidade, pois não afeta o direito material eventualmente titularizado pelo impetrante e nem impede que esse postule o reconhecimento de seu direito público subjetivo mediante adequada utilização de outros meios processuais” (STF, 1ª T., RMS 21.362/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 14.04.1992, RTJ 141/478). Em doutrina, ensina HUGO DE BRITO MACHADO que, da mesma forma “como a lei, ao estabelecer prazo para a propositura das diversas ações, não viola o dispositivo constitucional que garante o acesso ao judiciário (art. 5º, XXXV da CF), ao estabelecer o prazo de 120 dias para a impetração STJ, 2ª T., RMS 25.112/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 15.04.2008, DJe 30.04.2008. BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1992. p. 153. A situação jurídica é a mesma que se passa com a ação rescisória, para cujo exercício o CPC marca o prazo extintivo de dois anos a contar do trânsito em julgado da última decisão (art. 975). Dito prazo é visto, doutrinária e jurisprudencialmente, como decadencial, pelo seu caráter de prazo extintivo fatal, não sujeito a prorrogações, suspensões ou interrupções (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de direito processual civil. 51. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. v. III, n. 687, p. 939). Na jurisprudência: STJ, 1ª T., REsp 51.968/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 19.09.1994, RSTJ 68/395; STJ, Corte Especial, EREsp 677.672/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 21.05.2008, DJe 26.06.2008. “A doutrina atual dominante, entretanto, na qual se incluem HELY LOPES MEIRELLES, CELSO AGRÍCOLA BARBI, FRANCISCO WILDO LACERDA e OTHON SIDOU, firmou-se no sentido de que o prazo para impetração da segurança é de decadência” (g.n.) (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 407). STF, 1ª T., RMS 21.361/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 14.04.1992, RTJ 141/478; STF, 1ª T., RMS 21.505/DF, Rel. Min. Octávio Gallotti, ac. 30.06.1992, RTJ 141/813; STJ, 1ª T., RMS 1.030/ES, Rel. Min. Milton Pereira, ac. 29.09.1993, RSTJ 68/131. A Súmula nº 632 do STF é explícita no sentido de ser decadencial o prazo de lei para a impetração do mandado de segurança. PALHARINI JÚNIOR, Sidney. In: GOMES JÚNIOR et al.Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., 2015, p. 275. Explica o autor: “A decadência, que é a perda de um direito pelo seu não exercício em um determinado prazo fixado, no caso, diz respeito ao direito de a parte valer-se da ação mandamental (...), ficando, todavia, resguardado o direito material da parte vias ordinárias para perseguir o seu direito” (Op. cit., p. 275). Nos casos, por exemplo, de edital de concurso público, o prazo começa a fluir da sua publicação oficial, se a impetração é contra termos do próprio edital. Se, porém, o writ volta-se contra “cumprimento concreto das regras do certame”, não pode o prazo decadencial ser havido como iniciado “com a publicação do edital” (STJ, 2ª T., EDcl no AgRg no REsp 1.195.927/ RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 17.03.2011, DJe 04.04.2011). “O termo a quo do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança em que se impugna regra prevista no edital de concurso público, conta-se a partir do momento em que o candidato toma ciência do ato administrativo que, fundado em regra editalícia, determina a sua eliminação do certame. Precedentes (EREsp. 1.266.278/MS, Relatora Ministra Eliana Calmon, Corte Especial, DJe

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10/05/2013) e não a partir da data do edital, como julgado pelo Acórdão ora Embargado” (STJ, Corte Especial, EREsp. 1.124.254/PI, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 01.07.2014, DJe 12.08.2014). Segundo SÉRGIO FERRAZ (Mandado de segurança. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. p. 129), “supõe-se o conhecimento do ato se este é publicado em órgão oficial”, por força do princípio da publicidade dos atos da Administração (CF, art. 37, caput). “Doutra parte, publicado o ato, sua comunicação pessoal superveniente ao interessado não reabre o prazo, nem o faz renascer se já exaurido” (STF, Pleno, MS 20.310, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 13.05.1982, DJ 04.06.1982, p. 5.460, RTJ 103/965); CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 358, nota 1.041. Sendo decadencial o indigitado prazo, a conclusão a se extrair, em primeira mão, é que “o seu curso não se interrompe e não se suspende, nos termos da lei civil” (PALHARINI JÚNIOR, Sidney. Op. cit., p. 276). CPC/73, art. 184, § 2º. BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 169; STF, 3ª T., RMS 16.321/DF, Rel. Min. Luiz Gallotti, ac. 17.05.1966, RTJ 46/794. De acordo com essa doutrina, que preconiza a contagem segundo o regime do Código de Processo Civil, o prazo de ajuizamento do mandado de segurança só começa a ser contado em dia útil e, igualmente, só termina em dia útil (CPC, art. 224, §§ 1º e 3º) (CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Lei do Mandado de Segurança. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 284; CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 357). Para aqueles que, como SCARPINELLA BUENO, aplicam as regras civis dos prazos decadenciais, que não se sujeitam a suspensões e interrupções, o vencimento do prazo cai no 120º dia após o conhecimento do ato pelo impetrante, pouco importando seja útil ou não o dies ad quem (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança, cit., p. 145-146; ALMEIDA, Gregório Assagra de. Mandado de segurança, cit., p. 357). STJ, 5ª T., RMS 2.428/PR, Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, ac. 14.10.1997, DJU 09.02.1998, p. 29; “O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o prazo para a impetração do mandado de segurança, apesar de ser decadencial, prorroga-se quando o termo final recair em feriado forense” (STJ, 3ª Seção, MS 10.220/SF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 27.06.2007, DJU 13.08.2007, p. 330). STJ, 1ª T., RMS 13.062/MG, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 11.06.2002, DJU 23.09.2002, p. 225. “É pacífico nesta Corte Superior o entendimento segundo o qual, apesar de se tratar de decadência, findando o prazo previsto no art. 18 da Lei n. 1.533/51 (v. tb. art. 23 da Lei n. 12.016/09) em dia sem expediente forense, é necessário observar a prorrogação para o primeiro dia útil seguinte. Precedentes” (STJ, 2ª T., RMS 31.777/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 15.02.2011, DJe 24.02.2011). No mesmo sentido: STJ, 5ª T., AgRg no Ag 1.021.254/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 04.12.2008, DJe 02.02.2009; STJ, 3ª Seção, MS 10.220/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 27.06.2007, DJU 13.08.2007, p. 330. STF, Pleno, RMS 14.762/PE, Rel. Min. Hermes Lima, ac. 20.10.1965, RTJ 35/160; STF, 1ª T., RMS 14.729/PE, Rel. Min. Victor Nunes Leal, ac. 07.02.1996, RTJ 36/66; STF, Pleno, MS 20.171/DF, Rel. Min. Rafael Mayer, ac. 16.03.1979, RTJ 89/42; STF, 1ª T., RE 75.872/SP, Rel.

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Min. Antônio Neder, ac. 21.05.1976, RTJ 78/461; STF, Pleno, MS 21.356-AgR-ML, Rel. Min. Paulo Brossard, ac. 12.09.1991, RTJ 140/73. NEGRÃO, Theotônio, et al. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 293, nota 8 ao art. 184. STJ, 1ª T., REsp 51.968/SP, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 19.09.1994, RSTJ 68/395; STJ, 1ª T., REsp 167.413/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, ac. 08.06.1998, RSTJ 112/87; STF, Pleno, ED no RE 86.741/BA, Rel. Min. Oscar Corrêa, ac. 16.06.1982, RTJ 108/1.085; STJ, Corte Especial, EREsp 667.672/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 21.05.2008, DJe 26.06.2008; STJ, 2ª Seção, AR 3.291/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, ac. 10.03.2010, DJe 12.04.2010; STJ, 3ª Seção, EDcL na AR 703/SP, Rel. Min. Vicente Leal, ac. 08.08.2001, DJU 27.08.2001, p. 220; STF, 1ª T., RE 86.741/BA, Rel. Min. Antônio Neder, ac. 02.12.1977, RTJ 85/1.019. PALHARINI JÚNIOR, Sidney. Op. cit., p. 277. STJ, 3ª Seção, MS 10.220/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 27.06.2007, DJU 13.08.2007, p. 330. STJ, 2ª T., RMS 22.573/MS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 09.02.2010, DJe 24.02.2010; STJ, 6ª T., REsp 201.111/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 08.03.2007, DJU 26.03.2007, p. 291; STJ, 6ª T., AgRg no Ag 621.968/BA, Rel. Min. Paulo Gallotti, ac. 20.10.2005, DJU 21.05.2007, p. 621. STJ, 1ª T., RMS 13.062/MG, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 11.06.2002, DJU 23.09.2002, p. 225. Nesse sentido, a doutrina de ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES: “É de se notar que a prorrogação somente deverá existir se, na data fatal, não houver atendimento por parte do órgão judicial. Isto porque, embora possa cair em final de semana, férias ou feriado, o Poder Judiciário poderá manter regime de plantão, exatamente para a apreciação em casos de urgência e para se evitar o perecimento de direitos. A prorrogação, portanto, deverá ocorrer apenas diante da impossibilidade de impetração dentro do prazo legal, em razão do não funcionamento, em regime ordinário ou de plantão, por parte do órgão perante o qual se está impetrando o writ” (Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 178). THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ċurso de direito processual civil, cit., 59. ed., v. I, nº 368, p. 551. “Em se tratando de prazos, o intérprete, sempre que possível, deve orientar-se pela exegese mais liberal, atento às tendências do processo civil contemporâneo – calcado nos princípios da efetividade e da instrumentalidade – e a advertência da doutrina de que as sutilezas da lei nunca devem servir para impedir o exercício de um direito” (STJ, 4ª T., REsp 11.834/PB, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 17.12.1991, DJU 30.03.1992, p. 3.993); STJ, Corte Especial, REsp. 1.112.864/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 19.11.2014, DJe 17.12.2014; STF, 1ª T., RE 70.548/BA, Rel. Min. Luiz Gallotti, ac. 03.09.1970, DJe 06.11.1970, RTJ 55/465; STF, 1ª T., RE 70.777/SP, Rel. Min. Luiz Gallotti, ac. 02.04.1971, RTJ 57/408; STF, 1ª T., RE 74.869/ GO, Rel. Luiz Gallotti, ac. 20.10.1972, DJU 24.11.1972, p. 7.844, RTJ 64/273. STJ, 3ª Seção, EDcl no AgRg no MS 12.716/DF, Rel. Min. Celso Limongi, ac. 09.02.2011, DJe 15.04.2011. No mesmo sentido: STJ, 3ª Seção, MS 11.655/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 11.09.2013, DJe 18.09.2013. STF, Pleno, MS 20.321/DF, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 19.05.1982, RTJ 105/56. STJ, 3ª T., RMS 33.083/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 17.03.2011, DJe 25.03.2011.

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STJ, 2a T., AgRg no REsp. 1.115.711/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 03.05.2012, DJe 28.05.2012; STJ, 2ª T., REsp 1.200.324/MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 15.03.2011, DJe 22.03.2001; STJ, 2ª T., REsp 617.587/MG, Rel. Min. Castro Meira, ac. 11.03.2008, DJe 28.03.2008;STJ,3ªSeção,MS10.760/DF,Rel.Min.FélixFischer,ac.08.11.2006, DJU17.09.2007, p. 204; STJ, 2ª T., REsp 1.108.515/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 09.06.2009, DJe 25.06.2009 (o acórdão registra precedentes das 1ª e 2ª Turmas, e da 3ª Seção do STJ). TRF, 5ª Região, AMS 37.211/PE, ac. 26.06.1997, DJ 26.09.1997, p. 79.244; STJ, 1ª T., REsp 768.523/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 02.10.2007, DJe 28.05.2008. STJ, 3ª Seção, MS 12.473/DF, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 11.02.2009, DJe 14.04.2009. No mesmo sentido: STF, 2ª T., RMS 24.736, Rel. Min. Joaquim Barbosa, ac. 14.09.2010, DJe 08.10.2009; STJ, 4ª T., RMS 39.298/MG, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 20.08.2013, DJe 28.08.2013; STJ, 6ª T., AgRg no RMS 17.638/MS, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 03.09.2013, DJe 11.10.2013; STJ, 2ª T., AgRg no REsp. 1.211.840/MS, Rel. Min. Og Fenrandes, ac. 03.02.2015, DJe 06.02.2015. STF, 1ª T., RMS 23.987/DF, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 25.03.2003, DJU 02.05.2003, p. 40. Ato único de efeitos permanentes é, por exemplo, o que nega acolhida ao pedido do servidor para incluir determinada vantagem salarial. A decisão é única e seus efeitos persistirão de maneira permanente. Da decisão ofensiva ao direito de servidor começará a correr o prazo decadencial único para impugná-la por meio de mandado de segurança. Ocorrem atos sucessivos autônomos, quando, em interpretação equivocada da mesma lei, a autoridade coatora, de ofício, calcula a menor os vencimentos do servidor, repetindo a mesma ilegalidade em todos os meses. Aqui o prazo de propositura do mandado de segurança será reaberto a cada pagamento sucessivo irregular, enquanto não ocorrer uma decisão concreta que denegue, na via administrativa, de maneira direta e expressa, a pretensão do interessado. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 414. STJ, 1ª T., RMS 1.646/TO, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 29.03.1993, RSTJ 51/475; STF, 1ª T., RE 95.238/PR, Rel. Min. Néri da Silveira, ac. 23.09.1983, DJU 06.04.1984, p. 5.104. STJ, 3ª Seção, MS 10.583/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 08.11.2006, DJU 27.11.2006, p. 245; STJ, 1ª T., AgRg no REsp. 1.377.517/AL, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 13.06.2014, DJe 01.07.2014; STJ, Corte Especial, MS 5.788/DF, Rel. Min. Francisco Pe- çanha Martins, ac. 04.10.2000, DJU 11.03.2002, p. 152. “Na impetração contra ato omissivo, não existe prazo decadencial, mesmo porque a lesão ao direito líquido e certo, nesse caso, é permanente, renovando-se diariamente para fins de impetração de mandado de segurança” (CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 359). STJ, 5ª T., RMS 24.631/MA, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 30.05.2008, DJe 23.06.2008. STF, Pleno, MS 21.167 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 30.08.1990, RTJ 155/773; STJ, 6ª T., RMS 15.463/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 09.10.2007, DJU 19.11.2007, p. 291; STJ, 1ª T., AgRg no RMS 33.027/RO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 11.09.2012, DJe 17.09.2012; STJ, 2ª T., REsp 260.633/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 12.06.2001, RSTJ 151/209; STJ, 3ª Seção, MS 8.886/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 14.09.2005, DJU 24.10.2005, p. 168.

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STJ, 1ª T., RMS 4.495/ES, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, RSTJ 77/88; REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 412; BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de Segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 148-149. CPC/73, art. 263. CARREIRA ALVIM, op. cit., p. 361. STF, 1ª T., MS 21.337/RS, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 17.09.1991, RTJ 138/110; STF, 1ª T., RE 73.099/DF, Rel. Min. Moacyr Amaral Santos, ac. 08.02.1972, RT 450/299; STF, Pleno, MS 26.006 AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 02.04.2007, DJe 15.02.2008. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., p. 412; MACHADO, Hugo de Brito, O prazo para impetração do mandado de segurança, cit., p. 58. Numa única hipótese a distribuição da inicial do mandado de segurança não será suficiente para cumprir o prazo decadencial do art. 23 da Lei nº 12.016: Quando a petição distribuída estiver incompleta faltando dados indispensáveis para o respectivo deferimento. Enquanto não suprida a carência ou sanado o defeito, continuará a fluir o prazo decadencial. O que não se aceita é o condicionamento do ajuizamento da causa ao despacho da inicial, deixando sua sorte ao alvedrio do juiz. Quando o retardamento do despacho positivo, após regular distribuição, não depender de ato da parte, não se poderá reconhecer a perda de seu direito, que somente teria decorrido de deficiência dos próprios serviços judiciários. STJ, 1ª Seção, MS 11.957/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 14.11.2007, DJU 10.12.2007, p. 275. Entretanto, cumpre ressaltar entendimento do STJ no sentido de que “não há suspensão ou interrupção do prazo decadencial para impetração de mandado de segurança quando o Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer sua incompetência quanto a mandamus ali impetrado, dele não conhece ou nega-lhe seguimento e deixa de remeter os autos ao juízo competente, conforme prevê a regra do art. 113, § 2º, do CPC [CPC/2015, art. 63, § 3º]” (STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 9.532/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 08.02.2006, DJU 26.06.2006, p. 114). No mesmo sentido: STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 11.449/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, ac. 23.08.2006, DJU 05.02.2007, p. 195. STJ, 1ª T., AgRg no AREsp 213.264/BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 05.12.2013, DJe 16.12.2013. Precedentes do STJ: AgRg no AREsp 258.950/BA, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 18.03.2013; REsp 1.258.466/MS, Rel. Min. Castro Meira, DJe 13.09.2011; REsp 1.368.735/MS, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 29.05.2013; AgRg no AREsp 259.405/BA, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª T., DJe 18.04.2013. STJ, 2ª T., RMS 32.558/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 15.09.2011, DJe 21.09.2011; STF, Pleno, MS 25.072/DF, Rel. p/ ac. Min. Eros Grau, ac. 07.02.2007, DJU 27.04.2007, p. 62. “1. O direito potestativo outorgado à Administração Pública para anulação de seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais (Súmulas nºs 346 e 473, ambas desta Corte), expressão do poder de autotutela, não está regulado pelo instituto da prescrição, mas, sim, pelo da decadência, inocorrente na espécie. 2. O ato concessivo de pensão por morte ostenta natureza complexa, de modo que só se aperfeiçoa com o exame de sua legalidade e subsequente registro pelo Tribunal de Contas da União. Enquanto não aperfeiçoado o ato concessivo de pensão, não há falar em fluência do prazo decadencial previsto no art. 54 da 9.784/1999, referente ao lapso de

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tempo de que dispõe a Administração Pública para promover a anulação de atos de que resultem efeitos favoráveis aos destinatários, tampouco em estabilização da expectativa do interessado, aspecto a conjurar, na espécie, afronta aos princípios da segurança jurídica e da boa-fé, bem como às garantias constitucionais do ato jurídico perfeito e do direito adquirido” (STF, 1ª T., MS 26.864 AgR/DF, Rel. Min. Rosa Weber, ac. 01.12.2017, DJe 14.12.2017). Quando a impugnação é contra decisão de tribunal, o prazo para impetração do mandado de segurança conta-se da publicação do acórdão na imprensa oficial (STJ, 1ª T., RMS 33.490/ SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 01.09.2011, DJe 08.09.2011).

Capítulo XXV LITISCONSÓRCIO Art. 24. Aplicam-se

ao mandado de segurança os arts. 46 a 49 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. Súmulas: Súmula nº 631/STF: Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário. Súmula nº 701/STF: No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo.

Comentários ao art. 24 161. LITISCONSÓRCIO NO MANDADO DE SEGURANÇA Normalmente, os sujeitos da relação processual são singulares: um autor e um réu. Há, porém, casos em que ocorre a figura chamada litisconsórcio, que vem a ser a hipótese em que uma das partes do processo se compõe de várias pessoas. Os diversos litigantes, que se colocam do mesmo lado da relação processual, chamam--se litisconsortes. O que justifica o cúmulo subjetivo, in casu, é o direito material disputado tocar a mais de um titular ou obrigado, ou é a existência de conexão entre os pedidos formulados pelos diversos autores ou opostos aos diversos réus1. O art. 24 da Lei nº 12.016/2009, como, aliás, já fazia a Lei nº 1.533/1951, prevê a aplicação, ao mandado de segurança, das regras do Código de Processo Civil (arts. 46 a 49). Cumpre destacar que os artigos dizem respeito ao Código de Processo Civil de 1973, correspondentes aos arts. 113 a 1182, do CPC/2015. Portanto, é possível a formação de litisconsórcio, tanto ativo como passivo, em mandado de segurança. O litisconsórcio ativo é, em regra, facultativo, podendo, v.ġ., vários atingidos individualmente por um mesmo ato administrativo reunirem-se para a propositura de um writ comum. Já o litisconsórcio passivo é mais frequente sob a modalidade de litisconsórcio necessário. É o que se passa quando o ataque do impetrante se dirige contra ato da administração que gerou situação jurídica em favor de outrem. Ao pretender desconstituir tal ato, o impetrante está atuando não apenas contra o agente da Administração, mas igualmente contra o particular que se aproveitou do seu ato. É impossível, na sistemática processual, esse tipo de desconstituição, sem que todos os sujeitos interessados participem da relação processual (CPC/2015, art. 114. Por isso, “extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do

litisconsorte passivo necessário” (STF, Súmula nº 631). Incide plenamente, na espécie, a sanção prevista no parágrafo único do art. 1153 do CPC/20154. Há uma praxe, nos casos em que o direito discutido é igual para numerosos interessados (como, v.ġ., se passa com vantagens de servidores públicos), de outras pessoas nas mesmas condições jurídicas do impetrante requererem sua admissão ao mandado de segurança já proposto. Enquanto a causa ainda não tiver se definido subjetivamente, não há empecilho a que, com o consentimento dos impetrantes primitivos, outros interessados venham com eles consorciar-se. Mas a Lei nº 12.016 cuidou de disciplinar a formação dessa modalidade de litisconsórcio facultativo superveniente, vedando o acesso de novos impetrantes após o despacho da inicial (art. 10, § 2º). Portanto, só se pode pensar em alargar o polo ativo do mandado de segurança antes que o juiz tenha deferido a inicial e ordenado a notificação da autoridade coatora. O objetivo da regra legal é impedir a malícia do terceiro, que consistiria em aderir ao processo alheio, já conhecendo o juiz e o despacho dado à inicial, de modo a fugir do “juiz natural”, que haveria de ser aquele resultante da regular distribuição do novo feito.

162. LITISCONSÓRCIO PASSIVO Pelo fato de que são necessariamente convocados, para o processo do mandado de segurança, o coator e a pessoa jurídica a que aquele se vincula, há quem os considere como litisconsortes passivos necessários5. Argumenta-se que, in casu, “a relação jurídica não se forma sem a observância do litisconsórcio passivo necessário, na medida em que, além da autoridade coatora, que deve ser notificada para prestar informações (LMS, art. 7º, I), deve ser também cientificada a pessoa jurídica interessada (LMS, art. 7º, II), além daqueles que tiverem, de alguma forma, interesse jurídico relacionado com o alegado direito líquido e certo”6, arguido pelo impetrante. Esquece-se, porém, que o litisconsórcio corresponde a um cúmulo de litígios, num só processo (CPC/2015, art. 113, caput), que se funda (i) em “comunhão de direitos ou obrigações relativamente à lide” ou (ii) “conexão de causas”, ou pelo menos (iii) em “afinidade de questões” entre os litígios cumulados (CPC, art. 113, I a III). Quer isso dizer que o litisconsórcio importa trazer, para o objeto de processo, questões de direito material, cuja solução corresponderá a decisão de mérito dentro da defesa jurídica substancial de todos que se consorciaram, no polo ativo ou passivo da relação processual. Em outros termos, todos os litisconsortes haverão de ter pretensões ou sujeições de direito material envolvidas no objeto do processo. Não é o fato de incidentalmente ser alguém (além do autor ou do réu) chamado a comparecer em juízo, e praticar alguma intervenção em algum momento do processo, que o faz parte da relação processual e o torna litisconsorte, nos moldes e para os fins do art. 113 do CPC. É preciso, para que o litisconsórcio se dê, segundo a técnica processual, que ocorra a inserção de algum direito ou obrigação do litisconsorciado no objeto litigioso, ou seja, no mérito da causa. É no plano do litígio

(i.e., do direito material controvertido) que o litisconsórcio deita suas raízes7. Nessa ordem de ideias, inúmeros são os casos em que o CPC determina a intimação de terceiros, para a prática de algum ato, sem torná-los partes ou litisconsortes. Adverte, por exemplo, o art. 3788 do referido Código que “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade”. E, por isso, o terceiro, sem se transformar em parte ou litisconsorte, tem o dever de “informar ao juiz os fatos e as circunstâncias, de que tenha conhecimento”, bem como de “exibir coisa ou documento que esteja em seu poder”, e seja relevante para a instrução do processo (CPC/2015, art. 3809). É o que se passa com o coator, no caso do mandado de segurança. Sem ser parte no processo, é notificado a prestar informações sobre o ato impugnado, porque isso é relevante para a adequada elucidação do objeto litigioso, e porque, tendo sido o agente da pessoa jurídica que o praticou, tem condições de esclarecer as circunstâncias e os detalhes que o envolveram. Esse dever legal de informação não torna a autoridade coatora parte ou litisconsorte, porque nenhuma obrigação material do informante estará sob julgamento, mas apenas a situação jurídica da pessoa jurídica interessada, frente ao impetrante10. É sobre a esfera jurídica material desta que haverá de recair o efeito patrimonial da sentença de mérito do mandamus11. Pretende-se, nada obstante, justificar a posição de litisconsorte atribuída à autoridade coatora, porque, conforme o que vier a ser decidido no mandado de segurança, poderá a pessoa jurídica demandada exercer, contra seu agente, pretensão disciplinar ou regressiva. Mas esse relacionamento entre uma das partes e seu agente não está em jogo no processo do mandado de segurança, nem será objeto de decisão na sentença de mérito. Trata-se de fato exterior ao processo atual e que só eventualmente se tornará objeto de outro processo, já então travado entre partes que não as mesmas do mandado de segurança. Não havendo, portanto, comunhão dentro do processo de segurança entre o coator e a pessoa jurídica impetrada, sobre direitos e obrigações integrantes do objeto litigioso, nem conexão, dentro do processo atual, do litígio real travado entre o impetrante e a pessoa jurídica, com o futuro e eventual exercício de direito regressivo entre dita pessoa jurídica e seu agente, falta condição jurídica para que um mero informante seja erigido à categoria de parte ou litisconsorte da ação mandamental. Dir-se-á que essa condição teria sido reconhecida pela Lei nº 12.016, quando conferiu o direito de recorrer da sentença do mandado de segurança tanto à pessoa jurídica interessada como à autoridade coatora (art. 14, § 2º). Ora, o direito de recorrer não é atributo exclusivo da parte. Têmno, também, o Ministério Público e o terceiro prejudicado, como dispõe o art. 996, caput, do Código de Processo Civil/2015. A autoridade coatora, quando recorre da sentença do mandado de segurança, age exatamente como prevê o parágrafo único do aludido art. 996, ou seja, o faz com base na possibilidade de ser

“atingido direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual”, em razão da decisão proferida sobre “a relação submetida à apreciação judicial” – que é aquela que liga o autor ao réu – (esta, sim, o objeto do processo, cujo mérito a sentença solucionou). A justificativa para quem, mesmo sem ser parte, possa recorrer é o potencial reflexo daquilo que a sentença decidiu numa relação que não lhe diz respeito, sobre outra relação existente entre o terceiro e a parte vencida, e que esteja numa situação de dependência da que foi julgada. Em outras palavras, o coator recorre, não como parte vencida no mandado de segurança, mas como terceiro que mantém vínculo jurídico com a pessoa jurídica vencida, que pode ser afetado reflexamente pelas consequências do que restou acertado pela sentença dada entre o impetrante e a pessoa jurídica impetrada. Em suma, dentro da estrutura da relação processual estabelecida pelo mandado de segurança, não há fundamento para atribuir a qualidade de parte à autoridade coatora, tampouco a de litisconsorte passivo da pessoa jurídica a que se acha vinculada. A esta, e somente a esta, cabe a posição de sujeito passivo da ação mandamental. Pode haver situações de litisconsórcio passivo, nessa modalidade de writ, mas não será entre o coator e a pessoa jurídica demandada. Não obstante a posição tomada pela Lei nº 12.016, que prestigia a legitimidade passiva, no mandado de segurança, da pessoa jurídica interessada, reservando ao coator uma função meramente informativa e executiva, o STJ já concebeu um litisconsórcio necessário entre a autoridade coatora (Presidente do Tribunal de Justiça) e outra autoridade que não participara do ato impugnado (Delegado da Receita Federal), a pretexto de que o ato impugnado se referia à arrecadação de imposto de renda na fonte, ocorrida no âmbito dos servidores do Poder Judiciário do Distrito Federal. Porque o Tribunal de Justiça figuraria na retenção do tributo como simples responsável tributário, a seu Presidente não caberia “legitimidade exclusiva para figurar no polo passivo do mandado de segurança”, razão pela qual se deveria convocar o Delegado da Receita Federal para formar com aquele “litisconsórcio passivo necessário”12. Com a máxima vênia, à autoridade do aresto podem-se entrever alguns equívocos, que urge reparar a fim de que o regime processual do mandado de segurança seja efetivamente compreendido e aplicado. Assim é que a parte passiva da ação mandamental não pode ser ocupada pela autoridade coatora, quando a Lei nº 12.016 manda expressamente citar o representante judicial da pessoa jurídica de direito público para responder à impetração (art. 7º, II). Se nem a autoridade que praticou o ato impugnado é parte, muito menos o será outra autoridade tributária, que não teve qualquer relação com o referido ato, e que apenas pertence ao serviço arrecadador da pessoa jurídica interessada. Nem uma nem outra possuem qualidade jurídica para ocupar o polo passivo da ação, in casu ocupável apenas e tão somente pela Fazenda Pública Nacional. Assim, estava correto o ajuizamento em que se apontava como coator aquele que praticou o ato de retenção do imposto, tido como indevido. O que cabia era apenas cientificar o representante judicial da União, e não

determinar que ao processo se incluísse litisconsorte necessário, inexistente na hipótese do mandado de segurança sob consideração. Dessa maneira, o art. 7º da Lei do Mandado de Segurança seria fielmente cumprido, ensejando ao coator prestar as informações devidas acerca do ato que praticou, e à União, responder à ação, por meio de seu competente procurador. Não há título algum que justifique incluir, forçadamente, o Delegado da Receita Federal, como autoridade coatora, numa ação mandamental em que se discute ato administrativo em cuja prática nenhuma intervenção teve.

163. CASOS DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO O ato administrativo pode ter sua eficácia restrita ao relacionamento jurídico travado entre o impetrante e a Administração. A legitimação para o mandado de segurança ficará concentrada, portanto, entre o titular do direito líquido e certo e a pessoa jurídica, em cujo nome se praticou a violação àquele direito. Pode acontecer, no entanto, que o ato abusivo ou ilegal da Administração tenha criado ou constituído direito subjetivo para outra ou outras pessoas. A impetração, que busque invalidar ato dessa espécie, interferirá, de forma direta, não apenas na esfera jurídica da Administração, mas também na daquelas que adquiriram direitos em decorrência do ato impugnado. A sentença mandamental, sendo acatada a pretensão do impetrante, terá força constitutiva sobre direitos subjetivos de quantos se beneficiaram do ato questionado. Todos eles, ao lado da pessoa jurídica interessada, terão de figurar como litisconsortes necessários na ação mandamental, nos moldes do art. 11413 do CPC/2015. O que, de fato, torna necessário o litisconsórcio – como já observamos alhures – é a forçosa incidência da sentença sobre a esfera jurídica de várias pessoas. Sem que todas elas estejam presentes no processo, não será possível emitir um julgado oponível a todos os envolvidos na relação jurídica material e, consequentemente, não se logrará uma solução eficaz do litígio. A observância do litisconsórcio, quando este se manifesta necessário (obrigatório), é uma condição legal de eficácia da sentença, como prevê o art. 114, in fine, do CPC. Logo, se o processo tiver curso sem que todos os litisconsortes necessários tenham sido tempestivamente citados, a sentença não produzirá efeito nem “em relação aos que não participaram do processo nem em relação aos que dele participaram”14. O julgamento terá sido pronunciado inutilmente, pois o processo terá se contaminado de nulidade total15. Nesse sentido, prevê a Súmula nº 631 do Supremo Tribunal Federal: “Extingue--se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário”. O caso configura falta de requisito indispensável à formação e desenvolvimento válidos da relação processual, cuja consequência é a extinção do processo sem resolução do mérito da causa (CPC/2015, art. 485, IV)16.

Aplicando a técnica do litisconsórcio necessário, o Supremo Tribunal Federal acolheu mandado de segurança contra ato do CNJ que tomara decisão de desconstituir atos administrativos de interesse da Administração do Poder Judiciário, sem dar ciência e oportunidade de defesa a todos os interessados17. Nos mandados de segurança contra atos judiciais, em regra, há litisconsórcio passivo necessário entre o autor da decisão impugnada (órgão jurisdicional) e a parte que se beneficiara dos seus efeitos. Assim, quando, v.ġ., o mandado de segurança busca invalidar uma arrematação praticada de maneira ilegal, deverá ser intimado (além das partes de processo executivo), obrigatoriamente, o arrematante, “como litisconsorte passivo necessário, ao teor do art. 47 e seu parágrafo único, do CPC [CPC/2015, art. 115, parágrafo único]”18. Nos casos recorrentes de mandado de segurança contra atos praticados na abertura, processamento e julgamento dos concursos públicos, em regra, não figuram como litisconsortes necessários todos os candidatos concorrentes. É que, na condição de simples candidatos, mesmo já aprovados, não são, ainda, titulares de direito, mas de “mera expectativa de direito à nomeação”, razão pela qual “não podem ser considerados litisconsortes passivos necessários”19. Diversa é, contudo, a situação do candidato já aprovado e nomeado, se o mandado de segurança contém pretensão capaz de afetar sua nomeação. Aí já não se poderá falar em “mera expectativa de direito”, e sua integração ao mandado de segurança como litisconsorte do órgão da Administração impetrado será imprescindível. É que, a essa altura, estará em risco um direito subjetivo já adquirido pelo candidato20. Por último, a observância do devido processo legal não se contenta com a pura citação do litisconsórcio necessário. É indispensável que esta seja feita com expressa estipulação do prazo de defesa, para que o contraditório se estabeleça de forma regular e adequada21.

164. LITISCONSÓRCIO ATIVO É viável o litisconsórcio ativo no mandado de segurança, em todas as hipóteses genéricas arroladas no art. 113 do CPC22, quando, então, duas ou mais pessoas se consorciarão para formular pretensões comuns ou conexas, cumuladas numa só ação contra a mesma pessoa jurídica: a)

Os impetrantes, por exemplo, poderão ser comunheiros no direito ou obrigação prejudicados pelo ato da autoridade coatora (CPC, art. 113, I), como, v.ġ., os coproprietários do imóvel decretado de utilidade pública para desapropriação; caso em que o litisconsórcio será facultativo, uma vez que, mesmo cabendo o direito ameaçado a mais de uma pessoa, “qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança”, como faculta o § 3º do art. 1º da Lei nº 12.016;

b)

O mandado de segurança poderá ser impetrado conjuntamente por titulares de direitos

distintos, quando tiverem origem “no mesmo fundamento de fato ou de direito” caso em que serão defendidos direitos de várias pessoas originados de um só “fato jurídico”23: (i) diversos alunos, v.ġ., foram impedidos de comparecer à prova final da faculdade que cursam, em razão de tempestade de grandes proporções que os deixaram sem acesso ao local do exame, e, mesmo assim, foi indeferido o pedido de data para uma “segunda chamada”. A segurança poderá ser impetrada conjuntamente, sob fundamento de terem os direitos dos requerentes origem no mesmo fato; (ii) diversos licitantes impetram a segurança contra a Administração, para anular uma cláusula que contamina a licitação de ilicitude (fundamento comum de direito)24; c)

Mesmo não ocorrendo unidade de fonte, o litisconsórcio ativo facultativo é admissível se entre as diversas pretensões houver conexão, pelo objeto ou pela causa de pedir (CPC, art. 113, II), ou seja, quando o pedido for o mesmo nas impetrações cumuladas, ou se os diversos pedidos contiverem a mesma causa de pedir (CPC, art. 5525). Por exemplo, os diversos proprietários de vários imóveis submetidos a uma só e ilegal tributação, por diferentes lançamentos, formulam o mesmo pedido de anulação dos referidos lançamentos; ou os pedidos não são exatamente iguais (alguns querem só anulação do lançamento, outros, além da anulação, querem que o recolhimento indevido seja abatido dos recolhimentos futuros, por exemplo), mas a causa de pedir é a mesma. A impetração conjunta será permitida26;

d)

O litisconsórcio ativo permitido pelo inc. III do art. 113 do CPC ocorre quando não se exige identidade nem conexão entre as pretensões reunidas, mas apenas uma afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito. Por exemplo: atos administrativos diferentes tiveram em comum a aplicação da mesma lei que se pretende inconstitucional (ponto comum de direito), ou a ordem de encerramento do expediente forense (ponto comum de fato) prejudicou diversos litigantes de protocolarem seus diferentes recursos tempestivamente.

165. LITISCONSÓRCIO ATIVO SUPERVENIENTE O litisconsórcio ativo facultativo no mandado de segurança deve, em regra, se aperfeiçoar na petição inicial. Mas a praxe forense criou a possibilidade de ocorrer tal litisconsórcio, mesmo depois de já aforada a causa, mediante ingresso de outro impetrante na ação mandamental alheia, da qual poderia ter sido, na origem, litisconsorte facultativo, mas não o foi (“intervenção litisconsorcial”)27. Esse tipo de litisconsórcio ativo superveniente sempre encontrou sérias resistências doutrinárias, mas a Lei nº 12.016 a admite no mandado de segurança, desde que o retardatário formule seu pedido de adesão antes do despacho da petição inicial (art. 10, § 2º)28. Ultrapassado

esse momento, não ficará de todo vedada a reunião de pretensões litisconsorciais. O novo impetrante, porém, terá de ajuizar sua ação mandamental em processo próprio. E, se houver conexão, pelo pedido ou pela causa de pedir, as duas impetrações poderão ser reunidas, nos moldes dos arts. 57 e 286, I29, ambos do CPC/201530. Advirta-se, todavia, que essa reunião de ações ajuizadas separadamente, para processamento e julgamento conjuntos, só é permitida nos casos de conexão, os quais ocorrem apenas por comunhão de objeto (mesmo pedido) ou de causa de pedir (mesmo fato jurídico) (CPC/2015, arts. 5531 e 57). Não poderão, portanto, reunir-se ações por simples afinidade de questões por algum ponto comum de fato ou de direito (litisconsórcio facultativo recusável, previsto no art. 113, III, do CPC/2015). Além disso, a conexão só acarretará a reunião dos feitos aforados separadamente se houver compatibilidade entre as fases de desenvolvimento procedimental das diversas ações32. No caso do mandado de segurança, esse requisito assume proporções maiores, visto que a sumariedade e a presteza de solução da causa são essenciais ao remédio constitucional. Assim, não se pode tolerar que ulteriores acumulações de feitos venham retardar a tramitação e o julgamento do mandado primitivo. A reunião de feitos haverá de ser tratada sempre em caráter excepcional, devendo ser recusada quando, de alguma forma, puder dilatar e dificultar a solução do writ.

166. ASSISTÊNCIA NO MANDADO DE SEGURANÇA O fato de a Lei do Mandado de Segurança prever apenas a formação do litisconsórcio na ação mandamental – aliado à sumariedade do seu procedimento, indicativa da necessidade de uma solução pronta e efetiva para a tutela a que faz jus a vítima da ilegalidade praticada por agente do Poder Público –, levou à construção de um entendimento jurisprudencial infenso ao cabimento da assistência e demais formas de intervenção de terceiro no âmbito dessa ação constitucional33. Expressivo desse posicionamento é o seguinte aresto do STJ: “2. A jurisprudência do STJ é predominante no sentido do não cabimento da assistência simples em mandado de segurança, tendo em vista que o art. 19 da Lei n. 1.533/51 não dispõe, expressamente, sobre essa modalidade de intervenção de terceiro, além de se tratar de medida que vai contra a celeridade do rito em questão. 3. Precedentes do STJ: REsp 617.258/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 7.12.2006; AgRg MS 5690/DF, Primeira Seção, Rel. Min. José Delgado, DJ 24.9.2001; e MS 5602/DF, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJ 26.10.1998. 4. Precedente do STF: MS 24.414/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 21.11.2003”34. Como a intervenção do terceiro não poderia ocorrer sob a forma de um litisconsórcio ativo superveniente – e nem mesmo sob a modalidade de assistência simples isso seria admissível –,

imaginou-se uma terceira via para contornar tais vedações: o terceiro, que poderia ter sido litisconsorte ativo no início do processo, mas não o foi, se apresentaria, supervenientemente, como assistente litisconsorcial, para justificar sua tardia inclusão no mandado de segurança, como parte ao lado do impetrante originário. Entretanto, se o assistente simples não pode ser admitido no mandado de segurança, tampouco pode sê-lo o litisconsorcial, visto que essa assistência estaria sendo utilizada para, por vias transversas, realizar uma ampliação do objeto do processo, nele fazendo constar o pedido de segurança para alcançar também o direito subjetivo material do interveniente, que não constara da impetração originária. Ora, o verdadeiro assistente litisconsorcial entra no processo com o fito de defender direito próprio, que já está em jogo na demanda inicialmente proposta por aquele a quem irá assistir. Embora agindo em defesa de direito próprio, recebe o processo estabilizado objetivamente, não podendo, de forma alguma, ampliar o objeto da lide35. Assim, quem não teve condições de ingressar como litisconsorte facultativo superveniente, porque o objeto do processo já estava estabilizado com o despacho da inicial (Lei nº 12.016, art. 10, § 2º), não terá condições de fazê-lo como pretenso assistente litisconsorcial, pois isso camuflaria, simplesmente, a pretensão de ampliar o objeto litigioso36. De nossa parte, entendemos que a assistência litisconsorcial não deve ser afastada do processo de mandado de segurança, desde que o ingresso do assistente não se dê para ampliar o objeto da causa. Se o seu direito subjetivo já está em discussão no processo, sob a defesa do impetrante, nada deverá impedir que outro titular desse direito sub judice venha participar da mesma defesa. O que não se pode tolerar é que o rótulo da pretensa assistência litisconsorcial se preste para encobrir algo que nada tem a ver com essa figura interventiva ad coadjuvandum, e que consiste, isto sim, num cúmulo superveniente de ações diferentes. Na vigência da legislação anterior, o STJ chegou a admitir que, em grau de recurso, o terceiro poderia intervir no mandado de segurança, na qualidade de assistente litisconsorcial. Naturalmente, não foi para ampliar o objeto da impetração, o que não seria possível em primeiro grau, e assumiria o nível do absurdo em grau de recurso: “A assistência, simples ou litisconsorcial, tem cabimento em qualquer procedimento ou grau de jurisdição, inexistindo óbice a que se admita o ingresso do assistente em mandado de segurança, ainda que depois de transcorrido o prazo decadencial do writ”37. Já na vigência da Lei nº 12.016, o STJ decidiu que “o ingresso de litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da petição inicial”, justamente como prevê o art. 10, § 2º, da atual Lei do Mandado de Segurança38. A nosso ver, o problema não vem sendo equacionado de forma adequada. O que a lei quer é evitar, na ação sumária de segurança, o tumulto processual que a assistência e as demais intervenções

de terceiro provocariam, tanto pela ampliação dos sujeitos processuais, como pela inserção de pedidos novos acrescidos ao objeto originário do processo. É paradigmática, nesse sentido, a fixação de um prazo curto e de um momento certo para que outros impetrantes ingressem com pedidos novos (i.e., requeiram a segurança também em seu favor), ao lado do requerente inicial (Lei nº 12.016, art. 10, § 2º). Ultrapassado o termo legal, o mandado de segurança se estabiliza, subjetiva e objetivamente: definidos e mantidos o pedido e as partes, o processo se desenvolverá celeremente em busca do provimento final (de mérito), eliminada até mesmo a dilação probatória e suprimida a audiência. Nas ações sumárias em geral, como, v.ġ., as dos juizados especiais, as de busca e apreensão, as sujeitas ao procedimento sumário do CPC39, etc., é frequente a vedação de intervenção de terceiro, assim como a limitação das questões arguíveis e dos meios de prova produzíveis. Por isso, não é novidade que o mandado de segurança fique restrito à defesa de direito líquido e certo, e sua instrução somente possa ser feita por prova documental pré-constituída. Também, sob o mesmo enfoque, é razoável a jurisprudência que se formou no sentido de não permitir a assistência na ação mandamental, pois, ainda que o assistente não pudesse inovar o objeto da causa, traria interesses de terceiro para exame e justificativa do ingresso em processo alheio, ensejando incidentes e recursos que, obviamente, dilatariam a marcha procedimental e retardariam a composição definitiva do litígio. Diversa, contudo, é a verdadeira assistência litisconsorcial, em que o interveniente já tem seu direito inserido no objeto litigioso controvertido entre impetrante e impetrado, e intervém, portanto, ao lado do principal interessado na segurança (o impetrante) para coadjuvá-lo, sem nada adicionar ao pedido e à causa de pedir, e sem demonstrar interesse novo ou fundamento inovador. Nessa conjuntura de ausência de prejuízo para a parte primitiva e para a dinâmica processual sumária, não é razoável o impedimento a que o titular (ou cotitular) do direito tenha acesso ao processo instaurado para discuti-lo e tutelá-lo. O disposto no art. 10, § 2º, da Lei nº 12.016, a nosso ver, não cogita de situação como a que se passa na verdadeira assistência litisconsorcial (CPC/2015, art. 12440)41. Seu único objetivo é impedir que, indefinidamente, novos interessados possam ampliar o objeto do mandado de segurança aforado pelo primitivo impetrante. O impedimento é, pois, ao litisconsórcio ulterior, sucessivo ou superveniente, além do momento fixado na lei. Expandir a vedação do litisconsórcio sucessivo para fazer alcançar também a assistência litisconsorcial, em sua configuração técnica e genuína, além de não encontrar apoio nem na letra nem no espírito da lei, se nos afigura uma denegação de acesso à justiça a quem, reconhecidamente, já tem seu interesse ou direito pendente de julgamento em juízo. Pensamos, em suma, que a assistência simples e as demais figuras de intervenção de terceiro não se compatibilizam com a sumariedade do mandado de segurança, não, porém, a assistência litisconsorcial, desde – é claro – que manejada dentro da função que lhe é própria, e nunca como

subterfúgio para camuflar um litisconsórcio facultativo, superveniente e intempestivo.

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A teorização do litisconsórcio põe em relevo a constatação de que, sem embargo da autonomia do direito de ação e do direito processual como um todo, não se pode deixar de reconhecer a natureza instrumental e a interdependência entre direito substancial e processo (ZANUTTI- GH, Loriana. Verbete “Litisconsorzio”. Digesto. 4. ed. Discipline Privatistiche, Sezione Civile, v. 11, 1996, p. 42). CPC/2015: “Art. 113. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando I – entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide; II – entre as causas houver conexão pelo pedido ou pela causa de pedir; III – ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito. § 1º. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença”. CPC/73, art. 47, parágrafo único. Um caso em que, com bastante frequência, se impõe o litisconsórcio necessário entre a autoridade coatora e terceiro é o do mandado de segurança contra ato judicial. Embora a lei determine a notificação da autoridade coatora e a cientificação da pessoa jurídica interessada, estabelece-se um “litisconsórcio passivo necessário” entre ambos (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 38). Nesse sentido VIDIGAL, Luis Eulálio de Bueno. Direito processual civil. São Paulo, Saraiva, 1965. n. 52 e 53, p. 53. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 364. A teorização do litisconsórcio, como já afirmado, é uma das evidências da natureza instrumental da interdependência entre direito substancial e processo (cf. o item anterior). CPC/73, art. 339. CPC/73, art. 341. “A relação jurídica processual deduzida em juízo não se perfaz entre o impetrante e o coator. A vinculação subjetiva do bem da vida almejado opera-se entre o impetrante e a pessoa jurídica de direito público (ou de direito privado com funções públicas delegadas) a que pertence o coator” (SOUZA, Gelson Amaro de; RODRIGUES, Daniel Gustavo de Oliveira Colnago. Ainda sobre a situação jurídica da autoridade coatora no mandado de segurança. Revista dos Tribunais, vol. 888, p. 53, out. 2009). Para que o coator tivesse condição jurídica de ser litisconsorte passivo do mandado de segurança, primeiro teria de ter a possibilidade de ser, ele mesmo, parte na relação jurídica processual. Para que isso fosse possível, várias são as tentativas de legitimação que, na doutrina, se arquitetaram, como, por exemplo, a de substituição processual ou a de parte formal. Nenhuma delas, entretanto, se revela convincente. Não pode ser substituto processual quem figura, desde a origem do processo, ao lado do verdadeiro titular do direito material controvertido. A substituição

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processual pressupõe titular ausente, para que o substituto possa defender em nome próprio o direito alheio. No mandado de segurança, esse titular é a pessoa jurídica interessada, a qual integra a relação processual desde o momento do aperfeiçoamento da triangulação provocada pela citação. A ideia de parte formal, por sua vez, corresponde a uma representação anômala de massas ou entidades, as quais, mesmo sem personalidade jurídica, podem litigar em juízo, como se passa com a massa falida, o espólio e os órgãos estatais autônomos, que podem atuar no processo em defesa de suas prerrogativas institucionais. Nada disso ocorre com a autoridade coatora, no mandado de segurança, a qual não é chamada para defender, seja direito próprio seja direito alheio, e não comparece para responder à ação, mas apenas para prestar informações relevantes para a solução do litígio travado entre o impetrante e a pessoa jurídica a que o coator se acha ligado. STJ, 2ª T., REsp 1.377.480/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 17.09.2013, DJe 01.10.2013. CPC/73, art. 47. BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v. I, nº 304, p. 204, com apoio em CHIOVENDA, Giuseppe (Ensayos de derecho procesal civil. Trad. de Sentís Melendo. Buenos Aires: EJEA, 1949, v. 3, p. 322 e ss.) e REDENTI, Enrico (II Giudizio civile com pluralità di parti. Milano: Giuffrè, 1960, p. 13, nota 11). No RE 69.653, decidiu o STF que o não chamamento à lide do litisconsórcio necessário causa a “nulidade ab initio do processo” (ac. 12.03.1974, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, RTJ 71/72; no mesmo sentido: RE 61.744, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, ac. 09.06.1972, RTJ 61/377. No STJ: “Decisão proferida sem a citação dos litisconsortes necessários é nula, nos termos do art. 47, parágrafo único do CPC [CPC/2015, art. 115, parágrafo único]”, de modo que “é o caso de anularse o processo” (STJ, 2ª T., RMS 21.530/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 02.12.2010, DJe 15.12.2010). STJ, 4ª T., REsp 1.106.804/PB, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 18.08.2009, DJe 05.10.2009. “Sempre que antevista a existência razoável de interessado na manutenção do ato atacado, com legítimo interesse jurídico direto, o CNJ está obrigado a dar-lhe ciência do procedimento de controle administrativo. Identificado o legítimo interesse de terceiro, o acesso ao contraditório e à ampla defesa independe de conjecturas acerca da efetividade deste para produzir a defesa do ato atacado. Segurança concedida, para anular o acórdão atacado e para que o CNJ possa notificar os impetrantes acerca da existência do PCA e de seu direito de serem ouvidos” (STF, Pleno, MS 27.154, Rel. Min. Joaquim Barbosa, ac. 10.11.2010, DJe 08.02.2011). STJ, 4ª T., REsp 1.106.804/PB, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 18.08.2009, DJe 05.10.2009. Decidiu o acórdão que ao mandado de segurança contra ato judicial devem ser integradas todas as partes envolvidas no ato a ser desconstituído, “sob pena de ineficácia da decisão”. “É firme no STJ a orientação” no sentido do texto (STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.210.445/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 14.12.2010, DJe 04.02.2011; STJ, 6ª T., AgRg no REsp 772.833/ RR, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, ac. 05.11.2013, DJe 21.11.2013; STJ, 1ª T., AgRg no REsp

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1.284.773/AM, Rel. Min. Bendito Gonçalves, ac. 23.04.2013, DJe 29.04.2013). Citação desnecessária: “Recurso especial. Administrativo e processual civil. Concurso público. Cargo de agente de polícia federal. Litisconsórcio passivo necessário. Desnecessidade. Cassação da decisão. Retorno do feito para julgamento de mérito” (STJ, 5ª T., REsp 642.024/ CE, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 26.04.2005, DJU 23.05.2005, p. 330). Citação necessária: “Visando o mandado de segurança anular atos administrativos de nomeação, é indispensável a citação dos nomeados, na condição de litisconsortes passivos necessários” (STJ, 1ª T., RMS 19.096/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 12.12.2006, DJU 12.04.2007, p. 210). No mesmo sentido: STJ, 5ª T., RMS 20.780/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 09.08.2007, DJU 17.09.2007, p. 307. “Recurso ordinário. Processual. Mandado de segurança. Litisconsórcio passivo necessário. Aplicabilidade. Decisão que afeta situação jurídica de terceiros. Citação. Prazo para defesa. (...). A citação há que conter, expresso, o prazo para defesa (art. 225, IV, do CPC; CPC/2015, art. 250, II), sob pena de nulidade” (STJ, 6ª T., RMS 14.106/MS, Rel. Min. Paulo Medina, ac. 09.12.2003, DJU 02.02.2004, p. 363). A previsão de litisconsórcio do art. 113 do CPC compreende a comunhão de direitos e obrigações, a conexão de causas pelo objeto ou pela causa de pedir e a afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito. Cumpre ressaltar que o Código de 1973 previa quatro hipóteses de litisconsórcio, das quais o novo CPC conservou três. Na verdade, porém, não houve redução, visto que dois incisos da lei velha correspondiam a uma só causa, que eram o inciso II (direitos ou obrigações derivados do mesmo fundamento de fato ou de direito) e o inciso III (causas conexas pelo objeto ou causa de pedir). Portanto, as duas situações resumiam-se na conexidade de causas, que o atual CPC prevê no inciso II do art. 113. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 365. CPC/73, art. 103. CARREIRA ALVIM, reportando-se a CELSO BARBI, observa que o Código de Processo Civil de 1973 é repetitivo no inc. II do art. 46, visto que as hipóteses nele contempladas – “direitos ou obrigações derivadas do mesmo fundamento de fato ou de direito – são abrangidos pelo conceito de conexão descrito no item III” (BARBI, op. cit., p. 198). Daí a conclusão de que os mesmos exemplos relativos ao inc. II do art. 46 serviriam também para o inc. III do mesmo artigo, e viceversa (CARREIRA ALVIM, op. cit., p. 366, nota 1.064). Por isso, a nota número 25 ressalta que o CPC/2015 englobou os incisos II e III do art. 46 do CPC/73 no inciso II do seu art. 113. Atribui-se a esse litisconsórcio ativo tardio a denominação de “intervenção litisconsorcial facultativa” (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 e outros estudos sobre mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 154). Para o STJ, em sua jurisprudência anterior à Lei nº 12.016, “A inclusão de litisconsortes ativos facultativos em momento ulterior ao ajuizamento da ação fere o princípio do juiz natural, insculpido no art. 5º, incisos XXXVII e LIII, da CF/88, independentemente da apreciação da liminar e da efetivação da citação do réu” (STJ, 1ª T., REsp 931.535/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, ac. 25.10.2007, DJU 05.11.2007, p. 238). Tal admissão de litisconsórcio era vedada, sobretudo, “após o deferimento de liminar”, por se considerar contrária ao “princípio do juiz

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natural” (STJ, 1ª T., AgRg no Ag 420.980/RS, Rel. Min. Francisco Peçanha, ac. 20.06.2002, DJU 16.09.2002, p. 156). CPC/73, arts. 105 e 253, I. CPC/2015: “Art. 57. Quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, no processo relativo à ação contida será proferida sentença sem resolução do mérito; caso contrário, as ações serão necessariamente reunidas”; “Art. 286. Serão distribuídas por dependência as causas de qualquer natureza: I – quando se relacionarem, por conexão ou continência, com outra já ajuizada”. CPC/73, art. 103. “Ressalte-se, finalmente, que a conexão e a continência são eventos que influem apenas sobre processos pendentes, no mesmo grau de jurisdição. Encerrado um dos processos, ou proferida a sentença, mesmo que haja interposição de recurso, não se pode falar em conexão frente à outra ação que se venha a ajuizar” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, cit., 59.ed., v. I, nº 168, p. 252). “Não há conexão de causas quando uma delas já foi julgada, estando em grau de recurso no Tribunal” (1º TA Civ.SP – Ag. Inst. 209.468, ac. 25.02.1975, RT 485/134). No mesmo sentido: STJ, REsp 120.404/GO, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 10.03.1998, RSTJ 111/184; STJ, CComp. 15.824/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 26.06.1996, DJU 09.09.1996, p. 32.308. “Consolidação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de não ser admissível assistência em mandado de segurança, porquanto o art. 19 da Lei 1.533/51, na redação dada pela Lei 6.071/74, restringiu a intervenção de terceiros no procedimento do writ ao instituto do litisconsórcio” (STF, Pleno, SS 3.273 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, ac. 16.04.2008, DJe 20.06.2008). Também no STJ, embora de maneira não unânime, se entendia incabível a assistência no mandado de segurança (STJ, 1ª T., REsp 1.065.574/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 02.10.2008, DJe 20.10.2008). Mesmo depois do advento da Lei nº 12.016/2009, o entendimento da Suprema Corte se mantém: “1. Em recurso extraordinário em mandado de segurança, não se admite o ingresso de terceiros no processo na condição de assistentes simples de uma das partes. 2. Matéria já pacificada no âmbito da Corte, pouco importando a natureza da demanda, ou mesmo de quem postula o ingresso no feito” (STF, 1ª T., AI 507.988 AgR- AgR-segundo/GO, Rel. Min. Dias Toffoli, ac. 09.04.2013, DJe 06.06.2013). O mesmo se passa no STJ: “Segundo a jurisprudência predominante no STJ, não cabe assistência em mandado de segurança” (STJ, 1ª Seção, EREsp 278.993/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 09.06.2010, DJe 30.06.2010). Nesse sentido, também, a doutrina: “No exame mais acurado do art. 24, percebe-se que a intenção do legislador foi afastar expressamente, inclusive em harmonia com a jurisprudência dominante, a possibilidade de assistência, seja simples, seja qualificada, ao fazer a expressa menção aos arts. 46 a 49 do CPC [de 1973], alijando eventual interpretação que pudesse alcançar este segundo instituto” (DYRLUND, Poul Erik. In: CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves de (coord.), et al. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 179). STJ, 2ª T., AgRg no REsp 1.071.151/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 18.12.2008, DJe 16.02.2009. “2. O assistente se limita a ajudar a parte principal, sendo inadmissível a impetração de mandado de segurança pelo assistente simples, já que o mandado de segurança constitui ação

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personalíssima de natureza mandamental e elevada carga subjetiva. Bem por isso a jurisprudência desta Corte e do STF têm reiteradamente decidido não ser cabível a assistência em sede de mandado de segurança. 3. Não se admitindo a intervenção de terceiros em mandado de segurança em virtude da condição personalíssima e mandamental do writ, com maior razão não ser possível admitir que o assistente simples possa impetrar em nome próprio mandado de segurança no interesse de direitos processuais da parte principal. Com efeito, ainda que se admita que possa o assistente simples interpor recurso quando omissa a parte principal, essa possibilidade não chega ao ponto de lhe permitir a impetração da ação constitucional de mandado de segurança em benefício da parte principal. A hipótese, assim, é de ilegitimidade ativa ad causam” (STJ, Corte Especial, AgRg no MS 21.472/DF, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 05.10.2016, DJe 14.10.2016). “A intervenção do terceiro na qualidade de assistente não altera o objeto do processo, uma vez que se limita a aderir à pretensão do assistido, sem formular demanda nova (...). O mérito a ser julgado, em caso de assistência, tem os mesmos contornos do que seria sem ela. O juiz simplesmente julga a demanda inicial do autor (...)” (DINAMARCO, Cândido Rangel. İnstituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros Editores, 2001. v. II, n. 597, p. 385). A situação não é diferente para o assistente litisconsorcial, embora se reconheça maior autonomia na prática dos atos processuais, mas não sobre a preclusão dos atos e fases já superados e, principalmente, sobre a definição do objeto do processo. “O assistente litisconsorcial, tanto quanto o simples, não traz ao processo demanda alguma a ser julgada, nem em face dele foi proposta qualquer demanda a ser julgada na sentença de mérito” (DINAMARCO, op. cit., II, p. 389). “Na qualidade de litisconsórcio ativo ulterior, sua intervenção [a daquele que não figurou originariamente como litisconsorte ativo facultativo do impetrante] poderia, em tese, acarretar a ampliação do objeto do processo (...). Precedente da 1ª Seção” (STJ, 2ª T., RMS 26.718/ SP, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 01.09.2009, DJe 08.09.2009). STJ, 2ª T., REsp 616.485/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 11.04.2006, DJU 22.05.2006, p. 180. STJ, 2ª T., RMS 30.982/PR, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 26.08.2010, DJe 20.09.2010. Cumpre ressaltar que o CPC de 2015 aboliu com o procedimento sumário. Entretanto, por força do art. 1.046, § 1º, as disposições do CPC de 1973 relativas ao procedimento sumário “que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código”. CPC/73, art. 54. CPC/2015: “Art. 124. Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente sempre que a sentença influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido”.

Capítulo XXVI EMBARGOS INFRINGENTES E SUCUMBÊNCIA Art. 25. Não cabem, no processo de

mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. Súmulas: Súmula nº 294/STF. São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão do Supremo Tribunal Federal em mandado de segurança. Súmula nº 512/STF. Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança. Súmula nº 597/STF. Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de segurança decidiu, por maioria de votos, a apelação. Súmula nº 105/STJ. Na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios. Súmula nº 169/STJ. São inadmissíveis embargos infringentes no processo de mandado de segurança.

Comentários ao art. 25 167. OS EMBARGOS INFRINGENTES E O MANDADO DE SEGURANÇA Ao tempo da Lei nº 1.533/1951, travou-se um sério dissídio entre a doutrina e a jurisprudência em torno do cabimento, ou não, do recurso de embargos infringentes no processo sumário do mandado de segurança1. Enquanto o Supremo Tribunal Federal assentava em sua Súmula jurisprudencial o entendimento firme de que “não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de segurança, decidiu, por maioria dos votos, a apelação” (Súmula nº 597/STF)2 – o que era repetido pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 169/STJ) –, vozes abalizadas na doutrina consideravam não razoável a jurisprudência sumulada, preconizando a necessidade de submetê-la a revisão, por não se encontrar fundamento no direito positivo para sustentá-la3. A Lei nº 12.016/2009, retratando a tendência majoritária de repudiar o anacrônico recurso, revelada pelo Projeto do novo Código de Processo Civil em discussão no Congresso Nacional, acolheu a tese sumulada pelo STF e pelo STJ, para calar, definitivamente, a discussão4. Diante dos termos categóricos do art. 25 do novo estatuto legal, resta certo que “descabe a interposição de embargos infringentes em sede de mandado de segurança (Súmulas 169/STJ e 597/STF)”5. Tollitur quaestio6. Entretanto, cumpre salientar que os embargos infringentes foram abolidos pelo CPC/2015,

substituindo-o um sistema de quórum maior para aperfeiçoar o julgamento não unânime da apelação. Esse sistema, a nosso ver, pode ser aplicado ao mandado de segurança, visto que não tem a forma nem a natureza do antigo recurso de embargos de divergência. É apenas uma etapa do procedimento do julgamento do recurso da apelação, procedimento esse que não é disciplinado pela Lei do Mandado de Segurança, mas, sim, pelo CPC, de aplicação complementar à ação mandamental7.

168. HONORÁRIOS DE ADVOGADO E ENCARGOS SUCUMBENCIAIS O tema dos honorários advocatícios em mandado de segurança é novo na lei, não na jurisprudência, a qual, de longa data, veta o cabimento dessa verba sucumbencial, de maneira firme, por meio de posicionamento sumulado, tanto no Supremo Tribunal como no Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, consta da Súmula nº 512 do STF que “não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança”, enunciado que se acha reproduzido, quase ipsis litteris, na Súmula nº 105 do STJ8. Assim, a Lei nº 12.016, ao dispor, expressamente, em seu art. 25, que não cabe, no processo de mandado de segurança, “a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios”, nada mais fez do que consolidar legislativamente o que já era orientação tranquila e recorrente preconizada pelas Cortes Judiciais superiores9. O STJ, porém, faz uma ressalva, para aplicar a regra geral da sucumbência no julgamento dos embargos opostos à execução do mandado de segurança. Aí, já não se cogitaria da ação de mandado de segurança, mas de uma ação incidental comum aforada na fase de execução, para a qual o art. 85, § 1º 10, do CPC/2015 prevê a incidência da verba advocatícia ex novo11. Quanto aos encargos sucumbenciais, vigora a regra geral segundo a qual “a parte vencida no writ deve reembolsar as custas adiantadas pela impetrante”. Em outros termos, “em sede de mandado de segurança, os efeitos patrimoniais da demanda são suportados pelo ente público, que deve arcar com o reembolso das custas”12.

169. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ O art. 25 da Lei nº 12.016, ao vetar a condenação de honorários de sucumbência na ação de mandado de segurança, ressalvou que tal isenção não prejudica a aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. É certo que sucumbência e litigância de má-fé são fatos totalmente diversos e não guardam relação um com o outro. Podem, no processo civil, tanto o vencido como o vencedor sofrer as penalidades da conduta processual ímproba. O que determina a imposição da pena, in casu, não é a falta do direito subjetivo de uma das partes, mas a quebra da boa-fé e da lealdade processuais, identificadas nas hipóteses constantes do art. 8013 do CPC/2015. O que levou a Lei do Mandado de Segurança a reunir num só dispositivo a abordagem das duas

figuras sancionatórias – a verba honorária e a multa da litigância de má-fé – encontra explicação no art. 8114 do CPC/2015: a parte que praticar a má-fé processual será condenada a reparar os prejuízos da parte contrária acrescidos dos “honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou” (CPC, art. 81). Aqui, portanto, os honorários deixam de ser verba de sucumbência e se transformam em verba reparatória, a que o litigante se sujeitará, seja vencido ou vencedor, no resultado final do processo. É nesse sentido que se deve entender o texto do art. 25 da Lei nº 12.016: a sucumbência em si não é causa de aplicação da verba honorária, mas, se a parte se conduziu como litigante de má-fé, será condenada aos honorários do advogado da contraparte, pouco importando qual delas tenha saído vencedora ou vencida15. Releva notar que, diante da má-fé processual, o juiz pode estipular uma multa, que deve ser de valor superior a 1% e inferior a 10% sobre o valor corrigido da causa, à qual serão acrescidos os honorários de advogado, já que a indenização dos prejuízos e a condenação à verba honorária são tratadas como coisas distintas pelo art. 81 do CPC/2015. A multa fixa de até 10% não substitui a indenização, que será fixada pelo juiz ou, caso não seja possível mensurar o prejuízo, será liquidada por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos (art. 81, § 3º).16 Se, contudo, o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 vezes o valor do salário mínimo (art. 81, § 2º). Diante do sistema de repressão à litigância de má-fé, instituído pelo Código de Processo Civil e adotado subsidiariamente pela Lei nº 12.016 (art. 25), a condenação a honorários de advogado não se apresenta como algo totalmente estranho ao processo do mandado de segurança. O que caracteriza sua adaptação à Lei do Mandado de Segurança é sua vinculação à má-fé processual, em lugar da sucumbência pura e simples. Os casos em que a litigância de má-fé pode se caracterizar, no curso do mandado de segurança, são os mesmos que o art. 80 do CPC/2015 arrola para as ações civis em geral17. Lembra, a propósito, JOSÉ ANTÔNIO REMÉDIO, que “o impetrante, como autor de qualquer ação, deve guardar lealdade processual, pois, se verificará a litigância de má-fé quando atuar ilicitamente, omitindo fato relevante de que é exemplo, ação antes deduzida, cujo pedido fora julgado improcedente, transitando em julgado”18. Convém lembrar, porém, que não é só o impetrante que pode praticar a má-fé processual, não sendo raros os exemplos, na jurisprudência, de aplicação de sanções da espécie ao Poder Público19, mormente pelo abuso de direito de recorrer20. Numerosos são os exemplos de litigância de má-fé na impetração de mandado de segurança, reconhecida pelos Tribunais: a)

“Caracteriza-se a litigância de má-fé quando a parte impetra mais de um mandado de segurança, com o mesmo pedido e causa de pedir, perseguindo a concessão de liminar. O

pedido de desistência de um deles formulado após a decisão que examinou o pedido liminar não tem o condão de afastar a má-fé”21; b)

Configura má-fé processual “repetir, em novo mandado de segurança, questão já repelida em outro”22;

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“A impetração de mandado de segurança contra ato judicial que visa impedir pagamento de débito cujo valor foi admitido pelo devedor constitui ato que justifica a aplicação de multa prevista no art. 17, incisos I, IV, VI e VII, do CPC [CPC/2015, art. 80, incisos I, IV, VI e VII]”23.

Há de se ter em conta, porém, que a mera denegação da segurança, por não acolhida da arguição de ilegalidade cometida pelo coator, não autoriza, por si só, a aplicação da pena de litigância de máfé ao impetrante, uma vez que a boa-fé se presume, não configurando necessariamente má-fé como consequência de interpretação ingênua, bisonha ou esdrúxula da lei24. Por fim, a previsão de aplicação das sanções da litigância de má-fé ao mandado de segurança, feita pelo art. 25 da Lei nº 12.016, não se apresenta como de “pouco relevo”, como já se afirmou, em vista de “a temeridade processual” ter um regramento geral aplicável a todo e qualquer processo25. É que, antes da lei atual, a jurisprudência se dividia no tocante a ser, ou não, aplicável ao mandado de segurança a verba referente aos honorários e às despesas processuais, mesmo quando configurada a litigância de má-fé26. Sendo assim, foi realmente significativa a opção do legislador de acentuar que o mandado de segurança, embora não sujeito aos encargos normais da sucumbência, enquadrava-se no regime de sancionamento da litigância de má--fé. Com isto, restou claro que o regime dos arts. 77 a 8127 do CPC/2015 deveria ser respeitado pelos litigantes também na ação especial do mandado de segurança. Disso decorreu a superação do dissídio jurisprudencial acerca dos honorários advocatícios e despesas processuais. Se tais encargos não se aplicam apenas pelo fato de sucumbência de uma das partes da ação mandamental, agora está positivada sua imposição a qualquer dos sujeitos da relação processual da ação de segurança que pratique a litigância de má-fé, exatamente como dispõe o art. 81, caput, do CPC/2015. Outrossim, não se deve – como de certa feita entendeu o STJ – deixar de aplicar a sanção do art. 81, caput, no tocante aos honorários de advogado e às custas do processo, à parte que incorre em má-fé processual, apenas porque afinal saiu vitoriosa no mérito, e porque a litigância desleal teria se referido tão somente a algum fato, da instrução, e não ao mérito da causa. A maior ou menor extensão do ato de má-fé processual, data venia, não justifica a recusa de aplicar a sanção legal. A punição da litigância de má-fé não é uma faculdade deixada ao alvedrio do juízo. É uma determinação legal de ordem pública, que o órgão judicial está vinculado a cumprir, até mesmo de ofício (CPC, art. 81, caput). O que lhe cabe é tão somente dosar a pena, dentro dos parâmetros da lei. Se a má-fé foi parcial e teve pequena repercussão sobre o andamento e desfecho do processo, a multa será arbitrada

proporcionalmente ao prejuízo da parte afetada, o mesmo ocorrendo com a condenação ao pagamento de honorários e custas. Mas o que não é correto é deixar de sancionar o ilícito processual, abstendose de aplicar sobre o infrator as penas que a lei, de maneira cogente, cominou para a litigância de má-fé.

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Os embargos infringentes, no Código de Processo Civil de 1973, eram cabíveis contra acórdão não unânime que, no julgamento da apelação, houver reformado a sentença de mérito (art. 530). Também a Súmula nº 294/STF tratava do tema e dispunha: “São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão do Supremo Tribunal Federal em mandado de segurança”. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Ċódigo de processo civil comentado e legislação extravagante “São incabíveis embargos infringentes de acórdão que, por maioria, haja reformado sentença de mérito no bojo de mandado de segurança (Súmula 597/STF)” (STF, 1ª T., AgRg no RE 507.193/MT, Rel. Min. Carlos Britto, ac. 09.06.2009, DJe 14.08.2009) STJ, 5ª T., AgRg no RMS 25.813/ES, Rel. Min. Félix Fischer, ac. 03.03.2009, DJe 23.03.2009. O Superior Tribunal de Justiça mantém o entendimento, agora baseado no texto expresso de lei: “Por expressa disposição legal (art. 25 da Lei 12.016/2009), são incabíveis embargos infringentes em processo de mandado de segurança (Súmulas 169/STJ e 597/STF)” (STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 385.611/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 21.11.2013, DJe 29.11.2013). Na doutrina atual a inovação legislativa mereceu aplausos e censuras. Entre os que criticam a exclusão dos embargos infringentes do processo do mandado de segurança, figuram, v.ġ., Luís Otávio Sequeira de Cerqueira (in: GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel; et al. Comentários à nova Lei do Mandado de Segurança, 2015, cit., p. 290-291); Carreira Alvim (Comentários à Nova Lei de Mandado de Segurança. Ċuritiba: Juruá Editora, 2010, p. 387-388). Cássio Scarpinella Bueno, de outro lado, observou que a regra que afastou definitivamente os embargos infringentes do campo do mandado de segurança configurou uma “escolha legítima feita pelo legislador e que deve ser acatada pelo intérprete e pelo aplicador do direito processual civil”. Aduziu, ainda, que “o recurso de embargos infringentes é, em geral, bastante criticado pela doutrina do direito processual civil brasileiro e nem sequer era cogitado dos estudos preparatórios do Código de Processo Civil de 1973, como bem expõe ARAKEN DE ASSIS, Manual dos recursos. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2008, p. 559/560. A Lei nº 12.016/2009, no particular, andou bem em excluir expressamente o recurso do mandado de segurança, permitindo que, independentemente do resultado da apelação, possam as partes interpor eventual recurso especial ou recurso extraordinário, desde logo” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 149, nº 66 e nota 181). É positivo, também, o comentário de Mirna Cianci: “Com a devida vênia aos ilustres autores que, em sua grande maioria, criticam a adoção desse entendimento sumulado [refere-se às súmulas nºs 597/STF e 169/STJ], há que se considerar que os embargos infringentes deveriam ser expurgados não só em sede de mandado de segurança, como em todo o sistema processual” (CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al.

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Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 487). Quando a LMS não cuida de regular o ato processual, como se dá com a contagem dos prazos, “nada impede e até faz necessário que seja aplicado o Código de Processo Civil, pois é certo que tal diploma se aplica subsidiariamente às normas do mandado de segurança” (STJ, 6ª T., REsp. 201.111/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 08.03.2007, DJU 26.03.2007, p. 291). “Na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios” (Súmula nº 105 do STJ). Especificamente em relação aos honorários de sucumbência recursal, o STJ afasta a incidência da regra geral do CPC/2015: “O art. 25 da Lei 12.016/2009 estabelece regra de descabimento de condenação em honorários advocatícios ‘no processo mandamental’, expressão que reúne a ideia de ação e do procedimento subjacente, com a petição inicial, as informações da autoridade coatora, a intervenção do Ministério Público, a prolação de provimento judicial e, ainda, os recursos consequentes, de maneira a afastar a incidência do regime do art. 85, § 11, do CPC/2015” (STJ, 2ª T., RMS 52.024/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 06.10.2016, DJe 14.10.2016). Art. 85, § 1º: “São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente”. STJ, 1ª Seção, AR 4.365/DF, Rel. Min. Humberto Martins, Revisor: Min. Herman Benjamin, ac. 09.05.2012, DJe 14.06.2012. STJ, 2ª T., REsp. 1.381.546/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 15.10.2013, DJe 28.10.2013. CPC/73, art. 17. CPC/73, art. 18. “Em consonância com o estabelecido no art. 18 do CPC [CPC/2015, art. 81], não se aplica o princípio da sucumbência no caso de litigância de má-fé, hipótese em que o litigante, autor ou réu, será condenado a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e as despesas que efetuou” (REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 446). THEOTÔNIO NEGRÃO dá notícia de acórdão que determinou “o pagamento de honorários advocatícios pelo vencedor ao vencido, em virtude de ter aquele mentido no processo” (JTAERGS 83/289) (NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 45. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 135, nota 11-a ao art. 17). “A multa e a indenização a que se referem o art. 18 e seu § 2º [CPC/2015, art. 81, §3º] incidem sobre o valor da causa, e não sobre o valor da condenação” (STF, 3ª T., AI 639.308 AgRg-EDcl, Rel. Min. Menezes Direito, ac. 16.03.2006, DJU 10.04.2006, p. 175). “A indenização pela litigância de má-fé será fixada pelo juiz em até 20% sobre o valor da causa atualizado” (STJ, REsp 686.223/ RS, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 15.12.2005, DJU 20.02.2006, p. 334). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 829.875/RS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 06.05.2006, DJU 29.06.2006, p. 192. CPC/2015: “Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II – alterar a verdade dos fatos; III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV – opuser resistência injustificada ao andamento do

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processo; V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI – provocar incidente manifestamente infundado; VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório”. REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 447. No sentido do texto: STJ, 3ª Seção, MS 4.638/DF, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 25.06.1997, DJU 15.09.1997, p. 44.274; STJ, 2ª T., REsp. 267.434/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 27.09.2005, DJU 10.10.2005, p. 274. TRF-5.R, 4ª T., AC 179765320124058300, Rel. Des. Rogério Fialho Moreira, ac. 17.09.2013, DJ 20.09.2013. “Manutenção da multa aplicada pelo Tribunal de origem por litigância de má-fé à Fazenda Nacional, que interpôs recurso para discutir cabimento do depósito, apesar de entendimento contrário firmado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão” (STJ, 2ª T., REsp 1.192.037/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 17.06.2010, DJe 28.06.2010). STJ, 2ª T., REsp 705.201/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 07.03.2006, DJU 04.05.2006, p. 162. TJRGS, 1ª Câmara Civil, Ap. 590069597, Rel. Des. Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, ac. 02.04.1991, RJTJERGS 152/451. STJ, 2ª T., RMS 25.521/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 11.03.2008, DJe 28.08.2008. REMÉDIO, op. cit., p. 447; TJSP, 7ª C., Ap. 85.802. ac. 20.05.1987, Rel. Des. Nélson Schiavi, RT 623/56. CIANCI, Mirna. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de segurança, cit., p. 151. JOSÉ ANTÔNIO REMÉDIO registra vários acórdãos num e noutro sentido (op. cit., p. 447-448). No próprio STJ havia uma certa resistência à aplicação do art. 81 (STJ, 1ª T., REsp 614.254/RS, Rel. Min. José Delgado, ac. 01.06.2004, DJU 13.09.2004, p. 178). CPC/73, arts. 14 a 18.

Capítulo XXVII DESCUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA Art. 26. Constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferidas em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis.

Comentários ao art. 26 170. O CUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA A característica da ação assegurada pelo inciso LXIX do art. 5º da Constituição situa-se na força de seu provimento, que não se limita a uma condenação ordinária, restrita a permitir futura invasão do patrimônio do devedor para realizar, por execução forçada, a prestação inadimplida pelo devedor. Da sentença do mandado de segurança emana uma ordem direta do juiz ou tribunal impondo ao coator um facere a ser cumprido de imediato, ou no prazo que lhe for determinado, independentemente do aparato da execução forçada civil. Por dever legal (dever de ofício), o destinatário não pode deixar de acatar a ordem judicial, nem mesmo procrastinar seu cumprimento. O regime de cumprimento da ordem mandamental se assemelha, em certa medida, com aquele que o Código de Processo Civil estabelece para as sentenças que condenam a prestações de fazer ou não fazer: sendo procedente o pedido, o juiz determinará providências que assegurem “a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente” ao do adimplemento (CPC/2015, art. 536, caput1). A tutela é, portanto, específica, e tem de ser in natura, ou seja, haverá de forçar a realização da própria prestação definida no provimento judicial, inadmitida sua conversão no equivalente econômico. Afinal, o que a Constituição quer, por meio do mandado de segurança, é garantir a efetividade do direito líquido e certo violado ou ameaçado por ato ilegal ou abusivo do agente do Poder Público. Para forçar o cumprimento efetivo da prestação de fazer ou não fazer – regra que se estende ao cumprimento do mandado de segurança –, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas coercitivas necessárias (ditas “medidas de apoio”), tais como “a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial” (CPC/2015, art. 536, § 1º 2). Tudo isso, quando necessário, será utilizável pelo juiz, segundo a pertinência do caso, para forçar o cumprimento, pela autoridade coatora recalcitrante, da decisão pronunciada na ação de

mandado de segurança. Não se descarta, nem mesmo, em casos extremos, a prisão do descumpridor da ordem, por crime de desobediência.

171. RESPONSABILIDADE PENAL DA AUTORIDADE COATORA: CRIME DE DESOBEDIÊNCIA Prevê o art. 26 da Lei nº 12.016/2009 – regra que inexistia na Lei nº 1.533/1951 – que “constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 [Código Penal], o não cumprimento das decisões proferidas em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1.950, quando cabíveis”. A capitulação, daquele que descumpre a ordem emanada do mandado de segurança, no crime de desobediência, decorre da natureza mesma da garantia constitucional retratada na ação mandamental. Não se trata, como já se viu, de simples condenação, mas de ordem legal de autoridade competente, que, por isso mesmo, não pode, o destinatário, deixar de cumprir, sob pena de cometer o crime de desobediência, segundo expressa previsão da atual Lei do Mandado de Segurança. Sob o regime da Lei nº 1.533 – que era omissa quanto à aplicação da responsabilidade penal no âmbito do mandado de segurança – havia grande dissídio jurisprudencial sobre a possibilidade, ou não, de o descumprimento da ordem mandamental configurar o crime de desobediência. A corrente contrária a essa incriminação partia do princípio de que o funcionário público não poderia cometer o crime de desobediência (CP, art. 330), por se tratar de delito, previsto pela Lei Penal como “crime praticado por particular contra a administração em geral” (Título IX, Capítulo II, do Código Penal)3. No Superior Tribunal de Justiça, todavia, foi construída uma tese segundo a qual a autoridade coatora, “quando destinatária específica e de atuação necessária, que deixa de cumprir ordem judicial proveniente de mandado de segurança, pode ser sujeito ativo do delito de desobediência (art. 330 do CP)”. É que “a determinação, aí, não guarda relação com a vinculação – interna – de cunho funcional-administrativo e o seu descumprimento ofende, de forma penalmente reprovável, o princípio da autoridade (objeto da tutela jurídica)”4. A Lei nº 12.016 adotou a orientação da jurisprudência do STJ, para, de maneira expressa, sujeitar o descumpridor da ordem emanada do mandado de segurança às penas do crime de desobediência, cominadas pelo art. 330 do Código Penal5. Se o que faltava na legislação pretérita era uma previsão legal para tipificar, diretamente, a conduta da autoridade coatora, in casu, como crime de desobediência, agora não falta mais. Desse modo, resta certo que, atualmente, comete o crime do art. 330 do Código Penal o destinatário da ordem de segurança que não a acata, no tempo e modo devidos.

O juiz civil pode, com base na prática delituosa, determinar a prisão em flagrante do infrator, mas não tem competência para a respectiva ação penal. Deverá, pois, comunicar a ocorrência ao Ministério Público, a quem compete promover o respectivo procedimento criminal.

172. CRIME DE RESPONSABILIDADE E SANÇÕES ADMINISTRATIVAS Prevê o art. 26 da Lei nº 12.016 que, ao descumprimento da decisão do mandado de segurança, se aplicarão as penas do crime de desobediência, “sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei nº 1.079, de 10.04.1950”. A Lei nº 1.079 é a que define os “crimes de responsabilidade”, que são praticáveis pelo Presidente da República, ou por Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador-Geral da República, Governadores e Secretários de Estado. Dispõe o art. 12 da referida Lei: “São crimes de responsabilidade contra as decisões judiciárias: 1 – impedir por qualquer meio o efeito dos atos, mandados ou decisões do Poder Judiciário; 2 – recusar o cumprimento das decisões do Poder Judiciário, no que depender do exercício das funções do Poder Executivo; 3 – deixar de atender a requisição de intervenção federal do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral; 4 – impedir ou frustrar pagamento determinado por sentença judiciária”6. Para os agentes públicos não enquadrados no regime dos “crimes de responsabilidade” da Lei nº 1.079/1950, existem as sanções da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), que, entre outras infrações, pune o ato de “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”, em cujos limites pode-se incluir o descumprimento do mandado de segurança (art. 11, II)7. O fim visado pelo art. 26 da Lei do Mandado de Segurança não é o de cumular sanções administrativas comuns, aplicáveis aos atos de improbidade administrativa, com as da Lei nº 1.079, pois o Supremo Tribunal Federal já decidiu que “a Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidades político--administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei nº 8.429/92), e o regime fixado no art. 102, I, c (disciplinado pela Lei 1.079/50)”8. Diante do entendimento consagrado pelo STF, deve ser evitada a superposição de sanções à improbidade administrativa. “Caso seria – segundo MIRNA CIANCI – de considerar aplicável à espécie [aventada pelo art. 26 da Lei nº 12.016/2009], para agentes políticos, a regra expressamente

indicada pelo novo texto [a Lei nº 1.079/1950] e, para os agentes públicos, a regra da Lei 8.429/92”9.

173. OUTRAS SANÇÕES Além das sanções previstas no Código Penal e na Lei dos Crimes de Responsabilidade, o art. 26 da Lei do Mandado de Segurança prevê a sujeição da autoridade coatora às “sanções administrativas” lato sensu. Indaga-se se o dispositivo alcançaria as penas da litigância de má-fé (CPC/2015, arts. 77 e 8110), uma vez que a autoridade coatora não é a parte passiva da ação de mandado de segurança. A resposta deve ser afirmativa. Os deveres processuais, cuja infração justifica a punição da litigância de má-fé ou dos atos atentatórios ao exercício da jurisdição, são imputados não só às partes e seus procuradores, mas a “todos aqueles que de qualquer forma participem do processo” (CPC/2015, art. 77, caput). E entre os deveres em questão, inclui-se, textualmente, o de “cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais” (art. 77, IV). Ademais, o art. 25 da Lei nº 12.016 submete, expressamente, o processo do mandado de segurança ao regime sancionatório da litigância de má-fé. Por último, o § 2º do art. 77 do CPC/2015 – como já se afirmou – qualifica de ato atentatório à dignidade da justiça o não cumprimento, com exatidão, dos provimentos mandamentais. Logo, não se pode recusar ao juiz o poder de, entre outras sanções, aplicar a da má-fé processual, à autoridade coatora que deixar de cumprir, a tempo e modo, a ordem expedida em razão de decisão proferida no mandado de segurança (CPC/2015, art. 14, § 2º)11. É bom lembrar por último, que, compreendendo a ordem deferida uma prestação de fazer, pode ser instrumentalizada com as medidas coercitivas (de apoio) previstas no § 1º do art. 536 do Código de Processo Civil/2015, como a multa diária por atraso no cumprimento da decisão mandamental, como já restou exposto. Se tal ocorrer, não ficará excluída a possibilidade de ulterior aplicação da pena de litigância de má-fé (CPC/2015, art. 14, § 2º), haja vista que as duas sanções são de natureza diversa: a multa cominatória (astreinte) é coercitiva, enquanto a de litigância de má-fé (atentado ao exercício da jurisdição) é punitiva12. É interessante que as multas sejam aplicadas ao coator, já que sobre a pessoa jurídica de direito público pouco ou nenhum efeito surtirá, em relação ao imediato cumprimento da ordem judicial. A autoridade coatora é diretamente o destinatário da ordem de execução. É sobre ela, portanto, que as medidas de apoio, medidas de caráter coercitivo, deverão atuar. Ademais, é ela que, nos termos do art. 77, IV, do CPC/2015, estará descumprindo o provimento mandamental, e, por conseguinte, praticando o “ato atentatório à dignidade da justiça”, de que cogita o §2º do aludido artigo do CPC/201513. A propósito, adverte MARINONI que é indiferente ser, ou não, a autoridade pública parte no

processo, se é a ela que compete cumprir a ordem judicial. Como ensina o processualista, a cobrança da multa não tem relação com o fato de o inadimplente ser ou não parte, mas, sim, com a circunstância de ser ele o responsável pelo cumprimento da decisão, ou seja, não se exige nada da autoridade em virtude daquilo que foi discutido no processo, mas, sim, em razão da sua posição de agente capaz de dar cumprimento à decisão judicial14. Se a autoridade coatora comete crime de desobediência quando não cumpre a ordem judicial expedida no mandado de segurança (Lei nº 12.016, art. 26), parece lógico que, também, sofra a sanção civil correspondente ao mesmo delito, e assim suporte a multa processual que foi imposta na ação mandamental.

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CPC/73, art. 461, caput. CPC/73, art. 461, § 5º. “... evidente, quando o funcionário público (CP, art. 327) pratica ato de ofício, não comete delito próprio de particular. Assim, inviável a infração penal – desobediência (CP, art. 330 – Crime praticado por particular contra a administração pública, Título XI, Capítulo II)” (STJ, 6ª T., HC 2.628/DF, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 29.06.1994, DJ 05.09.1994, p. 23.122, RSTJ 63/70). “O crime de desobediência que exige dolo só pode ser praticado por funcionário público se este age como particular, pois se atua na condição de funcionário, o delito será outro (precedentes do Supremo Tribunal Federal)” (TRF, 3ª Região, HC 030221046, Rel. Juiz Jorge Scartezzini, ac. 26.05.1992, DOE 22.06.1992). “O prefeito municipal que, quando no exercício de suas funções, deixa de cumprir ordem judicial, não comete crime de desobediência e, sim, o denominado crime de responsabilidade, tipificado no art. 1º, XIV, do DL 201/67, que é, na verdade, crime comum (HHCC 69.428, 70.252 e 69.850)” (STF, 2ª T., HC 76.888/PI, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 29.09.1998, DJU 20.11.1998, p. 3). STJ, 5ª T., REsp 422.073/RS, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 23.03.2004, DJU 17.05.2004, p. 267. No mesmo sentido: STJ, 5ª T., HC 12.008/CE, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 06.03.2001, DJU 02.04.2001, p. 313. “Com efeito, observa-se a intenção do legislador de conferir mais eficácia às decisões judiciais concessivas de segurança, na medida em que caracteriza como crime de desobediência o seu descumprimento, considerando que o Mandado de Segurança é um mecanismo constitucional de proteção individual ou coletiva de pessoa física ou jurídica contra atos ilegais ou arbitrários do Poder Público” (DYRLUND, Poul Erik. In: MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Mandado de segurança individual e coletivo, cit., p. 179). Lei nº 1.079/1950: “Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador-Geral da República”; “Art. 3º A imposição da pena referida no artigo anterior não

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exclui o processo e julgamento do acusado por crime comum, na justiça ordinária, nos termos das leis de processo penal”. CF: “art. 37, (...), § 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. A Lei nº 8.429/1992 acresceu à punição da improbidade administração, no caso em que se atente contra os princípios da administração pública, as sanções de pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente (art. 12, III). STF, Pleno, Rcl 2.138/DF, Rel. p/ ac. Min. Gilmar Mendes, ac. 13.06.2007, DJe 17.04.2008; STF, 2ª T., AgRg no RE 579.799/SP, Rel. Min. Eros Grau, ac. 02.12.2008, DJe 19.12.2008. CIANCI, Mirna. Comentário ao art. 26. In: ALMEIDA, Gregório Assagra de; et al. Mandado de segurança, cit., p. 509. CPC/73, arts. 14 e 18. CIANCI, Mirna. Op. cit., p. 511. “2 – A multa processual prevista no caput do art. 14 do CPC difere da multa cominatória prevista no art. 461, §§ 4º e 5º [do CPC], vez que a primeira tem natureza punitiva, enquanto a segunda tem natureza coercitiva a fim de compelir o devedor a realizar a prestação determinada pela ordem judicial. 3 – Os valores da multa cominatória não revertem para a Fazenda Pública, mas para o credor, que faz jus independente do recebimento das perdas e danos” (STJ, 1ª T., REsp 770.753/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 27.02.2007, DJU 15.03.2007, p. 267). O STJ tem posição favorável à aplicabilidade da multa processual por atraso à pessoa jurídica condenada em mandado de segurança (STJ, 2ª T., REsp 1.195.394/AM, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 22.11.2011, DJe 01.12.2011). No entanto, entende que a autoridade coatora, não atuando como parte na execução, não se sujeita à multa por descumprimento da sentença, que só pode atingir o sujeito passivo do processo, no caso a pessoa jurídica de direito público interno (STJ, 5ª T., REsp 747.371/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, ac. 06.04.2010, DJe 26.04.2010). MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2008, p. 478; GUERRA, Marcelo Lima. Execução em mandado de segurança. In: BUENO, Cássio Scarpinella; ARRUDA ALVIM, Eduardo; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança: 51 anos depois. São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 652653. Em sentido contrário: TALAMINI, Eduardo. A efetivação da liminar e da sentença no mandado de segurança. Revista do Advogado, nº 64, ano XXI, p. 53, 2001. De acordo com o texto: BOCALON, João Paulo. Legitimado passivo da multa coercitiva contra pessoa jurídica de direito público. Revista Dialética de Direito Processual, nº 111, p. 81-82. No sentido de ser a astreinte aplicável apenas à pessoa jurídica demandada, sujeitando-se a autoridade coatora, porém, à multa do parágrafo 3º do art. 77 do CPC/2015 (parágrafo único do art. 14 do CPC/1973): CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual do mandado de segurança. São Paulo: Atlas, 2013, p. 275.

Capítulo XXVIII DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 27.

Os regimentos dos tribunais e, no que couber, as leis de organização judiciária deverão ser adaptados às disposições desta Lei no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da sua publicação.

Art. 28. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 29. Revogam-se as Leis nos 1.533, de 31 de dezembro de 1951, 4.166, de 4 de dezembro de 1962, 4.348, de 26 de junho de 1964, 5.021, de 9 de junho de 1966; o art. 3º da Lei nº 6.014, de 27 de dezembro de 1973, o art. 1º da Lei nº 6.071, de 3 de julho de 1974, o art. 12 da Lei nº 6.978, de 19 de janeiro de 1982, e o art. 2º da Lei nº 9.259, de 9 de janeiro de 1996.

Comentários aos arts. 27, 28 e 29 174. REFLEXOS DA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA Conforme previsão do art. 27 da Lei nº 12.016, foi assinalado o prazo de 180 dias para que os regimentos dos tribunais e as leis de organização judiciária fossem adaptados às disposições da nova Lei do Mandado de Segurança. Trata-se de autorização de cunho puramente regulamentar, limitada às particularidades dos serviços internos da justiça. Só se refere a atos procedimentais e administrativos, e, de forma alguma, pode a adaptação interferir, de maneira inovativa, nas regras substanciais e materiais estatuídas pela Lei do Mandado de Segurança, pelo Código de Processo Civil e demais leis federais pertinentes à ação mandamental, principalmente quando se cogita dos regimentos dos tribunais1. Já quando se trata das leis de organização judiciária, deve-se ter em conta que aos Estados e ao Distrito Federal, a Constituição atribui competência legislativa concorrente, sobre “procedimentos em matéria processual” (CF, art. 21, XI). A legislação local tem força para instituir procedimentos, indo além das atribuições meramente regulamentares. Mas, existindo lei federal sobre o assunto, a lei de organização judicial local não poderá ir contra as normas gerais naquela fixadas. Por isso, a adaptação permitida pelo art. 27 da Lei nº 12.016 não pode infringir regra alguma disciplinada pela Lei do Mandado de Segurança. Vale dizer: a atualização da organização judiciária deverá ser efetuada sem que haja, frente à Lei nº 12.016, incompatibilidade de qualquer espécie2. Enfim, é preciso ter em mente que a determinação do art. 27 – como bem adverte CARREIRA ALVIM – não significa que a aplicação da Lei nº 12.016 ficou na dependência da preconizada

adaptação, a ser efetuada pelos regimentos internos e leis de organização judiciária. Sua eficácia é imediata, e teve início na data da respectiva publicação (art. 28)3.

175. A VIGÊNCIA DA LEI Nº 12.016/2009 E O DIREITO INTERTEMPORAL Determinou o art. 28 da Lei nº 12.016 sua vigência a partir da data de sua publicação, fato ocorrido por meio do Diário Oficial do dia 10 de agosto de 2009. Trata-se, destarte, de lei de vigência imediata, fora do padrão habitual estabelecido no art. 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Dec.-Lei nº 4.657/1942), que estabelece, em regra, uma vacatio legis de 45 dias após a publicação. Como os processos geram relações jurídicas dinâmicas e duradouras, o problema que se oferece ao aplicador das leis processuais novas é o de como fazê-las incidir sobre aqueles ajuizados anteriormente à sua entrada em vigor. Chama-se “direito intertemporal” a técnica de conciliar o conflito de leis no tempo, ou seja, as regras que definem quais os fatos jurídicos que continuarão regidos pela lei velha e quais os que cairão, desde logo, sob a força da lei nova. Toda lei, como criação humana, é sujeita a um princípio e um fim, isto é, a um começo de vigência e a um momento de cessação de eficácia. As leis processuais não diferem das demais, em questão de vigência, subordinando-se às regras comuns da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Dec.-Lei nº 4.657/1942). Assim começam a vigorar após a publicação, respeitada a vacatio legis de 45 dias, se outro prazo não for especificamente estatuído (art. 1º do Dec.-Lei nº 4.657). Não sendo temporária (casos em que o prazo de vigência consta da própria lei), os diplomas legais de natureza processual sujeitam-se ao disposto no art. 2º da Lei de Introdução, conservando-se em vigor, até que outra lei a modifique ou revogue. Não há, pois, perda de vigência por desuso ou em razão de costume. Só outra lei pode revogar ou modificar a anterior. Há quem afirme o caráter retroativo das leis de processo, tendo em vista sua incidência imediata, inclusive sobre os processos em curso. Como explica AMARAL SANTOS, “encarregou-se a doutrina contemporânea de demonstrar o engano em que incide esta afirmação”4. Na verdade, a lei que se aplica em questões processuais é a que vigora no momento da prática do ato formal, e não a do tempo em que o ato material se deu. Também a lei processual respeita o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (Constituição Federal, art. 5º, inc. XXXVI, e Lei de Introdução, art. 6º). E mesmo quando a lei nova atinge um processo em andamento, nenhum efeito tem sobre os fatos ou atos ocorridos sob o império da lei revogada. Alcança o processo no estado em que se achava no momento de sua entrada em vigor, mas respeita os efeitos dos atos já praticados, que continuam regulados pela lei do tempo em

que foram consumados5. Se, por exemplo, a lei nova não mais considera título executivo um determinado documento particular, mas se a execução já havia sido proposta ao tempo da lei anterior, a execução forçada terá prosseguimento normal sob o império ainda da norma revogada. Em suma: as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos6. Tempus regit actum. Deve-se, pois, distinguir, para aplicação da lei processual nova, quanto aos processos: 1)

exauridos: nenhuma influência sofrem;

2)

pendentes: são atingidos, mas ficando respeitado o efeito dos atos já praticados;

3)

futuros: seguem totalmente a lei nova7.

É exatamente esse o regime de direito intertemporal que se deve aplicar aos mandados de segurança em curso na data em que ocorreu a substituição da Lei nº 1.533/1951 pela Lei nº 12.016/2009. Enfocando diretamente o problema da entrada em vigor da atual Lei do Mandado de Segurança, CÁSSIO SCARPINELLA BUENO8 o equacionou, com precisão, nos seguintes termos: a)

“todos os atos processuais praticados antes da entrada [em vigor] da nova lei devem ser respeitados, e seus efeitos não poderão ser desfeitos”;

b)

“todos os atos processuais ainda não praticados sob a égide da lei ‘velha’ serão praticados com total observância da lei nova”;

c)

“a entrada em vigor da lei nova, quando está em curso a prática de atos processuais, deve respeitar os efeitos já consumados, sendo sua aplicação de rigor para disciplinar os novos efeitos que ainda se esperam. A lei nova, por assim dizer, captura e passa reger tudo aquilo que não contradiz, que não anula, que não elimina a lógica, os efeitos e os próprios atos anteriores”.

Um exemplo bastante ilustrativo de direito adquirido processual, de grande interesse prático, e que não pode ser afetado pela lei nova, é o pertinente ao recurso, cuja aquisição pela parte vencida se dá quando é publicada a decisão a impugnar, não podendo sua admissão ser negada com base na lei superveniente9.

176. LEIS REVOGADAS O art. 29 da Lei nº 12.016/2009, evitando a antiga praxe de declarar, genericamente, a revogação das “disposições em contrário”, respeitou a técnica legislativa preconizada pela Lei Complementar nº 95/1988, e elencou, um a um, os textos legais revogados pelo advento da nova Lei

do Mandado de Segurança10. A revogação operada por força do aludido art. 29 compreendeu: a)

a Lei nº 1.533/1951, que regulamentava, com amplitude, o mandado de segurança até o advento da Lei nº 12.016/2009, e que a substituiu por inteiro;

b)

a Lei nº 4.166/1962; o art. 3º da Lei nº 6.041/1973; o art. 1º da Lei nº 6.071/1974; o art. 12 da Lei nº 6.978/1982; o art. 2º da Lei nº 9.259/1996; todas estas normas alteraram, a seu tempo, dispositivos da Lei nº 1.533/1951;

c)

a Lei nº 4.348/1964, que continha normas processuais relativas ao mandado de segurança, disciplinando o prazo para a apresentação das informações pela autoridade coatora, a perempção ou caducidade da medida liminar; a suspensão da segurança e a restrição às medidas liminares: todas essas matérias foram devidamente abrangidas pelo novo texto da Lei nº 12.016/200911; d) a Lei nº 5.021/1966, que dispunha sobre “o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público civil”: disciplinava a matéria relativa ao “procedimento de pagamento das verbas devidas em razão de concessão em sede de mandado de segurança, a partir da impetração”, tema agora “regulado pelo art. 14, § 4º”, da atual Lei do Mandado de Segurança12.

CÁSSIO SCARPINELLA BUENO registra que a Lei nº 4.348/1964, em seu art. 3º, cuidava da remessa de cópias da impetração aos órgãos administrativos e ao representante judicial da pessoa jurídica interessada, matéria que, hoje, se acha disciplinada de forma diversa pelo art. 9º da Lei nº 12.016. Daí entender, corretamente, que o referido dispositivo da Lei nº 4.348, embora não mencionado no art. 29 da atual Lei do Mandado de Segurança, se acha implicitamente revogado, nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga “Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro” – Dec.-Lei nº 4.657/1942)13. Adverte CARREIRA ALVIM, por outro lado, que as Leis nºs 8.437/1992 e 9.494/1997, que cuidam de medidas cautelares e tutela antecipada contra o Poder Público, não foram revogadas pelo art. 29 da Lei nº 12.016/2009, podendo ser aplicadas ao mandado de segurança, “no que não forem incompatíveis com as novas disposições”14.

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CÁSSIO SCARPINELLA BUENO considera louvável a iniciativa do legislador federal, manifestada no art. 27 da Lei nº 12.016/2009, destacando, contudo, que “os regimentos internos dos tribunais, inclusive o do Supremo Tribunal Federal, não podem inovar no cenário jurídico a respeito do assunto. O que elas podem fazer é, do ponto de vista da estruturação orgânica e interna

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3 4

5 6 7

8 9

dos tribunais, criar condições para a eficiente tramitação dos processos de mandado de segurança” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., nº 72, p. 155). Lembra MIRNA CIANCI, por exemplo, a conveniência de se proceder à adaptação dos antigos regimentos a novas diretrizes da Lei nº 12.016, em temas como o da utilização dos meios eletrônicos (CIANCI, Mirna et al. Mandado de segurança, cit., p. 515). CIANCI, Mirna. Mandado de segurança, cit., p. 514. Não basta, todavia, para cumprir os desígnios da Lei nº 12.016, relativamente à eficiência e presteza da tutela por meio da ação de mandado de segurança, que as normas regimentais e de organização judiciária sejam formalmente adaptadas ao modelo constitucional de processo. Na advertência de CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, para a superação dos muitos problemas que afligem o dia a dia do foro, o esforço deve ir muito além das inovações normativas: “Deve haver vontade política em municiar nossos tribunais e os nossos juízos de primeira instância com tecnologia, com aparelhos, com pessoal suficiente para que se dê aplicação escorreita à lei e, mais amplamente, à vontade constitucional (em) termos de eficiência processual, realizando-se, consequentemente, o comando do art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal” (BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., nº 72, p. 156). CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 396. AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 1971, v. I, n. 23, p. 51. COSTA, Sergio. Manuale di diritto processuale civile. 4. ed. Torino: UTET, 1973, n. 3, p. 4. AMARAL SANTOS, Moacyr. Op. cit., v. I, n. 24, p. 51. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 59. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, v. I, nº 26, p. 38-39. Sobre conflito intertemporal de leis processuais, deve-se consultar a excelente monografia O Novo Direito Processual Civil e os Feitos Pendentes, do Prof. Galeno Lacerda (Edição Forense, 1974). BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., nº 73, p. 159. “1º – A recorribilidade regula-se pela lei da data da sentença. ‘Os recursos não podem ser definidos senão pela lei em vigor no dia do julgamento.’ (ROUBIER, Paul. Les Conflits de Lois dans le Temps, Paris: Recueil Sirey, 1929, v. II, p. 728; CASTRO, Amílcar de. Ċomentários ao Código de Processo Civil (de 1939). 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1963, v. X, n. 593; STJ, REsp. 6.187/SP, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 04.06.91, in RF 320/79; STJ, CComp. 1.133/RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 11.03.92, in LEX JSTJ 39/22; STJ, 2ª T., REsp. nº 1.205.159/ES, Rel. Min. Castro Meira, ac. 15.02.2011, DJe 28.02.2011). Mais precisamente pela lei da data da publicação do julgado, já que é pela publicação que o decisório se integra ao processo e se torna suscetível de impugnação por recurso. Duas consequências do princípio: a) se a lei nova concedeu recurso que não cabia no Código revogado, a decisão permanece irrecorrível; b) se houve no Código novo supressão de recurso admissível pelo sistema revogado, continua interponível o recurso, desde, é claro, que o prazo para impugnação não tenha se esgotado antes da vigência da nova lei” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Ċomentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. V, n. 150-151); THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 51. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, v. III, nº 863-864, p. 1.240-1.243.

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O art. 9º da Lei Complementar nº 95, de 26.02.1988, dispõe: “A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis e disposições revogadas”. CIANCI, Mirna. Mandado de segurança, cit., p. 527. Idem, ibidem. BUENO, Cássio Scarpinella. A nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 161. CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança, cit., p. 399.

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