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Portuguese Pages 200 [201] Year 1999
Introdução ao
DESENHO URBANO no Processo de Planejamento
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Vicente dei Rio
Projeto cultural
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BRAS51NTER 5.4. INDUSTRIA
E COMERCIO
Parte I Origens e definição do desenho urbano Capitulo 1 Os anos 60: contexto para mudanças disciplinares Capitulo 2 Planejamento urbano x arquitetura: desenho urbano? Capitulo 3 Por uma definição de desenho urbano
Parte 11 O processo e as metodologias Capitulo 4 Processo de planejamento e desenho urbano Capitulo 5 Uma proposta metodológica • Morfologia urbana • Análise visual • Percepção do meio ambiente • Comportamento ambiental Capitulo 6 Implementando o desenho urbano Capitulo 7 Agora. um caminho aberto Anexo 1 Urbanização. estruturação e crescimento de favela. Desenho urbano na favela da Maré. Rio de Janeiro Anexo 2 Desenho urbano e revitalização no bairro de Felis Point. Baltimore. EUA Anexo 3 Os projetos de estruturação urbana no processo de planejamento: experiências recentes no Rio de Janeiro Bibliografia Bibliografia comentada
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no Processo de Planejamento Vicente dei Rio
BRAS51NTER 5.4. INDÚSTRIA
E COMERCIO
Dedico este trabalho à memória de meu pai, Edgard Forte presença da sua austJncia Carl Ruskin e Sérgio Lordello Amigos e urbanistas que também se foram cedo demais
"Na esperança de que nossa potencialidade criativa transforme a vida urbana e seu espaço em fontes de prazer e liberdade"
no Processo de Planejamento
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Vicente dei Rio
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BRAS51NTER 5.4. INDÚSTRIA
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COMERCIO
INTRODUÇÃO AO DESENHO URBANO NO PROCESSO DE PLANEJAMENTO ©COPYRIGTH EDITORA PINI LTOA. Todos os direitos de reprodução ou tradução reservados pela Editora Pini Ltda. Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Dei Rio, Vicente, 1955Introdução ao desenho urbano no processo de planejamento / Vicente dei Rio. - São Paulo: Pini, 1990. Bibliografia. ISBN 85-7266-031-3
CDD-711 -711.4
1. 2. 3. 4.
Cidade: Urbanismo 711.4 Desenho Urbano: Urbanismo 711 Planejamento urbano 711.4 Urbanismo 711
Edição de texto: Mariza Passos Produção gráfica: Carlos Mazetti Paste-up: Carlos Gomes Capa: Concepção - Vicente dei Rio; ilustração Secretaria editorial: Márcia Melkan
Jorge Baptista
Editora Pini Ltda. Rua Anhaia. 964 - CEP O1130-900 São Paulo SP Fone: 011 3352-6400- Fax 011 3224-0314 ' Internet: www.piniweb.com - E-mail: [email protected] lU edição
6" tiragem: 1.000 exemplares, nov/2001 7" tiragem: 1.000 exemplares, fev/2003 8" tiragem: 1.000 exemplares, mai/2004
Apresentação
décadas e, na Europa, há uns 20 anos. Vicente dei Rio enfatiza que o desenho urbano não é só uma temática visual, preocupada com a forma tridimensional da Cidade, mas que eXistem outros fatores significativos, que incluem também a compreensão dos aspectos relacionados ao desenvolvimento imobiliário.
"Introdução ao Desenho Urbano" é um livro altamente significativo. Vicente dei Rio é um dos teóricos urbanos de ponta no Brasil e sua pesquisa em desenho urbano começou a cobrir o abismo entre o planejamento urbano e o projeto de arquitetura. Talvez seja por ironia que uma das maiores conquistas do Século XX no campo urbano, a construção de Brasília, tenha ocorrido em um momento em que o desenho urbano como uma profissão ainda não era reconhecido em nenhum país. O projeto da capital deveria ter servido como início de um processo de desenvolvimento do conhecimento no campo do desenho urbano no Brasil, o que infelizmente não se verificou em sua plenitude. Dentre as diversas razões, várias inclusive abordadas neste trabalho, creio que as mais fortes tenham sido as limitações impostas por um país em desenvolvimento, de rápida urbanização e esparsos recursos. A "outra face" de Brasília, as favelas, apontariam no final dos anos 60 e nos 70 como a maior temática para o desenho urbano. Nesta questão, Vicente deI Rio desenvolveu pesquisa pioneira, em seu trabalho de Mestrado em Oxford alguns anos atrás, com um enfoque morfológico de desenho urbano para melhorias nas favelas e~~~~oo~OO~~M~~~~OO~ de Janeiro. A partir daí, seu trabalho na Universidade Federal do Rio de Janeiro tem sido reconhecido internacionalmente. Este livro reconhece a cnse na Arquitetura Moderna e o criticlsmo geral que o planejamento urbano tem atraído não apenas da mídia como do público em geral. Enfatizar a importância da participação comunitária no processo de planejamento nunca será demais e o autor mostra as diferenças entre as abordagens acadêmica e pragmática nesta questão.
O enfoque acadêmico no desenho urbano começou nos EUA, com as admiráveis pesquisas de Kevin Lynch há mais de três * - Co-autor
A questão principal abordada neste trabalho é a dificuldade de concordância sobre uma definição precisa do real signifl:cado do desenho urbano. Muitos autores nos EUA, Europa e América Latina propõem definições que, às vezes, se opõem mas o autor atesta-a com um quadro mais compreensível e global. São discutidos o processo e várias metodologias, como as diretrizes de desenho urbano, avaliações de performance, zoneamentos de incentivos, entre outros. Entretanto, o aspecto mais importante deste trabalho consiste nas metodologias que embasarão as propostas, e aqui o autor sugere sua própria abordagem metodológica cobrindo a análise Visual, percepção ambiental, estudos compo,rtamentals, além das interpretações morfológicas. E apenas através de tão profundas investigações que estratégias racionais de ocupação territorial podem ser propostas de uma maneira lógica; aqui incluindo-se as estruturas espaciais, os sistemas de movimento, as atividades suporte e até a controvertida legislação de incentivos. As imensas dificuldades enfrentadas pelas grandes áreas metropolitanas brasileiras, resultantes de seu crescimento explosivo na última metade do Século XX só podem ser resolvidas a partir de uma atitude para com o planejamento urbano diversa da prevalente até hoje. Para tanto, Vicente dei Rio começou a nos proporcionar chaves importantes e é por ISto que este livro deve ser particularmente visto como uma obra de referência definitiva.
de "Concepts
of Urban Design" (Academy Editions, Londres, 1984).
- Ex-Diretor da Faculdade de Arquitetura, Universidade de Sheffield, Inglaterra. - Professor e Diretor do Centro para Desenho Urbano, Universidade de Cincinnati, EUA.
Apresentação
Importa afirmar aqui que a agradável e compensatória leitura deste livro nos remete à conclusão de que este extraordinário trabalho intelectual consagra seu autor, Vicente dei Rio, como um dos mais destacados pensadores na área do Desenho Urbano, no Brasil. Constitui a mais gratificante revisitação dos mestres que empolgaram as três últimas décadas em busca de um melhor entendimento da cidade como o lugar das coisas da vida humana. Nada melhor do que fruir o caminho proposto, através do diálogo dos mestres, na catarse que leva à fundamentação das Idéias de Vicente dei Rio, relativamente à definição desse campo disciplinar, sua metodologia e sua implementação. Por pura homenagem a todas essas cabeças, bússolas inexoráveis de todas as crises, citamos muitas delas. Nos anos 60: Kevin Lynch, Jane Jacobs, Gordon Cullen, Bernard Rodowsky, Paul Davidoff, Fraçoise Choay, Christopher Alexander, Robert Venturi, Aldo Rossi, Herbert Gans, Edmund Bacon e Amos Rapoport. Nos anos 70: Robert Goodman, John Turner, Manuel Castel/s, Charles Jencks, Christian Norberg Schulz, E. F Schumacher, Peter Blake, Rob Krier, Leon Krier e Colin Rowe. E, nos anos 80: Kenneth Frampton, Jonathan Barnett, Donald Appleyard, Allan Jacobs e David Gosling. Além destes, não poderíamos deixar de mencionar os demais autores brasileiros citados por Vicente dei Rio ao configurar um quadro completo de trabalho, através de suas teorias, práticas e contribuições ao campo das disciplinas do Desenho Urbano. Vicente dei Rio procura o seu próprio lugar neste contexto. E quando afirma que "o Desenho Urbano é o campo disciplinar que trata a dimensão físico-ambiental da cidade, enquanto conjunto de sistemas físico-espaciais e sistemas de atividades que interagem com a população, através de suas vivências, percepções e ações cotidianas", nos damos conta de que tal definição pressupõe uma longa experiência teórica e prática, e uma obsessiva vontade e competência na pesquisa, como este livro, um livro aberto, aberto ao debate. Seu tema central é a sl!peração do "gap" entre Planejamento Urbano e Arquitetura, onde se deve situar o Desenho Urbano, porém, sem sucumbir à distorção de se procurar, com isso,
onde termina o primeiro e onde começa o segundo. O que importa é que "o Desenho Urbano deve ser encarado como uma atividade de Planejamento, cujos objetivos se reportam à qualidade físico-ambiental das cidades". Por isso, Vicente dei Rio trata de bem localizar o campo de atuação acadêmica e profissional do Desenho Urbano e seu consequente papel no processo de controle do desenvolvimento.
Daí a importância do livro, que trata das Metodologlas Possíveis, convocando a esfera acadêmica a bem organizar suas disciplinas e cursos, onde a qualidade físico-espaClal das cidades reivindica a qualidade do ensino e a excelência universitána. É que o corpo teórico do Desenho Urbano necessita constantemente de alimentar-se, através de um centro de produção de conhecimento, caminho seguro para o prestígio de qualquer atividade profissional. Por outro lado, as políticas, os planos, projetos e programas que caracterizam sua implementação são examinados aqUi; à luz das estruturas institucionais, e daquilo que já se conseguiu implantar no Brasil, ao nível da legislação e da prática profissional. É oportuno, pois, ressaltar que a nova Constituição Brasileira (7988) dedica, pela primeira vez, dois capítulos às políticas urbana e de meio ambiente. Trata-se de uma nova etapa para o Desenho Urbano no Brasil E o desafio maiór vincula-se aos conceitos básicos que informam nossa Constituição, como cidadania, participação da comunidade, sentido social da propriedade e tantos outros.
Finalmente, se Charles Jencks e Robert Goodman tiveram razão ao denunciar - o primeiro, a morte da Arquitetura Moderna, simbolizada na implosão do conjunto residencial Pruitt Igoe, em Saint Louis, 7972, obra do arquiteto Minoru Yamasakl;' e o segundo, o cansaço do planejamento urbano, através de seu livro "After the Planners, What?" (7977)é tempo de concluir-se que vivemos um período de busca de novos caminhos. Este livro constitui um deles, como contnbuição definitiva ao Desenho Urbano no Brasil.
Prefácio
Plantar uma árvore, fazer um filho e escrever um livro. Descobri que o mais difícil dos ideais do Homem é, sem querer minimizar a importância da procriaçâo, parir um livro ... e isto também implica em publicá-Io, uma tarefa quase tão árdua nos dias de hoje, e ficar torcendo para que alcance o público leitor. Mas, sem dúvida, o processo de um escritor que se pretende técnico é longo e doloroso; dói conseguir definir toda a temática a ser abordada, dói ter de se Impor limites a todo o momento, dói saber que o resultado fica muito aquém das potencialidades e, sem pretensões, da perfeição. Neste trabalho trato do Desenho Urbano, suas origens e definições, teonas e metodologlas básicas, papel e possibilidades no processo de planejamento das cidades. Acima de tudo é um texto com objetivos acadêmicos, . voltado para os profissionais de arquitetura e urbanismo, principalmente os estudantes, tão carentes de livros-texto para pesqUisa. Acredito que esta temática se faz necessána, por dois motivos principaiS, no momento que o pais atravessa.
Primeiro, porque em nosso pais já se tornou uma regra (que como toda regra possui algumas poucas exceções) a condição de caos ambiental em que vivem as nossas cidades. Como se o subproduto do progresso, tão positivistamente transformado em moto nacionalista, implicasse necessanamente em um despreparo e desprezo quase total das estruturas urbanas para o cotidiano. Minha cidade, que nos "bons" tempos foi a cantada cidade maravilhosa, há muito deixou de sê-Io e tão bem representa esta situação, repetida em maior ou menor escala por todo o país. Se a construção do Maracanã (o "maior estádio do
mundo") não contemplou preVisão de estacionamentos, se casas são substituídas por espigões Ignorando-se os Impactos nas estruturas, se o desenvolvimento põe em nsco as atrações turísticas e até os nossos próprios valores culturais, se nosso cotidiano é incomodado pela poluição visual ou por calçadas e áreas públicas tratadas como terra-de-mnguém, se a nova iluminação da pr3la e o novo gradeamento dos postos de salvamento em Copacabana estão mais para penitenciána, ou se o simples andar é agora uma tortura a evitar, há "algo no ar além dos aviões de carreira". Evidentemente, em pnmeira instânCia estão os motivos estruturais, gerados a partir de uma complexa situação política e econômica, mas os reflexos físico-ambientais que nós, cidadãos, sentimos em nosso dla-a-dia, representados pelos conflitos simples acima, demonstram que também eXiste muito despreparo e incompetência do poder público e de nossa própria profissãO. Em segundo lugar, porque vivemos um período de rede finições na vida do país, prinCipalmente no campo da política e da partiCipação cidadã, que já têm se rebatido nos planos e papéis acadêmicos e profissionaiS. Uma destas implicações é que o Desenho Urbano vem sendo tratado como uma nova moda anglo-saxã, como já o foi a expressão Planejamento Urbano. Se, por um lado, ISto pode ser positivo no sentido da popularizaçâo de seus conteúdos, potenciais e objetivos, por outro pode ter consequênclas negativas, pOIS muitos se utilizam da expressão para mascarar práticas de "arquitetura grande" ou como substituto do atualmente impopular Planejamento Urbano. EXiste, também, o problema gerado pelas conotações que "desenho" possui popularmente, tão mais limitadas que o Inglês "deslgn ", de onde se originou a expressão. Nesta problemática cabe destacar a penetração e a im-
portância alcançadas pelos resultados do I e li seminários de Desenho Urbano, realizados em 7984 e 7986 pela Universidade de Brasília. Respondendo a estes dois apelos, neste trabalho tento demonstrar minha certeza do Desenho Urbano como um campo disciplinar que se expressa como especialização profissional, assumindo entre nós, arquitetos, um lugar especial. É um campo típico para nossa atuação pois trata a qualidade da dimensão físico-ambiental das cidades, talvez o objetivo maior de nossa profissão. Apesar disto, não acho que deva ser campo exclusivo dos arquitetos pois nele utilizam-se dimensões de análise e de atuação antes especificas de outras disciplinas, como as Ciências Sociais (Teorias da Percepção e do Comportamento, por exemplo) ou a Geografia (estudos de Modologia Urbana, por exemplo), entre outras. O Desenho Urbano deve incluir profissionais de outras áreas; a complexidade do fato urbano eVidentemente faz com que sua análise e administração sejam necessanamente multidlsclplinar Aliás, como já observava Kevin L YNCH há anos, nós, arquitetos, sabemos muito pouco da vivêncla dos ambientes que nós próprios projetamos, principalmente os de escala urbana. Entendemos a prática do Desenho Urbano como processo gerenclador e conformador do ambiente urbano, como veremos, e ficamos longe de indicar modelos "certos" e paradigmas, algo sempre buscado pelas expectativas de nossa cultura arquitetõnica. Ao contrário, o que são mostrados são caminhos para se gerar o processo, caminhos de análise e caminhos de prática. Portanto, o escopo que defini/TIos para este trabalho, tratando possibilidades e metodologlas ao Desenho Urbano, acabou gerando pretensões bastante amplas. Inúmeras fontes foram consultadas e o leitor poderá faCilmente fazer uso das referências bibliográficas para maior desenvolvimento de seus estudos e projetos. Evidentemente, não se pretendeu esgotar o tema (que, aliás por definição, é aberto a constantes reavaliações) mas abnr possibilidades e definir campos de pesqUisa.
O livro está organizado em duas partes pnncipals. Na Primeira Parte, a ilustração de abertura mostra o magnífico manejamento urbanístico da Praça de São Pedro, por BERNINI, em meados do século 77, representando o Início de uma conscientização da importância da qualidade físico-espaclal nas
cidades. Nesta parte são tratadas as origens e definições possíveis do Desenho Urbano, sempre entendido em um contexto histórico e como integrante do processo de Planejamento Urbano. Veremos como e porquê surgiu o campo disciplinar a partir de todo um contexto crítico propício nos anos 60, quals as suas características básicas para tentar formar um corpo conceitual coerente em torno a uma definição de Desenho Urbano que responda ao contexto brasileiro. A ilustração de abertura da Segunda Parte do livro, o conjunto de King Circus e Roval Crescent em Bath, projetos de John WOOD pai e filho em meados do século 78, constitui-se das primeiras atividades imobiliánas como as conhecemos e representa a importância do designer lograr unir dimensões às vezes conflitantes na produção da cidade. Nesta parte discutimos o papel do Desenho Urbano no processo de Planejamento e propomos um enfoque metodológico possível de investigação/atuação em nosso contexto. Este enfoque parte de quatro categonas complementares às que o próprio Planejamento Urbano nos legou; são discutidos os conceitos e metodologias básicos das categorias de "modologia urbana ", "análise visual", "percepção ambiental" e "comportamento ambiental". A Morfologia Urbana é uma categoria com origens na geografi8 e desenvolvimento com base pnnclpal na Itáli8 e França. Mostramos como os trabalhos de sITTE, A YMONINO, ROsSI, DE ARCE, PANERAI, CAsTEX e dos irmãos KRIER, para citar apenas alguns, foram Instrumentais para o desenvolvimento de seus conceitos e metodologlas de analisar a forma urbana como lógica evolutiva das forças SOCiaiS. Veremos como esta categoria nos mostra diversas temáticas extremamente válidas para o estudo da cidade como um conjunto coerente de elementos, CUja existênCia, papel estrutural e Inter-relações são razões importantes na qualidade das formas urbanas. O trabalho de Gordon CULLEN serve de base prinCipal para a categona de Análise Visual e sua identificação de qualidades VisuaiS da paisagem urbana, profundamente enraizadas na experiênCia topo lógica do observador em movimento. São destacadas qualidades como complexidade e diversidade de "inputs" perceptivos nos percursos em trabalhos de gente como RAPOPORT e LOZANO Comentados também os estudos de "gestalt" urbana, representados por TRlEB e KOHLsDORF, assim como as possibilidades de aplicação da sem/ótica a níveis arquitetõnico e urbano por autores como BARTHEs, JENCKs e VENTUR/.
A Percepção Urbana, oriunda da psicologia, trata da nossa experiência urbana como atividade perceptiva e do processo de cognição como um momento vital para a compreensão e retenção das imagens estruturadoras desta experiência. Sendo um dos campos de estudo mais profícuos para o Desenho 'Urbano, comentamos o trabalho pioneiro de Kevin L YNCH, fundamentado em PIAGET e GIBSON. assim como de outros pesquisadores importantes como APPLEYARD, BAIU Y, GOODEY, CANTER e LEE. Aqui também falamos sobre a análise mais fenomenológica do espaço desenvolvida por gente como NORBERG-SCHUL TZ e TUAN. A quarta e última categona indicada, a chamada Comportamento Ambiental, também origina-se na psicologiB, mas no chamado "behaviorismo", ou comportamental/smo. Neste caso, parte-se do princípio que o meio ambiente construído influenCia as nossas atitudes, ações e decisões, sendo seu estudo, portanto, extremamente importante para a promoção de níveis adequados de satisfação da população em seu cotidiano. Importantes trabalhos são comentados, como os dos pioneiros SKINNER, SOMMER e HAU, e os de seus seguidores como LANG, APPLEYARD, ZEISEL, GEHL e PFEIFFER. Em seguida, são discutidas algumas temáticas de Desenho Urbano para sua implementação se tonal no processo de Planejamento, e para sua adoção como defil71doras de critérios de qualidade urbana a se perseguir nos planos e programas. Para tanto, discutimos alguns instrumentos de implementação ainda pouco conhecidos em nosso país, mas com grande potencial, como o "zoneamento de incentivos ': os "pacotes de desenho", e o "solo cnado". Finalmente, traçamos breves comentános sobre os caminhos mais eVidentes para o cuidado com a qualidade físico-ambiental urbana e futuras investigações e desenvolvimento do campo.
Em anexo, os três estudos de caso apresentados, em que tive participação direta, nos aUXiliam na avaliBção das discussões conceituals e metodológicas anteriores e de sua aplicabilidade. Primeiro, comentqmos um caso de intervenção na Favela da Maré, Rio, discutindo conceitos é a elaboração de uma proposta para a urbanização do assentamento e construção de novas áreas habitacionals conjugadas, alternativa à do BNH. O segundo estudo trata de proposta adotada e em implantação para a revitalização de área nbeirinha em bairro histórico de Baltimore, EUA. Finalmente, discutimos os chamados Projetos de Estruturação Urbana da prefeitura do Rio de Janeiro, sua assumida atuação em Desenho Urbano, a nível de suas características, possibilidades e limitações.
Além de uma completa bibliografia, fazemos breves comentários específicos sobre alguns títulos que indico como básicos para o aprofundamento dos conhecimentos neste campo disciplinar. Sempre que possível, indicamos edições brasileiras e aquelas de fácil acesso ao leitor. As discussões teóricas. conceitos e métodos discutidos no livro são permeados por exemplos concretos e ilustrados da melhor maneira possível. Embora sejam feitas referências à produção brasileira, principalmente a teórica, ao longo do texto, permiti-me não incluir no escopo deste trabalho uma avaliação completa das experiências c!assificáveis no campo do Desenho Urbano no Brasil. Este não era nosso objetivo e para esta tarefa pretendo estar instrumentalizando o leitor. Numa época em que estamos cada vez mais conscientes dos baixos níveiS de qualidade de vida das grandes Cidades e, com certeza, da baixa qualidade físico-ambiental que invade nosso cotidiBno, o Desenho Urbano sem dúvida possui importante papel a cumprir. Espero que esta publicação colabore no sentido de melhor definir como podemos responder a este desafio.
Este trabalho se originou de uma tese, elaborada em 7989, para inscrição 'em concurso de professor titular em planejamento urbano na FAU/UFRJ. Por se tratar de cadeira em curso de Arquitetura, acreditei que seria propício uma monografia sobre o Desenho Urbano e acabei me entusiasmando com o texto resultante; incentivado pelos colegas, decidi reestruturá-Io, preparando-o para ser acessível ao seu principaj público potenciBl. Para o leitor normal, os agradecimentos sempre correm o nsco de ser uma listagem enfadonha e inútil. Para o escntor, é quando fazemos um mínimo de justiça aos tantos que nos incentivam e ajudam, na vida, na profissão e na escrita. A meu pai, a quem dedico este trabalho, e minha mãe tenho a agradecer o amor e o constante incentivo às minhas atividades. A Monica e Adnana, minhas irmãs, ao amor Escorpião da Valéna, a Evelin, Alessandra, Marcio, Glauco, David, Mlhai Paschoal e meus amigos mais chegados, obrigado pelo carinho e paciência com que aguentaram meu emburrado processo de criação. Aos meus alunos Jonathan (obrigado pelas fotos), Marcelo, Christina, Marco, Tarcisio, GUilherme, N/lene, Francl; Claudia, Lu, que representam tantos outros, força maior por trás da academia. .
o incentivo
e a opinião de vários colegas me foram inestimáveis. Agradeço principalmente a Luiz Cartos Toledo, amigo do peito e urbanista, um dos meus iniciadores,' quisera ter consegUido corresponder completamente ao seu interesse por minhas idéias aprimorando este livro. Agradecimentos também são devidos ao apoio sempre presente de meu orientador Prof Dr. Lauro Birkholz (FAUlUSP) e aos comentários dos amigos Milton Feferman (FAUIUFRJ), Humberto Yamaki (DAUlUEU Ana Lucia Nadalutti e Vera Tângari. Agradeço ao Departamento de Planejamento de Arquitetura e à FAUI UFRJ, pelo apoio às minhas pesquisas. Finalmente, agradeço aos arquitetos e professores David Gosllng e Miguel Pereira, por suas gentis palavras de apresentaçâo, ao colega Jorge Baptista Azevedo por emprestar o seu dom de ilustrador, e ao empenho do pessoal da PINI, principalmente ao Mário. Cabe um agradecimento todo especial à BRA SSIN TER, nas pessoas de seu presIdente José Roberto Torres e do assessor de diretona Ary Frederico Torres Neto, pelo apoio cultural a esta publicação.
índice
Capftulo Capftulo Capftulo
1 2 3 -
Os anos 60: contexto para mudanças disciplinares Planejamento urbano x arquitetura: desenho urbano? Por uma definição de desenho urbano
Capftulo Capftulo
4 5 -
Processo de planejamento e desenho urbano Uma proposta metodológica
• • • • Capftulo Capftulo
6 7 -
Anexo 1 Anexo 2 Anexo 3 -
Morfologia urbana Análise visual Percepção do meio ambiente Comportamento ambiental Implementando o desenho urbano Agora, um caminho aberto
Urbanização, estruturação e crescimento de favela: Desenho urbano na favela da Maré, Rio de Janeiro Desenho urbano e revitalização no bairro de Fells Point, Baltimore, EUA Os projetos de estruturação urbana no processo de planejamento: experiências recentes no Rio de Janeiro
Bibliografia Bibliografia comentada Créditos das ilustrações
57 67 70 86
92 96 107 117
123 145 157 171 183 195
Parte I
Origens e definição do desenho urbano
Capítulo 1 Os anos 60: contexto para mudanças disciplinares
A década de 60 via surgir as primeiras críticas e protestos generalizados sobre a qualidade do ambiente urbano que vinha sendo produzido, tanto pelo poder público quanto pela iniciativa privada. Criticava-se tanto o impacto dos empreendimentos sobre o meio ambiente e a vida das comunidades, quanto a própria qualidade dos espaços urbanos e da arquitetura. Essas críticas surgiram, principalmente, da população afetada, além de pesquisadores e acadêmicos de ponta e da imprensa em geral. Vamos destacar as cinco questões básicas na origem dos debates e que, no nosso entender, passariam a caracterizar a produção de conhecimento dos anos 60 e 70, como um repensar das formas de como o próprio desenvolvimento vinha ocorrendo até então, num primeiro momento, nos países do chamado Primeiro Mundo. Claro está que este "repensar humanístico" deu-se, podemos dizer, em paralelo e independente ao desenvolvimento normal de campos de conhecimento ditos "científicos", como a própria informática. Isto levaria a novas ideologias, novas posturas e valores, fortalecendo, inclusive, as Ciências Sociais com enfoques mais humanísticos, e outras disciplinas com enfoques mais "pé no chão", como a microeconomia e a educação básica. Até mesmo novas disciplinas e campos de conhecimento viriam a ser abertos, facilitando o aparecimento de novas profissões. Foi a partir destas atitudes críticas, dos novos valores surgidos e da necessidade de novas categorias de análise e de novos instrumentos para o controle do desenvolvimento urbano, que o Desenho Urbano se consolidaria enquanto campo de conhecimento e, para muitos, profissão específica. A seguir, sem a pretensão de esgotar o assunto, destacaremos os fatos e trabalhos mais significativos e influentes
para a consolidação do Desenho Urbano e seu desenvolvimento acadêmico nos diversos centros de pesquisa e cursos de pós-graduação. Organizamos esta discussão em torno das cinco questões básicas na origem dos debates sobre a qualidade do meio ambiente.
Foi nos anos 60 que, pela primeira vez, intensas e violentas ondas de protesto enfrentavam as intervenções urbanísticas e os programas de renovação urbana das grandes cidades (fig. 1). Essas políticas públicas haviam sido iniciadas, ou tomado corpo, a partir da 1I Grande Guerra Mundial e visavam a reposição completa de grandes áreas do tecido urbano consolidado, principalmente aquelas dos antigos centros que, se não haviam sido bombardeados, eram considerados "deteriorados" ou em decadência.
Em muitos casos, aqueles de áreas grandemente afetadas pela guerra, como nas cidades de Coventry (Inglaterra). Rotterdam (Holanda) e Berlin (Alemanha). para citar apenas os casos mais famosos, esta atitude se justificava face à escala da destruição. Os novos planos e projetos seriam sempre desenvolvidos segundo os novos paradigmas e preceitos dos Congressos de Arquitetura Moderna e da Carta de Atenas.
É muito demonstrativa
a observação do famoso urbanista britânico Sir Percy JOHNSON-MARSHALL, responsável por inúmeros esforços de reconstrução e um dos mais famosos urbanistas na Grã-Bretanha, quanto à área de entorno da histórica Catedral Saint Paul, em Londres. A área havia sofrido intenso bombardeio e, segundo o urbanista, " .. apesar da devastação, se mantiveram de pé um número suficiente de edificações como que para criar problemas na hora de reorganizar a estrutura urbana" (JOHNSON-MARSHALL 1986: 124) Para ele, talvez fosse melhor se as bombas tivessem conseguido acabar com tudo para possibilitar o livre exercício do urbanismo modernista (fig. 2). Nos países do Primeiro Mundo, principalmente nos EUA, este tipo de ideologia e de modo de atuação se aplicaria às políticas públicas para com as áreas centrais, tanto habitacionais quanto comerciais, que se encontrassem em situação de esvaziamento populacional e econõmico. Esvaziamento este que, na maioria das vezes, não era causado pelas características físico-ambientais das áreas mas, de um lado, pelas próprias políticas regionais vigentes e de outro, pelos novos modos de vida e paradigmas buscados pela classe média, insuflados pela sociedade de consumo. Seriam as novas condições "dignas" de moradia ofertadas pelo subúrbio, as cidades-novas onde tudo era "corretamente planejado para nosso conforto", as migrações das grandes empresas para maior eficácia de sua atuação e de sua imagem, a nova forma de comprar dos" shopping-eenters", entre outros fatores (fig. 3). Como consequência, as áreas centrais se deterioraram física, econômica e socialmente; os grupos mais abastados se instalariam em suas novas casas de subúrbiO, o comércio e as atividades culturais perseguiram seu mercado, mudando para os subúrbios, os imóveis das áreas centrais passariam a apresentar alto índice de deterioro e abandono, os grupos menos favorecidos herdariam estas condições e os cortiços e guetos se formariam. Grandes intervenções do Poder Público, ou por ele apoiadas, buscariam adequar estas áreas centrais às novas funções pr conizadas pelos planos diretores e políticas de renovação,
Figura 2 -As linhas modernistas de projeto modelo de renovação nos esforços do pós-guerra; centro multiuso Barbican, Londres, Chamberlain-Powell & Bon, 1954
Figura 3 - O shopping-center regional e novos padrões de ocupação nos subúrbios norte-americanos; incompatibilidade morfológica com o urbano tradicional em Stonestown, San Francisco
de forma a viabilizar os mercados imobiliário e financeiro. Impunham-se CBDs ("Central Business Districts", distritos centrais de negócios). imponentes e grandiosos sistemas viários, espia nadas monumentais, grandes conjuntos habitacionais em periferias mas com condições mais "dignas", shopping-centers etc. (figs. 4 e 5). As cidades eram então vistas como simples problemas de funcionamento, maximização de investimentos e viabilização da reprodução e acumulação do capital. Importantes aspectos seriam ignorados nestes processos, tais como os valores da população e os intensos e lonÇ)os
patrimônio histórico, da integração e inter-relação~oooe •.
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Por seu lado, a corrente Neo-Vernacular também se popularizou, pela mesma razão de fácil consumo de símbolos. só que estes apelando para o "rudimentar" ou o "rústico". Bom exemplo disto é Port Grimaud. proj to d François SPOERRY. um luxuoso complexo de re idências d veraneio na co ta da França mediterrãnea. construído em 1977. que explorou as imagens de vernacular franc's c mo produto "chiqu " de consumo (fig. 15). Um fenõm no de consumo sem Ihant ao que hoje observamos. por x mplo. no litor I Rio-Santos e em Búzios. cidade de praia no Estado do Rio. com uas "casas de pescadores".
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Figura 13 - Uma linguagem mais contextual e expressionista representada pelo projeto para o Centro Regional da Toscana, Florença, de James STlRLlNG e Associados, 1977. Elementos organizados sobre quadrfcula romana e remanescentes do século 1 AC
a concepção original do projeto. em 1974. até a controvertida anulação dos resultados e demolição do pouco que havia sido construido em 1978. inspirou-se profundamente no neoc1assicismo elitizante.
Em segundo lugar. apontamo a importância das pesquisas das transformações urbanas: o r0 ultados fí ico- spaciai de processos de apropriação pela população dos elementos urbanos e arquitetõnicos ao longo dos séculos. como os anfiteatros romanos. Servindo como "estruturas-suporte" para as transformações. são elementos que acabaram transmutados em praças. residências etc .. perfeitamente incorporados ao tecido urbano mas cuja lógica conformadora e estruturas básicas ainda são distinguíveis (fig. 17)
Uma grande alteração nas políticas urbanas e nas profissões ocorrida neste período foi relativa à ampliação da democracia
na gestão urbana e na própria produção arquitetõnica, através da participação das comunidades e dos usuários dos projetos A partir do crescente descontentamento dos habitantes submetidos a ambientes modernistas e dos movimentos de protesto e resistência aos programas de intervenção urbana, fato comentado anteriormente, as populações das grandes
cidades dos países desenvolvidos foram conquistando importantes reivindicações. Assim como nos EUA. as principais cidades européias seriam palco de movimentos sociais semelhantes e suas administrações se veriam pressionadas a inserir maior participação comunitária em seus processos de planejamento e, principalmente, nos programas habitacionais (fig. 18).
! 'I .• Figura 14 - Conjunto residencial de média-renda Les Arcades du Lac; pós-moderno classicista de Ricardo BDFFIL em subúrbio de Paris; final dos anos 70. Sucesso nas classes burguesas com a linguagem simbólica associada ao clássico e seu rígido formalismo
Ao mesmo tempo, verificava-se um forte questionamento da própria noção de progresso e de desenvolvimento. Surgiam os grupos de defesa do meio ambiente, a ecologia se impunha como ciência necessária à própria sobrevivência da nossa espécie. levantava-se a questão de utilizar os recursos não-renovàveis, e a noção de produtividade econômica acabaria por ser contestada pela de produtividade social
(SCHUMACHER 1973, BRASilEIRO 1981) Surgiram, nestn época, estudos e movimentos que advogavam a utilizaçã() de tecnologias mais apropriadas aos contextos da produção, tomados como partes de um todo profundamente inter-relacionado, e de processos alternativos que, em Arquitetur e em Desenho Urbano, maximizassem a utilização dos reculsos disponíveis, da mão-de-obra, e a participação dos próprios
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Figura 15 - Port Grimaud, costa francesa mediterr/Jnea, luxuoso empreendimento de veraneio projetado por François SPOERRY, 1977. Sucesso na reprodução de padrões vernaculares locais; os corretores desafiavam o comprador a tentar achar duas casas iguais!
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Figura 17 (a, b) - A contfnua apropriação de antigas estruturas pela população, como os anfiteatros romanos: foi absorvido pelo tecido e em Lucca sua arena conforma uma praça e sua estrutura incorporou-se às casas
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as pessoas o que importasse". Também foi sintomática a p netração do livro de Richard SENNET (1970), onde defende os "usos da desordem" e a necessidade de contexto urbano d ord nado e diversificado com in trumento de liberação p I lib rd d de ação para H m m. Nos p r d r I ncia dos sistem s Ir dicion i ntaç O polítiCt, r Ila de sustentação omunit ri p r S tivid d do Pod r Público e a provisão dos serviç urbanos (CA I LI 1 72, AUNDERS 1979). Era crescente o distanciam nt d p Iíti os das reais necessidades da população. Os gov rn viram-se, então, obrigados a lidar com a participação popul r nos processos de planejamento, mesmo porque se consci ntizaram que esta seria uma solução mais populista e econômica do que o enfrentamento direto. Evidentemente, esta participação viria tomar várias formas, desde a co-optação até a utilização de mão-de-obra comunitária barata para as obras, não sendo "per se", garantia de influência nos processos de tomada de decisões (GOODEY 1980) (fig 19).
•..··jr Figura 18 - As cidades tornadas palco de movimentos por melhor qualidade ambienta! e as comunidades conquistando mais peso na "balança" polftica
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usuários no seu meio ambiente construído. Evidentemente, pela sua natural importância na reprodução da força de trabalho, as alternativas habitacionais tomaram lugar primordial nestas preocupações (TURNER & FICHTER 1972, WARD C 1974, HARMS 1982) A sociedade, principalmente através da nova geração e seus movimentos estudantis, buscava novas ideologias alternativas e forma comunitária de vida, como os movimentos "Flower Power" e "Hippie", ou as comunidades "drop out", ao som do rock de protesto ou de baladas romântico-lisérgicas. Bom exemplo desta nova maneira de pensar o desenvolvimento encontra-se no famoso livro de E. F. SCHUMACHER (1973), um "best-seller" até hoje, que se inspirou na obra de Gandhi para tratar de "economia como se fossem
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Não se pode negar. entretanto. que a partir disto os processos de planejamento se tornariam um pouco mais transparentes para a população e mais permeáveis a suas reivindicações: mais em alguns países e cidades do que em outros. Os movimentos de bairro e de grupos de cidadãos com interesses especiais. como os grupos de defesa do meio ambiente. se institucionalizariam e passariam a ser consultados e a ter voz ativa na administração e no desenho das cidades. Na Grã-Bretanha. por exemplo. foi aprovada legislação. em 1965. que tornaria obrigatória a participação popular na elaboração de planos diretores locais. Nos EUA. em 1969. nova legislação federal instituiu a obrigatoriedade de relatórios de impacto ambiental e participação das comunidades onde seriam aplicados os recursos federais. Logo. em 1974. também passaria a exigir-se a participação das comunidades de áreas atingidas por programas federais de urbanização para definição de prioridades de investimentos (fig. 20). Estas novas instâncias políticas e movimentos sociais urbanos levariam as Universidades e os técnicos a uma redefinição de seus papéis no processo de desenvolvimento urbano (SIMMIE 1974). As disciplinas sociais se veriam obrigadas a incorporar a dimensão participativa em seus programas. e a produzir novas metodologias. Surgiram novas atividades profissionais e até mesmo novos cursos superiores. como foi o caso dos cursos de graduação em Planejamento Comunitário ("community planning''), nos EUA. Inúmeros exemplos poderiam ser citados para ilustrar o crescimento da participação popular e sua incorporação à gestão das cidades nos países do Primeiro Mundo. As experiências proliferaram nos anos 70 e foram de enorme influência no desenvolvimento do Desenho Urbano. Em Nova lorque instituiu-se 59 Comissões Comunitárias de Planejamento para participar do processo decisório da gestão sobre alguns serviços urbanos. Em Baltimore. também nos EUA. implantou-se o planejamento comunitário distrital (community district planning). um sistema de planejamento coincidente com os distritos políticos oficiais a nível local. Em Amsterdam. na Holanda. o governo viu-se obrigado a ceder aos protestos. implantando um sistema de repasse de verbas a fim de que as comunidades contratassem seus próprios escritórios de projeto para elaboração de planos locais. pois verificou-se ser muito mais barato do que se o governo procedesse à produção e aprovação do plano frente à participação dos moradores.
Figura 20 - D desenho participativo através da televisão e de telefonemas dos espectadores; projeto de reurbanização em Dayton, Dhio, EUA, coordenado por Charles MDDRE em 1976. Hoje o baixo custo relativo da TVa cabo aumentou o potencial de uso deste veiculo para programas comunitários .
Na Inglaterra. vale mencionar uma experiência participatlva no projeto e implantação de conjunto habitacional que obteria grande sucesso popular. Trata-se de Byker, na cidade de Newcastle. onde o arquiteto Ralph ERSKINE e sua equipe montaram um escritório de campo onde os nove mil moradores podiam participar da decisão de diversos elementos do projeto arquitetônico e urbanístico. num processo que demorou de 1969 até 1982. quando complementou-se a obra final (BERNFELD et ai. 1980. BUCHANAN 1981. TRANCIK 1986 (fig. 21)
Por toda Europa e EUA repetiam-se os casos bem-sucedidos, evidenciando a importância da participaçâo direta. Revelava-se, entretanto, a sua viabilidade relativa pois verificavam-se fortes determinantes na escala do projeto e no próprio contexto sócio-eultural em que se trabalha. A participação legítima revelava-se muito dependente da capacidade organizacional das próprias comunidades participantes do plano ou projeto, como demonstraram vários estudos. Foi também no fim dos anos 60 que teóricos e técnicos começaram a se concientizar da escala do problema habitacional e a importância da autoconstrução, auto-ajuda e mutirão no Terceiro Mundo (fig. 22). Importância esta que se refletia não apenas a níveis psicológico e cultural, e evidente maior satisfação dos usuários com o produto de projeto, mas também a nível econômico. Se, por um lado, o Estado veria possibilidades amplas de maximização de seus investimentos
Figura 21 - Conjunto residencial de Byker, Newcastle, Inglaterra, 1969/1982, arquiteto Ralph ERSKINE. Participação dos futuros moradores em decisões relativas a suas unidades e ao conjunto
Figura 22 - A intensidade do problema habitacional mostrou a importtJncia dos investimentos já feitos pelos moradores e de programas mais participatívos; favela de Jacarezinho, Rio, população oficial 31.405 moradores (1980)
nos programas habitacionais de baixa-renda, por outro as famílias teriam a possibilidade de melhor investir conforme suas próprias capacidades de desembolso a longo prazo, administrando seus próprios gastos a partir da segurança gerada por um título de propriedade de um lote urbanizado ou casaembrião (DEL RIO 1982, WARD 1982). Neste sentido, destacamos o trabalho de HABRAKEN (1962). que apresentava estudos para programas habitacionais com "estruturas-suporte", edificações com interiores e fachadas flexíveis à participação dos moradores, enquanto que alguns elementos seriam fixos, como os núcleos de cozinha e banheiro e o sistema estrutural. Esta alternativa ao alojamento de massa, de concepção racionalizada, tem uma grande penetração acadêmica até hoje (fig. 23). .
Por seu lado Charles ABRAMS (1964). que foi assessor do governo norte-americano em questões de habitação e urbanização para países em desenvolvimento, informava em seus relatórios, publicados em forma de livro posteriormente, da importãncia e viabilidade da autoconstrução, da capacidade de progresso sócio-econâmico da população, dos assentamentos ilegais, e das desvantagens de sua remoção indiscriminada.
Uma extensa experiência junto ao governo do Peru possibilitou que William MANGIN e John TURNER compreendessem amplamente o problema da habitação de baixa-renda nos países do Terceiro Mundo e os levou a publicarem trabalhos importantíssimos para o desenvolvimento da questão. Os trabalhos e a atuação dos profissionais, divulgando seus resultados, vieram a ser instrumentais para as alterações das políticas governamentais e das instituições internacionais de crédito, como o Banco Mundial, no estabelecimento de suas políticas e programas habitacionais (PAYNE 197-6, WARD 1982).
Contestando alguns conceitos aceitos na época, MANGIN (1967) negava que as favelas eram caóticas e desorganizadas, marcadas por "patologias sociais", como o crime, e defendia que se constituíam, na verdade, em solução eficiente dos pobres e dos migrantes para o problema da falta de habitação. Junto com TURNER publicaria alguns artigos em revistas de penetração, sempre sobre suas experiências com as "barriadas" (assentamentos ilegais) de Lima, demonstrando as reais possibilidades da participação popular (MANGIN & TURNER 1968).
Figura 23 - Estruturas-suporte; elementos prefixados e participação dos moradores: processos flexfveis às necessidades e com potencial para interessantes resultados plásticos. Esqueleto de prédio invadido no Rio Comprido, Rio de Janeiro
Porém, foi TURNER o mais influente nesta questão, tanto por seus trabalhos publicados quanto por sua atuação acadê· mica e como ativo consultor internacional (TURNER & FICHTER 1972, TURNER 1976, 1982). Ele defendia o potencial da autoconstrução e dos processos por mutirão se dirigidos e apoiados pelo Estado. A idéia básica seria a institucionalização de processos participativos em habitação, maior auto-
nomia local e o Estado agindo como provedor de condições não-passíveis de serem conquistadas pelas comunidades. como programas de financiamento, transporte coletivo, assistência técnica, acesso à terra etc. (fig. 24) No Brasil destacou-se a atuação pioneira de grupo de arquitetos à frente da CODESCO (Companhia de Desenvolvimento de Comunidades). antigo órgão estadual criado em meados dos anos 60 e que, embora de curta existência, provou a víabilidade de trabalhos participativos de urbanização de favelas. A literatura existente já se dedicou à experiência da favela de Brás de Pina: urbanização participativa de forma progressiva por setores e com resultados físico-espaciais e sócio-econômicos significativos. principalmente se analisados numa perspectiva histórica, embora sofrendo diversas limitações como a não-regularização da propriedade do solo (BLANK 1977 e 1979, SANTOS 1981) Algumas outras experiências recentes brasileiras demonstram a viabilidade da participação comunitária na produção habitacional. a nível de projeto e de construção. como as de Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo. e Favela do Gato. em Niterói. O conjunto Vila Nova Cachoeirinha abrigou. em terreno originalmente ocupado por uma favela com 105 famílias, mais 333 novas famílias que. num processo de participação e ajuda mútua. conseguiram implantar o conjunto em 15 meses, sob coordenação de equipe da prefeitura de São Paulo Apesar de diversos percalços, principalmente a nível institucional, a experiência foi bem-sucedida e encontra-se detalhada em REINACH (1985). Já no caso da Favela do Gato. originalmente um assentamento de pescadores às mar-
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do recente lIVro de LANG (1987). que faz um excelente apanhado geral e desenvolve a noção de uma teoria de arquitetura baseada em estudos comportamentais A aplicabilidade desta categoria de análise pode ser ilustrada com o conhecido plano de circulação viária nas áreas residenciais de São Francisco, coordenado por APPLEYARD nos anos 70 A pesquisa desenvolvida mostrava importantes achados sobre a percepção do espaço da rua e do lar, a territorialidade dos moradores e seu comportamento sob a influência do tráfego veicular, por exemplo, chegando a propor uma série de medidas corretivas para promoção de "ruas de vivência" (Iivable streets), seu conceito básico desenvolvido em livro homônimo (APPLEYARD 1981) (figs, 85 e 86) O estudo das necessidades e comportamentos ambientais verificáveis nas ruas foram também determinantes para a Implantação do importante princípio de "woonerf" na Holanda: ruas residenciais onde, embora os pedestres sejam sagrados e tenham prioridade convivem com o tráfego local que tem sua velocidade controlada através de legislação limitadora de velocidade e dos próprios elementos construtivos, mobiliário e paisagismo (fig 87) Outro pesquisador Importante, o dinamarquês Jan GEHL (1980, 1989). há anos vem estudando os usos dos espaços públicos e seus trabalhos foram vitais para a aprovação e implantação de uma estratégia de pedestrianização progressiva do centro de Copenhage, iniciada em 1962 Como GEH L
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Figura 85 - Os territórios que os entrevistados reconheciam como seu "lar" são inversamente proporcionais à intensidade de tráfego das ruas onde moram; estudo de Donald APPLEYARD, em São Francisco
/Ib' / Figura 86 - Propostas de APPLEYARD para minorar o impacto do tráfego nas ruas residenciais, aumentando suas qualidades ambientais e seus espaços de vivt§ncia
ceram foram os eventos de pequena escala, gerados por pessoas vindas de toda a cidade e que têm algo que dizer, que mostrar, que trocar ou vender; "uma a cada dez pessoas em espaços públicos num dia de verão normal estava diretamente envolvida em alguma atividade direcionada a seus concidadãos, muitas das outras pessoas e atividades estavam em seu entorno ou direcionadas a estas novas atividades urbanas" (GEHL 1989: 15). Ele ainda conclui que os achados da pesquisa provam " .. a co-relação espetacular entre as qualidades físicas de um espaço público e seu volume e caráter de vida". Portanto, estudar o comportamento ambiental conforma a investigação sistemática das inter-relações entre o ambiente e o comportamento humano e suas implicações para o projeto (MOORE 1979, LANG 1987) Segundo MOORE (1977 63) "as questões básicas a serem respondidas são: como as pessoas se relacionam com o meio ambiente construído, quais são suas necessidades, e como aplicar tais respostas no processo de projeto 7". O projeto correto deve responder a três grupos básicos de satisfação do usuário: visual, funcional e comportamental. LERUP (1972). por exemplo, defende que a congruência entre o comportamento e o ambiente construído é um instrumento de medição da qualidade ambiental (fig. 88). Por outro lado, como concluiu um estudo sobre os espaços públicos de Nova lorque, embora acredite-se que as crianças
Figura 87 - Fotos de uma rua em Amsterdam antes e depois da implantação de um "woonerf", áreas residenciais com prioridade para os pedestres
brincam na rua porque não têm local apropriado, a verdade é que muitas crianças gostam mesmo é de brincar na rua (WHYTE 1980: 10). Os seus elementos e seu arranjo espacial sugerem usos e comportamentos extremamente diferenciados e apenas sua análise sistematizada nos fará começar a compreender suas qualidades enquanto locais para o comportamento social. Neste sentido, nunca é demais frisar a importância dos estudos de comportamento para o Desenho Urbano pois, sem usuários, o espaço público é de pouco significado e importância, ao contrário do que entendia a Arquitetura Modernista.
No sentido das interações sociais, PFEIFFER (1980: 35) lembra que" .., tem-se dado pouca atenção à criação consciente de espaço público para a administração da interação social .., ". Além dos sistemas de comunicação não-verbal e de padrões sociais dé comportamento, o "contexto" da interação social seria, segundo este autor, definido pelos arranjos físico, social e interacional Em consonãncia com outros autores, PFEIFFER afirma que o quadro arquitetõnico dos espaços públicos acaba sendo sempre apropriado em espaços intermediários ou zonas que se prestam a diferentes ocorrências; apenas seus limites não são sempre estabelecidos por elementos arquitetõnicos facilmente visíveis. Os grupos de usuários sempre se utilizam de subespaços conforme suas motivações e as características destes subespaços (vide figo 84). Ainda no mesmo trabalho, PFEIFFER descreve um caso interessante de estudo comportamental. Na Alemanha, a autoridade ferroviária vinha registrando muitos usuários queixan· do-se de que as estações de trem "estavam cheias de estrangeiros", o que diminuía seu nível de satisfação com os serviços. Na realidade, o que ocorria era uma diferença comportamental levando a uma percepção distorcida da questão: os estrangeiros concentravam-se em grupos em locais estratégicos junto às passagens! esperando amigos ou apenas orientando·se, enquanto que os alemães seguiam diretamente às plataformas de embarque; os estrangeiros representavam apenas 7 a 12% do total de usuários mas seu comportamento e a estrutura espacial interna das estações geravam percep· ção distorcida e equivocada (fig. 89). Na verdade, os métodos de análise do comportamento podem ser subdivididos em observação direta ou indireta: os que registram o comportamento na hora das próprias ocorrências e aqueles que o fazem depois, identificando pistas das ocorrências (WHYTE 1977). Para a observação direta, alguns procedimentos sistematizados se fazem necessários e ZEISEL (1981) nos fornece valiosa colaboração, que resumimos a seguir. Com razão, ele nos lembra que observar o comportamento ambiental parece algo tão óbvio que pode levar facilmente a distorções e pobreza de dados caso certos cuidados e procedimentos metodológicos não sejam seguidos. Basicamente, temos três temáticas instrumentais a considerar para a definição de nossos estudos, a saber:
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Figura 88 (a, b) - Medindo a qualidade f[sica do ambiente urbano: as dificuldades de duas idosas tentando subir os altos degraus de uma estreita calçada em Guadalajara, México (a); a ameaça do projeto do "orelhão" para o deslocamento de um cego que só localiza a barreira vertical tarde demais (b)
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Nada melhor do que descrever alguns exemplos para fixar estas considerações. O primeiro é o da praça central de Milão, onde se localizam a Catedral e a entrada principal da famosa galeria Vittorio Emmanuelle; também pudemos registrar interessantes eventos comporta mentais através de um dos métodos mais usuais para tanto, fotos em série (time-Iapse photography). Era um domingo ensolarado de inverno e a praça estava sendo intensamente utilizada. Havia dois percursos mais intensos de uso, um oriundo da Galeria, outro das laterais da Catedral. oriundos de um mercado de rua e de pontos de transporte coletivo. Os usuários demonstravam: fuga da projeção de sombra de um prédio alto, arranjos informais inconscientemente obedecendo aos padrões geométricos do calçamento, arranjos semiformais adotando os padrões como "palcos" para espetáculos de rua, grupos e indivíduos sentados em alguns locais dos poucos degraus que definem o espaço de entrada da Catedral etc. (fig.90).
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Figura 89 - A apropriação do ambiente segundo subespaços de usos especfficos e mais controláveis. Diagramas dos estudos de PFEIFFER em uma estação ferroviária alemã e os dois tipos de subespaços apropriados pelos usuários locais (a) e pelos estrangeiros (b)
- os instrumentos de registro: notações. checklists codificados, mapas, fotografias, filmes e vídeos;
pré-
- o que observar: a quem (atores). fazendo o que (ato). com quem (outros participantes significativos). quais as relações entre eles (visuais, auditivas, simbólicas etc.). o contexto e seu arranjo físico. Também podemos adiantar algumas categorias de análise do comportamento para o Desenho Urbano. Uma unidade útil que sugerimos adotar é a chamada "ambiente comportamental" (behavior setting) que BAKER (in MOORE 1979 70) e LANG (1987) nos permitem descrever como sendo uma unidade básica de análise de interações de comportamento ambiental e que possuam as seguintes características:
- aspectos temporais da ocorrência (hora, dia, estação, ritmo, periodicidade, duração etc.) Compreender quais são os "ambientes comportamentais" de um espaço urbano, como são apropriados, quais os comportamentos com que se relacionam e qual sua periodicidade são temáticas básicas. O importante deste conceito é que estes ambientes pressupõem a repetição dos comportamentos: certos arranjos tendem a fazer com que diferentes atores se comportem da mesma forma.
Figura 90 - Respostas ambientais segundo características dos elementos construtivos e as intenções dos usuários; respostas às vezes inconscientes a detalhes como o mosaico da pavimentação. Note-se também como se evita a sombra neste domingo de início de inverno; praça da Catedral de Milão, com saída da galeria Vitório Emanuel
Este tipo de reflexo comportamental no espaço não se limita a países de clima frio, ele pode ser notado em outros contextos. No Rio de Janeiro, por exemplo, desde a antiga Avenida Atlântica repete-se o equívoco de permitir prédios altos na faixa litorânea, cuja sombra projetada na faixa de areia da praia impõe limitações de uso e desconforto aos banhistas (fig. 91).
a Figura 91 (a, b, c) - O impacto negativo da projeção de sombras também se faz sentir no Rio, onde não se aprendeu a lição na orla de Copacabana antes do aterro (a) para evitar o que ocorre agora no Leblon (b, sombra de hotel) e em São Conrado (c), afugentando os banhistas logo antes do meio-dia em um sábado de julho
A adaptação do espaço e de elementos construtivos para determinar "ambientes comportamentais" temporários é outro interessante objeto de pesquisa. Fato, aliás, bastante comum em nossos países de Terceiro Mundo. No Rio pudemos registrar motoristas de táxi utilizando-se de um encaixe adaptado à saia de um poste de luz que apoiava um tabuleiro para seu jogo de dominá ou cartas; esta ocorrência se repetia quase todos os dias na hora do almoço numa esquina do bairro do Jardim Botânico No Alfama, em Lisboa, pudemos registrar a adaptação do ambiente para a feira protegendo as barracas e compradores com plásticos, não do Sol. pois são transparentes, mas da roupa escorrendo nos varais (fig. 92). No c.entro da cidade do México registramos a ocorrência de um interessante "ambiente comportamental", na calçada
em frente da Catedral Metropolitana, em plena área central. Seu longo muro gradeado oferecia apoio para que, durante o horário comercial, inúmeros biscatéliros (artesãos, pedreiros, bombeiros, eletricistas, carregadores, engraxates etc.) oferecessem seus serviços aos transeuntes, an;'mciando-os através de suas ferramentas ao chão e um pequeno letreiro indicativo (fig. 93). Numa calçada intensamente frequentada, definia-se um "palco de ação" e um "ambiente comportamental" específico, que viabilizavam a fácil encomenda dos serviços aos biscateiros. Podemos, então, finalizar sugerindo algumas temáticas para a investigação comportamental do espaço para o Desenho Urbano Estas investigações podem ser instrumentalizadas
através da observação sistematizada, fotografias (sequenciais ou não) ou filmes, entrevistas, questionários, mapeamentos e diagramas de uso, estudo de costumes, entre outros (fig. 94). As temáticas de investigação podem ser classificadas em quatro grupos principais:
Figura 92 (a, b) - No Alfama, Lisboa, utilização de plásticos transparentes como proteção da roupa escorrendo nos varais. No Rio, adaptação de poste com pequeno tabuleiro improvisado para o carteado aos motoristas de táxi na hora do almoço. Desenhos a partir de slides
Figura 93 - Um "palco de ação": a apropriação de toda a murada frontal da Catedral da Cidade do México por autónomos e biscateiros à espera de fregueses e transeuntes
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Figura 94 - Mapa dos percursos principais adotados pelos transeuntes, numa tarde de sexta-feira, na praça de São Miguel Paulista, São Paulo; estudo do autor com S. MACIEL e- R. LANA novembro, 1985
Figura 95 (a, b, c, d) - Temáticas para estudo comportamental: as dificuldades de um trajeto revelado em "sequ{}ncias comportamentais" seguindo uma transeunte no Leblon (aI, "palcos de ação", como uso das calçadas como integração das esferas privada/pública no Morro do Pinto, Rio (b), de atividades especificas como "atravessar a rua" (c) ou causadas· pelos ambulantes (d), ambas no centro do Méier
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Capítulo 6 Implementando o desenho urbano
o Desenho Urbano, como já frisamos, faz parte do processo de Planejamento da cidade e, como tal. deve estar embutido em seu corpo regulador. Ele deve vir sob a forma de políticas, planos, projetos e programas. 'Como afirma SHIRVANI (1985. 144/145), as políticas de Desenho Urbano conformam um quadro para a ação, definindo objetivos, meios de implementação e programas de investimentos. O plano, por sua vez, apresenta uma visão físico-ambiental para desenvolvimento integrado das políticas e deve ser mais orientado para um processo do que para um produto formal, pois ignoraria o dinamismo do contexto urbano, que não admite formas permanentes (LYNCH 1981, SHIRVANI 1985) Já os projetos de Desenho Urbano podem ser orientados para uma área ou território específíco, como é o caso dos PEUs já comentado, ou ainda para uma temática específica como "áreas livres", "sinalização", "arborização e mobiliário" ou, ainda, temas ainda mais particulares como "relações nova edificação com contexto existente", "localização de entradas/saídas de garagens" etc. Finalmente, os programas são entendidos como o conjunto de ações intersetoriais necessárias para a implementação das políticas, planos e projetos.
No sentido do tratamento do Desenho Urbano por temáticas específicas, que pode vir a ser um modo prático para facilitar a implementação setorial dos programas, SHIRVANI (1985) propõe uma categorização interessante, na qual nos baseamos a fim de sugerir algumas categorias para atuação; elas também dão margem para definição de critérios de qua/idade setoriais.
aI Uso do Solo: trata basicamente de tipos de funções e intensidade de utilização do solo e das edificações; busca uma variedade e mistura de funções compatíveis entre si e a mais intensa utilização possível 24 horas por dia, com densidades compatíveis, a fim de gerar uma área urbana com a maior vitalidade possível, postura totalmente diversa daquela preconizada pelo Movimento Moderno. bl Configuração Espacial: vai mais além do previsto nos tradicionais "zoneamentos", que além do uso das edificações apenas consideram gabaritos, afastamentos e áreas máximas de construção; compreende também cones de visibilidade, relacionamentos entre volumes edificados e topografia, relacionamentos entre o novo e o conjunto edificado existente, compatibilidades tipológicas, continuidade e inserção na morfologia etc. cl Circulação Viária e Estacionamento: a circulação viária é um dos elementos mais poderosos para a estruturação da imagem urbana (LYNCH1960, APPLEYARD 1981, SHIRVAN I 1985. 26) e, portanto, não pode ser tratada apenas como um sistema de movimento; um dos fatores básicos na democratização da cidade uma vez definidora da acessibilidade (LYNCH 1981); a circulação viária, o transporte público e o estacionamento devem ser entendidos como vitais para a animação e a sobrevivência social e econômica de uma área, em soluções conciliadoras. dI Espaços Livres: desempenham importantes funções no urbano como, por exemplo, social (encontros), cultural (eventos), funcional (circulação) ou higiênica (mental ou física); tão importante como o espaço construido na estruturação
urbana devendo, portanto, ser tratado como espaço positivo; sua importância não é tanto em termos de quantidade mas de suas relações ao contexto urbano e às atividades sociais às suas margens (ALEXANDER 1977) e àquelas que, por sua existência e características, são facilitadas (LERUP 1972). e) Percursos de Pedestres: conformam um sistema de conveniência tanto quanto um suporte à vitalidade dos espaços urbanos (SHIHVANI 1985: 31); integram um forte sistema interdependente com as atividades sociais e econômicas no nível térreo das edificações; devem ser tratados em conjunto com o sistema de circulação viária e transportes públicos e reforçados pelo projeto dos espaços livres e atividades de apoio. f) Atividades
de Apoio: conformam os sistemas de atividades que dão conteúdo, coerência e vitalidade aos espaços urbanos; sua interdependênciaé crucial (LERU P 1972, GEH L 1980, LYN CH 1976); devem se organizar a partir da alocação .de fortes nós de atividades (como no conceito de lojas "âncora" em shopping-{;enters) e integrar um sistema complementar e coerente com o de movimento de pedestres e veículos; devem incluir atividades temporárias e outras possibilidades de animação urbana. g) Mobiliário Urbano: considerado aqui como o sistema conformado pelos elementos complementares ao funcionamento da cidade, geralmente entendidos como temporários e, erradamente, encarados como de menor importância; o sistema inclui sinalização, elementos complementares aos espaços abertos (bancos, telefones públicos etc.). arborização, iluminação pública etc.; devem ser de fácil compreensão, cômodos ao uso, integrados ao contexto urbano (cultural e fisicamente). congruentes com os sistemas de comportamento social e não descuidar das necessidades físico-ergonométricas dos usuários. Assim, vemos que o Desenho Urbano busca, sobretudo, um tratamento da cidade que seja coerente para o usuário, na integração dos elementos conformadores da dimensão físicoambiental. A qualidade final do urbano, seja no tratamento de suas partes (calçadas, lotes, quarteirões, por exemplo). seja no tratamento de seu todo (interligações entre bairros, caráter çJa cidade, crescimento e expansão, por exemplo) em muito depende do inter-relacionamento entre as categorias acima descritas e a conformação de cada uma delas. Resta comentarmos alguns instrumentos úteis de implementação dos planos e projetos de Desenho Urbano. O instru-
mento usual do Planejamento Urbano é o zoneamento, adotado largamente por grande número de cidades, independente de sua escala. Também no Rio de Janeiro onde é complementado pelos projetos de alinhamento (PAs) e os de loteamento (PAts). como veremos no Anexo 3, com grandes possibilidades de conformarem um único instrumento integrado, o Projeto de Estruturação Urbana (PEU). Os zoneamentos, como dissemos, são os mais populares instrumentos para o controle do desenvolvimento urbano e provavelmente continuarão sendo. Na sua essência, dizem respeito aos tipos de usos permitidos, sua organização por zonas e sua distribuição espacial; muitas vezes eles também incluem alguns parâmetros máximos de utilização do solo, como gabaritos, afastamentos e coeficientes de aproveitamento. Estes são, evidentemente, parâmetros de Desenho Urbano e devem ser visto como tal pois são vitais para a geração da qualidade físico-ambiental urbana. Entretanto, são raros os casos em que se atinge mais do que um vestígio de organização físico-ambiental coerente, pelas dificuldades inerentes nestes instrumentos generalistas e pouco flexíveis, de tradição estática e mais próprios ao funcionamento da cidade como um todo racional. Exceções podem ser encontradas e, sem dúvida, deveriam ser a regra, como os modelos desenvolvídos pelo Instituto de Administração Municipal (IBAM) para cidades em Roraima e seu modelo proposto de Anteprojeto de Lei de Urbanismo e Edificação (SANTOS 1988). Na verdade, o Desenho Urbano é e pode ser expresso por estes instrumentos e, evidentemente, suas políticas e planos devem sempre se expressar neles. Mas suas características e amplitude exigem outros instrumentos de implementação, como demostram experiências em outros países. A prática da regulamentação urbanística no Brasil, em especial no Rio de Janeiro, ainda não prevê instrumentação diferenciada, exceto em poucas exceções, que possam refletir as intenções de Desenho Urbano, sejam flexíveis refletindo o processo de desenvolvimento físico-ambiental e abertos para uma maior negociação entre o Poder Público, a comunidade e os empresários. A seguir, comentaremos brevemente alguns destes instrumentos alternativos, uns já discutidos e até experimentados no Brasil, mas todos relativamente bem-sucedidos ou amplamente utilizados em outros contextos (KRAFTA 1986). Evidentemente todos possuem prós e contras, não são indiscriminada mente aplicáveis e nem sempre podem ser trans-
postos diretamente à nossa realidade. Sua discussão, no entanto, ajudará em nossa busca por métodos mais dinâmicos e efetivos para implementação do Desenho Urbano. Deve-se considerar que todos os instrumentos a seguir apresentados geralmente conformam Distritos Especiais na cidade, onde são válidas as suas regras em território definido; eles podem, entretanto, dependendo do caso, ser aplicáveis à área urbana como um todo.
Popularizadas a partir de experiências bem-sucedidas em que compõem os chamados "Guias de Desenho Urbano". Elas especificam o escopo das formas, os conceitos de projeto, o vocabulário físico-arquitetõnico e outros fatores básicos para o desenvolvimento de uma determinada área. Como coloca BARNETT (1982). devemos desenhar a cidade sem projetar edifícios. Existe enorme dificuldade de se legislar ou regulamentar o "bom desenho" e é impossível exigir dos empreendedores que reproduzam protótipos específicos, portanto, as diretrizes buscam encorajar o melhor e tentam evitar o pior (FORMA sd) (fig. 97) "Como as regras não podem cobrir todos os aspectos de uma edificação, o organizador das diretnzes deve deCidir sobre quais são os temas mais importantes, perguntando-se, na verdade, qual é o interesse do público em uma ediflcação e quais são os elementos essenciais de arqUitetura que afetam este Interesse" (BARNETT 1987 115).
-~ Figura 97 - Uma das ilustrações para as diretrizes de projeto no plano de desenho urbano de São Francisco, 1970, mostrando uma escala de transição entre um prédio novo e um conjunto de residências preservadas
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Figura 98 - Modelo de disposição para área residencial como diretriz para os empreendimentos imobiliários do guia de desenho de Essex, Inglaterra, 1973
Evidentemente, esta afirmativa aplica-se também a elementos e espaços urbanos Ainda no mesmo trabalho, BARNETT sugere as áreas básicas de desenvolvimento urbano que mais necessitam de Guias de Desenho: empreendimentos urbanos de larga escala, intervenções na cidade existente, compatlbilização de fachadas, empreendimentos de larga escala nos subúrbios/periferias e processos de revisão de projetos, A primeira experiência bem-sucedida com Guias de Desenho que se tem notícia foi no condado de Essex, na Inglaterra, onde no começo dos anos 70 publicou-se um trabalho que objetivava regulamentar a qualidade dos novos espaços e loteamentos residenclais (fig. 98) Na Grã-Bretanha, desde então, as experiências se sucedem e estão até incentivadas a escala nacional através, por exemplo, de publicações que "aconselham" como a "Introduction to Housing Layout", do Department of Architecture and Civic Design of the Greater London Council (1978). Este trabalho trata dos temas organização espacial, vias de acesso, estacionamento e movimento de pedestres, sugerindo soluções de projeto Nos EUA este tipo de instrumento de implantação também é muito popular, a partir da experiência bem-sucedida de São Francisco e hoje é adotada em diversas outras metrópoles (JACOBS 1980, BARNETT 1982, SHIRVANI1985)
É claro que a elaboração de diretrizes de desenho pressupõe a adoção de uma base conceitual e um critério de qualidade, subjetivo pois nem sempre se baseia em fatos mensuráveis,
mas objetivo na busca de compatibilizações e inter-relações claras. Afinal, como afirmou LYNCH (1981: 1) "decisões sobre política urbana, alocação de recursos, para onde deslocar-se ou como construir algo devem se utilizar de normas sobre o bom e o ruim" ... "sem alguma consciência do que seja melhor, qualquer ação é perversa". Parece que existe um certo consenso sobre o que as diretrizes devem comportar claramente: objetivos, procedimentos, elementos do desenho, significados, relações entre si e com o contexto, exemplos (FORMA sd, LYNCH 1981, SHIRVANI 1985). Como comenta SHIRVANI (1985: 148). as diretrizes
de desenho para uma área não implicam necessariamente em controles mais restritivos, mas devem viabilizar um quadro projetual e podem até sugerir formas alternativas para um mesmo terreno ou edificação. Importante é também lembrar que as diretrizes de desenho podem ser de dois tipos, prescritivas e de desempenho, ou "performance" (SCOTT 1969, LYNCH 1981, SHIRVANI 1985). As prescritivas estabelecem limites dentro dos quais os projetos devem ser amoldados, como as ATEs ou gabaritos máximos. Por isto possuem um caráter bastante restritivo e acabam por gerar projetos sempre nos limites máximos
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Figura 99 - Diretrizes de projeto para áreas históricas para as novas edificações
sugerem
as proporções
compatíveis
com as históricas como orientação
de lucratividade. As diretrizes de performance são mais flexíveís, já que adotam critérios de desempenho para todos os locais mas não exigem formas específicas apropriadas. Estas têm sido preferidas na grande maioria dos guias e diretrizes de Desenho Urbano pois possuem abertura suficiente para diversas soluções de projeto que atendam ao performance requerido para cada caso. Entretanto, não há consenso sobre se as diretrizes devem ser mandatórias ou apenas sugestivas. Neste último caso, geralmente elas servem para orientar um empreendimento e estão relacionadas com a existência de um processo de análise de projetos por um comitê especial, que pode possuir força legal ou apenas caráter consultivo. Este comitê é normalmente formado por representantes do Poder Público, da comunidade, dos empresários e da Universidade, pode vetar um projeto ou sugerir modificações seguindo as diretrizes publicadas. Nas experiências amerieana e inglesa, o solicitante, mesmo que as diretrizes não sejam obrigatórias, costuma obedecê-Ias mesmo se apenas para não atrasar a aprovação de seu projeto Neste processo existe espaço legal e real para negociações entre as partes. Em nossa própria experiência de trabalho junto à Prefeitura de Baltimore, EUA, desenvolvemos diretrizes de Desenho Urbano para uma área sensível do bairro de Fells Point. comentadas no Anexo 2. O conjunto de diretrizes foi transformado em adendo à legislação do bairro, aprovado pela câmara, e em 1988 a área já se encontrava recebendo um empreendimento misto. O empreendedor estava recuperando as edificações indicadas para novos usos e promovia novas edificações mistas bem integradas ao conjunto e ao entorno. As diretrizes provaram ser suficientemente flexíveis e de boa qualidade para promover um bom resultado final tanto em termos físico-espaciais quanto à exiquibilidade econõmica. Elas previam margem para negociação entre as partes. Também poderia-se dizer que o projeto original do plano piloto de Brasília se tratava de um antecessor de guia de desenho, embora alguns de seus conceitos fossem equivocados e tenham sido rigidamente aplicados. No Rio de Janeiro existe importante experiência de aplicação de Guia de Desenho no controle do desenvolvimento da área do Corredor Cultural, comentada no Anexo 3. Ótimos resultados têm sido alcançados, tanto em termos de inter-relação entre escritório técnico, comunidade e empresários, quanto em relação aos resultados práticos. As inúmeras experiências internacionais existentes também demonstram que as áreas de preservação, definidas como
Distritos Históricos, na maioria das vezes possuem um conjunto regulador de diretrizes d d senho especiais (fig. 99). Os resultados alcançados n st s experiências, aliados aos do Corredor Cultural. nos permitem concluir a grande viabilidade e aplicabilidade dos Guias de Desenho para o controle do desenvolvimento em áreas urbanas historicamente sensíveis.
Os "pacotes" (briefs) apenas diferem dos Guias de Desenho por sua maior especificidade e rigidez, pois são aplicados a áreas de menores dimensões, não raramente a terrenos determinados. São documentos em que a autoridade local especifica qual o escopo das formas construídas, suas relações internas e externas, e·seu tratamento arquitetõnico global. O objetivo é "garantir a maximização do potencial de Desenho Urbano de um terreno enquanto se controla a arquitetura o menos possível" (JOH NSON-MARSHALL 1978 1) Novamente, as experiências mais significativas de aplicação deste instrumento são as norte-americanas e as britânicas. Devido ao seu caráter de orientação. que pode vir a ser bastante restritivo, os "pacotes" são largamente aplicados para contextos em que a nova edificação precisa atingir a melhor integração possível com os elementos do entorno. Entretanto. sua aplicabilidade não se esgota aí pois também são extremamente úteis na determinação de condições especiais de edifícação. como localização de entradas sociais e saídas de serviço, acessos para veículos, localização de pátios de carga e descarga. localização de marquises, tipo e localização de atividades no térreo. elementos construtivos, acessos públicos e visuais através do terreno. amenidades públicas etc. (fig. 100) Normalmente um "pacote" de Desenho Urbano possuirá diretrizes dentro das seguintes temáticas principais: volumetria, relacionamentos estético e visual com o entorno, relacionamento funcional com o entorno. acessibilidades e silhuetas. A definição de conceitos, critério e diretrizes de projeto é sempre acompanhada por ilustrações explicativas e/ou exemplos de possibilidades para o desenvolvimento. Este instrumento também pode ser aplicado em um processo de planejamento que contemple a atuação de um Comitê ou Conselho de Desenho. principalmente se este for específico para áreas particularmente sensíveis, como entornos de bens tombados. Na verdade ele poderia ser complemen-
tado por diretrizes complementares, financeiras e imobiliárias, funcionando assim quase que como um edital de concorrência pública A experiência no Rio de Janeiro demonstra que, em termos legais, este instrumento é viável (ver mais detalhe no estudo do Anexo 3) Esta constatação deu-se a partir de episódios de restrição de uso e ocupação de terrenos em Botafogo e na Penha. Alguns casos se colocam como especialmente propensos a receber este controle do desenvolvimento: terrenos conflltuosos onde a comunidade quer ver determinados resultados, novas construções em áreas densamente ocupadas, orla marítima e de lagoas, Centro, entornos de bens tombados e áreas de interesse cultural, como o Corredor Cultural.
Este interessante instrumento de implementação é muito comum nos EUA onde foi implantado pela primeira vez em 1961, na cidade de Nova lorque, instituindo um adicional de até 20% de área construída além do que permitia o zoneamento em certas zonas da cidade, desde que o empreendimento tivesse uma plaza para uso público (HALPERN 1978, BARNETT 1982) Basicamente, o zoneamento de incentivos prescreve uma negociação entre o empreendedor e o Poder P0blico que permite exceder os limites estabelecidos pela regulamentação urbanística em troca de algum tipo de amenidade pública Evidentemente, este processo só pode existir quando o Poder Público exerce efetivo controle sobre o uso e a ocupação do solo. Para tanto, a regulamentação urbanística deve prever esta flexibilidade em certas áreas da cidade, ou em casos especiais. Outra das condições básicas é a existência de um mercado imobiliário dinãmico o suficiente, onde a demanda de áreas seja tal que o empreendedor queira superar os limites que a regulamentação normal preestabelece. Como afirmado por SHIRVANI (1985: 171) "se os Incentivos disponíveis ... não forem suficientemente atrativos para o empreendedor não há sentido nem mesmo em oferecê-Ios". As regras e o território onde este "Jogo" pode acontecer devem ser muito bem determinados do ponto de vista legal e claramente divulgados, a fim de evitar decisões meramente "fisiológicas". É claro que há uma grande diversidade de elementos de desenho que podem vir a ser considerados "amenidades públicas", transformando-se em objeto da ne-
gociação. Destes, os mais comuns são: espaço ou plaza pública, servidões, proteção de visadas através da área, marquises, alargamento de calçadas, estacionamento público, determinados usos públicos (culturais ou sociais). arborização e outros (flg. 101). As características destes elementos e exigências podem, inclusive, ser também definidas pela Prefeitura Do outro lado da negociação, o do empresariado, as vantagens mais evidentes a perseguir são quase sempre relativas ao aumento da área construída, tanto em termos de ocupação horizontal ou vertical, quanto àqueles relativos a outras exigências, como total de vagas na garagem e itens de caráter construtivo-arquitetõnico. Mas seja qual o caso, a lucratividade do empresário aumentará de forma inequívoca. Um outro tipo de aplicação deste conceito de incentivos são os chamados Distritos Especiais, zonas onde se buscam resultados específicos em uma área preestabelecida. O caso
a
de Nova lorque pode ser novamente citado como exemplo pois considera-se que foi a primeira cidade a aplicar este instrumento, em 1967 (HALPERN 1978, BARNETI 1982). Foi o caso do famoso Distrito de Teatros, uma resposta à invasão da área de Times Square, tradicional localização de salas de espetáculo em Manhattan, por modernos edifícios de escritórios. Através de um dispositivo de zoneamento, o empreendimento imobiliário localizado naquela área teria permissão de ultrapassar determinados índices de construção se o novo projeto incluísse uma sala de espetáculos para o público. Esta idéia, não o conceito de incentivos, foi aplicada em Curitiba, onde as novas construções comerciais em área central deveriam prever salas de cinema; procedimento que não chegou a obter resultados totalmente satisfatórios pela incompatibilidade de seus objetivos com o mercado e a demanda local. Tanto para a aplicação de instrumentos como o Zoneamento de Incentivos quanto os Distritos Especiais é fundamental um profundo estudo sobre os custos reais, necessidades, tendências de desenvolvimento e demandas reais dos serviços que se pretende oferecer, sob pena de terminar por gerar-se elementos inúteis para a comunidade ou inviáveis para o empreendedor. Não basta conseguir-se a construção de teatros, por exemplo, eles precisam vir a suprir uma demanda reprimida, acontecendo social e economicamente.
Trata-se de um instrumento de controle do desenvolvimento bastante inovativo, pois baseia-se na idéia de separar o direito de construir do terreno onde fisicamente este empreendimento se daria. Ou seja, o empresário que construir menos do que o permitido pela regulamentação urbanística em um terreno, passa a ter o direito de transferir esta diferença para empreendimento em outro local (fig. 102). A experiência pioneira deste instrumento foi em Chicago, onde o plano diretor de 1973 buscava salvar prédios históricos (COSTONIS 1974).
Figura 101 (a, b) - O zoneamento de incentivos permite concessões especiais como aumento de área construída (a) em troca de alguma amenidade pública em áreas de grande pressão imobiliária, como as arcadas no edifício-sede da A TT, Nova lorque, projeto de Philip JOHNSON 1978/82
Mas a expressão que nos parece mais apropriada para utilizarmos é a inglesa, que chama este instrumento de "transferência de direitos de construção" (transfer development rights). Entretanto, parece que se popularizou a expressão "solo criado", que embasa um conceito até mais amplo, discutido a partir de estudos e seminários desenvolvidos em São Paulo, em 1975, pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal (CEPAM). O conceito de "solo criado" baseia-se na "criação de áreas adicionais de piso utilizável não apoiadas diretamente sobre o solo" (MOREIRA
et ai. 1975) O solo criado seria, portanto, a geração de mais de uma utilização do terreno, seja através de andares superiores ou subterrâneos. O conceito pressupõe a desvinculação do "direito de construir" do "direito de propriedade", uma fundamentação Jurídica Que permite o proprietário exercer o direito básico de utilização plena do terreno mas limita o excedente à função social do solo. Desta maneira, se o Poder Público se interessa por limitar o direito de construir relativo a um lote ou uma área, o proprietário, embora obrigado a preservar a edificação, poderá vender os direitos de construir relativos ao excedente entre o Que existe e o Que prescreve o coeficiente de aproveitamento para a zona. Daí, existiriam duas possibilidades: um outro empreendimento poderia comprar diretamente estes direitos para exceder os coeficientes ditados pelo zoneamento de seu lote, ou o Poder Público agiria como um "banco de terras" e revenderia estes direitos a outro interessado. O excedente poderia ser vendido por completo ou em partes. A importância e o potencial deste instrumento são óbvios para o Desenho Urbano. Entretanto, se por um lado ele permite uma agilização da capacidade de intervenção do Poder Público, pelo outro pode gerar um total descontrole dos resultados físico-€spacials do desenvolvimento urbano. Por isto, alguns defendem a necessidade da definição cuidadosa de "áreas de recepção" destes excedentes, vendidos de maneira a haver uma certa previsão dos resultados finais dos conjuntos edificados. Outros sugerem que as áreas de recepção sejam vinculadas a áreas com maiores capacidades de adensamento, como margens de rotas de transporte público ou zonas de expansão. Como acontece com os instrumentos Que comentamos anteriormente, existem duas condicionantes básicas e determinantes do sucesso da instituição do solo criado em uma área ou em toda a cidade. Primeiro, uma regulamentação urbanística rígida e um processo de planejamento urbano fortes Que viabilizem ao Poder Público a sua aplicação. Em segundo lugar, um mercado imobiliário dinâmico tanto nas áreas de controle Quanto nas de recepção. Aliás, talvez estas últimas sejam fator determinante, uma vez Que o empresário não investiria em excedentes se as áreas de recepção não garantissem seu lucro (SHIRVANI1985) O conceito pode ser aplicado para lotes ou edificações já existentes, mas a experiência demonstra Que é em áreas já urbanizadas e com grandes pressões imobiliárias onde sua
Figura 102 - Aplicação esquemática de regulamentos de solo criado: os direitos aéreos da edificação a se preservar são vendidos a outros empreendimentos que excedem os limites da legislação em áreas equivalentes ao adquirido
implantação é mais viável. A transferência de direitos de construir tem sido utilizada como instrumento de compensação para proprietários de imóveis tombados ou em áreas históricas. Este foi o instrumento Que viabilizou o já citado projeto South Street Seaport, em Nova 10rQue (vide figo 41). Lá foi permitido a um consórcio de bancos adquirir os direitos de construir dos imóveis protegidos para só colocá-Ios à venda no mercado em momento apropriadG, sendo o seu entorno imediato à área específica de destinação destes excedentes (HALPERN 1978) A Prefeitura de São Paulo, em 1988, resolveu aplicar estes conceitos para viabilizar a ocupação de terrenos de favelas e outros de interesse para o desenvolvimento. Chamado de "operações interligadas", o processo consistiria basicamente em ampliar as possibilidades determinadas pelo zoneamento em troca da construção de uma Quantidade de casas populares proporcional ao investimento e em área determinada pela Prefeitura.
Estes tipos de incentivos dão ao Poder Público capacidade par implementação de políticas, planos, projetos e program d Desenho Urbano, impondo um mínimo de restrições O processo de desenvolvimento urbano e ao funcionamento d leis de mercado. Entendemos este grupo de instrumentos de implementação subdividido da seguinte forma: incentivos para que os empreendedores "façam" alguma coisa e aqueles para que "deixem" de fazer alguma coisa. Os conceitos baseiam-se em três premissas básicas. Primeiro, a constatação da dificuldade política de implantação de mecanismos coercitivos ao desenvolvimento urbano. Em seguida, a realidade das grandes cidades com sua base financeira cada vez mais deteriorada e limitada. Em terceiro e último lugar, a ideologia de intervenção no mercado imobiliário com mecanismos compensatórios. Os impostos de propriedade e as taxas públicas sempre foram importantes instrumentos não só de geração de renda municipal mas de controle do crescimento urbano. Se bem utilizadas, integradas ao plano diretor básico urbano e aos zoneamentos, as taxações diferenciadas podem inibir ou incentivar o desenvolvimento e suas características, tanto em sua forma quanto em sua direção. O imposto territorial progressivo, por exemplo, possui potencial muito grande neste sentido mas ainda é muito pouco aplicado nas cidades brasileiras. O instrumento mais comum utilizado para incentivar a adoção de medidas reguladoras do uso e ocupacão do solo, e para compensar os proprietários de seus possíveis reflexos negativos na lucratividade potencial do imóvel, é o incentivo fiscal de dedução de impostos e taxas municipais. Experiências de preservação de imóveis, como a do Corredor Cultural, devem grande parte do seu sucesso a isenções fiscais concedidas pela Prefeitura. Assim, para empreendimentos que obedeçam ao constante em Guias de Desenho, por exemplo, atribui-se uma determinada isenção. Outra forma de incentivar implementação de regulamentos ou projetos urbanos é a isenção total de impostos por um determinado período de tempo, durante o qual o investimento do empreendedor ainda não teria retorno. Esta isenção pode ser estabelecida por um determinado período de anos ou ser relacionada à lucratividade real do empreendimento. Isto é comum para áreas em processo de revitalização urbana,
onde o Poder Público precisa garantir a atração inicial dos empresários e gerar um novo dinamismo econômico e social integrado auto-sustentado. O poder público poderia, também, desenvolver projetos de obras públicas em conjunto com o empresariado, que seria compensado de seu investimento obtendo isenção de impostos e a cessão de uso da edificação/empreendimento por tempo determinado. Nos EUA é comum as prefeituras atuarem como verdadeiros empreendedores para implementação de um plano atraindo empresários com a oferta de "pacotes" de desenvolvimento: para a implantação de seus planos ela pode oferecer a terra abaixo do custo, isenção de impostos e uma série de facilidades ao empresário. No Anexo 2 vemos que este foi o caso em Baltimore quando, no processo de revitalização de sua área central. a cidade precisou de novos hotéis. Neste sentido, a experiência de preservação de imóveis históricos nos EUA também é exemplar, pois o governo federal, através de uma lei de isenção fiscal do fim dos anos 70, passou a conceder deduções no imposto de renda de até 25% do valor total investido na recuperação do imóvel. Além disto, no cálculo dos impostos também levava-se em consideração o artifício da "desvalorização acelerada" (accelerated depretiation) que considerava os imóveis preservados, por serem antigos, como passíveis de uma deterioração mais rápida do que os novos, por isto fazendo juz a pagar proporcionalmente menos impostos. Infelizmente, a segunda administração Reagan conseguiu impôr grandes limitações a este tipo de incentivo federal. Finalmente, vale comentar dois outros instrumentos fiscais: a contribuição de melhoria e a apropriação da mais-valia, que também são intimamente responsáveis por resultantes ligados ao Desenho Urbano. A contribuição de melhoria visa captar recursos extras em uma área que receberá uma melhoria pública. Há muito ela é assunto para debates no Brasil, onde é aplicada em várias cidades, mas seus opositores argumentam que ela é uma forma disfarçada de bitributação. Se, por um lado, parece justo que, se alguns moradores vão tirar proveitos diretos de uma melhoria, sejam obrigados a pagar por isto, por outro está a dificuldade de se determinar quem exatamente se beneficiará, como e com que intensidade. Além disto, acredito que este conceito implica em outro, exatamente o seu inverso, ou seja, a compensação monetária por parte da Prefeitura por desvalorizações reais causadas por obras que ela faz (como novos viadutos em frente a áreas residenciais) ou deixa de fazer (como em áreas urbani-
zadas mas sujeitas a inundações constantes por mau desempenho da infra-estrutura instalada). A apropriação da mais-valia também não é novidade mas, sem dúvida, é de difícil controle. Em teoria, o Poder Público se beneficiaria da valorização de imóveis afetados pela divulgação da implantação de uma melhoria pública, um parque por exemplo, e aumentaria seus impostos proporcionalmente a esta valorização, reinvestindo a diferença na própria construção da melhoria (BARNETT 1982). Neste caso, a dificuldade também estaria nas formas e critérios de determinação da lucratividade potencial e em seu controle. Outro tipo de experiência interessante também aconteceu em Baltimore, para implementação de parte do plano para revitalização da área portuária e central (DEL RIO 1985). Ali, o uso habitacional era um dos ingredientes mais importantes e havia um conjunto significativo de casas de dois e três pavimentos com grande valor histórico mas em deterioração e abandonadas. A Prefeitura lançou um programa de recuperação da área e vendeu as casas pela quantia simbólica de um dólar, contanto que o comprador atendesse a três condições: não tivesse outro imóvel na cidade, se comprometesse a recuperar a casa até um padrão mínimo estabelecido em seis meses e não poderia revendê-Ia em menos de dois anos. A Prefeitura também colocou à disposição um programa de financiamento de materiais de construção a preço de custo. O programa, chamado de "urban homesteading", inovava uma solução efetiva para implementação de objetivos explícitos de Desenho Urbano e foi de grande e rápido sucesso. Enfim, o que podemos afirmar é que a prática do Planejamento e do Desenho Urbano necessita cada vez mais de instrumentos fiscais e financeiros engenhosos para implementação de suas propostas. O desenvolvimento de práticas consistentes de colaboração entre os setores público e privado, a exemplo das cidades européias e norte-americanas, éindubitavelmente um caminho fértil.
Capítulo 7 Agora, um caminho aberto
Vimos como surgiu a necessidade de um novo campo disciplinar que possa lidar com a complexidade do urbano e sua qualidade físico-ambiental, utilizando-se de diversas dimensões de análise. Os argumentos desenvolvidos serviram para identificar claramente o campo disciplinar do Desenho Urbano, seu processo de desenvolvimento e um enfoque metodo- . lógico multidisciplinar possível. É claro, não é o único, embora se pretenda suficientemente abrangente para garantir bons resultados analíticos e projetuais. Claro está que, como afirmamos anteriormente, o Desenho Urbano é PROCESSO e, ele mesmo, faz parte de um processo maior, o do Planejamento. Por sua meta principal ser a promoção de qualidade físico-ambiental da cidade e dos espaços como fontes de prazer e liberdade, o Desenho Urbano não pode deixar de ser, como aliás todas as atitudes humanas, uma manifestação po/ftica. Por isto, todo o processo de Desenho Urbano prevê, em diversos momentos e sob diversas maneiras, a participação comunitária. A "conformação de espaços para o uso social" traz necessariamente um compromisso ideológico pois lida com imagens futuras da sociedade (SAMPAIO 1986: 40). A forma é uma expressão política. O Desenho Urbano define-se pela criação do domínio público, que compreende o espaço público, um "constructo" físico e formal, assim por suas instituições públicas, um "constructo" político e econômico (GUSEVICH 1986). Portanto, uma de nossas responsabilidades fundamentais é a consciência de nosso papel social. Por isto, lembramos novamente LYNCH (1981) quando afirma que qualquer ação sem uma noção do bom e do mau é nociva. Para conformar esta noção
e atingi-Ia como projeto social estão os processos participativos. Se entendermos metaforicamente a cidade como "um Jogo de cartas", a clareza dos papéis que cada ator social assume e seu respeito pelas regras são condições fundamentais para que haja jogo (SANTOS 1986, 1988). E neste jogo, o nosso papel é definido por nossa capacidade/especialidade profissional e, sendo o nosso um jogo democrático, pressupõe também a divulgação de nosso trabalho e das regras deste jogo no que diz respeito à promoção de qualidade físico-ambiental. A metáfora do "jogo de cartas" serve para demonstrar que só com regras bem definidas e respeitadas é possível que o projeto social da cidade que todos queremos possa sequer chegar a ser perseguido. Dito isto, enfatizando a dimensão política do Desenho Urbano, podemos compreender ainda melhor a sua necessidade para a cidade brasileira. Como resultado do nosso despreparo como profissionais e cidadãos, fruto, de um lado, do distorcido desenvolvimento da Arquitetura e do Urbanismo e, de outro, de um' longo período de autoritarismo, nossas cidades oferecem um ambiente pobre e, muitas vezes. nocivo à vida. Fato constatável mais intensamente nas grandes metrópoles, como Rio. São Paulo e Belo Horizonte A implantação do Desenho Urbano no Brasil deve buscar duas áreas básicas e fundamentais. Primeiro, dentro da estrutura administrativa governamental. principalmente ao nível municipal onde ele se faz sentir mais intensamente. Sendo o uso e a ocupação do solo urbano um preceito municipal porque afeta diretamente a vida do cidadão, a prática do
Desenho Urbano deve ser instituída nos processos de Planejamento. Isto não quer dizer que outros níveis de governo não o mereçam, ao contrário, a preocupação pela qualidade físico-ambiental deve se expressar em esferas institucionais maiores que o território municipal através de planos e constituições. Afinal, trata-se de um projeto social. A segunda área fundamental para a implementação do Desenho Urbano é a acadêmica. Em outras ocasiões já defendemos a sua implantação nos cursos de graduação em Arquitetura, onde se expressa com maior intensidade a educação do cidadão para lidar com a dimensão físico-ambiental das cidades. Ele deve aparecer com intensidade no ensino de graduação onde seu campo disciplinar multidisciplinar deve encontrar expressão; através de novas cadeiras, do ensino em atelier e embutido mais intensamente nas preocupações de diversas cadeiras existentes.
tlVO, na sua identidade e no imaginário da população. Típico exemplo são as imagens e símbolos do Rio explorados pelo turismo e que identificam a cidade em todo o mundo, a "cidade maravilhosa". O poder público nunca assumiu junto à população um verdadeiro "projeto de imagem" urbana, integrado e expresso nos regulamentos urbanísticos. Como é que nós queremos que seja a cara, ou caras, do Rio 7 Quais são os elementos que garantem estas imagens e como protegê-Ios 7 A presença e as características do ambiente natural, por exemplo, que sempre conformaram imagens básicas cariocas (praias, montanhas, florestas, lagoas etc.) estão cada vez mais ameaçadas pelo ambiente construído (fig. 103).
Também acreditamos que o Desenho Urbano deva se expressar no ensino de pós~raduação. Na área de Arquitetura ele poderia tomar duas formas: como programa específico, gerando uma titulação, ou como área de concentração dentro de uma titulação existente. Neste caso, impõe-se a reformulação dos cursos de Urbanismo e de Planejamento Urbano existentes e a inclusão de cadeiras que possam conformar o Desenho Urbano como área de concentração específica. Claro está que tanto a qualidade do ensino do Desenho Urbano quanto a de sua prática profissional pressupõem as condições discutidas ao longo deste trabalho. Este campo disciplinar exige certas pré-eondições fundamentais que acreditamos terem sido exaustivamente debatidas até aqui. Duas questões, no entanto, precisam ficar claras: a qualidade físicoambiental deve ser tratada como processo e suas dimensões de análise e atuação devem ser multidisciplinares. Finalmente, podemos identificar algumas temáticas principais que conformam perfeitamente o leque de preocupações do Desenho Urbano e poderiam destacar-se como grandes objetivos físico-ambientais. Embora nesta identificação façamos novamente uso de referências ao caso do Rio de Janeiro, estas temáticas podem e devem ser contempladas na gestão pública de qualquer cidade brasileira.
o processo de desenvolvimento pode, facilmente, comprometer a imagem das cidades já constante no repertório cole-
Figura 103 - O Cristo Redentor, legibilidade e simbolismo: elemento constante nas imagens coletivas do Rio de Janeiro, um marco cuja presença na paisagem deve ser respeitada; rua Pires de Almeida, Cosme Velho
Figura 104 -Identificação e proteção de visuais como as que conformam áreas como a lagoa Rodrigo de Freitas, onde a regulamentação edilícia era totalmente alheia ao sítio e ao perfil dos morros
Uma das características mais fortes de nossa qualidade de vida, em particular a do Rio, é o jogo urbano dos cheios e vazios, da percepção dos espaços abertos e das vistas .e panoramas. Isto também vem sido ameaçado pelo modo com que a cidade cresce e se configura, principalmente por incompetência dos regulamentos urbanísticos. Esta qualidade visual expressa-se tanto em termos de vistas panorâmicas e turísticas quanto de corredores visuais no próprio tecido urbano (para a praia, lagoas ou edificações de importância etc.). facilitando até a conformaçâo da "imagem da cidade" (fig 104)
A níveis sócio-{;ultural e de conforto psicológico, o Homem necessita se identificar com um território e um grupo social imediatos à sua residência Toda cidade deve ser um conjunto perceptível de partes conformando um todo coerente. Cada parte, cada bairro, cada comunidade, com sua identidade própria, sua história e suas características O Rio, pelo seu sítio natural e especificidades evolutivas, ainda possui bastante disto como uma de suas características mais marcantes. É algo para se fortalecer e promover, como se encontra nas vilas cariocas, por exemplo (fig. 105)
Apesar de todo desenvolvimento tecnológico, o relacionamento de nossas cidades com o meio ambiente é muito mais problemático que no passado, seja a nível de poluição ou das próprias técnicas construtivas. No Rio, independentemente de um "projeto de imagem" para a cidade, que inclui necessariamente a natureza carioca, o tipo de desenvolvimento praticado está em direto confronto com a natureza. Diariamente praticam-se agressões, muitas conscientemente, contra o sistema ecológico, a boa climatizaçâo, a correta drenagem e o bom relacionamento com o sítio. Estas agressões por vezes geram risco de vida, no caso da ocupaçâo de encostas, ou mesmo acabam por produzir resultados visuais agressivos de gosto duvidável (fig. 106).
~ Figura 105 - A cidade como somatória de suas partes: fortalecimento de identidades locais: Vila Santa Genoveva, 1916, em São Crístóvão, çom suas 74 casas, pracinha e igreja
Esta questão é, em grande parte, como vimos, reflexo do próprio desenvolvimento da arquitetura brasileira que só recentemente desperta para a importância do contexto cons-
truído na conformação do novo objeto a inserir. Ainda é comum a promoção de arquiteturas independentes do conjunto preexistente, cada novo prédio tentando ser um novo e sensacional objeto de arte, o que resulta em desrespeito à nossa história e em intensos conflitos tipológico, cultural e, às vezes, até mesmo funcional (fig. 107)
Tema que implica no respeito às lógicas sócio-espaciais preexistentes em uma determinada morfologia. Aqui se ultrapassa as relações históricas simples para lidar-se com os modos de vida das comunidades e seu rebatimento no urbano. Desenvolvimento compatível com continuidade é a qualidade norteadora. O desrespeito morfológico verifica-se repetidamente em nossas cidades; novas inserções, como shoppingcenters, conjuntos habitacionais ou condomínios fechados não se integram ao tecido existente, à sua volumetria e tipologia, desrespeitando itens como coerência urbanística, acessibilidades, linhas e pólos de crescimento (fig. 108)
Figura 106 - Absurdos nas relações com o sitio natural comprometem até a qualidade visual do conjunto: casas em "paliteiros" de pilares, fechados com paredes cegas, e retirada de "fatias" do morro para "encaixar" a arquitetura na Joatinga, área de alta renda no Rio
No fundo esta temática é dependente da educação social, tanto da população quanto de seus dirigentes; reporta-se desde o nível de comportamento ao de detalhamento do mobiliário urbano. Nas cidades brasileiras, particularmente no Rio e nas grandes metrópoles, o espaço público é tratado como terra de ninguém: os moradores não o reconhecem como de "sua propriedade" e o maltratam, a Prefeitura não o compreende como prioritário e não lhe dá a mínima atenção. Carros estacionados nas calçadas; trailers e quiosques alocados sem o menor critério ou cuidados ergonométricos; publicidade, telefones públicos e barreiras físicas alocados ao bel prazer das concessionárias É preciso maior atenção onde, afinal. os contatos sociais acontecem: valorização, manutenção, mobiliário integrado e bem projetado, planejamento de atividades temporárias etc. (fig. 109). Figura 107 - Arquiteturas conflitantes e pouca atenção para a importãncia do seu inter-relacionamento e do conjunto resultante sobre a esfera pública; Largo da Carioca, Rio
Outra herança do modernismo e do desenvolvimento de nossa arquitetura é a crença na monofuncionalidade que ainda se pretende em muitas áreas urbanas brasileiras. A Barra da Tijuca é um exemplo típico plano elitista com que o poder público promove condomínios residenciais e um paradigma de cidade norte-americana onde tudo é feito de carro. Sob a égide da segurança, estas estruturas são verdadeiros gue-
tos sociais onde as pessoas só esbarram com os seus iguais, tanto em seu "bairrinho" quanto em suas compras no shoppingo A variedade é qualidade a ser promovida tanto através dos usos formais das edificações e espaços quanto nos temporários e expressões espontâneas. Uma cidade só se torna socialmente forte com uma rica mistura social e de usos (fig. 110)
Figura 108 - Conflitos morfológicos impedem a inserção de novos empreendimentos no contexto e implicam problemas culturais, sociais e psicológicos incontornáveis; conjunto Capitão Teixeira, CEHAB, Realengo, Rio, 1974
Figura 110 - Homogeneidade espacial e social do paradigma modernista institucionalizada por elitismos e pela síndrome da segurança; a Barra da Tijuca e seus condomínios, verdadeiros "guetos" sociais, longe de uma verdadeira urbanidade
o
leitor atento com certeza percebeu que todas as temáticas acima podem ser resumidas em uma só, a imagem da cidade. Imagem é símbolo, identidade, caráter, personalidade, possibilidades. Disto há muito já havia se apercebido o genial Kevin LYNCH em sua busca pela boa forma urbana (LYNCH 1981). Para isto necessitamos de um projeto físico-ambiental coletivo e que só será alcançado através de um empenho coletivo. Encerramos com a certeza de havermos apontado novos caminhos, férteis, em direção a este projeto e na busca por uma maior qualidade para nossas cidades. Esta é a premissa básica do Desenho Urbano,. que vai se expressar em todos os aspectos físico-ambientais vivenciados em nosso cotidiano de cidadão. Assim foi que tentamos identificar e debater conceitos e metodologias, consolidando um campo disciplinar e de domínio profissional. Acreditamos, como SANTOS (1988: 15), que é aí que está a "verdadeira tarefa acadêmica".
I
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Figura 109 - O espaço público como "terra de ninguém"; nem o poder público se interessa em promover qualidade ou fazer respeitar: as novas bombas de combustível deste posto foram colocadas no alinhamento, obrigando os pedestres a andarem na rua Jardim Botânico, Rio
E, como parodiávamos na abertura deste trabalho, apesar das muitas visões diferentes que nós, cidadãos, temos do urbano, o sentimento de urbanidade e civilidade por trás do designerdeve sempre apoiar-se "na esperança de que nossa potencialidade criativa transforme a vida urbana e seu espaço em fontes de prazer e liberdade".
Anexo 1 Urbanização, estruturação e crescimento de favela: Desenho urbano na favela da Maré - RJ*
Apresentamos a seguir, bastante resumido, trabalho acadêmico de nossa autoria, realizado em 1981, que teve por objetivo formular uma proposta físico-espacial de desenho urbano, alternativa aquela formalizada em 1980 pelo Banco Nacional da Habitação para a Favela da Maré, Rio de Janeiro. Embora com todas as limitações típicas de um exercício acadêmico, achamos interessante comentar esta experiência pois ilustra algumas questões abordadas em capítulos anteriores, principalmente no que diz respeito ao enfoque metodológico; a questão da habitação de baixa renda também constitui antiga preocupação nossa (p.e DEL RIO & PAYNE, 1983) Neste trabalho, buscávamos um processo que viabilizasse formas de urbanização, estruturação e crescimento mais participativas e respeitosas com a comunidade existente e seu patrimônio sócio-cultural. Esta temática revela-se importante pois a Maré reflete as condições de vida de grande parcela da população urbana brasileira e, como tal, deve participar da praxis técnica, social e política do designer. Para tanto, interessáva-nos estudar as características do assentamento de forma a compreender seu desenvolvimento, suas razões, vantagens e desvantagens para os moradores. O estudo morfológico, como o definimos no Capítulo 5.1, revelava-se ideal para tanto pois permite-nos compreender o estado físico-espacial atual como produto de uma evolução e em relação às características sociais das comunidades. Ao mesmo tempo, como objetivávamos uma proposta de desenho alternativo ao oficial, este tipo de estudo conformaria uma base concreta para definir, em conjunto com as necessidades programáticas locais, padrões de desenho a se adotar e decisões projetuais, como a definição da malha viária ou a tipologia de novos quarteirões. Adotamos, também, como grandes diretrizes para a proposta final aquelas indicadas por
LYNCH (1981) para atingir uma "boa forma urbana", ou seja, a de melhor resposta possível às necessidades de seus usuários (vide Capítulo 4) Constataremos, com o desenvolver destes comentários, a viabilidade de enfoques de desenho urbano para áreas faveladas mais condizentes com as condições sócio-eulturais da população alvo e melhor integrados ao contexto existente. É evidente que o sistema habitacional não evitou a repetição de uma série de equívocos projetuais sintomáticos. No entanto, admitimos que os programas do tipo PROMORAR, que incorporava um certo nível de participação dos mutuários, pelo menos ao nível da consolidação da unidade, e limitava as prestações a um percentual do salário mínimo, em oposição aos rígidos programas de conjuntos habitacionais vigentes até então, significaram uma melhora relativa nas respostas institucionais, em direção ao que poderia ser interpretado como respostas mais satisfatórias à realidade. O BNH estava respondendo, na verdade, com um certo atraso, característico de sua burocracia paquidérmica, aos câmbios de políticas habitacionais das próprias agências internacionais, como o Banco Mundial (WARD 1982), e das atitudes sendo gradativamente assumidas pelos governos locais, como o do Rio de Janeiro, em prol da urbanização de favelas, como expresso na política setorial municipal carioca de 1979. * Texto originado em "Against the Tide: Upgrading and Expanding a Favela" (volumes 1 e 2). dissertação de Mestrado, Joint Centre for Urban Design, Oxford Polytechnic, 1981. Agradeço ao amigo David Gertner, coordenador do levantamento cadastral da favela da Maré pela FUNDREM, por seu inestimável apoio à realização de meu trabalho original.
A área conhecida por Maré, localizada às margens da Baía de Guanabara entre os acessos à Cidade Universitária e à Ilha do Governador, consiste da "conurbação" de seis assentamentos então classificados como favelas (fig. 1.1). Apresentando diferentes estados de consolidação e infra-estrutura instalada cada um possuía (e ainda possui) características específicas que permitem um forte senso de identidade a suas comunidades (figs. 1.1 e 12). Como uma das maiores favelas do Rio, sua população totalizava aproximadamente 66 mil moradores em uma área total com cerca de 81 hectares (tabela 1.1). Um número significativo de habitações, estimado por nós em cerca de 1.200, geralmente as mais recentes eram sobre palafitas e sujeitas às ações da maré (daí o nome do conjunto favelado). Havia se verificado a existência de aproximadamente 12 mil unidades residenciais na Maré, abrigando 17.067 famílias, das quais mais de 98% participaram diretamente das entrevistas cadastrais (1). Em 1979 o Ministério do Interior resolveu amparar um ambicioso projeto de recuperação ambiental para uma grande área às margens da Baía de Guanabara, abrangendo os Municípios do Rio e de Caxias. O chamado Projeto-RIO incluía em seu território diversas favelas, como o conjunto da Maré, consequentemente definindo-as necessitadas de intervenção. O então Ministro do Interior, Mário Andreazza, em uma decisão populista que pudesse apoiar suas pretensões à presidência da República, decidiu que as comunidades faveladas não seriam removidas, os projetos habitacionais incorporariam a participação dos moradores e os mutuários não pagariam prestações superiores a 10% do salário mínimo. Para isto o BNH alteraria radicalmente sua política, iniciando atuação em primeira linha e como agente promotor, ou seja, encarregado do financiamento direto e da consecução dos programas e projetos Ao mesmo tempo decidiu-se, ao contrário da opinião de inúmeros ambientalistas, promover o aterro hidráulico de uma enorme área já bastante comprometida com os processos de assoreamento, cujas causas principais evidentes eram a ação do Homem e a poluição da baía. A área total de inter-
(1) Os dados utilizados foram os censitários (1970) e aqueles obtidos pela FUNDREM (Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro). órgão estadual então indicado para coordenar os trabalhos do chamado Projeto-Rio em 1979, antes do BNH assumir por completo os trabalhos.
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Figura 1.1 - Planta de localização do conjunto Maré, assinalando a área a ser aterrada; estado em 1979
venção do projeto Maré incluía cerca de 130 hectares de aterro, uma escala que, evidentemente, representou imensos custos ao BNH, que não poderia repassá-Ios aos mutuários pois isto significaria uma prestação muito acima de sua capacidade de pagamento. Apesar de não ser nosso objetivo desenvolver esta questão, é necessário apontar que estes fatores, ao moldar a ação do BNH no caso Maré, representaram fardo significativo na falência institucional do sistema e,principalmente, que esta experiência serviu para demonstrar o despreparo do órgão para atuação em primeira linha e como agente promotor (2).
A Maré situacse a apenas uns 10 km do centro da cidade, ao longo da Av. Brasil, bem servida de transportes coletivos e inserida em área infra-estruturada. Já àquela época existia o projeto de via expressa paralela à Av. Brasil (linha vermelha). marginando a Baía, e que recentemente vem recebendo atenção do governo estadual para opções de sua implantação a curto prazo. As partes mais consolidadas da Maré já se encontravam perfeitamente integradas ao entorno, quase que exclusivamente ocupado pelo setor de comércio e serviços de médio porte, pequenas unidades fabris, e um grande quartel do exército. A população encontrava aí, com relativa facilidade, assim como na cidade universitária e no centro da cidade, a maioria de seus meios de sobrevivência. Entretanto, como era de se esperar, as condições de saúde do assentamento favelado eram das piores pois, embora 70% das habitações recebessem água encanada, a ausência de esgotamento sanitário e drenagem agravava-se com a falta de coleta de lixo, a poluição da baía, e o acúmulo dos dejetos, impactos ainda mais negativos pela ação da maré sob as palafitas (fig. 1.3). Aí as condições de moradia eram extremamente precárias, ao contrário de alguns dos assentamentos, como o do Timbau, cuja comunidade havia instalado o seu próprio sistema de col.eta de esgotos e distribuição de água (figs. 1.4 e 1.5). Pode-se imaginar as condições de insalubridade da vida sobre as palafitas, principalmente para as crianças; afogamentos e ataques de ratos eram comuns. Registros apontam que a ocupação da área pode haver se iniciado nos anos 30, no Morro do Timbau, a partir de uma "permissão" do quartel de exército adjacente. No início dos anos 60 foram construídos na região alguns centros de tria-
(2)Alguns autores analisamcom propriedade,atrajetória das políticas habitacionaisbrasileirase as causasda falênciado Sistema da Habitação que culminou na extinção do BNH. Ver, por exemplo: BOLAFFI. Gabriel, "A Casadas Ilusões Perdidas: Aspectos Sócio-Econômicos do Plano Nacional de Habitação", Cadernos CEBRAP n~27, Brasi· liense, São Paulo, 1977; VALLADARES,Lícia, "Passa-se uma Casa: Análise do Programa de Remoções de Favelasdo R.J.",Zahar, Rio, 1978; AZEVEDO, Sérgio e ANDRADE, Luis G., "Habitação e Poder: da Fundação da Casa Popular ao BNH", Zahar, Rio, 1982; MELO, Marcus, "Políticas Públicas e Habitação Popular: Continuidade e Ruptura, 1979/1988", in Revista RUA n~2, Faculdadede Arquitetura da U.F.Ba, Salvador, julho, 1989. Embora já precise ser atualizada, a única resenha abrangente publicadasobre a produção de pesquisa habitacional no Brasil encontra-se em VALLADARES, líGia (org.), "Repensando a Habitação no Brasil", Coleção Debates Urbanos n~ 3, Zahar, Rio, 1982.
gem, como Nova Holanda e Parque Rubens Vaz, habitações temporárias de madeira e em fila para as famílias removidas de favelas da Zona Sul (vide na figo 12 as filas de habitações mais regulares) Estas habitações tornaram-se permanentes e ao seu tecido Incorporou-se o desenvolvimento de áreas faveladas, principalmente ao longo da margem da baía. A única ameaça séria que sofreram foi com a remoção da favela de Inhaúma, localizada à base do Morro do Timbau, para a construção de melhor acesso à Ilha do Fundão, em meados dos anos 70. Logo toda a área estaria totalmente ocupada e "conurbada", com cerca de 45% das habitações em alvenaria. A densidade bruta variava desde os 378 habitantes/hectare no Timbau, até o extremo dos 1600 habitantes/hectare no subassentamento conhecido por Maré; evidentemente, com a maioria das edificações de um ou dois pavimentos, e áreas livres de uso coletivo, exceto pelos acessos, eram quase que inexistentes (vide tabela 1.1).
Tabela 1,1. Características populacionais dos assentamentos no conjunto MARÉ, 1980
nome
área (ha)
população
densidade (hab/ha)
unidades habitacionais
148,88
5640
378,78
1.118
Sapateiro
99,56
14.188
1.424,50
2.698
Maré
96.48
16129
1671,40
3.143
Timbau Baixa do
241,10
10.448
433,35
2.026
Rubens Vaz
58,48
6.273
1.072,31
999
Parque União
169,48
13.132
774.75
1.777
81,39
65.810
808.48
11.761
Nova Holanda
Total
De uma maneira geral, o comércio interno à Maré era bastante dinâmico e diversificado (com até mesmo chiqueiros sobre palafitas), totalizando mais de um mil estabelecimentos comerciais. No centro do assentamento e principal penetração desde a Av. Brasil, a rua Teixeira Ribeiro concentrava um dinâmico setor comercial e agitadas feiras semanais; um de seus supermercados especializa-se em produtos nordestinos, recebendo pelo menos um caminhão semanalmente I
Uma favela já consolidada como o conjunto Maré reproduz, em menor escala, a lógica típica de uma verdadeira cidade, com seu dinamismo interno, valorização de solo, mercado imobiliário etc. O seu processo de crescimento é, portanto, a demonstração mais evidente de fatores físico-espaciais como reflexos de condicionamentos sócio-econômicos. O mercado local, por exemplo, oferecia oportunidades aos recémchegados apenas nas áreas palafitadas, distantes das áreas
Figura 1.4 - A ocupação sobre palafitas no Parque Maré em 1980; o próximo estágio de consolidação seria o aterro dos acessos com entulho
Figura 1.5 - Avançado estágio de consolidação no Morro do Timbau, onde os moradores instalaram sistemas de distribuição de água e coleta de esgotos. Trecho com vistas para o conjunto favelado e o Hospital Universitário em 1980
mais "nobres" a menos que se dispusessem a pagar para tanto, sob controle dos "empresários" e grupos de poder locais. Os assentamentos de Parque União e do Morro do Timbau (fig. 1.6) tornaram-se os locais mais valorizados e melhor consolidados, este último desfrutando de bela vista da baía; isto pode ser verificado cruzando-se os dados das tabelas 1.1 e 1.2. Estimávamos a demanda imediata local em cerca de 3.200 unidades habitacionais, calculadas tomando por base apenas o número de famílias excedentes ao total de unidades existentes e o total sobre palafitas.
11 - Estratégia para Intervenção: Urbanização e Crescimento Como vimos, as condições reinantes na área da Maré inclusive o contexto institucional, combinava vantagens e d~svantagens mas, sem dúvida, proporcionava um quadro incentivador ao desenvolvimento informal, a ser reconhecido e incentivado pelas estratégias de intervenção. Estas, resumidas em suas linhas gerais a seguir, deveriam se refletir tanto nas áreas faveladas existentes, para sua melhoria geral, quanto nas novas a serem urbanizadas. Como à época deste estudo este aterro já estivesse em andamento optamos por assuml-Io como dado irreversível a receber o novo desenvolvimento. O quadro geral de escassez de recursos de nosso país indica que a ação institucional deve se ater a guiar o setor privado, promovendo apenas os meios facilitadores do desenvolvimento urbano por ele não servidos e aqueles que dependem de um quadro de garantias socializadas (TURNER 1976, PAYNE 1977). O poder público deveria ser o promotor consciente de elementos-ehave. "catalistas" do desenvolvimento, co~o malha viária ou escolas. A autonomia local de desenvolvimento deve ser alca'nçada com certas garantias governamentais no sentido da consecução dos objetivos e prioridades, estabelecidos junto com a população e seus representantes. Por este motivo entendíamos que os programas habitaclonals oferecidos pelo BNH deveriam ser os mais variados possíveis, .inclusive a nível de promoção de moradias para aluguel, atingindo todas as faixas de renda, e, principalmente, a nível do financiamento dos materiais de construção. De uma maneira geral, a nível de financiamento, todos os nossos programas e projetos propostos tomavam por base a menor utilização possível de recursos sem retorno, a capacidade de pagamento da população-alvo, e o melhor aproveitamento de sistemas de geração de subsídios cruzados inter-
nos à área Partindo do princípio da implantação de um processo de administração local de relativa autonomia, estes sistemas viabilizariam o reinvestimento local da mais-valia obtida com a valorização progressiva gerada pela implantação do ProJeto; por exemplo, um estoque de lotes estratégicos poderiam ser posteriormente vendidos por preços de mercado, atraindo faixas mais elevadas, compondo misturas sociais conjunto e gerando recursos para obras necessárias (3). E evidente que um sistema deste tipo pede monitoração firme das associações locais e técnicos responsáveis pelo proJeto, no caso o BNH, assim como o próprio acesso à terra e o mercado imobiliário local, principalmente o de aluguéis, tentando-se evitar ao máximo que as ações urbanizadoras do projeto gerem valorizações drásticas e não previstas, que acabariam por expulsar os inquilinos mais carentes.
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Outra estratégia seria que as ações institucionais não interfeririam no comércio informal, promovendo apenas atividades do circuito formal da economia que fossem complementares às existentes informais, como cooperativas e até agências
(3) Em relação a esta questão, WARD faz uma interessante proposta que permite aos próprios moradores tirar proveito da lógica de mercado: recebendo um "lote duplo", o mutuário poderia eventualmente ocupar sua metade extra ou, após determinado período de tempo, vendê-Ia no mercado, tirando proveito de uma valorização que ele mesmo ajudou a fazer e saldando suas dívidas com o financiamento. Veja WARD, Peter," Financing Land Acquisition for Self-Built Housing Schemes", in "Third World Planning Review" vol. 3 n? 1, Liverpool: fevereiro de 1981.
bancárias. Evidentemente, isto não deveria inibir o incentivo a atividades formais, fora dos limites do assentamento, capazes de gerar novos empregos, como faixas para o uso industrial não-poluente junto à Av. Brasil e ao acesso à ilha universitária A estratégia habitacional propriamente dita promoveria programas aos moradores locais com custos de financiamento proporcionais à sua capacidade de endividamento. Na faixa de renda familiar de .três a cinco salários mínimos mensais, por exemplo, uma quantia de 25 a 50% do SM.já era destinada a gastos com habitação; este deveria ser, portanto, o máximo desembolso mensal para as prestações de um dos programas habitacionais a serem oferecidos. Este raciocínio, evidentemente, seria respeitado em relação ao desembolso possível das várias faixas de renda. De uma maneira geral, os dados cadastrais mostraram que as habitações em piores condições (de construção e de espaço) e com mais de uma família moradora, correspondiam a menores tempos de fixação, famílias necessitadas de maior apoio. Os novos padrões urbanísticos e habitacionais a serem promovidos deveriam, também, reproduzir os padrões sócio-culturais básicos existentes nas comunidades locais, incentivando a apropriação total de novos valores e elementos. Os novos padrões físico-espaciais, por exemplo, deveriam incentivar a integração com as morfologias existentes e o entorno, o setor informal da economia, o fácil acesso a todas as partes do assentamento, a formação de subespaços para as pequenas redes sociais e a consolidação progressiva. Quanto ao sistema de propriedade a ser incentivado, o geralmente indicado tanto para áreas já consolidadas quanto para a nova Tabela 1.2 - Faixas de renda declarada do cabeça de família expressa em Salários Mínimos (sM), 1980 SM
1/2 SM
2/5 SM
Timbau
até 0,5 SM 168
202
545
436
47
Baixa do Sapateiro
318
582
1599
828
48
Maré
385
629
2.243
892
42
Nova Holanda
381
480
1.015
423
20
Rubens Vaz
135
218
774
480
29
Parque União
178
384
1.645
1.460
185
2495
7.821
4.519
371
14.9
46.6
26.9
2.2
nome
1.565
Total
% Obs.:
0,5/1
9.3 46 moradores
sem resposta.
1980 era de Cr$ 4.149.60.
O Salãrio Mínimo
equivalente
vigente
De uma maneira geral, as estratégias e seus programas e projetos deveriam não apenas responder aos anseios e reivindicações das comunidades, coletados pelo BNH e respondidos por nossa proposta, como também incorporar em seus processos de decisão e implementação a participação dos moradores e de suas associações (tabela 1.3). De uma certa forma, o Programa PROMORAR incentivou esta participação em níveis então inéditos em iniciativa habitacional desta escala e natureza, como possibilidade de escolha de tipo da unidade habitacional conforme necessidades familiares e capacidade de pagamento. Programas e projetos habitacionais, por sua vez, também deveriam prever diversos níveis de participação dos mutuários. Isto, como repetidamente observado em experiências participativas em todo o mundo, aumentaria o grau de satisfação dos moradores, permitiria uma adaptação contínua da unidade às necessidades da família e às suas possibilidades financeiras (4). Da mesma maneira, para o sucesso de uma implantação contínua e satisfatória dos objetivos da intervenção era vital a definição de um processo decisório com participação das comunidades atingidas, cujos atores seriam imbuídos de diferentes níveis de poder e responsabilidades (tabela 1.3). Uma garantia técnica disto seria fornecida pela implantação de escritórios técnicos locais, com representantes do BNH e da Prefeitura, em cada assentamento prestando assessoria às associações e aos moradores na construção e consolidação de suas unidades e administração de seu assentamento.
+5SM
em junho de
a US$ 58,73 (fonte:FUNDREM
urbanização seria o de condomínio; no primeiro caso pela facilidade de adaptá-Io às situações reais encontradas (físicas e sociais), no segundo por seu potencial socializante e limitador de individualidades exacerbadas.
1981).
Através do estudo físico-espacial do conjunto favelado, mais uma vez atendo-nos principalmente aos dados cadastrais existentes, interessáva-nos identificar os valores e as lógicas
(4) Já existem diversos registros de experiências bem-sucedidas na formalização institucional e participação na produção habitacional de baixa renda. Para o caso brasileiro veja-se, por exemplo: BLANK, Gilda;'Brás de Pina: Experiência de Urbanizalção de Favela", in VALLADARES, Lícia (org.), "Habitação em Questão", Zahar, Rio, 1979; REINACH, Henrique "Projeto Vila Nova Cachoeirinha: Construção Habitacional por Ajuda Mútua", in Revista Espaço e Debates n? 14, São Paulo, 1985.
Tabela 1.3 - Síntese esquemática participação no conjunto MARÉ
de processo de
atores
decisões
CODEFAM Conselho de Defesa das Favelas da Maré
participação no plano geral. implantação serviços. plano aplicação de recursos das agênclas setonals
diretas
responsabilidades controle programa de mato construção. receber prestações. controle do desenvolvimento
Associações de Moradores de cada favela
projetos de construção, administração de serviços sociais e de educação. aceitação novos moradores
controle dos serviços. controle do desenvolvimento. manutenção espaços
Conselhos de Moradores (por quarteirão)
assuntos afetam diretamente o grupo. aceitação novos moradores
manutenção dos espaços semipúblicos e pontos de serviços
Moradores
tipo de lote. de unidade e localização. construção ou opções de expansão. investimentos na unidade
prõpria tenção frente
unidade e manuda calçada em
de formação dos padrões típicos e elementos urbanísticos estruturais. Isto quer dizer, como vimos anteriormente quando comentávamos a teoria e metodologias de análise da morfologia urbana (Capítulo 51), estabelecer uma base projetual sócio-
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Figura 3_ 13 - Possibilidade de fachada para acréscimo frontal de edificação na Rua Buenos Aires, restabelecendo alinhamento original da-rua; escritório técnico do Corredor Cultural -
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f1itos de uso do solo e outros gerados pela regulamentação existente, limitações da equipe disponível e problemas oriundos à própria máquina administrativa, com excessiva burocracia entre seus inúmeros órgãos com diferentes orientações e prioridades. Quanto aos PEUs propriamente ditos, destacamos a importância da retomada de seu conceito original amplo e a adoção de territórios percebidos pela população como homogêneos e relacionados entre si, às vezes não-compatíveis com o con· ceito das U EPs. O tratamento destes projetos como de Dese· nho Urbano faz necessária a participação integrada de diversos órgãos afins à problemática a ser tratada, comprometendo-se a implementar suas partes nas diretrizes e intervenções definidas. Em relação a esta participação, a experiência tem mostrado a facilidade e os bons resultados obtidos nos trabalhos em conjunto com certos órgãos, como os de Patrimônio Histórico, talvez pela dificuldade que eles tenham em sua própria atuação individual. Por outro lado, é junto aos órgãos responsáveis pela engenharia viária e de transportes que mais se tem falhado nesta integração, talvez pela pouca claridade que sempre caracterizou este setor no Rio de Janeiro, com conflitos expressos até na atuação das diferentes esferas de poder. Talvez com a recente criação da Secretaria Municipal de Transportes, em 1987, e a possível passagem de responsabilidades do DETRAN, consiga-se uma melhor definição para esta questão específica. Estas considerações não anulam a necessidade de se desenvolver um plano geral de Desenho Urbano para a cidade do Rio de Janeiro, a ser incorporado no Plano de Desenvolvimento Urbano Municipal. Este plano deve contemplar os objetivos e conceitos gerais de Desenho Urbano a serem perseguidos e as imagens gerais e características físico-ambientais que o contexto urbano deve almejar, definindo uma "cara", uma personalidade e uma riqueza de visualidade e significados para as partes e para o todo da Cidade. O tempo envolvido nos procedimentos relativos a um PEU, desde a sua elaboração até a implementação, de suas propostas, é de grande importância e não deve estar limitado segundo os critérios usuais. Como frisamos, cada PEU e sua unidade espacial possui características e individualidades específicas que vão determinar procedimentos e tempos diferenciados. Isto deve incluir tanto o espaço para a necessária vivência de cada realidade, quanto flexibilidade para diferentes modos de
participacão comunitária e possíveis oportunidades de ampliação de projetos durante sua própria implantação. Não se deve esquecer, porém, que o Desenho Urbano, por tratar de qualidade físico-ambiental, possui tempos de implementação de curto-médio prazo, geralmente inferiores aos assumidos pelo Planejamento Urbano, e que a população espera ver resultados coerentes e concretos em pouco tempo. Certas ações, entretanto, se destacam neste processo. Primeiro, para a feitura dos PEUs, impõe-se a revisão inicial de todos os PAs e PALs, em uma proposta global de Desenho para todo o território de projeto. Em segundo lugar, verificamos ser vital que, se como primeira medida, se "congele" por decreto municipal o desenvolvimento da área do PEU, medida por tempo determinado para evitar que se inicie um brusco processo especulativo e corrida de aprovação de projetos com os interesses imobiliários adiantando-se à ação do Poder Municipal. A terceira ação destacada é a possibilidade de se decretar "zoneamentos pontuais", condições de uso e edificação para terrenos específicos, dando oportunidade de ações emergenciais, garantindo os interesses da comunidade durante a elaboração do PEU até a aprovação de uma regulamentação global para o bairro. Este tipo de processo viabilizaria, inclusive, a prática da negociação entre o Poder Público, a comunidade local e os empresários interessados, em torno a "pacotes" de projetos urbanos, como é comum em outros países.
A questão da capacidade de trabalho do Poder Público, frente às inúmeras áreas necessitadas de PEUs e às limitadas equipes disponíveis em seus quadros, poderia ser superada de forma descentralizadora e amoldando-se em um processo político mais democrático. A elaboração destes trabalhos poderia ser repassada a escritórios liberais, através de concursos públicos, em que talvez uma das exigências do edital fosse a de a equipe possuir alguma ligação vivencial com a área de projeto (poderiam participar escritórios ali localizados ou cujos sócios ali residissem etc.) ou que montassem escritórios locais abertos ao público para o desenvolvimento do trabalho. Estes escritórios contratados deveriam ter participação multidisciplinar e seriam supervisionados pela equipe municipal tendo, assim, potencial de maior dinamismo e "neutralidade". Quanto à questão da participação comunitária, observamos as dificuldades de sua implementação, principalmente na mobilização da população para problemas decorridos de uso do
solo e de legislação urbanística, temáticas ainda não evidentes ao cidadão normal. Também surge aí a evidência de um necessário trabalho constante de divulgação de nosso papel e dos processos de desenvolvimento e administração da cidade, possibilidades e limitações; os segredos da máquina administrativa, a democratização da informação e a definição das responsabilidades.
e valores da população, a fim de complementar o proc participativo formal, a exemplo do questionário cit do p r o PEU do Méier. Por outro lado, como importantes ag nt da vida política urbana, em pleno, desenvolvimento, as Assoei· ções de Bairro podem e devem se aproveitar destas oportunidades para sua própria legitimação e fortalecimento interno.
Destacamos a importância do desenvolvimento de análise que possam identificar percepções,
As leis e regulamentações do desenvolvimento urbano não devem, entretanto, apenas insistirem na obrigatoriedade do Poder Público em obter a "participação comunitária", citando a expressão como só o fato dela existir no corpo das normas legais fosse a resposta. O Poder Público deve esclarecer e regulamentar quais os processos participativos, definir o papel da éomunidade nos processos decisórios, estabelecer órgãos mistos e lidar com temas complexos como a questão dos níveis de representatividade, de poder e de responsabilidade nas diversas etapas da administração pública e implementação dos planos, projetos e programas.
de métodos expectativas
Finalmente, devemos levantar a questão da forma final que um PEU deveria tomar para ser implantado. A proposta original e a prática normal da Prefeitura até há pouco tempo vinham sendo a de instituí-Ios por decreto do Executivo, tanto por ser a tradição de regulamentar o uso do solo na cidade quanto por sua praticidade. É evidente que ao permanecer exclusivamente nas mãos do executivo os projetos ficam mais facilmente expostos a pressões econômicas e políticas, como era comum não há muito tempo no Rio de Janeiro. Nos últimos anos, com a ampliação das práticas democráticas, estas iniciativas Já têm sido apresentadas como projeto-lei à Câmara Municipal; algumas, como vimos, com bons resultados, outras com alterações substanciais e pouco técnicas por parte dos vereadores. Entretanto, é evidente qu.e a Câmara Municipal é o fórum dos representantes mais direto da população e, como tal, tem o direito e o dever de atuar no controle do desenvolvimento urbano, resguardados pela Constituição. De que forma e em que níveis são questões ainda não-definidas; talvez nunca exista um modelo, pois cada cidade possui as suas especificidades e os seus momentos políticos.
Figura 3.16 - Apesar das dificuldades, identificar necessidades dos grupos sem expressão política mas com muito significado na dimensão sócio-cultural de determinadas áreas, como é o caso destes sobrados na Lapa, Rio
O que se deve tratar de instituir no Rio de Janeiro, para tanto, é uma lei maior, de caráter amplo, como uma Lei de Desenvolvimento Urbano, amparando uma Lei de Macro-Zoneamento, que definiriam os grandes objetivos do desenvolvimento da cidade e as linhas gerais para sua implementação e funcionamento da cidade. Atualmente (1989), o Plano Diretor da cidade
encontra-se em desenvolvimento na Prefeitura e espera-se que ele venha a contemplar todas estas questões, viabilizando o seu detalhamento consequente. Continua a prevalecer a idéia de que os PEUs sejam instituídos através de decretos, em toda extensão do território. Mas cabe indagar se estes não deveriam também ser objeto de leis municipais? Entretanto, como cada instrumento possui suas vantagens e desvantagens, talvez o ideal seja um processo misto em que num primeiro momento haja um decreto "congelando" a área, depois a aprovação de uma lei simples de diretrizes locais gerais seguida de um decreto detalhado do PEU.
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Bibliografia comentada
Os títulos comentados a seguir compõem o que entendemos ser uma bibliografia básica no campo disciplinar do Desenho Urbano. Evidentemente, somos limitados pelos trabalhos que conhecemos e que já tivemos acesso; entretanto, nossa já longa atuação na área nos faz acreditar termos coberto na Bibliografia a grande maioria dos títulos importantes existentes. Nesta Bibliografia Comentada, tratamos de indicar os títulos que julgamos mais importantes, principalmente para o iniciante, traçando breves comentários sobre seu conteúdo e sua aplicabilidade. Sempre que possível, nos referimos àqueles editados no Brasil ou a edições de mais fácil acesso ao público leitor, principalmente em castelhano. Para facilitar ao leitor, adotamos a seguinte legenda indicativa dos campos temáticos abordados pelos títulos:
ALEXANDER, Christopher et aI., "Un lenguage de Patrones", Editorial Gustavo Gilli, Barcelona, 1980. A "linguagem de padrões" permitiria ao projeto ser gerado através da "maneira intemporal de construir", ou seja, reproduzindo qualidades reconhecidamente existentes na arquitetura vernacular e nos assentamentos tradicionais. Para isto são discutidos 253 padrões (dimensões ou metas) de desenho, englobando temas que vão desde o planejamento regional até detalhes de ornamentação e iluminação da edificação. Este é o mais importante de uma série iniciada com título sobre a definição teórica de "uma maneira intemporal de construir"; outros trazem três aplicações da teoria e, o mais recente, mostra sua aplicação a nívei de desenho urbano em uma proposta para área de São Francisco.
APPLEYARD, Donald, "Planning a Pluralist City: Conflicting Realities in Ciudad Guayana", MIT Press, Cambridge MA 1976. Leitura básica para os interessados na aplicação das teorias e métodos de Kevin LYNCH para o estudo da percepção espacial. O autor coordenou extenso trabalho nesta área para o planejamento
de Ciudad Guayana, uma cidade nova industrial na Venezuela que seria construída a partir de assentamentos já existentes. A partir de profundos estudos de campo com entrevistas, mapas mentais e de percursos ficaram evidentes diversos conflitos de imagens, valores e expectativas entre os grupos populacionais existentes, os novos habitantes (operários e técnicos) e os próprios planejadores. ARCE, Rodrigo Perez de, "Urban Transformations: The Architecture of Additions", in Architectural Design Vol. 48 n~4, Londres, 1978. Artigo que chama atenção para a importância do estudo das estruturas mais permanentes na evolução das cidades e que são apropriadas de diversas formas pela população e pelo tecido urbano. O autor incorpora a preocupação pela dimensão temporal e aí encontra embasamento para propor a adaptação de estruturas modernistas que conflitam com morfologias e modos de vida preexistentes, através de intervenções "aditivas" (Chandigard, Unité d'Habitation etc.). Neste caso talvez o problema do leitor seja o acesso à revista. AYMONINO,
Carlo, "O Significado das Cidades", Coleção Dimensões n~ 15, Editorial Presença, Lisboa, 1984. Junto com o de ROSSI, este é título básico no estudo da morfologia urbana. Após notas de dez anos de aulas na Universidade de Veneza, o autor objetiva mostrar que é a partir de uma série de análises específicas capazes de definir as transformações urbanas através do tempo como testemunhas físicas de condicionamentos sociais e econômicos, que se vai conseguir compreender o verdadeiro significado das cidades e promover uma atuação urbanística conscienciosa. A hierarquia dos elementos e suas inter-relações morfológicas
são aqui vistas como essenciais; a arquitetura é vista, antes de tudo, como um fenômeno urbano. BACON, Edmund, "Design of Cities", Thames and Hudson, Londres, 1974. Um amplo estudo sobre o desenvolvimento histórico das cidades, a partir de seu entendimento como um "indicador sem piedade do estágio de uma civilização". O autor acredita que uma melhor compreensão das interações resultantes da multiplicidade de decisões dos habitantes pode nos dar uma consciência maior de como criar cidades mais "nobres". Isto se daria se a arquitetura assumisse que seus "ingredientes" básicos são a massa e o espaço e se a articulação da cidade se der com base nos sistemas de movimentos. O texto é acompanhado de inúmeras e belas ilustrações e inclui um capítulo sobre Brasília, que o autor classifica como "o grande esforço" (uma visita a Brasília, posterior à primeira edição, fez com que o autor mudasse radicalmente sua opinião a ponto de alterar totalmente o texto e admiti-Io incluindo, também, a primeira versão).
BAILLY, Antoine, "La Percepcion dei Espacio Urbano", Coleção Nuevo Urbanismo n~ 29, Instituto de Estudios de Administracion Local, Madri, 1978. Trata conceitos e métodos de estudo da percepção ambiental na investigação urbanística. Como originou-se na tese de doutoramento do autor para a Sorbonne, é trabalho academicamente bastante abrangente neste campo temático. A abordagem é essencialmente geográfica e parte de uma ampla discussão do estado-da-arte e de definições conceituais sobre as diferentes teorias de percepção e os diferentes processos de formação
de imagens mentais. O autor faz uma útil discussão sobre as técnicas existentes para o estudo da percepção do meio urbano, bem como uma breve discussão sobre o enfoque comportamentalista (behaviorista) na análise urbana.
BARNETI, Jonathan, "An Introduction to Urban Design", Harper and Row, Nova lorque, 1982. Este é um dos livros mais conceituados em nossa área nos EUA, principalmente por sua forma de tratamento da questão da exequibilidade do Desenho Urbano, tanto em termos institucionais quanto do poder privado. O autor foi o responsável pela instituição de um processo de Desenho Urbano na cidade de Nova lorque, tendo a seu favor, portanto, prática bastante acirrada. Nos mostra como desenhar cidades sem desenhar seus edifícios em um contexto de planejamento capitalista onde regulamentos devem possuir um dinamismo todo especial em busca de objetivos sociais e econômicos.
CANTER. David & STRINGER, Peter (org.). "Interaccion Ambiental", Coleção Nuevo Urbanismo n~ 26, Instituto de Estudios de Administracion Local. Madri, 1978. Os organizadores e autores são psicólogos ambientalistas mais reconhecidos da Grã-Bretanha e o livro é uma introdução bastante abrangente ao tema, pois cobre campos arquitetônicos propriamente ditos, como iluminação e conforto térmico, e urbanos, tanto em termos de percepção espacial quanto em comportamento dos usuários. Interessante como discussão dos conceitos aplicáveis e de métodos de estudo.
CASTEX J., DEPAULE J. & PANERAI, P., "Formas Urbanas: de Ia Manzana ai Bloque", Gustavo Gilli, Barcelona, 1986. Segundo os autores, sua preocupação principal é a "dimensão física da cidade ... esta lógica dos espaços que é contida na expressão tecido urbano e onde o lote constitui um elemento determinante". A organização espacial é sempre vista como determinada/determinante das relações sociais. Para isto os autores concentraram-se no período do urbanismo já com o sentido moderno do termo, partindo de uma avaliação das modificações de Paris sob o Barão Haussmann, passando pela análise das cidades-jardim inglesas da virada do século, pelas extensões de Amsterdam de Berlage, por Frankfurt de Ernst May e pela crítica aos paradigmas e práticas de Le Corbusier. CULLEN, Gordon, "A Paisagem Urbana", boa, 1983.
Edições 70, Lis-
O mais importante título sobre a análise visual da cidade, tendo servido de base para inúmeros planos, projetos e regulamentações urbanísticas na Grã-Bretanha, país que adotou as teorias e técnicas de CULLEN quase que "oficialmente". Ele trata de mostrar a "arte" da paisagem urbana, esteticamente compreendida a partir de sentimentos e impressões no observador, numa percepção entendida como uma sucessão de quadros visuais. Qualidades físico-espaciais como variedade, incidência de luminosidade, desvio de ângulos visuais etc. são destacadas.
FRAMPTON, Kenneth,"História Critica de Ia Arquitectura Moderna", Gustavo Gilli, 1987. Um dos títulos recentes mais interessantes sobre a evolução da arquitetura
moderna e seu estado atual. O autor parte da análise do progresso cultural e tecnológico do período entre meados do século XVIII até o começo da II Guerra, para situar o desenvolvimento da arquitetura moderna. Depois, cada capítulo traz uma análise crítica de diversos arquitetos e grupos representantes de "correntes", terminando nas tendências mais atuais. Como todo trabalho histórico-analítico, não consegue escapar de ser tendencioso a partir dos próprios valores do autor, mas apresenta importantes conclusões sobre o que chama "vulgarização da arquitetura e seu progressivo isolamento da sociedade", ao invés de colocar-se como uma "redefinição crítica porém criativa das qualidades concretas do ambiente construído" .
é, na verdade, apenas introdutório a nosso campo disciplinar, abordando conceitos e teorias principais. Sua importância vem de sua abrangência, simplicidade de leitura e por sua publicação ter sido em época oportuna. . GOODEY, Brian & GOLD, John, "Geografia do Comportamento e da Percepção", Publicação especial n?3, Departamento de Geografia, Inst. Geociências, UFMG, Belo Horizonte, 1986. (f, g)
GEHL, Jan, "Life Between Buildings: Using Public Space", Van Nostrand Reinhold, Nova lorque, 1987. Analisando o comportamento dos usuários dos espaços urbanos públicos, este título representa importante apanhado das pesquisas deste autor dinamarquês cujas publicações até há pouco sofriam da falta de tradução para língua mais acessível. Parte formando base conceitual sobre a vida nos espaços gerados entre as edificações e suas qualidades sociais, passa pela identificação de requisitos para o planejamento, e desenvolve todo um estudo temático da utilização dos espaços públicos e seus efeitos sobre o comportamento dos usuários, como integrar/dispersar, abrir/fechar, andar, sentar, conversar etc.
Apostila onde os autores descrevem o desenvolvimento da área da geografia que trata do comportamento e da percepção espaciais. Há muito os geógrafos preocupam-se pelo uso do espaço, objeto primeiro de sua disciplina, e há uns dez anos têm-se interessado neste campo de pesquisas. O departamento de Geografia da UFMG tem-se interessado em promover o desenvolvimento destes estudos no Brasil, juntamente com o da Universidade de São Paulo, campus de Rio Claro.
GOSLlNG, David, "Desenho Urbano", apostila mimeografada, Mestrado em Planejamento Urbano, Instituto de Arquitetura e Urbanismo, UnB, 1976. (a, c, f, e)
Estas notas de aulas ministradas por GOSLlNG, quando professor em Brasília, já abordavam importantes temas em nossa área de estudos, principalmente relativos à análise visual do espaço urbano. A publicação é de difícil acesso e possui limitação natural imposta por ser gerada a partir de notas de aulas e por não possuir ilustrações.
GOODEY, Brian, "Participação, Percepção e Desenho Urbano", (org V. dei Rio), Coleção MÓDULO/Universidade n~1, Revista Módulo/Editora Avenir, Rio, 1985.
GOSLlNG, David & MAITLAND, Barry, "Concepts of Urban Design", Academy Editions/St. Martins Press, Londres, 1984.
Organizado a partir das palestras de GOODEY realizadas no Brasil, este título
Importante título abordando as origens da disciplina, conceitos básicos e áreas
temáticas de atuaçao. Os autores apontam o que seriam problemas de desenho urbano embora pareçam limitá-Ios a áreas geográficas específicas da cidade. O texto possui inúmeras referências a exemplos internacionais e é fartamente ilustrado. As conclusões defendem premissas para o desenho urbano como participação comunitária, respeito ao passado e adaptabilidade ao contexto ambiental, em busca de atuação "minimalista" para estruturação urbanística, flexível e coerente. HALL, Edward, "A Dimensão Oculta", Livraria Francisco Alves Editora, Rio, 1977. Título básico da ciência do comportamento humano, abordando antropologia e psicologia. O autor mostra a importância da cultura na determinação dos padrões e formas de comunicação e, consequentemente, na percepção espacial e no nosso comportamento social. Inicia-nos em conceitos como de territorialidade e na "proxemia", estudo das diversas distâncias adotadas pelo homem nas diferentes situações sociais, desde a íntima até a pública, e nas implicações que possuem para o comportamento e a vida urbana. HOLLANDA, Frederico de, "O Centro Urbano de Brasília", mimeografado, Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, 1975. Uma das primeiras análises teóricas sobre o centro da Capital enquanto produto físico-espacial e suas implicações sociais. Buscando referências teóricas nos centros de cidades não-projetadas, onde se expressam as mais altas formas de convívio, de trocas e de produção simbólica, o autor comenta como a riqueza ambiental tem sido substituída pelo simplismo modernista. O centro de Brasília é objeto de análise e algumas hipóteses para sua reestruturação são
colocadas, como promoção de animação urbana através da concentração e da variedade de funções e atividades, ocupação dos espaços intersticiais entre edificações e incorporação da função residencial. HOLLANDA, Frederico de, "A Morfologia Interna da Capital", in PAVIANI, Aldo (org.) 1985. O autor parte da premissa que a arquitetura e o urbanismo não determinam a nossa vontade, mas é inegável que os processos sociais não são indiferentes às morfologias e características dos locais onde acontecem. Diversas partes do Plano Piloto de Brasília são ~nalisadas sob esta ótica, tomando por base a teoria e os métodos de HANSON & HILLlER (1979). Constata-se como seus determinantes físicos encorajam apenas as práticas sociais uniformes e unívocas, sem a complexidade e variedade que caracterizam historicamente as áreas urbanas, e a privatização dos acontecimentos sociais. JACOBS, Jane, "The Deat and Life of Great American Cities: The Failure of Town Planning", Pelican, Middlesex, 1974. Se tivéssemos de escolher um título que representasse "onde tudo começou", sem dúvida optaríamos por este livro publicado pela primeira vez em 1961. Trata-se de uma crítica feroz à ideologia do planejamento nos moldes modernistas e em suas práticas e resultados. Exaltando a vida e as qualidades de lugares como Greenwich Village, em Nova lorque, a autora defende basicamente os aspectos da vida comunitária, como segurança e contatos sociais nas áreas públicas, necessidade de diversidade e concentração de usos, implicações sociais no tamanho dos quarteirões e na densidade. Ela também mostra as razões para o declínio dos centros urbanos e algumas condições importan-
tes para sua regeneração. Foi o primeiro texto consistente e de grande penetração a afirmar que os planejadores estavam errados e incutiam seus próprios valores asséticos e moralistas.
JENCKS, Charles & BAIRD, George (org.), "EI Significado en Arquitectura", Blume Ediciones, Madri, 1975. Importante coletãnea sobre a arquitetura e o meio ambiente enquanto fenômeno de comunicação, um dos títulos básicos de semiologia aplicada. Diversos autores colaboram para a qualidade do livro, com destaque para Charles Jencks, Geoffrey Broadbent e Christian Norberg-Schulz (semiologia e arquitetura). Françoise Choay (semiologia e urbanismo). Aldo Van Eyck (tempo, lugar e significado) e Nathan Silver (arquitetura como sistemas de pessoas).
KOHLSDORF, Maria Elaine, "Breve Histórico do Urbano como Campo Disciplinar", in FARRET, Ricardo (org.). "O Espaço da Cidade: Contribuição à Análise Urbana", Projeto, São Paulo, 1985.
Abrangente análise teórica sobre o desenvolvimento do urbano enquanto campo de preocupaçôes das diferentes disciplinas. Atenção especial é dada à evolução e caracterização das análises visual e de percepção ambienta!. A autora mostra como, em relação aos aspectos que dizem respeito à qualidade ambiental, ainda é frágil a pesquisa urbana no Brasil pois limitamo-nos à prática sem verdadeiro embasamento científico e ainda concentramo-nos no espacial unicamente como subproduto do social.
KOHLSDORF, Maria Elaine, "As Imagens de Brasília" in, PAVIANI, Aldo 1985
KOHLSDORF,
(a, e, f)
Maria Elaine "Manual de Técnicas de Apreensão do Espaço Urbano", mimeografado, Departamento de Arquitetura e Urbanismo, UnB, 1984. Apostila de curso que aborda importante temática, resultado de anos de pesquisa pioneira pela autora, docente da UnB. Partindo de um referencial teórico que define o processo de percepção e cognição da mente humana, a apreensão do espaço urbano verifica-se como processo consciente de referencial imagético. São identificados três níveis básicos para esta apreensão (da percepção, da imagem e dos dados objetivos) e para investigá-Ios são discutidas as técnicas de análise sensorial, visual e tipológica.
A partir da constatação de que hoje Brasília "configura-se como um tecido descontínuo e heterogêneo, composto por núcleos morfologicamente distintos e fisicamente distantes", ainda que interrelacionados como partes do mesmo todo, a autora identifica e analisa estas diferentes tipologias urbanísticas. Através de um embasamento de análise visual, principalmente fundamentando-se na psicologia "gestaltica", verifica efeitos imagéticos, como silhuetas, coroamentos, linhas de força, tipos de malhas, relaçôes espaços abertos/fechados, entre outros conceitos, para classificar a existência de quatro tipos específicos de assentamentos no Distrito Federal, cada um com sua lógica interna: plano piloto, cidades satélites, acampamentos, invasôes e vernáculo.
KRIER, Rob, "EI Espacio Urbano", Gustavo Gilli, Barcelona, 1981.
De autoria de um dos arquitetos mais famosos do pós-modernismo e do contextualismo nas práticas urbanísticas, este livro se tornou uma fonte de referência para os seguidores de suas idéias. Basicamente, KRIER segue uma postura essencialmente estética na composição urbana, a exemplo de Camillo SITTE, buscando a manutenção das lógicas físico-espaciais tradicionais da cidade européia. Parte da identificação de uma tipologia de elementos arquitetônicos e urbanos e de uma ampla crítica aos modelos modernistas, para chegar a propostas para reestruturação de áreas do centro de Stuttgart como exemplos da aplicação de suas idéias. LANG, Jon, "Creating Architectural Theory: The Role of the Behavioral Sciences in Environmental Design", Van Nostrand Reinhold, Nova lorque, 1987. Partindo do princípio que a base do conhecimento para a ação de projeto precisa ser melhorada substancialmente, o autor defende a construção de teorias da arquitetura mais consistentes e baseadas nas ciências do comportamento. Este título faz parte da nova geração de pesquisas norte-americanas que situa a arquitetura no campo abrangente do "desenho ambiental". A compreensão de fenômenos e processos usuários embasam-se principalmente no estudo do comportamentalismo e da percepção, que são detalhada mente revistos. LEE, Terence, "Psicologia e Meio Ambiente", Curso Básico de Psicologia, Zahar Editores, Rio, 1977. Um dos pioneiros trabalhos sobre a psicologia do meio ambiente como enfoque abrangente de análise e atuação em designo O autor desenvolve base con-
ceitual e analisa os diversos modos como o ambiente construído influencia nossas percepções, atitudes e comportamentos. São abordados importantes conceitos como territorialidade, espaço pessoal e privacidade, comentados diversos métodos de medição de fenômenos e de pesquisa, bem como estudos sobre residências, escolas, hospitais e áreas urbanas.
LYNCH, Kevin (1960). "A Imagem da Cidade", Martins Fontes, São Paulo, 1985. Este é o título mais influente da aplicação dos estudos da percepção ambiental para o desenho da cidade. LYNCH forma sua base teórica defendendo as qualidades que fundamentam a formação de uma imagem mental clara nos usuários: estrutura e identidade, legibilidade e imageabilidade. Estudando Boston, Jersey City eLos Angeles, a partir de entrevistas e questionários (com obtenção dos famosos mapas mentais de áreas e percursos). o autor identificou cinco elementos básicos na conformação destas imagens mentais: percursos, nós, limites, distritos e marcos. São traçados comentários sobre a utilização deste método e da aplicação dos achados para o projeto.
LYNCH, Kevin, "Managing the Sense of a Region", MIT Press, Cambridge (MA). 1976. Este é um pequeno livro com vastos rebatimentos, propondo um amplo programa de atividades para o planejamento e o gerenciamento territorial (região e cidade) principalmente no que diz respeito a suas qualidades sensoriais. LYNCH apresenta um minucioso glossário de técnicas de investigação que abordam desde a forma espacial, até o comportamento espacial e as imagens; apóia-se em evidências expostas por estudos descritos que abordam o
nível do sentimento, do comportamento, da formação de imagens, de preferências e valores, do ambiente natural, e da comunicação e processos educativos. O autor encerra apresentando exemplos hipotéticos de estudos regionais para a qualidade sensorial.
de se atentar que nos EUA ambos tipos de estudo são geralmente classificados em "comportamento ambiental" (environment-behavior), MUNFORD, Lewis, "A Cidade na História", Editora Itatiaia, Belo Horizonte.
LYNCH, Kevin, "La Buena Forma Urbana", Gustavo Gilli, Barcelona, 1985.
Originalmente publicada em 1961, esta é obra fundamental de um dos maiores pensadores urbanistas de nossos tempos, que nela analisa a evolução das cidades e o desenvolvimento do Homem. O autor defende que a natureza histórica da cidade deve ser compreendida se quisermos estabelecer uma nova base para a vida urbana. Segundo o pensamento humanístico de MUNFORD, a sociedade humana teria chegado a um estágio crucial em que terá de se decidir entre o desenvolvimento de sua própria humanidade ou render-se às forças quase automáticas de seu alter ego desumanizado, o "homem pós-histórico", Para embasarmos esta opção ele propõe uma análise histórica da cidade e das relações que o Homem manteve com ela, desde a pré-história e a formação dos primeiros assentamentos, até a megalópolis.
Obra máxima de LYNCH que nela busca a promoção da boa forma urbana e nos mostra como são inadequados os três modelos normativos de cidade existentes (cidade como modelo do cosmos, como máquina e como organismo vivo). As teorias normativas determinam como a forma deve ser, enquanto o autor defende não modelos específicos mas dimensões de performance da forma: características dependentes primordialmente de suas qualidades espaciais e que são mensuráveis a partir de seu uso pelos diferentes grupos de cidadãos. Ele identifica cinco dimensões inter-relacionadas (vitalidade, senso, congruência, acesso e controle) e dois meta-critérios (eficiência e justiça). O livro termina com alguns exemplos de aplicações da teoria e apêndices sobre a evolução de modelos urbanos. NORBERG-SCHULZ, MOORE, Gary, "Estudos de Comportamento Ambiental", in SNYDER J. & CATANESE A. (org.), "Introdução à Arquitetura", Editora Campus, Rio, 1984. (f, g)
Neste livro, o leitor precisa antes de mais nada precaver-se quanto à péssima tradução que, por vezes, consegue até distorcer a mensagem dos autores (para quem puder indico mesmo a edição original norte-americana). Entretanto, o artigo indicado de MOORE é talvez o texto mais acessível e simples sobre estudos de percepção e comportamento e seu rebatimento para o projeto. Há
Christian, "Genius Loci: Towards a Phenomenology of Architecture", Academy Editions, Londres, 1980. Prosseguindo em suas investigações sobre as implicações psíquicas da arquitetura e do urbanismo, iniciadas em títulos famosos anteriores como "Intentions in Architecture" (1963) e "Existence, Space and Architecture" (1971), este cerebrado "filósofo" do espaço acredita que se o meio ambiente influencia os seres humanos, o propósito da arquitetura transcende sua definição funciona lista. Para ele não existem tipos diferentes de arquitetura, mas apenas diferentes situações que pedem diferentes soluções para sa-
tisfazer às necessidades físicas e psíquicas do Homem. Baseia-se em conceitos como "espaço existencial", onde sobressaem as funções psíquicas básicas de "orientação" e "identidade", e no pensamento de HEIDEGGER, para mostrar que a arquitetura deve visualizar e materializar o "genius loci", ou o espírito do lugar. Suas considerações fenomenológicas nos levam a um passeio histórico e geográfico d"ls arquiteturas do mundo.
PANERAI P., DEPAULE J, DEMORGON M. & VEYRANCHE M., "Elements d'Analise Urbaine", Archive d'Architecture Moderne, BruxeIas, 1980. Representa bem a corrente francesa de estudos morfológicos da cidade, onde os autores procuram estudar a forma urbana identificando sua organização, os elementos de composição, demonstrando sua lógica e descrevendo a sua estrutura formal. "A análise urbana permite ... definir o lugar teórico do projeto". Os capítulos abordam os temas do crescimento urbano, perfil fundiário, tipologias edilícias, paisagem, prática social e estruturas urbanas, finalizando com a proposição teórica em busca de uma "arquitetura urbana".
PAVIANI, Aldo (org.), "Brasília, Ideologia e Realidade/Espaço Urbano em Questão", Projeto Editores, São Paulo, 1985. Para os arquitetos talvez esta seja a mais interessante coleção de ensaios analíticos sobre nossa Capital já publicada. Diversos níveis e tendências teóricas foram utilizados na análise deste objeto comum e de como ele vem respondendo às diversas necessidades impostas desde sua inauguração, como as políticas, as funcionais-metropolitanas, residenciais e de apropriação coletiva ou individual. O cam-
po específico do desenho urbano é contemplado principalmente nos excelentes textos de HOLLANDA e KOHLSDORF, já comentados, e de MACHADO e MAGALHÃES, onde se adota uma perspectiva antropológica para se discutir as leituras que as diferentes classes fazem da Capital. a sua representação e seu modo de vida.
PRINZ, Dieter, "Projetos Urbanos", (vol. 1), " Configuração Urbana", (vol. 21. Ed. Presença, Lisboa, 1984. O estudo de manuais deve sempre levar em conta a sua falta de embasamento conceitual expresso e que suas indicações de parâmetros não são generalizáveis para todos os contextos; apresentamos este título aqui por sua organização temática constituir bom enfoque de processo de planejamento físico-territorial, detalhando cada uma das fases. Em sua parte mais voltada para o desenho urbano o seu enfoque é extremamente visual e paisagístico mas, ainda assim, útil como recomendações e procedimentos para o estudante.
REZENDE, Vera, "Planejamento Urbano e Ideologia: Quatro Planos para a cidade do Rio de Janeiro", Civilização Brasileira, Rio, 1982. Através de uma análise da evolução das práticas urbanísticas principais no Rio de Janeiro, a autora nos fornece uma boa compreensão do estado atual da cidade. Os planos Agache e Doxiadis, o Plano Urbanístico Básico e o Plano Integrado de Transportes do Metrô são investigados quanto a seus papéis de legitimação de ideologias e reprodução das relações de produção. A análise temática que a autora apresenta nos permite, também, verificar como a dimen-
são físico-espacial da cidade foi perdendo a importância institucional e tornouse subproduto inconsciente da dinâmica urbana. ROSSI, Aldo, "A Arquitetura da Cidade", Edições Cosmos, Lisboa, 1977. Um dos expoentes da arquitetura neoracionalista italiana, urbanisticamente ROSSI é um dos definidores da corrente pós-moderna "contextualista". Publicado originalmente na Itália em 1966, as seguidas novas edições revisadas (também em espanhol. inglês, alemão e francês) atestam a importãncia deste livro. No prefácio da edição americana, Peter Eisenman compara ROSSI a Vitruvio, Serlio e Palladio, atestando a tradição italiana de análise da cidade e da arquitetura através do seu desenho cuidadoso. O livro parte de uma crítica ao urbanismo modernista e propõe o estudo da cidade entendida como fenômeno arquitetônico, dependente acima de tudo de sua própria história. Ele lida com conceitos de permanência e continuidade, tipologias, relações e memória coletiva. A edição portuguesa é de difícil acesso; existe a espanhola, editada pela Gustavo Gilli (coleção Punto y Linea)
SANTOS, Carlos Nelson F. dos (coord.). "Quando a Rua Vira Casa", Projeto Editora/lBAM, São Paulo, 1985. "A Cidade como Um Jogo de Cartas", Editora da Universidade Federal Fluminense/Projeto Editora, Niterói/São Paulo, 1988. Precocemente falecido, nosso maior pensador sobre a cidade nos legou inúmeros textos e coordenou diversos trabalhos importantíssimos para nosso campo disciplinar, dos quais destacamos estes dois títulos. Nos últimos anos
ele defendia a necessidade dos arquitetos "voltarem às pranchetas", de lidar com o objeto próprio da natureza de sua formação, a organização física das cidades. No primeiro, pesquisa de 1981 do IBAM coordenada pelo autor, é abordado, com bases teóricas e metodológicas na antropologia, o tema do inter-relacionamento das esferas pública e privada, da relatividade destes conceitos, da apropriação social dos espaços e em seus valores diferenciados. Isto é feito através da análise do Catumbi, tradicional bairro carioca vítima de renovação urbana, e da Selva de Pedra, área desenvolvida no Leblon segundo moldes modernistas. No segundo título Carlos Nelson nos apresenta um texto polêmico que, ao mesmo tempo, se fundamenta e propõe uma "praxis" transformadora. Como aponta o professor Maurício Abreu (UFRJ) na apresentação deste livro, seu autor nunca se amolda plenamente a esquemas teóricos rígidos e dogmáticoso O espaço urbano é colocado como "Iocus" de expressão das forças políticas: a cidade, portanto, devendo ser desenvolvida como um jogo de cartas, onde os participantes conhecem e obedecem às regras. Após breve análise do desenvolvimento da cidade possível no Brasil, o autor se baseia na experiência de coordenador do estudo para seis cidades novas em Roraima para traçar considerações e diretrizes de projeto e localização dê diversos elementos e sistemas urbanos, tendo o tecido em forma de grelha como princípio ordenador.
SENNET, Richard, "A Queda do Homem Público: as Tiranias da Intimidade", Companhia das Letras, 1988. Originalmente publicado em 1974, vem em boa hora esta edição brasileira do autor de "The Uses of Disorder: Per-
sonal Identity and City life", (Alfred Knopf, N.Y., 1970) onde analisa a profunda crise psicossocial e política que vivemos. Se, no primeiro título, o autor apontava que o excesso de ordem ameaçava nossa sociedade urbana, neste livro ele amplia seu raciocínio para analisar a falência do Homem público. Traça, por exemplo, um paralelo entre a crise do Império Romano e os dias de hoje: em ambos os casos o equilíbrio entre a vida pública e a privada teria se perdido; hoje a vida pública é apenas questão de obrigação formal e a vida privada o novo foco de nossas energias emocionais.
SOMMER,
(g)
Robert, "Espaço Social", Coleção Ciências do Comportamento, Editora Pedagógica e Científica/Editora da Universidade de São Paulo, 1973. Junto com HALL, o autor é considerado um dos expoentes do enfoque comportamentalista da psicologia ambienta!. Este trabalho pioneiro mostrou que a pesquisa comportamental é essencial para a programação arquitetõnica e urbanística. Ou seja, compreendermos os significados dos arranjos espaciais e suas inter-relações com os processos de apropriação espacial pelos indivíduos e grupos. Os psicólogos "behavioristas" ou "comportamentalistas" como SOMMER, que por muito tempo se concentraram em técnicas de experimentação em laboratório, expandiram seus níveis de estudo e desenvolveram conceitos e métodos úteis aplicáveis ao estudo dos ambientes construídos: neste livro é analisada a organização interna de hospital psiquiátrico, escola, bar e dormitório de estudantes.
TUAN, Yi-Fu, "Topofilia: Um Estudo da Percepção, Atitudes e Valores do Meio Ambiente", Difusão Editorial, São Paulo, 1980.
Tomando um enfoque geográfico, este é um interessante estudo sobre o elo afetivo que nos une a um lugar, definido pelo autor como "topofilia". Este conceito parte principalmente de um sentimento vivencial, predeterminado pela cultura e experiências pessoais, a partir das percepções, atitudes e valores que temos dos lugares. O autor diz que, embora todos os nossos sentidos se reforcem um ao outro na percepção de um lugar, é o visual que prevalece e é para ele que se volta a atenção do estudo da Topofilia. O autor dá seguimento à sua preocupação no título "Espaço e Lugar", também pela mesma editora. TURKIENICZ, Benamy (org.). "Desenho Urbano (Volumes 1,11 e 111", Anais do I SEDUR, Cadernos Brasileiros de Arquitetura 12 a 14, Projeto Editores, São Paulo, 1984. TURKIENICZ, B. & MALTA, M. (org.l. "Desenho Urbano", Anais do II SEDUR, Editora Pini, São Paulo, 1986. (a, b, c, d, e, f, g, h) Entre as publicações na área do Desenho Urbano no Brasil, sem dúvida destacamse os anais dos dois seminários promovidos pelo Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UnB, sob tutela principal de Benamy Turkienicz. Por duas vezes juntaram-se os responsáveis e interessados pelas experiências no setor, em discussões e publicações que, no mínimo, servem de iniciação obrigatória ao panorama nacional do tema. Os ensaios contidos nos dois anais são numerosos, portanto, não comentaremos todos. Destacaríamos no primeiro título os de TURKIENICZ, HOLLANDA, SANTOS, KOHLSDORF & BICCA, BARBOSA & VIANNA, KRAFTA & AGUIAR,
OLIVEIRA. CARVALHO. PEREIRA. CANEDO & BIENENSTEIN e GASTAL. Pode-se dizer que os trabalhos mostram duas preocupações principais: relacionar os processos sociais com a produção e apropriação das formas urbanas. e recuperar o papel do arquiteto na compreensão das lógicas espaciais e na estruturação da cidade. Do segundo título. organizado tematicamente. destacamos os ensaios teóricos de COMAS. KRAFTA. SANTOS e SAMPAIO; os que analisam a forma ou a imagem urbana de MACEDO. CURTIS et aI. e NISHIKAWA; aqueles que lidam com a preservação/revitalização de áreas centrais. PINHEIRO. ANDRÉS e BICCA et ai. os relativos a assentamentos espontãneos de MAGALHÃES e VASCONCELOS et aI.; e aqueles que discutem experiências de cidades e áreas novas de SILVA et aI.. ZIMBRES et aI. e DEL RIO. Neste seminário. além da confirmação das duas preocupações principais que destacamos no I SEDUR. observou-se um crescimento da preocupação pela preservação e revitalização urbana. refletido em diversas importantes experiências brasileiras.
ZEISEL. John "Inquiry by Design: Tools for EnvironmentBehavior Research". Cambridge University Press. Cambridge. 1984. Este é um dos mais completos títulos para o iniciante nos estudos das relações Homem/meio ambiente como embasamento para as decisões de projeto. O autor define como meio ambiente os atributos (físicos. administrativos e sociais) dos lugares onde as pessoas vivem. trabalham e se divertem. O livro está dividido em duas partes: na primeira. o autor discute conceitualmente as relações entre pesquisa e projeto. os possíveis campos de colaboração entre o estudo ambiental e o trabalho do arqui-
teto e as caracferísticas da pesquisa social aplicada. Na segunda. são discutidos métodos e instrumentos de pesquisa ambiental. como a observação sistematizada de aspectos físicos e do comportamento ambiental. a confecção de questionários e entrevistas. O autor expõe as possibilidades e limitações de cada método e instrumento.
Créditos das ilustrações
1 -in GOODMAN 1971; cortesia Elaine MARKSON L1TERARY AGENCY
13 - in GOSLlNG & MAITLAND GOSLlNG
1984; cortesia David
15 - in GOSLlNG & MAITLAND 1984; cortesia David GOSLlNG 16 - in L'Architecture D'Aujourd'hui n~217, Paris, 1984; cortesia GROUPE EXPANSION
scon
5 - in 1969; cortesia Planning Department. CINCINNATI
CITY OF
6 - in catálogo da exposição Affonso E. REIDY, Solar Grandjean de Montigny/Editora INDEX, Rio, 1985; arquivo Solar Grandjean de Montigny/PUC-Rio
20 - in PROCESS n~3, Toquio, 1977; cortesia Chad Floyd, Center Brook Architects 10 - in BLAKE, Peter "Gods Own Junkyard" & Wilson, Nova lorque, 1974
Holt. Reinhart
21 - in GOSLlNG & MAITLAND GOSLlNG
1984; cortesia de David
27 - lato Kevin Cole, in BLAKE 1974; cortesia THE BOSTON HERALD 28 - baseado em ilustração de RABINOWITZ, Harvey "Avaliação Pós-úcupação" in SNYDER J. & CATANESE A. (org.), "Introdução à Arquitetura", Editora CAMPUS, Rio, 1984
46 a/b - in TRAN CIK 1986; cortesia VAN NOSTRAND-REINHOLD
31 - in MARTIN L. "The Grid as Generator" in MARTIN & MARCH 1972, pág. 21; cortesia do autor
36 - in CITY of SAN FRANCISCO s.d.; cortesia Dept. 01 City Planning, City and County 01 San Francisco
39 - de folheto turístico; cortesia SOUTH STREET SEAPORT MUSEUM 40 - cortesia PENNSYLVANIA AVENUE DEVELOPMENT CORPORATION
60 - in STERN Robert "Modern Classicism" RIZZOLl, Nova lorque, 1988; cortesia de RIZZOLl International
64 - in GOSLlNG & MAITLAND GOSLlNG
1984; cortesia de David
85 - in APPLEYARD 1981; cortesia UNIVERSITY OF CALlFORNIA PRESS
91 a - foto arquivo Manchete; Engenharia
cortersia João Fortes
92 a/b - ilustrações de Jorge B. AZEVEDO a partir de fotos do autor
95 d - ilustração de Jorge B. AZEVEDO a partir de foto do autor 79 - in BENTLEY et ai. 1985; cortesia Butterworth Arch itectu re 97 - in City of San Francisco s.d.; cortesia Dept. of City Planning, City and County of San Francisco
99 - in CUTLER & CUTLER 1983; cortesia VAN NOSTRAND-REINHOLD
Anexo 1 - todas as fotos e ilustrações são do autor, com bases cadastrais e aerofotogramétricas da FUNDREM, 1981, exceto figura 1.3 (Foto cortesia de Sidney Waissman) Anexo 2 - todas as fotos e ilustrações são do autor, exceto 2.1 e 2.4 cortesia do Dept. of Planning, City of Baltimore
3.1 - desenho de Jorge B. AZEVEDO com base em FONTES, COELHO, REIS & NEVES 1986
3.15 - mapa elaborado por entrevistado campo, 1986
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314 e 3.16 - fotos de Zeca UNHARES; cortesia Rio Arte/Escritório Corredor Cultural
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o Autor: • Nascido no Rio de Janeiro em 1955, arquiteto (FAU/UFRJ 1978), especializado em Planejamento Urbano (UERJ 1979) e Mestre em Desenho Urbano (Oxford Polytechnic 1981); doutor em Estruturas Ambientais Urbanas (FAU/USPL • Trabalhou na Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana no Rio de Janeiro, na Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e no Department of Housing and Community Development, Baltimore, EUA (programa Partners of the AmericasL • Dedica-se ao ensino e à pesquisa desde 1979. Foi Senior International Fellow da Johns Hopkins University, Baltimore, Professor visitante na University of Sheffield, e atua como Professor visitante do curso de especialização em Percepção Ambiental 'e Espaço Urbano, Departamento de Geografia da UFMG. Foi Professor visitante e conferencista em diversas outras instituições no Brasil e exterior. • Recebeu o Prêmio "Olga Verjovski", XXVIII Premiação Anual do IAB-Rio, 1990. • Atualmente é Professor adjunto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e presta consultoria em Desenho Urbano.
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Este trabalho trata do papel e possibilidades Seu campo disciplinar de morfologia urbana,
Desenho Urbano, suas origens, definições, teorias e metodologias básicas, no processo de planejamento. é abordado, aqui, através de teorias e metodologias organizadas nas categorias análise visual, percepção e comportamento ambienta!.
o Desenho
Urbano, organização trsico-ambiental das cidades, é importante e atual temática no Brasil, face à situação de verdadeiro caos ambiental da maioria de nossas metrópoles e ao momento de redefinições acadêmicas e profissionais por que passam nossas universidades. " ... um livro altamente significativo. Vicente dei Rio é um dos teóricos urbanos de ponta no Brasil e sua pesquisa em desenho urbano começou a cobrir o abismo entre o planejamento urbano e o projeto de arquitetura ...( )... é apenas através de tão profundas investigações que estratégias racionais de ocupação territorial podem ser propostas de uma maneira lógica." (da apresentação, David Gosling, diretor do Centro para Desenho Urbano, Universidade de Cincinnati, EUA).
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