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0S GRANDES PROBLEMAS DA ATUALIDADE PETER
KROPÓTKINE
A QUESTÃO SOCIAL
CAPA DE AILSON
O HUMANISMO LIBERTÁRIO EM FACE DA CIÊNCIA
EDITORA MUNDO LIVRE CAIXA POSTAL 1 (Agência da Lapa) Rio de Janeiro
E
!
o
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,
MUNDO LÍVRE
PREFÁCIO DA EDIÇÃO FRANCESA Quando se analisa uma teoria social qualquer, não é difícil ve-
rificar, após um ligeiro exame, que ela não representa apenas um
programa partidário e um ideal de reconstrução da sociedade, mas
algo mais, pois, em geral, é conexa com um sistema qualquer de
filosofia — de concepção da natureza e das sociedades humanas.
Já tivemos oportunidade de expor esta maneira de ver em duas
conferências que em tempo socialismo libertário.
demos (1) sôbre como considerar o
Nesses dois estudos evidenciávamos as relações existentes entre as nossas idéias e a tendência atual, fortemente acentuada nas
ciências naturais, de explicar os grandes fenômenos da natureza pela ação dos infinitamente pequenos — onde, outrora, só se enzergava a ação das grandes massas, — e, nas ciências sociais, de
reconhecer como primaciais os direitos do indivíduo, ao invés dos in-
terêsses do Estado que, até hoje, se têm reconhecido como sobrelevantes âquêles. Pretendemos agora, nesta obra, mostrar que a nossa concepção
representa, de fato, uma consegiiência necessária do fragoroso des-
pertar geral das ciências naturais que se manifestou durante todo o decurso do século 19. O que nos inspirou o presente trabalho foi precisamente o estudo dêsse empolgante movimento, bem como
o das notáveis conquistas alcançadas pela ciência nos últimos anos do século recémjindo. É por demais sabido que os últimos anos do
(1) N. do T. — O autor refere-se, de certo, às suas duas conferências seguintes: a primeira, subordinada ao titulo Les Temps Nouveaux, dada em Zondres, publicada em francês em 1894; a segunda, que nada mais é do que uma reedição desenvolvida da primeira, não foi pronunciada mas escrita, intitula-se 1ºAnarchie, sa philosophie, son idéal, publicada em Paris, em 1896, * que já se acha por nós trasladada ao português.
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A
século findo se caracterizaram por notáveis progressos nas ciências legrafia sem fios, o conhecimento de uma série de radiações que dantes eram ignoradas, a existência de um grupo de gases inertes inadaptáveis a quaisquer combinações químicas, a revelação de novas formas elementares da matéria viva e assim por diante. E, por
miliar aos matemáticos, o que êles
Ai por 1891, quando estas ruidosas descobertas se faziam com
tury, Sr. James Knowles, propunha-nos continuarmos na sua revista a série de artigos que, sôbre a ciência moderna, publicava então Huxley, o famoso êmulo de Darwin, que, por motivos de saúde, se
vira forçado a abandonar. Fácil é de compreender porque, durante muito tempo, relutamos em aceder a êste convite.
novas pesquisas, êsses investigadores descobrem que a lei estudada
É que os assuntos científicos que Huxley tomava por temas não
nada mais é do que uma primeira aproximação, donde a concluir-
constitutam meras palestras literárias, mas estudos sérios de ciência em cada um dos quais explorava a fundo duas ou três grandes
se que os fatos que se pretendia explicar por ela são, na verdade,
muito mais complexos do que a princípio pareciam ser.
questões cientificas de suma importância que êle debatia admirávelmente, dando ao leitor, em um estilo compreensivo, a análise
Para tomarmos um exemplo assaz conhecido, citaremos as cha-
madas leis de Kepler concernentes ao movimento dos planêtas em
cerrada e crítica das descobertas modernas em que essas questões
volta do Sol. Um estudo minucioso dos movimentos planetários confirmou, a princípio, a exatidão dessas leis; provou-se, efetivamente, que os satélites do Sol se movem, grosso modo, ao longo das elipses em que o Sol ocupa um dos focos. Porém, agora descobrese que q elipse descrita é apenas uma primeira aproximação.
incidissem. Knowles insistia e, para facilitar o nosso trabalho, ainda
a Royal Society nos enviava convite especial para assistirmos às
suas memoráveis sessões. Afinal acabamos cedendo e durante um decênio, desde 1892, es-
terpretação da natureza vieram sobrepor-se às que haviam nota-
bilizado os anos de 1856-1862, e como um estudo mais penetrante das grandes descobertas levadas a cabo nos meados do século por
Mayer, Grove, Wiirtz, Darwin e tantos outros, davam às descober-
chamam a passagem de uma
primeira aproximação às seguintes. Continuamente, é fato, vemos o astrônomo e o físico demonstrarem, sob a denominação de “leis físicas”, a existência de certas relações entre diversos fenômenos, e para estudar, em suas particularidades, as aplicações dessas leis, não faltam investigadores decididos e competentes. Mas, q breve trecho, à proporção que os fatos se acumulam por
uma rapidez incrivel, o editor da revista londrina Nineteenth Cen-
cobertas dos últimos anos, chegamos « um duplo resultado. Por um lado, graças à aplicação do método indutivo, observávamos como as novas descobertas, de uma importância incalculável para a in-
Ei
da ciência” (2), víamos nós tão sômente um fato normal, muito fa-
tudo isso, fomos levados a estudar a fundo essas novas conquistas da ciência.
Levados assim q estudar com profundeza as extraordinárias des-
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tas precedentes um aspecto inteiramente nôvo e abriam novos horizontes à ciência fazendo surgir novas questões de alto alcance filosófico. E onde certos sábios, impacientados ou dominados pela influência de uma educação primária, pretendiam ver “uma bancarrota
naturais, e a um tal desenvolvimento devemos a descoberta da te-
crevemos uma série de artigos sob o título “Recent Science” para a referida Nineteenth Century, até que uma cardite declarada nos forçou, como sucedera ao nosso antecessor, a adiurmos êsse árduo trabalho.
CIÊNCIA
Na realidade, os planêtas, na sua trajetória ao longo das elípses,
Eu
E
sofrem diversos desvios por efeito da ação que uns sôbre os outros exercem.
Feito o estudo dêsses desvios, puderam os astrônomos
chegar à uma segunda e a uma terceira aproximações, que vieram,
(8) N. do P. — Alusão à um célebre artigo, que tanta celeuma produ-
miu, do escritor francês Ferdinand Brunetiere, convertido ao catolicismo,
“quando de uma sua visita ao Papa Leão 13, publicado pela primeira vez na je des Deux-Mondes, em janeiro, de 1895, e mais tarde reeditado no seu
La Solence et la Religion, publicado em 1916 pela livraria de Perrin
09, que, alho, valo a pena ser lido.
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naturalmente, a corresponder melhor do que a primeira aos movimentos reais dos planêtas (3). E” precisamente o que, na faze atual dos conhecimentos hu-
manos, se dá com as ciências naturais. Verificadas as grandes descobertas da indestrutibilidade da matéria, da variedade das espécies, da unidade das fórças físicas e da sua consegiiente ação sôbre a matéria animada como sôbre a inanimada, e as demais que, por brevidade, deiramos de mencionar, as ciências, que, nas suas mo-
A CIÊNCIA
MODERNA
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e de pura dialética, por que fogos de artifício de linguagem, o representante classificado dessa corrente filosófica chega às suas temerárias conclusões. O segundo dos resultados a que chegamos no estudo dos re-
centes progressos das ciências naturais e no reconhecimento de ser cada nova descoberta que surge uma nova aplicação do método in-
dutivo, foi ver como as idéias anarquistas, formuladas por Godwin e Proudhon e desenvolvidas por seus continuadores, representavam
dalidades especiais, estudam as consegiiências dessas descobertas, procuram neste momento as segundas aproximações que, com maior
igualmente a aplicação dêsse mesmo método às ciências que tratam
As pretensas “falências da ciência”, que filósofos modernistas exploram vastamente na época atual, são, por natureza, simples-
até que ponto o desenvolvimento da idéia anarquista marchou pa-
perfeição, correspondam às realidades da natureza.
mente a investigação das segundas e terceiras aproximações a cujo estudo, após o período culminante das grandes descobertas, a ciência, como lhe cumpre, dedica particular atenção. Não vamos deter-nos agora a discutir as obras dêsse parco nú-
da vida das sociedades humanas.
Trataremos de demonstrar na presente obra, em primeiro lugar,
ralelamente com os progressos das ciências naturais. Indicaremos em seguida como e porquê a filosofia do anarquismo se destaca nas
tentativas recentes de elaboração de uma filosofia sintética, isto é, de uma interpretação geral do Universo (5). Deliberamos, para melhor compreensão das referências feitas no texto do livro, pôr em
cleo de filósojos rutilantes, porém, superficiuis, que procuram tirar
«apêndice notas explicativas a respeito dos diversos autores citados
tiva para nos inculcarem a intuição mística e promover o descré-
natural curiosidade do leitor.
partido das inevitáveis indecisões das ciências na sua fase forma-
dito da ciência em geral perante um auditório que não tem a capacidade precisa para verificar a exatidão das suas soporíferas cri-
ticas. Não repetiremos aqui o que fica dito no texto dêste livro
acêrca dos abusos contumazes que os metafísicos fazem do método dialético. Ao leitor que, porventura se interesse por tais questões, indicaremos a obra preciosa de Hugh S. R. Elliot, Modern Science
and the Illusions of Professor Bergson (A Ciência Moderna e as Ilusões do Professor Bergson) com um excelente prefácio de Ray Lankester, publicada em Londres, em 1912, pelos editôres Longman
& Green (4).
e de alguns têrmos de ciência, julgando, com isso, satisfazermos a
Cumprimos, finalmente, o indeclinável dever de exprimir aqui
os nossos mais veementes agradecimentos ao nosso amigo Dr. Max.
Nettlau pelo inestimável concurso que nos prestou, especialmente na
elaboração dessas Notas, com os seus vastos conhecimentos da li-
teratura socialista e anarquista em que é profundo e emérito cultor. Brighton, fevereiro de 1913. PETER KROPÓTKINE.
Nessa obra se poderá ver por que métodos arbitrários
(8) N. do T. — Em abôno do que expende Kropótkine, podemos enumerar. somo uma;das referidas aproximações, a teória da relatividade restrita, exposta, * mustentada pelo sábio matemático alemão Einstein. (4) N. do T. — HENRI BERGSON, filósofo francês, autor de muitas obras em quo procura instituir, à moda da filosofia oriental, o método da intuição psicológica, como base da aquisição de conhecimentos,
(0) N. do 7, — Sobre este particular chamamos a atenção do leitor
OM capítulos em que o autor expõe e critica admirávelmente a filosofia Morbert Spencer, o notável pensador britânico.
1.
A CIÊNCIA MODERNA E O HUMANISMO LIBERTÁRIO ORIGENS
1.
Originariamente o anarquismo não procede de uma determinada descoberta científica nem assenta em um sistema definido de filoso-.
fia. As ciências sociológicas estão ainda muito longe Ca fase de cer-
teza a que já chegaram, por exemplo, a física e a química.
Ora, se
no estudo dos climas e do tempo (climatologia e meteorologia) ainda
não conseguimos com exatidão prognosticar com um mês, ou sequer
uma semana, de antecipação as condições meteorológicas que se vão suceder, seria absurdo, evidentemente, pretender, com os dados de uma ciência informe como é a Sociologia, que contende com matéria. infinitamente mais complexa do que o vento e a chuva, prognosticar,
com a mesma exatidão, os fenômenos sociais. Antes de tudo lembre-
estão sumo-nos de que os sábios, como quaisquer outros, homens,
às jeitos ao êrro, com a agravante de pertencerem, na sua maioria,
classes abastadas e, em consegiência, participarem dos preconceitos
do Estado. É, “ca classe, além do fato de muitos viverem a expensas procede, nena não ato, de tôda a evidência que O anarquismo proceder, das universidades.
O O socialismo, e em geral todos os movimentos de caráter:
| O anarquismo originou-se do povo e só conservará a vitali-
r Sórça criadora que lhe são inerentes enquanto se mantive
| peculiaridade de movimento popular.
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Através de todos os tempos verifica-se que, no seio das sociedades
“humanas, duas correntes de pensamento se têm encontrado constantemente em luta antagônica. De um lado, as massas, o povo, elaboravam, no decurso da sus, “existência, sob a forma de costumes, certo número de instituições
necessárias, a fim de tornar exequível a vida social, a manutenção
da paz, o ajustamento das contendas e a prática do auxílio-mútuo,
em tôdas as circunstâncias que exigissem um esfôrço combinado. Os costumes tribais entre os selvagens, as comunidades rurais e, mais
tarde, as guildas, corporações industriais nas cidades da Idade Média, que assentaram os primeiros elementos do direito internacional sôbre os quais estabeleceram as suas mútuas relações — essas e muitas outras instituições foram elaboradas e aperfeiçoadas, não pelos legisladores
mas pelo espirito criador das massas.
De outro lado, medraram sempre entre os homens os magos, os
xâmanes, os feiticeiros, os reptadores de chuva, os oráculos e os sacerdotes, que foram, pela ordem natural das coisas, os primeiros monopolizadores de um rudimentar conhecimento da natureza e os fun-.
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CIÊNCIA
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Ao lado dessas duas classes, havia ainda uma terceira, a dos:
chefes temporários dos bandos de combate, a quem se atribuia a posse Cos segredos mágicos do êxito das batalhas, do envenenamento:
das armas e de vários outros segredos militares.
Estas três categorias de homens constituiram sempre entre si,
desde tempos imemoriais, sociedades secretas com o fim de manter
e transmitir, após uma longa e penosa iniciação, os segredos das: suas fundações e de seus ofícios. Se algumas vêzes se combatiam. acabavam sempre, no fim de contas, por se entenderem maravilhosamente, uninco-se, por diferentes modos e formas, para dirigir e do-
minar as massas, mantê-las na obediência, governá-las e obrigá-las a. trabalharem para êles. Das duas citadas categorias, é evidente que o anarquismo repre-
senta a primeira delas, isto é, a fôrça criadora e construtiva das.
massas que, no passado, elaboraram as instituições de direito comum
para melhor se defenderem de uma minoria agressiva e de instintos
dominacdores. E também por essa mesma fôrça criadora e constru-
dadores dos diferentes cultos — do sol, da lua, das fôrças naturais, dos ancestrais que serviam perfeitamente de elo mantenedor da
tiva, apanágio do povo, cem o poderosa auxílio que lhe prestam a
Nêsses tempos, os primeiros germes do estudo na natureza —— a astronomia, a previsão do tempo, o conhecimento das doenças etc. — andavam estreitamente ligados a diversas superstições contidas
desenvolvimento da sociedade, em oposição àaquêles que depositam.
unidade federativa das tribos.
nos diferentes ritos e cultos.
Tôdas as artes e ofícios tiveram esta
origem de estudos e de superstições e, aqueles como estas, tinham suas
fórmulas místicas, só conhecidas dos iniciados e mantidas cuidadasamente ocultas das massas para evitar o acesso ao seu conhecimento. Concomitantemente com êstes incipientes representantes da reli-
gião e da ciência havia uma classe de indivíduos que, como os bardos entre os celtas e os gálios, os brehons da Irlanda, os pregoeiros da lei
nas povoações escandinavas, etc., eram tidos por peritos em matéria,
Ce usos e costumes antigos a quem se recorria em casos de discórdia ou de conflito. Conservaram mnemônicamente os preceitos da lei que algumas vêzes exprimiam por meio de certos sinais que vieram
«depois a ser os germes da escrita, e em caso de contendas era para
“éles, como arbitros, que se apelava.
ciência e a técnica modernas que o anarquismo procura, nos tempos
atuais, estabelecer as instituições necessárias que garantam o livre
tôdas as suas esperanças em uma legislação feita por minorias governantes e por rígida disciplina imposta às massas. Podemos, portanto, afirmar que, nesse
sentido, houve
sempre
anarquistas e estatistas. Demais, é da história outro fato que, uniformemente, se tem “observaco: que as instituições, mesmo as melhores, originariamente mbelecidas para efetivarem a igualidade, a paz e O auxílio mútuo,
petrificam na extensão da sua caducidade.
Perdem êsses institu-
a finalidade que lhes deu origem para cairem sob bo domínio de minoria ambiciosa e tornarem-se, por fim, um trambôlho ao de-
vimento ulterior da sociecade.
Surgem, então. isoladamente,
duos que, se rebelam .contra tais institutos. E enquanto alguns tontes se revoltam contra uma instituição, já fastidiosa, pro-
do fazê-la evoluir no interêsse coletivo ou promovendo a queda
uma autoridade absolutamente alheia à instituição e incrustaca.
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nela com o propósito de se lhe sobrepôr por todos os meios, outros, ao
contrário, procuram, a todo o transe, atacar essas mesmas institui-
ções — a tribo, a comuna rural, a guilda, etc. — com o único intuito
«de se colocarem fóra e acima delas, a fim de melhor poderem dominar
os outros membros da sociedade e locupletarem-se a expensas suas. Todos os verdadeiros reformadores sociais, políticos, religiosos ou econômicos, pertencem à primeira das duas categorias enunciadas. É indubitável que entre êsses reformadores se encontraram sempre
indivíduos dispostos a irem além, pouco se lhes dando terem ou não o consenso unânime cos seus concidadãos ou sequer da, minoria. Aquêles, todavia, sem esperarem pela adesão dêstes à causa que os impulsionava, quer absolutamente sós, individualmente, se não eram
seguidos pelos demais, quer, quando possível, em grupos mais ou
menos numerosos, marchavam avante no caminho da insurreição
contra tôda a espécie de tirania.
Revolucionádios desta têmpera depará-los-emos em tôdas as
épocas da história. Basta compulsá-la.
Todavia, fácil é de ver que em qualquer período histórico os revolucionários se distinguem por dois aspectos diferentes. Uns,
«embora em revolta contra a autoridade opressora aninhada no seio
da sociedade, não procuravam Ce modo algum destruir a própria autoridace, propunham-se simplesmente a conquistá-la em seu favor. consEm substituição a um poder que se tornara. tirânico, pretendiam faa sob tituir um poder nôvo de que fóssem exclusivos detentores autonova a que de gueira promessa, da melhor boa fé enunciada,
ridade em suas mãos se devotaria deveras aos interêsses do povo,
que -que ela constituiria a sua verdadeira representação, promessa tal
depois era, fatalmente esquecida ou traída,
Assim se constituiram a autoridade imperial na Roma dos Césares, a autoridade da Igreja nos primeiros séculos da nossa era, O poder dos ditadores nas cidades,já então decadentes da Idade Média, e outros análogos. A mesma idéia diretriz persiste na Europa, tratan-
do da constituição da autoridade real, já nos últimos tempos do feu«dalismo. A fé em um imperador — um César — de eleição popular
e destinado a servir o povo, não Cesapareceu ainda de todo, prevalece «em nosso dias.
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Ao lado, porém, desta corrente autoritária, uma corrente simultâneamente se afirmava impulsionada pela necessidade de proceder a uma revisão das instituições estabelecidas. De tempos remotos, desde a antiga Grécia até à época presente, houve sempre indivíduos e correntes de pensamento e de ação que se esforçavam, não por substituir uma autoridade particular por outra, mas por demolir a própria autoridade que, subrepticiamente, se havia imiscuído nas instituições populares, sem dar margem a que se fundasse outra em seu lugar. Prociamavam êles concomitantemente a soberania do indiviCuo e do povo e diligenciavam libertar as instituições populares das excrescências autoritárias com o intuito de restituir ao espírito coletivo das massas a sua plena liberdade para que o gênio popular pudesse livremente reconstituir de nôvo os institutos de auxílio
mútuo, de proteção recíproca, na conformidade das novas necessi-
dades e condições ca existência. Nas cidades da Grécia antiga e especialmente nas da Idade Mécia, como Florença na Itália e Pskov na
Rússia européia e outras mais, encontramos fartos exemplos dêste
gênero de lutas.
Assim se pode dizer, sem receio de contestação, que jacobinos (6) e anarquistas têm sempre existido de permeio nas hostes de refor-
madores e revolucionários.
Formidáveis movimentos populares, característicamente anarquis-
tas, se produziram nos tempos passados.
Vilas e cidades inteiras se
Bublevaram então contra o princípio governamental, contra todos os
“Órgãos do Estado, seus tribunais e suas leis e proclamavam aberta-
ente a soberania dos direitos do homem. Denegavam tôda a les
ta e afirmavam categóricamente que cata um deveria governar-
por sua própria consciência. Procuravam assim fundar uma nova dade baseada nos principios de igualdade, &e completa liberdade
trabalho,
O movimento cristão que se produziu na Judéia sob o império
o contra a lei romana, contra o Estado romano e a moral da
| Ou melhor, a imoralidade desenfreada que então campeava Inquestionávelmente, fortes laivos de anarquismo. Mas, pau-
do 7, — vide esta palavra nas Notas Explicativas no fim do
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Jatinamente, êsse movimento degenerou em movimento sectário que operou a formação da Igreja, traçada nos moldes da Igreja hebráica.
e até da própria Roma imperial, o que, naturalmente, matou tudo o que O cristianismo no seu início tinha de anarquismo, deu-lhe formas romanas e, râpidamente, veio a constituir o esteio principal da autoridade, do Estado, da escravdão e da apressão.
Os primeiros germes de oportunismo introduzidos no cristianis-
mo são já palpáveis nos quatro evangelhos e nos Atos dos Apóstolos,
senão na sua primitiva redação, ao menos nas versões que dêsses escritos temos nos livros que constituem o Nôvo Testamento. Igualmente, o movimento anabatista que, a bem dizer, inaugurou
GIÊNCIA
MODERNA
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mento das suas idéias. Não ousaram declarar-se positivamente contra O que constitui a fórça real co capitalismo: o Estado e seus admi-
nículos — a centralização da autoridade, a lei, feita sempre por uma
minoria em seu exclusivo proveito, e certa
forma de justiça, principal escopo é a defesa da autoridade e do capital.
cuje
Contrariamente a essa atitude, o anarquismo não se detev e onde
o socialismo parou: foi além, na critica dessas anacrônicas instituições. Ergue o braço sacrílego, não só contra o capitalismo, mas tam-
bém contra os pilares em que êle assenta:
Estado.
a Lei, a Autoridade, o
,
e fêz a Reforma, tinha um fundo eminentemente anarquista. Porém, esmagado pelos próprios reformados que, sob a regra de Lutero, se
DO MOVIMENTO INTELECTUAL DO SÉCULO 18
tados, êsse movimento foi sufocado pelo extermínio, em larga escala,
Embora o anarquismo, como todos os movimentos revoluci onáRon surgisse dentre o povo, do tumulto das lutas em prol das reivindicações sociais, e não de um estudo científico ou do trangiil o gabinete do sábio, é importante, todavia, determinar o lugar que ocupa, entre as Giversas correntes do pensamento científico e filosófico
haviam mancomunado com os príncipes contra os camponêses revol-
adêsses mesmos camponêses e dos cidadãos mais pobres da cidade
-— os da ralé, como lhes cnamavam.
Em consegiiência, a ala direita
dos reformados foi degenerando aos poucos até ao ponto de erigir
wm compromisso solene entre a, consciência e o Estado que ceu em
resultado a fundação do Protestantismo tal como hoje existe.
Sumariando q que ficou dito: o anarquismo originou-se da ativi-
dade criadora e construtiva das massas, que, em épocas remotas,
souberam elaborar tôda as instituições sociais da Humanidade, e
não só nisso assenta, mas nas revoltas incividuais e coletivas contra
os representantes da fôrça extrinseca a essas instituições, nas quais,
quando lhes bolem, é tão somente para as utilizar em seu único proveito. Todos os rebeldes cujo ideal haja sido, porventura, a reintegração, no gênio criador das massas da necessária liberdade para poderem
desenvolver, ao máximo da sua expansão, tôda a originalicade que as caracterizava de modo a efetivarem essas instituições exigidas pela época, estavam, evidentemente, insuflados do espírito anarquista . Nos tempos modernos, o anarquismo nasceu do mesmo protesto
crítico e revolucionário de que procedeu o socialismo em geral.
É
verdade que uma certa fração de socialistas, depois de haverem chegado até à negação do capital e da sociedade baseada na escravizacão do trabalho ao capital, se detiveram neste ponto do desenvolvi-
moderno.
Qual é a atitude do anarquismo em relação a essas diversas cor-
rentes? Sôbre qual se apoia de preferência? De que método de investigações se serve para comprovar as suas conclusões? Por outras
palavras: a que escola da filosofia do direito pertence o anarquis-
mo? Com que corrente da ciência moderna tem maior afinidade? Em face da fatuídade palavrosa da metafísica econômica, priva-
dos círculos marxistas, a resposta a estas questões reveste-se de considerável interêsse. 'Trataremos, pois, de analisá-las de modo into, tão simplesmente quanto possível, evitando, no que evitável
O emprêgo de têrmcs técnicos para, não dificultar a compreensãa junto.
movimento intelectual do século 19 derivou diretamente da B filósofos escoceses e francêses de meados e fins do século to, Wportar do pensamento que se produziu nessa época animou
Wtores do desejo de englobar todos os conhecimentos huma9 sistema geral, — o sistema da natureza. Repudiando
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inteiramente a escolástica e a metafísica medie vais, tiveram a audácia de conce ber a natur
eza em tódas as suas complexas manif estagões — io mundo das estrelas, o nosso siste ma solar, o nosso globo terrá queo, o casenvolvimento das plantas, dos animais e das
sociedades humanas sôbre a superfície da Terra — como uma série de fatos que podem ser estudados, em sua integ ralidade, de maneira
idêntica à por que se estudam as ciências natur ais,
Empregando largamente, com inteira proficiênc ia, o verdadeiro método científico, isto é, o método indutivo-d edutivo empreenderam a farmidável obra do estudo de todos os grupo s de fatos que a
natureza nos oferece a exame, quer pertençam ao mundo das estrê -
tas, quer ao dos animais, quer ao das crenças ou das instituições humanas, absolutamente co mesmo modo por que um naturalista estudaria as questões de ciência, física, Primeiro, registavam pacientemente os Tato c
e quando se lançavam ao terrena das genera
lam-no pela
via da indução. Formulavam certas hipóteses, maior importância da que Darwin atribuia à
O atribuiam a respei-
to da origem de novas espécies por meio da
na luta
pela existência, ou à de que Mendeleeff dava à toi oriódica.. Nas hipóteses emitidas, êsses pensadores viam| ras suposições capazes de fornecer uma explicação provisória. » hipótese de tra-
balho — dos fatos, pelo seu agrupamento, de estudo subsegiiente que celes se fizesse. Não olvidavam, porém, que tais suposições: tarde confirmadas pela sua aplicação a uma diversos e que teriam de ser, por sua vêz, exp teórico ou dedutivo. Assim, as hipóteses levam! ser leis naturais, isto é, generalizações provadas, passado pelo cadinho da verificação experimental e
,
| facilitar o
ser mais
O de fatos pelo processo O chegariam a de haverem adas que
fôssem as causas da sua constante exatidão, Quando a centro do movimento filosófico do século 18 foi
deslocado da Inglaterra e da Escócia para a França, decidiram os
filósofos franceses, com aquela clara percepção de método que ds
distingue, erigir, segundo um plano geral e sôbre 08 mesmos princi.
pios, o esquema de todos os conhecimentos humanos,
turais, quer de ordem histórica.
quer ts
Intentaram, desde logo, edificar
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o saber generalizado, ou seja a filosofia do universo e da sua vida,
sôbre bases estritamente científicas, repelindo, consegiientemente, tôdas as construções metafísicas das filós ofos anteriores e procurando explicar todos os fenômenos pela ação dessa s mesmas fôrças físicas (ações e reações mecânicas) suficiente s para explicar a origem e a evolução do globo terrestre. Conta-se que quando Napoelão 1.º expre ssou a Laplace a sua sur-
prêsa por não haver achado em tôda a sua obra sôbre o Exposição do Sistema do Mundo o nome de Deus, Laplace teria simplesmente respondido: “Não tive necessidade dessa hipót ese”, Porém o grande
matemático fêz mais e melhor: nunca recorreu aos chavões da metati-
sica, por detrás dos quais se oculta gera lmente a incompreensão ou a obscu
ra semi-compreensão dos fenômenos e a incap acidade de inter-
pretar os fatos em sua forma concreta como quantidades mensuráveis. Laplace dispensou a metafísica, como dispe nsado havia a hipótese
de um deus-criador. Ainda que a sua Exposition du Systeme du Monde não contenha cálculos matemáticos e fôsse escrita em ling uagem inteligível, acessível a qualquer leitor instruído, os matemáti cos puderam, mais tarde, exprimir caca uma das idéias esparsas pela obra em equações matemáticas, isto é, estabelecer as condições de igualdade entre duas ou
mais quantidades dadas, tão exatamente tinha Laplace, em todos og
pormenores, pensando na sua obra!
O que Laplace fêz para a mecânica celeste, fizeram-no os filóso-
franceses do século 18, no limite dos conh ecimentos da época,
into e do sentimento humanos que const ituem e psicologia.
Ha-
» de há muito, renunciado às afirmações puramente metafisi.
(que faziam as delícias dos seus predecesso res e que, mais tarde, 5 encontrar nos trabalhos do filósofo alemã o Kant. É por de.
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é
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CIA
categórico, lei universal — em vêz do fato palpável, conhecido de
tôda a gente, que se pretende exnlicar, e de que o filósofo alemão tão
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vida ic social. O senso moral na espécie humana te m essa origem
não outra
Ron
arredio ancou. E evidente que aos enciclopedistas franceses não podiam satisfazer semelhantes explicações envoltas nas frases empoladas da pura metafísica. Coma seus predecessores escoceses e britânicos, repugna-
astros e dos corpos físicos e químicos, ao da vida das plantas e dos
inserir uma palavra onde faltavam idéias como dizia o grande
das religiões etc.
va-lhes, para explicar a origem do conceito do bem e do mal no homem, Goethe.
Para cescobrir o porquê dessa concepção, foram levados,
naturalmente, a estudar o próprio homem em quem a idéia se manifestava e, como já haviam feito Hutcheson em 1725 e depois Adam Smith na sua melhor obra, 'The Origin of Moral Feeling (Origem do
Sentimento Moral), acharam que o sentimento moral no homem tem sua origem no sentimento de piedade e no da simpália que experimentamos por todos os que sofrem. Provém tal senti capacidade de identificação com o próximo, ao pom
a sentir como que uma verdadeira dôr fisica se
presença, bater em uma criança, pois, sem dúvida, & instintivamente, se revoltará contra tal proceder,
Ito da nossa
eghegarmos
|bm nossa
matureza,
Partindo dêste gênero de observações e de fatos anúlogos, geral-
mente conhecidos, os enciclopedistas, por êsse modo, formular as mais largas generalizações e assim, pelo
garam a
u dos fatos
mais simples, explicaram de verdade a origem do sentimento moral como fato complexo que é.
O que, porém, êles nunca fizeram toi
pôr, em vez de fatos conhecidos e compreensíveis, palavras incom-
preensíveis e obscuras que não explicam absolutamente nada, tais como as de imperativo categórico ou de lei universal,
E óbvia a vantagem do emprêgo do método dos eneielopedistas,
como o acabamos de expôr. Em vez debuscar uma inspiração lá do alto, em lugar de inquirir uma origem Humanidade, para explicar a origem mavam, como coisa averiguada, que simpatia, de que o homem é dotado,
sobrenatural, fóra € acima da do sentimento moral, proclao sentimento de piedade, de herdou-o êle de seus antepas-
sados desde remotas origens, o que as observações próprias em seus semelhantes lhe confirmavam diariamente, desenvolvido e aperfeiçoado gradativamente através das idades pela experiência da
Do exposto resulta que não mudaram de métod o os pensadores
do século 18 quando, nos seus estudos,
passavam
do mundo dos
animais e dêste ao do homem, desde o desenvolvime nto das formas
econômicas e politicas da sociedade até à evolução do sentido moral,
' O métoco permanecia sempre o mesmo. Em todos os ramos da
ciência aplicavam uniformemente o método indutivo. Reconhecera se, finalmente, que nem no estudo das religiões, nem no da análise do sentimento moral nem nos domínios do pensamento em geral,
se encontrava um único caso em que êsse método falhasse ou outro viesse a sobrepôr-se como necessário para a completa explicação dos
fatos ocorridos.
Em nenhuma circunstância se viram êsses pensado-
res na contingência de recorrer a concepções metafísicas inspiradas por qualquer ser superior (alma imortal, imperativo categórico,
tórca vital, lei universal)
ou
a
qualquer método dialético.
Daí,
consegientes, procurarem interpretar o universo integral, com tôda a sua fenomenalidade, por um único processo, um só método, na
atitude de verdadeiros naturalistas.
No transcurso Gêsses memoráveis dias do despertar do pensa-
mento científico, os enciclopedistas ecificaram essa, obra monumen-
tal que se chama a Enciclopédia.
Laplace publicava o seu estupendo
Sistema do Mundo e o Barão d'Holbach o seu formidável Sistema da Natureza.
Lavoisier afirmava o princípio da indestrutibilidade da
matéria, o mesmo é dizer da energia e Co movimento; Lomonossoff, na Rússia, inspirado, sem dúvida, em Bayle, esbocava já nessa época a teoria mecânica do calor; Lamarck, o grande naturalista francês, explicava a origem da infinita variedade das espécies de plantas e
animais por suas adaptações aos diversos meios; Diderot, o famoso dilósoto francês dos fins do século 18, dava uma explicação racio-
mal das origens do sentimento moral da Humanidade, dos hábitos
moralidade, das instituições primitivas e das religiões, sem recor-
à estafada idéia de uma inspiração divina; Rousseau, o genial jador, intentava explicar a formação das instituições políticas
22
PETER
KROPÓTKINE
À
CIÊNCIA
como resultantes de um contrato social, ou, o que é o mesmo, por
MODERNA
23
efeito de um ato da. vontade humana.
Dentro em pouco não havia um recanta dos conhecimentos huma-
nos que não houvessem devassado pelo exame profundo dos fatos e
sempre pelo mesmo método científico de indução e dedução, que a
observação e a experiência a cada passo confirmavam. Nessa, tentativa, imensa e ousada, por certo mais de um êrro se cometeu, Onde falhavam os conhecimentos positivos, fizeram-se, por vêzes, conje-
turas um tanto audaciosas e não raro errôneas. Mas, preciso era notar que um nôvo método de investigação se vinha aplicando ao conjunto dos conhecimentos humanos e que, graças a êle, os próprios
erros eram depois facilmente reconhecidos e logo corrigidos. Foi assim que o século 19 recebeu em herança um instrumento poderoso de investigação que nos permite elaborar uma. concepção integral do universo sôbre bases científicas, liberta, finalmente, dos velhos preconceitos que a. obscureciam e dos têrmos nebulosos que a envolviam e nada esclarecem, mas que, por temor das perseguições religiosas e por um mau vezo, se haviam manhosamente introduzido em tôdas as questões difíceis, para escapar à sua plena elucidação.
3
diária, dos Princípios cardiais Pregados na França nos períodos 1789-1793. Essa gradua de l realização, pela via evolutiva, dos princípio que a tormenta Tevolu s cionária precedente acl amara, tóra reconheci como uma lei geral da de desenvolvimento das sociedades humanas. Se a Igreja, o Estado e, até certo ponto, a Ciê ncia, conspurcavam 9 estandarte altaneiro em que a Revolução ins crevera fe gloriosa civisa “Liberdade, Iguald ade e Fraternidade”, se o acomodatismo com existente, que era a o servidão políti ca e econômica, se hav ia tornado
A REAÇÃO NOS COMEÇOS DO SECULO 19
Ao iniciar-se o século findo, após o fracasso da grande Revolução Francesa, a Europa, como é sabido, atravessa um perodo de reação
geral nos domínios ca política, da ciência e da filosofia. O Terror
Branco dos Bourbons, a Santa Aliança, concertada em 1815, em Viena, entre as monarquias da Austria, da Alemanha e da Rússia, para combater as idéias liberais, o misticismo e o pietismo, nas côrtes européias e nas altas camadas sociais, e a polícia política triunf avam por
tôda a parte e campeavam à vontade
ê
Pois não obstante essa formidanda organização, os princípios fundamentais proclamados pela Revolução não foram, nem poderiam ser, aniquilados como se premeditava, A gradual emancipação do estado de semi-servidão em que até então haviam vivido 09 trabalha.
tecobrar o seu antigo pocerio.
A vaga libertadora invadira a Alemanha, ocid
ental, depois rolou té a Prússia e a Austria em 1848, estendeu-se às penínsulas ibérica
Itálica e, marchando avante par a o Oriente, alcançou a Rússia, Ide em 1861 fôra abolida a serv idão, e em 1878 chega aos país es
icânicos.
A escravidão desaparecera na América em 1863.
AD mesmo tempo que êsses fatos se produziam, as idéias de igualde todo s perante a lei e de govêrno repr esentativo se propaga-
de veste a leste com notável rapidez, verificando-se que nos do século 19 só a Rússia e a Turquia cont inuavam curvadas
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PETER
A
KROPÓTKINE
ao jugo da autocracia — valha a verdade já bastante achacada e irremediavelmente condenada a morte fatal (7).
Enquanto êsse eram os fatos palpitantes da história, outros mais
notáveis se registravam. Na
linha divisoria
que separa
o século 18 do 19,
mos, já cCominantes, as idéias de emancipação econômica.
encontra-
Imediata-
mente após o apeamento da reaieza pelo povo insurreto de Paris a 10 de agôsto de 1792, e, sobretudo, depois da queda dos girondinos a 2 de junho de 1793 (8), deu-se na capital francesa e nas provincias uma irrupção de sentimentos revolucionários, que, nesse sendido,
levavam à ação direta as várias seções revolucionárias das grandes e pequenas cidades, e até dos municípios, em uma grande extensão da
França. O povo proclamava, alto e bom som, que soara a hora de cessar
de ser uma palavra vã a Igualdade, que era já tempo dela entrar no cComínio dos fatos concretos. E como todo o pêso da guerra que a República teve de sustentar contra as monarquias coligadas recaia
exclusivamente sôbre os pobres, o povo parisiense forçava os represen-
tantes da Convenção a tomarem medidas socialistas igualitárias. A própria Convenção se viu obrigada, pela grita popular, a agir nêsse sentido adotando algumas medidas que tendessem à abolição da pobreza e ao nivelamento das fortunas. Depois que o partido republicano burguês dos girondinos foi apeado do poder pela sublevação de 31 de maio-2 de junho de 1793,
a Convenção Nacional e o Clube Radical burguês dos jacobinos foram
compelidos a adotar disposições, não só tendentes à nacionalização
co solo como do comércio dos objetos de primeira necessidade.
do Thermidor (9).
CIÊNCIA
MODERNA
25
Ainda que de curta duração, êsse movimento im-
primiu ao século 19 o seu caráter específico, a tendência libertária dos elementos avançados. Enguanto o movimento de 1794-94 durou, não faltaram, para o
exprimir, oradores populares.
Porém, entre os escritores ca época.
não houve um sequer em França que desse uma expressão literária, racional às aspirações e bases em que o movimento assentava de modo a produzir uma ação duradoura sôbre os espíritos. Foi nessa altura que William Gedwin fêz aparecer em 1793 a sua extraorGinária e inesquecivel obra intitulada: An Enguiry into Poli-
tical Justice and its Influence on Public Morality (Da Justiça Poli.
tica e da sua Influência sôbre a Moralidade) que o elevou à categoria
de primeiro teórico co socialismo sem govêrno, isto é, do anarquis-
mo, ao passo que Babeuf, sob a influência, ao que parece, de Buona-
roiti, se apresentava em 1795 como o primeiro teórico do socialismo centraiista, isto é, do socialismo de Estado. Vieram posteriormente, desenvolvendo os princípios já formulados
pe! lo povo francês nos finais do século precedente, Fourier, Saint-
mon e Robert Owen, os três fundadores do moderno socialismo nas
três principais escolas, e mais tarde, no ano quarenta, tivemos «on que, desconhecendo a obra de Gcdwin, assentava de nôvo -undamentos do anarquismo, As bases científicas do socialismo nos seus dois aspectos princi-
pais: governamental e anti-governamental, foram elaborados des-
de os começos do século 19 com uma abundância de desenvol. vimento lastimosamente ignorada dos nossos contemporâneos. Mas a verdade é que o moderno socialismo que data da fundação da céle-
pre Associação Internacional dos Trabalhadores em 1864, não ultra-
fsse movimento, muito importante, durou, infelizmente, pouco; foi até julho de 1794, quando a reação burguesa dos girondinos, pondo-se de inteiro acôrdo com os monarquistas, atingiu o apogeu a 9
passou aquêles egrégios fundacores senão, talvez, em dois pontos,
(1 do A. — Vide o conclusivo capítulo da nossa obra LA GRANDE REVOLUTION, (8) N. do T, — Partido republicano moderado, que se formou em, Françw
peus objetivos somente pela revolução social poderiam ser alcança-
em 1791, dos deputados mais eminentes da Gironda. Combiteram a MONTANHA, nome dado aos democratas exaltados da Convenção francesa de 1793,
mas, vencidos, foram quase todos decapitados.
ás, muito importantes.
Enquanto uma das tendências do moderno socialismo se declararevolucionária, isto é, afirmava categoricamente que a realização
N. do t. — O undécimo mês do calendário republicano. Jornada do “Ihermidor do ano II (27 de julho de 1794) foi a data célebre da do feroz Robesplerre.
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PETER
A
KROPÓTKINE
dos sôbre o que Fourier, Saint Simon e Owen não ousaram pronunciar-se, a outra tendência rompia de vez com a concepção do Cristo
socialista e revolucionário, idéia, que, já antes de 1948, se ostentava garbosamente.
Esses, os dois pontos em que o moderno socialismo
difere essencialmente dos seus primitivos propugnadores. O moderno socialismo entende, e muito bem, que para realizar
a suas aspirações é absolutamente imprescindível a revolução social, não porém, no sentido em que muitas vêzes a palavra revolução é empregada £, quando se fala em revolução industrial ou revolução nas ciências, mas no seu sentido exato, preciso, concreto: o de reconstrução geral e imediata das bases da sociedade
E sôbre o que fica dito acrescentaremos que o moderno socialismo cessou de mesclar as suas claras concepções com as raras reformas, muito anodinas, de ordem sentimental, preconizadas por certos
reformadores cristãos.
Mas isso mesmo, cumpre salientar o fato,
iá havia sido feito por Grodwin, Fourier e Owen.
á
Quanto à centralização e ao culto da autorigade e da disciplina,
que a Humanidade deve principalmente à teocracia e à lei imperial romana, essa superstrutura de um passado obscuro, constituem res-
tos atávicos conservados ainda por uma multidão de socialistas mo-
dernos que, porisso mesmo, ainda não atingiram o nível dos seus
predecessores inglêses e franceses — Godwin e Proudhon. Seria difícil dar aqui uma idéia adequada da influência que a
reação, ufanamente campeante depois da Grande Revolução francesa, exerceu sôbre o desenvolvimento das ciências (10). Bastará notar que tudo aquilo de que a ciência moderna. tanto se ufana hoje, fôrajá indicado, — e muitas vêzes mais do que indicaço, expresso em ) forma rigorosamente científica, — nos fins do século 18.
A teoria mecânica do calor, a incestrutibilidade da matéria, por-
tanto, do movimento (conservação da energia), a variabilida: é
das
espécies sob a influência direta do meio, a psicologia fisiológica, a
interpretação antropológica da história, das religiões e da legislação, as leis da evolução do pensamento, —- em resume, tôca a concepção (10)
Este assunto foi objeto de uma conferência nossa em inglês, intttu=
jada The Development of Science During the Nineteenth Century, (A evolução
da ciência durante o século XIX).
CIÊNCIA MODERNA
27
mecânica da natureza, como a elaboração de uma filosofi a sintética.
que compreendesse, em um todo unitário, os fenômenos físicos, qui-
micos, vitais e sociais, haviam já sido delineadas, e em parte reali-
zadas no século 18.
Mas quando a reação se firmou fortemente após o fracass o da Grande Revolução, procurou-se, curante cérca de meio século, sufo-
car essas descobertas.
Os cientistas reacionários apresentavam-nas
como pouco científicas. A pretexto de se estudarem primeiro os fatos, de acumular materiais científicos para serem definitivamente elaborados nas sociedades sábias, chegou-se ao desplante de repudiar as simples investigações que, porventura, não se enquadrassem em processos mensuráveis! Notáveis cescobertas, como as de Séguin e de Joule concernentes à determinação do equivalente mecânico Go calor (da quantidade de fricção mecânica necessária para obter determinada quantidade de calor) eram, por êsses guardiães da tradição, repelidas se nelas podiam ver alguma sombra de um princípio nôvo que lhes
desabonasse a arcaica ciência! Até a própria Royal Society of Great Britain, que é a Academia Inglesa das Ciências, recusara imprimir, sôbre o assunto, a extraordinária memória de Joule por achá-la anti-científica! E quanto ao
notável trabalho de Grove a respeito da unidade de tôdas as fórcças físicas, escrito em 1843, não se lhe ligou a mínima importância até
1856! E pois necessário ler-se a história. das ciências na primeira meta-
de do século 19 se se quiser compreender quão densas eram as trevas que envolveram a Europa nessa caliginosa época! O véu entenebrecedor depressa foi despedaçado, quando, na seEnda metade do século findo, sob o impulso do ano revolucionário de 1848, se iniciou no Ocidente europeu o movimento liberal que redun-
dou na insurreição garibaldina, na libertação da Itália, na abolição
fla, escravatura na América, nas reformas liberais na Inglaterra e, guns anos depois, abolia a servidão e o degradante knut na Rús-
e (11).
O mesmo movimento desacreditou na Europaa
auto-
(11) N. do T. — KNUT: acoute, azorrague, usado na Rússia, composto tiras de couro com bolas metálicas nas extremidades, com que se vergastava
gondenados e que era aplicado, com exceção dos nobres, a fodas as demais
os sociais.
PE
à
KROPÓTKINE
CIA
MODERNA
ridade de que, em filesotia, gozavam Schelling e Hegel, e na Rússia, em particular, promoveu aberta revolta contra o servilismo intelec-
tual e o assédio a tôda a espécie de autoridade. Este movimento de rebelião é conheciko pelo nome de niilismo.
Fazenco agora um retrospecto da história intelectual dêsses anos. chega-se à evidência que a propaganda das idéias republicanas e socialista na terceira e quarta decádas do século 19, bem como a revolução de 1948, muito contribuiram para que a ciência pudesse quebrar as algemas que a oprimiam desde o coméêço da reação antirevolucionária pela coalizão das monarquias coligadas contra a República revoluciohária francesa de 1798-1793.
E Miu-severtiginosa de chotre lancada em vias com pletamente novas. rapicez i ciência da v t a inauguraram-se novosra;
ida (biologia), a das instituições Iomanos Cosaber. i
S
mos
s
(antropo-
tendimento da vo ntade e das paixõe s hu.
Sem entrar em particularidades, bastará recordar alguns fatos. Marc Séguin, há pouco citado, um dos primeiros promotores da teoria mecânica do calor; Augustin Thierry, o historiador que primeiro assentou as bases do regime popular das pequenas repúblicas da
Idade Média, bem como das idéias federalistas da mesma época; Léonard Sismondi, economista e historiador suíço, que fêz a história das repúblicas livres medievas da Itália, foram todos discípulos de SaintSimon, um dos três fundadores já referidos do socialismo na primei-
ra metade do século 19: Alfred Russell Wallace, êmulo de Darwin, que enunciou, ao mesmo tempo que êste, a doutrina da origem das
espécies por via de seleção natural, foi, em sua mocidace, um parti-
dário convicto ce Robert Owen; Auguste Comte, o fundador da filosofia positiva, foi sansimoniano; David Ricardo, economista inglês, e
J. Bentham, filósofo e jurisconsulto inglês, foram particários de
Owen: os materialistas Karl Vogt e George Lewes, como Grove, Stuart Mill, Herbert Spencer e tantos outros, foram requestados à
influência do movimento radical-socialista dos últimos períodos do século findo, e nêsse movimento hauriram a sua audácia científica.
O aparecimento, no curto espaço de meia dúzia de anos, — de 1856 a 1862, — cos trabalhos, de Grove, Joule, Berthelot, Helmholtz e Mendéléeft; de Darwin, Claude Bernard, Spencer, Moleschott, e
Vogt;
de Lyell, sôbre as origens do homem;
de Alexander Bain,
sôbre a psicologia fisiológica; de Mill, sôbre a lógica indutiva; de Emile Burneuf. sóbre a ciência das religiões; — tôda uma pléiade de pensadores surgindo como de repente com a apresentação de
& uma mística fôrca vital Pre cisar m R de consult; ar a triilo log gi Bia ia dy de Hegel para, com ” Eos 2 que atribuimos um a existência, ad , T a nossa ignorância. ao Os fenômenos aç o cos, E que
30
PETER
progressivamente se
A
KROPÓTKINE
complicam i à a medida i que e ui studo a
dos fatos físicos para o dos fatos da viga, bastaria amplamen
ii
esplicar a natureza e tôda a existência orgânica, intelectual ER so E em nosso planeta. Sem dúvida que no universo fica ainda o cotas de ignoto, de obscuro e de incompreendido; bem iods i à n o vasto campo Gos nossos co:nhecim novas lacunas se abrirão q E n mn ns Não conhece ã em que as velhas se forem fechan o. na proporção É E que Ecimentos em iã O ré conhece a lguma dos nossos região mos, porém, É aos i aos fenômenos q | j Ss r a explicação adequada : E seja possível encontra dai simples mais os sejam quer antolham, nos NO bato se ai icos, como, por exemplo, no caso Co encontro de duas bolas de quiçá a químicos, ú ômenos RR pr u da queda: de uma ped ra ao solo, quer os fenôm tistes fatos, puramente mecânicos, têm a a opleioa ã de todos os fenômenos ndes i atéÉ agora para a explicação lentes notou jamais ! ppao Éà se alguma Em parte uisdos su ibili e se escobrir ) ia à os a possibilidade de entrevem não amente, Nada, o estera em que os fatos mecânicos não tenham ação. : E : o até agora, nos autoriza a admitir a sua existênc
A FILOSOFIA POSITIVA DE AUGUSTO COMTE
4
ido É evidente que tendo a ciência, por meados do ne Epa os resultados surpreendentes que Eeperovemaos no necessário seria empreender a elaboração de nã da oa que englobasse todos os resultados até então a ns ' E io mente no domínio das ciências naturais. Sem ly E dia tempo com os produtos da, própria A na E Rap ã
,
pn s ECmE e da vida” e pi ha — paço srfismo, Y ao ã simbólicas; dando Ri à Ei expressões logas a end E noe da de intentar a exposição de an tôsse como que q sumário sistemático, unificado, uma filos ; od raciocinado, de todo o nosso saber.
CIÊNCIA
MODERNA
ol
Uma tal filosofia, elevan do-se gradualmente do simples ao composto, estabeleceria, a larg os traços, os princípios fun damentais da vida do universo e nos dari a i gualmente a chave da com preensão da natureza em sua integric ade. Deste modo teríam os nessa filosofia um poderoso instrumento para largas investigações que nos auxiliaria na descoberta de novas relações entre os diversos fenômenos ou. como se diz atualmente, na verificação de novas leis naturais, nos inspiraria, ao mesmo tempo, a confiança na exatidão de tôdas as conclusões científicas por contrárias que, porventura, fôssem as noçõescorrentes, Várias tentativas dessa espé cie se fizeram, de fato, no decu rso Go século 19, mas a de Aug usto Comte com sua Filosofi a Positiva e a de Herbert Spencer com a sua Filosofia Sintética, — de que adiante Garemos conta, — mer ecem muito da nossa atenção. Aliás, a necessidade da elab oração de uma filosofia sintétic a foi entrevista e compreendida pelo s enciclopedistas do seculo ad o por Voltaire no seu memorável Dictionnaire Philosophique, até hoje , com justiça, considerada uma obra monumental; por Turgot, o grande economista, e, posterio rmente, de maneira, m ais ampl a, por Saint-Simon, o funcador de uma das três grandes escolas de socialismo. Foi depois dessas tentativas que, com a publicação, na primeira metade do século 19, da sua vigo rosa Filosofia Positiva, o prec laro espírito Ce Augusto Comte empr eendeu a mesma tarefa, poré m de um modo rigorosamente científico e mais adstrito aos progressos das ciências naturais naquele tempo. A Augusto Comte segu iu-se o britânico E. Spencer, com a sua bem fundadai Filosofia Evolucionista, publicada já em plen a expansão das ciências naturais no século 19. (12) Com relação as matemáticas e às ciências exatas em geral, Comte saiu-se brilhantemente no tentame. Não se pode deix ar de reconhecer que Comte andou magn iiicamente inspirado ao introduz ir (12)
N. do T. — Dêstes dois grand es pensadores
temos, em lingua portuguêSa, exposições sumárias de suas filosofias, Para Comte; TEIXEIRA BASTOS, — Princ ípios de Filosofia Positiva, em dois
volumes, 1888. Para Spencer: CALDAS CORDEIROS — Sumário da Filosofia Evolucionista — Lisboa , 1897.
32
PETER
KROPÓTEINE
nas (sociologia) s sociedades huma (biologia) e à da da vi osofia Positiva, ca Fil a a nci su a ciê classificadas na vas iti pos as a menci a que, na segund no ciclo das ciê rmidável influênci fo à a óri a dos ri not é io ma como também erceu sôbre a
ex essa imensa obra tade do século 19, a. oc ép da ores m razão, Os admi cientistas € pensad indagam, não se -— e, mt Co em e o têm apreciad Mas porque é qu fo, os que à
óso co portentoso fil eendeu, na sua radores da obra co quando empr fra o tã ou tr os mM humanas, se das instituições sua inteireza, — itica, O estudo Pol a mo é que re Co sôb O da ética? segunca obra rnas, e, sobretudo, e: imentos mod ec as nh co e ent especialm stos e positivos va tão de , do constiprofun obra, veio a um espírito tão na sua primeira os st igião fe rel ni ma de um: a nova exuberantemente a, O fundador vid a su Ca io tuir-se, no declín
am em to? de Comte procur e de um certo cul orosos discípulos igião ard Rel is da ma s ão do aç Alguns ta da. fund tra e qu a a, obr cas tõ a última tando, com vão conciliar a su primitiva, susten ra ob o a sm su me a o com e seguir da Humanidade, nada, mais fêz qu fo óso a fil su te na en in em bem como as veras, que O osofia positiva, Fil é a o su nã O na e — qu s E rece exato. método em amba pa s no o nã E. e Mil e -— o qu ciscípulos, 3. gs. politica Positiva, s mais ilustres itiva de seu pos de s ca íti doi Pol o provaram-n e repudiam à qu e, ent alm tas igu a grance obra, Littré, positivis integrante da su te par ra am er id ns co vêem naquela ob Comte e não à des filosofos Ti ão a. an it gr ép cr is do de s ia se nc inteligê a Filosofla. Es produto de uma nte o ra e ag qu fl do is ma is de ma outra coisa o patente, por gar & contradiçã a Filosofia e à Não há como ne mte, entre à su Co ge s ra ob as de algudu das mos do estado e característica, em à inquirir rg ma dá cas da s fi no tí que e cien sua Politica, 0 tões filosóficas es qu s te an rt impo mas das mais Positive
|
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|
ilosophie atualidade. u Cours de Ph er terminar o se ao e, a tocado sequ mt vi Co Augusto a obra, não na ss ne to e, en qu im nt do vida, nota origem do se teria, sem dú s, a saber: à da tô do de ca l vi ia à nc is esse ento sôbre na questao ma e ia dêsse sentim qu nc uê e, fl nt in me a te € m ora, eviden s. na moral no home ma nu l ve es ad nte indispensá m € das socied ria apsolutame mesmo home se — va ti si na po de filosofia r da vida huma em um curso tão importante fato
um estudar a origem de
A
CIÊN + CIA
a M MODERNA
33
cáá-lo pel: o sentimento — e expli xplic
Comte explicava
js; REG o nasam AE causa eia
rar nos oridEa Fevena mpsi nd m, É é etançoençã fi ô que o home de uer o qualq x ni NR aa sente 0] brigado àEinfluência dêsse nina ou,C o menos, levado pelo o mputá-lo devidamente
; é exti que no novágel é que Comte se situasse n adde pont hos O Rae u o grand ente segui posteriorm sua E cs sua, em n, car, Darwi expli de s u inglê esen EEin este trato raordinária DiD Man (Origem do Homem) to + à Origem do sentimen
moral humano.
SE ' E nité s huria p ce r Instituant La Réligion E Ri o Ea ssagens soa padoAun o :
Comte inseriu, , por certo, ) no seu Syste: me Ê
e ta hseEaçã àct n auxílio mútur ns o ca sociabilidade e do os animais e a Rs ensã nsõ Neem fatos as Conclusões Mas, j para E dêsses e r E ” positivit; datos
Eea
te feude a n E e E a preci aa va ia falta ousad o a na mte isamente > rim ) iosóriea, Devo) a(dir eee
rias, os con!
Sup Rea osabnláfrio a
a homem deve adorar e a quem Sol obter a gra ERR e ão) iEnic anbot em , mas, à palava RAia um ser moralculo. Ante êsse nôvo id a de
os denava-n ó n
êle
H maiús didente a! ciripiriiio e com dayat Rodos Proetrnr
apena
i o ea tos morae r emdo onós nê os sentimen inho, reconheci de desen vêz entra nêss; cla roimque, uma volve E a e cami necessário que usque eo esto
ata D acuea a leça , para mant: er
dodever r
E o animal hº D — o resto viria natur OsHtdaLa aE al e suavemente reli:
(13) N. do à e
dês e nsta, ativi o pposi çoR ei Gr Tobi aa ma T o ca á mi par o o rca i ate m 1 a O o Ed avano enâmem , citando-me rg
Teferir essa: »
NB, primer a ediçãão inglesa
E
-mé obra de Comte e até presenteando à aenda de ine testemunhas aqui su queéocaito pelo nx, oque POl hz, aaa o
O ps qu sconi ln Positiva, pá, e o dota ndigio, que nt mo ie soc a to o ant jmt a, en agor at Mto relê-las Da uma HoM ds dobo ,erimente: Dia aguieaRo fas penhacimnhoo
PETER KROPÓTKINE
34
A
gião comteana encontra-se fâcilmente por entre os rituais das arcaicas religiões procedentes do Oriente.
sões, uma vêz que não reconhecera que o sentimento moral do homem, como a sociabilidade e a própria, sociedade, têm uma origem
homem pela observação da natureza e da vida cas sociedades hu-
:
manas, as conclusões deveriam ser fatalmente aquelas.
moral E que Augusto Comte não pudera compreender que o senso
avia Tecebido e da qual se ressentia.
Sem admit
poderosos, e sem a invocação do hom em ao representante do Dlmié
longo ganização física, as quais são uma herança, derivada de um
processo evolutivo.
Comte úotara, certamente, a existência de sentimentos de socia-
pilicade e de simpatia reciproca entre os animais, porém, sob a in-
consifluência do grande zoólogo Cuvier, que, naquele tempo, era e Buffon que o admitiu não derado a maior autoridade científica,
Lamarck haviam já entrevisto: a variabilidade cas espécies; não reconhecera, enfim, a doutrina, hoje corrente, da evolução continua, que vai do animal ao homem. Consegientemente, Comte não vira o que Darwin tão bem com-
homem o poder nefasto do Mal.
a
tentes em tôdas as sociedades animais muito anteriores ao apare-
desta origem natural deverão provocar necessariamente reações ca
que
ir uma uta entre q princípio &o Bem e 9 Princípio do Mal, ambos igualment;
rro dêsses principios para se encouraçar contra as influências insidi E do representante Go segundo, o Mal — sem todo êss E seria possível O cristianismo existir, é » talvez, essa a o sua condição essencial de vida. o Comte, fortemente imbuído dessa e oncepção cristã da moral, não 4hesitou em Tegre : ssar a ela quando topou no s: eu caminh oa Si Re e os meios de robustecêla nos sentimentos do onda, :a Humanidade devia servir-lhe m: agnificame i nt: =é gentar do
ordo homem depende tanto da sua intrínseca natureza como da sua
uma fase de declinio; que os atos contrários à moral derivada
:
E E enveredar pelo caminho de uma vida moral . ca a n Simo a n, ; a e pagou Comte o seu inevi tável tributo à educação
no uma mera evolução ulterior da sociabilidade animal, robustecido
indivíduos isolados, o senso moral na espécie humana percurará, todavia, instintivamente enquanto a humanidade não entrar em
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inventar uma nova divindade, a Humanida de,
culto, para manter vivo no homem o sénco moral,
pre-humana; desde o momento que não reconhecia nêsse sentimento
cimento, na Terra, dos primeiros espécimes com aparência humana. Pelas mesmas razões, Comte não pôde verificar, como agora de estamos habilitados a fazê-lo, que, não obstante os atos imorais
MODERNA
tivamente mais poderosa do que os mandamentos de qualquer: reiigião ou os éditos dos legislador es. como e tendo sido admitido por Comte, viu-se êle como que
concluNada de admirar, portanto, que Comte chegasse a tais
preendera: que o senso moral do homem nada mais é do que uma evolução sucessiva dos instintos, dos hábitos de auxílio mútuo exis-
CIÊNCIA
ad
O VIGOROSO IMPULSO CIENTÍFICO DE 1856-186 2
. E na verdade, Augusto Comt e fali iu no seu estudoa respeito stitnico das a e, sobretudo, no tocante às orig ens da morali le, e, entretanto, , não esquecer que êle ê escreveu os sei ê
mes do seu Curso de Filosofia Posit ositi i va nos ano; Sa 1830 a 1842 e os quatro do seu Sistem: a Ce Política E Bos Posi tiva Ca de 1851 Sa g a 1854,é, port port anto, muito antes do período áureo do desperta; í
parte dos outros indivíduos, tal qual uma ação mecânica que pro-
)
pacidade de reação contra os atos anti-sociais reside uma fórça naCas tural capaz de preservar o senso moral e os hábitos sociáveis
& se procurouelevar o nível das e conce pções gera gera;is de todo dl o home)em
duzirá a sua consequente reação no mundo físico.
Que nessa ca-
animais, sena sociedades humanas, como os mantém nas sociedades
infiniqualquer interferência exterior; que, finalmente, essa fôrca é
rito cientifico que se operou de 1856 a 1862 em que, de n a aa di vista, ruidosa e rápi damente, se dilataram os hori zontes da ciência
na Série de obras importantes concernentes a diversos ramos das cias, que se publicaram no decurso dessa meia dúzia de anos,
APR EDe ai E
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PETER
KROPÓTKINE
procuziram uma tal revolução no modo de interpr etar a natureza, sôbre a vida em geral e as atividades das sociedades humanas, que não há memória ce tamanha revolução em tôda a história das ciências nos últimos vinte séculos, O que os enciclopedistas mal vislumbraram ou obscuramente pressentiram, o que as mais fulgurantes intelig ências da primeira fase do século 19 haviam, com incaleuláveis dificul dades, lobrigado, fêz-se repentinamente matéria de conhecimento, tornouse certeza positiva exuberante em resultados apreciáveis. De notar é, porém, que êsses novos conhecimentos foram tão belamente concate nados, de maneira tão completa e em forma tão compreensiva, graças à aplicação co método científico indutivo-dedutivo, que ficou cabal. mente demonstrado ser o emprêgo Ge outro, que não êsse, falso, incompleto e absolutamente estéril. Analiseínos, ràpidamente que seja, êsses resultados para melhor nos habilitarmos a apreciar a grande tentativa que o genial Spencer levou a cabo com a publicação da sua exaustiva filosofi a evolucionista ou sintética. No transcurso dêsses notáveis seis anos, Cirove, Clausius, Helmholtz, Joule, e tôda uma falange de físicos e astrônomos, em icujo número devemos incluir Kirchoff, que, pela sua surpreendente descoberta da análise química espectral, nos permitiu reconhecer a constituição química das estrêlas, isto e, dos sóis mais distantes de nós, quebra. ramo encanto que, durante mais de meio século, reinou entre os homens de ciência, privando-os de se aventurarem a vastas e ousadas generalizações físicas. E, dentro de poucos anos, provaram e estabeleceram êles à saciedade a unidade da natureza em todo o mundo inorgânico, compreendendo os astros mais longínquos com o seu séquito ce planêtas. Dai por diante, a menos de querer ficar retrógrado, não era já possível falar em fluídos: calórico, magnético, elétrico ou de qualquer outra espécie, a que os físicos de antanh o haviam recorrido para explicar as diferentes fôrças físicas. Provou -se à evidência que os movimentos mecânicos das moléculas, tanto os que produzem as vagas marítimas, como os que se descob rem nas vibrações de um sino, de uma lâmina metálica ou de um instrumento musical, bas-
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tam para explicar todos os fenômeno s físicos: o calor, a luz, o som, a eletricidade e o magnetismo. Foi-se mesmo além, Aprendemos a medir êsses movimentos invisíveis vibratórios cas moléculas, conse guiu-se, por assim dizer, pesar a sua energia, da mesma maneira que medimos a energia do movimento de uma pedra atirada de certa altur a ou de um comboio em andamento. A física, afinal, tornou-se um mero ramo da mecânica. Sôbre tudo isso, Gemonstrou-se, no decurso dêsse memorável periodo de meia dúzia de anos, que nos mais distantes corpos celestes, nas miríades de sóis que povoam a via láctea, se encontram exatamente os mesmos corpos simples quími cos, ou elementos, que encontramos na Terra, e que se dão nêles as mesmas vibrações moleculares que se produzem em nosso planêta, com resultados físicos e químicos absolutamente idênticos. E, com todos os visos de probabilid ade, julga-se hoje que os moVimentos das massas celestes, dos astros que percorrem o espaço conforme as leis de gravitação unive rsal, não serão outra coisa mais do que as resultantes de tôcas essas vibrações transmiticas em tôdas as direções a milhões e biliões de milhas, através dos espaços inters telares do universo. Essas mesmas vibrações calóricas e elétricas bastam para explicar todos os fenômenos químicos. A química mesmo, em síntese, não passa de um capítulo da mecânica molecular. A vida, em suas inúmeras manifestações inerente ag plantas e aos animais, se resume em uma troca ce moléculas, ou melhor, ce átomos, na vasta série de corpos químicos, fâcilmente decomponíveis — instáveis pela sua extrema complexidade — Ge que se compõem os tecidos vivos de todos os sêres animados. A vida, portanto, nada mais é é&o que uma série de decomposições quími cas nas moléculas comple-
xíssimas, em resumo, uma série de fermentaçõ es devidas a fermentos
químicos inorgânicos. Como se tudo isso não bastasse, ainda nessa época se descobriu, o que dépois, na década de 1890-1900, ficou plenamente comprovado, que o processo vital das células do sistema nervoso consiste igualmente em uma série de permutações químicas nas moléculas celulares e que a capacidade de transmissão de uma a outra célula
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A CIÊNCIA
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s, nos fornervosa de vibrações moleculares e transmissões química
nece já uma explicação mecânica da vida psíquica nos animais e da propagação das excitações ns plantas. O resultado dessas investigações é, sem dúvida imenso.
Graças
puramente a elas, pocemos agora, sem sair do domínio dos fatos em nosso gravam se e fisiológicos, compreender como se produzem as congeram se como geral, cérebro as imagens e as impressões em dos habilita nunca, que do mais hoje, s cepções e as idéias. Estamo
das idéias, isto a compreender o mecanismo da chamada associação antigas apagaões impress as surgir faz ão impress nova cada é, como
das.
Logramos, com tais descobertas, erguer um pouco o véu
que encobria o mecanismo do pensamento.
Estamos, naturalmente, em semelhante ramo do saber, muito
primeiros passos; lenge da posse do conhecimento, mal ensaiamos os ainda mal ciência, A vasto. mente imensa é r descobri resta o que nos O estuassoma Jiberta da metafísica que a tem estrangulaco, apenas os primeir os Mas . siologia do dêsse imenso domínio, que é a psico-fi as para s assente já desde estão passos estão Cados. Sólidas pases ações ulteriores. investig
A antiga divisão na ordem dos conhecimentos em dois domínios estaabsolutamente distintos que o filósofo alemão Kant pretendeu
a sua, classibelecer, — o dos fenômenos que investigamos, segundo fenômenos dos o e físico) ficação, no tempo e no espaço (o domínio
menque só são investigáveis no tempo (o domínio dos fenômenos ecer. desapar a tais), — tende
ista, O A questão proposta, um dia, pelo fisiologista russo material — a ia? psicolog :a professor Syetchenoff: a que filiar e como estudar nte unicame e ia fisiolog à resposta categórica não se faz esperar: invess recente as que ente stâvelm Inconte pelo metodo fisiológico!
luz sôbre ligações dos fisiologistas têm projetado infinitamente mais
impressões e a sua o mecanismo do pensamento, sôbre a origem das
es fixação na memória e sua transmissão do que tôdas as sutis Ciscussõ
séculos. com que os metafísicos nos têm recreado o espirito durante sua, vamente exclusi era cantes que Assim, mesmo na fortaleza
e a a metafísica bate em retirada. As ciências naturais por um lado
incrível, inteifilosofia materialista por outro, que com uma rapidez avançar os nossos ramente desconhecida do passado, tanto fizeram
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hecimentos na, matéria debatida, invadem hoje vitoriôsamente os ínios, outrora reservados à metafísica, ca psicologia. Todavia, entre as obras que apareceram nessa meia dúzia ce
Os espíritos. oseo 18 e Lamarck nos comêç os do século 19 ha-
ntar que as diferentes espécies
di
i mais que povoam a Terra nãão representam forma a s imutáv an ei s é eles são variáveveis, is, , sob a açã ção Co meio i ambiente muda o m orii contin i nas uans semelhanças genealógicas de família que se no: : E!ntes espéci e es e pertinentes a um d: ado grupo — assi A per êsses ilustres naturalistas — prova m que ia Conétia
E cendem de um progenitor comum. Assim as diferentes espécies ro que habitualmente deparamos nos prados e nos pân-
De E necessáriamente os descencentes de uma mesma e única écie de antepassados ae , descendentes &ssses que se têm ê diversificad:
por efeito de uma série de variações e adaptações por que passar:
A
em suas várias condições de existência, E Icêntico fenômeno se dá com as atuais espécies de lobos, cães,
chacais, raposas, que, em tempos remotos, não existiam, havendo , entretanto, em seu lugar, uma espécie de outros animais da Fr no decorrer dos tempos, se originaram diversas classes ue são hoje os lobos, os cães, os chacais e as raposas nossos conhecidos. ARO que concerne, por exemplo, ao cavalo, ao jumento, à zebra, ete. conseguiu-se determinar perfeitamente o antepassado comum pela de: coberta das ossamentas respetivas nas camadas geológicas. No século 18 era, porém, perigoso professar semelhantes hereeias. Por muito menos fôra já Buffon perseguico pelo tribunal ecle-
siástico que o obrigara, quando da publicação: da sua História Na«
fural, a retratar-se das suas ousadas afirmações a respeito da evolu-
ção geológica da Terra.
Por essa época, a Igreja dispunha de todo
o poder e o naturalista que, porventura, ousasse sustentar heresias daquêle jaez, que vinham, naturalmente, solapar a sua histórica auto.
ricade, era inevitavelmente ameaçado de prisão, de tortura e, quando
menos, encerrado num hospício de loucos!
Tal o motivo porque os
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heréticos da primeira metace do século 19 falavam com tanta prudência e reserva. Porém logo, na segunda metade do século findo, após a revolu. ção de 1848, Darwin e Wallace puderam ousacamente afirmar a mes-
ma heresia. Darwin não temeu acrescentar que o homem era igualmente o produto ancestral de uma lenta evolução fisiológica cuja origem se encontra em uma espécie de animais semelhantes aos quamoral drumanos conhecidos, que a chamada alma imortal e o senso
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verificou-se que novos horizontes se abriam às nossas vistas permi-
tindo explicar, no domínio de todos os ramos do saber, os fatos mais
incompreensíveis e os mais dificeis problemas.
Baseando-se nêsse
princípio, tão aico de consequências, foi possivel reconstituir, não sô-
ER Eq dos organismos, mas a própria história das institui-
A biologia, manobrada por Spencer, evidenciou-nos perentoria-
do homem se haviam cesenvolvido análogamente à inteligência e aos
mente como tôdas as espécies de plantas e de animais puderam deenvolver-se, oriundas de uns poucos organismos que povoavam a Terra
Ninguém por certo ignora os fulminantes anátemas que os
GEvore genealógica, mais do que provável, das diferentes classes de
instintos sociais ce um chimpanzé ou de uma formiga.
de magnatas das diversas igrejas fizeram dardejar sôbre a cabeça ardoroso e sábio corajoso, seu de a sôbre te, especialmen e, Darwin magisdiscípulo Huxley que tanto se notabilizou pelas conclusões que verdade, na quais, as carwinista, tralmente soube extrair da doutrina foram a total ruína dos sacerdócios de tôdas as religiões. não A lita, foi sem dúvida, terrível, mas os darwinistas, como
podia, deixar de ser, sairam cela vitoriosos e desde então uma nova
ciência, a biologia, a ciência da vida em tôdas as suas manifesvistas como tações, se fundou e desenvolveu enormemente às nossas
é demasiado sabido.
um A doutrina ca origem das espécies por via descendente é hoje saprópios os até que reconhecido e o estabelecid e firmement fato tão apenas tracerdotes das várias religiões a aceitam sem contestação,
no seu início, e Haeckel pôde traçar o admirável esquema de uma
animais em que é abrangido o homem. Resultado imenso êsse a que
veio juntar-se o dos primeiros fundamentos sólidos, científicos,
história dos hábitos, dos costumes, das crenças e das institui.
da
es hu-
manas, conhecimento, aliás, que faltava absolutamente aos filósofos do século 18 e, especialmente, a Augusto Comte. Essa história — a das sociedades humanas, das várias instituições saciais e das reli-
giôss —podemos agora escreve-la, norteando-nos pelo fecundo principio da evolução, sem necessidade de recorrermos às fórmulas metafísicas de Hegel, sem ser preciso apelar para as idéias inatas, para
uma revelação exterior e superior ou ainda para as substâncias de Eant. Podemos reconstituir naturalmente essa história sem necessidade alguma Ge invocarmos fórmulas vasias de sentido que foram a morte
tam Ge a acomodar ao princípio teológico da Revelação.
de todo o espírito investigador e por detrás das quais se ocultavam,
a uma exata um nôvo método de investigação que nos habilitam que tanto método fenômenos, dos de complexida compreensão da e das organismos dos vida à como física matéria da vida à se aplica
outrora,
Assim a obra de Darwin forneceu-nos uma. nova interpretação e
sociedades em sua evolução.
a evoA idéia de um continuo desenvolvimento, de uma, progressiv sociedades das e indivíduos dos lução e ce uma gradual adaptação — essa idéia as novas condições, na medida que estas se modificam a que, até que larga mais muito aplicação encontrou fundamental essa conQuando então, pretendia explicar a origem das espécies.
cepção se aplicou ao estudo da natureza em geral e, em particular,
instituições sociais, ao estudo do homem, das suas faculdades e das
como por entre nuvens, a mesma ignorância, a crassa ignorância de sempre, as mesmas superstições do passado, a mesma fé cega de
Graças, de um lado aos trabalhos de naturalistas de renome, de
outro aus de Henry Maine e seus continuadores que souberam notôriamente aplicar o mesmo método científico ao estudo das institui“ções primitivas e das leis de que elas derivam a sua origem, foi possível, durante os últimos cingúenta anos, estabelecer a história co de.
senvolvimento das instituiçoes humanas em bases tão firmes como hoje está a história do desenvolvimento de qualquer espécie vegetal
e animal.
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Seria, de certo, injusto esquecer nesta resenha o trabalho imenso
já realizado antes dessa época, na terceira década do século 19, pela escola de Augustin Thierry na França, pela de Maurer e dos germaxistas na Alemanha de que foram continuadores, entre tantos
outros, Kostomaroff e Bélayeff na Rússia.
O conceito da evolução
fôra já certamente aplicado, desde o tempo dos enciclopedistas, ao estudo dos costumes e das instituições, bem como ao cas línguas. Mas só se puderam obter resultados exatos, científicos, depois que os homens de ciência entraram de considerar os fatos históricos
do mesmo modo por que um naturalista considera o desenvolvimento gradual dos órgãos de uma planta ou o de uma nova espécie. As fórmulas metafísicas, na época em que dominavam, poderiam,
até certo ponto, centribuir para algumas parcas generalizações . Tanto ou quanto, serviram para despertar algumas inteligências coactas
e estimular o pensamento com suas vagas alusões à unidade ca natureza e da vida incessante que lhe é inerente. No tempo em que a reação atingira o seu ápice, como foi o caso nas primeiras décadas
do século 19, quando as generalizações indutivas dos enciclopedis-
tas e dos seus prececessores ingleses e escoceses começavam a decli-
nar, nêsses tenebrosos dias em que se carecia de coragem moral para
falar, em face do misticismo então triunfante, da unidade da natu-
reza física espiritual, — valor moral que faltava aos filósotos do
tempo, — as poéticas concepções de alguns pensadores franceses e a
metafísica nebulosa dos filósofos alemães tiveram, pelo menos, o congão de despertar o gôsto das generalizações. Porém, as generalizações dessa época, estabelecidas umas pelo método puramente dialético, outras por uma semiconsciente indução, eram, por sua própria natureza, de uma, desesperadora, vacuidade. As primeiras, derivadas do método dialético, no fundo não passa-
concêntricos pelo fato de ser o circulo, na sua opinião, a curva mais
perfeita. O caráter simplista de tais afirmações, carecedoras de provas, não impressionava tôda a gente; eram aceitas simplesmente por que se forravam de raciocínios vagos e de uma ôca fraseologia servi-
da por um estilo empolado, grotesco e absurdo a mais não poder ser.
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As segundas das generalizações menci onadas, originadas
de uma indução semiconsciente, foram sempre basea das em uma série extremamente limitada de observações. Como tipo dessas generalizações mal elaboradas, conquanto largas, citaremos as de Weismann, que
tanto ruído produziram nas fileiras dos biólogos contemporâ neos.
Era então facilmente exagerado o valor dessa s generalizações, dema.. siado hipotéticas, tão-sômente baseadas na indução semi-consciente já referida, que se pretendia apresentar comol eis indiscutíveis, quando, afinal, mais não eram do que meras hipóteses, simples suposições, germes de generalizações carecedoras de verificação experimental pela comparação dos seus resultados com os fatos observados para
serem admitidas como verdades inconcussas.
Tôdas essas generalizações, em resumo, expressas em fórmu
las abstratas e enevoadas, como, por exemplo, as famosas tese, antitesc
e síntese de Hegel, só tiveram por efeito dar plena liberdade ao franco arbítrio para deduzir delas as concl usões mais contraditórias que é possível imaginar. Como ilustração diremos que delas tanto se pode deduzir, — o que, aliás, já foi praticamente feito, — o espírito
revolucionário de um Bakunine, a revolução de Dresden, o jacobinie-
mo revolucionário de Marx, como a sançã o do existente de Hegel,
que levou tantos autores a pretender a paz com a realidade, por
outras palavras, a justificação ca autoc racia. Em conseguência da sua predileção pelo método dialético e pela metafísica econômica, em vez de se aplicarem ao estudo dos fatos concretos da vida econômica dos povos , bastaria referir os numero-
sos e crassos erros econômicos em que os marxistas incidiram.
vam de asserções ingênuas, muito semelhantes às formuladas pelos
pensadores gregos da antiguidade quando afirmavam que os plane tas deveriam necessãriamente percorrer o espaço através dos círculos.
CIÊNCIA
6. 5
HERBERT SPENCER E A SUA FILOSOFIA SINTÉTICA
Quando o estudo da antropologia, que o mesmo é dizer da evolu
ção fisiológica do homem e do desen volvimento das suas instituições
sociais e religiosas, se fêz conforme os méto dos aplicados às ciências. naturais, foi, emfim, possível traçar as linha s essenciais da história da Humanidade, abandonango para sempre a metafísica que até então
Ma+ 44 o)
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“só havia obstruido o estudo da história tal como a tradição bíblica «obstruira
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outrora o estudo científico e O progresso da geologia. Nêsse estado de coisas seria de supôr que quando o genial Spen-
cer, na segunda metade do século 19, empreendeu, por sua vêz, a elaboração de uma filosofia sintética lograria fazê-lo sem cair nos “erros que caracterizam a Política Positiva de Augusto Comte, a que
Outro exemplo frisante. Spencer, na fase áurea do seu pensamento, bateu-se energicamente contr a a interferência do Estado na
iá nos referimos. Não obstante a Filosofia Evolucionista de H. Spencer constituir
Vida das sociedades e a uma das suas mais notáveis obras deu êle: O título
na verdade um notável avanço nos dominios do pensamento, pois que nela, de fato, não se enquadra qualquer nova religião ou culto, contém, todavia, na sua parte sociológica, dislates tão graves como os
que por si encerra todo um programa social revol
ucionário: O Indivíduo contra o Estado (The Man Versus State). Pouco a pouBo, porém, sob o falso pretexto de salva guardar as funções proteto. do Estado, reconstitui-o inteiramente tal qual hoje existe, apenas mui poucas e tímidas restrições.
que se observam na Politica Positiva de Comte. E um fato incontroverso que, ao tratar da psicologia das sociedades,
depois de haver examinado com admirável precisão a substân-
Essas, e outras contradições do mesmo gênero, enco ntram fácil
cia do nosso conhecimento no tocante às ciências físicas, à biologia e
à psicologia em geral, Spencer não soube, no estudo daquêle ramc do saber, permanecer fiel ao seu rigoroso método científico e assim não ousou enfrentar as conse ncias a que, fatalmente, o levariam a estrita adoção dêsse método. Assim, para citar um exemplo, Spencer reconhece plenamente que o solo nunca devera ser propriedade de quem quer que fôsse, como admite que o proprietário do solo, pelo fato do direito que lhe assiste de elevar sua vontade o preço de locação da terra, poderá im-
pedir os seus naturais cultivadores de extrair dela tudo o que, por
meio de uma cultura intensiva, poderiam obter, ou, em sentido,
contrário, terá a faculdade, consoante as suas conveniências, de conservarincultas as terras aguardando uma oportunidade em que o preço do hectare suba por via do trabalho de outrem e do progresso realizado na região que venham a promover a valorização dos terrenos adja-