Economia Política e Contas Nacionais - Mensuração Empírica da Exploração da Força de Trabalho no Brasil de 2000 a 2020

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Economia Política e Contas Nacionais - Mensuração Empírica da Exploração da Força de Trabalho na Economia Brasileira de 2000 a 2020 - Felipe Borti Research · August 2023 DOI: 10.13140/RG.2.2.23306.03522

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1 author: Felipe Reis Borti Universidade Federal do Maranhão 1 PUBLICATION   0 CITATIONS    SEE PROFILE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

FELIPE REIS BORTI

ECONOMIA POLÍTICA E CONTAS NACIONAIS: mensuração empírica da exploração da força de trabalho na economia brasileira de 2000 a 2020

São Luís 2023

FELIPE REIS BORTI

ECONOMIA POLÍTICA E CONTAS NACIONAIS: mensuração empírica da exploração da força de trabalho na economia brasileira de 2000 a 2020

Monografia apresentada ao Curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Maranhão como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas. Orientador: Prof. Dr. Elizeu Serra de Araújo

São Luís 2023

Ficha gerada por meio do SIGAA/Biblioteca com dados fornecidos pelo(a) autor(a). Diretoria Integrada de Bibliotecas/UFMA

Reis Borti, Felipe. ECONOMIA POLÍTICA E CONTAS NACIONAIS: mensuração empírica da exploração da força de trabalho na economia brasileira de 2000 a 2020 / Felipe Reis Borti. 2023. 81 f. Orientador(a): Elizeu Serra de Araújo. Monografia (Graduação) - Curso de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2023. 1. Contas nacionais. 2. Economia brasileira. 3. Economia marxista. 4. Economia política. 5. Exploração. I. Serra de Araújo, Elizeu. II. Título.

FELIPE REIS BORTI

ECONOMIA POLÍTICA E CONTAS NACIONAIS: mensuração empírica da exploração da força de trabalho na economia brasileira de 2000 a 2020

Monografia apresentada ao Curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Maranhão como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas. Orientador: Prof. Dr. Elizeu Serra de Araújo. Aprovada em 19/07/2023 BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Elizeu Serra de Araújo (Orientador) Universidade Federal do Maranhão

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Eduardo Simões de Souza Universidade Federal do Maranhão

___________________________________________________________________ Prof. Ms. Orlando Oscar Rosar Universidade Federal do Maranhão

AGRADECIMENTOS Gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos a todas as pessoas que contribuíram para a realização deste trabalho de conclusão de curso. Sem o apoio e incentivo de cada um de vocês, essa conquista não teria sido possível. Em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao meu orientador, o Dr. Elizeu Serra de Araújo. Sua orientação, paciência e expertise foram fundamentais para a condução deste estudo. Também quero expressar a minha profunda admiração intelectual. Durante a minha jornada acadêmica, fui cativado pela sua vasta expertise, seu domínio do conhecimento e sua paixão contagiante pela área de estudo. O professor Elizeu sempre se mostrou um exemplo inspirador de dedicação, comprometimento e excelência acadêmica. Sua capacidade de transmitir seus conhecimentos de forma clara e sua constante busca pela inovação intelectual foram fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho. Estou imensamente grato por ter tido a honra e o privilégio de aprender com um profissional tão incrível e admirado como o Dr. Elizeu Serra de Araújo. À minha mãe, Francisca de Souza dos Reis, minha irmã, Camila Reis Borti, e meu padrasto, Luiz Nonato, e minha família como um todo, agradeço por todo o apoio incondicional ao longo desta jornada acadêmica. Vocês sempre estiveram ao meu lado, encorajando-me e proporcionando um ambiente propício para meu crescimento pessoal e intelectual. Ao professor Luiz Eduardo Simões, sou grato pelos livros disponibilizados, que enriqueceram minha pesquisa e ampliaram meu conhecimento sobre o tema. Sua generosidade em compartilhar recursos foi de grande importância para o desenvolvimento deste trabalho. Não posso deixar de agradecer aos meus amigos José Felipe, Ruan Felipe, Luan Wilgner, Willian Correia, Lucas Carneiro, Perla Carreiro, Andresa Venancia e Lucia Pimenta. O apoio, a amizade e as discussões enriquecedoras que tivemos ao longo desses anos foram fundamentais para minha motivação e crescimento acadêmico. Vocês estiveram presentes em cada etapa, compartilhando alegrias e desafios, e sou imensamente grato por isso. À minha namorada, Ludmila de Jesus, gostaria de expressar meu profundo agradecimento pelo apoio, carinho e compreensão durante todo esse árduo processo de pesquisa e escrita. Sua presença e incentivo constantes foram um suporte

fundamental para superar os obstáculos e perseverar até o fim. Sem você, eu jamais teria conseguido. Gostaria de agradecer aos inscritos, membros e entusiastas do Canal Grundrisse, com quem compartilho informações e conhecimentos sobre este e outros estudos. A troca de ideias e a interação com essa comunidade foram enriquecedoras, contribuindo significativamente para o aprimoramento deste trabalho. A todos que direta ou indiretamente contribuíram para a realização deste trabalho, meu sincero reconhecimento e gratidão. Vocês foram peças fundamentais nessa jornada e sou extremamente grato por todo o apoio e incentivo recebidos. Por fim, gostaria de acrescentar um agradecimento especial ao meu querido avô, Abimael Soares, que infelizmente nos deixou durante o mês de conclusão deste trabalho. Dedico este trabalho à sua memória, em reconhecimento à sua sabedoria, amor e inspiração ao longo de minha vida. Seu apoio incondicional e suas palavras de encorajamento sempre foram um incentivo para seguir em frente, mesmo diante dos desafios. Sinto uma profunda gratidão por tê-lo tido como parte da minha vida e por todo o amor e cuidado que dedicou a mim. Seu legado continuará vivo em minhas lembranças. Descanse em paz, meu amado avô.

“Todo começo é difícil em qualquer ciência”. - Karl Marx (1818 – 1883). “Se você consegue medir o que está falando e pode expressar isso em números, você sabe algo de seu assunto, mas se você não pode medir isso, seu conhecimento é pobre e insatisfatório”. – William Thomson, engenheiro, matemático e físico (1824-1907).

RESUMO Este trabalho tem como objetivo mensurar empiricamente a exploração da força de trabalho na economia brasileira no período de 2000 a 2020, utilizando a metodologia desenvolvida por Shaikh e Tonak (1994). A mensuração empírica da exploração da força de trabalho é de grande importância para compreender a economia do país, especialmente considerando as desigualdades sociais e econômicas presentes. Shaikh e Tonak fornecem as bases metodológicas para a estimativa empírica de categorias marxistas, além de realizarem uma crítica ao sistema de contas nacionais convencional. Os dados e indicadores utilizados abrangem aspectos como a taxa e a massa de mais-valor, o capital variável e o valor adicionado bruto marxista. Ao finalizar o estudo, espera-se contribuir para o debate sobre a exploração da força de trabalho no Brasil, que possa subsidiar políticas públicas e estratégias para reduzir as desigualdades e melhorar as condições de trabalho no país. Palavras-chave: economia marxista, contas nacionais, exploração, economia política, contabilidade social, economia brasileira.

ABSTRACT This study aims to empirically measure the workforce exploitation in the Brazilian economy from 2000 to 2020, using the methodology developed by Shaikh and Tonak (1994). The empirical measurement of workforce exploitation is of great importance to understand the country's economy, especially considering the existing social and economic inequalities. Shaikh and Tonak provide the methodological foundations for the empirical estimation of Marxist categories and also criticize the conventional national accounting system. The data and indicators used encompass aspects such as the rate and mass of surplus value, variable capital, and Marxist gross value added. By the end of the study, it is expected to contribute to the debate on workforce exploitation in Brazil, providing support for public policies and strategies to reduce inequalities and improve working conditions in the country. Keywords: Marxist economics, national accounts, exploitation, political economy, social accounting, Brazilian economy.

LISTA DE GRÁFICOS, TABELAS E QUADROS Gráficos Gráfico 1: Taxa de mais-valor (exploração) no Brasil (2000 – 2020)

75

Gráfico 2: Taxa de mais-valor – variação anual – (2000 – 2020)

75

Gráfico 3: Taxa de mais-valor acumulada (2000 – 2020)

76

Tabelas Tabela 1: Valor adicionado bruto marxista, capital variável e taxa de mais valor (em milhões de R$ a preços correntes), taxa de mais-valor, taxa de variação anual da taxa de mais-valor e índice de mais-valor acumulado (2000 – 2020)

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Quadros Quadro 1: Atividades produtivas e improdutivas nas contas nacionais do Brasil

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SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 9 2. A DISTINÇÃO ENTRE ATIVIDADES PRODUTIVAS E NÃO PRODUTIVAS E A CRÍTICA DO SISTEMA DE CONTAS NACIONAIS ........................................................................... 12 2.1 A distinção entre atividades de produção e não produção em Shaikh e Tonak .... 12 2.1.1 Atividades básicas de produção social: equações simples ......................................... 12 2.1.2 Trabalho produtivo e improdutivo ............................................................................... 14 2.2. Crítica do sistema de contas nacionais: o conceito de produção.......................... 15 2.2.1 O conceito de produção nos SNA 1993 e 2008 .......................................................... 16 2.2.2 O conceito de produção adotado pelo IBGE .............................................................. 17 3. AS CONTAS NACIONAIS NA ECONOMIA MARXISTA: A METODOLOGIA DE SHAIKH E TONAK............................................................................................................................ 19 3.1 Fluxos primários ......................................................................................................... 20 3.1.1 Modelo simples I: apenas setores de produção.......................................................... 20 3.1.2 Modelo simples II: setores de produção e de comércio .............................................. 25 3.2 Fluxos secundários .................................................................................................... 33 3.2.1 Fluxos secundários privados ...................................................................................... 35 3.2.2 Fluxos secundários públicos ...................................................................................... 40 3.3 Salários e taxa de mais-valia ajustada ...................................................................... 44 3.4 Comércio exterior: economia aberta ......................................................................... 46 3.5 Atividades não capitalistas e atividades ilegais nas contas nacionais................... 50 3.6 Contas nacionais marxistas e contas nacionais convencionais: equações finais 51 3.7 Cálculo de magnitudes do valor-trabalho ................................................................. 55 3.7.1 Magnitudes de valor com fluxos de quantidades reais ............................................... 56 3.7.2 Magnitudes de valor com fluxos monetários ............................................................... 57 3.8 Taxa de mais-valia de trabalhadores produtivos e improdutivos............................ 62 4. ESTIMATIVAS EMPÍRICAS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA DE 2000 A 2020 ....... 70 4.1 Adaptações ao Sistema de Contas Nacionais do Brasil: atividades produtivas e improdutivas ..................................................................................................................... 71 4.2 Valor adicionado bruto marxista (VABM), capital variável, massa e taxa de maisvalor na economia brasileira de 2000 a 2020 .................................................................. 72 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 77 REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 79 FONTES ............................................................................................................................. 80

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1. INTRODUÇÃO A economia política das contas nacionais desempenha um papel fundamental na compreensão e análise dos processos econômicos de um país. Dentro desse contexto, a mensuração empírica da exploração da força de trabalho é um tema de grande relevância. O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo geral aplicar a metodologia desenvolvida por Shaikh e Tonak (1994) para estimar empiricamente a exploração da força de trabalho na economia brasileira no período compreendido entre 2000 e 2020. No caso específico do Brasil, um país com uma história marcada por grandes desigualdades sociais e econômicas, compreender a exploração da força de trabalho torna-se ainda mais relevante. Nesse contexto, a metodologia proposta por Shaikh e Tonak oferece uma abordagem consistente para a mensuração empírica da exploração da força de trabalho. Baseada em uma análise crítica das contas nacionais, essa metodologia busca captar a essência da exploração, considerando não apenas os aspectos monetários, mas também as condições de reprodução da força de trabalho. Este trabalho utilizará dados e informações disponíveis sobre a economia brasileira entre 2000 e 2020, mais especificamente das Tabelas de Recursos e Usos (TRU) do Sistema de Contas Nacionais, explorando indicadores como a taxa e massa de mais-valor, capital variável e valor adicionado bruto marxista. Ao finalizar essa pesquisa, espera-se contribuir para o debate sobre a exploração da força de trabalho na economia brasileira, fornecendo uma análise empírica fundamentada na metodologia de Shaikh e Tonak. Essa análise poderá servir como subsídio para a formulação de políticas públicas e estratégias voltadas para a redução das desigualdades e a melhoria das condições de trabalho no país. Segundo Shaikh e Tonak (1994, p. 152-153), as primeiras tentativas de mensuração empírica das categorias marxistas ocorreram ainda na década de 1920, sendo os japoneses os pioneiros. Matsuzaki faz estimativas em nível de empresas na década de 1920, Terashima em nível da indústria na década de 1930, Shah Riff desenvolve estimativas agregadas até 1940, e Okishio foi o primeiro a utilizar as tabelas insumo-produto para fazer estimativas de valor-trabalho a partir de 1959.

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No contexto brasileiro, os estudos sobre a economia política das contas nacionais têm aumentado nos últimos anos. Marquetti (1994) foi um dos pioneiros na mensuração empírica de categorias marxistas na indústria manufatureira do Brasil. Posteriormente, os trabalhos de Guedes Pinto (2007), Sigrist (2009) e Araújo (2011) deram continuidade aos estudos empíricos, aplicando a metodologia de Shaikh e Tonak,

mensurando

agregados

macroeconômicos

clássicos-marxistas

e

incorporando as mudanças ocorridas no sistema de contas nacionais do Brasil realizadas pelo IBGE a partir de 1997, quando foram adaptados para as contas nacionais do Brasil as recomendações do System of National Accounts (SNA) 1993 (PAULANI; BRAGA, 2020). Trabalhos mais recentes como Aruto (2019), Sampaio (2021) e Freitas (2021) realizaram uma aplicação da referida metodologia à economia brasileira, limitando-se a analisar e mensurar as categorias clássicas-marxistas até 20161. Um dos objetivos deste estudo é integrar na análise as alterações implementadas no sistema de contas nacionais do Brasil pelo IBGE em 2015, de acordo com as novas diretrizes metodológicas do SNA de 2008 (PAULANI; BRAGA, 2020)2. A escolha do período entre 2000 e 2020 é estratégica, pois engloba uma fase de importantes transformações na economia brasileira. Durante essas duas décadas, o país vivenciou mudanças estruturais, como a expansão do setor de serviços, a implementação

de

reformas

trabalhistas,

bem

como

eventos

econômicos

significativos, como a crise financeira global de 2008 e a recessão econômica vivenciada no país nos últimos anos. Outro aspecto relevante é a disponibilidade de dados e informações para esse período em particular. A mensuração empírica da exploração da força de trabalho requer acesso a dados econômicos e estatísticas confiáveis. Ao escolher um período mais recente, sem entrar nos dados referentes à década de 1990, marcada por ainda consideráveis taxas de inflação e mudança de moeda, facilita-se a realização da pesquisa e a análise dos dados, proporcionando uma base mais sólida e atualizada para a mensuração empírica da exploração da força de trabalho.

Podemos citar também o trabalho de Morato (2020) que, embora não realize nenhuma mensuração empírica de categorias marxistas, faz uma revisão de alguns trabalhos empíricos de mensuração das categorias marxistas. 2 As alterações decorrentes das novas diretrizes metodológicas do SNA 2008 são detalhadas no Capítulo 3 deste trabalho. Trata-se de algo fundamental para a aplicação da metodologia proposta por Shaikh e Tonak na análise da exploração da força de trabalho na economia brasileira. 1

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Com base nessas considerações, este trabalho busca contribuir para o campo de estudos da economia política e das contas nacionais no Brasil, por meio da mensuração empírica da exploração da força de trabalho. Espera-se que os resultados obtidos possam fornecer insights valiosos para a compreensão da dinâmica de acumulação e reprodução de capital na economia brasileira, subsidiando a formulação de políticas econômicas mais justas e efetivas, voltadas para o fortalecimento dos direitos dos trabalhadores e a redução das desigualdades sociais. O trabalho está dividido em cinco capítulos. O primeiro capítulo, naturalmente, faz uma introdução. O segundo capítulo trata da distinção entre atividades produtivas e não produtivas, assim como das críticas ao sistema de contas nacionais convencional. No terceiro capítulo é feita uma apresentação detalhada da metodologia de mensuração da exploração da força de trabalho criada pelos economistas Anwar Shaikh e Ahmet Tonak. O quarto capítulo busca realizar a mensuração empírica da exploração da força de trabalho na economia brasileira no período de 2000 a 2020. Por fim, o quinto capítulo traz as considerações finais.

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2. A DISTINÇÃO ENTRE ATIVIDADES PRODUTIVAS E NÃO PRODUTIVAS E A CRÍTICA DO SISTEMA DE CONTAS NACIONAIS O presente capítulo tem como objetivo analisar a distinção entre atividades produtivas e improdutivas a partir das contribuições teóricas de Shaikh e Tonak (1994) no âmbito da economia política marxista, bem como abordar a crítica ao sistema de contas nacionais convencional, a partir das contribuições críticas de Shaikh e Tonak (1994), Gontijo (2011) e Cámara (2008). Essa discussão se torna relevante no âmbito da economia política, pois a forma como as atividades econômicas são classificadas e mensuradas afeta diretamente a compreensão do funcionamento do sistema econômico e a formulação de políticas públicas. 2.1. A distinção entre atividades de produção e não produção em Shaikh e Tonak 2.1.1 Atividades básicas de produção social: equações simples Shaikh e Tonak (1994, p. 21) classificam quatro atividades básicas de reprodução social: produção, distribuição, manutenção e reprodução social (M) e consumo pessoal. Pode-se representar as atividades básicas de reprodução social por 𝐴𝑅𝑆 = 𝑃𝑑 + 𝐷 + 𝑀𝑠 + 𝐶𝑝 (1) Sendo: 𝐴𝑅𝑆 = atividades básicas de reprodução social; 𝑃𝑑 = produção; 𝐷 = distribuição; 𝑀𝑠 = manutenção e reprodução social; 𝐶𝑝 = consumo pessoal. Além disso, essas quatro atividades básicas são divididas em atividades de produção e de não produção. Podemos expressar as atividades de não produção (NP) como 𝑁𝑃 = 𝐷 + 𝑀𝑠 + 𝐶𝑝 (2) E as atividades de produção (AP) como:

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𝐴𝑃 = 𝑃𝑑 (3) As atividades de produção compreendem o processo de criação de novos valores de uso, resultando na criação de riqueza. A distribuição, por sua vez, referese às mudanças na propriedade ou posse dos objetos de uso social, ou seja, os valores de uso, para aqueles que irão consumi-los. A manutenção e reprodução social são responsáveis pelo consumo dos valores de uso, visando viabilizar os setores de atividades não produtivas, tais como o sistema jurídico, militar, serviços financeiros, publicidade, serviço civil, entre outros. Por fim, o consumo pessoal engloba os valores de uso consumidos pelos indivíduos. É importante destacar que todas essas atividades envolvem trabalho, exceto o consumo pessoal. Dessa forma, o trabalho total (TT) é expresso por 𝑇𝑇 = 𝑁𝑃 + 𝐴𝑃 (4) Sendo: 𝑇𝑇 = trabalho total; 𝐴𝑃 = atividades de produção; 𝑁𝑃 = atividades de não produção. Substituindo os valores das equações 2 e 3 na equação 4, tem-se 𝑇𝑇 = 𝐷 + 𝑀𝑠 + 𝑃𝑑 (5) Todas as atividades básicas de reprodução social consomem valores de uso para garantir seu funcionamento, seja produtivo na forma de insumos para a produção de novos valores de uso ou improdutivos na forma de consumo propriamente dito. Somente as atividades produtivas utilizam valores de uso visando a produção de nova riqueza, adicionando valor à produção. Assim, as atividades produtivas geram um produto líquido acima dos gastos produtivos (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 28). Por outro lado, as atividades não produtivas, que não agregam valor ao produto, têm a função de facilitar a transferência de riqueza, e a própria manutenção e reprodução social, assim como dos indivíduos e da sociedade. Trabalhos de não produção, embora úteis para a manutenção social, apenas consomem uma parcela do produto

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social líquido (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 28). Pode-se expressar o consumo total (CT) pela soma do consumo social (CS) com o consumo pessoal (𝐶𝑝 ). 𝐶𝑇 = 𝐶𝑆 + 𝐶𝑝 (6) Por sua vez, o consumo social é expresso pela soma da distribuição com a manutenção e reprodução social 𝐶𝑆 = 𝐷 + 𝑀𝑠 (7) Substituindo os valores da equação 7 na equação 6, tem-se que o consumo total é formado por 𝐶𝑇 = 𝐷 + 𝑀𝑠 + 𝐶𝑝 (8) Conforme apontam Shaikh e Tonak (1994, p. 28), o argumento de que as atividades de manutenção e reprodução social são resultado “indireto” da produção, não implica alterações na classificação adotada, visto que se trata apenas de outra forma de dizer que essas atividades são necessárias para a reprodução da sociedade. No mesmo sentido, pode-se dizer que a produção é resultante indiretamente do consumo, visto que é através do consumo que os produtores são reproduzidos socialmente. A ideia de que determinada atividade é resultante indiretamente de outra não muda em nada a classificação em questão. 2.1.2 Trabalho produtivo e improdutivo Para a compreensão do conceito de trabalho produtivo, é essencial considerar que a realização da força de trabalho não se dá no vácuo, em um mundo abstrato não físico, mas sim em relações sociais de produção determinadas historicamente. Nas palavras de Marx: O conceito de trabalho produtivo, portanto, não encerra de modo algum apenas uma relação entre a atividade e efeito útil, entre trabalhador e produto do trabalho, mas também uma relação de produção especificamente social, formada historicamente, a qual marca o trabalhador como meio direto de valorização do capital. (MARX, 1996, p. 138).

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Conforme Gorender (1996, p. 39) somente é considerado trabalho produtivo aquele que gera mais-valor. Além disso, destaca que, diferentemente da abordagem de Smith, em Marx alguns serviços são considerados produtivos Este é o caso do transporte, armazenagem e distribuição de mercadorias. Uma vez que as mercadorias são valores de uso destinados à satisfação de necessidades (como bens de produção ou como bens de consumo), é evidente que transportá-las, conservá-las em locais apropriados e distribuílas constituem tarefas produtivas, ainda que nada acrescentem à substância ou à conformação física das mercadorias. Por conseqüência, uma parte das atividades abrangidas pela rubrica do comércio tem natureza de trabalho produtivo. (GORENDER, 1996, p. 39).

É importante destacar que o significado de “distribuição” usualmente utilizado na economia política marxista é substancialmente diferente do significado adotado por Shaikh e Tonak. Normalmente, utiliza-se o termo “distribuição” no sentido de mudança na localização das mercadorias, enquanto em Shaikh e Tonak assume o sentido de transferência de propriedade. Os autores concordam que existe uma parcela do transporte que deve ser considerado produtivo (SHAIKH; TONAK, 1994; GORENDER, 1996). 2.2. Crítica do sistema de contas nacionais: o conceito de produção A fim de permitir o avanço da análise macroeconômica e o desenvolvimento de formulações de políticas econômicas, tornou-se necessário contar com uma medida precisa da atividade econômica. Para atender a essa necessidade, foi criado o Sistema de Contas Nacionais (SCN), cujo desenvolvimento esteve fortemente relacionado

ao

pensamento

econômico

keynesiano

e

sua

influência

na

macroeconomia até a década de 1970 (PAULANI; BRAGA, 2020). A elaboração do manual do Sistema de Contas Nacionais, que serve como referência para a elaboração das contas nacionais na maioria dos países, é de responsabilidade da Organização das Nações Unidas (ONU). A versão mais recente do manual é o SNA 2008, substituindo a versão antiga, o SNA 1993. Embora tenham sido incorporadas mudanças no novo sistema, a lógica básica das contas nacionais permanece a mesma (PAULANI; BRAGA, 2020). No contexto europeu, a adaptação do modelo básico das contas nacionais da ONU é realizada pelo Sistema Europeu de Contas (CÁMARA, 2008). Diferentemente das críticas de caráter keynesiano ou neoclássico ao sistema de contas nacionais, as críticas de Shaikh e Tonak (1994), Cámara (2008) e Gontijo

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(2011) vão no ponto central do sistema: o conceito de produção. Não é possível mensurar os agregados macroeconômicos sem um conceito de produção e, portanto, sem a distinção entre as atividades de produção e de não produção. Com a ascensão do pensamento neoclássico, passou-se a considerar todas as atividades socialmente necessárias (comercializáveis) como produtivas (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 3). Essa perspectiva teve impacto nas conceituações de atividades produtivas e não produtivas nos sistemas de contas nacionais, visto que: O produto interno bruto é um indicador da atividade de produção geral. Como tal, sua interpretação depende muito do conceito de produção usado no Sistema e da forma como é traçada a fronteira entre o consumo intermediário e os usos finais. (SNA-93, p. 54. Tradução nossa).

A análise crítica do conceito de produção tratado neste capítulo baseia-se nas contribuições teóricas de Cámara (2008), Shaikh e Tonak (1994) e Gontijo (2011). Esses autores fornecem insights relevantes e apresentam uma perspectiva crítica abrangente sobre o tema. Ao explorar as ideias e argumentos dos autores, nosso objetivo é contribuir para a discussão em curso e promover uma reflexão crítica sobre as diferentes abordagens e interpretações do conceito de produção. 2.2.1 O conceito de produção nos SNA 1993 e 2008 A discussão sobre as limitações e as inconsistências do conceito de produção nos sistemas de contas nacionais é um aspecto importante para avançar na compreensão e na medição da atividade econômica. O SNA 1993 entendia que [...] todos os bens e serviços considerados como produção devem ser tais que possam ser vendidos nos mercados ou, pelo menos, possam ser fornecidos por uma unidade a outra, a título oneroso ou gratuito. O Sistema inclui toda a produção destinada ao mercado dentro dos limites da produção, tanto para venda como para troca. (SCN-93:1.20 apud CÁMARA, 2008, p. 154. Tradução nossa).

Embora o conceito de produção englobe tanto a produção de bens quanto a de serviços, a mensuração do produto não é realizada com base em sua quantidade física, mas sim em termos monetários: [...] valores dos bens, serviços e ativos envolvidos nas transações entre unidades institucionais que estão associados a essas atividades são contabilizados, em vez de tentar registrar ou medir os processos físicos diretamente (SCN-93:1.20 e 1.12 apud CÁMARA, 2008, p. 154. Tradução nossa).

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O SNA 93 faz uma exceção neste conceito no que diz respeito à mensuração de bens que são fornecidos gratuitamente ou a preços baixíssimos, argumentando que sua produção em si não difere da produção voltada para a venda. Além disso, outra exceção é admitida pelo sistema: a contabilização de serviços de aluguéis como sendo produção (CÁMARA, 2008, p. 154). À medida que o sistema de contas nacionais se defronta com problemas práticos de mensuração, acaba flexibilizando a aplicação do conceito de produção neoclássico/keynesiano, adotando um caráter mais pragmático. Apesar desse desvio, o sistema ainda mantém em sua estrutura tal conceito, juntamente com suas inconsistências. A transição do sistema de contas nacionais de 1993 (SNA 1993) para a versão atualizada de 2008 (SNA 2008) não apenas manteve a estrutura lógica do sistema anterior, mas também preservou o conceito fundamental de produção. Se por um lado essa continuidade garantiu uma transição suave e evitou uma ruptura significativa na análise e mensuração das atividades econômicas, por outro, ao manter a estrutura lógica, o sistema de contas nacionais de 2008 manteve problemas estruturais como a questão do próprio conceito de produção quanto a classificação das atividades produtivas e não produtivas. No entanto, é importante ressaltar que essa base conceitual não é amplamente aceita e tem sido objeto de fortes críticas (SHAIKH; TONAK, 1994; GONTIJO, 2011; CÁMARA, 2008). As críticas levantadas questionam a solidez da base conceitual adotada pelo SNA e, portanto, pelo IBGE, para a mensuração da produção. Isso evidencia a necessidade de uma análise mais aprofundada e uma revisão dos critérios utilizados na definição de produção, a fim de incluir uma perspectiva mais consistente na mensuração dos agregados macroeconômicos. 2.2.2 O conceito de produção adotado pelo IBGE O conceito de produção adotado pelo IBGE, com base no Sistema de Contas Nacionais de 2008 (SNA 2008), é assim definido: A produção é a atividade econômica socialmente organizada que consiste em criar bens e serviços que são trocados habitualmente no mercado e/ou são obtidos a partir de fatores de produção comercializados no mercado. (IBGE, 2016, p. 36).

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Esse conceito considera que a produção vai além da simples fabricação de bens ou prestação de serviços. Ela envolve uma relação econômica em que os bens e serviços são criados socialmente com o propósito de serem comercializados. Além disso, ao adotar essa definição de produção, o IBGE alinha-se ao SNA 2008, referência internacional para a mensuração e análise das atividades econômicas de um país. Tal alinhamento carrega consigo a manutenção das inconsistências do conceito de produção dos sistemas de contas nacionais da ONU, tanto o SNA 1993 quanto o SNA 2008.

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3. AS CONTAS NACIONAIS NA ECONOMIA MARXISTA: A METODOLOGIA DE SHAIKH E TONAK Este capítulo tem como base os capítulos 3 e 4 de Shaikh e Tonak (1994), que tratam das contas nacionais na economia marxista. Nesses capítulos, os autores exploram de maneira detalhada a análise marxista das contas nacionais, fornecendo uma perspectiva crítica e única sobre o assunto. No contexto da economia marxista, as contas nacionais desempenham um papel fundamental na compreensão da dinâmica econômica de uma sociedade capitalista. Enquanto as abordagens convencionais das contas nacionais se concentram principalmente nas medições do produto interno bruto (PIB) e nas variáveis macroeconômicas, a perspectiva marxista, além de fornecer medidas alternativas mais rigorosas, também busca analisar as relações de classe e as contradições inerentes ao sistema capitalista. Os capítulos três e quatro do livro de Shaikh e Tonak (1994) oferecem uma visão crítica e aprofundada das contas nacionais sob uma perspectiva marxista. Eles exploram como a lógica do modo de produção capitalista se reflete nas contas nacionais e como as contradições entre as classes sociais podem ser identificadas e analisadas por meio dessas contas. Os autores examinam as categorias econômicas fundamentais da economia marxista, como valor, mais-valia, capital constante e capital variável, e mostram como essas categorias estão relacionadas às contas nacionais. Eles discutem a importância do conceito de valor-trabalho e sua influência na formação das estatísticas macroeconômicas, destacando as distorções que podem surgir ao utilizar apenas as medidas convencionais. Os autores apresentam uma análise crítica das limitações das contas nacionais tradicionais e propõem alternativas que levem em consideração as relações sociais de produção e as contradições inerentes ao sistema capitalista. Em suma, este capítulo tem como objetivo apresentar a metodologia desenvolvida por Shaikh e Tonak (1994), que oferecem uma análise aprofundada e crítica das contas nacionais na economia marxista. Essa abordagem fornece uma perspectiva única sobre as relações de classe, as contradições sociais e as dinâmicas econômicas presentes na sociedade capitalista, enriquecendo o campo de estudos econômicos com uma visão alternativa e perspicaz.

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3.1. Fluxos primários 3.1.1. Modelo simples I: apenas setores de produção A metodologia desenvolvida por Shaikh e Tonak combina dados das matrizes de insumo-produto com os dados das contas de renda e produto como base para a mensuração de categorias marxistas a partir do sistema de contas nacionais convencional (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 38). Os autores fazem a distinção de três conjuntos de variáveis: I) agregados marxistas em termos de valor: capital constante (C), capital variável (V) e mais-valia (S); II) as expressões monetárias desses agregados: expressão monetária do capital constante (C*), expressão monetária do capital variável (V*) e expressão monetária da mais-valia (S*); III) agregados correspondentes do SCN: insumos intermediários (M), salários (W) e renda do tipo lucro (P). Além disso, assim como na contabilidade social convencional, a contabilidade social marxista segue o princípio das partidas dobradas, em que cada lançamento realizado no lado dos recursos (ou da receita) terá sua contrapartida no lado dos usos (ou despesas), garantindo o equilíbrio das contas (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 38). Como destacam Paulani e Braga (2020, p. 05): O princípio das partidas dobradas reza que a um lançamento a débito deve sempre corresponder um outro de mesmo valor a crédito. O equilíbrio interno refere-se à exigência de igualdade entre o valor do débito e do crédito em cada uma das contas, enquanto o externo implica a necessidade de equilíbrio entre todas as contas do sistema.

Shaikh e Tonak começam com um modelo simples, que inicialmente desconsidera o comércio atacadista e varejista, finanças, governo e o setor externo, mas esses elementos vão sendo incorporados ao modelo à medida que ele se complexifica (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 39). No modelo simples, já é possível deduzir duas equações fundamentais: 𝑇𝑉 ∗ = 𝐶 ∗ + 𝑉 ∗ + 𝑆 ∗ (9) 𝑇𝑃∗ = 𝑈 ∗ + 𝑁𝑃 ∗ + 𝑆𝑃∗ (10) Sendo: 𝐶 ∗ = expressão monetária do capital constante;

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𝑁𝑃∗ = expressão monetária do produto necessário (consumo dos trabalhadores da produção); 𝑆 ∗ = expressão monetária da mais-valia; 𝑆𝑃∗ = produto excedente (usado no consumo capitalista, investimento, atividades não produtivas e estatais); 𝑇𝑃∗ = expressão monetária do produto total; 𝑇𝑉 ∗ = expressão monetária do valor total; 𝑈 ∗ = expressão monetária do valor-trabalho marxista dos insumos utilizados na produção; 𝑉 ∗ = expressão monetária do capital variável. Em termos do SCN convencional, podemos expressar a equação 1 como 𝐺𝑂 = 𝑀 + 𝑊 + 𝑃 (11) Sendo: 𝐺𝑂 = produção bruta; 𝑀 = insumos intermediários; 𝑊 = salários; 𝑃 = renda do tipo lucro. Portanto, no modelo simples, tem-se que C* + V* + S* = M + W + P e, consequentemente, GO = TV*. Os autores distinguem dois tipos de setores: primários e secundários. Os setores primários são aqueles que estão relacionados diretamente com a produção e realização/comercialização doméstica da produção total de mercadorias, como os setores de produção e comercialização em atacado/varejo, sejam eles públicos ou privados, e os aluguéis de imóveis e equipamentos. Por outro lado, os setores secundários estão relacionados à recirculação dos fluxos de valor e dinheiro provenientes dos setores primários, como finanças, aluguel e venda de terras, setores de comércio exterior, atividades não capitalistas e governo (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 39-40).

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Ainda no modelo simples, os autores consideram os seguintes pressupostos: I) as tabelas de insumo-produto incluem o capital fixo utilizado em insumos intermediários (como depreciação) e na demanda intermediária (como investimento de reposição); II) como resultado do pressuposto I, tem-se que o valor adicionado e a demanda final são medidas líquidas; III) o valor adicionado é explicitamente dividido entre salários e lucros, e a demanda de consumo explicitamente dividida entre consumo dos trabalhadores e consumo capitalista (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 39-40). Trata-se de pressupostos simplificadores que serão abandonados à medida que o modelo se desenvolve e se torna mais complexo, visto que o SCN, mais especificamente as matrizes de insumo-produto, não detalha tais questões. O conceito de produção adotado por Shaikh e Tonak (1994, p. 40) abrange atividades que criam e/ou transformam valores de uso. Além disso, destacam que tal conceito é resultado do caráter do processo produtivo, incorporando também empresas estatais que produzem valores de uso. Em relação ao conceito de comércio adotado, engloba tanto o comércio atacadista/varejista, aluguel de mercadorias, atividades das empresas comerciais governamentais e os transportes distributivos, associado ao processo de realização das mercadorias (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 40). O modelo simples dos fluxos primários parte de simplificações e, paulatinamente, vai incorporando novos elementos e complexificando o modelo. Inicialmente, o modelo trata dos fluxos primários apenas com os setores de produção e, posteriormente, incorpora os setores comerciais, os fluxos secundários, comércio exterior, dentre outros elementos (SHAIKH; TONAK, 1994). No modelo simples com fluxos primários e apenas setores produtivos, é importante distinguir duas categorias: valor-trabalho e a expressão monetária do valor-trabalho. Neste modelo simples, pode-se mensurar o valor-trabalho pela quantidade de horas de trabalho; a expressão monetária do valor-trabalho é medida pelo quanto essas horas de trabalho foram vendidas, mensuradas em unidades monetárias (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 41). Independentemente de quanto os preços do produtor ou dos preços de venda final das mercadorias se desviam ou não de seus respectivos valores-trabalho, no agregado, ou seja, na soma dos preços dos produtores individuais, define-se um preço do produto agregado, assim como a soma dos preços de venda final individuais gera um preço de venda final agregado do produto total. De fato, esses desvios vão influenciar no cálculo de magnitudes de valor-trabalho e nas medidas marxistas

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primárias, porém essas questões serão incorporadas à medida que o modelo for se ampliando e se tornando mais complexo, incluindo os demais elementos e fluxos (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 41). A partir do modelo simples, pode-se estabelecer algumas relações. O produto total é composto por: custos de produção (insumos utilizados), salários dos trabalhadores produtivos, lucros e outras despesas. Assim, Shaikh e Tonak (1994, p. 41-42) incluem os seguintes pressupostos simplificadores no modelo: •

os custos de produção são iguais aos custos dos insumos utilizados na produção (C* = M);



o consumo dos trabalhadores é igual aos seus respectivos salários (V* = W);



o consumo dos capitalistas é igual a metade de seus lucros (CONC = 1/2P);



a soma dos investimentos empresariais é igual a metade dos lucros. Inclui-se nos investimentos empresariais: instalações, equipamentos, estoques e variação de estoque não intencional (bens não vendidos ou vendidos mais que o planejado). Como destacam Shaikh e Tonak (1994, p. 42): Essa última suposição não implica em um equilíbrio setorial ou agregado entre oferta e demanda. É apenas um dispositivo contábil padrão no qual a diferença entre oferta e demanda é adicionada ao ‘investimento total’ no lado do uso como ‘mudança de estoque não intencional’ para equilibrar as receitas e os lados do uso ex post.

O modelo simples gera a ilusão de que as contas nacionais convencionais e a abordagem marxista são equivalentes, mas essa semelhança ocorre apenas porque o modelo inicialmente exclui os setores improdutivos. Ou seja, essas igualdades só se mantêm nesse formato específico devido à ausência dos setores não relacionados à produção. Portanto, no modelo simples (que considera apenas os setores produtivos), a correspondência entre as categorias marxistas e as categorias do Sistema de Contas Nacionais (SCN) convencional pode inicialmente parecer ter poucas diferenças. No entanto, à medida que os setores comerciais são incorporados ao modelo, as identidades macroeconômicas se tornam cada vez mais complexas e as contas nacionais convencionais se distanciam das contas nacionais baseadas na contabilidade social marxista.

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Assim, no modelo simples de fluxos primários com apenas setores de produção, tem-se que a expressão monetária dos insumos utilizados na produção (U*) é igual a demanda intermediária (M), o produto necessário, ou seja, o consumo dos trabalhadores produtivos (NP*) é igual ao consumo dos trabalhadores do SCN convencional (CONW) e, por fim, o produto excedente (SP*) é igual à somatória do consumo dos capitalistas (CONC) com os investimentos totais (I). Portanto, tem-se 𝑈 ∗ + 𝑁𝑃 ∗ + 𝑆𝑃 ∗ = 𝑀 + 𝐶𝑂𝑁𝑊 + (𝐶𝑂𝑁𝐶 + 𝐼) (12) 𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑃 (13) 𝐶𝑂𝑁 = 𝐶𝑂𝑁𝐶 + 𝐶𝑂𝑁𝑊 (14) Sendo: 𝐶𝑂𝑁 = consumo total; 𝐶𝑂𝑁𝐶 = consumo dos capitalistas; 𝐶𝑂𝑁𝑊 = consumo dos trabalhadores; 𝐺𝑃 = produto bruto; 𝐼 = investimento total. Além disso, dados os pressupostos do modelo simples de fluxos primários com apenas setores de produção, é possível deduzir as seguintes relações: 𝑉𝐴∗ = 𝑉 ∗ + 𝑆 ∗ (15) 𝐹𝑃∗ = 𝑁𝑃 ∗ + 𝑆𝑃 ∗ = 𝐹𝐷 (16) Sendo: 𝐹𝐷 = demanda final; 𝐹𝑃 ∗ = expressão monetária do produto final; 𝑉𝐴∗ = valor adicionado marxista (expressão monetária).

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3.1.2. Modelo simples II: setores de produção e de comércio Neste subtópico, é feito um aprimoramento no modelo simples de fluxos primários ao incluir os setores comerciais. Anteriormente, o modelo simples considerava apenas os setores produtivos. Ao incorporar os setores comerciais no modelo, buscamos ampliar a compreensão e a representação das interações econômicas, levando em conta as atividades comerciais que desempenham um papel essencial na economia. Essa expansão permitirá uma análise mais abrangente dos fluxos econômicos e aprofundará nossa compreensão dos processos econômicos sob uma perspectiva marxista, além de elucidar as distinções existentes entre o sistema de contas nacionais convencional e a abordagem marxista das contas nacionais. Antes de prosseguirmos com a incorporação dos setores comerciais no modelo simples de fluxos primários, é fundamental compreender alguns conceitos-chave. O preço do produtor refere-se ao valor pelo qual um produto é vendido pelo produtor ao atacadista ou varejista. Por sua vez, o preço de venda final corresponde à soma do preço do produtor com a margem de lucro. É importante ressaltar que, caso a margem de lucro seja positiva, ocorrerá uma transferência de valor do setor produtivo para o setor comercial, ou seja, ocorrerá uma transferência de valor do setor produtivo para o setor improdutivo. (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 41). Inicialmente, apenas o comércio atacadista/varejista é incorporado no modelo simples e, posteriormente, incluem-se os demais setores comerciais. A incorporação do setor de comércio atacadista/varejista não afeta diretamente o processo de produção e seus elementos vistos no modelo simples anterior, seu impacto se dá na circulação do valor total e do produto, que será mediado por atividades comerciais. É possível que haja, dentro de uma mesma empresa, divisões internas de produção e de vendas. Ao incluir esse setor de comércio, tem-se agora a separação entre o processo de produção e o processo de realização. O setor produtivo p venderá o seu produto ao setor comercial t, sendo que o preço cobrado pelo setor produtivo é chamado de preço de venda do produtor. Por outro lado, o setor comercial vende o montante de produto que foi comprado do setor produtivo. O preço do comprador é o preço de venda final do produto. Por sua vez, a margem comercial do setor comercial (TM) é igual ao preço do comprador menos o preço do produtor. No modelo simples, pressupõe-se que a depreciação é considerada parte dos custos de insumos, ou seja, a margem comercial será líquida de depreciação.

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Parte da venda do setor comercial se destina aos indivíduos para o consumo pessoal, outra parte para as empresas para utilizar como insumos e/ou capital fixo e outra parcela é mantida na forma de estoques. No sistema de contas nacionais convencional, a variação de estoques é contabilizada como investimento. Se a variação de estoques for positiva, ou seja, se ocorrer um aumento dos estoques, essa parcela de aumento é contabilizada como investimento positivo. Por outro lado, se a variação de estoques for negativa, ou seja, se for vendido mais do que é produzido, de modo que haja uma redução não planejada dos estoques, é contabilizado como um investimento negativo. O mesmo processo é utilizado no sistema de contas nacionais convencionais no que se refere à classificação dos investimentos. Como explicam Paulani e Braga (2020, p. 36) O investimento costuma ser dividido em variação de estoques, que congrega os bens cujo consumo ou absorção futuros vão se dar de uma única vez, e formação bruta de capital fixo, que agrega bens que não desaparecem depois de uma única utilização e possibilitam a produção (e, portanto, o consumo) de outros bens ao longo de determinado período, ou seja, possibilitam a produção futura de um fluxo de bens e serviços.

Ao incorporar o setor comercial no modelo, uma parcela do mais-valor gerado no setor produtivo será distribuída para os setores improdutivos, reduzindo a apropriação de mais-valor pelo setor produtivo e, portanto, seus lucros (Pp). Essa redução se dá por conta da apropriação de mais-valor feita pelo setor comercial através da sua margem comercial (TM). Por sua vez, o setor comercial utiliza sua margem para arcar com os seus insumos (Mt), salários (Wt) e lucros (Pt), conforme a equação 17. A inclusão do setor comercial não impacta, no modelo simples, o processo de produção de mais-valia; entretanto, o processo de apropriação da maisvalia muda completamente, visto que agora a mais-valia total não será completamente apropriada pelo setor produtivo, mas sim distribuída entre o setor produtivo através dos seus lucros (Pp) e o setor comercial através da sua margem comercial (TM). 𝑇𝑀 = 𝑀𝑡 + 𝑊𝑡 + 𝑃𝑡 (17) Sendo: 𝑇𝑀 = margem comercial; 𝑀𝑡 = insumos do setor comercial;

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𝑊𝑡 = salários do setor comercial; 𝑃𝑡 = lucros do setor comercial. O modelo simples, ao incorporar o setor comercial, tornando o processo de circulação mais complexo, não impacta variáveis como a expressão monetária dos insumos utilizados na produção (U*), a expressão monetária do produto necessário, ou seja, do consumo dos trabalhadores da produção (NP*), e a expressão monetária do produto excedente (SP*). O que muda é a distribuição da mais-valia entre os setores produtivos e improdutivos. Portanto, ainda são válidos os pressupostos do modelo simples ao incorporar o setor comercial. Assim, tem-se 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = 𝑊𝑝 (18) 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 = 𝑊𝑡 (19) 1

𝐶𝑂𝑁𝐶𝑃 = 2 ∙ 𝑃𝑝 (20)

𝐶𝑂𝑁𝐶𝑡 =

𝐼𝑝 =

𝐼𝑡 =

1 ∙ 𝑇𝑀 (21) 2

1 ∙ 𝑃𝑝 (22) 2

1 ∙ 𝑇𝑀 (23) 2

Sendo: 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = consumo dos trabalhadores do setor produtivo; 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 = consumo dos trabalhadores do setor comercial; 𝐶𝑂𝑁𝐶𝑃 = consumo dos capitalistas do setor produtivo; 𝐶𝑂𝑁𝐶𝑡 = consumo dos capitalistas do setor comercial; 𝐼𝑝 = investimento do setor produtivo; 𝐼𝑡 = Investimento do setor comercial; 𝑃𝑝 = lucros do setor de produção; 𝑊𝑝 = salários do setor produtivo.

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A equação 24 mostra como se dá a distribuição do produto excedente entre os setores ao incorporar o do setor comercial 𝑆𝑃∗ = (𝐶𝑂𝑁𝐶𝑃 + 𝐼𝑝 ) + (𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝐶𝑡 + 𝐼𝑡 ) (24) Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 47), no SCN convencional, mais precisamente nas tabelas de insumo-produto, grande parte da receita total das atividades é estimada em termos de preços dos produtores, em vez da receita real de vendas a preços de comprador. A receita total do setor comercial é igual à somatória das margens comerciais em todas as atividades incluídas neste setor. As tabelas de insumo-produto decompõem o preço de comprador final em preço de produtor e margem comercial, evitando problemas nas contas nacionais na mensuração da demanda final, visto que esses produtos de fato são adquiridos a preços de comprador. Ao incorporar o setor comercial no modelo simples de fluxos primários, as contas nacionais marxistas e as contas nacionais convencionais começam a mostrar suas diferenças. Como na contabilidade social marxista há uma distinção entre as atividades produtivas e não produtivas, a correspondência direta que existia no modelo simples apenas com setores de produção é rompida. Assim, não existirá nas matrizes de insumo-produto das contas nacionais convencionais o equivalente para as categorias marxistas de produto necessário (NP*) e produto excedente (SP*) (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 49). Portanto, ao incorporar o setor comercial no modelo, obtêm-se as seguintes equações: 𝑉𝐴∗ = 𝑉 ∗ + 𝑆 ∗ (25) 𝑇𝑃∗ = 𝑈 ∗ + 𝐹𝑃∗ (26) 𝐹𝑃∗ = 𝑁𝑃 ∗ + 𝑆𝑃∗ (27) 𝐿 = 𝐿𝑝 + 𝐿𝑢 (28)

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Sendo: 𝐿 = emprego total; 𝐿𝑝 = emprego produtivo; 𝐿𝑢 = emprego improdutivo. Não existem correspondentes diretos para as equações 25, 26 e 27 nas matrizes de insumo-produto tradicionais como no modelo simples de fluxos primários com apenas setores de produção, visto que as contas nacionais convencionais não oferecem informações necessárias para identificar diretamente os elementos das equações, bem como para a diferenciação dos empregos produtivos e improdutivos. As equações semelhantes nas matrizes de insumo-produto, mas não totalmente correspondentes às equações 25, 26 e 27 são, respectivamente 𝑉𝐴 = 𝑊 + 𝑃 (29) 𝐺𝑃 = 𝑀 + 𝐹𝐷 (30) 𝐹𝐷 = 𝐼 + 𝐶𝑂𝑁 (31) Sendo: 𝑉𝐴 = valor adicionado (SCN convencional); A expressão monetária do produto total (TP*) é igual a soma da receita total dos setores de produção e de comércio. Portanto, tem-se: 𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 (32) 𝐶 ∗ = 𝑀𝑝 (33) 𝑉 ∗ = 𝑊𝑝 (34) Sendo: 𝐺𝑂𝑝 = produto bruto do setor produtivo;

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𝐺𝑂𝑡 = produto bruto do setor de comércio; 𝑀𝑝 = insumos intermediários usados no setor produtivo. Nas contas nacionais marxistas, não são incluídas as receitas provenientes dos setores secundários, visto que esses setores apenas realizam transferências de fluxos de valor dos setores primários, ou seja, não adicionam valor. No sistema de contas nacionais convencional, que inclui as receitas dos fluxos secundários e considera essas como geradoras de valor agregado, tem-se 𝐺𝑂 = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 + 𝐺𝑂𝑠 (35) Sendo: 𝐺𝑂𝑠 = produto bruto das variáveis de fluxos secundários (setores secundários); Uma das críticas que Shaikh e Tonak fazem ao sistema de contas nacionais tradicional é justamente no que diz respeito à contabilização dessas receitas dos fluxos secundários. Na abordagem marxista, os fluxos secundários não são capazes de adicionar valor, sendo apenas capazes de recircular os valores gerados nos fluxos primários. Desse modo, quando o sistema de contas nacionais convencional contabiliza GOs na produção bruta, está na verdade realizando uma dupla contagem e elevando artificialmente o valor da produção bruta. Assim, normalmente as mensurações marxistas ficam abaixo dos valores encontrados pelo sistema de contas nacionais convencional; tal diferença se deve ao fato de que as contas nacionais consideram como produtivas atividades como comércio, aluguel de terra, finanças e outras atividades consideradas não produtivas na abordagem clássica-marxista (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 49). À medida que se for complexificando o modelo a igualdade entre o valor total marxista em sua expressão monetária (TV*) e o produto bruto (GO) das contas nacionais será alterada, também por conta da distinção entre os setores produtivos e improdutivos nas contas. Tal alteração será feita quando os fluxos secundários forem incluídos no modelo. Todavia, ainda neste nível de abstração do modelo simples com fluxos primários, é possível considerar a igualdade entre essas duas categorias em

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específico. Mas claro, tal suposição será abandonada à medida que se incorporam novos elementos ao modelo (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 49-50). Portanto, as equações finais geradas pela incorporação do setor comercial ao modelo simples de fluxos primários, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 50), são as seguintes3: 𝑇𝑉 ∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 = 𝐺𝑂 = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 (36) 𝐶 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = 𝑀𝑝 + 𝑀𝑡 (37) 𝑉𝐴∗ = 𝑇𝑉 ∗ − 𝐶 ∗ = 𝑉𝐴𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 > 𝑉𝐴 = 𝐺𝑂 − 𝑀 = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡 (38) 𝑉 ∗ = 𝑊𝑝 < 𝑊 = 𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 (39) 𝑃𝑝 + 𝑃𝑡 + (𝑊𝑡 + 𝑀𝑡 ) 𝑃𝑝 + 𝑃𝑡 𝑆∗ 𝑃 = >> = (40) 𝑉∗ 𝑊𝑝 𝑊 𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 = 𝐺𝑃 = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 (41) 𝑈 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = 𝑀𝑝 + 𝑀𝑡 (42) 𝐹𝑃∗ = 𝑇𝑃∗ − 𝑈 ∗ = 𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 > 𝐹𝐷 = 𝐺𝑃 − 𝑀 = 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 (43) Sendo: 𝐺𝑃𝑝 = produção bruta do setor produtivo; 𝐺𝑃𝑡 = produção bruta do setor comercial; 𝑉𝐴𝑝 = valor adicionado do setor produtivo; 𝑉𝐴𝑡 = valor adicionado do setor comercial.

As equações seguintes comparam as equações da contabilidade social marxista com as equações típicas do sistema de contas nacionais convencionais. À esquerda, tem-se as equações marxistas e à direita as equações das contas nacionais convencionais. 3

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A equação 36 mantém a igualdade de TV* com GO justamente por desconsiderar o componente GOs, que será considerado no modelo quando forem incluídos os fluxos secundários. Analogamente, isso ocorre com a equação 41. A equação 37 mostra que a categoria marxista expressão monetária do capital constante é menor que os insumos intermediários das tabelas de insumo-produto justamente porque as contas nacionais convencionais consideram também os insumos intermediários utilizados no setor comercial. Analogamente, o mesmo ocorre com a equação 42. A equação 38 gera, neste nível de abstração, o padrão de que o valor adicionado marxista tende a ser maior que o valor adicionado das contas nacionais convencionais. No primeiro momento, isso pode parecer algo contraintuitivo. Todavia, tal desigualdade tende a se reverter, passando para VA* < VA à medida que o modelo vai se tornando mais complexo. As evidências empíricas também demonstram tal reversão (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 94). Analogamente, o mesmo ocorre com a equação 43. Nas contas nacionais convencionais, não existem medidas análogas ao produto necessário (consumo dos trabalhadores do setor produtivo, NP*), produto excedente (SP*) e taxa de exploração. Tais variáveis são definidas, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 50), pelas equações: 𝑁𝑃 ∗ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 (44) 𝑆𝑃∗ = 𝐹𝑃 ∗ − 𝑁𝑃 ∗ = 𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 − 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = 𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝐶 + 𝐼 (45) 𝑆𝑃 ∗ 𝑁𝑃 ∗

=

𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 + 𝐶𝑂𝑁𝐶 + 𝐼 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝

(46)

A equação 44 expressa que o produto necessário é igual ao consumo dos trabalhadores do setor produtivo. A equação 45 mostra que o produto excedente pode ser calculado simplesmente subtraindo o produto necessário do produto final e expandido para Mt + CONWt + CONC + I. Por fim, a equação 46 mostra que a taxa de exploração pode ser calculada dividindo o produto excedente (SP*) pelo produto necessário (NP*) e expandida para (Mt + CONWt + CONC + I)/CONWp.

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Nas matrizes de insumo-produto, as empresas governamentais que realizam comércio estão contidas nos mesmos grupos das empresas privadas com atividades correspondentes. Assim, tais empresas já fazem parte do setor comercial em geral no modelo simples discutido aqui. Além do setor comercial atacadista e varejista, inclui-se também neste setor o transporte distributivo e a locação de prédios e equipamentos (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 51). Na matriz de insumo-produto, são contabilizadas apenas as margens de transporte como produção bruta. Todavia, na abordagem marxista, considera-se produtivo apenas o transporte de produção, enquanto o de distribuição é considerado improdutivo. Infelizmente as contas nacionais convencionais não oferecem tais informações discriminadas, sendo necessário considerar todo transporte como produtivo (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 51). Em relação à locação de prédios e equipamentos, as contas nacionais dividem tais categorias em três atividades: I) locação de ocupação própria, II) locação e venda de terras e III) venda e locação de prédios. A primeira atividade considera o custo de oportunidade de as pessoas alugarem suas casas, ou seja, contabiliza como se os proprietários estivessem alugando suas casas para si mesmos; tal atividade é desconsiderada na abordagem marxista das contas nacionais, visto que não adiciona valor, trata-se de uma atividade improdutiva. Locação e venda de terras fazem parte dos fluxos secundários, visto que apenas realizam uma nova circulação dos fluxos de valor gerados no setor primário, ou seja, também se trata de atividades improdutivas. Por fim, a venda e locação de prédios é considerada como parte integrante do setor comercial geral (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 51). Assim, surgem novos elementos que afastam ainda mais as contas nacionais tradicionais das contas nacionais na abordagem marxista. Tais variáveis como locação de prédios e equipamentos são contabilizadas como produtivas no SCN, enquanto na abordagem clássica-marxista tais atividades fazem parte do setor comercial. Portanto, na abordagem marxista, serão consideradas apenas as margens de locação na produção bruta (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 51). 3.2. Fluxos secundários Os fluxos primários englobam as atividades de produção e comércio. As receitas dessas atividades são oriundas da venda dos produtos. Por outro lado, os fluxos secundários englobam os pagamentos de aluguéis de terrenos/minas, etc.,

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encargos financeiros, taxas, impostos e royalties. Para fins de simplificação, todas essas categorias serão chamadas apenas de royalties. Enquanto as receitas dos setores constituintes dos fluxos primários são originadas a partir da venda, as receitas dos setores que fazem parte dos fluxos secundários são apenas uma recirculação dos fluxos de valor gerados pelos setores primários. Na tradição marxista, a renda da terra é considerada como um valor deduzido do excedente e apropriado pelos proprietários de terra que detém a propriedade privada desse meio de produção. No caso do juro, trata-se de um royalty pago pelo dinheiro ou pelo crédito. O imposto também é um royalty resultante do acesso a determinado elemento. Variáveis como a venda de terras, direito de propriedade e instrumentos financeiros fazem circular o direito de apropriação desses royalties. Além disso, os impostos também podem ser considerados royalties pagos ao Estado soberano (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 52). Conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 53) apontam, existem duas formas de transferências de valor entre os setores primário e secundário: I) a transferência direta ocorre quando o setor primário paga royalties ao setor secundário, através de aluguéis de terras, juros, dentre outros; II) a transferência indireta ocorre quando as famílias têm suas receitas dos setores primários (salários, dividendos, pagamentos de juros, etc.) e transferem parte dessa renda ao setor secundário. Deste modo, ao medir o produto social, para não realizar uma dupla contagem, é necessário excluir os fluxos dos setores secundários do valor total, visto que esses setores não agregam valor, apenas recirculam os fluxos de valores dos setores primários, ou seja, os setores secundários são improdutivos. Portanto, não faz sentido contabilizar as receitas recebidas pelos setores secundários no valor total. Tais considerações não implicam desconsiderar os setores secundários, pelo contrário. Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 53. Tradução nossa) Fluxos secundários fazem parte das transações totais, mas não fazem parte do valor total ou do produto total. Observe que isso não significa que ignoramos o uso real do produto pelo setor secundário ou pelos domicílios cujas rendas dele derivam. Os pagamentos de royalties são deduções do poder de compra do setor primário e de seus domicílios associados. O recebimento desses pagamentos pelo setor secundário aumenta o poder de compra desse setor e de seus domicílios associados. O que o primeiro setor perde, o último setor ganha. Dessa forma, a redistribuição de valor promovida por meio das transferências entre os setores primário e secundário leva a uma mudança no uso do produto.

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3.2.1. Fluxos secundários privados As transferências dos setores primários para os setores secundários apenas alteram os agregados marxistas na medida em que o pagamento dos royalties é descontado dos salários dos trabalhadores produtivos, visto que isso tende a reduzir o seu salário real e, portanto, aumentar o mais-valor. Por outro lado, no sistema de contas nacionais convencional, as transferências dos setores primários para os setores secundários tem um forte impacto nas mensurações dos agregados, visto que essas transferências são consideradas como produtivas, ou seja, são contabilizadas como compras de produtos por parte dos setores secundários. Assim, ao considerarmos os fluxos secundários no modelo, as distinções entre as contas nacionais marxistas e as contas nacionais convencionais aumentam, visto que isso vai impactar variáveis como produção total, valor adicionado e produto líquido e o montante da renda do tipo lucro. Ao incluir os setores secundários, as contas nacionais tradicionais acabam inflando artificialmente os valores da produção bruta (GO) e do produto bruto total (GP). Do ponto de vista marxista, nesse processo o SCN acaba realizando uma dupla contagem, pois contabiliza duas vezes valores gerados nos setores primários. Por isso, na contabilidade social marxista essas transferências de valor entre os setores primários e secundários não são incluídas nos agregados de valor total (TV*) e produto total (TP*). O impacto da inclusão dos fluxos secundários nos agregados do sistema de contas nacionais convencional, em especial no valor adicionado e no lucro depende da classificação dos royalties como custos ou desembolsos. Certos tipos de royalties pagos pelos setores primários aos setores secundários são contabilizados como custos e, portanto, como consumo intermediário (aluguel pago ao setor imobiliário e juros líquidos pagos ao setor financeiro). O recebimento dos pagamentos aparece como receita total do setor de royalties. Portanto 𝐺𝑂𝑟𝑦 = 𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡 (47) Sendo: 𝐺𝑂𝑟𝑦 = receita total do setor de royalties;

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𝑅𝑌𝑝 = royalties pagos pelo setor produtivo; 𝑅𝑌𝑡 = royalties pagos pelo setor comercial. Uma parcela da receita total do setor de royalties é apropriada pelos insumos intermediários desse setor (Mry). Desse modo, o valor adicionado do setor de royalties será menor que a quantidade transferida dos setores primários. Como resultado disso, tem-se que o valor adicionado marxista (VA*), no modelo simples, será maior que o valor adicionado agregado (VA) das contas nacionais convencionais. Em relação aos impactos sobre o lucro agregado na mensuração das contas nacionais, tem-se que parte do valor adicionado no setor secundário é absorvida pela folha de pagamento, além de que os aluguéis e alguns pagamentos de juros são contados como custos, diminuindo assim o lucro agregado na mensuração ortodoxa. Certos tipos de royalties são considerados desembolsos do valor adicionado, como juros líquidos, impostos indiretos e dividendos pagos às famílias, estrangeiros e ao governo. O impacto dessa classificação afeta a divisão de lucros e royalties. Tem-se que os desembolsos do valor adicionado são dados por: 𝑉𝐴𝑟𝑦 = 𝑅𝑌𝑝 ′ + 𝑅𝑌𝑡 ′ (48) Sendo: 𝑉𝐴𝑟𝑦 = desembolsos do valor adicionado; 𝑅𝑌𝑝 ′ = desembolsos do valor adicionado do setor produtivo; 𝑅𝑌𝑡 ′ = desembolsos do valor adicionado do setor comercial. Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 54-55. Tradução nossa): Como esses desembolsos não são feitos diretamente aos setores secundários, as receitas totais das empresas também não são alteradas. Portanto, transferências desse tipo não alteram a relação entre o valor adicionado marxista VA* e o valor adicionado ortodoxo VA. O mesmo pode ser dito para os desembolsos provenientes da renda do tipo lucro (a soma de lucros, aluguéis, juros e impostos), embora obviamente os próprios lucros agregados possam ser reduzidos pelo valor dos royalties pagos como juros líquidos e impostos indiretos.

As famílias, o governo e os estrangeiros que obtiverem sua renda a partir de setores primários podem destinar uma parcela dessas rendas aos setores

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secundários, através do pagamento de aluguel, juros líquidos, dentre outros. Trata-se das transferências indiretas dos fluxos de valor do setor primário para o secundário. Esse tipo de transferência ocorre no final do processo da produção bruta, ou seja, o valor adicionado e os lucros dos setores primários não são impactados por esse tipo de transferência. Na contabilidade social ortodoxa, o aumento dos fluxos para o setor secundário, ao aumentar a receita desse setor, seria contabilizado como aumento da produção bruta do setor. Todavia, como a contabilidade marxista não considera o setor secundário como produtivo, esse Impacto distanciará ainda mais as contas nacionais convencionais das contas nacionais marxistas. Nas contas nacionais ortodoxas, o aumento dos fluxos para o setor secundário seria contabilizados como um aumento das compras da produção do setor secundário, impactando a demanda final das famílias, do governo e do setor externo, ou seja, seria contabilizado como um aumento da demanda final. Esse aumento é apenas artificial visto que o setor secundário apenas recircula os fluxos de valor do setor primário. Do ponto de vista da contabilidade social marxista, não haveria nesse caso um aumento do produto, apenas uma dupla contagem na contabilidade nacional convencional. De modo análogo, no modelo simples, é possível que os lucros sejam elevados artificialmente nas medidas ortodoxas, podendo se tornar inclusive maiores que o valor excedente. Desse modo, o fluxo dos royalties aumenta as medidas de produção bruta (GO) e produto bruto (GP), em comparação com as categorias marxistas valor total (TV*) e produto total (TP*). Todavia, no modelo simples, não é possível determinar o efeito dos fluxos de royalties sobre as magnitudes de valor adicionado, demanda final e lucro agregado. Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 55. Tradução nossa) No entanto, o efeito sobre a magnitude do valor adicionado convencional VA e da demanda final FD em relação ao valor adicionado marxista VA* e ao produto final FP* não é igualmente determinado. Os pagamentos de royalties pelos setores primários aos setores secundários diminuem as medidas ortodoxas em relação às medidas marxistas, mas os pagamentos de royalties dos setores primários às famílias, governo e estrangeiros não têm efeito nas posições relativas das medidas marxistas e ortodoxas. E os pagamentos de royalties feitos pelas famílias, governo e estrangeiros aos setores secundários aumentam as medidas ortodoxas em relação às suas contrapartes marxistas. O mesmo pode ser dito para as medidas de lucro agregado (a soma de lucros e royalties) em relação ao valor excedente agregado. Assim, o efeito geral dos fluxos de royalties nas medidas ortodoxas de valor adicionado, demanda final e lucro agregado, em relação às suas contrapartes marxistas, é indeterminado.

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Embora no modelo simples não se possa encontrar um padrão geral entre o valor adicionado marxista e o valor adicionado ortodoxo ou entre a expressão monetária da mais-valia e o lucro em medida ortodoxa, é possível estabelecer, no modelo simples com fluxos secundários privados, a relação padrão de que a taxa de mais-valia (S*/V*) é maior que a relação lucro/salário de medida ortodoxa, visto que V* < W neste modelo, pois V* = Wp, enquanto W = Wp + Wt + Wry. Portanto, os resultados gerados com a incorporação dos fluxos secundários privados no modelo simples, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 57) são expressos pelas equações marxistas, em comparação com as equações das contas nacionais ortodoxas: 𝑇𝑉 ∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 < 𝐺𝑂 = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 + 𝐺𝑂𝑟𝑦 (49) 𝐶 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = (𝑀𝑝 + 𝑅𝑌𝑝 ) + (𝑀𝑡 + 𝑅𝑌𝑡 ) + (𝑀𝑟𝑦 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 ) (50) 𝑉 ∗ = 𝑊𝑝 < 𝑊 = 𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 + 𝑊𝑟𝑦 (51) (𝑃𝑝 + 𝑃𝑡 + 𝑃𝑟𝑦 ) 𝑆 ∗ [𝑃𝑝 + 𝑃𝑡 + (𝑀𝑡 + 𝑊𝑡 + 𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑝 ′ + 𝑅𝑌𝑡′ + 𝑅𝑌𝑡 ′ )] 𝑃 = >> = (52) 𝑉∗ 𝑊𝑝 𝑊 (𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 + 𝑊𝑟𝑦 ) 𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 < 𝐺𝑃 = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 + 𝐺𝑃𝑟𝑦 (53) 𝑈 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = 𝑀𝑝 + 𝑀𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 (54) Sendo: 𝐺𝑃𝑟𝑦 = produção bruta do setor de royalties; 𝑀𝑟𝑦 = insumos intermediários do setor de royalties; 𝑃𝑟𝑦 = lucros do setor de royalties; 𝑊𝑔 = salários dos funcionários públicos. 𝑊𝑟𝑦 = salários do setor de royalties; Além disso, há as equações marxistas cujo efeito geral dos fluxos de royalties nas medidas ortodoxas, em relação às suas contrapartes marxistas, é indeterminado neste modelo simples com fluxos secundários privados:

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𝑉𝐴∗ = 𝑇𝑉 ∗ − 𝐶 ∗ = 𝑅𝑌𝑝 + 𝑉𝐴𝑝 + (𝐺𝑂𝑡 ) = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡 + (𝑀𝑡 + 𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡 ) (55) 𝐹𝑃∗ = 𝑇𝑃∗ − 𝑈 ∗ = 𝑀𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 + (𝐶𝑂𝑁 − 𝑅𝑌𝑐 ) + (𝐼 − 𝑅𝑌𝑖 ) = 𝑀𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 + 𝐶𝑂𝑁 ∗ + 𝐼 ∗ (56) No SCN convencional, tem-se a contraparte ortodoxa das equações 55 e 56, respectivamente: 𝑉𝐴 = 𝐺𝑂 − 𝑀 = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡 + 𝑉𝐴𝑟𝑦 (57) 𝐹𝐷 = 𝐺𝑃 − 𝑈 = 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 (58) Por fim, há as equações marxistas que não possuem categorias correspondentes no SCN convencional: 𝑁𝑃 ∗ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 (59) 𝑆𝑃 ∗ = 𝐹𝑃∗ − 𝑁𝑃∗ = 𝑀𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 + 𝐶𝑂𝑁 ∗ + 𝐼 ∗ − 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 (60) Sendo: 𝐶𝑂𝑁 ∗ = expressão monetária do consumo total; 𝐼 ∗ = expressão monetária do investimento total; 𝑈 = valor-trabalho dos insumos utilizados na produção. À medida que se incluem os fluxos secundários no modelo simples, ou seja, através dos fluxos de valor do setor primário para o setor secundário, cria-se um padrão de tendência de diminuição do lucro em relação ao valor excedente. Por outro lado, como uma contratendência, há os efeitos resultantes dos impactos dos setores domésticos, do governo e do setor externo, cujos fluxos de valor tendem a elevar o lucro em relação ao valor excedente. Confirma destacam Shaikh e Tonak (1994, p. 56. Tradução nossa) Em um nível empírico, o efeito redutor de lucro das transferências de valor supera o efeito ampliador de lucro. Mas o fato de que existem dois efeitos opostos implica que não podemos dizer a priori se o valor excedente será maior ou menor do que o lucro total. Isso apenas serve para enfatizar o ponto

40 teórico de que o lucro agregado é a soma do valor excedente realizado e da transferência líquida de valor entre circuitos de capital e circuitos de renda.

A igualdade entre lucro total e excedente total, típica do modelo simples apenas com setores de produção e fluxos primários, é impactada com o incremento do pagamento de dividendos dos setores domésticos, podendo resultar em um caso curioso em que o lucro agregado seja superior ao valor excedente, como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 58 - 59. Tradução nossa) [...] pagamento de dividendos a partir dos lucros do setor de produção é registrado como uma distribuição de lucros, não como uma dedução dele (ao contrário dos pagamentos de aluguel de terra ou juros líquidos, que são registrados como custos empresariais e, portanto, como deduções dos lucros da produção). Como os pagamentos de dividendos não são tratados como deduções de lucros, não há transferência registrada de valor fora do circuito de capital. Mas quando os capitalistas, por sua vez, pagam uma parte dessa renda de dividendos de volta ao setor empresarial, o correspondente recebimento empresarial constitui uma transferência registrada de valor para o circuito de capital, uma parte da qual então aparece como lucro adicional registrado. É a particularidade da contabilidade de lucro e perda que dá origem a esse efeito, não alguma criação misteriosa ou negação de valor em circulação.

Portanto, a origem desta desigualdade, no modelo simples aqui tratado, de forma alguma anula o fato de que o lucro é oriundo do valor excedente. Tal desigualdade é originada a partir das diferenças conceituais e metodológicas entre a teoria marxista e as medidas convencionais de lucro, mais precisamente na contabilização dos lucros do setor secundário, visto que suas origens remontam ao setor primário (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 59). 3.2.2. Fluxos secundários públicos Ao incorporar os fluxos secundários públicos ao modelo, é preciso fazer a distinção das atividades governamentais consideradas produtivas e as atividades de reprodução e manutenção social, que são consideradas improdutivas na perspectiva marxista (SHAIKH; TONAK, 1994). Além disso, cabe destacar a distinção entre as receitas e despesas governamentais: Dentro das contas nacionais convencionais, as receitas governamentais consistem em impostos (empresariais e pessoais, líquidos de subsídios e transferências), taxas e multas, aluguéis e royalties e contribuições pessoais e patronais para a seguridade social. Os desembolsos governamentais consistem em compras de bens e serviços (incluindo pagamentos para setores não produtivos e funcionários do governo), transferências a pessoas, juros líquidos pagos a pessoas e estrangeiros e subsídios líquidos para

41 empresas governamentais, menos os dividendos recebidos pelo governo. O superávit ou déficit governamental é a diferença entre as receitas e os desembolsos (BEA 1986, pp. ix-xii). (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 60. Tradução nossa).

Tal definição ainda permanece válida para o atual formato das contas nacionais, sendo que a renda líquida do governo, conforme Paulani e Braga (2020, p. 92) é composta da soma dos impostos diretos e indiretos e das outras receitas correntes do governo, deduzidas as transferências (recursos pagos direta e indiretamente às famílias sob a forma de assistência e previdência, bem como os juros da dívida pública) e os subsídios concedidos às empresas.

Shaikh e Tonak ainda criticam o SCN convencional por considerar apenas determinada parcela dos fluxos secundários do governo. Dizem Shaikh e Tonak (1994, p. 60. Tradução nossa). As contas insumo-produto capturam apenas parcialmente os fluxos associados ao governo geral. No lado das receitas, elas capturam apenas os pagamentos das empresas (impostos, taxas, juros líquidos) ao governo. Os pagamentos das famílias ao governo, assim como aqueles ao setor de royalties, não aparecem explicitamente aqui. No lado do uso, os pagamentos de transferência a pessoas e empresas são excluídos (já que foram subtraídos dos impostos e taxas recebidos pelo governo).

Assim, é possível simplificar a atuação do governo na economia destacandose a compra de bens e serviços (G’) e os salários pagos aos funcionários públicos (Wg). Assim, no modelo simples de fluxos secundários públicos, tem-se: 𝐺 = 𝐺 ′ + 𝑊𝑔 (61) Sendo: 𝐺 = gastos totais do governo; 𝐺 ′ = compras de bens e serviços pelo governo; Os fluxos secundários públicos são semelhantes aos fluxos secundários privados, no sentido de que seus fluxos de valor apenas fazem recircular o que foi gerado pelo setor primário. Desse modo, na abordagem marxista, como tais fluxos de valor já são mensurados no setor primário, sua recirculação não deve ser contada, pois ter-se-ia uma dupla contagem. Segundo Shaikh e Tonak, as contas nacionais já excluem G’ da mensuração, mas acabam mensurando Wg, inflando artificialmente o produto total e o valor total. Na perspectiva marxista, tanto G’ quanto Wg devem ser

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descontados, visto que ambos são considerados improdutivos e, portanto, possuem seu valor adicionado já contabilizado na sua origem, ou seja, nos setores primários. Não há nesse caso geração de valor, apenas sua transferência (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 61-62). Apesar dessas atividades serem consideradas improdutivas na perspectiva marxista das contas nacionais, como advertem os autores: [...] a exclusão da indústria governamental fictícia não significa que ignoramos o uso pelo governo de produtos reais (que aparece na coluna de demanda final do governo na linha de produção) ou o consumo pessoal dos funcionários do governo (que aparece na coluna de consumo da linha de produção). Ambos os itens são usos genuínos do produto total existente. Ao excluir a indústria governamental fictícia, simplesmente excluímos qualquer expansão da medida desse produto. Como os pagamentos das empresas ao governo (juros líquidos pagos e impostos, líquidos de subsídios) são registrados no valor adicionado, sua introdução altera a distribuição, mas não a magnitude do valor adicionado das empresas. Mas como o subsequente pagamento dos salários governamentais a partir dessas mesmas receitas é registrado como a criação de um produto líquido do governo, as medidas agregadas convencionais de produto bruto e líquido são expandidas por Wg. (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 61-62. Tradução nossa).

Assim, G’ será incluso em FP*. A inclusão do governo no modelo de fluxos secundários gera basicamente duas tendências conflitantes: I) dado que o governo não possui lucro líquido, não impacta o lucro agregado, mas de fato os impostos indiretos, juntamente com os impostos sobre os lucros, podem reduzir a parcela dos lucros; II) como contratendência, ao incorporar o governo geral no modelo, parte da renda do governo é transferida para os setores econômicos, aumentando assim as receitas e, portanto, o lucro desses setores. Dependendo da força de uma tendência ou outra dominar, a inclusão do governo no modelo também é um elemento que pode gerar a possibilidade de o lucro líquido exceder o valor excedente (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 62). Shaikh e Tonak argumentam que as contas nacionais convencionais inflam artificialmente o valor da produção total e do produto total ao considerar o governo geral na medida em que [...] qualquer salário pago pelo governo a seus funcionários não produtivos como uma medida adicional de produto governamental (registrado por meio da criação de uma indústria governamental fictícia) e contam qualquer transferência do governo para o setor de royalties como uma medida do produto adicional criado pelo setor de royalties. Ao restringir-nos à soma da

43 produção bruta e do produto bruto dos setores primários, evitamos essas superestimações falsas do produto total medido. (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 62. Tradução nossa).

Assim, os resultados finais gerados pela incorporação do governo geral no modelo de fluxos secundários, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 63) são expressos pelas seguintes equações (sem considerar os fluxos privados de royalties), em comparação com as equações do SCN convencional: 𝑇𝑉 ∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 < 𝐺𝑂 = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 + 𝐺𝑂𝑟𝑦 + 𝑊𝑔 (62) 𝐶 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = 𝑀𝑝 + 𝑀𝑡 (63) 𝑉 ∗ = 𝑊𝑝 < 𝑊 = 𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 + 𝑊𝑔 (64) 𝑆 ∗ = 𝑉𝐴∗ − 𝑉 ∗ = (𝑃𝑡+ + 𝑃𝑝+ ) + (𝑊𝑡 + 𝑀𝑡 ) = 𝑃 + 𝐼𝐵𝑇 + (𝑊𝑡 + 𝑀𝑡 ) > 𝑃 + ≡ 𝑉𝐴 − 𝑊 = 𝑃 + 𝐼𝐵𝑇 (65) 𝑆 ∗ [𝑃 + 𝐼𝐵𝑇 + (𝑊𝑡 + 𝑀𝑡 )] 𝑃 𝑃 = >> = (66) ∗ 𝑉 𝑊𝑝 𝑊 (𝑊𝑝 + 𝑊𝑡 ) 𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 < 𝐺𝑃 = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡 + 𝐺𝑃𝑟𝑦 + 𝑊𝑔 (67) 𝑈 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑈 = 𝑀𝑝 + 𝑀𝑡 (68) Sendo: 𝐼𝐵𝑇 = impostos comerciais indiretos; 𝑃 = renda do tipo lucro, líquida de impostos indiretos sobre negócios. 𝑃+ = renda do tipo lucro, bruta de impostos indiretos sobre negócios. 𝑃𝑝+ = renda do tipo lucro (bruta de impostos indiretos sobre negócios) do setor produtivo; 𝑃𝑡+ = renda do tipo lucro (bruta de impostos indiretos sobre negócios) do setor comercial.

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Há também as equações marxistas cujo efeito geral dos fluxos nas medidas ortodoxas, em relação às suas contrapartes marxistas, é indeterminado neste modelo com fluxos secundários públicos: 𝑉𝐴∗ = 𝑇𝑉 ∗ − 𝐶 ∗ = 𝑉𝐴𝑝 + 𝐺𝑂𝑡 = (𝑊 + 𝑃+ )𝑝 + (𝑀 + 𝑊 + 𝑃+ )𝑡 (69) 𝐹𝑃∗ = 𝑇𝑃∗ − 𝑈 ∗ = 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 + 𝐺 ′ + 𝑀𝑡 (70) A contraparte do SCN convencional das equações 69 e 70 são, respectivamente, as equações: 𝑉𝐴 = 𝐺𝑂 − 𝑀 = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡 + 𝑊𝑔 (71) 𝐹𝐷 = 𝐺𝑃 − 𝑀 = 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 + 𝐺 ′ + 𝑊𝑔 (72) Por fim, tem-se as contas marxistas sem correspondentes no SCN convencional: 𝑁𝑃 ∗ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 (73) 𝑆𝑃∗ = 𝐹𝑃∗ = 𝑁𝑃 ∗ = 𝐼 + 𝐺 ′ + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 + 𝑀𝑡 ) (74) 3.3. Salários e taxa de mais-valia ajustada Ao mensurar o capital variável, Shaikh e Tonak incorporam o conceito de capital variável aparente, definido como o salário nominal menos os pagamentos de royalties feitos pelos trabalhadores produtivos. Conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 64. Tradução nossa): A medida real do capital variável é o salário nominal dos trabalhadores produtivos menos quaisquer pagamentos líquidos de royalties feitos por eles. Assim, para estimar o verdadeiro capital variável, devemos deduzir os juros líquidos, a renda líquida da terra e os impostos líquidos (líquidos dos gastos de benefícios sociais recebidos) pagos pelos trabalhadores de produção de nossa medida aparente de capital variável. Em um nível conceitual, o cálculo dos pagamentos líquidos de juros e renda líquida da terra é relativamente direto. Mas a estimativa dos impostos líquidos pagos requer uma comparação entre os impostos brutos pagos pelos trabalhadores de produção e as transferências correspondentes e outros

45 gastos com bem-estar social (para saúde, educação, estradas, parques etc.) direcionados de volta a eles.

Para obter os melhores resultados possíveis na mensuração dos agregados marxistas, é necessário adicionar a somatória do valor dos royalties líquidos pagos pelos trabalhadores produtivos (NRYwp) à mais-valia. Além disso, como destacado acima, é necessário subtrair NRYwp dos salários dos trabalhadores produtivos para obter o capital variável aparente. Ao incorporar tais elementos, a tendência é de aumento da massa de mais-valia e da taxa de mais-valia ajustada (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 64). Matematicamente, o capital variável e a massa de mais-valia ajustada podem ser expressos por: 𝑉 ∗′ = 𝑉 ∗ − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 = 𝑊𝑝 − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 (75) 𝑆 ∗′ = 𝑆 ∗ + 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 (76) Além disso, a partir da incorpotação desses elementos, é possível calcular a taxa de mais-valia ajustada. As equações 77 e 78 apresentam as taxas de mais-valia aparente e ajustada, respectivamente: 𝑆∗ (77) 𝑉∗ 𝑆 ∗′ (𝑆 ∗ + 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 ) = (78) 𝑉 ∗′ (𝑉 ∗ − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 ) Sendo: 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 = royalties líquidos pagos pelos trabalhadores produtivos; 𝑆 ∗′ = massa de mais-valia ajustada; 𝑉 ∗′ = capital variável ajustado. Ao incrementar os royalties líquidos pagos pelos trabalhadores produtivos, outras variáveis serão modificadas. É necessário descontar do produto necessário (NP*), o valor de NRYwp, visto que, uma vez que NP* é considerado igual a Wp, ao

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descontar o valor de NRYwp de Wp, faz-se necessário descontar também em NP*. Portanto, tem-se que o produto necessário ajustado é expresso por 𝑁𝑃 ∗′ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 = 𝑁𝑃 ∗ − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 (79) Em relação ao produto excedente, sendo SP* = FP* - NP*, ao ajustarmos o valor do produto necessário, automaticamente seu valor vai ser alterado, sendo expresso por ′

𝑆𝑃∗′ = 𝐹𝑃 ∗ − 𝑁𝑃 ∗ = 𝑀𝑡 + 𝐶𝑂𝑁 ∗ + 𝐼 ∗ + 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 − 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = 𝑆𝑃 ∗ + 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 (80) A partir das equações 79 e 80, é possível derivar a taxa de exploração ajustada. Portanto, tem-se que a taxa de exploração aparente e a taxa de exploração ajustada podem ser expressas, respectivamente, pelas equações 81 e 82. 𝑆𝑃∗ (81) 𝑁𝑃∗ (𝑆𝑃∗ + 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 ) 𝑆𝑃∗′ = (82) 𝑁𝑃∗′ (𝑁𝑃 ∗ − 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 ) Sendo: 𝑁𝑃∗′ = produto necessário ajustado (expressão monetária); 𝑆𝑃∗′ = produto excedente ajustado (expressão monetária). É importante destacar que, ao considerar os pagamentos líquidos de royalties no cálculo da taxa de exploração, a taxa ajustada será maior que a taxa aparente, justamente por conta das deduções realizadas nos salários dos trabalhadores produtivos. 3.4. Comércio exterior: economia aberta Ao incorporar as transações econômicas e financeiras com o resto do mundo, ou seja, incorporar o balanço de pagamentos ao modelo, a primeira questão importante a se destacar é a distinção entre o produto doméstico e o valor realizado

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no país em questão. Ao incluir o comércio exterior no modelo, é necessário analisar as transferências de valor no mercado internacional. Segundo Shaikh e Tonak (1994, p. 65. Tradução nossa): Existem três causas básicas dessas transferências internacionais: margens comerciais estrangeiras nas exportações e importações, que transferem valor entre as nações; desvios entre os preços dos compradores e os valores, que fazem a mesma coisa; e fluxos internacionais de salários, dividendos, juros, etc., que transferem valor diretamente na forma de dinheiro.

Será considerada nesta análise a produção do valor dentro das fronteiras nacionais. Isso implica em um possível problema ao considerar os transportes, visto que podem ultrapassar as fronteiras nacionais para entregar determinadas mercadorias. Para solucionar tal problema, Shaikh e Tonak (1994, p. 66) contabilizam as importações quando elas entram no país em questão ou quando são passadas para transportadores deste país; de modo análogo, as exportações também são consideradas quando forem transferidas para um transportador estrangeiro ou chegarem no território estrangeiro. As margens comerciais geram uma transferência de valor no comércio internacional, independentemente da proporcionalidade ou não dos preços dos compradores com os valores. Evidentemente, tal fato não significa que os desvios entre valor e preço não contribuam para acentuar ou mitigar as transferências de valor no comércio internacional. No modo de produção capitalista, os setores improdutivos obtêm seus lucros através da apropriação de certa parcela de valor dos setores produtivos. Desse modo, mesmo que os preços dos compradores sejam proporcionais aos respectivos valores, haverá uma transferência de valor (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 66 - 67). A distinção entre a transferência de valor para o setor comercial doméstico e a transferência de valor proveniente do comércio exterior reside na modalidade pela qual ocorrerão as transferências de valor entre os capitais comerciais domésticos e estrangeiros. Desse modo, uma parcela desse valor se manterá no país em questão, enquanto outra será transferida através das margens destinadas ao capital comercial estrangeiro (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 66). No caso das importações, supondo que o preço de venda final seja igual ao seu valor, O capital de comércio doméstico captura uma parte do valor estrangeiro adquirindo uma mercadoria abaixo de seu preço de venda final (que, por

48 suposição, é igual ao seu valor). As importações transferem valor para um país, mantidas outras coisas iguais. (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 67. Tradução nossa).

Considerando que o preço de venda final seja igual ao valor, então uma parcela desse preço (menor que o preço de venda final) será apropriada pelos setores comercial, de transportes e de produção do país em questão, enquanto outra parcela será apropriada pelos capitais estrangeiros. A diferença entre essa parcela e o preço final da venda do montante dessas mercadorias representará o valor transferido no comércio internacional através das exportações; o oposto ocorre com as importações (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 67-68). Acerca das transferências de valor através de desvios entre valores e preços de produção, conforme mostra Marx (1983, p. 123), a principal causa dessa transferência são as diferenças nas composições orgânicas do capital entre diferentes ramos produtivos. Assim, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 70), é possível expressar matematicamente as transferências de valor nas exportações pela fórmula 𝑇𝑥 = (𝑋 ∗ − 𝑋+ ) + (𝑋+ − 𝑋𝑣 ) = 𝑋 ∗ − 𝑋𝑣 (83) De modo análogo, pode-se expressar matematicamente as transferências de valor através das importações (Tim) pela fórmula 𝑇𝑖𝑚 = (𝐼𝑀∗ − 𝐼𝑀+ ) + (𝐼𝑀+ − 𝐼𝑀𝑣 ) = 𝐼𝑀∗ − 𝐼𝑀𝑣 (84) Por fim, pode-se expressar as transferências líquidas (T) subtraindo da equação 83 o valor da equação 84, sendo 𝑇 = (𝑋 ∗ − 𝐼𝑀∗ ) − (𝑋 𝑣 − 𝐼𝑀𝑣 ) (85) É possível expressar também as equações 83, 84 e 85 através do percentual do desvio entre os preços e os valores, sendo

𝑑𝑥 ≡

(𝑋 ∗ − 𝑋 𝑣 ) (86) 𝑋∗

49

𝑑𝑖𝑚 ≡

(𝐼𝑀∗ − 𝐼𝑀𝑣 ) (87) 𝐼𝑀∗

𝑇 = 𝑑𝑥 ∙ 𝑋 ∗ − dim ∙ 𝐼𝑀∗ (88) Sendo: 𝑑𝑖𝑚 = porcentagem do desvio dos preços de importação em relação aos seus valores; 𝑑𝑥 = porcentagem do desvio dos preços de exportação em relação aos seus valores; 𝐼𝑀+ = preços de comprador das importações totais; 𝐼𝑀∗ = preços domésticos das importações totais; 𝐼𝑀𝑣 = preços diretos (valores) das importações totais; 𝑇 = transferência de valor; 𝑇𝑥 = transferência de valor nas exportações; 𝑇𝑖𝑚 = transferência de valor nas importações; 𝑋 + = preços de comprador das exportações totais; 𝑋 ∗ = preços domésticos das exportações totais; 𝑋 𝑣 = preços diretos (valores) das exportações totais. A identidade dx ≡ (X* - Xv)/X* expressa a porcentagem do desvio dos preços de exportação em relação aos seus valores. De modo semelhante, a identidade dim ≡ (IM* - IMV)/IM* expressa a porcentagem do desvio dos preços de importação em relação aos seus valores (ou preço direto). Por fim, a equação 88 fornece uma melhor expressão para mensurar as transferências líquidas, visto que, caso a balança comercial esteja equilibrada (X* = IM*), a transferência de valor se dá pelos desvios entre os preços de exportação e os seus valores (ou preço direto). Os preços de exportações e importações, conforme definidos por Shaikh e Tonak (1994, p. 65-71) são diferentes das medidas das contas nacionais convencionais. Nas importações, as contas medidas ortodoxas desconsideram o custo de transporte das transportadoras estrangeiras, fazendo com que as medidas marxistas correspondentes sejam maiores. De modo semelhante, nas exportações as medidas ortodoxas são menores visto que suas medidas consideram apenas o custo de transporte doméstico. Todavia, as diferenças entre as medidas marxistas e as ortodoxas são pequenas, de modo que é possível ignorá-las, conforme fazem Shaikh e Tonak (1994, p. 70, nota 17).

50

As principais categorias marxistas que a metodologia de Shaikh e Tonak buscam mensurar são o valor produzido internamente e o mais-valor. Assim, o conceito de PIB é mais útil para tais objetivos do que o conceito de PNB. Desse modo, no que se refere às transferências de valor, os fluxos internacionais na forma de salários, lucros, juros, dentre outros são deixados de lado, focando nas transferências de valor via desvio entre preços e valor e através dos saldos comerciais realizados. Assim, inclui-se no sistema de contas o valor das transferências líquidas no lado dos recursos e o saldo comercial realizado no lado dos usos. 3.5. Atividades não capitalistas e atividades ilegais nas contas nacionais Um dos problemas de mensuração do sistema de contas nacionais convencional diz respeito à medição de atividades não capitalistas como a economia informal, ou até mesmo atividades ilegais. Como explicam Paulani e Braga (2020, p. 179): A dificuldade é operacional porque, na medida em que tais empresas não existem oficialmente e há, por isso mesmo, certo receio em prestar informações, fica um tanto difícil identificá-las, localizá-las e levantar os dados necessários. As empresas não oficialmente constituídas podem se dedicar à atividades legais, como ocorre normalmente quando as famílias se tornam produtoras, e a atividades ilegais, como contrabando, tráfico de drogas e prostituição.

Existem certas estimativas do impacto de determinadas atividades (não contabilizadas oficialmente) no PIB. No Brasil, foi criado o índice de economia subterrânea, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) que busca estimar o produto de atividades não legalizadas, incluindo certa parcela da economia informal. Todavia, tais estimativas possuem muitas limitações, visto que a economia subterrânea não inclui as atividades propriamente ilegais, assim como também não contempla a economia informal da costureira de bairro ou da cozinheira que faz doces para aumentar o orçamento doméstico. (PAULANI; BRAGA, 2020, p. 181).

Para além das limitações operacionais do próprio sistema de contas nacionais em mensurar as atividades informais, grande parte destas atividades, mesmo sendo de

produção,

não

constituem

atividades

de

produção

capitalista

e,

consequentemente, não são contabilizadas como capital variável. Por isso, os serviços domésticos, a economia informal e as atividades ilegais não entram na

51

mensuração dos agregados, tanto dos marxistas quanto, em muitos países, dos sistemas de contas nacionais (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 71). 3.6. Contas nacionais marxistas e contas nacionais convencionais: equações finais Dados todos os elementos incorporados, é possível derivar as versões finais das equações marxistas (à esquerda) que são expressas em comparação com as equações das contas nacionais convencionais (à direita), conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 76) 𝑇𝑉 ∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 < 𝐺𝑂 = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 + 𝐺𝑂𝑟𝑦 + 𝐺𝑂𝑑𝑦 (89) 𝐶 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑀 = (𝑀𝑝 + 𝑅𝑌𝑝 ) + (𝑀𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 ) + (𝑀𝑟𝑦 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 ) + (𝑀𝑑𝑦 + 𝑅𝑌𝑑𝑦 ) (90) 𝑉 ∗ = 𝑊𝑝 < 𝑊 = 𝑊𝑝 + 𝑊𝑡𝑡 + 𝑊𝑟𝑦 + 𝑊𝑑𝑦 (91) 𝑆 ∗ (𝐼𝐵𝑇𝑝 + 𝐼𝐵𝑇𝑡𝑡 + 𝑃𝑝 + 𝑃𝑡𝑡 + 𝑊𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑑 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑀𝑡𝑡 ) 𝑃 = > 𝑉∗ 𝑊𝑝 𝑊 =

(𝑃𝑝 + 𝑃𝑡𝑡 + 𝑃𝑟𝑦 + 𝑃𝑑𝑦 ) (92) (𝑊𝑝 + 𝑊𝑡𝑡 + 𝑊𝑟𝑦 + 𝑊𝑑𝑦 )

𝑇𝑃∗ = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡𝑡 < 𝐺𝑃 = 𝐺𝑃𝑝 + 𝐺𝑃𝑡𝑡 + 𝐺𝑃𝑟𝑦 + 𝐺𝑃𝑑𝑦 = (𝑀𝑝 + 𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 ) + 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 + (𝑋 ∗ − 𝐼𝑀∗ ) + 𝐺 ∗ (93) 𝑈 ∗ = 𝑀𝑝 < 𝑈 = 𝑀 = 𝑀𝑝 + (𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 ) (94) As equações marxistas finais cujo efeito geral dos fluxos nas medidas ortodoxas, em relação às suas contrapartes marxistas, é indeterminado são 𝑉𝐴∗ = 𝑇𝑉 ∗ − 𝐶 ∗ = 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 − 𝑀𝑝 = (𝑀𝑝 + 𝑅𝑌𝑝 + 𝑉𝐴𝑝) + (𝑀𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑉𝐴𝑡𝑡) − 𝑀𝑝 = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡𝑡 + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑀𝑡𝑡) (95)

52

𝑆 ∗ = 𝑉𝐴∗ − 𝑉 ∗ = (𝑃𝑝 + 𝑃𝑡𝑡 ) + (𝐼𝐵𝑇𝑝 + 𝐼𝐵𝑇𝑡𝑡 ) + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 ) + (𝑊𝑡𝑡 + 𝑀𝑡𝑡 ) (96) 𝐹𝑃∗ = 𝑇𝑃∗ − 𝑈 ∗ = 𝐶𝑂𝑁 ∗ + 𝐼 ∗ + (𝑋 ∗ − 𝐼𝑀∗ ) + (𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) (97) Enquanto as suas correspondentes no sistema de contas nacionais convencional são, respectivamente:

𝑉𝐴 = 𝐺𝑂 − 𝑀 = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡𝑡 + (𝑉𝐴𝑟𝑦 + 𝑉𝐴𝑑𝑦 ) (98)

𝑃+ = 𝑅𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑑𝑜 𝑡𝑖𝑝𝑜 𝑙𝑢𝑐𝑟𝑜 (𝑎) = 𝑉𝐴 − 𝑊 = 𝑃 + 𝐼𝐵𝑇 = (𝑃𝑝 + 𝑃𝑡𝑡 + 𝑃𝑟𝑦 + 𝑃𝑑𝑦 ) = (𝐼𝐵𝑇𝑝 + 𝐼𝐵𝑇𝑡𝑡 + 𝐼𝐵𝑇𝑟𝑦 + 𝐼𝐵𝑇𝑑𝑦 ) (99) 𝐹𝐷 = 𝐺𝑃 − 𝑈 = 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 + (𝑋 − 𝐼𝑀) + 𝐺 (100) Por fim, tem-se

as equações finais marxistas que não possuem

correspondentes no sistema de contas nacionais convencional: 𝑁𝑃 ∗ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = 𝑊𝑝 (101) 𝑆𝑃∗ = 𝐹𝑃∗ − 𝑁𝑃∗ = (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑛𝑝 + 𝐶𝑂𝑁𝐶) + 𝐼 ∗ + (𝑋 ∗ − 𝐼𝑀∗ ) + 𝐺 ∗ + (𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) (102) Assim como no sistema de contas nacionais convencional, a abordagem marxista das contas nacionais parte do princípio do método das partidas dobradas, garantindo o equilíbrio entre as contas do sistema, mais precisamente entre os recursos e usos. Considerando as seguintes identidades, é possível encontrar identidades semelhantes no sistema de contas marxistas (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 75): 𝐺𝑂 ≡ 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 + 𝐺𝑂𝑟𝑦 + 𝐺𝑂𝑑𝑦 = 𝐺𝑃 = (𝑀𝑝 + 𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 ) + 𝐶𝑂𝑁 + 𝐼 + (𝑋 − 𝑀) + 𝐺 (103)

53

𝐺𝑂𝑟𝑦 = 𝐺𝑃𝑟𝑦 ≡ 𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 + 𝑅𝑌𝑐𝑜𝑛 + 𝑅𝑌𝑖 + 𝑅𝑌𝑥−𝑖𝑚 + 𝑅𝑌𝑔 (104) 𝐺𝑂𝑑𝑦 = 𝐺𝑃𝑑𝑦 ≡ 𝐺𝑃𝑔 + 𝐺𝑃ℎ + 𝐺𝑃𝑟𝑜𝑤 = 𝑊𝑔 + 𝐻𝐻𝑐𝑜𝑛 + (𝑅𝑂𝑊𝑐𝑜𝑛 + 𝑅𝑂𝑊𝑥−𝑖𝑚 + 𝑅𝑂𝑊𝑔 ) (105) Shaikh e Tonak (1994, p. 76-77) demonstram a existência de identidades semelhantes nas contas nacionais marxistas. Como TV* = TP*, então podemos derivar as seguintes identidades marxistas: 𝑇𝑉 ∗ ≡ 𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 = 𝑇𝑃 ≡ (𝑀𝑝 + 𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝐶𝑂𝑁 − 𝑅𝑌𝑐𝑜𝑛 = 𝐻𝐻𝑐𝑜𝑛 − 𝑅𝑂𝑊𝑐𝑜𝑛 ) + (𝐼 − 𝑅𝑌𝑖 ) + [(𝑋 − 𝐼𝑀) − 𝑅𝑌𝑥−𝑖𝑚 − 𝑅𝑂𝑊𝑥−𝑖𝑚 ] + (𝐺 − 𝑅𝑌𝑔 − 𝑊𝑔 − 𝑅𝑂𝑊𝑔 ) (106)

𝐺𝑂𝑝 + 𝐺𝑂𝑡𝑡 = (𝑀𝑝 + 𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡𝑡 + 𝑅𝑌𝑟𝑦 − 𝐺𝑂𝑟𝑦 ) + 𝐼 + 𝐶𝑂𝑁 + (𝑋 − 𝐼𝑀) + 𝐺 − 𝐺𝑂𝑑𝑦 = (𝑀𝑝 + 𝑀𝑡𝑡 + 𝑀𝑟𝑦 ) + (𝐶𝑂𝑁 − 𝑅𝑌𝑐𝑜𝑛 − 𝐻𝐻𝑐𝑜𝑛 − 𝑅𝑂𝑊𝑐𝑜𝑛 ) + (𝐼 + 𝑅𝑌𝑖 + [(𝑋 − 𝐼𝑀) − 𝑅𝑌𝑥−𝑖𝑚 − 𝑅𝑂𝑊𝑥−𝑖𝑚 ] + (𝐺 − 𝑅𝑌𝑔 − 𝑊𝑔 − 𝑅𝑂𝑊𝑔 ) (107) 𝑉𝐴∗ = 𝐹𝐷 ∗ (108) 𝑆 ∗ = 𝑆𝑃∗ (109) Sendo: 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑛𝑝 = consumo de todos os demais trabalhadores (com exceção dos produtivos); 𝐹𝐷∗ = expressão monetária da demanda final; 𝐺 ∗ = medidas marxistas dos gastos do governo; 𝐺𝑂𝑡𝑡 = produto bruto do comércio total; 𝐺𝑂𝑑𝑦 = produto bruto do setor fictício geral; 𝐺𝑃𝑔 = produção bruta das indústrias fictícias do governo; 𝐺𝑃ℎ = produção bruta das indústrias fictícias domésticas;

54

𝐺𝑃𝑟𝑜𝑤 = produção bruta do resto do mundo; 𝐻𝐻𝑐𝑜𝑛 = consumo total das indústrias fictícias domésticas; 𝐼𝐵𝑇𝑝 = IBT do setor produtivo; 𝐼𝐵𝑇𝑡𝑡 = IBT do comércio total; 𝐼𝐵𝑇𝑟𝑦 = IBT do setor de royalties; 𝐼𝐵𝑇𝑑𝑦 = IBT do setor fictício geral; 𝑀𝑡𝑡 = insumos intermediários do setor de royalties; 𝑀𝑑𝑦 = insumos intermediários do setor fictício geral; 𝑃𝑡𝑡 = lucros do comércio total; 𝑃𝑑𝑦 = lucros do setor fictício geral 𝑅𝑂𝑊𝑔 = indústrias fictícias do governo do resto do mundo; 𝑅𝑂𝑊𝑐𝑜𝑛 = consumo total do resto do mundo; 𝑅𝑂𝑊𝑥−𝑖𝑚 = exportações líquidas do resto do mundo; 𝑅𝑌𝑐𝑜𝑛 = royalties advindos do consumo total (pagos pelos consumidores); 𝑅𝑌𝑖 = transferências provenientes de outras despesas finais (pagos pelas empresas); 𝑅𝑌𝑥−𝑖𝑚 = royalties pagos pelos estrangeiros (via exportações e importações); 𝑅𝑌𝑔 = royalties pagos pelo governo; 𝑅𝑌𝑑𝑦 = royalties pagos pelo setor fictício geral; 𝑅𝑌𝑡𝑡 = royalties pagos pelo comércio total; 𝑅𝑌𝑟𝑦 = royalties pagos pelo setor de royalties; 𝑇𝑃 = produto total; 𝑉𝐴𝑡𝑡 = valor adicionado do comércio total; 𝑉𝐴𝑑𝑦 = valor adicionado do setor fictício geral; 𝑊𝑡𝑡 = salários do comércio total; 𝑊𝑑𝑦 = salários do setor fictício geral; 𝑋 = valor total das exportações (medida pelo SCN). Ao derivar tais identidades, o método das partidas dobradas é atendido e, portanto, garante a existência de equilíbrio entre as contas do sistema de contas marxistas.

55

3.7. Cálculo de magnitudes de valor-trabalho O desenvolvimento do sistema de contas marxistas viabiliza o cálculo da forma de valor-trabalho das categorias marxistas. O preço de comprador dos insumos intermediários do setor de produção é dado pela equação, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 78): 𝑀𝑝 = (𝑀𝑝 )𝑝 + (𝑀𝑝 )𝑡 (110) Sendo: 𝑀𝑝 = preço de comprador dos insumos intermediários do setor de produção; (𝑀𝑝 )𝑝 = preço total do produtor das mercadorias usadas como insumos intermediários pelo setor produtivo, incluindo a depreciação como insumo intermediário; (𝑀𝑝 )𝑡 = margem de comercialização dos insumos intermediários usados pelo setor produtivo. De modo análogo, é possível decompor os demais elementos de insumos e demanda final. Pode-se resumir a demanda final à soma do consumo dos trabalhadores produtivos (CONWp) com a demanda excedente (SD) 4. Considera-se a expressão monetária do capital constante (C*) igual aos insumos intermediários utilizados no setor produtivo (Mp). No cálculo da forma de valor-trabalho das categorias marxistas, Shaikh e Tonak partem do pressuposto simplificador de que os preços do comprador (preços finais de venda) possuem a mesma magnitude de seus valores-trabalho. Tal suposição é necessária para analisar a relação e as diferenças nas medidas das categorias marxistas e suas correspondentes nas contas nacionais convencionais, de modo a garantir que as diferenças entre suas medidas sejam resultantes das diferentes abordagens acerca do conceito de produção e não dos desvios valor-preço (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 79). Como destacam os autores: [...] a forma monetária das categorias marxistas, precisamos estimar o preço (do comprador) de vários pacotes de mercadorias, pois esses são os preços de venda finais. No entanto, como as tabelas de insumo-produto são construídas em termos de preços de produtor, isso significa que devemos somar o preço do produtor e a margem de comercialização do pacote de mercadorias em questão (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 79-80).

4

Conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 79), tem-se que 𝑆𝐷 = (𝐶𝑂𝑁)𝑤𝑢 + 𝐶𝑂𝑁𝑐 + (𝑋 − 𝐼𝑀) + 𝐺.

56

Em relação à mensuração do preço de comprador de mercadorias individuais, surge um problema: É importante observar que, embora haja informações suficientes em tabelas padrão (ou seja, preços de produtor) de insumo-produto para calcular o preço (do comprador) dos insumos agregados, produtos e componentes da demanda final, não há informações suficientes para calcular o preço (do comprador) de mercadorias individuais. Por exemplo, a coluna "j" de uma matriz de insumo-produto lista o preço do produtor de vários insumos intermediários individuais [(M)p]ij, mas apenas lista sua margem de comercialização combinada [(M)t]j naquela linha de comércio daquela coluna. Da mesma forma, os produtos brutos [GOp]j de vários setores produtivos são os preços de produtor de seus produtos, enquanto o produto bruto do setor de comércio GOt é a margem de comercialização combinada sobre todos os produtos do setor produtivo. Como as margens de comercialização sempre são combinadas, não temos as informações necessárias para estimar os preços (do comprador) individuais. (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 80).

Desse modo, o cálculo do valor-trabalho precisa ser feito para um conjunto de mercadorias. Nas contas nacionais convencionais (matriz de insumo-produto) as mercadorias geralmente são mensuradas a preços do produtor. Assim, é possível calcular os respectivos valores-trabalho multiplicando as j-ésimas mercadorias pela razão entre o valor-trabalho e o preço do produtor (𝜆𝑗∗ ), conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 80). 3.7.1 Magnitudes de valor com fluxos de quantidades reais Partindo do pressuposto simplificador, que será abandonado com o desenvolvimento do cálculo, de que as matrizes de insumo-produto registram os fluxos em quantidade reais, o valor-trabalho do setor de produção j (𝜆𝑗 ) é igual as horas de trabalho produtivo mais o valor dos insumos consumidos produtivamente. Tem-se então a seguinte equação que representa os valores-trabalho por unidade de produção (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 80): 𝜆𝑗 = ℎ𝑝𝑗 + ∑𝑖 𝜆𝑗 ∙ 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 (111) Sendo: 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = quantidade do i-ésimo insumo consumido produtivamente por unidade de produção; ℎ𝑝𝑗 = horas de trabalho produtivo por unidade de produção;

57

𝜆𝑗 = valor-trabalho por unidade de produção. Além disso, tem-se, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 80):

𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 =

([𝑀𝑝 ]𝑝 )𝑖𝑗 𝑋𝑗

(112)

Sendo: 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = quantidade do i-ésimo insumo consumido produtivamente por unidade de produção; ([𝑀𝑝 ]𝑝 )𝑖𝑗 = quantidade de insumos intermediários do setor produtivo a preços do produtor por unidade produtiva; 𝑋𝑗 = quantidade da produção. A partir das equações 111 e 112, considerando como vetores linha 𝜆 e hp, com seus respectivos elementos 𝜆𝑗 e hpj e a matriz de coeficientes de insumo-produto do setor produtivo app com seus elementos appij, é possível derivar, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 81) as equações: 𝜆 = ℎ𝑝 + 𝜆 ∙ 𝑎𝑝𝑝 (113) 𝜆 = ℎ𝑝 ∙ (𝐼 − 𝑎𝑝𝑝∗ )−1 (114) Sendo: 𝑎𝑝𝑝∗ = coeficientes de valor monetário de insumos. 𝑎𝑝𝑝 = coeficientes de quantidades de insumos; ℎ𝑝 = horas por trabalhador produtivo; 𝜆 = valor-trabalho. 3.7.2 Magnitudes de valor com fluxos monetários Nas contas nacionais convencionais, as matrizes de insumo-produto registram os agregados em termos monetários a preços do produtor. Assim, é preciso abandonar o pressuposto simplificador anterior dos fluxos em quantidade real. Desse modo, os coeficientes de quantidades de insumos são substituídos na equação por

58

coeficientes de valor monetário de insumos (app*) (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 81). Portanto:

∗ 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = 𝑝𝑖 ∙

𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 𝑝𝑗

(115)

Sendo: 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = quantidade do i-ésimo insumo consumido produtivamente por unidade de produção; ∗ 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = expressão monetária de 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 .

𝑝𝑖 = preços do produtor i; 𝑝𝑗 = preços do produtor j. Além disso, os coeficientes de valor-trabalho também são alterados, sendo:

ℎ𝑝𝑗∗ =

ℎ𝑝𝑗 𝑝𝑗

(116)

Sendo: ℎ𝑝𝑗∗ = expressão monetária de ℎ𝑝𝑗 ; Assim, considerando os fluxos monetários, as equações 113 e 114 serão modificadas (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 81): 𝜆∗ = ℎ𝑝∗ + 𝜆∗ ∙ 𝑎𝑝𝑝∗ (117) 𝜆∗ = ℎ𝑝∗ ∙ (𝐼 − 𝑎𝑝𝑝∗ )−1 (118) Sendo: ℎ𝑝∗ = expressão monetária das horas de trabalho produtivo; 𝜆∗ = vetor linha das razões entre o valor-trabalho e o preço do produtor; 𝜆

𝜆𝑗∗ = razão entre os valores unitários de trabalho e os preços unitários do produtor ( 𝑗 ). 𝑝𝑗

59

O valor-trabalho dos insumos produtivos (C) é igual ao preço do i-ésimo insumo vezes o quociente entre o valor-trabalho e o preço do produtor. Assim, tem-se que o valor-trabalho do capital constante é igual a matriz de elementos (Mp)p vezes o vetor linha das razões entre o valor-trabalho e o preço do produtor. Matematicamente, 𝐶 = (𝑀𝑝 )𝑝 ∙ 𝜆∗ (119) Sendo: C = capital constante. A expressão monetária do capital constante (C*), ou seja, o preço de compra dos insumos produtivos, é igual a somatória do preço de produtor do setor produtivo (Mp)p com a margem comercial (Mp)t sobre os insumos em questão. Assim, matematicamente tem-se 𝐶 ∗ = (𝑀𝑝 )𝑝 + (𝑀𝑝 )𝑡 (120) Considerando os preços de compras correspondentes ao valor-trabalho, então C e C* são iguais. O cálculo do valor-trabalho da força de trabalho (V) é realizado através da estimativa de determinada cesta de consumo dos trabalhadores do setor produtivo CONWp. Assim, o valor-trabalho da força de trabalho (V) é igual ao vetor linha das razões entre o valor-trabalho e o preço do produtor (*) multiplicado pelo preço do produtor do consumo dos trabalhadores produtivos. A equação 121 expressa isso matematicamente: 𝑉 = 𝜆∗ ∙ (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 (121) Sendo: (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 = componentes de preço de produtor dos vetores de consumo dos trabalhadores produtivos; V = capital variável. A expressão monetária do capital variável (V*) é igual a somatória do consumo dos trabalhadores produtivos a preços do produtor (CONWp)p com a margem comercial (CONWp)t. Portanto, 𝑉 ∗ = (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑡 (122)

60

Sendo: (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑡 = margem comercial do consumo dos trabalhadores produtivos. O valor-trabalho do produto total (TP) é igual a somatória do capital constante (C), do valor da força de trabalho (V) e do produto excedente (SP). Como C = U e V = NP, tem-se 𝑇𝑃 = 𝑈 + 𝑁𝑃 + 𝑆𝑃 (123) Sendo: 𝑁𝑃 = produto necessário (consumo dos trabalhadores da produção); 𝑆𝑃 = produto excedente (usado no consumo capitalista, investimento, atividades não produtivas e estatais). Mantendo consistentes os cálculos das magnitudes de valor tanto em termos monetários quanto em termos de valor-trabalho, é possível realizar a mensuração empírica de categorias marxistas de forma que as diferenças entre as expressões monetárias e seus respectivos valores-trabalho ocorram somente em decorrência dos desvios valor-preço, em vez de ocorrerem por inconsistências na mensuração destes agregados (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 84-85). Nos cálculos das magnitudes marxistas em termos de valor-trabalho, se considera apenas os preços de produtor no cálculo do valor. Por outro lado, no cálculo das respectivas expressões monetárias do valor, se considera tanto os preços do produtor quanto as respectivas margens comerciais. Conforme explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 85. Tradução nossa): Se não tivermos derivado a representação detalhada da forma monetária, como tentamos fazer, então é tentador tornar a forma de preço simétrica à forma de valor. [...] isso significaria deixar de fora todos os elementos das linhas e colunas de comércio do cálculo das formas monetárias do lado da receita e do produto - essencialmente, tratando o setor de comércio como um setor de royalties com base no fato de que ambos são "improdutivos". Essa falsa simetria resultaria em magnitudes monetárias estimadas que seriam menores que as magnitudes de valor correspondentes, mesmo quando os preços fossem iguais aos valores. O procedimento seria inconsistente, e os níveis das magnitudes monetárias seriam subestimados.

E continuam os autores (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 86. Tradução nossa): Ao deixar de fora as margens de comércio, impõe-se um viés para baixo relativamente maior ao produto necessário do que ao produto excedente.

61 Portanto, um procedimento inconsistente no qual os cálculos das formas monetárias são feitos de forma simétrica com as formas de valor tenderá a produzir taxas monetárias de mais-valor que são mais altas do que as taxas de valor, mantidas todas as outras coisas iguais.

Conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 82) ao considerar as magnitudes de valor com fluxos monetários, é possível deduzir as demais equações em termos monetários: 𝑉𝐴∗ = 𝑉𝐴𝑝 + 𝑉𝐴𝑡 + 𝑅𝑌𝑝 + 𝑅𝑌𝑡 + (𝑀𝑝 )𝑡 + (𝑀𝑡 )𝑡 (124) 𝑆 ∗ = 𝑉𝐴∗ = 𝑉 ∗ (125) 𝑈 ∗ = 𝑀𝑝 = (𝑀𝑝 )𝑝 + (𝑀𝑟𝑦 )𝑝 (126) 𝐹𝑃 ∗ = (𝑀𝑡 )𝑝 + (𝑀𝑡 )𝑡 + (𝑀𝑟𝑦 )𝑝 + (𝑀𝑟𝑦 )𝑡 + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑡 + 𝑆𝐷𝑝 + 𝑆𝐷𝑡 (127) 𝑁𝑃 ∗ = 𝑉 ∗ = 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑡 (128) 𝑆𝑃∗ = 𝐹𝐷∗ − 𝑉 ∗ (129) Sendo: (𝑀𝑡 )𝑝 = insumos do setor comercial a preços de produtor; (𝑀𝑡 )𝑡 = margem comercial dos insumos intermediários do setor comercial; (𝑀𝑟𝑦 )𝑝 = insumos intermediários do setor de royalties a preços do produtor; (𝑀𝑟𝑦 )𝑡 = margem comercial dos insumos intermediários do setor de royalties; 𝑆𝐷𝑝 = demanda excedente a preços do produtor; 𝑆𝐷𝑡 = margem comercial da demanda excedente. Em

termos

de

valor-trabalho,

as

equações

correspondentes

respectivamente: 𝑉𝐴 = 𝐻𝑝 (130) (total de horas de trabalho produtivo na economia como um todo) 𝑆 = 𝐻𝑝 − 𝑉 (131)

são,

62

𝑈 = 𝜆∗ ∙ (𝑀𝑝 )𝑝 (132) 𝐹𝑃 = 𝜆∗ ∙ [(𝑀𝑡 )𝑝 + (𝑀𝑟𝑦 )𝑝 + (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 + 𝑆𝐷𝑝 ] (133) 𝑁𝑃 = 𝑉 = 𝜆∗ ∙ (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 (134) 𝑆𝑃 = 𝐹𝑃 − 𝑁𝑃 (135) Sendo: 𝐹𝑃 = produto final; S = mais-valia; 𝑆𝐷 = demanda excedente. 3.8. Taxa de mais-valia de trabalhadores produtivos e improdutivos Existe uma pequena diferença entre a taxa de exploração e a taxa de maisvalia. Em relação ao trabalho produtivo, as duas taxas são idênticas. Todavia, quando se trata de trabalhadores improdutivos, há uma distinção entre as duas taxas. Conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 87), as taxas de exploração e de mais-valia dos trabalhadores produtivos e improdutivos são expressas pelas seguintes equações: 𝑉𝑝 = 𝜆∗ ∙ (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 = 𝑉 (136)

𝑒𝑝 =

𝐻𝑝 −𝑉 𝑉

=

𝑆 𝑉

(137)

𝑉𝑢 = 𝜆∗ ∙ (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 )𝑝 (138)

𝑒𝑢 =

𝐻𝑢 − 𝑉𝑢 𝑉𝑢

(139)

Sendo: (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 )𝑝 = componentes de preço de produtor dos vetores de consumo dos trabalhadores improdutivos. 𝑒𝑝 = taxa de exploração dos trabalhadores produtivos;

63

𝑒𝑢 = taxa de exploração dos trabalhadores improdutivos; 𝐻𝑢 = horas por trabalhador improdutivo; 𝑉𝑝 = valor da força de trabalho dos trabalhadores produtivos; 𝑉𝑢 = valor da força de trabalho dos trabalhadores improdutivos. Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 87. Tradução nossa): A taxa de exploração é a proporção do tempo de trabalho excedente em relação ao tempo de trabalho necessário. Esse conceito se aplica a todo trabalho assalariado empregado de forma capitalista, seja produtivo ou improdutivo [...]. O tempo de trabalho necessário é simplesmente o valor da força de trabalho envolvida, ou seja, o valor- trabalho do consumo médio anual por trabalhador nas atividades em questão. O tempo de trabalho excedente é o tempo de trabalho em excesso em relação ao tempo de trabalho necessário. Para os trabalhadores produtivos, sua taxa de exploração também é a taxa de mais-valia, uma vez que seu tempo de trabalho excedente resulta em mais-valia.

Assim, as equações 136 e 138 podem ser reescritas, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 87): 1+ 𝑒𝑢 1+ 𝑒𝑝

=

𝐻𝑢 𝑉𝑢 𝐻𝑝 𝑉𝑝

=

𝐻𝑢 𝐻𝑝 𝑉𝑢 𝑉𝑝

=

𝐻𝑢 𝐻𝑝 𝜆∗ ∙ (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 )𝑝 𝜆∗ ∙(𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝

(140)

Considerando as proporções de consumo dos trabalhadores produtivos e improdutivos semelhantes, é possível derivar, a partir da equação 139, a seguinte aproximação, conforme Shaikh e Tonak (1994, p. 87):

1+ 𝑒𝑢 1+ 𝑒𝑝



𝐻𝑢 𝐻𝑝 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝

(141)

Sendo: 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 = consumo dos trabalhadores do setor improdutivo. Além disso, considerando que o consumo médio dos trabalhadores seja relativamente igual aos seus salários, tem-se que tanto o consumo tanto dos trabalhadores produtivos quanto dos improdutivos será relativamente igual às suas respectivas folhas de pagamento. Assim, dividindo tanto o numerador quanto e denominador da expressão 31 pelo quociente entre o emprego produtivo e o emprego

64

improdutivo (Lu/Lp), obtém-se a seguinte aproximação (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 87-88):

1+ 𝑒𝑢 1+ 𝑒𝑝



ℎ𝑢 ℎ𝑝 𝑒𝑐𝑢 𝑒𝑐𝑝

(142)

Sendo: 𝑒𝑐𝑢 = remuneração do trabalhador improdutivo; 𝑒𝑐𝑝 = remuneração do trabalhador produtivo. Dado que a taxa de exploração dos trabalhadores produtivos é idêntica à taxa de mais-valia, é possível reescrever a equação 143 da taxa de exploração dos trabalhadores improdutivos (SHAIKH; TONAK, 1994, p. 88):

𝑒𝑢 =

ℎ𝑢 ℎ𝑝 𝑒𝑐𝑢 𝑒𝑐𝑝

𝑆

∙ [1 + 𝑉] − 1 (143)

Como explicam Shaikh e Tonak (1994, p. 88. Tradução nossa): Na prática, as taxas relativas de exploração dependerão exclusivamente do tempo de trabalho relativo e das taxas salariais relativas. Ambos esses itens são facilmente estimados a partir de dados anuais. Além disso, como a taxa monetária de mais-valia é bastante próxima da taxa de mais-valia de valor [...], podemos substituir S*/V* por S/V na expressão anterior. Isso nos permite estimar diretamente a taxa anual de exploração dos trabalhadores improdutivos e compará-la com a do trabalho produtivo.

Glossário: 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = quantidade do i-ésimo insumo consumido produtivamente por unidade de produção; ∗ 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 = expressão monetária de 𝑎𝑝𝑝𝑖𝑗 .

𝑎𝑝𝑝∗ = coeficientes de valor monetário de insumos. 𝑎𝑝𝑝 = coeficientes de quantidades de insumos; C = capital constante; 𝐶 ∗ = expressão monetária do capital constante; 𝐶𝑂𝑁 = consumo total; 𝐶𝑂𝑁 ∗ = expressão monetária do consumo total;

65

𝐶𝑂𝑁𝐶 = consumo dos capitalistas; 𝐶𝑂𝑁𝐶𝑃 = consumo dos capitalistas do setor produtivo; 𝐶𝑂𝑁𝐶𝑡 = consumo dos capitalistas do setor comercial; 𝐶𝑂𝑁𝑊 = consumo dos trabalhadores; 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 = consumo dos trabalhadores do setor produtivo; (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑝 = componentes de preço de produtor dos vetores de consumo dos trabalhadores produtivos; (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑝 )𝑡 = margem comercial do consumo dos trabalhadores produtivos. 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑛𝑝 = consumo de todos os demais trabalhadores (com exceção dos produtivos); 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 = consumo dos trabalhadores do setor improdutivo. 𝐶𝑂𝑁𝑊𝑡 = consumo dos trabalhadores do setor comercial; (𝐶𝑂𝑁𝑊𝑢 )𝑝 = componentes de preço de produtor dos vetores de consumo dos trabalhadores improdutivos. 𝑑𝑖𝑚 = porcentagem do desvio dos preços de importação em relação aos seus valores; 𝑑𝑥 = porcentagem do desvio dos preços de exportação em relação aos seus valores; 𝑒𝑝 = taxa de exploração dos trabalhadores produtivos; 𝑒𝑢 = taxa de exploração dos trabalhadores improdutivos; 𝑒𝑐𝑢 = remuneração do trabalhador improdutivo; 𝑒𝑐𝑝 = remuneração do trabalhador produtivo; 𝐹𝐷 = demanda final; 𝐹𝐷∗ = expressão monetária da demanda final; 𝐹𝑃 = produto final; 𝐹𝑃 ∗ = expressão monetária do produto final; 𝐺 = gastos totais do governo; 𝐺 ′ = compras de bens e serviços pelo governo; 𝐺 ∗ = medidas marxistas dos gastos do governo; 𝐺𝑃 = produto bruto; 𝐺𝑃𝑔 = produção bruta das indústrias fictícias do governo; 𝐺𝑃ℎ = produção bruta das indústrias fictícias domésticas; 𝐺𝑃𝑝 = produção bruta do setor produtivo; 𝐺𝑃𝑡 = produção bruta do setor comercial; 𝐺𝑃𝑟𝑦 = produção bruta do setor de royalties;

66

𝐺𝑃𝑟𝑜𝑤 = produção bruta do resto do mundo; 𝐺𝑂 = produção bruta; 𝐺𝑂𝑝 = produto bruto do setor produtivo; 𝐺𝑂𝑠 = produto bruto das variáveis de fluxos secundários (setores secundários); 𝐺𝑂𝑡 = produto bruto do setor de comércio; 𝐺𝑂𝑑𝑦 = produto bruto do setor fictício geral; 𝐺𝑂𝑟𝑦 = receita total do setor de royalties; 𝐺𝑂𝑡𝑡 = produto bruto do comércio total; 𝐻𝐻𝑐𝑜𝑛 = consumo total das indústrias fictícias domésticas; 𝐻𝑢 = horas por trabalhador improdutivo; ℎ𝑝 = horas por trabalhador produtivo; ℎ𝑝∗ = expressão monetária das horas de trabalho produtivo; ℎ𝑝𝑗 = horas de trabalho produtivo por unidade de produção; ℎ𝑝𝑗∗ = expressão monetária de ℎ𝑝𝑗 ; 𝐼 = investimento total; 𝐼 ∗ = expressão monetária do investimento total (medida marxista); 𝐼𝑝 = investimento do setor produtivo; 𝐼𝑡 = Investimento do setor comercial; 𝐼𝐵𝑇 = impostos comerciais indiretos; 𝐼𝐵𝑇𝑝 = IBT do setor produtivo; 𝐼𝐵𝑇𝑡𝑡 = IBT do comércio total; 𝐼𝐵𝑇𝑟𝑦 = IBT do setor de royalties; 𝐼𝐵𝑇𝑑𝑦 = IBT do setor fictício geral; 𝐼𝑀 = valor das importações totais (medida pelo SCN); 𝐼𝑀+ = preços de comprador das importações totais; 𝐼𝑀∗ = preços domésticos das importações totais; 𝐼𝑀𝑣 = preços diretos (valores) das importações totais; 𝐿 = emprego total; 𝐿𝑝 = emprego produtivo; 𝐿𝑢 = emprego improdutivo; 𝑀 = insumos intermediários; 𝑀𝑝 = insumos intermediários usados no setor produtivo;

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(𝑀𝑝 )𝑝 = preço total do produtor das mercadorias usadas como insumos intermediários pelo setor produtivo, incluindo a depreciação como insumo intermediário; (𝑀𝑝 )𝑡 = margem de comercialização dos insumos intermediários usados pelo setor produtivo. ([𝑀𝑝 ]𝑝 )𝑖𝑗 = quantidade de insumos intermediários do setor produtivo a preços do produtor por unidade produtiva; 𝑀𝑡 = insumos do setor comercial; (𝑀𝑡 )𝑝 = insumos do setor comercial a preços de produtor; (𝑀𝑡 )𝑡 = margem comercial dos insumos intermediários do setor comercial; 𝑀𝑟𝑦 = insumos intermediários do setor de royalties; (𝑀𝑟𝑦 )𝑝 = insumos intermediários do setor de royalties a preços do produtor; (𝑀𝑟𝑦 )𝑡 = margem comercial dos insumos intermediários do setor de royalties; 𝑀𝑡𝑡 = insumos intermediários do setor de royalties; 𝑀𝑑𝑦 = insumos intermediários do setor fictício geral; 𝑁𝑃 = produto necessário (consumo dos trabalhadores da produção); 𝑁𝑃∗ = expressão monetária do produto necessário (consumo dos trabalhadores da produção); 𝑁𝑃∗′ = produto necessário ajustado; 𝑁𝑅𝑌𝑤𝑝 = royalties líquidos pagos pelos trabalhadores produtivos; 𝑃 = renda do tipo lucro. 𝑝𝑖 = preços do produtor i; 𝑝𝑗 = preços do produtor j; 𝑃𝑝 = lucros do setor de produção; 𝑃𝑡 = lucros do setor comercial; 𝑃𝑑𝑦 = lucros do setor fictício geral 𝑃𝑡𝑡 = lucros do comércio total; 𝑃𝑟𝑦 = lucros do setor de royalties; 𝑃+ = renda do tipo lucro, bruta de impostos indiretos sobre negócios. 𝑃𝑝+ = renda do tipo lucro (bruta de impostos indiretos sobre negócios) do setor produtivo; 𝑃𝑡+ = renda do tipo lucro (bruta de impostos indiretos sobre negócios) do setor comercial;

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𝑅𝑂𝑊𝑔 = indústrias fictícias do governo do resto do mundo; 𝑅𝑂𝑊𝑐𝑜𝑛 = consumo total do resto do mundo; 𝑅𝑂𝑊𝑥−𝑖𝑚 = exportações líquidas do resto do mundo; 𝑅𝑌𝑝 = royalties pagos pelo setor produtivo; 𝑅𝑌𝑡 = royalties pagos pelo setor comercial; 𝑅𝑌𝑝 ′ = desembolsos do valor adicionado do setor produtivo; 𝑅𝑌𝑡 ′ = desembolsos do valor adicionado do setor comercial; 𝑅𝑌𝑐𝑜𝑛 = royalties advindos do consumo total (pagos pelos consumidores); 𝑅𝑌𝑖 = transferências provenientes de outras despesas finais (pagos pelas empresas); 𝑅𝑌𝑥−𝑖𝑚 = royalties pagos pelos estrangeiros (via exportações e importações); 𝑅𝑌𝑔 = royalties pagos pelo governo; 𝑅𝑌𝑑𝑦 = royalties pagos pelo setor fictício geral; 𝑅𝑌𝑡𝑡 = royalties pagos pelo comércio total; 𝑅𝑌𝑟𝑦 = royalties pagos pelo setor de royalties; S = mais-valia; 𝑆 ∗ = expressão monetária da mais-valia; 𝑆 ∗′ = massa de mais-valia ajustada; 𝑆𝐷 = demanda excedente; 𝑆𝐷𝑝 = demanda excedente a preços do produtor; 𝑆𝐷𝑡 = margem comercial da demanda excedente; 𝑆𝑃 = produto excedente (usado no consumo capitalista, investimento, atividades não produtivas e estatais). 𝑆𝑃∗ = expressão monetária do produto excedente (usado no consumo capitalista, investimento, atividades não produtivas e estatais); 𝑆𝑃∗′ = produto excedente ajustado (expressão monetária); 𝑇 = transferência de valor; 𝑇𝑥 = transferência de valor nas exportações; 𝑇𝑖𝑚 = transferência de valor nas importações; 𝑇𝑀 = margem comercial; 𝑇𝑃 = produto total; 𝑇𝑃∗ = expressão monetária do produto total; 𝑇𝑉 ∗ = expressão monetária do valor total;

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𝑈 = valor-trabalho dos insumos utilizados na produção. 𝑈 ∗ = expressão monetária do valor-trabalho marxista dos insumos utilizados na produção; V = capital variável; 𝑉 ∗ = expressão monetária do capital variável; 𝑉 ∗′ = capital variável ajustado; 𝑉𝑝 = valor da força de trabalho dos trabalhadores produtivos; 𝑉𝑢 = valor da força de trabalho dos trabalhadores improdutivos. 𝑉𝐴 = valor adicionado; 𝑉𝐴∗ = valor adicionado marxista (expressão monetária); 𝑉𝐴𝑝 = valor adicionado do setor produtivo; 𝑉𝐴𝑡 = valor adicionado do setor comercial; 𝑉𝐴𝑡𝑡 = valor adicionado do comércio total; 𝑉𝐴𝑑𝑦 = valor adicionado do setor fictício geral; 𝑉𝐴𝑟𝑦 = desembolsos do valor adicionado; 𝑊 = salários totais; 𝑊𝑔 = salários dos funcionários públicos. 𝑊𝑝 = salários do setor produtivo. 𝑊𝑡 = salários do setor comercial; 𝑊𝑟𝑦 = salários do setor de royalties; 𝑊𝑡𝑡 = salários do comércio total; 𝑊𝑑𝑦 = salários do setor fictício geral; 𝑋 = valor total das exportações (medida pelo SCN). 𝑋 + = preços de comprador das exportações totais; 𝑋 ∗ = preços domésticos das exportações totais; 𝑋 𝑣 = preços diretos (valores) das exportações totais. 𝑋𝑗 = quantidade da produção. 𝜆 = valor-trabalho. 𝜆∗ = vetor linha das razões entre o valor-trabalho e o preço do produtor; 𝜆𝑗 = valor-trabalho por unidade de produção; 𝜆

𝜆𝑗∗ = razão entre os valores unitários de trabalho e os preços unitários do produtor (𝑝𝑗 ). 𝑗

70

4. ESTIMATIVAS EMPÍRICAS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA DE 2000 A 2020 Este capítulo tem como objetivo realizar a mensuração de alguns agregados macroeconômicos marxistas no contexto do sistema de contas nacionais do Brasil. Como já destacado ao longo deste trabalho, utilizamos a metodologia desenvolvida por Anwar Shaikh e Ahmet Tonak (1994), que oferece um arcabouço teórico sólido e rigoroso, bem como um conjunto de conceitos e técnicas para a análise marxista das contas nacionais. Como mostrado nos capítulos anteriores, a abordagem marxista oferece uma perspectiva crítica e profunda sobre as relações econômicas e sociais inerentes ao sistema capitalista, assim como sua manifestação no sistema de contas nacionais. Neste

capítulo,

mensuramos

algumas

das

principais

variáveis

macroeconômicas marxistas, como o Valor Adicionado Bruto Marxiano (VABM), o capital variável e o grau de exploração da força de trabalho, bem como a classificação das atividades produtivas e improdutivas dentro do sistema de contas nacionais. Essas medidas são fundamentais para compreender a dinâmica do funcionamento das economias capitalistas como um todo e proporcionam uma compreensão aprofundada das categorias marxistas e sua relação com as estatísticas macroeconômicas convencionais. No contexto brasileiro, adaptamos a metodologia de Shaikh e Tonak (1994) para as especificidades do sistema de contas nacionais do país. Nossa análise levará em consideração as particularidades do sistema de contas nacionais do Brasil, realizando a mensuração da exploração da força de trabalho no país, bem como identificando os seus determinantes. Ao aplicar a metodologia de Shaikh e Tonak no contexto brasileiro, buscamos contribuir

para

uma

análise

mais

abrangente

e

crítica

das

estatísticas

macroeconômicas do país. Através dessa abordagem, esperamos fornecer insights valiosos para o entendimento das dinâmicas socioeconômicas presentes no sistema econômico brasileiro. Na primeira seção deste capítulo, apresentaremos a metodologia utilizada para a mensuração de determinados agregados macroeconômicos marxistas na economia brasileira de 2000 a 2020, assim como os ajustes necessários para adaptá-la ao contexto das contas nacionais do Brasil. Em seguida, serão apresentados os resultados obtidos para a economia brasileira.

71

4.1. Adaptações ao Sistema de Contas Nacionais do Brasil: atividades produtivas e improdutivas Diferentemente do sistema de contas nacionais dos EUA, sobre o qual Shaikh e Tonak (1994) realizam a mensuração empírica das categorias marxistas, no sistema de contas nacionais do Brasil existem certas especificidades na adaptação do manual da ONU das contas nacionais. Assim, tais diferenças vão impactar na forma de mensuração das categorias marxistas, visto que são necessárias adaptações da metodologia de Shaikh e Tonak à realidade das contas nacionais brasileiras. A fonte básica de dados utilizada para mensurar o grau de exploração da força de trabalho na economia brasileira são as Tabelas de Recursos e Usos (TRU), que fazem parte do Sistema de Contas Nacionais do Brasil, elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A partir da clivagem das atividades econômicas da TRU, podemos classificálas como atividades produtivas e improdutivas, conforme Araújo (2011, p. 146-147) que adapta para as contas nacionais do Brasil a metodologia de Shaikh e Tonak (1994). A classificação das atividades é apresentada no quadro. Quadro 1: Atividades produtivas e improdutivas nas contas nacionais do Brasil. ATIVIDADES PRODUTIVAS

ATIVIDADES IMPRODUTIVAS

Agropecuária

Comércio

Indústrias extrativas Indústrias de transformação Eletricidade e gás, água, esgoto e gestão de resíduos Construção

Atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados Atividades imobiliárias Outras atividades de serviços Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social

Transporte, armazenagem e correio Informação e comunicação Elaborado a partir de: TRU, Araújo (2011) e Shaikh e Tonak (1994). É importante destacar, conforme abordado no capítulo 2, que a distinção entre atividades produtivas e improdutivas não tem a ver com o fato de atividades X serem

72

mais úteis que atividades Y. Tampouco que certas atividades sejam mais “importantes” que outras. A classificação se limita à condição das atividades no tocante à geração de mais-valor (SHAIKH, 1984; SHAIKH; TONAK, 1994). Cabe destacar que, devido às limitações da disponibilidade de informações do sistema de contas nacionais do Brasil, optou-se por considerar na estimativa do capital variável, conforme Araújo (2011, p. 148), as remunerações do total de trabalhadores das atividades produtivas. 4.2. Valor adicionado bruto marxista (VABM), capital variável, massa e taxa de mais-valor na economia brasileira de 2000 a 2020 A adaptação da metodologia de Shaikh e Tonak (1994) para mensurar o grau de exploração da força de trabalho (taxa de mais-valor)5 na economia brasileira é necessária devido às diferenças estruturais das contas nacionais dos EUA para a versão brasileira. Como destaca Araújo (2011), as contas nacionais do Brasil possuem muitas limitações em comparação com as contas dos EUA6. Desse modo, é necessário adaptar a equação 95 para mensurar o valor adicionado marxista a partir das contas nacionais do Brasil. Assim, conforme Araújo (2011, p. 148), o valor adicionado bruto marxista pode ser estimado desconsiderando os royalties pagos pelos setores produtivos, sendo considerados apenas os royalties sob a forma de “juros e dividendos pagos às famílias, aos não residentes e ao governo, além dos impostos indiretos” (ARAÚJO, 2011, p. 148)7. Assim, adaptando ao sistema de contas nacionais do Brasil, o valor adicionado bruto marxista é expresso por:

𝑉𝐴𝐵𝑚 = ∑ 𝑉𝐴𝐵 − ∑ 𝑅𝑀𝐵 + (𝑃𝐵𝑐 − 𝑅𝑀𝐵𝑐 ) (144) 𝑝

𝑝

Sendo: 𝑉𝐴𝐵𝑚 = expressão monetária do valor adicionado bruto marxista adaptado ao SCN brasileiro; Por contas das limitações dos dados do Sistema de Contas Nacionais do Brasil, optou-se somente pela mensuração da taxa de mais-valor dos trabalhadores produtivos. A taxa de mais-valor é, por definição, a taxa de exploração da força de trabalho dos trabalhadores produtivos. 6 Como bem apontam Silva e Santos (2016, p. 257), geralmente os países em desenvolvimento demoram para incorporar as recomendações contábeis dos SNA. 7 Tais elementos, conforme aponta Araújo (2011, p 148), já estão contidos no valor adicionado. 5

73

𝑝 = atividades produtivas no SCN brasileiro (conforme o quadro 1); 𝑃𝐵𝑐 = valor bruto do comércio (extraído das TRU); 𝑅𝑀𝐵 = rendimento misto bruto (extraído das TRU)8; 𝑅𝑀𝐵𝑐 = rendimento misto bruto do comércio (extraído das TRU); 𝑉𝐴𝐵 = valor adicionado bruto (extraído das TRU). Basicamente, estima-se o valor adicionado bruto marxista (𝑉𝐴𝐵𝑚 ), adaptado ao Sistema de Contas Nacionais do Brasil, somando o valor adicionado bruto dos setores produtivos p (conforme o quadro 1) deduzindo os seus respectivos rendimentos mistos brutos (RMB) e somando o valor bruto do comércio (𝑃𝐵𝑐 ) deduzido o rendimento misto bruto do comércio (𝑅𝑀𝐵𝑐 ), conforme Araújo (2011). Para mensurar o capital variável a partir das Tabelas de Recursos e Usos brasileiras, optou-se por considerar a expressão monetária do capital variável, adaptada às contas nacionais do Brasil, como:

𝐶𝑉 = ∑ 𝑊 + ∑ 𝐶𝑆𝐸 (145) 𝑝

𝑝

𝐶𝑉 = expressão monetária do capital variável adaptado ao SCN do Brasil; 𝑊 = salários (extraído das TRU); 𝐶𝑆𝐸 = contribuições sociais efetivas (extraído das TRU). Basicamente, a expressão monetária do capital variável adaptado ao SCN do Brasil é dada pela somatória dos salários dos trabalhadores dos setores produtivos (p) adicionada à somatória das contribuições sociais efetivas (CSE) dos setores produtivos (p), conforme Aruto (2019). Uma vez obtidas as categorias 𝑉𝐴𝐵𝑚 e CV, pode-se calcular a expressão monetária da massa de mais-valor subtraindo do valor adicionado bruto marxista o capital variável (ARAÚJO, 2011, p. 145). Ainda conforme Araújo (2011, p. 145), baseado em Shaikh e Tonak (1994), estimamos a taxa de mais-valor pelo quociente entre a massa de mais-valor e o

Confirme define o IBGE, “o rendimento misto bruto corresponde ao rendimento obtido pelos empregadores e pelos trabalhadores conta própria.” (IBGE, 2016). 8

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capital variável, ambos em expressão monetária. Os resultados da mensuração dessas categorias são expressos na tabela 1. Tabela 1: Valor adicionado bruto marxista, capital variável e massa de mais-valor (em milhões de R$ a preços correntes), taxa de mais-valor, taxa de variação anual da taxa de mais-valor e índice de mais-valor acumulado. Anos 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

VAB marxista

Capital variável

491.708 539.748 601.239 733.618 871.754 961.893 1.055.564 1.201.360 1.392.735 1.480.608 1.752.865 1.996.765 2.175.571 2.376.197 2.558.877 2.583.768 2.648.344 2.793.012 3.026.187 3.181.058 3.412.820

158.817 171.249 185.421 218.137 257.634 293.331 319.481 362.165 423.593 470.972 545.217 631.414 704.874 777.102 834.433 848.734 861.485 874.920 901.358 939.660 922.638

Taxa de variação Taxa de maisMassa de mais- Taxa de anual da taxa de valor acumulada valor mais-valor mais-valor (2000 = 100) 332.891 209,61% 100 368.499 215,18% 2,66 102,66 415.818 224,26% 4,22 106,88 515.481 236,31% 5,38 112,25 614.120 238,37% 0,87 113,12 668.561 227,92% -4,38 108,74 736.083 230,40% 1,09 109,83 839.195 231,72% 0,57 110,40 969.141 228,79% -1,26 109,14 1.009.636 214,37% -6,30 102,83 1.207.648 221,50% 3,32 106,16 1.365.351 216,24% -2,38 103,78 1.470.697 208,65% -3,51 100,27 1.599.095 205,78% -1,38 98,90 1.724.444 206,66% 0,43 99,33 1.735.034 204,43% -1,08 98,25 1.786.859 207,42% 1,46 99,71 1.918.092 219,23% 5,70 105,40 2.124.829 235,74% 7,53 112,93 2.241.398 238,53% 1,19 114,12 2.490.182 269,90% 13,15 127,27

Fonte dos dados brutos: Sistema de Contas Nacionais, TRU (IBGE), referência 2010. Elaboração própria. O gráfico 1 mostra a evolução da taxa de exploração da força de trabalho (taxa de mais-valor) na economia brasileira entre 2000 e 2020. É possível observar uma considerável tendência de aumento da taxa de exploração no final do governo FHC II e início do governo Lula I até 2004. A partir de 2004, ocorre uma leve tendência de queda da taxa de exploração, que volta a aumentar bruscamente a partir de 20152016.

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Gráfico 1: Taxa de mais-valor (exploração) no Brasil (2000 – 2020)

Taxa de mais-valor (2000 - 2020) 3,000 2,500 2,000 1,500 1,000 0,500

2020

2019

2018

2017

2016

2015

2014

2013

2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

2001

2000

0,000

Fonte: Sistema de Contas Nacionais (IBGE). Elaboração própria. O gráfico 2 mostra a variação anual da taxa de exploração (taxa de mais-valor) durante o período estudado. É possível notar um comportamento aparentemente cíclico da variação anual da taxa de exploração. Destaca-se a forte queda da variação anual ocorrida em 2009, bem como o intenso aumento da variação anual em 2017, 2018 e 2020. Gráfico 2: Taxa de mais-valor – variação anual – (2000 – 2020)

Taxa de mais-valor - variação anual (2000 - 2020) 15 10 5

-5

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

0

-10

Fonte: Sistema de Contas Nacionais (IBGE). Elaboração própria.

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Por fim, no gráfico 3 apresentamos a evolução da taxa de mais-valor acumulada. Assim como os demais gráficos, destaca-se a forte tendência de aumento do índice tanto nos primeiros anos estudados, quanto nos anos finais, principalmente a partir de 2016. Gráfico 3: Taxa de mais-valor acumulada (2000 – 2020)

Fonte: Sistema de Contas Nacionais (IBGE). Elaboração própria.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS As contribuições metodológicas de Shaikh e Tonak (1994), em especial na mensuração da taxa de exploração da força de trabalho, constituíram o mais importante avanço na economia marxista empírica no que tange a mensuração de categorias marxistas, como bem destaca Basu (2017, p. 5). A análise crítica de Shaikh e Tonak (1994) do Sistema de Contas Nacionais permite a construção de uma abordagem alternativa de mensuração dos agregados, pautada na perspectiva clássica-marxista moderna capaz de superar grande parte dos problemas das contas nacionais convencionais, principalmente em relação ao conceito de produção adotado, visto que as contas nacionais convencionais utilizam um conceito de produção, mantido no novo SNA 2008, que resulta em certas inconsistências nas mensurações, conforme mostrado no capítulo 2. A partir da aplicação da metodologia dos autores ao contexto econômico brasileiro, utilizando as contas nacionais como base para mensuração, foi possível estimar empiricamente a exploração da força de trabalho no Brasil ao longo do período investigado. Observando a evolução da taxa de exploração na economia brasileira, é perceptível o acentuado aumento da taxa de exploração da força de trabalho de 2000 a 2003. A partir de 2004, pode-se observar uma leve tendência de queda que dura até 2016. A partir de 2016, ocorre um forte aumento da exploração da força de trabalho. Esse fenômeno pode ser atribuído a diversos fatores, tais como mudanças estruturais na economia, políticas de flexibilização laboral e aprofundamento das desigualdades sociais. Esse cenário reforça a necessidade de políticas públicas e ações voltadas para a proteção e valorização do trabalho, visando a promoção de uma sociedade mais justa e equitativa. É importante ressaltar que este estudo apresenta limitações inerentes à disponibilidade dos dados utilizados, bem como à própria natureza complexa do tema abordado. No entanto, acredita-se que os resultados obtidos fornecem subsídios relevantes para a compreensão e discussão da exploração da força de trabalho no Brasil. Por fim, espera-se que este trabalho contribua para estimular debates e aprofundar o conhecimento acerca da relação entre economia política e contas

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nacionais, oferecendo elementos para a formulação de políticas públicas que promovam uma distribuição de renda mais justa e uma sociedade mais inclusiva. A análise da exploração da força de trabalho é fundamental para a compreensão das dinâmicas econômicas e sociais, bem como para a busca de alternativas que visem a um desenvolvimento sustentável e equitativo.

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