251 96 48MB
Portuguese Pages 210 [212] Year 1989
HISTORIA DA ”
ai
LUIZ ROBERTO LOPEZ IA
|
k
Ia
A
E
AM
tal
|
/
f '
MAN /
Ê
E
Li
A
"
À
l
N
PM
VN
“DE
LUIZ ROBERTO LOPEZ Licenciado
e Bacharel em História pela Historiógrafo do CODEC
Pós-Graduado
em
História da América
UFRGS
Latina
HISTÓRIA DA
AMÉRICA LATINA 2º EDIÇÃO REVISTA E AMPLIADA
PERCADO (fo
ABERTO
Capa: Lay-out de Leonardo Menna Barret o Gomes
a partir de mural de David Siqueiros Composição: Ricardo F. da Silva Revisão: Rosane Gava Supervisão: Sissa Jacoby Editor: Roque Jacoby
Copyright de Luiz Roberto Lopez, 1986
Todos os direitos reservados a
Editora Mercado Aberto Ltda.
Rua da Conceição, 195 - 1º andar
Fone (0512) 21 4022 - Cx. Postal 1432 90037 - Porto Alegre - RS
L684h
Lopez, Luiz Roberto História da América Latina. 2. ed. Revista e ampliada. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1989.
208p. (Revisão, 21)
CDU
América História: América Política:
Latina; História América Latina Latina: Política América Latina
970/980 = 6 32(7/8 = 6)
970/980 = 6 970/980 = 6 32(7/8 = 6) 32(7/8= 6), a
Bibliotecária responsável: Rejane Raffo Klaes CRB-10/586
SUMÁRIO
ADVERTÊNCIA
.....cccccciccccco
|. A CRISE DO FEUDALISMO EUROPEU ....... ||. O SIGNIFICADO DAS NAVEGAÇÕES ....... Crise do feudalismo e progresso urbano... ..... As navegações ......ccccccccccrcccs O caso da Espanha .....cccccccccccccc. ...ccccccclcc cc |||. A CONQUISTA Inícios da penetração espanhola ............ As capitulações de Santa Fê
...............
Da sondagem à conquista .. ..ccccccescssssa As brutalidades da conquista. . sex ssecevsses INES CONCIUSÕOS sms As duas Américas: o paralelo necessário ....... A religião dos conquistadores .............. ....... IV. A ORGANIZAÇÃO DA CONQUISTA Os órgãos administrativos metropolitanos ...... Os órgãos administrativos coloniais: vice-reis, capitães gerais e governadores ............ Os órgãos administrativos coloniais: as audiências . Os órgãos administrativos coloniais: o sistema TazendáiO cssmenmamiscemesas si Os órgãos administrativos coloniais: Cabildos . ... V. ÍNDIOS, NEGROS E PADRES NO UNIVERSO COLONIAL .......ccc.cc.... O trabalho dos índios ......cccccccccccc. O trabalho dos Negros .wvscegmsncmasa mas a O trabalho dos padres
.csssusasnrmamisew as
VI. A SOCIEDADE DA AMÉRICA COLONIAL HISPÂNICA: CARACTERISTICAS E CONFLITOS As áreas de ocupação... ......ccccccc
A sociedade colonial ......c.cccccccccccc. Conflitos na América Colonial hispânica ....... Conclusões sobre o mercantilismo e o MONODOSMO su cxsmcmiciciisnisd sad
Vil. AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XVIII... Espanha e América na fase bourbônica ........ Uma experiência na América: os intendentes .... O passivo do colonialismo .......ccccccc.
VIII. AS NOVAS NECESSIDADES DO CAPITALISMO EUROPEU .....ccclllll, -—
7
9 13 13 14 15 19 19
20
21 22 25 26 28 $i] 31 EE 34 35 38 42 42 44 47
51
51
52 55 58
60
60 62 63
65
IX. INDEPENDÊNCIA: POSSIBILIDADES E LIMITES CNES TED md E a O processo emancipatório da América Colonial
70
hispânica. ...cc.llea As circunstâncias que levaram à luta... ........ A primeira fase da luta emancipatória . . ....... A segunda fase da luta emancipatória ......... A sustentação diplomática da emancipação ..... A fragmentação da América Colonial hispânica... X. DO CAUDILHISMO AOS ESTADOS NACIONAIS O que foio caudilhismo ..........cccccc. Estados: nacionais e liberais .........c.ccc...
70 72 [E 75 77 78 81 81 83
OLIGÁRQUICA: INVENTÁRIO DE PAISES.... MEXICO aussi sasEEiL EI COLE DEDE NARA América Central .......ccccccccciccc TSICENLTT EMENTAS SER VeENCZUCA cms Peru, Bolíviae Equador .........ccccccc.. A ma ue ps ms e 4 EE EA ga CANO asas Argentina e Martin Fierro... .....cccccs.. nmam na dia is eppessace UTUgUO) m nn rEME eA
89 89 90 91 91 92 93 95
|.
XI. A AMÉRICA HISPÂNICA NA FASE
Paraqual
sasumimmsu SOMA
MES
EE Sd
E
XI. A AMÉRICA ESPANHOLA NO SÉCULO XIX:
E da
IDEOLOGIA E AUTO-ESTIMA... .......... XIIl. ESTADOS UNIDOS: EUFORIA IMPERIALISTA NA AMÉRICA LATINA ...... O desenvolvimento do capitalismo americano . ..
Imperialismo e destino manifesto. ........... O Big Stick: arrogância e auto-suficiência ...... A difícil independência de Cuba ............ O Canal do Panamá... ....ccccccccccc A Conferência de Washington .............. Do imperialismo à boa vizinhança ...........
96 98
103 103
10b 107
109 113 114 115
XIV. A CRISE DA ECONOMIA OLIGÁRQUICA E AS ALTERNATIVAS DE INDUSTRIALIZAÇÃO 117 A crise do modelo primário exportador... .....
117
EUR Sd q cubstitutiva crie ms erra ata ML ,.... XV. A CRISE DO ESTADO OLIGÁRQUICO resDe E E Cias znzamisicisa Cho DO cu am DE psi rig nimi mi Venezuela e Colômbia .............llll. ema a Lada siá Urugqual cusssssssnna
118 128 123 124 124 125
...ccccccccicccrss
127
As possibilidades de uma industrialização
ATOM
Nicarágua
iiãs RA treme asannamist
ENA
cr.
126
cc...
....
O Paraguai e a Guerra do Chaco... Bolívia
XVI. A REVOLUÇÃO MEXICANA...
iveco
“
e
... 0.0... mÕõE
e
=
Oligarquia e capitalismo na fase do Porfiriato ....
cce siIETETEDÉD MDE MaAdCO Huerta Carranza rar rare Cárdenas. .....ccccccccrcree a...
Us...
as...
os
O presidencialismo mexicano XVII. O PERONISMO ARGENTINO Argentina e Brasil: as lições de uma comparação . . Juan Perôn
Rr
oii...
a...
Do peronismo
XVIII. A REVOLUÇÃO
cc...
.....
ao estado militar...
CUBANA
Economia e perfil de classes na sociedade cubana pré-revolucionária. . ............. Dos anos 30 à Revolução Sierra Maestra O projeto revolucionário Cuba e o imperialismo o
O
O
O
O
O
TO
O
TO
O
O
DD
oiii.
o...
XIX. AMÉRICA
LATINA, TERCEIRO
ma
MUNDO,
IMPERIALISMO, GUERRA FRIA Industrialização latino-americana e capital monopolista
O...
AS MUItINaACIONAIS
;nzazsimsnsmemEmEE Ea Eh
Subdesenvolvimento e dependência: duas
teorias do capitalismo latino-americano . . .... América Latina e Guerra Fria O...
ÕõmÕ aa
Fracassos da integração latino-americana . ...... XX. AMERICA LATINA: ANOS RECENTES Bolívia O
di...
Uruguai Chile
TO
DO
õiõõc.õi.õõ.õiõ.iõ.i.õc.õiõc.Õis-
von...
mw
on...
=...
Peru .cccccccccc
RÃS:
ici
grass ig DO PD DE
DU
ma
iii
rca
GSI
A
ii
UR
re
Granada El SalVAdOL. ss Ei DEI ES EIS E CONCLUSÃO América Latina: fatalidade ou opção? ......... oi...
ma
oc...
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ii...
“a...
.
mw
q.
Advertência Um livro intitulado História da América Latina cobre, evidentemente, um espaco geográfico e histórico muito amplo. Tratar-se-á, portanto, neste caso, de um enfoque onde os pormenores descritivos ficarão subordinados às necessidades interpretativas ajustadas à moderna metodologia da ciência histórica, o que vale dizer, uma metodologia que põe o passado a serviço da formação de uma consciência crítica sobre os tempos presentes. Assim, interessará a construção de uma visão de conjunto do processo latino-americano e o estudo regionalizado só aparecerá na medida em que contribuir para a visão pretendida.
Um dado importante é que a América Latina compreende, a rigor, uma subdivisão em América Espanhola, América Portuguesa (Brasil) e América Francesa (Haiti e Antilhas Francesas). Nosso estudo privilegiará, conscientemente, a América Espanhola, incidentalmente mencionando o Brasil, quando for o caso de exemplificar algum aspecto
estudado sobre o continente. Embora a nossa História seja parte integrante do sofrido drama latino-ameri cano, optou-
se por deixar o Brasil de lado enquanto capítu lo específico, pela simples e prática razão de que já existe m, na série Revisão, três títulos que abordam a História bras ileira, História do Brasil Colonial, História do Brasil Imperial e História do Brasi! Contemporâneo, aos quais remetemos o leitor interessado em complementar a visão do nosso contin ente fornecida pelo presente livro. Na mesma série, existe ainda o livro de Voltaire Schilling, EUA X América Latina: as etapas da dominação, o qual desenvolve um dos aspectos mais polê micos que abordamos neste texto. Concluindo a nossa advertência, gostaríamos, portanto, de deixar claro que prioriza r a América Espanhola no livro História da América Latina é uma opção de trabalho e não uma exclusão conceitual.
Aos professores do Curso de Especialização
em História da América Latina/83/UF RGS:
|
Sílvia, Betinha,leda, Jane e Bárbara.
Que, se lerem este livro, vão se encontrar nele.
|. A crise do feudalismo europeu A integração da América Latina no contexto histórico europeu começou na fase das Grandes Navegações, ocorridas no início da chamada Idade Moderna, época durante a qual, no Velho Mundo, coexistiram o feudalismo decadente e o capitalismo emergente. O feudalismo foi o modo de produção dominante na sociedade européia no longo período que vai da desintegra-
ção do escravismo antigo ao triunfo da burguesia mercantil e industrial. O sistema feudal articulava-se através de laços de suserania e vassalagem, nos quais à natureza parcial da propriedade correspondia o caráter privado da soberania. À relação de proteção e dependência se repartia entre vários níveis senhoriais e também compreendia o vínculo estabele-
cido entre os senhores e os camponeses. Coagidos ao trabalho por mecanismos ideológicos, funcionando a religião como
agente
do
conformismo,
os
camponeses
estavam
presos à terra, não podiam dispor livremente de sua força de
trabalho no mercado e, obrigados a trabalhar um certo número de dias na reserva do senhor e a entregar a ele uma
parte da produção, geravam um excedente nada desprezível. Semelhante ao capitalismo no aspecto da dominação e da exploração, o feudalismo, contudo, diferiu muito dele. No capitalismo, a coação ao trabalho viria a ser puramente econômica e não ideológica. Além disso, o excedente econômico gerado, ou a mais-valia, estaria “embutido” no horário global de trabalho, não sendo, como no feudalismo, algo claramente visível — as horas que o trabalhador produ-
zia exclusivamente para o senhor. Por outro lado, no capitalismo o trabalhador não teria nenhum controle sobre os
meios de produção, sendo obrigado a vender sua força de trabalho para poder adquirir no mercado a ração para sua
subsistência. No feudalismo, embora o senhor detivesse um direito formal de propriedade, era do camponês a posse direta do meio de produção — a terra.
Os séculos XIl e XIII assinalaram o auge do feudalismo. O desenvolvimento das técnicas agrícolas favoreceu a produtividade camponesa e a ampliação dos arroteamentos. A reconquista da Península Ibérica, as Cruzadas e a colonização da Finlândia, Prússia e Brandemburgo pelos Cavaleiros Teutônicos se constituíram em marcos da expansão feudal. Ao contrário do que supõem alguns historiadores, a
existência e o progresso de enclaves urbanos no universo feudal não representaram algo de estranho naquele contexto, sendo, pelo contrário, parte integrante de suas necessidades comerciais. A autonomia das nascentes cidades foi possível porque o sistema, como já foi dito, segmentava e
hierarquizava em diversas instâncias o conceito de autoridade e soberania. No século XIV começou a manifestar-se, de forma profunda, a crise que, lentamente, destruiria o sistema feudal. Esta crise foi originalmente agrícola. As terras principiaram a se esgotar por causa do desmatamento, da falta de critérios de conservação do solo e da redução das áreas de pastagem em favor de culturas comerciais, o que diminuiu a atividade criatória e, por conseguinte, o fornecimento de
a
ASS!
adubo natural para a lavoura. Na mesma época, a mineração da prata viveu uma fase de esgotamento que duraria até o
séc. XV, quando a descoberta do processo seiger para sepa-
rar a prata do minério de cobre permitiu reabrir as minas e restabelecer o fluxo dos metais. O decréscimo da produção agrícola em contraste com o aumento populacional levou à fome na Europa: em 131516 houve a primeira grande epidemia. O ritmo de crescimento demográfico caiu. Declinando a população, declinaram a procura de artigos agrícolas e seu preco, ao mesmo
tempo
que os artigos de luxo
revendidos (ou produzidos)
pelas cidades e destinados a uma clientela aristocrática se tornaram mais caros. Dependente de tais artigos, a aristocracia se viu compelida sistematicamente ao saque, à rapina e ao mercenarismo como
tos
aviltados.
Entre
forma de recuperar seus rendimen-
as guerras e ações
de
rapinagem
dos
séculos XIV/XV ficaram famosas a Guerra dos Cem Anos, combinação de luta dinástica (Valois x Borgonha) e conflito internacional (França x Inglaterra), e a Guerra das Duas Rosas, luta entre segmentos da classe dominante inglesa, logo após a Guerra dos Cem Anos.
O acontecimento mais traumático do século XIV foi
certamente a Peste Negra (1348-50), que matou percentualmente mais do que as duas grandes guerras do séc. XX somadas — 40% da população européia. Para resguardar suas rendas, cada vez mais reduzidas, os senhores feudais recorreram
inicialmente a expedientes arbitrários e extorsivos, como se
pode constatar no Estatuto dos Trabalhadores (Inglaterra, 1349-51)
e na Ordonnance
(França, 1351). O resultado foi
o recrudescimento das revoltas camponesas (França: Jacquerie, de 1358; Inglaterra: Revolta dos Camponeses, de 1381). Solução inútil e conflitiva, a espoliação pura e simples
do campesinato acabou sendo preterida em favor de outras alternativas. Entre elas, a substituição da corvéia (trabalho
obrigatório do camponês) por pagamentos em espécie pro-
gressivamente monetarizados, o parcelamento das terras feudais em benefício de um campesinato que começou a
a
11
passar
da condição
aos poucos,
de servo para a de rendeiro
(surgindo,
a distinção entre rendeiros ricos, precursores de
um incipiente capitalismo agrário, e rendeiros pobres, tendentes a se transformarem em assalariados agricolas) e a venda de propriedades aristocráticas a mercadores das cidades, que
nelas instalaram
rendeiros ou proletários rurais. A
monetarização das obrigações feudais e a substituição da relação senhor/servo pela relação senhorio/rendeiro foram evidentes sintomas de transição social. O afrouxamento dos laços de dependência pessoal levou Perry Anderson a concluir que o absolutismo veio a ser o único instrumento político eficaz de que dispôs a ordem feudal enfraquecida para manter o camponês em regime de
submissão e obediência — algo análogo ao que ocorreu com o fascismo em relação ao capitalismo.
12
|]. O significado das navegações Crise do feudalismo e progresso urbano A crise do séc. XIV desorganizou profundamente o sistema produtivo europeu. A Peste Negra, a Guerra dos Cem Anos e as revoltas camponesas foram fatores de colapso e anarquia. Regiões inteiras ficaram despovoadas com a peste e a escassez de mão-de-obra aumentou seu custo. Muitos fugiram do campo para a cidade, já que a falta de braços obrigou os regulamentos corporativos a se abrandarem, ampliando, desse modo, as oportunidades de trabalho na atividade artesanal. Com a transformação do servo em rendeiro e das obrigações feudais em variadas formas de pagamento, nês passou a ter tempo
o campo-
para se dedicar a um artesanato do-
méstico, cujo produto era, depois, vendido ao comerciante. O, crescimento das indústrias têxteis nas cidades flamengas e lombardas, ao longo do séc. XV, levou a uma demanda de matérias-primas e isso estimulou os proprietários a preferi-
rem a criação de gado lanígero agricultura.
Na
(ovino) em detrimento da
Inglaterra, o processo
foi acompanhado
do
cercamento das terras comunais (enc/osures) para ampliação das pastagens, do que decorreu a expulsão de camponeses para a cidade e sua consequente transformação em mão-deobra barata para as manufaturas. A monetarização das obrigações feudais e o surgimento de uma produção artesanal doméstica para o mercado dinamizaram consideravelmente a economia urbana no séc. XV. A monetarização já tinha latentes possibilidades no sistema econômico das cidades e pôde, assim, se desenvolver,
ainda mais em face da retomada
da mineração na Europa
Oriental. Cada vez mais cresceu a concentração de massas camponesas nas zonas urbanas e o progresso do comércio, do setor bancário e da indústria manufatureira fez com que as cidades, à medida que se iam libertando de tutelas feudais, caíssem sob o controle de oligarquias plutocráticas.
As navegações Neste contexto de expansão comercial e urbana é que ocorreram as Navegações. Por um lado, foram viabilizadas por uma série de progressos técnicos — a bússola, o astrolábio, as caravelas e a imprensa, tendo esta facilitado a vulgarização de mapas. Por outro, os nascentes grupos mercan-
tis ibéricos perceberam que, se buscassem as especiarias no Oriente, não só barateariam o seu custo, visto que excluiriam os intermediários (caravanas que vinham por rotas terrestres e revendedores italianos), como também romperiam com o secular monopólio do comércio mediterrâneo e poderiam trazer mercadorias em maior quantidade. Portugal foi o pioneiro da empresa navegatória. Formado a partir de um feudo retomado aos mouros, neste
país formou-se, com a ascensão da Dinastia de Avis, uma estreita aliança entre o Estado e os grupos mercantis (1385). Desde
o séc.
XIII fora abolida a vinculação obrigatória do
servo à terra. Ademais, tradicionalmente,
Portugal tirava ri-
quezas do mar, especialmente o sal e o pescado. Compelido a se expandir, premido entre a Espanha e o oceano, tomou 14
av:
ue ug rt po os , ca ri Áf na pé o ar nc fi Ao . mo ti úl o rumo deste
de cana es çõ ta an pl às ra pa os av cr es ar sc bu ses trataram de das ilhas atlânticas. e 34 14 e tr En a. ut Ce m ra ma to s so lu os , Em 1415
alà os oc rr Ma do ia e qu ra ei st co a ix fa a 1444, percorreram é in Gu até m ra fo , 60 14 e 45 14 e tr En e. rd tura de Cabo Ve
a o, bã Ga o m ra gi in at , 74 14 e 01 14 e e Serra Leoa e, entr sde , is ma o nd ça an Av . ro Ou do a st Co a e Costa do Marfim O , as Di eu om ol rt Ba m co e, o ng Co rio cobriram a foz do ta ro a do an iz il ut , 98 14 Em . 8) 48 (1 a nç ra Cabo da Boa Espe às ou eg ch ma Ga da o sc Va , as Di eu om ol rt descoberta por Ba
etr en os e nt me ta re di r gi in at mo co u lo ve re Índias e assim
, ro ei il as br l ra to li do e ss po de da ma to A e. postos do Orient na ta si lu o çã bi am da o ri lá ro co o ser a io ve , is dois anos depo
. ia Ás a ra pa a ic nt lâ at ta ro da le ro nt co o r ra gu se as de
s no a ad ic at pr na pi ra da e io rc mé co do s to en ov Os pr r a outros continentes, longe de servirem para capitaliza er nt ma ra pa am ír bu ri nt co as en , ap sa ue ug rt po ia econom a um de xo lu o o nd ta en st , su da ra pe su al ud a fe ur ut tr uma es ens co a nc nu no ta si l lu ti an rc me o up gr a. O ri tá si ra pa e rt Co quiu evoluir para uma classe tipicamente capitalista e, com a implantação de um sistema colonial e mercantilista, também ele se tornaria parasitário e, sem condições de investir, acabaria se perpetuando à custa de benefícios extorquidos no ultramar. O caso da Espanha
Ao longo de toda a Idade Média, o que hoje é conhe-
cido como Espanha foi um território penosamente reconquistado à dominação islâmica, principalmente a partir da vitória cristã de Las Navas de Tolosa (1212). No correr do processo, no entanto, acumularam-se complexidades que tornaram singularmente confuso o quadro geral.
O grande elemento complicador era a permanente
ri-
validade dos dois mais importantes reinos cristãos — Aragão, por muito tempo mais integrado com o mundo econômico
e político do Mediterrâneo do que com o resto da Península Ibérica,
e Castela.
Este chegou
S
a se aliar a Gênova
contra
Aragão
e até a invadi-lo em quatro ocasiões, entre 1356 e
1364. O famoso casamento de Fernando de Aragão e Isabel de Castela não chegou a transformar a Espanha absolutista num Estado completamente centralizado. Diz Leon Pomer que o poderoso Filipe Il mandava mais em Castela e na América do que em Aragão, cuja autonomia era obrigado a
respeitar. Ainda
no séc. XVIII,
o monopólio do comércio
com o Novo Mundo não era acessível aos mercadores da Catalunha aragonesa. Chega a ser curioso registrar que, em pleno apogeu do absolutismo espanhol, Aragão tinha exército e justiça separados de Castela. Tropas de Castela não podiam cruzar as fronteiras de Aragão e nem castelhanos aí poderiam ocupar cargos públicos. Em Castela, à medida que espaços foram sendo reconquistados aos mouros, instalou-se um feudalismo que apresentava certa flexibilidade, estranha ao resto da Europa. A necessidade de conscrever os camponeses para o serviço militar permitiu-lhes, em contrapartida, certos direitos, inclusive o de trocar de senhor. Ademais, houve um processo de aproximação entre a monarquia e a burguesia, embora posteriormente ficasse claro O caráter meramente circunstancial de tal aliança. De qualquer forma, completada a expulsão dos muculmanos, o novo Estado espanhol formado por Aragão e Castela caracterizou-se por um absolutismo precoce e inacabado: não integrou os mercados e acentuou o exercício do poder pessoal sobre um país que persistiu sendo uma colcha de retalhos de privilégios regionais. E a ordem aristocrática retrógrada impôs-se a uma frágil e mal consolidada classe burguesa. O fisco interno e ultramarino foi usado largamente para sustentar o luxo estéril de uma vasta camada parasitária, formada pela alta burocracia, pelo clero (25% do povo espanhol, segundo Darcy Ribeiro) e pela nobreza,
Através dos metais preciosos da América, a Espanha pagou
suas importações de artigos manufaturados do resto da Europa, o que liquidou de vez com o segmento produtivo da burguesia espanhola, sobrevivendo apenas a que se dedicava à usura. Rígido, intolerante, exclusivista e espoliador, o absolutismo espanhol viveu mais da suntuosidade externa
16
qto
na do ci er Xe ex o m s i l o p o n o m O rna. te in ia ác ic ef a su de e qu do s da o m s i t i s a r a p do da ti trapar n co a a er a l o h n a p s e a Améric . s a n a t i l o p o r t e m s e t n a n i m o d classes do o t n e m a n o i c n u f o n e t n Um papel muito importa
ta lu A . ja re Ig la pe do ha en mp se de foi absolutismo espanho! in-
a u to en im al , al ud fe e ca ti lí no contra os mouros, que era Es do s õe iç u it st in às ia ar or rp tolerância religiosa que se inco CO O u no eg pr im e nt ta li mi e tado. Um catolicismo fanático
nme ga on ol pr um e a ad uz cr de to ri pí tidiano nacional do es e 2) 49 (1 us de ju de ão ls pu ex r io er st po to nefasto disso foi a a o, -l zê fa Ao . ja re Ig da s ão nç bê as mouros (1609), com ar rn to , al ci ra o çã ra pu de da s vé ra at monarquia pretendeu, um mo co es ud it at s tai do an ic if st ju a, se sólida e homogêne nhum Ne s. éi fi in Os ra nt co ta lu da co gi ló o nt me ga prolon . Em ão ix pa a nh ma ta m co o sm ci li to ca o u ve vi u pe ro país eu
l ua ns se se ta êx m co u di un nf co se fé a a, il Áv de za re Te a Sant
suítas, je s do m de or da or ad nd fu , la yo Lo de io ác In o nt e Sa ta lu em to ci ér ex ro ei ad rd ve um de to ri pí es a no umo plas or exlh me A ”. as ev tr s da go mi ni “i o ra nt co te en an rm pe pressão da influência retrógrada deste catolicismo exacer es bado foi a Inquisição, que acompanhou os conquistador da América e serviu de cobertura ideológica para a espoliação e o genocídio, apesar das vozes enérgicas, mas dissonantes, como as de Las Casas e outros. Na América, a ideologia religiosa deu respaldo à ordem colonial e na Europa sustentou a luta contra o emergente capitalismo anglo-francês. A Espanha foi, de fato, o
último baluarte medieval da Europa. O repúdio ao progresso tornou-se tal que o exercício de atividade manufatureira era vedado a quem possuía título de nobreza. O latifúndio aristocrático
improdutivo,
a repressão clerical e a hipertro-
fia burocrática determinaram a fisionomia do país. Tal como em Portugal, os metais preciosos e riquezas da América tão-somente puderam ser utilizados para o desperdício de uma minoria ociosa e estéril. A chocante opulência da arte barroca naquela Espanha
estruturalmente pobre revela ao estudioso que a riqueza só se transforma em capital e investimento produtivo quando TM
Ma
17
ocorrem condições prévias para isso na organização social existente. Tal não foi o caso espanhol. Por isso, os metais americanos apenas reforçaram o parasitismo de uma sociedade estagnada. Com o tempo, o contraste entre esbanjamento
e miséria
tragédia nacional.
18
evoluiria
ao ponto
insustentável
de
uma
|I. A conquista Inícios da penetração espanhola Em 1492, Cristóvão Colombo partiu do porto de Palos, Espanha, para uma expedição que, tomando o rumo do Ocidente, pretendia atingir as Índias do ouro e das especiarias. Alguns aristocratas da Andaluzia, um banqueiro, o governo de Castela e o próprio Colombo financiaram a empresa, organizada pelo tesoureiro de Fernando de Aragão. Eram tempos de euforia pela retomada de Granada aos mouros e também de intensa atividade para um dominicano que estava reorganizando a Inquisição, Tomás de Torquemada. Colombo fez quatro viagens à América, esperando, como seu ídolo, Marco Polo, encontrar o Grande Khan da China. Jamais o encontraria, por duas razões mais do que óbvias. Primeiro, porque chegara a um mundo até então des-
conhecido da Europa e não à Ásia. Segundo, porque o ge-
novês ignorava que, desde 1367, mudara na China a dinastia
reinante. A consequência imediata das viagens de Colombo foi a formação de uma comunidade espanhola em 5. Domingos que, no afã de enriquecer logo, provocou o rápido extermínio da população indígena local. Em 1493, para se evitar a disputa entre as duas grandes potências marítimas de então — Espanha e Portugal — o Papa Alexandre VI, autoridade internacional reconhecida na época, fixou um meridiano a 100 léguas das ilhas de Cabo Verde (Bula Inter Coetera), determinando que as terras a oeste seriam espanholas e a leste portuguesas. O Tratado de Tordesilhas, em 1494, alterou o decreto papal e passou a linha demarcatória de 100 para 370 léguas, o que, na prática, representou ceder o litoral brasileiro aos portugueses. Perante tal atitude do Papa doando terras, observou um chefe índio, que não entendia de interesses comerciais e nem de direito internacional, que este “devia estar bêbado, já que se pôs a repartir o alheio”. As capitulações de Santa Fé A iniciativa privada foi a forma encontrada pela Coroa de Castela para que a tomada de posse do Novo Mundo não implicasse muito Onus para o governo. Aventureiros interessados
na
empresa
poderiam
contratos
assinar
com
a
monarquia para realizar explorações. Assim nasceram as chamadas capitulações. O primeiro contrato no gênero foi o das Capitulações de Santa Fé, feitas entre Colombo e Castela. As Capitulações de Santa Fé possibilitaram a descoberta da América, apesar de caracterizarem
um
acordo am-
bíguo e marcado por duplicidades. Ao ceder direitos a Colombo, a Coroa não poderia imaginar a extensão dos interesses em jogo. Por isto, a falta de recursos do navegador e
as ambições de Castela terminaram por afastar o genovês, que, em 1506, morreria pobre e esquecido em Valladolid. As capitulações posteriores, assinadas pela Coroa com outros
aventureiros,
mostram
que
ela
aprendera
com
a
experiência de Colombo: os novos contratos deixavam claro seu caráter temporário. Iniciava-se, assim, a chamada fase da
20
E MAS
lo de tu tí o m co os id st ve in os ir re conquista, na qual aventu máo m co o an ic er am te en in nt co O adelantados devassaram de e ad rd be li me or en a su r po ximo de avidez permitido
de ão iç os sp an tr a u to en es pr re do ação.O título de adelanta nní Pe da a st ui nq co re da os mp te uma autoridade típica dos
e, ad rd ve Na o. nd Mu vo No O ra sula Ibérica aos mouros pa er o ir re tu en av um de se aav at no continente americano, tr
traço um m, ré po a, vi Ha o. tr ou do o rs ve rante e pioneiro, di em ão gi re a um de e t n a d n a m o c O o nt ta comum entre ambos:
do n u M vo No do or ad or pl ex O o m o c luta contra os mouros e s re de po os pl am de s da ni mu s, te an eram autoridades dist o ra pa ad st ui nq co mcé re o d n u m um de situadas na fronteira o cristianismo. urb tu e a ic qu ár an se fa m à ra ce en rt pe es As capitulaçõ va terra. no o na ic ér mo ib is al ni lo co o do çã ta an pl im lenta da
, as ez qu es ri nt ce es o cr nd la ve re a i fo st ui nq co a e qu da di A me
e qu a o d o , m de em ag lh pi m na de or r pô u a di ci de a se ro a Co ntes ta ns co os cr se lu is nt ra a ga ic e át em st se si as rn to se ela do O ra au st s in i vo fo ti je ob es ss de me no o. Em rn ve go o ra pa regime monopolista, que substituiu O aventureiro pelo funcionário e o massacre arbitrário dos nativos pelo genocídio civilizado nas minas e nas plantações.
Da sondagem à conquista Segundo Pierre Chaunu, deve-se distinguir as explorações iniciais da América Latina da conquista propriamente
dita, iniciada em 1519. Colombo, Américo Vespuccio, Ponce de León e Vasco Nunez de Balboa pertenceram à fase das sondagens, ao passo que Cortez, Alvarado, Pizarro e Alma-
gro foram vultos da conquista. Entretanto, tais marcos cronológicos não devem ser tomados demasiadamente ao péda-letra. Na época das sondagens, a dizimação dos nativos que não se ajustaram ao interesse espanhol de plantar cana ou minerar ouro na Hispaníola foi um típico episódio de conquista, ao passo que, já na fase da conquista, ainda ocorreram expedições de sondagem, como as de Panfilo de Narvaez à Flórida (1527) e Francisco Orellana pelo rio Amazonas, no atual território brasileiro
MIBLIOTECA PUBLICA MUNICIPAL Pe.
A
AT
"IDC
MARCON
ROSA
- RS
21
Na fase de sondagens, destacam-se as viagens de Alon-
so de Ojeda e Juan de La Cosa (norte da América do Sul, 1499), Yaniez Pinzôn (Maranhão, foz do Amazonas, 1499-
1500), Corte Real (Labrador, 1500), Sebastião de Ocampo (circunavegação de Cuba, 1500), Nuriez de Balboa (Oceano Pacífico, 1513), Ponce de León (Flórida, 1513), Juan Diaz Solis (Rio da Prata, 1516) e Fernão de Magalhães (circunavegação da Terra, 1519-22). Posteriormente, ainda devem ser lembrados
Pedro
de Mendoza,
que tentou, sem sucesso, Aires; Martinez de lIrala, fundador de Assun-
fundar Buenos ção; e Pedro de Valdívia, conquistador do Chile e fundador
de Santiago (1541). A colonização do Prata está relacionada estreitamente com o problema estratégico do acesso às minas do Peru. Quanto à conquista do Chile, deve-se destacar a feroz resistência dos índios araucanos, que vitimou o próprio Valdívia (1553). De todos os navegadores e exploradores do Novo Mundo, um, pelo menos, será sempre lembrado: o que lhe deu o seu nome — Americo Vespuccio. Agente dos Médicis e renascentista culto e refinado, como convinha a um florentino, Vespuccio descreveu, sem se horrorizar, a ma-
tança de índios nus por conquistadores cristãos. Em suas seis viagens à América, ele constatou que Colombo chegara
não ao extremo das Indias, mas a uma terra completamente
desconhecida. Foi com base nas informações daquele incansável viajante que Martin Waldseemiúller fez, em 1507, os mapas
do que chamou “Terra Americi”.
de “'a quarta parte do mundo”
—
a
As brutalidades da conquista A necessidade de cristianizar os nativos e tirá-los do estado natural, aproximando-os de Deus pelo caminho da civilização, foi o principal componente ideológico da con-
quista.
Minimizar
este aspecto significa não compreender
devidamente o quanto os interesses de classe precisam ocul-
tar-se
atrás de uma ideologia justificadora. Contudo, se a ideologia da cristianização é um elemento fundamental da
conquista, 22
elemento AS
que deita suas raízes, como se referiu
tt!
[o
antes, no durante a nhou um ber que a
longo processo de formação do Estado espanhol! luta contra os mouros, na qual a Igreja desempepapel de extrema importância, é essencial percevoracidade espanhola — e européia — pelo ouro
representa o outro lado da moeda. Somente a junção desta voracidade, gerada pelo beco sem saída em que se encontra»
a vam as elites aritocráticas decadentes da Espanha, com visão salvacionista (Darcy Ribeiro) pode explicar a fúria dos conquistadores. Há uma tendência na recente historiografia latinoamericana de realçar a brutalidade da destruição das culturas indígenas, de modo a resgatar o nativo e fazer a devida crítica do estereótipo do herói conquistador. Isso não ocorre por acaso. Em primeiro lugar, as novas abordagens do problema têm se orientado no sentido de vê-lo no âmbito da expansão do capital comercial, que implica desmistificar a crueza dos interesses em jogo. Em segundo lugar, a América Latina vive uma fase em que suas forças progressistas estão comprometidas na luta contra a dominação e a espoliação: parte dessa luta é desmistificar a conquista e, desse modo, situar as origens do processo espoliador. Em resumo, expor as realidades brutais da conquista, apesar no tempo,
de já distante
uma
torna-se
tarefa
incorporada
à construção de uma consciência libertadora. Contudo, é interessante observar que transformar a história da conquista em
instrumento
aparências,
de
denúncia
não
chega
a ser, apesar
das
algo novo: significa atualizar a leitura daquilo
que, já no séc. XVI, Bartolomeu
de Las Casas tinha escrito
sobre o genocídio indígena. O processo de conquista dos grandes núcleos civilizatórios da América indígena de então — México e Peru — foi traumático e fulminante. No México tudo começou quando o fidalgo Hernán Cortez dirigiu-se a Cuba em busca de riquezas, como outros de sua classe. Apesar de perseguido pelo governador cubano, Velásquez, Cortez penetrou no planalto de Anahuac, no México, com poucos homens, al-
guns cavalos, armas de fogo e canhões. Seu lugar-tenente, o truculento Alvarado, ainda na ilha de Cozumel, a nordeste AN
À
,
e
aa
de Yucatán,
principiou
a massacrar
indigenas, enquanto
o
padre Olmedo fazia alguns batizados: a civilização estava chegando. Na Quinta-Feira Santa de 1519, Cortez atingiu a baía de San Juan de Ulloa e logo entrou na capital do império azteca, cujo monarca, Montezuma, reinava há dezessete anos. O conquistador obteve o inesperado apoio de totonecas e tlascaltecas, inimigos jurados dos aztecas. Enfrentando
uma série de problemas, como o temor de que Velásquez enviasse uma expedição para prendê-lo e o desânimo que tomava
conta
de seus comandados
em
virtude da umidade,
das formigas, dos mosquitos e do calor, Cortez,
para evitar
que seus homens quisessem voltar, foi obrigado a queimar os navios. Finalmente, em agosto de 1521 os aztecas foram derrotados em definitivo e sua capital, Tenochtitlan, destruída. O saque incluiu uma enorme esmeralda que Cortez mandou para seu soberano, Carlos V, mas que, roubada por um corsário francês, foi parar no meio das riquezas do rei Francisco |. Os metais preciosos, que não passavam de adornos e objetos de culto para os indígenas, se transformaram na base da política mercantilista espanhola. Tendo sido destituído de suas funções por causa de intrigas, em 1526, Cortez morreu em 1547, com o título de marques. A partir da revolução mexicana de 1910, o seu nome se tor-
naria execrado como parte de um amplo repúdio à opressão estrangeira e consequente exaltação dos valores nativos. Conquistado o México, a posição central do império de Montezuma acabou favorecendo o envio de expedições em várias direções. Para o norte, foram Ulloa, Guzmán, De Soto e Cabeza de Vaca. Para o sul, foi Alvarado, que encontrou, na Guatemala, os remanescentes da mais antiga e brilhante civilização americana — a dos maias. A conquista do Peru não foi muito diversa. Persistente como Cortez, Pizarro não era, como ele, um fidalgo erudito, mas um analfabeto, quase um marginal. Já com cerca de
cinquenta anos, aliou-se ao também ambicioso e inescrupu-
loso Almagro e, firmadas as bases de um acordo com a Coroa, partiu para a conquista do Peru, em junho de 1529. Em
1531, com 180 homens e 27 cavalos, iniciou sua epopéia.
s do as rn te in es sõ vi di às s, ca te az s Tal como no caso do r do ra pe im do os lh fi is do Os s. incas ajudaram Os espanhói a di si re r ca as Hu r: de po o am av ut inca, Huayna-Capac, disp e ou ot rr de a lp ua ah At a. rc ma ja Ca em Cuzco, Atahualpa em da o tã en e ub So o. zc Cu e br so u eliminou O irmão e avanço s, vé in Ao a. rc ma ja Ca am ar up oc vinda dos estrangeiros, que il út in a io me Em e. -s eu nd re o, porém, de resistir a Pizarr ri ap a, lp ua ah At . os ad id uc tr m resistência, os índios fora acabou s ma , os ur so te em e at sg re so en im sionado, pagou Contua. ad in rm te va ta es a st ui nq co a , 33 15 assassinado. Em manesre s ca in os c, pa Ca onc Ma r po s do ra de li do, em 1537, ando qu , 72 15 em da ca fo su só ão li be re a um m ra ia centes inic onc Ma de or ss ce su u, ar Am cpa Tu am ar ut ec ex s os espanhói Capac. a u io ic in e qu o, gr , ma es Al or ad st ui nq co s ao to Quan o nd te o, rr za Pi m co to li nf co em ou tr en e, il Ch do ão ocupaç sido vencido e morto em 1538. Pizarro, por seu turno, acaor ad rn ve o, go al nz o Go mã ir u se . O 41 o 15 ad em in ss sa bou as de Quito e explorador do Amazonas, assumiu o governo do Peru até ser destituído e executado em 1548, por ordem de Carlos V. Conclusões Um aspecto instigante no que diz respeito ao processo da conquista é a questão de como foi possível que tão poucos europeus subjugassem povos tão numerosos e adianta-
dos como incas e aztecas? Eduardo Galeano enfatiza a supe-
rioridade tecnológica dos conquistadores (arcabuzes, canhões e cavalos). Leon Pomer observa que isso não foi tão importante, argumentando, inclusive, que sô um terço dos
espanhóis que entraram em Cajamarca montavam cavalos. Segundo este autor, o mais importante foi o conteúdo fatalista das religiões nativas que, com seu presságio de invasores vindos do mar, paralisaram a resistência do povo. Por outro lado, os espanhóis foram auxiliados pelas divisões internas dos indigenas: tlascaltecas e totonecas ajudaram Cor-
tez contra os aztecas, assim como a disputa Huascar-Atahualpa beneficiou Pizarro.
É preciso registrar aqui que as civilizações inca e azte-
ca tinham atingido um alto nível de centralismo político quando chegaram os conquistadores, o que significa que as massas nativas estavam condicionadas a obedecer passivamente a suas elites. Isso facilitou a tarefa dos espanhóis: bastou que se colocassem no lugar dessas elites e apresentassem o rei Carlos V como substituto dos imperadores locais. Em contraste com a relativa passividade das civilizações mais adiantadas, as tribos mais atrasadas, como os araucanos e seu líder, Lautaro, ofereceram feroz resistência à conquista. Por quê? Diz Pomer que, não tendo formado um império, não possuíam religiões que vinculassem a guerra a uma vontade superior dos deuses. Isto é verdade. Contudo, pelo fato correlato de não terem uma estrutura de Estado, os araucanos não se haviam tornado uma massa amorfa e passiva. Em outras palavras, não bastaria à Espanha, para dominá-los, subjugar os chefes: ciosos de sua liberdade, nunca deixaram de lutar contra o invasor. As duas Américas: o paralelo necessário Há casos em que a comparação é um instrumento histórico de escamoteação ideológica. Um desses casos é aquele em que se estabelece um paralelo entre a conquista da América do Norte pelos ingleses e a da América Latina pelos espanhóis. O paralelo é apresentado nos seguintes termos: enquanto que na América Latina a conquista precedeu a colonização, na América do Norte se deu o oposto. Aqui, um punhado de aventureiros ávidos e corajosos, entre 1519 e 1550, devassou e devastou um continente, antes que a Metrópole plantasse uma estrutura colonial. Lá, tudo se iniciou com
um
grupo de pioneiros que, fugindo dos credores
e da intolerância religiosa, buscavam uma nova terra e um | novo lar. Essa diferença seria a causa mais profunda do diferente desenvolvimento das duas Américas. Argumenta-se que os espanhóis vieram para cá com o único objetivo de espoliar, ao passo que os colonos ingleses que se fixaram na América do Norte eram movidos por objetivos mais profun-
26
aul nc vi os e qu O , lar um r ra nt co en dos, como o de povoar e o nt me gu ar te an lh me Se a. rr te va va mais estreitamente à no s ça ra s da ” al ic op tr a ci ên ol nd "i — como o que insiste na lare em os ic ér ib es ís pa s do so ra at o mestiças e no progressiv duas e qu r po ar ic if st ju ra pa o id rv se m ção à Inglaterra — te e nt me va ti la re o ic óg ol on cr o od regiões, ao longo de um perí es. ar sp dí o tã os nt me vi ol nv se de am av nt idêntico, aprese
o çã za ni lo co e a st ui nq co de so es oc pr É verdade que o
to fa os tr ou m, ré po , Há s. do ri fe re s so foi inverso nos dois ca o nã e rt No do a ic ér Am na r, ga lu ro ei im res em jogo. Em pr foram
de
encontrados
início
ouro
e especiarias,
o que
à
tian rc me to ex nt co no e nt me ta ia ed im e -s ar teria feito integr lôco am ir rg su lá e qu de to fa o ou lt su re í Da lista da época. , onde na ti La a ic ér Am da o ri rá nt co , ao to en am nias de povo a fase , do la o tr ou r Po . ão aç or pl ex de as ni lô co am se formar o avanço — e rt No do a ic ér Am na a st ui nq co da r posterio ta pi ca o do çã ta an pl im a m a co ri di ci in rumo ao oeste — co nre fe di ia om on si fi a um ou in rm te de e qu lismo industrial, o , num caso to an et tr . En ão aç tr ne pe de so es oc pr o ri óp pr te ao como
houve uma
noutro,
consequência comum: o exterm Í-
nio da população indígena. fe di as e tr en lo le ra pa do o tã es qu l na ta en am O fund
er eb rc pe é as ic ér Am as du s da ão aç up oc de as rentes form is e ma ad id al re a um ar fl mu ca ra pa o id rv se m te e el o quanto a. tr ou a e br a so ic ér Am a um o de çã na mi do da , a da profun ira s ja s cu ma le ob pr je ho ve vi na ti a La ic ér Am a e qu o Clar zes estão em grande parte na forma que assumiu a coloniza ção. E o maior problema é justamente o que decorre da so dependência estrutural que foi parte integrante do proces colonizatório, dependência esta perpetuada até hoje, embo-
ra como fenômeno transmutado ao longo do tempo. Atualmente, o maior beneficiário da histórica dependência latinoamericana são os Estados Unidos da América do Norte. Insistir, portanto, na origem colonial dos males do continente latino-americano, sem articulá-los com as responsabilidades da potência dominadora atual, significa emprestar ao con-
texto social sul-americano uma dose de fatalismo histórico que se reforça ainda mais na comparação com a “outra
C
x
a
,
217
América”.
Em tal caso, o paralelo com a América do Norte torna-se um instrumento de realimentação de um complexo de inferioridade, pois escamoteia o papel da grande potência do Norte como parte integrante e cúmplice nas misérias da América mestica.
A religião dos conquistadores Como foi visto, a vontade de expandir a fé cristã foi a base ideológica da conquista. Os padres, invariavelmente,
acompanhavam
os aventureiros. Inclusive é interessante reo Brasil, de um ponto de vista puramente for-
gistrar que mal, não foi descoberto por Portugal mas pela Ordem de Cristo, presidida pelo rei, e sucessora, naquele país, da extinta Ordem dos Templários. Foi sob sua bandeira que Cabral navegou. Os entes encontrados no Novo Mundo eram, de fato, seres racionais? Aplicavam-se a eles os chamados “direitos naturais”? Este assunto foi muito debatido na época. A idéia de que até a força era um instrumento legítimo de conversão deu origem a perigosas ambigiiidades. A violência empregada para converter o nativo e para obrigá-lo a trabalhar para o branco confundia-se de maneira conveniente. Segundo a visão corrente de então, tirar o índio da “barbárie” e levá-lo à “civilização” era parte da missão sagrada de conduzi-lo a Deus. Neste sentido, era natural considerar
justa
a guerra
contra
as tribos
refratárias
à conversão.
Assim, a violência — e até o genocídio — se apresentava como plenamente desculpável aos olhos de Deus. Tal política nada mais era que o prolongamento do espírito de cruzada, forjado nas lutas contra os mouros na Península Ibérica. A síntese entre o desejo do colonizador de usar a mão-de-obra indígena e sua tarefa cristã de convertê-lo foi a encomienda, um sistema em que o nativo pagava o trabalho de conversão por meio da prestação de serviços nas minas e
terra do seu — assim chamado — protetor. Diante da ques-
tão do relacionamento índio/colono, a Coroa espanhola nunca conseguiu uma definição plenamente satisfatória. Por
28
lado, sabia que a riqueza do Novo Mundo dependeria
AM
= dd=
um
Merss.
teo, tr ou por e, s na ge dí in dos o ad rç fo ho al ab tr muito do sse vie s ele e br so s no lo co dos le ro nt co o iv ss ce ex mia que um a ser politicamente perigoso. opl ex a ra nt co ios índ s do or ns fe de e nt ha il br s O mai
eu om ol rt Ba no ca ni mi do e ng mo o foi io ín rm te ração e o ex ter em s vo ti na os r pa ru ag de ia idé a e tev Ele as. de Las Cas aesp os o nd za ni de in , os ri óp pr si a par em ss ha al ab tr ras onde assim am er a, tic prá Na o. id uz od pr e nt de ce ex o m co is nhó
do trabalho direto para O colonizador, que os extinção, e, simultaneamente, tornavam-se triCoroa. Admitindo, inicialmente, a importação negros para resolver o problema da mão-deobra, em lugar do índio, Las Casas, posteriormente, arrependeu-se dessa sugestão. De qualquer forma, ficou na histôria como o primeiro grande defensor histórico das etnias
preservados condenava à butários da de escravos
espoliadas do novo continente. Na bula Sublimis Deus, o Papa Paulo Ill pronunciou-se a favor da tese que defendia a existência de alma nos índios. Esta decisão, porém, em nada alterou a situação deles, tanto mais que Roma não se ocupou muito do assunto, absorvida que estava pelo problema mais próximo e urgente da Reforma. Para todos os efeitos práticos, a definição do assunto reforçou a “missão civilizadora”” da catequese, da qual se ocuparam, a partir de meados do século XVI, os jesuítas. Instrumento de escamoteação dos verdadeiros propósitos de conquista, o discurso religioso viabilizaria, nos séculos seguintes, a dominação e a espoliação, funcionando como amortecedor das vontades e das consciências. À situação apenas começou a alterar-se a partir da segunda metade do séc. XX,
quando
parte da
Igreja começou
a revisar profun-
damente suas posições e, até mesmo, a colocar-se decididamente ao lado dos setores populares. Ao longo de toda a história da América Latina, a civilização européia cristã foi o Calvário do indígena, tornandose sinônimo de destruição física e cultural. O nativo foi forcado ao trabalho num sistema de lucro imediatista, que não
fazia parte de suas tradições, e perdeu suas terras, sendo também despojado da memória e da dignidade e encaixado
.
DT
29
numa hierarquia de opressão e exploração. Mais ainda, uma população de 80 a 100 milhões foi dizimada pelas doenças, que foram outras tantas misérias que o branco trouxe consigo — a lepra, a sífilis, o tifo, a varíola e as cáries. Doencças que geralmente acompanham a fome e a falta de condições sanitárias.
Como
coroamento
de
tudo,
o colonialismo
se
autojustificou com a implantação da ideologia racista, eficiente instrumento ideológico de degradação social.
ROTAS DAS GRANDES NAVEGAÇÕES MARITIMAS (Séculos XV e XVI)
Cd
Ú
OCEANO
LANT
o)
ÁSIA
EUROPA
aa
6º
>
ÍNDIA 2h
/
NV
PACÍFICO OCEANO
A “ATLÂNTICO
E
E
aa
Pos
«12 Viagem de Circunavegação Descoberta do Brasil
30
í
OCEANO
TE
DE gate
W
—
OCEANO
0
DO
$
Gg:
Ca,
“ai
É
A
ee
..cccesscemeneemecemereneensarsaseems e
a
e
EA
IV. A organização da conquista Os órgãos administrativos metropolitanos Os três séculos da América Colonial hispânica apresentam-se como uma longa — e, muitas vezes, corrupta e ineficaz — rotina burocrática. A turbulência anárquica dos conquistadores foi aos poucos substituída pela disciplina centralizadora dos administradores. Transformados em empresários coloniais, os conquistadores pretendiam continuar auferindo, sem controle, os lucros de uma rapina sistemática. Para evitá-lo e, desse modo, assegurar os ganhos da Metrópole, através da implementação das práticas mercantilistas, a Coroa deslocou para o novo continente um enorme exército de funcionários, burocratas que não precisaram do heroísmo e imaginação dos primeiros aventureiros. Organizando a exploração e a violência, o governo espanhol encerrou a era do aventureirismo no Novo Mundo. A
Espanha,
tarefas ao mesmo
na
época,
tempo:
teve que enfrentar
organizar
internamente
duas
novas
o Estado
nacional e externamente um Império colonial. Esta segunda tarefa concluiu-se entre 1550 e 1600 e privilegiou as áreas de mineração e maior concentração demográfica. No conjunto, montou-se uma administração que refletia, inevitavelmente, a matriz castelhana, já que foi Castela a maior beneficiária dos frutos da conquista. A Casa de Contratacción (de 1503, com sede em Sevilha e, a partir do séc. XVIII, em Cádiz) eo Consejo Indias (de 1524, originado da Junta de Las Índias, em 1518) foram os primeiros e mais importantes administrativos criados pela Espanha para tratar dos
de Las criada
Orgãos assuntos coloniais. O precoce surgimento da Casa de Contra tacción — antes mesmo da conquista do México e Peru — evidencia claramente a preocupação em preservar o quinhão real da cobiça dos aventureiros: a tarefa precípua do órgão era fiscalizadora e, portanto, de combate ao contrabando. Competia-lhe contar e registrar minuciosamente as riquezas
que vinham das Índias.
Supremo órgão da administração colonial, o Consejo de Las Indias era constituído de um presidente (o primeiro foi o Frei Garcia de Loaisa, confessor de Carlos V), quatro ou cinco conselheiros, um fiscal, um relator, um chanceler, um vice-chanceler, um oficial maior, um oficial de contas, vários escrivães, um advogado, um procurador dos pobres
(cargo instituído em 1536), um porteiro e um representante em Roma para tratar dos assuntos do Patronato Régio. Originalmente, competia ao Consejo de Las Indias instruir os funcionários, controlar a administração, atuar como tribunal de apelação e fazer leis para a América, a partir dos códigos de Castela. No tempo de Filipe |I (1556-1598), a Casa de Contratacción e o Consejo de Las Indias sofreram algumas mudan-
cas. A Casa de Contratacción perdeu as funções comerciais,
restringindo-se às fiscais, obrigando-se à subordinação hie-
rárquica ao Consejo de Las Indias e, posteriormente, ao Consejo de la Hacienda de Castela. Quanto ao Consejo de Las Indias, aumentou o número de seus funcionários e a
ingerência real em seus assuntos internos (através da subor-
32
RT
MAN:
óprio pr ao te des e a tel Cas de o ej ns Co ao o gã ór do o çã dina ões nç fu as eu rd pe ias Ind Las de o ej ns Co o da, ain rei). Mais oed pr o tiv ica nif sig um ter a ou ss pa e s ia ár nd ze fa e militares
e foram set o, oit (de a ci ên id es pr na s sta ali eci esp mínio de busao II, ipe Fil o ad fi on sc de O e, ad rd ve Na . os) jurisconsult
ou ab ac a, ui rq na mo da ar ul ac nt te o sm li ra nt ce o ar car reforç
sudo e ud it pl am a e a ci ân rt po im a e nt me va ti la re do an zi esva ain ag im a for mo co tal al, oni col vo ti ra st ni mi ad ão órg o nrem do por seus criadores. Os órgãos administrativos coloniais: vice- reis, capitães gerais e governadores O vice-rei era a maior autoridade executiva na América Colonial hispânica e o símbolo concreto da onipresença monárquica. Evidentemente, os primeiros vice-reinos surgiram nos antigos impérios azteca e inca: o da Nova Espanha, incluindo México e atual oeste dos Estados Unidos, em 1535, e o do Peru,
incluindo Bolívia, Equador e Colômbia,
em 1541-42. No séc. XVIII, foram formados mais dois: o de Nova Granada — Panamá, Colômbia, Equador — e do Rio da Prata — países platinos e mais a Bolívia. Escolhido dentre a nobreza, o vice-rei possuia uma autoridade tão grande quanto o medo que dela tinha o longínguo monarca espanhol e que o levou a multiplicar os artifícios para limitá-la, mesmo em prejuízo da eficiência burocrática. As funções do vice-rei eram militares, judiciárias — como presidente da Audiência sediada na capital, embora não possuísse direito de voto — fiscais — como membro do Tribunal de Contas — financeiras — como presidente da Junta da Fazenda Colonial — religiosas — como de suprema
autoridade da Igreja das Indias — e administrativas — já que
lhe competia distribuir repartimientos, ditar ordenanzas, doar terras e outras tarefas. Legalmente, o poder do vice-rei era limitado pelas Audiências. Além disso, ele não podia legalizar heranças ou conceder privilégios para criação de conventos e igrejas. Periodicamente, o vice-rei estava sujeito à inspeção de juízes visitadores. Do ponto de vista prático, as maiores limitações
ME
33
à sua autoridade foram as distâncias, as dificuldades dos meios de comunicação e o crescente poder de uma aristote eli a a ari rub der po, tem ido dev no , que al, loc a oll cri cia cra burocrática peninsular dos chapetones. Além dos vice-reinos, também havia as Capitanias Generales da Guatemala — toda a América Central, exceto O Panamá —, Cuba — Caribe e Flórida —, Venezuela e Chile. E as Gobernaciones, com seus governadores, cujas funções incluíam ministrar a justiça em nível local e primeira instância. Localizados nos pontos estratégicos mais expostos do
império espanhol, os capitães-gerais tinham funções prioritariamente militares.. Lembravam os primitivos adelantados em sua tarefa de garantir a presença da Coroa nos rincões mais distantes. Os órgãos administrativos coloniais: as audiências Pierre Chaunu observou que as circunstâncias fizeram dos órgãos administrativos coloniais entidades mais poderosas do
que
suas congêneres
metropolitanas.
Tal foi o caso
das Audiências, tribunais criados na Espanha pelos Reis Católicos e que, transplantados para a América, tiveram atuação mais ampla do que simplesmente na esfera judiciária. Primeiro, porque o rei estava longe. Segundo, porque, a serviço do próprio rei, fiscalizavam os vice-reis, funcionando, ao mesmo tempo, como um Conselho de Estado para eles. Terceiro, porque o gigantismo burocrático, em regiões tão vastas, provocava necessariamente um acúmulo de serviço. Símbolo da justiça real onipresente, a Audiência eventualmente chegou a ter o encargo de substituir o próprio vice-rei. A importância da Audiência sempre estava em conexão com
a região onde
foi instalada
e sua localização era
condicionada a critérios de concentração demográfica e importância econômica. A tarefa de presidi-la era da maior autoridade local — o vice-rei, governador ou capitão-geral. O número de ouvidores dependia da importância da Audiência
e
todas,
em
Consejo de Las Indias. 34
princípio,
acer:
estavam
subordinadas
ao
ram: fo a ic ér Am na s da ia cr as ci ên di Au is As principa eat Gu , 2) 54 (1 ma Li , 9) 52 (1 co xi Mé , Ss. Domingos (1526) s ca ar Ch , 9) 54 (1 tá go Bo , 8) 54 (1 a ar aj al mala (1543), Guad os en Bu e 9) 60 (1 e il Ch do go ia nt Sa , 3) 56 (1559), Quito (1 iér Am da ra Fo . e) nt me ia ar or mp te u no io Aires (1661, func iFil s na a, ll ni Ma em a ci ên di Au a um ou al st ca, a Espanha in de e co xi Mé do de da Ci da as ci ên di Au pinas (1583). As io ma as te en am vi ob m ra fo — s no ei -r ce vi Lima — sedes de is do , en im cr ! de es ld ca al ro at qu s, re do vi -es: tinham oito ou fe he (c r yo ma il ac gu al um ), al in im cr um fiscais (um civil e rsos funve di e er ll ci an ch an gr de te en ni te um , a) ci lí po de cionários menos graduados.
as ir ib co u so vi a ci ên di Au a e qu a tu en ac bo Lo a Euláli arbitrariedades da fase da conquista e assegurar O controle soe nt me te en id s. Ev so is bm su in s e te an st , di os st s va io ór it bre terr que coibir os excessos não significava nenhum amor pela ên di Au A a. ro Co da os nh ga os ir nt ra ga as en ap s a ma ic just l na se ar os do nt me ru st s in te an rt po im is ma s do um foi cia administrativo de um governo o tempo todo voltado para um só objetivo — a eficácia do monopólio comercial.
Os órgãos administrativos coloniais: o sistema fazendário Como
já foi dito, a imensa babilônia burocrática mon-
tada pela Espanha na América tinha uma única finalidade: assegurar sua dominação. Para quê? Para que a Coroa — e as classes dominantes conectadas com ela — auferisse os lucros pretendidos. Como a Coroa obteria tais lucros? Através do sistema do monopólio comercial, assegurado pela máquina estatal. E, finalmente, de que forma poderia o monopólio comercial garantir à Coroa os ganhos que a fariam se interessar pela América? Por meio da coleta de impostos. Estas questões merecem ser tratadas um pouco mais amplamente.
Vice-reis, governadores, audiências, corregidores, arre-
cadadores de impostos comissionados, contabilistas e fiscais foram as principais autoridades fazendárias nas Índias. Inde-
finições de hierarquia e falta de unidade na administração Ps
2)
35
contábil eram alguns dos problemas mais sérios enfrentados pelo fisco.
Filipe | criou três Tribunais de Conta na Améri-
ca para obter maior eficiência na área financeira — em Los Reyes (Peru), Cidade do México e Santa Fé (Nova Granada). Os encarregados diretos da arrecadação de impostos eram
os chamados
oficiais
reais
(tesoureiro,
factor,
con-
tador, veedor) e mais os particulares aos quais era estendida tal licenca, o que levava a abusos. Com o que a Coroa não se incomodava, já que lucrava vendendo estes cargos. Era comum na Europa do Antigo Regime venda de cargos burocráticos e militares, prática que só terminaria depois da Revolução Francesa. Os principais impostos cobrados pela Espanha no Novo
Mundo
eram os seguintes: a/mojarifazgo,
sobre o co-
mércio interno — feito por via marítima'— e externo, averia, para custear a proteção dos galeões que faziam a rota
entre Espanha e América; a/cavala, (2% a partir de 1574) sobre a circulação de mercadorias e cobrada dos índios varões em estado de trabalhar: e quinto, cobrado sobre as minas, que pertenciam ao rei e eram arrendadas a particulares para efeitos de exploração. Minas, tesouros indígenas, rendas alfandegárias e monopólios reais do azougue, da pimenta, do sal e do papel selado se constituíram nas principais fontes
de renda do governo metropolitano. Eventualmente acrescidas de multas, empréstimos, donativos compulsórios (!) e confiscos. A atividade econômica que mais concentrou o interesse espanhol! no Novo Mundo foi certamente a mineração
dos metais preciosos — ouro e, principalmente, prata. As minas mais importantes foram as de Guanajuato, Zacatecas e Oaxaca no México e Potosí, no vice-reino do Peru. As minas de Potosí iniciaram um verdadeiro “ciclo da prata” para a Espanha, cujo auge se deu entre 1545 e 16010. De 1503 a
1660, a Espanha tirou, da América, 185.000 kg de ouro e nada menos de 16.000.000 kg de prata. No começo, as minas foram exploradas por funcioná-
rios régios. Posteriormente, passaram a ser divididas em minas ricas ou de nación — confiscadas pela Coroa — e ordina-
do o nt me ga pa te an di me , res ula tic par por as ad rias — explor a ar rb Bá e y le an St do. raí ext al met do % 20 é, o quinto, ist esenapr a vad pri ão aç or pl ex de s na mi as que am rv Stein obse co da ris o alt ao s ado lig s ma le ob pr te en em nt ue eq taram fr
mut fez que o o, gir de l ita cap de es ad empresa e às dificuld nme al in ig or que es nt ia rc me co dos le ro nt co tas passarem ao s, mai ao to an Qu . ra do ra ne mi e ad id iv at a te financiavam que luos tr ou e m ira fal que s na mi de s io ár houve propriet ras para ter de o çã si ui aq na ros luc os am ir st ve in craram e agricultura e pecuária.
al oni Col a ic ér Am na e ent vig o ic át cr ro bu O gigantismo con s sua de es ss pa im Os e nt me te en an rm pe hispânica viveu iadm a in qu má me or en a r ta en st su a Par as. tradições intern vez a cad ar br co a va ga ri ob se ol nh pa es o rn ve go nistrativa, o
ia ac cr ro bu a um de ava cis pre , los rácob a Par . os mais impost e xa le mp co s mai to an qu o, lad o tr ou Por or. cada vez mai
a, nav tor se ela s de au fr a el áv er ln vu e a ad rr pe em s vasta, mai
mco a par s mai da ain a -l iá pl am a o rn ve go o ava lev fato que ria ata pir e o nd ba ra nt Co . ias ênc ici def es nt ce es cr as pensar a ric ifé per e l dua ivi ind ão aç re de as rm fo as o nd se am ar acab mo e o siv res rep o at ar ap do s de da mi or en e s do an sm de aos nopolista implantado na América. O contrabando foi não apenas a reação clandestina às exações do fisco e que se locomovia por entre as brechas do sistema, como também uma decorrência da própria incapacidade da Espanha em abastecer suas colônias. Foi visto que os metais americanos inundaram a Espanha para alimentar o luxo das minorias mas não favoreceram o desenvolvimento
da
produção
—
pelo
contrário,
financiaram
a
dependência espanhola dos artigos manufaturados das nações industrializadas. A Espanha importava mercadorias de Flandres, da Itália, da Inglaterra e da França e as repassava
ao Novo Mundo. Em quantidade insuficiente, porém, especialmente levando em conta o tamanho do continente e o
seu aumento
populacional.
espaços do contrabando.
Tal fato acabou
ampliando
os
Quanto à pirataria, foi uma reação mais dramática e
sensacional aos rigores da extorsão espanhola e seu apogeu EN CAS
4
é
37
restringiu-se ao séc. XVIl e princípios do séc. XVIII. Assim como o contrabando foi um comércio a conta-gotas, a pirataria foi uma rapina a conta-gotas, notadamente se comparada com a extensão do que os próprios espanhóis fizeram. Diferentemente dos corsários, que tinham o respaldo de seus países de origem, como Francis Drake, da Inglaterra, os piratas não eram vistos como forças de guerra mas como bandidos comuns. O foco da pirataria foi o Caribe, rota importante dos galeõdes espanhóis e área cujas características marítimas tornavam fácil driblar a vigilância da Metrópole ibérica. Tortuga, ilha hoje na costa haitiana, foi a base de operações daqueles famosos ladrões do mar autodenomina-
dos “Irmãos
compensadora,
da Costa”. As vezes, conseguiam uma presa
mas, em geral, viviam das migalhas do colos-
so espanhol. Fugazes momentos de prosperidade mal logravam distrair os piratas dos riscos e misérias permanentes. Alguns chefes se notabilizaram por sucessos obtidos à base de astúcia, ousadia e crueldade e adquiriram notoriedade nas telas de cinema
e nas páginas dos romances — Morgan, Olo-
nés, Capitão Kidd, Barbanegra.
Os órgãos administrativos coloniais: Cabildos Ao inverso da civilização portuguesa no Brasil, a civilização espanhola na América foi mais urbana que rural. As cidades foram importantes como centros de controle da política monopolista. Elas reuniam a massa dos funcionários e um sintoma importante do desenvolvimento urbano colonial foi o precoce surgimento de Universidades em diversas cidades. Na época da Independência, a América Colonial hispânica já tinha 36 Universidades. Qual a importância política das administrações municipais daquele período? Eulália Lobo fala do caráter democrático que as mesmas tiveram
e Chaunu refere o desembaraço das manifestações da autoridade municipal em face do poder central. Com efeito, houve um certo espaço para a autonomia local, em face das distâncias e dificuldades dos meios de comunicação. Todavia,
não deve ser exagerado o seu alcance. Primeiro, nunca foi um espaço democrático, se não que destinado às manobras
aa
DA
de oligarquias regionais. Segundo, tratou-se de um espaço consentido, implicitamente, pela Metrópole, já que se des tinava a resolver problemas miúdos e cotidianos, sendo, portanto, um fenômeno incapaz de afetar o sistema colonial como um todo. Em resumo, as administrações locais não foram, em princípio, uma frente de resistência ao colonialismo: antes o complementaram e com ele se articularam na totalidade da dominação monopolista. Quando a resistência ao
colonialismo começou,
as cidades e suas oligarquias
do-
minantes desempenharam um papel decisivo, mas é preciso dizer que o anticolonialismo não foi um mero produto de algum espírito libertário inerente às administrações municipais. Ele foi desencadeado com o aparecimento de novas condições econômicas e políticas, o que será oportunamente estudado. A administração municipal da fase colonial hispânica centralizou-se em corporações conhecidas como ayuntamientos ou cabildos. Segundo Eulália Lobo, eles estavam menos preocupados com os lucros da Coroa do que com o bem-estar dos seus cidadãos. Tal afirmação não significa que os cabildos estavam à margem do contexto colonial-monopolista mas apenas prova que, dentro desse contexto, as tarefas dos cabildos não diziam respeito aos lucros da Coroa. Para isso, ela possuía seu próprio exército de funcionários, instância superior no assunto, e certamente não tinha muitas preocupações com os cabildos. O cabildo elegia uma autoridade executiva e judiciária conhecida como a/lcalde mayor, algo como um prefeito dos dias de hoje. Os assessores judiciários e fazendários mais importantes do a/calde mayor eram os corregidores. Os cabildos mais desenvolvidos tinham doze regidores, dois alcaldes ordinarios, os alcaldes de hermandad (de papel decorativo), o alferez real, o ressetor de penas de Camara (cobrador de impostos) e o depositario general (de capitais em litígio). A
reunião trimestral regular do cabildo era o denominado cabildo ordinario. As reuniões de caráter extraordinário constituíam o cabildo abierto.
CNY
AV.
39
[|
|
O
Ê
e
z LA s NE ê
o
x
E 2.5
SVOVEVO
]
O
E
J
ARES
YNVAVH
à —.
b
(>
al
Q
a
o
ndo
*
de
|
%Y
“a
OO
b-
vo N
EN
A
+ vEvrWIVavNO
be
N
)
'N
q
a
SOIHQLINHIL
VNVISIM
suxaL
OD IX3N
/HIO VINVLIdVO
VIVWILYNOD Va
OQUNIIH-IDIA
YY10D08 VQVNVYHO VAON y fo) va
À
() |
A
oys
2
qnto tas
S35379NI
G—
%
cos TES tas OLHOd ing
se
SO9NINOQ
VINVLIVO
VIANZANTA VT”) 1VUID
E.
Pa
>
ES as
É a E
VTIOHNVdSI OVÔVZINOT1OD V
Us
À
"
&
%Y
Z,
r
O
Ri
4
q
ff
,
ig
'
a e
x
/
;
;
5
E
5 É
Õ
>»
,
f
“e
!
e
| O
/
/
4
S;/
J
gi
a
nHad 0]
AVN
DOVILNYVS
|
1
8 TA
a
Ns
mo! A ú
aa
(Vooznd ai a
;
go!
PA),o
O
Dar
CD
pc heat
P
E
( opdunssy Jo Roma
aeee
:
N
Ra
cam)
nepiamuow | sauiv sonang o a /
o
a
A
ne
69 “d 'C86L avVAa/DaIN OJouer ep olH 'Pe '8 'HYTODSI ODIHQLSIH SVTILY :ILNOA
5
Rs
N /
11
V. Índios, negros e padres no universo colonial O trabalho dos índios Estudar as relações de trabalho na América Colonial hispânica significa estudar a sua inserção no contexto dos interesses do capital mercantil monopolista e levantar um quadro de opressão e aviltamento que atingiu sobretudo as raças “de cor” — índios e negros. Vejamos a questão do índio. A encomienda foi um sistema de trabalho imposto aos nativos, diretamente derivado de uma instituição feudal do mesmo nome. Na Espanha, consistia no direito outorga-
do a um
nobre (encomiendero) de receber dos vassalos os
impostos devidos ao rei. No Novo Mundo, os vassalos eram os índios e a tributação era sob a forma de trabalho força-
do, visando compensar o ônus do latifundiário com as tarefas da catequese. Na prática, tratava-se de uma espécie de escravização por dívidas. Incluídos nas propriedades recebidas pelos colonos, os índios lhes deviam o trabalho, mas, à ma-
avo:
os uls exp ser lei, por , iam pod não ia, opé eur ão vid ser da ra nei uma realiia ser s ivo nat dos tal bru ção ria rop exp A ra. ter da
uséc uns alg te Nor do a ric Amé da e ina Lat a ric Amé da e dad ças for das ão ans exp a giu exi o im ass ndo qua , ois dep los produtivas, já na plena fase do desenvolvimento capitalista. para obras públicas ou
va o interesse econômico espanhol levou a Coroa a instituir o repartimiento — recrutamento, frequentemente por sor
teio, de massas indígenas para trabalharem em regiões prêvale
dizer,
mineradoras,
regiões
de agro-ex-
portação ou de interesse estratégico. Esta repartição compulsória da força de trabalho faz lembrar a corvéia, típica do feudalismo europeu, exceto num ponto: havia pagamento de salário em dinheiro ou espécie. O repartimiento teve pontos de contato com instituições pré-colombianas, como a mita incaica e O cuateguil azteca: as elites daquelas civilizações indígenas tinham posto em prática o recrutamento forçado para o trabalho produtivo e em obras públicas. Assim, quando os espanhôis se valeram de tal sistema, foi fácil fazer o nativo obedecer, pois já estava habituado e a única coisa que mudou foram as elites beneficiadas. Este foi um aspecto em que o espanhol mostrou um conveniente — e sinistro — respeito as tradições locais. Foi com o nome de mita que o vice-rei do Peru
implantou,
em
1569,
o sistema
minas.
Do
mesmo
modo,
nas
de trabalho compulsório
no
México,
conservou-se
o
termo cuatequi! para a instituição similar. Apenas com o detalhe que a Coroa costumava concentrar os índios em aldeias ou reduções, visando manter em permanente observação o rebanho humano periodicamente requisitado para as árduas tarefas das minas e das haciendas. A propósito das observações acima, é preciso dizer que a situação do índio na América Colonial hispânica foi tão heterogênea quanto as condições do continente. Em outras palavras, a espoliação e o sofrimento foram uniformes, mas as modalidades variaram. Houve alguns casos de tribos
expulsas de suas terras. No Pampa, por exemplo, as massas À
os,
43
O
determinadas,
UT
E
para o trabalho produtivo nas áreas onde mais se concentra-
E
A necessidade de mão-de-obra
nativas desenraizadas de suas comunidades originais, foram compelidas a se empregar nas hacienaas e trabalhar sob as mais instáveis condições, constituindo o que se denominou de peonaje. Na região do Yucatan, existiram os congregas, índios escravizados, utilizados no desmatamento e plantação em terras virgens e obrigados a se alimentarem de raizes e frutas silvestres. Finalmente, houve ainda uma relação de trabalho conhecida como yanaconazgo, na qual o indígena fazia, “livremente”, um contrato para trabalhar fora de sua aldeia, em troca de roupa e comida. Neste sistema o índio podia optar, ao menos teoricamente, por uma determinada relação de trabalho, caracterizando uma versão muito primitiva da mercantilização do trabalho. A presença do pagamento de salário no sistema de repartimiento poderia fazer pensar numa relação capitalista de trabalho em plena América Colonial hispânica. É um engano, porém. A coação e o recrutamento forçado impediram que o trabalhador vendesse livremente no mercado a sua força de trabalho. Além do mais, o que ele recebia de salário jamais teve condições de torná-lo um verdadeiro consumidor. Resumindo, a mera
existência do salário não basta para configurar a plena vigência de um sistema produtivo capitalista. Concluindo, é curioso registrar que as aldeias, de um modo ou de outro integradas no universo colonial, eram governadas, conforme determinação da Metrópole, por caciques que constituíam uma aristocracia nativa cooptada pelo colonizador. A eles foi dada a missão de exercerem o poder espanhol em nível tribal. O trabalho dos negros Em 1518 começou o tráfico negreiro para a América
espanhola.
Em 1873, em Cuba, registrou-se a última entra-
da comprovada de escravos africanos. No total, ingressaram
1.552.000 negros — número bem inferior ao dos que vieram
para o Brasil (3.646.000) e para as minúsculas Antilhas inglesas (1.665.000) e francesas (1.600.000). A menor utilização de negros na América espanhola se deveu, 44
antes de mais ARS
1
RS
nada, à possibilidade de utilizar o
mi e ad id iv at da to en im ec nh co u se índio, quer por causa de alho comab tr ao o ad tu bi ha do si r te já r po neradora, quer s na ho al ab tr o s, ai em Ad o. çã za li vi ci pulsório em sua própria aid br lu sa in a su à do vi de de da an rt minas provocava alta mo , na ge dí in o em ir er ef pr s io ár et ri op pr de e isso também fez os to en im st ve in um o, gr ne do s vé in ao que nada lhes custava, so ca em u re or oc só s na mi s na os gr ne caro. A idéia de usar a ad an Gr va No em mo co — s ei ív on sp di de não existir índios to Po de o ir ne mi e av cl en No s. do to do ci — ou de terem pere e qu s vo ti na de io ín ic rt mo o el ív rr te o tã sí, por exemplo, foi — or lh me a ri se os gr ne s do o us o e qu r po su a Coroa chegou a pelo
menos
os senhores,
por causa
do
custo
de
aquisição
e qu or lh me s lo áat tr a os id el mp co am ri se a, da mão-de-obr os indígenas. na r foi do ha al ab tr mo co o ad us is ma foi o gr ne o Onde an pl de a em st si o ad am ch o , ão aç rt po ex de a grande lavour
ar st ga or nh se do to fa o e qu ar tu en te ac an ss re te in tation. É
a zi fa o cr lu r da a e ss ça me co ele e qu s te an o av cr com o es sau ex a é at lo áor pl ex de o sã en op pr a se es uv ho com que ento im st ve in O o, az pr r no me no r, ra pe cu re a do tão, de mo enam em tr ex a av rn to se ho al ab tr o e, nt ui eg ns co r feito. Po de s so ca m ra ti is ex r, me Po on Le o nd gu . Se te an ad gr te de
para ra fo r ha al ab tr os av cr es us se am av nd ma e qu es or nh se , uma do la o tr ou r po a, vi Ha . am av nh ga es el e qu o ar ls bo em ho doclara distinção entre os escravos destinados ao trabal o méstico e ao trabalho produtivo: estes últimos viviam muit e ad id iv at s à do la re e at nt me ta re di os am er e qu z ve pior, uma li se am av ab , ac os ic st mé do os av cr es os , os tr ou Os a. iv lucrat orsf an tr se é at s e õe tr pa us se e s ao nt me ma ti in is ma o nd ga o , us O te en lm na Fi . es el ra pa us at st o de ol mb sí em m va ma
à u vo le o, az pr o ng lo a a, av a cr br es -o de omã do da ua in nt co estagnação
das forças produtivas
— não
porque
o escravo
para trabalhar, como argumentam
não tivesse “estímulo”
alguns, mas sim porque não havia motivos para investir imaginação e poupar esforços numa atividade tão desvalorizada e aviltada. Na ótica de uma estrutura escravista, para consequir mais produção basta incorporar mais força de trabalho. O Caribe, a América Central e o norte da América do E ANN
:
45
Sul foram áreas de p/antation e, portanto, de mais intenso uso do negro. Nos engenhos açucareiros cubanos, os senhores chegaram a permitir que os escravos plantassem em lotes próprios — desde que isto não interferisse com a atividades lucrativas que deveriam desempenhar no latifúndio. Em S. Domingos, ao contrário do que ocorreu na área platina, foi comum o uso do negro na criação de gado. A vida massacrante dos escravos fazia muitas negras abortarem para evitar filhos que viessem a sofrer a mesma coisa: tratou-se de um fato comum e deprimente em toda a América Latina. Isso e também o fato de chegarem mais
homens que mulheres ajuda a entender a baixa reprodução
dessa mão-de-obra nas colônias ibéricas. Ao contrário das colônias inglesas de Virgínia e Carolina do Sul, onde existiam verdadeiros criadores de escravos, encarregados das tarefas de reposição de trabalhadores. Estudando o proble-
ma sob o prisma do comércio triangular (Europa/África/
América), Décio Freitas foi levado a concluir que, por trás de tudo, houve o interesse dos traficantes de escravos:
quanto mais escravos — adquiridos a baixo custo na África
— os plantadores comprassem, mais em conta sairia, para os comerciantes, a aquisição das matérias-primas tropicais que revenderiam na Europa. Nunca é demais recordar que o tráfico negreiro foi uma das formas da chamada acumulação primitiva de capital. O fato de artigos como o chá, o açúcar, O tabaco, o cacau, o rum, o anil, o algodão e o café entrarem no Velho Mundo a baixo custo serviu aos interesses do nascente capitalismo manufatureiro. A liquidação física do negro acompanhou de perto a do índio naquele degradante sistema de trabalho. Crueldade e desumanidade andaram de braço dado com a irracionalidade e o desperdício. Escravos entraram e morreram aos milhares, vítimas de maus tratos e estafa. Nesse particular, a estratégia anglo-saxã de “criar” negros para o trabalho não
deixou de evidenciar certa “racionalidade” capitalista. Mais tarde, quando a escravidão foi suprimida, no interesse do mesmo capitalismo ao qual durante tanto tempo interessara
40
mantê-la,
persistiram
RAS +;
amargas
sequelas
na vida
social,
, al nu ma ho al ab tr O e br so e nt ta il av a gm ti notadamente o es até hoje vítima de desprezo e preconceito.
O trabalho dos padres 'Em 1508, duas bulas do
Papa Júlio ll instituíram O
a, tic prá na , que o , ias Índ das eja Igr a e br so o gi Ré do Padroa
e O br so le ro nt co do va ca di ab no ca ti Va significava que indo, assim, bu ri nt co , rei do or fav em o nd Mu vo No no clero O
l ta en am rn ve go ão iç rt pa re a um em eja Igr a para transformar m ra fo a ci er ex ela que is tua iri esp s efa tar na América. As : ol nh pa es mo is al ni lo co do es ad id ss ce ne enquadradas nas , confeho al ab tr ao is ce dó os ê-l faz a par ios índ os a ti er nv co ocol do s õe rs to ex às stã cri de da li bi ta ei sp re ria uma aura de posta su a um de me no em o di cí no ge o a av ic if st mi r, do za ni a al ger em os du ví di in os va na io ic nd co e a óri missão civilizat o uma obediência passiva das estruturas vigentes. Enfim, foi o das elo entre o poder das classes dominantes e a submissã ecleclasses dominadas. Através do todo-poderoso tribunal a e a ic óg ol te o sã es pr re a e -s am ir un , ão iç is qu In siástico da a do in it rm pe , da ci le be ta es r ula sec de da ri to au da coerção butri à er rr co re de do mo cô in o m se io ítr arb o r ce er esta ex nais de exceção.
Embora a Igreja das Indias, principalmente ao nível
do alto clero, tenha co-participado do sistema de opressão e todas as suas já conhecidas misérias, é preciso reconhecer, todavia, que houve alguns clérigos sinceros, empenhados em mi hu s s do to en im fr so os r ua en at e as ur ut tr es as r za ni ma hu
ro ei im pr a, ag rr má Zu de an Ju i Fre mo co ns me ho — os ad lh bispo do México e indignado denunciador das violências e arbitrariedades; como Frei Angel de Valência, que reclamou um clero melhor preparado; como Santo Toríbio de Mogrovejo,
que fulminou
os padres que se comportavam
na
condição de “verdugos dos índios”; e como o já citado Las Casas, em cujas horripilantes descrições do genocídio nativo encontram-se anotações como aquela que registra o desaparecimento de várias línguas indígenas, devido ao extermínio de todos os que as falavam.
NS
47
Através da atuação de tais personagens, alguns se esforçam para recuperar a imagem da Igreja na história da América Colonial hispânica. Entretanto, não se pode esquecer que os clérigos combativos acima mencionados não foram um padrão coletivo de comportamento. Ademais, há uma realidade que mesmo a denúncia dos religiosos não
podia contornar — a utilidade intrínseca da ideologia da Igreja como instrumento de dominação. “Os religiosos devem ser úteis ao Estado””, disse, certa vez, o vice-rei do Peru, Manuel
Amato.
Frase curta mas
que traduz
bem as respon-
sabilidades e comprometimentos da instituição eclesiástica no Novo Mundo. Quem com mais dinamismo desempenhou as tarefas ideológicas da Igreja das Indias foi, sem dúvida, a Companhia de Jesus. Criada por Santo Inácio de Loyola, levou às últimas consequências o trabalho missionário, com a seriedade e o sentimento dos antigos cruzados. Para os jesuítas, converter era devolver a Deus o mundo que ele mesmo criara. Ninguém como eles usou a palavra enquanto instrumento de luta — a palavra que quer varar as consciências e não suporta objeções. Viam'a Natureza como algo em “estado bruto”, “elemento passivo” da Criação à espera de ser “'lapidado'” pelos “soldados de Cristo” que traziam a civilização em sua mensagem. Na visão dos jesuítas, o índio estava tão longe de
Deus por estar tão próximo da Natureza. Tratado generica-
mente como o “'gentio”, não era percebido em suas diferen-
ças culturais. Inocente por nunca ter recebido a Verdade, o índio, uma
vez convertido,
O batismo lhe dava um
estava sendo trazido “'à razão”.
nome e, portanto, uma individuali-
dade. A conversão fez os jesuítas estabelecerem a primeira
distinção entre os nativos. A Companhia de Jesus deu muito valor ao caráter público e ostentatório do culto católico: era importante exibir-se como cristão e, desse modo, distinguir-se do herege —
servia inclusive para afastar as suspeitas inquisitoriais. À uni-
dade da fé correspondia a unidade. do Império. O índio era um “espaço vazio” a ser preenchido: não poderia ser deixado
as, uít jes dos s to re di es nt re or nc Co r. fe ci Lú à disposição de a um de os ri tá si po de s: do ra ec ex m ra fo s na ge os pagés indí en cr as m co s ra so va in s ça en cr as m ia at mb co , tradição nativa ulo ác st ob so ro de po is ma o m ra Fo m. ha un sp di e cas de qu
cultural e político à catequese. e -s ou tr en nc co a uít jes o , co ti má ag pr te en lm ia Essenc e nt me az ic ef is ma em ar iz il ab vi por no si na catequese e no en a esra nt co u to Lu . as ci ên ci ns co das co o controle ideológi ácar em io índ o r la ro nt co r de po a do mo de cravidão nativa, neas os ri pe im às ar rv cu se de e tev s ma e, ad id ter de exclusiv nto. ie im rt pa re O e da en mi co en a am ir uz od pr e cessidades qu Silenciou sobre a escravidão
negra,
uma vez que utilizar ne-
conveia ser o nã e qu do ém al , ios índ r era lib a av ic if gros sign o. fic trá do es ss re te in s so ro de po os r ngi niente ati e, nt me al tu en ev , ter a am ar eg ch as ít su je Os próprios a par as ic st lá co es es zõ ra am ar sc bu e os gr escravos índios e ne ela ser do an ar cl de , ão id av cr es da o çã ui it st » existência da in ca éti e ad id or ri fe in da , do ca pe do ” al ur at a consequência “n ra er gu da ou os up gr ou os du ví di in os rt ce e espiritual de ter ao , te en lm na Fi o. sã er nv co à s io ár at fr re os “justa” contra da ess” io íc “v os do en ec nh co re ra bo em a, uít jes escravos, O r era lib se de io me um mo co a ond ta ei ac a av cravidão, acab dos trabalhos “inferiores” considerava insubstituível.
para
outras tarefas nas quais se
Para facilitar o exercício de sua missão religiosa, O je-
eservava-o pr , vo ti na o do an ol is s: to en am de al os ou cri cuíta iu o trabatu ti bs su eia ald A s. sa go ri pe ” es çõ na mi ta on de “c
ao iu it rm pe e os ri ná io ss mi s ro ei im pr s do lho itinerante de e fac em a nç ra gu se e lh ond da o, ri óp pr ço jesuíta um espa hostil. e ho an tr es mo co to vis or ri te ex o nd mu um As Missões do Paraguai chegaram a se converter em naia om on si fi a um am ar ld mo e s co ti rá oc te s do ta virtuais Es turo fu do s mo ru os ia ar in rm te de e qu ar li cu pe cional muito Paraguai independente. Cultivo da erva-mate, tradição de discaracs ma gu al m ra fo vo ti le co ho al ab tr e a ri tá ri ciplina auto
ra pa ão gi re na a nç ra he de am ar ix de as uít jes os e terísticas qu náio ss mi os am ír sa e qu é ai gu ra Pa Do s. re io er tempos post rios que, cruzando O rio Uruguai, se instalaram no Rio
49
Grande do Sul, em duas ocasiões, tendo, na segunda, dado
origem aos Sete Povos (1682-1756). Foram os jesuítas que
introduziram neste estado a criação de gado, no ano de 1634. Ao longo do séc. XVIII, os jesuítas foram se tornando, para as estruturas da época, insuportavelmente ricos e poderosos. Com efeito, só no México, nos últimos tempos de glória, chegaram a possuir 45 haciendas com mais de 1.100.000 hectares, seis engenhos de açúcar valendo entre 500.000 e 1.000.000 de escudos, rebanhos de 300.000 carneiros, etc. É fácil imaginar os temores que levaram o rei Carlos Ill, em 1707, a expulsá-los da Espanha e suas colônias, medida que Chaunu parece lamentar, pois, conforme escreveu, “o decreto de expulsão de 27 de março de 1767 (destruiu) o melhor traço de união entre a Europa e o mundo índio”. Depois de tudo o que foi dito sobre a participação do jesuíta a serviço de um colonialismo que destruiu a identidade do nativo, a palavra ''melhor” é, no mínimo, questionável, Atuando em aldeamentos ou na superestrutura global da sociedade, o jesuíta militou ativamente em conexão com uma política de coerção e dominação. Quanto à sua expulsão do Império espanhol, vale, finalmente, um registro; não se tratou de um gesto isolado de Sua Majestade Católica. Em 1759, o Marquês de Pombal já tinha expulsa-
do os jesuítas do império português e a mesma coisa fizera o rei Luís XV na França, em 1764. Em 1773, o Papa Clemente XIV extinguiu com a Companhia de Jesus, determi-
nação que durou até ela ser recriada em 1814. Na verdade,
=”
ss
sis
a t de e
= A —
aii
o dá:
a
o antijesuitismo dos meados do séc, XVIII foi parte do clima geral de anticlericalismo, vivido por uma Europa onde o Antigo Regime começava a sofrer os primeiros golpes do pensamento iluminista,
VI. A sociedade da América Colonial hispânica: características e conflitos As áreas de ocupação A urbanização foi um instrumento fundamental na ocupação espanhola do Novo Mundo. Nem bem as civilizações azteca e inca haviam sido destruídas, surgiram as cida-
des do México (1521-24) e Lima (1535). Em geral, as cidades da América Colonial hispânica desempenharam o papel de centro burocrático-administrativo e foco irradiador do colonialismo. A rigor, a Espanha ficou sendo o único elemento de unificação numa América retalhada. As áreas onde mais se concentrou o interesse espanhol foram evidentemente as de mineração. Não se pode deixar de ter em mente que o projeto econômico mercantilista e
monopolista da época, privilegiava, antes de mais nada, os metais preciosos como base da riqueza nacional. Além das áreas mineradoras, atenção aos portos
a Espanha também dedicou muita comerciais: serviam para a navegação
BIBLIOTECA PUBLICA MUSA, ARLINDE xx: RCON
|
de cabotagem e para as relações de exportação/importação
com a Metrópole. Existiam ainda as áreas de plantation (agro-monocultura de exportação) e as de produção agricola e pecuária com vistas ao abastecimento interno — como
o Pampa, onde as pastagens possibilitaram a criação extensi-
va e a formação de uma sociedade rústica e hierarquizada em estancieiros e gauchos. Outras regiões do Novo Mundo foram destinadas a fornecer mão-de-obra índia e, finalmente, certas áreas foram ocupadas em vista de sua particular importância estratégica e militar. Nestas últimas, a Espanha se valeu da atividade missioneira como instrumento de povoamento — o que aconteceu na região ao redor do rio Uruguai, importante caminho de acesso ao estuário platino, que era porta aberta ao altiplano andino — ou instalou guarnições militares — como em Cuba, eixo central do Caribe, situado a meio caminho do México. A sociedade colonial No topo da rígida e hierarquizada
sociedade colonial existiam os latifundiários, proprietários de minas e comerciantes, Os latifundiários compreendiam proprietários de haciendas, plantadores e criadores de gado, a maioria, descendentes dos encomienderos. Quanto aos comerciantes, importadores e exportadores, eram diretos beneficiários de concessões feitas pela Metrópole, conforme as regras do sistema mercantilista e monopolista vigente. O grupo dominante incluía ainda a alta burocracia e o alto clero: administrando os lucros ou as almas, tais setores, de qualquer modo, estavam administrando os interesses
da Espanha e da estrutura colonial. Representando uma au-
toridade distante, frequentemente se mostravam permeáveis a fraudes e corrupções e era comum agirem mais em favor próprio do que em benefício do rei. Assim, longe de fornecerem o atenuante das mazelas do colonialismo, ainda mais as agravavam, já que as extorsões e arbitrariedades individuais aproveitavam-se da existência de um espaço implicitamente permitido para o enriquecimento e o exercício do poder pessoal.
52
;14 4 »
Pa
À
Abaixo da aristocracia criolla e dos burocratas chape-
tones estava a massa popular. À elite era branca e europei-
zada e as classes inferiores eram constituídas de índios, ne-
gros e mestiços — à hierarquia social dos dominadores e douma
correspondeu
minados
rígida divisão
racial. A cor da
pele se tornou um estigma ou símbolo de status — enfim,
um critério perceptível na definição dos direitos e privilégios. Os mestiços constituíam um grupo enorme e heterogêneo, com limitadas possibilidades de ascensão social e angustiado por trazer em seu físico a marca dos humilhados e
ofendidos. Mestico era especificamente chamado o produto do cruzamento do branco com o índio — no Brasil, ma-
de
mestiços
Os
meluco.
índio e negro
eram denominados
de zambos — no Brasil, cafusos — e o cruzamento de negro e branco dava origem ao mulato, termo comum à América espanhola e à portuguesa. Massa humana fluida, instável,
rancorosa para com índios e negros, os mestiços tinham na sociedade uma desconfortável e indefinida posição intermediária. Mesticos foram a maioria dos artesãos urbanos e mayordomos — feitores de trabalhadores indígenas —
das
haciendas.
mendigos
eles,
Entre
subempregados.
e
muitos A
eram
marginais,
quase
correspondência
a
entre
divisão de classes e divisão de raças veio a ser um dos problemáticos legados da fase colonial para o futuro. Índios e negros estavam na base da pirâmide social. Reduzidos a 10.000.000 em vista da devastação trazida pela conquista, os índios foram liquidados depois, a longo prazo, por vários outros fatores, principalmente
o trabalho
forçado nos campos e minas e as péssimas condições de vida. Sem higiene, subalimentados e vivendo em cabanas vítimas de doenças epidêmicas que faziam terrível devastação. Pierre Chaunu é eloquente em suas informações: só em 1779, uma epidemia de varíola, na infectas,
Cidade índios
eram
do
fez
México,
pereceram
quase 9.000 vítimas.
grande
em
quantidade
por
Além causa
disso, de um
tifo conhecido como matlazahualt e da febre amarela, apelidada de vómito prieto. Tantas vítimas fez a febre amarela no Panamá — e os futuros construtores franceses e americaE
Na
|
53
nos do Canal o descobririam mais tarde — que os colombianos chegavam a dizer que “ir ao Panamá é procurar a morEr
te.
Com
respeito aos negros, a Espanha concedia o direi-
to de fazer o tráfico em suas colônias a diversos países, atra-
vés do asiento. À prática se iniciou em 1517 e os genoveses foram os primeiros beneficiários. Holandeses, portugueses e ingleses também receberam tal concessão. Embarcados na África, os negros viajavam em condições de tal modo subumanas que 40 a b0% das “'peças”” morriam antes de chegar a seu destino. Na América espanhola, foram trabalhar sobretudo nas grandes plantações, eventualmente nas minas e também no serviço doméstico.
É interessante lembrar que, além das fronteiras colo-
nizadas pela Espanha, subsistiram índios em estado selvagem, muitas vezes revoltados e agressivos. Já foram mencionados os araucanos do Chile meridional e os da atual Argentina, devendo ser lembrados ainda os de algumas áreas amazônicas e de certas regiões bravias da América Central — numa dessas regiões bravias, aliás, foi que, em
pleno séc. XVII, o
pirata Olonés acabou preso e feito em pedaços por nativos entfurecidos. Atualmente, nota-se uma santa indignação no governo americano pelo fato de ser tão comum a coca nos países andinos,
produto
que, como
se sabe, é a matéria-prima
da
terrível droga chamada cocaína. Entretanto, há uma informação histórica a ser analisada aqui: a coca serviu muito aos propósitos dos espanhóis — era um estimulante que ajudava os índios a trabalharem nas duríssimas condições da mineração,
fornecendo uma
ilusão de energia e garantindo uma
eficiência a curto prazo, o que até permitia aos proprietá-
rios brancos economizarem
na alimentação. Resumindo, a
cocaína pode provocar a reação de escrúpulos morais e sociais, mas tal reação não deve fazer esquecer que as origens da disseminação de sua matéria-prima, a coca, estão ligadas
a uma questão de exploração e dominação de classe.
54
Conflitos na América Colonial hispânica spanica Uma imagem errônea da América Colonial hi a vertical ur ut tr es , co ti lí no mo € o es co a em st si seria a de um tada. es nt co is ma ja da gi rí ia qu ar er hi e a, ad ed pi sólida e desa re igual mp se e na to nó mo ie íc an pl ma nu ar ns pe a Poder-se-i dades, si lo gu an e s te en id ac m se o en rr te de a it fe ia ór — hist
mro ir do an qu a ad in rm te só z pa a um de ra fo tá me ta perfei asa, vi da To a. ri tó pa ci an em ta lu da s de ta es mp te as m nera sim
não foi: estruturas
da exploração
montadas
e do lucro
em
imediatista
função da ganância,
necessariamente
ti-
m ra de ce su se s ele € — s te en an rm pe s to li nf co r nham de gera is ca lo es nt re fe di is ma s , no as ci ân st in as rs ve di is entre as ma e com os mais variados graus de intensidade. Os espanhóis que vieram para a América O fizeram nte me al ci so er nd ce as er e ec qu ri en — vo ti je ob o ar cl um com s to os sp m di va ta es o , nã to an rt . Po el ív ss po o mp te r no me no s a aceitar nenhum obstáculo no caminho. Os encomiendero tiveram,
sob esse aspecto, dois inimigos perigosos — a Coroa
e os religiosos. Não querendo permitir, por óbvias razões políticas, um excessivo controle dos encomienderos sobre os índios, a Coroa fez tudo para circunscrever à exploração do nativo dentro de critérios que ela entendesse como aceitáveis. Em 1535, o vice-rei Antônio de Mendoza, da Nova Espanha, recebeu severas instruções para não permitir expropriação ilegal dos indígenas e a concentração de suas terras em poucas mãos. As Leis Novas, de 1542, restringiram drasticamente a liberdade de ação dos encomienderos. Os nativos não poderiam ser coagidos ao trabalho “contra a vontade”, com a morte do encomiendero a encomienda
reverteria para a Coroa e as autoridades das Índias estavam
proibidas de distribuir novas encomiendas. Mesmo que muis do do ia eg il iv pr s a do it gr à a, rt mo ra let em ss s fo go ti ar s to continente foi geral — revoltas contra a monarquia explo-
diram em Nova Granada (1553) e no México (1564). Em
1592-95,
ocorreu
em Quito
um
levante dos gru-
pos dirigentes contra Filipe ||, que decidira cobrar o imposto
da alcavala
para
financiar
a reconstrução
da
marinha
oo
espanhola, destruída com a catástrofe da Invencível da, em 1588.
Arma-
Na qualidade de agentes da Coroa, os religiosos — do-
minicanos, franciscanos, jesuítas — também foram alvo frequente da animosidade dos encomienderos. Afinal, arrebanhando e convertendo os índios, acabavam retirando-os do controle dos proprietários e, por conseguinte, atuavam em consonância com a política da Coroa de evitar um poder excessivo daquela classe. Como se viu, foram os religiosos que mais denunciaram as agressões sofridas pelos nativos. E houve igualmente casos de franciscanos que recusaram os sacramentos a soldados que participavam de guerras contra índios, induzindo-os a desertarem por temores de consciência. Existiram também conflitos entre proprietários e comerciantes que se beneficiavam do regime monopolista. Entre 1749 e 1752, por exemplo, ocorreu uma violenta rebelião de proprietários na Venezuela, chefiados por Juan Francisco de León, contra as extorsões da Companhia Guipuzcoana. Esta revolta e as dos encomienderos contra a Igreja e contra a Coroa não foram tão graves como parecem à pri-
meira vista. Na verdade, tudo era parte de um mesmo siste-
ma de dominação — proprietários, comerciantes, Igreja é Coroa. Portanto, não havia interesse em provocar alterações em profundidade. Enfim, os movimentos até agora citados
foram
fosse o os seus uniriam vam-se Pomer, O cial dos
revoltas dentro de um sistema e não contra ele. Se
caso de defendê-lo, numa eventual ameaça, todos beneficiários deixariam de lado as desavenças e se contra o inimigo comum. Porque, de fato, tratade aliados, embora, conforme as palavras de Leon “'em tensão permanente”. “inimigo comum” só poderia ser um: o estrato sodominados. Foram muitas as rebeliões que eles pro-
tagonizaram, mas, como não resultaram de uma consciência política da situação, não podem ser classificadas de revolu-
ções, sendo
marcadas mais pelo rancor de classe que difu-
samente exprimiram do que pela existência de algum proje-
to político, Em
96
1630-35 e 1657-65, por exemplo, ocorreram
eat.
revoltas indígenas em Tucumán,
Argentina;
na segunda, O
direiseu u mo la oc pr z ue rq ho Bo o dr Pe ol aventureiro espanh gião re na , co xi Mé do sul no , 12 17 Em a. ic to à Coroa inca va con ti na ão li be re a um iu od pl ex , ia ma o ri pé do antigo im das 'matir par a da ea ad nc se de s, co an br s do ão aç li tra a espo
nifestações” anos de 1743 da pelo índio Atahualpa |l.
de uma imagem da Virgem Maria. Entre os e 1750, teve lugar, no Peru, a rebelião chefias, de An s do rei do ma la oc pr to au , os nt Sa an Ju olrev das a um u re or oc e qu ru Pe no a nd ai Foi
se Jo : al ni lo co a ic ér Am da ia ór st hi da s te an rt tas mais impo do to re di e nt de en sc de u mo la oc pr se ui nq ca or nd Gabriel Co em s, ói nh pa es s lo pe o ad ut ec ex u, ar Am cpa Tu a inc líder zani lo co s e do ad id al ut br a ra nt co s ma ar em u go pe e , 72 15 anto, dores. Tomou o nome de seu suposto ancestral. Entret lião, a despeito da valentia dos índios e da extensão da rebe que chegou a cobrir as atuais áreas de Peru, Bolívia e parte
norte da Argentina, o sonho durou pouco (1780-81) derrota foi total. Tupac-Amaru acabou esquartejado quatro
cavalos,
seu
pescoço
foi cortado
e seu corpo,
e a por
feito
vio is ma de on ais loc os ra pa do ta or sp an tr foi s, ço da em pe lentamente se manifestara a insurreição. Em 1784, Felipe , ten ui nq pa u Yu ar Am cpa Tu de me no o o nd ma to o, zc Vela tou, sem êxito, reeditar o levante.
Ao longo do tempo, o nome de Tupac-Amaru permaneceu simbolicamente vivo, representando um continente des em ag im a um ar at sg re ra pa ar lut de ou ix de a nc nu e qu truída pelo colonialismo. Foi sintomático que os guerrilheiros da classe média uruguaia que passaram para à luta arma-
”, os ar am up “T de me no o do ma to em ss ve ti 60 os an s no da numa
clara alusão à luta que
nos fins do séc. XVIII
abalara
o Império espanhol.
Há um consenso entre os historiadores de que T upac-
Amaru
pretendera instaurar um Estado indígena nos Andes.
Em outras palavras, dada a enormidade de sofrimentos trazi-
coa av nt se re ap se o ic ca in o ad ss pa o , mo is al ni lo co o dos pel
mo uma época ideal. Tal como na Europa, as misérias da sociedade de classes faziam o povo buscar um refúgio seguro numa mítica Idade do Ouro. Erradamente considerado UNS
57
precursor dos movimentos emancipatórios do séc. XIX, o levante de Tupac-Amaru refletiu, na verdade, o anseio por recuperar um suposto tempo perdido. No que se refere à resistência negra à escravidão, ela assumiu diversas formas: aborto de negras, assassinatos de senhores e feitores, destruição dos instrumentos de trabalho, fugas e rebeliões. Era comum negros fugitivos organizarem redutos para restaurar a vida tribal destruída. Eram os chamados palenques, equivalentes aos quilombos brasileiros. Levantes sérios de escravos aconteceram nas minas colombianas, entre 1750 e 1790, e na Venezuela, em 1795. Apesar das dificuldades, a Coroa espanhola sempre acabava controlando as sublevações — inclusive porque nunca aconteceu
que
as raças oprimidas,
negros
e índios,
se unissem
numa única, imensa e organizada insurreição. A única rebelião de um setor oprimido na América Latina que conseguiu um êxito político concreto, expulsando os brancos e criando um Estado, foi a dos negros do Haiti, na passagem do séc. XVIII para o séc. XIX. Só que, com o transcorrer do tempo, o poder acabaria ficando com uma restrita oligarquia e a massa popular passaria às estatísticas como uma das mais pobres do mundo. O que prova aos historiadores que a autenticidade étnica é insuficiente para que uma rebelião adquira seu mais profundo sentido social. Não sendo acompanhada de um projeto coerente com tal propósito, ela pode muito bem, como ocorreu no Haiti, degenerar numa simples troca de elites opressoras.
Conclusões sobre o mercantilismo e o monopolismo Como já foi bastante enfatizado, o objetivo desse conjunto de práticas econômicas conhecido pelo nome de mercantilismo era o enriquecimento da Metrópole. Para isso, se
articularam, numa totalidade complexa, repressão, ideologia e administração, gerando um processo em que se combinavam a dominação e a apropriação. O mercantilismo integrou
áreas centrais — produtoras de artigos tropicais e minérios —
e periféricas — abastecedoras de mão-de-obra e produtos de subsistência. Os metais preciosos, por sua parte, vieram a ser
EQ
MIA
: (4)
o fator
nomia,
determinante
do
nível
do
índice
de
monetarização
da eco-
e qualidade da atividade comercial e do
ão e amns te ex da m, fi en — ão aç ut ib tr da e ad id ns te in e tipo
plitude da riqueza metropolitana. Parte integrante da fase primitiva da acumulação capi-
limites u ui ss po o an ic er am oan sp hi o sm li ti an rc me o a, ist tal abem definidos nas possibilidades de apropriação, de utiliz
ção da mão-de-obra, de abastecimento da área mineradora €
de manipulação dos recursos tecnológicos disponíveis. O que não supunha limites era a demanda. Por isso, com a implantação das práticas mercantilistas e seu regime de privilégios e monopolismo, a vida dos nativos foi drasticamente reordenada em função do trabalho compulsório e da busca afanosa do lucro a curto prazo, tanto na esfera estatal como no âmbito privado. Criou-se, assim, na América Colonial hispânica, uma economia à base de relacionamentos sociais e valores internos pré-capitalistas e relacionamentos mercantis externos de tipo capitalista com a metrópole. O afluxo de metais preciosos à Espanha sustentou indefinidamente a estagnação nacional — e essa estagnação condicionou a paralisia das estruturas americanas. Resumindo, a interdependência produziu o atraso mútuo. exposto acima, verifica-se algo importante: o secular sofrimento do nativo e do negro nas estruturas sociais desDo
te continente, por mais que excitea indignação, não pode ser isolado de uma totalidade, devendo ser visto como parte necessária de um sistema cuja razão de ser eraa obtenção de excedentes.A brutalização das classes dominadas, a despeito dos protestos de alguns padres bem intencionados, foi lógica e inevitável e não produto da perfídia individual de senhores e burocratas — mesmo que esta tenha existido. Tudo o que resultou da implantação do mercantilismo monopolista foi coerente com sua natureza intrínseca, incluindo contradições, conflitos, extorsões e desumanidades. Para um rigoroso espírito científico não há sentido em aplicar a palavra ““abuso'” para classificar o processo mercantilista. Os supostos “abusos”
foram, de fato,a própria essência das práticas daquele sistema.
59
VII. As transformações do século XVIII Espanha e América na fase bourbônica Entre 1701 e 1713, a Europa viveu um
período de
querras generalizadas, envolvendo Inglaterra, França, Áus-
tria, Império Alemão, Itália, Espanha e Portugal. Luis XIV, o onipotente rei da França, queria, a todo custo, manter, no trono espanhol, o seu neto, Felipe V, herdeiro presuntivo do último Habsburgo do Escorial, Carlos Il. O Tratado de Utrecht (1713) acabou reconhecendo o fato, fundando a dinastia que até hoje reina na Espanha. Filipe V (1700-46) implementou uma série de reformas visando modernizar e dinamizar a administração, de
modo a fazê-la mais racional. Uma
racionalidade que não
procurava aliviar o peso da dominação aristocrática, mas sim tornar mais eficazes a fiscalização e a arrecadação. Em outras palavras, desemperrar a enorme e corrupta máquina
burocrática e viabilizar um absolutismo mais eficiente.
diretos
eficiência, o rei preferiu os assessores de as ari ret sec as ou Cri o, iss por e, s ho el ns Co da
nome
Em
aos
de des , que se reist reg , ias Índ às to pei res diz que Estado. No
de l ia rc me co o li pó no mo o pel s ada cri es ad ld 1680, as dificu mo co iz Cád ir fer pre à o rn ve go o ado lev Sevilha tinham V comipe Fil 7, 1 1/7 Em e. qu ar mb se de e ue rq ba porto de em
a de Cas a ade cid a est a par do in er sf an tr , so es oc pr pletou o s. ato rel cor os égi vil pri e os li pó no mo os e n ió Contratacc Sucessor
Filipe V, Carlos
de
Hl (1759-88),
educado
aiz rn de mo a ar nd fu ro ap ou sc bu , id dr Ma de e rt Co longe da s are ili aux de pe ui eq a um de e -s do an rc ce , va ti ra st cão admini
o sid ter de ois dep , ias Índ Nas a. ez br no da am nh vi que não
do viceo ad br em sm de a, ad an Gr va No de o ein e-r vic o criado o do Rio ein e-r vic ,0 78 17 em , giu sur , 18) (17 u Per do no rei eu rd pe l ia rc me co o li pó no mo o o, mp te o sm me da Prata. Ao lo hátil par a ou ss pa iz Cád 65 17 em s poi z, ide rig a antiga rmite de 78 17 em , te en lm na fi e, tos por ros out ve com no com r ia rc me co a ri de po ol nh pa es to por er qu al qu que nou-se a América. Com esta última medida, Carlos Ill pretendeu desestio sid am nh ti e ebr cél s mai o pl em ex o cuj o, nd ba ra mular o cont na, ipi fil al pit (ca a ill Man re ent a rot a am zi fa que os galeões uod pr a u lo mu ti es Ill los Car . co ul ap Ac e ) 71 15 em a fundad er nd ve a par sas coi s mai e ess tiv s pai o que a par a ol nh pa cão es ades vid ati te en in nt co te nes r ve ol nv se de ou sc bu e a ic ér à Am estaque as , ive lus inc o, and tiv rea e, ol óp tr Me a a par s iva rat luc Stanley o nd gu Se ta. pra da o çã ra ne mi à mo co , as ad gn ta es “vam no ini, que to tan foi r ula tic par se nes to êxi o in, Ste a ar rb e Bá e, a ic ér Am da ha vin l ia nd mu ta pra da % 90 cio do séc. XIX, . na ca xi me ão iç bu ri nt co era % 66 al, tot se des As reformas bourbônicas se completaram por volta de
1790. Ocorridas a nível de superestrutura
das,
pública,
instrução
autonomia
— forças arma-
municipal,
assistência
s ela — a st li po no mo ca íti pol o, ic át cr ro bu social, aparelho es, as ent vig sse cla de es açõ rel as : ial enc ess o ram era alt não injustiças sociais, a apropriação, a miséria, o desperdício e a concentração da propriedade.
De resto, nem poderia ser di-
a pel das igi dir m ra fo as nç da mu as que do an er id ns co ferente,
a
e
ar
61 ma
própria estrutura de poder existente.
Por outro
lado, não
deixa de ser interessante acentuar que, mesmo não muito mais que um verniz, as reformas bourboônicas traram fortes resistências em diversos setores — clero, cracia, comerciantes monopolistas e alta burocracia tada no aparelho do Estado.
sendo encon-
aristoincrus-
No caso das Índias, não se deve atribuir às citadas re-
formas a sobrevivência do Império espanhol por todo o séc. XVIII: reconhecido oficialmente pelo Tratado de Utrecht, teria continuado a existir de qualquer modo. Quanto aos grupos sociais inferiores, em nada viram sua sorte melhorar, embora a escravidão índia tivesse sido formalmente derrogada e o trabalho forçado do regime da encomienda substituído por um sistema de tributação. Para as colônias, a Espanha era uma metrópole distante e isso reforçava o princípio de que as leis aí estavam para serem burladas. Por outro lado, quando rebentaram as revoltas das raças oprimidas — eloquentes depoimentos de como os novos tempos continuavam velhos — o governo dos Bourbon as reprimiu como qualquer Habsburgo o teria feito. Desta forma, ao longo de todo o séc. XVIll a Espanha continuou em decadência, o que não poderia ser detido por reformas paliativas. A despeito do bem intencionado Carlos II, o país não conseguia abastecer colônias enormes, cuja população crescia e cuja produção cada dia se tornava mais significativa em face da estagnação da Metrópole. Em resumo, os fracassos e limitações do projeto colonial-monopolis-
ta não puderam
ser superados por um programa cuja inten-
ção era modernizar sem transformar.
Uma experiência na América: os intendentes Adotando o modelo francês e visando “tornar
mais
leve, nas Índias, a máquina enferrujada da administração
dos vice-reis”, Filipe V inaugurou um sistema de intendencias, que representou a versão latino-americana das secretarias de Estado da Espanha. Designados pessoalmente pelo monarca, os superintendentes (nos vice-reinos) e os intendentes (nas cidades) envolviam-se diretamente nos pormenores 62
i
administrativos e burocráticos, sempre com o mesmo obje-
tivo — assegurar o fluxo das rendas para o rei e controlar os
agentes do poder real. Os superintendentes e intendentes
verdadeiros executivos do mercantilismo, com a inmcumbência de agilizar o monstro emperrado da burocracia colonial e impedir a evasão de impostos. Nos municípios, o eram
equivalente do intendente foi o subdelegado, que assumia à
tarefa de vigiar os índios e cuidar da administração, substituindo, na prática, o a/calde mayor e os corregidores, e zelando para que a liberdade de ação das oligarquias locais não viesse em detrimento do fisco real. A dominação monopolista da metrópole precisava se articular com a dominação de classe, já que esta é que viabilizava a produção do excedente que alimentava a voracidade do insaciável tesouro da Coroa. O universo colonial exigia uma complexa integração, envolvendo desde o rei no Escorial até o produtor de artigos tropicais nas florestas perdidas no Novo Mundo. Ao criar os superintendentes, intendentes e subdelegados, o rei deixava clara sua intenção de impedir que a arbitrariedade e a corrupção se apropriassem da parte do excedente econômico que lhe pertencia, como há muito vinha acontecendo. O passivo do colonialismo A conquista se distinguiu pela rapinagem desenfreada
e a colonização por um burocratismo estéril e corrupto. A cidade tos de abismo índios
foi o centro dinâmico das decisões e dos instrumendominação. A estrutura social caracterizou-se por um entre a minoria de privilegiados e a grande massa de e negros deserdados, coagidos a variadas formas de
trabalho
compulsório,
havendo
de permeio
uma
instável
e indefinida multidão de mestiços. Integrada perifericamente no emergente capitalismo europeu pela via do mercantilismo monopolista, a América espanhola era obrigada a
produzir apenas o que interessava a outros. Suas foram dilapidadas, a possibilidade de um progresso gico foi limitada pela alternativa de explorar até a um trabalho aviltado e o mercado interno não teve
riquezas tecnolóexaustão como se
63
expandir, dada a natureza das relações de produção pré-capitalistas e a elevada concentração da renda. No que tange à Espanha, locupletou-se com as riquezas extorquidas do Novo Mundo e assim alimentou tanto a pompa quanto a estagnação. As reformas bem intencionadas do séc. XVIII não deram em nada, a longo prazo. Elaboradas por um sistema de poder alicerçado em estruturas tradicionais, estavam limitadas pelo fato de terem surgido dentro de molduras estabelecidas e não para derrubá-las. Os últimos restos de grandeza da Espanha desapareceram com a emancipação de suas colônias. Um século mais tarde, a perda de Cuba e Porto Rico e a humilhante derrota para os Estados Unidos viriam como melancólico corolário. Sintomaticamente, como observou Josué de Castro, em pleno séc. XX a divisão dos latifúndios espanhóis ainda era a mesma dos tempos de Fernando e Isabel.
E
a
VIII. As novas necessidades do capitalismo europeu O progressivo declínio das formações sociais feudais e a segura expansão do modo de produção capitalista foram os traços dominantes da história européia ocidental durante o período que os historiadores costumam rotular de Idade Moderna. Em nenhum país o capitalismo teve um desenvolvimento tão profundo e precoce como na Inglaterra, o que se deveu
a dois motivos.
Em
primeiro
relações servis se desintegraram a formas
novas de dominação,
lugar, neste país, as
muito cedo e deram lugar como
o arrendamento
eo
salário na zona rural, rompendo-se o vínculo obrigatório do camponês com a terra. Por outro lado, a possibilidade de se produzir lã para teares britânicos e flamengos incentivou donos
de terra a cercarem
os campos
comunais,
transfor-
mando-os em pastagens e enxotando os camponeses para as cidades. À mesma coisa também fizeram comerciantes ricos
e proprietários de manufaturas que, investindo em terras, as destinaram à criação de ovelhas ou à agricultura em regime
capitalista para abastecimento das cidades que cresciam. A implantação da propriedade privada absoluta no meio rural significou a formação de uma massa camponesa posta em disponibilidade para se tornar mão-de-obra barata nas nascentes indústrias urbanas. O segundo motivo que explica a posição avançada da Inglaterra na expansão capitalista é de ordem política. No séc. XVII, os interesses dos proprietários de manutfaturas, negociantes e proprietários rurais capitalistas se uniram as expectativas dos pequenos rendeiros na luta contra a dinastia Stuart, último baluarte da declinante hegemonia aristocrático-clerical. As revoluções de 1640 e 1688 conduziram a um acordo onde a preservação da Monarquia se tornou o símbolo da “concórdia das ordens” — a velha nobreza recuou, aceitou uma acomodação com a emergente burguesia, de modo a instaurar a paz interna necessária ao projeto de acumulação capitalista. Em contrapartida, a aristocracia continuou a ocupar cargos de mando e a própria burguesia passou a ver no título de nobreza um adorno válido e respeitável para o status resultante da riqueza adquirida. Atrás dessa conciliação, encontrava-se o temor das elites. A presenca dos niveladores na revolução de 1640 mostrara a elas que se insistissem em continuar seus conflitos internos surgiriam brechas perigosas, por onde poderiam irromper descontentamentos e as reivindicações populares. Ao se iniciar o séc. XVIII, as classes dominantes inglesas já tinham chegado a um acordo quanto ao novo pacto
político, estabelecendo a partilha do poder e o liberalismo
econômico, de modo a viabilizar a acumulação capitalista. O Estado não praticaria apropriações ao estilo mercantilista
para cobrir gastos estéreis e também não interviria no pro-
cesso econômico, limitando-sea funcionar como uma espécie de polícia a serviço das leis do mercado. Finalmente, ao liberalismo econômico não deveria corresponder a democratização das instituições políticas, o que poderia comprometer a solidez pretendida para o sistema.
A
Inglaterra se tornara, ao longo do séc. XVIII, a
rainha dos mares, superando, sucessivamente, a Espanha, a
o ng lo de io rc mé co o , ro ei gr ne o ic Holanda e a França. O tráf aor pl ex a m co o nt ju m, ra fo al curso e a expropriação coloni
uum ac da s re to fa is pa ci in pr os a, br -o ção interna da mão-de
lação primitiva do capitalismo Índia
e o Canadá
aos franceses (Tratado
britânica
burguesia
inglês. Tendo arrebatado
conseguiu,
dessa
de Paris,
a
1703), a
promissores
forma,
s. ai ri st du s in ma ri -p as ri té ma de es nt fo mercados e Em comparação com a Inglaterra, a França teve me o ng lo ao a, st li ta pi ca ão aç ul um ac es de ad nores possibilid um lado, r . Po sa lo pu po is ma e ss fo ra bo em I, II XV c. do sé
pesaram
restrições
as
mercantilistas
de
uma
monarquia
cios. gó ne s do ão ns pa ex e vr a li a av iz ul ac st ob e a qu st ti absolu nto de me vi mo o st va o ça an Fr na e uv ho o nã o, tr ou r Po eses para on mp do ca an ls pu ex e, qu os mp ca s to do en am rc ce bra barata -o de omã a de rv se re a um em ou lt su , re de da ci a
a a para as fábricas. A indústria que mais se desenvolvi era o se nã e, qu e to ri st o re ad rc me um ra pa xo lu s de go ti ar de sadestinando ao consumo de massa, estimulou mais o arte o» nato do que a tecnologia. Enquanto na Inglaterra os camp s de neses foram privados do controle direto sobre os meio aprodução pela expansão do capitalismo e pela concentr u cão da propriedade, na França O declínio da servidão levo ros ao crescente progresso de uma numerosa classe de rendei proprietários
e pequenos
rurais,
auto-suficientes
nas suas
s. re do va er ns o co it te mu en lm ua s ig e ia nc rê ca as e miséri O rigoroso centralismo político, a manutenção dos , os ci gó ne Os ra os nt it co ce on ec pr a, os ez br s no io da ég privil ia ra ac pa cr to is ar e a tr en do or ac um ra pa ço pa es a de lt a fa
e nt ge er em ca e mi nâ a di si ue rg bu a e um e nt de ca de a e ri sitá ta en fr en ao e e ss pa im ão ao aç tu do si a in uz nd am co ar ab ac
mento. Através da Revolução Francesa, a burguesia em as censão buscaria o necessário desafogo político para o exito
do projeto capitalista. A maior impermeabilidade das estruiib ss po im s a e ai ci so os s ct õe pa e aç ci go s ne sa a ce an s fr tura es çõ em ca di in e iv re nt as me ca di ri r ju ça er ic al de de da li ri to ob en am rl pa do e a rt Ca a gn Ma da po ti os do nt instrume garam a uma ruptura radical com o passado. Enfim, os acontecimentos
C
mA
O.
mostram
que,
na
França,
foi
inviável
a
67
conciliação que, levando a um equilíbrio entre mudança e continuidade, poderia disfarçar ou atenuar o conteúdo mais profundo das transformações. Na Inglaterra, o liberalismo enraizou-se em tradições estabelecidas e respeitadas, e confundiu-se com elas, ao passo que na França teve de aparecer como algo completamente novo e alimentando-se de uma confiança entusiasmada e quase religiosa num futuro redimido para a raça humana. Essencialmente francês, o ilumi-
nismo veio a ser a expressão teórica da ideologia liberal. Sua doutrina falava nos “direitos naturais” do homem à liberdade e à busca da felicidade, desenvolvendo a crença de que a sociedade só seria feliz quando fosse governada pelos ditames da razão. Em outras palavras, urgia suprimir os irracio-
nais privilégios da monarquia e do nascimento: a igualdade perante a lei e as oportunidades deveria ser plenamente implantada. Entretanto, por trás desse discurso existia uma realidade concreta não contempiada pelo iluminismo: o fato da propriedade persistir como a base material da desigualdade. Na verdade, estava, no arcabouço de pensamento
dos iluministas, implícita a seguinte idéia: uma vez suprimidas as nefastas barreiras de nascimento, as desigualdades que prosseguissem entre os homens seriam lógicas e aceitáveis, já que decorrentes do fato de uns terem tido “mais capacidade"" que outros para “subir na vida”. Incorporando à defesa da liberdade humana os mais
elevados ideais éticos e filosóficos, ó iluminismo foi abso-
lutamente consentâneo com as novas necessidades da expansão capitalista da segunda metade do séc. XV! |, princi-
palmente quando a máquina a vapor e o tear mecânico provocaram um notável crescimento dos índices de produtivi-
dade. Na França, iluministas e fisiocratas se uniram contra o monopolismo mercantilista e restritivo e na defesa da liberdade de produzir, comprar e vender como sinônimo de riqueza e prosperidade. Na Inglaterra, Adam Smith (A
Riqueza das Nações) expôs minuciosamente seus argumen-
tos contra a intervenção do Estado na economia e em favor da total liberdade nos negócios. Tudo isso expressou o dese-
jo da burguesia de libertar-se das amarras para livremente
6
ai
RE
poder
usufruir
tão-somente
do trabalho alheio, comerciar
e enriquecer,
regida pelas sagradas leis da concorrência, do
mercado e da propriedade. A expansão do capitalismo europeu e do correspondente ideário liberal vieram a ser os fatores condicionadores externos mais importantes do processo emancipatório que rompeu o vínculo entre o Novo Mundo e os países ibéricos no começo do séc. XIX. Interessado em expandir os mercados que o mercantilismo monopolista mantinha fechados mediante restrições e privilégios, o capitalismo internacional, notadamente o inglês, se tornou o grande promotor das emancipações latino-americanas, em nome da urgente necessidade de redimensionar a integração desta parte do mundo no contexto econômico europeu. Outrora instrumento útil para o comércio burguês, o mercantilismo se transformou num sério problema para o crescimento da burguesia a partir de determinado momento e, portanto, precisou ser re-
movido. A independência e constituição de Estados nácionais vieram a ser os instrumentos políticos indispensáveis na consecução deste objetivo. A intenção antimonopolista do capitalismo internacional coincidiu com o desejo das elites latino-americanas de se libertarem da tutela e da opres-
são econômica da Metrópole e, desse modo, dois grupos dominantes, em dois continentes diversos e com caracteris-
ticas contrastantes mas em plena sintonia de interesses, terminaram confluindo para um mesmo objetivo e um mesmo resultado.
IX. Independência: possibilidades e limites O processo emancipatório da América Colonial hispânica O fato da chamada elite criolla ter sido a promotora da independência determinou, simultaneamente, as finalidades e os limites desta. Constituindo-se em classe dominante, não tinha, é claro, nenhum interesse em alterar a ordem social vigente. A estrutura interna latino-americana estava montada em função da articulação com os mercados europeus, para onde iam matérias-primas e de onde vinham as manufaturas. O monopolismo ibérico, tornando insuportável o pacto colonial, motivou, a partir de certo momento, a rebelião emancipatória. Por trás de uma retórica libertária o que houve foi a oposição aos seculares privilégios gerados no mercantilismo: a cobrança de impostos, a proibição de
produzir e negociar livremente e a obrigação dos navios que vinham ou saíam do Novo Mundo de passarem obrigatoriamente por portos ibéricos.
Com efeito, para a aristocracia local, a independencia bases, os as nov em ar, cul rti rea de io me um e nt me so otã fo!
vínculos com o mercado europeu, sem alterar a sua substância e o caráter de dependência.
Internamente,
deveria
ser
preservada a estrutura de classes montada na fase colonial. nExternamente, havia que modernizar e diversificar a depe fundência ao capitalismo internacional em ascensão. Em ção da causa emancipatória, acionou-se a ideologia liberal
importada da Europa. No Velho Mundo, tal ideologia tivera
o objetivo de promover a ascensão política da burguesia e extirpar os obstáculos mercantilistas à expansão do projeto capitalista. No Novo Mundo, ela foi também usada para ex-
tirpar
obstáculos
mercantilistas
mas
não
para
levar
uma
nova classe ao poder, e sim para consolidar, pelo contrário, a que já era tradicionalmente dominante e garantir-lhe os cargos de mando em lugar dos administradores metropolitanos que representavam o velho regime, já em franca decadência. Na realidade o liberalismo teve um papel revolucionário na Europa, substituindo as classes dominantes e viabilizando a hegemonia do modo de produção capitalista. No Novo Mundo, porém, atuou sobre uma base muito mais estreita, visto que teve por finalidade respaldar interesses de uma classe hegemônica de feição pré-capitalista. Enfim, o liberalismo latino-americano diluiu-se num contexto sócio-político onde a conservação prevaleceu sobre a transformação. Interessado em ampliar mercados e negócios na América Latina, o capitalismo europeu, com o inglês na vanguarda, não tinha qualquer interesse em que as estruturas dos
países do Novo Mundo sofressem qualquer alteração. E com
razão, pois tal como se encontravam serviam perfeitamente aos interesses europeus, que, desta forma, poderiam manter tais países em uma posição de dependência em todos os
planos. Na verdade, a introdução do liberalismo nas relações comerciais apenas serviu à modernização das formas de controle externo. Uma vez completadas as guerras de independência, as elites locais assumiram o poder político como
herdeiras da autoridade colonial e não como instrumentos
de transformação.
71
As circunstâncias que levaram à luta
maà ço pa es u ri ab e qu s to re nc co s to en em el s do Um nifestação dos descontentamentos da elite criolla foi a decadência da Metrópole, que o reformismo dos Bourbons não logrou deter. A Espanha não conseguia abastecer convenientemente as colônias, que, por seu lado, se expandiam e viam crescer sua população. Do ponto de vista ideológico, além da influência do
iluminismo
europeu,
ocorreu, no ocaso do
século, a influência da independência das colônias inglesas da América do Norte, marco de origem dos Estados Unidos. Tal fato foi um exemplo: era a primeira vitória dos colonizados sobre os colonizadores. Assim, os Estados Unidos tor-
naram-se um foco irradiador do ideário liberal-emancipatório e um inimigo a mais do monopólio comercial no Novo Mundo. O rápido declínio do monopolismo espanhol! iniciou-se durante a longa querra européia que se seguiu à tempestade política, social e espiritual representada pela Revolução Francesa. Impelida pelo Diretório, a Espanha entrou em querra contra os ingleses e, impedida, pela marinha británica, de abastecer suas colônias, tomou, em novembro de
1797, a decisão de abrir os portos das Índias aos navios neutros, esperando, através deles, continuar seus contatos com
o Novo
Mundo.
medida em restauração
É verdade que Madrid pretendeu anular a
1799, mas a situação se tornara irreversivel. A da paz na Europa (Tratado de Amiens, 1802)
foi demasiado efêmera para que o governo espanhol pudesse ter tempo de ressuscitar seu domínio colonial, a essa altura mortalmente golpeado. O país mais beneficiado com a crise européia de 1795
a 1815 foram os Estados Unidos. Navios americanos entraram, em quantidade cada vez maior, no Chile, no vice-reino do Rio da Prata, em Callao, Vera Cruz e Havana. Conforme
Chaunu, “em 1795, o volume das exportações dos Estados Unidos para a América Latina já era, apesar do monopólio
hispânico, de US$ 1.389.219; e o das importações, de US$ 1.739.138”. Em 1801, após o Ato de 1797, “as exportações ascenderam a US$ 8.437.659 e as importações a
72
as , io rc mé co o m co e nt me ea an lt mu Si ". 88 .8 US$ 12.799 conno is ma vez da ca am av tr ne pe as an ic er am eidéias nort
mo o ra nt co e in Pa as om Th de to le nf pa to en ol tinente: o vi as concepções liberais de nopolismo (O senso comum) Jefferson eram avidamente absorvidos por aqueles que se comprometiam com a causa emancipatória. Em 1806, inspi-
rado pelo republicanismo dos Estados Unidos, Miranda ten tou sublevar a Venezuela, ajudado pelos ingleses. Prematuro e mal conduzido, o esforço acabou em fracasso e repressão. Em maio de 1808, Napoleão forçou a abdicação dos Bourbons na Espanha para colocar no trono o irmão José Bonaparte. Rompeu-se, em consequência, o elo entre à Metrópole e as Índias. Napoleão tentou obter o apoio das colônias para José Bonaparte, mas Caracas, México, Bogotá e Buenos Aires se recusaram a reconhecer o usurpador e proclamaram a fidelidade à Junta de Sevilha, representante da dinastia caida. Entretanto, a instabilidade do momento, a divisão e a acefalia política da Espanha e a ação dos agentes napoleônicos acabaram fazendo a situação evoluir de uma proclamação de fidelidade dinástica a um movimento separatista.
A primeira fase da luta emancipatória Tudo começou em 1810: Manuel Belgrano, líder das elites rebeladas de Buenos Aires, expulsou o vice-rei nomeado pela Junta de Sevilha e o impacto do acontecimento fez a revolta se irradiar por todos os lados. Em 1811, Chile e Paraguai deram o sinal. No Paraguai, Gaspar Rodrigues Francia instalou uma insólita ditadura que combinou paternalismo estatal, tradições comunitárias indigenas e jesuiticas e um ferrenho isolacionismo. No Uruguai, Artigas enceguerrilheira, tentando unir a causa emancipatória à reforma agrária em favor dos deserdados do campo. O projeto foi impedido pelo Brasil, que anexou
tou
heróica
campanha
temporariamente O vizinho país (1821-28). No
México,
o padre José
contra o dominador
Hidalgo
levantou os índios
espanhol e acabou executado (1811).
O padre Morelos, sucessor de Hidalgo, conseguiu fazer pro-
clamar a independência da Nova Espanha e chegou a incluir 73
qa
medidas de cunho democrático-jacobino em seu projeto político, como a abolição da escravatura, a reforma fiscal e a igualdade de todos perante a lei (1813). Entretanto, as tropas regulares do general Iturbide, reforçadas por 8.000 soldados vindos da Espanha, terminaram derrotando as desorganizadas milícias índias e Morelos também foi executa-
do (1815). Em 1811 Caracas primeiro e Quito em seguida também romperam com a Espanha. A Constituição de 1811, inspirada em Jefferson, criou os Estados Unidos da Venezuela
e Miranda,
o líder
rebelde
de
1806, assumiu
o
poder. Todavia, um ano depois Caracas voltou às mãos dos realistas. Prisioneiro em Cádiz, Miranda morreria em 1816. Nesse meio tempo, Simon Bolívar tinha sucedido a Miranda e conseguido proclamar uma segunda República venezuelana. Nascido em 1783, homem de boa erudição, temperando seu idealismo libertário com leituras de Plutarco e Rousseau, Bolívar não teve, inicialmente, maior sucesso que Miranda. Derrotado pelos espanhóis, que retomaram definitivamente Caracas em 1815, foi forçado a se exilar na Jamaica. Quito, América Central (que se sublevara em 1812) e Chile também acabaram reconquistados pelos espanhóis e, por volta de 1815, a aventura da independência parecia um capítulo encerrado. Nesse ponto, deve o historiador se perguntar sobre os motivos desse fracasso. As respostas são várias. Afastado o poder colonial que unificava artificialmente a América, evidenciou-se a grande fraqueza das lutas emancipatórias em virtude da pulverização dos poderes locais, da fragmentação política do continente, da desunião e rivalidades pessoais que esfacelavam os exércitos rebeldes e paralisavam as vontades. Ademais, importantes frações da Igreja católica e da elite críolla não apoiaram decididamente a luta, pois temiam uma eventual
revolução social incubada na revolução colonial. Quando do terremoto de Caracas, em 1812, houve padres que afir-
maram ser o mesmo um castigo de Deus contra súditos injustamente revoltados.
Muito importante também foi a conjuntura internacional que, se por um lado, favoreceu o desencadear da 74
rebelião, por outro, prejudicou a sua continuação. As contradições da política britânica naquele momento exemplificam bem esta afirmação: auxiliar a emancipação hispano-americana
interessava ao capitalismo
inglês, mas
isso contrariava
frontalmente o interesse da Junta de Sevilha, empenhada na restauração bourbônica . .. e da quala Inglaterra precisava
na luta contra Napoleão. Quanto aos Estados Unidos, envolvidos na segunda guerra de independência contra os ingleses (1812-15), nada puderam fazer pelos insurretos. Em 18195, derrotado Napoleão e restaurados os Bourbons espanhóis, na pessoa do intransigente Fernando VII, tropas e navios foram liberados para “restabelecer a ordem” nas colônias. Os rebeldes não tinham marinha, as distâncias e dificuldades de comunicação isolavam os focos de rebelião e, desse modo, não foi muito difícil para a Coroa derrotar, um depois do outro, os núcleos locais de resistência. Mal preparadas, as tropas nativas não tinham como opor-se a soldados profissionais bem adestrados.
A
restauração
dinástica
na
Espanha
portanto, a restauração da dominação
correspondeu,
colonial na América.
Europa vivia aquele curto período em que o reacionarismo militante sonhou com a restauração da velha ordem. A
A segunda fase da luta emancipatória Na América espanhola dos anos 1815-17, calma temporária e tensão política se combinaram. Liberta de sua contradição conjuntural, a Inglaterra ficou em condições de apoiar diplomática e materialmente os rebeldes. Além disso, a Espanha pôs em vigor, nas colônias, uma política repressiva tão brutal quão desastrada, incluindo execuções, confis-
cos e vinganças e provocando a oposição generalizada à Me-
trópole.
Não
se pode,
aliás, nesse ponto, acusar Fernando
VII, restaurador até da Inquisição, de ter sido incoerente, pois que
internamente também aplicou uma política de repressão aos liberais espanhóis, o que provocou a rebelião de
1820, sufocada graças à intervenção do exército francês do não menos reacionário rei Luis XVIII.
YO
75
A ferocidade de Fernando VII fez a guerra reacenderse em toda a América Colonial hispânica a partir de 1817. Depois de anos de luta, generais rebeldes e massas nativas já tinham adquirido experiência militar suficiente. A dispersão geográfica, que facilitara a repressão vinda de fora, poderia agora servir à eclosão de levantes em vários locais, dificultando o deslocamento das forças repressivas, obrigadas a sair dos pontos onde tinham se estabelecido. Comandantes
como Bolívar e San Martin sonharam em construir um continente à base da harmonia social, enquanto os soldados
indígenas ansiavam por uma justiça que as estruturas coloniais sempre lhes tinham negado. Com ajuda inglesa, Bolívar voltou à América do Sul e,
em 1818, conseguiu dominar a foz do Orinoco. Pagando do seu bolso, alistou ingleses e irlandeses para lutar ao lado
dos índios das terras altas, formando um exército bastante heterogêneo. Apesar da habilidade do comandante espanhol, Morillo, conseguiu atravessar os Andes e libertar Nova Granada e em 1819 nascia a Colômbia. Logo a seguir tomou Caracas e fundou a Terceira República venezuelana (1821). Enquanto isso, na outra ponta da América do Sul, José de San Martin conseguiu unir os divididos argentinos e tornou-se o sucessor de Belgrano. Interior da Argentina e Buenos Aires superaram momentaneamente as suas desconfianças e a independência nacional foi formalizada no Con-
gresso de Tucumán,
San
do
Martin
entrou
O'Higgins,
no ano de 1816. Cruzando os Andes,
no Chile e, unindo-se à luta de Bernar-
derrotou
os espanhóis em
guiu libertar definitivamente o país (1818).
Maypu
e conse-
Graças à frota inglesa de Lord Cochrane, San Martin evitou o deserto de Atacama e entrou no Peru. O vice-rei fugiu de Lima e mais um país se tornou independente (1821). Ao mesmo tempo em que isso acontecia, Bolívar marchava para o sul e, em 1821, incorporou o Equador à Colômbia. Um ano depois, Bolívar e San Martin se encon-
E
po
EA F
76
mino
traram em Guaiaquil, em famosa entrevista, após a qual San
Martin
se
afastaria
do
cenário
político
latino-americano
reocupar
Lima, mas foram
para morrer no exílio europeu, em 1850, Os espanhóis conseguiram
definitivamente batidos em Ayacucho, por Sucre, oficial de Bolívar (1824). Em 1826, a rendição da guarnição de Callao encerrou a era colonialista ibérica no Novo Mundo. Porto Rico e Cuba ficariam como os últimos farrapos de um
outrora tão poderoso Império. No contexto emancipatório, a situação do México foi curiosa. Iturbide esmagara a revolta de Morelos não por causa de sua fidelidade política à Espanha mas por causa de um temor de classe diante do conteúdo social daquele mo-
vimento. Em aterrorizou
1820, a notícia da revolta liberal na Espanha os setores
reacionários
mexicanos
que
tinham
apoiado Iturbide e este fez desse medo um trampolim para suas ambições, conseguindo coroar-se imperador com o nome de Augustin |. Todavia, sua monarquia mal durou um ano (1822-23). Acusado de tirano, foi derrubado por Santa Ana. Querendo recuperar o poder, acabou fuzilado, em 1824. O México se tornou uma república federal, mas essa não seria a sua única experiência monárquica, como se verá mais adiante. A sustentação diplomática da emancipação Alcançada numa época em que a Europa
vivia sob
O signo restaurador do Congresso de Viena e da Santa Aliança, a independência hispano-americana viveu, inicialmente, a ameaça do retorno ao status colonial, através de
uma intervenção maciça das potências do Velho Mundo. Pelo menos Fernando VII, ao restaurar seu poder absoluto em 1823, sonhou com isso. Os países que garantiram a emancipação da América Colonial, naquele momento, foram a Inglaterra e os Estados
Unidos. Embora vivendo estágios diferentes do capitalismo,
ambos se uniram na política antimonopolista e no desejo de
ampliar mercados. Assim, a Inglaterra deixou claro que usa-
ria seus navios para bloquear o envio de qualquer expedição militar européia à América.
Eua
sa
"
'
Eu
yo
Respaldados por tal propósito,
71
os Estados Unidos resolveram proclamar (1823) a Doutrina Monroe ("'A América para os americanos”), afirmando que não tolerariam nenhuma ingerência do Velho Mundo nos assuntos do Novo. Retrospectivamente, há uma tendência a exagerar o alcance da Doutrina Monroe, considerando-a o ameaçador prenúncio do imperialismo norte-americano. Na época, os Estados
Unidos
não
eram
uma
potência
importante e cer-
tamente não tinham condições de aventurar-se militarmente longe de suas fronteiras. Considerando a questão com obje-
tividade, a Doutrina Monroe foi, no fundo, uma fanfarronada política, muito eficiente em termos de relações internacionais: os Estados Unidos posaram de “protetores” do continente simplesmente por saberem que nenhum invasor poderia impunemente atravessar um Atlântico patrulhado pela invencível frota britânica. Tal atitude tornou-se, de fato, um gesto diplomaticamente simpático para com as novas repúblicas, mas seria de duvidosa eficácia se as circunstâncias houvessem cobrado algo mais que declarações.
A fragmentação da América Colonial hispânica Um dos acontecimentos mais importantes da América espanhola pós-emancipatória foi o que Agustin Cueva e outros chamaram de “balcanização'”” do continente, isto é, a di-
visão em vários países. É pertinente perguntar-se por que ocor-
reu isto, principalmente levando em conta que a América por-
tuguesa, que ficou independente na mesma época, conservou, todavia, a sua unidade política. De maneira simplista, costumava-se no passado ensinar que a fragmentação política da América espanhola fora o resultado da proliferação de repúblicas, ao passo que a unidade do Brasil representara uma realização do governo monárquico. Mais certo é dizer que a mul-
tiplicação de repúblicas numa parte da América e o surgimento de uma monarquia unificada na outra foram consequências
das circunstâncias concretas que fizeram a primeira se esfacelar e a segunda se manter unida. Portanto, tomar a unidade ou divisão política como produto da adoção desta ou daquela forma de governo significa tomar o efeito pela causa.
78
metro ti
Um
fator
frequentemente da América
esfacelamento glesa, cuja hegemonia
pelo
cida num
continente
comercial
citado
como
responsável
é a influência inseria mais facilmente exer-
espanhola
dividido e, portanto,
debilitado. Em
cone dad uni de ho son O que -se nta ume arg e, tes a ess a apoio
sgre Con do so cas fra o com ou oro esb se r íva Bol de tinental cado s sse ere int os pel o ad de ar mb bo , 26) (18 má na Pa so do paí de ia ênc aus a çou for , ive lus inc , que , ico tân bri smo ali pit , ção oca col tal a nte Fre . ina ent Arg e le Chi , sil Bra mo ses co o que se pode observar é que ocorreu uma coincidência as e nar rei a par r idi div de a les ing ca íti pol ha vel uma re ent condições que já pré-existiam na América espanhola para a fragmentação. Com
efeito, a unidade da América Colonial hispânica
fora uma ficção política e jurídica a serviço dos interesses fiscais e mercantilistas. O “país formal” da América espanhola não correspondera ao “país real”, que sempre fora algo muito diferente. Este apresentava divisões tribais e lingúísticas, comunicações difíceis e populações rarefeitas num espaço amplo e extremamente diversificado. Por outro lado, não havia, no continente, um modo de produção capitalista capaz de propiciar a unificação política via integracão de mercados. A luta emancipatória foi resultado da ação de diferentes frações de uma mesma oligarquia, organizada a partir de determinados núcleos urbanos. Não existia uma fração hegemônica capaz de viabilizar a aglutinação política em torno de um único centro de poder. Como diz Kaplan, uma
vez afastada a dominação monolítica e coercitiva da Espa-
nha, a preponderância da inércia colonial levou ao estabelecimento de diversas hegemonias locais que, progressivamente, adquiriram uma fisionomia política e institucional, con-
figurada em frágeis e instáveis Estados nacionais. Stanley e Bárbara Stein observam que, destruído o colonialismo espa-
nhol, a tendência foi cada fração da elite agrupar-se ao redor do porto de exportação que melhor lhe permitisse uma
direta articulação com o capitalismo internacional, criandose, desse modo, um esboço de Estado capaz de fundamentar
19 AS
À
juridicamente dominante.
interesses econômicos
e mercantis
da classe
Em comparação com a traumática emancipação da América espanhola, a do Brasil foi pacífica, o que tem servido para alimentar os mitos sobre a cordialidade do brasileiro, entendendo-se
este termo como
sinônimo de passivi-
dade. O processo que resultou na independência do Brasil foi tão tranquilo que nem o chefe de Estado mudou na passagem de um status para outro. De fato, a instalação da Corte no Rio de Janeiro criara um efetivo centro de poder na América portuguesa e a expansão do café, justamente na região da capital, não demoraria a fornecer o necessário res-
paldo econômico a uma hegemonia político-institucional. Peru e México, que poderiam ter ocupado uma posição similar na América espanhola, tinham sua atividade econômica baseada na extração de metais preciosos, os quais, no século da revolução industrial, já não possuíam mais o significado econômico que os caracterizara na era mercantilista. Finalmente, há outro dado importante. Um forte interesse comum uniu as diferentes frações da oligarquia brasileira em torno de um centro de poder e de um monarca — a abolição indolor do monopólio e a construção pacífica de um Estado nacional seriam as melhores garantias de que a propriedade e a escravidão ficariam intocadas. Ao contrário da América espanhola, o Brasil teve no escravismo a única base de seu sistema social e a necessidade de mantê-lo veio a ser um ponto fundamental de coesão da classe dominante nacional, Não houve no Brasil, como no resto da América Latina, uma solução de continuidade entre o rompimento com a Metrópole e o início de um Estado nacional — foram dois momentos que integraram um mesmo processo político.
et
cd
a
80
X. Do caudilhismo aos estados nacionais O que foi o caudilhismo No instável e difícil meio século que se seguiu à emancipação, um fato se destacou na América espanhola: a progressiva militarização das instituições, resultado direto
da importância que assumira a luta armada no processo de independência. Mas esta não foi a única consequência resultante
da forma
assumida
pela separação da América
Colo-
nial hispânica em relação à Metrópole. Articuladas com ela importantes foram a submissão das massas po-
e igualmente
pulares, o férreo domínio da elite criolla e a tendência à solução violenta nos impasses políticos.
A geração militarizada que substituiu os generais idealistas da guerra emancipatória atuou sempre nos conflitos intraclasse dominante, servindo a uma ou outra facção e sempre impedindo que tais conflitos abrissem espaco às
manifestações populares. Formou-se, ao longo do séc. XIX, um militarismo que se ligou intimamente e permanentemente a
air oo
"A
)
aos interesses das elites: no começo, dos latifundiários, herdeiros diretos da hacienda colonial, e, num segundo momen-
to, do capital estrangeiro, quando este começou a penetrar
na economia do continente. A ausência de um poder político institucionalizado na fase posterior à independência abriu espaço às múltiplas manifestações autonomistas do latifúndio e foi assim que surgiram os caudilhos, líderes locais que funcionaram como porta-vozes das diferentes frações da classe dominante em variados momentos, valendo-se do amplo espaço que lhes permitia a falta de Estados juridicamente organizados. Com os caudilhos, fortaleceu-se uma tradição que se perpetuaria mesmo depois da América espanhola ter definido seus Estados e fronteiras: acima de leis ou instituições, com seu discurso ideológico, há o capricho de um chefe, com seu arbítrio e sua capacidade de arregimentar forças. No âmbito do caudilhismo se uniram o autoritarismo da dominação política e a anarquia da ordem institucional e, na base, destacou-se a prevalência de um modo de produção ainda précapitalista. Ao cabo, ficou, como herança perigosa, a validade da intervenção militar como um poder arbitral permanente na esfera política. Depois de superada a fase propriamente caudilhesca, o personalismo e o militarismo continuariam a ser elementos políticos mais dinâmicos e persistentes que os debates parlamentares ou a respeitabilidade das Constituições. Agustin Cueva observou que o caudilhismo tornou-se
um dos ingredientes favoritos da mitologia da ““incapacidade política” latino-americana, se contraposta à posição “evoluída” dos Estados Unidos, onde as instituições teriam sido sempre respeitadas. Acerca do problema, é preciso observar que, numa sociedade de classes como é a norte-americana, os conceitos de legalidade e de legitimidade são muito flui-
dos. Em outras palavras, a sociedade norte-americana, com todo o seu legalismo, é um regime de elites, idêntico aos da
América Latina, onde o arbítrio e os pronunciamentos militares tradicionalmente preponderaram sobre os refina-
mentos jurídicos. Por outro lado, a história da conquista do
Su
a:
Oeste, ocorrida na mesma época em que floresceu O caudide ia tór his a um ém mb ta foi , nde Gra Rio do sul ao lhismo violência anárquica, ambições particularistas e arbitrariedades de todo tipo. Finalmente, o “'barbarismo” e a “incapacidade política” inerentes ao caudilhismo não são características que se possam atribuir a todo um povo indiscriminadamente. Foram, isso sim, marcas registradas de uma elite em
nome da qual foi realizada a independência e que se manti-
nha no poder com a conivência dos interesses do capitalismo internacional. Vivendo uma fase em que nenhum setor da economia
primário-exportadora conseguia preponderar, de modo a possibilitar, em torno dele, a organização de um Estado na-
cional, a América espanhola recém-emancipada fracionou-se em inúmeras células de poder local e o caudilhismo constituiu-se na expressão de um militarismo pulverizado, com exércitos formados à base da fidelidade paternalística da massa rural submissa. Na opinião de Décio Freitas, o caudilhismo não foi nem o barbarismo avesso à civilização e nem a reação popular às tiranias de governos centrais sobre as províncias. Zorrilla, situando o caudilhismo no âmbito de um capitalismo ruralizado, com suas lutas intraclasse dominante, observa que o poder militar do caudilho esteve em íntima conexão com sua popularidade, a qual lhe permitia utilizar o campesinato como base de apoio e massa de ma-
nobra, gerando o que chamou de populismo oligárquico. Líder pseudo-popular numa fase de muitos conflitos locais e Estados nacionais ainda embrionários, o caudilho refletiu, em síntese, a fragilidade jurídica das instituições, a dependência das massas rurais submetidas ao latifúndio e o precário desenvolvimento das forças produtivas. Estados: nacionais e liberais
Foi a partir dos meados do séc. XIX que a fracionada América espanhola teve condições de evoluir rumo à institucionalização de Estados nacionais. Antes de mais nada, o fato resultou de uma conjunção das necessidades do
capitalismo internacional e as possibilidades do continente.
83
O capitalismo
precisava de mercados e fontes de matérias-
it
primas e o continente se revelou capaz de fornecer ambos.
Desse modo, constituir-se em Estados nacionais tornou-se a condição política capaz de viabilizar a integração desta parte do mundo ao emergente contexto capitalista hegemônico. Os países capitalistas adiantados se transformaram em compradores de artigos primários e vendedores de artigos manufaturados e os países latino-americanos, entre eles o Brasil, se abasteciam com as manufaturas estrangeiras e vendiam suas matérias-primas para os países centrais. Em todo o continente consolidaram-se, a partir de então, as classes dominantes monocultoras, co-participantes de um contexto de expropriação e dominação, encerrando definitivamente a conturbada era do caudilhismo. O que foi dito acima evidencia a articulação dialética entre o político e o econômico: o surgimento de Estados nacionais, ao mesmo tempo que cumpriu a função de viabilizar a inserção de toda a América Latina no contexto capitalista hegemônico, foi resultado direto da possibilidade dessa inserção. A organização econômica do continente, voltada a um centro dinâmico externo, trouxe como resultado necessário um período de modernização acelerada, inclusive com a participação de capital estrangeiro, interessado em que este processo se implementasse. Surgiram ferrovias, ampliou-se a rede de estradas, aparelharam-se os portos, construfram-se silos, usinas e instalações frigoríficas e a atividade produtora fixou-se nos artigos de que mais necessitava O capitalismo internacional. Com respeito a esse último aspecto, o capital estrangeiro chegou a montar enclaves produtivos dentro de alguns países, apossando-se, literalmente, da atividade mais importante, como ocorreu com o petróleo e certos minerais estratégicos para o processo de industrialização, deixando ao controle local apenas as áreas tradicionais e menos lucrativas. A modernização latino-americana, entretanto, não se
circunscreveu ao âmbito infra-estrutural. No nível político,
incluiu a institucionalização das tradicionais fórmulas liberais: governos presidencialistas, órgãos representativos,
84
Constituições e partidos políticos (normalmente um conservador e um /iberal). Na prática, deve-se dizer que as fórmulas liberais, importadas como panacéia mágica, pouco signtficaram numa América de massas índias, negras e mestiças humilhadas e submetidas a interesses de oligarquias nacio-
nais e estrangeiras. Capitalismo externo e oligarquias internas
manipulavam
os estamentos
burocráticos
do
Estado
—
sobretudo o militar — a seu bel-prazer. Frações de uma mesma oligarquia, os partidos careciam de qualquer representatividade. Atrás da fachada liberal, o que havia era um Estado excludente e repressivo. Basicamente, o liberalismo se constituiu no instrumento jurídico capaz de atender a interesses econômicos e a isso se limitou o seu papel: em nome dele, o Estado não intervinha nas relações de trabalho e assegurava, desse modo, a continuação da miséria secular.
Com
a vigência
da
ideologia
liberal, todas as formas
produtivas pré-capitalistas se viram submetidas ao interesse superior da economia dominante. Tal ideologia funcionou como a justificativa intelectual para a implantação jurídica do conceito
de propriedade
privada absoluta, isto é, a aqui-
sição por compra como único ato capaz de legalizar a posse de terra. À transformação da terra num bem capitalista regido pelas leis do mercado provocou, em diversos países, a expulsão dos índios de suas antigas reservas comunais. Tal ocorreu no México, El Salvador, Colômbia, Venezuela, Bolívia e Chile. E também no Brasil, onde o avanco das frentes pioneiras do café levou os latifundiários a expulsarem posseiros e índios e tomarem-lhes as terras, com a devida cobertura legal. Assim como a exploração do trabalho social e a ex-
propriação de populações
ocultos
nativas evidenciam
por detrás do discurso
dependência
dos
setores
de
liberal,
os interesses
da mesma
monocultura
em
forma
a
relação
empréstimos, financiamentos e mercados externos deixa claro a limitação da soberania nacional recém-obtida. Em
a
última instância, as maiores diferenças entre a nova situação
e o anterior status colonial limitavam-se a dois aspectos. Em primeiro lugar, não havia mais a imposição de manter um
85
relacionamento econômico exclusivo com uma única potência européia, em regime de monopólio. Pelo contrário, o continente passava à condição de condomínio de diversos países do Velho Mundo, embora a Inglaterra detivesse uma natural primazia. Em segundo lugar, os novos países haviam-se tornado formalmente independentes e, portanto, não estavam mais submetidos à administração direta da Europa, apesar desta, na prática, continuar sendo o centro econômico e cultural, Assim, o fato da administração direta ter passado às elites criollas veio a ser o dado que permitiu ao continente aparecer ante o mundo como um conjunto de Estados soberanos.
Ão longo do séc. XIX, à medida que foram se consolidando como Estados liberais, oligárquicos e não-democráticos, as nações latino-americanas passaram a extrair e produzir preferencialmente aqueles artigos de interesse direto dos países centrais e de suas indústrias em expansão. Ao invês de especiarias tropicais e metais preciosos, começaram a
ser exportados guano (Peru), trigo (Argentina, Chile), produtos pecuários (Uruguai, Argentina), salitre (Chile), cobre (Chile), estanho (Bolívia), petróleo (Venezuela, Peru, Méxi-
co), borracha e algodão (Brasil) e alguns artigos para alimentação como milho e batata (Equador). Num excelente estudo sobre as atividades econômicas de exportação na América Latina da fase oligárquica, Fernando Henrique Cardoso dividiu-as em economias nacionalmente controladas e economias
de
enclave.
No
primeiro
caso
(Brasil,
Colômbia
e
países platinos, por exemplo), a oligarquia interna manteve o controle sobre o setor dinâmico destinado ao mercado externo. No segundo (Bolívia, Venezuela e países centro-americanos, por exemplo), o capital estrangeiro se apropriou dá
atividade exportadora mais importante,
montando enclaves
autônomos e dinâmicos dentro de nações juridicamente soberanas. Como todas as tipologias, claro que esta também é sujeita a discussões, mas não deixa de ser um importante ins-
trumento de análise e debate. Restaria ainda lembrar que a tradição colonial de exportação de especiarias tropicais foi
86
café am ar rt po ex e qu es ís pa s lo pe X, XI mantida, no séc. e s) no ca ri me -a ro nt ce es ís pa e a el zu ne Ve , | (Brasil, Colômbia ). il as Br e ru Pe , co xi Mé , as an lh ti an açúcar (regiões ros do ad qu s no na ti La a ic ér Am a da to de ão rç A inse árquiig ol se fa da o ng lo ao , xe ou tr l na io ac rn te capitalismo in citadas: r se m de po s ta es e tr En s. ia nc uê eq ns co ca, diversas grámo de to en em cr in o , no ba o ur nt me vi ol nv se de o um cert ti la re um , as di mé s ai ci so s da ma ca s da ão ns fico, certa expa s vo ti ra st ni mi ad os e ic át cr ro bu os sm ni ca me s o do vo progress lcu e co gi ló eo id ho el ar ap do ão aç iz pe ro eu e nt ce es e uma cr ixou de a nc es nu çõ ui it st in s o da sm ri ta li mi o o, ud nt Co l. ra tu bterde circunstancialmente emergir, revelando persistir su raneamente. Derrubando governos ocasionalmente progresrco e, a nt na mi e ss do la ac tr s in to li nf co s o no nd ua at ou sistas poração militar latino-americana criou uma imagem negativa de co-responsabilidade na instabilidade institucional do continente,
ligando-se,
invariavelmente, a oligarquias iInter-
nas e/ou externas, em detrimento de aspirações populares e nacionais. As atividades econômicas monoprodutoras vigentes implicaram a exploração extrema das massas, marginalizadas das decisões e condenadas ao trabalho até a exaustão,
perpetuando os problemas da era colonial. Nas haciendas sob controle de oligarquias internas e nos enclaves estrangeiros a miséria dos trabalhadores era a mesma. Em certos casos, vigoraram relações de tipo mais capitalista, mas, na maioria dos casos, encontramos a plena vigência de relações pré-capitalistas ou semicapitalistas, o que propiciava a dominação patriarcal da oligarquia e a submissão das massas
através
de vínculos de fidelidade pessoal.
É interessante
observar que nas economias de enclave os trabalhadores estavam completamente dissociados do mercado interno nacional, pois o enclave lhes fornecia, diretamente de fora, os
artigos de subsistência. Ao contrário do que ocorria nos países com economias nacionalmente controladas, ondea dispo-
nibilidade interna de capital era logicamente maior e os trabalhadores não se achavam tão radicalmente isolados do contexto nacional, o que se refletia em termos de potenciaPRN DON
87 Ea
TSE
Dr
lidade de mercado. Oportunamente serão analisadas as consequências que tais fatos trouxeram para o processo de industrialização da América Latina. Por ora basta deixar registrado que, integrando-se de variados modos no contexto capitalista internacional, o continente viveu, dos meados do séc. XIX até a | Guerra Mundial, nas palavras possivelmente irônicas de Sérgio De La Pena, “os anos alegres de incorporação (. ..) ao mundo da abundância”.
88
XI. A América hispânica na fase oligárquica: inventário de países
santa
México Poucos anos após a instalação da república, em 1834,
Ana
tomou
guerra com
o poder
como
ditador.
Entrando
em
os Estados Unidos, evidenciou-se o total desprepaís, que, como resultado do conflito, perdeu o
praro do Texas, o Novo México e a Califórnia. O México tornavase assim a primeira vítima do avanço militar norte-americano rumo ao sul do Rio Grande. Certamente daí nasceu o antigo — e tão atual ainda — ditado mexicano: “Pobre do México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos!” Entre 1864 e 1867, com apoio dos setores mais con-
servadores, notadamente o clero, a França instalou um im: pério no país, pondo no trono um infeliz aventureiro que
terminaria
fuzilado: Maximiliano de Habsburgo.
A vitória
de Benito Juarez sobre essa invenção de Napoleão Ill desa,
VE
PMS
lojou os conservadores do poder e abriu caminho as refor-
mas liberais que viabilizaram a integração do México no emergente contexto capitalista internacional. Uma das reformas mais importantes foi a privatização da terra, do que decorreu a expulsão do índio de seus ejidos (comunas) rurais. Separar o índio do controle dos meios de produção significou torná-lo um miserável proletário rural ou um marginal sem terra e sem trabalho. Mais tarde, por volta da passagem do século, durante o Porfiriato (governo de Porfírio Díaz), o México assumiu plenamente as feições de um país capitalista dependente, com todas as suas contradições entre modernização e miséria: investimentos estrangeiros, progresso dos meios de comunicação e transporte, expansão da indústria e mineração e multiplicação da rede bancária ao lado da proliferação da pobreza e da extrema concentração das decisões políticas. Preparava-se a cena para a Revolução de 1910. América Central A Guatemala, durante
longo
tempo
após a indepen-
oficialmente em 1824, dependeu da exportacão da grana e cochonilha, ' produtos típicos do setor primário indígena. Essa atividade, porém, entrou em declínio nos meados do séc. XIX, por motivos econômicos (concordência, obtida
rência externa) e geográficos (asperezas climáticas, ocorrências de pragas). Em face disso, começou a entrar no país o
capital estrangeiro e iniciou-se a fase dos latifúndios cafeeiros. Destruídas as velhas comunas indígenas, a mão-de-obra assim liberada foi coagida a trabalhar nas grandes proprieda-
des.
Fato
idêntico — destruição da comuna
rural e avanço
do setor cafeeiro — ocorreu no vizinho El Salvador.
Desde
estrangeiro,
o começo do séc. XX, o controle do capital notadamente
o
norte-americano,
sobre
as
* Grana — corante avermelhado obtido de um inseto chamado quermes: Cochonilha — corante obtido de insetos da família dos coccídeos, vermelho, contendo ácido carmínico (N.E.).
90
E . to lu so ab e -s ou rn to s, na ca ri me -a ro nt ce s ia frágeis econom , ts ui Fr ed it Un à — a es pr em a ic ún a um de quase monopólio da s õe aç rt po ex s da % 90 , 18 19 Em . ds depois United Bran ilt mu a ss de as rr te s na as id uz od pr s na na ba Nicarágua foram nacional.
Venezuela A Venezuela
começou sua integração no mercado internacional exportando café e rivalizando com o Brasile a Colômbia. Entretanto, o surgimento dos enclaves petrolíferos deslocou o café como principal atividade exportadora e, em virtude do petróleo, a Venezuela conheceu uma modernização acelerada e concentrada em alguns pontos específicos do país. Em 1902, os credores europeus, querendo forcar o pagamento das dívidas externas venezuelanas, bloquearam os portos do país. A resposta foi a Doutrina Drago, segundo a qual nenhum país teria direito de cobrar dívidas com o recurso da
força, doutrina que teve o importante apoio dos Estados Uni-
dos. Alguns anos depois, Juan Vicente Gómez, o /irano dos Andes, instalaria uma rígida ditadura que assinalaria o auge
do Estado oligárquico venezuelano (1908-35).
Peru, Bolívia e Equador Até a fase da Guerra do Pacífico (1879-83), que opôs Peru e Bolívia contra o Chile, o Peru, devastado pelas guerras emancipatórias, tentou se recompor economicamente pelo caminho da diversificação das atividades. No litoral,
produzia-se algodão e açúcar, cuja exportação o governo financiava com lucros da venda de um fertilizante natural chamado guano. Na serra, subsistiam as comunidades indigenas. No final do séc. XIX, surgiram nesta região fazendas
para produção de lã, ao mesmo tempo em que começava um novo surto minerador. Na Bolívia, grande derrotada na Guerra do Pacífico,
pois perdeu todo o seu litoral para o Chile, ao longo do séc. XIX desenvolveram-se os latifúndios, às custas das comunas indígenas, e a mineração do estanho, na qual foi largamente explorada a mão-de-obra do índio expropriado. -
ea)
)
ii p
AA
91
Encravado entre os paises andinos e o mar, o Equador teve no conservadorismo da Igreja um obstáculo à implantação das chamadas reformas liberais, que integrariam o país no contexto capitalista internacional. A Igreja se opunha, como se opôs em outras regiões da América Latina, porque sabia o que implicavam tais reformas: separação Igreja/Estado, fim do controle eclesiástico sobre os índios e secularização dos bens do clero. Entretanto, as reformas acabaram vindo e a burguesia comercial litorânea tornou-se a maior beneficiária delas, já que assumiu o encargo de exportar artigos alimentícios produzidos nas fazendas serranas, como
milho, farinha e batata. O contato litoral/serra foi facilita-
do pela construção da linha férrea Quito-G uaiaquil, Chile
Após a independência, Bernardo O'Higgins deu implantar no Chile um despotismo esclarecido do no modelo bourbônico, que não vingou, e o país nou um condomínio oligárquico de proprietários de
preteninspirase torminas,
latifundiários e comerciantes, É interessante destacar que O
precoce desenvolvimento de uma camada média estimulou a expansão urbana e um notável crescimento dos índices de alfabetização. Com o tempo, a atividade econômica mais importante do Chile passou a ser a exportação de um fertilizante cha-
mado salitre. Na sua exploração, o Chile acabou avançando até a região boliviana de Antofagasta. A Bolívia resolveu cobrar impostos, os chilenos não concordaram. A consequência
na qual
foi a Guerra
Peru
do Pacífico ou do Salitre (1879-83),
e Bolívia foram batidos pelo Chile. O país
vitorioso apossou-se da região salitreira peruana de Tarapaca e de uma vasta faixa de terra boliviana, inclusive os distritos de Tacna e Ariça. Findo o conflito, era evidente o interesse
britânico de explorar o salitre nas novas áreas. O presidente chileno Balmaceda, precursor do nacionalismo latino-
americano, tentou bloquear o livre acesso da Inglaterra ao produto. Acabou derrubado por um golpe e constrangido
ao suicídio (1891).
92
Um
exército
peculiar enquanto força dado
da história chilena é o papel do repressiva de movimentos sociais
e populares, quer a serviço de oligarquias internas, quer a
serviço do capital estrangeiro. A violência empregada quando da rebelião dos mineiros de Marúsia e Iquique evidencia os extremos a que lá chegaram os enfrentamentos provocados pela luta de classes. Por isto, o golpe militar de 1973 contra o governo de Salvador Allende não foi um fenômeno estranho na história daquele país, mas somente o coroamento de uma tradição de violência antipopular, iniciada com o extermínio dos araucanos e modernamente articulada com os interesses da guerra fria e do capital monopolista. Concluindo, pode-se lembrar ainda que, desde os fins do séc. XIX, o salitre deixou de ter importância econômica no Chile por causa da descoberta de nitratos químicos sintéticos. À partir de então a grande riqueza nacional passou a ser o cobre, explorado pela empresa norte-americana Anaconda.
Argentina e Martin Fierro Desfeito o vice-reino do Rio da Prata, a Argentina tornou-se uma arena de conflitos entre caudilhos do interior e burguesia mercantil de Buenos Aires. O maior líder deste período foi um caudilho do interior que, tomando o poder em Buenos Aires, planejou construir um Estado centralizado, Juán Manuel de Rosas. Seu projeto, que incluía um rígido controle sobre o comércio fluvial, beneficiava o artesanato local em detrimento dos artigos concorrentes importados e, por outro, contrariava frontalmente os interesses do livre-comércio britânico e dos estancieiros. Sob os auspícios do
capital
inglês,
uma
coalizão
continental
—
Brasil, Uru-
guai e províncias de Corrientes e Entre-Rios — acabou derrotando e derrubando Rosas, na batalha de Monte-Caseros, em 1852. Na segunda
ocupar
vastos
metade
espaços
do séc. XIX,
se conjugou
com
a possibilidade uma
crescente
de de-
manda internacional por carne e cereais. Em troca de artigos manufaturados, a Argentina principiou a exportá-los
No
93
da ta no , se ulo mu ti es o, iss à e nt me la le ra Pa a. err para a Inglat gra imi a ens int a um o, nt ie rm Sa o rn ve go do mente a partir Bra no mo co Tal a. raç a ” ar ic if ur “p o nd sa vi , ia pé ção euro susil de D. Pedro 1l, alimentava-se o mito da “capacidade am er vi as lev s ra ei im pr As u. pe ro eu r do ha al ab tr do ” ior per para desenvolver a pequena e média propriedade na região de Santa Fé (1850-90). Em 1903-1904, a Argentina recebeu um total de 100.000 imigrantes, o que marcou de modo cam co o xã ne co Em al. ion nac ica étn ia om on si fi a ico íst ter rac a expansão da economia rural argentina, ocorreram a ex pulsão de remanescentes indígenas — eternas vítimas do progresso capitalista — e um acelerado crescimento urbano, consequência da multiplicação de companhias de transpor-
te, agências de exportação, profissões liberais e indústrias de bens não-duráveis, que processavam matérias-primas locais. Na década de 1880, a hegemonia das oligarquias rurais transformou a Argentina num Estado definitivamente centralizado. Buenos Aires se tornou capital nacional (1880), instituiu-se um Banco Central como emissor exclusivo (1891) e o serviço militar obrigatório foi implantado (1901). Nos começos do séc. XX, segmentos da classe média tradicional passaram a contestar o poder político oli-
gárquico
montado
sobre fraudes.
Mais do que mudanças
profundas, porém, tais setores reclamavam participação no poder e para tanto criaram a União Cívica, uma de cujas dissidências tornou-se posteriormente a União Cívica Radical ou Partido Radical. Que de radical pouco tinha, pois seu programa não incluía nem mesmo propostas de estimulos à industrialização. A implantação de um capitalismo agrário e modernizante, associado aos investimentos ingleses no setor das fer-
rovias, provocou um surto de ideologia saudosista, baseada no repúdio ao ''materialismo estrangeiro”, e na exaltação das “virtudes antigas” e da “pureza espiritual” do “'verdadeiro” gaúcho. Trazendo implícito a defesa de um Estado
autoritário capaz de coibir os “'modernismos” nocivos, esse tradicionalismo
pampeiro
acabou
sendo
apropriado
pela
nova oligarquia capitalista agropastoril, a qual o usou para ão
: e,
daN
|
identificar-se e confundir-se com
à nação. À partir dos anos
r po o íd tu ti bs su ia ser te an iz ca ar e o ri rá ag 30, o nacionalismo orp co in ou sc bu e qu , al ri st du in e no ba ur um nacionalismo
is nt me vi ol nv se de a pl am te en fr ma nu ia ár et rar a massa prol o ad am ch do l ta en am nd fu do eú nt co — ta is ta e antiimperial populismo peronista. O mais precioso documento literário das contradições
da Argentina oligárquica será sempre o poema de José Her-
nandez, Martin Fierro, relato épico do sofrimento das camadas sociais inferiores do campo na fase de implantação
do capitalismo agrário. A revolta de Martin Fierro, o protagonista, surge com veemência em versos vigorosos, mas, não raro, a despeito da força de sua denúncia, ela é limitada
pelo fatalismo religioso. Por outro lado, Hernandez vê o índio, tão vítima quanto o herói central, sob um prisma carregado de preconceitos. São notáveis no poema a aversão contra os imigrantes (os gringos) e o rancor contra a let, instrumento da injustiça dos poderosos. Em sua obra José Hernandez ainda deixa clara a sua oposição a Domingo Sarmiento (autor de Civilizacción y Barbárie). Enquanto este defendia a civilização européia e urbanizada dos imigrantes, Hernandez exaltava a autenticidade varonil do gaúcho como a verdadeira força da Argentina. Em seu final, o poema deixa um recado para não ser esquecido: Deus há de permitir que as coisas melhorem, mas a solução virá “de baixo ... que é de onde vem o fogo que mais esquenta; há que desconfiar dos que estão por cima e se tudo isso se falou não é para o mal de ninguém, se não que para o bem de todos”.
Uruguai Fracassando o projeto de independência associada à transformação social, como queria Artigas, o Uruguai tor-
nou-se um Estado-tampão entre Brasil e Argentina e foi, por longos anos, atribulado pelas lutas intraclasse dominante dos blancos e colorados. A possibilidade da pacificação in-
terna veio com a inserção do país no contexto capitalista internacional na qualidade de exportador de artigos agropecuários. Este processo se acelerou quando o Estado isentou
E É
-
a r
95
de impostos a importação de arames para cercar as terras. Com o cercamento, implantou-se definitivamente a proprie-
dade privada
capitalista.
Expandindo-se o latifúndio, que
ainda tinha a vantagem que as áreas livres, os todos se transformaram, obra barata e flutuante. entrou no séc. XX com populacional, à base de nado por uma oligarquia
de pagar menos imposto territorial camponeses arruinaram-se e quase no campo e na cidade, em mão-deTal como a Argentina, o Uruguai um notável crescimento urbano e imigrantes, e politicamente domiagropastoril de feição capitalista.
Paraguai O Paraguai
herdou da sociedade jesuítica dois traços que lhe moldaram a fisionomia político-social no primeiro meio século após a independência: autoritarismo paternalista e comunitarismo na vida econômica. Rompendo com o domínio espanhol, o Paraguai entrou no regime de Gaspar
Rodrigues
Francia, sem
passar pelo hiato do caudilhismo,
que caracterizou o resto do continente. Mas essa não foi a maior diferença entre o Paraguai e os outros países. A maior, seguramente, foi sua não-inserção no contexto capitalista como exportador de artigos primários e importador de artigos manufaturados, ou seja, a não-adesão aos princípios da divisão internacional do tra-
balho da era da dominação
européia. Francia (1811-40) e
Carlos António Lopez (1840-62) imprimiram estilos altamente personalistas a seus governos, mas revelaram singular eficiência. Isolado no contexto latino-americano, o Paraguai implantou um processo de ampla estatização, in-' cluindo rígido protecionismo alfandegário, controle de
muitas terras (fazendas da pátria) e monopólio governamen-
tal sobre o comércio exterior de erva-mate, tabaco e madeira. As consequências sociais desse modelo foram também
inéditas para o continente naquela época: o país não era do-
minado por nenhuma oligarquia econômica, o artesanato local recebeu muito incentivo e não havia camponeses sem terra. Nos meados do séc. XIX, o Paraguai já possuía boa base industrial: pólvora, munição e peças de artilharia, trilhos
96
1
z Mt Tah
de trem, tecidos, papel, tinta e até navios, que eram construídos nos estaleiros de Assunção. Caso raro, o Paraguai não tinha analfabetos e nem dívidas com a Inglaterra. Como “oficina do mundo”, a Inglaterra não podia tolerar tamanha auto-suficiência, contrária a seus interesses capitalistas.
Desse
modo,
valendo-se
de rivalidades fron-
teiriças, financiou e armou o Brasil para destruir o projeto nacionalista paraguaio. O Império escravista de D. Pedro || prestou-se para esta tarefa inglória, liderando uma coligação que incluiu os vizinhos Uruguai e Argentina. Depois de uma guerra desgastante (1805-70), o Brasil derrotou e virtualmente exterminou o Paraguai. Apresentada como uma guerra justa contra um tirano sangúinário (Francisco Solano Lopez, filho e sucessor de Carlos Antônio), a Guerra do Paraguai foi o instrumento brutal e drástico de que se valeu o capitalismo inglês para inserir um país recalcitrante do continente latino-americano nas regras da divisão internacional do trabalho, no período da hegemonia do capitalismo anglofrancês. Terminada a guerra, o Paraguai finalmente tornou-se um país “normal”: o poder passou às oligarquias, foram solicitados empréstimos à Inglaterra e uma geração de índios miseráveis sucedeu à raça exterminada nos campos de batalha. Um país que poderia ter sido próspero tornou-se, com o Haiti, o mais pobre do continente, como resultado, em grande parte, da guerra que lhe foi movida por seus vizinhos insuflados pela Inglaterra.
97
XII. A América espanhola no século XIX: ideologia e auto-estima A primeira concepção de mundo importante que moldou a América Latina foi o catolicismo, a serviço da apropriação da terra para as potências ibéricas. A partir dos últimos decênios do séc. XVIII a situação alterou-se e o liberalismo foi o instrumento utilizado para liquidar a dominação ibérica e redefinir a articulação do continente com o capitalismo emergente. Tanto o catolicismo dos colonizadores como o liberalismo dos emancipadores não serviram, porém, para que a América Latina conquistasse uma identidade continental, necessidade que Simon Bolívar sentiu em
1815, ao destacar a especificidade de uma sociedade constituída de uma “espécie intermediária” entre os índios e os europeus. Entretanto, este desejo de afirmação esbarraria, ao longo do séc. XIX, na dupla realidade da dominação européia e da consequente dependência latino-americana. Para os intelectuais da oligarquia, a Europa tornou-se o refeq oi:
Ê
ss
A
. nto ime olv env des e sso gre pro de tos cei con dos o fix l cia ren Na prática, isso implicou o desprezo pelos valores culturais
locais — desprezo consentâneo, aliás, com o estágio de absoluta submissão das massas populares. Há casos em que a dominação das elites se une a uma demagógica valorização das manifestações populares, como instrumento de cooptação dos grupos sociais inferiores. No séc. XIX, porém, o domínio oligárquico era tão absoluto que esse tipo de concessão nem se figurava necessário. Pelo contrário, as elites faziam da europeização um atributo da
sua condição de classe, um símbolo de status e distinção. O que era perfeitamente coerente com o contexto de dependência econômica, responsável pela ideologia de que tudo que vinha da Europa era, sem dúvida, '“melhor”.... Um dos mais típicos ideólogos da “'inferioridade”” da América Latina em face da Europa “superior” foi o chilenovenezuelano Andrés Bello (1781-1804), um dos criadores da Universidade do Chile. Segundo ele, a América Latina faz parte do “mundo ocidental mais distante e mais vasto”, o que a torna afortunada em comparação com “os sombrios
impérios da Ásia” ou “com
as hordas africanas em que o
homem (é) pouco superior aos brutos”. Na sua retórica simplista, Bello apenas revelou a total incompreensão do
que eram
os “impérios da Ásia”.
E, claro, nunca se deu
conta de quanta brutalização da criatura humana é intrínseca às relações capitalistas de produção. Poderia, entretanto, aperceber-se de tudo isso um intelectual que bebera sua erudição nas fontes refinadas da cultura européia, incluindo clássicos e românticos tipo Byron e Victor Hugo? Outro importante ideólogo da ocidentolatria foi Sarmiento (1811-88), o já citado autor de Civilizaçãoe Barbá-
rie (1845). Admitiu que o extermínio dos índios era uma “dura necessidade” para o “verdadeiro progresso” do continente, sem que nunca lhe ocorresse perguntar que tipo de progresso e para quem. Segundo Sarmiento, era justo que “raças fortes” e “povos civilizados” suplantassem “raças débeis” e “povos selvagens”. Nota-se aqui que a visão eurocêntrica de Sarmiento o levou a enveredar por tortuosos
99
caminhos ideológicos, caracterizados por um acintoso racismo. Seus conceitos sobre a “dura necessidade” de se aceitar um extermínio em massa não deixou de antecipar algo da concepção nazista sobre o genocídio como política de Estado. Como presidente da Argentina (1868-74), Sarmiento foi um dos grandes incentivadores da imigração européia
rc
como
fator de “purificação
racial”.
Em
seu governo, apro-
fundou-se a penetração do capitalismo agrário e, expandindo-se a ocupação das terras, o natural resultado foi a brutal expulsão de remanescentes pré-capitalistas indigenas. Juan Batista Alberdi (1810-84) é o terceiro nome na lista dos ideólogos da chamada ocidentolatria. Este chegou a um extremo quase passional ao negar a especificidade latino-americana. Afirmou taxativamente que “não somos outra coisa que europeus nascidos na América” e que “crãnio, sangue, cor, tudo é de fora”. Dito de outro modo, isso poderia ter valor crítico — dito como foi, tornou-se mera exaltação da submissão cultural. O rompimento com essa linha de pensamento comecou com o chileno José Victoriano Lastarria (1817-88), que não só percebeu ser a Europa incapaz de compreender as da América Latina, onde fazia seus negócios, também defendeu a necessidade de se enfatizar os
realidades
como caracteres
nacionais do continente. Partindo dessa concepção, o também chileno Francisco Bilbao enriqueceu-a com um tom panfletário veemente e, inobstante, rico de verdades destinadas a sacudir a adormecida consciência latinoamericana. Autor de A América em perigo (1803) e O Evangelho Americano (1864), Bilbao rechaçou a “grande hipocrisia de cobrir todos os crimes e atentados com a palavra civilização”. Não resta dúvida de que a civilização de que ele falava
nada tinha em comum com aquela idealizada e exaltada por
Sarmiento
e
tão
estranha
às
experiências
históricas
da
América Latina. Combatendo a imigração européia e a euro-
peização das instituições, Bilbao clamou por uma união capaz de salvar a civilização americana ''da invasão bárbara
da
o
Europa”.
Crítico
violento
ai:
do
imperialismo europeu
e
seus agentes,
de ça an Fr a e ra er at gl In a ou ic if al Bilbao qu
mou ir af é s vo po os tr ou m va ea qu sa e qu s” ta tu ti os pr “grandes e qu em er qu e se rza li vi ci de po o nã pa ro Eu enfaticamente: “A sde u pe ro eu iz rn ve O e qu em a oc ép a en pl nos civilize”. Em iif gn si de an gr ia ir qu , ad na ca ri me -a no ti la a lumbrava a periferi
ente in nt co um de r lo va o ar at sg re de fa re ta à o el ap u se cado r. la cu se na pi ra da s ro mb co es s do o ix ba de o ad lt pu se Uma forma conservadora de reação local à inserção da
a América Latina no contexto capitalista internacional foi r do uruguaio José Enrique Rodó (1871-1917), famoso auto mo is os ud do sa na io nc me já do te en po Ex . 0) 90 (1 l de Arie pampeano, Rodó lamentou o efeito destrutivo do “materialismo estrangeiro” sobre uma sociedade primitivamente rude e virtuosa. Em seu “gauchismo metafísico”, considerava o capitalismo americano ainda pior que o europeu, por ser “mais agressivo.. “Trincheiras de idéias valem mais que trincheiras de pedras” — assim escreveu o cubano José Martí, jornalista, poeta e revolucionário militante, um dos mais importantes intelectuais latino-americano de todos os tempos. Por um lado, Martí (1853-95) antecipou os conflitos que marcariam este continente quase um século depois. Por outro, constituiu-se no coroamento daquela tendência de defesa da latinidade americana que se iniciara com Bolívar e continuara
com
Lastarría e Bilbao.
No (famoso ensaio Nossa América
(1891), Martí combateu decididamente o caráter europeizante do ensino latino-americano e, criticando o fato de se ensinar aos jovens a história da Grécia em detrimento da
história
deste
continente,
cunhou
a célebre
afirmação:
“A nossa Grécia é preferível à Grécia que não é nossa”. De que adiantou a independência da América Latina, perguntou também Martí, “se a colônia continuou vivendo na república?” — no desprezo aos índios e no predomínio de uma erudição estéril e importada. Adversário implacável do liberalismo de fachada, Martí clamou por uma “segunda independência” da América Latina. Embora confiasse mais na massa popular do que nas elites, o grande intelectual cubano nunca chegou a assumir
101
objetivamente as teorias marxistas e socialistas, pois isto poderia prejudicar o seu projeto de união multiclassista que
visava a independência de seu país e que era necessária para
impedir o avanço do inimigo que só aguardava a sua oportunidade — os Estados Unidos. O objetivo de Martí era a formação de duas frentes amplas populares, uma destinada a preservar a liberdade de Cuba e a outra, de ambito continental, destinada a enfrentar a ameaça da “América européia”' sobre a “nosssa América”.
Numa fase em que a Europa ainda era hegemônica, poderia parecer prematura a preocupação de Martí, autor do poema Guantanamera, com os Estados Unidos. Ele, porém, conhecia bem aquele formidável adversário, pois residira dez anos em New York e escrevera a frase terrível: “NY ivi no monstro e lhe conheço as entranhas”. Com notável lucidez, Martí afirmou ainda que “o monopólio está senta-
do como um gigante implacável à porta de todos os pobres” e acusou o imperialismo de destruir a “identidade fundamental humana”, enfatizando a necessidade de fazer "causa comum” com os humildes e de se criar um “outro mundo” em lugar deste “mundo horrível”. Definido por Gabriela Mistral como um “guerreiro sem ódios”, Martí era antibelicista, mas nunca foi um paci-
fista estéril. Percebeu as asperezas do combate social e a distinção entre guerra justa e injusta, acentuando que “é criminoso quem promove, num país, a guerra que se pode evitar e deixa de promover a guerra inevitável”. Libertário intransigente, revolucionário lúcido e humanista, José Martí foi um defensor incansável da unidade continental. Como
disse Che Guevara, muito mais do que cubano ele foi latino-americano. Recusou a oposição entre “civilização” (européia) e “barbárie” (latino-americana), fabricada pelos ideólogos do eurocentrismo, sublinhando que a verdadeira oposição ocorre entre a "falsa erudição” e a natureza. Por tudo isso é-que N. Salomon
declarou que Martí foi o “pri
meiro que construiu (. . .) uma teoria (. . .) coerente da personalidade hispano-americana, capaz de afirmar-se a si mesma, alheia a modelos exteriores”.
102
XIII. Estados Unidos: euforia imperialista na América Latina O desenvolvimento do capitalismo americano Enquanto a Inglaterra reinava como a primeira potência imperial do mundo, lentamente e em relativa obscuridade os Estados Unidos iam crescendo. Sua colonização não ocorreu nos moldes mercantilistas comuns ao resto do continente, pois não havia metais preciosos ou especiarias tropicais para serem oferecidos à Europa dos reis. Desse modo, tornou-se :uma colônia de povoamento e não de exploração. Nos Estados Unidos da fase colonial nunca se construíram metrópoles suntuosas do tipo de Lima ou da Cidade do Mé-
não se formou
xico, mas também
um quadro social assina-
lado pela extrema concentração de luxo e desperdício em
contraste com a miséria endêmica das massas nativas. No final do séc. XVIII, os americanos, aproveitando a sua con-
dição de neutros, começaram a ter, primeiro no Caribe e, depois no resto da América espanhola, um mercado seguro
STE,
Mi
para produtos de sua nascente indústria.
Duas questões internas ocuparam à atenção dos Esta-
idos Unidos ao longo do séc. XIX: a luta intraclasse dom do sta qui con a e ão, ess Sec da rra Gue na da idi dec te, nan a lar tro con va ssa ere int l ria ust ind e s guê bur te Nor Ao Oeste. expansão da escravidão, a qual debilitava o mercado interno, e promover medidas protecionistas capazes de favorecer a industrialização; no Sul agrário e aristocrático o escravo era alicerce da monocultura do algodão. Além disto, considerando que a aristocracia sulista consumia manufaturas importadas, o protecionismo significava uma medida detestável. Com a eleição de Lincoln para a presidência, o antagonismo se transformou em enfrentamento e o impasse politico evoluiu para a alternativa militar. A Guerra da Secessão colocou o problema de quem deveria controlar a máquina do Estado. Ao vencer o Norte, após uma luta de quatro anos (1861-65), triunfou também o projeto industrializante e burguês. Em conexão com a expansão capitalista, intensificouse a ocupação do Oeste, dada a necessidade de obter matêrias-primas e incorporar novas terras. Bastante divulgada pelo cinema, essa fase de individualismo anárquico coincidiu com a expropriação e extermínio do índio, vítima inevitável do colonialismo interno. A ideologia em vigor exaltava a livre iniciativa e o heroísmo pioneiro. Prosperar e “subir na vida” eram as supremas metas da existência. Impunham-se a mentalidade do big business e o ideal do self made man. Na base, multiplicaram-se índios e negros marginalizados e operários espoliados. Fugindo da opressão em seus países, massas de imigrantes europeus rumaram para os Estados Unidos, visto então como uma verdadeira Terra Prometida. Alguns poucos conseguiram progredir dentro do sistema vigente, outros prosperaram à sua margem, mas seguindo suas regras fundamentais, o que deu origem ao banditismo organizado que faria a fama das cidades do Leste. A maioria, entretanto, reencontrou, no Novo Mundo, o sofrimento que acreditara ter deixado para trás. Inúmeras regiões foram sendo paulatinamente incorporadas ao território original dos Estados Unidos. Várias
104
foram
US$ US$ US$ parte
a
compradas:
Luisiana,
adquirida
à
3.000.000 (1803), a Flórida, comprada à 5.000.000 (1819), e o Alasca, adquirido 7.000.000 (1867). Algumas das regiões dos Estados Unidos, no entanto, foram
França
por
Espanha à Rússia que hoje anexadas
por por são em
decorrência de vitórias militares — tais são os casos do Texas, do Novo México e da Califórnia, arrancados ao Méxco, e de Porto Rico, arrancado à Espanha. Em 1848, os americanos ofereceram à Espanha USS 100.000.000 por Cuba, oferta que foi recusada. O que não impediu o senador Stephen Douglas de declarar, em 6/12/1858, ser destino da ilha pertencer aos Estados Unidos... Imperialismo e destino manifesto “Temos um destino a cumprir, um destino manifesto sobre todo o México, sobre a América do Sul, sobre as fndias Ocidentais e o Canadá.” De autoria de um jornalista e político sulista chamado De Bow, estas palavras, datadas de 1850, junto com outras mais tarde pronunciadas e repetiqual
das, mostram
a ideologia utilizada para camuflar os in-
teresses capitalistas que puseram em marcha o imperialismo americano: a missão civilizadora, o dever de levar o progresso e a ordem a povos inferiores. Mark Twain compreendeu
muito
bem
a hipocrisia desse gênero de concepção
gica quando disse, misturando sarcasmo e bem
"Apresento-vos
ideoló-
humor:
a altiva nação que se diz cristã, que
volta enlameada (.. .) de suas incursões de pirata (...), o bolso cheio de dinheiro mal adquirido, a boca trans-
bordante
de piedosas mentiras.
Dai-lhe sabão, roupa
branca, mas escondei-lhe bem o espelho.”'
Celebrado com um lirismo messiânico e exaltado, o destino imperialista foi visto, nos Estados Unidos, como ação generosa de um benfeitor: só o norte-americano poderia fazer o mundo melhor... se o fizesse à sua imagem e semelhança. Querendo ampliar as áreas de investimento de capital e obtenção
de matérias-primas e também
1 Campos, R. História da América. São Paulo, Atual,
sy À
Pityo+
a
seus mercados, 1982, p. 124.
105
-
os Estados Unidos começaram a ver, na América Central, um “quintal” de que poderiam dispor à vontade. Posteriormente, com o recuo imperial da Inglaterra, tal intenção foi estendida para o resto do continente. A estratégia aplicada foi semelhante à dos impérios europeus: controlar econom:camente as nações dominadas mas permitir-lhes que conser-
vassem as aparências de soberania. Como os Estados Unidos não tinham colônias na África, a escamoteação ideológica
implícita em tal estratégia tornava-se mais fácil de ser apli-
cada, pois os países dominados tendiam a não se aperceber, num primeiro momento, da dominação oculta. Foi depois de 1880 que os Estados Unidos intensificaram sua penetração na América Latina. Primeiro, porque seu capitalismo se expandira a tal ponto que, superando a fase da livre iniciativa, já começara a ingressar na fase monopolista, com algumas macro-empresas tendendo a controlar as decisões econômicas e parte considerável da produção do setor. Em outras palavras, o grande desenvolvimento das forças produtivas tornou o imperialismo uma exigência da manutenção e reprodução do sistema. Segundo, por volta
o capitalismo norte-americano já tinha atingido o
de 1880
Pacífico, isto é, já esgotara as possibilidades de crescer via apropriação interna, o que o levou, numa etapa seguinte,
à fase da expansão imperialista além-fronteiras. Ao
contrário
dos
ingleses,
cujos
investimentos
nos
países latino-americanos foram alocados em áreas periféricas à produção, notadamente ferrovias e outros serviços, os norte-americanos investiram preferentemente nos setores produtivos mais avançados e destinados a atender às necessidades da nova estrutura industrial (petróleo na Venezuela,
cobre
no Chile)
ou simplesmente nas áreas mais lucrativas
em relação às possibilidades do lugar (açúcar em Cuba, ba-
nanas na América Central). O capitalismo norte-americano extraiu e continua extraindo vultosos lucros na América Latina, combinando o que os economistas chamam de mais-
valia absoluta (exploração intensiva da mão-de-obra) e maisvalia relativa (exploração qualitativa da mão-de-obra pelo í F
'
pcs
aa
 a
)
i i
o
106
as
emprego de tecnologia cada vez mais aperfeicoada).
O Big Stick: arrogância e auto-suficiência Como já foi mencionado, a Doutrina Monroe adquire mais significado vista retrospectivamente do que analisada no contexto em que surgiu, em consonância, aliás, com o pouco significado que então tinham os Estados no panorama da política e da economia mundiais. E não foi sem razão que Chaunu a definiu como uma “estocada na água”. Entretanto, no final do séc. XIX, já a caminho da sua fase expansionista, os Estados Unidos colocaram a Doutrina Monroe na ordem do dia, edificando sobre esta “base jurídica”” duas importantes cartas de princípios, o Corolário
Olney (1895) e o Corolário Roosevelt (1904), documentos
nos quais o Estado norte-americano deixava claro até que ponto se comprometia com as estruturas capitalistas a caminho do apogeu. Menos conhecido, o Corolário Olney afirmava que Washington não toleraria nenhuma intervenção européia no continente, sem previamente ser consultado. Quanto ao Corolário Roosevelt, uma iniciativa que teve a marca pessoal do presidente que lhe dá o nome, é um documento em que a arrogância e a auto-suficiência imperialista melhor se exprimiram. Neste documento, estabeleceu-se que os EUA tinham o direito de intervir nos assuntos dos países latino-americanos sempre que ocorressem desordens e instabilidades internas. Assumindo o papel de guardiães do continente, os Estados Unidos colocaram as bases da política intervencionista militar que aplicariam no futuro sempre que algo ameaçasse os seus negócios ao sul do Rio Grande, fazendo da força armada, materializada no Corpo de Fuzileiros Navais, o respaldo político dos interesses econômicos. Muito de acordo com o Corolário, o presidente Theodore Roosevelt declarou ser necessário “falar macio e carregar um porrete grande” (big stick, em inglês). Nos anos seguintes, o porrete foi largamente utilizado em pa íses como Cuba, Nicarágua, México e Haiti. Sucessor de Roose-
velt, William Taft completou essa política formulando o que foi chamado de dip/omacia do dólar, expressa na declaração de que as intervenções dos fuzileiros navais visavam assegurar AT Wit
107
facilidades para a entrada
de mercadorias e investimentos,
"fonte de benefícios para ambas as partes”.
Estas doutrinas imperialistas, envoltas em declarações muito toscas e precários refinamentos ideológicos, são clara
evidência de uma fase eufórica, autoconfiante e arrogante, quando a ação ainda podia prescindir dos ornamentos da retórica. O que não ocorreria mais depois da Il Guerra Mundial, quando
então as intervenções armadas passariam a exi-
gir o máximo de palavras e discursos bem intencionados.
É interessante, aqui, reproduzir o depoimento, datado de novembro de 1935, do gen. Smedley D. Butler, homem por muito tempo a serviço do porrete grande: “Passei
33
anos
e 4
meses
no
serviço ativo, como
membro da mais ágil força militar de meu pais — o Corpo dos Fuzileiros Navais. Servi em todos os postos, desde segundo-tenente a general. E durante tal período, passei a maior parte do meu tempo como guarda-costas de alta classe para os homens de negócios, para Wall Street e para os banqueiros. Em resu-
mo, fui um quadrilheiro para o Capitalismo. Foi assim que ajudei a transformar o México, especialmente Tampico, em lugar seguro para os interesses petrolíferos, em 1914. Ajudei a fazer de Cuba e Haiti um lugar decente para que os rapazes do National City Bank pudessem recolher os lucros .. . ajudei a purificar a Nicarágua para os interesses de uma casa bancária dos irmãos Brown, em 1909-1912. Trouxe à luz a República Dominicana para os interesses açucareiros norte-americanos em 1916. Ajudei a fazer de
Honduras
um
lugar “adequado”
para as companhias
frutíferas americanas, em 1903. Na China, ajudei a fazer com que a Standard Oil continuasse a agir sem ser molestada. Durante todos esses anos, eu tinha, como diriam os rapazes do gatilho, uma boa quadrilha. Fui recompen-
sado com honrarias, medalhas, promoções. Voltando os olhos ao passado, acho que poderia dar a Al Capone algumas
sugestões.
O
melhor
que
ele podia fazer
era operar em três distritos urbanos. 112 a operávamos em três continentes.
Nós os fuzileiros,
r ta un rg pe as en ap te res ez lv ta a ez qu an fr a Perante tant . gen o a ri Se . fez as do an qu , fez as em sobre o que sentia qu mo ou sua is al ri pe im do o id nd pe re ar o nt me ru st in um Butler ên ot ep pr e ia nc gâ ro ar a sm me da va ta en im ironia ainda se al cia da fase a que se refere?
A difícil independência de Cuba
Ao longo do séc. XIX, Cuba viveu uma situação única, continuando como colônia espanhola quando o resto do continente já se emancipara politicamente. Para isso, comcorreram vários fatores. Primeiro, devido ao exemplo do vizinho Haiti e considerando o elevado percentual de negros e mulatos existente na ilha, a aristocracia cubana receou que a luta emancipatória criasse condições concretas para um levante racial. Segundo, dada a posição estratégica de Cuba, a Espanha sempre tendeu a conservar lá um forte contingente militar. Terceiro, em 1818, a Espanha resolveu "abrir os portos” de Cuba e permitir-lhe o direito de vender o açúcar a outros compradores, o que eliminou um dos fatores motivadores principais das guerras de independeência: o problema do monopólio comercial. Finalmente, tanto a Inglaterra quanto os Estados Unidos se opuseram à emancipação de Cuba. A Inglaterra porque temia que Cuba independente caísse na órbita norte-americana e os Estados Unidos porque tinham suas próprias intenções anexionistas em re-
lação à ilha. Espanha continuou sendo o meio que viabilizou a integração de Cuba no mercado internacional capitalista durante quase todo o séc. XIX. Ao modernizar arcaicas formas de controle monopolista, a Espanha continuou, não obstante, a lucrar através de mecanismos protecionistas na tributação, A
os quais induziram a ilha a exportar mais matérias-primas (açúcar, café, tabaco, etc.) para a Inglaterra e os Estados
2 Huberman,
L. & Sweezy,
P. Cuba, Anatomia de uma
4. ed. Zahar, Rio de Janeiro, 1961. p. 32-2.
CM
«04
SD
%7
Revolução.
109
panha, o seu elo natural com o exterior. Tais setores se concentravam em Havana e na parte ocidental de Cuba. Na parte oriental estava a fração mais atrasada da oligarquia, menos integrada na atividade exportadora e que, não tendo no escravo uma mão-de-obra tão importante, não hesitou em
unir a luta emancipatória à causa abolicionista. Mais atingi-
da pelo sistema fiscal espanhol, esta fração da oligarqui a, sob o comando de Carlos Manuel de Céspedes, deflagrou, em 1868, a Guerra dos Dez Anos, aliada aos setores populares.
As divisões internas dos chefes rebeldes e a repressão espanhola levaram à derrota do movimento, sendo que a elite dissidente ficou de tal modo enfraquecida que o futuro êxito da causa emancipatória ficaria na dependência de uma frente multiclassista e não mais da liderança de uma única classe. Como gesto conciliatório ao final da luta estafante, a Espanha concedeu a Cuba uma representação nas Cortes de Madrid e, em 1878, promoveu uma anistia geral na ilha. Entre 1878 e 1895, Cuba viveu um período de calma tensa, fase de fermentação intelectual da segunda guerra de independência. Economicamente, foi nessa fase que come-
çou a penetração do capital norte-americano. Logo os Estados Unidos, adquirindo terras desvalorizadas pelos lon gos
anos de conflito e devastação, assumiriam o contro le da produção açucareira cubana, instalando usinas mais produtivas e de tecnologia mais avançada. Em 1896, eles possuíam investimentos da ordem de US$ 90.000.000 na ilha, distribuídos entre açúcar, mineração e fumo. E chegaram a comprar 95% da exportação de açúcar. Co m a penetração
do capital monopolista, formou-se em Cuba um novo tipo o
oligarquia, diferente mma
de
ed
E
ano
Me
ES
Unidos do que para a Espanha e importar mais artigos manufaturados da Espanha do que da Inglaterra e dos Est ados Unidos. Essencialmente monoprodutora, a economia cubana teve uma oportunidade de diversificação com o início da indústria tabaqueira, em meados do século. A oligarquia latifundiária e escravista e os comercian: tes vinculados ao mercado externo mantiveram-se fiéis à Es-
do
padrão
latino-americano
de
oligarquias latifundiárias e pré-capitalistas e de poder paternalista. O modelo cubano gerou uma casta plutocrática de tecnocratas, executivos, comerciantes, financistas, burocratas
e profissionais liberais, com reduzidos vínculos com a terra e vivendo parasitariamente à sombra do domínio estrangei-
ro.
Apelidada
de
por
/umpenburguesia
Gérard-Pierre
Charles, a nova plutocracia cubana não constituiu o tipo de
oligarquia capaz de atrelar as classes populares a fidelidades pessoais fraca
do tipo
enquanto
e estruturalmente
patriarcal. Classe fluida componente
de
uma
nacionalidade,
seus
interesses sempre tiveram a ver mais com os Estados Unidos do que com a nação a que teoricamente pertencia. Isso ex-
plica porque o líder emancipacionista José Martí decidiu não contar com ela na guerra de independência: não era classe capaz de levar avante um projeto nacional. E tal fato também ajuda a entender porque foi relativamente fácil a Fidel Castro extirpá-la, mais tarde, do cenário cubano. Essa plutocracia
satelitizada
da fase monopolista
nunca
passou
de um "corpo estranho'”” numa sociedade com cujos valores nacionais jamais se identificara. A falta de uma aristocracia criolla de tipo tradicional
na hora da independência permite também entender porque Cuba, ao expulsar os espanhóis, não formou um Estado nacional de características liberais. Uma vez expulsa a Espanha, seguiu-se um vazio político que os Estados Unidos ocuparam, sobretudo para impedir que fosse ocupado pela massa popular arregimentada por José Martí e que quase ia vencendo a guerra emancipatória, quando os norte-americanos, na undécima hora, intervieram.
O
instrumento
político
inventado
por
Martí
para
unir as várias classes sociais com que ele contava no proces-
so
emancipatório
foi
o Partido
Revolucionário
Cubano,
criado em 1892. Através dele, o poeta e líder revolucionário pretendeu também preparar o futuro Estado independente em bases democráticas, de modo a evitar uma solução de continuidade que só beneficiaria aventureirismos caudilhescos. Temendo mais o imperialismo norte-americano
111
emergente do que o imperialismo espanhol decadente, Martí se apressou em aglutinar o povo na luta emancipatória com o objetivo de inibir as eventuais ambições anexionistas dos Estados Unidos. Derrotando os espanhóis, os revolucionários colocariam a burguesia norte-americana diante do fato consumado de uma independência conquistada pelos próprios cubanos e evitariam a ocupação estrangeira que se anunclava. Em 1895, com a liderança política de Martí e o comando militar de Máximo Gómez e António Maceo, come-
çou a segunda guerra de independência. Todavia, num estúpido acidente de batalha, Martí acabou prematuramente morto, em maio de 1895. Até 1898, a luta prosseguiu encarniçada. Nesse ano, deu-se o fato decisivo: antes que os cubanos alcançassem a vitória definitiva, os Estados Unidos invadiram a ilha, declarando guerra à Espanha. Os pretextos foram os “horrores” cometidos pelos espanhóis e o afundamento da belonave Maine no porto de Havana, com a morte de 260 marinheiros norte-americanos. Previamente
preparada pela imprensa de Hearst e Pulitzer, a opinião pú-
blica do país aplaudiu a guerra com entusiasmo. A chamada guerra hispano-americana de 1898 não foi mais que um passeio naval e militar dos Estados Unidos. A Espanha foi totalmente batida e aconteceu o que Martí mais temera: a intervenção imperialista, impedindo que o povo cubano conquistasse por si mesmo a liberdade. Consi-
derando
os já referidos interesses econômicos
norte-ameri-
canos na ilha, é fácil imaginar que não seria cômodo para os Estados Unidos uma Cuba independente com demasiada desenvoltura de movimentos e opções. Só por um detalhe, de resultados
a longo
prazo, não foi completo
o malogro dos
sonhos de José Martí: o fato dos cubanos terem chegadoa
lutar inibiu Washington de simplesmente transformar Cuba em um mero protetorado, como ocorreu com o vizinho
Porto Rico. Limitado como foi, o Estado nacional, consentido pelos Estados Unidos, ao menos garantiu aquele mnimo de espaço interno que mais tarde favoreceria a guerrilha de Sierra Maestra.
112
v
Com
a expulsão dos espanhóis, o gen. Leonard Wood tornou-se o governador militar de Cuba. Intelectuais, peque-
nos proprietários, operários do campo e da cidade, camponeses, negros e mestiços que tinham participado da guerra e dos ideais de Martí foram desarmados. Em 1901, uma
Assembléia Constituinte em Havana, dominada pela plutocracia vinculada ao imperialismo, organizou uma Constitui-
ção, a qual incluiu uma emenda que reduziu a soberania na-
cional a uma ficção jurídica acintosa, até mesmo para os parâmetros latino-americanos: a famosa Emenda Platt, elaborada pelo senador norte-americano Orville Platt, em seu
artigo Ill obrigava Cuba a aceitar eventuais intervenções do governo de Washington, para restabelecer a “ordem interna”, e em seu artigo VII compeliu o novo país a ceder locais estratégicos para os Estados Unidos instalarem bases militares, fato que permitiu aos norte-americanos se apossarem de Guantánamo. Na mesma época dessa emenda, um acordo de ''reciprocidade comercial” cubano-norte-americano criou tarifas alfandegárias preferenciais para os produtos
norte-americanos em Cuba (25% a 40% menores) e para alguns produtos cubanos nos Estados Unidos (20% menores). Assim Cuba se tornou um país “independente”, com direito a ter presidentes e tarifas alfandegárias próprias. Em 1906, 1912 e 1917 ocorreram intervenções militares que acentuaram o estado de ocupação econômica permanente, reforçando, desse modo, um quadro melancólico de humilhação nacional. O Canal do Panamá
O affaire do Canal do Panamá foi outro exemplo típico do gênero de imperialismo
praticado pelos Estados Uni-
dos na fase do big stick. Idéia antiga, o canal inter-oceânico unindo Atlântico e Pacífico, através do istmo do Panamá, fora iniciado pelos franceses de Ferdinand de Lesseps, que obtivera fama mundial construindo o canal de Suez. No Panamá, entretanto, Lesseps não teve êxito: as fraudes e os mosquitos liquidaram com seu projeto e foi então que os norte-americanos entraram.
A
o
EN
113
Naquela época, o Panamá era parte da Colômbia e esta resolveu opor-se ao projeto. Não só quis cobrar direitos sobre a pretensão dos Estados Unidos de abrir um canal na região como
ainda bloqueou os trabalhos enquanto discutia
o assunto no parlamento. Querendo liquidar logo a questão, Theodore Roosevelt apoiou um movimento emancipatório panamenho, liderado por um certo general Huerta. Em 1908, o Panamá proclamou sua independência e logo concedeu aos norte-americanos, sob forma de arrendamento perpétuo, a Zona do Canal. É fácil imaginar o que isso representou de vantagens comerciais e diplomáticas. Em 1914, o Canal ficou oficialmente concluído. Após a Il Guerra, a Zona do Canal se transformaria numa herança cada vez mais incômoda da fase selvagem do imperialismo. Todavia, só em 1978, no governo Jimmy Carter, um estadista empenhado em restaurar a imagem de “boa vontade” dos Estados Unidos no continente latinoamericano, é que chegariam a um bom termo as negociações entre Washington e o presidente panamenho Omar Torrijos, estabelecendo-se prazos para uma gradual devolução da área em questão aos legítimos donos.
A Conferência de Washington Em 1889-90, a convite dos Estados Unidos, os países latino-americanos se reuniram em Washington com seu anfitrião na hoje conhecida como a | Conferência Pan-Americana. Residindo então nos Estados Unidos, José Martí pôde escrever livremente sobre ela, já que o fez como correspondente
da
imprensa
argentina,
país que estava
na órbita
in-
glesa, a potência imperial rival dos norte-americanos. Observou
Martí
que a intenção dos Estados Unidos era a de ocupar o lugar da Europa nas relações comerciais com a América Latina, o que criaria dificuldades para a
divisão internacional do trabalho tal como então se apresen-
tava, pois os Estados
Unidos se dispunham
a vender, mas
não podiam comprar em troca, visto que precisavam manter
114
AH
ama
taxas protecionistas para benefício dos magnatas nacionais da lã, do cobre, do chumbo e do açúcar. Além disso, se a b h
-
+
'
Ta
América
Latina aceitasse
se prender
a uma
única hegemo-
Coa. nad a da uzi red -ia -se ver nia era sob el táv ins já sua , nia
Martí observou, “o povo que quer morrer vende para um só e o povo que quer se salvar vende para mais de um”. Advertência assustadora a que o crescente domínio do capital monopolista não demoraria a dar subsmo
o próprio
tância.
A Conferência Pan-Americana de Washington não trouxe, entretanto, maiores resultados práticos a curto prazo. Seriam necessárias duas guerras para que a Europa en-
trasse em declínio, ficando livres os Estados Unidos para dominar com exclusividade a América Latina. Na Conferência Pan-Americana de Bogotá, de 1948, foram lançadas as bases da Organização dos Estados Americanos (OEA), posteriormente classificada por Roberto Fernandez Retamar como “Ministério das Colônias ianques”.
Do imperialismo à boa vizinhança No começo da década de 1930, os Estados Unidos, passada a fase da expansão econômica e da euforia, enfren-
taram
a Grande
Depressão, o que influiu numa reciclagem
das relações internas de classes e das relações diplomáticas externas com a América Latina, então vivendo a efervescência de movimentos onde se combinavam programas sociais e afirmação nacional. Um segundo presidente Roosevelt, Franklin Delano, decidiu, unilateralmente, revogar a Emenda Platt e o Corolário Roosevelt. A Emenda Platt (1901) antecipara em três anos o Corolário (1904) em sua política acintosamente intervencionista e este ultimo ampliou, para todo o continente, uma conduta programada inicialmente apenas para Cuba. Revogando a ambos, Franklin Delano Roosevelt mostrou compreender que os novos tempos não
mais poderiam conviver com modalidades tão descaradas de dominação. O começo da crise do imperialismo que, a rigor,
ainda persiste, obrigaria a disfarces ideológicos cada vez mais sofisticados para, no mínimo, manter as posições já alcançadas.
À
“4
AS O 1
115
Ao longo da década de 1930 e até o final da || Guerra Mundial, Roosevelt manteve, com a América Latina, a chamada política de boa vizinhança. Retirou os fuzileiros navais das zonas ocupadas e evitou novas intervenções. Foram os anos em que a diplomacia norte-americana estava muito ocupada com o nazi-fascismo em expansão. Quando O país entrou na || Guerra, precisou da solidariedade (e dos recursos) do continente e isso assegurou a continuação da relativa trégua que a ação imperialista concedera às nações latinoamericanas. Finda
como
o desenvolvimento do socialismo
a Il Guerra,
programa
alternativo
para
a
emancipação
latino-
-
”
e
116
=
americana, num quadro social tumultuado por movimentos populares, faria o imperialismo retomar a sua agressividade intervencionista, reforçada e ampliada pela retórica maniqueísta da guerra fria.
XIV. A crise da economia oligárquica e
as alternativas de industrialização
A crise do modelo primário-exportador Em 1929 eclodiu nos países capitalistas centrais violenta crise, que, ao abalar as estruturas da periferia latinoamericana, levou estas nações a reciclarem suas formas de integração num contexto hegemônico que até então lhes parecera fora de discussão. Um dos aspectos mais importantes desta reciclagem foi o aproveitamento das oportunidades que
se abriram
à realização
de projetos internos de indus-
trialização, visando substituir os tradicionais artigos importados. A crise econômica não sô fez cair violentamente o preço de muitos artigos primários, tirando a diversos países as possibilidades
de importar,
como
também
acarretou
inú-
meras falências nos países centrais, reduzindo sua capacidade de exportar. A desorganização do comércio internacional durante a década de 1930 obrigou as nações latinoamericanas a uma análise em profundidade de suas estruturas
econômicas arcaicas e dependentes dos centros capitalistas. Contudo, nem todos os países sentiram a crise das exportações de artigos primários com a mesma intensidade. Os
que produziam mercadorias menos importantes (como café e banana) foram mais atingidos. Os que exportavam merca-
dorias menos dispensáveis (como carne, trigo ou petróleo) se ressentiram menos, já que os países centrais não podiam reduzir a importação de tais mercadorias com a mesma faci-
lidade. Os países que vendiam açúcar para os Estados Uni-
dos,
como
Cuba
e
República
Dominicana,
ficaram
numa
situação difícil por uma razão especial: os norte-americanos não comprimiram as importações de açúcar, mas, por causa » da crise, se viram obrigados a comprá-lo de suas dependencias coloniais de Porto Rico, Havaí e Filipinas. A maior parte dos países deste continente ingressou na década de 1930 com alto grau de endividamento externo e com sua moeda desacreditada. Insegurança, desemprego e miséria reinavam em toda parte — mais do que em qualquer época anterior. Só por ocasião da Il Guerra Mundial é que a América Latina teve chance de recuperar os índices de exportação de matérias-primas. Findo o conflito e consolidada a hegemonia norte-americana no continente, o nacionalismo latino-americano assumiu um caráter cada vez mais profundo, levando o contexto político ao ponto de confrontação.
As possibilidades de uma industrialização substitutiva A industrialização visando substituir importações começou no setor mais simples — bens não duráveis, como roupas e alimentos — e evidenciou duas dificuldades iniciais
básicas: a necessidade de conseguir acumulação via exporta-
ção de artigos primários (uma realidade que não tinha como mudar de uma hora para outra) e a inexistência de uma produção interna do maquinário exigido para a produção in-
dustrial, o que obrigava a onerosas importações no setor.
Apoiada nas diferenças que caracterizavam os países latino-americanos na fase oligárquica, Vânia Bambirra ela-
borou uma tipologia da industrialização continental, estabelecendo a seguinte classificação: 118
1. Países de tipo A: com industrialização mais antiga, anterior
à Il Guerra (Brasil, Argentina, México, Colômbia, Uruguai e Chile). 2. Paises de tipo B: com industrialização mais recen-
te, posterior à Il Guerra e já desde o início integrada ao ca-
pital monopolista (Peru, Venezuela, Equador, Costa Rica, Guatelama, Bolívia, El Salvador, Nicarágua, S. Domingos, Honduras, Cuba e Panamá). 3. Países de tipo C: sem industrialização alguma (Hai-
ti, Paraguai). Agustín
Cueva contesta as tipologias, convicto de que
elas terminam
perdendo
utilizada, uma
tipologia pode ser um
o contato
com
a realidade concre-
ta das situações. É preciso observar, no entanto, que, bem
instrumento científico
eficiente de trabalho, pois ajuda a formar uma visão totalizante, sem que se percam de vista as especificidades de cada
caso.
Construindo
outra
tipologia,
Fernando
H. Cardoso,
como
já foi visto, reconheceu, na fase das oligarquias primá-
rio-exportadoras, a existência de uma divisão entre países com economia “nacionalmente controlada” e com economia “de enclave””, tendo estes últimos o setor exportador sob controle estrangeiro e isolado do contexto nacional. Via de regra, os países com economia “nacionalmente controlada” transformaram-se nos de tipo A, de industrialização mais antiga, ao passo que os “de enclave” evoluíram para os de tipo B, de industrialização mais frágil e recente. Contudo, é preciso lembrar que o Chile e o México, apesar de típicas nações com enclaves estrangeiros, se tornaram países com industrialização de tipo A, pois também desenvolveram um setor agrário importante e nacionalmente controlado. No caso do México, a Revolução de 1910 acabou propiciando a formação de um mercado interno à base de um campesinato médio. O trabalhador da economia primário-exportadora do-
minante nos países do tipo A se achava mais integrado ao mercado nacional do que o trabalhador do enclave nos países de tipo B. Existiam, portanto, condições concretas para que os paises de tipo A promovessem antes a formação
RSA
NY
119
de seus parques industriais. Além do mais, como os resultados das exportações concentravam-se nas mãos da oligarquia local, existia, em princípio, capitais disponíveis para serem investidos na indústria. Nestes países, portanto, a
industrialização, ao mesmo tempo que dependeu da estrutura monoprodutora, em seu arranque inicial, igualmente abriu caminho à superação da mesma, já que viabilizou condições para o rompimento com a divisão internacional do trabalho específica da fase anterior. Deve-se também notar que nos países do tipo À a burquesia industrial não apresentava caraterísticas tais que lhe implementar um projeto industrializante e permitissem nacionalista pela via revolucionária. Assim, foi ao Estado que coube levar avante este projeto, ao mesmo tempo que disfarçou-lhe o conteúdo de classe com uma aparência multiclassista, traço dominante da retórica populista da época. O populismo, como se verá adiante com mais detalhes, significou uma espécie do condomínio temporário do poder, incorporando interesses diversos e conflitantese normalmente se identificando com o carisma de um líder comprometido com as aspirações coletivas e corporificando o Estado. Segundo Vânia Bambirra, a burguesia se valeu de movimentos popu-
lares como o Zapatismo mexicano, o Battlismo uruguaio, o Peronismo argentino e o Varguismo brasileiro para impor um projeto capitalista-industrial que ia bem além dos interesses específicos dos grupos sociais em jogo na época. A classe que poderia ter cumprido o papel histórico de apresentar um projeto alternativo ao projeto capitalista burguês
era o proletariado urbano, mas não havia condições para tanto devido a dois fatores extremamente importantes: a pouca expressão numérica, pelo menos em termos relativos, e a origem camponesa da maior parte de seus membros. Este último ponto fazia com que o operariado, recém-saído de uma estrutura em que a submissão e a obediência aos latifundiários era a norma corrente, tendesse à passividade ou a uma mobilização extremamente lenta. Além disto, a
própria seus
120
natureza do Estado populista tinha como um de
objetivos
neutralizar
o potencial
de luta dos grupos
sociais inferiores. Na fase da industrialização substitutiva, a implantação de um te
não
prescindiu
eficácia dependeu compromisso
projeto capitalista e nacional certamendo aparato
repressivo,
mas muito de sua
dos artifícios ideológicos que buscavam o
e a conciliação entre as várias classes sociais.
No que se refere aos países de tipo B, o sólido domí-
nio dos enclaves estrangeiros forneceu as condições necessárias para extrair do país o máximo e deixar o mínimo. Os trabalhadores do enclave constituíam um grupo separado e isolado do mercado nacional e o enclave, de modo geral, constituía um foco de progresso capitalista num contexto global que permanecia pré-capitalista e atrasado. A sua existência limitava o próprio espaço de poder das elites internas, atrelando
o arremedo
nos casos de economia
de
Estado
nacional,
mais do que
“'nacionalmente controlada”,
às de-
cisões do capitalismo externo. Via de regra, a burocracia governamental se restringiu ao papel caricato de gendarme dos interesses estrangeiros. Considerando que as elites importavam o que desejavam e que a massa da população, no contexto de uma
estrutura predominantemente
pré-capitalista,
não constituía mercado interno apreciável, é fácil imaginar como eram reduzidas as condições para a alternativa industrializante. O fluxo de renda, inteiramente controlado pelo enclave, fazia com que o índice de capitalização nacional fosse mínimo e, desse modo, o país não tinha como evoluir além do artesanato tradicional. Inexistindo um Estado com um mínimo de autonomia necessária e uma burguesia capaz de ser a base social de um projeto capitalista nacional, o mesmo acabou surgindo, embora com contornos mal definidos, como bandeira de movimentos de massa nos quais as exigências dos trabalhadores se uniram às aspirações da pequena burguesia. Bons exemplos desse gênero incompleto de populismo foram o Aprismo peruano e o Movimento Nacionalista Revolucionário boliviano, movimentos nos quais o conteúdo antiimperialista foi mais forte do que a proposta desenvolvimentista, o
que, aliás, é facilmente compreensível por se tratar de países
121
de tipo B, nos quais a penetração econômica estrangeira era mais intensa e opressiva. A maior dificuldade de implementar um programa industrializante explica por que, nos países de tipo B, a oli-
|
garquia interna não pôde se valer de fórmulas populistas, já que a industrialização era a miragem
| |
com
que o populismo
acenava no futuro e com a qual lograva galvanizar as massas no presente. Em tais países, diante da irrupção de tensões
sociais, a oligarquia geralmente limitou-se a
aplicar os mé-
todos tradicionais de repressão, o que assegurou a continui-
em
air
— Mm j
,
em
menta
4
N N9
mma
dade de um estatuto político-jurídico arcaico.
XV. A crise do Estado oligárquico Chile Nos fins do séc. XIX, como já se referiu, houve no Chile uma proposta de reforma política e social, no governo de José Manuel Balmaceda, um precursor de Allende e do nacionalismo latino-americano (1886-1891). Pretendendo impulsionar um projeto industrializador, reduzir o poder da Igreja, do latifúndio e do capital inglês, acabar com o monopólio da ferrovia inglesa em Tarapaca e desejando formar empresas chilenas para explorar o salitre, Balmaceda foi derrubado por um golpe dos conservadores, financiados pela Inglaterra, cuja imprensa o acusou de ser um “ditador da pior espécie”. A crise política desencadeada, que culminou com o suicídio de Balmaceda, permite concluir que, no caso do Chile, não foi preciso esperar pela instabilidade que
se manifestaria a partir de 1929 para que a rigidez e as deficiências do Estado oligárquico se evidenciassem e susci-
tassem as primeiras tentativas conscientes de reforma.
|
Peru
Foi nas presidências de Piérola (a partir de 1895) e
Augusto
Leguia (1908-12) que o Peru ensaiou as primeiras
reformas tendentes a debilitar o poder oligárquico. Entretanto, apenas a partir do Aprismo o reformismo político e social viria a se tornar bandeira de luta, Aprismo que, por sinal, voltou à cena peruana em 1985, com a eleição de Alan Garcia para a presidência do país. O criador da APRA — Aliança Popular Revolucionária Peruana, fundada em 1924 — foi Victor Raúl Haya de La Torre, líder político e intelectual falecido em 1979. A APRA combinou uma base popular e indígena com um estilo populista e um conteúdo doutrinário eclético. Como se viu, o controle econômico exercido pelo enclave estrangeiro impedira que pudesse se formar no Peru uma burguesia em condições de viabilizar um projeto industrializante e capitalista. O Aprismo, por sua parte, não chegou a decidir-se pela alternativa socialista, do que resultou uma inconsistência ideológica que prejudicou consideravelmente o projeto antiimperialista do partido. Colocar-se contra o imperialismo e oferecer o que em troca? O impasse gerado por esta contradição pequeno-burguesa desgastou o Aprismo, que nada mais fez do que passar longos anos lutando contra a oligar-
quia e o boicote dos militares. Não dispondo de uma proposta coerente e não logrando, em consequência, mobilizar
eficientemente as massas, o partido de Haya de La Torre continuou ao longo do tempo sistematicamente alijado do poder. Considerando que conseguiu, em 1985, assumir O governo, através de eleições, é de se perguntar o que poderá fazer. Será o instrumento útil de concessões inofensivas destinadas a tomar o lugar das mudanças necessárias ou terá aprendido algo mais profundo sobre os processos sociais, ao
longo dos difíceis tempos de ostracismo?
Venezuela e Colômbia O apogeu da fase oligárquica na Venezuela ocorreu durante o governo ditatorial de Juan Vicente Gómez (1908-
1935). A morte do ditador seguiu-se uma fase de “despotismo
124
NL
v
esclarecido”, quando sucessivos governos realizaram tentativas de modernizar o país utilizando os lucros do petróleo. Este processo foi interrompido com a implantação da ditadura de Perez Jimenez, em 1952. Com sua deposição em 1958, o país entrou numa fase democrático-constitucional que dura até hoje. A despeito de terem sido executadas al-
gumas reformas, a solidez institucional venezuelana se fun-
damenta em uma estável hegemonia das classes dominantes, tanto nacionais quanto estrangeiras. Na vizinha Colômbia, o reformismo radical conheceu um momento de agitação intensa e turbulenta, sob a liderança popular de Jorge Eliécer Gaitán, assassinado em 1948, ano em que ocorreu uma insurreição na capital, episódio conhecido como bogotazo. A brutal repressão levou ao poder o regime de Rojas Pinilla, deposto na década seguinte. A partir de então a Colômbia se transformou em um país onde o constitucionalismo liberal serve para encobrir a mera alternância de facções da elite oligárquica no poder.
Uruguai Do mesmo
modo
que o Chile, o Uruguai teve um pre-
sidente que se empenhou numa política de transformações sociais bem antes que a onda reformista antioligárquica varresse a América Latina. Seu nome foi José Battle y Ordonez
e sua atuação diferiu da de Balmaceda em um ponto básico: como a riqueza da terra se achava em mãos nacionais, não foi preciso a mesma cruzada nacionalista que fizera do governante
chileno
um
mártir
precoce
da
tragédia
latino-
americana. Battle governou o Uruguai de 1903 a 1907 e de 1911
a 1915
e pertenceu
ao
Partido
Colorado,
em
torno
do qual se reunia a maior parte da população urbana de Montevidéu de então. Para impor seu programa de reformas, Battle teve de
vencer a resistência, inclusive armada, da oligarquia, agluti-
nada no Partido Blanco. As medidas que tomou fizeram dele um precursor no continente. Foram criados e regulamentados a jornada de trabalho de 8 horas, o salário m íni-
mo, o salário-família e as pensões
por velhice e doença;
125
executaram-se amplos projetos de expansão da área da saúde publica e educação para adultos: foi abolida a pena de mor te e instituído o divórcio; separou-se a Igreja do Estado e bancos, linhas férreas, docas e distribuição de gasolina foram estatizados, além de serem montadas refinaria s de petróleo e fábricas de cimento. O Battlismo inaugurou a era do gigantismo burocrático no Uruguai — o governo se tornou o grande emp regador. Para manter a máquina administrativa e cumprir seus programas sociais, foi preciso utilizar os lucros da exportação agropecuária, o que obrigou o Estado a seguir uma política de “boa vizinhança” com o latifúndio, evitando executar qualquer reforma no setor agrário. Em 1952, o país adotou um sistema de Executivo colegiado e a partir de então conheceu um longo período de estabilidade institucional, merecendo até o qualificativo de 'Suíca latino-am ericana”, devido a uma prática que se revelou tão simples quão eficiente: a de cooptar o partido que perdia as eleições, oferecendo-lhe 40% dos cargos públicos. A falência do modelo uruguaio começou nos anos 60, quando a queda dos preços dos artigos pri mários exportados fez com que o sistema de desvio de recursos do setor agropecuário não mais pudesse ser aplicado. A deterioração internacional dos termos de intercâmbio revelo u plenamente a extensão da fragilidade de um projeto reformist a ao mesmo tempo fascinante pelo avanço e limitado pelo fato de excluir a necessária transformação das estruturas eco nômicas.
Argentina Na Argentina, como foi mencionado, no início do séculoa União Cívica Radical, uma dissidência da oligarquia unida à classe média urbana e reforçada pelo aflu xo de imigrantes, representou um esforço para opor-se à hegemonia política da classe dominante agropecuarista. Sob pressão, esta classe concordou em conceder o voto secreto para os homens maiores de 18 anos. Pouco depois, a União Cívica Ra-
dical elegeu para a presidência Hipólito lrigóyen, que governou de 1916 até 1922 e executou um programa de reformas
126
que,
não
atingindo
o
campo,
tinha
por
objetivo
tornar-
se aceitável para a oligarquia e, ao mesmo tempo, consolidar uma
base de apoio político, a qual, em sua heterogeneidade,
inclufa as classes média e popular.
Irigóyen construiu casas
populares, proibiu o trabalho aos domingos, criou pensões, salário-minimo e seguros contra acidentes de trabalho e ins-
tituiu o monopólio estatal do petróleo (Yacimientos Petrolíferos Fiscales — YPF). Reeleito em 1928, foi derrubado em 1930, quando voltou ao poder a oligarquia anglófila, na pessoa do gen. Uriburu. Nicarágua Na República Dominicana, com Nicarágua, com
Anastácio Somoza,
Rafael Trujillo, e na implantaram-se, na fase
da crise do Estado oligárquico, as mais brutais ditaduras da América Central, ambas com o respaldo de Guardas Nacionais organizadas e treinadas pelos norte-americanos. Nestes países, o controle dos Estados Unidos sobre as economias locais era completo, o que inviabilizava a formação de burguesias nacionais com projetos de industrialização. A United Fruit (hoje United Brands) e a Standard Fruit monopolizavam a produção de bananas, detinham 80% das exportações, usufru am de isenções fiscais e possuíam imensos latifúndios. Em 1926, ocorreu na Nicarágua uma revolta de setores liberais urbanos, inspirados pelo exemplo da Revolução Mexicana. Para impedir a vitória dos liberais, os fuzileiros navais intervieram. Contra essa intervenção, levantou-se o "pequeno exército louco” (expressão de Gabriela Mistral) de um patriota: Augusto César Sandino. Sandino nasceu na Nicarágua, em 1895, poucos dias antes da morte de José Martí, em Cuba. Em 1926, voltou do México para a Nicarágua, a fim de lutar contra os marines. Em 1933, os norte-americanos foram embora do país,
mas deixaram
uma
Guarda
Nacional como
ponta-de-lança
de seus interesses. Em 1934, numa cilada armada pelo chefe da Guarda Nacional, Somoza, talvez aliado ao embaixador norte-americano, Sandino foi assassinado e nunca se soube
=
127
onde foi enterrado. Ocupado até o fim na querra antilmperialista, Sandino não teve condições de formular uma teoria política definida sobre o rumo das mudanças em seu país, de certo modo,
o que,
facilitou a tarefa dos que hoje diri-
gem os destinos da Nicarágua, pois lhes permite elaborar livremente o seu próprio projeto, desde que plenamente idenas necessidades nacionais, sem se preocuparem com as eventuais confrontações com o pensamento do lider.
tificado com
Morto Sandino em 1934, a Nicarágua tornou-se virtualmente um feudo da família Somoza, cujos membros, coerentemente, mantiveram um regime tirânico ao longo de várias décadas, controlando, junto com a United Fruits, toda a economia do país e deixando a massa camponesa no analfabetismo e na mais absoluta pobreza. O papel dos Estados Unidos na sustentação de regimes desse tipo evidencia o quanto a prosperidade daquela nação sempre dependeu da riqueza — e da miséria — da América Latina.
O Paraguai e a Guerra do Chaco Uma guerra entre dois países miseráveis estimulados por conflitantes interesses imperialistas internacionais. Assim pode ser definida a chamada Guerra do Chaco, de 1932 a 1935, entre o Paraguai e a Bolívia, episódio que serviu para caricaturas e ironias nos países imperialistas e que, por contraposição, dá bem a medida da tragédia que
é a história de um continente dominado. Depois
de ter perdido a saída para o mar, na Guerra do Pacífico, a Bolívia passou a ver na planície do Chaco um caminho para os rios platinos e, indiretamente, uma forma de acesso ao Atlântico. Entretanto, naquela região,
o
Paraguai
explorava
erva-mate
e
quebracho.
Como
a
Standard Oil suspeitava que pudesse haver petróleo na região e estava
interessada em, pelo menos,
por ali escoar o petró-
leo já explorado em solo boliviano, decidiu financiar o em-
preendimento bélico da Bolívia contra o Paraguai, que, por
seu turno, teve o apoio da multinacional anglo-holandesa Royal Dutch Shell, também na expectativa de achar petró-
leo na zona disputada. Ao cabo de tudo, morreram 57.000
128
bolivianos
e 36.000
paraguaios,
tendo
o
Paraguai
ficado
com a maior parte do Chaco. As companhias petrolíferas fizeram um acordo entre si e a Standard Oil obteve licenca
para fazer a prospecção no local, tendo abandonado tudo depois de algum tempo, por não ter encontrado nada.
Finda a guerra, Paraguai e Bolívia continuaram se arrastando na miséria típica do Terceiro Mundo. Em 1954,
o Paraguai caiu sob a ditadura feroz de Alfredo Stroessner. A repressão, favorecida pela miséria e pela dominação exter-
na, instalou a “paz dos cemitérios”, e um longo período de tranquilidade política. Vítima direta do imperialismo dos Estados Unidos e, segundo Domingo Laino, do subimperialismo brasileiro, o Paraguai tornou-se um país onde não existiu, em momento nenhum, qualquer espaço para a organização de reivindicações sociais e democráticas. Tal fato foi decisivo para que os maiores beneficiários internos e externos da exploração nacional se dispusessem a sustentar
indefinidamente o regime de Stroessner. A estagnação paraguaia impediu que o país viesse a conhecer os conflitos decorrentes da crise do Estado oligárquico e as consequentes
alternativas progressistas para a sociedade nacional.
Com Stroessner, o Paraguai encerrou um ciclo de 21 anos com 22 presidentes, tendo-se tornado o pais dos mais antigos presos políticos da América Latina, contando, sempre, com o apoio do Brasil e dos EUA. Paraíso de exnazistas, traficantes e ditadores aposentados, o Paraguai acabou sendo pressionado por uma oposição no exílio. A desp-
eito de Esquivel (Prêmio Nobel da Paz) não ter podido entrar no Paraguai (1982) e, apesar da prisão ilegal do comunista
Antonio
não
Maidana,
o ajudaram
como ele queria.
as demonstrações
a se manter
no
de força de Stroessner
poder
indefinidamente,
Desde 1978 há uma oposição ativa no Paraguai. Cerca de 2% das propriedades ocupam 85% das terras e até já co-
meçou a se organizar um movimento camponês no país, reprimido pelo aparato repressivo do ex-ditador, os chamados “pés-descalços. À brutalidade do regime e a aparente apatia popular ajudaram
a manter
um
presidente que foi se
tornando decrépito e desgastado, e cuja queda, em virtude de um golpe palaciano em 1989, pegou a oposição de surpresa.
r.
“i “
|
129
cmgoro o -E e
Bolívia Típico pais “de enclave”, a maior riqueza boliviana, o estanho, era controlado pela família Patiho, que o industrializava em Liverpool, numa empresa chamada Williams, Hartwey and Co. Entretanto, em 1951, os ventos começaram a mudar. O Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR) conseguiu eleger para a presidência da República seu líder, Victor Paz Estenssoro, que tinha em vista um amplo programa de reformas. Baluarte do conservadorismo, o exército acusou o governo eleito de comunista e tomou o poder. Todavia, o golpe fracassou: em abril de 1952, uma rebelião popular de estudantes, mineiros e camponeses derrubou a junta militar e Paz Estenssoro assumiu o poder. Diversas reformas foram implantadas: estendeu-seo direito de voto aos analfabetos, o estanho foi nacionalizado, iniciou-se uma reforma agrária e os salários foram aumentados. No entanto, O MNR logo revelou as contradições típicas de
um movimento populista — contradições estruturais decorrentes da limitação e da heterogeneidade da base de apoio. Com efeito, no populismo, a causa dos trabalhadores fica marcada pelos horizontes da pequena burguesia, desejosa de elevar seu nível de vida e incapaz de unir esse projeto às necessidades mais amplas de transformação social. No populismo de Vargas, Cárdenas, Perón e Battle verificava-se um elemento comum: a execução de mudanças superficiais, sem a reforma das estruturas fundamentais, que permanecem intocadas. Um programa com tais características sempre termina em um impasse, o que frustra os que lutaram pelas transformações. Foi o que ocorreu com o regime de Paz Estenssoro. No setor de estanho, por exemplo, desapropriou as minas, mas pagou imensa indenização aos proprietários (o que Fidel Castro não fez, no caso das usinas de açúcar em Cuba) e ainda continuou mandando o produto para Liverpool. Além disso, o governo só nacionalizou as minas mais antigas, em vias de esgotamento. Quanto à reforma agrária, esteve longe de ser completa. Os aumentos salariais, por outro lado, ampliaram o mercado de consumo, sem haver uma produção industrial capaz de atendê-lo, o que inflacionou os preços. Finalmente, a
queda do preço do estanho no comércio externo agravou irremediavelmente
130
a dívida
nacional.
Por fim, do mesmo
modo
que
no caso peruano,
na Bolívia
não
houve
uma
clara
definição ideológica, o que veio em prejuízo ao MNR. Aos mesmo tempo que a fragilidade da burguesia nacional inviabilizava um projeto capitalista autônomo, também não exis-
tia a opção por um programa socialista alternativo. Os Estados Unidos, considerando que o governo Estenssoro
atingira sobretudo
Paz
interesses britânicos com seu
programa de nacionalizações, deram apoio inicial ao projeto
do
MNR.
Entretanto, ao ajudar a reconstruir o Exército nacional, trabalharam no sentido de fazer dele uma forca anticomunista, conforme os padrões da guerra fria Como resultado disso, esse exército começou, em 1964, uma série de intervenções no governo, as quais duraram até o início da década de 80, quando a ascensão de Hernán Siles Suazo à presidência marcaria o retorno do poder civil, apesar de não significar qualquer mudança nas estruturas sócio-econômicas do país. Em 1964, o Gen. René Barrientos derrubou Paz Estenssoro, que cumpria seu segundo mandato. Instalado no governo, Barrientos favoreceu o capital estrangeiro e reduziu Os salários dos mineiros. A International Minning Processing Co. entrou no negócio do estanho boliviano com um contrato altamente vantajoso. Ao mesmo tempo, aproveitando o desencanto popular com o caráter incompleto da revolução de 1952, a direita interna arregimentou forças e formou a Falange Socialista Boliviana, um movimento urbano, de características fascistas. Quanto ao mais, a Bolívia tem servido muito ao anedotário latino-americano como exemplo de extrema insta-
bilidade
política e anarquia de governos que se sucedem à
base de golpes e contragolpes.
duas observações.
Em
primeiro
Sobre
lugar,
isso, podem
ser feitas
uma das causas des-
ta instabilidade é a permanente capacidade de resistência da
classe trabalhadora, organizada emtorno da Central Operária Boliviana (COB). Em segundo, na América Latina, longose
estáveis regimes nunca foram sinônimo de credibilidade social e problemas resolvidos, como a história demonstra com
pródigos exemplos. ASS
131
XVI. A Revolução Mexicana Oligarquia e capitalismo na fase do Porfiriato Exceto de 1880 a 1884, quando governou seu testade-ferro Manuel Gonzalez, Porfírio Diaz foi o ininterrupto presidente do México desde 1876 até 1911. O seu longo mandato assinalou o apogeu da fase oligárquica mexicana e a definitiva inserção do México no contexto capitalista ocidental, com tudo o que isso implicou. A expansão comercial levou ao reaparelhamento dos portos, a rede ferroviária passou de 600 para 24.000 km, sendo 80% do setor
controlado pelo capital norte-americano. Além disso, multiplicaram-se os bancos, as hidrelétricas, os poços de petró-
leo e as comunicações telegráficas.
Apesar da modernização, porém, o desenvolvimento
mexicano sob o Porfiriato revelou muitas mazelas. Em primeiro lugar, a privatização da terra, submetida às leis do mercado, para beneficiar a expansão dos latifúndios nacionais e estrangeiros, provocou a expulsão dos índios de suas reservas
comunais (Leis dos Baldios, 1893-1902). Privado do contro-
le direto sobre os meios de produção, o índio ou foi compe-
lido a vender sua força de trabalho em condições desumanas ou se viu reduzido à marginalização e à mendicância. No norte do país, a criação de gado, a agricultura e a mineração
foram
os fatores básicos que
levaram
à concen-
tração da propriedade em detrimento dos índios. No sul, área de povoamento mais antigo, a concentração da terra ocorreu
em
virtude
da
monocultura
acucareira e o fim da
agricultura de subsistência, deslocada pela agricultura capitalista, obrigou à importação de gêneros de primeira necessidade, o que levou a um intolerável encarecimento da vida para a massa popular. Tanto no norte como no sul, a ques-
tão agrária seria vital para a eclosão de rebeliões sociais, sob o comando de liderancas combativas. A Revolução Mexicana foi sobretudo uma revolução agrária. Apesar de existir nas cidades um operariado já consciente da exploração, a participação dessa classe no processo revolucionário foi secundária e um dos problemas para o avanço do movimento veio a ser a dificuldade das classes trabalhadoras do campo e da cidade se unirem. A cooptação e a repressão tiveram condições de inibir o movimento operário e suas lideranças anarquistas e, como resultado, o proletariado foi induzido a aceitar soluções conciliatórias e reformistas. Um dos pontos básicos da Revolução Mexicana foi o problema da penetração do capital estrangeiro. Os norte-americanos tinham muito dinheiro investido no México: ..... US$ 110.000.000 em linhas férreas, USS 85.000.000 no petróleo e US$ 302.000.000 na extração e beneficiamento
dos metais, sendo US$
especialmente a prata.
140.000.000 em metais preciosos,
Inicialmente
sob controle
inglês, o
ouro, a prata, O ferro, O cobre e o zinco passaram ao contro-
le norte-americano a partir da década de 1880. Os Estados. Unidos investiram ainda no setor bancário, em riquezas florestais e no ramo de serviços em geral.
Com
Porfírio
respeito ao imperialismo, o comportamento de
Diaz
apresentou
a=
alguns
aspectos
interessantes.
A
133
partir
de 1905
começou
a favorecer
o capital
criar um contrapeso à excessiva hegemonia
inglês para
norte-americana.
Retornando com nova força, os britânicos chegaram a controlar 58% da extração petrolífera. Ao mesmo tempo, Diaz se recusou
a renovar
a cessão
da baia de Madalena,
usada
pelos Estados Unidos como base naval, ameaçando, simultaneamente, fazer um acordo militar com o Japão. Essa tática de chantagear com as rivalidades inter-imperialistas afastou, nos últimos tempos, o apoio norte-americano a Porfírio Diaz. Sua queda, por outro lado, não preocupou imediatamente os Estados Unidos, cônscios de que um governo liberal e, talvez, frágil poderia ser mais maleável que um ditador caprichoso e todo-poderoso. Ão
final do seu governo, Diaz tinha o apoio apenas de
reduzidos setores da elite que pretendiam se eternizar no poder: altos burocratas e oficiais superiores, alguns dignitários da Igreja Católica, alguns latifundiários e grandes empresas estrangeiras. Na oposição estava a massa popular de indígenas, mestiços e trabalhadores em geral; as frações progressistas e liberais da burguesia urbana, da classe média e do latifúndio compreenderam que melhor seria derrubar a ditadura corrupta de Porfírio Diaz do que esperar que isso acontecesse através de uma tempestade social. Sendo um regime altamente excludente, o Porfiriato, a partir de determinado momento, não serviu mais à oligarquia como um
todo. À modernização da economia precisava corresponder
a modernização das instituições. Quando perceberam isso, os setores mais avançados da classe dominante se puseram em ação para, na velha fórmula, fazer a revolução antes que
o povo a fizesse. Fórmula que seria usada, vinte anos depois, pelas elites brasileiras da Aliança Liberal. O Porfiriato homogeneizou o México para os interesses do capitalismo e do imperialismo através de sua máquina
política centralizadora e autoritária. À ocidentalização for-
çada correspondeu o desprezo pela tradição indígena, lógica decorrência da marginalização dos interesses populares.
Com a Revolução Mexicana impor-se-ia a recuperação dessa tradição como parte de um projeto político que incluiu, em 134
stiça ju à e r de po no r la pu po seu discurso, à participação com ta lu a a i r e v o m o r p o ã ç u l o v e social. Correlatamente, à R valor tra
os
apenas
xou
valores importados, retórico, mas que,
atitude demagógica e de assumida pela massa, não
der
uma z e t n o M . vo ti in st in o sm li ta pi ca de traduzir um anti
n do eo nt pa no ez rt Co de r ga lu O m a e Benito Juarez tomar domis se as cl as o d n a u q e, rd ta is ma e, oficialismo mexicano poraram r o c n i r, de po no m a r a m r i f se s a nantes modernizad idena um em ar nç ca al de o d o m um o m o essa substituição c tificação ideológica com à nação. gora pa iu rt o, pa ad ub rr de i fo az Di io ír rf Po o Quand de ditaos an e nt ra a du d a l u m u c a a un rt fo , a or zar, no exteri , marca do ta en os r ap do ta o di il qú an tr e m -s u do an dura, torn punes da m te i en lm ra ge e os st po s de no ra ti s da do ra regist irmou, r af do ta o di lh ve , o ir rt pa s de te . An na ti a La ic Amér tituíra bs su o e qu o r — e o d a sc M ci , an te Fr e en qu am ic et of pr — havia “soltado um tigre” e manifestou dúvidas sobre a ca pacidade dele para “'domá-lo”. Mas quem era Madero, este n e m i v o m r do de l, lí ra nt be sa li di ita so o e ri ri pí iá es nd latifu to que derrubara o Porfiriato? E que saberia ele sobre o “tigre solto” bruscamente na arena pol ítica?
Madero A queda de Porfírio Diaz começou quando ele se candidatou a uma nova reeleição, concorrendo com o candida-
to confiável das elites liberais, Francisco Madero. Tendo sido preso por Diaz, Madero fugiu e lançou o Plano de 5. Luís de Potosí, propondo reforma agrária, democracia re-
presentativa nos Estados sencadeou o lha no norte no sul. Diaz
e não-reeleição do presidente. Madero estava Unidos quando a repressão aos maderistas delevante, ao mesmo tempo que estalava a guerrie, sob o comando de Emiliano Zapata, também fugiu e Madero entrou aclamado na Cidade do
México, em 1911.
Passados os festejos, logo ficou evidente a impotência de Madero, pressionado por múltiplos e conflitantes interesses. À timidez da fração liberal maderista manteve muitos
adeptos do Porfiriato incrustados na máquina governamental,
sd
EO
a
135
enquanto as bases clamavam por reformas. Nas cidades, o operariado tentou se organizar. No norte, o mais popular |ider de oposição a Madero foi Pancho Villa. No sul, o grande nome que despontou foi Emiliano Zapata, talvez um dos líderes políticos mais consequentes da história latino-americana. Homem simples e sério, Zapata queria exatamente o que seu povo sério e simples queria: a reforma agrária e a devolução das terras ao campesinato espoliado pelo capitalismo. Nada
conseguindo de Madero, rompeu com ele, lançando Plano de Ayala, que exigia a reforma agrária imediata.
o seu
O choque entre conservadores e progressistas terminou imobilizando o governo e inviabilizando qualquer projeto. Madero mostrou ser muito moderado para uma situação que evoluía para uma crescente radicalização. O formulismo institucional não tinha forca para realizar reformas urgentes e necessárias e também não dispunha de instrumentos repressivos eficazes para garantir o latifúndio e tranquilizar o capital estrangeiro. Uma tímida inclinação de Madero para o lado dos progressistas terminou por condená-lo. O Exército, que permanecera um foco conservador e reacionário, passou a conspirar. Os Estados Unidos, que teriam desejado a continuação do Porfiriato sem o desgastado Porfírio Diaz, apoiaram a conspiração através do seu embaixador no México, Henry Lane Wilson. O gen. Vitoriano Huerta, o embaixador americano e Félix Diaz fizeram um acordo conhecido como Pacto da Embaixada ou Pacto
da
Cidadela
(1913)
e, consumado
Oo
golpe,
Madero
morto, tendo o gen. Huerta tomado o poder (1913).
foi
Huerta
De
saída, a ditadura
de Huerta
não foi reconhecida
pelo governador do Estado de Cohauilla, Venustia no Car-
ranza, que lançou o P/ano de Guadalupe, defendendo a pro-
mulgação de uma Constituição. Entre os co mandantes da heterogêna força anti-huertista e aparen temente fiéis a Carranza, os mais importantes foram Obregón, Pancho Villa
e Pablo
González.
O Pacto de Torreón foi o instrume nto destinado a firmar a unidada na luta contra Huerta.
136
udado aj am vi ha e qu , os id Un s do ta Es os e, rt pa Por sua
a, id gu se em go lo , se mra sa cu re r, de a colocar Huerta no po ia or st hi Os e? ud it at tal do ma to am ri a apoiá-lo. Por que te
o, pl em ex r po , ea rr Co ez in rt Ma a ri Ma a An . em rg ve dores di ins a a av tu en ac ta er Hu , ra du ta di a afirma que, optando pel
os ci gó ne Os a av ic ud ej pr m si as e ís pa tabilidade política do
ez lv ta e te en ci fi su in ce re pa ão aç ic pl ex norte-americanos. A Alperode es is ál an nas da ra nt co en a a sej a melhor resposta oduto pr um era ta er Hu s, re to au s te es ra Pa vich e Rudenko.
do
Porfiriato
reacionário
mais
e tinha,
como
logo que subiu ao poder, estreitas ligações britânico, sendo, inclusive, amigo pessoal de o rn ve go o rt cu seu Em . eo ól tr pe do a at gn ma investimentos ingleses chegaram a superar
US$
807.622.000 contra
afetado
pela
penetração
USS
inglesa,
se descobriu
com o capital Lord Cowdrey, (1913-14), os os americanos.
800.000.000. O setor mais O petrolífero,
obrigou
O
governo dos Estados Unidos a tomar posição contra Huerta, y nr He or ad ix ba em o e qu a nt co em ar lev m, ré , po se ond deve
Lane Wilson representava, no México, aqueles setores do capital norte-americano não ligados aos interesses petroliferos, OU Seja, Os que haviam investido em ferrovias, minas e indústria manufatureira.
As relações entre Huerta e Washington tornaram-se criticas quando ele recebeu, de um cartel europeu, um emprestimo de USS 150.000.000. O embaixador Wilson foi chama: do devolta a seu país. Entretanto, O governo norte-americano hesitava intervir no México em virtude da grande quantidade de capital ali investido. Uma intervenção militar poderia levantar uma onda de rancor popular antiimperialista e os Estados Unidos não poderiam correr este risco. Além disso, Washington não se atreveria a intervir sem um sólido apoio interno e Carranza não se dispôs a oferecê-lo, já que issoo desgastaria frente à forte corrente nacionalista mexicana. Para solapar o apoio inglês a Huerta, o presidente Woodrow Wilson, dos Estados Unidos, recorreu a um estratagema inteligente: fez um acordo com os britânicos se comprometendo a obter do Congresso a anulação de uma lei de 1912, que isentava de taxas os navios norte-americanos que
4)
137
cruzavam o canal do Panamá. Abandonado pelos ingleses, Huerta aproximou-se da Alemanha e do Japão, fazendo com que a Inglaterra e os Estados Unidos se unissem numa frente anti-huertista. A situação do ditador tornou-se ainda mais delicada quando ele decidiu sustar o pagamento da dí-
vida externa, em
virtude da difícil situação
financeira na-
cional. Pouco depois ocorreram dois incidentes que foram o pretexto para a ruptura entre México e Estados Unidos. O primeiro em Tampico, quando marinheiros do Delphin, belonave da esquadra do almirante Henry Mayo, foram presos pela polícia mexicana e o almirante se indignou pelo fato de Huerta ter se recusado a prestar homenagem à bandeira norte-americana, em sinal de desagravo. O segundo em Vera Cruz, o maior porto mexicano no Atlântico, quando fuzileiros navais do almirante Frank F. Fletcher o ocuparam para impedir o desembarque de armas que Huerta comprara dos alemães. Com isto, os Estados Unidos pretendiam também criar dificuldades econômicas para o ditador, privando-o das vendas da aduana de Vera Cruz. A intervenção, contudo, não chegou a se tornar uma guerra prolongada. Huerta não tinha condições de mobilitar as massas numa vasta frente antiimperialista. Por sua parte, os líderes populares mais importantes, como Villa e Zapata, não deram atenção ao fato e certamente não se emocionariam muito com as dificuldades financei ras do ditador. Carranza repudiou a atitude norte-americana, mas
os Estados Unidos não lhe retiraram o apoio, já que não havia outro líder mexicano que lhes parecesse confiáve l na-
quela conjuntura. Com a mediação da Argentina, do Brasil e do Chile, realizou-se uma conferência em Niagara Falls para resolver o problema. Pressionado para renuncia r, Huerta se recusou e o impasse acabou sendo resolvido por Carranza: em agosto de 1914, seu exército constitu cionalista
entrou na Cidade do México e Huerta fugiu, encerrando-se seu governo. Cessado o pretexto para ocupar Vera Cruz, os marines se retiraram e Carranza começou a surgir como o líder adequado às classes proprietárias, numa fase em que a vanguarda popular da revolução prosseguia muito ativa.
138
|
e: a
E
Cd
Carranza Em outubro de 1914, Carranza inaugurou a Conven do Ten . ico Méx do ade Cid na na ica Mex ia nár cio olu Rev ção a sede da Convenção passado para Aguascalientes, Carranza Zapadiscordou e retirou-se para Vera Cruz. Pancho Villa e ta assumiram o controle da Convenção de Aguascalientes, celebraram o Pacto de Xoximilco e chegaram a ocupar temporariamente a capital, com o que a Revolução Mexicana
começou
a definir seus contornos. Carranza e Obregôn de-
finiram-se como representantes moderados e constitucionalistas e Villa e Zapata como líderes radicais e populares. Comparando os dois líderes, Villa e Zapata, Alperovich e Rudenko observam que Zapata exerceu um tipo de
liderança mais consequente o que
se deveu
concreto
ter feito
ao fato de Zapata
reforma
de
no sul do que Villa no norte,
agrária,
ao
contrário
um
de
programa
Villa.
Com
efeito, a reforma agrária era de urgência maior no sul do que no norte, onde as terras eram mais áridas, havia menos latifundiários e a atividade criatória se processava em regi-
me de menor
exploração.
Por outra
parte, a vizinhança dos
Estados Unidos pôs Villa em direto confronto com o imperialismo norte-americano, o que não chegou a preocupar Zapata, cuja atuação se dava no outro extremo do país. As tropelias de Pancho Villa, na fronteira norte do México, chegaram a provocar uma nova intervenção norte-
americana,
desta
çar o líder cepcionado
Estados
feita para carevolucionário. Decom o apoio dos
Unidos
a
Carranza,
Villa atacou a cidade norte americana de Columbus e o governo de: Washington pôs 11.000 homens no seu encalço, sem sucesso, contudo. À interPancho Villa venção durou de março de 1916 a janeiro de 191/ e o resultado foi a união do país
E ad: ss:
139
esfacelado contra o imperialismo. Pouco depois, o México obtinha sua Constituição e os Estados Unidos perderam o respaldo moral para continuar agredindo um povo que ten-
tava se organizar. Wilson teve de retirar suas tropas e amargar O insucesso de sua frustrada aventura militar. O controle de Carranza sobre o processo revolucioná-
mexicano foi um fenômeno lento, porém seguro, e a Constituição de 1917 acabou assinalando a vitória das clasrio
ses proprietárias contra a radicalização das massas populares. Para isso, contribuíram vários fatores. Obregón derrotou militarmente Pancho Villa em Celaya (1915) e Agua Prieta. Zapata foi assassinado em 1917. E Carranza impediu a união operário-camponesa e reprimiu as greves trabalhistas, alegando que “seria inadmissível substituir a tirania do capitalismo pela dos trabalhadores". Com a lei agrária de 1915, o governo conseguiu ainda dividir a classe camponesa e aparecer como campeão de seus interesses. Consi-
derando que o México tinha 75% do seu povo vivendo na zona rural e que, dos 15.000.000 de habitantes, 10.000.000 não tinham terra própria, não há dúvida de que Carranza teve sucesso em suas manobras destinadas a neutralizar o setor mais explosivo da sociedade mexicana de então. A Constituição de 1917 foi a involução da revolução para a conciliação, embora não ocorresse um sumário retorno ao passado. Pela Constituição, a terra e a riqueza foram declaradas propriedades do Estado e do povo e só poderiam ser cedidas a estrangeiros com a condição destes não recorrerem a seus países de origem para defenderem seus interesses. A propriedade privada foi reconhecida, mas alguns latifúndios improdutivos e, especialmente, os bens da Igreja
foram
confiscados.
O
ejido,
comuna
rural
indígena,
foi
oficialmente definido como uma espécie de cooperativa fiscalizada pelo Estado. Reconheceu-se a “'premência” da reforma agrária e a igualdade jurídica e religiosa dos cidadãos. A Igreja perdeu antigas regalias e privilégios ao ser criado o casamento civil e instituído o ensino laico (embora mantendo-se a privatização, o que significa dizer que o clero
perdeu o tradicional monopólio no setor). Quanto às leis
140
a.
de a di : os nt po os rs ve di em e sociais e trabalhistas, inovou-s s do to en im ec nh co re , mo ni mí o ri lá sa trabalho de oito horas, a, st hi al ab tr o çã za ni de in e, ev gr de sindicatos e do direito da o cr lu no o ad eg pr em do ão aç ip assistência social, partic empresa, etc. e qu l ia s ic nê in po am -c no bi co ja o ls pu im o Extinto ou st re s, ai ci so s ze ti ma s co ri o tã na ca xi dera à Revolução Me
e qu s uê rg bu do ta Es um de ca di o rí çã ju za li à instituciona o nd ua at o, sã es pr re a o e çã ta op co te a en am usaria alternad s da ra ge s ai ci s so õe ns te s r da do la ro nt co or e ed como absorv irn de e mo nt me da vi a de st li ta pi a ca ur ut tr es a no seio de um zada.
Cárdenas A década subsequente assistiu a uma quase completa paralisia do processo revolucionário mexicano, natural consequência da vitória das forças mais moderadas. O petróleo continuou sendo explorado por monopólios internacionais
e rivais entre si, a Standard Oil e a Shell. Em 1919, chegou a se formar, nos Estados Unidos, uma Associação Nacional para Defesa dos Direitos Norte-Americanos no México. Ão
longo dos anos 20, entraves burocráticos intencionais bloquearam o avanço da reforma agrária e, além do mais, os Estados Unidos cobraram do governo mexicano a devida repressão aos movimentos operários ocorridos nas empresas petrolíferas ianques. Em 1929, sob o impacto da crise econômica, a Revolução Mexicana recobrou o impeto adormecido e, ante o recrudescimento do descontentamento social, Lázaro Cárdenas assumiu a presidência, cargo que manteve de 1934 a 1940. O período mais atuante e inovador de Cárdenas ocorreu entre 1934 e 1938. Logo no início foi retomado o processo de reforma agrária e o ejido foi reativado. Entretanto, tratava-se de um ejido diferente do antigo sistema da terra comunal indígena. Agora tratava-se de terras da nação cedidas aos camponeses para usufruto perpé-
tuo e hereditário. A fim de amparar a massa camponesa financeiramente, o governo criou o Banco de Crédito Nacio-
nal. Para o trabalhador urbano, ampliaram-se as leis sociais e
A
:
141
adotou-se a alternativa de não reprimir greves. Simultanea. mente, Cárdenas tratou de estimular o progresso capitalista fazendo obras públicas e implantando instituições financei. ras como o Banco Nacional de Comércio Exterior e o Fundo de Fomento Industrial. Na área das medidas econômicas
nacionalistas, a realização mais importante de Cárdenas foi a criação da PEMEX, o monopólio estatal do petróleo (1938) .
É preciso acentuar que Lázaro Cárdenas não foi um
revolucionário — foi um reformista. Porta nto, suas inovações , sem dúvida as mais avançadas do país no séc. XX, a nível de Estado, foram contidas pelos limites da sociedade de classes onde se inseriam. Jamais cogitou Cárdenas de tocar na propriedade privada e nem radicalizou na questã o da penetração do capital estrangeiro. Paternalizou o tra balho
com o único objetivo de assegurar a “paz social” e impedir confrontos prejudiciais ao progresso capitalista. Resumi ndo,
a atuação de Cárdenas viabilizou um capitalismo mais moderno, dotado de uma retórica “humanista”, confiáve l para as massas e, desse modo, capaz de implementar a industrialização substitutiva. O presidencialismo mexicano
Nas décadas seguintes, até hoje, o presiden te mexicano seria um membro do todo-poderoso Partido Revolucionário Institucional (PRI — uma curiosa contradição de termos, pois o “instituído” não pode ser “revolucionário”), concentrando em suas mãos uma auto ridade nada inferior à de Porfírio Diaz. O poder unipessoal do presidente me xicano tem tanto de ostensivo quanto de velado. Escolh e governadores, controla as Forças Armadas, decide so bre vários assuntos vitais (assistência social, habil itação, siderurgia, comunicações, transportes, agricultura, política ex terna, etc.), monopoliza a concessão de cargos públicos (o que lhe dá muito poder
de barganha), pode destituir membro s do Judiciário, tem a exclusiva iniciativa na ação penal (via Ministério Público) e, praticamente, designa o sucessor. Há uma liberdade de opinião formalmente reconhecida no país mas a imprensa
E
DR
«42
a MEN!
sempre
autoO . te en id es pr do ra gu fi a as ic ít cr preserva das
l ia ic of es ad rd be li s da a im ac tá ritarismo oculto do cargo es mente
proclamadas.
E a massa camponesa aceita o misto de
imposição e paternalismo
que caracteriza o poder vigente,
lso re de s õe iç nd co as m te de e qu acreditando ser ele à força ver as angústias sociais. z ue ig dr Ro el fa Ra a tu en ac mo co l, ua at No México aiz at di me ão aç or rp co à mo co o st vi é Castafieda, o Estado tos li nf co os o nd za li ra ut ne e do en rv so ab e, dora na sociedad to bi âm No a. st li ta pi ca ão uç od pr de do 'nerentes ao mo co ti rá oc cn te e al on si is of pr r to se um em iv nv burocrático, co ri to au A s. do ua ig an ap e es ar li mi fa de ão es rt co r e um seto um de ro nt de ua at te en id es pr do ta lu so ab te en lm dade virtua peso ra nt co io ár ss ce ne O o nd ti is ex in , ão aç de ro ct pe amplo es . do ta Es de l ve ní à s re de po os tr ou de ou a ic bl pú o iã da opin
143
XVII. O Peronismo Argentino Argentina e Brasil: as lições de uma comparaç ão Em comparação com o Brasil, a Argentina foi relativamente poupada dos piores efeitos da cri se de 1929, apesar do pânico inicial. O grande produto bras ileiro de exporta-
ção na época era o café, uma cultura pere ne — isto é, que produz durante anos — que não permitiu ao país adaptarse rapidamente à nova conjuntura. Quan to à Argentina,
vendia
trigo
e artigos pecuários, cuja aquisição o mercado
internacional não podia facilmente re duzir, mesmo nos piores tempos da Depressão, já que er am mais importantes
e necessários que o café. Por outro lado, o trigo é uma cultura anual e a pecuária, embora
não tendo ciclo tão rápi-
do como o trigo, igualmente não é uma cultura perene. Em resumo, nos momentos de retraç ão do mercado externo a
Argentina sempre teve a vantagem de poder, mais facilmen-
te que o Brasil, planificar a ofer ta de seus artigos exportá-
veis. Ao longo dos anos 30, essas circun stâncias ajudaram
aquele país a manter um
nível de capitalização inter-
certo
ando qu os rs cu re de ôs sp di do ta Es O e qu r na. o que vale dize al), de ci so ia nc tê is ss (a ia ár er op se as cl na resolveu investir f
. al on ci na a st li ta pi ca o et oj pr O ra pa a -l modo a cooptá
A medida
proscênio
que os trabalhadores foram passando ao
político,
nos
30/40,
anos
evidenciaram-se
duas
no to au is ma io ár er op o nt me vi mo o re ent s ica bás diferenças
frágil do is ma io ár er op o nt me vi mo o e a in nt ge Ar da mo int ge Ar na mo co sil Bra no o nt ta ar, lug ro ei im pr Brasil. Em ram na, os operários política e sindicalmente mais ativos fo
o çã ua at sua a in nt ge Ar na , to an et tr En e. nt ra ig im de origem s õe aç ic pl ex das a Um ê? qu Por a. ur do ra du e a ns te in s mai toi ar ul ic rt pa em — sil Bra ao os ad eg ch es nt ra ig im os e qu de a é
os italianos das primeiras levas, a partir de 1870 — provinham, em sua maioria, da zona rural e tinham menor consciência política que os italianos e espanhóis que, em data posterior, escolheram a Argentina para sua nova pátria, pagando, inclusive, a própria passagem ao viajarem para lá. Outro dado importante diz respeito à maior força histórica do sindicalismo argentino em comparação com o brasileiro. Ao contrário do Brasil, cujo sindicalismo nasceu dependente do e atrelado ao Estado, na Argentina houve um sindicalismo anterior e bastante combativo, que só a partir do peronismo e sua máquina burocrática atrelou-se ao Estado. Nunca foi tão marcante a dependência dos sindicatos ao poder na Argentina como no Brasil, onde estes sempre dependeram do Estado, devido à distribuição do imposto sindical e à necessidade de um reconhecimento legal, feito via
Ministério do Trabalho.
No Brasil, a relação operário/Getú-
lio Vargas era direta enquanto que na Argentina a relação operário/Juan Perón passava pelo sindicato e pelo partido. Como as instituições mediatizadoras sempre foram mais
fortes na Argentina que no Brasil, o Peronismo sem Perón
manteve Vargas. cuperar de tudo gentina
um vigor jamais conhecido pelo Varguismo sem Com a queda de Perôn, os sindicatos buscaram rea autonomia e ampliar as bases populares. Em vista isto, muito cedo a questão social se tornou na Aruma questão política.
E SS
A
145
Juan Perôn A partir de setembro de 1930, com o golpe que depôs lrigóyen, a Argentina entrou na chamada década infame, durante a qual vários governos se sucederam, todos eles empenhados
em
anular
das. Em 1933, o Pacto Inglaterra, evidenciou a
as conquistas
progressistas já obti-
Roca-Runcimán, assinado tradicional anglofilia das
com a oligar-
quias dominantes. Os britânicos obtiveram grandes vantagens nos setores de transportes, tarifas aduaneiras e câmbio. Em troca, assumiram o compromisso de importar a carne
argentina, fixando as quotas em função de suas necessida-
des. O governo mesmo
Uriburu, que derrubara
Irigóyen, tratou, ao
tempo, de abolir o salário mínimo e fechar sindica-
tos. Numa época em que tantos países latino-americanos conheciam progressos políticos e sociais ou movimentos com esse objetivo, a Argentina vivia um lamentável retrocesso, inclusive em comparação com seu próprio avanço, verificado na década anterior. Ao reformismo moderado dos anos 20, sucedia-se o mais estreito reacionarismo, de resto incompatível com o desenvolvimento das forças produtivas que o país estava conhecendo. O crescimento do parque industrial, visando a atender à demanda interna, acarretava a
rápida expansão da classe operária e isso logo traria conse-
quências políticas. A declarada submissão dos governos da década infame aos ingleses acabou suscitando a indignação nacionalista de
alguns militares, os quais formaram o GOU — Grupo de Ofi-
ciais Unidos —, que, em 1943, assumiu o poder. O colegiado militar prometeu a modernização e a moralização do país e, embora alardeasse simpatias fascistas, não deixou de prome-
ter também o retorno à democracia. Foi então que apareceu para as massas a figura carismática de Juan Domingo Perón, um dos oficiais do GOU e Secretário do Trabalho do novo governo. Perôn reimplantou as leis trabalhistas da
fase de Irigóyen e decretou um aumento de salários. Entretanto, devido aos temores da junta militar, foi destituído e preso. Em resposta, mobilizado por Eva Perón, o proleta-
riado se reuniu silenciosamente na Plaza de Mayo, no dia 17
+
1a as
E
—— que o
146
io
o, rn ve go do de se , da sa Ro sa Ca Na . 45 de outubro de 19 a av eg ch ão id lt mu à to an qu en r, ze fa e qu o e br e so -s va nesita
a nt ju a , te oi -n ia me da s te an o uc po 4 300.000. Finalmente, s pô se e qu , vo po ao u lo fa o tã en e qu mandou libertar Perón, a cantar: “Maniana
es San
Perón, que trabaje el patrôn!” A
rno s do e is na io ic ad tr s ia qu ar ig ol s da despeito da oposição ta os op pr er qu al qu em o sm ni mu co am vi e qu te-americanos, presipolítica ligada à massa trabalhadora, Perón foi eleito dente em 1946. A economia argentina vivia um bom momento.
O
país
estava
com
divisas acumuladas,
devido
às
exportações de matérias-primas ocorridas durante a Il Guer-
ra. Desejando que aumentasse a produção interna de bens a preços acessíveis, Perón decidiu taxar as exportações e assim conseguir recursos para as obras infra-estruturais necessárias ao progresso industrial. Essa alternativa, porém, colidiu em cheio com os interesses da oligarquia tradicional — principalmente quando a concorrência dos artigos agropecuários do Canadá e Austrália, no mercado externo, provocou a queda dos preços das exportações argentinas. A contradição produzida pelas crises cíclicas da moeda foi um problema que o Peronismo nunca pôde resolver. Quando a moeda internacional se desvalorizava em relação ao peso argentino, a concorrência das importações prejudicava as indústrias nacionais e o valor das exportações baixava. Todavia, por outro lado, caindo o valor das exportações, o custo interno dos artigos agropecuários ficava mais acessível. Já em períodos de desvalorização do peso argentino, ocorria a situação inversa: aumentava o valor das exportações (que eram cotadas em moeda estrangeira) e se elevava o custo interno dos artigos agropecuários. Gastando mais na aquisição de tais artigos, o trabalhador ficava com menos dinheiro para adquirir artigos industriais e, desse modo, as indústrias nacionais acabavam não lucrando tanto quanto poderiam em virtude da desvalorização do peso reduzir a concorrência de produtos importados. Em termos gerais, esta
inequação afeta até hoje a estrutura econômica argentina. A legislação social e sindical e o nacionalismo econômico foram os dois suportes do populismo peronista. De
à
147
acordo com a típica retórica populista, o Peronismo falava
em “povo” e “nação” de modo a mascarar a consciência da
divisão das classes, já que a Argentina continuava sendo um
país capitalista e atrelado às leis do mercado. Entretanto, Perón surgia como o líder iluminado que, absorvendo os reclamos populares, assumia o compromisso de resolvê-los, de modo a que a massa não precisasse recorrer à sua forca potencial, O que representaria riscos para o sistema da pro-
priedade privada. Enfim, o messianismo político peronista desempenhava o papel de catalisador da concórdia nacional
em função de um projeto industrial e capitalista. Tendo em Eva Perón um poderoso elemento de mobilização, o Peronismo foi, com todas as limitações acima expostas, um considerável avanço em relação à fase oligárquica e um inegável
enriquecimento da experiência histórica argentina e latino-
americana. Juan Perón impulsionou o progresso da siderurgia, construiu represas e gasodutos, desapropriou empresas britânicas, criou a Aerolineas Argentinas, estatizou o comércio exterior (através do Instituto Argentino de Promoción del Intercambio) e nacionalizou as estradas de ferro, bancos, companhias de eletricidade, bondes, água, gás e telefone. Mais ainda, apesar da oposição do clero, introduziu o divórcio e tornou facultativo o ensino religioso nas escolas públi-
cas. É de notar, porém, que Perón permitiu que o capital
estrangeiro continuasse atuando no setor petrolífero. A política social do Peronismo provocava arrepios
nos setores mais reacionários. O governo garantiu aumentos
salariais, férias remuneradas, indenização por tempo de serviço e, através das iniciativas de Eva Perón, uma ampla assistência social aos trabalhadores. Contudo, essas concessões sempre eram revestidas de um caráter paternalístico, a fim
de que Perón mantivesse um seguro controle sobre as massas, em particular os sindicatos e a CGT (Confederação Geral do Trabalho), que eram tutelados pelo Partido Justicia-
lista, braço político do regime.
crático
e popular,
Por trás do discurso demo-
o Peronismo,
como
regime
Ê
ah
Do RR
bs o.
a
Tie
+
AE
=
148
EO
clássico, ocultava um forte conteúdo auto ritário. |
populista
do in im pr re o, at nd ma Desde o, tr ou de as st ni mu co e o lad conservadores € liberais de um represA l. oa ss pe e o ri tá ri to au ilo est Perón deixou claro seu do sse cla de do eú nt co o te en id ev ou rn são aos comunistas to o fim
de
capitalista
primeiro
ninguém deveria colocar entraves ão
seu regime: nada nem projeto
seu
nacional
e, principalmente, disputar com
ia. rár ope a ss ma da ão uç nd co e a nç ra de li a n ró Pe
r po da la te tu , te in tu ti ns Co ia lé mb se As Em 1949, uma tituir a bs su a a ad in st de ão iç tu ti ns Co a um ou or Perón, elab urou-se que vigorava desde 1853. Nessa Constituição, proc a a ir ne ma de o, sm li ta pi ca ao a” an um “h dar uma imagem o. in nt ge ar vo po do de da ci li fe a ra pa e ad id il ab mostrar sua vi no Assim, nela insistia-se na função social da propriedade, direito do governo de intervir na economia e controlar os servicos públicos e no monopólio da nação sobre o solo e subsolo. Como a Constituição autorizava a reeleição presidencial, Perón se candidatou de novo e, em 1951, iniciou um segundo mandato, o qual terminaria com o golpe de 1955. Entre os fatores que levaram à queda de Perón — que ficou politicamente enfraquecido com a prematura morte de Eva Perón, em 1952 — poderiam ser mencionados o descontentamento dos latifundiários com a taxação das exportações, numa época em que a concorrência internacional provocava a queda dos preços no mercado externo; a oposição do clero e do imperialismo, este último inseguro diante da retôrica nacionalista do regime, e, para completar, a discordancia do Exército em relação à excessiva ingerência dos sindicatos nas instâncias do poder, Exército, de resto, devidamente imbuído do anticomunismo ideológico dos tempos da guerra fria.
Em setembro de 1955, em Córdoba, estalou o golpe
militar que
derrubaria
o Peronismo
do
poder. O novo go-
verno do gen. Aramburu tudo fez para extirpá-lo da vida argentina, o que, evidentemente, não conseguiu. Por outro lado, é interessante observar que, afastado Perón do cenário, a ambivalência ideológica da sua retórica acabou produ-
zindo
uma
divisão
muito
sintomática:
de um
lado,
uma
149
cúpula
burocrática
corrupção
e veio
e sindical a formar
tro, as bases herdaram embaladas
por sonhos
uma
O autoritarismo
herdou direita
oportunista,
ne
e a ou-
e, a st li pu po so ur sc di do o sm li o idea
de justiça social, vieram
a constituir
. os er on nt Mo de s do na mi no de s ro ei lh ri er gu de da uma esquer
o sm li pu po do es çõ ta mi li s e da nt ue oq el do da Um Pe s, pô de o e qu e lp go do o iã as oc r po , do transpareceu quan e qu s io ár er op s ao s ma ar em ss de se e qu iu it rm rón não pe
a em qu es o m e co nt me te en er Co . me gi re o er nd fe queriam de en id ev ra ze fi € a ru à ra pa as ss ma as ra va le n ró Pe a, populist
ciar-se sua força. Só ele, porém,
teria o direito tanto de usar
o nã as ss ma a. -l As zá li ra ut ne de ém mb ta mo co a rç fo tal tinham, no populismo, o direito de constatar, na prática, a força que possuíam. Perón não o permitiu em 1955 como, no caso brasileiro, Vargas também não o permitira um ano
antes. Acuado, Getúlio Vargas, no célebre 24 de agosto de 1954, optou por “sair da vida e entrar na história”. Na mesma situação, um ano depois, Perón foi bem menos trágico e mais modesto: preferiu sair da Argentina para refugiar-se no Paragual...
Do peronismo ao estado militar O presidente que substituiu Perón foi Arturo Frondizi, da União Cívica Radical, eleito, aliás, com os votos dos proscritos peronistas. Adotou uma política muito parecida com o seu contemporâneo Juscelino Kubitschek, que então
governava
o Brasil: desenvolvimento
industrial acelerado à
base do capital externo e, em absoluta contradição com seu próprio livro Petróleo e Política, permitiu ampla participa-
ção de empresas estrangeiras na exploração do petróleo argentino. Mas não foi apenas aos nacionalistas que Frondizi de-
sagradou. Para estimular o ingresso de capital estrangeiro, obrigou-se a comprimir os salários dos trabalhadores. A resposta foi a maciça votação em candidatos peronistas quando das eleições provinciais e municipais. Negando-se a anular tais eleições, Frondizi foi derrubado pelos militares, em
1963.
;
AA:
151
Em
julho do
mesmo
ano, com
apoio
dos peronistas,
outro candidato da União Cívica Radical subiu à presidên -
cia, o médico liberal e progressista Artu ro lia, que venceu facilmente o candidato militar, gen. Pedro Aramburu. lia não só suspendeu as restrições ao Pero nismo como até quis autorizar a volta de Perón à Argentina, com o que os militares não concordaram. Com respeito ao imperialismo, Arturo llia bloqueou a sua participação no setor petrolífero e se recusou a participar da intervenção no rte-americana contra S. Domingos em 1965. Em junho de 1966, foi derrubado por mais um golpe militar, que levo u ao poder o gen. Juan Carlos Ongania. Reacionário ao extremo, Ongania reprimiu tudo — comunistas, peronistas, operários, estudantes e até a minissaia. E, claro, os salários dos tr abalhadores. Tudo — exceto o custo de vida e o capital estr angeiro. Sua impopularidade provocou violento levante operário em Córdoba, em junho de 1969, que foi, todavia, repr imido. Mas o Exército não teve condições de continuar sustentando tal governo e o gen. Roberto Levingston o subs tituiu em junho de 1970. Em março de 1971 o gen. Al ejandro Lanusse assumiu, por sua vez, o lugar do gen. Levingston . A situação da Argentina cont inuava séria. A deterioração dos precos a nível de exportação agravava a dívida nacional e o achatamento sa larial tornava insuportável a vida do operariado. Por outr o lado, o exílio favorecia a imagem de Perón e as trocas de militares no poder desgastavam
Assim, o peronista Hector Campora se tornou presiden te e, em junho de 1973, permit iu a volta de Perón, que, eleito por ampla maioria, reassu miu o cargo presidencial, aos 79 anos, em outub ro de 1973.
Todavia, o Peronismo era aquela altura uma força que adquirira vida própria,
prescindindo do seu já então decré-
pito fundador. Perón, man ipulado pelos setores dire itistas, não conseguiu unir ou s equer controlar as facções antagônipartido,
especialmente
a
esquerda. Se não tivesse morrido em julho de 1974, as contradições do momento o teriam liquidado politicamente.
Perón, assumiu o governo a vice-presidente ego er alt o cuj '), ta' eli sab ("l ón Per de ez tín Mar ela Est ia Mar veio a ser José Lopez Rega, lídima expressão da facção mais reacionária e corrupta do Peronismo, a qual prepararia o cenário para o retorno de uma política direitista, desumana Uma
vez morto
e sangúinária sem precedentes. Com efeito, Lopez Rega iniciou uma operação subterrânea e sinistra contra a guerrilha urbana da esquerda peronista, a qual subsequentes governos militares.
Em
marco de 1976 um
atingiria
o auge
nos
golpe militar depôs Maria Es-
tela e subiu ao poder o gen. Jorge Rafael Videla. Com ele começou aquilo que os militares denominaram de “guerra suja” contra a guerrilha de esquerda. Ao contrário do Chile de Pinochet, onde a repressão mais violenta concentrou-se na fase inicial, na Argentina dos governos militares a violência distribuiu-se uniformemente ao longo de todo o período
e só recentemente veio à luz o seu terrível lado obscuro e clandestino. Como nos tempos da Gestapo hitlerista, milhares de pessoas sumiram ““na noite e no nevoeiro”. A fase de terror institucionalizado, que em nada ficou a dever ao nazismo alemão, durou de 1976 a 1983, sob a presidência dos generais Videla, Viola e Galtieri. Não só os guerrilheiros como também um amplo espectro de adversários reais e potenciais foram barbaramente torturados, violentados, massacrados e mortos. Seu número elevou-se a várias dezenas de milhares, em um episódio que só teve similar nas chacinas do período da conquista do continente pelos espanhóis. Paralelamente à garantia de impunidade pelos massacres e torturas, os militares tiveram também a oportunidade de enriquecer com os confiscos resultantes da brutalidade e não raro o roubo foi o único motivo dos assassinatos. A devastação provocada pelos regimes militares não foi só política e moral como também econômica. Durante
os anos dos governos militares, o ministro da economia, Martinez de Hoz, aplicou medidas neoliberais preconizadas
153
pela Escola de Chicago, liderada por Milton Friedmann. O governo deixou de praticar o confisco cambial sobre as rendas do campo e os agrodólares acabaram servindo ao consumo suntuário da classe dominante ou às especulações finan-
ceiras que acarretaram enorme evasão de divisas. A virtual liberação de importações levou a produção industrial argentina a uma crise irremediável, evidenciando-se a falácia do
E
postulado neoliberal, que afirmava que o ingresso de mer-
cadorias estrangeiras produziria uma salutar concorrência e forçaria a indústria interna a se aprimorar, para o benefício comum. Ão contrário, a indústria nacional faliu e o desemprego aumentou enormemente. Quando o governo Viola se deu conta disso e decidiu desvalorizar o peso, pensando,
desse
modo,
beneficiar
as exportações
e deter a evasão de
dinheiro acarretada pelas importações e pelo fluxo turístico, os resultados foram a carência e a carestia, pois a indústria nacional, que deveria suprir o mercado interno, simplesmente se achava despreparada para isso, golpeada que fora pela política econômica vigente durante tanto tempo. Sangrada no mais amplo sentido da palavra, a Argentina reencontrou o espaço para a formação de um governo civil e civilizado depois do episódio do conflito das Malvinas (1982). A derrota militar para os britânicos, quando da invasão às Ilhas Malvinas, fez naufragar o esforço dos generais de resgatar sua imagem através de uma aventura em que uma autêntica causa nacional apareceu travestida de patriotada irresponsável. A vitória de Raul Alfonsín nas urnas significou O reconhecimento popular de que o Peronismo era uma etapa ultrapassada na vida política do país, tudo indicando ocorrer o mesmo em relação à intervenção dos
militares na política, pelo menos a curto prazo. É o que se
pode deduzir do fato de Alfonsín ter conseguido levar os generais responsáveis pela guerra suja e pelo descalabro mili-
tar ao banco dos réus.
154
XVIII. A Revolução Cubana Economia e perfil de classes na sociedade cubana pré-revolucionária Já foi lembrado anteriormente que a monocultura
áçucareira
e a dominação
sociedade cubana
externa modelaram
pré-revolucionária.
No
o perfil da
alto, predominava
uma plutocracia integrada organicamente ao imperialismo e com reduzidos vínculos com as outras classes do pais — uma elite satelitizada de tecnocratas, burocratas, gerentes, comerciantes, profissionais liberais, etc., incapazes de estabelecer aqueles laços ideológicos que permitiram às demais oligarquias de outras partes da América Latina se confundirem com a nação. Como bem observou Gérard-Pierre Charles, a oligarquia cubana era uma classe social muito “moderna” para a época e pouco ''nacional”” para Cuba. No extremo
oposto do
espectro social cubano existia
uma explorada massa trabalhadora rural e urbana. O fato do imperialismo ter montado enclaves açucareiros em Cuba
a
EL3: Ari
com características plenas de empresas capitalistas fez com que a maioria dos trabalhadores rurais se tornasse um proletariado típico. Já em 1952, nada menos de 63,6% dos que trabalhavam no campo eram assalariados. Isto fez com que o trabalhador rural cubano, ao contrário do de outros países, não lutasse primordialmente para ter a terra e sim para
conseguir melhores
salários e condições
de vida. Nas lutas
sociais, desde O início, comunistas e anarco-sindicalistas desempenharam um importante papel: ao contrário das outras nações latino-americanas, onde tais forças políticas apareceram em época posterior à formação do Estado nacional, em Cuba elas apareceram juntas com a república, visando aglutinar os descontentes com o sistema. A tardia emancipação de Cuba fez com que sua evolução histórica fosse atropelada e o país não passou por aquele estágio intermediário de dominação de uma elite crio/la entre a emancipação e a entrada do capital monopolista. Pelo contrário, o capital monopolista foi que patrocinou a “emancipação”. E, no campo, muito cedo se formou um campesinato proletarizado, diferente daquele campesinato de feição tradicional, submetido à dominação patriarcal
de uma
elite identificada ideologicamente com a terra, en-
contrável em tantos países do continente. No que tange ao progresso industrial, Cuba pertencia ao grupo de países que Vânia Bambirra classificou como de tipo B, isto é, de industrialização tardia, posterior à Il Guer-
ra e desenvolvida já diretamente sob o signo do capital monopolista, no caso, norte-americano. Com efeito, virtualmente coagida a importar dos Estados Unidos os artigos manufaturados,
exceto os charutos, Cuba não teve muita chan-
ce de se industrializar. Após a guerra, porém, diante da falta
de espaço de crescimento na área do açúcar, já saturada, da falta de petróleo e das dificuldades técnicas na mineração do níquel e do ferro, o capital monopolista passou a buscar alternativas de investimento no setor de serviços públicos e,
apesar da limitação do mercado interno e da existência do “obstáculo” representado por algumas leis sociais duramente conquistadas, também na indústria manufatureira. Entre
156
mo ra no os an ic er am ert no s to en im st ve in os 58 19 1946 e
. .. .. .. .. . a par 00 .0 00 :0 40 $: US de industrial passaram 50% de is ma m va la ro nt co já 6 -5 55 19 Em . 00 .0 00 .0 80 $ US das ferrovias públicas e, possuindo 39 usinas, 40% da produção açucareira, um dado que evidencia uma elevada produ-
tividade, se se considerar que as 118 usinas de propriedade cubana totalizavam 59% da produção. Finalmente, é inte-
ressante observar que, não tendo conseguido um progresso
industrial apreciável, a Cuba pré-revolucionária acabou não formando um proletariado urbano muito numeroso, o que automaticamente limitou o espaço de manobra dos comunistas. Com respeito ao que se poderia chamar de classe média, o dado mais interessante a destacar seria o caráter heterogêneo e inorgânico que apresentou em Cuba. Foi uma classe tão sensível ao protesto e à rebelião quanto cooptável pelo imperialismo e seus agentes internos. Dela saiu o apoio a ditadores tipo Gerardo Machado e Fulgêncio Ba-
tista. Mas também
saíram
os guerrilheiros de Sierra Maes-
tra, a começar pelo próprio Fidel Castro. Gérard-Pierre Charles observa que a massa trabalhadora cubana foi a única classe homogeneamente identificada com uma consciência nacional e, portanto, potencialmente revolucionária, exceto, é claro, a fração do /umpenproletariado e dos camponeses não-proletarizados remanescentes. Um fator importante na eficácia revolucionária do proletário rural foi o caráter sazonal do trabalho que realizava, compelindo-o a migrar constantemente de um lugar para outro, o que facilitava o contato permanente com os mais diversos setores populares.
A sociedade cubana jamais conseguira integrar as clas-
ses entre si e os grupos superiores ligavam-se quase que exclusivamente aos valores e à dominação de fora. Em Cuba, segundo A. Blanco e C.A. Dória, havia mais agentes de jogo e prostitutas do que operários de mineração, configurando a virtual transformação do país num misto de cassino e bor-
del pela
dominação
estrangeira
na vida
imperialista.
cubana
dE" ATA
dava
A acintosa
um
interferência
conteúdo
particular-
157
mente rancoroso ao sentimento nacionalista popular, reforcando-o a partir de uma perspectiva de negação — a negação
da secular espoliação com todas as suas sequelas e ramificações internas.
e
o a
Dos anos 30 à revolução Em 1908, o açúcar representou 54% das exportações cubanas, percentual que subiu para 88,0% em 1918. Tendo a | Guerra desorganizado a produção européia de beterraba, ampliou-se o mercado para o açúcar e isso estimulou a especulação. Empréstimos bancários astronômicos foram feitos para incrementar a produção, dando início ao que se chamou de “dança dos milhões”. Entretanto, apesar desse crescimento, a pobreza da classe trabalhadora continuava crônica e o caráter sazonal do trabalho produzia aqueles longos períodos sem serviço conhecidos como “tiempo muerto”. Se a isto se acrescentar o crescimento populacional, o que significava mais gente querendo emprego, era natural que o resultado fosse a existência de reduzido espaco de barganha para o trabalhador e, portanto, a permanência de uma situação global de desvalorização da mão-de-obra e de aumento do desemprego, da insegurança e da miséria, configurando o que Oscar Pino Santos denominou de antidesenvolvimento. A partir de 1925, com a queda dos preços do acúcar
no mercado externo, resultado da recuperação da produção européia de beterraba, Cuba entrou numa crise aguda. A especulação desenfreada cobrou então o seu preço. Proprietários cubanos de terras e usinas perderam tudo para os proprietários norte-americanos e os bancos cubanos (Banco Nacional, Banco Espanhol) que haviam emprestado dinheiro e não puderam ser reembolsados acabaram falindo, sendo
absorvidos pelo First National City Bank, Com o episódio da depressão de 1929, a situação de Cuba piorou ainda mais. A crise compeliu os Estados Unidos a baixarem a quota de açúcar adquirida aos cubanos de 50 para 28,0%, devido à necessidade de prestigiarem os pro-
dutores de suas dependências coloniais (Havaí, Porto Rico e
158
tr
Po
Filipinas).
Este fato agravou
consideravelmente o déficit da
vo po o os ci gó ne s no e vr li ja se e u balança de pagamentos. “Q e is cr a E í. rt Ma sé Jo a di um a er ss di , e” vr li r Se er is qu e qu a el qu da e ad rd ve de an gr a , ba dos anos 30 revelava, em Cu
de. da ci li mp si al ut br m o c a d a advertência formul ovo p do a er o nã ão aç tu si da a lp Evidentemente, a cu rmit pe o as ci ân st un rc ci às e qu cubano, que reagia sempre a u o b u r r e d r a l u p o p o t n e m i v tiam. Em 1933, um amplo mo ada havia t n a l p m i , o d a h c a M o d r a r e G de ra sanguinária ditadu
e o qu d a n o i c n e t n i m e b o n r e v o g , o to an oito anos. Entret uco o p , in rt Ma n Sa au Gr n ó m a R r po do ia veio a seguir, chef
durou (1933-34) e nem então sob a presidência tre 1940 e 1944, Cuba Fulgêncio Batista, que bita norte-americana.
obteve O apoio dos Estados Unidos, de Franklin Delano Roosevelt. Enfoi governada pela mão de ferro de manteve O país firmemente na ôr-
vol in rt Ma n Sa , os ic nt tê Au s do o id rt Pa do te en fr A
ele m ne a vi da To . 48 19 até ou fic e 44 19 em r de po ao tou r e nem o seu sucessor, Pio Socarrás, conseguiram encontra soluções adequadas para um país que enfrentava problemas tão graves. Moderadas e paliativas, tais soluções acabaram naufragando na ineficácia e na corrupção, o que levou ao descrédito a via eleitoral e a esquerda tradicional como alternativas para a política nacional. Em face disso, mais tarde, quando Fidel Castro subiu ao poder, ficou de mãos livres para propor experiências completamente novas, absolutamente descompromissado com qualquer facção ou com a realização de eleições, já que as instituições estavam desmoralizadas. Em 1952, Pio Socarrás foi derrubado por Fulgêncio Batista, que instalou mais uma ditadura ao estilo de Gerardo Machado. A miséria e a dominação estrangeira tenderam então a se aprofundar e acabaram por fertilizar o solo de onde brotaria a revolução que fez o país passar de sócio menor da rapina imperialista para novos horizontes e perspectivas.
EEN
159
Sierra Maestra À pretexto de evocar o centenário de nascimento de José Martí, em Havana, em janeiro de 1953, realizou-se uma
gigantesca manifestação estudantil para protestar contra a
==
oe
sm
ditadura
de
Batista.
A
Universidade
da
capital,
reduto
da
intelectualidade da classe média, se tornava o centro da contestação. No dia 26 de julho de 1953, um grupo armado, liderado pelo advogado Fidel Castro, atacou o quartel de Moncada, em Santiago de Cuba. O ataque fracassou e Castro foi preso. Julgado, Castro aproveitou o julgamento para fazer uma divulgação de sua convicção política e revolucionária em um discurso que ficou famoso (“A História me absolverá!"'). Libertados por uma anistia, em maio de 1955, Fidel e seu irmão Raul foram para o México e organizaram o Movimento 26 de Julho, tendo se juntado a eles o médico e revolucionário argentino Ernesto Che Guevara. Em dezembro de 1956, um grupo de 82 homens embarcou no iate Granma, rumo à Cuba. Aguardados pelos soldados de Batista, grande parte dos rebeldes pereceram em luta sangrenta logo depois do desembarque. Os remanescentes conseguiram fugir para Sierra Maestra e lá iniciaram uma campanha de guerrilhas. O governo norte-americano estava comprometido com Batista, mas a corrupção e tirania imperantes em seu regime levavam a opinião pública dos Estados Unidos a simpatizar com os rebeldes. O passar do tempo desgastou o ditador, enquanto ja fortalecendo rapidamente a guerrilha. O Partido Comunista, que via Castro como um aventureiro
bem
intencionado,
ficava à margem
dos acontecimentos,
preso à visão ortodoxa de atuar apenas junto ao proletariado urbano.
À medida que os rebeldes foram ganhando terreno,
promoveram a reforma agrária nas regiões libertadas, o que aumentou a adesão à causa revolucionária. Por outro lado, numa evidência do conteúdo nacionalista da luta que travavam, os guerrilheiros promoviam sessões coletivas de lei. tura dos textos de José Martí entre os camponeses.
160
Em
1959,
de
janeiro
os revolucionários
finalmente,
ro, st Ca l de Fi te en fr à o nd te , na va Ha em am ar tr en os os ri vito tista fuCamilo
Raul
Cienfuegos,
Castro e Che Guevara.
Ba
or nf co um em a, nh pa Es na r ve giu para 5. Domingos e foi vi
. as di us se de m fi o é at u tável exílio que duro
O projeto revolucionário
Os primeiros projetos econômicos
e políticos dos
re-
is rm fo re um de s te mi li Os m va sa as ap tr ul o volucionários nã mo
democrático
e progressista
o programa
muito sistemático, pequenos
Sem
pequeno-burguês.
ser
incluía entrega de terras a
agricultores e arrendatários,
expropriação dos ex-
doha al ab tr s ao a ci ên st si as s, la co ri ag as es pr em cedentes das s imdo o çã en is e % 50 em is ué ug al s do o çã du re , res rurais
habide r to se do o çã ia pl am , as ri óp pr as di ra mo ra pa postos go, re mp be su e go re mp se de ao e at mb co s, re la pu po es taçõ ndidesenvolvimento do setor energético, melhora das co cões sanitárias, alfabetização em massa e adequação do ensino às necessidades de um desenvolvimento auto-sustentado. Obviamente, tal programa não era objetivamente socialista, a despeito de seu conteúdo bastante avançado. Pretendia libertar Cuba do atraso e da dominação estrangeira através de uma combinação de intervencionismo estatal na economia, atitudes decididamente nacionalistas, progresso social e redistribuição da renda. Naquele momento, não se mencionaram nem a coletivização nem a abolição da propriedade privada. Isso não foi suficiente para que os Estados Unidos aceitassem a nova Cuba. Mesmo sem aderir ao socialismo, o programa dos guerrilheiros já era o bastante para limitar os espaços da ação imperialista. Em junho de 1959, a reforma agrária levou à desapropriação dos latifúndios norte-ameri-
canos e, em junho de 1960, Cuba aceitou comprar o petróleo soviético a preços mais baratos que o petróleo vendido por empresas dos Estados Unidos. Como as refinarias norteamericanas em Cuba se recusassem a refiná-lo, Fidel Castro, em resposta, nacionalizou-as. Os Estados Unidos resolveram
então
boicotar
ê
a
3)+
compra
do
açúcar
cubano
e
Castro
161
respondeu vendendo o açúcar à URSS e aos países tas, ao mesmo tempo que estatizou todos os bens dãos norte-americanos na ilha. Em janeiro de 1961, Washington rompeu com Havana e em abril a CIA (Central Inteligence
patrocinou
uma
socialisde cidarelações Agency)
invasão de contra-revolucionários a Cuba.
A invasão acabou em grosseiro fracasso e mostrou a necessidade do povo cubano permanecer mobilizado para defender suas conquistas. Ainda no mesmo ano, Castro proclamou a adesão de Cuba ao marxismo-leninismo. Do ponto de vista da burguesia liberal, isso foi um “desvio” de uma revolução originalmente legítima e resultou de uma desastrosa agressão do imperialismo americano que, atingido em seus interesses, não soube reagir com a diplomacia adequada. Esta é uma interpretação um tanto simplista dos fatos. Na verdade, com socialismo ou sem ele a simples adoção de medidas nacionalistas representava uma atitude inaceitável para o capitalismo imperialista norte-americano. Por outro lado, considerando os objetivos fundamentais do projeto inicial dos
revolucionários,
a
adesão
ao
socialismo
não
representou
um desvio, mas um aprofundamento. Sob esse aspecto, o marxismo-leninismo não entrou em Cuba como importação extemporânea e sim como uma estratégia capaz de permitir que fossem alcançados os objetivos acima referidos. As idéias de Marx e Lenin serviram apenas de embasamento teórico para o anseio de progresso social que datava dos ensaios e do pensamento político de Martí, ainda no final do séc. XIX. O fato de Martí ser o herói nacional da Cuba revolucionária é um modo de afirmar o caráter nacional de tudo o que a revolução fez até hoje. E manter viva a imagem do |í-
der do passado seu movimento
serve para os revolucionários apresentarem não como um fato isolado mas sim como
parte dos problemas e opções de todo um. continente. Em outras palavras, Martí é usado pelos cubanos como símbolo
dos laços de união entre sua revolução nacional e as perp lexidades da América Latina.
Cuba e o imperialismo Ao romper com Cuba,
os Estados
Unidos decidiram
Na o. nh mi ca o sm me o ir gu se na ti La fazer toda a América a r te m ob ra ui eg ns co 2) 96 (1 te Es l De a nt Pu a de ci conferên
anos ic er Am s do ta Es s do o çã za ni ga Or da ha expulsão da il un of a pr er nd pe de re mp se ba Cu e do qu an er (OEA). Consid
e ar úc aç ar rt po ex ra pa er qu , os id Un s do ta damente dos Es e, ins do ra tu fa nu ma s go ti ar ar rt po im ra pa charutos, quer ana ic er am ert no da di me a s, ro pa re ra pa os ic clusive técn al on ci na da vi da em ag cl ci re l ca di ra e ca us br a um obrigou a cubana.
Para
URSS,
a
as posições
empenhada
imperialismo
do
em
ajudar
em todo
a enfraquecer
o mundo,
a situação
representava um verdadeiro presente. Com seu auxílio, ajudou os cubanos a levarem avante sua revolução e assim criouse um flanco exposto para os Estados Unidos em pleno Caribe. Os falcões da política norte-americana manipularam
ao
máximo
principiaram
da guerra
a histeria
mísseis
a instalar
fria
na
quando
os soviéticos
ilha, a pouco
mais
de
de Miami, e esse fato ameaçou, por um momento, lançar o mundo num conflito armado de proporções imprevisíveis. A crise explodiu em setembro-outubro de 1902, quando a frota norte-americana se interpôs no caminho da frota russa que rumava para Cuba. Um acordo de última 100
km
hora entre Washington e Moscou deteve a marcha do conflito, que parecia inevitável. A URSS assumiu o compromisso de não instalar mísseis em Cuba e, em troca, os Estados Unidos aceitaram não mais tentar invadir a ilha. Os rumos históricos adotados por Cuba e suas rela-
ções com os norte-americanos marcaram os últimos vinte anos da América Latina, de um modo ou de outro. Ao longo desse tempo, a pressão política e ideológica dos Estados Unidos, em conexão com os interesses das elites conservadoras latino-americanas tenderam a espalhar a desinformação e a confusão sobre a realidade cubana pós-revolucioná-
ria. Por outro lado, grande é a curiosidade a respeito do assunto, o que fica claro quando, em épocas de maior liberdade, se intensifica a procura de informações sobre a pátria NY
EA
E”,
Fé
AN
PJndS
pads
[to
163
Cao,
E
de Martí e sua
realidade
econômica,
social
e política.
Há
liberdade em Cuba? É verdade que Cuba passou da esfera
de dominação dos Estados Unidos para a da União Soviética?
Tais perguntas, muito comuns, não podem ser respondidas de forma simplificada e muitas vezes não podem ser desligadas da posição ideológica de quem as fez e de quem as responde. A palavra /iberdade, por exemplo, não pode ser desligada de um contexto social e histórico concreto, sob pena de não passar de uma abstração sem qualquer significado, o
que permitiria dizer que se pode ter a liberdade de morrer de fome, de não ter emprego ou de viajar por todo o país
ou por todo o mundo, mesmo não tendo um centavo no bolso. No caso de Cuba, certamente o país está longe de ser um paraíso na terra, principalmente por ser uma nação pobre e sem grandes recursos. Em todo o caso, já superou, há muito tempo e de forma rápida, os infernos tão familiares aos povos latino-americanos. As dificuldades econômicas são grandes e, em grande parte, resultantes do bloqueio imposto há vinte e cinco anos e até hoje mantido pelos Estados Unidos, fato que levou o país, por necessidade de sobrevivência, a depender estreitamente da União Soviética. Cuba não é também um paraíso consumista, mas qual dos países do continente o é A não ser, é claro, para reduzidíssimas faixas da população, que estão no topo da pirâmide econômica e social. Uma análise fria e desapaixonada, porém, reconhece que O regime instaurado a partir
de 1959 erradicou o analfabetismo, luta para dar moradia a
todos, tornou o ensino e a assistência médica acessívei s a toda a população e completamente gratuitos e eliminou a mis éria e a prostituição. O que não é pouco num país que antes de Fidel Castro era considerado o bordel dos Estados Unidos, com muitos milhares de prostitutas. Como ana lisar
teoricamente
Du
=
164
não é tolerada. Em última instância, portanto, as Oo.
regime
da liberdade em confronto com tais
Por outra parte, é evidente que a atividade co ntra o
a
dados?
a questão
no o sã es pr re da e e ad rd be li da es discussões sobre as questõ ca-
regime cubano — € também
rágua
aos
ligadas diretamente
estão sempre
—
no caso dos sandinistas da Ni
interesses
sim as e qu l ra tu na é E s. te an ip ic rt pa s ideológicos e sociais do seja. sta vi de o nt po o b so ba Cu de ão aç tu si a do Analisan
o it mu e nd pe de a nd ai ís pa O e qu r ze econômico, pode-se di
s do ta Es os ra pa is ma o nã a or ag , ar úc da exportação de aç mco l pa ci in pr a é e qu a, ic ét vi So o iã Un Unidos mas para a da ma le ob pr o o id nc ve , 82 19 Em o. ut od pradora do pr s. da la ne to s de õe lh mi 21 8, a ou eg ch ão uç ferrugem, a prod s, ai ci s so ma le ob pr es av gr is ma s o do çã ra pe su A despeito da o tã es o nã a nd s ai re to se is ma de s as no iv ut od as forças pr
de ea ár ar na ul ic rt s, pa da em vi ol e nv nt se me de te en ci sufi er ma qu al . qu is De ve o rá m du u s n o c s de ns te be or e sp an tr neira, parece evidente que, ao contrário do resto da América Latina, o problema de Cuba já não é mais transformar suas estruturas sociais e econômicas e sim aperfeiçoá-las. Quando no começo de 1980, 100.000 cubanos emigraram para o “'mundo livre”, de fato o que se evidenciou foi a atração por uma miragem — a da sociedade de consumo que tudo oferece sem muito esforço. O que deixa evi-
dente
o
quanto
de
consciência
social
exige
um
projeto
socialista, cuja realização cobra um árduo mutirão coletivo. Politicamente, Cuba é regida por uma Constituição, aprovada em plebiscito em 1976 e que, bem ao gosto latinoamericano, outorga a Fidel Castro diversos títulos: presidente do Conselho de Estado e do Conselho de Ministros, secretário-geral do Partido Comunista Cubano e comandante-em-chefe das Forças Armadas Revolucionárias. Na base do sistema de poder, estão as Assembléias do Poder Popu-
lar, organizadas em diversos níveis, desde o local até o nacional. No plano internacional, ainda excluída da OEA, Cuba faz parte da ONU (Organização das Nações Unidas) e do Movimento dos Países Não-Alinhados. Tendo como um de seus objetivos acabar com o isolamento continental de Cuba,
Che
Guevara,
na
década
de
1960,
decidiu
levar a
105
- experiência guerrilheira adquirida em Sierra Maestra para o resto da América Latina, promovendo uma revolução conti-
nental. Não conseguiu, porém, levantar o campesinato conservador da Bolívia e, além do mais, os norte-americanos já estavam
dos para
adestrados
na luta contra-revolucionária
enfrentar
tal conjuntura.
Che
Em
outubro
e prepara-
de 1967,
Guevara foi morto por militares bolivianos treinados pelos Estados Unidos. A expansão da guerrilha cubana para a América Latina serviu consideravelmente à propaganda de Washington e das classes dominantes latino-americanas para mostrar
como
Cuba, a serviço
da URSS,
espalhava a subversão no
continente, concepção essa que se tornou um pretexto ideológico para a repressão dos legítimos anseios populares por mudanças sociais, como se fossem mero produto da conspiração comunista internacional. Mesmo no tempo da distensão entre norte-americanos e russos, Washington manteve atuante o anticomunismo em seu quintal latino-americano, utilizando o fantasma da Revolução Cubana para dividir o povo de um continente potencialmente revolucionário, facilitando assim a tarefa das classes dirigentes internas de defender seus interesses e seu poder. Sob certos aspectos, os Estados Unidos temem Cuba mais do que a URSS. A URSS, afinal de contas, está longe e sua opção histórica sempre pode ser apresentada como um específico produto nacional. Já Cuba não. Ela está muito próxima e sua experiência socialista pode ser um exemplo que Washington não deseja para este continente tão cheio de dificuldades. Por isso, determinados setores tem insistido nesse ponto: Cuba é hoje uma ditadura unipartidária e unipessoal e apenas trocou o imperialismo norteamericano pelo soviético. O que se pode dizer a respeito disso?
Em primeiro lugar, multiplicidade de partidos nunca foi, na América Latina, sinônimo de democracia. Em segundo partidos políticos em regime capitalista e regime socialista não são a mesma coisa ou, em outras palavras, não se pode dissociar o conceito de partido político de um referencial 166
O
D
me
ati: A
4
ota ad e qu a st li ta pi ca ís pa m u N reto. c n o c l a i c o s econômico es nt ta li nf co e s lo ip lt mú os , is ra s libe o c i d í r u j s o m s i os formal e em ir im pr ex se ra pa l na ca os, um d i t r a p s o N , m ê t interesses alista O ci so ís pa m nu e qu o s s a p ao , o ç a p s e u e s m e r i u conseg portanto,
o e, i r á n o i c u l o v e o r t n e m u r partido atua como inst objetivos
dos
aglutinador
da coletividade
e aspirações
que
re to ci ér ex o Se . de da li ta to d Su em r ta en es pr re e r p m u c lhe ói tr ns co e qu vo po m u de o d a m r a volucionário é o braço o aç br u se o é io ár on ci lu vo re uma nova sociedade, O partido à mobiliza-
over m o r p de o ã ç n u f a m tê s o b m a político — €
a. us ca só a m u de o rn to em s ção de todo O
que
foi
dito
obviamente,
acima,
não
significa
que
a m u a de rç fo e-d sa mi ca na a st po uma comunidade inteira é nco a m u n e, qu m, si so is a, ic if gn Si . homogeneidade artificial opr s o e m s i n o g a t n a , os ta is al ci so ia e juntura revolucionár um n s se as cl de ta lu à e qu a is co a m s e blemas não são a m ar ol nr se de se m e d o s p to li nf co , OS to an rt a. Po país capitalist ís pa m . u o c N i n ô m e g e o h id rt pa o m s e m no âmbito de um nte e m e t n e u q e r ia f ár id de rt da pa ci li ip lt capitalista, a mu as e e ad , id s va a c a i t á r c o m e as d ci ên ar ap oculta, detrás de aspirações exclusivamente individuais. Por
resta
fim,
uma
última
e controvertida
questão:
eta rt is no al ri o pe ã ç im a n i m e o t n d e da m s e l p m Cuba passou si a? americana para a dominação imperialista soviétic o m s e m e, qu é r, ga ro lu ei im pr em r, ze di de po O que se
ên iv ev br e so ad de id ss ce ne , r do po ri se in a se nh que Cuba te
ia nc uê fl in ra de , fe as es na ic as ór ci st ân hi st un rc s ci la cia e pe o , , nã so mo ca is no al ri pe o im m r e a, t ic o ét vi o So iã da Un fi ci pe ne es a fi vr de , la e pa t a e n e qu m já a t e r r do o c ca li ap está camente o fenômeno resultante da expansão das forças pro-
fe ri o pe çã à re di is em ra as nt st ce li ta pi es ca ís pa s s do va ti du ria, que, em consequência, se torna o espaço no qual se opera a acumulação de capital a ser transferido para o centro. Por
mais
que
alguém
possa
considerar
os
Estados
Unidos e a URSS como apenas dois lados da mesma moeda, ia nc uê fl a in b su s so ea u ár o as c e s e o o M tr çã en la re de po o ti absolutamente
não
é da
mesma
natureza
que
o existente
entre o grande capital norte-americano e os espaços perifé1 EAN
»),
167
ricos. Para que assim fosse considerada a questão, seria preci-
so, pelo menos, admitir que na URSS existe um capitalismo de Estado, noção rejeitada até mesmo por teóricos do chamado eurocomunismo.3 De qualquer forma, à parte o sentido das palavras e a
intenção de quem as utiliza, é evidente que a sociedade cubana pós-revolucionária possui uma estrutura que, em grande parte, se apoia na URSS e dela depende, em que pesem os esforços do governo de Fidel Castro em manter
relações comerciais com todos os países, especialmente do continente latino-americano. Da URSS vem maquinarias, técnicos e petróleo e para lá vai o açúcar, a preço de mercado, ainda que os soviéticos sejam dos maiores produtores de beterraba do mundo. Por outro lado, se os soviéticos se em-
penham em auxiliar Cuba não é por filantropia — é porque lhes interessa enfraquecer os espaços do imperialismo. Independente destas controvérsias, ao findar oséc XX Cuba segue em frente rumo à construção de uma sociedade socialista, computando muitos êxitos e enfrentando algumas dificuldades. E é interessante observar que entre os ele-
mentos específicos que caracterizam sua história o mais importante talvez seja o ter sido o último país do continente a se libertar da Espanha e o primeiro a se libertar dos Estados Unidos.
3 Radice, Lúcio Lombardo. Brasiliense, 1982,
168
A
Lito,
Um
socialismo
a inventar. São Paulo,
XIX. América Latina, Terceiro Mundo, Imperialismo, Guerra Fria Industrialização latino-americana e capital monopolista A Il Guerra Mundial, por um lado, representou um golpe nos interesses do capitalismo, na medida em que favoreceu a aceitação do socialismo como alternativa de reconstrução
voreceu
mundo
de um
devastado.
muito
de modo
especial
Por outro, entretanto,
a acumulação
fa-
capitalista
nos Estados Unidos, dando a esse país uma posição de van-
guarda
definitiva no Ocidente, principalmente porque,
não
com
um
tendo enfrentado o conflito em seu território, não precisou gastar energias com a reconstrução nacional. Em 1945, os
Estados
Unidos
estavam
intactos
e contavam
imenso mercado mundial, mercado que estavam com plenas condições de abastecer, já que as necessidades da guerra
propiciara a total recuperação de seu parque industrial, violentamente atingido pela depressão econômica dos anos 30. AVE En /
Y
SJTi
“"
Devido, inclusive, ao trabalho de muitos cientistas de países europeus que tinham fugido do nazi-fascismo, os Es. tados Unidos eram a nação tecnologicamente mais adiantada em 1945. Economicamente, a extraordinária acumulação de capital levara a concentração das principais atividades nas mãos de um punhado de macro-empresas que não tardaram a articular seus interesses com um Estado que as circunstâncias do conflito haviam feito mais poderoso do que nunca — quer internamente, quer externamente. Finda a guerra, Os grupos que mais tinham se beneficiado com ela, os militares e os industriais, viram na manutenção de uma histeria belicista a possibilidade de garantir o seu controle hegemônico. A perspectiva de novo conflito garantiria negócios lucrativos para a burguesia industrial e conservaria o elevado prestígio que os militares tinham adquirido, já que eles continuariam sendo necessários na estrutura de poder vigente — além do que muitos militares tinham interesses na grande indústria. Enfim, os Estados Unidos passaram a ser governados segundo o interesse dominante daquilo que foi chamado de complexo industrial-
militar.
A manipulação do belicismo em função dos interesses acima referidos foi o principal fator que animou, do lado ocidental, a chamada guerra fria, que enriqueceu a indústria bélica, tornou os generais indispensáveis e fez com que as forças que tinham se voltado contra a Alemanha fossem desviadas contra a URSS. Dentro dessa ótica, a recuperação
econômica da Europa capitalista se tornou vital para a poli-
tica norte-americana. Em nome do Plano Marshall (1947), os dólares foram para a Europa na qualidade de soldados de
uma nova cruzada contra a ameaça de um novo infiel — o co-
munismo soviético. Na esteira do salvacionismo imperialista,
as macro-empresas norte-americanas penetraram na Europa e, desse modo, via dominação econômica, os Estados Unidos impuseram, no Velho Mundo, seus padrões de comportamento e consumo, Com
enorme
excedente de capital para ser investido,
os norte-americanos pressionaram para obter o controle total 170
HE
ali.
hot.
ATA Fu E Ret,
da
economia
latino-americana.
A
médio
prazo,
isso impli-
mte de , s o i l ó p o n o m s e d n a s gr do o i n í m o d e r p o iv us cl ex cou O por decr
im de s e z a p a c , ia og ol cn te tores do dinheiro e da r a t p o o c e o t n e m i t s e v n i de s e d a d sões, determinar suas priori moas classes dominantes
internas. Traziam
. o m u s n o c do o ís ra pa do e o ã ç a derniz
a miragem
da
Em países onde vigo-
o m s do o ã ç a r t e n e p de ia ég at rava o pacto populista, a estr s e d m o c m a i v e qu s o p u r g os ir nopólios consistiu em atra
o tr ou r Po . as ss ma às s e õ s s e c n o c conforto a política de fazer lado, à medida
do, an al st in se i a fo t s i l o p o n o m l que O capita
à r se a io a ve i c n ê u q e s n o c à u e r nos países onde isso ocor u d n o c u o n i m r e t e qu to fa , al ri adoção do achatamento sala re à s e e r a l u s p e o õ p ç a t s e f i n a m o s zindo à radicalizaçã da s. re ta li mi es lp a go d a a z vi i l a t n e m u r t pressão ins a r r i b m a B a i n â V s r do po ca fi si as cl es Naqueles país mi ca a e ga ti ão an is aç ma iz al ri st du in m como de tipo A, co tores, à se ns a gu i al c n ê em i c i f u s o t u r a i a u g e s n o c nho de o s s e c o r p m se u n uri a t se s i in l o p o n o l m ta pi penetração do ca a ad ic st fi so is ia ma og ol o d cn n i te z u d o r , t o n t i em andamen ti bs su à as st vi m o v o i c t u d o r a p em st r e si v l o para desenvo
is ta m e e, ar qu rv te se an ob ss re . te s e in õ É ç a t r o p m i de ão iç tu
su o in m o c s a a, m ri or ia oc já og ol cn te so de es países, O ingr s o i l esó p o n o o ã m s ç a do r t e n e p ir da . rt o d pa a A t mo impor e d a de d i l a u q na ar tr en a ou a i ss g o pa l o n , c e os t a trangeir ilt m a mu r se à a ç e m as o ri c st dú s e in d n a r g s de ai li l. Fi capita a s e r p m m e à u e m s o u c o n r o t es e ís os pa rs ve di ar em plic na previaa c i r e m a o n e i r t e a n l ê g n o ir c a a ir ir qu ge ad an estr mente existente. , Na fase da implantação do capital monopolista a apa: s a m e l b o r r ça p os ar sf di ra o iu pa ã rv ç a se l z i ma n rente moder o não-atendimento às necessidades populares, que eram as de bens de consumo imediato; a produção de bens mais requintados para um mercado restrito, o controle sobre as
decisões econômicas
nacionais; a concentração da renda, a
enevasão de divisas; a usurpação de benefícios fiscais, a dep
o ã ç a r o l p x , e a ra fo os ia de nd og vi ol cn is te ta e pi dência de ca da mão-de-obra e infra-estrutura locais; a falência de um , os rn a es a te ss t s in re i t o te n d e in a a m t i l o v v l o v n e o s l e e d d mo
171
livre manipulação de preços de artigos qu e deveriam ser produzidos a custos acessíveis: o alto grau de endividamen. to externo e, finalmente, o condicioname nto dos comportamentos e valores a estereótipos alienígenas. Alienação das consciências em função de certos padrões de consumo, aprofundamento das de sigualdades sociais, espoliação de riquezas nacionais e sangria financeira foram algumas das consegiiências relevantes das multinacionais para os países onde se instalaram e cuja soberania usurparam. Politicamente, tal processo foi comu mente acompanhado da implantação de um Estado tecnoburoc rático e autoritário. Os monopólios estrangeiros normal mente desen-
volveram, em tal conjuntura, uma capaci dade própria de ação e pressão política e os governos atrelado s a semelhan-
tes interesses geralmente só conseguiram viabiliz ar tal projeto desenvolvimentista restringindo os espaco s das massas
populares — pela repressão e pela ideologia. Observa Vânia Bambirra que a implantação do capital | monopolista em países de tipo A produziu , com o tempo, uma interessante contradição: como as mu ltinacionais passaram a fabricar no país insumos antes impo rtados, a questão da dependência deslocou-se do plano ec onômico para o político e o imperialismo terminou caindo no beco sem
saída de sua inutilidade estrutural. Em relaçã o a essa observação pode-se dizer que Vânia Bambirra te m razão apenas em parte, pois omite algo importante. Está cert a ao falar em inutilidade estrutural se forem levadas em conta as necessidades populares e o que é suficiente para atendê-las. Entre-
tanto, omite o fato de que a ânsia de lucro leva as multina-
cionais a renovarem continuamente os apelos ao consumo e a capacidade tecnológica de atendê -los. Em outras pala-
vras, à medida que uma multinaciona l se ramifica na vida social e econômica de um pais, pass a a criar artificialmente novas necessidades em ritmo cada ve z mais intenso e, desse
modo, forja a idéia de que é indispen sável para que a popu-
para os anos 80, o modelo
industrial
implantado
pelo capi-
s da am er rr co de s vo ti mo Os e. is cr em tal monopolista entrou en de an gr o : lo de mo o ri óp pr características intrínsecas ao
inde s ra ob de ão uç ec ex la pe o ad oc ov dividamento externo pr à as ad in st de as ic ég at tr es s õe aç rt po fra-estrutura e pelas im
implementar
o próprio
entre a modernização
processo
produtivo,
o
contraste
de certas regiões e atividades e o atra-
omã a de or ad up po ia og ol cn te a um de o us ; o as tr co de ou
a ri ng sa ta en ol vi a ; os eg pr em de ta er of a ta mi que li r ra ne mu re a a ad in st de , os cr lu de a ss me re à do vi de e a saturação de um mercado restrito e inelástico destinava a produção de bens de consumo sofis-
de-obra, o de divisas, o capital; ao qual se ticados. Nos países classificados como de tipo B, de industrialização mais frágil e recente, o processo industrial já comecou sob o signo do capital monopolista. Em tal caso, as multinacionais não precisaram começar se instalando em função de algum projeto capitalista nacional em andamento. Por outro lado, o processo de cooptação do Estado foi mais simples: este apenas deu continuidade as tarefas repressivas que já exercia, não tendo condições de se articular com o sistema produtivo em si, montado pelas macro-empresas. Por outro lado, o fato de não haver industrialização pré-existente fez com que o capital monopolista não tivesse como comprar fábricas locais, obrigando-se a erguer as suas desde os alicerces. Não houve a fase em que as máquinas entraram como insumos importados para mais tarde entrarem como capital nem existiu uma burguesia nacional que devesse ser cooptada. Nos países com essas caracteristicas, o domínio imperialista foi mais absoluto, dependeu menos de barganhas, já que a sociedade local, em seu todo, era mais frágil e menos complexa. Finalmente, os movimentos populistas, nos países de tipo B, apresentaram uma fragilidade congênita, referida antes: a impossibilidade de apresentar um projeto capitalista nacional determinou que tais movimentos baseassem sua força mais na negação do imperialismo estrangeiro do que na afirmação de alguma
proposta concreta e consistente.
ET
AS
173
A
estrutura
enclave”,
“de
por
outro
lado,
limitou
muito a ação do Estado nos países de tipo B por não existir a possibilidade de manipular os recursos das exportações em função do desenvolvimento interno. Geralmente, os monopólios impuseram, nesses países, uma industrialização dispersiva e anárquica, voltada para o supérfluo ou para bens de consumo não-duráveis, de modo a liquidar com o artesanato local. Às vezes, instalaram algumas linhas de montagem no setor de bens duráveis, mas, via de regra, preferiram vendê-los como mercadoria acabada, a título de exportação, diretamente automóveis.
das
notadamente
matrizes,
eletrodomésticos
e
Nos países de tipo B, portanto, a fase de industrialização sob o signo do capital monopolista assumiu, a rigor, a forma de uma mera variante da fase enclavista.
As multinacionais A era das multinacionais corresponde ao período posterior à Il Guerra e representa o auge da fase imperialista do capitalismo. Segundo Luciano Martins, 200 das maiores multinacionais são norte-americanas e 30 são européias, tendo o Japão entrado recentemente no “clube”, aliás, com grande destaque. De acordo com o mesmo autor, 20% dos investimentos norte-americanos no exterior estão na América Latina. Por volta do fim do século, calcula-se, cerca de 50% da produção capitalista mundial será das multinacionais. Ao contrário do que pensam alguns, a multinacional não é uma “'distorsão” no sistema capitalista mas uma consequência lógica de suas duas principais e históricas carac-
terísticas: acumulação e apropriação (e, portanto, expansão). Para implementá-las, a livre-concorrência foi importan-
te em certo estágio, mas, atualmente, não passa de um conceito ultrapassado em função da própria necessidade de expansão do capitalismo. Dado o desenvolvimento impressio-
nante das forças produtivas e da concentração do capital, para atender às exigências expansionistas do sistema, o monopolismo se tornou uma condição lógica e obrigatória. Re-
sumindo,
ao romper com o dogma de livre-concorrência, a 4 i =
i
é, il
É
i
f
ca i t s í r e t c a r a c a m u h n e n ndo a t n e l o i v tá es o nã l a n o multinaci -se ao o d n a t s u j a e t n e m o s o ã t mas o m s i l a t i p a c do l ia nc esse eguiu s n o c , do to m u o m o c , a sistem O e u q o s s e r g o r p de au gr
atingir.
a em nd te is na io ac in lt mu às , za re Pela Ss ua própria natu ,
ção consa n o d a a t s s s E a O p a r e ult u o q g l o a m o o d c a c r e m o r e v snaan tr ia ég at tr es a um r po do vi tituindo um subsistema mo ão de nç fu em o nd ua at e s ai ob gl s cional, formulando política aic if rs ve di e t n e m a m e r t x e o sã os ci macro-decisões. Seus negó de de re xa le mp co a um e d n e e r p m o dos e sua administração c lare ta re di a or tr ou a am iz at di me e estratos intermediários qu clasde ta lu da o çã ep rc pe a am lt cu fi di e ho al ção capital/trab . as st ni io ac € es nt re ge , os ic cn té ses, dada à multiplicidade de . O pans de or m e r p m u c s do to a, es pr em a é m ué De fato, ning mpreco in l, oa ss pe , im ta ra st , ab te an st di de da ti trão é uma en logia eo id m a a l u p i n a is m na io ac in lt mu As l. ve sí ensível e invi vergendi es ss re te in am ic if un e ia ác ic ef e da e ad id da racional ro ap e o cr lu de es çõ no . As al ci fi ti ar a e ad rj fo ca gi tes numa ló se ce re pa do tu e qu em to ex nt co m nu as íd lu di m priação fica o. çã ra ne mu re a st io ju e ár ss ce ho ne al ab tr r em resumi arm pe a os it je su s e in rt o Ma an ci Lu de s do o da nd Segu dos controlam a r e m o l g n o c 7 18 l de ta o, to çã um za li ua e at nt ne nais toio ac in lt mu As a. or o af d n u m as lo ri pe iá id bs su 00 10.0 rior, os te an ex ic no er am es rt to no en im st ve in s do % m 80 za tali
ri me -a no ti al la ri st du ão in uç od pr da 3 is 1/ r ve po são responsá m das cana e 14% do PNB global. Em 1966, controlava 35%
s as e ro me do nú is an ta er id . ns te Co en in nt s co õe do aç export as desfrutam an ic er am eis rt na no io ac in lt mu as s e en qu ag vant a nos países onde se instalam, é fácil entender porque tem um al on ci as na es pr em s da or ao ri pe o su it o mu cr margem de lu
mente orientadas. O custo da mão-de-obra, por exemplo, é
a es pr em a um ra l pa e na qu io do ac in lt mu a um ra r pa 2/3 meno norte-americana que atua nos próprios Estados Unidos. Logo após a Il Guerra, as multinacionais originárias o dos Estados Unidos contaram com o apoio de seu govern para defender seus Interesses na América Latina. Com o tempo, porém, a coincidência entre os interesses privados e a ideologia da segurança nacional norte-americana não pôde
,
EA ts
3)
175
mad y
J
i
7
Ê
»
á
j
mais ser resolvida com
aplicações simplistas do D/g stick, in-
clusive por causa do lento e seguro desenvolvimento de uma consciência antiimperialista. Nesse momento, as multinacionais se sentiram obrigadas a partir para uma ação política própria e autônoma.
A nova
estratégia
implicou
diversas atitudes: cooptação de elites econômicas, políticas, civis e militares internas, solicitação de foros de “nacionalidade” nos países onde se instalavam e operações de desestabilização contra governos incômodos por suas “excessivas” aberturas ao interesse popular e nacionalista (exemplo típico é o que a International Telephone and Telegraph (ITT) fez no Chile contra o governo Allende, em 1973). Incluindo propaganda ideológica e infiltração paciente e pacífica nas mais diversas instâncias da sociedade, as operações desestabilizadoras sempre exigiram muita cautela para serem ativadas no momento certo, sem qualquer precipitação danosa ao êxito pretendido. No começo do período pós-guerra, a ajuda externa norte-americana teve grande participação do governo, através da Agency for International Development (AID), e norteouse em função da política da guerra fria (ênfase ao auxílio militar, por exemplo). Todavia, esta ajuda, bastante onerosa, com o tempo caiu em desuso, até porque não evitou revoluções nas áreas “ajudadas”. Foi então que o auxílio externo passou a ser privatizado, embora o governo não se omitisse completamente. Em 1969, um órgão conhecido pela sigla
OPIC* principiou a se ocupar em orientar, defender e garan-
tir os investimentos americanos privados no exterior. Ao mesmo tempo, organismos financeiros internacionais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), começaram a negociar diretamente com os governos latinoamericanos, em função dos interesses das macro-empresas e sem a intermediação dos governos dos países credores. Nos inícios da década de 60, surgiu uma associação conhecida como ADELA,* “englobando 235 empresas norte-americanas, japonesas e européias, com a finalidade de viabilizar "OPIC: Overseas Private Investiment Corporation. “*ADELA: Atlanty Community Development Group for Latin Ame-
rica, (N.E.)
176
|
IN
V D
A Rito:
capital
do
investimentos
e joint
multinacional
ventures
eraop de ão aç iz al re ra pa s no er ov /g is na io ac in lt (acordo mu cões conjuntas). rte da pa m ze fa l ia nd Mu o nc Ba e A EL AD I, FM , IC OP |
por cima r ua at de is na io ac in lt mu as es pr em s da estratégia realidades as as en ap a nt co em o nd va le , es çõ na sdo dos Esta
do mercado
e utilizando a sua forca econômica e seu poder
tico ao lí po ço pa es o r ta us aj ra pa ha an rg ba e o çã ta de coop ovem a om pr a, ir ne ma a st De . es ss re te in us se s do to ambi modernização nas sociedades onde se instalam mas, como escentes, seus objetivos consistem em assegurar OS lucros cr a ci ên nd pe de a ar rç fo re e er nt ma ra pa do in bu ri acabam cont com seu passivo de distorsões sociais. Subdesenvolvimento e dependência: duas teorias do capitalismo latino-americano Ao longo dos eufóricos anos 50, desenvolveu-se nos Estados Unidos uma teoria que teve grande aceitação na América Latina. Segundo tal teoria, o capitalismo evolui através de etapas, alcançando, ao final, a superação dos problemas sociais surgidos na fases iniciais. Esta concepção, apresentada de forma quase esquemática por Walt Rostow em As etapas do desenvolvimento econômico, analisava O subdesenvolvimento latino-americano simplesmente como uma etapa mais ou menos inicial do processo, que deveria e poderia ser superada para se chegar ao pleno desenvolvimento. Em outras palavras, o problema latino-americano
não era o sistema
capitalista em
o estágio em que
si mas
aqui ele se encontrava. Na ótica de Rostow, os países industrializados tornavam-se um referencial do progresso a ser atingido. Em conexão com tais idéias, passou a ser defendi-
da a mobilização das forças políticas e sociais para a grande tarefa
nacional
do
desenvolvimento,
adoção de certos procedimentos e empresariado
se unirem
qual
resultaria da
de um
esforço cujo
o
eficazes,
na liderança
devendo Estado
êxito seria o inevitável resultado. A CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina) foi a grande defensora de uma política que preconine
VA?
zava chegar ao desenvolvimento em linha reta, tomando-se o desenvolvimento como um ponto fixo e imutável e o seu caminho como uma sucessão de etapas estanques e cumulativas. A teoria desenvolvimentista cepalina acreditava nos seguintes pressupostos: progresso voltado “para dentro” (industrialização substitutiva), integração das massas popu-
lares no sistema de consumo, declínio necessário das velhas oligarquias, intervenção do Estado no processo produtivo em combinação com a iniciativa privada e formação de uma consciência latino-americana crítica e democrática.
O conceito de subdesenvolvimento como etapa a ser
superada
a partir de critérios de esforço e competência
foi
devidamente criticado por Teotônio dos Santos. Segundo ele, trata-se de uma concepção anti-histórica, apegada a modelos ideais e a experiências irrepetíveis, que são as dos países considerados desenvolvidos. E, o que é o mais importante, sem levar em conta que a permanência da miséria e de estruturas arcaicas não é um dado estanque ou mero obstáculo ao desenvolvimento mas algo intrínseco às sociedades capitalistas dependentes. Finalmente, os teóricos do desenvolvimento cometem o erro metodológico de reduzi-lo a uma questão de planejamento eficaz dos tecnocratas, ignorando a sua relação com um contexto de interesses de
classe. Enfim, descartam do problema do desenvolvimento a
sua implicação política. As teorias desenvolvimentistas dos anos 50 tendiam a separar subdesenvolvimento e desenvolvimento como se um nada tivesse a ver com o outro, exceto pela relação ponto de partida — ponto de chegada. Além disso, afirmavam que vencer o subdesenvolvimento era basicamente abolir estruturas arcaicas e implantar estruturas modernas — enfim, vencer dificuldades internas. Justamente aqui se localizava a
maior fraqueza teórica desse enfoque: não havia a formulação de uma visão totalizante do capitalismo e não percebia a articulação entre os países ditos subdesenvolvidos (capita-
lismo periférico) e os países ditos desenvolvidos (capitalis-
mo
178
central).
O
problema
da América
Latina,
em
outras
não
palavras, no modo como
no fato dela ser ''menos”” capitalista, mas participa no contexto global do capitalismo.
está
O ponto fundamental é que os países capitalistas de-
volvien es bd su as st li ta pi ca es ís pa s do am is ec pr s senvolvido da e nt fo a é um o; ad eg pr em do ão tr pa mo co m si dos as
acumulação vimento
para o outro. Desenvolvimento e subdesenvol-
não são dois estágios isolados, mas dois componen-
tes dialeticamente
se supõem
integrados de uma
mutuamente.
Como
só realidade:
ambos
réplica às teorias desenvol-
vimentistas que tendiam a negar a importância do elemento externo no problema latino-americano, surgiu e amadureceu, ao longo dos anos 70, a chamada teoria da dependência, num esforço para superar a unilateralidade da aborda-
gem
anterior. Conforme
veremos,
deu uma contribuição fundamental
a teoria da dependência para uma
compreensão
dinâmica das dificuldades deste continente, incorporando o conceito de imperialismo, mas sem atribuir-lhe um papel equivocadamente exclusivo, o que prejudicaria a análise cor-
reta.
Brasil e Argentina foram os países onde 60 melhor evidenciou a falência daquele
a crise dos modelo de
anos desenvolvimento industrial preconizado pela doutrina cepalina, à base da combinação de uma industrialização substitutiva com o regime democrático. No Brasil, o processo
democrático foi bruscamente interrompido com o golpe militar de 1964, reforçado com o Al-5, nos fins de 1968.
Na Argentina, dois golpes militares, um em 1963 e outro em 1966, derrubaram, sucessivamente, Arturo Frondizi e Arturo lllia, numa coincidência cronológica com o Brasil que não foi acidental. Com respeito ao projeto industria-
lizante, seu fracasso mostrou a fragilidade estrutural que lhe
inerente e, nesse particular, o caso brasileiro foi exemplar. O empresário nacional dependia dos recursos da agro-
era
exportação para o financiamento das importações de insumos industriais, pois, em virtude da deteriorização dos termos de intercâmbio, tal importação se tornara onerosa e difícil. Nesse momento, evidenciou-se a dificuldade de um
sistema
capitalista
industrial
ANA
dependente
gerar,
por
si
179
mesmo, Os recursos de que precisa: a dependência ao setor agrário obrigou a burguesia urbana a se aliarà classe dominante rural, levando-a, por conseguinte, a se posicionar contra a reforma agrária, mesmo que a reforma agrária fosse um imperativo para ampliar o mercado nacional de bens de consumo. As insolúveis contradições acabaram desembocando em alternativas opostas às necessidades populares. O capital multinacional entrou com sua tecnologia sofisticada para produzir bens de interesse de um mercado restrito, que passou a concentrar a renda, via mecanismos de confisco salarial. Comprovou-se então a exatidão das análises de Rosa Luxemburgo, que dizia que os monopólios estrangeiros só atendem às necessidades do mercado na medida da sua própria necessidade de reprodução e acumulação. O “milagre brasileiro”” foi o grande desmentido das elocubrações cepalinas. Houve crescimento industrial e planificação e o país começou a exportar manufaturados e modernizou suas estruturas. Entretanto, as mazelas sociais não desapareceram. Aliás, pelo contrário, aumentaram, resultando a modernização numa falsa prosperidade. Foi nesse contexto que surgiu a teoria da dependência, a qual teve em Fernando Henrique Cardoso um de seus mais importantes formuladores. A idéia básica é a de que o capitalismo é um sistema totalizante e, portanto, centro e periferia são partes de um único contexto. Por outro lado, a dependência não implica uma mera situação condicionante e unilateral e um relacionamento baseado na rígida antino-
mia ativo (centro) /passivo (periferia) mas se apresenta como
um processo dinâmico, onde a dominação externa se ajusta e se redefine em função das variáveis e possibilidades da sociedade dependente. Em conseguência, mais do que mera imposição de uma das partes, a dependência configura uma acomodação de princípios e uma homogeneização de interesses. Em resumo, aquilo que se poderia chamar de duas faces da mesma moeda.
O conceito de dependência, ao basear-se na articula-
ção de duas partes envolvidas, leva a concluir que o chamado
je
180
desenvolvido
capitalismo
só subsistirá
como
tal
enquanto
ai tr ex al qu do , te en nd pe de o sm li persistir O chamado capita
há o nã , to an rt Po o. ss re og pr u se ao ia ár a mais-valia necess , rá ra pe su na ti La a ic ér Am a e qu r ze di em o menor sentido
o sugi tá es um r gi in at se se s ai ci so s la ze ma as no futuro, su a em st si tal em ão rç se in a su e qu já o, sm capitali nVe . le de ro nt de , ar eg ch de po e qu a s te os limi
perior do determina
dendo-se a idéia de que a América
caminho
caso
Latina encontrará
o grau de progresso
consiga
o seu
que à Europa
e
está fase o nd fu no e qu , o am ar nç ca al os id Un s do ta Es os eito zendo é eximir de culpa o capitalismo central com resp as ur ut tr es as e br a so ond , ga no jo ca ri me -a no ti ao atraso la larcaicas internas, mantidas no interesse desse mesmo cap talismo. Não por nada esta é a visão de Rostow e de seus seguidores. A teoria da dependência mostra que não é com "mais capitalismo” que a América Latina resolverá seus problemas. Se as idéias desenvolvimentistas dos anos 50 foram úteis para levantar problemas latino-americanos e superar a apatia e o fatalismo, a teoria da dependência dos anos 70 foi fundamental para que se compreendesse que o problema do desenvolvimento não é técnico e nem quantitativo, mas primordialmente político. Em resumo, o desenvolvilatino-americano não será possível, de acordo com essa Ótica, se não for superado o projeto capitalista vigente, que é onde radicam os impasses e as contradições. mento
América Latina e Guerra Fria O afastamento da Europa e do Japão dos centros de decisão, a absoluta liderança norte-americana no Ocidente e o choque entre o avanço do socialismo e dos movimentos de libertação nacional e a resistência de um imperialismo que saiu da guerra com força redobrada foram algumas
das
novidades
importantes
mais
do
mundo
pós-45.
O aparecimento da guerra fria nas relações entre Estados Unidos e América Latina mudou o caráter da política inter-
vencionista continente,
tradicionalmente exercida por aquele país no deixando de ser uma questão doméstica e
PENUA
Ea
RSTot
181 ' h
passando a ser encarada no contexto dos compromissos globais de defesa do “'mundo livre”. O anticomunismo tornouse um instrumento ideológico do apoio de Washington à
penetração do capital monopolista. Qualquer tentativa latino-americana de limitar a possibilidade de explorar seus mercados e recursos naturais passou a ser vista como parte
de uma conspiração comunista internacional.
As oligarquias tradicionais e os militares foram os primeiros aliados dos Estados Unidos em sua política hegemonica.
Formados
em
centros
de treinamento
criados
pelos
Estados Unidos a partir de 1946, como a Escola das Américas, no Panamá, os militares, na qualidade de corporação monopolizadora da forca, tiveram muita importância como instrumento repressivo, a serviço da ideologia anticomunista. Não só por efeito da mera doutrinação externa mas também por um outro motivo, nem sempre suficientemente levado em conta: a história mostrava que a primeira coisa que as revoluções socialistas faziam era destruir o exército tradi-
cional em favor da formação de milícias populares e revolu-
cionárias. Ao longo do período pós-45, multiplicaram-se as intervenções militares nos países latino-americanos para liquidar com governos que, de um modo ou de outro, estivessem ampliando os espaços para a organização popular. Conforme a Ótica que prevalecia, as forças armadas norte-americanas se encarregariam da defesa externa da América Latina, cabendo aos exércitos continentais a manutenção da ordem interna. O fato de os interesses norte-americanos terem atuado via golpes de Estado mostra que Washington, escamoteando suas intervenções, sabia que os tempos do exercício direto
e impune da função policial, através dos marines, já passara.
Em 1965, por exemplo, quando os fuzileiros navais invadiram a República Dominicana para derrubar um regime popular e impedir o êxito: do coronel Caamafio, os Estados Unidos fizeram questão da participação de tropas de outros
países, a fim de disfarçar a invasão atrás do nome da OEA — disfarce ao qual até forças brasileiras se prestaram. E em outubro de 1983, quando Washington decidiu ocupar a 4
td
AN
mM de
182
as su m co o nt ju , ou nt me gi arre minúscula ilha de Granada, a, ci Lú a nt Sa , ca ni mi Do tigua, divisões, contingentes de An
a o d n u m ao ar nt se re ap a odo m de a, ic ma Ja e e nt ce Vi o sã izaan rg (O O C E O a ur sc ob a m u invasão como operação de
. l) ta en id Oc be ri Ca do s do ta Es ção dos
aldo do sp re te en ar ap m o c mo is on ci en rv Além do inte en am rg la m ra ca li ap os id Un s direito internacional, os Estado
oio mateap o d n e d e c n o , c ia nc gê ur ns -i ra te a política da cont s co ni gô ta an s me gi re de es or rial e diplomático aos oposit a l a m e t a u G a , 54 19 Em . mo is aos interesses do imperial
, de da di un of pr a rt ce de ta is rm vivia uma experiência refo , nz be Ar bo co Ja de o ic át cr mo de sob o governo popular e ara ri op pr sa de e 2) 95 (1 a ri rá ag a que decretara a reform , to an et tr En . 3) 95 (1 t ui Fr ed it 161.000 hectares da Un nte e m l a i c n e t o p co fo um , to ci ér ex Arbenz evitou tocar no
, ao o d a m r a s e u d uo in nt o co os nç ra pe reacionário, e o povo es a, oc ép a m s e m na a, vi lí Bo na a ci te on contrário do que ac ópr as ci lí m mi ía tu ti ns co os ir ne mi s e e onde os campones nco m a i d o p o os nã an ic er am ert no Os , do prias. Por outro la o porud et br so t, ui Fr ed it Un ão da aç ri op pr cordar com a ex ) es ll Du er st Fo t, bo Ca rs oo o (M rn ve go que até a cúpula do , com ia nc uê eq ns co . a Em i h n a p m o c es na ss re tinha altos inte illo st l Ca ne ro co s do io ár en rc me os A, CI patrocínio da ndo o rea b u r r e a d l e a m e t a u o G a nd di va am in ar ab Armas ac e para dess za li bi mo to se ci ér ex O e qu m , se nz be gime de Ar fendê-lo.
o de sã va r in za ni ga r or e ta en st su de ca ti tá a m s e m A , a CIA aplicou, em os ri ná io uc ol ev -r ra nt co do an us , ís um pa s o n a b u os c ad il e u ex q de r a b m e s e d o do d n a u abril de 1961, q na Baía
dos Porcos.
como
Entretanto,
O povo cubano esta-
nce re . is ta Ma le mp s co i re fo so va in s a do ot rr , de a do va arma gua — rá ca Ni a ra nt o co ad o us nd se tá o es rs cu re l e, ta tement e novamente o país.
sem
dos problemas que cria para
êxito, apesar
Antes de John
Kennedy assumir o poder, o governo
me-a no ti s la ai s e ci õ so ç o m o o va c an as ra ic ca er en am ert no rações pi ns s co le mp si : am me er or if a un ir ne ma s de na ca ri
Moscou.
ascensão
A
td,
A
o]
ÉS
1
f
de
Kennedy
trouxe
183
RE NV
f
em
o
organizadas
ot
a
oi
uma alteração nesse quadro. Em primeiro lugar, a emancipação das colônias africanas legitimara os movimentos de |i-
bertação nacional, o que fortaleceu os setores progressistas latino-americanos. Em segundo, a Conferência de Banduny
(Indonésia, 1955) definira o nascimento do conceito de Ter-
ceiro Mundo, resultado do esforço para criar uma postura de luta solidária dos países periféricos, miseráveis e oprimidos. Frente a isso, os Estados Unidos se deram conta da necessidade de recuar, diplomaticamente, abandonando a rigidez anterior. Disto decorreu uma nova atitude, destinada a com: binar aparências de boa vontade e maior eficiência contrarevolucionária. | No começo dos anos 60, Kennedy criou a Alianca para o Progresso, através da qual os Estados Unidos se comprometiam a dar substancial ajuda financeira à América Latina para que lhe fosse possível sair de sua secular miséria, o que eliminaria um dos principais estímulos para os movimentos esquerdistas. O plano previa investimentos de
US$
2.000.000.000 anuais, sendo que 90% em obras públi-
cas capazes de gerar empregos. O programa não obteve êxito, e nem poderia ser diferente. Porque o problema da América Latina não era de investimentos mas de estrutura. Esta, através da injecção de capitais, poderia ser modernizada, é claro, mais isto não resol-
veria a grave questão social. Além disso, poderiam os Estados Unidos aceitar a substituição de estruturas que eram uma barreira contra o avanço do socialismo? Mais ainda, se os recursos a serem investidos sairiam dos lucros das multinacionais, Washington precisava que os investimentos norteamericanos na América Latina fossem protegidos e estimuJados, o que significaria manter uma das causas fundamentais do problema social deste continente... Um círculo vicioso sem saída, como se vê. Ao longo dos anos 60, a multiplicação dos movimentos guerrilheiros, inspirados e orientados por Havana, determinou a dupla fisionomia da política norte-americana. a ajuda financeira destinava-se a aperfeiçoar as estruturas capitalistas e, ao mesmo tempo, a sofisticar o arsenal repressivo.
184
aep pr e o çã na ri ut do l na io ic ad tr da ém al Naquele período,
ração dos militares e da cooptação
economica
e ideológica,
co : do to mé o tr ou a ic át pr em m ra se pu os id os Estados Un rea co fo /n ar nt ie or ra pa ” as st li ia ec sn "e ar mecaram a envi
selheron “c vo si en of in o e qu , is po de , se upressão. Constato s ururo ma pa Tu s lo pe o rt mo , ne io tr Mi n Da ro técnico” es, com or ad ur rt to de r to ru st in um e, ad rd ve na , guaios, era Estae lm fi No . il as Br lo pe e l ra nt Ce a ic ér Am passagens pela episoe ss de e is ál an da vi de a fez as vr Ga ast Co do de Sítio, e a br so te en am ic it cr ir lu nc co a or ad ct pe es o o dio, levand tudo, de bo ca ao e, qu z ve a um s, ro ei lh ri er gu s do atitude uiram eg ns co e qu já , til inú foi ta lu a su e qu o ar cl e -s tornou alismo — ri pe im do s te en ag os — s to ei ef os er at mb co as apen e não as causas ou o sistema como um todo. Uma tática muito usada pelos Estados Unidos para viabilizar golpes militares na América Latina tem sido a da desestabilização, termo que se tornou corrente entre Os racomentaristas políticos para designar infiltrações subter neas nas sociedades nacionais, junto a variados segmentos, quer pela via ideológica, quer pelo puro e simples suborno, buscando mobilizar ações concretas de oposição ao regime e justificando, desse a insegurança semeando vigente,
modo, o golpe militar para conter o descalabro e fazer voltar a ordem. Assim agiram os norte-americanos no Brasil, em 1964, e no Chile, em 1973, derrubando governos que haviam permitido a ampliação dos espaços populares. Em
1964, o governo João Goulart foi desestabilizado por uma
série de manifestações públicas manipuladas, destinadas a convencer a insegura classe média de que se tratava de um regime já sem controle da situação e totalmente desacreditado. Uma destas manifestações foi a “Marcha da Familia com Deus pela Liberdade”. Outro episódio importante foi o movimento dos marinheiros, sob a liderança de um agitador conhecido como Cabo Anselmo, um agente infiltrado, como se soube mais tarde. E tão claro se tornou o
apoio de Washington ao golpe que derrubou Goulart que até uma força naval foi mandada para apoiar o movimento, em caso de resistência do presidente deposto (Operação
Brother Sam). Quanto ao Chile, em 1973, a ITT chegou a financiar a greve dos camioneiros para gerar um clima de
insegurança
indispensável à queda da coalizão esquerdista
(Unidade Popular) que o presidente Salvador Allende lidera-
va. É interessante assinalar que, tanto na manifestação dos
marinheiros do Brasil como na greve dos camioneiros do Chile, a direita usou táticas e formas de reivindicação típicas da esquerda para atingir seus fins.
Os governos Lyndon Johnson e Richard Nixon mantiveram a mesma política em relação à América Latina: tornar o continente “economicamente viável” e apoiar regimes que garantissem os interesses vitais dos Estados Unidos na região. Durante o goveno de Carter as coisas se complica-
ram um pouco, pois o presidente optou por uma difícil acomodação entre o interesse imperialista e uma política de defesa dos direitos humanos, fortemente matizada de moralismo paroquial. Aos olhos da classe média norte-americana,
isso debilitou a imagem
de força do país no resto do mun-
do. E, na prática, não adiantou muito. Em 1979, quando o governo Carter se encaminhava para seu final, grande parte
dos países latino-americanos viviam sob regimes brutais e sanguinários. Com a ascensão de Ronald Reagan à presidência, houve o retorno de um anticomunismo histérico. Como não era possível negar as misérias insuportáveis da América La-
tina, Reagan começou a usar o argumento de que os comunistas se aproveitavam da vulnerabilidade social do conti-
nente para derrubar a ordem instituída. Em vista disso, incorporou-se aos manuais do Pentágono uma nova expressão para definir algo mais velho que o século: force projection, ou projeção de força. Segundo a doutrina embutida nesta expressão, os Estados Unidos devem ter forças militares
especializadas e sempre prontas para, a qualquer momento,
intervir rapidamente em qualquer país do Terceiro Mundo. O secretário de Defesa, Caspar Weinberger, solicitou, para 1985, um aumento orçamentário destinado a equipar tais forças. A verba anterior, que era de US$ 5,6. bilhões em
1984,
186
passou
para
AT!
US$
7,5 bilhões. Em
outras palavras,
€ inimigos
amigos
precisam
reconhecer
a liderança
norte-
a. -l mê te ra pa ou a el m o c americana — para contar nda gu se da io íc in O u o c r a m an ag de Re
política e) st Oe e/ st Le ão ns te is (d e nt te guerra fria, que sepultou a dé amenA
d a c r a m r te rá ca o o d n a r e d i s n o C n. dos tempos de Nixo cil fí di é , an ag Re de s o t n e m a t r s compo
ideológico do s to fa os , to an qu en r Po . to is do prever as consequências de tu de es ad id il ib ss po às or ri pe su é têm mostrado que à retórica s: va si es pr ex o c u o p as nh ça fa a do agressão. Esta tem se limita s a r u d n o H em s re ta li mi s a r b o n a m invasão a Granada (1983), a lh ri er qu à l ia ic of o oi ap , 4) 98 (1 a gu para intimidar a Nicará
te
ia cr e 5) 98 (1 l” ve já se de a e ri sá es ec anti-sandinista como “n r proze fa ra pa í) rt Ma io ád (R o di rá de o çã ta es ção de uma es a nd ai ez lv Ta . 5) 98 (1 ba Cu a em st paganda anticomuni
nam, mas à et Vi do ra er Gu da ma au tr o o it o mu nd teja pesa t el ev os e Ro r o d o e h T s, rá at os an a nt te verdade é que, há oi
não teria deixado
sobreviver
nem
um
ano esta Nicarágua
u ui eg ns co o nã a nd ai an ag te Re en id es pr que em seis anos o zer volfa os de rç s fo co es ti té pa us o se nd em sa as ac . Fr ar br do , es çõ ma la oc s pr a e ç a e m a s de vé ra ia at ór st tar a roda da hi e. ele corre o risco de transformar o seu discurso num blef
Fracassos da integração latino-americana José Martí foi, depois de Bolívar, o primeiro que sonhou com a unidade latino-americana, chegando a esboçar O projeto de uma frente contra a expansão do imperialismo dos Estados Unidos, cuja força anteviu. A efetiva e cada vez mais profunda penetração norteamericana na área não tem qualquer interesse em que o contal tinente busque sua união e sua integração. Pelo contrário, como à Inglaterra do séc. XIX, aos Estados Unidos de hoje é fundamental a balcanização da América Latina, o que pode ser percebido nos esforços do governo Reagan no sentido de negociar a dívida externa dos países latino-americanos de forma isolada e não em bloco. Um esforço para integrar economicamente os países da região foi a criação, em 1960, na Conferência de Monte-
vidéu,
da Associação
Latino-Americana de Livre Comércio
187
(ALALC), transformada, a partir de 1980, na ALADI, Asso. ciação Latino-Americana de Desenvolvimento e Integração. Nenhuma dessas siglas atingiu os resultados previstos, por dois motivos. Primeiro, por serem as economias latino-americanas mais concorrentes entre si do que complementares e, segundo, pelo simples fato de que os países da América Latina, para superar tal situação, necessitam não de acordos econômicos e comerciais mas de verdadeiras transformações estruturais. Com vistas a criar uma frente política de apoioà estratégia norte-americana na guerra fria, os Estados Unidos patrocinaram a criação de OEA, na Conferência de Bogotá (1948). Atuando como suporte diplomático do anticomunismo, a OEA concordou com a expulsão de Cuba (Conferência de Punta del Este, 1962) e na Conferência do Rio de Janeiro, em 1965, Lyndon Johnson tentou concatenar uma integração militar continental contra a chamada ''subversão comunista”.
A medida que a crise econômico-social da América
Latina se aprofundava e os regimes militares se enlameavam na violência, na incompetência e na corrupção, a hegemonia dos Estados Unidos começou a ser atingida. Em 1978, O governo panamenho de Omar Torrijos convenceu Washington a firmar um acordo fixando prazos para a devolução da Zona do Canal. Em 1979, a revolução sandinista veio a ser mais um golpe no predomínio dos Estados Unidos. E, em abril/maio de 1982, quando o governo militar do gen. Leopoldo Galtieri lançou a Argentina na aventura bélicoemocional da conquista das ilhas Malvinas, Reagan perdeu credibilidade política no continente por ter se obrigado a auxiliar materialmente a primeira-ministra Margaret Thatcher, uma vez que a Inglaterra era o mais fiel aliado do anti-sovietismo norte-americano na Europa. Sustentando uma potência européia contra uma nação latino-americana, Reagan praticamente rasgou a Doutrina Monroe e colocouse numa posição desconfortável na OEA, Por outro lado, à medida que penetrava na América La-
tina uma consciência terceiro-mundista, começou a se desen-
volver também uma consciência de sua especificidade histórica em face dos Estados Unidos, deixando de se ver simplesmente como parte integrante do '“'mundo livre”, conceito que a atrelava perifericamente a interesses hegemônicos.
188 AR:
! +
XX. América
Latina: anos recentes
Bolívia Os difíceis anos 70 foram de predomínio absoluto de governos autoritários e militares na América Latina. Em 1971, o gen. Hugo Banzer derrubou, na Bolívia, O governo progressista do gen. Juan José Torres e iniciou uma violenta repressão contra os mineiros, classe sindicalizada e muito organizada. Entretanto, a promessa de trazer a ordem e a estabilidade ao país não se concretizou. Pelo contrário, a Bolívia afundou cada vez mais na sua crise estrutural e a extrema corrupção do governo do gen. Garcia Meza, comprometido com o tráfico internacional de drogas, acabou
desgastando
ao
extremo a solução militar em
uma
nação
onde as quarteladas sempre fizeram contraponto com a resistência popular. No começo dos anos 80, o retumbante
fracasso dos generais abriu espaço ao retorno de uma proposta de caráter social-democrático, com o presidente civil Hernán Siles Suazo.
Uruguai
No final dos anos 60, a repressão à guerrilha urbana dos Tupamaros conduziu a uma excessiva concentração de
poderes nas mãos do Executivo em nome da segurança na-
cional, fato cuja consequência foi a evolução inevitável rumo à ditadura. O Legislativo foi fechado e seguiu-se um bru-
tal regime
policial
(1973)
que
incluiu
prisões arbitrárias,
simulacros de julgamento, sequestro, torturas e assassinatos no rol das funções cotidianas — atitudes que, todavia, não resolveram em nada o principal problema do país: a crise econômica, decorrente da baixa do valor das exportações, que, até então, tinham sustentado o vasto setor ter-
ciário urbano. Não conseguindo diversificar a economia nacional, o Estado militar ficou sem alternativas para oferecer uma saída em face da situação. A partir da década de 1980, o amplo protesto popular, iniciado no plebiscito em que a maioria negou aprovação a um projeto de Constituição dos generais, impediu que os militares conseguissem institucionalizar sua permanência no poder e os forçou a negociar com os tradicionais partidos Blanco e Colorado. Via eleições diretas, subiu ao governo um presidente civil, conservador e comprometido com a normalização democrática do Uruguai, Júlio Maria Sanguinetti. A ameaça golpista do exército está enfraque-
cida mas ainda não parece definitivamente afastada. Chile
Ao contrário de outros países do chamado Cone Sul, em inícios de 1986 o Chile ainda não se livrara do seu regime militar autoritário. Eleito em 1970, o presidente Salvador
Allende pretendeu implementar reformas sociais e nacionalistas com um Legislativo conservador e um exército reacionário,
imaginando
poder marchar rumo
à implantação do so-
cialismo mantendo os mecanismos legais existentes. O resul-
tado foi a desestabilização de seu governo e a cooptação da classe média para apoiar a solução de força, com respaldo de Washington. A morte de Allende no sangrento golpe de setembro de 1973 foi a clara demonstração de que as classes
190
s do r le va se em m ta si he o nã as dominantes internas € extern opr da o it re di o ad gr sa o do an qu mais truculentos recursos npe o ic íl id é , as vr la pa as tr ou Em . priedade parece em jogo
do o nh mi ca lo s pe ia ár on ci lu vo re es çõ sar que se chega a solu
refor mismo. A ascensão | período
um u ro gu au in et ch no Pi o st gu Au n. do ge oit os op s do a ss ma em os nt me la zi de massacres e fu
res, porém,
a partir do
início
tência à repressão começou país
entrou
num
processo
década
de 80, a resis-
desenlace
é imprevisível,
da
à Se reorganizar lentamente e o cujo
julgando alguns que possa marchar
para uma guerra
civil.
€s ar up oc a ou lt vo o ir ge an tr es l ta pi Economicamente, o ca se , do la o tr ou r Po o. ad ch fe a vi ha e lh paços que Allende aic Ch de la co Es da mo is al er ib ol ne do s quindo os ditame
, so is m co s e, õe aç rt po im às as ir te on fr as s go, foram aberta rial st du in ue rq pa o ir nd pa ex e de ad id il ib ss liquidou-se a po nacional. se m tê e il Ch do s ai ci so e as ic ôm on ec es tõ As ques iér Am s da xa le mp co e is ce fí di is ma s , da to an rt revelado, po lende Al or de ss ce te an , ei Fr o rd ua Ed o rn ve Go O . na ca Lati vore sa de es om pr a su m , co ca ri tó re da ém al o id a nh ti não
5 1/ de is ma ar nt o se as nd ui eg ns co o e, nã ad rd be li em o luçã era terras das 100.000 famílias camponesas às quais promet
iá nd fu ti la s es ao çõ za ni de in as ud lp po m co m, e mesmo assi o çã ga li co a r, um la pu e Po ad id Un da o gn si o b so to rios. Elei nde, le s, Al ta is al ci so as e st ni o mu nd co na ti lu , ag da er qu de es onal) e ci do Na ti ar a (P it re di à te en ta fr lu so a ab ri io ma m se otes e já centro (Democracia Cristã), sucumbiu ante os boic
A mais importante delas, de res-
referidas desestabilizações.
to, partiu
dos
camioneiros,
cuja
greve
afetou
catastrofica-
poto ja cu ís pa um é e qu e, il Ch o do nt me ci te mente o abas grafia não favorece o transporte ferroviário. O único ano bom para Allende foi 1971 baixou a in
a mortaligo e re mp se de o am ír ca B, PI O ou nt me au , flação eguiu ns e co nd le Al do , an to qu an et tr En c. , et il nt fa in de da ão das aç ri op pr sa de r a va ro o ap en o il ss ch re ng Co r o ze fa
do como minas de cobre em mãos americanas, consideran e is cr a ís pa no do ti ob am nh ti as el e qu o cr o lu o çã za indeni
Es
s: “ad
ES
191
começou. um
Na
mina de El Teniente, a Kennecott conseguia
retorno médio de 52,87%
Anaconda
um
sobre o capital
lucro semelhante
investido
e a
com a mina de Chuquica-
mata, motivos suficientes para que não desistissem de tudo sem luta. A resposta não tardou. Os EUA cortaram toda a
ajuda ao Chile, exceto a ajuda militar. Mais ainda, forçaram a baixa do preço do cobre no mercado externo, lançando seus próprios estoques. E a CIA e ITT começaram a financiar campanhas contra Allende, cujo ponto de detonação “veio a ser o caso da greve dos camioneiros. Caindo Salvador Allende, o Chile voltou a ser o paraíso do capital estrangeiro, como já frisamos. As minas foram devolvidas aos “legítimos”” donos. O país voltou a contar com créditos no exterior e a livre importação assegurou uma ficção consumista para os setores mais privilegiados. A
“nível internacional, o Chile sofreu condenações veementes da
OIT,
ONU.
do
Movimento
dos
Países
Não-Alinhados
e da
Foi em 1982-83 que a euforia econômica do Chile ruiu evidenciando-se as suas características de país depen-
dente. Em 1982, o Chile devia 18 bilhões de dólares para 611
bancos, a mais alta dívida “per capita” do mundo. Culturas agrícolas foram abandonadas e a farinha passou a ser feita com trigo importado. De 1974 a 1982, fecharam 4.000
fábricas. A capacidade ociosa da indústria da construção civil chegou a 70%. O PIB caiu 14%, o desemprego chegou a 30%. A previdência social foi privatizada e os preços ao consumidor — algo terrível em termos chilenos — chegaram a subir 23%. Mencionamos
antes que, nos anos 80, Pinochet come-
çou a enfrentar uma oposição cada vez mais organizada, o que o fez ficar cada vez mais isolado internamente. Até o direitista Partido Nacional deixou de sustentá-lo. Externa-
mente, seu respaldo só pode partir de governos tipo Reagan e Thatcher. Todavia, a oposição interna a Pinochet não che-
gou, inicialmente, a um consenso, o que o ajudou, já que ele conservou o sustentáculo militar. O Movimento Democráti-
192
am
o
co Popular (radical) queria até a luta armada, com o que
2.
não concordou
a moderada
Aliança Democrática.
O plebis-
a e qu r ca di in ce re pa , 88 19 de l cito que o derrotou, no fina sta e, mi ti gi le a íd sa a um de o rn to em o iã un a alternativa será não já e qu ís pa um ra pa ca ti rá oc em -d al ci pelo menos, so m ua in nt co A EU Os . ra du ta di da as ci suporta as truculên s re ta li mi s do or ac êm nt ma até e mo is et ch no apoiando o Pi
es e çõ ta mi li as e qu er ev pr e it rm pe e qu com o Chile, o ra que pa te en am iv at ic if gn si o rã sa pe is na io entraves instituc vas ti si po e nt me al re as íd sa r ra nt co en a ss po a a nação chilen
e qu er ev pr el ív ss po É o. az pr o rt cu a a, ic ór st hi e is para sua cr
la pu po s ço pa es os o rã ia pl am as en il ch es nt na mi as classes do o do to Em s. io ég il iv pr us se r va er ns co ra pa o ud et res, sobr mais ce fa a da ci ên an rm pe de as di os os ad nt co m ce re pa caso, em ag cl ci re a su a e is pa e el qu na o sm li ta bestial do capi interna talvez indique tempo de transição.
Venezuela Em 1946, um golpe militar projetou politicamente duas figuras que seriam importantes no futuro imediato da Vezenuela: Rómulo Betancourt, o líder da Ação Democrática, e o major Marco Perez Jimenez. Em 1947, foi eleito presidente um romancista, Rómolo Gallegos, que adotou um programa de cunho reformista e populista que não tardou a desagradar os setores conservadores: reforma agrária, punição a militares corruptos e aumento dos pagamentos efetuados
pelas multinacionais
que
usufruíam do direito de
extrair petróleo no país. Uma junta militar derrubou Gallegos em 1948, tendo ficado no poder até 1952. Apesar da repressão, como as oposições ameaçavam vencer as eleições de novembro daquele ano, o candidato dos militares e conservadores, Perez Jimenez, foi proclamado vencedor, mesmo sem as urnas terem sido abertas. De 1952 a 1958, Jimenez exerceu uma ditadura ao melhor estilo de um de seus antecessores, Juan Vicente Gómez: favorecimento as oligarquias e às multinacionais do petróleo e feroz anticomunismo,
4
é: 'w
Y 4
q
Vo Ed
Y 3 h
193
nos moldes da guerra fria. Caracas tornou-se, então, um mi crocosmo das mazelas nacionais, pelo seu gritante contraste entre consumismo e modernização, de um lado, e bolsões
de miséria e marginalidade, de outro. Em janeiro de 1958, um levante popular de três semanas, com apoio da Marinha,
derrubou Perez Jimenez. A eleição de Rómolo Betancourt em dezembro do mesmo ano marcou o retorno à ordem democrática. O candidato derrotado naquelas eleições fora o almirante Wolfgang Larrazabal, apoiado pelos comunistas. Betancourt ficou no poder de 1959 a 1964 e, prejudicado pela psicose do golpe, adotou uma postura reformista demasiadamente moderada. A fim de não preocupar os latifundiários, limitou a reforma agrária à distribuição de terras devolutas (públicas). Por outro lado, evitou tocar na questão da nacionalização do petróleo, determinando apenas um aumento nas taxas que as empresas pagavam. Tendo desiludido os setores mais radicais, inclusive de seu partido, a Ação Democrática, Betancourt acabou sendo alvo de campanhas guerrilheiras, visando derrubá-lo. Cuba foi acusada de insuflar tais campanhas e Caracas rompeu com Havana. Entre 1974 e 1980, Carlos Andrés Perez realizou o mais progressista dos governos que a Venezuela teve nos últimos anos. Eleito com 49% dos votos, contou com uma conjuntura duplamente favorável: o aumento internacional dos preços do petróleo e o retraimento diplomático dos Estados Unidos, afetados pela derrota vietnamita e sob uma política externa marcada pela diplomacia dos direitos humanos do presidente Carter. Representando a ala progressista da Ação Democrática, Andrés Perez determinou amplas reformas
econômicas na vida nacional, através de 211 decretos, inclusive a efetiva nacionalização do ferro e do petróleo.
Peru
O Peru viveu, nas últimas décadas, uma das mais interessantes experiências políticas do continente. A partir
do governo Manuel Odría (1950-56), intensificou-se no país a penetração do capital estrangeiro e grandes vantagens foram concedidas a empresas norte-americanas, como a 194
Er 1) Md 4
a l, Oi rd da an St da a ri iá id bs su International Petroleum Co, o, já sm ri Ap o , ão iç os op Na o. sc Pa do o W.R. Grace e a Cerr
sma as r za li bi mo a ui eg ns co o nã , do ta «deologicamente debili
sas como
riape im ti an ta ju da a nç ra de li a a er rd outrora e pe
Du . as st di er qu es os up gr os tr ou e as st lista para os comuni ve te ), 08 19 396 (1 y rr Te de ún la Be o rn rante o corrupto gove início o movimento
a, guerrilheiro. Na luta contra à guerrilh
alguns oficiais se deram
conta de que a mera repressão não
des au fr a ue eg tr en ís pa um de al ci so ma resolveria o proble istas rm fo re s õe nç te in as er nc si o, ss di ce fa e escândalos. Em
tar de li mi e lp go um e a rn se ca de o sm li ra mo se uniram ao gime, re o ou ub rr de na ti La a ic ér Am na m u m o c tipo pouco . do ra va Al o sc la Ve an Ju n. ge o r de po o no colocand r Num de seus primeiros decretos, o novo governo mu o rr za o Pi sc ci an Fr de al ci en id es pr o ci lá pa dou o nome do ar at sg o re nd sa , vi ca ri tó re de o en pl o st ge u, ar para Tupac Am rte In , a is po de o uc . Po na ge dí in r e la pu po r, la cu uma luta se o, por çã za ni de in a m ad se ri op pr sa de i m fo eu ol tr Pe al nation
do o princíci le be ta es i fo s, e do ga ne so os st po im s do a us ca uziu pio do mar territorial de 200 milhas, o que logo prod
conflitos com pesqueiros norte-americanos. À nível de vi mo o o m çã co ma xi ro ap ou sc bu ru Pe a, o rn te ca ex ti polí ta. is al ci o so oc bl s o m do co ha e in al onã es ís pa s o do nt me o No campo, uma lei de reforma agrária limitou o tamanh das propriedades e distribuiu terras ao campesinato. Em s o t a as assoc tr i ou d e n i s s s ue ao eg tr m en ra s fo ai rn jo , 1973 os ciações populares. Ao mesmo tempo, à Cerro do Pasco foi nacionalizada. Com a criação do SINAMOS — Sistema Nacional de Apoio à Mobilização Social — o governo buscou O
apoio das massas para um regime que ainda enfrentava a desconfiança e a força das tradicionais oligarquias. Qual foi o real alcance do reformismo militar peruano
iniciado em 1968? Na origem, a alavanca propulsora foi a indignação moral e nacionalista de setores militares progressistas diante da corrupção do governo de Belaúnde Terry
e de seus vínculos com a International Petroleum. Todavia,
a despeito de ter se originado de um entusiasmo cívico um tanto ingênuo, tal nacionalismo logo se ajustou a um
195 PORRA
programa
político que, contudo,
não atingiu as estruturas
mais profundas da sociedade peruana. Por outro lado, o po.
tencial de participação oficialismo vigente e o controle de uma elite como uma variante de
popular permaneceu nos limites do projeto foi mantido sempre sob o bem intencionada, configurando-se despotismo esclarecido. Os que de-
sencadearam a onda reformadora nunca abdicaram da intenção de assegurar o controle sobre seus efeitos, montando
uma espécie de populismo militar de caráter progressista.
Em 1976, a ala conservadora do exército, liderada pelo gen. Bermudez, afastou Alvarado do poder, cri ando as condições para o retorno da oligarquia, que, em 1980, ele-
geu, de novo, Belaúnde Terry. Voltava ao poder um anti go,
porém confiável, corrupto. Quanto a Alvarado, morreu num discreto ostracismo, poucos anos depois de deixar o
poder.
governo,
De qualquer forma, o Peru sofrera, a partir de seu profundas
alterações,
percutirão por muito tempo, em todo o continente.
que,
certamente,
ainda
re-
não só no pais como também
O segundo governo de Belaúnde Terry foi mar cado pelo surgimento do grupo Sendero Luminoso, uma organização guerrilheira relativamente poderosa, ide ologicamente
heterogênea, de linha maoísta e com laivos de nacionalismo
indígena. Contando com razoável poder de fogo, o grupo tem protagonizado episódios sangrentos, em particular nas zonas rurais da região montanhosa, secula rmente abandonadas.
Quanto
à experiência
reformista
peruana,
pode-se
dizer que, embora sem o aspecto traumático de outros casos, a queda do regime de Alvarado foi mais um fracasso
do populismo na América
Latina — populismo tardio, com
ativa participação de militares e hoje relegado à vala comum das experiências esgotadas.
Em vem e de renovado candidato,
1985 foi eleito para a presidência um político jogrande carisma, Alán Garcia, líder de um Aprismo em suas propostas e sua estratégia. Ao eleger tal por larga margem de votos, o povo peruano de-
a A
e “
alo
.
Mg
A
Má:
ce
196
ae a
'monstrou a definitiva incapacidade das oligarquias de oferecer qualquer alternativa viável. Tal como o populismo
er qu al qu is ma m ue ss po o nã is civ s ia qu ar ig militar, as ol de an gr da e ud rt vi em te en lm pa ci in pr (s, pã O proposta para
e qu s iai soc as rç fo s va no s la pe a ad tr ns mo combatividade de o sc la Ve de o rn ve go do mo is rm fo re do tir par se mobilizaram a
Alvarado.
Nicarágua
m ra as sa as ac fr mo o co st vi i ho fo al ab e tr st o de ng Ao lo ciais da as so ur ut tr es as r da mu ra as pa iv at rn te al as rs ve di o“d ou ab na ac ca xi a me ri o rá ag çã lu vo re . A na ti a La ic ér am
mesticada”
pelos interesses da burguesia. O populismo mo-
bilizou e, ao mesmo tempo, neutralizou as massas, em varios países. E o socialismo bem comportado de Allende terminou em catástrofe. Apenas a Revolução Cubana alcançou êxito no sentido de resolver pelo menos alguns dos seculares problemas nacionais. E a experiência mais próxima da de Cuba é a da Nicarágua depois da tomada do poder pelos sandinistas em 1979. Existem inegáveis semelhanças entre as experiências cubana e nicaragúense. Ambos os países foram vítimas da mais brutal política imperialista norte-americana, exercida via ocupação militar direta. E, tanto num como noutro caso, surgiram líderes populares e nacionalistas, empenhados na luta antiimperialista e precursores dos movimentos revolucionários que, num momento posterior, fariam questão de afirmar que estavam retomando uma tarefa interrom-
pida: Martí em
Cuba e Augusto
César Sandino na Nicará-
gua, ambos transformados, nos seus respectivos países, em símbolos de legitimidade revolucionária. Finalmente, há ainda a destacar que, nos dois países, os regimes derrubados
pelos revolucionários tinham se tornado corruptos ao ponto de ficarem isolados até das elites locais. Sustentados apenas boes se am ar ab ac z, ro o fe sã es pr re la pe e da ma ar a rç pela fo roando na luta tenaz contra uma guerrilha disposta a qualquer sacrifício. O Fulgêncio Batista nicaraguense foi Anastácio Somo-
za, chefe de uma familia que dispunha a seu bel-prazer do país, com O beneplácito dos norte-americanos, desde a
197
década de 1930. Em julho de 1979, a Frente Sandinista de Libertação Nacional tomou o poder. “Sandino vive” passou a ser a frase mobilizadora da forca revolucionária e da reconstrução nacional. Como foi visto antes, atarefado na luta contra a ocupação estrangeira, Sandino nunca tinha chegado a definir claramente como deveria ser a Nicarágua livre do imperialismo, fato que deu liberdade de ação aos vencedores de 1979 para fazerem suas próprias opções políticas. Hoje, os revolucionários nicaragúenses fazem questão de serem chamados de sandinistas, a fim de reforcarem a idéia de que seu programa não é nem cubano e nem soviético mas, sim, especificamente nacional. A Nicarágua tem sido, depois da revolução, um fascinante laboratório de experiências políticas e sociais, devendo dar-se especial importância ao planejamento econômico global, cuja eficiência, na visão sanuinista, não pode excluir a justiça social. Longe de ficar nos limites de uma retórica populista, os sandinistas transformaram o exército verdadeiramente no povo em armas e, diante das pressões internas e externas, tiveram que procurar o apoio dos países socialistas ao seu projeto nacional. Em consequência, os setores mais moderados da revolução dela se afastaram progressivamente e alguns até aderiram à contra-revolução, como Eden Pastora, o Comandante Zero, em 1982, e o governo Reagan pôs em prática uma política que tem por objetivo fazer com que o país volte à situação anterior, dando apoio aos con-
tra-revolucionários.
Na economia, o iniciativa privada, mas consumismo, assume o de diversas atividades
sandinismo respeita formalmente a limitou o seu espaço. Não estimula o controle total da comercialização e econômicas, cobra altos impostos
sobre artigos supérfluos para reinvestir em programas sociais, fiscaliza as taxas de lucro e incentiva a formação de cooperativas de pequenos produtores na agricultura e noarte-
sanato. Enfim, mantém um sistema de economia misto, com um setor privado e um setor público, procurando também ampliar a produção de seus principais artigos primários: café, açúcar, algodão, banana e madeira. A Nicarágua 198
gs
T
sto, de mo da vi de l ve ní um m te vo po u é um país pobre e se oluev -r ra nt co a lh ri er qu a r ta en fr en a do além de ser obriga s, ro ca os nt me ma ar ar rt po im , ia nc uê cionária e, em conseq americana ert no ia ég at tr es da e rt pa z fa e qu fato
para levar à
ista. in nd sa a ci ên ri pe ex a o rn te in to di ré sc exaustão e ao de por Reao ad et cr de l ia rc me co io ue oq bl ao re fe No que se re
ra pa is ma ne io nc fu e qu r ze di a ss po se ez lv gan em 19895, ta
o de nt po o b so e qu do o çã da mi ti in a e ão ns aumentar a te a á ar nç ca al o nã te en am rt ce ue rq po , vista prático. Primeiro ngu Se a. fri ra er gu da os re áu os mp te s eficiência que teria no zidu re se ua ág ar ic /N os id Un s do ta Es io rc do, porque o comé exitos s re io ma os e tr En . 79 19 de is po de e ra sensivelment alizaon ci na s: te in gu se os s do ta ci r se m de po s ta dos sandinis Guarda da ão iç tu ti bs su ; as st zi mo so es ad ed ri op ção das pr amb co a; ri rá ag a rm fo re r; la pu po to ci ér ex um r po Nacional colas e es de o çã ca li ip lt mu a; ri lá ma à e go re mp se te ao de hospitais;
e alfabetização em
massa,
atividade desenvolvida
corde, re o mp te em u, ui eg ns co e qu e o rã ti mu de a rm fo sob co re no me nô fe %, 12 ra pa % D0 o de sm ti be reduzir o analfa ied nc co io êm pr um de s vé te ra en at lm na io ac rn nhecido inte oo ec nt me ci es cr de s ce di ín e qu do is Ma . CO ES do pela UN e al ci so io é ár on ci lu vo o re rn ve go o do çã pa cu eo pr nômico, a a -l a, má -l ar zá ti en ci ns co r, la pu po a ss ma r a za li bi política: mo
e resgatá-la de sua histórica penúria.
Para resumir o projeto do governo sandinista, nada me-
pais ci in pr us se de um to de en im po de o ar nt se re ap e qu lhor líderes,
o ministro do Planejamento,
Henry
Ruiz, que
nele
a ci ên ci ns , co ia à ég at tr es de os rm te , em mo is al busca juntar o re socializante de um
da natureza
projeto político e econômi-
co: “Nós temos um processo socializante com claros objetivos socialistas. (. . .) O mais importante é ir resolvendo os problemas e consolidar o processo. Nestas
condições, uma encruzilhada é pura especulação e quem especula é a direita. Quem conduz o processo é a Frente Sandinista, que confere um papel importante ao setor privado, mas pede que ele tenha consciência E
a
TAN
X
199
nacional. Queremos, acima de tudo, manter a dignidade nacional e isso não se faz por decreto. Não se trata de amanhã anunciar: bom, daqui em diante, a Nicará-
gua é socialista”. Isso seria um disparate. Nós fomos
muito claros. Temos um projeto com ideologia clara, mas temos também metas igualmente claras, que
são as de libertar a Nicarágua da dominação a que his-
toricamente ela está sujeita e garantir a independência " nacional. Nôs não estamos numa encruzilhada e sim preocupados com a contra-revolução, com a afirmação nacional, com a busca da independência. Nos preocupa a possibilidade de uma invasão, o aumento dos gastos de defesa e a manutenção de um projeto pluralista, democrático, popular e não-alinhado. Queremos | provar que nosso esquema é viável, que podemos vi-
ver em paz com nossos vizinhos.'*
Granada Devido à evolução da situação na Nicarágua, o imperialismo norte-americano passou a ter um segundo flanco exposto na América Central. Em resposta, o governo Reagan endureceu sua política na região. Por interesse e considerações de prestígio, os Estados Unidos não se permitem sofrer novas derrotas. Os acontecimentos verificados em Granada e El Salvador são bons exemplos de uma atitude que busca retomar a autoconfiança dos tempos da guerra fria. Depois da República Dominicana em 1965, Granada foi o primeiro caso de intervenção militar direta dos Estados Unidos no continente. Tudo começou em março de 1979, quando um golpe do Movimento Nova Jóia (MNJ) derrubou o governo direitista de Eric Gairy, assumindo o poder Maurice Bishop, como primeiro-ministro, Bernard
Coard,
Hudson
teórico
Austin,
marxista, como
como
ministro
comandante
do
das Finanças, novo
Exército
* O Socialismo não virá por decreto. In: Cadernos do Terceiro Mundo. Rio de Janeiro, Terceiro Mundo, mar. 1984, n. 64, p.56.
200
a
e
u ce le be ta es me gi re vo no O Revolucionário do Povo (ERP).
eas de ár s na s no ba cu es or ss se as u relações com Cuba, recebe soas rm fo re r ze fa a ôs op pr se e Educação, Saúde e Defesa
ta Es Os . vo po do da vi de l ve ní O ciais com vistas a melhorar ão aç nt ie or l ta ra nt co e nt me ta en dos Unidos protestaram viol do uí tr ns co o nd se va ta es e qu o rt e alegaram que o aeropo nta bi ha 0 70 8. m co de da ci , 's ge or próximo à capital (St. Ge à s ma ar de o vi en o ra pa la ca es de tes) destinar-se-ia a servir . la go An ra pa s na ba cu as op tr de e na guerrilha centro-america ci fa vo ti je ob r po a nh ti o rt po ro Bishop insistiu que o ae gin sh Wa a ir , 83 19 em u, di ci de e as litar o afluxo de turist
18
ton para se explicar. i fo op sh Bi , os id Un s do ta Es s do ar lt vo Todavia, ao eme qu J, MN do da er qu es a al da e lp go derrubado por um latu pi ca de e ci pé es a um mo co on gt in sh Wa tendera sua ida a cções fa as e tr en s ta lu s e re la pu po os lt mu e tu -s am ção. Seguir rno ve go Oo u mi su as in st Au on ds Hu e op sh Bi ra pró e cont . io Foi ár on ci lu vo Re r ta li Mi ho el ns Co um de e ef como ch os ad ld so 00 .0 15 e qu , 83 19 de o br tu ou nesse momento, em ex et pr m, a ra ie rv te in be ri Ca ” do os ad li “a us americanos e se is Un do ta Es s do na ci di Me es de nt da tu es m ce er to de proteg dos que estavam em St. George's. ingsh , Wa ão aç er op da me lu vo o uc po do to ei sp de A
ton
teve
baixas e gastou
42
US$
130.000.000.
Austin,
t er rb . He os es pr m ra s fo no ba es cu or ss se as Coard e mais 748 e o novo -s ou rn , to an ag Re a de nç ia nf co de m e m o , h ze Blai o petã ha il a o nd se o m s , e te m en lm o. na tr Fi is in -m ro ei im pr o mp te e ço pa es e uv ho a nd , ai da pi rá o tã ão aç quena e à oper , du ro mb ve no s de io íc in s : no il e út in ad id ar para uma barb os an ic er am ert no es iõ av a, re ão aé aç er op ma nu rante a luta, ma co e ri át ui iq ps al it sp ho , um co vo uí eq , r po am ír destru taram 47 internos. El Salvador País menor que o Estado brasileiro de Sergipe, El Salvador tem vivido uma turbulência inversamente propor-
cional ao seu tamanho. Entre 1879 e 1882, a privatização da terra, estabelecida a partir da introdução do formalismo *,
a
ms,
VE
t
201
iur ídico-liberal capitalista, expulsou as comunidades indígenas e catorze famílias formaram enormes latifúndios. A
economia nacional integrou-se no capitalismo internacional da época, exportando matérias-primas, tal como acontecia em todo o continente. Politicamente, teve início uma longa série de ditaduras militares. Em 1932, violenta revolta po-
pular se opôs ao golpe do gen. Hernandez Martinez, que respondeu
30.000
massacrando
camponeses,
num
episódio
conhecido como /a matanza (o massacre). Um dos líderes populares mortos naquela oportunidade chamava-se Augustín Farabundo Martí. Durante a ditadura militar que durou de 1961 a 1979, surgiram em El Salvador certo número de indústrias e a classe média urbana se ampliou. Além disso, a grande expansão demográfica aumentou o percentual dos sem-terra, de 12% (1961) para 65% (1981). Contra a tirania dos quartéis, formou-se uma coligação civil, incluindo democratas cristãos, sociais democratas e comunistas. Entretanto, os militares bloquearam seu acesso legal ao poder e, em resposta, os elementos mais exaltados aderiram, a partir de 1972, à guerrilha. Em 1980, os militares oscilavam entre fazer algumas reformas e endurecer politicamente. Opondo-se a qualquer mudança, o grupo de latifundiários das catorze famílias começou a organizar grupos paramilitares direitistas, verdadeiros esquadrões da morte encarregados de sequestrar, torturar e executar. Roberto d'Aubuisson tornou-se o líder mais
representativo desse fascismo subdesenvolvido salvadorenho. Enquanto isso, José Napoleón Duarte, o principal polí-
tico democrata-cristão, decidiu aderir à junta militar então no poder, resolvido a incentivar a ala reformista que existia no governo. Na mesma época, intensificou-se a guerrilha, dividindo-se os guerrilheiros em Frente Democrática Revolucionária (democratas-cristãos e social-democratas) e Frente
om
Farabundo Martí de Libertação Nacional (comunistas). Tendo a sua posição debilitada na América Central por causa da defecção de Cuba e Nicarágua, os Estados Unidos não poderiam tolerar uma nova vitória de guerrilheiros. ' 4
d
4
eor ad lv sa to ci ér ex ao 00 .0 00 .0 Todavia, a ajuda de US$ 55 nquisco a lh ri er gu a e qu r di pe im ra pa te en nho mal foi sufici de apolar m ge ra co m Se s. do ti ob já 05 e qu s tasse mais espaço
Roberto
d'Aubuisson,
demasiado truculento para o gosto
epr an ag Re o rn ve go o a, an ic er am ert da opinião pública no mo um , te ar Du n ôó le po Na sé feriu apostar na eleição de Jo 1984. em s na ur s na do en nc ve ou ab ac e qu l ve derado confiá arte Du ón le po Na , do di vi di ís pa m nu r de po Assumindo o m nu a, lh ri er gu da es nt ta en es pr re m co do or tentou um ac lhe cuse qu — as lm Pa s La em o ad iz al re ro nt co histórico en rço fo es ro ei im pr O r se a lo ve e qu s ma e rt mo de s tou ameaça o nã a or ag é at o çã lu so a um , co ti lí po o an pl no , ar para alcanç conseguida por meios militares.
j A
À|
203
Conclusão América Latina: fatalidade ou opção? Ao longo das páginas anteriores foram percorridos quase cinco séculos da história da América Latina, desde o começo, sob a égide do colonialismo mercantilista, até a era presente do grande capital monopolista, passando pelo liberalismo capitalista da época dos grandes impérios europeus, e sua subsequente desagregação, a partir das primeiras décadas do séc. XX. Integrado inicialmente ao contexto hegemônico europeu, o continente deslocou-se posteriormente para a esfera norte-americana, sem que a relação de domina-
ção/dependência algumas
se alterasse significativamente, apesar de
mudanças
superficiais.
O
resultado
sempre
foi o
mesmo: opressão social e política, espoliação e dominação.
É esta uma fatalidade ou uma opção? Independente
das modalidades
assumidas, a dominação externa e a interna latino-americanas sempre se articula-
ram
mutuamente.
Na fase colonial, o continente produzia
E
O i
e Gm
does
matérias-primas tropicais e minerais para os países ibéricos
e
deles
recebia
os
artigos
manufaturados,
adquiridos
de
vos ti na de o ri só ul mp co ho al ab tr U s. outras nações européia a em st si um e a os gi li re a gi lo eo id a e negros, no o ad nt se As . ro ad qu O m va ta sivo comple ra pa , ia ig ex e nt ge vi o tã en o sm li ti mercan ta re di o çã ra st ni mi ad a um de de da uniformi
tributário extormonopolismo, O se reproduzir, a e rigorosamente
centralizada. ser a lo ve os ad ch fe os ad rc me s do ca ti Quando a polí a , al ri st du in se fa a su em a, st li ta pi ca obstáculo à expansão Na . al ni lo co ra tu ru st re pe su à m co a solução foi a ruptur es ss re te in os e -s am ir un o, ic ér ib o sm li po luta contra o mono ltado su re o e al ri st du in o sm li ta pi ca do e das elites criollas ascl as m ra za li bi mo e qu a, ci ên nd pe de in de foram as guerras ncia, uê eq ns co Em a. lh ta ba de o mp ca o ra pa ses: populares ilizar ab vi de vo ti je ob o m co s ai on ci na s do ta £tormaram-se Es e local ad ed ci so da os ul nc ví s o do çã na de or re e a nt juridicame r depente rá ca , O to an et tr en o, nd va er ns co , pa ro com a Eu
indo uz od u pr uo in nt co na ti La a ic ér Am . A co ri fé ri dente e pe admià s s, ma do ra tu fa nu ma do an rt po im s e io ár im pr s artigo nava mi do pa ro Eu A a. id im pr su ra fo a rn te ex ta re o di çã nistra alguns em ia st ve e in e nt me al ur lt cu e ra ei nc na fi l, ia rc come s. Toro ut no e qu es ís pa s un em is , ma ia om on ec da s re seto do de davia,-as nações do continente preservaram O arreme soberania.
tal contexto, as massas populares continuaram esas reforpoliadas e oprimidas. Porque a independência apen tamulara a dominação externa e substituíra o poder do es Em
e qu o l, ca ia lo qu ar ig ol da lo o pe ic o ér ic ib át cr ro bu mento is em e ia ic rf pe su o it as mu nç da mu m ra fo e qu r ze a di ic signif rem ta or mp co ra s pa to ri st re is ma de r es po ss re te in de ão nç fu qualquer ampliação no espaço de participação política. O liberalismo formalizado nos textos constitucionais tão-so-
mente exprimiu a liberdade das oligarquias internas de go-
vernar e enriquecer e da burguesia externa de controlar mercados e expandir a acumulação de capital. O esforço de tornar mais elástica a aplicação dos conceitos de liberdade, incorporando as massas populares na esfera das decisões políticas, marcou a entrada da América
Latina no séc. XX.
205
ás Qto
A partir dos anos 30/40, a crise nos países capitalistas e-am ino lat as ric ifé per s área as ers div em u, abri os nic emô heg ricanas, a alternativa da industrialização substitutiva, voltada para mercados nacionais. Foi adotado então um novo estilo de atuação do Estado, o populismo, destinado a incorporar as massas trabalhadoras a um projeto capitalista
que se pretendia auto-sustentado. A medida, entretanto,
que o populismo foi viabilizando espaços para à organização sindical e as reivindicações populares, cresceram os temores de classe da frágil burguesia interna e do poderoso imperialismo internacional. A resposta foi, a partir da década de 50, a aliança tácita ou declarada dos dois setores ameaçados. O anticomunismo da guerra fria reforçou ideologicamente essa aliança, que terminou orquestrando uma série de golpes militares e provocando o colapso não só do estilo populista como das velhas fórmulas liberais. Conceitos como ordem, eficiência e segurança nacional foram utilizados como argumentos para esmagar os direitos humanos mais elementares, enquanto o capital monopolista ampliava seu poder e seus espaços e a miséria, o endividamento
externo,
a
corrupção e a incompetência administrativa transformavamse no trágico legado de muitos anos de regime militar.
Pelos meados da década de 80, o recuo dos militares fa-
voreceu Oo retorno de governos civis, os quais têm buscado combinar um reformismo bem intencionado com práticas liberais e princípios da social-democracia. Tais concessões, porém, terão sempre por limite o sistema onde se enquadram e se ampliarão somente na medida direta das pressões que a sociedade civil tiver condições de fazer sobre o aparelho do Estado. O grande número de problemas que são parte da
herança histórica do continente não pode fazer com que os
povos latino-americanos encarem com pessimismo e fatalismo seu futuro. À experiência — como no caso de Cuba e da
Nicarágua — mostra que a participação ativa das grandes massas populares é a condição necessária para a eliminação das mazelas sociais latino-americanas, cuja solução depende, portanto, muito mais de medidas políticas do que de sim-
ples e sempre insatisfatórias “soluções técnicas”. 206
Ao
contrário
de certa
ideologia
corrente,
resultante
do mi su as lma um de o sm me é at e da dominação cultural, s to ei ac e r do za ni lo co lo pe ão racismo, postos em circulaç m ue ss po s na ca ri me -a no ti la es çõ pelo colonizado, as popula pacidade ca , ho al ab tr de e ta lu de de da ci pa extraordinária ca
a ic ér Am da so ra at O s. vo po os seguramente igual à de outr s vo po us se de ia nc lê do in a st po su Latina não é produto da o sã vi a o ad ss pa no a di en et pr mo ou do meio geográfico, co
do da s ma ”, co fi rá og ge o sm ni mi er pseudocientífica do “det o dos séng lo ao s te en es pr as rn te ex ão ss re op minação e da eec pr s na gi pá s na o st vi foi mo co a, st culos desde a conqui dentes.
serde es çõ la pu po as o, ri rá nt co lo pe e , do la o tr Por ou ra à nt co m ra ta lu e am ir st si re re mp se te en in dadas do cont o séc. e sd De a. rn te in o çã na mi do a e a rn te ex espoliação no séc. u ar Am c pa Tu de ão li be re de an gr la pe do an ss XVI, pa berdali la pe m ra ta lu s ca in s do s ro ei rd he os je ho é at I, XVII os das úlir ne mi s ao o ad ss pa s do no ca au ar s do e, il Ch No de. nte, como ta ns co a um i fo re mp se a lt vo re a s, da ca dé s ma ti xiMé no , ro st Ca l de Fi de e í rt Ma de ba Cu na foi também o ca Ni na í, rt o Ma nd bu ra Fa de or ad lv Sa El no , ta pa co de Za
ese os ir ne , mi es es on mp ca s de õe li be re s na o e in nd Sa de rágua
verna e qu s. O lo cu sé s do o ng lo ao es ís pa is ma de s do es nt tuda indoda a éi id re a mp se ra pa ar lt pu se ra , pa do an lt fa tá es de da
nco do s vo po o s do sm mi or nf co do de e da ci pa ca in da , ia lênc
s. na ca ri me -a no ti es la çõ lu vo re s da l ra ge ia ór st tinente é uma hi Nem mesmo os piores tempos de terror, repressão e ssas latiimobilismo sufocaram a disposição de luta das ma
, os nt le no ui ng sa os e ri tá ri to s au me gi re os s. E na no-america r mo te de an gr do a ov pr a um o nã se o sã , o te nã en am dialetic e a qu ez rt ce a um s s. Ei do mi ri op s do te an es di or ss re dos op ue rq . Po io áf it ep um o nã a e nç ra pe es a o um sã lu nc co a faz dest
os povos latino-americanos têm
O futuro em
suas mãos
e
do or ac de a e ir ne ma a o su à -l uí tr ns o co rã be te sa en am cert com seus interesses, como em alguns países já está ocorrendo.
207
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA PERIÓDICOS CADERNOS do Terceiro Mundo. Rio de Janeiro, Terceiro Mundo, mar. 1984, n. 04. ESTUDOS CEBRAP. São Paulo, jul./ago./set., 1973, n. 5. GUERRA na Paz. Rio de Janeiro, Rio-Gráfica, 1985, n. 65. e 66. GUIA do Terceiro Mundo. Rio de Janeiro, Terceiro Mundo, 1984-85. PROCESSO. México, 18 out. 1982, n. 311.
LIVROS ALPEROVICH, M. S. & RUDENKO, B. T. La Revolución Mexicana de 1910-17 y la política de los Estados Unidos. México, Fondo de Cultura Popular, 1960. ANDERSON, P. Linhagens do Estado Absolutista. Porto, Afrontamento, 1984. BAMBIRRA, V. E/ Capitalismo dependiente latinoamericano. México, Siglo XX], 1980. BARBEIRO, H. História da América. São Paulo, Moderna, 1980.
BLANCO, A. & DÓRIA, C. A. Revolução Cubana: de José
Martía Fidel Castro. São Paulo, Brasiliense, 1982. CAMPOS, R. História da América. São Paulo, Atual, 1982. CARDOSO, C. F. & BRIGNOLI, H. P. História Econômica da América Latina. Rio de Janeiro, Graal, 1983. CARDOSO, F. H, & FALETTO, E. Dependência e desen-
volvimento na América Latina. Rio de Janeiro, 1981. CHAUNU, P. História da América Latina. Rio de-Janeiro,
DIFEL, 1979. CORREA, A. M. M. Revolução Mexicana. São Paulo, Brasi| liense, 1983. CUEVA, A. O desenvolvimento do capitalismo na América Latina. São Paulo, Global, 1983. abri, +
ES
A
Do
7d!
À
o, ir ne Ja de o Ri . na ti La a ic ér Am da ia ór st Hi DONGHI, T. H.
Paz e Terra, 1970. DOZER, D. M. América
Latina: uma perspectiva histórica. Porto Alegre, Globo/EDUSP, 1966. a ic ér Am en o ll ro ar es bd su y o sm li ta FRANCK, A. G. Capi Latina. Buenos Aires, Siglo XXI, 1973. de o Ri . na ti La a ic ér Am da s ta er ab s ia ve GALEANO, E. As Janeiro, Paz e Terra, 1983.
HUBERMAN,
L. & SWEEZY,
Revolução.
P. Cuba: Anatomia de uma
Rio de Janeiro, 1901.
za li vi Ci o, ir ne Ja de o Ri o. an ic er o Am ri pé Im O , C. JULIEN ção Brasileira, 1970. ica ér Am na al on ci Na do ta Es do ão aç rm Fo M. , AN PL KA Latina. Rio de Janeiro, Eldorado-Tijuca, 1974. o. LOBO, M. E. L. O processo administrativo ibero-american Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1902. MARICHAL, J. Cuatro fases de la História intelectual latinoamericana. Madrid, Fundación Juan March/Cátedra, 1978. MORRIS, R. B. Documentos básicos da História dos Estados Unidos. Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1904. NEVES, L. F. B. O combate dos soldados de Cristo na terra dos papagaios. Rio de Janeiro, Forense/Universitária,
1978. PENA, Sérgio de La. El antidesarrollo en América Latina. México, Siglo XXI, 1972.
PIERRE-CHARLES, G. Génesis de la Revolución Cubana. México, Siglo XXI, 1978. POMER, L. As Independências da América Latina. São Paulo, Brasiliense, 1981.
—. História da América Hispano-Indrgena. São Paulo, Global, 1985. PRADO, M. L. O Populismo na América Latina. São Paulo, Brasiliense, 1981.
RETAMAR, R. F. Nuestra América y el Occidente. Cuadernos de Cultura Latinoamericana. México, UNAM, 1978, bo TO, ”
Fr
q *
o:
W
209
RIBEIRO, 1979.
D. 4s Américas e a Civilização. Rio de Janeiro,
ROJO, R. Meu amigo “Che”. São Paulo, Traço, 1985. STEIN, Stanley e Bárbara. 4 herança colonial da América Latina.
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977.
VÁRIOS Autores. América Latina em sua Literatura. São
Paulo, UNESCO/Perspectiva, 1979. HAUSER, Thomas. Desaparecido. Rio de Janeiro, Record, 1978.
OUTROS TITULOS DA SÉRIE Da conquista e da destruição das culturas autóctones no séc. XVI até a completa do-
minação
ibérica,
da
expansão
das
nações
capitalistas européias no séc. XVIII até a hegemonia imperial dos Estados Unidos, a história do continente americano se apresenta como o desenrolar de um duplo e contínuo conflito, resultante, de um lado, da dominação externa colonial ou semicolonial e, de outro, consequência do controle exercido internamente pelas elites oligárquicas em guerra quase ininterrupta — se bem que nem sempre publicamente reconhecida como tal — com as grandes massas de dominados e miseráveis.
Este panorama sofreu alterações importantes a partir de meados do séc. XX com as revoluções em Cuba e na Nicarágua, permanecendo, contudo, sem mudanças nos demais países, muitos dos quais envolvidos em
Ea os.
internos
mais
ou
menos
declara-
História'da América Latina, de Luiz Roberto Lopez, em estilo simples, direto, sem teorizações complicadas, mas sempre objetivo e adequado, oferece uma visão ampla e clara do processo histórico latino-americano. tornando-se, assim, uma obra fundamental para professores, alunos e todos que pretenderem adquirir as informações básicas para compreender as linhas essenciais d a evolução ciedades continentais. iii
História do Rio Grande do Sul
(Sandra Jatahy Pesavento)
A Literatura no Rio Grande do Sul
(Regina Zilberman)
História do Brasil Contemporâneo
(Luiz Roberto Lopez)
História do Brasil Colonial
(Luiz Roberto Lopez)
Cinema Brasileiro
(Hélio Nascimento)
Conto Brasileiro Contemporâneo (Antonio Hohilfeldt) O Romance de 30 (José Hildebrando Dacanal) História do Brasil Imperial (Luiz Roberto Lopez) O Escravismo Brasileiro
(Décio Freitas) Espaço & Sociedade no Rio Grande do Sul
(Igor A. G. Moreira e Rogério H. da Costa)
História do Século XX
(Luiz Roberto Lopez)
EUA x América Latina: as etapas da dominação
(Voltaire Schilling)
A Literatura no Século XX—
notas para uma leitura proveitosa (José Hildebrando Dacanal)
A Revolução na China Colonialismo/Maofsmo/Revisionismo (Voltaire Schilling) Literatura Grega (Donaldo Schúler) O Tenentismo
(Nelson Werneck Sodré) O Bando dos Quatro: a industrialização no sudeste asiático
(Samuel Sergio Salinas) Aliança Nacional Ideologia e Ação
Libertadora —
(Leila M. G. Leite Hernandez) Linguagem, Poder e Ensino da Lingua (José Hildebrando Dacanal) Portugal: do fascismo à revolução (José Paulo Netto) O Capitalismo Contemporâneo (Otto Alcides Ohlweiler) A Literatura em Santa Catarina (Janete Gaspar Machado) O Movimento Palestino (Mustafá Yasbek]) Breve História da Escravidão
(Mário Maestri)
Pedidos por reembolso: Editora Mercado Aberto Ltda.
Cx. Postal 1432 - 90230 P. Alegre - RS Livro; o presente inteligente
AG AIAOTeIH R
pe
E
"hE
4
SE
E
r
H
o
7
=
>
TOO
Tr
—— —
f
TIO! OTAAIOA SIUI ea
fr
A
t——
tr
“OP
A
OTIJAA (f o) (OGAINM