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Portuguese Pages 96 p. ; [85] Year c1989.
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COCAINA DOS POBRES
Gilberto Felisberto Vasconcellos IWJLeia Mais Todos os direitos reservados à
Editor Luiz Carlos Lucena 01pa Sebastião Maria e Ronald Chira RevisiTo Angela Ramalho Vianna EditoraçTo eletrônim Grafitte
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Maida Gorek, ín memoriam
ÍNDICE
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PC Farias, um empresc1rio pós-moderno A lógica do inquérito abafado A razão da paranóia: 1954, 1964, 1994. A glória da mentira ou a mentira dêl glóriêl ~ Roberto Carlos a Otávio Frias Filho Viva a vida marajá Os pobres não morrem de overdose A kultur rambocollor com xitãozim e xororó O candidêlto do computador O preço da esquizofrenia nas esquerdas brasileiras A ética do PC Farias é a estética do doutor Roberto Marinho Marvada mídia A fórmula um é o Collor no poder José Guilherme Merquior plagiado no planalto ágrafo ern 1992 Eduardo Suplicy entre Tókyo, Trótski e London London Ai de ti, Ccmapi! A rebeldia do ânus A fama do populismo ou a história de uma infãmia Kinema, a lacuna entre Jango e Brizola A facécia da CPI é o novo Plano Cruzado de 1992 É melhor viver do que ser feliz Gilete na história
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PC FARIAS, UM EMPRESÁRIO PÓS-MODERNO
"Alr, 11,n 11mln11xJ11so1111n mi11Jra sort.e!" Augusto dos AnJOS
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onversando na Urca, julho de 1992, com dois amigos, Rogé:io Sganzerla e Otcivio IJl,acudiu-meali a idéiadeescreveralguma coisa que retratasse o perfil psicossociológico desse vulto endjabrado da década de 90 chamado PC Farias, espécie de personagem síntese do desenvolvimento do empresariado brasileiro durante o reinado da democracia. Eis a questão fundc1mental: como se comporta o empresariado diante das eleições? Todo mundo estr1 careca de saber que ninguém se elege sem dinheiro, nem o mais bonzinho santo dr1 paróquia. Requer grana eleição. Muitr1. Então é preciso dispor de algum capitc1lista cheio da grana. Absolutamen~e secunc.fario se o candid~1to fica com o rabo preso ou refém do tesoureiro da G1rnpanl1c1 política. Devagar com a mistificação moralista: montado em seujatinho Morcego Negro, ou noxilindró com cela especial, PC Fé1rié1s poderei se converter nó herói que faz e é1 contece, inclusive se eleger sern1dor pelo Amapr1 ou Rondônià nas próximas eleições de 1994. Estupidez serié1 negar suas quaUdades de homem sedutor de homens (desde Aristóteles, fazer política é namorar homem ...): boa prosa, cativante, maneiro, generoso com os amigos, mão aberta nos hotéis, restaurantes, casas de pra ia, nos jatinhos, nas festinhas, nas viagens internacionais, nos vinhos finos, nas butiques carns, etc. Umanügão. Não fossé ele, Nc1ndo Collor não seria ninguém, nem governador de Alagoas. Aqui para nós: foi PC Farias quem convenceu á burguesia de todas as regiões do país a cacifar o candidato capaz de derrotar as esquerdas em 1989. 5 __ _j
Não é fáci Lchegar ao poder supremo da nação. É óbvio que PC Farias iria participar dos- altos esrnlões do governo Collor. Caso contrárió, PC Farias seria um otário. Na verdade, a natureza da campanha política determina necessariamente o perfil do futuro governo. Além da genialidade pecuniéiria de PC Farias, voando com os seus jatinhos o céu de anil dos Brasis,avitória de FernandoCollor foi um triunfo da telenovela. Esta continua em 1992corn seu irmão caçula, PedroCollor,quedenuncia o presidente da República de ser testé1-de-ferro dos negócios ilícitos de PC Farias. Levanta aí o dedo quem não é culpc1do por esse vexame? Zélia Pedro Tereza Rosane Tatá Coimbra Ana Bancesa. Onde esmo todos os que ajucfaram a incrível foçanha do caçador de marajás? Até eu que sou mais bobo não concordo com a atitude simplista da mídja, tantas vezes safada e vil, em querer considerar PC Farias o bode expiatóriodadegradaçãornoraldopaís.Issoéconversaparaboidormir. Quem me garante que PC Farias não seria um ótimo dono de jornal? Quantos PC Farias valem um doutor Roberto Marinho? PC Farias é um sicário t~ombadinha, cuja cabeça foi formada vendo os filmecos da TV Globo. E estarrecedor constatar que, à exceção do meu guru Leonel Brizola, ninguém pede uma CPI em cima do doutor Roberto. O ínclito deputado economista Aluízio Mercadante, homem probo e indignado diante do rniserê naciom1I, não tem no entcmto nenhum bode político com a telenovela, o câncer da polis pós-64. Em 1992 a opinião publica está alvoroçadc1: a despeito do vínculo com PC Farias, o mandato de Collor deve ou não continuar? No que eu vejo a Folha e o Estc1dão junto com Horestez Cuércya e Tc1sso Jereissc1ti pedindo a renúncia do homem, começo a encucar que há algo de esquisito nessa súbitc1 guinada émti-Collor. Estrc1nho: quem votou no homem quer agora tirá-lo. Por outro lado, intriga-me sobremaneira a ponderação singular de Leonel Brizolc1 em torno da defesa da legalidade em 1992, ou seja, sua preocupc1ção em torno de um possível golpe parlamentarista. Parlamentarismo já Parlamentarismo é coisa de vic1do! Para complicar os indiec1doresda parnfernália de 1992,eiso professor ACM fazendo alarde de que o vice Itamar Franco não tem condições
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morais e políticas de assumir a Presidência da República. De onde vem o golpe? O golpe continua desde 64. Não nos esqueçamos de que o Rezek fez milagre com o computador eleitoral de 1989. Collor deu um golpe de caratê no país, mas, convenhamos, Lula o ajudou a derrotm Leonel Brizola, tido como expressão caduca do trabalhismo pré-64. Eis que agoraoclimajanistadedelegadodecostumesvoltaabailarcomojurista Bisol, que é a UDN de toga no meio da UDN de macacão. Estamos assistindo à ênfase na m inudência do secundário, que silencia no entanto cliante do atual desmantelamento do Estado. Para Ltús Inácio Lula, a impwüdade que grassa no país não tem nada a ver com as perdas internacionais.AcríticadoPTaoColloréeminentementepequeno-burguesa, não vai fundo no fenômeno colorido do ponto de vista histórico. Na revista Veja o chefe-editorial é o Pau Linho Moreira Leite, o ex-teórico da Libelu que trocou Trótski por Carlos Lacerda. Refresquemos a nossa veneranda amnésia histórica: a revista Veja fez a campanha do caçador de marajá desde 1988. Por que o doge Civita está agora descontente com Fernando Collor? Com certeza não é por pmridos morais nem em nome da defesa dos cofres públicos. Leonel Brizola diz aos quatro ventos que a queda do Collor é uma tramóia urdida em São Paulo, ainda que&10 Paulo tenha sido a regiãoqueelegeu Fernando Collor. Fleury e sua wife votaram no Collor. Será que Horestez Cuércya votou no Lula? Depois das eleições de 1989, ressacado com o resultado, Lula declara que odeia Brasília. E se porventura ele tivesse ganho o segundo turno das eleições? Mudar-se-ia a capital do país para Piracicaba? Nunca me esquecerei que eu votei no Lula no segundo turno. E no Bisol também. Deveria ter anulado o voto, mas fui seguir o conselho do meu guru Leonel Brizola, o candidé1to laico das eleições de 1989. Collor ficou nos braços do pastor Edir Macedo coma Igreja Universal do Reino de Deus, enquanto Luís Inácio Lula embarcou na picaretagem da teologia da libertação by Boff e Frei Beto. Em 1992 a CPI cumpre o papel eleitoreiro em cima do tema da moralidade. Eduardo Suplicy quer se eleger prefeito de São Paulo com o dossier PC Farias. Toda a galera política estél de olho em 1994. Se Leonel Brizola despontar corno candidato foite, não há dúvida de que a classe dominante vai até dar nó em pingo d'água parei o homem não chegar lá . Atenção, cambada: Paulo Brossard, o Rui Barbosa em compota, poderá desempenhar em 1994 o mesmo papelão que o Rezek desempenhou em 1989. 7
Os five yea rs de José Sa rney p rep;-1 ra r;-1 m o bote de Fernando Collor.
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E Leonel em Minas? Juizde Fora, segunda cidade doestado, poderia ter decididoa parada em 1989 a favor dé Leonel Brizola, porém o PDT ;-1í não é nem pedetista nem brizolista. O que se cornent;-1 nas rodinh;-1s mineirns é q.ue Leonel Brizola precisa fazer urgentemente um espurgo no PDT de Ju1z de Fora. Caso contrário, 1994 ser;-í osso duro de roer. Para escrever este livro consulto o vereador Leopoldo Tristão sobre a situação delicada de Leonel Brizol;-1 em Minas Cera is. Ele me informa que o PTB vargo-janguist;-1 sempre foi forte em Juiz de Fora'. cid~de operária que antecipou o surto industrial de São Paulo. To~av1a existe o peso de 1964: tornara que JF esteja ,rnis p;-1ra o poeta Munlo Mendes que para o general Mourão Filho. Muitos brizolistas mineiros lastimam o fato de Leonel Brizola não ter ainda percebido que é através de Juiz de Fora su;-1 entrada triunfal em Minas Gerais. Não s;-10 poucos os brizolist;-1s mineiros que assinalam a danosa contradição: Leonel Brizola goza de carisma em )Liiz de ~ora, mas o PDT na Zona da Mat;-1 éÍ um partido;-1eéfé1lo. Port;-rnto,seucansrna não se traduz em número de votos, embora sua lingu;-1gern permeada d~ metáforas rurnis sej;-1 de agrado do homem do póvo juiz-cle-forano. Jw~ de Fo~a é a _terra do vice-presidente da República, !tarnar F,ranco, ~ amigo nac1onal1sta do doutor Aureliano Chaves e do mdefect1vel Jose Aparecido, o homem que estú cm todas as bocas do poder. Sem querer desqualificar a CPf do PC Farias, Leonel Brizola teme que a subida de Itamar Franco engendre a hegemonia do PMDB de Horestez Cuércya no poder. ' ,Luzinácio Lula at;-1ca a aproximação de Brizola e Col lor, dizendo que o l!der mar,1gato confunde legalidade com irm~ralidade, como se ele qwsesse ser o candidato de Collor em 1994. E difícil destrinchar o labirinto político de 1992. Oxalá tenha Col lor o saco roxo para apoiar em 19?4 Leone~ Brizola, o inimigo rnort;-1] do doutor Roberto Marinho. ('i. cOisaanda taoc5mfusa que,ern 1992, ltamar Franco é o Jangode Antômo Carlos M;-1g;-1lhaes: o Jango impossibilitado de substituir Fernando Collor. Donde se conclui que se fosse outro vice-presidente, a Rede Clobo teria derrubado o governo Collor. Jui~ de Fora ferve em fofocagem com ,1 perspectiva do pernedebista Tarcís10 Delgado ganhar a Prefeitura em 1992. Com fama de ter sido bom prefeitó, Taréísio Delgado - sob a ótica nacional - pode ser a ponta de lança do famigerado quercismo em Minas Gerais, embora ele não morra de amores pelo presidenci;-ível p;-1ulistc1. Há quem diga que Horestez Cuércya é o neo-Adernar de Barros, fenômeno confinado ao estad? de São Pc1ulo. A consciência progressista da cidade sonha com um d1sque-Cuércya na Zona da M;-1ta. E difícil imaginar que Tarcísio 8
Delga?o ch~gue a té1l ponto, seguin~io os pélssos do Requião no Parar~á; tod~vm 1m11ta ~e,~te q~1e Sé1?edaam1zadedeTarcísio Delgado com NiJo Bél~rsta e Wald,r Pires m1é1gmé1 que ele depois de eleito prefeito er~11992 - mgresse no PDT para fazer uma monu menta 1glasnost no pa rt,do de Leonel Brizola em Minas Gerais. A perguntél que. corre :10 meio universitário é a segLúnte: por que Tarcís10 Delgado a111da nc10 abandonou O PMDB? Córn o seu senso pragmé1tico, ele Sélbe que o PMDB ern Minas Gerais é bern estruturado e cheio da grnna, de modo que deixé1-loé1goré1 signifiG1 é1brirespé1ço para Newton Cardoso tomm cont~ ~io partido. Assim configura-se u.rna situação .assc1z par;-1doxal: Tar~1s10 Delgé1do é um político progr~ssrsta em âmbito regional, mas nacionalmente esté1 filiado a um partido de direita. A história corno pesadelo volté1 a afligir a consciência progressist~: em 1986 a vitória de Alberto Bejani em Jlliz de Fora prenuncia a vitórra de Fernando Col lor em 1989. Resta saber se a vitória de Tarcísio Delgado em 1992será o prelúdio da ascensão de HorestezCuércyaem 1994. Ou, pensando na melancólica abstenção eleitoral de 1992: a derrota do PT em Juiz de Fora espelhará a clerroG1da nacional de Luís Inácio Lula em 1994, • • • ' • os Exerçamos a f utur? 1ogra, essa c1enC1él que substitL!ru a 1~~storn~ n últimos trinta éll10S. Citemos élS pé1la:1ras de Leonel Bnzola: A_s olrgar·.,.s olham 94 e temem o que w11 acontecer. Porque 94 w11 ser um q U 1" ento nc1 historia ' . b rasr·1erra . que so' ocorreu em 50, qu;-111 d o V arg "'5 Om rn · - e tc1rnbem - él 1·1. cou be renovaçao - do eongresso". venceu as ele1çoes A
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A LÓGICA DO INQUÉRITO ABAFADO
"Hoje, doentes, doemos em,j o'/ares
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Darcy Ribeiro
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ala-se mujto no Brasil dos anos 90 em ética e política, como se houvesse em cada esquina um Aristóteles, ainda que tal retór~ca de candidatotenhasempreobjetivoprngrnático,poisoternadarnoral1dade é que rende votos. O sabichão Horestez Cuércyé1 jé1 bolou seu slogan de campanha para 1994: desenvolvimento com moralidade. Longe de mim pôr minha mão no fogo em relé1ção à probidé1de_de Fernando Collor; todavia me vem à lernbi·ança um deslurnbrnnle artigo de Ortega yGasset sobreMirabeau,o político. Nele o pensador espanhol sustenta a idéia de que um homem escrupuloso não pode ser um homem de ação. O ternperé11nento ativista não tem nada a ver com escrúpulo. Este é um valor mais para o intelectual que vive imerso na cor~templação. O homem executivo, impulsivo por llé1tureZé1, não pod_e grnar-s~ pelo valor do exemplo, ou ter em mente a idéia fixé1 da imoralidade. E burrice acusar de imoral O grande político. Evidentemente Ortega y Gasset não estava pensando- em Fernando Collor, e sim em César,Napoleãoe Mirabeau. Em todo caso, oalardeda mídia para caçar PC F~rias 1~ão resulta de nenhuma preocupação estóica em torno da apraxra do mtelectual ou do agir inescrupuloso do político. . A_ telen_ove~é1 brasileiré1 percebeu que o público gosta de ver no v~d~o a ndrculanzaçao da chamada classe polítiG1. Em toda telenovela osuJe1to politico é sempre um escroque, jé1rnais um cidadão preocupado com a organiZé1ção da polis. Convém aqui repisar a tese deste livro: Fernando Collor se elegeu porque captou este clima emotivo-ideológico da telenovela: todo político é safado. Não seria político se não fosse Il1é1Ucaré1tercorn talento parn enganarosoutros. O problemaéquea esquerda não tem ao pé de si um PC Farias. Ela não pode cotlté1r com um esperto
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