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Portuguese Pages 81 Year 1994
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A ESCRAVIDÃO NO BRASIL
JAIME PINSKY
Copyright O 1988 Jaime Pinsky Coleção: REPENSANDO A HISTÓRIA | Coordenador: Jaime Pinsky Projeto de Capa: Sylvio de Ulhoa Cintra Filho Revisão: Rosa Maria Cury Carodoso Composição:
Veredas
Editorial
|
o iprestão e Acabamento Gráfica Círcul
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
P725e
Pinsky, Jaime, 1939Escravidão no Brasil / Jaime Pinsky—13º ed. — São Paulo: Con-
texto, 1994. — (Repensando a história)
Bibliografia. 1. Brasil - História - Abolição da escravidão, 1988 I. Título. 84-2276
1º a 6º edições: Global Editora 7% edição: Editora CONTEXTO 13º edição: setembro de 1994
CDD - 981.0435
- abril de 1988
1994 Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei. Todos os direitos reservados à EDITORA CONTEXTO (Editora Pinsky Ltda.) Rua Acopiara, 199 — 05083-110 — São Paulo — SP Fone: (011) 832-5838 — Fax: (011) 8392.2561
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Cecília, Moisés e Isaac, irmãos queridos
Para todos os negros, também irmãos, que lutam pela dignidade de sua raça
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RUGENDAS — Engenho de açúcar
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Jaime Pinsky às vezes nega, mas adora ser professor. Já deu aulas na UNESP, USP e atualmente na UNICAMP, onde trabalha no Departamento de História.
Nascido em Sorocaba, ainda torce para:o São Bento, mas só assiste a jogos -do seu segundo time, o São Paulo, clube da cidade de
que ele mais gosta no mundo — junto com Salvador e'Paris, corrige. Fez pós-graduação, doutorado e livre-docência na USP. E titular na UNICAMP, “por concurso”, diz ele. Há tempos desenvolve atividade editorial, tendo criado e dirigido, junto com um grupo de intelectuais, as revistas Debate e Crítica e Contexto. Foi também o criador da Editora da UNICAMP, que dirigiu durante quase quatro anos.
Não é, contudo, o estereótipo do intelectual pálido e doentio. Gosta do sol e já foi fanático pescador, desses de varar a noite espe-
rando uma garoupa morder a isca. Abandonou a pesca pela caça submarina e não é raro vê-lo chegar a uma cidade litorânea, convidado para curso ou conferência, arrastando uma mala cheia de material para esse esporte.
Em São Paulo só anda de moto, pelo horror que tem ao trânsito e pelo prazer de ser motoqueiro. Sua grande paixão, porém, é a corrida de pedestres, responsável
pelo seu maior orgulho: ter completado, por duas vezes a corrida de
São Silvestre, tendo chegado entre os primeiros cinco mil...
Publicou artigos e livros como Cem textos de História antiga, As primeiras civilizações e Origens do nacionalismo judaico, entre muitos outros. Está escrevendo um romance há anos, mas não sabe se vai publicá-lo algum dia. Por outro lado gosta de receber cartas de leitores e costuma não deixá-las sem resposta.
A
seguir,
formulamos:
Jaime
Pinsky
responde
a quatro
questões
que
1. Após cem anos da abolição, qual a visão que se deve ter do negro escravo: submisso e amorfo ou inconformado e contestador? E, afinal,
a nossa escravidão foi mesmo branda e sem conflitos, como desejam
alguns autores?
R. Creio ter enfatizado neste livro tanto o caráter brutal da escravidão
como
o inconformismo do negro com a sua situação de escravo. Na
verdade, ele nunca deixou de lutar, na medida de suas possibilidades,
contra a opressão. Acontece que a historiografia oficial procura vender
a idéia de um escravismo brando, de um negro amorto, para “demonstra” que a História do Brasil se desenvolveu sem conflitos; uma histó- . ria sem oprimidos e opressores; uma história de paz social é o mito
que as classes dominantes querem impor. E a razão é simples: se aqui sempre .houve paz e harmonia — pretendem elas —-, não haveria nada que justificasse conflitos entre as classes. Desta forma, quaisquer levantes sociais, revoltas ou mesmo movimentos contrários à atual estruturação da sociedade, deveriam merecer a condenação
de todos, pois não passariam de iniciativas estra-
nhas à realidade brasileira, inspiradas por “ideologias importadas”. Noutras palavras, a idealização pacifista do passado procura justificar
a repressão a movimentos populares no presente. Nessa linha, recupe-
rar a verdadeira história da escravidão no Brasil significa não apenas a busca do conhecimento de fatos já ocorridos, mas uma forma de participação ativa no presente. 2. Quando se fala de escravidão esquece-se frequentemente do índio.
Alguns estudiosos asseguram que este não foi escravizado Dor causa de seu “forte instinto de liberdade”. Existe este “instinto” ou é pura fantasia? O índio sofreu da mesma forma que o negro os horrores da escravidão? |
R. E comum encontrar em certa literatura histórica a idéia de que o índio era livre por vocação, enquanto o negro ajustava-se melhor à escravidão. Nenhum homem tem vocação para escravo, assim como nenhum ser humano nasceu para burro de carga, ou para servo, ou para operário superexplorado. Todos nascemos para usufruir a vida e não para produzir para que outros a usufruam graças ao nosso trabalho. E um mito a idéia de que algumas pessoas nasceram para gozar a vida
enquanto outras só têm talento para trabalhar. Ocorre que grande par-
te da população é constrangida a trabalhar quase sem descanso para
poder sobreviver, enquanto outra usufrui. Fica claro, pois, que “espírito
de liberdade” é algo presente em todos os homens, não em alguns apenas. O Índio, durante muito tempo, foi legalmente aprisionado no Brasil e escravizado. Querer torná-lo, agora, o único com espírito de lIiberdade, Significa, de fato, por oposição, tentar demonstrar o “espírito de escravo” inerente ao negro. O que é uma evidente mentira. 10
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3. A escravidão no Brasil é um fato totalmente do passado ou não? Afinal, não há democracia racial em nosso país? R. Basta olhar em volta para perceber que a maior parte da população negra no Brasil se encontra entre as camadas mais pobres da população. E que o preconceito racial convive com o preconceito social, mas não pode se confundir por inteiro com ele. E comum ouvirem-se frases do tipo “nada tenho contra o negro desde que ele saiba o seu lugar”, que demonstram claramente não ser a questão negra no Brasil apenas
assunto para debates fechados na academia, porém problema vivo e cotidiano. A herança escravista continua permeando
nossas relações
quando estabelece distinções hierárquicas entre trabalho manual e intelectual, quando estabelece habilidades específicas do negro (samba, alguns esportes, objeto sexual), e mesmo quando estabelece a discri-
minação de forma evidente. Basta verificar a maneira como são trata-
dos negros em batidas policiais, portas de clubes elegantes e mesmo
hotéis, restaurantese edifícios residenciais. Esconder o problema é uma forma de não resolvê-lo. 4. Mudando um pouco o sentido das perguntas, é possível reconstruir o sofrimento do povo sentado atrás de uma escrivaninha? Quando
surgiu em você a “necessidade”, se se pode chamar assim, de pesqui-
sar o passado escravista?
R. O historiador pode atuar tanto para revelar (no sentido original da palavra, tirar o véu) a história como para ocultá-la. Minha opção é a de procurar transformar o conhecimento histórico num instrumento de luta. Quando o povo recupera sua luta e seus heróis e toma consciência de que nem sempre os heróis das classes dominantes são Os seus, ele (o povo) terá mais facilidade de encontrar o seu caminho. Veja bem, não creio que caiba ao intelectual pular, mas fornecer instrumentos sejam encontrados melhor e mais Devo confessar que, relendo
apontar os caminhos para a luta poque permitam que esses caminhos rapidamente. este meu livrinho, noto que ele está
pleno - talvez demais - de “ira sagrada”, sede de justiça, envolvimento com os oprimidos. E que no processo de elaboração do texto me envolvi profundamente com o personagem e me tornei negro e escravo. Filho de imigrantes oprimidos na Europa, identifiquei-me facilmente com os oprimidos, em qualquer tempo ou espaço. Assassinar a memória não é uma forma eficiente de redimir o passado. Para mim a escravidão não é apenas uma “instituição histó-
rica” ou um “modo de produção” mas uma maneira de relacionamento entre seres humanos.
do te par a zar rci exo a ará ili aux nos o est hon udo est o que io Cre passado da qual não temos razão para nos orgulhar. 11
RUGENDAS
— Mercado de escravos
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A escravidão se caracteriza pela sujeição de um homem pelo outro, de forma completa: não apenas o escravo é propriedade do senhor, como sua vontade está sujeita à autoridade do dono e seu trabalho pode ser obtido pela força. Esse tipo de exploração não se limita, pois, à compra e venda da força de trabalho, como acontece, por exemplo, no capitalismo, em que o operário fornece sua força de trabalho ao capitalista por um preço determinado, mas mantém sua liberdade formal. Na escravidão, temos uma transformação de um ser humano em propriedade de outro, a ponto de ser anulado seu próprio poder deliberativo: o escravo pode ter vontades, mas não pode realizá-las. A escravidão não é recente na história da humanidade. Já na Antiguidade verificamos sua ocorrência. Na Mesopotâmia e no Egito, quando da execução de obras públicas como barragens ou templos, grande número de trabalhadores era recrutado. Tornavam-se propriedade dos governantes que lhes impunham sua autoridade e determinavam as tarefas. Não eram, contudo, vendidos e sua atividade podia
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cessar quando do fim da construção, retornando os trabalhadores às suas tarefas anteriores. As relações que estabeleciam com seus proprietários eram eventuais, diferentes daquelas que ocorriam na Grécia
— principalmente Atenas — e Roma, onde a escravidão era a forma mais característica de extração de trabalho. Escravos eram comprados ou obtidos, após saques e batalhas e nunca perdiam — à exceção de casos isolados - sua condição. A organização das sociedades ateniense e romana baseava-se, em grande parte, na existência do escravo que, com seu trabalho, gerava riquezas para elas. Tão comum era a idéia da existência do escravo na Antiguidade
Clássica que Aristóteles costumava dizer que o escravo, por natureza, não pertencia a si mesmo,
mas a outra pessoa. Na verdade, o que ele
dizia é que existem pessoas que a natureza destinou a serem livres e outras que foram por ela destinadas a serem escravas. Com isso, O 13
filósofo grego escondia o caráter principal da escravidão, qual seja, sua historicidade. Porque o escravo não o era por natureza, mas por força de condições históricas específicas que se desenvolveram de uma forma na Antiguidade Oriental — Egito e Mesopotâmia — e de forma diferente na Antiguidade Clássica — Grécia e Roma. As diferenças históricas concretas é que nos levam a falar da forma pela qual a sociedade se organizava nos diferentes locais e momentos para explorar a força de trabalho. Por isso é que costumamos falar de um “modo de produção asiático” no caso do Egito e Me-
sopotâmia e de um “modo de produção escravista”, no caso de Grécia
e Roma. Trata-se de formas diferentes de organizações sociais e políticas que geravam maneiras diferentes de exploração de força de trabalho. Historicamente, pertencem ao passado e foram superadas por outras formas de organização. Por que, então, muitos séculos depois, o escravismo no Brasil? Teria sido um retorno a relações de produção que ficaram no limbo da história ou se trata de um outro tipo de escravismo? Nesse caso, quais
as condições históricas que propiciaram o aparecimento, aqui, de relações que implicam a sujeição total da vontade de um ser humano pelo outro? Este pequeno texto pretende mostrar, de forma clara, a origem da escravidão no Brasil, suas características gerais, apogeu e ocaso. Não pode esgotar o assunto, mas objetiva chamar a atenção do leitor para alguns pontos que ele poderá — e deverá — aprofundar depois, dentro do seu campo de interesse. A escravidão no Brasil decorre da “descoberta” do país pelos por-
tugueses. Antes de sua vinda, não há registro das relações escravistas
de produção nas sociedades indígenas. Os casos esporádicos de cativos feitos após lutas entre tribos não afetavam a estrutura econômica nem as relações de produção no grupo vencedor. Por outro lado, ao contrário do que muitos pensavam, não se deu
no Brasil a primeira experiência portuguesa com a mão-de-obra escra-
va. Ela já vinha de bastante
tempo antes e tinha se desenvolvido a
partir de 1441 quando Antão Gonçalves regressou de uma expedição ao Rio do Ouro, carregando consigo meia dúzia de azenegues captu-
rados na costa do Saara, na África, para o Infante D. Henrique. Portugal
encontrava-se,
naquela
ocasião,
com
sua
população
desfalcada não apenas devido à guerra de independência contra Castela e a uma série de epidemias que grassaram em seu território, co-
mo, principalmente, em função da aventura colonial que deslocava
mão-de-obra útil para a Africa e as Indias de forma maciça. A presença da mão-de-obra escrava permitiria uma intensificação da migração para o ultramar. Numa população de um milhão e meio de habitantes,
para o século XVI, os estudiosos estimam a emigração em quase
14
trezentas
mil pessoas.
Assim,
O escravo seria uma compensação ao
menos parcial, dessa perda populacional, uma condição para viabilizar as chamadas “conquistas ultramarinas”. De início, a obtenção de escravos ocorria de forma mais ou menos aleatória. As expedições portuguesas iam atrás de riquezas da costa noroeste da Africa e o rapto de nativos, arrancados de suas casas, fazia parte do conjunto de atividades a que se dedicavam os lusttanos. Logo, porém, saem especificamente para isso. Em 1444, por exemplo, seis caravelas partem de Portugal, com o objetivo exclusivo
e declarado de apresar escravos ou, como diz o cronista, vergonhosa cousa serya tornar pera Portugal sem avantajada presa. A expedição de 1444 dá bem uma idéia dessa fase de caça aos escravos, pela violência e desfaçatez. Chegando a uma pequena ilha, os portugueses deram sobre eles, matando e prendendo quanto podiam. O resultado foi cento e sessenta e cinco prisioneiros. Numa segunda ilha prenderam mais sessenta e finalmente, no Cabo Branco, sequestraram catorze homens que encontraram pescando e uma moça que estava dormindo. A volta da expedição a Portugal, com mais de duzentos escravos, entre negros, mulatos e brancos, foi saudada de forma entusiástica, o que contrastava com o estado de espírito dos cativos, uns se lamentando em voz alta, outros caminhando cabisbaixos e outros, ainda, au-
toflagelando-se. O cronista que nos legou essa descrição (Zurara) afirma ter, de início, se emocionado com o quadro. Logo, porém, lembrou-se que os males físicos e a perda da liberdade dos africanos eram amplamente compensados pelo “caminho da salvação espiritual”
que a conversão ao cristianismo lhes propiciaria. Como vemos, vários elementos “justificadores” da escravidão no Brasil (inclusive o papel
colonizador da religião), já aparecem
desde o início do escravismo
português.
Em poucos anos, as expedições ocasionais dariam lugar organização mais sofisticada. Um forte português, construído de Arguim, a 80 km ao sul de Cabo Branco, dá origem a uma através da qual os negociantes lusitanos compravam escravos
a uma na Ilha feitoria, negros
que os azenegues, intermediários do negócio, iam buscar no interior da
Africa. A moeda de troca eram tecidos, trigo, sal e cavalos; cada um destes chegava a valer vinte bons escravos. A população negra em Portugal cresceu muito no século XV e, embora não se tenha dados gerais confiáveis, são comuns as referências de autores da época a respeito de sua importância numérica, tan-
to em atividades agrícolas, como em serviços domésticos. Por outro lado, os comerciantes portugueses procuram — mesmo contra O inte-
resse da alegada necessidade de repovoamento de Portugal — vender 15
escravos para outros locais, como a Espanha. Verificamos assim, que, ao lado do interesse português na presença do escravo como fonte de trabalho e serviços, já encontramos o negro-mercadoria, aquele que era tratado pelo comerciante da mesma forma que a malagueta ou o marfim africanos. Esses comerciantes portugueses terão todo o interesse em abrir
novos mercados para aquele produto — o negro africano — que parecia
existir de forma inesgotável e pronto para ser negociado. Assim, tratam de abastecer Espanha e Itália e, principalmente, as ilhas mediterrãneas produtoras de açúcar e, em seguida, suas próprias ilhas atlânticas — Madeira, São Tomé, Açores e Cabo Verde. Não será exagero dizer que, no decorrer do século XVI, já se podem encontrar vários dos elementos explicativos da grande lavoura escravista que se desenvolverá mais tarde no Brasil: traficantes, escravos africanos — força de
trabalho e mercadoria — e a grande lavoura açucareira. Dir-se-ia que 0 ensaio fora aprovado. Texto e personagens estavam certos. O local da ericenação é que mudaria. Para o Brasil.
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Antes de chegar à escravidão negra, a História do Brasi, já em
seu primeiro século, registra a utilização do trabalho do índio. Interessados logo nos chamados produtos tropicais — notadamente o paubrasil — os membros das primeiras expedições tratavam de consegurr, em troca de algumas quinquilharias, a força de trabalho indígena. Enquanto os produtos oferecidos pelos portugueses atraíam os índios, o sistema de trocas funcionava bem: o pau-brasil e os alimentos desejados eram conseguidos. Seja, porém, pelo ritmo de trabalho dos Índios, seja pelo seu desinteresse total em servir os portugueses uma vez satisfeita a curiosidade pelos produtos europeus, o escambo não mais resolvia a necessidade dos comerciantes lusitanos. Partiu-se, então, para a escravização do índio. Embora seja difícil aferir a extensão do regime escravista completo para a mão-de-obra indígena no Brasil (com as características de perpetuidade, transmissão hereditária por via materna e irrestrita alie-
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nabilidade), não há dúvida de que não se tratou de casos esporádicos como se poderia pensar, mas de algo regulamentado pela Coroa portuguesa e que atingiu caráter amplo no espaço e no tempo. E verdade que a legislação variou bastante, estabelecendo inúmeras restrições à escravidão do índio — logo veremos porque o negro era mais interessante — mas os autores encontraram várias circunstâncias em que O aprisionamento e a escravidão do índio brasileiro podiam ser legitimados.
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As guerras justas, por exemplo, eram aquelas que deviam ser travadas — uma vez autorizadas pela Coroa e pelos governadores — em legítima defesa contra tribos antropofágicas. Nelas se justificava tomar escravos, como ilustra esta passagem
da História do Brasil de
Frei Vicente do Salvador: “De tudo isto informado, o governador Matias de Albuquerque mandou suster na jomada Antonio Lopes de Oliveira e os mais
se
capitães que iam da Paraíba, até se informar melhor do caso e
tomar conselho sobre a justiça da guerra, para o que fez ajuntar em sua casa os prelados das religiões, teólogos e outros letrados
canonistas e legistas. E concluindo-se entre eles sera causa da
guerra justa, e pelo conseguinte os que fossem nelas tomados, escravos, que são no Brasil os despojos dos soldados, e ainda o
soldo, porque o gentio não possui outros bens, nem os que vão a estas guerras recebem outro soldo (...)”. É interessante constatar que a força de trabalho do índio é considerada um bem que à falta de outros lhe será tomado como botim de guerra, pelos soldados. Estes, por sua vez, farão do índio o seu soldo.
E tudo isso considerado justo por teólogos e letrados cronistas... As expedições de apresamento, que celebrizariam os paulistas, tinham por objetivo expresso a caça ao Índio. A se confiar nos números geralmente apresentados, cerca de trezentos mil indígenas foram aprisionados e escravizados, dos quais uma terça parte transportada
para outras capitanias. Várias outras formas de escravidão ocorreram, umas formais, outras informais, inclusive a escravidão voluntária. Com suas formas de existência desestruturadas, frequentemente o índio via-se obrigado a se vender ou a entregar algum familiar em troca de um prato de comida. A legislação portuguesa permitia também a escravização de filhos de negros com índios. Uma vez atraído a um engenho, o índio, na prática, ficava retido e seu filho era formalmente escravo. Já em pleno
século XVII! há documentos que se referem à prisão de índios vagabundos e sua remessa a proprietários de terra. E fácil perceber que por índio vagabundo designa-se o índio livre e que sua escravização tornava-se corolário de seu aprisionamento. Como se pode ver eram diversas as maneiras pelas quais se re-
duzia O índio à escravidão completa. Além disso, havia outras formas
compulsórias de extração da força de trabalho indígena, como a “administração”, as reduções jesuíticas e até mesmo o assalariamento. Com frequência esses sistemas impunham regime de trabalho mais severo do que a escravidão propriamente dita. Um sistema muito curioso era imposto aos índios das missões: durante um semestre, serviam nas próprias aldeias e no outro atendiam às necessidades dos moradores. O salário era predeterminado e todos, de 15 a 50 anos, deveriam prestar esse trabalho. Sem nenhuma responsabilidade —- e sem nenhum custo inicial — cada patrão procurava extrair do índio o máximo — não respeitando horário nem carga de trabalho. Assim, além de deslocado do seu ambiente e sujeito a doenças comuns ao europeu, mas arrasadoras para si, O índio via-se submetido a condições de vida e de trabalho terríveis. O
que terá contribuído, enormemente, para a queda da população indí-
* gena em áreas de “colonização” branca.
Caberia aqui a pergunta: por que a mão-de-obra indígena escrava desapareceu? Primeiramente
seria necessário
relativizar o alcance da própria
pergunta. Hoje já sabemos que o cativeiro do índio não é simplesmente um fenômeno
imediatamente posterior ao escambo, sendo logo em
seguida substituído pelo escravo africano. Na primeira metade do século XVII, por exemplo, há um recrudescimento do processo de apresamento do indígena, quando, por decorrência da presença holandesa, surgiram dificuldades no tráfico negreiro. De qualquer forma, mesmo relativizada, a questão é válida: por que o negro, se o índio poderia ser escravizado”? Vários argumentos se colocam aí: a fraca densidade demográfica
da população indígena no Brasil, o fato de as tribos ficarem cada vez mais arredias, a partir da percepção do interesse do branco em escravizá-las: a dizimação dos indígenas através da superexploração de sua força de trabalho; a proteção jesuítica, etc. Não
se pode, contudo, deixar de lado um
aspecto essencial da
questão: o interesse da Coroa e dos traficantes. Enquanto que a captura do Índio era quase um negócio intemo da colônia — quando, frequentemente, até o quinto devido à Coroa era sonegado — O comércio ultramarino trazia excelentes dividendos tanto ao governo, quanto aos comerciantes. Assim, govemno e jesuítas apoiavam indiretamente os traficantes, estabelecendo limitações à escravidão indígena — em nome de Deus.
Em negra?
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Nada mais equívoco do que dizer que o negro veio ao Brasil. Ele foi trazido. Esta distinção não é acadêmica, mas dolorosamente real e
eso que ter cará O er lec abe est ar tent e pod se que é dela ir part a só
cravismo tomou aqui. Na verdade, o negro foi trazido para preencher o papel de força de trabalho compulsório numa estrutura que se organizava em função disso. A grande lavoura colonial não se preocupava em prover O Sustento dos produtores, mas em produzir para o mercado. Dessa forma, a “racionalidade” e a eficiência de sua organização só podiam ser avaliadas na medida em que atingissem esses objetivos para os quais O escravo era fundamental, Autores significativos têm procurado designar a especificidade da organização da grande lavoura, visando melhor compreender a necessidade que ela tinha do braço escravo. Assim, pode-se afirmar que .
uma característica sua era a de produzir gêneros destinados ao mer-
cado mundial. Outra, era de funcionar por equipes, a partir de um co-
mando
unificado. Realmente, a estrutura de poder na grande lavoura
baseava-se na família de proprietários — da terra e dos escravos — sob
cuja direção gravitavam feitores, agregados e principalmente os escra-
vos. Note-se aqui a flagrante distância entre esta forma de organização de trabalho centralizada e a organização feudal, onde pequenas
unidades produtivas de caráter familiar dispunham de relativa autono-
mia. Na grande lavoura, horários, tarefas, ritmo e turnos de trabalho eram todos determinados pelo proprietário e sua equipe.
Outro aspecto que não pode ser menosprezado é a complexidade das atividades que costumava apresentar uma unidade produtiva — “fazenda e engenho — da grande lavoura. Pois não se tratava de uma atividade simplesmente agrícola, mas também do beneficiamento de -
um produto da lavoura. A complexidade e mesmo a diversidade das atividades de um engenho exigiam um número bastante expressivo de
braços. Em levantamentos documentais que fizemos, raramente encontramos um “engenheiro” (dono de engenho) com menos de cinquenta escravos, quando se tratava da produção de açúcar. De resto, o investimento inicial em aparelhagem cara só se tornava viável com uma grande produção. E verdade que o dono do engenho recebia tam-
bém, para beneficiamento, a cana de pequenos proprietários. Contudo, na própria base de sua atividade, estava presente a mão-de-obra es-
crava, adequada à grande lavoura, ao comando unificado e à formação
de equipes de trabalho relativamente cordatas - até por força da condi-
ção a que foi submetido o negro.
Não
é por acaso que pequenos engenhos,
as engenhocas, de
custos inicial e operacional bem mais baixos, funcionavam com núme-
ro bem menor de escravos e, no limite, até sem eles. Seu próprio obje-. tivo era outro, a produção da rapadura ou cachaça, mercadorias que
colocavam na região e não no além-mar. E importante perceber que não são essas unidades produtivas que caracterizam o regime escra-
vista de trabalho, mas são subprodutos dele. O fundamental é a grande lavoura. Vale a pena exemplificar.
Em pesquisa realizada na região de São Sebastião, litoral norte
de São Paulo, notamos, para o fim do século XVIII, uma significativa população escrava, vinculada à grande lavoura açucareira. Lá por
1820, o café, que vinha sendo plantado esporadicamente, passa a. se
constituir no principal produto de exportação. A força de trabalho es-
crava é deslocada
para esta atividade, diminuindo, de forma sensível,
a produção do açúcar. Claro está que tanto o açúcar quanto o café tinham por destino o mercado mundial. Notamos, por outro ladó, um
grande aumento da produção de aguardente, com a utilização de pequenos grupos de escravos colhendo a cana e movendo engenhocas.
Os documentos permitem afirmar que, ao contrário do açúcar e do café, a aguardente é quase toda consumida local e regionalmente; uma parte muito pequena da produção iria servir de moeda de troca por escravos, junto a grupos africanos. A propriedade escravista (para a produção do açúcar, antes, e do café, depois) era, portanto, a característica principal da agricultura bra-
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sileira do período colonial e durante todo o século XIX.
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Havia, evidentemente, outros tipos de ocupação da terra, como também outro tipo de destinação para os escravos. No entanto, exceto na extração aurífera na região de Ouro Preto, as atividades dos escravos não podem ser superestimadas. O fato de se saber de escravos
em inúmeras atividades — como veremos em outra parte deste livro — não altera o dado fundamental de que a presença do negro escravo esta vinculada à forma de organização de produção na grande lavoura de exportação. E, é claro, ao interesse dos traficantes.
22
O CATIVEIRO
Lembramo-nos
sempre da origem africana dos escravos. Poucas
vezes, contudo, perguntâmo-nos sobre sua forma de existência na África. Na verdade, acabamos sendo devorados pela ideologia escra-
vista que trata do negro como sendo “naturalmente” escravo, ao con-
trário do índio. Ora, isso ocorre porque o índio era visto em estado de
liberdade, enquanto o negro, ao chegar aqui, já tinha passado pela ex-
periência da captura, escravização, transporte através do mar e o con-
sequente desenraizamento, deslocado que era do seu habitat e de sua organização social. O fato é que tachar as sociedades negras de “atrasadas” ou
“primitivas”, simplesmente é, não'apenas um preconceito injustificável
— embora explicável — mas um erro histórico. Já no início do tráfico mercantilista podemos reconhecer desde grupos que poderiam ser en-
quadrados dentro da categoria “comunismo primitivo”, como povos já divididos em classes sociais e sociedades tribais-patriarcais. Agricultura, pecuária, artesanato com madeira e metais eram atividades econômicas que desenvolviam ao nível do que havia de mais adiantado na época.E se praticavam a escravidão — o que é inegável — faziamno de maneira bem diferente daquela que se desenvolveria a partir do tráfico mercantil. O tráfico era muito reduzido, escravos eram geralmente prisioneiros de guerra e após algumas gerações as relações escravistas eram eliminadas. A escravidão por dívidas e a venda de
membros da família devido à fome também ocorriam, mas sem maior
significado numérico. E verdade também que antes do século XV, mercadores árabes levavam escravos negros para haréns ou para a escravidão doméstica que persistiu no Mediterrâneo na Idade Média. Mas nada disso — nem mesmo as eventuais grandes lavouras de reis negros na própria Africa com
mão-de-obra escrava — assemelhava-se
ao tráfico mercantil que iria alterar profundamente as sociedades africanas, desorganizando-as do ponto de vista político, econômico, demográfico e sócio-cultural.
Por força de produtos que os europeus ofereciam em troca, al-
guns grupos
de negros
passaram
a ter no apresamento de escravos
sua principal atividade econômica. Em diferentes períodos, o escambo
era feito com tecidos, trigo, sal e cavalos, mas desde logo, armas €
munições passaram a desempenhar um papel fundamental. De fato, O
grupo que dispunha de armas de fogo adquiria enorme superioridade
relativamente a outros, permitindo-lhes escravizar — e não ser escravizado — graças às suas vantagens bélicas.
A partir do aumento de contato com a América, outros produtos
passaram a ser trocados por escravos, como o tabaco, a aguardente e
E
Bo
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o açúcar. Assim, O sistema mercantil nos revela um elemento muito importante de sua perversidade intrínseca: escravos eram adquiridos pelos traficantes em troca de mercadorias produzidas pela força de trabalho escrava; e os novos cativeiros teriam por função reproduzir essa cadeia diabólica. A captação do escravo se dava principalmente
através de cidades portuárias como Luanda ou Benguela — que tinham conexões com agentes que, por sua vez, iam até regiões do interior - para a realização do escambo. Dessa forma, uma rede extremamente complexa estimulava aquilo que era para os traficantes um comércio de mercadorias, de bens de troca e para os negros cambo, troca de bens de uso.
um simples es-
ES JEOOULJÇÇ T OÕOÕOO ES! jP POTES
A ORIGEM Afirmar-se que os escravos foram trazidos inicialmente da Guiné
não é esclarecer muito as coisas. Olhando-se num mapa moderno da
Africa Ocidental, poder-se-ia pensar que todos os negros eram originários da região onde fica hoje o estado denominado Guiné. Contudo, na
época, o nome era usado de forma muito genérica e devia incluir toda
a região que vai da embocadura do rio Senegal — limite da região desértica entre Senegal e Mauritânia — até o do rio Orange, no atual Gabão. Por isso, durante os dois primeiros séculos, quase todos os escravos eram “da Guiné”, mesmo sem sê-lo. À origem dos primeiros escravos identificou a região. Na verdade se essa “Grande Guiné” foi uma das zonas de origem do negro escravo, Angola foi outra. Através de seus portos, como Benguela e Luanda, sem dúvida um número muito grande de negros
foi enviado, desde o início do tráfico. De outras regiões, como ilhas africanas ocidentais, ou zonas na Africa Oriental - como Madagascar e Moçambique — o tráfico foi menor, embora não desprezível. Deve-se, contudo, lembrar que o porto de origem do escravo não
tinha, necessariamente, relação com sua origem étnica. Como já vimos, a captação de escravos dava-se com fregiência, no interior, muitas vezes a distâncias significativas dos locais de embarque. Dessa forma poderemos notar uma grande variedade de grupos negros trazidos ao Brasil pelos traficantes (portugueses e ingleses, Os
mais expressivos já no século XVIII). Se temos os guinéus e os angolanos, temos também
os bantus, os sudaneses, e os minas, entre ou-
tros. A multiplicidade de etnias e clãs era decorrente não apenas do processo de apresamento do negro que, como vimos, variava com O tempo; decorria também do interesse que os senhores tinham em ter escravos de diferentes origens; isso, ao seu ver, representaria 24
diversificação de hábitos, lingua e religião, dificultando a integração da
população escrava e O surgimento de qualquer espécie de organização
conduzida por eles. Inicialmente interessados em cristianizar os “infiéis” — não tinha
sido essa a justificativa do início da escravidão negra? — os portugueces obtiveram
algum
sucesso nessa direção. Conseguiram converter
ao catolicismo vários reis e respectivas famílias na região do Congo. Em seguida, despejaram missionários, cuja função deveria ser a de
salvar as almas dos negros.
Já no século XVI, com o recrudescimento do tráfico e o interesse de mercadores e da Coroa portuguesa, o panorama vai se alterando.
Os missionários na África vão sendo substituídos por soldados e comerciantes; não se fala mais de um Estado cristão na África, fala-se de tráfico.
A justificativa da escravidão se desloca. A cristianização torna-se
um assunto a ser resolvido nos locais para onde os escravos seriam pensaser a sa pas os negr dos ça cren da ão zaç nei oge hom A levados. da em termos das vantagens ou desvantagens que poderiam trazer para seus algozes — traficantes e senhores. Como em qualquer organização social, as religiões africanas constituífam-se como decorrência de formas específicas de organização social. Assim, filhos de tribos pastoras ou agricultoras, habitantes de savanas ou de florestas, os negros eram desenraizados, aprisionados, vendidos, revendidos, escravizados, conduzidos ao porto e embarcados. Para uma longa viagem ao desconhecido. Dessa forma, nem seus deuses podiam auxiliá-los.
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A VIAGEM |!
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apar
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“Ontem a Serra-Leoa, A guerra, a caça ao leão, O sono dormido à toa Sob as tendas da amplidão
Hoje... o porão negro, fundo, Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar... E o sono sempre cortado Pelo arranco de um finado E o baque de um corpo ao mar...
(Castro Alves, “Navio Negreiro”) 2º
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O transporte dos escravos, ao qual só no século XIX a “civiliza-
ção branca” vai destinar poemas candentes como o citado, era, sem dúvida, uma forma de reduzir o negro à sua expressão mínima, de pre-
pará-lo para O que vinha. Tudo começava ainda em terra. Para fazer com que o navio ne-
greiro não perdesse demasiado
tempo tocando de porto em porto até
completar sua carga humana, construiram-se feitorias junto aos anco-
radouros. Sua função era reunir um grupo de cativos aguardando o navio e não o contrário. Os negros eram
que ficavam aglomerados
num depósito, constituído de barracos de madeira ou pedra. Eram relativamente bem tratados, mesmo quando tinham que trabalhar para sua
alimentação nas ocasiões em que os navios demoravam. Suas habita-
ções nada tinham a ver com os currais provisórios, cercados de paliça-
das, onde ficavam durante as longas caminhadas desde seus locais de origem. Chegando
o navio
negreiro
ao
porto, procurava-se
embarcar os
escravos à medida de sua chegada ao depósito. O temor de uma revolta dos negros estava sempre presente — o que deixa claro que não se tratava de rebanho cordato, mas de seres humanos orgulhosos — e imaginava-se que ninguém deveria ficar tempo demais nos depósi-
tos, para não semear o gérmen de uma rebelião. A propósito, é importante tentar avaliar bem a situação do negro,
antes de se acusá-lo de amorfo e submisso. Retirado do seu habitat, de sua organização social, do seu mundo, é natural que estivesse atemorizado diante de uma nova condição que, ao menos de início, nem chegava a compreender devidamente. Sem conseguir definir seu espaço social, sentia-se nivelado pelos captores aos demais cativos, oriundos de outras tribos, praticantes de outras religiões, conhecedores de outras linguas, vindos de outra realidade. Por isso, ele não se identificava com outros cativos, sentindo-se solto, perdido, sem raízes. Não entendia bem sua situação, reagindo com estupor e inércia às ordens. Sua tentativa de revolta, quando ocorria, era manifestação individual, por isso inconseguente. Não conseguindo interagir com os companheiros de cativeiro, não se organizava em termos de rebelião. Seu ato Isolado provocava uma pena considerada adequada pelos europeus. Ele aprenderia compreendendo que a alternativa à submissão
era o suicídio.
Outra alternativa não havia.
Na hora do embarque, ainda tinha que ouvir o sacerdote — que
ao colocar O sal em sua língua o batizava, pois pagãos não deveriam ir a um
pais cristao — insistir para que ficasse contente já que ia a um
pais onde aprenderia as coisas da fé: para tanto deveria deixar de “comer cães, ratos e cavalos”, 20
. em ig or de ís pa u se er ec qu es a ri ve de E ão aç lh mi hu s da vé ra at e ja re Ig o da çã ta ci ii so ar a iz al ri te ma ra Pa
— ele era, o av cr es de — ão iç nd co va no a su à o gr reduzir o homem ne À o. it pe no ou xa co na o, br om no o rr fe o a ad rc , ma em ag vi durante a
a st vi de er rd pe se é at s no me ao , os rr fe a o -l cá lo co praxe era também a costa africana. . ” a i r o d a c r r e e d m “ n a e f a a e v s d e a e d t u a g r t Claro que a lei portu liis do s, ia ár di s õe iç fe re ês tr as Exigia que ao escravo fossem fornecid dú de ra fo é s Ma . ca di mé o sã vi re se es fr so e tros e meio de água e qu traficans do e ss re te in s de õe iç os sp di as s da ri mp cu vida que só eram sistem
in mo co os os xu lu s ro ei uz cr a em ar lh me se as se tes e, longe de rio e a fo on sc de o a, ir je su a , me fo à s,
absurdamente
alguns
autore
. os gr ne s do em ag vi de os ir he an mp co am morte er s Un . el ív ss po mo xi má O ... era os vi na por os av cr es de ro me O nú mil de a rc ce — r io ma o vi na m nu os nt ce te se , la ve ra ca ma nu quinhentos cina o nc ci e nta tri de va ra mo de e qu em ag vi a m va ia ic toneladas — in de Janeiro, Rio ou a hi Ba , ife Rec até la go An de tir par a s dia ta quen
olonnuma viagem normal. Calmarias ou correntes adversas podiam pr
gar a travessia até cinco ou mesmo seis meses, tornando mais dan-
nrtescas as cenas de homens, mulheres e crianças espremidos uns co tra os outros, vomitando e defecando frequentemente em seu lugares, avam numa atmosfera de horror que o calor e o mau cheiro se encarreg
de extremar.
E claro que, num
ambiente
desses, grassavam doenças, fazendo
com que o fundo do mar se transformasse no ponto final da viagem de
muitos. Alguns autores procuravam minimizar a importância de escravos mortos na travessia, afirmando, não sem certa dose de razão, que
| ;
|
nenhum traficante teria interesse em perder sua mercadoria e que naquela época a viagem transoceânica representava um risco para todos, de forma que mesmo brancos sendo transportados ou até membros da tripulação morriam com frequência de escorbuto, avitaminose ou algum outro problema. O fato é que entre brancos, lá pelo século XVII, a taxa de mortalidade não passava de 1% em cada travessia, enquanto que os dados estimados para os negros são bem mais elevados. EEE
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MORRERAM?
QUANTOS NEGROS
Quantos negros morreram na travessia do Atlântico em direção ao
Brasil? Números divulgados recentemente por Herbert Klein confirmam
hipóteses que falavam que quatrocentos mil saíram da Africa e nunca
chegaram ao Brasil. Porém este número, por grande que seja, é apenas a ponta do iceberg da mortandade que consiste na transformação 21
do negro em mercadoria. Luiz Felipe de Alencastro, autor de profundo
trabalho, ainda inédito, sobre o tráfico negreiro, desvenda cruamente a dimensão trágica do tráfico. Segundo ele, 40% cos negros morriam
! [
n A
nos primeiros
seis meses
subsequentes
ao seu apresamento,
a cami-
nho do litoral. Doze por cento dos sobreviventes morriam durante o mês em que ficavam nos portos, aguardando o transporte. Durante a
travessia morriam 9 por cento dos que embarcavam e metade dos que
chegavam morriam durante os quatro primeiros anos de Brasil.
Desta forma, embora os números absolutos variem conforme a fonte consultada, o estágio atual dos estudos históricos aponta para as seguintes cifras:
negros apresados
8.330.000
mortos nos seis primeiros meses É
3.300.000
2.000.000
mortos no porto de embarque
600.000
mortos na travesssia
mortos nos quatro primeiros anos de Brasil LE
sobreviventes
4.400.000
sobreviventes
"400.000 4.000.000
sobreviventes
2.000.000 2.000.000
sobreviventes a
Assim de 8.330.000 negros aprisionados, só 2.000.000 consegui ram sobreviver mais do que cinco anos. Seis milhões de mortos. Um verdadeiro holocausto. Ser Mercadoria e Ser Gente
Deve-se colocar, portanto, a pergunta: se os traficantes tinham interesse no escravo como mercacoria por que o morticínio tão elevado? Por que os navios iam geralmente superlotados, não oferecendo condições mínimas de higiene e conforto? Para se responder a essas questões, deve-se pensar no tráfico como atividade econômica em que o escravo representava — na origem — a despesa menor. Possuir capital para colocar o navio no mar, equipá-lo, contratar tripulação, adequá-lo ao tráfico, adquirir comida pa-
ra a travessia — todos estes eram custos praticamente fixos, viajasse O
navio com duzentos ou trezentos escravos, por exemplo. Tendo certas
despesas,
ra
independentemente bhi
e e Ate rAP
LS
r o
do número
de escravos
transportado,
pagando pouco pelo escravo na África e recebendo muito por ele no Brasil, a perda eventual de 10% dos negros transportados era compen-
sada amplamente pelo maior número de escravos que o traficante teria para vender no seu destino. A morte dos negros na travessia tem que ser resgatada pela historiografia e compreendida dentro do seu caráter real. Ocorreu devido
à especificidade das relações de produção que se desenvolviam no Brasil e ao interesse dos traficantes em maximarem seus lucros. Não
“fatalidade” da natureza, mas
foi uma
Noutras palavras, coisa de gente.
determinação
uma
histórica.
TABELA | Africanos Desembarcados
Média Anual
Século
Total
1531 — 1575 1576 — 1600
10.000 40.000
222 1.600
XVI 50.000
1625 1650 1675 1700
100.000 100.000 185.000 175.000
4.000 4.000 7.400 7.400
XVII 560.000
1701 — 1710
153.700
15.370
1721 1731 1741 1751 1761
146.300 166.100 185.100 169.400 164.600
14.630 16.610 18.510 16.940 16.460
— — — —
1711
— 1720
1/71
— 1780
— — — — —
139.000
1730 1740 1750 1760 1770
13.900
161.300
16.130
1781 1791
— 1790 — 1800
160.900 233.700
16.090 23.370
XVII 1.680.100
1801 1811 1821 1831 1841
— — — — —
241.400 327.700 431.400 334.300 378.400
24.140 32.770 43.140 33.430 37.840
XIX 1.732.200 (apenas 50 anos)
1810 1820 1830 1840 1850
FONTE: Estatísticas históricas do Brasil. IBGE,
gros
Portos Brasileiros
Anos
1601 1626 1651 1676
Os
em
dados
revelam
escravizados
um
crescimento,
trazidos
1987, p.58.
praticamente
ao Brasil.
Observe-se
continuo,
uma
do número
de ne-
estabilidade bastante
grande no século XVlll e um aumento considerável no século XIX; em 50 anos desse século foram trazidos mais escravos que em todo o século anterior.
29
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30
DO
A CHEGADA E O TRÁFICO INTERNO O desembarque
dos
negros
dava-se
assim
que o navio chega-
va a um dos portos de destino no Nordeste, Norte ou no Rio de Janeiro, áreas de grande demanda de escravos nos séculos XVI e XVIL Mais tarde, teriam outros destinos — mais ao sul, mais para o interior —
mas, de início, ficavam nas zonas litorâneas. O tráfico se desenvolvia ou através da importação direta pelos proprietários de terras ou por
meio de alguém que financiava e organizava a importação. Frequentemente, o fazendeiro — em geral ligado à produção de açúcar — man-
dava buscar escravos para si e vendia os que não necessitasse.
A venda de escravos ocorria no próprio porto de desembarque, ou através de negociações diretas ou pela realização de leilões. A pre-
sença de intermediários — os chamados tratantes — só Iria se afirmar com o desenvolvimento da atividade aurífera em Minas Gerais. Esses comerciantes fariam o papel de ponte entre o traficante que chega até o litoral e o futuro proprietário dos escravos. A demanda de escravos nas chamadas Minas Gerais provocaria alterações significativas no tráfico, uma vez que não apenas deslocou o eixo da presença dessa mão-de-obra para fora da atividade canavieira, como ainda provocou um crescimento na quantidade de navios encarregados do tráfico; e o que é muito importante — os traficantes foram se desvinculando cada vez mais dos proprietários de terras e engenhos. Ou seja, a partir da virada do século XVII para o XVIII, o tráfico passou a ser uma atividade em si, explicada internamente pela maior demanda de escravos e, ao nível do sistema colonial, como um todo, pela necessidade de acumulação. Para o escravo, estas alterações representavam, concretamente, passar por várias mãos antes de chegar ao seu destino final. Significa-
vam também sua valorização e a consequente especulação derivada desse fato. O desenvolvimento do tráfico intemo que ocorre nesse
momento, derivava do fato de a demanda ser bem superior à oferta e
de o investimento deixar de ser rentável em certas atividades. Noutras
palavras, um escravo que tivesse um custo inicial de, por exemplo, cem mil réis, ainda poderia ser interessante na produção de açúcar em condições difíceis de plantação, terra já cansada, etc. Contudo, a du-
zentos mil réis era mais conveniente vendê-lo, já que o retomo da apltcação se tornava problemático. Desta forma, o tráfico interno tornava-se uma realidade e o caráter do escravo, enquanto
mercadoria, evidenciava-se. O movimento de
escravos continuaria ocorrendo até praticamente a época da abolição. 31
Durante quase todo o século XVIII, do litoral para as zonas auríferas;
em fins do século XVIII, das Minas Gerais para o litoral e para São Paulo; depois, do litoral para o Vale do Paraíba, de várias regiões para o oeste paulista e assim por diante. Este tráfico faz com que escravos sejam conduzidos para regiões cada vez mais distantes, caminhando, tangidos por seus antigos donos que iam vendê-los em locais onde podiam conseguir preço melhor, Ou, mais frequentemente, por intermediários que a isso se dedicavam. São frequentes as referências a grupos enormes de escravos, arrebanhados em vários locais, sendo levados na rota dos mercados favoráveis do momento. Após 1850, (quando o tráfico foi proibido), as condições tanto
da viagem
quanto de “comércio” interno tornaram-se mais difíceis.
para os escravos. Sabe-se de vários pontos que, durante longo tempo
e com a conivência das autoridades locais, recebiam escravos contrabandeados. Em São Paulo, a região de Castelhanos, na Ilha Bela é citada em vários documentos da época, sendo que nenhuma denúncia conseguiu impedir o contrabando. Os escravos eram desembarcados à noite e levados para uma região próxima à atual praia de Maresias. Lá ficavam algumas semanas com a finalidade de aprenderem algumas palavras e frases em português. Com isso, pretendia-se que as autoridades que fiscalizavam eventuais denúncias de escravos contrabandeados fossem enganadas e acreditassem na naturalidade brasileira dos negros. E importante registrar aqui que o negro era tratado como mercadoria, não havendo preocupação alguma em se respeitar sua natureza humana. No mercado do Vallongo, no Rio de Janeiro, gravuras e descrições mostram negros à venda sendo examinados como animais: Pais e filhos eram separados sem o menor problema por compradores “que não tinham, eventualmente, interesse na família inteira. Apenas em 1868, quando o grito contra a escravidão começou a penetrar de forma mais consistente nos ouvidos da opinião pública, saiu uma lei
proibindo a venda de escravos debaixo de pregão e em exposição pú-
blica, assim como a separação entre pais e filhos com anos.
menos
de 15
O caráter de mercadoria dos escravos se evidencia nos próprios anúncios que a imprensa registrou em todo o século XIX. Com fre-
quência, encontramos propostas de compra e venda de negros cativos, louvando suas qualidades como a humildade, conformismo, ausência de vícios ou defeitos e boa saúde. Como mercadoria, além de comprado, vendido ou alugado, O es-
cravo podia ser oferecido como fiança e trocado por bens móveis ou imóveis.
gia
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Noutro trecho deste livro tentaremos mostrar como o negro reaevolente do homem ben er rát “ca O que em or ess opr do mun e ess
o açã rel o com o idã rav esc da ade sid ver per À prasileiro não Se revelava.
de produção organizava a sociedade de forma a criar um mundo de a. ori cad mer e os don de, eda pri pro e s rio etá pri pro senhores e escravos, deveo idã rav esc da to pei res a a faç se que udo est er lqu qua Em tória abstrahis um er olv env des se não a par te men em se ter isso bem ta e irreal.
nsão do presene e r p m s o a c t à s o i d m v o a o ã s c ç s a a r p o e d p u c e r A ass ce ne a ss pa — r do ia or st hi do l pe pa O te e à iluminação do futuro — vo po o e qu de as ci ên ol vi e s la ze ma s da o çã ta riamente pela consta tem sido vítima. eas rp ci pe ên s ol e r vi o n e m s da do si rá ia te o or nã ad rc me r se E tradas contra o negro.
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DEBRET — Jantar de Familia Rica: pequenos escravos tratados como animais domés ticos
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VIDA
ESCRAVO
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Dentro de sua contraditória condição de humano e de “coisa — ter vontade própria e não poder executá-la, tendo de executar, por outro lado, vontades que. não são suas, mas do senhor — o escravo tinha um cotidiano desenvolvido em função das tarefas que lhe eram atri'* buídas. Claro que, dentro de uma caracterização geral semelhante, há uma especificidade diferente no dia-a-dia do escravo na agroindústria canavieira ou na agricultura cafeeira, na atividade aurífera ou doméstica. Tomaremos
aqui, como
referencial, o escravo da agricultura ca-
feeira. A importância econômica, a quantidade de mão-de-obra, a relativa proximidade cronológica e as fontes documentais e bibliográficas à disposição justificam amplamente esta escolha.
O TRABALHO
luga-se uma escrava para todo o serviço domestico. Na rua do Bom Jesusn. 27. 2—1 O negro era cativo para que sua força de trabalho o fosse. Como "Conseguência, o elemento predominante na existência do negro era o trabalho. Nas fazendas de café eram comuns as jomadas de trabalho que iam de quinze a dezoito horas diárias, iniciadas, ainda de madrugada, ao som do sino que despertava os escravos para que eles se
So
apresentassem, enfileirados, ao feitor, para receber as tarefas. Se as atividades fossem próximas à sede da fazenda, iam a pé: se mais dis.
do trabalho, de suas origens, dos patrões e de si mesmos, num ritmo monótono e constante, repetindo dezenas, centenas de vezes a mes-
ma melodia.
O almoço era servido lá pelas dez horas da manhã O cardápio
constava de feijão, angu de milho, abóbora, farinha de mandioca, eventualmente toicinho ou partes desprezadas do porco — rabo, orelha, pe, etc. — e frutas da estação como bananas, laranjas e golabas. Embora houvesse interesse em se manter o negro saudável e apto para o trabalho, não havia a preocupação com sua longevidade. Em fazendas mais pobres, a comida com frequência se resumia ao feijão com gordura e um pouco de farinha de mandioca, o que acabava provocando
seu definhamento precoce.
Qualquer que fosse a comida, era preparada em enormes panelas e servida em cuias onde os escravos enfiavam as mãos ou, na melhor das hipóteses, colheres de pau. A refeição deveria ser feita rapidamente, para não se perder tempo e, de cócoras: os negros tinham que engolir tudo porque logo em seguida a faina continuava. | Por volta de uma hora da tarde, um café com rapadura era servido — substituído nos dias frios por cachaça — e às quatro horas jantava-se. Al, comia-se o mesmo que no almoço, descansava-se alguns minutos e retomava-se o batente até escurecer. Cumpria-se, então, o ritual da manhã, todos se apresentando ao
administrador — ou dono — da fazenda. Era quando, após uma breve
oração, iniciava-se o serão que constava. geralmente, da produção Ou beneficiamento de bens de consumo. Os escravos debulhavam e moiam o milho, preparavam a farinha de mandioca e o fubá, pilavam e torravam o café. Com frequência, cortavam lenha e selecionavam o café apanhado no período de colheita.
S6 lá pelas nove ou dez horas da noite é que o escravo podia se
recolher.
Isto para alguém que, no verão, levantava por volta das qua-
tro horas da madrugada. Antes de se deitar, fazia uma refeiç ão rápida - e, extenuado, descansava até a jornada do dia seguinte.
O curioso é que os documentos da época trazem frequentes re-
clamações dos senhores com relação aos “negros preguiçosos...” 36
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tuguês misturado com suas linguas maternas, essas canções falavam
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No eito. distribuiam-se em grupos e trabalhavam horas a fio sob as vistas do feitor e embalados pela música que cantavam. Num por-
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tantes, um carro de bois os transportava.
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Juga-se uma escrava
omite
para todo o servico do-
mestico. Na rua do Bom Jesusn. 27.
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VICTOR FROND — Negra da roça
——— MORADIA
E ROUPA
As senzalas — habitações coletivas dos negros escravos — era m
construções bastante longas, sem janelas (ou com janelas gra deadas),
dotadas de orifícios junto. ao ção. Edificadas com paredes suiam divisões internas e um com esteiras — ou cobertores
teto para efeito de ventilação e iluminade pau-a-pique e cobertas de Sapé, posmobiliário que se resumia a um estrado — e travesseiros em palha. As vezes, e
se era o caso, havia também um jirau para o escravo guardar seus per-
tences. Em algumas fazendas, nem as divisõ es internas eram efetuadas.
Em outras, as senzalas eram menores. Em quase todas, os casais desfrutavam de uma situação especial, morand o em pequenos barra-
cos de pau-a-pique cobertos com folhas de bana neiras. Embora não houvesse empenho notável em “fazendas de reprodução”, havia a
preocupação em se dar um mínimo de conforto aos casais para que eles reproduzissem força de trabalho para o senhor.
Os solteiros dormiam em casas separadas — homens e mul heres
— € as crianças ficavam com as mães. E importante notar que, apesar de todos os inconvenientes registrados pela família dos senhores — ruído, odor, medo — a senzala era construída junto à ca sa-sede da fazenda. Afinal, por maiores inconvenientes que esta prática pudesse ter, não era nada comparada à preocupação que tinha o pro prietário em zelar pelo seu patrimônio. E O escravo era, frequentemente,
o que de mais valioso o senhor
“possuía”. No século XIX, as numerosas manufaturas de algodão espalhadas pelo país especificavam que sua produção
não se destinava aos
brancos e livres, porém aos negros escravos. Era um tecido gro sso
com o qual costuravam-se calças, camisas e uma espéci e de colete longo, destinados a proteger o escravo durante o ano inte iro. As mulheres, dependendo do trabalho realizado, usavam saia e blu sa de chita OU cretone. Havia uma diferença substancial na vestimenta de escravos ur-
banos e rurais e dentre estes, entre os que trab alhavam no campo e os escravos domésticos. Nos campos, principalmente no verão, os escra-
vos eram cobertos por trápos que se deteriorav am rapidamente pela ação do esforço realizado e das intempéries. Sol excessivo e chuva não eram, geralmente, motivos para a interrup ção do trabalho. Já os escravos domésticos, escolhidos dentre os que er am considerados ma
is bonitos (pelos padrões estéticos dos proprietários brancos), recebiam roupas sempre limpas, inteir as e às vezes até luxuosas, como era o caso de certas mucamas.
38
MD
e
mes
razão pela qual é frequente observarmos ampla legislação reprimindo aquilo que era considerado abusivo e atentatório à moral e aos bons
costumes. Escravo seminu podia dar multa ao patrão. A imagem
rias
sa
Todo
Na cidade já não era possível deixar o escravo seminu. Mesmo assim, parece que OS proprietários, por economia, tentavam fazer isso,
“O
a
te
primitiva, dominada pelos instintos. Sua figura, temível e atraen-
povoa
a
imaginação
dos
civilizados,
fascinados
por
seu
A
a
“estado natural”. Esses estereótipos, que persistem até hoje em nossa sociedade, decorrem, na verdade, não de alguma característica do negro em si, mas do seu papel social e de sua aparência possível, ambos determinados pelo senhor branco...
DO
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de um bruto selvagem. Mais ainda, ele nos é apresentado como uma figura
cc
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do negro escravo nos é, portanto, transmitida como a
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LAZER E TRABALHO
Somados
aos domingos,
EXTRA
os numerosos
feriados religiosos, pro-
vocavam um ano útil de duzentos e cinquenta dias, pelo menos entre os donos de fazenda que cumpriam as determinações católicas à risca. Isto criava um duplo problema: a interrupção de atividades fundamentais para a dinâmica da unidade produtiva e a preocupação com o que poderiam “aprontar” os negros utilizando-se do lazer. Alguns fazendeiros, simplesmente, não davam a menor atenção aos dias santificados e mesmo nos domingos exigiam que seus escravos consertassem estradas, cercas e construções, destruíssem formi-
gueiros ou realizassem pequenas tarefas que acabavam por lhes consumir toda a manha. Era comum a cessão de pequenos lotes que, embora pertencentes
aos proprietários, podiam ser cultivados pelos escravos que tinham ai
uma fonte de ganho. Nesses pequenos lotes — dez ou quinze braças em quadra -, Os negros plantavam produtos de subsistência que consumiam para complementar suas refeições ou mesmo vendiam. E difi- . cil acreditar que esta atividade tenha, de fato, suavizado o cativeiro ou desenvolvido, no escravo, o senso de propriedade e responsabilidade como pretenderiam os proprietários. Constituíram-se, antes, em formas adicionais de exploração do braço escravo. Na verdade, se o escravo
consumia sua produção, economizava a alimentação cuja responsabi-
lidade, dentro das relações escravistas de trabalho, deveria caber ao
senhor. Se vendia sua produção, o máximo que conseguia era adquirir uma roupa de domingo, quando não gastava tudo em cachaça ou fumo. 39
mais ri com q igor, ka erado remun era dias nesses os escrav pelos feito trabalho | Ocumen cem de fala os escrav a entos pagam sobre tação consultada Nas fazendas
que respeitavam
o Ss domin| gos
R
———
+—
tos réis, no máximo para este trabalho.
| VICT OR FRONO - Escravos socando café no pilão
à duzen-
Seria ilusório imaginar-se que com esse valor o escravo pudesse
fazer alguma coisa de mais substanciosa. Seriam necessárias mil jornadas de trabalho — o que
implicaria dizer, os domingos de quase vin-
te anos (cinquenta e dois domingos por ano multiplicado por vinte dá
um total de mil e quarenta domingos) a duzentos réis para que o escravo juntasse duzentos mil réis. Isso, na prática, era inviável. Primeiramente porque acrescentaria ao exaustivo trabalho semanal uma jornada extra dominical que transformaria o escravo numa máquina ininterrupta. Depois, porque exigiria uma disciplina acumulativa que o es-
cravo — sujeito à atração das roupas, bugigangas, fumo e cachaça, que os negociantes levavam até as fazendas ou suas proximidades — não
podia ter. Mesmo que (e agora a argumentação é por absurdo) tivesse
forças para-dar conta da jornada de trabalho e condições para ficar vinte anos sem adquirir absolutamente nada, acabaria não podendo com-
prar a sua liberdade. Um escravo produtivo e forte valia acima de cinco
vezes os duzentos mil réis que pudesse acumular. Os casos de escravos que conseguiam comprar
sua liberdade davam-se apenas ou quando já estavam mais velhos — imprestáveis para o serviço produtivo — ou apresentassem doença incurável, ou ainda portassem “defeitos” como cegueira e lesões no corpo, geralmente acidentes de trabalho que os impediam de desenvolver normalmente suas atividades produtivas. Nesse caso o significativo não era o dinheiro que eventualmente possuía, mas o fato de já não se prestar devidamente para o trabalho. A preocupação em esclarecer este ponto deve-se ao fato de que há autores que pretendem perceber no próprio seio do mundo escravista, relações de caráter diferenciado em que, de alguma forma, o trabalho é remunerado através de um salário. Desta forma, dentro do escravismo estaria se articulando sua superação, já que haveria uma total incompatibilidade entre relação senhor/escravo e pagamento (principalmente em dinheiro) pela força de trabalho empregada. Como vimos, a argumentação do rompimento da estrutura escravista pelo pagamento do trabalho realizado não procede porque não poderia transformar — como de fato não transformou — o escravo em camponês ou trabalhador livre. De qualquer forma, atualmente desenvolvem-se vários estudos tentando compreender as relações do mundo escravista com os pequenos proprietários, os agricultores livres sem terra, os negros aquilombados, o negro de ganho e outras categorias sociais que pretendemos tratar em outros trabalhos.
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ESSES.
RELIGIÃO, SEXO E FAMÍLIA O catolicismo funcionava não apenas como justificação última da O escravidão (vimos em capítulo anterior que tudo que acontecia com
41º
escravo “era para O seu bem, a salvação de sua alma”), mas dialeticamenie como elemento ideológico de manutenção da escravidão ao nível do próprio escravo. Noutras palavras, a conversão do negro ao cristianismo era determinada pela sua situação de escravo. O escray O não apenas podia ser católico: ele tinha que sê-lo.
Todos os elementos que caracterizaram as alterações no caráter
do cristianismo da Antiguidade para a Idade Média, do “todos os homens são iguais perante Deus para “a César o que é de César, a Deus o que é de Deus”, vão despontar com muita força sobre a cabeça dos negros. A religião deveria ser um freio para os revoltados, um consolo para os desanimados, uma esperança para os desgraçados,
um alento para os fracos, como se dizia na época.
O senhor deveria ser entendido como um pai, severo e duro, temido e respeitado, que tudo fazia para o bem dos seus filhos. Há al-
gum tempo foi projetado em São Paulo um excelente filme cubano.
A Ultima Ceia”, que caracteriza muito bem o tipo de relação que o senhor desejava ter com seus escravos, através da mediação religiosa. Lá, como aqui, a par da exploração material, acenava-se com a igualdade espiritual: conviviam o fato da miséria terrena e o ideal do paraíso celeste; argumentava-se com o infinito âqueles que só enxergavam suas cadeias; acenava-se com um assento à mesa de Deus aos miseráveis que engoliam sua comida nojenta de cócoras; falava-se de plenitude aos carentes, de calor aos que tinham frio, de alegria aos tristes, de alívio aos sofridos. Tudo isto, porém, só poderiam obter se cumprissem o seu dever.
Porque a virtude do homem — dizia a religião para o escravo — estava
em trabalhar duro para o seu sustento: em conformar-se e se manter
manso (Cristo não o fora?); em submeter-se à ordem vigente, em respeitar o senhor e em arrepender-se das faltas - mesmo que eventualmente cometesse.
pequenas
—
O escravo era batizado logo que chegava ao seu local de traba-
lho — fazenda ou cidade — recebendo um nome “cristão”. Devia esque-
cer a forma pela qual era chamado no seu lugar de origem. A atribuição de um novo nome e o batismo representavam a transformação do
cativo em escravo, isto é, o início do trabalho compulsório. Assim, era de se esperar uma identificação feita pelo escravo, entre o poder e a religião. Isto, de fato, ocorria, uma vez que a documentação demonstra que em muitos casos de revolta, os negros atacavam os símbolos da religião, como imagens, crucifixos e os próprios padres se ousassem ficar por perto. A religião, ensinando a mansidão e o conformismo, não se afinava com os movimentos de revolta em qualquer nível, ativos e passivos. 42
Por outro lado, não se pode negar que a grande massa de escra-
vos ia se adaptando, tanto à sua condição quanto à religião. As formas de repressão desenvolvidas pelos senhores tinham por objetivo exa-
tamente
desestimular qualquer tipo de revolta ou reação contra si. A
contrapartida oferecida — o consolo da religião — acabava sendo aceita
pela maior parte dos escravos. No decorrer dos anos, o catolicismo imposto aos escravos val sofrer alterações significativas, digerido tanto pela cultura trazida por eles
da África, quanto pela prática social no Brasil. O chamado sincretismo
religioso é uma das formas que distinguem a religião dos escravos da-
quela dos senhores. Contudo, a legitimação social do catolicismo dos senhores continuava sendo uma eficiente forma de controle social; e valores como conformismo, resignação e trabalho duro, formas de se chegar ao paraíso celeste, marcavam de maneira indelével a vida cotidiana do escravo brasileiro. Por outro lado, valores morais apregoados pela religião eram sa-
bidamente
desobedecidos
senhores.
pelos
toda
Com
a
propalada
preocupação em manter unida a família, o escravismo foi um elemento
profundamente desagregador de uniões permanentes. Primeiramente porque separava, sem a menor cerimônia, casais que porventura viessem unidos da Africa. Depois, porque a desproporção entre homens e mulheres trazidos não era de molde a propiciar ligações permanentes. Na verdade, as condições de vida nas senzalas e a existência de uma mulher para quatro ou cinco homens estimulava o caráter transitório das ligações. SÓ após a cessação do tráfico oficial é que a proporção de mulheres iria crescer, quando o contingente de nascidos aqui se tornou preponderante. Conscientes do problema que representava a presença de muitos homens sem mulher, os senhores, na prática, estimulavam uniões
transitórias,
realizadas,
frequentemente,
apenas
com o seu benepláci-
to, sem as bênçãos da religião — que, aliás, fechava os olhos para o fa-
to. Mais comum ainda era a negra ter filhos de vários homens, sem mesmo se envolver em ligações transitórias oficializadas pelo senhor. Quando, excepcionalmente, a cerimônia religiosa ocorria, os sacramentos eram cumpridos pelo padre como formalidade desagradável e não como ato de fé. Considerava-se o ato como um luxo e não como
decorrência
infância.
da
formação
religiosa
ministrada
aos
negros
desde
a
Não se leva em consideração esses elementos quando, com enorme carga de preconceito, pretende-se atribuir aos negros características como
leviandade
nas relações pessoais
e promiscuidade
se-
xual. Na verdade, seus senhores, os responsáveis pela situação, é que mereciam ser mimoseados com esses epítetos. 43
Mesmo porque os senhores se utilizavam da situação para dar vazão à sua atividade sexual geralmente bastante reprimida em casa,
Com efeito, o papel da esposa era o de dar filhos ao seu marido, o maior número possível deles. Limitada em seus movimentos às frontei-
ras da residência do casal, pouco fazia. Desde menina tinha um bando
de negrinhas a segui-la, atentas às suas ordens. Não se abaixava para levantar um lenço do chão, crescia balofa e vadia. Casava-se cedo, cedo começava a procriar. Evitava O terrível pecado original do prazer nas relações sexuais, mulher séria que era. Engordava após o parto e
dificilmente voltava às curvas originais — com vinte anos já era uma matrona. Recentemente levantou-se a hipótese de a sinhá ter o hábito de compensar suas carências afetivas e seu sexo reprimido com suas próprias criadas, mas não há comprovação histórica disto, apenas indícios esparsos.
Quanto ao senhor, contudo, não há dúvidas. Cumpria com sua mulher branca as obrigações de procriador e marido, mas voltava-se às escravas para O prazer sexual. Entregava-se às negras e mulatas com todo o empenho, buscando usufruir delas a satisfação que não encontrava em
sua formal cama
de casado.
O mito de mulheres quentes,
atribuído, até hoje, às negras e mulatas pela tradição oral, decorre do papel que lhes era designado pela sociedade escravista. José Alípio Goulart recolheu, numa de suas obras, duas quadrinhas populares que
consagram o caráter de objeto sexual dado às escravas bonitas: “Preta bonita Mata tudo que Embriaga a Tira a vergonha
é veneno é vivente; criatura, da gente”.
“Mulata é doce de coco,
Não se come sem canela.
Camarada de bom gosto, Não pode passar sem ela”.
Por seu turno, para as escravas, uma relação com o patrão pode-
ria reverter em vantagens dentro da sua condição. Quanto melhor O seu desempenho sexual, mais oportunidades ela via de prender o senhor num ato que era também uma forma de vingança contra a sinhã e expectativa de tratamento privilegiado. Se conseguisse engravidar, via perspectivas de seu filho vir a ser libertado e incluído como agregado à grande família do senhor. Vingança contra as sinhás, esperança de tratamento privilegiado,
expectativa de manumissão para o filho. Nem sempre essas expectativas se realizavam.
Às vezes — e muitas — a vingança saía pela culatra. Ofendída em seu
amor
próprio, a senhora
utilizava-se de sua posição
e torturava
quir seque nem , vezes as pouc não aliás, Que, va. escra a cruelmente
sera dormir com o patrão, mas vira-se constrangida a concordar com
uma relação que sua condição de propriedade alheia dificilmente conseguiria evitar. as retingr ne de os lh s, fi to la mu ão de id lt mu a a, De qualquer form formas tas e grande número de agregados e manumissões de outras
seos que ões urs inc das o unh tem tes em e m-s tue sti con inexplicáveis, nhores faziam
as suas senzalas com ou sem o consentimento das si-
nhás, com ou sem a aprovação da escrava. A partir de meados do século passado, a propaganda abolicionis-a como ndo usa , ual sex e dad cui mis pro da os ect asp ios vár ta iria revelar
O com ra ago já o, and ent esc acr o, idã rav esc à rio trá con argumento ilei bras a íli fam a a mpi rro “co ela que ja, Igre da s ore set tos cer apoio de
es, ra”. Só então a legislação tratou de evitar a separação entre cônjug ores de estimular a união duradoura, de impedir a venda de filhos men de quinze anos, entre outras medidas. Tentou-se, mas não se conseguiu, incluir um item relativo à libertação das escravas que tivessem tido um filho do senhor. Alforriar a negra seria confessar a imoralidade, o que a hipocrisia das relações sociais não admitia. Já bem para o final do escravismo vieram à tona situações aparentemente incríveis, como o da escrava que solicitava em juízo sua liberdade, alegando ser mãe do réu, seu proprietário. Sim, pois o senhor legitimou o filho natural, transformando-o em seu herdeiro e não alforriou a escrava com quem tivera a criança. Mais comum eram filhos de senhores ou irmãos de senhores que continuavam escravos. Como se vê, a relação não era sempre tão romântica quanto a fi-
xada em certa literatura, de flagrante caráter classista, que resume as relações familiares à presença da matronal mãe preta, reduzida a produtora de leite sempre à mão e anjo de guarda das traquinagens dos garotos brancos.
Através da relação senhor/escrava ou através de ligações que ocorrem entre negros e brancos livres a miscigenação racial que ocorreu ara de tal intensidade que traços brancos são frequentemente encontrados em famílias negras (um dos filhos com pele mais clara, ou nariz afilaosos fam os ou — rior inte no diz se o com m” “bo elo cab — liso do ou cabelo não — o pov no rar ont enc cil difí é , lado ro out por ); ata mul da des ver os olh dos sse cla nas o sm me e — dos gra imi êmrec aos o, clar é , mos eri ref nos um cabente ese apr que uém alg ha ten não que o açã ger uma es, minant o um lo “ruim” — encarapinhado — traços largos, boca camuda ou mesm de tom de moreno mais escuro, por vezes atribuído (com forte dose
. icos ibér s rai est anc dos ra mou a anç her à to) cei precon 45
Em
São
Paulo,
a mistura racial é muito
profunda
nas classes
dominantes e a presença de traços negros intensa na burguesia do ca-
fé, contrastando com os imigrantes europeus que vêm para “melhorar a raça” (ambição dos Varnhagen da vida). Um importante historiador paulista costumava afirmar, em tom de blague, que se os brancos mandaram nos negros até a abolição, os negros mandam nos brancos
após 1888, em São Paulo. Trata-se, é claro, apenas de frase de efeito. Na verdade, as clas-
ses dominantes nunca assumiram sua eventual negritude e a cor da pele sempre
teve um
caráter ideológico que
superava a simples apa-
rência. Mas isso é uma questão que tem a ver com um problema ligado à abolição e que será tratado mais em detalhe em outro livro desta série.
CE
ÊZOOZOSMZSZIIIIOIOE
IA
REPRESSÃO Tolhido em suas liberdades mínimas, o negro deveria receber um
bom tratamento por parte de seus senhores, uma vez que a ninguém interessava dilapidar o patrimônio, impedindo o escravo de realizar suas tarefas. A legislação, antes portuguesa, depois imperial, teve
sempre presente a preocupação de “evitar excessos”. Já em 1688, o rei de Portugal recomendava que “se perguntem pelos senhores que com crueldade castigam seus escravos” uma vez que desejava evitar “que os pobres escravos sobre lhes faltar a liberdade, ainda fossem maltratados pelos seus senhores”. Para viabilizar sua recomendação, O rei português autorizava denúncias de religiosos contra crueldades no trato dos negros e até mesmo reclamações dos próprios negros. Leis, portarias e recomendações — no sentido de os castigos aos escravos não serem desproporcionais às irregularidades por eles cometidas — sucederam-se nos séculos subsequentes. Todas elas devidamente desobedecidas.
antes
O fato é que para o proprietário de escravos, estes eram vistos como
propriedade
do que como
seres
humanos.
Desta
forma,
viam-se no direito de descumprir leis que considerassem atentatórias à sua condição de donos; não reconheciam na Coroa Portuguesa autoridade para limitar aquilo que consideravam seus direitos: propriedade absoluta sobre O escravo, condições de vendê-lo, trocá-lo ou até liber-
tá-lo e, principalmente, de puni-lo se não estivesse aquilo que dele era esperado. 46
rendendo
tudo
Desta forma, pode-se dizer que havia um choque de concepções.
De um lado, O interesse do sistema escravista como um todo que procurava estabelecer regras para a relação senhor/escravo. De outro, o
senhor concreto que não admitia limitações ao seu direito de proprietá-
ria próp a va ona sti que se não o, tud con a, outr de ou rio. De uma forma poo tant ter em hom um de ito dire ta, avis escr ção rela da perversidade
der sobre outro. Quando a força do direito — no caso, a legislação — se identifica
de so ces pro um os tem — são res rep à , caso no — a forç da com o direito aos a itid perm era ta avis escr a tem sis No violência institucionalizada.
com r faze para ca físi ção coa de icas prát de e séri proprietários uma abuos os, sem dis o Com o”. gaçã obri sua a e iss mpr “cu o rav que Oo esc sos eram
frequentes.
Mas
é importante deixar claro que mesmo
as
as ênci viol em se amtuf sti con lei por as zad ori aut as práticas repressiv
sem nome. NeNa verdade, nunca existiu no Brasil algo como um “Código limites e os o end lec abe est , igos cast de ção ica apl a sse ula reg que gro” pre sem foi ão slaç legi A s. açõe viol das ina erm det a as pen atribuindo los izácter cara sem ” sos ces “ex Os ir coib nas ape do can genérica, bus entre o perte limi do nto ime lec abe est o que o ind mit per te, men ida dev quan ou, es hor sen rios próp dos ério crit a sse fica so” ces mitido e o “ex até do muito, de juízes venais e dependentes dos eventuais réus. Se hoje, em nosso país “rico não val para à cadeia”, imagine-se durante à escravidão... É claro que a simples existência de um “Código Negro” — como ocorria em muitas outras partes da América — não seria suficiente para aliviar muito a sorte dos negros; em qualquer legislação, a relaçao entre a importância do crime lesa-escravo e a pena imposta ao senhor pesava de forma significativa a favor... do mais forte. O código de Martinica, por exemplo, punia com o pagamento de duas libras ao senhor que cortasse o punho do escravo; cinco, por decepar as orelhas; seis, por extirpar a língua e trinta por enforcar o negro. Se O senhor quisesse se permitir o requinte de queimar vivo seu escravo, bastava pagar sessenta libras pelo direito da macabra diversão. vo, Desprotegido, longe de sua terra de origem ou já nascido cati e senhores, às o negro ficava sujeito às explosões de gênio de feitores
esto prot de ato er lqu qua m tere de m alé os, ism sad aos e taras do com violência. Se a violência institucionalizada não existisse mais, nem críticos sem opressores € oprimidos, ou (no dizer irônico dos a pen a sse vale não ez talv is, igua mais e ais “igu democracia)
reprimi-
existis-
da falsa se preo-
s ido met sub m era que a igos cast Os e são res rep a com o tant cupar
ensão do pre com a o sad pas no ca bus ória Hist a se Mas, . avos escr os
— udo est seu do ido sent o este é e — ro futu O inar ilum presente para 4/ MA
temos que procurar as raizes do autoritarismo e da violência dos fortes
nas próprias práticas repressivas que marcaram o período escravista. Não é sem sentido a preocupação de certa historiografia em mostrar o caráter cordial que sempre teria caracterizado as relações
entre os brasileiros. Vários autores insistem em lembrar que no Brasil
tudo foi diferente — e mais pacífico. A independência ocorreu quando um membro da própria família real se deu conta de que ela era necessária: sem sangue. A abolição foi decretada pelas mimosas mãos de
uma suave princesa; também sem sangue. A República foi proclamada durante um pacífico passeio de um militar e sua comitiva pelas ruas do
Rio, também sem sangue. ram em nosso bendito país Essa visão da nossa cia do dia-a-dia, a fome, a
E mesmo as rebeliões e quarteladas ocorresem violência alguma... História esquece deliberadamente a violênfalta de condições de higiene e de moradia,
a obrigação do trabalho sem lazer a que é submetida a maior parte da população. Vendendo a imagem do brasileiro pacífico, procura desau-
torizar eventuais manifestações dos oprimidos contra o atual estado de coisas, sob a alegação de que não seria uma atitude brasileira. Assim, a violência institucionalizada — a repressão — acaba sendo justificada em nome da luta contra a violência popular. Noutras palavras, o povo, submetido à violência cotidiana, não pode reagir, pois isso não seria uma tradição nacional, uma vez que, historicamente, teríamos uma tradição de não-violência. Cabe-nos, pois, denunciar as diferentes modalidades de violência a que eram submetidos os negros durante a escravidão. Algumas já
vimos no decorrer deste livro. Agora vamos estudar as formas pelas quais os negros eram castigados. Correntes,
gargalheira,
tronco,
algemas,
peia,
máscara,
anjinho,
bacalhau, palmatória, golilha, ferro para marcas, figuram em listas de castigos aplicados a escravos e que foram classificados por Artur Ramos em instrumentos de suplício e instrumentos de aviltamento. Vamos descrever aqui alguns deles. A Máscara de Flandres
Confeccionada em metal flexível — zinco ou folha de flandres - a máscara cobria todo o rosto à exceção do nariz e dos olhos que eram
liberados por pequenos furos. Seu objetivo era impedir a ingestão de
alimentos
ou
bebidas
por parte do escravo.
Na zona
aurífera foram
constatados casos de colocação da máscara em negros para impedir
que engolissem alguma pedra preciosa ou pepita de ouro que depois, por meios naturais, pudessem recuperar e vender por conta própria. Além do incômodo e da dor, a máscara era fonte de ridículo para os infelizes que a ela eram submetidos, razão pela qual era utilizada quando se queria humilhar alguém. 48
O pretexto que os senhores usavam para aplicar a máscara aos
escravos quase sempre era a bebida. De fato, o consumo de cachaça entre a escravaria — como, aliás, entre os livres e os próprios senhores
— era generalizado e independia de sexo e idade. Vimos que a pinga funcionava quase como complementação alimentar, graças a seu alto índice de calorias. Sabemos ainda que o hábito da bebida funcionava duplamente, como forma de o escravo tentar esquecer sua sorte e co-
mo forma do senhor ver o escravo prostrado fora do horário de serviço, de forma a não lhe criar maiores problemas. O que não podia era em-
bebedar-se a ponto de atrapalhar a produção, a carpa, o plantio ou a colheita. Aí o escravo era castigado e, no limite, vendido.
José Alípio Goulart nos recorda uma quadrinha popular que, com
certo humor e alguma ironia, retrata a preocupação acima descrita: “Todo branco, Jesus Cristo Mas o negro Foi a cachaça
quando morre é quem levou. quando morre que matou...”.
Mais uma vez a condição a que o negro foi submetido e os hábi-
tos adquiridos a partir disso aparecem como vícios inatos ou característicos da raça. O Chicote O castigo
mais frequente era o de açoites. De tão comum,
sua
aplicação pelo feitor tornou-se frequentemente a representação deste
empunhando um chicote. Antonil já lembrava que era comum em sua época
(século
XVII)
dizer-se
que para o negro são
necessários
três
pês: pão, pano e pau. O castigo era banalizado pela sua constância e se chegava a ter um caráter oficial com surras públicas e programadas, era muitas vezes improvisado já que para funcionar bastava uma sim-
ples vara de marmelo — ou outra madeira flexível — e o lombo de um negro.
Há casos em que: os próprios proprietários aplicavam o castigo, às vezes, sem nenhuma razão. O escravo novo, mal acabado de chegar, já levava uma surra de relho “para não se meter a besta”, isto é, para se manter em sua condição de escravo. Noutros casos, o castigo era sistemático, violentissimo e desmoralizador. O negro, após ses-
sões contínuas de tortura, deveria engolir o seu orgulho e evitar qualquer manifestacão de rebeldia ou independência. 49
Apesar de a documentação ser muito falha a este respeito, há registros de feitores ou senhores que “se excederam nos castigos, . matando seus supliciados, naquilo que nos dias de hoje recebeu a irgnica denominação de “acidente de trabalho”. Para evitar a “paixão” dós algozes improvisados, o governo organizou a tortura.
No Rio de Janeiro, por exemplo, os açoites eram aplicados entre nove e dez horas da manhã. A cerimônia, anunciada com antecedência, provocava um ajuntamento de povo que via os infelizes, acorrentados, chegarem, em fila de dois, escoltados pelos soldados, até uma
praça central onde estava instalado o pelourinho. No pelourinho — uma maciça e grande pedra, ou um tronco de madeira, com duas argolas laterais — o negro era amarrado e supliciado. O povo escolhia o lugar predileto para assistir à bárbara cena: ficando atrás da vítima podia
Eme
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e
e
TO
observar melhor os estragos feitos pelo látego, mas
ficando de frente,
podia presenciar com mais acuidade as expressões de dor a cada açoite. Debret lembra que havia carrascos que por sua habilidade atraiam um público maior que outros! Terminado o suplício do primeiro, vinha o segundo e assim por diante até o último, sabendo todos que nada impediria sua tortura, referendada e mesmo aplicada em nome da lei. Como se vê, o problema não se dava ao nível de uma eventual violência, perpetrada por um senhor mais sádico, mas naquilo que denominamos violência institucionalizada, nas relações aceitas como corretas, na tortura prevista em lei. Onde, pois, o caráter cordial do brasileiro?
O Calabouço Na verdade, havia senhores que não queriam sujar suas mãos e nem sequer assistir a torturas executadas por seus prepostos. Para esses casos — e para alguns outros — havia em algumas cidades, a insti-
tuição do calabouço, para onde o escravo era levado e, por determinação de seu dono, recebia castigos. O algoz costumava aplicar cem
açoites ao escravo para fazer jus ao “direito de pataca”, moeca que lhe
era dada pelo dono do escravo castigado.
Simples desobediências, atitudes consideradas afrontosas ou
mesmo ataque de ciúmes de sinhás pouco atraentes (como vimos em capítulo anterior), podiam também levar escravos e escravas para uma permanência nesses calabouços. Nem há necessidade de se falar muito sobre as condições de vida nessas fétidas cadeias. Para se imaginar, basta fazer uma síntese
entre as prisões atuais e a escravidão como sistema social. O homem
livre, privado temporariamente de sua liberdade, já é tratado como Let.
0
hicho. Imagine-se o escravo! Não são ocasionais os dados — como os de 1870 — que falam de dez escravos mortos no calabouço do Rio de Janeiro.
É importante lembrar que o calabouço não era uma prisão no
sentido de local de recolhimento de homens julgados e condenados. Bastava a vontade do dono para enviar um escravo ao calabouço e mantê-lo o tempo que julgasse necessário. A tal ponto essa vontade — estimulada pelas relações que o sistema escravista, proporcionava — era arbitrária, que em certas situa-
ções tentou-se estabelecer limites a ela. É o caso de Feijó que, em
1831, estabelecia que nenhum escravo ficasse no calabouço por mais de trinta dias. Esta lei, contudo, “não pegou”. Em 1871, o prazo era ampliado para seis meses “mesmo quando seus senhores fossem pontuais no pagamento das comedorias”.
Ao que indicam documentos posteriores, sequer este prazo era observado, ficando mesmo o escravo no calabouço ou nele morrendo — a juízo de seu senhor. Pena de Morte
Certos crimes eram castigados com a pena de morte. Vários autores viram documentos — e nós vimos outros tantos — que se referem a escravos enforcados por terem morto seus senhores, feitores ou familiares ou mesmo por terem ferido seus donos. Em 1838, por exemplo, as estatísticas apontam vinte e dois negros executados no Brasil. Estes dados, contudo, além de provavelmente não representarem a totalidade dos negros enforcados oficialmente (os documentos a respeito são incompletos), não computam o enorme número de negros seviciados e mortos pelos próprios patrões, feitores ou pela polícia. Não devemos esquecer que nem sempre havia a preocupação com formalidades quando se tratava de matar um negro. De resto, a situação jurídica do negro era de todo diversa. Sua sentença era executada sem direito de recurso ao Imperador que, co-
mo poder moderador, tinha o direito de perdoar ou moderar as sentenças. No caso de escravos, já que estes não se faziam “dignos da Minha Real Clemência” no dizer do próprio Imperador, eram sumariamen-
te executados.
|
Só no decorrer do século XIX, no bojo de alterações substanciais no sistema escravista como um todo, começou a se desenvolver um movimento contra a pena de morte. A consciência da população contra o enforcamento institucionalizado de negros coincide com as leis de 1850 que impediam a importação de escravos. Desta forma, a carência
de braços provoca a transformação da pena de morte em prisão perpétua com trabalhos forçados.
Muitos negros continuavam sendo mortos pelos próprios senhores, com a conivência explicita ou implícita das autoridades. Quando o escravo era fujão, frequentemente era morto após a captura, tendo sua cabeça decepada e exibida para servir de exemplo. Os documentos relatam inúmeros casos de escravos assassinados a tiros, torturados
ou mesmo “suicidados” (a moda é antigal!). J. A. Goulart narra dois casos em que padres fazem matar suas amantes, uma delas assassina-
da por meio de um pau que, introduzido pelo ânus atravessou a infeliz
mulher (Paraíba, 1801). As descrições dos crimes registrados — e são poucas, com certe-
za, já que havia preocupação em não documentá-los — dão-nos uma idéia de quão bárbaros podiam ser os senhores no seu poder sem limites sobre outros seres humanos: negros mortos a chicotadas; criança assassinada a garfadas (Maranhão, 1878) por uma mulher que desconflava ser ela filha de seu marido com uma escrava; um senhor, em Lo-
rena, que assassinou quinze escravos; outro que amarrou seu escravo no chão e o matou lentamente com suas botas e esporas (São Paulo, 1863); negros atirados à fornalhas dos engenhos e queimados vivos. Não havia limites para a crueldade que, seria bom insistir, não decorre
“das personalidades doentias de alguns senhores — o que poderia pressupor a bondade como norma e a maldade como exceção — mas do próprio caráter das relações escravistas, de perversidade inerente ao sistema escravista como tal, do próprio poder sem limites (ou quase) que um homem tinha sobre outro. Os castigos eram considerados necessários, formas de o senhor conseguir do escravo a força de trabalho que tinha adquirido ao comprar o negro. Era um direito do senhor fazer com que o escravo desempenhasse o papel para o qual tinha sido designado e, se não o fizesse, era considerado um vadio, um fujão, um violador das leis vigentes. O castigo era a forma pela qual a sociedade se defendia do negro marginal, daquele que não cumpria suas tarefas. Certos excessos nas punições não passavam de aberrações desculpáveis e justificadas pela negação do negro em cumprir a sua tarefa na divisão social do trabalho. Nesse tipo de sociedade não há espaço para a cordialidade espontânea. A violência é que permeia todas as relações e se explicita
na própria forma pela qual o senhores extraem a força de trabalho dos seus escravos. Por isso a violência é institucional e permanente e se situa antes, durante e após a aplicação de castigos eventuais. Noutras palavras, O castigo é uma mais-violência, uma sobre-violência, já que a
violência é a própria relação que a sociedade escravista proporciona.
Dentro desse raciocínio, as aberrações e os chamados excessos serão uma sobre-sobre-violência. O fato de só alguns casos doentios serem condenados pela sociedade nos dá a medida de como a população aprendeu à conviver com a violência institucionalizada (as relações es-
cravistas) e a própria mais-violência (os castigos “necessários”). Mesmo
assim, humilhados e submetidos, agredidos e reduzidos
a simples peça na complexa engrenagem da grande lavoura, muitos escravos lutaram contra sua condição, em momentos de silencioso ou altissonante heroísmo.
REAÇÃO DOS ESCRAVOS
DEBRET — Negros açoitados
“O índio não se acostumava com o cativeiro, seu espírito de liberdade não era compatível com a escravidão”. E assim que muitos manuais de História “explicam” o início do tráfico negreiro. Além de incorreta do ponto de vista factual — como já vimos em capítulo anterior — a explicação faz entender que, ao contrário do índio, o negro “se acostumava com o cativeiro, porque sua ausência de espirito de liberdade era compatível com a escravidão”. A origem desta distorção remonta a Vamhagen na historiografia,
a Gonçalves Dias na poesia e a José de Alencar no romance; por trás da transformação do índio no herói libertário e do “negro submisso” em
mancha da História, está a própria idéia da concepção do Estado Nacional burguês, da constituição da raça brasileira” e, portanto, da descoberta de marcos heróicos reais ou elaborados em nosso passado idílico. Por outro lado, existia a preocupação em negar tudo que não fosse “heróico” em nosso passado histórico. Daí se chegar ao limite de negar, não a escravidão como. sistema, mas o próprio negro por sua pretensa passividade perante o cativeiro.
Ora, se o negro não se revoltou é porque ele se ajustou à sua
condição de escravo — defende certa linha historiográfica. Esta visão não é inconsequente, não é gratuita. Aceitando-se a idéia da adequação do negro à escravidão, teríamos absolvido as nossas manchas ocasionais por termos mantido tal sistema social, uma vez que, dentro desse tortuoso raciocínio, teríamos apenas mantido o negro em sua condição “natural”. Claro, pois sua adequação ao trabalho era algo “natural” para ele. A corrente que tenta explicar a submissão por mecanismos psicológicos inerentes à própria personalidade do negro é tão expressiva
que, não raro, vemos autores sérios embarcarem nesses perigosos e absurdos equívocos.
O fato é que o negro não tinha “jeito” ou “espírito” de escravo. Aliás, ninguém tem. O próprio do ser humano é a liberdade e não a escravidão. De todo e qualquer ser humano, qualquer que seja sua cor, idade, religião, sexo, classe social ou convicção política. |
Para provar isto, no que se refere aos escravos, convém apresen-
tar, de forma clara e objetiva, algumas das manifestações de inconformismo dos escravos relativamente à-sua situação. Em seguida fa-
remos uma rápida discussão do sentido dessas manifestações.
Havia negros que mesmo sabendo serem poucas as chances de permanecerem muito tempo em liberdade lutavam até o fim contra o cativeiro. Veja-se este anúncio publicado no “O Velho Brado do Amazonas” de 23/5/1852: | “Fugiu ao Cirurgião-mor Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque o seu escravo mulato de nome Florentino, de idade de 20 a
22 anos, com os seguintes sinais: mulato um pouco escuro, cabelos
crespos e ruivos nas pontas, os dentes da frente podres, ambas as orelhas foram furadas dias antes da sua fuga, o que deve apresentar vestígios, caso se tenha tapado, tem marcas de surra na bunda, tem um cicatriz de golpe ao longo do pescoço, e é quebrado de uma das
virilhas. Este mulato já andou fugido há tempo, e andava embarcado
em uma embarcação do Xalupa de Óbidos com o nome de Antonio Macapá, foi capturado nesta cidade; fugindo segunda vez, andou na Escuna
Lua Nova de propriedade de Luís Martins de Alenquer aon-
de passava como fórro e sempre com o nome de Antonio Macapá. À
Lo
(sic) nesta cidade ao sr. Joa-lo ntá ese apr O € urar capt O que soa pes apá a seu Senhor, ou ao sr. Mac de vila na ou os, Lem de o ian mar quim onio Rola receberá imediatamente 100$000 réis de gratipi uto”. co r de lhe em qu ra nt co Lei da r go vi do to m co ficação e protesta-se e s to ul ad , os up gr em e s só o nd gi fu os gr ne de os pl em Há ex crianças, homens € mulheres.
20045000
Fugiu da fazenda de José de Campos Salles, em Cempinas, no dia 3 de Janeiro de 1973, um escravo com es signaes seguintes: Benedicto, idade 24 annos, pouco mais ou menos, altura regular, côr preta, rosto redondo, bonito de cara, bem feito de corpo, boa dentadura, tem pouca barba, falla bem, é crioulo da cidade de S. Paulo ; levou camisa e calça de algodão da fabrica
de S. Luiz de Itá, camisa de baeta azul ainda nova, chapéo de
panno preto, já velho. (O mesmo foi encontrado na estrada que do Rio Claro segue para S. Carlos-do Pinhal.
em Campinas
o prender e entregar
Quem
ao seu senhor 4—l
será gratificado com a quantia de duzentos mil réis.
Os constantes anúncios de fugas documentam o inconformismo dos escravos
a mi
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DOSES
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FUGAS
Registros de fugas de escravos têm sido encontrados em diversas partes do país, a partir do século XVII até às vésperas da Abolição. Alguns exemplos: Já perto da Abolição, na região de Sorocaba, um cronista narra
uma fuga coletiva - homens, mulheres e crianças capitaneadas pelo negro Pio — da forma seguinte: ciais
“Caminhavam para a cidade de Porto Feliz. Destacamentos polios
cercaram
agressores.
Em
na estrada.
Eles
resistiram
e dispersaram
seus
pleno dia, em marcha serena e calma, atravessaram
5
as ruas da cidade. Mais adiante, duas ou três escaramuças vitoriosas com a polícia. Vencida a sua, O governo policial requisitou força do Exército. Sob o comando do alferes Gasparino Carneiro Leão, cingtien.
ta praças de cavalaria partiram para cercar e deter os resolutos rebeldes. Já nessa época, o Exército Nacional recusava-se a prestar os ser-
viços de “cães de sangue de caçadores de escravos. O alferes Gaspa-
rino, moço de alma nobre, não escondia seus sentimentos abolicionistas. Seguiu para a infame diligência, disposto a não perseguir os infelizes; mas, nas cercanias de Santo Amaro, do alto de um morro, avistou os escravos que, da ladeira oposta, desciam para os fundos do desfiladeiro. O comandante destacou um aspençada, também abolicionista,
para aconselhar os pretos a debandar
pelas matas.
O aspençada
apeara e seguiu a pé. O chefe dos fugitivos, o preto Pio, ignorando os humanitários intuitos do soldado, correu-lhe ao encontro e matou-o com golpe de foice. As praças, em espontânea represália, a tiros, mataram o preto. Apesar da excitação do momento, o oficial abolicionista não consentiu na chacina dos foragidos apavorados. Voltou para São Paulo, respondeu a conselho militar e foi unanimemente absolvido. Os escravos continuaram sua dolorosa viagem para a cidade de
Santos e, nas abas da Serra do Mar, entre os contrafortes por onde corre o Cubatão, foram caçados como feras. Os capitães-do-mato e a polícia mataram homens, mulheres, crianças sem piedade. Menos de
vinte fugitivos conseguiram chegar a Santos.
O cadáver do preto Pio, trazido para São Paulo, foi aberto na Repartição de Polícia. O relatório pericial mostrou que ele não se alimentava havia mais de três dias! A autópsia revelou, pois, que aquele chefe negro, que batera forças organizadas, que pisara dominador de povoações ricas, padecia de fome no momento em que deu a vida pela liberdade de sua raça” (Arquivo Aguirra, “Depoimento de uma Testemunha”, in “A Perseverança lil e Sorocaba”, José Aleixo Irmão, págs. 363/4). Por que fugiam? Para
alguns
autores,
porque
não
se
conformavam
com
os
maus-tratos a eles dispensados. Para outros, porque queriam gozar a "perdade por algum tempo, embora sabendo que acabariam sendo
capturados. Não cremos que seja possível limitar a fuga dos escravos sempre
a essas razões. Se quisessem gozar de uma liberdade fugidia não tra-
tariam de alterar seus nomes, deixar crescer ou raspar barbas e cabe-
lo, buscar uma integração econômica em alguma vila próxima. Ou, como em muitos casos, aquilombando-se.
Não se pode negar que alguns negros fugidos ficassem ron dando a
fazenda de origem, a qual às vezes assaltavam para conseg uir comida,
roupa e até companhia. Há casos de escravos fugidos, recapt urados h6
nas próprias senzalas de origem ao visitar suas namoradas ou tentando convencê-las à fuga. Esse fujão ribeirinho acabava sendo pego com
mais facilidade. Há também os que nunca mais foram resgatados, re-
fugiando-se em quilombos quase inexpugnáveis. O mais famoso deles foi o de Palmares, cantado em prosa e em
verso como
um
momento
heróico do negro brasileiro. Cremos que,
além disso, as revoltas dos escravos se constituem em atos de digni-
dade humana. Palmares, por exemplo, chegou a se constituir em verdadeiro esa ur , ut s is a tr c ve es i tá m ô es n es o c çõ e la , m re do o c ta ro es do nt do de ta sócio-econômica estabelecida e contatos comerciais com vilas próximas, em pleno século XVII e com duração total de 67 anos, segundo se crê. E isto no Nordeste brasileiro, área das mais povoadas e desenvolvidas da colônia na época. Mas falar de quilombos não é falar apenas de Palmares (a respeito de que não nos estenderemos aqui porque há vasta bibliografia). Vamos encontrar quilombos em
São Paulo, na Bahia, no Norte e em
Mato Grosso onde, curiosamente, uma mulher chegou a governar. Por vezes os quilombos tinham constituição apressada e duração efêmera, sendo destruídos por alguns capitães-do-mato ou mesmo por dissenções intemas. Noutros casos, porém, alcançavam tamanha importância que exigiam pedidos enfáticos por parte dos senhores, ao govemo,
no
sentido
de
destruir o foco
subversivo.
E o que
ocorre
quando os “moradores e mineiros” próximos a Cuiabá pedem ao govemador para que mande destruir Quariterê, em 1769. Esse quilombo, liderado pela rainha Tereza, vivia não apenas de “Suas lavouras, mas da produção de algodão que servia para vestir os negros
e, segundo
alguns
autores,
até mesmo
para funcionar como
produto de troca com a região. Possuía ainda duas tendas de ferreiro
para transformar os ferros utilizados contra os negros em instrumentos
de trabalho. Sua destruição foi festejada como ato de heroism” am Portugal. O govemo português afirmou, por carta, que considerava a capitania
capaz de se defender dos castelhanos “que não suponho, nessa fronteira, muito mais fortes, nem melhor disciplinados que uma multidãc
de negros armados e resolutos. Por aí pode se ter uma idéia da importância dada pelos portugueses ao sucesso por eles obtido na repressão ao quilombo de Quariterê — como aliás na de qualquer outro quilombo. Um quilombo era um foco de negros livres numa sociedade que se baseava em relações sociais de caráter escravista. Era, pois, um
mau exemplo para outros escravos e uma esperança concreta para os fugidos.
5f
É importante perceber que a fuga não era, em si, a libertação do
negro, uma vez que, via de regra, ele não tinha para onde ir. Sua cor
de pele logo o denunciava — o negro era escravo até prova em contrário —, a falta de um trabalho o levava muitas vezes a assaltar para sobreviver; sua captura era apenas uma questão de tempo. O quilombo tomava-se uma altemativa viável para ele, uma forma de conseguir
não apenas uma intervenção passageira do brutal cotidiano, mas uma
liberdade real. À destruição de um quilombo representava, portanto, uma luta
contra a agitação subversiva, uma vez que negros livremente congre-
gados constituíam-se num flagrante desafio ao regime vigente — todo ele articulado com o sistema escravista. O objetivo do escravo em sua fuga era a liberdade definitiva. Ao
sistema cabia evitar que isso ocorresse. E é claro que o escravo não
fugia apenas porque e quando era submetido a maus-tratos. Rebe lavase contra sua condição de escravo. Através da imprensa em todo o século XIX podemos ler anúncios que reclamam de escravos fugidos. E eles continuavam fugindo, mesmo sabendo dos bárbaros castigos que os aguardavam quando fossem recapturados - ou mesmo a morte; continuavam fugindo até quando eram bem tratados, o que levava seus senhores a solicitar que fossem os “ingratos” encontrados e devolvidos. Mais para o final do século, as fugas recrudesceram, estimuladas pelo movimento abolicionista que chegava, inclusive, a acobertar negros. Perto da Abolição, o movimento chegou a adquirir tamanha força
em alguns lugares que os próprios senhores não tinham mais controle
sobre a situação. Isto, contudo, só nos anos finais da escravidão, quando a repressão ia se reduzindo porque já não contava sequer com o apoio da população. O sistema escravista começava a deixar de ser algo natural. E a figura do capitão-do-mato, a repressão materializada, tornava-se um tipo ultrapassado pela História. . | De fato, o capitão-do-mato era o executor da caça e captura do
negro fugido e se constituía em algo apenas compreensível dentro do sistema como um todo. De uma forma um pouco simplista, ele tem sido visto como o negro traidor, aquele que renegava as suas origens ao se dispor a fazer o sujo serviço de aprisionador de seus irmãos de raça. E preciso lembrar que este era um serviço muito bem remunera-
do, exceção dentre os ofícios que aguardavam o negro liberto. Embora
considerado serviço duro, era legitimado socialmente, de maneira a transformar o capitão-do-mato num Negro diferente” uma vez que ele se sentia um homem do sistema. O poder que adquiria como capitãodo-mato O levava a ter, muitas vezes, a seu serviço, por algum tem-
po, negros que havia caçado e que deveria devolver aos donos. Só 58
se qua do en ec an rm pe , ros out ava caç ndo qua os rav esc uns alg devolvia
sempre com um verdadeiro “capital de giro . Não é portanto acidental
esde s rio etá pri pro ros neg , XIX ulo séc do ção nta ume doc em vermos, | cravos ou de terras.
Ser capitão-do-mato, trair suas origens, era uma das poucas for-
mas de o negro romper a barreira etno-social e usufruir — carregando embora a maldição de traidor — O sistema que o havia oprimido. Mais para O final da escravidão, não apenas o capitão-do-mato perde sua legitimidade, como a fuga de escravos muda sua imagem, como veremos. Mas até lá a revolta do escravo era, quase sempre, um ato solitário que, no limite, revelava-se no próprio assassinato do seu senhor.
Senhores Assassinados
Um escravo foi julgado em meados do século passado por ter
assassinado seu senhor, no Rio de Janeiro. O processo reconhece ter sido o escravo “bom trabalhador” e seu senhor — um mercador de café ávido de lucros -, homem impiedoso que exigia trabalho excessivo dele. Mesmo assim, o destino do escravo parecia selado, tanto que quando o juiz lhe perguntou, ao final da sessão, se tinha algo a acrescentar em sua defesa, o negro sentenciou: “— Em meio às galinhas, baratas nunca têm razão”. Este é um documento pouco comum que não apenas demonstra ter sido um escravo ouvido em juízo, como ainda registra a sua fala. Na verdade, assassinatos de senhores, feitores e administradores por parte de escravos foi uma constante no decorrer de todo o período escravista e muito raras vezes a imprensa explicava as razões do crime, preocupando-se apenas em ver o lado do senhor. Veja-se a transcrição que um cronista faz do assassinato do vicepresidente da Câmara Municipal de Sorocaba, o tenente-coronel Fernando Lopes de Sousa Freire, “o mais abastado cidadão desta localidade”, ocorrido no dia 28 de abril de 1875: Estava o tenente coronel sentado à porta do seu palacete, na rua Flores, conversando com seu hóspede, comendador Luiz Vergueiro, quando, ao passar alguns amigos, levantaram-se e ficaram a palestrar com eles. Assim que saíram, o Tte. cel. Femando Lopes ficou um
minuto só, de costas para a rua. Ouviu-se o estrondo de um bacamar-
te, lançando por terra a vítima que, morrendo, pronunciava as seguin-
tes palavras: “eu morro... eu morro... minha mulher... meus filhos... foi meu escravo Generoso”. Houve pânico, cuidando-se mais de socorrer a vítima do que em se prender o criminoso. Mesmo assim, apesar de sair às carreiras, foi ele perseguido por dois escravos do falecido e por dois rapazes que, à meia-lua do lampião do Hotel das Flores,
5Q
reconheceram ser mesmo o escravo Generoso, que enveredou pela travessa do Born Jesus. Vendo que não cessava a perseguição, parou, abriu o poncho e se voltou para os perseguidores que, temerosos, também pararam. Então Generoso pôs-se a correr e a gritar pela travessa referida: “pega! pega!”. Sumiu por um dos becos da rua do Hospital que levam ao brejo do Supiriri. Sumiu e nunca mais foi preso.
Esse escravo estava foragido há quinze meses. Era de confiança
da vítima. Fora visto, na antevéspera do crime, pelo capataz de tropas, do com. Luiz Vergueiro, no lugar chamado Cruz-de-Ferro. Estava ar-
mado de bacamarte e faca. Avisado o tenente-coronel, este comuni.
cou-se com a polícia que soube estar o Generoso em casa de uma tal Bárbara, em Terra Vermelha. De posse de mandado de prisão foram à
casa de Bárbara. Já lá não se encontrava o escravo. Vingou-se ele do senhor, no dia 28, ao cair da noite, aproximando-se, calmamente, do palacete, pelo lado da Rua Direita e desfechando-lhe o tiro mortal. O enterro do tenente coronel foi acompanhado por grande massa popular, pelos irmãos da Misericórdia e representantes da Perseverança Ill da qual era irmão ativo e prestimoso”. (“A Perseverança Ill e So-
rocaba”, de José Aleixo Irmão, págs. 140/1.) Não foi um caso isolado. As vezes, pelo depoimento dos assassinos ou nas entrelinhas do processo compreende-se o móvel do crime — a reação violenta a castigo considerado injustificável: “Segundo o réu, estava trabalhando na prensa quando se quebrou um prego. Por isso foi espancado pelo seu senhor, pelo que, revoltado, esfaqueou-o quatorze vezes”. — Desesperança, castigos sistemáticos: “ havia dito ao feitor que se achava doente e que não podia trabalhar, ao que lhe respondeu o feitor que negro e burro eram para trabalhar senão não faltaria o chicote, já porque no dia do delito e logo no começar o serviço pela manhã foi chicoteado pelo feitor, vendo-se então como disse, descoroçoado, tomou a faca e feriu a este e fugiu...” — Revide a opressões familiares:
Benedito, de 18 anos, crioulo, trabalhador da roça, em abril de 1849, quando viu o senhor açoitar-lhe a mãe, avançou para ele com
um pau e esbordoou-lhe até matá-lo”. — Às vezes o crime era premeditado:
“Ana, Martinho, João Caetano e também Benedito (feitor) mata-
ram seu senhor a golpes de enxada, em 28 de fevereiro de 1876, em Campinas. Segundo declarações dos réus, o crime foi perpetrado de comum acordo entre eles por ser a vítima muito má”. Outras vezes visava a mulher do senhor:
“Em 14 de agosto do referido ano (1881)... . foi barbaramente as-
sassinada por um seu escravo de nome Simão, a esposa de Apolinário Jacinto da Silva. O assassino armado de uma mão-de-pilão e um facão
penetrou de improviso na sala em que sua senhora estava e descarregou uma mortífera bordoada sobre a cabeça e em seguida uma facada
no ventre...” Ocorriam explosões, verificavam-se vinganças pessoais a tal ponto de alguns autores quererem estabelecer a etema dicotomia
bons/maus
senhores
e bons/maus
escravos,
a revolta resultante da
maldade de um ou outro senhor individualmente. Nada nos permite assegurar que possa ser feita um tipificação de proprietários e escravos que revele algo de novo. De fato, a leitura dos jomais do século XIX nos permite verificar que havia um ambiente de medo, uma verdadeira paranóia, notadamente em áreas onde a população escrava era, relativamente, muito grande. Notícias de revoltas de escravos, assassinatos de patrões e familiares — às vezes verdadeiros massacres — eram assuntos de conversas à mesa, em voz baixa, para que nenhum negro ouvisse. Brancos não saíam sozinhos em regiões onde se sabia de negros aquilombados ou mesmo fugidos e agrupados. São inúmeros os apelos de Câmaras Municipais ao governo relativamente a tropas para conter “revoltas iminentes”. A insegurança — fruto do profundo desequilíbrio social, da terrível exploração — levava os senhores a tomarem medidas mais repressivas, a solicitarem leis cada vez mais severas. Como se as leis severas, medidas coercitivas, “esquadrões da morte” liderados por ferozes capitães-do-mato, pudessem resolver o problema... Suicídios
No limite de sua resistência física e moral, o escravo se matava. Além de gesto de libertação, de ponto final à sua condição de objeto, ele golpeava fundo seu senhor, fazendo com que tivesse prejuizo do investimento que fizera nele. Alguns números nos permitem levantar suposições a respeito do assunto. Em 1848, dos 33 suicídios ocorridos na Bahia, 27 foram de escravos, dos quais 26 africanos.
As formas de auto-eliminação eram as mais variadas: asfixia, enforcamento, arma branca, arma de fogo, veneno. Alguns exemplos:
“O preto fugido Antonio, escravo de José Maximiano de Carvalho, por ocasião de ser capturado, cravou em si, no ventre, uma faca, O que lhe produziu instantaneamente a morte”. | Em Manaus, cinco escravos fugiram, mas logo foram recapturados.
Um deles se mostrou tão indócil que se julgou necessário encadeá-lo por
uma perna a um poste, no pátio. A noite, atravessando o seu senhor o
pátio, o escravo tentou assassiná-lo com uma faca. Frustrada sua ten-
tativa, encostou o cabo da faca no poste e rasgou o seu próprio ventre. teve
Em
que
1885, ou seja, já próximo do final da escravidão, um senhor
ser
protegido
pelas
autoridades, 61
acusado
que
era
de,
pela brutalidade dos castigos aplicados, ter concorrido para o suicídio de um escravo.
Uma visão folclórica da História fala que a doença do escravo no
Brasil era o banzo, irreprimível saudade essa doença o levava ao suicidio.
da pátria distante. No limite,
Essa visão deixa de lado dois dados fundamentais: primeiro que
a saudade do negro era referente à sua liberdade, a uma organização
social menos
injusta; depois, que o suicídio do escravo não era sir-
plesmente um ato de fraqueza, mas antes derradeiro e eloquente gesto de revolta.
um
gesto de revolta: um
Revoltas
Ão contrário do que certa historiografia costuma apresentar, a
presença do negro na História do Brasil não se resume ao trabalho pesado baseado na submissão total. Como já vimos, os escravos fugiam, se
matavam
e atentavam contra a vida de seus senhores. Isto, dentro das
condições de existência a que eram submetidos não era coisa pouca. Que dizer então das revoltas dos negros? Não de um ou dois, mas de grupos de negros que se levantavam contra sua condição? Autores como J.A. Goulart e Clovis Moura têm tido a preocupação de estudar essas revoltas, enxugando-as de seu aspecto folclóricoreligioso e recuperando seu caráter de rebelião dos oprimidos. De algum tempo para cá, vários trabalhos acadêmicos têm buscado mapear os levantes negros e é de se esperar que logo mais es-
tes importantes capítulos da nossa História façam parte dos manuais
escolares, uma vez que vamos encontrá-los por todo o Brasil. A Balaiada, ocorrida em 1838 no Maranhão e no Piauí, talvez seja o mais conhecido dos levantes escravos. Durante três anos, os negros revoltosos resistiram às tropas do govemo para, no final, capitularem diante das forças muito superiores lideradas pelo futuro Duque de Caxias. Na Bahia, negros muçulmanos causaram transtomno muito grande às autoridades nas primeiras décadas do século XIX. Em
1808/9 escravos haussás desertaram de engenhos no Recôncavo Baiano e intermaram-se nas matas onde foram caçados brutalmente e
depois mortos ou aprisionados. Em 1813, cerca de seiscentos negros da armação de Manuel Inácio da Cunha se revoltaram e atacaram todos os brancos que encontraram pelo caminho nas cercanias de Ita-
puã. Só foram batidos quando importantes tropas colocadas no seu
encalço mataram ou feriram cinquenta deles. Em 1835, apesar de denunciados por uma negra liberta, dezenas
de nagôs se revoltaram, chegando a ocupar, por horas, ruas e edifícios
públicos de Salvador.
62
No Rio, no Espírito Santo, em São Paulo, no Sul, a quantidade de levantes negros ocorridos ou abafados graças a denúncias foí muito grande. Na segunda metade do século XIX, o temor desses movimentos se tornou intenso. Nas cidades, os negros constituíam sociedades secretas de cunho religioso onde preservavam antigas crenças — é o
caso do islamismo — ou desenvolviam práticas sincréticas — a “síntese” entre o cristianismo e religiões africanas, treinavam lutas onde aprendiam golpes mortíferos — capoeira — destinados a seus ínimigos. No campo, a grande concentração de escravos apavorava os brancos. Um delegado de polícia de Campinas escrevia ao presidente da
província dizendo que com tantas fazendas amontoadas fácil seria aos escravos, juntar uma força de dois mil homens, “o que é bastante para assolar uma população sem meios de defesa. Pondero a V.Exa. que, nesta cidade, há muita gente de classe baixa que se liga com a escravatura, dizendo-lhes coisas que podem ser fatais. Por exemplo, que a Inglaterra e o Paraguai protegem os escravos e que os para-
guaios nos declararam guerra para libertá-los da escravidão-
Como se vê, o fantasma de uma insurreição ampla estava sempre presente nos pesadelos dos senhores e das autoridades. Levar isto em consideração é importante, tanto para destinar ao negro o verda-
deiro papel que ocupou, como para se pensar o próprio processo do
fim do escravismo nc Brasil. Se não se pode falar de uma sedição negra que tenha provocado o fim do escravismo, o inconformismo dos oprimidos materializado em gestos como fugas, suicídios, assassinatos, rebeliões, demonstra o peso que os escravos teriam em sua própria libertação. A abolição não pode ser reduzida a um ato de brancos.
Foram
Escravos em fuga 150 os escravos
que fu-
giram da fazenda Bom Jardin, do sr. barão da Serra Negra. No acto da fuga, houve conflicto entre os mesmos
por se opporem
alguns .a que praticassem grandes crimes na mesma fazenda estava fazeunla Na referida uma força de linha. Notícia em jomal, de Campinas, às vésperas da abolição
DEBRET - Feitores castigando negros
A rm
ESCRAVIDÃO
ACABOU?
Assinado o decreto da abolição da escravatura no Brasil em 1888
teríamos de fato virado uma “negra” página de nossa história e partido
para a constituição de uma nação-exemplo de democracia racial? Nossos livros didáticos, em sua maioria, ainda dizem que sim, que os três séculos e meio de escravidão não foram senão uma febre passa-
geira que, uma vez superada, não teria deixado vestígios e muito menos sequelas. Estudos bem elaborados vêm mostrando que, infelizmente, a alegada democracia racial não existe. Pesquisas que tiveram em Florestan Fernandes seu vanguardeiro (“O negro na sociedade de classes”, “O negro no mundo dos brancos”, etc.) procuram dar conta da situação subalterna do negro na sociedade brasileira, seja em termos de mercado de trabalho, de acesso à educação, de cargos públicos ocu-
pados e assim por diante. Infelizmente há uma estranha convivência entre o preconceito e a idealização da igualdade racial, o que nos impede de uma reflexão séria sobre o problema. Ora, conscientizar-se do problema é uma etava fundamental para
superá-lo. Neste pequeno capítulo pretendemos divulgar dados já de há muito conhecidos dos pesquisadores, mas, aparentemente, distantes dos “não iniciados”. Dados sobre a situação econômica dos negros,
sobre a situação educacional, sobre o preconceito e até sobre a autorepresentação.
Auto-representação, sim. O problema do negro ter vergonha de sê-lo. De tentar passar-se por branco ou mulato. E, o que é mais grave, introjetando o preconceito, com frequência. Lembro-me da longa conversa que tive com um mecânico negro
que, após consertar minha moto, orgulhosamente proclamou: “serviço de branco, doutor”, aceitando a propalada “evidência” segundo a qual serviço de preto é mal feito. Ou dos negros que se autodenominam 65
“negros de alma branca”. Ou ainda daqueles que dizem, a qua'quer notícia de roubo ou assalto efetuado por um negro, “é, essa raça não tem jeito não; a gente faz o que pode prá melhorar, mas eles (sic) mesmos estragam tudo.” O preconceito se manifesta pela segregação explícita e por manifestações sutis. Exigir, num anúncio, uma funcionária “branca, de boa aparência” é segregar. Obrigar um negro a entrar pelo famigerado ele-
vador “de serviço” é discriminar. Impedir acesso a certos restaurantes,
bares, hotéis e clubes é segregar negros. Dificultar o acesso à educação, a postos-chaves no governo, é discriminar. A seguir, alguns exemplos do que vem sendo dito. O leitor responderá sozinho à pergunta-título desta unidade.
TABELA III Distribuição percentual de empregados, empregadores, trabalhad ores por conta própria e membros da família fora do mercado de trabalho em São Paul o Empregados Brancos
Mulatos
......
......
NeMOS Ea es Amarelos .....
FONTE:
Empregadores 665%
5%
76%
1% .
79% 23%
Conta Própria
Membro da Família
16%
13%
11%
0,8% 10%
9% 32%
12%
11% 35%
Florestan Fernandes, O negro no mundo dos brancos. São Paulo, Difel, 1972, p. 147.
TABELA
IV
Cursos concluídos
Negros ........
(90,2%) (1,8%)
(4,3%)
FONTE:
Florestan Femandes, ibid, p. 148.
(96,3%) (0,5%)
(97,8%) (0,4%)
(2,5%) (0,07%) 100%
(1,5%) (0,06%) 100%
(0,6%)
Amarelos . ...... (3,6%) Sem decl. cor... (0,1%) MOTAS cms ns so 100%
Superior
(0,2%)
O negro no mundo dos brancos. São Paulo, Difel, 1972,
66
Mi giadi
Brancos «ssa las Mulatos » . ....cs
Médio
Es
Elementar
SS
DO
BOX | Anos Rendimento Médio da População Economicamente Ativa de 10
e Mais por Anos de Estudo Segundo o Sexo e a Cor
LHB
70
60
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10
|
11
|
13
17
Anos de Estudo Legenda LU) Homem Branco
+ Homem Negro
O Mulher Branca à Mulher Negra
FONTE: Tabulações especiais do Censo Demográfico de 1980.
|
Os dados transcritos permitem que se destaque: a) Os diferenciais de rendimento mais acentuados
aparecem
quando se comparam homens brancos e mulheres negras, fato que se evidencia nos níveis superiores de instrução. No segmento da PEA que atingiu os níveis mais elevados de escolaridade (14 anos e mais) o rendimento das mulheres negras corresponde a apenas 30,5% do rendimento dos homens brancos.
b) Os diferenciais de rendimento menos acentuados aparecem na comparação entre mulheres negras e mulheres brancas, onde não se observa o aumento progressivo da diferença à medida que se eleva o nível de instrução. c) Para todos os níveis de instrução, as diferenças de rendimentos entre homens brancos e homens negros são menos intensas que entre homens brancos e mulheres brancas. d) Quando se comparam mulheres e homens dentro de um
mesmo segmento racial observamos que os diferenciais são ligeiramente mais acentuados entre os brancos que entre os negr os. Assim, as mulheres brancas obtêm um rendimento médio inferior a 50% dos
homens brancos em todos os níveis instrucionais: as mulheres negr as
obtêm um rendimento ligeiramente superior a 50% daquele recebido pelos homens negros. Quando se tenta compreender como se processa esta diferenciação salarial entre os segmentos raciais e os sexos, a despeito da eqjivalência dos níveis de instrução, a primeira tentativa de explicaç ão que ocorre proviria do número de horas trabalhadas: negros e mulher es teriam rendimentos inferiores porque trabalhariam um menor número de horas semanais. Estudos recentes têm mostrado, porém, que não exis-
tem diferenças significativas entre a jornada de trabalho de homens e mulheres, de jovens e adultos e que, ao contrário, a população negra tende a trabalhar um maior número de horas semanais que a branca. Por outro lado, as diferenças de rendimento entre homens e mulheres, brancos e negros, têm sido atribuídas pelos estudos brasileiros, exclusiva ou principalmente, às discriminações que sofrem estes segmentos populacionais no mercado de trabalho. À nosso ver, a desigualdade salarial observada reflete tanto uma discriminação do mercado de trabalho quanto uma co-responsabilidade do sistema educacional, pois a escola frequentada pelo branco e pelo negro, pelo homem e pela mulher, não é a mesma, da mesma forma que a escola frequentada pelo rico não é a mesma que o pobre frequenta. Ou seja, um mesmo nível de instrução pode esconder trajetórias escolares diversas, tanto no que diz respeito à qualidade do ensino oferecido quanto aos ramos de ensino seguidos. Rosemberg (1981), analisando escolas da rede estadual situadas na Grande São Paulo, verificou que aquelas que atendem à “população carente” tendem a ser “escolas carentes”, isto é, escolas que não oferecem condições para que as aprendizagens ocorram adequadamente. Os dados que obtivemos sobre as escolas frequentadas por alunos brancos e negr os
sugerem
tendência semelhante: o aluno negro tende a frequentar,
mais intensamente que o branco, escolas públicas e particulares de pior qualidade. Os alunos brancos estariam sendo, portanto, melhor preparados pelo sistema de ensino, o que lhes poss ibilitaria 68
desempenho mais competitivo no mercado de trabalho (Rosemberg et alii, 1986).
Além das diferenças quanto à qualidade do ensino, o sistema es-
) a o r t b n o e m e a d i o c dio ã n ã ç e e m a d d r e a a r p u p i o c ( e c i r t da p colar par srenciada, também através da diferenciação de trajetórias escolares.
a dem ten s nco bra e ros neg es, her mul e ens hom , mos tra mos já o Com
seguir ramos de ensino diferentes, que desembocam mais ou menos valorizadas no mercado de trabalho.
FONTE:
profissões
em
Fúlvia Rosemberg, Educação: Democratização e desigualdade. Mimeo, São Paylo, Fundação Carlos Chagas, p. 15/17.
BOX
II
Sondagem realizada recentemente junto a eleitores de São Paulo
concelto
racial |
|
F
Instrução
Renda
B | 1 | S
latéso|s1w150|+151
Estado Civil
Idade
Sexo
Existe pre-
l1825/2835/36+]
S | C
joutros|
TRE
SIM
73.0 | 72.9]
80.2]
75.5]
58.8]
77.3|
66.7]
58.3 | 61.4]
79.7]
90.9]
65.3]
68.8]
90.7)
73.0
NAO
2701
27.1]
19.8]
24.5]
41.2]
33.3)
22.7]
41.7]
38.6]
20.3]
9.11
34.7]
31.2
sq
27.0
[100 | 100 | 100 |(33) | (49) | (93)
õ|
100
tes)
(185)
TOTAL
FONTE:
|100 | 100 | 100 | 100 | 100 100 (100) | (85) | (81) | (53) | (91) id
100 | 100 | 100
[100
(54) | (12) | (88) | (64)
Ana Lúcia Farah Valente, O eleitorado negro em São Paulo: resultado de uma son-
dagem. Mimeo, ANPOCS, São Paulo, 1984, p. 11.
69
BOX
Sondagem junto a eleitores negros de São Paulo
Auto
Sexo
Idade
Estado Civil
Instrução
Renda
representa-
ção
M |
F
4.0|
4.7 |
5.0)
3.8]
Brasileiro
1.0]
—-
1.2 |
Branco
1.0]
8.3]
Mulato
4.0]
3.5 |
Não quis se definir
|1825/2635/36+|
TOTAL
S |
C
loutros|
B
3,9]
4.2]
5.5
—
3.4]
6.3]
3.0|
2.0
4.3 |
7.0]
4,3
—-
—
0.8|
—-
-
—
—
3.0|
—
Ro
2.3!
0.5
1.2]
1.9]
2.0]
2.5]
—
—
—
1.5]
6.1
—
—
7.0|
1.6
6.2)
1.9)
2.0]
5.1]
1.8
=
2o|
3.1]
9.1
6.1
21)
4.7]
3.9
8.6)
7.5/13.7|
16.7
112.5]
9.4]
3,00
2.0 | 10.7
/16.3]
9.7
121.0
/18.9/13,.7
33.3
/17.0/20.3
S
[até50]51/150]+ 151
Mulato claro
9.0/15.3|]
7.6/13.0/]
Mulato escuro
Moreno
15.0
122.3
8.0]
6.0]
5.0/11.3|]
5.9]
117.6
16.7.
9.2]
3.7]
Negro
62.0
TOTAL
(100)|(100)|(100)|(100)|(100)|(100)
(100)|
/45.9/51.8/54.7
(85)|
(81)|
(53)|
|58.8/53.0/59.3|
(51)|(119)]
(100)|
(54)]
-
10.2]
/18.2 | 22.5 | 19.4
3.1]
6.11
50.0
|54.6156.3
151.51
(100)
|(100)|(100)|(100)|
(12) | (88)|
(64)|
(33)|
12,3
BS
55.1 | 57.0
111.6 | 18.4
2 LSI
48.8 | 54.0
(100) | (100) | (100)|
(49)|
(93)|
RO
(100)
(43)| (185)
O “embranquecimento”, pelo menos pela auto-imagem, é mais frequente entre as mulheres do que entre os homens.
FONTE:
Ana Lúcia Farah Valente, O eleitorado negro em São Paulo: resultado de uma sondagem. Mimeo, ANPOCS, São Paulo, 1984, p. 22.
70
BOX
IV
ões e Regi des Gran as o und Seg Cor, por o laçã Popu a d ão iç Distribu
Unidades da Federação — 1980
Distribuição da População (%)
Grandes Regiões e
Unidades da Federação
Cor Total
Branca | BRASIL
100,00 |
Preta | Amarela | Parda |
Sem
Declaração
54,23
5,92
0,56
38,85
0,44
20,11 IIS
2,69 3,54
0,24 0,17
76,18 61,22
0,78 1,34
NORTE Rondônia
100,00 100,00
Amazonas Roraima Pará Amapá
100,00 100,00 100,00 100,00
18,02 25,27 18,61 20,53
1,71 3,12 2,90 | 3,37
0,28 0,53 0,24 0,08
79,25 70,67 77,50 75,74
0,74 0,41 0,75 0,28
NORDESTE Maranhão Piauí Ceará Rio Grande do Norte Paraíba Pernambuco” Alagoas Sergipe
100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
20,80 21,86 15,41 27,85 38,65 34,48 33,77 26,68 26,30
6,73 74lT 6,38 4,16 4,16 3,97 4,82 So 5,47
6,13 0,20 0,10 0,16 0,11 0,15 0,08 0,16 0,09
65,82 69,60 77,80 67,40 56,75 60,90 60,96 68,85 67,69
0,52 0,57 0,31 0,43 0,33 0,50 0,37 0,59 0,45
Acre
100,00
23,11
3,06 |
0,25 | 72,80
0,78
Bahia
100,00
21,82
ISIS
0,13
66,16
0,74
SUDESTE Minas Gerais Espírito Santo Rio de Janeiro
100,00 100,00 100,00 100,00
66,33 57,931 54,12 60,59
7,02 8,35 7,10 10,79
0,97 0,09 0,04 0,11
25,32 34,02 38,38 27,96
0,36 0,23 0,36 0,55
100,00
74,73
4,60
1,90
18,42
0,35
100,00
83,95
3,16
0,46
12,08
0,35
1,04
18,95
São Paulo
SUL Paraná
100,00
77,11
2,60
0,30
Santa Catarina Rio Grande do Sul
100,00 100,00
91,44 87,16
2,07 4,21
0,07 0,08
6,06 8,14
0,36 0,41
CENTRO-OESTE
100,00
49,46
4,17
0,32
45,61
0,44
100,00 |
39,46
5,30 |
0,35 | 54,11
0,78
Mato Grosso do Sul
100,00
Goiás Distrito Federal
100,00 100,00
Mato Grosso
55,02 49,40 52,91
2,65
4,67 3,18
0,75
0,14 0,36
41,25 45,40 43,14
0,33
0,39 0,41
IBGE, Diretoria Técnica, Departamento de Estudos de População, apud Anuánio Estatístico do Brasil, 1983. Noronha * Inclusive o Território de Femando de
FONTE:
11
BOX
V
Distribuição Percentual dos Grupos Raciais Segundo Rendimento Médio Mensal da PEA — Brasil, São Paulo — 1980 Até 1
De1tas
Salário |
Salários
Mais de 5 | Sem Rendim. Salários
Mínimo | Mínimos Branco
Amarelo
Preto
Pardo
(Negro”)
TOTAL
Minimos
Sem
Declarar
Desempr.
TOTAL Ya
1000
|S. Paulo |
15,3
62,9
18,0
3,6
100 |
Brasil
24,6
54,0
13,8
7,6
100 | 24.036
S. Paulo
52
49,7
38,1
7,0
100
218
| Brasil
9,5
48,1
34,6
7,8
100
294
26,5
67,0
3,5
2,9
100
547
44,2
2,0
6,7
100 |
2.876 2.000
S. Paulo |
7.609
Brasil
47,1
S. Paulo
21,4
69,9
5
3,5
100
Brasil
44,4
42,0
3,7
9,9
100 | 15.861
5. Paulo
22,6
69,3
Ao
3,4
100 |
Brasil
44,8
42,3
3,4
9,4
100 | 18.738
S. Paulo
16,8
64,4
15,2
3,4
100 | 10.411
Brasil
33,2
48,7
9,4
9,4
100 | 43.235
—
2.548
FONTE: Censo 1980, apud Cameiro & Santos (1985) p.20 (") Preto + Pardo sa
INCIDENTES DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL E RACISMO REGISTRADOS PELA IMPRENSA 1. JB 15.04.71 Caruaru (PE). O Clube Náutico de Ipojuca exclui negros de serem contratados como jogadores de futebol. Segundo um dos artigos do regulamento do clube, é permitido, no máximo, a contra-
tação de morenos “desde que não sejam morenos demais”. Recentemente, a diretoria chamou o treinador e decidiu fazer uma “limpeza” no
time de futebol, que estava “infiltrado de elementos quase negros, € alguns negros de verdade”. 2. JB 21.05.71 Salvador (BA). R.B.G., professora preta, acusou
F.J. de nacionalidade síria e síndico do edíficio em que reside, de não deixá-la usar o elevador social, sob a alegação de que “mulher preta só
A
=
Elil E
E
Ê
E j
F
“es
72
pode ser doméstica ou vagabunda”. A acusação foi levada ao delegacao e sobr u sto ife man se bém tam nça ura Seg de io etár Secr O A.B. do so, dizendo que ele criou uma boa oportunidade para lembrar que a
discriminação é anticonstitucional.
3 JB 14.09.71 Belo Horizonte (MG). Cansado de viver em companhia de uma mulher preta, S.D.C,, pedreiro, mulato de 39 anos, tentou resolver seu problema racial dando um banho de soda cáustica em
sua mulher, A.M.S., para mudar-lhe a cor e ganhar, desse modo, uma companheira branca. S.D.C. para quem se black is beautiful, branco é
melhor, chegou em casa na noite de sábado meio embriagado e decidiu que a melhor solução para a sua questão racial era conservar a mulher mudando-lhe a cor. 4 JB 04.02.72 São José (SC). G.S., 32 anos, solteiro, foi um dos que mais ajudaram na construção do clube paroquial de Santa Tereza, em São José, mas não conseguiu participar do baile público de inauguração. Não pôde entrar porque é negro. A denúncia partiu de R.L.M,, telefonista da Universidade Federal, a quem o presidente do clube :manifestou que “esta festa é de inauguração do clube e tem muita gente importante”. O vigário da paróquia concordou com a barração de G.S. já que não queria desagradar aos demais diretores do clube, pessoas que ajudavam à paróquia. Perguntado se não iria tomar nenhuma providência, G.S. afirmou que não. Mostrou-se surpreso ao saber que a Constituição previa punição de preconceito de raça e mais ainda ao saber que a Lei A.A. punia com
prisão e 15 dias a três meses quem
recusasse a entrada em estabelecimento público de diversões a qualquer pessoa por preconceito de raça ou cor. 5. O Dia (Recife) 18.05.73 Olinda (PE). A direção da Academia Santa Gertrudes, das freiras Beneditinas de Olinda, negou que a Profa. T.V.R., noviça em vésperas de receber o hábito, tenha sido afastada
devido a sua cor negra. T.V.R. é africana de Angola e deixou de dar aulas, segundo denúncia feita, por pressões das mães, que não queriam ver suas filhas estudando “com uma negra que devia ser empregada doméstica” e “que é uma negra africana que tem o sotaque horrível”. 6. JB 22.02.76 Pelotas (RS). A diretoria do Clube Comercial de Pelotas tentou justificar com duas notas a posição que adotou depois de denunciada a intenção de segregacionismo racial nos bailes de carnaval a serem promovidos em sua sede pela Prefeitura Municipal da cidade. Para não permitir a entrada de negros em seus salões, cancelou todos os acordos já assinados. A denúncia de que as entidades negras estavam sendo sabotadas na promoção partiu do vereador F.P.M. (MDB). Outro vereador do MDB, ALL., afirma não tratar-se de caso isolado. Existe segregação na maioria das sociedades (clubes) do Rio Grande do Sul. Os dois mil sócios do centenário clube pelotense são todos brancos.
Ss
73
7. JB 05.11.76 Rio de Janeiro (RJ). O estudante quintanista de
medicina O.S. vai constituir advogado contra a diretoria do Sanatório
Botafogo por não lhe ter permitido realizar estágio naquela clínica por
ele ser negro. (UH
19.1.76): Como
prova, o estudante juntará a grava-
ção de seu diálogo com o Dr. P.C. no qual o psiquiatra explica que a
razão principal de sua não contratação como estagiário é o fato de ele ser preto. O médico diz que o diretor da clínica não permite a admis-
são de psiquiatras pretos por causa de sua clientela de alto nível. 8. JB 24.03.77 Belo Horizonte (MG). A Câmara Municipal constitui comissão especial para apurar denúncias de moradores do bairro
Cidade Nova, segundo as quais foi proibida a matrícula de alunos ne-
gros no Grupo Escolar Modesto Cravo. A comissão esteve no grupo escolar e constatou que ali não existe nenhum aluno preto e que há
vagas em todas as séries. 9. ESP 20.04.77 Criciúma (SC). O vereador C.C. denunciou, na
Câmara Municipal, a existência de discriminação racial nos clubes e associações da cidade, especialmente nos 23 centros comunitários criados pela Prefeitura com o objetivo de oferecer lazer à população local. Citou o caso da professora negra C.L., barrada na festa realizada na Sociedade Recreativa União Mineira, porque não era sócia daquele clube. Declarou ainda: “As lojas locais não têm uma única balconista negra, enquanto centenas de negros com instrução secundária completa são obrigados a trabalhar como simples mineiros nas empresas carboníferas”.
10. JB
Câmera
25.05.77
Passo
Fundo
de Vereadores de Passo
(RS).
Fundo
Uma
CPI, nomeada
vai apurar se houve
pela
infração
da Lei A.A. na eleição de representante da cidade no concurso de Miss Rio Grande do Sul. Denúncia do radialista e vereador P.S.. que participou do júri, diz que a escolhida era a universitária A.L., de 21 anos, preterida por ser mulata, em favor da branca REA A mudança teria sido feita em consequência do protesto de duas juradas, senhoras da so-
ciedade local, que argumentaram: “não ficar bem para Passo Fundo ter uma representante de cor”.
FONTE:Carlos A. Hasenbalg, 1979, p. 271/281.
Discriminação e desigualdades sociais no Brasil. Rio. Graal
ooo E"
DE
SUGESTOES
COEINRURA
EE
não
Este não é um estabelece uma
trabalho acadêmico. Não traz notas de rodapé, discussão bibliográfica explícita, evita uma ter-
minologia que possa afastá-lo de um público maior. Não foge, contudo, de algumas questões básicas relativamente à problemática da es-
cravidão no Brasil e que vêm sendo tratadas por autores ca mais alta significação. As pessoas familiarizadas com a bibliografia sobre o tema reconhecerão aqui polêmicas extremamente atuais — e de suma importância por baixo do jargão acadêmico — que buscamos resumir e apresentar aos leitores. Devido às características da coleção, várias vezes fizemos referências textuais — ou quase — a autores sem citá-los. Ao listar aqui os livros que efetivamente funcionaram como base para este trabalho, pretendemos não apenas citar nossas fontes, como ainda sugerir leituras mais aprofundadas àqueles que assim o desejarem.
É importante lembrar que este volume não é um simples resumo
dos livros citados. Ele se baseia também
em pesquisas originais que
realizamos por vários anos com a colaboração de três então alunas nossas: Jussara, Letícia e Lili.
É muito vasta a bibliografia a respeito de escravidão no Brasil. A que listamos a seguir refere-se unicamente a obras diretamente utili-
zadas para a realização do trabalho. Vários capítulos estão montados a partir de um ou outro dos livros aqui apresentados e só não são citados textualmente devido à
exigência da coleção. Para O leitor que quiser se aprofundar no assunto fica uma indicação eclética que poderá auxiliá-lo em suas pesquisas.
15
ALENCASTRO, Luis Felipe de — Le commerce des vivants: traite dos. claves et “pax lusitana dans IAtlantique sud. (3v.) Tese de Dousorado. Paris, 1985
CAPELA,
José — Escravatura.
Conceitos.
edição — Afroniamento, Porto, 1978.
CARDOSO,
A empresa
de Saque — 2a
Ciro Flamarion S. — Agricultura, Escravidão e Capitalismo
— Editora Vozes Ltda, Petrónolis, 1979.
COSTA, Emília Viotti da — Da Senzala à Colônia — Difusão Européia do Livro, São Paulo, 1966.
FERNANDES, 1977.
GORENDER,
Paulo, 1978.
Florestan — Circuito Fechado
— Hucitec, São Paulo, |
Jacob — O Escravismo Colonial - Editora Ática, São
GOULART, José Alínio — Da Palmatória ao Patíbulo (Castigos de Escravos no Brasil)- Editora Conquista, Rio de Janeiro, 1971.
GOULART, dia dos 1971.
José Alívio — Da Fuga ao Suicídio — (Aspectos de Rebel-
Escravos
no
Brasil)
— Editora
Conquista,
Rio de Janeiro,
GOULART, Maurício — A Essravidão Africana no Brasil (Das Origens à Extinção do Tráfico) — Editora Alfa-Omega, São Paulo, 1975. IRMÃO, José Aleixo — À Perseverança nal “O Cruzeiro do Sul”, (s. 1.), 1969.
Ill e Sorocaba
— Grática do jor-
LAPA, José Roberto do Amaral (org.) — Modos ds Produção e Realidade Brasileira - Editora Vozes, Peiróvolis, 1980. MARCHANT, Alexander - Do Escambo à Escravidão — trad. Carlos Lacerda — Comaanhia Editora Nacional, 1980. MATTOSO, Katia M. de Queirós — Étre Esclave au Brésil (XVIEXIXe siécle) — Hachette, Paris, 1979. NOVAIS, Fernando A. — Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808) - Editora Hucitec, São Paulo, 1979. QUEIROZ, Suely Rosles Reis de — Escravidão Negra em São Paulo — Livraria José Olympio Editora/MEC - Rio de Janeiro, 1977.
RODRIGUES,
Nina — Os Africanos no Brasil — Companhia
Editora
Nacional, São Paulo, 1976. STEIN, STANLEY J. — Grandeza e Decadência do Café no Vale do Paraiva — trad. Edgar Magalhães — Editora Brasiliense, São Pau lo, 1961.
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A participação do leitor é muito importante neste livro. Sem isso há o perigo de o conhecimento livresco permanecer desvinculado da vida real. Gostaríamos, portanto, de sugerir algumas atividades que pudessem enfatizar (ou negar) algumas das teses defendidas no de-
correr do volume.
É sempre interessante trabalhar com dados estatísticos. Procure a
sede do IBGE da sua cidade e levante os dados referentes à cor da pele nos censos em que este dado aparece. Você obterá um certo percentual de negros na população. Vale a pena confrontar esses dados com outros sobre presença de negros em classes universitárias ou número de professores negros em colégios e universidades. Confronte o número percentual de presidiários negros com o de congressistas negros. Tente encontrar nos cartórios de sua cidade dados relativos à escravidão. Há mais do que muita gente pensa. Ler um documento é uma experiência fascinante. Talvez sua cidade tenha um arquivo organizado (como o Arquivo do Estado de São Paulo), onde as informações sejam mais fáceis de ser obtidas. Aí você poderá desenvolver muitas atividades sugeridas pelo texto que acabou de ler. Procure, em jornais antigos, material sobre a escravidão, como os anúncios que você viu nas páginas deste livro. Bibliotecas municipais, gabinetes de leitura e mesmo particulares constituem-se em excelente acervo para uma rica pesquisa em jornais. Busque em jomais e revistas mais recentes referências preconceituosas contra negros. Você po-
derá notar isso em apelidos a jogadores, notas policiais e até em edi-
toriais e no noticiário geral. Preocupe-se em observar a presença negra em novelas de televisão, entre animadores e apresentadores de TV. Procure, por outro lado, observar esta presença entre crianças abandonadas nas ruas, ff
operários e empregadas domésticas. Discuta com colegas, amigos e
professores as explicações para o fenômeno que você observar.
Procure, além dos livros listados, outros que discutam questões
raciais. Você acredita que alguma raça possa ser superior ou inferior a
outra? Leia sobre o assunto e discuta em classe. E, após as discussões, se achar interessante, entre em contato com o autor deste livro, apresentando as suas posições, no encereço da editora.
REPENSANDO
A HISTÓRIA
tem como proposta básica criar alternativas para o ensino e o aprendizado de história do Brasil. Seu objetivo é desenvolver a visão crítica de estudantes e
professores,
através da discussão, análise e reformulação constantes dos temas
históricos, evitando visões fechadas e dogmáticas. Para tanto, pretende comprometer diretamente os estudantes, incentivando sua participação ativa no processo de elaboração do saber histórico quer pelo tratamento
desmitificador dos “grandes temas”, personagens e visões consagradas, quer pela abordagem de questões que fazem parte do dia-a-dia das pessoas “comuns” que, sistematicamente, têm sido postas à margem da história. A responsabilidade pelos textos que compõem REPENSANDO A HISTÓRIA, está sendo atribuída a autores com experiência em ensino e pesquisa, comprometidos com as idéias de renovação que inspiraram sua
criação. O resultado são livros que encerram discussões substanciosas sem
prejuízo da clareza, objetividade e adequação ao público a que se destinam.
TÍTULOS JÁ PUBLICADOS
ESCRAVIDÃO NO BRASIL, de Jaime Pinsky
O MITO DO HERÓI NACIONAL, de Paulo Miceli A MULHER NA HISTORIA DO BRASIL, de Mary Del Priore TÉCNICA E SOCIEDADE NO BRASIL, de Diana Vidal
CINEMA E HISTÓRIA DO BRASIL,
de Jean-Claude Bernardet e Alcides SUBMISSÃO E RESISTÊNCIA: a mulher na de Maria Lucia de Barros IMPRENSA E HISTÓRIA DO BRASIL, de A CLASSE OPERÁRIA VAI AO SINDICATO, PARTIDOS POLÍTICOS NO BRASIL, de
Freire Ramos luta contra a escravidão, Mott Maria Helena Capelato de Letícia Bicalho Canêdo Edgard Ferreira Neto
CANUDOS, UMA UTOPIA NO SERTÃO, de José Antônio Sola
"*
REVOLTAS E REBELIÕES, de André Luiz Joanilho
AS VÁRIAS FACES DA INCONF. MINEIRA, de Júlio José Chiavenato REPÚBLICA: UM OUTRO OLHAR, de Ana Luiza Martins
O BRASIL NOS PRIMEIROS SÉCULOS, de Laima Mesgravis HISTORIA
DA CASA
BRASILEIRA,
de Manuel
Correia de Andrade
de Carlos Lemos
1964 E O NORDESTE: GOLPE, REVOLUÇÃO OU CONTRA-REVOLUÇÃO,
PEQUENA
HISTÓRIA DA AGRICULTURA NO BRASIL, de Tamás
Szmrecsányi
O BRASIL DE 1945 A 1964, de Edgard Luiz de Barros GOVERNOS MILITARES, de Edgard Luiz de Barros
Conheça também da Coleção Vivendo a História, o livro: BRASILEIRO(A) E ASSIM MESMO - Cidadania e Preconceito, de Jaime Pinsky e Luiza Nagib Eluf Procure os livros da Editora CONTEXTO nas boas livrarias de todo o Brasil. Caso não encontre, peça diretamente à Editora Contexto, Rua Acopiara, 199 - CEP 05083-110 - S. Paulo - SP Fone: (011) 832-5838 - Fax: (011) 832-356] a
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A HISTÓRIA GERAL
tem por objetivo desenvolver a visão crí tica através da discussão, reformulação constante dos temas históricos.
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Pretende, também, estimular a participação de todos no processo de elaboração do saber histórico, tanto atra vés do tratamento desmistificador de visões consagradas, como pela abordagem de questões que fazem parte do dia-a-dia das pessoas “comuns”, sistematicamen te postas à margem da história.
TÍTULOS JÁ PUBLICADOS:
CULTURA POPULAR NA ANTIGUIDADE CLÁSSI CA, de Pedro Paulo Funari REFORMAS RELIGIOSAS, de Flávio Luizetto OS MUÇULMANOS NA PENÍNSULA IBÉR ICA, de Ruy Andrade Filho GUERRAS E GUERREIROS NA IDADE MÉDI A, de Cyro de Barros Rezende Filho
A MULHER NA IDADE MÉDIA, de José Rivair de Macedo
ANTIGUIDADE ORIENTAL:
POLÍTICA E RELIGIÃO
de Ciro Flamarion S. Cardoso É ESTADOS UNIDOS: DA COLÔNIA À INDEPENDÊN CIA, de Leandro Karnal O MERCANTILISMO E A AMERICA, de Cleber Cristiano Prodanov ESTADOS UNIDOS E AMÉRICA LATINA, de Gerson Moura A REVOLUÇÃO FRANCESA E A MODERNIDADE, de Berenice Cavalcante
HISTÓRICA IBÉRICA: APOGEU E DECLÍNIO, de Flavio Campos DESCOBRIMENTOS E RENASCIMENTO, de Janice Theodoro A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL, de Augustin Wernet
Conheça também, da coleção Vivendo a Histór ia, o livro: BRASILEIRO E ASSIM MESMO: CIDADANIA E PRECONCEITO, de Jaime Pinsky e Luiza Nagib Eluf Procure os livros da Editora CONTEXTO nas boas livrarias de todo o Brasil. Caso não encontre, peça diretament e à Editora Contexto, Rua Acopiara, 199 - CEP 05083-110 - S. Paulo - SP
Fone: (011) 832-5838 - Fax: (011) 8323561
REPENSANDO A HISTÓRIA
tem por objetivo desenvolver a visão crítica através da discussão, análise e reformulação constante dos temas históricos. Pretende, também, estimular a participação de todos no processo de elaboração do saber histórico, tanto através do tratamento desmistificador de-visões consagradas, como pela abordagem de questões que fazem parte do dia-a-dia das pessoas “comuns”, sistematicamente postas à margem da história.
A ESCRAVIDÃO NO BRASIL
é uma pequena obra-prima que reúne, de forma equilibrada, profundidade de pesquisa e simplicidade de exposição. “Jaime Pinsky, professor titular da UNICAMP, toca, através deste livro, em temas como a viagem dos escravos da
África ao Brasil, sua vida cotidiana nas fazendas, sua luta pela liberdade, sua sexualidade, e vários outros. Livro apaixonado, leitura apaixonante,
A ESCRAVIDÃO NO BRASIL sai em nova edição, totalmente revista e ampliada com dados e informações fundamentais para todos que se interessam pela nossa história social.
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