A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista 9788575592984


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A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista
 9788575592984

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~o m,, •milênio. a dasse trahalliadora brasilhna tnmsfi m1 u-se em um rt"speitá.vel ator glob~, estimuland9 nmoo PSforços investigati.vos para c{fmpreeri,der sua amai. iinâmica histórica e política. Com este rn~Irilifilmente ambicioso livro, Ruy Braga não a:pen.as respom.k ao desafio, como também inaugura um capítlJ!.o na~ linh~em da sociologia do, i'rabalho lll0 füa,sil.

Dt-bme tf'rico. análise lristóriea e observa~·ão etrwsráfi .. t>Stão mw'to bem entrelaçados. No tocante à teuru.i.. Braga eng~ia-se na :rica 'tradição tle pensar a namn-7a da dassn>ira. e cheg~ndo a perspectivas co.ntemporâ...-. mo as de André S:ingei; e Jessé 5ouza. Ao mea·- :l·mpo, desafia alglill-s rMen1íes tefü-i.c~s euro'}?~us da pn"t-ariedade-. rom.0 Robert Casliel e Guy otantlirig, ar!!Um••mando que o atu.al "preeariado': não reswlt-a 'olllJ)iesme-nte das abeiTas "tele1'.:>pe1:aidore;;- pauli$1.anos, aris, PUF, 199 1). "De alguma maneira, trata-se do reromo das classes perigosas, ou seja, da cristalização em cercos grupos sociais situados nas mai·gens de rodas as ameaças que carrega em si uma sociedade. O proletariado industrial desempenhou esse papel no século XIX: classes trabalhadoras, e.lasses perigosas.» Robert Castel, La inseguridatl soda!:· Sim, ao longo do segw1do pós-guerra, o fordismo periférico . redo . d , 19 ceria se cransformado no modelo de descnvo lv1menro p minante naqu cs patses •

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grande medida, esse movimenco foi coroado pela criação_ do Ins'. i~to de Organiwçáo_ l"l.:icio n~l do Trabalho (ldort), em junho de 1931, rendo Simonsen como diretor fCOllCO. No Idort reuniram-se tmporrantes figums públic:is, como o engenheiro Annando Salb ~e Oliveira~ w1ccor do inMi'.u10 na époat d~ sua criação e, posrcriormcme, interventor e governador do Estado de Sao Pau lo. Para mais dernlhes, ver N,lton Varg.is, "Gênese e difusão do taylorismo 110 Brasil", Ciênci(IJ Sociais Hoje(Sáo Paulo, ~orrez--:n~es, 1~85): Sobre O movimemo de racionalização do trabalho industrial na àécada de 1920, alem da croaçao do Seruu e do Scsi ver Barbara Wcinstcin, (Re)farmt!fnO da classe rmbalhadom 1io Brasil (1920-1964} (São Paulo, Conc1., 2000). A respeito da trajetória e do desrino lústórico do Idort, ver Maria A111onitta l\fartinc-,., A vitória da razlío(?): oMm e11 sociftlade pauliJt11 (São Paulo, Marco 1/..ero, 1993). Sem mencionar o estudo de Jual'C1. Brandão Lopes sobre fábricas têxteis em pequenas cidades mineiras, objeto do pri~eiro capfc~o dcsrc trabalho. Vale lembrar que a mais bem-sucedida análise da gênese, da estrutura e da cnse do tayloi:15· mo primitivo no Brasil foi empreendida por José Sergio Leite Lopes em sua_renon~ada etnografia do maior polo da produção rêxtil nacional no imediato pós-Segunda Guen~ Mundial, it odac!e per'.,am~ucrna de Paulisca, construída pela Companhia de Tecidos Paulista. Para mais detalbes, ,·er Jo,,c Serg10 Leite t .opes, A 1mkigem tÍIJs ronjlito; de clmtt na "ridade dm chmmnés" (São Paulo, Marco Zero, 1988). Ver Ahin Llpierz, Miragens e milagres: problemas dtt indmtrinlizaçáo no Terceiro M11ndo (Sáo Paul~, Nobel, 1988). Parn uma síntese da trajetória da teoria francesa da regulação, ver Ruy Braga, A nostntgía do fordiJmq: modernizafdO e crise na teoria da sociedade salari,1/ (São Paulo, Xamã, 2003).

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De foto, a análise d::is relaçóes sociais de produção ocupa um espaço privilegiado neste livro: ao in terpretarmos a crise do fordismo periférico no país partindo dos desajustes e1.me o regime de acumulação despótico e o modo de regulação populista, pensamos atualizar a problematização marxista da regulação dos conflitos de classe20. Sinteticamente, a sociologia marxista co11struiu um modelo globalizante do funcion amento do modo de produção capitalista combinando crês teses principais: 1) a tese da reprodução das relações sociaís de produção afxrma que, em virmde da natureza exploradora do sistema capitalista, a estrutura de classe é inerentemente instável, exigindo a intervenção de arranjos institucionais para regulá-la; 2) por sua vez, a tese da natureza contmditória do capitalismo advoga que as soluções inst.itucionais encontradas para o problema da regulação das relações de produção apresentam a. tendência imanente de se tornarem menos funcionais; 3) a tese da crise e da transformação das instituiçóes pleiceia que, tendo em vista a combinação das teses 1 e 2, as instituições selecionadas pela manutenção das relações sociais de produção tenderão a ser periodicamente desafiadas e transformadas por meio de crises21 • Recorremos ao aparato conceitual regulacionista a fim de passar do n ível conceituai abstrato p ara a análise hiscórica concreta. Esquematicamente, diríamos que tendo em vista a natureza dependente e despótica da industrialização brasileira, um modo de regulação populista desenvolveu-se a partir da década de 1940 visando garantir a reprodução das relações de produção em condições sociais periféricas. A medida que os trabalhadores brasiJeiros, em éspecial o proletariado precarizado, 20

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Vale observar que, por modo de regulação, emendemos o complexo social formado pelas instituições com responsabilidade direta pela reprodução mais ou menos coerente dos conflitos inerentes às relações sociais de produção capiralistas. Usualmente, essas instituições orga nizam-se em torno da normalização global d as relações capital-trabalho (legislação crabalhista, p revidência p ública), do controle dos sindicatos e dos mercados (interno e externo) de t rabalho. A eficácia de um modo de regulação (sua hegemonia) pode ser medida por sua capacidade de reproduzir os co nflitos trabalhistas por meio da construção do conscnrimento entre as classes sociai.s subalternas, isco é, sem a necessidade do uso da força repressiva do aparato estacai. Por regime de ammulaçáo, compreendemos as instituições sociais com responsabi.lidade d ireta pela reprodução cio processo de valorização do valor (produção e apropriação privada do excedente econômico) em um contexto histórico dado. Usualmente, o regime identi fica-se com os sistemas empresariais derivados do cruzamento dos diferentes modelos orgaaizacionais de conffole do trabalho, das formas de contratualização de força de trabalho e da base tecnológica das empresas. Finalmente, por modelo de desenvolvimento, entendemos a combinação histórica mafa ou menos coerente de um determinado modo de regulação com um regime de acumulação dado. No caso brasileiro, um mesmo modelo de desenvolvimento, o fordismo pe.riférico, por exemplo, componou diferentes modos de regulação, o populista (1943-1964) e o autoritário (1964-1986), além de supor distintos momentos do regime de acumulação despóüco: a superação do taylorismo primitivo (meados dos anos 1940), seguida pelo auge (período do "milagre" econômico brasileiro, de 1968 até 1974), pela crise (a chamada "década perdida", de 1978 acé 1989) e pela substituição do fordismo periferico por um novo regime de acum ulação pós-fordista e financeiriiado (de 1994 até os dias atuais). Para mais detalhes sob re a definição dos conceitos regulacio• n istas, ver Jean-Marie Vincem (org.), Écok de la régu!ation et critique de /,1raison économique (Paris, L'Harmattan, 1994). Pa1·a mais detalhes, ver Michael Burawoy e Erik Olin Wright, "Sociological Marxism", em Jonachan H . Turner (ed.), Handbook o/SociokJgi _P· 6~. Naturalmente, caberia aos rr,ibalhadores confurmarein-se com essa condição inelutável e . necessana, deixando a tarefu da denúncia de seus dissabores diá rios para a "verdadci ra sociolooia cririca" ., s Para_q_uem se propõe a explicar o ft:itiço, Souza não tem nada a dizer sobre o feiticeiro. Reflexivame;1_ re, dtr:amos: o :;xercício_da violência simbólica não é um privilégio da burguesia ou das classes médias: ~~mb~1~ a tal verdadeira sociologia crítica", que Souza imagina representar, reproduz a violência s11n bol1ca contra os grupos ~ubaltcmos poliúcamence ma is organizados. 3 '

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N,1~ 1H1hl11 1,1~ p.lgi n:1s, :wg1.1mc11r:1rcmos que a participação eleitoral rcprcscntn t', n111lt:1s vcl.,1lhado1\'~ vindos de ,írc:is tradicionais[... ], os sindicali·1~tdos e os operários de origem .igrícoln [.. .].~1

, l,1, ,isr.1s", ou :;çja, respostas que mcnd oua111 o sindicato não como cncid.1dc :1,,,,i,1c11d,1I l:1~ is1t·11cb médica ou jurídic.'l], mas como organização de defesa do prolet-a ri ado. " N;1 verdade, os números nunca falam por si e a noção de passividade operária acabou produzindo uma espécie de "inversão" nas informações recolhidas pelo autor. Um:i interpretação altemadva diria simplesmente que a "assistência jurídica" não deve ser agregada aos "serviços médicos e dentários". Afinal, os trabalhadores recorrem à assistência jurídica sindical quando vivenciam situações de conAit0 laboral, pois trata-se de um meio de defesa dos direlrns trabalhistas. Mesmo Rodrigues reconhece isso 11uando, comentando a interpretação que os operários apresentam em relação ao serviços j urídicos prestados pelo sindicato, afirma: "O siodicato apresenta-se como um instrumento a s.er ucilizado na perspectiva das ambições de melhoria de vida ou de ascensão social. O trabalhador 'conhece seus direitos' assegurados pela legislação trabalhista e dela se vale contra a empresa''38 • Caso agregássemos as respostas relacionadas à "assistência jurídica" àquelas relativas ao papel do sindicato como instrumento de defesa dos direitos trabalhistas, teríamos um quadro distinto: 62% das respostas aponta.riam para uma posição "classista", contra 33% de respostas "assistencialiscas"39. O caráter latente do conflito operário manifesta-se igualmente no "paradoxal" ativismo sindical do jovem precariado migrante. Trata-se de uma "anomalià', afiJ1al: pelo fato de não possuírem experiência lndusuial prévia, esses operários deveriam se sentir satisfeitos com o progresso material proporcionado pelo modelo de desenvolvimento fordista periférico, aJém de contentes com o acesso aos direitos trabalhistas, até então inexistentes no mundo rural. Hipoteticamente, isso os conduziria para longe do sindicato. Então, como explicar que os jovens operários migrantes, mesmo quando comparados aos ferramenteiros, estivessem entre os mais ativos militantes do sindicaco de São Bernardo? Como interpretar o de.5eo.otemamento salarial, as opiniões favoráveis em relação às greves e a inclinação para a slndicalizaçao40 ?Em relação aos salários, Rodrigues destacou que, apesar de a maioria de seus entrevistados entender que a Ford pagava um salário adequado:

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Essá irregularidade entre o comportamento operário esperado e o aferido foi interprccaJa ern termos instrumentais. Como os trabalhadores migrantes seriam mais dependentes do amparo do sindicato, tenderiam a recorrer a seus serviços com mais frequência. O mesmo tipo de comportamento poderia ser observado em relação à empresa fordista: o jovem precariado migrante acreditava: "[ ...] Utilizar-se mais dela [Ford] do que cm utiliz.ado"42 . Trata-se de uma explicação convincente, a não ser por dois problemas: em primeiro lugar, a suposta predileç.fo pelo assistencialismo manifestado nas respostas à enquete operária apoiav~i-se n.t interpretação duvidosa do significado atribuído à ex:pressiío "assistência jurídica"; além disso, se os operários preferiam o assistencial.ismo, como explicar a maior simpatia pela greve, claramente assinalada pelo jovem precariado migrante? Se a explicação instrumental carece de estofo, talvez a interpretação dualista do operariado metalúrgico tenha melhor sorte. A hipótese de que os trabalhadores da indústria automobilística estariam cindidos em duas frações antagônicas, uma delas q ualificada e satisfeita com seus salários e com suas condições de trabalho,_ al~m de orgulhosa de seu status profissional, e oucra desqualificada, dependente dos s111d1catos e dos amnencos gerais do salário mínimo, além de incapaz de se integrar ao ambiente fabril, talvez explicasse a insmunentalidade do comporcamento do precariado migrante. Tendo em vista suas origens rurais, assim coi:no a fulta ~e qual~ncaçã_o técnica, o vínculo desses trabalhadores com o modo de vida urbano-mdusmal sena intermitente, tornando compreensível seu suposto comportamento oportunista. Aqui, talvez valha uma lembrança: ao comentar o livro de Frederick Taylor, Princípios da administração cientifica, Harry Braverman not?~ que o "s~nhor Smith'.', também um jovem imigrante (holandês), considerado afas1co e despoJado de qualificações profissionais, construía sozinho sua própria casa nas horas vagas43. Uma certa equivalência pode ser verificada no caso brasileiro. Aqui a casa própria tornou-se uma preocupação permanente dos operários habituados às vicissitudes do mercado de trabalho. Conforme Rodrigues: "Entre os rerramenteiros, 68% d eclararam sei' proprietários de suas moradias, entre os operários, a porcentagem foi de 46%. Frequentemente, a casa é construída pelo próprio operário nos seus momentos de folga ou em sistema de rourirão" 44 . Seriam os operários migrantes destituídos de aptidões indusu'iais? O próprio Rodrigues nos permite aventar a hipótese contrária: desde Tbidem, p. 6-1-5. ldem. 13 Ver Harry Braverman, Trabalho e capitili monvpolista, cit. " Leôncio Marr.ins Rodrioues, l11d11strializaçíio e atitudes operdrias, cit., p. 26. Para mais detalhes sobre 0 padrão periférico de :utoconsrrução da moradia pelos oper.í.rios, ver Ennínia Marimco (oi;g,}, A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil indwtrial (São Paulo, Alfa-Omega, l982). e reresa Pires do Rio Caldei ra, A polftic,i dos outros: o cotidiano dos rrl(Jrr1dores da periferia e o que pc11s11111 t i (! podet e d1Js podel"/Jsos (Sáo Paulo, Brasiliense, 1984). 41

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"1" 1"',,.," rm 1,r,·rro1,11m, rw /1H(l llll'l'nvolviinenro dc,igual e combinado do capitalismo. Daí a ênfase na resistência do :w.m, ruml como cxplicaç:io para a reprodução do subdesenvolvimento do país. /\ssim, a sociologia profissional mostrou-se afinada com o grande desafio imposto ao projero desenvolvimemiSta brasileiro: reconciliar as duas sociedades que teriam evoluído em rirmos discordantes. De acordo com o raciocínio dualista, enquanto o :lt1mo rural condenaria uma parte da sociedade brasileira à reprodução dos cosnimes coloniais, o modelo de desenvolvimento fordista periférico p ressionaria a outra parte na direção da modernidade capitalisra. No entanto, as fo rças do atraso seriam cão poderosas e tão refratárias às mudanças trazidas por esse modelo que, apesar de abaladas pelo ciclo desenvolvimentista, ainda condenariam o país a décadas de subde-~cnvolvjmento. Na luta entre o arraso e o progresso, o precariado rural estaria 1)erhlado do lado oposto às fileiras vanguardistas. ,10

QUADRO s. O dualismo operário

Para Rodrigues, as origens históricas do dualismo operário remontam à década de 1920: com o colapso do modelo de desenvolvimento agroexportador, a relativa diminuição da imporrância dos setores de produção de ben~ de con.sumo não duráveis somada ao aumento dos investimentos nos setores de bens de capital e de bens dt: consumo durável, 011 seja, a chamada transição do taylorismo primitivo ao fardismo periferico, ampliar:1 subira.mente a demanda da indúsnia por força de trabalho barata, deslocando o eix.o gravitacional da reprodução da condição oper.íria das regióes centrais da cidade de São Paulo para as áre(IS periféricas da metrópole. Se, por wn lado, seria exagero falar cm um "colapso" dos velhos grupos operários- na realidade, muitos des.çes antigos operários passaram a ocupar postos qualificados no novo parque industrial paulistano - , por outro, é notório que as modernas indi'1strias fordístas preferiram se afastar dos bairros operários u adicionais, tais como o 13rás e a Mooca, concena:ando-se ao longo das principais rodovia~ da cidade de Sáo Paulo. Assim, formou-se um cinmrão industri:il que recebeu uma ond:1 de trabalhadores migrances originários das chamadas áreas "rradicionais'' do pais, isto é, da agricultura e das pequenas cidades do interior, especialmente dos esrados nordestinos e de Minas Gerais. Esciliza11do a abordagem dualista, teríamos duas classes operárias no Bm.sil: uma primeira formada por imigrantes europeus atraídos pelo primeiro ciclo de indusuializaçáo do país ( 1920), concentrada em bairros proletários e capazes de conservar as tradições culturais e polfcicas dos países de origem, e uma segunda formada a partir dos anos 1930 por meio de intensos auxos migrató rios, sem experiencia industrial e que foi rapidamente incorporada ao regime de acumulação baseado na mecanizaÇI idaricdade fortalecia-se com essa experiência. Empreitada de considerável risco, n viagem parn a metrópole supunha estratégias para minimizar os efeitos de um evenll 1;11 fracasso, como, por exemplo, a frequente ida dos filhos mais velhos solteiros que, p,1ssa das sociologias aplicada (José J\ll1oc11111r11t,1rtiu 1· M r111,h/,111,1 1!11,.,1,

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Anre.s de mais nada, é necessário uma teoria que nos permita analisar, n,1s palavrn~de ( ;ra,nsci, a transformação do subalterno de "irresponsável" em "protagonistà'. Ou seja, ~t.: desejamos compreender a "atividade empreendedora da massà', devemos começar wblinhando que "[,..] o fatalismo é apenas a maneira pela qual os fracos se revcsr.cm de 4 11ma vontade ativa e real" . Neste capítulo, argumentaremos que, originalmente, cs~.t li!(1rirJ. encontra-se presente nas sociologias aplicada, pública e crítica do trabalho, ou scjit, nas abordagens alternativas à sociologia profissional do trabalho brasileira, descnvolvidns durnme a década de 1960 e o início dos anos 1970. Assim, consideramos que unm abordagem mais afinada com o modelo de desenvolvimento fordista periférico pode ser extraída das qualidades complementares JMn:cia csa1p,1r ao controle da estrutura sinJica.l oficial com o surgimento de: 1 ••• j

l ' 111 si11dim10 agressfro, rebelde àquelas imposições legais, que não se concc:m no bali1.1111rnr11 das funçiic~ arribuíclas pelo Estado e se propõe a desempenhar todos os papéis 11 j\11 q 11c 11~11po11 .nê 199,i, \'v'dl1111, I >p11p11/íw1111M pnlítim lm11ilem1 (S.í o P.u,lo, , ,111 I' , 01>!1110

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(orm.,, de •>l'g,111i·1.,1~:;io adequad:is à conquista de seus objetivos. De mnncirn simil:tr, m ca~os de 1968 ~:io relevante.:s, não obsmmc sua extensão limitada, por colocarem uma s~ria dúvida sobre as soluções encontradas naquela época e por sugerirem esboço5 de fonnns alternatit·11S de orientação e org,wizaçiÚJ. De fato, essas greves conrrascam fone1111:nce com as c:mtctcríscicas gerais exibidas ;1té aqui pelo movimento operário brasileiro, seja o da fase de ascenso que transcorre entre 1950 e 1964, seja o da fase posterior marcada pela desarticulação e pela perplexid:ide. Manifesta-se nelas, seja no plano ela orientação, seja 110 plano da organização, uma atitude de independi11cia em face do Esrado e das empresas que, quaisquer que: sejam as qualificações a seri:m feitas, se di(crencia bastante dos hábitos do sindicalismo do período populista. Segundo me parece, é precisamente esca posição de independl'.:nda que oferece seu inccrcsse para um exame das possibilidades atuais do sindicalismo no pals. 21 Parrindo da formação nlrn>. p 1 1 i

A , ,nllt/1•11 " " /JIIWW '"' /11: t/11/ Hl/ /ll //. como explicar a disposição dessa massa para se reuni r? Na realidade, a relação da in~,1 tisfoção operária com a auto-organização das bases recebeu pouca luz: o pro c cs~o de• formação das com issões de fábrica em C'.,ontagem não foi explorado, assim como pr.uí camente nada ficamos sabendo sobre o regime fabril vigente nas duas cidades.

Sociologia crítica do trabalho: a inquietude como desaJienaçáo Com isso, não queremos dizer q ue \Vetfort tenha subestimado a inquieraçiiú pnp11l.11 , Ao contrário, argumentamos acima que essa noção recebeu grande d.estaque; cm ~l•11~ ensaios sobre o populismo. Assim como esteve igualmeme presente n a ;111,Hbc: d.i•, greves de Contagem e Osasco. No encanto , enfatizando a ação dos líderes 1,i ndit ,11•, na cena política, ele registrou apenas indiretamente a inquietação dos s 11b:1h·c 11111•, , Sem recorrer à etnografia operária, o autor descreveu a ação das fo rças c.:xtc rn.1 ~ ,1 relação do sindicalismo com o Estado, o contexto da crise econômica, o auinc 11t11 d.1 c.·uestia... - sobre o objeco, sem esmiuçar suas determinações internas - o dcw11vol vimcnto da insatisfação nas bases, a relação d os operários profissionais c:0111 e, jow111 precariado metalúrgico, a amo-organização sindical, a relaç:io dos rrabalhad n 1e~ l t1l11 1 os diferentes agrupamenros políticos' .. . Aos nossos olhos, essa brecha podl' \r' 1

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da reificrrçlio29•Assim, buscou compreendei' a consciência do grnpo (tpt l'.irlo t:omo uma processualidade na qual coexistiam, contraditoriamente, canto a "fulsa consciência" isto é, as formas contingentes, fragmentadas e imediatas da consciência psicológica dos operários subsumidos ao processo de coisificaçáo das relações capitali~tas de produção - quanto vestígios de "consciência necessária", ou seja, a consciência capaz de reconhecer no operariado um sujeito político30• A fim de investigar a consciência operária em Santo André, Frederico: 1) posicionou a consciência operária na história de sua prática imediata, apontando, ao mesmo rempo, para a existência de indícios de uma práxis transformadora; 2) refutou as análises sociológicas profissionais cujo método (auto)limitava-se exclusivamente ao terreno da prática política imediata dos metalúrgicos; e 3) destacou as mediações entre as formas da consciência contingente e necessária, especialmente a insatisfação operária espontânea, as greves, a po.lítica do chão de fábrica e a relação dos operários com os sindicatos. Para isso, foi necessário revisitar a interpretação da sociologia profissional tanto do problema da consciência de classe quanto do problema do subdesenvolvimento capitalista. Para Frederico, a principal inconsistência da sociologia profissional foi ter reduzido os diferentes momentos da consciência operária à combinação da regulação populista com o regime de acumulação despótico. Diante disso, o autor propôs partir de outra relação da teoria com o objeto, considerando o operariado como o "sujeito de sua própria histórià': ainda que subsumidos ao processo de reificação, os operários seriam c.1.pazes de elaborar seu inconformismo latente e reagir politicamente à sua própria coisificação. As formas "espontâneas" da consciência de classe serão, então, valorizadas, ainda que a relação entre as demandas econômicas e as reivindicações políticas apareça turva no discurso dos operários entrevistados. Na realidade, Frederico enfatizou a necessidade de a sociologia do trabalho crírica apoiar-se em uma abordagem dialética da prática social capaz de combinar a investigação conjunta d.a massa operária, dos operários avançados e de seu núcleo revolucionário. Amparado por suas entrevistas, ele concluiu que os operários mais qualificados e experientes atuavam como o grupo mais avançado e reivindicativo dencro da fábrica e que os ajudantes - pelo faro de serem jovens, solteiros, náo qualificados ou semiqualificados - representavam uma massa politicamente inorgânica. Ainda assim, Frederico 2'1

Evidenrcmencc, não ignoramos o crabaU10 pioneiro de Michael Lõwy sobre História e comciê11cia de clt1sse. Ve.r Michael Lowy, "Consciência de classe e partido revolucionário", Revista Br.uilieme, n. 41, 1962, e Michael Lõwy e Sara Chucid, "Opiniões e atitude;; dos líderes sindicais metalúrgicos", RevisBmsíleira de Esttulos Políticos, n. 13, 1962. Sem dúvida trata-se de estudos que, partindo de História e ,·011sciinci11 de classe, transformaram-se em imponantes referências teóricas e metodológicas para a l'n

sociologia do trabal ho no país. Contudo, referimo-nos ao pioneirismo de Celso Frederico no toca me à :u1~lise, para além da consciência da liderança sinclical, da articulação entre o processo de trabalho, a

consciência operária e a cena política nacional. "' A propó&ito da metodologia dialética de Marx, em especial sobre a centralidade da categoria hisroric:1111c11tc n1ur:ivcl de "necessidades humanas" na dcccrminação da internçáo complexa entre consciê11cin de classe conringcnrc e conscitncia de classe ncccss,lria, ver lstv,ln Mész~ ros, fü1m111111 socitt! e fim1111s de c1Jmclb1cii1 (Sáo P.11110, 13oiccmpo, 201 1, ,,. 11), espccinlmc11rc o 1'iltin10 c,tpllll lo.

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idcntilic:011 fonnas d ementares da consciência de classe que, em c.lctcrminadas condições hist6 ricas, poderiam evoluir para formas politicamente ativas. Por coustituírcm O scrnr mais dominado e explorado do grupo operário, o precariado metalúrgico do scror competitivo da indústria automobilística, mesmo interpretando sua situação cm termos mais vantajosos do que a do precariado rural, percebia claramente as dificuldades para progredir no interior da empresa. Por um lado, se a expecradva de progresso ocupacional reforçava certo conformismo, por outro, essa esperança chocava-se cotidianamente com o medo da demissão, a realidade da carestia e a intensificação do trabalho. Em cercos momentos, essa tensão !.atente conseguia erodir as barreiras do conformismo, vocalizando uma inquietação capaz de fustigar até mesmo o sindicato: Pedro: "O sindicato cínha mais forç.'l antigamente. Agora ele caiu muito com a mudança de governo. O Castelo Branco encrou aí e acabou com tudo. O sindicato não pega mais forca. Ames do Castelo os sindicatos tinham força, depois mudou. O Castelo disse que sindicato não resolvia nada, era tudo com ele que se re.çolvia. O sindicato perdeu a força que tinha. Naquela época, se o cara queria aumento, arrumava 5 pessoas, ia lá e resolvi:i. Até greve pdia fazer que o sindicato garantia. Agora aumento é só de ano em ano por lei, e se os trabalhadores fazem greve o patrão chama a cavalaria sobre a gente. O Presidente da República ajudava o sindicato, qualquer c.oisa o si.ndicaco fulava com o presidente e conseguia. Agora o sindicato tem uma desculpa: diz que os trabalhadores caíram muito, que eles estão com medo". Ciro: "O sindicato não vale mais nada. Antigamente ele tinha mais força, mandava parar, parava. Depois que encrou o governo militar, eles cassaram e prenderam os dirigentes sindicais. Hoje é tudo mandado pelo governo. Antigamente tinha gre\··e, eles tinham força para fuzer greve e pedir aumento. Eles tinham força porque o governo apoiava eles também. Não é que apoiava, é que cinha liberdade de fazer. Com esse governo acabou. Os operários não fazem mais greve porque não podem. Agora n5o pode nem falar, o governo prende".31

A valorização da insatisfação do jovem precariado metalúrgico, especialmente os ajudantes, levou Frederico a relativizar duas observações centrais nos estudos de Ro• drigues sobre as greves operárias: por um lado, a ênfase acribuída por este à orienrnçáo salarial do governo não seria suficiente para compreender o sentido imanente das greves; por oucro, a despeito de Frederico reconhecer que, em alguns casos, os piquetes apareciam como uma ameaça aos operários, nem rodos os entrevistados mani festavam medo dos piqueteiros. A consciência operária aparecerá aos olhos do autor como uma realidade histórica e relacional formada por diferentes temporalidades que usualmente não costumam se coadunar. Daí a imporcâncht atribuída pelo autor aos setores aptos a estabelecer a ligação entre a massa proletária e os líderes sindicais, i~m 6, aqueles operários politicamente "avançados" capazes de elaborar as frustrações cios ajudantes. No entanto, em uma conjuntura marcadamente desfavorável ~l mobili1açfü> t.:oletiva, os operários avançados tendiam a conter seu impulso militante. Nem por isso o conformismo instalou-se entre os metalúrgicos. Incerra, a inquh:• raçflo operária assL1miu a forma da contenção da produção. O bjetivando pressionar a

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l'lllprc:sa por nume111os .5a lari:lis, a conhecicl:i récnica d e dimi nuiJ' o ritmo de 1.rabalho i.urglu como um estratagema dos grupos profissionais para pressionar a gcrê11cia. Em u·n a medida, a limit:aç5o produtiva substituiu o recurso à greve. l endo em vista a fr.1gilidadc do movimento sindical, os operários se viam cada dia mais dependentes d:1 11rilização de enfrentamentos "espontâneos" no chão de fábrica para defender seus ,.,!:frios. Nesse sentido, a contenção identificada por Celso Frederico entre os anos de 1970 e 197 .1 prefigurou a resistência operária em 1978:

Orlando: "O engenheiro chegou pedindo aumento de produção, mas uão fulou em aumento de salário. No primeiro dia nós demos a produção que ele queria e pedimos aumenro. l(lc negou. Todo mundo amarrou a produção! Foi impressionante! Não foi um nem dois, Íve para 111 \ s~foco C melhorar de vida, também não podemos permitir que OS m1balhadorcs sejam vítimas ur 111ovc111 c111 ~ 111 ehc Unitéli S1.11c~", 1111111ml Rr11lr11111,{Sn,inlri,i:_y, v, 1H, l ')'IJ

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() N11r.1111c as grandes greves pelo reajuste salarial (20%) cm maio-junho de 1978, um repórter do jorn:il Fw '/i:mpu indagou a um operário: 'Mas a greve é contra o governo ou contra os pa rróes ou por .111111c11111 de salários?'. O operário respondeu: 'Se o senhor vê muita diferen~, dii pra nós'." José Luiz 11111111, "Mas que o povo está gostondo, islO csrá", l?m Te111p1J, São Paulo, 22-28 maio 1978, p. 6. Luís 1-1.\vio H,1 l11ho. ( >s prõrs t/11 Jfl'IIIUle 11/JC, cil., p. .308.

n,h \l'lll(" qm· i, p1.1 poc t,t da f.ibriai, prn não deixar ninguém cnrrar'. Quem começou piqut c·,w cl 1• lmt li 111 io11,1l11,1\ 10 d~ 1,,11,1,1.11, d1• 1,1'11 h , ,l 1 1111,I p,1, 111, c111o livcirn, Ci-í1ic11 ,) 1,1z,ío du11fistr1/0 ,>mitorrinco (S:ío Paulo. Boitc,np, 200,3). 1 1r11i 11, ( i11l1•r11ot .w/lrr 11 d!11lét1m rir Hrgel (Rio de J.mci(o, faliwra d ll UFRJ, 20 1 l), p. 1O~. \i1•1l 1,111.l\l o ,11· ( lll vd1,1, Os rlirritos dr111111!/llllr1r; 11 m11111111lt1 p11//1ím t/11 hl'gr111u11/11 i111pcrfti1n (l'rollil, 1i 1 ,t 1litli1 l\-h • lli.1,d l 1PI! ~llll /' ,

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/\os 1\0~~os olhos, a pol!rica do pl'n:scn1c n,1 h:isc dessa p111s.1o. I! p:11·a mel hor con1p rcc11dê-la ti vemos de invcstíg;1r os prncc.~sos in t'c m os e as Ít>rças cs 011 t'\tc-111111 indeterminadamente a validade dos mandatos dos atuais parh1111c1uarcs. Poi fi m, 11 "Troika" planeja manter uma m issão permanente ern Atenas a fim de monh or,11 ,1~ contas públicas e supervisionar a execução do acordo. Evi 111 111 t ltw· tlt' /,1 ;,11/itiqm· projnne. Paris, Albin Michcl, 2008. 1111\NI 11 1 \I\ 111, 1 I l,1/1t11,lfti1111 dr (,'1;1111sci: filosofia, histúria e polftica. Sâo P:rulo, Alameda, 'llllH \p11 ,, 111 1\ lu /(f11/i/,t dl' S11ci(J/ogin e Pol!tica, Curitiba, 11. 23, 2007. lt, ~r11t1, 111 p. 1"1v.1• 11 lururo do pretérito. Crítica Marxista, São Paulo, 11. 23, 2007, lllt \ l ,I\, ll11) l11 ,11il: 'l he l.111., govcrn menc and fi nancial globalizarion. Soci11l ,,.,,,,, t h,q11 111 111, V, Hl, li, -1, 2005, l l,d 11< li ,1I P 1: w111 i1111it?I e rou urc dclla sinistra brasiliana. Protto, Roma, v, 2, 11 1, '00) I' H·l 1)0, N, olil H•1,rl1\ 1110 e rcsirn:ncia opcr:lria no governo FHC. ln: COGGIOLA, Osvnld11 (1111\,l . , 1rrt11' l@rilcilil e o govem o FHC. São Paulo, Xamã, 1997. Ili( 1 \ , J1111,I\ l,1111,111. Os tntb1t!IJ11dorrs mbco111rnr11dos da região metrnpolit1111n de São PrmkJ: p1 r 1111 k d,,dl· 011 t ,tnhlll•1,nç~o? Oí~scrrnção de Mestrado. Faculdade de Filosofia, Lenas e < l~ ll l hl', l l11111an ,1\, Univcc·~idadc de São Paulo, 20 1O. Ili .A< 1, 1\UllN, llohi11, 'lhe uncqu:il socicty. ln: 13LACKl3URN, Robin; COCKl3URN, Alt ~,111d t•1 (01,~~.). 'lhe /11co111p11tibles: 'frade UHion Milirancy and thc Consensus, Londres, Mltldlr" •~, 1% '/. Ili •\l J, Jutllrh; t.;MI 111, Kcri E. lyall (1.'tts.). P"b/it' Sociol.ogirt Render. Lanham, Rowm.111 & 111tld11•ld, .!OU(1, IH H11 ), A,111.11,do. () s/ll(lit'tl/;s1110 de lú11ulo no /Jnui/: u m a análise crític;i da estruu,msindical. " '" P,111111, l lmitc·l , 1991. H1•ln111111 l' p r 1~i\l t 11da d.1 cs1rnrnra sindical. ln: _ _ _ (org.). O si11dicnlis11111 /iwllrn1111M 11t111s HO. S:io P.111l0 , Paz e l c rm, J991. Ili li I AN,\ 1\ 1, 1 til , n r /11 rriliffllt: préci~ de sociologic de l'émancip.1tion. Paris, Callimard, 1()1)1) ,

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