Uma introdução aos quatro conceitos fundamentais de Lacan 853080094X


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Uma introdução aos quatro conceitos fundamentais de Lacan
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ROBERTO HARARI Tradução Marta M. Okamoto Luiz Gonzaga . B. Filho

UMA INTRODlJÇÃO AOS 4 CONCEITOS FONDAMENTAIS DE LACAN

Título original em espanhol: Los cuatro conceptos fundamentales dei psico­ análisis, de Lacan: una introducción

© Ediciones Nueva Visi6n, 1987 Tradução: Marta M. Okamoto e

Luiz Gongaza B. Filho

Capa:

",.

Francis Rodrigues

Equipe Editorial Coordenação: Beatriz Marchesini Copidesque: Rosana Monteiro Revisão: Eliane Cornacchia

Regina Maria Seco Vera Luciana Morandim

·

Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Harari, Roberto. Uma introdução aos quatro conceitos fundamentais de Lacan / Roberto Harari : tradução Marta M. Okamoto, Luiz Gonzaga B. Filho. - Campinas, SP : Papirus, 1990. 1. Lacan, Jacques, 1901-1981 2. Psicanálise I. Título CDD-1S0.195 9�0505 lndices para catálogo sistemático: 1. Lacan, Jacques : Teoria psicanalítica 150.195 2. Psicanálise : Teorias : Psicologia 150. 195 3. Teorias psicanalíticas : Psicologia 150. 195 ISBN 85-308-0094-X

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A Jacques Lacan, psicanalista a-típico, mestre de leitura

SUMARIO

Prólogo do autor para a ediçãq brasileira Prólogo ............__.... _ _ . �-...................

9 11

Capítulo I, Hélice e quadrângulo: A psicanálise e seus - conceito� fundamentais .........- ..... _... . . . . . ..... ... . .

15

Capítulo II A ling!'agem, o inconsciente - - A causa, a pulsação ;- ._ � .._ ..... temporal- ............_ .............. _

Capítulo

41

m

Nassa e Tiquê

69

Çapítulo · IV · Trauma ou estágios? - Repetição e escopicidade

97

Capítulo V Nódoa e engodo - A transferência I ............. 121

Capítulo VI Engano, saber, ideal - A transferência II .. . . . . . .. 143

Capítulo VII Erastés, Eromenós - Quatro limites, cinco destinos pulsionais ..................., . .. . ... . .. . . . ... 165

Capítulo Vlll Parcialidade, borda, traçado: a deriva em circuito . . . 189

Capítulo IX Sexualidade ou mântica? - O "vel" da alienação. . . . 219

Capítulo X Separação, metáfora, interpretação ............... 241

PRôLOGQ DO AUTOR PARA A EDIÇÃO BRASILEIRA

Estou em condições de afirmar que, hoje em dia, o Brasil cons­ titui uma das "potências emergentes" no mapa internacional do mo­ vimento lacaniano. Que me autoriza a afirmá-lo? O fato de ter minis­ trado de modo regular aulas pertinentes nas cidades de Porto Alegre e Florianópolis, convidado sempre por colegas locais que desejavam instituir uma formação psicanalítica para a qual me honraram com· sua escolha como analista e como professor.' Assim, desde 1976, e quando "Lacan" não implicava senão a menção de um nome carregado de mistério e de legítima inquietude epistemofílica, fomos traçando nessas referidas cidades, e de modo sucessivo, os pontos fundamentais da trajetória do mestre francês, depois do necessário percurso pela obra de Freud, lida lacanianamente. Durante esses 14 anos, um verdadeiro boom institucional e edito­ rial registrou o aumento de interesse a que me referi ao princípio, a tal ponto que - verbi. gratia - alguns títulos franceses começaram a ser editados antes no Brasil que na Argentina que é, desde há muito, um dos quatro países do mundo de maior implantação psicanalítica e, especialmep.te, lacaniana. Além do mais, devemos considerar que o referido desenvolvi� mento institucional ocorreu - tal como sucede em outros centros do Brasil - de modo marginal, isto é, por fora das . entidades que res9

pondero à IPA (Associação Psicanalítka �ntêtnacional, cujas hostis relações com Lacan são discutidas neste livro). Menciono isto não .só. porque tais eqtidades desqualificassem os analistas quê não per. tenciam a elas mas. também pelo peso excessivo da eficácia de suas leis que eram obedecidas à distância mesmo por quem, de boa.fé, s�· opunha a eles. Por exemplo -'- avalie•se o valor da piada -"- o autori• zar-se o uso do divã foi vivido, por muitos colegas, como um tipo de ataque aos direitos legitimamente adquiridos pelos· membros da IPA°, os que haviam se apropriado - qual feudo exclusivo - da experiência �a clínica psicanalítica. Retomando, esse quiasma institucional-editorial deu pé a que a generosid'ade da Editora Papirus tenha respaldado a edição brasi­ leira do livro introdutório que você, leitor, tei.n nas mãos. Curioso destino o do livro, esta é a opinião do a�tor que, no geral, sempre se equivoca: riunca sabe muito bem o valor de seu produto. Assim, as oscilações maníaco-depressivas - isto é, avaliar como grande obra que de imediato é visto com destino de dejeto - vão de mãos dadas com a comparação de um texto com outros do mesmo autor, de onde resultam filhos queridos e filhos ,defeituosos. 1

o

Pois bem, nesta · última condição se encontrava este livro, pa­ ra mim, antes de ser editado na Argentina, até que, com o passar do · tempo, meu juízo imaginário foi· recusado de longe: foi minha obra de maior aceitaç.ão} difusão e reconhecimento.

Um mero fato numérico, ant�s de mais nada? Considerá-lo assim implicaria uma subestimação infundada de meus leitores que são, em definitivo, aqueles que outorgam sua licença simbólica como Outro. Desde já espero do público brasileiro - que recebeu com ter� oura.meu Discorrer a psicanálise (Artes Médicas, P. ·Alegre, 1987) uma grata resposta também a este livro, a qual aprofundará ainda mais o afeto, gratidão e respeito intelectual que sinto por este país · · entranhavelniente lacanoamericano. Buenos Aires, janeiro de 1990 R. H.

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PROLOGO

"Coisa miserável é pensar _ s:r mestre aquele que nunca foi discípulo". F. de Rojas, La ·Celestina

Embora os propósitos, alcances e escolhas temáticas deste livro estejam explicitados no texto - e isso não poucas vezes, o que indica­ ria a pertinência de sua audição reiterada por parte do próprio· emis­ sor - não é de todo inútil a pormenorização das circunstâncias, das conjunturas, que o tomaram factível. Como se observará, a obra segue, em seu estilo e em seu linea­ mento ::-- o caráter oral próprio de sua origem: a saber, dez aulas proferidas - entre abril e· agosto de 1986 - no Centro de Extensão Psicanalítica do Centro Cultural General San Martin, dependente da Prefeitura da Cidade de Buenos Aires. A esse respeito, cabe· destacar o caráter localmente - ou mundialmente? - inédito que assinala tanto o nascimento como o decurso do C.E.P.: de fato, amparados no surgimento da democracia na Argentina, e contando com o entusias­ ta e incondicional respaldo do então brilhante Secretário _ da Cultura Municipal, Dr. Mario O'Donnell, um conjunto heteróclito de psica• nalistas convergiu, no início de 1984, na tarefa de trabalhar - gratui­ tamente_._ no "San Martin". Na realidade, este trabalho foi o resul­ tante de uma oferta de Pacho O'Donnell · ante um • projeto que se denominou Maiêutica-lnstituição Psicanalítica para colaborar orga­ nicamente çortl a gestão da Secretaria por ele orientada. A proposi­ ção implicava, nessa ordem, um múltiplo desafio: para começar, e em estando óbvio ._tratar-se de um empreendimento cabalmente pluralista, o Centro - coordenado por mim - convocou, com vistas a sua inte-

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gração, qualificados colegas que até então não haviam realizado a ex­ periência de compartilhar um espaço de trabalho comum. Mas não era só isso o que trazia em si um fator de incerteza: com efeito, a isso havia que acrescentar-se o fato de que esse espaço deveria ser construído sobre bases extremamente não convencionais, na medida em que propunha não os clássicos, previsíveis percursos dos - nos cânones das instituições analíticas, mas a realização em ato da liga­ ção entre psicanálise e cultura, por um lado, e a consideração espe­ cial para com a diversidade do público, por outro, dado que, supos­ tamente, o Centro Cultural abre gratuitamente suas portas a todos os interessados em suas atividades, sem exigências prévias de pro­ fissão ou nível de informação e escolaridade. No San Martin, en­ contramos o apoio franco e generoso de Javier Torre, quem, como é de conhecimento notório, imprimiu em · sua gestão à frente do orga­ nismo uma força e criatividade que tomaram seu amplo poder de convocação num dos mais notáveis internacionalmente. O profundo agradecimento que estes dois amigos merecem, em nada diminui o dirigido aos meus companheiros da Comissão Orga­ nizadora do C.E.P ., e aquele referido . aos numerosos convidados que foram prestigiando seu percurso. E, cabe ainda um lugar diferenciado aos que assistem às nossas propostas: sem estímulo de certificado al­ gum, sem programa predefinido, sem a promessa de fomiação, ocupam cotidiananiente cadeiras, chão e corredores de acesso com uma cons­ tância, uma atenção e um interesse verdadeiramente destacáveis. Eles são, sem dúvida, os instigadores necessários - e os primt,;�ros desti­ natários - das páginas que seguem, já que não têm parado de me estimular - até . de insistir com cordialidade - para que dê forma publicável às aulas proferidas no contexto mencionado. Ainda, se finalmente a empresa pôde ser realizada, isso se deve à inestimável colaboração que me dedicaram Andrea Gómez, na trans­ crição, e Alejandra Cowes, na ajuda para a determinação do texto a partir do registro oral. A ambas, também, minha sincera gratidão. Quero mencionar, ainda, que o "resíduo" do original é mínimo, tendo em vista o objeto de preservar as condições originais de sua enunciação; os títulos dos capítulqs, por seu lado, foram incorpora­ dos para esta edição, de acordo com o que foi desenvolvido em cada aula. O mesmo acontece, obviamente, com as notas e referências bibliográficas. 12

Um voto, para finalizar: que o leitor aprecie esta Introdução como uma tentativa válida no sentido de assentar, com o máximo de rigor possível no reino das luzes - que não é o do Iluminismo a incomparável riqueza da l�itura pós-moderna de Freud processada por Lacan. O que certamente é sustentável no que diz respeito a cada conceito da psicanálise, põe-se à prova radicalmente quando se trata - como se verifica aqui - dos seus próprios fundamentos. Buenos Aires, junho de 1987

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1 HÉLICE E QUADRÂNGULO : A PSICANÁLISE E SEUS CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Quero agradecer-lhes muito sinceramente, porque não esperava que fossem tantos; de minha parte, este fato me compromete a traba­ lhar arduamente para justificar que vocês continuem ,vindo. Creio que não é, desde já, um reconhecime,nto pessoal exclusivo, ma!! que o mesmo, decisivamente, está dirigido ao ensino de Lacan. - Vai-me ocupar, durante dez reuniões, o desenvolvimento introdutório de al­ guns temas de seu Seminário' 1 1 , Os quatro conceitos_ fundamentais da psicanálise 1 • Peço desculpas por começar por um lugar-comum, mas às vezes, as redundâncias não são demais. Certamente, a visão que posso dar­ lhes do Seminário 1 1 é obviamente parcial, considerando que tal Seminário, por um lado , é impossível de ser abarcado em dez reu1 . Assim denominado no momento de seu aparecimento em forma escrita, cm 1 973, já que seu título original foi Os fundamentos da psicanálise. A res­ peito, J. Allouch opina que se encontra "longe de ser aceito que o conceito constitui, para Lacan, fundamento" (in "Lacan censurado", Littoral; idem, La torre abolida, Córdoba, 1986, . p. 1 1 ) . De maneira farta e menos mani­ queísta, M. Marini sustenta que "Lacan ora fala �e conceitos, ora se pergunta se os psicanalistas não vivem 'na impostura' e receia as relações entre psicanálise, religião e ciência" (Jacques Lacan, Belfond, Paris, 1986, p. 201 ) . Pela via do nosso desenvolvimento, poderá "fundamentar-se" - es­ peramos - o _ porquê da opção a11ui abraçada. 15

moes programadas e, por outro, é inevitável que se trate da apro­ ximação de quem lhes fala.

O que se segue é um princípio próprio da leitura que faremos: acontece que não há uma leitura pontual nem literal, mas há temas que me parecem cruciais e ante os quais um outro poderá dizer: " Como é que apenas tocou tal ponto, ou que desconsiderou outro? " Terá razão . . . também. Em todo caso, é um princípio destinado a advertir-lhes acerca de como será o desenvolvimento a que me pro­ ponho realizar diante de vocês.

Podemos localizar - brevemente - o momento em que Lacan profere este Seminário, não somente quanto à cronologia, mas também quanto ao decurso do seu ensino. Isto requer uma consideração sobre a política da psicanálise; especialmente quanto ao lugar de Lacan nessa política. Um lugar efetivamente revulsivo, rechaçante, para a entidade oficial, a IP A. Assim, começa mencionando a "excomunhão" de que foi objeto por parte desta. Não é por acaso que já utilize este termo, por intermédio do qual remete imediatamente à questão reli­ giosa. Veremos depois como - desde o princípio - centrará a psica­ nálise em suas relações com a religião e com a ciência, tratando de deslindar - se isso é possível - e demarcar as respectivas fronteiras epistemológicas, para dizê-lo com Bachelard.

Em todo caso está em jogo se à psicanálise tem a ver com a ordem da ciência, ou não. Sendo assim, o que é que deve ter a ver, de modo imperativo. �ntes disso, volto à questão política. Lacan é efeti­ vamente expulso da Associação Psicanalitica Internacional; nesse mo­ mento, além disso, pelos bons ofícios daqueles que patrocinam sua expulsão, se consegue que não possa prosseguir seu Seminário no Hos­ pital de Sainte-Anne.

Consegue, então, ser recebido pela Ecole Normale Supérieure, uma entidade universitária. Ali tinha bons amigos; por exemplo, Lévi­ Strauss e Althusser, que nesse momento estava muito interessado no ensino de Lacan, a ponto de tornar categorias da psicanálise para pro­ cessar sua revisão do marxismo. Vocês podem ver em - agora que seus livros voltaram a circular entre nós - Para ler o Capital ou Revo­ lução teórica de Marx, como Althusser instrumenta noções como so­ bredeterminação, deslocamento, condensação, que toma diretamente 16

dos ensinamentos de Freud e de Lacan. Introduz, dessa forma, todo este andaime em sua releitura de Marx; basicamente na de O Capital. Estes bons amigos - e outros - conseguem que Lacan possa voltar a ter um auditório numeroso, ante o qual lhe parece então cru­ cial desenvolver nem mai� nem menos que uma temática referida aos fundamentos. O que implica, então, colocar-se a questão nodular como assinala - desta prática, desta práxis - termo que é, também, de extração marxista -: O que é que fundamenta nossa práxis? O que faz com que não seja finalmente uma espécie de taumaturgia, de magia, ou de algo que funciona mas do qual não se pode dar as ra­ zões do porquê acontece? Porque muitas coisas funcionam . A questão. é se o que as faz funcionar conhece as causas do funcionamento e, produzido o efeito, sabe porque se produziu . Assim poderá estabelecer uma certa lógica, um certo rigor, diferente ao de um efeito baseado - diríamos nós - na transferência, efeito que, de uma maneira ou outra - e pelo lugar que ocupamos - podemos produzir com duvi­ dosa " eficácia " . Reparem que aqui aparecem - atentemos à questão d o nú­ mero - " Os quatro " . Este número é um operador constante, e de­ finidor, no ensino lacaniano. Alguns acreditam que é o três, mas nós pensamos que não é a empírica " triangularidade edípica" a que dá basicamente o sustento a muitas concepções de Lacan ; mas que o número quatro possui a primazia. Não quero passar à -assinalar os respectivos motivos argumentados, porém percorrendo o seu en­ sino se poderá ver, em diversos momentos e em diferentes lugares, como esta maneira de dispor os dados e conceitos de experiência analítica em quatro produz um feito muito particular, obtendo uma logicização - se me permitem o neologismo - peculiar do campo analítico 2 • Dizer " quatro conceitos " implica concebê-los em um certo ní­ vel de homogeneização . Parece que isso, claro, não se coaduna com o afã positivista de definir uma ciência por meio de um único obje­ to formal e abstrato. Por exemplo : O que estuda a psicanálise? Costuma-se dizer : "o inconsciente, ou aquilo que é inconsciente " , 2 . Contudo, não seria banal recordar esta citação de Lacan : "Uma estrutura quatripartida é a partir do inconsciente sempre exigível na construção de uma ordenação subjetiva" ( "Kant con Sade", Escritos II, Siglo XXI, Mé;:ko, 1 975, p. 3 46 ) .

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sem mais . Então a pertinência de uma · ciência, ao modo positivista, sempre se caracterizará por um objeto singular teórico - ao mes­ mo . tempo situado na práxis - que lhe permite tomar sua especi. ficidade. Lacan diz - no entanto -:- quatro conceitos, como, nos bailes; quatro conceitos, quatro; são quatro e não só um. Além disso, articulados entre si de tal maneira que com eles possam ser colo­ cados os fundamentos - o fundamental - do que se sustem o cam­ po operativo da psicanálise. Vou escrever de um modo particular estes quatro conceitos, propondo-lhes um esquema que, didaticamente talvez seja inconve­ niente colocá-lo no começo, ainda que queira fazê-lo sobretudo para causar-lhe a intriga de ver se a proposta, no transcurso das dez aulas, poderá ser cumprida ou não. Trata-se de um quadro que procura ampliar a questão dos quatro conceitos, indicando um relacionamento entre eles que me parece importante. As razões disso lhes apontarei paulatinamente. '-._ Os quatro conceitos, dispostos deste modo particular, são : Inconsciente

Repetição

Transferência

Pulsão

Lacan dirá, nas primeiras pagmas do Seminário, que um dos requisitos que uma_ ciência deve preencher é o de poder colocar em fórmulas aquilo abarcado por seu específico campo de conhecimento. Supostamente podem haver fórmulas de qualquer coisa ; e isso rião implica, absolutamente, que a disciplina em questão seja científica . Não importa: aos que nos reconhecemos devedores do ensino d e La­ can " sai assim ", efetivamente, quando se trata de elevar conceitos - fundamentais ou não .- à categoria de elementos articuláveis em termos do que se denomina algoritmo. O que é um algoritmo? Este vocábulo, tomado da matemática pela psicanálise, outorga a possibi­ lidade de poder trabalhar com algumas letras, fazendo entre elas algum tipo de deslizamento regrado, e . obtendo, p�r estas fórmulas, efeitos produtivos de conhecimentos . Faremos, então, seriamente, um desses .jogos :

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Articulamos inconscientemente· com pulsão, e repetição com trans; ferência, o que não implica - de modo algum - que seja a única relação possível . Deve-se reconhecer, nestes traçados, aos que supo­ mos simétricos - mas que deixam um· lugar vacante __; · um buraco re­ presentado por um . " simbolozinho " bastante usado e útil no ensino de . Lacan. Vejamos como é utilizado em uma fórmula; neste caso a do fantasma: ($. a) . O rombo, que se lê " corte de " ou " desejo de" , indica uma série de operações vinculantes entre o s dois termos pos­ tos em relação. Por exemplo, desfazendo-o de acordo com um eixo horizontal, na parte inferior fica o seguinte : 'V_'. Em lógicà é o sím­ bolo de disjunção (ou . . . ou . . . ; ou . . . ) . Retomando o anteriormente assin alado, escrevemos : _j ou objeto a, no sentido de um ou outro . Mais adiante, veremos mais detidamente as figuras diferenciais da disjunção segundo o modo com que as coloca Lacan 3 • Agora tente­ mos entender o que é que se deriva do rombo que chama punção - literalmente poinçon - e ainda que às · vezes apareça, devido à figura, como losange. Parece que essa literalidade, pelo visto, não con­ venceu os tradutores. Claro, o desenho parece um rombo, mas o pun­ ção, o instrumento, se liga a uma marca particular usada pelos pra­ teiros que informa a singularidade iiesses artesãos . Através do pun­ ção se estampa uma espécie de firma, por cujo intermédio, inclusive, pode-se saber o lugar e o ano em que a peça de prata foi cunhada. De tal modo que o punção tem uma colocação espaço-temporal e uma

a

3 . Cf. cap IX. 19

ordem de singularidade bastante evidentes. Creio que nos quer trans­ mitir, quando diz punção, justamente isso, e não simplesmente um rombozinho figurativo. O rombo é uma descrição fenomenológica, en­ quanto que aqui o que interessa é resgatar esse valot de singulari­ dade que se obtém através do punção. Então, reitero: no nosso es­ quema ficou um punção na articulação dos quatro conceitos. Obtive­ mos, ao dividi-lo, o aspecto 'V', que chamamos disjunção. Se agora superpusermos a parte superior, ' A ', tem-se a operação lógica com­ plementar, chamada conjunção.

Num romance, quanto à lógica, o que foi dito seria uma aporia, ou seja, uma enunciação não taxativa que admite inclusive o seu contrário; todavia, não liquida - trivializando-o - o sistema. Se em lógica alguém diz "A não é B " e " A é igual a B ", não diz nada; isto - assinalam os lógicos - trivializa todo o conjunto. Não há possibilidade de fazer a menor discriminação. Contudo, os estu­ diosos puderam chegar a uma espécie de compromisso, no sentido de aceitar que tanto há negações fortes, onde a disjunção é absolu­ ta, como há outras - com negações débeis - onde se suportam as aporias, tal como acontece nessa colocação. Há disjunção, e nem por isso deixa de haver conjunção. De outro modo há o $· ou o a, mas também o, I 7 o a. A prova disso é que alguém poderia dizer, ' em funçã