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Portuguese Pages 334 Year 1954
FERNANDO DE AZEVEDO Professor da Universidade de S. Paulo
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL INTRODUÇÃO AO ESTUDOo DOS FENOMENOs EDUCACIONAIS E DE SUAS RELAÇÕES COM OS OUTROS FENOMENOS SOCIAIS
3.a EDIÇÃO
4
EDIÇOES MELHORAMENTOs
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1954
Nos pedidos telegráficos basta iar o n.° 2271
PuoIO AO UVIO, UMA BEALIZAÇAO MELHORAMENTOS
1NDICE
Prefácio da 2. cdição Introduço
0 QUE ÉSOCIOLOGIA E O QUE É SOCIOLOGIA
I-
EDUCACIONAL
Os dois principios especifico. Asociologia, ciência natural com objeto em A delimitação do ciência. constituir se para base por tornou que A diversidade e a complexidade dos fenômenos campo sociológico. II - A natu sociais particulares. sociais. - Asociologia e as ciências educação. pedagó sociais fatos Os de reza sociológica dos fenômenos Oponto americana. A concepção gicos. A sociologia educacional.francesa. a educacional, sOciologia À de vista da escola sociológica III - A pedagógicas. doutrinas das história e a educação história da de vida social. - O em função da estrutura ou das formas educaço conhecimnento da sociologia, necessário ao educador. - A sociologia edu
bases científicas das profissões ligadas à educação. uma das pedagógica cacional, A sua utilidade direta. O seu grande interêsse sociológico.
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PARTE PRIMEIRA
A EDUCAÇÃO, FENOMENO SOCLAL Capitulo I O INDIVIDUAL E O SOCLAL
o homem, animal social.
As faculdades especificas do homem. -
A sua
capacidade de organizaçãoAsocial. - Alinguagem e a técnica. - Oindividuo e a hereditariedade. natureza biopsicológica e a natureza socal. o indivíduo e a sociedade.
Sères de naturezas diferentes. -0 individuo
ea vida social. Anoção de personalidade. -O problema das relações entre o individuo e a sociedade. -O individuo,
produto social.
A conscièn
cia do "eu" ou de si mesmo e a consciência do "nós" ou consciència socal.
O predominio da consciència social nos pequenos grupos. - A soiedade
e a sua natureza própria, distinta da natureza individual Capitulo ll
A COESÃO SOCLAL E A TRADIÇÃO
A coesão social.
A consciència do espaço e do território social. - A noção de
"lotalidade" do grupo ou a consciència da comunidade que tle forma.
Oapgo ao solo. As sociedades, segundo sua densidade e seu grau de
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FERNANDO DE AZEVEDO
VIII
organização. sUciais.
Acoesão social nas sociedades primitivas.
As
instituições Disiplina e autoridade. - Transmisão da coesão soriaes
radicão e a imitação. O elemento tradicional e o clemento individ, Os fatos que perpetuam a continuidade necessária cntre os tempos d ida soial. 0 estudo do fenômeno geral da tradição de uma socedd
daca. - Espécies de tradiçQcs.
conscientes de tradições. dições. - A educaão
Aradição puramente social. - As espérins
A "memória coletiva".
A ransmisso
ds
51
Capitulo 11n
AINTEGRAÇÃO DO INDIVIDUO NO GRUPo o anteo aos grupos sociais. AOsformação grupos primários. A familia, a comunidade e a expansão dos idcais coletivOs. grupos de jogos. eAsossociedades pequenas e homogèneas.
O imediatismo do contato nessonnl
direto. - Comunidade e socicdade. A solidariedade mecånica ou por semelhanca e asolidariedade orgånica ou A por diferença. . Tönniese Os grupos secundários. variedade de grupos em que E. Durkheim. vive ohomem, nas sociedades modernas.
A integração e desintegracão.
- As époas em que a sociedade desintegrada atrai menos fortemente a si as vontades particulares. Os fatôres permanentes c temporários de integraço.
A máquina c a maior subordinação do homem ao mcio social
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Capitulo IV A NATUREZA SOCIOLÓGICA DO FENOMENO DE EDUCACÃO
A concepção sociológica do fenômeno da educação.
A educação, fato social.
As características do suscetivel de observação e tratamento cientifico. das sociedades, de interior no coexistência, A fato social pedagógico.
três gerações. A "distância social" que separa as geraçõcs, - 0 conflito das gerações. A educação, "ação exercida pelas gerações adultas söbre as gerações jovens, para adaptá-las a si mesmas, e, em conseqüência, ao meio fisico e social". PrOcesso de transmissão e reconstrução da experiên
cia social. - As influências mediatas e imediatas. - A educação, como ação difusa e inintencional. A educação intencional e sistemática. Os ideais - A irredutível. aparentemente Dualismo sociais e os ideais humanos.
educação, em função do meio e do tempo
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Capitulo V
A EDUCAÇÃO, UM PROCESSO SOCIAL GERAL A educação, um processo social geral. - A pluralidade das fôrças que con correm ao movimento das sociedades.
Acultura estudada como um
"todo". - A explicação dos fatos sociais por sua "função", pelas relações reciproas que têm no sistema e pelas relaçõcs que tem ésse sistema com omeio fisico. - A teoria cstruturalista (o estudo das instituições, Durk heim) e atendenia funcionalista (Malinowski). - A iniciação, interpretada
o sentido sociológico dêsse mito. cono uma morte e uma renascenca. Todas as espéies de meios são cncarregadas de "fabricar" o mcsmo homem. -A funão cducacional exerida de maneira difusa pela sociedade no conjunto de suas förças e instituicões.- A educação sistemátiCa dada nas escolas. - A variedade das instituicões encarregadas da educação e a
diversidade do funcionamento destas instituições
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LX
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
Capitulo VI
A EDUCAÇAO NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS A mentalidade primitiva.
Primitivos e civilizados. Os caracteres da vida
Social entre os primitivos, - Sociedades de volume restrito e de uma fraca
densidade. - Acomplexidade de organização social em alguns povos pri. mitivos. - A estratificação social segundo a idade. - 0 predomínio dos velhos. - P'sicologia social excessivamente estável e conservadora. - A trans missão dos valores e dos juízos coletivos. - Auséncia de educacão siste mática. - 0papel da estratificação da sociedade. - As sociedades secretas e os ritos de iniciação. - As suas funções cducadoras.
A concentração
social e apressão do meio soial "total". - A distância social entre crianças c adultos. - A participação dircta na vida social. - Imitaçáo e sugest£o
A educaço em estado difuso. - A educação geral. - As educações
especiais de ordem material e noral
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PARTE SEGUNDA
AS ORIGENS E A EVOLUÇÃO DA ESCOLA Capitulo I
A FAMILIA E A EDUCAÇÃO
As formas primitivas e antigas da família. - A família, um agrupamento de
trabalho. - Funções economicas da família antiga.
Agens romana, um
grupo quase completo: um pequeno Estado. A perda progressiva de algu mas de suas funções. Afamilia patriarcal na sociedade colonial e no império. - Aevoluço e as atribuições da familia nos tempos modernos -A familia e a função educacional. A lei de divis£o do trablho e a
especialização funções. - Arescente partiipação da mulher nas atividades eco nÕmicas. = Adecomplexidade da função educacional. 0 tipo
da familia conjugal.
Concentração, não enfraquecimento da sociedade
familial. - A família, foco da vida afetiva e agrupamento moral. - A primeira escola da criança.
O problema das relações entre a familia e
a escola
111
Capitulo II O GRUPO
A divisão da
PROFISSIONAL PEDAGOGICO
sociedade em grupos e classes distintas.
profissionais.
A O grupo especificamente pedagógico. formaão Professôresde ougrupos mes
res, agentes especiais de educação. - A categoria social, denominada im pròpriamente "classe" dos intelectuais. 0 gènio pedagógico. - 0 "tipo social" do educador profissional e seus caracteres principais. A com plexidade dos sistemas escolares e a especialização decorrente dentro do grupo profisional pedagógico. Aprofissão do educador e a sua posição na hierarquia interprofissional. Hierarquia intraprofissional. Os pro blemas postos pela formação de grupos prolissionais especializados. Insde trução e educação. 0 hiato entre a familia e a escola. Associaçs pais e mestres. A essencial
associação profissional,
uma necessidade moral
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FERNANDO DE AZEVEDO
Capitulo I1
ESCOLA,
UMA INSTITUIÇÃO SOCIAL
Aescola funções da vida social. educativa difusa nas outras pro A açãoblema Os antecedentes e as fôrças criadoras. - eo A cscola de suas origens.
uma instituição social. - Campo especifico de educação.
A variedade
formas que revestem as organizações escolares.- As formas corporativas da
soa. na ldade Média. A evolução das instituições escolares. A cscola instituiço solidária com o conjunto das instituições sociais, domési politicas, cconômicas e religiosas. A diversidade de "tipos" de escolae
As cscolas especiais. - Aequação entre a pressão do meio escolar e a
da atmosfera social geral.
A ducação instituionalizada pode criar dis.
tándas econflitos sociais?
Aescola, como instituição normal do pais e
Cxpressão da consciência nacional. - As instituições escolares e sua impor tânia nos tempos modernos
133
Capitulo IV
A ROTINA NA EDUCAÇÃO. FORMADORES E REFORMADORES
A traicáoe
a sua fôrça coercitiva.
terivelmente rotineiras.
As sociedades, ainda as mais avançadas,
0 papel da rotina na vida social.
A noção
do cquilibrio social. - As rupturas de equilíibrio e as crises sociais.
restabelecimento do equilbrio graças às invenções da ténia industriale
social. - A rotina na educação. Os fatos de inovação, de constância dos inovadores e de resistência a inovações. - As idéias novas. e o papel das
individualidades. - As idéias tecnológicas e não tecnológicas. - Constân
da e rotina podem scr fatos de individuos, e inovação e revolução, obras de grupos e subgrupos. Os períodos orgânicos e os períodos críticos e
os tipos sociais de educadores que Ihes correspondem. -0 tipo de for mador. - Os precursores. Os periodos de crise social. - Reformadores sociais e reformadores de educação
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Capitulo v A EDUCAÇÃO E O PROGRESSO
A idéia de uma evolução única. linear e ilimitada. - As evoluçõcs múltiplas, especiais, limitadas. - Os fatos e os mecanismos da evolução. Evoluço c progresso. O progresso é mais normal que a estagnação?- As trans
formações técnicas e económias da civilização atual e suas repercussões
na educação. 0 dominio e a utilização, pelo homem, das fórças natu rais. - Amáquina e a renovação os métodos de produço. A mecani ação moderna e suas conseqüéncias sociais, políticas, econömicas e peda gógicas. Época de rise de transição. Revisão de valores e das relações do homem com o meio fisico e social. um
lizacão em mudança? - A educação,
Educação para uma ivi
processo de ransmissão de
tradições. - Como e dentro de que limites a escola pode ser um fator de transformação soial
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sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
XI
PARTE TERCEIRA
OS SISTEMAS ESCOLARES Capitulo I os SISTEMAS ESCOLARES E OS SISTEMAS SOCIAIS GERAIS
Escola e sociedade. - A organização c o processo social. - A educação institu
ional ou escolar em função da estrutura das sociedades. -A Coordena cão e subordinação das escolas em "sistemas". - 0 que se entende por
"sistema cducativo". A correspondència entre os sistemas sociais escola res e o sistema social geral. Processo de integração e de diferenciação.
Diversificação de funções à base de um ideal comum. - As três grandes
seções na estrutura dos sistemas escolares. - A variedade das necessida
des das classes e dos grupos sociais que coexistem no interior da socie.
dade.
Educação comum e educações especiais.
A complexidade dos
sistemas cscolares, decorrente da complexidade das sociedades modernas. - Os sistemas escolares públicos
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Capitulo II
A EDUCAÇÃO E AS CLASSES SsOCIAIS A idéia de classe social. - Classes e castas.
A educação nas sociedades de cas
tas (sistemas hindu e feudal). - 0 sistema educacional da cavalaria. Classes e profissões. A barreira e o nível. - A educação nas socie
dades de classes. - A cscola e a classe governante. Classes sociais e atitudes revoluionárias, 0 papel das classes médias nas sociedades
modernas. - Educação para uma democracia. classes aos estudos. A questão da escola única. ou uma nova distinção de classes?
0 acesso das diversas Uma nova hierarquia
Classes e elites.
A formacão das
elites
189
Capitulo III A
COMPLEXIDADE
EA CRISE EM
o desenvolvimento das sociedades e a diviso
EDUCAÇÃO
do trabalho social.
As trans
formações econömicas e o progresso cientifico e técnico, fatôres de espe
cialização.
Suas conseqüências pedagógicas.
A decomposição em "espe
cialidades" (funções especiais) das diversas operações que levam a têrmo a
cducação do individuo. A perda da consciência da obra total da educa ção. A formação de grupos e órgãos especializados. Concorrendo a
um "conjunto" que escapa a cada um dles. Massas e minorias. - A "invasão vertical das massas" e o abaixamento do nivel das minorias. A redução progressiva da zona do ensino geral ou comum em beneficio
da especialização. - Escolas técnicas e politécnicas versus "humanidades e Universidade. O homem, o trabalho e a profisão. - A cultura e a
cspecializaço,
profissional ou cientifica
A ORGANIZAÇ
Capitulo ty DOS SISTEMAS ESCOLARES
A organização dos sistemas escolares publicos. - Centraliaçáo e dexentralinçto. - A extensão dos serviços de ensino e os problemas decorrentes de organi
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FERNANDODE AZEVEDO
XII
ncáo, direção e controle ténico.
A variedade das "necessidades especifi
cas" dos grupos e dos habitat e o que ha de mais "genérico" nos intersses Variedade de sistemas e de tipos de escola e unidade funda. mentai de cspírito ede estrutura. -O problema das relaçõcs entre ensinos de diversOs graus.- Iroblemas cspeciais. 0 ensino técnico profissional. 0 maquinismoeo mundo do trabalho. - A mobilidade e a flutuação das profissõcs nas sociedades novas. 0 ensino médio
geral ou cnsino secundário. o sicas".
e cultura
Ainda a questão das "humanidadcs
e
problena universitário ca rise das elites. - Especializacão
217
PARTE QUARTA
OS PROBLEMAS SOCIAIS PEDAGÓGICOS Capitulo I
AS CIDADES E OS CAMPOS E OS PROBLEMAS DE EDUCACÃO
As cidades nas civilizações antigas. nas.
A origem e a formação das cidades moder
As idades, focos de progresso.-0 papcl unificador das cidades.
- Os grandes centros urbanos da civilização industrial. - A cidade estu dada nos seus bairros.
rurais.
As cidades e os campos, -
As comunidades
Problemas de relações e influências entre as populações urbanas
e rurais. Os fenomenos de movimento e de fixação. A tendência rescente de agregação urbana. Civilizaço e urbanização. - Os cam pos "urbanizados. A complexidade do problema da cducação rural.
- Problema fundamentalmenie demográfico. politica geral de melhoramentos rurais
A educação rural e uma 237
Capitulo II
O ESTADO E A EDUCAÇÃO
A origem do poder político.
OEstado, sociedade politicamente organizada.
Ovelho conflito entre a liberdade e a autoridade. - As novas for mas do Estado. O alargamento das funções do Estado. Distinção entre
"público" e "privado".
A educação, uma função eminentemene pública.
- A função do Estado em matéria de educação. Formas e objeto do ensino público. - 0Estado e a organização da escola para fins políticos. - A educação nos Estados democráico e totalitário. Concorrência edu
cacional ou concorrência política?
Os Estados modernos e os proble
mas de educação e cultura. - As pesquisas científicas na categoria das
administrações do Estado
Capitulo 11
POLITICA E EDUCAÇÃO
A noção socológica do "político". Os grupos sociais políticos. As lutas políticas e a sucessão normal dos partidos no poder. - Regime demu rático (multipartidário) e regime totalitário (unipartidário).
A noção
de interésse geral. - Apreponderånia dos interésses particúlaristas sôbre ointerésse geral e a rise dos paridos. - A mediocrizaç£o das elites diri gentes. - A interferéncia da politica na educação. Politica geral e
253
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
XIII
política da educação. A educação, "meio de exercer poder sobre os individuos ou meio de concorrer ao seu progTesso?" Política de cdu
ac£o e técnica.
0fenômeno da revolução. - Revolução e educação
267
Capitulo 1r
o PROBLEMA DOS FINS EM EDUCAÇÃO o problema dos fins em cducação. - Filosofia e politica de cducação. - Uma distincão fundamental. Os sistemas filosóficos e as doutrinas pedagó gicas que dêles derivam. As suas relações com as particularidades étnicas e a estrutura social de cada povo, - A representação de um ideal à ima gem do qual, numa socicdade determinada, se modelam as novas gera Ções. Teorias e instituicões. A variedade de concepção de tipo humano, c, portanto, do ideal pedagógico nas sociedades históricas. - A cada época corresponde uma concepção da vida e do homem, que cons
titui oideal dos adultos. nétodo sociológico.
A pesquisa do "conteúdo real" dèsse ideal pelo
Os três planos de uma poliica de educação.
Humanismo e nacionalismo. - Fins mais gerais e abstratos, mas nem por isto menos "coletivos" na essência.
A crise de "ideais" em educação
281
Capitulo V
AESCOLA, O PATRIOTISMO E AUNIDADE NACIONAL A idéia de pátria através dos séculos. - As comunidades humanas de una
páuria e o sentimento de pátria.
Conceito e definição de patriotismo.
A idéia de nacão e a consciência nacional.
A formação da conscièn
cia, da coesão e da unidade nacional. - 0papel da escola na unifiação nacional. - Alingua vernácula, instrumento de unificaçio nacional. A geografia e a história.
Oproblema das colônias estrangeiras.
A consciência nacional e a formação de sentimentos de solidariedade mais larga que transbordam o quadro das pátrias. A consciència nado nal e a consciència universal e hunana.
As humanidades
297
Capitulo VI A OPINIÃO PÚBLICA E A EDUCAÇÃO
A opinião pública e o seu conceito.
A multido
res comuns e suas diferenças especificas. "público"
e o público.
Seus caracte
A transformação do povo num
Os meios modernos que atuamn nessa transformação. -
imprensa, o cinema e o rádio.
A
O maquinismo e a maior dependència
do homem em relação ao meio social. A tendncia do Estado a contro lar os fatôres da opinião pública e os seus meios de ação. - A opinião
pública e as democracias.
Quanto mais a estrutura de um govèrno dá
fôrça à opinião pública, tanto mais éessencial que ela seja esclarecida. - A opinião pública, meio de contrôle social. Reguladora da educação como ação difusa do meio social. A opinio a escola. O papel saliente que lhe cabe na educação. As públicae reformas educacionais e os movimentos de opinião
Bibliografia geral
311
323
PREFÁCIO ÉSemprc
intereSsante para
DA 2a
EDIÇÃ0
quern escreveu há dez
söbre uma olhar retrospectivo, observar anos a essa progressos realizados no de seus estudos e dar um diståncia balanco às pesquisas e publicações domínio mais importantes, para rever idéias à luz désses trabalhos eulteriores, pÕr o em dia com a ciência e suas últimas conquistas. A evolução da livro ciència, como observou Charles Richct, c tão rápida que, ao cabo de trinta anos, trabalhos, ainda excelentes, estão fora de moda. Em 1930 quase já não se liam tratados cientificos do século XIX. Mas, se isto é verdadeiro em relação a algumas ciências, como a fisica, a química, a e fisiologia outras, cujos progiessos tém sido extraordinários em nossos tempos, não é igual mente Cxato para outras, como a sociologia, ao menos em alguns de seus ramos, em que nem foram tão os progressOs que acentuados cnvelhecessem os tratados em um ou dois decênios nem seu amadure cimento chegou ao ponto, não digo de permitir, mas de favorecer as grandes obras de sintese e de
cspecialidadc, lançar um os
sistematização conhecimentos. É certo ainda que, apesar das transformações por que e dos seus desenvolvimentos sucessivos, devidos a investigaçõespassaram, e descobertas pos teriores, em várias ciências, das mais antigas às mais recentes, perma necem atuais e vivas, resistindo ao tempo, algumas obras fundamentais que ficaram comno marcos no processo histórico de sua (l). evolução No vasto dominio dos estudos a esta parte vêm tomando forma sociológicos, que apenas de um século verdadeiramente cientificae cujos avan cos tên sido notáveis nestes cinqüenta anos, não se adiantaram por igual os diversos setores de trabalho (s0ciologia econômica, politica, jridica, etc.), em que se divide ou pode dividirse, por necessi cdade de especialização, a análise de uma realidade múltiplae complexa como a realidade social. Não evolveran com o mesmo ritmo nem rece beram os mesmos impulsos. Entre as esferas em que têm sido menores as contribuições de sistematizadores de grande pso ou de pesquisado res de alto quilate, está certamente a da da educaçio. Foi sociologia Émile Durkheimn quem, num pequeno e excelente livro, introduziu com una notável preciso e lucidez, o ponto de vista sociológico no estudo dos fatos pedagógicos. Quando o grande sociologo trancè apon de
) Entre essas obras capitais podiam citar-se os manuscritoa do abade Greqor
Mende
em que se fixaram os trabalhos e as conclusões do genial leis da
pesquisador que es abeleceu a hereditariedade e toi o criador da gené tica: a "lntroduo da medicina experimental", obra clássica de Claude Bernard, um dos tundadoresao daeaudo medicna conten poranea; e, no setor da sociologia, outras, "A divisâo do trabalho sOCial"As Ragras do método sociológico'", de £mile Durkheuma Comun id ade Socedade de Ferdin and OsFolk ways' de Graham Sunner, quer pelo rIqor logLo de sua onatruçáo terica, bos na observaçáo dos tatos, quer pela torçu e limpidea do penaamen to critico e expe rimental, quer por sua extraordinária riqueza de suqestes
FERNANDO DE AZEVEDO 2
da cducacão: tou e esclareceu a natureza sociológica do fenômeno em face examinando-os quando, comparando os sistemas educativos e das organizações sociais, mostrou que foram sempre "a resultan eteàdeluzestados sociais determinados e em harmonia com les, porque con cretizava e verificava, cada um dêles, o ideal que a sociedade, onde se
instituia, se fazia do homem, do que deve ser sob otriplice aspecto,
fisico, intelectual e moral": quando estabeleceu as relações intimas entre
as mudanças de estrutura social e as transformações dos sistemas esco
lares que acompanham aquelas mudanças, estavam lançadas as bases da sociologia da educação e aberto à exploração cientifica um novo e largo campo de investigações. Mas, na França, entre os próprios disci pulos de Durkheim, à semente que lançou o mestre, não se ofereccu
solo fértil em que pudesse germinar.
Em 1940, logo que foi divulgada a l2 edição dêste livro, escrevia
me o Prof. Roger Bastide uma carta em que se reconhece e se proclama a verdade dessa observação. "Como o dizíamos um dia, em vossa casa,
se arrisca, pela interferència cons a sociologia educacional americana nomativo, a conduzir a confusões la
tante dos dois planos teórico e Por outro lado, mentáveis sôbre a própria significação da sociologia. entre Durkheim que tão magistralmente havia aberto um caminho, viu, aplica ser substituida pelas os seus discípulos, a sociologia da educação é a mesma coisa. Restava, não que o educação, Ções da sociologia à que o chele da pois, escrever, neste sentido durkheimiano, a obra de me proponho a 0 que fizestes, e eu escola havia dado o prefácio. É pondo-os a par de vosso livro e ana franceses, leitores diz-lo a meus de Sociologia", lisando-o em longo estudo na "Revista Internacional lhe impediu a publicação" (l). A se, como eu o espero, a guerra nãoporém, lapso de tempo que situação, na França, não mudou, Bastide neste a 1950, e constitui o dec decorreu das ponderações de Roger edição, em português, dêste livro. nio intercalado entre a 1.2 e a 2,a que o constata quando, refe Éoutro sociólogo france, René Hubert, afirma expressamente, rindo-se à "sociologia educacional comparada", que "èste ramo da ciência Pedagogia", da "História sua em 1949, em penosan1ente sentir" (2). não existe ainda e a sua auséncia se faz Durkheim abriu sociologia da educação a que substituída pelas Mas, se na França a fundamentos, continua a ser os lançou e caminho o fevereiro de 1940. Carta dirigida ao autor a 3 dese refere essa carta. Prof. ROGER BASTIDE a artigo do impediu, de fato, a publicação Sociologia'". A guerTa de 1939-1945 a "Revís ta Internacional de apareceu não periodo ésse Universitaires de France. 108, Ern todo Presses Pédagogie. Histoire de la se não (2) RENÉ HUBERT 4). Parece-nos ocioso, educacional" 1949. (Chapitre premier,à pág. "'sociologia expressao Boulevard SaintGermain. Paris, René Hubert acrescenta redundante, o qualificativo que educacional comparada'. Tôda sociologia educacional A(como com ia "sociolog por definição. chamar que prefere política, etc.) é "comparada", que econômica, importa relgiosa, não de sociologia análise aliás, a recorrem os sociólogos na interesse que a métodos maior o dos "haveria umn Paraçáo é Certanente, como lembra René Hubert, de ensino setor da realidade social. observar, desCrever e, se possí vel, explicar as instituiçõessua gênese determincda, de época uma em em não se contentar dada, ade ern uma sOCied sistemas es tabelecidos nas mais os si e de educaçáo, existentes entre cOmparar cinda em semelhanças e as diferenças e suds trans1ormaçbes, mas analogias de estruturas, as dlversas s0Ciedades, procurar suas (Histoire de la Pédagogie, pág. 4). Foi isto exatamente educacional", sempre que que apresentan en sua evolução'". o fizemos em nossa "Sociolog iaem nossas pesquisas and que prOcuramos fazer, e, de faio, empregar o método comparativo nos paTeceu necossár io ou útíl (1)
lises no domínio déstes estudos.
aplicaçoes
da
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
à educação, ou se confunde com a dassociologia comparada dos, a sociologiainstituiçöes e doutrinas pedagógicas, nos Estadoshistória Uni é antes urna que cducacional, educacão", ainda sc debate, em "sociologia aplicada à
grande parte devido ao conlusoes pragmatismo Boger Bastide, dos dois decorrentes dessa interferéncia a que se refere planos, teórico e pais, por Ern normativo. um e outro e razões progressOs circunstâncias nesta parte de nossa diversas, não se verificaram grandes Na França, Durkheim não deixou nem suscitou discipulos queciència. lhe estudos sociológicos sôbre os fatos e recolhessern a heranca de seus teorias da educação, para a aper fciçoarem e desenvolverem, com a mesma sob a inspiração de seus orientação metodológica e principios buicão
americano,
nas
aparcceu ai nestes dez últimos fundamentais. Nenhuma contri anos, de Marcel Mauss sôbre como antes dêsse periodo, trabalho os processos de são cultural nas transmis sociedades ou de primitivas tipo arcaico. As désse fato são múltiplas, mas uma delas, talvez a mais profunda,raizes o será racionalismo francs, com suas conseqüências razão, na evidéncia e na pedagógicas. A fé na "todo conhecimento vem de demonstracão, e a doutrina de que principios irrecusáveis, a priori, eviden tes, de que é a conseqüéncia a pedagogia a algumas verdadesnecessária", tendiam, de fato, a reduzir a não ser o
de que tudo mais resul tassc, como num sistema lógico. fundamentais a atitude de Daí desconfiança e de prevenção em face de idéias, como a de para formação instituições pedagógica do professor de ensino secundário, e o desinterêsse análises científicas, pelas biológicas, e sociológicas, dos fatos e problemas da psicológicas A longa e a tradição do ensino francêseducação. cuja influência seexperiència fêz e sentir cuja fama seprestigiosa por todo o mundo, não iradiara deixaram de contribuir para èsse estado de espirito. Na América do Norte, as obras que apareceram sob o titulo de "Sociologia Educacional" ou equivalentes, vieram ma orientação com que surgiram marcadas pela mes quase tòdas originadas de Professôres. Nos paises nos Colégios em que hispan0-americanos nosso livro, tra duzido para o espanhol e já em duas ediçöes, teve desde 1942 e o divulgação melhor acolhimento (1), não se publicou, na larga matéria, qualquer trabalho de real valor, em que se tenham atacado de um ponto de vista e com métodos os fatos e teorias de edu cação e suas relações com as sociológicos estruturas e organizaçöes sociais. nos Estados Unidos tênm aparecido Certamente, algumas contribui ções de primeira ordem, como os de Margaret Mead, Ruth estudos Benedict, Neal Miller, John Dollard, Willard Waller e outros, além de artigos importantes enn revistas de sociologia. Em 1945, rican Journal of Sociology'" dedicou seu número 6, de The Ame maio daquele ano, aos trabalhos, alyuns excelentes, sobre "educação e o processo e
(1) FERN ANDO DE AZEVEDO Sociologia de a educación. ntroducctón al estudi los lenomenos pedagogicos y de sus relaciones con los denás teudmenos sOCiales. Versión nold do Lrnestina de Champourcin. Sección de obras de Socoloqia dr ig.da por Joe Echavarria. Fondo de Cultura Economica. Mexio, 1 ed., 1942: 24 ed. 1946
2 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
cultural", que foi objeto de um sympostum, em que tomaram noe
especialistas, sociólogos e etnólogos dêsse país (1 ). Mas, além de pouco
freqüentes, constituem antes monografias e trabalhos fragmentários, são abordados sses ou aquêles aspectos da educação cm socieem quecivilizadas e primitivas. Nenhuma obra de vulto, que saibamos, dades s, retomou essa questão de uma riqucza poliédrica, para encarála
minila pelas suas faces mais importantes. Nenhum centro de pesquj.
vista sociolóei sas que se tenha proposto a analisar, de un ponto de ratamento ri a variedade dos fatos de educaçãoe a dar-Ihes um samente científico. Se acrescentarmos, pois, a essa produção intelectual um que revela a literatura sociológica americana, as atividades de do lnstituto de Educação da Universidade de Londres eteremos as publicaçoes o o 1945, a 1941 entre (2), Mannhcim Karl promovidas por dro, certamente incompleto, das anál1ses sociológicas de fatos e pro blemas de educação, muito interior, en todo o caso, ao das contri.
buicões, no dominio da psicologia, e ao das obras, no campo da filo sofia e da história da educação ou das instituições e doutrinas peda gógicas. Se em paises como a França, a Inglaterra e os Estados Unidos, em
que tiveram grande impulso os estudos de sociologia e de antropolo
gia cultural, foram tão reduzidos os progressos nesse setor de investi pouco gações e trabalhos sociológicos, não será de estranhar que muitotocante no consideração, se nos depare, no Brasil, realmente digno de instituições educativas. a pesquisa e a ensaios sôbre fatos, problemas e Não
a atenção e as é neste campo da sociologia que se concentraram
dedicam ao atividades dos que cultivam, entre nós, esta ciência ou se
não regisura, de fato, seu magistério. A literatura sociológica no Brasilsenão alguns trabalhos nesse decènio que se estende de 1940 a 1950, sociologia da educação. esparsos e investigações de real interese para aantropologia, Scha Em São Paulo, Emílio Willems, professor deFernandes, nossoEgon as antigo den que lhe sucedeu na cadeira, e Florestan relativos ou ligados sistente, abordaram por vêzes problemas sociológicos alemães no Brasil, e a àeducação, aquêle, estudando a aculturação dos do papel assimilação e educação, o segundo, tratando particularmente por analisando, e o último, da magia nas práticas rituais da iniciação, transmissão na exemplo, a função dos grupos e dos folguedos infantis and sex in pri the south se as. Studies of adolescence Ternperament (1) MARGARET MEAD - From Company. and 1939; Sex York, New mitive societies. William Morrow and Paul Limited, Londres, 1948: RUTH BENE three primitive societies. Routledge and Kegan Mental health in the classroom. 13th. Year note. comparative process. A Educative DICT Association. Department of Supervisors and, book, págs. 122-127. National Educational a0 Social learning and imitation. DOLLARD JOHN and MILLER E. NEAL rectors, 1940: learning. John The sociology of University Press. New Haven, 1941: WILLARD WALLER LINTON - The indl 1939: ABRAM KARDINER and RALPH Columbia.O Wley and Sons Inc. New York, organization. social ve primiti of psychodynamics vidual and his society. The MaY XLVIII, Vol. Sociology. of lournal American versity Press, New York, 1939-1944: The 1943. Number 6. The University of Chicago Press, Chicago, Illinois, U. S. A The soa poder-se-iam citar as de C. M. FLEMING2 Entre essas publicações ondon L Ltd., Kegan Paul and Routledge transitions. study. PSYChology of educatíon: a sociological and A socio 1948; NICHOLAS HANS Conparative education. Astudy of education facts
University of London Institute of Education; H. C. DENT Education in transt logical analysis of the impact of the war on english education. Routledge Ltd., London, 1944.
Kegan Pau!
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
5
dos imaturos (|). A não ser, da cultura e na formação da personalidade assistente de nossa porém, Antônio Cândido de Melo e Sousa, 1,° de São Paulo, e cadeira, na Faculdade de Filosofia, da Universidade de dar os cursos sôbre fundamentos sociológicos de incumbido nós por de modo particular educação, nenhum outro professor tem consagrado especialidade cientifica, com possibili seu tempo e sua cultura a essa originais. dade de lhe trazer contribuições época de profundas transformna Pode parecer estranho que, numa lado, e de um Ções sociais, econômicas, politicas e pedagógicas, por um
se desenvolvimento notável dos estudos sociológicos, de outro, não pelas extenso, tenha despertado um interêsse maior, mais vivo e mais
realizados do investigações e análises objetivas dos fatos de educação, ciência. As trans ponto de vista e com os métodos próprios de nossa políticas e educa formações por que passam instituições econômicas, se prestava
tivas, pondo em foco fatos e problemas a que antes não atenção devida e desafiando, para encará-los ou resolvê-los, a argúcia dos homens de pensamento e de ação, obrigam-nos a debruçar-nos e a refletir sôbre suas causas e sua extensão, como sôbre os problemas que levantam e cujas soluções são tanto mais prementes e difíceis quanto mais graves e violentas as crises desencadeadas. O homem só comecou a meditar mais sèriamente sôbre a sociedade depois que se acelerou o
ritmo e sc dilatou o campo das mudanças de estrutura e de valores sociais. Foi preciso um choque traumático para lhe ferir e abalar a in teligência, levando-a a refletir e a investigar sôbre fatos que lhe pas
savam quase despercebidos. Épossivel, no entanto, (a observação éde
Roger Caillois) que o aparecimento dêsse espirito de pesquisa e de
análise objetiva "constitua mau indício para determinada sociedade
porque resulta sem dúvida em falta de solidariedade para com esta o fato de instigarmos a inteligência a situar tôdas as coisas discretas que mantêm a sua coesão e que desempenham a tarefa com mais efi
ciência quando menos conhecidas. Quem as designa, denuncia-as e, por conseguinte, enfraquece-as. Uma sociedade, segundo parece, não foi feita para meditar: étanto mais vigorosa quanto menos espelhos e ocasiões tem de estranhar a sua fisionomia. De resto, o mesmo acontece em rela ção ao indivíduo, porque não é sinal de muita saúde o fato de pre
ocupar-se demasiado com o próprio organismo. Apenas certos enfer mos gos tam de imaginar-se fora de seu corpo, para seguir-Ihe os mov mentos com curiosidade, cono se o olhassem do exterior" (2).
Mas, essas rápidas e profundas mudanças de estrutura e de men
talidade, êsses fenômenos de transformação e de desagregaço (1)
EMILIO WILLEMS
A
social
aculturaçáo dos alemâes no Brasil. Estudo antropológico dos imigrantes alemåes e seus descendentes 1946 (sobretudo, o capítulo XII, págs. 376-419 ):no Brasil. Comp. Editòra Nacional, S. Paulo, Assimilaçáoe educaçáo, un Revista Brasi leira de Estudos Pedagógicos, vol. IV. N. l1, aio e1945; EGON nas cerimônias de iniciacaoin de S. Paulo' S. n.Paulo, 1944: FLORESTAN FERNANDES Educaçáo e cultura infantil, in "Sociologia'', vol. V, 2. 1943, págs 134-146: Ãs "trocinhas'" do Bom Retiro. Contribuição ao estudo tolclórico sociologico da cultua " dos grupos infantis. Separata da Revista do Arquivo Municipal, n.° CXIII S. Paulo, 1947: TIAGO MARQUES AIPOBUREU Municipal, vol. CXII, S. Paulo, 1946.Um bororo marginal. Separata da Revista do Arquivo (2) ROGER CAILLOIS A obra de Montesquieu. A revoluáo sociológica.. n "O E tado de São Paulo, s. Paulo, 1949.
FERNANDO DE AZEVEDo 6
que têm suscitado uma sucesso de idéias e de teorias pedagógicas, nor
Que não foram ainda capazes de igualmente provocar um movimente mais poderoso de estudos e investigações objetivas sôbre os fatos e as instituições de educação? As doutrinas, como justamente pondera Rend
Hubert, "representaram, na sua maior parte, rupturas com os sisteme
estabelecidos, críticas ao seu espírito e aos seus métodos, esforcos po lhes provocar a renovação. Elas são, sobretudo, a obra de pensadores
prosseguindo suas meditações à margem de seu meio, embora Ihes
sofram a influência, e impelidos antes a recollher as aspirações que o agitam do que a refletir as tradições que o mantêm. Os sistemas soli.
damente estabelecidos não têm necessidade de justificaão. A ldade Média ocidental não produziu nenhum grande teórico de educacão. E sòmente quando as instituições antigas começam a desagregar-se e a perder sua alma que surgem as doutrinas novas, trazendo com elas
uma nova filosofia do homem" (1). A explicação dêsse contraste entre
a série de teorias pedagógicas, de um lado, e de outro, a escassez de
análises sociológicas, baseadas na observação metódica dos processos e
das instituições educativas, parece-nos residir no fato de que os homens estão mais empenhados em reformar os sistemas, nesta ou naquela
direção, do que pròpriamente em "conhecè-los". A inpaciência com que se lançam àaventura das reformas e das inovações, não lhes dá disposiço
nem lhes assegura o tempo necessário para o trabalho, na
turalmente lento, das análises em profundidade e em campos cada vez
mais largos de investigação. Acresce ainda que, de uma parte, as pai
xões e os interêsses não nos permitem fàcilmente realizanos em nós
mesmos essa "revolução sociológica", a que se refere Roger Caillois, "essa atividade de espírito que consiste em fingir-se estranho à socie
dade em que vive, em encará-la de fora e como se a visse pela primeira
vez", e, por outra parte, as ideologias politicas ou já trazem, como o
comunismo, as suas doutrinas pedagógicas, feitas e acabadas, com que
a educação se transforma num simples instrumento político de domi
nação, ou, realizando reformas numa direção determinada, não cuidam
senão de a posteriori construir teorias, para justificá-las.. No entanto, sejam quais forem o volume e a importância das
contribuições de pesquisas e monografias, nessa esfera da sociologia, e elas podiam ter sido maiores, neste decènio, se as atividades no do mínio dos estudos etnológicos não tivessem sido tão sèriamente com prometidas senão quase suspensas pela última guerra mundial (1939. 1945), foram levadas em conta no preparo da 2a edição deste livro, em que houve mais acréscimo do que modificações essenciais. Mas, não
foram sòmente os trabalhos publicados depois da 1.a edição, em 1940,o O que nesta nova cópia se tomou em consideracão. A obra tivemos
cuidado de rev-la também à vista dos reparos que suscitou e se redu zem a dois ou três, dos quais um,
o mais importante, se prende ao
principio divisório adotado, e os outros, à extensão e à densidade do
livro que, a juízo de alguns, podiam ser encurtadas ou reduzidas. As (1) RENÉ HUBERT Histoire de la Pédagogie. Presses Universitaires de France. 106, Boulevard Saint-Germain. Paris, 1949, pág. 5.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
vista críticas, pela suma, são estas. Não apareceram outras. Do ponto de
que o do plano e da divisão do trabalho, a Emilio Willems pareceu denomina não pedagógicos", título da Parte IV- "Problemas sociais em alguns capi ria com precisão os fenômenos tratados, englobando "'sociologia pedagó
problemas referentes à tulos (como oCap. IV)condicionamentos dos processos
gica", e, nos demais, os
educativos por
determinados fatos sociais estruturais (a densidade demográfica, opi condicionamentos êsses que, nião pública, Estado e partido politico),educacional", no sentido em sua opinião, fazem parte da "sociologia acepção mais alta, ba restrito. A critica, tomada essa palavra na sua a sociologia educacio seia-se no pressuposto de que é possivel dividir seria a sO nal lato sensu em duas grandes partes, das quais a primeira como pro ciologia cducacional, stricto sensu, ou a sociologia da educação cesso social, em suas modalidades e variações no tempo e no espaço, e a
segunda, a "sociologia da pedagogia" ou "sociologia pedagógica", que teria cono objeto "o estudo cientifico das interdependncias
entre es
trutura social e doutrinas pedagógicas".
Não há certamente sutileza nesta distinção entre processos edu cativos e fatos de estrutura e organização escolar, de um lado, e de
outro, as teorias ou doutrinas pedagógicas que constituem a pedago ou seja "o conjunto de normas ou técnicas, orientadas para de gia, terminados fins (baseadas em conclusões cientificas ou não) e recomen dadas a fim de tornar possível a transmissão cultural e a in tegração social dos imaturos". A distinção é exata, já sob o aspecto científico, já
sob o aspecto didático. Mas, a discriminação que, com justas razöes, se procura estabelecer entre essas duas categorias de fatos, instituições
e idéias ou teorias, -e que sempre tivemos no pensamento e na ela boração do trabalho, não me parece justificar a fragmentação da socio
logia da educação em duas partes distintas, como se houvesse duas so
ciologias: a sociologia educacional pròpriamente dita e a sociologia da
pedagogia. Dênos, pois, licença o eminente professor que acolheu esta
obra com as mais altas e honrosas referências, para dissentir, neste ponto, das observações realmente interessantes com que nos obsequiou.
Em primeiro lugar, a sociologia educacional ou da educação, é, con
forme êle mesmo o reconhece, "a sociologia da realidade educacional como setor da realidade social". Mas essa "realidade educacional" se
constitui não sòmente dos processos educativos e das estruturas esco
lares, como também das doutrinas e teorias pedagógicas. A sociologia educacional tem, pois, por objeto, a nosso ver, oestudo tanto dèsses processos, das instituições e sistemas escolares, e da interdependëncia
que existe entre estrutura e organizaço social, de um lado, e os pro Cessos educativos, de outro, quanto das teorias e doutrinas pedagógi
cas. Oque se pretende separar em dois dominios distintos, preferimos unir, sem deixar de discriminar teorias e fatos, em um campo único de observação. Esta associação de ambos os estudos, nos quadros de uma só disci
plina, justifica-se ainda pela relação que une as doutrinas da educação
aos fatos pedagógicos (processos e instituições) e que é preciso inves
FERNANDO DE AZEVEDO 8
tigar e estabelecer. Este, o segundo argumento em que seria cos niente insistir. Como tôdas as grandes funções sociais, observa Maurice
Halbwachs, "o ensino tem um espirito que se exprime nos programas
nas matérias ensinadas, nos métodos, e um corpo, uma estrutura mate.
rial que, em parte, exprime o espirito mas que, também, reage såh
Ale. aue põe algumas vêzes sôbre êle sua marca e lhe opõe temporària.
mente seus limites". Fatos e teorias são freqüentemente por tal forma
jigados e mutuam tão fortes influências que nem sempre é possível separá-los. É o próprio professor Emílio Willems que o reconhece com
Sua alta autoridade. "Obvioé (escreve ele) que as regras pedagógicas não permaneceram nem permanecem mera doutrina.
Elas infyem
como influíram, sôbre processos educativos e, assim, sôbre organizações
e estrutura social. De outro lado, não padece dúvida que as doutrins
pedagógicas recebem poderosos impulsos da estrutura e organizaço
social, sendo, muitas vêzes, meros reflexOs dsses dois fatôres, como, por
exemplo, a pedagogia individualista foi un reflexo da estrutura das
Sociedades ocidentais do século XIX". Dese modo (acrescenta), o ob cientifico das "estudo como afigura-se pedagógica" "sociologia da jeto
interdependências entre estrutura social e doutrinas pedagógicas".
Aresce ainda que educação e pedagogia coincidem no setor em que
determinados processos educativos representam a realização de deter tão ninadas normas pedagógicas, e cuja extensão, "embora não sejaatuais, tempos nos dilatar-se, a tende imagina", grande como às vêzes se sob a pressão das idéias políticas e das correntes de pensamento filoe análise dos fins sófico e científico. E, por último, se a pedagogia, ou conhecimento dos meios, representa um aspecto parcial do "saber" sociológico das estudo de uma determinada época ou sociedade, e se o "da sociologia do saber ou teorias pedagógicas faz parte, por conseguinte, sociologia de do conhecimento", ela articula-se, por outro lado, com a os processos educação que abrange, como objeto de seus estudos, tanto pedagógicas. e instituições educativas como as idéias e as doutrinas reduzir ao es A despeito do cuidado com que nos esmeramos em deviamos ra que sencial, sem prejuízo da clareza, a extensa matéria
ainda alguns excessiva tar, de forma metódica e sistemática, julgaramdestinado apenas a estu a densidade do livro, na pressuposição de ser êste ramo de estu dantes. Entre professôres que então freqüentavam por um "guia seguro e completo", oso dos, não faltou quem, tendo-o difícil para considerasse instrumento de manejo talvez um pouco e sociológica. preparação filosófica que iniciavam seius cursos, sem uma e enxuto... A prevalecer, porem, Certos editôres o quereriam mais magro elementar, apro ésse critério, teríamos de cair nos manuais de tipo assuntos fôssem tr priados a um regime de subnutrição, em que ouos tão apertadas que, a tados pela rama e em sínteses ou superficiaisMas, além de ser um tra fôrça da brevidade, se tornariam obscuras... professôres e estudantes, uma tado oque pretendemos pôr nas mãos de ainda uma fonte de intorma obra que, sôbre ser livro de texto, fôsse uma
sistematização e çöes, êste trabalho representa um esfôrço de apareceu depots
conribuição teórica, - a primeira que, no gênero,
do
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
fenômeno da educação livro de Durkheim, - ao estudo cientifico do sociais. Pensarmos, com e de suas relaÇões com os outros fenômenos mas em des le, não sòmente em aplainar o caminho aos estudiosos, complexidade dos pertar-lhes o sentido do relativismo histórico e da examinando as ques lenômenos e abrir-lhes novas perspectivas, querproblemas e organizan tões por tôdas as suas faces, quer levantando mostrando ainda quer do, em cada capitulo, matéria para discussões, dos diante pesquisas. Os professöres, tendo a extensão do campo de abundante, grande uma mas fundamental, olhos, no texto, matéria e as mais completas informações variedade de problemas e discussõeslargamente, no acervo do material bibliográficas, poderão "escolher" investigar e discutir, partindo do mais que se Ihes oferece, para expor, nos pontos que a orientação simples ao mais complexo e insistindo constante do espirito e dos méto de cada um indicar, para a aplicação de educação.
dos sociológicos ao estudo dos problemas
INTRODUÇÃO oQUE ÉSOCIOLOGIA EO QUE ÉSOCIOLOGIA EDUCACIONAL I - AsOociologia, ciência natural com objeto especifico.
Os dois prin
cipios que tomou por base para se constituir em ciência. - A delimitação do campo sociológico. A diversidade e a complexidade dos fenômenos sociais. -A sociologia e as ciências sociais particulares. - II - A natureza sociológica dos fenómenos de educação. Os fatos sociais pedagógicos. A socioiogia
cducacional. - A concepção americana.
francesa.
O ponto de vista da escola sociológica
A sociologia cducacional, a história da educação e a história
das doutrinas pedagógicas. - III A educação em função da estrutura e das formas da vida social. O conhecimento da sociologia, necessário ao educador.
A sociologia educacional, uma das bases cientificas das profisões ligadas à
educação.
sociológico.
A sua utilidade pedagógica direta. - 0 seu grande interèsse
No século XIX, a biologia, com Claude Bernard e Gregor Mendel, e a sociologia, com Auguste Comte e Émile Durkheim, se separavam
da filosofia em que, desde a antiguidade, figuraram como especulação eXVII, a fisica com Galileu, e no século XVIII a química, com La voisier, já se haviam desprendido da filosofia para se constituirem em cièncias. ssa concepção da sociologia, como ciència positiva, não se fèz, porém, senão muito lentamente e através de incompreensões e de resistências, ainda não de todo vencidas, já quanto ao principio do determinismo sociológico, já quanto à especificidade de seu objeto. sôbre os fatos biológicos e sociais, como anteriormente, nos séculos XVI
Todos conhecem a polêmica que durou mais de 10 anos e que per
dura, embora atenuada, nas escolas opostas de seus discipulos, entre Émile Durkheim e Gabriel Tarde, que no seu livro "Les lois de l'imi
tation" sustentara a tese da redutibilidade dos fatos sociais aos fenó nienos psiquicos e, em conseqüência, da impossibilidade de se distin guir a ciência das sociedades da ciência dos individuos. Tarde apoiava se, para defender a sua tese, na afirmação de que "a sociedade não é
nada fora dos individuos que a compõem e são tudo o que ela tem de real". A raciocinar assim, replicou Durkheim, poder-se-ia sustentar
igualmente que a biologia não seria senão um capitulo da fisica e da
quimica. Mas a verdade é que, se não há na celula senão elementos
minerais, êstes, combinandose de certa maneira, desprendem pro
priedades que não têm quando não estão combinados assim e que são caracteristicas da vida (propriedades de se nutrir e de se reprodu
zir), e que èles formam, pelo fato de sua síntese, uma realidade de um gênero todo novo, que é a realidade viva e constitui o objeto da bio logia. Da mesma forma as conscièncias individuais, associando-se de
FERNANDO DE AZEVEDo
12
maneira estável, desprendem, em conseqüência das relações que se
trocam entre si, uma vida nova, muito diferente daquela de que seriam teatro, se tivessem ficado isoladas umas das outras: éa vida social". A sociologia "não podia aparecer, escreve Durkhcim (1), - antes que se tivesse adquirido o sentimento de que as sociedades, como o
resto do mundo, são submetidas a leis que derivam necessàriamente de
sua natureza e a exprimem". E foi sòmente no fim do século XVII
que se começou a entrever que o reino social tem as suas leis próprias como os outros reinos da naturcza. Procedendo mais tarde. iá no
século XIX, no seu curso de Filosofia Positiva, à revista sintética de
tÙdas as ciências constituídas em seu tempo, Comte "constatou que elas
repousavam tôdas sôbre êsse axioma que os fatos de que tratam são
ligados segundo relações necessárias, isto é, sôbre o principio determi nista; donde concluiu que éste principio que fôra assim verificado em todos os reinos da natureza, desde o reino das grandezas matemáticas até o da vida, devia ser igualmente verdadeiro para o reino social". Estabelecida a concepção de que a essa nova ordem de fatos, de que não se ocupava nenhuma das ciências anteriormente constituídas, se
aplicava o mesmo principio do determinismo universal, estava fundada uma nova ciência, a ciência social que tomou o nome com que Comte
a batizou. Assim, pois, se "os fatos sociais se encadeiam uns aos outros segundo relações de causa e efeito, definidas e invariáveis, que o sábio procura observar por processos análogos aos que são empregados nas
ciências da natureza", e se a matéria,
os fenômenos sociais, - dessa
nova ciência, o objeto de que ela empreendia o estudo, "não se con
fundia com nenhum daqueles de que tratam as outras ciências", a con
clusão a que se tinha de chegar, daquele princípio e dessa constata
ção, é de que efetivamente se inaugurava, sob o nome de sociologia, uma nova ordem de investigações e de pesquisas, de caráter eminen
temente científico.
Mas, se êste princípio suscitou debates que ainda não se amorte
ceram, mais forte foi a resistência e mais violentas as polêmicas que
levantou o princípio do determinismo sociológico, isto é, de que a so
ciedade ésubmetida a leis necessárias. Dêsse ponto de vista, esclarece
Durkheim, "as sociedades deixariam de aparecer como uma espécie de matéria maleável e plática que os homens podem, por assim dizer,
modelar à vontade; era preciso, daí por diante, ver nelas realidades, cuja natureza se impõe a nós e que não podem ser modificadas, como
tôdas as coisas naturais, senão em conformidade com as leis que as
regem". Àobjeção de que ésse principio implica uma espécie de fata
lismo ou, por outras palavras, de que, uma vez admitido, se segue "que os homens são incapazes de modificar a sociedade e de que, por
conseqüência, éles não podem agir sôbre a sua própria história", Durk
heim responde, lembrando o que se passou nos outros reinos da natu reza, isto é, as modificações que se introduziram no universo desde (1) E. DURKHEIM Sociologie et sciences sociales, in De la méthode dans les scien
ces sociales, l.e série, págs. 307-333, Nouvelle Collection Scientifique, Librairie Féliz Alcan, 1928.
SOCIOLoGIA EDUCACIONAL
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que as cincias positivas da natureza se constituíram, tomando por base omesmo postulado. As ciências, acrescenta êle, nessa página admirá vel de lucidez e de penetração, "as ciências, ao mesno tempo proclamam a necessidade das coisas, nos põem nas mãos os meios de que do miná-las". Aliás, de todos os fenômenos naturais, observa Comte com
insistência, os fenômenos sociais são os mais maleáveis, os mais aces síveis às variações, porque éles são os mais complexos. A sociologia, pois, "no impõe, de forma alguma, ao homem uma atitude passiva mente conservadora: ela estende o campo de nossa ação por isto sò mente que estende o campo de nossa ciência" (1). Acresce ainda que a palavra "lei", de um emprégo bastante incerto
em sociologia e, de resto, em geral em outras ciências, se deve tomar antes no sentido de "relações regulares ou constantes entre os fatos".
Foi neste ponto de vista, puramente objetivo e positivo, que Halb wachs se colocou quando considera, como objeto próprio da sociologia, "as leis ou relações regulares às quais obedecem as consciências coleti
vas". Os dois caracteres essenciais de uma lei cientifica permanecem
neste conceito, a saber a) a universalidade, e b) a racionalidade, sendo
três os elementos dessa racionalidade: 1) ser excluída da relaço a con
tingência; 2) aparecer a relação como não podendo ser outra, e 3) e
ordenar-se ela num conjunto que abrange um campo crescente de rea lidade estudada, e nela toma conhecimento do essencial. As dificulda des quese encontram para uma explicação determinista dos fatos no
mundo social não podem surpreender, sobretudo numa época em que odesenvolvimento dos estudos da estrutura atômica veio determinar.
sem tirar àfísica o caráter científico, uma revisão de alguns dos prin cípios da física clássica, essencialmente determinista. A expressão rigo rosa do princípio de causalidade encontra-se "nas equações da mecâ
nica de Newton e da teoria da Relatividade, que permitem prever com
certeza o estado futuro do sistema quando é dado o estado inicial. No campo atômico verificou-se, observa Gleb Wataghin (2), ser impossível aplicar essas equações e fazer previsões com certeza porque as proprie
dades das radiações e dos corpúsculos elementares impedem uma de
terminação suficientemente precisa do estado inicial e do estado final".
A impossibilidade de veriicação da existência de uma ligação entre
causa e efeito, devida àlimitação de nossas possibilidades de medida, leva os fisicos modernos a esperar ou o aperfeiçoamento dos métodos
de medida, que permitam uma descrição determinista dos fenômenos
atômicos ou a descoberta de novas limitações de nossos conceitos
usuais, alguns dos quais se mostrarão provàvelmente inaplicáveis no microcosmo, isto é, no mundo atômico.
Mas aquêles mesmos que negam a aplicação do determinismo à
sociologia, isto é, a subordinação do sistema e dos fatos sociais a leis
necessárias especificas (a explicação do social pelo social), aceitam a (1) E. DURKHEIM
Sociologie et sciences sociales, in De la méthode dans les scien
ces socíales, l.e serle, págs. 307-333, Nouvelle Collection Scientificque, Librairie Félix Alcan, 1928. (2) GLEB WATAGHIN
o princípio de causalidade na Fisica moderna. conferência
pronunciada na Universidade de S. Paulo.
14
FERNANDO DE AZEVEDo
explicação determinista quando subordinam o sistema social a um de. terminismo fisico ou a um determinismo biológico. Essa atitude im plica freqüentemente a negação de unna "realidade social especifica" e se traduz na tendència a eduzir o campo sociológico ao domínio da geografia, da biologia, da psicologia e da história, contràriamente ao
ponto de vista dos que, reconhecendo a especificidade do fato social. procuram a explicação do fato social no fato social, definindo ou de.
limitando ocampo de investigaço sociológica, que ora se amplia ora se restringe, conforme a concepção que se tenha dessa nova ordenm de fatos. Eis em resumo como Halbwachs põe e esclarece a questão (1). "Supo
nhamos que, dadas certas condiçõcs, uma evolução se produza. Pode acontecer que cstas condiçöes não se reproduzam: que garantias tere mos de que há verdadeiramente uma lei? Pode dar-se tambénm que as
mesmas condições se reproduzam, mas que não sejam tôdas de natureza
social: nada nos provará então que não é a influência dessas condições
sociais, exercida durante tôda a experiència, que explica as regulari
dades observadas. O determinismo social aparente seria então suspenso a um determinismo fisico verdadeiro. Ainda mais o encontro de um fato
social e de um fato fisico, mesmo quando se repetisse, ficaria contin
gente... É uma lei particular, do tipo das explicações históricas. Não
ë nem uma lei fisica, nem uma lei da sociedade em geral. Tôda a socie dade ocupa uma parte do espaço. Ela compreende homens que desen volvem uma vida orgånica. Acha-se, pois, submetida a um conjunto de ações fsicas e biológicas. Na medida em que essas ações ficam cons
tantes, não há tomar conhecimento delas em sociologia, quando se
pesquisa a causa das variações de tais ou quais fatos sociais. Dáse o mesno quando essas ações físicas se transformam?" Mas vamos a um
exemplo dentre os três citados e explicados pelo próprio Halbwachs, para esclarecimento da questão.
Foi Durkheim, lembra êle, um dos primeiros que, observando o nitidamente entre a proporção dos suicidios e, de uma parte, a con fissão religiosa (matando-se os protestantes mais que os católicos), e fenômeno do suicidio, mnostraram a relação que se manifesta muito
de outra parte o estado civil dos suicidas (mais numerosos entre os celibatários do que no grupo dos casados e diminuindo àmedida que
aumenta o número dos filhos). As leis que se podiam assim formular assemelhavam-se muito às leis das ciências físicas. A tendência ao suicí dio apresenta-se como um caráter de grupo e suas variações são fatos sociais que se podem explicar pela estrutura e pelo funcionamento da
sociedade, em tal ou qual estado ou em tal ou qual fase de sua evo
lução. Objetou-se, porém, que, explicando-se o maior número de sui cidios por perturbações mentais, êsses fatos sociais resultariam de cau
sas de ordem biológica. Mas, em primeiro lugar, responde Halbwachs, é-nos dificil admitir que um fato biológico como tal possa ser a causa
de um fato social. Em segundo lugar, todos ésses fatos ou casos par
ticulares (doença mental, ruína, luto, decepção de carreira, etc.), "o (1) M. HALBW ACHS - La loi en sociologie, págs. 173-196, in Sclence et Loi, V.o Se
maine internationa le de Synthèse, Félix Alcan, Paris, 1934.
SOCIOL0GIA EDUCACIONAL
15
que se realiza, se nos limitamos às relações do homem que aí se acha. com a sociedade de que faz parte, éque êle se sente bruscanente isolado e que se Ihe impÑe (por èsse ou aquêle fato biológico ou não) um sen
timento insuportável da solidão. Desta maneira não se trata de intro duzi na rede das relações sociais um fator fisico ou biológico. Há, aliás, tÛdas as razões para pensar que do momento em que poden ser expressos cm têrmos puramente sociais, êsses fatos, em tanto quanto aletam a sociedade, se explicam também por causas puramente sociais: assim o sistema de fatos sociais em que são compreendidos, apresenta-se
em rclação às outras ordens de fatos de natureza inerte ou orgånica,
como um todo independente'". A éste exemplo da relação entre a proporção dos suicidios e a con fissão religiosa, o estado civil dos suicidas e o grau de complicação da vida social, se podiam acrescentar outros, como a relação entre o mo
vimento do comércio exterior e a taxa de nupcialidade ou o número
de casamentos. A mesma observação poder-se-å fazer relativamente ás instituições, como, por exemplo, a familia. "A continuidYde da familia parece condicionada por um fenômeno fisiológico, a descendencia pelo
sangue. Sabemos, contudo, que essa relação de sangüinidade importa
menos que a idéia ou a crença de que o filho descende do pai ou da
mãe ou ainda dos antepassados em geral e que a adoção, fato pura
mente social, produz a êsse respeito os mesmos efeitos que a ligação
biológica". Éainda Comte que formulou essa idéia poderosa de que todo o rea! comporta diversos mundos formando planos superpostos
e submeteu a um exame comparativo os conceitos dessas diferentes for
nas do ser, para lazer ver que é impossível ligar as formas superiores às lormas inferiores por um laço de necessidade. É pela rítica das dife
rentes ciências que Comte, com seu universo hierarquizado e descon tínuo, chegou a sustentar que, para explicar uma realidade mais ele vada, é preciso introduzir leis novas, dotadas de uma especificidade própria e iredutiveis às precedentes. É o modo de demonstração em
pregado por sua vez por Boutroux (1). "Cada ordem de cièncias supöe,
escreveu êle, postulados que lhe são próprios". Se os planos que com
porta o real, se condicionam, sem que o inferior baste a explicar con
pletamente o superior, "o mundo fisico e o biológico podem condicio
nar o social,
o que não impede o social como tal de gozar uma in
dependència verdadeira e de escapar a um determinismno fisico ou bio lógico, em todo o caso materialista, para se submeter a leis que lhe são próprias". Não podemos, por isto, concordar totalmente com Simiand nas
reservas queque fêz quanto à especificidade lei pedidaao por lembrando as maiores descobertas da cientificas, queHalbwachs, dizia um grande sábio, foram feitas "nas fronteiras das ciências". Se foi util ou mesmo necessário à sociologia afirmar-se logo de inicio como distinta e tender por principio a procurar em fatos sociais a expliação dos () E BOUTROUX
De Iidée de ot naturelle dans la Seience et Aa Phulosopàie
ontemporaines (liçöes prolessadas na Sorbonne, 1892-1893. " sounidas em volume sob èsse tútulo )
16
FERNANDO DE AZEVEDO
Simiand, fatos sociais, " verdadeiramente indispensável hoje, pergunta probante, mais é Não prejudicial? postulá-lo como regra imperativa, tendo feito a volta a outras possibilidades não excluídas de antemão, dos fatos so tender pelos próprios fatos a reconhecer que a explicação é, no ciais estudados é ela mesnma social?"" Ora, a hipótese da necessidade ma tempo presente, a hipótese da redução de tôdas as cièncias às ciências
temáticas. Foi Descartes que pôs o problema nestes têmmos. Mas essa hi da investi ptese, que talvez não seja seno um princípio leiregulador foi causalidade, de a da como diretriz, idéia gação científica e uma
certamente fecunda pelas descobertas que inspirou, e pode-se legiti mamente esperar que continue a ser no dominio dos fenômenos sociais.
A constituição da sociologia, como ciência positiva, indutiva, tenm à sua base ésse sentimento de que a realidade social, realidade objetiva, indivi conscièncias as específica, sui generis, que, embora penetrando
duais, lhes fica de algum modo exterior, deve ser tratada como as outras realidades raturais. Aliás, se por um método concreto, determinarmos como Boutroux nas lições de 1892, a idéia da ciÃncia segundo as ciên cias efetivamente realiza das e seus resultados mais recentes, verificare e seus mos que a sociologia continua a afirmar-se como ciência distinta demar aumentam na proporço em que se define a linha de progressos cação entre a ciência social, de uma parte, e de outra, a geografia, a êsse poderoso instrumento de a psicologia e a história (1),
biologia, análise para o sociólogo. Certamente, todo o campo abrangível dos fatos sociais, de fron
teiras já mais definidas, não é suscetível de ser dominado de um golpe
posi por uma visão sintética désses fenômenos. A história das ciências grandes através de tivas prova que éde sua natureza constituirem-se acabadas. As lições esforços ede pesquisas especiais e nunca estarem professadas na Sorbonne, em 1892-1893, por Boutroux põem no mais forte relvo o papel do sábio na ciência, e, ao mesmo tempo, o sentido sua
degradadas de e o alcance destas leis que foram sucessivamente
necessidade e de sua imutabilidade. A realidade social, múltipla e com
de plexa, não poderia, também ela, estudar-se na prática, sem Segolpes es essa fatos. divisão e de distinções entre as diversas categorias de
pecialização fôr desenvolvida sem um sentido penetrante da complexi
dade dos fenômenos e uma largueza de vistas dominando os conjuntos, osociólogo se arriScará sempre a falsear e a deturpar arealidade que, verdadeiramente, não se decompõe senão por abstração. Ä por isto que Marc Bloch se inquietava, como historiador, de ver história religiosa com a narração dos fatos chamados "políticos", o que tende fundida invencivelmente a limitá-la à história eclesiástica e radicalmente se nos dá que desdobra diante de nós a história, historia (1) "Se o quadro rico em contrastes sempre novas, é que os cenas de sucessão uma de caleidoscópica impressão a concreta e se prendem sobretudo observa Halbwachs, tomam os fatos sob sua forma estreitamen te às condições de ligados os fatos com ocupa-se história A diferenças". às irreversiveis no teopo; a variáveis, e concretos fatos preciso, tempo preciso e de lugar e circunstâncias que fatôres dos desprendida social, realidade a própria Ou, por outras palavras, a história estuda asOciologia produzemestuda e condicionam. "acontecinentos" 'o historiador Durkheim, de palavras as segundo ainda, a sociologia, dos fatos "ienómenos'". BOciais, mas Ou êle Os considera, sobretudo, pelo lado em que são particulares trata um tempo determinados. O sociólogo, êste, consagrase ùnicamente a des um relações povo e agerais, acobrir leis verificáveis em sociedades diferen tes'".
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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Parada da história das idéias. A evolução dos Estados e a da armadura iurídica das sociedades, se clas säo encaradas quase sem lacos com
Sbstrato cconômico de um lado, e com a mentalidade e a evolucão das idéias, de outro, não se arriscariam, pergunta Bloch, a ao leitor como outros tantos edificios de miragens suspensos aaparecer cem cÔva dos acima do solo" Mas a especialização não provém sòmente da forma
de nosso espirito, votado por natureza à análise, isto é, àdecomposição. Ninguém ignora as necessidades, tristernente inperiosas, que decorrem
de uma justa especializaço
entre os sábios, tanto mais necessária
quanto maiores a variedade e a complexidade dos fatos que constituem a matéria de investigação.
Desde cedo pareceu necessário isolar ou separar os grupos de fatos
de natureza diferente, proceder a cortes e divisões no vasto campo dos
¬studos sociológicos, mas não de tal forma que viesse a tornar menos
sensível a interdependéncia de todos éses grüpos e não permitisse sen tit, no interior de cada um dêles, as repercussões do corpo social e
as correlaçõcs entre o grupo de fatos estudados e os outros fenômenos.
Na suposição de que, quando se trata do homeme da sociedade, o con junto émais bem conhecido, julgava Comte não convir senão às ciências
inorgânicas, tais como a fisica e a quimica, a regra que prescreve a0
sábio ir do simples ao composto. "É a correlação de fenomeno que deve guiar-nos na sua exploração direta... Todo estudo isolado dos di
versos clementos sociais énecessàriamente irracional e estéril (1), Mas a prática dos sociólogos, como já observou Halbwachs, orientou-se num
sentido oposto. Não pensamos sòmente na especialização crescente das
pesquisas neste dominio. O sociólogo cada vez mais propõe-se determi nar relações de causalidade parciais, em lugar de partir de uma vista
geral das funções da sociedade". Mas desde que se precise o que enten demos por conjunto, não se pode deixar de reconhecer, diz Halbwachs, certo valor metodológico no preceito formulado por Comte, a saber.
que "em sociologia em vez da marcha seguida nas cièncias fisicas, é
preciso partir do conjunto para ir às partes. O que é dado, não é uma
sociedade única, a sociedade, mas grupos. £stes, contorme as relações conjuntos tèm aliás certa independencia, um em relação ao outro, é oque se exprime, dizendo que há evoluções politicas, religiosas, eco nômicas, etc., que devem ser distinguidas e estudadas separadamente. Tomemos agora un dêsses conjuntos, num pais ou durante um pe riodo ou uma sucesão de periodos continuos. Ë visivel que os grupos
que se estabelecemn entre si, podem constituir diversos conjuntos. Estcs
que èle compreende, nos seus movimentos e reações, são ligados uns
aos outros; que seus movimentos se encadeiam e que deses movimen
tos mesmos e de sua ligação parece resultar a evolução do conjunto'" (2).
Assim, depois de Comte, que distinguiu a sociologia em duas par
tes, pelas quais se distribuem o estudo das condiçõese das leis do equilibrio da sociedade (estática social) e o das sociedades em evolu (1) A. COMTE -
Cours de Philosophie Positive, 43.e Laon.
(2) M. HALBWACHS - La loi en soclologie, págs. 173-196, in Science et Loi, Félix Alcan, Paris, 1934.
FERNANDO DE AZEVEDO 18
desenvolvimento cão e da lei de seu inspirandose na biologia, como Comte na fisica,
(dinâmica social),
Durkheim,
duas partes: a) morfologia social, e b) fisiologia dividiu-a social, atribuindo emà também exterior e forma material da sociedade ou a primeira o cstudo da do demográfica Conssubstrato social, e à e geográfica tituição
segunda, sas manifestaçöes vitais das sociedades. Fo esta a primeira tentativa uma classificação metódica dos fatos sociais. Ao lado da multidão de fatos morfológicos, mostra Durkheim a grande variedade dos sociais, de ordem fisiológica ou funcional. Poder-se-ia, a seu fenômenos dir a sociologia em tantas partes quantas são as categorias dejuizo, divi. nos sociais. Os fatos e as instituições religiosas; as idéias morais fenôme-e.
de moral e os costumes; os fatos e as instituiçocs juridicas, em estreitae
relações com as ideias morais; as instituições politicas, os fatos
instituições econômicas, são, para Durkhein, os principais lamos
sociologia, que tomará denominações de sociologia religiosa, mo
iuridica ou económica, conforme a ordem especial de fatos e proble. mas estudados. Se se acrescentarem a êses fatos a linguagem, que é
também um fenômeno social, ainda que, a certos aspectos, dependente
de condições orgânicas, e as obras e manifestações de arte que, "elab radas num mesmo meio social e numa mesma época, exprimem. soh formas diversas, um mesmo ideal, estreitamente em relação com o tem. peramento dos grupos sociais", teremos uma sociologia lingüistica e uma sociologia estética ou, por outras palavras, mais outros dois ramos
ou partes da sociologia. E não quer isto dizer que sejam os únicos.
"Por mais diferentes que sejam umas das outras as diversas classes de
fatos sociais, não são todavia, pondera justamente Durkheim, senão espécies de um mesmo género; há, pois, lugar de pesquisar o que faz a unidade do gênero, o que caracteriza o fato social in abstrato e se
não há leis muito gerais de que as leis diversas estabelecidas pelas ciên
cias especiais não sãoseno formas particulares". Este seria o objeto da sociologia geral, mas "como o valor da sín
tese depende do valor das análises de que ela resulta, fazer avançar ésse trabalho de análise constitui, comno observa o grande sociólogo, a
tarefa mais urgente da sociologia. Veja-se, para exemplo, o que se passa nas ciências fisicas. Os fenômenos que servem de matéria a "sse
con
junto de pesquisas e de análises" a que se dá o nome de fisica, distin guem-se dos fenômenos que constituem o objeto da química em que aquéles não dão e êstes dão lugar ao aparecimento de substäncias
novas. Conforme dessas alterações ou transformações que se passam na
matéria, resultam ou não novas substâncias, estaremos diante de teno
menos quimicos ou fenômenos fisicos, que formam o objeto de duas
ciências distintas, embora se ocupem, ambas, do mundo inorgânico. Esta distinção que permite estabelecer entre as duas ciências uma linha
de demarcação inteligível, abriu oportunidade a uma especializaçao rescente, extraordinàriamente fecunda para o estudo cientifico das duas espécies diferentes de fenómenos. Se nos detivermos, porém, nos tenômenos fisicos pròpriamente ditos, verificaremos que eles ta CoStumam ser divididos em certo número de grupos mais ou menos
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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correspondência com os nossos sentidos: movimentos dos corpos; som;
calor: luz e radiações congéneres; cletricidade e magnetisno. Os fend
mcnos mecânicos, sonoros, térmicos, luminosos, electromagnéticos, as sim distinguidos, - espécies do mesmo gênero, dão lugar a uma divi
são da física em tantas partes ou ramos (mecårnica, óptica, acústica, ter
nologia, eletricidade) quantas são as classes ou grupos de fenômenos
fisicos. No mundo orgånico ou no dominio da biologia experimental,
dividida nas suas partes clássicas, a anatomia ou morfologia que estuda a estrutura dos sêres vivos ea composição de seus tecidos e de seus
tecidos e déses órgãos, órgãos, e a fisiologia que analisa as funções désses numa pluralidade de surgiram, desdobrando essa ciência complexa
ciências particulares, a embriologia e particularmente a genética, que estuda os fenômenos de hereditariedade e que, não tendo senão pouco
mais de meio século, já "revelou nos cromossomos o lugar específico da substância hereditária, deu a chave da diferenciação sexual e pre cisou nossas idéias sôbre a origem das espécies". A cincia é repartida em disciplinas fragmentárias e os homens
devem especializar-se em seus conhecimentos para que possan domi
nálos. É uma contingência a que não épossível escapar, já pela va riedade e complexidade dos fenômenos a estudar, já pela limitação na tural da inteligência humana. Onúmero dos espíritos sintéticos univer sais foi em tôdas as épocas extremamente reduzido. Certamente a di visão do trabalho, impelida ao extremo, conduz a uma antinomia
entre as exigências da especialização e as da universalização. "Não se pode adquirir uma ampla cultura científica sem se limitar bem num
domínio qualquer; não 'se pode tornar especialista perfeito sem conhe
cimentos cientificos extensos. Eis a antinomia" (1). Mas, em primeiro lugar, essa especialização cientifica que se acentua cada vez mais nas
ciencias exatas ou melhor, fisicas e matemáticas, não se tornou ainda excessiva nas ciências do homem, e apenas se manifesta na sociologia
àmedida que esta ciência, desprendendose da especulação, estende a aplicação dos métodos positivos às diversas categorias de fenômenos
sociais. Em segundo lugar, se os especialistas se tornam excessivamente "limitados", confinados nas suas concepções sintéticas, êste
um outro
problema, cuja soluço estará em substituir uma preparação cientifia demais fragmentária e estreita que não deixa de ter repercussões sôbre
onivel da cultura filosófico-científica por uma preparação mais racio
nal, em que se evitem ou se reduzam os perigos de uma especialização
prematura e a todo transe. Uma preparação filosófica e uma sólida cultura geral permitiriam aos especialistas coordenar as suas idéias e 0s seus conhecimentos fragmentários, numa sintese que se está sempre
reconstituindo, e enquadrá-los numa concepção compreensiva do mundo.
E se é verdade, segundo a crença radicional, que a ciència tende
para a unidade e é possivel estabelecer leis mais gerais de que não sejam mais do que expressões particulares as leis relativas a vários gru (1) .. DELEVSKY - Les perspectives de la spécialisatioa scientitique, in Le Synthèse de l'activitó mondiale, n.° S8, Oetobre, 1935. 3 Sociologia Educacional
Mols,
FERNANDO DE AZEVEDO 20
se processar pos de fenômenos, essa marcha para a unidade, longe ade de modo contínuo, está sujeita a constantes revisöes e recuos parciais. e das novas perspectivas em conseqüência de conclusões imprevistas no sen abertas pelos novos conhecimentos. Os esforços dos cientistas, e a tido de uma sintese, "já emparelharam, definitivamente, a fisica inorgânico e não excluem a hipó química que se ocupam do mundo dominio dos fenômenos biológicos'" tese de agregar às ciências fisicas o O aperfeiçoamento da técnica experimental, de um lado, ampliando e aprofundando o campo de pesquisa, e "as novas teorias propostas para interpretar as observações, conduzindo àprevisão de outros fatos, ten dem, em cada um dos domínios científicos, a invalidar as constantes
tentativas de uma visão de conjunto e a acentuar a precocidade dessas vastas construções unitárias. A ciência que se está sempre formando, sem nunca se fomar de todo, tem um caráter fragmentárioe provisó. rio e, como já se escreveu, "uma hora de síntese supõe anos de análise".
De um modo geral "a sintese é condicionada à possibilidade de expli car-se um fenômeno considerado complexo, com o auxilio de leis co
nhecidas relativas a fenômenos mais simples". A ciência poderá assim tornar-se cada vez mais harmoniosa, àmedida que se fôr enriquecen do com êstes fatos impereciveis, que, segundo a fórmula de Claude
Bernard, "são o único fim das teorias efemeras de que surgem"; e se
se considerar que a ciência em geral está na sua infância e sòmente as ciÃncias fisicas se possam ter como entradas na sua maturidade, se
compreenderá melhor então, sobretudo para a sociologia, que fazer
avançar ésse trabalho de análise éa sua tarefa mais urgente.
£sse trabalho de análise pressupõe, evidentemente, delimitação e
escolha de determinado fenômeno ou grupo de fenômenos, a que o so ciólogo reduz o seu campo de investigação. Éle não poderá, no entanto,
aprofundar-se por si nesta ou naquela especialidade sem ter obtido, anteriormente, uma sólida formação científica que Ihe permita uma
visãode con junto e Ihe dé os elementos para passar da observação me
tódica à interpretação dos fatos observados. As teorias ou leis relativas
a fenômenos mais simples podem abrir caminho à explicação de fe nômenos mais complexos ou a interpretações e hipóteses de trabalho
verdadeiramente fecundas. É assim que, na fisica, a teoria das vibrações para explicar os fenômenos sonoros, a teoria mecânica do calor, entre vista por Newton, e a teoria emissiva da luz, são outras tantas aplica Ções de leis de mecânica à interpretação dos fenômenos sonoros, tér micos ou luminosos. Interpretados os fenómenos sonoros "como vibra: Ções devidas à reação elástica que os corpos oferecem à deformação",
os movimentos oscilatórios das partículas são regidos pelas leis da meca
nica a que se filia a acústica como um capítulo da teoria das vibra ções. Se o calor é simplesmente "uma tradição do movimento nais ou
menos intenso das moléculas (ou dos ions)", as leis relativas aos fenô menos térmicos e as da termodinámica (que regem as relações do calor e do trabalho) são corolários das proposições gerais da mecânica que envolve, não só "os movimentos de conjunto de numerosas moléculas, constituindo os corpos ordinários, como também os movimentos indi
soCIOLOGIA EDUCACIONAL.
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viduais dessas partículas no interior dos corpos, nos enômenos do som e do calor". E se, conforme a teoria de Newton, os corpos luminosos emitem partículas finíssimas que avançarm pelo cspaço, segundo as leis
gerais dos movimentos dos corpos, as teorias modernas "reabilitaram a
da luz, aplicando Ihe novamente, de modo mais concepção corpuscular mecânica", complexo, leis de
No domínio sociológico, não sòmente foi a mec£nica que sugeriu,
na concepção de fôrças sociais, a primeira interpretação fisica dos feno menos sociais. A expressão "fôrças sociais" denunciava mais do que uma
aplicar aos fenome simples analogia tomada àmecânica, a idéia de que não tardaram a mecanica nos sociais as proposições e as leis da biológicas. Mas, ceder o lugar àaplicação àsociologia das leis e teorias dos preponderncia a estabeleceu que com a doutrina de Karl Marx, fatos econômicos, énestes que se passou a procurar, à luz dessa dou trina, a interpretação dos fatos de estrutura e de evolução social. A so
ciologia econômica, o ramo que estuda os fatos econômicOs, ficou para o estudo dos outros fenômenos sociais, como a mecânica para os outros fenómenos fisicos. Afirmando, de fato Karl Marx que "o modo de
produção da vida material condiciona o processo da vida social politica,
intelectual no seu conjunto", no quis certamente dizer que o fator reciprocas entre a base (situação econômica) e a superestrutura (for mas politicas, modos de concepção juridica, religiosa, estética, etc.). E nessa base real, econômica e tecnológica, sôbre a qual se eleva a superestrutura, isto é, toda organização social, éque pretendeu encon trar achave da explicação das diversas formações sociais. Como quer que seja, e seja qual för a atitude tomada em face dessa teoria. isto significa não sòmente que "o social équalquer coisa diferente da soma de suas partes" (especificidade do social), como também que, dada a interdependência dos fenômenos sociais, as investigações em qualquer econômico é o inico determinante mas estabelece a ação e reação
dos setores no vasto dominio dos estudos sociológicos não podem fiar
sem repercussão maior ou menor nos estudos a que se proceder sobre
as outras categorias de fenômenos, pois há uma unidade protunda entre
as diversas ordens de fatos estudados pelos especialistas.
Por isto, mais do que no estudo dos outros fatos sociais, tem pe
netrado os métodos sociológicos na investigação dos fenòmenos eco
nômicos não só por parecerem êstes, mais do que os outros, suscetiveis
de ser estudados objetivamente, como também por se esperar deles um
método positivo que fôsse aplicável ao conjunto dos fenömenos so ciais. Depois da notável obra de Durkheim sobre a natureza dos fend
menos religiosos, é no estudo dos fenômenos economicos, com Simiand
e outros, que tem sido pösto à prova o valor das ideias metodológicas de Durkheim, e édevido à aplicação dos métodos de pesquisas a ea ordem de lenomenos que se vem renovando a propria economia poli
tica. Aaplicaço das regras do método sociológico àos fendmenos juri dicos, politicos, lingüisticos, em tódas as suas manitestações, com E. lévy e M. Hauriou, com G. Davy e A. Meillet tem contribuido para reno
var prolundamente a ciência do direito, a politica ea lingüistica, cada
FERNANDO DE AZEVEDO 22
veY mais penetradas da influência de Durkheim e de suas reorae dológicas. Na sua memória Comment les mots changent de sens, demonstrava, de fato, que as modificações são ligadas,Meillet das estado às ao sociedades, variações sociais e queema primeiro lugar, definir a relacão que existe procurar ciência da linguagem deve stes dois tipos de mudanças. Estava provado que havia matéria entre D Para um estudo sociológico da linguagem, por um trabalho que, investigação iniciando a sôbre essa ordem de com espírito cientifico uma das maiores contribuições à sociologia lingüistica. fatos, trazia
lingüisticas
Todosdes êsses trabalhos atestam uma penetração que se torna cada vez maior nirito sociológico nas técnicas espeCiais, apesar da reserva suspeitosa P e muitos ainda se avizinham da sOCiologia como uma ciÁncia positiva. Certamente, a própria complexidade dos fenômenos, as dificuldades que oferecem àinvestigação e o rigor que exige o método
sociológico, com seu aparato estatistico, têm qualquer coisa gue inti mida: mas no fundo jáse vai percebendo que a desconfiança nasce as
mais das vêzes do perigo que essa nova orientação faz correr às pos.
Ções das idéias antigas em ada um désses donmínios de conhecimenio. II
Mas a observação de que os sistemas educacionais variam con
forme as condições de tempo e de lugar, e a variedade de grupos em
que se seciona a sociedade determina uma diversidade correspondente
de tipos ou formas especiais de educação sôbre uma base comum, co
loca-nos diante de fatos que constituem uma outra categoria distinta
das precedentes. Em tôdas as sociedades, desde as primitivas, de forma
rudimentar, até às mais complexas sociedades mnodernas, podemos des
prender da complexidade dos fatos sociais o fato fundamental da edu cação que, em última análise, se reduz à transmissão pelas gerações adultas às gerações jovens dos modos de vida e tipos ou padrões de cul tura que caracterizam cada grupo humano. A extrema diversidade de formas que pode revestir sse fato fundamental, e das instituições que se organizam no interior de cada sociedade, variáveis com a sua estru
tura e prepostas a essa função de formar o homem de certo tempo e
lugar determinado, revela não só a constância do fenômeno sociológico
da educação que, em esséncia, quanto à sua natureza, se repete iden
ticamente no tempo e no espaço, eé, portanto, essencial às sociedades humanas, mas também a estreita dependência das suas formas e insti
tuições educativas em relação aos sistemas sociais gerais. Se a educaçao é uma "coisa social" ou um fato social, como a religião, a linguage, as idéias morais e os costumes, as instituições jurídicas e econômicas,
outros tantos produtos sociais ou obras coletivas, há certamente mate
ria para um estudo sociológico da educação que, como um fenòmeno realidade suscetivel de observação científica. A linguagem, a religiao
que se produz em todos os grupos sociais, sob formas diversas, é uma
ea moral, as técnicas e as tradições profissionais, as crenças e os co
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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sentimentos ehábitos que tumes e, enfim, todo êsse sisterna de idéias, personalidade (o "ser indivi
exprimem em nós, não a nossa própria parte, transmitem-se dual"), mas o grupo ou grupos de que fazemos por un trabalho coletivo que se às gerações jovens por via social ou para po renova a cada geração eque traz a marca, bastante profunda der defini-la, de cada sociedade no seu conjunto. rasa" sôbre a qual traba Assim, pois, cada geração é uma "tábua mecanisno social em que lham as gerações adultas por sse processo e sociais e que se intervêm, mais ou menos, tôdas as fôrças e instituições que se con medida à refletida realiza de maneira mais sistemática e Othmar observa centra em órgãos especiais de educação. A educação, Spann (l), "está condicionada pelo fato de que os homens morrem e
reparação nascem sem cessar. Isto torna necessária uma ininterrupta e psicológica tem lugar espiritualmente na educação, que todo, do econômicamente no movimento de população (estatística). "Fôsse ver dadeira, a teoria de Lamarck que postulava a transmissão hereditária
dos caracteres adquiridos e se poderia legitimamente esperar um pro
gresso e aperfeiçoamento constantes por meio da transmissão, através
de gerações sucessivas, de caracteres adaptativos, criados pela ação con tínua do meio. O progresso mental que se criasse, pela educação, no
individuo, acabaria por inserir-se no patrimônio genético da espécie, apprentissage: ing. learning). Mas a revisão das experiências de Brown Sequard que retomou e pretendia ter demonstrado a tese de
diminuindo-se progressivamente as dificuldades da aprendizagem (fr.
Lamarck e das mais recentes de Pavlov, controladas e mais bem inter pretadas por MacDowell e Vicari, desautoriza completamente o pos
tulado da transmissão genética de um caráter adquirido. Ou, por ou
tras palavras, uma vez que ainda não se demonstrou nenhum caso
tipico de hereditariedade de um hábito adquirido por meio da educa gues, "que os seus efeitos puramente fenotipicos passem a ser gené ticos, eugènicos, inscrevendo-se no patrimônio biológico". ocaráter
ção, não se pode pretender, como pondera justamente Otávio Domin
eminentemente social da educação estádeterminado pelo fato de que,
morrendo e nascendo sem cessar os homens, tôda a reparação ou recons tituição social do grupo como um todo faz-se exclusivamente pelo meca
nismo da vida coletiva, pela transmissão da herança cultural a cada
geração, por processo, formas e instituições e segundo leis que se de senvolvenm em plano diferente do plano biológico. As maneiras de ser e de agir, inatas, preformadas, que o patrimônio hereditário individual, podem ser despertadas,constituem desenvol vidas e orientadas pelos processos educativos na direção sugerida pelas condições e exigèncias especificas do meio social, em dado momento histórico. Mas, à educação, por mais eficaz que se ja, pela duração e in tensidade de suas influèncias, não épossivel ulrapassar os limites pre fixados pela natureza individual, nem acrescentar "ao fundo primiti vo" alguma coisa suscetivel de se incorporar ao patrimonio
biologico
(1) oTHMAR SPANN Occidente, Madrid, 1933.
Filosotia de la Sociedad, trad. do al. por E. Imaz, Revista do
FERNANDO DE AZEVEDO 24
hereditaricdade. que não chega a transmitir "as pcla muito complexas perpetuar e de se que a vida social do homem supõe, aptidões aptidões predisposições orgânicas". As materializadas sob a foma desecundárias, históricas, de uma serem para modificaçöes são que adquiridas tendências e faculdades gerais, aptidoes das aptidões, "natureza original", dentro e, portanto, ligacaráter fenotípico, transitório, produziram, constituem efeitos deindividuos sob a ação orgase que em dos estritamente aos de agentes educativos. Se a educação, pois, começa sistemática
uma dupla função, não sò. nizada e acaba, cabe-lhe, no entanto, eugenia onde a orientandoapurar as aptidões dos individuos, de possibilidades mente a de estimular e e tendências das isto é, vocação, sua os no sentido de nas como também a de descobrir e "apontar capazes e intelectualmcnte" sua "natureza original", evoluidos massas humanas os biótipos mais eticiente diversas atividades ou pre às e pronta mais de uma adaptação numa sociedade determinada. É essa função de il. fissões dominantes a selecão à educação contribuir para cada uma tro" ou de reativo que permite sucessivas, em perquirindo, dos mais capazes, nas gerações os indivíduos mais bem dotados e enca delas, por uma larga sondagem, as atividades do meio social, a gue minhando os para aquelas, dentre poderá ter melhor natureza. A educaçãoDomingues aparelhou ou predestinou os a expressão de Otávio sempre, por essa forma, segundo das aptidões intelectuais ina "a virtude de um comprovador excelente afirmar, no estado atual da tas". Mas só; a0 menos quanto se pode
ciência.
que queira aprofundar, deve camde Ora, se o pesquisador, uma vez dos mais belos dicar-se a uma ordem especial de problemas, um pretender aplicar os pos de estudos abre-se diante do sociólogo eque de educa métodos de investigação científica aos fatos às instituições de educação e de ção. Estabelecer uma noção precisa dos fenômenos da escola como sua função social; operar uma sondagem sôbre a origem e a so instituição social, especifica; estudar as relações entre a escola como geral, ciedade, enre o sistema social pedagógico e o sistema social e o Estado; investigar sôbre entre a política ea educação, e a educação estreitamente a estrutura dos sistemas educacionais e a sua evolução, dos grupos sociais, ligadas ao temperamento, àestrutura e àeevoluão essas ins desenvolveram se no interior dos quais tiveram nascimento competiria tituições: não seriam alguns dentre tantos problemas quedominio dos ao investigações ao sociólogo pesquisar, limitando suas dos existência a fatos sociais pedagógicos? Afimar, em duas palavras,
fenôomenos da educação, tão consideráveis e, na civilização atual, tão
surpreendentes, não poderia de certo bastar; para nos convencermos de sua realidade e da variedade de formas que pode apresentar, seria in
dispensável uma série de investigações em que o problema toSse pro
fundamente explorado e o assunto mais nitidamente desprendido do plano sociológico. Mas não é possível desde logo nem desejável pro
esquema pedagógico teórico, para ser lançado, com decisão, sôbre o
curar abranger ou reter todos os problemas que se inscrevem no inte
rior dessas fronteiras mais ou menos determinadas. A unidade do lu
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
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gar, como a do tempo, ou de um povo, não ésenão desordem. Só a
ünidade do problema faz centro. Segundo que critério, contudo, esco Jher as ordens de fenômenos capazes de esclarecer, como por uma ex periência espontânea, - que bem pode ser, conforme a ocasião, nega
tiva, - o "valor das relações" que se tratasse de perscrutar? Mais par ticularmente, entre as duas fôlhas necessárias do díptico, sejam a escola e asociedade, ou a educação e a politica, como prOcurar urn justo equilíbrio nas ações e reações reciprocas? Em todo o caso, os fatos sociais pedagógicos que servem de matéria a êsse conjunto de pesquisas, de análises e de teorias, que se designava comumente sob o nome de "pedagogia" e, mais tarde, sob o nome de
"ciéncia da educação", constituem um campo de investigação socio lógica que pode ser realmente fecundo. E não se pode negar que foi
ainda Durkheim que, definindo a natureza sociológica do fenomeno da educação, abriu o caminho a um dos principais ramos da sociolo gia, e não sòmente estabeleceu o primneiro ponto de aplicação do méto
do sociológico ao estudo dêsses fenômenos, como forneceu, no seu livro
"Educação e Sociologia", um precioso fio condutor nas mãos dos pes quisadores que quiserem seguir os seus traços. Pôde verificarse uma vez mais, nessa ocasião, que "não se acha senão o que se procura" ou ao menos que não se acha o "novo" senão com a condição de saber em
que direção épreciso procurar. Mas, quando èse pequeno livto podia uma corente de pesquisas originais, num domínio tão pouco explorado, não se viu, depois dle, uma só obra que, baseada
eterminar
sôbre inquéritos objetivos, extensos e precisos, nos desse uma justa idéia da importância e variedade dos problemas que se podiam esta belecer a quem percorresse êsse campo de estudos, aberto e definido
por êle, no vasto dominio das investigações sociológicas. No entanto, seria de todo ponto útil que sociólogos se especializassem com decisäo
também nesse ramo de sociologia e escavassem em profundidade o
campo restrito que se tivessem limitado, dos fenômenos sociais peda gógicos. Pois a educação e seus processos que dependem, sem dúvida,
de condições orgånicas ou fisiopsicológicas, e as instituições educacio nais em tôda a variedade de formas que podem apresentar, são "feno
menos sociais" suscetiveis, como as outras categorias de fatos dessa natureza, de observação e de tratamento cientifico.
O estudo dos fatos e das instituições de educaço,
cuja natureza
sociológica jå não precisaria ser demonstrada, constitui, pois, o objeto da "sociologia educacional", como um dos ramos principais da socio logia. Os sociólogos americanos falam freqüentemente de "sociologia
educacional",
expressão que já se vulgarizou enre nós, osentido
que lhe deram, difere profundamente do que ela quer dizer, para nós, e muitas pesquisas foram, e serão ainda necessárias para descobrir, sob essa palavra, bastante vaga e obscura para muitos, as realidades concre tas e variáveis que ela recobre. Essa expressão (sociologia educacional)
parece exremamente cara aos americanos que a empregam habitual
nente em seus livros. Contessamos que não nos desagrada, embora a tomemos num sentido diverso, e que a preferimos à expressio "iència
FERNANDODE AZEVEDO 26
à semelhança da de "ciência adotada por Durkheim,estudo educaão" da sociológico das instituipara designar o empregada direito" no sentido oue educacional" do "sociologia denominação Å ed. cies juridicas. sociológico dos fatos einstituições daeconà. "estudo de é, isto damos, sociologia ihe às de "sociologia jurídica, cação", corresponde, de fato,etc., utilizadas pelo próprio Durkheim par religiosa", sociologia mica, juridicas, econômicas instituições das sociológico estudo exprimir o a expressão "sociologia educacional" religiosas. Se tomamos, portanto, empregamos num sentido diferente a sòmente não americanos, aos como título déste livro), como também. (e é neste sentido que ela figura categoria especial de feno dando tal nome ao estudo sociológico dessa colocamos rigorosamente
educação, nos menos sociais que são os fatos de para estabelecer uma "nomen Durkheim, dentro do critério que adotou têrmo gené. à palavra "sociologia", clatura científica", acrescentando fenômenos, estruturais ou fun. dos estudo designaro para serve ricoque limites dêsse estudo, indicando cionais, - um qualificativo que fixa os se aplica a nossa investigação. sociais a que espécie ou ordem de fatos dualidade de sentidos que recobre a Essa variedade ou, melhor, bastante vaga, em alguns autores, expressão "sociologia educacional", embora com sentidos diversos, não mais precisa e limitada, em outros, vocabulário das ciências humanas pode causar surprêa a ninguém. O em formação, como a sociologia, e, especialmente, de uma ciência nova, de classificação, já o obser étão mal fixado que as "palavras-fontes" de "espírito capitalista", vou Marc Bloch, referindo-se à definição de sua Pesadas, no momento tem muitas vêzes um estranho destino. mas insuficientemente delimitadas no seu
riação, de sugestões novas, mão em mão, por se carregar sentido, "acabam, à fôrça de passar deinsensivelmente divergentes. Ao de uma multidão de acepÇões quase se não se toma cuidado,-0 equí têrmo da evolução, elas geram, o pensamento do vOCo, e, pior ainda, o anacronismo; antes embaraçam presença de tentativas de que o servem". Ainda uma vez, eis-nos em
de verda definição aplicadas a têrmos que, em disciplinassuaprovidas significação rigo
deira nomenclatura, teriam desde longo tempo e leal rosamente estabelecida. Sem embargo do esfôrço, penetranteparte de o de grande para compreender um estado de espírito comnoexpressão comporta, hu sociólogos americanos, com tudo o que essa de sub manamente, de nuanças, de contradições e até, na novidade, preconceitos missão mais ou menos inconsciente ou confessada a certos de tradicionais, era preciso tentar, como o fazemos nesta introdução,
educacional" e pôr finir exatamente o que se entende por "sociologia expressão. Pois não ésÒ
um conteúdo concreto e específico sob esta do presente sempre tão difícil a observar; é também das obses mentee das sões tendéncias do passado que se nutre uma corrente de ideias
em qualquer dominio filosófico, literário ou científico. de "sociologia educacional", ainda predominante entreAos concepção americanos, diverge profundamente de nosso modo de ver, sob dois aspectos. Ela tem, em primeiro lugar, um caráter essencialmente descritivo e pragmático e é mesmo dominada freqüentemente menos
SOCIOLoGIA EDUCACIONAL
27
pela idéia de observar arealidade social e refletir sôbre ela do que pela
de cmpreender a sua reforma ou a sua reconstrução. £sse caráter de
estudo utilitário do "estado educacional" americano, dos sistemas, mé
todos e programas escolares, com objetivo de prática e reforma da edu cação, provém aliás de certa tendência outrora dominante que levava a considerar a sociologia não como uma disciplina cientifica de fins desinteressados, mas como um estudo prático das questões da vida so cial, politica e econômica, contemporanea (1). Do ponto de vista cien tifico, essa tendência desenvolveu se demais para não sermos tentado a reprovar terem concedido uma importåncia às vèzes excessiva "à poli tica educacional", sob o seu aspecto mais voluntário e mais aberta
mente confessado, e de terem, ao contrário, pôsto menos em relêvo do que se teria desejado, a um tempo, os grandes fenômenos de massa
da educação, os fatos institucionais e a influência exercida pelos outros
sistemas sociais sôbre os sistemas educacionais. Em segundo lugar, os autores americanos, na sua maioria, entendem por "sociologia educa
cional (educational sociology; sociology applied to education; socio
logy with educational applications) o estudo da sociologia geral com apli cações à educação ou, por outras palavras, sociologia aplicada à edu cação. Esta consistiria, para êles,em fazer passar para o campo das apli
cações práticas os princípios, as verdades ou as leis da sociologia que
se diz teórica ou racional; quando a verdade é que, para haver uma "'sociologia educacional" nesse sentido, seria preciso que, em sociolo gia, já tivéssemos chegado a um enunciado de leis com certo grau de generalização e de sistematização. Ora, "a educação em uso numa sociedade determinada e consi derada em momento determinado de sua evolução é, como diz Durk
heim, um conjunto de práticas, de modos de fazer, de costumes que de que os outros fatos sociais". Fazendo recair o objeto da "sociologia educacional" sôbre essa categoria ou ordem especial de fatos sociais, que são os fatos e as instituições sociais de educação, além de limitar constituem fatos perfeitamente definidos e possuem a mesma realida
mos sob essa expressão o campo das investigações sociológicas, restitui
mos a sse
ramo da sociologia o seu caráter científico e desinteressado.
Ogrande pensador e sociólogo que preparou o caminho, como um
precursor, a essa concepção sôbre que repousa a sociologia educacional. tal qual a entendemos, mostra que êsse conjunto de estudos, engloba
dos por êle sob o nome de "ciência de educação'", apresenta os caracte
(1) Sem dúvida, mais do que em qualquer outro pais, nos Estados Unidos a socio logia in troduziu-se ràpidamen te no ensino de todos os graus, não sÓ nas como também nas high schools, nas escolas normais e nos colégios, como nosuniversidades sua nu merosa literatura didática sôbre a matéria (v. FR. W. ROMAN - La placemos detrala asociologie dans l'éducation aux Elats Unis, 428 págs., Paris, Giard, 1923). O trabalho de em Roman constitui "um precioso quadro documentário da situação e das idóias da America ma téria de educação'". Mas o que, nesse país, se entendia por sociologia era bastan te dife rente do que entendemos paiava: não se trata as mais das vezos "de uma disci. pling científic de fi todo desinteressados cuidadosa, intarmediário antes de tudo, do método crítico; mas de um ensino prático do estado social americano, entre o que se
chamou, entre nós (franceses), a moral prática, a instruç£o civica, a economia politica as ciências sociais". Os fins dêsses estudos assim são essencialmente compreendidos, prá ticos e pragmátlcos, , como tais, poderiam ser feitos livre imparcialmente, pergunta
Roman, no ensino secundário? Entre os tranceses, ao contrário, a opiniâo dominan te era que
a sociologia não podia ser introduzida nos programas oticiais sondo com a condiçáo de se guardar o seu caráter científico e desinteressado.
FERNANDO DE AZEVEDO
os cstudos sôbre a saber: a) recaírem científica, uma homogeuma disciplina passíveis de observaão e com res de objetivos fatos clasificados numa nesma categoou poderem ser dados para cstudos feitos de modo absolutade neidade suficiente objeto serem sses fatos conhecê-los e sòmente para conhecê. ria; b) desinteressado, isto é, "para começa desde que o saber Durkheim, mente próprio o O sábio não descopor si mesmo".suscetíveis de utiliz. los. A ciência, lembra-o procurado fôr, seja seja êle qual suas descobertas sãodirija as que dúvida, sôbre tal ou qual nhece. sem mesmo que êle se per. acontecer mais aproveitáveis ou ção futura. Pode pareçam lhe porque entrega à ponto, de preferência, urgentes. Mas, enquanto se práticas". necessidades a mitam satisfazer das conseqüncias se desinteressa sociologia investigação científica, êletorna-se de que é um dos conmo a especula educacional pura, uma ciência A sociologia ciência uma partes, e reno principais ramos ou sôbre novos fundamentos com educação a edificar embora tiva, destinada a suas funções sociais, de e origens suas de var o estudo educacional e possamos util/ politica em aplicações conduta, já para porte numerosas dêles uma regra de deduzir para já dados zar seus legitimá-las, nossas opiniões ou teorias 28
Ihes ligar, a fim de revé-las ou
sôbre educação (1).
uma das vias de acesso por é vÁ, se como sociologia, fato ou Assim, pois, a científico da educação, comoconteúdo estudo o abordar pode onde se observação, como sejam "o conjunto de fatos suscetíveis detransmite (idéias, sentimentos coletivos, da civilização" que aeducaçãoas formas diversas que reveste (institui tradições, hábitos e técnica), estrutura social, e a aparelhagcn ou da pressão a sob escolares) Ções que se serve para trans instrumental próprio (livro, material, etc.) de que se produz em todos os gru miti-la. A educação, fenômeno social serve como uma realidade objetiva e cientificamente tratada é pos, de pesquisas, que constituem de matéria a êsse conjunto de análises e ciência da educação o que se a a "sociologia educacional". Deu-se com segundo observou Durkheim (2), que, verificou com a economia política hibrido, intermediário entre a arte "ficara até o presente um estudo observar a vida industriale co e a ciência, muito menos ocupado em conhecer e lhe determinar as mercial tal qual é etal qual foi, para a ser. Os economistas (como leis, do que em reconstruí-la tal qual deve
educação em relação à realidade edu os pedagogistas ou teóricos de muito fracamente o sentimento de que cacional) não têm ainda senão
como as realidades fisi a realidade econômica se impõe ao observador
por Durkheim a essa concepção de (4) E curioso observar que, aberto o caminho aparecido ainda, na França, uma tenha ), não educacional (sociologia educação ciéncia de instituições de educação. O livro e das fatos sociológico dos estudo o tentasse que se obra aliás em excelen te de HESSE e GLEIZE (Notions de sociologie appliquée à la morale escola er a inspiração da a sob I'éducation, Paris, Alcan, 1923 ), que é escrito, do te0, de E. Durk toi em o t o parte tomado aos trabalhos sociológica cesa, e acusa, Cujo material heim e de C.fran Bouglé, ao contrário, no seu plano una concepcão de 'sociologia apll
cada á educação". Depois de uma introducão sôbre o indivíduo e a sociedade, a obra se
distribui en S partes : ) eociologia economica; 2) doméstica; 3) politica; 4) criminal 5) origens e relações da seligião, da ciência eda arte. Éprefaciada por P. Fauconnet. (2) E. DURKHEIM
Sociologie et sciences sociales, págs. 323-324.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
29
cas: de que ela ésubmetida à mesma necessidade ede que, portanto. Apreciso fazer-lhe a ciência de um modo todo especial antes de em
preender reformá-la. Demais, êles estudam os fatos de que tratam como
se éles formassem um todo independente que se basta e pode explicar se por si mesmo. Ora, em realidade, as funções econômicas (e iga se o mesmo das funções educacionais) são funções solidárias das outras funções coletivas e tornam-se inexplicáveis quando nós as abstraimos
destas últimas. Tornando-se um ramo de sociologia, continua Durk heim, a ciência econômica será naturalmente arrancada a ésse isola
mentoao mesmo tempo que ela se penetrará mais da idéia do determi
nismo cientifico. Por conseguinte, tomando assim lugar no sistena das
ciências sociais, ela não se limitará a mudar de etiquêta, transformará
não só oespirito de que estáanimada como os métodos que ela pratica". Essa concepção perfeitamente clara de uma "ciência de educação", segundo Durkheim, ou de "sociologia educacional" (expressão que to mamos aos americanos, revestida, porém, do mesmo sentido que Durk heim atribui à"ciência da educação") permite-nos estabelecer uma dis tinção nítida entre sociologia educacional (estudo sociológico ou cien
tífico da educação), de um lado, e pedagogia e história de educaço, de outro. Quanto ao que Durkheim entende por "pedagogia" convém
frisar, segundo comenta Fauconnet (l), que ela "não é nem a ativi dade educativa em si mesma, nem a ciência especulativa da educação.
Éa reação sistemática da segunda sôbre a primeira, a obra da reflexão que pesquisa, na psicologia e na sociologia, principios para a prática ou a reforma da educação. Assim concebida, a pedagogia pode ser
idealista sem chegar a ser utópica". A pedagogia que consiste em uma
reflexão sôbre a ação que se tem de exercer, tende, pois, a tomar um
caráter tanto mais cientifico quanto mais se basear na psicologia e na
sociologia em que se inspira e a que vai buscar os elementos para as
suas regras e construções teóricas para a prática da educação. O estudo
objetivo e desinteressado dos fatos, das práticas e das instituições de
educação; das semelhanças e diferenças entre os sistemas educativos de cada povo; dos tipos genéricos de educação correspondentes às diver
sas espécies de sociedade; da maneira por que se formam ou se cons
ituiram as instituições pedagógicas; de como, uma vez formadas, fun cionam; quais as relações entre os sistemas pedagógicos e o sistema social geral equais as leis que dominam os sistemas educativos, etc.. constitui o objeto da ciência da educação ou da sociologia educacio nal. Todos êsses fatos passíveis de observaço e outros que seria fácil desde já indicar, relativos à gênese, à estrutura, ao funcionamento e à evolução dos sistemas de educao, abrem à especulação cientifica ou sociológica um vasto campo de estudos, quase todo por explorar. Ora, enquanto a sociologia educacional, como ciència pura e especulativa que é, descreve e explica o que é e o que tem sido, o objetivo da pe lagogia ou das teorias pedagógicas, é de determinar o que deve ser. () E. DURKHEIM - Sociologia e educayáo, pref. de Paul Fauconnet, págs. 14 e 15 Rio, 1929.
trad. de Lourenço Filho, Comp. Melhoramentos de $. Paulo, S. Paulo
FERNANDO DE AZEVEDO
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que não estuda cientifica A pedagogia é, pois, uma teoria prática Durkheim, reflete mais ou mente os sistemas de educação, mas, diz menos profundamente sôbre tais sistemas, no sentido de fornecer ao educador uma teoria que o dirija. Certamente, como já se disse, na medida e proporção em que se
desenvolverem as ciências (biologia, psicologiae sociologia), em que se apóiam, cssas especulações pedagógicas ou teorias para a educação tendem aganhar maior valor, coerência e solidez. Enquanto não ad. quiriremn certo grau de exatidão essas ciências que residem à base da pedagogia, não é de estranhar a insuficiència e a precariedade das
teorias pedagógicas, das quais algumas, sem dúvida, poderão percorrer,
como jáse tem dado, as teorias e as descobertas da ciência pura. e outras, a maior parte, estão sujeitas ao abandono ou a constantes revi
sões sob a pressäo das conquistas que se realizam no terreno pura mente cien°fico (1), A outra confusão, não menos freqüente, já assi nalada por Durkheim e sublinhada por Fauconnet, é a que se estabe
lece entre sociologia educacional (ciência da educação) e história da educação, de uma parte, e, de outra, entre a história das doutrinas pe dagógicas e a história da educação em si mesma. O problema das rela
ções entre a história da educação e a sociologia educacional éum caso
particular do problema, tantas vêzes já pôsto e discutido, entre socio logia e história, que já examinamos em "Principios de Sociologia" e a que nos referimos em nota, nesta introdução. A sociologia educacio
nal é a aplicação do método sociológico às coisas ou aos fatos de edu
cação, suscetíveis de observação direta (estado atual) ou de observa
ção indireta, pela história que nos permite remontar aos fatos passa dos e no-los apresenta estritamente ligados às condições de tempo pre ciso e de lugar preciso.
Émister ainda ver duas coisas distintas na
história da educação que é a história das instituições escolares, dos fatos realizados em certo tempo e numa sociedade determinada e na histó ria das doutrinas pedagógicas, que tem por objeto o estudo de outra
categoria de fatos que são as "próprias teorias pedagógicas", ligados
por sua vez às condições do meio social em que tiveram a sua origem
eo seu desenvolvimento. Assim, qualquer que seja o valor dogmático cialmente, "a revelaão das fôrças sociais que as impulsionavam ou trabalhavam por modificá-las. A história da pedagogia não éa história
das teorias, Durkheim, observa Fauconnet, procurava por elas, espe
da educação, porque as teorias não exprimem com exatidão o que real (1)
Compare-se a distinção entre sociologia educacional e pedagogia com a distinção
entre na sociologia (clência dos moral,et que _as conferèncias feitas Sorbonnemoral e publicadas sob costumes) o título Morale scienceestabelecem ( Paris, Fernand Nathan, Premiere serie, 1923: deuzième série, l924 ). As lições sôbre a moral (1.rè série: LAPIE,
Morale et science; PARODI, La notion de Bien et la notion de valeur en morale; 2.e srie. PÉCAUT, La Pailosophie de la morale ) "tomam por ponto de partida a existência de una sociologia moral cujo papel é apreseníar-nos o sis tema real de valores (PARODI, I, 4l ) ou de uma ciência dos costumes (LAPIE, I, 3) que tem por objeto descrever, não retormar? ern resumo, todos consideram primeiro a morai como um fato. (PECAUT, II, 4-2). É sobre
ste fato ou antes sôbre éste conjunto de fatos, que são os valores morais, que o nord lista deve fundar uma doutrina. Déste ponto de vis ta, a sociologia, ciência especulava não substituirá a moral, ciência normativa; a moral cientificgmente não cessaria, isto por éisto, de nos ur mlaeal a atingir, mas deterninaria, e justificaria sociolàgicamente,
éste ideal'". (Apud L'Année Sociologique, Nouv. Série, J. I. pág. 215, Paris, Félix Alcoan, 1923-1924).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
31
mente ocorre, e não enumeram também exatamente o que de fato se realizará. Mas as idéias também são fatos, e fatos sociais quando al
cancem repercuso".
III
Daí, pelas relações existentes entre as concepções filosóficas e as
instituicões sociais, o grande interèsse sociológico que apresenta o es
tudo histórico das doutrinas pedagógicas, por sua vez ligadas à histó
ria geral do pensamento humano. Fica bem entendido que, quando
afirmamos a existência de "relações", estamos longe de aceitar aidéia
de uma subordinação das teorias de uma época às suas formas de vida
econômica e social, como se aquelas tivessem de ser necessàriamente o produto destas. Essa questão foi posta, com admirável lucidez, nurm
livro recente (1), que constitui "um vigoroso esfôrço para pôr em rela ção, ao longo de um periodo de "passagem" e de transição, e no qua
dro de uma mesma sociedade, as superestruturas filosóficas com as
fundações econômicas e a estrutura social". Entendamos bem aliás que
Borkenau, na sua obra, não pretende, de forma alguma, como observa
Lucien Febvre, numa síntese luminosa dsse trabalho, "pôr, um em face do outro, dois mundos confusos; aqui, o pensamento, acolá, a eco nomia, edecretar que um éo reflexo do outro, pura e simplesmente.
Seu esfôrço, ao contrário, é distinguir os dominios, a fim de mostrar por que pontes éles se comunicam uns com os outros, na vida". O cui
dado constante nessas páginas, de ligar a história das idéias, tantas vê
zes desencarnada, à história social pròpriamente dita, é que faz o in
terésse dêsse pequeno livro, sólido e vigoroso, que mostra como é fe cunda a idéia de estudar em conjunto, e não separadamente, as insti
tuições sociais e as especulações filosóficas, os dois dominios na histó
ria socialena história do espírito humano. Se não nos recusarmos a
priori repor no seu quadro social a ciência e a filosofia de uma época para continuar a jogar o jögo fácil dos conceitos, engendrando se mecâ
nicamente no éter imponderável do pensamento puro - na frase ex
pressiva de Lucien Febvre, havemos de reconhecer, sempre que o ten
tarmos, como é útil todo o esfôrço que tende "a pÓr em relêvo as liga
çöes, as correspondências e as repercussões, a estabelecer as solidarie
dades múliplas entre as manifestações, as mais opostas em aparência, da vida em uma época determinada".
Mas, se para compreender a história do pensamento humano, é sempre útil e fecundo repor a especulação filosófica no seu clima his
tórico, a história das doutrinas pedagógicas não se poderá compreen
der senão banhando se longamente, de um lado na história social, e,
de outro, na história geral do espirito humano. Asim também, ainda que distintas, a história das teorias pedagógicas e a da educação ou das (1) BORKENAU - Fondations économiques, thèse. £tudes sur l'histoire de la philosophie pendantsuperstu la periode
philosophique: une sy
manufacture (trad. ).
1934, v., Annales d'Histoire Economique et sociale, n.o 28, 6.e année, Juillet. 1934, Librairie Armand Colin, Paris.
32
FERNANDO DE AZEVED0
instituições escolares de tal maneira se interpenetram que tanto o es
tudo das instituições sociais e de sua evolução contribuirá para eluci
dar as doutrinas pedagógicas como o conhecimento destas concorrerá
para esclarecer as mudanças operadas nos sistemas de educação. Nas transformações de estrutura e de processos escolares, sôbre um desen volvimento em aparência puramente técnico, surpreendemos ao vivo as
repercussões das doutrinas pedagógicas, quer deduzidas de cspeculações filosóficas, quer provenientes de pesquisas no dominio estritamente científico. As grandes personalidades politicas e educacionais, nos do
mínios da ciência ou da técnica,
pois a técnica é a parte da ciência
voltada para a aço - são também elas, ao menos por uma boa parte
figuras e símbolos da vida coletiva; os reformadores, como aliás os pen
sadores e os artistas, são focos que concentram enm dado momento raios emanados da coletividade e que os devolvem em seguida a ela, diver
samente combinados e modificados. A sociologia educacional, pelo es tudo das condições concretas da atividade educacional e suas relações com as outras manifestações, econômicas, políticas, religiosas, etc., da
vida social, pretende conhecer a natureza dos fatos de educação, esta
belecer as relações constantes entre os fenômenos pedagógicos e outras
categorias de fatos sociais, entre o sistema social pedagógico e o siste
ma social geral, e chegar, por esta forma, àteoria geral dos mecanis mos eduacionais, considerados de algum modo in abstrato, isto é,
despojados das condições precisas de lugar e de tempo. Proceder às
mises au point necessárias, fundir noções gerais em um quadro coeren
te, e, enfim, fazer aparecer as grandes correntes de causalidade ou de
inter-relações que ligam os diferentes fatos estudados, tal é o objeto da
sociologia educacional que, sendo um ramo da sociologia, permanece, como a ciência de que faz parte, uma ciência pura e uma disciplina especulativa, ainda que comporte numerosas aplicações. Ora, a sociologia, constituindo-se como ciência, sugere-nos um mé todo novo para atingir a realidade educacional, a saber, considerá-la
como um aspecto ou um setor da realidade social e analisá-la nas suas
relações com os outros fenômenos da vida coletiva. A sociologia eco nômica, observa Raymond Aron, não se acrescenta à ciência ou teoria
econömica, ela a transforma e a substitui. Não designapesquisas parde ponto dum conduzidas original, espírito um ciais inspiradas por vista original; confunde-se com a ciência econômica verdadeira, reno
vada na obra de Simiand pelo método positivo e pelo sentido do ser coletivo". Pode-se dizer o mesmo da sociologia educacional que não sò mente inaugura uma nova ordem de pesquisas, inspiradas por um es
pirito original, mas se confunde com a cincia da educação renovada
enriquecida pela aplicação do método científico ao estudo dos fatos, e das instituições e dos problemas de educação. Mas para que se tenha
uma idéia ainda mais precisa de quanto interessa e é necessário ao educador o conhecimento da sociologia, como base cientifica de sua
profissão, basta atentar-se para ésses três fatos fundamentais: a) a natu
reza sociológica do fenômeno da educação; b) as relações dos fatos so
ciais pedagógicos e os outros fenômenos coletivos; c) e as variações, em
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
33
conseqüência, scgundo os povos e sob a pressão das condições sociais. s das instituições escolares, como também dos tipos de mentali dade ou dos ideais que se transmitem pela
educação, de fato, quer se processe de torma difusa ou educação. assistemática, guer se rea lize Dor meio de instituições espeCiais, é sernpre "uma ação exercida pelas gerações adultas sôbre as gerações jovens para adaptá-las à A
sua Pnria mentalidade delas (as gerações adultas) e, em ao conseqüència, meio físico e social"; ou, por outras palavras, é a transmissão das tra dicões materiais e espirituais de uma geração a outra, numa sociedade
determinada. Éum fato eminentemente social cuja essncia sociológica ressalta de não ser explicável senão dentro da organização social e por ela, e de não só ter condições sociais, mas ser de natureza, de origem e de finalidades sociais.
Mas tÑda aeducação que, reduzida àsua essência, como fenomeno social, se repete idênticamente no tempo e no espaço, ésolidária com
aevolução histórica e social que a enquadra e a condiciona. Os siste mas de cducação, determinados pelas estruturas sociais, não podem ser senão o que elas são numa sociedade dada. Certamente, cada socie
dade, seja qual fôr o tipo e a complexidade de sua organização rudi
mentar ou embrionária, extremamente complicada ou altamente evo luida, age sôbre os individuos para modelá-los à sua imagem, marcá
los mais ou menos conscientemente com o seu caráter e, tornando-os
semelhantes, assegurar a sua coesão interna, a continuidade do grupo como tal e o seu crescimento. Tôdas as sociedades fazem grandes es forços nesse sentido e, em tôdas elas, realiza-se êsse fenômeno que
consiste na transmissão, pelas gerações adultas, de seus tipos de cul
tura e de seus modos de vida, às gerações que vão surgindo e, àmedi da que sobem, vão sendo assimiladas à vidae às condições sociais do
grupo. A sociedade, porém, é um todo orgànico, um "Zusammen hang" de que épreciso apanhar a solidariedade interna. A familia
romana, comenta Aron, "compreende-se melhor pelo conjunto da so ciedade romana do que pelas aproximações com instituições ainda que análogas, em sociedades fundamentalmente diferentes". Se nas socieda des primitivas, "tôdas as espécies de meios são encarregados de fabricar o mesmo homem e elas conseguem fabricar um", no há, entre as so
ciedades arcaicas e as nossas, observa Marcel Mauss, "nem identidade de estrutura das instituiÇões encarregadas da educação nem simeria dos funcionamentos dessas instituições". Éque as instituições escolares
vartam com o conjunto das instituições sociais e, não sendo possive! compreender um sistema social pedagógico senão em face e àluz do
SIstema social geral, é preciso ligar sempre as instituições educacio nais às formas e aos quadros da estrutura social que as determinam e que, transformando-se, as fazem variar em consequència. Não s£o apenas as instituições educacionais que variam de uma Sociedade para oura ou no interior de uma mesma sociedade de um tempo para outro, mas também os ideais morais, sociais, politicos, etc., que se transmitem por êsse processo social a que chamamos educação.
Se o adulto, tuncionário especial (mestre) ou não, "intervém para
trans
FERNANDO DE AZEVEDo
34
formar, isto implica nle, lembra Davy, arepresentação de um certo
ideal à imagem do qual se esforça por modelar os jovens espíritos". Não se trata, pela educação, de formar o homem in abstracto, mas o
homem e o cidado para certa época e para certo meio, isto é,de torná-lo conforme, em nosso tempo, ao tipo atual do homem civi
lizado, como cada sociedade, cm cada época, procurou conformá-lo com
odastipo social que lhe impuseram as suas condições peculiares, dentro exigências e das aspirações de um determinado tipo de civilização. Ora, como estudar, senão pclo método sociológico, um fenômeno que
é de origem, natureza e finalidade sociais? Como, senão pelos métodos de investigação social, conhecer e dominar, para explicar as instituições escolares, o complexo das instituições sociais, em que se enquadram
e que as determinam, situando as no seu conjunto e marcando-as com as suas caracteristicas e a sua fisionomia própria? E, se o ideal que se transmite pclos processos e instituições educacionais, varia em função da civilizaço, "como, pergunta Davy, determinar, senão pelo método sociológico, qual será, em cada momento considerado, o conteúdo real dêsse ideal"? Se não é possivel ter noções precisas e verificáveis do fe nômeno educacional, sem estudá-lo pelo seu aspecto sociológico, nem
compreender as instituições escolares sem abrir os olhos sôbre as reali
dades sociais que nos cercam e que as enquadram; nem atingir o co
nhecimento e a definição dos ideais a transmitir, sem a análise da so viver; não se podem contestar a utilidade e a importância dos estu dos sociológicos para os candidatos ao magistério e a outras ativida des ligadas à educação.
ciedade em que vivemos, do mundo real em que os jovens terão de Mas o estudo da sociologia educacional que é uma das bases cien
tíficas das profissões ligadas à educação, não tem apenas uma utilidade pedagógica direta. Tem o mais alto interêsse sociológico. Não há dúvi
da que a inserção do ensino sociológico no quadro das disciplinas de
um curso de formação profissional tem antes de tudo o objetivo de subministrar à preparação dos futuros professôres uma base científica
mais sólida, de lhes fornecer meios de atingir a uma compreensão mais ampla e completa dos fatos e dos problemas educacionais e, ao mesmo
tempo, alargar-lhes o espírito, despertar-lhes o sentido critico, levando
os a conhecer "o maior número possível de fatos sociais racionalmente
coordenados" ou, ao menos, verificáveis e coordenáveis. Num inquérito
a que procedeu Raymond Aron, na França, e em preparação de um inquérito mais largo de que o Ministério da Educação Nacional acei
tara o principio, pôde êsse sociólogo reunir testemunhos vindos de uma dezena de Escolas Normais, de moças e rapazes. "Na maioria dos casos,
segundo nos infoma, afirna-se que êste ensino interessa especialmente os alunos, e, mais (dizem-nos) do que o da psicologia, que aliás
parece de molde a desenvolver certas tendéncias naturais à sua moci
dade, -
contribui a dar-lhes o sentido do relativo e o sentido do com
se não lhes fornece ainda tanto quanto se desejaria de resul E, plexo. tados adquiridos, de verdades gerais demonstradas, os incita a pro curar com método, os ensina a observar, a comparar e a induzir, antes
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
35
le chegarem a uma conclusão ou de se lançarem à ação (l). Esta, para futuro professor, a sua grande utilidade pedagógica direta: de
Curiquecer asua própria personalidade e ampliar e aprofundar a sua cultura, concentrando, para projetá-la sôbre os fatos e as instituicões nedagógicas, a luz da observação cientifica e das pesquisas metòdica nente conduzidas, que permitiro aos estudantes adquirir una visão mais clara da realidade social, a noção do papel dos fatôres econômi.
cOs e ideológicos na organização das estruturas escolares, o dinamismo
dos fatos cducacionais como processo sOCial geral e cono uma acão
especifica, realizada pela escola, as reações dstes fatos sôbre o corpo social, e as repercussões de outras categorias de fatos sociais (econo
micos, politicos, religiosos, morais, etc.) sòbre os fatose as instituicões
de educação.
Já bastava para justificar a introdução da sociologia educacional nas Faculdades de Educação e nas Escolas Normais, a sua utilidade pedagógica para a formação profisional que se alarga na sua base científica, para se arejar no seu espírito, abrangendo, sôbre a sociedade,
horizontes mais vastos, acima dos quadros das instituições escolares. Mas a sociologia educacional ainda tem, sôbre essa utilídade, um in
terêsse sociológico direto, que não se limita às investigações nessa ordem
de fatos sociais, que são os fatos, os problemas e as instituições de edu cação quase todos por estudar entre nós, de um ponto de vista e com
métodos científicos. O professor que reduzisse a essa categoria especial de fatos o seu camnpo de investigação social, estudando-os, por meio de observações limitadas mas precisas, e de estatisticas relativamente fáceis
de obter, pode fazer obra de sociólogo. Se se considerar, porém, que
a educação consiste, como já o dissemos, na transmissão de uma civili
zação, isto é, do ideal humano que os adultos trazem consigo, com
preender-se-á que "êsse ideal dos adultos nunca seja mais fácil per ceb-lo e defini-lo, do que quando se assiste à sua transmissio". No
que uma geraço
faz para criar os seus sucessores há a ocasio
de sur
preender o segrêdo de sua alma, ou, por outras palavras, ainda de
Fauconnet "o trabalho a que a sociedade se entrega para educar os seus filhos é omais seguro teste de sua concepção de vida. Pela prima
zia que concede à educação moral ou fisica, intelectual ou religiosa, à formação do caráter ou àdo espirito, ao cultivo da polidez ou ao da franqueza, se pode afirmar que, para essa sociedade, é esta ou
aquela a hierarquia de valores". Pode-se traçar um quadro da socieda de francesa ou da sociedade brasileira contemporånea só pela obser vação e descrição do que éa educação na França ou no Brasil e, se
épossivel reconstituir um quadro da sociedade brasileira, vista através da França, da Alemanha, do` Brasil, "na história de uma escola ou mes no na história de um termo tomado ao vocabulário das coisas de edu caço". A história da educação, observa justamente Fauconnet. é uma
de seu sistema de educação, pode-se cifrar uma lição inteira da história das mais seguras vias de penetração na história de nosso passado.
Ea sciales ea France ) A. ARON - La Sociologie, págs. l3-49, in Les Seienoes sciales. scieaca daa dludes seignement et Recherche HartOPepare Rapport qroupe par l Paris. ubllcation N,o 5, Paul 4 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 36
todo o partido pos É preciso, sem dúvida, para que se possa tiraralém de formado protessor, sÍvel desses estudos sociológicos, que o tenha um sentido apurado da mais rigorosos métodos de pesquisa, das instituiçõcs, c, tanto aut realidades sociais, o gôsto da história um scntimen oenriquecimento desa feliz faculdade de generalizaço, das diferenca* to delicado e sutil das nuanças e a viva percepção Aliás n5 sociais. esferas que separam umas das outras as diversas
se pode da fisica, nem da quimica, nem da biologia pròpriamente que maneira mas da tirar todo o proveito para a tormação do espirito, fisicos, os ot os êles com qual ensinam aos jovens e trabalham
pela especiali micos, os biologistas ou quaisquer outros protessôres nas suas ão educação de fatos respectivas. A observação cientihca dos dades apenas o único meio de compreende-los na sua natureza, na sua de fatos função especifica, nas suas correlações com as outras ordens "talvez o mas sociais e na variedade de formas que podem revestir; melhor meio de que dispomos para penetrar profundamente a psico senão o logia de um povo". Não tive, com éste livro, outro objetivo ao professor de definir êsse novo campo de investigações que se abre de relações a e fatos e ao sociólogo, de mostrar um grande número de por uma série estudar e as perspectivas que se rasgam ao observador, Para isto fecundas. verdadeiramente de pesquisas e de comparações prático a não é preciso nem convém dar um caráter excessivamente étes estudos de acôrdo com os que entendem que a sociologia, nasci da da ação, da idéia de reforma, não deve cessar de preocupar-se comn a ação. Certamente, se a ciência será mais satisfatória para o homem, como o sábio, se lhe orienta a ação, é de bom método que oprofessor,possível da con no momento da pesquisa, se desprenda tanto quanto resultados de seu sideração dos fins aos quais podero ser aplicados os científicos tantas rabalho. O próprio Durkheim, em cujos trabalhos vêzes estêve presente a vontade de reforma, insistiu em explicar quanto a pre a preocupação muito direta dos problemas práticos se arrisca comprome
judicar a pesquisa e a retardar o conhecimento preciso, tendo a observação e a reflexão sôbre os fatos.
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PARTE PRIMEIRA
AEDUCAÇÃO, FENOMENo SOCIAL
Capitulo I
O INDIVIDUAL EO SOCIAL homem. - A O homem, animal social. - As faculdades especificas do - 0 técnica. e a linguagem - A de organização social. capacidade sua indivíduo e a hereditariedade. A natureza biopsicológica e a natureza Sêres de naturezas diferentes. - 0 0 indivíduo e a sociedade. social.
indivíduo e a vida social. A noção de personalidade. - 0 problema das produto soial. O indivíduo, sociedade. e a indivíduo relações entre o ou consciência "nós" do consciência e a A consciência do "eu" ou de si mesmo social.
O predomínio da consciència social nos pequenos grupos. -
sociedade e a sua natureza própria, distinta da natureza individual.
A
O homem, se é, como seus vizinhos na escala zoológica, um meca nismo nervoso complexo sensório-motor, dêles evidentemente se dis tingue, sobretudo pelo extraordinário desenvolvimento dêsse sisterna nervoso que possibilitou e condiciona um maior desenvolvimento de sua vida mental. Mas, como a inteligência, tão iìntimamente ligada ao seu sistema nervoso, é, na variedade de suas formas, tipos e graus, uma
capacidade, não adquirida, mas inata, embora suscetível de aper feiçoamento, de cultivo e de orientação, não é menos inerente ao ser humano o poder de interação mental que dela decorre e faz do ho
mem um "animal social". Þ homem não é apenas um "ser vivo", mas um "ser consciente", ou, por outras palavras, não apenas uma indivi
dualidade biológica, mas uma individualidade social, que só por abs tração podemos separar do meio cósmico, físico e social, em função do
qual se constitui e se desenvolve e de que se torna, por sua vez, um componente. É na continuidade dos componentes que reside o prin
cípio de interação entre os individuos, a solidariedade de fato que os une e os opõe, e os une mais do que os opõe, não sendo a inter-repul
são senão uma conseqüência possivel da interação sensorial e mental, que se apresenta ela própria como um caso particular da interdepen dência geral. Não parece, pois, ter razão Lester Ward quando afirma
que o homem não éum "ser social" por natureza. 0 individuo, como
observa Jean Piaget, "é provido, desde o seu nascimento, de certo
número de tendências hereditárias, das quais umas implicam a sua inteligência futura, e as outras, suas capacidades sociais. £le é. pois, em um sentido, inteligente e social desde o primeiro dia". Se há entre as sociedades humanas e as sociedades animais uma diferença mais de
grau do que de natureza, não se podenm considerar "sociedades artifi
ciais" aquelas em oposição às "sociedades naturais" que seriam apenas, a juízo de alguns, as colônias animais e as sociedades orgånicas. As sociedades humanas, que têm por base e condição o processo inter
FERNANDO DE AZEVEDo 42
interna sensoriale mental e obedecem a um princípio de finalidade consciente ou racional. ou de solidariedade teleológica, mais ou menos como nas próprias sociais, são produtos naturais, não só nas estruturas riações técnicas, com que o homem transtorma o meio para adaptá. lo às suas necessidades.
Nenhum animal certamente nasce tão desprovido de meios de ser mais frágil defesa e de proteção como o filho do homem. Nenhum debruçam, com se do que a criança embalada no berço, sôbre o qual e o orgulho os seus desvelos e as suas esperanças, a ternura maternal pe maturidade, nascimento à paterno. Nenhuma criatura atravessa, do infância ríodo tão extenso de fraqueza, e necessita, na sua prolongada entanto. No humano. ser e adolescência, de tamanhos cuidados como o o homem cuja natureza é social, como já dizia Aristóteles, supera todos outros animais, não só pelo seu poder de organização social, como os ainda por duas outras faculdades ou propriedades eminentes que pos indefinidamente as facul sui e com que pode não sòmente acrescentar dades de adaptação ao meio exterior, mas transmitir e assegurar o seu progresso através do espaço e do tempo. Essas faculdades especificas
são: l) o poder de fabricar instrumentos: e 2) a linguagem. Quadrúpe
de em quase todos os animais, a marcha começa a ser oblíquaA nos ati antropóides, para só se tornar perfeitamente ereta no homem. tude ereta (1 ), libertando-lhe as mãos que não mais se pousaram no chão, e a faculdade que tem o homem, e só êle, de apor o polegar aos outros dedos, o que lhe torna a apreensão mais perfeita e delicada, - fizeram do homem o único animal capaz de modelar instrumentos,
de ser o toolmaking animal, na expressão de Franklin, o animal trans
formador por excelência. Se não traz, ao nascer, incorporados ao pró prio organismo os meios de defesa (garras, chifres, etc.), como nas outras
séries animais, em que a adaptação biológica ao meio se processa "por como lhe chama transformação no próprio organismo", o homo faber, instrumentos, fer H. Bergson, tem a capacidade de fabricá-los, fazendo
ramentas e utensílios (adaptação por mecanismos externos) "com que
pode prolongar e reforçar as respostas possíveis ao meio exterior ime diato". Tão frágil e débil, no berço da civilização, tornou-se o homem, graças a essa faculdade de fabricar instrumentos, senhor do meio fisico,
o mais terrível inimigo dos outros animais, o "rei da criação" que,
éle que desde a aurora da humanidade, pôde manter à distância, habitantes das sel
ser présa fácil de todos, Os mais perigosos podia vas, e sujeitar, mais tarde, as fôrças da natureza à sua vontade e ao seu domínio.
Mas, se a segunda faculdade humana (pois a primeira é o seu poder de organização social) é a de ser o "homo faber", a terceira, a de ser "homo loquens", não émenos especificamente humana. Gra
ças àquela, éle pode aumentar o poder das mãos, pela ferramenta, o poder dos sentidos, pelos instrumentos, e o poder de se deslocar no
espaço, pela máquina, e graças àcriação dos símbolos da linguagem (1) o homini sublime dedit caelumque tueri iussit et erectos ad sidera tollere vultus
(OVID0O, Metamortoses, 1. 1. v. 85-86).
sOCIOLOoGIA EDUCACIONAL
43
articulada, pôde o homem ligar opassado ao presente, ser um time
binder, segundo uma expressão feliz, isto é, "comunicar ijustificar e perpetuar seguramente suas iniciativas", de uma para outra geracão,
como de um povo para outro. "Se o homem, na luta contra as tôrças de destruição, ultrapassou os animais, mais próximos na escala zooló
gica, que, como já escrevi: 1) é capaz de não sòmente se adaptar às coisas, mas de adaptar as coisas a si, transformando-as, e 2) de conse
guir, pela linguagem nascida da vida social, transmitir a sua expe. riência à geração seguinte". Certamente, reduzido ao seu poder de técnica, o "homo faber", sem os meios de transmitir e perpetuar, pela
linguagem articulada, as suas experiências, teria visto paralisar-se na rotina todo o seu imenso esfôrço que teria de recomeçar em cada nova
geração; "mas, confinado no seu gênio lingüistico, o "homo loquens" se teria construído um mundo verbal, onde, libertada da pressão do real, teria divagado a sua imaginação pela fôrça que têm as palavras
de não sòmente exprimir a realidade de um objeto, mas também de
ocriar, quando acontece não existir". Para dar o homo sapiens, foi pre ciso, entre o homo faber e ohomo loguens, intima e estreita colabora ção que não se estabeleceu senão muito lentamente, através de obstá culos e compromissos. Pois, "só a palavra, observa ainda Paul
Lecène (1), permitiu a atividade técnica transmitir-se e assegurar o seu progresso; só o progresso das técnicas constrangeu a palavra a abando nar as suas ilusões e a limitar o mundo real, no qual é indispensável
ao livre e pleno exercicio do pensamento".
No homem, que ésubmetido a leis objetivas de sua natureza, é
preciso, no entanto, distinguir desde logo 1) a individualidade de natu reza biológica, que se exprime pelos caracteres dos sêres vivos, e 2) a
individualidade sociológica, istoé, oindividuo (2) considerando não sò
mente como ser vivo mas um "ser consciente" e, mais do que isto, "um
ser capaz de se subtrair à imitação e à sugestão para se tornar um cen
tro autônomo de atividade social". Em todos os sêres humanos encon tram-se l) o ser individual, ligado estritamente à sua natureza biopsi
cológica ae sociedade, 2) o ser social, ligado ao "ser moral empiricamente obser que é, para o individuo, o seu meio permanente" Sabe-se como mesmo a individualidade biológica, já muito mais bem caracterizada, do que a individualidade fisica, é difcilmente determi nável. Foi o abade Gregor Mendel que estabeleceu, nas suas maravi vável,
lhosas experiências, feitas durante 8 anos, no jardim do Mosteiro dos (1) CH. BLONDEL, no seu artigo sôbre PAUL LECÈNE, Essai sur I'homme et sa double
nature, in Revue Philosophique de la France et de I'Étranger, Avril-Mai, 1931.
(2)
A noção de "indivíduo" que começou por ser uma noçâo de fisicos,
de oriqem
grega. Aristóteles transpôs a noção ao plano metafísico para opor o"individuo" à "aspecte". Em latim, como em grego, a palavra tem o sen tido etimológico dY "indivisivel". Cada ser,
seja ôle qual tôr, inanimado, vivo, racional, tomado em particular, chamado 'individuo
porque nãoindivíduo, pode ser dividido som também deixar dYnãosero ale umárebanho de carneiros, não é um Uma pedra é. mesmo. Mas umAssim, curneiro um individuo, como o é a molécula de una pedra, porque dividi-la é des truí-la. Pode-se dizer, porém, que a
palavra individuo, na sua acepção corrente, 6 uma in vençáo
uma herança da escolástica.
noção de individuo nela desempenha, com efeito, um papel aupital. O ndividuo "a substäncla o "unum oposto aoao"unum aocideas", o que se cha aaria o sistomaprimYira'", ou organismo opos toperaose" amontoado, que s per juntou.
44
FERNANDO DE AZEVEDO
Augustinhos de Brünn (Koenigskloster), o mecanismo da transmissão dos caracteres hereditários. O indivíduo humano, animal superior, não
é, sob o aspecto biológico, seno "o encontro ocasional e precário de um conglomerado instável, o soma, e de uma continuidade difusa. o
germe, os dois em graus diversos submetidos a um meio de que não são nunca separados por um contôrno preciso de fenômenos". Tanto
para um vegetal, como para um animal, enquanto as células compo
nentes do corpo (somáticas) possuem dois fatôres para cada caráter, só
possuem um as células reprodutoras (germinativas). Ora, como as leis
da hereditariedade, fixadas por Gregor Mendel,são as mesmas para todos os sêres vivos, e resultam negativas tôdas as tentativas para veri
ficação da hipótese apresentada por Lamarck da transmisso
heredi
tária dos caracteres adquiridos, e individualidade biológica ou a natu
reza biopsicológica do individuo, é, em cada individuo, independente
do meio, incapaz de criar ou destruir fatôres hereditários.
Mas, se o homem vive naturale necessàriamente na sociedade ou
se a vida na sociedade faz parte da própria natureza do homem, o in divíduo e a sociedade implicam-se reciprocamente, e a sociedade não pode deixar, como efetivamente não deixa, de agir sôbre os indivíduos para nêles criar um ser de outra natureza: o ser social. Certamente são
os indivíduos que compõem cada sociedade, mas a sociedade é uma realidade que os ultrapassa, lhes preexiste e lhes sobrevive, "agindo
sôbre êles para os modelar muitas vêzes à sua imagem e, em todo o caso,
Essas para os marcar mais ou menos inconscientemente com o seu sêlo'".
realidades sociais que os ultrapassam e que são, a um tempo, materiais
(instituições, produtos diversos da civilização) e espirituais (tradições,
espirito de classe ou de corpo, etc.) constituem o meio natural e neces por todos os sário em que nascem e se desenvolvem, e que os penetramaterial, inte vida lados, exercendo uma influência profunda sôbre a lectual e moral do ser humano. Pois, "não há, de fato, crenças, pergunta Georges Davy, costumes e modas que preexistem e sobrevivem àqueles
abraço, a lingua que falo, que os praticam e as seguem? A religião queprofissão, meus deveres mo
a lei que me rege, as obrigações de minha
fora de mim. rais de homenm civilizado, tôdas essas coisas existem
em nenhum Eu as aceito, recebo-as, suporto-as, pouco importa. Mas, Elas me são an
caso eu as crio. Elas não nascem nem morrem comigo.
pretensão de defini-las teriores, exteriores e superiores. Não tenho anenhum outro individuo em função do individuo que eu sou nem de sociedade. Elas determinado. O sujeito, osubstrato, o lugar delas é a individualidade
Ora, a não existem senão porque existe a sociedade". que sociológica é exatamente êsse "ser social", consciente e refletido, a sociedade criou, o "eu" socializado, um "eu" impessoal e adventício, revela, muito importante na vida cotidiana em que êle só age e se
mas de que é preciso fazer abstração, se se quer conhecer o indivíduo, na sua realidade profunda e verdadeira" (1).
tlements de sociologie, 1, Soclologie Politique. Introduction, pág. 9, (1) G. DAVY Paris, Librairie Delagrave, 1924.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
45
ohomem não é duplo, mas triplo: constituído de uma natureza
psicofisiológica, de uma parte, e social, de outra, éle é, além disso, e,
sobretudo, orientado para uma finalidade espiritual que é a persona
lidade própria. É uma pessoa (1). Embora a pessoa seja uma história
e uma história irreversível, isto é, o resultado de uma longa elabora
ção e de tomada progressiva de consciência de si mesmo, o que Ihe dá
ocaráter fundamental é a unidade e a identidade do ser pensante, que eram, para a psicologia clássica, oobjeto de uma intuição primitiva e
imediata. A psicologia moderna encarregou-se, resume Lévy-Strauss, de
destruir essa ilusão. Longe de ser um dado primário, a idéia do "eu" é o resultado de uma construção complexa (psicologia da infância),
frágil (psicologia patológica) e de aquisição relativamente recente para a cspécie (psicologia comparada). "A experiência individual fornece, com efeito, àconsciência uma multiplicidade de estados, mas não um
sentimento permanente. Daí a existência de duas tendências inconci
liáveis que se prolongam na psicologia contemporånea: a psicologia do Je, do sujeito conhecendo-se a si mesmo como um ser idêntico (de
Descartes a Bergson) ea psicologia do Moi, isto é, do sujeito revelan
do-se àanálise como disperso em uma multiplicidade elementar (ten
dências associacionistas, psicologia da reação). "Mas, recolocado o in
dividuo no seu meio permanente,
a sociedade, resolve-se, pela socio
logia, o conflito que a psicologia é impotente a resolver: só a vida
social nos confere uma identidade e unidade que não são, para o in dividuo, uma propriedade primitiva. A sociologia explica, com efeito,
por que processos se formou o sentimento de personalidade. O estudo
das sociedades primitivas mostra que "a individualização das pessoas não se efetuou senão progressivamente". Reservada a principio ao reis, heróis, mágicos, estendeu-se pouco a pouco, segundo embra René
Hubert, ao conjunto do corpo social. Anegação da noção de pessoa ou o desconhecimento da pessoa, cuja finalidade espiritual orientaria a um tempo a vida do individuo e a da sociedade, não permite escolher senão entre a soberania absoluta desta e a soberania absoluta daquele. A personalidade que se sobrepõe ao individuo, faz-se e se constrói, como diz Paul Janet, por uma sintese de elementos diversos. Tanto a
psicologia como asociologia fazem ressaltar a formação de algum modo
dinâmica da individualidade, que toma então o caráter de "persona
lidade". Sôbre a base da individualidade física produz-se a "conscien
(1) A palavra "pessoa'" vem do latim persona (máscura de teatro; papel de ator; personagem de uma peça), que tem as mesmas acepções do vocábulo grego corresponden tY prósopon que, além de "máscara de teatro", significa também, em Homero nos textos primitivos, a face, o ros to, a figura e daí, a aparência caracteristica de cada um. Mas como
Os histriões se serviam máscaras parahomens representar chamar também personge dessas (pessoas ) os outros que se particulares, reconhecem por seu aspecto particular. Do sentido de "personagem de teatro"
tornou-se hábito se distinguem
(repres en tar um papel;
assumir palavra passou a ter (personam um sentidocapere, juridico, apresen tando se em er pressões um com papel) grande avariedade de nuanças sumere, induere, suscipere,
tenere, etc.). Ela designa, por sua origem gramatical e juridica, uma situaçoo em referencia sociedade ou ao conjunto do drama humano, uma pura rolação a outrem, que, do mestno
Ienpo que ligava por deveres (obligatio ), opunha díreitos a direitos. Só a pessou tinha o
direito de possuir. Ela, só ela era tida por livre: "persona est sul furis; servus non est persona". No latimn clássico jáse encon tra correntemente o sentido concreto de sujeito humano
(Personanem mea,tomou Cic. ).toda A palavra gregade prósopon nâo persona a sua fôrça signiticaçáo.
sotreu tödas as derivações do latim
46
FERNANDO DE AZEVEDO
ciaço", isto é, nas expressões de Janet, "uma aspiração para a unidade e distinção conscientes. O eu se "constrói"; a unidade é aqui uni ficação". A personalidade apresenta-se como uma "multiplicidade" de
elementos diversos e impõe a tôdas as suas condutas uma "unidade de direção". Ora, se o próprio de uma substância é permanecer idêntica a si mesma, sob as particularidades variáveis e acidentais que lhe
sobrevêm, o próprio de uma "pessoa" é também durar em tanto quan
to tal, prosseguindo o papel que Ihe é particular, segundo um ritmo, com uma fôrça e numa direção que lhe são próprias. A oposição da "pessoa" à natureza parece natural ao homem, ela se impõe cspontâ neamente ao pensamento eé certamente anterior a todo o sistema de
escola. Para os gregos, a "pessoa" revela-se a si mesma pela posse cons
ciente, pelo poder não sòmente de agir, mas de comunicar a outrem
o que ela possui, pela livre disposição do que ela tenha e sua possibi lidade de o dar; de possuir e ter como próprio; e "distinguir-se", por
isto mesmo, de outrem, como também obter ou dar supõe uma relação
de oposição a outrem. A pessoa é, pois, pela sua tendência à integra
ção, à construção da unidade, a subsistência concreta dessa relação de
oposição a qualquer outra pessoa, a qualquer outro indivíduo. Mas uma pessoa não é sòmente, observa Durkheim, "um ser que
se contém, é também um sistema de idéias, de sentimentos, de hábitos e tendèncias; é uma consciência que tem um conteúdo, e tanto mais se
éuma pessoa quanto mais êsse conteúdo é rico em elementos. Não é
por esta razão que o civilizado éuma pessoa num grau mais alto que
o primitivo, e o adulto do que a criança? Ora, a moral, tirando-nos
fora de nós mesmos, ordenando-nos a mergulhar-nos neste meio nutriz da sociedade, põe-nos precisamente em condições de alimentar nossa
personalidade". Certamente, o indivíduo e a sociedade, acrescenta Durk
heim, "são sêres de naturezas diferentes. Mas, longe de haver entre os
dois não sei que antagonismo, longe de ser verdade que o indivíduo não possa ligar-se à sociedade sem abdicação total ou parcial de sua natureza própria, êle não é verdadeiramente êle mesmo, não realiza
plenamente sua natureza senão com a condição de se apegar a ela".
iMas se a individualidade é um produto social, o resultado da "inte
riorizaço" da sociedade "'exterior" que faz pressão sôbre ela e lhe imprime certo número de caracteres exteriores, tendendo a "unifor
mizar" os individuos, a personalidade modela-se m função da
cooperação social e reintroduz assin "o individual" na elaboração da razão. O individual e o social são solidários um do outro; ¬, como a
personalidade não é uma entidade, mas resulta da coordenação de es tados sem cessar renovados, o meio social pode contribuir, não sò mente para a sua "editicação", mas para destruí-la, pela pressão social que ulrapassa o "eu", como personalidade, pela cooperaço com que se realiza o acôrdo enue a originalidade própria ao "eu" e a disciplina do grupo. O indivíduo e a sociedade não são os pólos antagônicos de um sistema heterogéneo; e, se há dissociação dsses dois elementos, Com a exageração ou exacerbação do clemento individual, não bastan
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
47
te
socializado -, individualismo (), pode haver sern dúvida, por cau sas diversas, a cxageração do elemento social, chegando à supressão do "eu", enquanto centrado sôbre si mesmo, pela ação uniformizadora
da coerção.
"A maior diferença, escreveu Durkheim, que separa o homem do animal, asaber o maior desenvolvimento de sua vida psíquica, se cula a esta sua maior sociabilidade". E, por isto, ao mesmo tempo arti se desperta e se desenvolve no indivíduo a consciência do "eu", que isto 6. a consciência que o indivíduo adquire de si mesmo, em tanto quanto
diferente dos outros, se processa a formação da consciência do "nós",
a saber, de que éparte integrante e solidária do grupo como um todo. É a consciência social. A individualidade pode compreender-se, como vimos, em dois sentidos bem distintos; o primeiro é o"eu" pessoal, isto é, o indivíduo enquanto centrado sôbre si mesmo, ou tros "eu', ou, por outras palavras de J. Piaget, enquanto oposto aos ou re anterior
fratária à socialização; o segundo, o "eu" social, isto é, o indivíduo en
quanto se renuncia a si mesmo para se submeter às normas da reci
procidade, cooperação e coerção sociais. É evidente, com efeito, "que.
na medida em que a sociedade penetra do exterior no não está êle preparado sem mais a recebê-la tal qual, nãoindividuo, há harmonia preestabelecida entre a constituição de cada um de nós e o conjunto de valores intelectuais psicobiológica e morais que nos propõe a vida em comum; e, se existe naturalmente uma conveniência global entre
a primeira e os segundos, essa conveniência supõe, contudo, um tamento laborioso (a "educação" tôda inteira) para ultrapassar oajus vir tual e tornar efetivo". Nós não somos, pois, "entre nós", o que somos "em nós"; sêres sociais, de uma parte, observa Davy, "se a falamos mes ma linguagem, raciocinamos sôbre os mesmos a fim de po conceitos, dermos comunicar e viver entre nós; somos, de outra parte, cada um, um indivíduo, cuja iredutível originalidade é mais real e mais verda deira que todos os quadros artificiais e que aliás lhes escapa, vivendo com uma duração e segundo um ritmo que lhe são próprios". Longe de se oporem, como mundos nitidamente separados, êsses dois sêres, o individual e o dois social, acrescenta Davy, "penetram se em todos os graus em nossa vida mais interior como em noSsa vida mais exterior. Há em nós, se assim se pode chamar, o "entre nós" assimilado; e é inútil querer purgar o nosso "eu" afetivo de tòda infil. profundo tração social". E se essa infiltração social é mais poderosa nos peque nos grupos, em que acaba por prevalecer a consciència ela é constante nas sociedades ainda as mais complexas emn que social, o entrecru (1) A palavra de invenção recente, parece nåo remon tar, além dos fins do séc."individualismo'", na França, XIX.
pela primeira em 1835, no Dcionario da Aca demia, o verbo individualiser,Aparecendo só a partr dos positivis tasvez, è que surge o tèrmo que, introduzido numn dicionário francês individualisme por Bescherelle em 1852, toi logo porado à lingua portuguêsa. As detinições importa do e incor se que sucedem, provisórias nos dicionários, acentuam a idéia de sistema: *" teoraproximativas, inompletas ia que ta: prevalecer reitos do indivíduo sôbre os da os d sociedade''. Mas não indica o individualismo, a tôda anteriormente ggia, um instinto essoncial ao homem inclinando-o ao egoismo? Fazendo parte de umn conjun to que ultrapassa, o individualismo sera entào a insurreiçço da parte em relação ao seu todo:o "Turpis observa Sto. Agostinho (Contessones, c. III).estE omnis pars, universo suo non congruens". vergonhosa tôda parte que escapa qo seu todo, que não se integra mais em seu universo.
FERNANDO DE AZEVED0
48
grupos múltiplos contribui tão fortemente para despertar dos zamento a consciência do "eu" e libertar oindivíduo. "É que a sociedade ultra passa o indivíduo, diz Durkheim; ela tem sua natureza própria, dis
tinta da natureza individual, e, por isto, preenche aprimeira condição necessária para servir de fim à atividade moral. Mas, por um lado, alcança o indivíduo; entre ela e êste não há vazio; ela mergulha em nós fortes e profundas raízes. Não é bastante dizer isto; a melhor parte de nós mesmos não é senão uma emanação da coletividade. Assim se
explica que possamos apegar-nos a ela, e mesmo preferi-la a nós mes mos". As representações coletivas por onde a sociedade se exprime,
"são comuns aos membros de um grupo social dado; transmitem-se de
em geração, impõm-se aos indivíduos, despertando nêles, con geração forme os casos, sentimentos de respeito, de temor e de adoração por seus objetos. Não dependem do indivíduo para existirem. Não que elas impliquem, observa Lévy-Brühl, um sujeito coletivo distinto dos indivíduos que compõem ogrupo social, mas porque se apresentam com caracteres que não se podem explicar pela só consideração dos in divíduos como tais. "Tendo umna natureza própria, ou sendo uma rea
lidade sui generis, elas se regem com um mecanismo especial e leis
próprias, produzindo-se e modificando-se segundo condições sociais de terminadas". PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. O homem cuja natureza é social, distingue-se dos outros animais:
a) pelo maior desenvolvimento de sua vida psiquica e pela sua maior sociabilidade (capacidade de organização social);
b) pela faculdade, que também Ihe éespecifica, de fabricar instrumentos (homo faber) e, portanto, não só de se adaptar às coisas, mas de adaptar as coisas a si mesmo, transformando-as;
) pela linguagem, isto é. pelo poder de criar, compreender e transmiir
os simbolos da linguagem articulada (homo loquens).
Analisar e discutir, do ponto de vista científico, estas três propriedades especi ficas, e mostrar como o homo sapiens resultou da íntima colaboração entre o homo
faber (Bergson) e o homo loquens, e as perturbações sociais que provêm ou podem provir da ruptura désse equilíbrio entre a linguagem e a técnica.
2. No seu Vocabulaire Philosophique, ED. GOBLOT define o indiiduo: "O
que não se pode dividir sem destruir o caráter pelo qual se designa; aquilo cujas partes não podem ser chamadas com o mesmo nome que o todo". Examinar os
seguintes problemas de biologia geral: a) em que medida a noção do indivíduo é aplicável a todos os sêres vivos, e em que casos se apaga;
b) se tudo, no mundo vivo, éregido pelo puro mecanismo ou se deve
admitir algum princípio ou tendéncia especial para explicar os fenômenos dos
seres organizados; ) se a evolução tende para a constituiço
do individuo diferenciado.
3. Se a individualidade psicológica (e não a conhecemos senão nos homens simultâneamente individual e social, mostrar como:
que vivam em sociedades) é o fruto de uma lenta elaboração psicológica, a fonte
a) o individuo psicológico está sempre em transformação (en devenir),
ou, por outras palavras, éuma construção que se prossegue pouco a pouco,
etapa por etapa;
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
49
b) apersonalidade que se sobrepõe ao individuo, se faz e se constrói
também por uma multipliidade de elementos diversos (P. Janet).
4. Do ponto de vista sociológico, mostrar como a individualidade que se
constitui no mneio social:
a) não se forma senão lentamente, segundo prova o estudo das socieda
des primitivas; a individualização das pessoas não se efetua senão progresiva mente; reservada a princípio aos reis, heróis, mágicos, estende-se pouco a pouco a todo o conjunto social (R. Hubert):
b) cscapa parcialmente àaço uniformizante do meio social. por diversas
causas, e, entre estas, a formação no seio da sociedade, de grupos sociais, de objetos e tendências diferentes, que se entrecruzam ("intercruzamento ou inter
secão dos grupos", G. Simmel, C. Bouglé) e con tribuem a libertar o individuo dles; que pertence a vários
) tende a distinguir-se. pela muluiplicidade de suas funções, de seus
atributos, dos grupos parciais a que pertence, à medida que a socicdade se
complica; havendo, pois, um número tanto mais elevado de individualidades
efetivamente distinguiveis numa sociedade quanto esta é mais complexa. 5. A civilização moderna, em vez de defender a personalidade e favorecer o
seu desenvolvimento, tende a destruí-la? e por quê? Por várias causas, e, entre estas: a) a ruptura do equilibrio entre ohomemea natureza, entre o indivíduo
e a sociedade, entre o pensamento e a ação;
b) a forte industrialização em alguns países, com as suas conseqkèncas,
o trabalho em série, a estandardização e o conformismo social como outros tantos fatôes, que entravam ou paralisam a personalidade original e criadora;
c) a hipertrofia do poder do Estado, com as suas tendências uniformiza que têm de especifico os Estados totalitários modernos): d) o naturalismo filosófico e a tirania politica.
doras (analisar as teorias de Hobbes que se encontram na origem de tudo o
6. Analisar a seguinte definição do individualismo: "O individualismo é um
estado de espirito anormal, embora cada vez mais dominante, que se caracteriza pelo
desconhecimento das leis e dos deveres sociais e pelo culto do "eu" (egocentrisno).
Ao fazer a análise e a crítica dessa definição, notar os casos de outros vocábulos, cuja terminação em "ismo" não se torna pejorativa senão quando uma realidade subalterna
ou parcial éerigida em princípio absoluto, centro e fim de um sistema que pretendesse integrar tudo e bastar a tudo. 7. Examinar e distinguir as diversas espécies de individualismo, entre as quais:
a) o individualismo anárquico, que se exprime pela recusa de tôda autoridade exterior, de tôda ordem imposta de fora em nome do conjunto social de que faz parte, ou pela recusa a ser limitado por sse todo e a tendènia
a ultrapassar êsses limites, a pôr-se fora das leis (outlaw), a desproporionar-se
em relação ao seu todo, qualquer que seja a desordem que daí possa resultar. sociedade tanto para a parte como para o todo, para o indivíduo como para a (Eritis sicut dii Sereis como deuses): b) o individualismo gregário, pelo qual a sociedade se ransforma em
rebanho de indivíduos que, despojando-se do seu caráter de "pessoas", renun
ciam a refletir, a julgar, a decidir (atos enminentemente pessoais) para ver, ouvir
e seguir (opor a "comunidade" à "sociedade", segundo a concepção de F. Tönnies). na capital ou no interior, 8. Observar o que se passa numa "pequena epensão", num "grande hotel", em que não
com seu espírito de associação e de solidariedade, pequena idade ou numa vila há mais como subordinados senão "indivíduos"; numa e que retorna para o desconhecido e numa grande cidade, em que o vizinho éum desmedida humana (cfr. as
"individualismo", por uma espécie de gigantismo ou que sofrem os grupos, G. SIMMEL, conseqüências das modificações quantitativas grupos sociales, Revista do Oddente, Sociologia, T. I., C. II, La cantidad en los
Madrid, 1927).
FERNANDO DE AZEVEDO 50
do "eu", o individua) 9. Tomando por base a distinção entre os dois sentidos observar e mot nós", "entre somos o que somos "em nós", e o social, o que como o nosso *"eu" profundo émenos claroc menos fàcilmente pene que o nosso "cu" supcrficial, socializado; do rável b) quc, se o "eu" social, um "eu" impcssoal e adventício, é muito impor.
tante na vida cotidiana, emn que quase só êle age e se revela, é preciso fazer
abstração dêlc, se se quer conhecer o indivíduo, na sua originalidade verda deira;
mas, como em momentos de crise em que agimos e quercmos com
tóda a nossa förça (decisões livres), se abre às ves para fora essa consciência
profunda e fechada; d) que êsses dois "eu", o individual eo social, longe de se oporem, se interpenetram em todos os graus de nossa vida mais interior (intelectual. moral e afetiva) como de nossa vida mais exterior (G. DAVY). REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS L'individualité. IIle, Semaine JANET (P.) PLAGET J.) (C.), Centre CAULLERY (M.). BOUGLE Internationale de Synthèse, Intern. de Synthèse. Paris, Félix Alcan, 1933. 1928, pág. 213. DUPREEL (E.) - Le problème sociologique du rire, Révue Philosophique, Henrique
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SPRONCK
chez Les origines du Caractère WALLON (H.) 1934. Paris, Boivin, personnalité.
Capitulo lI
A COESÃO SOCIAL EA TRADIÇÃO A coesão social. - A consciênia do espaço e do território social. - A
noção de "totalidade" do grupo ou a consciência da comunidade que le forma.
O apégo ao solo. -
grau de organização. instituições sociais.
As soiedades, segundo sua densidade e o seu
As A coesão social nas sociedades primitivas. Disciplina e autoridade. - Transmisão da coesão
social. A tradição e a imitação. - 0 elemento tradicional e o elemento individual. Os fatos que perpetuam a continuidade necessária entre os
tempos da vida social.
sociedade dada.
Oestudo do fenômeno geral da tradição de uma
Espédes de tradições.
As espécies conscientes de tradições.
das tradições.
A educação.
Atradição puramente social. -
A "memória coletiva".
A transmisio
Se por sociedade entendermos um conjunto complexo de indivi
duos e grupos, em reciprocidade de ação e unidos numa mesma comu nidade politica, uma sociedade, seja qual fôr a sua estrutura, não po derá subsistir sem certo grau de coesão social (unidade do todo) e de continuidade através do tempo (perpetuidade do todo). Em uma
sociedade determinada temos, pois, duas ordens de fatos a estudar: a
solidez e a continuidade do grupo como tal ou, por outras palavras, a unidade no espaço (coesão) e a unidade no tempo (radição). Por unidade social entendemos a coesão dos elementos, através de cuja
mobilidade, proveniente de ações e reações múltiplas, o grupo subsiste
na sua unidade, persevera no seu ser, e "faz o efeito de um ser único";
e por continuidade ou tradição, a permanència própria dos grupos so ciais, a conservação ininterrupta da personalidade coletiva, isto é, "o fato de se manter o grupo idêntico a si mesmo enquanto seus membros
mudam ou desaparecem". E, assim como, observa Georg Simmel, "o fato de serem os indivíduos exteriores uns aos outros não impede a unidade social de se constituir, e a uniäo espiritual riunfa de sua se paração especial; assim a separação temporal das gerações não impede que a sua seqüência forme, para a nossa representação, um todo inin
terrupto". Sendo a sociedade uma unidade sui generis, distinta de seus
elementos individuais, as fôrças especificas que ela pöe em jogo para "se conservar" (coesão) e para "se
perpetuar" (tradição), constituem a conseqüência ou a resultante de fenòmenos, particulares e variados, de natureza social, como, entre os fatos que estabelecem "a unidade do
todo", a sensação do espaço e do território social, a noão de "totali
dade" e de descendência comum, a organização social, autoridade e dis ciplina, e, entre os fatos que perpetuam a continuidade necesária enre os tempos da vida social, a tradição e a educação. 5 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
se d quais uma sociedade pelos elementos Certamente um dos explicam a gènese da unidade social que permanência do solo sôbre o qual fine e um dos fatôres a é coletivos, sêres "traduz-se materialmente continuidade dos explica Marcel Mauss, capital ou pelas Cani social, coesão vivem. A parte, e de outra, pela uma de fronteiras, sensaço do espaço ou do pelas pela caso, o todo tais, se existem: mas, emdo Raum, de Ratzel). Essas fronteiras. éstes território social (noção determinado de individuos número um ordinário uma sociedade. d% . espaços encerram de nome". A unidade de 52
que trazem um mesmo dúvida, a essa base material, - a comunidade tôdas Estado, prende-se, sem "que serve de substrato durável a
pondera do habitat e o apgo ao lugar, da sociedade". A benm dizer, efetivo o sofre que mudanças as no produz por si sÓ a permanência Simmel, "a permanência do lugar unidade de que se trata é tÑda psí da unidade social; e, ademais, a verdadeiramente a unidade faz que espiritual unidade essa é e quica, vez que se constituiu, territorial, longe de derivar dela. Contudo, uma primeira e o auxílio para
torna-se a seu turno um sustentáculo para a necessária, mas não suficiente. se manter". A essa primeira condição do tempo, deve-se para a coesão e a persistência do grupoumatravés todo (a "noção de tota acrescentar a consciência do grupo como co lidade", no dizer de Mauss), que resulta em parte das tradições
fisioló muns de que a sociedade é depositária e, em parte, da ligação relações indivíduos pelas gica das gerações, da cadeia formada entre osterritório e a comunidade de parentesco em geral. A comunidade do do sangue, real ou presumida, (pois pode ser a noção de uma descen
dência comum) são dois dos fatôres mais eficazes na elaboração da
unidade da vida coletiva que é um fato essencialmente dinâmico e estásempre se formando sem nunca se formar de todo.
Pois, se há fôrças conservadoras que constantemente trabalham
por assegurar ao grupo a sua coesão, e, em conseqüência, garantir a
unidade do todo, fôrças contrárias podem contribuir para afrouxar essa coesão social, romper o equilíbrio e comprometer, até a dissolução
da sociedade, a unidade de grupo fixado sôbre o mesmo território. Aliás esa coesão que tem como base material a comunidade territoriale fisiológica, e como fatôres um fundo de idéias e de tradições comuns
e uma língua ou um tradutor comum, não só é um fenômeno essen
cialmente dinâmico, mas ainda, por isto mesmo que variável, suscetí
vel de medida quanto ao apgo da terra, as quantidades de tradição
coletiva e a maior ou menor fôrça de atração que determina a "con densação" dos individuos. As descrições morfológicas, isto é, as anál1
ses de estrutura social (hierarquia das classes, grupos e instituições) São, por isto, de grande importância para o estudo dos fatos de uni
dade ou de coesão, que varia conforme a densidade das sociedades, sua
mobilidade, sua homogeneidade ou heterogeneidade, e o grau e a na
tureza de sua organização. Se é mais fácil a análise da coesão social no interior de uma sociedade homogênea, completamente independen te ena medida de sua independência, como em certas sociedades prl mitivas, as dificuldades surgem quando se trata de estudar o mesmo
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
53
grupo de fatos em organizações sociais compósitas e, sobretudo, nas complexas sociedades modernas em que a variedade de línguas, de
crenças e de religiões, a diversidade erelativa independência dos gTU pos e subgrupos, coexistentes no interior da sociedade geral, e a per
meabilidade às influências alógenas ou estranhas, constituem outros
tantos fatôres de descontinuidade nas coesões ou mesno, em certa me
dida, de desagregação. A intensidade de circulação (econômica e cul.
tural), o número das grandes reuniões sociais, sua facilidade e sua efi.
cácia, são, ao contrário, fatôres e "excelentes medidas dessa coesão".
Assim, é preciso examinar, em cada caso concreto, os fatôres dessa
solidariedade, que é a condição mesma da coesão social, e sôbre a qual
Durkheim insiste, distinguindo dois tipos de solidariedade: a solida
riedade mecánica e orgânica. A solidariedade dêste tipo (orgånica), a
que Durkheim também chamava "solidariedade por diferença", surge com o nascimento, no interior de uma sociedade e em conseqüência
da complicação da vida social, de numerosos grupos dos quais pode par certa libertação do indivíduo. Estudando os elementos que se ex
ticipar um mesmo individuo, e não só admite mas favorece e estimula
primem fortemente na forma primitiva da solidariedade (mecânica
ou por semelhança), Paul Huvelin prefere a expressão "de interdepen dência orgânica", recusando a de "solidariedade orgânica", para de
signar a que assegura a coesão nas sociedades de trabalho dividido e
de coerção organizada. Nas sociedades de interdependncia orgånica, eguirnormais, em equilibrio juridico-moral, Huvelin julga poder distin dois tipos diferentes de coesões, conforme prepondere uma "so ciabilidade instintiva", que compensa os defeitos de organização (Ate nas, França), ou uma submissão maior, um maior espirito de disci
plina que força à organização, como na antiga Esparta e na Alema nha. No primeiro caso, por outras palavras, os homens são mais "s0
ciáveis", menos "sociais". Nas sociedades primitivas, mais unitárias, pre valece o tipo de solidariedade mecânica ou por semelhança (l) e nas sociedades modernas, altamente evoluidas e extremamente complexas, a "'solidariedade orgânica" que dá lugar a uma espécie de "pluralismo
coerente", o equilibrio e a unidade social resultante da interde pen
dência dos diversos grupos que se formam no seio da sociedade. À
diferença das instituições medievais que repousavam quase tòdas sòbre a unidade da fé, agita-se a sociedade moderna à procura de uma nova
ordem que salvaguarde um minimum de unidade moral, sem recorrer à hipertrofia do poder e àintolerância, e de sistema corporativo que seja eficaz sem arrastar à opressão da pessoa pelo organismo profissio (1) "O misoneismo que se constata nestas sociedades á uma conseqüincia imediata do conformismo que, por motivos ligados à natureza da men talidade primitiva, estrita
mente obrigatório para seus membros. Singularizar-se de qualquer maneira que seja, e expor-se. Entre certos Bantus, por exemplo, "o filho não deve asprar a nada de nelhor do
que o que teve o pai antes dêle. Se umn homem teve a audácia de melhorar a cons truçáo de sua cabana, de lhe abrir uma entrada maior do que de costume, se tra: uma roupa mais
bela que a dos outros, ou
diferente, é logo condenadoa umg multa:
tornase ao mesmo
tempo objeto de zombarias tão mordazes que é preciso que seja te um homem verdaderamnen muito ousado para afrontá-las uma segunda vez''. (LÊVY SRUHL La meatalité primitive, pág. 463, Paris, Alcan, 1922 ).
54
FERNANDO DE AZEVEDO
nal encarregado de assegurar o minimum de coesão no plano cconA mico geral.
A idéia de coesão social implica anoção de autoridade que a ex. prime e a cria e que, podendo ser imposta ou aceita (acôrdo espon. tâneo) e, portanto, suscetível de se graduar pela quantidade de od no caso em que a autoridade
coercitivo, nunca se reduz, ainda "oprimir", auma coação e simples subjugamento. Sem dúvida. pareça aind
que a autoridade, brotando das qualidades pessoais do indivíduo, seja
antes fundada numa vocation of leadership, ou venha a pousar e a ins talar-se numa personalidade individual ou num grupo de individuos a que uma potência supra-individual (a Igreja, o Estado) confere
dignidade e poder de decisão, é preciso distinguir entre a pessoa ou
pessoas que a exercem, e as fôrças e normas objetivas, sociais, em gue passa a apoiar-se ou tem as suas origens. A disciplina e a autoridade. como bem definiu Mauss, não são "o conjunto dos usos e das jdéias que permitem a todos os grupos funcionarem em si mesmos e entre
si", na sua vida interior e nas suas relaçöes com os outrOS organismos
sociais. Pode-se, pois, de acôrdo com a indicação do mesmo sociólogo,
observar a autoridade ou melhor as autoridades, para ter em seguida
uma idéia da autoridade e de seus efeitos, o primeiro dos quais é a disciplina que pode ser feita: a) de coações dos superiores sóbre os
inferiores e então se confunde em parte com a autoridade; e b) das
necessidades da vida em comum; e o segundo, a autoridade que, cfeito e muitas vézes a causa, não é senão a organização da disciplina. A or
ganização do poder, a repartição da autoridade, o quantum de despó tico da autoridade concentrada em indivíduos ou grupos de individuos, a preponderância do "individual" ou do "coletivo", em cada caso, a
coexistência de tipos opostos de disciplina, consciente, quase consen
tida e imnposta, são outros tantos fatos a estudar, para se precisar, numa sociedade dada, a forma da "autoridade", que étão importante
para a vida social, em seus tipos e graus mais diversos. "Um dos meios
de analisar in loco a fôrça e a fraqueza de uma coesão social e o vigor de seu sintoma moral: a disciplina, e a solidez de suas formas superiores:
a hierarquia, a autoridade, é, observa Mauss, estudar cuidadosamente os momentos em que tudo isto desaparece": a guerra civil e a desordem
interior; oestado gregário, o de multidão e suas variedades, como cntre lamidades e epidemias. outros, os mêdos pânicos, as migrações místicas, o terror diante das ca
Mas "o que faz a fôrça dos estados coletivos não é sòmente o fato de serem comuns àgeração presente, mas, sobretudo, serem, na maior parte, um legado das gerações anteriores". Fazendo essa observação,
Durkheim mostra como a consciência comum ou coletiva é quase tôda
inteira um "produto do passado" e, como o que vem do passado é geral
mente objeto de um respeito todo particular, a autoridade da cous ciência coletiva é feita em grande parte da autoridade da tradição. Uma vez criada, e ela não se constitui senão muito lentamente, atradição é, em verdade, "o que se transmite". Assim, pois, se uma
sociedade não pode subsistir seim que exista, entre os individuos e os
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
55
de vistas e de sentimentos, grupos que a compõem, certa unidade não pode perdurar, como um e. portanto, certa coeso social, ela através de gerações, de todos os todo, sem que se opere a transnissão, técnicos, econômicos e morfo elementos espirituais, morais, religiosos, conjunto. lógicos que lhe asseguram a coerência interna e a unidadea de da tra fôrça É a isto exatamente que chamamos "radição". O que faz
que a transmitem e dição, ensina Durkheim, "é o caráter das pessoas a sua expressão viva; só êles fo a inculcam, isto é, os antigos. £les são São o único interme ram testemunhas do que faziam os antepassados. lado, gozam junto às diário entre o presente e o passado. Por outro e sob sua direção un pres gerações que se educaram sob os seus olhos com efeito, tem a conscién tígio que nada pode substituir. A criança, cia de sua inferioridade em face das pessoas mais velhas que a cercam co e sente que depende delas. O respeito reverencial que temn por elas
munica-se naturalmente a tudo que delas vem, a tudo que dizem e a
tudo que fazem. É, pois, a autoridade da idade que faz, em grande parte, a da tradição. "Ao contrário do que às vêzes se supõe, tomando por "preconceitos" juízos e fatos que são apenas "precedentes", a autoridade, observa Mauss, é feita, quando se trata de tradições, não
sòmente do apriori social, mas ainda do a poste riori social, no sòmen te da obscuridade do pensamento, mas da ancianidade eda verdade dos acordos humanos".
Numerosas experièncias "inserem-se, de fato, numa tradição, incor
poram-se por tôda parte, nos menores comportamentos". Quer se
trate de uma técnica elementar, como a de comer e a de beber, ou de uma técnica mais complicada como a do fabrico e manejo do arco e
flecha, quer se trate de um désses juízos morais, provérbios, adágios,
em que se exprime a ciência do povo (o folclore), ou ainda de formas
de estrutura social, tudo que recebemos do passado implica uma cadeia ininterrupta de adaptações e experiências humanas que se inscrevem em cada tradição, no plano técnico e econômico, como no dominio
moral e religioso. Mas, se tudo que pode contribuir para prolongar a influência dos mais antigos além da infância, não pode senão fortificar as crenças e as práticas tradicionais, a maior ou menor mobilidade e
permeabilidade dos grupos, a pressão de novas necessidades e, em con seqüência, a adaptação às circunstâncias novas, as transformações mor
fológicas das sociedades, as iniciativas individuais, as descobertas e in
venções determinam uma ruptura de equilibrio e estabilidade social,
uma reação contra a rotina e um enfraquecimento de tòdas as tradi
çöes. Estas se vão despojando, auavés de resistència, variável conforme os grupos, do conteúdo de erros e de preconceitos que nelas se acumu
laram e se tinham por fundados na razão e verificados pela experièn
cia, e que, em periodos críticos, são submetidos a um processo cons tante de reviso, e mesmo a assaltos violentos, nos periodos revolucio nários. Para que se produzam novidades na vida social, não basta,
explica Durkheim, "que gerações novas venham à luz, é preciso ainda
que não sejam elas muito fortemente arrastadas a seguir os erros das
que lhes precederam. Quanto mais profunda é a inluència destas úli
FERNANDO DE AZEVEDO 56
durar, e ela é tanto mais profunda quanto mais res são os obstáculos às mudanças".
mas,
tanto maio
No estudo do fenômeno geral da tradição de uma sociedade dada a) a é preciso distinguir, segundo Mauss, duas espécies de tradições: b) uma
tradição oral que, em nossas sociedades, parece ser a única e outra, talvez mais primária ainda, que se contunde geralmente com a
imitação. Oemprêgo dos simbolos orais, explica, "no é senä um caso do emprego dos simbolos: ora, toda prática tradicional, tendo uma forma e transmitindo-se por esta forma,
é em certo grau simbó.
lica. Quando uma geração passa a uma outra a ciência de seus pestoe
e de seus atos manuais, há tanta autoridade e tradição social como quando se faz essa transmisso pela linguagem. Há verdadeiramente tradição, continuidade: o grande ato é a transmissão das ciências, dos saberes e dos poderes de mestres a discipulos. Pois tudo pode perpe
tuar-se assim. São antes as formas intelectuais do pensamento que têm
necessidade da linguagem para se comunicarem. As outras formas da vida moral e material se transmitem antes por comunicação direta". Acada momento pode-se medir, acrescenta o mesmo autor, o poder e
amedir fraqueza de cada tradição. Chegar-se-á assim a descrever e quase a as quantidades de tirania, a grandeza da fôrça mecânica da tra diçãocoletiva. Ainda em sociedades de estrutura semelhante ou do mes mo tipo de civilização há traços tradicionais coletivos (o horror ao em
préstimo e à mudança, a hospitalidade ou a aversão ao estrangeiro, etc.) que podem variar com cada sociedade (1) e ajudam a compor a sua fisionomia própria. Ainda recentenente, em obra notável - "Para compreender a Inglaterra contemporânea",
o historiador francês Hi
lário Belloc assinalava, para o Estado inglês, três caracteres a princi pais, dos quais dois, a tradicional hostilidade ao catolicismo e anti
qüissima e vigorosa mentalidade mercantil subsistem, parecendo es
morecer o feitio aristocrático que há cêca de 300 anos, desde o inicio
da Inglaterra moderna, mantinha a vitalidade do país.
Além das formas de simples conformismo social encontram-se em
tôdas as sociedades, como observa Mauss, tradições conscientes (a his tória social, mais ou menos real, a ciência já separada da massa do
povo, etc.) "que consistem no conhecimento que a sociedade tem de si mesma e do seu passado mais ou menos imediato". Estabelecendo
as diferentes espécies de tradições verdadeiramente conscientes, julga êsse sociólogo poder grupar todos êsses fatos sob o nome de memória coletiva, "coisa diferente dos quadros sociais da memória (individual
e coletiva a um tempo) de que Halbwachs discutiu a existência, pois são êsses quadros que dão forma a tôda memória, inclusive a coletiva.
(1) Entre êsses fatos enumera Mauss, depois de uma referência às páginas de Tarde sôbre misoneismo, filoneísmo, zenotobia, xenofilia: "horror da mudança, horror do empres
timo, privilégio dos corpos de ofícios, inércia social das mulheres, salvo talvez em materia estética, eis uma quantidade de traços que podem variar com cada sociedade. Por oposiça: facilidade da assirnilação, permeabilidade mental podem ser traços coletivos. A curioside dos Astecas e dos Quíchuas fêz dêles vítimas dos conquistadores. Os polinésios, quando Cook chegou, foram tão curiosos dessas tripulações inglêsas que elas mal puderam co
preendê-los'".
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sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
No interior desta a tradição consciente, relativamente cdara, intencio
nalmente transmitida, organizada, é a matéria e condição a um tempo
para sses quadros sociais". A continuidade que assegura a perpetui dade do todo resulta, pois, désse fato de que a extinção dos elemen
tos antigos, depositários da tradição e aentrada dos elementos novos
se operam progressivamente e de que aquéles elementos ficam sem
pre umn tempo suficiente para podererm modelar seus sucessores à sua imagem, isto é, segundo o espirito e as tendências da sociedade. "E
esta renovação lenta e progressiva do grupo que lhe faz a imortalidade, - segundo as palavras admiráveis de Georg Simmel, - e essa imor
talidade é um fenômeno sociológico do mais alto alcance. A conser vação da unidade coletiva durante um tempo teòricamente infinito
dá ao ser social um valor que, ceteris paribus, é infinitamente superior
ao indivíduo. A vida individual é tôda inteira organizada para acabar num tempo dado, e, em certa medida, cada indivíduo comneça êle mesmo. com novos esforços, a sua própria existência. A sociedade, ao contrário,
não está encerrada a priori numa duração limitada; ela parece insti
tuida para a eternidade e eis por que ela chega atotalizar conquistas, fôrças e experiências que a elevam acima das existências particulares e de seus recomeços perpétuos. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Uma sociedade, explica Mauss, define-se ela mesma de duas maneiras: a) pela sensação do espaço e do território social (noção do Raum, de Ratzel), isto é, pelo nome, pelas fronteiras e pelos direitos que se dá sôbre si mesmo e sôbre o seu solo;
b) pela sua vontade de ser uma, por sua coesão própria e por sua limita
ção voluntária a aqules que podem dizer-se "nós" (wegroup) e chamar os outros: "os outros" (other-group), estranhos, estrangeiros;
c) pela representação coletiva correspondente a esta repartição dos indi que se exprime pelo nome que a sociedade se dá e pela sensaçio muito aguda da comunidade que forma (M. MAUSS).
viduos, em um momento e em um lugar dado, pela "noção de totalidade".
Analisar cada um dêses elementos pelo qual se exprime e define uma sodedade
dada e estudá los à luz de nossa formação histórica e social e de observações diretas
de nosso meio social, tanto do interior como das capitais, especialmente de idades como S. Paulo, em que hádensos agrupamentos de estrangeiros (com suas tendènias a determinadas atividades, a concentração em zonas agricolas ou em ruas de comerio e bairros de residências, etc.) 2
Estudar e caracterizar o fenômeno de coesão social que se constitui do apgo
geral à terra e à comunidade de que o individuo faz parte e se pode decompor "num conjunto de fatos que ligam de maneira permanente os grupos, os subgrupos e os individuos, no interior dos grupos e subgrupos e toxBos èstes no interior da própria sociedade", e examinar os fatòres ou elementos que fazem variar ca coesáo e constituem, por isto, "excelentes medidas de tòda coesão social": a) densidade das sociedades e sua organização cerrada ou larga;
b)
"insulamento" dos grupos ou relativa permeabilidade
(contato e
influência de outros grupos) que determina uma descontinuidade nas coesões;
) intensidade das trocas econòmicas, culturais ("densidade dinåmica",
na terminologia de Durkhein) ou intensidade de irculaço;
FERNANDO DE AZEVEDO
58
ou reuniões sociais número, facilidade e eficáia dos grandes contatos ctc.) religiosas, cívicas, (assembléias, comiios, cerimônias parte o indivíduo, manifesta. so 3. O apêgo àterra e à comunidade de que faz pays", o Heimweh, que vai até às vézes, mais ou menos intensamente, pelo "mal du (ctr. nostalgia). Analisar despatriado meio, a morte do individuo deslocado do seu lembra M. Mauss.e segundo indígenas, os entre esse fato que é muito freqüente da documentacão estudar as suas expressões na literatura e nas artes, bem como à luz histórica (especialmente, com referênia ao índio, ao negro, nos cronistas, viajantese )
historiadores dos séculos 16 e 17, no Brasil). 4. Nas sociedades de "interdependênia orgånica" ("solidariedade orgánica'". na denominação de Durkheim) que opõe às sociedades ligadas pela forma mais
primitiva de solidariedade (a "solidariedade mecânica"), pensa P. Huvelin poder distinguir, como vimos, dois tipos diferentes de coesões: a) em dadas sociedades (Atenas, França) uma sociabilidade instintiva, moral, compensa os defeitos de organização; os homens são mais "sociáveis" e menos sociais:
b) em outras (Esparta, Germânia) os homens, mais dóceis, menos
independentes, de instinto gregário mais acentuado, sabem organizarse e forçar-se à organizaço. Entre éstes dois tipos morais do direito distribuem-se os tipos intermediários, por exemplo, o anglo-saxão, anárquico e conservador. Analisar e discutir essas con clusões de Huvelin e comparar, a ésse respeito, as duas prinipais soiedades (S. Paulo e Rio) as suas caracteristicas próprias e as causas que contribuem para
diferenciá-las.
5. Para se ter uma compreensão mais nítida do papel que desempenham em
tôda coesão e estabilidade social, a autoridade, na sua significação concreta e pessoal,
ou nas suas formas transpessoais e objetivas (o direito, a moral, a religião), e a hierarq uia, em tôda a organização social, analisar os efeitos que se produzem quando
desaparecem ou se perturbam, na soiedade, a disciplina, a autoridade e a hierarquia:
a) nas revoluções, nas guerras civis ou intestinas, em que se destrói a
armadura das sociedades ainda as mais fortemente hierarquizadas; b) em tôdas as ordens de pånico, militar, religioso, político e econômico,
nas exaltaqões coletivas, e nas agitações em face das calamidades e das epide
mias, isto é, nesses fatos em que se estabelece o estado gregário ou de multidão.
6. Analisar o fenomeno de autoridade (todo o ascendente que exerce söbre
nós o poder moral que reconhecemos superior a nós) e de coesão, que, nas sociedades primitivas, é "sempre moral e colorido de religio" e estudar e discutir: a) atese de Fustel de Coulanges (La cité antique, 1865) e de George
Frazer (Lectures on the early history of Kingship, 1905), segundo a qual a
religião (as religiões organizadas), para aqule, e a magia, para èste, foi principal aminho que conduziu os homens ao poder (as origens religiosas
ou mágicas da realeza):
b) a afirmação de Fustel de Coulanges, baseada em textos clássicos, de que "os antigos reis da Gréca e da Itália eram sacerdotes supremos do lar da ddade", e de que "as funções religiosas do arconte-rei em Atenas, do rex sacrificulus em Roma testemunham que, se os reis cedo deixaram de ser sacerdotes, certos sacerdotes nunca esqueceram que exerciam funções de reis (tese do caráter religioso da realeza primitiva);
) a tese de Frazer, segundo a qual muitos reis foram mágicos hábeis,
mas que, se a vara mágica levou os homens, em certas tribos selvagens, da classe dos feiticeiros à dignidade de rei, a magia, desacreditada, se apagou diante da religião, com suas orações e sacrificios: os reis vieram a ser sacerdotes;
d) as provas reunidas em recente livrode March Bloch (Rois Thaumatur ges) da sobrevivência das atribuições, não só religiosas, mas nitidamente mágicas da realeza.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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7. Se a solidariedade é a condição mesna da coesão social, e se "nos grupos,
em que julgamos encontrar as formas primeiras da organiznço social, o papel do indivíduo se acha estritamente limitado se não suprimido":
a) como explicar que, no interior das sociedades, cuja coesão é a lei, o individuo chega a tomar consciência de si mesmo, a reivindicar sua autonomia e mesmo a opor-se ao seu meio? (libertação do indivíduo);
b) como sucede que a organização social deixa, enfim, um lugar ao
indivíduo e conceda um valor à personalidade? (examinar a distinção entre
solidariedade mecánica, que exclui as diferenças, e a solidariedade organica
que as admite): e mostrar como essa diferenciação dos valores individuais é favoreida
pela "intersecção dos grupos" (G. Simmel e C. Bouglé) e pelas modificações produzidas na estrutura das sociedades, nos períodos ríticos, que são necessá
rios ao progresso e implicam um abalo na tradição, de que pode aproveitar 8. A tradição de um grupo (tribo, idade, província, nação) é o conjunto de maneiras de pensar, de sentimentos, normas, hábitos de vida e prátias que. transmi tindo-se, perpetuam entre os tempos da vida social a continuidade necessária e a libertação do indivíduo.
desempenham ésse papel para as atividades mais espeiais. Analisar as diversas
categorias de fatos tradicionais (relativos a uma tribo, idade ou região):
a) os fatos tradicionais morais (direito, moral, religião) que encerram as principais práticas rigorosamente coercitivas;
b) as práticas tradiionais referentes à economia, à estética, à técnica
e à educação;
) a sabedoria popular, etiquêtas, hábitos de vida, que se exprimem por
provérbios, dizeres, preceitos (adagiário), contos, fábulas, mitos, trovas e
canções (folclore);
d) as tradições consientes que consistem no saber que uma sociedade tem de si mesma e do seu passado e se podem grupar sob o nome de "memória
coletiva" e estudar nos documentos escritos, na pintura, em gravuras,
monu
mentos, etc.
Escolher entre as diversas tradições um determinado grupo de fatos bemn definidos
para proceder a uma investigação social num quadro geográico e cultural, cancteris
tico e limitado, como seja em S. Paulo, por exemplo, a zona marítima, S. Sebastião,
Iguape, Cananéia, Conceição de Itanhaém.
9. Entre os fenômenos gerais da vida intra-social Mauss distingue dois grupos de fatos sumamente importantes, "a solidez do todo" e "a perpetuidade do todo":
1) a coesão social e a autoridade que a exprime e a cria, e 2) a radição e a
educação que a transmitem de geração em geração. Mostrar:
a) como a tradição se estende a tudo (desde gestos, atitudes, etiquètas.
arranjos do habitat, modos de vida e ténicas até o direito, a moral ea religilo) e tem um grande poder, essa fôrça que Durkheim considerava como seu poder
coercitivo;
b) que a förça das tradições é variável de uma tradição para outra e dos grupos, e, no interior da mesma sociedade, de um grupo para outro, com a sua antiguidade, com as estruturas sociais, o isolamento ou a mestiçagem
(maior no grupo religioso, menor no grupo econômico):
c) que as sociedades são terrivelmente roineiras (a masa sempre, a
elite as mais das vêzes) e que "a instauraçio das novidades não se faz fàdl mente senão nas pequenas coisas ao menos nas mediocres" (M. Mauss);
d) que ohorror a tomar hábitos novos, a obedecer a idéias novas, a criar um precedente, e a facilidade de inovaçãoe a permcabilidade mental, se misturam diversamente conforme os grupos e, dentro do mesmo grupo, variam de uma época para outra (v. distinção estabelecida por Saint-Simon entre
"periodos orgânicos" e "periodos criticos").
FERNANDO DE AZEVEDO
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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TOENNIEs (F.) Gemeinschaft und Gesellschat. 1880-1881; Soziologische Studien und Kri tiken. Erste Sammlung. Jena, Fischer, 1925, VI
368.
Capitulo 1II A INTEGRAÇÃO DO INDIVÍDUO NO GRUPO O apêgo aos grupos sociais.
Os grupos primários.
A família, a
comunidade e os grupos de jogos. - A formação e a expansão dos ideais
coletivos. - As sociedades pequenas e homogêneas. -0 imediatismo do contato pessoal direto. Comunidade e sociedade. - A solidariedade mecânica ou por
semelhança e a solidariedade orgånica ou por diferença. F. Toennies e E. Durkheim. Os grupos secundários. A variedade de grupos em que vive o homem, nas sociedades modernas. A integração e desintegração. As épocas em que a sociedade
particulares.
desin tegrada atrai menos fortemen te a si as vontades
Os fatôres permanentes e temporários de integração. -
A
máquina e a maior subordinação do homem ao meio social. Examinada em si mesma, a sociedade aparece como um ser cole tivo, de natureza diferente do ser individual, e, por isto mesmo que preexiste e sobrevive aos indivíduos, impõe-lhes normas e coer Ções, inelutáveis em substância, mas incessantemente variáveis em suas
formas, segundo o meio e o tempo. Somos, pois, naturalmente impe lidos a "considerar o eu não mais isoladamente, mas no seio do grupo de que faz parte". Se tomarmos individuos de determinado grupo e procedermos àanálise de suas maneiras de pensar, de sentir e de agir, será fácil provar que "no
somente o conteúdo de suas consciências,
mas sua forma, não sòmente as suas idéias, mas a maneira pela qual elas se estabelecem e se opõem umas às outras, dependem, de certa
maneira, do "estado social" e o próprio sentimento que temos do nosso eu depende do meio em que vivemos. Voltamos assim àdistinção fun damental entre o eu pessoal, ligado à estrutura biopsicológica e à vida puramente individual, e o eu social ligado ao grupo de que faz parte
o individuo. A consciência coletiva não está para a consciència indi vidual apenas "como o todo está para a parte, mas como o tipo está
para o exemplar": além dos sentimentos comuns por que se exprime.
a consciência coletiva (ou se quiserem, a sociedade no conjunto de suas representações) "contém imperativos, regras que, uma vez cons
tituídas por uma espécie de síntese criadora, ultrapassam as conscièn
cias particulares com tôda sua universalidade e se lhes apresentam
como geradoras de deveres". A integração no grupo, isto é, a sociali zação do individuo não provém sòmente do fato de que a sociedade. preexistindo-lhe e sendo alguma coisa que o ultrapassa, se impòe ao individuo pelo seu poder dominante e regulador, e tende a modelá-lo segundo seus padrões culturais. Ela resulta ainda do apègo do indivi duo ao grupo social, do interêsse que èle tem de se prender à socie dade, foco e reservatório das idéias, sentimentos e práticas de que se
62
FERNANDO DE AZEVEDO
sociedade traba alimenta a consciência individual. Pois é próprio daunidades organiza constituição de Ihar, ao mesmo tempo que para apersonalidades que ela une, e cujo das, para o desenvolvimento das na coleti valor, "se mergulha suas raízes no coração do indivíduo, é
vidade que desabrocha". De fato, uma pessoa "não é sòmente um ser que se contém, diz Durkheim, étambém um sistema de idéias, de sentimentos, de hábitos
e de tendências, uma consciência que tem um conteúdo; e cada qual elemen é tanto mais uma pessoa quanto mais êsse conteúdo é rico em
tos. Não épor esta razo que o civilizado é uma pessoa em mais alto grau que o primitivo e o adulto que uma criança?" As idéias, normas e práticas que servem de base à vida social, constituindo os valores e
determinando as atitudes, isto é, os padrões de cultura do grupo, são transmitidos aos indivíduos por uma constante ação da sociedade e
pela variedade de meios de que dispõe para exercer as suas influên cias assimiladoras. A coesão dos grupos depende do grau de identifi cação de seus membros, e, portanto, da unidade de idéias, de senti mentos e de hábitos, que, tornando os indivíduos semelhantes entre si,
dentro da "noção de otalidade" (ou do sentimento de todo), assegura
a sua integração na vida social. Certamente os grupos primários (fa
milia, grupo de recreio e vizinhança), que, segundo a classificação de Cooley, se caraterizam pela presença dos indivíduos, uns em face
dos outros (face to face groups) exercem, pela contigüidade espacial,
estímulos mais poderosos uns sôbre os outros; mas os chamados gru
pos secundários (Igreja, Estado), sem essa proximidade fisica dos in divíduos, podem exercer sôbre êles uma ação de igual ou maior inten
sidade, mantendo-os coesos e integrados pela identidade de sentimen tos, de interêses e de aspirações. Para o estudo do fenômeno de inte
gração épreciso ter em vista as diversas modalidades que assumem as Telações entre os individuos, o tipo de organização social, o grau de consistência e interpenetração dos grupos que compõem uma socieda de e a fôrça imperativa com que se impõe o patrimônio tradicional do povo. Em todo caso, a tradição, isto é, "a soma total dos padrões de cultura que o indivíduo encontra ao nascer, envolve-o e atua sôbre
éle de modo coercitivo, nos grupos primários, como a familia, e em
grupos secundários, como o Estado, por meio de tôdas as fôrças e instituições sociais, desde o riso que responde a uma utilidade social e exerce uma função de freio social e de correção, como mostrou H.
Bergson, até à língua que, sendo "a parte social da linguagem exte
rior ao individuo", é, também ela, um sistema de representações cole tivas, coercitivo e de natureza espiritual, e possui asim o caráter essen
cial da instituição social: a coerção.
Os ideais coletivos, ainda os mais fundamentais, uma vez formados
e consolidados, propagam-se, constituindo, para o individuo, êsse ele
mento novo, uma espécie de "depósito social'", que corresponde ao quantum especifico que a matéria social acresce à psicobiológica e varia, de um lado, conforme a maior complexidade do grupo e a maior riqueza de sua herança cultural, e, de outro, segundo os tipos de reação
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e de
63
capacidade de assimilação do
£ a dissimetria que cria o fenômeno, lembra Pierre Curie, individuo. e, sendo universal a tendência à maior simetria ou simetria superior, a simetrização interindividual,
pelo máximo de adaptação, adquire-se às vêzes à custa da intraindivi dual; mas uma vida interior de estados nitidamente caraterizados,
como observou Bergson, responderá melhor às exigências da vida so
cial. "O homem, - é Poyer quem traça êste quadro, o é, desde a sua infância, educado num meio socializado que homem o penetra cada vez mais intimamente à medida que êle assimila a linguagern e
as regras convencionais désse meio. O adulto civilizado obedece mais
freqüentemente a leis, isto é, a uma regulamentação social do que a
seus instintos e a suas tendências pròpriamente fisiológicas. É para um
fim social que é dirigida a maior parte de sua atividadee tendem os
seus esforços mais vigorosos, e o ideal de alguns é mesno a subordina ção quase completa dos instintos à regra. £ste fim é representado à
consciência de maneira mais ou menos clara, que tende a tornar-se cada
vez mais clara àmedida que se realiza um tipo mais elevado de huma
nidade. £le oferece aliás um caráer cada vez mais abstrato. Osistema da moeda é um excelente exemplo dessas abstrações que envolvem e penetram o adulto civilizado. Outros sistemas de abstrações regulam
as relações tão complexas dos individuos e dos grupos, e tornam pos
sivel, por seu aperfeiçoamento progressivo, o sincronismo e o engre namento dos esforços de cada um. Éainda por semelhantes processos que o conjunto do grupo social chega a constituir uma representaço mais ou menos clara tanto do seu passado como de seu futuro enquan
to grupo, apresentação esta que permite a seu turno o estabelecimen to de um plano, de um programa em vista de fins às vêzes muito afas
tados no tempo, ultrapassando mesmo muitas vêzes de maneira notá
vel a duração normal da vida dos membros do grupo". A aceitação consciente desa modelagem do eu pelo meio diz Gilson, citado por Blondel, "constitui para muitos o seu maissocial, alto esfôrço. E contudo, essas obediências passivas, essas vontades de todo feitas e apenas pessoais são verdadeiramente vontades. O que a torna tais, na observação de Blondel, é que elas tÁm por armadura conceitos
capazes de se aplicarem a uma série indefinida e abraçar, na sua ge neralidade, todo o conjunto da conduta humana". Mas êsse poder de adaptaço e de integração social que se constata nas sociedades peque nas e homogêneas, baseadas no imediatismo do contato pessoal direto e na intensidade de estimulos e reações que os numa inte individuos, ração constante, produzem uns sôbre os outros, diminui à medida que aumenta o número de unidades associadas e se complica a organiza ção social de uma sociedade dada. Se nas sociedades pouco diferencia das não há lugar regular para a vontade e iniciativa individuais, crescimento quantitativo do grupo e a multiplicidade de circulos dio ferentes, não coordenados, mas concèntricos, que se formam no inte rior de uma sociedade (amilia, classe social, Igreja, partido, grupo profissional e associações diversas) e em que vive o homem, conri buem, como vimos, para a formação da personalidade e a libertação
FERNANDO DE AZEVEDO
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do indivíiduo. É por isto de grande utilidade ter em vista para o estudo
dos fatos de assimilação ou de integração social, a distinção fundamen
tal estabelecida por Toennies, no seu livro Gemeinschaft und Gesell
schaft que Hans Freyer considera como um dos livros mais belos e mais fecundos do século XIX, e "com o qual se iniciou uma nova época de nossa ciència na Alemanha". A comunidade", para Toen nies, se diferença da "sociedade", em que aquela procede de uma reunião de fôrças vivas, associadas com os instintos, emoções e hábi tas, a que êle denominou uma comum Wissenwillen, enquanto a "so
ciedade" repousa numa comum Kürwillen, que se distingue, ao con
trário da primeira, pelo predomínio da deliberação e eleição conscien
tes; na "comunidade" que se caracteriza por uma conduta altamente integrada e orgânica, os meios e os fins estão em correspondência
direta e cerrada, ao passo que na "sociedade" a conduta é segmentária e indiferenciada, os meios e os fins podem estar afastados e os meios
podem no dar origem aos fins prosseguidos.
A "comunidade", considerada por Toennies como "um produto da natureza", nasce, portanto, segundo o sociólogo alemão, das rela Ções naturais, involutárias e orgânicas, entre os homens e as insti tuições (é a fase natural e orgânica), e a 'sociedade'" se apresenta
(fase voluntária e teleológica) como uma criação artificial ou um pro
duto da inteligência humana. Mas, embora aceite a distinção estabe lecida por Toennies e reconheça com êle a existência dessas duas espé
cies de sociedade, admitindo que "a Gemeinschaft é o fato primeiro
e a Gesellschaft, o fim derivado", equivalente à sociedade pròpriamen te dita, não concebe Durkheim que não façam parte de um mesmo
desenvolvimento e que, embora diversas entre si, haja entre elas dife
Tença de natureza: "se a sociedade, diz êle, é um fato natural em sua
origem, permanece tal até o fim de sua evolução, porque não épos
sivel que seja primeiro um agregado natural, para se transformar mais tarde num produto mecânico". A distinção, assim compreendida, sem
as conseqüências exageradas que dela tem extraido o espírito de sis
tema, confunde-se, a vários aspectos, com a de Durkheim, segundo a qual nas sociedades primitivas reina umasolidariedade mecânica ou por semelhança, enquanto nas sociedades mais evoluídas e civilizadas
a solidariedade é ada vez mais orgánica ou devida à divisão do tra
balho. Ou, por outras palavras, ao passo que os membros de uma tribo
são ligados por uma solidariedade que exclui as diferenças, os habi
tantes de uma grande cidade são tanto mais solidários quanto mais diferem, ao menos sob certos aspectos, pondo-se os indivíduos, pela especialização crescente, numa dependência maior uns dos outros e as segurando-se por esta forma a harmonia do conjunto. Éa mesma dis
criminação proposta por Huvelin (1), que distingue, como Durkheim,
os grupos elementares, nos quais a coesão é devida à semelhança das
consciências individuais e as sociedades organizadas com as quais
Co
meça o direito comercial, evoluindo àmedida que se dissolve ou de
dina otipo social segmentário e progride o tipo organizado. (1) P. HUVELIN -
Histoire du Droit Commercial, Paris, Cert., 1904.
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Certamente a complexidade da estrutura social, com suas classes
hieràrquicamente dispostas e a especialização crescente em conseqüén
cia da divisão do trabalho, determinam, nas cidades modernas, a for
mação de grande número de grupos que se entrecruzam e de que faz parte o indivíduo. A sociedade geral seciona-se em sociedades secun
dárias (grupos ocupacionais, religiosos, politicos, etc), com suas exi
gências a que obedecemos ou, em outras palavras, "está sulcada em to dos os sentidos, por linhas de dermarcação mais ou menos precisas que
a subdividem em grupos mais restritos". O homem vive no seio de gru
pos múltiplos (familia, Estado, Igreja, classe, grupo profissional, etc.)
e, graças a essa interseção de grupos de que faz parte o individuo, a
personalidade individual desenvolve-se e se desprende da massa social, tomando uma fisionomia distinta e pensando e agindo à sua maneira: a variedade de grupos a que pertence o individuo, segundo observa
ram Simmel e Bouglé, contribui para a sua libertaç£o. Mas é preciso
lembrar que as sociedades primitivas, pequenas sem dúvida, e de gran
de homogeneidade aparente, na sua estrutura clásica, apresentam às vêzes uma organização social complicada: "as tribos primitivas são por
assim dizer estratificadas, observa Roberto Lowie (l), pelas diferenças
de idade, de sexo e de status matrimonial, e o fato de ser tal indivi
duo filiado a um dêsses grupos pode afetar sua existência de maneira mais poderosa que a sua qualidade de membro de tal clã". Examinan do o estado de coisas, entre as tribos da Austrália, em que clãs e asso ciações são de uma importância quase igual, verificou Lowie que "na
maior parte das tribos cada indivíduo é simultâneamente membro de
várias unidades sociais. £le se liga a um sexo, a uma pátria, a um clã
totêmico e a uma classe, aos quais está filiado de maneira permanen
te". Em todos os periodos de sua vida, da infância ao estado de adulto.
e dêste ao de ancião da tribo, "seus deveres e seus privilégios depen
dem, tanto quanto de seu parentesco, das associações às quais se liga". A sociedade é, pois, seja qual fôr sua estrutura, a fonte de uma vida original sui generis que se acrescenta à do indivíduo e a transtor
ma, segundo essas representações que, tornando-se coletivas, se conso
lidaram e se cristalizaram como produtos de uma "condensação social",
na expressão de Franz Jerusalem, e cujo poder nãoé menos eficaz sobre
a inteligência do que sôbre a vontade e o sentimento. A integração
do individuo no grupo ou assimilação social repousa sôbre a distin ção entre o social e o individual, e não se processa senão por meio de reações típicas, variáveis com os individuos e o grau de coesão social
que, por sua vez, depende das formas de estrutura de uma sociedade
dada. É nessas formas de organização sociale nos caracteres especiais
do pensamento coletivo de cada grupo que é preciso procurar não
só a intensidade e a eficácia com que a sociedade age söbre o indivi duo para modelá-lo à sua imagem (socializaço do individuo) comno (1) R. LOWIE
Traité de sociologie primitive. Edition trançuise rovue et complé tée
par l'auteur. Trad. por E. Métraux, Payot, Paris, 1935.
FERNANDO DE AZEVEDO 66
sociedade à formação da personalidade ina contribuição edalibertação do indivíduo). A também dividual (diferenciação obra de Durkheim sôbre osuicidio nos oferece, a êste respcito, um exemplo frisante: a distinção dos suicídios por excesso de integração social e dos suici-
Esses problemas de socialização do ind: de integração. dios víduo,pordefalta transmissão a êste das interpretações e das normas sociais,
cultura e da personalidade, podem ser estudadae relações da normal das personalidade como na personalidade mórbida, "dessocializadiferente do noSsO. em da", que se move num mundo conceptual següência de uma ruptura por que termina o contlito entre o indivi. duo e o seu meio social. A socialização do individuo, comenta Mario. lin, referindo-se ao trabalho de Dollard (1) sôbre a personalidade pato lógica, "é um problema dificil a estudar, sobretudo porque esta socia.
lização é contínua, e se processa por uma multidão de caminhos dife
rentes que é muitas vêzes impossível de distinguir uns dos outros, As rises em que esta socialização éentravada, interrompida ou destrujda. oferecem um terreno eminentemente favorável à pesquisa sociológica e
permitem reconhecer aos diferentes fatôres a importância que Ihes cabe
e medir a ação dos diferentes tipos de coerção". Nós estamos presos, certamente, ao meio social que nos cerca, nos
penetra ese mistura a nós; e, para viver uma vida puramente indivi
dual, isto é, desintegrada do grupo, "seria preciso, observa Durkheim,
despojar-nos de nossa natureza social, o que nos étão impossível como
saltar fora da própria sombra". No conflito entre o indivíduo e oseu
meio social, a completa ruptura é um caso anormal ou patológico.
Também, "as épocas em que a sociedade desintegrada atrai menos for
temente a si, em razão de sua decadência, as vontades particulares e
onde, em conseqüência, o egoismo tem mais livremente curso, são épo cas tristes". Mas, se há sociedades em que os indivíduos, "uma imensa turba de homens que querem por vontades de todo feitas", são
as abelhas da colmeia e "vão da vida à morte através dos obscuros
caminhos que a sociedade traçou para êles, por uma espécie de con
formismo social", há outras em que, sem se romper o equilibrio em
que se exprimem as assimilações necessárias à vida social, se rasgam,
pela sua própria estrutura, perspectivas ao desenvolvimento da perso
nalidade e às iniciativas individuais. Podem-se lembrar aqui, ainda
uma vez, para se tirar partido delas, algumas das indicações dadas por Durkheim sôbre a divisão do trabalho e seus efeitos, preparando, nos
Centros de aglomeração urbana, em que se instala, formas imprevistas
de individualismo.
Épreciso, por isto, no estudo de cada caso coT
creto ter em vista os fatôres permanentes e temporários de integraç e de desintegração da sociedade, que é, para o homem, uma necess
dade, uma realidade orgânica, "não que ela esteja tÙda organizada no
seu organismo, explica Henri Wallon, mas porque é dela que recebe (1) DOLLARD (J.)
The
psychotic person seen culturally. The American Jourma Sociology. Março, 1934, págs. 637-648 (ctr. CH. BLONDEL, La conscience morbiae
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
67
o indivíduo suas determinações: estas são para êles um complernento necessário eêle mesmo tende para a vida social corno para seu estado
de cquilibrio". Ora, opor, como é freqüente, o individuo à sociedade,
édesconhecer esta verdade fundanental de que o homern, sen deixar
de ser um indivíduo, é um clemento e ao mesno ternpo um produto
da sociedade que nle
se exprime por um sistema de idéias, de senti
mentos e de hábitos. Havia, conta uma parábola japonsa, dois pra
tos cheios de arroz. Em um, cada grão diz: "Eu sou um grão": no
outro, cada grão pensa: "Nós somos arroz". Assim, em cada um dos
individuos que compõem um grupo social, coexistern, mistura ndo se e fundindo-se, harmonizando-se e opondo-se, o "ser individual", de
origem hereditária, e o "ser social", criado e organizado para a vida
social.
Tem-se observado mais de uma vez que, àmedida que se desen volve a civilização, se compliam os recursos materiais, como utensí
lios, instrumentos e máquinas, e "seu conjunto acaba por formar um
verdadeiro mundo artificial por neio do qual o homem se adapta a
si omundo natural". A atual civilização mecânica e industrial apre
senta, como um de seus caracteres, a extraordinária riqueza dos recur sos e artifícios técnicos, cada vez mais aperfeiçoados, de que a ciência
a aparelhou, permitindo ao homem meios de ação privilegiados na
luta para a conquista e do dominio das fôrças naturais. Mas, se se estudarem os efeitos produzidos pelo fenômeno do maquinismo nas relações do homem com o meio social, verifica-se que as descobertas e
as invenções mec£nicas, aumentando de modo desconcertante a com plexidade, tornaram o homem mais dependente do seu meio social. Os dois grupos de fatos mais caracteristicos das sociedades modernas,
a divisão do rabalho eo desenvolvimento mecânico, agem diversamen
te, pois enquanto a especialização e a fragmentação da sociedade numa
grande diversidade de grupos, se não forem acompanhados de uma
centralização proporcionada, tendem a exercer uma aço desintegrado ra, as facilidades de transmissão de idéias e de valores (o livro, o cine ma e o rádio) e de transporte terrestre, maritimo e aéreo podem cons
tituir-se em fatôres extremamente eficazes e poderosos de assimilação.
Aliás, "à medida que as sociedades progridemne se centralizam, observa
Durkheim, a vida geral da sociedade, que é comum a todos os seus membros, e que tem no grupo político sua origem e seu fim, toma
sempre mais lugar nos espiritos individuais", atraindo o individuo para fora do meio doméstico e dos grupos profissionais para prender a sua atenção a outros objetos (negócios públicos de tòda sorte, acontecimen
tos econômicos, científicos, etc.) que afetam o corpo inteiro da nação.
Seria útil notar, por outro lado, as formas particulares que impoe à
disciplina o desenvolvimento das ciÁncias e da indústria: "medida,
substituição dos ritmos naturais pelos ritnos artificiais, especialização
em vista de uma carreira, preparação para a utilização das técnicas à qual permanece ligada a preparação às asimilações, neceárias elas próprias à vida social". 6 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 68
PROBLEMAS E DISCUSSOES
expressão das inlluan no grupo éo resultado ea 1. A integração do indivíduo comum individt pensamentos exerce sobre os em funda cias, ações e pressões que a vida pontos êstes discutir Para compreender bem os fenômenos de socialização, mentais: do homem-organismo e) o dualismo sôbre o qual Durkheim tantoserinsistiu do ser so individuale do e do homem social, ou, por outras palavras, instituiches em cristalizadas b) a soiedade é um sistema de crenças, atividade: à e que não cessam de interessar à sensibilidade de c) o pensamento coletivo constituído desse conjunto ou sistema indivíduos: valores (idéias, renças, normas e tendências) ultrapassa a todos os d) os individuos estão submetidos às influências do grupo e, se são les que constituem a sociedade (pois esta não ésòmente uma organizacão de indivíduos), são constantemente trabalhados e modelados por ela à sua semelhança (socialização);
e)
aação do grupo como tal, cuja importância épreciso pôr em relêvo:
porque éle é arrastado pelo grup0, é que o individuo progride, mesmo se o grupo como tal não progride;
a ação individual (tendência iniiadora), muito limitada nas socieda des primitivas, pode fazer sentir o seu poder, mesno no sentido de uma
mudança da civilização do grupo, por meio da socialização progressiva de suas
concepções e tendências individuais (chefes, condutores, inventores, reforma
dores).
2. A lei ou a condição primeira do cômico se encontraria, segundo BERGSON (Le rire, Essai sur la signification du comique, Paris, Alcan, 1900), na "inserção do
automático novivo, isto, na rigidez, na inadaptaço às condições vitais, quer se tradu za pelo desajeitamento dos movimentos e das formas, pela repetição regular dos aconte imentos ou das palavras, quer pelo mecanismo dum caráter ou dum sentimento que parecem distender-se e funcionar como uma mola e em que a vida parece dis
traida de seus fins sempre novos e da livre originalidade de sua natureza. Mas por que
esta "substituição do vivo pelo mecânico" nos aparece como cômico ou ridículo, em uma palavTa, risível? É que o riso é um fenômeno social e responde a uma utilidade
social. Eis como explica Bergson: a) A vida e a sociedade têm necessidade de uma atenção constante e de
um contínuo esfórço de adaptação às suas condições mudáveis; b) As inadaptações profundas e essenciais, pela impossibilidade mesma de viver, eliminam-se por si próprias; ) Mas à soiedade não basta viver, ela precisa viver bem: tôda a rigidez
(inadaptação) do caráter, do espírito e do corpo lhe será, pois, suspeita. porque ela éosinal possivel de uma atividade que adormece e também de
uma atividade que se isola; a sociedade está em presença de alguma coisa
que a inquieta...
d) £, pois, por um simples gesto que ela responderá: "o riso deve ser
alguma coisa dèsse gênero, uma espécie de gesto social, uma espécie de freio
social, uma correção". 3. Estudar as diversas formas sociais e os caracteres mais simples e gerais da
sociedade, apontados por Bouglé, e mostrar as relações entre essas formas e a integraçao
do indivíduo no grupo, integração ou assimilação social que varia conforme:
mais o número ou a quantidade das unidades grupadas, tornando-se alto o grau de integração nas sociedades pequenas; b) a densidade da população e sua concentração nas cidades, a rapidez
a
das comunicações que, muliplicando os contatos,relorcam os efeitos do número;
) a quantidade (homogencidade e heterogeneidade) das unidades soclals maior a integração do indivíduo nos grupos homogèneos;
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
69
d) a complicação das sociedades, que tende antes a diferenciar" do que a "integrar" o individuo;
) a unificaçãoe a centralização que supõem "um Estado que centraliz a
autoridade e una nação", isto é, indivíduos que tenham consciênda de sua solidariedade.
4.
Analisar e prccisar a distinção estabelecida por Durkheim entre os dois
tipos de solidariedade: solidariedade mecânica ou por semelhança e solidariedade (cfr. a distinção entre omunidade, Gemeinschaft, c oie ou por diferença orgânicaGescllschaft, dade, segundo Tönnies) e proceder a inquéritos e pesquisas para defini-los e caracterizá-los, sôbre:
a) grupos sociais, fechados e homogêneos (tribos indígenas: comunida rurais, e antigas cidades do interior, ern que as relações se estabelecem des pelo imediatismo do contato pessoal direto eé maior o poder da tradição
coletiva); como S. b) agrupamentos urbanos, mais móveis e menose tradicionais, só do não efeitos os modernas, Paulo e Rio e, em geral, grandes cidades sodal. trabalho do divisão da como grupos crescimento quantitativo dos Etude sociologique, 5. Examinar e discutir a tese de DURKHEIM (Le Suicide, aquelas que The suicídio o produzem que causas 1897), que, depois de separar das por uma dirigido e envolvido é e de mostrar que o indivíduo parccem extra-sociais realidade moral que o ultrapassa (a realidade coletiva). distingue três formas gerais do fenómeno, ligadas a tendências que reinam na sociedade: a) o suicídio egoista, produzido por tendéncias sociais que levam o indivíduo a isolar-se, e que varia em razáo inversa do grau de integração dos grupos sociais de que faz parte o individuo (suicidios por falta de integraçio
social);
b)
o suicídio altruísta, que não aparece, ao contrário, senão onde o
individuo é fortemente integrado no grupo social e que é o único que se nota nas sociedades selvagens e o mais freqüente no exército (suicidios por excesso de integração social);
)
osuicidio anômico, ligado às crises (revoluções, guerras, crises econd
micas) que surgem nas soiedades ivilizadas e. acarretando no individuo um
desacórdo dos fins e dos meios, deixam desregrada a atividade do individuo. Pensa Durkheim que o único remédio é tornar mais fortes os grupos que
enquadram o individuo e, entre êstes, os grupos profissionais, que. reconstituidos, Ihe parecem mais próprios a desempenhar tsse papel (de reintegraço do individuo no grupo).
6. Em um dos capitulos de Elementi di sociologia criminale (Palerno, 1910)
F. SCARLATA descreve a criminalidade das diferentes classes sociais e. entre outras
conclusões, afirma que o desenvolvimento da criminalidade moderna provém em parte
de um estado de desequilibrio social que isola o individuo e tem como causas prinipais:
a) a mistura das classes, conseqüència das opiniões igualitárias e indi
vidualistas; b) a instabilidade das condições econdmicas e a posibilidade deixada a cada um de se "desclassificar" de uma maneira ou de outra.
Analisar e pesquisar aação de cada um dèses fatòres que contribuem para estabelecer oestado de desequilibrio social e as consequèncias produidas söbre a desintegração do individuo.
7. As crises em que a socialização do individuo é entravada. interrompida e
destruída, oferecem um terreno eninentemente favorável à pesquisa sociológica. É.
na personalidade patológica que John Dollard e Charles Blondel estudaran. por
meio de monografias (ife-history) e investigações, os problemas de socialização ou de transmisso ao individuo das interpretaçóes e normas sociais Examinar e discuir a
tese, nos três pontos capitais: a) a personalidade morbida de que tratam é "a que se criou um meio
novo, un mundo em que os objetos e os fatos não tèm mais a significação
FERNANDO DE AZEVEDO
70
individuo" (a personalidade que lhes atribui o grupo social ao qual pertence o"versão privada da cultura
segundo a expressão de Dollard, uma se forjou, b) cssa personalidade se "dessocializou", isto é, move-se num mundo con. de dcs. ceptual diferente do nosso e no qual tudo nos é ininteligivcl (fenônmeno socializaço): meio ) é preciso explicar a gênese do conflito cntre o individuo eo
social ou antes seu meio social, conflito que termina por uma ruptura.
8.
Estudando a sociologia do "pânico", Gothein, discipulo de Dilthey, apresenta
interessantes observações e ilustra suas tescs com numerosos exemplos tomados a de pânicos, militar, religioso, político e cconômico. Examinar com tôdas as ordens observaÇões próprias (o caso típico de pânico no cinema Oberdan, em 1938, em
S. Paulo, a0 alarma de fogo) ou com exemplos tomados à literatura sôbre a matéria as seguintes afirmações de Gothein: a o pânico, em um sentido, isola o indivíduo e desagrega todo o Jaco social:
b) o pânico transforma em poeiras de átomos sociedades organizad:as; ) a intensidade da brusca descarga nervosa de que são vítimas os indivíduos, é decuplicada pela pressão que exercem uns sôbre os outros, pelas
simpatias que experimentam e sugestões a que cedem.
9. Entre as questões relativas aos aspectos sociológicos do maquinismo no
mundo moderno (avilização mecânica e industrial), algumas se prenden aos efei tos
produzidos pelo fenômeno do maquinismo sôbre as relações do homem com a natu
reza e o meio social. Analisar e discutir estas duas questões: a) em que medida o maquinismo torna a vida mais fácil e mais segura,
tornando o homem mais independente do seu meio natural? b)
em que medida o mecanismo torna a vida mais complexa e mais
difíil, tornando o homem mais dependente do seu meio social? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALDWIN -
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losophischen Soziologie. Stuttgart, Enke, 1923.
Capitulo IV
ANATUREZA SOCIOLÓGICA DO FENOMENO DE EDUCAÇÃO educação. do fenömeno dacientífico. A concepção sociológica tratamento e observação de suscetivel social,
Aeducação, fato
As características do
sociedades, de trés gera fato social pedagógico. A coexistncia, no interior das conflito das gerações. 0 ções. - A "distância social" que separa as gerações. - söbre as gerações jovens adultas gerações pela exercida "ação - Aeducação, físico e soial. meio ao conseqüéncia, e, em a si mesmas para adaptá-las As influências social. Processo de transmissão e reconstrução da experiência ação difusa e inintencional. - A
mediatas e imediatas. - A educação, como Os ideais sociais e os ideais humanos. educaço intencional e sistemática. em função do meio e - Dualismo aparentemente irredutível. - A educação do tempo.
As observações cientificas feitas sôbre indivíduos ou grupos de in divíduos, pertencentes a sociedades animais ou a espécies de ani mais superiores, mostram-nos que o seu comportamento é determina
do pelos instintos, - aptidões ou impulsos inatos que os levam a agir
desta ou daquela forma. Para os animais, ainda os mais próximos da
escala zoológica, tudo éobra da hereditariedade e dos instintos: nada, nêles, que se adquira, lembra A. Povina, por via externa ou social: o que a natureza não deu, não se pode aprender. A aprendizagem ou treinamento progressivo, como o faz notar Durkheim com exatido,
"facilita o jôgo das aptidões naturais, mas não cria nada". No homem,
ao contrário, étão rudimentar o que chamamos "instinto" como nos
outros animais o que denominamos inteligência e que não lhe serve para realizar espontâneamente os atos mais individuais. A hereditarie
dade transmite os mecanismos instintivos que asseguram a vida orga
nica e, nos animais que vivem em sociedade, uma vida social muito
simples; mas "não chega a transmitir as aptidöes de tòda ordem que supõe a vida social e que são complexas demais para poderem mate rializar-se sob a forma de predisposições orgånicas". A palavra, o poder de fabricar instrumentos e a capacidade de organização social, que pa rece derivada da linguagem e da técnica, são as très caracteristicas ou capacidades essenciais que diferenciam os homens dos outros animais: as experièncias realizadas até hoje não constataram a existencia, ainda entre os símios, de capacidades idênticas ou parecidas. Asim, pois, se
o comportamento dos animais gregários é preestabelecido por heredi Lariedade e, em conseqüència, determinado por impulsos da natureza instintiva e não por tendências adquiridas, - pois as abelhas, as tér
mites e as tormigas, passam aviver gregàriamente como seus antepas
72
FERNANDO DE
AZEVEDo
sados, sem a mínima necessidade de experiència social; o comporta. mento dos homens obedece a poucos instintos e se baseia mais na cul.
tura e a transmissão dos atributos especificos que distinguem o homem,
se faz por uma via que é social, como sociais são dles: essa via é a edu.
cação, privilégio exclusivo da espécie humana.
As normas fixas, a que obedecem os animais gregários para vive.
rem em conjunto, estão predeterminadas na sua constituição orgânica. e se transmitem de geração em geração por via de hereditariedade bio lógica, ao passo que as normas que regem a vida dos grupos humanos.
- normas sociais, objetivas e exteriores aos individuos, transmitem-se
por via social, externa. A lingua, a moral, a religião, as ciências, tudo o que integra a cultura de um grupo, é produto social, obra coletiva,
eo seu conjunto é que forma o "ser social"; constituir e organizar êsse
ser em cada um de nós, ensina Durkheim, tal é o objetivo preciso da
educação. £sse ser social não se apresenta acabado na constituição pri.
mitiva do homem, que não seria senão um animal sem a ciilização. Por intermédio das gerações sociais que formam como os anéis de uma
cadeia graças à educação, observa A. Povina, realizam-se a continuida
de da sociedade e a permanncia do grupo. A sociedade desempenha o papel de um mecanismo de transmissão que supõe a manutenção da sociedade como um todo. Mas, como, por um lado, idéias, sentimen tos, hábitos, aenças e práticas são "aquisições culturais", aptidões e tendncias que se adquirem pela educação, isto é, por via social, e, por outro lado, não há transmissão hereditária de caracteres adquiri dos, - oque vale dizer que os efeitos da educação, puramente fenotí
picos, não podem inscrever-se no patrimônio biológico,
"em face de
cada geração a sociedade se acha quase como se estivesse diante de uma tábula rasa e forçada, por isto, a novos esforços para uma cons trução que perpètuamente terá de renovar-se". À morte de cada indiví
duo, observa C. Bouglé, o fio das tradições, condições da vida cole
tiva, é como que cortado. A cada nascimento épreciso reatá-lo. Do ser novo que traz a vida é necessário fazer um "ser social", isto é, um ser
capaz de levar uma vida social e moral. O poder de plasticidade que dá à natureza humana a variedade de aptidões gerais, hereditárias, suscetiveis de serem orientadas em diversos sentidos e a existência, na
espécie, de um periodo prolongado de imaturação (infância e ado
lescência) (l), permitem àsociedade, pela educação, fazer do ser hu
mano "um homem", não sòmente estimulando, despertando e dirigin do, mas modificando o que nêle existe emn germe ou em potencial, de acôrdo com as necessidades, valores e ideais de vida de cada grupo. A educação é, como se vÁ, um fenômeno eminentemente social, tanto por suas origens como por suas funções, e apresenta os dois ca (1) A infancia prolongada do homem, se o coloca, nesse período, em estado de inte rioridade em do indivíduo, GOs cultivar torna, de fato, possível à sociedade, nessa idade mais plástica relação não animais, isto e, dotá-lo de uma segunda natureza, transmitindo-lhe todos êsses elementos constituem o "ser social'" organizando êsse ser na criança que, quando vem à vida,que não traz senão a sua natureza de indivíduo. Nas espécies, segundo a observação de H. Spencer, os mais perfeitos sao os indivíduos cujo precedente à é mais prolongado, retardada a puber dade e dilatado o período tenpo de contato con maturidade os pais.
outOelementos
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
73
racteres dos fatos sociais: a objetividade e o poder coercitico. É uma realidade social suscetível de observação, e, portanto, de tratamento científico. Mas o fenômeno da educação que se dá em todos os grupos sua função específica sociais, se distingue dos outros fatos sociais portradições ou da cultura das que consiste num processo de transmissão considerarmos a sociedade de um grupo, de uma geração a outra. Se a) a unidade sob os três pontos de vista pelos quais pode ser encarada: podemos, com social; b) a continuidade social e c) a evolução social, a cada Alfredo Povina, apreciar o fenômeno da educação en relação como objeto, ten por um dêsses fatos fundamentais. Pois, se a educação fisicOs, estados de ensinava Durkheim, "desenvolver certo número política no seu con sociedade pela intelectuais e mora is, reclamados se destina", é por ela junto e pelo meio especial a que o indivíduo pelo jögo dêsses social, que a sociedade procura realizar a sua unidade que, no fundo, dois subprocessos de homogeneização e deà diferenciação, geral, no seu con importam num processo de assimilação sociedade profissionais, (grupos junto, e às sociedades secundárias ou especiais da divisão lei classes) que se formam, no interior das sociedades, pela do trabalho. As sociedades procuram assim diversificar as pessoas, par
sendo um tindo de um esfôrço para uniformizá-las. Mas a educação, processo o é social, veículo que realiza a transmissão da experiência
a "conti que garante à sociedade a sua existência contínua, assegura
nuidade social", isto é, a permanência da unidade social no tempo. Graças a ela, "é possível a assimilação pelo homem das aquisições an teriores da sociedade, a "transmissão dos conhecimentos acumulados,
que é obra da solidariedade no tempo, segundo a justa expressão de
Duprat"; e, embora pelo seu caráter tradicionalista, decorrente de sua
própria natureza, a educação seja antes um instrumento de adaptação, não é apenas, do ponto de vista da evolução social, "um elemento passivo na medida em que reflete o progresso social, mas um fator
ativo na medida em que pode servir de instrumento para auxiliar as transformações coletivas".
Ora, como êste processo de transmissão de representações e de valores se realiza entre dois "conjuntos de individuos em condições
determinadas",
preciso fixar, na análise sociológica do fenômeno de
educação, essas camadas ou segmentos sociais, "èsses grupos de indivi
duos", entre os quais se produz o fenômeno cuja natureza procuramos
definir. Certamente, o individuo, - objeto ou matéria da educação, não éo indivíduo isolado ou distinto dos outros, mas os indivíduos "nun grupo dado": uma geração determinada ou, mais particularmente, a
"nova geração". Do ponto de vista sociológico, uma geração é "um
agregado de indivíduos que possuem certos caracteres, redutiveis a um
denominador comum, a idade", um segmento ou uma camada social, uma figura de caráter coletivo. Cada sociedade apresenta très geraçöes
sucessivas e distintas que se distribuem em periodos aproximados de 25 a 30 anos e que, constituindo embora um conjunto, se diferenciam
mais ou menos, conforme as épocas, uma das outras, por certos traços
e caracteres, ligados às suas maneiras de pensar, de sentire de agir: a
FERNANDO DE AZEVEDO
74
geração descendente, a dos avós; a geração reinante, a dos pais, e a
geração ascendente, a dos filhos (1). Essas três gerações, velhos, adultos e jovens, cronològicamente justapostas, pelas suas idades respectivas, abrangem um "século", unidade histórica. Mas embora as gerações se jam uma repartição por idades, elas não constituem fatos puramente orgânicos, pois se distribuem e se diferenciam, no interior dos grupos,
conforme a sua estrutura e as suas instituições. Sem dúvida, lembra
Halbwachs, "as idades correspondem às diversas etapas da evolução orgânica, mas a idade não émenos uma noção social, e que nos é im
posta pela sociedade. Nos paises em que não existe ainda estado civil,
os homens não podem dizer exatamente sua idade. £les sabem sòmen
te que são crianças, adultos ou velhos, e ainda não o sabem bem senão porque êles podem comparar-se uns aos outros.
Não se é, pergunta Halbwachs, ou a gente não se crê jovem por
mais tempo onde há poucas crianças, velho mais cedo, ao contrário, lá onde há relativamente menos pessoas de idade e maior número de
jovens? Demais, a repartição por idades, "não é um simples fenômneno natural (sempre no sentido orgânico) pois que varia segundo as con dições econômicas e sociais e, por exemplo, numa nação em pleno
surto industrial, as camadas de idade mais jovens tornam-se ràpida
mente mais largas do que num país estacionário". Assim, a geração
também, que implica um conteúdo nìtidamente sociológico, não é menos uma noção social; as diferenças sociais de estrutura e de insti tuições e o sentido e o ritmo da evolução não sòmente explicam as
proporções em que coexistem as diferentes gerações (velhos, adultos e jovens) em uma sociedade determinada, mas estabelecem a distân
cia social" (conjunto de traços e caracteres) que separa e distingue as
gerações descendentes das gerações ascendentes e se torna mais forte
mente acentuada pela civilização (2). A transmissão de valores em que
consiste, em sua essência, o fenômeno da educação não se faz, pois, se não mediante uma "pressão" dos adultos e uma "resistência" dos jo
vens, cuja relação nem sempre éigual e ésempre variável conforme (1) As gerações sucessivas, observa Duprat, têm o dever de transmitir, acrescido sem
áqueles que se Ihes seguem, o bem coletivo legado pelas que as precederam, pois as
sociedades apresentam ng sua vidg uma continuidade análoga à que apresentam os orga nismos individuais: não se separam uns dos outros os momentos sucessivos de sua exis
tência senão no pensamento que os representa; em realidade, a interdependência constante velhos e dos mais jovens faz que não haja nunca solução de continuidade na transformação social. Os novos vindos à vida coletiva fazem, perto dos mais velhos, a aprendizagem de todos os meios de conhecimento e de ação que permitem a civilizaçáo e o progresso. (G. L. DUPRAT, La solidarité sociale, Doin, Paris, 1907 ). (2) Entre os povos primitivos em que os homens envelhecen mais ràpidamente, co meçando a velhice, para muitos naturais, aos 35 anos, é preponderante a influência das ge dos mais
rações mais velhas. Dadas as dificuldades e pobreza de sua existência, compreende-se, diz
W. MUHLMANN (Rassen und Volkerkunde, Braunschweig, 1936), que os homens, atingida
uma pos ição social elevada, não abram mão dos privilégios conquistados. Assim se ex plica a "gerontocracia'. Entre os povos modernos, com a civilização que nelhora as con dições de existência, tende a alongarse a vida e a aumentar o número de velhos e, por
tanto, a tornar-se, en certos países, ngis sentida a influência da velha geracão. Na França,
por ezemplo, segundo a estatística de Von Mayer, sôbre l000 indivíduos, havia em 1928, 347, de menos de 20 anos, 525S, de 20 a 60, e l28 de mais de 60 anos, enguanto no Brasil,
as trôs gerações coexistian nas seguin tes proporções: 570, de menos de 20 anos, 400, de
20 a 60, e 30, de mais de 60 anos, sôbre o mesmo número de indivíduos (1 000 ). A França
pode ser, pois, citada entre os povos modernos a que G. Richard chamou 'velhos coletivos.
Em todo caso, a autoridade dos velhos, como bem observa Schmoller, marca a ordem tra
diclonal de uma sociedade, o seu "'grau de consis tência".
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
75
e contribui para caracterizá a "distância social" que separa as gerações social traduz las. Na estrutura coletiva, como diz A. Povina, "a geração uma função o processo de diferenciação social no tempo, realizando a dife semelhante à das classes sociais no espaço. Estas representama diferen significa renciação num sentido horizontal, enquanto aquela da geração sociológica ciação num sentido vertical. £sse corte da figura entre permite-nos dizer que a educação é um processo que se realiza sôbre formada duas gerações: é a ação exercida por uma geração já passivo respecti uma geração em formação: o sujeito ativo e o sujeito formada
vamente. A educação é, assim, a obra de uma geração já sôbre uma geração a formar ou em via de formação". ação exercida pelas ge A cducação pode-se, pois, definir como "aadaptá-las a si mesmas e, rações adultas sôbre as gerações jovens para pedagógica em conseqüência, ao seu meio fisico e social". Se a relação
revestir éuma relação social, de finalidade específica e suscetível de pode ela sociais, as formas que assumem as relações ou os processospode a lugar dar derivar de relações sociais não pedagógicas como
novas relações socia is e a fatos de estrutura (instituições especializa das) a que imprime um caráter próprio a idéia originalmente educa
tiva implicada em sua constituição. É por isto que, considerada a edu cação no sentido mais amplo, Aloys Fischer (1) apresenta como objeto da sociologia educacional três fatos fundamentais: a) a re lação peda gógica como relação social, entre a geração adulta e a geração nova, e, dentro dessas camadas sociais, entre educadores e educandos, ou
entre indivíduos que exercem e os que sofrem a ação educativa, e
esa relação pedagógica émarcada pela intenção, pelos meios e pelos resultados da ação educativa; b) derivações da relação pedagógica de
relações sociais não pedagógicas, como são as relações sociais entre pais e filhos, entre velhos e moços, entre pessoas cultas e incultas, entre in divíduos de classes diversas e, portanto, entre ricose pobres; relações
essas que, embora não pedagógicas, podem tomar um caráter educa
tivo, seja pela intervenção ativa e consciente, de um lado, sôbre as
maneiras de pensar, de sentir e de agir, do outro, seja pela orientação passiva do comportamento segundo os padrões do grupo, individuo
ou classe considerada superior; c) derivação de novas relações sociais
de relação pedagógica, como éo caso de agregados (classes) e insti tuições (escolas ou sistemas escolares) que resultam de relações peda
gógicas entre mestre e discípulo, professor e aluno e cuja finalidade,
estruturae atividade funcional recebem a direção, o estilo e o ritmo
da idéia educativa: elas representam, como observa A. Fischer, o pro cesso educativo cristalizado em instituições sociais.
Seja, pois, por meio de uma relação social pedagógica pura ou
derivada, seja mediante uma ação difusa e assistemátia do meio (edu
cação não formal) ou por uma ação intencional e organizada (insti
tuições especiais, como a escola), aeducação é sempre èse processo de transmissão cultural de uma geração a outra, das gerações adultas às (), FISCHER (A.) - Pidagogische Soziologie (Handwärterbuch de: Soziologie ), Stutt
gart, 1931.
FERNANDO DE AZEVEDO 76
de transmissão de idéias e repre. gerações jovens. Mas, êsse processodito, nem sem "pressão" dos adultos sentações, não se faz, como ficou éum processo social, essencialmente vivo nem sem "reação" dos jovens;"mecânicamente, mas através de resistên e dinâmico. Não se realiza que sofrem a acão cias e conflitos, por meio dos quais as gerações novas experiência das gerações adultas, reagem sôbre elas. As formas de do patrimó depositária social "transmitidas" por uma geraço que érecebidas tais quais, mas são não grupo, do nio espiritual e material "reconstruídas" pela geração que as modifica, para integrá-las num patrimônio, lenta mas constantemente renovado através das gerações. É por isto que, como observa John Dewey, "uma sociedade humana está sempre começando de novo, sempre em processo de renovação e perdura só por causa da renovação. As alterações de uma língua, por exemplo, nunca foram intencionadas e precisas. As pessoas sempre pretenderam reproduzir a palavra que ouviram a seus pais e supu seram que o conseguiam. £ste fato pode servir de símbolo da re
construção operada nos hábitos, por causa de fato de que podem transmitir-se e fazerse perdurar sÕ por meio das imperfeitas ativida des do jovem ou mercê do contato das pessoas que têm hábitos dife
rentes. Em sua maior parte, essa alteração contínua foi inconsciente
e impremeditada. A atividade do imaturo não desenvolvida, logrou modificar, acidental e sub-repticiamente, a atividade organizada do adulto". Não há, portanto, quando Durkheim fala em "transmissão" e Dewey em "reconstrução" da experiência social, dois conceitos postos ou irredutíveis: transmissão e reconstrução são dois tempos ou dois
aspectos do mesmo fenômeno de educação que se processa entre duas gerações, uma das quais, a dos adultos, exerce uma ação para "trans mitir" as formas de experiÁncia social, e a outra, a dos jovens, reage
pela sua plasticidade, ao recebê-las, modificando-as e reconstruindo-as.
Em tôdas as sociedades, primitivas ou civilizadas, seja qual för a complexidade de sua estrutura ou o grau de sua civilização, encontra se um conjunto de idéias, de sentimentos, de hábitos, e de práticas,
e, portanto, uma determinada concepção de vida, um "ideal social",
ideal de "certo tipo de homem'", que essas sociedades procuram rea
lizar. Em face de "uma geração nova a formar", elas se comportam, de maneira igual, para tôdas as épocas: procuram, por todos os meios, assimilá-la, adaptá-la ao seu meio social, "transmitindo-lhe" as aquisi ções de cultura, em tôdas as suas modalidades, acumuladas pelas ge rações anteriores. As sociedades mantêm-se pela transmissão dêsse pa
trimônio que, constantemente enriquecido e modificado, se transfere de uma geração a outra, por um conjunto de influências inintencio nais e assistemáticas ou intencionais e sistemáticas que se exercem sôbre o indivíduo, envolvendo-o, aliás, como numa rêde, do berço ao túmulo. Podem variar, e efetivamente variam de sociedade para so ciedade, e de uma época para outra, no interior do mesmno grupo, 05
valores e as representações que constituem o conteúdo dessa transmis
são, os tipos de agentes sociais (mestres, apóstolos, professôres e edu cadores) e as instituições, por meio das quais se opera essa transmis
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
77
são. Mas o processo que assegura a continuidade e o desenvolvimento
da sociedade, pela transmissão do patrimônio social, é a "educação". A educação, porém, nem mesmo nas sociedades extremamente comple
xas e altamente evoluídas, se realiza sòmente, nem sobretudo pelas ins tituições especializadas, que são as escolas, ainda que coordenadas e
subordinadas, na variedade de seus graus e de seus fins, num sistema de organização. Assim, ainda nos povos primitivos, en que não existe nenhuma estrutura escolar ou que não chegaram a organizar nenhum "sistema'" de transmissão (1), dá-se o fenômeno de educação, que se
realiza, de maneira difusa mas eficaz, por tôda espécie de meios, des tinados a tornar homogêneas as camadas montantes da população em relação às camadas dominantes, "porque são estas, lembra Mauss, que
dotam verdadeiramente os jovens membros da sociedade de tudo o que os qualifica como homens". Reconhecer o caráter social que realmente anima a educação, pon
dera Fauconnet, comentando o pensamento de Durkheim, "não im
porta em prejulgar as fôrças morais que solicitam o educador em
direções diversas e, às vêzes, opostas. Nem se pode concluir daí nenhum antagonismo entre os ideais nacionais e os ideais humanos: o cosmo politismo não é menos social que o nacionalismo. Há civilizações que impelem oeducador a colocar a pátria acima de tudo; outras que olevan a subordinar os fins nacionais aos fins humanos, ou melhor,
a harmonizá-los. O ideal universalista está ligado a uma civilização sintética que tende a combinar tôdas as outras. Aliás, no mundo con
temporâneo, cada nação tem o seu cosmopolitismo, seu humanismno próprio, no fundo do qual se reconhece o seu próprio espírito". De modo que, conforme as tendências profundas que se manifestam na
sociedade e a impelem nessa ou naquela direção, o ideal por que se
orientam as gerações adultas e que procuram transmitir, pode vir car regado de humanismo (tendências universalistas) ou marcado por um
vigoroso sentido nacional (tendências particularistas), mas é sempre
um "ideal social", pelo qual se afirma o homem de certo tempo e
de lugar determinado e que a geração adulta se esforça por riar nos seus sucessores. A educação, como uma realidade social, varia no tem
po etoma formas distintas no espaço, "refletindo sempre tòda a escala
de valores da sociedade, de maneira que seria possível conhecer a sua estrutura social pelo conhecimento da educação. O rabalho a que se
entrega uma sociedade para formar os seus filhos, constitui, nas ex
pressões de Fauconnet, "o mais seguro teste de sua concepção de vida;
e o ideal que os adultos trazem consigo e se esforçam por transmitir
às gerações jovens, nunca será talvez mais fácil apreendlo
quando se assiste à sua transmisso". (1)
do que
Se cada povo tem as suas caracte
En tre os povos primitivos ou naturais, não há, de fato, o que se pode chama
"'educação sistemática', não só por faltarem experiências metódicas, omo também por não
terem êles escrita em que poss am registrá-las, utilizando se dela, em tavor dos jovens, para a sistematização e difusão de conhecimentos. Em conseqüència dêsse fato, isto é, da ine
xistência de uma transmissão organizada de valores de práticas, está sempre em perigo, W. Muhlmann, a própria cultura material dêsses povos, pois, pela perda de
observa técnicos de valor vital para a sociedade, pode a morte de poucos indivíduos conhecimentos ameaçar a economia de uma comunidade in teira.
Speciais necessidades próprias, se a sua econômnica, e religiosa, se social, tura materialpolítica e, comorganização e espiritual, transforma a sua cul ela, a educação, que éa transmissão dessa cul. tura e se processa num de determinado quadro variar em tem de necessàriamente instituições, nos tura e nos seus processos, comn seus conseqüência, ideais, na sua estru os graus diferentes de os diversos tipos de evolução sociale civilização. e
PROBLEMAS E DISCUSSÕES 1. Examinar e discutir as experiências feitas sôbre o animais gregários (abelhas, dos homens para mostrar que,formigas, etc.) e compará-lo ao comportamento dos apesar de suas notáveis social comportamento dentistas especializados no estudo semelhanças, das sociedades animais: observadas pelos a) o dos animais é comportamento pelos seus impulsos interiores, determinado e hercditários, que ou inatos os levam a agir dessa instintos forma, enquanto o dos homens, ou daquela obedecendo a alguns instintos, se baseia prin ipalmente em tendências adquiridas (educação e cultura); b) o que leva, portanto, as e as formigas a em obedecendo a normas fixas, tal abelhas como os homens, é o viverem instintiva, transmitida por hereditariedade biológica e nãoimpulso da conjunto, natureza das por educaço; umas e outras, sem tendências adquiri sem qualquer experiência aprendizagemn, social, passro a viver gregàriamente como seus antepassados; c) ainda entre animais superiores, comno nos grandes símios antropóides, africanos ou oceanianos (o gibão, o gorila, o e o chimpanzé), segundo observações feitas em indivíduos orangotango ou grupos de indivíduos não se constataram capacidades idênticas ou parecidas à linguagem, àcativos, eà técnica de
capaidade organização social; d) como o social, nos homens, devido às particula ridades específicas,comportamento depende mais de tendèncias adquiridas do quesuas de e no inatas, diretrizes dos animais, tudo é obra da hereditariedade e dos instintos (0 que a natureza não deu, não se pode aprender) é lícito concluir que a educação é privilégio exclusivo da espécie humana.
2. A natureza sociológica do fenômeno de educação se depreende dos seguintes Eatos sôbre os quais é preciso refletir e um "fenômeno social" suscetível, como osque nos permitem reconhecer na educação demais, de ser cientificamente e determinar com precisão em que consiste êsse fenômeno em tratado sua essência: a) a coexistência, em cada indivíduo, de dois sêres que não se podem separar senão por abstração: o ser pessoal e o ser social; aquêle, de origem hereditária, formado por todos os estados mentais que se ligam a nós mesmos eaos acontecimentos de nossa vida pessoal; êste, o "ser social", um de idéias, de sentimentos e de hábitos que em nós exprimem, não nossa sistema individua lidade, mas o grupo ou grupos distintos de que fazemos parte (E. Durkheim); b) se a personalidade, considerada em sentido fisico, é um dado origi nário, em sentido social e moral é, porém, algo que precisa ser elaborado,
que representa um conjunto de aquisições relativas ao uso que delas se tenha de fazer no grupo, a que pertence o individuo;
) essas aquisições culturais que constituem o "ser social", realizam-se
por um processo de transmissão (educaço), pelo qual a sociedade, mediante a ação das gerações adultas sóbre as gerações jovens, garante as condições essen
ciais de sua existência contínua;
d)
se o fenômeno de educação que consiste, em sua essência, nessa
transmissão de herança social de uma geração a outra, permanece idêntico em
sua natureza e se dá, em todos os grupos sociais, - variando as formas de
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL estrutura variam em ideais). b) social, os agcntes a) o c os conseqüéncia conteúdo e c) as çõcs pedagógicas, sistemas processos, (valores práicos e formas dessa transnissão 3. escolares). (institui Podem-se
79
distinguir,de 25em uma sociedade, três periodos aproximados e se que se distribuem manciras de pensar, de sentir edeanos em gerações colocam planos agir: a) a diversos, avós; b) a geração geraão descerndente, os mais pelas suas os pais; c) a de 25 anos em que reinante, se distribuem as três geração ascendente, os filhos. Osvelhos, os de períodos periodos gerações (avós, pais e filhos) sociedade paranupcialidade, fecundidade e dos dependem outra. Examinar e procurar mortalidade, nuito de uma variáveis fixar: a) em que proporções coexistem, no interior de uma (a do Brasil, em geral, ou a de S. Paulo ou de sociedade dada três idades ou qualquer outro Estado), essas gerações; b) eas distâncias que separam as três gerações, pelo estudo dos de nupcialidade, fecundidade e mortalidade, periodos S. Paulo. no Brasil, e, em espeialmente, 4. A de transmissão e de valores, de uma transmissão em que consiste representações o geração a outra, da em
educação, em sua essência, e que se faz sempre mediante uma "pressão"fenômeno dos mais velhos sobre os jovens, não se faz sem da "reação'" parte dêstes. Mas se os velhos "atuam" sôbre os moços e êstes "resistern" à ação daqueles: a) a relação entre essa pressão e essa resistência nem sernpre é b) essa relação é variável igual; conforme a "distância social" que separa gerações; as c) as gerações só se podem caracterizar em virtude dessa distância social. isto é, dos traços e caracteres de pensar e de sentir e modos de (maneiras que as separam e as vida) 5. A
transferência choques como
ou
distinguem.
transmissão de representações ou de valores pode fazer-se processar-se maior a "distância social" que separa ascom dificuldades que são tanto miores quanto gerações descendentes das gerações ascendentes e que é a um tempo: a) horizontal, isto é, a distância que as separa no tempo;
sem
pode
b) vertical, ou o grau a que os jovens se elevaram ou julgam se terem elevado acima dos velhos. Mas a tendência dos jovens é procurar acentuar aquilo em que diferem dos velhos; e fazendo ressaltar o que os distingue dèstes, esperam provar que são "notá veis" não só pela distância que os separa de seus como sobretudo pelo ascendentes grau a que se elevaram acima dêstes. Daí c)
P.
a
distância social horizontal,
exagerada e. de bom em distância socialcomplacentemente transmudada "de vertical, J. BENDA, qualidade". ARBOUSSE BASTIDE).
grado,
6. Examinar como os grandes acontecimentos sociais, econômicos, etc., multiplicam o espaço e dobram o tempo existente entre politicos, as gerações, rompendo o equilíbrio entre elas, como por exemplo: a) a guerra européia que, em 4 anos, determinou uma ruptura entre os que fizeram 20 anos, antes da guerra (1914) e os que os fizeram depois, a
partir de 1918 (v. JULIEN BENDA, que analisa, na Revue de
Paris, 15 de
março de 1937, o antagonismo das gerações atuais e, em particular, da que tinha
30 anos em 1900 e da que tem hoje 20 anos).
b) a revolução de 1930 e os fatos que Ihe sucederam e a que deu origem
(1930-1938), que acentuaram as distâncias sociais entre as gerações ascendentes
(a dos jovens, que tinham então 20 anos) e as gerações descendents, de velhos,
mudando radicalmente a ordem de seus ideais.
7. Em tôdas as sociedades coexistem, mas em proporçoes variáveis, velhos, adultos e jovens. Há sociedades de velhos, isto é, em que a influência déstes, pelo
número, é a única ou a maior que se faz sentir (gerontocracia) e h£ sociedades de
a influência doras; estas,que asé sensivel dêstes. Aquelas são em que émaior rias. Observar e sociedades eminentemente conserva dos mostrar, com fatos históricos ae influência moços, dados revolucioná a) como a estatísticos: a geração média eriqueza numérica de uma das gerações (a geração dos a o conflito geração ascendente) acentua a velhos, entre as geraçQcs; distância social, agravando b) o rância de comno numéricoo entre as gerações, com a uma ou desequilíbrio de outra, o fenômeno preponde agravando já acentuando oconflito das gerações, repercute educacional, sôbre dor da educação, já ou conserva o equilíbriocaráter revoluionário entre as formas de estrutura rompendo social. instituições ecolares e as 8. A educação, como vimos, consiste em gerações adultas transmitem às gerações essência no processo pelo qual as e material) do grupo, jovens a herança social para asscgurar a continuidade (cultura espiritual volvimento. Mas essa transmissão das formas de de sua existência e o seu desen experiência social: a) realizando-se, do ser e organizado para o ser (criança e adolescente) não sematuro ainda faz de outras palavras, não é uma simples maneira mecánica, mas viva, imaturo ou por tais quais, as modifica, transmissão: o indivíduo, ao invés de receb&-las refunde ("reconstrução da experiência", J. Dewey), para ao seu patrimônio; incorporá-las b) opera-se, mediante uma "pressão" maior ou menor das gerações adultas sôbre as gerações jovens com o fim de
modelá-las em relação a si ao seu meio social e físico (há, secundàriamente, adaptá-las em con: seqüência, reação das gerações jovens e pressão das gerações adultas): c) processa-se pela ao desenvolvimento das pluralidade das fôrças e instituições que cooperam mesmas e,
sociedades, isto
é, por um
conjunto de influências ou voluntárias e sistemáticas, assistemáticas, pela ação difusa do meio e pela ação organizada (instituições especiais) que são exercidas sôbre oindividuo para assimilá-lo e adaptá-lo ao seu meio social.
inintenionais
e
9. Estudar a evolução dos ideais, dos e das instituições de cducação no Brasil ou tentar um estudo comparativo daprocessos educação contemporânea no Brasil, na Anérica do Norte e na Alemanha, para observar e mostrar: a) como, se há ideais universais e humanos, para os quais tende a
educação, que ora se orienta fortemente para éles ora dêles se desvia, não há uma educação ideal apropriada a tôdas as sociedades, quaisquer que sejamn as
condições de tempo e de lugar; b)
que há de comum entre as fases históricas sucessivas de uma evo
lução eduadonal, insistindo sôbre a continuidade da realidade educacional ou pedagógica;
c) o que há de diferença histórica, ligada às contingèncias temporais e
locais, acentuando as descon tinuidades no processo de evolução educacional,
numa sociedade determinada e as diferenças especificas da educação de um país para outro;
d) como cada povo, em cada época, tem a educaço que lhe éprópria e que é tão ìntimamente ligada àsua estrutura que pode servir para defini-lo,
como a sua organização política, religiosa e moral.
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Capitulo AEDUCAÇÃO, UM PROCESSO SOCIAL GERAL A cducação, um processo social geral. - A pluralidade das fôrças que
concorrem ao movimento das sociedades.
A cultura estudada como um
"todo". - A explicação dos fatos sociais por sua "função", pelas relações reciprocas que tÃm no sistema e pelas relações que tem ésse sistema com o mcio fisico.
A teoria estruturalista (o estudo das instituições, DURKHEIM)
e a tendència funcionalista (MALIN OWSKI). A iniciaço, interpretada como
uma morte e uma renascença. O sentido sociológico dsse mito. Tödas as espécies de meios são encarregadas de "fabricar" o mesmo homem. A
função educacional exercida de maneira difusa pela sociedade no conjunto
de suas förças e instituições.
A educação sistemática dada nas escolas.
A
variedade das instituições encarregadas da educação e a diversidade do funcio namento destas instituiçõcs.
A concepção sociológica da natureza da educação, para quem está habituado a observar a realidade, "impõe-se com a fôrça de uma evi
dência", nas expressões de Fauconnet que, depois de lhes assinalar a
natureza sociológica, procura mostrar, apoiado em Durkheim, em que consistem os fatos educacionais, em sua essncia, ou ao menos quais os indicios pelos quais os recohecemos e se distinguem nitidamente dos outros fenômenos sociais. Em todos os grupos humanos, como vi mos, dá-se o fenômeno da educação pelo qual a sociedade transmite a sua cultura de uma geração a outra e prepara, através da forma ção das gerações jovens, as condições essenciais de sua própria exis tência. Mas, como geralmente, em parte devido ao extraordinário de senvolvimento das instituições escolares, nas sociedades modernas, há certa tendência a identificar erradamente se somente ou sobretudo pela escola se "educação" e "escola", cono realizasse èsse processo de transmissão, éde todo ponto útil tornar bem claro que essa transmis são se processa por uma grande diversidade de meios e se acha per leitamente assegurada antes de se concentrar em formas especificas. Ora, a educação é feita não sòmente pelos institucionais pais e pelos nestres, mas ainda pelos adultos em geral, que cercam as crianças e OS adolescentes (pois são as gerações adultas que exercem ação sobre as gerações jovens), e pelos mais companheiros velhos, já "iniciados" na vida dos adultos; e não sòmente na e familia na escola, mas na greja e na oficina, na casernae no teatro, e por todos os meios de transmissão de idéias e de sugestões, pela palavra, pela imagem e pelo exemplo. No sentido mais geral, segundo a defimiu Dewey, a educa Çit0 é realmente "a soma total de processos por meio dos quaIS uma 7 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 84
comunidade ou um grupo social, pequeno ou grande, transmite seu propÓsitos, com o objetivo de seus e adquirido assegurar sua poder existéncia Contínua e scu desenvolvimento". própria educacionais" nän Assim, pois, quando falamosde em "latos tratamos instituiçocs ou sistemas de concluir sempre que
educação:
pois, como observava Durkheim a respcito da religião, um sistema pe
dacóeico é também um todo de tenömenos cducacionais, c o tod Pe node ser detinido senão depois de Suas partes. Alás, se há uma m
so de manifestações religiosas que não se ligam a nenhuma religiao pròpriamente dita, há também um grande número de manilestacoer
relações e práticas pedagógicas que não cstão integradas em nenl sistema determinado. Épreciso distinguir "latos pedagógicos" e siste. institucionalizados. A criane mas pròpriamente ditos que são tatos expressão como uma simnies conforme diz Durkheim, -e tomada a socie analógia, é "orgão" a desenvolver para um "organismo", afôrcas suas c de dade, que trabalha, pelo complexo de suas instituiçôes c exigéncias da condições às na formação e adaptação do individuo
vida do grupo. A educaço, portanto, éum processo social de que não procuramos ol) é possivel ter uma compreensão bastante nítida se não servá-lo na multiplicidade e diversidade dessas forças e instituições é que concorrem ao desenvolvimento das sociedades. Só por abstração e. sociais que podemos isolá-lo do sistema de relações e instituicões ou uma ainda quando a educação adquire uma forma mais definida estrutura (escola, sistemas escolares), não é possível compreender o sistema pedagógico, senão colocando-o em seu lugar, no conjunto do como uma das ins sistema social em que se organizou e a que scrve, o
cquilibrio e tituições destinadas a assegurar a sua unidade, o scu e, como culiural; desenvoivimento. Todo povo tem seu sistema
seu estudada como um existe uma unidade emn cada cultura, esta deve ser manifes
das "todo", e a educação, parte integrante dêsse todo, uma se destina tações dessa cultura, e uma das mais importantes porque da
compreendida, "fora a preservá-la e a perpetuá-la, não pode ser totalidade cultural de que faz parte", como um fenômeno isolado.
tudo quanto na ordem material A "cultura", segundo resume Samuel Lowrie, é cultura, corrente na antropologia ou espiritual o homem tem produzido. No conceito de conseguiu transformar, partindo homem moderna, está incluído não só quanto o como tamben tue da matéria bruta (ferramentas, máguinas, utensílios, cdificações), as maneiras de (linguagem, coletivo urabalho do que resulta, como produto soial, portanto abrange, pensar e de sentir, as crenças, os ideais comuns. etc.). A cultura
os elementos materiais e espirituais da civilizacão. A cultura compõe-se de lTaç0se ou forna (patter coniplex0s. Uns e outros combinam-se, obedecendo a um padrão é o traço cu cultura de unidade A particular. caracteristica de uma área de cultura
tural. A mesa, o relógio, o prato, o automóvel, a crença em Deus, são, coe em plifica Lowrie, traços culturais do Brasil atual. o número de traços e enotlu outro qualquer parte, diferindo segundo os povos. Três são as caracteristicas do t a odada qualquer ral: l) cada
um dêles tem uma história individual, separada da de do automesma cultura, como se pode ver, por exemplo, no velocimeiro e na roda outro, para móvel; 2) os traços são móveis, istoë. tendem apassar de un lugar Para de que se difundir muitas vézes de modo elementar, desacompanhado da culturaentre si. fazem parte: 3) os traços culturais tendem a aglomerar-se, combinando-se
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expressão de se combinar, deu origem à Essa tendència que tem o traço cultural entre unidos estreitanente traços conjunto de complexo cullural que designa "um recombinan-se combinam-se e culturais complexos si, de acôrdo com um central". Os mais vastos. Mas cono os têrmos traçocone de maneira a fornar complexos ainda considerada ora um traço ora um complexo são relativos, uma coisa pode ser uma vista de quem os encara. Existe entre de plexo cultural, de acôrdo com o ponto tem, caráter, imprime e Ihe unidade em cada cultura: o que lhe dá unidade (culture pattern). O padrão de cultura de padro de os antropologistas, o none forma e o espírito pode ser designado como sendo "amodeladas cultura, segundo Goldenweiser, fase as novas são dessa cultura en que de uma cultura ou de uma tódas as cleciona cultural padrão O aquisições que surgem ou são importadas". podern não os traços que podem e os que possibilidades que terão lugar, indicandoespecifico limitada área uma por estende-se se adotados. Todo padrão de cultura centro cultural, isto é, o território o distinguir a) podem qual se na (área cultural), característicos são mais intensamente ou territórios, dentro dessa árca, em que os traços e b) margem cultural, expressão usados, nas suas formas mais completas ou perfeitas, (zonas culturais periféricas). afastadas mais enpregada para designar as zonas culturais verificável à medida que o observador se nas quais, por um processo de atenuação generalizado e as suas formas menos afasta do centro, o uso dos traços é menos perfeitas.
religiosos, politi Certamente, os fatos educacionais, como os fatosconformidade com
cos, econômicos, etc., devem ser todos tratados em
a sua natureza, isto é, como fatos sociais, e é indispensável, para a pes de um grupo especial de fenômenos, começar por defini-los e quisa isolá-los, uma vez estabelecidos os caracteres pelos quais se distinguem dos outros. O sociólogo pode, sem dúvida, isolar da realidade social um grupo distinto de fatos ou um conjunto coerente de traços da mes
ma natureza (complexo) e "rabalha como se ésse grupo ou sse com plexo social fösse independente do complexo técnico isolado, do outro
lado, pelo etnólogo, ou do complexo da linguagem isolado pelo lin
güista. Mas, observa Durkheim, "quer para descrevè-los, quer para ex plicá-los, épreciso ligá-los a um meio social determinado, a um tipo definido de sociedade e é nos caracteres distintivos dèsse tipo que é preciso buscar as causas do fenomeno considerado". A ciència da edu
cação, como a ciência das religiões, fala o mais geralmente dos pro cessos, das práticas e das instituiÇões como se elas não estivessem liga
das a nenhum sistema social. A antropologia cultural mostra, no en
tanto, à evidència essa conexão intima entre as diferentes mani
festações de cultura de um povo, que não só reagem umas sôbre as outras (ações e reações reciprocas), nas revelam a fòrça de coeso na
resistência oposta à penetração de traços ou complexos que nào se afinam com o padrão de cultura existente no grupo (). Essa ideia,
aliás, de interdependència dos diferentes elementos da vida social é antiga, na sociologia, e é essa mesma noção que Comte procurava esta (1), É de acôrdo com o tipo ou padråo de cultura que se dá a seleáo dos traos culturais'", isto é, um povo não aceita os traços culturais de outro, da uma torma inondi cionada mas selecionando aquðles que constituem em relaçâo aos traços culrurais que ja possui, uma "continuidade' e, portanto, nâo quebram a harmonia do coajunto Assim, nos Estados Unidos ou na Inglaterra onde perdura o individualismo, a implantaao de idáias relativas ao intervencionismo do Estado em matéria social, tem encontrado sempr Nsis tência. Assim, quanto à cultura material. Quando foi in troduzido o avalo entre os fndios
das Planícies, o
"travois", de uso entre åsses Indios, foi man tido e apenas fabricado em
tamanho maior para ser usado com o cavalo; mas quanto à roda, fesào estranha à sua cultura, toi por ôles rejeitada.
FERNANDO DE AZEVEDO 86
que "os fenômenos sociais são belecer quando escrevia um estreito parentesco entre os conexos". Se existe, pois,êles são não sòmente solidários fatos tão dËse versos da vida social; ao ponto de ser compreendidos, se os isolamos, mas, no fundo, não poderem natureza porque são manifestações fenomenos da mesma de realidade a é uma social, nesma realidade que o aldos todo estudo fenômenos no educacionais, a idéia da cance que tem, dêsses solidariedade estreita fatos cocom os outros da relação e
profundamente
diversas comprecnde-se
nos sociais e com as diferentes formas de organização social. fenômePara o sociólogo, como para o historiador, ensinava Durkheim, "os fatos Sociais são função do sistema social de que fazem
parte;
não podemos compreendé-los quando os destacamos dÁe". Por isto mesmos
civilizações diferemn umas das outras em nivel e cm aspectos, e as so ciedades apresentam uma grande variedade de sistemas sociais, eroná
micos, politicos e religiosos, não há, nas diversas civilizações, como oh.
serva justamente M. Mauss, "nem identidade de instituições de edu.
cação nem simetria no funcionamento dessas instituicões"
Ainda nas sociedades civilizadas que apresentam um sistema peda
gógico já estratificado, perfeitamente observável na variedade de suas instituições, nos fins que se propõe realizar e nos seus processos de
ação, as relações e os fatos pedagógicos, extra-cscolares ou extra-ins titucionais, constituem uma rêde complicada, de tecido tão estreito,
e tão distendida pelo conjunto social que não é possivel destacá-la désse conjunto nemn compreendé-la senão mediante o estudo da orga nização social geral. A educação, nessas sociedades, já tomou uma forma mais definida e organizada, às vêzes extremamcnte rica e com
plexa, nos meios especiais (escolas e sistemas) em que se concentrou;
mas, por tôda part, simultâneamente com a ação sistemática da cs
cola, se processa a transmissão culturale se produzem fenômenos de
educação, de maneira constante mas sem sistema, e por uma série de
relações pedagógicas, puras ou derivadas, que se tecen e se destecem
em todos os contatos mais ou menos efêmeros das gerações jovens com as gerações adultas. A realidade social pedagógica que, nas sociedades Prmiuvas, se apresenta em estado difuso por todo o organismo social,
revela-se atual e vivaz, multiforme e ativa, espalhada por todo o Sste ma social ainda nessas sociedades mais evoluídas em que se cristalizou
em instituições de grande solidez e com um longo raio de ação. en se reprovado a Durkheim de haver, na sua concepção estruturalisa insistido tanto sôbre os fatos institucionais que parece ter reduzido a
êstesdefinida: ocampo"ade ciência investigação sociológica. de Parasuaele,genese a sociologia podade ser das instituições, e de seu pesquisa senvolvimento". Mas, se Durkheim aconselhava a a concentrar a políticas, científica as religiosas, (domésticas, etc.), não sôbre era certamente por sociais julgar que fôssem elas os únicos fatos
instituições
mai estudar, mas por oferecerem as instituicões, pelo seu cara mais concreto e estático, o melhor camp0 de investigação. Aexplicação, porém, dos fatos sociais por suas funções e pelas suas correlações,
segundo a tendência "funcionalista" de Malinowski, ninguém a
com
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
87
sociólogo, a quem não eescaparam preendeu melhor do que odasgrande realidades sociais, dinâmicas vivas, de variedade da idéia nem a das instituições, nemn observação, porém muito mais dificil do que atal, e que reside à base
estudar como a noção de um conjunto social aà edificação de uma sociologia como de suas notáveis contribuições ciência positiva. de relações essen entanto, por meio dessa rêde intrincada
É, no pedagógicas derivadas de relações cialmente pedagógicas e de relações social exerce sôbre o indiví meio o todo que pedagógicas, não sociais imagem,
para modelá-lo à sua duo imaturo (criança e adolescente), "êsse esfôrço contínuo para lhe im cssa pressão de todos os instantes, às quais não teria espontâ agir, de e sentir de ver, de maneiras por vital do sistema de orga neamente chegado". A educação, como parte realiza em todos os gTupos so nização coletiva, é um processo que se sua estrutura e o nivel de sua ciais, sejam quais foren as formas de apenas funcionários especiais civilização, e do qual participam, nãoatingiram a maioridade, o con (mestres e professôres), mas todos que dotam verdadeiramente junto das gerações anteriores "que são os que de tudo o que os qualifica como ho os jovens membros da sociedade organização do "ser social" no indiví mens". Éum grande esfôrço de mentalidade dos adul
e duo, de recriação para a sua adaptação à vida social (1). É êste o signi físico e tos, e, em conseqüência, ao seu meio"iniciação", nas sociedades primi ficado profundo das cerimônias de com todo o cuidado tivas: processo de suma importância, efetuado dos adolescentes, dos
pelos velhos, a iniciação é a recepção solenecomunidade dos adultos rapazes e às vêzes também das raparigas na e revela, pondera W. Mühlmann, o enorme interêsse, da parte dêstes,a em "conservar e favorecer o tesouro mais precioso da comunidade: geração nova, garantia da continuidade do grupo". Ser iniciado não é ser libertado de tôda coerção social, segundo a tendência a ver no
fenômeno de iniciaço, pelo qual o menino passa de um grupo a outro, um ato de libertação. Ésimplesmente, observa Smets, ser chamado daí por diante a executar outros ritos, a obedecer a outras prescrições. E quando a iniciação égeralmnente interpretada como uma morte e um renascimento (África Negra, Melanésia, etc.), "o mito corresponde, diz Mauss, a essa maneira pela qual os antigos recriam completamente o homem, não sòmente o dotam de seu oficio e sua inteligència, mas
() A afir mação de que, do ponto dY vista social, a individualidade se constitui nT
meio social, não implica de forma alguma em negação da "pessoa". A individualidade um produto de uma lenta elaboraço psicológica, de fonte simult àneamente individual
6ocial. A sociedade, com tôda a presso sôbre o indivíduo, raranente consegue iazer delY a rigor um produto anônimo. A educaç o, já o dissemos, se implica uma pressao" das gerações antigas, não se realiza sem uma "'reação'" das gerações jovens, reação variavel strando com a natureza individual e com as condições sociais. A experiência protes ta, mostr todo o espirito como umn "eu'', isto é, um ser singular, um querer Lndividual que so atrma e se opõe nais ainda do Marear suas reaçes ao seu ambiente, LEMARIEobedece. como observa O. 6 não descrever senão seu gesto exterior e desconher que ôle é, para si mesmo, um centro e uma espécie de fim. O que òle tem, antes de tudo, a sua vida interior. Ao longo de sua existôncia, adquire, mune-se, enriquecese e se onstról. Tomando-se parcialmente por fim, ôle se busca, se modela e se cria; sua vontade, seus hábitos, seu saber, seu gÕs to, seu ideal, sua consciência, eis as riqueras que acumula fora de si, mas que edifica no seu íntimo; e cada uma delas participa, em certo grau. de sua originalidade tundamental. (Essai sur la personne, BibliothYque de Philosophie Con tempo raine, Félix Alcan, 1936).
FERNANDO DE AZEVEDO 88
também ao mesmo tempo lhe conferem sua virilidade, sua coragem, à maneira pela qual os antigos e os sA ea nova alma, e tambémalma essa depois de a terem provado". gradosÀreconhecem medida, porém, que se complicam os sistemas de organização eleva o grupo na esCala cultural, vai crescen e econômica easedistáncia social proporcionalmente social entre a criança e o adulto e, em
conseqüência, aumentam em complexidade e em importância êsses processos de transmissão de cultura de uma geração a outra. Pode.sse,
pois dizer que o que dá nascimento às instituições e aos sistemas eseo do trabalho social e iares é a dupla pressão que exercem a diviso especialização de funções, de um lado, eo desenvolvimento. em
tidade e qualidade, da riqueza cultural, de outro, que, estendendo a
mais diståncia social entre a criança e o adulto, tendem a tornar das fn. longado o periodo de formação do individuo. Mas a reuni£o
cöes educaionais de uma sociedade, em nmãos de um grupo por mais
numeroso que seja, de profissionais especializados, não chega nunca a absorvê las ainda nos paises em que ela tenha atingido o mais alto grau de concentração. No estudo dos fenômenos educacionais é pre ciso, por isto, têrmos sempre em vista, como uma idéia diretriz de nos
sos trabalhos, ésse sentimento ou essa noção da pluralidade e da va riedade dos agentes, dos meios e das instituiões com que se realiza o processo de educação. Essa diversidade e multiplicidade de fôrças e de meios variam segundo a riqueza de cultura técnica, o giau de civi lização que um povo atingiu, a maior ou menor condensação da massa
social, as fornas politicas que reveste e o grau de concentração das förças governamentais ou polítias. A transmissão escrita, a imprensa,
ocinema e, mais recentemente, o rádio, multiplicaram sucessivamente
e de tal maneira as possibilidades e as perspectivas de ação sobre as
gerações jovens que o Estado, por tôda parte, se sente obrigado, alar gando a sua esfera de ação, a controlar êsses meios para utilizar as suas influências no sentido de uma política educacional com unilade de
direção. Tôdas as espécies de meios, de que dispõemn as sociedades, entre primitivos ecivilizados, são aplicados para assimilar o individuo ou fabricar o mesmo homem para erta época e de uma sociedade
determinada: os "meios" variam e têm efetivamente variado, perma necendo idéntica a "função social" da educação. Esta é uma verdade tão profunda que a observação dos antigos jå a registrara; e, entre os modernos, Montesquieu já notava,
o
lembra Crouzet (Maitres et Parents) "gue recebemos rês educaçoes
ferentes ou contrárias: a de nossos pais. a de nossos mestres
,
"do
mundo". Oque nos dizem na última, derruba tôdas as idéias das P
meiras. 0 objetivo da cooperação entre mestres e pais e de
s
gue se assoCiem e se completem, em vez de se contradizerem, essas tres educações". No entanto, as mais poderosas e vastas associações de pais e mestres, se podem tornar convergentes a acão da escola e da Ta
não poderiam jamais exercer um contrôle eficaz sôbre essa mulipli-
cidade de ações e influéncias que Montesquieu englobou sob a denominaço
de "educação do mundo" (o meio social geral) e que se dis-
SOCIOL0GIA EDUCACIONAL
89
persam na sociedade e escapam a qualquer ingerencia da escola e da
familia. Sòmente o Estado, alargando suas funções, poderá, dentro de certos limites, atingir essas influências, modificandoas ou corrigindo
as, por medidas de contrôle puramente negativas e medidas positivas
de construção. Os trabalhos dos especialistas, aliás tão raros nesse setor do vasto dominio dos estudos sociológicos, se já esclareceram alguns dos problemas que estabclccem as relações das gerações, a função da escola e o papel educativo da familia, estão longe ainda de ter pro
jetado, nesse ciclo imenso e obscuro de relações e influências pedagó gicas dispersas, tôda a luz suficiente. A educação,(sociedades no seu processo evo primitivas. lutivo, passa certamente de uma forma difusa por exemplo) para uma forma mais organizadae individualista, mas
nunca poderá atingir, pelas suas instituições, (educação sistemática)
tão grande amplitude e tão alto grau de condensação que chegue a apagar as múltiplas influéncias das gerações adultas, no seu conjunto. Essa "iléia de um conjunto', ex tremamente fecunda, no estudo dos
lenönenos educacionais, não só nos leva a estabelecer as suas relações Com os outros fenómenos da vida social, como também, dando-nos
uma compreensão mais ampla dsses fatos, nos permite destacar, em cada especie social, a variedade das instituições encarregadas da edu
cação, a diversidade do seu funcionamento e o seu papel no conjunto
dos sistemas doméstico, religioso, politico e econömico. PROBLEMAS E DISCUSSOES
1. A educação, tomada em sentido amplo, éo processo pelo qual as geraçóes adultas transmitem as gerações jovens a sua cultura ou a sua tradição, para arantir a coninuidade do grupo como um todo. Sobrepor uma "natureza social" às naturezas
individuais, modclar as almas ainda jovens "segundo um ideal conum", tal é, nas palavras de Bouglé, o fim que a soiedade prossegue a fim de asegurar a sua exis
tência c o seu desenvolvimento. Mas, para agir sobre os seus membros, a sodedade
se serve:
a) do conjunto das förças e instituições sociais, domésticas politias
cconömias e religiosas, nas quais o individuo é envolvido do berço 20 túmulo
e que exercem söbre le uma ação difusa e assistemáia: b) das escolas e dos sistemas escolares que se organiam para reaizar a
"função especifica" de educar por meio de uma ação fortenente concentrada e sistemática. Observar e comparar uma das sociedades primitivas em que nåo se encontramn
rganizados quaisquer sistemas de elucação c uma das socedades madernas em que èsses sistemas se apresentam altamente evoluidos: aquelas, sem escolas, isto è. sem instituições espeiais, atingem integralmente, pela açáo do conjunto scial, o cbjetivo de fomar o homem para o seu meio e para a sua epoca; nestas, por mas competo que seja o seu aparelhamento educacional, a ação especifia è evercla a um tenpo
pelas escolas (ação sistemática) e por todos os grupos e subgrupos que conpóem a sociedade (ação assistemática). 9
Tôdas as sociedades, primitivas ou cviliadas, tèm o wu istema cuitural"
cin que os Taços e complexos culturais se combinam e recombinam, na rope tiva
área geográlica, edentro de uma torma ou um espuito culture patlern) que marca a unidade de cultura e em que são modeladas as aquisiçoes novas, surgidas no grupo
ou inportadas. A nào ser em raros grupos que, vivendo em iolamento, chegaram a
un alto grau de homogeneidade, observa se constanteuente, devido acs contatos
FERNANDO DE AZEVEDO 90
de eunos. difusão, conflito e intercâmbio de culturas. Uma "culura pura" & u. pesguisa: fic£o como uma " raça pura". Observar, delimitado o campo de a ofenomeno de aculturação (acculturation), isto é, o processo de onflito e acomodação cntre duas ou mais palaVras, valores ou hábitoe
te duas tradicões culturais, duas séries de instituições ou práticas em paises
como oBrasil, em que houve ou háem contato dois ou mais povos c, portanto diversas culturas (1):
)
oconflito ou série de conflitos (lutas internas, ctc) que se Droduess
auando umaidéia nova ou um trao novo não se afina com o "pad£o cçuual existente (como o caso das idéias dcmoráticas no Brasil, no MIéxico e en
outros paiscs, que eram, na justa observação de Samucl Lowrie, "sufic iente:
mente fortes para minar a velha ordem politica, mas demasiado inconsistentes para se tornarem a base etetiva de uma nova ordem política"):
) o papel de agente selecionador que cxerce o padrão cultural (culture
pattern), determinando os traços novos que não podem e os quc poden ser
adotados e que, para Tiarem aizes, precisam 1) achar uma cultura ou unm
complexo a que possam juntar-se, 2) estar mais ou menos de acôrdo com sse complexo culturale com outros que lhe cstejam relacionados, ou. por outras palavras, ser consistente.
3. Se existe uma unidade em cada cultura, que deve ser considerada como um
todo cujas partes estão ajustadas ou tendem a adaptar-se perfeitamente para se manter em equilibrio a cultura de um grup0, a educação de uma sociedade não se pode
considerar fora da totalidade cultural de que faz parte. A articulação ou o cntrosa
mento dos fatos culturais constituem um "sistema interfuncional" que mantém o
equilíbrio interno de tóda a cultura: cada esfera cultural tem sua função especifica,
em razão do "todo". Assim:
a) tocando-se em qualquer ponto da vida cultural de um povo, o choque recebido comunica-se mais ou menos intensamente à estrutura tôda, e, por conseqüênciz, tódas as modificações introduzidas numa esfera cultural repercutem söbre a educação e vice-versa;
b) os múltiplos contatos com povos e culturas diversas, operando mudan
ças nas instituições e nos costumes, determinam desajustamentos e conflitos
que perturbam a ação do educador e, em geral, das gerações adultas (observar seqüncia das modificações de sua estrutura, sob a pressão de fatôres internos ou de influências estranhas);
a ruptura de equi!ibrio dos sistemas escolares, nos povos modernos, em con
) a introdução de modificações no processo educativo de uma tribo Willens, "senão quando acompanhada de uma série de medidas sociais de
de indios ou negros não pode surtir os efeitos desejados, observa justamente
envergadura suscetiveis de paralisar ou compensar os choques produzidos 4. As instituições, segundo as definiu HERTZLER (Social Institutions), são
(problema da catequese e da assimilação dos indios à civilização).
Pieaosas acumulações culturais, processos escolhidos e estandardizados de viver em
Comun, regras de conduta, uniformes entre os membros de um grupo". Ora, se ainda os povos primitivos tém os seus sistemas culturais, às vêzes muito complica dos, ésses sistemas iendem a tornar-se cada vez mais complexOS à medida que se
desenvolve a dvilização e, em conseqüência,
a) os processos de transmissão e perpetuação de cultura de uma geraço
2 outra rescem em dificuldades e importnia
lização e
à medida que progride a d
() O livro Lifte in a Haitian Valley, de MELvILLE L HERSKOVITS, da Northwester Umves17, e um exemplo típico de in vestigacões dessa natureza. ÉSse professor de anuo 1bgia, que ja es téve no Brasil, ng Africa, ngs GuiangS e em Haiti, se tem estudos sobre os africanos na Africa e América e. sob a direcão de FRANZespeciazs BOAS, quECs BODre o negro nos Estados Unidos. No seu sltimo trabglho trata de um povo1ez uaPe da Africa para o "'clima americano, onde pela plantado mil problemas de contlito, adaptação e mescla de culturas"fôrça das circunstncias ses
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
91
b) aumentando sempre em complexidade, vão tornando sempre maior
a distdncia social que separa o adulto iniciado da criança não iniciada (J. O. Hertzler).
5. Quando se observam os fatos tais quais são ou quais foram sempre, salta
aos olhos, como diz DURKHEIM, que
a) tóda acducaço consiste num csfôrço contínuo para impor à criança
e ao adolescente manciras de ver, de sentir e de agir;
b) cssa pressão de todos os instantes que sofre a criança é a presso
mesma do meio social que tende a modelá-la à sua imagem e de que os pais
c mestres não são senão represen tantes e intermediários;
) sendo numerosas e variadas as passagens ern que a sociedade apanha
o individuo, assim numerosos e variados são os processos e meios que ela
cmprega a seu respeito (C. BOUGLÉ), para marcá-lo com seus caracteres e assimilá-lo de acôrdo com os seus valores
ideais.
Examinar cada uma dessas proposições à luz dos resultados de investigacões
sóbre a maneira por que efetivamente se educam as crianças (estudos de casos e
histórias de vidas) e a varicdade de influências a que, da família à escola, estão
sujeitas até à sua formação (cír. VIRIATO CORREIA, Cazuza, História de um menino de colégio, Comp. Editôra Nacional, S. Paulo, 1938).
6. Ainda nas sociedades modernas em que surgiram os sistemas pedagógicos
mais ricos e complexos e apesar da tendência de "concentrar-se" a função educaconal nessas instituições especiais, a sociedade continua a exerc-la de maneira difusa, pelo conjunto das geracões anteriores e por toda a espécie de meios de assimilação. Examinar, por meio de e inquéritos, em uma das sociedades, na de S.
pesqativa
Paulo, por exemplo, a ação
a) da familia, da Igreja e de outras instituições não escolares (culturais, profissionais e rccreativas), que têm um papel preponderante na formação das
gerações jovens;
b) dos meios modernos de transmissão cultural, como o jornal. o
cinema e o rádio;
)
e, finalmente, da escola, o seu papel e o seu lugar no conjunto dessas
fôrças e instituições sociais que, pelas influências que são suscetiveis de exercer, Ihe delimitam o circulo de ação.
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Capitulo VI
A EDUCAÇÃO NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS A mentalidade primitiva.
vida social entre os primitivos.
Primitivos e civilizados. - Os caracteres da
Sociedade de volume restrito e de fraca
densidade. A complexidade de organização social em alguns povos primiivos. A estratificação social segundo a idade. O predomínio dos velhos. P'sicologia social excessivamente estável e conservadora. A transmissão dos valores e dos juizos coletivos. Ausência de educação sistemática. 0 papel da estratificação da sociedade. - As sociedades secretas e os ritos de iniciacão. As suas funções educadoras. A concentração social e a pressão do neio
social "total".
A distância social entre crianças e adultos.
A partiipação
direta na vida social. - Imitação e sugestão. A educação em estado difuso. A educação geral. As cducações espcciais de ordem material e moral.
Embora geralmente reconhecidos os serviços que a etnologia,
entendida como o conhecimento das sociedades primitivas, tenha pres
tado àsociologia pròpriamente dita, e dos quais Bouglé, entre outros,
nos apresenta um balanço, êste ramo da ciência (a sociologia educa cional), ao que me consta, até hoje não havia ainda suficientemente recorrido àetnologia. No entanto, também no estudo dos fatos sociais
pedagógicos, têm um interêsse capital, para osociólogo, as pesquisas
sôbre as instituições primitivas. Na história da educaço (|), os auto
res já entraram a tratar da educação entre os primitivos, começando geralmente, ainda que de modo sumário, por êsses povos, e seguindo
o curso do tempo mais em conformidade com a ordem natural das
coisas, ou, mais raramente, partindo da descrição dos fatos contempo râneos para remontar, pelo método regressivo, etapa por etapa, até às
idades mais recuadas (2). Entre os sociólogos, já Durkheim abordara o
assunto, mostrando o caráter difuso da educação, ao menos na origem, sob o regime da tribo, e Mauss (4nnales, série A, Fasc. I) dedicou al gumas páginas substanciosas à educação e à instrução nas populações primitivas. Mas essa orientação ctnológica, tão úil e fecunda, ainda não penetrara nos trabalhos dos especial istas dêsse novo ramo da ciên cia. Certamente, quando se trata de elucidar as "origens" de um fato
social, há sempre um grande perigo em lhe abordar o estudo por seu periodo de gênese. A embriologia, notava a sse respeito Marc Bloch, (1) PAUL MONROE -
Historia de la Pedagogia, vol I, Cap. I. Educación Primtiva. La
educación como adaptación progressiva. Ediciones de la Lectura. Madrid.
Traducción del ingls
por
Maia de Maeztu.
(2) LEOPOLD WALK - A educação nos povos primitivos, in Geschichte der Paedago gischen Ideen und Einrichtungen in den Grossen Kulturlae ndern, Vol. I, Parte I Die Pae dagogik der nicht christlichen Kulturvoelker, da notável obra Handbuch der Erziehungswissen
achaft, em 25 vols. Herang von Josete Schroeteler. Verlag Jàset Koesel und F. Puster, chen, 1934.
Mün
FERNANDO DE AZEVEDO
94
é uma admirável ciência; mas não tem ela sentido senão uma vez
conhecido antes, ao menos sumàriamente, o ser adulto. Uma institui
ção, como a servido por exemplo, éem primeiro lugar, em sua fase
de pleno desenvolvimento que convémn apanhá-la; "sem o que nos ex poriamos a pesquisar as primícias de coisas que nunca existiram". As
pesquisas sôbre as sociedades primitivas, porém, nos levarão a conce ber melhor a natureza dos fenômenos de educação e as instituicões edu
cacionais sob traços bastante diferentes da imagem à qual podiam con duzir-nos erradamente as investigações reduzidas apenas às sociedades civilizadas.
Este estudo, fundado sôbre o método comparativo, é tanto mais
útil e interessante quanto as sociedades chamadas primitivas ou de tipo
arcaico apresentam, em relação às sociedades civilizadas, profundas di.
ferenças de nível e de aspecto. E, como a sociedades de estrutura diferente correspondem tipos diversos de mentalidade, conforme um
principio da escola de Durkheim, muitas investigações foram feitas
para mostrar até que ponto amentalidade das sociedades "inferiores"
se distingue da nossa e em que medida essas diferenças se explicam por
diferenças de estrutura social. Para Lévy-Brühl (1), essa mentalidade
é radicalmente distinta da nossa; ela lhe épròpriamente irredutível. As funções mentais, nessas sociedades, diferem das nossas, segundo êsse sociólogo, não sòmente em grau, mas por assim dizer em natureza. Elas
são místicas, isto é, refratárias à experiência e à razão; as representa
ções do primitivo, indiferenciadas neste sentido "que as imagens dos objetos não são independentes das emoções que provocam", impiicam uma "associação", a êsses objetos, de poderes misteriosos e de förças ocultas. Além disso, as ligações que unem entre si essas idéias são in
compreensiveis dentro "do princípio de contradição" que domina tóda
a ciÃncia, e se conformam a uma "lei de participação": os objetos, os sêres, os fenômenos podem ser, de uma maneira incompreensível para nós, "ao mesmo tempo êles mesmos e outra coisa que éles mesmos; emi
tem e recebem fôrças, qualidades e ações místicas que se fazem sentir
fora dles sem que cessem de estar neles". A mentalidade primitiva é impermeável à experiência e refratária ao princípio de contradição.
Estabelecendo essa irredutibilidade do pensamento "pré-lógico" das so
ciedades primitivas ao pensamento lógico dos povos civilizados, Lévy
Brühl afirma uma "oposição de natureza" onde não existem senão di
ferenças de graus: nem os primitivos são insensíveis à contradição (Como, por exemplo, nos seus tabus, nas suas interdições, nas antíteses rituais entre o sagrado e o profano) nem lhes são privativas essas ma neiras místicas de pensar que se encontram também nas sociedades civilizadas.
Parece, pois, dificil admitir, observa Smets, "entre a mentalidade primitiva e a nossa, existência de um fôsso intransponível: quando
muito há uma dosagem diferente entre o pensamento simbólico eo pensamento racional. O primitivo que usa de um utensilio procede. (1) L. LÉVY-BRUHL
Alcan, 1910,
Les fonctions mentales des sociétés intérieures, Paris, Fellz
La mentalité primitive, F. Alcan, 1923: L'áme primitive, F. Alcan, 1927
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
95
como nós, segundo as regras que Ihe ditam sua experiència práica e
seu conhecimento empírico das leis naturais. O civilizado que age sob
oimpério de uma grande emoção individual e coletiva apresenta todos
os traços do pensamnento místico ou pré-lógico". £sse problema da men talidade primitiva que tem suscitado numerosas discussões, sobretudo
em tôrno da tese de Lévy-Brühl, se vai esclarecendo à luz dèsses deba
tes (v. H. Bergson, Les deux sources de la Morale et de la Religion)
e de estudos comparativos ão sóentre o primitivo eo civilizado, omo entre a mentalidade infantil e a do primitivo, eentre o pensamento do esquizofrênicoe do primitivo. As relações entre as duas séries serão tantomais evidentes, observa
Henri Wallon, quanto, em vez de incli
narmos por antecipação as duas séries uma para outra, cada objeto fôr mais estritamente estudado por si mesmo. Apoiando-se sôbre uma abun
dante documentação etnográfica. Storch foi o primeiro a assimilar as
núltiplas analogias entre o pensamento do esquizofrénico e o do primi
tivo; e Bursztyn, retomando a questão, acrescentou-Ihe comparações com a mentalidade infantil, tão bem estudada por Piaget e por Wallon que já havia assinalado as analogias entre a criança e o primitivo. Segundo Bursztyn, a criança, o primitivo e o esquizofrênico operam, antes de tudo, por percepções "em bloco" e por ligações intuitivas. O objetivo e o subjetivo acham-se intimamente misturados: o objeto é
visto através da reação afetiva do sujeito. Mas essa forma de pensamen
to se encontra na mentalidade normal e civilizada, ao menos em parte. As representações que se fazem do mundo o primitivo e oesquizofrênico, assemelham-se, em diversos pontos: as coisas não têm, para êles, uma significação fixa e bem definida, mas "variável" em função do estado
aletivo, de tal forma que coisas fundamentalmente diferentes podem
ser objeto de analogias (por causa dos sentimentos que provocam). A diferença essencial entre a esquizofrenia e a mentalidade primitiva é que o mundo do doente não incide sôbre a realidade enquanto o do
primitivo se apóia sôbre a realidade que éle interpreta (1).
Assim como não há "oposição" entre a mentalidade primitiva e a
nossa, mas diferenças de grau, não h£ também oposição enre os carac teres da vida social, entre os primitivos, e os da vida social, entre os civilizados. "As funções sociais, diz Smnets, não são diferentes. De uma
parte e de outra, épreciso assegurar a subsistência da população e a perpetuidade do grupo, sua defesa contra outros grupos: estabelecer
no interior certa unidade e manter certas diferenciações; perpe (1)_ As representações do primitivo, por outras palavras, têm por objeto o mundo am
biente, são permeáveis å ação do real
he sofrem o contrôle, enquanto as representações
do esquizofrênico se recrutam ora do real são impermeáveis à ação do real. "O que faz a armadura do pensamento lógico, pondera com razão Achille Ouy, o grupo na medida em que éste apresenta um caráter coerente e civilizado. O primitivo pertence a um grupo.
O esquizofrënico, por sua atitude mental mórbida, se desintegra de toda vida social. Donde o
absurdo ainda maior que o do primitivo em face do real. Do homem isolado (representado curiosamente pelo esquizofrênico) até o civilizado, pass ando pelo primitivo, achamos caracte Tes comuns, fundamentais, mas também diferenças, conforme a vida social, mais
u menos rica
e mais ou menos evoluída, recobre ou não o "'núcleo" cen tral. Tomamos esta linguagem à
a z e r sentr bem o que isico-quimica; com a condiço de não seh abusar dela, d tornar claro: a identidade do fundo diversas tormas que seu "envólucro soeiglnd fealo revestir Ouanto nais èsse envólucro, por uma razao qual quer, tende a desaparecer tanto mais encontramos um pensamento alógico (ou pré-lógico). imagem". reduzido à sensação, à lembrança,
FERNANDO DE AZEVEDO
96
tuar os usos, transmitir os conhecienos e as crenças, atestar certos
fatos que acarretam conseqüências determinadas". Ainda que emincn
temente conservadoras, as sociedades primitivas não são imóveis nem
de todo refratárias à instauração de novidades, sobretudo em peque
nas coisas; e, se a individualidade, pelas condições de vida e organi zação social, só muito penosamente consegue chegar a desprender-se do
grupo e dèle não se desprende senão por uma seqüència de "reduções", rompendo séries de cadeias, o individuo representa, nessas sociedades, um papel idèntico ao que lhe pertence, entre os civilizados. Ele não éum animal gregário estreitamente ligado àsua horda e de quc se
tem falado às vêzes; e, entre os individuos, constatam-se, lembra Smets,
diferenças de caráter, de aptidões e de influência. No entanto, são tais
os caracteres pelos quais elas se distinguem das nossas que não seria
possível mesmo a um leigo confundir primitivos e civilizados. De
modo geral, afirnmaremos com Smets, "que as sociedades primitivas são sociedades de volume restrito e de fraca densidade; que não possuem
senão uma técnica industrial rudimentar, em relação com neces
sidades pouco numerosas e pouco variadas, e, em conseqüência, é nula
ou pouco marcada a especialização dos ofícios; e que tèm uma estru
tura mais homoginea que a dos civilizados, o que vale dizer que o mes
mo individuo faz parte de um menor número de grupos sociais". Mas,
entre as próprias populações primitivas, é muito variável a complexi
dade de estrutura social, de um povo para outro, havendo alguns que
apresentam uma organização social, rica e diversificada, extremamente
Complexa, ao lado de formas econômicas complexas ou, mes1no em cer
tos casos, de todo primitivas. Os recentes trabalhos de Curt Nimuendaju (1) publicados em American Anth1ro
pologist, revelam a existéncia, entre os Gê, de uma organização social extre
mamente complexa e altamente evoluída. Trata-se dos Ramkókamekra
(Índios
Canclas orientais) (2), que se dividem em duas metades da mesma ordem, matrili neares, não totêmicas, teòricamenie exogánicas (3), e cuja função a regulamentação
do casamento. Uma segunda divisão repousa na distinção entre uma estação séca e uma estação chuvosa; durante esta última, a aldeia é repartida entre os indivíduos Ka e os individuos Átuk. Essa divisão é complicada por uma terceira separação, relativa tão-sòmente aos homens, em metade Este e metade Oeste, da praça central da aldeia. Finalmente o elemento masculino é ainda subdividido em duas classes de idade as quais, durante a estação séca, entram cm competição esportiva. Em suma (e isto é muito importante para os nossos estudos) cada indivíduo pertence
a uma família, uma linha materna, baseada na residéncia matrilocal e na pro
priedade da casa pelas mulheres, a uma metade matrilinear exogânica e a
uma metade de estação chuvosa, esta não exogâmica. Os individuos do sexo mascu
lino pertencem: a um grupo particular estabelecido na praça em certas ocasiões, e pertencentes a uma metade não exogámica da mesma praça; a uma classe de idade,
a uma certa metade de classe de idade, a um clube masculino, etc. O prof. Lévy (1)
CURT NIMUENDAJU and ROBERT H. LOWIE
The dual organizations of the
Ramkókamekra (Canela) of Northern Brazil. American Anthropologist Vol. 39, N.° 4, páqs. S65-582, October-Decenber, 1937. CURT NIMUENDAJU The social Structure of the Ramkó kamekra (Canela). Translated and edited by Robert H. Lowie. American Anthropologist, Vol. 40, N,° 1. January-March, 1938.
(2) Os Rankókanekra ocupam a aldeia do Ponto, nas planícies do Maranhão, cêrca de 78 quilómetros ao sul da vila de Barra do Corda.
(3) Chamase exogamia ("casar fora'' de seu clâ, de sua família ) a regra que obriga
o indivíduo a procurar cônjuge num outro grupo que nâo o seu; ao passo que endog amia exprime a regra nais rara entre os primitivos, en virtude da qual se casa no interior dY sua classe, e implica em geral um sistema de castas restrito.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
97
Ctrauss cncontrou uma organização equivalente nas dos Bororo. en Mato Crosso. que, de um modo geral, e segundo as suastribos observações, igualmente bmctidás a um sistena matrilinear e se dividem em duas netadessãomatrilineares exogámicas, cm duas metades "perpendiculares" de Este a Oeste, em subgrupos ISe com nomes de animais e, enfim, em subgrupos "perpendiculares" de classes
trimoniais. Os BororO quc pertencem a um nivel cultural elevado, aproximam-se.
Dela estrutura de suas aldeias, por sua cultura material e certos aspectos de suas Pnias funerárias, dos Ramkókamekra, que figuram entre os povos mais pri miivos (l).
Entre os caracteres que convém reter, para a compreensão désses tipos de estrutura social e do mecanismo dos processos de transmissão
de cultura, nos povos primitivos, é a estratificação das idades, forte. mente marcada em muitas sociedades de tipo arcaico. Em tÙdas as so ciedades humanas a subordinação dos imaturos aos mais velhos é um fato nomal econstante que varia quanto à natureza (espécie) e quanto ao grau, e se baseia na fraqueza da geração nova ou, por outras pala Vras. na inferioridade biológica do imaturo, de um lado, e, de outro
lado, na autoridade resultante da experiência social de que são depo
sitárias as gerações mais antigas. Mas a pobreza de cultura técnica, as dificuldades da vida, extremamente rude e penosa, o envelhecimento
precoce, o apégo dos mais velhos aos privilégios conquistados e, em conseqüéncia, a sua estabilidade na posição social a que se elevaram,
contribuem para aumentar o predominio dos velhos (gerontocracia)
nas sociedades primitivas. "Técnica pobre, observa Mühlmann, e pos sibilidades restritas de adaptação transferem necessàriamente o centro de gravitação da vida social "para cima", isto é, para as gerações mais velhas". E, sendo a estratificação biológica (classe de idade) uma das
características principais dêsses povos, compreende-se não só, como diz Emilio Willems, que a transição de uma geração a outra seja precedi da Ireqüentemente de cerimônias especiais (séries de iniciação), de na
tureza c duração diversas, como também que, nessas iniciações, para
a admissão progressiva às funções sociais, tenham os velhos um papel da maior importåncia e se manifestem, da maneira mais decisiva, todo
o seu poder e tôda a sua autoridade. A pobreza de técnica industrial,
a homogeneidade dessas sociedades pequenas, de pouca densidade e volume restrito, o predomínio dos velhos (a autoridade, entre os pri
mitivos, tem um caráter essencialmente gerontocrático) e a fôrça quase mecânica da tradição, explicam a psicologia coletiva, excessivamente estável e conservadora, dessas sociedades primitivas, em que parece se
Tem tão raras as rupturas de equilibrio. As sociedades primitivas se
riam, no dizer de Smets, sociedades equilibradas em que o progresso,
como nos mostra a história, "é quase sempre trazido de fora e vem
raramente de dentuo".
Ora, nessas sociedades de tipo primitivo, o elemento pedagógico
acha-se, geralmente, por tal forma ligado e intercalado na sua admi
rável e complicada organização socialcerimonial que é quase imposi (1) C. LEVY- STRAUSS
Contribuição para o estudo da organizayáo sOCia! dos tndios
Bororo, in Revista do Arquivo Municipal, Ano Il, vol. XVIL, págs. 780. sYtembro, S. Paulo. 1936.
FERNANDO DE AZEVEDO e se torna incomprcensível sem um vel separá-lo dclaorganização (1). Atransmissão dos minucioso dessa realiza-se, de maneira difusa, sem um "sistema
e valores conheci juizosment cole-o
cducativo",coorde-pròcducação, os individuos e subordiná-los que eficazmente acaba por assimilar estritamente ao seu educação uma há a rigor tivos de priamente dito, isto é, sem instituições específicas tào mas determinado, sistema num não D2das ou
gTuposocial. Não ausência de uma primitivos. Mas a
sisstemática
entre os povos educação, intencional e da, em meios especiais, é perfeitamente compensada, entre êles,organizaea mentalidade mistica e religiosa, já pelo seu próprio sistemajá pelaEta em que a lei da hierarquia, fixando rigorosamente o indivíduo na sua cdasse, o mantém na dependência constante e ao alcance direto das
gerações antigas. A estratificação biológica, nas sociedades divididas
or idades, as mais das vêzes hierarquizadas entre si, e a estratilicacio social por classes e camadas superpostas desempenham, de fato, um
papel considerável, não só assegurando a solidez social de
manc:
muito eficaz, mas abrindo, na organização social, verdadeiros "centros de preparação", para onde são "canalizadas" as gerações jovens, quase
sempre a dos homens, para a sua assimilação prog1ressiva à comunida
de dos adultos. O indivíduo, apanhado muito cedo pela engrenagem
social, vaise integrando progressivamente no grupo mediante uma série
de iniciações aos graus e às funções sucessivas da sociedade: a passagem
de uma dasse de idade a uma outra, longe de significar, como vimos, uma libertação do individuo, indica antes o seu acesso a uma nova
situação social e a sua submissão, em conseqüència, a novas prescrições e a novos ritos. Quanto mais observamos as sociedades primitivas, mais importante nos parece no só a iníluência da hierarquia sôbre as for (peneiramen mas de educação, mas o seu papel na formação e seleção por estratificação to) dos jovens, papel ésse fàcilmente verificável na
séries de "inicia Idades enas relações constantes que existem entre as
çöes" eas idades hierarquizadas.
vulgarmente chamadas Canelas, Opovo Timbira, ao qual pertencem as tribos precisamente neste ponto, de é, admiràvelmente estudadas por Curt Nimuendaju segundo as informações dêsse Timbira, os entre fato, de um interésse espeial. Existe, de funcões sociais de uma regulamnentada etnólogo, uma sequéncia sistemática e que o individuo novo siga estritamente as geraça0 2 outra. Tudo contribui para - os Timbira são matrilineoS, ligam-se à Pegadas dos seus antepassados. As funcoes passam, - do tio materno para o sobrinho. Uma grande parte dessas fungões
a saber: Serie de nomes que o tio sucessivamente passa ao sobrinho,
(1) Essa interpenetração do elemento
é real.
funções sociais quando pedagógico e das outras vai nais longe primitivo. Franz Boas nas civilizações
mente um dos traços das sociedades de tipo Folklore, atividades mentais'" Lota a "cuséncia de tôda a diíeren ciação entre as culture in Journal of American religiosos se primitive sentimentos prumitivas'". (Ct. F. BOAS morais, por Some traits of os noções 1904, XVII, págs. 243-255 ). £le indica sucessivamente Como ali com as associação íntima de cOstume, confundem aqui corm as noções concernentes ao Essa e social, 16da c parte com o próprio cOstune, quase sempre com a arte.fenômeno rreligiosoidéias, no no fundamental de uma nassa de funções sociais lhe aparece limiprópria heterogeneidade das associações por
Embora tenha Marcel amorfismo social. conclusões, julga de observvações essas muitas so provas en que se apóiam é fecundo'". As outras Mauss que "a discussão é fertil em idéias e o princípio em muitas Þoas parecem-ne, no entanto, confirmadas pelas pesquisas ulteriores mais primitivo,
o totemnismo. A
désse Primitivo, proviria dessa homogeneidade, 1adas e insuficien tes das
ciedades "primitivas'"
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
99
1) a qualificação num dos dois partidos (Kámakra e Atúkmakra) en que se divide a tribo durante a estação das chuvas; 2) a qualificação num dos 2x3 "grupos do pátio" (Menkacá): 3) a qualificação em duas das 5 sociedades de festa: Gaviõcs e Onças ou
Gaviões e Kokrit (que usam máscaras) ou Marrecos e Cutias;
4) a rclação de solidariedade e respeito (Hapin) com os portadores de
certas outras séries dc nomes.
As iniciações dos guerreiros novOs estendem-se por um período de mais ou
menos 10 anos, começando na idade de cêrca de 10 anos e aabando aos 20 apro
vimadamente. Consistem em 2x2 cerimónias principais, cada uma com imna reclusão
de 3 a 4 meses e um complicadíssimo cerimonial. A primeira fase (Ketuavé) tem por fim pôr os meninos em contato com as almas dos antepassados. ligando assim o futuro da tribo ao passado. A segunda (Pepyé) visa espeialmente o desenvolvimento
fisico, Durante esta rcclusão do Pepyé os mocos recebem tanbém severas licões de
moral c de comportamento. Todos os que juntos concluíram um iclo de iniiacões
formam, para o resto de sua vida, uma Classe de Idade organizada: e essas organia
cõcs constituem as mais coesas e poderosas da tribo. Os comandantes e instrutores
dessas classes são as únicas pessoas que exercemn um verdadeiro mando na tribo. O
sentimento de camaradagem, altamente desenvolvido. pode ser reforçado ainda pela
relação de amizade (KwunQ) formada por pessoas da mesma classe por ocasião do encerramento da última reclusão do Pepvé. Essa relação é muito diferente da de
solidaricdade c respcito transmitida pelo nome. A amiade vai às vêzes ao ponto de
dois Kwuno trocarem entre si as suas mulheres. As quatro classes de idade mais novas
são as esportivamente ativas e têm, cada uma, o seu lugar (como qualquer outra organização) no pátio da aldeia (que é de forma circular). duas do lado do Nas
cente, e duas do lado do Poente. Ös sobreviventes das classes mais antigas. esporti vamente inativas, formam o senado, que tem o seu lugar no meio do påtio. Asubsti
tuição das classes dá-se automaticamente pela formação de uma nova classe que co
meça assim que a classe mais nova acaba o seu ciclo de iniciacões. Estas 2 x2 casses de
idade, esportivamente ativas, formam os dois partidos para os esportes do tempo de
verão (da cada colheita do milho à passagem pleiade)(Vuté) que éque a época festas Reúne-se partido na casa de certada moça tem das un grandes papei impor tante no cerimonial. Os meninos pequenos que ainda não começaram o seu ciclo de
iniciações, reúnem-se numa classe não-oficial, tomam um adulto por instrutor e
imitam com seriedade e conviccão as funções e o cerimonial dos maiores.
Entre os primitivos, como se vê, os homens constituem geralmente uma sociedade à parte, politica, militar, religiosa (divião por sexo):
e nessas "sociedades dos homens", divididas por idades (classes de idade) e às vèzes, ao mesmo tempo, por gerações, formam-se, quando elas mesmas não constituem, sociedades secretas". Essas sociedades se cretas, assim chamadas embora os rituais sejam conhecidos de todos, a) constituem categorias, repousando não sôbre o parentesco, mas
a idade; b) nas quais se entra depois de tòda uma série de ritos de sôbre inicia são, e c) das quais não podem fazer parte seno individuos do mesmo sexo, homens geralmente (separação por sexos). Elas são particularmente Ireqüentes na Melanésia e existentes em ouras partes do mundo, como na Africa Negra, em que se encontram também sociedades secretas de mulheres. Nessas associações que se mantèm em relação estreita con a instituição do clube ou casa dos homens em (habitação que todos os homens iniciados vivem, comem e domem), os membros formam um corpo hierarquizado (estratificação da associação constituida em uma espécie de hierarquia) e composto de diversos graus a que se atinge por uma "iniciação", cada vez mais complexa à mnedida que se eleva 8 Sociologia Educacion al
100
FERNANDO DE AZEVEDO
observa em grau. Essas associações, como
Métraux, "constitucm,
pois, um sistema muito complicado; e às suas diversas vem ainda acrescentar-se a sua ação educadora. Com efeito, a iniciação se além do ensino do folclore tribal, da aprendizagem de um ofício
atividades
de uma arte. Enfim, as provas de coragem e de resistència
nham um papel considerável nos ritos de
iniciação (l). As
compõe,
Ou
desempeiniciações,
quase sempre impregnadas do clemento religioso., marcam, COmo se vÁ. as diversas lases do processo de educação; e o seu educativo, tão accntuado nas cerimônias e atividades, vigílias ecaráter privações, de
gue se compõe, destaca-se, de maneira altamente expressiva, não sí
da presença freqüente de uma interpretação simbólica dos ritos i
ciatórios, figurando uma morte e uma ressurreição, como da relacão es.
treita do deus que preside às cerinmônias, com os antepassados e os heróis civilizadores. O deus que preside à iniciação, , ele mesnmo, um herói civilizador e formador, e o rugido dêsse curioso instrumento bull-roarer (rombo) que é um dos traços essenciais dessas cerimonias. deve representar a sua voz para os não-iniciados".
Mas, por maior que seja a ação educadora das sociedades secretas,
sobretudo pelas cerimönias de iniciação que constituem, nas expressões
de Mühlmann, um "processo de peneiramento social", a transmissão e
educação consciente realizam-se, nas comunidades primitivas, por uma extrema variedade de meios e pela ação conjunta das gerações adul.
tas (2). Na educação das crianças e adolescentes de uma tribo de índios,.
todas as especies de recursos e processos, (iniciações, cerimônias, ritos
religiosos, danças e encenações mágicas, com fins educativos, etc.) con correm para formar o tipo de homem que convém e integrar o indi (1), Entre os negros Babali, do Congo, a cerimônia da iniciação (Mambela), que se
des tina c ntegração dos jovens na vida e nos costumes da tribo, tem estreita relação com os antepasscdos. Agita-se nela, descreve Mühlmann, um pau zunidor destinado a re produzit a voz do amces tral (Maduali) que preside àiniciação. A flagelação com vara
(como paa significT, provavelmen te, a morte) e a imposição de uma nova tanga e a unçáo compreendense como ritos de renovação. O ser antigo, o menino, morre, nascendo agora um ser novo, o homem. Os velhos que, na Mambela, sacrificam simbòlicamente o Een ino, realizan c transição para a sua própria geração, mantendo, contíinua e viva, com
" ingresso dos jovens assim iniciados, a comunidade dos adultos.
(2) Nas sociedades primitivas, como nas civilizadas, observa-se o mesmo esfôrço,grupo mais E Por éste processo constante de transmissão dos valores culturais, de uma a outra geração, e. poriarn to, de integração das gerações jovens na vida dos adultos, que se asseguram, como Timos, a unidade e a continuidade do grupo como tal. Mas, enquanto, nas sociedades cvlizsis, ésse processo visa de preierên cia a educação física, intelectual e moral do ou menos refletido, de se transmitir às novas gerações o patrimônio cultural do
GGolescer. ie, - acentuando éssee aoutransmissão aquêle tipodedeconhecimentos educação, contorme os padrões culturais e habilidades profissionais, nas socedades primitavas, como justamente observa Egon Schaden, "ao mesmo tempo que se tanazmiem os valores moras e religiosos e os padrões de comportamento peculiaresa culturc tribal". proc°ase "'munir o jovem de faculdades mágicas, destinadas a proporcio na-he maiot facilidade e segurança na satisfação das necessidades e protegeos e as tendéncias do grupo,
maor eficácia Contra as influências maléficas dos inimigos e dos maus espiritoS q Gmeaçam cotstan tenen te de todos os lados'". £sse papel da magia nos ritos de
ou essa larga cpicagão dos recursos mágicos, ng educação moral e religiosa, cuja feiçao Partieular corresponde d mentalhdadeKurtmística do primitivo, EgonOs Schaden, Das observações de Koch-Grunberg, Nimuendaju, Preussestuda e outros. vários rhtoapoigo
integram as cerimônias de iniciação, como reclusão, jejum, torturas, etc., "visam
dsti.
transtormaçáo do imaturo em individuo adulto'" e Bão outros tantos recursos mágicos "deste sCHDBarando-o para nados, por sua vez, a in ter.sificar as faculdades mágicas do (ZGON indivíduo,
a vida serual, como paa os mis teres da caça e da guerra". ( e magia nas cerimónias de iniciaçáo. S. Paulo,
1944).
Educação
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
101
educação, víduo no grupo. De fato, escreve Mauss, "ensino, instrução, conhe tal de sugestão, autoridade, forçando ou reservando a aquisição tudo isto cimento, de tal "mancira", de tal ou qual maneira de fazer,
funciona simultâneamente e tanbém emn sinconia com a imitação es pontánea dos gestos de eficácia fisica e com o jogo que consiste em que se rcalizar ocupaçõcs sérias ou artisticas". A concentração social restrito, favo processa nas sociedades mais homogêneas e de volume jovens pos rece umna presso do meio social "total" sôbre os indivíduos mais velhas, e suscetíveis, tos em contato permanente com as gerações à vida em comum, às por isto, de, pela imitação, se irem amoldando A unidade da edu vêzes mnesmo sem interferência direta dos adultos.
intencional do que cação éassim oefeito, menos de uma coordenaçãorituais e de tòdas as da convergência, para o mesmo fim, de todos os a enqua atividades sociais ou pròpriamente educativas, que tendern semelhan drar o indivíduo na coletividade e a desenvolver qualidades das crian tes às dos outros individuos do grupo. A participação direta variedade de grande ças na vida dos adultos e a ação dêstes, por uma
constantes e in meios, sôbre as gerações jovens, são de tal ordem, tão (crianças tensas, que se atenua a distância social entre as duas gerações e adultos), e o indivíduo se identifica tão completamente com a sua
que seja a sua situação, tribo que, nas expressões de Monteil, "qualquer é ela que existe e comunidade: da membro êle não vale senão como vive, le
não existe nem vive senão por ela e, em grande parte, para
ela" (1).
A participação direta na vida social começa, mesmo antes dos im 7 anos, nesse periodo (3 a 7 anos) em que muitas vèzes os meninos feminina, são púberes, pela suposição de terem uma natureza ainda relegados à sociedade das mulheres, mas em que as crianças, de um c outro sexo, já prestam serviços úteis como pequenas unidades eco nômicas. A iniciação precoce no trabalho, sob a pressão das necessi dades vitais da comunidade, que levam as crianças a participar desde cedo da procura de alimentos e assistir a seus pais en seus misteres,
não deixa de contribuir poderosamente para a "asimilação" das gera
ções jovens e sua integração na vida do grup0. A atividade predomi nante, nessa idade, é, para um e outro sexo, a atividade dos jogos que "mimetizam" as ocupações sérias ou, por ouras palavras, não passam de uma imitação do trabalho dos adultos. O papel da imita ção e dos jogos tem uma importância considerável na educação enue
os povos primitivos. As crianças coneçam, imitando, e aprendem, brin
cando, o que fazem os pais e os adultos em geral: e, fabricando flechas
e arcos, ou, se se trata de mulheres, fusos e peneiras, apropriados no ta manho à sua idade, praticamn, com essas armas e utensilios, como observa
Herbert Baldus söbre a tribo tapirapé, todas as atividades de caça. pesca e
outras, que constituem as ocupaçöes dominantes dos homens e das nu (1) CH. MONTEIL cesa), pág. 220.
Les Bambara du Segou et du Kaurtu (da Atica
Qeidental Fran
FERNANDO DE AZEVEIDO
102
lheres (1 ). Sob o regime da tribo, a educação tem, pois, certamente, Por caráter essencial de ser difusa, isto , de ser dada indistintamente atodos os membros do grupo não em meios especiais ou por
funcionários espesociedades os individuos que atingiram a maioridade, pelo junto das gerações que desempenham êsse papel. No entanto, tambconciais, em cujas mas por todos
mâos tende a concentrar-se nas
civilizadas,
nessas tribos, percebe-se, opondo-se à consciência difusa da oninit pública e àação coletiva, um estôrço de consciência educacional clo
que se manifesta e se traduz pela transmissão constante, consciente
intencionalmente organizada, como por exemplo nas cerimonias de ini ciação nas sociedades secretas, nos santuários do bosque ("escol:a" dos mganga, no Baixo Congo francès e belga) e em certas corporaçõcs de
oficios, em que, em algumas comunidades primitivas, os aprendizes
devem igualmente passar por um periodo de iniciação (2). Além das educações especiais de ordem material e moral, minis.
tradas na série de periodos de iniciação em que os jovens são subme
tidos a uma preparação intensiva, tem às vèzes grande importância educativa eum interese particular a formação de profissionais espe
cializados, nas corporações de oficios, em certas sociedades de tipo pri
mitivo. "Ograu de especialização profissional, observa Métraux, varia consideràvelmente de uma sociedade a outra. É naturalmente nas so ciedades primitivas que a divisão do trabalho é menos narcada; en
contram-se, no entanto, individuos mais hábeis em suas mãos do que outros. Os próprios fueguinos recorrem a especialistas para darem a
suas pontas de flechas a última demão. As sociedades mais complexas
apresentam uma especialização mais avançada e certos artesõcs formam
corporações análogas aos "trade-unions". Em tôda a Polinésia, os cons trutores de barcos formavam uma classe privilegiada, altamente respei
tada dos patricios que os empregavam. Os pedeiros, os tatuadores, os
escultores, etc. constituíam igualmente espécies de ghildes". Esses ofí
cios que, em geral, são de caráer hereditário e podem tambénn cor responder a uma posição determinada na escala social, transmitem-se, nas associações profissionais, de pais a filhos, ou, em outros casos, me
diante uma espécie de aprendizagem ou de iniciação a que são sub (1) As atividades de jogos variam extraordinàriamente, de uma sociedade para outra,
em corTespondência com a sua cultura material. O jôgo ou esporte nacional dos Timbira,
por ezempio. é a corrida de toras, que não tem relações, como se presumia, com o casa
mento e éefetuada, sob formas divers as, por duas "eguipes' ou turmas (corno o futebol).
Alem da corrida de toras, praticam corridas de estafeta'mimetizar'" e de pares e diversos jogos de a vida dos adultos, os brinquedos e instrumentos para ésses jogos reproduzem, em miniatura, a civilização ma terial de uma socedade determinada. Mas as atividades lúdicas e o material nelas empre ffechas. Como grande número de jogos se destin am a
gado não só exprimem a civilização material, em uma dada sociedade e época (examine-so uma loja de brinquedos, em S. Paulo, constítuída de pequeninos automóveis, derOi trens de ferrO, etc.), com0 também podem precorrer um tipo determinado, de civilização
(a polvora, China; uscda como inventada brinquedo,naetc.).
a måquina avapor, descoberta pelos gregos, mas sòmente
(2) Em geral, esceve Mauss, "a transmissão se faz antes por via oral e manua! a
gçe pela lógica. Será preciso observar a qutoridade dos instrutores, a idade, as recepu vidades, os talen tos dos "discípulos". A palavra, para designar êste estado, encoám
na nas línguas dos Algonquins. Essa autoridade marca-se tambem pelo linguas caráter poinésicas secreto das cono artes, das belas artes e dos
conhecimen tos".
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
103
metidos os principiantes (1). Às vézcs, como observa ainda Métraux, chegam a constituir classes sociais profissionais, nitidamente diferen
ciadas, "em que, se não há obrigação de casar no seu próprio grupo (endogamia), se nota, contudo, certa tendência nesse sentido, devi do quer à existência em comum quer ao temor de ver divulgados os segredos de ofício". PROBLEMAS E
DISCUSSÕES
psicólogos, sociólogos 1. O problema da mentalidade primitiva tem prcocupado partindo da observação de que a sociedades e, cntre êstes, sobretudo Lévy-Bruhl que, tipos diferentes de mentalidade, procurou corresponden de estruturas diferentes irredutivel entre a mentalidade primitiva e a e radical distinção estabclecer mentalidade uma civilizada. A mentalidade primitiva seria, a seu juízo, inpermeável à
experiênia c refratária ao princípio de contradição (pensamento mistico ou pré-lógico). Examinar e discutir:
a) a oposição estabelecida por LÉVY- BRUHL (La Mentalité primitive, 1922; L'£me primitive, 1927) entre a mnentalidade prinitiva e a mentalidade
civilizada, e as razões que se podem levantar a essa tese e tendentes a demons trar que entre as duas mentalidades há antes uma diferença de grau do que
uma oposição de naturcza; b) a explicação psicanalítica da mentalidade dos selvagens
(S. FREUD):
c) as relações entre a mentalidade primitiva e a da criança estudadas por HENRI WÁLLON (La Mentalité primitive et celle de l'enfant, in Revue
Philosophique, 1927; 1928, págs. 101-105):
d) as múliplas analogias (de forma e de conteúdo) entre o pensamento
do esquizofrênico e o do primitivo, pelo estudo das formas que revestem os p
Peisetos dos caracteres
esuzoreniCo e primitivo, do conteúdo dèsses pensamentos e das duas mentalidades em questão (`TORCH. Das
archaisch-primitive Erleben und Denken des Schizofrenen, Springen. Berlim.
1922; A. OUY, Esquisse d'une sychologie à trois dimensions, 1926; P. J
BURSZTYN, Schizophrenie et mentalit
primitive, Paris, Jouve et Cie. 1933)
2. A distinção entre primitivos e civilizados é bastante nitida para não ser percebida pelo próprio senso comum: "èle não confundirá nunca primitivos e ivili
zados". As sociedades primitivas que apresentam entre si grandes iferenças de nivel e diferenças de aspectos, diferem das sociedades civilizadas pelos seguintes aracteres distintivos que convém examinar e discutir com os dados recolhidos pelo estudo
comparativo.a)Emsãogeral, pode-se dizer com Smets que as sociedades primitivas: sociedades de volume restrito e de fraa densidade:
b) não possuem senão uma técnica industrial elementar (pobrera de
recursos técnicos) em relação com as necessidades pouco numerosas e pOuco variadas;
c) não apresentam, na atividade econòmica, nenhuma especialiação de oficios e, quando a apresentam, épouco variada: (1)
Nestes casos em que os ofícios são de
hereditário á que a própra cul tura material fica permanentemente aneaçada de caráter ou, pelo mecos, de udngs involuntárias e às vêzes profundas'", como lembraexterminio E. WILLEMS. de W. MUHLMANN (Rassen und apoiad nas obaarvas pág. 267. Voelkerkunde,
Braunschweig. 1936 ). Pois, se por exemplo, escreve Mühlmann, "numa ilha australlana, se extinguiu, pela mocte, uma família, a única que conhecia a arte de construir mar, desparece, nessa sociedade, a construção de embarCuções para a navegaçáo em alto brcos. Mas ndo apencs sto que acabou. Pols todo o elemento cultural está mais tais ou menos intimamen te liqad outros elementos culturais. Se acaba a construção de barcos, já no se pode prattcur, em conse qüência, a pesca em alto mar. Não se realizam igualmen te viggens às ilhas viinhas. Assim desaparecem o comercio e as comnunicaçÖes com os de outras lhs, bem como a permuta de elementos culturais, e deixam da existir,habitantes entim, os astimulos de um ho cultural mais amplo. Em uma palavra, a em tôda a sua onseqüåncia daquele tato um retrocasso
extensâo.
FERNANDO DE AZEVEDO
104
d) iem uma estrutura mais homogênea que a dos civilizados quer dizer que o mesmo individuo faz parte de um número menor de e.e sociais; e) não dispõem, em geral, senão da transmissão oral (ausência de
escrita).
tradição
S Aestratificação biológica ou das idades, de suma importância na cducacão
é uma das caracteristicas dos povos de cultura pobre, como são os primnitivos. As
tribos primitivas são, por assim dizer, estratificadas pelas diferenças de sCxO. de i
ou de status matrimonial. Apassagem de uma clase de idade a outra, imediatamente superior, nåo se faz senão mediante condições ou "iniciações" determinadas. Adureza
de vida, o caráter rudimentar da técnica e a velhice prematura levam os homee
que atingiram a uma clevada posição social. a defender a todo o transe os privilégios
conquistados. Examinar o papcl que desempenha a idade, na sociedade primitiva. e as conseqüências da estratificaão por idade, a saber: c) o predomínio soial dos mais velhos (gerontocracia) e o respeito pelos
pais e pela geração velha, em geral;
b) ainfluência enorme dos velhos na cducação dos jovens (ninguém e oporia àpalavra dos velhos), e o poder e a autoridade de que gozam,
aparecem de maneira mais convincente, nas iniciações, para a admissão gradual dos adolescentes àvida dos adultos (W. MUHLMÁNN): c) a oposição maior às novidades, que Lévy-Bruhl mostrou ser tão pode. rosa nas sociedades primitivas: a instauração do "novo" não se faz fàcilmente
senão nas coisas medíocTes, tornando-se "a revola um fato raro":
d) uma vida infantil prolongada, embora com certa precocidade no trabalho, mas um trabalho pouco forçado: o menino e, sobretudo, a menina
torna-se depressa uma pequena unidade econômica.
4. As investigações dos etnólogos sôbre as sociedades primitivas revclam-nos que, se elas são, de modo geral, tcrrivelmente rotineiras, estáveis e conservadoras, não se pode afirmar que sejam refratárias ao movimento e a tôda renovação. Examinar
e expliar, com exemplos das sociedades ditas primitivas, as seguintes proposições de
Maunier:
a) nessas sodedades a "conservação" prima sóbre a transformação, c o
desejo profundo das sociedades éde se conservarem e de se confirmarem no
lugar e no tempo, de manterem e protegerem os costumes estabelecidos;
b) se oestado estacionário é, pois, a regra nas sociedades primitivas,
há também sodedades progressivas que formam a exceção;
) ainda entre os povos bárbaros, e mesmo nos grupos mais bem inte
grados, uma "oposição" existe e se agita (existência de refratários, segundo a expressão de Blondel): d) verificam-se, também, nessas sociedades modificações resultantes de
empréstimos culturais e introduzidas por inovadores isolados ou ainda impostas
por chefes mais ou menos clarividentes (v. inquérito de A. VIERKANDT, que fornece um repertório de personalidades "influentes" em tôda a espécie de
populaçóes bárbaras).
5. Em tôdas as sociedades, desde as extremamente rudimentares às mais evoluí
das, dá-se ofenomeno da educação, isto ¬, da formação das gerações novas e de sua
adaptação àvida soial. As funções sociais são as mesmas entre os civilizados e os
primitivos, e éstes t¿m, como aquêles, a necessidade de manter a unidade e a con tinuidade do grupo, de perpetuar os usos e de transmitir os conhecimentos e as Tenças. De modo geral, pode-se dizer, em face dos numerosos estudos sôbre essas
sociedades,
a) que não h£ educação sistemática ou organizada entre os povOs pri mitivos, isto ¬, funionários espeiais incumbidos de formar o homem ea
mulher em um meio todo especial: a escola (que jå aparece, como instituião
autónoma, dirigida pelos sacerdotes e com finalidades eclesiásticas, entre os Incas e os Astecas):
b) que, para certas educações, segundo observa Maus, são, no entanto, determinados lugares e tempos: como, por exemplo, para os lugares, a casa dos
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
105
homens (Guiana, Melanésia), santuários de bosque ou em bosques sagrados
(Africa do Norte); e, quanto ao tempo, a época da puberdade, e a série de
iniciações aos graus e as funções sucessivas da sociedade dos homens.
Ora, qual a cxplicação da auséncia, entre os povos primitivos, de uma educação
sistemática por que ou como a falta de um sistema de transmissão, entre os primitivos, constituía às vézcs una amcaça para a sua própria cultura técnica? na casa dos homens, nas sociedades secretas e nos santuários em que funcionam. em certos povos,
sistemas organizados de cducação não se poden buscar as origens obscuras da ecola,
como instituição social? 6. Embora não haja pròpriamente uma "educação organizada", nas sociedades primitivas, a ausência, em algumas tribos, ou o cocficiente quase nu lo de desajustados
demonstra que êsses povos têm mcios que Ihes sáo próprios, para educar, e conseguen formar o "tipo de honem", de acôrdo com as necessidades e os ideais do grupo.
A transnissão de lendas, crenças. práicas e preceitos, é. entre éles, perfeitamente
assegurada. Mas como se processa a transmissão cultural pela qual se assegura a "perpetuidade do todo"? a) pela pressão do meio social "total" que, sendo de volume restrito e de estrutura mais homogênea, exerce sòbre cada individuo uma ação poderosa
pela förça das leis e dos costumes e pelo conjunto de pressies, ritos e obriga
çõcs que tendem a orientar a conduta do indivíduo:
b) pelo poder ou pela föra quase mecânica da tradição (moral. direito,
religião), cuja transmiss£o dos antigos aos jovens, dos chefes aos homens, é
extraordinàriamente failitada pela enorme autoridade dos velhos (geror tocracia),;
)
pela convivncia
íntima e constan te de indivíduos de idade e sexo
diferentes, que favorece a transmissão pela linguagem oral, pelos gestos e pelos
atos manuais, de todo o tesouro de experiência acumulado pelas gerações anteriores;
d) pela partiipação direta, edesde muito cedo. na vida social. das
rianças de um e outro sexo que aprendem, brincando. pelas atividades de jogos (jogos, sobretudo, que "mimetizam" as ocupações sérias). e cujas atividades
precoces, (1) imitando os pais e os adultos, em geral. desenvolvem o hábito do
trabalho e contribuem para integrá-las na vida da comunidade: e) e por tôda a espécie de meios variáveis de umn povo para outro, e
que vãodesde os grupos de idades, as danças e cerimônias. a série de "iniciações
aos graus e às funções da sociedade, com suas provas e reclusões, até às socie
dades secretas e às sociedades de mágicos, em que è completada, em alguns
povos primitivos, a instrução juridica e religiosa. 7. Na educação, entre os indigenas, observa Mauss, "coexistem e se recortam
duas divisões fundamentais: por sexo e por idade. A diversidade das educações por sexo como a divisão por idades são muito marcadas nos povos primitivos. Embora
seja certo que a educação e a iniciação dos meninos funcionem, na África Negra, fora
da familia, as meninas em geral ficam no seu meio. Para os meninos que såo separados de sua familia, instala-se, nuitas vèzes bem antes da puberdade, uma nova época de educaço que tem por fim as educações espeiais e que consiste: a) na "fosterage" que designa a instituição pela qual o menino é
arrebatado aos pais, educado depois, retomado. guardado, utiliado e submetido
entre seus parentes uterinos, com o tio uterino que é de direito o futuro cunhado;
b) na iniciação que consiste numa série de periodos dos quais um é.
ao menos geralmente, muito longo, em que os meninos såo separados, iolados em santuários, e submetidos a uma educação intensiva de que fazem parte durissimas provas (a circunisão, por exemplo):
) na educação intensiva que é dada no periodo da inicação e com a
qual se põe tèrmo à transmissåo' das artes (cducação estética). dos oticios ou
, )BOAS), v RedHarcourt, Jungle Brace Boy. written and illustrated by ELZABETH K. STEEN (Pretaio de FRANZ and Company, New York, 1937.
FERNANDO DE AZEVEDO
106
das técnicas manuais e das tradições morais, religiosas c ténico-científicas:
"fosterage" c a iniiação chegam a mudar-lhe a linguagem; d) na preparação militar, ministrada na sociedade dos homens (socie. dade de caçadores e soldados, na África), de que o indivíduo já aprendeu.
periodo de iniiação, a linguagem secretac os ritos;
e) na instrução moral e religiosa que não se tem por terminada senão com a obtenção dos graus mais altos da sociedade dos homens e das socicdades secretas, das sociedades dos mágicos, ctc. (M. MAUSS).
8. Nas socicdades primiivas, muitas vêzes a vida da família, que é uma unidade
social muito forte, se acha modificada pela ação de leis que operam a scgrcgação dos
individuos não casados, Essa segregação, em virtude do duplo fator da idade c do sexo, a)
contribui sèriamente para enfraquecer os laços familiares, porque
arrebata os adolescentes às suas famílias;
b) e. comose produz, no momento da puberdade e às vzes antes, desloca da família para o grupo (ao menos nesse periodo) a educação do individuo; c) e tende a diminuir a afeição pelos pais, aumentando, em compensação,
o respeito por éles c pela geração velha, em geral (costumam tratar, em
algumas tribos, todo homem de idade por pai ou avô, e as nulheres, como mãc ou avó).
Toda a sociedade primitiva "tem suas estações e seus lugares para o cnsino,
como os tem para os jogos". A cartografia e o calendário da vida social corrente, observa Mauss, permitem descobri-los. A êsses inventários destinados a fornecer-nos indicações sôbre tempos e lugares em que são ministradas certas educações, lembra
o sociólogo francês que se pode acrescentar um outro meio de inventário: o da coleção de autobiografias, como, por exemplo, a dêsse chefe indígena Crashing Thunden de que Radin nos escreveu a história.
a) ler autobiografias como a que nos legou Radin e em que se encon tram depoimentos de chefes indígenas sôbre a maneira por que foran cducados; b) recolher, se possível, a índios de tribos do Brasil (bororo, tapirapé, carajá, etc.) narrativas dêsse gênero em que, através de sua vida, se possa ver de que maneira foram educados, por que educadores, em que e por que método; primitivo, ) proceder a investigações in loco sôbre uma sociedade de tipo primitiva sociedade uma monografias, ou estudar, através de bem definida,para determinada, a análise de sua estrutura social e de suas formas e processos de educação.
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PARTE SEGUNDA
AS ORIGENS E A EVOLUÇÃO DA ESCOLA
Capitulo I
A FAMÍLIA E AEDUCAÇÃO As formas primitivas e antigas da fanília. - A família, um agrupamento de trabalho.
Funções econômicas da familia antiga. - A gens romana, umn
grupo quase completo: um pequeno Estado.
A perda progressiva de algumas
de suas funções. - A família patriarcal na sociedade colonial e no império.
A evolução e as atribuiçõcs da familia nos tem pos modernos. - A familia e a
função educacional.
A lei de divisão do trabalho e a especialização de
funções. - A participação da mulher nas atividades econômicas.- A comple xidade crescente da função educacional. - o tipo da família conjugal.
Concentração, não enfraquecimento da sociedade familial. - A família, foco da vida afetiva e agrupamento moral. A primeira escola da criança. problema das relações entre a familia e a escola.
A familia, segundo a concepço
atual, é a comunidade formada
por um homem e uma mulher, unidos por laço matrimonial durável e exclusivo, e pelos filhos nascidos dêsse casamento. Num sentido mais largo, a família compreende, além dos pais e dos filhos, as mulheres dos filhos e seus filhos, e as mulheres dos netos e seus filhos. Mas
a análise das instituições familiares, das sociedades primitivas às socie dades civilizadas, não só nos revela uma grande variedade de formas
de familia, que não se enquadram na concepção a que nos leva o estudo
da família conjugal,
tipo da familia contemporànea, como nos mos
tra que a familia, sempre ligada às formas de estrutura social e evo
luindo com elas, obedeceu, na sua evolução, a uma "lei de diferencia
ção e de condensação progressivas". Nem sempre, de fato, para a cons
tituição da familia foi necessário que houvesse coabitação, nem sufi:
ciente que houvesse consangüinidade. Mas sempre foi preciso que hou
vesse direitos e deveres, sancionados pela sociedade e que unem os membros de que a familia é composta. Em outros tèrmos, diz Durk
heim, a família não existe senão enquanto ela é uma instituiçio social, a um tempo juridica e moral, colocada sob a salvaguarda da coleti
vidade ambiente. A forma primitiva da familia é o clã totèmico (l), que apresenta êsses dois caracteres distintivos: I) é formado de indi víduos que são ou se consideram como sendo emn geral consangüineos (1)
"Chamamos assim, define Durkheim, um grupo
individuos que se consideram como parentes uns dos outros, mas que reconhecem èssedeparen tescoserEor um sinal muito particular de que são providos de um mes Imo totem. toten um animado ou inani mado, mais geralmente um vegetal ou um animal, de que grup0 jlgado descender e que lhe serve a umn tempo de emblema
de nome
coletivo. Se o totem
os membros do clâ crêen que èles tè n um lobo por an tepassado
um
öbo. todos
e por consegun te, que
êles têm em si mesmos alguma coisa do löbo. O clâ sstm datinido pous uma s0ciedade doméstica, pois êle é composto de pessoas que se olham como provenien tes de una nesma família; mas distingue-se das outras pelo tato da sor o parenesco tundado ùnicumen te sbre a comunidade do totem, não sobre as relaçÖes de consangçinidada detnida.
FERNANDO DE AZEVEDO I12
consangüinidade vem sòmente de na crença cuja mas outros, uns dos mesmo antepassado, de natureza tÙda mis.
pensarem todos que têm um parentesco é trazerem les tica; 2) o sinal pela qual reconhecem o seu emblema do grupo e de o mesmo totem que serve a um tempo de tem o seu equi. nome coletivo. O cdã, da Austrália e da América, queinteiramente dife. valente no bratstvo, entre os eslavos, é coisa, porém,
com rente de familias de tipo Zadruga, quer com filiação uterina,dequer Sumner filiação agnática: a Zadruga eslava, como a joint-family, Maine, que é uma constituição de grupos amiliares compostos, carac teriza-se pelas suas dimensões e pela unidade juridica formada de sejus bens, e éum agregado de ramos colaterais, ainda os mais afastados.
de irmãos e ims, que vêm coabitar, com seus descendentes, numa mesma casa eexplorar um mesmo dominio.
Àfamilia primitiva que é o clã totêmico, "a forma mais antiga que se conhece da familia, com o parentesco fundado sôbre a "comu
nidade do totem", sucedeu a familia fundada sôbre a "comunidade do nome", isto é, um grupo familiar que compreende a um tempo descendentes de um ancestral comum (filiação natural) e estranhos ad
mitidos nesse grupo "por adoção". Daquele tipo de família encontram
se exemplos na Austrália e entre os indios da América e dêste outro.
cujo sinal de parentesco é a comunidade de nome, podem-se citar
como exemplos tipicos a tribo entre os judeus, a antiga família dos hindus e dos gregos, e a gens romana, que, no seu estado primitivo, se constituía dos agnatos, dos escravos iniciados no seu culto e dos
clientes e que, subdividindose, talvez em razão de sua densidlade cres
cente, deu lugar à familia patriarcal romana dos tempos históricos. A "adoção", na família antiga, criava laços tão fortes como os do san
gue. Mas, se essa familia compreendia todos os agnatos, isto é, todos os descendentes de um mesmo pai em linha masculina e os indivíduos admitidos por adoção e se constituía uma unidade indivisível grupada em tôno do pai (patriarcado), os estudos etnográficos revelam um tipo de familia em que, ao contrário do regime patriarcal, o pai tem um papel diminuído, em todo o caso subordinado, e a mãe aparece em primeiro plano (matriarcado). Esse grupo familiar pode considerar-se, observam Hesse e Gleyze, "o desernvolvimento anormal de um regime muito espalhado que se encontra nos povos mais diferentes e nos está gios mais diversos da civilização": o regime em que os filhos não tra zem o nome de seu pai, que éles ignoram ou tratam como um e personagem sem conseqüéncia, nem Ihe obedecem nem lhe estranho herdam os bens; éles estão, como a própria mãe, na do dependência pai e dos irmãos desta que mantêm com ela os seus filhos e gozam, em face dês tes, de uma consideração recusada ao espôso (l). Mas, em todos êsses (1) É preciso não confundir a família oom uterina, isto é, composta dos des em linha cendentes e o matriarcado que filiação é uma organização a um e social em que a maternal, tempo familial mulher gozaria de verdadeira cendência supremacia. Nas sociedades de des matrilinear, muitas que parte que é, antes de tudo, iqnora-se teve o pai em relação ao filho o descendente da vêzes e mâe dos antepassados do clã filho se assemelha fisicamen te ao maternal. Se o pai, explica -se antes filho depois que nasceu. cuidados que êste deu ao La (MALINOWSKI, vie sexuelle pelos daman ). chez les indigènes des iles An
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
113
grupos, desde o clã indiferenciado ou a familia totémica, que têm
funções sociais múltiplas, religiosas, econômicas e politias, até a gens
romana, poderoso agrupamento de trabalho, que resume em si todas
as formas de atividade humana, a vida familial se confunde com a
vida social que não se manifesta seno pela celebração de ritos e de
festas religiosas, ligadas algumas à vida econômica e destinadas tôdas a concentrar, no interêsse geral, a população inteira por uma duração variávele sobre pontos determinados. Ora, a família patriarcal romana, que proveio da gens, concen
trava também em si tôdas as funções sociais: centro de produção, ba
seada na propriedade latifundiária e no trabalho escravo, era, mais do que uma unidade econômica, uma unidade religiosa, com a sua religião e os seus deuses, e uma unidade politica, com as suas leis e
a sua justiça interior, "acima da qual não havia outra a que se pu
desse apelar", em uma palavra: "um pequeno Estado". A cidade não era scnão um grupo de gentes, e o senado que a administrava, com punha-se exclusivamente dos pais, isto é, dos chefes (patres conscripti). como, no combate, cada gens (familia) constituía uma unidade mili
tar: estreitamente distintas umas das outras, na paz e na guerra, as
familias não se misturavam na morte, repousando, à parte, no seu
túmulo.O homem, chefe de familia (pater-familias), era o chefe supre divinos, futuro mo da religião doméstica: "descendente dos antepassados proprietário cerimônias": deus do lar, êle tem o primeiro lugar nas propriedade que se trans único, sacerdote, juiz, era o administrador da único pela per mitia indivisível de geração em geração; e,umresponsável justiça, "com de direito petuidade do culto, exercia, na sua casa, unitàriamente, constituir-se pieto e sem apêlo". A familia, forçada a pater-familias, absorveu-se 'se concentrou tôda inteira na pessoa do ficarem a propriedade indivisa nêle, e eis porque os bens, em lugar de dessa personalidade soberana". do grupo, caíram sob a dependencia com da lei da divisão do trabalhoe da Mas pouco a pouco, sob a pressão deslocou se o centro da vida ativa o aparecimento da indústria, senão um centro de consumo, familia que, emn nossas sociedades, não é a religião, deixando de ser doméstica, para a oficina e para a fábrica; igreja, com seus sacerdotes e seu culto: transferiu-se para o templo ou a sacerdotais, foi também
de suas funções e o pater-familias, destituidojudiciárias, com a formação e o desenvol despojado de suas funções estabelecer mais justiça entre vimento do Estado, que se organiza paraem lugar da familia, a célula a ser, os individuos (o individuo passa e amulher, entre interpondo-se entre o marido contribuindo politico), organismo para do relações, e as "regular" lhes para filhos, os pais e os chefe (patria potestas). e ar
absoluta de quebrar a soberania quase antiga. família ruinar a coesão da
periodo colonial do Brasil, familial que se encontra no latifundiária, "uma socie organização mesma Éa com a monocultura dominando patriarcais, se desenvolveu, na zona agrária, onde e de brancarrões, brancos de criados aos magotes nas dade semiteudal, uma minoria cal, não sÐ os esravos, e pedra de grande de casas de taipa e casa nmoradores do alto da lavradores de partido, os agregados, sombra das gran
senzalas, como os formou na sociedade colonial, à palha". A família patriarcal que se
114
FERNANDO DE AZEVEDO
des plantações de açúcar, em rernambuco e Bahia, desenvolveu-se mais tard.
colónia c no Império, apoiada na exploração do ouro e atinal na uuha café, ao longo do vale do Paraíba, no Estado do Rio e cm S. Paulo, A C a do
completada pela senzala, conmo observa Gilberto Freyre, na sua análise Ihde, da formação patriarcal do Brasil, representa todo um sistema
e politico, tendo à base. como a antiga familia romana, um cconômico, vigoroso social centro de produção e de trabalho a que vieram juntar-se, enriquecendo o sistema, as formas de atividade social. Asua autoridade. poderosamente concentrada no tôdasas
de familia (patriarca). a sua sólida coesão interma, a sua estabilidade apoiada no acle (cngenho) c no negro (scnzala) e a sua intensa atividade produtiva, iizeran delaar expressões de Gilberto Frevre, a nosa unidade cconômica, base de nossa form
socal c o maior fator colonizador do Brasil, cm todo o período que se cstend
colonia ao Império. A casa grande de engenho, cheia de salas, corredores e uar com asua capcla e os scus terraços hospitaleiros, dominando opátio, a scnzala
plantaçõcs, refletia, na sua sólida arquitctura e nos seus vastos domínios, a poderos vitalidade da familia patriarcal que reunia, sôbre a base cconômica da riqucza
ert
cola e do trabalho escravo, tódas as funções sociais e econômicas. Na família pariael do norte e do sul. de vida e costumes tão característicos, todas as atividades funções sociais concentravam-se, no seu ritmo normal, à sombra e em tôrno do patriarca, "único proprietário, absoluto na administração da justiça, chefe e senhor. não só em relação aos escravos c agrcgados, como também em relação à cspôsa relegada a um plano de inferioridade, e aos filhos menores e mesmo aos maiores
söbre os quais, mantidos à distância, exercia uma autoridade dura às vzes crucldade, severa quase sempre até à opressão" ().
até à
Mas, a nossa familia atual, se, por uma parte, se pode considerar herdeira da família romana, cujos caracteres distintos se encontram
tão acentuados na família patriarcal, da colônia e do tempo do Impé rio, descende também da familia paternal, germânica, de que éantes "uma forma evoluida e de que guarda os traços fundamentais. Pois a familia germânica, semelhante, na aparência, à antiga familia patriar cal, diferia profundamente desta", por uma independência maior, reco nhecida não só à mulher, mas aos filhos, pela igualdade de direitos de marido e mulher, pela comunhão de bens entre os esposos, e pelo
reconhecimento de direitos aos "cognatos", isto é, aos parentes do lado maternal, postos quase no mesmo pé de igualdade que os "agnatos",
parentes de lado paterno. A patria potestas que, em Roma, se exage rou ao ponto de absorver tôda a vida da familia na personalidade so berana do pai, teve a sua autoridade reduzida, já por influència da
familia germânica, em que o casal, com a igualdade de direito dos côn
juges, adquiria uma dignidade mais alta, já pela repercusso, no in: terior da família, das idéias crists sôbre a igualdade da mulher, os deveres dos pais e os direitos dos filhos. Foi, como se vê, a familia romana, o direito matrimonial germânico e as idéias crists que deram origem à nossa organizaço doméstica. Sem dúvida, "pode-se estabele Cer a pr1OTI (é o próprio Durkheim que o afirma) que as idéias de
1) A vida e os costumes da famílig patriarcal. tão admiràvelmente estudados por
Glberio Freyre em Casa Grande e Senzala, toram fixados sob muitos de seus aspectos, de romances, contos e peças de teatro, como em "Memórias de um Sargento de MiMat Manuele de em "Demônio Familhar de Alencar, nas "Mulheres tilha emAlmeida, "Morer inha, de Joaquim Manuel dedejose Macedo, no "Ateneu'" de Raul de Pomp , e has
MenOr ias POs tumas de Brás
Cubas'". en "Dom Casmurro'" e
"laiá Garcia'" de
chado de Assis, entte tantos outros. Adocumentação iconográfica (J. B. Débret, Ruge nào lem, no estudo da família patriarcal, menor interésse que a literatura, táo
dados e de íatos, quer reproduzidos com fidelidade (pintura de caracteres e de costu quer defortnadoE, intencionalmente, no poetas satíricOs como Gregório de Matos.
de s).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
115
humanidade que oCristianismo trouxe consigo, devem ter tido reper
cussão no interior da família, ou, melhor ainda, que as mesmas causas que suscitaram estas idéias tiveram também por efeito adoçar e hu
nanizar as relações domésticas". Como quer que seja, a familia, na sua
evolução, reduzia-se, não só nos elementos de que se compunha, anti gamente tão numerosos, e limitados hoje aos pais e filhos, como nas
Suas funções interessadas de que progressivamente se foi despojando. A familia moderna já não é um templo, una oficina, um hotel, um "pe
queno Estado", centralizado e governado pelo chefe: a vida econônica,
religiosa, social e politica, desenvolve-se fora dela, assegurada por ou
tros órgãos; mas à medida que se reduziu e se despojou dessas funções interessadas, "seu papel se concentrou e se espiritualizou", nas expres
sões de Hesse e Gleyze, tornando-se um centro da vida sentinental e
moral, um foco da vida afetiva, o "pequeno mundo" das coisas capi tais
nascimento, casamento e morte, o lugar geométrico de todos os
interêsses comuns, de pais e filhos, e de todos os laços de parentesco.
Mas, se do ponto de vista educacional ela se despojou em parte
de suas funções, não se pode dizer nem que a função educacional da
familia tivera sempre a importância que adquiriu na família patriar
cal, nem que, com a redução gradual da grande família, tenha perdido
oseu caráter pedagógico. Nas sociedades de tipo primitivo, em que
sempre estêve a cargo da familia a educação da primeira infância, a
segregação dos individuos do sexo masculino, no momento da puber dade, e às vèzes mais cedo, arrancando os adolescentes às suas famílias, não só contribuia, como vimos, para afrouxar os laços familiais, como
deslocava a educação da familia para as sociedades dos homens, nas
cerimônias sucessivas da iniciação. A ação educativa dos adultos e dos fatôres externos cedo superava a ação dos pais. Assim, na Austrália, a
admissão de meninos, a partir de 7 anos, no acamnpamento dos celiba
tários, os colocava sob a influência única dos jovens mais velhos do
que èle: e nas ilhas Banks, na Melanésia, a casa dos homens separava os das
maridos mulheres, como os filhos, de seus pais, que ocupavam, em compartimentos graduados, grau superior ao dos filhos. Ora, se se
considerar de um lado que as sociedades dos homens são divididos em classes, como a das tribos de Nigéria Meridional, em que vai dos 4 aos 7 anos a pimeira dessas classes de idade, organizadas como ver dadeiras associaçöes ou clubes, suscetiveis de exercer disciplina sòbre seus membros; e, por outro, que exige meses, em certos casos, a çao dos rapazes para o ensino religioso e profissional acompanhadaniCia de provas de circuncisão e outras mutilações, compreender-se-á fàcilmente que a familia não constituia o maior centro de ensino e educaço, nas sociedades primitivas. Conforme o predominio do homem ou da mu lher, na organização familial, a educação, ao menos a dos homens, as sume, nas sociedades totèêmicas, um caráter antifamiliar, ou toma feição mais nitidamente doméstica nas sociedades em que se estabeleceu o Tuatriarcado. É, porén1, na familia pariarcal que a função educacio nal, ainda tão acentuada na familia germànica, adquire um relèvo ex Cepional já pela pernanència maior dos filhos, mesmno além da fase 9 Sociologia Educacional
116
FERNANDO DE AZEVEDO
pubertária, sob a proteção dos pais, já pelo fortalecimento da auter: dade paterna, já pela ação preponderante da mãe na primeira eda
cação, já pela concentração, no grupo doméstico, da quase total ida
das atividades de ensino e de educação e de ritos e cerimônias desti.
nadas a transmitir ea manter a tradição de uma geração a outra.
Àevoluço hipertrófica com que, no regime patriarcal, como já
tive ocasião de observar, a familia se dilatou num agrupamento poi. tico quase completo, sucedeu, pela divisão do trabalho que deu luear à multiplicação dos grupos profissionais especializados, uma "invou.
ção atrofica" da família, despojada pouco a pouco de suas funções se.
cundárias. Mas, enm matéria educacional épreciso distinguir, na fun
ção que a família exercia ou é suscetível ainda de exercer, a educação pròpriamente dita, sempre dada pelos pais, educadores de seus filhos
e afunção docente (ensino, transmissão de conhecimentos) que, retida pelos pais, não tardou a ser confiada, dentro do próprio quadro das instituições domésticas, aos escravos, libertos e mestres gregos em Roma,
ou aos capelães, tios-padres e preceptores, no regime patriarcal bras/
leiro. Certamente, quando a funo docente (institutio) se deslocava, no interior da família, dos pais para profissionais, leigos ou religio sos, continuando ao cargo daqueles aeducação pròpriamente dita (edu catio), já era um processo que se realizava de fragmentação e de "espe cialização" da função educacional, concentrada antes nos pais e repar
tida depois entre êstes e os que eram chamados a auxiliá-los. Em rela ção ao ensino, a família se despojou, com efeito, quase totalmente da
função educacional que se transferiu para os grupos profissionais espe cializados, no seu próprio campo de ação e por meio de agentes e ins
tituições especiais (escolas, institutos, etc.). Além da redução progres siva da "grande familia", concorreram para promover êsse deslocamen to de funções, do grupo doméstico para órgãos especiais, de um lado a aceleração do progresso científico e técnico, e, em conseqüência, a
complexidade crescente da obra educacional que exige profissionais
cada vez mais especializados para a função docente, e, de outro, as ne cessidades econômicas que, obrigando também a mulher a procurar trabalho, afastam do lar os pais ou lhes reduzem freqüentemente a permanência no lar e o contato com os filhos. Mas, não se pode afir mar com isto que a família, no dizer de Paul Lapie, além de outros
caracteres (econômico, religioso, político) "perdeu aqule que lhe dava, entre as instituições sociais, sua maior originalidade, seu caráter peda gógico" e que "a família jánão é mais uma escola, mas uma nursery". Pois, a família nem foi uma escola senão no regime patriarcal, como
vimos, nem se reduziu a uma "nursery" na sociedade familial moderna
que, embora limitada quanto à sua composição e às suas funções, con
serva um papel importante, dificilmente substituível, na educação do indivíduo, sobretudo na primeira infância. As transformações do regime de autoridade na família e as mu danças que se operaram na sua estrutura, por um lado determinaran uma redução, quanto à amplitude e à estabilidade, da familia antiga,
e imprimiram-lhe, por outro lado, um novo caráter, fazendo prepon
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
117
as de ordem moral, e estrei jurídica ordern de relações as sôbre derar que entram na sua comp0 tando a solidariedade entre os elermentos e mais numerosa, sob o an sicão (1). A coesão da familia, mais estável sôbre a autoridade paterna, que tigo regime, baseava-se especialmente no interêsse de quem "deixou de ser um direito estabelecido en favoresimples poder de pro familial, um o exercia, para ser, no novo tipo cumprir seus deveres para com os filhos". teção, um meio, para o pai, deprogressiva da "grande família" em con Se examinarmos a redução resultou da contração traste com a vitalidade da "família estreita" que do poder paterno da família paternal, verificamos que a diminuição mediante uma senão processou que assegurava a solidez daquela, não se das afeições domésticas com condensação correspondente de energia raízes no coracão que a familia mnergulhou mais profundamente as suas modifica humano. A autoridade diminuiu, com as transformações que aumen
mas ram a natureza e a extensão do liame entre pais e filhos, taram a afeição e a ternura; e a solidariedade entre os parentes afrou Xou-se mas para fortificar-se a que une os pais aos filhos, pouco nume concerne rosos, em que se concentrou tôda a sua afeição. Tudo o que
à vida de família é, de fato, dominado pela idéia de dever. "Presente
aimãos), tódas asa suas relações (entre espôso e espôsa, pais efilhos ou entre família lhes imprime uma marca especial, observa Durk heim, e as eleva acima do que são simples relações individuais. Eis também por que o lar tem sempre hoje, como outrora, um caráter reli gioso. Se já não há altares domésticos nem divindades familiais, a fa
milia não ficou menos impregnada de religiosidade: ela é sempre a arca santa na qual éproibido tocar, precisamente porque ela é a escola
do respeito e o respeito é o sentimento religioso por excelència. Acres centemos que é também o nervo de tôda disciplina coletiva".
A família que repousava outrora sôbre uma relação de domina
ção, "tornou-se cada vez mais um grupo moral, nas palavras de Schmol ler; de uma instituição, tendo por objeto a produção e os negócios, ela
écada vez mais uma instituição, que tem em vista a comunidade de
vida moral; e, cada vez mais limitada nos seus fins econômicos, pode
(1) A análise das de estrutura do grup domés tico e. portanto. d s13 tema de relações entre ostransformações elementos que entram em sua composiçáo (enre coajuges. POs e filho3, etc.), podi-se completar com a da "desagregação ou do afrournento dos aços familiares. São dois fenônenos distin tos, embora ligados sob varios aspectos. Um-0 das
transformações estruturais (fatos morfológicos), e outro, o da desagregação, fenÏmeno tam
bém de estrutura, mas que se na categoria dos fatos patológicos. Tratase en t2 de una "crise da família', às enquadra vêzes grave e profunda. A famíia pode, transior mar-se, como qualquer grupo, sem se des in tegrar ou sem perder a porem. terna. À base dessa desintegração residem vários tatôres que contribuem,sua o s o in combinados e com intensidade variável conforme os paí zes, diversarente para determinc-la ou 10vore cer-lhe o desenvolvimento. Entre ôles figuram as mudanças de estru tura socicl: cs s es a instabilidade e a econômicas; política e econômica que decorrem dessas crises e flutuações; a concepção insegurança, e estilos de vida, em que os valores me riais; os progressos técnicos (telefone, cinena, facilidades de prevalecem de transpor tes ): a multiplicação, em cOmuniaes dos conseqüència, te: contatos culturais; a rbaniza20 Tescen a emancipaçáo e a participação efetiva da em qucse todas as atividades fora da casa. A uma sociedade organizada sôbre a mulher base da família que constituia o fundamen to, do edifício social, é certo que sucedeu uma organização social fundada sobre o individuo (cfr. e, já liberalismno) nes te século, sôbre grupos, sociais, de in tersses ou étnicos (classes, raças ). Não parece, porem, que, sindicatos, o predominante sejam entre todos as fatöres, idélas e S que tazem assentat söbre o ésses ou individuo Obeguposdererninados a ordemtendèncias social es tabelecida sobre a famila, comno unidade
individualismoe
fundamental. O
é mais
complexo
do que pode
parecer à primneira vista.
FERNANDO DE AZEVEDO
I18
colimar melhor fins nobres, ideais, e tornar-se, enfim, um mais rico dos sentimentos simpáticos que produz". Por isto mesmo que se reduziu em número e se despojou de funções tão pôde concentrar-se e espiritualizar-se para se transformar numa madura de solidariedade moral, num centro de vida sentimental t
reservatório diversas,
telectual intensa, e num doce refúgio em que o homem se refazese
retempera das lutas da vida social, readquirindo, de volta ao lar, e
em contato com a familia, novas förças e novos estinmulos. É por isto
que, baseada na compreensão, confiança eafeição recíproca, a familia como observou Hesse e Gleyze, "continua a ser, apesar de tudo, a ins. tituição mais qualificada para educar a criança. A educação tem nees.
sidade de paciência, indulgència, dedicação e sacrifício: são qualidades que é mais natural esperar dos pais do que de estranhos å familia
Em grande parte, aeducaçãodos filhos éa obra capital, o fim supremo
da existência, às vêzes, a única razão de viver". Mas, se éa institujcáo
mais adequada para "educar", éprecisamente a menos própria pra
"instruir" já por ser a instrução uma tarefa cada vez mais complexa
edificil, para que se exigem profissionais especializados, já pela pro
funda repercussão, no interior da familia, das novas condiçoes e cxi
gências da vida econômica. A família e a escola, longe de se oporem.
tendem, pois, a completar-se e a auxiliar-se motuamente, por uma in
tima colaboração tanto mais fácil de ser obtida no domínio educacio
nal, quanto mais viva e profunda fôr a consciência da necessidade de
estreitar as relações entre a familia e a escola e de lazer convergir, para
um fim comum, essas duas grandes instituições sociais. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Em que consiste nos seus elementos essenciais, o totemismo em que, segundo
alguns, repousa a organização primitiva da família? a)
o totem é o ser animado ou
cl;
inanimado que serve de emblema ao
b)
éste nome coletivo é tambén o dos indivíduos:
)
o animal (lôbo, lebre,
tartaruga, serpente, etc.) que serve de totem é honrado como o antepassado do grupo; isto é, todos os membros do clã são havidos como descendentes de uma mesma origem, ou, por outras palavras, são parentes; d) na organização social totêmica, a mais antiga que se conhece, dois
esposos não podem ser de um só e mesmo totem, em virtude da exogamia. Examinar a relação estabelecida entre o totemismo e a família primitiva e se é de naturcza a lançar luz sôbre a evolução doméstica. 2. No estudo da evolução familial verifica-se que e parentesco são coisas diferentes. A consangüinidade nem écondicão consangüinidade do suficicnte parentesco (em Roma, a criança não se tornava membro da família seno depois de ser recebida como tal, por uma cerimônia apropriada, podendo de todo pela nem écondição necessária, pois desprender-se o adotado éparente doparentesco e dos "emancipação") adotante parentes déste último. Assimn, segundo Durkheim, a) o parentesco é essencialmente e morais que a sociedade impõe a certos constituído por obrigacões jurídicas indivíiduos: ésses individuos a grupos cujos membros são, em geral, provenientes de uma origempertencem (laços de sangue) ou se comum
consideram como tais;
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
119
descendéncia poden deter b) considerações estranhas a tôda idéia de reparte, entre os diferentes minar a socicdade na maneira pela qual cla
membros do grupo familial, os dircitos e as obrigações domésticas; pela qual é organizada a ) o parentesco varia segundo a maneira segundo o lugar constituen, a que família, conforme o número de membros das formas de antes dependem variações essas e etc., que é dado a ada um, estreita com relação mantêm não estrutura social e das nccessidades sociais e descendència. o fato todo físico da
matéria educativa, através das transfornao 3. Examinar o papel da família naemorganização da sociedade conjugal, desde Ções sucessivas que se vêm operando com escala até a família conjugal moderna, clã indiferenciado (a fanília totémica) especialmente considerando-se germânica, pela família patriarcal e a familia paternal família patriarcal romana
da o papel do pater-familias no interior Revue des Deux Mondes, romain, pire sous l'em L'éducation (v. G. BOISSIER, Rome, Librairie Enfance à L'éducation 15, Mars, 1884: A. BAUDRILLART, a
et Jeuncsse, Paris): e o do Domacin na família paternal germânica., b) o papel do pai, naséculo Eslávia; da sul ao passado Zadruga que perdura até o na família patriarcal brasileira, naO Colônia c) o papel do pai de familia, pai de 0 Pais do Pau de Tinta, e no Império (v. VIRIATO CORREIA, Brasileira, 1938). Rio, família colonial, págs. 68-77, Civilização sociológica sôbre a vida e costumes da família 4. Proceder a uma investigação S. Paulo), comn a monocultura patriarcal que se formou, no vale do Paraíba (Rio eespecialmente na análise latifundiária (café), de base escravocrata, detendo-se religiosas, que aparecen e a) das funções sociais, econômicas, politicas
concentradas na família patriarcal, centro de produção, grupo político ereli gioso, hotel, escola, etc.;
dessas vastas resi b) da arquitetura dos casarões das fazendas do sul, e capelas hóspedes para dências senhoriais, com suas grandes salas, quartos oratório); no tradição, a ficou famílias, (de que ainda, em algumas os esposos, c) do sistema das relações de autoridade e subordinação entre depois ainda e menor filho o sôbre do pai domínio do filhos, e e entre pais e
de atingida a maioridade; d)
meninos da vida doméstica das crianças de um e outro sexo: "os entre
homenzinhos à força obrigados a se comportarem como gente grande,ambiente rigorosamente patri num criadas meninas, as e anos; dez Os nove ou o sentido socio (analisar pais" dos tirania arcal e vivendo sob a mais dura às meninas): aplicadas outras e janeleira, saia, lógico das expressões rabo de dos educaçio na capelão, e do tio-padre do e) das influências do pai, (v. doméstia soiedade na moleque, do e mucamas papel das filhos, e do Demónio Familiar, de José de Alencar).
5 As famílias de imigrantes não podem adaptar-se fadlmente à vida social emigraram, e essa adaptação que dos país, para do adiantada a idade pais. Tem-se observado que a delinqüentes, no grupo dos estrangeiros, são rurais, se adaptam nenos fàcilmente a condições novas
elevada dos imigrantes aliás
tanto mais ditiil quanto mais maior parte dos pais de menores e que tèm menos Amaleabilidade ciminalidade de existência.
éfato conheido: não só a emigraçio arasta muitas
origem. os maus elementos, mas os torna piores, subtraindo-os ao seu meio de vêzes Proceder a um inquérito sôbre famílias de imigrantes e, particularmente. para ccla
recer èsses pontos capitais:
fenómeno de imigraão, a) as relações entre a criminalidade infantil e o guia c Ireio; criança à faltem novo, mundo num pois é fácil conceber que,
da mãe no b) a influência das condições econömicas (pobreza, ausncia especial e a aão infantil criminalidade lar, fugas para o trabalho, eic.) sßbre a sobre as filhas que tiam maior tempo (mais sexos da familia sôbre um e outro em casa); famiias pobres, onde deve ) a situação penosa do filho mais velho nas atender muito cedo às necessidades de todos;
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d) a situação igualmente penosa do orfão e da criança de fanília "degradada": e) a influência da vida escolar para clevar a taxa de moralidade escola naional como clemento de assimilação do estrangeiro (nível ese dos filhos de imigrantes, sua freqüènia escolar, preferéncia ou não nela
escolas estrangeiras). 6. Analisar as influências da familia italiana, em S. Paulo, partindo do estudo
de sua estrutura, pela observação edescrição de tip0s regionais, por ex., o calabrés
c do maior número possível de exemplares existentes da família italiana,
tante da família pariarcal ou familia-tronco, e pela análise e descrição represen de seus
traços túpicos quanto:
a) ao sistema de repartição de bens e ao sistema de dotes;
b) àcoesão familial (permanência dos filhos casados em casa dos pais):
) à autoridade paterna em relação aos filhos e filhas, solteiros e
casados:
d) ao sistema de educar (autoridade, disciplina, aprendizagem, escolas a que mandam de preferência os filhos, etc.) Estudada a família italiana, na sua estrutura enos seus caracteres prinipais.
mostrar exemplos e causas da decomposição dêsse tipo de familia-tronco e das influ
ênias que tenha exerido entre nós, pela observação exata e metòdicamente condu ida de casos conretos e individuais.
7. A família moderna, reduzida quanto ao número e despojada de suas fun Ções múltiplas, continua a ser, como a instituição mais apropriada para educar
(educatio), a primeira escola da riança. Mas, em parte devido à divisão do trabalho
que deslocou para órgãos especiais (a escola) a função educacional, cada vez mais complexa na parte relativa à instrução (institutio), em parte sob a pressão das
novas condições econômicas que forçaram a mulher a procurar trabalho fora do lar,
a família tornou-se a instituição menos apropriada para a instrução (institutio).
Examinar e estudar àluz da documentação etnológica, histórica e social:
a) a função educacional da família nas sociedades primitivas em que não parece estar a cargo dos pais senão a educação da primeira infância (até os 7 anos e às vêzes mesmo sòmente até os 4 anos);
b) a variedade de funções sociais e a extensão da função educacional
da família patriarcal, poderosamente concentrada e severamente disciplinada em tôno da autoridade do pai de família; e, por meio de inquéritos sóbre
o maior número possivel de familias das diversas classes sociais;
) a transferéncia, da familia para a escola, da instrução (institutio), na sociedade contemporânea, e os problemas que estabelece essa transferência (relações entre a família e a escola).
REFER£NCIAS BIBLIOGRAFICAS AZEVEDO (Fernando de) A educação entre os romanos, in No tempo de Petrônio, 1. ed.,
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MÉNARD (René) - La vie privée des Anciens. I. La tamille dans 'antiquité. L'éducation, págs. 17 a 85. Paris, A. Morel et Cle., l883. STARCKE (C.V.) - Die primitive Familie in ihrer Entstehung und Entwicklung. Brockhaus, 1888. La tamille dans les dittèrentes sociétés, trad. Paris, Giard et Brière,Leipzg 1893.
Capitulo II OGRUPO PROFISSION AL PEDAGÓGICO A divisão da sociedade em grupos e classes distintas. -
Aforma(io de
gTupos profissionais. O grupo espeificamente pedagógico. - Professores A categoria social, denominada especiais de educação. mestres, agentes ou impròpriamente "classe" dos intelectuais. 0gênio pedagógico. 0 "ipo social" do educador profissional e seus caracteres prinipais. - A complexidade dos sistemas escolares e a especialização decorrente dentro do grupo profissio
nal pedagógico. A profissão do educador e sua posição na hierarquia inter profissional. A hierarquia intraprofissional. Os problemas postos pela formação de grupos profissionais especializados.
Instrução e educação. -
Ohiato entre a família e a escola. - Associações de pais e mestres. - A associa
(ão profissional,
uma necessidade moral essencial.
Aeducação, como vimos, é um fenômeno social que se produz em
tôdas as sociedades humanas, cuja unidade, continuidade e evolução
a supõem e implicam, como uma de suas condições e funções funda
mentais. Pelo simples fato de se desenvolver e de se prolongar uma co munidade através das vicissitudes das gerações, ela exerce sôbre seus membros e os descendentes dêstes uma disciplina, uma formação, uma
educação. "A educaço não é, pois, conclui Ernest Krieck (1), uma in
venção da razão dedutiva ou do pensamento refletido; não é também
um produto das altas civilizações com suas escolas, seus professores,
seus métodos, seus sistemas de ensino. Ela é antes uma função essencial da vida de comunidade, função original, inconsciente, involuntária, e
que se apresenta também na vida primitiva dos negrOS e dos indios.
As altas civilizações podem desenvolver e aperfeiçoar essa educação primordial por escolas e outras instituições. Mas a escola, o professor, tôda a educação consciente e sistemática, não fazem senão edificar
sôbre as fundações lançadas por essa educação original e inconsciente". Entre os povos primitivos, "suas normas de vida são suas normas edu
cativas para a mocidade. Uma atmosfera educativa envolve as crianças como o ar e a luz; por uma ação continua, ela penetra suas almas por tôdas as aberturas e as torna semelhantes aos adultos e aos antepassa dos". A educação, nas sociedades de tipo primitivo, pode-se, pois,
com parar a um pano, fabricado no tear, e cuja urdidura se inicia por uma série de fios paralelos que correm em um sentido, enquanto uma lança deira, movendo-se em dire£o transversal, faz cruzar com èstes, pren dendo-os em um trançado resistente, uma outra série de longos tilamen tos. A trama e a urdidura dos tecidos tèm uma correspondència na
educação; àmedida que se desenvolve a série de iniciações a que são (1) ERNST KRIECK - Das Wesen der Erziehung. Braun, Karlsruhe.
122
FERNANDO DE AZEVED0
submetidos os individuos, especialmente homens,
desde
a
puberdad,
às vêzes mesmo mais cedo, a tradição cerrada do grupo, cOmO uma
lançadeira, vai prendendo, numa trama sólida, pelos ritos e pelas ceri
mônias, pelas suas maneiras de viver e pelas suas ocupações, as 0s sentimentos e as práticas que caracterizam a vida comum, crenças, no se espirito e nas suas funções essenciais. Certamente, o fundo da educação, como já observamos e risou Krieck, " o mesmo e sempre por tôda parte: descendentes são sem
pre educados para o fim de se tornarem membros perfeitos da com.
nidade, e até å imitação mais perfeita possível do tipo humano tepre.
sentado pelo grupo. Aeducaço éuma função essencial de tôda a vida de
comunidade; mas, no estágio primitivo, ela não chega a tornar-se alguma coisa de "separado", um dominio especial, tendo o seu fim e os seus meios próprios. A ação educativa é difusa nas outras funcões
da vida social"(). Não foi, porém, senão com a divisão do trabalbo
social e a especialização de funções que a educação, dada pelo con junto das gerações anteriores, se foi progressivamente concentran do nas
mãos de funcionários especiais. A sociedade, àmedida que se compli cava a sua estrutura, se secionava em classes e em grupos profissionais
distintos, a cada um dos quais passou a corresponder uma de suas ati
vidades e funções fundamentais. Surgiram os primeiros mestres e pro fessôres, agentes especiais de educação, e pouco a pouco se constituiu, com êles, um novo grupo profissional: o grupo especificamente peda gógico. A função educacional, porém, antes de se concentrar no grupo profissional próprio, que lentamente se formava, fixou-se no grupo
religioso, que a absorveu, como prova a identidade do educador e do sacerdote, nas sociedades primitivas e em sociedades altamente evoluidas. Intérprete das coisas sagradas, tradições, ritos e cantos, mais cultivado e desprendido dos cuidados da existência material, e, em
conseqüência, com maior autoridade que o comum dos homens, o sacerdote devia ser, como foi, o primeiro preceptor, cuja função essen cial consistiu por muito tempo em formar discipulos para o Encontra-se, lembra Spencer, uma iniciação religiosa já entresacerdócio. os povos
selvagens; no Congo, os sacerdotes feiticistas organizaram retiros nas florestas, como os brâmanes na Índia antiga. Nas primeiras civili zações, na fndia e no Egito, são os sacerdotes que absorveram essa função: e, ainda na Idade Média, em que mosteiros e colégios foram ligados aos templos, "o ensino continua em poder da classe que étambém depositária da ciência e da justiça, até que, sacerdotal, dividindo se otrabalho, cada função passou a ter órgãos perfeitamente especia (1) Nas sociedades primitivas em que a educação ten por caráter essencial ser difusa, já se encontra, e não raramente, um princiípio de especialização. As iniciações não cons tituem em sua série, senão outras tantas de uma educação sistemática. O dos bosques, em algumas sociedades defases "santuário tipo arcaico (a escola dos mganga no Congo belga, por exemplo) notàvelnente de una escola, no sentido que damos a essa palavra. Entre osaprozima-se que se caracterizam pela ausência de Omaha, todo "for'" interior doméstico, e entre Os quais o que tern lugar na casa, se passa aos olhos de todo mundo, o caráter público, observa Fletcher, estudando a vida de fanília se acha também ngsegundo entre os indios, a disciplina das crianças em educação; uma vila está nas mãos de indivíduos especialmente encaregados dessa função e que o papel de nosso papão parecem desempenhar ao natural tradicional. (A. C.
FLETCHER, Haeusliches Leben
bei den
Indianern).
123
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
educação, aumentada de lizados". Sòmente, pois, na idade moderna, a professor chegou a sepa novos ramos de ensino, se "secularizou", e o sido completa em alguns rar-se do sacerdote, embora a cisão não tenha ou restaurar sua prepon países em que o clero ainda luta por manter derância de educador (l ). constituído e nitidamente O grupo profissional pedagógico, assim especifica, é uma das forna diferenciado dos demais pela sua função "classe" dos intelectuais, cões que se desenvolveram dentro da chamada outros grupos dessa cate de que faz parte e na qual se distingue dos que é uma certa formação social goria social. O grupo dos intelectuais, Alfred Weber, caracte demonstrOu acima e fora das clasSses, como o de produção, de critica e de aper riza-se pela sua função social, no só dos bens e feiçoamento, mas de organização, transmissão e circulação de uma sociedade valores espirituais, que constituem a herança social pondera jus ou civilização determinada. Os intelectuais não formam, a bem tamente In Arnost Blaha, nem uma corporação nem uma classe, dizer; não são uma categoria econômica particular, mas uma formação
organizando-se ou po social, de caráter tipicamente ocupacional, que, é aberta, aces classes, as tôdas de elementos dendo organizar-se com sível, em permanente renovaço, e tem, como caracteTisticas principais, o cultivo e o exercicio predoninante das funções intelectua is, a cul
tura geral ou especializada e a lríplice funão social de produzir (cria ção), julgar (crítica) e transmitir (ensino, pregação, propoganda, etc.) os valores espirituais de um povo. A cultura, diz Blaha, "tomada em tÑda sua amplitude, com seus elementos racionais e irracionais (afeti
vos e volitivos), representa, sem dúvida, um traço essencial do inte lectual, mas tão longe está de definir por si só o caráter fundamental da categoria dos intelectuais que ela pode caracterizar, o industrial, o comerciante, o agricultor, o operário". Éna sua função social, na sua atividade essencialmente especifica que se temn de buscar o traço emi
nentemente distintivo do grupo dos intelectuais, cuja atividade mais alta é, nas expressões de Ivanov Razamnik, citado por Armost Blaha, "a criação e a realização ativa de formas e de ideais novos, dirigidos
para a libertação fisica e psiquica do individuo e da sociedade". Ora,
se "criar a atmospera espiritual sem a qual a sociedade não poderia
respirar, os laços espirituais senm os quais ela não seria una, o tesouro dos bens espirituais semn os quais a sociedade não poderia subsistir",
éprecisamente a tarefa da função intelectual,
organizaão ecirculação no dominio espiritual,
função de produção,
faz certamente parte
da categoria dos intelectuais e ocupa, na sua hierarquia, um dos graus mais altos o grupo dos educadores, cuja função consiste numa comu nicação da herança social, da experiència acumulada por toda a especie
humana,
comunicação essa que torna possivel "a capitalização da
experiència e dos ideais de individuo para individuo, de grupo para grupo, de geraço
para geração".
Mas, se a transmissão dos valores espirituais, pela palavra e pelo
exemplo, éa função especitica do educador, o que ele ransmite, atinal, (1) H. SPENCER
The educator, Con tenporary Review, Deceanber. 1895.
FERNANDODE AZEVEDO 124
herança social acumulada a isto é, é, róprio ile que o é aos outros e ninguém se comunica a si adaptada às suas próprias disposições, Ao passo que "o artesão mesmo senão pelo amor e pela compreensão. modificando-o, melhorando-0 mais trabalha com o que le tem, utilidades, para vender menos felizmentee adaptando-o a determinadas observa Van Ginneken contrário, ao professor, o mercadoria, a sua comunica, antes de tudo. se. não trabalha senão com o que ile é, não sábio neerlands, deve não o que é". O saber acumulado, acrescenta o
e à nossa vida. tornar-se nosso ser, deve ser integrado à nossa pessoapoder de atracão o antes de ser dado e para sê-lo eficazmente. Ademais,maneira por que le que um homem exerce sôbre outro, depende da justa observação de que, na se dá a si mesmo e se dedica. Épor isto genial é tão dificil a examj Dilthey, "o estado de alma do pedagogo sentimento e a in nar e a descrever como o de umn grande poeta. É O inteligência".
de gènio, e não a tuição que predominam num pedagogo que pos De fato, constatamos que são pessoas de inteligència média
suem êsse talento inato; mas, se certa ingenuidade espontânea educador o acesso às que, mantida intata no fundo da alma, abre ao infantis, como no caso de Froebel, se acompanha de uma po
almas como a de derosa inteligência, então surge uma personalidade genial, "nenhum que ainda um Sócrates ou a de um Platão" (1). É por isto dominio livro, pondera Newman, poderia dar o caráter próprio de um de um cientifico com essa certeza e essa rapidez que, por essa simpatia fisionomia, voz espírito por umn outro, se transmitem pelos olhos, pela sem procura de e atitude, pelas expressões ocasionais pelas palavras individualidades um diálogo"... Mas essa ingenuidade espontânea, nas
contato pouco ricas e impulsivas, pode, no entanto, pelo espírito de infantilidade com as crianças, dar lugar a uma de primáia) que provém, na media dos educadores, não
prolongado (mentalida só da natu
sistematiza reza de sua função social (transmissão dos conhecimentos dos, da ciência feita), própria a desenvolver o espírito dogmático e conservador até àrotina, como de causas sociais e econômicas, que con tribuem para acentuar certos traços do "tipo social" de educador, fà
cilmente distinguível por caracteres especiais, ligados às condições so ciais de cada meio e ànatureza de sua profissão.
A profissão do educador (mestre, professor), como qualquer outra, marca o indivíduo e lhe imprime uma mentalidade particular, corres
pondente às ocupações, às exigéncias e aos modos de vida próprios des
sa profissão; e essa mentalidade étanto mais caracteristica quanto mais os grupos especiais se isolam e se fecham, por causa de suas necessi dades e condições próprias ou do desejo de se afirmarem como gru pos distintos. Mas, se há caracteres que constituem umn denominador comum de todos os educadores e servem para distingui-los dos demais (1) Na época de Platão, lembranos o cardeal Newman, 'não havia ainda uma li
Vraria em tôda acidade. Duvido que Alenas tivesse tido alguma antes de Adriano. O que o estudante vic, oque ouvia, oque apanhava de passagem pela tôrça mágicaestudante de sud
simpatia, e não o que constituía a formação que Atenas. Um BlPnsava e desde êsse monedegseu estrangeiro transpõe o limiar da porta da Acgdemi ot olhar se concentra sôbre um só objeto: a figura de Platão'". (J. H. NEWMAN, The a University ).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
125
grupos que coexistem no interior de uma sociedade, a lei de divisão do
trabalho e a complexidade crescente dos sistermas escolares deterrnina
ram e tendem a desenvolver uma "especializaço" dentro do próprio grupo profissional pedagógico, fracionando-o en tantos subgrupos,
com seus caracteres particulares, quantos são os graus e as especialida des do ensino nos sistemas modernos. As exigências particulares de
cada um dêsses grupos e a falta de uma unidade de espírito que só
se poderia criar mediante uma unidade de formação profissional, se
param freqüentemente os profissionais especializados que tendem a or ganizar-se em associações de caráter restrito (de professôres primários,
ou secundários ou ainda superiores, etc.), mas opõem uma grande resis tência a associações de educação, de caráter geral, destinadas a agrupar os profissionais de tôdas as especialidades e dos diversos graus de ensino.
"o desenvolvimentodos serviços de educação, quer no sentido vertical,
desde as escolas de educação infantil até os institutos de pesquisa e as
escolas de altos estudos, quer no sentido horizontal, para se estender a tôda a massa da população em idade escolar, tende, pois, como já
observei em "A Educação e seus Problemas" (pág. 155), a dispersar o numeroso pessoal que exige, tornando cada vez mais distantes uns dos
outros, os membros do magistério". O trabalho organizado segundo um método racional tornou-se cada vez mais parcela do também na educa
ção, isto é, "as funções são repartidas entre grande número de profes
sôres, nos diversos graus de ensino, de maneira que cada um dêles não
tem a realizar senão uma operação ou função, sempre a mesma, con
correndo a um conjunto que escapa a cada um dles, e de que, por isto, não chegam a ter, senão raramente, uma perfeita visão". O crescimento quantitativo do grupo e a distribuiço hierárquica de seus membros, em correspondència com os diversos graus e catego rias de ensino, vêm acelerando o fenômeno de estratificação, isto é, de
formação de camadas (strata) do grupo profissional pedagógico. Aexis tência da estratificação profissional pode ser vista, segundo ensina Piti rim Sorokin, de duas series fundamentais de fatos. Em primeiro lugar, do fato de que certas classes de ocupações comnpuseramn quase sempre as camadas sociais mais altas, enquanto outros grupos ocupacionais
residiram quase sempre à base da pirâmide social. Em segundo lugar, ofenômeno de estratificação profissional manifestase também dento de cada atividade ocupacional. Ou, por outras palavras, a estratifica ção profissional manifesta-se nestas duas formas fundamentais, a saber: na forma de uma hierarquia enre os principais grupos ocupacionais (estratificação interprofissional) ou na forma de uma estratificäção den tro de cada grupo ocupacional (estratificação intraprofissonal) (1). Pode-se, portanto,estabelecer, por meio de estudos, inqueritos e dados estatisticos, a posição do grupo profisional pedagögico, relativamente não só aos demais grupos protissionais que integram a categoria dos
"intelectuais", como a todos os outros grupos profissionais, de comer
ciantes, industriais, bancários, etc. (estratiticaç£o interprolissional). (1) soROKIN (P.) The social págs. 99-133, Harper and Brothers, 1927.
mobility. Chapter Vi. Oocupational Stratitication,
FERNANDO DE AZEVEDO I26
para o estudo dessa classe de ocuno Não émenos importante, porém,desenvolvimento, a segunda ordem de ções, na sua formação e no seu (hierar. pesquisas a realizar relativas à estratificação interna do grupo intraprofissional), em que já se distingue nitidamente a superbo. quia sição dos subgrupos em correspondéncia aos diversOs graus de ensino (escolas primárias, ginásios, escolas superiores) e dos subgrupos em que émais marcada a exigència intelectual e que, por isto, se tornam mais classificados na hierarquia, söbre aqueles (os de professôres de traba lhos manuais ou de desenho, mestres, contramestres, etc.) em que &
menos acentuada essa exigência e que se destinam ao ensino de ativi dades de base manual ou mecânica.
A formação do grupo profissional pedagógico e o secionamento normal dessa classe de ocupações em subgrupos especiais, estabeleceram problemas que não sòmente não estão ainda resolvidos, mas nem mes
mo suficientemente estudados. Entre os problemas postos pcla forma ção de grupos profissionais especializados, na educação, um dos mais graves éo que decorre da própria especializaço a todo o transe e que consiste não só no predomínio da "instrução" sobre a "educação"', como
na perda da unidade de espírito e de uma visão de conjunto (sentido
social e filosófico). Em primeiro lugar, a ciência domina de tal modo a vida moderna que a educação se vê relegada a um segundo plano pela instrução que, sendo um meio para um fim (a educação), tra tada como umn fim em si mesmo, acentuando a dissociação entre uma
e outra, como coisas profundamente distintas e, mais do que distintas, separadas. Mas, se educar não é certamente sinônimo de instruir; se a
educação se apodera de tôda a vida; se, como pondera Chesterton, "começa com as primeiras vagas impressões da criança e não termina antes da última experiência, a última e a mais profunda 1eflexão do velho: se ela se apodera de todos os domínios e se dirige tanto ao corpo como à alma, tanto aos nervos como ao cérebro" (1); compreende-se o grave conflito interno que estabeleceu, na educação atual, êsse predo
mínio senão o dominio quase exclusivo, nas escolas dos diversos graus,
da instrução sôbre aeducação. Em segundo lugar, a diversificação de do sistema edu grupos profissionais e a complicação, em conseqüência, sociedades modernas,
cacional, para atender às novas exigências das multiplicam, no ensino, os quadros dos professôres cada vez mais espe
cializados que, ainda quando chegam a possuir a fundo as partes, perdem
de vista as suas relações espirituais, e, com elas, essa "unidade orgånica", a consciência da obra total de educação de que não véem senão os aspectos mais ligados às suas especialidades. Ora, se a especialização a todo transe tende a deformar o homem "por um excesso de competência sôbre um ponto e insuficiências flagrantes sôbre muitos outros", ela torna-se muito
mais perigosa na educação, em que, mais do que em qualquer outro do
mínio, se impõe, nas expressões de Willmann, uma síntese, uma "visão de conjunto", não só porque o trabalho cotidiano estreita constante
mente o horizonte, mas sobretudo porque todo trabalho de formação, (1) CHESTERTON (G. K.)
Sone doubts of education. Report of the XVI Annual
Conterence of Education Associations, University College, London.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
127
para ser realmente profundo, cficaz, implica, na sua essencia, uma con cepção da vida e do mundo. E se se acrescentar que, por essa ausência de uma visão de conjunto, acaban, nestres e professôres, perdendo to talmente a consciência da solidariedade moral, indispensável a todos
aquêles pelos quais se distribui a tarefa complexa e imensa da edua cão, compreender-se-á aimportância dos problemas que levanta o de. senvolvimento dos grupos profissionais especializados.
Mas, quando a função educacional se deslocou da família e da dasse sacerdotal para um grupo especializado, estabeleceu-se um hiato entre a familia e a escola, e entre a escola e a religião, e o desenvol vimento dêsse grupo não se tern processado senão nediante conflitos entre a escola e essas duas instituições, cujo papel educativo nunca será demais encarecer. Certamente, dada a multiplicidade das tarefas e exi gências que o mundo moderno criou, a família, por incapacidade natu ral de se especializar em todos os misteres, tem necessidade de mandar
os filhos para centros especializados onde possam ter uma preparação adequada. Mas, como a família continua a ser a primeira escola da criança e égrande, principalmente em nosso meio, a influência que a familia ainda exerce em matéria de educação, as duas instituições so
ciais,
escola e familia, que freqüentemente trabalham em sentidos
divergentes, e às vêzes opostos, deveriam aproximar-se e articular-se para o entendimento e a ação necessários a uma obra comum de edu
cação. As associações de pais e mestres não visam outro fim senão o de
pôr em contato e em harmonia de vistas, para uma ação convergente,
uns e outros, levando até à familia a atividade educativa da escola
(educação dos tilhos e reeducação dos pais) e permitindo à escola uti
lizar, no interêsse das crianças e dos adolescentes, tôdas as fôrças edu cativas e as influências verdadeiramente formadoras dos pais. Se essas associações de pais e mestres contribuem para resolver o problema da
colaboração entre a familia e a escola, as associações profissionais,
abrangendo trabalhadores do ensino nos diversos graus, público e pri
vado, teriam a vantagem de lhes alargar o horizonte acima dos quadros
estreitos de sua especialidade e fazê-los compreender mnelhor a sua ta refa em tÑda a sua profundidade e nos seus fins supremos. No seu livro "Le suicide", Durkheim, espantado comn a taxa de suicidios, verifiada na Europa, no século XIX, tão alta que classificou de patológica, já aconselhava como o melhor meio para restabelecer o dominio da nor malidade, nessa matéria, a organização dos "grupos profissionais". En bora não possa compartilhar da opinião de Durkheim, para quem os grupos tradicionais (familia, religião) que tinham atuado como pre servativos nas antigas sociedades, já não poderiam ser chamados à mes ma ação, (pois continuo a pensar que èsses grupos exercem e poxlem exercer uma influência poderosa), parece-me, com le, ser erònea a tendência de se conservar umn tipo estereotipado de meios para a exe cução de qualquer fim, fazendo dsses meios uns "incondicionados" válidos para tôda a sociedade em qualquer época de sua evolução. Não épossivel, porém, negar, no estágio atual de nossa civilização, a feliz influência moral que teria uma reconstituição dos grupos pro
FERNANDO DE AZEVEDO
128
fissionais, e, especialmente, do grupo profissional pedagógico, hoje
fragmentário e disperso numa poeira de subgrupos, numa vasta Cor.
poração de professôres de todos os graus e especialidades do ensino,
já Oto Willmann, cuja "didática ou teoria da formação do espírito,
cm suas relações com a sociologia e a história da cultura", visa DÔr
em foco o princípio da unidade orgânica de todo o ensino e a unida. de da corporação professoral, julgava que a tarefa do futuro será de
concretizar essa unidade numa vasta organização de todo o corpo pro
fessoral. Para êle, é sobretudo o professor primário que deve ser ini.
ciado nessa concepção do ensino considerado como um conjunto, sem
Ihe ficarem, porem, estranhos os departamentos de ensino situados acima da escola primária. Se égrande a utilidade social e moral de organizações dessa natureza (e já tivemos ocasião de lhes fazer refe rência),
oúnico perigo que se poderia recear, o da formação de um
espirito de classe, estreito e utilitário, nos parece afastado, já porque
o desenvolvimento do "espirito de corpo" (1) se faz no sentido de um liberalismo cada vez mais largo e mais tolerante, já porque a união, na mesma corporação professoral, de professôres de diversos graus e setores do ensino, tem de forçosamente concorrer para prevenir e cor rigir os excessos e estabelecer o equilibrio. Cada grupo profissional
(eclesiástico, militar, etc.) torna-se cada vez menos exclusivo de outros
grupos, como éfácil constatar e o demonstra o desaparecimento pro gressivo dos costumes, dos usos cerimoniais de tôda sorte. Acresce
que, com a multiplicação dos círculos sociais de que um indivíduo faz
parte simultâneamente, e que levou Palante (2) a julgar estivesse o "es
pírito de corpo" destinado a desaparecer,
pos diferentes que se contêm
essa concorrência entre gru
uns aos outros, deve necessàriamente im
pedir tornar-se tirânico o espírito de grupo e capaz de absorver com
pletamente os individuos. Essa feliz situação que faz com que o indi viduo poSsa misturar-se àvida de associação, prender-se a ela, sem cair
sob sua dependéncia, é um dima favorável à organização e ao desen
volvimento de todo o corpo de professôres para os fins que se têm em
vista, isto é, para uma ação em comum, de largas perspectivas, sem o
perigo de se transformarem essas associações em grupos estreitos e
Lechados.
PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Àmedida que se desenvolve em variedade e riqueza e se complica a sua organização, uma soiedade se seciona em diferentes grupos particulares, com suas
ocupações, interésses e necessidades próprias. Adivisão da sociedade em grupos e classes distintas exerce influéncia sôbre o sentido das palavras que, ainda que herdadas da
mesma lingua "se colorem, nesses grupos, de uma nuança distinta a qual se fixa e
(1) o "espírito de corpo'" ou "espírito de grupo'", segundo observa G. Tarde, "consiste ern um orgulho coletivo, in tenso, em um amor próprio muito suscetível, comum a todos os membros do grupo, e também em uma simpatia mútua mas fechada que faz a sua solida riedade'. A tradição do grupo pode ser maleável, aberta às inovações, às importações de fora (o grupo industrial, o grupo artístico ) ou bem, rotineira, dobrada sÑbre si mesma, mais inacessível às influências exteriores, como a do grupo religioso, por exemplo. . TARDE, L'esprit du groupe, Archiv. d'Anthrop. Criminelle, 15 Janvier, 1900). (2) G. PALANTE -
L'esprit du corps, Rev. Philosophique, Aot, 1899.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
129
acaba por aderir à palavra". (Ex. operação, com sentidos diferentes conforrne seja o têrmo usado por um cirurgio, um militar, um comerciante, um protessor de álculo,
etc). Esse fenômeno de variações semánticas, observado por Michel Bréal, Antoine Meillet e outros, tem as scguintes causas:
a) as diferenças de ocupacões c interêsses, nos diferentes gTupos: como nem o estado de espírito nem a direção da atividade são os mesmos, num sacer dote, num soldado, num educador ou num médico, cada grupo de homens utiliza de uma maneira particular os recursos gerais da língua. b) a heterogeneidade, do ponto de vista lingíiístico, de cada um dos grupos que se formam no interior de uma sociedade: compostos de pessoas que não saíram necessàriamente da mesma localidade, da mesma região, "essa ausência de homogeneidade é evidentemente una caua de instabilidade e de incerteza", e. portanto, uma das causas principais das mudanças lingüísticas
como dos empréstimos; c) o maior ou menor isolamento do grupo em relacáo ao resto da sociedade: quando se trata de um grupo mais ou menos fechado, mais ou
menos autônomo, "a variação do vocabulário náo se limita ao que exige a naturcza mesma do grup0; ela éaumentada intencionalmente em conseqüênia da tendência que tem cada grupo de marcar exteriormente sua independênia e sua originalidade" (os argots). Poder-se-ia fazer uma investigação sôbre a lingua dos estudantes brasileiros
(como KLUGE, no seu Studentensprache, em que estudou a língua dos estudantes
alemães) ou dos soldados brasileiros, a exemplo do que fêz HORN. no seu Soldaten
sprache, sôbre a língua dos soldados alemães.
2. Mostrar como o grupo profisional pedagógico, que não se distinguia a
princípio do grupo religioso, confundindo-se "educador" e "sacerdote", se desprendeu para constituir um grupo autÓnomo, caracterizado por uma atividade essencialmente
específica, sob a pressão de causas sociais, culturais e econòmicas, entre as quais:
a) a divisão do trabalho social e a especializaçio de funções: b) a complexidade de estrutura social e a multipliidade de gupos em que se dividem as sociedades e para os quais se exige preparação especial. c) a complexidade da função educacional, decorrente do progresso cien
tífico e técnico, que reclama uma especialização profissional para o magistério
de todos os graus; d) a corrente do "laicismo", em virtude do qual, desligada a Igreja do
Estado, se "secularizou" a educação, separando-se o "sacerdote" e o "educador". com suas funções distintas; e) e a tendència do Estado moderno a ampliar a estera de suas atribui ções, e, em conseqüència, a exercer, ou ao menos a controlar a função edua cional, cada vez mais complexa e dispendiosa. 3. Os educadores constituem um grupo social profissional bem caracterindo que faz parte da categoria social denominada, em geral, e impròpriamente "clase dos intelectuais, isto é, certa formação social que está acima das classes e fora delas (sozialfreischwebende Intelligen:, ALFR. WEBER), se compõe de individuos de tôdas as classes, naturalmente dotados, cujas disposiçóes hereditárias encontraram um meio social favorável ao seu desenvolvimento e que se distingue dos outros gTupos. a) por uma diferença de grau de evolução social e intelectual: b) por um desenvolvimento particular das funçes psiquias e pcla cultura dessas funções, no sentido formale material: c) e, portanto, pela cultura geral ou especializada que é uma das grands caracteristicas ou traços especificos da categoria dos intelectuais: d) e pela sua função socia! de organizaão, ransmisão, irculaçio e aperfeiçoamento (função critica) dos bens e valores espirituais Analisar a origenm e a formação social da categoria dos intelectuais (chamados antigamente "letrados") para separar e detinir os traços especificos que os distinguem como grupo dos ouros grupos sociais e que não constituem uma questão nem de
FERNANDO DE AZEVEDO
antes As sociais se ligam e sexo, de nem raça, biológicas. clase, nem de analisando os seus caracteres e geográficas condições social" do cducador, social (transmissão de função "tipo o sua de natureza 4. Estudar estreitamente ligados àexemplo: dência feita), como por conservador até à rotina: acentuado entre os profcssôres a) o espírito "dogmatismo", mais
condições
I30
que
pricultura ncipais,
primários,
b) o
com as crianças; contato constante de conduta
do
a
e
pelo
sua quc corresponde típico ) um cstiloconforme as condições sociais de cada meio; particular e varia contribuem para acentuar êsses fatôres que ou causas a) as o trabalho cotidiano que estreita constantemente o horizonte, especial. e à
mentalidade
caracteres:
mente, na educação;
conseqüência, o baixo padro de via. b) o salário reduzido e, emmateriais e de iniciativas e meios de renove inufhiència de meios profissional, e de tudo o que estimula a vida do espírito; de cultura, geral ou isolamento em grupos mais Ou mnenos fechados, cond tendência ao
natureza do ensino. forme o nivel e a
faz pate grupos sociais de que o indivíduo o ibeta de número do aumento O já observaram Bouglé e Simmel, uma sociedade determinada, conforme dêles. algum modo de cada um a posico ou a uma investigação para estabelecer inquérito 5. Proceder a um profissionais dos grupos pedagógico, na escala hierárqica advogados, comerciantes do grupo profissional engenheiros, médicos, (estratiicação interprofissional), de um dégses cada de meio, nosso industriais. etc.. analisando-se a importância, emnum dos seguintes dados: cada grupos mediante o estudo comparativo de para o exercício das atividades estabelecidas c) as condições legais registro, etc.); profissionais de cada grupo (duração dos estudos, estágio, geral, 0 que vence em b) honorários e vencimentos ou, de maneira etc.), tendo-se em vista professor, (médico, engenheiro,
média o profissional
as horas de trabalho;
aposentadorias) quando se ) vantagens e regalias concedidas (licenças, pública; trata da aplicacão da atividade profissional em função de "maior procura" (profissões grupo do d) autoridade ou prestígio social social" do indivíduo, ou pelas facilidades ou mais indicadas para elevar o "nível de aceso à vida pública, política e administrativa). a estratificação interna de um 6. A hierarquia intraprofissional representadistinção e classificação hierárquica a mesmo gTUpo de oupações, como, por exemplo,operários, e é mais ou menos rigida e e entre engenheiros, empreiteiros, empregados Estudar interna no grupo estratificação a Complexa conforme o grupo ou a profissão. de nível de preparação proisio profissional pedagógico, marcada pelas diferenças coexistem, C nal, de vencimentos, de regalias e vantagens, e as proporçõcs em que nosso sistena educaional, as diversas classes ou categorias de professöres:
a) mestres-escolas ou professôres primários, que
Constituem no gTupo,
2 categoria mais numerosa;
b) mestres e contra-mestres, de escolas técnico-profissionais;
)
professôres de ensino secundário;
(sobrepondo-se, nesse
d) professöres de ensino superior e universitário e catedráticos). e grau de ensino, preparadores, assistentes, livre-docentes de um lado,
imp1cava já suprimida no ensino secundário, entre professor (letras, mestre, de outro (mestre de desenho, de trabalhos manuais, de ginástica) uma distinçáo de cdasse, baseada na superioridade do ensino intelectual
A distinço
ciências) sötbre o ensino de atividades de base manual e mecánica.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
131
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10 Sociologia Educacional
Capitulo III A ESCOLA,
UMA INSTITUIÇÃO SOCIAL
e A ação educativa difusa nas outras funções da vida social. - A escola criadoras. fôrças A as e antecedentes Os origens. de suas problema o
escola, uma instituição social.
Campo específico de educação.
A variedade
de formas que revestem as organizações escolares. - As formas corporativas A A evolução das instituicões escolares. da escola, na Idade Média. escola, instituição solidária com o conjunto das instituições sociais, domésticas, políticas, econômicas e religiosas. - A diversidade de "ipos" de escolas. As escolas especiais. - A equação entre a pressão do meio escolar e a da
atmosfera social geral. - Acducação institucionalizada pode criar distincias
e conflitos sociais?
A escola, como instituição normal do país e expressão da
consciência nacional. - As instituições escolares e sua importância nos tempos modernos.
Procurando lançar as bases de uma verdadeira ciência da educa
ção, Durkheim,
e com èle todos os que estudaram objetivamente
essa nova ordem de fatos, verificou que o fenômeno de educação se produz em todos os grupos sociais, manifestando-se, ainda em estado
difuso, nas sociedades de tipo primitivo. A educação que se revela
"como uma preocupação constante de transmitir à nova geração os bens intelectuais e morais acumulados pelas gerações anteriores", antes
de se concentrar em órgãos especiais (escolas), apresenta-se difusa nas
outras funções da vida social, tomando, porém, já nas sociedades pri
mitivas, formas embrionárias ou rudimentares de organização nas séries de "iniciação" dos adolescentes na vida dos adultos.
Mas, por mais di
ferente que possa parecer o estado amorfo (educação assistemática e
difusa) que o precedeu, o regime institucional (função concentrada e organizada) saiu diretamente dle e coexiste com èle, como já vimos, ainda nas sociedades mais avançadas em que essa difusão se atenua sem nunca deixar de existir. Nenhuma revoluç£o, nenhuma vontade individual implantou a escola. É uma evolução lenta que lhe deu ori gem, que aliás remonta às civilizações mais antigas. Se examinarmos as fôrças criadoras que, concentrando a fumção educacional em doninios especiais, com agentes e meios próprios, lhe deranm uma vitalidade nova e um movo aspecto, encontranmos duas principais: umna, essencialmente cultural, a acumulação e o enriquecimento dos bens intelectuais e morais a transmitir de uma geração a outra, e a segunda, essen cialmente social, a especialização crescente, a divisão do trabalho social que "continua o melhor criterio geral do desde que se acompanhe de uma centralização proporcionada".progresso Mas essa evolução inão loi regular, unilinear. Pois, se se constatan formaçöes escolares,
FERNANDO DE AZEVEDO
1S4
de que só mais tarde se dese no interior de instituições domésticas e se, em tôrno dos deram, como na familia patriarcal naromana, Idade Média, pela sua importantes in-
função ros e das igrejas, t£o e pela natureza de sua n telectual c cconomica, como pelo número sistema educativo, de de um lação, se produziu a ristalizaçãosociedades primitivas, podem-Se c heterogènea, as iniciações, nas
derar agregados escolares, ainda que rudimentares, inteiramente inde pendentes da familia, e as escolas, na Grécia antiga, ja subordinadas
aos magistrados da cidade, se formaranm como instituiçocs autônoma
sem ligações com a familia ea religiâo. Entre os colégios e as aglomeraçöes escolares, de origem familial ou edesiástica, que lhes são logo assimiláveis, de uma parte, e os focos
ùnicamente escolares, autônomos, de outra, há uma diferença apenas
de processus institucional, ligada às diferenças de estrutura social, eco
nômica, politica e religiosa. Mas a especializaço,
acompanhada de sis.
tematização, em órgãos próprios, gerados no flanco de outras institui
Ções ou de formação autônoma, se produziu sempre que a educação difusa e assistemática se revelou insuficiente, devido ao grau de com
plexidade atingido pela organização social. A principio, ensina Paul Monroe, "a classe de mestres é representada pelos chefes de grupos fa
miliais; mas, multiplicando-se os deveres dos pais e tornando-se mais complexa a cultura dos espiritos, formou-se um sacerdócio especial...
Aparecem assim os primeiros mestres profissionais. Durante muitos
séculos o ensino permanece exclusividade do clero''. Mas, entre o pai de familia e o sacerdote que acumulam ainda, com a função educa
ional, as respectivas funções, doméstica e religiosa, e o mestre, assim denominado no grupo, por sua atividade especifica, êste era verdadei ramente o educador "profissional", enquanto os outros dois o são antes em conseqüéncia de outra função social, por acidente ou por acréscimo
em fases diversas da evolução social. Pode-se, pois, dizer que a educação
existe em estado adulto, quando a função educacional é organizada e
aparece, nese estado, desde que a oportunidade dessa organização é ressentida por todo ocorpo social que a impõe e a modela segundo a sua própria estrutura. Surge então uma nova instituição social (1), que éa escola, preposta, como um campo especifico de educação, a ministrar
a cducaço sistemática, comum ou especial, e que condiciona, como esfera de atividade especifica, a formação e organização de grupos re presentados por a) educadores e educandos (classe, escola, de qualquer (1) Tentamos aqui não só um "'estudo genético'", senão também um ""estudo analítico
da ins tituição sOCial que é a escola, sem expor preliminarmente, por presumi-los já conne cidos, Os caracteres de uma instituição. Durkheim identifica a institujcão e o fato soCia déste ponto de vista, observa P. Vignaux, é a instituicão que se abaixa até o fato soClai, cai ao nivel de uma coisa, uma realidad concreta e viva. submetida sòmente à causall" dade. Donde, a ezclusáo da finalidade. As 'teorias da instituição'" colocam-se, ao conu numa perspectivg finalista, carcterizan o "iato ben comum, o papel de uma sdéia. £ o elemento institucional"O por umg funcão, um nm, elemento "coativo'é tanto (Cor exprime-se em regras e nOr nas que forInam um primordial. coniunto: o todo institucional órgáo ou umn sistema orgânico quanto um coniunto de regras e de normas. A insutus que é dotada de pernanencia, capaz de sobreviver às vontades individuais, não e pressão de un simples "fato social", parece exprimir ainda uma ""norma" que, sUpe ezterior às vontades individuais, se apresen ta capaz de
obrigá-las.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
135
tipo ou grau), b) educadores (instituições de contrôle e de direção,
associações e sindicatos profissionais), e c) educandos (associações, gru pos, clubes secretos). Se a educação, em geral, como a define admirà velmente Willmann, "consiste na acão (previdente, diretriz e forma dora) dos adultos sobre o desenvolvimento da mocidade, com o fim
de fazla participar dos bens culturais que residen à base das insti tuições sociais", a educaço, dada nas escolas, é a) uma ação sisternática, b) exercida por agentes especiais (mestres, professóres) e c) em meios ou órgos especiais. Mas, sem ser rica, é grande a variedade de espécies ou formas so iais quc revestiram ou são suscetíveis de tomar as instituicões esco
lares em funcão dos "quadros sociais" em que tiveram origem e desen
volvimento. Quando hoje falamos em "escola", pensamos geralmente na forma que essa instituição assumiu nos tempos modernos eque nos parece tão inerente às instituições educacionais que, onde não vemos
essa "forma", já não julgamos encontrar uma instituição social dsse
tipo. No entanto, as iniciações, com seus ritos e cerimônias, os retiros,
nos bosques sagrados, e as sociedades secretas, com suas "classes de iclade", apresentam, nas sociedades primitivas, embora sob uma forma rudimentar, como jáobservamos, os caracteres fundamentais das insti tuições pedagógicas. Se as cidades gregas possuíam ginásios que se asse melhavam aos nossos e se consideravam instituições municipais ou na cionais, o que chamamos hoje "ensino superior", era dado em Atenas, geralmente em palestras, passeando mestres e discipulos em bosques, entre estátuas de deuses e àsombra das árvores, ou nos pórticos, nos mercados e nas praças públicas. Dai o nome de "peripatética" atribui
do à escola de Aristóteles, que começou a ensinar perto do templo de Apoio Licio e costumava dar lições, ao ar livre, "em amena palestra.
passeando nos umbrosos caminhos do templo de ApoBo". Não agiam de outra maneira Sócrates que expunha suas doutrinas, nas praças, nos
póticose nos mercados, aos mais variados auditóßrios, e Zenão, a cujos
discipulos, pelo costume de ensinar-lhes o mestre num dos pórticos
(oria), lhes veio o nome de estóicos. Na Idade Média, no principio do século XIlI, as Universidades, na França feudal, não eram senão
"corporações" de mestres e estudantes, e, portanto, uma das grandes corporações de oficios ou coletividades constituidas em pessoa civil, com seus privilégios como os tinha tòda corporação. A organização ins
titucional dessas grandes escolas às quais se reservava o que se pote
chamar então o ensino superior (studia generalia), diteria profunda
nente de nossas escolas de tipo ou nivel universitário. As Universida
des, cosmopolitas por longo tempo, abertas aos jovens provenientes de
todos os paises, constituiam grandes contrarias de pessoas, verdadeiras
associações de professores e estudantes, que se organizavam para dare
receber lições e a cujo reitor, - um dos estudantes, em Paris como em
Bolonha, chete da corporação universitária, competia "manter os privi
légios, dirigir-se ao rei nas circunstâncias solenes, presidir o tribunal
I 36
FERNANDO DE AZEVEDO
da Universidade, inspecionar cada mès os colgios, não cedendo o passo
senão aos legados do papa e aos cardeais de sangue real" (l).
Não seria, porém, possivel traçar um esquema racional, válido para todos os povos, do processo evolutivo da escola, nem quanto às insti-
tuições sociais (familia, fábrica, igreja) sob cuja dependncia
àsua emancipação nem quanto às "formas" que revestiu
estêve at e
sempre intimamente ligadas às formas dominantes de estruturaestiveram das so
ciedades, no processo de sua evolução. Ela não passou sistemàticamcn. te, como por um processo necessário, da esfera particular para a d Igreja, e dèsse domínio para o do Estado. Na China, em que se veri.
ficou, através de dinastias sucessivas, uma preOcupação constante pelo
progresso pedagógico de base puramente moral, a escola que atingira o pincaro (Hochpunkt) de sua evolução entre 2 205 e I 122 antes de Cristo, jáera pública (staa tisch ), nesses velhos tempos, como observa Aufhauser, a0 estudar a educação e o ensino na Índia, China Japão (2). Ao passo que, nas cidades gregas, os ginásios se organizaram
sob a dependência dos magistrados (escolas públicas, municipais ou
mesmo nacionais), oEstado romano sempre se desinteressou da instru ção e dos estabelecimentos de ensino até os tempos de Vespasiano, que
impôs às municipalidades o encargo de administrar as escolas: a edu
cação dada, em Roma, na familia patriarcal organizada como um centro politico, sôbre o modlo do Estado, se deslocou para as instituições par ticulares de ensino e, só mais tarde, se transferiu para a esfera do Es
tado. As instituições escolares, públicas ou particulares, mantidas pelo
Estado e pela Igreja, não são aliás formas absolutamente contraditó
rias nem exclusivas uma da outra: acontece mesmo, mas não necessà
riamente que se prestam mútuo apoio, em geral, embora, consideradas
em si mesmas, andem juntas, sem se ajudarem, e em competição, para
a conquista de predominio. E ainda mesmo depois que se foi preci sando o tipo de educador "profissional" e a escola, pelo movimento de laicismo, no século XVIII e XIXe pela importância que assumiu, se foi emancipando da Igreja; ainda mesmo depois que, separada a greja do Estado, se deu quase um secionamento do poder espiritual e do p0 der temporal, e, em conseqüéncia, ma ruptura entre o pedagógico e oeclesiástico, as escolas públicas, e as confessionais (mantidas pela
Igreja ou pelas congregações religiosas) coexistem, nos povos moder
nos, ainda que estas últimas tenham sido postas, em quase todos 0s paises, sob o contróle e a fiscalização do Estado. (1) Uma instituição nova, lembra Strowski, veio, do século XII, consolidar organização das universidades e fizar um pouco melhorno afimcondiço instituição dos colégios, cujo primeiro des tino foi de servir de abrigo dos aos estudantes. mestres e estu dantes pobres. Tal fo1 a instituição fundada em 1277, em Paris, no mesmo lugar em que ainda hoje se encontra, pelo capelão de S. Rotbert de Sorbon, que fêz construir um casa para mestres e Gstudantes pobres, de Luís, teologia. O colégio foi, pois, a principlo, estalagem ou hospedaria, mas, cono convinha cursos e bibliotecas. Essa, a origen humilde daa professôres e estudantes, com salay Mas, a partir do século essas fundações de caridade, essas casas de asilo Sorbonne. ou de pensão, "já se haviam mado em grandes estabelecimentos trans de ensino substituiram a universidade decrépita, na sua tenaz vitalidade. (P. absorvendo-a STROWSKI, Étudiants et étudiantes. Text 180 1llus trations. Au moyen age, págs. 10-22, Flammarion, Paris, 1935). (2) Apud Geschichte der ldeen Die Einrichtungen pedagogischen in den turlcender. Vol. 5. Parte I k j. B. AUFHAUSER - und Pedagogik der nicht grossen christlichen Kulturvoelker, München, 1934.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
137
na organização patriar Conforme o prcdominio da família, como ou do Estado, politico romana, da Igreja, como na Idade Média,
cal terse-á uma subordinação religioso, ou politico, na civilização atual, Estado. Na Idade Média, por maior da escola à familia, à Igreja e ao cada grande mosteiro tinha capítulo catedral, exemplo, em que cada sòmente mas se instruíam os futuros clérigos, suas escolas, onde não subordinação origern e condição, a tornaram se admitiam crianças de qualquer rigorosa que as Universidades se
das escolas à Igreja era tão de ortodoxia". Mas quem sobretudo academias teológicas e cidadelas perpétua do mundo dos clérigos aspi diz Idade Média, diz interpenetração também dos cuidados profanos e das portanto, e, leigos, dos do e as sociedades e aglomerações urba
rações religiosas. Em seu nascimento,pelas fundações de novas paróquias, paróquias, nas, cujos progressos são atestados lugar na estrutura eclesiástica. As
tiveram de procurar umn recente, forneceram seus quadros aliás, fôssem antigas ou de criação sobretudo quando elas com coletiva; ação da formas muitas a naturais mais ainda, se, - cono se deu
ou portavam um conselho de fabrico, de cidade haviam, êles pró habitantes muitas vêzes na Alemanha, - os patronato. Mais tarde, os estreitos laços de
prios, recebido o direito de patriciado e o clero local, recru o entre estabeleceram se que familia explicam a atitude do elemento tado entre os filhos e os protegidos, corporações. "Numa época clerical, entre a aristocracia mercantil e asmais ou menos ributária da conhecimentos era em que tôda ordem de erao inevitável resgate da vida religião, observa Calmette, essa orientação das cátedras dos mestres e intelectual intensa que se irradiava em tôrno ésse despertar do hu
preparava de longe dos conciliábulos de alunos, e aurora dos tempos modernos, tão eficaz na ser, deveria que manismno da Idade Média para a atual, mente evocador" (1). Mas, se passarmos da escola ao Estado, e, em maior subordinação uma é verifica o que se a Igreja eo Estado, para a conseqüência, uma série de conflitos entretende a tornar-se "pública", conquista e o dominio da escola, que das fatôres que trabalham na transformação já pela pressão ex terna desentido de desenvolver as funções e o raio de instituições políticas, no ação interna das instituições ação do Estado (estatismo). já pela própria complicandose na sua estrutura, escolares que, crescendo em volume eextremamente complexos, de um se organizam em sistemas culturais dos orçamentos poblicos, e, de lado, inpossíveis de se manterem fora "interèsse público" pela influència outro lado, cada vez mais ricos de gerações novas. que são suscetíveis de exercer sôbre as é uma instituição solidária pode-se, pois, atimar, A escola, só sob e, na sua evolução, nãorelacöes sociais instituições das conjunto com o também do ponto de vista das
religiosas) oaspecto morfológico, senão instituições (domésticas, politicas, povo cada de subordinação a outras linhas de evolução social geral da as época, cada Tem-se em segue, determinada civilzação. e as tendências e os caracteres de (1) CALMETTE J) -
Calun, Puris, 1927. La société téodale, Armand
FERNANDO DE AZEVEDO 138
acusado a escola de ser confessional ou religiosa, pública e às vêzes mesmo politica: no entanto, o seu caráter rel1gioso ou político é ais
socit ou menos acentuado conforme as tendências dominantes do meio a que cla serve, a cujas influências não pode subtrair-se e que, trans. formando-se, a faz "variar" em conseqüência, com o mesmo sentido e na mesma direão. Na Idade Média, com o movimento de associacio que levanta a indústriae produz um renascimento econômico, "as of.
cinas senhoriais, escreve |. Calmette, vêm fundir-se com o trabalbo
livre no quadro da corporação, tornada o tipo industrial da Idade Me.
dia evoluida". Tôda acorporação de oficio, nos séculos XIl eXIII, &
uma "universidade", gozando da personalidade civil e tendo sclo
estandarte. As corporações têm bens e são, às vzes,
riquissimas. Nas
corporações de oficios em que são submetidos à mesma regulamenta
ção aprendizes, operários e patrões, os operários são alojados e alimen
tados em casa do patrão (l): foram todos aprendizes e não podem ser mestres ou patrões sem terem obtido a sua mestria depois de um exame
sôbre a teoria do ofício e depois da execução de uma obra-prima teste munhando sua habilidade profissional. A escola especial (técnico-pro fissional) em que se faz a aprendizagem dos oficios é, como se v», uma
corporaço que é, por sua vez, a um tempo, escola e oficina de pequena indústria. £sse mesmo espirito de associação que presidia ao desenvol
vimento da indústria e do comércio, deu à Universidade, no sentido intelectual da palavra, sua fisionomia corporativa. A Universidade, como vimos, é também uma "corporação" de professôres e estudantes, com seus bens, seus privilégios, seus estatutos. As formas que assumem
as escolas especiais, de tipo profissional, as Universidades e as funda
Ções colegiais, são modeladas pelas formas características da sociedade:
e a subordinação da escola à Igreja explica-se pela interpenetração do
mundo dos clérigos e dos leigos, e pelo predominio da Igreja e dos
estabelecimentos monásticos que desempenharam "um papel altamcn te moral ecivilizador na história dos tempos feudais". Não é, porém, nas sociedades, simples e homogêneas, de voiume restrito e de estruturaelementar que épreciso buscar o segrêdo do de
senvolvimento da escola e da variedade de seus "tipos" (escolas espe
ciais). Ao contrário, importa,
e no mais alto grau,
estudar êsses
fatos nas suas próprias fontes, isto é, nas sociedades modernas, cxtre mamente complicadas, no interior das quais, em virtude de sua exten são e complexidade crescentes, se diferenciam nitidamente as funções
sociais de tóda ordeme aparece um grande número de grupos ocupa
cionais, com suas funções e necessidades próprias. À medida que a so ciedade se complica na sua organização e cresce aimportância dos gru
pos prolissionais, em que se secionou, surge, em correspondência com
(1) A organizaço corporativa, de resto muito antiga, como diz Funck-Brentano, tivera origem no trabalho familiar, conservando, até às vésperas da RevoluçãO Francesa, as carac terfsticas mais preciosas e mais encantadoras. O aprendiz era criatura da casa do patrao; fazia literaimente parte de sua família; sentava-se à mesa do mestree dormia sob o seu teto. O mestre por sua vez transmitia as tradições, Os costumes, a arte da casa que
aprendiz era chamado a con tinuar; e ambos se sentiam orgulhosOs dessa missáo.
139
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
êstes grupos e para atender às suas necessidades especificas (1), uma grande variedade de "tipos" de escolas, isto é, escolas especializadas para a formaço de técnicos e profissionais, no dominio das ativida des de preferência intelectual (cientificas, literárias e artísticas) e das atividades de base manual ou mec£nica. São as escolas de direito, de cngenharia, de medicina, de educação, de comércio, agricultura e in
dústria, para citar apenas algunas: destinadas, umas à especialização no campo profissional (profissöes liberais e oficios), outras, à especia lização no terreno cultural e científico (filosofia, ciéncias e letras), e.
ainda outras, a pesquisas e aos altos estudos. Se a estrutura dessas
cscolas se modela segundo o tipo de organização social geral, ern que
se formaram e florescern, a cada uma dessas escolas especiais imprime
uma fisionomia particular a sua finalidade própria, determinada peio
grupo para que se organizou e a que serve nas suas necessidades fun
damentais. É ste um fenômeno caracteristico da época contemporå nea; a marcha para os sistemas culturais complexos, com o crescimento
de número de escolas especiais que, formadas sob a pressão das exi gências dos grupos secundários, se incorporaram radicalmente nos sis temas públicos, ou projetadas dos próprios grupos em que se forma ram,
como, no caso dos grupos industriais, desorganizados pelo apa
recimento da grande indústria e da maquinofatura, - apenas aderi
ram aos sistemas, instalando-se nos seus flancos, para voltarem a loca
lizar-se nas próprias fábricas, segundo o regime das corporações na Idade Média. Éo caso das escolas técnico-profissionais. Essa marcha
para a educação complexa, como para a economia complexa, implia
certamente um progresso das tendências estadisticas: a uma especializa
cão maior e, em conseqüência, a uma complexidade maior de sistema,
corresponde maior esfôrço de centralização.
Assim, pois, qualquer que seja a forma que possam revestir e seja qual fôr a sua função especifica dentro do campo da educação, as esco
las, gerais ou especiais, sofrem uma pressão continua para se amolda
rem às exigências de cada sociedade e às formas de estrutura social. "A escola, como expressão normal de um pais, no dizer de Ortega v
Gasset, depende muito mais da atmosfera publica em que flutua do
que do ar pedagógico artificialmente produzido dentro de seus muros. Não é boa a escola senão quando há equação entre a e outro ambiente". É exatamente o que exprime Sadler pressão de um quando indica. (1) ¾ falsa a noção de educação que "nos dà apenas a idéia de um dasen volvimento de todos os poderes mentais sem nos proporcionar a idea do uso a que s se 30 da destinar'". Se, por um lado, "a
única adequaçoo possivel a dar a criança, Das
condies existentes, é a que resulta da plena de seus poderes, pondera Dewey. pot uro lado, para saber o que é um poder, posse devemos conhecer a sua tunahdada, so ou e não podemos saber senão admitindo o individuo como o ser aivo ds re.es suno. No seu livro os 'O
nelhor dos
mundos'
atirma Huxley que, criangas destinadas a se tornarem trabalhadores de usinas seráo apresentads otes e belos aspectos da natureza, sempre acompanhadas de
sensaçSes dolorsas. ra e te nham horror a essa natureza de que so con3 tan teente aias tadas em virtude de suas futuras funções divisão do trohh na Assim náo lhes era ausa de inicdade a sua reclusão forçada. Embora se trate de uma suposio, da um sonho de omancia ta. parece existirem, nela, duas verdades tundamen tais: uma,a de que a uo. psicológico, Se baseia na teorta dos retlexos condcionados a saber, que o desen volv inentointeiramente dos poderes, dos gos tose das cupacdades do se faz (e éste á o aspecto social da educução ) em vsta do uso que deles tenha na sociedadee na sua protissao. de vista
d
pon to
acutra
indinduo de fazez
FERNANDO DE AZEVEDo 140
influência tiveram no estrangeiro, ", entre as idéias inglêsas que mais vivificantes da conscièn. compreensão dêse fato de que muitos fatôres impostos nas escolas, mas da cia nacional provm não dos programas goza de grande in. tradição social que, apesar de sua maleabilidade, e esclarecendo cssa fluência, e da qual a escola, ainda que filtrando entanto, a educacão. No tradição, retira o seu melhor impulso vital".escola, por isto mesmo gue quando toma uma forma institucional, - a artificial e distante da é mais sistemática e refletida, pode tornar-se antagonismos e confli
vida, riando distâncias sociais e exacerbando educação se tos sociais. Enquanto não há uma organização escolar, a e à ação educativa liga ao sistema cultural ocasionalmente existente efetivamente ativida natural das pessoas e dos circulos que exercem des educacionais, como sucede nas sociedades primitivas, e em geral, nas sociedades, de volume restrito, mais simples e homogêneas. A edu pelo con cação mais natural e espontânea, dada, na própria vida social, e assistemática mais mesmo, isto junto das gerações adultas, é, por
menos consciente. Mas, ainda que de formação espontânea nas suas origens, a escola, como uma instituição social, está mais sujeita à ação e àiniciativa individuais, reformadoras, que podem, conforme os casos, ou acentuar os caracteres de sua estrutura adaptada às condições sociais,
passageiramente uma organização artificial, desarti imprimir-lhes ou culando-a do meio e fazendo dela um foco de conflitos sociais, tanto mais graves quanto as reformas educacionais não foram acompanhadas de reformas sociais, de grande envergadura. E, se êste é um fenômeno que se pode produzir, e já se tem verificado, - sobretudo no mun
do atual que, muito longe da concepção liberal individualista, tende
asubstitui aorganização espontânea pela organizaço "querida".
VO
luntária, não é menos verdade que a escola constitui, em geral, nas
sociedades modernas, como diz Alois Fischer, talvez a "melhor orga
nização de peneiramento ou de seleção social" (1).
Mas, por mais bem organizada que seja a escola, mais adaptada
ao seu meio social e aos seus fins, por mais largo que seja o seu âmbito
de ação e mais animadoras as suas perspectivas, a escola não pode ser (1) legítima No estado aatual da velha con trovérsia da transmissão dos caracteres adquiridos, parece-nos conclusão de que os beneffcios da educação não se podem trans
mitiu, por via bereditária, de uma geração
à seguinte: não se chegou, de fato, a demonstrar
transmissão de em um caráter adquirido pelaelas educação. famosas de experiências de Pavlov que,genética a principio, 1923, julgara ter comn provado aAs hipótese Lamarck, e csnovas investigaçoes de W. MacDougall, da Universidade de Duke, também com os
ratos, e do sábio nglês E. w. MacBride, com certa espécie de insetos importados da India, não chegaram a restabelecer a teoria hereditária dos caracteres adquiridos. Mas aedu cação pode ezercer um papel notável de filtro ou de reativo procedendo a uma seleçao em cada nova geração, isto é, indicando na massa humana, ou, melhor, na massa escolat. os biotipos mais evoluídos intelectualmente e de uma adaptação mais rápida e completa a atividades e profissões determinadas. A pluralidade das inteligências 6 um fato que
resulta da experiência e da observação, e é estudado pela noologia, ciência dos tipos inte lectuais, e um dos ramos da psicologia concreta, como a etologia, ciência dos caracteres ou dos tipos éticos. A uniformidade da estrutura da intellgência humana não exclui a diver
sidade das aplicações da inteligência e, por conseqüência, das formas que pode reves t. As virtualidades ou aptidões gerais do indivíduo não se desenvolvem iqualmente: êle con trairá na escola tais ou quais hábitos mentais, e as suas ocupações ordinárias e as necessl; dades intelectuais que delas resultam, contribuirão a orientar seu espírito en tal ou qual a classicaçao dos principais grupos de mentalldade eo diagnóstico direção.,Pesquisa A
podem, pois, cornportare conseqüências pedagógicas notáveis, só solução dos problemas de seleçóo orientação profissional como hre nãoorganização racional dos estabelecimentos escolares.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
141
apresentada, conforme otem sido freqüentemente, nern como a grande "organizadora da vitória", nen como a grande "fornecedora do crime".
Já não se afirmou tantas vêzes ora que "abrir escolas é fechar prisões",
ora que "as causas da delinqüncia juvenil residem na instituição da escola pública"? E não repetem todos os partidos, lembra Bouglé. que aquele que se apoderou da escola, tem nas mos a sociedade inteira? Certamente, as escolas nunca tiveram, em qualquer periodo da civili
zação, a importância que assumiram nos tempos modernos, pela sua
varicdade, pela riqueza de seus recursos e pela sua organização. Se confrontarmos um sistema escolar nas civilizações antigas, mais com plicadas e altamente evoluidas, com os sistemas educativos nas socie dades modernas, não podemos deixar de reconhecer a sua enorme dife rença: nenhum daqueles apresenta uma tão grande diversidade de es colas, de todos os tipos e graus, coordenadas e subordinadas num sis
tema, nem o número de unidades da mesma espécie espalhadas no
mesmo nível ou hieràrquicamente sobrepostas, nem a solidez do tra vejamento que sustenta essas vastas e complexas armaduras dos siste-.
mas escolares modernos. Mas convém não esquecer que, com èles, não
desapareceu, mas apenas se atenuou a ação difusa da vida social no
seu conjunto e que, em tôrno deses focos de irradiação de cultura e
dsses admiráveis e complexos instrumentos de ação consciente, se es tende tôda a espécie de förças invisiveis e de zonas de influncia,
po
derosamente aparelhadas para fortalecer ou contrariar a ação da escola na formação do indivíduo. "Comparemos, escreve Bouglé, numa pá gina admirável, comparemos a essas pressões e a essas opressões in voluntáias (da sociedade em geral) a palavra do mestre na sua cdasse: oponhamos às raras lições da escola as lições incessantes da vida, e aos professôres pròpriamente ditos, os preceptores de que fala Helvetius, que são os amigos e as leituras, e a forma do govèrno sob o qual se
vive, e a condição social em que se está, e as condições sociais do meio
e todos os azares da existência. Compreender-se-á então que a zona luminosa é singularmente mais estreita que a zona de sombra: os pe
quenos focos de ação consciente que so as escolas, não são senão pon toS na noite, e a noite que as cerca, não é vazia, mas cheia e por iso
mais inquietante; não é osilênio e a imobilidade do deserto, mas
o frêmito de uma floresta povoada".
PROBLEMAS E DISCUSSOES
1. Se considerarmos a educaço,
na sua evolução histórica, constatamos que.
difusa na origem, ela se especializou em seguida, concentrando se nas mhos de
funcionários especiais e em órgãos próprios (escolas). Aesxola, como instituição xial:
a) tem as suas origens nas sociedades primitivas em que, embora o ensno tenha por caráter essencial ser difuso, já aparecem as formas rudimentares ou embrionárias da "escola", nas séries de iniciaçåo, nos santuáriose nas soxialades secretas (ctr. c. VI, Parte l): b) fornou-se e desenvolveu-se nos Elancos da religiao e no interior da
familia, contome as civilizações: na fndia e no Egito sáo os sacerdotes encarre
FERNANDO DE AZEVEDo
142
gados desta função e. na ldade Média, o ensino continua em poder da dase
sacerdotal;
) só mais tarde se desprendeu de outros grupos e instituições sociais em cujo seio se formou, para se tornar uma instituição nitidamente diferen ciada, com sua função específica, seus lugares, regimne, processos e funcionários
espeiais.
Estudar a cscola como instituição social, nas suas origens e nas fases principais de sua
evolução, e mostrar como a sua emancipação eo seu crescimento foram
favorecidos, nos tempos modernos, por diversos fatôres, entre os quais a divisão do trabalho social, a separação dos dois poderes (movimento do laicismmo), o progresso
cientifico e acrescente especialização de funções. 2.
Aducação, como esfera de uma ação específica, observa Fischer, realiza-se
num meio especial (escola). condicionando a formação e organização de grupos repre
sentados por:
a)
educadores e cducandos (classc, cscola, colégio):
b) cducadores (associações pedagógicas, ordens e sindicatos profissio
nais, instituições de contrôle. diretorias, etc.);
) cducan dos (associações escolares, recreativas, esportivas, culturais, socie dades e clubes secretos, etc.). Proceder a uma investigação ou inquérito sôbre uma escola ou um conjunto de escolas de determinado tipo ou grau, limitando a pesquisa ao grupo dos educadores
e dos educandos, às relações que mantêm entre si e às associações de educandos ou
de ecucadores. que se formaram no interior das instituicões escolares e devem ser
analisadas nas suas origens, na sua estrutura e nos seus fins (estatutos, regimentos,
etc) enas suas relações de subordinação, de interdependência e de cooperação. 3.
A escola, como um fato institucional, é suscetível de ser estudada, em cada
meio soial e em cada época:
a) nas suas origens (iniciativa leiga ou confessional, pública ou privada); b) na sua primitiva finalidade e organização e nas transformações por
que passou, no seu processo de evolução;
) na sua estrutura atual (fins particulares, organização interna, tcnica d) no seu funionamento normal (disciplina, meios de acão, técnicas ensino, relacões entre professores ou entre estudantes, de professôres e
e administrativa, programas de estudos e atividades recreativas); de
estudantes entre si), e no seu rendimento (freqüència, percentagem de aprova
(ões, etc): ) c quanto às relações I) com o grupo ocupacional a que serve, se se trata de escolas especiais, profissionais; II) com a fanília e outras instituições
sociais; III) com a sociedade em geral, em cujo seio se formou, em que se
enquadra ecom a qual tende a modificar-se em conseq üência.
Tomar uma das escolas mais antigas de qualquer grau (primário, secundário
ou superior) sociológica ou de qualquer natureza (especializada ineestigação sob os seus diversos aspectos.
ou não) e proceder a uma
4
"Esforcem0-nos por conhecer a fundo nossa pequena cidade e a sociologia viverá", esrevia há cérca de 40 anos um colaborador de DURKHEIM. E, ainda recentemente, PAUL LA PIE, diretor do ensino primário em Franca, indicava ao
professor, no seu livro "L'école et les écoliers" que campos diversos de observaçã
sociológica podia enoontrar na sua comuna. Proceder a un estudo da vida social de
uma pequena comunidade rural e urbana e ) comparar as atitudes e as reações de uma classe de crianças da idade (tal como se pode ver, por exemplo, num grupo escolar) e de uma classe de rianças, no campo; b)
examinar a influência do meio social sôbre o desenvoBvimento
intelectual e moral de uma criança;
c) comparar as atitudese as reações dos pais em face da escola, de sua
vida nornal, dos inidentes escolares (puniçóes, reprovações) e dos mestres (oriundos do próprio meio social estudado ou vindos de meios diferentes)
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
143
Todas as instituições sociais, econômicas, políticas, religiosas, de uma
sociedade dada, estão de tal modo entrosadas no sistema geral e trazem tão marcado
caráter dessa sociedade, que não é possivel compreend-las seno à luz do meio socal em que se fornaram. Assim, as instituições sociais pedagógias, Estudar, em face do sistema social de que fazem parte, no seu epirito e na sua estrutura orgånica: a) os "gináios" das grandes cidades gregas, e particularmente de Atenas, com seus pátios, jardins, bosques e estádios, em que aos jovens dos 13 a0s 17
anos era dada a cducação, superintendida pelos magistrados;,
b) a educação sistemáica dada pelos pais e, mais tarde, pelos escravos e libertos gregos na antiga família romana, que, concentrando tôdas as ativi dades sociais, inclusive a função educacional, constituía como que "um pequeno
Estado" (cfr. a educação na família patriarcai brasileira, no período colonial c no império); as Universidades que, no regime corporativo da Idade Média, não eram c)senão grandes corporações de oficios, associações de mestrese estudantes (séc. XIIl), que se organizavam para dar e receber liçóes e que, cosmopolitas (mestres e estudantes vinham de tôdas as partes), tinham seus privilégios, como
tôda corporação. 6. Seja qual för aescola que considerarmos, o ensino secundário ingls, o liceu francês e a universidade alem, "seriam intransferiveis, diz Ortega y Gasset, porque instituições (dentro da totalidade nacional) são uma porção dela mesma. Sua essas realidade integra éo pais que as criou e as mantém". O que valem essas instituições provém menos de sua forma estrutural (regime institucional) do que das "virtudes ambientes e gerais" dsses países que nelas se refletem, com suas mentalidades par ticulares (qualidades e defeitos), como se pode ver: a)
na escola inglêsa, privada, social, naional, fiel à radição nacional
e cristã que mantém à base da educação e do ensino, a religião, a formação do caráter, o respeito à pessoa humana, a liberdade individual, e em que
tudo se ordena à formação de individualidades "livres, pessoais, conscientes e ideal de gentleman, o seu espirito esportivo, o fair-play): literário (o "letrado ativas" (cfr. O liberalismo inglês, o seu amor àtradição, o seu empirismo, o
b) no liceu francês, com o seu ensino humanista e é o tipo do francès cultivado, como o "gentleman" o é do ingls), radicionalista até à rotina, individualista, intelectualista, em que predomina o espirito carte
siano e "todas as preocupações da pedagogia convergem em consequènia para a instrução" (F. DE HÔVRE): c) na escola alem,
oficial, política, nacionalista (estatização do ensino,
pela predominância, na hierarquia dos valores, do Estado sobre a Sociedade). que se propõe a formação do espirito de disciplina e de organizaço, de acordo
com o ideal de vida militar, e a favorecer, com o desenvolvimento inteiectual. num ambiente carregado de estimulos para a ciència, "a cultura", compreendida
esta palavra, explica De Hovre. coino "o conjunto das förças opirituais nacionais, organizadas e regidas pelo Estado e para o Estado".
7. Se observarmos a pluralidade e a diversidade das forças que concorrem
ao desenvolvimento da sociedade", e colocarmos o sistema pedagógico em eu lugar. no conjunto, isto é, no nmeio dos sistemas doméstico ou politico, eonòmico ou relgioso, adquirimos: a) a idéia do conjunto das fôrças e instituiçóes que trabalhamn sôbre o individuo imaturo (criança e adolescente) para nèle organizar o ser social" e prepará-lo para a vida do adulto, de acordo com as necessidades, valores e ideais de vida em cada sociedade: uma concepção menos larga, menos idealista, mas certamente mais exata,b)mais realista do papel da escola, que não e "tudo na educação, mas que. por exercer uma ação consciente e metódica, fortemenie concenrada. pode exercer influência decisiva na tormação das novas geraçdes: Bouglé. se c) um sentimento maior de responsabilidade: pois, observa
muias fôrças são capazes de contrabalançar aquelas de que nos deram o manejo e a direço, devemos maneja las com unais exrupulo e estorçar-nos,
FERNANDO DE AZEVEDo
144
procurando seu melhor ponto de aplicação, por Ihes obter o rendimento
máximo";
d) ea consciência mais viva da necessidade de fortalecer eampliar a ação da escola, por um conjunto sistemático de medidas e, entre estas, as que se destinam I) a associar å obra escolar, dirigindo-as no mesmo sentido,' as
instituições sociais não escolares, e II) a pôr, a serviço da educação, o jornal, ocinema e o rádio, já reduzindo, mediante o contrôle pelo Estado, as suas
influências prejudiiais (medidas negativas), já utilizando-as (medidas positivas)
como instrumentos de ação educativa.
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WALLER (Willard)
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Capitulo IV
AROTINA NA EDUCAÇÃO. FORMADORES E REFORMADORES A tradiçãoe sua förça coercitiva. - As sociedades, ainda as maisA avançadas, O papel da rotina na vida social. noção do equilíbrio social. - As rupturas de equilibrio e as crises sociais. 0 resta belecimento do equilíbrio graças às invenções da técnica industrial e social. terrivelmente rotineiras.
-A rotina na educação. 0s As fatosidéias de inovaço, de constância dos inovadores novas e o papel das individualidades.
e de resistência a inovações.
- As idéias tecnológicas e não tecnológicas. Constancia e rotina podem er fatos de individuos, e inovação e revolução, obras de grupos esubgrupos. - 0s periodos "orgânicos" e os períodos "ríticos" e os tipos sociais de educador que lhes correspondem.
periodos de crise social.
o tipo de formador. - Os precursores. - Os
Reformadores sociais e reformadores de educação.
A consciència coletiva é, para Durkheim, oconjunto das crenças
e dos sentimentos comuns àmédia dos membros de uma mesma socie
dade e formando uma sistema determinado (de semelhanças) que tem sua vida própria. Se ela não tem por substrato um órgão único, "no tem menos caracteres especificos que dela fazem uma realidade distin
ta. Com efeito, independente das condições particulares em que os in dividuos se acham colocados (eles passam e ela fica...), não muda a cada geração, mas liga, ao contrário, umas às outras as gerações suces sivas". As aquisições constantes da civilização se acumulariam, pois, na consciência coletiva, descrita por Durkheim e Halbwachs como um foco da memória coletiva que a consciência individual não pode nunca realizar totalmente, o reservatório da "radição e da continuidade" das
gerações, às quais o individuo não é elevado senão por uma educação
sempre penosa e fazendo-se por etapas. No interior da memória cole
tiva, cuja existência Halbwachs discutiu, "a tradição constante, cons ciente, relativamente clara, intencionalmente ransmitida, organizada, é a matéria e condição a um tempo por excelència dos "quadros so ciais". Em tÑdas as sociedades, essas tradições verdadeiramente conscien
Les e as demais formas de tradição, juridicas, morais, religiosas, são individuos no interior dèstes, e todos entre si, no interior da pröpria sociedade, "perpetuam entre os tempos da vida social geral a conti nuidade necessária", ao lado de outros fatos tradicionais, técnicos, eco nômicos, estéticos, etc. que "desempenham èse mesmo papel geral para as atividades especiais". Embora o poder de cada uma dessas tradições fatos que, ligando de maneira permanente os grupos e subgrupos, os
seja variável conforme as espécies, os grupos e as épocas, é certo que
atradição se esternde atudo, observa Mauss, e éao menos muito pode
FERNANDO DE AZEVEDO 146
e aos individuos, por uma rosa, impondo se aos gruposDurkheim que chamou scu "poder temente inesistivel a Uma vez criada ou já estabelecida, o que se transmite é padròes dição, pois é pela transmissão de seus de e das acumuladas experiências dições resultantes de
ação freqüencocrcitaivo",traculturais,Sempre suas
vida enm comum, que as
sociedades mantênm a sua
tra-
coesão,nccessi no dades dae espaço,
acontinuidade no processo de sua evolução. Mas, pela pressão que exercem as tradições, "as
sociedades ainda Imente arotineiras,
as mais avançadas são, como esCreveu Mauss, terrivel e se a massa sempre, e a clite as mais das vêzes se
recusam render-se a qualquer invenção", é que as inovações são determinam ou podem determinar rupturas de equilibrio Oulatos que sadaptaço, ainda que transitória, aos seus meios exteno e uma deinterno.do Tôda a inovação que é, pela sua própria natureza, um
consideradas
"habitual", traz, de fato, consigo uma perturbação na alastamento condutaa o estamos habituados e que parece "natural". As sociedades de tino
mitivo, que vivem de maneira tão adaptada aos seus meios e inteno, não sentem rigorosamente, diz Mauss, Senão uma externo necessi.
dade: a de continuar o que elas sempre tizeram. Elas seriam, pois. so.
ciedades não sòmente equilibradas, mas às vêzes voluntàriamente eaui. libradas (l). Tradição, continuidade, rotina, são expressões de certo
modo equivalentes, ão intimamente ligados estão os fatos que elas recobrem e que chegam a identificar-se nas formas do simples confor mismo que são as "espécies frustas da tradição". Se se considerar que
a sociedade, sem a resistência que a tradição e a rotina opõem às ino
vações, se arriscaria a perder a sua unidade e coesão interna, desagre gandose até à anarquia, ter-se-á compreendido, em todo oseu alcance, o papel da tradição e da rotina que, funcionando, na vida social, como um verdadeiro sistema de freios permitem à sociedade elaborar, Sem
se desintegrar, as novas formas de adaptação e restabelecer, em conse
qüência, oseu equilibrio. Certamente, como os fatos de inovação são Lão constantes e normais como os de resistência à inovação, conforme
se verá, verificam-se em tÑdas as sociedades, sob a pressão de causas
múluplas, rupturas e alterações dessas tradições, movimentos e corren
tes de idéias, invenções e reformas que fazemn surgir novas idéias e tradiçöes novas. Mas, não só as perseguições que sistemàticamente so
Ireram e a que estão sempre sujeitos os grandes inventores, 1elorma
dores e riadores, mostram a resisténcia obstinada oposta à instauay
(7) 2 ésse o espetáculo que, lembra-nos Smets. nos oferecem os australae ne
populagão é estável por efeito de uma fraca natalidade, do inianticidio. cessáro, Os grupos utes sáo escrupulos amente respeitados e que bastam a ocupam
da
se nemortalidade infantil e,cujos li
bem determinados, cU sua caça subsistência; tabus reservam
territórios de certos climentos aos velhos; o espólio prescnções muito conhecidas caçador a repartir com seus paren tes e aliados. Regras bem hoje O(casamnento entre primos cruestritas forçam zados, obtigação de casar em uma classe determinada) fazem com que cada um, limitado e guicdo na sua escolha, ache um espôso; aliás as cerimônias de iniciação podem ser disponíveis. Um de maneira retardadas COmércio interttibal de que volume bem aregulado, a certa especializaçáo não restrito, haja naismasjovens casar doligado que moças
numerosos alias, industrial, lavOrece a 10dos as naterias e satisSua que lhes Láo Os objetos fabricados, pouco pode modificar-se indisper.sáveis. As necessidades estéticas encontram 1açáo nas cerimonias e lendas, cujo detalhe todavia tradicionais e misteriosasintelectuais de bastante para de crernças e deestinular aé curiosidade. Enfim a transmissão de um patrimônio preceitos perteitamente
assegurada".
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
147
nova tradi das novidades, como também, uma vez estabelecida, toda que resiste a tôda nova evo cão apresenta a mesma fôrça de inércia espalhando-se, e incorporadas ucão. As próprias idéias libertadoras, não se liber gerações e as à tradição, tornam-se por sua vez opressivas, instru tam de uma tradição senão para se tornarem elas mesrnas um
mento de servidão para as gerações seguintes.
equilíbrio Assim, se as sociedades procuram manter o estado deàs condições perfeita que se traduz pela sua adaptação mais ou menos e de que instituições das do meio interno eexterior e pela harmonia êsse fundamentais, resulta a satisfação de seus intereses e necessidades as são pode romper-se: cquilibrio social (1), sempre instável, dinamico, estagnação (perÍodos orgá criscs sociais. Poderá haver, observa Smets, às invenções da técnica nicos) desde que, uma vez restabelecido, graças de equi industrial e da técnica social, não houver mais novas rupturas justamentos desa librio. Entre os fatos suscetíveis de determinar ésses sua acuidade conforme podem, ou crises sociais (periodos criticos) que guerras intestinas, destacam-se eviolência, deflagrar em revoluções ou contatos com gru pela sua importância: l) as crises econômicas; 2) as nivel e de aspec pos de culturas diversas e, portanto, as diferenças de de individualidades tos de duas civilizações em presença, e 3) a açãoé aliás uma das ques cujo papel, na sociedade e no progresso humano, correntes e sob tões mais discutidas pelos sociólogos das mais diversasperto a questão. de os mais diversos aspectos. Mas abordemos mais (persistëncia dos agre Se as condutas e práticas coletivas tradicionais as socie söbre gados, na linguagem de Pareto) pesam tão fortementeo progresso, elas dades, contendo-as na sua evolução e regulando-lhes em que, ao lado não são as únicas molas do mecanismo da vida social trabalham, das tradições que fazem o papel de "sistemas de freios", de pistões", "sistemas se nos permitem a imagem -, como verdadeiros Pa Vilfredo fôrças ativas de renovação (instinto das combinações, dede fato, como reto). Sob a camada das condutas habituais encontra-se, observou Georges Gurvitch, a camada mais profunda das condutas co
letivas que "quebram as tradições, criam o novo" e que, permanecen (1)
Para dar uma idéia do equilíbrio econômico social"
de 'utilidade estabelecer objetivamente a noção sôbre de o que á soas geralmente não se entendem
social, V. PARETO Oeça por pes
tn to mais diicl qucnto s
"úti" à sociedade, pela ontusdo comua
entre "os meios para atingir um fim e o fim em si mnesmo'". Sòmente
pesquisa daquales
pode ser objetiva. £le insis te sôbre a necessidade de distinguir en tre dois n u n de w
lidade para as sociedades e mostra que a utilidade podY variar de grandesc segundo
posições em que se podem achar as sociedades, e uma delas constitut onárno de utl
dade. Esforçando-se por dar, em uma síntese, uma idé ia geral do que
a orna
sociedades determinada por
quais lc rege,
elemen tos que agem sObre ela
a saber: 1) o solo, o clima, a flora, a fauna, etc.; 2)
sÔbre a
lemen tos exteriorea
espaço (ação de outras sociedades ) seja no tempo (o estado anterior da
3) elementos interiores, tais como a raça, os
l ds
ala sej 2
sociedade ):
os residu0 , C3 ecdánci, autlidad Pareto quea o r a eqth brio dos residuos zo peo Ua
os conhecimen toa interêsses, as derivações, que gOza "são determinadas principalnentY pelo teoria, aliás diticl das Assim,uma pois,sociedade sua de proBperidadede é realizado por certa
Ce
muio abs trata, um nKua a residuos aregados ). sa da 2.4 edia 0s de 1.a classe (instinto das combrnaçóes ) omparao oa proporção que deve ser diferente para as diversas camadas soCtais. escTeve Pareto. um sistema de pontos materiaisreações a única que, a noaao juizo, Tazer compreender as açõese muito complicadas dos fendmeno sciaia dar-noa Alén disso un sistemg de pontos assim uma idéia nítida do equilíbrio econdmico materiais pres ta-se a essas considerações de movimeatos virtuais.. Ao con trário, a ompa a melhor quando se trata de s fonar una idóia da Façao com um organlsmo vivo evoluçao das sociedades'
|| Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
148
do latentes em determinadas condições sociais, só se exprimem yion
rosamente em estados de efervescência social, como as guerras
60
voluções, os grandes movimentos das instituições em que a sociedade
toma consciência mais viva das forças que trabalham por modificá-la. ameaçando-lhe a estabilidade e produzindo rupturas de equilibrio. Es sas condutas coletivas inovadoras e criadoras, imprevisíveis, que reali. zam as aspirações e as tendências e correspondem ao que Durkheim havia designado como "as correntes livres do psiquismo coletivo", pro
vÁm não só da heterogeneidade social (os homens não são iguais nem
do ponto de vista fisico, nem do ponto de vista social) como do fato
de que, operando-se a "transmissão" das tradições das gerações adul.
tas ås gerações jovens, as atividades do imaturo tendem a modifica
necessàriamente a atividade organizada dos adultos.
Esses dois fatos a) da desigualdade natural, biopsicológica, dos in
dividuos, e, portanto, da heterogeneidade social, e b) da constante reconstrução dos hábitos devido às atividades imperfeitas dos jovens,
fatos que determinam um movimento contínuo no interior da vida social, residem como um substrato biológico à base dessas condutas co
letivas inovadoras e tornam, em conseqüência, os fatos de inovação e
de constância dos inovadores tão normais como os de resistência à ino
vação. As variações das "representações coletivas" e das instituições cor respondentes que se modificam sob a ação do grupo e de acontecimen
tos de tôda ordem que afetam o grupo, prendem-se, pois, não a capri
chos individuais, mas a causas sociais ou coletivas, como seus efeitos.
Mas, por isto mesmo que as condutas coletivas inovadoras estão mais
ligadas às camadas profundas e espontâneas da vida social e, portanto,
são fôrças de desagregação, extraordinàriamente ativas, compreende-se
que as tradições e as condutas coletivas habituais, cristalizadas ou não em "instituições", que constituem o "organizado" da realidade social,
só se podem estabelecer e durar na medida de sua capacidade de resis
tência às inovações. E é exatamente por êsse poder coercitivo que exer cem ou são suscetíveis de exercer sôbre os indivíduos, que se reconhe
cem as formas organizadas da vida social, isto é, as instituições. Ora a educação que consiste na transmisso de "tradições", é conservadora,
por natureza, e os grupos educacionais, como os grupos religiosos, sem pre professaram uma terrível rotina, um verdadeiro misoneismo; e é
entre êles que "se puderam conservar como em vasos fechados os usos
antigos. O tabu do novo é sua lei" (1). Não se poderá contestar (e êste
éo "ideal" que temos professado e defendido na ação) que uma ver (1) Essa questão será atacada com vagar e mais de perto quando estudarmos
adiante as relações entre a educação e o progresso. Não é sòmente o ensino elementar
médio que tem por matéria "conhecimentos desde longo tempo adquiridos e sistematizados As próprias Universidades que não deveriam cingirse à transmissão da "ciência feita" ms ao contrário, contribuir para o progresso da ciência, têm-se constituído, em quase todos o países, Como núcleos de resisténcia às inovações mesmo no terreno puramnente cultural e Cle ttico. Elas são, em geral, tradicionalistas por excelência. A maior parte das grandes desco bertas são ertra-universitárias (Galileu, Newton, Pasteur, Mne. Curie, Einstein, entre o
tros)
a penetração das ciôncias novas e das novas técnicas de trabalho nas Univers
dades sempre foi muito lenta. "Na antiga Sorbonne, conta-nos René Maunier, dava-se de se opor a to quatro mais antigos doutores, designados pelo nome de sénieurs, a missão contra a inovação novidade.
sabe-se quanto os corpos de ofícios lutaran àsperamente
técnica atentatória "auz us et auz coustumes del mestier'".
soCIOLOGIA EDUCACIONAL
149
dadeira cducação humana consiste, na justa expressão de John Dewey, "em uma direção inteligente das atividades naturais em vista das pos sibilidades e necessidades da situação social". Não devemos, contudo, contundir um "ideal" que se pode e, a nosso ver, se deve procurar, e
realidade objetiva que se apresenta e que não podemos mudar senão nização, que Dewey classifica de inpaciente e prematura, da atividade impulsiva dos jovens, de acôrdo com a norma fixa dos hábitos de pen
a obedecendo às suas leis, e dentro de limites determinados. Essa meca
samento e sentimentos dos adultos, essa aceitação mais ou menos cons
ciente da modelagem do 'eu" pelo meio social, é um fato constante e
normal na educação pela qual, observa Charles Blondel, "nós recebe mos de fora, do grupo de que fazemos parte, todos os conceitos, pre
existentes aos indivíduos e que imprime em nossos atos, antes que nos
sejam acessíveis sob forma de idéias, tôdas essas maneiras de pensar, de sentir e de agir, de que só mais tarde podemos adquirir uma inteli gência mais clara, conforme nosso grau de cultura, nossa curiosidade enossa inquietação natural".
Nos grupos educacionais, porém, tão fortemente dominados pelas
tradições, surgem também idéias novas e correntes de renovação, já sob apressão, de fora para dentro, de fatôres políticos, econômicos e cul
turais, já
oque émais raro,
por movimentos no interior do pró
prio grupo, determinados pela ação criadora de individualidades in
fluentes. Mas êsses movimentos de renovação não só constituem geral mente repercussões, no interior do grupo profissional pedagógico, das nudanças que se estão operando no sistema social geral, como tam
bém resultam de correntes de idéias que os vinham elaborando e aca
bam por determiná-los, depois de uma longa evolução: as inovações da técnica social, como as invenções importantes em todos os dominios da vida social, foram sempre precedidas de numerOsas descobertas e idéias que as preparavam. Tôda a inovaço, no campo da civilização, possui uma préhistória, lembra Vierkand, que, examinando as ori gens das
inovações, admite a existência de pessoas singulares destina das a um papel renovador e se esforça por descobrir, ainda nas socie dades primitivas, em que a vida é menos complexa e menos penetra
da de influências diversas, o traço mais aparente do papel rante de individualidades determinadas. De fato, por mais que preponde reduzir a esfera de sua influência, não se pode negar a prioriseo queirn efeito das iniciativas individuais que, entrando na trama dos acontecimen tos, não só constituem objeto de investigação histórica, mas são tíveis de estudos do ponto de vista estritamente sociológico. Fazer susce cièn cia é, sem dúvida, desprender o que há de e "regular no necessário" fluxo dos acontecimentos em que se misturam a e a liber necessidade dade, a regularidade e o acidente, e distinguir, portanto, "constantes" sob as variáveis individuais, o essencial do acidental e destacar dos acontecimentos que estão ligados às condições de tempo e de lugar. a parte verdadeiramente interessante e permanente que pode ser ana lisada com alguma certeza, e, emn certa medida, reduzida a leis: os fenômenos sociais. Se a explicação "causal" verdadeiramente determi
150
FERNANDO DE AZEVED0
nante só se pode aplicar às açõæs tipicas, aos fenòmenos gerais de nats. reza a se reproduzirem, a explicação "linalista ", que deixa sempre um lugar à liberdade, parece, àprimeira vista, ser a ünica que convém às ações singulares, pessoais, que entram na tranma dos acontecimentos
que não se explicariam senão pelo "fim" que se propunham os indivi.
duos. A verdade. porém, outra, que se esclarece pelo principio a que já nos referimos, da "reciprocidade das perspectivas". Essas individua iidades verdadeiramente influentes (e êste é o aspecto sociológico do problema) são, nas expressões de Blondel, "espelhos sòbre os quais as representações coletivas se refletem para se orientarem em direcões novas; e quer se trate dêsses desvios superficiais ou dêsses rellexos
totais, é forçoso procurar-lhes a causa na constituição psicorginica
(nos temperamentos), com a qual as representações coletivas têm de
entrar em composição para agir" (1). No estudo das idéias novas e do seu papel na evolução social, convém, para
melhor compreensão do problema, estabelecer uma distinção entre as idéias tecnológicas e as idéias não-tecnologicas, isto é, entre as invenções técnicas (utensílios, instru
mentos, máquinas) e as novas idéias morais, novos modos de pensar, novas concepções da vida e do mundo. Uma idéia nova é sempre uma "perturbação de crenças
admitidas"; e. como se cr que as idéias novas em geral são perturbadoras da conduta
social (o que é verdade no que respeita à conduta antiga e estabelecida), são
sempre olhadas com suspeita e recebidas com hostilidade. As invenções (ideias de natureza tecnoiógica), também elas, encontram grande resistência, e tanto maior quanto "o laço que se estabelece entre processos industriais inferiores e os valores
sociais que lIhes comunicam parte de seu prestigio e de sua própria autoridade, for
nece motivos nobres para repelir obstinadamente técnicas novas". Mas, ao passo que
a comunidade organizada, na justa observação de Dewey, vacila sempre com referência
às novas idéias de uma natureza não técnica ou não tecnológica (novos princípios, sistemas de idias), as invenções, nos diversos domínios da arte e da indústria em
que se pode dar um lugar maior ao fator individual, "se têm aberto caminho insidio
samente por causa de certa conveniéncia imediata". A percepção mais clara dos fins
imediatos a atingir por ésses meios (um utensilio mecânico, o automóvel, o rádio, por
exemplo) permite, no domínio técnico, maior aplicação dos raciocínios experimentais que têm um grande valor quando o fim éclaramente dado e se procuram os meios próprios para atingi-lo, e que, por isto, são empregados com sucesso nas artes e os
ofiios, na indústria e na estratégia, na agricultura e no comércio. As invençóes são, en conseqüéncia, mais bem recebidas numa época de transformações técnicas em que a imaginação já está habituada às invenções e descobertas c uma invencão é"algo que se espera". Se, porém, os efeitos morais e sociais dessas invenções, as (1) £ o que exprime, por outras palavras, MONOD quando observa que "os aconte
cimen tos e os personagens verdadeiranente importantes o são sobretudo como sinais S bolos dos diversos momentos dessa evolução. Mas a maior parte dos fatos chamados tóricos" não são para a verdadeira história humana senão o que são, para o
movime
constante e profundo das marés, as vagas que se elevam à superfície do mar, sedeixarem colore sem nada um instan te de todos os tons da luz epersongliddm depois se sobre a praiasobretudo história na da de si mesmas. Exagerar freqüente, Parte como é pois, não somee política, mais do que todas as outras, uma história de pessoas, , ntos deter-se na parte exterior e corncreta, mais brilhante, da realidade social (os acontec1ne históricOs omo as como tendências 'coletivas'" profundas quedasefasemanites través dessOs indidualidades. enresshes de ummais estdo socia ou de,
evolução. Ora, por um lado, nâo se pode chegar a leis encerrando-se no concreto:P Gescobrir Telaçbes constantes, lembra Bouglé, é preciso anglisar o real, é preciso abstra
e, por outro lado, se individualidades determinadas aque apresentam alguma co15as e
gular, influen sôbre a sociedade cono órgãos de renovação das represen taçoes,co arbi das instituições correspondern tes, as suas iniciativas não se podem considerar cridço sáo, trárics de um capricho individual ou criações ex nihilo. Essas personalidades de escol também elas, funções de condições sociais, produtos de uma época ou de um meio dado, eé preciso pesquisar em que
medida as tendências
coletivas
que se encanara
nessas
Personalidades de elite, inlluiram para as orientarem em direçóes novags no mundo do po samento e da ação.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
151
essenciais, ao alterar os hábitos da conduta, tivessern sido ou suas conseqüéncias pudessem ser previstos, pode-se afirmar com segurança, lembra Dewey. que a
maioria delas teriam sido destruídas por perniiosas, assim como se retardou a adoção de muitas por serem consideradas sacrílegas. Com efeito, as invencões que não são senão "coisas", a máquina, o automóvel, o telefone. exercen söbre os homens, o scu espírito eos seus hábitos de vida, como observa Lucien Fébvre, urna ação poderosa, gerando um mundo de sentimentos e de idéias novas: eé umn domínio
ésse das transformacões profundas que deterTminaram, en por estudar. nossas sociedades, não só as invencões que modificaram a vida de relacão dos honens (estrada de ferrO, telefone, automóvel, avião), como "tantos objetos, instrumentos, máquinas que estão longe de serem indiferentes à nossa vida moral"
quase todo
Em todo o caso, para que se produza uma "mudança" numa socie dade ou numa civilização, são necessárias, segundo Alfred Vierkandt,
tris condições: 1) que uma civilização seja "madura" para essa
mu
dança; 2) que ela tenha, conscientemente ou não, necessidade dela:
3) que a impulsão seja dada quer por individualidades dirigentes. quer
por uma influéncia exterior. Parecem-nos exatas essas observações de Vierkandt, desde que, interpretando-lhe o pensamento e precisando o sentido do têrmo equivoco "maturidade", consideremos que uma so ciedade está "amadurecida" para uma mudança quando poSsui os co
nhecimentos e as crenças que lhe tornem possivel a realização. Nenhu ma das três condições é, por si só, condição suficiente da mudança
que não se realiza senão pela reunião das três condições necessárias e nunca é determinada exclusivamente pelas iniciativas individuais ou pela inteligência humana. Aliás a grande lei que explica as invenções.
resume Paul Lapie, é a lei enunciada por Wundt, da "heterognese
dos fins" ou, segundo a expressão preferida por Vierkandt, da "con
versão de móveis", a saber, móveis elementares humildes, isto é, cegos
e inconscientes, determinam invenções úteis que o homem liga a aspi rações mais altas. Não é preciso, como nos previne Maus, "confundir causas coletivas, orgânicas, com a ação dos individuos, que são (já o
dissemos) antes seus intérpretes do que seus senhores. Não há opor invenção individual e hábito coletivo. Const§ncia e rotina podem ser
o fato dos individuos, novação e revolução podem ser obra das grupos, dos subgrupos, das seitas, dos individuos agindo pelos e para os gru pos". Em outros têrmos, que são de Lucien Fébvre, "háno passado dos
homens, obras de grupos e obras que saem dos grupos", que se estendem acima dos limites e das fronteiras, vencendo a hostilidade e a oposição dos meios, como são as religiões de um grupo e mesmo às vezes de um
grupo muito restrito; "grandes religiões de vistas ecumènicas: as que
enxameiam, que emigram; as que admitem e provocam conversões: os grandes sistemas de idéias que podem determinar movimentos de entu siasmo, de esperança, de fe, análogos por tais ou quais de seus aspectos, aos movimentos que suscitam as grandes religioes; obras de arte, plás ticas ou literárias, que såo suscetiveis de via jar, de conquistar um
público largamente humano, longe de seu territorio de origem; e, en
fim, naturalmente, tudo que é ciência e obra de ciència. Quer se trate de idéias, ou de mtodos, de técnicas ou de invenções, dessas que não s£o sen£o coisas, mas engendram sistemas de ideias, invenções maneiras
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diretamente, elicazmente, sôbre os ht agem que pensar, de ou de ser moralidade dos grupos". bitos de vida, a mentalidade e a no tempo e no espaço, e a essae As representações coletivas variam mudanças de condutae se registram grandes fases de evolução em que estrutura social, chamou Saint-Simon "nert coletivas ou de formas de que a sociedade aos "periodos orgânicos" em mais estática s dos críticos" em oposição estrutura social fortemente integrada apresenta uma econômico. A divisão de uma civil:. um estado de equilíbrio social e
SaintSimon, corresponde aos dois tiDos zação em dois periodos, segundodivergentes e talvez opostos, que encon. principais de relações sociais, estabelecidas por Sumner Maine, aue tram sua expressão nas antíteses se suce opõe a idade do estatuto e a do contrato; por Bagehot, para quem
Tarde, que assinalou, dem a idade da tradição e a da discussão; apor da moda; por Toennies. na evolução social, a idade do costume e (Gemeinschaft) e socieda na sua dássica distinção entre comunidade Durkheim quando distingue, senão de (Gesellschaft), e, afinal, por uma solidariedade mecânica ou por opõe, as sociedades ligadas por por semelhança e as que se baseiam numa solidariedade orgânica ou e "tipos diferença. A cada um dêsses períodos correspondem atitudesestados so êsses diversos sociais" diferentes, pelos quais se exprimem formador, tipo autêntico o ciais e que são, no dominio educacional, a)almas, que, não sendo exclu de educador, modelador de caracteres e de
em que as socie sivo dos periodos orgânicos, prevalece nessas épocas b) o dades atingiram um alto grau de consistência e de unificação e tradições reformador que, encarnando as idéias novas, rompe com as
juízo e ese caracteriza pela audácia do pensamento, pela liberdade decrises so nas pelo impeto de ação. São os reformadores que dominam ciais e revolucionárias, nos periodos críticos, em suma. Aquêles são coletivas se refrangem como que "prismas em que as representações inicial"; conservadores, sem se separarem sensivelmente de sua direção fiel por excelência, reduzem-se àaceitação consciente e à transmissão da herança social ou dos valores estabelecidos, e é nas sociedades mar cadas por uma forte unidade de concepção de vida que são investidos de maior autoridade social e de maior prestigio. £stes, os reformadores, representam não a sociedade total, extremamente complexa e fragmen
tada, nos periodos críticos, mas algumas das suas frações ou das cor
rentes de opinião em que se divide: tendo tomado e refundido um sis tema de representações coletivas, elaboram "um meio novo para o con ceito se inserir na realidade e traduzir-se em ação". Entre o formador e
o reformador, situamse os "precursores" que constituem tipos interne quaisquer outros da vida social, percorrem, às vêzes a séculos de di tância, as doutrinas e ideias dominantes mais tarde, criando sistemas diários, e assim chamados porque, no domínio educacional ou em
ou embriões de sistemas novos que não enconram, em sua época, a
condições sociais favoráveis ao seu pleno desenvolvimento. Os precul sores surgem nos meios sociais e nas épocas em que já se acham os gel
mes de determinada teoria ou se criam as doutrinas de que chega1 a
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
153
adquirir aintuiçãoe a formular alguns princípios com mais ou menos nitidez e preciso. Mas, se as crises sociais se caracterizam pela perturbaçã£o dos valo
res estabelecidos e pela ruptura de tradições, compreende-se fàcilmente
mais que, nesses períodos de atividade intensa e de furor construtivo,
que se do que qualquer outro dominio da vida social, é a educação abala nos seus fundamentos, desagregandose o con te údo (tradições) que constitui a herança social e é o próprio objeto da transmissão (|). social A crise que atravessa e a dificuldade de se reorganizar a função sisternas os entre constantes da educação, manifestam-se nos conflitos educacionais e as novas condições e exigências da vida social e nas
dêsses sis sucessivas adaptações (reformas orgânicas ou fragnentárias) transformações das temas, impostas pelo ritmo e segundo a direção plêiade de teóricos, uma Tôda sociais, econômicas, políticas e morais.
reformadores sociais e fundadores de escolas, de sistemas ou de regimes
"encontra seu lugar e desempenha seu papel em todos os carminhos que
a coletividade abriu àatividade humana"; e suas individualidades mais de que ou menos influentes e poderosas, apaixonadas pelos problemastôrno de procuram a solução, "se cristalizam, descreve Blondel, em ideais, no sentido mais largo do têrmo, de que se tornam a um tempo escravos e instigadores". Étambém êsse, no campo educacional, o pe ríodo das grandes inovações. Sucedem-se as reformas escolares de larga
envergadura, ou, como conseqüência imediata das mudanças de estru
tura social, econômica e política (como nos casos da Rússia, México,
Alemanha e Itália), partindo de cima para baixo, ou preparadas no interior do próprio grupo pedagógico e realizadas por inovadores ou reformadores que, tomando atitude revolucionária, conseguem implan tar, em circunstâncias especiais, como no Chile e no Brasil, por exem plo, uma nova política de educação. No primeiro caso, a açio vitoriosa dos grandes politicos ou chefes revolucionários, aproveitando-se da con tradição entre a "topia" e a "utopia", fornece um ponto de concentraçio às tendências do grupo dominante, e, chegando a uma ditadura de
minorias, ajusta a estrutura pedagógica, num sitema orgânico, às funções
da Escola e aos novos fins do Estado. São reformas totais, nacionais. No
segundo caso, são reformas nacionais ou locais, parciais ou gerais, cujo sucesso definitivo depende, porém, da adoção da politica geral de que faz
parte e em que estácontida essa nova política de educação. Em qual quer hipóese, tôdas essas reformas, realizadas por individuos ou pelo Estado, como "sistema de centro diretor", e tendo por efeito global
orientar a política tôda inteira (geral e de educaço)
numa direçio
determinada, não fazem mais do que dissimular ou revelar uma evo lução mais profunda e mais grave, movida por fôrças coletivas, susce tíveis de exame cientifico, e de que essas refornas não são seno mente do fato de se tor não siçao, provm de ser mais abun consqu`ncia, e en diferenciada, vez mais cada narem as sociedades unbem daste outro ms tecnicus, das trad1çoes das "transmissao'" a dante e complexa necessidadea da vida atual runde nçmero fato, a saber, que, não correspondendo mais àsessas tradies antigas so pouoa pouco moraia, ideológicas concepçbes de antigas outras". onde nào toram anda subs tituidas or abandonadas pelas novas geraçbes sbre a eduaão. repercuaades protundus de meatal anarquia de estado resulta um (1)
A crise terrível, no estado de
FERNANDO DE AZEVEDO
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manifestações, tanto mais vigorosas quanto mais organicas na sua es trutura e mais orientadas no sentido das novas evoluções sociais. PROBLEMAS E DISCUSSOES
1. As sociedades, ainda as mais avançadas, "são terrivelmente rotineiras, ohser..
Maus; a massa sempre e a elite as mais das vzes recusam submeter-se a Oualo
inovação". Esa observação comprovada pclos fatos: os mais perSeguidos são geral. mente os maiores inventores e descobridores. Analisar a)
ofenômeno geral da tradição, numa sociedade dada, nos fatos moraie
tradicionais mais importantes, quanto à função primordial que exercem, isto é, de "perpetuar" entre os tempos da vida social geral a continuidade necessiria. quanto às diversas espécies de tradições, e quanto ao maior ou menor grau de coerção com que se impõem as tradições (da religião, da moral, do direito, da arte, dos oficios, da educaço, etc.); b) o fenômeno da rotina que consiste no apgo de indivíduos, de grupos ou subgrupos à tradição ou a determinadas tradições e, portanto, na resistência
à instauração de novidades, de natureza técnica ou não tecnológica, e que varia
com a fôrça coercitiva da tradição e com os temperamentos individuais, podendo rotina e inovação coexistir e misturar-se no mesmo indivíduo e no mesmo
grupo (individuos ou grupos extremamente rotineiros, relativamente a uma tradição, por exemplo, moral ou religiosa, mas inovadores em relação a outros
domínios da vida social, técnico, artístico, literário). 2. Todas as sociedades procuram um equilíbrio que se traduz pela sua adaptação mais ou menos perfeita às condições do meio físico como pela articulação e harmonia
das instituições estabelecidas, adaptaço e harmonia que Ihes permiten a satisfacão de suas necessidades fundamentais, econômicas, políticas, religiosas, estéticas. Mas, em tôdas elas a) se produzem crises ou rupturas de equilibrio por fatôres os mais
diversos, como por ex., crises econômicas; contatos com grupos de culturas
diferentes; invenções que determinam mudanças na vida de reláção dos homens
e agem diretamente sôbre a mentalidade dos grupos; e a ação dos indivíduos que, em meios diferentes e pelos mais diversos processos, trabalham àmargem da sociedade, na transformação do meio em que vivem;
b) o equilíbrio não se restabelece senão graças a novas invenções da técnica industrial e da técnica social; e, uma vez restabelecido, poderá haver
estagnaço, desde que não haja novas rupturas de equilíbrio, sucedendo-se os
periodos críticos aos periodos orgânicos, numa sociedade dada.
Tomar uma soiedade, seja o povo brasileiro, e proceder à análise de uma das
Tupturas (rises) e conseqüentes restabelecimentos de equilíbrio que se produziram
desde o 1.0 império, e as suas causas determinantes, internas ecxternas, particulares
ou gerais, períodos.
ligadas à civilizaço, e aação das personalidades influentes, nesses diversos
3. Os fatos de inovação e de resistência à novidade são normais e constantes em todos os gTupos: ainda nas sociedades primitivas mais estagnadas existem as
invenções e se observa a "inserção" do inventor, do criador de novos valores materia1s eespirituais. Observar, pois,
) que tóda opinio comum, tóda tradição uma vez estabelecida, tem
uma força de inércia que resiste à nova evolução: essa resistência às mudanças e às idéias novas (rotina, misoneísmo) tem um papel social importante, fun cionando como um "freio" no processo de evolução; b) que, dependendo o sucesso das idéias novas, ao menos por uma par do meio social que lhes estimula o as propaga ou lhes 1es pesquisa dentífica deve inidir antes nascimento, sôbre causas determinantes e as circus tâncias (contrárias ou favoráveis à ac£o do indivíduo) gque sôbre homens cuja ação se acha limitada por essas circunstâncias;
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
155
de génio é obrigado a c) que, a cada nomento da história, o homem feitas do seu tempo, mas, romper a crosta espéssa dos preconceitos, das idéias menos de suas qualidades pessoais do se bem sucedido (e o sucesso depende"éle não se liberta dessa servidão senão que das condições especiais do meio), to de servidão para seus contempo para tornar-se êle próprio um instrurnen fundam igrejas, escolas, ráneos e seus sucessores"; os espíritos revoluionários
de escolas novas. teorias que lutam por durar e se opõem àfundaçãotradiçãoe a rotina varíam papel social da rotina, mostrar como a
Analisando o sociedades novas, de maior rau de mes conforme as condições do meio (menor nas nas de maior homogeneidade étnica; menor tiçagem, maior nas sociedades velhas, ocasiÑes indivíduos aos constantemente socicdades denocráticas em que são oferecidas ùtilmente seus esforços, etc.), e com os grupos em que possam afirmar e desenvolver religioso, no grupo sociais (menor no grupo industrial, militar, e maior no grupo as idéias feitas.
de transmitir as tradições, pedagógico que, pcla sua própria função conseqüência).
( mais conservador e rotineiro, em complexa e menos 4. Ainda nas sociedades inferiores em que a vida é menos papel preponderante penctrada de influências estranhas, é fàilmente observável osacerdotes. Seria, pois. os mágicos, os chefes, os determinadas: de individualidades no uniformes e confusas um érro não ver nos grupos rudimen tares senão mnassas a reconhecer entre Mas, diferenciar. nenhum elemento se deixaria das quais meio influência às vêzes notável, sobretudo nas sociedades mais recentes, de individualida o des determinadas, e afirmar que só o indivíduo é criador ou considerá-lo como
único, ou mesmo prinipal agente de evoluço social, éenorme a diferença. De ato. a) a fonte de autoridade e de influência do indivíduo, em geral, deve ser procurada, menos na sua habilidade pessoal do que numa fôrça espeial que o ultrapassa em tanto quanto indivíduo, não é de essênia individual e esti
ligada às condições de vida coletiva, "como a que possuem (mana tangata) os
indivíduos que entre os Maori, da Nova Zelandia, têm autoridade suficiente
para impor um "rahui", isto é, um tabu de propriedade, sen os ritos costu neiros eque não são nem os mais hábeis, nem os mais audaciosos" (G. DAV):
b) "se é do individuo que as instituições sociais emanam, observa Durkheim, elas não poderiam ulrapassá-lo e, inversamente, se elas o ultrapas
sam, impondo-se a éie com um poder coeritivo, não é dle que elas decorrem": e, por isto mesmo, para que uma mudança se produza numa dilinção, não basta que a impulsão seja dada por uma individualidade (ou por uma influ
ência exterior), é preciso ainda que a sociedade, preparada ou amnadureida pelos seus sentimentos e pelas suas crenças, tenha necessidade dessa rans
formação;
c) e, por último, convém distinguir entre a influência dos reformadores
morais e sociais (domínio das idéias não-tecnológicas) e a dos inventores nos
diversos ramos da arte e da indústria (isto é, no plano das idéias tecnológias). em que entram em jögo fôrças diferentes e se deverå talvez, dèste ponto de vista, dar um lugar maior ao fator individual: ainda asim, as grandes invenes foram sempre precedidas de numnerosas descobertas que as preparavam ecias
só se explicam em determinadas condições sociais e aum deterninado aivel de Seja para explicar, por exemplo, a invenção do telégrafo: a necesidade è ata estratégia de Napoleão; o estado da iência tornava possivel, desde dois seculos cultura.
pela a inovação; a sociedade estava, pois, amadurecida para essa mudança: enfim, surgu a iniciativa de Chappe. Nenhuma das très condições nåo e por si so. observa
Vierkandt, a condição suficiente da mudanç. 5. Estudar uma determinada sociedade, em seus periodos orgånicos e criticos. e os tipos sociais de educador que lhes correspondem, a aber, o "fornador e o
"precursor", nos periodos de tradição e de conformismo social (orginicos) eo "retor mador", nos periodos de crise e de ransformação social (peridos criticos). Mas para proceder à análise com método,
4), definir ecaracteriar, antes de tudo. cada um dèss tips soxiais, o
"formador", modelador de almas e de caracteres, ipo conservador, eminente mente representativo de um estado social dado: o "precursor", spirito revolu
FERNANDO DE AZEVEDO 156
contra as idéias feitas e as nri: donário, de reação que, insurgindo-se antecipa a uma nova fas estabeleidas, fica deslocado cn seu meio e se que, encarnando idéias novas, procura tran evolucão social; e o "reformador" social); (reforma feri-las à realidade pela ação históricos e observações diretae a b) mostrar, em seguida, com dados sociais" correspondem aos dois próprio meio e da época atual, que êsses "tipos em que se estabeleceu, com naqueles periodos, orgånico e critico, da sociedade: e, portanto, uma unibe vida de concepção o equilíbrio social, uma nítida vida social, predomin estreita entre essa concepção e todos os domíniosa dasociedade entra em crise a "formador" de personalidades; c, neste em que "reformador d o idéias), em processo de transformação, (pluralidade de
instituições; ) estudar o tipo social do "precursor" que surge em periodos orgânicos:
constituem o precursor, cujas idéias em dissonância com as idéias do tempo teórico. fêz se abortado que reformador um estado de espírito particular, é um meios tem não preconceitos, de crosta a e, se tem bastante fôrça para romper outros). e Pestalozzi (Comenius, isoladas para agir, senão em iniiativas sentido da 6 Os tipos sociais do "formador" ("educador", no mais rigoroso e do ação) em entrar chega a quando palavra), do "precursor" (um cducador, valores de transmissão pela pedagógico, plano "reformador", que se distinguem, no
de acôrdo com valores estabeleidos, pela riação de valores novos e pela reconstruçãocondições sociais, isto é. as novos, predominam neste ou naqucle periodo, conforme conservadoras) ou a maior e o maior grau de consistência (sociedades estáveis intensidade de transformação (sociedades instáveis, revolucionárias). Mas, a) eses dois tipos fundamentais, o formador e o reformador, que encon naquela fase de evolução soial o seu clima próprio, isto é, nesta oumais tramcondições as favoráveis ao seu desenvolvimento, em qualidade e em número, correspondem a dois tipos de mentalidade (conservadora ou gôsto de
estabilidade, e revoluionária ou gôsto das mudanças), e, portanto, são cons tantes em tôda cultura;
b) afimar que les sempre sucedem em correspondência com os dois periodos (orgånico e rítico) e não poderiam coexistir, seria incorrer em êrro semelhante ao da lei dos três estados de Augusto Comte: "o santo, o
pensador e o pesquisador, observa Von Hugel, são três tipos constantes em tôda cultura; a religião, a filosofia e a iência são três dominios da cultura, independentes e iredutíveis".
Analisar e discutir cada uma dessas afirmações com os grandes exemplos his
tóricos e atuais dos dois tipos de "formador" e de "reformador", estudados em face
das condiçóes sociais em que teve origem e desenvolvimento a sua ação, formadora e reformadora.
7. Nas pesquisas biotipológicas a que Marcello Boldrini procedeu, no seu laboratório de Estatística, sôbre "os tipos e as atitudes constitucionais e substituições
das aristocracias" (comunicação feita ao Congreso Internacional de Bruxelas), partiu observam-se, na história moderna, ciclos de grande atividade constatação:seguidos seguinteconstrutivo, dae ímpeto de ciclos contemplativos ou trangüilos em face das instituições estabelecidas. Assim, pois, a sociedade parece ser dirigida alternativamente por honens que agem (iclos ativos) ou homens que contemplam (ciclos contem
plativos). Observar, entre outros fatos,
a) que os grandes intelectuais franceses do século XVII foram antes
de tudocontemplaivos, enquanto os do século seguinte são antes reformadore
sociais que preparavam e fomentavam, por um vigoroso movimento de idetas a Revolução Francesa;
b) que, a partir da segunda metade do século XIX, a educação comea
a agitar-se, na França, sob o influxo das novas idéias, até entrar nosconduzida tins
século XIX e neste sculo em plena fase de renovaço, vigorosamente Unidos, na Bélgica, na Inglaterra e na Alemanba: éa época dos grandes refor
por homens de pensamento, de iéncia e de ação, sobretudo nos Estao madores.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
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Sem descer à análise das conclusões a que chegou Boldrini que descobre a
razãodéssses ciclos periódicos no fato de se sucederemn, no cume da hierarquia social, homens de gênio diverso, uns ativos, de tipo brevilineo, e os outros, antes passivos, de tipo longilinco, astênico, pode se perguntar se a sociedade mudou porque subiram gènios de tipo diverso e, pela ação dles,
ou se ascenderarn outros tipos porque a
soiedade se transformava? Transformando-se a iviliação, e entrando num periodo critico dos mais graves e agitados que registra a história.as novas xigéncias wciais determinaram a ascensão ao poder e favoreceram a influência de tipos de génio diferente, ativos e reformadores: a mudança biotipica periódia no "estado maior social" se fêz em conseqüència.
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Capitulo v
A EDUCAÇÃO EOPROGRESSO A idéia de uma evolução única, linear e ilimitada.
As evoluções
múltiplas, especiais, limitadas. Os fatos e os mecanismos da evolucão. Evolução c progresso. O progresso é mais normal que a estagnação? - As
transformações técnicas e econômicas da civilização atual e suas repercussões
na educação.
O dominio e a utilização, pelo homem, das förças naturais.
A máquina e a renovação dos métodos de produção. - A mecaniação moderna
esuas conseqüências sociais, políticas, economicas e pedagógicas. - Época de
crise e de transição. meio físico e social.
Revisão de valores e das relacões do homem com o Educação para uma civilização em mudança? -
A
educação, um processo de transmissão de tradições. Como e dentro de que limites a escola pode ser um fator de transformacão social.
Tòdas as sociedades, desde as mais elementares até às mais alta
mente evoluidas, têm asua cultura, que se pode distinguir en mate rial e não material e se define, segundo Gilling, menos pelo inven t£rio de seu conteúdo do que pela sua configuração, sua Gestalt, "que
émais e outra coisa do que a soma de suas partes e deve ser conside
rada como um conjunto, tendo sua unidade
(pattern), estrutura e
orientação". Estudar sociològicamnente a mudança de um grupo social
é, certamente, supor uma "unidade"" capaz de lhe explicar a con
tinuidade e que não deve ser procurada nem no econômico nem no processo histórico comporta, pois, seu padro, seu tipo caracterizado pelas relações dos valores de cultura e dos sistemas utilitários (econò
geográfico, mas no sistemna de valores incorporados a èste grupo. Todo
mico, técnico) com os fatôres pròpriamente materiais (1). Mas, pos suindo uma dada sociedade uma civilização ou uma cultura bemn adap tada à sua constituição e ao seu meio, essa sociedade é capaz de evoluir por si mesma ou como se poderá produzir uma mudança em suas in tituições? Quais as condições para que se produzam mudanças sociais e quais as causas suscetíveis de determiná-las? Há sempre continuidade (1)
Tôda civilização, segundo
Graebner, feita dY camadas diferen tes (Kulrurschcb ten), umas antigas, outras recentes, umas que tèm tal origem, outras, uma orsgam diterec te e se ester.de por áreas determinadas (Kulturkreise). Um grande de
nùmero caraceres co Imuns a duas sociedades (critério da quan tidade) prova da uaidade de suctesc v i uo salvo o caso dêsses paralelismos que se encontram entre civhzaços dieren Tylor chamou "recurrências''. A unidade ou dentudade de torma, em 20c1edades dseren es de um obieto ou complexo de necessàriamente à ou complexo de nsutues sem que essa semelhança se prendaobjetos, gadas, aos usos adotados, é outra prova de que èsses objetcs sss pratacus perencem
des oisas. s marsas ere
a uma mesma área ou a una mesma camada da CiVilhzado
( CEiterio da
orma
s
mente quando as sao tixdas e n a i v e . aund Grge ner. abordar dois camadas e as áreas de cultura LImen to (Eawckungsre:ben ) outros O das series de des constituidas pela seqüència das por gue passou um Lns trumen io. uma arma una institulçáo; e o das causas (Kausalitae tstragen) que se poden pesquiar scmente quando as sérles são constituidas (V. F. GRAEBNER, Methode der Ethnolgie. Kulturqeschichtliche Bi
Probies
bliotek, C. Winter, XVIII, Heidelberg. 1910).
ças sociais ou
pode haver saltos bruscos interior de uma evolução, e, neste caso, é causa essas soluções de admissível que sejam sem A evoluço tido unilinear, movida continuidade? por um só fator processa-se num so constata são antes "evoluções", determinante, em um ponto,Ou o que se progressões contrapeso estagnações, regressões tendo em vá-lo o estudo das cuituras outros pontos, como parece por analítico dado incontestável o fato da humanas? Admitindo como proevolução das de concluir, julgamos des e lentos acôrdo com o estado atual da instituições, ciência que, além dos poder das movimentos evolução seé faz por mutações instituições (variações progressivas),grandemais, preciso distinguir o (revoluções); que, nesses fatos como nos da contingência e oda sidade e que, além do variável,domínio neces do nente, que pode ser traduzido em contingente, h£ o geral, o perma leis; e, enfim, que é mais exato falar em cientìficamente do que "evoluções" luções são determinadas e que as evo "evolução" por causas sociaisem ou parte, provenientes do contato de duas coletivas (1 ), e, na maior culturas específicas. A idéia de uma evolução única, linear, ilimitada e que nos habituou o século espontânea a XIX, como lembra Smets, tende mais a ser no
(descontinuidade),
cada vez por essa nova substituída social, ao invés de se processar, num concepção de que a evolução regular, em todos os do minios da sociedade tomada em bloco, ritmo se constitui antes "de múltiplas, especiais, limitadas, provocadas por evoluções Numa mesma sociedade, fenômenos de mecanismos franca evolução, noaparentes". da arte e das domínio
ciências, por
em uns pontOs e mesmo exemplo,empodem coexistir com estagnações, outros, como se Viu na Grécia, na Itália e na Alemanha, regressões "em que uma decadência militar, ¬
econômica religiosa foi, na Renascença, contemporânea de uma floração artística e cientifica". No estudo da evolução extraordinária social não bas tará, pois, ter em vista que ela ésempre por determinada causas bio lógicas e sociais e não se realiza de modo e continuo; se lhe uniforme quisermos compreender os mecanismos, desprender os complexos de causas que podem acelerá-la ou retardá-la, e estabelecer a sucessão necessária ou provável de suas fases, é preciso distinguir os "elemen tos históricos e contingentes" da evolução humana e dos problemas em que se pode desdobrar o estudo do estudar cada um ou das ransformações de uma sociedade dada. Entre desenvolvimento êsses problemas, cuja análise objetiva nos permite penetrar mais profundamente nas causas e no mecanismo das evoluções, destacam-se, já indicados por Mauss, os fenômenos de recorrência e das invenÇões técnicas, ideol0 gicas, institucionais independentes; das propagações e dos emprestl mos; das evoluções os divergentes;
contatos e conflitos das civilizaçoes,
colonizações, rupturas, aniquilações e revoluções; progressos e regres (1)
Além das
causas socigis, coletivas, que as transíormaçoes Pnn cientificamente estudadas, há sem dúvida. fatóresdeterrninam individuais introduzem nos tecimentos uma parte de contingência inpossível de se resolver que em leis. Mas, nao o influência das personalidades históricas tem sido grandemente exagerada, contormeAuo. dissemos, comno também essas personalidades têm causas e em parte êle próprio, diz Durkheim, "é um produto de causas necessárias; &le sociais. tem suasO lnalvão leis e não há razão para que a ciência não possa ser feita en relação a êle".
ser
sões e o
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
161 progresso Em todo o caso, uma humano. civilização evolui, transforma-se, sob a sociedade ou uma entre os quais de influência diversos primam, e das e b) asegundo Thurnwald, a) a acumulação dosfatôres, invenções, meios assimilação, por um grupo, de invenções ou de
idéias ao
um
de qual se pode dar o none de sistema constatar evolução de cultura e cultura; pode para cultura e de cada uma delas. As da população mudança no interior variações dinâmica, e a evolução da (densidade estáica e mobilidade) e na civilização técnica da vida atual, por exemplo, foram econôrnica, de não é de hoje), observação acompanhadas fato, (e a de todo um conjunto de das outras instituições e crenças características da vida transformações familia, a moral, a educação social, como a e o Estado. Mas, em relação a semelhantes mudanças não se poderia falar de progresso senão com referência ao ideal daqueles que as as que se operam na estrutura transformações das sociedades julgam: por si sós o progresso que épreciso não geram fatos de evolução. A facilidade de distinguir nitidamente dos outrOS trou Dewey, é uma condição do mudança social, como o demons fato de que não se verifica o progresso. Assim, pois, "ao lado do progresso pela simples substituição de uma sociedade estática por uma estrutura social dinâmica ou fàcil mente mudável, está o fato de que essa substituição proporciona a ocasião do progresso". Que éque se deve, pois, se
entender por essa pa iavra? Afirmar que progresso, não sendo tôda é uma evolu evolução, ção "para melhor", seria fazer apêlo a juízos de valores, isto é, trans ferir a conceituação de "progresso" do terreno para o domi cientifico nio filosófico e deixála, em conseqüência, condicio nando-o àidéia de "melhor" que depende da indeteTminada, de variedade de pontos vista em que nos colocamos para a apreciação, neste caso subjetiva, do progresso. Oque seria progresso para uns, inteiramente para outros. O progresso que não é uniforme, continuo, não o seria ilimitado, e não se deve confundir com a existência da ransformação social, de pende antes da direção que os homens dão deliberadamente essa mu dança, isto é, da intervenção da inteligência e da técnica, aindustrial e social, no processo de evolução e varia na medida dos resultados do esfôrço empregado para "reger" os acontecimentos e as transformações, segundo um maior conhecimento dos fatos e das leis sociais (l). Pro gresso é, pois, organizaço, reconstrução, direção inteligente e racio nal, e implica necessàriamente não só um sentido mais profundo das transformações sociais e das fôrças coletivas que as determinam, como
a intervenção deliberada da sabedoria humana nas diversas partes do
novimento social, para dirigi-lo de acòrdo com as leis naturais. já Troelstsch, estudando as relações entre leis naturais e leis ideais, obser
vava que todo o esfôrço das civilizaçöes é "conciliar as leis ideais, normas morais e juridicas, politicas e religiosas, que constituem o pa trimônio universal da civilização, com as condiçües positivas do desen
volvimento das sociedades. Daí os compromissos de diversos graus, em Ctr. FERNANDO DE AZEVEDO Prineipios de Sociologia Parte Primetra, Capi tulo Vi, A evoluço social, 6.9 ediço, Comp. Melhoramentos de Sdo Paulo, 1954
FERNANDO DE AZEVEDO
162
que os grupos dão prova de uma fôrça e destreza desiguais, segundo a
sua estrutura ea sua orientaço. Mas, como tòda organização implica um esfôrço consciente para a ordem e a estabilidade, isto é, para o
restabelecimento do equilíbrio social (contrôle dos nascimentos, regu
lamentaço
da imigração, organização racional da produção, etc.), pode
se perguntar, com Smets, se o progresso émais normal que a estagna
ção, e admitir que, "se é possivel que as nossas sociedades escapem
sempre à estagnação, não seria ela, no caso em que se produzisse, senão
um fenômeno que teria tido precedentes em tôdas as civilizações primi tivas atualmente estagnantes'
A concepção de Durkheim acêrca da evolução social é uma concepção puramente mecânica, diz René Hubert, para quem "talvez fôsse possível invocar, a propósito da
vida social, a idéia do élan vital que Bergson aplicou à evolução das espécies
biológicas". Na sua sociologia marxista, Georges Sorel já havia tomado à filosofia
de Bergson, para aplicá-la à vida social, a idéa da tensão e do relaxamento, e Halbwachs, a teoria das duas memórias, dos dois eu, o eu profundo e o eu socializado; mas só mais tarde, em 1927, Daniel Essertier, em Les formes inférieures de l'explication, utilizou o lan vital, para conciliar os dois pontos de vista opostos, de Bergson e de Durkheim, sÑbre a personalidade. Pois, enquanto para êste, o que se encontra de mais elevado no homem é o eu social (tudo o que se deve à sociedade: a razão, a
vida moral e estética, a religião), o eu criado pela vida social é, segundo aquêle, o eu superficial, e o eu verdadeiro é o eu profundo, o único capaz de nos garantir a alegria e a liberdade da criação. Ora, a evolução, para Bergson, é uma evolução
criadora, determinada pelo impulso vital que, encontrando a resistência da matéria, se fragnenta em correntes que seguem direções diversas. É exatamente esa idéia de uma multipliidade de correntes evolutivas e de sucessivas criações que Essertier vai
utilizar, como lembra Roger Bastide, (1) concluindo "pelo reconhecimento do élan espiritual, desenvolvimento humano do élan vital". Essa noção do poder criador da
energia espiritual, ésse esfôrço contínuo e verdadeiramente revolucionário da inteli
géncia, reagindo contra a magia e o empirismo técnico, é que explicaria o progresso, a marcha da humanidade para a frente. Todo o progresso, escreve Roger Bastide, "consiste em quebrar barreiras. Os grandes homens são aquèles que, por um eslörço
de intuição, puderam abrir uma brecha no gêlo rígido do seu "eu" socializado e
atingir, além das representações coletivas, no mistério do "eu" profundo, a corrente
que continua a passar, o fluir do élan vital". Éo que afirmamos, em vários pontos de nossa obra, e, especialmente quando, sob a a inspiração de Dewey e Bergson, a um tempo, colocamos à base da` vida e evolução social, além das duas faculdades especificas do homem (a linguagem e a ténica), a tendência à exploração, à des coberta, à criação, em que se alarga, no plano humano, a ação do impulso vital (élan de vie) e que consiste numa exigênia de criação (2). Ora, as ransformações técnicas e econômicas de que resultaram,
na atual civilização, profundas modificações de idéias e de estrutura
social, têm àsua base um fato de capital importância, em que se po dem buscar as suas origens mais próximas: o extraordinário progresso
cientifico e, em conseqüência, o dominio e a utilização pelo homen das förças naturais.A fase presente da evolução "caracteriza-se essencial mente pela preponderåncia do progresso material, e se exprime na
conquista pelo homem, das fôrças naturais, outrora pràticamente não utilizadas". Tem razão Dewey quando afirma que, enquanto os ho (1) ROGER BASTIDE
A sociologia trancesa contemporánea. I
ciologia, in "O Estado de S. Paulo', 13, Junho, 1939.
Bergson ismo e so
(2) Cír. FERNANDO DE AZEVEDO Princípios de Sociologia. Parte Primeira, Capí tulo Vi, ¢ evolução social, 6.9 edição, Comp. Melhoramen tos de São Paulo, 1954.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
163
mens não haviam adquirido o doninio das fôrças naturais, a civiliza c£o foi sempre precária: um "acidente local", cono o provam tantas CIvilizações (1) que surgiram no passado, mas para se desmoronarem e se converterem em mnontöes de ruinmas. As permanentes decadncias
to
tais de civilização, escreve Dewey, são hoje impossíveis. Enquanto exis tir um grupo de homens que entendam os métodos da ciência física e sejam experimentados na sua aplicação, éseguro e relativamente rápido
o restabelecimento, ainda nas piores circunstáncias, da base material
de cultura. Ainda que o homem moderno estivesse enganado acèrca da quantidade de progresso que havia feito e singularmente iludido quan
to àcerteza de um progresso automático e sem interrupção, tinha razão
em pensar que, pela primeira vez na História, o género humano deti
nha em seu poder a "possibilidade do progresso" (2). A passagem do
instrumento à máquina que éo nó da revolução industrial e se opera
diante de nós, o desenvolvimento de uma técnica nova de produção,
a renovação e o progresso incomparável dos novos meios de transporte
e de comunicações (automóvel, aviação, telefone, rádio) introduziram
um rimo novo de vida que rompeu com um passado várias vezes milenar e fèz estalar os quadros tradicionais de nossas velhas socieda des. O fermento, por assim dizer revolucionário, dos novos métodos
de produção industrial, observa André Siegfried, numa análise de no tável lucidez, "ultrapassa de muito o dominio próprio da produção:
éle trabalha a vida social, penetra até na intimidade do individuo, fazendo estalar, -
vemo-lo bem,
a armadura várias vêzes milenar
originada de um passado pré-histórico, acarretando a revisão das rela Ções do homem com a natureza, com os outros homens, transformando
não sòmente as técnicas antigas, mas as próprias morais, subvertendo o equilibrio dos continentes e das raças". É êste, sem dúvida, o espetáculo que nos oferece a fase atual da civilização humana e, para que não se julguem carregadas as còres do quadro, bastará lembrar, com Smets, que nossos paises estão longe de sair dése periodo de transformação rápida que começou há séculos e não se sabe se já atingiu o seu ponto culminante: acumulação dos
conhecimentos técnicos e aplicação imediata das descobertas cientifi cas, crescimento da população, concorrência industrial intensa, modi
ticações de composição das classes sociais e de suas relações entre si,
Conflitos entre os povos, acarretando transformações politicas protun
das. Tudo isto constitui uma série de fatos, cada qual mais importante,
Cujas repercussões, sempre graves e às vèzes violentas na educaçio, ain
da não foram suficientemernte estudadas: alguns, como o rescimento das populações e a complexidade crescente da estrutura social e ec (1) Pode-se chamar civilização, es clarece Mauss, "'os resultados dåsses comércsoa
contatos de tôda sorte que se estabelecem por vizinhança ou por tuliaçào entre soctedades que se podem classificar em relação a èles (familas de povos, areas de civiliaag,
ca
madas de civilizações ). É preciso distinguir civilzaçdo do que se chama cultura ou a civi
lização de umna nação e que não é outra coisa senão o seu siatema social ou o deal que
ela se faz dêsse sistema
(2) J. DEWEY - Progress,. in International Journal ot Ethics, vol XXVI paqs. 311314
Human Nature and Conduct, 289-290. 12
Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDo 164
nômica, em virtude da formação de grupos distintos, t¿m contribuido e outroe
sistemas escolares; para ampliar e complicar cada vez mais osdecadência das elites, a ascen como a recomposição das classes sociais, a são das massas ao poder, e os conflitos entre as formas tradicionaise
os novos hábitos de vida, não cessam de fazer presso sÑbre a estrutura
dêsses sistemas, desarticulando-os, nas suas peças essenciais, e impondo
esforços sucessivos de revisão e de reconstrução. Não se trata, pois, de
evitar uma "revolução". A revolução já a temos, e é difícil que possa
ser mais profunda. Aliás as águas não arrebentaram ainda todos os diques, mas a direção da corrente já não pode iludir. Trata-se mas é
de estudar, no seu sentido mais profundo, as evoluções que se proces sam, para podermos coordená-las e dirigi-las; e, se nos lembrarmos que as próprias fôrças desencadeadas pelo progresso material e, sobretudo,
pela máquina, e que tão fortemente abalaram e transformaram o sis tema de relações humanas, poderão servir-nos, se inteligentemente con troladas e dirigidas, para a reconstrução social, teremos reanimadas
as esperanças e novos estímulos em face dos graves e complicados pro blemas com que nos desafiam as sociedades, nesta fase de sua evolução. A gravidade desses problemas, os conflitos de idéias e de interêsses, no interior dos grupos, e entre os diversos grupos e classes, a crescente
especialização do trabalho social que ameaçava levar a sociedade à anar
quia se não fôsse acompanhada de uma centralização correspondente, é que determinaram, em conseqüência e como natural reação, êsse notá vel "movimento de integração e consolidação social" que culminou na
organização e supremacia do Estado, como órgão unificador, e tem sido acelerado pelas fôrças concentradas e combinadas do vapor, do motor de explosão, da eletricidade e do rádio.
Sem afirmar, pois, que a economia é função da técnica ou tôda a cultura seja função da economia", - o que seria incidir no êrro do materialisno histórico, não se pode negar a existência das relações da atividade econômica com tôdas as formas da vida social, e as pro
fundas transformações quer dos hábitos sociais, quer dos processos in telectuais, ligadas ao progresso da técnica, em geral, e particularmente da técnica econômica que organiza a produção. Édifícil exagerar a in fluência que a técnica exerce sôbre tôdas as formas de cultura e as
modificações que a especialização ligada ao progresso técnico introdu
ziu nas "formas organizadas" da educação. A especialização de funções, acentuada pelo desenvolvimento da técnica e da racionalização do tra
balho, não teve apenas, como conseqüência, a especialização profissio
nal e, daií, o extraordináriodesenvolvimento que alcançaram, nos siste
mas educacionais, as escolas especializadas de diversos tipos e grause téccom vistas a uma
a preponderância do ensino especial, organizado nica ou a uma profissão. Ela teve também "conseqüências morais im indivíportantíssimas", das quais uma consiste em confinar e isolar o "fora agir duo no dominio de sua especialidade, tornando-o incapaz de autoridade
da
hierarquia a que pertence" e, portanto, de dispensar
a
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
165
que lhe designa a posição e Ihe marca a tarefa, e a outra, a prepon
deråncia, na hierarquia dos valores, do valor-utilidade ou de produção
sôbre os valores morais ou espirituais (1). Assim, contra a excessiva di ferenciaço dos cursos, determinada pela especialização, não tardou a formar-se uma "corrente de reação" que tende, para corrigir-lhe os ex
cessos, a intensificar e estender o ensino geral comum, unificado, (ele
nnentar e médio), como um suporte cada vez mais necessário às diver
sificações ulteriores, impostas pela diversidade de oficios e de profis
sões. Mas, de tôlas as repercussões do progresso técnico sobre a edu
cação, as que nos parecem mais graves, em uma época de rise revolu
cionária, são as que resultaram da ruptura de equilíbrio nas necessi dades das classes, nos seus hábitos, e as modificações introduzidas em
conseqüência na escala habitual dos valores sociais. E não foram sò
mente a hierarquia das classes, a sua situação econômica e os valores
antigos que se transformaram ouse estão alterando sob os nossos olhos. As próprias relações do homem com omeio fisico e social foram per
turbadas pelas invenções de tôda ordem e sobretudo pela máquina
que, se, por un lado, tornou a vida mais fácil e segura, reduzindo a
dependéncia do homem em relação ao seu "meio natural", tornou, por outro lado, a vida mais complexa e mais difícil, tornandoo mais de pendente do seu "meio social", extraordinàriamente equipado de tôda
espécie de instrumentos e máquinas, de meios de transportes e comu nicações, suscetiveis de apertar cada vez mais o sistema de relações entre
Os individuos, entre os grupos no interior das sociedades, e entre as
próprias nações e continentes (2). Oquadro, talvez um pouco sombrio mas exato, que no seu livro "Na sornbra de amanh" (Diagnóstico da doença espiritual de nosso tempo), nos traça Johan Huizinga (3), permite-nos compreender melhor a contestura intima, o sentido profundo de nossa época que é essencialmente uma época de transição. Não se podem comparar com a nossa, em sua opinião, senão rês épocas da história européia; époa revolucionária e napoleonica, entre 1789 e 1815; a época por volta de l500 e.a entin. a época de transição entre a antiguidade e a Idade Média que èle obra verdadeiramente notável "O outono da ldade Média". Em analisou, na sua 1300, como por volta de 1800, todavia, o sismógrafo da história registra menos profundos. O sistema moral do Cristianismo, dizabalos menos violentos e Obermann, resumindo Huizinga, não foi abalado de maneira radical nen pela Reforma nem pela Revolução Francesa. A estrutura política dos Estados europeus não foi sèriamente afetada no século XVI nem tão profundamente abalada no tempo da Do mesmo modo o sistema Revoluçio cono econômico, nessas duas épocas, não mostrou sinais dehoje. um (1) Educaçáo comparada, Companhia Edinôra São Paulo, sILVA 1936. RODRIGUES (M.) (2) E o que
Nacional
exprine Ortega y Gasset quando reconhece no imperio das ng ascensão do nível de altitude de tempo que anuncia, simples sintomas de um masscs Completo e geral, isto é, "que o mundo 2at0 ais e, com åle, e nåle, a vda". cresceu se universalizou, quero dizer que o s ta. de tato da conteúdo no vida homen de tipo mdio o planta; e cada indivíduo vive hof todo habitualmente todo o mundo. Fas pouc ano, lembra Ortega y Gasset, os ncis de um sevilhanos seguiam hora or hora, mseus jornais popu lares, o que estava a uns homens junto ao Pólo. Cada pedaço de terra ja no esta confinado no seusucedondo lugar geomtrico, ao contrario, para mutos eteitos, atua Dos dacmais pontos do planôta''. (La Rebelion de las Masas, pág. 53 ). (3) HUIZINGA (JOHAN) - In the Shadow ot to Morrow. Trad. inglèsa do holands pelo filho do autor J. H. Huizinga, Heinemann, Londres, 1936.
FERNANDO DE AZEVEDO
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perturbada por uma deslocamento essencial, e a ordem social não foi Ba aspectos, a crise do êsses apoiada söbre a noção da luta de classes. Sob todos Mae antigo, mundo do o fim moderno parece assemeclhar-se antes à que marca ccdend certas diferenças essenciais. Nós vemos, com efeito, uma alta e rica civilização gradualmente lugar a uma outra indubitàvelmente mais baixa de qualidade e mai
ideologia
reduzida em seus meios, o que não deixa de assemelhar-se ao que se passa hoie: contudo, esta nova civilização, inferior à antiga, tomou a esta ultima e conservou
como seu maior tesouro uma forma muito alta de vida religiosa que lhe asscgurava
oricodesenvolvimento ulterior, enquanto que hoje pode sedizer que ode queRoma desapa er rece lega ao futuro um poder igual? Por outro lado, a decadência dominio observável no um processo de estagnação e de degencração igualmente que nossas ciênias afirmar pode-se intelectual; ora, social e da vida da organização do Ocidente estão em decadência e estacionou o progresso de nossa técnica? Assin mesmo a analogia com o declínio do mundo antigo éincapaz de nos esclarecer sôbre a verdadeira natureza da crise atual.
Essa simples análise objetiva já bastaria para sublinhar a impor
tância dos problemas de educação postos por essas sociedades de tizo mÕvel da civilização atual a que Kilpatrick chamou "civilização em essencialmen mudança" (changing civilization) e que, se se caracteriza pela confusão
moral, te pelo progresso material, se traduz, na ordem valores. de idéias e de sentimentos e pela instabilidade e subversão de
(absolutos ou rela Àruptura das tradições e dos valores estabelecidosCOmo uma nova tra tivos) não sucedeu, já organizada, para se impôr dição, outra hierarquia de valores, de acôrdo com uma nova concep que elas são ção de vida. As próprias noções comuns, por isto mes1mo cinema
comuns a um grande número de espiritos, (e a imprensa, o indetermina e o rádio as estendem a tôdas as camadas sociais), ficam
como das, como observou Dupréel (1), e essa indeterminação aparece im dizer, poder-se-ia uma condição de sua própria ação: sua difusão, idéias confusas" esta plica certo grau de confusão. Éa "teoria das que fa belecida por Dupréel na última parte de seu livro. As razões fazem
mesmas que zem triunfar umas ou outras não serão, pois, as
distintas, em que triunfar, no espírito individual, as idéias claras e lógico. É exatamente importa, mais do que a utilidade prática, o valor das quais se ordenam o contrário, no caso das idéias confusas, em tôrno levadas pela as vontades, embora estas, quando se defrontam, sejam conflitos) a tornar claras as sua própria oposição (antagonismos e suas suas idéias diretrizes. "As idéias confusas que são implicadas em
em clareza, tor relações sociais de antagonismo tendem a progredir das fôrcas sociais, o limite nando-se a lógica pura, pelo jógo natural destruídas ou abaladas as tra
para o qual tende a lógica social".
Ora,
adquirido, hereditário, cole dições antigas, que constituiam o caráter substituídas por tra tivo do capital da civilização anterior e não foram
conseqüencs dições novas, bastante consolidadas, podiam ficar semsentimentos e de para a educação êsse estado de confusão de idéias, de
de la sociolo Le Rapport social. Essai sur l'objet et la méthode Paris, Félix Alcan, 1912. (1) DUPRÉEL
167
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
diversidade e sucessão, êsses que do mais e pluralidade, hábitos (1), essa constituem a desordem moral e que doutrinas, de e conflitos de idéias o ofício do educador, pai ou intelectual de nosso tempo? Certamente, de que o maior número pos professor, é cuidar, como ensina Dewey, ad crianças e pela mocidade, sejam pelas adquiridas idéias motrizes, das sível idéias que se convertam emconseqüência das quiridas de um modo tão vitalconduta. Mas, se, em dis a grande fôrças móveis na direção da sentimentos, é tão mudanças de estrutura, de idéias e de e as gerações jovens que elas táncia social entre as gerações adultas compreenderemn como dois mun freqüentemente se defrontam sem se vacilam, nas suas crenças abaladas e velhos mais os se diferentes; dos social, em direções divergentes senio os jovens são solicitados, na vida nova geração, sem que ela seja atra opostas, como é possiível iniciar a formação que marcará vessada pela corrente de uma cultura total, na existência? tôda a sua sua vida, seu trabalho, sua atividade e as expressões Em notável ensaio em que "analisa, para empregar até em suas mundial de Fr. de Hovre, a essência profunda da crise quais ela se reve fibras mais ocultas e pesquisa tôdas as formas sob as mostran lou", Karl Jaspers põe em evidencia essa crise em educação,
a concepção tradicional da do que tôda a educação se desagrega, sematuridade, lhe trazem a res vida se desagrega naqueles que, na sua ponsabilidade'" (2). Uns se voltam para a tradição e pretendem impor aos filhos, como absoluto, o que êles próprios já não admitem: outros rejeitamn a tradição e crêem fazer educação pelo treino técnico e ensino enciclopédico. "Quando a noção de cultura geral se erige claramente
diante do espirito, observa Jaspers, a educação se liga a normas fixs: ela tem um fim, um papel, uma significaço... O que dá cada cduca dor, lhe éapenas consciente. Sem ser obrigado a procurar, acha-se todo
inteiro ao serviço dessa corrente de progresso humano que avança ao ritmo de uma continuidade imperturbável. Ao conrário, quando a noção de cultura geral se torna problemática e ameaça ruina, a edu cação torna-se incerta e se dispersa. Ela já não introduz a criança no vasto templo de uma cultura universal, mas a familiariza com a varie
dade matizada das noções particulares. Experimenta-se sem cessar: e
as matérias propostas, os fins prosseguidos, os métodos empregados (1) Essa confusão de idéias, de sentimentos e de praticas, nas crses socsaia 2 ds paes ). s T revoluções (e, neste caso, também sob a influência dos in terèsses
flete e se traduz na confusão de linguagem e nas variaçöes do sen tbdo das pcicvra causa deve ser procurada exatamente na evoluçào dos sen timen tos ds deics
fenômeno constante, êsse das transformações semanticas: as palavras mudam de
aoep
u
Ou apresentam nuanças diversaS de sentidos, atravessando grupos clasaa ditera hs lhes imprimem variações correspondentes s suas ocupaçoes man tahdadea par
(linguas especiais ) ou passando de uma geraçáo à geraçáo segunte nua procesao DocD.
de evolução. Mas ¿ nesses periodos de transiçâo de crse revolucioárna ue se procuD ao lado de novas formações de vocábulos, maiores mudangas de sen ndo das palaVTS Já Salústio fazia dizer a o verdadeiro nome das coca Catáo:perdemos 0 erc vocabulacoragem, amisimusa ):audácia chamamos liberalidade do crime. (SALL I s O d e s isPenacdaa om bem de Catiina C. LII ). pos. de um ar cular interêsse, pela luz que projeta sobre as oa sen tume toa da uma poc a deias pesquisa sobre as moditicaçoes operadas no vOcabulario cocren be que sdo sunomas a teristicos de tôdas
as épocas de (v. A. JOUSSAIN Le teporaire du sens des mots dans les crises transiçáo. sociales. in Revue Intarnationale decàangement 1936 ). Soctologie, na 11-12, (2) JASPERS (KARL)- Die gelstige Situation der Zeit. Samne Gaeschen.
168
FERNANDO DE AZEVEDO
mudam continuamente". Essa confusão ainda éagravada pelo fato de que, sendo impossivel ao homem despojar-se inteiramente do que deve
aos seus antepassados e ao seu próprio meio social, o mais decidido
revolucionário, na justa observação de Joussain, retoma sempre por sua própria conta, transpondo-as à sua doutrina, as crenças e as idÃias
que pertencem à ordem de coisas que pretende destruir ou à qual se subtrai. Por mais hostil que seja àordem estabelecida, êle se acha cons
ciente ou inconscientemente na necessidade de acomodar-se, para go
verná-los, com os sentimentos profundos daqueles sôbre os quais pre
tende agir. Se se considerar, pois, que o processo pelo qual o homem
sea educação faz verdadeiramente homem e que se repete em cada individuo, é e esta consiste, em essência, numa transmissão da cultura do grupo de uma geração a outra, compreender-se-á fàcilmente que, onde se desagregou a concepção tradicional da vida, como é o caso de uma civilização em mudança, entrou em crise a própria "noção" de
cultura e, com ela, a educação. A falta de uma nova concepção de vida,
de uma "unidade de ideal", seja êle qual för, nas gerações adultas não permite que as idéias transmitidas por elas e adquiridas pelos jovens se convertam em fôrças operativas da conduta; e a nossa época vive assim, nesse periodo de transição, "sob o signo da decadência de toda
educação verdadeira e de uma experimentação sem fim".
A educação, no seu sentido geral, (incluindo-se o ensino e a disciplina moral) não é, para Dewey, o processo ou a soma de processos por meio dos quais o homem maduro, oadulto, eleva gradualmente o imaturo ao grau em que pode buscar por si
mesmo. "Adq uirir do presente o grau e classe do progresso que há nêle, eis o que
é cducação, segundo Dewey, e é isto uma função constante, independente da idade".
Mas, em primeiro lugar, ésse grau e classe de "progresso" (tomada essa palavra no
sentido que lhe atribui ésse pensador, "aumento de significado da experiència presente"). como poderiam ser avaliados senão dentro da concepção de vida dominante
nogrupo, ou de uma determinada hierarquia de valores? Esses progressos, em segundo
lugar, tanto na ordem material como no domínio das idéias, não constituem objeto ou conteúdo de transmissão, pelas gerações mais antigas, senão depois que entraram nos häbitos de pensamento e de conduta dos adultos e foram, portanto, filtrados e
incorporados à massa dos conhecimentos mais antigos. E, por último, se não se pode e neste ponto estamos de acôrdo com Dewey, pois o homem permanece em tôda a sua vida sujeito a influéndas de contatos pessoais, leituras, viagens que podem enriquecer ou retificar considerar a idade adulta "como um limite fixo de desenvolvimento",
a sua experiência e modificar as suas condutas habituais,
não é menos certo que a
educação é "preparação" das gerações jovens, e essa preparação é tanto mais eficaz quanto "recebe o seu sentido de uma filosofia geral", isto é, de uma concepção de vida sufiientemente clara, definida, e fortemente enraizada, nas gerações adultas. Pela eduação metódica que recebe, diz Jaspers, pelas instituições livres em que entra,
por tudo o que vé e aprende, ao longo de sua vida, cada indivíduo adquire, graças
ao seu trabalho pessoal de síntese, o que é a sua formação. Mas, se éle nao adquiriu, na sua idade mais plástica, uma base de cultura geral, isto é, de maneiras de pensar, de sentir ede agir, enquadradas num "sistema de idéias", como poderia
numa vida limitada, reduir à unidade conhecimentos múltiplos e fragmentários e
realizar essa síntese que, sem dúvida, cada indivíduo reconstrói' à sua maneira, retitica
e adapta a si mesmo, de acórdo com as suas posibilidades e exigências naturais, mas que resulta, nas suas linhas essenciais, de longa elaboração através de geraçoes sucessivas?O estadoconcentração, de desordemumaintelectual e moral, individuo geral mente consegueque,nãonesse é uma clarificação, uma o síntese; é sòmente uma "mistura" de conhecinentos parcelados e contraditórios.
De resto, a carênda
sOCIOLoGIA EDUCACIONAL
169
A tese de Sócrates de moral não pode ser compensada por "aquisições científicas". a amorali que a moral se reduz ao saber, não é verdadeira senão em parte, porque e inconsciência, à cono dade e a imoralidade podem ser devidas tanto à ignoráncia Poincaré. sábio o e Kant filósofo o acôrdo e sôbre êste ponto estão de a moral, ciênia objetiva. - tem um caráter imperativo de outra ordem, de natureza diferente da
A análise da própria natureza do fenômeno da educação e a ob servação metódica dos seus mecanisnos não nos permitem, pois, afir menos mar, com Alfredo Poviña, que a instituição educacional sejaque ela "fossolífera" que as outras instituições, sob fundamento de é necessàriamente obrigada a recolher tôdas as inovações e todos os progressos que se realizam na vida social à maneira de um aparelho registrador do coletivo'". Ela é, ao contrário, tradicionalista por natu
reza: função social que é exercida pelas gerações mais antigas e tem por
fim a transmissão dos valores estabelecidos e dos padrões culturais do grupo, antes reflete as mudanças coletivas do que as determina e serve
antes para "perpetuar" do que para produzir o progresso social. O
predominio dos "mais antigos" no grupo pedagógico sempre tèz da
escola um dos maiores redutos de resistência às inovações: e, se se acrescentar que oconteúdo da transmissão é sempre constituído de co
nhecimentos desde muito tempo adquiridos e sistematizados (tradi
Ções), compreender-se-á melhor não só essa atitude normal de hosti
lidade em face das idéias novas, como se terá a explicação do fato de que sempre foi muito lenta a penetração de ciÃncias novas (fisica, so
ciologia, biotipologia, etc.) nas escolas e a maior parte das teorias novas
e das descobertas cientificas tiveram origem fora das escolas, isto é, das "formas organizadas" da educação. Mas a educação consciente e sis
temática torna-se, certamente, menos tradicionalista e às vêzes mesmno
revolucionária quando, por efeito de certas causas coletivas (as rises
sociais, as revoluções, etc.), se produziu um enfraquecimento das tra dições e se verificou a ascensão ao poder, de gerações novas, portado
ras de novos ideais; e pode ser, ela própria, fator de progresso social na medida em que ela "se organiza" para difundi-lo no espaço e perpe tuá-lo no tempo, contribuindo para que a evolução se produza de ma
neira mais orgânica e gradual e tornando o individuo mais sensivel às
condições de progresso e mais capaz de se aproveitar delas. Para que uma inovação possua uma verdadeira transcendência social, é, de fato,
indispensável, como observa justamente A. Poviña, "que ela penetre
nos individuos que formam a sociedade, que èles a conheçam e possam
utilizá-la"; e nenhuma outra instituição serve de maneia mais eticaz do que a educação para realizar essa finalidade, isto é, "que os pro
gressos sociais se produzam na organização de maneira mais sistemá
tica eadquiram uma estabilidade suficientemente durável na vida do grupo". ÉSÓ neste sentido, preciso e limitado, que nos parece verda deira a afirmação de Dewey, de que "a educação mais consciente da mocidade é o meio mais eficaz e econòmico de progresso e de reorga
nização social, e que a prova de tódas as instituiçoes da vida aduita éo grau em que educam a todo individuo na plena extenso de sua
FERNANDO DE AZEVEDo
170
possibilidade", fazendoo participar dos progressos realizados e dando.
ihe, pela posse do conhecimento e pela cultura, os meios de sua con. tinuação. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. No estudo da evolução histórica e social das instituições e dos diversos estágios dessa evolução, uns em relação aos outros, pode-se pesquisar se uma práica é a forma primiiva de tal outra ou se é derivada. Mas êsse estudo, em que é precis
considerar os próprios fatos de que se quer determinar a relação causal, não se pode fazer sem método. Eis os principios de que não devemos desviar-nos e que foram enunciados por Kohler e parecem a Durkheim irepreensiveis, se aplicados con circunspeção:
I) Quando se constata, em certo número de casos, que a instituicão a saiu da instituição b, sem que nunca a relação inversa tenha sido observada.
élógico admitir que a segunda é a forma original da primeira.
II) Diversos processos podem dar a esta conclusão um acréscimo de
autoridade:
a) se se consegue achar quais os fatôres que determinaran a evo lução a se fazer neste sentido, e, sobretudo, se se pode estabelecer que éstes fatôres se acham idênticamente em tôda sociedade humana;
b) se, onde a está em plena floração, se acham traços de b que
estão em ponto de extinguir-se, mas não se podem explicar seno como sobrevivências do passado. III) Enfim quando duas instituições se encontram constantemente juntas,
apesar da diversidade das raças e das civilizações, ter-se-á fundamento para
supor que existe entre elas um laço interno, sobretudo se se pode fazer ver quais são as causas psicológicas e sociológicas que fazem esta solidariedade. 2.
Nem todos os fatos sociais são igualmente aptos a "internacionalizar-se",
a tornar-se universais, segundo observa Durkheim. Examinar e discutir as questões capitais relativas a essa observação: a) as instituições políticas, jurídicas, religiosas, educacionais e outras, os
fenômenos de morfologia social fazem parte da constituião própria de cada
povo; ao contrário, os mitos, os contos, as moedas, o comércio, as belas-artes,
as técnicas, os conhecimentos científicos, etc., tudo isto, viaja, se empresta, resulta em uma palavra, de uma história que não é a de uma sociedade
determinada;
b)
há, pois, lugar de se perguntar de que depende ésse desigual coefi
ciente de expansão e de internacionalização;
) essas diferenças não se prendem ùnicamente à natureza dos fatos sociais mas também às próprias condições em que se acham colocadas as sociedades; pois, segundo as circunstâncias, uma mesma forma de vida coletiva é ou não suscetível de se internacionalizar. (Durkheim).
3. Todo o esfôrço das civilizações, segundo Troeltsch, consiste em conciliar as
leis ideais, - normas morais e juridicas, politicas e religiosas, com as condições
positivas do desenvolvimento das sociedades. Observar e mostrar conm exemplos:
a) que essas tendências, se lhes seguirmos odesenvolvimento através da
história, se encontram sob formas diversas, nas teorias do direito, da moral, da educaçãT, nas diferentes épocas;
b) que daquele fato resultam os compromissos de diversos graus em que os grupos dão prova de uma maleabilidade desigual, segundo sua cons tituição e sua orientação; ) que, conforme o exemplo dtado por Troeltsch, "uma Igreja se acomodará mais fàilmente como "século" do gue uma seita, enquanto
misticismno, pela espécie de indiferença que professa em face das colsSas
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
171
terra, dará às almas uma atitude tbda especial que vai da extrema tolerância 4. Estudando os mecanisnos de evolução e a natureza do progresso, chegamos seguintes conclusões, entre outras, que são aqui resumidas para análise e discussão: à hostilidade total para com o nundo.
às
a) de modo geral, as evoluções de nossa civilinção são ligadas a um
"alargamento" de certos grupos e uma diminuiçáo de outros (comparem-se, por exemplo, a família e o Estado, na sua evolução até as formas atuais): b) por tôda parte em que certas formas sociais (fatos estruturais ou morfológicos) são dadas, as diferentes atividades (fatos funcionais) que se realizamn através delas, se acham modificadas em conseqüência (C. Bouglé); oprogresso ou civilização multiplica os grupos de que os individuos )
e parece que, quanto mais se é civilizado, mais se conta com essas dependem; dependências que se limitam e às vÁzes se neutralizam reciprocanente. "podendo
ser considerada (é a tese de Simmel e de Bouglé) a multiplicidade dos círculos sociais como o fator constitutivo da independència das personalidades". 5. O progresso do maquinismo, que pode ser considerado como o desenvolvi
mento acelerado e intensificado de um antigo fenômeno, resolvendo problemas, criou
outros, de suma importância não só no domínio industriale econômico, mas em todos os setores da vida social. Examinar
a) qual a atitude do homem diante da máquina, como instrumento
utilizado na vida cotidiana, e como meios de recreação e de divertimento:
b) em que medida os instrumentos e máquinas afetaram a mentalidade
e aconduta, transformando a vida de relação dos homens (a estrada de ferro,
o automóvel, o avião, como "geradores de um mundo de sentimentos e de idéias novas");
c) quais são as mudanças ou os desenvolvimentos nos domínios econó
mico, poliico, moral e estético, que é possivel atribuir ao fenômeno do maqui nismo;
d) quais são, em geral, os métodos que permitem controlar o maquinismo
no interêsse do agente humano e de que maneira nosso sistema de educação
atual deveria ser modificado para que o fenômeno do maquinismo possa ser
dirigido pela sociedade humana em lugar de reagir sôbre ela como uma fôrça exterior e distinta (Do "Questionário relativo ao probiema do maquinismo no mundo moderno", preparado pelo Instituto Internacional de Cooperação
Intelectual e pelo Bureau Internacional de Trabalho, Junho, 1936). 6. A complexidade da vida social manifesta-se pelo número de grupos (família. igreja, grupo profissional, partido, etc.) em que ela se seciona e aos quais pode pertencer o individuo. BOUGLÉ explica a libertação do individuo, como vimos, pelo fenômeno de entrecruzamento dos grupos sociais, já observado por G. Simmel: pertencendo em geral o individuo a diversos dsses grupos, de objetos e tendèncias
diferentes, e submetido a influências diversas e às vézes opostas, éle escapa não só
"ao imperialismo de um dêles, mas também, mais ou menos, à ação unitormiante
da sociedade, isto é, ao domínio de um imperativo social único". £le emancipa se. Ora. a) como o desenvolvimento da criança e do adolescente é, ora refreado.
ora facilitado, mas senpre influenciado pelos diversos grupos a que pertence
sucessivamente, a escola, observa PLAGËT, contribui para desenvolver. nas
crianças, o espírito de revolta contra a autoridade dos pais. à qual se opóe o prestígio dos companheiros e dos mestres:
b) longe de negar èsse espírito de revolta, BOUGLE vÁ neie "uma das torças que provocam a mudança das sociedades; cada geração tende a repor em questão muitas coisas: bom meio de eviar a anquilose das sociedades".
Examinar àluz de observações diretas e discutir essas duas proposiçles e. especial mente, a conclusão de Bouglé, em que Piaget vè também o aspeto importante do problema que põem as relações entre as gerações". 7. O império das tradições e a influÁncia das gerações antigas. isto é. a autoridade da idade. constituem um dos maiores obstáculos às mudanças coletivas
esociedacde. ao progresso social, mas variam de um povo para outro, e. dentro da mesma do meio urbano para o rural, e de unma para oura época de sua evoluc ão
FERNANDO DE AZEVEDo 172
seguintes fatos, já assinalados por Observar, em casos concretos, e analisar osdos fenômenos de educação e de suas
Durkheim, de importância capital no estudo
e ela A a influência das gerações antigas, a) quanto mais profunda tanto maiores obstáculos há para mais dura, pode tanto mais profunda quanto palavras, que o "tudo Durkheim, ainda de nod não as mudanças; ou, por outras infáncia, da além velhos dos contribuir para prolongar a influência tradiionais; é o que se dá quando o senão fortificar as crençase asnopráticas fica então em meio em que foi educado, pois sua homem feito continua a viver conheceram ação: à submetido e criança relação com as pessoas que o são trans. indivíduos adolescência, os b) inversamente, se, ao saírem da os éle is que velhos do mais homens plantados para um meio novo em que imigra dá nas sociedades de não são aquêles de que sofreram a ação (o que segerações antigas e, em conse
relações com o progresso:
ção, de tipo móel), diminui a influência das qüênia, a oposição às mudanças; da idade desce grandes cidades que "a influência moderadora
) é nas tempo que, em parte alguma, as tradições ao minimum; constata-se ao mesmo são focos com efeito, as grandes cidades têm menos império sôbre os éespíritos; necessidades costumes, incontestados de progresso; nelas que idéias, modas, do país". resto pelo seguida em espalharem novas se elaboram para se é o caráter das faz, sobretudo, a fôrça da tradição 8. Se é certo que "o que que consiste, educação a saber, os antigos", a transmitir pessoas que a transmitem e a inculcam, para geraç×es conscientemente feitos pelas natureza? em sua essência, nos esforços por conservadora e tradicionalista antes as suas tradições a uma outra, não é esclarecem as relações entre a educação Analisare discutir as seguintes observações que eo progreso: e das tradições (das idéias estabelecidas a) a educação é a transmissão são que antigas gerações pelas dos conheimentos adquiidos e sistematizados) das gerações que foram educa junto "gozam e tradições a expressão viva dessas um prestígio que nada pode substituir": a educação das sob os seus olhos, de causa do tradicionalismo que lhe vem de é, portanto, mais conservadora, por sua própria natureza; fenômenos de imigra por fôrça e sob a pressão de contatos b) se, no entanto, e influências de de mnestiçagem; aumento um determinaram ção que se promove a ascenso de revoluções, emn que de culturas diferentes; de guerras; de tôdas enfraquecimento etc. - se produz um "fossilífera", menos a0 poder, de gerações moças, tradicionalista, torna-se menos as tradições, a educaçãorevolucionária, em conseqüência; mais progressista, e até produz o reflete e acompanha do que mudanças antes portanto, educação, a c) na medida em que estimula as progresso social, mas pode favorecê-lo parte de uma política social geral, como que coletivas e contribui para dirigi-las, gerações jovens, para que os progressos por umna ação intensa sôbre asrealizem na organização de maneira sistemática efetivamnente se produzem, "se suficientemente durável na vida coletiva". e adquiram uma estabilidade
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PARTE TERCEIRA
OS SISTEMAS ESCOLARES
Capitulo I OS SISTEMAS ESCOLARES E OS SISTEMAS SOCIAIS GERAIS Escola e sociedade.
A organização e o processo social. -
Aeducaçáo
institucional ou escolar em função da estrutura das sociedades. - A coordenação e subordinação das escolas em "sistemas". 0 que se entende por "sistema educativo". A correspondência entre os sistemas sociais escolares e o sistena
e de diferen ciação. - Diversifiação de Processos de integração As social geral. funções à base de um ideal comum. três grandes seções na estrutura dos sistemas escolares. - A variedade de necesidades das classes e dos grTupos socdais que coexistem no interior das sociedades. Educação comnum e educacoes
especiais. A
complexidade dos sistemas escolares decorrente da complexidade
das sociedades modernas.
Os sistemas escolares públicos.
A maior parte das divergências que suscitou a questão das relações entre oindivíduo e a sociedade, entre a consciência individual e a cons
ciência coletiva, e as aberrações a que deu origem essa velha polêmica,
provieram, sobretudo, de se querer estabelecer antagonismo ou oposi iuga, da vida social na sua plenitude. As duas consciências, individual
ção irredutível onde havia apenas duas direções, centripeta e centri e coletiva, "são consubstanciais, pressupõem-se reciprocamente, são ima
nentes uma
à outra, se as tomamos na sua totalidade conreta". Elas
são ligadas por êsse principio que pela primeira vez Theodor Litt pôs
em foco, da "reciprocidade das perspectivas" (1). É, de fato, nas profun
didades mais íntimas de nosso "eu" que encontramos a consciênia cole tiva, e, inversamente, é nos estados mais fortes e intensos da consciência
coletiva que constatamos que ela faz menos "pressio" sôbre as consciên
cias individuais. Da mesma forma, àluz dessa outra noção fundamen tal, em sociologia, da "reciprocidade das ações causais", - com a qual significamos que, em matéria social, a causa pode tornar-se efeito e in
versamente,
se apresentam, em tôda a sua importância, as repercussöes
e interferências dos fatos sociais, profundamente conexos, as reações entre
o "organizado" e o "espontaneo" da realidade social e a estreita solida
riedade entre as estruturas de grupos e o sistema social geral de uma
sociedade determinada. Ora, a escola, instituiçåo social, taz parte "dèse
lado cerimonial e organizado da realidade social" que Bergson, no Le
Rire, descreveu como "uma pelicula sólida, fria, condensada, que reco
bre as camadas mais profundas e espontâncas da vida social, à maneira
de um vestido que pode ser mais ou menos adaptado ao corpo que reco
bre". O problema das relações da escola e da sociedade pode, pois, ser (1) THEODOR LITT- ladividuum und Gemeinschatt, 3.4 ed.. 1926.
FERNANDO DE AZEVED0 178
examinado sob três aspectos ou desdobrado em três espécies de entre o "organizado" I) as relações de tensão e de penetração condutas coletivas, não cristalizadas sistemas escolares) e as práticas e"espontâneo", o processo ou o e lado, organizações, de um transformação, de 2) outro: as conexões Social em constante entre as sociedade global; e 3) as açoes truturas escolares e a estrutura da e
est(escoludos:as, em movimenteso
côes reciprocas da escola e da sociedade, isto é, as exigências qùe a rea-
dade, globalmente e em diversas classes e grupos, impõe à influência que a escola pode ter no desenvolvimento da sociedar relações sociais. A educação consciente e organizada, como ensina começa senão quando a cultura mental e moral adquirida pela
escola,
e aa
não Durkheim,huma-
nidade chega a ser demasiado complexa e representa um papel excessi.
vamente importante na totalidade da vida comum para que se pudesse
deixar ao acaso das circunstâncias o cuidado de assegurar sua transmie são de uma geração à seguinte. Nao é, de tato, senão nas altas civiliza.
ções que a educação, como modo de formação intelectual e moral siste
mática, é isolada do complexo das outras funções sociais. Ela torna-se. observa por sua vez Krieck, "um dominio relativamente independente, com instituições e organizações particulares, com métodos e programas próprios. Aescola eo corpo docente surgem então como partes da orga nização social". Mas essa educação escolar, como parte que é da estru tura social global, "reflete de maneira notável não só o tipo especial de organização, mas tôda a escala de valores de uma sociedade, em um mo mento determinado, a tal ponto que seria possível conhecer tôda uma estrutura social conhecendo sòmente seu sistema de educação". Éevi dente, pois, que as escolas, não sendo senão expressões parciais e sempre
insuficientes das camadas mais profundas e mais imediatas da realidade
social, variam e se adaptam em função não sòmente da estrutura global
em que se enquadram, comotambém do movimento espontâneo da vida social que está sob essas organizações. É êste o problema das relaçõcs que se estabelecem entre as superestruturas organizadas (instituições esiste mas) e suas infra-estruturas subjacentes, constituídas pelas práticas e con
dutas coletivas e ainda pela vida social espontânea em permanente mo
vimento. Noentanto, por isto mesmo que só na esfera refletida e racio nal das formas organizadas, os fins fixados habitualmente pelas traal "precisam, Cristaçöes ou antemão nos (leis, etc.) de estatutos códigos, lzam as funções, empobrecendo-lhes os conteúdos e tornando-as mals estáticas", as organizações escolares podem entrar em conflito com as prá-
ticas coletivas e com a vida social, por uma demora" (décalag) processo de adaptação (sobrevivências de formas arcaicas)outras ou institupo
"aceleramento" no seu processus evolutivo em relação às ções sociais, domésticas, economicas, políticas e religiosas. Embora a expressão "estrutura social" seja empregada tidos diferentes, conforne os
em três sen ao
exclusivamente
menos
(estrutura autores, a tendéncia é de usar êsse Lêrmo para designar as "formas organizadas ou institucionais" da vida coletiva É COm esta da sociedade global em tal ou qual época ou estruturas de grupos).exprime, pois, acepção que sempre empreganos o vocábulo. Quem diz "estrutura"
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
179
estruturas sociais sáo o "organizado" en oposicão ao "espontáneo", na vida social: as
rstratificações (politicas, econónicas, religiosas, ocupacionais) ou condutas e práticas coletivas habituais, combinadas, hierarquizadas, centraliadas, egundo modelos mais refletida e ou menos refletidos. Ora, como não há fins ou objetivos senão na esfera racional da vida social organizada, é preciso distinguir fim e função. A funcão ou
"a idéia dirctriz da obra, como observa Hauriou (). ultrapassa singularnente a
nocão de fim", c não pode nunca ser con1pletamente expressa por éle. A relaçáo entre fim e função, comenta Gurvitch, é análoga à que existe entre o fin (representaçáo de um bem a rcalizar no futuro), de uma parte, e os fins (têrmos diretos das aspira cões acompanhadas de uma imagem intelectual) e os valores (os mesmos têrmos náo deformados pclas imagens), de outra parte, sendo êstes últimos subjacentes a0 fim sCm sercm plenamente expressOs por éle. Assi n, a organizacáo, seja ela qual fôr, uma Cscola, una igreja ou um partido, é "funcional", isto é, por ela se manifesta o se
Tealiza una das funcõcs fundamentais da vicda social. e. em qualquer dessas organia cóes, as funcoes se idlentificam com os fins precisos: mas, como os fins (objetivos) das estruturas sáo mais pobres que as funções (fins e valores). a educação, no entido
largo do térmo, como realidade social, nem se exprime sömente nem e csgota nos fins (estrutura da sociedade e estruturas de grupos), distingue se. pois, segundo a nedida
racionais c precisos da cducação organizada. A vida social. refletida e orzaniada
de sua abertura ou comunicações en relação à vida social espontânea que fia
subjacente àqucla, no conjunto ou em cada uma das práticas e condutas coletivas cristalizadas em organizações.
A sociedade, como vimos, não apresenta, ainda entre os primitivos,
uma estrutura homogênea, e, em conseqüncia,
mesmo em sociedades de
tipo arcaico, já se esboça uma educação organizada que tende a desen volver-se à medida que, sob a pressão das formas sociais e de suas varia ções em volume e densidade, faz progressos a divisão do trabalho. £.
cde fato, nas sociedades que atingiram determinado nível de cultura e
cm que se produziram divisões de trabalho profissional e cientifico, que tomam impulso e relêvo e tendem a crescer em número as instituições pedagógicas. Mas só muito lentamente se vo "agregando" as instituições
escolares de diversos graus para constituirem, pela sua coordenaçio e
subordinação num conjunto, verdadeiros "sistemas que, supondo sem
pre grupos muito largos de unidades heterogêneas, organiadas e cen tralizadas, começam geralmente a formar-se "de cima para baixo" (2).
acompanhando a evolução social das formas aristocráticas para as mas igualitárias. Podemos, pois, dizer de modo geral, com Bouglé, "um sistema pedagógico é o conjunto das por meio quais uma sociedade procura conscientementeinstituiçöes e, principalmente,
for que
das
pela
(I) M. HAURIOU La Théorie de I' institution et de la tondation Cah:ers da la Noue velle Journée, n.° 4, 1935. (2) £ fácil compreender porque os sistemas pedagogicos começam a organar- e labo riosamnente "de cima po baixo", das Superiores para as aecundarsas deat s para as primárias que samente do séculoescolas XIX em diante tomaram maior Este fato é registrado na lenta ta. volvien de todos os sia tamas escolares. desen elaboração nas aviliaes antigas, na Idade Média e nos povos modernos, tem como cuusaa das formas aris tocráticas sôbre as an erorsdade democraticas; a educaçáo orguniada a)a para as classea ou camadas superiores só se desenvolve para baLxO em extenado aob a pressao das dências e dos ideais democráticos; b) a participaçáo d todca as torças no "processo de integraçáo" a que natuges socias noa correspondem, ensino elementar (primárias ) e, at certo ponto, as daSiatems pedaguqicoa as eacolas de ensino medio (qn daos. colegca ). enquanto a "'diferenciação' ou especial1zaçáo, protiaainal cien titca, pela sua proprsa natureza, obra de grupos e de poucos; c) o progresso cien titicoadiviado do trabalho: a que, devido ao pequeno volume de conhecumea OSpecializaço'" hoa. Tera do ensino superior, somente mais seatur na e tarde qanhOu o ena no de qrqu taa medio elementar, transterindo tambn para protessores meios eapeciaia (oacolca) aaino ensno ou conum, que passou a ter importància geral capital. 13
Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
I80
palavra, formar as idéias, os sentimentos e os hábitos de seus ainda jovens". Todo sistema pedagógico a rigor implica, já se vê, uma de "organizações", públicas e particulares, um conjunto pluralidade mais ou menos complexo de unidades escolares. de natureza e níveis ferentes, superpostas, hierarquizadas e ligadas entre SI por suas relações de coordenação e de subordinação, ¬, portanto, por uma espirito (estruturas organizadas à base de colaboração) e, mesmo Cmde certos casos, como nos regimes unipartidários ou por uma unidade de direção (estruturas organizadas à base de Essas superestruturas organizadas (sistemas que põem, nas sociedades, certo grau de complexidade e nível de pressu-
membros,
unidade
totalitários, dominação)
(). cultura, indispensável à sua estratificação e ao seu desenvolvimento, estão s de formarem todo, e apresentam, conpre se fomando sem nunca se forme a sua organização e segundo as condições sociais c históricas, maior consistência ou mobilidade e maior ou menor acessibilidade
educacionais)
influências de sua infra-estrutura espontânea. Elas podem como quais.
quer outras superestruturas, "ora ser profundamente enraizadas na vida social espontânca subjacente e registrar-lhe tôdas as oscilações, ora
destacar-se cada vez mais dela e fechar-se à sua influência e ao seu mo. vimento".
Mas, se os sistemas escolares correspondem às formas mais evolui das da sociedade (a Gesellschaft, segundo a terminologia de Toennies)
e não às formas primitivas da sociedade (a Gemeinschaft), éles trazem
sempre, na sua estrutura, a marca das diferentes formas sociais, e, por tanto, da densidade das sociedades, de sua heterogencidade, do grau ou da qualidade de sua organização. E se, de modo geral, "por
tôda parte em que são dadas certas formas sociais, as dilerentes ati
vidades que se realizam através delas se acham modificadas em conse
qüÅncia", os sistemas educacionais, como os econômicos, juridicos, po
liticos, variam também em função das formas da sociedade, pelas quais se modelam e com que mantêm relações constantes (2). Não épossi vel, pois, compreender um "sistema pedagógico" senão à luz e em face
do conjunto do sistema social em que teve origem e desenvolvimento e
em cujas formas de estruturae transformações operadas no processo e
sua evolução, se devem buscar os caracteres constitutivos e as causas de (1) Segundo a dis tinção clássica de GIERKE a vida social pode organizar-se segu. é Orga
O princípio de dominação (Herrschatt) e o de colaboração ( Genossenschaft): ela nizada: a) àbase de dominação quando nenhuma qarantia é prevista para que a ela Pn. transcenCaso, ser penetrada pela à vida social espontânea déncia em relação ínfra-estrutura espontâneaa que atingese osobrepõe máximo; e,b) neste à base de colaboração subjacente,
quando comporta tódas as garan tias possiveis de penetração pela vida social e, neste caso, abaiza a0 mínimo aquela transcendencia. de so(2) Afirmar que os sistemas es colares correspondem a determin adas formas de implica ciedade, isto é, às formas evoluídas, é apenas constatar um fato social e não Parc mesmos. si forma alguma a idéia de que represerntam um moral'" em evolução aft ), a TOENNIES, que prefere a comunidade (Gemeinsch aft"progresso consisociedade (Gesellschrecusando ) à sOcial aparece antes como uma "'regressão moral'"; e, para SCHELER que, o contrário, as derar fornas sociais como etapas históricas do desen volvimento, afirma, ápice da hierarqula que elas são coexis tentes, a 'personalidade observa GURVITCH, complexa'" é o coletiva das formas sociais, a valores, não encarnação dos mais altos valores. Ora, como uma hierarquia das formas segundo uma tábua de uma estabi"estabelecendo sociais sómente se misturam juízos de valor e Paris). mas se pressupõe idade e um monismo da escala dos juízos de realidade,Sociologie, Recueil Sirey, valores'" (Essais de
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
181
em mo terminantes de um sistema dado. Cada sociedade considerada expõe Durkheim, "possui mento determinado de seu desenvolvimento, indivíduos de modo geral aos um sistema de educação que se impõe acreditar que podemos educar nossos
mente irresistível. É uma ilusão que somos obrigados a nos filhos como queremos. Há costumes com gravemente, éles se vingarão conformar; se os desrespeitarmos muito estarão em estado de viver em nossos filhos. Éstes, uma vez adultos, não quais não encontrarão har no meio de seus contemporâneos, com os idéias passadistas ou monia. Que les tenham sido educados segundo não são de seu tempo futuristas, não importa; num caso como noutro, normal. Há. conseqüência, não estarão nas condições de vida
e, por
regulador de educação, do qual não pois, a cada momento, um tipo resistências que restringem as veleida nos podemos separar, sem vivas
mais des dos dissidentes". Não há ninguém, pois, acrescenta Durkheim momen num tenha, adiante, "que possa fazer com que uma sociedade implicado to dado, outro sistema de educação senão aqule que está organimo a um impossível em sua estrutura; da mesma forma que é
vivo ter outros órgãos e outras funções senão os que estejam implica
dos em sua constituição". Os sistemas educativos que são função do sistema social geral de
que fazem parte, não podem, pois, ser compreendidos quando os des tacamos do conjunto das instituições de cada povo. Tudo, efetivamen
te, ligase na vida social e nada se compreende senão em relação ao ção e de diferenciaço, que têm por base as semelhanças dos indivi todo. Mas, como a sociedade é um resultado de processos de integra
duos e grupos que a compõem, e as disse melhanças complementares,
os sistemas educativos trazem, na sua estrutura, mais ou menos ica
e complexa, organizações fundamentais destinadas à unificação e à di versificação. Em tôda e qualquer sociedade, a coesão social éfundada
não só sôbre "certa conformidade de tôdas as consciências parti culares a um tipo comum" (solidariedade mecanica ou por semelhan
ça), como sôbre a diferenciação de indivíduos e grupos que se comple tam reciprocamente, dando lugar aum outro tipo de solidariedade a que Durkheim chamou "orgånica ou por dissemelhança". £sses dois processos, sucessivos e alternativos, coexistem emn todos os grupos: e, se nas sociedades primitivas, em que os individuos se acham fortemente integrados no grupo e se constata o mais alto grau de conformismo
social, se distinguem nitidamente, e, às vèzes, com uma complexidade
extrema, adivisão do trabalho por sexos, por idades e a especialização por classes hereditárias, nas sociedades modernas que parece terem atin gido um maximum de divisão do trabalho por grupos profissionais, há um minimum de semelhança comum que permanece como condição essencial de sua própria existência. Ora, se a educaçio tem por fim
assegurar a perpetuação de uma dada sociedade, seja ela qual fÕt, deve. por isto mesmo, realizar entre os seus membros certa homogeneização (preparaço para o meio social geral) e diterenciá-los em seguida (prepa ração para os meios especiais). É que a sociedade, àmedida que se com
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plica, precisa, para manter e perpetuar a sua unidade, da diversificação de funções à base de um ideal comum: ela uniformiza e diferencia, mas, especializando, coordena, completa e harmoniza, de modo que, a par das pela vida coletiva, se assegure a semelhanças essenciais, reclamadas divisão do trabalbo Per pela impostas diversidades sistência dessas causas mais ativas da diterenciação dos grupos, uma das que é Assim, se tomarmos, para análise, qualquer dos sistemas escolares modernos, verificaremos que a sua estrutura semelhantee a "uma pirå
mide que o individuo percorre da base ao ápice", é constituída por
uma infra-estrutura de educação comum (ensino elementar e médio, êste, ao menos até certo nível) söbre a qual se ediica uma superestyy
múltiplas (escolas superiores e Universidades) em educações de tura que há uma preponderância absoluta de especialização. Essas duas estruturas superpostas, nos sistemas pedagógicos, correspondem à dupla
exigência da sociedade que, tendo por base da sua unidade social. m minimum de semelhanças dos indivíduos, grupos e subgrupos que a indi. compõem, tomam como ponto de partida a homogencização dos víduos (cultura geral, comum) para as "diversificações" ulteriores, Das escolas especializadas. Os sistemas escolares em cuja organização se le. fletem os interêsses das classes dominantes e as diversas canadas e mo
dalidades sociais, político-econômicas, de cada sociedade, tendem, pois. a tornar-se sistemas cada vez mais complexos (pluralismo vcrtical e plu
ralismo horizontal) para se porem em relação com as dilerenciações múltiplas que impõe a divisão do traballho social em una sociedade determinada. Mas, se na educaço organizada se encontram "êsses dois
subprocessos da unidade social (integração e diferenciação), combina dos em proporções diferentes, segundo o grau do ensino que vai da unidade àmultiplicidade do conhecimento'"', essas combinaões de in
tegração e de diferenciação se produzem e se exprimem, nos sistemas,
em níveis diferentes. Suponhamos que se fizesse um corte vertical de
alto a baixo, em um sistema escolar mnoderno: encontraríamos três gran
des seções ou camadas superpostas na estrutura do sistema pedagógico, uma das quais, na base, constituida pelo conjunto das escolas elemen
tares, destinadas a dar uma educação comum ou a "estandardizar os
(gina espiritos; a outra seção, formada pelas escolas de ensino médio acentuada
sios, colégios) em que
essa tendncia
persiste de
maneira
mais ou menos
àhomogeneidade, até certo nivel (desenvolver e pfu-
fundar a cultura geral comum e preparar para as especializações ensino conturas), e a última, no ápice, composta das universidades cujo siste na formação para as profissões intelectuais (especialização pro investigado
fissional e técnica, superior) e na preparação de futuros (especialização res, nos diversos domínios das atividades cientificas ensino elemencientifica). Na zona fronteiriça entre as duas seções do e ofitar e médio acham-se as escolas de especialização técnica (artes elevando-se cios) que, mantendo-se ao nível do ensino elementar oue artístico), ao do ensino médio (ensino médio técnico, profissional
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se grupam em seções diferentes e nitidamente distintas, segundo os
oficios e as atividades manuais e mecânicas (1). A base dos sistemas escolares reside senpre, como se vê, uma edu cação comum, variável, na duração e homogeneidade, conforme cada
tipo definido de sociedade e as condições de tempo e de lugar, e desti
nada a estabelecer tÑdas essas semelhanças essenciais que são a condi ção da coesão social; e, ao nível dessa educação comum fundamental
e sobreposta a ela, uma série de educações especiais (escolas de espe
cialização técnica) correspondentes à divisão do trabalho que consiste na especialização por grupos e conduz à constituição dos oficios e pro fissões. Mas, nesses sistemas educativos, constituídos de uma
plura
lidade de organizações, superpostas e irredutiveis umas ás outras, nas três camadas do plano vertical, a materia social da educação no se repartiu entre elas segundo um modlo ou plano racional: como as suas fronteiras reciprocas são determinadas sob a influncia de causas as mais contingentes, resultaram daí confusões e distinções, tão ira
cionais umas como as outras, mas ligadas às formas de organização so cial atuais ou já desaparecidas (2). A especialização técnica e profis sional ora é ministrada nas corporações (na Idade Média), ora nos
sistemas escolares públicos, como entre nós, ora distribuída, em partes
variáveis, pelas escolas superiores e pelas ordens ou sindicatos profis
sionais, como na Inglaterra e outros paises, em que a formação profis sional de advogados, por exemplo, iniciada nas Universidades, é com
pletada pcla prática forense controlada pela ordem dos advogados à Em conseqüència da desorganizao das corporações do regime feudal, pela maquinofatura e pelo desenvolvimento da civilização industrial, o ensino técnico e profissional (de artes e ofícios) que garrou da órbita qual cabe expedir diplomas ou licenças para o exercicio da profissão.
do sistema corporativo, desmantelado, veio cravar-se nos flancos dos sistemas escolares públicos, de que tende novamente a desprender-se para ser repartido entre as escolas (ensino teórico) e as fábricas dizagem profissional). É essa a tendência atual, já adotada, em (apren parte, na Bélgica e na Suiça, em que a educação técnica (de artes e oficios) é ministrada mediante entendimento e colaboração entre o govèrno e as indústrias que, pela variedade crescente de seus tipos e especialida (1) A superposição hierarquizada de escolas, conforme os graus de ensino que or respondem ou menos às três etapas do crescimen to humano mocidade) ou1à SLCessão cronológica das idades. que v-o dos Institutos Superiores e Universidades, constitui a
(intància. cdolescencia. Jardins de Infnia a0s estrutura vertical do cada uma das seções, distribuem-se, no mesmo Mas, en nível, escolas ou cursos sistema. de especes dite rentes, ainda que do mesmo grau. E o que se poderia chamar estrutura horizoatal do sistea (2) A "distinção de classe'', estabelecida entre escolas primársas gundo a situação econômica; secundárias, s a variedade de categorias escolares de ensino distintas umas das outras e coexisten tes no txs. sistema, como na Alemanha. an tes medio, escolar do III Reich, com seus quatro tipos de da retora escolas a (como, secundárias: exs tência de escols verdadeir exemplo, as escolas normais de S. Paulo, até a retorma de 1933 ) que constituiam 'organizações fechadas, enquistadas, sem aberturas para a estudantes, dessas circula de para outras no mes mo social e econômica, escolas de sis temas escolares en dois nível ou em nivel superior:a diviso tos quase compartimen municáveis, como dois sistemas sobrepos tos, um para a estanques nc0 ensino primário e profissional, educagao de de artes e outro, o ensino popular constituido ofticios, para formação de elites, secundário e superior em correspondència a duas classes socais dis tantos exemplos dessas "confusões tin são outros tas. e tâo irracionais umas como ca explicáveis pelo processo de evoluçãodistinções outras mas e pelas tormas de estru tura social emn que tiveram origem, a que correspondem ou a que sobreviveram (sobrevivências sociais ).
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des, pela riqueza de suas organizações epelo aparelhamento técnico
material (instrumentos, máquinas, etc.), tornam cada vez mais diffc mal ao Estado ministrar, em suas escolas deficientes e fo
forçosamente
eguipadas, uma formação técnica de acôrdo com as exigências múlt: plas das indústrias modernas (l).
Acomplexidade dos sistemas escolares decorre, pois, da comnle
xidade das sociedades modernas que, aumentando extraordinàriamen. te em volume edensidade, se dividiram numa grande varicdade de
pos e subgrupos, com suas ocupações e necessidades particulares. ESa complexidade crescente, resultante em grande parte da especializacão do trabalho social; odesenvolvimento que adquiriram os sistemas no sentido vertical e que tende a aumentar, em extensão, sob a presso dos ideais democráticos (de massa) e das exigências culturais, e a sua mo
bilidade, determinada, sobretudo em paises novos, pelas constantes re.
formas de adaptação às novas condições de vida social, não só carac terizam os sistemas escolares, mas explicam o esfôrço desenvolvido por tôda parte, pelo Estado, a fim de lhes manter a coerência e a unidade
interna, constantemente ameaçada por essas förças de desagregação. Mas, essas superestruturas educacionais, como aliás as demais estrutu
ras da vida social, organizadas, hierarquizadas, centralizadas segundo
planos ou modelos refletidos, não podem aspirar a exercer exclusiva
mente a função educacional: em tôrno dessas superestruturas, por mais
completas e eficientes que sejam, se desenvolve, com tÑdas as suas pres
sões e influências, a vida social espontánea, que lhes fica sempre sub
jacente e nunca se exprime inteiramente nelas. Ainda recentemente,
Hauriou, aproveitando as sugestões de Bergson no Le Rire, precisou, lembra Gurvitch, os diferentes graus de penetração e de tensão entre o patamar organizado (sistemas, estruturas) e o "espontâneo" da rea lidade social e demonstrou em particular, por suas análises, que as
superestruturas organizadas da vida social não podiam ser caracterizadas
como o "mecânico aplicado sôbre o vivo", pois as organizações possuem
sua vida própria e são penetradas, em diferentes graus, pelas camadas espontâneas, mais profundas e imediatas, da realidade social. Não é, aliás, a "eficiência" que pode ser o fim supremo. "A tarefa da educa ção é, atualmente, enorme, observa Sadler (2) e pode bem acontecer oficial seja o sinal que a própria complicação da organização do ensino precursor de sua desaparição final. É a opinião de Pestalozzi... e ele tinha instintos de profeta. Segundo éle, a organização oficial desem
penha o papel de andaimes que desaparecerão logo que a construça0 estiver acabada, e essa con_trução final será espiritual, familial, social.
(1) £ impossível alongar-nos no estudo de cada um dêsses problemas sempre formação e a evoluçao atraentes e às vézes tão díscutidos que põem ao investigador a lhes assinalar a importân cia para educacion ais. o que já é suficiente sistemas Mas dissemos eo interesse sociológico. Assistimos, na civilização atual, à constituição de sindicatos "a: ( contratos coletivOs. limitacâo das horas de trabalno, importantes mais dos seusto pontos nos chamen obrigatório estabelecimentos comerciais e industriais, etc.) não Psstor s. AO de ofícios".corporações, um regresso à velha organização corporativa, aos antigos "corpos as antigas ensino, narem à vida, sob diversas formas e da maneira nais inesperada, de oficiais a aprendizagem técníco profissional tende a desprender-se dos sistemas
para fixar-se novamente no selo dos grupos profissionais roorganizados. (2) SADLER (J.) - The educational Outlook, Address, 1928.
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maior parte Para le o lar era a verdadeira escola das crianças. Para a reconstruída social tradição dentre nós, a verdadeira escola a de uma e consolidada".
PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Escolher certa categoria de escolas, de determinado tipo ou grau, por exem
Pernambuco, plo, a escola primária brasileira, do Rio Grande, de S. Paulo ou de determinar: e pesquisar e procurar ou maleável, isto é, tendendo à completa organização, a) a suade ensino, cujorigida uniformidade efeito, às vêzes agravado com o de um poder centralizado ao excesso, scria de extinguir diversidades vivas e aracterísticas
do povo, ou, ao contrário, suscetível, pela sua plasticidade, de amoldar-se sem quebra de sua unidade fundamental, às particularidades regionais (idade e campo, região agrícola e região industrial, etc.); b) em que proporção (e a proporção é muito variável de uma escola a outra) se misturam na escola, os diversos elementos do meio social. que, mere cendo ser chamado popular, pode graduar-se e difereniar-se en camadas
nitidamente caracterizadas: elemento operário, elementos que flutuam entre
a cdasse média e o operariado e classe média (distinções nitidamente per
cebidas por pais e professôres quando se referem, numa linguagen bur
guesa, a escolas bem ou mal freqüentadas): c) as conseq üências, sôbre a escola primária, de fatos e aspectos sociais
(políticos, econômicos, etc.) que marcam mais fortemente a época e o meio e em que medida essa instituição toma ou não consciência dsses fatos e dèsses aspectos (isto é, a sua permeabilidade às correntes que atravessam o meio social):
d) a curva de adaptação e as afinidades que podem ligar a escola
pública a uma larga categoria social (as camadas populares da comunidade urbana ou iural) e, em conseqüência, a intensidade, ausncia de ressonåncia popular de nosso ensino primário.
ou insufiiènia
2. Em scu livro "Misión de la Universidad" mostra Ortega é,yuma Gaset como é maravilha:
falso êste raciocinio tão freqüente: "A vida inglêsa tem sido, ainda
logo as instituições do ensino secundário inglês têm que ser exemplares, porque delas saiu aquela vida. A ciência alem é um prodigio: logo a Universidade alemã éuma instituição modelar, uma vez que produziu aquela. Imitemos, pois, as insti tuições secundárias inglêsas e o ensino superior alenão". £ste raciocinio é falso porque a) existem estreitas relações entre as instituições (escolas, sistemas) e as formas de estrutura social: para compreenderpedagógicas e explicar aquelas, épreciso ligá-las a um meio social determinado, a um tipo definido de soie dade, e énos caracteres constitutivos dèsse tipo queépreciso buscar as determinantes do fenômeno considerado (político, econòmico, educacional,cauas etc.);
b) em conseqüência, "quando uma nação é grande, é boa também a sua escola, e se um povo é polìticamente vil, é inúil esperar qualquer coia da escola mais perfeita: só cabe então a escola de ninorias que vivem à parte e contra o resto do pais, até que um dia os educados nessa escola influan na vida total de seu país e, através de sua escola nacional (e não a excepcional)". totalidade, consigam que seja boa a c) ainda que fössem perfeitos o ensino secundário ingls e a universidade alem, seriam intransferiveis da nação, porque são uma parte dela mesa. Sua realidade integra é o país que os criou e mantém. "O que se potia trans ferir, não é a vida inglêsa, o pensamento alemo, mas muito as instituições sdmente pedagógicas, na sua estrutura, e, como tais, "importa onsiderar o que são elas por si, abstraindo das virtudes ambientes e gerais dèsses paises". Examinar aquèle raciocínio e cada uma dessas objeções que se Ihe podem levantar, como fêz o
pensador espanhol, mostrando que, nos paises estrangeiros, podemos buscar "intormações e lições", não modelos.
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3. A organizacão de um sistema cscolar forma-se lentamente por "agregacio"
e, em seguida, pela coordenação e subordinação de "escolas", num plano de Teat coerência interna cuja riqucza se mede pelo número de unidades associadas e ui
complexidade varia com o de escolas especais prepostas a fins particulares, no mes nível ou em níveis diferentes. Mostrar como a) quanto mais "espontåneamente" se processou, através de séculos
"agregação" de escolas, num conjunto de instituições solidárias c hierarquia (estratificação). tanto maior a resistência oposta pela tradição à reducäo unidade orgânica, das diferentes instituições escolares, sobrepostas como C
camadas, correspondentes a épocas diversas (por exemplo, a organizaão escolar inglèsa):
b) as formas de organizaço do sistema escolar correspondem não sòmente aos fins que se procuram nos planos escolares, mas à fôrça da tradicão coletiva, sob cuja pressão se mantêm formas arcaicas que já perderam o sen tido e a finalidade, e coexistem, no interior dos sistemas, com novas formas
de organização, criadas por adaptação às novas necessidades e às fôrcas gue tendem a transformá-las;
)
as transformações e as tentativas de mudança operadas na cstrutura
da vida social, política e econômica, se refletem nas tentativas renovadoras, nos esforços e resultados que se constatam emn matéria de modificacõcs de estrutura e de processos, nos sistemas educativos. 4. Se tomarmos, para analisar, um determinado sistema escolar, seja por
exemplo, o sistema escolar brasileiro, podemos examiná-lo em face e à luz do sistema social geral, cm que se enquadra e a que serve. Observar e explicar os seguintes fatos prinipais: a) ésse sistema educativo, relativamente pobre e de formação recente. sob o duplo controle dos Estados e do Govêrno federal. constitufdo, na realidade, de tantos sistemas escolares quantas são as unidades da Federacão
(regime federativo: pluralidade de sistemas)
o que, além de dificultar uma
"unidade de vistas e de ação", contribui para limitar a mobilidade horizontal, (de alunos, e, sobretudo, de professôres, da escola de um sistema para outra, do mesmo grau, em outra organização escolar); b) sôbre uma infra-estrutura de educação comum formada pelas cscolas primárias e, até certo nível, pelas escolas secundárias, eleva -se umna superes trutura de escolas superiores, de caráter nitidamente profissional, começando
a especialização em dois pontos ou níveis do sistema: depois da escola primária,
as de oficios (escolas profissionais primárias e sccundárias). e, depois do curso ginasial fundamental, os cursos complementares, de pré-especialização, que dão acesso às escolas superiores; ) nesse sistema educativo, portanto, coexistem a rigor, dois sistemas
escolares superpostos, nitidamente diferenciados: l) um sistema de educação popular, constituido de escolas primárias, e de escolas técnicas e profissionais: e2) um sistema de formaço de elites, integrado pelas escolas secundárias (gináios, colégios) e escolas superiores; donde uma menor mobilidade verti
cal (1);
(1) Uma das mais importantes características das chamadas "sociedades democráticas':
na justa observação de Sorokin, é uma mobilidade vertical mais intensa, comparada com
dos grupos não democráticos. Essa maior mobilidade vertical, existente nas sociedades ver
dadeiramente democráticas, verifica-se também nas suas estruturas es colares, de tipo dem cráico. Entre nós subsis tem ainda diversos "sistemas fechados'", que não asseguram culaçá0 nem em sen tido horizontal nem em sentido vertical, como, por exemplo, a
ig
organização das Escolas Normais, modificada em 1932, no Distrito Federal, e em 1933, etu S. Paulo (r. Código de Educação de S. Paulo, 1933 ): segundo êsse velho regime. um esl dante não pode transferir -se, por falta de correspondên cia de graus, de uma de Normal outro Estados, Estado, ascender e, terminado o curso,Superiores. não poalaAssim S. um Paulo,Estado como para não Escola pode ainda em de outros às Escolas também,
nas escolas
profissionais secundárias,
os seus
cursos
propedôuticos, não sendo
equivalen tes, ao menos até certo nível, ao de ginásio, não permitem se tornem acessi aos seus estudantes os diversos graus da hierarguia escolar. É outro exemplo de "sislem fechado'".
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d) apesar dos esforços e tentativas no sentido de grupar em blocos universitários as escolas superiores profissionais (direito, medicina, cngenharia,
ctc.), estas persistem en manter-se dispersas, como viveram desde a sua funda ção; e o caráter profissi on al que cultivaram, opõe uma resistênia tenaz, nos
novos organisnos universitários, às escolas (Faculdades de Filosofia e Letras,
Faculdades de Ciências) que se propõem às funções de transmissão de cultura,
investigação cientifica e formação de homens de ciència.
Proceder à analise, tão completa quanto possivel, do sistema ou sistemas educa
tivos brasileiros, determinando as causas dos fatos apontados, e observando, descre vendo e explicando outros, como a tendncia à desagregação de serviços escolares que ora são incorporados no sistema e subordinados a uma direção central, ora dle se desprendem para se tornarem instituições autônomas. 5. Escolher dois outros sistemas escolares (sejam as organizações escolares
inglèsa, francesa e alem) e, depois de analisá-las sobretudo quanto ao ensino univer
sitário, compará-las entre si
a) para observar os seus pontos de contato e diferenças existentes
(aproximnações e oposições). que "apesar do movimento de convergênia, em tôdas as universidades européias, que as vai tornando homogêneas, ainda são
enormes", c não são tanto diferenças universitárias, como dos próprios paises, de suas respectivas tradições, estrutura e necessidades especiais:
b) para verificar os residuos ou sobrevivèncias das velhas escolas medie
vais, como, por exemplo, o aspecto não profissional da universidade inglèa que, no cntanto, diz Ortega y Gasset, se tem feito tão profissional como qual quer outra, ou ainda a imposição a todo estudante de curso profissionai ou que trabalha em investigação, de assistir a um curso de caráter geral: "as Üniversidades da Idade Média não investigavam e tudo nelas era cultura
geral, - teologia, filosofia, artes". 6. A complicação dos sistemas escolares não está ligada apenas à variedade dos grupos profissionais que se formam no interior das sociedades e a serviço dos quais se organizam as escolas especiais de caráter profissional. Ela é determinada ainda, nos
mais ricos e complexos: a) pela divergència de ideais e pela concorrència, em uma sociedade determinada, de velhos e pedagógicos novos ideais impõem ou l) a coevis Lência de categorias escolares fixas, distintas umasque das outras, como os quatro tipos de ginásios, na Alemanha do Império e da Constituição de (Gymnasium, Real-gymnasium, Oberrealschule e Deutschoberschule), Weimar diferen ciados entre si pelo predomínio das ciênias, das letras cláásicas, das letras modernas ou da cultura nacional; ou 2) as ramificações, nos últimos anos do ensino do 2,° grau, como a bifurcação, a quatrifurcação e a trifurcação (1927-29) ou divisão em seções paralelas do liceu francès (1902). e a diversificação em 4 seções, do curso comnplementar, na organização do ensino secundário no Brasil; b) pelas novas impostas pelos ideais modern os, sociais e cien tíficos, de assistência exigéncias e proteção à criança, de educação ou reeducação de débeis fisicos, retardados e anormais, de reeducação da linguagem. etc. o que determina o aparecimento nos sistemas, cada vez mais, de novas categorias escolares: escolas de débeis complicando-os fisicos, classes e escolas de anor mais, escolas ortofônicas, etc. (cfr. os sistemas educativos americanos e outros).
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Capitulo II A EDUCAÇÃO E AS CLASSES SOCIAIS Aidéia de classe social. Classes e castas. - A educação nas sociedades de castas (sistemas hindu e feudal). O sistema educacional da cavalaria. - Classes e profissões. - A barreira e o nível. A educaç£o nas sociedades de
classes. - A escola e a classe governante. - Classes sociais e atitudes revolucio nárias. - 0papel das classes médias nas sociedades moderTnas. Educação para uma democracia.
da cscola única.
Oacesso das diversas classes aos estudos. - A questão
Uma nova hierarquia ou uma nova distinção de classes?
Classes e elites. - A formação das elites.
A desconfiança certamente justificada que suscitam doutrinas uni laterais e interpretações tendenciosas, parece ter arrastado alguns es
píritos excelentes a fechar os olhos a tudo quanto fôr impulso de clas ses. A palavra, em certas obras, écheia de perigose vem freqüente mente caregada de preconceitos. Como, porém, quando se trata de estudar uma estrutura social, esquecer que uma coletividade não é
una? e não é um dos deveres primordiais do sociólogo, - e um dos mais delicados também, trabalhar em decompor esa unidade factí cia em seus elementos? As sociedades, ainda as de tipo primitivo, apre sentam, de fato, uma organização às vêzes extremamente complicada devido ao número de classes (classes de idade, classes profissionais) e grupos que ora são simplesmente justapos tos uns aos outrOS, ora orga nizados e hierarquizados segundo um sistema mais ou menos complexo. Os grupos ou camadas que se superpõem, numa sociedade estratificada, são as classes, em cuja formação uns acentuam o papel da divisão do
trabalho, outros, as diferenças de propriedade e de rendas ou a distri buição de riquezas. Para Schmoller, por exemplo, que define as clas
ses como "grupos mais ou menos fechados, determinados pelo gènero
de trabalho, pela propriedade, pela formação de espirito e, muitas vè zes, segundo direitos politicos", o que est£ na das classes é a divisão do trabalho provocada pela desigualdadeorigem das aptidoes. As di ferenças de propriedade e de rendas não s£o, porém, para Karl Bücher, efeito da divisão do trabalho, mas, ao contrário, causas da ordem das classes que, a admitir-se a riqueza como seu elemento fundamental, podiam definir-se, segundo a fórmula de Schaetfle, estratifica ções, camadas sociais, fundadas sobre as dilerenças de"como ou sóbre o fato da propriedade ou da não propriedade". propriedade Mas, a verdade é que a noção de classe, como observa Salomon, é complexa demais para ser inserida numa fórmula única. A profissio e a propriedade,
notadamente, podem ser encaradas ora como fim ora como meio, e t£o longe estão de caracterizar por si sós a idéia de classe que as definições,
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exclusivamente ésses elementos, não se aplica em que entramdeterminados. a certos casos
A ésses clementos (profisso
senä«,
c propriedade) que constituem cole-
caráter objetivo, o substrato ou condição econônmica de tivos camadade social, é preciso acrescentar indices subjetivos, como a uma mene a consciência de certa homogeneidade ou solidarieda talidade de (espirito de classe). Foi Werner Sombart que, segundo pondera Salomon, alargou o debate, caracterizando as classes pelos sistemas econômicos aos quais corresponde certa repartição entre as
funções; e. se outro economista Schumpeter, insiste söbre a significação atri.
buida a uma função determinada e ao comportamento dos membros de uma classe que exercem essa função, Jean Lhomme introduz
clemento imaterial na formação da classe: "a consciència de classe
Assim, pois, sôbre uma base material, - a função (que não éidêntica
com a profissão), se desenvolve uma "consciência" que, em tÑda a for
macão dinâmica das sociedades modernas, corresponde a uma tarefa real, se não degenera em uma ilusão ou em uma falsa presunção. Mas,
enquanto uma classe é aberta erepousa antes sôbre aopinião, OS COS tumes e a consciência de classe, uma casta é uma classe fechada, enm que intervém o elemento "descendência", já assinalado por Schmoller como
uma das causas possíveis da formação das classes: é uma instituição
de existência legal em que as riquezas, as funções e os privilégios se transmitem por herança, isto é, só pelo nascimento. 0 regime das cas
tas definese, segundo Bouglé: a) pela especialização profissional here
ditária; b) pela organização hierárquica; c) e pela repulsão reciproca
ou pela oposição dos grupos uns aos outros. Sem descer àanálise dos diversos problemas que suscita a origem das castas, êsse regime, pelo
principio de sua hierarquia, como por sua endogamia (casamento no
"interior" do grupo tradicional), "aparece como uma instituição reli giosa: esta vive e se conserva pela observação das regras que definem
para ela o puro e o impuro". Grandes impérios conheceram sse siste
ma, ainda que incompletoe num período de sua evolução: a feudali
dade é uma forma désse regime, e os Estados modernos passaram quase
todos, como nos lembram Hesse e Gleyze, por uma fase em que domi
nava o espírito de casta. Mas o exemplo mais caracteristico dessa orga
nização social é o que apresenta a Índia, em que a divisão, a especa
lização e a hierarquização se conservaram até hoje e a vitalidade d0
regime ficou atestada na resistência a tôdas as operações e intluencias arruinar tendentes a impedir o mecanismo da casta e suas divisões e a
o principio de sua hierarquia.
Na India a sociedade é estratificadae disribuída pelos quadros sólidos eimutáveis que o povo deu à sua organização Social. Essa estrusubtura fundamental pode representar-se com suas duas mil castas e castas (cêrca de 14 milhões de individuos) sob a fornma de uma pirámide em cujo ápice ficam os brâmanes gozando em Paz os privilé gios de sua santidade, e em cuja base se estende, esmagada sob o péso de todas as castas superpostas, uma
de
panchamas, intocáveis, votados
multido
aos serviços
de mais de 50 milhões ao sofri repugnantes.
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sOCIOLO0GIA EDUCACIONAL
e jainis mento e ao desprêzo. Através de tódas as reformas (budismo a hege contra un espírito de reação e de revolta por impelidas mo) nonia dos brâmanes e o regime tiránico das castas, e através de con
quistas, mudanças de dinastias e revoluções, êsse sisterna social extre mamente complicado se tem mantido intato, como uma armadura es scncial e invencível do povo indiano. Nesse pais imenso que, sendo uma organ1zaço de povos, raças, crenças chegou a elaborar uma forma permanente politica, e em que coexistem todos os ção homens da mais alta cultura até nômades
e costurnes diferentes, não
de unidade e de organia graus de civilização, desde e tribos, ainda em estado
sclvagen, isse sistema fundarnental constitui "a única fôrça que
man
tém a Índia de pé e lhe permite desa fiar ou desencorajar todos aqu
les que pretenderam submet-la ao seu dominio". Em tal sistema, em quc as castas são rigorosamente hierarquizadas, das castas supremas às
inferiores, os brâmanes fazem respeitar seus privilégios, mantendo os
outros individuos a uma distância variável e estreitamente medida, se gundo a casta de cada um, e jamais cessaram de constituir uma elite que se glorifica de deter, como um monopólio, as mais altas funções
públicas e o cxercicio das profissões liberais mais elevadas. Todo osis
tema de educação eminentemente intelectual e moral destina-se a pre
pará-los, sendo a cultura um de seus privilégios. Nio há educação na
cional nem para a mulher hindu, submetida, salvo raras exceções, ao regime do purdadh (l), ao menos tão bárbaro como o do harém, nem
para os párias que, nas ruas e estradas, chegam a lançar-se nos
fossos, para não mancharem com o seu contato a sombra do brâmane que passasse sem vê-los.. Os rigores excessivos do espirito de casta, a intolerância dos brâmanes e seus preconceitos aristocráticos excluem
os párias dos benefícios da educação: "êles no
quear o limiar da escada: aprendero
têm o direito de fran
como puderem, não infligir£o
aos meninos de casta a injúria de sua presença.
Asociedade feudalétambém, por excelència, uma sociedade estra
tificada em que se distinguem, de alto a baixo, as duas classes domi nantes: a) a nobreza, b) o clero e, sucedendo se a estas, très degraus ou camadas sociais, a burguesia, as classes camponesas (o vilão ou o cam
ponès livre) e o servo. A nobreza feudal, primitivamente ligada à cava laria, - pois o que a define éprecisamente a aptidão a ser armado cavaleiro (casta de cavaleiro), - veio mais tarde a distinguir-se da a valaria, constituindo uma nobreza de raça. Na origem, de fato, como odemonstrou Guilhiernoz, "é uma só e mesma coisa ser nobre e ser (1) Cortina atrás da qual, nas casas hindus, à diasimulodo aparamento das m lheres. A mulher que se torna viçva, considerada, na thdsa, reaponsdvel pela morie de
seu espôso e, como tal, votada ao desprèzo " à excraçdo: perde sua cata e no ea mais direito a traçar sôbre a tronte o signo de Vichnou ou de Siva: elajada ao últim Plano da família, mais baixo mesmo que o dos doma ticos. Baaha alas que pais de uma jovem a tenham prometido aos de un rapaz, para que a morte dàaie au da nova uma viúva. Nunca a moça poderá "casarse novamen te: ninguem s diqnara cuparse de sua sorte; ela é daí por diante excluida da sociadude hin du. A nauuido Mahiasr ham (casa das viúvas ), criada em 1895 por bràmanes paraa teagr contra dase coshum barbaro reune escolas, um colégio uma casa, onde sao acolhdas as viuvas A nova tndia ja POssui, no entanto, colégios para meainas e mesmo uma
Universidade da Mulher
insti
Tuiçóes educacionats de iniciativa inglèsa. (v. VALENTINE CHIROL, ndia Old and new)
FERNANDO DE AZEVEDo 192
/ identifica com oserviço a cavalo" se nobreza que cavaleiro, pois cavaleiro épÔsto em estado de futuro o qual pela investidura Assim a especial e um supõe uma cducação dissociacão função, sua efetivamente dae exercer
complexo. A cquipamento adequado, cada vez emais cavalaria), determinada pela com. (nobreza originárias duas noções completo, só possivel aos nobres equipamento do crescente plicação princípio da heredi. afortunados, foi ainda facilitada pelo triunfo do nobiliária. Embora
a herança tariedade: a herança dos feudos trouxe sido onascimento, a nobreza fontes tenha a mais importante de suas uma casta inteiramente fechada. A cone. feudal nunca foi, na França, anterior à feudalidade, tornou-se era se século, o e Igreja a xão entre que tudo decorre da terra: com a mais íntima, no meio feudal, em feudalizar tinha necessàriamente de Igreja a imobiliária, riqueza sua sua justiça, seus privilégios, conseqüência, em adquirir, e terra pela se classes privilegiadas, na ldade duas As senhoriais. e feudais direitos seus por essa forma, na hierarquia Média, nobreza e clero, engrenaram-se,jurisdicional, uma concorrência terreno o sôbre "fizeram-se, e feudal, da mais impressionantes dessa etapa que éseguramente um dos traços o poder espi
1greja que, detendo civilização". As escolas dependem dajurisdição, as faz gerir e mantém o ritual, - o poder de ordem ede que se tornaram sobretudo "acade
dominio sôbre as Universidades ortodoxia". Todos os conventos e mos mias teológicas e cidadelas da proteção da autoridade eclesiástica, teiros tinham suas escolas; e, sob a estudantes (universi desenvolvem-se as "Universidades'" de doutôres e dar e receber lições, scholarium), corporações para tas magistrorum et que fazem parte,
de oficio de enquanto, nos quadros da corporação aprendizes e patrões, é submetidos ao mesmo regulamento, operários,(2). operário feita a preparação técnica do futuro
manteve ànobreza que, na França, se é Embora não tomasse todo o seu conteúdo cavalaria a política, inglêsa, uma casta na religião militar, e não se tornou, como a nobreza da intervenção jovens nobres. A reservada, salvo casos excepcionais, aos disciplinar teve apenas o corpo feudal, nãoconsagrando para a morais: cavalaria, num grau de esfôrço deveres aos militares como efeito a associacão dos deveres coS os contribuiu para perpetuar cavalaria que se pôde chamar um "sacramento", destinava-se a transmitir, com as cavalaria tunes guerreiros. A aprendizagem da rural; o castelo, residência se Idade Média, é sobretudo uma vidg paixao
e a (1) A vida, na permanece o símbolo da vida nobre, parte, ex grande nhorial construída à maneira de fortaleza, em é, literatura Idade Média, cuja origeis nas disseminadas, dos torneios e da guerra domíng a Nas cidades, pequenas e e do como tação da guerra (canções de gesta). pelo desenvolvimento da indústria prósperas, coletividade urbana. tarde, maís e, feudal, do regime a tarde: a e impulso (renascimento econonico), organiza-se e toma corpo para se enfrentarem mais origines proveitos, les e a acumnular poderes sur Duas fôrças passam Essai La Société (A. GUILHIERMOZ autoridade senhorial, a comunidade burguesa. CALMETTE J. 1902; Paris, vol., Age, 1 de la noblesse en France au Moyen Féodale, Paris, Armand Colin, 1927. 1dprivi. Média. é uma "universidade'', como seus (2) Toda corporação de offcio, ng ldade bens, seus fisionomia com civil, servamos, isto é, uma coletividade constituída em pessoa ofício sua légios e seus estatutos. O mesmo espírito de associação que deu ao do comércio (assodesenvolvimento ao presidiu e ) COrporativa (corporações de ofício etc.), inspirou germânicas, as confrarias, de professôres ciações mercantis, como as hansas, as ghildes(""universidades'", associações hoje a palavra também a organização da vida intelectual enpregamos que cultural, puramente e estudantes ). É neste último sentido,
"universidade'", mas já sem qualquer idéia de ""corporação".
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
193
técnicas da montaria, da armadura e do combate a cavalo, os de cavalaria, a saber a obediência e a disciplina, a bravura e a intrepidez, ideais o desprendimento
pessoal, a glória militar e, mais tarde, como ampliações do ideal de serviço e de
obediênia, o respeito pelos fracos, o dever do serviço nobre prestado voluntària
mente, o culto da mulher e o amor cavalheiresco. A cortesia foi no regime brutal da feudalidade uma escapada para o ideal, "oásis de poesia no deserto moral da
barbaria tenaz", nas expressões de Calmettc, e represen ta uma combinação da cavalaria
cdo sentimento, com profundas repercuss×es na vida e nos costumes da nobreza. A
cducação do cavaleiro, (1) em que a parte intelectual era reduzida ao mínimo (leitura e escrita), dividia-se em dois períodos: 1) o do pajen (de 7 a 14 anos). Cuja aprendizagem consistia em prestar um servico doméstico ou cortesão, como o de atender às damas, servir à mesa, etc.; e 2) o do escudeiro (dos 14 a0s 21 anos)
que desempenhava uma grande variedade de serviços pessoais até tornar-se o escu deiro às ordens de seu senhor, na batalha e nos torneios. O pajem e o escudeiro
deviam aprender os rudimentos do amor, da guerra e da religiáo: aquêles, no servico das damas e pelo conhecimento dos trovadores; os da guerra. nos tor neios, nos pátios c liças do castelo, e nas planícies vizinhas onde se davam
combates pequenos exércitos, e o da religi£o nas capelas por toda a espécie de ritos
e cerimónias religiosas. A investidura do cavaleiro (e cavaleiro só era armado por um cavaleiro), a princípio inteiramente leiga, impregnou-se. depois. do espírito
religioso, sob a influência do Cristianismo, com a "vigília das armas", na capela do
castelo, e a bênção das armas, na cerimônia da investidura.
A casta, sendo um grupo endógamo exclusivo, é, sem dúvida, a mais fechada e a mais conservadora das classes: se ela caracteriza ain da hoje a estrutura social da índia e se a feudalidade foi uma de suas
formas, o espirito de casta marca, em quase todos os povos, uma fase
evolução. Mas, se não temos mais castas, temos classes em quase tÙdas as sociedades modernas. O primeiro regime, o de castas, é deter minado pela presença, e o segundo, o de classes, pela ausncia da es
de sua
tratificação hierarquizada das classes e, portanto, do principio de trans
missão hereditária. Uma aristocracia associa-se quase sempre a uma situação privilegiada de fortuna e é, antes de mais nada, hereditária. Uma classe, pois, como já se disse, é aberta; ela tem "parvenus" (homo
novus) e desclassificados, individuos e familias que procuram "distin guir-se" para serem reconhecidos, e outros que decaem na escala sOcial: o que mais teme a burguesia é a "desclassificação" (cfr. o sentido pe jorativo do têrmo "desclassificado"). Essas expressões e outras como
"subir", "descer", "arrivista", "novo rico", por exemplo, denunciam por
si mesmas êsse fenômeno de mobilidade social vertical que consiste num
constante deslocamento de pessoas, idéias e práticasde conduta. de
uma classe para outra, e essa capilaridade social que falta aos regimes de casta e graças à qual se universalizam as necessidades e se intensi
tica a produção. A demarcação social, porém, de uma clase em rela
ção a outra, étão nítida como a de uma casta; "sòmente ela é trans
ponivel e não se apaga, como observa Goblot, só pelo fato de que a podemos transpor". A distinço das classes é uma questio de juizos de
Valor, em cuja composição entram, como elementos coustitutivos, (1) P. MONROE
Histor ia de la Pedagogia antga y média. Trad del inglás de
Maria Maeztu, págs. 340 347, Ediciones de la Lectura, Madrid.
FERNANDO DE AZEVEDo 194
modo de vida correspondente certo grau de riqueza ou um (1), a proUma classe, fissão e a "consideração social" enm suma. às classes superiores uma casta, escreve Goblot, "não se liga por uma gradação continua. Não haveria classes se a desigualdade não
tanto quanto fôsse, de comportasse Senão
qualquer maneira, heterogeneidade, se ela não ou menos". Os caracteres que separam devem ser qualitativos, "mais e são comuns a todos os que les distinguem. Tôda demarcação social , a um tempo, barreira e nivel. É preciso que a fronteira Seja uma mas que acima dela haja um planalto. Dentro de si mesma, tôda a dasse é igualitária; ela não admite nem declives nem elevaçõcs: a icmt dade na dasse é condição de superiodade de classe".
eScarpa,
As distinções de classe, tais como são consideradas nas sociedade
democráticas, não têm, pois, outra base senão as diferenças de profis. s§o, de gênero de existência e de recursos materiais. O que opöe as
cdasses uma àoutra não são sòmente os antagonismos de interêsses. säo
também sentimentos de superioridade ou inferioridade. Tòda a sOcie.
dade dividida em classes constitui uma verdadeira hierarquia em que o degrau corresponde a uma escala de valores geralmente estableci
da (2). Certamente a divisão em classes representa uma realidade viva. e as classes, com suas fronteiras determináveis eno interior das quais se atenuam as diferenças, e com suas oposições e colisões entre os seto res mais próximos e os mais afastados, correspondem a um nível de terminado na ascensão social. São, de fato, as classes que influenciam a escolha das profissões e que grupam as profissões e as separam; "a
lingua registra esa separação; as funções exercidas por artesõcs, não
se chamam profissões, mas ofícios". A profissão que, uma vez escolhi
da, determina o género de vida, éum sinal de classe, como orevelam o desfavor em que se têm os ofícios manuais e mecânicos,
de inferioridade de escala social",
"sinais
e a preferência pelas prolisões
liberais que constituem o primeiro degrau de ascensão. A escala social
das profissões, escreve Goblot, e a escala social das fortunas não class:
ficam nem uma nem outra, porque são elas contínuas, umaeoutra;
mas essa escala é cortada em duas pela demarcação das classes". Ora, (1) Ariqueza não basta, por si só, para diferenciar as classes, porque: a) a desigual dade de riqueza apresenta uma gradaçáo insensível e contínua, e a distinção de classes, uma demarcaçáo precisa; b) as classes e subclasses (classes superiores, média, interiores, clta, média, pequena burquesia) não coin cidem com os graus de riqueza; c) há burguese pobres que ficam burgueses, apesar de sua pobreza, e ricos, nas classes populares, Podem ioar muito ricos sen se tornaren burgueses. Uma classe, quando não tem prg légios, repousca, pois, exclusivamente sóbre a opinião e os costumes, e,
c o m o oa
é um dos elemen tos que lhe permitem fazer-se considerar superior, assegurandoortd ""importa superoridade quanto ao contorto, a educação, à cultura e à escolha de profisso. menos a quantidade e a forma de riqueza do que o uso que se faz dela'". (v. ED. La barriere et le niveau, Paris, 1930).
professôres do
(2) É por isto que, por um lado, os mais modestos empregados, os prinício de car erisino primáno, cinda tâ0 mal remunerados (pois Os seus vencimentos, no comerciantes,ao reira, não passavam, em S. Paulo, de Cr$ 2.300,00, em 1950 ) os uma pequenos classe sluperior etc., mais endividados, contin uam a considerar-se como membros de a Bélgica, superior. proletariado. Ainda mais, a medida que temem, en países como a França, classe a ameaça da "proletarizaçáo econômica'", mais reivindicam seu lugar na em direito, Por outro lado, se os privileqiados (nobres, desapareceram em "'enobreciaristocratas) pelo alquns paises, uma aristocracia de dinheiro, cuja consolidação (sobretudo prestígio nem mento, como ng Bélgica) não se faz sem grandes dificuldades, "'não tem o psicológicos e a tradiçâo dos privilegiados de direito, mas conta com muito mais meios nateriais de açüo à sua disposiçao".
SOCIOL0GIA EDUCACIONAL
as diferenças de profisso,
195
de modos de vida e de fortuna são causas
de grandes diferenças na educação e nos sistemas escolares, em cujas
estruturas se encontram as seções correspondentes às clases e aos meios diversos existentes no interior da sociedade. Entre a) aeducação pri mária e técnico profissional, de um lado, estreitamente limitada por sLa brevidade e votada, esta última, aos oficios manuais, e b) a educa
c£o secundária e superior, de outro, destinada às proissões liberais.
cntre aqudle ciclo de estudos que termina aos 13 e 15 anos, e éste outro
que se estenderáaté aos 23, não há gradação insensível, mas uma de
marcaçao franca, e, portanto, diferença de classe, mais ou menos acen
tuada conforme os sistemas sociais. A questão do latim ou das hurna
nidades clássicas, sôbre aspectos pedagógicos, apresenta aspcc tos so ciais ou, por outras palavras, de Goblot, "sob a questão pedagógica, há
a questão de classe social: ensino imposto como uma regra comum a
tôda burguesia e inacessivel ao povo, serve para "distinguir" a instru ção de uma classe, marca, pois, um nivel e é uma barreira que defen de contra a invasão".
As classes superiores asseguram, pois, aos seus filhos uma determi nada educação de classe, quer dentro do sistema escolar do Estado,
quer graças à organização de escolas particulares de tipos diferentes; e,
conforme seja esta ou aquela a classe governante, ter-se-ão dois siste
mas inteiramente diversos de organização escolar (regime burguês ou
regime soviético) orientados para fins diferentes de educação. Em cada sociedade, a classe que está no poder organiza o tipo de escola que cor
responde a seus interèsses, servindo-se dela para transmitir, de ma neira elicaz, às novas gerações o tipo de vida e de cultura dominante no grupo e os seus ideais e valores morais, religiosos, politicos e sociais.
Mas, como a politica geral, em quase todos os paises, tende a estabele
cer uma harmonia e colaboração de classes, são repelidos os dois tipos
diversos de opressão (burguesa ou proletária; escola reacionária ou re
volucionária), para cederem o lugar a uma politica de educação, mais
larga e humana, que proporcione, por um conjunto sistemático de me
didas, igualdade de oportunidades a todos os individuos. Em vez das lutas e conflitos de classes, harmonia e colaboração de classes. Énesta fase de reconstrução social que reassumem importância primordial as
"cdasses médias", cujo papel ético, politico e social tem sido até hoje fundamental, nas sociedades burguesas, baseadas sôbre o individualis mo e a concorrência. O esfôrço, talvez sem unidade, mas vasto e sus
tentado, que essas classes tentam para subsistir, é para elas vital. Se parece assinalar-se pela demora em relação aos outros movimentos de
classe, é que, como observa justamente Robert Lemoine, "dispondo de reservas que não se esgotaram senão gradualmente, oupando posi Sões que não foram ameaçadas senão em conseqüència da duraçio in sólita da crise, as classes médias só mais tarde tomaram consciència de
sua "especialidade" politica e mesmo revolucionária. Enfim, desxde mais de um século, elas se beneficiaram de vantagens que esgotaram todos os seus eleitos, mas que já se voltam contra aalta burguesia, subrain 14 Sociolog ia
Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 196
dos negócios e o contrôle do orçamento". direção a do-lhe acrescenta Lemoine, cometendo o êrro fundamental de considerar as classes médias como passivas e resignadas, nessa luta do dinheiro (bure do número (massa), os socialistas políticos por muito guesia) as subestimaram, por uma interpretação tendenciosa da "lei de prole-
Contudo, tempo
tarização" das classes; não levando em consideração senão os elementos objetivos, desprezavam os fatôres subjetivos e morais das lutas e flitos sociais.
Se conservarmos, pois, àexpressão "classes médias" o mesmo sor
tido em que aemprega Goblot, isto é, "a parte mais folgada das cas.
ses operárias e agricolas e a parte pouco afortunada da burgucsia", é
fácil explicar o nascimentoe o desenvolvimento da política modemme
em favor das clases médias. Pois, "como os habitantes das "fronteiras
acusam mais, de uma e outra parte da fronteira, o sentimento nacio.
nal e os traços de nacionalidade que os distinguem, assim também, ob.
serva Goblot, os mais vizinhos da fronteira das classes são aquêles aue a mantêm melhor. Uns aplicam-se a acentuar que estão acima do i.
mite; os outros, pelo csfôrço que fazem para franqueá-lo, assinalam in voluntàriamente que estão abaixo. E, como sse limite cai justamente no meio do que se chama muito impròpriamente "classe média", é af que as distincões são as mais matizadas e a luta se torna mais áspcra". O que se observa hoje é uma dupla corrente: a) o movimento de dife. renciação que continua, mas também b) um movimento ascendente de todos os elementos, vigorosos e capazes, das classes inferiores. Uma nova "classe média" tende a constituir-se. Se o afastamento crescente das classes éo aspecto natural do progresso da civilização, o seu aspecto intelectual e moral é a aproximação dos homens, pela elevação das classes inferiores. E aí éque está a importância do papel da educação que, estendendo-se ao maior número de indivíduos, tende a sclecio nar, por uma larga sondagem, os elementos capazes, para favorecer êsse movimento ascendente e estimular a circulação e a dos qua dros das classes mais clevadas e, emn conseqüência, renovação das elites culturais e dirigentes. O corpo social assemelha-se a uma de liquidos de mistura densidades diversas, no seio da qual se formam correntes contrad1to rias, circulando sobretudo de baixo para cima, entre elementos turados e separados. Algumas partículas subsistem intatas nos diferenmis tes níveis da escola social, numa espécie de ou establ lidade passageira. Todo o problema consiste, insensibilidade as pe mutas, harmonizando-as, abrir a porta às pois, em orientar e às possibi reclassificações lidades de ascenso ou, para empregar a terminologia de Goblot, ta litar a transposição das "barreiras", aos individuos proporcionando possibilidades de acesso a quaisquer carreiras e Pela orientaço e seleço profissional, às atividades eencaminhando-0S, profissões mais ade quadas às suas aptidöes naturais.
Mas, atacando o problema mais de diz "vida", diz "organizaço", perto, em primeiro lugar, quem seja no ponto de vista biológico, Sj no ponto de vista social, e
organização implica necessàriamente
a
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
197
Marc Dubruel (1l) quando de "diferenciação". Estamos de acôrdo com que não servem se afirmações reconhece como extracientíficas tôdas as homogeneidade in não para embalar-nos no sonho da igualdade ou da organizado e viver" ser tegral do meio social: "só o heterogêneo pode aquelas cujos exatarnente e as sociedades mais bem construídas são "fornecen, outros uns aos órgãos ricamente diversificados e adaptados É certo, maravilhoso". trabalho por sua colaboração harmônica, um ou demnocrático todo o impulso em segundo lugar, que històricamente de novas modali de idéias igualitárias não chegou senão à formação Velha história antiga. dades de aristocracia ràpidamente assimilada à quase tão antiga para de Atenas e de Roma, escreve Dubruel, história de ontem, a nós, da emancipação comunal, na Idade Média; história hoje". Na burgue do terceiro Estado, depois da Revolução; história de que são sernpre os sia, não são, de fato, os filhos das mesmas famílias quedas indi e burgueses: "o curto espaço de cem anos traz ascensöes viduais e familiais, mas desde que somos civilizados, isto é, organiza dos e, por conseguinte diferenciados, alguma coisa de análogo ao qua dro burgus, sempre semelhante a si mesmo em suas linhas essenciais,
persistiu em tôrno do quadro móvel das individualidades e das fami
lias". A classe ou os quadros sociais persistem; o que se renova, exata
mente porque a burguesia é uma classe aberta, é o "conteúdo" dos seus quadros sociais. Parece-nos também, em terceiro lugar, não haver ele
vação que se justifique, se mantenha ou se imponha, se os beneficiá
rios não representam um modêlo constante conformado ao "ideal" de uma dada época ou de cada tipo de civilização; e é por haverem per
dido de vista essa verdade que sucumbiram ou apressaram seu desno
ronamento tantas hierarquias e aristocracias. E por isto mesmo ordem alguma será recriada em condições de perdurar se não se combinarem com uma melhoria incessante do nível de vida o reconhecimento e a
utilização dos méritos, tanto mais quanto a cada degrau da escala
social ou dos valores sociais, deve corresponder uma série de exigèn cias e obrigações cada vez maiores.
Ora, se assim é, se essas afirmações exprimem a realidade social,
as medidas que tendem a estabelecer igualdade de oportunidades para todos, a selecionar valores e a franquear o acesso às profissões mais elevadas, àqueles mais capazes de exerce-las, e, portanto, a reconhecer
e a fazer prevalecer o mérito pessoal, só contribuirão para imped1r a
estratificação muito rígida de classes, facilitando a constante circulação de elementos de valor das camadas inferiores às superiores. Éèse um dos objetivos da "escola única", que quer dizer simplesmente "identi dade de formação intelectual para todos no principio da carreira esco lar, para diversificações ulteriores. Hoje, como o reconhece o próprio Dubruel, "essa igualdade não existe: meninos igualmente dotados pela natureza são diversamente orientados, desde os seus começos, e ireme diàvelmente o mais das vèzes, segundo a desigualdade de sua condiçio
social de origem". Mas, como organizar cientificamente essa seleção e
orientação? No ponto de partida, uma formação comum durante (1)
M. DUBRUEL, S. I. -
L'école unique. Editions Spes, Rue Souttlot, Paris, 1926
FERNANDO DE AZEVEDo 198
que consiste a escola certo número de anos (e é nisto para os estudos seguida, a orientação, dendo-se, periores, em dos mais capazcs, independentemente de suas condiçöese Sureservando-se aos outros a instrução e ciais e econ ômicas, e de adquirir; ou, por técnica que êles são suscetíveis
única),os proce secundári educação outras origem, a desde todos, pal a vras, a imposição 1) a e sistema); 2) orientação, não do base formação (a escola única, na dos ulteriores (escola imposta, formaçõcs diversas as educandos para de uma só e única
múltipla,
como superestrutura), segundo os resultados obtidos nessa primeira restrito. sentido nesse tomada Assim, a escola única (1), 0 único
(ormação.
aceitável de um ponto de vista científico, e com seus principios es:senciais, a gratuidade e a seleção, - não visa senão à renovação das
cdasses superiores, pela elevação de todos os elementos de valor vindos
das classes inferiores e não tende senão a alargar cada vez mais o recn
tamento das elites suscetíveis de degenerar quando não alimentadae
pela circulação normal (cfr. o fenômeno da circulação das elites, estu.
dado por Pareto). Não se pode, pois, considerar antidemocrática ou
anti-social uma reforma em que se encontra subjacente a idéia de tor.
nar acessíveis os estudos superiores a todos naturalmente dotados e reconhecidos como capazes de faz-los e de consagrar as diferenças de
mérito pessoal que os estudos manifestaram. A verdadeira democracia
(liberal ou autoritária, não importa) não está apenas na ascensão glo bal de uma clase, isto é, na elevação de nível das camadas populares
(operários urbanos e rurais), como pensa Dubruel, nnas na eliminação
dos obstáculos ao recrutamento seletivo, em tÑdas as camadas sociais,
àrenovação e ao enriquecimento dos quadros culturais e politicos com
tódas essas "fôrças intelectuais" que, sendo melhor conlhecidas, pode
riam ser mais bem empregadas e dirigidas para funções mais elevadas. Tudo isto é mais fàcilmente compreensível desde que tenhamos
uma noção clara de "elite", cujo papel é de importância capital nas sociedades modernas, de tipo democrático. Classe e clite são duas ca
tegorias sociais perfeitamente distintas: enquanto uma "classe" implica
diferenças de graduaão ou de nivel, ligadas aos costumes, condições
de vida, fortuna e profissões, "que criam obstáculos difíceis a transpor
(barreiras), e põem sôbre o mesmo plano (nível) aquêles que os trans puseram", a elite éuma minoria que, constitujda de individualidades
merecedoras por si mesmas, não se defende por nenhuma barreira nem
sofre nenhum nível. Ela é uma "selecão" e, como se apóia sobre
sequndo
(1) Em vez de democracia, o que poderia resultar da escola única, seria, temíível alguns, "uma nova hierarquia ou uma nova distinção de classes, particularmente outro lado, porque batejada pelo govêrno. De um lado, as inteligências "oficiais'', e demandarinato sejamos delicados, o resto... Não seria de temer eventualidade dêsse única; ôle não Sim, realmente, observa Lévy Strauss, em excelente a cujo sôbre artigo comoa escola uma hierarquia, é, porém, inevitável. Seria umn êrro conceber a escola Os outros ápice oorres pondesse aOs estudos mais longos do ciclo única supremo, rePartd de d lado os apanágio de uma ciclos, segundo a duração, pelos degraus inferiores. Notemos que, estudos superiores que o grau con sem dúvida, como no presente, minoria, a duração dos continuarão, ensino do 2,0 grau. Mas será a mesma para todos, pois oensino 1.°pode afirmat do se duzirá à mesma idade estudos (18 ) que o ciclo pós-escolar do darse-á a um e outro valores anos que concebem menos "diferentes'"? £ difícil prevê-lo. O menos ôles é que não é êste o dos partidários da escola única: pensamento "diterenças de graduação" do que "diversidade de funções".
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
199
entram qualidade dos individuos que e soma pela vale pessoal, provieram. mérito de que o meio ou a classeBastide, fôr qual seja constituição "é forçosa sua na expressões de Arbousse fortemente as usarmos marca para elite, A de perTSOnalidades grupo um minoria, cons uma uma mente outras, e cujo traço cornun é das umas distintas bem das, social de que vivem e da ma ciência lúcida das necessidades do meio a essas necessidades"; ou ain corresponder neira pela qualépreciso soma ou justaposição de pessoas "individual uma da, segundo Goblot, merecedoras. Certamente, a aristocra mente", mas não solidàriamente lazeres necessários à cultura, constitui. cia ou a burguesia, dispondo dosmais favorável à aquisição da cultura social sob êste aspecto, o meiocom dificuldade e não se mantêm senão com formam com a qual se compreende-se por que a burguesia um esfôrço constante as elites; e honrando o saber e acolhendo os in se julgue e queira ser uma elite, a burguesia, escreve Goblot, se soli telectuais. Por necessidade vital, dela, se esforça por dariza com o mérito que surge nela ou abaixo sua irradiação, a absorvé-lo, colorir-se tôda inteira com seu reflexo e natural. "Nio há floração fim de que pareça ser sua emanação e sua função da cul cultura verdadeira sem elites, sendo, por outro lado, a função educativos, tura criar elites. Esta é precisamente, nos sistemas dú das Universidades ou dos estudos superiores que continuarão, sem pre no como a ser, revestir, possam diva, seja qual fôr a forma que seleção: a uma pois, sente, apanágio de poucos. As elites correspondem, e tôda cultura sistemàticamente organizada que pretende formar elites, como observa Arbousse Bastide, deve evidentemente fazer uso da sele
ção, a fim de que todos os espiritos suscetiveis de aperfeiçoamento cultural,
e apenas êstes, possam ser atingidos. Mas nenhuma seleçio
"pode formar automàticamente elites: ela apenas facilita a elaboração do meio de onde surgirão as verdadeiras elites".
Essas diversas questões da escola única, com todos os debates que
levantou, da difusão do ensino e da cultura, da orientação e seleção
profissional e da formação de elites, mostram à evidència como o pro blema das relações das classes sociais e da educaço apresenta múlti plos aspectos e precisa ser examinado objetivamente e de todos os ân
gulos de observação. A civilizaço industrial, com tôdas as suas conse
qüèncias, a multiplicação e o crescimento das aglomerações urbanas, os conflitos e as colisões das clases sociais e as tecnicas modernas de transporte e comunicações (o vapor, a eletricidade e o ridio), altera ram e alargaram singularmente o papel atribuido à luta contra a igno
rância e àformação dos quadros culturais e técnicos que exigem as sociedades modernas para sua continuidade e desenvolvimnento. É pre
ciso adaptar opais a uma organizaço econðmica, cada vez mais com plexa e delicada, acalmar os espiritos aos quais desconcertam ou iri
tam formas novas de vida e de atividade e resolver os problemas que suscitam os interêsses das classes superiores e as reivindicações popula res, às vêzes obscuras e violentas. Nessa obra urgente e diticil, que é todo umn progranma de reconstruço social e politia, é de uma impor
tância primordial o papel que cabe à educação, no mais largo sentido
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200
instrução na lv.. da palavra. Haverá, de fato, melhor arma do que aviolências dos invasão da máquina e contra as crescente a contra ques de interêsses e conflitos sociais que constituem tão grave perigo
para o espírito? Em tôdas as épocas, as classes superiores tendem a li
o problema da instrução às suas preocupaçöes e necessidades e, embora
o transponham às vÁes em têrmos concretos de interêsse geral, nunca o resolvem de outra maneira senão no sentido de seus interêsses nor
ticulares. Mas, se tôdas as classes, superiores, médias e inferiores, cons. tituem, com seus órgãos diversificados, um todo coerente e organico,
que é o povo e a nação, as grandes reformas suscetíveis de durar se
sòmente aquelas em que os problemas de educaço e cultura tiverem sido resolvidos não com um "espírito de classe", mas com um espirito
coletivo, não no sentido unilateral de grupos ou camadas sociais, mas na direção que indicarem o sentimento do interésse público e a cons.
ciência de que, de todos os problemas sociais, o da educação é exata mente o que, interessando a cada individuo e a cada classe em parti.
cular, interessa sobretudo, e de maneira vital, àcomunidade inteira: a
tôda a nação.
PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Definiro que se deve entender por "diferenças individuais" (E. H. HANKINS,
Individual Differences and their significance for Social Theory. Publ. of. the Amer. Sociolog. Soc. XVII, págs. 27-39) e analisar e discutir as seguintes afirmações:
a) a quantidade relativa ou o desvio de nível das "diferencas" de indi víduo a individuo é maior entre os brancos do que nas outras raças e varia
êle mesmo segundo as condições sociais;
b) a existência de "extremos", a desigualdade, é ela própria um fato:
e ésse fato éem imensas proporções, devido mais à hereditariedade do que a
qualquer outra causa, como o meio social, a alimentação e a educação;
() a qualidade dêsses "extremos", é um fator tão importante como o
nível médio da massa, ainda quando êste é muito elevado, como, por exemplo, nos Estados Unidos e na Alemanha (cfr. à luz dessas afirmações, as doutrinas aristocráticas e as teorias igualitárias). 2. Depois de definir os grupos sociais, seus caracteres, aptidões e interêsses, J.
DELEVSKY (Antagonismes sociaux et antagonismes prolétariens, Paris, Giard, 1924)
mostra a presença de antagonismos e de lutas na vida social (antagonismos raciais, religiosos, políticos, das idades, dos sexos). que cada grupo social e caracterizado "pela coesão, a solidariedade queConsiderando reina emn seu seio, e pelo antagonismo que o separa para fora de outros grupos do mesmo gênero", toma esta observação como ponto de partida ou princípio de uma classificaçãoDelevsky das teorias históricas em dois grandes história humana a luta ou a grupos segundo apresentam como princípio motor Ca solidariedade: a) o primeiro grupo constituído por Vico, Kant, Marx e os darvínicos (predomínio do antagonismo social) e subdividido em trêssociólogos grupoS, segundo se considere a luta: l) como a rivalidade de indivíduos ou de grupo a grupo (darvinismo social): 2) como o exercício da opressão e a 3 resistêncda opressão (materialismo econômico, Karl Marx): ou 3) como os dois a um tempo (luta das raças, de Gumplovia, ou luta dos grupos de de Pareto) b) o segundo grupo que aceita, ao contrário, a seleção, solidariedade como principal motor da vida
social (G. Tarde).
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201
ainda classificar Analisar, à luz dos fatos, essas diferentes teorias que se podem se ihes poderia que nostrar c segundo o tipo dos grupos sociais a quc pertencenn acrescentar pernsam que êsses dois fatôres, C) um terceiro grupo, o dos teóricos quc as sociedades, desempenham tôdas en presentes solidaricdade e antagonismo, ora de outro. um um papel alternativo, com predominio ora de segundo GEORG SIMMEL 3 A moda, nas sociedades humanas, é feita, responder à dupla necessidade (Philosophie der Mode, Berlin, Pan Verlag. 1905). para à separação (tendência scparatismno do e do conformismo (tendência à assimilação) ou distinção). Assim, pois, para Simmel, cuidado de escolher, a) a moda alivia ou exonera o indivíduo do dando-he ao mesmo tempo o prazer de se distinguir: enfeudando-se b) mas, na verdade, êle não "se distingue", neste caso, seno a um grupo, a uma classe:
cuidado c) a moda perde seu direito e sua utilidade onde falta quer o coletivas; distinções das assimilações quer o cuidado das d) mas, por isto mesmo que a moda éalgo de móvel, senpre en trans formação, proporciona ao individuo a ocasião de se pôr adiante, e Ihe comuni ca o sentimento de dirigir tudo, sendo dirigido.
Examinar e discutir essas observações de Simmel e confrontá-las com as de
GOBLOT (La barrière et le niveau, Paris, Alcan, 1930), para quem a moda éum ultrapassa a classe e passa a ser imitada fora dela, e, portanto, perdeu a sua função sinal de classe, antes uma barreira, mas uma barreira móvel; mas, uma vez que ela
"distintiva" (tornou-se um "nível"), ela muda, dá lugar a outra moda (tornou-se novamente uma "barreira"). BOUGLÉ, em Les Tdées Égalitaires (1899). vÁ na
moda um agente próprio a desenvolver as idéias igualitárias e con testa seu papel de diferenciação: "a multiplicidade e a variabilidade das modas neutralizam essas con
seqüências". Mas, replica Goblot, "a variação consiste justamente em que os costumes são constantemente diferenciados e a moda muda sobretudo para que les fiquem diferenciados".
4. Estudar o problema das classes médias, no Brasil e especialmente em São Paulo, a sua situação atual e as suas perspectivas de futuro, tendo-se em vista que a) os grupos que se reúnem sob êste nome são muito diversos e é difii! definir com precisão o que constitui ou pode fazer a sua unidade:
b) seria preciso atender menos ao nível econômico do que aos gèneros de atividade, que exercem êses grupos, e, portanto, à sua função em relação
aliás com seu gènero de vida, para explicar que eles se mantêm num nivel
social intermediário e têm antes tendência a crescer:
c) se as classes médias, como em geral as classes e subclasses não se
podem determinar conforme os graus de riqueza, sob essa denominação englo bam-se, segundo Goblot, "a parte mais abastada das classes operárias e a parte pouco afortunada da burguesia": elas não correspondem, entre nós, a middle class dos inglêses, "que tem grandes rendas e uma vida abundante e confortável" e assim chamada porque a aristocraia (the upper clas) subsistiu".
5. Já se pôde observar, por pesquisas nesse dominio, que os nascimentos
diminuíam sobretudo nas partes socialmente mais elevadas da população, e Mombert apoiou-se em estatísticas alems para provar que "a natalidade varia em ra£o invera da riqueza". Assim, parece ter-se deterninado, com dados estatisticos precisos, de
que maneira as famílias desaparecem nas classes superiores da sociedade: pelo enfra quecimento regular da natalidade, de geração em geração. £ste fato se explicaria,
em grande número de casos, segundo A. DUMONT (Dépopulation et Civilisa tion). a) pela "capilaridade social", isto e, pela fôrça que leva os membros de um grupo a elevar-se progressivamente cada vez mais alto, seno
a si mesmos,
ao menos seus filhos, na hierarquia das situações sociais (teoria da capilaridade social).
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202
e em parte determinada pela tend&n-is Mas desa extinção relativanmente rápida ao menos a partir de certo nível de recure
dos honens a reduzir a sua descendència, resulta uma circulação da matéria social, de modo que
b) pela baixa da natalidade, nessa fase crítica, se estabelecem vayior
nas camadas superiores (depauperamento ou empobrecimento das elites. ia observado por Pareto):
c) e à medida que se abrem esas lacunas, elementos novos saídos das classes inferiores se clevam e vão ocupar os lugares vagos, dando-se uma
ascensão forçada que nada pode impedir.
Analisar em que medida a redução da natalidade nas classes superiores contribui para a circulação da matéria social eexaminar essas observações, apoiadas na estatística. à luz da "teoria da circulação das clites", de Parcto. 6. Examinar e discutir a evolução da classe média (middle class) ingléêsa, que não corTesponde à burgucsia e à brasileira, e mostrar a)
como, no intuito de elevar-se socialmente, garantindo o futuro dos
filhos, foi-se restringindo a natalidade, e reduzindo-se, em onseqüncia,
a
Inglaterra a um dos países mais estéreis da Europa; b) como influiu essa evolução no domínio intelectual, democratizando o ensino universitário, dantes reservado a uma classe privilegiada (o govêrno
gastava, em 1935, quantia avaliada em 150 milhões de francos com a manu tenção de estudantes universitários pobres): ) como a elite do pais, constituída em grande parte de clementos da cdasse média (middle class), tende a transformar-se já pcla diminuição de nasci mentos de crianças que bastem a substituir os pais, nessa classe, já pela invasão
de elementos das camadas sociais inferiores, em conseqüência da "democratiza ção" do ensino universitário.
7. Na impossibilidade de proceder a um inquérito sôbre um território extenso, diversidades étnicas, cconômicas e sociais, escolher um território por causa das homogêneo quanto possível e limitado (um Estado, ou melhor, um município, por exemplo Reife, em Pernambuco; Sorocaba ou Ribeirão Prèto, em S. Paulo; Juiz de Fora, emn Minas, etc.) para investigar sóbre: a) o agrupamento dos operários por indústria (a situação dos estabele cimentos, o desenvolvimento das indústrias, o agrupamento por idade): b) a proporção de mulheres e de menores, na indústria, distinguindo-se as indústrias em que há forte proporção de operárias (têxtis, de cigarros, etc.) e aquelas em que são total ou quase completamente ausentes: () os salários de homens e mulheres e suas diferenças; distinguindo-se
os salários de diaristas, trabalhadores e operários qualificados, e a proporção déstes em 1elação aos primeiros; c a d) o tempo de trabalho, as distâncias das habitações às fibricas, familia; maior ou menor diminuição em conseqüência da vida de e) o padrão de vida das famílias operárias (habitação, alimentação,
despesas domééticas), estabelecendo-se a balança econômica das casas operárias,
pelo estudo da receita e despesa; especialmente a proporção das despesas, se
existem, consagradas à cultura intelectual e àhigiene: paterna as relações de marido e mulher, de pais e filhos (a autoridade trabalho e do vida de condições das e os sentimentos filiais) e a repcrcussão )
sôbre a educação dos filhos.
em nações moder 8. Nos países novos em formação, como o Brasil, e, em geral, mistura de Taças da (melting-pot), cruzamn se que as raças se misturam e nas cm pela resulta hereditariedade que as classes e as castas se apagam, tanto pela "assimilaça0 dos indivíduos", que dos individuos" que elas separavam, como pela "ditereniacão brasileira, os populacão da heterogeneidade encerravam (C. BOUGLÉ). Examinar a fenómenos de mestiçagen ou miscigenaço, e estudar a sua repercussão söbre a
"democratização" e a redução dos sentimentos de classe:
a) os efeitos de democratização sôbre a aristocracia rural (casas gTan
des, engenhos) da escravidão (indígena e sobretudo africana) e dos estrangerOS
203
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
que, em pequenas imigrações sucessivas, se incorporaram ao povo brasileiro (cfr. GILBERTO FREYRE, Casa Grande e Senzala), desde as origens de sua formaço; b) a influência democratizante ou igualitária das correntes de imigração,
intensificada sobretudo em S. Paulo e para o Sul, depois da abolição da escra
vatura, e especialmente onde, como em S. Paulo, foramn mais ràpidamente "assimiladas" devido às mudanças constantes dessas populações. 9. Segundo W. MUHLMANN (Rassen und Völkerkunde, 1936) existe uma correlaço entre posição social e nível de inteligència; e, como existe uma determinada
relação entre posição social de uma família e o número de filhos, lícita Ihe parece a concluso de que há uma correlação entre o nível de inteligència e o número de
filhos. Averiguar, por meio de uma investigaço,
se na sociedade brasileira ou numa
das frações dessa sociedade (S. Paulo, por exernplo) existe essa mesma correlação
observada em numerosas pesquisas feitas na Inglaterra, na Alemanha e na Suiça. Mas como há relaçõcs estreitas entre o número de filhos, de um lado, e profisso,
classe
social, credo religioso e a nacionalidade, do outro lado, dever-se ápesquisar e interrogar nos qucstionários, sóbre: a) média total obtida, pelo menos durante dois anos; b) número de imãos vivos; ) profissão do pai;
d) religião praticada pelos pais; e) nacionalidade dos pais.
Verificar, comparando os resultados dêsse ingquérito com os de outras pesquisas, se se pode concluir: (l)
") que existe um paralelismo integral da nota escolar e o número de
filhos: "quanto mais baixa a nota obtida, tanto maior o número de filhos"
(conclusão de pesquisa no distrito rural, de Kronach, na Alemanha, sÔbre gru
pos homogêneos de alunos, pertencentes à mesma camada social e economica:
chacareiros, operários);
b) que, em determinadas condições da vida social, o processo de elimina ção afeta os mais inteligentes como parece vir confirmado em investigao Ções que tiveran por base, em lugar da nota escolar, de valor outras problemático,
"coeficiente de inteligència".
Sôbre a possível influência da "classe social" do aluno, escolher algumas de composição heterogènea e outras freqüentadas, devido à sua localização,escolas elementos relativamente homogêneos quanto ao nivel social, e comparar as por duas categorias para verificar se há realmente uma relação mensurável entre classe social, nota escolar e número de filhos (MUHLMANN, obra itada, págs. 158-159).
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Capitulo III A COMPLEXIDADE E A CRISE EM EDUCAÇÃO O desenvolvimento das sociedades e a divisão do trabalho social. -
As
transformações econômicas e o progresso científico e técnico, fatôres de espeia
lização.
Suas conseqüèncias pedagógicas. - A decomposição em "especiali
dades" (funções especiais) das diversas operações que levam a têrmo a edu
cação do indivíduo. A perda da consciència da obra total da educação. A formação de grupos e orgãos especializados. Concorrendo a um "conjunto" que escapa a cada um dêles. Massas e minorias. A "invasão vertical das massas" eo abaixamento do nível das minorias. -A reducão progressiva da zona
do ensino geral ou comum em beneficio da especialização. - Escolas técnicas e
politécnicas versus "humnanidades" e Universidade. 0 homem, o trabalho e a profisso. A cultura e a especialização, profissional ou cientifica.
Um dos fatos mais fecundos em conseqüências e mais caracteris ticos da civilização atual éo extraordinário desenvolvimento da espe cialização do trabalho que se divide na medida em que as sociedades
se tornam mais volumosas e mais densas. A formação, subdiviso
e
criação de profissões, à decomposiço das operações e ao secionamento da produção correspondem, na ordem pròpriamente econômica e nos
outros setores da vida social, outros tantos grupos e subgrupos profis sionais que se distinguem pela particularidade ou especialidade de sua função e acabam adquirindo, no curso de seu desenvolvimento, uma mentalidade particular determinada pela natureza de suas ocupações Tôdas essas variadíssimas especialidades (oficios e profissões) que se oferecem àatividade humana e cujo número já ascendeu a 000 emn alguns países, como a França, distribuem-se pelas diversas 10 classes so ciais em que se formaram, hierarquizando-se entre si (estratificação in terprofissional) conforme o grau de cultura que pressupõem e a auto ridade social de que se revestem e que varia de um povo para outro. £sses diferentes grupos de atividades (1 ), em que, na sua se evolução, seciona a sociedade geral, e que se caracterizam pela de comunidade ocupações e de interêsses, ainda são suscetiveis de decompor-se em sub grupos, hierarquizados (esttatificação ou não: as di versas ações fragmentárias que, dentrointra-profissional) de cada oficio, concorrem para a ação global dêsse oficio, podem constituir novas especialidades (espe cializaço técnica) e, dentro de cada profisso, como a do médico, por
exemplo,
a
atividade profissional se divide numa grande variedade de especializações, algumas, comuns a tôdas as sociedades, e outras, liga das às condições particulares de cada meio social. Se, porém, a con (1) R. MAUNIER
Contemporaine. Félix Alcan,Essais Paris,sur1929.les groupements sociaur. Bibliothèque
de
Philasophie
206
FERNANDO DE AZEVEDo
um acréscimo densação da massa social, sobretudo se acompanhada de transformacões de população, e a luta pela vida, de que decorrem as
econômicas, são as causas principais da divisão do trabalho, segundo Durkheim, o progresso científico e técnico, nas sociedades só nodernas da divi. éum dos maiores fatôres do seu desenvolvimento. E não
são do trabalho, mas da própria criação de novas espécies de profissões, sob a pressão de invenções e descobertas que podem determinar tanto oaparecimento de atividades profissionais e técnicas, e tal é o caso das numerosas especialidades a que deram origem o aeroplano,
cinemaeo rádio,
como a extinção de outras, estabelecendo una cons.
tante flutuação e mobilidade de profissões e dos grupos correspondentes no interior das sociedades.
Mas, êsse fenômeno da divisão do trabalho, cujo desenvolvinnento progressivo, na vida econômica, constitui "o grande fato económico atual" e de que se pode observar a repercussão crescente nos mais di versos domínios da vida social, exerceu extraordinária influência sôbre
a educação. Modificou-a
e complicou-a em extremno (1). Certamente,
comoobservaram Hesse e Gleyze, a divisão do trabalho abriu perspectivas
quase ilimitadas às aptidões originais do individuo e às suas aspirações,
permitindo-lhe a escolha de uma atividade no número crescente de pro fissões que se lhe oferecem e "deixando, numa sociedade mais numerosa
e mais condensada, o indivíduo mais livre ao mesmo tempo que mais
diferenciado". O papel de cducador tornou-se tanto mais impoitante mais especializado o trabalho; pois, enquanto nas sociedades
quanto
de organização mais elementar (as sociedades inferiores, por exemplo) "as funções sociais, sendo muito gerais, não reclamam senão aptidões igualmente gerais que podem mais fácil e integralmente passar de uma gerações a outra", tornando-se profissões "hereditárias", nas sociedades muito complexas e altamente evoluidas, diminui, se não desaparece, a parte da familia ou das corporações, na formação profissional, aumen tando a da educação pública, cada vez mais importante e complexa à medida que se desenvolve a divisão do trabalho. Não se tratando ape nas de dar ao individuo uma formação tradicional, na família, na cor
poração ou na classe, mas de orientá-lo e preparálo para uma das nu merosas profissões e especialidades, que se apresentam à atividade hu trabalho social não
é sòmente um dos fatôres mais importantes da
do (4) A divisão ""complexidade'" da educação, mas também, como já vimos, uma das
caus as sociais que
da educação extrafamiliar, escolar, ou da educação organi o aparecimernto aram determin zada. Não pensa, porém, assim Letourneau que, procurando explicar quando e porque Co meçou a educação extrafanilial, aponta, como causas principais dêsse importante
militarismo e b) o caráter popular que teve sua Or1gemn histórica e suas causas sociais, a) o divisão do democratico de uma religião ou de um govérno. Mas a verdade é que a
ou trabalho é condição necessária e suficiente da educação extradonéstica, isto é, da for mação do grupo profissional especializado. A correlação estreita que Letourneau constatou o militarismo de um lado (sobretudo para entre educação pública, dada pelo Estado, edemocrático das instituições políticas ou reli caráter o outro, e, de física), educação agioscs, explicaria apenas o aparecinento da intervenção do Estado, em matéria de educaçáo e a extensáo da educação, das classes ngis elevadas a tôdas as camadas sociais. Assim,
govérno ou a religiâo (ligada ou não ao Estado) deixa de ser coisa dos go pois, vernanquando tes ou odos sacerdotes para se tornar mais ou nenos coisa do público, não se pode dizer, com Letourneu, que, nesse momento e por essa causa, "'a educação passou a ser
dada tora da condições tamilLa'". históricas, Aeducação extratamiliar, escolat, já existia; mas, determingdas capacidade pública, ela transferiu-se para adquirinao o Estado,
tor
nouse uma função pública. (. CH. LETOURNEAU, Lévolution de I'éducation dans les races
humaines. Paris, Vigot Frères, 1898).
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
207
mana, e de escolha sempre difícile delicada, o papel do educador, redu zido antes à preparação geral e técnica, se complica com os problemas e os encargos de orientação profissional, que se prendem não só aos estudos e à determinação das aptidões individuais como ainda à aná lise das condições sociais e do estado das profissões dominantes no meio. A divisão do trabalho age também (e êste é um ponto capital)
como uma fôrça centrifuga, já deslocando o indiv iduo para una esíera
particular e limitada, a de seu grupo profisional, e afrouxando, em conseqüência, os laços que o prendem aos outros homens, à socie
dade em geral, já decompondo a educação não só em "especialidades" (funções especiais) correspondentes às diversas operações que levam a témo aeducação total, como em um grande número de escolas espe ciais, prepostas à preparação para as mais diversas atividades e pro fissões.
Estamos longe do tempo em que, lembra Durkhe im, "a filosofia
era a ciência única; ela se fragmentou numa multidão de disciplinas es peciais, cada uma das quais tem seu objeto, seu método e seu espírito. De meio em meio século, os homens que se destacaram na ciència, tor naram-se mais especiais". Essas divisões e subdivisões das ciências, de terminadas pelo crescimento constante de volume dos conhecimentos,
decorrente da complexidade do saber humano, e pela necessidade de
dividir, para aprofundar, qualquer dos setores do vasto dominio cien tífico e literário, forçaram o parcelamento do ensino em ramos dife
rentes, confiados, ao menos a partir do ensino médio, a outros tantos profissionais especializados. Se a educação em qualquer de seus aspec tos, se tornou uma função extremamente complexa, devido à varieda
de e multiplicidade de conhecimentos que é preciso inculcar aos indi
víduos, a especialização tinha forçosamente de decompor, como decom pôs, a obra total para lhe facilitar a execução. Nenhum professor, ne nhuma escola, podia tomar a si essa tarefa, cada vez mais árdua e com
plicada, que se reparte por grande número de professöres, nos diversos
graus de ensino. Além de ser a especialização crescente um fato a que não é possivel fugir, não se pode negar a vantagem e téc nica da divisão racional do trabalho. Mas, concebidoeconòmica e ministrado o ensino por seções e ramos especiais; organizadas as escolas de maneira a ser dada a educação "por fragmentos" e por especialistas diferentes que trabalham, cada um no seu setor, uns, nas classes, o ministrando ensino das matérias do curso, outros, incumbidos do ensino religioso, outros ainda, do desenho, da música e da educaç£o fisica, compreende se fàcilmente que a educação, à medida que aumentou em complex0 dade, perdeu em estrutura orgånica, tornando-se fragmentária e dis persiva, sem unidade e sem coesão. "Uma só coisa, observa Jackx, mas a mais importante perdia-se de vista: o homem total (1), que é a um
tempo espirito, alma e corpo. Deixavam-nos, por essa forma, desenre dar-nos, para extrair, custasse o que custasse, dèses tragmentos espar (1) L. P. JACKX
The education ot the whole man. Capa Ill
London, 1931: ctr. FERNANDO DE AZEVEDO, A educaçdo 3,4 edição. Companhia Melhoramentos de S. Puulo, 1953.
IV, University Presa,
seus problemcs, paçs 103-107.
208
FERNANDO DE AZEVEDO
sos um mosaico unificado". Não se apreende nem se domina a vida
na sua "totalidade"; e, em conseqüência, por falta de uma síntese, ber. os educadores, distribuidos por trabalhos os mais diferenciados, são levados a perder a consciência da obra total da educação, de que näo vem senão os aspectos ligados às suas especialidades, concorrendo unm
dendo de vista as ligações que unem ao todo essas operações parciais,
pouco mecânicamente a um "conjunto" que escapa a cada um dèles.
Certamente, "quanto mais as funções se aproximam (escreve Durk
heim), tanto mais pontos de contato existem entre elas, c, portanto,
estão mais expostas a se combaterem; e, ao contrário, profissões dife
rentes podem coexistir sem serem obrigadas a se hostilizarem recipro
camente, pois elas prosseguem objetos diferentes". Mas, enm primeiro lugar, dividindo-se o trabalho social, a luta desloca -se apenas: dimi
nuindo a concorrência entre os grupos que prosseguem fins diferentes, torna-se cla mais intensa no interior de cada um dos grupos profissio nais, e tanto mais quanto êsses grupos crescem em volume e em den
sidade. Em segundo lugar, nas sociedades em que reina a divisão do
trabalho, desaparece a concorrência entre os grupos ocupacionais dis
tintos, mas para dar lugar ao "isolamento" dos grupos no interior das
sociedades, e dos individuos ocupados em tarefas especiais, no interior dos grupos. A tendência a êsse isolamento é tanto maior quanto mais
estreita aespecialização, e tanto mais perigosa quanto a consciència de uma tarefa especial a desempenhar não é acompanhada de uma "idéia de conjunto", da consciência da conexão ou interdependência social e
das obrigações para com a sociedade como um todo, para com a cidade,
a provincia, a nação. Essa especialização a todo transe a que Ortega yGasset chamou a "barbárie do especialismo", e que consiste no pre
dominio do homem-massa, do homem-médio, isto é, do profissional, do
técnico e do homem de ciência, reside à base dêsse fenômeno "da in vasão vertical das massas" (1)) e do conseqüente abaixamento de nivel das minorias, fenômeno êSse para que concorreram ainda o cresç mento considerável da população nestas três últimas gerações, a cxpan
são dos ideais democráticos, e a vulgarização pelo jornal, livro, cinema e rádio, de tóda a espécie de intormações e conhecimentos. Se tomar mos a pirámide para representar gràficamente a organização de um sistema escolar moderno, podemos dizer que, em conseqüência da es pecialização e da ascensão das massas ao poder social e político, se pro (1) Para Ortega y Gasset o advento das massas ao poder social e político constitu expostas em 1926 e desen volvidas em 1930 ). Asociedade, explica Ortega y Gasset, 6 sempre uma unidade dinamica de dois tatôres: massas e minorias. A massa é o conjunto de pes
o fato mais importane da vida pública européia "na hora presen te'" (estas idéias foraa
soas nâo especiaimente qualiticadas. Massa é o homem-médio, o homem, enquanto ndo o homem que não se valoriza a si mesmo e se sente "como todo o mundo". As ninor
diteroncia de outros homens, mGs que repete em si o tipo genérico; é, por outras palavr
Bão indivíduos ou grupos de individuos "especiaimente qualificados". Es sa divisáo da
ciedade ern mcssas e minorias excelentes não é uma "divis ão em classes'" nem pode Coe
cidir com a hierarquização em classes superiores ou inferiores: pois, embora nas superio
quando chegam a sê-lo e enquanto o torem de verdade, há mais probabilldade de se de rem bomens altamente qualificados, e as inferiores es1ão normalmente cons tituídas por
víduos Eem qualidade, a rigor, dentro de cada classe socAal há nassa e minoria auten (ORTEGA Y GASSET, La Rebelion de las massas).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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duziu um "achatamento" dessa pirámide, diminuindose a altura e, por
tanto, baixando o nivel das camadas superiores constituídas pelas es colas de tipo universitário e alargando-se a base formada pelas escolas
de cnsino elementar e médio (geral ou técnico). Oconjunto subiu com o nivelamento que se produziu na sociedade, determinando a que
da de nível do ensino superior e médio, não especializado.
Assim, pois, por um lado, a excessiva divisão do trabalho que apa em conseqüência da complexidade do saber humano, determinou uma
rece nas ciencias enos seus diversos ramos (especialização intelectual).
crescente Iragmnentação do ensino em seções e ramos e numa multidão
de disciplinas especiais. £ste fato trouxe, em conseqüència, a) o pre dominio da instrução sôbre a educação tornando cada vez mais dificil dosar, em proporções convenientes, os dois elemen tos, de modo que
a educação não entrave a instrução nem esta possa contrapor-se à cul
tura intelectual; e b) a perda do sentido da obra total da educação, e. portanto, de sua unidade de cspírito. Por outro lado, a especialização técnica e profissiona! complicou os sistemas escolares de uma grande variedade de escolas especiais, técnicas e profissionais, de grau elemen tar, médio e superior; agravou o contlito entre as exigëncias da cul tura e as exigncias
da utilidade, e, fazendo dupla pressio dos lados
e de cima para baixo, tende a degradar o nivel do ensino médio e su
perior, não especializado, com a redução progressiva da zona do ensino geral ou comum, de todos os graus, em beneficio da tecnica e da espe
cialização. Éste é o problema dos mais graves que, no dominio edu
cacional, estabeleceram a complexidade das sociedades modernas, trag
mentadas em numerosos grupos distintos, e as necessidades da especia
lização do trabalho profissional e técnico. A escola, pela própria
tureza de sua função, deve, sem dúvida, preparar o individuo para s
grupos especiais em que a sociedade se divide e cujas atividades, es senciais à vida social, contribuem notàvelmente ao desenvolvimento do
conjunto;: mas se ela não cuidou antes de Ihe dar uma solida base de cultura comum, para as diversificações ulteriores, a unidade do grupo social como um "todo" fica sèriamente comprometida pela mulipli CIdade de grupos profissionais, entre os quais não se estabeleceram
laços bastante fortes para resistirem às suas tendèncias ao isolamento
e à dispersão. De fato, porque o grupo mais vasto (cidade, naçio, hu
manidade) de que fazem parte, "está fora de sua visåo normal e não
opera sôbre êles senão de maneira muito fraca", nunca se tomou t£o
necessário cono hoje um estôrço de assimilação e de homogeneização
dos individuos, para as diterenciações posteriores, em escolas cspecias
destinadas àpreparação ireta para as diversas carreiras. A lragmentação ou, - para empregar uma expresio mais viva, a "pulverização" das sociedades em grande nçmero de grupos protis
em tre Sionais distintos, com suas ocupações e interèsses particulares angular desvio tremendo o qüentes conflitos com o interèsse geral. e concorreram que a evolução riara enue a culura ea técnia, é que
FERNANDO DE AZEVEDO
210
para
determinar, como vimos, o nivelamento das sociedades (1), por
baixo, e o predomínio da mediocridade intclectual em tôdas as esferas da vida social. É a época de valorização do técnico, do especialista, ou, por outras palavras, do "homem-médio". As lutas travadas entre os ideais de cultura representados pelas "humanidades" eUniversida des, e os interêsses da utilidade de que são expressões as escolas técni
cas e politécnicas, e as sucessivas reformas a que têm dado origem, mostram
até que ponto e com que violència têm repercutido sses
fatos nos sistemas de educação. As sociedades e as suas formas orga nizadas de educação vacilam entre as duas necessidades da vida atual:
1) a de dar lugar, nos sistemas escolares, aos estudos técnicos e profis
sionais que permitem estabelecer o contato "com o real imediatamen
te presente e vizinho"; e2) a de reduzir, por uma cultura de alto
nível, profundamente humana ecompreensiva, "a desproporção entre
a complexidade dos problemas atuais e a capacidade das inteligèncias":. Na própria Rússia em que a escola da Nep se transformou num ins trumento da ditadura do proletariado e em que todo o ensino é pro fissionalizado e todo aluno se tornou um técnico, sentiram os fun
dadores do regime soviético a gravidade do problema que enfrentaram
antes da Nep (1929-1928) mas que não souberam resolver, opondo à
formação técnica, dirigida para uma produção material, para uma fa bricação, a formação geral", politécnica, que visaria o aperfeiçoamento
da pessoa. Mas a "formação politécnica", segundo a expressão de Le
nine, tomada a Marx, não se distingue a rigor da formação profis
sional (unitécnica) senão pelo fato de que aquela não determina o do problema não consiste em aluno para um só oficio. Éque a solução seria uma utopia; mas antes 0 que reintegrar o ofício na cultura, profissional e em estabelecer, como introdução a tôda especialização no cientifica, uma cultura geral de base, organizada "segundo formas an letras e linguas vas de humanidades (neo-humanismo) de que easrecolher às escolas su alimento" o e matéria tigas não seriam mais a aos quais periores, segundo métodos de seleção racional, os individuos suscetiveis deve ser outorgada essa cultura, isto é, que foram julgados
de um preparo profissional especializado.
interêsses da utilidade, entre £sses conflitos entre os interêsses da cultura e os preconceitos
pela persistência de velhos a cultura e a espeialização ainda são agravados nos sistemas escolares que se vão e preconceitos novos, com profundas repercussõesorganizações ligadas a velhas cultu ou complicando pela coexisténia de instituições avançadas. Umas e outras, excessivamente novas organizações de e ras desaparecidas e, justapõem-se sem se integrarem no sistema
sobrevivèncias e antecipações,
socie a influência desse "nivelamento'" das (1) Eis como Grand-Carteret analisamais avançanmos para o fim do século (escrevia "Quanto dades na evolução da caricatura. mais caricatura, em relaçao áspera e violenta se torna averdadeiramente pessoal. éle em fins do século XIX) tanto criadores, sôpro um de animados subiu, conjunto às individualidades, aos espíritos o : sociedade ng produziu nivelamento que se Eis uma das consegüências do inteligências'", mas as cabeças das charco chamada 'o bem tão mediania atingiu essa preciso abaté-las, Pois então pela pena e pelo lápis, é combate muito altas prejudicam a sinetria. en 1avo de arma outrora tarnsiorna: se caricatura a palavra, alinhá-las. Em uma homem anônimas (do multidões das serviço a vêzes muitas do direito e da liberdade, hoje Ortega tra os con bdio de arma ser querer parece ), Gasset y medio, do homem-massa, diria espíritos superiores'" .
sOCIOLOGIA EDUACIONAL
211
além de não oferecerem um princípio de unidade, constituem, no interior da organização escolar, redutos de resistência às inovações úteis ou focos de inquietação.
É claro que tôda velha cultura, pondera Ortega yGasset, "arrasta no seu desenvoli
vimento tecidos caducos e não pequena carga de matéría córnea, estôrvo à vida e
tÔxico residuo. Há instituições mortas, valorizações e respeitos sobreviventes e já sem sentido, soluções indevidamente complicadas, normas que já provaram sua "insubstan cialidade". Haja vista à questão das humanidades clássicas. Os preconceitos ligados à tradição do ensino clássico, grego c latim, "como sistema único e generalizado" não têm constituido apenas um grande obstáculo à solução do problema do ensino médio, mas tem contribuido, como já notamos, para complicar os sistemas escolares, em que chea
ram a figurar (como no caso da Alenanha, antes do III Reich) quatro categorias cspecificas de ensino secundário. Segundo a concepção estreita de humanisno, para o qual não haveria cutro caminho senão as humanidades clássicas, os gregos e os latinos (a crítica é do cônego Beaussart) aparecem não como "homens de um tenpo e de
uma civilização dadas mas como tipos únicos da humanidade, sôbre os quais todos
devcm modelár-se". Daí a luta para manter o grego e o latim não só para uma elite,
mas mesno "para todos". A verdade, porém, é que "as humanidades clássicas não ão perimeas, mas, generalizadas hoje, pereceriam de sua própria generalização": o latim
c, sobretudo, o grego, devem ser reservados ao ensino superior e. por consequinte.
às especialidades, e, nos cursos de "pré-especialização" (ensino médio), àqueles que se destinam às seções de letras clássicas, nas escolas superiores. E se as humanidades
clássicas foram, em deterninada época da civilização, o caminho que levou ao huma nismo (humanismo clássico) pode-se conceber a idéia de outros caminhos, de formas novas de humanidades (neo-humanismo): outras matérias (dèncias e letras modernas)
poderão levar ao mesmo resultado, se forem animadas do mesmo espirito iberal. "desinteressado, profundamente cultural e humano", que foi o do ensino secundário clássico.
Em todo o caso, seja qual fôr o ponto de vista em que nos colo carmos para apreciála, e reduzindo-a a seus dados concretos, a rup tura de equilíbrio entre a cultura geral e a especialização se baseia no divórcio entre a teoria e a prática, entre a cultura e a técnica,
como se fôssem duas coisas mais que distintas, forçosamente separadas. Ora, ao contrário dos que julgam, como Spengler, que a técnica pode seguir vivendo, quando morreu o interese pelos principios da cultura, "a técnica, escreve admiràvelmente Ortega y Gasset, é consubstancia mente ciência, e a ciência não existe se não interessa em sua pureza
cpor si mesma, e não pode interessar se os individuos não continuam
entusiasmados com os princípios gerais da cultura. Se se embota sse fervor, como parece acontecer, a técnica só pode permanecer um pouco, o que durar a inércia do impulso cultural que a criou. Vivese com a técnica, mas não da técnica. Esta no se nutre nem respira a si mes ma, não é causa sui, mas precipitado úil, prático, de
preocupações supérfluas (ou desinteressadas), não práticas". £sse divórcio entre a técnica e a cultura pode, pois, determinar uma paralisação não só do progresso cientifico, mas, mesmo em conseqüència, do próprio pro gresso técnico. "Uma pausa nos progressos da ciència é a estagnaço
da indústria; una estagnação na técnica é o retardamento das desco
bertas científicas". Acresce ainda que, no dominio industrial, a rans
formação dos meios de produção não parece ter aumentado por ora
senão a parte do automatismo. A noção de "rabalho, grandeza que se nede facilmente, valor puramente quantitativo, vai substituindo, 15
Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 212
ou de "labor", àmedida no iuízo exato de Valéry (1), a noção da obra" o uso da máquina se esto que mais e mais se encara o rendimento, e Mas diante dela o operário, aue de até fazer, por assim dizer, erecuar é essa "obra" nada mais. A trabalho é um meio de vida, coisa. Aliás, diz Valéry, o desenvolvi razão à vida, e não é a mesma complexas, neccssàriamente mento de emprêsas imensas, extremamente personalida de, nos homens da acarreta a diminuição correspondente Só. nas alturas. grandes das que elas empregam, "até às imediações vontade: a fôrça de alturas, se encontram a iniciativa, a invenção, em "obra", enquanto, nesse ponto, transforma-se de novo o "trabalho" que molas automáticas nas embaixo, os trabalhadores não são mais do trabalho mecânico". fábricas, embrutecidos pela monotonia do em proporções Ora, é o mesmo fenômeno que se constata, embora sistemas esco os para diferentes, se passarmos das emprêsas industriais à maneira das lares modernos, extremamente complexos, organizados com a divisão do tra grandes indústrias, em que tendem a imperar, correspondentes de balho, o mesmo primitivismo técnico, e as noções a ciência, trabalho, de "eficiência" e de rendimento. A educação, como obrigados a dividiu-se em disciplinas fragmentárias, e os educadores,especialização se especializarem em seus conhecimentos por fôrça da concepções ge suas científica (2), tornaram-se estreitos, limitados em enrique multiplicaram, rais, enquanto, nos sistemas educacionais, se pelas necessi cendo os e complicando-os, as escolas especiais, geradas e com densidade a com variáveis dades de especialização profissional, que antinomia pela plexidade da estrutura dos grupos sociais. Assim, exi as entre a divisão do trabalho, levada ao extremo, estabeleceu gências da especialização e as da universalização, e pelas repercussões
geral, cien que a especialização estreita tem sôbre o nível da cultura aliás tifico-filosófica, a tendência crescente à especialização, imposta perigosa pelas condições inelutáveis da vida atual, criou umna atmosfera desenvolvimento o Ademais, para a cultura geral e para a educação. extensão horizontal, pelo vasta a sua e escolares sistemas vertical dos Crescimento quantitativo das unidades escolares, tanto maior quanto
aumentando as distáncias mais nos aproximamos da base da estrutura,diversos graus de ensino e sociais dos educadores, distribuídos pelos
de funções técnicas, conribuem pela grande variedade de escolas econcentração de cada um no retiro para acentuar ésse isolamento e essa 1) P. VALERY.
do livro Métier d'homme, de RAOUL DAUTRY, drotor geral
Ptado trancês. aprofun dar'" é
dos Caminhos de Ferro do (2) Certamente, ""dividir para
o objetivo da especialização intelectual sem se limitar o indivíduo num científica cultura ampla adquírir uma pode e, se não se sem conhecimen tos científicos especialista, verdadeiro tornar se pode não domínio qualquer, a antínomia. Mas, observa com admirável precisão Paul Arbousse Bas tide, extenSOs. "o fato de aprofundar umn setor de conhecimento remedeia o empobrecimento resultante de sua divisâo. Aprofundar é, em verdade, analísar táo completamen te quanto possível a cotnpleidade de uma parte da realidade, a tim de bem apreender tôdas as ligações que a unem ao todo. A dfvisho é apenas o ponto de partidaae não se deva ver nela senão uma
mitaçto netodolégioa noatravés trabalho conhecimen to. O ponto de chegada permanece conhecimento do conjunto, da do pesquisa aprofundada de setor bem delimitado. Assimo compreendida a especialização intelectual não implica na ignorância de tudo aquilo que não egtá materiaimente echado pelo setor escolhido. Uma especialização intelectual quo se fe chasse dentro do setor escolhido não Beria uma verdadeira especialização. "Masêsse 6
certamente o tipo mais comum do especialista: o falso especialista, o "ospecialista I
mitado'
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213
relativo, em que segue a sua linha, sem uma consciência da unidade
de conjunto. A "instrução" separouse da "educação" e uma e outra
desacertaram, não obedecendo ao mesno ritmo. A noção de "obra".
também em cducaço,
cedeu o lugar à noção do trabalho, a) por falta
de uma organização suficientenente completa de conhecimentos e, por tanto, de uma cultura geral comum a todos, bastante substancial, cocrente e vigorosa, e b) de uma grande finalidade diretora que atuasse
söbre todo o conjunto: essa politica social, de ampla inspiração e en vergadura, concentraria, como o coração, os grandes valores morais e cspirituais,
o que existe de sangue, de vitalidade na cultura de um
povo, - para lançá-los, já filtrados, a todos os órgãos do sistema, como
un ideal inspirador capaz de transformar o trabalho em "obra" e uni ficar, emn espírito, os trabalhadores de educação, nos mais diversos carn pos de atividades escolares. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Para a compreensão da complicada estrutura que apresentam os sistemas cducacionais modernos, e pela qual se evidencia a complexidade crescente da função
educacional, é preciso ter em vista e analisar êsses dois fatos fundamentais:
a) a divisão do trabalho social que é um dos fatos mais ricos em con seqüènia tanto para a vida econômica como para a vida social: tòta con densação da massa social, sobretudo se ela éacompanhada de um arécimo de população, determina progressos da divisão do trabalho (v. E. DURK HEIM, La Division du Travail social); b) o secionamento, em conseqüênia, da sociedade geral em sociedades
secundárias, grupos de "especialidade". profissionais, que se distinguem pela particularidade ou singularidade de suas funçóes, e que, como tem valor.
prestigio e poder social desiguais, são hierarquizados hierarquia de oficios e
de profissões).
Mostrar ainda que o progresso ientifico e técnico, determinando novos progTesos
da divisão do trabalho, cujas causas principais são a densidade social e aluta pela vida, não só contribui para a criação de novas profisQes erenovaçáo das existentes.
tornando o trabalho cada vez mais "parcelado", mas também é uma das auas dentes (cfr. as conseqüèncias da máquina, do cinema sonoro, do rádio e outras descobertas cientificas). da extinção e do enfraquecimento de outras profissões e grupos sociais correspoa
2. Examinar as principais conseqüèncias pedagógicas da diviio do rabalho social, cujas razões se podem buscar nas formas sociais e nas variações de seu volume e de sua densidade (E. Durkheim). Podem resumir-se a très essas conseq üencias:
a) a complicação e enriquecimento dos sistemas etucacionais com uma
crescente diversidade de escolas técnicas e proissionais, de grau elementar.
médio e superior, em correspondència e sob a presdo da tormaçâo, subtivio e riação de profissöes nas sociedades modernas em que se oterecem à aividade humana centenas de "especialidades" de base cientutica. suscetiveis de tratamento
educativo;
b) a decomposiço e secionamento, em "especialidades tunçdes espeiais). das diversas operações que levam ao tèrao a cucaçko do individua, em que
trabalham, para conpletá la, ada um no seu setor. grande açmero de protes sôres dos diversos ramos e graus de ensino, desde a escola primária até as de nivel universitário; e, em conseqüènia, falta de uma visão global da vida eo aráer Iraguentário da educação que perdeu a sua unidade orginica:
FERNANDO DE AZEVEDO 214
os guaie a"dispersão c dissociaão" de protcssóres e cducadores cntre fechando e que, cducacional, função da atividades sio repartidas as múltiplas cada vez mais restrito, acabae em um campo de ocupação profissional que não vêcm sen dendo a consciênda da obra total de educação, de essa solidaricdade me cla, com aspectos ligados às suas especialidades c,de vistas" e à idéia de trabalb intimamente associada a uma "unidade comum.
escolar, como ho Analisar cada um dêsses fatos, num determinado sistema e que são agravados suscitam que exemplo, o do Brasil, e a gravidade dos problemas (o crescimento horizontal extensão nas grandes organizaçõcs escolares, pcla excessiva
o problema da quantitativo das unidades escolares), que "complica singularmente a outro nível de um interiores comunicações onganização dos serviços, torna dificeis as e aparelhamcnto vez mais um ou de um a outro setor no mesmo plano e impõe cada 156). pessoal especializado". (v. Acducação e seus problemas, pág."a especializaço profis espccializaço: 3. Existem, pelo menos, dois tipos de ou de uma profisso, sional e técnica que consiste na aprendizagem de um ofício que é a pesquisa aprofundada de um setor e a especialização intelectual ou científica como o mostrou Arbousse bem dclimitado do conhecimento humano. Aquela, intelectual ou cien Bastide, permancce à margem da cultura. Esta, a cspecialização da cultura". Observar, analisar tífica, não passa de "um processo inevitável e fecundo sociólogo, no estudo das relações entre e discutir os seguintes fatos apontados por ésse a cultura ea especialização: à margem da cultura, no a) "se o ensino profissional especializado eestá não ocupam nelas profisão a oficio estado atual de nossas soiedades, é que o o lugar que lhes cabe"; certa sociedade quc dela b) não foi a cultura que os afastou, mas que o oficio e a profissão em surgirão excluiu: outros tipos de sociedade os serão "integrados" na cultura;
e, portanto, na especia ) háuma "hierarquia de ofíios e de profissões", na especialização cien há lização profissional existe uma hierarquia que é,nãopor definição, uma especiali intelectual tífica; e, ao passo que espeialização poderá ser sempre nem profissional especialização zação de grau superior, a elevada ao nível da cultura. ao estudo dos problemas que 4. Nas páginas que Ortega y Gasset dedicou especialismo), moderno (c. XI, La barbarie delpredomínio levantou a "especialização" no mundo do o e desenvolvimento da especialização
analisa o pensador espanhol o
como lhe chama, o primitivo, o homem de dênda e do técnico, o "homem-massa", bárbaro moderno: Gasset, é científica, a técnica a) se nem tôda técnica, diz Ortega y caráter específico, moderna tem uma raiz ientífica, e dessa raiz lhe vem seu
a possibilidade de um ilimitado progresso; da burguesia, pelo b) a 2ristocracia do presente é constituída, dentro que homem-massa), (o homem de ciência e pelo técnico, isto é, "especialista" espírito à época; de seu exerce hoje o poder social e impõe a estrutura que os homens de ciència sc exigia iência a ) a0 especializá-lo (e de sua especialização; espeializassem) "ela o fêz hernéico e satisfeito dentro não entra em sua quanto éle não é um sábio porque ignora formalmente sua porção
cspeialidade e não é um ignorante porque conhece muito bem a de universo". o predo Examinar ésses fatos e algumas das conseqüências que daí derivaram: a) valia, do
a sensacão íntima de domínio e mínio do homemn intelectualmente médio:conhecimento, o leva a querer predominar ténico, no seu setor de trabalho ou de esferas da vida soClal fora de sua espeialidade, e daí, o primiivismo em tôdas as governos despóticos; O os para especialista ou b) a fórça que representa o técnico lhes infunde sábio, o universal, homem o nada, recusa homem especial não lhes ao nivel do cultura medo; éle cnte, éle pensa" (Lamartine): c) o rebaixamento da
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
215
reajustamento da especialização profissional à oficio c da profissão e a crise do espeializaçáo, da cultura de base, introdução ulura: d) a redução, em proveito da indispensável à formação profissional ou ientífica. educacional e. em conseqüência, dos 5. A complexidade crescente da função cssa função, é deterninada sistemas escolares, por mcio dos quais se realiza em parte,
e analisar: por diversos fatôres quec convémn observar se formam, se subdividem a) a divisão do trabalho social: à medida que cada vez mais complexa a tornar-se a ou se criam oficios e profissões, tende de escolas tarcfa de cducação e a aumentar, em conseqüência, o número os "especialiar" diferentes, de grau elementar, médio e superior, destinadas a alunos (especialização profissional e técnica); em complexidade b) o progresso científico: pois, como o saber aumenta a divisão do impQe-se conhecimentos, na medida em que cresce o volume de só as seções náo daí delimitado; ben setor trabalho para a pesquisa de um
à espccialização intclectual, no don inio filosófico, ientifico e destinadas literário, como o secionamento "por matérias", no ensino médio secundário: cada professor não deve ensinar senão a matéria em que se especializou;
c) o desenvolvimento das idéias democráicas e humanitárias a que as conquistas científicas abriram novas perspectivas e que tendem a tornar cada
vez mais complexa a tarefa educaional: daí, as classes e as escolas especialia
das para cegos, surdos-mudos, débeis mentais, retardados, etc.
Tomar um sistema escolar. por exemplo o do Brasil, e mais particularmente o
de São Paulo ou de outra unidade da federação e examinar, através da análise de
sua estrutura, até que ponto èsse sistema se tem complicado sob a pressão dsses fatos e adaptado às novas exigèncias impostas pela divisão do trabalho, pelo progresso das ciênias e pelo desenvolvimento do espirito democrático e humanitáio. 6. Nas sociedades de organização extremamente complexa como as sociedades
modernas, é fácil observar o processo de crescente especialização no trabalho profis sional e técnico e no trabalho dos pesquisadores, no dominio científico. Essa tendèn cia étão acentuada que freqüentemente se discute a idéia à qual muitos são favoráveis,
de uma substituição gradual das formas e métodos de uma democracia de massa por um govêrno formado por uma espéie de elite em que teriam papel preponderante o técnico e o homem de ciència. Sem dúvida, é preciso a) tornar-se quanto possivel um técnico acabado (e a educaçio pode e deve contribuir para isto), e "aceitar e compreender essa lei de especialiação do trabalho que é a condição da ação úil; mas não é menos necessário
b) "compreender sua própria vida, nas expressões de Jean Jaurés. pred sá-la, aprofundá-la, estabelecê-la e coordená-la, contudo, à que não épossivel sem enquadrar os conhecimentos e os ideaisvida geral.-o numa concepção
compreensiva do mundo. Os professores, em conseqüència do "parcelamento" do cada vez mais especializado, não ministram mais do que uma quantidade detrabalho frag conbecimentos, mentos não coordenados de ciência, sem nenhuma compreenslo comum dos process nos quais tenham de intervir: essa de espirito" um problema que cstá ligado ao da "unidade de formaçio" "unidade e, portanto, ao de uma finalidade diretora de todo o sistema de educação. Em que consistem èsses problemas? quais as particula ridades que apresentam em nosso meio? e quais as soluções que podem ser propostas, nos quadros atuais da civilização brasileira?
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Sociology.
Traduite par le dr. Brödal. Paris, Marcel Rivière, 1931."
Capitulo IV ESCOLARES A ORGANIZAÇÃO DOS SISTEMAS públicos. - Centraliação e descende Aorganização dos sistemas escolares e os problemas decorrentes ensino de serviços tralização. A ex tensão dos das "necessidades organização, direção e contrôle técnico. - A variedade "genérico" nos mais há de específicas" dos grupos e dos habitat e o que e unidade escola de tipos e de sistemas de Variedade interêsses da nação.
fundamental de espírito e de estrutura. O problema das relações entre os O ensino técnico e profis Problemas especiais. ensinos de diversos graus. mobilidade e a flutuação A trabalho. do -Omaquinismo e o mundo sional. das profissões nas sociedades novas. 0 ensino médio geral ou o ensino Ainda a questão das "humanidades clássicas". Oproblema secundário.
universitário e a crise das elites.
Especialização e cultura.
A extenso e o desenvolvimento dos sistemas educacionais nos tem
pos modernos, e principalmente nestes últimos 50 anos, foram tais e
de tamanho vulto que Dewey, referindo-se ao sistema escolar americano,
exclamava recentemente que "em vão se buscaria fato semelhante na história do mundo e pela primeira vez inscrevem seus anais, não como
um mero ideal planejado no papel, seno como realidade viva, a pro
messa da educação universal". Nesse sistema escolar, em cujos extremos se defrontam os jardins de infância e os cursos para a educação dos pais, as escolas elementares e as Universidades, e no interior do qual
se multiplicaram as escolas primárias, as high schools ou colégios, as escolas técnicas e profissionais e escolas especiais de vários tipos (para subnormais, surdos e mudos, cegos, etc.), observa-se, ao lado desse extra ordinário enriquecimento interno, e paralelamente a êle, a tendência a projetar fora da escola, o seu raio de ação por uma série de associações
complementares, ligadas às instituiçöes pròpriamente educativas. Se é certo que poucos paises, ainda entre os mais altamente evoluidos, como a França, a
Inglaterra e a
Alemanha, apresentaro a riqueza e a comple xidade dêsse formidável aparelhamento não menos ver educacional(1), dade que o aumento da população escolar eo ea
crescimento
complica
(1) Para que se tenha uma idéia do dernos, bastará refletir sôbre desenvolvimen to dos sistemas educat:vos o os dados estatísticos, de 1932, escolar americano, certamente umseguintes reterea tes ao sistema dos nais importan tes total era calculada em 30 omplexos. escolar milhões, "tan tos, observava John Dewey Aempopulaão a 25 de outubro de 1932, irradiada uma conterència como os que constituíam a em tenpo presente à populaçdo total deste pais memÑria dos velhos'" e dos quais dois terços nas escolas elementares, (20 milhSes) de 6 milhões, nos colégios sino técnico e profissional,cêrca nos estabelecimen tos estavam de en de jovens de um e outro riores. As escolas normais ee 4asmilhões sexo, nas esolas supe classes preparatórias de professÓres serviço futuro mais de 250 mil jovens. paTa o recrutavam um corpo de cêrca de um milh ão de Todo êsse 'consideràvel exército" era dirigido por niente de e mes tres. A funcionários dotaço pstes de verbas criadas financeira, prove pela bilhões de dolares, ou sejam cêrcubeneticència popular, responde à grandezg de 5l milhes de contos, em nossa moeda.
FERNANDO DE AZEVEDo
218
code estrutura constituem, de modo geral, uma das particularidades c. racterísticas dos sistemas educativos modernos. Um confronto das cstatisticas relativas aos sistemas escolares de qualquer dos povos curopeus ou americanos não deixaria dúvidas sóbre êsse fato do extraordinário
desenvolvimento que adquiriram os serviços públicos e particulares de educação. É fácil, pois, compreender que essa expansão quantita tiva e complexidade crescente dos serviços de ensino não podiam dei. xar de estabelecer os mais graves problemas de organização e, entre êstes, em primeiro plano, 0s de direção e de contrôle técnico, os de coordenação e de orientação, com a solução dos quais se procura esta belecer uma unidade de espirito na variedade de instituições e uma sintese das diversas influências (escolares e extra-escolares), freqüente
mente divergentes, exercidas söbre as novas gerações,
Em todos os países, e mesmo nas sociedades de ordem democrd
tica em que predomina um regime de liberdade de organização e de
ensino, já se realizam esforços no sentido de dominar do alto êsses conjuntos escolares extremamente complexos, e de entrar mais ou me
nos resolutamente no caminho da "concentração" da obra educacio
nal, disseminada pela variedade e pelo número de públicas e particulares de ensino. Na América do Norte, porinstituições exemplo, em que o grande número de escolas particulares e a administração municipal
das escolas públicas conduziram a uma acentuada diversidade de mé
todos e a sérias desigualdades entre os estabelecimnentos e, portanto, "a uma primazia para as invenções e experiências novas com o perigo de certo caos e confusão", já se t¿m feito vários ensaios no sentido de passar dêsse regime de descentralização, levada ao extremo, para
um regime de centralizaço, compatível com osistema politico fede
rativo. ÉêSse regime, no entanto, predominante nos países anglo-saxo nios em que quase todo o ensino superior e, por larga parte, o ensino
secundário ficam assegurados por organismos privados ou exteriores
ao Estado. Certamente, nos paises totalitários, como a Rússia e, nos governos de Hitler e Mussolini, a Alemanha e a Itália, por fôrça do
regime politico, de um despotismo avassalador, a educação, como a eco nomia, tende decididamente à"centralização autoritária" (1), aos planos
e àsubordinação dos interêsses e das instituições privadas ao Estado. Mas não se pode contestar que as sociedades modernas, democráticas ou não-democráticas, são levadas, pela fôrça das coisas, a construir edi fícios simétricos, tornando, em umas e outras, fortemente hierarquza
da a organização do ensino, já pelo fato de que as evoluções sociais são "condicionadas pelo desenvolvimento da técnica moderna que sem pre transtorma oEstado e as suas relações com o público e as insti
tuições", já porque aextensão e complexidade dos serviços de ensino
) Em sua obra, que classifica de ensaio histórico e doutrinário, A. Desqueyrat
Eostra. a propós ito da idéia do "direito institucional', que os corpos constituidos no interior etdo dão lugar a Para um "direlto vertical nãoase deixam horizontal iqualitário". êle, como aliásautoritárió'" para Hauriou, instituiçáoreduzir um ao "direito da , no seio do qual se produz direito, fenomeno sOcial, e o direlto, fenomeno social da
to ostatal. 6qualquer''. "essencialmente o mosmo que odireilo,lefenomeno' socialet dela uma insti tuição corporativa (A. DESOUEYRATL'institution, droit objectif tecnig positive. Paris, Sirey, 1934 ).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
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contrôle téc e os problemas decorrentes de organização, orientaçãoe uma "conver realizar perrnita nico exigem una sólida armadura que
gência de esforços" no sentido de determinada política de educação. descentralização, estabelecido na Ainda no Brasil em que o regime de dualidade de sistemas - o siste república (1889-1930), favoreceu uma pela União ma de ensino secundário e superior, mantido ou fiscalizado primárias e e os diferentes sistemas estaduais constituídos das escolas cscolas técnicas e profissionais, com instituições e leis próprias, a ten dencia à unificação e à centralização se veio desenvolvendo desde 1930. para se tornar fortemente marcada a partir de 10 de novembro de 1937, com o novo golpe de Estado.
Se examinarmos comparativamente os sistemas escolares modernos, num grande número de paises, verificaremos que há certas formas e princípios de organização quase constantes nos mais diversos sis certos temas educacionais. Todos apresen tam, de fato, em conformidade com as duas necessidades fundamentais da sociedade, assimilação e diferen
ciação, duas estruturas hieràrquicamente organizadas: a) uma infraes lrutura de ensino comum, constituída das escolas primárias e, até certo nível, das escolas secundárias, que são destinadas respectivamente a mi nistrar o ensino geral ou comum e a elevar ao mais alto nível, para as camadas selecionadas da população escolar, a cultura geral, sen nenhuma finalidade profisional; b) e uma superestrutura de especia lizações profissionais, sobrepostas à escola primária e ao nível das esco
las secundárias (escolas técnico-profissionais) ou superpostas a estas, neste caso, os sistemas universitários. A preparação para a utilização das técnicas e as especializações em vista de umn oficio ou de uma profis são constituem essa superestrutura à qual, em todos os sistemas, fica subjacente a preparação às assimilações, necessárias elas próprias à vida
social. Uma educaço universal não é sòmente aquela que ministra uma
cultura geral comum e põe ao alcance de todos as suas vantagens, se não também, como observa justamente Dewey, "a que satisfaz à imensa
variedade das exigèncias sociais e das necessidades e aptidões indivi
duais". Nesses sistemas educativos em que, por essa forma, as socie
dades assimilam ou uniformizam para diversificarem, em seguida, en especializações as mais variadas, e, estabelecendo o que há de "gené rico" nos interèsses do grupo total ou da nação, atendem à variedade das necessidades "especificas" dos grupos e dos habitat, verificase ain da certo número de principios comuns de organização administrativa, tais como: a gratuidade e a obrigatoriedade no curso dos primeiros anos de ensino; a divisão do ensino em diferentes ordens, segundo a idade dos alunos e os cursos prosseguidos (ensino primário, médio ou secundário geral, profissional e técnico, e superior), a gratuidade do sistema de subvençöes e de bôlsas no curso das escolaridades secun dária e superior: preparação profissional dos protessores, e a colação de graus, pelo Estado, nos diversos institutos. Mas essa semelhança de
estrutura interna e de principios fundamentais de organizaço não deve fazer esquecer a extrema diversidade de formas que revestem os siste
220
FERNANDO DE AZEVEDo
mas educativos e "a variedade de soluções que trazem os Estados as ques tões de principios que lhes são postas". Amaior parte dos problemas fundamentais de organização pren dem-se à necessidade que se manifesta por toda parte de uma melhor
adaptação da cscola às novas exigèncias sociais, variáveis de um povo
para outro e às necessidades e condiçöes comuns do mundo moderno. Para a solução racional dèsses problemas é preciso preliminarmente
examinar aquestão em que ainda não se deteve suficientemente a aten
c£o dos sociölogos eque é"a distinção entre os hábitos e as tendências
gerais da humanidade e as aptidões e as tendèncias especificas tais
quais são constituidas pelas diversas culturas",
distinção impossivel de
se estabelecer com cdareza senão mediante o estudo, pelo método com
parativo, das relações do homem com o mundo orgâmico e inorgânico,
das relações dos homens entre si e daquilo a que Franz Boas chama "relações condicionadas subjetivamente", isto , a atitude do indiví duo diante das possibilidades que lhe abre ou das necessidades que lhe impõe a cultura da sociedade em que vive. As constantes transforma
cões intrínsecas e extrínsecas dos sistemas educativos mostram
à evi
dência não só as modificações de estrutura ou morfológicas que se têm
operado no sistema social mas a gravidade da crise dsse estado atual
de transição, proveniente do fato de que, não correspondendo mais
às necessidades da vida atual certo número de concepções ideológicas
e morais, foram elas pouco a pouco abandonadas e não foram ainda
substituidas por outros valores universalmente reconhecidos. Certamen
te a intervenção do Estado com que, nos regimes totalitários, se deslo
cou o centro de gravidade do sistema educativo para o sistema escolar público, permite estabelecer ràpidamente uma unidade fundamental
de espírito e de estrutura, soldando, num bloco maciço, a variedade de sistemas e de tipos de escolas. Mas, não sòmnente essa unidade im posta pelo Estado é exterior ao sistema e artificial, como também essa
constelação de escolas, pasando a gravitar em tôrno de um foco (o Estado), num determinado regime politico, nem por isso deixa de sofrer
as influèncias extraestatais ou extrapolíticas, internas ou externas a
um meio social dado. Acresce ainda que, consideradas as relações que articulam entre si os ensinos de diversos graus ou tipos, quaisquer mo
dificações mais profundas nesse ou naquele domínio de ensino reper cutem imediatamente em outro do sistema educativo (1), que mais do (1) £ assim que, como se observa no balanço do movimento educativo em 1935-1936, secundário sem encarar "não se podem tomar, por exemplo, medidasprofissional. no domínio Adonecessidade de achar um escod Gs repercussies que possam ter no domínio
douro escolar para o8 alunos aos quais as porias da escola secundária se fecharam, acar retou uma reorganização das escolas profissionais em certos países". E não fo1 para le vantar um dique contra a corrente para a escola secundária e refrear êsse movimento quÝ
se tem apertesçoado por tôda parte oasistema de seleçao Pro da esCola primária de maneira estimular o interêsse se por têm certosmodificado offcios e os ensinOs gramas
profissionais? Os próprios ezarnes, tão combatidos, não fizeram, apesar disso, a sua
edp
rição na cena pedagóqica, como tratamento de urgencia, para descongestionar ensino secundário? Esses fatos são suficien tes para mostraT a importância do problema das lações entre os diversos ensinos e das repercusBÕes e contrachoques das medidas tomada no sistema educativo. Nas próprias retormas totais do ensino, empreendidas por c países, em relação com a ansformação radical de uma politica geral, muitas nedi sôbre
ioram abandonadas e subat:tuidas por outras, em virtude derepercussóes inesperadas ao
°conjunto ou alqumas I'Educatíon etdodesistema I'Enseignement, 1937 ).de sugs instituições. (ctr. Annuaire
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
221
que nunca "pode ser comparado a um jogode xadrez em que o desloca mento de um peão acarreta uma mudança geral da situação sôbre todo
o tabuleiro".
É esta exatamente uma das maiores dificuldades que se levantam
àorganização do ensino profissional, de caráter industrial e agrícola,
que vem ocupando lugar cada vez maior nos sistemas escolares públi cos, ecujas relações com o ensino primário e secundário provêm da nccessidade não só de se organizar um "sistema de seleção" dos estu
dantes a serem encaminhados a êsses cursos, como também de se dar
uma cullura de base, "destinada a desviar o individuo do estreito ho
rizonte de seu ofício, para o ligar a tais ou quais fins sociais". O desen
volvinento considerável que têm tido as escolas técnicas e profissio nais é uma conseqüência da revolução econômica que, nas expressões
de Dewey, "estimulou a ciência, submetendo-lhe problernas a resolver,
despertando mais respeito intelectual pelas aplicações mec£nicas e
abrindo, portanto, às ocupações industriais um campo infinitamente
maior emais largas possibilidades culturais do que as que jamais tive ram. A necessidade, acrescenta, de uma educação capaz de fami liarizar os operários com as bases científicas e sociais de suas profissões,
torna-se imperativa, pois os que dela são privados se degradam ao ní
vel de simples apndices das máquinas". A vontade geral, observada, por tôda parte, de racionalizar o ensino técnicoe profissional, esbarra,
no entanto, em grandes dificuldades que se acusam fortemente nas suas reformas sucessivas e entre as quais se podem enumerar: a) a defi
ciência de estudos sôbre as relações entre o maquinismo e o mundo do
rabalho e os problemas que suscitou o trabalho mecanizado; b) a cons tante mudança técnica que é a própria esncia da revolução indus
trial, em virtude das continuas invenções; c) a mobilidade e a flutuação
de oficios e profissões ligadas ao trabalho necanizado,
mobilidade
essa determinada por fatôres técnicos, econômicos e sociais, e mais acen
tuada em sociedades novas; d) os conflitos entre as exigèncias da espe
cializaço
e as de um ensino de cultura, que tenha por fim não
elevar o oficio ao nível da cultura, mas penetrar os diversos ensi
nos e especializações. Mas, por mais considerá£vel que seja o desenvol
vimento do ensino técnico no interior dos sistemas escolares públicus,
a riqueza do aparelhamento material que exigem certos tipos de ensi
nos profissionais, os progressos do sistema corporativo ou sindical e a necessidade, para essas escolas, de contato mais íntimo com os meios
profissionais interessados, parece tenderem a deslocar a aprendizagem
puramente técnica e profissional, da esfera dos sistemas escolares públi
cos para a dos sindicatos e das fåbricas, em que já certos nucleos de
condensaço dessa espécie de ensino assinalam, no horizonte educativo, os novos pontos de orientação.
De todas as instituiçöes que integram o sistema educativo, a que tem sotrido mais violentamente o conuachoque das transformações so ciais, econômicas e politicas, é talvez o ensino secundário. Ainda recen
222
FERNANDO DE AZEVED0
temente, na resenha do movimento escolar de 1935-1936 (1), observava. se que, nesse periodo, foram tão numerosas como no ano anterior as
reformas de estrutura dêsse ensino (número de anos de estudos, divi.
sões e seções) e de programas emétodos. Representada gràficamente, essa estrutura interna do ensino secundário, como se assinalou nesse
relatório, "apresenta duas dimensões: uma dimensão vertical (núnmero total dos anos de estudos, separados em divisões inferiores e superio
res e uma dimensão horizontal, comportando quer estudos comuns
a todos os alunos (bacharelado único), quer especializações oferecidas por várias seções paralelas (bacharelado clássico, moderno, cientiico.
etc.)". Ora, o fato de não apresentarem uma tendência nitidamente de
senhada tôdas essas modificações tanto verticais como horizontais, vol tando alguns paises a estruturas que haviam abandonado e reforman do outros, ao mesmo tempo e em sentido oposto, aorganização do seu
ensino secundário, mostra claramente a "permanência de uma inguie
tação no ensino secundário". Essa inquietação prende-se a três questões
aque não se deu ainda uma solução conveniente: 1) a questão da adap.
tação reciproca das estruturas do ensino secundário e dos ensinos pri mário e profissional; 2) a questão de se saber se o ensino secundário
deve ser uno e igual para todos ou múltiplo (diversidade de categorias de escolas secundárias, ou diversidade, por meio de ramificações, - bi
furcação, trifurcação ou quatrifurcação, etc.,
nos últimos anos, sôbre
uma base comum; 3) e a questão do humanismo clássico e moderno. Essas três questões, tão diferentes na aparência, reduzem-se, em última
análise, à crise que estabeleceu, a tendência ao "especialismo" e à divi são do trabalho, em conseqüência do progresso científico e que deter minou uma ruptura com o ensino secundário tradicional, de tipo clás sico. Trata-se de saber, no fundo, se o ensino secundário, que tem por geral co função desenvolver em extensão e profundidade a cultura atual, um época na mum, iniciada na escola primária, deve ministrar, combinar caso, como devem tipo de ensino igual para todos, e, neste(predominância do ensino lite se, no curso, as matérias fundamentaisclássico ou moderno); ou se deve rário ou cientifico; do ensino literário um comço de especialização ser um ensino de préespecialização, ouparalelas de escolas secundárias de estudos, pela variedade de seções com diversifica nível, ou por uma escola secundária comum, até certo ções ulteriores.
das ciências na formação do espírito foi, em Essa questão da parte das letras e Deputados, na França, por dois grandes ora 1837, levada à tribuna da Câmara dos a organizar para os estabele programas dores, Lamartine e Arago, a propósito dos que investiu contra as Lamartine poeta secundário. O cimentos públicos do ensino da educação integral, voltou à tendências à especialização e defendeu a causa Portraits, t. III) sôbre questão numa página verdadeiramente bela (Souvenirs et homens que não sabem fazer senão "o preconceito dos homens especiais, isto , dos "essa mutilação do homem", chama uma sÑ coisa" e contra aquilo a que éle de que não se tratava
cspeialização. Ume outro, porén, insistiram sóbre ésse ponto
Publications du (1) Annuaire International de l'£ducation et de l'Enseignement.
Bureau International de l'Education. N,° 56, Genève, 1937.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
223
de estabelecer una preeminencia dos estudos literários ou científicos, mas o con curso e a harmonia, de mancira a "cvitar (as palavras são do sábio Arago) a grande desgraça de se chcgar a estabelecer um divórcio entre os dois ramos que s£o destínados afortalcccr-se motuamente". A questão continuou a ser debatida durante um éculo, em quc o cnsino sccundário francês passou por sucessivas reformas (1832, 73. 82. 91. 1902. 25 e 20), c ainda hoje não se pode dizer que tenha tido uma soluçáo racional. o ensino secundário guardou, nesse país, scu caráter clásico; mas, depois de res
taurada a unidade do bacharelado (1902), a primeira parte do ensino, cindida então cm 4 seqõcs (latim grego: latim-ciências; latim línguas: ciênciaslinguas). comporta hoje três scçÑcs paralelas: latim-grego - cièncias; latim-linguas vivas
ciências, e dèncias
linguas vivas, em que, como se vÁ, se tornou preponderante o papel das ciências no ensino secundário. A Suécia, a România, o Egito e outros países adotaram regime
semelhantc, fragmentando o curso em dois graus ou ciclos de estudos e dividindo o
scgundo grau, geralmente de dois anos, em duas seções (letras e ciências), em três
(letras, matemáticas e iências) ou em maior número:e no Brasil, o curo secundário,
segundo a rcforma Francisco Campos, constituiu-se de dois ciclos, fundamental de 5
anos, e complemen tar de dois, dividido êste último em quatro seções paralelas, com
um caráter marcado de pré-cspecialização. A organização alem comportava váios moderno, oientifico, e o popular ou nacional) até o regime nacional socialista. segundo o qual foi prevista, senão realizada, a redução dessas escolas a um número menor ou a um tipo único sôbre o modlo da Deutschobersch ule, como a escola tipos ou categorias de escolas secundárias (e, entre êstes, o tipo clássico, o literário -
secundária genuinamente nacional.
Mas, admitamos que a educação secundária (ensino médio), ten do por função desenvolver uma cultura comum, literária e científica, e ministrá-la aos indivíduos mais bem dotados intelectualmente e recru tados por um determinado sistema de seleção, deva ser uma "educaçio humanística" por excelência, como um substractum e base comum a
tÙda especialização profissional ou científica. Afirma-se, e não sem fun
damentos, que essa formação comum, sólida e intensiva, é a melhor
preparação para os estudos superiores, profissionais ou não, e constitui
o meio mais eficaz de soldar pela base todos os grupos profissionais em que se seciona a sociedade e reduzir, por essa forma, os inconvenientes
e perigos da especialização. Parece, de fato, do ponto de vista socioló
gico, que, sendo a unidade do grupo, como um todo, um dos fatos fun damentais da sociedade, quanto maior a divisão do rabalho, tanto maior a necessidade de estender e aprofundar a comum em que tem de repousar a diversidade de carreiras e cultura profissões intelectuais, dominantes no grupo (povo ou nação). O latim e a literatura latina foram, sem dúvida, em certa época, os fundamentos dessa cultura hu
mana (humanidades clássicas) com que se procurava não só a forma ção do espírito literário e do espírito critico, mas aprender o que há de permanente e essencial e, portanto, universal no homem, servindo para a sua identificação através do tempo e do espaço. A lingua latina, lingua geral, como vimos (v. cap. anterior), na Idade Media e na Renascença, era apenas um "meio"" para um "fim", e, pouco com a redução do campo em que o latim era praticado comoa pouco, viva, e com o extraordinário desenvolvimento das ciências e daslingua lite raturas modernas, o que devera ser apenas instrumental se tornou final eo estudo das humanidades passou a identificar-se, através do tempo, com a lingua e literatura romanas. Ora, se por humanismo se a confiança na razão e o espirito critico, o senso da medida, aentende clareza
FERNANDO DE AZEVEDO
224
e aprecis£o, a sociabilidade e a humanidade, c, afinal, o cquilibrio
entre a "ciência" e a "sabedoria", o essencial, observa justamente Cres.
son (1), é bem menos o que se estuda do que a maneira por que se cs.
tuda, e os estudos literários, clásicos ou modernos, e cientificos baverá alguma coisa de mais tuniversal do que a ciência?) podem uns
e outros (2) servir como meio para atingir ésse tim, desde que utiliza
dos como simples ocasião para o trabalho de observaço, reflexão, crf. tica e contrôle pessoal, e disciplina do gósto e da razão. Eis como cor
tar, diz Cresson, a maior parte dos grandes debates que se travam entre
os partidários dos estudos clássicos tradicionais pelas linguas antigas.
os dos estudos modernos pelas línguas vivas e os dos estudos exclusi
vamente ou ao menos principalmente cientificos, e que se reduzem à
grande questão do neo-humanismo, de tão alto interêsse para o ensino médio como para o ensino universitário a que serve de base em todos os sistemas.
Entre os Entretiens ou pequenos congresos, promovidos pelo Instituto Inter
naional de Cooperação Intelectual, o que se realizou em Madrid, de 3 a 7 de maio de 1933, sob a presidência de Mme. Curie e com a participação de sábios historia dores, filósofos, escritores e artistas, teve como objeto principal: o futuro da cultura.
£sses debates e as suas conclusões são do mais alto interèsse para a compreensão do problema a tôdas as luzes e sob os mais diversos aspectos. Entre os perigos que
ameacam a cultura se sublinhou o desenvolvimento excessivo da ciência com a especialização, sem dúida inevitável, mas forçada, levada aos últimos limites, e a faíta de um ideal coletivo, claro e definido, que possa agir sôbre a totalidade dos
homens. À observação de Garcia Morente de que as massas continuam inpermeáveis
a0s resultados intelectuais do progresso cientifico, respondeu Jules Romains que "èsse
alheamento das massas em relação às conquistas intelectuais" foi de tôdas as épocas,
e não constitui obstáculo ao desenvolvimento da cultura. Alguns, como Miguel de
Unamuno, declaram com ceptiismo não saberem o que écultura, outros como Orestano,
entrentando o problema, procuram defini-la. Para êste, o alargamento do habitat humano, a transformação èsse habitat em um sentido humano e o enriquecimento ecultura. a valorinção do homem interior, constituem as fases essenciais da cvolução da Os povos, como os individuos, podem ser criadores ou portadores de cultura. No entanto, para Vigo Broendal, que tem sérias dúvidas sôbre a possibilidade de
uma civilização única e universal, as diferenças de mentalidade dariam sempre tons diferentes à driliação de cada povo ou de cada raça. Reconhece, porém, na civilização ocidental as suas res grandes tradições que a Europa e os povos da mesma civilização poderiam cultivar: a) o culto da inteligência pura herdado dos gregos: b) o direito radonal provindo dos romanos; c) eo sentido profundo da vida interior e da missão a cumprir, caracteristico da tradição judaico-crist. O comité reunido em Madrid, sob
os da Sociedade Nações, está éde ìntimamente parecer que "oligado futuroaoda desenvolvimento cultura, mesmo no auspicios interior das unidades das nacionais, désses elementos universais que, por sua vez, dependem de uma organização da humanidade, como unidade moral'e juridica", e preconiza "a organização e a exten (1) A. CRESSON - L'éducation humanisante et les préocupations artificielles, in Revue
de Metaphysique et de Morale, pág. 296, n.° 2, Avril, 1938.
(2) Não há, de fato, ciência senão do "geral'", e a razão 6 essen cialmente um instru
mento de conhecimento científico. Ela tende invencivelmente a generalizar e, sob O.qu passa. a pesquisar o que flca. Épor isto que, sob sua poderosa influência, pondera Victo
Girqud, a arte clássica, ainda que observando e represen tando os franceses dos os XVII, pintar o homen en o geral, que é dedaStodos os tempos e faz, de atraves ves paises;fotelalevada insstiua tão fortemente sôbre que, aodespeito diterenças locais,
dos Beculos, a unidade fundamental da espécie humana, que nessa imagem de sl nes Be reconheceu perteitamente a humanidade de todos Os tempos'". Tem-se pensado,ciências, ddemu o sôbre o interêsse educativo e profundamente humano teria, no ensino das
estudo das grandes descobertas e das grandes correntes ou movimen tos do Pensuae humano?
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são a todos de uma cultura largamente humana, fundada sobre a iniciação ativa às
diversas disciplinas eao método ientífico, - em particular para o alargamento que
esa iniciação produz na concepção geral do mundo, - e sbbre uma orientac£o progressiva em que se levem em conta as aptidQes individuais, sem espeialização prematura".
As transformações por que vem passando a sociedade invadida pela técnica, numa civilização marcadamente industrial, não podiam
deixar de influir sôbre as Universidades, suscitando novos problemas
ercanimando velhas questões de organização de ensino universitário.
Entre estas, a principal que se formulou é a de saber qual a parte que
se devia atribuir, nas universidades, àciência pura e à ciência aplica da, e se deveriam estas ser separadas, - constituindo a pesquisa objeto
de institutos especiais e reservando-se às faculdades o ensino da ciência de aplicação prática edas profissões de base científica, - ou reunidas no mesmo sistema e ainda nas mesmas escolas de tipo universitário.
Certamente, o objetivo da ciência deve ser a descoberta; e, se, por um
lado, é discutível a finalidade de uma ciência que ignora a técnica e
não tem aplicação prática, por outro lado, pergunta Charléty, que valor pode ter uma técnica que ignore a ciência? Na realidade, respon de êle, a técnica e a ciência não poderão viver àparte uma da outra, Luma vez que os seus progressos são interdependentes. Mas, como tôda
a instituiçao social, uma instituição universitária não pode ser com
preendida senão através de sua evolução histórica, e, portanto, do meio e da época a que serviu e das fontes de energia de que se alimentou e
que lhe deram, com o impulso, uma deternminada direção (1). As Uni
versidades que existem há mais de mil anos no mundo ocidental, sem pre como instituições prepostas ao "ensino superior", preponderante mente filosófico-teológico na Idade Média, em que essas instituições
"respiravam uma atmosfera carregada das doutrinas de uma igreja uni
versal", e filosófico e cientifico no século XIX, tomaram sem dúvida um caráter mais científico e técnico nos tempos modernos. Estabeleci
das num mundo em constante evolução, as Universidades tinham de forçosamente transformar-se, sob a presso
das necessidades especiais
e das aspirações mais profundas da sociedade de que fazem parte, mas sem perderem o seu caráter essencial de instituições de ensino superior que procuravam, desde as suas origens, constituir-se "um ciclo con pleto de estudos", acentuando o ensino dèste ou daquele ramo de co
nhecimentos (especialização) conforme o tipo de cultura e as tendèn
cias dominantes na época. Ainda nos séculos XII e XIII, se Paris bri (1)
Essa separação a que aludimos aparece fortemente acentuada por ermp
na
França, com a decadência da universidade desde o seculo XVI, o lorescimento das Grm des de o antigo Collége du Roi (1530 ), hoje Colegio de França. a Escola da Minas e a de Pontes e Calcadas. entre outras, fundadas com de o tim de suprit aa acna do enano tradicional das velhas faculdades, ministrar o ensino linguas clêncts at entto goo radas pela Universidade, favorecer a pesquisa cien tiflca preprr peasoal cpzirisa da atender ao serviço público. "A medida que declinava o preatgio dasumUntversidades. a esse propósito Charlóty, acentuaram o seu predominio as escolas thácnius, velhas
novas.
tais cono a Escola Normal Superior e a Escola Politá cnica". Com rgnizaçao o retlo rescimento das Universidados, no sáculo XIX, o ensino superior em Frnqa contunuou a
processar-se nas expressÖes de Charlety, "por dola sistemas paralelos da inatituiçes. tornandos êssa paralelsmo, ainda hoa, cura terfstico predoninante da instruço superior francesa.
as Universidades e as grandes Escolas,
FERNANDO DE AZEVEDO 226
Ihava pelo ensino teológico, graças a Guilherme de Champeaux e a
Abelardo, em Bolonha e Orléansestudava-se particularmente o direito, e a especialização em medicina se fazia em Montpellier que recollheu, no Mediterråneo, a herança das tradiçöes médicas dos gregos.
Oensino universitário aparece-nos, como se vê, na sua evolucão.
integrado por essas duas funções essenciais: 1) a transmissão da cul.
tura (studia generalia) e 2) oensinodas profissões ou a especialização, segundo uma tendência que remonta às suas origens e já se maniles tava em Montpellier, donde sairam os maiores médicos, ou em Bolo
nha, onde se formaram os grandes juristas do tempo. Mas com oextra
ordinário progresso científico, nestes últimos cem anos, as ciências ti
nham de passar como passaram efetivamente ao primeiro plano, no
sistema universitário, quer pelo desenvolvimento do ensino daciências ciência pura e da pesquisa cientifica, quer pela maior ênfase dada às
e aos principios básicos que são parte essencial da preparação profis
sional (medicina, direito, engenharia, agronomia, magistério, etc.). As
Universidades modernas, pois, não sòmente são responsáveis pela con
servação da ciência, mas tendem a constituir-se em focos de progresso
cientifico, pela pesquisa desinteressada, "associando as funções didáti
cas com as investigações e mantendo em intimo contato, uns com os
e os outros, os que se dedicam às investigações básicas (ciência pura) entregam àpesquisa aplicada". As próprias indústrias têm veri que ficadose ser lucrativo auxiliar por tôdas as formas as pesquisas, e as Universidades se convencem cada vez mais do alcance social e prático
ordem prática, de onde das investigações, pois tôdas as descobertas decondições de vida, resul nasceu o melhoramento material das nossas mais especulativas, abstratas taram de investigações, em aparência, as outro fato, senão pelo alar e desinteressadas (1). Não é também por das profisões, que se gamento das bases e dos princípios científicos escolas profissionais e multiplicaram, nos sistemas universitários, as ou à preparação de técnicas, destinadas à especializaço profissional sociedade atual, nos vários do profissionais capazes de que precisa a porém, quais forem as formas Universidades mínios de atividades humanas. Sejam, étríplice a função das que parece revestir, posSsam pclo en que e os progressos da ciência, de modernas: l) assegurar a existéncia pela formação de novos homens e cientifica investigação 2) ciência; difundir a sino, pela ensinar, criar e ciência, ou, por outras palavras, ja, nas expressões de Charléty, organi ou se riar uma cultura comum do conhecimento e da pesquisa multiplicidade infinita a unificar zar e técnicas e profissionais. Essas escolas pelas profissões, e 3) ensinar as moderno", lida na Con Uníversidade no mundo "A função da 1937), o prof. GEORGE F. a 28 de julho dea educação profissional em (1) Em sua conferéncia (26 Superior Ensino de separar Internacional de institutos ferência não se deve ponto de vista de Universidade e a outra, a cargo ZOOK defende o da princípios básicos, uma ficaria a cargo níveis de Universidade. As ciências e os todos duas fases das qua1s da sagrados en jun tos estar tecnicos fora dos confinsaplicacões práticas, por outro, completam-se devem um edifício. Uns tra e as suas sustentam A CONANT, alicerces POr um lado, assim os (ctr. J. BRYANTsetenbro do l930, eaucaCao profissional; intearantes de um todo'", unciada de partes 18 a fato, de pron 0, conferéncia doa cutros, superior ng Frana: Estados Unicos. CHARLETY. A tinalidade da educação Giçao universitaria nos
G. na Universidade de Harvard: Madrid, 1900) J. ORTEGA Y GASSET, La Misión de la Universidad,
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funções que se combinam, em proporções variáveis, de uma Universi periodo de sua evolução, têm feito dessas instituições verdadeiros reser vatórios de que se alimenta a vida intelectuale científica e grandes centros de cultura em que se prcparam as elites dirigentes, profissio dade para outra, ou, na mesma Universidade, de um para outro
nais, sociais e políticas dos povos modernos.
A função que hoje desempenham as Universidades em que, no século XIX, lutaram por ser reconhecidas e obtiveram lugar perma
nente as ciências fisicas e naturais e, atualmente, as ciências sociais, é.
pois, cm essencia, a mesma da Universidade, na Idade Média, em que o fator preponderante da vida universitária foi a filosofia de Tomás de Aquino. Ao lado da "especialização profissional", praticada em
maior escala, tinha de ganhar terreno, nas Universidades modernas,
a "cspecialização cientifica", imposta pela complexidade crescente do
saber humano e pela necessidade de limitação metodológica no traba lho do conhecimento. É que, instituições em evolução constante, as Universidades, no seu processo de adaptação às alterações fundamen
tais que sofrem as sociedades, transformaram-se e continuarão a trans
formar-se, não só quanto aos seus aspectos morfológicos, como tam
bém quanto ao sen tido e ao conteúdo da cultura que são chamadas a
trans1mitir eque varia de uma época para outra e mesmo, dentro de certos limites, de nação para nação. As Universidades, porém, não estão apenas em transformação, mas ameaçadas pela negaç+o do principio
intelectual e também, portanto, do princípio moral, da razão e dos
valores espirituais, negação essa que se pode considerar um dos traços essenciais da crise do mundo moderno. As causas politicas, econômi cas e técnicas que produziram "a crise das elites, t£o grave para os intelectuais como para töda a sociedade da qual èles constituem uma verdadeira armadura, não podiam deixar de repercutir profundamen
te sôbre as Universidades, deixando-as hesitantes söbre as diretrizes a que tendem a diminuir o papel da inteligncia e a depreciar o traba lho do espirito, considerado fàcilmente como un luxo, se acrescenta Seguir na sua reorganização e nas suas reformas. E, se a essas causs
Tem a tendència a opor, como se fôssem incompativeis, as tradiçies para a conquista da Universidade e a sua uilização como "instrumento
nacionais e a concepção universalista de cultura, e a luta dos partidos
politico", ter-se-á o quadro completo das dificuldades com que tem de
arrostar, no mundo atual, para assegurar asua existència e os seus pro
gressos. Mas, qualquer que seja a preponderåncia que possam asumir, las Universidades modernas, as duas especializações, cientifia e pro fissional, tão diferentes entre si, elas guardarão sempre a sua influèn
cia tradicional se se revelarem capazes de criar, no novo ambiente un versitário, o clima favorável ao desabrochar da flor da cultura humana
e universal que, nas expressöes de Arbousse Bastide, "permite não li
mitar o saber às suas aplicações técnicas, mas extrair do rescimento
do saber (science) un aréscimo de sabedoria (sagesse) e que é válida
paratolas as sociedades que atingiram certo grau de desenvolvimento".
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Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO 228
PROBLEMAS E DISCUSSOES
atua sóbre èle tende a 1 A rigor. "como o indivíduo é uno e tudo que a instruco modificá-lo em sua totalidade", as medidas tomadas para The eassegurar e a s tendncias sentimentos lembra Claparède, irão repercutir SÐbre os Seus com a comnl
trabalho intelectual. Mas, educacão moral influirá também sôbre o seu instrução, educação e preservação (higiene xidade crescente da função educacional, tendem a separar-se, na prática no fisica e mental) das crianças e adolescentes ésses problemas de organizacão ed. diversos órgãos e instituiçõcs sociais. Examinar bem postos por Claparède: acional relativos àpreservação, instrução e educação, tão maneira que se harmonizem como deve ser organizada a educação de desideratos e a instrução seja uma ocasião de ação educativa: ésses diversos
um tempo limitado. b) em que medida é isto posível, na escola, comclementos, instrucão e dois êsses dosar e em que proporções é necessário valor social: educação, para fazer da criança um harmonização
que melhor permitem a ) quais os meiose as instituições preservação (mais perfeita adaptação da escola da educação, da instrução e da escola e da familia, escolas ao ar às condições da vida social, colaboração da
escolares, etc.); livre, coeducação, excursões pedagógico e social e das solucões No estudo dessas questões, de seu alcance do sistema educativo brasileiro, as estado atual dificul propostas, ter sempre em vista o as possibilidades que abrem ou as serve, que a meio do espeiais condicões problemas de organização, as tentativas
prática dêsses dades que levantam àsolução resultados. seus feitas nesse sentido e destina-se a à base do sistenma cducativo, 2. A escola primária, que reside intelectualmente aptas, "sejam
escolar (7 anos) e distribuição receber tôdas as rianças em idadenascimento, de crenças, de fortuna, de primária. de escola quais forem as suas condições fundamental da organização para a regional". Éde importânciasociológico, a sua função dentro do sistcma em que teve examinar, do ponto de vista por fim: indispensável um minimum de cultura comumn, em cursos a) ministrar às crianças grupo nacional, unidade e, portanto, do social coesão e unidade culturais à mais) com o nível e as exigénciasobrigatorie a de duração variável (4, 5, 6 anos ou secundário: extensão do ensino de cada paíse a maior ou menor finalidade de ensino comum; dessa dade e a gratuidade decorrem e especia em conseqüência, para as diversificações a aspecto, êsse b) assimilar e unificar, sob e profissionais; c, e social mas lizações ulteriores, nas escolas técnicas pedagógico, alcance, não só a escola grande tem que escola primária semelhantes uns aos outros, nacional - tornar os indivíduos constituem, nas organizações escolares, nível, certo até menos ao secundária, um "sistema de integração e de assimilação"; as suas capac a todos, "para manifestarem biopsicológica sondagem c) oterecer igual oportunidade constitui o periodo de
dades, pois a escola primária encaminhá-lo depois para onde o predis e indivíduo o observar que permite ponham as suas aptidões". em quc rural ou marítima)desviar de (urbana, região Aescola primária, seja qual fôr a especial; e seria educacionais, esteja instalada, não deve preparar para nenhum trabalho todos os sistemas entre nós,
sua finalidade a escola comum em que se baseiam
como o que imprimir-Ihe qualquer caráter de especialização, escola primária,
várias vêzes,
no camp0, na roça ou Analisar
se pretendeu dar å escola rural, fazendo da escola de casta".diferentes nos uma escola de trabalho agricola "um sistema fechado,dauma especialização cscola primária cada um désses pontos à luz e em face da estrutura tôda a como JÚNIOR, in
sistemas educativos, europeus e americanos, e mostrarA.
ALMEIDA
E. (v. se opõe ao espírito e aos fins da escola primária págs. 202-206). 1936, 1935 Paulo, Anuário do Ensino do Estado de S.
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8. A reorganização do ensino técnico e profisional, de acôrdo com as novas
Cxigências da indústria necanizada, prende-se fundamentalmente às questões de importáncia primordial: 1) quais os efeitos do trabalho mecanizado söbre o trabalhador, no que concerne às condições físicas, fisiológicas, psicológicas e sociais; 2) qual o processo natural de adaptação do trabalhador ao trabalho mecanizado e 3) como o
trabalhador adquire as qualidades técnicas e profissionais reclamadas para a execução
de seu trabalho mecaniado. Proceder, pois, a estudos e a pequias, com o fim de conhecer: a) os efeitos do trabalho mecanizado sóbre o trabalhador: se o uso da máquina implica mais automatismo que o trabalho puramente mecânico, e
em que medida o maquinismo produz a intelectualização do trabalho humano,
transferindo às máquinas os trabalhos puramente automáticos;
b) como o processo de adaptação pode ser favorecido por certas medidas tais como, por exemplo: a seleção; a orientação e a reeducação profissionais; a
informação técnica do trabalhador: o estudo do meio no qual o operário deve trabalhar; oajustamento dos métodos de trabalho, etc. c) em que medida e como o maquinismo afeta as qualidades técnicase
profissionais exigidas do trabalhador moderno, a duração dos seus lazeres,
estabilidade e asegurança do emprgo; como o trabalhador adquire as quali dades técnicas e profisionais exigidas para a execução do trabalho mecanindo (regime de aprendizagem nas fábricas; escolas anexas às indústrias; escolas técnicas e profissionais), e em que medida as escolas dse tipo, particulares e públicas, contribuem para a preparação profissional para o trabalho mecani
zado (1). 4. Analisar os problemas de orientação profissional e. correlativamente. o esfôrço para adaptar o número de estudantes às profissões e carreiras a prover. "notando-se que, seja qual fôr a maneira por que a orientação profissional é prati cada, não poderia chegar a encerrar o estudante numa especialidade". O cuidado democrático em respeitar a pessoa, observa Monod, e o empenho do Estado totalitário (comunista, fascista) em formar a consciência do proletário ou do partidário, tenden a dobrar o ensino profissional de um ensino de cultura, destinado a desiar o
individuo do estreito horizonte do ofício, para oligar a tais ou quais ins sociais. Examinar particularmente:
a) "em que medida êsse ensino de cultura pode. nas diferentes etapas da
escolaridade, conservar o mesmo objeto e pariipar da mesma inspiração:
b) como a cultura geral e desinteressada pode. sem descair e sem se
falsificar, penetrar os diversos ensinos e revelar às conscièncias o ideal humano que ela traz em si; c) se a escola única implica forçosamente monopólio ou, organiando-se num quadro de ensino de Estado não monopolizado, deixa, como o sustentam
seus partidários, subsistir uma verdadeira liberdade". (G. MONOD).
É êste, como lembra o mesmo autor, um novo aspecto dos problemas disimula dos sob a rubrica da escola única e que, no fundo, se reduzem ao problema esenial da escola ou antes da cultura única.
5.
Abordar e examinar a questão das "humanidades" ou do humanisno num
espirito objetivo e não de controvérsia. Essa questão é particularmente interesante para a educação secundária na França, a mais antiga herdeira, entre as naçoes da Europa, da tradição clásica e entre os povos cuja lingua se originou de Roma e que se pretendem co-herdeiros da tradiçio romana. Para estudá-la, colocando-nos num ponto de vista imparcial, é preciso deter-nos nos seguintes pontos exeniais: a) 1 noção de humanismo, palavra enu que hå. iniial e expiatamente, "homem' e "hunmano": o humanismo é aquela cultura que. pela riqueza de seu conteúdo humano, isto é, pelo que apresena de esencial e permanente, nos permite fazer penetrar um pouco de eternidade, de univeralidade, em
nossa efèmera concepção de natureza humana; ou, por outras palavras, é a
(1)
v. Questionnaire rélatit au problème du machinisme dans le monde moderne.
(L'adaptation de la mecanisation aux conditions du travail humain ). Prépare par llnstitut de Coopération Intellectuelle et le Bureau In ternational du Travail, Juin, 1936.
FERNANDO DE AZEVEDo 230
cultura que, desenvolvendo o espírito crítico e o gôsto das idéias e principios gerais, nos permite ver mnais claro e mais longe e descobrir um horizonte mais vasto;
as cienque pode revestir o humanismo: tódas jdiarden b) as formas convenientemente fornecer matérias, podem ensinadas literárias, tiicas ou bem pensar, afazendo-nos a "coS, métodos de trabalho e guias depara universal dentro de nós, e a ser "humanos" que há as com o próximo pclo ver coisas subspecie aternitatis"; há. pois, os homens e a
nas relações comcdássico, nco-humanismo e um humanismo moderno. va mhumanismo conteúdos e aos seus métodos, com o clima histórico de cada quanto aos scus poca; identificar a causa do humanieme ) não épossível, em conseqüência, de o que importaria numa estreita concepcão com a das humanidades clássicas, Renascenca na e Média Idade na humanidades, bumanismo: se os estudos de duas literaturas grega e latina (huma. até o século XIX, tiveram por base asgrandes mestres da experiência humana nismo clásico) e, por inspiração, ossòmente "admitir a possibilidade e aceitar no (huma. que foram os antigos, épreciso de formas novas de humanidades realização a preparar ajdéia, mas línguas as e letras e científico) de que as nismo novo ou moderno, literário alimento e a matéria". antigas não seriam mais o animado do "mesmo espírito liberal, desin o ensino, de fato, pode ser ainda cultural", que foi o do ensino secundário teressado, verdadeira e profundamente reorganização dentro dêsse grandes dificuldades para sua que não vê outro "veículo" clássico. Mas surgem trêsconcepço estreita de humanismo clássicas moder espírito tradidonal: 1) a e o grego, quando as literaturas em geral, têm latim o senão humanidades ciências, para as e italiana, etc.), como asmais ricas em "conteúdo nas (rancesa, inglesa, espanhola são e educativo eminentemente Shakespeare, Cervantes, também elas, um caráter latinas (cfr. as obras de Dante, eliminar do seu campo as que de real humano" do universal, é ter um caráter o Racine, etc.) e o próprio das iências concentrar o pensamento para apanhar e acessório detalhe noção aidente, a entre tudo que é freqüente, e às vêzes acirrada,
essenciale ver melhor; 2) a oposição (nacionalismo) de cultura: os a noção particularista homens de seu tempo, mais universalista (humanismo) e latinos, que através dos antigos, gregos e sobretudo consignaram os resultados de suas pesquisas nos livros estudaram o "homem eterno" e
menos nacionais, do seu tempo e do seu meio, eram os "prus menos foram isto por nem êsses então que deixaram, linguagem moderna; os romanos, e da técnica que, inva especialização para nos exprimirmos em reivindicações da
3) e as comprometem se não supri sianos" de sua época;ameaçando ensino de todos os graus, o e sociedade a dindo humanística e os interêsses da cultura."profissionais", mem o cuidado da formação tipos de sôbre alguns dos diversos região pesquisa uma a do país) e a sua Proceder 6. Paulo (ou de outra pública S. de superiores ou particular, escolas por tormados da vida social, quadros nos aproveitamento distribuição ou verificar: engenheiros, médi no Estado, com o fim prinipal de profissionais (advogados, prepararam, ese de percentagem qual se a) qual a exercem a profissão para aem que etc.) proféssores, seguida a experiências cOS, formados ouexclusivamente de depois ou acuumulalogo exercê-la, começaram a profissão; em outras atividades estranhas a essa para tivamente com outras atividades acessórias; sua profissão de desviaram flutuação b) qual a percentagem dos que se para êsse "desvio" ou essa profissiode outras e quais os fatôres que contribuíram profissional; formação "nível social" (concorrénia de profissional mobilidade ou formudanças do meio; que se nais em desproporço com as necessidades escolha para profissão nas diversas profissões, deslocando individuos da êrro originário na defeitos lurativas; maram, para outras mais qualificadas ou profissional, decorrente defixaramn; de profissões; insuficiència de preparação atividades em que se formados de "organização" das escolas especiais, etc.) e astotal de profissionais ligadas às ) em que proporção relativamente ao atividades públicas entre tal ou qual data, foram admitidos às
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quais
prepararam, qual o processo dêsse recrutamento e para que sedessa asprofissQes causas principais afluéncia de profisionais para as funções públias;
e no pró d) e. finalmente, a existência e a organização, no meio socialprofissional, orientação educativo, de instituições de seleção e prio sistemaa orien destinadas tar os individuos na escolha das profissões e a canalizá-los para as carrciras que elegeram c para as quais se prepararam. método de Para a realização dessa pesquisa é preiso preliminarnente, como nas formados "profissionais" dos levantamento ou trabalho, l) proceder ao censo associa dados nas recolher 2) oficiais; dados segundo e período certo em (ordens de advogados, associações médicas, etc.), nas repartiçies públicas escolas, cões de classe
e emprêsas particulares; e 3) obter informações dos próprios profissionais, mediante
questionários e contato pessoal estabelecido por meio de endereços fornecidos pelas escolas, colhidos em listas telefônicas, ou em indicadores profissionais, etc.
7. Nas palestras (Entretiens) rcalizadas em Madrid, en maio de 1933. por iniciativa do Instituto Internacional de Cooperação Intelectual, foi discutida por
sábios, pensadores e artistas, uma grave questão: o futuro da cultura. En tre os perigos que ameaçam a cultura, consideraram-Se, como os mais sérios, a especialia ção prernatura e exagerada, o desinterêsse das massas pelas coisas do espírito, o
enriquecimento material e opredomínio dos problemas práticos, a superproduçn
intelectual, de baixo nível, e a "estandardização da vida", tendente a uniforminr
os indivíduos. Analissr e discutir as seguintes dentre as conclusões às quais chegou o comité e que interessam de perto à organização do sistema educativo: a) estando o futuro da cultura ligado, em primeira linha, à sorte dos
indivíduos mais bem dotados, "é de tôda import£ncia estudar os meios de
recrutamento e de seleção dos jovens destinados à cul tura, a fim de melhor
assegurar a descoberta e o desenvolvimento dos talentos naturais". (Conclusão
n.° 6);
b) "o futuro da cultura está ligado a certas condiçôes das quais algumas
das mais importantes são: 1) o esförço criador de uma elite de espiritos que imprimem aos produtos do pensamento humano um valor e uma qualidade supremas; 2) a maleabilidade e a diversidade das formas de vida que, permi
tindo o livre jögo das iniciativas originais, evitem os perigos da uniformidade: 3) uma pelo organização do da trabalho queradical corrijaemostòdas defeitos da inevitável especia lização, sentimento unidade as produções do espirito". Analisadas essas conclusões, examinar, à luz dos debates do comité, em que
medida o sistema educativo brasileiro tem contribuido não só para transmitir e difundir, mas para criar cultura, e quais as medidas, instituições e refornas neces sárias para proteger a cultura contra os perigos já indicados e outros decorrentes das
condições especificas de nosso meio social (como sejan, a insuficiència do sistema universitário, ainda em organização, o isolamento em que vivem os Estados, desniveis culturais e econômicos, preeminència dos problemas de valorizaçio do território, etc) Que as universidades, no mundo atual. atravessam uma fase critia de
transformação, parece não haver dúvida. Mas, se o fato da mudança que se opera é inquestionável, resta investigar e discutir as causas dessa transtormação que suscitou novos problemas e repÔs as velhas questões de organiaçio do ensino universitário. Todo o desequilibrio no sistema universitário, cuja função é a transmissio de cultura e a preparação para profissões intelectuais, resulta de uma cise de cultura e das próprias elites intelectuais. Analisar as causas mais importantes dessa crise ou desor dem intelectuale moral: a causas intelectuais e morais: as diferentes maneiras de conceber a "cultura" que freqüentemente se mpondo iterente "ábuas de valores (ctr. o sentido alemão, a noção cultura: a noção univeralista e
nacionalista de cultura): a "desracionalização" do pensamentoe a negação dos mais altos valores da tradição liberal, verdade e liberdade: a
evaltação ta vida en si mesma ou dos valores concretos biológicos ou sociais acima dos valores do espírito, etc.: b) causas cientificas: a complexidade do saber humano decorrente do aumento do volume de onhecimentos, pelo progresso (do século cientifico XVIII ao seculo XX); dai a crescente espeialização cientifica e protisional
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"barbárie da especializaç?ão", segundo a cxpressiva fömula de Ortega y fragmentos não coordenados de ciência, e nada feito para cnquadrar essa quantidade considerável de conhecimentos e de idéias numa concepção
(aGasset):
compreensiva do mundo;
cconômicas e técnicas: a depreiação do rabalho do esnit,
) causas onsiderado como um luxo (ri mun MvCTe...): a dithculdade de se sustenta: pclo exercicio de s rem os intelectuais, pela sua produção intelectuale iSa "desmoralizar" para contribui profissão; a crise econômica quc dentifca a produção intelcctual e dasses intelectuais e tende a dinminuir espeCialização técnica c os progressos da a riqucza; em conseq üência, a propria
mecanicas das descobertas dona próprio máquina que, embora sejam aplicaçòes nr iniciativa espírito, tendem a diminuir o papel da inteligência e da ção (A. LICHTENBERGER): intclectuais (sábios d) causas políticas: a desconfiança em relação aos Lichtenberger. tero diz pensam, pensadores c artistas), nas democracias "que que não lhes fazem sombra nem
interêsse em ser governadas por mediocridades subjugá-los e pó-los ao seu servico: as inguietam", e nas ditaduras que procuram e de crítica e, portanto, de pensamento de liberdade da restrição ou supressão que seja livre"); luta para cátedra (e "não hádignidade no pensamento a sem como instrumento "utilizá-la" tendência conguista da universidade e a
a
político. concretos e verificar em Examinar cada uma dessas causas, em face de casos problemas de organização das Universidades
que medida concorrem para agravar os que já tenham sido propostas (Univer e as soluções que lhes podem ser dadas ou tradição universitária; sidades do tipo tradiional; universidades modernas, dentro da
universidades técnicas; universidades do Trabalho).
universitário (e o mesmo se 9. É freqüente afirmar-se que falta, no ensino que ligue todos os estudos, poderá dizer em relação ao ensino em geral), uma alma reprova, com essas pala que Ihes faça a síntese e os fecunde uns pelos outros. O sem seoferecer um principio de VTas, é justapor demais conhecimentos esparsos, Mas, essa crítica que é inspirada pelo unidade, capaz de dominar todo o conjunto. Idade Média, se reduzirá às suas justas confronto de nossas universidades com as da proporções, se considerarmos: como o foi a teologia, na a) a existência de um principio unificador,centros universitários estavam os Idade Média, se justificava numa época em que conhecimentos era mais ou menos de subordinados à Igreja e tôda ordem conservadoras, que se tributária da religião; as universidades, eminentemente teoló "academias sobretudo caracterizavam pela fé e disciplina, tornaram-se gicas"; o séc. XIX, em que emanci b) a mudança dêsse clima histórico, desde do laicismo, e invadidas pelas ciên padas da tutela da Igreja, pelo movimento preponderante, as universidades passaram a Cias que passaram a ter um papel progresso das ciências, organizar-se sobretudo para assegurar a conservação e o
inteligência c pesquisa num regime de liberdade e de razão, de entusiasmo pela dentifica e de discussão de todos os problemas; um "princípio unificador" ) se não existem ainda sinais de elaboração de que
agir sÑbre a totalidade dos homens, o que seja universalmente aceito e possaraz·o e a liberdade, sobretudo, em algunS se constata é uma reação contra a universl" se imnpõe aos sistemas oficiais paises como os de regime totalitário, em que teorias das ou interêsses táios uma disciplina e unidade, em nome dos livre sucede outra do Estado: a umna época em que o mundo viveu da discussão decreta: "Senhores, acabou-e em que o regime político, reacionário ou vermelho, a discussão". possível um
é Analisar cada um désses fatos e examinar, através dêles, I) se principio unificador, universalmente aceito, senão em um mundo quecomo To foram exigéncia estado de confiança, de valores estabeleidos e de seguranca garantida, a a ldade Média e o século XIX até a grande guerra; e 2) como conciliar espirituais, unitária que reclamam a saúde política e o minimum de verdades morais e
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com a exigéncia pluralista que fundamento de tôda a vida política desenvolvida, pensamento e de pesquisa, reclamam orespeito da pessoa humana e a liberdade de científico.
essenciais a toda vida espiritual e condição do progresso
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PARTE QUARTA OS PROBLEMAS SOCIAIS PEDAGÓGICOS
Capitulo I
AS CIDADES E OS CAMPOS E OS PROBLEMAS DE EDUCAÇÃO
As cidades nas civilizações antigas. - Aorigem e a formação das cidades modernas.- As cidades, focos de progresso. - 0 papel unificador das cdades. - Os grandes centros urbanos da civilizao industrial. Addade estudada nos seus bairros. As cidades e os campos. As comunidades rurais. Problemas de relações e influências entre as populações urbanas e rurais. Os fenônenos de movimento e de fixação.
urbana. - Civilização e urbanização.
A tendéncia crescente de agregacão
Os campos "urbanizados". - A com
plexidade do problema da educação rural.
demogråfico.
Problema fundamentalmente
A educação rural e uma política geral de melhoramentos rurais.
Na antiguidade até à ldade Média, a cuja sociedade o regime feudal imprimiu fortemente os seus caracteres gerais, a cidade (urbs,
civitas) se distinguia da vila ou povoado (vicus, villa) mais pelas suas fortificações (oppidum, castrum) e tinha geralmente por origem quer uma necessidade estratégica, quer uma preocupação de ordem econò mica, a constituição de mercados, de formas de senhorial ou, mais remotamente, de vastos celeiros, como os exploração dos palácios dos an tigos reis da Grécia e do Egito. As cidades primitivas, a ése caráter militar e econômico, eram fundadas söbre alturas devido e cercadas de muralhas para defesa, como Atenas e Roma, desdobrando-se em segui da, como
aconteceu na Idade Média, em outra qual uma cinta exterior, ao redor do núcleo cidade que se estendia, fora dos muros. Translormar uma povoação em cidade, como central, observa relação à Idade Média, "é, pois, cingi-la de sólidas ]. Calmette, em muralhas, capazes de fazer face a um assédio. As guerras os interesses senhoriais feudais, estão na base dessas transformaÇões". Muitas vèzes, acossadas pelas in vasões e pelas guerras, as populações se refugiam determinados lugares, "cristalizando-se essas aglomerações, como noem caso de Mont pellier e Perpignan, emn tôrno de um centro de resistència defensiva ou de proteção moral: castelo ou No mosteiro". a entanto, diferença inicial na constituição dos grupos rurais afetou que se formavam as cidades: entre os celtas, sempre a maneira por não era dividido em povoados (vicus), mas empor exemplo, cujo pa is circunscrições territo riais de maior extensão (pagus), a concentração de diversos pagi,
desses grupos étnicos naturais ou "agregados de clâs", na hipótese de Durkheim, éque deu lugar a um
de tipo novo (tCus) agrupamento que se ranstormou depois em cidade: ao passo que, entre os germa nos, foi ogrupo local (vicus) que existia desde a origem, e não o dis
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FERNANDO DE AZEVEDO
trito territorial, que foi o ponto de partida da constituição das cida
des (1). As cidades alems, segundo Rietschel, ou nasceram diretamen te dèsses antigos burgos (Burgen) medievais e das velhas cidades roma
nas, (civitates e castela), como Maiença e Colonha, que eram ao mesmo tempo centros de comércio e centros administrativos e militares, ou resultaram da instituição de mercados que se formaram espontânca mente em certos lugares, em determinadas épocas do ano (as Kirch messe, Kermesse) ou que, fundados deliberadamente por uma autori dade política ou religiosa, apresentavam, pela sua própria origem, me nos mobilidade, e caracteres distintivos (2). Como quer que seja, examinados o desenvolvimento e o papel das
cidades modernas, e confrontados com os das cidades gregas e roma
nas, da Idade Média e da Renascença, verifica-se que, embora ofenô meno urbano seja observável em tÑdas as civilizaçõcs, a organização
e o progresso das cidades constituem um dos fatos mais característicos
e impressionantes da civilização atual. Nenhuma das cidades antigas,
dentre as mais famosas e de vida mais intensa, como Atenas, Roma e
Alexandria, se pode comparar a qualquer das grandes cidades moder
nas, pela densidade de sua população, pelo seu impulso econômico, pela sua importância comercial e industrial, pela beleza de seus aspec
tos, epelo brilho e intensidade de vida social que "nosso pensamento
associa ao conceito da existência urbana". Éque a vida nas civilizações antigas, como a civilização romana, e na Idade Média, é essencialmen única ou te rural, e enquanto a agricultura permanece a indústria principal, as sociedades não ultrapassam o estádio da povoação (vicus, aos zilla). Segundo Ferrin Weber, que assinala trés grupos de causas consti é progressos que fazem os centros urbanos, o primeiro grupo suficien tuído exatamente pela intensificação da agricultura, em grau de produtividade, sem empre te, para poder manter-se no mnesmo grau graças às descobertas gar o mesmo número de braços: é o que se deu da ciência e ao desenvolvimento do maquinismo que tornaram possí para entrar em vel destacar-se do solo "uma parte da população, livre êsses elemen tos Com grupos novos e dedicar-se a ocupações novas. É conseguinte, se carac mais mnóveis que se formam as cidades que, por de sua terizamn, desde a origem, por uma independência maior emda face troca que necessidades base territorial". Em segundo lugar, são as levaram êsses elementos,
os habitantes dos grupos rurais (do po
und ger. den ehemals keltischen célticos Zur Stadtentstehung in das (1) KORNEMANN (Ernst) o cidades nos países formação (sôbre a Roemerreichs des Gebieten manischen Universitktsdruckerei, 1898.
germânicos do Império Romano). Giessen, reunida para o mercado, dispersava-se, quando (2) Na primeira hípótese, a multidão, poderiam citar de cidades que tenham nascido nestas
êste terminava; e poucos exemplos se das cidades primitivas originaram-se, na Alemanha, segundo ndicões. A maior Pa pudessem desen vol mercados que se fundavam, parade que Rietschel, da instituição dependiam, ou fora que convento do catedral, da castelo, do cia distân "a certade que era centro êsse estabelecimento"". Os grupos novos ver-se, da localidade que assim se formavam não resultaram, pois, comenta Durkheim, "do acréscimo espon tâneo da povoação ou vila preexís tente : 6 sôbre um solo virgem, fora de tôda espécie de povoação, ainda que na proximidade de um lugar fortificado, que tomaram raízes. Por conseguinte, êles não isso, se dife e ompreenderam senão comercian tes e artesóes, nas n CO UR ndd Stadt in renciaram muito nitidamen te dos grupos rurais". (SIEGFR.
Stadtvertassung. rechuichen Verhgeltnis. Ein Beitrag zur Geschichte der deutschen e acidade nas suas relações jurídicas. Contribuição à história da organização urbana na Alenanha. Leipzig, Von Veit, 1896).
ihrem rem
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
239
voado, da aldeia), de quc a agricultura não tern mais necessidade, a tomar, organizando se, a torma especial dos grupos urbanos: os arte
sões diversos que se haviam formado, ao lado de agricultores, (ferrei
ros, sapatciros, tecelóes, ctc.) em lugar de irem de aldeia em aldeia.
oferecer seus serviços, acharam mais cômodo estabelecer-se, em caráter
definitivo, em lugar determinado, situado a igual proximidade das
aldeias e povoações rústicas onde se achava sua clientela. "A cidade .
pois, na origem, o produto de uma diferenciação entre o campo que
cultiva a terra eum grupo de artesões e comerciantes estabelecidos no
centro dêsse campo" (). E por último, resumindo ainda a lic£o de
1Weber, o sistema de manufatura que é um poderoso instrumento de concentração; pois, se as indústrias no implicam, tão diretarmente como o comércio, a vida urbana ("as cidades são essencialmente centros de
troca e se desenvolvem com as trocas") hácertamente uma afinidade entre as manufaturas e as grandes aglomerações urbanas: as indústrias similares atraem-se umas às outras e atraem a si outras indústrias de que são solidárias.
Ora, pela análise de Weber, é fácil compreender: a) que a cidade não aparece senão quando a cultura da terra cessa de absorver tôda a
população; b) donde vem a matéria social com a qual se fizeram as
cidades e que se constitui dos elementos mais móveis da população rural; c) porque essa matéria tomou, organizando-se, a forma especial dos grupos urbanos, isto é, a agregação urbana como resultado das ne cessidades da troca; e d) dentro de que limites as indústrias favoreceu
o desenvolvimento das grandes cidades. Mas como se completou, se
gundo Weber, o desenvolvimento que tornaram necessário as transtor mações econômicas, de que maneira se produziu? As migrações inte riores são, como vimos, o fator essencial do fenômeno, e ésses movi mentos migratórios dos campos para as cidades se realizam, segundo
certas leis que Weber enuncia, reduzindo a três principais: l) as migra
ções internas fazem-se geralmente entre pontos pouco distantes uns dos outros; as grandes cidades tiram seus imigrantes da região que as con
vizinha imediatamente, enchendose, com imigrantes de distritos mais afastados, as lacunas que dai resultam na população rural; 2) o cir culo de influência das cidades varia com a sua importância, ou, por outras palavras, a distância entre o ponto de partida e o ponto de chegada ou o que se poderia chamar a amplitude da onda de imgra (ão, é tanto maior quanto mais considerável é o centro urbano; 3) a
parte dos imigrantes no conjunto da população das cidades varia com a grandeza das cidades, sendo o inverso que se produz nas comunas rurais, isto é, enquanto nas grandes cidades há proporcionalmente mais imigrantes que nas pequenas, nas grandes aglomerações rurais há me (1) Cada um dêsses grupos, uma vez formado, observa Weber, tendia a principio a ser umn todo completo, bastando-se a si mesmo, isolado dos grupos similares. Ndo havia comércio seno do centro urbano ao campo vizinho. Tal o tipo da cidade, na ldade Média. Mas com o tempo, as relações comerciais estendem-se; as diteren tes cidades entraram
em contato, dai resultaram especializações novas. Uma fabricou a là, de que a oura fêz o vestido. A extensão dos mercados cresceu e. em conseqüència, a exenaáo ds dades. (ADNA-FERRIN WEBER, The Growth ot the cities in the nineleenta Ceatury. New York, Macmillan, 1899).
240
FERNANDO DE AZEVEDO
nos que nas pequenas. Assim, pois, como observa Félix Pécaut, as ci
dades não só desempenham um papel eminentemente assimilador (elas são "o centro em que os campos vêm dissolver as suas diferenças"), mas
ainda, intensificando e superexcitando as energias fato da concentração, e elevando ao mais alto ponto to possível as capacidades latentes e dispersadas na como poderosos instrumentos de seleção social. E, se
coletivas, pelo só de desenvolvimen população, atuam se acrescentar quc
elas concentram, mas para difundir, e essa irradiação é tanto maior
quanto mais intensa a concentração urbana, compreender-se-á que as grandes cidades são êsses focos incontestados de progresso, de que fa lava Durkheim, pois "é nelas que idéias, modas, costumes, necessida des novas se elaboram para se espalharem em seguida pelo resto do pais"
Mas, instrumentos de assimilaço e seleção social, fatöres de unifi cação efocos de progresso, a um tempo, fundindo as populações que afluem para elas e nelas se concentram, favorecendo as evoluções de tÑda parte e espalhando em seguida no campo e por todos os recantos
da região vizinha, dentro de seu raio de ação e de influência, hábitos
e concepçöes citadinas de vida, as cidades representam para a educa
ção um interésse capital e cada vez maior devido ao desenvolvimento
crescente dos grandes centros urbanos. É preciso ter em vista não só as
influências que exercem sôbre os campos e que variam com asua im
portância, como também, quando se trata de resolver problemas de
difusão do ensino, as regiões em que, pelo clima, pelas suas condições geográficas e pelas suas possibilidades econômicas e industriais, tende aconcentrar-se a população, pelo desenvolvimento das grandes cidades
ou pela formação de novos centros urbanos. É êste, de fato, um dos caracteres da civilização atual, a tendência crescente à urbanização.
Entre 1920 e 1930, conforme nos relata A. Philip, "a população ur
bana cresceu, nos Estados Unidos, de 14 milhões e meio de habitantes,
a população rural não agricola de 3 e meio, enquanto a população rural que vive da agricultura diminuiu de mais de um milhão, apesar de a natalidade permanecer mais elevada no campo do que na cidade.
Entre as cidades, o rescimento foi particularmente sensível nos grandes
centros: as cidades de mais de um milhão de habitantes ganharam mais de 5 milhões de membros novos e as de 250 a 500 mil foram
acrescidas de 3 milhôes e meio, passando, entre 1900 e 1930, de 10 a 17 % do total a população das cidades de mais de 500 mil habi tantes e de 8 a l6,8 ,
a das cidades de l00 a 500 mil habitantes". No
Brasil, o crescimento de cidades como Recife, Bahia, Belo Horizonte,
Rio, São Paulo e Pôrto Alegre, para citar apenas algumas, e de diver
sas no Estado de São Paulo, em que surgiram ainda cidades novas, com uma vitalidade surpreendente, atesta, embora em menores propor (ões, essa tendéncia à urbanização que merece ser analisada nas suas
causas principais, na maneira pela qual se vem produzindo, nas suas conseqüéncias sociais e económicas e, particularmente, nos seus efeitos sôbre a educação. Não éde menor interêsse para a distribuição e loca
lização de escolas de todos os graus, o estudo preliminar da cidade, nas
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
241
SIlas origens e na sua tormação, na sua estrutura morfológica, nas fon
tes dedensidade recrutamento (imigrações estrangeiras e migrações internas), na de população, nas uas atividades predominantes, c
auanto às direções em que se propagam as correntes de influência urbana (1,.
No estudo monográfico de uma cidade é de bom método analisá-la nas suas
próprias fontes e decompô-la em seus diferentes elementos para Ihe podermo apanhar e explicar a formação. Só o bairrO (quartier) que corresponde a uma divisão orgânica da ddade (empregada aquela palavra no sentido que hojelIbe
damos), pode ser tomado para base de um estudo parcelar pròpriamente urbano. A cidade é, freqüentemente, na sua origem, uma organização excêntrica (suburbium) que se formou em tôrno de um núcleo central, uma "justaposição de células de origens diferentes" que permanecem, durante muito empo, como pequenos centros de povoamentodistintos que ela, no curso de sua extensão, acaba por atingir e ultrapas
sar, envolvendo-os por todos os lados. Em Berlim, como em Paris e en Londres a
cidade se desenvolveu para o oeste, sem dúvida em razão do estabelecimento de aveni. das monumentais, orientadas nesse sentido desde o 17,° e 18,° século, e também à medida que os bairros do este foram tomando uma fisionomia industrial e se povoa ram de operários (2). Não é menos interessante o fenômeno de despovoamento do centro em que os escritórios, os bancos, as lojas e os edifícios públicos, como jiá se
observa nitidamente em S. Paulo, tomam progressivamente o lugar às habitações que. em conseqüência da formação da City, se deslocam para a periferia nas idades-jar
dins (Jardim-Europa, Jardim:América, por exemplo). Orecuo da população do centro, - núcleo primitivo constituido de arranha-céus,- continua, jåpelo deslocamento das residências para as zonas marginais, já pela concentração em casas de apartamentos
(habitações coletivas), num movimento que se pode assinalar, verifiando-se a partir de i0 andares. Em seu estudo sôbre a formação de Lyon, na França, Kleinclausz e Cholley aplicaram se a mostrar como (e o Rio é entre nós, um exemplo frisante) "a ação fragmentadora dos enormes desvios de altitude e dos largos braços fluviais foi reforçada pelo desenvolvimento dos diversos bairros, em épocas históricas diferea tes, e cuja influência se traduz ainda por uma fisionomia especial dos caminhos e das de quando e en que proporções aumentaram as casas de 3, 4 ou 5 andares e de mais
construções". No curso de sua expans£o ou a cidade guarda sua unidade morfológica,
como se dá em S. Paulo que se estendeu en tôdas as direções, transformando-se, sem dúvida, em suas paisagens urbanas, mas absorvendo e assimilando todos os centros de
povoamento, ou perde a sua unidade, como o caso tipico de Berlim, o Gros- Berlin, (1) Para conhecermos os meios adecarta circulação de uma grande facilidades ue apresentam, é cômodo levantar dos isócronos, a partircidade de ume as ponto central.
Em algumas cidades, como o Rio, há vários. £sse processo consiste emn traçar, a partir do
Ponto cen tral as40curvas que representam o lugar dos pontos dâsteecantro o maximum de 20, e 60 minutos, para aquêles que circulam por afastados ônibus, bondes estrads de ferO, Supondo as melhores ligações. Constata-se assim que os isóccronos de uma hora,
em Berlim, por exemplo (FRIEDRICH LEYDEN, Gross-Berlin. Geographie der Weltstadt, Bres lau, Ferdin and Hirt, 1933), são quase por tÙda parte, alén do limite atual dos subúrbios, bem que difiram segundo o centro adotado. Mas ter-se-ia podido fazer uma comparaçto
instrutiva entre ôsses isócronos e o cartograma, distinguindo diversas regiðes de Berli segundo a densidade da população. Os isócronos de 40 minutos, a partir de Wittenbergsplatz (centro um pouco a oeste, em Berlim ), sequemn sensivelmente a oeste o limite das regiSes que contam mais de l 000 habitantes por kma e os mesmos isócronos, a partir de Alern
derplatz (centro deslocado um pouco para este), a Este. Em todo o caso as salåncics
s
reintrncias
tomam a mesma forma. Tem-se, por ôste processo, uma tigura ou rpressd5
Viena. Apud
Mitte ilungen der Geographischen Gesellschatt von Wien, t, 53, paqs. S$8.
nuito viva da relação que aparece entre as direções da população e os meios de circulaçdo. (Ctr. cartas de isócronos estabelecidos segundo o mé todo que HASSINGER aplicara em 1910).
2Aanálise dos diversos bairros,e em vista debancos, sua especializagdo tunciona! dencias, indústria, comércio por atacado a varejo, serviços públlcos, ete.) e(rest nos eShecentros urbanos, do maior interêsse para a localização de escolas, em qeral, cialmente das das escolas técnicas enecessárias, profissionais.o8 Sõbre cidadetraram pode ou delimitar, depois investigacães bairros umenmapa que da se concen n grupar-se as residências (cidades-jardins) os que se especializaram nessa ou tunção e indicar as tendências para especializações novas. Éo que s0 chama ua "mapa funcional'"
242
FERNANDO DE AZEVEDO
oue & talvez "antes uma grande do que uma grande cidade", na de Halbwachs; uma constelação aglomeração de e cidades vilas, de agrupamentos humanos,expressão tes em grandeza, aspectos e origem, quc, diferen da grande cidade, reagiram influência sôbre cla à sua mancira, e guardaram sofrendo os
sua adaptação ao novo conjunto.
caracteres próprios que condiionaram
a
Ora, à volta de tôda
importante constitui-se um território colocado sob sua influênciacidade e onde a distinção dade e o campo tende a atenuar-sC. As cidades tradicional entre a ci "resultam de uma con centração que elas reforçam, e aparecem nos pontos em que diversas
correntes sociais (comerciais ou outras) se entrecruzam e são produzi das por êsse entrecruzamento". Ainda nas cidades nas aglo pequenas, merações urbanas de fraca extenso, pode-se constatar o mesmo papel que desempenham as cidades em nossas sociedades contemporâneas.
Pelo mesmo fato de suas dimensões restritas, observa ainda Durkheim, "as fôrças sociais que nela se concentraram, achando-se mais estreita
e constantemente em relações, agem e reagem umas sôbre as outras com mais continuidade e energia; o que tem por efeito levar ràpida
mente a vida social a um alto grau de intensidade. É o que fêz a pre coce maturidade das cidades greco-latinas". Desta maneira as aglome
rações urbanas se dispõem a influir sôbre todo o território circundan intensidade de produção e de trocas e sistema de comunicações e de e uniforme pela relativa esta
te, ao alcance de sua ação, variável com a sua densidade demográfica,
transportes, e mais ou menos contínua
nas cidades, bilidade de sua população. Se, de fato, a imigração é forteWeber, fican demonstra como a emigração é geralmente muito fraca, to não metrópoles "as do abaixo da média a mobilidade do citadino: imigrada de cidades às mam senão uma parte fraca de sua população por que se formaram segunda importância". No estudo da maneira como dos problemas de relaçÇões e
entre nós as cidades mais recentes, é preciso ter em vista influências entre os grupos rurais e urbanos, grupos rurais, geralmen dos dois fatos fundamentais: l) a constituição fazenda de café ou fazenda (engenho de açúcar, cercada te formados de uma estância, dos campos etc.) imediatamente de outras culturas, outras; 2) e conseqüência, isoladas umas das em e, dependentes, dela cidades e os campos, entre o urbano as entre continuidade de a solução e dispersos, com vêzes, em blocos solitários às estende, se que Entre nós foi rural, "'scrtão". e o limiar do o até flutuantes, as suas populações constituiu, com as suas vastas dependências, (lati antes a fazenda que morfológica fundamental, e as grandes distâncias fúndios) a unidade entre as cidades e os camp0S, distinção a acentuar para contribuiram rurais (roças, sítios) e, ainda, nas
aglomerações completamente, en vêzes sem falar nas pequenas às isolam sertões os fazendas de criação quelados, com a sua natureza selvagem, a sua exten volvendo-as de todos os solidão. de são de léguas e a sua pesada e em algumas regiões Paulo São de Estado Rio e Certamente, no outros Estados (Pernambucomodifica poucos de e oeste) e uma Minas (sul já se acompanhou de Grande) a concentraço urbana suprimir pouco a pouco a distinçao, a tende que importante são mais
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL mesmo entre
243
cidade e campo. Avida rural, com efeito, em
não suficientemnente limitadas e estudadas, perde certas o seureziões, isola. toe os burgos ou Vilas de mais de 250) habitantes progridem tor. lo.se ocentro de atraçao do campo vizinho e servindo, gracas ao mvel, de clos ou centros de ligação comnercial e cultural entre as
cidades e os campos. Se, em grande parte do país, predomina aindao tipo da cidade da Idade Média, em que, por falta da extensão das rela. s comerciais e de contato entre as vilas ou cidades diferentes. não
icomércio senão do centro urbano ao campo confinante, já se pode dizer que, sob a pressão de fatôres fisicos, geográficos e econômi
cos de movimento e de ixação, começa a desenhar-se francamente a tendencia de agregação urbana e a alargar-se, em conseqüência, a
perspectiva da extensão do bem-estar material e moral, como do ensino
e de outros serviços públicos. Mas, exatamente pela vastidio territo
rial, pela fraca densidade demográfica e pelas dificuldades de comu
nicação e de transpor tes, a "urbanizaço" éum fenômeno particular mente sensível apenas em algumas regiões aliás isoladas umas das ou
tras, e está longe de ating1r, mesmo nessas regiões, o grau de intensi
dade que já alcançaram a Inglaterra, a Alemanha, a França e, em geral, os paises europeus e, em parte, os Estados
Unidos, entre os países
americanos. Civilização é, a muitos respeitos, urbanização: é estender
aos campos, aos diversos tipos de agrupamento rural o bem-estar, o
confôrto, a higiene e a educação dos centros urbanos, isto é, os bene ficios da civilização (l). O campo e a cidade confundem-se, na Ingla terra, de tal modo que quase não se faz sentir a transição entre as gran des cidades com seus parques (squares), suas ruas arborizadas e os
campos magnificos, cultivados, amenizados, "urbanizados", e tão poli dos pela mão de homem que constituem, para o os seus melhorces e mais belos centros de recreação. A cidadegentleman, e o campo se in terpenetram às vèzes, nesses paises de população fortemente grupada e modificados, nas suas paisagens naturais, por longos de civili zação. Em Berlim, na Gross-Berlin de 1920, estudada séculos por Halbwachs, subsistem, dentro do perimetro urbano, lacunas; e o campo, em cer tos lugares, penetra a própria cidade que, e propagando expandindo-se segundo tal ou qual direção as suas correntes de influència, envia an tenas ao longo dos cursos d'água, dos canais e ao limiar das florestas. Não é esta, evidentemente, a paisagem que apresentam os nossos campos, não só diferentes do campo inglès, - campo aspecto bucólico, uma "espécie de arcádia ordenada e urbanizado, de subjugada pela mão do homem", mas muito isolados das cidades e uns dos outros, conmo ilhotas geralmente de cultura na imensidade de solos virgens e de regiões despovoadas e apenas desbravadas. É que os fenòmenos de urbanização, isto é, de concentração urbana e atração dos grupos hu manos são tanto mais acusados quanto mais desenvolvida a civilização. ) Essa idéia de assimilar "civilização' às con tomadas e modos de vida de cidade. (de como Padrão, está implícita no próprio sentido cepgões etimológico da palavra "civiliaagto S.nomem de cidade, civitas, cidadão ). £ interessan te, a èsse respeito, acompanhT evoluçáo senåntica das palavras urbanidade Viláo ( de villa, (urbanus, urbs). rustico (de rus camnpo ), vila, proveniente de vicus (vicla). povoado ). e. 17 Sociologia Educacional
244
FERNANDO DE AZEVEDO
o êxodo rural ou o movimento migratório para as cidades não passa, pois, de um fenômeno normal e constante que se acentua nos períodos
de crescimento urbano, e só se pode considerar anormal quando, exce dendo certa taxa, determina o desequilibrio entre as duas popu lações, rurais ou urbanas, ou, por outras palavras, quando o progresso das cidades acarreta um despovoamento ou uma diminuição quase ab
soluta dos campos (1). Certo, êse crescimento migratório se acusa for
temente nos periodos de crise que, determinados "pela insuficiência
do mercado interior ou o fechamento de escoadouros estrangeiros, em face de uma agricultura ràpidamente progressiva", obrigam o país, como aconteceu na América, segundo relata Philip, a abandonar as
terras marginais e a reduzir a superficie cultivada. A introdução do maquinismo em tôdas as atividades da fazenda e o aumento da capa cidade produtora da agricultura, em conseqüência da revolução técnica operada nos métodos de produção, libertando maior número de braços para a lavoura,obrigam a emigrar para as cidades e aacelerar, em con
seqüència, o rescimento dos grupos urbanos. Mas, a sociedade, como
vimos, tende sempre a concentrar-se em determinados pontos; e o de senvolvimento das cidades não é, como observa Durkheim, "senão um
caso particular dese processo mais geral em virtude do qual as socie
dades tendem cada vez mais a concentrar-se. Ora, êse movimento de
concentração é anterior não só àmaquinaria agricola como à grande indústria, edeve, pois, ligar-se a outras causas que devem reencontrar se, mas amplificadas, àraiz dos fenômenos urbanos". Aliás êsse pro
cesso de concenração, nas grandes metrópoles, se acha dobrado de um processo de expansão, em virtude do qual os subúrbios e arrabaldes progridem mais do que as próprias cidades, como verificou Meuriot
em Paris, que aumentou de 1817 a 1856 de 65 %o enquanto foi de
496 % o desenvolvimento do Sena, sôbre o total da população (2). o problema de difusão da educaço rural está, como já se
pode concduir, ligado ao desenvolvimento da população e do sistema
de comunicações e, portanto, aos fenômenos de atração e concentração (1) Em relação às nossas populações rurais (engenhos, fazendas, sítios, estâncias, povoados rústicos, etc.), está quase tudo por estudar. Não se conhecem, além do "Nor deste", de Gilberto Freyre, excelente ensaio de ecologia humana e de sociologia rural,
mo Dografias regionais, cOm iníormações estatísticas postas em relação com os dudos carto gráficos, e observações sôbre os costumes e mentalidade tradicionais e suas transformaÇões. Compreende-se, pois, o intersse que apresentam, para a inteligência de nossas comuni
dades rurais, os inquéritos e pesquisas sôbre Os diversos tipos de agrupamento rural, e
Cujos resultados se imporáo ao espírito com tanto mais fôrça quanto se impuseram primeiro
aos olhos, graças a um dossier cartográfico e gráfico, às ilustrações e croquis, pelos quais
o leitor é constantemente levado à região estudada, à realidade. Do ponto de vista edu
cativo, o interésse sociolbgico dessas pesquisas será tanto maior quan to mais se concentrar a observação sôbre o passado e as tradições sociais dos grupos, os seus modos de vida,
o seu maior ou menor isolamento, as influências dos centros °banos, a adaptação de insti tuições vindas de fora a um meio físico e a um meio humano geralmente mal preparado nas para recebé-las, a atitude dessas chn como professor, os progressos, P "sentido da saúde'" (hábitos higiênicos) e, enfim, rrais, do que se poderig massas sôbre tudo o que, erplicando a atividade do homem, sob suas formas atuais, forneça dados precisos para uma imagem, entre tôdas, difícil de apanhar em profundidade: a do Brasil
Tural de hoje, que não 6 posível figurar, ainda que numa representação aproximada, (2) Com efeito, na observação de Meuriot, em tôdas as grandes metrópoles euro péias, se a densidade 6 maior no centro do que na perileria,deelas se odesenvolvem muito dos bairros tôdas inte Am um sentido ezcêntrico. O crescimento Paris, Berlin, riores. (P. MEURIOT, Des agglomérations urbaines dans peritericOntemporaine,
senão por uma série de inquéritos, pesquisas e monografias regionais.
1897 ).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
245
dos grupos humanos. A sua solução progressiva depende essencialmen te de um conjunto de fatôres favoráveis, entre os quais se devem con
siderar as causas demográficas e econômicas. Povoar, unir e sanear é. sem dúvida, preparar o caminho àexpansão da educaço rural, con
dicionada por tôla parte "pela criação de riqueza e pela formação de
núcleos populosos". A fixação do homem ao campo "não se fará, diz Almeida Júnior, cspantandoo da cidade, mas aumentando o poder de atração do campo", isto é, elevando, como pregam os americanos, o padião de vida na zona rural ao nível dos homens cultivados (l). As
questõcs puramente técnicas e pedagógicas no interessam senão às zonas marginais do estudo dos problemas de extensão da educação rural:
o que se coloca por si mesmo no centro dêste é uma série de proble
mas e de influências demográficas, econômicas e sociais: densidade e
estabilidade das populações, constituição de núcleos urbanos (po voações, vilas e cidades) e desenvolvimento das vias de comunicação que, estabelecendo um contato mais íntimo com os campos, contribuam
para "civilizá-los" e, ligando os grupos rurais a êsses centros, permi tam, pelas facilidades de acesso, a localização de escolas. É, Como se
vê, de cxtrema complexidade oproblema da educaço
rural, para
cuja solução gradual e progressiva é preciso sempre ter em vista os fenômenos de movimento e de concentração e todos êsses fatôres que,
concorrendo para condensar as populações, desenvolv-las e aproximá
las, contribuem, ao mesmo tempo, para estender aos grupos rurais o
ensino e outros beneficios da civilização. Todos que estudam essa ques
tão, sem dúvida do maior alcance, mas irredutivel, pela sua compiexi
dade, aesquemas puramente pedagógicos, reconhecem que não há pro
paganda nem cruzadas capazes de "suscitar escolas no deserto" e que
a extenso do ensino rural tem de forçosamente seguir a linha do desenvolvimento natural das populações e das condições econömicas. A educaçãorural está, portanto, tão intimamente ligada a uma poli tica geral de melhoramentos rurais, de que constitua parte inte grante, como essa politica se acha, por sua vez, condicionada aos fatò
Tes demográficos eeconômicos e não se pode realizar senão em regiões
determinadas onde condições locais particulares, como situação espe
cialmente favorável à lavoura e ao comércio, proximidade de riquezas naturais aexplorar, movimentos migratórios em dada direção, sejam de
natureza a atrair as populações e apromover e intensificar os fenöme nos de concentração.
Mas, se ainda em paises superpovoados em que a intensidade ds
ses fenômenos vai apagando a diferença entre o rural e o urbano, a
educação fundamental (elementar, primária) é uma e a mesma para
todos os grupos urbanos e rurais, a necessidade dessa educaçio geral ou comuméainda maior em paises novos em formação em que epar ticularmente marcada a distinção entre as cidades e os campos, Não
épreciso passar de uma provincia a outra, de norte a sul, - pois o (1)
A. F. ALMEIDA JONIOR
A escola rural, in Anuário de Ensino do Eatado de
S. Paulo, 1935-1936, organizado por A. F. Almetda Tunior, diretor geral do Enaino, páq L80-226.
FERNANDO DE AZEVEDO 246
fato se constata de uma região a outra no mesmo Estado, perceberem as oposiçöes múltiplas entre os pequemos
para
grupos regiopara diferenciar
de causas diversas nais que uma multidão diversidade de formação étnica e (relévo, clima, vegetação,fatôres de diferenciação um dos lamento, etc.). Entre os tamente, em pais de tão vasta extensão territorial e de
contribui
social, iso principais,varie-cer tamanha meios
dade de quadros geográficos, é a constituição dos união de fatôres diversos e, em conseqüência, a ação dêsses {isicos por
materiais sôbre os gêneros de vida da população rural, a maiselementos sensiv
aliás a tudo o que vem da terra e do Céu. As diversidades dos tiOS da
agrupamento rurais, de suas tormas e
estrutura sOCial, de suas ativida
des e de seus modos de vida, saltarão à evidência, nitidamente deff
nidas, em qualquer investigaço pessoal edireta, desde que não faltem
ao pesquisador um sentido apurado dos mil laços que unem o ho mem dos campos à natureza e certa habilidade en apanhar, nas
coisas visíveis, o seu valor de sintoma, em descobrir, através das formas de vegetação, o clima ou a mão do homem, e em reconhecer, através
do plano da casa (choça, palhoça, mucambo, etc.) as ocupações rurais
que a ditaram. Sendo tão grandes as diferenças dos grupos rurais entre si e entre êstes e os grupos urbanos, uma escola rural (primária) de
tipo especial só concorreria para acentud-las transformando-se em sis
tema fechado e em "escola de casta", de separação entre os habitantes
do campo e os da cidade, em vez de trabalhar por ministrar a todos, que essa éa funão primordial do ensino primário, uma educa
ção de base comum para divergências técnicas, indiferenciada, portan to, e indispensável àunidade e àcoesão social. Àmedida que as con dições locais particulares forem permitindo, a educação rural se irá, pois, estendendo a maior número de crianças que vivem na roça, nos sitios, nas fazendas e em outras regiões rurais, em cuja assimilação ou um papel de ex conquista para a "civilização" poderá desempenhar traordinária importância o aparelho receptor do rádio. Já se denomi
nou, e com razão, o rádio, o moderno "cavalo de Tróia", pois, por essao maravillhosa invenção, por Ãsse poderoso instrumento civilizador,e sepoli e sua ação social Estado pode penetrar, com a sua propaganda também instalar-se tica em tôdas as casas dos centros urbanos, poderá dos agrupamentos rurais, ainda os menos acessi
no próprio coração
veis, enravados no sertão. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
alojá-la.
existem- épara 1. Quando a Populaço de uma cidade resce, dois meios casos, a organizaconstroem-se O primeiro, secundário porque insuficiente na maioria dos ção interior da cidade em vista de um número maior de habitantes; vazios, jardins casas de diversos andares; edifica-se sôbre espaços que permaneceramdesenvolvimento, e påios interiores. 0 segundo meio, mais importante, consiste no em gomos), quer à sua periferia, quer por apinhoamento espécie de formaçãodos caminhos. A (uma sob forma de subúrbios, compostos de casas grupadas ao longo qualquer de construço de um novo monumento eo aparecimento de uma fonte
sOCIOL0GIA EDUCACIONAL
247
Rovoamento emTomar um ponto seu perimetro, provocam sua Santos, cxtensãoS. numa determinada. uma de grande cidade (Pôrto Alegre, Paulo,direção Belo Horizonte, Rio, Bahia ou Recife) e estudar:
a)
adirecão ou as direções de seu desenvolvimento em tôrno do núcleo
central, deixado intato ou reconstruído, ou de seus diversos centros:
b) a mancira pela qual se procesou ésse desenvolvimento: "por con
centracáo" construçÑes de arranha céus e construções en espaços varios) ou "por aglutinação" de bairros ou subúrbios (crescimento sem plano por zonas
concêntricas);
) os desvios de direção determinados pelos obstáculos naturais (mon
tanhas, rios, etc.), quebrando a unidade orgânica da cidade ou fragmentando a distintos; cm centros urbanos mais Ou menos
d) o papel dos monumentos (com o sentido largo que Ihe deu C.
JULIAN, Cm Revue des Cours et Conférences, 22 année. 1914, n 8) na for os projetos e planos com que se esforçaram os poderes públicos para regular e orientar o desenvolvimento da cidade e dirigir as transformaçóes
mação topográfica da cidade: inevitáveis;
) a parte, nesses planos, reservada aos espaços vazios (parques, jardins).
aos campos de jogos para crianças (play ground), de esportes para adultos, e às construções escolares ou destinadas a instituições culturais.
2 Na constituição de nações (grandes ou pequenos Estados) há quase semnpre o choque entre habitantes de regiões diferentes pela sua natureza, entre o monta
nh¿s e o homem da planície, entre o nômade e o sedentário, entre o comeriante e o
proprictário (C. VALLAUX). Da união de elementos a princípio hostis resulta um grupo mais bem dotado porque reúne as aptidQese os recursos dos dois grupos antes
isolados (o Estado escocês, pela justaposição dos High lan ds e dos How lands: o
Estado suíço pela junção dos cantões pastorais dos Alpes aos cantões agricolas e comerciais da planície e do planalto). Examinar em relação ao Brasil: a) o choque entre as diversas regiões do norte e do sul, da montanha e
da planicie, da praia e do interior, da cidade e do serto,
em conseqüência das
diferenças de formação social e de mentalidadee dos desníveis econômicos e culturais, e sua repercussão nas manifestações culturais e artísticas; b) a cooperação progressiva de elementos, a principio refratários uns
aos outros, que se fusionam em seguida, sob a presão de diversos fatòres
(entre os quais, a escola) para formar um ser mais rico e mais completo, -
a comunidade nacional:
c) os tipos de cidades a que a vida politica dá nascimento, no interior
dos Estados, especialmente, as idades capitais (Belo Horixonte. Goiânia, Curitiba). "cidades especializadas, na sua função de centro politico". que. em bora artificiais e desprovidas de raizes economicas, podem rescer e tornar-se grandes cidades (centros culturais, universitários, etc.)
3. Estabelecer acarta dos isócronos para S. Paulo, por exemplo, tomando como
Ponto central o "Triangulo", limitado pelo Largo da Se. Esplanada e Praça do Correio, para estudar ou deterninar: a) a relação entre as direções da população e os meios de arculação: b) em que medida o povoamento efeito e causa dos novos meios de
circulaço, eda direço dos bondes, Onibus e rens (o que nos poaderia ensnar
um estudo de detalhe, incidindo sobre as datas dos acrescimos da populaçáo
e dos traçados de linhas):
c) a função que exercem essas linhas, segundo servem os bairros que
atravessam ou põem em ligaçá£o aquèles que são situados aquém ou alem:
d) a relaçáo entre as direções da população e a localiação das escolas dos diversos graus, e entre estas e os meios de circulação, influindo em sentido diferente (aproximando as distâncias, conribuem antes para fixar as escolas do que para deslocá-las).
FERNANDO DE AZEVEDO
scgundo H. Pirenne, G. des Marez, P. Marsin e (quartier), da ddade, e, por isso, só êle pode bairro divisão orgânica 4. Só o uma corresponde a estudo parcelar pròpriamente urbano. Mas o outros, por base de umpalavra, isto é, "um território urbano apresentomado lògicamente scr à hoje damos caracteres particulares, - território sôbre cujo "bairro", no sentido que e topográfica são submetidos a influência agiu c cujos habitantes tando certa unidade mesma uma de cidade, uma tomando-se desenvolvimento cstudo monográfico de existênia". Nopreciso dar a maior atenção aos seguintes pontos análogas condições territorial, Por base essa unidade Sscnciais: solo: a existência de uma pcqucna clevação a) o cstudo geográico do construído ou habitado antes de porque tal ponto foi compreender um agrupario pode explicar querindependente: fazer de braço pode existência de um crcsceu que bairro outro, como a um de isolamento mento corporativo, quer o (estabelecimento de uma fábrica, de um mercado. determinaram ol prinipais b) os fatos escolas, ctc.) quc grandes geral, outro: interêsse de ediiios dedesenvolvimento da adade num sentido mais do que cm interior o accntuaram no cada um dos clementos situados ) ohistórico c a situação de como "partes integrantes do bairro"; considerados que o dos limites fixados e composição, na medida em sua e população classes ou da d) a densidade de habitantes por profissões grupos documentos: suas profissionais, os permitirem população, suas ocupações 248
essa sociais: a vida levada por político; papel distraçõeseo seu bairro que, vivendo, da fisionomia doforçado e caracteres dos variações a modificar-se c) as interior de seus limites, foi e no acontecimentos constituído, uma vez demolições), sob a pressão dos a chamado reconstruções, foi que (construções, ao papel cada parcela do solo Paulo). para melhor apropriar S. em exemplo, desempenhar (cfr. o Brás, por como ao de uma cidade um bairro um de estudo ao de planos antigos, Éindispensável ajuntar ou reproduções cidade (restituições retrospectiva" de S. Paulo, reconstituiço da antiga *dossier de topografia da gêsso grupando em maquette iconográfico, cono a excelente elementos, um "corpus" os têm se se Ipiranga), e, Do Museu dogravuras e fotografias. "densidade" miniaturas, escala, pode-se represen tar a
determinada Paulo, a 5. Söbre uma carta, de bairros da idade (seja a do Rio, a de S. dessa dos plano um o sôbre da população de cadaManaus, por exemplo). E se se marcarem,domiciliados em cada de estiveram ou a de Fortaleza menores delinqüentes povoados que ddade, tantos pontos quantos quarteirões e os bairros mais os são que verifica-se de casas, criminalidade juvenil. Mas
ou a lornecem maior contingente à proporcionalidade entre um e outro fato, simplesmente a) há uma ircunstância agravante? densidade da densidade da população age como a influir a escola para reduzir
b) em que medida podeagravante?. populaçáo como ircunstância em bairros super jardins e campos de jogos parques, de a influência 2usência reduzindo bairros, c) a dêsses social situação povoados não agrava a da escola? sua vida e cidade, participa deinteressantes parte integrante da mnanifestações faz que mais "habitação" 6. A ta-se-nos como uma das estudados lhe sofre as reações, apresen papel imnportante nos fenômenos tem e um desempenha e homens no que dificeis da atividade dos permite penetrarfenômenos O seu estudo de e pela demografia. concepcão uma pela soiologiaexisténcia adquirir dos homens e dentre as nais mis intimo a meios. Tomar uma cidade parte velha, na outros por dominar, e de compreender Diamantina, em Minas; S. Salvador, da habitação ipicas do país (Ouro Préto ou tentar um estudo arqueológico c exemplo) Pernambuco, por Bahia; Olinda, em geográfico, prinipais aspectos histórico,
urbana, detendo-se nos seus
e técnioo:
qual se casa e com o urbano), a evolui que meio humano em meio (interdependência da habitação e do
a) o quadro do acha estreitamente ligada
preisando-lhe as particularidades e as variações;
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
249
b) as influências quc os grandes acontecimentos como as guerras eedas as revolucõcs, ctc. Cxerceram sóbre o modo de desenvolvimento das cidades disposições adotadas para a habitação do citadino; ) os dados relativos ao clima, ao subsolo, ao solo, para a compreensão
das necessidades às quais a habitação deve satisfazer, e os referentes aos mate
riais de construção, isto é, às condiçóes do meio natural que agiram sôbre a natureza da construção;
d) a distribuição das peças, a construção, as formas e a decoraáo, comparada a casa que éobjeto do estudo, com os tipos análogos e diferentes,
e estudada quanto às influências que sofreu ou exerceu (se o habitat urbano teve origem no meio rural, etc.). Os dados históricos relativos às guerras, como mostrou R. QUENEDEY (Habita tion urbaine ct son évolution, in les Annales d'Histoire Economique et sociale, n.* 25-26, 1934), explicam "por que os subúrbios ficaram pouco povoados até o século
XVIlI, en Ruão, c como a população se concentrou no interior das muralhas, pro
vocando assim a acumulação das construções. As numerosas revoluções que durante
muito tempo se desencadearam sôbre a cidade esclarecem a organização do rés do-ch5o nas casas antigas. Por outro lado, pela distribuição da casa e repartição do mobiliário. se cstabeleceu que, na família da Idade Média, reinava a vida en comum em peças
pouco numerosas mas vastas" (cfr. a "casa grande" no Brasil), enquanto nos séculos
yVII e XVIII as peças da habitação se multiplicaram e se espeializaram para permitircm atribuir uma peça a cada uso e a cada um o seu quarto. 7. Em inglês a palavra "country" quer dizer "pátria, país, lugar de nascimento". c significa também "campo e campo de lavoura". Em portugus usamos uma sinédoque parecida com a palavra "terra", que é lugar de nascimento, torrão e tambén pátria (terra påtria, ou simplesmente, pálria, em latim, terra dosnatal pais, pátria). Examinar e cstabelecer as diferenças de sentido que a palavra "country" ea cor respondente "campo", em portuguès, apresentam, indicando os graus e tipos diferen tes de civilização: a) campo e cidade, rural e urbano quase se confundem, na Inglaterra, chegando-se a não se perceber em Londres a solução de continuidade entre urbano e rural: "o campo inglès, nas expressões de Carlos Calvo, éum campo urbanizado e as idades inglêsas têm um aspecto campestre, o sse costume de chamar campo explia à pátria, e pária ao campo": oque campo de lavoura étamb¿m um "campo de recreio", incrustado entre as próximo delas, e cobrindo o espaço que as separa, com idades e muito seus prados, suas colinas e suas gran jas; b) na Inglaterra, pais pequeno e densamente povoado, à medida que progredia a civilização industrial e aumentava a riqueza e, com ela, o sentido do bem-estar e do conförto, o campo iviliava", tomando um aspecto urbano e atraindo, pela paz bucólica de"sesuas gran jas e pela belea pitoresca de suas paisagens, comno um campo de recreio (r. a prátia do tweek-emd, entre os inglêses): c) no Brasil, em geral, e mesmo em S. Paulo, a extensão territorial. as grandes distâncias, a pouca densidade muito recente das cidades e o fraco de população, o desenvolvimento ainda econòmico "opóem" ainda forte mente a idade ao campo que guardaprogresso ainda, quase por toda parte, a sua feição o agreste, seu desconfôrto e a sua 8. Proceder a um inquérito sôbre asolidão. evolução da agricultura em S. Paulo, com o intuito de pesquisar e determinar: a) o sentido e as causas da evolução agricola, que parece tendet esen à "industrialização" cialmente da agricultura sob a dupla press£o do mento das técnicas e da abertura melbora de mercados cada vet maiores; b) a repartição da propriedade imobiliária e os meios de exploração, a grandeza das em pequenas propriedades propriedades; (latifúndios) e a tendència à fragmentaçdo destas c) as zonas de do capitalismo na agricultura e os dessa impregnação sobrepenetração efeites a antiga organizaço familial e sobre os costumes mundo rural; do
FERNANDO DE AZEVEDo
250
a mdida em quc essa penctraço
do capitalismo favorece a solurao
de de educação das populaçóes do campo e de assimilacão problemas dos grantes estrangeiros (colonos).
de uma sociedade rural pesquisas 9. Realizar, para melhor conhecimento nitidamente definidas e limitada relativas a determinadas zonas e populaçõcs rurais, habital e a morfologia das a de concentração do e espeialmente sobre os graus procurando cstudar: merações, onde clas existem, cuidadosame... a) os tipos de roças c aldeias ou povoaões rústicas distribuicão: descritas e classificadas e traçar a carta que mostra a sua
b) a população rural, sua composição, densidade e migraçõcs; a (amilia
rural;
as formas das aglomerações rurais, confrontadas com o relvo
(a
topografia, o plano) da região ou do local, e com a antiga cstrutura das "casas grandes" e das fazendas:
à os meios de irculação interna que ligam ao núcleo ccntral os pontos do perimetro de determinada aglomeração rural, e os decomunidade circulação eestudada transpore
tes entre êsse grupo e outros grupos rurais c entre a as cidades mais próximas; rural: os nro. e) os principais aspectos econômicos e sociais da vida blemas riados pcla vida social do campo e os obstáculos que se levantam Como
as possibilidades que se abrem àação do professor rural.
10. Fazer um inquérito sôbre o movimento das populações mente o êxodo rural em S. Paulo, com o fim de determinar
rurais c especal
a) a amplitude, composição e orientação do êxodo rural;
b) as causas (cconômicas e outras) do movimento migratório para as
ddades:
c)
os seus remédios ou meios de combat-lo
ou de reduzi -lo, se a taxa
exceder a de um movimento normal das populações do campo.
Verificar, no inquérito, se houve, em algum momento, mudança de orientação
do movimento migratório (por exemplo, a marcha da lavoura do calé para o oeste abandono das culturas antigas, ao longo do Paraíba) e se já se teria e o quase sentido, entre nós, o fenômeno constatado em alguns países, como na Alemanha, de um movimento em sentido contrário, das cidades para os campos, não só por motivos de ordem economica, mas por um idealismo de que se anima uma geração
rudemente atingida pelas conscqüências da evolução econômica e de que procede
necessàriamente o desejo de um modo de vida mais simples e mais perto da natureza (BOEKER e von BÜLOW, L'éxode rural en Allemagne, Études et documents,
Genève, 1935). 11. Tem-se observado, por estatisticas, em vários países de imigração, que o meio rural étavorável ao desenvolvimento da criminalidade eque não éem virtude de suas condições de existéncia e de suas qualidades próprias que o homem do campo émenos criminoso. Assim, como explicar que, na América, por exemplo, a crimina lidade no campo é pelo menos igual àdas idades? Observar, no estudo comparativo
da taxa da criminaidade rurale da criminalidade urbana:
a) a imunidade relativa das populações rurais européias provém de que o homem do canpo, fixado no seu meio, éprotegido por tradições mais fortes, enquanto o habitante das grandes idades muitas vÁzes um desenraizado; b) ora, na América do Norte (e isto se pode dizer de S. Paulo, e, em geral, das regiões de forte imigração), a população dos campos, como a das
Gdades, de desradicados; não é denossurpreender, pondera Ray, queéaconstituída riminalidade se desenvolvae muito campos ondecomo a solidarie dade e o contróle coletivo são necessàriamente mais frouxos;
) de acórdo com estatísticas antigas, anteriores ao grande desenvolvi mento das idades, a taxa de criminalidade nos campos é muio elevada; e se oposição
o mio rural parcce gozar de certa imunidade, é sòmente por 2una população que um rescimento muito rapido tornou anormalmente
criminosa J. RAY).
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
251
1
Estudar os problemas de cducação rural cuja solução, como vimos, está Conicionada ao desenvolvimento da população (aspecto demográfico) e da riqueza e do sistema de comunicações e transportes (aspecto cconômico). A fornacão de
núcleosadifusão populosos e o desenvolvimento das vias de com unicação favorecem e faih do cnsino rural eo cstabclcamento de escolas que não se podem iar no deserto, "sem um minimum de possibilidades e condiçóes econômicas". Examinar
tam
as principais dificuldades àsolução do problema da cducação rural: a) a rarefação c instabilidade de população; os rítmicos de condensação e dispersão de agrupamentos rurais tornammovimentos impossível a fixação
de escola em um ponto determinado; b) a dificuldade de acesso devido a condições cconômicas desfavoráveis, C. portanto, àfalta de meios de comunicação para gTupos geralmente pequenos e, quando estáveis, muito isolados uns dos outros;
) a segregação eo desconfôrto, em conseqüência: isolamento èsse acen tuado pelas profundas liferenças entre o rural e o urbano e pelo contraste entre a cultura do professor e a do meio social rural: d) o cstado sanitário de algumas regiões, infestadas pela verminose e.
sobrctudo, pelo impaludismo, dizimando as aglomerações rurais ou disper
sando-as e impclindo-as a emigrações. Apreciada a questão sob os seus aspectos fundamentais, demográfico, econômico, social e sanitário, examiná-la ainda do ponto de vista técnico-pedagógico, estudando: a) a questão da escola primária rural e de sua reorganização para se tornar o centro vital da comunidade rural, mas semn prejuizo de suas finalida des essenciais de escola comum, isto é, de educação indiferenciada, comum a todos, sem distinção de crenças, fortuna e distribuição regional, b) as medidas tendentes a fixar o professor na e. entre estas, as de casa para escola e residência do professor, instituição roça, dos tipos de "granjas escolas", maiores vencimentos ou gratificação pro labore, proporcional ao tempo de permanência no meio rural, etc.; ) o papel das missões culturais e técnicas, ao fim de aparelhar o professor, na roça, de elementos indispensáveisprepostas à sua atividade mantê-lo
em contato com os centros urbanos e dar-Ihe a
profissional,
técnica de novos
processos ou iniciativas em proveito da comunidade rural: d) os meios mais eficazes para que a escola primária possa estender a sua ação educativa à comunidade a que serve, contribuindo para a educação dos filhos e reeducação dos pais, como um centro de e de interèsse iradiação de tôda a rural.
comunidade
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FERNANDO DE AZEVEDO
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Capitulo II
OESTADO E A EDUCAÇÃO A origem do poder político. oEstado, sociedade politicamente orga nizada.- 0 velho conflito entre a liberdade e forrnas do Estado. O alargamento das funções doa autoridade. - As novas "público" e "privado". - A educação, uma função Estado. Distinção entre Afunção do Estado em matéria de eminentemente públia. educaço. - Formas e objeto do ensino público. O Estado e a organização da cscola para fins politicos. A educa c£o nos Estados democrático e totalitário. educacional ou concorrência política? Os Estados modernos e Concorrência cultura. As pesquisas ientíficas na categoria dasos problemas de educação e administrações do Estado.
Esta questão, que
assumiu importância primordial, das relações entre o Estado e a educação, émuito vasta e complexa para ser dada a fundo em algumas páginas de um capítulo. Mas não só oestu que importa, dentro dos limites de obra desta natureza, é pôr os pro blemas em seus têrmos exatos, uma estimular a reflexão pessoal e suscitar pesquisas, como também épossível o assunto e reduzi-lo ao es sencial, para tratá-lo com precisão. limitar há, por isto, necessidade, nem seria aqui o lugar de reconstruir a Não e o gênese lisar o mecanismo do Estado, que é desenvolvimento e ana uma das mais Ções do mundo moderno. Para poderosas institui os mostrar laços estreitos que unem o e a Estado educação é preciso, porém, estabelecer uma noção fica do Estado, cienti como uma realidade viva, sem vistas sistemáticas que não escapariam ao arbitrário e aos quadros demasiadamente desta ou da quela teoria do Estado. Seja qual fôr o de ponto vista em que nos co loquemos para explicá-lo e justificá-lo, écerto que o Estado é a orga nização édo poder político ou do poder de sencial de fazer reinar, num dominação, cuja função es terior e manter a segurança territórioe determinado, a ordem no in fôrça (não só material, como exterior é que, sustentando-se sôbre a veremos) um criador de direito (1). Para Tealizar as suas funções fundamentais, o Estado que
é uma
concentra
(1) A soberania foi, a nas principio, difusa, não encarnada na pessoa totêmicas, de natureza religiosa e dos chetes. sociedades dades se fixaram no solo Não toi senão e mais tarde, quando s socie sob influências rania se concentrou e se a do potlacà) complexs (como a conclusão dos que essa sobe sob a forma quer individualizou, trabalhos de Durkheim e de Davy sôbre a feudal quer monárquicu rania nas sociedades esta mais primitivas e a maneira origem a evoluçto da Esobe se pela berania qual, no seio é um da -se ate no concentrou so tão belo e tão soberano pessoal absoluto "de quecivilizaço, exemplo o taruo egipco 1922; MORET et DAVY, (G. DAVY, La Foi Des clans aux rOrient ancien, Paris, empires. L'organisation sociale chez lesfuree. ex et Ad du primitits Rena.ssance 1923 ). Mas a onclusâo à que, observa Parodi, a) "'se a sociedade ainda discutivel. por cemos, totêmica è a mais simples primitiva pode não ser um "comêço Be não existem b) não verdadeiro; está nas resolvida a questáoquede conhe de seu poder: echefes saber totmicas, sejam quas torem c) nåo se sociedades a vÁ a bem e a durgo aecessidade de chefes do que tribos priort, porque Populagles nåmeta teriam tido menos sedentárias.
encnasenliyel
FERNANDO DE AZEVEDO
254
c£o do poder coletivo de uma classe ou dos cidadãos, não sòmente se
apóia e tem de forçosamente apoiar-se sôbre a fôrça pública (exército, policia) como clabora um sistema de leis que limitam e regulam o bo
der politico. É graças a sses dois clementos, a) a tôrça quc é um atri. buto necessário do Estado e b) a faculdade de criar o direito com gue,
de um lado, "pode èle manter oequilibrio entre os grupos coexistentes
(politicos, econômicos, profissionais, religiosos, etc.) e, de outro, cstabe.
lecer ou restabelecer entre tantas unidades divergentes êsse minimum de
ajustamento ou de integração, sem o qual se reduziria à poeira ou se desa gregaria tôda a sociedade". Para que haja regime de direito éprecisO que a förça e o poder primitivos do individuo se achem 1imitados e disciplinados; mas o primado não pertence de forma alguma ao di
reito que vem limitar o poder em condições precisamente a determinar. Em parte alguma, escreve Hauriou, "o direito reina sem o auxílio
do poder. Sempre e por tôda a parte, quando uma regra de direito se impõe a um poder, é que ela lhe é imposta por um outro poder. De uma parte o poder é criador do direito (1) eas regras de direito posi
tivas não têm outra fonte que o poder; de outra parte, essas mesmas
regras de direito têm necessidade de ser sancionadas pelo poder de tal
sorte que elas têm por missão limitar o poder que as cria e as sanciona". Mas, a despeito de todos ésses apoios, o poder do Estado é fraco e perpètuamente ameaçado e não é limitado interiormente senão pelo
temor de uma revolta e exteriormente, senão pelo de uma derrota. A
cada momento (a observação éde Ch. Edw. Merriam) deve le como que recriar sua fôrça, para se defender não sòmente contra o inimigo de fora, mas contra tôda a espécie de inimigos exteriores que o esprei tam. Assim, como a segurança é a virtude, por excelência, do Estado, o recurso àfôrça pode tornar-se mais ou menos raro e o grau de förça requerida mais ou menos fraco, segundo as condições de cada meio ou de cada época; e, ainda no Estado mais liberal, o regime não se insti
tui, "impedindo-se a existência da fôrça organizada, mas limitando-se, na mais larga acepção do têrmo, as ocasiões de seu emprêgo". Seria, pois, inexato opor democracia e ditadura, liberdade e autoridade, como normas fixas e definidas ou entidades absolutas, quando averdade éque
todo Estado, de forma monárquica ou republicana, de regime par lamentar ou autoritário, oscila, segundo um ritmo natural e complexo, entre a liberdade e a autoridade,
duas necessidades que parecem
contraditórias e entre as quais ora se exacerba, ora se atenua o con flito tão velho como as sociedades humanas. Se nenhuma democracia
pode dispensar a autoridade, nenhuma ditadura poderia existir por muito tempo sem o consentimento ou, ao menos, a indiferença de grande
parte dos cidados.
Na sua evolução política e social, a substituição da
(1) Sequndo a teoria realista, o Estado não é a causa do direito; o direito fundado
e, se existe em estado adulto sObre as necessidades socigis é anterior e superior ao Estado, oportunidade sançao e a que desde aparece organízada, é social; os governos recebem dêle a competência dessa a sanção quando ressentida POr todosocial o cotpo estádica, nota damente a de con.statar o direito que se forma espontâneamente e de o formular em le3 e
(ct. HANS KELSEN, Allgemeine Staatslehre, 1925). Mas, seja como fôr, o Estado pode definir-se como "'a centralizaço neste ponto as divergencias,
permanecem
politica ß
juridicade uma nação, operada por um govôrno munido de poderes de coerçao, Parde fim de organizat um protetorado da vida civil".
sOCIOL0GIA EDUCACIONAL
255
förça pela lei, nas relações entre cidadãos, do regime de dominacão política de umaclase por um regime de igualdade de direitos, do culto exclusivo da förça por um sistema de liberdade, marca o desenvolvi. mentodo Estado para as formas democráticas que se caracterizam, em sua esséncia, 1) pela liberdade do ato eleitoral que torna legitimo o poder, 2) pela divisäo dos poderes, e 3) pelo contrôle da autoridade, isto é, pelo mecanismo que permite chamar a contas, perante os cidados
em nome dos quais são exercidos, os poderes de decisão e de execução, Atransformação do regime econömico pelas invenções técnicas, os meios de transporte e os de difusão do pensamento, ademagogia fi
nanceira conseqüente à combinação do sufrágio universal com a hi
pertrofia do Estado, aplutocracia engendrada pela demagogia e, por
im, aconfusão de poderes determinando choques violentos e profun
das mudanças nas estruturas sociais e politicas, deram lugar às novas
formas de Estado, como reações autoritárias nascidas da anarquia que
as precedera. Os conflitos de interésses econômicos e de ideologias ex tremistas contribuiram notàvelmente para desenvolver a vontade de unidade e de poder, dos Estados nascentes, e, em conseqüência, o po der, que nunca foi tão avassalador, do Estado, fortalecido pelo medo das lutas intestinas e pelo temor da guerra. O liberalismo politico e
econômico repousava essencialmente sôbre uma concepção otimista
da vida social, sôbre o princípio de que "tudo se acomoda ou ao me nos tudo acaba por se acomodar por si mesmo". Nada mais estra nho ao Estado moderno do que essa confiança numa ordem automá
tica a que sucedeu a convicção de que o homem tem necessidade de
ser perpétuamente comandado e mantido em tutela (economia diri
gida: culura dirigida) e, portanto, de que são inoperantes, senão intole ráveis, as alternativas de um govèrno responsável, com poderes limita dos. A desordem e a insurreição ficaram as únicas válvulas abertas à von tade e representação das massas, em regimes que, para se mante
rem (tão longe estão de serem formas naturais de govèrno), pre
cisam de uma propaganda persistente, de uma censura rigida e de
uma repressão violenta contra os adversários. Seria, porem, um êrro Julgar que opoder politico, ainda em tais sistemas, não se sustente se
não pelas baionetas: "on peut tout faire avec les baionnettes, dizia
Talleyrand, sauf s'asseoir dessus...". Dai o aplo que fazem os Estados totalitários à mistica ou aos suportes imateriais do poder, que é pre CISO procurar mais longe, além de seus simbolos. Não s£o sòmente os
poderes primitivos que se apoiaram nessas fòrças imateriais do poder
(a que Merriam chama os miranda e os credenda): dos povos antigos aos modernos, os Estados sempre se utilizaram de tôda uma simbolica
(cerimônias, comemorações, paradas, etc.), certo número de artigos
de lé (mistica), ou que o poder vem de Deus (omnis potestas a Deo).
0u que éle exprime a vontade da maioria (sutrágio universal), ou, nos tempos modernos, amística da classe (Estado soviético), da raça (Es tado nacional-socialista) ou do Estado (fascismo). Em todo caso, seja qual fôr o regime, uma fornma de Estado é
tanto mais durável quanto melhor combine istes us ideais: ) opo
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256
der e o rigor na ação; 2) o respeito da vida privadac o bem-estar dos individuos, e $) uma faculdade de adaptação rápida no caso de usura das instituições. A sua estabilidade depende menos do poder das ar mas (fôrça) do que da redução dos pontos de fricção ou de atrito no
jogo livre do mecanismo das instituições politicas, da rapidez e duti
lidade de reações e do seu sistema de válvulas de segurança, no caso de irritação popular ou dos grandes fenômenos de massa e movimen tos de opinião. Mas o que distingue o Estado moderno, além da pre
dominância das funções econômicas e do fortalecimento do poder exe
cutivo (regime autoritário), o alargamento das funções do Estado para oqual passaram ou tendem a transferir-se muitos serviços outrora as segurados pela economia e pelas atividades privadas. Se a defesa nacio
nal e a manutenção da ordem no interior permanecenm as suas funçõcs essenciais, surgiram outras funções mais positivas que o Estado desem
penha e se sente hoje no dever de realizar, além da guerra eda con servação da ordem interna. A máquina governamental tornou-se ex
traordinàriamente mais complexa, com as novas funções de que se sobrecarregou, como, entre outras, a organizaço de transportes, a de
fesa sanitária e a instrução com que se substituíram ou se completa ram as instituições privadas por serviços públicos. A distinção funda
mental ou, ao menos, uma das distinções entre o socialismo e oindi
vidualismo repousa mesmo, como observou Bertrand Russell, sôbre as funções habituais, não essenciais do Estado, "que os socialistas querem
estender, e os individualistas, restringir", A questão, porém, de se saber
quais as atividades que devem incidir sob a ingerência ou direção do
público está ligada, segundo Dewey, à distinço primordial entre "público" e "privado". Éprivada a ação cujas conseqüências se limitam
ou se crêm limitadas principalmente às pessoas compreendidas na
ransação, e o ato adquire capacidade pública quando as suas conse
qüências se estendem além das pessoas diretamente atingidas. Assim
quanto mais gravese extensas são as conseqüências de determinados atos
e mais viva a percepço delas, tanto mais êsses atos, afetados de interèsse público, por causa da expansão quantitativa de suas conseqüncias, ten
dem a transferir-se do dominio privado para a esfera do público ou, por
outras palavras, para a esfera de atribuições do Estado (1).
Ora, se o que importa, para se examinar experimentalmente se
uma atividade socialé ou n¥o função pública, "é verificar o caráter (1)J. A gravidade e a eztensão conseqüências atos ¶ que processos determinam, como observa Dewey, a transferência de das formas de ass un tos dos privados políttcos normais;tbda e a perda da consciência queseostransladem efeitos de certas atos (por náo atingem a comunidade faz comdeque outras idéias, formas atitudes de vida ou social zemplo, ritos e renças religiosas) do domínio público para o privado. Para Bertrand o Estado tem o direito de intervir, is to é, de exercer habitualmente uma atividade,
como uma função pública, em todos os casos em que aprosperidade ou o bem-estar goral
de uma sociedade pràticamente da deaquisição de certo (sn; tário,tôda espiritual, econômico depende ) de condições de Baúde, conhecimentos e de minimum vida espiritual
que interessam a comunidade inteira. O Estado desempenha en tão essa função de saude, Instrução ou economia para que êsse minimum possa ser atingido. £ o caso das leis sn
tárias, das medidas preventivas contra as moléstias contagiosas oda instrução primaa obrigatória. (J. DEWÉY, The public and its problems; B. RUSSELL, Principles of social ne construction ).
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
257
extenso das consequèncias, no espaço e no tempo, sua natureza fixa, uniforme e periodica, e sua qualidade de irreparáveis", tornase evi-
dente que a cducação de que resultam as mais inportantes e graves conseqüèncias para o conjunto social, prcenche tôdas essas caracteristi.
cas gue definem o ato públicoe justificam a sua transferência para o dominio público. Acresce que o periodo no qual a educação é possí
vel. de modo eficaz e no mais alto grau, é o da infância e o da adoles cência, c, se não se aproveitam essas idades, as conseqüèncias são ime Daráveis. A existência de massas ignorantes numa população, escreve Bertrand Russell, constitui um perigo para a sociedade; quando há uma considerável porcentagem de iletrados, o mecanismo governamen tal obrigado a levar em consideração ésse fato, tanto mais quanto a democracia, na sua forma moderna, seria totalmente impossivel para
uma nação onde a maior parte dos cidadãos não soubesen ler. É evi
dente, acrescenta, que só o Estado pode insistir sôbre a necessidade de assegurar a tódas as crianças o minimum de conhecimentos e de
cuidados que possam atualmente satisfazer a consciència da comuni
dade. Além disso, o Estado desenvolve-se segundo uma lei orgånica de
integração e de diferenciação: assimilação progressiva (lingua, costu mes) bastante grande de uns aos outros, para que, apesar de sua desi gualdade fundamental, ofereçam aos outros povos uma frente única ou se apresentem como um todo orgânico e coeso. £ste, o papel da escola primária e, até certo nivel, do ensino médio. Mas sempre, em
face da integração, a diferenciação: as escolas profissionais, secundá rias ou superiores, destinam-se à preparação, de intersse igualmente vital para a coletividade, para as classes e grupos profissionais em que
se divide a sociedade geral e que atendem, pelas suas atividades espe
cificas, anecessidades fundamentais da comunidade. Que o ensino seja. pois, no estado atual da civilizaço, uma funço do Estado, já não pa rece possivel discutir, e bastará, para prová-lo não só a) a observação
dsse fato essencial de que o Estado, além da organização do sistema
escolar público, mantém geralmente, sob o seu controle, as institui çöes particulares do ensino de todos os tipos e graus, como também
b) a análise das somas crescentes que se elevam em alguns paises a 20 % dos orçamentos gerais, consagradas ao exercicio dessa função. Admitido êsse princípio de que a educação é uma funço eminen temente pública e reconhecido o fato de que, em matéria de ensino, se tem alargado constantemente a função do Estado, pergunta se: qual o objeto do ensino público? A educaço como função do Estado está certamente condicionada, segundo observa Poviña, à lz dos fatos, "por um ideal relativo de acordo com o meio e o tempo, não só do ponto
de vista fisico, como também do ponto de vista intelectual e moral; e ésse duplo ponto de vista é sempre o mais conveniente aos fins pró
prios da comunidade, relegado ao segundo plano o ponto de vista pu
FERNANDO DE AZEVEDo 258
individual e pessoal" (). O Estado
ramente propõe-se ou a) a conduzir o indivíduo à humanidade, por uma cultura geral
cfetivamente para certos, é o próprio objeto da civilização, ou a públioque, educando à sua futura função social: oficio, profissão, b)cargo adaptar co ou privado: ou ainda, ) quando preocupado sobretudo COm OS
seus próprios fins politicos, a fazer do indivíduo um cidadão ou
mesmo um partidário, "cujo pensamento e coração não tenham ou
objeto que a coisa pública. representada por uma raça, por uma din
tia ou por um homem". Mfas, como pondera G. Monod, se. isolad por abstração essas tendèncias umas das outras, se poderá dizer "oue primeira caracterizaria atualmente os Estados democráticos, de ideal b. mano: a segunda, os Estados socialistas, e a terceira, os Estados de forma fascista ou totalitária", na verdade, elas se misturam e se
binam, em proporções diferentes, conforme as tendências dominantes
de cada Estado, nas diversas fases de sua evolução. "Na realidade, e
pelo próprio fato de que nenhum regime politico contemporâneo res
ponde a uma forma ideológica perfeitamente simples, escreve Monod.
essas tendências agem simultâneamente e de forma contraditória nas
diversas organizações da instrução pública. O sistema francês pode ser
tomado por exemplo: de uma parte o Estado francês sanciona a cul tura geral, de forma literária ou cientifica, por graus ou diplomas que confere; de outra parte, organiza o ensino técnico e profissional que se esforça por adaptar às necessidades da vida econômica e social; e, enfim, nestes anos de 1934-1935, é cada vez mais solicitado a instituir certas
formas de educaço
nacional capazes de reforçar, na criança, as virtu
des civicas e militares".
Esta úlima tendência de utilizar a escola como instrumento poli tico (instrumentum regni) e de fazer da criança não sòmente um cida dão (o que émais ou menos procurado em todos os sistenas), mas
um "partidário", é, sem dúvida, singularmente marcada nos Estados
totalitários. Num regime, como o democrático, que não é senão "a substituição do tradicional pelo racional", como se exprime Fr. Nitti;
cuja vitalidade está fundada na existência dos partidos (pluralidade
de partidos), e em que, em conseqüência, oEstado
mais "direção"
e menos "dominação", não se conceberia nem épossivel a regulamen tação autoritária da educação pelo Estado, para manejar osistema escolar como um instrumento político de dominação. Mas éesta exa tamente a tendéncia natural, em Estados totalitários (comunista, fascista ou nacional-socialista), em que o poder é o seu fim mais torte
mente procurado, para assegurar a ordem interna e possuir a maior () Contudo, para corrigir o excesso de estandardização do Estado, pela sua vontade
de poder e de unidade, existem, em tôdas a sOciedades, outros órgãos de educaçdo,
quais o mais importante, pelas suas caraterísticas, é a família: órgão de educaçao m
individual, vida sOcial em germe, "a tamília que educa para si, nas expressões de da ovida experiência achase em tae da escola que educa e e a primeira um contrapêso pare o sOcial, na medida en que eflete a sociedade em Ptura Ainda como
Go Esigdo educador, funcion am numerosas instituicões particulares, relativamente n e Gentes (escolas de todos os tipos e grgus ), pelas quais o Estado atinge os seus m s l e
sáo respeiladas na sua autonomia, dentro de certos limites, enguanto dão ao Estado a s g rança de estarem à altura de sug missão. Nos países anglo-saxônios, porém, quase Oensino superior e, por uma larga parte, o ensino secundário ficam assegurados por og nismos privados ou exteriores ao Estado.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
259
força exterior possivel, c que, reclamando para si uma jurisdição cada vez maior sóbre a vida dos individuos, mantém o seu poder sotberano, fazendo um apélo constante à fôrça niveladora, ampliando o raio de s ne oda autoridade e intens1ticando a sua intervencão em todos artido
ios. Todos os esforços do Estado, identificado com olador, tendem nesses regimes autoritärios, de um despotismo avassa que deve encar
abricacão e oacabamento do tupo do homem novo" r oregime, e a modelar, portanto, o homen à sua própria imagem:
n a d e seus sistemas de educação. Oque se chama hoje ditadura,
hserva com notávcl lucidez Paul Valéry, vem a ser um ensaio para tra o modio forne. tar a fabricação contínua da "ordem social" conforme indústrias mo das cido pelas vastas emprèsas, extremamente complexas, de uma forçosamente denas. Todos os seus mecanismos devem ser absoluta, suprimindo-se permanentemente os desvios indivi perfeição duais. Quaisquer que sejam as diterenças nominais e ideais, o que lhes
aprovei torna possível a existência é a simplificação dos individuos, do E atividade de campo no condições tados todos em igualdade de inte e afetivo fundo tado; e épreciso que a modificaço atinja até o lectual de cada um déles (1). É, pois, indispensável que, antes de serem
consumidos pelos espíritos e de servirem de nutrição às almas, uma "entidade central" elabore prèviamente os sentimentos, as idéias, os
impulsos. A essa entidade ùnicamente (Duce, Führer) pertencem o
"psiquismo superior" e a apacidade de agir na sua plenitude. Só ele
éo único "homem completo" da nação, e, "patenteia portanto, em nossa época êle uma vez ou e para seu povo, uma espécie de semideus:
outra, por meio de atos simbólicos, que na sua pessoa se concretizam
os principios de todos os "ofícios", ora pegando na enxada, ora se
meando, ora assestando um canhão, ora conduzindo uma máquina ou
aparecendo também como o principe dos atletas...". Mas, por maior que seja a ação do Estado, em matéria educacio nal, não se pode deixar de reconhecer, conforme já lembrei em outro
livro(2), o papel das iniciativas privadas e como essas duas formas
(pública e particular) de atividades educacionais seguiram até hoje os
seus destinos paralelos. É fácil, de fato, verificar não sòmente a coexis téncia das instituições públicas e privadas de ensino e educação, mas
também ofato de que as condições favoráveis à eclosão e ao desenvol
vinento dos sistemas educacionais públicos são muitas vzes as mesmas
que intluem sôbre o nascimento e o imnpulso dos focos de atividade
Iivre, no ensino. Certamente, se a tendência a substituir a organizaçio
espontànea por uma organização voluntária, a ampliticaçio das funçöes ) Em tal regime que se apóia,
an tes de tudo, sobre o poder ds
na,
ea
cOnseqüência, tende à exaltacão dos valores vitais e guerreros, a educugo haica. mit o nih tarsno es io, desde teenlca passa para o primeiro plano, A educação ntelectualde opressdo dos ruiu um ma Suas origens, em razão inversa. Ora, nunca uma nedida palavra magni conve n recordar Ou uma crença, cujas fontes permanecemdegrada intatas.s. osAliás, cidadaos para deles fuzet natrumea os tica de Stuart Mill, "um Estado que pe no próprio in terèsse déles. perceberd que. con mesmo mâos, suas de es em nada uenos homens grande poderá ser realizado; e quea perteiqo das nsuruiçtes.
qual tudo foi sacrificado
acabará por ser inúul ean rado da talta de drqu vital que,
Estado preieriu buar. ad 4ue a náquina pudesse tuncionar sen atritos, o páys 133-155. 3° digo. educuçdo, de Política seus problemas
23 V. A Educaçáo e Companhia Melhoramentos do S. Paulo, 1953. t8 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
260
de seu raio de ação imnlico do Estado e o alargamento constante estádicas ou estatistas", não se no um "progresso para as tendênciasliberalismo cujos princípios são nais concluir daí nem que morreu o que o estatismo velhos do que tôdas as constituiçõcs existentes, nem que se cons oscilação Essa tudo. a bom para alguma coisa, pode bastar do estatismo e do tata dos Estados e das doutrinas, entre os dois pólos atingiu liberalismo denuncia apenas o periodo crítico queorganizaçãoademocra. cada ve, cia no seu processo de adaptação a formas de da per. ou equilibrio mais complexas e que se traduz na ruptura do socieda. e Estado muta recíproca entre autoridade e liberdade, entre conscientes. entre de, entre constrangimentos impostos e comunhõcs a decadència da be. vOcações pessoais eo destino do grupo. Mas, com como lembra reditariedade monárquia, o princípio liberal pernanece,qual as grandes conhecido pelo Walter Lippmann, "o único principio e continua". Além disso. nações podem ser governadas de maneira Brocard, que fato de do L. êste é um ponto capital esclarecido por liberalismo tradicional, reaiza o concebeu a como a concorrência, tal não cada vez menos a ordem perfeita (na economia como na cducação) que e isto para ainda se deve concluir que ela não possa contribuir e se tira, pela regulamentação seja possivel suprimi-la. Tudo o que econômica dá-se educacional, ou pela ação do Estado, à concorréncia à e, por isto, concorréncia politica. à luta para a conquista do Estado, "está em saber qual é, dessas duas Tôda a questão, conclui Brocard, formas da concorrência e da luta, a que vale mais, ou antes, - pois que uma e outra são inelutáveis, - qual a parte que é preciso conce der a cada uma delas".
como Essa questão está ligada ao problema geral que se estabelece, tém o cuidado observa Bertrand Russell, para todos aquêles que ainda e a harmo unir tendente a de um ideal inspirado por um liberalismo com a organização. Parece do nizar a liberdade e a iniciativa pessoal estabilidade deslocar a concor próprio interêsse do Estado e de sua Estado, réncia do terreno político, isto é, da luta para a conquista do
sem deixar de exercer para o terreno econômico e educacional e, indispensável, facilitar a maior parte possível de iniciativa
contrôle organizações particular e deixar as aparências de govêrno nas mãos de frações de op voluntárias. Tôdas essas organizações que representarn particulares, escolas e nião, como sindicatos e cooperativas, associações da li salvaguardas leigas ou confessionais, devem ser acolhidas "comosem insistir sôbre a berdade e estímulos da iniciativa privada". Mas, e man uniformidade dos sistemas, como o fazem os Estados totalitários exceções, restaria ainda tendo mesmo a maior tolerância para com as taretas que
duas aos Estados, em qualquer regime, realizar ao menos chama a atençao quais alguns d¿les já começam a perceber e para asmeio de extenmedidas de G. Monod: 1) entreter no corpo social, por extensão unide são e difusão cultural (educaço de adultos, cursos intelectual que o vida versitária e em geral, o ensino post-escolar) a exissua tal ensino procurou despertar; 2) assegurar à ciência como Monod, tência e seus progressos. É ésse um problema novo, escreve
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
261
tendo os Estados até o presente velado antes pelo ensino da ciência do que pela sua criação. Oencorajamento das pesquisas científicas entra assim na categoria das administrações do Estado, "porque os benefi cios de uma descoberta aumentam o bem-estar da comunidade, as pes quisas impõem geralmente grandes despesase nunca se estácerto do re
sultadodos trabalhos individuais". E se se considerar que, para uma de mocracia, a educação constitui uma das principais exigncias do próprio
regime, c que a promoção dos valores espirituais interessa fundamental
mente às sociedades humanas, compreender-se-ácomo e porque os proble
Inas de educação e cultura, caindo na órbita do interêsse coletivo, entram na esfera das preocupações dos Estados e têm as soluções que lhes su gerem as suas doutrinas, os seus fins políticos e os seus tenperamentos. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. Ainda numa tribo nômade ou numa horda gernånica, escreve Félix Pécaut,
bá diferenciação de governan tes e de governados, não Estado ou regime de Estado.
O Estado é um fenômeno social próprio de certas ivilizações, e dle não se pode falar scnão a propósito "de grandes sociedades como as nações saídas da feudalidade ou das que se acham nos cinco ou seis séculos que precedem a nossa era e de que
o Império Romano éo exemplo mais considerável e mais típico". Examinar e discutir as fases dominantes das origens e da formação do Estado: a) nas origens de Atenas, de Roma e na Idade Média, as instituições
primárias existentes antes do Estado, isto é, as instituições feudais, cujo traço
essencial éque o poder politico está ligado à patrimonialidade (o direito do
suserano sôbre os súditos provém do direito que ele tem sôbre a sua terra) e
éfragmentado entre inúmeros despotismos individuais, sern unidade real, de
homens poderosos que têm clientes e vassalos;
b) a formação pouco a pouco de um enorme poder de domina_ão dos grandes suseranos edepois, dos reis), que se estabelece söbre as instituições
feudais como uma superestrutura e acaba por abater os senhores e governar
só, impondo a unidade a tóda nação e realizando a centraiaçio politia: a
formaço do Estado »o poder executivo que vem primeiro: ), aseparação do poder político, da posse da terra (o poder politico é separado da patrimonialidade) e a criação do direito por esse poder de domi
nação, com a adeso da consciència públia que iransforma a förça em
direito, e éa consciència necessária dessa transtormaçio; d)
o desenvolvimento das relações juridicas interindividuais, com os
progressos da diviso do trabalho, do comérdo e com a formaçio das cidades, "resultado e fatôres dessa
transformação", -e em conseqúència, o desenvol vimento da sociedade civil que se distingue do Estado e constitui o privado em relação ao poblico (F. PÉCAUT, La sociologie politique, in Revue Péda gogique, Nouv. Serie, t. 79, n.° 10, Octobre, 1921).
Aseparaço do poder politico, antes ligado à patrimonialidade. a organiaçdo da adesão popular, "difusa, mas presente dexde a aurora da evolução poltia. e a distinção entre a vida pública e a vida privada são os primeiros pasos para a democraia que se desenvolve comn a separaçáo dos poderes (evecutivo, judiaário e
legislativo) ea criação do poder eletivo pelo exericio do direito do voto, uma popular, - e as variaçóe de certas propriedades das sociedades (volume, densidade. heterogeneidade, complicação) a que Bouglé liga as idéias igualiárias que aceleraram a evoluçdo para as formas democráticas. 2 As condições especiais de cada pais inclinam a vida poliuca ora para a
das tormas por que se manifesta a opinio
lWberdade ora para a autoridade. Segundo as circunståncias os pov como os regime,
FERNANDO DE AZEVEDo
262
osilam de uma para outra. A tarefa de realizar é difiil c omplexae cice
ts
a acio? Voltam se para a autoridade, como nos casos de guera. Realizada a obra a liberdade reclama os seus direitos. Analisar êstes pontos capitais:
e) o Estado é a onganização do poder politico apoiado sobre a colahe.
racão a força e do direito, para fins colctivos, com funçõcs esscnciais (lcrisla ivas, executivas e judiiárias) centralizadas num sÑ poder ou distribûidas por óngãos espeiais (divisão ou diferenciaço de poderes): b) o Estado por esséncia é fôrça, e enquanto puder repousa sôbre a
förça das armas, mas quando chegou a completar o istea de seu poder Dt um sistema juridico, essa förça é consagrada c limnitada pelo direito,
cssëncia é marcar a todo o poder suas fronteiras: oEstado gucrrciro pa a ser um Estado jurídico;
) o dualismo entre o poder e o direito é eterno e rcpousa sóbre o antagonismo entre a förça e a "forma", e éa forma que organiza a förca Os dois clementos são esscnciais e se completam reciprocanente: o poder sem
odireito. como o direito sem fôrça levam ao arbítrio perecerem, e à anarquia; daf o claborar-se
fato de gue tôdas as ditaduras procuram, para não uma "forma de direito" ou um sistema de leis;
d) aruptura do equilíbrio entre o direito e a förça co predoninio da
förça söbre odireito, de disciplina (ordem mecånica) sobre a justiça (orden orgánica) dão lugar àditadura, ao Estado totalitário, que, repousando sôbre a förça, tende a organizar-se militarmente, a voltar às formas primitivas do
Estado guerreiro: o Estado é, em conseqüência, militarista e imperialista.
Estas duas tendências para a liberdade e para a autoridade encarnaram-se, na
antiguidade, em Atenas, "a cidadela avançada da democracia, a guardiã da pessoa
humana, a protetora da liberdade", e em Esparta, oregime da disciplina eda auto ridade, um estado de guerra permanente; Atenas, o ideal do Estádo democrático, em que o Estado vive para o homem; Esparta, o ideal do Estado guerreiro, em que
o individuo vive para o Estado. Na civilização atual, a Inglaterra, por exemplo, é
uma cxpressão da democracia e do Estado juridico, e o Estado guerreiro era representado, no mais alto grau, pela Alemanha. (R. COUDENHOVE-KALERGI, L'homme et l'État totalitaire, trad. de Marcel Beaufils, Paris, Librairie Plon). 3.
Analisar e discutir os princípios fundamentais da doutrina que, ausente ou
invisível, na origem do movimento, reside hoje à base do regime totalitário e justifica, nesse regime, o primado do Estado: a)
a idéa de que o individuo não pode existir seno
na sociedade e
pela soiedade e da qual tirou ofascismo italiano uma apologia do Estado encarado como a encarnação do absoluto, "um fim em si mesmo" (uma "estatocraia" que chega não sòmente a uma "monocraia" mas a uma "auto
raia");
b) todo o poder apóia-se sôbre a fôrça (as armas), mas atrás de suas
proteções materiais, põe em jogo, para sustentar-se, tôda uma simbólica ou uma mística (a mística do Estado divino, omnis potestas a Deo; a demorática da soberania do povo; a mística de classe, de raça e de mística naçáo,
respectivamente no Estado comunista, nazista, fascista);
c) se o Estado é um fim em si mesmno e se o indivíduo existe para o
Estado e não éste para o indivíduo, pode tle e deve suprimir as liberdades, nobilizar a opinião pública e impor a unidade à nação para atingir os seus fins politicos; o Estado totalitáio que repousa sôbre o princípio de autoridade edisciplina, é "unificador e nivelador" por excelência. Em scu livro L'empire fasciste (Paris, Sirey, 1987) MARCEL PRELOT um quadro instrutivo e tão objetivo quanto possível", comenta Bouglé, dasapresenta instutul çóes fascistas e expõe a doutrina em gue se apóiam e "que comporta não sòmente uma confissão mística (à maneira de Sorel) ou uma explicação psicológica (cono a que enta Panunzio) mas uma demonstracão (de que os elementos sociológica são tomados aos e discursos livros de Rocco e de 1. Ea educação uma "função pública"? qual Gentile)". do Estado em nateta de educaço? Para responder a essas questões ligadas, oporpapel sua natureza, ao probieme
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
263
das relações entre acducação e o Estado, é preciso estabelecer preliminarmente uma
distincáo táo nítida quanto possível entre "público" e "privado", isto é, analisar público. Ora, e fxar a natureza do
a) a questão sobre quais os fatos que se devem deixar no possivel à
iniiativa eà conveniência particulares e quais os que devem cair ob a
ingeréncia c direção do público (do Estado) uma questão, oberva Dewey. de temp0, de lugar e de condições concretas, que só se podem con hecer por
métodos de investigação social;
b
alinha divisória entre o público e o privado deve traçarse, segundo
Dewey, sôbre a base da extensáo e do alcance das conseqüências dos atos que são tão importantes que necessitam ser governados já por inibicio, iá nor promoço; ou uma assim, para se cxaminar experimentalmente se uma atividade ) é
social (a educação, por exemplo) é ou não uma função públia, função preciso verificar l) o caráter extenso das conseqüèncias no tenpo e no espaço:
irreparáveis. 2) uma naturcza fixa, uniforme e periódica, e 3) sua qualidade de esfera par da educação Examinar se existe realmente a tendncia de pasar apúblicas e se a normais ticular para a do Estado, como uma de suas funções define que C) letra da 3. 2 e 1, (nos. educação preenche tôdas cssas caracteristicas Estado. do domínio o para transferência o ato público e justificam a sua do dominio púbico 5. É um fato observado que, assim como se transladaram perda da consciènda
os ritos e crenças religiosas pela comunidade inteira, para o privado, por exemplo,devoção e da impiedade atingiam a de que as conseqüências da passaram também para processos politicos normais ou
formas de assuntos privados afetadas de interèsse público. E sua expansão quantitativa, se viram, por causa da atividades transferncia da e práticas educativas. Analisar a o que se deu com as explicam: e a determinaram educação escolar para o Estado e os fatos que a sua própria naturera. a) o papel assimilador do Estado que tende,quepelaprejudica a vida comum o tudo suprimir a instituições, a "homogeneizar as de assimila obra nessa ora, comum"; e a interessar os espiritos numa história poder fazer de outro modo, com todo ção que o Estado continua sempre, sem é um dos meios mais eficaes: o seu poder e todo o seu instinto, a escolacultura intelectual e moral. ela é espalhando por todo o território a mesma um dos maiores fatöres de assimilação; do Estado cuja ação se desdobrou b) a expansão crescente das funções regulador da irculaçio; o Estado o até a hipertrofia (o Estado produtor: para atender às novas necessidades Estado monopolizador do c£mbio, etc.) funções do Estado moderno. coletivas: a educação é uma das mais importantes condensador de energias equilibrio, como agente de coordenação, fator deunidade nacional: dispersas e elaborador da consciência e dos sistemas educacionais: pelo c) o crescimento e a complexidadegraus e tipos, pela complicação das número crescente de escolas de todos os vez maiores que reclama, tornou-se organizações escolares e pelos recursos cada de que, no seu conjunto só o Estado se a cducação uma obra ou um serviço consagradas à educaçio publica que atingem
poderia encarregar (cfr. as somas a França e o Japo, e se elevam a 0% para 7 a 9 % em países como a Itália,
a Suiça, a Suécia, a Dinamarca e outros). um "serviço público". tende natural OEstado, organizando a escola como 6. se prope. objetivos de interese geral que pois, os segundo educação, a orientar neces mente a Toda a educação públia impica, e vida de concepção como instituição de fins coletivos. determinada fins, uma sàriamente, na sua estrutura e nos seus pelo Estado, do Estado. É preciso, porém, distinguir: organizada e superintendida republicana) pública" "coisa uma a) a escola democrático (s0b forma monárquica ou
sufragio como no caso do Estado livre c, portanto, odiferente o poder é preferènca, legitino torna que eleitoral entre ato onde o com a sua iguais condições: universal pode escolher, de acôrdo
apresentan ao julgamento em partidos e programas que se
FERNANDO DE AZEVEDO 264
esnk de poder político" (instrunentum bea escola, instrumento a com onde, nazista) e ascista omo no Estado totalitário (comunista, rssen a condicão püblico, desaparece partido e o poderliberdadc, c;neal ato tiicação entre o democrática, o onde é, isto - a da legitimidade universal deve dar a sua aprovacão g B sufrágio o oreanizado pelo govêno e impôsto pelo govêrno. partido e programa único e Estados Unidos), a escola nL: No primciro caso (França, Inglaterra para todos e a etabe oportunidades de destina -se a proporcionar e iberdade. igualdade uma solidariedade orgånica que admite as diferencas: no num regime Irl: passados regimes do fascismo c do nazismo., scgundo caso (Rússia, como, nosutilizada verdadeie um político, como instrumento Alemanha) a cscola pública é unilor. em seu proveito, o reino daabsolta estabelecer, para Estado pclo monopólio exerido Sendo diferenças. as exclui que mecânica midade. isto é, uma solidariedade totalitário, não há mais perante a lei senão uma
a soberania exerdda pelo Estado político e social dessa expressio. csoola única, uma cducação única, no sentido nic e a doutrina da escola 7. Pôr em seus têrmos exatos a questão diversi. a e denominação, examinar os iferentes problem as que se levantam sob essa as suas necessidades dade de soluções que lhes foram dadas pelos Estados, conforme e os seus temperamentos: o qual se afir. a) o principio fundamental da "escola única", segundo a todos instrução a levar de sòmente ma "a obrigação para o Estado não mas ainda de assegurar a tôda crianca (escolaridade obrigatória c gratuita) sem que sua a possibilidade de desenvolver as suas aptidQes intelectuais, o Estado de provendo obstáculo, constituir situação social ou econômica possa MONOD); (G. necessidades" tôdas as maneiras as suas
escola primária única b) as instituições que derivam désse principio: profissional; orientação de sistema na base:; sistema de seleção das aptidões; aptos às mais dos acesso o permitindo exames, de regime de concursos e
diversas arreiras;
do programa da as etapas na realização mais ou menos completa primária única "escola Monod; G. por indicadas sumàriamente escola únia, dos (podendo aplicar-Se essa unidade aos programas e aos métodos; à origem )
escolar); professôres; a0 recrutamento dos alunos; ao tipo de estabelecinento de concurso, de seleção, de sistemas por realização da orientação profissionalsegundo de ou obrigação de regimes, os exames, etc. e om um caráter, estu e alunos sugestão; e, correlativamente, esfôrço por adaptar o número de
dantes às funções e carreiras a prover". a um Analisar a objeção feita à doutrina da escola única, de que ela chegava intervenção a e fascista, com "estatismo absoluto", como se deu nos regimes soviéticomocidade. No entanto, observa da orientação e formação na Estado quase absoluta do certas peças do que mostraram G. Monod, "os acontecimentos dêstes últimos anos inseridas na instituição social: ser mesmo deviam sistema não sòmente podiam, mas deixando aos regime liberal que, a chômage dos intelectuais revelou o perigo de um dos destino do decidir de aprichos individuais ou às emprésas comerciais o cuidado
jovens, expõe a soiedade às maiores desordens". (cfr. a questão no Brasil, os seus fundamenios, as iniiativas nesse sentido, e as soluções propostas). REFERÉNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO (Fernando de) - A educação e seus problemas (especialmente, O Estado Educaçáo, págs. 67-85. 3. edição, Companhia Melhoramentos de S. Paulo, 1953.
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Capitulo II POLÍTICA E EDUCAÇÃO A noção sociológica do politico". Os grupos sociais politicos. As lutas políticas e a sucessão normal dos partidos no poder. Regime demo cráico (multipartidário) e regime totalitário (unipartidário). A noção do interêssc geral.- A preponderância dos interêsses particularistas söbre o
intersse geral e a crise dos partidos.
A mediocrização das clites dirigentes.
-Ainterferéncia da politica na educação.
cação.
Politica geral e politica de edu
A cducação, "meio de exercer poder sôbre os individuos ou meio de
concorrer ao seu progresso?" - Política de educação e técnica. - 0 fenômeno
da revolução.
Revoluço
e educação.
Em tôdas as sociedades humanas há uma distinção nítida entre dirigentes e dirigidos, entre o sujito e o objeto do poder politico, isto é, do poder sobre o grupo como um todo, num território determinado. A não ser nas sociedades totêmicas em que parece ter sido de natureza
religiosa e difusa, a soberania, como vimos, logo que as sociedades se
fixaram no solo, se concentrou e se individualizou na pessoa dos che
fes sob forma feudal ou monárquica. Sem entrarmos na análise das origens do poder e da evolução de que saiu o Estado, sob o seu aspecto moderno, como superestrutura social, é fácil verificar que, sejam quais forem as formas políticas que assumiu ou foi suscetivel de revestir, o
poder politico éum "poder de dominação": por tòda parte onde se estabelecem grupos humanos que queiram durar, constitui-se, sob uma forma ou outra, uma autoridade e se exerce umn contrôle com o fim de estabelecer o equilibrio entre os individuos e os grupos coexis tentes no interior da sociedade, sancionar as obrigações e fazer, por
tanto, reinar a ordem social e assegurar a defesa num dado território.
Mas, se poder politico implica necessàriamente autoridade e subordi
nação e como tôda a autoridade, apesar de todos os seus apoios (mili
tar e mistico) está sempre ameaçada e nenhuma subordinaço é com
pleta, há, de um lado, um constante rabalho de recriação ou recons trução do poder, e, de outro, fôrças sociais que tendem a promover a
desagregação quando não lutas rancamente definidas para a conquista
do poder politico. A complicação da estrutura social e econômica das
sociedades e a conseqüente diferenciação em grupos, a divergència e o antagonismo de interêsses e a evolução das idéias democráticas torna
FERNANDO DE AZEVEDo
268
determina ram mais sistemáticas essas lutas em tôno do poder (1), e coletivida. ram, dos tempos antigos aos modernos, a formação dessas do poder, em forma de des em que se congregam, para a conquista vontades ou interêses coincidentes dos indivídu0s e Ct. as "partidos", pos. A tendência a se organizarem os indivíduos em grupos políticos ou partidos, para influirem sôbre o poder público ou dêle se apo derarem, parece, pois, um mecanismo natural e irreprimível na vida política que, nem por perder sua forma legal, nos regimes de fôrça, deixa de funcionar sob formas secretas, de caráter revolucionário,
O partido que constitui um "órgão de luta no campo político".
tem uma origem social natural e, por fundamento sociológico, a com batividade e a luta em tôrno do poder e a tendência à dominação. A
divisão dos partidos que, segundo a teoria biológica de Rohmer e Bluntschli, corresponde às idades da vida (a mocidade, partido liberal:
a maturidade, o conservador; a velhice, a do absolutismo) e tem a sua causa principal ou no conflito, sob uma forma coletiva, entre a tradi
e a inovação, segundo Tarde, ou na combatividade primitiva e ção no instinto de luta, conforme Sumner Maine (teorias fisiológicas), re
de pro presenta, na explicação econômica de Loria, as diversas formasdistinção priedade, tais como a terra e os capitais, como se verifica na entre os wighs e tories, guelfos e gibelinos, patrícios e plebeus. De modo geral, podem definir-se como grupos representativos de interês ou aspirações gerais de grupos consideráveis de indivíduos ou de ses classes, organizados para o combate e a conquista do poder ou, por outras palavras, de Poviña, "agrupamentos permanentes e organizados de cidadãos que, mediante a conquista legal do poder público, se pro põem realizar, na direção do Estado, um determinado programa polí
tico-social". Assim, pois, a) a agregação (organização interna e estru
tura exterior) de cidadãos; b) a conquista do poder poblico como fim
imediato e meio, efetuada por meios legais, e c) a realização, como que inte fim, de um programa político-social, são os três elementos natu a sua não só gram a noção sociológica dos partidos e definem reza e a função que lhes corresponde, como os caracteres distintivos que
os diferenciam de outras categorias sociológicas (classe, povo, etc.). Mas, se opartido preenche uma necessidade social na ordem política, que o objeto da política éa organização do Estado como expres sãopois da forma social do poder, e o sujeito coletivo ou agente político de lutas em tôrno aspecto dinâmico, (1) Foi por considerá-lo sòmente sob êsse 1932), procurando München, Politischen, des (Der Begritt KARL SCHMITT do fixarpoder, a noção que sociológica do "político'", es tabeleceu a tese de que, assim como para a ètica,
os conceitos fundamentais são o bem e o mal, para a estética, o belo e o feio, e para a
economia, o competidor e o rival, para a esfera do político figuram as categorias funda mentais de amigo e inimigo, ou de correligionário e adversário (mit und wegen ) como
elementos constitutivos en que se estribam a atividade e o pensamento políticos. De fato,
se os partidos que se organizam para a conquista do poder, são um meio e manifestação
dos prOcessos sociais de conflito e oposição (rivalidade ), êles não são nem a única nem a principal expressão do poder público que, na sug tormg estática, ten como elementos constitutivos a autoridade e a subordinacâo. A dicotomia da sociedade em dois blocos sociais (classes) ou políticos (partidos ) não é senão uma necess idade de luta e cono
que um "mito" necessário. Já Aristóteles, como lembra Sorel, observava que os demagogo:
não geral, se descuidavam nunca asociedade em dois campos. se"polittco,a em 6 aquêle que contadeatédividir dois ("amigo'" e "inimigo"), 6 certo Aliás, que treqüentenen te
conta até trôs,
as maiores revoluções não sáo as que são teitas por um dos dois, nas
por um terceiro (tertius gaudens... )."
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
269
como expressão do grupo é o partido, onde assume uma importân cia capital o papcl dos partidos, é nos governos de opinião.
democrático eregime de partidos são têrmos correlativos e de talRegime modo so condicionam que um supõe a existência do outro. Para que haja uma verdadeira opinião pública sôbre um assunto qualquer, a maio ria do povo, ensina Lowell (1), deve estar em condições de determinar, por scus próprios conhecimentos, uma parte essencial dos fatos neces sários, - ideal êsse tanto mais difícil quanto mais se estende a popu
lação e aumenta a complexidade das questões a resolver. Daí a neces
sidade dos partidos que, interpostos entre o indivíduo e a massa, de
um lado, e o Estado, de outro, canalizam de alguma sorte a opinião
e desempenham um papel de "corretores", atraindo as massas de ho mens sôbre um terreno em que possam entender-se para a apli
cação de uma política comum.
Ora, os par tidos politicos que se organizam para representarse ede fender intersses de grupos consideráveisde individuos ou de classes, po dem transformar-se em perigosas comunidades de interêsse privado, quer por vícios originários de organização, quer pela sua própria decom
posição sob a pressão de causas múltiplas e complexas. £les são, efeti
vamente, muitas vézes "corretores de intersses
particulares e não de
idéias gerais", poderosas associações parasitárias que se formam, para a
conquista do poder, menos para organizá-lo e manejá-lo como instru mento de aspirações públicas do que para explorá-lo em proveito de seus nembros. É sempre o que se dá quando, em uma sociedade deter minada, faltou à democracia política o substrato social, economico e cultural (como a organização de grupos que representam interèsses reais; sensibilidade e poder da opinião; sentimento do interèsse públi
co, etc.): os partidos então ou se organizam ou acabam por transfor
mar-se em agregações montadas para fins exclusivamente eleitorais, e incapazes de se moverem, a não ser em certos momentos, por objeti
vos ou impulsos de interêsse coletivo. Os partidos podem, pois, "dege nerar" e apresentam-se, nesse caso, sob uma forma patológica ou anor mal, - a facção, que dles se diferencia por seus propósitos particula res, sem programas superiores (formais ou reais) e, em especial, por seus meios ilegitimos e anormais para chegar ao poder. Eles pasam a constituir, como observa Poviña, "o caldo de cultura para ogerme que dará nascimento ao partido revolucionário (fascista, comunista)". em vez de desempenharem "a função de uma válvula de escapamento das explosões revolucionárias", conforme a teoria de Morse, de que todo o partido éuma organização que tomou o lugar de uma revo lução, como meio de terminar a luta e a oposição politica com um
"chamado aos eleitores", em lugar de acabar por um recurso à fôrça.
A crise dos partidos que entram em decomposiço é. pois, um dos sin tomas da crise da democracia, que se mantém em estreita correlação
com oregime de partidos nmúliplos. A essa crise periódica que, per turbando a sucessão normal dos partidos no poder, atinge, na sua cs (1) Paris, _LOWELL (A. 1924. L) - l'opiaion publique et le gouvernemeat populaire. Trad. de A. Jèze, Giard,
270
FERNANDO DE AZEVEDO
sência, o próprio mecanismo do regime democrático ou representativo,
sucedem regimes de fôrça, com a supressão do poder cletivo, e, em con seqüência da dissolução dos partidos, o predominio do econômico sôbre o político, o sistema de representação dos interêsses, com que se ins
tala o eleitor na moldura do grupo profissional, e o alargamento do
papel confiado aos técnicos nos negócios públicos. Mas, o partido poli
tico que é, por essência, o sujeito coletivo autntico
da politica, nas
verdadeiras democracias (regime de partido múltiplo), não desaparece nas falsas democracias, que são as novas formas de autocracia (reeime do partido único), entre as quais oscila, à maneira de pêndulo, o mun
do moderno e que são também regimes de partido (). Se a vida do Estado democrático está fundada na existència dos
partidos e a constituição dêstes éreclamada pelo próprio mecanismo do sistema representativo, a decadência dos partidos e o fracasso con seqüente do govèno parlamentar, tem de arrastar forçosamnente a do próprio regime democrático para dar lugar a qualquer das fornmas de govêrno autoritário. A decadência do regime de partidos provém de várias causas, entre as quais se podem destacar: 1) a incapacidade dos
governos parlamentares, em certos países, para administrar uma socie
dade complexa e altamente organizada e para movimentar o mecanis mo econômico, de modo a assegurar asubsistência de tôda a popula
ção; 2) a fragmentação excessiva dos grupos organizados de opinião e
a conseqüente pluralidade de partidos que, dividindo os pariamentos numa grande variedade de correntes, tornam as lutas políticas mais ásperas e violentas e amneaçam conduzir ao caos ou, ao menos, a uma
paralisia rônica; 3) e, afinal, a incapacidade de subordinação dos in
terêsses partidários ou particularistas ao interêsse geral. Entre essas cau sas, em que se alimenta, como em suas fontes de energia, a maré mon tante das ditaduras, a perda ou ausência do interêsse comum nos par
tidos, éa causa interna que, agindo no interior dêles, contribui mais fortemente para a sua desagregação. As outras causas são-lhes exterio
res, ou atuam de fora para dentro ou nas relações intergrupais, de par
tido para partido; esta é ogerme ou a fôrça interna que trabalha cons tantemente por decompôlos ou transformá-los em instituições para sitárias ou nocivas. Pois o sentimento do interêsse particular, mais concreto, é que é instintivo, e a noção do interêsse geral, idéia abs: trata, que não é concebivel senão aos espíritos capazes de abstraço,
- éuma qualidade adquirida, pela formação moral e intelectual, e sempre foi por tôda parte apan¯gio de poucos. Certamente, &se sen timento do interése comum, variável com as épocas e as nações, como
observa Julien Benda, apresentase, em certas épocas, com grande in (1) No govêrno sob o regime de partido múltiplo (democracia liberal ), "'são os par
tidos que dão orientação ao govêrno que obedece à vontade do partido; no reqime do par: tido único, ao con trário, é o partido que obedece ao chete do govêrno, executando a vontade". Mas, entre Qsses dois regimes, não é esta dierença assinalada por Oliveira idealismo na Constituição, edição,como 1939,observa pág. 201 ), a únicaGuglielmno nem a principal: ° que (0 separa essencialmente os dois 2. regines, justamente Ferrero, no regime democrático, o ato eleitoral que torna legítimo o poder, é livre, isto jul sufrágio pode escolher entre diferentes partidos e programas que se apresentam ao
gamento 'em iquais cond1ções; enquanto no regime totalitário, o ato eleitoral 6 organizado
pelo próprio govêrno, e o sufráqio universal, não tendo liberdade de escolha deve da a sua aprovação plebiscitária ao partido ou programa único impôsto pelo govôrno.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
271
tensidade, mas normal, como na Roma antiga, ou sob uma forma aguda
ou patológica, como entre os jacobinos, na França; mas sempre foi inicialmente um "movimento de cima para baixo", uma exaltacão de fôrças nacionais, por influència de uma pequena minoria e sob a su gestão de "mitos" (cfr. a grande variedade de "místicas" postas em cir
culação): e, quando o vemos experimentado pela massa, nas horas em que a pátria estáem perigo, "o que se produz na consciencia do povo,
éuma coincidncia do interse
particular com o interésse geral e, por
isto mesmo que o particular e o público se identificam, sob a pressão dos fatos, na consciência, é que temos a ilusão de que o sentimento do interésse comum é experimentado peia totalidade da nação" (1).
A preponderåncia, sôbre o interese geral, dos interésses parti
cularistas ou de grupos que levam os partidos a "parasitar" a adminis
tração pública, em lugar de servi-la, e a desmoralizar o regime, despres de nível das elites dirigentes. Não se pode, certamente, por um lado,
tigiando-se a si mesmos, é sem dúvida, um dos síntomas de abaixamento
compreender a ação dos lideres fora do meio que os impele e os sus tenta. Os tipos de lideres, como pondera Merriam, ao retomar o pro blema tão debatido hoje da leadership, "diferem como meio social no qual são colocados, com as tensões que se produzem no interior mes mo désses tipos, com suas exigèncias variáveis de prestigio ou de ideo logia. O lider éfunção de um tipo social dado e não poderia ser com
preendido sem éle"; e, conforme os diversos tipos de situações sociais,
os vários graus de tensão e as maneiras diferentes de abordar os pro
blemas, há um grande número de tipos de lideres e encontra-se,
entre os detentores do poder, grande número de qualidades, disposi
ções, aptidões e caracteristicas diferentes. Por outro lado, segundo as
sinalou Robert Michels, a direção politica e econômica não coincide
com a direção intelectual; e, por isto mesmo que elite não designa senão tocracia do cspirito (2). As democracias não julgam ter necessidade de sábios eas ditaduras, sempre desfavoráveis aos intelectuais, preten dem antes subjugá-los, e sòmente os apóiam quando éles não consti
superioridade pela posição nas alavancas de comando, não é uma aris
tuem anmeaça ou se põem ao seu serviço sem restrições. Mas, como os
direitos dos cidadãos se tornaram mais largos, escreve Salomon, comen tando Jean Lhomme, camadas sociais mais extensas acharam-se em con
diçöes de se elevar ao primeiro degrau da escala das funçôes politicas. E no recurso ao apoio das massas e no apèlo ao número que residem a um tempo osucesso das elites atuais (ctr. os regimes totalitários) e
as razöes de suas próximas decadèncias, declara èle: e as elites perpe (1) Ctr. FERNANDO DE AZEVEDO A educaçdo e seus problemas, págs 83-100. 3.0 edição, Companhia Melhoramentos de S. Paulo, 1953. (2) A sentença tempo de Marxnunca (no foram Manitesto ) no ó de tormadaalquma exata: "que déias dominantes de senão as idias classe domnan te. Pode-se dlzer, ao contrário, escreve G. Salomon, "que as idóias
dominan tes de uma vanguarda
Intelectual servem à revolução da ordem social, que os untelactugis funcanarios os ntelectuais das profissões liberais vâo muitas vèzes contra os ntersses que ales repre
sontamn ou administram. Os círculos das elites sáo in ternecun tes. A ques tâo esti an tes em
Baber que papel desempenham os intelectuais
- negócios'". Février, (G. 1930).SALOMON,
quata as suas coneres com a direao dos
n Revue lnternationale da Sociologie, 47.e Annèe. t. 11, Janvier
272
FERNANDO DE AZEVEDO
traram um verdadeiro suicidio, porque elas prepararam o terreno à
vitória do espírito gregário (espírito de corpo, espírito de classe). De
pois de terem exercido una influência sôbre a massa pela educação e
pela organização num sentido democrático, as elites aceitaram uma
"classificação de valores" que comportava sua própria condenação. A
explicação dos regimes de mediocrização e do retôrno aos despotismos e às barbáries está, para Jean Lhomme, que retoma a tese fundamental
de Ortega y Gasset (Rebelion de las massas), na queda absoluta do nível das elites contemporâneas e na elevação relativa das massas. A elite, como já frisamos, não se deve confundir com "classe"; clite éscleção social e aparece como instrumento e condição de progresso aos olhos dos que veem na desigualdade a causa de tôda a civilização. Aquestão da "clite", que depende da idéia de scleção, tem suas origens no darwinismo, segundo o qual a cvolução &
interpretada como uma "difereniação de funções"; e a seleção se encontra l) para
o acesso de cada classe, não sendo do número dos eleitos todos os que aspiram a
elevar-se: 2) para se manter e levar adiante sua dinastia, como se vÁ na destruição das famílias no apogeu de sua prosperidade, que se desmoronam pela ruína ou se extinguem pela esterilidade natural e voluntária. Ao contrário do que pensan os socialistas segundo os quais os indivíduos são muito menos colocados por seus dons
naturais do que pela herança e por suas rendas, "os homens de valot, de classe
inferior, diz Ammon, cessam de pertencer-lhe e as condições de educação favorecem
o desejo e a failidade de clevar-se". A luta não se produz senão entre elites, observa Salomon, e são sempre as minorias que se arrogam o direito de dirigir as massas.
Ora por infiltraço, ora por ascensão de todo um grup0, produz-se uma "substit ui
ção" da clite dominante. Foi Pareto que sistematizou os fatos de ascensão social, na sua teoria da "circulação" das elites. Em contraste com Marx, que pro dama a necessidade de uma circulação em sentido único, o acesso ao poder da
cdasse oprimida da idade precedente, Pareto toma conhecimento da queda e da
substituição das elites, da mudança interna na classe politica e do ritmo de accleracão
e de retardamento. Os autores que estudaram os fatos de circulação das elites e os
inquéritos sôbre a ascensão dos operários qualificados ou o recrutanmento dos iun donários, estão de acôrdo sôbre a "dinâmica ascensional" (Michels),
movimento êsse
que tende a precipitar-se em nossa época por diversas causas (a restrição dos nasci mentos, a renúnda a conservar sua posiço, a superprodução de intelectuais, a
proteção dos fracos, etc.). Tôda a elite deve ceder o seu lugar a uma outra, e
Jean Lhomme sublinha com razão o que é verdadeiramente novo: a lei de acclera
ção progressi va da substituiço e do nivelamento de tôda superioridade" (1).
Ora, se se considerar que o "sistema público de educação" é o sistema organizado, mantido e dirigido pelo Estado, será fácil com preender todo o interêsse sociológico, não só educacional mas politico, em encarar os problemas do ensino sob a ângulo da filosofia política
e da politica geral, isto é, em marcar olaço estreito que liga a orga
nização da instrução pública aos sistemas e aos regimes políticos. Não
há, evidentemente, política geral que não traga, de forma implicita
ou explícita, uma política de educação, e tôda a política de educação,
em conseqüéncia, varia "em função" da política geral e não toma seu
sentido concreto senão situada no conjunto e animada por um espi rito, isto é, por um plano de política geral. Ela é predeterminada, nas suas partes fundamentais, mais estáveis, pelas formas de estrutura so
(1) G. SALOMON- Problèmes de classes et délites, in Revue Internationale de So ciologie, 47.e Année, Jan vier Février, 1939. Ctr. MAURICE MURET, Grandeur des élites, Albin Michel, Paris, 1939.
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
273
cial, cconômica e politica, de cada pais, e se transforma mais ou menos
profundamente com o programa de valores que se propõe realizar a
casse ou o grupo politico que se instalou no poder, por meios paci Ciros ou não. É a classe ou o grupo governante que imprime o caráter
e dá otom à politica geral e, portanto, à politica de educação, variá
vel dentro dos limites prelixados pela realidade social e econömica e
das aspirações e exigèncias do partido que detém o poder (1). Se todo problema politico de construção ou de reforma está submetido a duas condições: a) de realizar um ideal ou apliar um programa e b) de
inspirarse nos dados da história ou da evolução geral da nação, épre. ciso distinguir, numa política educacional, a) os seus elementos pers
bectivos, históricos, que influem sôbre os "programas de valores", mo diticando-os, evariam de nação para nação, e b) os elementos prospe tivos, suprahistóricos que variam, dentro de certos limites, com os pro
gramas dos partidos ou grupos politicos que se sucedem no poder (re
Pime democrático) ou detenham o poder, com exclusão de outros parti
dos (regime totalitário). Assim, além do fato das relações constantes entre
uma politica geral (democrática ou totalitária, fascista ou comunista)
ea politica de educação, que dela deriva, podemos constatar ésse outro fato de que, em cada sistema de educação e em cada programa de ação educacional, os fins particulares ou especificos, de valor histórico, liga
dos ds condições objetivas da estrutura e da evolução de cada povo, e
os fins derivádos de uma "tábua de valores", organizados, segundo de
terminada concepção de vida, num programa politico (doutrinas que
o informam) combinam-se em proporções variáveis, conforme o maior
ou menor grau de "radicalismo de idéias" do grupo que detém o poder
e a maior ou menor fôrça de que dispõe, em dado momento, para
impô-las ou realizá-las. Se é certo que o ideal da democracia exclui a representação de classe, - pois os eleitos do povo falam (idealmente) em nome da nação inteira, - não émenos ver
dade que, ainda em regimes demoráticos, a classe governante éque ditari as dire trizes, de acôrdo com os seus interêses essenciais, à politica geral e, em conseq üència, à de educação. Foi, sem dúvida, o sufrágio universal, instituido com o progresso das idéias democráticas, que deu lugar ao desenvolvimento do ensino primário: mas aos da educação popular não ocorreu o fato de os progressos extasiaran que que, secomo lembra com Wladimir Weidle, "um analfabeto pode ter cultura superior ao
do leitor de jornais e que a escola primária obrigatória é perfeitamente compativel com a barbárie universal". Éo que se pôde observar na Rússia, cuja cultura. Do Império, ainda na época de seu maior esplendor, ficou sempre continada a uma elite. a que o povo continuava a opor uma espéie de resistènca menos larga,damas ou A Imais passiva. cultura classe dirigente, hoje de nivel extremamnente baixo, é atual mente bem mais próxima da cultura, muito mais homogenea do que antes da revo lução, da classe dirigida ou da população em geral; "o compartimento estanque que elite, já não existe. mas o separava, na Rússia de outrora, a cultura popular e a da pais, foi reduzda ao nivel nesse cultura, a tôda que é Po do Seu desaparecimento distancia, tâo grande no lmperio, entre a cultura da de uma técnica A cultura da antiga eite e elite e a da massa, reduziu-se, mas pela destruição doda espirito. A devastação, pela pela erradicação de tôda a atividade livre e criadora ao homem e à história, a dogmática marxista, de tòdas as ciências concernenles isto é, toxdo aquèle utihtário, n£o conhecimento suspeição relativamente a todo problemas. Politieu de
seus A educaçdo (1) Ctr. Fernando de Azevedo Melhoramento de S. Paulo, 1853. cação, págs. 133-155. 3.4 edição. Companhia
edu
FERNANDO DE AZEVEDO 274
sem tréguas cont aue emnenha a personalidade inteira do individuo, c a lutaobra de destruicão dà completaram essa ida religiosa que se prctendeu extinguir, sotido uma revolução, observaa Ace tenha quc um pais de destino nltura. 0 tudo do compromisso que cssa revolução cedo de "depende antes respeito Weidle, à qual será sempre preiso saciic realidade, a com concluir o tarde fôr levada a de uma ideologia, duma trndiu alguma coisa: o compromisso se faz, pois, à custa na Rússia foi fcita sobret Estado: de um duma camada social, do poder exterior russa". a cxpensas da cultura
Tem, pois, tôda razão Berturand Russell quando afirma que tàd,
educacão tem um fim politico e que ela visa retorçar um grupo nacional ou religioso, ou mesmo soCial, em concorrência com outros êsse motivo, como justamente observa, que grupos. É principalmente o conhecimento oferecido, o co programas de estudos,
determina os
e que decide também que hábitos de espirit devem ser incutidos nos alunos (1). Se assimn é, na verdade, não se pode dizer que a educação seja "um meio de exercer poder sôbre os indivi.
nhecimento subtraido,
duos ou meio de concoIrer ao seu progresso", como se êsses dois fins se excluíssem necessarianente e não houvesse antes a preponderância de um ou de outro, conforme os regimes políticos. Foi Simmel que es
tabeleceu a distinção entre os diversos tipos de superioridade, conforme
t exercida por um individuo, por um grupo ou por um principio cole
tivo superior aos individuos. No caso das monarquias absolutas ou
dos modernos Estados totalitários em que se dá a subordinação da socie dade (povo, nação) a um só individuo (Führer, Duce), como essa sub
ordinação tem por conseqüência normal a "unificação" dos grupos e
dos individuos, dominando-os o chefe com a sua personalidade inteira, a educação, manejada como arma politica, éantes um meio de exercer poder sôbre os indivíduos, sem deixar, contudo, de ser um meio de
concorrer ao seu progresso. Os individuos são instruídos e educados por
meio de deformações, de supressões e de sugestões de tôda ordem,
de acôrdo com os interêsses e as aspirações da política dominante (mis tica de classe, de raça, de nação). Mas, se o que se instalou é um regime liberal democrático, em que a superioridade de um princípio, de um ideal impessoal que se eleva acima de todos os individuos, torna a su
jeição menos pesada aos governados, e em que antes se pretende pro
mover a "união" do que impor a "unidade'", a educação é antes um "meio de concorrer ao progresso do indivíduo", de favorecer-lhe o de
senvolvimento interior da inteligência e do espirito, sem deixar, po rém, de ser um "meio de exercer poder sôbre o indivíduo". 0 regime
escolar depende, como se vé, do estado social epolítico: se a socicda (1) Ésob a pressão da política dominante na Rússia e na Alemanha (de 1933 a 8 que nesses paises, ohumanismo foi calcado aos pés, mas pela aplicação de principios inlo ramente diferentes: na Rússia, pela sdeologia comunista que serve de base àcultura sove e dá um valor preponderante a todo conhecimento utilitário (reação contra o humanismo
como expresso de cultura geral e desinteressada ), e na Alemanha, pela teoria naciondls e racial que torna suspeitada tôda cultura pela qual se desenvolve 'a consciência contin constante da humanidade'". É a exaltação dos valores ngcionais e raciais sôbre os valo universais humanos. Nos dois paises, o Es tado "'monopolizou" o ensino de alto a baixo, com a diterença que na Alemanha ésse nonopólio se estabeleceu progressivamentei ministrar inss decreto (1939), determinando que as escolas privadas não poderiam ruçao senão às crianças, anteriormente matriculadas. equivaleu à extinção gradua
ensio Reich.privado, que pormaneceu, no entanto, aberto aos tilhos de estrangeiros resldeno
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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de é governada pela coerção, a escola pública, preparando para a vida social, também será regida pela coerção, e se o sistena social e político evolui para a liberdade, a escola evoluirá nesse sentido, passando mes mo a ser um instrumento dessa evolução. Além disso, quando se fala
em educação como meio de concorrer ao "progresso" do indivíduo, não épreciso examinar objetivamente o que cada povo entende por "pro Oresso" em determinada situação histórica ou, por outras palavras, po de-se considerar progresso, in abstracto, como uma noção esvaziada de seu conteúdo histórico? e, ainda que haja paralelismo entre a história
do poder politico e a da autoridade pedagógica, esta, por mais liberal que seja, exercendo-se sôbre sêres cuja razão não está ainda formada, não terá que conservar, por mais tempo que aquela, seu caráter de coerção?
Assim, pois, seja qual fôr, numa sociedade dada, a política de edu cação que está ligada, de um lado, à formação social e histórica e às
condições especificas de cada povo, e, de outro, àpolítica geral deter
minada pela classe ou grupo que esteja no poder, é, sem dúvida, à politica de educação, em harmonia com a politica dominante, que cabe traçar os "objetivos e valores" a serem atingidos ou conquista dos. Mas a técnica que é um meio de realizar essa política, não sò mente está e deve estar subordinada aos "fins", como também, por
maiores que sejam os seus fundamentos cientificos, está sujeita de uma parte, àação pessoal dos agentes incumbidos de aplicá-la, e, de outra às reações das gerações novas a que se aplica, para atingir os fins de
terminados de uma política de educação. Em primeiro lugar, se a técnica material e, em geral, a técnica do espírito, na elaboração cien
tífica, é indiferente aos fins, a técnica, em matéria de educação, pela própria natureza dêsse fenômeno, não só não é indiferente aos fins, mas é suscetível de variar e efetivamente varia conforme os fins propostos. O agente ou sujeito, aqui, porque a técnica (a linguagem, os pro cessos de ensino, os programas escolares, etc.) não lhe é totalmente exterior e constitui algo de vivo e de plástico, - reage sôbre ela, impri mindo-lhe a marca de seu caráter, de seu temperamento, de suas ideias, de suas tendências e de seus gostos. Em segundo lugar, além do fato de que as técnicas, longe de estarem "fora do agente", na realidade ex terior, objetiva, são constantemente trabalhadas e modificadas por le, `ses "meios" (a técnica) para realizar determinados objetivos, não po
dem ser adaptados aos fins a atingir, isto é, a uma politica de educaço, sc os próprios educadores, incumbidos de executá-la, não estiverem
animados do "ideal" que informa e vivifica essa politica, e dá, portan
to, sentido, valor e eficácia aos meios utilizados. Acresce ainda que os
educadores, agentes e criadores a um tempo, trabalham sôbre o mate Tal humano com técnicas do espirito e, por isto mesmo, agindo sòbre
a matéria viva que reage inconsciente ou conscientemente, não po dem lugir às intluências e pressões que sobre èles e a sua técnica exerce a natureza imatura dos jovens, contribuindo a seu turno por modificar 19 Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDo 276
anatureza organizada dos adultos (). No cstudo das relações entre politica de educaço e as técnicas, seria, pois, do maior interêsse cien-
tifico examinar experimentalmente dentro de que limites variam as
técnicas de ensino, de trabalho e de organização escolar, com as "mudan-
ças de orientação" na política educacional, e quais, entre essas técnicas, as
que, pela riqueza do seu conteúdo social, são mais suscetíveis de variar, em conseqüência dessas mudanças.
Essas mudanças de "orientação" e, por conseqüência, de oreani.
zacão escolar e de técnica ou, por outras palavras, essas refor.
estrutura, de técnica e de processos, em virtude de nova oricntacão no. lítica, operam-se sempre que um "partido político" ou uma minoria
chega por meios legais ou não à conquista do poder público. o con teúdo dos programas constitui, em essência, soluções distintas para os
problemas sociais, inscritas, como planos de ação, nas bandeiras dos
partidos. Mas essas transformações, no plano educacional, são tanto mais radicais e profundas quanto mais radical éo partido que ascende ao poder, ou por meios legais, isto é, por eleição e maioria do sufrágio,
ou, sobretudo, por meios anormais que são os golpes de fôrça ou de
Estado. Estamos então, neste caso, em face de um partido revolucio
nário. Ora,se revolução (2) é"tôda a mudança radical e repentina das instituições fundamentais do Estado ou da sociedade, realizada pela förça", se oque caracteriza, em essncia, o fenômeno revolucionrio, éum ideal novo ou um programa de reorganizaço
que traz consigo
e procura realizar a classe ou grupo que se apoderou do poder, não
pode deixar de repercutir profundamente na politica educacional todo político do Estado ou na "política geral" correspondem uma crise e
fenômeno de revolução. A uma crise e transformação radical no centro
conseqüente mudança radical na política de educação (ctr. as trans formações educacionais operadas em conseqüência e por força da implan tação de regimes novos, como sejam os Estados totalitários). É por êsses movimentos de mutações bruscas que se chegam a concentrar em curto periodo mudanças que se teriam desenvolvido em uma larga evolução. Èfácil aliás compreender o interêsse particular que apresentam para o Estado revolucionário as transformações na educação: as crises revo (1) C. FERNANDO DE AZEVEDO A educação e seus problemas, in A política de educaçáo a técnica, págs. 139-146. 3.9 edição. Comp. Melhoramentos de S. Paulo, 1953.
(2) A "revolução", que pode ser estudada nos seus am tecedentes (período pró-revo
lucionario ), na sua crise central ou culmin ante (revolução pròpriamonte dita) nas trans formações etetuadas em conseqüencia (periodo pós-revolucionario ), tem, além, do causas
individuais que trazen uma parte de contingêncía impossível de resolver em leis, causea são sociais, internas e externas, suscetíveis de tratamento científico. As figuras aliaseo "a encanação de uma idéia, o alto símbolo social e político, a vontado consciente são explicáveis senão dentro de seu próprio meio social em que se formam e Cujas rações chegam a encarnar em determinada fase de sua evolução.sociedade, A existôncia do e se associa corpo social ou de umg minoria que se à massa
Pra
de reconstrução
conquista do poder
uma za, no interior de que enquadra um proqrana um "novo ideal'"
a transterência do poder político sáo, paraM. Ralea e C. Bougleo
tres elenentos constitutivos do fenômeno da revolução. Há sempre revolução, segunonn Wiese, quando'umhá movimento um brusco dedeslocamento de tôrca. A detinição que L. M. nos propõe: massas graças ao qual a continuidade do direito éa interrompida pelo uso da fôrça e um direito novo criado, por adaptação à evougnto
torica e s suas terndôncias'", será verdadeirg se nela se Substituir a exprossão "movduz. submetô-las ggn enao entre elites, e, como já trisamo8, são as minorias que se arrogam de dirigir as massas e não procuram atraí-las e conquis tá-las sendo Pdoba, 1933). (ctr. A. POVIRA, Sociologia de la Revolution, Imprensa de la Universidad, de masss por "um movimento de minoria gssociada às massas'". A luta não se P t direito
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lucionárias que resultam de uma ruptura de cquilíbrio nas necessida des e nos hábitos dos grupos e cdasses sociais, resolvem-se pela estabili zação de um "novo estado social epolítico", criado por adaptação à cvolução histórica e às suas tendèncias. Mas esse ideal novo que se ex prime em têmos morais, políticos e econömicos e pelo qual se traduz uma nova escala de valores, não se pode "perpetuar" senão pelas ins tituições educacionais que se transformam, en conseqüència, nos seus fins, na sua estrutura e nos seus processos, para "integrar" as gerações jovens (crianças e adolescentes) na nova ordem de coisas e assegurar, por essa forma, a continuidade dos ideais e da obra de uma determi nada revolução. PROBLEMAS E DISCUSSOES
1. A categoria social política a que chamamos "partido" está intimamente
ligada às estruturas democráticas: os partidos, de fato, surgem quando as sociedades se tornam democráticas e os cidadãos são chamados a exercer o "poder eletivo", isto 6, a designar e investir os órgãos legisladores e, direta ou indiretamente, o poder executivo. Proceder a uma análise objetiva a) sôbre a natureza sociológica dos partidos: a tendència a organiar-« em "partidos", parece constituir um mecanismo natural e irreprimivel da
vida políica, nas sociedades democráticas, com a função de colaborar na
constituição dos órgãos dos poderes públicos; os partidos podem definir-se
como "grupos políticos representativos de interèsses ou aspirações gerais de grupos consideráveis de indivíduos ou de classes e organiados para o contrôle e a conquista do poder": b) sôbre a sua organização interior, examinada através dos programas,
reais ou formais, dos estatutos ou de seu funionamento real, especialmente quanto: ao mecanismo das adesões e das assembléias; à permeabilidade e
resistência dos quadros à ação de base, à concepção que o partido faz dos
chefes e à influència real dèstes;aos grupos e classes que representam: à
solidariedade, disiplina e hierarquia, e maior ou menor vontade de diferen ciação e de ação "por oposição": ) sôbre os seus métodos de ação: ação comn predominåncia de uma dou trina, do oportunismo ou da tática; ação legal e ilegal; regional ou nacional: s
relações do partido com o público em geral, o parlamento e as organinçóes "fora de partido"; como se comportam na oposição e no poder (curas de oposição e curas de govêrno): a importånia maior ou menor da cultura
politica sôbre a mentalidade e os atos dos partidos: principios e meios de
propaganda (cír. Esprit, Revue Internationale,. págs. 104-106, Enquete sur les partis, 7.e Année, 73, l.er Octobre 1938)
Tomar alguns exemplos de partidos existentes no pais, até 1950, e studar. além de sua organização e de seus métodos de ação, as suas origens, evolução e desaparecimento, por decadència ou por dissolução; o seu papel na vida publia: os vícios de organizaço do nosso sistema partidário (clãs terrioriais de tipo patriarcal:
agrupamentos para fins exclusivamente cleitorais); os partidos "parasitando a admi nistração (as cartas de empenho, "o filhotismo", as "derrubadas") e a degeneração dos partidos em conseqüência da preponderåncia dos interèsses partidários söbre os
interêsses coletivos (cír. OLIVEIRA VÌANA, o idealismo da Constituiçdo, 2 cdição, Brasiliana, Comp. Editôra Nacional, S. Paulo, 1939). 2. As transformações de estrutura democrátia que se operam na dviliaçío
atual, sob a pressáo do poder econòmico, extraortinàriamente desenvolvido em rela
ço ao poder politico, e da necessidade de se tortalecer o poder executivo, puseram
em conflito:
FERNANDO DE AZEVEDO
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a organização liberal demorática, multipartidária, isto ¬, com no tidos plurimos, organizados de acordo com a variedade de interêsses e d Par. acöes de grupos e de classes, no quadro d uma soCiedade; c, daí as políticas ea sucessão normal dos partidos no poder: ) a organização autoritária, sem partido ou unipartidária (sad
totalitário), estabelecida para forjar a unidade da nação, pela ação excdusiva do partido detentor do poder, unificado pela mística (de classe, de raca
posta em irculaço
por ese partido.
Aexperiênia (b) parece ser. na cvolução das formas democráticas, um voet de transiçao, impôsto pelas condições atuais, para uma democracia renovada em gine
estabcleçam os meios de "coniliar" a exigéncia unitária, que reclamam a se politica de uma nação e um minimum de principios políticos, fundamento de
toda a vida política desenvolvida, com a exigência pluralista que impõem a liberdade o respeito das pessoas, o diálogo necessário a tôda a vida espiritual, e o processe
ordinário de representação e de debate. s. Um sistema politico, uma vez instituído, observa Durkheim, suscita um
sistema de idéias sôbre o qual se apóia e que o justifica racionalmente: ésse sistema de idéias, a seu turno, uma vez acabado, reage sôbre a organização política que não
fazia primitivamente senão exprimir, e a modifica. Geralmente êle tende a exagerá-la. Pois os principios, as fórmulas que se inventam para fundá-la lògicamente, são, em geral, muito mais simples, mais excusivos do que as causas históricas que lhe haviam
determinado a gênesee afetado o desenvolvimento espontâneo. Analisar a) essa troca de ações e reações entre o sistema fascista ou o regime
nacional-socialista, por exemplo, e as doutrinas que suscitou e com as quais os teóricos do Estado fascista ou nazista pretendiam justificá-lo racionalmente: b) em que medida ateoria assim construida para dar ao Estado tota
litário (fascista, nazista) uma aparência de base lógica, reagiu sôbre o sistema
político, modificando-o;
c) as repercussões do sistema político e do sistema de idéias que deter.
minou, sötbre o plano educacional, tanto nos fins da politica de educação ajus tada à política geral, como na estrutura do sistema escolar, modificada em
conseqüência.
4. De todos os problemas políticos, um dos mais importantes em qualquer
regime, é oda formação das elites dirigentes. Sem direção intelectual e moral, não
há vida politica possivel. É a opressão da ignorância, da estupidez que esmaga e
destrói todos os valores esseniais. Estudar e analisar
a) a natureza, o papel, as origens e a evolução das elites no mundo moderno; e mostrar como,se uma elite dirigente é indispensável em qualquer regime politico, muito mais o é na democracia que não tem sentido se não permite e favorece a eclosão de uma elite intelectual dirigente;
b) o fenômeno de renovação e circulação das elites, graças ao qual os
individuos bem dotados se elevam ao ápice da pirâmide, e seus descendentes,
entrando em decadência, deixam o lugar aos novos; a interrupção da circulação normal das elites, com a acumulação, nas classes inferiores, de uma elite nova, cheia de vigor, àqual se torna quase impossível a ascensão por fatôres econo micos, sociais e políticos, constitui, para V. Pareto, uma das causas, se nao a causa real da revolução (1 );
) a decadéncia das elites no mundo atual e suas causas (politicas, econömicas, ientíficas, etc.) e especialmente no Brasil, onde, para essa medio crização das elites contribuíram, além das causas gerais, a ausência de cursos universitários e de cultura políica, e os próprios partidos que, entre nós, Tara
mente passaram "de sociedades cooperativas de colocação e seguro contra a (1) No Brasil, até 1930, no os deputados eram v regime republicano "pràticamente cios, lembra Oliveirg Vi bancadas, cono as de Minas, S. Paulo, Bahia,
aone cdo Sul e Estado do Rio, só raramente deixavam filtrar, ngs suas fileiras, ssA (OLIVEIRA VIANA, aquêle elermento novo, quase sempre um parente do governador'". O idealismo na Constituição, Brasillana, S. Paulo, 1939).
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FERNAND0 DE de Joaquim Nabuco (cfr. edição, Companhia miséria", na justa expressão e seus problemas, págs. I10-119, 3.a AZEVED0, 4educação Paulo, i953). Melhoramentos de São de educa implica uma "polítia educacional pressupõe efixando deve tender, que a fins 5. Toda organização os ou refletida que, e nas Cão", mais ou mnenos consciente interna, no seu meanismo funcional estrutura sua na escolar, educação). de (política atinge o sistema alcançar os objetivos a conseqüência. Mas de educação. Conforme próprias técnicas técnicas de ensino variarão em as e funcionamnento o cstrutura, a em cada pais, àpolítica geral a) tôda política de educação está ligada, varia em função desta e não toma
depcnde: ela de que faz parte e de que situada no conjunto e animada por um espiírito. seu sentido concreto senão tal política geral, tal política de
isto, é, por um plano de política geral:
cducação;
tom à que imprime o caráter e o limites b) é a classe ou grupo governante dos dentro variável à politica de educação, política geral e, portanto, sociale econômica do país e pela maior ou menore estrutura prefixados pela o "programa de valores" (aspiracões da tradição e de acordo com poder político (cfr. a educação pública, cxigências) do partido que detém o num regime totalitário, como
França, e cn um regime democrático, como a
a Alemanha nazista): educação se transformou em conseqúência c) se, porém, a política de(irradiação cima para baixo), uma política das mudanças da política geral de baixo depara cima, por uma "revolução de educação pode desenvolver-se político: é o aso organismo próprio do interior operada pelos educadores no no Distrito 1932-1935 e (1927-1930 das grandes reformas de educação, no Brasil quais obedeceu a qualquer plano Federal: 1933, em S. Paulo), nenhuma das partidos dominantes (cfr de política geral, preconcebido e determinado pelos Melhora
Aeducação e seus problemas, págs. 139-146, 3.a edição, Companhia
mentos de São Paulo, 1953). 6. Seéa política de educação, em harmonia com uma política geral que "traçará conquistados", a técnica éun conjunto aos técnicos os objetivos e os valores a sereme não vale por si mesma, mas n medida política realizar essa a destinados de meios realização. Mas não é possível, em matéria de educação, para essa contribui que os em separar fins a atingir e a técnica ou conjunto de meios para realizá-los, devido a
êsses dois fatos que é preiso analisar: a) a técnica de educação não é totalmente exterior ao "agente e cons titui alguma coisa de vivo e maleável: a transmissão, a0 individuo, dos ideais, das interpretações e das normas sociais por uma forma sistemáia
(educaçáo
escolar) se faz efetivamente por técnicas muito sutis e flexiveis (como a lingua gem, a disciplina, os processos de ensino, etc.) que, longe de estarem fora do agente, na realidade exterior, objetiva, são constantemente modiicadas e trabalhadas por èle, de acòrdo com as suas maneiras de ser, de sentir e de agir:
b) as técnicas têm, geralmente, um conteùdo social de que não se podem
esvaziar e que faz que, mudados os objetivos a atingir. elas se ranstormem em conseqüènia: a disciplina, a construção dos programas escolares, os proces sos de ensino, as técnicas de organização e de trabalho: coníorme os fins a alcançar, teremos, por exemplo, de recorrer a uma disciplina de tipo militar ou aristocrático, rigida, uniforme, autoritária, ou a unma discipina de upo demo«ri tico, mais espontânea e livremente consentida. Assim, pois, se a técnica material e, em geral, a ténia do espirito, como na
pesquisa científica, é indiferente aos fins, em matéria de educaçio, pela própria
natureza dêsse fenômeno, não sÑ não é indiferente aos fins, mas é suscetivel de variar e, de fato, varia freqüentemente contorme os ideais propostos numa politica
de educação (cfr. A educação e seus problemas, págs. l41-I46, Politia de educação
e técnica. 3.a edição. Companhia Melhoramentos de São Paulo, 1953).
7. A revolução que constitui uma das tormas por que se completa a evolução social é um fenômeno eminentemente social, caracteristico da vida em grupos, e um
dos fenômenos mais freqüentes nas sociedades hunanas As transíormações que afetam as instituições sociais, podem realizar-se: a) de forma gradual ou lenta (evoluçio
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normal) ou b) de modo brusco ou violento (evolução anormal ou fenomeno revoluionário pode ser estudado nas suas causas, no seu O e desenvolvimento c nos scus efcitos. à luz de determinadas revoli no Analisar, antigas ou modemas: a) os clementos fundamentais que cntram cm toda noção de )o corbo social, isto é, uma fração ou minorna que se forma no interior d soiedade, c é o grupo rcvoluaonárno; duas minonas e uma massa neutra da população; 2) um novo prOgTa ma e valores emem luta, que exprine a mentalidade de oposição à classe ou ao grupo dominante, e 3)se uma tre feréncia do poder político: b) as repercusões do fenomeno revolucionário söbre a educacão: revoluço consiste na conquista do poder publico por uma classe ou gruno que traz um novo ideal ou programa de reconstrução, com o fim de in ao grupo inteiro, de uma mudança radical na politica geral scgue-sc, ncces.
revolução), mecanismo,
revolução:
sàriamente, uma nova política de educação; ) a importância quc tem a no pensamento c no plano revolu donário: é por meio da integraçocducação das gerações jovens na nova ordem coisas que se torna possível perpetuá-las, isto é, realizar, dentro de novOs de ideais mletivos a unidade c a continuidade social: todo osistema de organizacão escolar é inteiramente reconstruído para tôdas as suas instituicões e funções se adaptem às novas formas que que toma a sociedade e às inovacõcs ideológicas e institudonais que nela se produziram. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Capitulo IV OPROBLEMA DOS FINS EM EDUCAÇÃO - Filosofia e politica de educacão. O problema dos fins em educação. filosóficos e as doutrinas peda sistenas Uma distinção fundamental. Os com as particularidades étnicas relaçoes suas As gógicas que dles derivam. de um ideal àimagen representaçáo A c aestrutura social de cada povo. gerações. - Teorias novas as modelam se do qual, numa sociedade determinada, e, portanto, do A variedade de concepção do tipo humanocorresponde e instituições. uma época cada históricas. - A ideal pedagógico nas sociedades que - A pesquia adultos. dos ideal o constitui homem, concepção da vida e do Os três planos de sociológico. do "conteúdo real" dèsse ideal pelo métodonacionalisno. Fins mais gerais e e Humanismo educação.-
de
uma politica abstratos, nas nem por isto menos "coletivos" na
essencia. -
A crise de
"ideais" em educação.
primeira ase de Se educação édirigir a evolução do homem, naconcepção da reali sua existência (infância e adolescència), segundo a educativa pres obra dade total da vida num grupo determinado, tôda
supõe fins e ideais que procura realizar e a que se subordina, na suae organização e nos seus processos. Existe uma dependência estreita essencial, inerente à própria natureza do processo pedagógico, entre
educaçãoe uma concepção de vida que aparece "explicitamente formu
lada num sistema ou implicitamente suposta", na estrutura escolar, nos programas, no conhecimento que se oferece ou se subtrai, nas ações do educador e nas técnicas de trabalho. Certamente, as ciências que
residem à base da educação (biologia, psicologia, etc.) subministram à técnica instrumentos preciosos de ação, mas, como lembra Leonel
Franca, é uma concepção de vida que Ihe orienta a aplicação, subordi
nando os meios aos fins: e, uma vez que os fins de educaço se per
deram de vista, tòda obra educacional tende a limitarse aos detalhes da práticaea reduzirse, sem finalidade, e, portanto, sem sentido a um
puro jogo de processos e de técnicas. Ao lado do "problema dos meios",
problema técnico e social a um tempo, é preciso pôr em seus tèr mos exatos e estudaro "problema dos fins a que atendem ou devem
atender a organização e a atividade pedagógicas. Este é um problema, em última análise, filosófico, porque tòda orientação da obra educa cional, realizada de maneira difusa pelo conjunto das geraçies adul
tas ou de forma sistemática e organizada, pelas instituiçöes escolares, dirigida pela Igreja ou pelo Estado, enquadra se, como parte integran te, numa concepção do mundo, e, portanto, numa tilosotia de vida.
Assim, pois, uma "organização elucacional" püblia, seja ela qual tòr, pressupöe e implica sempre, em correspondència com uma tilosotia de
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vida e uma politica geral, uma filosofia e politica de educação, mais
se divige ou menos consciente ou retletida, que, tixando os tins aseuque mecanisn no interna, cstrutura atinge o sistema escolat, na sua
funcionale nas próprias técnicas de educação. fste problema, como se vê e já observamos, éde uma importancia primordial ede profundas repercussões nos sistemas educacionais: con. forme os objetivos a alcançar, a organização, o funcionamento ¢ as técnicas (l), - estas, ao menos dentro de certos limites, -
consegüência. Se o processo educativo
variarão em
o meio para um fim e não um
fim em si mesmo, e se a filosofia uma reflexão sistemática sôbre a cs
sência e os objetivos de cultura, a educação, como uma das funcÙes fundamentais da cultura, pode e deve ser, argumenta Messer, objeto imediato da especulação filosófica, e tôda filosofia contém também
uma filosofia de educação. Nem se pode conceber que o trabalho do
educador seja verdadeiramente útil e criador sem que sua vida e ativi dade sejam dominadas por um "ideal", tanto mais fecundo quanto mais esclarecido pelo exame da essência do espírito e de seu significado, no conjunto da realidade e por uma visão geral da vida e dos fundamen tos de tôda a educação. É certamente uma "filosofia de vida" que dá
unidade àcultura, despertando no educador a vida espiritual, permi tindo-lhe, pela reflexão pessoal e pela espirito critico, pôr em ordem,
ile próprio, os seus conhecimentos e fornecendo-lhe a inspiração in cessante de seu trabalho criador orientado com firmeza numa deter
minada direção. Mas, se tôda a obra ou politica de educação pressupõe uma filosofia de vida, essa concepção de vida que está implícita em um sistema educativo não é nem pode ser deduzida lògicamente de qual quer dos grandes sistemas filosóficos. Abordemos, pois, a questão mais
de perto, distinguindo entre "doutrinas" e "instituições" pedagógicas
de uma sociedade, em certo período de sua evolução. Tôda doutrina pedagógica éclaro que indui uma filosofia ou, por outras palavras, é dominada por certa concepção de vida; e, conforme a resposta que se dá, em sistemas filosóficos, a questões essenciais, ter-se-ão teorias
de educação fundamentalmente diferentes. Assim, dado um sistema filosófico de Platão, de Descartes ou de Kant, uma filosofia espiritua lista ou materialista, pode-se deduzir a doutrina pedagógica que im plica e que, de acôrdo com ésse sistema, deve orientar a educação nas suas linhas essenciais. fato eminentemente social,
socia! por
(1) Depois de observarprocura que arealizar educação, em seus membros, por via da educação, um sociedade e cada seus fins, ideal que he é próprio, mostra Durkheim que a ação social se faz sentir na própria natu reza dos meics empregados para atingir ésse fim. "Sem dúvida, escreve éle, êsses meios variaráo segundo a noção que fizernos da consciência das crianças, segundo os dados
da psicolbgia e, sobretudo, da psicologia infantil. Mas, em primeiro lugar, se os fins prosse guidos pela educação são sociais, os meios devem ter o mesmo caráter. E, com efeito, ds instituições pedagógicas são muitas vêzes uma forma resumida de verdadeiras instituiçoes
8OCiais: por ezemplo, a disciplina escolar tem os mesmos traçOs essenciais que a disciplina
da cidade. Demais, a natureza dos fins predetermina a dos métodos. Tais metodos
proscritos ou adotados porque estão ou não de acôrdo com a concepço que a sociedaas se faz do ideal a realizar. O que suscitou o método pestalozziano, por exemplo, é o senu
mento que tinha seu autor das aspirações morais de seu tempo, muito mais do queet sde ciência psicológica. (E. DURKHEIM, Pédagogie et Sociologie, Revue de Métaphysia Paris, Morale, Jan vier 1903, páge. 37-54; (ctr. in L'année Sociologique, 7.e année, 1902
Péliz Alcan ).
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
283
Ainda mais: como as correntes pedagózicas seguem o fluxo e o
refluxo das idéias filosóficas e os problemas fundamentais da pedago gia são, no fundo, problemas filosóficos, éde importância capital para oteórico de educação,
observa De Hovre na sua obra magistral (1).
- estudar paralelamente os sistemas filosóficos e as doutrinas pedagó
gicas que dai decorrem e ver como estas nascem daquelas. Se encarar
mos, porém, não já as "doutrinas e teorias" que aliás são, também elas,
fatos e podem, como tais, constituir objetos de investigação sociológica,
mas as "instituições" (escolas, sistemas escolares) que sofrem, sem dúvi da, a influência dessas doutrinas, a concepção de vida que os sistemas cducativos pressupõem, os ideais evalores que procurarn efetivamente atingir, não podem ser extraidos dedutivamente de sistemas filosóficos nem scr explicados por essas ou aquelas doutrinas. É que não é menos
certo que a educaço, tal como se produz, corresponde sempre ao espi rito da época e reflete as idéias coletivas dominantes, segundo as quais é cavalheiresca e mística, na Idade Média; liberal e clássica, na Re
nascença; racionalista e idealista, no século XVIII: mais positiva e
realista, no século XIX, até nossos dias, em que tomou um caráter acen tuadamente técnico e científico. A escola que sucede a uma revolução vitoriosa, não é o resultado de uma teoria nem a realização do ideal de um pedagogo, mas o produto das förças e idéias coletivas, sociais,
politicas e econômicas, que acionaram e fecundaram o processo revo
lucionário. Os teóricos vêm depois para formular em principios e sis
tematizar os elementos que a revolução trouxe em si de um novo sis
tema educativo. As diretrizes do processo de formação das novas gera
ções variam com os tipos étnicos e culturais e com as condições espe
cificas de cada povo e são ditadas antes pela orientação geral que im
põem as tendncias de uma coletividade e os problemas fundamentais tema de educaço pode, de fato, escapar à dupla iníluència que sôbre éle exercem, para amoldá-lo a cada forma peculiar de civiliação e a cada tipo de Estado, as idéias predominantes no momento histórico e as circunstâncias do meio que determinam o sentido, as formas e a
que têm de enfrentar nas diversas fases de sua evolução. Nenhum sis
direção do trabalho educativo.
As observações realizadas sòbre o fenòmeno educacional mostram
nos que, se as gerações adultas intervèm para transtormar, isto implia se estorçam por modelar as novas gerações": mas èsse ideal educaivo aoque comesponde uma concepãode vida e do homem e que constitui ideal dos adul tos,
nelas, como diz Davy, "a representação de um ideal à imagem do qual varia de um povo para outro, e, numa mesma so cicdade, de uma para outra época, no processo de seu desenvolvimen to. O fim essencial, geral e comum, ésempre o mesno, isto , fazer do individuo um homem ou torná-lo contorme ao ideal de homem e de
vida que se fornmou e domina numa determinada sociedade ou numa
dada civilização. As finalidades "especiticas" do proceso pedagógico (1) FR. de HOVRE
Essal de Pailosophie Pédagogique (ctr. Syathàmes Philoaophiques
el Pédagogiques Contemporains brairie Albert Dewit, Bruxelles. ). Traduit daprès lod1tan tlcmande par G Stmecaa,
FERNANDO DE AZEVEDO
284
sociedade e são, pois, impostas pelos caracteres fundamentais de cadapolíticas oue coletivas, religiosas e morais, cconômicas e idéias pelas representam os elementos constitutivos de certa cultura e orien.
tam ésse trabalho nesta ou naquela direção, segundo esta ou aqucla
escala de valores. E exatamente esa observação, bascada na cxperièn
dia enos fatos, que levou Fr. De Hovre aaccitar em cducaço, os di.
versos tipos étnicos e a distribuir, em uma de suas obras, os grandes
pensadores e lideres pedagógicos pelos diferentes grupos étnicos e cul turais, americano, alemão, anglo-saxônio e francés, a que pertencem e
que são estudados suceivamente nos seus tipos de vida e de cducação. Áinstrução e a educação apresentam rasgos caracteristicos tão marca
dos de povo a povo que a pedagogia moderna se divide forçosamente.
diz De Hovre, "em compartimentos nitidamente distintos segundo os diversos grupos étnicos". As escolas primária, secundária e superior as
semelham-se àprimeira vista nos diversos povos; na realidade, pondera oilustre professor de Anvers, "espirito, orientação, ideal as opõem às vêzes diametralmente entre si,porque aqui um americano, lá, um alemão,
se encontram na cátedra". E depois de reconhecer que "hereditarieda de racial, cultura nacional não são palavras vazias de sentido, e que uma teoria pedagógica idêntica reveste de um povo a outro uma forma diferente", conclui que "o espírito de um povo se reflete no seu ideal
educativo e a pedagogia é uma chave da psicologia comparada dos povos".
Para De Hovre, pois, "se a pedagogia e os pedagogos tomam luzes
a cultura ao grupo étnico de que dependem, esclarecem a seu turno o Alén-Reno; de cultura a particular. A pedagogia alem reflete tôda popular inglêsa; Dewey gentleman põe a nu todo um lado da alma americana; o movimento psicologia descobre uma grande porção da escoteiro de Baden-Powell revela-se anglo-saxônio até à medula". Tôdas essas observações são perfeitamente exatas e não surpreendem a quem e repercussões e aesta se habitou a realçar ligações, correspondénciasmanifestações diferentes belecer as solidariedades múltiplas entre as vida em uma dada época. Pode-se as mais opostas, na aparência, dadessas interpendéncias, se se tiver o alis ir mais longe na análise sistemas cuidado de ligar não sòmente as doutrinas pedagógicas aos de cada específicas filosóficos que delas derivam e às mentalidades desencarnada, à vêzes tantas povo, mas também a história das idéias, his
plano história social, recolocando a especulação filosófica no seu pensamen do movimento o tórico. Se não é, de fato, possível explicar não há social, estrutura to humano só pela evolução das formas de e sentir de maneiras
nossas negar as relações que ligam nossas idéias, sociais, econômicas, políticas nossas crenças aos regimes e às instituições nossa existência cotidiana. É de e religiosas que constituem o quadrosociedade da qual participavam, sôbre os próprios fundamentos da criadores e refor trabalhos seus e que sempre apoiaram suas observaÇõesciência ou de ação; e, como todos madores, homens de pensamento, de larga tomaramn pé sòlidamente sôbre as realidades sociais de que, em
medida, sofreram as influéncias, podem e devem aparecer-nos, na ela
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
285
boracão histórica de sua obra, cono frutos de seu tempo; mas, -
oportuno lembrar as palavras admiráveis de Lucien Fébvre, - "a par. tir do momento em que formularam, uns, seu sistema do Universo,
outros, seu sistema de idéias ou de crenças, aquêles não dependem se
não da sua inteligència e do universo; e êstes, seno de sua consciência e de suas magnificas csperanças. O mundo social sóbre o qual toma ram apoio e de que não podem deixar, na partida, de sofrer as condi cões, ésse mundo abre-se diante dles de repente, amplia-se, desaparece e foge como a terra sob o avião que decola; seu pensamento não co nhece outras leis que as de sua consciência, nem outro guia senão o deus entrevisto e possuido por ela".
Mas, se as próprias teorias pedagógicas trazen a marca dos povos
em que tiveram origem e desenvolvimento, e a tal ponto que, "à medida que se põem mais à luz as vistas pessoais em educação e ins trução, se descobrem também melhor as correntes nacionais da peda
gogia", essa iníluência da mentalidade particular de cada povo e das transformações por que passou, se apresenta ainda mais acentuada nos scus sistemas educativos, tais quais estão organizados, e nas finalida des principais do trabalho pedagógico, que se revestem de um caráter eminentemente coletivo. As teorias que são reflexões sistemáticas, mais ou menos profundas, sôbre os fatos e não representam o que realmente
ocorre, podem, sem dúvida, projetar luz, -e luz intensa, - sôòre a
realidade e as tendências educacionais, na medida em que elas expri
mem idéias estabelecidas ou em via de formação e tendências coletivas
pressentidas às vêzes, em intuições luminosas, pelos teóricos que Ihes
dão forma e expressão (l); mas no trabalho educativo a que a socie dade se entrega, para formar os seus sucessores ou para transmitir o ideal humano que os adultos trazem consigo, é que se pode der, com mais segurança, a sua verdadeira concepção de vida,surpreen e. por tanto, os fins a que se propõe a educaço. Não ésòmente de um povo para outro, ou de um para outro "tipo étnico", na expresso de Fr.
De Hovre, que variam as concepções de tipo humano; a cada época, na evolução de uma mesma sociedade, corresponde uma concepção da vida e do homem, que constitui o ideal dos adultos. É sse "ideal" efe tivamente procurado, e variável com o tempo e a região, que é susce
tivel de investigação sociológica. Se se começa a indagar, observa Durk
heim, qual deva ser a educação ideal, abstraço (1)
feita das condiçües de
Na pesquisa sociológica dos fins, em educação, o estudo das teorias ou deis
pedagógicas, numa dada época, tem, certamente, grande importància, pelo que elas r velam ou podem revelar, "das fôrças sociais que as impuls ionaram ou trabalbaram por modificá-las''. As idéias também são tatos, lembra quando alcuncem reper cussáo, são tatos sociais'', As doutrinas, com eteito, ouFauconnet, revelam o sdeal Fedaqogico domnanl (teorias conservadoras) ou, sobretudo nas épocas de crise ou de mudança ea que tendea a multiplicaT-se, traduzem mais ou menos contusamen te prenunciam sdeS e via de tormaçáo (teorias de precursores, revolucionárias ), tendèncias coletivas que podea ser. POr elas, observadas. Tome-se, para exemplo, citado por Faucoanet, o estudo que, dèsae poato de vista, empreendeu Durkheim, das idias pedagógicus da Renascnça, e no qual "mehot do que ninguém antes dêle, distinguiu as duas grandes corren tea que ca diriqem: uma, a que inspira a obra de Rabelais; outra, muito diversa, a que animna as teorias de Erasm". (Ctr. E. DURKHEIM, Educaço e Sociologia, in pretácio de P. Fauconnet, edigdo brasileira S. Paulo, 1929).
286
FERNANDO DE AZEVEDO
tempo e de lugar,
porque se admite implicitamente (0 que é um
grave êrro) que os sistemas educativos nada têm de real em si mesmos, quando na verdade "êles são um conjunto de atividades e instituições lentamente organizadas no tempo, solidárias conm tôdas as outras ins
tituições sociais, que a educação exprime ou reflete,
instituiçõcs essas
que, por consequência, não podem ser mudadas àvontade, mas só com
a estrutura da própria sociedade".
Em seu livro Gran deur des élites apresenta-nos Muret (l) cinco dos belo e bom (kalokagathós), o idadão romano, o homem da Renasccnça, o honndte hom me francès, o gentleman inglês". £le podia ter acrescentado o cavaleiro c o monge, na Idade Média. A êsse último, "o gentleman, obra prima do gênio inglés", Danie! Orme dedica, sob êsse título, em Le Mois (Março, 1939) algumas páginas de "tipos de homens" que fizeram e encarnaram cinco tipos de civilização: "o principais ateniense,
grande lucdez e penetração. Uma civilizaço,
cscreve, "é o resulado de estorços
convergents orientados, de uma parte, para a produção pura e simples de valores intclectuais e artísticos, morais e materiais, c, de outra, para o homem mesImo
que se propõe formar, educar segundo tais idéias preconcebidas do que deveria ser, do que deve aspirar a tornar-se". Assim, se encontramos na antiguidade, em Atenas do tempo de Péricdes, ésse ideal humano que exprime a beleza e a bondade reunidas,
e, em Roma, o civis romanus que representa o tipo de homem característico dessa
raça de lavradores e guerreiros, entre os povos modernos, "Itália criou o ideal do
cortigiano, do homme de cour, que a Espanha acomodou um pouco mais tarde ao gòsto nacional, e a França do grande século, inspirando-se nesses dois modelos pro
pôs ao mundo o do honnéte-homme". Ogentleman que na origem não ésenão o equivalente exato do gentilhomme francês e não aparece, ao menos nos três primeiros
séculos (XVIII, XIV eXV) seno como uma adaptação do ideal cavalheiresco aos costumes e às idéias ingleas, é o último dos grandes ideais dèsse gênero, no
Oi
dente, e herdou não sòmente de seu antepassado próximo, o cavaleiro medieval, mas de todos os seus predecessores, antigos e modernos. A noção do gentleman,
porém, mudandoe enriquecendo-se com as condições de tempo, écomplexa demais para ser definível por qualidades exclusivamente morais: o que caracteriza o gentle man não é sòmente o sentimento de honra e do cavalheirismo mas a justa medida, o equilíbrio entre o desejável e o possivel, o gôsto das idéias gerais que herdou dos
antigos, através da cuitura clássica dos humanistas, a distinção de manciras e de linguagem, a polidez discreta, o amor dos lazeres e do esporte e o desprèzo por
certo género de vida muito estreito, que le deve ao prestigio persistente dos hábitos
aristocráticos. "No dominio da vida moral e social, pondera Daniel Orme, o ideal do gentleman pode ser considerado como a principal contribuição da cultura inglèsa à avilização universal" (2).
Assim, pois, quando dizemos que a educação se destina a tornar
o individuo apto a ser um "cidadão" ou a ser um "homem", não sabe remos com precisão o que queremos dizer, se não somos um pouco
sociólogos, dizia com razão Davy aos professôres em 1913. "Cidado, homem sem dúvida. Mas, cidadão de que cidade? homem de que tem po? Os estoicos não compreendiamn a humanidade da mesma maneira que Aristóteles. E certamente hoje, temos nós, por nossa vez, nossa ma (4) M. MURET - Grandeur des élites. Albin Michel, Paris, 1939. (2) De uma parte, o ideal do gentleman, escreve Orrne, "é capaz de encorajar o mais modesto impulso do homem para as formas mais elevadas de ação e de pensamento; de outra, é suscetí vel de ser in terpretado de nodo a satisfazer as exigências de outra ma neira profundas de uma alma que possui real cultura moral e intelectual. De um lado, propõe ao nobre uma díscipling a seguir, uma perfeição a conquis tar, mas de outro toma o nobre tal qual e faz ver seu género de vida, certas de suas maneiras e de seus hábitos como outras tantas coisas boas em si mesmas".
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL neia D ópria de entend-lo.
287
Que quer isto dizer senão que,
encarre gando o professor de nos preparar cidadãos e homens, nós, franceses do
século XX, queremos significar que éle deva tornar nossos filhos con formes ao nosso ideal atual de cidados
e de hormens? Ora, como de
terminar, senão pclo método sociológico, qual seráem cada momento considerado o conte údo real désse ideal?" le varia, de fato, em funcã da civilização. Mas, na pesquisa a que se proceder, para determinar os
ideais ou fins de educaço, em uma das sociedades históricas ou atuais.
podemse distinguir, numa politica de educação, três planos ou cama
das que se combinam ou se sobrepõem, de maneira diferente e em pro
porçõcs desiguais: 1) oplano nacional: 2) o plano correspondente a certo "tipo de civilização"; e 3) o plano universal e humano. Em primeiro lugar encontram-se determinados fins imediatos e particula
res, ligados às condições e exigèncias vitais de cada coletividade, variá veis de povo para povo, e segundo as quais a educação se desenvolve
em função da "vida nacional", como a função ou expressão mais alta
da vida coletiva. Mlas, como há fatos que ultrapassam a área do terri
tório nacional e que não são limitados a um organismo politico (Esta do ou Nação), a politica geral e a educação, em conseqüência, não podem fugir à pressão que exercem êsses fatos e os ideais que envol vem, e que, ultrapassando as fronteiras, ficam dentro das áreas espi
rituais de uma civilização (civilização oriental, japonsa, hindu ou
chinesa, civilização crist, mediterrånea, etc.). £ éste o segundo plano
a pesquisar. E, por último, o plano de "valores universais" que trans cendem as épocas e as fronteiras e definem antes a espécie humana do que um grupo politico (Estado ou Nação) ou um tipo de civilizaço. Conforme predominam, numa época, as tendências nacionalistas ou
humanistas, a organização pedagógica de todos os graus, refletindo mais fortemente os caracteres e as aspirações de um povo, se orientará no
sentido de uma afirmação enérgica de nacionalismo ou tenderi a acen
tuar o humanismo, isto é, os valores fundamentais que exprimem uma
natureza essencialmente idêntica em todos os homens, e subsistem "sob
adiversidade acidental das raças e das nacionalidades". Por "humanismo" entende-se tôda cultura que possa ultrapasar os imite
de um povo e adquirir universalidade e, em conseqüència, todo o ensino que tende a tornar os homens mais "humanos" e a acentuar o essencial sobre o contingente
(o que está ligado às condições de tempo e de ugar), o sen tido de humanidade
(universalismo) sôbre o de nação ou região (nacionalismo, particularismo ) Assim, pois, o humanismo, tanto mais rico quanto maior a faculdade de riar valores de
atração e influência universais, depende menos da matéria ou matérias que se fazem
estudar, do que "da maneira como se ensina", e. portanto, do ideal humanista do
educador queo saberá extrair de dequaisquer ensino (ilosoia. dèncas, letras e artes) conteçdo humano que estãomatérias mais ou de menos carregadas Certamente.
em uma determinada época, a educação humanística (a cultura do "humano") foi dada, de maneira preponderante ou quase exclusivamente, pelo ensino das linguas clássicas. Mas, se houve um "hunmanisno clássico" é, evidentemente, um èrro iden uticar humanidades com a aprendizagem das linguas mortas e. sobretudo da lingua latina, isto é, com as hunanidades clássicas, que não passam de uma das formas
FERNANDO DE AZEVEDO
288
que o humanismo revestiu e ésuscetivel de revestir. Na ldade Média e, especial
mente, na Renascença, o latim que se vulgarizou, já por influència da Igreja (cató
lica, universal), já pelo renascimento das letras antigas, com a descoberta dos manus
eritos gregos e latinosea sua divulgação com a descoberta da imprensa, tornou-se a ensino e quase oúnico objeto de estudo (1). Na época da Renascença, em que o ensino se ministrava em latim e em latim se escreviam as grandes obras, filosóficas, lingua geral (européia), a base de todo o saber, o maior instrumento de cultura e de
literárias e dentificas, se pregava do púlpito, se orava nas cerimônias c se carteavam
na intimidade, é claro que o conhecimento dessa língua se tornou e tinha de tornar-sc, nos liceus e nas escolas, o conhecimento fundamental. E, como o objeto de qualquer
escola naturalmente épreparar o studante para vida social de sua época, ministran do-lhe para isso os conhecimentos necessários na sua época, o latim se constituiu,
desde inído, como disciplina primordial das escolas da adolescência (2). Estudava se
o latim, - língua então não só útil, mas indispensável, c
estudava -se quase sòmente
ou sobretudo o latim, pelo método direto, para aprender a ler, a escrever e a falar
a língua latina. O extraordinário progresso científico c ténico, as transformações de
que resultou a ivilizaço
industrial e o desenvolvimento das línguas e literaturas
modernas não sÐ modificaram as condições de vida mas ampliaram os conhecimentos
humanos na época atual em quc o latim já não representa senão "uma parte quase
insensível dos conhecimentos e da cultura". O latim perdeu em "utilidade" e, por
kência, em extensão como um ensino para todos, para se tornar, como qualquer
conseq espeialidade, objeto de estudos de uma minoria restrita que se propõe, por tôda os romanos. parte, a penetrar e dominar os segredos do imortal idioma que falaram
fins universais Mas, quando a educação se dirige sobretudo parahomens antes de e humanos e procura fazer das crianças verdadeiros fazê-los cidadãos, é que "só uma cultura amplamente humana pode
necessidade". Não há dar às sociedades os cidadãos de que elas têm em determinada dúvida de que os fins a que ela procura chegar, que a parti época, se destacam então das condições locais ou étnicas e abs gerais mais cularizavam antes; "os fins da educação se tornam Durkheim, se tornam menos coleti tratos, mas nem por isto, pondera que se passou do século XIX vos na sua essência". Senão vejamos o observar Durkheimn nos gran até à guerra de 1914-1918, segundo pôde das mais diversas raças e em constituídos des povos europeus. Povos divisão do trabalho social, e crescente uma operava se sociedade cuja diferenciados, já não havia quase entre os indivíduos, cada vez mais geral, "não pode
homem, em nada de comum senão a qualidade de a homogeneidade indispen riam êles guardar, argumenta Durkheim, se
com a condição de serem tão sável a todo o consensus social senão lado em que todos se parecem, melhantes quanto possivel, pelo únicoqualidades humanas comuns. Em 1sto é, tanto quanto representam as diferenciadas não podia haver outro tão sociedades em têrmos: outros
estudo, até o literalmente o único objetoa demestr es e alunos ser a fato, de chegou, latim (1) o era interdito permissáo na França, por exemplo, jesuítas se distinguem pela último ano da escola em que,
das horas de classe. Só os nos recreios e dias de falar francâs, mesmo fora outros da língua maternaRichelieu, e uns servirern que se difundiu de se de que concediam com as primeiras reformas classiques en XVI, século études no Les te somern (CREWE, Pol festa. se dava o ensino. que em ). língua Instruction como et francés Education o uso do Mai-Juin, 1924; OCTAVE GR£ARD,
France, La Revue de Paris, problen1a o latim - Ensaios. O clássico na educação o o (2) Cfr. ANTONIO SÉRGIO págs. 113-179, Seara Nova, Lisboa, 1929.
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL.
289
tipo coletivo senão o tipo genérico do homem" (1). Mas, contra o uni versalismo em ascendència progressiva até a época en que escreveu o eminente sociólogo, começou a reagir, até impor-se, sob a pressão de
causas multiplas e complexas, uma corrente forternente nacionalista
oue, depois da grande guerra, e sobretudo, nos últimos 30 anos, se es tendeu a quase todos os povos. A educação que se propunha realizar
o tipo humano que a sociedade construiu e elevou à dignidade de modèlo, tornou-se, em vários povos, não só estreitarmente nacional mas
agressivamente nacionalista, elevando-se os fins particulares da nacão à categoria de finalidade suprema do trabalho educativo. Ao huma
nismo que se desenvolvera e se expandira no século passado, de acôrdo
com una interpretação universalista do mundo, sucedeu uma das
maiores afirmações de nacionalismo que regista a História. Tanto é
verdade que o ideal pedagógico se explica pela estrutura social e que
"tôda a tansformaço
mais ou menos importante na organização de
uma sociedade apresenta uma mudança de igual importância na idéia
que o homem deve fazer de si mesmo", e, em conseqüência, nos fins que a educação se propõe realizar.
A grande inquietação que, no entanto, ainda caracteriza a educação
atual, em quase todos os paises e, especialmente, entre os povos ame
ricanos, provém de uma nova concepção de vida e da subversão dos
valores anteriormente estabelecidos. Mas de uma nova concepço de vida que ainda não se definiu com precisão e se mantém em conflito com outras doutrinas derivadas de concepções de vida diferentes, seno opostas. A causa dessa crise prende-se essencialmente a uma desorga nização da consciência moral e a uma dissoluço de valores e renças em conseqüência das transformações técnicas e econômicas, morais e
politicas do mundo atual. £sse grande abalo revolucionário determi nou, como já observava Fouillée (2), uma desclassificação geral tanto das idéias como dos individuos, sem que se tivesse ainda estabelecido uma nova reclassificação. Os fins os mais contrários solicitam sucessiva
ou simultâneamente as vontades e as instituições sem que uns tomem (1) Seria interessante observar o paralelismo existente entre o desenvolvimento do hu
manismo e o regime dYmocrático, e o do nacionalismo
os regimes autorinárioa "Os paises
democráticos (já notava Tocqueville, de que muitas relexões na Démocratie en Amerique devem ter tido para êle uma resson ància protática) amam apaixonadamente os êrmos gac ricos e as palavras abstratas, porque essas erpressões engrandacem ointeligància.. pensamento permia omens encerrar em pouco n o l e o s cObjetos,
que habitam
os
ajudam o trabalho da
democráticos tàm, pois, muitas vÁzes pensamen tos vacilantes: sto lhes necessárias expressões muito largas para encerra-los". £sse terto ndica, pare Huiinga a reação de um racionalis ta da velhg tradiço diante da vaga de dearacsonaliaado do pensanento, que ôle julga vir de longe. Para åle, comenta A. Obermann,
precaamen ta
nisto, "no enfraquecimento da faculdade de juízo, na negaçto do principio inelectual em conseqüência, do princípio moral, que se encontram cs traços asenciais da Tae n
derna'". Aos mais altos valores da tradição iberal, vardada liberdade, cua negado está na base de todos os males modermos, se opdem a vontada de podes. a aga. o"in tinto vital", com que os povos se des Viam da razdo, preter tndo-lhe o subracionaliamo nas
suas mais brutais. £ assa "exaltagão da (abstratos, vida tomadase emsmnada valoresmantestações concretos, biológicos ou sociais acima dos valores quiserem) do Espi od trad.
ot To Marrow. o ihes parece ser a grande apostasia'. (. HUIZINGA, n The Shadow
holandôs, Heinemann, London ).
(2) A. FOUILLEE - La Prance au poiat de vue aorl. Parta, Aln, 1900
290
FERNANDO DE AZEVEDo
sôbre os outros uma preponderância nossos pais estavam ligados, "perderam sem que nós vejamos bem
Os reconhecida. sua autoridade
(ins
e seu aOS atrativo
claramente, ao menos com a que seria necessária, onde estão aquèles que é por diante". Resulta dai um verdadeiro oásis em
quais
unanirmiddaqui ade preciso prossegui nossa moral. Pois, por um lado, não será por fôrça de consciênciade. retos gque se podem propor a educaçao fins a amar leis e de. novosdoutrinas, rer, e por outro, "para que a educação faça pode esperar, é essencial que se mostre aos realmente o que dela se mestres a que
ideal novo devem ligar-se e ligar o coração dos jovens". mais recentes, de análise penetrante da crise Ora, se algumas obras atual, como as de fried, Huizinga, Valéry e outros, já projetam luz Sicg: sse em formação, e podem ajudar-nos a descobri-lo, sôbre a maior ideal novo, como observa Durkheim em relação à de parte delas, Fouillée, um esfôrço para consolidar o que pode ser conservado antes da existente do que uma tentativa para determinar convém entrar resolutamente". A dificuldade de se o caminho no aual êsse iden) novo, devida em parte àcoexistência de idéias de descobrir vida diferentes ou mesmo em franca oposição (o que denuncia uma civi. evidentemente lização em mudança), éagravada, de um lado, pela preponderância do "político" em educação, com o do Estado, e, de desenvolvimento outro, pela grande perturbação que trouxe o industrialismo nas neces sidades outrora satisfeitase que já não o são na maior parte dos povos modernos.
"constituem disciplina
Em uma de suas conferências, consagrada ao espírito da co munidade ou espirito público (Gemeingeist) que procura definir, Troeltsch (l) mostra que não se devem exagerar as diferenças de estru tura entre as sociedades consideradas em diversos estágios de seu de
senvolvimento; e, depois de uma comparação entre as sociedades pouco
evoluidas e as sociedades muito evoluidas, analisa as suas semelhanças
ediferenças, e insiste sôbre o fato de que "o homemn vive sempre no
interior de diversos circulos diferentes, como a nação, a classe social,
afamília, associações diversas, igreja". Ora,êsses circulos, diz Troelsch,
não são coordenados, mas concêntricos. Era a Igreja que outrora ope
rava a síntese entre êsses diversos elementos. Mas hoje a Igreja já "não
pode desempenhar em cada povo, êsse papel: ela agora um plural
(diversas Tenças e religiões) e não mais um singular". É o Estado que procura desempenhar essa função: tendo tido um extraordinário au
mento de funções e de fôrças, o Estado moderno que se apresenta coo
"a mais alta expressão da consciéncia coletiva" (cfr. os Estados tota
litários), toma a si, nesse papel unificador, realizar a síntese entre todos ésses elementos. Mas &fácil verificar que, com tal primado do EstadO, osessenciais, fins "politicos" em educação tendem a prevalecer sôbre outros s gerando "culturas estatistas", cuja unilateralidade é marcaVerlag 2TROELTSCH Rol! Heise, 1924.(Ernet) - Der Historism us und seine Ueberwindung. Berm
sOCIOLoGIA EDUCACIONAL
291
da fortemente pelas tendènciase teorias de cada Estado (1 ). Ern segun
do lugar, a revolução industrial modificou radicalmente a vida coti diana dos homens e "as crenças gerais resultantes do instinto e das cir
cunstáncias, observa Bertrand Russell, tornaram-se muito diferentes do que elas eram no século XVIII; mas nossas instituições não são ainda
adaptadas nem às tendèncias nascidas de circunstâncias novas, nern às nossas crenças reais". A nova insatisfação que daí deriva, é atribuida. porém, quase exclusivamente à insatisfação de necessidades de orden eonômica, em teorias absolutarmente falsas quc se inventaram para ex plicar a origem dêsse mal estar, e que se baseiam numa compreensio lemasiadamente restrita das necessidades vitais das sociedades huma nas. O socialismo, a sse respeito, diz B. Russell, "como panacéia, me parece um érro, pois se apóia no pressuposto de que melhores condi Ções econónicas tornarão os homens mais felizes. Os homens n£o têm
sòmente necessidade de um naior número de bens materiais, mas ain
da de liberdade, de direção pessoal, de possibilidades para crescer e
aperfeiçoar-se, de lazeres para experinentar as alegrias da vida, de coope
ração voluntária, e de menos servidão involuntária a fins estranhos. PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1.
Todo processo educativo é, por sua natureza, finalista e toda orientaáo
dèsse processo postula uma filosofia de vida ou uma hierarquia de valores A questão dos fins, em educação, é. portanto, de importância primordial: tais sejan os fins a atingir, tais serão as formas quc reveste e tais as técnicas de ensino e de rabalho. Mas essa questão é a um tempo filosófica e sociológica, ou, por outras
palavras, pode-se pôr de duas maneiras: a) quais os fins que a educação ter, dentro de determinada concepção de vida e do mundo, isto é, dado umdeve sistema filosófico, qual a doutrina peda gógica que daí resulta: podem-se assin estudar as doutrinas filosóficas e as doutrinas pedagógicas e ver comoparalelamente estas nascen daquelas e. dado um sistema filosófico, de Platão ou de de Aristóteles, ou de Desartes Kant, deduzir a filosofia de educação que Ihe corresponde: b) quais os ins que a cducação procura efetivamente ou tende a prosseguir (uma questão de fato). dentro das especiais de um meio social, numa época determinada: ou, dada condições uma organiação podem-se pesquisar as diretri:es a que se subordinoue os tins queeduacional. prossegue O prineiro (letra a) é um est udo demonstra que, variando os problema fundamentalmente ilosofico, e o seu filosóicos, variam as doutinas petagó gicas, em conseqüênia. O segundo sistemas (letra b) e um problena A lógico. socio emineniemente "filosofia de educação", que deriva de certa concepção de vida e esta implícita em tôda politica de educação, è suscetivel de ser invesigada como um fato conm espírito e métodos soiológicos. (1) Estabelecendo o primado da Nação do Es tado, cs tuns Estado (fascista, exteriorea propos oa peio ta, nacional-socialis sbre outros prepanderam da intelignciacomunista) desenvolvimento interior e do ito espir ), e a à inculcar mocidade que a lel suprema è o n en eacola o des aada a terèsse do stado.O Lndvido ndo não tem direitos senáo pelo Estado e para o Estado. e tacil compreender como, em ets gime, se perde de vista a hal re da personalidade capital tação da obra educacional importáncia humana, e 3eixo de grTV se desloca do individuo o Estado, determinada, human) para uma ns tiugo considerado como un tun(pessog em s1 fins procurados pela Nau:aimen certos educação atual. soráo sempre prossequ:dos em todoa qual fÓr o seu regime os paines, seja politico, nas, com a preponder dncta do tins transtormam se en meios atano sses esmos para a reahzao dos fins supremos do Eatado 20 Sociologia Educacional
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FERNANDO DE
AZEVEDO
2. A observação dos fatos mostra-nos que a cducação, tanto nos seus fins
como nas formas que reveste, varia com as condições de tempo c de lugar. N
existe, portanto, a não ser em teoria, uma cducação ideal, universal, isto (, perit e apropriada indistintamente a todos os homens. 1Tomem-sc, para análise, na anticui
dade grega, duas diferentes estruturas de sociedades, a fim de examinar a essénci seus objetos e proessos pedagógicos correspondentes:
a) de um lado, Esparta: isolamncnto cmn rclação aos outros povos gregog:
pobreza ténica, baixo nivel econômico, organização social comunitária; doni em conseqüéncia o fim da cducação espartana cra desenvolver a resistendia fisica, ocstoicismo ante o sofrimento, o gósto e a paixo pelas arnas, valor c hábitos de obediènia às leis, ormar, portanto, o "ipo de guerreiro" de que
completo do Estado sobre o indivíduo: predomináncia dos serviços militaresc a sociedade necesitava e no qual "o individuo desaparecesse sob o idadao": b) de outro lado, Atenas: proximidade de pörto de mar; contatos ton
outros povos gregos e bárbaros (estrangciros) ccom culturas diversas; riqucza:
sociedade comerial e democrática; regime de liberdade individual; grande dentro da concepção de vida ateniense ("viver bela e felizmente'"), a nova educação, na Repúblia. novimento artístico, literário e filosófico; em conseqüncia,
se descnvoivia num regime de liberdade de aprender e de ensinar Lerm
und Lehr-freiheit), que permancce o ideal da educação supcrior, e procurava
formar "espiritos dclicados, prudentes e sutis, embebidos da graça e da har monia, capazes de gozar o belo e os prazeres da pura especulação". Na hierarquia de valores predominavam, em Esparta, os ideais morais, civicos
e militares, c, em Atenas, os valores intelectuais, morais e artísticos; e aeducacão fisica, altamente aprecada e praticada em um e outro povo, diíereniava-se profún: damente de Esparta, em que tinha por fim dar ao individuo fôrça e resistência fisica e moral, indispensável aos guerreiros, para Atenas, em que visava antes a agilidade, e destrcza, a beleza das formas e a de movimento (euritmia). Em cada sociedade, a educação varia, como se vê, nos seus fins, nas suas instituições e nos
seus processos, conforne a concepção de vida e as idéias coletivas dominantes, e
atende, nas justas expressões de Durkheim, "as necessidades inelutáveis de que não épossível fazer abstraço". 3. Entre a cducação e uma filosofia de vida existe uma dependència essencial que provém da própria natureza finalista do processo pedagógico. Mas essa concepção de vida segundo a qual se orienta o trabalho educativo, sujcita certamente a influências de sistemas filosóficos e de doutrinas pedagógicas que daí resultam, não é, como vimos, constituida sòmente de verdades supra-históricas. As tradições, a mentalidade especifica de cada povo e as suas tendencias que se traduzem também
en teorias, não só imprimem aos grandes princípios uma "fisionomia particular" e os distribuem em diferentes escalas de valores, como também os subordinam a "finali
dades especiais", ligadas às condições de tempo e de lugar. Examinar, por ex., as
diferenças que separam os caracteres inglês e alemo c as repercussões na concepção de vida de um e outro povo: a) o sentimento do trágico, a paixão pela obediéncia e a tendência
mística do povo alemão; o alemão adora a tragdia ou mesmo a morte, observa Ludwig. enão tem o humor e a ironia que não podem existir na ausncia do espírito de liberdade; o misticismo germânico que tem, na extraordinária nusicalidade désse povo, uma de suas mais altas expressões, "substitui osen tinento religioso ou o torna mais arraigado, levando-o fàcilmente à crença
de que tôda a adverténcia sancionada por um verboten (proibido) é de origem divina"; b) o senso do cómico, o espirito de liberdade e o enpirismo do povo inglés; o humor (cfr. o fair-play) e a ironia, alheios ao povo alemão repre sentam clementos fundamnentais no pensanento inglês que se inclina antes para o inediato e o concreto e se distingue por cerla desconfiança para com a razão no que ela possa ter de excessivamente abstrato, de demais necâni
canente obrigatório e, portanto, ameaçador para a liberdade humnana. (tr. ashigh-brou, espresóes depreciativas, na lingua inglêsa, para designar o intelectual: literalmente, fronte alta; brainy, de brain, cércbro).
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
293
Dal a inportância que assume, para o alemão, "a pirâmide viva do Estado", a submissão total aos governantes, a disciplina militar, a sua adoraço habitual pelo uniforme, a significação mística atribuída até ao poder, à raça (mística do Estado, da raça, ctc.). Assim, num povo guerreiro, para o qual o Estado é nantido pelo poder mais importante que o Espírito, as palavras de ordem não são espírito e inteli egência, verdade e liberdade, mas "existênia", "vontade de poder", "sangue e solo" (cr. à eo que tantos pensadores modernos chamam "a vida" ou "instinto vital". luz dessas observações, os regimes educativos, na Inglaterra e na Alemanha, ao tempo do nazismo, e suas diferenças essenciais, determinadas pelas direrizes de sua política cducacional). 4. Se, em vez de dois países como a Inglaterra, fiel ao regime de liberdade e
de opinião, e a Alemanha, cm que dominaram um regine autoritário e um "esta tismo" avassalador, compararmos a Inglaterra e a França, dois povos profundamente enraizados, por tôda a filosofia implíita na sua politica, na grande tradição
liberal, cncontraremos diferenças fundamentais nas suas diretrizes escolares, ligadas a duas mentalidades contrárias: a) o caráter britânico c a vida inglsa não podem ser compreendidos sem que se faça intervir a noção do "empirismo", cuja base essenial é certa desconfiança para com a razáo: o traço central do caráter inglês está, para muitos, precisamente nessa desconfiança para com tôda análise radonal
e nessa falta de fé na razão humana; é um pensamento que teme o sistema e a abstração; e desconfiar da abstração é desconfiar também das verdades
gerais e da aplicação das teorias que não foram verificadas em detalhe pela prática (BACON foi o primeiro que exprimiu, e com um poder incomparável
essa estrutura essencial do pensamento e do caráter ingls): b) o "raionalismo", ao contráio, é uma das manifestações particular
mente salientes do espírito francês e de que se acham numerosos sintomas em outros dominios que não o do pensamento puro: enquanto o pensador e
o sábio ingls procuram evitar as iladas de um sistema e o politico prefere o
bom senso e a tradiço
à dialética e à teoria que lhes parecem sempre
suspeitas (a filosofia inglsa
não criou nenhum grande sistema comparável
ao de unm Descartes, Spinoza, Leibnitz ou Kant), o francès, observa Daniel
Orme, tende para as idéias gerais, para a verdade, isto é, para tudo o que "se concebe muito clara e distintamente", para os grandes principios (cfr. o racionalismo cartesiano que Descartes exprimiu e sistematizou no Discours de la Méthode, 1637).
No regime educacional inglès, nenhum cálculo, nada de regular. nada que faça
pensar num plano traçado de antemão, mas decisões ad hoc ditadas pelas circuns
tâncias especiais do problema a resolver (na Inglaterra encontra-se, de fato, o menor
número de leis escritas). No regime educacional francès, planos de organinçio e reformas traçados de acôrdo e sob a pressão de doutrinas. E, embora em um e outro regime educacional seja central o valor da pessoa humana e domnine a tradição, o
sistema francs tende a fazer predominar a instrução söbre a educação (inteiectua caional ingls põe o acento na formação do caráter, na formação do genteman,
lismo) e revela persistente o espirito cartesiano (radonalisno), e todo sistema edu
e visa menos as convicções do homem do que o homem total na sua conduta de todos os dias. Na França. a intervenção do Estado em matéria de educação, ao contrário da Inglaterra, "inimiga de toda cultura estatista unilateral". 5.
Estudar e analisar a evolução do sistema de ensino francès, nas suas fases
prinipais, segundo Lévy Strauss, e as transformações que nle se operam em cor respondncia
com o conjunto das instituições sociais e ideias coleuvas, reinantes
em cada época: a) no regime feudal, a parir do seculo XIl, na ldade Média, em que tôda ordem de conhecimentos era mais ou nenos ributária da rehgio e
cada grande mosteiro tinha suas escolas, as "univeridades nåo se separavam do sentido geral dado então a èsse vocábulo: o de coletividade constituida em pessoa civil: asociações de doutores e estudantes que xe tormavam para dar e receber lições, transtormaram-se eu academias teológicas: 20 bis
Sockologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
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(monarquia), em quc não cxistia ainda o ensino
ofidalb) ounodoantigo Estado,regime a educação secundária, dada por ordens religiosas, partiaos filhos da nobreza ou d cularmente a dos jesuítas, tinha por fim fornecer clássica:
literária e grande bunguesia uma formação geral, eminentemente deixar de ampliar os fns d c) na época da Revolução que não podia não se chegou a realizar, lembr educaçáo, pelas transformações quc provocou, de achria planos de organização nacional, elaborados cstabelecia Léy Srauss, nenhum dosrevoluionárias, que Condorcet, como o de com as novas concepções graduadas e de base nacional, mantinba a secundárias e primárias as cscolas, facultativas", desaconsclhava os "matérias linguas antigas, nos liceus, como essencial do ensino: estudos superiores de latime tornava a iència o objeto d) no Império de que data, nas suas linhas cssenciais, a organizacão
e centralizava todo o do ensino secundário e superior, Napolcão refundia organização fortemente uma sistema de instrução nacional, e o ensino, de harmonia comn as novas exi. hierarquizada, se propõe finalidades novas em cspecia conhecimentos semn elite uma gêndas da sociedade: "trata-se de criar
tão-sòmente lizados (renascimento das humanidades), reclamando, nessa poca, formação técnica"; a mediina e a arte militar uma e o sufrágio universal que então se instituiu. 48 de e) com a Revolução modificam-se e ampliam-se os fins do ensino que se propõe não mais a cons senhores de uma tituir uma elite mas a instruir todos os franceses, igualmente
(daí o nascimento do ensino parcela do poder público, pelo poder cletivo fêz sérios esforços para regime o é que primário); mas só depois de 1852 época a bifurcação dessa (data secundário ensino do reformar a organização
com a seção de letras e a de ciênias); o ) nos fins do século XIX, Com a revolução cientifica e industrial, ensino o também ser "que jánão era mais o único, deixa de ensino secundário completo para tornar-se o vestíbulo das escolas especiais" (em que se prepara das circunstâncias, para para as funções de direção); e surge sob a pressão multidão de células de ensino especiais, uma grupos de necessidades atender a (ensino técnico, escolas de agricultura, de comério, etc.) e a universidade entra em completa transformação, nessa sociedade invadida pela técnica. tipos de 6. Analisar alguns dos prinipais "tipos de homem" que encararam homem o monge, o medieval, iviliaão: o ateniense, o ddadão romano, o cavaleiro caracterís nas suas inglês, gentleman o da Renascença, o honnéte homme francs, na vida de ticas fundamentais, na sua evolução e quanto ao papel que exerceran de origem. seus paises de fronteiras das além influênia à sua ada um désses povos e
Observar, sobretudo, do ponto de vista da "especialização", para caracterizá-los, os dois tipos étnicos e culturais, inglés e germânico: diz a) que o traço mais caracteristico do gentleman, é talvez o fato,
Daniel Orme, de que êle se acha nos antípodas de tôda idéia de especialização; que tem suas origens históricas na circunstância de que um nobre, eessa aversão durante séculos, "não conheceu outra profissão senão a de guerreiro", persiste
do instinto pròpriamente inglês, "preferindo o homem por causa ainda natural,hoje completo, igualmente desenvolvido de corpo e de espírito, ao homem
preparado, mesmo de um modo admiràvelmente eficaz, para uma tarefa única" (para o inglês, o homem vale mais pelo que é do que pelo que faz); estabelecimento b) que a Alemanha sempre se mnostrou refratár1a ao
de um ideal assim concebido e lhe preferiu, ao contráio, o do "profissional" (o Berufsmensch) que vale antes pela sua Leistung, pelo que faz, pela sua obra,
e não pelo que é, contentando-se com uma mulidão de ideais especializados,
se assim podemos dizer, e form ulados de tal maneira que "o que nles
ficou
de importante não é o homem mas a coisa, sua obra, o rendimento de seu trabalho".
Examinar em que medida ésse ideal de homem que representa o gentleman e
torma como que o núcdeo íntimo davida inglesa foi inspirado, através da cultura
clássica dos humanistas, pela idéia de humanismo que põe, acima do valor pro
ional, a qualidade e oalor do homen, pelo scu caráter, pela sua conduta. pela
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qualificativo de scholar (distinguir sua cultura geral e permancce viva no próprio o sentido dessas duas palavras scholar e gentleman). fins da educaçáo pública, no Brasil atual, 7. Proceder a uma pesquisa sóbre osdeterminar qual a "escala de valores que con cspirito e métodos soiológicos, para e segundo a qual predornina homem, do corresponde à nossa concepção de vida efísica, cívica, etc) e se estabelece intelectual, (moral, educação sse ou aquêle tipo de do individuo e os interêsses os uma relação de harmonia ou de subordinação entre verificar: da socicdade e do Estado, e cspecialmente, para para funcóes técnicas a) se a educação atual tende a formar o indivíduo de base manual atividades e direção) (especialistas, produtores, funções de a tradição com acôrdo ou de indústria, e na agricultura e mecánica, na snial" "utilidade uma de vista em mais as chamadas profissões liberais; e, se o proveito para e sem pessoal, ordem do que de um consumo intelectual de
conjunto da civilização;
graus procura formar b) em que medida a escola pública de todos os una e indivisível: pátria, de sentimento o volver e desen nacional a consciência do "idadão". formação a é c, se a finalidade principal do trabalho educativo do submissão na importa objetivo èsse até que ponto, em nosso sistema,
indivíduo ao Estado e se opõe à consciência universal e humana, ou se
sobrepõe a ela, sem procurar suprimi-la; formar c) se o sistema educativo é deliberadamente encaminhado a brasileiros, cidadãos de uma pátria, dispostos a colocar acima de todos os valores, a independência naional, a unidade de pátriae a integridade de seu
território, quais as restrições opostas por essa finalidade à liberdade de ensinar ede aprender e em que medida concorre à realização dos objetivos civicos
a educação moral, física e intelectual.
Essa investigação sôbre fatos e constantemente provada na pedra de toque dsses mesmos fatos, deve ser feita sôbre a legislação e organização escolar e. em geral, sobre todo material concreto que. por exprimi-los, é suscetível de esclarec&-los: i) alegislação escolar: 2) a estrutura do sistema educativo (predominio dèse ou daquele tipo de escolas, a estrutura interna do ensino secundário, a distribuição das matérias e a duração do ensino, que revelam o predomínio do ensino literirio ou científico): 3) os programas e o material didático em uso e as tendèncias que
manifestam (pelo conhecimento que se oferece ou se subtrai ou pela maneira de
apresentá-lo): 4) relatórios e instruções oficiais; e 5) recrutamento e seleção do
"pessoal" pelo Estado. 8 A educação não revela atualmente, já o observava Dewey, uma "grande
finalidade diretora": resce, sem dúvida, e progride levada por uma presso especifia, exercida aqui e ali, e não, como fôra preciso, pelos estimulos generalindos e cons tantes de uma politica social de ampla envergadura e inspiraçio. As escolas, como a nação, reclamam, porém, um propósito central que venha criar umn novo entusiasmo e uma nova devoção, associar e guiar os espiritos. Essa crise, carateriada pela alta
de uma inalidade que atue fortemente sobre todo o conjunto, é determinada: a) pelas transformações sociais (técnicas, econômicas, politias e morais) que se estão operando e, sendo fatos reais, "devem ser encaradas e não ignora
das". para que, conhecidas nas suas causas e nas suas conseqüèncias, posam
ser orientadas e não fiquem reduzidas a fòras de desintegração:
b) pela destruição, em conseqüència, ou plo abalo de valores anterior mente estabelecidos, muitos dos quais perderam a sua vitalidade e o seu significado e que não foram substituidos por um "ideal novo", capaz de atuar sôbre o conjunto das instituições sociais e do sistema de educação como "uma fôrça vital interna";
c) pela coexistência de doutrinas e das teorias petagógicas em diver vida: umas, conservadoras, outras, revolucionárias; umas, spiritualistas, outras materialistas; democráticas ou autoritárias; individualistas e coletivistas, que
gência e mesmo em oposição, que correspondem a dilerentes concepÑes de todas indican uma "iviliação em mudança".
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Entre os sistemas que exprimem essa grande crise em cducação, são os mais
importantes: 1) o grande número de doutrinas a multiplicarem -sc, como acontece em
boras de crise, e pelas quais se manifestam tendências confusas, mas enérgicas, da
sOdedade, aspiraçoes coletivas e ideais novos em via de formação; 2) as refotmas
transformações constantes que se operam nos sistemas cducativos e denunciam, com a abundância e conflito de teorias, a inquictação educacional do mundo moderno Analisar cada um dêses pontos fundamentais e discuti-los à vista de fatos eda
documentaçáo (legislaço,'literatura pedagógica de caráter filosófico, científico, ou didático, correntes educacionais, etc.). REFER£NCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Capitulo V A ESCOLA, O PATRIOTISMO E A UNIDADE NACIONAL A idéia da pátria através dos séculos.
As comunidades humanas de
uma pátria e o sentimento de pátria. Conceito e definição de patriotismo. - Aidéia de nação e a consciència nacional. A formação da consciènia, da
coesão e da unidade nacional. O papel da escola na unificação nacional. A lingua vernacula, instrumento de unificação nacional. - A geografia e a
história. - 0 problema das colônias estrangeiras. A consciência nacional e a formação de sentimentos de solidariedade mais larga que transbordam o quadro das párias. humana.
A consciência nacional e a consciênda universal e
As humanidades.
A idéia de pária (terra natal, torrão natal) é uma noção impreg
nada de sentimento que se deve ter formado quando as sociedades se fixaram ao solo e puderam perpetuar-se as gerações, de uma descen dência comum, na mesma região habitada pelos antepassados. A pala
Vra "pátria", de origem latina, é um adjetivo (patrius, a, um) que
qualifica e limita "terra": terra pátria, terra dos pais (1); empregado como substantivo, já entre romanos que subentendiam a palavra terra, tinha a mesma significação que hoje se lhe atribui: pátria, terra dos antepassados. Desde tempos remotos essa idéia veio tomando ascenden
te nas consciências públicas; como a idéia mais recente de nação, "age
no mundo e é cheia de förça". Ëum conceito eminentemente socio
lógico que se gerou nas relações entre a sociedade e o meio fisico, e no
apgo do homem à terra pela comunidade de origens e tradições de
uma sociedade formada e desenvolvida num território determinado.
Se é verdade que a comunidade de habitat reside à base e como que
constitui o substrato material da noção de pátria, não se pode dizer
com Dunkmann (2) que ela seja "uma conseqüència dos efeitos sinte
tizadores do espaço geográfico". Que superioridade de sintese mostra
com isso o espaço, escreve Dunkmann, "revela a cada um de nós a pró
pria experiência da vida e àtotalidade de um povo a sua experiència: a história, com a sua sementeira de sangue (a "ferocidade das pårias
primitivas"), que eleva o torrão natal por tôda parte e em quase tòdas as gerações novamente ao nivel de um valor supremo". Mas essa idéia (1)
A palavra latina pater que no plural patres, siqnifica "antepassados, corres
ponde a pitar, em sânscrito, e artp. em grego, que, como sa và. tem uma fonte o mum, e aparece, sob formas em que fàcllmente so reconhe aidentidade de sua oriçem, em tôdas as linguas indo-europélas. (Ctr. terra patria, lat., Vaterland, al ). (2) K. DUNKMANN
Lehrbuch der Soziologie, Berlin, 1931.
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de pátria que pareceu a Dunkmann oresultado das influèncias sinte
tizadoras do espaço, se originou e se consolidou, ao contrário tôda noção social, no foco da vida coletiva, por um processo de assoas ciação em que entraram as relações entre a vida social, de um lado, Com
as suas lembranças, glórias e provaçõcs comuns, e de outro, o teitorin ou oquadro geográfico em que se desenvolveu eno apgo ao omal se exprime a solidariedade moral entre as geraçöcs unidas, através de tempo, no mesmo espaço, conquistado, defendido e modificado pclo esfôrço de gerações sucessivas. Se a natureza fisica influi sõble
mem, o homem influi não menos intensamente sôbre ela, tomanda Ale mesmo "um dos fatôres essenciais da paisagem e um dos mais po derosos artifices das modificações terrestres". A dependència do homem
em relação à natureza de hoje é, pois, na realidade, como observa
Simiand, uma dependència do homem em relação aos seus antepassados. A terra, berço e túmulo das gerações, cujos olhos se embelberam
nas meSmas paisagens e cuja vida se alimentou nas mesmas fontes.
surge, a cada geração, modificada nos seus aspectos naturais, pelo esfôrço humano que lhe imprimiu uma fisionomia particular, com suas culturas, suas construções, suas cidades, seus túneis, suas estradas e suas
próprias destruições. Assim o apêgo à terra em que habitamos e de que
vivemos, em que se guardam os despojos das gerações anteriores e se
erguem as obras de tôda ordem que perpetuam os seus esforços e esti
mulam constantemente novas iniciativas, é, em última análise, o culto
das tradições comuns e dos antepassados (1 ). A sociedade humana, eis como se exprime Bossuet, "pede que amemos a terra em que vive mos juntos. Nós a olhamos como uma mãe (terra mater) e uma nutriz
comum. Apegamo-nos a ela, e isto nos une. É a isto que os latinos chamam caritas atrii soli, o amor do solo da pátria, e êles o encaram como un laço entre os homens. Os homens, com efeito, se sentem liga dos por alguma coisa de forte, quando pensam que a terra que os
trouxe e nutriu, durante sua existência, os receberá em seu seio quan do morrerem". O patriotismo é, assim, uma fonte de fôrça para o Es
tado, e, como se vê, um sentimento muito complexo, fundado sôbre instintos primitivos e sôbre convicções puramente intelectuais. Nêle se misturam, segundo observa Bertrand Russell, com o amor ao seu interior e àsua família, "a afeição instintiva pelos compatriotas, que
é uma força contra oestrangeiro; oorgulho ligado ao sucesso da co munidade àqual nos sentimos pertencer e uma crença, sugerida pela altivez e reforçada pela História, de que nossa própria nação representa (1) A pátria, escreve numa página admirável Yves de la Brière, "apresenta-se como a herança coletiva dos antepassados; o território que habitaram, os trabalhos, as Xplo rações, Gs construções que executaram, as ações úteis e gloriosas que realizaram, de go
Taçao em geração, as obras literárias e artísticas de que enriqueceram o patrimönio here ditario, as alegrias e os entusiasmos, as lutas e as dores gue experimentaram na sud exs*
tência coletiva. Eis a herança
a um tempo material e espiritual que os pais trans
aos ilhos, e Gs gerações. A pária é essa comunidadG nobre. preciosa e bela que nossos Pais editicaram de idade em idade, pelo seu trabalho, seu amor e seu sangue. A geay
presente é depositária dêsses bens. Ela se reconhece obrigada a guardar e a tazer r d o
o magnífico patrimônio hereditário, para transmiti-lo intato e enriquecido às geraçoei futuro. Sob osímbolo prestigioso da mesma bandeira, ela protege, como o tesouro da goe comum, o túmulo dos antepassados e o berço dos filhos'".
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à raça hu ideal, cuja mnanutenço importa grande tradição e umconsiderações se acrescenta, na análise obje essas tôdas a Mas mana". a um tempo mais nobre e mais tiva de Russell, "um outro elemento, idolatria, de sacrifício vo de elemento um controvérsia: à propício vida da nação. de sua própria vida pelafôrça luntário, de alegre imolaçãopatriotismo do Estado, é essencial à do religioso elemento represen Esse sacrifício nacional os melhoresinstintivo e pois que agrupa do lado do sentimento de pátria, uma
o tantes da nação". O patriotismo oureflexão, visando um bem limitado pela mistico, reforçado e apurado inteira e impelindo-nos, por humanidade à não e nação, própria à comunidade, tende a afirmar tanto, a prossegir os fins impostosnaspela horas tranqüilas, en que parece se, opondo-se; e não é, por isto, perigo (crises, guerras, invasões), que adormecer, mas nos momentos de e em todo o seu poder podemos surpreend-lo em tôda a sua intensidade de energia nacional. poderosas de exaltação, comno uma das fontes mais damos a essa pa A idéia de nação, ao menos no sentido que hojeposse de um terri lavra, é uma idéia mais recente que implica 1) a população uma 2) tório ou a longa coabitação numn território dado; 3) e o regime de animada de um sentimnento e uma vontade comuns; for Estado, ou um poder central que mantém a unidade do grupo. A da mação das nações que surgem com a fixação ao solo, os progresSos cultura da terra, o aumento da população e a centralizaç£o do poder político, é, como observa Hauriou, um fenômeno extremamente im portante, não só porque "dura ainda e continua a agitar o mundo, pelos movimentos contraditórios do nacionalismo e do internacionalis mo, como também porque as nações constituem a matéria-prima dos
Estados". Pode-se, pois, com Hauriou, definir as nações como "grupos de populações fixadas ao solo, e nas quais um laço de parentesco espi ritual desenvolve o pensamento da unidade do próprio grupo". Na
análise do fenômeno de nação, de sua formaço e evolução histórica, alguns autores, considerando as nações como formações puramente es pirituais, acentuam o seu elemento subjetivo, um pensamento e uma
vontade comuns, a consciència nacional (é a tese idealista ou eletiva defendida por Renan) e outros, como os pensadores alemães, dão pre
ponderância aos elementos objetivos (o solo, a raça, etc) que, a seu
juizo, determinam por fora a formação das nacionalidades (tese realista
ou determinista preferida pelos alemes). Para Renan e, em geral, os pensadores franceses que definem a nação pelo seu elemento subje
tivo, uma "nação é o patriotismo ou o sentimento comum de pátria",
e essa consciência "torna-se independente dos fatôres que se podem
chamar objetivos, e, em certas condições sociais, podem ser necessários àsua ecloso:
unidade de religião, de raça, de lingua". Segundo os ale
mães, ao contrário, não reside na consciência o critério da nacionali dade a qual éantes um tipo por excelència de fenômeno "inconsciÁn te", produzido por elementos "exteriores" ao individuo, a raça, a lin
gua, e, em geral, as necessidades que conduzem o individuo e "cujo
FERNANDO DE AZEVEDO 300
conjunto perpetua o evoluir histórico de uma nação". A verdade.
o
rém, é que, por um lado, raças muito diterentes podem incorpo rar-se nos mesmos quadros nacionais e se existem nações bilíngües e
trilingües e com religiõcs diferentes, a homogeneidade énica a até tradição, alingua ea religião são fatôres de primeira ordem na cons. tituicão das nacionalidades; e, por outro lado, se êstes fatôres nã são
de ordem estritamente inconsciênte, a raça e as fronteiras naturais,
também elas, longe de serem dados concretos absolutamente definiveis
aparecem antes "como conceitos construidos de antemão segundo um
esgquema político", sendo certo que podemos tornar-nos e julgar-nos semelhantes de civilização semn esperamos ser orgånicamen te seme lhantes.
Se, pois, esses diversos fatôres objetivos concorrem para a produ
ção do fenômeno "nação" e se não aparecem sempre agindo simultâ
neamente ou com intensidade igual no processo de formaço
de cada
nacionalidade, a constituição de uma nação deve ser estudada in con
creto, nos elementos que efetivamente contribuiram para a produção
do fenômeno. É sòmente ése estudo in specie, histórico e sociológico
a um tempo, que nos permitirá compreender por que certos fatôres
foram e deixaram de ser indispensáveis à unidade nacional, e como e
dentro de que limites a ausência de um deses fatôres, no processo
de uma formação nacional determinada, foi compensada pela ação mais intensa de outros fatôres objetivos. Em todo o caso, a assimilação é, como mostra Félix Pécaut, a lei da vida nacional: sem certa homogeneidade de instituições, sem tradições comuns e sem uma uni
dade moral, não seria possível, de fato, estabelecer uma vida comum
e a consciência de uma unidade, - a consciência nacional que, residin
do àbase da formação de uma nacionalidade, se desenvolve con ela e constitui o elemento essencial pelo qual se define e se manifesta a vida
da nação. A comunidade de raça que existia no núcleo primitivo, a contínua mestiçagem de raças absorvidas pelo núcleo nacional, a longa coabitação no mesmo território, a comunidade de língua e religião, as tradições comuns, todos êsses elementos, em proporções variáveis, si multânea ou sucessivamnente contribuem, assimilando os indivíduos e
grupos, para estabelecer o laço de parentesco espiritual e, portanto, 0s para formar a consciência, a coesão e a unidade nacionais. É dêsse pro cesso longo e acidentado de assimilação progressiva que brotam uma vontade e um sentimento comuns: a vontade de continuar a viver jun tos no mesmo meio e o amor a êsse meio geográfico e social, em que
Vivemos juntos e desejamos morrer, e a que chamamos pátria, naçao.
É antes de tudo o Estado, criador de nacionalidades, que, na justa ob
servação de Pécaut, "continua sempre com todo o seu poder e todo o seu
instinto, sem poder fazer de outro nodo, tanto sob uma monarquia como
sob uma repoblica, sua obra de assimilação. £le homogeneiza as instr tuições, suprime tudo o que prejudica a vida comum, interessa as al
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
301
mas em uma história comum" (I). Em matéria de nacionalidade, o Es tado hoje, como outrora a dinastia, cujo papel histórico na formação
das nacionalidades foi assinalado por Renan, é, pelo seu poder assi
milador, o artifice da unidade nacional, tanto quanto o ascendente do
poder politico, como o de uma personalidade ou de uma familia, nas a fraca consciência que um povo tinha de sua fisionomia e de suas as
dinastia, "põde ser necessário para encarnar e estimular a um tempo pirações nacionais".
Mas, se por uma parte, um povo,
unidade mais fácil a sentir
do que a definir, e que, pela colaboração dos mortos com os vivos, tem um caráter de infinito,
se esforça por perseverar no seu ser e guar
dar a sua fisionomia própria, por outra parte, as förças particularistas de diferenciação e secessão trabalham constantemente por diversificar e separar os individuos e os grupos, quebrando-lhe a unidade funda mental. A formação das nações, no sentido que damos à palavra, coin cidiu com a constituição de uma sociedade nova mais rica e mais com plexa, que tem necessidade de maior mobilidade e deve elaborar novas
instituições para fazer respeitar as iguais liberdades entre os indivíduos. Épreciso, pois, um trabalho constante de unificação e de defesa con tra essas tendências de secessão que põem, a cada momento, em perigo a existência nacional e a tornam, nas expressões de Renan, "um ple biscito de todos os dias como a existência de um indivíduo é uma afir
mação perpétua da vida". Daí a importância do papel reservado à
escola como um dos mais poderosos fatôres de assimilação.
Oensino
geral ou comum que se destina a todos (ensino primário e, em parte. o secundário) e se distingue, por isto, dos ensinos especiais que aten
dem às necessidades dos diversos grupos (especialização profissional) e
são antes fatôres de diferenças e oposições sociais, tem, em realidade, como frisou F. Pécaut, um alcance incomparável, não pedagógico, mas social: faz-nos semelhantes". As fôrças de coesão, observam por sua vez
Hesse e Gleyze, encontram na escola "um lugar de concentração e de expansão. A escola é, por excelência, o agente do sentimento nacional.
o meio de espalhar em todos um patriotismo são e vivaz. Ela é o
foco em que se elabora a unidade nacional. A vida familial separa
os escolares; a vida profissional os dividirá mais arde em classes hos tis; num
momento decisivo de sua vida (infância e adolescència).
quando sua alma se forma, tomam corpo suas aspirações e a cons
ciência se desperta, êles se misturam na escola pública, classes e pro
víncias. A nação lhes é revelada na continuidade de sua vida e na
permanência de seus laços". Assim o papel da escola que, aberta a todos, se propõe a ministrar um ensino comum eem que as crianças (1) F. Pécaut acentua ainda, como já vimos, o pape! assimilador das cdades qua ei
tivamente assimilam, "porque (são palavras suas ) dissolvem as diferengus da costumes de crenças das populações que afluem para elas. Elas sâo o cen tro em que a cumpos as suas diferenças. Notai essa atmostera de iberdade que s rspira na cdade: se a analisais, ó um sentimento de libertagão relativamente às dtfesençus". As cidadas. porém, não constituem apenas os focos mais intensos de ass imilaço, m que s apagam ds diversidades de costumes so temperaagrupamen a untdadetoa nacional: o daaen valvimento a expansôo das cidades, a tormaço de urbanos, diminuindo as distâncias
que as separam dos campos
aumentando a sua nttuancta sdbre dles. contribuem para
conquistá-los pouco a pouco à civilizago.
FERNANDO DE AZEVEDO
302
de tôdas as condições "viriam sentar-se juntas antes da educacão espe
de ser decisivo na formação e no desenvolvi cial", não pode deixar mento da unidade nacional. Nesse ensino geral ou comum, o trabalho de assimilação que se
realiza, ministrando-se uma base vergentes, tem um papel social de maternal: o ensino de gramática cer a unidade de lingua e lutar
de cultura comum para técnicas di. suma importância o ensino da língua visa, de fato, antes de tudo cstabele incessantemente contra as causas de
diferenciação. Os poetas e prosadores que criaram ou, melhor, chega
academias aue ram a fixar uma lingua e literatura nacionais, e as atraindo e aproximando elementos de tôdas as provincias,dascontribuem variantes para a formação de uma lingua comum, por eliminação
de unificação lin ou das formas regionais, participam dêsse esfôrço e se consolida a prepara güistica e literária, com que se antecipa, se uma unificação política. A unidade de lingua sempre se considerou todos necessidade nacional. Éa língua comum, a língua vernácula que semelhan
devem falar para se entenderem e se sentirem e as suas liberda tes, se têm de defender um dia a sua independência admiràvelmente Alfred Vinet, des ameaçadas. A língua, como observoumesmos; a mais sincera, a mais "é a primeira revelação de nós a nós homem; uma ciência tÑda feita larga e a mais viva representação do a primeira palestra em que mergulham as raízes de tôdas as outras; introdução a todos os exer da razo humana; a melhor e a mais fácil lingua é um produto cole cicios ulteriores do pensamento". E, como a preciso gênio original de cada povo, é vivas tivo em que se exprime o índole, de ter descido até às fontes ter-lhe apanhado a própria a gramáica tanto quanto o que emanam a fonética como a inflexo, primeira revelação do povo a si estilo, o ensino da língua vernácula, graus do ensino, matéria essen mesmo, tem de constituir, em todos os nacional. Épor isto, por os cidados
cial àformação da unidade e da consciência ou repudia geralmente do curso primário êsse aspecto social, que selínguas prematura estrangeiras: ministrado elementar o ensino das pelos quais o espírito se prende mente pode, de fato, afrouxar os laços à cultura da povo e causar prejuízosmaneira próprio seu de desviá-lo pátria, a glo à cada país, de em ensinada história, A materna. língua cerimônias escolares ou públicas em rificá-lo, e avivada nas festas e figuras nacionais; a geografia em e datas grandes as celebram que se transformada pelo que habitamos e que, tornando-se que nos érevelada a região diversifica, limita e se homem, no curso dos séculos, se imagem do povo", e a transmissão, "como uma medalha cunhada àde um mesmo espírito, de tradições e enfim, de uma mesma cultura e meios de que, por tôda parte, a escola ideais comuns, são outros tantos gerações e desenvolver-lhes a consciên se serve para assimilar as novas cia e o ideal nacional. tra seja o papel da escola nesse influên Por mais importante, porém, que da consciÁncia nacional, a
pressões balho de unificação e de formação ser neutralizada pelas pode só não escola da assimiladora ela tamnbém cia em sentidos diferentes, como
e sugestões do meio social,
303
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
ésuscetível de variar c varia efetivamente com as condições e as idéias
coletivas dominantes, afrouxandose ou atingindo um alto grau de in tensidade. Nos paises novos em formaço
e em velhos países, nas épo
cas de crise, em que as fôrças de desagregaço põem em perigo a sua
existência ou unidade, as correntes de nacionalismo tendem a ganhar
terreno, vivificando a política de educação de um profundo sentimento de pátria, e utilizando-se da escola nacional como urn dos mais pode
rosos instrumentos para ativar o processo de integração de todos os
grupos cde todos os indivíduos na vida de uma nação. A acão contra as escolas estrangciras, em paises de fraca densidade dernográfica e de
intensa imigração, constitui sempre parte, e das mais importantes, de tôda a política de educação nacional. Essas escolas, com efeito, quase
exciusivamente destinadas aos filhos de imigrantes, longe de integrar os seus alunos na comunidade nacional, não fazen mais do que reforçar o sentimento de seus países de origem. Foi o que vinha sucedendo, no
Brasil, com as escolas italianas e, especialmente alemãs, no Rio Gran
de, em que o isolarnen to das colônias e, em conseqüência, a ausência trangeiras, enquistadas no território nacional, favoreceram a organiza
quase absoluta de ação dos poderes públicos sôbre essas populações es cão de escolas francamente italianas ou alems,
na sua estrutura, no
seu ensino e no seu corpo docente. Até 1930, e desde os meados do século XIX, em que se constituíram algumas dessas colônias, ficaram elas inteiramente entregues a si mesmas, sem escolas brasileiras, sequer
para o ensino do idioma nacional e puderam manter e transmitir, de pais a filhos, com a lingua própria, a sua religião, os seus costumes, a
sua cultura e as suas tradições. O estabelecimento de uma colonização
alem homogênea, privada durante muito tempo de suas relações com oterelemento nacional, e a organizaço de um ensino privativo, de cari eminentemente estrangeiro, que se justificava pela ausència de qual quer iniciativa nacional para instruir e assimilar essas colônias, criaram entre nós, em dado momento, um dos mais graves problemas da edu
cação nacional. A questão que vinha sendo agitada periòdicamente,
antes de 1980, numa atmosfera de tolerância e indiferença oficial, pa tersse vital para o pais, têm sido postas em prática com o objetivo de fundir essas colônias alems no mundo dos brasileiros. Mas se o sentimento de uma comunidade nacional que é um alar
rece já ter sido encarada sèriamente, e várias medidas eficazes, de in
gamento da família, da tribo, da provincia, se revela hoje tão forte
como nunca foi e continua a ser uma das maiores fôrças da História
êle implica, pela sua própria natureza, a adesão refletida dos indivi
duos e não se opõe necessàriamente a uma consciència universal eà idéia de unidade do espirito humano. Aförça do sentimento de nação resulta não só de que constitui o principal apoio do poder do Estado,
dois temores, o da anarquia no interior e o de agresso exterior, mas da fuso progressiva de suas populações e da consciència de origens,
de um passado, de fins e de interèsses comuns a um grupo determina do. Écerto que, como escreveu B. Russell, "quase todos os individuos consideram essencial à sua própria felicidade sentirem-se membros de
FERNANDO DE AZEVEDO 304
e unidos para um grupo, animados por simpatias e aversões comuns essa consciência moral a defesa e para o ataque". Mas, por um lado,mais forte e mais sólida e coletiva que se chama uma nação, étanto mais consciente e refletida; e, se éessencial à nação um esfôrco quanto civilizador constante para integrar todos os elementos (grupos e re giões) na comunidade nacional, êsse esfôrço étanto mais eficaz quanto
e ås Dar. mais se basear no respeito prático à personalidade humana e a uni ticularidades e diversidades legítimas compatíveis com a vida dade essencial da nação. Entre os dois processos que os Estados alter mais lentos, mas. nadamente aplicam para consolidá-la, um, de efeitos união, uma unidade em compensação mais duráveis, tende a suscitar a enquanto o outro, real, apoiada na adesão consciente das populações, dissimulada. - o estabelecimento da unidade pela fôrça, ostensiva ou
mais profunda, só pode atingir essa unidade artificial, aparentemente num compressão, passa com a
e mas, na verdade, precária, que se obtém de tendências e de nível costumes, de círculo de ferro, das diferenças que as correntes do culturale econômico. Por outro lado, se é verdade na História e, não nacionalismo e do internacionalismo se alternam nacional, em determina raramente, se opõem, aos assaltos da paixãotempo de guerra, o senti das circunstâncias, como por exemplo em em senti desdobrar mento nacional ésuscetível de se alargar e de se que transbordam o mentos mais largos (humanismo, universalismo) pois se oporem necessàriamente, quadro das pátrias (1). Longe de assimilação como às suas civilizações há, entre as nações, tendências à modernas, precisas, nações as causas de diferenciação e de conflito, de mais no que elas têm tendendo diferenciadas, se completam reciprocamente da civilização, profundo e original, e servem à obra comum estuário, pela comunida mesmo ora a separar-se, ora a confluir para ode cultura e de ideais. Em certas de de interêsses como pela unidade guerras de religião, depois da Reforma, épocas, como se deu durante asou o protestantismo) "tornou-se um laço uma fé comum (o catolicismo nacionalidade" e, ainda que, em mais mais forte do que uma mesma Russell, a mesma coisa se pro fraca medida, como observa Bertrand movimento do socialismno. duziu no mundo moderno, com o industriais do vapor, da eletricidade As descobertas e as aplicações prodigioso, suscitaram, segundo e do rádio, com seu desenvolvimento fenômenos característicos da civili três Briére, la de Yves lembra nos econômica e universal; b) a pene zação atual: a) a interdependênciageneralizada entre todos os povos e tração múua ou compenetração crescente de hábitos sociais no semelhança a c) e culturas, tôdas as movimento do nacionalismo mundo inteiro. Assim, pois, ao lado do espírito, mantém conteúdo e pelo seu supratemporais e uma cultura que, pelo seu desinteressados, (1) O humanismo é geração sentido dos valores o uniadde na em e consciência geração de na reencontrarem " renova indivíduOs "se reconhecerem e se diz Strowski, para quem permite aoshumDano". momento, a própria civilização, neste 6, £le qrandes tendências materiaisdo do gånero duas por ameaçado duplamente da pessoa hu o humanismo se acha tecnicidade e a racionalização, e 2) a socialização efeito, o técnico Comn individual. mundo moderno: 1) a vida a absorver ng sociedade 6 também 6le que de destruição mana, isto é, a tendência aresístir de social, ao ospírito de bdio do seu melo "não tem nenhum meio de mais eficaz servidor e individuo, "que não 6coletivas" senáo uma (inPrelace de Pour un huma não é menos escravo que o técnico, das paixões Paris).
BASTIDE, nisme nouveau, Enquête dirigée por P. ARBOUSSE
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
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que se accntua por tôda parte, às vêzes sob forrmas agresivas, e tende,
cm conseqüência, a confinar os povos dentro de suas pátrias respectivas ea armá-los uns contra os outros, a corrente de universalisno se refaz
e se desenvolve, pela assimilação crescente dos costumes e das institui ções, e pela absorção progressiva das nações nos quadros de uma mesma
civilização, humana e universal. Essa compenetração, interdependència
esolidariedade entre as nações, que ora se aceleram pelo predominio
dos interêsses em comum, ora se retardam com os interêsses em con flito, "tornam pouco a pouco semelhantes as civilizações materiais de todos os países, e essa semelhança tende a acarretar por sua vez uma
semelhança das civilizações politicas e mesmno morais". E, assim como a transmissão, através de gerações, da cultura peculiar e das tradições próprias de cada uma das unidades nacionais, desenvolve o sentido da
continuidade social, dentro das fronteiras, a tradição dessa cultura re
sultante das contribuições dos mais diversos povos, e de experiências humanas acumuladas tende naturalmente, sob formas gerais que in teressam a todos os homens em tôdas as latitudes, a estabelecer a soli dariedade moral entre as nações e aprofundar e alargar "o sentido de humanidade", que, em suma, é "a mais alta realidade ideal que atin gimos". Se o nacionalista explica e define o individuo pela nação, pelo lado em que se prende ao seu pais ou pelo qual nêle se reflete o que a nação apresenta de mais caracteristico e original, o humanista é, como
bem observa Arbousse Bastide, "um imanentista à procura de uma ex
plicação do individuo pelo homem, do homem pelo humanidade". Não
são dois critérios ou duas noções que se opõem, mas antes uma noção
que se alarga na linha de seu desenvolvimento natural, para a explica
ção da cultura e do indivíduo, ligados, uma e outro, por um lado, às diversidades nacionais, por suas faculdades diferentes, muitas vzes
opostas, e, por outro, à unidade fundamental do espirito humano. Seja. pois, qual fôr a forma que possa revestir o humanismo (religioso e
cristão, clássico, literário ou científico) e que depende necessar iamente
da concepção que se tenha do próprio homem, de seu destino e de seus
deveres, as "humanidades" lutam por manter, nos sistemas educativos,
o lugar que Ihes conquistaram as correntes sucessivas de cosmopolitis mo ou de universalismo, na 1dade Média e na Renascença, e que pa
rece consolidar-se com o fenômeno de interpeneração e assimilaçio de
culturas e da crescente interdependência econômica, moral e politica
entre os mais diversos grupos humanos ou comunidades nacionais. PROBLEMAS E DISCUSSOES
1. Analisar como se íormou e se desenvolveu a noção da pátria que é conceito
puramente sociológico, e o sentimento complexo que lIhe corresponde (patriotismo) e que reside à base da estrutura politica eé um elemento essencial à fôrça do Estado. Estudar a origem eo sentidoprofundo do sentimento patrióico e aracterizá-lo
nos seus elementos fundamentais:
a) o apègo à tea em que viveram nossos antepamdos (tera pitria) e
que conquistada, trabalhada e modificada pela ação do homem, nos trans mitiram de geração em geraço como um patrimdnio comum: a terra em que
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FERNANDO DE AZEVEDO
habitamos juntos, túmulo dos antepassados e berço dos filhos, e que nos recolherá em seu seio, quando morermos; b) o amor refletido à tradição, à herança material e cspiritual que os antepassados nos legaram e de que as gerações presentes se sentem depositárias, considerando a terra como um patrimônio confiado à sua guarda, ao seu
esförço empreendedor e à sua defesa:
c) como todo sentimento coletivo que tende a unificar, é constantemente
trabalhado pelas tendências antagônicas de difereniação e de secessão que põem
em perigo nas nações, ameaçando-lhes a unidade, a sua própria existência: em tempo de paz, parece afrouxar-se, se não é suficientemente cultivado, para se
tornar extremamente vivaz, "suspeitoso e exigente", em caso de guerra;
d) sendo uma das mais nobres e generosas paixões da alma e da vida humana, o bem que o patriotismo procura é um bem limitado à própria nação e não um bem para a humanidade inteira: nacionalismo e humanismo se
diferenciam em que aquêle se limita, nos fins que prossegue, às fron teiras de uma pátria, e êste transborda os limites da nação, para nos abrir mais vastos horizontes espirituais (por exemplo, o Cristianismo).
2. É preciso distinguir na populaão de uma nação, como sugere Hauriou (l ), dois elementos: a) um núcleo costumeiro, assimilado pela longa coabitação sôbre o mes1no território; b) os imigrantes. Não sòmente, acrescenta Hauriou, as nações que são "formações costumeiras e territoriais, não podem criar-se senão por um núcleo tradicional, como também não podem, em seguida, continuar aassimilar os imigrantes
senão graças a êle, êle só capaz de engendrar o parentesco espiritual nacional que não pode ser ùnicamente uma questão de vontade". Analisar a respeito os seguintes fatos:
a) o núcleo primitivo (português) da população do Brasil, como base de comunidade de raça, e en tôrno do qual se formou essa comunidade
étnica em conseqüência da contínua miscigenação (mestiçagem); a nacionalidade brasileira, misturada como tôdas as "raças" nacionais, já estava constituida
nos fins do periodo colonial, quando acabou a mestiçagem das primeiras popu
lações do país (cfr. M. Hauriou);
b) a absorção pelo núcleo primitivo nacioral dos inigrantes e suas con
dições essenciais: a assimilação não se pode dar senão com a condição 1) de que o nçmero dos estrangeiros fique relativamente fraco em relação ao núcleo
primitivo; 2) de que a população imigrante seja móvel, passando fàcilnmente
do campo à idade, da agricultura à indústria, e mais fàcilmente assimilável no curso dessas mudanças que contribuem para romper os laços de origem J. Lambert);
c) mobilidade e isolamento dos imigrantes e suas conseqüências: "como o instrumento de assimilação é o movimento da população", os grupos estran geiros em S. Paulo (e o mesmo aconteceu em outras regiõcs), freqüentemente
divididos pelas mudanças tiveram que fundir-se na maioria, ao contrário dos colonos alemães do Rio Grande que, fixando-se em pequenas propriedades, permaneceram entregues a si mesmos e cujo isolamento no interior do Estado,
já tão isolado da nação, "permitiu, observa Lambert, o estabelecimento de uma homogènea colonização alemã (enquistamento), durante muito tempo privada das relações com os clementos pròpriamente brasileiros do país: d) a riquea de elementos heterogéneos e a unidade nacional: a intro dução de elementos estrangeiros assimiláveis, em número sempre muito fraco em relação ao núcleo nacional e em contato constante com o mundo dos brasileiros, é um meio de enriquecer, excitar e renovar as fôrças nacionais;
"selecionar e cruzar, assimilar e nacionalizar", segundo a fórmula exata de
M. Sampaio Ferraz; todos os povos, cujas origens foram estudadas (França,
Itália, Alemanha, Estados Unidos, etc) "fazem ver a mesma riqueza de elementos
étnicos que, entrecruzando-se, contribuíram para for1mar sua unidade naci0
nal". (J. FINOT, Le prejugé des races. Paris, Félix Alcan, 1905). () M. HAURIOU - Précis du droit constitutionnel. Paris, Tannin, 1923.
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Analisar e discutir cada um dèsses pontos, à luz da documentação histórica
(França, 1tália, Alemanha) e de fatos diretamente observáveis (Estados Unidos,
Brasil, Argentina, etc.), de que resulta a importância, na formação dos povos, dése fenômeno de invasão, interpenetração e assi milação de raças e culturas diversas,
em tôrno de um núcleo primitivo.
3.
Aunidade nacional não é um fenômeno de cristalizaçáo, mas um fenomeno
continuo, quer dizer, nunca éum fato inteiramente realizado e acabado, mas alguma coisa que está sempre se formando sem nunca se formar de todo: ela resulta de um
conjunto de fatóres objetivos (raça, território, língua, etc.). e subjetivos (consciència nacional, patriotismo) que tendem a uniformizar, mas está sujeita a crises determina das por fatôres de diferenciação ou de secessão que tendem, ao contrário, a diversi ficar os grupos e a romper a unidade nacional. Assim, pois, a) compete às nações defender-se contra essas fôrças e tendèncias que
lhes ameaçam, a cada instante, a própria existência, por uma política forte
e sábia que tenha por fim dissolver as antinomias regionais e os antagonismos
dos grupos, moer as diferenças de formação e de costumes e impedir os
enquistamentos raciais por uma série de medidas (distribuição das correntes
deimigrantes, movimento da população ou imigrações internas, etc) susce tíveis de facilitar a absorção das populações estrangeiras;
b) ao Estado que foi sempre um criador de nacionalidades e o maior
instrumento de assimilação, incumbe um papel, que é da maior importånia.
nesse trabalho de unificação nacional, e corresponde ao das dinastias na forma ção das nações, como a dos Capetos, na formaão da unidade francesa, e a
dos Hohenzollern, na constituição da Prússia de outrora, e, em seguida, da Alemanha (cfr. a influência rescente de Paris sôbre um reino em que a centralização napoleônica rompeu o isolamento das provincias e tende a impor às classes superiores um clima espiritual comum):
c) as instituições políticas "edificam-se sôbre a nação que elas procuram
edificar a seu turno", lutando contra as causas de diferenças e oposições
(diversidades regionais, de formação étnica, de nivel cultural e econômico, isolamento e formação autonômica das províncias): e. se a unificação étnica (pela mestiçagem), lingüistica, religiosa, moral, etc, prepara a unificação politica, o poder centralizado como uma superestrutura reage sobre a nação já constituida para fortalecer a unidade nadonal (examinar as oscilaçóes, no Brasil, entre o unitarismo do regime imperial e o federalismo republicano, vencedor em 1889, e o recuo do federalismo para a centralização no regine de 1938 a 1945, os postulados em que se apóiame as suas conseqüènias para a unificação nacional).
4. A língua é, como vimos, um dos maiores fatôres de assimilação social e um instrumento de unificação nacional. Mas a extensão da área geográfica que
ocupa uma sociedade, as diferenças de formação e de níveis econômicos e culturais
das diversas regiões e a complicação de organização social tendem a diferenciar a língua, fragmentando a sua unidade em certo número de linguas particulares
(dialetos, conforme as regiões; linguas especiais, argots, etc). Observar
a) que a ação da sociedade geral tende a uniformizar a passo que a ação dos meios distantes, de formação diferente, e doslingua, gruposao parti culares (classes e grupos profissionais) tende a diferenciar;
b) que, se a ação das regiões, quanto mais distantes e isoladas tende
a formar linguas especiais (dialetos, como o dialeto caipira), profundamente diferenciadas, na pronúncia, na gramática e no vocabulário, a ação dos grupos
particulares (profissionais) diferencia o vocabulário, ficando a pronúnca e a gramática sensivelmente unas;
"há daduaslingua tendências que dasresultam tanto ), do que caráter geral, antagonistas como do papel linguasimediatamente particulares" (A. Meillet).
Analisando os fins reais do ensino gramatical que conserva sempre um lugar importante em todos os sistemas educativos, especialmente nos cursos primárioe secun dário, impondo a todos uma sintaxe uniforme, Pécaut mostra o seu papel social como
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elemento unificador da língua. "o instinto que o mantém no programa, escreve
tle, é mais seguro que a teoria dos inovadores, e enganam se os gramáticos que lhe atribuem por fim explicar a lingua. Não; trata-se muito mais profundamcnte de fazer a unidade da lingua, de lutar incessantemente contra as causas de diferencia
(o" (cfr. com a função do ensino gramatical, nas escolas, a das academias literárias.
dos diionários nacionais, ctc., que contribuem para o trabalho da unificação lin güística).
5. A escola, cono ficou explicado, é um dos maiores fatôres de assi milação,
e seu papcl assimilador ela o realiza pelo ensino geral ou comum (primário e
secundário), que, nos sistemas educativos, tem por fim fornecer a base de cultura geral para as diversificaçõcs ulteriores (pelo ensino especial, na variedade de escolas técnicas e profissionais). Examinar êsses dois pontos capitais: a) os nacionalismos que se desenvolvemn por tôda parte, por empalmar a um tempo a cducação e a instrução a fim de começaram fazer que uma
e outra sirvam em proveito da comunidade, desenrolando aos nossos olhos "uma das maiores tentativas de educação estatista da história", como se pôde observar na Itália e na Alemanha: o sistema pedagógico que procurava, como
objetivo essencial, o desenvolvimento do indivíduo, como um fim em si mesmo,
tende antes a preparar os cidadãos, artífices permanentes da grandeza do país, exaltando o csfôrço coletivo, o interêsse nacional, as glórias e os destinos
da pátria; b)
mas a ação da escola nacional sôbre a mocidade seria ineficaz se, fora
da escola, "ela tivesse de ver impunenente atacado o ensino que recebeu": o
Estado, utilizando a sua autoridade e os extraordinários meios de propaganda
de que dispõe (imprensa, cinema, radiodifusão), tende a exercer sóbre töda a forma, para as novas gerações uma atmosfera social impregnada dos mesmos
sociedade uma ação de tutela, no campo moral e social, e a criar, por esta
ideais e inspirada nas mesmas virtudes e nas mesmas tradições.
A vida naconal transforma-se num foco intenso de assimilação e de união, não
só pela aço da escola, reformadae vivificada por uma política de educação nacional, como pela extensão da ação educativa exercida pelo Estado, através do sistema peda
gógico, sôbre as gerações novas, e sôbre a sociedade inteira, por sua autoridade rescente e por tôda a máquina de ação social e de propaganda.
6. Assim como uma nação resulta de assimilação de todos os grupos e indivi duos, integrados numa comunidade territorial e unidos por uma profunda solidarie
dade moral, eà idéia de nação corresponde o sentimento de nacionalismo, há também, entre as nações, correntes para a assimilação de suas civilizações e para a união (internacionalisno, humanismo). Analisar e estudar: a) a distinção entre nacionalismo e universalismo: falta de universalidade,
no nacionalismo que visa umn bem limitado àprópria nação, enquanto o huma
nismo é uma mensagem para tôdas as nações, um sentimento universal que ultra
passa as fronteiras e, avivando-nos o interêsse pela pessoa humana, liga essen cialmente todos os homens (cfr. a catolicidade ou universalidade da doutrina cvangélica): b) os movimentos conuraditórios do nacionalismo e do humanismo, que se afastam e às vêzes se opõem oonforme as idéias coletivas dominantes em
cada época, e as diversas formas que o cosmopolitismo revestiu: 1) cristão ccavalheiresco na Idade Média; 2) literário e clássico na Renascença; 3) clás
sico e filosófico, no século XVIII, em que se baseia sôbre o racionalismo e
o liberalismo; 4) romântico no século X0X, em que a unificação espiritual é conseqüència, em parte, de revoluções, guerras, emigrações e desterros, e, em parte, de viagens e expedições científicas; )
coniliação entre os dois sentimentos que não são exclusivos, em sua
esséncia: o ideal de cooperação e união entre os povos, o ideal de paz, e a mais nobre conquista da inteligéncia humana, que consiste em harmonizar os
direitos e os legitimos interésses de cada naç©o particular com o interésse
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
309
comum da humanidade inteira; "o que caracteriza o seu ideal nacional, escreven Hesse e Gleyze, referindo-se ao povo francés, é ter querido confundir sua causa com a da humanidade" (cír. a afirmação do poeta: "quanto mais ne sinto francês, mais me sinto humano").
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Capitulo VI
EDUCAÇÃO AOPINIÃO PÚBLICA E A - Seus A multidão e o público. conceito. seu o e pública povo do transformação A opinião especificas. - A A transformação. caracteres comuns e suas diferenças nessa modernos que atuam do dependéncia maior num "público". - Os meios a e 0 maquinismno os imprensa, o cinema e o rádio.A tendéncia do Estado a controlar social. meio ao relação homemn em pública opinião A ação. -
meios de fatôres da opinião pública e os seusa estrutura de um govêrno dá fôrca à mais Quanto e as democracias. esc larecida. - Aopinião é essenial que ela seja opinião pública, tanto mais cono ação difusa educação, Reguladora da refornas pública, meio de contrôle social. que lhe cabe na educação. - As do meio social. - Opapel saliente educacionais e os movimentos de opiniáo.
fenômeno educativo e os movi Se o problema das relações entre o na época atual, o maior in mentos de opinio apresenta, sobretudo pode parecer estranho terêsse não sòmente sociológico mas pedagógico, estudos e inves que não tenha ainda constituido objeto de quaisquer lado, não se tinha prestado atenção tigações especiais. Éque, por ummais poderosa dos fenômenos de opi suficiente àinfluência cada vez educativo que nião pública sôbre a educação, e, por outro, o processo
um "subst ractum socioló se baseia, pela sua própria natureza, sôbre relacionado a um con gico continuo", em vez de ser constantemente estudado quase sempre junto social que o subentende, vinha sendo ànossa percepção, bastan como um objeto em si, imediatamente dado a questo. A maior do-se a si mesmo. Esforcemo-nos, pois, por abordar dificuldade dêsse estudo reside, sem dúvida, na diversidade de sentidos
no que ainda se atribuem àexpressão "opinião pública" e, portanto, que noção complexa que apresenta de impreciso e de flutuante essaproceder à investigação se deve ser preliminarmente esclarecida para sôbre os fatos relativos à opinião pública e opapel ou a função que
Mas, exerce na conservação dos costumes e no processo de educação. "opini£o como as representações e as atitudes coletivas que constituem a
"público", pública", pressupõem um grupo social a que se denomina cuidado sociológica não émenos necessário munir-nos de uma noção samente elaborada, de "público", para podermos precisar tòda a reali
dade social que recobre aquela primeira expressão, como esta outra, de significado geralmente tão vago quanto de uso corrente, dentro e fora do campo científico. Arás dessas palavras procuremos, pois, as verdadeiras realidades sociais, os grupos sociais, - reunindo algu e co mas noções elementares, e certo número de observações tipicas sociológicas locando-nos num ponto de vista quantitativo. As noções
21
Sociologia Educacional
FERNANDO DE AZEVEDO
312
fundamentais que devem servir-nos de base para o exame dessa
ques.
täo, a saber, o que se entende por "público" e por "opinião pública"
sâo as noções a) de grupo social e b) de imterpenctvação de grupos, E
esta licão da maior parte dos sociólogos que, procurando caractei "o público", estão de acôrdo em considerá-la essa categoria social,
um agregado social sui generis, um grupo social, começando as divergèncias na apreciação das diferenças essenciais que distinguem essa CS pécie de grupo dos outros grupos sociais.
A multido e o público são "grupos" que surgem das sociedalese organizadas e servem, em geral, a preparar novas formaçõcs sociais:
distinguemse nitidamente dos outros grupos ou das formas sociais o. ganizadas. São, segundo Park (1), associações indeterminadas que. fo.
mandose edissolvendo-se, não têm iradições nem consciência nitica
de si mesmas, nem se recrutanm segundo regras e principios estabeleci
dos: são grupos sociais ou sociedades que, pelo seu caráter efêmero.
apresentam um grau muito baixo de consistència e não chegam a cons. tituirse uma estrutura própria. Mas em que se diferenciam o público
e a multidão? Para Bogardus, o público é "um grupo de volume extre
mamente variável, de pessoas dispersas sôbre uma área extensa, aue
pensam e sentem semelhantemente a respeito de determinados assun
tos" (2). Essa definição coincide, nos seus elementos principais, com a
de Park, sociólogo americano como Bogardus, que define também o público: 1) um agregado social; 2) composto de individtos que não
estejam em contato imediato, portanto, de pessoas dispersas; c 3) cujas
reações são suscetiveis de maior deliberação(3). Não é dilerente o con: ceito de Tarde que, em L'opinion et la Foule, um de seus livros que menos envelheceram, já considerava o público, trinta anos antes de Bogardus e de Park, como "uma coletividade puramente espiritual, uma
disseminação de indivíduos fisicamente separados e cuja coesão é tôda
mental". O que diferencia, como se vê, o "público" e a multidão", é apresença neste e a auséncia naquele, de con tato imediato dos in
divíduos: a multidão é, também ela, um agregado ou grupo social, mas,
ao contrário do público que seria antes uma multidão difusa, é cons
tituida de relações sociais caracterizadas pelo contato imediato dos
indivíduos que são seus t¿rmos, ou, ainda por outras palavras, *uma
sociedade a um tempo intensa, por causa do contato, e efemera, pois
e um grupo em estado nascente, que mal acaba de nascer e já está
em ponto de terminar, quer por deslocação simples quer por trans:
formação em alguma coisa de mais orgánico".
Mas, se éesta a diferença especifica, fundamental entre a multi
dão, agregação de indivíduos fisicamente em contato, e o público, - um agregado de individuos fisicamente separados, o caráter comum ao público e àmultidão, é "a mistura ou fusão que se produz (décloi sonnement), naquela agregação, de espíritos e de consciÅncias, e, nesta, (1) PARK., R. E. Masse und Publikum. Bern, Lock und Grunau, 1904. (2) BOGARDUS, E. Fundamentals of Social Psychology, New York, 193l. (3) PARK, E. R.
New York, 1931.
Collective Behaviour. Encyclopedia of the Social Sciences, vol.
soCIOLOGIA EDUCACIONAL
313
de individuos, de classes ou grupos diferentes". Em uma e outra, os
individuos são "descompartimentados" (décloison nés) das antigas clas ses: a multidão e o público, nas suas formas típicas, segundo a lição de Dupréel (1), "apresentam uma desordern relativa, cuja condição mais regular é certa heterogeneidade dos elementos que ela reúne", in divíduos décloisonnés, isto é, socialmente formados, mas pertencentes aoutros grupos. Os indivíduos que comnpõem uma multidão ou um
público provem, de fato, de grupos sociais diferentes que, ao menos em parte, se interpenetram em dado momento, fundindo elenentos mais
ou menos heterogéneos nessas sociedades inconsistentes e compósitas, em estado nascente e de duração efêmera, que não chegam a improvi
sar-se uma estrutura, mas devem tender a resultados instantåneos no caso da "multidão", ou a uma intervenção eventual no caso do "públi
co". o grupo social que constitui uma multidão ou um público, por maiores quc sejam a fôrça e a intensidade comunicadas, num dado ins tante, nãoémenos, por isto, "uma sociedade dotada de um fraco grau de consisténcia, por causa de seu caráter efêmero e de sua falta de estru tura interior": os fatôres de coesão, devido à instabilidade dses gru pos, não prevalecem senão por pouco sôbre os fatôres de antagonismo
ou de dispersão. Mas tanto na multidão como no público que cons
tituem um décloisonnement, isto é, uma abolição relativa ou parcial de uma ordem anterior e um reagrupamento, tendência a se constituir
em um todo organizado, "uma unanimidade tende a estabelecerse a despeito dos tipos de indivíduos, de sua proveniência, de suas conve
niências distintas ou opostas". Como a multidão, escreve Dupréel, o público é "uma sociedade nascente, inconsistente por falta de estrutura
e que tende a criar-se uma. Essa tendència é aqui (no caso do público)
mais fortemente entravada pela estrutura dos grupos estabelecidos, mas se acontece, apesar dêsse obstáculo, que a opinião (digamos melhor,
o público que se formou) chega a constituir-se uma armadura perma
nente, é diante de um outro tipo de sociedade, mais consistente, um
partido, por exemplo, que nos encontramos afinal". O público, for
mado em circunstâncias determinadas, em vez de se dissolver, cristali zou-se, neste caso, num grupo social mais estável: uma seita, uma ret
gião ou um partido.
Ora, como um público é um efeito do contato e, sobretudo, da interpenetração dos grupos, "a opinião pública constitui a enencruzilha
da em que se encontram os espiritos ligados aliás às sociedades mais
diversas". É dêsse fato que provèm as suas flutuações e a sua instabili dade; a opinião pública "se forma e se reforma sem ser condicionada
necessàriamente pela aproximação dos corpos, -é a diferença mais (1) Em um de seus trabalhos, Dupréel com tôda razåo erítca aqudles que, sem ne
nhuma preparação sociológica, pensando como biologistas paicologos ùnicumen te, s aven turaram aos fenômenos sociais: "e por lsso que, no objeto da seu estudo, a maltddo. percebem o mundo dos fenômenos sociais inclusos confusamen te ou ndiretamente imp cados, e são levados a tratar êsse objeto muto onplexo sequndo un metodo que nao he é próprio'". £le mostra entâo a sidade, para abordar o exame dåssa tendmeao, a multido, destas quatro noções fundamen tais: a) a noção de relaçdo entre individuos ou de relaçáo social; b) a de grupo social, em geral; c) a deia de grau de estència ou de con
sistênciaune de toule um grupo; e tinalmente. d)a nogáo dY interpeneraçdo doa grupoa. DUPREEL. dittuse? in La Foule, IVe, Sematne Inte da synthàse, Puria, Alcan. 1932 ).
914
FERNANDO DE AZEVEDO
formal em relação à multidão'", e que sugeriu a lLévy-Bruhl opor As
brutalidades da multidão comn seus contatos corporais, as da opinião pública, uma comunhão espiritual. Uma segunda nuanças segundo observa Dupréel, resulta dêsse mesmo fato, "é que a opini§o n apressada; não se trata , para ela, (Como para a multidão) de chee
diferença,
a resultados imediatos e decisivos. Ela se clabora lentamente em c
espírito sem intenção de aço precisa, em vista de uma vaga interven
ç¥o eventual, de alguma mudança favorável à qual se reuniräo aguees
aue decidem (e primeiramente aquêles com quem se conversar). Po isto é muito justo comparar a opinião a uma multidão afrouxada parsa, difusa sôbre a trama contínua da
vida social completa". Embora
entre a opinião pública, considerada como opinião de grupos diferen
tes e a opinião que exprime interêSSes de grupos estáveis, haja antes
uma diferença de grau, convém evitar, pondera o mesmo Dupréel. "confundir a opinião pública, os movimentos de opinião com a comu nidade de crenças e de sentimentos dos membros de un grupo social dotado de um alto grau de consistência. A crença de um católico, o patriotismo de um francês não são questão de opinio. O que carac teriza a opinião pública (pois que ela emana de sêres sociais, em tanto
quanto sses despojaram as exigências de seus grupos respectivos) é
um pensamento "descompartimentado" (não limitado nem ligado aos
interêsses particulares dos grupos). Os leitores de um jornal de gran
de tiragem não são sòmente numerosos, mas diferentes uns dos outros.
£les vivem àdistância; têm interêsses variados, emanam de grupos múl tiplos: o jornal faz convergir sua atenção sôbre assuntos estranhos às
preocupações de cada um dêles. Acordos, inclinações comuns formam-se e se desfazem: são as flutuações de opinião". Ésempre em algum acórdo
de um grande número sôbre um julgamento, um valor, un agravo,
um desiderato, que têm seu ponto de formação os movimentos de
opinião pública, geralmente ligados a assuntos ou temas muito frívolos
ou muito elevados, muito particulares ou muito universais, - proble
mas, em todo caso, "que transcendem o nível dos interêsses particula
res e o das conveniências de grupos". Assim, pois, se considerarmos os movimentos de opinião pública como "fenômenos de acôrdo e de divergência entre indivíduos hetero géneos, ligados aliás a grupos variados", e que constituem em dado ins tante um "público", não se pode chamar no mesmo sentido "opinião pública", o pensamento de indivíduos do mesmo grupo debatendo como tais seus interêsses, por mais numerosos que sejam. Mas, como se do pÍvo num "público" fracão uma de ou povo do transtormação essa ou quais os meios que atuam nessa transformação?Éfácil verificar em
ação nos fatos, através de observações acumuladas, os diversos fatóres que influem, nas diferentes situaçoes, para a criação de um "público eo desencadeamento, em conseqüência, de fenômenos de opiniãoe cuja eficiência varia com a concentração ou rarefação da população, com as forças dos grupos ativos que entram na composição do "público" e
públi
asco técnicas propaganda ação sôbre omoderna público. O que não adotadas écoisa oudecategoria sociale de exclusivamente e surgu
SOCIOLOGIA EDUCACIONAL
315
de estrutura dos grupos e a complicação técnicas que com ocrescimento quantitativo atual, com as transformações
social, tem na civilização ao mais favoráveis à sua formação e sociais condições as operam, se e, especialmente, o telégra seu desenvolvimento: o livro, a imprensa a ida isto que Gabriel Tarde considera fo, o cinema e o rádio. Épornão transforma a era das multidões" (1 ). A de atual "a era do público e pública, que era devida, na an ção de opiniões individuais em opinião privada e à palavra tiguidade, quase exclusivamente à conversação elementos comuns a todos os pública, é devida hoje não só a êsses principalmente à imprensa, ao povos e a tôdas as idades, mas ainda ealiás inevitável, em grupos inor cinema e ao rádio. Essa transformação duração e a solidez dos ganizados, instáveis e temporários, diminui a"público" e, mobilizados, se interpenetram no antigos grupos que suscetíveis de estender-se e de "internacionalizar observa Tarde, são fronteiras, con uma se", constituindo grandes públicos através de caso Dreyfus e tantos opinião curopeia, americana ou mundial (cfr. da acrescenta paixo, outros). "A simultaneidade da convicção e ou emo idéia sua Tarde, a consciência adquirida por cada um de que outros de número ção épartilhada no mesmo momento por um grande homens, tal éo laço que une os elementos do público": essa sugestão àdistância, que não era possivel antes senão por uma longa prática de sugesto direta, por sucessivos contatos pessoais e pelo hábito de uma vida social intensa, é extremamente facilitada hoje pelas técnicas mno
dernas de propaganda, imprensa, cinema e rádio, que, atingindo tÑdas as camadas e classes sociais, são capazes, com seu caráter perma
nente e cotidiano, de mobilizar ràpidamente os grupos e manipular
um público e uma opinião, pelo extraordinário poder de transmissão
e de sugestão de que são dotados.
A técnica suscitou não só formas novas mas também meios novos
de agir sôbre a opinião e de tamanha eficácia, umas e outras, que se desenha por tôda parte a tendência e, em alguns países, já se adotou
a prática de controlar, pelo Estado, êsses fatôres que influem sobre a opinião pública e os seus meios de ação. Todos os meios de comunica
ção e de transportes que se multiplicaram, neste periodo de descober tas e invenções, como mais recentemente a máquina, o cinema e o
rádio, diminuindo a dependència do homem em relação ao meio fisico,
só contribuiram para tornar maior, mais iíntima e mais profunda, a de pendència do homem em relação ao meio social, facilitando o contato dos indivíduos edos grupos entre si e permitindo uma ação, à distân cia, cada vez mais intensa sôbre a totalidade dos individuos e sôbre as classes e grupos de que se compõe uma sociedade (povo, nação) em (1) A multidão e a opiniâo, se não se podem considerar, como pensava Tarde, 0 extremos de um desenvolvimento unilinear da vida social', tornaram se certamen ta, graçs à técnica, segundo observa Dupréel, "duas coisas menos es treitamente liqadas do que no passado. A opiniáo pública, essa espécie de sociedade nascen te, formada de um comum assentimento sôbre uma crença, uma apreciação ou um desejo, que se superpõe aos grupos sociais bem estabelecidos, tem cada vez menos necessidade, para se produzir ou se renovar, que reuniðes no espaço venham abolir, por um tenpo, a ordem de vida reqular dos indivíduos". Se a opiniâo pública (acrescenta ) "se torna cada vez mais independente das reuniões e cada vez mais distin ta dos novinentos da multidào, nâo se segue, Por, que êstes últimos tendem a desaparecer".
FERNANDO DE AZEVEDO S16
tôda acxtensäo de seu território. O poder do Estado é, pois, mais
reforçado pela opinião püblica do que pelas leis. Eo quc já se dava na Inglaterra,e éporainda exemplo, a opinião étão poderosamente organizada, o casoemdosqueEstados totalitários: o Estado cria,
em grande parte, a opinião pública, pela palavra, pela imprensa e, so bretudo, pelo rádio, e, como pondera Bertrand Russell, uma opinião pi. blica tirånica torna-se um tão grande inimigo da liberdade como leis ti.
rånicas. Aopinião püblica vale certamente o que valem os grupos que a exprimem: "as idéias, diz justamente Bentley, podem ser sempre cxpres:
sas em têrmos de grupos, não 0s grupos em têrmos de idéias". São de Lato
ésses grupos que entram, em dado momento, na composiço de um "pú
blico", com suas fôrças respectivas e suas técnicas particulares, chegando
a pressões mais ou menos diretas, que é preciso analisar e conhecer para compreender o que move a máquina politica, inexplicável fora das con
dições sociais e dêsses grupos em ação, lutando uns contra os outros para
assegura-se os meios de pressão necessários àsatisfação de seus interêsses
ede suas aspirações. Mas écerto que as invenções, como a imprensa, o ci
nema e o rádio, sobretudo, armaramo Estado de novas técnicas de propa
ganda com que pode desenvolver oseu despotismo, galvanizando e cana lizando, para melhor Ihes dirigir a impulsão num determinado sen
tido, energias dadas, correntes de opinião que, unificadas, dão lugar
a fenômenos de opinião e de massa tão característicos das sociedades modernas.
As ditaduras coagidas, para se manterem, a organizar as massas.
a provocar-lhes reações e a produzir a exaltação e a embriaguez, num
aplo constante aos mitos, contribuíram, sem dúvida, de maneira no
tável, para elaboração de uma técnica de propaganda e ação social, pela utilização ecoordenaço de todos os instrumentos modernos de
disciplina, contrôle e reações coletivas. Ainda quando eradas, sabem
oque querem e mobilizam todos os meios de ação direta sôbre as mas
sas amorfas e os grupos dispersos para transformá-los num "público" impressionável, extremamente sensivel aos movimentos da vida política e preparado para tôdas as reações que ao Estado convém produzir, em determinado momento. Essa técnica social manipulada pelas ditaduras,
para uma ação direta sôbre as massas e tornada cada vez mais eficiente
pela unidade de direção, serve certamente para todos os fins e, se de
uma parte favorece as reuniões, as formações de multidões, por outra,
permite passar sem elas, fornecendo outros meios de obter o que elas
procuravam. A opinião pública, é preciso reconhecê-lo com Tarde, - ganhou em importáncia relativamente àmultidão. Pode-se dizer e éverdade, - que certos governos (o fascismo, o nazismo), como ob
servou Mannheim (), apelam freqüentemente para as reservas irracio nais (sentimentos, paixões, etc.) e, procurando uniformizar as tendên Cias sociais epolíticas e eliminar os atritos decorrentes do espirito cri tico, da diversidade de grupos e das diferenças individuais, tendem, em última análise, a instalar a unanimidade maciça, a estabelecer um
nive"
(1)
K MANNHEIM - Zur
Dlagnose unserer Zeit
Berlin, l937.
SOCIOL0GIA EDUCACIONAL
317
lamento pelo inferior e a abaixar, em conscqqência, o nível da vida espiritual (1). Mas, essa técnica social, tão largamente utilizada pelaa política demagógica dos Estados totalitários, não só se subordina racional, como pode principios de organização, disciplina e contróle orientada para fins mais humanos e racionais; e é possível, como ser Irisa bem Mannheim, utilizá-la para um plano em que sejam respei
caso, como o tadas a liberdade e as diferenças individuais. Em todo o tanto quanto éinstintiva a multidão, ea sua uni
"público" crítico, do que sôbre un pen dade se funda menos sóbre impulsões comuns pelas ditaduras, samento comum, tôda essa técnica social, manipulada pode e deve ser aplicada para "educar" para "unificar", estandardizar,
elevados e superiores, nacio as massas e orientar o público para fins pública, dentro de um nais ou universais. A organização da opinião pois quanto mais 1egime de liberdade, éaliás essencial às democracias, förça à opinião dá politico aestrutura de um govérno ou um aregime se dá na In como manifestar-se, pública, chamada constantemen te que essencial tanto mais é glaterra e nos Estados Unidos, por exemplo, pro A técnica de ação social e depode cla seja verdadeiramente esclarecida. fins, seus técnica, indiferente aos paganda éum meio e, como ditaduras. às como servir às democracias que exerce a opinião Ora, se sc considerar o poder às vèzes tir£nico quer na educação, o papel que desempenha, estabelecidos, pública, compreender-se-á valores apoio dos como um meio de controle social, em reformas desde que precedidas quer como um estimulante às grandes Não se trata apenas, como pode de um rigoroso movimento de opinião. fiscalizadora do processo edu parecer à primeira vista, de uma função o contrôle das reações coletivas cativo que se desenvolve não só sob de temor da reações ou movimentos cfetivamente produzidas, mas pelo des inesperadamente, paralizando, num opinião que se podem formare reformas no sistema educativo. A edu vio, a nmarcha de iniciativas de esclarecer, "é a e já tivemos ocasiãocomunidade cação, segundo define Deweymeio ou um dos quais uma soma total de processos por e seus seu poder adquirido ou grande, transmite e continua grupo social, pequeno existència sua própria inter propósitos com o fim de assegurar cultura de transmissão fatos de seu crescimento". Em todos êsses opinião pública que exerce um papel a es vém, para fixá-los e policiá-los, costumes e que, nio tendo órgãosmes dos conservaço importante na isto sanção social, e talvez por peciais por onde se exprima a sua
das masas com o reservas urracionais, emotivasreaçes persódics, às ditaduras das apêlo provocu-hes (4) £sse da re instintos e as paixões o ou mundo pensamen os sôbre do racionalizaçâo agir propósito de inquietan tes da "des que constitui a grande rse do mais manifestações uma das to racional, de Kirkogard do pensanen gressâo geral e consClente "sum'" (ttlosotia exis tencial, a hlosotia assunalar, te de morte doDescartes teressan in é moderno. Éa ). Mas, ao uraconalsmo noe ta, de racionalis mistico, (filosofia teudo con seu Lndividual ""cogito" do nconscea te que tanto devia, pelo
pensamen to ro para as tòrças obscuras ea política hitleriana, tenpo que apelava das con tiança mas de reaçao con tra o açdo nics da sucs apenas da o não racionalsia racionalismo na elaboraç proceasos, Soclal, numa atitude de grau alto um ta, nos raCIonal ao coor Cional, dava provas de e de organizaçáo. Racionalis adesao ao pensumen to soclal, de propaganda ta va, com a sua racionalismo que ela repudiava, na sua pres tica poli essa ao maneirs na sua filosotia,de coletiva, uma homenagem as suas nais elenen iares com o seu nisticisno e denar os mei0s concepção de vida ee de política. derno, ao
de pensar.
mesno
318
FERNANDO DE AZEVEDO
mo, pelo seu caráter difuso, pelo que tem de nnisterioso nas suas ori
gens obscuras, constitui um meio de coerção mais eficaz do que a an
çäo social organizada, isto é, administrada por órgãos especiais. No pro.
cesso de ristalização das formas sociais as correntes de opinião gue säo
fenömenos intercalares, comunhöes de grupos diferentes, entram em
atividade, convergindo mais ou menos intensamente, conforme as cit.
cunstâncias, nesse trabalho solidificador de estruturas ainda mal assen
tadas ou já abaladas pelas fôrças de desagregação. Sendo, pois, aopi.
nião pública em geral, consevadora por excelência, ela pesa sôbre a
educação mais como um clemento de contrôle, com que o meio social
completa o seu "sistema de freios" para manter a unidade e a conti. nuidade do grupo, reforçando sentimentos que se atrofiavam ou rea gindo contra medidas de ensino ou de organizações julgadas contrárias ao "estilo de vida", aos costumes e às tradições. Mas, como a opinião pública émaleável, isto é, como é possivel translormá-la ou mesmo produzir fenômenos de opinião, pela aplicação da técnica de ação so cial ede propaganda, o que égeralmente um "elemento de contrôle" pode transmudar-se, em dado momento, numa "corrente de estímulo" bastante forte para arrastar, no seu curso, as mais audaciosas iniciati vas e as mudanças mais radicais na politica geral como na política de educação. Nas épocas nornmais como nos periodos de crise e de transição nem
sempre se tem tido presente éste fato fundamental de que as leis não
vingam se não cavarem o anal do consentimento, e êste é a opinião pública suficientemente trabalhada que écapaz de rasgar, abrindo o caminho às grandes reformas. Nem mesmo se tem dado a devida aten
ção a tsses movimentos profundos que às vézes se registram e são como que "sismógrafos" mnorais, sinais de transformações de opiniäo com que jáse torna possível controlar o curso dos fatos e interpretar o sentido real dos acontecimentos. Certamente, em relação aos problemas e ini
ciativas no dominio educacional, a técnica social, com todos os seus
recursos modernos, para a produção de movimentos de opinião pública, esbarra em dificuldades inerentes à própria natureza do fenômeno da educação: êsses movinmentos, antes de tudo, se têm de formar em tôno de "ideais", suscetiveis de congregar e de galvanizar um grande público. E todos sabemos, e éexatamente o que nos confirma a experiéncia
dos Estados totalitários, com a sua linguagem agressiva, - que émuito mais fácil reunir os homens contra um inimigo comum do que em tórno de um ideal omum, sobretudo quando ésse inimigo éao mes de classc, de mo tempo um mito e uma realidade social (a mística raça, etc.). Além disso, como os problemas educacionais são mais abs tratos e os cfeitos da educação não são imediatos nem fàcilmente per ceptiveis em curto prazo, émuito mais dificil levantar, em favor désses
ou aquéles ideais de educação, os movimentos de opinião púbica que podem suscitar, por exemplo, as reformas econômicas ou as mudanças
a todos ou de regime politico, suscetíveis de interessar imediatamente quando se trata
quase todos os individuos e grupos sociais. No entanto,
de preparar ou provocar movimentos de opinião ou um "público reso
sOCIOLOGIA EDUCACIONAL
319
lutamente favorá vel a uma determinada reforna escolar, é preciso lem
brar que essa obra de ação social será extremamente facilitada se a
abordarmos pelo lado mais geral, isto é, pelas questões de educação que transcendem os interêsses dos grupos especiais. São essas realmente as
únicas suscetiveis de "interessar" um público mais vasto, constituido de
grande número de clementos de quase todos os grupos. A opinião
pública que costuma agir sôbre a escola, com um sentido profunda mente conservador, poderá então desempenhar um papel saliente nas transformações escolares, como fenómeno intensificador ou decisivo, não só riando um ambiente favorável senão tanbém fornecendo ao poder público uma base de opoio e de sustentação para iniciativas que seriam temerárias ou, pelo menos, incficazes por falta de adesão da consciència pública.
PROBLEMAS E DISCUSSÕES
1. É de boa regra quando procuramos proceder à análise de fenômenos com plexos, insufiientemente determinados, "abordar e esclarecer indiretamente o feno meno que escapa, pelo estudo de outros fenômenos mais fáceis de conhecer". Para
orientar aanálise e fazer progredir os estudos söbre os fenomenos de opinião, convém. pois:
a) munir-nos de algumas noções sociológicas fundamentais. "cuidadosa
mente elaboradas e de utilidade científica provada", como sejam a noção de grupo e a de interpenetração dos grupos sociais e situar, em seguida. os fenò
menos de público e de opinião sobre a armadura permanente das relações e dos grupos; b) aproximar sses
fenômenos (formação de público" e movimentos de
opinião) de fenömenos mais bem definidos e mais fåceis de analisar (grupas sociais organizados, como os grupos religiosos, politicos, profissionais, etc. e grupos inorganizados, instáveis, temporários, como são as multidões, societades imperfeitas, já sufiientemente estudadas ou mais conhecidas).
Analisar èsses dois pontos de partida para o estudo do publico e da opinio e mostrar que, se considerarmos a nultidão e o público grupos sociais, em estado nascente e de duração efèmera, mas grupos sociais, em todo caso, tles ) se anteri
zam em comum pelo fato de serem, tanto a mulidão como o público, gTupos sociais
constituidos de elementos dos mais diversos grupos que se interpenetram, e capazes de
reagir söbre a estrutura e a mentalidade dos grupos subentendidos (pluralidade e heterogeneidade dos individuos que reúnem): e b) se diferenciam èsses dois tipos de agrupamentos pelo contato fisico dos individuos, na multidão, e pela disseminação dos individuos, fisicamente separados, no publico, cuja coesâo è tôda mental.
2. Aopinião pública,segundo a definiu Tarde. "é um conjunto momentånco
e mais ou menos lógico de juízos que, respondendo a problemas atualmente postos,
se acham reproduzidos en numerosos exemplares nas pessoas do mesmo pais, do mesmo tempo, da mesma sociedade". Ela representa o pensamento coletivo ou. por outras palavras, é a reação representativa de um grupo mais ou menos numeroso (o público), formado sob a pressão de circunstâncias especiais e constituido de ele
mentos heterogêneos, ligados a grupos muito variados. Assim a opinilo publica. como o próprio público que por ela se manifesta e que se torna e se transtorna por assim dizer, a cada instante:
a) é impressionávele,e por móvel, sujeita a mudanças lentas e às vèzes radicais isto, suscetivel de seguir um ritmo capnchoso que seria inexplicavel se nåo se soubese donde partem os tios do comando (flutuações de opinio),
(gruposnasaivos, politicos, econdmicos, trabalham por iregular todos os modos transformações da opinio); religioscs dai o seuque caráter incoerente. e aparentemente contraditório;
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b) de um poder tirânico, dando fôrça e prestigio àqueles que se lIhe
submetemetirando aos que querem resistir, embora sem a intensidade, por
falta de contato imediato dos individuos, da ação das mulidões, em gue os instintos tendem a desempenhar um papl preponderante e quc se encaminham
a resultados rápidos e violentos:
) suscetível de ação e tratamento intencionais, que, empreendidos em tÑdas as épocas (Atenas, Roma, Renascença italiana, etc.), de mancira mais ou menos empirica, podem tornar-se científicos: a técnica moderna de sugestão social e de propaganda, que dispõe de grandes recursos para formar a opinião pública (cfr. as influências da imprensa com seu caráter pernanente e cotidiano.
eo poder cada vez mais avassalador do rádio, pela variedade e instantaneidade da ação social).
Analisar cada um dsses caracteres da opinião, acentuando que a sua instabilidade e as suas flutuações provèm não só da heterogencidade dos clementos que constituem
o público (interpenetração de grupos), como do seu caráter descontínuo (a multidão eopúblico são fenômenos "descontínuos") e da maior possibilidade de reflexão que
permite a dispersão dos individuos (a multidão éinstintiva, o público
crítico).
S. A pesquisa sôbre os movimentos e correntes de opinião pública édo maior
intersse político para orientação e ação dos governos. No grande inquérito empre endido nos Estados Unidos, no curso do ano 1932-1933, a pedido do presidente
Hoover, e publicado em 1933 (1), figura um capítulo consagrado às atitudes coletivas em face da vida e em que o autor, M. Hart "calcula o interèsse do público americano por determinado problema segundo a percentagem de livros ou artigos de revistas consagrados à questão num periodo dado e classifica essas publica(ões segundo suas opiniões favoráveis ou desfavoráveis a uma atitude moral dada". Reconhccendo o valor das informações, em alguns pontos preciosas, que Hart nos forncce com suas
investigações, A. Philip faz algumas sérias reservas a êsse método quc, na sua justa
ritica
a) atribui o mesmo cocficiente de importancia a tôdas as revistas
quando a sua irradiação pode ser extremamente variável; b) dápreponderånda às opiniñes urbanas donde vém as publicações e, além de ignorar as renças do campo silencioso, deixa de lado orádio cada
vez mais influente na formação das crenças;
) esquece que o apégo a uma opinião está longe de ser proporcional ao número de suas afirmações; pois, na verdade, não é senão quando uma instituição ou uma crença começa a ser abalada que se torna necessário
afirmá-la e reafirnmá la pùblicamente: d) supõe. enfim, que as publicações exprimem a crença do público, quando elas são muitas vézes o testemunho de uma propaganda, do estôrço de tal ou qual grupo interessado em impor uma crença a leitores que, no
conjunto, n¯opaísa partilham: o quee évagas particularmente verdadeiro nos Estados Unidos, dos "drives" sucessivas de opinião impostas ao público".
4. Na Africa do Norte, as sociedades comerciais ou industriais (grupos de interésse) distinguem-se em dois tipos: as sociedades de freio, segundo a denominação
pitoresca dos árabes, pois que cada associado ou cada chrig pode ser um freio para
todos os associados e impedi-los de tomar uma decisão sem a sua aprovação, e as
chamadas sociedades de confiança em que um dos associados tem o poder de deidir ou de contratar, por delegação dos outros(2). Analisar, sob o aspecto politico, os dois tipos de sociedades e o papel da opinião pública, em cada um déles: a)
as sociedades democráticas,
verdadeiras sociedades de freio, em
que, pelo voto, cada cidadão exerce uma parcela do poder (poder eletivo) e as
câmaras (poder legislativo) constituem um sistema de freios ao poder executivo
que não pode decidir sem a aprovação delas e, portanto, dos cidadãos eleitores; (1) Recent Social Trends in the United States. Report of the President's Research Com
mitee on Social Trends. 2 vols., Mac Graw Hll Book Co., New York, 1933.
(2), R. série MAUNIER - Les groupes d'intérêt1937.et in Annales, C., Fasc. 2, Paris, F. Alcan,
ridée du contrat en Atrique du Nord
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a organização, o esclarecimentoe a sensibilidade da opinião pública residen àmecanismo base dos daregimes democráticos e constituem uma das molas principais do vida política: b) as sociedades aristocráticas, como nos regimes totalitários, tipos de
sociedades de confiança, que requerem o "rédito de um cidadão privitegiado, de um cidadão autorizado em todos os sentidos da expressão" (Duce, Führer), tendo mandato tácita ou expressamente para decidir em relação à política intra ou internacional, representando, simbolizando o corpo social e conden sando cm si as faculdades do corpo social (Estado, Nação); o Estado organiza a opinio pública, monopolizando ou controlando totos os fatöres que podem contribuir para a produção de fenömenos de opinião.
5. Nessa ação constante em que consiste o processo de educação e que é
exercida pelas gerações adultas söbre as gerações jovens para as adaptar ao meio fisico c soial c, em conseqüéncia, à mentalidade daquelas, a opinião públia parti cipa como um fenómeno conservador por exceléncia. Sob a pressão dos grupos sociais, mais ativos e influentes (como os grupos religiosos, com a longa persistncia de sua ação, as dases sociais que detêm a propriedade e os privilégios, nas aristo racias, o grupo político que detém o poder, etc.) o fenömeno da opinio püblica
se produz sempre que se infiltram na cultura, que se transmite de uma geração a
Outra, idéias novas tidas como perigosas ou contrárias às tradições, a0s costumes e à unidade cspiritual do grupo. Examinar
a) o papel que exerce a opinião pública na conservação dos costumes e
a resistência que ela opõe às idéias novas, variável com o número, as fôrças
eas pressóes respectivas dos grupos sociais que entram e tendem a preponderar
na "composição" do público e nas suas reações representativas (movimentos de
opinião);
b) a tirania da opinião pública, maior que a das leis em alguns paises. como na Inglaterra, e suscetível de pesar, em momento dado, com grande pso, sóbre a sociedade obrigada a submeter-se a seus decretos e a orientar-se segundo essa ou aquela direção; a fôrça de tradição, de um lado, e o pêso ou o medo da opinião, de outro, criam uma série de tabus, de convenções e de mitos que
tòda a gente se sente obrigada a respeitar. Apresentar alguns exemplos, históricos e atuais, dsses novimentos de opiniio, analisando-lhes as origens, seu ponto de formação (acôrdo de um grande número sôbre um juízo, um valor, etc.) e seus resultados, variáveis certamente com rentes fatôres geográficos (extensão territorial), demográticos (rarefação ou os dife concen tração das populações) e sociológicos (densidade social dinàmica, nivel de cultura. maior ou menor sensibilidade a determinados problemas, etc.). 6. Os públicos, de que a opinião é uma rcação representativa, constituem. ensina Dupréel, menos um grupo social inconsistente do que série de grupos sociais de fraco grau de existència que tendenm perpetuamente "uma a nascer e que ceam de ser para renasceremn uns dos outros em uma nova ocasião". Observar
a) que uma técnica de ação sociale propaganda, pela imprensa, inenma e rádio, equivalentes o primeiro e o último pela sua função dinånia, pode servir de instrumnento não só para a disciplina e contròle das reações (regular os movimentos de opinião) como para fornaço de publicos coletivas novos e produção de fenômenos de opinião; b) que manipulada pela técnica de ação social, com todos os recursos de um alto poder de sugestão, a opinião publica pode ser um fendmneno
intensificador, notor (embora nunca diretor) de iniiativas e reformas sociais, políticas, econômicas, educacionais, capazes de vingar, se suticientemente pre paradas c acionadas por sses movimentos de opinião:
) e quc, enfim, como a opinião pública que se retrabalha as opinibes e os sentimentos de maneira a formou repercutir"combina sobre ose grupos especiais, consistentes, que lhe constituem a trama", éposivel agir por essa forma, por movimentos de opinio, não sòmente sobre os em geral, como sôbre a mentalidade e a estrutura dos gruposgrupos sociais, profissionais
pedagógicos, para determinados fins de uma politica de educa£o
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£sses movimentos de opinião tendem ainda a estreitar os laços de solidariedade moral entre os mestres e o público, a fazer a comunidade participar na obra de
educacáo, eaeducacional". levantar o espirito despertando "consciência isto é, público do papeldase comunidades, do alcance daquer educaçãoe de uma seus
problemas fundamentais, quer renovando a confianga que resulta da pelo povo, dos resultados imediatos que se obtêm da obra coletiva.
comprovação,
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