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Brasileiro Pages [213] Year 2020
, CAS DA IN IM IZ A D E POLITI . . · ·t· ' título ong,nn \·. Politiqucs de l,.inin u te Achi\\CMben,bc •~" /\chi \k M bc n1 bc, 2. 02 0
,1 " n , ed iç ões, 20 20 \~ \\N
978-65 -~6941 -173
Embora adote a mai oria dos uso s editor iais do âmbito br . , s não se gue asileiro, a n-1 ed,~ necessan.am en te oe as convenço_es da . . . normativas, pois s mst1tutções considera a edição um trabalho de interagir com a p1 criação que deve uralidade de lingua ge ns e a es pe cificidade de cada obra pub\icada. coo RDENAÇÀ OED lTORIAL Peter Pá l Pelbart e Ricar DIRE ÇÃ ODE ARTE do Muniz Fernand Ricardo Muniz F es er na nd es TRADUÇÃO Sebastiã o Nascimento ASSISTÊNC IAEDlT ORlAL Inês Mendo nça EDIÇÃO EM 15If.X- Pa ulo Henrique Pom permaier PREPARAÇÃO Clari ssa Melo REVISÃO Flavio T aam CA PA E PROJETO GR ÁFICO Érico Peret ta A reprodução
parcial deste livro sem fins lucrativ privado ou coletiv os, para uso o, em qualquer m eio impresso ou autorizada, desd eletrônico, está e que citada a fo nte. Se for necess na íntegra, solici ária a reprodução ta-se entrar em co ntato com os edit ores.
••
AMBASSADE DE FRANCE AU BRÉS\L Lif:.m t l:g11/,1t J-rata11ité
1ª
ediç ão \ Novembr o,
n-1edicocs.org
Este livro, public ado no âmbito do Programa de Apoio à Public ação 2018 Carlos Drummond de Andrade da E mbaixada da Fra nça no Brasil, contou com o ap oio do Ministério da Europa e das Relações Ext eriores \ Cet ouvr age, publié dans le cadre du Program me d'Aide à la Pu blication 20 18 Carlos Drummon d de Andrade de l' Ambassade de France au Brésil, bénéficie du soutie n du Minis terc de l'Europe et des Affaires Etrangêre s
20 20
,
POLITICAS DA I N I M I Z A D E Achille M b e m b e
. ~o Nascimento tradução Seb astia
Rara F.al:>1~tf Éboussi Boulaga, rrean-Fran~ê rrean-Fran~Õis Baya~{l 'r eter L. Geschiere ~~;/i, ._ -· '
l!t
-,;·--,i~i~; .
'
.
Introdução 11
O rascunho do mundo
Capítulo 1
25 A saída da democracia Reviramento, inversão e aceleração O corpo noturno da democracia Mitológicas A consumação do divino Necropolítica e relação sem desejo Capítulo 2
75 A s_o ciedade da inimizade O objeto perturbador O inimigo, esse Outro que eu sou Os condenados da fé ' Estado de insegurança Nanorracismo e narcoterapia Capítulo 3 111
A farmácia de Fanon
O princípio da destruição Sociedade de objetos e metafísica da destruição Medos racistas Descolonização radical e um festival da imaginação A relação de cuidado O duplo espantoso A vida em seu fim
c a p ít ulo 4 Este meio-d ia abrasado r Impasses do h un1anis m o o O u tr o do ser h u m a n o e as g e n e a lo g ia s d o o n1undo zero ob)eto Anti1nuseu Autofagia Capitalismo e a n im is m o E m a n c ip a ç ã o d o s vivos C o n clu s ã o 205
A ética do p
assante
o RASCUNHO DO MUNDO
Segurar na mão un1 livro não basta para saber tirar proveito dele. De início, desejáva1nos escrever um que de modo nenhum estivesse envolto e1n mistério . No fim das contas, chegamo s a um
breve ensaio feito de sombrea mentos esboçados, de capítulos paralelos, de traços mais ou menos descontí nuos, de pinceladas, de gestos vívidos e súbitos, quando não de sutis movime ntos de recuo seguidos de bruscas reviravoltas. É verdade que o tema, áspero, em nada se prestava ao som do violino. Bastaria, pois, sugerir a presença de um osso, de uma caveira ou de um esquelet o no corpo do elemento . Esse osso, essa caveira e esse esquelet o têm nomes: o repovoa mento da Terra, o abandon o da democra cia, a sociedad e da inimizad e, a relação sem desejo, a voz do sangue, o terror e o antiterro r enquant o remédio e veneno da nossa era (capítulo s 1 e 2). O melhor meio de se chegar a esses diferente s esquelet os foi engendr ar uma farma que não fosse frouxa, mas rija e carregad a de energia. Seja como for, eis aqui um texto sobre cuja superfíci e o leitor pode deslizar livremente, sem nenhum controle de documen tos nem visto de entrada. Pode nele permane cer pelo tempo que quiser, movimen tar-se à vontade, entrar e sair a qualquer moment o, por qualquer porta. Pode seguir em qualque r direção, mantend o em relação a cada um de seus termos e a cada uma de suas afirmações o mesmo distancia mento crítico e, se necessár io, uma pitada de ceticismo.
11
aparentemente inocuos do dia a dia, por causa de uma insignifi-
cancia, uma afirmação aparentemente inconsciente, uma brincadeira, uma alusão ou uma insinuação, um lapso, uma piada, algo implícito e, que se diga com todas as letras, uma malícia voluntá-
menosprezo ou um estorvo deliberados, um obscuro desejo de estigmatizar e, acima de tudo, de
ria, uma intençao maldosa,
um
agredir, de ferir e humilhar, de profanar aquele que não consideramos como
sendo dos nossos?
Obviamente, na era do nanorracismo desavergonhado, quando se trata
apenas dos
nossos e
pouco importa
do outro,
se com
maiúsculas ou minúsculas, ninguém mais quer ouvir falar disso. Pois que
fiquem lá onde vivem, ouve-se dizer.
Ou
se
deve
teimam
em
ser com o tra-
vivemos, querer morar perto de nós, onde seiro à mostra, de calças arriadas, a descoberto. A era do nanorranavalha cismo é de fato a era do racismo imundo, do racismo da na lama. encardida, do espetáculo dos porcos chafurdando com Sua função é transformar cada um de nós em celerados intoleráveis o maior núE colocar em nós
condições luvas de pelica. mero possível daqueles e daquelas que consideramos indesejá-
veis, encurralá-los cotidianamente, infligir-lhes
reiteradamente
um número incalculável de golpes e feridas, privá-los de qualquer direito
adquirido, enfumaçar a
que não lhes
reste
colmeia
escolha além da
e
aviltá-los
autodeportaço.
a
tal ponto esta-
E já que
cientes de
estar falando de feridas racistas, ainda precisamos um suou cortes sofridos por lesões de se trata geralmente que de um caráter bem um ou mais golpes
mos
atingido por Cspecihc0- golpes dolorosos e
Jelto humano
8Cm o
corpo
ntangivel das
e sua
dificeis de esquecer, porque
materialidade,
(a dignidade,
a
mas
Clentes
de que,
tanto
e
acima de tudo
o
mais
no autoestima). Seus vestígios, de cicatrizar. ferimentos, dificeis
vezes, são invisíveis e seus lesões Ja que estamos falando de
odr
também
atin-
nesse
e
cortes, ainda precisamos
banco de gelo
em
que tende
a se
99 A
INIMIZADE SOCIEDAN DA
converter a Europa quanto no
Caribe e
em outros
na America, na
lugares,
temos
Africa do Sul
no Brasil,
a.
agora que contar as Con
ntenas
sofrem todos os dias f de milhares aqueles aquelas que com frequencia o risco de serem ati racistas. Eles correnm por uma nstituição, uma vor uma com toda a força por alguem,
feridas idos
e
autoridade pública ou privada que Ihes exige que justifiquem
quem são, por que estão ali, de onde vm, para onde vão. nOr que não voltam para o lugar de onde vieram, uma voz ou autoridade
deliberada provOcar-lhes que busca de maneira
um
menor
on
maior choque, irritá-los, ofende-los, injuriá-los, fazê-los sair dos eixos, justamente para ter o pretexto necessario para profaná-los, Ihes é mais privado, para sem nenhum pudor violar aquilo que mais intimo e mais vulnerável. Em se tratando de violação reiterada, cabe ainda ressaltar que o nanorracismo no
é prerrogativa do "branco pobre",3 esse su-
balterno corroído pelo ressentimento e pelo rancor, que odeia profundamente sua condição, mas que não se esfalfaria por qualquer migalha, e cujo pior pesadelo é acordar um dia recoberto com a pele negra ou com a pele morena de um árabe, não lá longe, em uma longinqua colônia de outrora, mas sim- e seria este0
cúmulo- aqui mesmo, em casa, em seu próprio país. O nanorracismo tornou-se o complemento necessário do
racismo hidráulico, o dos micro e macrodispositivos jurídico-
-burocráticos e institucionais, da máquina estatal que mergulha de cabeça na fabricação de clandestinos e ilegais; que isola de ma neira incessante a ralé em campos na periferia das cidades, como um amontoado de objetos desconjuntados; que multiplica em
profusão os "sem papéis"; que pratica ao mesmo tempo a expu são do território ea eletrocussão nas fronteiras, quando nao s
V32. No original, "petit Blanc". No contexto colonial francês, a população branca dia em grands blancs, estrato abastado composto por proprietários e burocratas, e petu
blancs, a camada
100
dos artesãos
e
trabalhadores
braçais brancos. [N. T.]
POLITICAS DA INIMIZADE
omoda
pura
e
simplesmente ao
naufrágio em alto-mar,
que
aos num determ rmiarfil étnico, nos Onibus, n0s acroportos, no metrô, na tas
quat
fiscaliza
os
rostos que
se
encaixam
rua;
nao
1ela as muçulmanas e freneticamente ficha seus familia-
que res: que
ultiplica
centros
os
de retenç
de detenção e s cam-
e
d e trânsito; que investe, Sem considerar os custos, em técni. discrimina e
deportação; que
ac cas
de
l17
do dia,
pratica
segregação à plena
a
temp0 que professa a neutralidade e a im. indiferente à diferenca: do Estado laico republicano arcialidade parc aue
ao mesmo
provoca mais
nenhuma
contramao do
bom
sua
banalidade
sociedade,
neste
descerebração temor,
que bem esses
Os ,
nos
momento
dejetos de
cascos
muçulmanos e , tomarão o lugar dos
Ora,
lixão,
o
entre a
das mais curtas.
se infiltrar nos
de s e r e m OS ou
seja,
poros
os
os
veias da
de outrora,
negros,
de ser,
transformarão
Ogrande
djinns de hoje,
distância e o campo, a
campos de refugiados, de Campos
os
árabes,
os judeus
nação
a
lixão de Maomé.
fobia do lixão
e
em
generalizado, de
mesmos
não poderia deixar
senhores e
respiração,
em m a s s a .
saturnais, quando
fendidos,
na
do homeme do cidadão".
embrutecimento
convencer
chamar,
se insiste em
de enfeitiçamento
como
imenso
de
o medo das
poderiam
que
"direitos
capacidade de
mecânica e
visceral, é
de
mas
t o r n a d cultura e o racismo
é O nanorracismo e
ereçao,
senso,
céu aberto que no
essa putrefação a
ea direito invoca a torto
num
sempre foi
deslocados, zonas ade
estrangeiros, campos de acampamentos de imigrantes, centros de
áreas de trânsito, ctençao para pessoas em trâmite, identificaçao e c e n t r o s de administrativa, acolnictençao ou detenção c e n t r o s de fronteira, de CXpulsao, pontos de travessia ctO
,
para
requerentes
de asilo,
centros
acolhimento
tempo
gue
de imigrantes, de refugiados, aldeias de inserção bser a lista não par, o casas do imigrante, albergues,
a1dejas
tos,selvas,
de
101
A SOCIEDADE DA INIMIZADE
vou
Michel Agier
remete
sempre a
uma com
de, sente, apesar nara
num
estudo
realidade
frequencia,
familiar e, não dizer
reconhecer que
o
recente.35
campo
Essa
minável
Se faz constanteme
ente pre-
que
ser em
grande medida intris
sível,
analise, banal. Deveriam. mos
em ultima
t o r n o u uma nao so se
Ele deixou de
lista inter.
parte
escandalizar.
estutra
rante
Mais ainda
da condição global. Ele e o noSSO futuro, a nocoo nosso presente. o é só campo não para conter on re "manter afastado o que perturba,
solução para
humanos, jeitar aquilo que, quer sejam
síduo industrial, for excessivo",*
materia
orgânica ou re-
em suma, uma
das
formas de
governar o mundo.
De resto,
por não
e
corresponde à exceção,
encararmos
mas
à
de trente isto
norma
(o
que
fato de que
as
já não demo-
cracias liberais também são capazes de tolerar o crime), aqui nos vemos, pois, mergulhados em um tráfico infindável de palavras e gestos, de símbolos e línguas, à base de chutes e pon-
tapés,
cada
vez
mais brutais
uns
que
os
outros, à base tam-
bém de mimetismo, o laicismo e seu inverso especular, o funda-
mentalismo, tudo isso num perfeito cinismo, pois, justamente, tendo todos os epítetos perdido seus nomes próprios, já não resta nome
algum
para nomear o escândalo, nem linguagem para enunciar o imundo, pois quase nada mais se mantém de pe, exceto o ranho que flui das narinas, viscoso e purulento, em*
bora já no
haja necessidade de espirrar, nem de apelo ao b o senso, à boa e velha república, com seu belo dorso arqueado nem derrocado, de apelo ao bom e velho humanismo froUxO, nem de apelo a um certo feminismo aloprado, aos Ol do
33. Michel
Agier (ed.),
34. 1bid., p. 11.
Un
monde de camps. Paris: La
Découverte, 2014.
102
POLITICAS DA INIMIZADE
igualdade agora
restir-calcinha-fio-dental-totalmente-depilada.3
mana-de-v
Como forma
ma com o dever-de-fazer-aZer-a-jovem-muçul-
época colonial,
na
aO uegro ou o årabe muçulmano trata "suas mulhe-
de
res"
veja do
harém. A
uma
manipulação das
voyeurismo
inveja:
e
in.
a
questões de gènero para fins
dominação masculina no Ourealidade da falocracia no pró-
do realce dado à via pela
sempre visa quase
prio quintal. simbólico e
O
toda forma de
dade coloca o prazer
seja
nOSsas
ela secular
minimamente a
o
poder,
aos
Em todo
sua
velo-
lugar, o poder
de confrontação
com a
maternina feminilidade e na
de
na esteira
ou
recur
"novos bárbaros". Ea
que Ihe confere
uma forma
investimento
sexual
virilidade como
na
democracias.
medida,
em certa
o estátua, sendo que
tamento,
a
político não é algopeculiar de
é,
ocultar
superinvestimento
linha mestra em cidade, inclusive sempre
de
combinaçao
racistas,
vado
da
como
unga
tro,
interpretação depreciativa
a
laica. Ao
uma
mesmo
num sério, preciso,
cultura
política de arrebatempo, para
ser
mos-
dado moment0,
hedonista,
ao
le-
pai sempre
Nesta que "se tem aquilo". Nesta cultura asprimordial. de plantador o atribuído papel foi desejo de do pai incestuoso, habitado sombrada pela trar
pelo
figura
consumir sua donzela ou
seu
garoto,
anexar a
mulher ao seu
à estátua prio corpo a fim de usá-la como complemento homem tornou-se
ISso, todas
essas
algo banal.
pró-
falida do
tudo Portanto, devemos esquecer
mitologias crestadas e desprovidas de músculos,
e decididamente passar a algo distinto, mas o que exatamentes
Apesar dos horrores do tráfico de escravos, do colonialismo, do fascismo, do nazismo, do Holocausto e de outros massacres e
Benocidios, as nações ocidentais em particular, com seus intesu-
stendidos pelos mais diversos gases, continuam a mobilizar
ons
de
Cn
1'Aube
Souilamas e Éric Macé, Les Féministes et le garçon arabe. Paris: Edit-
Joan Wallach Scot, The Politics
University Press, 2009.
A SOCIEDADE DA
of the Veil. Princeton: Princeton
INIMIZADE
103
racismo a o
serviço
de qualquer
histórias mais ou
de históri
variedade
história rias
de esem cuja cara as portas de hordas de migrantes de e trangeiros deve ser erguido às nreda arame farpado que Ssas, do ser fechadas, menos
absurdas
menos assassinas
e mais ou
sermos varridos pela sob pena de
de
fronteiras que devem
vessem
-
selvagens; stórias com0 se alguma vez s
de
mare
ser restauradas,
histórias de nacionais, chegado a desaparecer;
inclhuind.
muito antigas, aos quais se deve sempre oriundos de colônias de intrusos que devem ser cacaatribuir o epíteto de imigrantes, os
dos, de inimigos que devem
ser erradicados, de
terroristas que
se
de vida que devem de nós por causa do nosso modo altitudes por dispositivos de ser aniquilados a partir de grandes e
ressentem
voo
teleguiado; histórias de escudos
humanos convertidos em
vítimas colaterais dos nossos bombardeios; histórias de sangue,
degolas, de terra, de pátria, de tradições, de identidade, de pseudocivilizações sitiadas por hordas bárbaras, de segurança nade
cional; uma variedade de histórias pontuadas por epitetos, esgarpara espalhar fuligem; histórias intermináveis que são constantemente recicladas na esperança
çadas; histórias para se assustar e de enganar os mais crédulos.
E verdade que, tendo fomentado longinquamente a misériae o decesso, longe do olhar de seus cidadãos, as nações ocidentais temem
agora o retorno da espada,
em um
desses
atos
de vingança
piedosa exigidos pela lei do talião. Para se precaverem contra es sas
pulsões vingativas, elas se utilizam do racismo como se fosse
cimitarra, suplemento venenoso de frangalhos, reduzido aos seus últimos uma
um
nacionalismo em
farrapos, num momento
desnacionalização dos verdadeiros centros decisórios, de offsno
ring das riquezas,
de encravamento dos reais, de mass fpoderes do endividamento e de e zoneamento de
cação lações inteiros, subitamente tornados
104
territórios pop
supérfluos.
POLITICAS DA INIMIZADE
Mas se
racism
o
tão
se tornou
insidioso, é porque ele
agora dispositivos puisionais e da subjetividade econá
do dos dos fazparte
micadonosso tempo. Ele nã0 Se tornou apenas mais um produto
m
c o n s u m o
da ;mesma categoria que outroS bens, objetos e mer da
de cadorias. Nestes tempos de indecencia, ele é também o recurso
ual simplesmente inexiste a "sociedade do espetáculo"
Debord que Guy
m muitos casos, ele
descreveu.
adquiriu um
status suntuário. Passou a ser algo que nos permitimos não por tratar
S
de
algo incomum,
mas em
resposta
a0
apelo generali
7ado à lubricidade lançado pelo neoliberalismo. Ficou esquecida a
abrindo-se
greve geral,
dade.
Nesta
espaço para a brutalidade e
a
sensuali-
época dominada pela paixão pelo lucro, essa combi-
e sensualidade favorece o processo nacão de luxúria, brutalidade do racismo pela "sociedade do espetáculo" e sua
de assimilação
consumo contemporâneo. molecularização pelos dispositivos do consciência disso. Depois Ele é praticado sem que se tenha nos chama a atenção ou nos fhcamos surpresos quando O outro adverte. Ele alimenta nossa necessidade de diversão e nos per-
mite escapar
ao
tédio reinante
e
à monotonia. Fingimos
acre-
não têm a impor ditar que não passam de atos inofensivos que um policiatancia que lhes é atribuída. Ficamos ofendidos que de rir, do direito a um mento de outra ordem nos prive do direito
humor que nunca é dirigido contra si mesmo (autodepreciaçao) Ou
contra os
ra
os
poderosos
(a sátira propriamente dita),
que são mais fracos que nós
dquele que
se
eentreado,
o
-
mas
sempre
direito de rir as custas e
divertiao busca estigmatizar. O nanorracismo
completamente
idiota,
que tem
prazer em
enalu
a
Mdl na 1gnorânciae reivindicao direitoà estupidez e a violencld esse,
pois, o espírito dos
nossos
tempo
aCde d aseé quea transicão já tenha ocorrido. Que lave temer
e demais.
E
que, no
fim das
SOCiedade decente não passe de
uma
contas, O
SOLd
de se miragem. E
temei
105 A SOCIEDADE DA INIMIZADE
violento
uma retorno a
"parcelas
vergonhosas"
epoca de
em
que
O racismo
não nerta
rtencia as
sociedades, aquelas que, se não
s sociedad
nossas
nos e s t o r ç a v a m o s por ao m e n o s erradicávamos, as serå doravante a nossa
racismo
destemido e
por causa
dela,
galhardo
sOCiedade se surda contra a rebelião a menos
aberta e veemente, pelo vez mais se m a n t e m da pertença A questão
ro
upageme,
tornará
por parte dos
viva.
e
cada
rechie
lusos.
Quem é daqui
e
quem
aquelas que não da que significa
aqueles fazem em nossa não é? O que deles? Mas o Como nos livramos estar aqui? veriam dos mundos, terra
escon onder.
mas
também
do entrelaçamento "aqui" "lá" na era de fato é uma Se o desejo de apartheid rebalcanização? sua de a Europa real, por sua vez, das características do nosso tempo, e
nunca
mais será como
era
antes,
ou
seja, unicolor.
Nunca mais
um único centro do mundo. existirá, se é que alguma vez existiu, no plural. Será viDe agora em diante, o mundo será conjugado
não há absolutamente nada que possa ser feito para reverter essa nova condição, que é tão irreversivel quanto
vido
no
plural e
irrevogável.
Uma das
consequências dessa nova condição é a
rea-
tivação, para muitos, da fantasia do aniquilamento. Essa fantasia está presente em qualquer contexto no qual as forças sociais tendam a conceber a política como uma luta atë a
morte contra inimigos incondicionais. Tal luta passa então a ser
qualificada como existencial. E uma luta sem a possibilidade de re conhecimento mütuo e muito menos de reconciliação. Ela contra-
poe essências distintas, dotadas cada uma delas de uma substan" cia e
quase impenetrável, ou possuídas exclusivamente por aqueles aquelas que, pela lei combinada do sangue e do solo,
pertence
espécie. Ora, tanto a história política quanto a histort do pensamento e da metafisica no Ocidente estão saturadas por esse problema. Os judeus,como se sabe, pagaramo preço isso no proprio coração da Europa. Anteriormente, negros e indios il viam inaugurado a Via Crucis, a
mesma
particularnmente no Novo Munu
106
POLITICAS DA INIMIZADE
politica é o produto quase natural da obmetafísica ocidental por muito tempo nutriu, po cão
Essa concepção
sessão
que
a
la alestão do ser e Sua suposta verdade e, por outro.
nia da da vic vida. De acordo com esse mito, a história seria
um
ela
ontologia
realização ser
0
de
ce s e
da
ente. o
contrapõe ao
contra
posto que
vivenciar o O
ciar o
recomeço.
O
desenvolvido essa
universal, sendo
dos os lugares,
seus
história idioma, a
ou a
Seria isso
ser.
que
significados válidos de maneira
seja, em too independentemente de qual seja
tempo,
a todo
capacidade de viven-
qualquer topografia,
muito alem de
capacidade de
da condição de ente
lugar deciSiVo do
o
seria recomeço, pois
incondicional,
não passaria
resto
Ocidente teria
tornaria
o
unico a desenvolver essa
teria sido o
ser,
Ap
terminologia heideggeriana. O i d e n t e seria o lugar decisivo do
do ser. Na
essência
ou
à história do ser e condição. Com relação o Ocidente
dizer, portanto, que
nunca
à política do ser, pode-se finitude. conceber sua própria chegou realmente tulou como
a
seu inevitável e absoluto
e esse horizonte
sempre
se
próprio
Sempre poshorizonte de ação,
uniglobal e uni pretendeu, por definição, necessariamente não é se trata aqui
de que versal. O universal seria válido do
ser para qualquer
humano en-
que horizonte ou meu próprio de ampliar sinónimo universal, quanto tal. Nem é finitude. O minha própria da de assumir as condições vencedores de guerras violência dos à dado nesse cas0, é o n o m e confiitos Mas esses predação. de conflitos onto-históricos, que são naturalmente 0
equivalente
ae
predação são também
pOls neles se desenrola Levada aos seus
d c a o não visa paccimento
e sobretudo
uma
limites,
apenas a
história
tal,
PCSupoe
a
nem
c o m uma
a fantasia
do
que
sua
seja
porque
o
aO se trata
Apocalipse,
uma um Trata-se
Ap rta
Cia
em
sobrevivente,
que
ou da
mastambemou
extinção. Não
existência de
munha cuja tarefa seria contar o
verdade fatidica.
aniquilamento
explosão do planeta,
do ser humano.
uanto
conflitos
teste
de
uma
presenciou.
107 INIMI.AL A SOCIEDADE DA
concebida
não
aniquilação como
uma
purificação
da aniquilamento para
caminho
ria
pelo fogo.
humanidade
Neste
momento
retorno aos
atual, o
rificação equivale ao0
purificação equiunl
que
abrirá
supostamente ah.
começo
de uma outra outra
fantasia Portanto, uma
ansiogeno que
vivemOs,
ontológica temas da diferença
cia da "guerra das
temida, mas
catástrofe catástrofe aa ser ser ten
Mas a
para o outro começo,
humanidade atual.
sem a
reos,
como uma
e a contra o terror"
Os
estão
massacres,
dos
de ablac
p.
indícios de
aí. Em decorwrén-
reboque dos bombardeios aé.
(de preferência, execuções extrajudiciais
de drones), dos
histó-
atentados e
de
com o auxilio
formas de
outras
ideia de que o Ocidente é sua cadència, a ditam carnificina que compreender e de do mundo capaz de sequer a
única província
A cisão da humanidade em adiantada. Se, com Schmitt ou forasteiros está muito
instituir o universal
nativos
e
volta
a
surgir.
era encontrar o
fundamental no passado Heidegger, requisito basta criá-lo para em seguida se inimigo e trazê-lo à luz, hoje de aniquilamento a contrapora ele, oferecendo-lhe perspectiva o
e anulação total. Pois, na verdade, são inimigos com os quaisa nem desejável. Situados fora da hunão é
possível comunicação manidade, nenhum entendimento é possível
com
eles.
Pode-se realmente estar presente no mundo, habitar o mundo, ou atravessá-lo, sobre essa base de uma partilha impossível, de uma distância intransponível? Basta abater o inimigo ou livrar-se do estrangeiro para ficar quite com ele ou para relegá-lo à eternidade daquilo que deve ser esquecido? Tal atitude exige que,
ainda em vida, seja apagado, em sua morte
ou em sua
relegaçao,
aquilo que em seu rosto o fazia humano. Esse empreendimento de
desfiguração e apagamento é praticamente um prerrequisito
para qualquer execução em toda a lógica contemporânea do Odlo. No seio de
sociedades que estão constantemente
multiplicando dispositivos de segregação e de discriminação, a relação de cu dado tem sido
os
substituída pela relação sem desejo.
108
POLITICAS DA INIMIZADE
Explicar e en
conhecere
tender,
reconhecer já não são
Ostilidade
idade e em volta
nunca
quelas figuras
foram tão
para
s
hmento dos inimigos nunca
o sofri
indispensáveis. Hospita antitéticas.
Daí o intere quais desgraça dos homens e se tornaram "resto mudo da a
po-
lirica"30 Eles sempre estiveram vinculados àeexigência de recoa nhecimento, especialmente onde experiencia de ser humilhado, alienad0 e maltratado era a norma.
Paris: Gallimard,
Repersar
a
1994. F
x
ignorado,
Dits etderits, V.+
droits de l'homme", mos em face dos goverm homem do : "Os direitos de Janeiro Pessoa. Rio
gouvernements, les
política. Ditos e escritos 6, trad. de Ana Lúcia
Paranhos
orense Universitária, 2010, pp..369-370: 370).
109 A SOCIEDADE DA INIMIZADE