O ensino religioso e a sala de aula 9786599442599


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O ensino religioso e a sala de aula
 9786599442599

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA

DE AULA

simpósio internacional amar e mudar as coisas

Organização

EDUARDO MEINBERG DE ALBUQUERQUE MARANHÃO Fº

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº

(Organização)

O ensino

Religioso E a sala de aula

Coleção ENSINO RELIGIOSO

1º Simpósio Internacional Amar e Mudar as Coisas

Af(é)tos, Direitos Humanos e Sensibilidades Religiões, Resistências e Diversidades

Textos Completos do 1º Simpósio Internacional Amar e Mudar as Coisas: A(fé)tos, Direitos Humanos e Sensibilidades; Religiões, Resistências e Diversidades. UFPB, 08 a 13 de dezembro de 2019. João Pessoa, Paraíba, Brasil. O conteúdo dos textos e a adequação aos pareceres é de inteira responsabilidade das/es/os autoras/es, não refletindo necessariamente a opinião de quem organizou a obra, da FOGO Editorial e da AMAR (Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões). Realização; FOGO Editorial / AMAR (Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões) / EDUCAR (Núcleo de Estudos de Educação, Afeto e Religião / AMAR). Apoios: Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal da Paraíba (CCHLA/UFPB). Organização da Coletânea Ensino Religioso: Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº. Projeto Gráfico: FOGO Editorial. Coordenação de Revisão: Patricia Leonor Martins. Produção Editorial: Fábio L. Stern e Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº. Capa: Claudia Intatilo Esta obra foi produzida na Casa do Amor, situada na Praia do Amor (Conde, litoral sul paraibano, Brasil); e na “Ilha da Magia” (Florianópolis, litoral catarinense, Brasil).

E59 O Ensino Religioso e a sala de aula / Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº. (Organização). Florianópolis : FOGO / AMAR, 2021. 153 p. – (Ensino Religioso) Inclui referências ISBN: 978-65-994425-9-9 1. Ciência das Religiões. 2. Ciências das Religiões. 3. Laicidade. 4. Base Nacional Comum Curricular. 5. Educação. 6. Ensino Religioso. 7. Diversidades. 8. Direitos humanos. I. Maranhão Filho, Eduardo Meinberg de Albuquerque. II. Série. CDU: 291

Catalogação na publicação por: Onélia Silva Guimarães CRB-14/071 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Proibida a reprodução parcial ou integral desta obra, por quaisquer meios de difusão, inclusive internet, sem a prévia autorização da FOGO Editorial, detentora de todos os direitos da obra. ID do Direito Autoral: DA-2021-012417

CNPJ da FOGO: 41.360.800 / 0001-09

Uma Associação com partido

Livros feitos com AMOR

A FOGO gerou a AMAR sob a lua cheia de uma sexta feira 13, durante o primeiro Simpósio Internacional Amar e Mudar as Coisas (UFPB, 2019), organizado pela editora. De lá para cá, a AMAR foi se constituindo uma Associação com o coração partido (com tanta falta de responsabilidade e educação por parte do atual governo federal), e que toma partido dos a(fé)tos, sensibilidades e diversidades, atuando em prol de uma Educação emancipatória, crítica, acolhedora e amorosa.

O AMOR trouxe a FOGO ao mundo. Nascida de uma fogueira realizada em uma lua cheia de agosto, os trabalhos da FOGO são delicadamente selecionados e produzidos com o respeito e a(fé)to que você merece, refletindo ações (cri)ativas e uma Educação respeitosa a todas as sensibilidades e diversidades.

Juntas, a FOGO e a AMAR realizam uma série de atividades, com ênfase em eventos internacionais de participação gratuita e em premiações internacionais. E em breve acolheremos outras coisas que você também vai amar. Que tal participar deste movimento com a gente? Vem conosco à AMAR

A FOGO edita trabalhos acadêmicos relacionados: a) a uma miríade de conexões entre as religiões e religiosidades e suas interfaces / b) à educação / c) aos a(fé)tos, emoções e sensibilidades / d) a gêneros, sexualidades e diversidades. Nossos trabalhos também estão abertos para obras infantojuvenis a partir do selo Chaminha e para obras não acadêmicas como romances e poesias. Você já se encantou com a FOGO? Vem amar com a FOGO

A FOGO e a AMAR são, respectivamente, uma Editora e uma Associação Internacionais com enfoque nas relações entre a(fé)to e religião, política e educação. Nossos trabalhos encontram-se em nosso Portal de Fogo Amoroso e são sintetizados na frase que o inicia: “Sabe o que nos interessa mais? Amar e Mudar as Coisas”, inspirada na canção Alucinação, de Belchior. E você, o que está esperando para vir com a gente?

Como referenciar este livro: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O Ensino Religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021.

AMAR

ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE ESTUDOS DE AFETOS E RELIGIÕES Uma Associação Com Partido Conselho Diretor Eduardo Meinberg A. Maranhão Fº (Flor), Brasil (Presidência) Patrícia Fogelman, Argentina (Vice-Presidência) Claudia Touris, Argentina (Secretaria Geral)

Clarissa de Franco, Argentina/Brasil (Secretaria Geral) Fernanda Marina Feitosa Coelho, Brasil (Tesouraria)

Coordenações Nacionais AMAR Angola – Elvira Moisés AMAR Argentina – Patricia Fogelman AMAR Brasil – Du Meinberg Maranhão (Flor) AMAR Camarões – Elias K. Bongmba AMAR Colômbia – Maricel Mena López AMAR Costa Rica – Silvia Regina de Lima Silva AMAR Estados Unidos - Keila Pinezi

AMAR Honduras - Reinaldo Reyes AMAR Itália – Tiziana Tonon AMAR México – Renee de la Torre AMAR Polônia – Renata Siuda-Ambroziak AMAR Portugal – Paulo Mendes Pinto AMAR Suécia – David Thurfjell AMAR Venezuela – Cantaura La Cruz

Comissões Especiais • Comissão Infanto Juvenil (CHAMINHA) • Comissão de Acessibilidade e Anticapacitismo • Comissão de Artes e Afetos • Comissão de Mulheres Negras e Indígenas / Antirracismo

• Comissão de Combate à Intolerância Religiosa • Comissão de Ética • Comissão Queer, Transgênera e Não Binária • Conselho Fiscal

Núcleos e Grupos de Pesquisa e Extensão criados na AMAR ALEGRAR – Núcleo de Estudos de Gênero, Afeto e Religião / AMAR AMADURECER – Núcleo de Estudos em Religiosidades, Educação, Meio Ambiente e Políticas Públicas / AMAR - IFPR - FAMA EDUCAR – Núcleo de Estudos de Educação, Afeto e Religião / AMAR RELIGMI – Grupo de Estudos e Pesquisas de Religião e Migração / AMAR TRANSAR – Grupo de Estudos Queer, Não Binários e Transgêneros / AMAR

Núcleos e Grupos de Pesquisa e Extensão filiados à AMAR CEPRES – Centro de Estudos Religiões, Religiosidades e Politicas Públicas / PPGH-UFAP FIDELID – Grupo de Pesquisa Formação, Identidade, Desenvolvimento e Liderança / PPGCR-UFPB MANDRÁGORA NETMAL – Grupo de Estudos de Gênero e Religião /PPGCR-UMESP OCRE – Observatório de Cultura, Religiosidades e Emoções / PPGA-UFPE VIDELICET Religiões – Grupo de Estudos em Intolerância, Diversidade e Imaginário / PPGCR-UFPB

Instituições filiadas Mestrado em Ciência das Religiões – Universidade Lusófona, Portugal Frente da Diversidade Religiosa da Paraíba – Paraíba, Brasil

VEM CONOSCO À AMAR

Saiba mais em: www.amarfogo.com

FOGO EDITORIAL Livros feitos com AMOR Coordenação científica Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº (Flor), Brasil

Conselho científico internacional Alejandra Oberti, Universidad de Buenos Aires, Argentina. Alejandro Frigerio, Universidad Católica Argentina / CONICET, Argentina. Cecilia Delgado-Molina, Universidad Nacional Autónoma de México, México. Cecilia Maria Bacellar Sardenberg, Universidade Federal da Bahia, Brasil / Boston University, Estados Unidos / University of Sussex, Inglaterra. Claudia Touris, Universidad de Buenos Aires, Argentina. Cristina Pompa, Universidade Federal de S. Paulo, Brasil / Universidade de Udine, Itália. Dario Paulo Barrera Rivera, Universidade Metodista de São Paulo, Brasil / École d’Hautes Etudes en Sciences Sociales, França.

Laila Rosa, Universidade Federal da Bahia, Brasil / New York University, Estados Unidos / Universidad Autónoma de la Ciudad de México, México. Luis Bahamondes González, Universidad de Chile, Chile. Margarita Zires, Universidad Nacional Autónoma de México, México. Maricel Mena López, Universidad Santo Tomás, Colombia. Marie Hélène / Sam Bourcier - École des Hautes Études en Sciences Sociales, França. Mari-Sol García Somoza, Universidad de Buenos Aires, Argentina / Canthel / Université Paris Descartes, França. Mary Lucy Murray Del Priori, Universidade de São Paulo, Brasil / Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, França. Néstor da Costa, Universidad Católica del Uruguay, Uruguai.

David Thurfjell, Södertörn University, Suécia.

Nicolás Panotto, FLACSO, Argentina.

Donizetti Tuga Rodrigues, Universidade da Beira Interior, Portugal.

Oscar Calávia Sáez, Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil / Universidad Complutense de Madrid, Espanha.

Einar Thomassen, European Association for the Study of Religions (EASR) / University of Bergen, Noruega.

Pablo Pozzi, Universidad de Buenos Aires, Argentina.

Elias Bongmba, Rice University, Estados Unidos / African Association for the Study of Religions (AASR), África.

Pablo Wright, Universidad de Buenos Aires, Argentina.

Florence Marie Dravet, Universidade Católica de Brasília, Brasil / Universidade de Paris III - Sorbonne-Nouvelle, França. Francisco Díez de Velasco, Universidad de La Laguna, Espanha. Francirosy Campos Barbosa, Universidade de São Paulo, Brasil / University of Oxford, Inglaterra. Gabriela Scartascini, Universidad de Guadalajara, México. Giuseppe Tosi, Universidade Federal da Paraíba, Brasil / Università degli Studi di Firenze, Itália. Giovanni Casadio, European Association for the Study of Religions (EASR) / Università degli Studi di Salerno, Itália. Javier Romero Ocampo, Universidad de Chile, Chile. João Eduardo Pinto Basto Lupi, Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil / Universidade Católica de Portugal, Portugal / Boston College, Estados Unidos. Joana D’Arc do Valle Bahia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Brasil / Universidade de Lisboa, Portugal. Jorge Botelho Moniz, Universidade Nova de Lisboa, Portugal. Juan Esquivel, Associación de Cientistas Sociales del Mercosul (ACSRM) / Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET), Argentina.

Pablo Semán, Universidad Nacional de San Martin, Argentina.

Paulo Mendes Pinto, Universidade Lusófona, Portugal. Patricia Fogelman, Universidad de Buenos Aires, Argentina. Rita Laura Segato, Universidade de Brasília, Brasil / Universidad Nacional de San Martin, Argentina. Roberta Bivar Carneiro Campos, Universidade Federal do Pernambuco, Brasil / University of St. Andrews, Escócia. Rodrigo Ferreira Toniol, Universidade de Campinas, Brasil / Utrecht University, Holanda / University of California San Diego, Estados Unidos / Ciesas/Guadalajara, México. Rudolf Eduard von Sinner, Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Brasil / Center for Theological Inquiry (CTI), Estados Unidos / Lichtenberg-Kolleg em Göttingen, Alemanha / Universidade de Basiléia e Universidade de Berna, Suíça. Stefania Capone, Ecole d’Hautes Etudes en Sciences Sociales, França. Steven Joseph Engler, Mount Royal University, Canadá. Stewart Hoover, University of Colorado, Estados Unidos. Tim Jensen, International Association for the History of the Religions (IAHR) / University of Southern Denmark, Dinamarca. Veronique Claire Gauthier De Lecaros De Cossio, Pontificia Universidad Católica del Peru, Peru.

Conselho científico brasileiro Alexandre Brasil Fonseca, UFRJ.

Leyla Thays Brito da Silva, UFPB.

Ana Maria Clocet, UNICAMP.

Magali do Nascimento Cunha, MIRE/INTERCOM.

André Chevitarese, UFRJ.

Marcelo Ayres Camurça, UFJF.

André Sidnei Musskopf, UFJF.

Marcelo Tavares Natividade, UFC.

Aramis Silva, UNIFESP.

Maria Lúcia Abaurre Gnerre, UFPB.

Ari Pedro Oro, UFRJ.

Maria Luiza Tucci Carneiro, USP.

Artur Cesar Isaia, UNILASALLE.

Melvina Afra Mendes de Araujo, UNIFESP.

Carlos André Cavalcanti, UFPB.

Mundicarmo Maria Rocha Ferretti, UEMA.

Cecilia Loreto Mariz, UERJ.

Nadia Maria Guariza, UNICENTRO.

Clarissa de Franco, UMESP.

Paula Montero, USP.

Claudio de Oliveira Ribeiro, UFJF.

Patricio Carneiro, UNILAB.

Christina Vital da Cunha, UFF.

Raymundo Heraldo Maués, UFPR.

Durval Muniz de Albuquerque Jr., UFRN.

Regina Novaes, UFRJ.

Edlaine de Campos Gomes, UFRJ.

Ricardo Mariano, USP.

Elcio Cecchetti, UNOCHAPECÓ.

Ricardo Mário Gonçalves, USP.

Emerson Giumbelli, UFRGS.

Rosa Maria de Aquino, UFPE.

Etienne Higuet, UFJF.

Rosane Cristina de Oliveira, UNIGRANRIO.

Frank Antonio Mezzomo, UNESPAR.

Rosangela Wosiack Zulian, UEPG.

Georgiane Garabely Heil Vásquez, UEPG.

Sandra Duarte de Souza, UMESP.

Gilbraz Aragão, UNICAP.

Sergio Junqueira, UFPR.

Gizele Zanotto, UPF.

Solange Ramos de Andrade, UEM.

Gustavo Soldati Reis, UEPA.

Sônia Weidner Maluf, UFSC.

Ivanir dos Santos, UFRJ.

Stela Guedes Caputo, UERJ.

Jacqueline Moraes Teixeira, USP.

Tânia Mara Campos de Almeida, UnB.

Jérri Roberto Marin, UFMS.

Uipirangi Câmara, Faculdades OPET.

Joana Célia dos Passos, UFSC.

Vanda Fortuna Serafim, UEM.

Joana Maria Pedro, UFSC.

Zuleica Dantas, UNICAP.

Joanildo Albuquerque Burity, Fundação Joaquim Nabuco.

Zwinglio Mota Dias, UFJF.

Leila Marrach Basto de Albuquerque, UNESP.

VEM COM A FOGO

Saiba mais em: www.amarfogo.com

Participe de nossas PREMIAÇÕES INTERNACIONAIS Prêmio AMAR / FOGO de Teses, Dissertações e Monografias Prêmio AMAR / FOGO de Fotografias Mais informações no Portal AMAR / FOGO

Portal e redes sociais da AMAR / FOGO Editorial Portal AMAR / FOGO: www.amarfogo.com Página do Facebook: facebook.com/amarfogoeditorial Perfil do Facebook: facebook.com/perfilamarfogo Canal do Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCkCH_1Z28oujFHrgx8tawOw Instagram: instagram.com/amarfogo/ Hashtags: #amarfogo / #fogoeditorial

DOAÇÕES Você gostaria de doar qualquer quantia para apoiar as atividades e a manutenção da FOGO? Você pode fazê-lo através das chaves-pix (CPF) 17423416835 ou [email protected], ou através de depósito no Banco do Brasil, ag. 3560-2, cc. 109.977-9 (Eduardo Meinberg A. Maranhão Fº). Caso deseje, pode encaminhar o comprovante a [email protected] Agradecemos sensível e amorosamente

“Educar é um ato de amor e um ato de coragem” Paulo Freire

Esta obra é dedicada A Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, que em 19 de setembro de 2021 completaria 100 anos. A Airton Luiz Jungblut, autor da FOGO Editorial, que faleceu durante a pandemia de COVID-19 em 2020. À Dávila Andrade, Coordenadora de Grupo de Trabalho do Simpósio Internacional Amar e Mudar as Coisas, falecida por COVID-19 em 2020. Às milhares de vidas perdidas pela pandemia de COVID-19 no Brasil, ocasionadas em grande parte por conta da negligência e irresponsabilidade de um governo federal negacionista, autoritário, mau educado(r) e anticientífico. Pedimos AMOR e #ForaBolsonaro

SUMÁRIO

Prefácio Dos magistérios eclesiásticos para os magistérios acadêmicos

11

Gilbraz Aragão

Prefácio Ensino religioso: de volta para o futuro

19

Paulo Agostinho N. Baptista

Carta da AMAR e da FOGO a Paulo Freire: AMAR e impeachment já!

25

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº

Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas: Apresentando desafios e novos olhares do Ensino Religioso em sala de aula

31

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº

Ensino Religioso e diversidade religiosa: desafios e perspectivas em sala de aula

45

Maria José Torres Holmes

A perspectiva da disciplina de Ensino Religioso na construção de uma cultura de paz no Ensino Regular

61

José Carlos Cezar da Silva Maria da Penha Lima da Silva

O professor frente à tarefa de mediar o Ensino Religioso: sua postura diante da diversidade religiosa em sala de aula

71

Edilson Antônio da Silva Jéssica Cardoso da Silva Monica da Mota Fonseca Karina Cesi de Souza Holmes

Diversidade religiosa no ensino religioso: desafios à prática docente

87

Maria Dalva de Oliveira Araujo

Ensino Religioso na Educação de Jovens e Adultos nas Escolas Públicas: religião, cultura, religiosidade e espiritualidade

99

Maria José Torres Holmes Mônica da Mota Fonseca

Ensino Religioso na Diversidade Cultural Religiosa: Relatos de experiências

111

Maria José Torres Holmes Eliane Barbosa de Carvalho

Ensino Religioso: da teoria à prática na sala de aula

121

Simone Simões da Cruz

Laicidade e Ensino Religioso: desafio aos docentes e à formação humana

135

Maria Dalva de Oliveira Araujo

Posfácio Ensino Religioso, o carro-chefe da Ciência da Religião aplicada brasileira Rodrigo Oliveira dos Santos Fábio L. Stern

149

DOS MAGISTÉRIOS ECLESIÁSTICOS PARA OS MAGISTÉRIOS ACADÊMICOS Prefácio

Gilbraz de Souza Aragão Trabalha na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) desde 1991, sendo hoje Professor Titular e Pesquisador nos Programas de Pós-graduação em Ciências da Religião e em Teologia. É também Colaborador no Programa de Pós em Ciências das Religiões da UFPB. É Coordenador do Grupo de Pesquisa Interuniversitário sobre Espiritualidades, Pluralidade e Diálogo (CNPQ), desde 2009, e do Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife, a partir de 2005. Mantém pesquisa sobre teologia cristã e diálogo inter-religioso, transdisciplinaridade e estudos de religião.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: ARAGÃO, Gilbraz de Souza. Dos magistérios eclesiásticos para os magistérios acadêmicos. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 11-17.

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Quero saudar a Coleção Ensino Religioso que a FOGO Editorial e a Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR) estão lançando. Com certeza, a compreensão do fator religioso é hoje um campo importante de conhecimento para o avanço ou retrocesso da civilização e o discernimento do modo como a escola tematiza a religiosidade pode ajudar ou atrapalhar os processos humanistas de emancipação. O chamado Ensino Religioso não deveria mais ser entendido como doutrinação de uma religião ou ensinamento das religiões, e sim como aprendizagem cidadã (e não religiosa) sobre os fatos espirituais. Por que, então, não avançamos? Cada vez mais temos escutado em ambientes de educação que “se você não tiver contato com Deus, você está perdido”. Essa atitude pedagógica vem do tradicionalismo1, filosofia que inspira os gurus bolsonaristas Olavo de Carvalho e Steve Bannon (e que tem vínculos históricos com o nazifascismo) e acredita que a religião deve estar no centro da sociedade ao invés da democracia secular, que o cristianismo é a religião verdadeira que deve suplantar toda diversidade cultural. Acredita que a competição capitalista e a hierarquia (encabeçada por empresários brancos e machos) deve superar as lutas modernas por liberdade de expressão e igualdade econômica, que a racionalidade científica e a solidariedade ecológica devem retroagir à submissão e metafísica medievais (este mundo está condenado e nossa meta é o céu), que o nacionalismo populista deve derrubar a utopia dos “direitos humanos”, o “globalismo socialista da ONU e da sua OMS”, que a tradição judaico-cristã dos EUA deve vencer o materialismo “comunista” da China. Essa é a lógica rasteira e perversa que a máfia no poder usa para justificar a exploração econômica e a dominação política do nosso povo. Contrariando a laicidade da Constituição brasileira, o bolsonarismo prega a religião (uma versão fundamentalista e fascista da religião cristã) como política de Estado: foi o que defendeu na Hungria o secretário de Assuntos de Soberania Nacional e Cidadania de Bolsonaro, embaixador Fabio Marzano, em conferência sobre perseguição aos cristãos, promovida por governos de extrema direita (para justificar sua política anti-imigrantes)2. Conforme essa gente, a liberdade religiosa precisa dar relevo à defesa dos cristãos, “que são os mais perseguidos no 1 Ver a esse respeito o livro Guerra pela eternidade, de Benjamin Teitelbaum, traduzido no Brasil pela Editora da UNICAMP, e resenhado em https://www.unicamp.br/unicamp/ju/noticias/2020/12/10/guerra-pela-eternidade-desvenda-base-ideologica-que-funda-nova-direita; acesso em 8/ago./2021. Ver também, sobre o tradicionalismo aplicado ao cristianismo, o livro A força do passado na fraqueza do presente, de João Décio Passos, publicado pelas Paulinas em 2020. Há também versão infantil para divulgação do tradicionalismo no movimento QAnon, conforme comentado em https://saidapeladireita.blogfolha.uol.com.br/2020/08/27/teoria-da-conspiracao-da-direita-americana-qanon-chega-ao-brasil/; acesso em 8/ago./2021. 2 Conforme analisado em https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2019/11/28/governo-bolsonaro-cristaos-hungria-diplomacia-itamaraty.html; acesso em 8/ago./2021. Gilbraz de Souza Aragão

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

mundo”, incluir a possibilidade de converter aqueles que não têm religião, além do direito de criar os filhos com valores cristãos, “contra a ideologia globalista, o comunismo e a liberdade sexual”. Outro dia um menino foi condenado a dez anos de prisão por blasfêmia (disse heresia sobre Deus na discussão com amigo) e levantou solidariedade internacional3. Isso foi em um tribunal islâmico fundamentalista, mas se os “talibãs de Cristo” continuarem crescendo por aqui, logo chegaremos lá igualzinho: o ministro reverendo da educação já prega castigos físicos4 e a bancada da bíblia proibiu cenas de nudez e símbolos religiosos em exposições artísticas5 e quer proibir símbolos cristãos no carnaval6 e sátiras das crenças cristãs7. O drama hodierno das religiões, mormente em contextos tradicionalistas, é a (falta de) atualização frente ao desenvolvimento das liberdades modernas – e como os políticos populistas tiram partido dessa dificuldade, para deixarem as pessoas amedrontadas e submissas. As bancadas da bíblia (igrejas-empresas “evangélicas” e carismáticas), do boi (agronegócio) e da bala (indústria do armamento) confraternizam-se não só nas assembleias: esse povo tá junto agora em campanha para botar a bíblia nas escolas e para vender armas pros ricos e metidos, justificando uma coisa pela outra nos púlpitos. Aí o destino do povo é virar gado mesmo (ou nem isso, porque os bois eles vacinam). Então, o problema do Ensino Religioso é esse fundamentalismo (anti) moderno, que se espraiou pelo Brasil mas despontou entre protestantes norte-americanos, os quais no começo do século XX criaram um movimento político-teológico para combater os cristãos liberais, que praticam uma interpretação científica da bíblia e aceitam as causas modernas do socialismo e do feminismo ou de gênero. Atualmente, a religiosidade vem sendo manipulada por grupos poderosos, que se aproveitam do medo de transições culturais para manter dominação política e exploração econômica, reforçando o comunitarismo da “civilização cristã tradicional” e práticas identitárias contra a alteridade e o diálogo8. 3 Ver https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/09/diretor-do-memorial-de-auschwitz-pede-para-cumprir-parte-de-pena-de-nigeriano-de-13-anos.shtml, acesso em 8/ago./2021. 4 Ver https://revistaforum.com.br/politica/forum-faz-lista-de-todos-os-absurdos-ditos-pelo-novo-ministro-da-educacao; acesso em 8/ago./2021. 5 Ver https://www.correiobraziliense.com.br/diversao-e-arte/2020/08/4869437-cldf-aprova-projeto-que-proibe-nudez-e-simbolos-religiosos-em-exposicoes.html; acesso em 8/ago./2021. 6 Ver https://overbo.news/deputado-quer-proibir-uso-de-simbolos-cristaos-nos-blocos-de-carnaval-do-rj; acesso em 8/ago./2021. 7 Ver https://omunicipio.com.br/raul-sartori-projeto-em-tramitacao-na-alesc-proibe-satira-crencas-da-religiao-crista; acesso em 8/ago./2021. 8 Para aprofundar essa questão, ver o livro Os desafios dos fundamentalismos, apresentado e disponível em https://www1.unicap.br/observatorio2/?p=5720; acesso em 8/ago./2021.

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PREFÁCIO

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

E assim vários grupos religiosos opõem um “deus” sério e sacrificial a uma divindade amorosa de justiça e compaixão; uma igreja exclusivista, rígida e hierárquica, a movimentos inter-religiosos em favor da terra como Casa Comum; manifestam um apego teológico ao pecado original, contra uma espiritualidade da Criação e sua compreensão de bênção original; pregam a intolerância ao estrangeiro e ao “estranho” moral, contra o abraço ao feminino e aos outros gêneros; o medo da ciência, enfim, ao invés do incentivo à sapiência. Então, evangélicos e católicos fundamentalistas, entre outros grupos conservadores, que são concorrentes no mercado religioso, unem-se “ecumenicamente” contra o ecumenismo e o diálogo entre as religiões e sobretudo com as tradições afro-indígenas, contra imigrantes e especialmente muçulmanos, unem-se pela catequese cristã nas escolas e contra o “ensino religioso” laico e republicano, pela “liberdade religiosa” entendida como direito ao proselitismo intolerante e à ocupação do espaço público pela “bíblia”. Imaginamos que os estudos de religião, frente a essa onda religiosa reacionária, precisam realçar marcadores epistemológicos e demarcar político-pedagogicamente sua área acadêmica, assolada por magistérios eclesiásticos e treinadores “espirituais” a serviço das ideologias neofascistas. Em fins do ano passado detectamos e denunciamos que, ao arrepio da lei, contrariando as diretrizes da Base Nacional Curricular do MEC para o Ensino Religioso e as determinações do Conselho Nacional de Educação para a formação dos seus professores em Ciências da Religião, a bancada da bíblia está pulando os muros e invadindo os espaços de educação, fazendo aprovar em várias prefeituras o serviço de Capelania Escolar9 para “realizar celebrações religiosas e oferecer assistência espiritual nas escolas”. Segundo essa invenção, o Capelão Escolar será selecionado entre sacerdotes, padres e pastores e, ainda, entre ministros e ministras ordenados que possuam habilitação comprovada para o exercício da função, deverá possuir certificação a ser obtida mediante aprovação em curso de formação em Capelania Escolar com duração de, no mínimo, cento e oitenta horas de aula. Enrolada pedagógica e política! Então, como deve ser o Ensino Religioso? Para o campo dos estudos de religião no Brasil, deve ser uma aprendizagem crítica e transdisciplinar sobre as 9 Exemplos de projetos de lei a respeito da Capelania Escolar, que são vergonhosos perante o espírito laico republicano: em Vila Velha: https://sapl.vilavelha.es.leg.br/media/sapl/public/materialegislativa/2019/6266/prot._1974_19_-__cria_o_servico_de_capelania_escolar_para_atuacao_nas_unidades_escolares_da_rede_municipal_de_ensino_-_maturano.pdf; em Taubaté: http://camarasempapel.camarataubate.sp.gov.br/Sistema/Protocolo/Processo2/Digital.aspx?id=27874&arquivo=Arquivo/Documents/ PLO/27874-105922802117092019-assinado.pdf#P27874; em Vitória: http://camarasempapel.cmv.es.gov. br/Sistema/Protocolo/Processo2/Digital.aspx?id=184325&arquivo=Arquivo/Documents/PL/PL1805201825092018163218.pdf#P184325; em São José dos Campos: http://camarasempapel.camarasjc.sp.gov.br/ Arquivo/Documents/PL/239900-173110456918022019-assinado.pdf; em São Luiz: https://www.camara. slz.br/pavao-filho-aprova-projeto-sobre-criacao-do-servico-voluntario; acessos em 21/set./2020. Gilbraz de Souza Aragão

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experiências espirituais da humanidade. Todas as tradições espirituais e filosóficas fazem parte do patrimônio cultural da humanidade e merecem respeito e liberdade. Mas, para promover a convivência em nossas sociedades democráticas e pluralistas, os Estados devem controlar o proselitismo e regrar o uso de símbolos religiosos em espaços públicos, além de não submeter questões legais, como a educação dos fatos espirituais, a interesses de algum grupo privilegiado10. No Brasil, por exemplo, o direito de criticar dogmas e crenças, de quaisquer tradições, é assegurado como liberdade de expressão pela nossa República; mas atitudes agressivas, ofensas e tratamento diferenciado a alguém em função de sua crença ou de não ter religião são crimes (discriminação ou intolerância religiosa ferem a dignidade e constituem crime de ódio: inafiançável e imprescritível, passível de prisão por um a três anos e multa). Na prática, contudo, às vezes a teoria é outra e a liberdade religiosa é invocada para o abuso proselitista e discriminatório do espaço público e dos meios de comunicação social, para se ferir a laicidade do Estado e fazer promoção religiosa em seus órgãos ou às suas custas. Em sociedades democráticas as religiões devem se articular por baixo, na sociedade civil, para colaborarem no debate sobre os valores comuns da sociedade e combinarem atitudes em defesa do bem comum, e não se associar por cima em mútuo apadrinhamento com o poder estatal para defesa das suas igrejas. Em sociedades livres uma religião não deve formar partido político (nem ter concessão de meios de comunicação social), mas sim educar os seus membros para traduzirem os valores de sua fé em uma práxis ética para todos os partidos (e quaisquer programas de TV). Todas as pessoas, sobretudo as novas gerações, têm direito ao esclarecimento das crenças e descrenças da humanidade e para isso o Ensino Religioso deve avaliar as notícias religiosas e fenômenos espirituais em seus contextos, estudando as religiões como questão e não como dado. O Ensino Religioso, compreendido como campo de aplicação da área de conhecimento das Ciências da Religião, em uma visão transdisciplinar, não objetiva transpor conteúdos enciclopédicos e muito menos doutrinais para um ensino catequético, mas o desenvolvimento de processos de aprendizagem participativos, de construção de conhecimentos significativos através de projetos de pesquisa, em conexão com as pautas de estudo e engajamento dos cientistas da religião. A Base Curricular Nacional está apontando esse horizonte para o Ensino Religioso e é por aí que a intolerância 10 A Base Nacional Curricular incluiu o Ensino Religioso para o ensino fundamental em todas as escolas, como um desenvolvimento pedagógico dos estudos sobre as várias espiritualidades e religiões: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf; acesso em 8/ago./2021. O Conselho Nacional de Educação determinou que os professores do Ensino Religioso devem ser formados em Ciências da Religião: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=99971-pcp012-18&category_slug=outubro-2018-pdf-1&Itemid=30192; acesso em 8/ago./2010.

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religiosa pode ser enfrentada. Lembrando que o contrário da intolerância não é a tolerância: o diálogo e a coexistência assinalariam melhor o caminho das relações interculturais e transreligiosas. As questões religiosas acabam entrando nas escolas de todo jeito e o melhor a fazer é compreendermos o Ensino Religioso11 como educação sobre a religiosidade humana, devendo tratar pedagogicamente do conhecimento espiritual que existe entre e para além de todas as tradições místicas, religiosas e não ou pós-religiosas, tematizando os seus conteúdos simbólicos nos espaços e tempos sagrados, bem como os valores – e antivalores – que as espiritualidades, na prática, desenvolvem através da história. Trata-se, então, de comparar criticamente e interpretar os fatos – que sempre são, também, espirituais – nos seus contextos históricos, em busca de significados mais profundos para esse patrimônio cultural da humanidade que são as atitudes e os imaginários filosóficos e religiosos. Produzir conhecimentos nas Ciências da Religião e traduzi-los para o Ensino Religioso, transdisciplinarmente, significa romper com o conteudismo abstrato e fragmentado e gerar processos de aprendizagem colaborativos e compromissados, através de projetos de pesquisa das vivências espirituais – e de engajamento no seu esclarecimento e terapeutização. O professor, nessa perspectiva, precisa compreender a situação social e religiosa dos educandos a fim de construir com eles conteúdos programáticos contextuais, precisa interagir criticamente com o contexto concreto das religiões na vida dos educandos em seus aspectos desumanizadores e opressivos, promovendo uma tomada de consciência desmistificadora das religiões. Mas o Ensino Religioso deve promover também uma ação educativa esperançosa, com base em metodologias focadas na experiência, em que a utopia desempenha um papel reconstrutivo e transformador das religiões. Trata-se, minha gente, de uma mudança cultural, dos magistérios eclesiásticos para os magistérios acadêmicos: uma história difícil de se fazer, mas a gente deve ter orgulho em participar dela. E gratidão a Du Meinberg Maranhão pelo fogo que a Coleção Ensino Religioso vai trazer, para que possamos nos amar mais que nem gente.

11 Para um aprofundamento dos estudos sobre o Ensino Religioso, ver SILVEIRA, Emerson e JUNQUEIRA, Sérgio (Orgs.). O ensino religioso na BNCC. Petrópolis: Vozes, 2020; CECCHETTI, Elcio e SIMONI, Josiane (Orgs.). Ensino religioso não confessional. São Leopoldo: Oikos, 2019; JUNQUEIRA, Sérgio; BRANDENBURG, Laude e KLEIN, Remi (Orgs.). Compêndio do ensino religioso. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: Vozes, 2017; RISKE-KOCH, Simone; BLANCK, Lílian e POZZER, Adecir (Orgs.). Formação inicial em ensino religioso. Florianópolis: Saberes em Diálogo, 2017. Gilbraz de Souza Aragão

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ENSINO RELIGIOSO: DE VOLTA PARA O FUTURO Prefácio

Paulo Agostinho N. Baptista Doutor e mestre em Ciência da Religião (UFJF), Especialista em Filosofia da Religião (PUC Minas), Licenciado em Filosofia (UFJF) e Bacharel em Teologia (PUC Minas). Foi aluno e cursou todas das disciplinas da primeiro curso de Ciências da Religião (UFJF, 1977-1980), mas que foi encerrado prematuramente por ingerência religiosa. É Pós-doutore em Demografia pelo CEDEPLAR/UFMG. É pesquisador e professor no Programa de Pós-graduação em Ciênicas da Religão da PUC Minas, na Linha Religião, Política e Educação e líder do Grupo de Pesquisa “Religião, Educação, Ecologia, Diálogo e Libertação” – REDECLID, Tem experiência na área de Educação como professor do componente curricular Ensino Religioso na Educação Básica de 1985 a 2010 e, no Ensino Superior desde 1985, como Diretor Acadêmico, editor e Diretor da Editora PUC Minas. Pesquisa temas como ensino religioso, educação e religião; teologia do pluralismo religioso, teologia(s) da libertação, paradigma ecológico, pensamento decolonial e a obra de Leonardo Boff (mestrado e doutorado). A partir de 2012 (pós-doutorado) retoma pesquisas sobre geração universitária e perfil das juventudes, com o apoio do CNPq, anteriormente realizadas na PUC Minas e no Brasil sob sua coordenação em 1990 e 1991.

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Como referenciar este capítulo: BAPTISTA, Paulo Agostinho N. Ensino Religioso: de volta para o futuro. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 19-23.

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Introdução Uma Coletânea sobre o Ensino Religioso é sempre bem-vinda. Ainda mais três, frutos de Simpósios e de seus Grupos de Trabalhos – GTs, que foram produzidos a partir de debates e reflexões da AMAR – Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões e da FOGO Editorial, no 1º Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas. Como a AMAR e a FOGO afirmam, essas coletâneas expressam “a-fe-to”, fé e ato, fé e ação de amar. E não é outra coisa que o Ensino Religioso quer, pois ele tem sido praticado em quase todo o país como ato educativo de amor, de fé e de esperança na educação laica para todas e todos. Parabéns a essas entidades que promoveram e patrocinam as publicações. Por sua história de controvérsia, refletir criticamente sobre o Ensino Religioso é necessário e urgente, pois é preciso ressignificar esse espaço escolar, que durante muito tempo foi proselitista, para reconsiderá-lo fundamental para a educação de crianças, adolescentes e jovens. Aliás, quem mostra essa importância é o próprio art. 33 da Lei n. 9.394/1996, nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ao dizer que o Ensino Religioso é “parte integrante da formação básica do cidadão”. Mas porque esse Ensino é importante e parte integrante para a formação básica de todo cidadão? Porque não se pode reduzir a escola e à educação só à perspectiva de preparação para o trabalho. Primeiramente, deve-se pensar uma educação inclusiva e integral. Todas as habilidades cognitivas são importantes, das diversas linguagens – das línguas, do lúdico na arte e do corpo –, da matemática, das ciências da natureza, das ciências humanas do espaço-tempo, através da história e da geografia, enfim tudo isso é muito significativo. Mas incompleto sem o Ensino Religioso, que desde 2018 está incluído nessas humanidades, nas ciências humanas. Sem a educação da dimensão religiosa ou espiritual o processo educativo fica precário – e aqui não podemos pensar nada que seja confessional, pois lugar de confessionalidade é na religião e não na escola para todas e todos.

O que “ensina” o Ensino Religioso - ER? Fruto de uma luta de décadas, que envolveu inúmeras e inúmeros educadoras e educadores, finalmente o ER ganhou cidadania ao ser integrado pelo Conselho Nacional de Educação - CNE à BNCC e aos Currículos Referências estaduais, bem como por terem sido criadas, por esse mesmo CNE, as Diretrizes Curriculares Paulo Agostinho N. Baptista

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Nacionais da graduação em Ciências da Religião, curso que oficialmente forma os docentes desse Ensino. E todas e todos que lutaram há anos por isso estão de parabéns, de modo especial o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER. Com mostra a BNCC, o Ensino Religioso é tempo e espaço de reflexões críticas sobre os conhecimentos religiosos e as filosofias de vida da humanidade, da brasilidade e da regionalidade. Preocupa-se com as atitudes de reconhecimento e respeito às alteridades e todo tipo de diversidade. Deve ser espaço de aprendizagem e partilha de experiências pedagógicas, de trocas e intercâmbios permanentes. De convivência da diversidade, de acolhimento das identidades, sejam elas culturais, espirituais, religiosas ou não religiosas, de gênero, enfim, da riqueza biodiversa. E, tudo isso, sob o horizonte da interculturalidade, dos direitos humanos, que precisam ser ampliados, e da cultura da paz. Nesse processo de formação, o ER tem um enorme papel: “Contribuir para que os educandos construam seus sentidos pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania” (BNCC, 2017, p. 434). E, nisso, os aspectos emocionais e afetivos não podem faltar. Por isso, como todo ato de educar, o Ensino Religioso é lugar da educação do afeto, é um ato de amor, como lembrava nosso mestre centenário, Paulo Freire: “educação é um ato de amor [...] um ato de coragem” (Educação como Prática da Liberdade, 1967, p. 97). Educar, amar e a-fe-tar o outro é criar uma comunicação autêntica, onde construímos nossa autonomia, nossa liberdade, contra toda forma de educação opressora, colonizadora, de toda educação bancária. E a atitude amorosa, presente no ato de educar, não existe sem diálogo. Mais uma vez nosso mestre Paulo Freire nos ensina: “Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens. (Pedagogia do Oprimido, 1981, p. 93-94). E nosso grande poeta e cantor também dizia e cantava isso: “o amor só dura em liberdade” (Raul Seixas). Educar é um ato de liberdade amorosa, quando educador e educando aprendem e ensinam mutuamente. As três Coletâneas estão apresentadas no início de cada obra. Não é preciso reapresentá-las. Trazem reflexões importantes para os / as que pesquisam e estudam o tema, para quem está na lida da sala de aula e para interessados / as em conhecer essa fantástica área das ciências humanas. Colocam questões importantes “na prática” e na “sala de aula”, sem deixar de provocar discussões sobre “desafios”, como também apontar para o futuro, as “perspectivas”. São discussões muito relevantes sobre a área de Ciências da Religião, formação docente, laicidade, direitos humanos, racismo, gênero, diversidade religiosa, epistemologia do a(fé)to, sobre a afetação política, inclusive na pandemia, dentre outros temas muito ricos. 22

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Parabéns mais uma vez aos / às organizadores /as e membros da Coordenação e dos Conselhos Científicos da AMAR e da FOGO Editorial, e especialmente às autoras e autores que tornaram possíveis essas obras, verdadeiros atos de amor e a-fe-to.

Paulo Agostinho N. Baptista

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CARTA DA AMAR E DA FOGO A PAULO FREIRE AMAR e impeachment já!

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº. Du (ou Flor) é uma pessoa transgênera não-binária. Realizou Doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), Mestrado em História do Tempo Presente pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e Graduação em História pela USP. É Pós-doutore em Ciências das Religiões (UFPB); em História (Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC); e em Interdisciplinaridade em Ciências Humanas (UFSC). Atuou como Professore Visitante no Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos (PPGDH) e no Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

No Mestrado pesquisou as re(l)ações entre mídia, gênero e religião na igreja Bola de Neve Church, gerando o livro A Grande Onda Vai Te Pegar: Marketing, Espetáculo e Ciberespaço na Bola de Neve Church (2013), que esta agência religiosa procurou censurar na Justiça por duas vezes. Cantar é um de seus passatempos prediletos, e atualmente têm composto paródias de classic rock com o tema impeachment de Bolsonaro.

[email protected]

Atua na Coordenação Científica da FOGO Editorial e na Presidência da Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR). Presidenciou a Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR) em duas gestões. No Doutorado pesquisou o que as pessoas transgêneras faziam com o que determinados discursos religiosos procuravam fazer delas (ou com elas), tendo como campos de pesquisa principais as igrejas inclusivas e os ministérios de “cura, restauração e libertação” de pessoas transgêneras e não hétero. Como referenciar este capítulo: MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Carta da AMAR e da FOGO a Paulo Freire: AMAR e impeachment já! In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 25-30.

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Sensível amigo Paulinho1, Antes de tudo, gostaríamos de te louvar, honrar, saudar e agradecer por seus luminosos escritos. Neste ano de seu centenário, relembramos a canção Alucinação, de Belchior, especialmente o trecho alusivo ao nosso sentimento atual de que ““amar e mudar as coisas nos interessam mais”, e mais especificamente, que ““amar e impeachment” é o que o Brasil mais necessita no momento2. Não sabemos se você tem acompanhado todos os acontecimentos recentes aqui no país desde que Jair Messias Bolsonaro foi eleito à Presidência da República em 2018. Foram ataques sistemáticos à educação – ele até sugere que você não deva mais ser considerado o patrono da Educação brasileira, acredita? Foram dezenas de informações falsas (as famosas “fake news”), distribuídas desde a campanha à presidência, houve escândalos diversos, uma política econômica desastrosa que levou ao desemprego em massa e retorno de altíssima inflação… E enfim, até a data em que encaminhamos esta carta a você (junho de 2021), mais de meio milhão de vidas foram perdidas pela pandemia de COVID-19 no Brasil, graças à condução negligente e irresponsável do atual governo. Um verdadeiro genocídio. Em outras cartas que a Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR) e a FOGO Editorial assinaram – as Cartas da AMAR (publicadas em nosso sítio) –, pedimos o impeachment de Bolsonaro, crendo que “somente com o definitivo afastamento da chapa eleita à Presidência (Capitão Bolsonaro/General Mourão) avistaremos um horizonte mais alvissareiro. Uma solução é eleger uma junta governativa com a tarefa de organizar as próximas eleições com a celeridade necessária e elegermos uma nova chapa, realmente representativa e com a sensibilidade, empatia e firmeza condizentes com o momento que atravessamos”. Comentamos ainda que “caso isso não aconteça, o número de mortes, o desemprego, a inflação, a fome e o sofrimento só aumentarão – e nosso país não pode continuar sendo vitimado pelo descaso, falta de planejamento e organização, negligência, negacionismo e obscurantismo reinantes”. Pois é, amado irmão Paulo. Como teria sido melhor se nas últimas eleições tivesse sido eleito um professor. Mas, infelizmente, foi escolhido – democraticamente – um ex-deputado federal que, em 27 anos de mandato, não aprovou mais de 2 projetos de lei. Menino, dá vontade de perguntar se a gente vai conseguir caminhar da teoria à 1 Versão ligeiramente modificada desta carta foi encaminhada para o livro “Cartas para Paulo Freire”, a ser publicado em 2021 pela EDUEPB. 2 Algumas destas reflexões encontram-se em capítulo da coletânea Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas, intitulado: Ensino Religioso e Epistemologia do A(fé)to: Perspectivas e desafios entre a Educação de Paulo Freire e a falta de educação de Jair Bolsonaro (MARANHÃO Fº., 2021). Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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prática de uma educação democrática, libertadora, laica, emancipatória neste atual contexto brasileiro. Estamos, infelizmente, sob a égide de tempos “terrivelmente bolsonaristas”, mas ainda mantemos a esperança e o amor. Precisamos, né, Paulo? Precisamos continuar crendo e atuando em prol de uma educação revolucionariamente amorosa e emancipatória; em outros termos, procurando amar e mudar as coisas. Ai, ai, Paulo… mas será possível imaginar que o governo federal valorize uma educação voltada às diversidades e que ensine as pessoas discentes a refletirem e questionarem acerca de seus contextos, quando um dos alvos ideológicos do governo foi justamente você, nosso patrono da Educação brasileira? O atual presidente interpelou nosso patrono (você) de “energúmeno”, foi crítico do seu método de alfabetização – que é tão bonito, sensível e amoroso! –, se posicionou contra sua influência pedagógica nas escolas públicas brasileiras… Mas sabemos que o título que lhe foi conferido em 2012, após aprovação de Projeto de Lei, é justíssimo. Bolsonaro está rodeado de gente chata, Paulo (para não dizer outras coisas, né?). Por exemplo, a deputada federal catarinense Caroline de Toni (PSL), que protocolou em 29 de abril de 2019 um PL que retiraria seu título. E, pasme, justificou no projeto que você “preocupou-se tão somente em discutir formação política e relegou a segundo plano os verdadeiros desafios da educação”. Menino, ela não sabe é NADA. Sabemos que, para ti, a educação não se dissocia de sua dimensão cultural e política; e a justificativa da deputada demonstra a valorização que alguns segmentos da sociedade dão a uma educação que “deposite conteúdos” na mente de discentes ao invés de lhes ensinar a aprender, a questionarem e se posicionarem criticamente no mundo, encontrando ressonância no movimento ideológico denominado Escola Sem Partido (ESP). E não vale nem a pena comentar agora sobre este movimento doutrinário tacanho e desamoroso. Perdoe o desabafo, amor! Sei que o que importa é que “eles passarão e nós passarinho”, e que “apesar deles, amanhã há de ser outro dia”. E temos em mente suas lições de sensível amorosidade. Não esqueceremos de sua atuação tão apaixonada e apaixonante no processo de emancipação crítica de docentes do Brasil e do exterior a partir de um método participante, dialogal, crítico e ativo. Você sempre explicava que a educação se encontrava na encruzilhada entre domesticar (instigar a obedecer), e emancipar (libertar o pensamento, preparando-o para a ação criativa). O atual governo prega a primeira alternativa, mas a gente escolhe a segunda… mudando as coisas para amar, amando para mudar as coisas, e acreditando que a educação emancipatória é o que permite estes movimentos! Por aqui ainda acreditamos em uma Economia do Cuidado e em uma Educa-ação fundamentada no que podemos chamar de Epistemologia do A(fé)to. Quem acompanha a FOGO Editorial e a AMAR sabe que costumamos grafar a palavra afeto da seguinte forma: com o termo “fé” entre o “a” e o “to”, ou seja, ao redor 28

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da palavra “fé” está a palavra “ato”, indicando a mistura de “crença” e de “ação”. Amor, A(fé)to, fé, ato, ato de fé, ação de crer, ação de acreditar, crença na ação, na eficiência e eficácia da ação. A(fé)to, então, denota afetividade e também ação, ou afetividade em ação. Fé+ato: afeto / Ato+fé: afeto… e vamos sintonizando questões cognitivas e afetivas. Vamos pensando uma ação educativamente amorosa e amorosamente educativa, relacionada à inclusão. E você sabe tão bem, , querido, que esse processo educativo e amoroso de ensino-aprendizagem (troca) vai acontecendo quando abdicamos de bagagens que não nos servem mais, nos abrindo à novidade, à empatia, à sensibilidade. E digo sobre AFETO no sentido da afetividade mesmo. Poderíamos pensar em uma miríade de sentidos relacionados a contribuições da Antropologia, da Sociologia, da História, da Psicologia e de tantas áreas, mas nesta cartinha vamos pensar no sentido da afetividade mesmo, tá bom? Porque sim, poderíamos pensar o termo afeto como afecção, impacto, e também sob a ótica de pesquisadoras como Jeanne Favret-Saada, mas conversamos sobre isso em outra doce oportunidade. Mas o afeto, enquanto afetividade, vai passando pela importância de se pensar as emoções e sentimentos na construção das relações humanas democráticas, na construção de uma educação verdadeiramente inclusiva e emancipatória, no desenvolvimento das capacidades cognitivas e sensíveis (nossas e de todo mundo). E saber da importância do afeto nos lembra da urgência de educar (e nos educar) ao amor. As re(l)ações entre conhecimento e a(fé)to são indissociáveis. Não é possível separar inteligência e afeto na experiência concreta das pessoas. Então, de algum modo, é necessário pensarmos em uma inteligência afetiva e afetuosa e em uma afetividade inteligente, na imbricação entre o que é considerado pedagogicamente “cognitivo” e “afetivo”, como se estas coisas não fossem realmente separadas, e não o são necessariamente (ou pelo menos não em relação ao presente texto). É pensar epistemologicamente e concretamente o afeto. E patroninho! Sua educa-ação emancipatória é tão a Epistemologia do A(fé)to, né? E temos fé na sua Educação. Por isso, te saudamos. E louvamos a fé no ato (de amar)! Isso é amar e mudar as coisas. Mudar as coisas para amar. Amar para mudar as coisas, pois amar e mudar as coisas É amar, e amar É mudar as coisas. E neste movimento, é necessário governos nada bancários e nada autoritários, mas, sim, inclusivos e que estimulem uma poética Educação acolhedora. Amorosamente, 19 de junho de 2021.

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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Referências Carta da AMAR pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro (11 de fevereiro de 2021). Cartas da AMAR. Disponível em: www. amarfogo.com/amar/cartas. Acesso em: 19 jun. 2021. FRANCO, Clarissa de; MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Não metam gênero na nossa religião! Educação em disputa nos movimentos "Escola Sem Partido" e "Con Mis Hijos No Te Metas". REVER. São Paulo, v. 20, n. 2, 2020. FRANCO, Clarissa de; MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Um Estado "terrivelmente cristão" e privatizador: A opressão à Educação em Direitos Humanos no Governo Bolsonaro. Revista de Estudos Teológicos - EST, 60, 1, p. 134-155, 2020. FRANCO, Clarissa de; MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque.A teocratização, privatização e militarização no Governo Bolsonaro: Perspectivas antidemocráticas e contrárias à educação. Mandrágora, v.26, n. 1, 2020, p. 203-224. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. 25ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015. Lembrar para não repetir: Ditadura nunca mais! (Primeiro de abril de 2021). Cartas da AMAR. Disponível em: www.amarfogo.com/ amar/cartas. Acesso em: 19 jun. 2021. MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Amar e Mudar as Coisas no Arco Íris de Euá: A(fé)to, Sagrado Não Binário e Teologia Queer de Orixá. Texto no prelo. MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Ensino Religioso e Epistemologia do A(fé)to: Perspectivas e desafios entre a

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Educação de Paulo Freire e a falta de educação de Jair Bolsonaro. In: Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas. Florianópolis: FOGO / AMAR, 2021. MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque; COELHO, Fernanda Marina Feitosa; DIAS, Tainah Biela. “Fake news acima de tudo, fake news acima de todos”: Bolsonaro e o “kit gay”, “ideologia de gênero” e fim da “família tradicional”. Correlatio, v. 17, n. 2, p. 65-90, 2018. MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque; FRANCO, Clarissa de. “Menino veste azul e menina, rosa”: Educação Domiciliar e as ideologias de gênero e gênesis de Damares Alves, a “ministra terrivelmente cristã” dos Direitos Humanos. RBHR, n. 35, 2019, p. 297-337. MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. O navio negreiro do racismo religioso "reverso" e a escola como porto inseguro. Semina, v. 17, N.º 1, 2017, p. 10-30. Muito mais de 300 mil pessoas mortas – Impeachment já! (24 de março de 2021). Cartas da AMAR. Disponível em: www. amarfogo.com/amar/cartas. Acesso em: 19 jun. 2021. Simpósio Internacional Amar e Mudar as Coisas. Disponível em: www.amarfogo.com. Acesso em: 19 jun. 2021. SOUSA, Cidoval Morais de. Cartas a Paulo Freire. Vol. 3. Campina Grande: Editora Universitária (EDUEPB), 2021 (no prelo). SOUZA, Odair; MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Gênero e Diversidade na Escola ou Ideologia de Gênero? Reações religiosas a um Plano Municipal de Educação de Santa Catarina. Poder e Cultura, v.5, n.9, p. 330-349, 2018.

CARTA DA AMAR E DA FOGO A PAULO FREIRE

SIMPÓSIO INTERNACIONAL AMAR E MUDAR AS COISAS Apresentando desafios e novos olhares do Ensino Religioso em sala de aula

Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº. Du (ou Flor) é uma pessoa transgênera não-binária. Realizou Doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), Mestrado em História do Tempo Presente pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e Graduação em História pela USP. É Pós-doutore em Ciências das Religiões (UFPB); em História (Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC); e em Interdisciplinaridade em Ciências Humanas (UFSC). Atuou como Professore Visitante no Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos (PPGDH) e no Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Atua na Coordenação Científica da FOGO Editorial e na Presidência da Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR). Presidenciou a Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR) em duas gestões.

de “cura, restauração e libertação” de pessoas transgêneras e não hétero. No Mestrado pesquisou as re(l)ações entre mídia, gênero e religião na igreja Bola de Neve Church, gerando o livro A Grande Onda Vai Te Pegar: Marketing, Espetáculo e Ciberespaço na Bola de Neve Church (2013), que esta agência religiosa procurou censurar na Justiça por duas vezes. Cantar é um de seus passatempos prediletos, e atualmente têm composto paródias de classic rock com o tema impeachment de Bolsonaro.

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No Doutorado pesquisou o que as pessoas transgêneras faziam com o que determinados discursos religiosos procuravam fazer delas (ou com elas), tendo como campos de pesquisa principais as igrejas inclusivas e os ministérios

Como referenciar este capítulo: MARANHÃO Fº, Eduardo Meinberg de Albuquerque. Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas: Apresentando desafios e novos olhares do Ensino Religioso em sala de aula In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 31-44.

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Amando e mudando as coisas AMAR e Mudar as Coisas é o título dos Simpósios Internacionais organizados pela FOGO Editorial e pela Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR), realizados aos fins de ano, em dezembro. O 1º Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas aconteceu na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) entre 08 e 13 de dezembro de 2019 e teve como tema: A(fé)tos, Direitos Humanos e Sensibilidades; Religiões, Resistências e Diversidades. Durante o evento realizamos o primeiro Prêmio AMAR / FOGO Editorial de Teses, Dissertações e Monografias; e o primeiro Prêmio AMAR / FOGO Editorial de Fotografias; lançamentos de livros; Mesas Redondas (chamadas no evento de Rodas de Fogo Amoroso), além de diversas outras atividades aprovadas após chamada pública, democrática e aberta, como Grupos de Trabalho (GTs), Minicursos, Vivências Amorosas, Atividades Artísticas e Oficinas. A AMAR, aliás, nasceu no nosso primeiro AMAR e Mudar as Coisas (amorosamente gestado pela FOGO), em plena sexta-feira 13 de lua cheia. De lá para cá, como definido em Assembleia, FOGO e AMAR realizam suas atividades de forma conjunta, com todas as publicações a cargo da FOGO. O AMAR e Mudar as Coisas é um Simpósio Internacional de participação 100% gratuita e aberto a toda a comunidade, não apenas acadêmica. Tanto nesta primeira edição do evento como nas seguintes, só houve valor de contribuição financeira para quem quis publicar em livros digitais e impressos do Simpósio (referentes às Rodas Amorosas e aos Grupos de Trabalho), delicadamente produzidos pela FOGO, cujo lema é livros feitos com AMOR. Por conta da pandemia de COVID-19, a segunda edição do AMAR e Mudar as Coisas foi realizada em 2020 de forma remota. O mote foi A(fé)tos e Religiões, Sensibilidades e Emoções, e além de todas as atividades relacionadas ao primeiro evento, tivemos as segundas edições de nossos Prêmios Internacionais de Teses, Dissertações e Monografias e de Fotografias, com dezenas de trabalhos inscritos nestas modalidades. Nosso terceiro AMAR e Mudar as Coisas será realizado em 2021 também de maneira on-line. Esse ano, nosso evento tem como temas geradores AMAR e Impeachment Já! e Gênero e Religião, A(fé)to e Educação. Cabe destacar que a AMAR e a FOGO tem pedido o impeachment do atual presidente da República Jair Messias Bolsonaro desde o ano passado. Temos publicado cartas a respeito e também participado de todos os atos públicos pedindo a derrubada da presidência. Estimulamos, inclusive, que todes que puderem participar, que participem, sempre seguindo todas as medidas de distanciamento social, cuidado e prevenção recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo bom senso. Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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Neste sentido, a FOGO está organizando uma Coletânea que terá como tema as relações entre fé, política e pandemia durante o “desgoverno” de Bolsonaro, a ser publicada neste segundo semestre de 2021. Convidamos você: vem conhecer a FOGO e vem com a gente à AMAR, por muito mais AMOR e por impeachment já! Além do AMAR e Mudar as Coisas, a FOGO e a AMAR realizaram, em sua recente trajetória (2019-2021), eventos como o Simpósio Internacional Gênero e Religiões Afro-Indígenas, em duas edições (05 e 08 de agosto de 2020 e de 2021), celebrando o aniversário da FOGO (08 de agosto); o Simpósio A(fé)to como Alternativa à Transfobia Religiosa (28 de maio de 2021); o Simpósio Nas Águas de Iemanjá: A(fé)to e Emoção, Sensibilidade e Educação (2 e 3 de fevereiro de 2021), e o Simpósio A(fé)to como Alternativa à Intolerância Religiosa (21 de janeiro de 2021). O objetivo é que alem destes eventos temáticos, a partir de 2022 sejam realizados simpósios da AMAR e da FOGO em países diversos, bem como em todas as regiões do Brasil, no intuito de concomitantemente atuarmos na internacionalização e na regionalização da Associação e da Editora. Além disto, está prevista a realização de eventos organizados por Núcleos e Grupos de Pesquisa e Estudos criados dentro da própria AMAR, ou já existentes e filiados à mesma. Para quem tiver interesse em fomentar a criação de grupos específicos ou de filiar coletivos que já existem, convidamos a acessarem nosso Portal de Fogo Amoroso em www.amarfogo.com. E você que está lendo este texto pode ter se perguntado: Como surgiu o nome do nosso Simpósio Internacional de fim de ano? A (ins)piração veio dos versos de Alucinação, de Belchior, que canta: “Mas eu não estou interessado / Em nenhuma teoria / Em nenhuma fantasia / Nem no algo mais / Longe o profeta do terror / Que a laranja mecânica anuncia / Amar e mudar as coisas / Me interessa mais / Amar e mudar as coisas / Amar e mudar as coisas me interessa mais”. Podemos perguntar: seria uma alucinação de nossa parte realizar um evento como este em uma academia muitas vezes engessada e tóxica, inserida em um contexto sociopolítico marcado por um governo federal autoritário, xenófobo, teocrata, racista, misógino e fóbico, capitaneado por um autêntico “profeta do terror que a laranja mecânica anuncia”? Não é de hoje que a FOGO Editorial e a AMAR, representadas por pesquisadoras/es que tem como preocupação as re(l)ações entre a(fé)to, política e religião, têm alertado aos perigos representados por aquele que veio a se tornar presidente da República, historicamente famigerado por apologia à ditadura, tortura e torturadores, e por discursos racistas, masculinistas, intolerantes religiosos, xenófobos, LGBTQIA+fóbicos, etc. E como alternativa ao nada distópico – bem realístico, por sinal – atual governo anticientífico, negacionista e intolerante, a FOGO e a AMAR recorrem à alucinação belchiorana de amar e mudar as coisas. 34

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Cabe perguntar: A quem interessa amar e mudar as coisas? A quem interessa dialogar e exercitar a(fé)tos, emoções e sensibilidades? Pensar estratégias de estímulo a uma educação crítica, respeitosa e emancipatória que tome partido das liberdades e diversidades de ser e de estar no mundo? Com certeza, interessa a nós todes, que queremos ser movimentades por estes (e)ventos calorosos. O AMAR e Mudar as Coisas (assim como todas as atividades realizadas pela FOGO e pela AMAR), tem como ambição aprofundar assuntos relacionados às sensibilidades, emoções e a(fé)tos – este último termo – a(fé) to –, aliás, é compreendido pela gente como o ato de crer ser possível amar e mudar as coisas. Não é por acaso que a maioria dos nossos Grupos de Trabalho e Rodas de Fogo Amoroso se relaciona justamente à educação, pois cremos ser a partir dela que podemos modificar as coisas de forma amorosa. É através de uma educação (ou educa+ação) respeitosa à pluralidade que podemos aceitar, acolher e respeitar quem é diferente de nós, e amar (n)a diferença. E foi no sentido de propiciarmos uma educação afetiva, laica, emancipatória, crítica, democrática, inclusiva e que ensine a pensar e a se posicionar sociopoliticamente que surgiu a presente publicação: quando os Anais da primeira edição do AMAR e Mudar as Coisas (2019) estavam sendo organizados, percebemos que grande parte dos textos (relacionados a diferentes Grupos de Trabalho) tratavam de um marcador comum, as questões relativas às conexões entre educação e religião e acerca do Ensino Religioso laico. Deste modo, foram reunidos textos referentes a este assunto (e aprovados pelas respectivas Coordenações de GTs) em forma de duas coletâneas, intituladas O Ensino Religioso na Prática e O Ensino Religioso e a Sala de Aula. É importante mencionar que os capítulos que compõem estas compilações são referentes a pesquisas em andamento em diferentes níveis de profundidade (não representando necessariamente as opiniões de quem organizou a obra e nem tampouco do Simpósio AMAR e Mudar as Coisas ou de suas principais promotoras, a FOGO e a AMAR), e foram aconchegados textos tanto de pessoas comunicadoras como de coordenadoras de Grupos de Trabalho do evento. Vale ressaltar também que, mesmo tendo a participação de quase duas dezenas de pessoas internacionais no evento (tanto em forma presencial como remota), todas as pessoas que compõem as coletâneas O Ensino Religioso e a Sala de Aula, e O Ensino Religioso na Prática, são vinculadas a universidades públicas do formoso Nordeste brasileiro, célebre por sua proeminência no Brasil como centro gerador de excelência intelectual. Enquanto estávamos organizando estas duas compilações, algumas pessoas que fazem parte de nossos Conselhos Científicos manifestaram interesse em participar deste projeto, e assim, uma nova compilação foi organizada com estas pessoas e outras que também se mostraram entusiasmadas em participar. De Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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modo estritamente relacionado com os dois temas anteriores, geramos assim a Coletânea Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas. E mais que isto, estas três obras compõem a nova Coleção Ensino Religioso, singelamente produzida pela FOGO Editorial e pela AMAR. Esta compilação de textos de refinada carpintaria traz contribuições de elevada importância ao Ensino Religioso que, frisamos, deve constituir-se laico, democrático, acolhedor e sempre aberto a tomar partido das sensibilidades e das diferenças. Como os assuntos destas coletâneas são bastante intervencionados, logo abaixo seguem apresentações sucintas das três. Estimulamos fortemente que você, que lê este texto, usufrua de todos os volumes da melhor forma possível.

Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas Os textos que compõem a Compilação Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas apresentam, de maneiras diversas, a necessidade de um Ensino Religioso laico, democrático, diverso e criativo, e que prepare as pessoas a uma sociedade mais que tolerante, respeitosa às diversidades. Nossa coletânea é aberta com o texto Campo dos Estudos de Religião no Brasil: Desafios e Perspectivas, de Gilbraz Aragão. O autor (des)envolve instigantes questões: Como tem se dado as relações referentes à laicidade e à confessionalidade do Ensino Religioso a partir do Supremo Tribunal Federal (STF)? Como os parâmetros curriculares desta disciplina têm sido fomentados pela área de Ciências da Religião e Conselhos de Educação? Como a famigerada “Bancada da Bíblia” tem ameaçado este campo de estudos? De que formas o estabelecimento e atualização pelo CNE/MEC dos referenciais curriculares nacionais para as graduações de Teologia e de Ciência(s) da(s) Religião(ões) têm se demonstrado complicadores às pesquisas de religião? Danielle Ventura de Lima Pinheiro contribuiu com o texto Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas, em que demonstrou como esta disciplina é arquitetada a partir de um caleidoscópio de tensões marcado por debates que vão desde a defesa do ensino catequético até a integral exclusão na grade curricular da educação básica. Com base em Pierre Bourdieu, a autora reflete: como se dá a autonomia relativa deste campo de conhecimento? A autora ainda sinalizou os principais desafios da área de Ciência(s) da(s) Religião(ões) na viabilização de uma formação inicial e continuada capaz de levar o respeito à diversidade religiosa para discentes e docentes, observando a carência de materiais didáticos que subsidiem o aprendizado daquilo que é almejado para a educação básica. No capítulo intitulado Ensino religioso: desafios em diferentes espaços, Edile Maria Fracaro Rodrigues e Sérgio Rogério Azevedo Junqueira demonstram como 36

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a diversidade cultural e religiosa podem constituir-se em espaços de fomento à cidadania. Dialogando acerca das re(l)ações entre igreja, Ensino Religioso e escola, a autora e o autor procuram contribuir para a disseminação de espaços em que o respeito às diversas expressões religiosas se constitua concreta e densamente. Sergio e Edile observam que este componente curricular foi introduzido originariamente nos currículos como estratégia de dominação cultural, e que a partir da revisão do Artigo 33 da LDB e da consolidação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vai sendo demandada a conexão com os métodos da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) afim de proporcionar estudos empíricos e sistemáticos sobre as tradições religiosas que estimulem uma educação cidadã e de respeito à diversidade. Em Formação de docentes para o Ensino Religioso: desafios e perspectivas, Josiane Crusaro Simoni e Elcio Cecchetti notam como a escola brasileira não eliminou sua face prosélita, difundindo valores e crenças de dadas confissões religiosas, veiculadas através de relações sociais, currículos e práticas pedagógicas. Para Elcio e Josiane, tal proselitismo se constitui em entrave ao acolhimento da diversidade religiosa de quem é participe do cotidiano escolar, e faz-se mister uma proposta de Ensino Religioso alicerçada na perspectiva da formação integral e cidadã em que todas as crenças, expressões religiosas, convicções e filosofias de vida sejam respeitadas, o que demanda a promoção de políticas públicas voltadas para a habilitação específica de profissionais que ministrem esta disciplina nos contextos escolares. No texto Laicidade do Estado e Ensino Religioso no Brasil: trajetórias, desafios e perspectivas, Tália de Azevedo Santos e Giuseppe Tosi identificam a complexa problemática que envolve as relações entre o caráter laico do Estado e as tradições históricas da escola no que se refere ao ensino confessional, e analisam algumas das formas como o Ensino Religioso demonstra-se campo ameaçado e ameaçador de disputas ideológicas em um contexto sócio histórico que expressa as ambiguidades nas relações Estado, igreja e Direitos Humanos. Para a autora e o autor, é de suma importância salientar e investir no papel que as instituições e a sociedade civil, inclusive a escola pública, têm na garantia dos direitos de valorização da liberdade e pluralidade religiosa. Desafios em tempo de polarização político-religiosa nos espaços escolares, escrito por Marinilson Barbosa da Silva, busca analisar algumas das binariedades políticas, econômicas e sociais refletidas no campo religioso do Brasil contemporâneo, com especial ênfase no Ensino Religioso e em suas re(l)ações com a diversidade religiosa, confessionalidade e direitos humanos. Para Marinilson, um dos primeiros pontos de conflitos de polarizações respinga no objeto de estudo acerca desta disciplina: qual é o objeto do Ensino Religioso de direito e de fato? O autor ainda questiona: Deve-se trazer à tona o fenômeno religioso a partir do viés da confessionalidade ou da perspectiva da pluralidade religiosa? Outra Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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das questões içadas pelo autor é que a polarização entre confessionalidade e diversidade não deixa de refletir um conflito entre tendências político-religiosas partidárias contemporâneas tanto de esquerda como de direita. Já o texto Ensino Religioso e Epistemologia do A(fé)to: Perspectivas e desafios entre a Educação de Paulo Freire e a falta de educação de Jair Bolsonaro, escrito por mim (Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº), comenta sobre dois elementos relacionados ao “desgoverno” do atual presidente da República Jair Bolsonaro, a falta de aportes e investimentos na área de Educação e a sua falta de respeito e polidez em discursos e entrevistas. Como contraponto a um governo especialista em fake news, “terrivelmente evangélico” e mal educado(r), o legado de Paulo Freire, nosso patrono da Educação, inspirará a pensar em formas de condução prática de um Ensino Religioso amorosamente inclusivo, laico, democrático e emancipatório, e relacionado à proposta de uma Epistemologia do A(fé) to ou Epistemologia do Amar e Mudar as Coisas. Em Ressignificando a prática docente em tempos de pandemia: O uso dos jogos, brinquedos e brincadeiras nas aulas de Ensino Religioso como desafio e perspectiva, Daniel Ribeiro Ferreira Junior e Marcos Vinicius de Freitas Reis trazem outras perspectivas contemporâneas sobre as relações entre o Ensino Religioso e o contexto sócio político atravessado não só pelo Brasil como o mundo. Os autores perguntam: quais os desafios enfrentados por quem leciona esta disciplina em um planeta aterrorizado pela pandemia de COVID-19? Para além disso, indaga-se se dentre as alternativas pedagógicas a serem adotadas, poderiam estar incluídos jogos, brinquedos e brincadeiras. É possível lecionar e ensinar com leveza e ludicidade em um contexto emocionalmente tão pesado? Outra delicada contribuição à consolidação de um Ensino Religioso que agrega linguagens culturais diversas está na literatura, como demonstram Juliana Rabaioli e Elcio Cecchetti, em Ensino Religioso e literatura: veredas, travessias e desafios. Com base nas contribuições da obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, a autora e o autor apresentam alguns dos desafios e possibilidades da literatura como recurso pedagógico para as aulas de Ensino Religioso, em uma perspectiva intercultural e interreligiosa, exercício que pode ser feito com um sem número de obras literárias, justamente pela necessidade imanente deste componente curricular em dialogar com todas as ciências e saberes que circulam pelo ambiente escolar.

O Ensino Religioso na prática A Coletânea O Ensino Religioso na Prática é iniciada pelo capítulo O Ensino Religioso nas Graduações em Ciência(s) da(s) Religião(ões): Inserções e repre38

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sentações no currículo, de Mirinalda Alves Rodrigues dos Santos. Adotando perspectivas curriculares pós-críticas que podem inspirar o Ensino Religioso à óptica da diversidade, subjetividade e multiculturalidade, a autora demonstra a importância dos Departamentos de Ciência(s) da(s) Religião(ões) brasileiros em estimular uma formação inicial de docentes de Ensino Religioso não confessional que reforce a necessidade de uma educação laica e inclusiva em todos os ambientes escolares. Para a mesma, a pretensão desta área deve ser a de demonstrar, através desta disciplina, que não há apenas uma religião a ser considerada como única e verdadeira, mas sim, toda uma miríade religiosa a ser considerada de modo respeitoso e acolhedor, promovendo uma educação que leve em conta a diversidade em todas as práticas pedagógicas1. A discussão da autora é complementada pelo texto seguinte, Teoria e prática na construção do currículo do ensino religioso em Belém, de Rodrigo Oliveira dos Santos, que lembra que enquanto componente curricular, o Ensino Religioso deve desempenhar (em conjunto com as demais disciplinas), imprescindível papel na formação cidadã e para o mundo do trabalho, como previsto no Art. 2 da LDB (Brasil, 1996). Falando a partir das suas vivências junto à ACREPA (Associação de Cientistas de Religião do Pará), que é a única sociedade profissional dedicada exclusivamente à esta área no país - e sediada em um estado em que apenas pessoas licenciadas na(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) podem ministrar este componente curricular -, o autor apresenta documentos curriculares da rede municipal de Belém que demonstram esforços pela adoção dos parâmetros da BNCC para o Ensino Religioso, o que é estruturado a partir não somente de unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades, como também a habilidades e objetivos da aprendizagem. Tal documento, alicerçado na(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) que o baliza(m), também fundamenta-se em uma estrutura interna que se organiza a partir de dois campos de estudo, o sistemático/comparativo e o empírico/histórico das religiões, visando dotar a disciplina da necessária cientificidade e laicidade. Outro capítulo do livro que elabora profícuos diálogos acerca de questões curriculares envolvendo este componente é Ensino Religioso: Estudo sobre proposta curricular com base no FONAPER e BNCC, escrito por Aldenir Teotônio Claudio, que apresenta algumas das múltiplas maneiras como a disciplina supramencionada pode funcionar como marco estruturado de leitura e de interpretação da realidade, algo fundamental para assegurar uma participação cidadã e autônoma que leve em conta, nas salas de aula, a valorização da diversidade não só religiosa como cultural, de modo mais amplificado possível. 1 Agradecemos à Mirinalda dos Santos, que participou da Comissão Organizadora do AMAR e Mudar as Coisas 1 (e extensivamente agradecemos à toda comissão), além de ser uma das Coordenadoras de Grupos de Trabalho do evento – assim como Danielle Ventura e Maria José Torres Holmes, que também integram amorosamente esta Coletânea. Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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De modo convergente, um aspecto de fundamental relevância em relação a este componente curricular está nos estágios supervisionados, e dois capítulos contribuem com esta conversa. Em O papel do estágio supervisionado nos cursos de licenciatura em Ciências das Religiões, Danielle Ventura de Lima Pinheiro e Renata Tatianne de Lima Silva destacam como o mesmo é instrumento indispensável no preparo de um Ensino Religioso que se fundamente na laicidade e no respeito à diversidade. Pinheiro e Silva analisam em seu capítulo algumas das características do processo de consolidação do Ensino Religioso no Brasil, até chegar à questão do estágio como imprescindível no currículo e na formação de quem se licencia em Ciência(s) da(s) Religião(ões). Para as autoras, a partir da implantação do Ensino Religioso na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), enfatiza-se a relevância do estágio supervisionado, já que é este componente curricular do curso de licenciatura em Ciência(s) da(s) Religião(ões) que vai preparar o caminho para a futura docência. Semelhantemente, Thiago Rafael Soares de Souza Guedes indaga, em O Estágio como prática reflexiva e demonstrativa na construção de saberes pelo professor de Ensino Religioso: “quais saberes o futuro educador constrói no Estágio Supervisionado, em um panorama de associação entre universidade e escola? Como o estágio, compreendido numa perspectiva argumentativo-reflexiva, colabora para a construção de habilidades educacionais?” Tais perguntas salientam conexões entre pesquisa e processo de construção de docentes e ajudam a refletir, por exemplo, sobre como o convívio com a escola pública durante estágios supervisionados pode capacitar discentes a elaborarem concepções que colaborem com seu próprio desenvolvimento formativo e humano, em prol de uma sociedade inclusiva e democrática. Levando em conta o que é proposto pela Lei nº 9.475/1997, que visa garantir que as práticas pedagógicas do Ensino Religioso protagonizem a abordagem das distintas tradições religiosas, o capítulo Ensino Religioso, identidade e consciência negra, de Thalisson Pinto Trindade de Lacerda e José Rodrigo Gomes de Sousa, apresenta reflexão acerca do racismo estrutural e como ele molda a maneira como as pessoas pensam, ao ponto de uma parcela de estudantes demonstrarem preconceito e intolerância quando a temática das religiões afro-brasileiras é levada para a sala de aula. Para os autores, faz-se mister que as concepções de identidade e de consciência negra sirvam como mecanismos de combate à discriminação nos ambientes escolares e fora dos mesmos. Complementando o assunto, Lambesujos x Caboclinhos: interfaces entre Ensino Religioso e a Lei 11.645/08 em Laranjeiras/SE, de autoria de Ramon Diego Fonseca Costa, apresenta, em seu cerne, a ludicidade: o autor, imbricando suas vivências como brincante e candomblecista, tece algumas relações entre a manifestação cultural denominada Lambesujo X Caboclinho e as Leis 10.639/03 e 11.645/08, relativas à ministração das disciplinas de História e Cultura Afro-brasileira e 40

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Indígena em ambiente escolar, bem como ao componente curricular de Ensino Religioso, tendo como objetivo discutir a inserção das manifestações culturais e folclóricas afro-indígenas em uma perspectiva pedagógica que assegure um ensino pluriétnico. E nem só de respeito à liberdade e diversidade religiosa vive o Ensino Religioso. Para muito além, este componente curricular deve se constituir como centro gerador de respeito a todas as formas de ser e estar no mundo, não somente se preocupando com o estudo das diversas religiões e manifestações religiosas, outro aspecto de interesse fundamental desta disciplina. É o que nos apresentam Alana Carla Lucena e Isabelle Saraiva Tavares no capítulo As duas faces da educação: do proselitismo cristão ao Ensino Religioso como promotor dos Direitos Humanos das mulheres. As autoras explicam que o Ensino Religioso, que em boa parte de sua História foi se constituindo como proselitista e hierarquizador de gêneros binários, serviu a um status quo em que as mulheres eram delegadas a um plano inferior ao homens, inclusive direcionando as primeiras à serventia doméstica e os segundos à esfera pública, política e decisória. Todavia, no mundo hodierno, o Ensino Religioso pode se constituir como mecanismo de dissipação dos reflexos desta cultura masculinista e misógina, tornando-se propulsor da dignidade, emancipação e protagonismo feminino em todos os ambientes sociais.

O Ensino Religioso e a Sala de Aula A Coletânea O Ensino Religioso e a Sala de Aula traz sensíveis interlocuções com as compilações descritas acima. Aliás, não seria nada injusto dizer que todos os textos das três obras lançadas concomitantemente na Coleção Ensino Religioso da FOGO e da AMAR se relacionam aos títulos das coletâneas: estamos tratando dos desafios e perspectivas de um Ensino Religioso que, dentro e fora de sala de aula, tem titubeado entre o que teoriza e o que pratica. O texto que abre os trabalhos deste volume se conecta diretamente com a questão dos desafios e das práticas desta disciplina. Trata-se do capítulo redigido por Maria José Torres Holmes, chamado Ensino Religioso e diversidade religiosa: desafios e perspectivas em sala de aula. Em seu trabalho, a autora comenta sobre a trajetória deste componente, de um contexto de catequização de pessoas indígenas e escravas, passando pela Instrução Religiosa da doutrina confessional católica, que era reforçada pela Constituição de 1824, o que ocasionou bastantes danos à Educação; observando a declaração de Estado laico através da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 1891, em que se instaurava certo distanciamento nas relações entre as religiões com o Estado; e contemplando uma reviravolta ocasionada através da Constituição da Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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República Federativa do Brasil de 1988, que assegurava o Ensino Religioso nas escolas públicas desde que se respeitasse a diversidade cultural religiosa do país – um país que, à propósito, ainda reverbera intenso preconceito religioso. No capítulo A perspectiva da disciplina de Ensino Religioso na construção de uma cultura de paz no Ensino Regular, José Carlos Cezar da Silva e Maria da Penha Lima da Silva observam que o Ensino Religioso pode contribuir de modo delicado e potente na formação cidadã de estudantes, auxiliando na promoção de uma sociedade solidária e fraternal. Valores comuns às religiões e religiosidades, como amor, bondade e solidariedade, analisados sob esta perspectiva, podem estimular a assimilação desde cedo de conceitos relacionados à inclusão da pluralidade e diversidade. Como metodologia, foi utilizada pesquisa bibliográfica em fontes de consulta impressa e digital, tendo como principal resultado a percepção de que uma educa-ação enraizada em valores morais, espirituais e pacíficos recupera seu objetivo primordial, ligado à cidadania em seu sentido mais holístico. E é em sala de aula que se desenvolvem majoritariamente os trabalhos de profissionais do Ensino Religioso na promoção da cidadania e do respeito às diversidades e aos direitos constitucionais e humanos. Neste sentido, o texto O professor frente à tarefa de mediar o ensino religioso: sua postura diante da diversidade religiosa em sala de aula, de Edilson da Silva, Jéssica da Silva, Monica Fonseca e Karina Ceci de Sousa Holmes, reflete a necessidade de uma educação transformadora, nos moldes dos ensinamentos do patrono da Educação brasileira, Paulo Freire, pensando como o Ensino Religioso deve ajudar as pessoas discentes em como percebem, problematizam e combatem proficientemente situações de discriminação e intolerância religiosa, instigando diálogos sempre respeitosos e acolhedores às subjetividades e diferenças que estejam “de olho” no respeito à laicidade e diversidade, que, à propósito, constituem o leitmotiv que deve nortear este componente curricular. Aliás, como indaga Maria Dalva de Oliveira Araujo, em Diversidade religiosa no ensino religioso: desafios à prática docente, “Ensino Religioso” é uma disciplina que tem como objetivo ensinar as pessoas a terem uma religião? Seria sinônimo de “aulas de religião”? Certamente que não, como sinaliza a autora. Em seu texto, Araujo aborda alguns dos desafios de docentes desta disciplina, refletindo sobre elementos sinalizadores do respeito à diversidade e laicidade em sala de aula. Para a mesma, a prática pedagógica do Ensino Religioso pressupõe a elaboração de novas perspectivas relacionadas à infinitude que é a diversidade humana, e como este componente curricular tem em seu “DNA” a possibilidade de adentrar em questões profundas da subjetividade, urge ao Ensino Religioso a prática da responsabilidade social e o respeito a todas as formas de existência. De modo similar, o capítulo escrito por Maria José Torres Holmes e Mônica da Mota Fonseca, intitulado Ensino Religioso na Educação de Jovens e Adultos 42

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nas Escolas Públicas: religião, cultura, religiosidade e espiritualidade, pergunta provocativamente se seria o Ensino Religioso “aula de catequese”, e como essa disciplina costuma ser ministrada no “chão da escola”. Apresentando um estudo sobre a diversidade cultural religiosa com especial mirada à comunidade estudantil da Educação de Jovens e Adultes (EJA), as autoras demonstram o quanto a coletividade escolar muitas vezes confunde equivocadamente “estudos sobre religiões” com a confessionalidade inerente às mesmas. E é justamente por conta da confusão recorrente entre Ensino Religioso e “aulas de cristianismo” que é urgente se desfazer tais equívocos. Fundamentado em narrativas biográficas de vivências em sala de aula, como vários dos textos desta compilação, Maria José Torres Holmes e Eliane Barbosa de Carvalho também procuram identificar, em Ensino Religioso na Diversidade Cultural Religiosa: Relatos de experiências, este componente como propiciador de trocas inclusivas e respeitosas entre escola, família e comunidade, observando o quanto faz parte da tarefa escolar contribuir para o desenvolvimento da coletividade escolar no tocante à cidadania e aos aspectos afetivo, intelectual e antropológico de modo interseccionado. Como percebemos, uma das questões que percorrem esta coletânea de Grupos de Trabalho do Simpósio é referente ao como ministrar este componente curricular. É o que infere Simone Simões da Cruz em seu texto Ensino Religioso: da teoria à prática na sala de aula, em que a autora procura demonstrar como a educação para os Direitos Humanos e cidadania é um processo de constante busca, que necessita o investimento paulatino da convivência afetuosa através do diálogo sempre respeitoso às diferenças. Fechando a coletânea – novamente salientando que os textos dos nossos Grupos de Trabalho tem este caráter de trabalho progressivo em grupo (daí convidarmos a todes a participarem (cri)ativamente de nossos eventos e de outros eventos importantes da área, afim de aprofundarem seus estudos) –, o capítulo intitulado Laicidade e Ensino Religioso: desafio aos docentes e à formação humana, redigido por Maria Dalva de Oliveira Araujo, analisa que para respeitar o princípio da laicidade, o primeiro passo a ser dado é conhecer, da melhor forma possível, as cosmovisões das pessoas educandas. A partir de diálogos com base nas diferenças de opiniões e experiências, e através de uma educação crítica e emancipatória, possibilitar que cada discente se torne protagonista de sua própria história de vida, em constante transformação e no respeito à pluralidade. O texto da autora, mais que fechar os trabalhos desta compilação, contribui na abertura de importante frente de estudos relacionados ao Ensino Religioso, referente às perspectivas e desafios que constituem este componente curricular. E é neste sentido que sugerimos a leitura da obra Ensino Religioso: Desafios e Perspectivas, que como já salientado, faz parte da Coleção Ensino Religioso, da Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Fº.

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FOGO e da AMAR. Como é possível perceber, os textos apresentados (referentes a Comunicações Orais em Grupos de Trabalho sobre Ensino Religioso do Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas) continuem um mosaico multicolorido de instigantes contribuições a uma pedagogia do respeito à cidadania, aos Direitos Humanos, à laicidade, à multiplicidade e ao a(fé)to. Outra coisa que devemos salientar novamente é que podemos considerar as coletâneas O Ensino Religioso e a Sala de Aula e O Ensino Religioso na Prática como produções genuinamente nordestinas. Ainda que inseridas no contexto de um evento internacional, que contou com diversas pessoas estrangeiras, as mesmas se caracterizam por sua marcante regionalidade. O evento foi realizado de forma híbrida, com algumas participações on-line, mas predominantemente presenciais, em uma Instituição de Ensino Superior nordestina, a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), conhecida como centro de excelência intelectual (e berço onde nasceu a AMAR, durante o Simpósio). As pessoas que colaboraram com os Grupos de Trabalho relacionados ao Ensino Religioso e que nos encaminharam generosamente seus textos são vinculadas a universidades do Nordeste brasileiro, bem como os professores que gentilmente prefaciaram e posfaciaram a obra, e as principais promotoras do Simpósio Internacional AMAR e Mudar as Coisas, a FOGO Editorial e a AMAR, mesmo que compostas por pessoas de todas as regiões do Brasil e também do exterior, têm atualmente sede nesta região, mais precisamente na Praia do Amor, situada no litoral sul paraibano. E foi com muito respeito, delicadeza, carinho e amor que esta compilação foi coletivamente produzida. Agradecendo a você que está lendo este trabalho, fica nosso estímulo a que continuemos atuando em prol de uma educa-ação que, mais que simplesmente “tolerante”, seja respeitosa, libertadora e acolhedora não somente da diversidade religiosa, como de todas as demais formas de diversidade.

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SIMPÓSIO INTERNACIONAL AMAR E MUDAR AS COISAS

ENSINO RELIGIOSO E DIVERSIDADE RELIGIOSA Desafios e perspectivas em sala de aula

Maria José Torres Holmes Doutoranda em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB). Mestra em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB). Especialista em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB). Realizou Curso em EAD: Administração da Educação (PPGCE/UFPB), e se formou em Pedagogia pela mesma Universidade. Integrante do FIDELID (UFPB), filiado à Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR). Membro do FONAPER.

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Como referenciar este capítulo: HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso e diversidade religiosa: desafios e perspectivas em sala de aula. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 45-60.

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Introdução Os cinco séculos de existência do Ensino Religioso (ER) coincidem juntamente com a educação brasileira e a história do Brasil, que passou por diversas formas teórico-metodológicas na escola e que, durante muitos anos, foi de viés confessional. Por isso, paga um preço muito alto, ainda como resquícios do passado. Até que chegou o tempo de rever a legislação, apontando um ER laico, nos ideais da democracia, inclusão social e educação integral, em que distintos setores da sociedade civil passaram a reivindicar a abordagem do conhecimento religioso e o reconhecimento da diversidade religiosa no âmbito dos currículos escolares. Haja vista a implantação do FONAPER no Brasil, que foi criado para dar o total apoio ao ER nas escolas, defendendo as dificuldades pelas quais tem passado o ER. O surgimento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2018) é mais uma porta que se abre para esse componente curricular, através desse novo olhar, focando a diversidade cultural religiosa do Brasil, bem como o respeito à laicidade do Estado Brasileiro. Por isso, [...] é questionável, por parte dos debatedores e críticos da laicidade do Estado, que a inserção do Ensino Religioso nas escolas públicas se deu de forma gradual. Por meio de decisões normativas e constitucionais, ele foi sendo integrado na base comum do Ensino Fundamental (SIQUEIRA SILVA, 2015, p. 16).

Mesmo assim, ele se depara com grandes desafios, como a falta de incentivo no seio do ambiente escolar e até mesmo dos gestores das três esferas governamentais. Outro detalhe que muito nos preocupa é a falta de cursos de licenciatura na área da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões). Embora exista tais cursos de formação inicial em alguns Estados da federação, entretanto eles ainda são poucos. Qual será o motivo dessa indiferença? É por parte do MEC? Talvez seja o desconhecimento da lei, dos princípios e objetivos que regem esse componente curricular? Outro problema que pode dificultar, talvez seja até a própria nomenclatura Ensino Religioso. Entretanto, graças às mudanças na legislação de ensino, atualmente há um novo olhar sobre o ER que proporcionou grandes discussões focalizando a parte pedagógica no processo de ensino e aprendizagem dentro do contexto escolar. Por isso, nesse momento, a grande preocupação do FONAPER1 é sistematizar 1 O Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER( é uma associação civil de direito privado, de âmbito nacional, sem vínculo político-partidário, confessional e sindical, sem fins econômicos, que congrega, conforme seu estatuto, pessoas jurídicas e pessoas naturais identificadas com o Ensino Religioso, sem discriminação de qualquer natureza. Fundado em 26 de setembro 1995, Maria José Torres Holmes

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um currículo que venha oferecer ao educador(a) mais segurança quanto à transmissão dos conteúdos no processo de ensino e aprendizagem, bem distante das questões proselitistas, de preconceitos de um modo geral, e dos mais diversos tipos de fanatismos religiosos. Essa proposta intenta promover um espaço onde o diálogo, o respeito e a aceitação dos educandos, sejam quais forem suas convicções, se deem no sentido de um amadurecimento sobre o conhecimento religioso das tradições religiosas, os quais possam minimizar ou até mesmo eliminar as diversas formas de preconceitos existentes no espaço escolar, na família e na sociedade. Com isto educam-se as novas gerações, apresentando-lhes alternativas e precavendo-as contra fundamentalismos e manipulações ideológicas de discursos religiosos. Tais considerações são importantes para os educadores do Ensino Religioso, já que precisam se fundamentar a esse respeito para que possam desenvolver na escola, de forma organizada em sua linguagem específica, a releitura do fenômeno religioso, conforme preconiza a Lei 9.475/1997. Neste sentido, Holmes (2010, p. 53), afirma: Todas as culturas religiosas têm o seu modo especial de expressar o seu encontro com o sagrado. Por isso a religião para cada ser humano se expressa com uma dimensão existencial de grande profundidade, marcando assim os seus elementos culturais dentro de uma realidade histórica, onde a religiosidade se torna se efetiva para o ser humano, denominada em cada cultura como fenômeno religioso.

De acordo com os PCNER2, a escola pode e deve fazer-se presente, dando subsídio para que, na promoção de cada educando, através do diálogo, o sentido pleno da cidadania se estabeleça, criando vínculos de solidariedade, fraternidade e amor ao próximo pela construção da paz. Isso deve servir de alicerce para sustentação de uma proposta norteadora, para transmitir, construir e se instalar no chão das escolas públicas, conforme os PCNER, que afirmam ser: Básico para a construção da paz na sociedade é a humildade, para reconhecer que a verdade não é monopólio fé religiosa ou política. E, no Ensino Religioso, pelo espírito de reverência as crenças alheias (e não só pela tolerância), desencadeiam-se o profundo respeito mútuo que pode conduzir à paz (FONAPER, 2009 p. 33). em Florianópolis/SC, vem atuando na perspectiva de acompanhar, organizar e subsidiar o esforço de professores, pesquisadores, sistemas de ensino e associações na efetivação do Ensino Religioso como componente curricular. É um espaço de discussão e ponto aglutinador de ideias e ideais na construção de propostas concretas para a operacionalização do Ensino Religioso na escola. 2

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Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (FONAPER) ENSINO RELIGIOSO E DIVERSIDADE RELIGIOSA

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Este estudo tem como objetivo principal: Desenvolver formas diferenciadas sobre a prática do diálogo inter-religioso, a vivência do respeito às diferenças pessoais, culturais e religiosas em seu convívio social, através da identificação dessas diferenças e semelhanças a fim de firmar atitudes de paz, compreensão e solidariedade, por meio da construção do conhecimento, apresentando a dimensão religiosa do ser humano e sua repercussão na sociedade.

A diversidade religiosa no contexto escolar Quando se fala de diversidade religiosa, é necessário pensar no respeito às diferenças, no diálogo e no cumprimento do que preconiza as leis que dizem respeito a essa temática. A diversidade cultural é a riqueza da humanidade, e como tal, a escola está permeada de valores dessa diversidade. Portanto, precisa se transformar num espaço de convivência, onde os conflitos sejam trabalhados, e não camuflados. É necessário se conhecer para conhecer o outro, e isto faz parte de uma escola cidadã, mais humana, onde o educando amplia o seu conhecimento, descobrindo o sentido da convivência interpessoal, social, cultural e religiosa de cada educando, bem como da própria comunidade escolar. Destacamos um dos objetivos do Ensino Religioso que coloca este educando no centro das competências no contexto escolar, que se apresenta conforme os PCNER: “Proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no contexto do educando” (FONAPER, 2009 p. 47). Esse componente curricular, por ser considerado facilitador de uma educação dialógica, inventiva, reflexiva e humana, provoca discussões sobre o sentido da vida, cujas referências estão no estudo sobre as tradições e culturas religiosas que acontecem na história. Associando esse saber à educação e à cidadania, observa-se que há uma sintonia entre estes valores, muito especial na formação do ser humano. É através do Ensino Religioso (ER) que o professor desenvolve o diálogo democrático, possibilitando a formação do cidadão. Esta relação repercute através do “ethos, em que se realiza o próprio sentido do ser. É formado na sua percepção interior dos valores, de que nasce o dever como expressão da consciência e como resposta do próprio “eu” pessoal” (FONAPER, 2009, pp. 55-56). Por outro lado, observa-se que esta moral está atrelada ao “processo dinâmico da intimidade do ser humano e, para atingi-lo, não basta deter-se à superfície das ações humanas” (FONAPER, 2009, pp. 56). E, por conseguinte, atua e discorre Maria José Torres Holmes

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de um encadeamento íntimo com a pessoa, através de uma “ética, cujas funções são muitas, salientando-se a crítica e a utópica” (FONAPER, 2009, p. 56.). Isso se refere a uma abordagem que diz respeito a uma realidade humana que é construída historicamente e socialmente a partir das relações coletivas entre os seres humanos nas sociedades onde nascem e vivem. Observa-se que aí se encontra uma interação dialógica entre educadores e educandos(as). É importante destacar que nessa relação de diálogo não existe distanciamento entre docentes e discentes, haja vista que este componente curricular está sempre objetivando o estudo do conhecimento religioso, através da pesquisa sobre as tradições culturais religiosas. Isso se dá porque, segundo os cientistas da religião, os seres humanos criaram as tradições religiosas3 e as sistematizaram para cultuarem o sagrado, numa visão de explicar o mundo, diferente da linguagem científica. Filoramo e Prandi asseveram que: O estudo da religião em perspectiva científica, qualquer que seja a definição que se dê ao estatuto dessa cientificidade, tem essa característica fundamental: ele é um convite ao estudo, não para que alguém se torne mais (ou menos) religioso - o fato de existirem consequências desse estudo é um efeito imprevisto, não fazendo parte das regras do jogo, estuda-se segundo o ethos do conhecimento que anima e funda esse tipo de trabalho, para poder conhecer melhor essa complexa e cálida realidade, para poder melhor orientar-se dentro dela (FILORAMO; PRANDI, 1999, p. 290).

O que existe é uma sintonia dialógica de respeito e de amor, quanto ao estudo do ethos, frente a essa grande diversidade. Freire afirma, quando aborda sobre estes valores, que “não há diálogo, porém se não há um profundo amor ao mundo e aos homens. Não é possível a pronúncia do mundo, que é um ato de criação e recriação, se não há amor que a infunda” (FREIRE, 2007 pp. 91-92). A abordagem sobre essa relação dialógica traduz a importância do Ensino Religioso no processo de inclusão do diálogo, através da partilha, não só do afeto e amor ao próximo, mas vivenciar os valores da vida cidadã. Despertando, assim, entre os discentes, a descoberta para o sentido da vida. [...] o ser humano é uma criatura responsável e precisa realizar o sentido potencial de sua vida, quero salientar que o verdadeiro sentido da vida deve ser descoberto no mundo, e não dentro da pessoa humana ou de sua psique, como se fosse um sistema fechado. Chamei esta característica constitutiva de “a autotranscendência da existência humana”. Ela denota o fato de que ser humano sempre aponta e se dirige para algo ou alguém diferente de si mesmo - seja um sentido a realizar ou outro ser humano 3 Émile Durkheim diz que a religião é um sistema de crenças e práticas relativas a coisas sagradas que une, na mesma comunidade moral. Lactâncio afirma que a palavra vem de religare, trata-se, então de uma relação, um liame com a divindade (FONAPER, 2000, p. 30).

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a encontrar. Quanto mais a pessoa esquecer, de si mesma - dedicando-se a servir uma causa ou a amar outra pessoa - mais humana será e mais se realizará (FRANKL, 1984, p. 76).

A Proposta Curricular da Paraíba (PCPB) apresenta as ideias da vida além da morte enquanto uma temática muito importante para ser estudado em sala de aula, principalmente quando se trata deste momento atual da pandemia, onde as pessoas se curvam diante do sagrado, tentando se conectar espiritualmente com suas divindades, na busca de preces, súplicas e orações, para obter graças e o conforto espiritual de que tanto necessitam em busca dessa paz espiritual, além de obterem respostas para suas perguntas existenciais. Quem sou? De onde vim? Para onde vou? No conjunto das crenças e doutrinas religiosas, encontram-se ideias de imortalidade (ancestralidade, reencarnação, ressurreição, transmigração, entre outras), que são norteadoras do sentido da vida dos seus seguidores. Essas informações oferecem aos sujeitos referenciais tanto para a vida terrena quanto para o pós-morte, cuja finalidade é direcionar condutas individuais e sociais, por meio de códigos éticos e morais. Tais códigos, em geral, definem o que é certo ou errado, permitido ou proibido. Esses princípios éticos e morais atuam como balizadores de comportamento, tanto nos ritos como na vida social (PARAÍBA, 2018, p. 369).

A escola, pela sua função social, deve ser o lugar em que todos os educandos devem ter as mesmas oportunidades de aprendizagem, respeitando suas diferenças, sejam social, cultural ou religiosa. De um modo geral, têm-se suas dificuldades de trabalhar com essa diversidade, principalmente quando se fala de fenômeno religioso. É necessário pensar no respeito às diferenças, no diálogo e na tolerância, entendendo a sua importância na manutenção dessa construção dialogal. É nesse exercício que esse componente curricular pode servir de modelo em suas práticas inspiradas nos grandes “mestres das religiões”, cujos gestos de amor estavam sempre presentes nas suas ações. Todavia, isso não quer dizer que essa prática seja de proselitismo, mas exemplos dentro de cada tradição religiosa, que até hoje serve de parâmetros para a boa convivência entre irmãos e irmãs. Para Martirani (2006, p. 90), “Buda nas práticas de meditação expõe as necessidades fundamentais de seus discípulos, Isto é, de todos os seres humanos”. Enquanto para Nunes (2003, p.19), “Gandhi, apesar de sua formação religiosa e filosófica ser de origem hinduísta, utilizou-se deste ensinamento das tradições jainista e budista [...]”. Estes são ensinamentos que devem ser aprendidos nas aulas de ER, que por sua especificidade, não deve ser confundido com nenhuma outra ciência humana, pois apresenta um grande desafio de como despertar os(as) estudantes para a percepção do transcendente, sem proselitismo e com respeito à diversidade, Maria José Torres Holmes

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vivenciando uma ética para o convívio com a nossa diversidade (Holmes, 2016). Vale destacar um trecho da Cartilha: Diversidade Religiosa e Direitos Humanos: “Existem muitos povos, de muitas raças, falando várias línguas. Mas, para eles, só existe um sol, uma lua e uma mãe terra. Somos parte um do outro, pela vontade do Grande Espírito” (BRASIL, 2004, p. 23). A riqueza da diversidade é um desafio para os estudiosos das religiões, pela complexidade existente entre as culturas religiosas. Compreender o significado de todo esse mistério que está atrelado à natureza, a qual faz parte do conhecimento humano que é finito, desperta nos estudiosos um interesse em se aprofundar para descobrir algo mais dessa dimensão infinita, principalmente do ponto de vista científico. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, assegura, em seu Artigo XVIII, que: Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular (UNICEF, 1948).

Tais afirmações do artigo acima citado torna claro que todo ser humano tem o direito de escolha e, por isso, jamais deverá ser desrespeitado diante do seu credo religioso. Quando se fala de diversidade religiosa, é necessário pensar no respeito às diferenças, no diálogo e na humildade, cuja liberdade religiosa possa promover o diálogo inter-religioso, pois cada religião é considerada um pequeno mundo à parte, onde as pessoas que a praticam vivem suas dimensões religiosas e fazem delas o seu mundo, com sua verdade e o seu culto ao sagrado. Todas devem ser respeitadas. Diante desses argumentos, é importante destacar que além da legislação, a BNCC aponta como um dos seus objetivos fundamentais “proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos, culturais e estéticos, a partir das manifestações religiosas percebidas na realidade dos educandos” (BNCC, 2017, p. 432). Por outro lado, a Proposta Curricular do Estado da Paraíba: Educação Infantil e Ensino Fundamental apresenta um objetivo que é fundamental: “propiciar conhecimentos sobre o direito à liberdade de consciência e de crença, no constante propósito de promoção dos direitos humanos” (PARAÍBA, 2018, p. 367). Logo percebemos a importância deste componente curricular no âmbito escolar. Portanto, trata-se aqui da legalização do Ensino Religioso respaldado 52

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e garantido pelo Estado Laico Brasileiro4. Por outro lado, Durkheim, um grande pesquisador sobre religião, optou em estudar apenas uma religião. Foi neste momento que esse teórico compreendeu a igualdade dentro das tradições religiosas. Pois, segundo este nos assegura, Não há, pois, no fundo religiões que sejam falsas. Todas são verdadeiras à sua maneira: todas respondem, ainda que de maneiras diferentes, a determinadas condições da vida humana. Na verdade, não é impossível dispô-las segundo ordem hierárquica. Umas podem ser ditas superiores às outras, pelo fato de colocarem em jogo funções mentais mais elevadas; são mais ricas de idéias e sentimentos, integram mais conceitos, menos sensações e imagens, e sua sistematização é mais erudita (DURKHEIM, 1989, p. 31).

Tudo isso tem sentido porque toda cultura religiosa tem o seu valor e a sua verdade, o que justifica todo o dispositivo do processo legal que ampara e direciona este componente curricular para todo o Território Nacional enquanto currículo das escolas públicas, conforme será discutir no subitem abaixo.

A BNCC e o aspecto legal do ensino religioso De acordo com o texto compilado da BNCC (2017) pelo FONAPER, envolvendo os aspectos legais que situam o Ensino Religioso no contexto das escolas públicas de todo o Território Nacional Brasileiro: A Constituição Federal de 1988 (artigo 210) e a LDB nº 9.394/1996 (artigo 33, alterado pela Lei n. 9.475/1997) estabeleceram os princípios e os fundamentos que devem alicerçar epistemologias e pedagogias do Ensino Religioso, cuja função educacional, enquanto parte integrante da formação básica do cidadão é assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa, sem proselitismos. Mais tarde, a Resolução CNE/CEB nº 04/2010 e Resolução CNE/CEB nº 07/2010 reconheceram o Ensino Religioso como uma das cinco áreas de conhecimento do Ensino Fundamental de 09 (nove) anos (BNCC, 2018 p. 435).

Observamos que este componente curricular está bem embasado em matéria de leis e documentos como nenhum outro componente. A proposta formativa do componente curricular do Ensino Religioso tem como objetivo geral tratar sobre os conhecimentos religiosos a partir de pressupostos éticos e científicos, sem privilégio de nenhuma crença ou convicção, com base nas diversas culturas e tradições religiosas, sem desconsiderar a existência de filosofias seculares de vida. 4 Significa que não existe uma religião oficial no Brasil. O que existe é a garantia da liberdade religiosa garantida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, através do Artigo 5º que assegura ao povo o direito de escolha de ter ou não ter uma crença religiosa. Maria José Torres Holmes

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Destacando ainda os estudos sobre documentos entre outros que normatizam este componente curricular no campo educacional brasileiro, com ênfase no Estado da Paraíba, de acordo com o Art. 33 da LDB, temos a Lei substituta desse artigo, de nº 9.475/1997, que nos assegura o ER: O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo (BRASIL, 1997, Art. 33).

Vale ressaltar que assim se confirma o ER na nossa Constituição Brasileira atual, conforme citado anteriormente e assegurado pelas Resoluções e Pareceres do Conselho Nacional de Educação (CNE) e confirmado pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC): Estabelecido como componente curricular de oferta obrigatória nas escolas públicas de Ensino Fundamental, com matrícula facultativa, em diferentes regiões do país, foi elaborado propostas curriculares, cursos de formação inicial e continuada e materiais didático-pedagógicos que contribuíram para a construção da área do Ensino Religioso, cuja natureza e finalidades pedagógicas são distintas da confessionalidade (BRASIL, 2017, p. 435).

E assim, vale destacar que a história tem dado grande contribuição nos estudos realizados cientificamente tanto no campo da educação quanto no campo das ciências das religiões, assim como outras áreas de conhecimentos. Esses pesquisadores intensificam suas investigações e cada vez mais se conscientizam com firmes propósitos de que em suas descobertas conseguem vislumbrar meios que venham enriquecer cada vez mais seus objetivos focados nestes campos de conhecimentos. Destacando que: É comprovado pela história e outras ciências que não existe nenhum povo sem religião ou sem tradição religiosa. As diversas religiões e tradições religiosas que foram se constituindo no decorrer da história fundamentam a sua concepção de Transcendente, o sentido da vida e da morte, a maneira de ser e de agir no mundo, através de seus escritos e também da oralidade (HOLMES, 2010, p. 24).

Destarte, em se tratando de Ensino Religioso, ser esta a verdade para ser seguida no campo educacional brasileiro, sendo estudado e compreendido, respeitado e dialogado na forma da lei e outros documentos, com certeza podemos contribuir grandemente na formação ética e estética para a formação cidadã de nossos(as) estudantes. Nesse caso, teremos então uma educação inventiva e reflexiva, com professores preparados para assumir com responsabilidade e compromisso as propostas de54

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terminadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, a qual vem alicerçar o Ensino Religioso no âmbito das escolas públicas brasileira, que através da Resolução Nº 5, de 28 de dezembro de 2018, iInstitui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de licenciatura em Ciências da Religião e dá outras providências” . Art. 1º A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de licenciatura em Ciências da Religião, modalidade presencial, semipresencial e a distância, definindo princípios, concepções e estrutura a serem observadas na elaboração dos projetos pedagógicos pelas instituições de educação superior e pelos órgãos dos sistemas de ensino (BRASIL, 2018, p. 1).

Por conseguinte, vale destacar que essa Resolução oferece uma oportunidade para o docente de se qualificar, estendendo esse prazo para os que ainda não possuem a formação adequada nesta área de conhecimento, conforme o Art. 10, “pelo prazo de 8 (oito) anos, a contar da publicação destas DCN, a habilitação para a docência do Ensino Religioso para graduados não licenciados reger-se-á pelo disposto no artigo 14 da Resolução CNE/CP nº 2, de 1º de julho de 2015” (BRASIL, 2018, Art. 10). Ainda restam para esses docentes mais quatro anos para se qualificarem, caso queiram continuar sendo professores de Ensino Religioso. No pensamento de alguns autores sobre o processo de Formação Inicial e Continuada, o foco na área da(s) Ciência(s) da(s) Religião(ões) é muito pertinente diante de tudo que este componente curricular tem passado, pois é preciso que uma base teórica venha facilitar e direcionar o conhecimento valioso no âmbito educacional, cultural e religioso, com uma visão holística na concepção de compreender o ser humano como um todo. Esse é um dos momentos mais tranquilos pelos quais se situa o ER, que agora está saindo de um terreno pedregoso para florescer e frutificar num solo fértil e, assim, estender-se por todo o solo brasileiro, o que é muito salutar para o benefício de sua proposta norteadora, centralizada no ser humano e estendida em todas as escolas públicas. Ao longo da história da educação brasileira, sobretudo, no que diz respeito ao componente de Ensino Religioso, vinculado ao currículo escolar como parte integrante da formação dos educandos, é preciso ser entendido de norte a sul do Brasil como área da educação que oportuniza ao professor dialogar com os educandos sobre diversidade religiosa, respeito, reconhecimento, acolhida e convivência com as diferenças e diferentes formas de expressões religiosas de indivíduos e grupos (SIQUEIRA SILVA, 2018, p. 44).

A autora supramencionada é uma das pesquisadoras que têm primado pela defesa do Ensino Religioso não confessional, para que este se estabeleça no chão das escolas públicas. Maria José Torres Holmes

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O ensino religioso articulado com as demais áreas de conhecimento É na vivência do Ensino Religioso que se aprende e se demonstra uma atitude que dá estabilidade, abordando vários temas educativos relacionados à diversidade cultural e religiosa do nosso país e, ao mesmo tempo, apresentando, no processo de ensino e aprendizagem, que as religiões podem ser fontes de espaços para o diálogo e, principalmente, de respeito e humanização para não se transformem em fontes de opressão e exclusão, seguindo o caminho da intolerância e do desrespeito para com as diferenças. Nesse caso, esse Componente Curricular tem muito a contribuir como um referencial de diálogo e da boa convivência e, ao mesmo tempo, apresentando uma proposta significativa e interdisciplinar de forma amorosa e de inclusão para o desenvolvimento da cidadania, dialogando com as outras áreas de conhecimento com a finalidade de desenvolver um trabalho coletivo, proposto pelo Projeto Político Pedagógico da escola. Oliveira e colaboradores afirmam que a relação entre docentes e discentes das unidades escolares sobre o Ensino religioso e outros componentes curriculares, acontece de forma dialógica: O professor de Ensino Religioso, assim como os demais professores na unidade escolar, é uma pessoa que, em relação com os estudantes e com os conhecimentos próprios dessa área do conhecimento, contribui-nos muitos processos de aprendizagem realizados. Importa que saiba desencadear e ativar processos dialógicos cujos confrontos abertos e construtivos entre estudantes, conhecimentos e professores promovam o rigoroso respeito à liberdade e à consciência de cada um (OLIVEIRA et al. 2007, p. 125).

Quando se fala sobre educação e cidadania, não se pode deixar de citar o grande educador Freire, cuja contribuição no processo educativo é um marco referencial para o conhecimento de todos(as) os(as) educadores(as) do Brasil. “É através deste que se opera a superação de que resulta um termo novo: não mais educador do educando, não mais educando do educador, mas, educador-educando com educando com educador” (Freire, 2007, p. 79). Por outro lado, Oleniki e Daldegan afirmam que no campo educacional brasileiro, uma parte dos estabelecimentos escolares não oferece condições de desenvolver um trabalho pedagógico quanto à oferta deste componente curricular, em virtude de ser visto enquanto “uma história que o colocou por muito tempo numa via de mão única: ser um elemento evangelizador na escola. Isso fez com que seu lugar no espaço escolar ficasse distanciado dos demais saberes [...]” (OLENIKI; DALDEGAN, 2004 p. 9). Essas autoras defendem e afirmam que “todo educador busca as novas informações, conceitos e tecnologias para 56

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aperfeiçoar-se” (OLENIKI; DALDEGAN, 2004, p. 7). E, assim, é muito importante ressaltar a existência de conceituados teóricos e autores voltados pela defesa dessa área de conhecimento.

Considerações finais O Ensino Religioso, enquanto um processo de laicidade, é considerado como uma disciplina dialógica, respaldado pela Legislação de Ensino, sem quaisquer formas de proselitismo, e ainda fortalecido pelos PCNER elaborados pelo FONAPER, órgão que acompanha, organiza e dá subsídio para os professores, apoiando-os e apresentando propostas na sua formação em nível nacional, levando-lhes oportunidades de crescimento pessoal e intelectual. Ao docente é necessário muito estudo e muito comprometimento político e profissional, mas não apenas isso. É preciso ter uma ternura que se manifeste de forma afetiva e efetiva. No entanto, é necessário também que este ou esta tenha uma competência técnica e científica, que esteja sempre em busca de novos conhecimentos passando para os(as) estudantes um espírito de pesquisador que permita conhecer e dividir este conhecimento com o outro. Para muitos daqueles que não compreendem o verdadeiro sentido do Ensino Religioso não confessional, essa construção parece utópica. Para outros, não, principalmente para os(as) docentes que atuam nessa área de conhecimento e procuram dar tudo de si para que se aprimorem quanto ao entendimento desse componente curricular. Partindo desse princípio, o(a) educador(a) precisa estar atento, propiciando ao outro o despertar de novas esperanças. Tais ensinamentos conduzem os discentes para vivenciar esses valores aprendidos no espaço escolar e, por conseguinte, tornem-se semeadores da paz. Esse é o cuidado que se devem ter uns com os outros, o que significa dizer que isso é: cuidar do humano na educação. Tudo isso mostra que cuidar do outro é um ato de amor e reciprocidade, que conduz a pessoa a uma educação cidadã, voltada para a promoção do ser. Esse é um caminho possível através do Ensino Religioso. Em meio aos avanços no processo de construção deste componente curricular, observa-se que, no campo educacional brasileiro, pode-se dizer que o Ensino Religioso agora está tendo a oportunidade de se destacar dentro da escola entre os demais componentes, pois se encontra alicerçado e fundamentado no chão das escolas públicas. Nessa construção, verifica-se que esse ensinamento reúne o conjunto de conhecimentos ligados ao fenômeno religioso, os quais servem de fundamentos e de compreensão para que essa aprendizagem seja significativa para o entendimento das culturas apresentadas entre docentes e discentes. Maria José Torres Holmes

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Vale ressaltar que esses ou essas podem admirar e respeitar as diferentes culturas religiosas existentes numa sociedade diversificada e pluralista como a nossa, bem como serem compreensivos e abertos ao diálogo, respeitando e considerando as diferenças como oportunidades de desenvolvimento e de construção da própria identidade. A escola precisa encontrar meios que leve ao educando a busca de conhecer a si próprio, para conhecer o outro. Educar com solidariedade, com fraternidade, para a construção de uma cultura de paz e pela paz, de forma interdisciplinar e transdisciplinar.

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Referências BARCELLOS, Lusival Antonio; HOLMES, Maria José Torres; LELIS, Daniel. Ensino religioso. In: FERREIRA, Robson Rubenilson dos Santos. MELO, Rilma Suely Souza.(orgs.). Proposta Curricular Educação da Paraíba: educação infantil e ensino fundamental. João Pessoa: Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Paraíba, 2018, p. 364-380.

FILORAMO Giovanni; PRANDI, Carlo. As Ciências das religiões. [tradução José Maria de Almeida]. – São Paulo; Paulus, 1999. – (Sociologia e religião).

BRASIL, MEC. Base Nacional Comum Curricular - BNCC, Brasília, 2018.

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

PARAÍBA. Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia da Paraíba (SEECTPB). Proposta Curricular do Estado da Paraíba: Educação Infantil, Ensino Fundamental. João Pessoa, 2018b. Disponível em: https:// drive.google.com/file/d/ 1Nap1d3vMKcgTar_ jhFGS9R7M2ORqEXeh/view. Acesso em: 20 mar. 2021.

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ENSINO RELIGIOSO E DIVERSIDADE RELIGIOSA

A PERSPECTIVA DA DISCIPLINA DE ENSINO RELIGIOSO NA CONSTRUÇÃO DE UMA CULTURA DE PAZ NO ENSINO REGULAR

José Carlos Cezar da Silva Especialista em Ensino Religioso, realizado na Faculdade Famart. Graduado em Pedagogia , realizado na Facibra. Membro associado ao FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso).

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Maria da Penha Lima da Silva Graduada em Ciências das Religiões (UFPB). Mestra em Ciências das Religiões pelo PPGCR /UFPB. Pesquisadora do grupo Grupo de Pesquisa Formação, Identidade, Desenvolvimento e Liderança da Universidade Federal da Paraíba (FIDELID / UFPB), filiado à Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR) e ao PPGCR / UFPB. Integrante do FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso).

[email protected]

Como referenciar este capítulo: SILVA, José Carlos Cezar; SILVA, Maria da Penha Lima da. A perspectiva da disciplina de Ensino Religioso na construção de uma cultura de paz no Ensino Regula. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 61-69.

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Introdução O presente estudo trata da perspectiva da disciplina de ensino religioso na construção de uma cultura de paz no ensino regular. O ensino religioso está disciplinado em diversos documentos legais, sendo que a Constituição Federal de 1988, art. 210, parágrafo 1º, § 1º aduz: “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.” A religião faz parte da vida de milhares de pessoas e com seus credos baseiam e orientam suas vidas, não há como negarmos este fato, por isso mesmo se faz tão necessário oportunizar o diálogo no ambiente escolar, discutindo questões referentes ao respeito às diferenças e à igualdade. Para Holmes (2016, p. 7): É comprovado pela história e outras ciências que não existe nenhum povo sem religião ou sem tradição religiosa. As diversas religiões e tradições religiosas que foram se constituindo no decorrer da história fundamentaram a sua concepção de Transcendente, o sentido da vida e da morte, a maneira de ser e de agir no mundo, através de seus escritos e também a oralidade.

No encontro disto, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo XVIII determina a garantia da liberdade religiosa enquanto direito fundamental da pessoa humana. Quando se fala em cultura de paz, justiça e liberdade significam dizer que são fundamentos para a vida e que para serem efetivados precisam considerar a diversidade cultural, a ética, a religião e o saber viver com as diferenças. O ensino religioso está presente nas escolas e sistemas de ensino, o que favorece o conhecimento das tradições culturais religiosas, além de atender a necessidade do constante exercício da paz. Diante do exposto, o problema da pesquisa se constituiu em descobrir como o ensino religioso pode contribuir para a construção de uma cultura de paz no ambiente escolar. O objetivo geral do estudo foi de apontar caminhos para a compreensão da importância do ensino religioso na construção de uma cultura de paz. Nos últimos tempos, a violência nas escolas tem se tornado comum e acredita-se que a promoção da cultura para a paz seja mais adequada para enfrentar a situação que se apresenta. Além da violência, a escola convive com outras problemáticas que envolvem toda comunidade escolar, como evasão, reprovação, indisciplina, entre outros, que podem eventualmente ter como uma das raízes o furor físico e moral que atrapalham diretamente o desenvolvimento pleno desses indivíduos, não podemos esquecer que a escola é uma experimentação de sociedade dessa criança e desse adolescente e que em alguns anos terão que estar preparados para os percalços da vida adulta. José Carlos Cezar da Silva & Maria da Penha Lima da Silva

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

O estudo é relevante e se justifica uma vez que o ensino religioso pode favorecer a cultura da paz, pois a escola é um espaço de ampla convivência onde estão presentes fatores como diversidades e diferenças e o professor deve ter sempre em mente seu papel social no fomento ao desenvolvimento de um ambiente propício ao convívio e ao aprendizado. Eis o desafio e compromisso de todo educador/a: cultivar uma Cultura de Paz, pelo respeito e acolhida ao Outro; pelo cuidado para com a Vida em suas múltiplas e diferenciadas formas de ser e de se manifestar (CECHETTI; OLIVEIRA; HARDT, 2013, p. 226). Tal sentimento deve estar inserido internamente nas pessoas, promovido pelas famílias, sociedade e todos os segmentos da vida humana. Além do mais, este estudo é importante para comunidade escolar, pois promove informação atualizada sobre o tema, assim para acadêmicos, como fonte de consulta. Em 1999, a Organização das Nações Unidas promulgou a Declaração e Programa de Ação sobre uma Cultura de Paz compreendendo-a como conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos, formas de vida, relacionados a uma postura que promovesse harmonia no trato entre todos os grupos sociais. Ou seja, a cultura de paz se efetiva na implementação de mudanças que possam promover melhorias para a humanidade, como: justiça social, direitos iguais, combate ao racismo, tolerância religiosa, respeito à diversidade social, às minorias, ao meio ambiente, à política etc. (MILANI, 2003). Na escola a cultura de paz pode ser efetivada quando há o planejamento de ações educativas e interativas com base no diálogo e solução de conflitos por meio de ações não violentas. Para que isto ocorra, é preciso que a escola reflita sua prática pedagógica, estimulando relações e comportamentos estáveis, enfocando o trabalho participativo, coletivo e interdisciplinar que envolva toda comunidade escolar, professores, especialistas, gestores, alunado, pessoal de apoio, conselhos de pais e estudantes. A escola tem como função social preparar estes “pequenos” para a vida social e faz parte de sua responsabilidade motivar o exercício da convivência pacífica e solidária. Para a realização deste artigo, utilizou-se os métodos exploratório e descritivo. A técnica foi a pesquisa bibliográfica em fontes de consultas impressas e virtuais que tratam do tema. Os dados compilados foram apresentados de forma descritiva.

Ensino Religioso e cultura de paz No processo de colonização do Brasil, século XVI, a cultura predominante foi a europeia estendida à população que já habitava a colônia. Com a educação, também não foi diferente, foi idealizada de acordo com os costumes da Europa. Os padres jesuítas foram os responsáveis pela fundação das escolas em determinadas 64

A PERSPECTIVA DA DISCIPLINA DE ENSINO RELIGIOSO NA CONSTRUÇÃO...

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

regiões do Brasil. Naquela época, somente os filhos dos senhores de engenho tinham acesso à educação. A educação jesuíta não considerou a religiosidade dos índios, tampouco dos negros que vieram da África. Não havia aceitação de tais crenças. (ARANHA, 1996; CARVALHO, 1989). De acordo com Freitas (2018, p. 27) citando Holmes (2016): [...] a preocupação maior inicialmente era de que os indígenas fossem salvos, assim como despertá-los para uma religião diferente da sua, pois, se fossem catequizados seria mais fácil explorá-los para o trabalho na terra, já que a conheciam tão bem e o trabalho se mostrava tão necessário naquela situação de ambientação e conquistas.

Depois do encerramento do trabalho dos jesuítas foram criadas medidas para reconstruir o sistema educacional, porém os professores mestres ainda atuavam no sentido de reproduzir seus ensinamentos. Já no final no século XIX e XX, com a Proclamação da República houve vontade de elevar o país a um status econômico e social superior. A expectativa era de que a educação pudesse formar brasileiros saudáveis e capacitados. Os leigos começaram a fazer parte do ensino, o que fez com que o próprio Estado assumisse os encargos educacionais. Diversas reformas foram realizadas para se chegar ao modelo de educação existente hoje (ARANHA, 1996; CARVALHO, 1989). Segundo Passos (2007), no Brasil experimentamos três modelos de ensino religioso: O modelo catequético, teológico e o de ciências das religiões. O modelo catequético aplicado no ensino religioso é o mais antigo e se relaciona a contextos em que a religião tinha papel de poder e hegemonia na sociedade. Segundo Nascimento (2016, p.5) “Esse modelo vigorou no Brasil desde o período colonial até a Proclamação da República e sua posterior constituição em 1891 em que a o Estado tornou-se laico”. O teológico se efetiva no diálogo com as diversas sociedades, construídas em bases antropológicas e teologia moderna. Este modelo é voltado para a formação religiosa do indivíduo e procura, por meio de discurso religioso e pedagógico, dialogar com a sociedade e instituições religiosas, respeitando as referências teóricas e metodológicas (PASSOS, 2007). Já as ciências das religiões, em desenvolvimento, oferecem direcionamentos com base na autonomia epistemológica e requer a inclusão no currículo dos sistemas educativos. Esse formato, de acordo com Passos (2007, p.70) busca compreender a autonomia pedagógica e epistemológica do ensino religioso no sentido de que “[...] é uma questão de educação para a cidadania plena; sustenta-se sobre pressupostos educacionais e não sobre argumentações religiosas”. O ensino religioso também é discutido na LDB. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394, de 20 de dezembro de 1996, artigo 3º, inciso II José Carlos Cezar da Silva & Maria da Penha Lima da Silva

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infere que o ensino deve ser aplicado com liberdade de aprendizado, prática de pesquisa, divulgação da cultura, pensamento, arte e saber e em relação ao ensino religioso no Brasil, o art. 33 desta LDB foi alterado pela Lei n. 9.475, de 22 de julho de 1997, estabeleceu como disciplinar escolar, integrante no currículo da formação básica dos alunos. Deste modo, a partir da Lei n. 9.475/1997, art. 33 o ensino religioso passou a ser de matrícula facultativa, uma disciplina a ser oferecida em horários normais das escolas públicas, com o intuito de contribuir na apreensão de temas que favorecem o modo de vida, ética, formação para a cidadania, tolerância religiosa e das diferenças com vistas a convivência pacífica e cultura da paz. Vale ressaltar que o Brasil é um país laico, ou seja, não existe religião oficial, sendo responsabilidade do Estado em manter o direito à liberdade religiosa, pois, é um dos direitos fundamentais da humanidade previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. A liberdade religiosa é um direito fundamental que defende o pluralismo ou ausência de religião, direito este efetivado em consonância com o da dignidade da pessoa humana, do Estado Democrático de Direito (CF/88, ART. 1º). Cabe ao Estado proteger o exercício das mais diferentes religiões brasileiras. Porém, na prática observa-se intolerância religiosa, mesmo estando garantida em lei, como é o caso dos praticantes de cultos afro-brasileiros; dos cristãos católicos que presenciam ataques, chutes a imagens, monumentos, além de serem discriminados por heresia, idolatria. Já os cristãos evangélicos por charlatanismo, curandeirismo, estelionato. Houve o caso recente de malfeitores envolvidos com tráfico de entorpecentes em comunidades pobres do Rio de Janeiro que atacaram terreiros afros e expulsaram esses líderes religiosos da comunidade, puramente por preconceito e intolerância religiosa, uma vez que estes se declaravam cristãos evangélicos. Até mesmo os ateus sofrem discriminações, pela sua suposta falta de “Deus”. Inúmeros absurdos que têm se propagado por nossa sociedade e devem ser motivo de preocupação de todos a ponto de nos fazer refletir e alinhar posturas de enfrentamentos. Nesse contexto, o ensino religioso pode colaborar com a mudança de mentalidade que nossa sociedade almeja no tocante a uma convivência onde o outro pode ter sua liberdade religiosa ou não-religiosa assegurada como garante a lei. Nas escolas, o ensino religioso deve ser uma disciplina que promova o aprendizado dos alunos, assim como os demais aspectos de pressupostos morais. O acesso e a aprendizagem de saberes de diversos conhecimentos religiosos e não religiosos em uma educação integral precisa acontecer a partir de pressupostos científicos (POZZER; WICKERT, 2015, p.91). Desta forma, compreende-se que o ensino religioso estudado e pautado em conhecimento científico pode e deve provocar resultados como qualquer 66

A PERSPECTIVA DA DISCIPLINA DE ENSINO RELIGIOSO NA CONSTRUÇÃO...

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

outra disciplina, no caso do ensino religioso, possibilita ao aluno comparações, avaliações entre sistemas de referência, propondo ideias propositivas como a promoção da paz e formação plena dos alunos para uma vida voltada para o bem comum e coletivo. Dentro desta perspectiva que o ensino religioso foi tratado na BNCC – Base Nacional Curricular Comum, de dezembro de 2018, a qual determina que deverá ser ofertada em horário normal das aulas, com foco não-confessional. Ainda, a BNCC (2018) depreende sobre os objetivos do ensino religioso: possibilitar o aprendizado dos conhecimentos religiosos, culturais e estéticos a partir de manifestações religiosas que estejam presentes da realidade dos alunos; ofertar conhecimentos relativos à liberdade de consciência, crença com foco nos direitos humanos; promover competências para o diálogo nas mais diferentes perspectivas religiosas e seculares, com pluralismo de ideias e contribuir para que os alunos construam seus próprios sentidos de vida, valores, princípios éticos e cidadania. Ou seja, o intuito é a promoção de cultura de paz. De acordo com a UNESCO (Organização das Nações Unidas) a Educação para cultura da paz deve apontar para a prevenção de conflitos, violência, amparada por princípios como tolerância, solidariedade e respeito à vida. O Estado pode investir na cultura de paz, por meio de políticas públicas educacionais que promovam este objetivo. Desta forma, a paz deve ser entendida como processo contínuo, constante que requer mudança de comportamento, vida focada na cultura da paz e da não violência, levando a mudança de atitudes e ressignificação dos valores. Visa ainda motivar comportamentos pacíficos, resolução de conflitos sociais e conscientização dos direitos individuais e coletivos (LIMA, SOUSA, LIMA, 2019). É difícil pensar na educação, construção de valores, sem convivência e paz. As escolas são locais de conflitos e estes sempre existiram e existirão. Não há grupo ou sociedade que não se depare com ele, a questão é que esses conflitos devem sempre que surgirem ser tratados em suas resoluções de forma não violenta, mais dialogada, debatida e discutida, se assim for direcionado os efeitos podem ser bem positivos, uma vez que os alunos compreenderão que é sim, possível haver entendimento de pensamentos discordantes sem a necessidade de imposição de uma opinião em relação a outra com base na agressão seja ela qual for.

Considerações finais O objetivo deste artigo foi compreender a importância do ensino religioso na formação de alunos do ensino regular a partir da cultura de paz, da promoção ao José Carlos Cezar da Silva & Maria da Penha Lima da Silva

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

diálogo. O ensino religioso foi aplicado de forma doutrinária conforme demonstra a história e trajetória no país, mas que evoluiu, tornando-se área de conhecimento e com identidade própria, integrando o currículo pedagógico dos sistemas de ensino e recentemente ganhando um reforço tão necessário com a BNCC. Com relação à prática educativa do ensino religioso deve se pautar no diálogo, tolerância, respeito à diversidade, visando a informação, interpretação dos conhecimentos, aquisição de conteúdos, sendo enfatizado a necessidade de compreender as diferenças, diversidades, pluralidades a fim de atender a formação integral do cidadão. Entende-se que a batalha em benefício da paz constitui um desafio não apenas para a comunidade escolar, mas para a sociedade como um todo. Nos últimos anos tivemos vários avanços tecnológicos e em outras frentes, nunca na história da humanidade produzimos tanto em conhecimento, tecnologia, agricultura, artes, entre outros, não podemos regredir em relação a nossa moral, o homem precisa do homem para se comunicar e viver, temos uma relação de dependência e precisamos motivar uma cultura onde as pessoas saibam lidar com as diferenças e que tenham o direito de expressar essas diferenças, onde o grupo minoritário não seja sufocado pela maioria e que a sociedade perceba que é justamente na diferença que crescemos como povo, como cultura, como humanos no sentido mais literal que se conceba.

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A PERSPECTIVA DA DISCIPLINA DE ENSINO RELIGIOSO NA CONSTRUÇÃO...

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José Carlos Cezar da Silva & Maria da Penha Lima da Silva

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O PROFESSOR FRENTE À TAREFA DE MEDIAR O ENSINO RELIGIOSO Sua postura diante da diversidade religiosa em sala de aula

Edilson Antônio da Silva Graduação em História (UVA). Pós-Graduação em Ciência da Religião, Diversidade e Ensino Religioso (IESP).

[email protected]

Jéssica Cardoso da Silva Especialização em Ciências das Religiões (IESP). Cursando Letras (UFPB). Voluntária ativa do Projeto de Extensão Tessituras Negras: laboratório de leituras literárias e práticas pedagógigas (CCHLA/ UFPB).

[email protected]

Mônica da Mota Fonseca

Karina Ceci de Sousa Holmes

Graduanda em Pedagogia do Campo (UFPB).

Especialista em Ciências das Religiões (IESP).

Pós-Graduada em Ciências das Religiões (UNIESP).

Cursando Biblioteconomia (UFPB).

Graduada em Sociologia (UFRPE).

[email protected]

Membro do GECIMP.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: SILVA, Edilson Antônio da; SILVA, Jéssica Cardoso da; FONSECA, Mônica da Mota; HOLMES, Karina Ceci de Sousa. O professor frente à tarefa de mediar o ensino religioso: sua postura diante da diversidade religiosa em sala de aula. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 71-85.

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Introdução Entendemos por preconceito como um conceito pré-definido com opinião formada e acompanhada de atitudes e comportamentos negativos sobre algo que não conhece. Ou seja, uma opinião adotada sem conhecimento prévio (AURÉLIO, 2009). Esse fato pode ser visto nas atitudes que ofendem, tanto fisicamente quanto verbalmente., pessoas não agem ou praticam as mesmas escolhas religiosas, as mesmas opções sexuais, pessoas especiais entre tantas coisas consideradas pelos intolerantes como diferentes. E, no Brasil, mesmo considerado um país laico juridicamente e com liberdade de crenças assegurada pela Constituição de 1988, possui um cenário vasto de preconceitos e intolerância, principalmente quando se refere à intolerância religiosa. Percebemos que o principal conflito religioso é causado por incompatibilidade de opiniões, gerando as agressões físicas, verbais, depredação de templos que são considerados sagrados para uns e profano para outros grupos religiosos. Essa intolerância abrange todo o país e vem crescendo de forma acelerada, sendo necessária a criação de Leis para deter certas atitudes nocivas entre crenças. O Art. 1º da Lei 7.716, de 15 de Janeiro de 1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, que “serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” e o Art. 1º e Art. 20 da Lei nº 9.459 de 13 de maio de 1997, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, reza texto de mesmo teor. Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Observamos nas atitudes que a liberdade de expressão e de crença ainda não é algo real em sua prática. Mesmo assegurados por leis dispostas no Código Penal e nas escritas das Constituições Brasileiras, o Brasil continua sendo um país preconceituoso e intolerante, apesar da laicidade. Diante disso, compreendemos o quanto o Ensino Religioso (ER) nas escolas possibilita a disseminação à cultura de paz, de valores, de respeito e de diálogo. O presente trabalho tem como ponto central não as delimitações dos conceitos de preconceito, intolerância e ER, mas, a postura do professor diante da diversidade religiosa em sala de aula e destacar suas práticas educativas, suas dificuldades, desmotivação e satisfação. Sabemos que em se tratando de religião há, neste campo, certas barreiras, tanto da parte do professor (comunidade escolar) quanto dos próprios alunos (família) uma vez que a desinformação também contribui Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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para a construção de preconceitos e intolerâncias. A metodologia aplicada é de relato de casos e fundamentada por Freire, Boff, Vilhena entre outros.

Ensino Religioso Na empreitada de querer conhecer algumas das dificuldades encontradas pelos professores em sala de aula, ao ministrar as aulas de ER, acreditamos que devemos perpassar algumas concepções desse componente curricular a qual, a nosso ver, é uma reflexão crítica numa teia de significados considerando, pois, que a dimensão religiosa passa a ser compreendida como um compromisso histórico diante da vida e do Transcendente, conforme entendimento do FONAPER1. Desse modo, tem-se uma ressignificação nas relações do homem com a natureza. Isso porque, como ressalta os PCNER2, a função da escola é ajudar os educandos a se desvencilharem de estruturas opressoras que, de alguma forma, os impedem de seguir, de progredir e isso vai acontecendo na medida em que refletem e que buscam o conhecimento da pluralidade das manifestações religiosas existentes. (FONAPER, 2009, p. 6, 42 e 43).

Segundo Oro (2013, p.12), “desde os primeiros sinais do ser humano sobre a terra verifica-se a presença de objetos, desenhos e locais sagrados. O fenômeno religioso é parte integrante de toda história da humanidade”. Isso mostra o quanto esse componente curricular não pode ficar restrito ao levantamento das experiências dos alunos e nem à história das religiões como algo acabado. O ER deve sim, ao contrário, ser inserido num processo consecutivo de relevância da própria postura ética, frente ao desenvolvimento da construção do conhecimento entre professores e estudantes. Nesse sentido, Holmes (2016, p. 43) evidencia que: A experiência religiosa leva o ser humano a uma relação com o desconhecido, a qual se manifesta através da busca pelo transcendente, cuja liberdade se processa como um ser em construção que deseja superar sua condição de finito, para ter na sua totalidade o desejo de infinitude. Entretanto, isso pode corroborar para um sentimento de insegurança que o conduz à submissão e à dominação. 1 com.br

Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Ver com mais detalhe em: www.fonaper.

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Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso do FONAPER.

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Ao se pensar, dialogar, questionar, levantar hipóteses, dentre outras situações em sala de aula, isso pode contribuir não só para esclarecimentos de todos, mas, principalmente, possibilitar a ampliação do conhecimento no que tange a diversidade de crenças, de religiões e, certamente, de pessoas e ou de grupos em que em nada creem ou até os que ainda negam algum tipo de fenômeno sobrenatural. Considerando alguns instrumentos teóricos, advindos das ciências humanas, para que de forma interdisciplinar, sem nenhuma valoração, possamos ter uma ideia das diferentes manifestações religiosas dentro dos seus respectivos contextos históricos, sociais e culturais, por meio de uma breve releitura dos clássicos da sociologia, por exemplo, podemos identificar alguns conceitos que tentam dar conta do conceito de Religião. Porém, sem querer aqui enquadrar tais definições a partir de um referencial específico, analisamos como cada teórico adentrou nesse terreno tão íngreme, partindo do seu tempo histórico, do seu convívio político e econômico e, sobretudo, da visão social do seu lugar na concepção do mundo. Por isso, cada tentativa de exaurir tal conceito ora, ‘feriu’ o caráter sagrado, o tipo de hierofania ou, mesmo, quis retirá-lo do processo fenomenológico religioso, ora, reduziu a um caráter utilitarista e determinista, no que tange o comportamento dos ‘adeptos’. Entretanto, em linhas gerais, foi possível perceber que, de uma forma ou de outra, a palavra Sagrado, esteve presente em muitos dos conceitos de Religião. Para Eliade, por exemplo: O homem toma conhecimento do sagrado porque este se manifesta, se mostra como algo absolutamente diferente do profano. A fim de indicarmos o ato da manifestação do sagrado, propusemos o termo hierofania. Este termo parece cômodo, pois não implica nenhuma precisão suplementar: exprime apenas o que está implicado no seu conteúdo etimológico, a saber, que algo de sagrado se nos revela. Poder-se-ia dizer que a história das religiões, - desde as mais primitivas às mais elaboradas – é constituída por um número considerável de hierofania – por exemplo, a manifestação do sagrado num objeto qualquer, urna pedra ou árvore – e até a hierofania suprema, que é, para um cristão, a encarnação de Deus em Jesus Cristo, não existe solução de continuidade. Encontramo-nos diante do mesmo ato misterioso: a manifestação de algo “de ordem diferente” – de uma realidade que não pertence ao nosso mundo – em objetos que fazem parte integrante do nosso mundo “natural”, “profano” (ELIADE, 2008, p. 11).

É nessa compreensão de que é possível perceber a religiosidade como sendo inerente à natureza humana, que ela vem de uma necessidade de se crer, de encontrar sentido, segurança pessoal e que, do ponto de vista da fé, a religião é desse modo, admissão do sagrado no meio cultural, sobretudo. Assim sendo, por toda essa grandeza de conteúdo é que se inscreve o ER como um instrumento mediador na (re) significação de (pré) conceitos criados culturalmente e, por isso mesmo, tem-se assim um desafio importante para o professor do ER. Contudo, adverte Eliade (1959, p. 232): Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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No presente, historiadores das religiões estão divididos entre duas orientações metodológicas divergentes, mas complementares. Um grupo se concentra primariamente nas estruturas características dos fenômenos religiosos, o outro optou por investigar seu contexto histórico. O primeiro busca compreender a essência da religião, o último busca descobrir e comunicar sua história.

Seja como for, o ER, ao que pode ser compreendido, traz consigo um fio condutor de esperança, transcendência, liberdade, vida, vida com qualidade tornando alunos e professores seres de sonhos, sujeitos do mundo e, harmonizado com a finitude da vida: “a espiritualidade é uma das fontes primordiais, embora não seja a única, de inspiração do novo, de esperança alvissareira de geração de um sentido pleno e de capacidade de autotranscendência do ser humano” (BOFF, 2001, p. 9). Porque o conhecimento deve ser libertador, acima de tudo.

Diversidade religiosa e educação: assunto para ser levado a sério No período da colonização os portugueses trouxeram em sua bagagem sua doutrina religiosa e a fixaram como religião oficial. No entanto, existiam os nativos (índios), os quais já possuíam seus ritos, suas crenças religiosas. Desse modo, a presença religiosa diversa já era clara em nosso país. Nesse sentido, afirma Cecchetti (2013, p.20) que “diversidade é a marca do nosso mundo e se manifesta nos ecossistemas naturais e na própria humanidade”. O Brasil é um país plural e, em sua Constituição de 1988, tem assegurado nossos direitos, assim como mostra o preâmbulo da Constituição: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte. (BRASIL, 1988).

Entretanto, a desinformação sobre o que é Diversidade Religiosa, faz com que a intolerância e o preconceito se acentuem. A desinformação pode induzir o ser humano a negar ou a excluir o outro pelo fato de não aceitar as escolhas, nem mesmo, as maneiras pelas quais algumas pessoas se conectam com o transcendente. 78

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Diante disso, precisamos levar a Diversidade Religiosa à discussão, principalmente em sala de aula, para que alunos e professores se esclareçam acerca das religiões nas diversas culturas como descreve Vilhena “essa maneira de entender a cultura permite que, olhando para o mundo, detectamos facilmente a enorme diversidade cultural que é característica das construções humanas” (VILHENA, 2005, p. 37). Sendo assim, Fleuri (2013, p. 62 apud GEERTZ, 1989) enuncia que: Cultura pode ser entendida como um padrão de significados transmitidos historicamente, um sistema de concepções herdadas e expressas em formas simbólicas por meio das quais os seres humanos comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em relação à vida.

Acreditamos no respeito à pluralidade religiosa como sendo o caminho para a desconstrução de certos comportamentos discriminatórios, de conflitos, guerras, preconceitos e de intolerâncias. Pois, a diversidade está vinculada ao convívio de todos os indivíduos, tanto na família, trabalho, escolas, quanto nas igrejas, templos, terreiros e em todos os lugares em que haja grupos de pessoas. Desse modo, vemos que as pessoas necessitam conviver umas com as outras, mesmo pertencendo a crenças ou a religiões diferentes. No entanto, devemos ressaltar que as religiões não precisam ser entendidas, mas, respeitadas, mesmo diante de tantas denominações existentes, umas até mesmo chamadas de grandes religiões mundiais, como há também as denominadas de novas religiões. Portanto, elas também não deixam de ser religião, pois, todos têm o direito de acreditar no que lhe convém, de viver como melhor desejar, sem que sejam desprezados, julgados e até mesmos excluídos do mundo em que estão naturalmente inseridos, porque “uma das principais características das sociedades atuais é a crescente pluralidade de realidades sociais com suas especificidades culturais, éticos, relacionais, geracionais e comunicativas” (COPPETE, 2014, p. 69). Como convivemos diariamente com pessoas de pensamentos, de atitudes, de olhares e de comportamentos diferenciados dos nossos, necessitamos aprender a conviver com as diferenças e respeitar cada um com seu jeito de ser, isso deve ser um fato importante em nossa aprendizagem obtida não só na educação familiar como também ser apreendida fora dela, destacando assim em especial a escola, onde deve ser um ambiente neutro de opiniões, educando para a cidadania e aderindo a sensibilidade e aos direitos de cada um, além de preparar os alunos a conviverem com as diferenças. Holmes (2016, p. 179), observa que, “o Ensino Religioso, dialogando com a diversidade e construindo referências que levem a uma educação mais humana, mais cidadã”. Então, diante das políticas educacionais, Fuchs afirma que: Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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Na medida em que o ensino religioso passa a ser área de conhecimento e parte integrante da formação esse componente curricular passa a ser da escola e não só da denominação religiosa. A partir dessa compreensão, só há Ensino Religioso na escola na forma da legislação vigente. Não há diferentes concepções para esse componente curricular na escola, seja de gestão pública, privada ou comunitária, na medida em que a escola é pública na perspectiva de concessão do Estado. Mesmo assim, ainda não encontramos escolas com concepções diferentes, que não se enquadram nas diretrizes curriculares nacionais e nos parâmetros curriculares nacionais do Ensino Religioso (FUCHS, 2010, p. 50).

É necessário desde já, na sala de aula, explicar às crianças sobre a importância da diversidade, sobretudo, religiosa. Deve ser implantada desde cedo na criação, na educação doméstica e, em seguida, ou concomitantemente, complementada na escola. Com muita propriedade Coppete (2014, p. 69) nos informa que a “cultura e a educação são protagonistas neste espetáculo vivo, vibrante e inédito que é o dia a dia de cada um”. Dessa forma, percebe-se que o professor deve trilhar caminhos, fazendo pontes necessárias, lutar contra as imposições para poder trabalhar em sala de aula e assim prevalecer o respeito, a dignidade, o diálogo, a interação entre aluno e professor. Porém, de acordo com a Lei 9.475 no art. 33 da LDB/97 (Lei do Ensino Religioso), segundo destaca Oliveira (2007, p. 55) em seu texto sobre ela dizendo que é permitido. [...] a presença do Ensino Religioso confessional e interconfessional nas escolas públicas, com matrícula facultativa e considerando parte integrante da formação básica do cidadão, além de [...] assegurando o respeito da diversidade cultural e religiosa do Brasil, sendo vedadas quaisquer formas de proselitismo e cabendo aos sistemas regionais e regulamentação dos procedimentos para a definição dos conteúdos e das normas para a habilitação e admissão dos professores. Essa mudança na legislação representa um marco essencial na trajetória do Ensino Religioso, ao apresentar dois aspectos basilares: disciplina que assegura o respeito à diversidade cultural e religiosa brasileira.

Portanto, é imprescindível que haja professores capacitados e preparados para incluir em suas práticas o incentivo, a curiosidade, o desafio, o debate, a vontade dos alunos de se expor contribuindo com suas opiniões, críticas e vivências. Cabendo ao professor medidas que possibilitem e que façam prevalecer o respeito e a tolerância acerca da diversidade religiosa. Tudo isso, entretanto, implica necessariamente na formação continuada com um processo permanente e constante de aperfeiçoamento da prática pedagógica, colaborando, assim, com o processo de ensino e aprendizagem e ao mesmo tempo dando sustentação à formação inicial. 80

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Desafios de professores do ensino religioso A prática docente é naturalmente desafiadora e repleta de obstáculos, as dificuldades vão muito além de fazer jus à enorme responsabilidade de formar cidadãos críticos e reflexivos, cientes de que impasses acompanham esta profissão desde seu surgimento. Nossa pretensão é registrar que elas persistem em pleno século XXI. Este texto não daria conta da relação das atribuições e de todas as dificuldades enfrentadas por esta categoria. Então, podemos dizer que o educador deve em primeiro lugar se inteirar daquilo que o aluno conhece, não apenas para poder avançar no ensino de conteúdos, mas, principalmente, para trazer a cultura do educando para dentro da sala de aula. A partir daí ele pode desenvolver atividades que contemplem as dificuldades específicas, que possam despertar o interesse de perfis tão distintos, considerando as respectivas particularidades. Como não podia deixar de ser, com dificuldade, há quem aceite o desafio de combater essa cultura que reduz quase a invisibilidade a imagem do professor(a) e lhe atribui um percentual injusto no gráfico do que dá errado na educação. No contra fluxo, Oliveira (2007, p. 9) adverte: [...] Os professores são profissionais essenciais nos processos de mudanças das sociedades. Se forem deixados à margem, as decisões pedagógicas e curriculares alheias, por mais interessantes quem possam parecer não se efetivam, não geram efeitos sobre a sociedade. [...] Na sociedade contemporânea, as rápidas transformações no mundo do trabalho, o avanço tecnológico configurando a sociedade virtual e os meios de informação e comunicação incidem fortemente na escola, aumentando os desafios para torná-los uma conquista democrática e efetiva. Transformar práticas e culturas tradicionais e burocráticas das escolas que, por meio da retenção e da evasão, acentuam a exclusão social não é tarefa simples nem para poucos. O desafio é educar as crianças e os jovens, propiciando-lhes um desenvolvimento humano, cultural, científico e tecnológico, de modo que adquiram condições para enfrentar as exigências do mundo contemporâneo. Tal objetivo exige esforço constante de diretores, professores, funcionários e pais de alunos e de sindicatos, governantes e outros grupos sociais organizados.

Habitante deste tenso terreno chamado educação, o professor de ER sofre com suas intempéries, com inúmeras dificuldades, não só com relação à questão salarial, como também ao convívio diário com estresses, dentre outras. Em sua seara há também particularidades e problemas exclusivos. Antes que elencamos alguns desses problemas, reflitamos sobre a proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso-PCNER (2009, p. 13) afirma que: [...] Por tradições religiosas aqui compreende a sistematização do fenômeno religioso a partir das suas raízes orientais, ocidentais, africanas e indígenas, Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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que exige para seu ministério (ou mister) um profissional de educação sensível à pluralidade, consciente da complexidade sociocultural da questão religiosa e que garanta a liberdade do educando sem proselitismo. Esta proposta original responde à necessidade de fundamentar a elaboração dos diversos currículos do Ensino Religioso na pluralidade cultural do Brasil.

Acreditamos que o esforço para que se constate que a religião do Império é uma dentre tantas e que a pluralidade não deve ser ignorada é algo que deveria compor o perfil de qualquer educador, lamentavelmente torna-se parte das atribuições do professor de ER só apresentar incessantemente esta realidade não apenas para os alunos, mas para colegas de profissão, gestores e autoridades. De acordo com a BNCC (2018, p. 436): O Ensino Religioso deve atender os seguintes objetivos: A) Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos, culturais e estéticos, a partir das manifestações religiosas percebidas na realidade dos educandos. 1. Todavia, quando uma religião de matriz africana é representada por meio de uma atividade escolar, o preconceito se revela como nos exemplos/depoimentos que usaremos para ilustrar os itens a seguir. Em escolas da rede municipal de Bayeux, por exemplo, acerca das quais não citaremos os nomes por questões éticas, o que também será feito em relação aos nomes das pessoas envolvidas: “Pedi que os alunos confeccionassem maquetes de seus locais de culto[...] Surgiram maquetes que representavam as igrejas católicas e evangélicas e um ilê (casa de candomblé)”. 2. Os trabalhos foram expostos no pátio da escola, tudo havia sido acordado com o gestor, mas os demais profissionais ao verificarem as maquetes, comentavam diante do ilê: “como é que um professor de religião permite que um aluno faça isso? [...] O aluno ficou constrangido, só fotografaram as igrejas.” (Professor - A, 2017, sic.). B) Propiciar conhecimentos sobre o direito à liberdade de consciência e de crença, no constante propósito de promoção dos direitos humanos. Em relação ao que versa este tópico, em outra escola o Professor – B (2019, sic.) diz: “isso serve pra ser posto no vaso e dado descarga”. Ou seja, uma atitude descabida por parte de tal professor [...] C) Desenvolver competências e habilidades que contribuam para o diálogo entre perspectivas religiosas e seculares de vida, exercitando o respeito à liberdade de concepções e o pluralismo de ideias, de acordo com a Constituição Federal. “Ouvimos tenho liberdade para desenvolver meu trabalho, conto com o apoio da supervisão e gestão mesmo encarando alguns olhares atravessados 82

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dos colegas”. “Os alunos demonstram mais evolução neste aspecto em relação aos educadores”. (Professora - C, 2019, sic.). D) Contribuir para que os educandos construam seus sentidos pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania; Relacionamos essa fala à conformidade desse objetivo e à prática do professor: “quando a escola nos apoia, o trabalho dá frutos, realizamos apresentações que promovem o respeito usando uma linguagem plural [...] A semente acaba germinando [...]” (Professor – C, 2019, sic.). Tais relatos apontam a recorrência com que os profissionais que buscam desenvolver um trabalho com seriedade e compromisso, contemplando a multiplicidade, a pluralidade escolhendo promover o respeito, mesmo que eventualmente ou inevitavelmente poderão se deparar com algum tipo de retaliação ou frase preconceituosa ou algo desta natureza. Para que não sejamos radicais, diremos que as exceções devem existir, mas seria leviano desconsiderar este dado lamentável e vergonhoso, e obvio que não para por aí, como aponta o professor, Barbosa (2011, p. 22): [...] O grande desafio hoje dos professores de ensino religioso reside na difícil superação destas concepções visualizadas: o modelo catequético e o modelo teológico. Pois em ambas as abordagens existem em comum, a visão da passividade dos sujeitos que compõem o universo educacional. No modelo catequético, o professor transmite e o aluno absorve. No modelo teológico, os sujeitos (alunos e professores) não precisam dialogar, não precisam se colocar no lugar do outro e visualizar a religiosidade e a espiritualidade de um ponto de vista diferente, apesar do respeito e entendimento de que vivemos numa sociedade Plurirreligiosa.

As dificuldades se confundem com o que é inerente à atividade docente e, em certa medida, vamos incorporando à nossa prática ao ato de diluir incansavelmente estes obstáculos. Nesse sentido, a importante colaboradora, pesquisadora e defensora do ER, a professora Maria José Torres Holmes ressalta em sua obra Ensino Religioso: Esperanças e Desafios: reflexões da práxis do cotidiano escolar, a seguinte reflexão: [...] É que todos esses entraves são reflexos de uma herança que nos foi deixada desde a era colonial e que vem incomodando os diversos segmentos da sociedade. Uns veem como algo que nada acrescenta no processo educacional. Enquanto para outros esse componente curricular é válido nas escolas e muito pode contribuir na formação cidadã.

Em consonância com o que propõe Holmes (2016), o ER enquanto componente curricular que objetiva evitar qualquer forma de proselitismo, promovendo o respeito a uma cultura tão diversa e tão plural, persiste, resiste e segue Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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colaborando com o processo educacional brasileiro superando gradativamente seus desafios.

Considerações Finais Concluindo, podemos dizer que, mesmo aqui, numa breve explanação sobre essa temática tão pontuada em vários espaços sociais, sobretudo, nas salas de aulas, há, sem dúvidas, uma caminhada ainda bastante longa tanto das posturas dos docentes, em suas construções e desconstruções, no que tange às metodologias a serem aplicadas, quanto na ministração das aulas do ER. E quanto da necessidade de uma consciência coletiva no que se referem aos conceitos, as histórias de crenças religiosas e das próprias práticas religiosas. Desse modo, acreditamos como também pregava Paulo Freire que, o conhecimento de mundo na interação dos sujeitos, de educadores e educandos, onde há de fato, a possibilidade de transformação da sociedade. Logo, o ER pode contribuir na escola no sentido de ajudar os educandos a alcançar clareza intelectual a respeito da discriminação religiosa, possibilitando a ampliação do conhecimento. Além do desafio que o professor encontra em sala de aula, é importante salientar que mudanças podem acontecer no momento em que o professor busca transformar certos acontecimentos como forma de aprendizagem, permitindo, assim, que seus alunos possam ser pessoas capazes de dialogar, de debater e, principalmente, de não ter vergonha de expor o que defende no que acredita e a religião que segue.

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Edilson A. da Silva, Jéssica C. da Silva, Monica da M. Fonseca & Karina C. de S. Holmes

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DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO RELIGIOSO Desafios à prática docente

Maria Dalva de Oliveira Araujo Mestrado em Ciências das Religiões (UFPB). Especialista em: Educação Básica (UFCG), Gestão Escolar (F. Pitágoras) e Novas Tecnologias na Educação (UEPB). Professora aposentada e Supervisora Educacional aposentada. Membro do FONAPER.

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Como referenciar este capítulo: ARAUJO, Maria Dalva de Oliveira. Diversidade religiosa no ensino religioso: desafios à prática docente. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 87-98.

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Introdução O fenômeno religioso é algo que perpassa a história da humana como pode ser percebido na filosofia da Grécia Antiga, que buscava explicação dos fenômenos a partir da natureza e dos deuses. Naquela época, já havia preocupação com relação a uma mudança de paradigma conforme mostra o pensamento socrático que convidava a filosofia a descer do céu e instalar-se nas cidades, nos lares, incluindo o estudo da vida, das coisas boas e más. No contexto brasileiro isto também aconteceu e, exemplo disso, é a inserção do Ensino Religioso (ER) na educação, que tem raízes desde o início da história com a chegada dos colonizadores. Sua operacionalização começou com a instrução dos jesuítas no período colonial, perpassando, durante o transcurso histórico, a catequese, a proibição, o retorno com base legal e, atualmente, encontra-se firmada como uma das 05 (cinco) áreas de conhecimento no âmbito das Diretrizes Curriculares Nacionais. Nesse contexto, a homologação da lei nº 9.394/96, que define as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) inseriu o ER na educação básica do cidadão e da cidadã brasileiros/as, em seu artigo 33. Todavia, a versão original deste artigo abriu margem para uma série de discussões em relação ao ER uma vez que deixava este componente curricular à mercê de instituições ligadas às religiões. Por esta razão, a partir da mobilização de grupos defensores de um ensino religioso laico, que possa abranger a diversidade cultural e religiosa, foi homologada a nova lei nº 9.475/97 que deu nova redação ao referido artigo. A busca por um ER laico, que considere a diversidade implícita na origem da população brasileira tem sido um processo de lutas dos profissionais da área em prol de inserir este componente no currículo escolar equiparado aos demais, embora com a manutenção do caráter facultativo da matrícula, fato que tem gerado desafios à prática docente, inclusive no sentido de conquistar os/as estudantes para participarem das aulas. Alguns se recusam justificando que são ateus e outros que já possuem sua religião e não precisam das aulas de religião, conforme depoimentos de docentes (ARAUJO, 2014). Isso demonstra que há pouca clareza com relação aos pressupostos teóricos e metodológicos deste componente curricular que ainda se confunde com as tradicionais aulas de religião. Especialmente, no que se refere aos conteúdos e a prática parece consistir um desafio em face da dinâmica da sociedade que se transforma, cotidianamente, à luz da disputa e de conflitos, mas também de consensos possíveis, desde que não absolutos. Desse modo, as definições de conteúdos e de práticas abrangem esse processo dinâmico em que os diversos olhares e os diversos fazeres possam ser considerados. Maria Dalva de Oliveira Araujo

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Nesse sentido, como contemplar as diversidades e, dentre elas a religiosa, na prática docente no âmbito do Ensino Religioso? Isto constitui um leque de desafios em face dos resquícios históricos da dominação de uma religião, bem como pela pluralidade cultural e religiosa que se acentua continuamente. Por outro lado, também favorece o conhecimento e o respeito dessas diversidades, especialmente a religiosa, pela sua presença marcante na sociedade e até mesmo dentro dos próprios grupos familiares. Este trabalho, portanto, contempla um recorte de dados coletados durante o mestrado em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), especificamente, do item Perfil dos Estudantes Colaboradores (EC) contido no questionário semiestruturado que foi aplicado junto a 41 (quarenta e um) estudantes voluntários, de uma turma de 7º ano do ensino fundamental numa escola pública estadual na cidade de Campina Grande/PB. Desse modo, temos como objetivos: 1) refletir conceitos de diversidades na dimensão do pensamento complexo; 2) relatar a diversidade constatada numa turma de 7º ano do ensino fundamental; e 3) discutir aportes da atual Base Nacional Comum Curricular (BNCC), apresentando elementos sinalizadores para uma prática pedagógica permeada pelo respeito às diversidades. Inicialmente, recorremos de forma sucinta, ao entrelaçamento de olhares sobre o conceito de diversidade (s), em algumas áreas do conhecimento, das quais destacamos: a biologia e a filosofia, entre outras que contribuíram para nossas reflexões.

Diversidade religiosa no ensino religioso: entrelaçando olhares Refletir sobre o conceito de diversidade religiosa envolve adentrar uma dimensão mais profunda na qual passamos a considerar a expressão em seu plural, ou seja, diversidades. No âmbito da história da humanidade, partimos do pressuposto de que somos seres humanos possuidores dessas diversidades em nosso próprio DNA. Isto, em decorrência do fato de sermos concebidos por meio da união de um homem e uma mulher, oriundos/as de famílias e culturas diversas, muitas vezes, de matrizes étnicas também diversas. Em nossa constituição vamos, paulatinamente, consolidando as diversidades na medida em que formamos nossa personalidade que é ímpar. Se observarmos uma família constituída por vários filhos do mesmo pai e da mesma mãe biológicos, que receberam a mesma educação e se desenvolveram no mesmo contexto social, vamos constatar que cada um é diferente do outro. 90

DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO RELIGIOSO

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Trata-se de um processo em que há conexão da unidade na diversidade e da diversidade na unidade. Esta dimensão profunda da diversidade pode ser ilustrada pela “imensidade de línguas e religiões existentes no mundo, que embora praticadas em locais distantes e por povos diferentes, ou distintos, apresentam traços comuns” (SMARJASSI, 2011, p. 240). Considerando esta questão, na perspectiva da história humana como parte da história dos seres vivos, encontramos no campo da biologia, referência à diversificação destes seres com a seguinte explicação: A história dos seres vivos não é uma progressão ou avanço em direção a algo melhor; é apenas a história da conservação dos diferentes modos de viver, que se mantiveram porque os organismos que os viveram assim o fizeram até se reproduzir. A história humana é um fenômeno dessa mesma espécie; daí a grande diversidade de culturas que surgiram como diferentes modos de conviver no devir da humanidade (MATURANA; VERDEN-ZOLLER, 2004, p. 13).

No olhar destes biólogos é sustentada a ideia do caráter inerente da diversidade no desenrolar do processo de humanização do ser humano. Um processo que acontece permeado por certo modo de viver e conviver que culmina com a consolidação de determinada cultura. Contribuindo com esta linha de raciocínio complexo e a necessidade de lidar com a diversidade de forma respeitosa, em que uma visão de mundo não se sobreponha a outra, encontramos o seguinte olhar no âmbito da filosofia: “não dá para formar pessoas desconectadas do mundo e de outras pessoas, fixando sua visão só em si mesma, sem considerar a visão ampliada do Todo. Não se vê como o Todo, mas inserido nele, fazendo parte dele” (RÖHR, 2013, p. 246). Este raciocínio é extensivo ao contexto social em seu todo, pois envolve pessoas, suas relações, interações e interdependência, porém, sem dependência. Embora dependa do outro para existir desde a sua concepção, o ser humano tem um potencial de se tornar um ser ímpar. A dependência em termos do outro, também existe até certo tempo da vida, mas uma que é contínua é a dependência da natureza, dos seus recursos naturais que nos garantem viver, como é o caso da água e dos alimentos, por exemplo. Sem eles não há possibilidade de vida e, pena que nem sempre temos a consciência disso. Estas breves reflexões ilustram a dimensão profunda da prática pedagógica no componente curricular ER. Tal dimensão é contemplada no olhar da UNESCO, enfatizando uma nova perspectiva epistemológica para este componente curricular da educação básica, que envolve a construção, reconstrução, desconstrução do conhecimento, bem como sinaliza como imperativo “a reforma do pensamento sobre o modelo de ER, baseado numa educação para a compreensão humana, como missão espiritual da educação, que busca a solidariedade intelectual, espiritual e moral da humanidade” (SMARJASSI, 2011, p. 249). Maria Dalva de Oliveira Araujo

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Isto envolve a necessidade de, para além do compromisso, o comprometimento de cada ser humano consigo, com os outros e com tudo que faz parte da vida no sentido da garantia da qualidade do viver. A pesquisadora referida anteriormente alerta para a importância de que o ER possa: Estar em sintonia com a epistemologia contemporânea delineada pelo pensamento da complexidade e da religação dos saberes, deverá resguardar a alteridade no intuito de se erradicar a intolerância, o fanatismo, o fundamentalismo para defender o respeito ao outro como via de se alcançar a unidade na diversidade (SMARJASSI, 2011, p. 250).

De acordo com este argumento, é ressaltado o valor de uma prática pedagógica no âmbito do ER que possibilite a conexão de saberes, de visões e de encontros. A autora faz referência ao conhecimento nesta área, na perspectiva do pressuposto teórico filosófico, em que sejam superadas atitudes limitadoras que fragilizam as relações e interações entre a humanidade, tais como: intolerâncias, fanatismos e o fundamentalismo religioso. Este último se traduz numa forma fechada de compreensão doutrinária. Nessa direção, a pesquisadora afirma: “entendemos que o conhecimento religioso no ensino religioso deve ocorrer por meio do encontro do sujeito com o outro, com a natureza, com o diferente, com a arte, com a literatura, com a metáfora, com o transcendente e consigo mesmo” (SMARJASSI, 2011, p. 252). No sentido da transposição didática destas reflexões no âmbito do ER encontramos sintonia com algumas proposições da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), documento norteador para a elaboração dos currículos nas várias esferas, incluindo, a esfera escolar. Dentre os componentes curriculares, está incluído o ER que, atendendo a exigência legal, necessita contemplar a diversidade, não somente a religiosa, mas as diversidades implícitas no processo de desenvolvimento da humanidade. Diante disso, em termos de ilustração, destacamos: É sempre importante ressaltar que o Ensino Religioso deve tratar os conhecimentos religiosos a partir das diversas culturas e tradições religiosas, baseando-se em pressupostos éticos e científicos, sem privilégio de nenhuma crença ou convicção. Por esse motivo, a BNCC reafirma a interculturalidade e a ética da alteridade como fundamentos teóricos e pedagógicos do Ensino Religioso, porque favorecem o reconhecimento e respeito às histórias, memórias, crenças, convicções e valores de diferentes culturas, tradições religiosas e filosofias seculares de vida (BRASIL, 2017, p. 367).

Como podemos perceber, estas orientações abrangem um leque de aspectos relacionados ao processo de constituição dos seres humanos e suas diversas culturas. Em se tratando da realidade brasileira, dada à diversidade étnica que 92

DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO RELIGIOSO

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

integrou a constituição da sua população, consiste um aspecto fundamental para promover uma prática no ER articulada pelo encontro harmonioso de todos estes saberes e fazeres. Ilustrando a dimensão dessas diversidades, apresentamos parte dos resultados de nossa pesquisa que retratam a realidade de uma turma de 7º ano do ensino fundamental de uma escola pública em Campina Grande, na Paraíba.

Diversidade em sala de aula: realidade de uma turma de 7º ano do ensino fundamental No que se refere à diversidade em sala de aula, coletamos dados a partir do questionário semiestruturado aplicado junto a 41 (quarenta e um) Estudantes Colaboradores (EC) do 7º ano que, voluntariamente, se dispuseram a participar. Após cumprir as exigências do Comitê de Ética em Pesquisa, foi possível iniciar o trabalho. Dentre os dados relacionados ao perfil destes EC, que foram identificados por esta sigla seguida da sequência numérica, escolhemos 04 (quatro) tabelas construídas cujos dados podem ilustrar o tema aqui proposto. Iniciamos pela Tabela 1 - Grupos Familiares dos Estudantes, seguida da Tabela 2 – Escolaridade dos Pais, Tabela 3- Renda Familiar e, finalmente, Tabela 4 – Religiões praticadas pela família. Tabela 1: Grupos Familiares dos Estudantes Grupos familiares constatados

N

%

Pai, Mãe e Irmãos Mãe, Padrasto e Irmã Mãe Mãe e Irmãos Mãe e Avó Pai, Mãe, Irmão, Avó e Tio Avó Avô e irmão Avós Avó, Mãe e Primos Avós, Mãe, Tia e Irmã Total

16 7 5 4 2 2 1 1 1 1 1 41

39.02% 17.07% 12.20% 9.76% 4.88% 4.88% 2.44% 2.44% 2.44% 2.44% 2.44% 100.00%

Fonte: Dados da pesquisa (ARAUJO, 2014, p. 89). Maria Dalva de Oliveira Araujo

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Os dados da tabela 1 permitem visualizar a diversidade da organização familiar dos EC em suas realidades de vida. Em termos de percentuais, observamos que a maioria dos estudantes possui um grupo familiar composto por pai, mãe e irmãos (39.02 %). Entretanto, esta maioria é seguida por grupos familiares diversificados. Sete dos estudantes (17,07%), no lugar do pai, possui padrasto e cinco convivem apenas com a mãe (12.20%). Quatro (9.76%) convivem com a mãe e irmãos. Sete estudantes, que corresponde a 17,07% também declararam a presença de outros parentes no grupo familiar, como avós, tios e primos. Portanto, a tabela 1 ilustra a diversidade de grupos familiares constatada no contexto vivido pelos estudantes. Esse dado parece importante pelo fato de ilustrar a diversidade até mesmo geracional na organização do grupo familiar, pois, na medida em que convivem com avós, por exemplo, de certa forma são influenciados em suas percepções. A tabela 2, referente à escolaridade da família, também retrata a diversidade em termos cultural. Tabela 2: Escolaridade dos pais Pai

Escolaridade Ensino Fundamental Incompleto Ensino Fundamental Completo Não frequentou escolar Ensino Médio Incompleto Ensino Médio Completo Ensino Superior Incompleto Ensino Superior Completo Não responderam Total

Mãe

N

%

N

%

13 4 4 1 6 2 6 5 41

31.71% 9.76% 9.76% 2.44% 14.63% 4.88% 14.63% 12.20% 100.00%

15 6 0 3 9 2 6 0 41

36.59% 14.63% 0.00% 7.32% 21.95% 4.88% 14.63% 0.00% 100.00%

Fonte: Dados da pesquisa (ARAUJO, 2014, p.89)

Os dados referentes à escolaridade dos pais revelam que a maioria dos pais (31.71%) e das mães (36.59 %) possui o ensino fundamental incompleto, sendo que as mães são maioria. Dentre as mães, nenhuma delas deixou de frequentar a escola enquanto quatro dos pais (9,76%) nunca frequentaram. Com relação ao ensino superior houve empate entre pais e mães tanto em termos de ensino superior concluído (14,63%) quanto incompleto (4,88%). No que diz respeito à renda familiar média das famílias dos estudantes, as respostas foram apresentados na tabela 3 e também refletem a diversidade: 94

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Tabela 3: Renda Familiar Renda Familiar

N

%

Menos de 1 salário mínimo 1 salário mínimo Até 3 salários mínimos Mais de 3 salários mínimos Não respondeu Total

6 20 11 2 2 41

14.63% 48.78% 26.83% 4.88% 4.88% 100.00%

Fonte: Dados da pesquisa (ARAUJO, 2014, p. 91).

Como mostra a tabela 3, a maioria das famílias dos EC, sobrevive com a renda de um salário mínimo (48,78%) e a minoria (4,88%) conta com renda familiar acima de três salários mínimos. Entre elas, onze (26,83%) possuem uma renda de até três salários mínimos. Dentre os dados, também observamos que seis das famílias (14,63%), possuem renda inferior a um salário mínimo, sem contar dois estudantes (4,88%) que não responderam. No intuito de ampliar a fotografia da diversidade presente em apenas uma turma do 7º ano do ensino fundamental, ilustramos com a Tabela 4, a diversidade de religiões praticadas pela família. Tabela 4: Religiões praticadas pela família. Sua família pratica alguma religião?

N

%

Nenhuma Católica Evangélica Evangélica/Católica Igreja Universal do Reino de Deus Protestante Não respondeu Total

7 17 10 1 1 1 4 41

17,07% 41,46% 24,39% 2,44% 2,44% 2,44% 9,76% 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa (ARAUJO, 2014, p. 91-92)

A Tabela 04 mostra a diversidade religiosa e não religiosa vivenciada pelos EC. A maioria declarou que sua família pratica a religião católica (41,46%), seguida da religião evangélica (24,39%) e sem nenhuma religião (17,07%). Na sequência vemos ainda: protestante, Igreja Universal do Reino de Deus e Evangélica/Católica na mesma família (2.44%). Além disso, 9.76% não responderam. Maria Dalva de Oliveira Araujo

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Enfatizamos que, no conjunto, as respostas dos EC, revelaram que não há um único padrão familiar, conforme tradicionalmente é afirmado: pai, mãe e filhos. Por outro lado, em termos de escolaridade e perfil sócio econômico também encontramos a diversidade, mesmo se tratando da realidade de uma escola pública. Da mesma forma, ocorreu com a experiência no campo religioso dos grupos familiares, em que observamos um percentual considerável que declarou não praticar nenhuma religião (17,07%), bem como a existência de diversidade religiosa no interior do mesmo grupo familiar, conforme declarou o EC 06: “Religião evangélica eu e minha mãe e meu pai católico”. Estas questões precisam ser consideradas nas práticas do ER, tendo em vista que abordar o fenômeno religioso, muitas vezes, abrange uma gama de experiências que até mesmo os profissionais acabam aprendendo na prática. Isso remete à experiência antropológica da pessoa humana, pois defende que, a própria ideia de ateu, em si, admite a existência de Deus que se nega crer. Nesse sentido, é comum em todas as sociedades e culturas, o ser humano ser considerado um ser religioso, mesmo que não reconheça isso (HOLMES, 2010, p. 40). Os argumentos desta pesquisadora revelam a presença marcante das religiões na sociedade, como também remete às reflexões da introdução em relação aos pensadores da Grécia Antiga que tinham os deuses e a natureza como base para seus estudos e questionamentos. Daí que nasceu a própria ciência. Enfim, as experiências reveladas nas tabelas de 1 a 4 demonstraram a necessidade de que o ER utilize a pesquisa, em sua prática buscando, inicialmente, uma aproximação à experiência religiosa, ou não religiosa dos estudantes e suas famílias. Isso implica no estudo das diversidades relacionando-as à própria constituição do ser humano, ao fenômeno religioso no contexto familiar e na sociedade, considerando também as matrizes étnicas que deram origem a nossa história. A partir dos dados aqui revelados e das reflexões suscitadas passamos às considerações.

Considerações A prática pedagógica no ER pressupõe sempre novas perspectivas, constantemente, em face da dinâmica das diversidades não somente já existentes, mas que surgem a cada dia. Diversidades estas, que não estão fora do ser humano, como costumamos pensar, mas implícita em sua própria constituição. Está na nossa origem étnica, no nosso DNA e, infelizmente, muitas vezes, nos deixamos influenciar pelo discurso dominante que supõe a supremacia de uns sobre os outros quer seja em termos de etnia, classe social, gênero, entre outros aspectos. 96

DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO RELIGIOSO

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Tudo isso precisa ser contemplado nas práticas educativas, especialmente, no componente curricular ER pela sua possibilidade de adentrar em questões profundas do ser humano, em seus encontros que envolvem saberes e fazeres. Esses encontros precisam ter como ponto de partida o encontro consigo mesmo, a começar pelo próprio professor. A dinâmica exigida na prática pedagógica do ER, em consonância com a complexidade deste componente curricular, envolve adotar a perspectiva do pensamento complexo, no qual os fenômenos tanto humanos quanto da natureza sejam considerados não superficialmente, mas em profundidade para que possa encontrar conexão com a vida vivida e melhorar as relações e interações, tendo em vista que não vivemos isolados e, sim, conectados com tudo e com todos, formando um Todo.

Maria Dalva de Oliveira Araujo

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Referências ARAUJO, Maria Dalva de Oliveira. Ensino religioso como aporte da formação humana: percepção de estudantes do ensino fundamental. (Dissertação do Mestrado em Ciências das Religiões) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2014. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: https://presrepublica.jusbrasil. com.br/legislacao/109224/lei-de-diretrizes-ebases-lei-9394-96. Acesso em: 06 nov. 2019. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a base. Brasília, MEC/ CONSED/UNDIME, 2017.

MATURANA, Humberto; VERDEN-ZOLLER, Gerda. Amar e brincar: fundamentos esquecidos do humano. Tradução: de Humberto Mariotti e Lia Diskin. São Paulo: Palas Athena, 2004. RÖHR, Ferdinand. Educação e Espiritualidade: contribuições para uma compreensão multidimensional da realidade, do homem e da educação. Campinas /SP: Mercado das Letras, 2013. SMARJASSI, Célia. Educação e Espiritualidade: limites e possibilidades de um encontro pedagógico no ensino religioso. In: Rev. Pistis Prax., Teol. Pastor., Curitiba, v. 3, n. 1, p. 239268, jan./ jun. 2011.

HOLMES, Maria José Torres. Ensino religioso: esperanças e desafios – reflexões da práxis do cotidiano escolar. Florianópolis: Saberes em diálogo, 2016.

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DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO RELIGIOSO

ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NAS ESCOLAS PÚBLICAS Religião, cultura, religiosidade e espiritualidade

Maria José Torres Holmes Doutoranda em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB). Mestra em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB). Especialista em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB). Realizou Curso em EAD: Administração da Educação (PPGCE/UFPB), e se formou em Pedagogia pela mesma Universidade.

Mônica da Mota Fonseca Graduanda em Pedagogia do Campo (UFPB). Pós-Graduada em Ciências das Religiões (UNIESP). Graduada em Sociologia (UFRPE).

[email protected]

Integrante do FIDELID (UFPB), filiado à Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR). Membro do FONAPER.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: HOLMES, Maria José Torres; FONSECA, Monica da Mota. Ensino Religioso na educação de jovens e adultos nas escolas públicas: religião, cultura, religiosidade e espiritualidade. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 99-109.

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Introdução Agora, tendo em vista uma visão mais apurada sobre as questões religiosas e da espiritualidade, ratifico a importância da minha inquietação inicial no sentido de trazer esses caminhos como um esteio de ressignificação de sentidos e, que, assim, o idoso poderá, nessa perspectiva, ter dias mais felizes e (re) confortantes enquanto estiverem por aqui. (FONSECA, 2019, p. 5).

Falar da Educação de Jovens e Adultos é Valorizar a dimensão da existência humana, a partir de reflexões que dão sentido à vida, através dos valores que auxiliam o indivíduo a se reconhecer enquanto ser humano afetivo, social, físico e espiritual, refletindo sobre suas reações consigo mesmo e com o outro e com toda diversidade ao qual está inserido no mundo, respeitando e dialogando com as diferenças. A educação de forma participativa envolve o ser humano num mundo de conhecimento, possibilitando aprender com as experiências de vida diária, em que permitem as pessoas a se questionarem, encontrarem respostas e ao mesmo tempo aprenderem com as situações concretas do seu cotidiano. Os/as estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA), ao se entrosarem com o estudo sobre o Ensino Religioso vão aprofundar esses conhecimentos no seu dia a dia no espaço escolar. A partir dessas vivências é que vão compreender todo o processo de alteridade e o porquê do Ensino Religioso no chão das escolas públicas. Do ponto de vista didático, nos deparamos com conceitos diversos, seja a partir da História da Religião, seja de cunho mais sociológico, ou ainda antropológico. Seja como for, a dimensão significativa em que se insere a palavra religião, no contexto da humanidade, é de fato, longa e profunda e dinâmica. Exemplo disso são as práticas religiosas, ou fatos sociais, como missas, cultos, batizados, o luto, dentre outros. (FONSECA, 2019, p. 13).

Nesse caso é preciso que o docente procure sensibilizar a turma diferenciando o conhecimento religioso da religiosidade e da espiritualidade. De acordo com o Caderno Temático do FONAPER (nº. 1, p. 22), “O objetivo é apresentar o Transcendente, tal como é concebido nas mais variadas culturas e tradições religiosas”. Portanto, não podem ficar excluídos desse processo de aprendizagem, já que o Ensino Religioso faz parte da formação básica do cidadão. A cultura geral elaborada é um importante instrumento de luta para as minorias [...], trata-se de incorporar uma abordagem do ensino/ aprendizagem que se baseia em valores e crenças democráticas e procura fortalecer o pluralismo cultural num mundo cada vez mais interdependente. Por isso que a educação de adultos deve ser sempre uma educação multicultural, Maria José Torres Holmes & Mônica da Mota Fonseca

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uma educação que desenvolve o conhecimento e a integração na diversidade cultural. FONAPER (2000).

Nessa caminhada da EJA observamos a grande diversidade no contexto da sala de aula, do ponto de vista, não só dos aspectos sócio-conômico-cultural-religioso, mas, principalmente na faixa etária, pois temos estudantes adolescentes, jovens, adultos e, mas, essencialmente idosos/as. Esses/essas são pessoas que em sua maior parte do tempo não tiveram oportunidade na vida de sequer sentar-se num banco de escola. Muitos, entre estudar e trabalhar, não teve outra escolha e optaram por essa última, por tratar-se da questão da sobrevivência, enquanto que os estudos foram ficando para traz. Entretanto as oportunidades vão chegando, embora tardiamente, porém este é o grande sonho que é aprender a ler e a escrever, como muitos dizem: agora vou aprender, pois quero aprender a assinar o meu nome! O acesso ao conhecimento possibilita ao surgimento de uma nova sociedade. Portanto é importante conhecer as diversas concepções de mundo, presentes nas diferentes tradições religiosas, envolvendo os aspectos sociais, políticos, econômicos e ambientais de determinadas culturas. Assim sendo, de acordo com alguns relatos de docentes, afirmam dizer que não é fácil trabalhar com Ensino Religioso na EJA, pois algumas opiniões de estudantes afirmam que: Eu já tenho a minha religião, para que outra? Ou até mesmo: Professora essa aula faz a gente mudar de religião? Porque se for isso eu não estudo! E por aí vai... “Todo educador imagina que em sua classe terá alunos dispostos a abrirem-se ao conhecimento.” OLENIKI e DALDEGAN (2004 p, 7). Portanto, será preciso que seja desenvolvida uma dinâmica de sensibilização, no sentido de garantir a elaboração de um trabalho pedagógico muito eficaz, direcionada para a vida de cada um/a. É importante lembrar que o espaço escolar não deve ser uma comunidade de fé, mas, um ambiente privilegiado de reflexão sobre limites e superações e construção de conhecimentos, de princípios éticos e estéticos, bem como de alteridade. Em se tratando do Ensino Religioso essa construção do conhecimento dar-se-á através do conhecimento religioso para subsidiar o entendimento do fenômeno religioso. Quando se aborda esse entendimento na EJA nos reportamos logo para aqueles que ficaram muito tempo sem estudar e quando chega a uma idade mais avançada como o caso das pessoas idosas, são mais interessadas em correr atrás do prejuízo. Na visão docente esse/as discentes se tornam com a sua sabedoria e experiência de vida, verdadeiros heróis da aprendizagem! 102

ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NAS ESCOLAS PÚBLICAS

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Uma caixinha de surpresa, experiência e sabedoria O envelhecer é uma questão atual e pertinente, no sentido de reformulação dos segmentos, sobretudo social, para a pessoa idosa que, em sua maioria, teme a morte. Nesse sentido, as crenças, espiritualidades e as práticas religiosas apresentam-se como um bálsamo (re)confortante em termos de esperanças e qualidade de vida. O objetivo desse trabalho é compreender a relação da religiosidade e de espiritualidade na qualidade de vida do idoso. A metodologia trabalhada tem um caráter qualitativo, com técnicas de observação participante, por considerar que esta se realiza através do contato direto do pesquisador com o fenômeno observado na obtenção de informações sobre a realidade dos atores sociais em seu próprio contexto. A antropóloga Maria Cecília Minayo (2002, p.60) irá dar sustentação à pesquisa por ser estudiosa, também, do fenômeno religioso. O presente trabalho destinou-se a compreender a relação da religiosidade e espiritualidade numa perspectiva de fé em pessoas idosas, a partir da releitura de artigos e da compreensão de conceitos pertinentes a temática proposta, a exemplo do conceito de idoso entendido, aqui, como um marcador social construído (negativamente) culturalmente, conforme Britto Motta (1996), Debert (1999). Além de fornecer subsídios a outros estudos sobre a vida da pessoa idosa, ele, ainda, estará contribuindo para alternativas de convívio mais saudáveis a partir do fenômeno da fé. Esse é um assunto disseminado em vários segmentos do saber, seja no âmbito médico científico, seja nas áreas sócio antropológica, em especial, no que tange as questões de religiosidade e espiritualidade. A proximidade da morte, frequentes perdas, limitações físicas, entre outros fatores da saúde e da sociedade trazem uma nova configuração para a vida dos idosos, principalmente, uma vivência espiritual e religiosa funcionando como um instrumento atenuador nos “novos” dilemas advindos com a idade. Nesse sentido, Neri (1999) diz que há uma redefinição da identidade da pessoa idosa para a qual as crenças e práticas religiosas se apresentam, sobremaneira, como um bálsamo (re) confortante produzindo esperanças, altruísmo, idealismo, oportunidade de autoconhecimento, sentimento de pertença ao grupo no qual estará inserido. E, que a religiosidade se faz presente também contribuindo para a promoção de benfeitorias na vida da pessoa idosa, entendendo que o envelhecimento é um processo progressivo e irreversível. Ao que se pôde observar a convivência de idosos, em grupos de convivência, desperta uma análise crítica, pelo fato de, nesses espaços, conforme a exploração bibliográfica, haver probabilidades de Maria José Torres Holmes & Mônica da Mota Fonseca

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muitas transformações na vida de seus componentes, com suas semelhanças e diferenças, no que tange à religiosidade, a percepção da velhice, da saúde, da doença, do sentido da vida e, até mesmo, de motivações gerais, Frankl (2008). Sendo assim, analisando os conceitos referentes a fé, ao sagrado, a Deus, podemos nos aproximar do valor da fé para eles nessa afinidade de espiritualidade e de religiosidade que, não só ao longo da vida, mas, especialmente, no “fim” dela tem encontrado um espaço de “cura” Minayo, (2002). Desse modo, a pesquisa qualitativa, através da revisão bibliográfica, passa a ser uma referência, por considerar que existe um vínculo indissociável entre o objeto de estudo e o sujeito que dele participa. Desse modo, a relevância deste trabalho se imprime não só às ciências humanas, mas abrindo, sobremaneira, um novo leque para ampliação dessa temática entre pesquisadores da área e da sociedade como um todo. Destarte é importante dentro desse leque de possibilidades o acesso na Educação de Jovens e Adultos com a inclusão das pessoas idosas que retornaram à escola e encontraram nela uma forma de realizarem seus sonhos, que é estudar e, portanto, sentir-se um/a vitorioso/a, compreendendo que o verdadeiro significado do Ensino Religioso é conduzi-lo para a busca de dar sentido à vida. Quando um homem descobre que seu destino é sofrer, tem que ver neste sofrimento uma tarefa sua e única. Mesmo diante do sofrimento, a pessoa precisa conquistar a consciência de que ela é única e exclusiva em todo o cosmo-centro deste destino sofrido. Ninguém pode assumir dela isso, e ninguém pode substituir a pessoa no sofrimento. Mas na maneira como ela própria suporta este sofrimento está também a possibilidade de uma vitória única e singular. (FRANKL, 1984 p. 58).

O ensino religioso na diversidade cultural religiosa pela conquista do bem Para início de conversa, deixamos aqui um recado para todo professor de Ensino Religioso, ou até mesmo de outro componente curricular seja qual for à modalidade e o ano em que atua. Não podemos perder de vista, o quanto é importante desenvolver o trabalho pedagógico no chão da escola dialogando de olho no olho com os/as estudantes para manter um ambiente saudável e harmonioso. “Todo educador precisa sentir-se amado e amando seus educandos...” (OLENIKI; DALDEGAN, 2004 p, 7). O Ensino Religioso nas escolas de EJA tem a função de garantir a todos os educandos a possibilidade deles estabelecerem diálogo. E, como o conhecimento 104

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religioso está no substrato cultural, na perspectiva unificadora que a expressão religiosa tem, de modo próprio e diverso, diante dos desafios e conflitos. Assim sendo, percebemos que esse componente curricular aos poucos vai sendo introduzido em sala de aula com suas temáticas a respeito da diversidade cultural religiosa, a partir da construção do conhecimento. Entretanto, não é nada fácil, tendo em vista a compreensão de que no passado era tratado na confessionalidade. O Ensino Religioso possui uma história que o colocou por muito tempo numa via de mão única: ser um elemento evangelizador na escola. Isso fez com que seu lugar no espaço escolar ficasse distanciado dos demais saberes e de “certas obrigações” pedagógicas, assumindo por vezes o papel de apêndice na educação dos alunos. Diante desta realidade, o professor assumia funções e atividades de diversas ordens: catequistas, apaziguador, disciplinador, orientador espiritual... (OLENIKI, DALDEGAN, 2004 p, 9).

Portanto para reverter esse quadro foi preciso retirar o ER dos sistemas de ensino público durante muitas décadas, tendo em vista a laicidade do Estado Brasileiro. Influenciada pela Revolução francesa, a educação é atingida pela laicização do ensino, ficando a cargo do Estado e com isto o ER seria ministrado no âmbito dos diferentes cultos religiosos, já que a escola deveria dar uma educação moral racional. A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, é uma prova dessa mudança relacionada ao Estado Laico. Podemos observar isto através do Art. 72 nos parágrafos abaixo: § 3º - Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum; § 6º - Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos; § 7º - Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos Estados; § 28 - Por motivo de crença ou de função religiosa, nenhum cidadão brasileiro poderá ser privado de seus direitos civis e políticos nem eximir-se do cumprimento de qualquer dever cívico; § 29 - Os que alegarem motivo de crença religiosa com o fim de se isentarem de qualquer ônus que as leis da República imponham aos cidadãos, e os que aceitarem condecoração ou títulos nobiliárquicos estrangeiros perderão todos os direitos políticos.

Nessas idas e vindas do ER na nossa história e com isso vieram também as mudanças de cunho sócio-cultural-educacional e com elas as inquietações que provocaram a sede de reverter esse quadro e transformar o ER num componente curricular fundamentado pela Constituição Federal do Brasil de 1988 que no seu Art. 210 § 1º do capítulo III da Ordem Social, o Ensino Religioso nos seguintes termos: “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental”. Maria José Torres Holmes & Mônica da Mota Fonseca

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A partir deste momento histórico favoreceu também a mudança da LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), que em seu artigo 33 estabelece o Ensino Religioso nas escolas públicas do Brasil, através da Lei substituta do Art. 33 dando origem a Lei do Ensino Religioso de nº 9475/97 que assegura: O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

Além das Resoluções 04/2010 e 07/2010 do CNE com seus respectivos Pareceres favorecendo assim o Ensino Religioso no contexto escolar. Junto a todo este aparato legislativo soma-se a Base Nacional Comum Curricular (BNCC. 2018 p. 436) que nos aponta: O conhecimento religioso, objeto da área de Ensino Religioso, é produzido no âmbito das diferentes áreas do conhecimento científico das Ciências Humanas e Sociais, notadamente da(s) Ciência(s) da(s) Religião (ões). Essas Ciências investigam a manifestação dos fenômenos religiosos em diferentes culturas e sociedades enquanto um dos bens simbólicos resultantes da busca humana por respostas aos enigmas do mundo, da vida e da morte. De modo singular, complexo e diverso, esses fenômenos alicerçaram distintos sentidos e significados de vida e diversas ideias de divindade(s), em torno dos quais se organizaram cosmovisões, linguagens, saberes, crenças, mitologias, narrativas, textos, símbolos, ritos, doutrinas, tradições, movimentos, práticas e princípios éticos e morais. Os fenômenos religiosos em suas múltiplas manifestações são parte integrante do substrato cultural da humanidade.

Destarte, nesse viés o ER deve ser tratado enquanto um componente do currículo escolar, cujos conteúdos se fundamentam na compreensão do conhecimento religioso que forme consciência e atitudes anteriores a qualquer opção religiosa. É preciso esclarecer e renovar o conceito de ER, da sua prática pedagógica, da definição de seus conteúdos, de natureza não confessional, respeitando o estado laico brasileiro, numa metodologia adequada ao universo escolar de acordo com a realidade dos educandos da EJA. Pois para alguns discentes que passaram muito tempo sem estudar, ao retornarem sentem-se com a idade muito avançada para retornar a estudar ou até mesmo, freqüentando a escola pela primeira vez. Para Fonseca (2019, p. 7) O conceito de velhice tem sido construído ao longo do tempo como uma etapa estagnada, sem que tenha mais condições de o idoso se redescobrir, descobrindo potenciais de realização pessoal, social, dentre outros aspectos conforme sua vivência. Entretanto, a experiência de vida, se for lembrar, por exemplo, dos idosos orientais, de suas relações respeitosas entre as gerações e do grau de intelectualidade que eles possuem, atestamos o 106

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O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

valor incomensurável de tantas benesses, em termos de acúmulo de experiências, em vários sentidos, no decorrer da vida.

Diante de tais dificuldades, é importante que se estabeleça um elo de estreitamento e de diálogo em sala de aula, para que haja mais interação entre docentes e discentes, pois para Oleniki e Daldega (2004, p. 29) afirmam: “Ao assumir o Ensino Religioso pela via do conhecimento, os conteúdos deverão proporcionar o diálogo e a participação dos educandos, por meio de um procedimento que gera atitude a atitude de alteridade em relação ao conhecimento religioso [...]”. Nesta perspectiva o espaço da sala de aula favorecerá um diálogo permanente e consequentemente nossos/as jovens e adultos poderão elevar sua auto-estima, estabelecendo assim um clima de amizade e respeito pelas diferenças. “[...]. Todo educador sonha em contribuir na formação de pessoas mais justas, solidárias e fraternas” (OLENIKI, DALDEGAN, 2004, p.7). Bem como: “Todo educador imagina que em sua classe terá alunos dispostos a abrirem-se ao conhecimento...” (OLENIKI, DALDEGAN, 2004, 2004, p.7) Portanto, essa é a maneira eficaz de operar como os nossos/as jovens e adultos, detalhando a importância do Ensino Religioso no espaço escolar que veio para somar com a educação integral dos/as discentes, educando para a cidadania enquanto princípio da alteridade, a partir de uma construção coletiva, objetivando o sentido da vida. Sendo assim: “Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível.” (FRANKL, 1984, p.2)

Considerações finais Vários são os questionamentos que se faz a respeito do ER. É preciso que se procure saber o porquê dessa cisma com este componente curricular! Esta é uma trajetória pela qual passou este componente curricular durante muitos séculos e até o presente momento isso ainda perdura, tendo em vista a sua complexidade de entendimento, bem como as dúvidas, se é aula de religião, ou se é aula de catequese? Embora se tenha atualmente um novo olhar á respeito de todo o seu aparato legislativo com leis; resoluções; BNCC e DCNs existem muitas dúvidas no ar quanto ao seu desempenho no chão das escolas. Todavia, o discurso do Ensino Religioso deve estar sempre atrelado ao conhecimento religioso das diversas tradições culturais religiosas e, portanto nas manifestações religiosas, as quais apresentam o seu fenômeno religioso. Maria José Torres Holmes & Mônica da Mota Fonseca

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A dimensão cultural abrange as dimensões materiais, intelectuais e espirituais, e o fenômeno religioso vai se formando e transformando à base de uma contínua experiência histórica, que deve cultivar uma postura esperançosa no contexto escolar que é desenvolver o senso de responsabilidade e compromisso aos estudantes, a capacidade de observar e refletir; criar e agir; além de desenvolver o espírito de pesquisador, indo mais além em relação às atitudes éticas e as tomadas de decisões, dando dessa forma o verdadeiro sentido da vida para essas pessoas que retornaram aos estudos muito depois de certo tempo. Dessa forma, nos reportamos à EJA, pois é necessário associar à teoria e a prática adequando de forma dinâmica às atividades, textos, linguagem para esses/ as discentes, no sentido de busca e respeito às suas limitações e histórias de vidas já construídas. Para isso é necessário que se apresente uma prática pedagógica do ER através de uma linguagem própria e acessível, para essa faixa etária. Vale ressaltar que deva existir nessas aulas não uma conduta de fé, mas um entendimento de que além da verdade de cada pessoa, existem outras verdades, o direito de ir e vir, de ter ou não ter religião, além do respeito mútuo, do princípio de alteridade. Pois o chão das escolas é uma porta aberta para refletir sobre os limites e superações de todas essas dificuldades, visando um melhor entendimento sobre as perguntas existenciais e suas respostas para vida além-morte. Nessa compreensão do significado do Ensino Religioso têm-se então um ambiente saudável e agradável. Em se tratando, das relações sócio-comunicativa e afetivo-dialógica são valores importantíssimos na convivência humana. Esses valores são essenciais para serem refletidos junto às/aos discentes da EJA, enquanto estudantes e não como fiéis desta ou daquela religião, mas como pessoas que compreendem as atitudes de alteridade com uma nova visão de respeito às diferenças. Posicionando-se frente às diferenças, sabendo-se colocar no lugar do outro enquanto outro. Destarte, a partir de um entendimento sobre o diálogo inter-religioso interdisciplinar para a construção de uma cultura de paz no espaço escolar, bem como transportando esse valor para fora de seus muros, interagindo uns com os outros numa atitude de respeito ao sagrado do outro/a.

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ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NAS ESCOLAS PÚBLICAS

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Referências BRASIL, MEC. Base Nacional Comum Curricular - BNCC, 2018 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, Serviço Gráfico. BRASIL Primeira Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Promulgada em 24 de fevereiro de 1891. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. (MEC.) Resolução 04/2010 do Conselho Nacional da Educação (CNE).

FONSECA, M. M. A religiosidade e espiritualidade como instrumentos atenuantes no processo do envelhecer. TCC apresentado ao IESP como requisito exigido para fins de conclusão e aprovação para o curso de Pós-Graduação em Ciências das Religiões, Diversidade e Ensino Religioso. 2019. João Pessoa – PB. FONSECA, M. M. Idosos e uma nova forma de ressocialização: Grupo Esperança de Viver. Monografia apresentada em 2010, na UFRPE, para conclusão do curso de Bacharelado em Ciências Sociais.

BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. (MEC.) Resolução 07/2010 do Conselho Nacional da Educação (CNE) BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº. 9394/96 de 20 de dez. 1996. Diário Oficial da União, nº 248 de 23. 12. 1996. Seção I. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Nova redação do Art. 33 da Lei 9394/96. Lei nº. 9475/97 de 22 de julho de 1997 (Lei do Ensino Religioso). Brasília: Diário Oficial da União, de 23 de julho de 1997, Seção I.

FRANKL, Viktor E Sede de sentido. São Paulo: Quadrante, 2005. FRANKL, Viktor. Em Busca do Sentido da Vida. Equipe Le Livros. Edição Norte Americana 1984. MINAYO, Maria Cecília. COIMBRA Jr CEA (Org). Antropologia, Saúde e Envelhecimento. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2002

BRITTO DA MOTTA, Alda. Terceira Idade - gênero, classe social e moda teórica. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS - GT Relações Sociais de Gênero - 20., out. 1996d, Caxambu/ MG. (Publicado em COSTA, Ana Alice A., ALVES, Ívia Iracema (org.). Ritos, mitos e fatos - mulher e gênero na Bahia. Salvador: NEIM, 1997. p. 103-120. Coleção Bahianas 1. DEBERT, G. G. (Org.). Antropologia e velhice. Campinas: IFCH/UNICAMP, 1998.

FONAPER. O Ensino Religioso capacitação para um novo milênio: Curso de Extensão à Distância cadernos nº1 Ano 2000.

MINAYO, M. C. S. (Org) Antropologia, saúde e envelhecimento. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2000. NERI, A. L. e DEBERT, G. G.. Velhice e Sociedade. (Orgs) – Campinas, SP: Papirus, 1999 – Coleção Vivaidade. OLENIKI, Marilac Loraine R., DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: uma prática pedagógica no Ensino Religioso. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

Maria José Torres Holmes & Mônica da Mota Fonseca

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ENSINO RELIGIOSO NA DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA Relatos de experiências

Maria José Torres Holmes

Eliane Barbosa de Carvalho

Doutoranda em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB).

Pós-Graduação em Ciências das Religiões, Diversidade e Ensino Religioso (UNIESP).

Mestra em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB).

Pós-Graduação em Arte e Educação (CINTEP).

Especialista em Ciências das Religiões (PPGCR/ UFPB). Realizou Curso em EAD: Administração da Educação (PPGCE/UFPB), e se formou em Pedagogia pela mesma Universidade.

Licenciatura em Ciência da Religião (UNIQ).

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Integrante do FIDELID (UFPB), filiado à Associação Internacional de Estudos de Afetos e Religiões (AMAR). Membro do FONAPER.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: HOLMES, Maria José Torres; DE CARVALHO, Eliane Barbosa. Ensino religioso na diversidade cultural religiosa: relatos de experiências. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 111-120.

O ENSINO RELIGIOSO E A SALA DE AULA

Introdução A pesquisa aqui apresentada é parte da pesquisa intitulada Ensino Religioso na Diversidade Cultural Religiosa: relatos de experiências, que faz parte do requisito oficial, apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Faculdade de Quixeramobim CE, referente ao Programa de Formação Docente (PFD), com a habilitação de professora de Ensino Religioso (ER). A priori, venho atuando como professora deste componente curricular desde 2006. Trabalhando com os estudantes do Ensino Fundamental, em três escolas: 1-Escola Municipal Anita Trigueiro do Vale, localizada no bairro do Altiplano Cabo Branco, atuo com todas as turmas do Fundamental nos turnos manhã e tarde, e à noite com as turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA). 2-Escola Municipal Escritor Luís Augusto Crispim, localizada no Bairro dos Ipês, atuo com as turmas do fundamental no horário da manhã e à noite com a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Local onde predomina as questões de violências, prejudicando o ensino e aprendizagem. 3-Escola Municipal Senador Rui Carneiro, localizada no bairro de Mandacaru. Nessa escola atendendo as turmas do fundamental II no horário da tarde. O objetivo geral desta pesquisa é: Favorecer no espaço escolar a vivência real e sistemática dos valores humanos, das Tradições e Culturas Religiosas em prol da integração nas relações interpessoais na escola, família e comunidade. Esta pesquisa representa um estudo bibliográfico acerca do Ensino Religioso e da diversidade cultural religiosa, fazendo a ponte com os nossos relatos de experiências em sala de aula. Vale destacar a importância das aulas de Ensino Religioso para essas turmas, pois segundo as falas de alguns, têm muito significado. “No melhor da aula toca.” Outros dizem: “E por que não têm duas aulas?” “Uma aula só é pouco”. Entre esses, outros relatos apresentaremos no decorrer desse TCC. Todavia, essa é uma proposta fundamental para o desencadeamento do que se faz no chão das escolas: “No processo de ensino-aprendizagem do Ensino Religioso o encantamento será a mola motivadora que favorece o educador e educando, a reconhecer, pelo prisma do conhecimento e do respeito o seu universo religioso e do outro” (OLENIKI e DALDEGAN. 2004 p. 14). Vale destacar que esse encantamento deve partir da ação e da metodologia utilizada pelo docente, em que precisa aproveitar a bagagem cultural dos/das estudantes, que por meio do diálogo possa encantá-los/las, pois o ensino e a aprendizagem só acontecem de fato, quando se dá essa interação entre docentes e discentes. No âmbito da BNCC, destacamos um dos importantes objetivos entre os demais que é: “Contribuir para que os educandos/as construam seus sentidos Maria José Torres Holmes & Eliane Barbosa de Carvalho

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pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania” (2017, p. 434). Embora, a diversidade de culturas em sala de aula, mas, o que importa mesmo é a construção do conhecimento que eles e elas adquirem no cotidiano escolar. Por outro lado, Cecchetti nos assegura: “Se a humanidade se constitui pela diversidade de identidades culturais, pois cada sujeito ou grupo social possui maneiras e características próprias de viver e de entender o mundo e vida, pode-se inferir que existem várias concepções e práticas educativas” (CECCHETTI, 2014, p. 43).

Vidas e histórias: na prática educativa do ensino religioso Inicialmente, expomos aqui um pouco da nossa trajetória enquanto professora de Ensino Religioso da rede estadual de ensino na década de (90), permanecendo nessa rede até a década dos anos (2.000), enquanto que na rede municipal de ensino de João Pessoa iniciei a partir de (2006), como a participação dos/das discentes e seus entrosamentos com este componente curricular. A escola é um espaço privilegiado, onde se encontram a comunidade escolar, um lugar em que discentes e docentes dialogam, em busca de trocarem ideias sobre o conhecimento. Isso, portanto, é o que faz toda diferença de trabalhar com o Ensino Religioso. De acordo com Oleniki e Daldegan asseguram que: O professor, no espaço da sala de aula é o comunicador e o socializador em sua área de conhecimento. Assim no Ensino Religioso, como em outras áreas, precisa assumir, no primeiro momento, o papel da borboleta, despertando no educando a curiosidade e a admiração pelo conhecimento religioso. Num segundo momento, proporcionar ao educando transportar-se para o lugar da borboleta, que em seu vôo olha a natureza de cima e descobre o que há além dela mesma, percebendo as diferenças no mundo sobre outro prisma (OLENIKI E DALDEGAN, 2004, p. 13).

A escola é o lugar adequado para que haja a roda de conversa com as/os estudantes que se possam trabalhar os limites e comportamentos, os quais possam proporcionar atividades adequadas para as práticas pedagógicas da sala de aula, além de trabalhar as culturas e tradições religiosas, numa construção coletiva. No ano de 2017 apresentei aos/as discentes o projeto A Diversidade Religiosa que teve como objetivo geral: Compreender que cada crença tem, na formação cultural, uma sociedade sem preconceitos, envolvendo os valores universais para a construção da cidadania. Pois essa é uma forma de construir na escola uma cultura de paz, envolvendo os valores humanos, tão significativos na formação humanística. Nesse caso, é importante destacar sobre o papel do /da docente, pois: 114

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Entendemos que nos diversos níveis do processo formativo, a prática do professor pode colaborar para fomentar questões que estimulem o desenvolvimento dos valores humanos e da autonomia, em consonância com uma educação voltada para a interculturalidade. [...] (PINTO e BONFIM, 2017 p.158).

Este trabalho apresenta a sua importância, tendo em vista as questões relacionadas ao preconceito, ao bullying e todo tipo de intolerância, principalmente a racial e religiosa, existentes em todos os âmbitos da sociedade. Vale ressaltar que é uma prevenção para minimizar esses problemas que destroem a vida humana. E como fazer? O que trabalhar em sala de aula? Vivenciando essas questões, foi o que pensamos em amenizar essa situação por meio das propostas das autoras, abaixo citadas: São as atividades em grupo, pesquisas, produções, troca de ideias, apresentação de trabalhos, entrevistas, interpretações, análise, comparações... Que possibilitam desvendar o desconhecido, dar significado aos fatos e às situações, superar barreiras, vencer preconceitos (OLENIKI e DALDEGAN, 2014, p. 15).

Para tanto, foram desenvolvidos, nas escolas citadas, os valores humanos como a igualdade perante a lei, onde foi exibido um vídeo sobre a diversidade religiosa, com o intuito de detalhar para esses/essas estudantes o respeito às diferenças, e a importância do diálogo, sabendo-se colocar no lugar do outro e refletir sobre: aquilo que não quero para mim, não desejo para o outro. Que eu possa sentir nesse outro a minha presença. Tudo para a construção de uma cultura de paz e pela paz... Ora, a cultura de paz é ação que implica os sujeitos. Na sociedade atual, a paz é dinâmica revolucionária porque não se trata de amortecer os conflitos sociais, mas, de entendê-los para transformá-los com atitudes de respeito, amor, compreensão e solidariedade (DIÓGENES e CARNEIRO, 2017, 110).

O ensino religioso e a prática educativa na comunidade escolar Esta atividade é intitulada de Projeto Resgatando Valores e Sonhos, outra proposta lançada pela escola, que tem como objetivo: proporcionar ao aluno condições para que ele se conscientize da necessidade de respeitar os diretos e deveres de cada um, a partir dos valores éticos e morais, para o exercício da cidadania. Cumprindo assim com o maior papel da escola: favorecer uma aprendizagem realmente significativa na formação de seres humanos mais conscientes Maria José Torres Holmes & Eliane Barbosa de Carvalho

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e participativos no convívio social. Vale destacar, portanto, neste projeto o seu desenrolar no processo pedagógico da escola, com o envolvimento de toda comunidade escolar principalmente esses e essas estudantes, pelas mudanças de atitudes (CAMPOS, 2010, p. 37). O professor, pela docência se coloca como ator do processo pedagógico e, ao negar a lógica da educação alienada, liberta-se. Pela reflexão da sua prática alienada, reifica o sentido do ofício docente para a transformação da sua prática na imediaticidade do fazer docente, conscientemente superado com autenticidade diante do trabalho alienado.

Outor apresenta uma crítica ao professor que não se importa com os/as discentes, apenas faz de conta que dá aula, não se interessando com o ensino e a aprendizagem, o que é muito eficaz para todos/das os/as envolvidos/das com o processo pedagógico. Por outro lado: Esse autor afirma que: “A gestão escolar baseada no conhecimento traz como modelo a pedagogia da competência que muito se aproxima da racionalidade técnica-Instrumental”. Porém, isso se torna um risco de cair no tecnicismo, [...]. Entretanto: “A escola como lócus de formação humana é espaço de diálogo, de trocas, de vida” (CAMPOS, 2010 p.37). Essa é uma das atividades que faz parte do Projeto Político Pedagógico da Escola Municipal Senador Rui Carneiro, que consiste na conscientização de todos e todas, à compreensão e à necessidade de convivência com as pessoas, adotando atitudes de respeito, uma atividade que deve ser muito utilizada principalmente no diálogo do professor/a em sala de aula. Esse é o caminho que encontramos para prevenir a cultura de paz nessa escola. Tudo começou por meio de uma roda de diálogo que mantivemos com as turmas, a partir de um vídeo sobre a Diversidade Cultural Religiosa e Direitos Humanos. Após as discussões e críticas positivas, é claro, as turmas despertaram e mostraram interesse pelo debate, pois a riqueza da diversidade é um desafio muito pertinente para ser discutido e trabalhado em sala de aula, fundamentado num diálogo permanente. Assim sendo, foi então que aproveitamos o momento para planejarmos as ações de uma cultura de paz, pedindo sugestões às turmas, no sentido de motivá-las cada vez mais à implementação do referido projeto, mostrando a importância de se trabalhar em grupo. Nesta reflexão, percebemos que aos poucos as turmas foram amadurecendo as ideias e com ponderação, prudência e argumentos vencíamos os obstáculos e fazíamos o que era mais viável realizar. As mudanças no Ensino Religioso nos levam a refletir quanto ao seu rumo nas escolas, por se tratar de uma nova dimensão, uma nova era. É preciso que haja entrosamento entre educadores e educandos, por se tratar de uma nova postura, uma nova identidade, frente à diversidade cultural religiosa brasileira. 116

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O diálogo encantando a escola: discentes e docentes A proposta intenta promover um espaço onde o diálogo, o respeito e a aceitação dos educandos, sejam quais forem suas convicções, se deem no sentido de um amadurecimento sobre o conhecimento religioso das tradições religiosas, os quais possam minimizar ou até mesmo eliminar as diversas formas de preconceitos existentes no espaço escolar e na sociedade, como é o caso da intolerância religiosa. Ao perguntar aos discentes o que é o Ensino Religioso? Foram inúmeras as respostas dadas, entre elas destacamos algumas para apresentarmos neste contexto, observando o cuidado para identificá-los/las utilizando os nomes de flores: O Ensino Religioso vem com o intuito de espalhar o conhecimento das culturas e o mais importante que é respeitar as diferenças, através dos professores de Ensino Religioso podemos compreender o porquê as religiões são diferentes. Podemos dizer que a base fundamental da matéria é o respeito ela nos ensina expressar nossas opiniões de diversas maneiras como dançando ou em silêncio cantando etc. A professora nos ensina que: As misturas de raças e crenças geram riquezas de diversidades nas religiões e nos apresenta um conhecimento sem limites. (Violeta, 9° Ano Escola Anita Trigueiro do Vale).

Com este diálogo observamos que aos poucos estamos educando as novas gerações, apresentando-lhes alternativas e precavendo-as contra fundamentalismos e manipulações ideológicas de discursos religiosos. Tais considerações são importantes para os educadores do ER, pois estes e estas precisam pesquisar e estudar no sentido de desenvolver na escola, de forma organizada em sua linguagem específica, a releitura do fenômeno religioso. Todas as culturas religiosas têm o seu modo especial de expressar o seu encontro com o sagrado. Por isso a religião para cada ser humano se expressa com uma dimensão existencial de grande profundidade, marcando assim os seus elementos culturais dentro de uma realidade histórica, onde a religiosidade torna-se efetiva para o ser humano, denominada em cada cultura como fenômeno religioso (HOLMES, 2010, p. 53).

Em se tratando deste componente curricular, também precisamos estabelecer seus conteúdos. Ensino Religioso não é qualquer coisa! Não é trabalhar religião! Não é também imaginar que este professor é bonzinho. Nem tão pouco uma oportunidade do professor complementar a sua carga horária. Ao contrário do que se possa imaginar, é levar os/as discentes a refletirem, a dialogarem e desenvolverem atividades diversificadas destacando a diversidade cultural religiosa. Haja vista algumas de suas falas ao responder O que o Ensino Religioso nos traz? “Traz conhecimentos sobre várias religiões e nos ensina a respeitar cada Maria José Torres Holmes & Eliane Barbosa de Carvalho

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uma delas, seus valores e nos traz amor pela nossa religião.” (Margarida, 9° Ano - Escola Anita Trigueiro do Vale). Perguntando a uma estudante: Qual o conhecimento que o ER traz para você? Como resposta, obtivemos: “O Ensino Religioso nos traz os valores, a dignidade, o amor, o respeito que temos com o próximo e com sua religião, não importa qual seja.” (Tulipa, 9° Ano Escola Anita Trigueiro do Vale). Esta é uma trilha que não podemos perder de vista. Temos sim de cultivá-la, assim como cuidamos de uma plantinha, para crescer, florescer e dar frutos. Não podemos perder a oportunidade de instigar as/os nossos e nossas educandos/ das para esse convívio tão significativo no seio escolar.

O encantamento de uma estudante pelo ensino religioso “O Ensino Religioso é mais do que uma matéria escolar, é também uma forma de expressar o real significado cultural de cada religião. O ensino religioso tem como principal assunto o respeito à grande diversidade religiosa ensinando a todos a sua cultura.” “[...]O mais interessante é que o ensino religioso faz com que várias pessoas se abram para conhecer mais aprofundadamente uma religião especifica fazendo com que o interesse se torne mútuo, também dando a oportunidade de que cada pessoa individualmente expresse a sua opinião e suas crenças assim gerando um ambiente mais agradável e democrático”. “[...] Gostaria também de lembrar que cada pessoa tem o direito de compartilhar os seus pensamentos e a sua opinião, mas não interferindo ou machucando alguém, pois o direito do outro começa quando o nosso acaba.” (Hortência, 9° Ano Escola Anita Trigueiro do Vale).

Considerações finais A escola é o espaço aberto, amplo e muito rico para se trabalhar com as culturas e tradições religiosas. Não só no aspecto de construção do conhecimento, mas pela riqueza de sua diversidade. Faz parte de uma de suas tarefas o desenvolvimento do ser humano nos aspectos: sensorial, intuitivo, afetivo, racional e religioso-antropológico, porém, não é função da escola mostrar a vivência desses valores, enquanto conduta religiosa de fé, mas possibilitar esse conhecimento por meio do componente curricular do Ensino Religioso que não privilegia esta ou aquela religião. 118

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Esta é uma questão de respeito às diferenças existentes no contexto escolar. Trabalhar com a pedagogia de projeto facilita o ensino aprendizagem, em que levanta a autoestima dos/das estudantes, tendo em vista a existência de dinamismo nas aulas, bem como apresentar uma grande troca de conhecimentos. O mais importante é saber que essas / esses estudantes estão atentos participando de todas as atividades e animados para outras que surgem, haja vista os depoimentos citados neste texto. Que se possa reconhecer em cada pessoa principalmente os /as estudantes. Portanto, esta é uma das experiências vivenciadas no contexto dessas três escolas. É lógico que cada uma tem suas peculiaridades, são outras realidades, porém, na minha visão, todas são capazes de compreender o significado do ER. Acredita-se que o Ensino Religioso desempenha hoje um papel fundamental na educação para a cidadania universal, em que as religiões deixem de significarem opressão e se tornarem fonte de uma humanidade cidadã, na qual o diálogo possa ser o maior interlocutor dessa relação. O cuidado com os oprimidos deve ser realizado em um ato do amor. Percebemos que nessa diversidade, apesar das diferenças, todos somos iguais, porque somos seres pensantes, temos os mesmos direitos e deveres enquanto cidadãos.

Maria José Torres Holmes & Eliane Barbosa de Carvalho

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Referências BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Base Nacional Comum Curricular: 2017. CAMPOS, Casemiro de Medeiros. Gestão Escolar e Docência – São Paulo, SP: Paulinas, 2010. (Coleção pedagogia e educação). 158 p. CECCHETTI, Elcio. Cultura Escolar e Diversidade Cultural: entre a negação e o reconhecimento das diferenças. In: Cecchetti, Elcio. Pozzer, Adecir (Org.). Educação e Diversidade Cultural: tensões, desafios e perspectivas. - Blumenau: Edifurb, 2014, p. 40 a 65. DIÓGENES, Elione Maria Nogueira. CARNEIRO, Maria Joyce Maia Costa. Cultura de Paz como Mediação no Cenário da Escola Pública. In: MATOS, Kelma Socorro Lopes de, (org). Cultura de Paz, educação e espiritualidade IV. Fortaleza: Ed UECE. 2017p. 99 a 114. FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. 6ª Ed. São Paulo: Ed. Ave Maria, 1997.

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HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso: problemas e desafios. Dissertação de Mestrado em Ciências das Religiões. Universidade Federal da Paraíba-UFPB, 2010. OLENIKI, Marilac Loraine R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: Uma prática pedagógica no ensino religioso. 2. ed. Petrópolis: Vozes 2004. PINTO, Edmara de Castro. BONFIM, Maria do Carmo Alves do. Novos Caminhos da Educação: a necessidade de educar para a interculturalidade e a cultura de paz. In: MATOS, Kelma Socorro Lopes de, (org). Cultura de Paz, educação e espiritualidade IV. Fortaleza: Ed UECE. 2017 p. 157 a 168. RELATOS dos/das estudantes da Escola Municipal Anita Trigueiro do Vale. Rede Municipal de Ensino de João Pessoa-PB. O significado do Ensino Religioso. 201.

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ENSINO RELIGIOSO Da teoria à prática na sala de aula

Simone Simões da Cruz Licenciatura em Pedagogia (UNIPÊ) Graduação em Ciências da Religião (UNIQ) Professora de Ensino Religioso pela Secretaria de Educação e Cultura de João Pessoa

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Como referenciar este capítulo: CRUZ, Simone Simões da. Ensino Religioso: da teoria à prática na sala de aula. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 121-134.

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Introdução O presente artigo faz parte da conclusão do Curso de Habilitação em Ciências da Religião do Programa de Formação Docente - (PFD), da Faculdade de Quixeramobim - CE, com a habilitação de professora de Ensino Religioso, tendo em vista, enquanto docente, trabalhar com os estudantes do Ensino Fundamental, assim focalizando esta pesquisa com as turmas da Educação Infantil e Fundamental I da Escola Municipal Economista Celso Furtado, no Bairro dos Funcionários IV, município de João Pessoa. - PB. Por que essas turmas foram escolhidas? Qual o motivo da Educação Infantil ter ficado de fora das aulas de Ensino Religioso? Em primeiro lugar, houve um remanejamento entre escolas separando o fundamental I do fundamental II. A escola acima citada se tornou uma escola em regime integral, voltada para atender crianças na faixa etária entre 4 e 5 anos, (Educação Infantil); e a partir dos 6 anos a 10 anos, (Fundamental I), embora ainda existam crianças fora da faixa etária com distorção de idade e série. Essa foi uma atitude da Secretaria de Educação e Cultura de João Pessoa (PMJP-PB), para separar suas escolas em “Regime Integral”. Todavia, a Educação Infantil ficou fora do processo pedagógico do Ensino Religioso, já que o ponto de vista da Secretaria de Educação do Município de João Pessoa-PB é retirar desse segmento o Ensino Religioso, o que nos deixou surpresos, por tratar de uma temática tão importante nessa área de ensino e aprendizagem. Entretanto, o que ocorreu é mais um motivo que nos leva a não desistirmos de lutar por nossos ideais. Em consideração a tudo isso, é que se justifica o desenvolvimento deste artigo, que tem como objetivo geral analisar o comportamento dos/as estudantes diante dos conteúdos apresentados em sala de aula, em relação à prática pedagógica envolvendo o lúdico, com a finalidade de estabelecer um elo entre as diferenças culturais e religiosas existentes no espaço da sala de aula, além de sentirem o prazer de estudar por meio da ludicidade, para o sucesso do ensino e aprendizagem. FREIRE (2003, p.28), em seus escritos na Pedagogia da Autonomia, afirma: “O professor que pensa certo, deixa transparecer aos educandos que uma das bonitezas da nossa maneira de estar no mundo, e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de intervindo no mundo, conhecer o mundo.” A fundamentação teórica deste artigo propõe um estudo sobre o uso de atividades e jogos como recurso pedagógico facilitador na construção da aprendizagem do Componente Curricular de Ensino Religioso. Todavia, “A(s) Ciência(s) da(s) Religião (ões) enquanto uma área científica de estudo e pesquisa está para nos dar o respaldo na compreensão da diversidade religiosa existente no mundo. Enquanto o Ensino Religioso se explica no chão das escolas públicas do ponto Simone Simões da Cruz

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de vista científico, cujo conhecimento religioso é o seu objeto de estudo, com o foco no fenômeno religioso. Apresentamos neste trabalho um estudo bibliográfico de autores como Freire (2003), Silva (2011), Oleniki e Daldegan, (2004), Gebhard (1996), ROGERS. (2009), Froebel, (2009), entre outros que apresentam suas considerações sobre o “ensinar prazeroso”, bem como a fundamentação de todo o processo de estudo dessa pesquisa. Refletindo sobre isso, demonstra-se que em uma pesquisa deste feitio possibilitará aos sujeitos envolvidos, uma construção de valores significativos, tais como: autonomia, competência e cooperação, tudo isso sendo alicerçado no dinamismo educacional, também conhecido como lúdico, que juntamente com o ER, será de grande valor na Educação Infantil. [...] o jogo e a criança caminham juntos desde o momento em que se fixa a imagem da criança como um ser que brinca. Portadora de uma especificidade que se expressa pelo ato lúdico, a criança carrega consigo as brincadeiras que se perpetuam e se renovam a cada geração (KISHIMOTO, 1999, p. 11).

Esses instrumentos metodológicos são importantíssimos na sala aula principalmente quando aplicados pelos professores de ER, como forma de enriquecer as aulas, sensibilizando educandos e educandas ao prazer de estudar e aprender. Vale ressaltar também as leis e resoluções, que asseguram este componente curricular no chão das escolas públicas, assim como o grande compromisso do FONAPER que juntamente com a BNCC, apresenta princípios e normas quanto ao trabalho didático-pedagógico relacionado a este conhecimento em todos os aspectos relevantes ao processo de ensino e aprendizagem.

Ser professor/a, missão ou profissão? Quando se escolhe entre tantas profissões a de ser professor, não se imagina a responsabilidade de se trabalhar com uma das realidades nobres que é a inteligência e o coração do ser humano. Usa-se o termo nobre porque é por meio da mente (intelecto) e do trabalho humano (esforço físico) que o homem domina todas as coisas, projeta, constrói, inventa e transforma. Para o teórico Gebhard afirma e detalha a existência de seis (6) pontos importantes de um perfil que enfatiza como deve ser um professor: 1 Conversar com outros professores sobre ensino; 2 Trocar experiências sobre metodologias e práticas; 3 Frequentar seminários e palestras sobre ensinos; 4 Ler sobre ensino, sobre o significado do ensino, sobre o papel e responsa124

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bilidade do professor na sociedade; 5 Observar aulas de outros professores, conversar sobre problemas e práticas de ensino e levantar novas questões sobre essas práticas; 6 Avaliar sua própria aula, ou seja, pedir a outros professores para observar suas aulas e em ordem, analisar pontos negativos e positivos, para que, com o olhar do outro, o professor possa saber a postura que os outros e ele mesmo têm sobre sua aula. (GEBHARD, 1996, p.14).

Esta deve ser a nobre missão do professor e educador, que é construir a juventude no aspecto da cientificidade acadêmica, humano, moral e ético, já que, sem a primazia da pessoa sobre essas responsabilidades históricas e sociais, a humanidade poderá se deparar com sérios riscos, como situações ocorridas no século XX, com desastrosas guerras e morticínios. Essa é a realidade social que impõe às pessoas diante de uma sociedade consumista onde o mais importante é o ter que o ser. Viver de aparências dentro de uma cultura que transforma as pessoas em um egocentrismo sem limites, o que dificulta a própria prática pedagógica, prejudicando, assim, a construção do conhecimento.

Metodologia É fundamental repensarmos o nosso fazer pedagógico e a partir daí abrir espaços para a construção do diálogo inter-religioso. Oleniki e Daldegan (2004, p. 36), afirmam: “Portanto, o educador deve propor em suas aulas o encantamento, a ética nas relações ensino-aprendizagem, a escuta, o respeito ao educando e a construção de sua autonomia na elaboração do saber religioso”. Com isso percebemos que as atividades lúdicas, como metodologia, é uma das estratégias de despertar o interesse dos estudantes pelas atividades escolares o que contribui para um melhor desempenho das habilidades a serem desenvolvidas por eles e elas. Para alguns estudiosos, a utilização de jogos e atividades lúdicas no processo de aprendizagens tem significativa contribuição na interação entre estudantes e professores, e assim a construção da aprendizagem favorece numa prática envolvente e atraente para estes, detalhando que há sempre o respeito a nossa diversidade cultural religiosa. A Educação Infantil sempre possibilita uma aprendizagem lúdica. É onde as crianças aprendem brincando de forma prazerosa. É a fase também de se trabalhar o Ensino Religioso, por absorverem com facilidade o que lhe é ensinado. Enfim de aprender de forma divertida, como assegura Froebel: [...] as brincadeiras são o recurso no caminho da aprendizagem. Não são apenas diversão, mas um momento de criar representações do mundo Simone Simões da Cruz

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concreto com a finalidade de entendê-lo. Com base na observação das atividades dos pequenos com jogos e brinquedos (FROEBEL, 2009, p. 47).

Todavia, além da ludicidade, destacamos ainda que, nessa prática-metodológica-pedagógica, acrescentamos leituras de textos, vídeos e outras atividades inerentes à aprendizagem dos/as educandos/as, tendo o cuidado de aos poucos de incluir nessas atividades momentos de espiritualidade. Como bem afirmam as autoras (Oleniki e Daldegan, 2004, p.21) “As situações de aprendizagem precisam promover a abertura para conhecer e dialogar com as diferentes tradições religiosas.” São momentos como estes que promovem na criança uma relação dialógica com o seu sagrado e o sagrado do outro ou da outra, aprendendo a ser solidário.

A diversidade cultural religiosa Uma pergunta que muitos docentes de ER fazem: O que fazer? Como trabalhar com o Ensino Religioso de uma forma que respeite as religiões e a diversidade? Essa é uma realidade em nosso mundo atual, que se passa aos educandos e educandas uma visão tão estreita de sua religião. Faz-se necessário que os estudantes desenvolvam a percepção sobre a importância do respeito a cada cultura religiosa, seja qual for seu credo, pois Deus não tem religião, porém as culturas e tradições o invocam como: o “Ser Supremo”, o “Transcendente”, o “Sagrado”, o “Divino” e tantos outros nomes dados. Todavia, os/as estudantes podem compreender isso, pois lhe dá o sentimento de pertencer a um mundo onde há uma diversidade cultural e religiosa. Compreender que o seu nascimento o colocou em uma nação que é laica e que tem uma Constituição que respeita essa diversidade. Assim terá a possibilidade de ter o conhecimento de outras religiões e, de uma forma natural, irá construir o respeito, ampliando sua visão de mundo diante das diferenças sociais, culturais e religiosas. Por conseguinte Holmes (2016 p. 49) afirma: “No Brasil, o Estado tem o dever de proteger a diversidade religiosa e de garantir a liberdade religiosa [...].” Isto é lei. Respeitar a diversidade religiosa é compreender que os seus fundadores vieram ao mundo dentro de um contexto, de um país e de uma época, com a finalidade de apresentar uma mensagem específica e razões precisas. Ainda que tenhamos em sala de aula estudantes que suas famílias sejam ateias, temos que partilhar com coração aberto e ensiná-los a encontrar dentro de si uma consciência flexível, para o acolhimento das diferenças. Quando essas duas autoras Oleniki e Daldegan, se referem à diversidade cultural religiosa, é uma forma de mostrar à comunidade escolar, o quanto é 126

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necessário que se entenda que este componente curricular oferece um leque de possibilidades para o trabalho didático-pedagógico. Pois, “[...], é preciso que tenham como princípio o conhecimento, com uma abordagem informativo-formativa, e não a catequização ou doutrinação, que privilegia uma determinada religião.” (OLENIKI E DALDEGAN, 2004 p. 36). Este é o olhar didático-pedagógico, por meio do qual o Ensino Religioso assegura, não somente para a escola como um todo, mas para que a própria sociedade que tanto questiona, mas, que possa entender de vez, a importância deste componente curricular nos estabelecimentos de ensino público. E, por que não nos privados? De acordo com o FONAPER, segundo (PCNER. 2002 p.22). Por questões éticas e religiosas e pela própria natureza da escola, não é função dela propor aos educandos a adesão e vivência desses conhecimentos, enquanto princípios de conduta religiosa e confessional, já que esses são sempre propriedade de determinada religião.

Isso faz parte de uma educação inclusiva, que promove no ser humano, vários tipos de conhecimentos e entre estes destacamos o conhecimento religioso como objeto de estudo do Ensino Religioso, sendo uma forma de se conhecer este componente curricular do ponto de vista científico, enquanto uma área de conhecimento. Cecchetti e Pozzer, membros do FONAPER1 (2014, p.42), “A educação é um dos elementos culturais presente em todos os povos de diferentes nações e em diferentes épocas. E como tal, é parte do processo de humanização e da constante busca pela construção de sentido, [...]”. Em todas as culturas e tradições religiosas existe como normas e princípios educativos de seus valores, uma proposta que norteia todo o processo de compreensão e respeito a nossa diversidade cultural religiosa, visando uma base sólida no processo de construção do ensino e aprendizagem. Conforme Silva que faz um pequeno comentário a respeito das diferenças, porém de grande significado: “Numa sala de aula, há uma grande diversidade, não só religiosa, mas também étnica, cultural, social e de gênero. Essa diversidade se estende ao campo das opiniões e formas de pensamentos. Diferentes elementos influenciam no convívio entre as pessoas.” (SILVA, 2011 p.13). Destarte, é importante se observar o crescimento da diversidade cultural religiosa dentro do nosso território nacional, bem como no mundo inteiro. Holmes (2016 p. 50), afirma que: “Atualmente, o respeito à diversidade constitui-se 1 O Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso - FONAPER é uma associação civil de direito privado, de âmbito nacional, sem vínculo político-partidário, confessional e sindical, sem fins econômicos, que congrega, conforme seu estatuto, pessoas jurídicas e pessoas naturais identificadas com o Ensino Religioso, sem discriminação de qualquer natureza. Ver www.fonaper.com.br Simone Simões da Cruz

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a um fator de desenvolvimento pessoal e social, bem como um caminho para a sustentabilidade do Planeta. [...] o respeito pelas suas diferenças, tais como racial, social, cultural e religiosa.” A autora enfatiza o respeito à diversidade como um dos caminhos para uma cultura de paz entre as religiões e os grupos sociais promovendo uma convivência pacífica entre todos os povos. Assim como observamos essa convivência em sala de aula, entre as crianças no momento do fazer pedagógico. Temos aqui alguns depoimentos advindos delas, ao perguntar para elas sobre a importância do Ensino Religioso. Vejam o que responderam. Porque “Forma o nosso caráter.” “Nessas aulas só aprendemos coisas boas”; “[...] são educativas e dinâmicas, porque abordam sobre várias religiões e ensinam que deve haver respeito com as diferenças.”; “Passa mensagem de vida.” (HOLMES, 2016 p. 128-131). Basta dizer que admiram e gostam das atividades realizadas. Há sempre um clima de uma relação dialogada entre docentes e discentes. Isso é muito gratficante a/o educador/a. Assim, assegura (ROGERS. 2009 p. 100) quando se refere à Educação afirma que “a única coisa que se aprende realmente faz diferença no comportamento da pessoa que aprende é a descoberta de si mesma.” Nesse caso, a Educação Infantil se faz presente, pois a formação básica do cidadão não se completa somente no Ensino Fundamental, mas sim na educação básica, como um todo como já citado anteriormente. Este autor generaliza a Educação de um modo geral em todos os sentidos da vida.

Ensino Religioso: as leis e a Base Nacional Comum Curricular A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 nos assegura em seu Art. 210, § 1º do capítulo III da Ordem Social: “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental.” Esta é uma das passagens mais importante da história do Ensino Religioso, quando este retornou às escolas respeitando a laicidade do Estado Brasileiro. A LDB, lei de nº 9.394/1996, artigo 33, alterada pela lei de nº. 9475/1997 que estabeleceu o Ensino Religioso nas escolas públicas do Brasil, com seus princípios normativos, respeitando a sua diversidade cultural religiosa, Essa Lei é de autoria do Deputado Roque Zimmermann2: 2 Autor do Projeto de Lei que criou a Lei do Ensino Religioso. (Falecido recentemente). Em 22 de julho de 1997 foi sancionado o substitutivo do artigo 33, com o número 9475/97, substitutivo que define o Ensino Religioso como disciplina normal do currículo das escolas públicas, sendo do Estado a responsabilidade pela contratação de professores.

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Art. 33- O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da educação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado com respeito a diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

São esses fundamentos que alicerçam epistemologias e pedagogias para o Ensino Religioso, enquanto parte integrante da formação básica do cidadão, e assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa, sem proselitismos. Assim sendo, a Resolução do Conselho Nacional de Educação, (CNE) e do Conselho de Educação Básica CEB de nº 04/2010 e Resolução CNE/CEB nº 07/2010 reconhecem o ER como uma das cinco áreas de conhecimento do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Por outro lado, em se tratando da Educação infantil observamos o tratamento que se tem em relação à (BNCC 2018 p.25), pois, assegura para essa primeira etapa da Educação Básica, os seguintes conteúdos que dão o direito a uma aprendizagem significativa, ou seja: “O eu, o outro e o nós; Corpo, gestos e movimentos; Traços, sons, cores e formas; Escuta, fala pensamento e imaginação; Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações.” Portanto, estes conteúdos se adequam aos conteúdos do Ensino Religioso quando se trata da expressão: “O eu, o outro e o nós”, que anuncia a própria identidade da criança. É quando ela começa a aprender a se ver no outro/a, sua sociabilidade começa a se ampliar, saindo do meio familiar para o meio escolar. Diante das normas e conformidade com as competências gerais estabelecidas na BNCC (2017, p.432), o componente curricular de Ensino Religioso deve atender os seguintes objetivos, porém, entre outras destacamos uma entre as demais: “Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos, culturais e estéticos, a partir das manifestações religiosas percebidas na realidade dos educandos.” O Ensino Religioso propõe construir, por meio do estudo dos conhecimentos religiosos e das filosofias de vida, atitudes de reconhecimento e respeito às alteridades. São espaços de aprendizagens, experiências pedagógicas, intercâmbios e permanente diálogo que acolhem as identidades culturais religiosas, ou não, promovendo assim uma Cultura de Paz para se estender no seio de nossas escolas. Entendemos que o espaço público deve ser um caminho para o diálogo entre as diferenças religiosas, sem qualquer tipo de proselitismo, enquanto princípio de alteridade. Percebemos então, que o ser humano compreendendo tais reconhecimentos de atitudes e de respeito a/o outro/a, estará apto à construção de uma aprendizagem sólida, pois de acordo com a BNCC e seus objetivos observamos que: O ser humano se constrói a partir de um conjunto de relações tecidas em determinado contexto histórico-social, em um movimento ininterrupto de apropriação e produção cultural. Nesse processo, o sujeito se constitui enquanto ser de imanência (dimensão concreta, biológica) e de transcendência (dimensão subjetiva, simbólica). Ambas as dimensões possibilitam que os Simone Simões da Cruz

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humanos se relacionem entre si, com a natureza e com a(s) divindade(s), percebendo-se como iguais e diferentes (BRASIL, 2018, p. 438).

Portanto, é nesse viés que esta relação de ser humano e suas atitudes repercutem através do ethos, onde se realiza o próprio sentido do ser, no qual é formado na sua: “[...] percepção interior dos valores, dos quais nasce o dever como expressão da consciência e como resposta do próprio “eu” pessoal” (FONAPER, 2000 p. 8). Isso diz respeito a uma realidade humana que é construída historicamente e socialmente a partir das relações coletivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem, vivem e convivem com outros tipos de sociedade, numa inter-relação dialógica para estabelecer uma convivência pacífica, independente de credo religioso. Assim, detalhamos no quadro abaixo, alguns objetivos que direcionam o trabalho pedagógico para situar a Educação Infantil no Ensino Religioso.

Quadro 1- Dos objetivos da Educação Infantil, do ER e Pré-Escola Objetivos da Educação Infantil (Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil)

Objetivos do Ensino Religioso Objetivos do ER na Pré(Referencial Curricular Escola (Sugestão) Nacional para o ER).

Conhecer algumas manifestações culturais, demonstrando atitudes de interesse, respeito e participação frente a elas e valorizando a diversidade.

Possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na construção de estruturas religiosas que tem na liberdade o seu valor inalienável. Estabelecer e ampliar cada vez mais Refletir o sentido da atitude as relações sociais, aprendendo aos moral como consequência do fenômeno religioso e poucos a articular seus interesses expressão da consciência e pontos de vista com os demais, respeitando a diversidade e e da resposta pessoal e desenvolvendo atitudes de ajuda e comunitária do ser humano. colaboração. Promover o diálogo como um Utilizar as diferentes linguagens (corporal), musical, plástica, dos elementos construtores oral e escrita ajustadas as da cidadania, da reverência e da alteridade. diferentes intenções e situações de comunicação, de forma a compreender e ser compreendido.

(Re) conhecer diferentes manifestações culturais religiosas, demonstrando atitudes de respeito frente a elas. Oportunizar estudos e reflexões acerca das relações humanas, do respeito às diferenças e à diversidade religiosa.

Ampliar a capacidade e as possibilidades de interação e comunicação por meio de diferentes linguagens, nas perspectivas de aprender a conviver com as diferenças.

Fonte: MEC - Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, 2010 e FONAPERParâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER, 2009)

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Considerações finais Diante das reflexões apresentadas neste trabalho, são consideradas as estratégias lúdicas para a ação pedagógica no cotidiano escolar com o componente curricular de Ensino Religioso. Tais reflexões almejam que a escola responda, não apenas os estudantes que ingressam em busca de saberes, mas aos desafios que lhes são atribuídos na formação de cidadãos que juntos promovem a diversidade e o respeito como elemento significativo no processo de construção da aprendizagem. Se olharmos em nossa volta, percebermos que não existe ninguém igual, na natureza, no pensamento, nos comportamentos e ações. Essas diferenças não são sinônimas de incapacidade, mas de equidade humana. Enfim, as mudanças sociais, culturais e educacionais restabeleceram o direito do Ensino Religioso a ser um componente curricular junto aos demais saberes do currículo escolar. Esse componente curricular, por ser considerado facilitador de uma educação dialógica, inventiva, reflexiva e humana, provoca a discussão sobre o sentido da vida, cujas referências estão no estudo sobre as tradições e culturas religiosas que acontecem na história. Associando esse saber à educação e à cidadania, observamos que há uma sintonia entre estes valores, muito especial na formação do ser humano. Todavia, refletimos que no campo educacional brasileiro é possível dizer que o Ensino Religioso agora está tendo a oportunidade de se destacar dentro da escola entre os demais componentes curricular. Isso acontece por meio da construção do conhecimento, apresentando a dimensão religiosa do ser humano e sua repercussão na sociedade escolar. O Ensino Religioso, de acordo com a sua especificidade, não deve ser confundido com nenhuma outra ciência humana, pois apresenta um grande desafio de como despertar a/o estudante esta percepção do transcendente, sem fazer proselitismo. Além disso, observamos que em cada cultura religiosa existem suas normas educacionais de valores e essas se apresentam com ensinamentos para a construção de uma ética para a cidadania e a cultura de paz tão sonhada por todo planeta. A construção do conhecimento vem proporcionar a/o discente não só a oportunidade de conhecer, mas também de oferecer um espaço de encontro e de alegria, numa relação humana solidária e dialógica. Assim, possibilita uma reflexão, para que haja mais integração entre educadores (as) e educandos (as). Pensar uma educação para a cidadania como um processo contínuo, é refletir sobre a vivência de valores em que as/os educandos e os/as docentes possam aprender juntos e transformar esses ensinamentos num ato amoroso. Tais ensinamentos só poderão ocorrer por meio do respeito e do diálogo. Simone Simões da Cruz

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Nessa construção, verifica-se que tais ensinamentos reúnem o conjunto de conhecimentos ligados ao fenômeno religioso, de cada cultura religiosa, os quais servem de fundamentos e de compreensão, para que essa aprendizagem tenha o mais proveitoso entendimento das culturas apresentadas a/os discentes e docentes, em que esse ou essa possam admirar e respeitar as diferentes culturas religiosas existentes numa sociedade diversificada e pluralista como a nossa, bem como ser abertos e abertas a essas diferenças, respeitando e considerando-as como oportunidades de desenvolvimento e de construção da própria identidade e, portanto, do seu “EU” pessoal.

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Referências BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC), MEC. 2018. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC), MEC. 2017. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov. br/. Acesso em 10de setembro de 2016. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei nº. 9394/96 de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, nº 248 de 23. 12. 1996. Seção I. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Nova redação do Art. 33 da Lei 9394/96. Lei substituta de nº. 9475/97 (Lei do Ensino Religioso) de 22 de julho de 1997. Brasília: Diário Oficial da União, de 23 de julho de 1997, Seção I. BRASIL. Conselho Nacional de Educação/ Câmara de Educação Básica. Resolução nº 4, de 13/07/2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Diário Oficial da União, Brasília, 14 jul. 2010, Seção 1, p. 824. BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação; Câmara de Educação Básica. Resolução nº 7, de 14/12/ 2010. Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove anos). Diário Oficial da União, Brasília, 15 dezembro de 2010, Seção 1, p. 34. COSTA, Iolanda Rodrigues da. MELO, Maria de Lourdes Santos. QUARESMA, Rosilene Pacheco. Ensino Religioso na Educação Infantil: contribuição para o trabalho pedagógico. In POZZER, Adecir. et all (Orgs). Ensino religioso na educação básica: fundamentos epistemológicos e curriculares. Obra 20 Anos do FONAPER. Florianópolis SC: Saberes em Diálogo, 2015.

FREIRE, Paulo - Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 27 ed. 2003. FROEBEL, Friedrich. O formador das crianças pequenas. Revista Nova Escola - Grandes Pensadores. São Paulo, edição especial, v.1 e 2, n.25, p. 32-34, Ed. Abril, jul/2009. FONAPER. Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Disponível em: www.fonaper. com.br. Acesso em: 10 out. 2020. FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (PCNER). Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso - São Paulo: Ave Maria 2002. FONAPER. Ensino religioso capacitação para o novo milênio. Caderno nº 9 - ano 2000. GEBHARD, Jerry G. Teaching as a Foreigner or second language: a selfdevelopment and methodology guide. Michigan: The Universiy of Michigan Press, 1996. HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso: esperanças e desafios. Reflexões da práxis do cotidiano escolar. Florianópolis: Saberes em Diálogo, 2016. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 1999. SILVA, Marinilson Barbosa da. Em Busca do Significado do Ser Professor de Ensino Religioso. João Pessoa: Ed. UFPB, 2011. OLENIKI, Marilac Loraine R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: Uma prática pedagógica no Ensino Religioso. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004. OLIVEIRA, Lilian Blanck de et al. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo, SP: Cortez, 2007. Simone Simões da Cruz

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Referências ROGERS, Carl. Um psicólogo a serviço do estudante. Revista Nova Escola - Grandes Pensadores. São Paulo, edição especial, v.1 e 2,n.25, p. 32-34,Ed. Abril,jul/2009.

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LAICIDADE E ENSINO RELIGIOSO Desafio aos docentes e à formação humana

Maria Dalva de Oliveira Araujo Mestrado em Ciências das Religiões (UFPB). Especialista em: Educação Básica (UFCG), Gestão Escolar (F. Pitágoras) e Novas Tecnologias na Educação (UEPB). Professora aposentada e Supervisora Educacional aposentada. Membro do FONAPER.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: ARAUJO, Maria Dalva de Oliveira. Laicidade e Ensino Religioso: desafio aos docentes e à formação humana. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 135-148.

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Introdução O Ensino Religioso (ER) enquanto componente curricular da Educação Básica (EB), no contexto do Estado laico, ainda é complexo, embora tenha raízes no início da trajetória histórica da educação brasileira. Surgiu atrelado ao ensino da religião dos colonizadores portugueses, desconsiderando outras práticas, especialmente, da população nativa, a indígena. Nesse contexto, em consonância com cada momento histórico tem perpassado a catequese, a proibição, contudo, mantém-se no currículo obedecendo ao princípio da laicidade. Conforme o artigo 33 da lei 9.394/96, modificado pela lei 9.475/97, o Ensino Religioso é um componente curricular obrigatório e facultativo aparentando certa contradição, pois, se veta o proselitismo, não justifica ser facultativo. Em face disso, os professores enfrentam desafios, tais como: garantir a presença dos alunos nas aulas, a escolha dos conteúdos, interligação com a formação humana no sentido mais amplo, entre outros. Tudo isso foi constatado por meio de observação não-participante em 4 (quatro) reuniões de planejamento com professores do referido componente curricular dos municípios integrantes da Terceira Gerência Regional de Ensino da Paraíba. Estes dados foram coletados durante a realização do mestrado em Ciências das Religiões (UFPB) e sinalizam a importância de aprofundar a reflexão sobre o ER como componente curricular da educação básica dos cidadãos e da cidadãs brasileiros/as, portanto, também integrante da formação humana. A partir das referidas reuniões, sediadas em Campina Grande/PB, foi possível registrar no Diário de Campo (DC) alguns Depoimentos dos Docentes (DD) dos quais foram selecionadas expressões que revelaram desafios, e analisadas sucintamente, especialmente, considerando a maneira como alguns professores trataram a situação em sua sala de aula. Os DD revelaram ainda o desafio de trabalhar com a diversidade e, acima de tudo, com a diversidade humana. Diante disso, são objetivos deste trabalho: 1) refletir sobre laicidade no ER com base no artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) e a Constituição Federal de 1988; 2) discutir desafios dos docentes; e 3) ampliar o debate sobre formação humana. Este tema parece relevante tendo em vista que, mesmo com as determinações legais para a permanência deste componente no currículo das escolas públicas, ainda persistem incompreensões acerca da sua importância para a formação básica cidadã. Nesse sentido, são destacadas, inicialmente, as interfaces do ER com dispositivos legais: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), LDBEN 9.394/96 e Lei 9.475/97, aliando estudos de alguns autores que contribuem Maria Dalva de Oliveira Araujo

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para as reflexões sobre o ER, bem como algumas proposições da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017).

Laicidade no ER: interfaces com a CF/88, LDBEN 9.394/96 e Lei 9.475/97 e a BNCC A laicidade do Estado Brasileiro no âmbito do componente curricular ER implica considerar que esta expressão não designa, necessariamente, desconsiderar a existência das práticas religiosas ou sua inexistência na sociedade. Pelo contrário, sinaliza que é necessário articular o trabalho de modo abrangente, contemplando as diversas experiências vivenciadas pela humanidade, especialmente, partindo das experiências dos próprios estudantes quer sejam religiosas, ou não. Tais experiências práticas devem ser trabalhadas no cotidiano escolar propiciando uma convivência harmoniosa, em qualquer situação. Por outro lado, vale salientar a importância de compreender as múltiplas dimensões implícitas no processo de formação humana, pois, o desenvolvimento de conteúdo, também abrange relações interpessoal e intrapessoal. Nesse sentido, torna-se imprescindível priorizar além da dimensão cognitiva, entre outras, a dimensão espiritual, enquanto inerente ao ser humano em sua integralidade. Esta é uma dimensão que corresponde a “parte fundamental e perene da humanização do ser humano” (RÖHR, 2013, p. 21). Dada à relevância deste aspecto na formação humana e no contexto educacional, é comum observar que, muitas vezes, a dimensão espiritual é confundida com a religião ou religiosidade, em particular. Todavia, cabe aos profissionais do ensino religioso buscar constantemente expandir a compreensão sobre esta dimensão do ser e unir, mas não confundir com as práticas religiosas. Ou seja, filtrar no seio de todas as experiências ligadas à religiosidade, ou não, o lado espiritual do ser em suas ações e interações. Para tanto, um caminho a seguir é atentar para as diretrizes legais que fundamentam à prática pedagógica do ER. Conforme determina a Constituição Federal de 1988 , no Artigo 5º, inciso VI “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Esta determinação revela a necessidade de cultivar o respeito à diversidade, defende a relação com a liberdade de expressão, de consciência e de culto. Em suas entrelinhas, portanto, abrange a espiritualidade enquanto dimensão humana em sua essência, uma vez que contempla a questão 138

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dos direitos e deveres humanos e, nesse contexto, agrega o respeito à diversidade cultural religiosa. O fato do Estado brasileiro em determinado período histórico ter sido declarado laico, significa, pois, que “tornou-se equidistante dos cultos religiosos sem assumir um deles como religião oficial” (CURY, 2004, p. 184). Assim sendo, a laicidade a ser respeitada na articulação do ER tem aporte legal na Constituição Federal de 1988 (CF/88), que determinou o desligamento Estado/Igreja, desfazendo esse atrelamento iniciado junto com a história brasileira. Isto pode ser constatado no texto constitucional, conforme mostra o art. 19, no inciso I: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações, dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público (CF/88).

Esta determinação legal é comentada por Cury (2004) fazendo alusão ao Inciso IV do Art. 3º, que se refere ao bem de todos, indistintamente, como objetivo da República. Também ressalta o fundamento da cidadania e prevalência dos direitos humanos, o que é reafirmado no Art. 5º, expressando além dos direitos, os deveres individuais e coletivos, nos Incisos de VI a VIII. Em face do atrelamento inicial Estado/Religião, a inserção do componente curricular ER tem raízes na educação catequética ministrada pelos jesuítas no período colonial e, portanto, foi marcada fortemente por essa influência. Os resquícios desta influência persistiram por algum tempo, mesmo após o Estado Brasileiro ter sido decretado laico, como pode ser observado na versão original do artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 (LDBEN, 1996): O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter: I – confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou II – interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa (CURY, 2004, p. 185).

Nesta versão do artigo 33 da LDBN 9.394/96, embora a oferta legal do ER fosse garantida, não incluía a garantia de sua manutenção pelo Estado Brasileiro, tanto em termos financeiros, como em termos de diretrizes pedagógicas. Além de deixar em aberto estas diretrizes, atribuía poderes a igrejas ou entidades religiosas para a condução das aulas. No inciso I, deixa o espaço escolar aberto Maria Dalva de Oliveira Araujo

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para a confessionalidade e, no inciso II, admite a interconfessionalidade. Em ambos os casos entregava a responsabilidade total do ER ao campo das igrejas ou entidades religiosas. Então, se por um lado aparentava atender ao dispositivo da Constituição Federal, por outro, descumpria o que estava vetado no Artigo 19. Em face disso, a partir da mobilização de educadores e órgãos envolvidos, foi elaborado um Substitutivo ao Projeto anterior do Deputado Nelson Marchezan, que incluía as propostas dos demais projetos, substituindo a redação do mencionado Artigo. O documento foi aprovado em todas as instâncias dando origem a Lei nº 9.475 sancionada em 22 de julho de 1997, deixando o Artigo 33 com os seguintes termos: O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso (HOLMES, 2016, p.82).

Com esta nova redação do Artigo 33, o ER passou a fazer parte da formação básica do cidadão, exigindo uma visão mais ampliada desse processo, especialmente no que se refere ao respeito à diversidade cultural e religiosa. Todavia, mesmo vedando proselitismo é mantido o caráter facultativo em relação à matrícula do aluno, fato que parece contraditório e, muitas vezes, alimenta resistência dos estudantes em participar das aulas gerando desafio aos professores conforme constatado na pesquisa. Apesar de atribuir aos sistemas de ensino “o controle dos procedimentos e definição de conteúdos”, no parágrafo 2º, abre a possibilidade da “orientação de entidade civil atrelada a diferentes denominações religiosas para a definição dos conteúdos do ensino religioso” (ARAUJO, 2015, p. 35). Todavia, essa possibilidade de articulação precisa ser caracterizada como metodologia, no sentido de pesquisas evitando, assim, proselitismo. Desse modo, favorece que o ER possa priorizar a formação humana em sentido amplo e não se limite à transmissão de conteúdos específicos das religiões. É necessário contemplar nessas pesquisas as vivências dos estudantes que, conforme propõe a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) são sujeitos diversos e de direitos ocupando lugares e espaços, “com seus corpos, suas culturas, suas práticas sociais e devem, por isto, ser ‘validados’ por toda a comunidade escolar” (BRASIL, 2017, p. 20). 140

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Tudo isso, porém, representa um desafio para os profissionais da área, pois, este componente curricular representa uma complexidade superior aos demais. Mesmo com o aporte legal do artigo 33 da LDBEN 9.394/96, reformulado pela Lei nº 9.475/97, que cumpre o estabelecido no artigo 19 da Constituição Federal oficializando a oferta do componente curricular, deixa alguns desafios para os docentes. Dentre os quais o caráter facultativo que exige a habilidade docente para conquistar os alunos no sentido de participarem das aulas, bem como ampliar os olhares sobre a formação humana.

Ensino religioso laico: desafios docentes revelados na pesquisa Uma aproximação à realidade do ER laico foi possível, neste trabalho, recorrendo a alguns registros efetivados durante 04 (quatro) reuniões de planejamento bimestrais observadas durante pesquisas do mestrado em ciências das religiões (UFPB), em 2013. Estas eram articuladas pela coordenação pedagógica da 3ª Gerência Regional de Ensino do Estado da Paraíba, com sede na cidade de Campina Grande/PB. Contava, na época, com a colaboração de uma professora atuante em sala de aula na mediação das referidas reuniões. Nesse contexto, foram selecionados alguns Depoimentos Docentes (DD) registrados que aparentaram os desafios mais relevantes, tais como: garantir a presença dos alunos nas aulas, a definição de conteúdos, interligação com a formação humana no sentido mais amplo. Estes estão identificados neste trabalho de acordo com a sequência: Depoimento Docente I (DDI); Depoimento Docente II (DDII); Depoimento Docente III (DDIII) e, assim, sucessivamente. Segue, pois, algumas afirmações que revelaram o desafio de garantir a presença nas aulas de ER: DDI- Os alunos afirmam que ER não reprova e, portanto, não tem necessidade de participar das aulas; DDII- Uma aluna perguntou como iria participar das aulas de ensino religioso, se era ateia; DDIII- Os alunos perguntam: por que na aula de ensino religioso não se fala só de Deus, de Jesus? DDIV- Na aula de ensino religioso os alunos introduzem questões de política partidária. DDV- Os alunos associam o espiritismo ao diabo. Mas com relação ao mal associado à religião, expliquei que o mal assim como o bem está no ser humano e não na religião; Maria Dalva de Oliveira Araujo

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DDVI- Um aluno disse que não queria aula de religião porque já tinha a religião dele.

Estes seis trechos dos DD sinalizam uma aproximação aos desafios enfrentados. Dentre eles os DD (I, II e VI), possivelmente, tenham relação com o caráter facultativo da matrícula. Por outro lado, os DD (III, IV e V) parecem sinalizar especificamente a questão dos conteúdos a serem trabalhados. Atrelado à questão da religiosidade encontramos o DDIII e reportando a situações vividas no cotidiano o DDIV, uma vez que o momento da pesquisa antecedia as eleições para governadores e deputados. Já o DDV revela, talvez, certo preconceito. Os DD destacados revelam a necessidade de trabalhar o respeito à diversidade religiosa, as experiências vivenciadas no cotidiano, bem como o protagonismo humano na relação com o bem e o mal. Os depoimentos destacados parecem oferecer valiosas contribuições para as reflexões pretendidas neste trabalho, uma vez que permitem delinear duas categorias para orientar práticas no ER: 1) o conteúdo do ER e 2) ER como espaço de discussão da vida vivida em suas diversidades. Para articular o trabalho neste componente curricular na perspectiva laica, cabe um olhar carinhoso sobre os conteúdos assim como a metodologia a ser utilizada. Os depoimentos revelam que o conteúdo do componente curricular ER recebe uma amplitude maior em relação aos demais componentes curriculares (CURY, 2004) e isso foi confirmado nos Depoimentos Docentes: É a disciplina mais difícil de se trabalhar. Porque se você for trabalhar Português, Matemática, ou outra, você pega o livro didático e vai só pesquisar a metodologia, mas o conteúdo é um só. Ensino religioso, não, você trabalha com a diversidade - a diversidade religiosa. A diversidade humana é difícil, imagine a diversidade religiosa (DD).

Este desafio apontado no DD retrata a necessidade de considerar as diversidades, tanto humana quanto religiosa, ressaltando a diversidade religiosa como a mais complexa. Foi constatado que as orientações durante as reuniões eram, exatamente, no sentido do respeito à diversidade, especialmente a religiosa, conforme revela o DD acima. A partir disso, é possível concluir que há uma preocupação docente em relação à complexidade deste componente curricular no contexto da educação escolar e, automaticamente, da formação humana que está implícita. Além de abranger a diversidade própria do ser humano em sua constituição/ formação abrange também a diversidade religiosa, a ser respeitada conforme o respaldo legal. Estas diversidades foram constatadas no perfil dos 41 (quarenta e um) estudantes do 7º ano do Ensino Fundamental que responderam ao questionário semiestruturado da pesquisa (ARAUJO, 2014). No sentido de 142

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contemplar estas diversidades, a professora mediadora das reuniões sugeriu aos colegas abrir espaço para discutir com os jovens qual o sentido deles em relação aos problemas atuais da sociedade. Refletir acerca desta questão, segundo ela, favorece ao aluno pensar: “porque os alunos não gostam de pensar, afinal, não é formação humana?” (DD). Ao mencionar a diversidade humana, ela sinaliza a formação humana no sentido mais amplo e, desse modo, atende às orientações da Base Nacional Comum Curricular, pois “os sujeitos são diversos e deverão ser compreendidos assim, nos diferentes espaços em que forem pensadas propostas e práticas pedagógicas” (BRASIL, 2017, p. 20). No contexto observado foram sinalizados conteúdos do Ensino Religioso na visão dos docentes, relatados por eles em seus depoimentos. Foram destacados conteúdos como: o fenômeno religioso, o conhecimento religioso, o estudo das religiões, relação do homem com o transcendente, a transcendência do ser humano. Além destes, o estudo do sagrado, a formação humana, a convivência e as relações entre os/as estudantes. Todos estes conteúdos implicam aprofundamento de estudos e dinamização de práticas no sentido de contemplar a formação humana em sua integralidade que abrange ações, relações e interações conforme a vida vivida.

Ensino religioso na formação humana: espaço de discussão da vida vivida Nesta categoria foram elencados DD que mostram aproximação dos conteúdos trabalhados com a vida vivida pelos estudantes em suas diversidades. Considerar o âmbito dessas diversidades abrange a espiritualidade, aqui entendida como a dimensão profunda do ser humano sem, necessariamente, envolver vínculo com alguma religião em particular. Neste item também foi possível selecionar 06 (seis) DD, identificados seguindo a sequência dos que foram destacados anteriormente: DDVII - Trabalhar a convivência, as relações entre eles. DDVIII - A transcendência do ser humano. É preciso assumir a dimensão transcendente da vida humana. DDIX - Os pais têm a ideia de que ensino religioso é para ensinar os alunos a rezarem. Mas, o estudo das religiões favorece ao aluno despertar sobre a diversidade; DDX - É preciso mostrar logo no início a diferença entre ER e religião – que o ER foca o conhecimento religioso; Maria Dalva de Oliveira Araujo

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DDXI - ER não ensina conteúdos em si, mas para a vida; DDXII - Vivemos num mundo muito complicado e a disciplina ER tem muita responsabilidade.

Podemos perceber que os DD VII e XII admitem a necessidade de considerar as situações vividas no cotidiano de modo a favorecer uma convivência mais harmoniosa. Nesse contexto, o ER assume uma responsabilidade maior em face do mundo muito complicado conforme o DDXII. Este DD parece denotar a preocupação com a formação humana numa dimensão macro, ou seja, considerando os estudantes no âmbito social como um todo, indo além dos muros da escola. Envolve a convivência e as relações no âmbito das diversidades de modo a desenvolver o espírito de solidariedade e respeito mútuo. Por outro lado, os DD IX e X mostram a necessidade de maior clareza junto à comunidade escolar quanto à proposta do trabalho na área ER. Sinaliza a importância de propiciar momentos de interação ampliada envolvendo também os pais. Trata-se de uma forma de conectar os atores envolvidos no processo educacional, pois, “não dá para formar pessoas desconectadas do mundo e de outras pessoas, fixando sua visão em si mesma, sem considerar a visão ampliada do Todo” (RÖHR, 2013, p. 245). A revelação da dimensão mais profunda do ser pode ser observada nos DD VIII e XI que mencionam a transcendência, como uma dimensão da vida. No que se refere ao ser humano, abrange o potencial humano de ir além de si mesmo. Quanto aos conteúdos em si supõe transpor os limites do ensino conteudista, associando-os à vida. Envolve, ao que parece, vinculação à espiritualidade, pois é uma dimensão humana que possibilita “acesso ao transcendente”, aliás, a única forma (RÖHR, 2013, p. 72). A espiritualidade, no cerne dos debates sobre educação, vem desfrutando de especial atenção, sobretudo, naquilo que pode se considerar educação integral. Sendo uma dimensão educativa, quer seja reconhecida, ou não, está implícita no trabalho escolar fazendo parte do currículo oculto. Nesse sentido, torna-se imprescindível “repensar o Ensino Religioso como fecundo terreno para se recuperar, refletir e desenvolver de forma plural e universal, a categoria espiritualidade trabalhada como conteúdo e estratégia didática” (SMARJASSI, 2011, p. 243). Esta pesquisadora afirma que “a espiritualidade diz respeito aos sentimentos interiores das pessoas, enquanto a religião refere-se a um conjunto organizado de regras e regulações” (p. 246). Por esta razão, ela considera justificável à espiritualidade como categoria de ensino. Diante disso, contribuindo para as práticas pedagógicas no seio dos desafios apresentados neste trabalho encontramos os 04 (quatro) objetivos do ER, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL. 2017, p. 436): 144

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a) Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos, culturais e estéticos a partir das manifestações religiosas percebidas na realidade dos educandos; b) Proporcionar conhecimentos sobre o direito à liberdade de consciência e de crença, no constante propósito dos direitos humanos; c) Desenvolver competências e habilidades que contribuam para o diálogo entre perspectivas religiosas e seculares de vida, exercitando o respeito à liberdade de concepções e o pluralismo de ideias, de acordo com a Constituição Federal; d) Contribuir para que os educandos construam seus sentidos pessoais de vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania.

A seguir, ampliando as possíveis contribuições para a reflexão e a prática sobre a questão da convivência e das relações no âmbito das diversidades é abordado no referido documento, o conjunto de 06 (seis) competências para o ER (BRASIL, 2017, p. 437): 1. Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes manifestações, tradições religiosas e filosofias de vida, embasados em pressupostos científicos, filosóficos, estéticos e éticos, a partir das manifestações percebidas na realidade dos educandos; 2. Compreender, valorizar e respeitar as manifestações, tradições religiosas e filosofias de vida, suas experiências e saberes, em diferentes tempos, espaços e territórios, no constante propósito de promoção dos direitos humanos; 3. Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza, como expressão de valor da vida. 4. Conviver com a diversidade de crenças, de pensamentos, de convicções, de modos de ser e de viver exercitando o respeito à liberdade de concepções, o pluralismo de ideias e a cidadania; 5. Analisar as relações entre as manifestações, tradições religiosas e filosofias de vida e os campos da cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia e do meio ambiente para a construção de projetos de vida. 6. Debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos e às práticas de e intolerância, discriminação e violência de cunho religioso, de modo a assegurar os direitos humanos no constante exercício da cidadania e da cultura de paz.

Além de outras orientações contidas na BNCC, os 04 (quatro) objetivos e as 06 (seis) competências do ER presentes norteiam a elaboração dos currículos em nível estadual, municipal e escolar aparentando contemplar, em linhas geMaria Dalva de Oliveira Araujo

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rais, os desafios revelados neste trabalho oriundos de Depoimentos Docentes (DD) durante as reuniões de planejamento observadas. Trata-se, portanto, de orientações gerais que poderão subsidiar a elaboração e operacionalização de projetos no âmbito do componente curricular ensino religioso, acrescidas das especificidades de cada realidade escolar.

Considerações Finais O ER no contexto escolar parece representar uma via favorável ao trabalho com aspectos do ser humano em suas relações consigo, com o outro e o entorno social, bem como com a natureza. Trata-se de um componente curricular que possibilita formar protagonistas da história da própria vida e não somente meros expectadores. Desse modo, a reflexão sobre o conteúdo de ER, é fundamental, mas sem esquecer que, para respeitar o princípio da laicidade, o primeiro material a ser trabalhado é o mundo vivido pelo/a educando/a. Nesse sentido, a prática pedagógica precisa ir além do aspecto religioso, em si, tendo em vista que nem todos os estudantes revelam possuir vivência religiosa. Disso nasce a importância de contemplar a espiritualidade, como uma dimensão mais profunda que possibilita acesso ao transcendente ou sua própria transcendência enquanto potencial humano. Com relação ao caráter facultativo do ER parece razoável possuir o mesmo tratamento das outras disciplinas. Entretanto, a forma de lidar com o componente curricular é que fará a diferença no sentido de conquistar os estudantes para participarem das aulas. Um exemplo disso é a forma de avaliar, pois esta não precisa ser impositiva, mas reflexiva, processual, formativa, levando o estudante a desenvolver a capacidade de auto avaliação que também é um exercício para a própria vida. A avaliação da aula feita pelo estudante, por exemplo, constitui uma oportunidade de desenvolver o seu senso crítico e, ao mesmo tempo, representa em instrumento valioso de auto avaliação também para o professor. A presença do estudante na aula de ER precisa ser valorizada não só no sentido de cumprir as atividades propostas, mas, quando necessário, viabilizando outras atividades em que ele possa se expressar trazendo para o cenário da sala de aula suas experiências, expectativas e anseios. Afinal, sendo o ER facultativo, o aluno que participa das aulas não poderá ser penalizado por meio de uma avaliação autoritária, classificatória e somativa. Na medida em que o professor de ER adotar essa prática, ele estará viabilizando a oportunidade de reflexão sobre o sentido da vida e adentrar no sentido que faz parte da vida vivida pelo estudante, a vida no presente. Dessa forma, estará 146

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focando sua espiritualidade, enquanto dimensão intrínseca ao ser, que poderá ser desenvolvida ou até mesmo despertada, pois, muitas vezes, ela permanece adormecida.

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Referências ARAUJO, Maria Dalva de Oliveira. Ensino religioso como aporte da formação humana: percepção de estudantes do ensino fundamental. (Dissertação de Mestrado em Ciências das Religiões) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2014. Orientação de Glória das Neves Dutra Escarião. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a base. Brasília, MEC/ CONSED/UNDIME, 2017. BRASIL. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da Uninão, Brasília: 23 dez. 1996, P. 27833. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao.htm. Acesso em: 26 maio 2014.

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CURY, Carlos Roberto Jamil. Ensino religioso na escola pública: o retorno de uma polêmica recorrente. In: Revista Brasileira de Educação. n. 27. set./out./nov./dez. 2004. HOLMES, Maria José Torres. Ensino religioso: esperanças e desafios – reflexões da práxis do cotidiano escolar. Florianópolis: Saberes em diálogo, 2016. RÖHR, Ferdinand. Educação e Espiritualidade: contribuições para uma compreensão multidimensional da realidade, do homem e da educação. Campinas SP: Mercado das Letras, 2013. SMARJASSI, Célia. Educação e Espiritualidade: limites e possibilidades de um encontro pedagógico no ensino religioso. In.: Rev. PistisPrax., Teol. Pastor., Curitiba, v. 3, n. 1, p. 239-268, jan./ jun. 2011.

ENSINO RELIGIOSO, O CARRO-CHEFE DA CIÊNCIA DA RELIGIÃO APLICADA BRASILEIRA Posfácio

Rodrigo Oliveira dos Santos

Fábio L. Stern

Doutorando em Ciência da Religião (PUC-SP).

Licenciado em Ciências da Religião (UFSM).

Professor de Ensino Religioso e redator do currículo de Ensino Religioso da rede estadual (Pará) e municipal (Belém).

Especialista em Ciência da Religião (PUC-SP).

Membro do LAB-CR.

Doutor em Ciência da Religião (PUC-SP).

[email protected]

Mestre em Ciência da Religião (PUC-SP).

Bolsista PNPD/CAPES pelo PPG em Ciência da Religião da PUC-SP. Membro do LAB-CR.

[email protected]

Como referenciar este capítulo: DOS SANTOS, Rodrigo Oliveira; STERN, Fábio L. Ensino Religioso, o carro-chefe da Ciência da Religião aplicada brasileira. In: MARANHÃO, Fº. Eduardo Meinberg de Albuquerque (Org.). O ensino religioso e a sala de aula. Florianópolis: AMAR; FOGO, 2021, pp. 149-152.

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Recentemente, apesar de tantos ataques à ciência, a Ciência da Religião conseguiu (de)marcar espaços mais significativos na sociedade brasileira, em termos de pesquisa e aplicação, sendo o último tão expressivo e fundamental para a formação humana cidadã, aspecto esse central à discussão desta Coleção da FOGO Editorial e da AMAR. Em âmbito mundial, a Ciência da Religião aplicada tem se destacado no Brasil, especialmente na educação, tendo o Ensino Religioso como seu carro chefe, onde viabiliza iniciativas de adequação dos resultados produzidos nessa disciplina acadêmica ao nível cognitivo dos alunos na educação básica. O fato de o Brasil ser o único país do mundo a ter uma graduação de licenciatura em Ciência da Religião, focada exclusivamente na formação docente, mas com peso de lei igual ao do bacharelado, colocou-nos na dianteira das discussões mundiais sobre um Ensino Religioso laico pautado em ciência, com poucos países em situação melhor que a nossa (p. ex. Suécia). Os resultados do trabalho de formados em Ciência da Religião não só possibilitam um aspecto básico comum a todo componente do currículo escolar – o conhecimento científico sobre algo –, como também oferta, esse conhecimento como algo capaz de ser localizado, estudado e verificado em sua natureza própria, a natureza humana. E por mais que esse conhecimento assuma tantas versões, cada versão não deixa de ser uma versão humana. Aí está toda grandeza deste ramo da Ciência da Religião que, nesse caso, ao adotar o conhecimento sobre religiões e outras visões de mundo numa perspectiva empírica, própria de todo e quaisquer estudo científico, possibilita um ambiente na escola propício ao respeito às diferenças e às diversidades humanas, sejam elas religiosas, culturais, étnicas ou sexuais, além do reconhecimento e apreço às versões de vida, sejam religiosas ou não. Num Ensino Religioso pautado em Ciência da Religião, elas tem a oportunidade para se (re)conhecerem. Conforme Clemens Cavallin1 comenta, a Ciência da Religião Aplicada tem grande potencial em promover o empoderamento de minorias, os Direitos Humanos, e estimular a vida cidadã. Essas considerações apontam e, de certa forma, ratificam todo esforço empreendido nesta Coleção por todos os colaboradores, assentada na proposta que a Ciência da Religião tem algo a contribuir com a sociedade brasileira e com a produção do conhecimento científico sobre religiões no país, diante de seu vasto e imenso universo religioso e outras visões de mundo. A FOGO Editorial oferece-nos tais obras num momento mais que oportuno, consolidando um esforço conjunto de afirmação de um Ensino Religioso com 1

Disponível em https://revistas.pucsp.br/rever/article/view/54400 Rodrigo Oliveira dos Santos & Fábio L. Stern

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base na ciência, desempenhado uma função vital no currículo escolar, tão atacado por ideias e visões da realidade empírica assentadas em posturas equivocadas e, muitas vezes, até fundamentalistas, com incentivos discriminatórios e discursos de ódios direcionados a determinadas pessoas, grupos e versões que, na realidade, não deixam de ser igualmente humanos e, por isso, merecedores de respeito. Nesse bojo, o Ensino Religioso é mais que um acesso para a humanização dos estudantes, ele amplia a cidadania em todos os aspectos inerentes a palavra, pois é grande conciliador de tais versões – religiosas ou não –, ensinando que cada uma não deixa de ter origem e desenvolvimento em uma das múltiplas formas de se ser humano. Como tal, une a todos nós, construíndo uma sociedade mais acolhedora e igualitária. Mas o trabalho para os formados em Ciência da Religião não termina com esta Coleção. No momento atual, tanto precisamos garantir esse espaço de cidadania no país, como também precisamos garantir maior protagonismo de cientistas da religião na educação básica e nas escolas. Ainda que o Brasil esteja na dianteira mundial nas discussões sobre um Ensino Religioso não catequético, pautado em Ciência da Religião, estamos muito longe do ideal. O trabalho é árduo, mas reconheçamos também nossas conquistas. Concluímos este posfácio convidando todos os licenciados em Ciência da Religião para que atuem mais ativamente pelas políticas públicas em prol da educação cidadã, e assumam o protagonismo necessário para consolidarmos nosso espaço na sociedade. Apoiem seus cursos. Participem das reuniões dos conselhos locais e associações profissionais. Frequentem os congressos e simpósios da área. Valorizem os seus colegas de profissão. Leiam nossos periódicos e citem os autores da área. E, mais do que tudo, continuem amando e mudando as coisas.

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POSFÁCIO

AS PESSOAS QUE CO - LABORARAM COM ESTA OBRA AGRADECEM AMOROSAMENTE POR SUA LEITURA SENSÍVEL Comissão Editorial da Coletânea

Patrícia

Fábio

Du (Flor)

Ornélia

Cláudia

Autoras e Autores

Gilbraz

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Du (Flor)

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Marinilson

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amar associação internacional de estudos de afetos e religiões