Meu Sistema [1 ed.] 9788598628080

O livro Meu Sistema é considerado por muitos como o mais importante da literatura enxadrística. Escrito em 1925 e traduz

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Portuguese Pages 272 Year 2020

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Meu Sistema [1 ed.]
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© Editora Solis Ltda.2007 Primeira edição em português:agosto de 2007 © Editora Solis 2007 Editora:Jussara Chaves Garcez Leme Revisão:Joara Chaves Editoração eletrônica:Studio Camera Tre

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Nimzovitsch, Aaron, 1886-1935. Meu Sistema / Aaron Nimzovitsch ; tradução de Francisco de Assis Garcez Leme -- 1. ed. -Santana de Parnaíba, SP : Editora Solis, 2007. Título original: Mein System ISBN 978-85-98628-08-0 1.Xadrez 2. Xadrez - Estudo e ensino I. Título 07-6418

CDD-794.107

Índices para catálogo sistemático: 1. Xadrez : Estudo e ensino

794.107

ISBN:9788598628080 As fotografias e ilustrações incluídas neste livro procedem dos arquivos da Editora Solis. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, armazenada ou transmitida em qualquer forma, nem por qualquer meio, seja eletrônico, químico, mecânico, ótico, de gravação ou de fotocópia, sem autorização prévia e por escrito dos detentores dos direitos da presente edição em língua portuguesa. A infração dos direitos do tradutor e da editora pode constituir crime. EDITORA SOLIS/WGD www.editorasolis.com.br contatos:[email protected]

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Apresentação da edição brasileira

As bases científicas do jogo de xadrez foram desenvolvidas por Wilhelm Steinitz (1836-1900), considerado o primeiro campeão mundial de xadrez após sua vitória sobre Johann Zukertort no match disputado em 1886. Steinitz, um ferrenho seguidor do método científico, foi o primeiro a estabelecer os princípios gerais da estratégia, dividindo a posição de uma partida de xadrez em seus elementos e captando os seus fatores e fases mais importantes. Suas descobertas significaram uma revolução conceitual no jogo de xadrez, a qual inaugurou a Escola Clássica, que sucedeu a era romântica dos primórdios do jogo, marcada desde o Século XVII pelos geniais Philidor, La Bourdonnais, Staunton, Anderssen, Morphy e vários outros jogadores. O primeiro jogador a compreender corretamente as idéias revolucionárias do grande Steinitz e a difundir seus ensinamentos à legião de jogadores foi o Dr. Siegbert Tarrasch (1862-1934), nascido em Breslau, na Alemanha, e que se transformou através dessa difusão em mentor intelectual de mais de uma geração de mestres. Tarrasch, apelidado “o professor da Alemanha”, possibilitou assim o surgimento no primeiro quarto do Século XX de jogadores como Rubinstein, Alekhine e os “hipermodernistas” (também chamados de “neo-românticos” no início de uma nova revolução iniciada por Nimzovitsch na década seguinte ao ano de 1910). Esse pequeno resumo histórico é importante para a contextualização do presente livro, editado pela primeira vez no idioma alemão em 1925, cuja publicação consolidou os resultados de um longo debate de idéias sobre a abordagem do jogo de xadrez pós-Steinitz. Ao longo de Meu Sistema o leitor encontrará as bases de uma nova revolução na estratégia do jogo de xadrez, cujos resultados repercutem até os nossos dias. Sob a influência da série de empates registrada em Havana em 1921 na disputa pelo título mundial entre Lasker e Capablanca, ambos jogadores iniciaram a discussão sobre a “morte pelo empate” do jogo de xadrez. “O jogo de xadrez está se aproximando da perfeição”, escreveu Lasker. “Atualmente muito é sabido e por isso não é necessária a intuição, como 3

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nós os mestres mais antigos estávamos acostumados desde os dias da nossa juventude. Por mais triste que seja, o conhecimento traz a morte”. E mais tarde completou: “A hora fatal desse jogo se aproxima. Em sua forma moderna, esse jogo em breve morrerá a morte dos empates, a inevitável vitória da certeza e da mecanização dos conhecimentos sobre a intuição. Então novas regras terão que ser inventadas”. Capablanca pensava de forma parecida e em 1929 chegou a propor uma variação do jogo para um tabuleiro com 192 casas, protagonizando até uma interminável exibição com Maróczy, levando ao conhecido gracejo de Alekhine de que “esses projetos sempre são liderados por jogadores que perderam o campeonato mundial...”. Na verdade, os temores de Lasker e de Capablanca significavam uma clara ilustração da limitação do conhecimento humano. Na pequena ilha de conhecimento enxadrístico na qual evoluíram a um nível técnico sem precedentes, parecia-lhes que não havia mais por onde crescer. Com o passar dos anos perceberam que o território do xadrez é muitíssimo mais vasto e que eles, como de resto todos os jogadores de qualquer época, estavam muito longe de esgotar as possibilidades do jogo. Um grande papel nessa percepção foi desempenhado pela Escola Hipermoderna, uma nova e revolucionária tendência do pensamento enxadrístico. O pai dessa nova escola foi Nimzovitsch, os seus pilares, Réti e Breyer e os seus grandes apoiadores e divulgadores Alekhine, Bogoljubov, Tartakower, Grünfeld.... e tantos outros jogadores ao longo de quase um século, os quais trouxeram essa revolução do pensamento enxadrístico iniciada por Steinitz até os nossos dias. Aaron Nimzovitsch, autor entre outros livros de Meu Sistema, nasceu em Riga em 1886 e morreu vítima de pneumonia aos 48 anos, no ano de 1935, em Copenhagen. Através de seus estudos, refinou e expandiu substancialmente os princípios de Steinitz ao colocar em prática várias idéias verdadeiramente revolucionárias. Seu famoso e provocativo artigo “‘A Partida Moderna de Xadrez’ do Dr. Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno?”, publicado em 1913 e apresentado na íntegra ao final deste livro, foi o estopim de uma nova revolução. O antagonismo com o difusor inicial das idéias de Steinitz, o Dr. Tarrasch, se transformou em um debate intelectual sobre a teoria do jogo em nível jamais visto na história do xadrez. Convém lembrar que Tarrasch e seus seguidores davam um valor muito grande à ocupação central com os peões na abertura. Nimzovitsch e os demais próceres da escola hipermoderna sustentavam o domínio central à distância, considerando os movimentos de peões na abertura como 4

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necessárias perdas de tempos. “Com sua habilidade em imaginar esquemas profundos e originais, Nimzovitsch estava muito à frente do seu tempo e a sua contribuição para a teoria do jogo posicional foi enorme. Seu livro ‘Meu Sistema’ tornou-se um manual de valor inestimável para muitas gerações de jogadores (Petrosian, por exemplo, cresceu através dele!). Sua polêmica com Tarrasch aumentou os limites da nossa compreensão do xadrez. Como escreveu Lasker, ‘a nova escola deveria unir e sintetizar aquelas que foram personalizadas nas figuras antagônicas de Steinitz e Chigorin’. Acredito que a histórica disputa entre esses dois titãs do pensamento enxadrístico foi vencida por Nimzovitsch: a popularidade de sua defesa excedeu e muito a de Tarrasch. Uma vitória da flexibilidade”. (Garry Kasparov em Meus Grandes Predecessores – Volume 1, Ed. Solis, 2004, fonte de diversos trechos desta apresentação). Este livro é fundamental para a compreensão estratégica e evolução prática no jogo de xadrez. É um livro de estudo obrigatório para todos os jogadores que querem evoluir em competições e torneios, sendo bastante recomendado para adoção em escolas onde esse jogo é ensinado. Também é um livro necessário para as pessoas que queiram compreender uma partida de xadrez jogada em alto nível entre jogadores de elite. Por essa razão, é um livro muito útil para os simples entusiastas desse esporte, dentre os quais me incluo. A Editora Solis orgulha-se em publicar esse grande clássico da literatura enxadrística universal pela primeira vez na língua portuguesa. Esperamos que a leitura do mesmo em nosso idioma seja motivo de prazer e facilite o estudo e o progresso enxadrístico de jogadores do Brasil e dos demais países de língua portuguesa. Francisco Garcez Leme Julho de 2007

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Prólogo

Em geral não gosto de escrever prólogos ou introduções, mas nesse caso julgo necessário, pois em se tratando de matéria nova resultará uma introdução que poderá favorecer a sua leitura. Meu novo sistema não surgiu do nada, por geração espontânea, mas de forma progressiva e, de certo modo, orgânica. A idéia central ou motriz era a de passar em revista a todos e cada um dos elementos estratégicos do xadrez e analisá-los em profundidade, sem levar em conta a intuição. De pouco serviria, por exemplo, dizer ao leitor que as colunas abertas devem ser ocupadas e aproveitadas, ou que um jogador que enfrenta um peão passado deverá freá-lo. Um tema dessa amplitude exige que se detenha nos detalhes e circunstâncias. Embora possa parecer cômico, para mim, caros leitores, o peão passado tem alma e, assim como os homens, possui aspirações que habitam seu interior e temores de cuja existência apenas suspeita. Isso se estende à cadeia de peões e aos demais elementos estratégicos. Sobre cada um desses elementos darei uma série de princípios e regras, para estudá-los em detalhes e assim poder esclarecer a forma em que os acontecimentos se encadeiam nas 64 casas do nosso querido tabuleiro. Na segunda parte do livro trataremos do jogo posicional, com especial atenção ao aspecto neo-romântico (hipermoderno, de Hipermodernismo, como é mais conhecida essa escola. N. do T.). Como muitas vezes se disse que sou o pai dessa escola, não deixa de ser interessante conhecer as formulações nas quais se baseia. Os livros de xadrez muitas vezes são áridos, pois carecem por completo de senso de humor. Seguramente seus autores pensam que o tom humorístico retiraria valor do conteúdo, que pode resultar menos pedagógico nesse caso. Essa concepção me parece totalmente errônea, uma vez que com o humor pode-se sublinhar a maior das verdades. Confesso, por exemplo, que creio nas verdades da vida cotidiana, de onde me agrada utilizar os fatos para, comparativamente, esclarecer algumas facetas complicadas do xadrez. Às vezes preparei esquemas comentados, de forma que possam ressaltar 7

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a estrutura das idéias. Fiz isso por convicção pessoal e por razões pedagógicas, para assentar os fundamentos, pois caso contrário qualquer crítico medíocre – dos tantos que existem! – poderia dizer que os detalhes isolados não representam um todo, que é o autêntico objetivo desse livro. Os detalhes dos diferentes temas tratados na primeira parte aparentam ser simples, e esse é justamente o mérito do livro. Ter conduzido o caos a uma série de regras orgânicas, que guardam entre si uma relação de causas é precisamente o mérito da obra. Muito simples, por exemplo, parecem ser os casos especiais das sétima e oitava fileiras, porém foi muito difícil extrair do material caótico existente esses cinco exemplos. O mesmo se pode dizer das colunas abertas e da cadeia de peões. Naturalmente, à medida que se avança o texto, aumenta a dificuldade, pois o livro está concebido em forma progressiva. De toda forma, não me utilizarei dessas dificuldades para defender-me de críticos superficiais. Suponho também que serei criticado por citar partidas jogadas por mim, porém isso não me importa. Não tenho o direito, por acaso, de ilustrar o meu sistema com as minhas próprias partidas? Devo dizer também que inclui algumas partidas de amadores, porém o leitor não deve ter receio, pois essas partidas são bem jogadas. Ao submeter esse livro ao julgamento do público, o faço com a consciência tranqüila, pois nele coloquei todos os meus conhecimentos. Minha obra tem os seus defeitos, porque é impossível investigar todos os rincões da estratégia, porém estou certo de ter escrito o primeiro livro de verdadeiro ensino do jogo de xadrez e não somente um tratado de aberturas. A. Nimzovitsch Agosto de 1925

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Capítulo I - Desenvolvimento

O que se deve saber sobre centro e desenvolvimento

Na estratégia enxadrística deve-se considerar os seguintes elementos: 1º - O centro; 2º - As colunas abertas; 3º - O jogo na sétima e na oitava fileiras; 4º - O peão livre; 5º - O bloqueio ou cravada; 6º - O xeque descoberto; 7º - A troca; e 8º - A cadeia de peões. Na seqüência se tratará com detalhes cada um desses elementos. Começaremos pelo centro, tratando-o por ora para o principiante, deixando para a segunda parte (dedicada ao jogo posicional) o enfoque do ponto de vista cientificamente “superior”. Como se sabe, nos anos 1911-1913 começou a revolução enxadrística sobre os conceitos de centro, na qual se inserem meus artigos. Em ‘Entsprich Dr. Tarrasch´s Moderne Schachpartie wirklich Moderner Auffassung?’ (“‘A Partida Moderna de Xadrez’ do Dr.Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno?”) ataquei violentamente o conceito antigo de centro, sendo esse justamente o toque de alvorada que originou o nascimento da escola neoromântica [ou escola hipermoderna, como também é conhecida. N. do T]. Por essa razão se justifica a divisão no conceito de centro, que aqui fazemos por razões pedagógicas, e que posteriormente terá seu alcance ampliado

Vejamos algumas definições:

Diagrama 1

No diagrama 1, chamamos linha divisória (ou limite) à linha desenhada, mantendo o conceito geométrico de linha, e centro do tabuleiro ao marcado no diagrama 2, sempre no sentido geométrico, ao qual se chega facilmente pela interseção das diagonais maiores do tabuleiro.

Diagrama 2 – O pequeno quadrado central

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1 – O desenvolvimento e a mobilização das peças até a fronteira (ou linha divisória) que divide ambos os campos.

A mobilização é similar ao início de uma guerra. Ambos os exércitos tratam de alcançar o limite o quanto antes com o objetivo de penetrar, se possível, no território inimigo. O desenvolvimento é um conceito coletivo. Desenvolver uma, duas ou três peças não significa que estamos desenvolvidos. A situação requer que todas as peças se desenvolvam. O período de desenvolvimento deve estar imbuído de um espírito democrático. Seria pouco democrático, por exemplo, enviar um de nossos oficiais para fazer uma grande viagem, enquanto os outros ficam no quartel em um tédio insuportável. Não, convém conceder um lance a cada oficial e... lancemo-nos à luta! 2 – Os movimentos de peões não são desenvolvimento, mas lances auxiliares ao mesmo.

O principiante deve sempre considerar o importante postulado de que se fosse possível o desenvolvimento sem movimentar os peões, seria esse o ideal estratégico de avanço. O peão não é uma unidade agressiva, no sentido de que o inimigo deva temê-lo quando consiga cruzar o limite, pois o poder ofensivo dos peões é pequeno em comparação com o das demais peças. No entanto, uma disposição de avanço sem peões é irrealizável, pois o centro de peões inimigos, devido à sua força interna de expansão, expulsaria as nossas peças desenvolvidas. Por esse motivo temos que organizar um centro de peões para a segurança das peças. 12

Entendemos por centro o quadrado menor que se agrupa ao redor do ponto central, ou seja, as casas d4, e4, d5, e5 (veja o diagrama 2). O fracasso de um avanço sem o apoio dos peões é ilustrado pelo seguinte início de partida: 1.Nf3 Nc6 2.e3 Como o peão não realizou seu avanço até o centro, consideramos dentro do nosso conceito de que o avanço se faz sem a intervenção de peões. 2...e5 3.Nc3 Nf6 4.Bc4? d5 Nessa posição podem-se observar as falhas na disposição do avanço das brancas e que os peões estão desmobilizados. 5.Bb3 Esse lance é mau, pois se teve que jogar duas vezes a mesma peça. 5...d4 E as brancas se encontram em uma posição incômoda do ponto de vista do jogador com pouca experiência competitiva. Outro exemplo é a partida que exponho brevemente na continuação. Nimzovitsch (sem a Ra1 e o Pa2) Amador. 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.c3 Nf6 5.d4 exd4 6.cxd4 Bb6 As pretas perderam seu centro e, ainda mais, por não terem jogado 4...d6, permitiram uma mobilidade excessiva ao centro das brancas. Por isso se pode dizer que a posição das pretas se transformou em uma disposição sem peões ou, mais propriamente, que na posição atual não há peões que contribuam para o seu desenvolvimento. 7.d5 Ne7 8.e5 Ne4 9.d6 cxd6

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10.exd6 Nxf2 11.Qb3 Pela colocação do peão em d6, as pretas em poucos lances sofrerão as violências do ataque e, apesar da nova torre tomada, abandonarão. 11...Nxh1 12.Bxf7+ Kf8 13.Bg5 As pretas abandonaram. De acordo com a regra que encabeça o parágrafo, os lances de peões no desenvolvimento só são admissíveis na fase de desenvolvimento, quando tendem a ocupar o centro ou estão em relação lógica com esse, como seria, por exemplo, um lance de peão que cubra o próprio centro ou que ataque o centro inimigo. Em partidas abertas, na posição 1.e4 e5, tanto 2.d3 como 2.d4 são lances corretos, quer sejam feitos logo em seguida ou mais tarde. Se de acordo com isso somente devem ser permitidos lances de peões que se ajustem à regra, os tão vulgarizados lances de peões nas alas significam somente perdas de tempo, como efetivamente o são. Nas disposições de partidas fechadas, a regra também é válida, mas nesse caso sua influência é reduzida, pois o contato com o inimigo é menor e o desenvolvimento é mais lento. Resumindo, diremos que no jogo aberto a velocidade do desenvolvimento é primordial e por isso toda peça deve ser desenvolvida em um só lance. Qualquer lance de peão, que não favoreça a formação do centro, o apóie ou ataque o centro inimigo, deve ser considerado uma perda de tempo, pelo que, como corretamente observou Lasker, não deve haver na abertura mais do que um ou dois lances de peões.

3 – O ideal da vantagem no desenvolvimento.

Se eu tiver que disputar uma corrida com alguém, devo saber que não é oportuno perder parte do tempo assoando o nariz, sem que por isso pretenda criticar esse ato em si; mas se eu puder instigar meu adversário a fazê-lo, ele perderia tempo e eu obteria uma vantagem na corrida. Os lances repetidos com uma mesma peça podem ser comparados com essa ação. A posição do diagrama 3 é um exemplo típico e se produziu após os seguintes lances: 1.e4 d5 2.exd5 Qxd5 3.Nc3

Diagrama 3 – O típico ganho de tempo 4 – A troca com o conseqüente ganho de tempo.

A partida anterior, apesar da sua brevidade, contém uma manobra que podemos classificar como complexa. Qual a finalidade do lance 2.exd5? (veja o diagrama 4). A resposta é a seguinte: atrair a dama a uma casa comprometedora. Essa é a primeira parte da manobra; a segunda (3.Nc3) consiste no aproveitamento da posição na qual ficou a dama. 13

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Diagrama 4 – As brancas jogam. A troca se impõe e a peça que retoma se posiciona em uma casa comprometedora

A manobra complexa assim caracterizada é de enorme valor para o principiante. Na seqüência damos mais alguns exemplos. Após: 1.d4 d5 2.c4 Nf6 3.cxd5, apresentam-se duas variantes. No caso de 3...Qxd5, então 4.Nc3, ou se 3...Nxd5 seguiria 4.e4. Em ambos os casos, as brancas com seu quarto lance completam o seu desenvolvimento, enquanto as pretas se vêem obrigadas a perdas de tempo. O principiante pode se perguntar: “porque as pretas tomam de novo?” Essa pergunta pode ser associada ao fato de que alguns comerciantes espertos mostram no xadrez uma assombrosa nobreza de espírito e... não tomam de volta! Mas o mestre de xadrez sabe que existe uma obrigação absoluta de retomar, pois caso contrário o equilíbrio material estará alterado. Disso se deduz que quando surge uma obrigação de tomar se retarda o desenvolvimento, salvo no caso em que com a captura se complementa o mesmo. 14

Outro exemplo: 1.e4 e5 2.f4 Nf6 3.fxe5 Nxe4 Obrigado, senão as pretas perderiam um peão sem compensação. 4.Nf3 Para evitar Qh4+. 4...Nc6 5.d3 Nc5 6.d4 Ne4 7.d5 E as brancas depois de 7...Nb8 têm a possibilidade de ganhar novos tempos com 8.Bd3 ou 8.Nd2. Essa última alternativa deve ser a preferida, pois a troca do cavalo desperdiçador de tempos pelo cavalo econômico oferecido en d2 significa a consagração das perdas de tempo das pretas, pois com o desaparecimento do devorador de tempos não restará rastros dele no tabuleiro. Quando um fazendeiro perde seus leitões devido a uma peste, lamenta não somente a perda dos leitões mas também da ração consumida. O possível “intermezzo” na manobra de troca e ganho de tempo é acidental à manobra em si. Ao jogar: 1.e4 e5 2.f4 d5 3.exd5 Qxd5 4.Nc3 Qe6, as brancas já estão em condições de considerar a manobra de troca fxe5 e Qxe5, pois a dama ficaria em uma casa comprometedora. Porém, deve-se considerar ainda que a 5.fxe5 segue 5...Qxe5+ e aparentemente as brancas não estão em condições de aproveitar a posição falsa em que se encontra a dama preta. Porém, na realidade, o xeque nada mais é do que um “intermezzo”, porque as brancas respondem 6.Be2 (ou, mais vigoroso ainda, com 6.Qe2) e ganham tempo às custas da dama com Nf3 ou d4; 6.Be2 Bg4 7.d4 (não 7.Nf3 Bxf3

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com o que se diluiria o ganho de tempos ao não se forçar as pretas a moverem a dama) 7...Bxe2 8.Ngxe2 Qe6 9.0–0, e as brancas ganharam cinco tempos (ambos cavalos e a torre estão desenvolvidos, um peão está no centro e o rei está seguro, o que também significa um tempo), pois se bem que as pretas possuam um tempo visível, ou seja, a dama em e6, esse tempo será perdido em breve, talvez de forma dupla ou tripla, uma vez que a dama terá de ir de um lado para o outro (perseguida pelo cavalo do rei), de forma que a vantagem das brancas é de pelo menos cinco tempos.

E as pretas até aqui se mantêm evitando que lhe coloquem a dama a correr, porém após 6.Bd2 sua situação se torna comprometida (veja o diagrama 5), pois o retorno da dama lhes custará pelo menos um tempo.

5 – A liqüidação, o desenvolvimento posterior e a liberação resultante.

Quando um comerciante percebe que seu negócio vai mal, fará bem em liqüidálo e começar com os meios que lhe restarem um outro negócio mais promissor. Lamentavelmente há também outra alternativa: o comerciante pede emprestado de um lado para pagar do outro, e assim faz tantas vezes até que não consiga pagar em nenhuma parte, o que não é muito correto. Levando isso para o xadrez, penso que se um desenvolvimento se vê ameaçado é imprescindível uma cura radical e não se prender a paliativos que a nada conduzem. Vemos isso em um exemplo: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 d5 Esse último lance das pretas é duvidoso, pois elas não estão em condições de repetir o belo lance branco do peão da dama. 4.exd5 Qxd5 5.Nc3 Bb4

Diagrama 5 – Posição após

6.Bd2

Será correta a liqüidação: 6...Bxc3 7.Bxc3 (liqüidação enérgica) para seguir com 7...exd4 (nunca jogadas artificiais como Bg4 ou efetuar um lance ilusório como e4, pois isso custará tempos no desenvolvimento) 8.Nxd4 e se segue agora o desen-volvimento com 8...Nf6, o que faz desaparecer a tensão no centro sem atrasar o desenvolvimento. Tudo isso é fator principal no processo de troca, que justifica a liqüidação realizada. Depois de: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 d5?, as brancas podem assustar o inimigo com 4.Bb5 que por não estar desenvolvido se vê consideravelmente ameaçado por 5.Nxe5 (veja o diagrama 6). O que fazer? 15

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4.Bb5 Cobrir com 4...Bd7 seria tão mau quanto 4...Bg4, já que ambos os lances têm o mesmo defeito de manter a tensão central, pois se 4...Bd7 5.exd5 Nxd4 6.Bxd7+ Qxd7 7.Nxd4 exd4 8.Qxd4 e as pretas terão perdido um peão valioso; por outro lado, a 4...Bg4 deve ser obrigatório 5.h3 Bxf3 (no caso de 5...Bh5? 6.g4, seguido de 7.Nxe5); 6.Qxf3 (com o que a dama branca exercerá uma ação preponderante sobre o centro), 6...Nf6 7.exd5 e4 8.Qe3 Qxd5 9.c4 com vantagem visível para as brancas. Relativamente melhor para as pretas teria sido: 4...dxe4, buscando a liqüidação, pois seus recursos não lhes permitem o luxo de manter uma posição latente no centro. Então poderia ter seguido: 5.Nxe5 Bd7 As pretas ameaçam ganhar a peça com ...Nxe5. 6.Bxc6 Bxc6 7.0–0 Bd6 8.Nxc6 bxc6 9.Nc3 f5 Resultando um desenvolvimento satisfatório e uma posição bastante boa para as pretas. Também após 6.Bxc6 Bxc6 7.Nc3 Bb4 8.0–0 Bxc3 9.bxc3 Ne7 10.Qg4 0–0 11.Nxc6 Nxc6 Diagrama 6 – Posição após

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12.Qxe4 as brancas têm um peão de vantagem, porém as pretas podem ocupar a coluna do rei mediante 12...Re8 e depois de 13.Qf3 com 13...Na5 se pode dar por encerrado o desenvolvimento e iniciar as manobras de meio-jogo. Agora as pretas, após ...c6, talvez possam dominar as casas brancas enfraquecidas c4 e d5 e ocupá-las com ...Nc4 e ...Qd5. Podemos buscar outros exemplos na conhecida variante italiana “Giuoco Piano”: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.c3 Nf6 5.d4 exd4 Ruptura forçada no centro. 6.cxd4 Bb4+ 7.Bd2 Nessa posição se originou uma pequena ameaça ao bispo preto de b4, começando com 8.Bxf7+, seguido de 9.Qb3+, se as pretas tomarem. Se, por outro lado, imediatamente a 7...d5 8.exd5 Nxd5, então 9.Bxb4 Ncxb4 (ou Ndxb4) 10.Qb3 e as brancas se encontrariam em uma situação mais favorável. Também é correto 7...Bxd2+, com o que se elimina a ameaça latente sobre o bispo e ainda deixa o lance libertador 8...d5. Uma vez feito isso, segue 9.exd5 Nxd5 10.Qb3 e as pretas, com uma retirada estratégica, 10...Nce7, asseguram o equilíbrio. Como vimos, a troca bem empregada constitui uma arma excelente e é a base das manobras típicas que acabamos de analisar: 1º Troca seguida de ganho de tempo; 2º Liqüidação, desenvolvimento e liberação. A regra geral resultante é que durante o desenvolvimento somente se deve trocar nos casos citados. Há que se prevenir de não se trocar às cegas, pois a

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troca de uma peça que tenha realizado vários movimentos por outra que o inimigo não tenha movimentado é um erro de principiante. Vamos ver um exemplo de troca sem motivo: 1.e4 e5 2.d4 exd4 3.c3 As brancas jogam um gambito. 3...Bc5 Esse lance, que consome tempo, embora pareça estranho, é sempre a primeira ou segunda idéia de todo principiante. Pode ter pensado em 3...dxc3, porém o desprezou pois alguma vez ouviu alguém dizer que não se deve conseguir vantagem de peões na abertura. As conseqüências lamentáveis para as pretas saltarão aos olhos. 4.cxd4 Bb4+ Com o que o bispo começa a perambular pelo tabuleiro. 5.Bd2 Bxd2+ E, por serem obrigadas, ao seguir 6.Nxd2 as brancas ficam com três tempos de vantagem. O erro tem sua origem em 3...Bc5, uma vez que caso a 4.cxd4 tivesse seguido 4...Be7 ao invés de 4...Bb4+, que conduziu a uma troca desfavorável, não seria muito melhor. 6 – O centro e sua ruptura. Exercícios. Quando e como suportar o avanço do centro inimigo. Comentários sobre a conservação e o abandono do centro.

Através do exposto se terá notado que um centro móvel é uma terrível arma de ataque, pois o avanço dos peões no centro faz retroceder as peças inimigas. Em todas essas manobras de avanço deve se considerar se a peça atacada pode manter-se conservando sua posição e tempos, ou se terminará expulsada. Exemplo:

1.e4 e5 2.d4 exd4 Com isso o peão do rei se habilita a iniciar a caminhada, esperando somente que o cavalo se posicione em f6. 3.c3 Nf6 Dispondo-se tranqüilamente a agüentar as conseqüências. Todo principiante faz isso, com o que adquire a experiência dos efeitos do avanço do peão central. 4.e5

Diagrama 7 – Posição após 4.e5 4...Ne4! E por ora o cavalo pode ficar em sua nova posição, uma vez que se 5.Bd3 segue o lance de desenvolvimento 5...d5, que é bom, devendo-se tomar cuidado com 5...Nc5, pois com 6.cxd4 Nxd3+ 7.Qxd3 as brancas ficam com quatro tempos de vantagem. Também não seria oportuno depois do ataque 4.e5 levar o cavalo a d5, pois não deixarão descansar tranqüilo esse pobre inocente: 4...Nd5 5.Qxd4 (não 5.Bc4, pois com 5...Nb6 é o bispo que perde um tempo) 5...c6 6.Bc4 Nb6 7.Nf3, com o que as brancas têm 6 tempos e as pretas somente 2, ou 1½, já que o cavalo em b6 não estará melhor posicionado do que se estivesse

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na casa f6 ou c6. Outro exemplo: 1.e4 e5 2.f4 exf4 Perda de tempo. 3.Nf3 Nf6! 4.e5 Com o que nos encontramos novamente na situação de que as pretas devem saber escolher seu quarto lance.

4.e5 O lance 4...Ne4 seria inconsistente, pois seguiria de imediato 5.d3 Nc5 6.d4. Na posição após 4.e5 (diagrama 8) observamos a possibilidade excepcional de se aproveitar a casa h5 (em geral as casas nas bordas do tabuleiro são desfavoráveis ao cavalo). 4...Nh5 Segue 5.d4 E as pretas não ficam em má posição ao jogar 5...d6 ou 5...d5, provocando o peão do rei das brancas, que jogou duas vezes, com seu peão dama, que só o fez uma única vez. No geral, os cavalos devem tratar de se manter no centro do tabuleiro, como no primeiro exemplo (diagrama 7) e só excepcionalmente posicionar-se nas bordas. Depois de Diagrama 8 – Posição após

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1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.c3 Esse lance é pouco amistoso, pois planeja tomar de assalto o centro das pretas, cortando assim as possibilidades de avanço. 4...Nf6 5.d4 exd4 6.e5 O cavalo das pretas não pode se manter por meios próprios, pelo que é apoiado pelo peão da dama com 6...d5; e no caso de se jogar 7.Bb3, então 7...Ne4 mantendo a posição. O lance 6...Ne4 jogado diretamente seria um erro devido a 7.Bd5. Outro exemplo em uma situação amplamente sustentada: na posição que já vimos, 1.e4 e5 2.d4 exd4 3.c3 Nf6 4.e5 Ne4 5.Bd3 d5! 6.cxd4, as pretas não devem se sentir muito seguras, pois há a perspectiva de um assalto lento sobre o cavalo em e4 (por Nc3). As pretas podem se defender dessa ameaça atacando com 6...c5, porém nunca com o lance ilógico 6...Bb4+, porque segue 7.Bd2 e as pretas se vêem obrigadas a trocar, com perda de tempo. Manter o centro intacto é, sob qualquer ponto de vista, uma idéia cautelosa, pois ainda estando em condições de estancar o golpe da avalanche de peões, com um deslocamento adequado do cavalo, o jogo se torna desconfortável, já que a avalanche de peões não tem obrigatoriamente que se realizar de imediato. Constitui-se em uma ameaça latente, razão pela qual, se não houver incovenientes, deve se manter o centro (ver diagrama 9).

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Diagrama 9 – As pretas jogam. O que é mais correto, ...exd4 ou ...d6? Como resistirá o bispo do rei das pretas? Porque não se joga ...f6?

Depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Be7 Lance acertado, porém mais agressivo é 3...Bc5. 4.d4 O melhor lance das pretas é sustentar o centro com 4...d6 porque depois de 5.dxe5 dxe5 está conseguido esse propósito. A defesa necessária se fez através de um peão, o que é correto, pois o peão é um defensor nato (naturalmente não ...f6, que é um erro grave pois faz a diagonal a2-g8 adquirir um papel preponderante). 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 O lance 3...d6 é incômodo para as pretas, pois para evitar a queda do peão do rei deve seguir 4.dxe5 dxe5 5.Qxd8+ Kxd8, com o que perdem o roque e com ele o contato cômodo entre as torres. 4.Nxd4 Nessa posição, as pretas depois de muito matutar, se disporão a jogar 4...Nf6, uma vez que se sentirão em condições de responder a intenção da mobilização do peão do rei das brancas, que se produz após 5.Nxc6 bxc6 6.e5

com 6...Ne4 ou ao lance 6.Bd3 com 6...d5. Há que se advertir, no entanto, que com isso as pretas só resolveram uma parte do problema, ou seja, o do desenvolvimento difícil do seu cavalo do rei, deixando sem solução o problema do centro em si. Para se resolver o problema do centro há que se considerar dois postulados. O primeiro é que quando se permitiu ao inimigo o estabelecimento de um peão central móvel e livre, esse deve ser considerado como um criminoso temível (ou melhor, como um cavalo selvagem), contra o qual deve-se empenhar com todo furor. O segundo postulado surge como corolário, estabelecendo que tem que se deter ou capturar de forma inapelável tal peão (ou seja, preparar d5 e dxe4). A detenção pode ser preparada por meio de 4...d6, ampliando-a com Nf6, Be7, 0-0, Re8, Bf8 etc. De acordo com isso, a partida poderia ser assim: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 d6 5.Be2 Nf6 6.Nc3 Be7 7.0–0 0–0 8.f4 Re8! 9.Be3 Bf8! 10.Bf3 Bd7 Não 8...d5 devido a 9.e5, resultando ambos os avanços completados.

Diagrama 10 – Os prós e os contras do avanço e5

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Nessa posição, as brancas tentarão pressionar com e5 e as pretas se esforçarão para realizar uma contrapressão adequada. O processo de detenção é muito difícil: parece mais fácil tomar o peão (e convém fazê-lo sempre que se possa), porém essa possibilidade não é muito freqüente. Vejamos uma possibilidade: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 Nf6 5.Nc3 Bb4 6.Nxc6 Lance realizado com a intenção de fazer a jogada defensiva Bd3. 6...bxc6! 7.Bd3 Nessa posição, as pretas não precisam deter o peão com a manobra prévia de d6 seguido de 0–0 e Re8. Podem jogar diretamente: 7...d5 8.exd5 cxd5 e o peão branco desaparece de forma repentina. Na partida jogada em Ostende (LeeNimzovitsch) o peão central sofreu justamente esse destino. 1.d4 Nf6 2.Nf3 d6 3.Nbd2 Nbd7 4.e4 e5 5.c3 Be7 6.Bc4 0–0 7.0–0

Diagrama 11 – De que forma após 7...exd4 8.cxd4 as pretas fazem desaparecer o peão central?

7...exd4 8.cxd4 d5! 20

Depois do que o orgulhoso peão branco livre e móvel desaparecerá repentinamente, sendo em breve pulverizado. 9.Bd3 Se 9.exd5 segue 9...Nb6 e ...Nxd5. 9...dxe4 10.Nxe4 Nxe4 11.Bxe4 Nf6 Uma troca que significa um conseqüente ganho de tempo para as pretas. 12.Bd3 Nd5 13.a3 Bf6 Com o que as pretas ficaram um pouco melhor, devido à debilidade do peão d4. Poderia mostrar muitos outros casos, mas devido ao espaço vamos nos conformar com apenas mais um. Como terceiro exemplo vão os lances da partida Nimzovitsch-Yates, em Baden-Baden: 1.e4 Nc6 2.Nf3 Nf6 3.Nc3 No caso de 3.e5, então 3...Nd5 4.c4 Nb6 5.d4 d6 e as pretas ameaçam reconquistar os tempos sacrificados. Talvez tivesse sido preferível jogar 6.e6 fxe6 com chances de ataque para as brancas. 3...d5 4.exd5 Nxd5 5.d4 Conseguindo estabelecer um peão central livre. 5...Bf5 6.a3 g6 A alternativa é deter o peão da dama através do peão do rei e ocupar a coluna da dama, ao mesmo tempo tomando cuidado com a casa d5. 7.Bc4 Nb6 8.Ba2 Bg7 9.Be3 e5 Com isso as pretas se recusam a deter o peão e optam pela captura direta. 10.Qe2 0–0 11.dxe5 Bg4, reconquistando o peão e conquistando jogo mais livre.

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7 – Comentários sobre a captura de peões nas aberturas. A falta de tempo para as capturas. O respeito pelo peão central e a forma de manifestá-lo.

O desenvolvimento das peças se constitui no mais importante objetivo da abertura. A todos que sabem disso parece cômico observar com que afã o principiante se ocupa de assuntos completamente secundários (no nosso caso, a tomada de peões). Do ponto de vista psicológico, pode-se explicar esse afã de forma satisfatória: quando ocorre com o iniciante, é a manifestação de suas energias internas e quando ocorre com o jogador mais experiente, esse o faz para exteriorizar sua alma juvenil. Porém o resultado para ambos é igualmente desastroso. Se levarmos em conta que uma partida ainda não desenvolvida é como um tenro organismo infantil em vias de desenvolvimento e considerarmos ainda que os amadores que tomam peões antes do desenvolvimento são pessoas que empregam a lógica (ainda que barata), chama-nos a atenção que se vangloriem das capturas. Se um dia aparecesse na Bolsa de Valores um menino de seis anos que com toda seriedade adquirisse ações, as pessoas soltariam uma gargalhada, pois diriam que isso é próprio de pessoas adultas e “conscientes”, que ao comprar “sabem muito bem o que fazem” - tendo dinheiro em excesso, querem gastar parte dele e naturalmente conseguem isso - e lhes restará ainda a pergunta: para que o menino compra as ações? Com o mesmo direito eu pergunto aos tomadores de peões: o que conseguiram ao tomar peões ao invés de desenvolverem as peças? O organismo infantil tem que se desenvolver, constituindo isso a sua função primária.

Ninguém, nem o pai, nem a mãe, podem crescer por conta do menino, de forma que ninguém pode substituí-lo nessa função primordial, ninguém pode fazer isso por ele. Moral da estória: não ganhar peões às custas do desenvolvimento (só há uma exceção que veremos adiante). Agora, em primeiro lugar, veremos a melhor forma de recusar gambitos. Serei breve, pois considero que anteriormente já vimos alguns casos suficientemente completos. 1.e4 e5 2.d4 exd4 3.c3

3.c3 As pretas podem jogar 3...Nf6 (como já recomendamos especialmente ao principiante), ou qualquer outro lance de desenvolvimento (com a exceção de 3...Bc5?), como por exemplo 3...Nc6 4.cxd4 d5, ou finalmente 3...c6 4.cxd4 d5 (com o qual o c6 entra em conexão lógica com o centro). Ao se jogar 3...c6 e seguir 4.Qxd4, a continuação poderia ser 4...d5 5.exd5 cxd5 com o conseqüente 6...Nc6. No Gambito Evans: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.b4 Recusamos com 4...Bb6 para não nos obrigar a ficar perambulando com o bispo (ao jogar 4...Bxb4 5.c3). As pretas ao jogar 4...Bb6 de forma alguma Diagrama 12 – Posição depois de

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perderam um tempo, pois o lance branco 4.b4 foi realizado gratuitamente (já que nesse intervalo de tempo as pretas não puderam desenvolver nada) e é inútil para o desenvolvimento das brancas, de acordo com o que já foi dito sobre o valor do movimento de peões não conectados ao centro. Segue então 5.b5, tentando obter um benefício do avanço sem motivo de peões em situação difícil por estar atuando de forma desmobilizada: 5...Nd4! e no caso de seguir 6.Nxe5, então 6...Qg5 com um forte ataque. O Gambito do Rei, 1.e4 e5 2.f4 Pode ser recusado pelo principiante com 2...Bc5, ou de forma mais simples por 2...d6, que é um lance de efeito muito maior do que o considerado geralmente. Por exemplo 3.Nf3 Nc6 4.Bc4 Be6! e seguindo 5.Bxe6 fxe6 6.fxe5 dxe5 as pretas têm bom desenvolvimento, as colunas abertas, razões pelas quais, apesar dos peões dobrados, estão um pouco melhor (se depois de 4...Be6! seguir 5.Bb5, então 5...Bd7). Depois de 1.e4 e5 2.f4 d6 3.Nf3 Nc6 4.Nc3 Nf6 5.Be2 o principiante deve levar em conta a possibilidade 5...exf4 uma vez que ao seguir 6.d3 então 6...d5 teria feito um abandono temporário do centro para realizar uma nova e rápida reconquista. Também não há inconveniente em aceitar o gambito - 1.e4 e5 2.f4 exf4 3.Nf3 Nf6!, sempre que não se tenha a intenção de conservar o peão do gambito, mas submeter o centro das brancas a uma dura prova (4.e5 Nh5) ou também depois de 4.Nc3 chegar ao contragolpe liberador 4...d5. 22

8 – Capture sempre um peão central se puder fazê-lo sem perigo

Exemplo: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Nf6 4.c3? Nxe4 Onde o ganho ideal, a captura realizada, não se paga caro com um tempo. Conservar o peão é pouco importante, porém deve nos interessar o triunfo da idéia e não o da matéria. Como se diz, o ganho de um peão em qualquer parte do tabuleiro durante a partida não traz a felicidade, porém se é central transforma-se em algo que vale a pena comentar. Com isso, se conseguem possibilidades de expansão na parte onde se realiza preferencialmente a batalha, ou seja, o centro: considerando dessa forma podemos dizer que quem o consiga receberá do contrário as mesmas manifestações de apreço do que daquele que sentado em uma reunião relaxadamente olha com superioridade para os seus vizinhos mal-acomodados. Porém... não é falta de educação sentar-se de forma cômoda, razão pela qual sempre que se possa deve-se fazê-lo (veja o diagrama 13 com novo exemplo).

Diagrama 13 – As brancas jogam (no sentido do item 8): 1.Nxe5 Nxe5 2.d4

Com isso encerramos o primeiro capítulo.

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Capítulo II - As Colunas Abertas

1 – Introdução. Generalidades. Definições.

A teoria das colunas abertas é uma das pedras fundamentais do meu sistema. Publiquei há 14 anos na “Wiener Schachzeitung” [em 1911, N. do T.] a lei de criação dos postos avançados, porém na época não havia adquirido ainda a percepção de que essa manobra se subordina de forma lógica às operações fundamentais sobre a coluna aberta, cujo objetivo principal é a ocupação da sétima e oitava fileiras. De acordo com isso, a lei agora seria: deve-se estabelecer postos avançados para quebrar a resistência do inimigo nas colunas, porém sempre levando em consideração a sétima fileira, cuja ocupação é o objetivo de toda operação na coluna. Dessa forma, o estabelecimento dos postos avançados é somente uma operação auxiliar. Na Escandinávia terminei uma conferência sobre as colunas abertas com as seguintes palavras: “Espero, senhores, que essas regras sobre as colunas abertas tenham servido para abrir-lhes os olhos.” Essa pequena brincadeira na realidade é bastante séria, nunca foi refutada. A “coluna aberta” é o favorito dentre os meus filhos espirituais e para mim sempre foi um prazer explicar aos leitores esse conceito, que me deu tanto trabalho e dificuldades. Diz-se que uma coluna está aberta para uma torre quando nela não existe o próprio peão, ou se existe que esteja situado atrás da torre como, por exemplo,

a coluna h no diagrama 14.

Diagrama 14 – As brancas têm abertas as colunas b, f e h e fechada a coluna d. Depois de h6 a coluna h fica bloqueada

Essa definição supõe que, ao se decidir se uma coluna é “aberta” ou “fechada”, não nos deve preocupar a questão de que a coluna esteja ou não totalmente livre de peões mas sim se constitui ou não uma pista de acesso para atacar os pontos vulneráveis ou peças ativas do adversário (geralmente peões). Não há, em princípio, diferença fundamental em se atacar uma peça, um peão ou uma casa. Imaginemos, por exemplo, que em uma dada posição a torre branca esteja em h1 e o rei inimigo em g8 com um peão em h7. A torre está atacando o peão de h7, porém se esse peão desaparecesse do tabuleiro, a torre continuaria atacando a casa h7, que é o objetivo de conquista. Em ambos os casos as brancas com todo o material que tiverem (o que é claro que deve acontecer, pois no diagrama nada mais faço do que indicar a essência da 23

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posição) tratarão de alcançar a supremacia sobre a casa h7, acumulando maior número de atacantes do que de defensores e, depois desse trabalho, em um caso jogarão Rxh7 e no outro Rh7. A diferença somente está em que, no primeiro caso, as brancas colocam sua peça com orgulho de vencedor na casa do peão tomado e, no segundo caso, na casa conquistada. Como a capacidade do peão em h7 era de uma magnitude que tendia a zero, na prática não há diferença entre uma ou outra operação, uma vez que se cumpriram os objetivos do ataque, os quais, por outro lado, devem ter o maior grau de concisão.

Há que se ressaltar aqui a colocação central da peça oferecida em troca, pois raramente (e nunca na abertura) se estará em condições de forçar o inimigo a uma troca que abra colunas por meio de uma peça colocada lateralmente. Consegue-se muito mais facilmente o objetivo com colocações centrais, porque então a peça oferecida é perigosa por poder exercer sua capacidade agressiva por todos os lados. Na partida Thomas-Alekhine, jogada em Baden-Baden em 1925, temos um belo exemplo a partir da posição do diagrama 16.

2 – Formação de colunas abertas por via pacífica e por avanços bélicos. O ataque lateral.

Da definição de coluna aberta surge logicamente que a coluna se abrirá quando dela desaparecer um dos nossos próprios peões. Esse desaparecimento se consegue por via pacífica fazendo que o inimigo se veja obrigado a tomar uma peça nossa, muito bem colocada na forma central, para retomá-la com um peão (veja o diagrama 15)

Diagrama 15 – As pretas ao jogarem

Bxe3, abrem para as brancas a coluna f 24

Diagrama 16 – Jogam as brancas

As pretas têm seu cavalo centralizado e as brancas se vêem obrigadas a trocar. 1.Nxd4 cxd4 Ou seja, abrindo a coluna c e após 2.Nxd5 Qxd5 3.Bf3 Qd7 4.Bxb7 Qxb7, a coluna aberta alcançou uma importância fundamental. Seguiu então: 5.c4! Caso contrário o peão c2 seria insustentável. 5...dxc3 e.p. Abre-se a coluna d pois desaparece o obstáculo do próprio peão nessa coluna.

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6.bxc3 Rac8, seguido de Rfd8, adquirindo jogo simultâneo nas duas colunas (veja a partida 11). De acordo com isso vemos que as colocações centrais, feitas de forma segura para se evitar avalanches de peões, muito freqüentemente provocam trocas com a conseqüente abertura das colunas. Imaginemos que a posição do diagrama 15 fosse continuada com os lances: 1...Bb6 uma linha de jogo poderia ser: 2.Qd2 0-0 3.0-0-0 h6?

Diagrama 16A - O objetivo de ataque é a casa h6

Aqui teremos o aspecto precursor clássico da abertura das colunas de forma ativa. As brancas, graças ao avanço do peão das pretas a h6, podem rapidamente chegar ao desaparecimento do próprio peão g, sendo correto dessa forma dizer que o lance 3...h6 foi mau. Não se pode classificar esse lance como uma perda de tempo, pois as pretas já estavam desenvolvidas e dormir após o trabalho ou durante o mesmo são coisas muito diferentes! O ataque lateral (nesse caso “Angriffsmarke” na terminologia do

Dr.Tarrasch) se realiza por via de h3, g4, g5 onde após hxg5 se retoma de peça e a torre ocupa a coluna g que ficou aberta. É certo que uma de suas próprias peças a obstrui, mas isso é somente um fator temporário. O verdadeiro obstáculo é um peão inimigo que obstinadamente se coloca à nossa frente e muitas vezes requer um trabalho duro para tirá-lo do caminho. Um novo exemplo: imaginemos que no diagrama 16A os bispos de b6 e e3 não existam e que os peões pretos estejam em h7 e g6 respectivamente. Nesse caso, o ponto de ataque lateral é g6 e portanto se tratará de abrir a coluna h (sempre deve ser a coluna vizinha ao ponto de ataque). O plano de ataque será h4, h5 e hxg6. O principiante às vezes dá demasiada importância às colunas abertas. Um deles, cheio de orgulho, mostrou-me uma posição com colunas abertas à qual havia chegado... Porém no tabuleiro já não havia dama nem torres, pois haviam sido sacrificadas anteriormente. Na posição modificada do diagrama 16A há no entanto um pequeno inconveniente, e por isso antes de se jogar h4 é necessário se atacar o incômodo cavalo preto de f6 com Nd5, e então se poderá jogar, tranqüilamente e sem perder nada, h4. Como último recurso, a parte atacada ensaia por sua vez a ida do peão a h5 ou g5, mas esse último lance não é possível porque a casa g5 está dominada pelas brancas. 3 – O objetivo ideal das operações em uma coluna aberta. Comentários sobre pequenas operações laterais. Incursões e manobras envolventes.

O ideal de toda operação sobre uma 25

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coluna aberta é conseguir uma penetração definitiva no território inimigo, ou seja, na sétima ou oitava fileiras. Esse é um postulado muito importante, porém há que se ressaltar ainda que a penetração deve se realizar sobre uma coluna determinada. Se, por exemplo, partimos da coluna d, seguindo Rd1-Rd4-Rd7 teremos chegado à sétima fileira após muitas voltas e de nenhuma maneira esta manobra se constitui uma exploração direta da coluna d. Vejamos alguns casos elementares de operações de colunas (diagrama 17). Coluna de operação: “h”.

Diagrama 17 – Catástrofe na coluna h

A ocupação da coluna se realizará através de 1.Qh1+ Se imaginarmos uma seta na direção h1-h8, essa indicaria a direção da força na coluna h. 1...Kg8 E agora, imaginando o objetivo ideal segue: 2.Qh7+ Kf8 3.Qh8+ Com uma incursão final que termina com um ataque em linha e a captura da dama inimiga (Qxb8). 26

Se no diagrama 17 a dama preta estivesse situada em d7 ao invés de b8, o método seria: 1.Qh1+ Kg8 2.Qh7+ Kf8 3.Qh8+ Ke7 4.Qxg7+ Ke6 5.Qxd7 Kxd7 6.g7 Um resultado nada agradável para as pretas. Os lances da dama branca em h7, h8, e g7 constituem um triângulo que se denomina “rodeio” ou “manobra envolvente”. Resumiremos assim as conclusões: quando falta resistência (o peão inimigo em h6 ou h5 oferece grande resistência para as brancas), o atacante, depois de assegurar as casas de penetração e chegar às 7ª e 8ª fileiras, tem geralmente lances de captura direta, ou por rodeio, como recompensa pela sua manobra. Até aqui as coisas têm sido fáceis de entender e de fazer, porém posteriormente veremos que há grandes obstáculos a vencer, como mostrará o parágrafo seguinte. 4 – Os impedimentos para se realizar operações sobre colunas. Os “muros de granito” e formas de miná-los. Obstáculos (peões) defendidos e não defendidos. As duas formas de ataque contra peões inimigos: concentrados e diretos.

Já vimos a grande importância da entrada envolvente nas 7ª e 8ª fileiras. Tendo isso em conta, podemos supor que deve haver algo para defender essa vulnerabilidade e, por assim dizer, admitir que a natureza por si mesma assim o fez, da mesma forma que havia feito com o nosso coração, colocando-o bem protegido dentro do tórax, atrás das costelas. A posição que ilustra a parte direita do diagrama 18 é a característica da

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proteção natural, onde o peão em g6 impede a penetração, com a mesma postura do campeão que dizia: “Só passarão sobre o meu cadáver!”. Se o peão inimigo citado estivesse defendido por outro peão, digamos em h7, não haveria sentido em atacar esse bloco, que talvez se pudesse fazer com uma triplicação de peões em linha. É mais prático minar previamente a colocação do peão g6 com h4, h5, hxg6 e com isso a poderosa muralha se transforma em um humilde peãozinho que grita por socorro.

deve ser defendido somente por seus colegas de ofício. Quando o peão do cavalo se desliga de seus colegas (sai do sindicato), então poderá ser atacado por qualquer peça. A idéia que surge disso é a de que deve se atacar a aglomeração de peões para a sua conquista, não só pelo ganho material, mas também para romper a resistência na coluna. Tecnicamente, o ataque se realiza dispondo as peças em posição de ataque e desencadeando ao redor do ponto uma luta sangrenta. A supremacia se pode obter por: a) desvio de posições; b) mediante troca ou c) um ataque a algum trebelho coadjuvante à defesa. Isso significa que transmitimos o ataque para o objeto em si, sobre os defensores. Esse é um processo inteiramente natural, freqüentemente praticado no dia-a-dia, que todas os jovens já conhecem em suas lides escolares. O seguinte final ilustra o método a seguir (diagrama 19):

Diagrama 18 – a) O peão preto de c6 é um peão incômodo defendido. b) O peão preto de g6 é um peão incômodo indefeso

Na parte esquerda do diagrama a ação corrosiva do bloqueio estaria a cargo de b4, b5 e bxc6. Já dissemos anteriormente que temos que reconhecer os peões como elementos natos de defesa. A defesa com peças pode ser classificada como mau conceito de jogo, uma vez que somente o peão defende com tenacidade, de forma contínua e sem gritar. Com mais razão então devemos entender que um peão

Diagrama 19 – Sobre a coluna h, um ataque concentrado contra h6 1.Rh2 Kh7 2.Reh1 As brancas acumulam forças contra o

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incômodo peão em h6, aproveitando que não está defendido por nenhum outro peão. 2...Bf8 3.Nf5 Ra6 Agora a defesa e o ataque estão equilibrados. Mas com... 4.d6 Fica fora de combate o defensor de b6 e com a queda conseqüente do peão h6 se produz o rompimento simultâneo das sétima e oitava fileiras através da coluna h. Se as pretas após o 4º lance das brancas já tivessem ambas as torres na sexta fileira (por exemplo, em a6 e b6), teria seguido 4...Rxd6, sacrificando a qualidade, pois teria sido muito mau 4...Bxd6, ao que seguiria 5.Rxh6+ Kg8 6.Rh8+ Kf7 7.R1h7+ Kf6; e agora, por assim dizer, um lance de espera, depois do êxito dos lances de força (uma torre na sétima e outra na oitava fileiras!), anuncia um mate imparável 8.Rg7!, necessário para 9.Rh6 mate! Na posição: brancas, Rf1, Rd2 e Nd4; pretas Kf8, Bd8 e Rc8 e Pf6, a partida poderá seguir: 1.Ne6+ K move 2.Nxd8 Rxd8 3.Rxf6 Com o que se dizimam as defesas pela troca. As manobras comentadas até agora entram no conceito de ataque concentrado, como se indica o fato de concentrar a supremacia sobre um ponto, de uma forma ou de outra. O objetivo desejado também é metódico, pois compreende tanto o ganho material (tomar um peão) como o ideal sonhado, ou seja, a conquista da sétima fileira. Essa finalidade dupla é característica dos ataques concentrados. 28

Diagrama 20 – Invasão através de h7 (ataque direto ou revolucionário)

Uma manobra completamente diferente veremos no diagrama 20 (só se apresentam os atores principais do drama). Devemos supor que a operação na coluna h a começar por meio de Rah1 seria estéril devido a ...Nf6 ou por ...h6, com o que as brancas colidiriam contra um muro de granito. Sendo assim, como as brancas podem aproveitar de outra maneira a coluna h? A resposta é que não podemos prescindir de tomar o peão da torre, pelo que devemos proceder com violência à sua eliminação, ainda que à custa de grandes sacrifícios. Segue então 1.Rxh7+ Kxh7 2.Rh1 ++ Apesar da aparência simples desse final, creio que é de grande importância e esclarece bem a diferença entre ataque concentrado (ou progressivo) e ataque direto (ou revolucionário). No entanto, queremos dar mais um exemplo (veja o diagrama 21). Seguindo: 1.R1h1 Nf8 2.Be7 Se produz um ataque concentrado ao se dizimar a defesa pela troca. O ataque revolucionário, por outro lado, prescinde do ganho material do peão e, pelo contrário, baseia-se no sacrifício material:

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5 – O avanço “contido” sobre uma coluna aberta, com a idéia de entregar a coluna em troca de outra. Exploração indireta de uma coluna. A coluna como trampolim de assalto e a alegoria da carreira diplomática.

Diagrama 21 – Como desenvolver ataques concentrados e diretos?

1.Rxh7 Kxh7 Não há conquista material, pois as brancas decidiram entregar a torre pelo peão. 2.Rh1+ Kg8 3.Rh8 ++. A idéia do ataque direto, que por comparação pode aqui ser bem observada, consiste na ruptura violenta do obstáculo que fecha a entrada da sétima e oitava fileiras. Sacrifica-se uma torre para que a sua colega possa dar o mate em h8. Como vemos, nas 64 casas não está prescrita a camaradagem. Em que ordem de tempo se devem aplicar os ataques citados? Resposta: primeiro deve-se ensaiar o ataque concentrado, ou seja, atacar com um número crescente de peças o peão obstáculo, em seguida se buscará a oportunidade de levar os defensores a posições desfavoráveis (eles se incomodam, em geral, entre eles mesmos com a falta de espaço, o que é normal no campo dos atacados). Depois deve ser considerada a possibilidade de abrir a passagem de forma violenta, ou seja, em termos vulgares, com uma manobra revolucionária.

No diagrama 22 o aproveitamento imediato e completo da coluna f não será possível, pois mesmo não se considerando o defensor de f8, ao fazer o lance Rxf7 não poderemos arrematar a partida por falta de material sobrevivente no tabuleiro.

Diagrama 22 – Um exemplo simples de “avanço restrito”; uma manobra de translação de torres traz novas linhas

Rf5-Rxb5-Rb7 Jogando simplesmente Rf5, evidentemente se ganha um peão e da casa b5 poderíamos jogar Rb7. Será de grande importância para nossos conceitos investigar o conteúdo lógico dessa manobra. Ao jogar Rxb5 em nenhum momento se poderia falar do aproveitamento da coluna f, porém, por outro lado, seria levar ao extremo a ingratidão se afirmarmos que a conquista do peão nada tem a ver com a coluna f. Qual é a verdade? Efetivamente, a coluna f não é aproveitada de forma direta, em toda a sua extensão, mas sim de forma indireta. Ou seja, como uma espécie de 29

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trampolim.. Quando uma pessoa escolhe para o seu futuro a carreira diplomática, pois se sente capaz de deixar no chinelo Lloyd George (David Lloyd George, 1863-1945, político e estadista nascido no País de Gales, foi o único galês a ocupar o cargo de Primeiro Ministro britânico, exercendo esse cargo durante a Primeira Guerra Mundial - N. do T.), é porque quer progredir no cargo; mas se a escolha se realizou porque o jovem sonhador espera entrar em círculos restritos para poder ao final se casar com a filha de um milionário (de preferência em dólares...), então a profissão escolhida nada mais é do que um trampolim até o talão de cheques no bolso do seu futuro sogro. Como último exemplo, consideremos a seguinte posição: brancas: Rg1, Be3, Ph2; pretas: Kh7, Ph6 (somente os atores importantes). Nessa posição, a manobra 1.Bd4 e 2.Rg7+ seria uma exploração direta da coluna g enquanto que 1.Rg3, 2.Rh3 e 3.Rxh6 seria uma exploração indireta da mesma. Vejamos na seqüência o diagrama 23, onde se mostra um outro exemplo da utilização da coluna como trampolim.

Diagrama 23 – O trampolim - coluna c, exemplo posicional. As brancas podem jogar Rc5-a5, atacando o peão de a7

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É possível que exista quem negue todo o valor prático à diferenciação entre exploração direta ou indireta, mas os que acreditam no pensamento teórico para esclarecer assuntos complexos sem dúvida reconhecerão o valor do meu mérito, uma vez que para se apresentar em primeiro plano a coluna fica iluminada sob os mais potentes holofotes. Talvez isso possa ser colocado de forma mais simples, mas me agrada dar fundamentos para que os críticos medíocres (que nunca sabem distinguir entre o essencial e o não essencial) possam me atacar com bases em questões formais (pois é possível que a expressão iluminação sob os mais potentes holofotes soe algo rebuscado...). 6 – O posto avançado. Seu raio de ação. Com que peça se deve cubrir o posto avançado. Quando olhar uma coluna de centro e quando uma dos cantos. O que mostra a troca de funções.

Observando o diagrama 24, vemos que a partida está igualada. As brancas dominam o centro e têm aberta a coluna d e as pretas, por seu lado, controlam o centro por meio do seu peão em d6 e dispõem da coluna e. Ao jogarem as brancas, devem pensar em realizar alguma operação na coluna d, ainda que iso pareça difícil, porque o peão d6 da forma como está defendido é uma muralha de granito. Se as brancas, desprezando as regras do parágrafo 4, tentarem atacar o peão d6 por meio de Rd2 seguido de R1d1, os meus queridos e atentos leitores soltariam uma gargalhada e... até o peão riria. Para evitarmos essa zombaria recorramos às regras e em primeiro lugar

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pensaremos em minar o soberbo peão d6 do inimigo. Para isso pensamos em e5, porém esse lance resulta inconveniente, pois operações inimigas na coluna e o neutralizariam com toda facilidade.

Diagrama 24 – As brancas criam um posto avançado na coluna d

Devemos, pois, abandonar a pretensão de uma operação na coluna de forma integral e pensar no aproveitamento parcial da coluna, ou seja, na forma indicada no parágrafo 5. Se jogarmos Rd4 e depois Ra4, poderemos observar a pobreza desses lances ante a ala da dama das pretas, por demais compacta, o que faz fraca essa manobra. Mais adequado resultará o lance em que de forma semelhante e através da coluna d se poderá levar à coluna a a outra torre. Tendo fracassado todas as tentativas, sem razão aparente, devemos então buscar sobre outra base de operações a utilização da aproveitável coluna d. A chave se encontra no lance 1.Nd5. A casa é como um posto avançado de sentinela e o cavalo, a sentinela. Por sentinela entendemos uma peça própria colocada em uma linha aberta (dentro do campo inimigo), geralmente um cavalo (que logicamente estará defendido por

um peão). Esse cavalo, devido à sua ação defendida e apoiada, dentro do raio de ataque, constitui uma figura muito alarmante. Devido a isso, instiga o inimigo a jogar c6, com o qual se bem que debilita sua posição na coluna da dama, consegue fazer ruir a posição do cavalo. De forma geral podemos dizer: a) O posto avançado significa uma base para novos ataques; b) O posto avançado produz uma debilidade na resistência inimiga na coluna em que se encontra. Depois de jogar 1.Nd5 c6 o cavalo volta a c3 e então o peão d6 não poderá sorrir depois de Rd2 e R1d1. Também poderia ter sido jogado 1...Rc8 como resposta a 1.Nd5, mas as pretas deverão ter nervos de aço para agüentar o baile do cavalo na cabeça... Bem sabemos como é difícil tolerar alguns minutos de uma mosca sobre o nosso nariz. O principiante deve saber que a força do posto avançado se baseia em relações estratégicas de sua própria retaguarda. Ou seja, lhe são fornecidas pela coluna aberta na qual se encontra e pelo peão que o apóia. Por essa razão, o posto avançado sempre deve estar em relação com a coluna na qual se encontra e pelo peão vizinho que o defende. Na posição da “Giuoco Piano”, brancas: Kg1, Ra1, Rf1, Nc3, Pa2, Pb2, Pc2, Pd3, Pe4, Pg2 e Ph2; pretas: Kg8, Ra8, Rf8, Be7, Pa7, Pb7, Pc7, Pe5, Pf6, Pg7 e Ph7 (ambos os lados poderiam ter mais outras peças), as brancas têm seu posto avançado em f5, sobre a coluna f, e as pretas o têm em d4, ou seja, sobre a coluna d. Ambas as colunas estão agora 31

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reluzentes a granito (estão dirigidas contra peões defendidos). Para minar a resistência, as brancas poderiam levar um cavalo a f5, passando por e2 e g3. Uma vez nessa casa, o mais natural para as pretas será atacá-lo com g6, porém, ao retirar-se, o cavalo deixa à mostra como cumpriu sua missão, transformando em ponto débil a casa f6. É importante ainda notar que Ne5 seria a base de um novo ataque contra o peão g6. Muitas vezes as sentinelas transferem a patente ou trocam de posto. Se o atacante jogou bem poderá fazer a troca da sentinela por outra da mesma hierarquia, ou talvez a troca de categoria e mesmo às vezes a troca de posicionamento. Se ao retomar a peça que capture o cavalo em f5 o fizermos com um peão, se troca a posição do posto avançado (de f5 para e4), o qual poderia ser ocupado pela torre ou pelo cavalo, apresentando-se a oportunidade de abrir a coluna g depois de g4, g5. Por outro lado, o peão f5 fixou o correspondente f6 das pretas (veja o diagrama 25 e também a partida 5, Haken – Giesse). Quando se trata de colunas laterais (são colunas laterais as das torres e dos cavalos; de centro as dos bispos, dama e rei), o posto de sentinela deve ser coberto por uma peça de grosso calibre. A ocupação a cargo dos cavalos nesse caso é insuficiente devido à pouca ação que esses poderão desenvolver. O campo de ação de um cavalo em g6 seria reduzido, porém muito mais quando estivesse colocado em h6. A torre, em troca, colocada em g6 estaria em posição excelente, pois com ela há um princípio de ocupação da coluna g pela qual se estava combatendo (a coluna está em 32

disputa enquanto nenhum dos rivais estiver em condições de passear airosamente por ela). As brancas, então, devem buscar o ponto e a forma adeqüada para dobrar as torres (à famosa alavanca de Arquimedes não faltava mais que o ponto de apoio necessário para erguer o mundo). Aqui, em troca, procuramos o ponto e o encontramos.

Diagrama 25 – A ocupação do posto avançado deverá ser feita com Rg6 e não com Ng6

A partir do diagrama 25 se joga: 1.Rg2? Rxg2 2.Nxg2 Rg8, com o qual as pretas obteriam a coluna g. Se for jogado 1.Rg4? Rxg4 2.hxg4 Rg8 3.Ng6 as brancas dificilmente poderão fazer valer sua superioridade material do peão g. Porém se 1.Rg6 (estabelecimento do posto avançado) 1...Rxg6 (caso contrário as brancas dobram as torres na coluna g) 2.hxg6, a coluna aberta g acabou fechada, mas de suas cinzas saiu um poderoso peão passado e a possibilidade de jogar, após Nf3, a torre a h4 por via de g1-g4. Vimos com isso a contribuição e transformação em vantagens das trocas dos postos avançados. Observando a posição do diagrama 25, vemos que após 1.Rg6! Rxg6 hxg6

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Rg8 estamos em vias de realizar uma típica troca de funções. Antes de jogar ...Rxg6, o peão branco de h apoiava a torre em g6 e após a troca realizada é a torre que apóia o peão de h, que agora se encontra em g6. Esse caso repleto de agradecimento e sentimentos nobres nos mostra ainda que entre a coluna g e o peão que defende o posto avançado (nesse caso em h5) há relações estratégicas. Concluiremos este capítulo com um final onde se buscam objetivos puramente pedagógicos e não de diversão para os leitores. Nimzovitsch - Amador (veja o diagrama 26).

Diagrama 26

1.Nf4 O desenvolvimento é um princípio que se deve ter em conta até o final. No entanto, o jogador pouco experiente o despreza ainda na abertura. 1...Rag8 2.Rh7 Pedimos considerar esse lance somente com o propósito de ocupação do posto avançado, pois também se poderá ver nele a intenção de penetração na sétima fileira. Como se trata de uma partida pedagógica, pode-se aceitar isso.

2...Be8 3.R1h1 Rxh7 4.gxh7 Troca de “coluna” pelo “peão livre”. Também teria sido bom 4.Rxg7 Kf8 5.Nh5, seguido do oportuno sacrifício do cavalo em f6. 4...Rh8 5.Ng6+ Bxg6 6.fxg6 Com o que se transforma o peão passado em peão defendido por peão. 6...Ke6 7.Rh5! Esse “avanço restringido” impede toda intenção de liberação através dos possíveis lances ...Ke5 ou ...f5 ao aproximar-se o g6. 7...b6 8.c4 Teria sido mais paralisante o lance b4, porém as brancas perseguem outras finalidades. 8...c5 9.a4 a5 10.b3 c6 11.Kd2 Kd6 12.Ke3 Ke6 13.Kf4 Kd6 14.Kf5! E agora se pode desenvolver o plano de ruptura das brancas. Por meio de lances forçados as brancas se colocaram em condições de poder realizar e5 e com isso fazer desaparecer o peão de f6 que impedia o acesso da torre até f7. 14...Ke7 15.e5 fxe5 16.Kxe5 Kd7 17.Rf5 Depois disso vemos claramente que o lance Rh5 continha todos os elementos da manobra denominada “avanço restringido” sobre uma coluna, uma vez que por bem ou por mal, e apesar do grande intervalo de tempo, os lances Rh5, Rf5 e Rf7 devem ser considerados como necessários para levar a torre à sétima fileira. As pretas abandonaram, já que com Rf7 e ao fazer Rxg7 se obtêm os peões passados e apoiados entre si.

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COLUNA CENTRAL Dirigida contra peões defendidos

Colocação do cavalo como sentinela, com a perda da defesa do peão

Eliminado violentamente (ataque revolucionário)

Conquistado por ataque concentrado

incômodo

Penetração na sétima e oitava fileiras com os freqüentes fenômenos que acompanham: o xeque duplo e o rodeio

Abandono da coluna em favor de outra, ou “avanço restrito” com o fim de manobrar sobre a outra coluna

COLUNA MARGINAL Disputada

A sentinela de grosso calibre ocupa a coluna ou consegue um peão passado

O peão resultante é apoiado pela coluna em questão

Penetração na sétima fileira

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Capítulo III - A Sétima e a Oitava Fileiras

1 – Introdução e generalidades. Finais e meio-jogo. A escolha do ponto de ataque. A indecisão.

Como expliquei no capítulo anterior, a penetração no campo inimigo (para a 7ª e 8ª fileiras) é o objetivo lógico das operações de coluna. Então ressaltei a penetração com alguns casos notáveis por serem catastróficos, mas, para não exagerar, devo ter presente que o desenvolvimento normal dos feitos de ocupação da 7ª fileira se realiza na definição final da partida. As catástrofes, qualquer que seja a sua categoria, são as traduções de graves erros do inimigo e por isso não devem ser consideradas no desenvolvimento normal dos fatos. Por esse motivo, nos inclinamos a considerar a ocupação das 7ª e 8ª fileiras como vantagens de final, ainda que no meiojogo possam terminar definidas inúmeras partidas, justamente por tal ocupação. A partir do que foi dito, convém ao principiante penetrar o quanto antes na base inimiga e, se então tiver uma desagradável comprovação de que a torre que lá penetrou nada poderá fazer, não deverá por isso desanimar-se. Em nosso sistema ensinamos o mais rapidamente possível os elementos estratégicos. Porém, por razões pedagógicas, não se pode manter a ordem. Assim, depois de falar da “7ª e 8ª fileiras”, do “peão livre” e da “técnica da

troca”, intercalamos um capítulo que na realidade pertence ao jogo de posição, mas que convém ser abordado antes. Quando o principiante conhecer esses elementos, poderá ver nas operações sobre as 7ª e 8ª fileiras não somente um instrumento de mate, mas também uma arma aguda que conduz aos finais. Como vemos, contém uma dupla característica, predominando o último como conceito no jogo. É de grande importância orientar as operações na sétima fileira, fixando desde o início um determinado objetivo de ataque. Para o amador é típico que se faça tudo ao contrário, se disperse observando pontos de vista diferentes, mudando constantemente de objetivo. A regra diz: escolha um ponto de ataque! Nós sabemos que o ataque pode orientarse em direção a uma casa ou uma peça e que isso em grande parte não importa, mas divagar sem sentido constitui um erro estratégico. 2 – Ataques concentrados e diretos sobre a sétima fileira. A conquista de um ponto (casa ou peão) com ressonância acústica.

Na posição do diagrama 27 as brancas escolhem como ponto de ataque o peão c7. Jogando as pretas Rc8, o ataque e a defesa ficam equilibrados. 35

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Diagrama 27 – A 7ª Fileira

De forma análoga ao método aplicado no capítulo anterior, buscamos alterar o equilíbrio a favor do atacante. Se no entanto estivessem no jogo um bispo branco em g3 e um cavalo preto em g6, se teria conseguido o propósito devido ao bispo em g3. Se ao invés de Bg3 tivéssemos Bf1 com Ba6 se dizima o inimigo. Se completarmos a posição do diagrama 27, dando às brancas outra torre em d1 e tirando-lhe o peão h2, equilibrando o material com um cavalo preto em g6, o ponto de ataque será o mesmo peão em c7. Para obter esse propósito, temos que primeiramente forçar a troca da torre: 1.Rd8+ Rxd8 2.Rxd8+ Nf8, com retorno à 7ª fileira, passando por c8 (3.Rc8 c5 4.Rc7 etc). No diagrama 27 sem modificação, se quisermos alterar o equilíbrio sobre o ponto fixado, somente poderemos consegui-lo com manobras de marcha do rei sobre o ponto de ataque. 36

Diagrama 28 – Jogam as pretas. Luta sobre a casa h7

Na posição do diagrama 28 as coisas são semelhantes. As brancas escolhem a casa h7 como ponto de ataque, porque desde esse local vislumbram a possibilidade de uma manobra mortal. 1...Rh6 2.Nf5 Rh5 3.g4! Rxh3+ 4.Kg2 Rxb3 5.Rh7+ E as brancas conseguiram seu objetivo. O defensor (torre preta) teve que fugir, as brancas conquistaram a casa apetitosa e darão mate: 5...Kg8 6.Rcg7+ Kf8 7.Rh8 ++ Com esse exemplo creio ter esclarecido suficientemente a idéia de um ataque concentrado contra uma casa determinada da 7ª fileira. Antes de passar ao ataque direto (revolucionário) faço notar a seguinte regra importante: derruba-se o ponto de ataque com as costas da torre. Por exemplo: uma torre na 7ª fileira mantém um ataque sobre o peão em g7. Ao se jogar g5, então Rg7, e não um ataque lateral pela 5ª fileira. O ataque lateral não convém pelas seguintes razões: 1ª- A 7ª fileira deve-se manter ocupada por todo o tempo que seja possível, pois assim podem surgir novos pontos de

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ataque. 2ª- O envolvimento é a forma mais forte de ataque (os ataques em ordem crescente de força são: a) o ataque frontal; b) o ataque lateral; c) o ataque envolvente, por meio do qual geralmente se obriga o inimigo a efetuar lances forçados de defesa. 3ª- O ataque lateral faz factível uma defesa mais cômoda.

se mostram corajosas) 2.Qxh6+ (as brancas não ficam atrás) 2...gxh6 3.Rh7 mate, no ponto escolhido. Esse exemplo ilustra a idéia do ataque revolucionário aplicado à 7ª fileira. O peão é eliminado violentamente para prolongar a ação da 7ª fileira.

Diagrama 30 – Ponto de ataque (captura violenta) Diagrama 29 – “Violência”. Captura do ponto de ataque g7

Sem nos assustarmos pelo fato de que está bem defendida, no diagrama 29, escolhemos a casa g7 como ponto de ataque. Concentramos o ataque com: 1.Ng3 a3 Os peões livres se tornam mais ameaçadores. 2.Nf5 a2 3.Qe5 Ameaçando mate depois de Rxg7+ 3...a1=Q, mas como g7 fica novamente defendido, as brancas perdem. Isso somente nos diz que foi um erro a escolha de g7 como ponto de ataque. O ponto exato é h7, porém a sua conquista só se consegue através de um ataque revolucionário: 1.Nf6+ gxf6 2.Qe6+ Kh8 3.Qd7 Ou então com 1.Nf6+ Kh8 (as pretas

g7

O diagrama 30 ilustra outro exemplo. Aqui é difícil para as brancas atacarem g7 (mais fácil lhes seria sem o peão g4, pois 1.Qg4 g6 2.Qh4 h5 3.Qxf6 etc) porque se 1.Rd7 (ameaçando R1c7) então 1...Rc8, ou se 1.R1c4 (ameaçando Qf7+) segue 1...Rf8. O correto é: 1.Rxg7+ Tomando para ponto de ataque h7. 1...Kxg7 2.Rc7+ Kh8 3.Qxh7++ A entrega em g7 teve como conseqüência o prolongamento da ação na 7ª fileira até h7. Se fosse jogado 2...Kf8 também se venceria com 3.Qxh7 porque as pretas estão completamente impossibilitadas de manterem-se na 7ª fileira. Um jogo mais preciso, no entanto, é não tomar o peão com a dama e jogar 3.Qh6+ (avançando a dama com ganho de tempo) 3...Ke8 4.Qe3+ Kf8 5.Qe7+ (ocupação da 7ª 37

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fileira com ressonância – Akustischen Beiklang) 5...Kg8 6.Qg7 mate. Essa última manobra merece comentários. É típica para impedir a chegada de reforços inimigos. Tomemos outro exemplo da mesma manobra. Posição: brancas – Kf1, Qh5, peões em d4, e3, f5; pretas: Kg8, Ra8, Rf8, Nh1, peões em f7, f6, onde as brancas devem tomar o cavalo e simultaneamente dar xeque. Conseguem com a seguinte manobra: 1.Qg4+ Kh7 2.Qh3+ Kg7 3.Qg2+ Kh6 e agora Qxh1+. Trata-se de levar o rei até o lugar desejado sem perder o controle do trebelho ou da casa a se tomar.

ação. E depois de 2...Kf8 3.Qxc5+ dominam a casa e7. 3 – Os cinco casos especiais na sétima fileira. 1º Sétima fileira absoluta e peões livres. 2º As torres dobradas mantêm o xeque perpétuo. 3º O mecanismo para conquistar o empate (torre e cavalo). 4º A incursão na sétima fileira. 5º O jogo combinado na sétima e oitava fileiras (jogo envolvente em um canto do tabuleiro).

Por “sétima fileira absoluta” entendemos a sétima fileira que encerra o rei inimigo. Exemplo: brancas – Ra7; pretas – Kf8, f7, se o peão estivesse em g7 sua ação retiraria o caráter de “absoluta” da sétima fileira possuída pelas brancas. 1º - Sétima fileira absoluta e peões livres

Diagrama 31 – Conquista de e7, com xeque simultâneo (mate em 4)

Na posição do diagrama 31, o ponto de ataque é e7. Se pretendessemos chegar a ele por 1.Qh4 ou 1.Qf2+ Ke8 2.Qxc5, fracassaríamos devido a 2...e3+ seguido de 3...Ra1 mate. O correto é: 1.Qf1+ Ke8 2.Qb5+ Kf8 3.Qxc5+ Ke8 4.Qe7++ Também se poderia estabelecer o problema da seguinte forma: as brancas devem ocupar a casa c5 dando xeque simultaneamente. Depois de 1.Qf1+ Ke8 2.Qb5+ as brancas tomaram contato com a casa c5, prosseguindo sua 38

A sétima fileira absoluta e os peões avançados ganham quase sempre. Exemplo: brancas – Kh1, Re7, peão em b6; pretas – Kh8, Rd8. As brancas jogam b7 e não haverá forma de impedir que sigam com Rc7 e Rc8+. Se o rei preto estivesse colocado em g6, a partida estaria empatada.

Diagrama 32 – Exemplo do primeiro caso

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Na posição do diagrama 32 a partida se define após 1.Qxh3+ Rh6 2.Qxh6+ gxh6 3.b6 pois a sétima fileira se transformou em absoluta. Se não tivesse ocorrido essa transformação, ou seja, se se tivesse conservado o peão g em sua casa original, ao terem as pretas a possibilidade de jogar ...Kh7, a partida poderia resultar empatada. Na posição (brancas – Kf2, Rd7, peões em d4, g3 e h5; pretas – Ke4, Ra5, peões em a7, f6, g7 e h6) produzida na partida Tarrasch-Lasker, Berlim 1918, Lasker em um comentário deu a posição como ganhadora com 1...Ra2+ 2.Kg1? ao que segue 2...a5 3.Rxg7 a4 4.Rg6 a3 5.Rxf6 Rb2. Se nesse momento no entanto as brancas tivessem seu peão g na casa original, teriam podido empatar, mas como não é assim, ou seja, a sétima fileira é absoluta para as pretas, que vencem. Foi interessante o ensaio das brancas. Depois de 1...Ra2+, trataram de neutralizar os efeitos da sétima fileira, jogando 2.Ke1!. Lasker continuou da seguinte forma: 2...a5 3.Kd1 a4 4.Kc1 a3 5.Kb1, produzindo-se o empate. 2º - As torres dobradas mantêm o xeque perpétuo

O interesse nesse caso reside em um erro psicológico muito comum. Brancas – Kh2, Rd7, Rf7, peão em h3; pretas – Ke8, Rf1, Bf3, peões em e5 e f4. Nessa posição qualquer jogador, por pouco experiente que seja, percebe a posição desesperadora das brancas e portanto empata com 1.Rfe7+, reconhecendo que 1.Rde7+? teria permitido ao rei preto deslocar-se aos poucos do lugar cercado. (1.Rde7+? Kd8 2.Rd7+ Kc8 3.Rc7+ Kb8 e as brancas não têm xeque). Com

1.Rfe7+ Kf8 2.Rf7+ Kg8 3.Rg7+ Kh8 4.Rh7+ (4.Rg1?? Rf2+) 4...Kg8 5.Rhg7+! Kh8 6.Rh7+ Kg8, ficamos olhando com orgulho para as pretas, como perguntando a elas se no entanto pensavam em escapar, repetindo os xeques algumas vezes. Porém depois, com a única finalidade de fugir da monotonia, damos um xeque com a outra torre 7.Rdg7+??, com o qual se perde a partida, pois como vimos o rei pode escapar até b8. Disso se deduzem os seguintes ensinamentos: 1º Nem sempre é conveniente a variação; 2º Quando uma torre se constitui em uma boa guardiã, não convém devido a isso incomodá-la sem motivo. 3º - O mecanismo para conquistar o empate (torre e cavalo)

Na posição: brancas – Kh2, Rb7, Nf6; pretas – Kf8, peões em c2, d2 e e2, o lance Nh7+ seguido de Nf6+ fracassa, pois o rei escapa a d8. Porém, ao se fazer o lance 1.Rd7, o mecanismo de empate funcionará admiravelmente: 1...d1=Q 2.Nh7+ Kg8 3.Nf6+, constituindo-se em suicídio 3...Kh8. Observe-se o lance fundamental 1.Rd7 que realiza o contacto estratégico entre a torre e o cavalo. Se na posição estabelecida agregarmos uma torre preta em c8, o lance Rd7 não é necessário, pois a própria torre dificulta a fuga do rei e portanto se pode jogar diretamente 1.Nh7+ Ke8 2.Nf6+ Kd7?? 3.Rd7 mate. Encontramos com um rei inteligente que se suicida no meio do tabuleiro; outro menos inteligente teria abandonado a luta, retirando-se para o seu canto. 39

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4º - A incursão na sétima fileira

O quarto caso é muito simples, porém seu estudo é imprescindível para se tratar do quinto, que é muito complicado. Consiste em uma manobra de ataque pela qual o rei é obrigado a abandonar o canto, produzindo-se na seqüência um xeque duplo. Exemplo: brancas – Kh2, Ra7, Rb7, peões em g2, g6, h3; pretas – Kh8, Rc8, Rd8, Bf1. Segue 1.Rh7+ Kg8 2.Rag7+ Kf8 3.Rf7+, capturando na seqüência o bispo. A trama para conseguir o objetivo está baseada na posição defendida da torre em h7, porque se não 3...Kg8 impediria a tomada do bispo. Nesse quarto caso há que se fazer notar a aptidão especial das torres unidas para tirar o rei do canto até a terceira coluna (c ou f), pois esse é o fundamento do quinto caso. 5º - O jogo combinado na sétima e oitava fileiras (jogo envolvente em um canto do tabuleiro)

Posição: brancas – Ra7, Rd7; pretas – Kh8, Qb8. As brancas tentam ocupar a oitava fileira, mas para consegui-lo terão que se valer de algum ardil, pois a posição da dama rival corta o caminho direto. Então o canto, afastando o rei e obtendo espaço para a torre, que deve dar o rodeio. 1.Rh7+ Kg8 2.Rag7+ Kf8 3.Rh8+, com possessão da oitava fileira e captura da dama. A posição que surgiu após os xeques de torre nas colunas h e g é a posição típica de todas as manobras de rodeio para passar da sétima para a oitava fileira. (Veja o diagrama 33). 40

Diagrama 33 – A base para o rodeio.

A análise dessa posição inicial nos mostra as duas torres dispostas a dar o rodeio em um rei valente. O contato com a torre o preserva do pior, ou seja, do mate, que se faz impossível por essa razão. Com esse rei ocorre o mesmo que a um pacífico caminhante que repentinamente se vê ameaçado por um assaltante, que com a arma à mostra pretende conseguir seus propósitos. Se o atacado conseguir segurar o braço do assaltante fará o possível para não largálo mais, pois sabe que enquanto dure o contato o criminoso não poderá desferir o golpe decisivo. Disso surge a regra: se o rei está ameaçado de ser rodeado, deve manter contato com a torre mais “próxima” o maior tempo possível, enquanto as torres ameaçadoras tratam de afastar-se desse contato, porém conservando a posição. Ao mesmo tempo de manter o contato, o rei chega ao canto e então as torres também se obrigam a impedir essa manobra, ou tirálo de lá se conseguiu chegar ali. Partindo da posição apresentada ao começar o quinto caso, as brancas podem ensaiar três tipos de manobra:

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a) ganho material; b) ruptura do contato entre a torre e o rei; c) combinação de ganhos de tempo. Já consideramos esse caso, de forma que se há uma dama na oitava fileira, surge buscar Rh8+ com a troca da torre pela dama inimiga. Há que se romper o contato, quer seja defendendo a torre da coluna g com um peão ou qualquer outra peça, ou afastar o rei da casa f8 mediante outros xeques. Brancas – Rh7, Rg7, Be1; pretas – Kf8, Qa8, Ra2. Nessa posição se joga Bb4+ e depois disso as brancas estão em condições de dar o golpe mortal com Rh8+. Se imaginarmos no lugar do bispo um peão branco em e6, o jogo seria 1.e7+ Ke8 2.Rh8+, cumprindo-se o rodeio. Mas agora o rei preto dispõe de uma casa para se refugiar que antes lhe era inacessível. O lance 2...Kd7, mas essa colocação não tem influência nos resultados, pois a atmosfera, aparentemente limpa, na realidade era completamente viciada: 3.e8=Q+ e logo sobrevém o mate.

posição inicial de forma igual à do diagrama 33. 1.Rg7+ Kf8 2.Rh7 (ameaçando mate) 2...Kg8 (buscando o refúgio do canto) 3.Rcg7+(cortando o refúgio) 3...Kf8 4.Ng5! (teria sido fraco 4.Nf2 ameaçando Ng4 devido a 4...Be2) 4...fxg5 5.f6 e mate em h8. Ou se não também 4.Ng5! d4 5.Ne6+, forçando 5...Bxe6 6.fxe6 e em seguida e7+, tirando o rei da casa f8 para levá-lo ao campo aberto onde perecerá envenenado em d7. Assim: 7.e7+ Ke8 8.Rh8+ Kd7 9.e8=Q+ etc. O xeque de e7, destruidor do contato, somente se poderia estancar à custa de uma torre: 6...Re8 7.e7 Rxe7 8.Rxe7 e as brancas venceriam com facilidade, ainda que as pretas conservassem um ou dois peões livres, pois então se faria ver a capacidade das torres em apunhalar pelas costas o peão que se aproxima da coroação.

Diagrama 35 – Os ganhos de tempo. As brancas vencem

Diagrama 34

Vejamos o diagrama 34, onde as brancas prontamente podem forçar a

Se a partir do diagrama 35 se jogar 1.Rh7+ Kg8 2.Rfg7+ Kf8, as brancas terão chegado a tomar posse de uma base, porém como seguir depois? Os planos a e b poderiam ser aplicados se o rei branco estivesse em g5, porque então resultaria factível seguir Kh6 etc, mas 41

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como não é assim, aparentemente as brancas não teriam outro remédio senão conformarem-se com o xeque perpétuo. No entanto, as aparências enganam. A 3.Rxd7 com ameaça de mate com Rh8, segue forçado 3...Kg8 e as brancas depois de voltarem com 4.Rdg7+ Kf8 5.Rxc7 se mantêm agressivas e novamente as pretas são obrigadas a repetir 5...Kg8, devendo postergar seu sonho dourado de ir a dama com seu peão defendido de a. Quando se retira um tempo do inimigo para realizar um movimento que lhe convém, obrigandoo a jogar um lance que não possa postergar, se produz, como já sabemos, um ganho de tempo. Segue, pois, 6.Rcg7+. Esse xeque que se dá antes de devorar o peão b7 não é para aumentar o apetite, mas para criar uma ameaça. Seja como for, esse jogo bonito, tão bonito como a lenda de Swjatogor, herói russo que simboliza a terra fértil, que envolvido em uma luta contra o espírito do mal (um dragão) conseguiu vencer pelo fato de que nos momentos críticos se apoiava sobre a terra. Através desse contato com a maravilhosa mãe terra adquiria novas forças para continuar lutando até esgotar o inimigo. Da mesma forma atua aqui o contato com a “posição inicial típica”, provocado pelas brancas, criando uma ameaça de mate e com ela o ganho de tempo. Em nosso lance o final é semelhante: 6...Kf8 7.Rxb7 Kg8 8.Rbg7+ (nesse momento no entanto teria sido um erro 8.Rxa7 devido a 8...a1=Q) 8...Kf8 9.Rxa7 Rxa7 10.Rxa7, ganhando o peão de a2 e portanto a partida. Resumindo diremos que a manobra c consiste na renovação de forças que se 42

produz ao se voltar à posição base, ou, de outra forma, com a criação da base se origina uma ameaça de mate e com ela a oportunidade de roubar tempos. Com isso creio ter esclarecido suficientemente as três formas do quinto caso. Vimos que o primeiro é forçar a posição inicial, ou seja, a “base” e assim começa nossa novela (que corresponde à primeira conversa entre ele e ela). Depois se pode escolher entre os planos a, b ou c e, de acordo com o critério pessoal, dar seqüência a essa novela do xadrez. Isso não oferecerá maiores dificuldades, uma vez que já adiantamos uma comunicação valiosa na arte de desligar a torre na sétima do rei inimigo. Citaremos para finalizar dois finais e um pequeno esquema.

Diagrama 36 - Nimzovitsch - Bernshtein

O diagrama 36 ilustra a posição após 50 lances, jogada por mim contra o Dr.Bernshtein no torneio de Vilna. Nessa oportunidade meu adversário jogou 50...Rf8, com a pretensão de reduzir o material para seguir f6. Porém respondi com toda tranqüilidade: 51.Rxb4 f6 pois percebi que poderia confeccionar

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“meu caso especial” anteriormente conhecido (peão livre e sétima fileira absoluta). Um salsicheiro, com os mais diversos materiais, faz uma salsicha de verdade. Mas há uma diferença comigo, meus componentes são produtos originais... A matéria prima do salsicheiro é, digamos, um tanto obscura. Depois segui: 52.Bc5! Rc8 Forçado, pois a 52...Rf7 seguiria 53.Rb7 Rxb7 54.axb7+ Kxb7 55.exf6, evidenciando-se as preocupações do bispo em f5. 53.exf6 Rxc5 54.f7 O peão livre! 54...Rc8 55.Rb7 A sétima fileira absoluta, a superioridade do inimigo é somente material. “Tudo foi concebido de forma maravilhosa”, expressa Lasker em Schachwart (1913). Mas, queridos leitores, essa concepção tanto para mim como para qualquer outro que conhece meu sistema não oferece nenhuma dificuldade. Com isso quero indicar as grandes possibilidades práticas do meu sistema. Então continuou: 55...Bd3 56.Re7 E naturalmente 56...Bb5 57.Kf4 As brancas evitam jogar 57.Re8 Bxe8 58.f8=Q porque se bem que com isso tivessem a satisfação de ter coroado o peão, depois de 58...Bc6+ e 59...Rxf8 teriam visto repentinamente desaparecer a dama e com ela morreria toda alegria. 57....Rh8 58.h7 Ba4 59.Ke5 Bb5 60.Kf6 e5 61.Kg7 e as pretas abandonaram.

Diagrama 37 – Nimzovitsch-Eliasstamm (vantagem de cavalo no início)

No diagrama 37 deve-se jogar: 1.a6 Qa8 Ameaçando ...Ra7 seguido de ...Rxa6. As brancas se salvam dessa situação embaraçosa através de uma armadilha escondida, que eu denomino “Dünazeitung”, ou por meio de uma combinação baseada no conhecimento do terreno (conhecimento dos elementos realmente disponíveis). Seguiu: 2.b3 Rb8 Seria melhor 2...Rb7, porém o lance do texto impõe o sacrifício de dama. 3.Ba3! Rxb6 4.Bxd6 Rc8 5.Rxg7+ Kxg7 6.Be5+ A qualquer lance do rei chegamos ao empate por xeque perpétuo. Há que se notar, no entanto, que depois do sacrifício da dama as brancas sempre obtêm o empate, por exemplo: 4...Qxa6 5.Be5 Ke8 6.Rh8+ Kd7 7.R6h7 Qa2+ (para desocupar a casa a6) 8.Kg3 c5 9.Rxg7+ Kc6 10.Rxc7+ Kb5 11.Rxc5+ Ka6 12.Ra8+, com a recuperação da dama. De outra forma seria: 4...Qg8 5.Bxc7 Rxa6 6.bxc4 seguido de 6...Be5, ou se 4...Qg8 5.Bxc7 cxb3 6.Bxb6 b2 7.Rxg7+ Q(ou K)xg7 8.Rh1, ficando as brancas no 43

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entanto melhores devido ao poderoso peão a que possuem. Exemplos de partidas para os primeiros capítulos Primeiro Bloco

Uma seleção de partidas é em realidade difícil, pois o número dessas é muito grande. Por outro lado, a escolha é mais simples devido a que, no fundo de quase todas partidas boas, há algo característico do meu sistema. Sempre encontramos jogos em colunas abertas ou na sétima fileira e ainda mais, como ninguém pode nos impedir de interpretar as partidas sob o nosso ponto de vista, podemos tranqüilamente assim fazê-lo para proveito dos meus leitores. Por isso, não vale muito quebrar a cabeça escolhendo as partidas e é mais importante colocar imediatamente as mãos à obra. Partida 1 Nimzovitsch - Alapin Vilnius, 1912 Defesa Siciliana Ilustra a conseqüência da captura de um peão

em plena abertura. 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Nf6 4.exd5 Nxd5 Abandono do centro. 5.Nf3 c5 Com o objetivo de tomar o peão (veja Abandono do Centro no capítulo I). A contenção é possível seja com ...Be7, ...0-0, ...b6 e Bb7. 6.Nxd5 Qxd5 7.Be3 As brancas trocaram os cavalos em d5 para poder fazer esse lance de desenvolvimento e ataque (ameaça ganhar um peão com dxc5). Veja o 44

parágrafo 4 do primeiro capítulo. 7...cxd4 Desaparecido o comedor de tempos, se consagrou a perda de tempo. 8.Nxd4 a6 9.Be2 Qxg2 Captura de peão. Esse feito trará conseqüências desastrosas. 10.Bf3 Qg6 11.Qd2 e5 Momento crítico. As pretas querem se desembaraçar do cavalo branco incômodo de d4 e melhorar um pouco seu desenvolvimento com ...Nc6. 12.0–0–0 exd4 13.Bxd4 Com isso as brancas consagraram sua notável vantagem de desenvolvimento. 13…Nc6 14.Bf6 Um lance oportuno. Qualquer outro lance com o bispo teria permitido às pretas responderem com um lance de desenvolvimento, enquanto agora as pretas devem efetuar a captura com a perda de um tempo. 14…Qxf6 15.Rhe1+ Jogo simultâneo nas colunas centrais abertas d e e com ameaça de penetração decisiva. 15...Be7 Se 15…Be3 16.Qd7 mate. 16.Bxc6+ Kf8 Se 16…bxc6 Qd8 mate. 17.Qd8+ Bxd8 18.Re8 ++

Partida 2 Teichmann - Nimzovitsch Carlsbad, 1911 Defesa Philidor

As brancas nessa partida conseguem o peão central livre e móvel em e4. As pretas para freálo utilizam os recursos de que podem dispor na

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dita coluna (posto avançado: cavalo em e5), obtendo um êxito completo, pois conseguem capturar o agressor (ver parágrafo 6 do capítulo I), mas depois no entanto desperdiçam o seu trabalho e ao final caem exaustas. 1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 Nf6 4.Nc3 Nbd7 Com esse lance se dificulta o desenvolvimento, porém se consegue manter o centro. Classificá-lo como feio seria de mau gosto. 5.Bc4 Be7 6.0–0 0–0 7.Qe2 c6 As pretas estabelecem dessa forma pelo menos uma quantidade maior de peões no centro, o que não retira no entanto a supremacia das brancas no mesmo. 8.a4 Pode-se continuar com lances de peões na abertura devido ao seu caráter fechado. 8...Qc7 9.Bb3 a6 Para poder eventualmente avançar o peão de f. 10.h3 exd4 De forma alguma se deve considerar como uma inconseqüência o abandono do centro. A felicidade, por acaso, não era felicidade por ter durado pouco? Não se pode ser feliz eternamente. 11.Nxd4 Re8 Estratagema de restrição dirigido contra o peão e. 12.Bf4 Bf8 13.f3 Nc5 Um estudante inteligente talvez esperasse uma ocupação através de ...Ne5, porém no momento interessa mais para as pretas a troca para poder respirar melhor. Como sabemos, a troca é um recurso interessante em situações asfixiantes. 14.Ba2 Ne6! 15.Bxe6 Bxe6 16.Qd2 Rad8 17.Rfe1 Bc8 18.Rad1

Nd7! Depois de realizar um desenvolvimento harmônico (na realidade a falta de terreno não deixava muito espaço para a harmonia) as pretas ocupam o posto avançado. 19.Nf5 Ne5 Domínio do campo. Grande raio de ataque. Posicionamento tranqüilo. Qualquer tentativa de expulsar o cavalo através de f4 debilitaria o peão e. 20.Nd4 f6 21.Kh1 Qf7 Observe-se a crescente paralisia do peão e das brancas. 22.Qf2 Qg6 23.b3 Nf7 Com isso se preparou ...c5. Se o principiante perguntar o que fez até agora o cavalo em e5, se poderá responder simplesmente: impediu todas as ações das brancas. 24.Kh2 Re7 25.Nde2 f5! Eliminando o peão paralisado. 26.Ng3 fxe4 Muito precipitado. O correto teria sido jogar antes ...Rde8, para depois seguir 27.exf5 Bxf5 28.Nxf5 Qxf5 29.Bg3 Rxe1 30.Rxe1 Rxe1 31.Qxe1 Qxc2. 27.Ncxe4 No caso de 27.fxe4?, o peão ficaria isolado e fraco. 27...d5 28.Nc5 Rde8 29.Nd3 Rxe1 Com isso as pretas simplesmente igualam a partida. Se 29...Nd6, cederiam a casa e5 ao inimigo, permitindo 30.Be5. 30.Rxe1 Rxe1 31.Qxe1 Qe6 32.Qxe6 Bxe6 33.Be3 Esse belo lance restringe a superioridade numérica dos peões pretos na ala da dama. As pretas, frente a isso, deveriam ter-se conformado com o empate, mas na ânsia de conseguir mais perderam de forma instrutiva: 45

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33...Bd6 34.f4 Kf8 35.Kg1 g6 36.Kf2 h5 37.Nc5 Bc8 38.a5 Nh6 39.b4 Kf7 40.c3 Ng8 Novamente com 40...Nf5 teriam conseguido empatar. 41.Kf3 Nf6 42.Bd4 Bxc5 43.Bxc5 Be6 44.Bd4 Ne4 45.Ne2! E não 45.Nxe4 porque segue 45…dxe4+ 46.Kxe4 Bd5+, seguido de …Bxg2. 45…Bf5 Não há nada o que fazer. As pretas têm um peão a menos na ala do rei, mas onde têm a maioria estão paralisadas, enquanto as brancas na sua ala têm mobilidade. 46.g4 hxg4+ 47.hxg4 Nd2+ Muito melhor era passar o bispo para a reserva, ou seja, jogar 47...Bd7. 48.Kg3 Bc2 49.Ng1 Ke6 50.Kh4 Bd1 51.Nh3 Ne4 52.f5+ gxf5 Aproveitamento artístico da manobra (depois de 52…Kf7 teria sido incômodo 53.fxg6! Kxg6 54.Nf4+). 53.Nf4+ Kf7 54.g5 Bg4 55.g6+ Ke7 56.g7 Kf7 57.Ng6 c5 58.bxc5 1–0

Partida 3 van Vliet-Znosko Borovsky Ostende, 1907

Um exemplo excelente para ilustrar o jogo em coluna aberta. Desde o início Znosko-Borovsky consegue a supremacia e, sem utilizar nenhum posto avançado, abre espaço na base inimiga. 1.d4 d5 2.e3 c5 3.c3 e6 4.Bd3 Nc6 5.f4 A formação da muralha de pedra, “Stonewall”, praticada pelas brancas é um esquema fechado de abertura. 46

5...Nf6 6.Nd2 Qc7 7.Ngf3 As brancas não se aperceberam do perigo de 6...Qc7. Melhor teria sido jogar 7.Nh3 para seguir com Qf3. 7...cxd4!

Diagrama 38 – Posição após 7...cxd4! 8.cxd4? O lance posicionalmente correto aqui seria 8.exd4 - quando as brancas têm um posto avançado sobre as colunas e (em e5) e ao mesmo tempo o peão em c3 fecha a coluna da dama para o inimigo (ver o quarto parágrafo do capítulo I). Aqui, no entanto, com tal captura as brancas perderiam um peão. Apesar disso, esse lance é preferível ao do texto, razão pela qual veremos a continuação: 8.exd4 Qxf4 9.Nc4! Qc7 (se 9...Qg4 10.Ne3!) 10.Nce5 Bd6 11.Qe2 com o que as brancas conseguem colocar uma sentinela muito bem coberta na coluna e, que as pretas não conseguem remover nem depois de 11...Bxe5 12.dxe5 Nd7 13.Bf4 f6?, pois as brancas ficam em posição vencedora após 14.exf6! Qxf4 15.fxg7 Rg8 16.Qxe6+. Enquanto a coluna e estiver em poder das brancas, seja com Ne5 como sentinela, ou que

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este tenha sido substituído pelo peão (depois de 12.dxe5), as brancas apesar da sua inferioridade numérica se encontrarão em uma posição excelente. 8...Nb4 9.Bb1 Bd7 10.a3 Rc8 O lance do cavalo, que pode parecer de principiante, mostra as garras depois do belo lance de torre. 11.0–0 Bb5! 12.Re1 Nc2 13.Bxc2 Qxc2 14.Qxc2 Rxc2 Com o que as pretas tomam posse da 7ª fileira, além da diagonal f1-a6 para o bispo e casa e4 para o cavalo. 15.h3 Bd6 16.Nb1 Ne4 Não se trata de um posto avançado em nosso exato sentido, pois falta a coluna aberta na posição, mas constitui um bom substituto. 17.Nfd2 Bd3 18.Nxe4 Bxe4 Também teria sido bom 18...dxe4, fortificando o bispo em d3, dando-nos ainda a oportunidade de entender que a força de uma coluna ou diagonal toma expressão na casa fortificada. Ou seja, vemos o conceito abstrato de coluna ou diagonal fazer-se objetivo (no sentido de que havíamos considerado “matéria” uma casa defendida). 19.Nd2 Kd7 20.Nxe4 dxe4 21.Rb1 Rhc8 22.b4 R8c3 23.Kf1 Kc6 24.Bb2 Rb3 25.Re2 Rxe2 26.Kxe2 Kb5 27.Kd2 Ka4 28.Ke2 a5 A ruptura decisiva. A posição da torre preta (que fixa e ameaça o peão e) era forte demais para resistir. O que segue não é difícil de compreender. 29.Kf2 axb4 30.axb4 Kxb4 31.Ke2 Kb5 32.Kd2 Ba3 33.Kc2 Rxb2+ 34.Rxb2+ Bxb2 35.Kxb2 Kc4 36.g4 Kd3 37.g5 Kxe3 0–1

Partida 4 Lee - Nimzovitsch Ostende, 1907 Abertura do Peão da Dama

Partida ilustrativa do posto avançado e da sétima fileira. 1.d4 Nf6 2.Nf3 d6 3.Nbd2 Nbd7 4.e4 e5 5.c3 Be7 6.Bc4 0–0 7.0–0 exd4! 8.cxd4 d5 O tratamento da abertura por parte das pretas resulta instrutivo. 9.Bd3 dxe4 10.Nxe4 Nxe4 11.Bxe4 Nf6 Produziu-se uma “troca com conseqüente ganho de tempo”. 12.Bd3 Nd5 Jogo na coluna d contra o peão branco de d4. 13.a3 Bf6 14.Qc2 h6 15.Bd2 Be6 16.Rae1 c6 17.Be3 Qb6 18.h3 Rad8 19.Rc1 Rd7 Tudo se dispôs lentamente devido ao fato de que o objetivo do ataque (d4) está imobilizado, não havendo portanto motivo para pressa. 20.Rfe1 Rfd8 21.Qe2 Qc7 22.Bb1 Ne7 Após ter completado a sua missão (e como trabalhou o cavalo!), convém a ele mudar de ares. Agora ele se dirige a f5. 23.Ne5 Bxe5 24.dxe5 Qxe5 25.Bxa7 Qxe2 26.Rxe2 Rd1+ As pretas penetraram pela coluna d nas posições inimigas. 27.Re1 Rxc1 28.Rxc1 Rd2 Agora começa o jogo na sétima fileira (nesse caso a segunda, porém sétima para as pretas). 29.b4 Nd5 30.Be4 Nf6 31.Bc2 Nd5 32.Be4 Ra2! Provocando um final de bispos de 47

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cores opostas. 33.Bxd5 Bxd5 34.Rc3 f5! Tudo foi jogado de acordo com o meu sistema. Agora as pretas buscam um objetivo de ataque na sétima fileira. Uma vez que o ataque ao peão de a3 não pode progredir, fixam o objetivo em g2 e o procedimento é um avanço generalizado na ala do rei. 35.Kh2 Kf7 36.Bc5 g5 37.Rd3 b5 38.Bd4 Be4 39.Rc3 Bd5 40.Bc5 Kg6 41.Rd3 h5 42.Bb6 f4 43.Bd4 Kf5 44.f3 A posição das brancas é claramente inferior. As pretas ameaçavam ...g4, seguido de ...g3+, ou após a troca de peões fxg3, ...Rxg2+ etc. 44...g4 45.hxg4+ hxg4 46.Kg1 Re2 A oitava fileira também é fraca pela ameaça das pretas em g3 e ainda por cima as brancas não dispõem de muitos lances. 47.fxg4+ Ke4 48.Rd1 Bb3 49.Rf1 Kxd4 E as pretas venceram após poucos lances: 50.Rxf4+ Re4 51.Rf6 Bd5 52.Rg6 Re2 53.Kh2 Rxg2+ 54.Kh3 Ra2 0–1

Bd6 5.Bd3 Nf6 6.h3 0–0 7.0–0 h6 Na variante das trocas na Defesa Francesa, um dos motivos principais é a cravada dos cavalos através do bispo em g5 e g4. Aqui no entanto, devido aos lances h3 e h6, a cravada está eliminada e portanto têm-se que voltar a atenção para a coluna e. 8.Nc3 c6 9.Ne2 Re8 10.Ng3 Ne4 Ocupação do posto avançado. 11.Nh5 Nd7 12.c3 Ndf6 13.Nh2 Qc7 14.Nxf6+ Nxf6 15.Nf3 Ne4 16.Bc2 Bf5! Todas as peças apontam em direção ao ponto estratégico para fazê-lo mais forte e reforçar seu domínio sobre o mesmo. 17.Nh4 Bh7 18.Be3 g5 19.Nf3 f5 20.Re1 Re7 Em cada lance aumenta a pressão na coluna e. 21.Nd2 f4 22.Nxe4 dxe4 O cavalo que fez as vezes de sentinela deixou no semipassado peão e um herdeiro digno. 23.Bd2 Rae8 24.c4 c5 25.Bc3 Bg6! Esse último lance foi jogado para poder seguir com ...Kh7 e posteriormente avançar o peão ...e3 e também para responder ao avanço do peão em h6 com ...h5 seguido de ...g4. 26.Qg4 cxd4 27.Bxd4 Be5 28.Bxe5 Rxe5

Nas partidas que seguem, o cavalo do posto avançado constitui-se no protagonista principal. No primeiro caso é trocado, porém suas tropas obtêm plena compensação ao retomar o peão. No segundo caso se manifesta sua grande elasticidade. Partida 5 Haken - Giese Riga, 1913 Defesa Francesa

1.e4 e6 2.d4 d5 3.exd5 exd5 4.Nf3 48

Diagrama 39 – Legenda: Posição depois de 28...Rxe5

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29.Qd1 No caso de 29.Rad1 seguiria 29...e3 30.Bxg6 exf2+ 31.Kxf2 Qc5+ 32.Kf1 Qxc4+ 33.Kf2 Qc5+ 34.Kf1 Qb5+ 35.Kf2 Qxb2+ 36.Kf1 Qb5+ 37.Kf2 Qb6+ 38.Kf1 Qa6+ 39.Kf2 Qxa2+ 40.Kf1 Qa6+ 41.Kf2 Qb6+ 42.Kf1 Rxe1 41.Rxe1 Rxe1+ 42.Kxe1 Qxg6. Trata-se de uma bela ilustração do tema “conquista de um peão com xeque simultâneo” (ver o Capítulo III, diagrama 31). 29...Rd8 30.Qb1 Rd2 31.Bxe4 Qc5! 32.Bd5+ Kg7 33.Qc1 Qxf2+ 34.Kh1 Rexd5 As brancas abandonaram. Como se pode ver, essa partida é um exemplo valioso do tratamento do posto avançado.

Partida 6 Tarrasch - Berger Breslau, 1889 Abertura Espanhola

Como se pode observar, trata-se de uma partida dos primórdios da ciência do xadrez. Nesse caso o cavalo também atua como personagem principal, porém agora mostra a elasticidade dos seus movimentos. 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 a6 4.Ba4 Nf6 5.Nc3 Bb4 6.Nd5 Be7 7.d3 d6 Agora o Dr. Tarrasch consegue a vantagem de dobrar um peão jogando da seguinte forma: 8.Nb4 Bd7 9.Nxc6 Bxc6 10.Bxc6+ bxc6 A fraqueza criada, no entanto, é de difícil aproveitamento imediato. 11.0–0 0–0 12.Qe2 c5? Esse lance é considerado ruim hoje

em dia (o comentário é de 1926 – N. do T.), pois a fraqueza do peão dobrado se manifesta ao avanço das pretas, enquanto uma ruptura central das brancas não tem porque acentuá-la. Pelo contrário, após d4, exd4 o peão de c6 seguiria defendendo o possível posto avançado de d5 para as brancas. Aqui podemos ver como fica fácil pensar em função do sistema. Era correto, por conseguinte, 12...Re8, seguido de ...Bf8, ficando na expectativa dos acontecimentos. 13.c3! Para poder jogar d4 o quanto antes, a qualquer preço. Hoje sabemos que o ataque central não é o único que conduz à felicidade. Teria sido mais correto levar o cavalo a c4 via d2 e depois jogar f4 deixando o centro passivo. 13...Nd7 14.d4 exd4 15.cxd4 Bf6 16.Be3 cxd4 17.Bxd4 Re8 18.Qc2 Bxd4 19.Nxd4 Nc5 O destino da partida depende da posição do cavalo. Caso fosse obrigado a se retirar, poderia surgir um ponto fraco em c7, o qual se converte em uma debilidade. 20.f3 Qf6 21.Rfd1 Reb8 As brancas possuem a coluna d e o ponto forte d5. As pretas não podem aproveitar a coluna e porque e4 está defendido e, por outro lado, as torres têm a função de impedir o avanço b2-b4. 22.Rab1 a5 23.Kh1! A idéia desse lance sutil é dar valor ao centro como arma de ataque. A ameaça agora, depois de 23.Kh1, é 24.e5 Qxe5 25.Nc6, ganhando qualidade. Isso não teria dado resultado de imediato, devido a 25...Qe3+, como seria o caso se o rei estivesse em g1. No entanto, o lance do rei não tem valor positivo, pois em 49

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qualquer caso as pretas podem responder ...Rb7, ainda que fosse para dobrar as torres. Como se pode observar, as pretas pressionam a coluna b buscando impedir b4. 23...Rb6 Isso não é bom, pois permite às brancas fazerem-se fortes rapidamente na coluna d, que será ocupada com ataque à torre. O posto avançado d5 pode agora ser empregado para dirigir o ataque a Rd3. Teria sido mais conveniente 23...Rb7 (como indica Steinitz) ou algum lance passivo, como h6. Por exemplo: 23...h6 24.e5 dxe5 25.Qxc5 exd4 26.Rxd4 a4 (as pretas exercem pressão na coluna b) 27.Rb4 Qd6 com o que se chega a um cômodo equilíbrio. Ou também 23...Rb7 24.Ne2 Reb8 25.Nc3 a4 e novamente a coluna b ganha importância. 24.Ne2 Ne6 25.Nc3 Rc6 Percebe-se claramente que o cavalo em d5 incomoda a Berger, porém lhe teria sido mais conveniente realizar uma retirada ordenada, como 25...Qd8 25.Nd5 Rb7 seguido de ...Rab8. 26.Qa4 Rc5 27.Nd5 Qd8 28.Rbc1 O sentido dos lances das brancas Qa4 e Rbc1 é tão claro como a luz do dia. Sua intenção é controlar a coluna c (pela qual no momento tanto se luta) para fazer sentir o poderio dessa coluna jogando Qc6 no momento oportuno. 28...Rxc1 29.Rxc1 c5 Saneado o ponto fraco c7, criou-se para as pretas um motivo de novas preocupações em sua casa d6. As pretas já se encontravam em condições desfavoráveis por terem descuidado da coluna b. 50

30.Rd1 Nd4 31.Qc4 As brancas querem trocar o cavalo com a manobra Nc3-e2 para logo em seguida atacarem impunemente o peão d. Esse ataque pode ter êxito, pois é fácil que as peças protetoras caiam em situação incômoda (por exemplo – pretas Rd7, Qe7; brancas: Rd5, Qd3), nas quais o peão e ocasionará um terceiro ataque e as pretas perderão seu peão d. Segundo nosso ponto de vista, há interesse em ver como as peças brancas fixaram seus olhos no ponto d5 (31.Qc4!). O que acontece é que se alguém domina uma casa, como d5 nesse caso, pode envolver-se em longas manobras cuja base é o ponto em questão. Com isso quero dizer que as peças próprias podem circular pelo ponto d5. O pobre peão preto d primeiro é atacado de uma forma, depois de outra e por fim as pretas perdem o rumo, não podem manter o passo porque não têm fluidez de manobras para evoluir, dado seu espaço restringido (veja-se o capítulo II sobre a manobra contra uma debilidade inimiga). Aqui, na realidade, não se chegou a esse tipo de luta que esboçamos pelo fato de que as pretas cometeram um erro que tirou a partida de seu caminho lógico. 31...Rb8 32.b3 Rc8? 33.Rxd4 cxd4 34.Ne7+ Não 34.Qxc8? Qxc8 35.Ne7+ pois venceriam as pretas, dado que o peão d coroaria. 34...Qxe7 35.Qxc8+ Qf8 36.Qxf8+ E as brancas vencem o final pelo peão livre distante. Trataremos esse final como ilustração, pelo que peço um pouco de paciência.

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Partida 7 Rabinovitsch-Nimzovitsch Baden-Baden, 1925 Defesa Índia da Dama

Nessa partida seguiremos uma luta de grosso calibre. 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nf3 b6 4.Nc3 Bb7 5.Bg5 h6 6.Bh4 Be7 7.e3 d6 8.Bd3 Nbd7 As pretas têm um jogo sólido, porém restringido. Nesses casos a liberação só é possível de forma lenta e gradual. 9.0–0 0–0 10.Qe2 e5 Mais de acordo com a posição, por ser mais tranqüilo, teria sido 10...Nh5. 11.dxe5 Bxf3! Não 11...Nxe5 12.Nxe5 dxe5 devido a 13.Rad1, com pressão na coluna da dama. 12.gxf3 Nxe5 13.Bxf6 Bxf6 14.Be4 Rb8 Com a coluna d em seu poder, com o posto avançado Nd5, as brancas poderão conseguir com segurança um relaxamento, pois obrigarão as pretas a ...c6. No entanto não será difícil sustentar o peão d6, pois ele se encontra em casa de mesma cor do bispo das pretas, mas o que acontecerá com a coluna g? Veremos em breve... 15.Rad1 Nd7! 16.Nd5 Nc5 17.Bb1 Não é certamente um posto avançado, mas é forte. O principiante deveria treinar colocar os cavalos em lugares dos quais não possam ser desalojados. 17...a5 18.Kh1 g6 Essa debilidade sempre teria sido forçada por Qc2. 19.Rg1 Bg7 20.Rg3 c6! 21.Nf4 Rb7!

A situação na coluna g se esclareceu. Permite-nos ver a possibilidade de um ataque revolucionário das brancas, com um sacrifício em g6 ou uma corrosão lenta através de h4, h5. O primeiro é uma ameaça firme, o segundo apresenta muitas dificuldades. 22.Qc2 Qf6 23.b3 As brancas poderiam ter tentado a combinação 23.Nh5 Qxb2 24.Rxg6 fxg6 25.Qxg6, mas o ataque dificilmente obteria êxito. 23...Re8 24.Ne2 Para colocar o cavalo em d4 as brancas estão em condições de escolher entre as colunas d ou g. Como não podem decidir qual delas utilizar, seu jogo desmorona. 24...Rd7 25.Rd2 Red8 26.Nf4 Kf8 27.Qd1 h5!! Não somente para fazer possível ...Bh6, mas porque caberá ao peão h uma função importante a desempenhar. 28.Qg1 Bh6 29.Ne2 d5 Desembaraçando-se da fraqueza de d6 e preparando a conquista da coluna d. 30.cxd5 Rxd5 31.Rxd5 Rxd5 32.f4 Se 32.Nd4, teria seguido 32...Bf4 33.exf4 Qxd4 34.f5 h4 35.Rg4 Qf6 com uma posição difícil de defender. 32...Bg7 É complicado tomar a decisão de abandonar a diagonal h6-f4, mas é relativamente mais fácil para alguém que saiba que haverá obstáculos (talvez um cavalo em d4) que convém bombardear. Não me agradava de imediato 32...Rd2 ao invés de 32...Bg7 devido à continuação 33.Nd4 Bxf4 34.Rf3. 33.Qc1 Nesse momento eu esperava (finalmente!) que se produzisse o sacrifício sobre g6 e tinha preparado uma 51

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resposta de um verdadeiro problema: 33.Bxg6 h4! 34.Rg4 fxg6 35.Rxg6 Qf5 36.Rxg7 Qe4+ 37.Qg2 (forçado) Rd1+ 38.Ng1 e na seqüência a chave: 38...h3!! 39.Qxe4 Nxe4 com ameaça de mate por ...Nxf2. 33...Qd6

Diagrama 40 – Posição depois de

28...Qd6 O que segue é simplesmente o aproveitamento, de acordo com o livro (refiro-me ao meu), de uma coluna onde, devido ao belo arremate, adquire rasgos de particular beleza. Se eu não estivesse de posse das minhas normas de jogo, jamais teria me ocorrido a manobra final. Na seqüência farei notar as atribulações que se seguem a alguns lances para ilustrar o leitor e fazer com que ele possa sentir melhor os desenvolvimentos. 34.Bc2 Ne4 35.Rg2 h4 36.Ng1 Porque me agradava livrar-me do cavalo joguei: 36…Nc3 Essa manobra facilita a entrada na base inimiga, ou seja, a primeira e segunda fileiras. 37.a4 Se 37a3? Na2 ganhando o peão a3. 37…Na2 38.Qf1 Nb4 Aqui tive a sensação desagradável de 52

que o bispo deslizava por ter-lhe deixado espaço em demasia. 39.Be4 Rd1 Meu primeiro pensamento foi: que lástima! Tive uma impressão desagradável – agora também me escapava a dama! Mas em seguida vi renascer a perspectiva de mate que eu havia notado no lance 33. 40.Qc4 f5! 41.Bf3 h3! 42.Rg3 Nd3 43.Qc2 Rc1 Aqui fiquei feliz com a volta involuntária da dama para casa. 44.Qe2 Rb1 As brancas abandonaram porque o lance ...Rb2 é fatal. A impressão que isso deixa é a de que o sistema orientou de forma ativa a elaboração das combinações. Partida 8 Saëmisch - Nimzovitsch Copenhagen, 1923 Defesa Índia da Dama

Veremos agora uma partida breve, conhecida em vários lugares sob o nome de “Unsterbliche Zugzwangpartie” (Partida Imortal de Zugzwang, que significa a obrigação de se fazer um lance). Essa partida nos interessa porque o posto avançado, apesar de se mostrar como um fantasma, ou seja, uma mera ameaça, nem por isso carece de efetividade. 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nf3 b6 4.g3 Bb7 5.Bg2 Be7 6.Nc3 0–0 7.0–0 d5 8.Ne5 c6 Com o propósito de assegurar a posição. 9.cxd5 cxd5 10.Bf4 a6 Para assegurar o posto avançado de c4 com o possível lance ...b5. 11.Rc1 b5 12.Qb3 Nc6

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E o cavalo com trote cauteloso se aproxima do posto avançado c4! O fantasma se aproxima! 13.Nxc6 Com esse lance Saëmisch sacrifica dois tempos (troca o devorador de tempos Ne5 por um cavalo recémdesenvolvido), com o único propósito de livrar-se do fantasma. 13...Bxc6 14.h3 Qd7 15.Kh2 Nh5 Poderia ter se criado um novo fantasma através de ...Qb7 seguido de ...Nd7, ...Nb6 e ...Nc4, mas preferi dirigir-me em direção à ala do rei. 16.Bd2 f5! 17.Qd1 b4! 18.Nb1 Bb5 19.Rg1 Bd6 20.e4 fxe4! O sacrifício do cavalo, que causou forte surpresa ao meu adversário, se justifica pelo seguinte cálculo realista: mais valem dois peões, sétima fileira absoluta e a ala da dama inimiga destroçada do que a peça sacrificada. 21.Qxh5 Rxf2 22.Qg5 Raf8 23.Kh1 R8f5 24.Qe3 Bd3 25.Rce1 h6!! Um lance brilhante que coloca o inimigo frente à obrigação de jogar, quando não lhe convém ser a vez (descrição do termo enxadrístico “zugzwang”). As brancas não têm mais lances. Se Kh2 segue ...R5f3, o mesmo que seguiria a g4. As pretas podem agora realizar lances de espera com o seu rei, até que as brancas pratiquem o harakiri. As brancas abandonaram. Segundo Bloco de Partidas Introdução

Que pretende sublinhar a importância e profundidade filosófica de um trabalho significativo em xadrez. Um breve porém sentido adeus às colunas abertas. Depois desse bloco de partidas,

passaremos ao peão passado e ao final, mas nessas lutas as colunas abertas e os postos avançados continuam a ser protagonistas. Permito-me chamar a atenção do leitor disposto a calcular e avaliar posições, que embora já esteja habituado a explorar as colunas abertas, deverá se despedir das mesmas, ao menos no plano teórico. Procede ainda uma última despedida, com nome e sobrenome. Você já sabe de quem estou falando? Sim, meu amigo, refiro-me ao habitual acompanhante das colunas abertas, o posto avançado, esse cavaleiro andante que de todas as formas continuará presente. Até a vista! Essa introdução às últimas partidas ilustrativas dos três primeiros capítulos supõe portanto ser também uma espécie de prólogo aos próximos capítulos. Verteremos lágrimas, diremos adeus, mas buscaremos novos objetivos. Tratase agora de outras façanhas: os peões passados. Por mais jovem e impetuoso que seja o meu leitor – assim se move o mundo – em qualquer parte e de qualquer maneira recomendo-lhe com entusiasmo que trabalhe a assimilação desses temas, se quiser vencer partidas. No tabuleiro, após uma luta dura e manobras árduas no meio-jogo, ainda terá que superar os caprichos do destino no final, sofrendo para materializar o lento processo que conduz à vitória, mas então, pouco a pouco começará a lhe ser revelada a bonita verdade de uma disciplina precisa: o jogo posicional, que estudaremos na segunda parte dessa obra. O primeiro bloco de partidas supôs uma seleção cuidadosa, pois era obrigatório impedir que o leitor não entendesse o conteúdo das partidas. Esse 53

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primeiro bloco foi imaginado para jogadores mais fracos, com intenção pedagógica. É certo que aqui poderão surgir críticas e no entanto há poucos motivos para que esse seja o caso. Procedi a uma seleção minuciosa de partidas, incorporando os elementos essenciais a fim de completar um trabalho de reflexão filosófica sobre o xadrez. Não existe aqui filosofia? O jogador forte não é capaz de penetrar na matéria filosófica? A verdade nua afirma o contrário. Enquanto o jogador fraco chega ao primeiro bloco após ter tirado suas primeiras conclusões, o jogador forte enfocará a luta de outra forma, pelo que conhece e pratica com seriedade questões como o desenvolvimento e os temas estratégicos básicos. Isso faz com que deva procurar novas perspectivas, se quiser vencer. As manobras que uma e outra vez projeta da mente para o tabuleiro, como uma espécie de raio X, têm um significado importante, integrando-se em uma associação de idéias que dá passagem a planos estratégicos flexíveis, mas orgânicos. Um exemplo: ao situar um cavalo em um posto avançado (digamos, em c5, protegido por um peão em d4 e secundado por uma coluna c aberta), isso imediatamente sugere ao jogador forte uma correspondência com uma eventual penetração na sétima fileira (ou seja, Rc1-c7 no exemplo citado), convertendo-se em uma de suas manobras favoritas. Mas o domínio e o tratamento do posto avançado requerem um trabalho preparatório e essa é a contribuição do meu livro. Com relação ao bloqueio – que será tratado no Capítulo IV de Meu Sistema, falo de bloqueio obrigatório com fundamentos detalhados. Também devo dizer que uma estratégia superior sem 54

qualquer dúvida está vinculada à superproteção ou superdefesa, e esses temas se manifestam em algumas partidas, ainda que não tenham sido tratados no livro. Isso é inevitável e aqui, novamente, os críticos têm um prato cheio para se esbaldarem. Por outro lado, o tratamento do bloqueio do peão passado é complexo e não se pode resumi-lo em uma série de fórmulas, o que daria ao livro a característica de “uma coleção de conselhos práticos à dona de casa competente”. O capítulo sobre os peões passados reflete, e tal era a minha intenção, os postulados de uma escola vanguardista com relação ao jogo posicional. O certo é que, embora o jogo posicional seja aparentemente uma questão heterogênea, não deixa de ser, sem dúvida, uma disciplina convincente. Partida 9 Nimzovitsch - Pritzel Copenhagem, 1922 Defesa Índia do Rei

Nessa partida podemos dizer que por seu intermédio se conhecem a fundo os recursos que tem o defensor de uma coluna. 1.d4 g6 2.e4 Bg7 3.Nc3 d6 4.Be3 Nf6 5.Be2 0–0 6.Qd2 Buscando a troca do Bg7 através de Bh6. 6...e5 7.dxe5 dxe5 8.0–0–0 O plano que as brancas adotaram é fascinante pela simplicidade dos meios empregados. As brancas, com a troca das damas, obterão vantagens na coluna d aberta. 8...Qxd2+ 9.Rxd2 c6? Na medida do possível, convém evitar os lances que debilitem casas tão importantes como d6, pois, como

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veremos a seguir, uma peça inimiga rapidamente se instalará nesse ponto. O que o leitor deve notar é que, antes do lance ...c6 das pretas, a coluna d só se encontrava sob pressão, enquanto depois desse avanço a coluna ficou claramente debilitada. Teria sido melhor esquecer ...c6 e optar por 9...Nc6. A continuação poderia ser, por exemplo, 9...Nc6 10.h3 (para poder jogar Nf3 sem temer a resposta ...Ng4) 10...Nd4?! 11.Nf3! (nunca 11.Bxd4 exd4 12.Rxd4 Ng4!) 11...Nxe2+ ou senão 11...Nxf3 e as brancas estão melhor depois de qualquer recaptura. Apesar disso, 9...Nc6 era o correto, com a ressalva de que a resposta das pretas a 10.h3 deveria ser 10...Be6. Por exemplo, 10...Be6 11.Nf3 h6 12.Rhd1 a6. Nessa posição as brancas se apossaram da coluna d, mas como resulta impossível a penetração com Rd7 ou o estabelecimento de Nd5 (posto avançado), o valor dessa coluna resulta problemático para as brancas. O peão e das brancas requer proteção e esse fato exerce um efeito consideravelmente restritivo. As pretas têm à sua disposição duas possíveis formas de atuar: a primeira é jogar de imediato ...Rfd8, com a idéia de após uma dupla troca em d8, Nxe5, ...Nxe4, embora essa variante deva ser preparada com ...Kh7 ou ...g5 para proteger o peão h do ataque do bispo inimigo. A outra possibilidade é a lenta manobra ...Rfc8, seguida de ...Kf8-e8 e finalmente opor torres na coluna com ...Rd8. O fato de que seja possível essa última linha é um indício significativo da escassa atividade das brancas na coluna d. 10.a4 Esse lance, aparentemente comprometedor, tem na verdade suas funções. Por um lado impede o lance ...b5, que encerra um ataque indireto contra e4 e portanto é indesejável. Por

outro lado, tem a intenção de sitiar a ala da dama das pretas. Sinto-me justificado por ter perseguido esse plano ambicioso, pois a debilidade que surgiu na coluna d após 9...c6 causa um benefício posicional inquestionável no centro, o qual repercute em ambas as alas. Resumindo: uma posição central de superioridade dá o direito a efetuar um avanço nas alas. 10...Ng4 11.Bxg4 Bxg4 12.Nge2 Nd7 Em situações anormais os lances comuns poucas vezes são efetivos. O exato teria sido ...Na6, seguido de ...Rfe8 e ...Bf8, pois dessa forma se teria coberto a debilidade de d6, equilibrando a posição. 13.Rhd1 Nb6 14.b3 Bf6 15.f3 Be6 16.a5 Nc8 17.Na4 Agora se vê claramente que com a variante citada (…Na6) se teria requerido menos tempo do que com os lances do texto (Nb8, ...Nd7, ...Nb6, ...Nc8). As brancas conseguiram enquanto isso fortalecerem-se na parte externa da ala da dama, ameaçando ainda um rodeio com Nc5. Também se pode ver agora que o lance 10.a4 possuía um valor de ataque nada desprezível. 17…b6!

Diagrama 41 – Posição após

17...b6! 55

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Uma combinação magistral. Ao se jogar 18.axb6 axb6 19.Nxb6 Nxb6 20.Bxb6 naturalmente seguiria 20...Bg5. 18.Rd3 O avanço restrito ressalta aqui com nitidez especial, pois a torre consegue assim uma fluidez especial, disposta para atuar nas colunas c e d, segundo seja necessário, ou inclusive se for o caso ficará situada na coluna a. 18...bxa5 Era correto 18...Rb8. A posição das pretas poderia ter subsistido e ainda por cima, da mesma forma do que o Dr.Lasker, eu não acredito na defesa. 19.Rc3 Ne7 20.Rc5 Rfb8 21.Nec3 O peão a não escapará. 21...a6 22.Rxa5 Kg7 23.Nb6 Ra7 24.Nca4 Um cavalo se move para dar seu lugar a outro. 24...Rab7 25.Rxa6 Nc8 26.Nxc8 Rxc8 27.Nc5 Rbc7 28.Rd6 Ocupando a casa d6, que as pretas haviam debilitado no lance 10. A ocupação desde então estava latente. 28...Rd8 29.Rxe6 As pretas abandonaram. Nos comentários a essa partida nos familiarizamos com os recursos à disposição do defensor para lutar contra uma coluna. Dado que o conhecimento desses recursos é do maior valor prático para se jogar uma partida, incluímos outra luta que resultará instrutiva no mesmo sentido. Partida 10 Nimzovitsch - Tarrasch Breslau, 1925 Abertura Réti 56

1.Nf3 Nf6 2.c4 c5 3.Nc3 d5 Jogável, porém me parece mais sólido 3...Nc6 4.d4 cxd4 5.Nxd4 g6 6.e4 Bg7 7.Be3 Ng4! (Breyer) 8.Qxg4 Nxd4 9.Qd1 Ne6 (idéia pessoal minha). A posição que surge após o lance 9...Ne6! é bastante rica em recursos para as pretas. O desenvolvimento poderia seguir com ...Qa5, ...0-0 e eventualmente ...f5 ou ...b6, seguido de ...Bb7. É conveniente ao estudante analisar as possíveis continuações. 4.cxd5 Nxd5 5.d4 cxd4 O melhor para as pretas parece ser 5...Nxc3 6.bxc3 cxd4 7.cxd4 e6. 6.Qxd4 e6 7.e3 Decidi realizar esse lance cauteloso porque havia reconhecido a pouca efetividade de 7.e4 e 7.Nxd5. O primeiro seguiria 7.e4 Nxc3! 8.Qxc3 (8.Qxd8+ Kxd8 9.bxc3 e as brancas teriam tido a seu encargo os cuidados do peão c enfermo) 8...Nc6 9.a3 Qa5!, ou talvez 9.Bb5 Bd7, com jogo equilibrado em ambos os casos. A segunda possibilidade nos conduz a resultados análogos: 7.Nxd5 exd5 8.e4 dxe4 9.Qxd8+ Kxd8 10.Ng5 Bb4+ 11.Bd2 Bxd2+ 12.Kxd2 Ke7. Deixamos aos estudantes que gostem dos problemas de desenvolvimento a investigação da variante 7.Nxd5 exd5 8.e4 Nc6, no lugar de 8...dxe4!, seguida por nós. Depois de 9.Qxd5 Qxd5 10.exd5 Nb4 seguiria 11.Bb5+ e as pretas teriam problemas para encontrar uma boa continuação. 7...Nc6 8.Bb5 Bd7 9.Bxc6 Bxc6 10.Ne5 Nxc3 11.Nxc6 Qxd4 12.Nxd4 Nd5 13.Bd2

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13.Bd2 A posição do diagrama parece inofensiva, porém está cheia de veneno. As brancas ameaçam a coluna c, dispondo ainda de uma cômoda casa para seu rei (e2), enquanto as pretas se vêem em apuros (veja o comentário ao lance 17 das pretas). Nessa posição, o defensor deverá jogar com muita cautela. 13...Bc5 Para afastar o cavalo do centro. Porém como este pode emigrar em direção a b3, transformando c5 em um posto avançado, resulta ser um lance agradável para as brancas. Teria sido mais correto 13...Be7 com a intenção de jogá-lo a f6. Por exemplo 13...Be7 14.e4 Nb6 15.Rc1 0–0 16.Ke2 e agora as brancas têm seu rei bem defendido, enquanto o preto, apesar de rocado, pode precisar de defesa. Porém o Be7 é um ministro tão hábil que pode dirigir os negócios por sua conta sem precisar de ajuda. Por exemplo 16...Bf6 17.Be3 Rfc8 18.b3 Bxd4 19.Bxd4 ao que segue 19...Nd7 ou 19...Rxc1. Se for jogado esse último lance, segue: 20.Rxc1 Rc8 21.Rxc8+ Nxc8 22.Kd3. Agora as brancas tratam de fazer valer as suas forças e as pretas não estão em condições de imitar: 22...f6 23.Kc4 Kf7 24.Kb5 a6+ 25.Kc5 (caso contrário será necessário sacrificar o Diagrama 42 – Posição após

bispo) 25...Ke7, seguido de ...Kd7 com o qual se consegue empatar. Por esse motivo julgo 13...Be7 como a defesa correta. 14.Nb3 Bb4 Aqui teria sido mais conveniente ...Bb6 ou ...Be7. O primeiro guarneceria a casa c7 contra todo ataque, o que é o que mais interessa à defesa. Depois de 14...Bb6 15.e4 Ne7! a vantagem branca seria mínima 15.Rc1 Rd8 16.Bxb4 Nxb4 17.Ke2 Ke7 As pretas desocuparam uma casa para o seu rei, porém à custa de tempos preciosos (Bf8, ...Bc5, Bb4). 18.Rc4 Na6 Uma retirada desagradável. A 18...Nc6 não teria seguido 19.Nc5 (devido à resposta 19...Na5! e ...b6!), mas as brancas previamente teriam dobrado as torres. 19.Rhc1 Rd7 As pretas, apesar de ter o vírus da morte em sua posição, ainda dão a impressão de estarem bem. Os dois próximos lances das brancas degradam a coluna d a ponto de torná-la passiva, ou seja, retiram-lhe todo o valor de ataque e condenam à passividade o plano de ação das pretas sobre essa coluna.. 20.f4! Rhd8 21.Nd4 f6

Diagrama 43 – Posição após

21...f6 57

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As pretas pretendem jogar e5. Isso é uma ameaça? Se não fosse assim, o estudante poderia realizar um lance de espera com as brancas. 22.a4 O passo duplo pode ser também um lance de espera. Não é que as brancas temam 22...e5, pois seguiria 23.fxe5 fxe5 24.Nf3, ficando finalmente débil o peão e preto. Seria de se considerar o lance mais enérgico 22.b4, pouco vantajoso devido a 22...b5!, porém é conveniente reservá-lo como uma ameaça de cerco às pretas mais adiante. 22...e5 A confusão do ponto de vista psicológico é explicável quando a situação aperta, mas do ponto de vista objetivo não tem justificativa. As pretas estão mal e isso explica o que acontece aqui. 23.fxe5 fxe5 24.Nf3 Ke6 25.b4 b6 26.R1c2 Trata-se de um desses lances pouco vistosos, que são mais incômodos para o inimigo, mais fechado e apertado por todos os lados do que o pior ataque direto. O lance é de espera e defensivo, porém simultaneamente encerra uma ameaça. A ameaça é Ng5+, seguido de Ne4 para continuar depois com b5, relegando o cavalo inimigo a b8. 26...h6 27.h4 Rd6 28.h5 Depois de 26.R1c2 surgiu uma nova possibilidade de ataque ao ficar atrasado o peão g. O lance Rg4 não só faria ressaltar a fraqueza do peão g como também colocaria o rei preto em uma posição extremamente difícil. A possibilidade dessa manobra é recebida pelas brancas como uma fruta madura caída da árvore e se obteve tão somente 58

uma conseqüência lógica (talvez psicológica) do lance de espera 26.R1c2. Os lances de espera são justamente os mais sutis! 28...Rd5 29.Rg4 R5d7 30.Rc6+ Rd6 Se 30...Kf5 31.Rgg6 e se 30...Kd5 R4c4 etc. 31.Rg6+ A posse das casas c6 e g6 assegura um confinamento impecável do rei inimigo. Observe-se o uso da coluna c como trampolim (Rc1, Rc4, Rg4). 31...Ke7 Depois de 31...Kd5 surgiria uma graciosa catástrofe: 32.Rcxd6+ Rxd6 33.e4+ Kc6 34.b5+ e o cavalo, que se acreditava tão seguro em a6, é tomado com grande surpresa. 32.Rxg7+ Kf8 33.Rxd6 Rxd6 34.Rxa7 Nxb4 35.Nxe5 Re6

35...Re6 As brancas têm uma posição vencedora. Explorar de forma efetiva uma vantagem material é uma das coisas imprescindíveis que um estudante deve aprender e recomendo que pratique para se treinar. As brancas ganharam dois peões. Ao se dar uma olhada no diagrama se observa: 1º Que a sétima fileira está de posse das brancas; 2º Que as brancas têm Diagrama 44 – Posição após

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peão e isolado e peão g atrasado. Então vemos que há de reunir as tropas isoladas ou dispersas, contando com o auxílio da sétima fileira. Com esse objetivo levaremos o cavalo a f5, economizando tempos. 36.Ng6+ Kg8 37.Ne7+ Kf8 38.Nf5 Nd5 39.g4 Como vemos, o cavalo em f5 defende o peão e3, ataca o peão h6 e ainda por cima permite jogar Kf3 (o rei, por sua timidez, se esconde atrás do cavalo). 39…Nf4+ 40.Kf3 Nd3 Para defender o peão de h, jogando na seqüência ...Ne5+ seguido de ...Nf7. 41.Ra8+ Kf7 42.Rh8 Nc5 43.Rh7+ Como se diz, on revient toujours à son premier amour! (sempre se volta ao primeiro amor!). O triunfo da sétima fileira! 43…Kg8 Se 43...Kf8, seguiria 44.Nxh6 com ataque de mate, ou o imparável avanço do peão g. 44.Rxh6 Rxh6 45.Nxh6+ Kf8 46.Nf5 Nxa4 47.h6 Kg8 48.g5 Kh7 49.Kg4 Nc5 50.Kh5 Sigamos o ditado “Todos à frente” (ver em seguida o capítulo sobre “Finais”). 50...Ne6 51.g6+ Kg8 52.h7+ Kh8 53.Kh6 As pretas abandonaram.

decisivo de imediato, é como um raio sem defesa sobre a casa atacada. O estudante poderá aqui apreciar a íntima relação que existe entre os elementos e a técnica superior do jogo. O profundo conhecimento dos elementos significa mais da metade do caminho em direção à maestria enxadrística. 1.e4 Nf6 2.d3 c5 3.f4 Nc6 4.Nf3 g6 5.Be2 Bg7 6.Nbd2 d5 7.0–0 0–0 8.Kh1 b6 9.exd5 Qxd5 10.Qe1 Bb7 11.Nc4 Essa colocação dos cavalos é o único consolo da posição inteiramente desarmônica (Be2). As pretas possuem uma posição muito superior. As brancas no quinto lance, ou ainda antes, deviam jogar c4. 11...Nd4 Ocupação do posto avançado na coluna d. 12.Ne3 Qc6 13.Bd1 Nd5 14.Nxd4 cxd4 15.Nxd5 Qxd5 16.Bf3 Qd7 17.Bxb7 Qxb7 As brancas aliviaram sua situação com as trocas, mas a coluna c impõe um próximo lance que novamente altera a harmonia entre as suas peças. 18.c4 dxc3 19.bxc3 Rac8 20.Bb2 Rfd8 21.Rf3 Bf6 22.d4

Partida 11 Thomas - Alekhine Baden-Baden, 1925 Defesa Alekhine

Essa partida nos mostra um avanço contido na coluna da torre, que ainda que não seja

22.d4 Temos agora uma posição bem

Diagrama 45 – Posição após

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conhecida do Gambito da Dama, porém com as cores invertidas. Compare-se o começo da partida com consulta Nimzovitsch - Prof.Kudrjawsew e Dr.Landau (Dorpat 1910), conforme segue: 1.d4 d5 2.Nf3 Nf6 3.c4 e6 4.Nc3 c5 5.cxd5 exd5 6.Bg5 cxd4 7.Nxd4 Be7 8.e3 0–0 9.Be2 Nc6 10.Nxc6 bxc6 na qual se pode comparar e identificar a configuração de peões na forma dita com a chegada na presente partida. Na partida tomada em comparação seguiu-se assim: 11.0–0 Be6 12.Rc1 Rb8 13.Qc2 Bd7 14.Rfd1 (está no entanto em discussão o conhecido tema do par de peões em c6 e d5) 14...Ne8 15.Bxe7 Qxe7 16.Na4 Nf6 17.Nc5 Rb6 18.Rd4! Rfb8 19.b3 Be8 20.Bd3 h6 21.Qc3 Bd7 22.Ra4, com vantagem considerável na posição. Voltemos agora à partida ThomasAlekhine. 22…Qd5 23.Qe3 Qb5 24.Qd2 Rd5 25.h3 e6 26.Re1 Qa4 27.Ra1 b5 28.Qd1 Rc4 Veja-se “o avanço restrito” ou também “o aproveitamento da coluna c como trampolim em direção à coluna a”, no capítulo II, parágrafo 5. Observe-se ali a equivalência das manobras com respeito à partida realizada com consulta. 29.Qb3 Rd6 30.Kh2 Ra6 Também a coluna d é utilizada como um trampolim de assalto! 31.Rff1 Be7 32.Kh1 Rcc6 Magnífico! As pretas planejam o reagrupamento ...Qc4, ...Ra5 e ...Rca4. 33.Rfe1 Bh4 34.Rf1 As brancas de forma alguma devem enfraquecer a sua base jogando 34.Re5? devido a 35...Qxb3 35.axb3 Rxa1+ 36.Bxa1 Ra6 37.Bb2 Ra2 e as pretas 60

vencem. 34…Qc4! 35.Qxc4 Rxc4 Para as pretas as trocas resultaram como um anel no dedo, porque a2 resultou muito débil. Observe o estudante que a troca surgiu como uma conseqüência quase automática da ocupação meticulosa de pontos estratégicos importantes. O principiante, em geral, busca as trocas por outro caminho. Persegue a peça que o seduz com ofertas de troca... e com freqüência recebe uma negativa. O mestre ocupa os pontos fortes e obtém a troca desejada como uma fruta que cai madura da árvore (veja o capítulo V). 36.a3 Be7 37.Rfb1 Bd6 38.g3 Kf8 39.Kg2 Ke7 Veja “a centralização do rei” no capítulo V). 40.Kf2 Kd7 41.Ke2 Kc6 42.Ra2 Rca4 43.Rba1 Kd5 Completou-se a centralização. 44.Kd3 R6a5 45.Bc1 a6 46.Bb2 h5 Com isso se inicia um novo ataque na ala do rei, o qual é somente a conseqüência da atadura das torres brancas sobre o peão a3. Se imaginarmos que as torres pretas padeceram da mesma má disposição (o que não é certo, pois podem voltar a engrenar no jogo através de ...Rc4, possivelmente atacando c3), estaríamos no mesmo devido à posição vantajosa do rei preto. Essa supremacia do rei preto, que seria quase ilusória se as torres inimigas tivessem mobilidade, deve-se somente à circunstância de que as torres brancas não podem respirar tranqüilamente pela maior mobilidade das pretas. Por isso se pode dizer que o ataque na ala do rei se fez mais capaz

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devido à maior mobilidade do rei no centro. O contato estratégico entre esses dois campos de batalha, diferentes na aparência, terminou demonstrado claramente com o que foi dito e pode se estender à ala do rei quando, em posições análogas, se provoca h4, para que fique descoberto g3 e possa atuar com todo vigor e5. Trata-se de casos muito ilustrativos, cujo estudo recomendamos com entusiasmo. 47.h4 f6 48.Bc1 e5 É o rompimento que define a derrota inimiga. 49.fxe5 fxe5 50.Bb2 exd4 51.cxd4 b4! Apesar da simplicidade desse lance, há de entusiasmar a todo entendedor que o rompimento não perseguia outra finalidade a não ser a eliminação do incômodo peão c. A virtude máxima do mestre consiste na modéstia! 52.axb4 Rxa2 53.bxa5 Rxb2 0–1 O avanço contido foi realizado nessa partida com todo virtuosismo. Com isso nos despedimos da “coluna aberta” para nos dedicar ao “peão passado”.

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Esquema sobre a sétima e oitava fileiras ESCOLHA DO PONTO DE ATAQUE (proibido divagar)

Conquista do alvo escolhido através de ataque concêntrico

Prolongamento do raio de ação mediante um sacrifício

Manobra secundária. Conquista de um ponto com xeque secundário.

1 - A sétima fileira absoluta e um peão passado 2 - Xeque perpétuo com torres dobradas 3 - Mecanismo de empate (torre e cavalo) 4 - Retiradas complicadas

5 - Entrada na oitava fileira por rodeio no canto a partir da sétima fileira

Organizada a base, inicia-se escolhendo entre Rg7 e Rh7

Rodeio imediato

Mate por alteração de contato

Combinação ganhadora de tempos

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Capítulo IV - O Peão Passado

1 – A orientação. O vizinho ao lado que incomoda e o da frente que é absolutamente insuportável. A maioria de peões. O candidato. Nascimento do peão passado. As regras sobre o candidato.

Um peão é “passado” quando à sua frente não há nenhum peão inimigo (ou seja, na mesma coluna), nem tampouco nas colunas lateralmente vizinhas, que possa obstruir a sua marcha até a coroação (veja o diagrama 46).

Diagrama 46 – Os peões a5, e5 e d5 estão passados. O peão e5, embora passado, está bloqueado

Se um peão se vir detido em seu caminho por uma peça inimiga (bloqueado), não muda por isso o seu sentido de liberdade. Se lembrarmos que o peão frente às demais peças é somente um defensor nato, pouco a pouco nos daremos conta do respeito que pela sua situação especial goza nas 64 casas do tabuleiro. Quem poderá frear as

ambições do peão inimigo de forma mais econômica? Quem defende melhor as peças do mesmo lado? Qual é a mão de obra mais barata? A resposta a estas três perguntas é: o peão. É o peão, pois às demais peças é desagradável uma colocação crônica (como é a de bloqueio e a de defesa) e ainda porque, ao se empregar uma peça, haveria um desperdício de uma capacidade potencial maior. Na posição do diagrama 46 os peões brancos b e g não são passados. Entre eles existe, no entanto, uma diferença: o segundo, por ter na frente um peão inimigo, tem maior obstáculo. O peão à sua frente pode-se considerar um antagonista e o lateral, um vizinho tranqüilo com algumas manias incômodas, como a de nos falar do tempo, de política ou do alto preço da cerveja em um dia em que nos encontra apressados aos pés da escada quando nos dirigimos a um compromisso importante, impedindo-nos de cumprir nosso propósito. Essa é a forma como atua o peão de c em relação ao peão branco b. De qualquer forma, um vizinho um pouco tagarela em nada se parece com um inimigo declarado e por isso podemos dizer que o peão lateral não é um verdadeiro antagonista. Consideremos agora a família do peão passado. Nesse sentido devemos considerar a superioridade numérica de peões. Ao se iniciar a partida, todos os peões se acham distribuídos de forma 63

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igual, mas logo ao se produzir a primeira troca de peões (por exemplo: 1.e4 e5 2. d4 exd4 3.Qxd4) se observa a superioridade na distribuição dos peões: as brancas se encontram na ala do rei com uma proporção 4:3 a seu favor, invertendo-se a proporção favoravelmente às pretas na ala da dama. Na configuração de peões na ala do rei (brancas – e4, f2, g2, h2; pretas – f7, g7, h7) e na da ala da dama (pretas – d6, c7, b7, a7; brancas – c2, b2, a2), podemos atribuir ao peão d das pretas a função de freio do peão e das brancas, pelo que as brancas têm superioridade. Seguindo a partida com essa configuração de peões, se as pretas jogarem f5 (com o propósito de eliminar o peão passado central do inimigo), ao se realizar a troca a superioridade das brancas na ala do rei então se ressaltaria mais ainda, pois estaria na relação 3:2. Adicionalmente, temos que recordar uma regra prática: toda superioridade de peões, sã e não comprometedora, conduz ao estabelecimento de um peão passado (veja o diagrama 47).

Diagrama 47 – Maioria de peões na ala do rei

Porém, qual dentre eles é o indicado? 64

Entre os três peões da ala do rei somente o f não tem antagonista, sendo por conseqüência o menos travado e, portanto, o que tem mais chances de ficar passado. Em uma palavra, deve ser o candidato, mais ainda, daremos a ele um grau social elevado e o chamaremos de “senhor candidato”. Moral da estória: o candidato tem seus privilégios. O grau se outorga não somente por razões estratégicas, mas também por simples razões de cavalheirismo. Na linguagem técnica diríamos: o avanço estará a cargo do candidato, enquanto os demais peões são somente acompanhantes, ou seja, para realizar f5 após f4 o peão f deve estar acompanhado pelo peão g4. Se os peões pretos da ala do rei estivessem em g6 e h5, o acompanhamento se deveria fazer jogando g3 (não imediatamente h3, porque o lance ...h4 das pretas conduziria a fenômenos paralisantes), h3, g4, seguido de f5. Que simples é tudo isso! Apesar disso, é comum observarmos vários jogadores de nível médio que na posição do diagrama começam com g4, ao que seguem com ...g5 e a superioridade das brancas perde todo seu valor. Já quebrei a cabeça muitas vezes pensando porque jogadores pouco experientes começam a manobra com g4. Na realidade a coisa é simples: encontramse indecisos entre começar à direita com h4 ou à esquerda com f4 e, frente à dúvida, com perfeito critério burguês, escolhem o caminho dourado do meio. 2 – O bloqueio dos peões passados. Os fundamentos da obrigação de bloquear. Relações extremamente complicadas entre peça bloqueadora e peão passado. Comentários sobre bloqueadores: fortes e fracos, elásticos e rígidos.

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Diagrama 48 – O problema do bloqueio

Na posição do diagrama 48, as pretas possuem um peão passado, que pode ser bloqueado jogando-se o cavalo ou o bispo na casa d4. Entende-se por “bloqueio” o freio de um peão por uma peça inimiga, que se consegue mecanicamente colocando a peça imediatamente adiante do peão a bloquear. Como em todos os casos análogos, aqui surgem diversas perguntas: o bloqueio não é por acaso um gasto desnecessário de energia? Não é suficiente manter o peão sob observação com o bispo ou o cavalo que atuam sobre d4? O bloqueio merece confinar uma peça? Ao bloquear com uma peça, essa perde a sua mobilidade a ponto de se tornar como um peão imobilizado? Em uma palavra: o bloqueio é ou não econômico? Agrada-me o fato de poder lhes oferecer, ao meu juízo, uma solução conclusiva do problema em discussão. Um crítico medíocre daria o assunto por encerrado dizendo: “é necessário frear os peões passados”, porém, de acordo com as minhas idéias, essa resposta seca é um atestado de incompetência! O “por que”

da resposta é sumamente importante. É ridículo estruturar uma novela sem uma trama psicológica, como também me pareceria ridículo escrever um livro sobre estratégia enxadrística sem aprofundar as particularidades das peças. Como meu ponto de vista, já esboçado anteriormente, coincide pouco com o geral, acho conveniente esclarecer que para mim o peão passado, como os demais atores dessa trama, possui uma alma com desejos que nela dormem e temores cuja existência é ignorada quase por completo (veja o prólogo do livro). Deixando-se isso de lado, o fundamento detalhado da obrigação de bloquear oferece mais considerações práticas do que poderia acreditar a priori quem deprecie a teoria no sentido filosófico, não no sentido da “Ciência das Aberturas”. Passemos à ordem do dia. Existem três motivos que, pela lógica, forçam o estabelecimento do bloqueio e os analisaremos sucessivamente no parágrafo 2, itens a, b e c, enquanto que no parágrafo 3 observaremos minuciosamente as manifestações de vigor que pode desenvolver o elemento bloqueador. 2 a) Iº Motivo: O peão passado é um criminoso que deve estar na prisão; não bastam medidas suaves. Os desejos de expansão do peão passado. O tumulto da retaguarda.

Voltemos novamente ao diagrama 48. As forças pretas (a torre, o bispo e o cavalo), por assim dizer estão agrupadas, formando garbosamente parte integrante de um complexo pendente do peão passado. O núcleo do complexo é a casa ocupada pelo próprio peão. O cavalo e o 65

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bispo protegem o peão livre e a torre por sua vez fornece força para o avanço, ou seja, apóia as ambições de expansão do peão. A vontade e as possibilidades de expansão do peão, principalmente a primeira, são tão grandes (como demonstra o fato de que as peças, esquecendo todo espírito de classe social, se agrupam de forma pitoresca ao redor do humilde peão), que o peão parece disposto a sacrificar sua vida nas mãos do cavalo ou do bispo, avançando em direção a d4. O sacrifício tumultua repentinamente a retaguarda preta, pois por meio disso o bispo conseguirá uma diagonal aberta em direção ao rei e o cavalo, uma casa central para se colocar. O avanço forçado, com o próprio sacrifício (tendo por finalidade abrir uma coluna), em geral é característico somente para os peões (ver a partida modelo da página 14, pois o centro móvel, uma onda de peões, repleto de uma força de expansão quase inacreditável, sinaliza amplamente a vontade de expansão do peão passado. A liberação de uma casa para ser ocupada com o cavalo constitui, ao meu modo de ver, uma particularidade muito especial do avanço do peão passado. Diremos, portanto, que o primeiro motivo que força logicamente o bloqueio é que o peão passado é tão perigoso como um criminoso e que, portanto, não é questão de submetê-lo a uma liberdade vigiada (através de Nb3 e Bf2) mas sim de recolhê-lo ao cárcere tirando-lhe totalmente a liberdade, através do bloqueio com o cavalo ou com o bispo da casa d4. Continuaremos com outros exemplos. 66

Diagrama 49 – Te Kolsté- Nimzovitsch (Baden-Baden 1925) – As pretas sacrificam um candidato, tumultuando a retaguarda.

No diagrama 49 as pretas, cujo centro e ala da dama parecem ameaçados, tiram proveito de seu candidato. As regras do peão passado são aplicáveis ao candidato, pois em noventa por cento dos casos este é um peão passado. Foi jogado: 19...f4! 20.gxf4 g4! 21.Bg2 Nhf5 O que significou o sacrifício de um peão passado (candidato) com a liberação resultante de uma casa (f5) para o cavalo que estava em h6. Seguiu: 22.Qb3 dxc4 23.Qxc4+ Kh8 24.Qc3 h5 25.Rad1 h4 26.Rd3 Nd5 27.Qd2 Rg8 As pretas de qualquer forma tratam de assegurar sua superioridade numérica de peões. 28.Bxd5 cxd5 29.Kh1 g3 e as pretas conseguem o ataque. Na partida Alekhine-Treybal (veja o diagrama 50) chegou-se à seguinte posição interessante:

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que mostra a ameaça tão importante tratada de uma forma verdadeiramente digna. Partida 12 Leonhardt - Nimzovitsch San Sebastian, 1912 Defesa Philidor

Diagrama 50 – Alekhine - Treybal (Baden-Baden 1925)

As brancas jogaram: 27.e4 E o centro móvel se põe em movimento. 27...f6 Com 27...Nc7 se perderia o peão c. 28.exd5 fxe5 O peão passado que surgiu repentinamente em d5 parece ser efêmero, que tão rápido nasce como morre. Mas as aparências enganam. Até esse peão de d5, cheio de romantismo, no entanto saberá submeter-se às férreas leis lógicas do xadrez. Seguiu: 29.d6!! O sacrifício do peão nessa casa não persegue a liberação daquela da qual veio o peão. Porém, apesar disso, está repleto do espírito da nossa regra, ainda que não expressada com as mesmas palavras: o peão quer morrer no avanço. A variante principal seria: 29...e4+! (para impedir 30.dxe5, uma vez que a torre tivesse tomado o peão d6) 30.Kxe4 Rxd6 31.Ke5!! Rcd8 32.Bxe6. Observe-se que a participação ativa do rei só foi possível graças ao sacrifício do peão d. Vejamos agora uma partida completa

1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 Nf6 4.Nc3 exd4 Abandono do centro. As pretas deverão depois frear o peão e (veja a partida 2). 5.Nxd4 Be7 6.Be2 0–0 7.0–0 Nc6 8.Nxc6 bxc6 Essa troca dá vantagens para ambos os lados. É certo que as pretas criaram uma massa central compacta e se asseguraram da casa d5 contra a possível ocupação pelo cavalo inimigo, mas também seu peão a ficou isolado e a sua casa f5, como veremos, ficará débil. 9.b3 d5 Também seria bom ...Re8 seguido de ...Bf8, o que equivale a um bom freio. 10.e5 Ne8 11.f4 f5 Para impedir f5, que daria um bom ataque às brancas. 12.Be3 g6! É necessário bloquear o peão e, porém antes convém esclarecer se deve fazê-lo com o bispo ou com o cavalo. O primeiro terá pouca elasticidade (um campo de ação restrito com a única possibilidade de dirigi-lo sobre g4, ou seja, entorpecer o propósito das brancas de atacar a minoria de peões pretos na ala do rei através do lance g4) e ainda poderá ser atacado por um cavalo, que de forma inexpugnável se estabeleça em c5. O cavalo, por sua vez, 67

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ao colocar-se na casa de bloqueio (e6), não somente seria um bloqueador inatacável, mas também atuaria com muita agressividade, animando entre outros o lance g5. Ou seja, o cavalo constituiria um excelente bloqueador e para permitir o seu emprego as pretas realizaram o último lance. Saber escolher o bloqueador de forma acertada é no geral de máxima importância. 13.Na4 Ng7 14.Qd2 Qd7 Para jogar o quanto antes ...Rd8. 15.Qa5 Vincula a pressão continuada sobre f5 (ver o comentário ao lance 8 das pretas) e ao jogo contra o peão a fraco e isolado. 15...Ne6 16.Rad1 Rd8 17.Nc5? Um erro posicional. As brancas deveriam manter seu cavalo para poder usá-lo como bloqueador ou trocá-lo em último caso por outro cavalo. Nessa posição os dois cavalos eram os atores principais (os melhores bloqueadores) e alguém que em um caso assim troque um desses nobres corcéis terá feito um mau negócio se o tiver feito por um bispo. O correto teria sido 17.Bc5. 17...Bxc5 18.Bxc5 Bb7 19.Rf3 Kf7 20.Rh3 Kg7 21.Rf1 Re8 22.Rhf3 Rad8 Não é possível 23.Qxa7 devido a 23...Ra8 24.Qxb7 Reb8. 23.Rd1 a6 24.b4 Kh8 25.Qa3 Rg8 26.Qc3 Rg7 27.Kh1 Rdg8 Na presente posição, se compararmos os bloqueadores, ou seja, ...Nd6 e o Bc5, veremos que a vantagem é do cavalo. O bloqueio pelo bispo não é mau, porém sua ação é quase nula. Por sua vez, é o cavalo que permite às pretas o lance ...g5 e sua ação de bloqueador será complementada com uma ajuda inestimável na manobra. 68

28.Be3 c5!

Diagrama 51 – Posição após 28...c5! A força de expansão do peão o conduz ao ganho

Um avanço de sacrifício de peão com abertura da diagonal ao bispo que já temos tratado em várias oportunidades. Podem me dizer que o peão c6 não era um candidato e sequer era um peão passado. Essa objeção efetivamente é certa, mas temos que admitir pela lógica que o peão deveria estar transbordando de fundados desejos de expansão, pois de outra forma não se explica que as brancas tivessem se incomodado tanto tempo em bloqueá-lo. 29.Rg3 O correto era a indicação de Schlechter 29.bxc5 d4 30.Rxd4! Nxd4 31.Bxd4 Bxf3 32.Bxf3 ficando no tabuleiro as duas torres por dois bispos e dois peões. 29...d4 30.Qa3 g5 31.Bc4 gxf4 Também era bom, com a única finalidade de conservar o cavalo ilustre, 31...Bd5. 32.Bxe6

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2 b) IIº Motivo: O otimismo no xeque e a posição segura do bloqueador contra possíveis ataques frontais. O peão livre como muralha protetora. A missão mais fundamental do bloqueador.

Diagrama 52 – Posição após 32.Bxe6. Como as pretas continuarão seu plano de rompimento?

32...Bxg2+ Exacerbado pela morte do cavalo, o bispo se lança à luta com raiva. 33.Kg1 Com grande surpresa vemos que o intrépido patife terminou vivo! No entanto, caso o tivessem matado (33.Kxg2) teria sido vingado com honra: 33.Kxg2 Qc6+ 34.Kf1 fxg3 35.Bxg8 gxh2 e não 33.Rxg2 devido a 33...Qc6 33...Qxe6 Quem considerar o lance 32...Bxg2 como sendo somente um raio em céu limpo demonstrará que não entendeu a lógica que encerra a explosão de selvageria acumulada pelo bispo durante os longos anos de recolhimento. 34.Bxf4 Bb7 35.bxc5 Qd5 Ganhando na seqüência 36.c6 Bxc6 37.Kf2 Rxg3 38.Bxg3 Qg2+ 39.Ke1 Bf3 40.Qxa6 Qg1+ 0–1 Essa partida mostrou claramente os fundamentos do “primeiro motivo”. Passemos agora à analise do segundo motivo.

Em meu livro O Bloqueio falei a respeito desse assunto: “Também o segundo motivo a esclarecer é da maior importância, tanto do ponto de vista estratégico como pedagógico e no xadrez, como definitivamente tudo depende do otimismo, também do ponto de vista psicológico é muito importante cultivar o dom de poder se alegrar quando se obtêm pequenas vantagens. O principiante somente se alegra quando pode dar xeque ao rei inimigo e mais no entanto quando consegue conquistar a dama (que suponho seja para o principiante o maior êxito no jogo). O mestre, por sua vez, fica contente e se sente amplamente satisfeito quando consegue descobrir a sombra da fraqueza de um peão em algum canto do tabuleiro. O otimismo assim caracterizado constitui a base psicológica indispensável no jogo posicional. Também é o que dá as forças necessárias para descobrir o bem que o mal, por maior que seja, trás consigo. Tomando o nosso tema como exemplo, poderemos comprovar que o peão passado inimigo constitui, sem dúvida, um mal considerável. No entanto, até esse mal tem um pequeno raio de sol. Trata-se do fato de que, nesse caso, ao bloquear um peão, teremos a oportunidade de postar de forma segura, nas costas do peão inimigo, a peça que bloqueia, assegurando-a dessa forma contra um ataque frontal. Assim por exemplo, se imaginarmos que um peão passado inimigo se encontre em ...e5 e o 69

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bloqueador fosse Nf3, este não poderá ser atacado pela ...Re8, ou seja, está seguro.” Ao que foi dito em O Bloqueio temos que acrescentar ainda que a segurança relativa que acabamos de esboçar, da qual goza o bloqueador, na realidade é sintomática especialmente no que se refere a outras missões mais fundamentais do bloqueador. Quando o mesmo inimigo se ocupa da segurança do bloqueador, não cabe a menor dúvida de que este está chamado a grandes destinos. Esse fato é exato, pois freqüentemente o ponto de bloqueio se transforma em um ponto fraco do inimigo. Eu imagino perfeitamente que o caminho para se chegar ao conceito de “ponto fraco” tenha passado através do conceito de “ponto de bloqueio”. O inimigo possuía um peão passado, nós o freamos e agora se nota que esta peça de bloqueio exerce uma pressão incômoda, difícil de arrancar porque o peão deu um abrigo natural ao bloqueador. Conhecido esse conceito, o mesmo foi ampliado e materializado. Ampliou-se no sentido de que agora classificamos como fraca toda casa situada à frente de um peão, esteja ou não passado, porém sempre que haja oportunidade de que o inimigo se fixe nela sem correr maior perigo. Atrás das costas de um simples peão há um bom refúgio contra o incômodo perigo retilíneo das torres. Mas o ataque contra o ponto fraco também se materializou e assim vemos o Dr. Lasker falando de casas brancas fracas (veja o diagrama 52A), onde aprendemos que o peão inimigo já não tem como conditio sine qua non servir de anteparo à peça que ocupa a casa débil. 70

Diagrama 52A- Casas brancas débeis 2 c) IIIº Motivo: A paralisia provocada por um bloqueio não é de “caráter local”. Repercussão dos fenômenos de paralisia na retaguarda. Sobre a dualidade mental do peão. Comentários sobre os conceitos pessimistas no mundo e sua possível cristalização na mais terrível melancolia.

Na partida Leonhardt-Nimzovitsch, o Bc5 branco bloqueava o peão c e dessa forma mantinha prisioneiro em seu próprio campo o Bb7 das pretas. Isso resulta esquemático, pois com freqüência é todo um complexo de peças que termina afetado pela manobra. Desta forma é possível inutilizar uma grande parte do tabuleiro para manobras ativas e, ainda mais, às vezes toda a posição inimiga tem uma rigidez alarmante. Em outras palavras: a paralisia é transmitida pelo peão bloqueado em direção à retaguarda. No diagrama 53 os peões de d5 e e6 estão completamente bloqueados e, por esse motivo, toda a posição das pretas está afetada dessa rigidez alarmante. O bispo e a torre se encontram prisioneiros em seu próprio campo e as brancas, apesar da minoria material, têm possibilidades de vencer.

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Diagrama 53 – Ressonância do bloqueio em direção à retaguarda

A posição assim esquematizada não nos deve surpreender. Temos notado com freqüência que todo peão constituise um obstáculo para as próprias peças e muitas vezes sente desejo íntimo de deixar de sê-lo, seja para abrir uma coluna para a torre ou para dispor de uma casa para se colocar o cavalo (capítulo IV, parágrafo 2). O bloqueio resulta então não somente oneroso para o peão bloqueado, mas também para seus companheiros de luta (torres e cavalos). Para o estudante, a propósito do peão, é importante reconhecer o determinado dualismo que este tem na sua mente. Como já dissemos em outra parte, o peão por um lado quer se suicidar e por outro aferrar-se à vida. Esse último desejo é devido a que percebe sua grande importância nos finais e que contribui para impedir o escoamento das peças inimigas, que ocasionaria a criação de casas fracas em seu próprio campo. A impressão lastimável que recebe um peão móvel a ser bloqueado pelo inimigo pode ser explicada através de um ponto de vista puramente psicológico. Não é possível afirmar que o peão esteja desprovido de pessimismo em relação ao

mundo (seu dualismo prova isso). Podese estranhar então que, ao surgir o primeiro conflito real, o pessimismo citado se cristalize até se transformar na mais negra melancolia? Melancolia negra que também pode afetar os peões brancos. Estranharíamos se essa veia melancólica se transmitisse às outras forças? Seja como for, a mobilidade de um peão passado (especialmente se é central) constitui o nervo vital de toda posição e evidentemente a paralisia do mesmo repercutirá em toda a posição. Como pudemos apreciar, há motivos importantes para se estabelecer o bloqueio e, portanto, temos que fazê-lo o quanto antes. 3 – O Bloqueador em seu trabalho principal e suas ocupações secundárias. Seu comportamento quando está irritado e quando excursiona. Conceito de elasticidade. O bloqueador forte e o fraco. Que deve fazer o bloqueador para satisfazer suas múltiplas funções. A utilização de uma figura como vigilante é um conceito insustentável.

O principal trabalho de um bloqueador consiste a olhos vistos no bloqueio correto do peão correspondente. Por isso, o bloqueador tende a imobilizar-se em sua posição, mas apesar disso desenvolve uma atividade considerável (que maravilhosa vitalidade!): 1º- Ameaçando desde a casa na qual se encontra (veja a partida LeonhardtNimzovitsch onde o cavalo desde e6 preparou g4); 2º- Aproveitando a elasticidade que permite ao bloqueador em certos casos abandonar o posto. Parece que poderá ter essas viagens prazerosas quando: 71

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a) no caso em que essa viagem prometa muito (temos que advertir que essas viagens devem ser realizadas em trens expressos); b) no caso em que possa retornar em tempo e voltar a bloquear o peão, o qual enquanto isso pode ter ocupado outra casa; e c) no caso em que possa deixar substituto capaz de preencher o posto. É claro que o substituto deve ser escolhido dentre as peças que auxiliam o bloqueador. Essa circunstância, que poderia passar de forma inadvertida, é muito importante, pois mostra que a elasticidade depende diretamente (pelo menos na forma correspondente ao motivo c em maior ou menor grau à ação conjunta de bloqueio. Como ilustração do caso a, veja-se a partida Nimzovitsch-Nilson; para o caso b tomemos a posição: brancas – Kd1, Rh4; pretas – Ka8, Rh8, h5, b4, bem simples (a mais simples), na qual o bloqueador inicia uma pequena viagem de férias: 1.Rxb4 e naturalmente o peão passado aproveita a oportunidade de avançar 1...h4 2.Rb2 h3 3.Rh2. A senhora torre aparece no escritório, se apresenta ao chefe, cumprimenta seus colegas e, com um gesto de quem teve um bom descanso sem sobressaltos (na realidade teve que correr para chegar a tempo), ocupa seu lugar na escrivaninha do bloqueio, trocando a sua cadeira anterior (h2 no lugar de h4). A manobra que acabamos de mostrar poderia ser repetida em muitos exemplos. Para o caso c observe-se o Bc4 na partida Nimzovitsch-Freymann. De acordo com os diversos casos esquematizados de aproveitamento da 72

elasticidade, podemos notar que esta se reduz quando o peão bloqueado está muito avançado. O bloqueador por sua vez desenvolve sua elasticidade máxima quando tem que bloquear um peão semipassado que se encontre no centro do tabuleiro como, por exemplo, na posição: brancas – e3, f2, Nd4; pretas – d5, h4, Bb7, onde o Nd4 (bloqueador) pode empreender viagens aos quatro ventos, pois é muito elástico. Com isso creio haver dito o suficiente sobre a elasticidade do bloqueador. A ação de bloqueio (eficácia e ação)

A força desenvolvida ao bloquear deve ser sistematicamente orientada em contraposição da que surge por si mesma pela elasticidade. A manobra de bloqueio se acrescenta com a chegada de novas forças que por sua vez estejam bem colocadas. Comparem-se entre si o diagrama 54 e o diagrama 54A.

Diagrama 54 – Jogam as pretas. É um bloqueador forte?

Rc6

No diagrama 54, por razões de segurança pessoal, o bispo migrará em direção a g6, por cujo motivo o bloqueador (Rc6), sem a menor dúvida, perderá um apoio muito importante. E mais, a vacância do bispo sobre a grande

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diagonal deve ser cuidadosa, pois o olho da lei está alerta (Qd4). Porque depois de 1...Bg6 segue 2.Kb5 Be8 3.Qe5+ Kd7 4.Qxe8+ Kxe8 5.Kxc6.

Diagrama 54A - Jogam as pretas. O bloqueador pode se manter?

No diagrama 54A por sua vez o bispo poderá ocupar a casa f3 de onde, sem poder ser desalojado, se encontrará em lugar seguro. A Rc6 ganha assim importância e é evidente que a partida terminará empatada. O bloqueador na realidade não tirou forças de si mesmo, as tomou das que surgem das combinações de retaguarda. Ao estudar o posto avançado, constatamos fatos semelhantes. Um bloqueador mal defendido não pode suportar ataques enérgicos das peças inimigas. Se não atira será destruído e então o peão inimigo continuará o seu avanço. A casa de bloqueio é um ponto estratégico importante e o menor sinal de inteligência nos impõe a necessidade de defendê-la ainda mais do que o estritamente necessário. Não há que se esperar, portanto, o acúmulo de ataques para defender-se, mas sim prevenir-se de antemão. Com isso surgiu uma constelação estranha: enquanto a ação do bloqueio

resulta difícil e somente se pode manter com a ajuda de forças exteriores, as vantagens secundárias do bloqueio (ações provenientes da elasticidade e a ação ameaçadora desde a casa de bloqueio) são naturais e se desenvolvem sem esforço. Não há dúvida de que desde a escolha do bloqueador há que se levar em consideração as possibilidades da ação elástica e da ameaçadora, porém há que se convir que freqüentemente basta considerar a ação do bloqueio em si, uma vez que a ação ameaçadora e a elasticidade surgem do bloqueio de forma espontânea. Levando em consideração que os fatos delineados são extraordinariamente característicos, agora não teremos dúvidas de que não se rebaixa em nada um oficial quando se lhe oferece o cargo de vigilante, pois em seu posto no lugar de bloqueio, apesar de burguês e seguro, está repleto de possibilidades de iniciativa. 4 – A luta contra o bloqueador. O desenraizamento. “Changes les bloqueurs”. Como fazer para trocar um bloqueador de mau gênio por outro mais amável.

Quando dissemos que o bloqueador era forte pelas relações que mantinha com a retaguarda, expressamos uma verdade irrefutável. Mas, apesar disso, o bloqueador por si mesmo pode e deve fazer algo para a estabilidade da muralha de bloqueio. Sua ação se nota porque dispõe de um raio de ataque que impede a aproximação das tropas inimigas e, se ainda for de baixa linhagem, proporcionará outra vantagem. Quanto mais baixa for a linhagem, melhor. Também creio que o bloqueador deve ter “couro duro”, não ser susceptível. A sensibilidade excessiva dos reis não está de acordo com o papel de bloqueador 73

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(rei ou dama). Uma peça menos importante (cavalo ou bispo) pode se manter contra um ataque solicitando os reforços necessários, enquanto a dama reage à menor desconsideração e se retira da sala com a sua orgulhosa cabeça levantada. O rei também é muito mau bloqueador, porém no final faz sentir seus privilégios reais que lhe permitem trocar de cor. Se foi desalojado de um ponto de bloqueio preto, poderá novamente tentar colocar-se na etapa mais próxima de bloqueio, ou seja, um ponto branco. Por exemplo: brancas – g5, Kg4, Bd1; pretas – Kg6, Na7. O xeque 1.Bc2 expulsa o rei de g6, mas este continua o bloqueio desde g7. Como estamos vendo, os bloqueadores podem ser de classes diferentes (fortes e fracos, elásticos e rígidos) e, portanto, é claro que segundo seja a necessidade haverá de se utilizar um ou outro. Se eu capturo um bloqueador este será substituído por outro para realizar a dita função e com ele o “Changez les bloqueurs” seria um “fait accompli”, ou, falando-se em linguagem internacional, a troca ministerial do país inimigo seria um fato consumado. Esta combinação é uma manobra típica (veja o diagrama 55).

O início seria: 1.Rb8+ Rf8 O raio de ataque do Ba8 impede a aproximação do rei, pois se assim não fosse o caso seria fatal. 2.Rxa8 Rxa8 3.Kb7 O novo bloqueador (a torre em a8) demonstra ser uma pessoa tranqüila, que não pensa nem remotamente em rechaçar a tentativa de aproximação. 3...Rf8 4.a8=Q Rxa8 5.Kxa8 A partida se torna insustentável para as pretas, pois seu peão e foi rodeado. 5...Kg7 6.Kb7 Kg6 7.Kc6 Kg5 8.Kd7! Kf5 9.Kd6 e as brancas vencem. Por outro lado, se 1.Rb8+ Rf8 2.Kb6 (ao invés de 2.Rxa8) 2...Bd5 3.Kc7 Kf7 4.Rxf8 Kxf8 5.Kb8 as brancas teriam fracassado por 5...Kf7 6.a8=Q Bxa8 7.Kxa8 Kg6.

Diagrama 56 – “Changez les bloqueurs”

Diagrama 55 – De uma partida jogada por mim. O bloqueio Ba8 será desalojado pela torre

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Na posição do diagrama 56, as pretas estariam bem se não tivessem o rei tão afastado. As brancas substituem o bispo incômodo de f5 que impede a aproximação do rei a g4 por uma torre tranqüila: 1.Rxf5 Rxf5 2.Kg4 Os peões brancos se fazem móveis e o

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rei preto chega tarde. 2...Rf8 3.g6 Kb5 4.f5 Kc6 5.g7 Rg8 6.f6 Kd6 7.Kf5 (para impedir ...Ke6) e as brancas vencem. A idéia de fundo é a seguinte: o atacante está disposto a aceitar o duelo com o conjunto inimigo de bloqueio, mas de antemão impõe ao inimigo a substituição do chefe supremo por outro homem. As negociações ou o ferimento. Vejamos como levar a cabo as negociações indicadas. Temos que concentrar todo o ataque possível no bloqueador, pois este solicitará a ajuda da reserva (peças defensoras). Na luta que se desenvolverá ao redor do bloqueador, obteremos a supremacia dizimando o inimigo por trocas ou entretendo-o com outras ocupações, cujo final será a retirada do bloqueador, e nosso peão consegue avançar. A transmissão da vantagem do ataque da peça atacada para a peça que a defende constitui um esquema conhecido que já tivemos a oportunidade de citar ao tratar a coluna aberta. Nos finais, no caso de bloqueios, se hostilizam os auxiliares do bloqueador e no meio-jogo se procura distraí-los. Um exemplo é a partida que dá seqüência, jogada por mim em Breslau contra Von Gottschall em julho de 1925. Partida 13

Nimzovitsch - Von Gottschall

Breslau, 1925 Abertura Zuckertort

1.Nf3 e6 2.d4 d5 3.e3 Nf6 4.b3 Nbd7 Era correto ...c5 e ...Nc6.

5.Bd3 c6 6.0–0 Bd6 7.Bb2 Qc7 Com a intenção de abrir o jogo com ...e5. As brancas para impedir isso iniciam um contra-ataque. 8.c4 b6 Se 8...e5 seguiria 9.cxd5 Nxd5! (não 9...cxd5 porque depois de 10.dxe5 o peão d ficaria isolado) 10.Nc3 com maior liberdade. 9.Nc3 Bb7 10.Rc1 Rc8 11.cxd5 exd5 12.e4 As brancas se preparam para abrir todas as suas linhas! 12...dxe4 13.Nxe4 Nxe4 14.Bxe4 0–0 15.d5 c5 Os dois bispos brancos têm abertas as diagonais em direção à ala do rei inimiga. Impressionadas por isso, as pretas se sentiram inclinadas a depreciar a possível oportunidade de se livrarem do peão d do inimigo. Que papel poderia desempenhar esse peão tão solidamente bloqueado? Ainda mais se em d7 há outro bloqueador de reserva. 16.Re1 Qd8 17.Bb1 Esse ataque tem para nós o ilustrativo resultado de distrair e anular as peças bloqueadoras ...Bd6 e ...Nd7. Por ora se ameaça jogar Qd3. 17...Re8 18.Qd3 Era mais preciso 18.Rxe8+. 18...Nf8 Era mais correto 18...Rxe1+. 19.Rxe8! Qxe8 20.Nh4 f6 21.Nf5 Rd8 As pretas percebem a sua fraqueza frente ao peão d quando uma manifestação pública (com tochas) lhes tira dos sonhos. 22.Bxf6! Bxh2+ Para se evitar a perda de um peão temse que aceitar a troca indireta dos bispos 75

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(Bb2 pelo Bd6). Se tivessem jogado 22...gxf6 seguiria 23.Nxd6 Rxd6 24.Qg3+. 23.Kxh2 gxf6 Que mudança de situação! O bispo de d6 desapareceu, o Nd7 logo veremos em g6 e o peão d se livrou de todos eles. 24.Qg3+ Ng6 25.f4! Para possibilitar Re1, ficando o peão passado defendido de forma indireta. 25...Kh8 Não é possível 25...Bxd5 ou 25...Rxd5 devido a 26.Re1 seguido de Ne7+. 26.Re1

Diagrama 56 A – Posição após

26.Re1

26...Qf8! Se 26...Qg8, o peão passado se teria feito valer de uma forma muito interessante: 27.Ne7 Nxe7 28.Rxe7 Qxg3+ 29.Kxg3 Rg8+ 30.Kf2 Rg7 (aparentemente a sétima fileira está neutralizada. Mas é agora que começa a atuar o peão passado) 31.d6 Rxe7 32.dxe7 Bc6 33.Be4 Be8 34.f5!! Kg7 35.Bd5 (ficando agora inexpugnável o peão e7) 35…Kh6 36.Kf3 Kg5 37.Ke4 e as pretas ficam indefesas frente à ameaça Bb7, Kd5 e Bc6, que ocasiona a queda do bloqueio. 76

27.d6! Rd7 Por acaso 27...Bc8 não teria conduzido à queda do peão passado? Não, pela seguinte continuação: 28.Ne7 (ao jogar d6 as brancas fizeram da casa e7 uma guarita) 28...Qh6+ 29.Kg1 Nxf4 30.Nxc8 Rxc8 31.d7 e as brancas vencem. 28.Qc3 Ameaçando 29.Re8! Qxe8 30.Qxf6+ Kg8 31.Nh6 mate. Portanto, as pretas têm que assegurar a oitava fileira, com o retrocesso da torre a d8, mas então as brancas vencerão com Re7, pois a sétima fileira ficou sem proteção. Observe-se que os lances vencedores Re7 (ou Ne7 no comentário anterior) temos que considerá-los como conseqüência do avanço do peão passado. 28…Rxd6 28...Rf7 seria desespero: 29.d7! Rxd7 30.Re8! 29.Nxd6 Qxd6 30.Bxg6 hxg6 31.Re8+ Kg7 32.Qg3 E as brancas venceram com a seguinte continuação: 32...Bc6 33.Re3 Bd7 34.f5 Qxg3+ 35.Kxg3 Bxf5 36.Re7+ Kh6 37.Rxa7 Bb1 38.Ra6 b5 39.a4 bxa4 40.bxa4 Kg5 41.Rb6 Be4 42.a5 f5 43.a6 c4 44.a7 c3 45.Rb3 f4+ 46.Kf2 c2 47.Rc3 1–0 5 - O ataque frontal do rei contra um peão isolado. O rodeio. O papel do guia. A manobra triangular de ataque frontal. A casa de reserva de bloqueio. A oposição recusada.

Muitos heróis do xadrez, já envelhecidos, levarão as mãos à cabeça ao inteirarem-se de que têm que eliminar o

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conceito de “oposição”. Lamento muito não lhes poder poupar essa dor. O conceito da oposição tem no fundo muitos pontos de contato com o critério exclusivamente aritmético para o “centro de peões”. Em ambos os casos, avalia-se uma situação inteira com base puramente em indícios externos. Para melhor nos orientar: avaliar de forma aritmética o centro de peões significa efetuar a contagem dos peões ali colocados e a superioridade numérica, nesse caso, significa supremacia. Este é um conceito completamente irracional, porquanto na realidade a situação central só pode ser estabelecida de acordo com a maior ou menor mobilidade. No que segue, darei minha teoria completamente nova, que analisa os fatos em sua essência, prescindindo da oposição. As conclusões estabelecidas nessas bases hão de resultar muito úteis para o estudante.

Diagrama 57 – Direita: as brancas conquistam alguns dos peões inimigos. Esquerda: de que forma através da ameaça de rodeio se desloca o inimigo e se conquista o peão f6, objetivo da luta?

No diagrama 57 (à direita) a formação de um peão passado através de h3, f3 e g4 não é suficiente, uma vez que o rei branco ficaria atrasado

relativamente ao peão passado. É necessário que o rei desempenhe o papel de guia, comparável com o de um ponteiro em uma corrida de bicicletas, ou seja, não deve ficar tranqüilamente em casa lendo o enredo da guerra. Outro ponto importante para o estudante. O rei tem uma personalidade completamente diferente segundo atue no meio-jogo ou no final. No meio-jogo é tímido, se refugia em seu castelo (posição de roque). No final, por outro lado, o rei se transforma em herói – o que não oferece maiores dificuldades, uma vez que na maioria das vezes não há inimigos no tabuleiro. Logo que tenha começado o final, abandona seu roque e avança com passos lentos mas majestosos em direção ao centro – aparentemente para posicionar-se no local dos fatos. Veremos isso com mais detalhes no capítulo VI. Em sua luta contra um peão isolado, se arroja com decisão e valentia, preparando sua luta para um ataque frontal que conduzirá por exemplo à posição: brancas – Kf4; pretas – f5. Essa posição frontal é a ideal, com a qual o rei sonha. De acordo com isso, quando, no entanto, existam forças, o peão de f5 bloqueado pelo rei é submetido a vários ataques que levam a uma posição incômoda os trebelhos defensores e quando se trata de um duelo de reis (ou seja, quando já não restam peças no tabuleiro) o atacante se vê forçado pelo zugzwang. Por exemplo: posição do diagrama 57 à direita com um bispo branco em f1 e outro preto em f7. Depois de 1.Kf3 Kg7 2.Kf4 (a posição ideal) 2...Kf6 segue 3.Bd3 Be6 e a diferença do bispo ativo de d3 e o passivo de e6, por estar esse último amarrado ao 77

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peão f5, é bastante considerável (veja o capítulo VI, parágrafo 2). O final puro de peões, por sua vez, se desenvolverá da seguinte forma (ver o diagrama 57 à direita): 1.Kf3 Kg7 2.Kf4 Kf6 3.h4 (a primeira parte da manobra) 3...Kg6. O rei inimigo teve que se desviar à força, devido à obrigatoriedade de jogar (zugzwang), o que constitui a segunda parte da manobra. Segue agora a terceira e última parte na forma de rodeio branco, 4.Ke5, através do qual as brancas vencem. O ataque central, portanto, se transformou em um ataque envolvente, o que significa um triunfo, pois já sabemos que o ataque envolvente é o ataque mais poderoso. Os exemplos dos diagrama 57 à esquerda e do diagrama 58 à direita nos convencerão que o rodeio final é muito poderoso. No segundo caso se joga 1.Kh6 Kf8 2.Kg6 Ke7 3.Kg7 Ke8 4.Kf6 Kd7 Kf7, onde podemos observar a aproximação do rei branco aproveitando o zugzwang. No diagrama 57 se joga 1.Kd7! Kb5 2.Kd6, mas nunca 1.Kd6? porque então as brancas cairiam em zugzwang e não teriam nenhum lance bom após 1...Kb5. Finalmente, na posição: brancas – Kh5, a4, a5, f5; pretas – Kd5, b7, f6 se jogaria 1.Kg6 Ke5 2.a6! bxa6 3.a5, onde as brancas com o sacrifício de um peão colocam as pretas em um incômodo zugzwang. Depois de haver destacado a importância do rodeio (que somente tem importância quando o objeto atacado é imobilizado por algo que por sua vez trata de atacar o rei), facilmente podemos perceber o esmero que tem que se colocar nas três manobras necessárias para o rodeio. 78

Diagrama 58 – Direita: as brancas rodeiam o inimigo. Esquerda: as brancas conseguem a casa b5 para colocar seu rei

Levaremos agora a manobra típica a uma posição sem peões inimigos (diagrama 58 à esquerda). Deve-se tratar de conquistar a casa b5, mas antes de buscar a conquista devo esclarecer qual é a razão que assiste para que seja justamente essa a casa indicada. A colocação do rei branco em b5 assegura o avanço do peão até b6, porque basta que o rei se coloque de um lado para que o peão, que já imaginamos em b4, tenha assegurado seu caminho até a casa indicada. Na posição do diagrama 58, a chegada do peão a b6 constitui justamente a primeira etapa da marcha insegura do peão passado até a coroação, porque a passagem por b4 e b5 já tinha assegurada com a colocação do rei em c4. Iniciamos então o ataque frontal contra a casa b5: 1.Kb4 (esta é a primeira parte) 1...Ka6 (Kf6) (retirada lateral do rei inimigo, segunda parte) 2.Kc5 (Ka5) (terceira parte, ou seja, o rodeio completo), 2...Kb7 3.Kb5! e a conquista do ponto buscado para o rei. Na posição que surgiu: brancas – Kb5,

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b3; pretas – Kb7, o lance já realizado 3.Kb5 deve ser considerado como um ataque frontal da próxima etapa, que culminará em b6. A manobra triangular dirigida contra b6 se desenvolverá de forma semelhante ao que acabamos de descrever, ou seja: 3...Ka7 (Kc7) 4.Kc6 (Ka6), para seguir depois com Kb6. Mais fácil ainda é a aplicação do método que acabamos de descrever para o defensor. Na posição: brancas – Kc4, b4; pretas – Kc6 as pretas poderão conseguir o empate porque o rei branco se encontra atrasado. Tudo o que terão que fazer é impedir que o rei branco tome o papel de guia e ter em conta que, depois da casa de bloqueio, a mais segura é a de reserva de bloqueio. Para um peão branco em b4, a casa de bloqueio é b5 e a de reserva de bloqueio é b6. Na posição citada anteriormente: brancas – Kc4, b4; pretas – Kc6, depois de 1.b5+, as pretas jogam 1...Kb6 (bloqueio) 2.Kb4 Kb7 (reserva de bloqueio) 3.Kc5 Kc7 (nunca 3...Kb8 (Kc8) porque isso facilitaria o avanço do rei inimigo) 4.b6+ Kb7 (bloqueio) 5.Kb5 Kb8 (reserva de bloqueio) 6.Kc6 Kc8 7.b7+ Kb8 8.Kb6 e empate. Para evitar mal-entendidos tenho que notar que a casa b8 se transformou em casa de reserva de bloqueio, devido ao que o peão branco avançou a b6, o mesmo que a casa b7 frente ao avanço a b5. Na posição: brancas – Kc5, b5; pretas: Kb7, o lance 1...Kb8? é desastroso, pois o rei inimigo se apropria de todo o campo e com ele a possibilidade de controlar todas as ações com 2.Kb6, que implica em um ataque frontal decisivo contra a casa b7 (primeira fase da nossa manobra triangular).

A ciência da “oposição”, pela sua pouca clareza, deve ser considerada ciência de pura obscuridade. Essa é a verdade: o rei atacante luta para tomar o papel de guia e o inimigo trata de enfrentá-lo fazendo intervir a “casa de reserva de bloqueio”. 6 – Os peões passados privilegiados: a) os ligados; b) os defendidos; c) o passado algo distante. O rei como arranca-dentes. Sobre os preparativos da excursão. O principiante dedicado à caça de um peão passado que não pode alcançar.

Devido ao fato de que as oportunidades ficam distribuídas desigualmente pelas 64 casas do tabuleiro, os peões passados poderão desenvolver sua capacidade de ação com maior ou menor grau de intensidade de acordo com a sua colocação no mesmo. Aqueles que têm mais liberdade para atuar (privilegiados) merecem ser respeitados.

Diagrama 59 – O peão c é um peão passado defendido. Os peões g e h estão ligados e em posição ideal

Observe-se a posição ideal típica dos dois peões passados unidos no diagrama 59. As relações entre os peões 79

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ligados são de verdadeira camaradagem e, portanto, a posição que deve ser considerada como a mais natural é a de que ambos se encontrem na mesma fileira. O vigor dos peões livres situados nessa última forma se baseia na impossibilidade de bloqueá-los (os peões em g4 e h4 impedem o bloqueio em g5 ou h5), porém o desenvolvimento posterior dos fatos exigirá dos peões livres (ou passados) o abandono dessa posição ideal. Desde g4 e h4 atuam bastante bem, mas a ânsia de expansão que todo peão passado possui em alto grau os fará avançar. Como conseqüência do avanço de um deles surge então a possibilidade de bloqueio. Depois de h5 as peças pretas poderiam bloquear desde g5 ou h6. O avanço de um dos peões desde a posição ideal tem que se efetuar em tal momento que não seja de temer um bloqueio forte. Outra coisa mais: se o peão avançado é o correto e foi feito no momento oportuno, então o bloqueio fraco que tiver sido produzido pode ser vencido facilmente pelo avanço do peão atrasado, restabelecendo ao mesmo tempo a posição ideal. Portanto, no diagrama 59 à direita se jogará da seguinte forma: no momento indicado avançará g5, por assim dizer, dando oportunidade ao inimigo para bloquear desde h5. Devemos supor que a peça que bloqueará não estará bem secundada (o que se chama bloqueio fraco), sendo então atacada e ao abandonar a casa permitirá o avanço do peão a h5, restabelecendo dessa forma a posição ideal na 5ª fileira. O auxiliar mais valioso para esses casos é o rei quando este penetra nas 80

brechas deixadas abertas pelo avanço. Se no diagrama 59 à direita imaginarmos que ao avanço g5 segue um possível lance bloqueador Nh5 e que o rei branco ficasse à espreita, este ao apoderar-se da casa g4 penetra na brecha, constituindose em novo fortificador. A manobra descrita é a “cimentação” do peão. De acordo com isso, “meu” rei nunca deverá temer ficar sem trabalho. Em último caso sai a campo como um arranca-dentes a cimentar os peões.

Diagrama 59 A

A posição do diagrama 59A surgiu em uma partida de clube jogada em Estocolmo em 1921. As brancas jogaram 1.b6+?, permitindo assim o bloqueio absoluto 1...Kb7 (dizemos bloqueio absoluto porque, de acordo com a situação, o rei preto não poderá ser desalojado). Seguiu então 2.Kd6 para avançar em direção a g7 e reconfortar-se tomando o peão h7. Mas nesse momento as pretas jogaram 2...Bh5 e o banquete transformou-se em indigesto para o rei. Cheio de remorso, sua majestade branca se dirige em direção a outra parte, mas aqui também não encontrou nada, pois o bispo de h5,agora livre de compromissos,

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impedia-lhe toda vida tranqüila no tabuleiro. As brancas receberam o castigo justo que aguarda todos os que joguem fora das regras. O correto teria sido: 1.a6 Bd3 2.Bd4 Bf1 3.Kb4+ (buscando cimentar em a5) 3...Ka8 4.Ka5 Be2 5.b6. Tudo então se desenvolveu de acordo com o programado. O peão a avançou primeiro, porque os ligeiros impedimentos que surgem (não se pode chamar de bloqueio, seria demasiado) poderão ser superados com facilidade. O rei cimenta a brecha formada pelo avanço e em seguida avança o peão b e os bons companheiros estão de novo unidos. Lembrando a bela canção “Eu tive um companheiro...”, podemos dizer a respeito dos peões ligados que estes constituem uma ilustração magnífica “...ao mesmo passo e compasso...” (veja o diagrama 60).

Diagrama 60 – Perlis – Nimzovitsch, Carlsbad 1911. As pretas jogam. O peão g5 deixa em perigo seu camarada h4 porque já é uma personalidade. Desfaz a camaradagem com 1...g4 2.Rxh4 g3, vencendo

Passemos agora a nos ocupar do peão passado defendido.

Diagrama 61 – As brancas vencem pela diferença de valor entre peões livres comuns e peões livres defendidos

O valor diferente que tem um peão livre comum de outro defendido podemos notar bem com base no seguinte exemplo (veja o diagrama 61). As brancas abrem o jogo contra a superioridade numérica dos peões pretos. 1.a4 Ke5 2.axb5 (teria sido errado 2.c4 porque seguiria 2...b4 onde o peão ficaria muito bem defendido e os reis teriam a tarefa pouco grata de passear de um lado para outro para cuidar dos peões. A estes passeios com observação simultânea dos peões por parte dos reis é o que chamam “governar”) 2...cxb5 3.c4 bxc4+ (obrigado, pois 3...b4 teria permitido a coroação de um peão branco) Com esse lance surgiu uma posição característica que torna evidente a diferença de valores entre os peões: brancas – Kb3, peões em f5 e g4; pretas – Ke5, peões em a5, c4 e g5, pois o rei branco poderá capturar sucessivamente os peões livres. O peão f5 se mantém inexpugnável a todo ataque real. A força do peão passado defendido se baseia em sua impunidade contra os ataques do rei inimigo. 81

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encontram um lance atrasadas) 4.Kf6 Kxa4 5.Kxg6 Kb3 6.h5 h4 7.h6 etc. Moral da estória: é indispensável que a viagem planejada pelo rei tenha sido perfeitamente preparada antes de realizar a troca. Deve-se empregar até onde for possível a obrigatoriedade dos lances. Os companheiros de viagem devem avançar. Observe-se ainda o exemplo da partida número 6; veja o diagrama 66. Diagrama 62 – O peão passado distante desloca o rei inimigo do centro do tabuleiro

No diagrama 62 o peão h4 é o peão mais afastado (em relação ao centro). Depois da troca indireta mútua dos peões livres 1.h5+ Kh6 2.Kf5 Kxh5 3.Kxf6, o rei preto ficou fora de jogo, enquanto o branco está nele com desenvolvimento no centro, o que é essencial. A troca de peões foi realizada para desviar a atenção do rei preto e ao mesmo tempo permitir ao branco o início da viagem vencedora. A viagem deve estar cuidadosamente preparada antes do avanço do peão. Vejamos a posição: brancas – Ke4, a4, c4, h2; pretas – Kd6, a5, e5, g7, na qual as brancas possuem o peão passado mais afastado (c4). Se as brancas o avançassem imediatamente cometeriam um erro: 1.c5+ Kxc5 2.Kxe5, pois a viagem até o peão g7 do inimigo resulta longa e o companheiro de viagem (h2) muito preguiçoso. O lance correto é 1.h4 (o companheiro de viagem avisa que está pronto) 1...g6 (uma amabilidade que devemos agradecer ao fato de ser obrigatório jogar, aplicada especialmente ao caso do peão passado mais afastado) 2.c5+ Kxc5 3.Kxe5 Kb4 (as pretas se 82

7 – Quando se deve avançar o peão passado: a) por motivos pessoais; b) para preparar terreno ao rei; c) para oferecê-lo como isca. A manobra do rei que lhe abre o apetite. O jovem que emigra para conquistar o mundo.

“Trata-se de uma história velha que sempre é nova”, aforismo que se pode aplicar ao amador que avança seu peão passado no momento menos apropriado. Quando se trata de dois peões passados ligados (veja o diagrama 59A), joga, por exemplo, 1.b6+, permitindo com ele um bloqueio gigantesco. Porém, no entanto, pareceme ser de valor prático revisar os casos nos quais se convém fazer o avanço. Distinguiremos três casos: a) Quando o avanço aproxima o peão passado da meta final (unicamente no caso em que se possa produzir um bloqueio fraco). Observe-se minha partida com Von Gottschall: peão passado, parágrafo 4; nesse caso o lance d6 contribuiu para defender a casa e7 e criou as ameaças Ne7 e Re7. É equivocado o avanço do peão quando possa ser fortemente bloqueado ou tenda a defender pontos sem importância. É muito fácil obter peões passados, o difícil é vigiar o seu futuro.

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Diagrama 63

b) Quando o peão passado que avança ilumina o caminho para a peça que o segue, especialmente se esse avanço dá a oportunidade do avanço do próprio rei contra outro peão inimigo (veja o diagrama 63 à direita). Joga-se 1.f5 Kf7 2.Ke5 Ke7 3.f6+ Kf7 4.Kf5 Kf8 (o peão f por si só não tem nenhum futuro) 5.Kg6 e se ganha com o peão h. Ou seja, o avanço se fez com o objetivo de deslocar o rei inimigo para que o próprio rei pudesse aproximar-se do peão h inimigo. c) Quando existe o propósito de sacrificar o peão. Trata-se nesse caso de distrair ao máximo o rei inimigo (veja o diagrama 62). Outro exemplo: brancas – Kg3, a4, h2; pretas – Kh5, a5. Aqui o peão branco h deverá se sacrificar pela pátria “como vítima de uma distração” dos seus chefes. Agora somente lhe será permitido perguntar onde, quando e como. É correto carregar de imediato o rei para a outra ala: 1.Kf4 Kh4 2.Ke5 Kh3 3.Kd5 etc. Teria sido mau 1.h4 (não somente querer sacrificar o peão, mas ainda entregar a vítima na bandeja francamente passa do limite). Depois de 1.h4? segue 1...Kg6 2.Kf4 Kh5 3.Ke5

Kxh4 4.Kd5 Kg5 5.Kc4 Kf5 6.Kb5 Ke6 7.Kxa5 Kd7 8.Kb6 (ameaçando Kb7) 8...Kc8 9.Ka7 Kc7 fechando o rei branco, com empate. Depois de 1.Kf4 Kh4 2.Ke6 Kh3 sua majestade preta, com o agradável desjejum do peão h, pode se dar por satisfeita, pois o cansativo passeio matinal desde h5 a h3 abriu-lhe o apetite. É certo que a isca deva ser sacrificada, mas o sacrifício deve ser feito de tal forma a produzir a perda máxima de tempo do inimigo. Nem sempre é simples fazer notar os motivos do avanço de um peão. Veja-se o diagrama 63 à esquerda: 1.c5 Kc7 2.Kd5 Kd7 3.c6+ Kc7 4.Kc5 Kc8 (reserva de bloqueio) 5.Kd6 Kd8 6.c7+ Kc8 7.Kc6. Aparentemente o avanço foi sem motivo, pois não estamos em nenhum dos casos estabelecidos (a, b ou c). Segue então 7...a5 pois as pretas têm a obrigação de jogar e com isso tem início um drama fascinante. O peão preto de a deu o passo duplo com a energia própria da juventude, mas as brancas preferem a suave resposta 8.a3, demonstrando assim à juventude que a serenidade também é uma virtude. Depois de 8...a4 9.Kd6 a partida ficou definida. Se o nosso jovem amigo (o peão a inimigo) desprezasse de toda forma a nossa capacidade e frente ao passo decisivo jogasse com moderação 7...a6, então mostraríamos ao infeliz jovenzinho que a energia é uma base verdadeira de triunfo, jogando 8.a4. Depois de 8...a5, com 9.Kd6 as pretas estariam vencidas. Eu costumo chamar ao final anterior como sessão espírita. À primeira vista pareceria inexplicável que as brancas pudessem vencer pelo simples fato de ter um peão em a2 ao invés de a3, em cujo 83

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caso só resultaria um empate. Damos fim ao capítulo dos peões passados apresentando alguns finais e partidas. Considero esse capítulo como uma pré-escola para o jogo posicional. Por essa circunstância entrei com tanto carinho em alguns detalhes de posição. Quem tiver poucas condições para conceitos abstratos pode prescindir dos “fundamentos da obrigação de bloquear”.

mais nitidamente a marcha do rei buscando a posição ideal. Foi jogado 1.Re6+ Kd5 2.Rxf6 gxf6 3.axb5 (ameaçando c4+ Kxc4 b6 etc) 3...c4 4.Bxh6 Rh8 5.Bg7 Rxh5 6.Bxf6 Kc5 7.Kd2 (diagrama 64A).

Finais e partidas com o peão passado como tema.

Diagrama 64 A – A colocação do rei branco para o ataque frontal contra peões isolados. Jogam as pretas e vencem.

Diagrama 64 – Nimzovitsch-Rubinstein, Breslau 1925

No diagrama 64 as brancas jogam fazendo um sacrifício de qualidade. Apesar da amplitude da combinação (peço-lhes perdoarem-me a expressão), pode-se resumir a idéia simplesmente a duas palavras: o rei se coloca na posição ideal (ataque frontal contra um peão isolado, veja o parágrafo 5). Pude realizar essa idéia oculta (ainda podia ter sido evitada) devido ao fato de que Rubinstein não conhecesse a fundo os postulados do meu sistema, o que o colocava em condição de inferioridade a esse respeito, pois esses postulados não têm segredos para mim. Não conheço nenhum outro final no qual se ressalte 84

A possibilidade de se jogar esse último lance (7.Kd2) era a razão de ser de tudo, pois o que foi jogado anteriormente era única e exclusivamente para aplainar a marcha do rei em direção a f4 (veja o diagrama 64). As pretas jogaram 7...Kxb5, o que significa um erro, pois aqui poderiam, de acordo com a continuação que segue, impedir a viagem planejada pelo rei branco e vencer: 7...Rh6 8.Bd4+ Kxb5 9.Ke3 Re6+ 10.Kf4? Re4+, seguido de ...RxB. O estudante deve observar que também não adiantaria jogar 10.Kf3 (ao invés de 10.Kf4) para salvar a partida, pois então teria sido jogado 10...Re4, seguido da marcha oportuna do rei em direção a d2 e e1. Mas o lance foi 7...Kxb5 8.Ke3 Kc5 9.Kf4 (caso encerrado) 9...Kd5 10.f3 e empate depois de poucos lances, pois a

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torre e o rei não podem adquirir liberdade simultaneamente, fato necessário para que tenha lugar um ataque duplo contra c3 seguido do sacrifício de qualidade. É um final muito ilustrativo. O rei buscou com todo ardor o ataque frontal, pois essa aspiração corresponde a um desejo que está de acordo com o sentimento mais íntimo do rei (mas ainda de acordo com as regras do bloqueio).

Esse terceiro exemplo ilustra a ação do peão livre distante (veja o diagrama 66, Tarrasch-Berger)

Diagrama 66 – Tarrasch-Berger

Diagrama 65 – Hansen – Nimzovitsch (simultânea na Dinamarca)

No diagrama 65 apresentamos como segundo exemplo um caso simples de rodeio. As pretas jogaram 1...Kc7, pois devem fazer algo contra a ameaça c3 que implica na criação de um peão passado distante, daí resultando um simples desenvolvimento repleto de efeitos. 2.c3 Se 2.c4 Kb6 3.cxd5 cxd5 4.Kc2 Ka5! – o tempo! 2...Kb6 3.cxb4 Kb5 4.Kc3 Ka4 e o rodeio pode se realizar sem falhas, apesar da perda do peão, devido ao fato de que a paralisia das brancas favorece o rodeio inimigo.

37.Kg1 Ke7 38.Kf2 d5 39.e5 Se 39.exd5 Kd6 40.Ke2 Kxd5 41.a3 Kc5 seguido de f4 e da distração b4+, que define a partida. 39...Ke6 40.Ke2 O lance 40.f4 é fraco devido a 40...g5 41.g3 gxf4 42.gxf4 Kf5. 40...Kxe5 41.Kd3 h5 42.a3 Era preferível primeiro jogar h4. 42...h4 Surge uma chance para o futuro. 43.b4 axb4 44.axb4 Kd6 45.Kxd4 Kc6 46.b5+ As brancas aqui não quiseram se aproveitar do zugzwang 46.f4, que ocasionaria um lance de peão preto favorável às brancas pois facilitaria uma posterior excursão do rei com execução de peões pretos. 46...Kxb5 47.Kxd5 Kb4! Isso mostra que a distração realizada teve aqui pouca importância porque as pretas ao tomarem os peões g e h se aproximavam de seu peão h. É um final proveitoso pelos erros cometidos. A 85

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posição a que chegamos foi finalmente vencida pelas brancas, após as pretas terem deixado escapar uma possibilidade de empate.

demonstrar que a defesa está “no ar”. 5...Qc5 A demonstração resultou eficaz e o bloqueador teve que ceder algo. 6.Ne5 Também era correto 6.h5 Qxh5 7.b6 e os dois camaradas ficavam novamente de braços dados. 6...Rd4 A variante principal teria sido 6...Rd2 7.Nd3 Qxc2 8.b6 e os peões continuam a sua marcha sem se preocupar com a perda de peças. 7.Qe2 Nxh4 8.b6 Rb4 9.Rxb4 axb4 10.b7 Qc3 11.Qe4 Nf5 12.Nd7 Nd4 13.b8Q 1–0

Diagrama 67 – Nimzovitsch-Alapin, São Petersburgo 1913

O exemplo 4 é característico para a forma de avanço dos peões ligados (veja o parágrafo 6) No diagrama 67 que o ilustra foi jogado: 1.c6! Para a escolha do peão que deve avançar primeiro não se realizou uma análise sobre o maior ou menor risco de bloqueio, mas de que simplesmente se não jogassem assim as brancas teriam perdido seu peão c5. 1...Qb6 No caso de 1...Rxc6 2.bxc6 Qxb1 3.Rxb1 Nxe5 4.c7 com peão passado e a sétima fileira absoluta - 4...Nd7 5.Nc6 vencendo. 2.Qe3 Tentando tirar o bloqueador ...Qb6 para que se possa avançar o peão b. 2...f4 Pela ameaça de Nxe6. 3.Qe4 Rcd8 4.Nf3 Rd6 5.h4 As brancas, aproveitando a sua forte posição central – Qe4 – querem 86

Diagrama 68 – Nimzovitsch (sem o Nb) - Amador , Nuremberg. A marcha triunfal do peão e

O exemplo 5 mostra a energia que é capaz de desenvolver um peão livre. À primeira vista não se poderia acreditar em tal capacidade, mas já sabemos que eles sempre são capazes de ter desejo de expansão e por isso o exemplo que segue já não tem porque surpreender tanto. Foi jogado: 1.g4 Bxg4 2.exf6+ Kf7 O rei, devido à sua extrema sensibilidade, é um mau bloqueador. Os riscos de mate fazem ilusória a sua ação

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bloqueadora. 3.Bd5+ Para criar o mais rápido possível um raio de atividade para a torre de f1. 3...cxd5 4.Qxe8+ Kxe8 5.f7+ Kf8 Uma última tentativa de bloqueio. Mas agora o homem da retaguarda desperta e atua de maneira muito incômoda para o inimigo. 6.Bg7+ Kxg7 7.f8=Q++ De forma notável esse final mostra as conseqüências do desejo de expansão.

Diagrama 69 – Nimzovitsch - Nilson, Torneio Nórdico de mestres.

O diagrama 69 mostra um exemplo característico a respeito da elasticidade do bloqueador. É um final que tratei em meu livro O Bloqueio, devido ao que me limitarei ao mais notável. As brancas têm em seguida a oportunidade de se apoderarem da importante coluna f jogando 1.Kg3 seguido de Rf1. A conquista do ponto de interrupção (f6) só será possível com o avanço do peão h e a ajuda do rei, razão pela qual é indispensável a permanência do rei branco em sua ala. O lance de bloqueio 1.Ra5! que assegura a posição só foi possível jogar aproveitando a elasticidade do bloqueador, que permite voltar

rapidamente com ele mesmo em direção à ala do rei. A partida se desenrolou da seguinte forma: 1.Ra5! Kc6 2.Kg3 Kb7 3.Rf1 Kc6 4.Rf5 Re7 5.h4 Raa7 6.h5 Re6 7.Rf8 A invasão. Apesar de tudo, no entanto em a5 está a impávida e fiel sentinela, mas devido à sua elasticidade está prestes a intervir por meio de Ra2, Rf2 ou, no caso em que se afaste a torre preta, com Rxa6. A possibilidade de se realizar Rxa6 deve estar classificada como “ameaça desde a sua casa”. A partida seguiu: 7...g6 8.h6 g5 9.Rb8 Kc7 10.Rbxb5 Rxh6 11.Ra4 Rf6 12.Rba5 Kc8 13.Kg4 h6 14.Ra2 Raf7 15.Rxa6 e as brancas venceram após mais sete lances. Com o exemplo anterior entramos rapidamente nos bloqueadores e agora na seqüência me deterei um pouco nessa função mista. De imediato lhes mostrarei um bloqueador que leva a cabo suas numerosas obrigações de forma notável. Já sabemos que as funções a serem desempenhadas por um bloqueador são: a) bloquear; b) ameaçar; c) ser elástico. Recomendamos a ginástica matinal. Parem e admirem. Depois dessas palavras o crítico bem intencionado poderá tecer alguns comentários sobre elogio próprio. Mas não se deve duvidar que não admiro a condução da partida, mas a atividade do bloqueador, que abstraio de minha própria atividade. Para um crítico medíocre “abstrair” não significa nada. Seu mundo é regido pela inveja e dela sim é que é difícil se abstrair. 87

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Partida 14 Nimzovitsch - Behting Riga, 1919 Contra-Gambito Greco

1.e4 e5 2.Nf3 f5 Segundo a opinião de C. Behting, da qual compartilho, esse lance é completamente admissível. Pelo menos ignoro que tenha sido formalmente refutado. 3.Nxe5 Qf6 4.d4 d6 5.Nc4 fxe4

Diagrama 70 – Posição após

5...fxe4.

O lance de bloqueio Ne3 é verdadeiramente ativo?

A “teoria” (prática de outros mestres) recomenda seguir com 6.Nc3 Qg6 7.f3 (o princípio do desenvolvimento) 7...exf3 8.Qxf3 Nf6 9.Bd3 Qg4 10.Qe3+ Be7 11.0–0 Nc6 12.d5 Nb4 13.Rf4 Qd7 14.Nb6 axb6 15.Rxb4 e jogo equilibrado. 6.Ne3!! Contra esse lance há: 1º- A tradição, que exige 6.Nc3; 2º- O princípio econômico de desenvolvimento (impedir que as peças perambulem); e 3º- Que a ameaça do bloqueador é aparentemente pequena. Apesar dessas razões, 6.Ne3, complementado com o lance que segue, é 88

um lance magistral sob qualquer ponto de vista. Se a despeito da minha opinião todo mundo joga 6.Nc3, isso não me fará variar, pois seguirei acreditando que o meu lance de cavalo até e3 é o mais acertado por motivos do meu sistema. 6...c6 7.Bc4!! Uma sutileza. Para poder realizar o roque curto, o adversário deverá jogar d5, criando com isso um novo campo de ação para o cavalo em e3 (Bb3 e c4 concretizam a pressão contra d5). 7...d5 8.Bb3 Be6 Se 8...b5 9.a4 b4 10.c4. 9.c4 Qf7 10.Qe2 Nf6 11.0–0 Não Nc3 devido a ...Bb4. As brancas tratam de submeter o peão d5 à pressão máxima. Observemos agora a respeito do bloqueador: 1º- Bloqueia fortemente, impedindo ao mesmo tempo a aproximação de peças inimigas (casa g4); 2º- Ameaça desde a sua casa; 3º- É completamente elástico, como se demonstrará mais adiante. 11...Bb4! 12.Bd2 Bxd2 13.Nxd2 0–0 14.f4 Buscando jogar f5 para conquistar sua casa d5. 14...dxc4 15.Ndxc4 Qe7 16.f5 Bd5 As pretas tratam de manter a casa d5. 17.Nxd5 cxd5 18.Ne3 Rápida substituição. Ou seja, contra a elasticidade do bloqueador nem a morte pode fazer nada. 18...Qd7 19.Nxd5! Com esse sacrifício decisivo culmina a “ameaça desde a sua casa”. 19...Nxd5 20.Qxe4 Rd8 21.f6 Sutileza na combinação e outra ilustração sobre a vontade de expansão do peão (o peão em f5 era um candidato). 21...gxf6

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No caso de 21...Nc6 22.f7+ Kh8 23.Bxd5 Qxd5? 24.f8Q+ seguido de 25.Qxd5; ou se nessa variante 22...Kf8 23.Bxd5 Qxd5 24.Qxh7 e ganham. 22.Rf5 Kh8 23.Rxd5 Re8 Se 23...Qe8 24.Bc2. 24.Rxd7 Rxe4 25.Rd8+ Kg7 26.Rg8+ Kh6 27.Rf1 1-0 Para evitar uma fé exagerada nas “vontades de expansão do peão passado”, que teria uma influência prejudicial, terminaremos o capítulo com uma partida na qual veremos a contrapartida da anterior. Partida 15

Nimzovitsch - von Freymann

Vilna, 1912 Defesa Francesa

1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.Nf3 cxd4 Teria sido melhor 4...Qb6. 5.Nxd4 Nc6 6.Nxc6 bxc6 7.Bd3 Qc7 8.Bf4 g5 Não muito sólido, mas conduz a um jogo muito interessante. 9.Bg3 Bg7 10.Qe2 Ne7 11.0–0 h5 12.h3 Nf5 13.Bh2 Teria sido mau 13.Bxf5 devido a 13...exf5 14.e6 f4 15.exf7+ Kxf7 etc. 13...g4 14.Re1 Se 14.hxg4 hxg4 15.Qxg4, poderia seguir 15... 15...Rxh2 16.Kxh2 Bxe5+ 17.Kg1 Bxb2. 14...Kf8 15.Nc3! O cavalo trata de chegar a f4 (depois de uma troca prévia em f5). 15...Qe7 16.Bxf5 exf5 17.Qe3 Rh6 18.Ne2 c5 19.Nf4! Este cavalo deve ser considerado antes de tudo como o bloqueador do

peão preto f, sem descuidar de ser também um “anti-bloqueador” do peão branco e. 19...d4 20.Qd3 Qd7 21.Qc4 Qc6 22.hxg4! Introdução necessária a Nd3, pois se 22.Nd3 gxh3 23.Qxc5+ Qxc5 24.Nxc5 Rg6 25.g3 e as brancas ficam mal. 22...Ba6 23.Qd5!! Qxd5 Teria sido muito interessante 23...hxg4, pois teria como conseqüência o avanço triunfal do peão até e8: 24.e6 (com ataque direto à dama) 24...Qxd5 25.e7+ Ke8 26.Nxd5 com xeque em c7. (o surpreendente avanço do peão não restringido). 24.Nxd5 Bc4 No caso de 24...hxg4 25.e6! com ganho de qualidade. 25.Nf6 hxg4 26.Bf4 Rg6 27.Nd7+ Tomando-se na seqüência o peão c e após mais 20 lances vencendo-se a partida. Interessa-nos antes de mais nada analisar o papel desempenhado pelo cavalo em f4. Como bloqueador estava colocado em uma posição muito forte, atuando de forma paralisante sobre Bg7, Rh6 etc. Adicionalmente, sua ação ameaçadora era considerável sobre d5 e e6. A mobilidade do peão e6 é uma contrapartida picante da imobilidade do peão preto em f5. Finalmente, sua elasticidade era considerável, uma vez que o cavalo poderia empreender viagens tranqüilamente pois tinha como substituto o Bf4. Passemos a um esquema com o qual damos por encerrado o capítulo sobre o peão passado. 89

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Esquema sobre o Peão Passado

Jogo de perguntas e respostas 1 – Como surge um peão passado? R. Devido à maioria. A regra do candidato. 2. Porque é necessário bloquear um peão passado? R. 1º- Porque, se não, ameaça avançar. Suicídio como jogo de ameaça. A parábola do criminoso (é insuficiente somente uma vigilância policial). 2ºPorque a casa de bloqueio está segura contra ataques frontais e adicionalmente tende a se constituir em um ponto fraco do adversário. 3º- Porque é possível paralisar todo um complexo inimigo. 3. Quais são os requisitos que um bloqueador deve cumprir? R. 1º - Boa ação de bloqueio. 2º Ameaça dede a sua casa. 3º - Elasticidade. 4. Como se pode acrescentar à ação de bloqueio a de elasticidade? R. Mantendo contato com a retaguarda. (Convém a sobredefesa). A elasticidade aumenta de forma automática ao aumentar a ação de bloqueio, mas há de se cuidar que o peão a bloquear não avance em demasia. 5. Onde está o mistério do bloqueio? R. No fato de que todas as casas de bloqueio são geralmente casas boas sob qualquer ponto de vista. (Explicável pela tendência citada de transformar-se em pontos débeis inimigos). 6. Como se manifesta o jogo contra o 90

bloqueador? R. 1º - Tratando de expulsá-lo. 2º Procedendo a “Changez des Bloqueurs”. 7. Porque o conceito de “oposição” é antiquado? R. Porque classifica as situações de acordo com sintomas externos. 8. Quais são os “peões privilegiados” e como se deve tratá-los? R. 1º - Os peões ligados. O avanço dos camaradas. O “arranca-dentes”. 2º - O peão passado defendido. 3º - O “peão passado mais distante”. 9. Qual é a alma e a essência do peão passado? R. 1º - Aproximar-se da meta final para sua transformação ou defender casas. 2º - Para abrir caminho para o rei que vem avançando. 3º - Para terminar sua existência como isca. A distância entre o rei inimigo e a isca deve ser a maior possível.

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Capítulo V - A Troca

Um capítulo breve, cujo propósito é esclarecer os possíveis motivos da troca

Geralmente, se a troca é praticada em excesso, deve-se admitir esse fato como mau. Para o mestre, as trocas surgem por si mesmas. É preciso ocupar colunas, assegurar alguns pontos estratégicos importantes e a realização da troca que parecia desejável cai como uma fruta madura (veja na partida 11 a observação ao lance 35). No capítulo I já analisamos a troca com o conseqüente ganho de tempo. Mas adicionalmente se efetua a troca quando nos vemos obrigados a realizar uma retirada ou a realizar um lance de defesa que nos levaria muito tempo (liqüidação e desenvolvimento posterior). Os últimos casos devem ser considerados como combinações de tempo, porque em toda troca o cálculo do tempo é um fator importante. Sem ir muito longe, pensemos na troca de uma peça recémdesenvolvida por um devorador de tempos. No meio-jogo o tempo se manifesta, na manobra de troca, nas oportunidades que esboçaremos em seguida: 1. Quando efetuamos a troca para ocupar uma coluna sem perda de tempo (para abrir a mesma).

Um exemplo muito simples é o seguinte: brancas – Re1, Be4; pretas – Kg8, Nc6, Bb3, Pf7, Pg7, Ph7. As brancas tratam de ocupar ou abrir uma

coluna para dar mate na oitava fileira. Mas 1.Bf3 ou Ra1 como lance prévio não serviria, pois as pretas teriam tempo de responder com Kf8 ou g6. Aqui o acertado seria 1.Bxc6, dado que as pretas não têm tempo para proteger-se contra o mate, pois devem “tomar” (ponto de vista psicológico). 2. Quando eliminamos um defensor com a troca.

A forma mais simples de reconhecer os defensores é por seu valor material, pois toda peça de defesa tem o seu valor material. Nos primeiros quatro capítulos conhecemos várias categorias de defensores: peças que defendiam um peão incômodo no caminho em direção a uma coluna aberta, peças que colaboram com o bloqueador e peões que contribuíam com um trabalho de posto avançado etc. Em todos esses casos convêm eliminar essas peças, sem esquecer que o conceito de “defender” é muito mais amplo, pois também é possível defender terreno (por exemplo, o acesso à sétima fileira). Na posição: brancas – Pe3, Pf3, Pg3, Ph3, Nd4; pretas – Pd5, Pf7, Pg7, Ph7, Be7, o bloqueador Nd4 deve ser considerado como “defensor” no nosso sentido. A regra prática de acordo com o nosso pensamento seria: sobre todo defensor de raio de ação mais ou menos amplo deve cair a sanção de sua destruição. 91

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então surge um caso especial, que trato em seguida. 3.a) “Vamos vender caro a nossa vida”

Diagrama 71 – Série de trocas Apresentam-se combinados o primeiro e o segundo casos

No diagrama 71 as brancas vencem através de uma série de trocas regidas por fundamentos diferentes. Observando a posição, vemos o cavalo extraviado (Nh2) apoiado em longínqua esperança (Bb8). Jogamos 1.exd5 (troca que abre a coluna sem perda de tempo) 1...cxd5 2.Re8+ (a torre em c8 defendia a oitava fileira e portanto deve desaparecer) 2...Rxe8 3.Rxe8+ Kh7 4.Rxb8 (com isso caiu o defensor principal) 4...Rxb8 5.Kxh2 e vencem. 3. Quando se troca para não se perder tempo em uma retirada.

Em geral, trata-se de uma peça atacada e frente ao dilema de nos retirar com perda de tempo ou trocá-la pela peça atacante optamos por esse último sempre que o tempo poupado resulte proveitoso, ou seja, adotamos uma resolução como uma questão de tempo. Um exemplo muito simples seria: brancas – Kb1, Rb3, Nd2, Pf3; pretas – Kg8, Bf6, Nb6, Pa7, Pa5. Segue 1.Ne4 a4 (um contra-ataque) 2.Rxb6 (para poupar tempo) 2...axb6 3.Nxf6+ e vencem. Quando peças valiosas de ambos os lados são atacadas, 92

Na posição: brancas – Kh2, Qb2, e5, a2, h3; pretas – Kb8, Nb7, Qd6, a4, nosso adversário jogou 1...a3. As brancas estão de acordo em que devem trocar as damas, mas, como sua dama está condenada à morte, é lógico compreender que trate de vender caro a sua vida, da mesma forma que o soldado encurralado e disposto a morrer gasta até o último cartucho, pois quer matar tanto mais inimigos quanto lhe seja possível. Então se joga 2.Qxb7 para em algo compensar o falecimento da dama, que em outra época foi jovem e bonita... 4. Quando e onde se deve efetuar a troca?

a) Quem tenha mais material é quem deve desejar as simplificações. Do que deduzimos que a troca pode ser utilizada como arma para expulsar o inimigo de posições fortes. b) Quando duas potências perseguem a mesma finalidade estoura um conflito. No xadrez, toma a forma de batalha de troca. Por exemplo: brancas – Pf3, Pg2, Ph2, Ne4, Bc2 Re1; pretas – Pe5, Pg7, Ph7, Nf6, Bg6, Rf8. A chave está em e4. As brancas defendem essa casa dentro do possível. As pretas tratam de limpá-la, pois lhes incomoda uma peça branca em e4 (pelo seu raio de ação). A conseqüência é o início da luta pela casa e4.

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c) Quando se é forte sobre uma coluna, um simples avanço na mesma pode conseguir a troca, devido ao que o inimigo não pode tolerar a invasão. d) As casas ou os peões fracos tendem a desaparecer por troca mútua (troca de prisioneiros aleijados). Sobre isso daremos o seguinte final como exemplo:

Diagrama 73 – Rosselli-Rubinstein Baden-Baden, 1925

Diagrama 72 – Bernshtein-Perlis San Petersburgo, 1900

No diagrama 72 foi jogado: 31...Ra8 32.Rb3 Rxa2 33.Rxb4 Os peões fracos a2 e b4 são trocados entre si e desaparecem do tabuleiro – o mesmo ocorrerá com os peões d5 e b7. 33...Ra5 34.Rxb7 Rxd5 35.Rb8+ O simples aproveitamento da coluna b traz consigo a troca desejada. 35...Qxb8 36.Qxd5+ Kh8 Porém o Dr. Lasker disse que era preferível manobrar o rei em direção a f6 e efetivamente está certo. Bernshtein jogou na seqüência 37.b3 e venceu com esse peão um final conduzido brilhantemente, o qual veremos depois. Terminaremos o capítulo apresentando dois finais:

Rosselli – Rubinstein. No diagrama 73 temos a posição após o lance 21 das brancas. 21...Rxe3 Se não tivessem jogado isso, as brancas teriam feito Rxe8. 22.Bxe3 Ne8 23.Re2 Ng7 24.Bd2 Nf5! 25.Re1 c5 26.dxc5 Bxc5 Agora a casa d4 das brancas se transformou em um foco ao redor do qual se fere uma batalha sangrenta. 27.Kf1 h4 28.gxh4 g4 29.Nd4 Bxd4 30.cxd4 Prestem atenção ao comentário anterior. 30...Rxh4 31.Bc3 Rh1+ 32.Ke2 Rh2 33.Rg1 Nh4 34.g3 Nf5 35.b3 Ke6 36.Bb2 a6 37.Bc3 Nd6 38.Ke3 Ne4 39.Be1 Seguiram diversas tentativas em vão na coluna c por parte de Rubinstein, chegando-se depois do lance 55 à seguinte posição: brancas – Kd3, Rf1, Ba5, a4, b3, d4, f2, g3; pretas – Kg6, Re7, Ne4, a6, b5, d5, f5, g4. Seguiu: 55...f4 56.gxf4 Rh7 57.Bd2 Nxd2! Desaparecem o defensor de f4 e o 93

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atacante de f2. 58.Kxd2 Rh3 59.f3 gxf3 60.Rf2 Kf5 61.Ke3 Kg4 62.b4 A 62.f5 seguiria 62...Kxf5 63.Rxf3+ Rxf3+ 64.Kxf3 bxa4 65.bxa4 a5 continuando o rodeio ao rei branco. 62...Rh1 63.f5 Re1+ 64.Kd3 Re4 0-1 Depois desse final clássico seguiremos com uma partida de café na qual o motivo da troca surgiu de forma original (veja o diagrama 74).

Diagrama 74 – Nimzovitsch-Druwa, Riga 1918

Nessa partida, as brancas haviam dado a “pequena” vantagem da dama pelo cavalo e se arriscaram a fazer o rompimento: 1.d5 Ao que seguiu: 1...exd5 Teria sido melhor ...Nxd5. 2.e6 fxe6 O correto era rocar curto. 3.Ne5 O cavalo em e5 é “o homem da retaguarda que desperta”. 3...Nxc4 4.Bh5+ Ke7 5.Nxc6+ Uma surpresa. A quem ocorre efetuar a troca em plena perseguição do inimigo? 5...bxc6 6.Rf7+ Kd6 7.Nxc4+ dxc4 8.Rd1+ 94

Vemos agora claramente que o bispo preto de c6, pela sua possibilidade de jogar em d5, era um defensor. 8…Ke5 9.Bf4+ Ke4 10.Bf3++!

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Capítulo VI - Elementos de Estratégia nos Finais

Introdução e generalidades. A desproporção típica.

É um fenômeno comum que o amador conduza com bastante habilidade o meio-jogo e que fracasse lamentavelmente no final. Essa discordância que registramos não deixa muito bem a pedagogia antiga do xadrez, pois a condução igual do jogo é um dos requisitos essenciais do bom xadrez. Esse mal (pois não é outra coisa) se deve a que a natureza dos fatos faz com que o estudante adquira inicialmente conhecimentos da abertura e do meiojogo. Temos que ensinar ao aprendiz que os pratos do final não são os pobres restos do banquete servido no meio-jogo. O final é também uma parte da partida na qual se cristalizam as vantagens sistematicamente cimentadas no meiojogo, mas há de se advertir que se estas vantagens são de natureza material sua obtenção não constituiu uma “ocupação secundária”. Muito pelo contrário, a obtenção de vantagens exige a atuação de um verdadeiro artista. Para chegar a avaliar um final e saber o que haverá de se passar nele, é necessário estudá-lo com base em seus elementos. Já tratamos o peão passado, que é um desses elementos e nos restam: 1º- A centralização, com a divisão sobre a centralização do rei (condução do rei, o refúgio e a construção da ponte). 2º- A posição agressiva da torre e a peça ativa em geral. 3º- Reagrupamento de forças isoladas.

4º- O avanço geral - “Todos à frente!”, e 5º- A “materialização das colunas” (no sentido em que o conceito abstrato de coluna se faz algo material ao ser defendida por um peão – ou outra forma completa). Se prescindirmos por completo de Rinck ou de Troitzky teremos que reconhecer que o final em si é muito interessante. [O russo Alexey Alexeyevich Troitzky (1866-1942) e o francês radicado na Espanha Henri Rinck (1870-1952) são dois dos principais compositores de problemas de xadrez com finais artísticos. A.A.Troitzky morreu de inanição durante o cerco de Leningrado na Segunda Guerra Mundial, quando boa parte das suas anotações foi destruída. A obra de H. Rinck foi publicada de forma a sempre incorporar os volumes anteriores e portanto suas composições podem ser conhecidas por completo em seu último livro “1414 Fins de partie”, publicado em 1952. - N. do T.]. 1º - A centralização: a) do rei; b) de peças menores; c) da dama. A marcha até o castelo. Como o rei escapa do temporal. O refúgio e a construção do telheiro. a) Centralização do rei

A grande mobilidade do rei se constitui, como sabemos, uma das principais características a considerar na estratégia dos finais. No meio-jogo o rei se mantém quieto, porém no final, por sua vez, é um dos principais atores, razão pela qual é necessário aproximá-lo das linhas de fogo. Esse processo se cumpre pela centralização do rei e se traduz na seguinte regra prática: quando começar o 95

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final, avance o rei até o centro, pois dali poderá se dirigir de um lugar para outro que lhe convenha. Dessa forma surge o seguinte quadro: o rei avança lentamente até o centro, onde ele se reúne com todos seus ministros e assessores, se fortalece com um suculento desjejum, consulta seus ministros, se alimenta de novo (o rei, diferentemente dos outros mortais, toma o café da manhã duas vezes), efetua uma última consulta com seus assessores e então escolhe o campo que lhe parece apropriado para a batalha. Essa imagem tende a mostrar-nos a lentidão característica do rei para tomar uma decisão e em seguida realizá-la. Exemplo 1: brancas – Kg1; pretas – Re8 (para citar somente os atores principais). 1.Kf2, avanço em direção ao centro com defesa simultânea da base (casas e1 e e2), impedindo a entrada da torre (Re2 ou Re1). Exemplo 2: brancas – Kg1, Rd2, Pb2, Pf4, Pg3 Ph2; pretas – Kg8, Rb3, Pb7, Pg7, Ph7. Aqui da mesma forma o rei joga a f2 e e2 para dirigir-se logo para a ala da dama via d1-c2, onde protege o peão b e deixa em liberdade a torre que poderá jogar, por exemplo, a d7.

A centralização imediata do rei fracassaria por ...Bd5, por exemplo: 33.Kf1 Bc4+ seguido de 34.Ke1 Bd5, forçando a troca ou a perda de peões. 33...Bc4 34.f4 Ke7 35.Kf2 Kd6 36.Ke3 Kc5 As brancas perderam a oportunidade de ocupar a casa d4. 37.g4 Kb4 Aqui está o pulo do gato. A posição central c5 é considerada uma escala para o ataque na ala da dama e na ocupação destas casas se baseia a importância da centralização. 38.Kd4 Muito tarde. Veja a observação final. 38...Bb3 39.g5 a4 40.Nb1 Be6 41.g3 Kb3 42.Nc3 a3 43.Kd3 g6 44.Kd4 Kc2! 0–1 Nesse exemplo vimos o avanço central sob outro ponto de vista: o avanço não somente abre caminho para o rei, mas também se realiza às custas do rei inimigo. Nessas lutas e outras semelhantes o rei, apesar de sua majestade externa, mostra ser mesquinho internamente, dada a forma como defende como se tratasse de todo o seu reino uma simples casa. O estudante recordará então que deve por todos os meios possíveis fazer avançar seu rei ao centro, tanto para a vantagem do mesmo, como para reduzir o rei inimigo e tirarlhe até o último lugarzinho ao sol. b) Centralização das peças menores

Diagrama 75 – Rubinstein-Nimzovitsch, Carlsbad 1907. O rei no centro

Exemplo 3: Na posição do diagrama 75 foi jogado: 33.Nc3 96

A centralização não deve ser considerada uma exclusividade real, pois as demais peças também aspiram uma tendência semelhante. Posição: brancas – Ke1, Nb3, Pa5, Pe2, Pf2, Pg3, Ph2; pretas – Kf8, Bg6, Pa6, Pd6, Pf7, Pg7, Ph7. Aqui tanto pode se jogar o rei a d4 passando por d2 e c3, como Nd4 seguido de e3 e, analogamente ao caso anterior, a centralização do cavalo mostra-nos duas tendências:

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1º- desde d4 ele olha de relance para ambas as alas; 2º- reduz o espaço do inimigo (o rei não pode viajar a d5 via e6). Se existisse uma torre inimiga, o cavalo constituiria uma muralha para o próprio rei, que às costas do cavalo se centraliza. O Dr. Tartakower, autor genial de A Partida Hipermoderna de Xadrez, consideraria esse conjunto como uma ilha de peças. Um exemplo claro temos na seguinte posição: brancas – Ke2, Nc2, Pe3, Pf2, Pg2, Ph3; pretas: Kf8, Rd8, Pf7, Pg7, Ph7, onde o lance 1.Nd4 seguido de Kd3 formaria uma ilha central de peças. c) Centralização da Dama

Temos a demonstração mais palpável da importância da centralização no fato de que o ideal seria ter uma dama central defendida por um peão que proteja por sua vez a vários peões. Se o rei também se encontra abaixo desse protetorado, poderá efetuar viagens prolongadas dentro do território inimigo. Aqui o rei branco deixa que os ventos soprem em seus ouvidos e avança alegre e contente pelo mundo, parecendo um herói lendário, para finalmente chegar a um belo castelo onde o espera a princesinha de grande beleza...

Diagrama 76 – Posição centralizada da dama defendida, protegendo a excursão do rei ao campo inimigo. O objetivo da viagem é g6 ou b6 (ataque frontal)

Isso acontece para o nosso rei na posição do diagrama 76, com a diferença de que dispõe de dois castelos na direção dos quais pode ir (as posições ideais g6 ou b6) e por isso depois de andar vacilante por um tempo chega finalmente a uma dessas casas, onde poderá estar seguro. O refúgio e a construção do telheiro.

Com o dito, fizemos do nosso rei que gosta de passeios um alegre e otimista viajante de conto de fadas. Mas temos que reconhecer que entre a realidade e os contos às vezes há diferenças muito materiais. Nos contos com freqüência há tormentas que surpreendem o viajante e por incrível que pareça este nunca sofre o menor resfriado (ainda que muitas vezes apareça a mal humorada bruxa malvada). Mas na crua realidade, o resfriado é a conseqüência das condições meteorológicas. O rei viajante, como ser material, deverá, portanto, para se preservar dos perigos de um resfriado, ter à disposição um refúgio no qual possa se abrigar no caso de uma tormenta.

Diagrama 77 – O refúgio

Na posição do diagrama 77 seria errado jogar 1.a7 devido a 1...Ra2 e 97

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depois de 2.Kb6 (para poder tirar a torre da casa de promoção) o rei branco fica exposto à tormenta sem dispor de nenhum refúgio (uma série de xeques da torre preta). O correto é reservar a7 como refúgio para o rei, ou seja, 1.Kb6 Rb1+ 2.Ka7 Rb2 3.Rb8 Ra2 4.Rb6 Ra1 5.Kb7 (brilha o sol e o rei se anima a sair do refúgio) 5...Ra2 6.a7 e vencem. Na posição: brancas – Ke5, Rg1, Pd5; pretas – Kd8, Ra2 sucede algo semelhante. O refúgio nesse caso é a casa d6 e então não se deve jogar 1.d6 mas sim 1.Ke6 porque no caso de 1...Re2+ o rei se refugia com 2.Kd6 e as pretas não só não podem dar mais xeques como seu rei está ameaçado de ser deslocado da casa de promoção.

Diagrama 78 – O telheiro

Os homens, logo que a casualidade os coloca frente a algo útil, se esmeram em conhecer o achado a fundo para dele tirar o máximo proveito. Isso também é aplicável ao xadrez, pelo que resulta que a técnica de finais exige o refúgio e então quem não o tenha começará, como o escoteiro, a construir o telheiro (veja o diagrama 78). Se nessa posição for jogado 1.Kf7 o rei sofrerá uma série de xeques e se verá obrigado a regressar sem 98

levar a cabo os seus propósitos. A chave, um pouco oculta é: 1.Re4! Pois segue 1...Rh2 E então o rei se atreve a sair. 2.Kf7 Rf2+ 3.Kg6 Rg2+ 4.Kf6 Rf2+ 5.Kg5 Rg2+ 6.Rg4. O telheiro foi levantado e g5 se transformou em excelente refúgio. Depois de 4.Kf6 as pretas poderiam manter a expectativa, por exemplo: 4...Rg1, mas então seguiria uma manobra que reconforta pela sua beleza. Transportamos o telheiro de um lugar a outro. Com 5.Re5! podemos levá-lo a g5 e montamos o refúgio em g6. Esse jogo maravilhoso pertence às manobras mais comuns no xadrez, constituindo por si só uma nova demonstração da beleza do jogo-ciência. Seria interessante investigar se não é possível jogar diretamente 1.Re5. Efetivamente é possível, porquanto também se vence: 1.Re5 Kd6 2.Kf7 Rf1+ 3.Ke8 (não 3.Kg6 por 3...Kxe5 4.g8=Q Rg1+ etc.) 3...Rg1 4.Re7 Rb1 5.Rd7+ e ganham. Se 4...Rg2 5.Kf8 Rg1 6.Rf7 ganhando. A construção do telheiro e a construção do refúgio para o rei viajante é a parte mais típica da estratégia de finais e está intimamente relacionada com a manobra a tratar no parágrafo 3. Por outro lado, em nossa partida 11 também se construiu uma cruz através de Nf5, que permitiu um refúgio para o rei em f3 (veja o diagrama 43). 2º- A posição agressiva da torre como vantagem característica nos finais. Exemplos e fundamentos. A torre ativa em geral. A fórmula de Tarrasch.

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Se ao se referir a uma posição no meio-jogo alguém dissesse “a posição é bastante equilibrada, mas as brancas, devido à colocação agressiva da torre, possuem uma vantagem decisiva” o comentário provocaria um duvidoso meneio de cabeça, porque realmente essa vantagem no meio-jogo dificilmente pode resolver a partida. Caso, porém, se tivesse essa vantagem no final, tudo muda de figura, porque então a vantagem citada adquire grande importância (veja o diagrama 79).

Diagrama 79 – A torre branca tem colocação agressiva; a preta passiva.

Na posição: brancas – a4, Rb5; pretas – a5, Ra7, a torre branca, quando, no entanto, existem dois peões para ambos os lados na ala do rei, pode servir como base para o avanço nessa ala. Isso se acentua ainda mais no caso da seguinte configuração de peões: brancas – a5; pretas – a6 (veja o diagrama 79A). As brancas estão em condições de habilitar o seu peão g para o ataque depois de 1.h4, seguido por um oportuno h5 e hxg6. Vemos que enquanto a torre branca é a alma da operação, a torre preta mostra uma elasticidade insuficiente, o que não lhe permite opor resistência à sua inimiga atacante na ala do rei.

Diagrama 79A

Resumindo, podemos dizer: a debilidade da torre defensora reside no fato de não dispor de elasticidade suficiente para atuar na outra ala. Ainda mais, essa falta de elasticidade permite ao rei branco adquirir maior liberdade para manobrar – pois no geral sente muito temor pelas torres – ou como diz o ditado “quando o gato sai de casa os ratos dançam na mesa”. No diagrama 79A não é desprezível a ameaça de se levar o rei (naturalmente andando devagar) de f4 a b6. Um dos fenômenos mais comuns na luta entre mestres é que um dos adversários realize manobras prolongadas fazendo todo o possível para conseguir, como único fruto do trabalho, deixar a sua torre em posição agressiva e, melhor ainda, colocar a torre do adversário em terreno passivo. Então a torre ativa, com pose de “prima-donna”, olhará a sua rival desempenhando um papel secundário. Podemos facilmente entender que a rival menosprezada se faça de doente 99

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tentando assim que se suspenda o espetáculo. Isso acontece na posição: brancas – Kg1, Rc5, Pa4, Pg2, Ph2; pretas – Kg8, Rb7, Pa5, Pg7, Ph7. As pretas, a quem cabe jogar, agradecem, mas não aceitam o papel passivo que pela partilha coube à sua torre (1...Ra7) e jogam 1...Rb2. Segue 2.Rxa5 Ra2 . A torre preta adquiriu agora grande elasticidade e com ela pode assegurar o empate. Se tivesse sido jogado 1...Ra7 as brancas teriam possibilidades de vencer. Depois de uma luta árdua comigo mesmo e perfeitamente me dando conta da responsabilidade que adquiro, cheguei à conclusão de que poderei dar a seguinte regra prática: frente ao dilema de defender um peão de torre atacado por outra torre, dentre as opções de se condenar a um papel agradável mas passivo ou sacrificar tranqüilamente o peão mantendo ativa a torre, temos que optar pela segunda alternativa. Naturalmente que a regra prática dada deve ser aplicada com reservas. Os diferentes graus de atividade em cada caso devem ser submetidos a um exame com lupa, pois não se trata de forma alguma de se fazer um sacrifício pagão. Tudo bem quanto ao sacrifício, mas deve ser feito com plena consciência. Quando se pode chamar-se ativa uma torre levando em consideração um peão passado amigo ou inimigo? Essa pergunta interessante que surge já foi respondida por Tarrasch, que disse: “A torre deve estar colocada atrás do peão passado, seja amigo ou inimigo”. (Veja o diagrama 80): 100

Diagrama 80 – As brancas podem realizar lances agressivos com a sua torre

As brancas jogam 1.Ra3, que corresponde à colocação assinalada. A torre exerce uma ação enorme desde a3, pois injeta no peão passado algo de sua própria vida. Se fosse a vez das pretas jogarem, com 1...Rd2+ 2.Kf3 Ra2 a posição das pretas é agressiva a respeito do peão g, que oportunamente poderá ser tomado. A diferença de valor entre peça atacante e peça defensora, mostrada para a torre, também existe para as peças menores. A debilidade do cavalo ressalta por sua unilateralidade (com qualquer lance que faça perde seu caráter de defensor) e devido a essa condição é uma vítima fácil para o “zugzwang”. Na posição: brancas – Ke5, Nc4, Pa4, Pb5, Pg5; pretas – Ke7, Nc8, Pa5, Pb6, Pg6, se jogam as pretas, essas sucumbem pelo “zugzwang”; mas, se jogam as brancas (aqui está a sutileza), essas somente na aparência sofreriam os efeitos da citada doença, pois o cavalo branco devido à sua agilidade poderá desenvolver múltiplas ameaças. As brancas jogam 1.Ne3 e o “zugzwang” é transferido para as pretas, ou também 1.Kd5, com a

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ameaça de Ne5 etc. Também ganhariam as brancas se deslocássemos toda a posição uma fileira para trás (ou seja, em direção ao seu próprio campo). O bispo defensor resulta fraco com respeito ao seu colega agressivo pela circunstância de que não pode alcançar a velocidade com que troca de frente esse último. Observem a condução gananciosa e agradável do diagrama 81.

Diagrama 81

O bispo das pretas é o que trabalha como defensor e o branco ameaça chegar a b8 passando por h4, f2 e a7; mas essa ameaça aparentemente pode ser contornada tranqüilamente levando em tempo oportuno o rei a a6. Joga-se 1.Bh4 Kb5 2.Bf2 Ka6 (se agora o bispo voltar para h4 para ameaçar c7, terá que passar por d8 e então o rei preto terá tempo para regressar a c6) 3.Bc5! (para instigar o adversário a jogar mantendo-se na diagonal para impedir ...Bd6) 3...Bg3 (agora o bispo branco volta em direção a e7) 4.Be7 Kb6 5.Bd8+ Kc6 6.Bh4! (as pretas já não têm tempo de realizar o lance salvador ...Ka6 passando por b5) 6...Bh2 7.Bf2 Bf4 8.Ba7 Bh2 9.Bb8 Bg1 10.Bf4 Ba7 11.Be3 e ganham.

3º - O reagrupamento das peças desconectadas e o avanço geral “Todos à frente!”

As manobras do título estão intimamente ligadas e como geralmente acontece se passar sem perceber de uma para a outra, nesse parágrafo as trataremos em conjunto. Não será muito difícil colocar em contato forças isoladas, para isso basta saber o que significa uma peça com relação a outra. Alguns desses significados nós já sabemos. Por exemplo, o cavalo tem condições especiais para facilitar refúgios ao rei pela sua arte mágica para fazer o telheiro e que como simples cavaleiro (outra denominação do cavalo) pode aceitar a hospedagem de um camponês (ser defendido por um peão) e se é mistér desembainhar sua espada quando se tornar necessário para defender sua parentela de peões ou para bater energicamente nos peões inimigos. Sabemos também que o rei é capaz de cimentar cuidadosamente os próprios peões que avançam e não podemos esquecer que uma dama colocada de forma central pode cobiçar peões muito distantes entre si sob o mesmo chapéu (por se tratar de um chapéu da dama deve-se tratar de um da última moda) – veja o diagrama 76. Outra coisa mais: o avanço deve ser realizado pelo conjunto. A circunstância de que um peão de repente fique nervoso e se adiante aos seus camaradas e protetores, como pode acontecer (veja o diagrama 60), constitui uma das exceções à regra. Essa se expressa da seguinte forma: o peão que avança deve manter contato com o resto da tropa. O local deixado livre pelo avanço do peão deve 101

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ser ocupado o quanto antes por um “cimentador”. Em algumas oportunidades uma torre inimiga trata de alterar o jogo de conjunto dando xeque. Nesse caso é necessário tomá-la ou atacá-la (veja PostAlekhine). O jogo em massa constitui 80 por cento da técnica dos finais. Todas as particularidades que temos tratado aqui, a saber, centralização, refúgio, construção do telheiro e cimentação, estão subordinadas ao jogo de conjunto. Então, como para que um relógio funcione bem é necessário que assim o façam todas as engrenagens, aqui também tudo irá bem se for um avanço no qual intervenham todos os membros do exército. Todos à frente! O estudante deverá se dar conta de forma clara que a centralização não somente se realiza no centro, mas poderá também se realizar em qualquer uma das alas. Bastará que as peças se agrupem a um peão que esse se fará centro e teremos a mais formosa harmonia central. 4º - A materialização do conceito abstrato de “coluna” ou “fileira”. A diferença principal entre as operações lineares realizadas no meio-jogo ou no final.

A respeito desse tema creio ser conveniente antes de tudo fazer notar a estranha e algo oculta diferença que existe entre o meio-jogo e o final. No meio-jogo, o aproveitamento de uma coluna exige grande energia e, portanto, deve ser essencialmente ativo. Para se convencer basta pensar no aparato complicado que é o cavalo quando atua como sentinela em um posto avançado. Nos finais, por outro lado, tanto as 102

operações nas fileiras como nas colunas são simples e fáceis de se ver (em nenhum lugar se vê o cavalo como sentinela) e o feliz possuidor desse animal terá muito tempo. De forma definitiva, podemos dizer que as operações lineares no meio-jogo são ativas e no final são tristes. Esclareceremos isso com alguns exemplos.

Diagrama 82 – Nimzovitsch-Jacobsen, 1929 – “Materialização” da quinta fileira

Na posição do diagrama 82, as brancas, de posse da 5ª fileira e com uma série de lances que têm o selo de primitivos, sabem como “materializar” essa fileira de aparências abstratas, ou seja, condensá-la em algo real. Foi jogado: 42.Rc6+ Kd7 43.hxg6 hxg6 44.Nxe6 fxe6 45.Rc5, seguido de 46.Rg5 e 47.f4. A casa g5 resultou decisiva ainda mais devido à torre preta de g7 (passiva), que termina vítima de sua passividade. Outro exemplo é mostrado em meu final contra Alan Nilson (veja diagrama 69). Mas ali na realidade não aconteceu nada, talvez o peão branco h mostrasse vontade de avançar. No entanto isso passou batido e a torre conseguiu entrar

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na 8ª fileira. Na posição: brancas – Kg5, Rc1, Pa2, Pb2, Pd4, Pf4; pretas – Kg7, Rd7, Pa7, Pb7, Pf5 e Pg6, o desenvolvimento é típico. As brancas passeiam com toda tranqüilidade: b4, a4, b5, a5, b6 e finalmente Rc7. Se a ameaça desse desenvolvimento for contestada por b6, então seria possível jogar Rc6 (veja o diagrama 79A) e a sexta fileira teria se realizado como um ponto material (g6).

Ganhando um peão. 34...Qh8 35.Qxh5 Qxh5 36.Rxh5 Rf3 37.Kg2 Rxb3 38.Rf5 E as pretas abandonaram, pois o peão h é inatacável porque se 38...Rb2+ então 39.Rf2 etc. De acordo com esse exemplo, poderíamos formular a seguinte regra prática: se no final se possui de forma permanente uma coluna, não há porque buscar em outros pontos possíveis rompimentos, porquanto o rompimento na coluna surgirá sozinho, quase que de forma automática. Concluiremos o parágrafo com alguns finais e um pequeno esquema.

Diagrama 83 – Capablanca- Martínez, Buenos Aires 1914

No diagrama 83 vemos que as brancas possuem a coluna f e observamos que as pretas defendem as suas duas primeiras fileiras. Capablanca venceu quase de forma automática pelo grande peso da coluna que possuía. Seguiu: 27.Ref1 Rhe8 28.e4 Qb5 29.Ra1 As brancas dispõem de tempo e no momento certo o peso da coluna f dará seus frutos. 29...Qd7 Retirada frente à ameaça de c4 ...Qb6+ c5 Qb5 e Ra5 com uma graciosa captura da dama. 30.c4 Rf7 31.Rxf7 Qxf7 32.Rf1 Qg7 33.Rf5 Rf8 34.Qg5

Diagrama 84 – Nimzovitsch-Spielmann, San Sebastian 1912

Exemplo 1 – Veja o diagrama 84. Depois de: 20.Bf5 Nxd4 21.Bxc8 Rxc8 22.cxd4 0–0 23.dxe5 fxe5 24.Qxd5+ Qf7 25.Qxf7+ Rxf7 26.Bxe5 As brancas têm uma superioridade numérica temporária de peões e um bispo central doente. 26...Rf5 27.f4 Rxh5 28.Rab1 Be7 Spielmann se defende com sua habitual tenacidade. 29.Kf2 Começa a centralização. 103

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29...b6 30.Kf3 Rh6 31.Rfd1 Rc4 32.Rd7 Kf7 33.a5 b5 34.Re1 Rcc6 35.Bd4 Rhe6 36.Rh1 h6 37.Rb7 Red6 38.Be5 Re6 39.Ke4 Observe-se a casa b6 que trata de se materializar. Depois das manobras anteriores da torre branca, a passividade manifesta das pretas é um forte atrativo para o avanço do rei: Be5, Ke4 e f4 formam uma ilha central de peças, o bispo levanta o telheiro e o refúgio é a casa e4. 39...Rc4+ 40.Kf5 Rc5 41.Rd1 b4 Já não há salvação possível. 42.Rd8 Rxa5 43.Rf8+ Kxf8 44.Kxe6 1–0

Diagrama 85 – Thomas-Nimzovitsch, Marienbad 1925

Exemplo 2 – Veja o diagrama 85. Outro caso de centralização. As pretas, que estão em uma situação bastante má, jogam: 20...Kf7 Ao qual seguiu: 21.Re1? Teria sido correto 21.g4. 21...Ke7 22.Bc3 Nd5 Depois de mais uns lances as pretas passaram pelo pior. 23.Rxf8 Kxf8 24.Be5 b5 25.Bb3 Nf6 26.Kf1 Ke7 Agora Sir G. Thomas não pôde resistir 104

à sedução de conquistar um novo peão. 27.Bxf6+ gxf6 28.Rxe4 e5 29.Rh4 E com isso as pretas conseguem a superioridade e vencem com um ataque vigoroso de estilo centralizado. 29...Bf5 30.Ke2 Bg6 31.Bd5 Rb8 32.c3 f5 33.Bb3 Kf6 Preste atenção no avanço conjunto da massa central das pretas. 34.Bc2 a5 A maioria no fundo é uma minoria; em outras palavras, uma maioria abandonada pelos seus protetores, a torre e o rei. 35.Rh3 e4 36.Rh4 b4 37.axb4 axb4 38.Rf4 Ke5 Cimentação! 39.Rf1 b3 40.Bd1 f4 41.Ke1 Bf7 42.g3 f3 As brancas estão desestimuladas, pelo que segue um sacrifício. 43.Bxf3 exf3 44.Rxf3 E as pretas venceram depois de uma luta árdua, impondo sua superioridade material: 44...Bg6 45.Rf4 Be4 46.Kd2 Rd8+ 47.Ke3 Bc2 48.Rh4 Rd3+ 49.Ke2 Rd7 50.Rh5+ Ke6 51.Rh6+ Ke7 52.Rb6 Ra7 53.c4 Ra4 54.c5 Rc4 55.Rb5 Kd7 56.Ra5 Kc6 57.h3 Bg6 0–1

Diagrama 86 – Post-Alekhine, Mannheim 1914

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Elementos de Estratégia nos Finais

Exemplo 3 – Veja o diagrama 86. É um final rico em combinações. Pareceria que o Doutor Alekhine, cheio de fantasias, nessa partida arrasava o meu sistema, devido à sua inesgotável fonte de inspiração. Mas isso é somente aparente, pois na verdade tudo foi jogado de acordo com o meu sistema, especialmente a centralização. Nessa posição seguiu: 40...g4+ O peão ...f5, que é o candidato, está atrasado, mas o avanço era uma combinação de sacrifício. 41.Kg2 O lance 41.Kf4 implicava 41...Kf6, com ameaça de mate. 41...Kf7 42.Nxa6 Re1 43.h4 Kg6 44.Nb4 Rg1+ 45.Kh2 f4 46.gxf4 g3+ 47.Kh3 Bf2 Agora ficaram reunidos a torre, o bispo e o peão em um conjunto, mas no momento têm poucas possibilidades de expansão. 48.Kg4 A ameaça era 48...Rh1+ 42.Kg4 Rxh4+ etc. 48...Rh1 49.f5+ Kf6 50.Nd5+ Ke5 51.Kf3 Kxf5 52.Nxc7 Rxh4 53.Nxb5 Devido à queda do peão h, a expansão anteriormente impossibilitada – ver o comentário ao lance 47 – agora é em alto grau possível. Por essa possibilidade, as pretas abandonaram por completo a ala da dama, uma vez que os “dois camaradas unidos” pelo rei fazem força e romperão qualquer resistência. 53...Rf4+ 54.Kg2 h5 55.Rd8 h4 56.Rf8+ A torre impede o jogo de conjunto. 56...Kg5 57.Rg8+

Se 57.Rxf4? Kxf4, seguido de ...Kg4 etc. 57...Kh5 58.Rh8+ Kg6 59.Re8 Para assegurar a base no caso das pretas jogarem ...Bc5 seguido de ...Rf2+. 59...Bc5 60.Re2 Kf5 Apareceu o “arranca-dentes”. 61.b4 Bb6 62.Kh3 Rf2 63.Nd6+ Kf4 64.Re4+ Kf3 65.Kxh4 Bd8+ 66.Kh5 Rh2+ 67.Kg6 As peças brancas estão completamente na intempérie. A casa ficou abandonada e triste... 67...g2 0–1

Diagrama 87 – Cohn-Nimzovitsch, Munique 1906.

Como exemplo 4 tomaremos uma partida interessante, no sentido de que o rei realiza uma excursão sob o protetorado da dama centralizada (diagrama 87). Jogou-se: 39. De5 Dd1+ 40.Kf2 Dd5 Luta pela casa central do tabuleiro. 41.Df4+ Kg6 Começo da excursão. 42.Ke1 Df5 43.Dg3+ Kh5 44.Dg7 De4 O rei preto se dispõe a ir até h2 ou e3. Compare com diagrama 76. 45.Df7+ Kg4 46.Dg7+ 105

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Ou 46.Dd7+. 46...Dg6 47.Dd7+ Kf3 48.Dh3+ Ke4 Essa é a nossa posição ideal. 49.Ke2 Ke5 Assim que o rei chega à posição ideal Ke4 - ele se retira, ameaçando Dc2+. Nisto está a fineza da manobra, pois se trata apenas de ganhar tempo para jogar c4, obrigando a dama branca a defender continuamente a casa d3. Também é muito interessante a retirada precipitada do rei até e6 e como se ameaçam xeques enquanto avançam os peões da ala da dama. 50.Kd2 c4 51.Df1 De4 52.De2 Kd6 53.Qf1 Ke7 54.Qe2 b5 55.Qf1 a5 56.Qg1 Qe5 57.Kc2 b4 58.Qf2 Qe4+ 59.Kc1 a4 60.Qg3 b3 61.axb3 cxb3 62.Qc7+ Ke6 63.Qc8+ Kd5 64.Qd7+ Kc4 65.Qf7+ Kd3 0-1

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Esquema sobre os quatro elementos que intervêm no final 1

CENTRALIZAÇÃO

Dos reis. Proteção da base, auxílio à torre, luta para ganhar terreno

Dos bispos e cavalos. Criação de refúgios para o rei

O refúgio O telheiro

2

Da dama. Apóia o rei em seus desejos de aventura

O jovem aventureiro e a alta velocidade em direção ao castelo

POSIÇÕES AGRESSIVAS DE TORRE, BISPO E CAVALO

Debilidade da torre passiva: a) Elasticidade insuficiente em direção à outra ala; b) Maior liberdade de manobra do rei inimigo

Fórmula de Tarrasch

Debilidade do cavalo passivo: sua missão unidimensional o faz sucumbir ao zugzwang

Debilidade do bispo passivo: lentidão para entrar em combate

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REAGRUPAMENTO DE PEÇAS ISOLADAS “TODOS À FRENTE”

Cimentação

4

Refúgio e telheiro

“Centralização” nas alas

MATERIALIZAÇÃO DE FILEIRA OU COLUNA

Diferença importante: atividade no meio jogo, tranqüilidade no final

Exploração automática de colunas ou fileiras no final

Lentidão nos acontecimentos

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Capítulo VII - A Peça Cravada

1 – Introdução e generalidades. Tática ou estratégia? Utilização de um tema de cravada quando não se pode realizar. Esboço de um peão que impediu a cravada.

Depois de ter passado o capítulo VI tão difícil do ponto de vista posicional, esse capítulo seguinte poderá nos parecer muito fácil e ainda motivará a pergunta: a peça cravada pode ser considerada na realidade um elemento no sentido por nós assinalado, já que uma partida pode se desenvolver sobre uma coluna aberta, um peão passado etc, mas nunca sobre uma cravada? De qualquer forma, não compartilho desse ponto de vista. Naturalmente as cravadas surgem de maneira geral em momentos puramente táticos, por exemplo, durante a perseguição ao inimigo em fuga. Por outro lado, entretanto, uma cravada prevista na partida pode ter como conseqüência lógica influenciar no desenvolvimento da mesma. Nesse sentido, é de especial interesse a partida 5, Haken-Giese. O lance 25...Bg6 significa renovar o tema da cravada, desaparecido desde o lance anterior, pois agora se apresentou a ocasião e se ameaça um avanço (...h5 e ...g4) contra o objetivo h3, concebido certamente como uma forma de evitar a cravada ameaçadora e, conseqüentemente, permanece logicamente vinculada a esse tema. Devido a isso, o ataque ao peão h das brancas também deveria ser

considerado como uma variação lógica sobre o mesmo tema, o da cravada. Isso apesar do fato de na partida, da forma em que foi jogada, as pretas não prosseguirem com a aventura reiniciada com 25...Bg6 e em troca optarem por voltar a lutar pela coluna e, quando foram recompensadas. Mas isso é totalmente intangível, pois facilmente poderia ter ocorrido de outra forma. O importante é que devemos aprender o grande significado estratégico do tema da cravada. 2 – Conceito de peça cravada absoluta e relativa. A defesa que uma peça cravada pode aportar é ilusória. Combinações de troca sobre a casa em que está a peça cravada e os diferentes temas para essas combinações.

Para a cravada são necessários três personagens: 1º - a peça que crava; 2º - a peça inimiga cravada; 3º - a peça que se encontra detrás da peça cravada. A primeira ataca a terceira através da segunda, por isso a peça cravada se encontra situada entre as outras peças. A peça de trás geralmente tem sangue nobre – se não fosse assim não se cuidaria com tanto afã atrás das costas de outro; geralmente se trata do rei ou da dama. Os três personagens devem se encontrar sobre a mesma linha ou diagonal (veja o diagrama 88). 109

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do bloqueio. O poder defensivo de uma peça cravada é só ilusório. Faz como se protegesse, mas na realidade é um paralítico que não pode se mover. Podemos portanto deixar uma peça sendo atacada por uma peça cravada, pois essa não se atreverá a colocar as mãos em nossa peça. De todas as maneiras a peça cravada não pode atacar! Veja por exemplo o diagrama 89. Diagrama 88

A peça cravada não pode ser movimentada sem que isso ocasione a realização do ataque desde a posição onde havia tapado a ameaça. Se a peça cravada não pode realizar nenhum movimento, trata-se de uma cravada total ou absoluta e se existem algumas casas úteis para a peça cravada entre esta e a peça que a crava, então se trata de uma meia-cravada ou semi-cravada. No diagrama 88 a cravada da torre é média, pois é possível o lance ...h5. Por outro lado, a cravada do bispo é absoluta. Um cavalo cravado sempre o está de forma absoluta. Das outras peças, diríamos que somente podem ser semi-cravadas por outras peças do mesmo tipo. Por exemplo: brancas – Bh1; pretas – Bc6, Kb7. Nesse caso o Bc6 está somente semi-cravado, pois lhe é possível moverse sobre a diagonal c6-h1. Os peões só podem ser cravados totalmente por uma peça na diagonal. Para conseguir o mesmo com cravador em linha, a peça que crava teria que bloquear o peão cravado. Por exemplo: brancas – Rg6; pretas – Kg8, Pg7. A imobilidade não tem muito a ver com a peça cravada em si, pois também pode ser conseqüência 110

Diagrama 89 – À direita: 1.Qxg3+ ganhando a dama; à esquerda: 1.Qxa6+ e mate em seguida

Os lances vencedores com tomada de peão pela dama tanta à direita como à esquerda do diagrama são fáceis de encontrar: só é suficiente comprovar que tanto ...Bf4 como ...b7 estão cravados. Como é simples isso! No entanto, o enxadrista pouco experiente prefere colocar sua cabeça na boca do lobo antes de expor (!!) a sua dama. Respeito enorme frente aos direitos da realeza. Como a peça cravada está desarmada, podemos dizer Ânimo e valor! De forma freqüente também vale a pena jogar buscando a conquista da peça cravada. Nós sabemos que toda peça mais ou menos imobilizada (ainda que

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esteja somente estancada) tende a ser fraca e portanto não nos pode surpreender essa aspiração. Mas então, paralelamente ao objetivo da conquista da peça cravada, temos o problema de impedir a sua saída dessa condição, pois uma vez conseguido retornaria a gozar de mobilidade. Com o objetivo de impedir essa saída e conquistar a peça, temos que acumular os ataques e no caso de uma defesa suficiente temos que dizimar os defensores. Mas podemos notar um êxito mais absoluto: quando a peça cravada sofre o ataque decisivo de um peão. Isso resulta assim pelo fato de que a peça só pode se salvar do ataque de um peão fugindo, coisa que não pode fazer por estar cravada e portanto se entregará indefesa (veja o diagrama 90).

a supremacia que falamos em diversas oportunidades, ou seja, acumular uma maioria de atacantes frente aos defensores do objeto de ataque (nesse caso o objeto de ataque é a peça cravada). Como dissemos, fazemos o possível, mas como ideal devemos considerar o ataque de peão, ao qual, quase na maioria dos casos, corresponde a verdadeira glória.

Diagrama 91 – Ataque de peão precedido de assédio

Diagrama 90 – Dois exemplos elementares sobre a conquista da peça cravada

À direita segue Rh1, ...g6 e g4. À esquerda não é tão imediato, pois é necessário forçar o avanço, mas se consegue: 1.Rxa5 bxa5 2.b6, vencendo. Geralmente um plano de ataque contra uma peça cravada se desenvolve de forma a conseguir dentro do possível

Consideremos o diagrama 91 à esquerda. Podemos ver claramente o intenso assédio que sofreu o peão b6. Mas agora com o avanço do peão a chegaremos a um resultado mais visível. No mesmo diagrama, à direita, temos o cavalo em g7 cravado de forma triste, sendo nesse caso a peça da frente da casa h7 onde se ameaça o mate. Através do avanço h5 as brancas se preveniram da possível manobra de descravada Kh8h7-g6, enquanto através das suas peças exercem uma clara pressão sobre a peça cravada que no entanto não conduz a um resultado imediato. Então avançam f4 (como um punhal sob o braço) de forma decisiva. O peão é o executor da sentença de morte. 111

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A combinação de troca na casa da cravada

as pretas não sofreram nenhuma baixa. Ou seja, com o lance teriam perdido a supremacia, se é que não fosse errado o raciocínio do último passo. Não há dúvida de que ainda que se mantenham vivos os defensores (rei e bispo), mas o bispo já não é defensor da casa pois se converteu em um objeto cravado de ataque. Segundo tema:

Partida 16

Diagrama 92 – A combinação de troca – à direita, o primeiro tema; à esquerda, o segundo Primeiro tema: no diagrama 92 à

direita, trata-se da conquista do peão g7 cravado. Se acumularmos ataque sofreremos a desilusão ao notar que o tal peão avança satisfeito a g6. O malandro não estava cravado, quando muito semicravado (a f6 não podia seguir ...gxf6). Apesar desse inconveniente, o problema da conquista do objetivo da luta não é de difícil solução: 1.Nxg7 Bxg7 2.f6 A idéia se baseia em que as brancas trocam o peão semi-cravado de g7 pelo bispo completamente cravado, o que constitui o primeiro tema de manobra de troca sobre a casa da cravada. É necessário agora esclarecer a espinhosa questão: como é possível que as brancas apesar de terem perdido um atacante conservem a supremacia sobre a casa g7? Na realidade antes de 1.Nxg7 as brancas tinham três atacantes: a torre, o cavalo e o peão pronto para atuar e as pretas dois defensores: o rei e o bispo. Depois de Nxg7 as brancas só mantiveram dois atacantes, enquanto que 112

Morphy - Duque de Brunswick / Conde Isouard

Paris, 1858

1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 Bg4? 4.dxe5 Bxf3 5.Qxf3 dxe5 6.Bc4 Nf6 7.Qb3 Qe7 8.Nc3 c6 9.Bg5 b5 10.Nxb5! cxb5 11.Bxb5+ Nbd7 Nessa partida famosa, a posição do cavalo cravado em d7 é crítica. 12.0–0–0 A forma mais rápida de conectar as torres para o ataque sobre a coluna d, contra a casa d7. 12...Rd8

Diagrama 93 – O segundo tema

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Nessa posição, dobrando-se as torres se ganharia o cavalo: 13.Rd2 Qe6 14.Rhd1 Be7 15.Bxf6. Mas Morphy colocou em marcha uma manobra muito mais forte. 13.Rxd7 Rxd7 14.Rd1 Essa combinação de troca que acaba de se realizar sobre a casa da cravada merece nossa atenção especial. Não se realizou para se substituir uma peça semicravada por outra totalmente cravada, uma vez que ...Nd7 já era uma peça completamente cravada. Tampouco a combinação teria se realizado se as brancas já tivessem duas torres dobradas, pois não teria feito falta. Então visivelmente a manobra se realizou para ganhar um tempo na luta contra a casa d7 das pretas. Observemos agora com toda a calma a posição antes e depois do lance 13.Rxd7. Antes desse lance as brancas dispunham de dois atacantes contra dois verdadeiros defensores, pois o ...Nf6 está meiomorto e a dama, como peça maior, sairia muito mal de uma luta com peças pequenas. Depois de 13.Rxd7 as brancas perdem um atacante e as pretas um defensor, com a diferença de que as brancas repõem rapidamente o atacante enquanto as pretas perderam o defensor de forma irremediável (lembre-se da questão espinhosa). Portanto, as brancas tiraram proveito assegurando a supremacia na luta contra a peça cravada, vendo-se claramente que o segundo tema é o ganho de tempo. 14...Qe6 Teria vencido facilmente 15.Bxf6, mas Morphy preferiu uma variante mais espetacular. 15.Bxd7+ Nxd7

Agora o cavalo em d7 está cravado ante a ameaça de Rd8 mate. No entanto, ele se vê forçado a mover e segue o mate. 16.Qb8+ Nxb8 17.Rd8++ Voltando à posição do diagrama 92 à esquerda, a Rb5 que crava está atacada. Retirá-la implica em dar tempo ao inimigo para sair da cravada. Por exemplo, 1.Rb2 Ka7 2.R1b1 Nd6. O correto é: 1.Rxb7 Rxb7 2.Rb1 Vencendo. Como aqui se fez o sacrifício de qualidade sobre b7 para evitar perdas de tempo, devemos reconhecer nessa manobra a presença do segundo tema. Às vezes em uma combinação ambos os motivos se encontram reunidos. Vejamos o diagrama 94.

Diagrama 94 – Combinação do primeiro e do segundo temas

Nessa posição parece que o predestinado fosse a troca geral. Mas depois de 1.Bxf6+ Rxf6 2.Rxf6 Kxf6 as pretas se salvariam de forma justa. Há que se fazer então a troca de maneira mais hábil. Por exemplo: 1.Rxf6 Rxf6 2.b4 Onde as pretas terão que perder um tempo com o lance de rei (o movimento 113

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que realizar será absorvido pelo seu lance seguinte e portanto não resultará em seu benefício). Depois de 2...Kf7 3.Bxf6 Kxf6 4.b5 O peão não poderá ser alcançado. Uma combinação para ganhar tempo, pode ser dito. Isso é correto, mas só ocorreu porque soubemos trocar o bispo semi-cravado pela torre completamente cravada. Resumindo, esse caso é de uma reunião de ambos os temas. Terminamos esse parágrafo com um exemplo que nos mostra a cravada ajudada pelo aparato de “zugzwang”, que com muita razão goza da maior simpatia. Que a cravada pode conduzir à falta de lances se vê claramente, pois com muita freqüência a elasticidade das peças defensoras se vê muito diminuída e a defesa somente se pode realizar a partir de uma casa determinada.

Pois sem esse lance o rei preto abriria caminho através de ...f4. Agora esse avanço fracassaria, pois a 2...f4 seguiria 3.g4 e as pretas sucumbem devido à unilateralidade defensiva da torre. Depois de 2.g3 as pretas também se veriam mal com 2...g4 pela mesma razão. (Essa combinação está refutada. As pretas conseguem o empate através de 2...Kg6! 3.Bxe5 Kh5, com a ameaça de 4...f4! – N. do T.) Com isso o jogo contra a peça cravada está esgotado em seus aspectos mais essenciais e passaremos então ao tema da “descravada”. 3 – O problema da descravada a) na partida; b) no ruído da batalha. A política do “sistema corredor” e a “união militar defensiva dos ameaçados”. Os interrogatórios.

Depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.Nc3 Nf6 5.d3 d6 as brancas estão em condições de cravar com 6.Bg5 e, embora pareça estranho, essa pequena e simples cravada abre uma verdadeira árvore de possibilidades. (Veja o diagrama 96)

Diagrama 95 – De uma partida com vantagem do Dr. Tarrasch. Cravada aproveitada pos “zugzwang”

No diagrama 95, se produz o sacrifício inicial do qual já tratamos várias vezes (primeiro tema). 1.Rxe5 Rxe5 Com o que estamos no primeiro tema. Segue 2.g3! 114

Diagrama 96 – Depois do sexto lance das brancas. O problema da descravada

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As pretas devem de imediato interrogar o bispo audaz com 6...h6 7.Bh4 g5 ? Ou, ao contrário, devem se mostrar reservadas e jogar com um sorriso despreocupado 6...Be6 ? Devem se arriscar a fazer uma contra-cravada com 6...Bg4 ? Não será melhor ao fim e ao cabo ignorarem completamente tudo o que está relacionado com a cravada 6.Bg5 e por sua conta centralizar-se tranqüilamente com 6...Nd4 ? Adicionalmente a tudo isso no entanto poderia ser considerado 6...Na5 e 6...0-0. Na seqüência trataremos de analisar separadamente a cada um dos métodos da descravada. a) Os interrogatórios:

Pode-se notar facilmente que o avanço prematuro do peão de ala há de resultar comprometedor. Para citar um exemplo na Abertura Escocesa, depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 Nf6 5.Nc3 Bb4 6.Nxc6 bxc6 7.Bd3 d5 8.exd5 cxd5 9.0–0 0–0 10.Bg5 c6 11.Ne2 h6 12.Bh4 g5? 13.Bg3 As brancas têm o lance de ataque f4 e também a possibilidade de ocupar as casas h5 e especialmente f5 que ficaram debilitadas por 12...g5?. Ou seja, nesse caso o interrogatório foi realizado em momento muito inoportuno. Em outras oportunidades, porém, o interrogatório pode render bons frutos. Vejamos o início de uma partida de torneio, Cohn-Nimzovitsch, Carlsbad 1907: 1.e4 e5 2.Nc3 Bc5 3.Nf3 d6 4.d4 exd4 5.Nxd4 Nf6 6.Be2 0–0 7.0–0 Re8 As pretas abandonaram o centro, mas

pressionam e4. 8.Bg5? O correto seria 8.Bf3. 8...h6! 9.Bh4 g5! 10.Bg3 Nxe4 Para ganhar esse peão importante as pretas não se importaram em desarrumar a sua posição (veja o capítulo I) A continuação foi: 11.Nxe4 Rxe4 12.Nb3 Bb6 13.Bd3 Bg4 14.Qd2 Re8 E depois de ...Nc6 e ...Qf6 a posição das pretas termina consolidada. O peão de d6 em particular exerce um efeito estabilizador e assim as pretas venceram com facilidade. De propósito citamos dois casos extremos e assim se verá melhor do que, na verdade, se trata o interrogatório. Chegamos à conclusão de que o interrogatório debilita as posições e que portanto somente deve ser realizado quando há compensação por outro lado. Tal compensação reside normalmente no fato de que o bispo é expulso para um campo estéril. Esse deserto, no entanto, logo se transformará em um jardim florido se o centro puder ser aberto. Os exemplos que seguem ilustram esse aspecto. 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 Bb4 5.0–0 0–0 6.Bxc6 dxc6 7.d3 Bg4 8.h3 Bh5 9.Bg5 Jogar em seguida 9.g4 é um erro devido a 9...Nxg4 10.hxg4 Bxg4, seguido de ...f5. 9...Qd6 10.Bxf6 Qxf6 E agora resulta perfeitamente correto o lance das brancas 11.g4, pois o bispo terá que ir a g6, de onde morde uma massa inexpugnável de peões (d3, e4). Convém observar que se as pretas seguissem tendo o seu peão d (um peão 115

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em d6 no lugar de c6), o deserto poderia recobrar vida com ...d5. É certo que o bispo preto pode, eventualmente, seguir para f7 depois de ...f6, mas isso custa tempo. As brancas, por outro lado, não têm porque sofrer, pois com centro compacto, uma ala do rei desorganizada é facilmente defensável. Também esses peões desorganizados da ala do rei podem se converter lentamente em um instrumento de ataque (do tipo “tanque”), sobretudo com um cavalo que colabore desde f5 (veja a partida 106, Nimzovitsch-Leonhardt). Agora, uma vez demonstrada de forma mais ou menos conclusiva a conexão lógica entre o deserto e o centro, será proveitoso analisar a posição à qual nos referimos no início dessa seção. Depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.Nc3 Nf6 5.d3 d6 6.Bg5 h6 7.Bh4 g5 8.Bg3 precisamos saber se o deserto ao qual foi empurrado o bispo pode ou não se transformar através de um avanço central. Nesse sentido, devemos examinar minuciosamente as opções das brancas de ataque no centro. (Veja o diagrama 97)

Diagrama 97 – O interrogatório e o que dele se consegue

Há, como se verá, duas possibilidades. Percebemos que Bb5 seguido de d4 e 116

Nd5 seguido de d4 são duas possibilidades (temos que notar ainda que Nd5 é a sentinela da diagonal do ...Bc5 de forma semelhante à sentinela de coluna). Depois de ...a6 das pretas para cortar a primeira possibilidade, pode seguir 8...a6 9.Nd5 Be6 10.c3 Bxd5 11.exd5 Ne7 12.d4 exd4 13.Nxd4, ganhando as pretas um peão, mas depois de 13...Nexd5 14.0–0 o jogo das brancas é preferível pois agora o bispo já não se encontra no deserto e abandonará sua situação de retiro. 8...Bg4 Para limitar um pouco as aspirações brancas no centro. Em uma partida se jogou: 9.h4 Nh5 Também seria viável ...Rg8 ou ...Kd7; o lance do texto retira muitas tropas do centro. 10.hxg5 Apesar de sugestivo – pois capturar é a conseqüência lógica do avanço do peão – esse lance é incorreto. Seria correto 10.Nd5 de acordo com a seguinte lógica: o lance 9.h4 implicaria 9...Nh5, obtendo as brancas assim a maioria no centro que poderiam aproveitar. 10...Nd4 Essa transposição perde, já que as brancas dispõem de uma combinação surpreendente de reserva. Com 10...Nxg3 11.hxg3 Nd4 as pretas poderiam ter lançado um belo ataque. Assim, 12.Rxh6 Rxh6 13.gxh6 Bxf3 14.gxf3 Qg5; ou mesmo 12.Nd5 (essa tentativa de explorar o centro chega muito tarde) 12...Bxf3 13.gxf3 Qxg5 14.g3 c6 15.Rh5 cxd5! e ganham, pois a dama arrasta consigo a morte de quase todas as peças das brancas.

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Portanto é de suma importância para o estudioso se dar conta de que o interrogatório que se desenvolve em uma ala é na realidade um problema do centro. b) Ignorar a ameaça, ou em outras palavras, permitir que a nossa formação de peões seja deslocada

Esse método pode ser escolhido sempre que se disponha de forma segura de uma liberdade maior no centro. Por exemplo: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bc4 Bc5 5.d3 d6 6.Bg5 A ameaça é o incômodo lance Nd5. No entanto as pretas podem ignorar a ameaça. 6...0–0 7.Nd5 Be6 8.Nxf6+ gxf6 9.Bh6 Re8 10.Nh4 Kh8 Com jogo de tantas possibilidades prós como contras. As brancas de forma alguma têm vantagem ostensiva, pois existe a liberdade que exigimos para o centro (a possibilidade das pretas jogarem ...d5) e adicionalmente uma operação de ala por nada pode ser respondida melhor do que por um contragolpe central. Isso ocorre porque as brancas efetuaram uma virada com suas tropas que lhes tirou o contato com o centro. No entanto, isso poderia se justificar se as brancas assegurassem a casa f5 permanentemente, o que não é o caso aqui. Se tivessem jogado 8.Bxf6 (em lugar de 8.Nxf6+) segue 8...gxf6 9.Nh4 e o lance final seria duvidoso. O melhor para as brancas após 6...0-0 (veja o diagrama 96) 7.Nd5 Be6 seria 8.Qd2 mantendo a pressão, pois se 8...Bxd5 9.Bxd5 as brancas ficariam um pouco melhor, já que agora não convém a descravada 9...h6 10.Bh4 g5 11.Bxc6 bxc6 devido a 12.Nxg5.

c) Utilizar reservas descravada pacífica

para

uma

Trata-se de uma continuação muito recomendável a todos aqueles que gostam de vida tranqüila. Conhecemos especialmente por Variante de Metger na Abertura dos Quatro Cavalos e pela partida entre Tarrasch e Marshall. A modalidade de jogo de Metger é a seguinte: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 Bb4 5.0–0 0–0 6.d3 d6 7.Bg5 Metger agora joga: 7...Bxc3 8.bxc3 Qe7 Com a intenção de jogar o Nc6 a d8 e e6 para no caso do bispo ir a h4 levar o cavalo a f4 e g6 e se novamente Bg5 jogar ...h6. Essa manobra só é admissível quando se dispõe de uma posição central sólida. Depois de 8...Qe7 geralmente segue: 9.Re1 Nd8 10.d4 Ne6 11.Bc1 E depois de 11...c6 ou 11...c5 as possibilidades são iguais. Na Defesa Petroff, Tarrasch depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nf6 3.Nxe5 d6 4.Nf3 Nxe4 5.d4 Be7 6.Bd3 Nf6 7.0–0 Bg4, se livraria da cravada através da tranqüila manobra Re1 seguida de N1d2-Nf1Ng3, jogando antes ou depois h3. Com esse método venceu algumas partidas lindas. A estrutura lógica que lhe permite realizar essa manobra que leva tanto tempo se baseia nos dois seguintes postulados: 1º- A descravada deve ser feita o mais rápido possível; e 2º- Uma espécie de recompensa sorri para as tropas que concorrem em auxílio na forma de uma posição favorável. Com 117

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respeito ao primeiro postulado quero fazer notar que os jogadores modernos estão inclinados a tolerar durante algum tempo os males da cravada. Ou seja, não estão convencidos de que convém eliminar o quanto antes a cravada e procedem como veremos no item d a seguir. d) Manobras, mantendo considerações a, b e c anteriores

as

Isso é muito difícil e exige um grande esforço técnico. Vejamos: 1.e4 e5 2.Nf3 Nf6 3.Nc3 Nc6 4.Bc4 Bc5 5.d3 d6 6.Bg5 Be6 (como jogava Capablanca) 7.Bb5 h6 8.Bh4 Bb4 9.d4 Bd7 Devido ao avanço d5 o peão branco e4 necessita de auxílio. 10.0–0 Bxc3 11.bxc3 Poderia também jogar-se primeiro Bxf6. 11...g5 12.Bg3 Nxe4 As pretas reservam a descravada para o momento oportuno. 13.Bxc6 Bxc6 14.dxe5 dxe5 15.Bxe5 Talvez fosse melhor Nxe5. 15...Qxd1 16.Raxd1 f6 17.Bd4 Kf7 18.Nd2 Rhe8 Com final favorável às pretas. Seu adversário, o autor deste livro, teve que entregar suas armas no lance 64. No estado avançado de uma partida, especialmente nos momentos táticos, o processo da descravada oferece uma imagem muito diferente (veja o diagrama 98). 118

Diagrama 98 – A descravada utilizando o corredor 1...Nb4 ou 1...Nb6

Nessa posição as pretas jogam 1...Nb4 ou 1...Nb6. O espaço entre a peça que crava e a cravada e entre esta e a peça coberta chamamos de “corredor”. Colocando-se ali uma peça defensora pode-se anular a cravada. Outra possibilidade consiste na fuga da peça de trás. Por exemplo, voltando ao diagrama 98, os lances 1...Kc6 ou 1...Kc7 poriam fim à cravada. Quando a peça de trás não é muito valiosa, uma defesa suficiente faz as mesmas tarefas. Nessa última possibilidade, temos sempre que ter presente o contato a se buscar entre a peça cravada, a peça de trás e a que a essa defende.

Diagrama 99 – A “união militar dos ameaçados”

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No diagrama 99 as brancas com 1.Rab2 seguido de Bd3 querem fazer ressurgir a ameaça a4 e então as pretas, para adiantar-se a essa ameaça, colocam a torre b6 em b7 e defendem a mesma com ...Bc6, para a a4 seguir tranqüilamente com ...bxa4. Também devemos considerar a descravada no diagrama 100:

Diagrama 100 – O bispo preto cravado

Nessa posição, 1...Rb1+ 2.Kg2 Rb2+, seguido de ...Bd4 e o contato estabelecido entre bispo e torre salvou a vida do bispo que estava em b6. Com isso damos por terminado o capítulo “A Peça Cravada”; citaremos somente alguns exemplos de partidas e daremos um esquema. Partidas sobre a Cravada

Na posição do diagrama 101 foi jogado 22.Rb1, ao qual se respondeu 22...Re8, restabelecendo-se assim novamente o contato. Como demonstrei posteriormente, se venceria com: 22.Re4 A variante principal é: 22...Bc6 23.Nf6+ gxf6

Se fosse jogado 23...Kh8, então 24.Rh4 Qxc2 25.Nxh7! conduz a uma perseguição direta ao rei preto, que se vê obrigado a fugir, mas essa fuga é desagradável, pois surgem cravadas amargas. Em outro parágrafo fizemos notar que a cravada é típica nas perseguições.

Diagrama 101 – Posição na partida Nimzovitsch-Vidmar, Carlsbad 1911

24.Rg4+ Kf8 25.Qxf6 Bd7 26.Rg7 Be6 27.Rxh7 Ke8 E agora vem a cravada número um, com: 28.Re1 Através da qual se ameaça 29.Qxf7+!. Para evitá-la as pretas se vêem obrigadas a jogar: 28...Kd7 Mas agora o peão f7 está cravado (número dois). 29.Qxe6+ Vencendo com facilidade. Com o objetivo de nos exercitar, vamos nos deter por um momento na posição surgida após 25.Qxf6 Bf7. Nessa posição também se ganhava com 26.Rf4 porque 26...Be6 não era possível devido a 27.Qxe6. Também fracassava 26...Be8 devido a 27.Re1 e 26...Kg8 119

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porque implica em 27.Qxf7+ Kh8 28.Qf6+ Kg8 29.Rf3. Nas três partidas que seguem pode-se observar as relações entre a cravada e o centro. Partida 17 Nimzovitsch - Leonhardt San Sebastian, 1911 Abertura dos Quatro Cavalos

1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 Bb4 5.0–0 0–0 6.Bxc6 dxc6 7.d3 As brancas possuem agora uma posição sólida, pois a coluna d inimiga bate sobre granito (ou seja, sobre o peão defendido d3) A solidez também se manifesta no peão e das brancas, que não pode ser incomodado com d5. Em outras palavras, o centro não pode ser aberto. 7...Bg4 A cravada. 8.h3 Bh5 9.Bg5 Teria sido prematuro 9.g4 devido a 9...Nxg4 hxg4 10.Bxg4, seguido de ...f5. 9...Qd6 10.Bxf6 Qxf6 11.g4 Aqui o interrogatório é procedente, pois o bispo se meterá em um deserto, o qual, devido à ausência de d6 ou d5, não poderá ser transformado em um jardim – veja a descravada segundo o item a. Observe-se agora como os peões brancos g e h se vão transformando em uma massa de ataque. 11...Bg6 12.Kg2 Rad8 13.Qe2 Bxc3 Caso contrário teria seguido Nc3-d1e3 para conseguir Nf5. 14.bxc3 c5 15.Nd2 120

As brancas por um lado querem agora facilitar a manobra Nd2-c4-e3-f5, mas adicionalmente impedir durante o maior tempo possível o lance ...c5 das pretas sem jogar de sua parte c4, pois isso deixaria sem defesa a guarita (sua casa d4) na coluna d. 15...Qe7 16.Nc4 b6 17.Ne3 f6 Com isso finalmente o bispo consegue escapar do deserto, ainda que esse lance permita às brancas oportunamente jogarem g5. 18.Rg1 Qd7 19.Kh2 Kh8 20.Rg3 Qb5 21.Qe1 Qa4 22.Qc1 Rd7 23.h4 Bf7 24.c4 O condutor das pretas conseguiu forçar c4 das brancas. Mas enquanto isso elas se arraigaram fortemente na ala do rei. 24...Be6 25.Qb2 a5 26.Rag1 Qc6 27.R1g2!! As brancas de forma silenciosa tomaram as últimas medidas para recepcionar a dama das pretas na colocação que busca (...Qd4). Observe como as brancas associam a defesa do centro com os planos de ataque na ala do rei. 27...Qd6 28.Qc1 Qd4? 29.Nd5! Com isso se pode ganhar a dama! Essa cilada foi muito comentada em toda parte. No entanto ninguém se fixava com atenção ao fato de que a mesma estava subordinada a alvos estratégicos previamente fixados. A finalidade estratégica era impedir a ruptura central (ou seja, a manobra central) e principalmente assegurar o ataque g5. Seguiu então 29...Rxd5 30.c3 Qxd3 31.exd5 Qxc4 32.dxe6 Qxe6 33.Qc2 c4 34.Qf5 Qxf5 35.gxf5 1–0 O estudante deve notar, com base nas

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grandes e difíceis manobras executadas pelas brancas (lances 21, 22, 25 e 28), que estas se davam conta perfeitamente de que a disposição dos peões (h3 e g4) exigia de forma irremediável um centro fechado. Essa partida ilustrou o problema da interrogação. Partida 18 Nimzovitsch - Dr. Fluss Partida por correspondência 1913

1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bc4 Bc5 5.d3 d6 6.Bg5 h6 7.Bh4 Naturalmente também seria jogável 7.Be3. 7...g5 Aqui teria sido melhor 7...Be6. 8.Bg3 Bg4 9.h4 Nh5 10.hxg5 Como fizemos notar, aqui as brancas tinham que ter prestado mais atenção ao problema do centro, jogando por exemplo 10.Nd5! Nd4 11.c3. 10...Nd4 Se as pretas tivessem continuado com 10...Nxg3 11.fxg3 Nd4 poderiam ter feito valer o centro descuidado das brancas, pois 12.Nd5 não é suficiente pelo sacrifício da dama 12...Bxf3 13.gxf3 Qxg5 14.g4 c6 15.Rh5 cxd5. Da mesma forma seria insuficiente para as brancas depois de 10...Nxg3 11.fxg3 Nd4 a continuação com sacrifício 12.Bxf7+ Kxf7 13.Nxe5+ dxe5 14.Qxg4, pois depois de 14...Qxg5 15.Qd7+ Kg6 as pretas ficam seguras. Portanto o ataque na ala (10.hxg5) ao invés do avanço central indicado (10.Nd5) constitui um erro sem salvação que as pretas poderiam ter aproveitado

com 10...Nxg3 seguido de 11...Nd4. 11.Bxe5 Uma oferta desconcertante. As brancas sacrificam seu bispo, porém deixam balançando tanto o cavalo em h5 como o rei inimigo. 11...Bxf3 Se as pretas tivessem aceitado o sacrifício jogando 11...dxe5 então 12.Bxf7+ Kxf7 13.Nxe5+ Kg8 14.Qxg4, ganhando. 12.gxf3 dxe5 13.Rxh5 Rg8 Aparentemente a posição das brancas não é nada viável, pois o Nd4 das pretas pressiona e o peão g das brancas parece perdido. 14.f4 A salvação. 14…exf4 15.Qg4 O ponto culminante. As brancas não temem o fogo fátuo do ataque das pretas (...Nxc2). 15…Nxc2+ Obrigado, pois se não teria seguido 0-0-0. No caso de 15...Rxg5 segue 16.Qxf4. 16.Kd2 Nxa1 17.Bxf7+ 1-0 Se 17…Kxf7 então 18.Qf5+ Ke8 19.Qe6+ Kf8 20.g6 e ganham. Tanto com 19...Qe7 20.Qxg8+ Qf8 21.Qh7! Qe7 22.g6 Qxh7 23.gxh7 Bd4 24.Nb5, como com 22...Bd4 23.Nb5 Qb4+ 24.Kd1, as brancas igualmente venceriam. Partida 19 Rubinstein - Nimzovitsch Mariembad, 1925 Defesa Índia da Dama

Nessa partida encontramos um festival de 121

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cravadas. Veremos alternar em série cravadas peçonhentas com outras inofensivas. 1.d4 Nf6 2.Nf3 b6 3.g3 c5 4.Bg2 Bb7 5.dxc5 bxc5 6.c4 Não se pode criticar a manobra adotada pelas brancas. Elas obtêm a coluna d com a correspondente guarita d5, enquanto a maioria central das pretas (peões c, d e e contra c e e) dispõe de mobilidade reduzida. Como se pode notar, começamos a nos introduzir no jogo posicional. A mobilidade como critério de valorização de peões é o eixo ao redor do qual gira todo o jogo de posição. Muitos teóricos, sem razão, têm criticado de forma desfavorável essa manobra duvidosa pelo fato de que a teoria da época não é muito conclusiva em lances fechados. Um mestre proeminente, franzindo a testa diria: “o peão c faz dois lances e desaparece!”. 6...g6 7.b3 Bg7 8.Bb2 0–0 9.0–0 Com a consciência tranqüila ambos os lados fizeram o roque. Nem a mais hipermoderna dupla de mestres pode conseguir mais do que quatro bispos na diagonal. 9...Nc6 Um lance comum que tem o sentido mais profundo. Era de esperar ...d6 e ...Nd7 para seguir depois ...a5 e em seguida ...Nb6 e ...a4. Apesar de sã a tendência de se livrar do peão ...a isolado, não é recomendado acentuá-la em demasia. Nessa tendência se baseia, no meu entender, o principal erro da estratégia “pseudo-clássica”, segundo a qual seus partidários, com todas suas forças, tratavam de efetuar o avanço sem ter em conta que primeiramente há que se considerar o fato que se denomina “capacidade de transformar vantagens”, ou seja, a capacidade de se entregar uma vantagem para conseguir outra. Há que se considerar também que o inimigo por 122

si só e sem ser forçado tem que abandonar muitas casas. Naturalmente, em nosso caso, as brancas devem jogar seu cavalo a c3 para defender ...a4. Por outro lado, o cavalo está muito melhor em c3 do que em b3 pois aparentemente assim as brancas dispõem da estrutura Nc3, Qc2 seguido de e4 para se oporem à contra-estrutura preta de ...Nc6, ...d7, ...e5, ...Nd4!, escudando o peão d6 através de ...Nd4. 10.Nc3 a5 11.Qd2 d6 12.Ne1 Começa a dificultosa e dispendiosa viagem Nf3-e1-c2-e3-d5. Parece mais econômico 12.Nd5 Nxd5 13.Bxg7 Kxg7 14.cxd5. 12...Qd7 13.Nc2 Nb4! 14.Ne3 Bxg2 15.Kxg2 Tomar com o cavalo significaria desviá-lo de seu caminho (planeja Nd5). 15...Qb7+ 16.f3 No caso de 16.Kg1 então 16...Ne4 17.Nxe4 Qxe4 e seria o momento do peão preto h se mostrar ativo. 16...Bh6 Uma cravada do tipo inofensivo. Aparentemente o último lance significa um enfraquecimento perigoso da ala sobre o próprio rei. 17.Ncd1

Diagrama 102 – Legenda: Posição depois de 17.Ncd1

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Agora é ameaçado Bxf6, seguido de Qxd6. 17...a4! Veja o comentário a respeito do lance 9...Nc6. 18.bxa4 Rfe8 Esse lance dirigido contra a ameaça citada anteriormente (Bxf6 etc) chama tanto mais a atenção pelo seu caráter puramente defensivo em contraste com o enérgico e desejado que as pretas iniciaram com o lance 17. Qualquer coisa era de se esperar, menos um lance defensivo. Essa conciliação entre ataque e defesa dá à combinação uma característica especial. 19.Bxf6 Rubinstein parece não acreditar na solidez da defesa escolhida pelas pretas, mas logo terá que acreditar. 19...exf6 20.Kf2 Agora as brancas ameaçam descravar mediante f4, após o que ocupariam definitivamente a guarita d5. 20...f5!! Descobre-se o plano das pretas. Têm uma nobre ameaça de cravada crônica: por um lado 21...f4 22.gxf4 Bxf4 e por outro 21...Bg7, seguido de 22...Bd4. 21.Qxd6 Bg7 22.Rb1 Bd4 Ameaçando ...Nd3+. 23.Kg2 Pobres cavalos! No lance 17 tiveram que suspender sua viagem e agora encontrarão a morte sem terem conseguido aproximar-se mais da meta. Se 23.Rb3, então 23...Re6 24.Qf4 Qe7 (com ameaça ...Nc2) 25.Kg2 Rae8, completando-se o assédio sobre o cavalo cravado em e3. 23...Bxe3 24.Nxe3 Rxe3 25.Qxc5 Agora é a vez das brancas cravarem. 25...Rxe2+ 26.Rf2 Rxf2+ 27.Qxf2

Diagrama 103 – Legenda: Posição depois de 27.Qxf2

Obrigado, uma vez que a 27.Kxf2 segue 27...Nd3+ e depois de 28...Nxc5 a dama preta fica defendida pelo cavalo. 27...Rxa4 Não se pratica a descravada imediata jogando-se 27...Qe7 porque as brancas não podiam se aproveitar da cravada. 28.a3 No caso de 28.Qb2 então 28...Qc8 era o único lance bom de volta da peça de trás. Era mau 28...Qc7 devido a 29.Re1. Por outro lado não fazem falta os comentários para reconhecer que 28...Rxa2 é um erro gravíssimo (29.Qxa2 Nxa2 30.Rxb7). 28...Rxa3 29.Qe2 Ra8 A descravada. 30.c5 Qa6 31.Qxa6 Nxa6 32.Ra1 A última cravada. 32...Nc7 A última descravada. 33.Rxa8+ Nxa8 34.Kf2 Kf8 35.Ke3 Ke7 36.Kd4 Ke6 37.f4 f6 38.Kc4 Nc7 0–1

123

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Esquema sobre a cravada O JOGO CONTRA A PEÇA CRAVADA

A peça cravada só fornece uma defesa imaginária. Ataque enérgico sobre a casa da cravada

Balanço entre as peças que atacam a peça cravada e as que a defendem. O peão executa um ataque decisivo

Combinação de troca sobre a casa da cravada

Para converter em cravada uma peça semi-cravada

Para ganhar um tempo

A DESCRAVADA

Na abertura

Em seqüências táticas

a) O interrogador (confinar o bispo no

a) Mediante a utilização do corredor

deserto; cuidado com a reação central) b) Permitindo o deslocamento da

b) Coalizão (coordenação) das peças ameaçadas

formação de peões c) Manobras tranqüilas das reservas d) Nadar e guardar a roupa: manter no bolso as possibilidades a), b) e c)

c) Por substituição da peça

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Capítulo VIII- O Xeque Descoberto

Outro capítulo breve, porém rico em complicações dramáticas 1 – A relação entre a cravada e o xeque descoberto mostrada detalhadamente. Em que direção deve se deslocar a peça que descobre o xeque?

Diagrama 104 – O xeque descoberto. À direita: Rb1 é a peça ameaçadora, Nb4 a intermediária ou retirável e Kb8 a peça de trás, ou seja, a ameaçada

Temos no diagrama 104 uma imagem clara sobre o grau de afinidade que existe entre a cravada e o xeque descoberto. De acordo com isso poderíamos deduzir que a peça cravada, cansada de ser eternamente perseguida, resolveu mudar de cor e que essa troca provocou a transformação de um menino antes fraco em um poderoso guerreiro. Poderíamos então dizer que o xeque descoberto é uma cravada na qual a peça cravada com as bandeiras ao alto passou para o lado do inimigo.

Portanto, na cravada e aqui temos três personagens: 1º- A peça que ameaça o xeque descoberto ao sair de um esconderijo; 2º- A peça que esconde e descobrirá o xeque da anterior; e 3º- A peça adversária, ameaçada indiretamente. Resumindo, temos a peça ameaçadora, a intermediária e a ameaçada. Enquanto na cravada a fonte de todo o mal é a pouca mobilidade da peça cravada (intermediária), inversamente no xeque descoberto a peça intermediária está repleta de uma notável mobilidade: qualquer lance com essa peça é admissível. Mais ainda, ela pode ocupar casas ameaçadas por vários lados do inimigo porque esse não pode capturar por se encontrar em xeque. Ou seja, na transformação da peça intermediária resulta que um homem pequeno adquire uma força própria de quem se sente apoiado por um robusto guarda-costas. Analisemos agora os possíveis lances denominados descobertos e veremos que podem ter três sentidos: a) Poder tomar impunemente qualquer peça adversária que se encontre ao seu alcance, já que o oponente não poderá retomá-la. b) Atacar qualquer peça grande do inimigo sem a menor preocupação pela casa na qual se coloque, seja ela propriedade do inimigo ou esteja fortemente bombardeada. c) Poder se deslocar de uma casa a ou125

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tra, se por qualquer razão a nova casa é mais favorável do que a que ocupava. Vejamos os três casos no diagrama 105:

moinho (Zwickmuhle). 2 – O Moinho. A peça que descobre pode escolher dentre as diferentes casas pertencentes à linha descoberta, sem perda de tempo

Diagrama 105

Segundo a), Rxh5+ ou Rxa5+, podendo-se observar a tranqüilidade com a qual a torre toma. Segundo b), Re5+ ou Rd3+. Segundo c), podemos aplicar se levarmos em consideração que o Bg1 está cravado e portanto não pode tornar evidente seu apetite típico. Então se joga 1.Rd1+, K joga e então 2.Bxe3. É quase desnecessário alertar o estudante, porque esse já sabe de acordo com o capítulo anterior que é necessário ser valente frente ao perigo... quando esse perigo é imaginário. Portanto, todas as casas, mesmo aquelas que estão sob o fogo do inimigo são acessíveis à peça que descobre. No diagrama 105 certamente as manifestações de aplicação do item c são muito maiores que o exemplo aqui mostrado. Não há sentido em citá-las, pois o fato de que uma peça atue melhor aqui do que ali pode ser regido por muitas causas. Como exemplo citaremos um curioso caso figurativo de um 126

Diagrama 106 – Dois moinhos

No diagrama 106 à direita é jogado: 1.Bh7+ Com o qual se obriga 1...Kh8 Aparece então um novo xeque descoberto. Se as brancas jogarem 2.Bb1+, as pretas saem do xeque com 2...Kg8, mas 3.Bh7+ de novo as submete ao xeque descoberto, uma vez que a casa h8 é a única para a qual o rei pode ir. Assim, com Bh7 se obstrui a linha de ação da dama, ou seja, da peça ameaçadora, criando uma casa de fuga. Essa situação sem saída cria um moinho, cuja enorme vantagem consiste no fato de que a peça intermediária pode ocupar qualquer casa da linha descoberta (nesse caso a diagonal b1-h7) e sem perder tempo com isso. É como se sempre coubesse jogar às brancas. Esse moinho pode ocasionar danos terríveis. Veja o diagrama 107.

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anterior. Aqui o problema é instigar o ...Bd5 a deixar sem defesa a casa f7, o que se consegue jogando: 1.Bh7+ Kh8 2.Bc2+ A melhor casa, de acordo com o item c. 2...Kg8 3.Rg2+ Bxg2 Agora, novamente: 4.Bh7+ Kh8 5.Bg6+ Kg8 6.Qh7+ Kf8 7.Qxf7++.

Diagrama 107 – Moinho com carnificina, sacrifício e finalmente mate

Nessa posição se joga: 1.Bh7+ Kh8 2.Bxf5+ Kg8 3.Bh7+ Kh8 4.Bxe4+ Kg8 5.Bh7+ Kh8 6.Bxd3+ Kg8 7.Bh7+ Kh8 8.Bxc2+ Kg8 9.Bh7+ Kh8 10.Bxb1+ Kg8 Agora as brancas, como o avarento enriquecido, como humilhação devolvem um pouco do seu dinheiro, fazendo-se de magnânimas. 11.Rg6+ fxg6 12.Bxa2+ E mate na seqüência. O bispo percorreu toda a diagonal até a casa b1 e depois do sacrifício da torre conquista a diagonal a2-g8.

As duas posições anteriores foram compostas com finalidade didática, porém temos que notar também um caso prático de moinho, um final em que Torre derrotou Lasker, o qual, apesar de sua elegância, trago à baila com um pouco de má vontade, pois é muito grande a minha admiração pela pessoa do Dr. Lasker. Mas também os grandes gênios são vulneráveis, como parece indicar a partida que segue.

Diagrama 109 – Torre-Lasker, Moscou 1925

Diagrama 108 – As brancas vencem

O diagrama 108 nos dá um quadro mais refinado, porém semelhante ao

Na posição do diagrama 109 há muito de ameaçador para as brancas (Re1 está ameaçada diretamente e Bg5 de forma indireta). As brancas jogaram: 21.b4! Qf5 Não 21...Qxb4 devido a 22.Rb1, mas sem dúvida era melhor 21...Qd5. 127

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22.Rg3 h6 23.Nc4 Essa intervenção do cavalo teria sido impossível se tivesse sido jogado 21...Qd5. 23...Qd5 24.Ne3 Torre luta como um leão pela descravada, porém sem a sutileza do descoberto. Isso lhe teria sido impossível. 24...Qb5 25.Bf6 Para que esse descoberto fosse possível foi necessário conduzir a dama para uma casa inócua, mostrando como isca 24.Ne3. 25...Qxh5 26.Rxg7+ Kh8 Estabeleceu-se o moinho! 27.Rxf7+ Kg8 28.Rg7+ Kh8 29.Rxb7+ Kg8 30.Rg7+ Kh8 31.Rg5+ Kh7 32.Rxh5 Kg6 33.Rh3 Kxf6 34.Rxh6+ E as brancas venceram com facilidade. 3 – O xeque duplo Muitas vezes aparece como uma tempestade violenta. Origina-se quando a peça que descobre por sua vez também dá xeque. A força do xeque duplo se baseia no fato de que das três respostas possíveis só se pode usar uma. Desaparecem as possibilidades de se tomar a peça ou intercalar outra, restando como conseqüência somente o remédio da fuga.

No diagrama 110 as brancas poderiam escolher entre 1.Qh7+ ou 1.Qh8+. No primeiro caso trata-se de um simples xeque descoberto (1...Kxh7 2.Bf6+) cuja resposta tanto pode ser tomar (2...Qxh1) ou cobrir (2...Qh5). No segundo caso, ao contrário, será produzido um xeque duplo que eliminará as duas respostas antes citadas: 1.Qh8+ Kxh8 2.Bf6+ E só resta 2...Kg8, ao que segue 3.Rh8++. Também é conhecida a posição: brancas – Qf6, Ne5, Bb2; pretas – Kg8, Rf8, Re8, f7, g6, h7 na qual as brancas dão mate em três: 1.Qh8+ Kxh8 2.Nxf7+ Kg8 3.Nh6++. O xeque duplo é uma arma puramente tática, mas de efeitos devastadores. Não cabe ao rei, frente ao xeque duplo, mais do que a fuga precipitada. Terminaremos esse capítulo com três pequenos exemplos: 1) Na partida jogada há muitos anos entre von Bardeleben e o estudante Nisniewitch chegou-se à bela posição do diagrama 111:

Diagrama 111 – Xeque duplo Diagrama 110 – Xeque duplo

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O último lance das brancas foi ter

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jogado a torre que estava em b7 a c7 (naturalmente não poderiam ter jogado Rb8+ devido a ...Rf8+ seguido de ...Rxb8) e então as pretas jogaram ...Qxc7, com o qual a partida terminou empatada. Algum tempo depois mostrei a seguinte continuação vencedora: 1...Rf1+ 2.Kxf1 Ng3+ 3.Ke1 Qe3+ 4.Kd1 Observe como vamos tocando o rei: ele já está em d1 quando há poucos lances se encontrava placidamente em casa. 4...Qe2+ 5.Kc1 Qe1+ 6.Kc2 Qxe4+ Ao xeque duplo se adicionou aqui uma manobra conhecida e que só parece rara porque em geral ela é praticada em linhas e não na diagonal como aqui. Foi empregada a manobra tática de se introduzir uma peça entre duas que se defendem mutuamente, forçando o rei sobre a casa c2 a romper dessa forma o contato entre Qb1 e Be4. 7.Kc1 Ne2+ ganhando a dama e a partida. 2) Entre o genial Réti e o não menos genial Dr. Tartakower foi jogada em Viena em 1910 a seguinte miniatura: 1.e4 c6 2.d4 d5 3.Nc3 dxe4 4.Nxe4 Nf6 5.Qd3 Um lance bastante raro. 5...e5 O gesto algo teatral das brancas teve seu efeito. O correto teria sido 5...Nxe4 6.Qxe4 Nd7 seguido de ...Nf6, que conduziria as pretas a uma posição sólida. 6.dxe5 Qa5+ 7.Bd2 Qxe5 8.0–0–0 Nxe4? Um erro. O correto seria 8...Be7. 9.Qd8+!! Kxd8 10.Bg5+ Kc7

11.Bd8++ Se 10...Ke8 Rd8++. A combinação final é muito agradável pelo seu efeito. 3) Em 5 de dezembro de 1910 dei uma sessão de partidas simultâneas em Pernau (Báltico) em cuja oportunidade se jogou a seguinte partida graciosa: NimzovitschRycknoff 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 Nf6 4.0–0 d6 5.d4 Nxe4? 6.d5 a6 7.Bd3 Nf6 O lance 7...Ne7 salva a peça, mas não foi jogado. Por exemplo 8.Bxe4 f5 9.Bd3 e4 10.Re1 exf3 11.gxf3 ou 11.exd3, ao que segue 11...gxf3 ou 11.Qxd3, ficando as brancas com um forte ataque. 8.dxc6 e4 9.Re1 d5 10.Be2!! Após ter forçado o ...d5 das pretas para defenderem seu peão e ameaçado, as brancas dispunham de tempo para retirar intactas as suas forças ameaçadas pelo garfo, mas ao jogar o bispo dessa forma sacrificam o cavalo. 10...exf3 Ou seja, as pretas não viram nenhum perigo e tranqüilamente tomaram a peça. Mas pulam da frigideira para o fogo... 11.cxb7 Bxb7 No caso de 11...fxe2, então 12.bxa8=Q, pois o peão e2 está cravado. 12.Bb5++ Xeque duplo e mate!

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Capítulo IX - A Cadeia de Peões

1 – Generalidades e definições. A base da cadeia de peões. O conceito de dois teatros de operações bélicas.

1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 Formou-se uma cadeia de peões brancos e pretos. Os diferentes membros dessa cadeia são os peões d4, e5, e6 e d5. O peão branco d4 deve ser considerado como base, ou seja, como o pé da cadeia branca, enquanto para as pretas o peão e6 desempenha papel análogo. Vemos então que a base é o elo mais atrasado ou o último sobre o qual se apóiam os demais membros da cadeia.

Diagrama 112

Toda cadeia branca e preta de peões divide o tabuleiro em duas partes seguindo sua diagonal. Para nossa maior comodidade, denominaremos a cadeia branca e preta de peões simplesmente de “cadeia de peões” (veja o diagrama 112 e o diagrama 112A).

Diagrama 112 A A idéia da formação em cadeia

Antes que o estudante se ocupe desse tema deve estar seguro de que se recorde bem da “coluna aberta” e o bloqueio do “peão passado”, nos quais se desenvolvem conceitos imprescindíveis para se entender o que segue. Dessa forma recomendo que releia os capítulos 2 e 4 desse livro. A questão é a seguinte: após 1.e4 e6 2.d4 d5 as brancas, enquanto seu peão se mantenha na quarta fileira, têm à sua mercê a possibilidade de abrir a coluna e jogando exd5 e então empreender sobre essa coluna operações mais ou menos valiosas (colocação da sentinela Ne5). 3.e5 Ao jogarem esse lance, se esvai a citada possibilidade e desaparece a tensão pelo centro. No entanto, a energia armazenada de ataque na posição das brancas antes de jogarem 3.e5 não pode ter desaparecido pelo simples fato de se 131

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ter realizado esse lance. É muito possível que a energia continue a existir em uma forma algo modificada, a qual trataremos de estabelecer na seqüência. Por exemplo, o lance 3.e5 contém o avanço do peão e das pretas, o que significa que se produz um bloqueio. Como já sabemos, os peões centrais têm enorme vontade de expansão e portanto o bloqueio estabelecido acarreta ao inimigo um apreciável prejuízo. À parte disto, graças a 3.e5 o campo de batalha toma lugar em duas regiões distintas: na ala do rei e no centro. Na ala do rei

um avanço oportuno (...f5), estabelecendo uma comunicação em sua segunda fileira com a eventual ação de Ra7, então nosso peão e5 se transforma em um excelente formador de cunha, no sentido de que contribui a ligar a ala do rei isolada com o exército restante. Em outras palavras: as brancas atacam g7, as pretas fazem avançar dois passos seu peão f para poder defendê-lo a partir da segunda fileira. Essa defesa, que poderia se classificar como magnífica, fracassa pelo fato de que o peão e5 protesta energicamente e toma o ousado peão na passagem. As brancas, depois da resposta ...Rxf6 obtêm a coluna e e a correspondente guarita e5 para pressionar o peão atrasado e6. No primeiro caso (luta na ala do rei), um peão branco em f4 resultaria incômodo, pois sua ação negativa excede a positiva. No Centro

Diagrama 113 – A ala do rei como campo de ambiente guerreiro. As tropas atacantes são Q, B e N

No diagrama 113 o peão e5 deve ser considerado elemento precedente à desmobilização e formação da cunha. Tirou a casa f6 para um cavalo preto, facilitando assim a aproximação das tropas de ataque das brancas (Qg4). A ala real é pressionada, facilitando o bombardeio das outras peças, que poderiam ser Bd3, Nf3 e Bc1. Se as pretas buscarem se defender através de 132

De forma simultânea ao estreitamento da ala real inimiga, 3.e5 persegue também outras finalidades. Com ele as brancas querem fixar o peão preto e6 em seu lugar para depois atacá-lo com f4, f5. E se jogarem então ...exf5 as pretas teriam abandonado a base da cadeia de peões. Porém se as pretas não realizarem o lance ...exf5, as brancas poderiam então formar uma cunha (f6) ou optar pelo começo da liquidação do peão e6 (fxe6 fxe6 Rf2 ou Re2). Para melhor interpretar a relação convém analisar de forma mais

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aproximada o elemento primário de ataque, tanto lateral como por rodeio (veja o diagrama 114).

Diagrama 115 – Esquema do campo central de ambiente guerreiro. Ambos inimigos atacam reciprocamente as base da cadeia de peões e as torres estão na espreita dispostas a intervir Diagrama 114 – Elementos primários. À esquerda o ataque frontal. À direita o ataque lateral ou rodeio

À esquerda, a torre realiza ataque frontal. O objetivo do ataque (o peão c6) é tranqüilamente submetido ao bombardeio. À direita é impossível um ataque frontal e portanto seria necessária a manobra Rg1-g6-Rxf6 ou então Rg1-g7-f7 e Rxf6. Para nossa finalidade é importante notar que o peão f das brancas é um elemento do componente primário, dado que se não existisse seria possível o ataque frontal contra f6. Adicionalmente, o ataque contra f7 no entanto não fixado é um contra-senso estratégico, pois sabemos que primeiro temos que fixar o objeto de ataque. Portanto, o diagrama 114 à direita nos mostra o elemento primário do ataque lateral ou por rodeio. Depois dessa valiosa comprovação, o plano de luta a se desenvolver no diagrama 115 aumenta seu valor lógico.

Se a operação realizada conduz a estabelecer um elemento primário de ataque, trata-se na realidade de um ataque e em conseqüência ao lance e5 há que se dar um significado semelhante, pois não é outro o sentido pela possibilidade de ser seguido por f4 e f5. Como conseqüência final, podemos dizer que terá que se considerar o centro como um segundo campo de batalha sobre o peão e6. Em outras palavras: e5, ou seja, a formação da cadeia, sempre traz consigo a divisão do campo de batalha em dois, um dos quais é a ala do rei restrita e o outro é a base da cadeia de peões inimigos. 2 – O ataque contra a cadeia de peões A cadeia de peões como problema de bloqueio. Como e porque minha filosofia sobre a cadeia de peões deu lugar a uma “indignação geral” dos especialistas. O ataque contra a base e seu momento crítico.

Anteriormente a 1913 se acreditava que uma cadeia de peões, pelo fato de perder um elo, perdia todo direito à vida. Coube a mim limitar os alcances desse 133

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preconceito, porque já em 1911 demonstrei, com base em algumas partidas (contra Salve, Carlsbad 1911 e Lövenfisch-Tarrasch), as razões pelas quais me inclinava a considerar a cadeia de peões como um problema de puro estancamento. Não interessa se ficam ou não todos os elos, se ficaram estancados pelos peões inimigos. Conseguido esse último, não é fundamental se é pelos peões ou por peças ou ainda somente por torres e bispos. O importante é que os peões inimigos sejam estancados. Esse meu conceito tão revolucionário, ao qual cheguei depois de me haver ocupado muito intensamente do problema do bloqueio, trouxe com ele o desencadeamento de uma tormenta de indignação. Mas o que mais irritou as pessoas foi o meu postulado: “A palavra de ordem é um ataque recíproco sobre a base da cadeia de peões.” Não posso menos que citar a passagem de um artigo de Alapin, que destilava veneno contra a minha teoria. Nos encontramos frente à velha questão: um inovador. A crítica que sobre ele vocifera como louca. O novo é aceito e ao final se chega a afirmar: “Isso era o novo? Mas tudo isso já conhecíamos!” Citarei agora o que foi dito pelo conhecido teórico Alapin em sua forma original, sem tirar nem colocar nada, deixando cair sobre a minha cabeça suas reprovações. Ressalto adicionalmente que todos os parênteses e sinais não são interrupções do atacado, mas do próprio Alapin, a quem passo agora a pena: “No que diz respeito a seus chamados fundamentos ‘filosóficos’ (?!) relativamente a 3.e5, na realidade consistem no seguinte: segundo se disse, com esse lance as brancas querem transferir o ataque sobre o peão d5 para 134

o peão e6 (deveria previamente ser esclarecido se anteriormente ao lance 3.e5? existia algum ‘ataque’ sobre o peão d5. Se observarmos, veremos que havia uma ameaça que era do peão d5 das pretas sobre o peão e4 das brancas, ou seja, o lance ...dxe4. O inverso não é correto, pois após as brancas jogarem exd5 não terminavam dentro de nenhuma ‘ameaça’ previsível, a não ser a situação do Bc8 das pretas. De acordo com isso, não se pode falar da ‘transmissão’ do ataque das brancas, pois esse não existia!...) Depois dessa ‘transmissão’ (3.e5) segundo Nimzovitsch, a palavra de ordem consiste em um ataque recíproco sobre as bases das cadeias de peões, que se produziria, da parte das pretas, com d5 e das brancas, com f4 e f5. Efetivamente é certo que depois de 3.e5? as pretas de imediato iniciam o ataque contra a cadeia branca através de 3...c5; mas buscando nos círculos mais amplos, nada se conhece sobre ‘e4, f4 e f5’ nessa variante. Nas dez partidas anteriormente citadas até o próprio Nimzovitsch jogou em todas elas Nf3, sem se importar com o peão f ?!... Portanto não existe nem sequer sombra da ‘reciprocidade’ estabelecida na sua palavra de ordem ?!... Mas a ‘filosofia’ mais importante do mestre Nimzovitsch se vê em sua ‘lei’ impressa em negrito na página 76 que diz: ‘O ataque a uma cadeia de peões pode ser transmitido de um elo para outro...’ Não cabe dúvida de que se pode fazer isso. Ninguém o proíbe!... Porém essa possibilidade depende do inimigo, das circunstâncias e da sorte..., que é o que quer dizer essa lei (!?), porque a quer denominá-la ‘filosofia’ (?...) escapa à minha compreensão!?” Até aqui Alapin. Quando leio essas linhas parece-me gozar novamente das alegrias dolorosas que se sente ao se criar novos valores! Que bonito! Observem, senhores, que a inovação desconhecida para ele lhe faz inchar as veias da testa e eu... Eu fui esse inovador!

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Hoje já não se trata de segredo, sabemos que tudo o que eu disse acerca da cadeia de peões é uma verdade irrefutável. Nós, ou seja, os gentis leitores de meu livro, sabemos que: a) Depois de 1.e4 e6 2.d4 d5 existe um ataque branco contra d5. Alapin não sabia, pois ignorava minha teoria sobre a coluna aberta. b) De uma forma absoluta hoje em dia se reconhece, por ser facilmente demonstrável, que a posição caracterizada por e5, f4 e f5 é a tendência para o terceiro lance ou um pouco mais tarde. Podemos aprender muito ao investigar porque razão após 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 o ataque das pretas 3...c5 é muito mais predominante do que a manobra das brancas e4, f4 e f5. Como já observamos, a tendência em estancar os elos brancos e pretos é recíproca. Os peões brancos querem bloquear os pretos e vice-versa e após 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 os peões pretos foram freados em sua marcha para o centro enquanto os brancos já se encontram nele (comparem-se os peões e5 e e6). Por essa circunstância temos o direito a considerar os peões pretos como freados e os peões brancos como freios, devido ao que a vontade de expansão dos peões é máxima em direção ao centro. Conseqüentemente as pretas têm mais direito ao ataque (...c5) do que as brancas ao seu avanço correspondente na ala (e4, f4 e f5), o que não basta para negar a existência da ameaça. Se o ataque ...c5 se perde sem conseqüências, então caberia às brancas efetuarem o citado avanço dos peões. O fato de que em muitas partidas não se tenha chegado a realizar a citada

ameaça só nos mostra que as brancas estavam inteiramente ocupadas em deter o curso do ataque ...c5, ou, por outro lado, que lhes foi mais conveniente escolher o outro campo de batalha, ou seja, a ala do rei restrita por e5. 3 – O ataque à base como necessidade estratégica A ruptura dos elos da cadeia inimiga é feita para liberar nossos peões restringidos. A questão da cadeia de peões na sua essência acaba reduzida a um problema de bloqueio.

Reconhecer como inimiga a cadeia de peões que nos pressiona e atacá-la é uma só coisa e por isso podemos dizer que nunca é cedo para iniciar uma ação libertadora contra a cadeia. A luta libertadora se realiza de acordo com os seguintes princípios: através de um peão se consegue a eliminação com um ataque à base da cadeia e depois temos que virar o ataque ao inimigo mais próximo, ou seja, contra a possível nova base. Por exemplo: depois de 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5, a massa de peões pretos (e6 e d5) aparece estancada e por conseqüência, de acordo com a nossa regra, o ataque contra a cadeia branca que pressiona deve ser iniciado de imediato. O ataque deve se iniciar imediatamente através de: 3...c5, pois o peão e5 é uma ornamentação do peão d4, esse sim o verdadeiro cimento da estruturação da cadeia branca. Se o objetivo é destruir um edifício o mais rápido possível, a ninguém ocorreria começar por demolir os detalhes de ornamentação, pois é sabido que ao se 135

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derrubar as bases o restante cai por si mesmo. Depois de 3...c5 as brancas dispõem de vários lances. Mas o plano das pretas ficará mais claro se supusermos que as brancas jogassem com ingenuidade, como que ignorando de forma absoluta o problema da cadeia de peões: 4.dxc5 Bxc5 5.Nc3? f6! Com isso vemos o desenvolvimento mais lógico dos acontecimentos: primeiro foi destruído o “pilar” d4 e agora é a vez do peão e5. Cada um ao seu tempo, da mesma forma que o herói do cinema que luta sozinho contra uma multidão. Este, de forma simples, primeiro agarra alguém que esteja próximo e o enche de pancadas. Segue o seguinte, que fica inválido frente uma feroz bordoada. O terceiro recebe um chute descomunal e assim por diante, até que em breve os inimigos estarão espalhados pelo chão de forma lastimável. Em nosso caso será o mesmo... mas começando pelo pilar, ou seja, a base da cadeia de peões. Depois de 5...f6 segue: 6.exf6 Continuando com ingenuidade; naturalmente teria seguido 6.Nf3. 6...Nxf6 7.Nf3 Nc6 8.Bd3 e5! A ação libertadora das pretas, que geralmente compreende entre 20 a 25 lances, já pode ser dada como concluída. Primeiramente venceram os diferentes elos da cadeia das brancas, começando pela base, obrigando-os por determinação própria a desaparecer para então fazer um avanço com marcha triunfal dos seus peões, que se inicia com ...e5. Esse avanço tão desejado é a explicação das medidas enérgicas 136

adotadas pelas pretas no terceiro lance e nos seguintes. Os peões estancados recuperaram a sua mobilidade, ou seja, as pretas atenderam suas aspirações. Esses peões avançam possuídos por um verdadeiro espírito bélico: dão a impressão de que se quisessem vingar da humilhação sofrida ao serem estancados anteriormente.

Diagrama 116 – Aqui o correto seria efetuar o ataque contra a cadeia branca através de ...b5-b4 e não por meio de

f6 Outro exemplo é apresentado pelo diagrama 116, onde vemos que o peão c3 é a base da cadeia branca (não o peão b2, pois esse peão não faz parte da cadeia branca pela falta de seu colega preto em b3) e que portanto é contra esse peão que se deve efetuar o ataque violento com o peão b das pretas (...b5, ...b4). Depois de se realizar cxb4 o peão d atua como sucessor do peão c em seu papel como base da cadeia. Mas agora, de forma diferente do peão c a nova base está sem defesa. A base indefesa (não defendida por peão) significa uma debilidade. No exemplo citado, jogar ...f6 (ao invés do correto ...b5, ...b4) é errado, pois após a queda do peão e5 a cadeia de

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peões brancos no entanto permanece intacta. Vamos fazer notar os fatos da forma que correspondem: a luta de liberação está de acordo com a luta com um bloqueador que incomoda (capítulo IV) e portanto trata-se simplesmente de um problema de bloqueio. 4 – Transmissão das regras de bloqueio estabelecidas para o peão passado para a cadeia de peões A manobra de troca (para substituir um bloqueador implacável por outro mais amistoso) aplicada à cadeia de peões.

De acordo com o estabelecido no capítulo IV, sabemos que bloqueador é toda peça que detém um peão, o qual se não fosse por isso disporia de mobilidade. Apesar disso poderia surpreender que, depois de: 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5, consideremos bloqueadores aos peões d4 e e5 pela simples razão de não estarmos acostumados a designar como bloqueador a um peão! Mas devo advertir que os peões de cadeia são de uma classe superior aos comuns e portanto podem muito bem ter funções diferentes das de um peão comum. Disso se deduz que é completamente correto considerar os peões de cadeia como bloqueadores. Estabelecido isso, vamos aplicar agora a manobra de troca na casa de bloqueio, conhecida no capítulo IV, no campo de ação da cadeia de peões. Então a troca só teria razão de ser quando o novo bloqueador, sucessor do derrubado, seja mais fraco do que o anterior e, conseqüentemente por extensão, podemos estabelecer o mesmo princípio para nosso caso. Por exemplo: 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5! 4.Nc3

Agora as pretas poderiam trocar o bloqueador (d4) por outro (Qd4) seguindo entre outros lances: 4...cxd4 5.Qxd4 Nc6 Onde vemos que a dama resultou em um bloqueador que não poderá se manter na sua posição. Ou seja, a manobra de troca foi correta para as pretas. Se agora se jogasse 6.Bb5, depois da resposta 6...Bd7 7.Bxc6 bxc6 as pretas têm os dois bispos e uma massa de peões móveis no centro, com a conseqüente vantagem. Em troca, a manobra teria resultado fraca depois de: 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5! 4.c3 Nc6 5.Be3 cxd4 Seria melhor 5...Qb6. 6.Bxd4 O bispo se transforma em um osso duro de roer (bloqueador forte) e as pretas realizam uma nova troca para eliminá-lo. 6...Nxd4 7.Qxd4 Ne7 8.Nf3 Nc6 9.Qf4 Embora as pretas tenham expulsado as tropas de bloqueio, foi somente à custa de tempo, causado pelos lances do cavalo do rei preto. Depois de 9.Qf4, as brancas estão muito bem. Suas peças estão bem situadas para um ataque na ala do rei, mas também exercem um controle suficiente no centro. Por exemplo: 9...f6 Para fazer saltar a cadeia das brancas. 10.Bb5 a6 11.Bxc6+ bxc6 12.0-0 As pretas jamais conseguirão fazer móvel seu peão de e6, pois se 12...fxe5, 13.Nxe5 e o cavalo se instala no posto avançado. Com isso vamos compreendendo 137

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melhor a cadeia de peões: toda manobra de troca dentro do campo de ação da cadeia só deve ser realizada considerando a possível substituição de bloqueadores enérgicos fortes por outros mais fracos. Para essas manobras devemos ser auxiliados em alto grau pela sensibilidade sutil adquirida no estudo do capítulo IV, através da qual devemos estabelecer se se trata de bloqueadores fortes ou fracos, elásticos ou rígidos etc. Diagrama 118 – Para conseguir o bloqueio permanente de e6 e d5 é melhor jogar

15.Bd4 Qc7 16.Qe2 ou

de forma direta 15.Qe2 ?

Diagrama 117 – O problema imediato para as brancas é a conquista permanente de suas casas d4 e e5

Observemos o diagrama 117 onde Qc2 seria um lance fraco, apesar da forte ameaça que encerra (Bxf6 seguido de Bxh7). A fraqueza reside na circunstância de que as brancas melhor teriam feito algo para defender sua muralha de bloqueio. O correto então seria: 1.Nd2 0-0 Nf3 Por outro lado, se 1.Qc2?, a resposta poderia ser 1...0-0! 2.Bxf6 Rxf6 3.Bxh7+ Kh8 4.Bg6 (ou Bd3) e5!, onde, embora as brancas tenham ganhado um peão, as pretas venceram o bloqueio e ficaram prestes a iniciar a marcha central. 138

No diagrama 118 se poderia considerar a manobra 15.Bd4 Qc7 16.Qe2, para depois seguir com 17.Ne5, mas esse plano de ampliar o círculo de bloqueio não é realizável, pois poderia seguir 16...Ng4!! 17.h3 e5! e a vontade de expansão do peão preto e se impôs, apesar de todas as contra-medidas. Seria correto: 15.Qe2 Rac8 Ou 15...Bxe5 16.Nxe5 Rac8 17.c4!. 16.Bd4! Qc7 17.Ne5 E as pretas ficariam suficientemente bloqueadas. Resumindo: é mau jogar 15.Bd4 Qc7 16.Qe2 porque o bloqueador que está à espreita (ou seja, o Nf3 pretendente ao bloqueio) só exerceria uma ação limitada. Nos comentários de minha partida contra Salve (da qual tomei esse exemplo e que veremos a seguir) demonstrarei minha teoria da troca com novos exemplos. 5 – O conceito de movimento de tropas e assédio posicional aplicado à cadeia de peões. O atacante frente aos dois caminhos.

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Se o lado atacante jogou conforme o espírito das explicações dadas nesse capítulo (ataque à base e correta aplicação da operação de troca na casa de bloqueio), com freqüência se verá recompensado pelo fato de que seus peões restringidos obterão plena liberdade. Haverá ocasiões, no entanto, em que a luta dentro das linhas aqui desenhadas chegará em um ponto morto e em tais casos se fará necessário o emprego de algum outro plano. Vejamos a seguinte partida, que considero instrutiva de A a Z, pois nela exponho, com certo detalhe, minha filosofia sobre o centro. Partida 20 Nimzovitsch - Salve Carlsbad, 1911 Defesa Francesa

1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 Como se pode observar, as pretas através de ameaças tratam de instigar seu inimigo a retirar-se da casa d5. Esse empenho tem por objetivo o envolvimento completo da cadeia e portanto o catalogaremos como estratégia de surpresa. Observe-se também o lance 5...Qb6, pois sabemos que os lances de dama na abertura não são usuais e no entanto aqui é admissível, pois sendo o princípio dominante a cadeia de peões todas as nossas ações estão regidas pelo campo de ação da mesma. 6.Bd3

Diagrama 119 – As pretas estão na encruzilhada e deverão optar por métodos de surpresa ou por luta de posição. Para o primeiro caso devem jogar ...Bd7. O segundo seria ...cxd4 e

cxd4 submeter o peão branco d a um assédio tenaz 6...Bd7 Era mais correto 6…cxd4 7.cxd4 mudando completamente de rumo. 7.dxc5! Bxc5 8.0–0 f6 As pretas agora se sentem triunfantes e cheias de vontade se lançam na destruição do último elo da cadeia com o grito de guerra “passo o meu peão e”, mas... ocorre o contrário. 9.b4! Para defender a casa e5 de forma segura. Com 9.Qe2 também se defenderia, mas não de forma acentuada, pois sobreviria a troca 9... fxe5 10.Nxe5 Nxe5 11.Qxe5 Nf6 e o bloqueador de e5 é facilmente atacado. 9...Be7 10.Bf4 fxe5 Outra vez a manobra da troca, mas agora não conduz a nada pois o novo bloqueador Be5 é um osso duro de roer. 11.Nxe5 Nxe5 12.Bxe5 Nf6 O lance desejado pelas pretas 12...Bf6 fracassaria devido a 13.Qh5+ g6 14.Bxg6+ hxg6 15.Qxg6+ Ke7 ao seguir

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16.Bxf6+ Nxf6 17.Qg7+. 13.Nd2 O ganho do peão com Qc2? 0-0 resulta ser ilusório (veja o diagrama 117). 13...0–0 14.Nf3! Reforço das tropas de bloqueio com o cavalo. 14...Bd6 Não serviria 14...Bb5, pois com 15.Bd4 Qa6 16.Bxb5 Qxb5 17.Ng5 se ganha um peão. 15.Qe2 Veja o diagrama 118. Já sabemos que 15.Bd4 é agora prematuro. 15…Rac8 16.Bd4 Qc7 17.Ne5 A imobilidade dos peões bloqueados é maior do que nunca. As brancas jogaram de forma econômica, mas é bom fazer notar que o êxito de se manter d4 e e5 estava por um fio, ou seja, dependia do aproveitamento correto das casas d4, e5, c2 e e2. 17...Be8 18.Rae1 Bxe5 19.Bxe5 Qc6 20.Bd4! Obrigando o lance …Bd7. 20...Bd7 21.Qc2 Reagrupamento decisivo. 21...Rf7 22.Re3 b6 23.Rg3 Kh8 24.Bxh7 No capítulo IV aprendemos a forte ação das peças centralizadas em direção às alas. 24...e5 O lance 24...Nxh7 perderia por 25.Qg6. 25.Bg6 Re7 26.Re1 Qd6 27.Be3 d4 28.Bg5 Rxc3 29.Rxc3 dxc3 30.Qxc3 As brancas já têm a partida ganha. 30…Kg8 31.a3 Kf8 32.Bh4 Be8 33.Bf5 Qd4 34.Qxd4 exd4 35.Rxe7 Kxe7 36.Bd3 Kd6 37.Bxf6 gxf6 38.Kf1 Bc6 39.h4 1–0 140

Recomendamos agora dar uma olhada retrospectiva na partida. Após 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 6.Bd3, as pretas mediante 6...cxd4 7.cxd4 Bd7, seguido eventualmente de ...Nge7 e ...Nf5 seriam obrigadas a passar para um rumo mais tranqüilo. Preferiram, no entanto, jogar de forma a obrigar o inimigo a capitular completamente à sua aspiração dentro do campo de ação da cadeia, de acordo com o seguinte plano: 1. Forçar os lances brancos dxc5 e exf6 e 2. Fazer fugir os possíveis bloqueadores de reposição (por exemplo, Be5). Seu plano fracassou na última parte, pois os bloqueadores de reposição se mantiveram firmes e em conseqüência exerceram uma ampla ação de bloqueio. Para nós interessa estabelecer os seguintes postulados: a) Aos peões pretos estrangulados (estancados) não lhes interessa se o são por peões ou por peças, tanto faz uma ou outra coisa. b) A destruição da cadeia de peões que estanca não significa em si mesma uma ação libertadora ampla, a qual no entanto teria que colocar em fuga os possíveis bloqueadores, ou seja, as peças bloqueadoras. Uma questão de importância decisiva é estabelecer até onde isso é possível. Para esclarecer as relações entre o peão e as peças, citarei a observação retirada de um artigo meu publicado em 1913 (“O abandono do centro - um preconceito”): “É claro que os peões são os mais adequados para formar o centro, pois são os mais estáveis. Porém as peças colocadas no centro podem muito bem substituir os peões.” Voltaremos a esse assunto mais adiante e aqui só fazemos

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notar que nos inclinamos a considerar bastante prejudicial todo ensaio de libertação que termine inconcluso (como a tentativa de Salve na partida anterior). Agora voltemos à posição do diagrama 119. 5A – A luta posicional, ou o assédio lento da base indefesa. Bombardeio contínuo. O desconforto mútuo das peças defensoras. Como manter a pressão. Formação de novas debilidades. A base como debilidade no final.

Na posição após os lances: 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 6.Bd3 parece conveniente, como já observamos em várias oportunidades, não jogar 6...Bd7, mas sim 6...cxd4. Através desse lance se imobiliza por completo a base d4. Antes de se jogar ...cxd4, o peão branco poderia abandonar seu posto (jogando dxc5), mas depois desse lance a possibilidade desapareceu. Há que se reconhecer então que 6...cxd4 significa uma resignação, pois com esse lance são sepultados os sonhos ambiciosos de se obrigar o inimigo a capitular em suas aspirações dentro da cadeia. Em troca, as pretas conseguem outras pequenas possibilidades. O peão branco que retoma pode ser atacado repetidas vezes, o que se faz nem tanto com a intenção de conquistá-lo, mas sim com a de dar às peças que o defendem um papel defensivo. O objetivo perseguido é a vantagem da posição agressiva das peças (veja o capítulo VI). A continuação poderia ser: 6...cxd4 7.cxd4 Bd7 Ameaçando ...Nxd4, o qual não

poderia ser feito de imediato: 7...Nxd4?? 8.Nxd4 Qxd4 9.Bb5+, com a perda da dama. 8.Be2 Se 8.Bc2 Nb4 e as pretas teriam vantagem pelos seus dois bispos poderosos. 8...Nge7! Dentro de toda lógica as pretas escolhem um desenvolvimento que exerce pressão conta a base, uma vez que em partidas fechadas a cadeia é quem dita os rumos – partidas fechadas são aquelas caracterizadas pela presença de uma cadeia de peões. 9.b3 Nf5 10.Bb2 (veja o diagrama 120)

Diagrama 120 – A base branca (d4) está submetida à pressão. Assédio típico da base desprotegida

10...Bb4+ Esse xeque põe à mostra a fraqueza da defesa de um ponto por numerosas peças, que acabam por atrapalhar umas às outras. 11.Kf1 Tanto 11.Nc3 como 11.Nd2 causariam a anulação de uma defesa. 11...Be7 Original do Dr. Tarrasch. O estudante deve honrar esse lance, prestando nele 141

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toda a atenção. Para manter a tensão as pretas sob nenhum ponto de vista devem permitir que se produza uma modificação no equilíbrio existente entre defensores e atacantes (3 a 3) do peão d4. Ou seja, as peças que atacam não devem perder suas posições de ataque e por isso deverão jogar 11...h5 para impedir o lance inimigo g4 ou fazer o lance do texto, que por outro caminho conduz ao mesmo lugar. Se depois do lance do texto seguisse 12.g4, com 12...Nh4 desapareceriam um defensor e um atacante, conservando-se a relação de atacantes e defensores (2 a 2). A estratégia típica a se empregar em casos semelhantes se esclarece de acordo com os seguintes postulados: a) A base inimiga fixada é atacada por diversas peças. b) De acordo com isso, se conseguirá pelo menos a vantagem ideal da posição agressiva das peças, que também se faz notar pelas dificuldades que se cria para o inimigo se desenvolver. (Seria o caso de se citar a elasticidade restrita e a limitação da capacidade de manobra nas peças inimigas. No caso de um ataque repentino em um flanco as peças defensoras não teriam a mesma velocidade para socorrer o lugar de perigo e portanto terminarão atrasadas). c) Trata-se de manter o maior tempo possível a pressão sobre a base, até quando pelo menos se tenha criado uma fraqueza no inimigo. (A debilidade surgirá como conseqüência lógica das dificuldades de desenvolvimento). d) Chegado o caso, tem-se que modificar o plano de luta: abandona-se a debilidade primitiva (base d4), atacando com maior vigor o novo objetivo. Muito 142

mais tarde, talvez no final, se volta de novo a ter como objetivo de luta a base débil da cadeia inimiga. e) A base débil deve ser considerada como debilidade no final, pois é então quando o elemento específico de ataque (a coluna aberta, no nosso caso a coluna c) se faz sentir (...Rc4, seguido de ...Rxd4, ou ...Rc2-d2, seguido de ...Rxd4). f) O atacante não deve esquecer que também tem uma base para tomar conta. No nosso caso, se as brancas conseguirem sanear suas condições na cadeia, ou seja, eliminar a pressão contra d4, então o peão f – f4 e f5, com ataque contra a base preta de e6, ou então um jogo de peças contra a ala do rei apertada por e5, pode inverter a situação no tabuleiro. A aplicação do postulado a) não é difícil para o estudante. Na posição: brancas - Kd2, Nb2, Rc1, Pa2, Pb4, Pc5, Pd5, Pe4, Pf5, Pg2, Ph2; pretas Kb8, Nh6, Rf8, Pa7, Pb6, Pc7, Pd6, Pe5, Pf6, Pg7, Ph7, vê-se que a cadeia é e4-d5 das brancas e e5-d6 das pretas, na qual a base preta é d6. As brancas aqui jogam: 1.cxd6 cxd6 2.Rc6 Nf7 3.Nc4 Rd8 No caso de 3...Rc8 então 4.b5 Rxc6 5.dxc6 com melhor final de cavalos 4.a4! Com o objetivo de manter em seu posto o Nc4 atacante. As brancas agora pressionam d6, possuindo por conseqüência a vantagem ideal da posição agressiva de suas peças devido ao fato do cavalo branco de c4 ser mais agressivo do que o ...Nf7 das pretas etc. Essa vantagem poderia ser aproveitada com 5.b5 seguido de Kd2-e3-f3-g4h5, para continuar g4-g5 e frente ao

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lance preto ...h6 conseguir a penetração de Kg6. Será muito mais difícil ao estudante assimilar os postulados c) e d). O aproveitamento direto de uma debilidade de peões na realidade não pertence ao meio-jogo (veja o item f). A única coisa que se pode esperar é submeter o inimigo durante algum tempo aos inconvenientes de uma defesa forçada. Se durante esse transcurso de tempo tiver surgido no campo inimigo alguma outra debilidade (o que é muito possível) então será indicado mudar de cavalo, deixando a base em paz para se dedicar à nova debilidade. Quanto mais afastadas estiverem essas debilidades, melhor será para nós (coisas pouco conhecidas na escola pseudo-clássica). Por exemplo: Tarrasch costumava continuar atacando de forma inflexível a base escolhida, ou quando muito se mantinha fiel à ala escolhida. Eu, por outro lado, atribuo valor a que a debilidade na base inimiga deva ser aproveitada no final. Por exemplo: as pretas atacam desde o meio-jogo a base contrária e as peças inimigas se acumulam e começam a atrapalhar umas às outras, criando dificuldades no desenvolvimento, do que necessariamente surgem novas debilidades – conseqüência lógica das dificuldades de desenvolvimento. A debilidade criada deve ser considerada como o fruto legítimo do trabalho de assédio e então temos que dirigir todas as forças de ataque contra a nova chama, esquecendo por completo a anterior. No final poderemos voltar a ela, ou seja, “em direção ao nosso primeiro amor”. De acordo com isso, no final a base fraca volta a ser o objetivo principal do ataque.

Diagrama 120A - Jogam as pretas. Como poderão manter a pressão contra d4?

Como exemplo para esclarecer o aproveitamento indireto de uma base inimiga debilitada, pode-se considerar o diagrama 120A, correspondente à partida Paulsen-Tarrasch (partida 21): 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 6.Bd3 cxd4! 7.cxd4 Bd7 8.Be2 Nge7 9.b3 Nf5 10.Bb2 Bb4+! 11.Kf1 As brancas (Paulsen) se vêem obrigadas a abandonar o roque e jogar 11.Kf1. O diagrama nos mostra então o êxito da pressão contra d4. O objetivo das pretas se fixa agora em manter a pressão contra d4 – que se pode obter através de 11...h5 ou também com 11...Be7, para no caso de 12.g4 jogar 12...Nh4 e conservar dessa forma o mesmo vigor do ataque contra d4 – mas as pretas decidiram abandonar o jogo contra a base e fazer o possível para evidenciar e aproveitar a debilidade criada pelo lance Kf1. Esse aproveitamento só é possível realizar através de um sacrifício de qualidade muito sutil que constitui uma variante de combinação minha, a qual aprecio sobremaneira pois ilustra de 143

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forma clara a concordância entre “princípio” e “combinação” (ou seja uma combinação que somente pode ser encontrada reconhecendo a exatidão do princípio “abandonar o ataque à base!”). Voltemos à posição do diagrama 120A, onde eu jogaria assim: 11...0–0 No caso de seguir 12.Bd3 para aliviar d4, então 12...f6 13.Bxf5 exf5 com posição vantajosa para as pretas devido aos seus bispos. 12.g4 Nh6 13.Rg1 f6! 14.exf6 Rxf6! 15.g5 Rxf3 16.Bxf3 No caso de 16.gxh6 Rf7. 16...Nf5 17.Rg4 (diagrama 121)

Diagrama 121 – As brancas apesar de sua superioridade material se encontram mal

A ala branca real assolada e as casas da coluna f debilmente defendidas seriam suficientes para a perda da partida, porém faremos um pequeno extrato: 17...Be8 Também seria bom 17...Rf8. 18.Qe2 Ncxd4 19.Rxd4! Nxd4 20.Qe5 O último foguete... 20...Bb5+ 21.Kg2 Nf5 22.Bxd5 Se 22.Nc3 seguiria 22...Bxc3 144

23.Bxc3 d4 etc. 22...exd5 23.Qxf5 Rf8 24.Qxd5+ Rf7 Uma auto-cravada para assegurar o peão g contra o possível lance Qd4. 25.Qd4 Bc5 e as brancas devem abandonar. A decisão se produziu na ala do rei, ou seja, as pretas aproveitaram integralmente a nova debilidade sem ser necessário voltar à primeira. O estudante deve ter em conta especialmente a virada realizada após o lance 11, onde o ataque se transfere do centro (d4) para a ala debilitada por Kf1. Como contrapartida da virada citada, temos que observar que 11...Be7 (voltemos ao diagrama 120A) 12.g3 e Kg2 e posterior eliminação da pressão contra d4 teria dado boas chances para as brancas, que de acordo com isso bem que poderiam ter invertido a situação do tabuleiro (veja o postulado f). Com isso se nota a possibilidade de ataque contra a ala real preta pressionada por e5 (veja a Partida 22, Nimzovitsch-Tarrasch). Antes de prosseguir, quero recordar especialmente a conveniência de se exercitar em se aproveitar no final a base fraca inimiga e para isso recomendo o estudo da partida 15 com a aplicação do seguinte método: colocar uma cadeia de peões no tabuleiro. Por exemplo, brancas – d4, e5; pretas – d5, e6 com uma série de peões por ambas as partes (brancas – a2, b2, f2, g2, h2; pretas – a7, b7, f7, g7 e h7) e uma torre ou torre e peça menor por lado e como jogo puro de peões tratar de aproveitar a debilidade de d4.

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6 – A transferência do ataque

As pretas, na posição do diagrama 119, podem optar por dois planos: 6...Bd7 (tática de jogo por surpresa) ou 6...cxd4 (assédio posicional da base fixada). Com toda probabilidade haverá um momento no qual as pretas deverão se decidir, pois é impossível manter a opção de modo permanente, porém é muito mais dentro da cadeia de peões. Nesse último caso, o defensor se apóia nas possibilidades de contragolpear que existem na sua posição, que se baseia na possibilidade de realizar uma violenta ação libertadora. O amadurecimento dessa ameaça inimiga é que obriga a definição imediata. Também poderá ser obrigada se o inimigo dispuser de um ataque de ala que nos obrigue uma contração. Os lances obrigados são obrigados... e portanto a escolha entre dois planos de jogo é o mais recomendável. Até agora temos nos referido somente à escolha entre dois planos de ataque, mantendo fixo o objetivo (d4), mas agora veremos como é difícil a simples escolha desse objetivo. Trata-se de uma cadeia de peões que deve ser atacada e então o leitor dirá que “sem dúvida deve-se atacar a base da cadeia de peões”. Efetivamente tem razão, mas no caso em que por algum motivo isso não fosse oportuno o ataque tem que ser dirigido a outro objetivo na cadeia. Veremos isso com um estratagema que esquematiza a translação do ataque. Observemos a cadeia que se forma depois de: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Be7 4.d4 d6 5.d5 Nb8 As brancas agora escolhem o centro como campo de batalha, ou seja, jogam

Bd3 para seguir com c4 e eventualmente c5 (ainda que pudessem optar por um ataque de peças, ou seja, sem jogar c4) contra a ala da dama pressionada por d5. As pretas tratarão de jogar ...f5 para sacudir a base branca em e4. A escola pseudoclássica considerava que ...f5 anulava o lance d5, mas de acordo com o demonstrado em meu trabalho revolucionário surgido em 1913, “‘A Partida Moderna de Xadrez’ do Dr.Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno?”, isso não é assim. Trata-se somente de uma reação natural contra d5 e portanto se pode suportá-la tão facilmente como o lance branco c4-c5.

Diagrama 122

Em essência se pode chegar ao diagrama 122, onde o ataque à base e4 não parece prometer muito, pois ao se jogar ...fxe4 pode seguir fxe4 e a nova base termina bem defendida, ou também com Nxe4 ou Bxe4, com bom centro de substituição. Considerando isso, as pretas não jogam ...fxe4, mas sim ...f5, com o que transferem a base branca para f3 que se pode defender bem (contra g4 f4xg3 e.p.), mas nesse caso a posição do rei branco resulta ameaçada e algo restrita. Ou seja, por culpa do rei a nova base 145

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branca resulta mais fraca do que a anterior. Há ainda outros casos nos quais uma base resulta mais fraca do que outra e por isso a transmissão do ataque de uma base para outra não é uma casualidade, como acreditava Alapín e outros mestres antes do surgimento do meu artigo, mas sim que a possibilidade de transmissão é uma arma a mais na luta contra toda a cadeia de peões. O juízo global sobre a cadeia de peões é a seguinte: “Base e4 difícil de atacar; base f3 (depois da translação por ...f4 das pretas) muito sensível pelas razões expostas”. Vejamos o seguinte início: 1.e4 Nc6 2.d4 d5 3.e5 Bf5 4.f4 e6 5.Nf3 Nb4 6.Bb5+ c6 7.Ba4 b5 8.a3! Na6 9.Bb3 c5 10.c3 A translação do ataque que se realizará contra d4 e c3, a executar com 10...c4 é amplamente justificada, pois o peão d4 está defendido em excesso. Seguem os lances: 10...c4 11.Bc2 Bxc2 12.Qxc2 (veja o capítulo sobre a restrição), restringindo a continuação da ala real branca, que estava disposta para o ataque através de h4 e Nf4 e começando o ataque contra o novo objetivo (c3) com a5 e b4. Antes de apresentar o habitual esquema, considero necessário recordar como na realidade é difícil a condução acertada do jogo na cadeia de peões. Quase em seguida à formação da cadeia há que se escolher entre “ala” ou “cadeia” e um pouco mais tarde, na oportunidade de dirigir o ataque contra a base, optar pela tática de surpresa ou guerra de assédio. Mas isso não basta, 146

tem que se contar ainda com uma possível translação do ataque ao elo seguinte da cadeia, não sendo fácil saber onde e quando se deve realizar essa translação. A dificuldade culmina quando nos damos conta que também nós temos uma base vulnerável. Mais considerações sobre a cadeia de peões serão vistas nos capítulos sobre o centro e a restrição. Partidas sobre a cadeia de peões

Partida 21 Paulsen -Tarrasch 1888 Defesa Francesa

Essa partida mostra a luta contra uma cadeia de peões por assédio 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 6.Bd3 Como tem-se que cuidar da base, é mais natural o desenvolvimento 6.Be2 pois defende melhor do que o lance do texto. 6...cxd4 7.cxd4 Bd7 8.Be2 Nge7 9.b3 Nf5 10.Bb2 Bb4+ 11.Kf1 Forçado (veja o diagrama 120A). 11…Be7 Mantendo a pressão contra d4 (se agora 12.g4 Nh4!), mas seria mais correto 11...0–0 12.g4 Nh6 13.Rg1 f6! 14.exf6 Rxf6 15.g5 Rxf3! 16.Bxf3 Nf5 17.Rg4 Be8 (veja o diagrama 121 e as observações correspondentes). 12.g3 a5? Buscando aproveitar a “nova debilidade b3”. É uma pena que b3 na verdade não seja uma debilidade. 13.a4 Rc8 14.Bb5

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A casa b5 terminou transformada em um excelente ponto de apoio para as peças brancas. 14...Nb4 15.Bxd7+ Inteiramente equivocado. Com 15.Nc3! as brancas poderiam salvar todas as dificuldades, por exemplo: 15...Bxb5+ 16.Nxb5 Nc2 17.Rc1 Nce3+ 18.fxe3 Nxe3+ 19.Ke2 Nxd1 20.Rxc8+ Kd7 21.Rxh8 Nxb2 22.Rc1 e ganham. 15...Kxd7 16.Nc3 Nc6 17.Nb5 Na7 18.Nxa7? De maneira alguma as brancas deveriam abandonar a casa b5, em todo caso teria sido suficiente 18.Qd3 Nxb5 19.axb5 para evidenciar o mal causado por ...a5?. 18...Qxa7 19.Qd3 Qa6 Agora guardaremos a base debilitada como debilidade no final. 20.Qxa6 bxa6 21.Kg2 Rc2 22.Bc1 Rb8 23.Rb1 Rc3 24.Bd2 Rcxb3 25.Rxb3 Rxb3 26.Bxa5

Não ...Ra3 devido a Rc1. Se com o lance do texto as brancas jogassem Rc1 seguiria ...Ne3+ e na seqüência ...Nc4. 27.Bd2 Bb4 28.Bf4 h6 Pode-se ceder um canto, pois a posição das pretas assim o permite. 29.g4 Ne7 30.Ra1 Nc6 31.Bc1 Rc2 32.Ba3 Rc4 Era mais simples 32…Bxa3. 33.Bb2 Bc3 34.Bxc3 Rxc3 35.Rb1 Kc7 36.g5 Rc4 Finalmente! 37.gxh6 gxh6 38.a5 Ra4 39.Kg3 Uma última tentativa desesperada de continuar o “ataque” iniciado com g5. 39...Rxa5 E ganham as pretas: 40.Kg4 Ra3 41.Rd1 Rb3 42.h4 Ne7 43.Ne1 Nf5 44.Nd3 a5 45.Nc5 Rc3 46.Rb1 Nxd4 47.Na6+ Kd8 48.Rb8+ Rc8 49.Rb7 Ke8 50.Nc7+ Kf8 51.Nb5 Nxb5 52.Rxb5 Ra8 etc. Recomendamos ao estudante sua atenção a esse final tão bem conduzido pelo Dr. Tarrasch. Partida 22 Nimzovitsch -Tarrasch San Sebastian, 1912 Defesa Francesa

26.Bxa5 As brancas conseguiram se livrar de sua debilidade b3 sobre uma coluna aberta, mas seus peões d4 e a4 são difíceis de defender. 26...Rb2! Diagrama 123 – Posição após

Os primeiros 14 lances como na partida anterior, com alguma troca na ordem de lances. 15.Nc3! Na6 Com relação a 15...Bxb5+ 16.Nxb5 Nc2 veja-se o comentário ao lance 15 da partida anterior. 16.Kg2 Nc7 17.Be2 Bb4 18.Na2 Na6 19.Bd3 Ne7 20.Rc1 Nc6 21.Nxb4 Naxb4 22.Bb1 147

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As brancas superaram agora as dificuldades do desenvolvimento e têm a base perfeitamente defendida. Será possível então virar as lanças contra o inimigo e iniciar um ataque contra as pretas na ala do rei, que se encontra pressionada por e5. 22…h6 23.g4 Para tornar pouco simpática a possível intenção de rocar. 23…Ne7 24.Rxc8+ Bxc8 25.Ne1 Rf8 26.Nd3 f6 27.Nxb4 Qxb4 28.exf6 Rxf6

belo exemplo de sua mente estratégica. O próprio Dr. Tarrasch, um dos grandes mestres de estratégia enxadrística, foi completamente superado”. Apesar do comentário lisonjeiro, devo observar que não é difícil manobrar bem quando se faz inteiramente baseado em um sistema. Então eu já sabia que o peão e5 ameaçava gravemente a ala do rei inimiga e ainda mais, que se as brancas conseguissem manter seu peão d4 chegaria o momento de colher os frutos. Tudo isso hoje em dia é corrente, mas na época era absolutamente revolucionário. Partida 23 Becker - Nimzovitsch Breslau, 1925 Defesa Francesa

Diagrama 124 – Posição após

28...Rxf6 29.Bc1! A coragem necessária para conscientemente se deixar ameaçar durante horas e horas com o único objetivo de realizar uma possibilidade remota bem que merece um prêmio. Nesse caso a recompensa aparece pelo ataque direto que as brancas conseguem. 29...Nc6 30.g5 hxg5 31.Bxg5 Rf8 32.Be3 Qe7 33.Qg4 Qf6 34.Rg1 Rh8 35.Kh1 Rh4 36.Qg3 1–0 A ameaça era Bg5 e também Qxg7. A respeito dessa partida Burn fez a seguinte observação: “Uma partida excelente por parte de Nimzovitsch, um 148

Ilustra minha idéia sobre os campos de luta de forma muito acentuada. 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Nc6 Um “Vorgabstil” (xadrez de Café, N. do T.), que no sentido de Lasker consiste em escolher uma variante que a seu próprio juízo é inferior para colocar o inimigo frente a um problema difícil. Lasker jogava esse estilo com preferência e um virtuosismo único. Talvez para Lasker venha daqui a idéia de procurar na abertura o “calcanhar de Aquiles”, o qual, de acordo com o exposto, era uma pretensão equivocada. O lance 3...Nc6 provém de Alapin. Depois de e5 o peão c das pretas ficará mal colocado. Este é o defeito da inovação de Alapin. 4.Nf3 Bb4 5.e5 Bxc3+ 6.bxc3 Na5 Os últimos lances aumentam o perigo,

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ao demorarem as pretas o desenvolvimento da ala do rei, pois uma ala restrita deve ser cuidadosamente atendida. 7.a4 Pouco compreensível. Teria sido melhor 7.Nd2 Ne7 8.Qg4 (primeiro campo de luta), onde as pretas deveriam responder 8...Nf5 9.Bd3 Rg8 10.Qh3 h6 para se defender. 7...Ne7 8.Bd3 b6 Constitui um preparativo para o ataque da base d4 com ...c5. 9.Nd2 c5 10.Qg4 Como as pretas farão para defender seu peão g? 10...c4 Abandonando-o. Qualquer defesa teria resultado comprometedora. 11.Be2 No caso de 11.Qxg7 seguiria 11...Rg8 e depois ...cxd3. 11...Nf5 O peão g fica defendido, porém às custas da pressão sobre d4 e em conseqüência as brancas voltam a ter a mão livre na ala do rei. 12.Nf3 h6 Lasker prefere a defesa elástica 12...Nc6 para no caso de 13.Bg5 seguir com 13...f6. Teria sido interessante 12...Nc6 13.a5! Nxa5 14.Bg5 f6 15.exf6 gxf6 16.Bh4 pois fracassaria 16...Nxh4 devido a 16...Qg7!, mas em troca 16.Qe7 parece ser suficientemente consolidador. 13.Qh3

13.Qh3 Como as pretas se arranjarão frente à ameaça 14.g4 Ne7 15.g5 h5 16.g6! Nxg6 17.Ng5 seguido de Rg1? 13...Kd7 Elas gostam de fazer o rei passear. 14.g4 Ne7 15.Nd2 Ameaça Qf3, seguido de Qxf7 ou respectivamente Nxc4. 15...Qe8 A dama se senta no trono real que ficou livre, olhando ao mesmo tempo o peão a4, do qual parece gostar muito. 16.f4 Mudança de cenário. O campo de luta anterior subitamente deixa de sê-lo surgindo outro novo: as brancas, quando jogarem ...f5 atacarão a base da cadeia. 16...Kc7 O rei continua o passeio. 17.Ba3 Bd7 18.Qf3 h5! A ala do rei é um instrumento terrível de ataque e o último lance das pretas tende a inutilizá-lo. Teria sido insuficiente 18...Bc6 para responder com a ameaça (Nxc4!), pois então teríamos 19.f5 seguido de f6 com a formação de uma cunha insuportável. 19.Nxc4! Com 19.gxh5 Nf5 a ala do rei teria Diagrama 125 – Posição após

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ficado parada. E se 19.h3 então 19...hxg4 20.hxg4 Rxh1+ 21.Qxh1 Qh8 e as brancas têm com o que se entreter. 19...Nxc4 20.Bxc4 hxg4 Naturalmente não 20...dxc4?? devido a 21.Bd6+ seguido de Qxa8. 21.Qg2 Nf5 22.Bd3

Diagrama 127 – Posição após

Diagrama 126 – Posição após

22.Bd3

22...Bxa4!! Um frugal desjejum em uma posição perigosa. 23.Bxf5 exf5 24.Qxd5 Teria sido difícil parar 24.c4. Poderia se conseguir alguma coisa com 24...Qc6 25.Qxd5 (não 25.cxd5 devido a 25...Qc3+) 25...Qxd5 26.cxd5 Bb5!!, pois agora não será possível impedir a colocação do bispo em d5 passando por c4. 24...Bc6 O rei preto está ameaçado, porém sua posição não é desesperadora. 25.Qd6+ Kc8 Levando em conta a combinação planejada. Também era possível 25...Kb7 26.d5 Bb5. 26.d5 Rh6 27.e6 Bxd5 150

27...Bxd5 Esse lance foi apontado como único. No entanto as pretas dispunham de outros. Assim 27...Rxe6+ 28.dxe6 Bxh1 29.0–0–0 Bf3 (não 29...Be4 devido a 30.e7 seguido de Qe5! ficando a dama branca com casas decisivas à sua disposição) 30.exf7 Qxf7 31.Qd8+ Kb7 32.Rd7+ Ka6, assegurando a posição. Disso resulta que toda posição sã dispõe ao menos de “dois lances únicos”. 28.Qxd5 Qxe6+ 29.Qxe6+ Rxe6+ A única alegria das brancas é que elas dispõem de uma peça a mais, pois seus demais soldados dão a impressão de estarem inválidos (isso não é de se estranhar depois de uma batalha como essa). O rei branco não sabe aonde ir. Se for para a esquerda chorará seu peão f, se for para a direita o seu par de peões c cairá em um pranto comovedor... 30.Kd2 Kb7 31.Rae1 Rh8 32.Rxe6 fxe6 33.Re1 Rxh2+ 34.Kd3 g3 Nada de posições passivas de torre! (...Rh6?). 35.Rg1 Depois de 35.Rxe6 g5 36.fxg5 g2 o peão branco em g5 teria se transformado em uma barreira.

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35...Rh3! Muito melhor do que 35...g2 porque as possibilidades de se chegar a ...c2 são dignas de serem avaliadas. 36.Kd4 Kc6 37.Rg2 a5 38.c4 Rh2! 39.Rxg3 Rxc2 Veja o comentário anterior. 40.Rxg7 Re2 41.Bc1 Re4+ 42.Kd3 b5 43.cxb5+ Kxb5 Apesar do belo jogo centralizado e de terem uma peça a mais, as brancas não podem vencer a partida. De acordo com isso o sacrifício da peça pelas pretas foi correto. 44.Be3 Kc6 45.Rf7 a4 46.Rf8 a3 47.Ra8 e5 48.Ra6+ Kb5 49.Rb6+ O Professor Becker quer vencer a todo custo e por isso ao final saiu perdendo. 49...Ka5 50.Rf6 a2 51.Bd2+ Kb5 52.Bc3 Rd4+ Depois de uma luta árdua de seis horas não pode causar muita graça se encontrar um “problema de xadrez” como esse. 53.Ke2? Era correto 53.Kc2 Rc4 54.Kb3 Rxc3+ 55.Kxa2 etc. 53...Rxf4 54.Rf8 Kc4 55.Ba1 Re4+ 56.Kd2 f4 E agora as brancas já estão perdidas. 57.Rc8+ Kd5 58.Rd8+ Ke6 59.Re8+ Kf5 60.Rg8 f3 0–1 Partida 24 Opocensky - Nimzovitsch Mariembad, 1925 Defesa Nimzoíndia

Essa partida ensina como e quando deve se castigar um avanço de ala equivocado. 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nc3 Bb4 4.Qc2 b6 5.e4 Bb7

Os desejos de expansão do peão central são menores do que podem parecer à primeira vista. 6.Bd3 Nc6 7.Nf3 Be7! Mediante essa resposta surpreendente, que implica na ameaça de se poder jogar posteriormente ...Nb4, as pretas conseguem engarrafar a massa central inimiga e conservar seu valioso bispo do rei. 8.a3 d6 9.0–0 e5 10.d5 O engarrafamento. 10...Nb8 11.b4 Nbd7

Diagrama 128 – Posição após

11...Nbd7 12.Bb2 A cadeia de peões e4-d5, e5-d6 exige que se jogue c5 (com preparação prévia suficiente), pois dos dois ambientes de luta que se formaram por d5 só é possível o aproveitamento de um e nesse caso corresponderia atacar a base d6. O outro plano bélico teoricamente possível deve ser considerado fracassado desde seu início pela presença do peão c4 que intercepta. O único plano viável de luta (c5) tem que ser preparado com 12.h3 seguido de 13.Be3!, por exemplo: 12.h3 h6! (o melhor) 13.Be3 g5 14.Nh2. Agora as pretas tratarão de 151

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atacar a ala do rei das brancas. Mas o ataque branco (Na4, c5) se inicia rapidamente ficando ainda sua posição de roque apta para a defesa. Portanto 12.h3 seguido de 13.Be3 era o lance correto. 12...0–0 13.Ne2 As peças brancas abandonam a ala da dama para dirigir-se ao outro lado, diminuindo assim sua capacidade de ação no centro. Com seu cavalo em c3 poderiam responder a c5 com ...bxc5 pois esse fixa-se ameaçadoramente em d4. Estando o cavalo viajando, o avanço c5 terá força maior. 13...Ne8 14.Qd2 Se fosse jogado 14.g4 seguiria ...Nef6. As pretas desejam serem atacadas na ala do rei pois sabem que esse campo é de pouco proveito para as brancas, que têm seu jogo na ala da dama. 14...g6 15.g4 Ng7 16.Ng3 c6! Esse avanço de nenhuma forma é para se limitar à troca de peões, pois essa é somente uma das ameaças. O âmago do lance, muito mais agudo, está no estreitamento da posição. 17.Qh6 Rc8 18.Rac1

Diagrama 129 – Posição após 18.Rac1

18...a6!! Um lance muito difícil de se encontrar. 152

Ao se jogar 18...cxd5 poderia seguir 19.exd5 e as pretas, embora obtivessem dois peões fortes com 19...f5 20.gxf5 gxf5, depois de 21.Kh1 e Rg1 ficariam mal, pois enquanto a mobilidade de seus peões (e e f) é ilusória, o ataque branco na ala do rei seria uma realidade. As pretas pretendem jogar ...cxd5, mas querem fazê-lo no instante no qual não convenha para as brancas responder com exd5. 19.Rfd1 Rc7 20.h4? cxd5! 21.cxd5 Como h4 acentuou a debilidade da posição branca (sua casa g4), pareceu conveniente jogar ...cxd5. Depois de 21.exd5 teria seguido 21...Nf6 e como na partida ficaria a ameaça de rompimento ...b5. 21...Rxc1 22.Rxc1 Nf6 23.Nh2 Kh8 A dama branca corre perigo de morte. Se 24.f4 Ng8. Se fosse jogado 23.Ng5, então 23...Qd7! 24.f3 Rc8 e a dama estaria frente à ameaça de ...Bf8. 24.Qe3 Nd7 25.Nf3 Nf6 26.Nh2 Ng8 27.g5 f6 Esse ataque se inicia com vigor e é na realidade uma conseqüência pois já se produzira com 16...c6. As brancas se viram obrigadas a acelerar o contraataque com h4. Isso criou novas debilidades na sua ala do rei. Ou seja, podemos considerar ...f6 como subordinado e conseqüência lógica do lance ...c6. 28.Nf3 fxg5 29.hxg5 Bc8 30.Rc6 Observe que a posição nesse momento dá a impressão de que as brancas tivessem operado de forma contínua e exclusiva sobre a ala da dama (com c4, c5 e cxd6 ao qual teria seguido

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o lance preto ...cxd6) e que o inimigo tivesse tentado buscar a sorte em um contra-ataque sobre a base da cadeia branca e4... As brancas já têm a partida perdida de qualquer maneira, mas se vê a tendência da natureza de equilibrar os fatos. 30...Bd7 31.Bxa6 Depois de 31.Rxb6 seguiria 31...Rxf3 e o sacrifício de qualidade abriria muitas possibilidades. 31...Bxc6 32.dxc6 Qc7 33.b5

33.b5 33...h6! Se 33...Ne6 34.a4 Bd8 35.Ba3 Qf7 36.Bxd6 Qxf3 37.Bxe5+ Ng7 38.Qxf3, o lance 39.c7 cria a liberdade de manobra necessária. 34.gxh6 Ne6 35.a4 Bd8 36.Ba3 Qf7 Agora a 37.Bxd6 Qxf3 38.Bxe5+ se responderia simplesmente 38...Kh7. 37.Nxe5 dxe5 38.Bxf8 Qxf8 39.a5 Nxh6 A possibilidade do cavalo intervir é uma conseqüência de 33...h6!. 40.axb6 Ng4 41.b7 Nxe3 42.b8Q Qf3 43.fxe3 Qxg3+ 0–1, pois as pretas tomam o peão e com xeque simultâneo. Diagrama 130 – Posição após

Partida 25 Rubinstein - Duras Carlsbad, 1911 Abertura Inglesa

Já sabemos que a filosofia aplicável à cadeia de peões constitui um bom critério para julgar qualquer situação da cadeia de peões. A presente partida nos mostrará que essa teoria também é capaz de esclarecer bem os campos de luta vizinhos. Trata-se de uma extensão do critério para as manobras nas quais será necessário se esmerar partindo das premissas estabelecidas para a cadeia de peões. 1.c4 e5 2.Nc3 Nf6 3.g3 Bb4 4.Bg2 0–0 5.Nf3 Re8 6.0–0 Nc6 Seria de se considerar a troca 6...Bxc3. 7.Nd5 Bf8 8.d3 h6 9.b3 d6 10.Bb2 Nxd5 11.cxd5 Ne7 12.e4 c5 Com atraso teve que se fazer algo para o peão c. 13.dxc6 Nxc6 14.d4 Bg4 15.d5 Ne7 Agora se formou a cadeia de peões e4/d5 e d6/e5, onde a base das pretas d6 aparece parcialmente descoberta. O quadro nos apresenta como se estivessem presentes os peões c e se tivesse desenvolvido o ataque típico das brancas (c4, c5 e cxd6), com a tomada de peões pelas pretas (cxd6). 16.Qd3 Qd7 17.Nd2 O cavalo começa a avançar para atacar a base indefesa. 17…Bh3 18.a4 Para assegurar a força do cavalo uma vez colocado em c4. 18…Bxg2 19.Kxg2 Reb8 20.Nc4 b5 21.axb5 Qxb5 22.Ra3 153

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22.Ra3 Nessa posição, como em semelhantes, surge a questão de qual dentre os peões a das pretas e b das brancas está mais fraco. Nesse caso, a questão se resolve por dedução lógica. Sabemos que o peão d6 das pretas é mais fraco do que o peão d5 das brancas e partindo daí podemos admitir a mesma relação no restante da ala da dama. Se isso não fosse correto, o lance a4 das brancas teria sido errado, o que é pouco provável uma vez que as brancas têm o direito de aplaudir o êxito de seu cavalo colocado em c4, que é de alta importância estratégica. 22...Ng6 Talvez fosse melhor 22...Nc8. 23.Rfa1 a6 24.Bc1 Rb7 25.Be3 f6 26.f3 Se as pretas pudessem jogar ...f5, suas possibilidades não seriam de todo más, mas aqui não se pode falar nesse lance. As pretas serão cercadas. 26...Ne7 27.Qf1 Ameaça Nxd6. 27...Nc8 28.Nd2 Qb4 29.Qc4 Qxc4 30.Nxc4 Rab8 31.Nd2 Rc7 32.Rxa6 Observe-se o magistral aproveitamento múltiplo pelo cavalo das casas d2 e c4. Diagrama 131 – Posição após

154

32...Rc2 33.R6a2 Rxa2 34.Rxa2 O restante que significa a centralização do rei branco e o conseqüente avanço fechado da unidade peão, cavalo e rei é fácil de se compreender. Seguiu 34...Be7 35.Kf2 Kf7 36.Ke2 Ke8 37.Kd3 Kd7 38.Kc3 Bd8 39.Nc4 (a casa c3 é um refúgio construído pelo cavalo em c4) 39...Bc7 40.g4 Bd8 41.Ra6 Bc7 42.h4 Bd8 43.h5 Bc7 44.b4 Rb7 45.Ra8 Kd8 46.Kb3 Rb8 47.Rxb8 Bxb8 48.b5 Ne7 49.b6 f5 (não há nada o que fazer) 50.gxf5 Ng8 51.Bf2 Nf6 52.Bh4 1–0 Partida 26 Maróczy - Süchting Barmen, 1905 Gambito da Dama

Essa partida mostra uma translação realizada no sentido clássico. 1.d4 d5 2.c4 e6 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 Nbd7 5.e3 Be7 6.Nf3 0–0 7.Qc2 c6 8.a3 Nh5 Pouco adequado. Era melhor 8...Re8 ou 8...h6. 9.h4 f5 Se 9...f6 seguiria 10.Bd3. 10.Be2 Ndf6 11.Ne5 Bd7 12.Qd1 Be8 13.c5 A formação da cadeia. 13...Qc7 14.b4 a5 15.g3 Maróczy sabia como muito poucos impedir os lances libertadores (nesse caso o lance ...f4 das pretas). 15...axb4 16.axb4 Rxa1 17.Qxa1 Ne4 18.g4! Nxc3 19.Qxc3 Nf6 20.Bf4 Começa o jogo no verdadeiro campo

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de batalha. A idéia principal é o ataque contra a base preta c6 através de b5. 20...Qc8 21.g5 Nd7 22.Nd3! Bf7 23.Kd2 Bd8 24.Ra1 Bc7 25.Ra7 Re8 26.Bxc7 Qxc7 27.f4 Cortando qualquer tentativa de rompimento das pretas através de ...e5. 27...Rb8 28.b5 Finalmente! 28...Qc8 No caso de 28...cxb5 29.Nb4.

36...Qxe6 37.h6 d4 38.Qxd4 Qa2+ 39.Ke1 Ne6 40.Qe5 Re8 41.Nxb7 Qb3 42.Be2 Qb1+ 43.Kf2 Qh1 44.Nd6 Qh4+ 45.Kg2 Nxf4+ 46.Qxf4 Bd5+ 47.Bf3 Bxf3+ 48.Kxf3 1-0 Com isso damos por encerrada a parte 1 do livro, o manejo dos elementos.

Diagrama 132 – Posição após

28...Qc8 29.b6 Com isso as brancas transferem o ataque para a nova base das pretas (b7). O jogo contra a base anterior (c6) deveria ser continuado por 29.Nb4 e talvez Qa3, Qa4. A translação do ataque em direção à nova base tem mais força e antes de tudo é mais seguro o resultado. Süchting ficou totalmente paralisado. 29...Be8 30.Nc1 Nf8 31.Nb3 e5 De outra forma seguiria Na5, Nxb7 e se ...Rxb7 então Ba6. 32.dxe5 Ne6 33.Bd3! g6 34.h5 Bf7 35.Na5 Nd8 36.e6! Nosso conhecido avanço com sacrifício de peão livre não bloqueado. A retaguarda desperta! 155

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Esquema sobre a cadeia de peões (A) O ATAQUE À BASE

Ataques inesperados

Ataques sistemáticos

Bombardeio sistemático à base, sem a fixação da mesma

A base é fixada e submetida a um ataque coordenado de peças

O lado defensor é induzido a capturar com peões da cadeia

Dificuldades defensivas e de desenvolvimento que conduzem à criação de novas debilidades

Expulsão de possíveis bloqueadores de reserva

As novas debilidades são atacadas energicamente, reservando para o final a exploração da debilidade inicial

Os peões próprios, antes bloqueados, avançam triunfalmente

(B) POSSÍVEL TRANSFERÊNCIA DO ATAQUE À NOVA BASE

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1 - Introdução ao Jogo Posicional e o problema do Centro à Distância 1 - As relações existentes entre “elementos” e “jogo posicional”.

O amável leitor perceberá logo em seguida que o meu conceito sobre o jogo posicional se apóia em grande parte nas deduções que obtivemos no estudo dos “elementos”. Isso se ressalta principalmente nos esquemas referentes à restrição e à centralização. A relação que existe entre elementos e jogo posicional resulta-me agradável, pois permite que a minha obra adquira uma estrutura compacta, para benefício do leitor. Mas não se deve abrigar a esperança de penetrar na essência do jogo posicional diretamente e sem maiores dificuldades. Há que se saber que o jogo posicional contém idéias próprias, como por exemplo a lei que descobri a respeito da “superproteção” e a que se refere à estratégia do centro. Também temos que reconhecer que o transporte das idéias surgidas do estudo dos elementos ao campo mais amplo do jogo posicional oferece muitas dificuldades, que são mais ou menos do mesmo tipo daquelas que se apresentam a um compositor de música que quer instrumentar para uma numerosa e variada orquestra uma “sonata” de violino. Por mais que o tema ou os motivos não se alterem, temos que ampliálos consideravelmente em profundidade e abrangência. Vamos esclarecer isso em um caso concreto de xadrez. Escolhamos, por exemplo, a restrição. Quando nos referíamos aos elementos, tínhamos um campo bastante reduzido,

pois então só se tratava de restringir um peão livre ou impedir o avanço de uma cadeia de peões. No jogo posicional, por sua vez, a restrição toma uma dimensão muito maior, pois se amplia o campo. Com freqüência é necessário restringir uma ala inteira e mais. Em partidas nas quais o adversário coordena com vigor especial, pode-se ver que ambas as alas, os recantos mais afastados e na verdade todo o tabuleiro está coberto do motivo que transborda por todos os lados (nesse momento me recordo de minha partida contra Johner, Dresden 1926). Esse último caso é difícil para o estudante. O tema alcança amplitude épica, pois está misturado com uma série de lances que parecem não fazer sentido, mas cujo conjunto corresponde aproximadamente ao acompanhamento de uma partitura musical. Muita gente considera que tanto o jogo de manobras como o acompanhamento não merece maior consideração e deles se pode prescindir. Mais ainda, alguns amigos do xadrez acreditam que o transporte do jogo de um lado em direção ao outro do tabuleiro é uma manifestação de decadência. Na realidade, essas evoluções servem para assinalar o caminho estratégico que permitirá fazer valer a pequena vantagem conquistada (advirto que se trata de aproveitar pontos de vista estratégicos, não somente psicológicos) que fará inclinar a balança à base dessas pequenas vantagens acumuladas, a vantagem de espaço e a conseqüente 159

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maior capacidade de deslocamento das nossas tropas para um ou outro setor do tabuleiro. 2 – Comentários sobre as idéias preconceituosas referentes à posição, cuja eliminação constitui uma condição “sine qua non” para entrar no noviciado do jogo posicional; a) a obsessão em sempre fazer alguma coisa, que caracteriza tantos amadores e b) a valorização exagerada que os mestres atribuem à soma de pequenas vantagens.

Existe ao que me parece um bom número de amadores aos quais o jogo posicional não significa nada. Pessoalmente pude me convencer através de vinte anos de teoria e ensino prático de xadrez que se pode eliminar com facilidade o citado mal, pois na maioria dos casos só se trata de um conceito psicológico equivocado que se arraigou entre os amadores. Atrevo-me a afirmar que o jogo posicional por si mesmo nada tem de misterioso e que todo aquele que tenha estudado os elementos através dessa obra está em condições de entender com relativa facilidade esse tipo de jogo, penetrando no espírito do meu xadrez. Para isso só deve se propor: primeiro, destruir as sementes que obstruem seu entendimento e segundo, aplicar no tabuleiro os ensinamentos que se difundem no restante dessa obra. Uma idéia preconceituosa típica, amplamente difundida, apóia-se no fato de que o amador imagina que cada lance deve trazer consigo algo, de forma imediata. Em conseqüência disso, nossos amigos do xadrez só se empenham em 160

buscar lances ameaçantes ou respostas diretas a esses lances, passando por alto os demais possíveis lances, como de espera, ordenamento etc. De maneira geral, os lances posicionais não constituem lances de ameaça ou de defesa, mas se tratam, de acordo com o meu conceito, de lances que asseguram a posição em um sentido elevado, colocando em contato as peças próprias com pontos inimigos ou próprios que sejam de importância estratégica (veja mais adiante “luta contra lances inimigos de libertação” e “superproteção”). Quando um jogador posicional, ou seja, um jogador que está em condições de assegurar sua posição em um sentido elevado, joga contra um jogador de combinações puras, freqüentemente ocorrem surpresas interessantes, pois o jogador de combinações que ataca com energia só espera dois tipos de lances inimigos: os de defesa ou os de um possível contra-ataque. A surpresa reside em não haver previsto que o adversário possa escolher um lance que não esteja dentre as categorias citadas e que por meio desse lance tenha conseguido colocar em contato a própria peça com um ponto-chave. Graças a esse contato surgem milagres, ou seja, se conserva a posição e o ataque fracassa. Um lance que defende uma casa que nem sequer tenha sido atacada pode parecer um lance inócuo, porém o jogador posicional que o fez o defende, não pelo próprio lance, mas sim porque sabe que uma determinada peça muito ganhará em seu vigor graças ao contato agora possível. Veremos isso com mais detalhes nos

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casos de “superproteção”. Passarei a ilustrar agora uma partida, por meio da qual os leitores poderão apreciar o conceito psicológico errôneo que acabamos de apresentar. Nessa partida eu conduzia as brancas frente a um amador bastante conhecido e nada fraco, que entretanto sustentava o conceito de que uma partida normal de xadrez seguia mais ou menos esse caminho: “Se um dos adversários efetua o pequeno roque e outro o grande roque, contra a posição do roque de ambos os adversários deve-se iniciar um violento ataque de peões e ganhará aquele que chegar primeiro.” Agora veremos como foi demonstrada “ad absurdum” a fragilidade desse conceito de evidente verniz amador e de forma especial, o como e o porquê. Abertura Escocesa Nimzovitsch-N.N., Riga 1910 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 d6 Pode-se jogar, porém somente com a intenção de estabelecer uma defesa sólida ...Nf6, ...Be7, ...0-0 e ...Re8 para pressionar e4. 5.Nc3 Nf6 6.Be2 Be7 7.Be3 Bd7 8.Qd2 a6 9.f3 0–0 10.0–0–0 b5 Esse lance de ataque parece pouco adequado no momento, mas ficou um tanto mais engraçado pela expressão do meu adversário: “Agora você vai ver!”. Entendi de imediato a expressão, pois ele somente esperava como resposta 11.g4, iniciando-se assim a eletrizante corrida de peões para ver quem chegava primeiro (veja o diagrama 133).

Diagrama 133 – O ensaio de ataque das pretas pode ser rechaçado através de um lance posicional

Mas, no entanto, para sua surpresa eu joguei: 11.Nd5 Com esse lance, que implica na ocupação de um posto avançado na coluna d, cumpre-se de forma simultânea um requisito de ordem posicional, castigando com jogo central o ataque prematuro do inimigo na ala, rompendo e ocupando o centro. 11...Nxd5 12.exd5 Nxd4 13.Bxd4 As brancas se encontram muito melhor. Sua posição central não lhes poderá ser arrebatada. Por exemplo: 13...Bf6 14.f4 Re8 15.Bf3, seguido de Rhe1. Como se pode notar, as pretas têm a sua ala da dama avariada, o que resultará muito incômodo para o final. O lance 11.Nd5 foi um lance posicional. O critério psicológico do condutor das pretas era justamente o expressado anteriormente, pelo qual surge a moral da estória: nem sempre tem-se que atacar! Os lances de segurança (em sentido amplo) impostos por exigências que nos pede a posição são muito mais recomendáveis. Há outro conceito equivocado que é 161

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muito compartilhado em círculos de mestres. Muitos desses e uma grande parte dos amadores fortes acreditam que o essencial no jogo posicional é acumular pequenas vantagens que depois se exploram no final. Acreditam que essa forma de jogar necessita de uma sensibilidade sutil e exigências estratégicas. Em desacordo com isso, quero fazer notar que a acumulação de pequenas vantagens de forma alguma é a parte fundamental do jogo posicional, onde se dá uma importância secundária a esse tipo de resultados. Por outro lado, não passa de um mito que sejam muitas as dificuldades para se acumular pequenas vantagens. Por último, deixamos estabelecido que existe uma série de coisas que devem absorver os pensamentos de um jogador posicional, frente às quais a “acumulação” perde toda importância. Se me perguntarem no que consiste isso, responderia de forma concreta: a profilaxia. 3 – Meu conceito sobre o jogo posicional: a conhecida acumulação de pequenas vantagens só é classificada em segundo ou terceiro lugar; o primordial é a profilaxia externa e a profilaxia interna.Minha inovação: a superproteção. Sua expressão e sentido.

Segundo a minha opinião, tanto o ataque como a defesa não fazem parte do jogo posicional na realidade. Este se compõe de uma “profilaxia” que terá que se desenvolver de forma enérgica e com toda consciência. No jogo posicional, de forma primordial, é necessário diminuir a oportunidade para o desenvolvimento de algumas possibilidades indesejáveis do 162

ponto de vista posicional. Excluindo os desastres que possam ocorrer para jogadores menos experientes, restam dois tipos de possibilidades. Devo recordar de passagem para o iniciante que é mister cuidar primeiramente de seu peão central, pois a falta do mesmo poderá contribuir para uma avalanche de peões inimigos. O jogador experiente encontrará com maior facilidade os meios e o caminho para restringir a avalanche. A primeira possibilidade indesejável reside em que o inimigo possa realizar seu “lance libertador de peão”. Portanto, frente a isso, o jogador posicional há de dispor as suas peças de tal forma que possa impedir o desenvolvimento desse lance por parte do inimigo. É claro que antes de tomar as providências, ele deve esclarecer se o lance ameaçado é de fato um “lance libertador”. Em meu trabalho revolucionário originado pela publicação do livro do Dr. Tarrasch (“‘A Partida Moderna de Xadrez’ do Dr. Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno?”), demonstrei que nem tudo que reluz é ouro e esse provérbio também se aplica aos lances de libertação. Alguns desses lances somente conduzem a uma abertura prematura e desfavorável do jogo, mas há outros que devemos considerar como resultado de um processo natural. Contra esses últimos seria ridículo lutar, da mesma forma que enfrentar um fenômeno da natureza. Apesar de que ao tratar o tema da restrição iremos ver com mais detalhes o assunto dos lances libertadores, não quero deixar passar essa oportunidade sem citar dois exemplos.

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devemos dificultar as manobras sem nos empenhar cegamente em impedir esse tipo de avanço.

Diagrama 134 – As brancas resistem com b4 ao ensaio libertador ...e5 do seu adversário

No diagrama 134 vemos um caso de aparente libertação O lance ...e5 das pretas em posições desse tipo está dentro dos lances libertadores, pois ao mesmo tempo em que abre o jogo fechado implica em uma manobra central que é a indicada como contestação frente ao rodeio que as brancas ameaçam realizar na ala da dama (contra jogo de ala, jogo central). Para se oporem a essa libertação as brancas deveriam jogar Re1. Porém, por sua vez com toda razão, jogaram: 1.b4! e5? 2.dxe5 Nxe5 3.Bf4! Nxf3+ 4.Qxf3 Qd8 5.h3 Seguido de 6.Rad1 e posterior ocupação da casa de bloqueio d4, quer seja com o cavalo ou com o bispo, ficando assim as brancas com jogo superior. Como resultado as pretas, que desde o início estavam em desvantagem de tempo, viram fracassado o seu lance libertador. Ilustraremos o segundo exemplo aproveitando o diagrama 135. Esse nos mostrará que de maneira geral é impossível impedir os avanços libertadores amadurecidos com consciência e que nesses casos apenas

Diagrama 135

O diagrama 135 mostra uma posição que surge após os lances: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Be7 4.d4 d6 5.d5 Nb8 A cadeia de peões d5/e4 oposta a e5/d6 implica que as brancas tratarão de levar seu peão c a c5. Nessa situação, empregar a violência com 6.Bd3 Nf6 7.h3 0–0 8.g4? não estaria de acordo com a posição. Por outro lado, parece conveniente: 6.Bd3 Nf6 7.c4 0–0 8.Nc3 Ne8 9.Qe2 e depois de 9...f5 responder 10.exf5 Bxf5 11.Bxf5 Rxf5 12.Ne4 (veja o que foi dito a respeito do diagrama 122). Com isso estabelecemos que a obstrução a lances libertadores, sempre que forem possíveis e necessárias, devem ser feitas, pois são de máxima importância em todo jogo posicional. Essa obstrução insere o que havíamos classificado como profilaxia externa. A segunda possibilidade indesejável é que as próprias casas se encontrem 163

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defendidas de forma débil. O remédio é a profilaxia interna. Estou convencido de que esse conceito exige maior atenção para ser compreendido, pois se trata de uma idéia totalmente nova. Há de se defender de uma enfermidade que nunca tinha sido considerada como tal, a qual costuma ter forte virulência. No nosso caso, o mal reside no fato de que as peças defendem de forma deficiente as casas de importância estratégica. Como considerei essa circunstância um mal, pode-se exigir a superproteção dessas casas, ou seja, defendê-las mais do que o ataque exige. Em outras palavras, “armazenar defesa”. Meu fundamento pode se expressar da seguinte forma: deve-se superproteger as casas débeis e mais ainda as fortes, ou seja, superdefender tudo o que se possa incluir dentro do conceito de pontos com importância estratégica. As peças que intervenham nessa manobra terão sua recompensa e não se arrependerão desde qualquer ponto de vista, pois, expressando-me de forma patética, a importância da casa estratégica lhes enfeitará com sua auréola. Com respeito às casas de importância estratégica, são necessárias duas observações para esclarecê-las: 1ª- Temos que pensar na circunstância misteriosa que notamos, ao analisar o peão passado, de acordo com a qual as casas de bloqueio são boas sob qualquer ponto de vista. O conceito de superproteção, em certo sentido, não é outra coisa do que a idéia já esboçada, considerada de uma forma mais ampla. 164

Diagrama 136 – Qual o ponto que deve ser superprotegido?

No diagrama 136 poderemos observar a superproteção necessária para o peão e5, que é um peão forte que avançou bastante. Vemos que a defesa atual (d4) é insuficiente, pois as brancas devem responder ao lance ...c5 das pretas com dxc5 (equivalente à perda da base da cadeia e abandono da casa d4) e portanto superprotegeremos e5 com o auxílio de peças da seguinte forma (partida Nimzovitsch-Giese): 9.Nd2 Ne7 10.Nf3! Ng6 11.Re1! Bb4 Buscando posicionar o bispo em ...c7 para jogar ...f6 apesar da sobre-defesa das brancas. 12.c3 Ba5 13.Bf4! Terceira superproteção. 13...0–0 14.Bg3 Bc7 15.Ng5 Agora de forma drástica se mostra a força interna da superproteção. Os superdefensores semi-mortos que eram Nf3, Bf4 e a velha torre de e1, ao acordarem de seu sonho desenvolvem

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uma ação considerável. 15...Rfe8 16.Nf4 Nh8 17.Qg4 Nf8 18.Re3! Pode-se observar como a velha torre estava à espera da luta que vai se desenrolar. 18...b6 Teria sido um pouco melhor 18...Bd8. 19.Nh5 Nhg6 20.Rf3 Re7 (veja o diagrama 137) Diagrama 138 – Nimzovitsch-Alekhine, Baden-Baden 1925. O último lance de Alekhine foi 14…Qf5

Diagrama 137 – A carreira de superdefensores

21.Nf6+ Kh8 22.Nfxh7 E as brancas ganham de forma clara após: 22…Nxh7 23.Nxf7+ Rxf7 24.Rxf7. A idéia de fundo era a seguinte: a superdefesa de uma casa de importância estratégica constitui-se em uma “boa ação” e tem a sua recompensa pela ampliação do raio de ação dos superdefensores. Sobre esse tópico, vejamos outro exemplo, pois veremos a superdefesa com seus diferentes matizes mais adiante em um capítulo especial.

Na posição do diagrama 138, depois de: 15.Rad1 Rae8, segue a manobra aparentemente inverossímel 16.Rd2 seguida de 17.Rfd1. Por que? Porque a dama em d3 ou eventualmente em d4 constitui a chave da situação das brancas e portanto é conveniente a sua superdefesa. Efetivamente, após poucos lances as torres de d2 e d1 mostram-se combatentes ativas e defendem de maneira magnífica seu próprio rei. Seguiu: 16.Rd2! Qg5 17.Rfd1 Ba7! 18.Nf4 Nf5 19.Nb5 Bb8 E agora deveria ter sido jogado Re2, seguido de Rde1, com o que os superdefensores teriam se coberto de glória. (Nessa partida seguiu 20.Nd5 Re6 21.Bc1 Qg4 22.Nf4 Nh4+ 23.Kh1 Nf3 e Alekhine saiu-se vencedor no lance 60 – N. do T.). 2ª- As regras de superproteção se aplicam de forma mais natural a pontos particularmente fortes, a casas centrais importantes susceptíveis de serem 165

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atacadas, a fortes casas de bloqueio ou a fortes peões passados. Os pontos fracos ordinários não deveriam ser superprotegidos sob nenhuma circunstância, pois isso pode conduzir facilmente a uma posição passiva dos superdefensores. Mas o caso muda completamente de figura quando o peão débil se constitui na base de uma importante cadeia de peões. Para ilustrar isso, tomemos a conhecida cadeia de peões d4-e5 frente a d5-e6 e comparemos o diagrama 139 com o diagrama 140.

Diagrama 139 – A base segura d4 confirma a condição de peão de ataque (como uma lança) do peão e5

Diagrama 140 – A posição branca aqui tem disposição passiva

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No diagrama 139, as torres defendem a base fraca (a base de toda cadeia de peões é até certo ponto sempre fraca, pois lhe falta a única defesa segura e natural que é um peão). Essa defesa se transmite de forma indireta ao forte peão e5, pois sabemos que o fortalecimento da base fortalece de forma simultânea toda a cadeia. Pode ser tomada como exemplo a minha partida contra o Dr. Tarrash (partida 18) na qual, depois de muito trabalho, pude superdefender o peão d4 e como prêmio consegui um forte ataque que me conduziu à vitória. O peão e5 constitui-se na alma do ataque, o qual havia ficado em uma posição brilhante e de forma confiante agora se apóia no peão d4. No diagrama 140, por outro lado, não aparece o peão e5 e portanto o papel desempenhado pelas torres é muito reduzido. Na verdade, essas peças tão repletas de responsabilidade não têm outra função senão a mísera defesa para impedir a ruína de d4. Em outras palavras, no caso do diagrama 140 a posição de superproteção não encerra nenhum ataque futuro, de forma muito diferente do caso do diagrama 139 e portanto nada mais é do que uma disposição passiva de peças defensoras que, como já dissemos, deve ser evitada a todo custo. Em resumo, a lei de superproteção somente deve ser aplicada sobre casas fortes. As casas fracas somente devem ser superdefendidas no caso em que contribuam para o fortalecimento de outras casas fortes, ou seja, quando o peão fraco funciona como se fosse a babá de um gigante em pleno crescimento.

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4 – A profilaxia e a idéia de “mobilidade coletiva” da massa de peões constituem-se no postulado fundamental do meu entendimento de jogo posicional.

As lutas posicionais, afinal de contas, não são outra coisa além da luta entre o desejo de, por um lado, mobilizar a massa de peões e, por outro, o empenho do adversário em restringi-la. Nessa luta tão ampla, a estratégia da profilaxia, embora muito importante, é apenas um dos meios para se conseguir êxito. É muito importante conseguir a mobilidade da massa de peões, pois a mesma, devido à sua força de expansão, pode desenvolver uma ação arrasadora. Entende-se por massa móvel de peões a soma das mobilidades isoladas de cada peão. Pela possível presença de um peão atrasado no avanço, nem sempre temos que considerar a situação como de mobilidade restrita, pois o peão atrasado pode fazer o papel de babá.

Diagrama 141– Nimzovitsch-Prof. Michel Semmering, 1926 – As brancas formam uma “massa móvel de peões” e deixam um deles como babá em casa

No diagrama 141 era de se esperar que, para se livrarem do peão atrasado d2, as brancas promovessem o avanço

regularizador d4. Porém na partida, de forma muito mais criteriosa, foi jogado: 17.f4 Qe7 18.e4! Bc6 19.g4! (veja o diagrama 142) e as brancas venceram com facilidade.

Diagrama 142 – Os peões e4, f4 e g4 formando uma massa de assalto, acionarão em combinação oculta com o fundo da diagonal a1-h8

Também na partida NimzovitschRubinstein, jogada em Dresden em 1926, não senti nenhuma dificuldade para me livrar do peão atrasado: 1.c4 c5 2.Nf3 Nf6 3.Nc3 d5 4.cxd5 Nxd5 5.e4 Nb4 6.Bc4 e6 7.0–0 Nbc6 Se 7...a6, não seria conveniente a pressa em avançar o peão atrasado, pois só se conseguiria o empate: 8.d4 cxd4 9.Qxd4 Qxd4 10.Nxd4 Bc5 11.Be3 Bxd4 12.Bxd4 Nc2 13.Rad1 Nxd4 14.Rxd4 Nc6 15.Rd2, ao qual seguiria ...b5 e na seqüência ...Bb7 e ...Ke7 8.d3 Nd4 De outra forma, 9.a3. 9.Nxd4 cxd4 10.Ne2 E depois disso as brancas com f4 obtiveram uma massa móvel de peões apoiada de forma ativa por Bc4. Essa partida pode ser vista como apêndice do capítulo seguinte. Esperamos que o tratamento suave 167

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que tivemos com o peão atrasado nos recuperará a simpatia de mais de um jogador de xadrez. Alguns leitores terão considerado por demais rigorosa nossa lei referente à superproteção e aqui damos a compensação. A muitos amadores aborrece o fato de não poder manobrar de acordo com o seu gosto e menos ainda ter que superproteger qualquer casa misteriosa, que nem sequer foi atacada. A esses leitores tão queridos, o tratamento suave para esse peão atrasado servirá de consolo. Dito isso, dirigiremos nossa atenção em direção àquela região terrível, onde o amador (e até mesmo às vezes o mestre) sofre sérios tropeços. Estamos falando do centro. 5 – O centro. O erro típico e reiterado de uma vigilância insuficiente do terreno central. O centro são os Bálcãs do tabuleiro. A popular, e duvidosa do ponto de vista posicional, mudança de ataque que se efetua do centro para as alas. A invasão e ocupação das casas centrais.

Sabemos que em certas posições é necessário direcionar as peças contra o centro inimigo. Pode nos servir de exemplo a posição dos peões brancos em e4 e f4 contra d6 e e5, ou também d4 e c4 contra e6 e d5. Por outro lado, é menos conhecida do que a vigilância do centro. Com peças, também é necessária em posições semifechadas de peões. O centro é como os Bálcãs, sempre se vive em uma atmosfera bélica. (Nas primeiras décadas do século XX, época em que Nimzovitsch escreveu esse livro, os Bálcãs foram o epicentro de numerosos conflitos políticos os quais, inclusive, levaram à eclosão da I Guerra Mundial. Essa imagem lúcida de similaridade do centro do tabuleiro com os conflitos nos Bálcãs feita por Nimzovitsch novamente se tornou real 168

em nossa época, com as guerras da Iugoslávia e do Kosovo na década de 1990 – N. do T.). Comentarei inicialmente uma posição de aparência totalmente inofensiva para o centro, que surge após os seguintes lances: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bc4 Bc5 4.Nc3 Nf6 5.d3 d6 6.Bg5 h6 7.Bh4 g5 8.Bg3 Observe o que foi dito a respeito no diagrama 97. Nessa posição o centro das pretas, apesar de seu caráter inofensivo, encontra-se ameaçado por duas ações bélicas: 1ª- Bb5, seguido de d4 e 2ª- Nd5, seguido de c3 e d4. Temos outro exemplo na abertura da partida Capablanca-Martínez, jogada em Buenos Aires em 1914. Depois de: 1.e4 e5 2.Bc4 Bc5 3.Nc3 Nf6 4.d3 Nc6 5.Bg5 h6 6.Bh4 g5 7.Bg3 h5 8.h4 g4 9.Qd2 d6 10.Nge2 Qe7 11.0–0, as pretas acreditaram estar em condições de jogar 11...a6 (veja o diagrama 143)

Diagrama 143 – As brancas punem o último lance 11...a6 com a invasão do centro.

A perda desse tempo mais se faz notar à medida em que a posição só é fechada

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aparentemente. Na realidade, a posição poderia ser aberta a qualquer momento com Nd5 (essas rupturas podem se realizar em quase 90% das posições centrais fechadas). Seguiu então: 12.Nd5 Nxd5 13.exd5 Nd4 14.Nxd4 Bxd4 15.c3 Bb6 16.d4! f6 E como observei no próprio dia da partida, as brancas poderiam ter conseguido uma vantagem decisiva com 17.Rfe1 (Capablanca jogou o mais fraco 17.Rae1) 17...Bd7 (17...0-0 18.dxe5 fxe5 19.Rxe5 Bxf2+ 20.Qxf2 Qxe5 21.Bxe5 Rxf2 22.Kxf2 dxe5 23.Re1, ganhando. Mas não 23.d6+? Kg7 24.dxc7 b5, seguido de ...Ra7). 18.a4 0-0-0 19.a5 Ba7 20.b4, seguido de Reb1 e b5, com ataque ganhador. Após os primeiros seis lances dessa partida, as pretas poderiam ter conseguido a iniciativa através do emprego de uma estratégia central mais hábil. O mais simples teria sido 6...Be7. Se por outro lado fosse jogado 6...d6, poderia seguir 7.Nd5 g5 8.Bg3 e então com 8...Be6 a conhecida ameaça ...Bxd5, exd5 Ne7, Bb5+ c6, dxc6 bxc6 e como resultado as pretas dominariam o centro. Se no entanto tivessem jogado 6...Nd4 seguiria 7.Nd5 g5 8.Bg3 c6! 9.Nxf6 Qxf6 10.c3 Ne6 11.h4 d6, seguido de ...Bd7 e ...0-0-0 e no momento oportuno ...Nf4. Todos os casos que acabamos de citar ensinam que a função dos cavalos em c3 e ...c6 não é somente a de impedir os avanços dos peões de dama, mas esses cavaleiros têm ainda a obrigação perfeitamente definida de iniciar uma invasão central indo a d5 (ou ...d4). O normal é que a maioria dos amadores não faça isso, mas que

demonstre uma forte tendência para realizar uma mudança prematura em direção às alas. Não se pode negar que se deve considerar essa manobra, mas naturalmente isso será quando se tiver retirado do centro um grande número de peças. Durante muitos anos têm ocorrido partidas assim entre amadores e também em torneios de mestres. Vejamos uma: 1.e4 e5 2.Nc3 Nf6 3.Bc4 Bc5 4.d3 Nc6 5.f4 d6 6.f5? (diagrama 144)

Diagrama 144 – O último lance das brancas em nada contribui com a vigilância central, mas constitui uma mudança que alivia o centro

Naturalmente o lance indicado é 6.Nf3, pois se não com 6...Nd4, seguido de ...c6, ...b5, ...a5 e ...Qb6 , seguindo com o avanço ...d5 no momento oportuno, as pretas conseguem um forte jogo central e na ala da dama, o qual as coloca em clara vantagem. No que diz respeito à “mudança em direção às alas”, nunca serão suficientes as advertências sobre seus riscos. Na seqüência darei um exemplo nada sangrento, pois trato com leitores com os quais felizmente não é preciso ameaçar de forma constante com o diabo a quatro: 169

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1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 Nf6 4.dxe5 Nxe4 5.Bd3 Nc5 6.Bf4 Nxd3+ 7.Qxd3 Nc6 8.0–0 (8.Nc3, seguido de 0-0-0 nos agrada mais) 8...Be7 9.exd6 Bxd6 10.Bxd6 Qxd6 11.Qxd6 cxd6 (veja o diagrama 145)

Deve se considerar como um erro típico, ao se supor que não existe nenhum campo de batalha em desenvolvimento no centro. Parece-nos melhor 5...Nc6! e no caso de 6.Nbd2 Be7 7.h3 (prevenindo ...Nh5) então 7...Bd6! 8.Ne5 Bxe5 9.dxe5 Nd7 10.Nf3 desenvolvendo-se agora a violenta batalha pela casa e5 (veja o diagrama 146)

Diagrama 145 – As brancas fazem a tradicional “mudança” Ng5 etc

12.Re1+ Be6 13.Ng5 A virada característica dos jogadores que não se aplicam à posição. 13…Kd7 14.c3 E as brancas não ficaram muito bem. O correto teria sido, de acordo com o diagrama 145, 12.Nc3 ao invés de 12.Re1+ para continuar com 13.Nb5 e 14.Nd4 com centralização e jogo sólido. Agora seguiremos integralmente uma partida interessante que se caracteriza por demonstrar o desprezo que sentem até jogadores fortes pela estratégia central. Partida 27 Berndtsson - Bjurulf Suécia, 1920 Abertura Peão da Dama

1.d4 d5 2.Nf3 Nf6 3.Bf4 e6 4.e3 c5 5.c3 b6 170

Diagrama 146 – Exemplo típico da luta pelo domínio da casa central (e5)

Nunca será demais repetir a recomendação ao jogador posicional, incitando-o para que se exercite nessas lutas centrais. Um bom plano de continuação seria 10...a6! 11.Bd3 f6! (não 11...Qc7 devido a 12.0–0 Ncxe5? 13.Nxe5 Nxe5 14.Qh5, vencendo) 12.exf6 Qxf6 e com ...e5 se apoderam da casa e5. Recomendamos aos caros leitores o estudo dessa posição. 6.Nbd2 Bd6 7.Ne5 Era preferível 7.Bb5+ Bd7? 8.Bxd7+ Qxd7 9.dxc5. No entanto 7.Ne5 é mais lógico, pois o outro lance possível 7.b4 deve ser considerado uma

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perda de tempo no que se refere à ação central em um momento em que o centro amadurece para o rompimento. 7...Bxe5 8.dxe5 Nfd7 9.Qg4 Rg8 10.Nf3 Nc6 11.Bd3 Nf8 12.Ng5

14.Bc2 14…Bb7? As pretas aqui deveriam tratar de conquistar a casa e5 apesar de parecer arriscado: 14...Nxe5! Dessa forma teriam conseguido um jogo satisfatório e talvez até melhor. Com 15.Qg3 f6 16.Nf3 Nxf3+ 17.Qxf3 e5 18.Qxd5? Bb7 19.Ba4+ Ke7; 14...Nxe5 15.Ba4+ Ke7 as pretas ganham a peça. Também 14...Nxe5 15.Ba4+ Ke7; por outro lado seria errado 15...Bd7 pois as brancas com 16.Bxd7+ Nfxd7 17.Nxe6! fxe6 18.Qxe6+ Kd8 19.Qxd5, se bem que sacrifiquem uma peça, compensam isso com três peões e ficam com um forte ataque. Concluindo, podemos ver que as pretas com 15...Ke7 após 14...Nxe5 15.Ba4+ poderiam conseguir um jogo excelente. Os acontecimentos estratégicos até aqui na partida são os seguintes: 1º- 5...b6 em nada contribuiu para o problema do centro e por esse motivo as brancas se tornaram fortes e poderosas; 2º- No lance 12 as brancas se despreocuparam um pouco da casa fundamental e5. Se as pretas jogassem com precisão, as brancas teriam perdido todas as vantagens. Diagrama 148 – Posição após

Diagrama 147 – Não há dúvida de que as brancas dominam fortemente a casa

e5 As brancas com esse lance cometem o erro estratégico de subestimar a importante casa e5, que é o segredo de toda a posição. Nunca deveriam ter conduzido o ataque de forma tal que essa casa permanecesse insegura, mas pelo contrário, muito melhor teria sido promover a superdefesa. Um jogo correto seria 12.0–0 Bb7 13.b4! c4 (não 13...cxb4 devido a 14.cxb4 e se 14...Nxb4 15.Bg5 com ganho de peça ou o desenvolvimento de fatos desagradáveis); 14.Bc2 Qd7 15.a4 a6! (no caso de 15...0–0–0 então 16.a5 bxa5 17.b5! com ataque vencedor) 16.e4! 0–0–0 17.Be3 Kc7 18.a5 com ataque decisivo. 12...Qc7 13.Bxh7 Rh8 14.Bc2

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Tudo isso nos permite apreciar a grande influência da estratégia central. 15.Nf3 g6 16.Bg5? Logo na seqüência de conseguirem se salvarem do perigo no centro, as brancas sacrificam sua propriedade mais importante do ponto de vista posicional, ou seja, a casa e5, devido às idéias combinatórias de seu condutor. Os superdefensores Nf3 e Bf4 deveriam ter permanecido em seus postos, devido ao mecanismo mostrado no comentário do lance 12. 16...Nxe5 Agora as pretas se mostram valentes. 17.Nxe5 Qxe5

Diagrama 149 – As brancas podem reconquistar a casa e5

18.h4 As brancas por todos os meios deveriam tentar reconquistar a casa e5, por exemplo: 18.Bf4!. E se então 18...Qh5 segue 19.Qg3 f6 20.Bd3 e teria sido muito problemático para as pretas manterem a conquista em vista das ameaças que se acercam por todos os lados. Por outro lado, seguindo os lances do texto, as pretas poderiam ter-se assegurado por completo. 18...b5 Esse lance significa não somente uma 172

perda de tempo mas também debilita o peão ...c5 e ainda por cima permite às brancas jogarem a4. O correto teria sido 18...Nd7 e se 19.Ba4 então 19...f6 20.Bf4 Qe4 21.Bb5 g5. Ou também 21...0–0–0 com o qual as pretas ficariam bem. 19.0–0 Nh7 20.Bf4 Qh5 21.Qxh5 gxh5 22.a4 Na seqüência a partida foi conduzida de forma muito inspirada pelo senhor K. Berndtsson. 22...Bc6 23.Be5 f6 24.Bd6 bxa4 No caso de 24...c4 então 25.axb5 Bxb5 26.Ra5 seguido de Ba4, ficando as brancas com um jogo forte na coluna a. 25.Bxc5 Kd7 26.Bxa4 a6 27.Bxc6+ Kxc6 28.Ra5! Rhb8 29.Bb4 Abre espaço para o ataque na 5ª fileira. 29...Rb5 30.Rfa1 Rxa5 31.Rxa5 Kb6 32.e4 Rd8 33.exd5 exd5 34.c4 dxc4 35.Rxh5 Rd7 As brancas conseguiram seu propósito e os peões pretos agora são indefensáveis. 36.g4 Rg7 37.f3 Kb7 38.Kf2 Rf7 39.Rc5 Nf8 40.Rxc4 Ng6 41.h5 Ne5 42.Rd4 Nc6 43.Re4 f5 44.Rf4 Ne5 45.Rxf5 Rxf5 46.gxf5 1-0. Embora tenhamos deixado de lado muitos assuntos, o comentário é rico em idéias muito agradáveis e, ainda mais, serviu para estudarmos bem o problema central. O lance 5 das pretas nos mostra uma vigilância insuficiente do centro e o lance 12 das brancas por sua vez nos ilustra a despreocupação exagerada com o centro, com o erro típico simultâneo da mudança do centro em direção às alas. No lance 14 as pretas subestimaram o ponto crucial, caso contrário se arriscariam a jogar 15...Nxe5.

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Finalmente nossos comentários sobre o lance 18 constituem um exemplo ilustrativo no que diz respeito à ocupação das casas centrais. Moral da estória: 1º- Vigiar o centro (ver o lance 5 das pretas, o lance 12 das brancas e seguintes e o lance 14 das pretas); 2º- Superproteger o ponto-chave (veja os lances 12 e 16 das brancas); 3º- Não mudar antes do tempo (lances 12 e 16 das brancas); 4º- Uma vez eliminados os peões do ponto-chave (e5), esse deve ser ocupado por peças (lance 18 das brancas). 6 – Uma superproteção consciente e uma centralização de forças efetuada de forma sistemática constituem o “carro-chefe” de uma verdadeira estratégia. O “jogador do centro” merece a vitória.

Na última partida, pudemos apreciar como a “mudança” e o desprezo pelo ponto central trouxeram consigo um resultado curioso. Também às vezes se vê a citada “mudança” em partidas de mestres. Recordemos somente a partida Opocensky-Nimzovitsch (Marienbad 1925) – veja o diagrama 150.

Diagrama 150 – Outro exemplo da mudança inadequada! As brancas cometem o erro de desviar o cavalo de c3 para a ala do rei

Foram jogados os seguintes lances: 13.Ne2 Ne8 14.Qd2 g6 15.g4 Ng7 16.Ng3 c6 A mudança executada alterou tanto a posição que as pretas, que estavam muito restringidas na ala da dama, puderam por sua vez iniciar um ataque. É típico para partidas de mestres a centralização e naturalmente a mentalidade do mestre checo Opocensky não teria porque ser uma exceção. Alekhine se vale com freqüência dessa estratégia, que conjuntamente com o jogo contra as casas inimigas de uma determinada cor, forma o objetivo inicial em quase todas as suas partidas. Ainda quando na ala do rei o punhal pareça ameaçar-lhe a garganta, ele encontra tempo para revigorar suas forças no centro. Na partida Nimzovitsch-Alekhine, que jogamos em Semmering em 1926, as pretas se encontraram em uma posição difícil após: 1.e4 Nf6 2.Nc3 d5 3.e5 Nfd7 4.f4 e6 5.Nf3 c5 6.g3 Nc6 7.Bg2 Be7 8.0–0 0–0 9.d3 Nb6 porque se esqueceram de jogar 9...f6. Seguiu então: 10.Ne2 d4 11.g4 Início de um forte ataque. 11...f6 12.exf6 gxf6 Caso contrário seguiria a centralização do cavalo branco Ne2-g3-f5. 13.Ng3 Nd5 14.Qe2 Bd6 15.Nh4 (veja o diagrama 151) 15...Nce7! 16.Bd2 Qc7 17.Qf2 Agora torna-se clara a força interna da estrutura centralizada das pretas através dos seguintes lances surpreendentes: 17...c4! 18.dxc4 Ne3! 173

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Diagrama 151 – Nimzovitsch-Alekhine, Semmering 1926 – Posição após

20.a3 Bxd2 21.Qxd2 a5 Manobra equivalente à restrição. 22.Ng1 Re3 23.Qf2 Rae8 24.Rd1 Qb3 25.Rd2 Nd6 26.c5 Nc4 27.Bxc4 Qxc4 O peão branco c5 ficou fraco, o bloqueador Bd3 foi eliminado e a ação central cada vez se faz mais incômoda às brancas. 28.Rc2 Qd5 29.Rc1 Qe4 Com isso se encerra a centralização (veja o diagrama 152).

15.Nh4 Com os quais Alekhine conseguiu a igualdade. (Nimzovitsch venceu essa partida no lance 46 – N. do T.) Pessoalmente apóio a centralização tanto na teoria como na prática. Observe-se nesse sentido a partida contra Yates (Semmering 1926), na qual eu conduzia as pretas: 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Bb4 4.exd5 exd5 5.Bd3 Ne7 6.Nge2 0–0 7.0–0 Bg4 8.f3 Bh5 9.Nf4 Bg6 10.Nce2 Bd6 11.Qe1 De acordo com a centralização caberia agora jogar 11...Bxd3 12.Nxd3, ficando as casas c5 e d5 sob vigilância contínua. No entanto seguiu: 11...c5! 12.dxc5 Bxc5+ 13.Kh1 Nbc6 14.Bd2 Re8 15.Nxg6 hxg6 Formou-se uma casa forte em f5. 16.f4 O desenvolvimento normal da ação teria sido 16.Qh4 Nf5 17.Qxd8 Rexd8 com o qual as pretas teriam ficado com ligeira vantagem no final. 16...Nf5 17.c3 d4 18.c4 Qb6 19.Rf3 Bb4 Para limpar a casa crítica e3. 174

Diagrama 152 – Yates-Nimzovitsch, Semmering 1926. O domínio da coluna central livre, o peão d4 e a posição da dama dão à posição das pretas uma notável característica centralizada

Yates sacrificou um peão para aliviar a pressão crescente na coluna e, mas perdeu o final após: 30.f5 Rxf3 31.Nxf3 Qxf5. Encontraremos numerosos exemplos de centralização na prática magistral, podendo ser citados aqui como típicos Alekhine-Treybal (Baden-Baden 1925) e Nimzovitsch-Spielmann (San Sebastian 1912). No geral, o jogador central possui as melhores possibilidades, mas condicionadas a posições comuns que

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passaremos a esboçar. Um dos adversários iniciou em direção à ala do rei inimiga uma ação que promete bom resultado. Tudo parece estar muito bem, mas o inimigo domina uma coluna central livre e é justamente por isso que o atacante de ala perece com uma regularidade assombrosa. Mais assombroso ainda é que apesar da circunstância apontada essa ação encontre novos partidários, os quais deverão pagar o tributo na forma de derrotas arrasadoras, devido à realidade inalterável: a coluna central vencerá o ataque de flanco. O preço que pagou o autor desse livro consistiu na mísera insignificância da perda de um primeiro lugar (perdi a partida decisiva contra Rubinstein no Torneio de San Sebastian de 1912 e tive que me conformar em dividir o segundo e o terceiro prêmios).

Diagrama 153 – Ataque na coluna central, contra-ataque na ala

No diagrama 153 está colocada a posição da batalha que acabo de comentar. O ataque das pretas sempre há de fracassar pelo fato de as torres pretas terem a desagradável obrigação de defender a própria base (sétima e oitava fileiras) contra o rompimento das torres brancas dispostas para a manobra. Ainda por cima a casa e5 se encontra mal

protegida (o que não é uma casualidade, pois o cavalo de f3, consoante com toda a estrutura branca centralizada, está direcionado contra ela). Como toda a ação é muito interessante do ponto de vista da centralização, darei toda a partida. Partida 28 Rubinstein - Nimzovitsch San Sebastian, 1912 Defesa Índia Antiga

1.d4 Nf6 2.c4 d6 3.Nf3 Nbd7 4.Nc3 e5 5.e4 Be7 Possivelmente nada se poderia dizer de um fianchetto imediato com 5...g6 seguido de ...Bg7. 6.Be2 0–0 7.0–0 Re8 8.Qc2 Bf8 9.b3 c6 Aqui, como indicou Lasker, poderia ter se estabelecido um jogo muito mais saudável através de 9...g6, ...Bg7 para após ...exd4 seguir ...Ne5. 10.Bb2 Nh5? A mudança, que me custou 2.500 francos e o primeiro lugar. 11.g3 Nb8 12.Rad1 Vislumbra-se a coluna central. 12...Qf6 13.Nb1 Bh3 14.Rfe1 Nf4 Eu já havia previsto ao jogar 10...Nh5? que nada me impediria de levar meu cavalo a f4 e foi isso o lamentável, pois caso contrário teria resistido à tentação e evitado a mudança. (veja o diagrama 154) 15.dxe5 dxe5 16.Nxe5! Rxe5 17.Bf1 Nd7 18.Qd2 Com isso as pretas desviadas em direção à ala caíram das nuvens. 175

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18...Bxf1 19.Rxf1 Nh3+ 20.Kg2 Ng5 Ameaçando mate em dois. 21.f4 Qg6 22.fxg5 Rxe4?

Diagrama 154 – As brancas (Rubinstein) evidenciam a fraqueza do ataque preto na “mudança” com um belo jogo central

Depois de 22...Qxe4+ 23.Kh3 Re7 se ganharia uma peça com 24.Rde1. O melhor era 22...Re7 23.Ba3! c5 24.Nc3, entregando-se às brancas somente o domínio da casa d5, devido ao lance preto forçado de 23...c5. Na última variante não se poderia jogar 23...Qxe4+ devido a 24.Kg1 c5 25.Rfe1. A partida seguiu: 23.Qxd7 Re2+ 24.Rf2 1-0 Em 22 anos de carreira enxadrística, essa foi a maior catástrofe que ocorreu comigo! Como uma variação do mesmo tema, ao finalizar o capítulo os leitores encontrarão outra partida, jogada entre Kline e Capablanca. 7 – O Abandono do Centro

Nos anos 1911 e 1912 publiquei algumas partidas nas quais já então manifestava o conceito moderno de que o centro não precisa ser ocupado com peões. Eu assegurava que as peças 176

dispostas em forma central ou que as linhas direcionadas para o centro poderiam substituir os peões. O fundamento era restringir os peões centrais do inimigo. Enviei essa idéia em forma de um artigo ao jornal sueco Sydvenska Dagbladet Snallposten (cujo redator de xadrez era Lindstön) e também a G. Marco. O diário sueco publicou o artigo de imediato, porém a revista vienense o fez com muito atraso, com a observação da redação do New Wiener Schachzeitung em 1923 como segue: “Este artigo estava pronto para a publicação em nossa revista, mas a guerra nos obrigou a suspender as nossas atividades. O amigo Marco agora o colocou à nossa disposição e o publicamos com muito gosto, pois esse artigo possui justamente um alto grau de atualidade nessa era da Escola NeoRomântica” [Escola Hipermoderna, como mais tarde ficou conhecida essa nova escola- N. do T.]. Transcrevemos em seguida o artigo citado: O Abandono do Centro – um preconceito

(Comentários sobre a variante 3...dxe4) Quando as pretas na variante da Defesa Francesa 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 realizavam o lance 3...dxe4, de acordo com o senso comum realizavam o abandono do centro. Mas esse conceito ao meu modo de ver se baseia em uma idéia incompleta e errada do verdadeiro conceito de “centro”. Em seguida trataremos inicialmente de fixar o preconceito em si e em segundo lugar esclarecer o desenvolvimento histórico

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do mesmo. Vamos definir o conceito de “centro” e para isso simplesmente teremos que nos ater à própria palavra. Centro significa a parte média do tabuleiro, com suas casas. Casas, não peões, o que é essencial e se deve levar em conta em todos os casos. Portanto seu verdadeiro significado é o conjunto de casas situadas no meio do tabuleiro, bases possíveis para operações posteriores. Vamos recordar, corroborando essa idéia, o comentário de uma partida de Lasker feito por ele mesmo: “As brancas não estão suficientemente bem no centro para operar nas alas”. Isso se expressa de uma forma muito elegante e ao mesmo tempo ilustra as profundas relações existentes entre o próprio centro e as alas, mostrando o centro como dominante e os flancos como subordinados. A razão de ser da prioridade do centro e da sua importância pode-se apreciar de forma imediata, pois estabelecido um centro existe a possibilidade de se atuar simultaneamente em ambas as alas e efetuar um movimento de transformação em direção a elas. A falta de condições saudáveis no centro prejudica toda a posição. Falamos de condições saudáveis do centro. O que significa isso e como elas são produzidas? Atualmente, a idéia é a seguinte: o centro deve ser ocupado por peões. O ideal é fazê-lo com e4 e d4, porém sempre que o inimigo não possua o peão correspondente é suficiente somente um deles para se obter a ocupação do centro. Isso é realmente assim? Por acaso nas

posições do diagrama 155 e do diagrama 156 a colocação do peão em d4 e e4 justifica se falar de ocupação do centro?

Diagrama 155

Diagrama 156

Se considerarmos que uma batalha objetiva conquistar um campo aberto, ou seja, sem fortificações, e se consegue ali colocar um bando de soldados sem que se possa impedir o tiroteio obstinado do inimigo, pode-se falar de uma verdadeira conquista de campo? É claro que não. E então, porque devo falar que sim em uma partida de xadrez? Passo a passo vamos percebendo que se trata não somente da ocupação, ou 177

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seja, da colocação dos peões, mas sim de uma atividade geral no centro, que tem por origem fatores inteiramente distintos. Tenho expressado estas idéias com as seguintes palavras: com o desaparecimento de um peão do centro (por exemplo, com 3...dxe4 4.Nxe4, diagrama 155), de nenhuma forma se abandonou o centro, uma vez que seu conceito é muito mais amplo. Por lógica natural, os peões são justamente os trebelhos mais indicados para estabilizar a formação de um centro, mas as peças colocadas no centro podem substituí-los perfeitamente, ou mesmo a pressão que as torres ou os bispos são capazes de exercer sobre o centro inimigo pode surtir o efeito desejado. O caso citado por último aparece justamente na variante 3...dxe4. Esse lance, que de maneira equivocada se considera abandono do centro, na verdade aumenta a atividade das pretas no mesmo, pois a eliminação do peão d libera as mãos das pretas na coluna d e na diagonal a8-h1 que se abre com ...b7. Obstrução! Esse é o aspecto negativo da ocupação do centro através de peões. Por sua característica, o peão (pela estabilidade, no sentido conservador), é o mais indicado para formar o centro, mas ao mesmo tempo também se constitui em um obstáculo. Já sabemos que a atividade do centro não dependerá dos peões que o ocupem, como veremos em muitos exemplos. Vamos citar alguns. “Peças no centro”: 1- Diagrama 157, Nimzovitsch178

Löwenfisch, Carlsbad 1911.

Diagrama 157

Os peões pretos ...e6 e ...d5 bloqueados pelo cavalo branco em e5 e pelo peão em c3.

Diagrama 158

2- Diagrama 158, a dupla de peões pretos isolados ...c6 e ...d5 estritamente bloqueados pelas peças brancas. Os dois casos nos mostram um bloqueio, mas esse conceito é muito elástico e implica com freqüência uma pequena fixação e uma introdução de uma torre que pressione, começando uma paralisia completa que culmina em uma restrição mecânica. Os casos de pressão exercida contra o centro inimigo são numerosos. O que foi dito nos ensina que nada se

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ganha com a contagem aritmética dos peões no centro e a pretensão de levar isso em conta como ponto de partida de uma filosofia central. Trata-se de requisitos articulados, que no entanto ficam entre os modernos jogadores posicionais. Estou certo de que dentro de alguns anos ninguém considerará o lance 3...dxe4 como abandono do centro e com o desaparecimento desse preconceito se abrirá o caminho para um novo e brilhante desenvolvimento da filosofia e estratégia enxadrísticas. Vejamos agora algo sobre como se foi esclarecendo esse preconceito ligado de forma tão íntima à história do jogo posicional. Em primeiro lugar vem Steinitz. Porém o que ele dizia era de tamanha novidade e ele próprio era uma figura tão destacada que os seus princípios demoraram em se tornar populares. Em seguida veio Tarrasch, que tomou os princípios de Steinitz e os colocou de forma mais agradável ao público. Mas foi Steinitz que aplicou sua grandeza e profundidade nos conceitos relativos ao centro. O fato de transformar um peão inimigo aparentemente são em uma debilidade frente aos olhos de todos, como ele fez com a sua defesa à Abertura Ruy Lopez (...d6) reduzindo a uma debilidade o peão e4 inimigo, essa conquista teve a categoria de uma façanha insuperável. Nada mais longe de seus pensamentos do que uma concepção formalista ou aritmética do centro... Até aqui o artigo, agora passaremos a ilustrar o conteúdo deste capítulo com uma série de partidas ilustrativas, em particular a de número 30, que ilustra o

problema essencial acerca do centro. Partida 29 Nimzovitsch - Michel Semmering, 1926 Abertura Zuckertort

Ilustra a idéia de “mobilidade conjunta” e ao mesmo tempo trata do tema da “profilaxia”. 1.Nf3 d5 2.b3 Nf6 3.Bb2 c5 4.e3 e6 Uma novidade. As pretas não desenvolvem seu cavalo por ...c6 pois as brancas poderiam estabelecer uma cravada com Bb5. 5.Ne5 Nbd7 6.Bb5 a6? Levando em conta o desenvolvimento em primeiro lugar e ainda por cima que as brancas ameaçam se fortalecer na diagonal b2-g7 contando com o apoio do posto avançado de e5, o lance 6...Bd6 era melhor do que o do texto. Seria conveniente praticar a profilaxia com urgência através de 6...Bd6 7.Nxd7 Bxd7 8.Bxd7+ Qxd7 9.Bxf6 e estaríamos frente a um peão dobrado com seus prós e contras conhecidos. 7.Bxd7+ Nxd7 8.Nxd7 Bxd7 9.0–0 f6 Reconhecimento implícito da debilidade na diagonal b2-g7. Também poderia ser considerado 9...Bd6 para seguir com ...0-0-0 após 10.Qg4 e ...Qc7. 10.c4 dxc4 A ameaça era cxd5, Qh5+ seguido de Qxd5. 11.bxc4 Bd6 12.Qh5+ g6 13.Qh6 Bf8 14.Qh3! É difícil encontrar posição melhor para a dama. Com e5 as pretas somente deixariam exposta a casa d5. Por 179

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exemplo: 14...e5 15.Qg3 (ameaça Bxe5) 15...Bg7 16.e4, seguido de d3, Nc3 e Nd5 com vantagem posicional para as brancas. 14...Be7 15.Nc3 0–0 16.a4! As brancas se dispõem a sacrificar a força operativa do peão d, pois planejam estruturar e4, f4 etc, deixando atrasado o peão d. Para o êxito desse plano é necessário paralisar os três peões inimigos da ala da dama, justificando assim o lance do texto. 16...Bd6 17.f4 Qe7 18.e4 Bc6 19.g4 Uma avalanche de peões difícil de ser parada. 19...f5 Se as pretas tivessem permanecido tranqüilas, as brancas teriam podido optar por um ataque direto ao rei ou estruturarem um jogo contra o peão c5. Por exemplo: 19...Rae8 20.Qe3 e depois a5, seguido de Ba3. Com o lance do texto a partida é vencida com um ataque de mate. 20.gxf5 exf5 Se 20...gxf5 21.Kf2 etc. 21.e5 Para os amigos que apreciam as complicações combinatórias, reservei o seguinte desenvolvimento: 21.Nd5 Qxe4 22.Rae1 Qxc4 23.Ne7+ Bxe7 24.Rxe7 Rf7 25.Rxf7 Qxf7 26.Qc3 Kf8 e as pretas têm uma defesa suficiente. 21...Bc7 22.Nd5 Bxd5 Se as pretas no lance 21 tivessem levado o bispo para b8, teriam a oportunidade de replicar a penetração Nd5 com ...Qe6, mas mesmo assim não 180

teriam alcançado a salvação: 21...Bb8 22.Nd5 Qe6 23.Nf6+ Rxf6 24.exf6 Qe4 (a contra-chance das pretas) 25.f7+ e as brancas vencem após 25...Kxf7 26.Qxh7+ Kf8 27.Qg7+ Ke8 28.Rae1 etc. 23.cxd5 Qd7 24.e6 1–0 Após 24...Qxe6 o mate é forçado com 25.Qh6 (ou pelo menos uma torre limpa) e se 24...Qe7 a dama de mau agouro chega através de 25.Qc3. Partida 30 Tarrasch - Mieses Berlim, 1916 Defesa Francesa

Essa partida mostra com que facilidade o abandono prematuro do centro pode conduzir a uma catástrofe. No entanto, esse procedimento nos parece ser em si mesmo perfeitamente praticável, sempre que empregarmos no tabuleiro toda a tenacidade de que dispusermos e não sucumbirmos à tentação de um caminho fácil, que poderia levar a um ponto morto. Se assim fizermos, nossas perspectivas de futuro serão boas. Para outro exemplo, veja a partida 26. 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 dxe4 A coluna d e a diagonal b7-h1 se abrem para exercer pressão sobre o centro das brancas. 4.Nxe4 Nd7 5.Nf3 Ngf6 6.Bd3 Nxe4 O lance do texto é aceitável, porém teria sido mais sólido 6...b6. 7.Bxe4 Nf6 8.Bd3 b6 9.Bg5 Bb7 10.0–0 Be7 11.Qe2 0–0 12.Rad1 h6? A tenacidade ou firmeza de propósito, imprescindível em partidas de torneio, não acompanha aqui o condutor das

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pretas. Por que não jogou 12...Qd5? Se 13.c4 Qa5 15.d5, então 14...Rae8! com fortes contra-ameaças. Por exemplo: se 15.dxe6? Bxf3, seguido de 16...Qxg5. O porque de que a casa d5 seja uma benção é evidente. A chave, em primeiro lugar, é que se trata de um posto avançado na coluna d e, em segundo lugar, ocorre o mesmo com a diagonal a8-h1 e finalmente a casa d5 é uma casa de bloqueio. A enorme importância estratégica para as pretas da casa d5 deixa claro que até o mais breve contato com esse ponto produz maravilhas! 13.Bf4 Qd5 Agora esse lance resulta desfavorável, pois o peão em c7 ficou no ar e as coisas vão por ladeira abaixo. 14.c4 Qa5 15.Bxc7 Bxf3 Era de se considerar 15...Rac8 16.Be5 Rfd8 após o que a maioria branca de peões teria dificuldade em avançar. 16.gxf3! Qxa2 As pretas não se conformam com a perda de peões e ao buscar compensações arriscadas chegam a perder a dama. Era mais sólido 16...Rfc8 17.Be5 Nd7 (respeitando a ameaça latente de Kh1 seguido de Rg1). 17.Ra1 Qb3 18.Bc2 Qb4 19.Ra4 1–0 Uma graciosa caça à dama! Partida 31 Grünfeld - Tartakower Semmering, 1926 Gambito da Dama Aceito

Em situação muito semelhante à anterior, a casa d5, tão desprezada por Mieses, é utilizada

por Tartakower como base de uma ação realizada com todo virtuosismo. 1.d4 d5 2.c4 dxc4 3.Nf3 Bg4 4.Ne5 Bh5 5.Nxc4 Se 5.Nc3 conviria seguir com 5…Nd7 e o orgulhoso cavalo de e5 teria que declarar a que veio. 5…e6 6.Qb3 Com a ameaça simultânea de Qb5+ e Qxb7. 6…Nc6 7.e3 Rb8! Não se recusa a usar uma torre para defender um humilde peão. 8.Nc3 Nf6 9.Be2 Bxe2 10.Nxe2 Bb4+ 11.Nc3 0–0 Ambos os lados terminaram seu desenvolvimento e o jogo é mais ou menos igual, porém o centro das brancas que está bem defendido apresenta um evidente grau de imobilidade. Meu Sistema ensina que todo complexo fixo apresenta uma tendência em direção à debilidade. Em breve comprovaremos a veracidade desse princípio. 12.0–0 Nd5! O cavalo em d5 se sente em casa, pois o lance e4 das brancas é desfavorável pela resposta ...Nxd4. 13.Nxd5 Se 13.Ne4 seria iniciada a mobilização da ala da dama das pretas, seguindo 13...b5 14.Ne5 Nxe5 15.dxe5 c5 16.a3 c4 etc. Ou 14.Ncd2 e5! com o desmoronamento do jogo das brancas. 13...Qxd5 14.Qc2 e5 O centro das brancas começa a ficar a descoberto. 15.Nxe5 Nxe5 16.dxe5 Qxe5 17.Bd2 Bxd2 18.Qxd2 Rfd8 19.Qc2 Rd5 As pretas aproveitam a casa d5 de forma magnífica. 181

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20.Rad1 Rbd8 21.Rxd5 Rxd5 22.Rd1 g6 23.Rxd5 Qxd5 24.a3 c5 Uma vantagem clara para o final: maioria de peões na ala da dama, domínio da coluna d e ainda por cima a dama está bem colocada no centro. Ainda assim a vantagem não é considerada suficiente. 25.h3 b5 26.Qc3 c4 Continua a centralização! Se 26.f3 as pretas seguem com 26...f5, impedindo e4. 27.f4 Qe4! 28.Kf2 a5! O final é conduzido por Tartakower com precisão admirável e sutileza verdadeiramente artística. Na minha opinião não há dúvida de que dentre os jogadores atuais Tartakower é o terceiro maior artista de finais. (Saviely [Xavier] Tartakower, 1887-1956, foi um dos mais proeminentes jogadores de xadrez da sua época, além de destacado jornalista e cronista desse esporte nas décadas de 1920 e 1930 – N. do T.). 29.g4 h6 30.h4 Qh1 A parcimônia que o conduz ao triunfo é trocada ao deixar o centro para se decidir por uma mudança para a ala. 31.Kg3 Qg1+ 32.Kf3 Qh2 33.g5 h5 34.Ke4 Qxh4 35.Qxa5 Qh1+ 36.Ke5 Qc6! A fim de responder a 37.Qe1 com a seguinte manobra: 37...Qc5+ 38.Ke4 Qf5+, seguido de ...Qc2 vencendo. 37.Qa7 h4 38.f5 O canto do cisne. 38...gxf5 39.Kxf5 Qf3+ 40.Ke5 h3 41.Kd4 Qg4+ 0–1 Partida 32 Kline - Capablanca Nova Iorque, 1913 Sistema Colle 182

Ilustra a estratégia de “colunas centrais” contra ataques nas alas. 1.d4 Nf6 2.Nf3 d6 3.c3 Nbd7 4.Bf4 c6 5.Qc2 Qc7 6.e4 e5 7.Bg3 Be7 As brancas agora dispõem da vantagem indiscutível que significa a posição de ataque no centro. Mas a debilidade do seu peão e4 (em seguida veremos a razão de ser dessa debilidade) rapidamente lhes forçará a abrir mão dessa vantagem, pois para manter o equilíbrio se verão obrigadas a jogar dxe5. 8.Bd3 0–0 9.Nbd2 Re8! 10.0–0 Nh5 Com o objetivo de trocar o cavalo pelo bispo. 11.Nc4 Bf6 12.Ne3 Nf8 13.dxe5 A troca é necessária devido ao ataque ao peão d4. 13...dxe5 14.Bh4 Qe7 Com esse lance e com o próximo se inicia uma mudança de jogo que contraria o espírito da abertura. O jogo correto teria sido ...Bd6 e dobrar as torres na coluna d, através do qual se teria conseguido explorar a posição um pouco incômoda do bispo branco em d3. 15.Bxf6 Qxf6 16.Ne1 Nf4? 17.g3 Nh3+ 18.Kh1 h5 19.N3g2 g5 20.f3 Ng6 21.Ne3 h4 De acordo com os meus estudos, a incursão do cavalo branco a f5 teria definido a partida a favor das brancas. (veja o diagrama 159)

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Diagrama 159 – O cavalo de h3 tem a saída cortada. É necessário efetuar a invasão do centro e nesse caso deve-se jogar Nf5.

A retirada do cavalo das pretas de h3 está cortada. A tentativa de resgate através de um avanço temerário de peões na ala do rei freqüentemente concede a oportunidade de um contra-golpe decisivo mediante a invasão no centro (no presente caso com Nf5). Por exemplo: 22.Nf5 hxg3 23.hxg3 Bxf5 24.exf5 Ne7 25.Kg2 Kg7 (acaso seria melhor o sacrifício de peão 25...g4 26.fxg4 Ng5?) 26.Kxh3 Rh8+ (no caso de 26...Nd5 27.Qe2) 27.Kg2 Qh6 28.Kf2 Qh2+ 29.Ng2 Rh3 30.Ke1 Rxg3 31.Ne3. Por outro lado, o lance 26.Rh1 também é jogável e inclusive demonstrei que é ganhador para as brancas em análise publicada no jornal Rigaer Rundschau. 22.g4?? Nhf4 Com o que o cavalo se alegra de estar novamente em liberdade e na seqüência as pretas iniciaram uma excursão algo duvidosa que com facilidade poderia ter tido um desenlace fatal. Mas o jogo dirigido de maneira acertada na coluna d foi feito com tamanha maestria que

alcançou a vitória. O que segue necessita de poucas explicações. 23.Rf2 Nxd3 24.Nxd3 Be6 25.Rd1 Red8 26.b3 Nf4 27.Ng2 Nxd3 28.Rxd3 Rxd3 29.Qxd3 Rd8 Possivelmente fosse melhor 29...Bxg4. 30.Qe2 h3 31.Ne3 a5 32.Rf1 a4 33.c4 Rd4 34.Nc2 Rd7 35.Ne3 Qd8 36.Rd1 Rxd1+ 37.Nxd1 Qd4 Centralização e domínio da coluna d. 38.Nf2 b5 39.cxb5 axb3 40.axb3 Bxb3 Ameaça 41...Qa1+. 41.Nxh3 Bd1 42.Qf1 cxb5 43.Kg2 b4 44.Qb5 b3 45.Qe8+ Kg7 46.Qe7 b2 47.Nxg5 Bb3 48.Nxf7 Bxf7 49.Qg5+ Kf8 50.Qh6+ Ke7 51.Qg5+ Ke8 0–1 Partida 33 Rubinstein - Lövenfisch Carlsbad, 1927 Defesa Francesa

Ilustra a idéia de ações lineares contra peões centrais. Objetivos: primeiro parar, depois bloquear e por último destruir! 1.d4 e6 2.e4 d5 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 Be7 5.e5 Nfd7 6.Bxe7 Qxe7 7.Qd2 0–0 8.f4 c5 9.Nf3 f6 No sentido correto da condução de ataque contra uma cadeia de peões, o lance era 9...cxd4 10.Nxd4 e somente então ...f6. Mas após 10...f6 11.exf6 Qxf6 a posição ao final seria similar à da partida. 10.exf6 Qxf6 11.g3 Nc6 12.0–0–0 a6 13.Bg2 Nb6 A diagonal de ataque g2-d5 constitui a essência do plano das brancas, pois essa 183

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linha após dxc5 estanca o avanço libertador das pretas ...e5 de forma mais completa do que qualquer outra disposição. 14.Rhe1 Nc4 15.Qf2 b5 16.dxc5! Bravo! O ataque na ala …Nxb2 não intimida as brancas, pois um jogo central forte jamais poderá ser destruído através de um ataque na ala. Nesse caso não há dúvida de que o jogo está centralizado, pois há colunas centrais onde a pressão sobre elas já se faz sentir. Por outro lado, as brancas têm a opção de ocupar d4 e e5. Observe agora como o ataque das pretas na ala é rechaçado através de ações centrais. 16…Nxb2 17.Kxb2 b4 18.Nd4 bxc3+ 19.Ka1 Se encarrega a uma torre a futura destruição do peão c das pretas. 19…Nxd4 Se 19…Bd7, então segue 20.Nxe6 Bxe6 21.Rxe6, continuando com 22.Bxd5. 20.Qxd4 Rb8 21.Re3 g5 Agora as pretas conquistam seus objetivos na ala do rei. 22.Rxc3 gxf4 23.gxf4 Bd7 24.c6 Qxd4 25.Rxd4 Be8 26.Bh3 Rf6 27.c7 Teria sido mais agradável para mim a decisão da partida em um final de bispo, como o da seguinte posição: brancas – Ke5, Bh3, a2, c3, f4, h2; pretas – Ke7 Bf7, a6, d5, e6, h7. As brancas jogam 1.f5 exf5 2.Bxf5 e ganham a partida. Então teríamos a idéia geral de forma mais nítida, ou seja, primeiro manter os peões e e d restringidos, em seguida bloqueá-los e finalmente destruí-los. Mas da forma como se jogou, a partida foi muito instrutiva (observem-se os lances 13, 16 e 18). 184

27...Rc8 28.Rxd5 Rxc7 29.Bxe6+ 1–0 Caminho para o domínio do jogo posicional 1- Deve-se refutar o conceito errado de que cada lance persegue uma finalidade imediata, pois também têm direito à vida os lances de repouso e espera. 2- Deve-se reconhecer a profilaxia como a idéia central do jogo posicional. É preciso neutralizar os lances inimigos de liberação e evitar ao mesmo tempo a desorganização das próprias peças, mantendo-as em contato com as casas de importância estratégica. 3- Há que se ter respeito pela estratégia central, evitando toda mudança prematura em direção às alas (por temor a uma invasão central do inimigo) e manobrar sempre sob o lema da centralização. 4- Deve-se jogar buscando a mobilidade coletiva da massa de peões e não a mobilidade individual de cada peão. 5- Há que se acostumar a considerar o domínio do centro como uma questão de bloqueio e que, portanto, o número de peões centrais não é fator decisivo. 6- Não é o ataque nem a defesa, mas sim a consolidação, o que confere ao jogo posicional um caráter específico.

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2 - O Peão Dobrado e a Restrição

1 – As afinidades entre o peão dobrado e restrição. O peão dobrado deve favorecer a execução de planos inimigos de restrição. Qual a desvantagem de um peão dobrado? Conceituação de debilidades passivas (estáticas) e ativas (dinâmicas). Quando é conveniente a dissolução dos peões inimigos dobrados. O único aspecto forte do peão dobrado.

Ainda que se possa imaginar a restrição sem a presença de peões dobrados, uma restrição absoluta que se espalhe por amplos setores do tabuleiro e quase impeça o inimigo de respirar só é concebível quando esse inimigo sofra adicionalmente dos inconvenientes de um peão dobrado. Agora podemos nos perguntar de que forma se sofrem esses inconvenientes. Um peão isolado é fácil de ser conquistado no final, ou pelo menos impõe necessárias e desagradáveis obrigações defensivas. Há que se reconhecer que o inconveniente persiste ainda no caso de se tratar de peões dobrados compactos, ou seja, facilmente defensáveis. Denomina-se peão dobrado compacto àquele que esteja unido a uma massa de peões, veja o diagrama 160.

Diagrama 160 – Esquema – Depois de d3-d4-d5 o avanço c3-c4-c5 é restringido com ...b6, pois não existe um peão branco b que possa colaborar com a ruptura

O sofrimento também não decorre completamente da dificuldade de se obter peões livres que sejam fáceis de defender (por exemplo, na posição: brancas – a2, b2, c2, c3 contra pretas – a7, b7, c7), mas principalmente no fato de que ao se efetuar um avanço fechado possam ocorrer certos fenômenos de paralisia. Observe-se, por exemplo, o diagrama 160. Com o peão c2 em b2 teria sido possível o avanço desse peão no lugar de d4, d5, continuando com c4, b4, c5. Mas na posição do diagrama falta exatamente o peão b e, portanto, resultará inútil qualquer tentativa de transferir o ataque à cadeia de peões. Jogando-se na posição do diagrama d4, d5 e c4 as pretas respondem com ...b6 e o lance c5 imaginado fracassa por completo. O reconhecimento da debilidade dessa 185

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forma, a qual denominamos ativa ou dinâmica (a principal para o peão dobrado compacto) permite estabelecer a regra: é conveniente incitar o proprietário da massa de peões, cujo valor de ataque se veja diminuído pela presença de peões dobrados, a avançar os peões. Ou seja, no caso do diagrama 160, se as brancas realizarem o avanço d3-d4, as pretas, de acordo com o espírito dessa regra, deveriam induzir o adversário a prosseguir as ações no centro. Enquanto se ocuparem de restringir o avanço d3-d4, o efeito estrutural dos peões dobrados não aparecerá de forma clara. Somente com o avanço se manifestarão as debilidades. Devemos diferenciar uma debilidade ativa de uma passiva, ou estática. Essa última, de forma diferente do exemplo anterior, se coloca em evidência com o ataque violento com peões ao lado que tem o peão dobrado. Imaginemos no diagrama 160 as seguintes modificações: as brancas têm as peças Kg1 e Re2 e ao invés de d3 têm d5; as pretas conservam a configuração de peões e têm ...Kf8 e ...Rc8 e dessa forma teremos um quadro no qual a debilidade estática do peão dobrado é grande, pois com 1...c6 2.dxc6 Rxc6, ou mesmo 2.c4 cxd5 3.cxd5 Rc3, seguido de ...Ra3 as pretas conseguem vantagem. Temos condições de estabelecer outra regra: quando o peão dobrado apresenta uma debilidade passiva, convém atacar o mesmo sem temer a dissolução do peão dobrado inimigo, pois o desdobramento do peão não deve nos preocupar devido ao fato de que para o adversário o mal só desaparece pela metade. É verdade que parte da debilidade se transformou em fumaça, mas pela parte que permanece o adversário pagará com juros. Vejamos agora o diagrama 161. 186

Diagrama 161 – Um plano ativo para as pretas é trocar o peão ...d6 pelo de c4, mas como conseguir isso?

As pretas (conduzidas pelo autor desse livro) deixaram o inimigo (E. Cohn) tomar a iniciativa com a esperança de que assim, com o tempo, o jogo se simplificasse e depois disso não se tornasse difícil aproveitar o peão dobrado das brancas no final. A partida continuou: 16...Qd7 17.Qe1 Ng6 18.Bd3 Bf6 19.Qf2 Be5 As pretas confiam na casa e5. 20.Rc2 Rf8 21.Kh1 b6 22.Qf3 Rae8 23.Rcf2 Nh8 24.Qh5 c6 25.g4 f6 Agora Cohn se deixou levar pela idéia de um ataque interessante, mas cujo resultado só foi simplificar a posição e manifestar a situação desesperadora de seus peões e3 e e4. 26.c5 Bxf4 27.Rxf4 dxc5 28.Bc4+ Nf7 29.g5 Re5 30.Rf5 Rxf5 31.exf5. A vitória poderia ser forçada com 31...Kh8, já que a 32.g6 se responderia 32...Nh6 e a 32.Bxf7, 32...Qxf7 33.g6 Qd5+, seguido de ...h6. As pretas, portanto, adotaram uma estratégia correta de espera, pois o ataque no flanco deve falhar frente ao domínio da coluna

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central com o ponto forte das pretas e5 e dessa forma o final é sem esperanças para as brancas. Embora a estratégia de espera fosse correta, existia também a opção de se jogar ativamente, uma vez que os peões brancos de e3 e e4 constituem uma séria debilidade. A atividade poderia desenvolver-se mais ou menos assim: 16...Nd7 (ao invés de 16...Qd7) 17.Bf3 Nf6 18.Qc2 c6!. As pretas sacrificam o peão d em troca do peão e das brancas. Depois de 19.Rcd1 Qe7 se produz a troca de peões, com a qual, uma vez desaparecido o peão frontal, as pretas podem bombardear à vontade o peão e3. A regra principal então é essa: Deve-se questionar (ou seja, atacar com peões) tanto os peões dobrados isolados como os compactos que avançam. Um complexo inimigo de peões dobrados que ainda não iniciou o seu avanço, antes de ser questionado deverá ser convidado a avançar. 1A - O único aspecto forte do peão dobrado

Conforme vimos, uma massa de peões que tenha o peso de conduzir um peão dobrado contém certa debilidade latente que se manifesta ao avançar. Ou seja, essa massa de peões encerra o que chamamos de debilidade dinâmica. Também aprendemos que essa massa em estado de repouso pode ser bastante forte. No diagrama 160 por exemplo, depois das brancas jogarem d4, chegam a uma posição na qual somente com muito trabalho poderão ser desalojadas. Em outras palavras: as pretas carecem de meios suficientes em sua posição para forçar o inimigo a se decidir entre jogar dxe5 ou d5. Por outro lado, isso seria muito mais fácil se o peão branco

estivesse em b2 ao invés de c2. O peão dobrado na realidade permite uma resistência maior. Filosoficamente, é difícil explicar porque isso é assim. Talvez se trate de uma justiça eqüitativa, que compense a debilidade dinâmica com força estática, ou talvez se deva à coluna que se abre. Mas o certo é que a experiência mostra que o peão dobrado c favorece a resistência nessa formação. Nessa tenacidade encontramos o único ponto forte do peão dobrado. Vejase a partida Haakanson-Nimzovitsch logo abaixo e também minhas lutas contra Johner e Rosselli (páginas 208 e 207). 2 – Os complexos de peões dobrados mais característicos. O complexo de peões dobrados como instrumento de ataque

Vejamos novamente o diagrama 160. A formação mais forte para as brancas é aquela a que se chega após terem jogado d4. Essa formação deveria ser preservada o maior tempo possível. Depois de d5, no entanto, se evidencia a debilidade da posição das brancas, de forma que é uma necessidade estratégica para as pretas induzirem as brancas a efetuarem tal avanço, se possível sem o auxílio de ...c5. O motivo é que depois de ...c5, d5, a possibilidade de interrogar o peão com ...c6 se reduziria a cinzas, assim como também a possibilidade de ocupar a casa c5 com um cavalo. Na mesma posição, muitos jogadores com as pretas cometem o erro de avançar de forma rápida ...d5, o que vai contra a regra segundo a qual um complexo de peões dobrados do inimigo deve ser incitado à ação. Então, e somente então, poderão ser exploradas as debilidades (dinâmicas) do complexo de 187

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peões dobrados. Incluiremos agora alguns exemplos para ilustrar a luta entre uma força defensora que cuida de manter a posição e outra de ataque, que busca decidir o jogo a seu favor. Em primeiro lugar um caso no qual o defensor, com somente um lance mal pensado, joga por terra todas as vantagens conquistadas. Haakanson - Nimzovitsch (1921) 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nf3 b6 4.Bg5 h6 5.Bxf6 Qxf6 6.e4 Bb7 7.Nc3 Bb4 8.Qd3 Bxc3+ 9.bxc3 d6 Agora após ...e5 se produzirá o complexo dobrado do qual estamos falando. 10.Qe3 Nd7 11.Bd3 e5 12.0–0 0–0 13.a4 a5 14.Ne1 As brancas estão bem e é improvável que as pretas as obriguem a avançar d5. O melhor plano era 14.Nd2, seguido de 15.f3 com o qual a dama, um pouco exposta, teria uma casa de fuga em f2. Seguiu: 14...Rae8 15.f3 Qe6! Agora as brancas deveriam jogar 16.d5, mas ao invés disso optaram por 16.Nc2, com o qual perderam um peão e em seguida a partida após 16...exd4! 17.cxd4 f5! 18.d5 Qe5 19.Qd4 Nc5 20.Rad1 fxe4 21.fxe4 Nxd3 22.Rxd3 Qxe4. O exemplo esboçado anteriormente adquire maior relevo no caso seguinte: Janovsky - Nimzovitsch, Leningrado, 1914 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nc3 Bb4 4.e3 188

b6 5.Bd3 Bb7 6.Nf3 Bxc3+ 7.bxc3 d6 8.Qc2 Nbd7 9.e4 e5 10.0–0 0–0 11.Bg5 h6 12.Bd2 Re8 13.Rae1

Diagrama 162 – Jogam as pretas. Como podem provocar o avanço do peão d das brancas?

Como podem as pretas provocar as brancas a empreenderem ações no centro? 13...Nh7 Outra possibilidade era 13...Nf8 14.h3 Ng6 15.Nh2 Re7! e se agora 16.f4 exf4 17.Bxf4 Qe8 as brancas não dispõem de uma forma cômoda de defenderem seu peão de e4. 14.h3 Nhf8 15.Nh2 Ne6! 16.Be3 Resistindo! 16...c5 As pretas não vêem outra forma de romper a obstinação de seu adversário. 17.d5 Nf4 18.Be2 Nf8 A debilidade de c4 em conjunto com o domínio da casa f4 dá às pretas possibilidades de ataque em ambas as alas. Uma vez que, como vimos, freqüentemente é difícil induzir o adversário – que se mantém na espera, em uma postura fechada – a empreender ações, somente quando conseguimos

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obrigá-lo a abandonar essa postura é que conseguimos explorar o complexo de peões dobrados. Nesse sentido, pode se tornar muito instrutiva a seguinte abertura: Nimzovitsch – Rosselli, BadenBaden 1925 1.Nf3 d5 2.b3 c5 3.e3 Nc6 4.Bb2 Bg4? 5.h3! Bxf3 6.Qxf3 e5 7.Bb5 Qd6 As brancas poderiam nesse ponto castigar o adversário com um peão dobrado através de 8.Bxc6+ bxc6 9.e4, porém o que teriam conseguido? Como se pode obrigar as pretas a jogar ...d4?

Diagrama 163 – Legenda: Jogam as brancas, que se abstêm de castigar o adversário com um peão dobrado através de 8.Bxc6+ bxc6 pois percebem que não é possível forçar o avanço do peão d das pretas

8.e4 Renunciando à idéia por algum tempo. 8...d4 Mas agora, com o avanço ...d4 já efetuado, o complexo dobrado é muito interessante para as brancas, que com tal propósito jogaram: 9.Na3 Ameaçando 10.Nc4 Qc7 11.Bxc6+ bxc6. A partida continuou assim:

9...f6! 10.Nc4 Qd7 11.Qh5+ g6 12.Qf3 Qc7 O lance 12...0-0-0 não é suficiente devido a 13.Na5 Nge7 14.Qxf6. 13.Qg4 A diagonal c8-h3 logo levou as pretas a se resignarem ao peão dobrado para evitar outros aborrecimentos. 13...Kf7 14.f4 h5 15.Qf3 exf4 16.Bxc6 bxc6 17.0–0 g5 18.c3 Rd8 19.Rae1 Ne7 20.e5 Nf5 21.cxd4 Nxd4 22.Qe4 Be7 23.h4 Qd7 24.exf6 Bxf6 25.hxg5 1–0 O adversário que se mantém na espera deve levar em conta o fato de que sua mobilidade é muito limitada e por isso deve planejar seus lances com precisão em função das possibilidades de ambos os lados. O que eu quero dizer com isso poderá ser visto de forma clara nas partidas que seguem. Nimzovitsch – Sämisch, Dresden 1926 1.c4 e5 2.Nc3 Nf6 3.Nf3 Nc6 4.e4 Bb4 5.d3 d6 6.g3 Bg4 7.Be2 h6 8.Be3 Bxc3+ 9.bxc3 Qd7 As brancas tinham consciência do complexo do peão dobrado e por isso seu plano consiste em manter o seu peão d3 parado, nunca o avançando além de d4. Observem-se agora os lances sutis das peças brancas a fim de enquadrarem as condições criadas pela configuração central de peões. Quando se opera com dinheiro curto (e a pequena mobilidade dos peões brancos é análoga) deve-se gastar com economia. A continuação foi: 10.Qc2! 0–0 11.Qd2! Se as brancas tivessem jogado de forma imediata 10.Qd2, a resposta teria 189

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sido 10...0-0-0 e a dama branca estaria mal posicionada em d2. Após 10.Qc2, a resposta 10...0-0-0 permitiria a resposta 11.0-0, seguido de Rfb1 e as brancas teriam uma posição excelente - incluindo a posição da sua dama - o que não é pouca coisa. 11.Nh7 12.h3 Bxh3 Seria melhor 12...Bxf3!, porém as brancas estão melhor graças ao par de bispos. 13.Ng1 Bg4 14.f3 Be6 15.d4 e as brancas ganharam a peça e a partida. Acabamos de submeter o complexo de peão dobrado a uma análise muito rigorosa. Sob a luz dessa análise, muitos acontecimentos corriqueiros tomam outros aspectos.

Diagrama 164 – Essa “posição agressiva” das brancas dissimula suas debilidades dinâmicas (c2 e c3) e então é melhor caracterizada como uma “posição escondida”

Na posição do diagrama 164, à qual se chega após os lances: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 Bb4 5.0–0 0–0 6.d3 d6 7.Bg5 Bxc3 8.bxc3 Qe7 9.Re1 Nd8 10.d4, costuma-se dizer que as brancas têm uma 190

posição de ataque no centro. Em minha opinião, no entanto, afirmo que isso não é correto. Seria verdadeiro se o peão branco de c2 estivesse em b2. Na posição em que está, a aparente posição de ataque do peão d4 somente oculta a debilidade em seu próprio campo, ou seja, os peões dobrados na coluna c. Ao se jogar d5 essa debilidade dinâmica será óbvia. Em conseqüência, a configuração de peões apresentada no diagrama 164 deve ser considerada como característica das posições que chamamos escondidas. A partida seguiu assim: 10...Ne6 11.Bc1 c6 Aqui o correto era 11...c5 e após 12.dxe5 dxe5 e se 13.Nxe5? então 13...Nc7. 12.Bf1 Rd8 13.g3 Qc7 14.Nh4 Agora as brancas jogarão 15.f4, com o que poderia se acreditar que teriam a iniciativa no centro. Porém isso não é assim. A situação é a seguinte: como no lance 11 as pretas não aproveitaram a ocasião para incomodar o inimigo, as brancas, que como um sapo só tinham à disposição uma posição escondida, puderam colocar um ataque em marcha. De acordo com a excelente partida entre Spielmann - Rubinstein, jogada em Carlsbad em 1911, seguiu: 14...d5 15.f4! exf4 16.e5 Ne4 17.gxf4 f5 18.exf6 Nxf6 19.f5 Nf8 20.Qf3 E Rudolf Spielmann venceu de forma brilhante: 20...Qf7 21.Bd3 Bd7 22.Bf4 Re8 23.Be5 c5 24.Kh1 c4 25.Be2 Bc6 26.Qf4 N8d7 27.Bf3 Re7 28.Re2 Rf8 29.Rg1 Qe8 30.Reg2 Rff7 31.Qh6! Kf8 32.Ng6+ Uma brilhante combinação de

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penetração. 32…hxg6 33.Qh8+ Ng8 34.Bd6 As pretas estão amarradas por todos os lados e não conseguem se opor à invasão da coluna por g8. 34…Qd8 35.Rxg6 Ndf6 36.Rxf6 Rxf6 37.Rxg7! 1–0 Estudaremos agora a seguinte posição de complexo de peões dobrados – diagrama 165 e diagrama 166.

Diagrama 165

Diagrama 166

Essas posições são bastante similares. O peão branco central se encontra em e4 ou d4, segundo o que o complexo de peões dobrados das pretas se encontra na ala da dama ou na ala do rei. A

importância dessa configuração de peões reside no fato de que as pretas podem considerar seu peão de c6 (ou de f6) como uma compensação pelo centro perdido, uma vez que cada um desses peões exerce uma ação em direção ao centro. Essa ação se manifesta no fato de que as brancas (no diagrama 166) não podem utilizar a casa e5 como posto avançado. Por outro lado, as pretas dispõem da ameaça ...e5 e também da possibilidade ...f5, ...f4, ...Rg8 (nesse caso as brancas poderiam jogar g3), ...h5, ...f4 e ...h4. Em outras palavras, a massa de peões e6, f6 e f7, que em primeira instância é defensiva, pode se soltar e se dispor em ordem de ataque. Sua debilidade reside no peão h isolado. As brancas tratarão de neutralizar o ataque das pretas que apresentamos (com ...Rg8, ...f5 etc) colocando seus peões em f4, g3 e h2 e seus cavalos talvez em f3 e g2. O jogo estará então equilibrado. Será, no entanto, extremamente difícil para as pretas decidirem o momento adequado para saírem de sua postura defensiva com ...f5. Citamos peças imaginárias para facilitar a explicação. Vamos ver agora alguns exemplos. Nimzovitsch – Perlis, Ostende 1907 Defesa Francesa 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 dxe4 5.Nxe4 Be7 6.Bxf6 gxf6 7.Nf3 Nd7 8.Qd2 Rg8 Talvez esse lance seja algo prematuro. 9.0–0–0 Nf8 Protege o peão h, fraco e isolado. 10.c4 c6 11.g3 Qc7 12.Bg2 b6 13.Rhe1 Bb7 14.Kb1 0–0–0 O Dr. Perlis tirou um bom proveito 191

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defensivo de seu complexo de peões dobrados e logo chegará o momento de considerá-lo como arma ofensiva. 15.Nc3 Kb8

Diagrama 167 – As pretas aproveitaram o potencial defensivo de seu complexo de peões dobrados

16.Qe3 As brancas lamentam muito não dominarem o posto avançado e5. 16…Ng6 Aparece agora a ameaça …f5-f4, pois o cavalo preto vigia o ponto e5. 17.h4 f5 18.Ne5 Finalmente! 18…f4! 19.Qf3 Nxe5 20.dxe5 fxg3 21.fxg3 Bb4 Com jogo igual. 22.a3 Bxc3 23.Qxc3 c5 24.Bxb7 Qxb7 25.Rd6 Rxd6 26.exd6 Rd8 27.Rd1 Qe4+ 28.Ka2 Rd7 29.Rd3 Kb7 30.Ka1 h5 ½–½ O tratamento desse problema foi menos convincente na partida que segue. Yates – Olland, Scheveningen 1913 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 dxe4 5.Bxf6? Teria sido melhor antes jogar 5.Nxe4. 5…gxf6 6.Nxe4 f5? 192

O momento do avanço parece prematuro. Era um plano melhor a construção da posição característica (ou seja, do esqueleto de peões) com ...b6, ...c6, ...Nd7, ...Qc7, ...Bb7 e ...0-0-0, de forma similar à partida anterior. 7.Nc3 Bg7 O bispo de g7 se encarrega de defender a casa e5, mas o peão f – agora avançado – seria um guardião muito melhor. 8.Nf3 0–0 Depois de 8...Nc6 (que recomendei na “Winerin, 1913”), poderia seguir 9.Bb5 0-0 10.Bxc6 bxc6 11.Qd3! Rb8 12.0-0-0 e é provável que falhem todas as tentativas das pretas em atacar, devido à invasão branca por e5, por exemplo: 12...Qe7 13.Ne5 Qb4 14.b3 etc. 9.Bc4? Era melhor 9.Qd2, seguido de 10.0-0-0. 9...b6? A seqüência 9...Nc6 10.Ne2 e5! 11.dxe5 Nxe5 teria dado aos bispos pretos mais espaço para manobrar, por exemplo: 12.Nxe5 Bxe5 13.c3 Be6 e as pretas estão bem. O importante é que surge a oportunidade de se jogar ...e5. Vejam-se as observações introdutórias aos diagramas 165 e 166. 10.Qd3 Bb7 11.0–0–0 Nd7 12.Rhe1 Qf6 13.Kb1 Rfd8 14.Qe3 c5? Parece melhor 14...c6 para por um lado cravar o peão d e ao mesmo tempo preparar o avanço ...b5 seguido de ...Nb6. O lance 6...f5? não deu bom resultado. A massa de peões pretos não vai a parte alguma e o avanço g2-g4 está no ar. 15.d5 e5 16.g4

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Nessa posição, as brancas deveriam se contentar com seu peão d passado. O melhor que poderia ser feito era manobrar para restringir o peão e das pretas, à base de Nd2 e f3, com o que as brancas estariam bem. O lance 16.g4 conduz a partida a grandes complicações. 16...fxg4 17.Ng5 Bh6 18.Nce4 Qg6 19.f4 exf4 20.Qxf4 E após alguns erros por parte das pretas, Yates se impôs no lance 44. Na partida que acabamos de comentar, o complexo de peões dobrados das pretas não se manifestou como instrumento de ataque. Um caso muito diferente do da partida a seguir, na qual o complexo de peões dobrados c7, c6 e d6 se depara com os peões brancos de c2 e e4. Podemos considerar essa estrutura como idêntica em características às posições esquemáticas dos diagramas 165 e 166.

14…Qb8 Uma última “preparação de peças” para que a ruptura planejada ...f5 tenha o efeito desejado. 15.Bc1 Qb6 De acordo com o Dr. Lasker, teria sido melhor 15...a5 (ameaçando ...a4!) 16.Na4! c5. Se 16.a4, então 16...c5 17.Ndb5 Bc6, seguido de ...Nd7, com bom jogo para as pretas. 16.Na4 Qb7 17.Nb2! c5 18.Ne2 Bb5 19.c4 Bc6 20.Nc3 O lance do texto pretende frear o avanço ...a5-a4. As brancas não podem jogar a4, porque então o peão b se transformaria em um bebê debilitado, o que as privaria de qualquer perspectiva de vitória. 20...Nd7 21.Be3 Nb6 22.Rb1 a5 23.Bf2

O Complexo de Peões Dobrados como Instrumento de Ataque

Teichmann-Bernshtein, São Petersburgo 1909 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 d6 5.d4 Bd7 6.0–0 Be7 7.Re1 exd4 8.Nxd4 0–0 9.Bxc6 bxc6 10.b3 Re8 De forma simultânea ao problema de como extrair a vantagem adequada de seu complexo de peões dobrados, as pretas têm outro problema a resolver: a restrição do centro inimigo. 11.Bb2 Bf8 12.Qd3 g6 13.Rad1 Bg7 14.f3 As brancas desprezam a possibilidade de obter uma posição agressiva no centro – com f4 – e optam por uma posição segura.

Diagrama 168 – Aproveitamento agressivo do complexo dobrado. Como conseqüência, as brancas poderão ocupar a casa d5

Agora as pretas deveriam jogar 23...Qc8, ameaçando 24...a4 e se 24.Nd5 então 24...Nxd5 25.cxd5 Bd7, seguido de ...a4. Minha impressão é a seguinte: o lance preto ...c5 liberou a casa d5 branca e portanto, até certo ponto, atuou como uma arma de duplo fio. No 193

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entanto, há que se reconhecer que se são cumpridas as condições préestabelecidas, ou seja, o peão e4 branco estivesse mais ou menos restrito e que tivessem sido tomadas medidas preventivas contra Nd5, então o avanço ...c5 poderia ser justificado. Considero apropriada, mas insuficiente para vencer, a contra-formação escolhida pelo primeiro jogador nessa partida (peões nas casas c4, b3 e a2, com cavalos nas casas b2 e c3). As partidas nessa linha jogadas entre os jogadores mais fortes (por exemplo, no match Lasker-Schlechter) terminaram todas empatadas. Por outro lado, considero que seja mau o avanço ...d6-d5, uma vez que pode facilmente conduzir a partidas muito restringidas. A instrutiva partida a seguir ilustra bem esse aspecto. Billecard-Bernshtein, Ostende 1907 – Abertura dos Quatro Cavalos 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3 Nf6 4.Bb5 d6 5.d4 exd4 6.Nxd4 Bd7 7.0–0 Be7 8.Bxc6 bxc6 9.b3 0–0 10.Bb2 d5 11.e5 Ne8 12.Qd2! As brancas acertadamente consideram que os peões dobrados não serão mais fortes com o avanço. 12...c5 13.Nde2 c6 14.Rad1 Qc7 15.Nf4 Qb7 Existia a ameaça Nxd5. 16.Na4 Esse lance inicia um bloqueio ocupando a casa c5, onde um cavalo branco seria incômodo para as pretas. Porém mais sensível ainda para as pretas seria tendo c7, c6 e d5. Um cavalo em c5 exerceria uma ação de paralisia completa. Essa partida tornará evidente ainda a afinidade que existe entre o peão dobrado e o restringido, que citamos no início desse capítulo. 16...c4 17.Bd4 cxb3 18.axb3? Parece mais lógico 18.cxb3. 194

18...Nc7 19.Nd3 Ne6 20.Ndc5 Qc7 21.Nxd7 Qxd7 22.Qe3 Nxd4 23.Qxd4 Rab8 24.Nc5 Qf5 25.Nd3 E as brancas dominam o ponto c5. Porém, se tivessem jogado 18.cxb3 a pressão sobre a coluna c teria se reforçado de forma considerável. Com esse procedimento, parece estar refutado o avanço 10...d5. O estudante interessado em profundas conexões lógicas dirá a si mesmo: “como é fácil bloquear o complexo c7+c6+c5, pois ainda que as pretas consigam desdobrar os peões e apesar do erro das brancas (captura 18.axb3? em lugar de 18.cxb3), a mobilidade dos peões pretos de c6 e c5 permanece tão pequena como antes!”. Essa conclusão é absolutamente correta. Os peões de c7, c6 e d5 certamente são susceptíveis de serem bloqueados. Em outras palavras, a relação entre o peão dobrado e o restringido, que enfatizamos no começo desse capítulo, pode ser assumida como previsível. À medida que avançarmos, essa opção acabará se convertendo em certeza. Sugiro rever a partida Leonhardt-Nimzovitsch, San Sebastian 1912 – página 67.

Diagrama 169 – Ala da dama e centro da partida Gottschall-Tarrasch, 1988. As torres brancas estão afogadas. A torre de a2 é pouco elástica e dificilmente atuará na ala do rei.

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3 – A restrição. Os “misteriosos” lances de torre. Lances libertadores e pseudo-libertadores e como devem ser combatidos esses lances.

Houve uma época em que me atacavam de forma contínua, com o objetivo de ridicularizarem as minhas idéias. Havia inclusive alguns críticos que, de forma irônica, qualificavam meus lances de torre como “misteriosos”. Um lance desse tipo é apresentado no diagrama 170.

Diagrama 170 Blackburne-Nimzovitsch, São Petersburgo 1914 – As pretas realizam seu lance “misterioso” ...Re8 como ação preventiva contra d4 das brancas.

Nessa posição, as brancas pretendem efetuar o avanço d3-d4 logo que lhes seja possível. Dessa forma, o deslocamento da torre preta a ...e8 tem como finalidade dificultar esse lance libertador. Trata-se, portanto, de um lance que tem característica preventiva. Na realidade, somente é misteriosa a manifestação externa do lance, uma vez que a torre se coloca em uma coluna fechada, e não a finalidade estratégica do lance em si. No entanto, manteremos para esse tipo de lance a classificação de “misterioso”, com a diferença de que

agora a ironia não se dirige especificamente ao lance. Exigir das peças somente uma atividade de ataque leva a assinatura de um empurrador de peças. Uma mente enxadrística sutil com sabedoria pedirá também às peças que realizem manobras preventivas. A seguinte situação é típica: uma ação libertadora (normalmente o avanço de um peão) planejada pelo adversário nos concederá uma coluna aberta. O potencial representado pela abertura dessa coluna (que não depende de nós, mas que se ocorrer nos permitirá nos apoderarmos dela) sugere como positiva a sua ocupação prévia, de forma que desencorajamos nosso adversário a realizar o lance libertador. Assim então, o lance misterioso de torre é um indiscutível ingrediente de uma estratégia racional. O estudante deverá considerá-la com freqüência e eventualmente usá-lo para lutar contra o erro psicológico que estabelece que somente a atividade máxima é digna de uma torre. Estou em condições de afirmar que impedir o avanço libertador é muito mais eficaz do que a passividade momentânea da torre. Vamos considerar alguns exemplos. Vejamos a posição: Brancas: Kg1, Rc1, Rf1, Be2, Nf3, Pa2, Pb2, Pd4, Pe3, Pf2, Pg2 e Ph2. Pretas: Kg8, Rd7, Rf8, Bb7, Nf6, Pa5, Pb6, Pc6, Pd5, Pf7, Pg7 e Ph7. Nessa posição esquemática, as brancas jogam Rfd1 esperando a resposta ...c5 para que após dxc5, bxc5 aproveitem as colunas c e d para pressionar os peões pendentes resultantes da operação (em d5 e c5). O lance misterioso de torre é um fato 195

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que geralmente ocorre na abertura, mas também o veremos desempenhar um papel importante na primeira parte do meio-jogo.

Diagrama 172 – Legenda: As pretas (Capablanca) iniciam uma ação preventiva contra o avanço g4 e arrematam com grande virtuosismo Diagrama 171

As brancas planejam a2-a3, seguido de b4 e c5. As pretas resistem a esse plano através de ...Ra7 e ...Rfa8 com o objetivo de atenuar seus efeitos. A partida poderia seguir assim: 1...Ra7 2.a3 Rfa8 3.Qb2 Qd8 4.b4 axb4 5.axb4 Qb8 6.Rfb1 Se 6.Rxa7?, então 6...Qxa7 e as pretas controlam a coluna a. 6...Kf8 7.c5 bxc5 8.Rxa7 Rxa7 9.bxc5 Qxb2 10.Rxb2 Ra3 11.Rc2 Bc8! 12.c6! O melhor. Não 12.cxd6 cxd6 13.Nb5 Ra1+ 14.Kf2 Ba6 com equilíbrio. 12...Ne8 Seguido de ...f5, com algum contrajogo. Outro exemplo nos é dado na seguinte partida: Kupchik-Capablanca, Lake Hopatcong 1926. Após o lance 19 das brancas, chegouse à posição do diagrama 172. 196

A cadeia de peões requer o ataque das pretas à base branca, ou seja, ao peão branco de c3, através dos lances ...a6, ...b5, ...a5 e ...b4. No entanto, as pretas devem prevenir o avanço g4 das brancas. Pensando nisso, Capablanca jogou: 19...h5! 20.Ref1 Rh6!! O lance misterioso de torre, pois as pretas antecipam o avanço projetado pelas brancas (h3 e g4) e querem estar prontas para o ataque na coluna h quando isso ocorrer. 21.Be1 g6 22.Bh4 Kf7! 23.Qe1 a6 No momento preciso! 24.Ba4 b5 25.Bd1 Bc6 26.Rh3 Aqui o mais indicado seria um lance defensivo na ala da dama. 26...a5 27.Bg5 Rhh8 28.Qh4 b4 29.Qe1 Ou 29.Bf6 Be7. 29…Rb8 30.Rhf3 a4 As pretas levaram o ataque a bom termo. 31.R3f2 a3 32.b3 cxb3 33.Bxb3 Bb5 34.Rg1 Qxc3 etc. Nessa partida a manobra de torre

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(...Rf6-h6-h8) produz um belo efeito plástico e por certo agradará a todos que a reproduzirem. O diagrama 172A corresponde à posição da partida Von GottschallNimzovitsch, Hannover 1926, após o lance 28 das brancas (28.h3).

Diagrama 172A

As pretas queriam explorar sua maioria na ala do rei com a manobra ...Kg6-f5, seguida de ...e6-e5. Ao lance ...Kg6 no entanto as brancas poderiam responder g4. Em conseqüência disso, decidi-me pelo lance misterioso de torre (pois ele também é possível no final!). 28...Rh8! Depois de 29.Rd1 Kg6 30.Rd4 Kf5 31.Bd2, seguiu outro lance misterioso de torre, 31...Rf8 Ainda que, para falar a verdade, seria mais adequado classificá-lo como semimisterioso, pois, enquanto ...Rh8 responde a propósitos preventivos, ...Rf8 tem a diferença essencial de ser puramente ativo. Seguiu: 32.Be1 e5 33.fxe5 fxe5 34.Rh4 g5 35.Rb4 Se 35.Rxh5?? Kg6+. 35…Ke6+ 36.Ke2 e4 37.Bf2 Rf3

O peão passado, a penetração da torre no campo do adversário e certa debilidade do peão c branco conduziram lentamente ao desmoronamento da posição das brancas. O misterioso lance de torre, com o qual se posiciona uma torre em uma coluna fechada que somente poderá ser aberta pelo adversário (ou seja, que se não o fizer deixará a nossa torre sem ter o que fazer de forma permanente), nunca deverá ser realizado se não o for feito de forma consciente de que estamos sacrificando certa força ativa da torre. Esse sacrifício é feito para impedir uma manobra libertadora do adversário, ou pelo menos para dificultá-la no que for possível. Se, no entanto, percebermos que uma manobra libertadora imaginada pelo nosso adversário é ilusória, pois a mesma não tem um efeito realmente libertador, então seria um desperdício realizar esse sacrifício. Em minha partida contra Blackburne citada anteriormente, salta aos olhos a diferença entre um lance realmente libertador e outro ilusório e a partida também é pertinente para a nossa concepção de estratégia profilática, razão pela qual na seqüência a ofereço integralmente. Partida 34 Blackburne - Nimzovitsch São Petersburgo, 1914 Abertura Irregular

1.e3 d6 2.f4 e5 3.fxe5 dxe5 4.Nc3 Bd6 O melhor lance, pois o desenvolvimento prioritário dos cavalos, como preconizava Lasker, aqui é 197

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indiscutível. A razão é a configuração dos peões e a prevenção de lances libertadores de peões. 5.e4 Be6 Antecipando-se a 6.Bc4. 6.Nf3 f6 As pretas jogam, como se tornará evidente no lance 8, para impedir o avanço do peão d4, que em certo sentido teria um efeito libertador, uma vez que a maioria central das brancas se faria sentir. Jogando assim as pretas conseguiram paralisar a maioria inimiga no centro e o leitor poderá perguntar porque as pretas concedem ao seu adversário a possibilidade de jogar d4 em seu sétimo lance. 7.d3 As brancas com sabedoria se abstêm de jogar o peão d, pois 7.d4 seria o típico lance pseudo-libertador, que só serviria para criar novas dificuldades. Por exemplo: 7.d4 Nd7! 8.d5 (de outra forma 8...exd4, com jogo sobre o peão branco isolado de e4) 8...Bf7, seguido da ocupação da casa c5 por parte de um cavalo ou o bispo. 7...Ne7 8.Be3 c5! Com a ajuda dos recursos de que dispõem na coluna d as pretas obrigam o seu adversário a permanecer na defensiva. Veja os seus dois próximos lances. 9.Qd2 Nbc6 10.Be2 Nd4 11.0–0 0–0 12.Nd1 Nec6 13.c3 A debilidade do ponto d3 das brancas é a recompensa merecida pelas pretas pelo seu esquema operacional sistemático. Agora d3 é uma debilidade. 13...Nxe2+ 14.Qxe2 Re8! O lance misterioso da torre, que, no caso das brancas jogarem d4, ameaça fazer a situação muito incômoda para elas na 198

coluna e. Ainda por cima habilita a casa f8 para o bispo de d6. 15.Nh4 Bf8 16.Nf5 Kh8! As brancas utilizaram de forma muito adequada a coluna f, sua única vantagem. O lance das pretas, apesar da sua modéstia, tem seu significado no plano posicional. As pretas asseguram dessa forma a possibilidade eventual ...g6 e ...f5 sem ter que se preocupar com um xeque de cavalo em h6. 17.g4 Qd7! Permite parar o sempre ameaçador avanço g5. Por exemplo: 18.g5 g6 19.Ng3 f5!, com jogo excelente (veja o comentário anterior). 18.Nf2 a5 O peão a das brancas está constantemente ameaçado e agora se 19.b3 é possível 19...a4. É óbvio que a ala da dama das brancas está sob a influência do seu centro fraco. 19.a3 b5 Aqui teria sido mais forte 19...Bb3, ainda que dessa forma deixassem de restringir o avanço g4-g5. Apesar de tudo, as pretas teriam que jogar 19...Bb3, pois não devemos permitir que os nossos conceitos defensivos nos escravizem!) 20.g5 fxg5 21.Bxg5 c4! (sugestão de Lasker) 22.dxc4 Qe6 23.Ne3 Qg6 24.Qg4 Bc5! e as pretas vencem. Ou mesmo 23.Qf3! Bxc4 24.Rfd1 e as pretas têm uma ligeira vantagem. 20.Rad1 Rab8 Poderiam ser poupados alguns tempos ao se jogar de forma imediata 20...b4. 21.Rd2 b4 22.axb4 axb4! Se 22...cxb4, então 23.d4! 23.c4

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Diagrama 173

As pretas agora devem mostrar as cartas. 23...Ra8? As pretas haviam conseguido uma posição estratégica quase vencedora, mas não puderam manter o triunfo nas mãos. Assim, poderiam ter jogado 23...Nd4, forçando 24.Bxd4 ou mesmo 23...g6, seguido de ...Bh6, dominando a diagonal. Por exemplo: 23...g6 24.Ng3 Nd4! 25.Bxd4 cxd4, seguido de ...Bh6. Ou ainda, se 25.Qd1 (no lugar da troca), 25...Rba8, seguido de ...Qa4, forçando a troca das damas com um bom final para as pretas. Também poderia ter sido jogado em outra ordem, por exemplo: 23...Nd4 24.Bxd4 cxd4 25.Qf3 (o melhor) 25...g6 26.Ng3 Qe7 27.Nd1 Bh6 28.Rg2 Bg5!, seguido de ...Rb8a8-a1 etc. 24.Qf3 Ra2? Ainda era possível ...Nd4. 25.g5 Graças a um golpe tático (o próximo lance das pretas), esse avanço, que parecia ter-se impedido, afinal é possível. 25...g6 26.Ng4! Esse lance retira das pretas os frutos de seu profundo plano de campanha. Seguiu: 26...gxf5 27.Nxf6 Nd4 28.Qf2

O lance 28.Qh5 teria vencido de forma mais rápida. 28...Qc6 29.Nxe8 Qxe8 30.Bxd4 exd4 31.exf5 E as brancas venceram com facilidade. 31...Bd7 32.Re1 Qf7 33.Qh4 Ra8 34.Rf2 Bc6 35.Qg4 Re8 36.Rxe8 Qxe8 37.Re2 Qd7 38.Re6 Ba8 39.g6 hxg6 40.Rxg6 Qh7 41.Qg3 Qh5 42.Rg4 1–0 O que aprendemos nessa partida é a distinção entre os lances libertadores e pseudo-libertadores. É importante observar a forma pela qual as pretas puderam conter o avanço d4, e até o momento do fracasso repentino, o lance g5. Permito-me ressaltar a importância do tema com o seguinte postulado: Não existem lances libertadores absolutos. Um lance libertador, em uma posição na qual não se completou o desenvolvimento, poderá ser, na imensa maioria dos casos, completamente ilusório e vice-versa, um lance que não entra na categoria de libertador pode, se for o caso (por exemplo: um excesso de tempos a seu favor), conduzir a uma partida muito livre. Como exemplo, observemos a posição do diagrama 174.

Diagrama 174 – O lance “libertador” ...f5 das pretas conduz a um desenvolvimento pobre

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As brancas, de forma óbvia, têm uma vantagem substancial de desenvolvimento. Nestas circunstâncias, o lance “libertador” das pretas ...f5 só conduz a uma abertura prematura de linhas. Por exemplo: 1...f5 2.exf5 gxf5 3.Nh5, seguido de f4, com um forte ataque. Essa associação de idéias era desconhecida pela escola pseudo-clássica, que não sabia absolutamente nada de lances libertadores. O avanço ...f5 das pretas, em uma posição com a configuração central de peões como a do diagrama, era recomendado por essa escola em 80% dos casos. Reduzimos essa proporção a mais ou menos 60%, já que, inclusive depois do lance defensivo das brancas 3.f3 (após 1...f5 2.exf5 gxf5), a força da dupla de peões pretos (de e5 e f5) é relativa. Encontramos-nos de imediato com a célula-mãe da ação restritiva. Devido a sua importância, dedicaremos a isso uma seção independente. 4 – A semente da ação restritiva contra uma maioria de peões. A luta contra a maioria central. A maioria qualitativa.

É impossível representar a semente da restrição com base em diagramas, de forma que adotarei outro método. As pretas têm uma maioria, digamos peões nas casas a5 e b5 contra um peão branco na casa a3, ou talvez peões pretos em e5 e f5 contra um branco em f3, além de outras peças cuja posição concreta não nos importa de forma teórica. Em ambos os casos, o jogador com as pretas ameaça criar um peão passado e também no segundo caso atacar o roque das brancas com o lance ...f4 e a manobra ...Rf5-h5, ou ...Rf5-g5, ou inclusive ...h5 etc. 200

Nesse caso também se deve considerar a opção de instalar um cavalo na casa e3. Em que consiste a idéia da restrição? Essa idéia reside na forma de neutralizar o peão inimigo para o que usaremos a coluna aberta e duas casas possíveis de bloqueio: no caso do avanço ...e4 o lance f4, seguido de um eventual Be3 para bloquear o peão e das pretas nessa casa e por outro lado se as pretas efetuarem o avanço ...f4, a idéia é impedir todo o avanço posterior com Ne4. Esse cavalo, graças ao seu raio de ação, fará com que a tentativa de ataque das pretas resulte difícil de se levar a cabo. Disso se deduz que a semente da ação restritiva é uma coluna aberta combinada com duas possibilidades de bloqueio. Não se deve permitir que uma maioria central avance muito, pois a cunha exercerá ameaças muito graves. Por exemplo, na posição: brancas – Kg1, Pf2, Pg2, Ph2; pretas – Pe4, Pf4, Pg7, Ph7 com diversas peças para ambos os lados. As pretas com ...f3 (a cunha) ameaçam cortar as linhas de comunicação das brancas entre seus peões g e h e o restante da segunda fileira e assim o ataque das pretas pode ser classificado como muito forte. Por isso é necessário fixar uma maioria central inimiga em sua quarta fileira (por exemplo, com os peões pretos em e5 e f5 e um branco em f3). O conceito de maioria qualitativa é fácil de assimilar para qualquer um que tenha entendido bem o tema da cadeia de peões. Na posição com os peões brancos em a2, b2, c3, d4, e5, f4, g4 e h3 e pretos em a7, b7, c5, d5, e6, f7, g7 e h7 as brancas têm uma maioria qualitativa na ala do rei e as pretas na ala da dama. A

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maioria mais avançada em direção ao campo adversário naturalmente é considerada qualitativamente superior. 5 – As diversas formas de restrição examinadas em detalhe: a) A luta contra peões centrais móveis; b) A restrição de uma maioria qualitativa; c) A restrição de complexos de peões dobrados; d) Minha variante especial e o tema da restrição. a) A luta contra peões centrais móveis:

As brancas com um peão em e4 contra peões pretos em d6 e f7 (ou mesmo peão branco em d4 contra peões pretos em e6 e c6). Uma formação de peões desse tipo pode surgir, por exemplo, depois de: 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 d6 4.d4 exd4 5.Nxd4 Bd7 A ação restritiva começará com ...Nf6, ...Be7, ...0-0, ...Re8 e ...Bf8. Outra ajuda importante para paralisar o centro das brancas é assumir uma estrutura mais passiva, com peões em d6 e f6. A posição com um peão branco em e4 contra peões pretos em d6 e f6 é típica e eu a chamo de posição de serrote (Sagestellung) devido ao fato do peão e4 ficar cortado entre os dois dentes que são os peões pretos. A sucessão das manobras dirigidas contra um centro móvel em geral é a seguinte: 1) A posição passiva de serrote (Sagestellung); 2) A ação mais agressiva de uma torre que pressione o centro; 3) Isolamento ou retardamento de um peão central que inicialmente era móvel; 4) Fixação mecânica do peão com uma peça bloqueadora; 5) Conquista do peão.

O propósito do lado restritivo pode ser assim resumido: Primeiro restringir; em seguida bloquear e por último destruir! Colocar isso em prática é difícil porém gratificante e o processo resulta interessante para quem o estuda. Para ele a análise da posição que se produz após 1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 exd4 4.Nxd4 constitui um excelente treinamento que recomendo com entusiasmo aos nossos leitores. A partida ilustrativa que segue parece complicada, mas na realidade só o é em seus temas, dentre os quais o dominante é o da luta contra o peão branco de e4. Partida 35 Shoosmith - Nimzovitsch Ostende, 1907 Abertura Peão da Dama

1.d4 Nf6 2.c4 d6 3.Nf3 Nbd7 4.Nc3 e5 5.e4 Be7 6.Bd3 0–0 7.0–0 exd4! Se 7…Re8, então 8.d5 e as pretas estarão restringidas durante muito tempo. Por exemplo: 7...Re8 8.d5 Nc5 9.?Be3 Nxd3 10.Qxd3 Nd7 11.b4 a5 12.a3 etc. 8.Nxd4 Re8 9.b3 Ne5 10.Bc2 a6 Esse avanço logo resultará claro. 11.Bb2 Bd7 12.h3 Bf8 13.f4 Ng6 14.Qf3 c6 15.Rae1 b5 Agora a situação é clara: as pretas olham de soslaio o peão e das brancas e ao mesmo tempo buscam se livrar do incômodo peão c, uma vez que esse faz atrasado o peão d6. 16.Qd3 Qc7 17.Kh1 Rad8 18.Bb1 b4!! Isso tem a ver com uma formação em 201

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cadeia, ainda que seja totalmente incomum. O projeto para os elos da cadeia seria: peões brancos em b3 e c4, peão preto em b4 e... cavalo preto em c5! Porque não podemos, a título experimental, permitir que um oficial interprete o papel de um peão na cadeia? A razão está no plano da manobra ...Bc8, ...Nd7-c5 e ...a5-a4, atacando a base inimiga de b3. Em conseqüência, 18...b4!! implica na transferência do ataque de c4 para b3. 19.Nd1 Bc8 20.Qf3 Nd7 21.Nf5 Nc5 22.g4? Um erro que deixa por um instante mal defendida a casa f4 e esse breve momento é o suficiente para que as pretas irrompam brilhantemente no campo adversário. 22…Ne6 23.Qg3 Bb7 24.h4 d5 25.e5 c5 26.cxd5 Rxd5 27.Kg1 Se 27.Be4? Rxd1! 27...Rd2 28.Nfe3 Qc6 29.Rf3 Qxf3 0–1 Recomendo ao leitor atento minhas partidas contra Teichmann e Blackburne que encontrará nesse livro. b) A Restrição de uma maioria qualitativa:

Imaginemos que, na posição do diagrama 171, o cavalo preto se encontre em c5 ao invés de f6. Então teríamos um caso típico de restrição de uma maioria qualitativa. Se agora 1.Nxc5 segue 1...bxc5 e o avanço das brancas está contido. Se, no entanto, 1.a3 com a idéia de seguir 2.b4, então 1...a4! 2.b4 Nb3! e esse forte cavalo compensa a possibilidade de que as brancas cheguem a jogar c5. O estudante deve notar 202

que a ação do peão a preto é composta por partes iguais de efeito passivo e agressivo, uma vez que esse peão (ou o peão de h5 no diagrama 175) é o verdadeiro pilar de toda a manobra restritiva.

Diagrama 175 – A maioria qualitativa das brancas está restringida. Se 1.h3 segue 1...h4! 2.g4 Ng3, com eficácia garantida.

Em ambas as posições o avanço do peão branco de a3 (ou respectivamente o de h3) será respondido por sua vez com o avanço do peão lateral (a4 ou h4). Teremos outro exemplo típico na posição do diagrama 176. Aqui de forma geral não se poderá evitar o avanço fechado planejado pelas brancas, à base de Qg3, h4 e g5. Esse avanço (imaginemos por um instante que as pretas já jogaram o que parece inevitável ...f6) exporia a base da cadeia de peões pretos. É muito pior para as pretas, no entanto, o ataque na ala do rei que esse avanço significa. O plano correto para as pretas seria conter os avanços inimigos de h4 e g5 o maior tempo possível para permitir que o seu rei escape desse setor.

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c) A restrição de complexos de peões dobrados:

Diagrama 176 – van Vliet – Nimzovitsch, Ostende 1907

Com essa idéia, as pretas jogaram: 21...Nh7 22.Nf3 Qe7 23.Qg3 Rfe8 24.h4 f6 25.Ra1 As brancas, como é óbvio, também têm suas fraquezas. 25...Qb7 26.Rfe1 Kf7 27.Re2 Se 27.g5, então 27...hxg5 28.hxg5 Ke7!, com posição defensável. 27...Rh8! O lance misterioso de torre! 28.Kg2 Nf8 29.g5 hxg5 30.hxg5 Nd7 Pode-se dizer que o ataque das brancas na ala do rei se consumiu, uma vez que após 31.gxf6 gxf6 32.Qg6+ Ke7 33.Qg7+ Kd6, as pretas teriam um ótimo jogo. A partida continuou assim: 31.gxf6 gxf6 32.Nh4 Rag8 33.Ng6 Rh5 34.Kf2 Nf8 35.Rg1 Rg5 36.Qh4 Rxg1 37.Kxg1 Nxg6 38.Qh5 Kf8 39.fxg6 Qg7 40.Rg2 Rh8 41.Qe2 Rh4 42.Bc1 Rxe4 43.Qd2 Rh4 44.Qxa5 Qd7 45.g7+ Kg8 46.Bc4+ bxc4 47.Qxc5 Rh1+ 0–1 O estudante fará bem em se lembrar desse recurso aqui exibido.

Em conjunto com a debilidade dinâmica de um complexo assim, a qual já fizemos notar em várias oportunidades, devemos caracterizar como decisivos os seguintes fatores: 1º- O bispo prisioneiro; 2º - Espaço restringido e as conseqüentes dificuldades em se encontrar uma defesa. Com relação ao primeiro ponto, convém observar as posições que surgem na Abertura Holandesa (Bird) e na Abertura Inglesa. Na Bird teremos dois casos, o primeiro dos quais é apresentado no diagrama 177, que ocorre após os seguintes lances: (I) 1.f4 d5 2.Nf3 c5 3.d3 Nc6 4.Nc3 Bg4! 5.g3 Bxf3!! 6.exf3 e6 7.Bg2 f5! 8.0-0 d4

Diagrama 177 – O bispo de c8 é um “morto-vivo” (prisioneiro em seu próprio campo)

Um jogo delicioso! O bispo branco agora está prisioneiro em seu próprio campo, enquanto a debilidade das pretas em e6 é facilmente defensável. 9.Nb1 b5 10.a4 b4 11.Nd2 Na5 12.Qe2 Kf7 13.Re1 Qd7 14.Nc4 Nxc4 15.dxc4 Nf6 E segundo o Dr. Erdman, as pretas 203

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dão o ritmo da partida. O segundo caso pode ser exemplificado pela partida Nimzovitsch-Réti, Breslau 1925: (II) 1.e3 e5 2.c4 Nf6 3.Nc3 Nc6 4.Nf3 Bb4 5.Be2 Se 5.d4 então 5...exd4 6.exd4 d5 7.Be2 com jogo igualado. 5...0-0 6.0-0 Re8 7.a3 Bxc3 8.bxc3 d6 E as brancas viram o seu bispo preto emparedado por toda a partida, sem conseguir se ativar.

exemplo, a branca em a4 e a preta em d8). A partida está perdida para as pretas. Isso demonstra até que ponto um peão dobrado restringido pode paralisar uma posição.

Diagrama 179 – O efeito que o cavalo bloqueador exerce sobre o complexo de peões dobrados do adversário é demolidor d) Minha variante especial e o tema da restrição:

Diagrama 178 – Sem o peão de c7, as pretas teriam liberdade de movimentos, mas nessa situação não dispõem de lances úteis

O diagrama 178 e o diagrama 179 são apresentados para ilustrar o segundo caso. O último nos mostra um cavalo cujo efeito sobre o complexo de peões dobrados é enorme. Não somente faz com que a maioria resulte ilusória para as pretas em seu valor total, como mostra também que cada componente de forma isolada está com os dias contados. Nessa circunstância, a maioria branca vence como bem entender e nada mudaria esse fato, mesmo que ambos os lados contassem com torres no caminho (por 204

A linha de jogo em questão é a seguinte: 1.c4 e5 2.Nc3 Nf6 3.Nf3 Nc6 4.e4 Já em 1924 eu havia ensaiado (após 1.f4 c5 2.e4 Nc6 3.d3 [o lance do Dr.Krause] 3...g6) o lance 4.c4, cuja razão de ser é uma idéia de bloqueio que alcança metade do tabuleiro e em 1925 expliquei a respeito dessa partida em um comentário em uma revista: “Uma vez que esse lance não é inspirado pela esperança de prevenir ou dificultar o avanço ...d5, requer uma explicação especial. As pretas desejam formar a configuração e6-d5. Feito isso, considerarão ampliar sua formação de ataque para a ala da dama com ...Nd4 quando se apresentar a oportunidade para, após Nxd4, ...cxd4, pressionar a

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casa c2 pela coluna c. O lance do texto é efetuado para impedir a possível extensão do jogo na ala da dama. O buraco em d4 não parece ser muito importante.” Quando hoje me pergunto onde reuni a coragem suficiente para conceber um plano que ia em direção contrária a todas as tradições do xadrez, penso que seja a minha intensa preocupação pelo problema do bloqueio que me ajudou a fazê-lo. Em relação a esse problema, sempre estava procurando novas formas, de modo que em Dresden (1926) com as pretas, após 1.e4 c5 2.Nf3 Nc6 3.Nc3, aventurei-me com o lance 3...e5, que na ocasião causou verdadeira sensação. Minha variante predileta, indicada no começo, deve ser considerada apenas um passo à frente em uma trilha que já havia sido aberta. O competente teórico dinamarquês Dr. O. H. Krause levou a cabo uma pesquisa original sobre a possibilidade de combinar os lances e4 e c4, na qual, ao lado de minha análise, chegou a conclusões em parte semelhantes às minhas próprias. Agora passaremos em revista algumas partidas e ao mesmo tempo recordaremos ao amigo do xadrez minha pesquisa original O Bloqueio. Partida 36 Nimzovitsch - Rubinstein Dresden, 1926 Abertura Inglesa

Essa partida ilustra o efeito de medidas preventivas e a idéia da mobilidade coletiva. 1.c4 c5 2.Nf3 Nf6 3.Nc3 d5 4.cxd5 Nxd5 5.e4 Uma novidade, que ao preço do peão

d atrasado, visa assegurar outras vantagens. 5...Nb4 Era preferível 5...Nxc3 6.bxc3 g6. 6.Bc4! e6 Não era possível explorar de imediato a debilidade branca de d3, por exemplo: 6...Nd3+ 7.Ke2! Nf4+ 8.Kf1, com a ameaça 9.d4. Ou mesmo 6...Nd3+ 7.Ke2 Nxc1 8.Rxc1 Nc6 9.Bb5 Bd7 10.Bxc6 com final melhor. 7.0–0 N8c6 Era melhor 7...a6, se bem que é certo que inclusive nesse caso as brancas teriam um jogo excelente com 8.a3 N4c6 9.d3 e 10.Be3. 8.d3 Nd4 A ameaça era 9.a3. 9.Nxd4 cxd4 10.Ne2 As brancas agora estão muito bem. A debilidade de d3 está coberta e a mobilidade coletiva da ala do rei (f4!) é considerável. Finalmente e o mais importante, o bispo aparentemente bloqueado de c4 desempenha um papel preventivo (contra o possível ...e5), que na soma concede às brancas uma vantagem considerável. 10...a6 Frente à ameaça 11.Bb5+ Bd7 12.Nxd4. 11.Ng3 Bd6 12.f4 Aqui teria sido forte 12.Qg4. Vejamos: 12...0-0 13.Bg5! Be7 14.Bh6 Bf6 15.Bxg7 Bxg7 16.Nh5. Ou mesmo 13...e5 14.Qh4, seguido do sacrifício em g7 (Nh5xg7). A melhor resposta a 12.Qg4 teria sido 12...Qf6. Por exemplo: 12...Qf6 13.f4, mas inclusive nesse caso a superioridade posicional teria resultado muito expressiva. Após o lance menos incisivo 205

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do texto, as pretas podem igualar. 12...0–0 13.Qf3 Já não existe um ataque de mate direto. Por exemplo, 13.e5 Bc7! 14.Qg4 Kh8 15.Nh5 Rg8 16.Rf3 f5! 17.exf6 gxf6 18.Qh4 Rg6 19.Rh3 Qe7 e as pretas ameaçam consolidar sua posição com ...Bd7 e ...Rag8. 13...Kh8 14.Bd2 f5 15.Rae1 Nc6 Rubinstein defendeu-se com habilidade, mas as brancas têm uma carta na manga: a coluna e. 16.Re2 Qc7 Isso não é bom. Em posições restringidas nunca se deve renunciar à possibilidade de um lance futuro. Mas aqui ...Qc7 abandona a possibilidade de se jogar ...Qf6 após exf5 exf5. Portanto, o lance correto era 16...Bd7 e se então 17.exf5 (o melhor), 17...exf5 18.Rf1 Qf6 e as pretas estariam muito melhor do que ficaram na partida. 17.exf5 exf5

17...exf5 18.Nh1 O cavalo parte para uma longa viagem em direção a g5 para apoiar por todos os meios o bispo do rei, que agora deixou seu papel preventivo e caminha a passos largos. Entretanto, a coluna e, por assim dizer, abandonada à própria sorte, realiza Diagrama 180 – Posição após

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um esforço desesperado mas eficaz para sobreviver. Essa vitalidade da coluna e dá sentido à manobra do cavalo. 18...Bd7 19.Nf2 Rae8 20.Rfe1 Rxe2 21.Rxe2 Nd8 Agora vemos que a 21...Re8 seguiria 22.Qd5. 22.Nh3 Bc6 Aqui 22...Re8 permitiria uma combinação muito agradável: 23.Qh5! Rxe2 24.Ng5 h6 25.Qg6 hxg5 26.Qh5++. 23.Qh5 g6 24.Qh4 Kg7 25.Qf2 O roque das pretas segue fortemente defendido, de modo que as brancas tratam de, antes de prosseguir o ataque, forçar um reagrupamento das peças adversárias. 25...Bc5 Ou mesmo 25...Qb6 26.b4, seguido de Bc3! 26.b4 Bb6 27.Qh4 O tema de retorno, como nos problemas. Também teria sido bom 27.Qe1 Be4 28.Nf2, ganhando um peão com Nxe4 etc. 27...Re8 Se 27...Rf6, então 28.Ng5 h6 29.Nh7 vence no ato. 28.Re5! Nf7 Se 28...h6 seguiria 29.g4, com um ataque muito forte. Após o lance do texto, as brancas forçam um caminho elegante para a vitória. 29.Bxf7 Qxf7 No caso de 29...Rxe5 30.fxe5 Qxf7 31.Ng5 Qg8 32.e6 Bd5 33.Qf4 as brancas vencem com facilidade. 30.Ng5 Qg8 31.Rxe8 Bxe8 32.Qe1!

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Partida 37 Nimzovitsch - Rosselli Baden-Baden, 1925 Defesa Nimzoíndia

32.Qe1! Uma posição que curiosamente está perdida para as pretas, pois as brancas forçam o mate em uma seqüência decisiva. 32...Bc6 Se 32...Kf8 as brancas vencem através de 33.Qe5 Bd8 (o melhor, pois se 33...Qxa2 segue 34.Qf6+ Kg8 35.Ne6, ou mesmo 34...Bf7 35.Nxf7 e Qxb6) 34.Ne6+ Ke7 35.Qc5+ Kd7 36.Nf8+!. Observe-se como as brancas em seu lance 35 renunciam ao descoberto e como o rei das pretas fica preso entre suas próprias peças. 33.Qe7+ Kh8 A 33...Kh6 segue o óbvio 34.Ne6. 34.b5 Fechando o cerco! Se 34...axb5 35.Ne6 h5! 36.Qf6+ Kh7 37.Ng5+ Kh6 38.Bb4 conduz ao mate. 34...Qg7 Desespero. 35.Qxg7+ Kxg7 36.bxc6 bxc6 37.Nf3 c5 38.Ne5 Bc7 39.Nc4 Kf7 40.g3 Bd8 41.Ba5 Be7 42.Bc7 Ke6 43.Nb6 h6 44.h4 g5 45.h5 g4 46.Be5 1–0 Diagrama 181 – Posição após

Essa partida ilustra a restrição de um complexo de peões dobrados de forma verdadeiramente assombrosa. 1.Nf3 d5 2.b3 c5 3.e3 Nc6 4.Bb2 Bg4 5.h3 Bxf3 6.Qxf3 e5 7.Bb5 Qd6 8.e4 Aqui nos encontramos frente a uma posição na qual as brancas não dobram de imediato os peões das pretas com 8.Bxc6+ bxc6, mas o fazem com uma manobra de rodeio. Após 8.Bxc6+? bxc6 nunca poderíamos obrigar a esse obstinado adversário que cedesse aos nossos desejos e realizasse o avanço ...d4. As pretas (após 8.Bxc6+ bxc6 9.e4) jogariam simplesmente 9...Nf6. 8...d4 9.Na3 Ameaça 10.Nc4 Qc7 11.Bxc6+ bxc6 e é evidente a debilidade dos peões dobrados. 9...f6 10.Nc4 Qd7 11.Qh5+ A manobra da dama tem por objetivo impedir o roque das pretas na ala da dama, não na ala do rei como poderia se imaginar. 11...g6 12.Qf3 Qc7 Não 12...0-0-0 devido a 13.Na5 e não é possível o lance de cobertura ...Nge7 pois o peão f ficaria pendente. 13.Qg4! Agora a dama alegremente se coloca no posto de observação conquistado. Essa manobra da dama branca tem um aspecto absolutamente hipermoderno. 13...Kf7 A ameaça era 14.Qe6+ Kd8 207

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(14...Be7 15.Na5) 15.Bxc6 e o desagradável peão dobrado é um fato. 14.f4 h5 15.Qf3 exf4 16.Bxc6 No momento preciso, pois não se pode permitir à dama preta retomar em c6. Se 16...Qxc6 17.Qxf4 Re8 18.0-0!! Qxe4 (se 18...Rxe4 19.Ne5+!) 19.Qc7+!!, vencendo (19...Qe7 20.Nd6+, seguido de Nxe8). 16...bxc6 Finalmente as brancas conseguiram seu objetivo, ainda que às custas de um peão, mas isso não desempenhará um papel importante nessa posição concreta. 17.0–0 g5 A posição das pretas pode ser demolida, porém as brancas devem impedir a manobra ...Ng8-e7-g6-e5. Para fazer saltar a posição inimiga se requerem três lances de peões: 1.c3; 2.e5 e 3.h4. Se as brancas se contentarem somente com dois, seu trabalho estará incompleto. Na partida se realizaram os três lances. 18.c3 Rd8 A torre felizmente fica encadeada ao peão de d4. 19.Rae1! Ne7 20.e5 Nf5 21.cxd4! Nxd4 Se 21...cxd4 22.exf6 Kxf6 23.Qe4 e agora 23...Ng3 falha devido a 24.Bxd4+. 22.Qe4 Be7 A resposta a 22…f5 teria sido 23.Qb1, um lance de ataque no espírito mais moderno! Por exemplo: 22...f5 23.Qb1 Ke6 (protegendo o peão f) 24.Qd3! e Nd6! com ataque decisivo. 23.h4 A posição das pretas, devidamente minada, vem abaixo como um castelo de cartas. 208

23...Qd7 24.exf6 Bxf6 25.hxg5 1–0 Após 25...Bg7 26.Ne5+ Bxe5 27.Qxe5 o desvalido rei das pretas se transforma em uma figura patética. Meu querido colega Kmoch, dentre os mestres objetivos, tem um espírito notadamente crítico que o faz incapaz de se entusiasmar sem crítica (ao contrário das pessoas que se entusiasmam sem perguntarem muito o porquê). Ou seja, nosso amigo tem a elegância de ser objetivo. Bem, Kmoch me autorizou a dizer aos meus leitores que está verdadeiramente encantado com a partida Nimzovitsch-Rosselli. (Hans Kmoch [1894-1973], Mestre Internacional austríaco, foi também escritor e jornalista de xadrez – N. do T.). Partida 38 Johner - Nimzovitsch Dresden, 1926 Defesa Nimzoíndia

Esta partida ilustra a restrição total. Poderia ser comparada com a Imortal do Zugzwang, Sämisch-Nimzovitsch, Copenhagen 1923, embora pessoalmente considere que a que analisamos aqui seja superior. 1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nc3 Bb4 4.e3 0–0 As pretas tratam de criar um complexo de peões dobrados em condições favoráveis. 5.Bd3 c5 6.Nf3 Nc6 7.0–0 Bxc3 8.bxc3 d6 O diagnóstico para o complexo de peões dobrados (c3-c4) é ligeiramente favorável às pretas, mas sem exageros. Seguindo 9.e4 e5 10.d5 Na5 as pretas não conseguiriam erguer a baixo custo a

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barricada que conseguiram na partida, pois seu peão c teria estado muito melhor situado em c7 nesse caso. 9.Nd2! Uma ótima idéia. Em resposta a 9...e5 10.d5 Na5 a intenção é pedir que o cavalo de a5 se explique com 11.Nb3. 9...b6 10.Nb3? Havia o tempo certo para isso. Era necessário antes jogar 10.f4. Se então 10...e5, poderia seguir 11.fxe5 dxe5 12.d5 Na5 13.Nb3 Nb7 14.e4 Ne8 e o ponto fraco c4, que agora pode ser atacado a partir de d6, seria protegido com Qe2, já que as brancas podem utilizar a coluna f em conjunto com a4a5 como base de operações. A partida estaria então mais ou menos equilibrada. 10...e5! 11.f4 Mas agora a resposta a 11.d5 seria 11...e4! e após 12.Be2 Ne5! ou 12.dxc6 exd3 com vantagem das pretas. 11...e4 Também era possível 11...Qe7. Se 12.fxe5 dxe5 13.d5 então 13...Nd8 14.e4 Ne8 e as pretas com ...Nd6 e ...f6 obtêm uma forte posição defensiva (veja o comentário ao 10º lance). 12.Be2 Qd7! As pretas vêem nos peões brancos da ala do rei (f, g e h) uma maioria qualitativa. O lance do texto supõe um complicado sistema de restrição. Poderia ser iniciado outro mais simples com 12...Ne8, por exemplo: 13.g4 (ou 13.f5 Qg5) 13...f5 14.dxc5! (observe o leitor o bispo “morto” de c1 e considere como estão mal posicionadas as peças brancas para lançarem um ataque sobre a coluna g) 14...dxc5 15.Qd5+ Qxd5 16.cxd5 Ne7 17.Rd1 Nd6 e as pretas têm jogo melhor.

13.h3 Ne7 14.Qe1 No caso de 14.Bd2 as pretas também obteriam vantagem. Por exemplo: 14...Nf5 (com a idéia de ...Ng3 para trocar o bispo de e2 que protege o peão de c4) 15.Qe1 g6 16.g4 Ng7 17.Qh4 Nfe8 e a configuração de peões aconselha a ruptura 18...f7-f5. A inércia das peças dificulta as ações das brancas na ala do rei. 14...h5! 15.Bd2 Não daria resultado 15.Qh4, pois 15...Nf5 16.Qg5 Nh7 17.Qxh5 Ng3. 15...Qf5! Por incrível que pareça, a dama se dirige a h7 onde ficará muito bem posicionada para anular a ala do rei do inimigo com ...h4. Há que se admitir que a manobra restritiva ...Qd7-f5-h7 constitui-se em uma concepção notável. 16.Kh2 Qh7! 17.a4 Nf5 Ameaçando 18...Ng4+ 19.hxg4 hxg4+ 20.Kg1 g3! etc. 18.g3 a5! Nessa posição, o peão b atrasado não tem significação negativa para as pretas. 19.Rg1 Nh6 20.Bf1 Bd7 21.Bc1 Rac8 As pretas querem provocar o avanço d4-d5 para operarem tranqüilas na ala do rei. 22.d5 De qualquer forma d5 seria finalmente forçado com ...Be6. 22…Kh8 23.Nd2 Rg8 Agora começa o ataque. A manobra ...Qd7-f5-h7 pode ser considerada uma manobra de ataque? Sim e não. Não, porque a idéia essencial da manobra era restringir os peões brancos da ala do rei. Sim, porque toda ação restritiva é o prelúdio lógico do ataque e porque todo 209

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o complexo imobilizado de peões tende a ser uma debilidade e portanto cedo ou tarde se converterá em um alvo de ataque. 24.Bg2 g5 25.Nf1 Rg7 26.Ra2 Nf5 27.Bh1 As brancas dispuseram com habilidade todas as suas peças na melhor formação defensiva possível. 27…Rcg8 28.Qd1 gxf4 As pretas abrem a coluna g para elas, mas ao mesmo tempo também a coluna e para seu adversário. Esse lance mereceu portanto uma reflexão cuidadosa. 29.exf4 Bc8 30.Qb3 Ba6 31.Re2 As brancas aproveitam sua oportunidade. Agora o peão e das pretas deve ser protegido. Se elas tivessem se limitado a tomar medidas defensivas como, por exemplo, 31.Bd2, então teriam se deparado com uma bela combinação: 31...Rg6! 32.Be1 Ng4+ 33.hxg4 hxg4+ 34.Kg2 Bxc4! 32.Qxc4 e agora segue o tranqüilo 35...e3 e o mate com ...Qh3 só pode ser estancado com Nxe3, que no entanto custaria a dama para as brancas. 31...Nh4 32.Re3 Naturalmente aqui eu esperava 32.Nd2, pois o único remédio para as brancas consiste em atacar o peão e do adversário. Mas o certo é que esse lance permitiria um gracioso sacrifício de dama. Vejamos: 32.Nd2 Bc8! 33.Nxe4 Qf5! 34.Nf2 Qxh3+! 35.Nxh3 Ng4++. A chave de ...Bc8 e ...Qf5 reside em que não se pode inverter a ordem desses lances. Por exemplo: 32.Nd2 Qf5? (ao invés de 32...Bc8) 33.Qd1! Bc8 34.Qf1 e tudo fica protegido. Após 32...Bc8!, por outro lado, não serve 33.Qd1 devido a 210

33...Bh3!! e a posição branca se desmorona (34.Kxh3 Qf5+ etc). 32...Bc8 33.Qc2 Bxh3! 34.Bxe4 A seqüência 34.Kxh3 Qf5+ 35.Kh2 levaria a mate em três lances. 34...Bf5 O melhor, pois agora as brancas já não poderão conter o avanço ...h5-h4. Após a queda do peão h das brancas a defesa é desesperada. 35.Bxf5 Nxf5 36.Re2 h4 37.Rgg2 hxg3+ 38.Kg1 Qh3 39.Ne3 Nh4 40.Kf1 Re8! Um golpe final muito preciso. A ameaça é 41...Nxg2 42.Rxg2 Qh1+ 43.Ke2 Qxg2! e as brancas estão indefesas. Se 41.Ke1, então 41...Nf3+ 42.Kd1(f1) Qh1+ conduz ao mate. As brancas abandonaram. Uma das melhores partidas de bloqueio já jogadas!

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3 - O peão

d isolado e seus descendentes

1 – O peão d isolado; 2- O par de peões isolados c6 e d5; 3- O par de peões pendentes c5 e d5; 4- O par de bispos.

d isolado: O tema do peão d isolado é, em minha opinião, um dos problemas fundamentais em toda a teoria do jogo posicional. Preocupamo-nos em avaliar um peão fraco do ponto de vista estático, mas, no entanto mesmo débil um peão está impregnado de força dinâmica. O que predomina em sua natureza: a debilidade estática ou a força dinâmica? Esse problema estabelece um dilema que podemos dizer que ultrapassa os limites do xadrez. É indispensável que o estudante adquira experiência própria enfrentando por sua conta esse problema, o que significa que terá que experimentá-lo em xadrez de competição. Assim deveria treinar com as brancas a posição chamada normal no Gambito da Dama: 1.d4 d5 2.Nf3 Nf6 3.c4 e6 4.e3 c5 5.Nc3 Nc6 Nesse momento cabe praticar duas variantes. Em uma partida pode-se jogar 6.Bd3 cxd4 7.exd4 dxc4 8.Bxc4 (as brancas têm o seu peão d isolado), e em outra, 6.cxd5 exd5 7.dxc5 Bxc5 e agora são as brancas que lutam contra o peão d isolado. Isso é muito instrutivo e não fará mal o leitor comprovar em sua própria pele o perigo que pode chegar a ser o peão d isolado do inimigo e como é 1- O peão

difícil salvar o próprio da perseguição do adversário. Dessa forma, caro leitor, você poderá percorrer um caminho espinhoso do qual não devemos poupá-lo, uma vez que só passando por situações dolorosas será possível enfrentar a realidade. 1A- A força dinâmica do peão d isolado

Diagrama 182

A força dinâmica do peão d4 (veja o diagrama 182) reside na sua capacidade de expansão d4-d5 e na circunstância de que esse peão crie os eventuais postos avançados de e5 e c5. Pelo lado contrário, para as pretas, o posto avançado d5 não é totalmente equivalente, pelo menos no meio-jogo. Ao lado de qualquer conclusão aritmética (dois postos contra um) as brancas podem assinalar o fato de que um cavalo em e5 deve exercer um efeito maior sobre a posição que o correspondente a um cavalo inimigo em d5. Por outro lado está claro que um cavalo em e5 apoiado por duas diagonais 211

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fortes para os bispos (b1-h7 e h4-d8) deve exercer pressão sobre a ala do rei das pretas e não há nada mais forte do que um ataque ao rei. Essa análise superficial sugere sem dúvida, portanto, uma vantagem para as brancas. Não obstante, sabemos que o nosso peão tem uma acentuada tendência a ser fraco no final. Como devemos entender isso? Cabe então estabelecer se esta debilidade reside só na dificuldade em mantê-lo ou se implica ainda em outras calamidades. 1B – O peão d isolado como uma fraqueza no final

Para avaliar adequadamente a questão colocada, é preciso examinar as casas e5 e d5 com um critério diferente do adotado na avaliação do meio-jogo. Agora já não se pode ter em conta o ataque direto à ala do rei e portanto a casa e5 perde muito do seu brilho, ao mesmo tempo em que a casa d5 para as pretas cresce em importância. Se no momento em que se chega ao final as brancas não conseguiram penetrar em c7 ou não dispõem de algum outro troféu conquistado no meio-jogo, sua posição não será muito invejável. As brancas sofrerão não somente pela necessidade de proteção que tem seu peão d isolado, mas também pelo fato de que as casas brancas d5, c4 e e4 podem com facilidade tornarem-se débeis. Vamos supor que no diagrama 183 as brancas tivessem o rei em c4 e um bispo em d2, enquanto que o rei preto se encontra em c6 e um cavalo em d7. Com um xeque de cavalo, as pretas desviam o rei branco de c4, jogam seu rei a d5 e ameaçam seguir avançando com seu rei 212

por c4 ou e4. Em todos os casos da situação comentada, a casa d5 deve ser considerada como o ponto-chave da posição das pretas.

Diagrama 183

Com base nessa casa, irão bloquear, centralizar e manobrar: d5 será a porta de entrada do campo inimigo e também um ponto de inflexão para todos os possíveis movimentos de tropas, como por exemplo, na suposição de que enriqueçamos a posição do diagrama 183 com torres e cavalos. O jogador com as pretas poderia efetuar a manobra ...Rd8d5-a5 ou mesmo ...Nf6-d5-b4 ou ainda ...Nd5-e7-f5xd4. Um cavalo preto situado em d5 exerce um efeito impressionante sobre ambas as alas. Um bispo em d5 com freqüência força uma decisão, inclusive em finais de bispos de cores diferentes (se as torres de ambos os lados permanecem ainda no tabuleiro). As brancas obviamente podem tratar de conseguir uma contrapartida, ou mesmo a vantagem, como compensação por esses triunfos das pretas. Por exemplo: uma de suas torres pode ter penetrado por c7, mas tais casos devem ser considerados exceções à regra. Vamos recapitular: a debilidade das

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Jogo Posicional: 3 - O peão

brancas no final reside no fato de que o peão de d4 parece ameaçado, enquanto que d5 é um trampolim extraordinariamente forte para as pretas. Por outro lado, as casas brancas c4, d5 e e4 tendem a fazerem-se débeis enquanto a importância que a casa e5 tinha no meiojogo se vai reduzindo. As brancas tinham uma formação de peões que na realidade não era compacta (entendendo por isso aquela formação na qual não há peões isolados), além de outras desvantagens das quais já falamos, como debilidades que contagiam todo um complexo de casas de uma mesma cor e que necessariamente se produzem em uma formação de peões que não é compacta. Aconselhamos o estudante a esmerar sua apreciação de formações, compactas ou não. Também deve ter presente que não é só o peão d isolado que tende a tornar-se fraco, mas também todo o complexo de casas que o rodeiam. Este é o seu principal defeito estrutural.

d

isolado e seus descendentes

Na fase de desenvolvimento (ver o diagrama 182) recomendamos, portanto, uma posição sólida à base de Be3 (não Bg5), Qe2, torres em c1 e d1 (não d1 e e1), Bd3 ou Bb1 (ou Bb3) e as brancas devem manter-se alertas entre opções de ataques de surpresa que possam surgir nos primeiros movimentos do meio-jogo, talvez com Ne5xf7 (com um bispo em a2), ou uma manobra agressiva de torre (Re1-e3-h3). Uma posição sólida que garanta a segurança do peão d4 é o único caminho correto e deve ser lembrado sempre que o bispo de e3 está unido ao peão d4 como uma ama-de-leite ao bebê que alimenta.

1C – O peão d isolado como instrumento de ataque no meio-jogo

A solidez da posição e uma distribuição harmônica das peças devem dar lugar ao primeiro descuido do adversário, como por exemplo, a disposição de suas peças na ala do rei, a um forte ataque. Muitos jogadores com um peão d isolado atuam, no entanto, com violência excessiva e me parece que não há necessidade de se lançar em ataques tão desesperados. Em primeiro lugar, é necessário se dar consistência à própria posição e o momento do ataque chegará por si mesmo, por exemplo, se as pretas retirarem seu cavalo de f6 (o que podem ser obrigadas a fazer, uma vez que o cavalo naturalmente busca a casa d5).

Diagrama 183A Nimzovitsch-Taubenhaus, São Petersburgo 1913 – As pretas jogaram ...Ne8 (com destino a d6). Este é o tiro de partida para o ataque das brancas. Como deve ser iniciado e qual é o seu desenvolvimento previsível?

As brancas desenvolveram suas peças respeitando o espírito dessas posições e o lance seguinte das pretas lhes dá a possibilidade que, em circunstâncias similares, permite-lhes lançar um ataque direto ao rei inimigo. O resultado no presente caso é duvidoso, mas uma vez que todo método de condução do ataque 213

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é usual em posições com peão d isolado, incluímos aqui algumas variantes. 19...Ne8 20.Qh5 g6 O lance 20...f5 falha devido a 21.Bg5. 21.Qh6 Ng7 Se 21...f6, 22.Ng4. 22.Bg5! As peças brancas saem da reserva. 22...f6 23.Bxg6 hxg6 24.Nxg6 Agora surgem duas variantes, segundo a retirada escolhida pela dama. 24...Qd7 Ou mesmo 24...Qd6 25.Qh8+ Kf7 26.Qh7 fxg5 27.Ne5+ e a continuação poderia ser assim: 27...Ke8 28.Qxg7 Qe7 29.Qg6+ Kd8 30.Rc6, com enormes complicações. 25.Bh4! Ou 25.Bxf6 Nxf6 26.Qh8+ Kf7 27.Ne5+ Ke8 28.Nxd7 Rxh8 29.Nxf6+, com três peões pela peça sacrificada. Assim, lembremos uma vez mais do que se trata de construir uma posição sólida, colocando proteção no peão d isolado (Be3) e somente atacar quando se apresentar uma oportunidade fundamentada. 1D- Que casos são favoráveis às brancas e quais às pretas?

Em geral, pode-se dizer que nos dois casos seguintes o peão d isolado é favorável às brancas: Quando podem efetuar o avanço d4d5, pois após a captura (...exd5 ou ...peçaxd5) as brancas ficam com a melhor parte devido fundamentalmente a uma posição mais centralizada das suas peças (como na partida RubisteinTartakower, Baden-Baden 1925). Quando se asseguraram do domínio 214

da coluna c (veja-se a partida Nimzovitsch-Taubenhaus adiante). Para o jogador das pretas podem ser favoráveis: Todas as posições próximas ao final, com igualdade dos outros fatores. Aquelas posições nas quais as pretas jogaram ...Nd5xc3 e as brancas devem retomar bxc3. A idéia das pretas é cravar o peão de c3 desde o início e assediá-lo posteriormente (veja-se a partida Thomas-Alekhine, pág. 59 e também a partida Nimzovitsch-Taubenhaus, pág. 226) 1E- A possível criação de uma debilidade reflete nos peões da ala da dama

Um sintoma da debilidade do peão isolado constitui a possibilidade que com bastante freqüência se apresenta ao atacante de poder transferir o ataque do peão d isolado para um da ala da dama. Um caso assim do que chamamos debilidade reflexa se pode ver na partida Rubinstein-Duras, pág. 153. Um caso similar se encontra na partida jogada entre Rubinstein e Lasker, Moscou 1925: 1.d4 d5 2.c4 c6 3.e3 Nf6 4.Nc3 e6 5.Nf3 Nbd7 6.Bd3 dxc4 7.Bxc4 b5 8.Be2 a6 9.0–0 Bb7 10.b3 Be7 11.Bb2 0–0 12.Ne5 c5 13.Bf3 Qc7 14.Nxd7 Nxd7 15.Ne4 Rad8 16.Rc1 Qb8 17.Qe2 cxd4 18.exd4 Rc8 19.g3 Qa8 20.Kg2 Rfd8 21.Rxc8 Rxc8 22.Rc1 Rxc1 23.Bxc1 h6 As pretas conseguiram vantagem estratégica às custas do peão d isolado. A continuação foi: 24.Bb2 Nb6 25.h3 Uma vez que querem evitar a troca de damas, não serviria 25.Qc2 devido a 25...Qc8.

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25...Qc8 26.Qd3 Nd5! Com a idéia de 27...Nb4. 27.a3 Nb6!! Agora b3 é um ponto débil. 28.Kh2 Bd5 29.Kg2 Qc6 30.Nd2 a5 31.Qc3 Devido às suas dificuldades, as brancas decidiram trocar as damas, com o que sucumbem às debilidades reflexas agora criadas. 31…Bxf3+ 32.Nxf3 Se 32.Qxf3, então 32…Qc2. 32…Qxc3 33.Bxc3 a4! Agora é evidente a debilidade da ala da dama das brancas. 34.bxa4 bxa4 E as brancas perderam, uma vez que a tentativa de salvação 35.Kf1 falhou devido a 35...Bxa3 36.Ke2 Kf8 37.Kd3 Nd5, e a aproximação do rei branco (e2-e3-e4) fica impossibilitada (a Ke2 se responde sempre ...Nc3+). O notável desse grande final, além da transferência de ataque, é a maestria no uso variado da casa d5 por parte das pretas. A respeito do modo de se planejar um assédio duradouro ao peão d isolado, gostaria de fazer a seguinte observação adicional: hoje em dia não é imprescindível imobilizar completamente um peão d isolado. Pelo contrário, inclusive podemos lhe dar a ilusão de liberdade antes de prendê-lo em uma jaula. Como isso é feito, podemos observar na partida seguinte entre Lasker (a quem classificamos na categoria de jogador moderno) e Tarrasch, São Petersburgo 1914 (observese a fina ironia de Nimzovitsch com referência ao seu desafeto histórico Siegbert Tarrasch. Veja o famoso artigo de Nimzovitsch no final deste

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livro – N. do T.): 1.d4 d5 2.Nf3 c5 3.c4 e6 4.cxd5 exd5 5.g3 Nc6 6.Bg2 Nf6 7.0–0 Be7 8.dxc5 Bxc5 9.Nbd2 E agora o peão d isolado pode escolher entre se converter em um peão fraco em d5 ou em d4. Tarrasch escolheu essa segunda opção e seguiu: 9...d4 10.Nb3 Bb6 11.Qd3 Be6 12.Rd1 Bxb3 13.Qxb3 Qe7 14.Bd2 0–0 15.a4 Ne4 16.Be1 Rad8 17.a5 Bc5 18.a6 bxa6 Se 18...b6, então 19.Qa4 ameaçando 20.b4. 19.Rac1 Agora todas as peças que defendem o peão d4 estão no ar. Seguiu: 19...Rc8 20.Nh4 Bb6 21.Nf5 Qe5 22.Bxe4 Qxe4 23.Nd6 Ganhando a qualidade. Considerando suas vantagens e inconvenientes, podemos concluir que o peão d isolado pode ser uma arma efetiva no meio-jogo, mas no final resulta ser uma fraqueza. 2- O par de peões isolados

c6 e d5

Diagrama 184 Com

1...Nxc3 2.bxc3 forma-se o par de peões isolados c3 e d4

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Na posição do diagrama 184, as pretas podem trocar os cavalos em c3. Essa estratégia, que pode parecer estranha, tem sua razão: as pretas podem manter os peões inimigos em c3 e d4 até que se consiga bloqueá-los completamente no final. Os peões amarrados podem se transformar em um sério problema para as brancas. A primeira dificuldade, a proteção de ambos os peões, se verá agravada pela segunda, a saber, um espaço restringido. Os peões bloqueados em c3 e d4 e somente estes (ou também, evidentemente, os de c6 e d5 no caso das pretas – N. do T.) são os que eu chamo de par de peões isolados. Um bom exemplo pode ser visto na partida Thomas-Alekhine, página 59. Um quadro muito diferente se produz quando o jogador ameaçado consegue avançar seu peão c, caso em que teremos peões brancos em c4 e d4. Agora esses peões já não se chamarão “par de peões isolados”, mas “peões pendentes”. Não será difícil decidir entre esses dois pares de peões, pois em geral o par isolado tem mobilidade escassa, o que faz com que os pendentes sejam claramente preferíveis, ainda que somente por permitirem planejar ameaças. Ainda no caso em que essas ameaças fossem só aparentes, uma iniciativa duvidosa é sempre melhor do que uma passividade morta sem qualquer esperança, como vimos no caso de um par de peões bloqueados na partida Thomas-Alekhine já citada. Como regra, pode-se estabelecer o seguinte postulado: “O dono de um par de peões isolados (como o do diagrama 184 após 1...Nxc3 2.bxc3) deve fazer todo o possível para avançar c3-c4, impedindo de qualquer 216

forma o bloqueio do peão em c3. Deve considerar portanto a formação c3+c4 como transitória para alcançar a formação móvel c4+d4 com a eterna ameaça de c5 ou d5.” Agora apresentamos um exemplo no qual as pretas, donas de um par de peões isolados, lutam para conseguir a possibilidade de jogar o avanço desejado. Nimzovitsch-Giersing e Kinch Copenhagen 1924 1.c4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 Nf6 5.Nxc6 bxc6 6.g3 d5 7.Bg2 Bb4+ 8.Bd2 Bxd2+ 9.Nxd2 0–0 10.0–0 Rb8 11.Qc2 As brancas evitam 11.b3, uma vez que desejam ter essa casa disponível para a manobra de peças, como Nb3 ou Qa4. 11…Re8 12.e3 Be6 13.cxd5 Deve ser considerado 13.Nb3 dxc4 14.Nd4. 13…cxd5 As pretas têm os peões em questão. A formação c7+d5 é ainda mais merecedora da designação “peões isolados” que o caso de c6+d5. As pretas com sabedoria tratam de fazer possível o avanço ...c5. 14.Nb3 Qd6 15.Rfc1 Rec8 16.Qc5 Qxc5 17.Rxc5 Nd7 18.Ra5 Para estabelecer com 19.Rc1 um bloqueio duradouro. 18...c5!! 19.Rxa7 c4 20.Nd4 Rxb2 21.Nxe6 fxe6 22.Rxd7 c3 As pretas conseguiram a mobilidade do seu peão c à custa de uma peça menor, mas o certo é que as brancas não conseguem vencer. 23.Bh3 c2 24.Bxe6+ Kf8 25.Rf7+ Ke8 26.Bxc8 Rb1+ 27.Kg2 Rxa1

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Se 27...c1Q seguiria 28.Rxb1 Qxb1 29.Rf4. 28.Rc7 c1Q 29.Rxc1 Rxc1 e a partida foi considerada empatada no lance 42. 3- O par de peões pendentes c5 e d5

Suas origens e o que podemos aprender. O avanço em uma posição bloqueada. A evolução ou a história dos peões pendentes pode ser vista no diagrama 185, no diagrama 186 e no diagrama 187 abaixo.

Diagrama 185 – Primeiro quadro: o peão d isolado

Diagrama 186 – Segundo quadro: o par de peões isolados

Diagrama 187 – Terceiro quadro: os peões pendentes

Uma vista nestas três posições nos remete à origem dos peões pendentes, pois a “árvore genealógica” mostra de forma clara as três gerações em ordem cronológica: primeiro o patriarca, o fundador da família, o peão d isolado, depois um par de peões isolados e finalmente os peões pendentes. Este último conceito, cuja correção é demonstrável, nos será de grande valia, uma vez que nos permitirá comparar os temas característicos dos peões pendentes e a sua relação com o peão d isolado, esses mais fáceis de discernimento. Em outras palavras: o estudo dos antecedentes familiares contribuirá para entender esse parente tão complicado. De seu avô, o senhor peão isolado, os peões pendentes herdaram o caráter específico, uma mistura estranha de debilidade estática e força dinâmica. Mas enquanto no caso do peão isolado se mostram claramente tanto a força como a debilidade, no caso dos peões pendentes ambos ingredientes estão mascarados. O avô era mais sincero, os netos ocultam mais as coisas. A respeito dessas criaturas problemáticas, há dois pontos que convêm serem 217

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esclarecidos: 1) Que os peões pendentes estão desprotegidos, ou seja, por definição não defendidos por outros peões e que, portanto, o bombardeio ao qual estão submetidos por se encontrarem em colunas abertas pode se tornar angustiante; 2) Que se apresenta com freqüência a opção de que alcancem uma posição segura na qual um peão proteja o outro (d5+c4, d4+c5). O problema, no entanto, é esse: se a possibilidade de alcançar essa segurança relativa ocorre à custa de renunciar a toda iniciativa no centro, permitindo o seu bloqueio, não é mais recomendável se esquecer de tal segurança e permitir que continuem sendo pendentes? A resposta não é fácil, pois depende completamente das circunstâncias particulares que ocorrem na posição, ou seja, a forma e os detalhes que revestem o bloqueio resultante. Falar de segurança quando se refere a um complexo de peões bloqueados é simplificar o significado do termo, pois sabemos que peões bloqueados tendem a debilitar-se com muita facilidade. Em alguns casos, não obstante, seria perfeitamente recomendável permitir que os peões pendentes avancem, mesmo à custa de serem bloqueados. Estes casos são os seguintes: 1) Quando os peões que formam o bloqueio são em si mesmos atacáveis, como o peão branco de b2 no diagrama 187; 2) Quando o bloqueio resultar muito custoso para o adversário por qualquer motivo, quando os bloqueadores são pouco elásticos ou quando da sua 218

colocação são pouco agressivos. Como antítese a isso, chamo a atenção do leitor para o diagrama 188 e o diagrama 189 abaixo.

Diagrama 188 – Duras-E.Cohn, Carlsbad 1911 – A segurança conseguida pelos peões pendentes é muito relativa. Ainda que o peão de d4 seja passado, o de c5 é fraco

Diagrama 189 – O peão de d4 é sobrevivente dos peões pendentes. Muitos lances atrás se produziu o avanço ...d4, cxd4, ...cxd4. Esse peão pode ser bloqueado agora com Ke2-d3 e as brancas terão vantagem

Nessas duas posições, a segurança “bloqueada” resulta decepcionante. Os peões avançados se tornam débeis. Novamente isso ocorre devido à

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qualidade das forças de bloqueio, pois nas duas posições tanto o cavalo de d3 como o rei em d3 (depois de Ke2-d3) resultam respectivamente em excelentes bloqueadores, o que basta para anular as tentativas do adversário para salvar a situação. A verdade parece estar na seguinte avaliação do caso: assim como a nossa avaliação do peão isolado de d4 dependia em maior ou menor grau da iniciativa que pudesse dele se derivar (o posto avançado que cria deve ter alguma importância), também consideramos que temos direito de esperar algum tipo de iniciativa derivada dos peões pendentes que tenham conseguido uma segurança “bloqueada”. A passividade absoluta não oferece perspectivas. Em seguida nos concentraremos em alguns exemplos. Na partida Rubinstein-Nimzovitsch, Carlsbad 1907 (diagrama 187) foi jogado: 15.Qa4 Qb6 As pretas “esperam”. 16.Qa3 c4! Optando pela segurança do bloqueio, porém aqui o dispositivo de bloqueio é atacável – o peão de b2. Portanto o avanço das pretas está justificado. 17.Be2 a5 18.Rfd1 Qb4 19.Rd4 Rfd8 20.Rcd1 Rd7 21.Bf3 Rad8 22.Nb1 Aqui seria melhor adotar um compasso de espera, com 22.R4d2 etc. 22...Rb8 23.R1d2 Qxa3! 24.Nxa3 Kf8 25.e4 Conduz em última instância à perda de um peão, mas as brancas de qualquer maneira estavam mal. O equilíbrio que existia no lance 21 se rompeu. Agora o peão de b2 se torna débil, enquanto o de d5 parece super-protegido!

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25...dxe4 26.Rxd7 Nxd7 27.Bxe4 Nc5 28.Rd4 Ou mesmo 28.Bc6! Rb4 29.Bd5 Na4, com vantagem das pretas. 28...Nxe4 29.Rxe4 Rxb2 30.Nxc4 Rb4 31.Nd6 Rxe4 32.Nxe4 Bxa2 e as pretas venceram. Na prática magistral, o avanço d4-d5 (a partir da posição dos peões pendentes c4+d4) ocorre com maior freqüência. Tal avanço consiste em fechar o cerco, ainda que um cerco muito original, que nos leva de um peão central isolado a peões pendentes e destes de novo a um peão isolado. O exemplo que segue é a partida Nimzovitsch-Tartakower, Copenhagen 1923. 1.Nf3 d5 2.b3 c5 3.e3 Nc6 4.Bb2 Bg4 5.Be2 Qc7 6.d4 cxd4 7.exd4 e6 8.0–0 Bd6 Agora temos um Gambito de Dama Recusado com cores invertidas. 9.h3 Bxf3 10.Bxf3 Nf6 11.c4 dxc4 12.bxc4 0–0 13.Nc3 A seqüência Nd2-b3, Qe2, Rac1 e Rfe1 corresponderia aqui ao espírito de uma política restritiva, mas eu queria realizar minha transação com o avanço d5. 13...Rfd8 14.Nb5 Qe7 15.Qe2 Bb8 16.d5 exd5 17.Qxe7 Nxe7 18.Bxf6 gxf6 19.cxd5 Be5! 20.Rab1 E o peão d não somente conseguiu se manter à tona como também durante todo o transcurso da partida serviu de contrapeso à maioria das pretas na ala da dama. No entanto, Tartakower não entendeu dessa forma e perdeu a partida. 219

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Diagrama 190 – Bernshtein-Teichmann, Carlsbad 1923. As pretas nos entretêm com algumas belas piruetas

A posição do diagrama 190 não teve uma evolução tão cômoda para o condutor dos peões pendentes. Seguiu: 17.Qa3 Ne4 18.Rd3 Rfd8 19.Rfd1 Qe6 20.Nd2 Qb6 21.Nf1 Nf6 22.Ng3 Rac8 23.h3 h6 24.Ne2 Rd7 25.Nc3 Qe6 26.Qa5 d4! Cansadas das ameaças constantes, as pretas buscam modificar a posição dos peões pendentes por uma segurança de bloqueio, da qual temos falado. Mas essa decisão está a ponto de lhes custar caro. 27.exd4 cxd4 28.Nb5 Como poderá se salvar o novo peão d isolado? 28...Qf5! Segue agora uma bela troca de golpes. 29.Qa4! Rc1! 30.Rxc1 Qxd3 31.Rc8+ Kh7 32.Qc2 Qxc2 33.Rxc2 d3! 34.Rd2 O peão isolado parece estar em perigo. 34...Ne4! 35.Rd1 Rb7 A liqüidação final! 36.Nc3 Nxc3 37.bxc3 Rb2 38.Rxd3 Rxa2 E ambos adversários concordaram com o empate. O estudante deve observar a forma 220

pela qual o peão d foi defendido indiretamente. Esse esquema permite ao lado defensor uma possibilidade adicional de modificar a posição de seus peões pendentes e adaptá-la a circunstâncias mais favoráveis. A condição pendente, como já dissemos, deve ser considerada como transitória, à espera de que se apresente o momento oportuno para liqüidá-la. Em geral, o lado defensor tende a se precipitar, efetuando tal liqüidação um ou dois lances antes do momento apropriado. A razão é de caráter psicológico, pois em uma resistência prolongada a sensação de estar suspenso não agrada o temperamento humano. Mas se pretendemos modificar a condição de nossos peões suspensos, temos que pensar muito bem antes de tomar uma decisão drástica. Inclusive se decidimos nos acolher à segurança bloqueada, convém fazê-lo vislumbrando algum tipo de iniciativa. Nunca devemos consentir um bloqueio que nos prenda em uma posição passiva! É melhor seguir em suspenso. 4- O par de bispos

Os dois bispos são uma arma temível nas mãos de um enxadrista habilidoso. Não obstante, devo confessar que por um momento pensei no sacrilégio de omitir esse tema em meu livro. Em Meu Sistema, pensei, só devo contemplar dois temas que merecem uma investigação cuidadosa: os elementos e os temas estratégicos. Por exemplo: o peão central isolado, que me parecia de alguma forma transcender o problema da restrição como tema estratégico. Mas onde seria possível colocar o tema dos orgulhosos bispos? Essa questão não deve parecer retórica nem descabida, pois a considero de

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inegável interesse teórico. Seria ir demasiado longe aqui desenvolver os fundamentos nos quais se baseiam minhas opiniões a respeito, razão pela qual peço aos leitores que se conformem com o anúncio dos resultados. Cheguei à conclusão de que a vantagem do par de bispos não pode ser classificada nem como elemento, nem como esquema. Para mim, os bispos são (e não podem ser outra coisa) uma espécie de arma. O exame de diversos tipos de armas e a determinação da sua aplicação a determinados casos (como fez Berger [Johann Nepomuk Berger, 1845-1933, foi um forte jogador, historiador, teórico e problemista. Escreveu o livro Theorie und Praxis der Endspiele em 1890, um clássico nos tempos de Nimzovitsch – N. do T.] que converteu esse procedimento no carro-chefe de seu famoso livro sobre finais), está completamente fora do escopo desse livro. O leitor, no entanto, tem direito a esperar que eu lhe informe, na medida do possível, dos perigos que um par de bispos pode significar. A superioridade do bispo sobre o cavalo fica demonstrada claramente no diagrama 191.

Diagrama 191 – Superioridade do bispo sobre o cavalo. Ainda que este se encontrasse em c3, as pretas não poderiam se salvar

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Cada jogador tem um ou mais peões passados, apoiados pelo seu rei. O bispo vence, pois sua capacidade de apoiar o avanço dos seus peões ou de conter os do adversário é superior.

Diagrama 192 – As brancas sucumbem devido à fraqueza das casas de sua cor.

Por outro lado, no diagrama 192 podemos ver a principal debilidade do bispo, que se tiver que defender um terreno normalmente é inoperante, uma vez que seria um absurdo pretender que um bispo de casas pretas defenda casas brancas! O progresso das pretas nessa posição, para vergonha do bispo, poderia se produzir da seguinte maneira: 1...Na5+ 2.Kc3 Ka4 3.Bf2 Nc6 4.Be3 Na7 5.Bf2 Nb5+ 6.Kd3 Kb3 E eventualmente seguirá um xeque de cavalo em b2 ou b4 e o rei preto conquistará a casa c4. Peço ao leitor que examine as posições dos diagramas 191 e 192 como os dois pólos opostos entre os quais se encontram todos os demais tipos de lutas entre o bispo e o cavalo. A principal qualidade do bispo é a de poder realizar grandes deslocamentos. Seu principal defeito reside na impotência para controlar as casas de cores opostas à sua. Há mais ainda! Na posição - brancas: 221

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Bg2, Pc5; pretas: Nb8, Pc6, com outras peças e peões distribuídos no tabuleiro, a vantagem do bispo é tão pouco demonstrável como a sua aparente inferioridade na posição – brancas: Bb4, Pc5; pretas: Ne6, Pc6. Em ambos os casos, trata-se da preponderância estratégica (ou seja, a vantagem que dá a posição ativa ou passiva das peças, analisada em seu momento), o que constitui o fator-chave, não a possível superioridade inerente ao tipo de arma em questão. Repetimos que a principal debilidade do bispo reside na sua incapacidade para atacar ou defender casas de cores opostas e que a sua força principal reside na facilidade para realizar longos deslocamentos. Agora já podemos compreender porque os bispos que atuam em conjunto são tão fortes. A razão é clara: sua força se vê multiplicada e a debilidade de cada um se neutraliza porque o outro a complementa. É quase impossível citar na sua totalidade as diversas situações nas quais o par de bispos pode resultar perigoso. Trataremos, no entanto de expor as mais importantes. (a) Os bispos Horwitz

(Bernhard Horwitz, 1807-1885, foi um forte jogador, editor da Revista “The Chess Player” e autor em conjunto com Kling do livro “Chess Studies”, sua obra mais famosa – N. do T.) Quando os dois bispos estão situados em diagonais adjacentes (por exemplo, Bb2 e Bd3), orientados em direção à posição do rei adversário, se chamam às vezes bispos Horwitz. Seu efeito com freqüência é devastador. Um dos bispos força um lance de peão, o que abre o caminho para o outro. 222

Diagrama 193 – 1.Qe4 força o avanço do peão g e então entra em ação o bispo de f2

No diagrama 193, por exemplo, 1.Qe4 força o lance 1...g6, o que expõe a posição das pretas, permitindo que o segundo bispo entre em ação com efeitos decisivos: 2.Bd4+. Os acontecimentos tomaram um rumo similar na seguinte partida: 1.e4 e5 2.d4 exd4 3.c3 dxc3 4.Bc4 cxb2 5.Bxb2 Bb4+ 6.Nc3 Nf6 7.Nge2 Nxe4 8.0–0 Nxc3 9.Nxc3 Bxc3 10.Bxc3 0–0 As pretas se sentem seguras com o roque, sem temer 11.Qg4 (11...g6) nem 11.Qd4 (11...Qg5), mas omitem o jogo combinado característico dos bispos Horwitz. 11.Qg4 g6 E somente agora 12.Qd4, quando o mate é inevitável. A cooperação do bispo de c4 reside obviamente na cravada do peão f. Os bispos do diagrama 194 podem ser considerados uma variante dos bispos Horwitz e desde logo do tipo mais nobre. Aqui não se trata em absoluto de ataque ao rei. No entanto, o ataque ao peão a7 (só se incluindo no diagrama as peças mais significativas), ainda que não seja importante resulta ser desagradável, pois

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obrigará as pretas a situar seus peões em a7, b6 e c5, quando o caminho para o outro bispo estará livre. As brancas prosseguem com a4 e b3 e então as casas a6, b5 e sobretudo c4 estarão disponíveis para o bispo de casas brancas. Agora a maioria preta da ala da dama está paralisada.

Diagrama 195 – Tarrasch (com as pretas) encaixota os cavalos brancos

Diagrama 194 – Esquema. Dois bispos atacam uma massa de peões para conquistar casas. (b) Os bispos apóiam o avanço de uma massa de peões. Restrição dos cavalos inimigos

Para poder avançar o suficiente e reduzir a ação dos cavalos inimigos, obtendo possibilidades de rompimento, uma massa de peões não necessariamente deverá ser maioria, mas lhe bastará ter o apoio do par de bispos. A partida Richter-Tarrasch pode servir-nos de exemplo. A partir do diagrama 195, a partida continuou assim: 19...c5 20.Ng3 h5 21.f3 As brancas não demonstram uma grande habilidade defensiva. Se os cavalos não querem sucumbir, têm que lutar duramente por um posto. O indicado era 21.a4, seguido de Nc4.

21...Bd7 22.Re2 b5 23.Rae1 Bf8! 24.Nge4 Rg8 Para poder jogar …f5. 25.Nb3 Rc8 26.Ned2 Bd6 27.Ne4 Bf8 28.Ned2 f5 29.Re5 Bd6 30.R5e2 Se 30.Rd5?, então 30...Rg6. 30...Ra8 O peão a se dispõe a avançar. 31.Na5 Rab8 32.Nab3 h4 33.Kh1 Rg6 34.Kg1 Be6 A defesa da coluna e, muito bem exercida pelos bispos em d7 e e6, pode ser considerada a ideal. Com 34...Be6 a natureza passa a ser material, ou seja, a parte do processo em que a restrição ideal de um peão passado desemboca em sua imobilização mecânica (bloqueio). Basta sobre o significado estratégicoteórico da manobra escolhida. O significado prático do lance reside, no entanto, (e como o Dr. Tarrasch muito bem observou) no fato de que se abrem novas possibilidades: a) ...Kf7-d7; b) ...a6, ...Rc8; c) ...Bb8-a7, seguido finalmente de ...c4. Posso acrescentar que ...c4, sem dúvida alguma, deve ser considerado o plano estratégico dessa posição. O por quê nos será revelado no lance 38. 223

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35.Rf2 Ra8? As pretas não são fiéis ao plano principal, …c4 e de novo tratam de fazer possível ...a5. Conseguem isso, mas somente pelo adversário não ter visto um recurso oculto. É claro, ...a4 é uma excelente conquista, pois faz retroceder por completo as forças contrárias. Mas não deveria se ir tão longe como subordinar o plano indicado pela posição à idéia de um amplo efeito meramente decorativo. Mas na ocasião, a escola pseudo-clássica tinha um incrível fraco por efeitos decorativos assim! 36.Rfe2? Um grave erro. Como se pode permitir o avanço …a5 sem luta? Em resposta a 36.Na5 o Dr. Tarrasch indica 36...Bc7 37.Nb7 Bf4, ganhando tempo para ...Rc8 e ...c4 com a ameaça 38...Be3. No entanto, omite na análise o recurso oculto 38.Nxc5! Be3 39.c4 e as pretas não podem vencer, uma vez que a ala da dama das brancas é forte e as casas pretas (c5 para o cavalo) também o são. Uma variante possível poderia ser 39...bxc4 40.dxc4 Rc8 41.b4 Rc7 42.Kf1 Bxf2 43.Kxf2 e as brancas estão bem. 36…a5 37.Nb1 a4 38.N3d2

Diagrama 196 – A restrição está completa

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Agora segue a ruptura, o que não tem nada de surpreendente, pois como sabemos, as pretas dispõem de uma grande maioria qualitativa, que se manifestaria ainda mais se as brancas tivessem um peão em e4 e as pretas outro em e5. Aqui a possibilidade de ruptura se vê ampliada pela lastimável posição dos cavalos brancos e pela extensão da frente de contato (os quatro peões). 38…c4 39.Nf1 Rc8 40.Kh1 c3 41.bxc3 dxc3 42.Ne3 b4 Só as pretas jogam. As brancas se renderam no lance 47. Restrição do cavalo em sua luta contra a maioria de peões

Pode-se dizer que a restrição dos cavalos, ao lado da luta simultânea contra uma maioria de peões, é um problema muito diferente cuja solução requer uma pronunciada habilidade técnica. Mas o certo é que não é assim. Qualquer jogador razoavelmente versado na arte da restrição e do bloqueio de complexos de peões logo descobrirá a plena satisfação que no tipo de posição a que nos referimos, a restrição dos cavalos, se consegue com mais facilidade do que no caso estudado no item anterior. Podemos afirmar sem medo de errar que o procedimento de executar a restrição de uma maioria de peões acarreta consigo, de forma automática, a restrição dos cavalos. Com isso quero dizer que os peões bloqueados podem facilmente se converter em obstáculos para seus próprios cavalos. Vejamos um exemplo. Partida 39 Harmonist -Tarrasch Breslau, 1889 Abertura Espanhola

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Jogo Posicional: 3 - O peão

1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 Nf6 4.0–0 Nxe4 5.d4 Nd6 6.Bxc6 dxc6 7.dxe5 Nf5 8.Qxd8+ Kxd8 9.Bg5+ Ke8 10.Nc3 h6 11.Bf4 Be6 A maioria branca só tem uma ligeira mobilidade. 12.Rad1 Rd8 13.Ne4 c5 14.Rxd8+ Kxd8 15.Rd1+ Kc8 16.h3 b6 17.Kf1 Be7 18.a3 Rd8 19.Rxd8+ Kxd8 A troca das torres incrementou o raio de ação do rei preto. 20.c3 Bd5 21.Nfd2 Kd7 22.Ke2 g5 23.Bh2 Nh4 24.g3 Ng6 25.f4 Ke6 26.Ke3 c4 27.Nf3 gxf4+ 28.gxf4 c5

d

isolado e seus descendentes

O lance 34.Nd6, forçando um final de bispos de cores opostas, oferecia uma possibilidade de empate. 34...Kd5 35.Nf2 h5 36.Kf3 Bf5 Bloqueio! 37.Ke3 b5 38.Kf3 a5 39.Ke3 As brancas estão afogadas. 39...b4 40.Kf3 Kc6 41.axb4 As brancas estão perdidas. 41...cxb4 42.cxb4 axb4 43.Ne4 Kd5 44.Nd6 Bxd6 45.exd6 c3 46.bxc3 b3 As brancas abandonaram. O par de bispos no final

Como ideal, consideramos a transformação de uma vantagem proporcionada somente pela qualidade da arma em uma vantagem estratégica claramente perceptível. Por exemplo, a posição agressiva de nossas peças em oposição à postura passiva das peças do adversário. O jogo combinado com dois bispos pode conduzir a uma transformação desse tipo, como no seguinte exemplo: Diagrama 197 – Harmonist-Tarrasch, Breslau 1889

As peças brancas estão muito restringidas, um fato que é conseqüência do eficiente bloqueio dos peões de e5 e f4. A essa altura isso já não pode nos surpreender, uma vez que em quantas ocasiões já não experimentamos a forma em que, como por milagre, um bloqueio eficaz influiu de forma favorável sobre a posição? A partida seguiu assim: 29.Ng3 Nh4 30.Nxh4 Bxh4 31.Ne4 Be7 32.Bg1 Bc6 Com a idéia de levar o rei a d5, seguido de ...Bd7-f5, fazendo voltar o cavalo do adversário. 33.Bf2 Bd7 34.Bg3

Diagrama 198 – Tartakower, com as pretas, incrementa de forma decisiva as possibilidades dos seus bispos.

Na posição inicial do diagrama 198 (Michel-Tartakower, Mariembad 1925), 225

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as brancas parecem estar bem consolidadas e a debilidade das casas pretas c3 e d4 não parece significativa. A partida continuou assim: 40.Kg1 Kg7 41.Kf1 Bc6 42.Ng1 g5 43.Nf3 h5 Os dois peões avançam, pois se consideram uma maioria qualitativa devido à forte proteção de que desfrutam por parte dos dois bispos. 44.Be2 Re4! 45.Bd3 Rf4 46.Ke2 g4 47.hxg4 hxg4 48.Nh2 g3! 49.Nf3 Com sabedoria as pretas não perseguem vantagens maiores tratando de prender o cavalo, pois as que têm no momento já lhes bastam. O peão branco de g2 é o alvo do ataque e as forças pretas fixarão nele seu ponto de mira. Essa vantagem estratégica logo decidirá a batalha. 49…d4 50.Rf1 b4 51.Nd2 Rh4 52.Nf3 Rh8 A partir desse ponto a torre ameaça simultaneamente o ponto h e a coluna e. 53.Kd2 “Quando não há lances bons, logo aparece um erro disposto a substituí-los.” (Goethe) 53…Rh2! 54.Nxh2 gxh2 55.Rh1 Be5 56.Bf1 Be4 Uma posição encantadora! 57.Kd1 Kf6 58.Kd2 Kg5 59.Ke1 Kg4 0–1 Com o que foi dito até aqui, consideramos de forma suficiente a atuação gloriosa dos bispos e agora citaremos as ocasiões nas quais não podem desempenhar um papel tão lúcido. Tratam-se das posições fechadas ou semi-fechadas (por exemplo, a partida Schurig/Laue-Nimzovitsch apresentada adiante), onde resultam 226

incrivelmente fracos contra um cavalo centralizado e inexpugnável e até na posição do diagrama 199 tenho a impressão de que as pretas estão em condições de suportar os temíveis bispos Horwitz.

Diagrama 199 – A posição das pretas pode ser defensável

Partidas ilustrativas: Partida 40 Nimzovitsch - Taubenhaus São Petersburgo, 1913 Abertura Peão da Dama

Essa partida ilustra um exemplo de posição com o peão d isolado. 1.d4 d5 2.Nf3 Nf6 3.c4 e6 4.e3 c5 5.Bd3 Nc6 6.0–0 dxc4 7.Bxc4 cxd4 8.exd4 Be7 9.Nc3 0–0 10.Be3 Não seria bom 10.d5 devido a 10…Na5 11.b3 Bb4 e se 10.Bg5 b6. 10…b6 O lance 10…a6 seguido de …b5 enfraqueceria sem necessidade a casa c5. 11.Qe2 Bb7 12.Rfd1 Nb4 13.Ne5 Rc8 14.Rac1 Nbd5 15.Nb5 Uma notável concepção estratégica. As brancas ponderam: “no centro estou

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Jogo Posicional: 3 - O peão

forte, então se justifica uma mudança estratégica. Por outro lado, não desejo ficar com peões pendentes (após 15.Ba6 ou 15.Bd3)”. O lance correto, no entanto, era 15.Ba6. Poderia seguir assim: 15...Nxc3 16.bxc3 Qc7 17.Bxb7 Qxb7 18.c4, eventualmente seguido de a4-a5. 15...a6 16.Na7! Ra8 Se 16...Rc7, 17.Bxa6. 17.Nac6 Qd6 18.Nxe7+ Qxe7 19.Bd3! Nxe3 Não havia tempo para isso. Outras continuações possíveis eram a)19...a5 e ...Rfc8 ou mesmo b)19...Rfd8, seguido de ...Nd7-f8. 20.fxe3 b5 Esse avanço debilita a casa c5. Depois de 20...a5, seguido de 21...Rfc8 as pretas estão bem. 21.Rc5 Ao ocupar o posto avançado, as brancas se asseguram de um bom jogo sobre a coluna c. 21...Rfc8 22.Rdc1 g6 23.a3 O que agora segue serve de modelo exemplar de jogo sobre uma coluna aberta. A lentidão com que as brancas, passo a passo, vão ganhando terreno, também tem significado do ponto de vista do jogo posicional. 23...Ne8 24.b4 Nd6 A 24...Qg5 seguiria 25.Nxf7! 25.Qf2 f5 Para aliviar a pressão sobre f7 e tornar possível ...Qg5. 26.Qf4 Ne8 As pretas não podem fazer nada. 27.Be2 Nd6 28.Bf3 Liqüida a oposição na coluna c. 28...Rxc5 29.dxc5 Ne8 Se 29...Ne4 então 30.c6! g5 31.cxb7

d

isolado e seus descendentes

Rf8 32.Rc8 e as brancas vencem. 30.Rd1 Nf6 31.c6 O peão c, fruto das operações sobre a coluna aberta, agora decide a partida. 31...Bc8 32.c7 Ra7 33.Rd8+ Kg7 34.Rxc8 Rxc7 35.Nxg6 1–0 Partida 41

Rubinstein-Znosko-Borovsky

São Petersburgo, 1909 Defesa Ortodoxa

Essa partida, cujo tema são os peões pendentes, é também característica, embora de modo muito peculiar, pois nos mostra os perigos aos quais está exposto o par de peões desde o instante do seu nascimento. A mortalidade infantil é muito elevada entre os da sua espécie e excede consideravelmente a mortalidade entre os peões pendentes desenvolvidos, os quais no pior dos casos sempre podem se abrigar sob uma segurança bloqueada. 1.d4 d5 2.c4 e6 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 Be7 5.e3 Nbd7 6.Nf3 0–0 7.Qc2 b6 Aqui é possível fazer 7…c5. Por exemplo: 8.cxd5 Nxd5 9.Bxe7 Qxe7 10.Nxd5 exd5 11.dxc5 Nxc5 e o peão d isolado não parece tão mal. 8.cxd5 exd5 9.Bd3 Bb7 10.0–0–0 Ne4 11.h4 f5 12.Kb1 c5 A correção desse lance depende do sacrifício de peão recomendado no comentário seguinte. Em seu lugar, era bom e correto 12...Rc8, como observou Lasker. Por exemplo: 13.Qb3 Nxc3+, seguido de ...c5. Não tão bom, mas de nenhuma forma mau seria 12...h6 13.Bf4 Bd6 14.Bxd6 cxd6. 13.dxc5 bxc5 Aqui era possível fazer 13…Rc8. Se 14.cxb6 Nxb6 as pretas teriam opções 227

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de ataque. A resposta a 14.Nd4 poderia ser 14...Ndxc5. O desenlace da partida seria duvidoso em qualquer caso, enquanto agora não há a menor dúvida. Vale a pena observar que a 13...Ndxc5, 14.Nxd5 Bxd5 15.Bc4! vence. 14.Nxe4! fxe4 15.Bxe4 dxe4 16.Qb3+ Kh8 17.Qxb7 exf3 18.Rxd7 Qe8 19.Rxe7 Qg6+ 20.Ka1 Rab8 Como um furacão, o jogo arrasou os peões pendentes levando ainda uma peça de passagem. O ataque desesperado das pretas é refutado com facilidade. 21.Qe4 Lasker elogiou esse lance, mas também parece bom 21.Qd5. Depois de 21...fxg2 22.Qxg2 Qc2, segue 23.Bf6!. O certo, porém, é que todos os caminhos conduzem a Roma. 21...Qxe4 22.Rxe4 fxg2 23.Rg1 Rxf2 24.Rf4 Rc2 Se 24...Rbxb2, então 25.Rf8+ ganha no ato. 25.b3 h6 26.Be7 Re8 27.Kb1 Re2 28.Bxc5 Rd8 29.Bd4 Rc8 30.Rg4 1–0 Outra partida ilustrativa acerca do par de bispos pode ser vista ao final do Capítulo V.

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4 - A Super-Proteção

(1) Porque é preciso reforçar de forma sistemática nossos pontos fortes

Esse é um breve capítulo que servirá para ilustrar as diversas formas nas quais se pode apresentar o tema da superproteção. Em capítulo anterior já vimos em profundidade o espírito e o significado da super-proteção. No entanto, creio ser conveniente aqui repetir que o contato entre o ponto forte e os super-protetores proporciona vantagens para ambos. Para o ponto forte, porque a profilaxia induzida por um procedimento desse tipo concede a maior segurança imaginável contra um possível ataque. Para a peça superprotetora porque a casa em si lhe serve de uma fonte de energia, na qual pode de forma contínua extrair sua força. A super-proteção constitui-se em uma manobra que por si mesma está estreitamente vinculada ao jogo posicional. Não obstante, inclusive no tema dos elementos podemos encontrar traços de super-proteção. Por exemplo, em uma coluna aberta - brancas: Rd1, Nc3, Pe4; pretas: Pc7, Pd6. O cavalo do posto avançado (após Nc3-d5), como já anteriormente indicado, deve ser protegido não somente por um peão, mas também por uma torre. O que significa esse mandamento nada mais é do que a necessidade de super-proteger o importante posto estratégico! No tema da cadeia de peões, a superproteção é uma estratégia que merece prioridade total. Voltemos à partida

Nimzovitsch-Giese (pág. 164) e comprovemos que não foi a base da cadeia o ponto super-protegido, mas a casa e5, uma vez que sempre tínhamos que considerar uma troca eventual e inevitável dxc5, quando o peão e seria promovido a base da cadeia. A maravilhosa vitalidade da peça super-protetora pode ser ilustrada aqui com outros dois exemplos. (I)Nimzovitsch-Rubinstein Carlsbad 1911. 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.c3 Nc6 5.Nf3 Qb6 6.Bd3 cxd4 7.cxd4 Bd7 8.Be2 Nge7 9.b3 Nf5 10.Bb2 No momento d4 está protegido e nada mais do que isso. 10...Bb4+ 11.Kf1 h5 12.g3 Rc8 13.Kg2 g6 14.h3 Be7 Com a idéia de responder a g4 com …Nh4+. 15.Qd2! a5 16.Rc1 Bf8 17.Qd1! Bh6 18.Rc3 0–0 19.g4 Nfe7 20.Na3! Somente agora se torna claro porque as brancas postergaram o desenvolvimento desse cavalo. A razão é a de que ele foi distinguido com o honroso papel de super-protetor do peão d4. 20...Nb4 21.Nc2 Agora segue um desenrolar surpreendente e tranqüilo das peças brancas na ala da dama. 21...Rxc3 22.Bxc3 Nxc2 23.Qxc2 Rc8 24.Qb2! Aconteça o que acontecer o peão de 229

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d4 continuará super-protegido. 24...Bb5 25.Bxb5 Qxb5 26.Bd2! O super-protetor arregaça os dentes! 26...Bf8 27.Rc1 hxg4 28.hxg4 Rc6 29.Qa3 Outro super-protetor que não faz por menos. 29...Rxc1 Uma pena, pois a 29...Nf5 as brancas sacrificariam a dama com 30.Rxc6 Bxa3 31.Rc8+ Kg7 32.gxf5, com forte ataque. 30.Qxc1 Com jogo superior. (II)Nimzovitsch-Spielmann Estocolmo 1920 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.Nf3 Nc6 5.c3 Qb6 6.Be2 cxd4 7.cxd4 Nh6 8.Nc3 Nf5 9.Na4 Qa5+ 10.Bd2 Bb4 11.Bc3 Bd7 Teria sido melhor 11…Bxc3+ 12.Nxc3 Qb4 (12…Qb6 13.Na4) 13.Bb5 0-0 14.Bxc6 Qxb2 15.Na4 Qb4+ 16.Qd2, com o que as brancas teriam conquistado a casa c5, enquanto as pretas teriam um peão a mais, embora atrasado. 12.a3 Bxc3+ 13.Nxc3 h5 14.0–0 Rc8

15.Qd2! Qd8 Ameaça 16...g5. 16.h3 Para responder a 16...g5 com 17.g4, por exemplo: 17.g4 hxg4 18.hxg4 Nh4 19.Nxh4 Rxh4 20.Kg2 e 21.Rh1, com vantagem das brancas. 16...Na5 17.Rad1 Qb6 18.Rfe1 A casa d4 e até certo ponto a e5 agora estão super-protegidas de forma sistemática e esta estratégia possibilitará posteriormente o domínio da situação por muitas complicações que possam surgir. 18...Nc4 19.Bxc4 Rxc4 20.Ne2 Ba4 21.Rc1 Observe a disponibilidade que tem a peça super-protetora em todas as direções. 21…Bb3 22.Rxc4 Bxc4 23.Ng3 Ne7 E as brancas, graças à sua posição melhor, se impuseram no lance 67. Falando da super-proteção da base, creio que o exposto é suficiente. Mas é necessário dizer algo mais acerca da super-proteção nos seguintes pontos: (a) A super-proteção das casas centrais

Diagrama 200 – As brancas desenvolvem suas peças para superproteger de forma sistemática a casa d4

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Em outras oportunidades já criticamos o fato muito freqüente de se descuidar do teatro bélico central. Aqui nos ocuparemos em detalhes dessa questão, ou mais exatamente a analisaremos à luz de uma situação típica que caracteriza a forma de jogo chamada escola hipermoderna. Como é conhecido, o jogador hipermoderno sabe admiravelmente como resistir à tentação de ocupar o centro com seus peões, ao menos até que não se apresente uma

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Jogo Posicional - 4- A Super Proteção

oportunidade realmente favorável para fazê-lo. Ao se apresentar essa ocasião, deixa de lado a timidez e os peões, apoiados por bispos em fianchetto, avançam com passos firmes e até selvagens para se apoderarem do centro e esmagar o inimigo. Contra essa ameaça, a super-proteção de certas casas centrais resulta ser um remédio eficaz sobre o qual nunca será demasiado insistir. Vamos dar uma olhada na partida RétiYates, Nova Iorque 1924: 1.Nf3 d5 2.c4 e6 3.g3 Nf6 4.Bg2 Bd6 5.b3 0–0 Para que essa pressa? Era mais importante colocar em ordem o centro e, nesse sentido, os lances mais apropriados eram ...c6, ...Nbd7, e ...e5. 6.0–0 Re8 7.Bb2 Nbd7 8.d3 c6 9.Nbd2 e5 A posição a que se chegou sem dúvida favorece as pretas. As brancas tinham que ter feito 8.d4. 10.cxd5 cxd5 11.Rc1 Nf8 12.Rc2 Bd7 13.Qa1 Ng6 14.Rfc1

Diagrama 201 – Jogam as pretas. Qual a casa que deve ser super-protegida?

A manobra da dama branca é significativa. Réti trata de minar o centro inimigo com d4, quando a ocasião se apresentar e se as pretas responderem

...e4, então Ne5. A obrigação das pretas portanto é super-proteger e5, inclusive de maneira excessiva. A melhor continuação possível seria primeiro fazer 14...b5, apontando para a ala da dama das brancas, comprometida pela posição da sua dama. Se então 15.Nf1, poderia seguir 15...Qb8! (super-proteção de e5) 16.Ne3 a5 e as pretas têm jogo melhor. Em 1924 eu já havia publicado um artigo na revista editada por Kagan, Neueste Schachnachrichten, lançando ao mundo do xadrez um balão de ensaio acerca da idéia da super-proteção. Vejamos na seqüência uma partida muito instrutiva, na qual eu empreguei a mesma manobra de dama, para que meus amigos leitores possam avançar na compreensão desta idéia revolucionária. Partida 42 SchurigLaue - Nimzovitsch Leipzig, 1926 Partidas Simultâneas

1.Nf3 e6 2.g3 d5 3.Bg2 c6 4.b3 Bd6 5.Bb2 Nf6 6.d3 Nbd7 7.Nbd2 Qc7 Também era possível 7...e5. Com o lance do texto se inicia uma manobra original. As pretas planejam atacar na ala da dama, mas antes de lançar o seu ataque querem salvaguardar o centro contra a possível ameaça e4-e5. Como conseqüência, primeiramente tratam de super-proteger e5 e logo a dama preta terá à disposição uma casa em seu bolso, b8, para a qual poderá se retirar se for o caso, talvez após a abertura da coluna c. 8.0–0 a5 9.c4 b5 Para responder à pergunta de se o 231

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ataque na ala se justifica é necessário levar em consideração a situação do centro. Se o centro é seguro, um ataque na ala pode não estar fora de lugar. Isso é válido aqui, pois, ainda que o rei não tenha rocado, o certo é que no momento é inatacável. 10.cxb5 cxb5 11.Rc1 Qb8 A casa de reserva. 12.Qc2 Parece mais apropriado 12.e4. Nesse ponto da partida, em uma sessão de simultâneas, Laue agregou-se ao condutor das brancas até esse momento, Schurig. 12...0–0 13.e4 Bb7 14.Nd4 Rc8 15.Qb1 Rxc1 16.Rxc1 b4 17.Nc6 Creio ser esse lance um pouco precipitado. 17...Bxc6 18.Rxc6 a4 Cada momento de respiro é aproveitado para melhorar a posição na ala da dama. 19.d4 Esse lance é a conseqüência da estratégia das pretas de super-proteção de e5. Agora a valiosa diagonal a1-h8 fica bloqueada, mas não há outro meio de realizar o avanço e5. As peças empregadas na super proteção resistiram de maneira admirável à prova. Isso não significa, é claro, que não se encontrem com inconvenientes, mas a sua presença se faz sentir em todas as direções. Cabe mencionar aqui uma possível variante, 19.f4, com a idéia de manter o peão d em d3. A continuação poderia ter sido 19...Bc5+! e as brancas seriam obrigadas depois de tudo a jogarem 20.d4 e após 20...Bf8 21.e5 se chegaria à mesma posição da partida. 19...Bf8 20.e5 Ne8 Os bispos brancos têm um campo de 232

ação reduzido. 21.f4 Qb5 O imediato 21...a3 era mais preciso. 22.Qc2 a3 23.Bc1 Aqui era essencial intercalar 23.Bf1.

Diagrama 202 – As pretas jogam, e com um sacrifício de qualidade conseguiram ganhar o peão de a2. Como?

23...Bc5 Essa combinação interessante deveria começar com o lance 23...Nc5! em lugar de 23...Bc5. A diferença logo se fará notar. 24.Rxc5 Nxc5 25.dxc5? Com 25.Bf1, que não teria sido possível se as pretas jogassem 23...Nc5, as brancas teriam conseguido um tempo extra no final. 25...Rc8 Agora podemos ver pela sua má aparência que o peão da coluna a está com pinta de morto. 26.Nb1 Qxc5+ 27.Qxc5 Rxc5 28.Bxa3 Ou mesmo 28.Bd2 Rc2 29.Bf1 Rxa2 30.Bxb4 Rg2+! e as pretas vencem (se 31.Bxg2 ou 31.Kxg2, segue 32...a2). Se as brancas tivessem um tempo a mais (veja o comentário ao lance 25 das brancas) essa combinação teria sido impossível.

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28...bxa3 29.Nxa3 Ra5 30.Nc2 Rxa2 31.Nd4 Rb2 32.f5 Nc7 33.fxe6 Nxe6 34.Nc6 d4 As brancas abandonaram. (b) A super-proteção do centro como medida defensiva da nossa ala do rei

O caso que vamos debater em detalhes difere do considerado no item (a) em sua tendência geral e, por conseqüência, consideramos aqui uma manobra independente, não uma simples subdivisão da primeira. Na partida Nimzovitsch-von Freymann, Vilna 1912, analisada anteriormente (pág. 89), chegou-se à posição apresentada no diagrama 203 após o lance das pretas 13...g4!

Diagrama 203 As brancas neutralizam o ataque ao seu rei super-protegendo um ponto central. Como fazem isso?

À resposta 14.hxg4 hxg4 15.Qxg4 as pretas pensavam continuar com o forte lance 15...Rxh2!, seguido de ...Bxe5+ e ...Bxb2. As brancas, no entanto, jogaram: 14.Re1 Com o que, ao reforçar seu centro reforçaram da mesma forma a capacidade de resistência da sua posição

contra os ataques de ala. Seguiu: 14...Kf8 15.Nc3! O prelúdio de uma manobra de bloqueio. 15...Qe7 16.Bxf5 exf5 17.Qe3 Rh6 18.Ne2 c5 19.Nf4 E as brancas estão melhores, pois os bispos têm pouco o que falar frente à força do cavalo inexpugnável. Por outro lado, a mobilidade coletiva das pretas é limitada, pois ainda que os peões de d5 e c5 tenham certo grau de mobilidade, os demais estão bloqueados. De igual interesse, no mesmo sentido, resulta a posição do diagrama 204, que extraímos de uma partida sob consulta.

Diagrama 204 – Partida sob consulta. Brancas: 3 amadores; Pretas: Nimzovitsch

Jogam as pretas. Não cabe dúvida de que o cavalo de d5 é o orgulho da sua posição. No entanto, não era fácil encontrar um plano adequado. As brancas estão preparando um, ainda que na realidade não apresente maiores perigos, a saber Qd2, seguido de Ne1d3-c5. A linha de pensamento empregada na partida permitiu-me descobrir uma manobra oculta, que continuo considerando boa até os dias de 233

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hoje. Os elos separados dessa cadeia de idéias são os seguintes: 1) o cavalo de d5 é forte, por conseguinte 2) as peças super-protetoras Qd7 e Rd8 também são fortes, mas 3) a torre de d8 tem os seus deveres para com seu rei, o que guarda relação com sua força no centro e por conseguinte 4) a torre de h8 deve se posicionar em d8! 14...Kb8 15.Qd2 Rc8! 16.Ne1 Be7 17.Nd3 Rhd8 E as sementes estão plantadas! A torre de d8 sente que pode prestar toda a sua atenção ao centro, uma vez que sua colega de c8 se ocupa da segurança do rei. As aventuras seguintes da torre de d8 podem ser acompanhadas na partida ilustrativa ao final desse capítulo. Poderíamos falar de muitos outros pontos que requerem super-proteção, mas nos limitaremos aos poucos exemplos que aqui incluímos. Antes de passar ao nosso tema estratégico seguinte, devemos enfatizar o fato de que somente os pontos estrategicamente valiosos devem ser super-protegidos. Não um peão doentio, nem uma ala do rei que repousa sobre fundações fracas. Não se deve considerar em nenhum sentido a super-proteção como um ato de caridade cristã! As peças super-protegem uma determinada casa porque do seu contato com essa casa obterão vantagens estratégicas. Por conseguinte, devemos tratar de estabelecer conexões com pontos fortes. Quando se trata de um peão fraco, só há um caso excepcional que requer super-proteção e é quando o peão protege um gigante da espécie. Por exemplo – brancas: Pd4, Pe5; pretas: Pd5, Pe6. O peão de d4, embora fraco, é a base da cadeia e a ama-seca do peão 234

estrategicamente muito importante de e5. Portanto a casa d4 requer super-proteção. (2) Como nos desembaraçar de nossos próprios peões fracos

Tratarei de estabelecer quais são os peões que em certas posições não devam merecer maior atenção. A situação é sempre a mesma: há um complexo de peões que, a menos de um ponto débil em seu corpo, seria completamente são. Separamos dois casos: (a) a debilidade evidente do peão e (b) a debilidade que só se coloca em evidência após o avanço de peão, quer seja próprio ou do inimigo. Incluímos a seguir exemplos de ambos os casos: (a) Nimzovitsch-Jacobson, Copenhagen 1923 (veja o diagrama 204A)

Diagrama 204A Nimzovitsch-Jacobson, Copenhagen 1923

36.Rc5 Bd7 Se 36...Bd3+, 37.Kc1 Rd7 38.Rc8+, seguido de 39.Rb8. 37.Rxd5 As brancas têm um peão de vantagem. 37...Kf8 38.Kc2 b3+ 39.Kc3 Ke7 As brancas agora estão em condições de agrupar seu rebanho de peões (peões

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e, f e g) no mesmo redil e para isso só têm que jogar e4. Tudo ficará assim maravilhosamente protegido e o pastor, a torre de d5, com clara consciência disso, pode dedicar a sua atenção para outros assuntos. Mas não é assim! A estúpida ovelha desgarrada, o peão h, requer a atenção do pastor (em algum momento se ameaça ...Ra1-h1 capturando-o). 40.h5 Be6 41.Rc5 Kd6 42.Rc6+ Kd7 43.hxg6 hxg6 44.Nxe6! fxe6 A 44…Kxc6, 45.Nd8+. 45.Rc5 Para seguir com Rg5 e f4, com final de torres facilmente vencedor. (b) Tarrasch-Barthmann (veja o diagrama 205)

Diagrama 205 – Tarrash-Barthmann

As pretas aqui jogaram: 21...Rc6 22.Rhc1 Rhc8 23.g4 g6 24.f5 gxf5 25.gxf5 Rg8? As pretas não deveriam permitir 26.f6+ sob nenhum conceito. Era melhor 25...exf5 26.Nf4 Be6 27.Rg1, com uma luta dura pela frente. 26.f6+ Kf8 27.Rg1 Rxg1 28.Nxg1 Kg8 E o peão h é uma debilidade evidente. Poderia ter-se evitado esse

inconveniente se as pretas jogassem 21...h5, com a idéia de permitir f6 das brancas, somente com a condição de que os peões g e h desaparecessem na operação. Em tal caso, a continuação poderia ter sido 21...h5 22.h3 g6 (não 22...h4? devido a 23.Ng1 seguido de Nf3) e as pretas, em poucos lances, teriam obtido uma posição mais favorável do que a da partida. Enquanto o caso (a) não apresenta grandes exigências por parte do jogador, o tratamento correto da arma estratégica apresentada em (b) é extremamente difícil. Requer acima de tudo um conhecimento minucioso das diversas formas em que o avanço de uma massa compacta de peões pode seguir seu curso, em particular em uma ala. Nesse livro se dedicaram várias páginas a tais avanços e suas conseqüências, de modo que para lidar com os mesmos deixaremos o amável leitor abandonado à própria sorte, que esperamos não seja menos amável com ele. Somente deve ter bem presente que a necessidade estratégica de se desembaraçar de um próprio peão incômodo pode surgir tanto no caso do avanço de seus peões, como no caso do avanço dos peões adversários. Quando a ovelha negra da família fizer ato de presença, deverá decidir, antes de empreender suas operações ou durante as mesmas, se procede ou não eliminar essa ovelha, segundo os casos. Partida Ilustrativa A partida que segue é muito didática com relação à super-proteção e ao problema do peão d isolado. Com ela damos por encerrado esse capítulo. 235

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Partida 43

3 amadores suecos Nimzovitsch

Copenhagen, 1921

1.e4 Nc6 2.d4 d5 3.e5 f6 4.Bb5 Teria sido melhor 4.f4. 4...Bf5 5.Nf3 Qd7 6.c4 Bxb1! Com essa troca, que pode ser considerada qualquer coisa menos evidente, as pretas planejam conquistar a casa d5 para o seu cavalo. 7.Rxb1 0–0–0 8.cxd5 Se 8.c5, então 8...g5 em cujo caso teria lugar uma dura luta pela posse da casa e5. Por exemplo: 8.c5 g5 9.Qe2 (ameaçando e6, prendendo as pretas) 9...Qe6 10.a3 Nh6 (ou mesmo 10...Nb8), seguido de ...Nf7. Em qualquer caso, a posição das pretas não seria má. 8...Qxd5 9.Bxc6 Qxc6 10.0–0 e6 11.Be3 Ne7 12.Qe2 Nd5 Podemos ter uma clara consciência com referência ao isolamento do peão d branco. Sua debilidade (para o final!) é evidente. As pretas têm um ponto muito forte na casa d5. Como vantagens compensatórias pelo que chamamos peão d isolado, as brancas têm o posto avançado de c5, que servirá a algum propósito. Por outro lado, e5 não é utilizável como posto avançado para seu cavalo. A partida está mais ou menos equilibrada. 13.Rfc1 Qd7 É questionável se 13.exf6 não teria sido melhor para as brancas do que o lance de torre. O certo é que em tal caso seu adversário teria ficado dono e senhor da coluna g e com um bispo centralizado 236

em d6, mas não se deve perder de vista a coluna e como contrapeso. Agora, entre os lances 13 e 18, tem lugar uma curiosa forma de super-proteção, já comentada no diagrama 204. 14.Rc4 Kb8 15.Qd2 Rc8 16.Ne1 Be7 17.Nd3 Rhd8 18.Qc2 f5

18…f5 Uma vez consolidada sua posição, as pretas passam ao ataque, que não é fácil de conduzir, pois por um lado carecem de objetivos e por outro as brancas têm possibilidades de ataque na ala da dama. 19.Rc1 Sem dúvida, aqui deveria ser jogado 19.b4 com intenção de seguir com 20.Nc5 Bxc5 21.bxc5. A questão que agora se coloca é se a posição das pretas é o bastante forte para suportar o enfraquecimento. Há dois lances concretos que entram em consideração como resposta a 19.b4, a saber, 19...b6 e 19...b5. Se 19...b6 então pode ser jogado 20.Nc5!, mas após 20...Bxc5 21.bxc5 c6, as pretas estariam muito bem. Mas não devem aceitar o sacrifício de cavalo, como demonstra a seguinte seqüência combinatória: 19.b4! b6 20.Nc5 bxc5 21.bxc5+ Ka8? (é essencial devolver a peça com 21...Nb6) 22.c6 Qe8 23.Ra4 Diagrama 206 – Posição após

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(ameaçando 24.Rxa7+) 23...Nb6 24.d5!! Rxd5 25.Rxa7+ Kxa7 26.Qa4+ Kb8 27.Bxb6 cxb6 28.Rxb6+ Kc7 29.Rb7+ Kd8 30.c7+! Rxc7 31.Rb8+ Rc8 32.Rxc8+ Kxc8 33.Qxe8+ e as brancas vencem. Uma verdadeira combinação ao estilo de Morphy. Podemos observar tranqüilamente o fato de que sua posição central superprotegida é tão forte que as pretas conseguem aqui seguir dominando a situação, por mais que em sua posição surja algum ponto vulnerável, já que podem escapar de toda combinação do adversário, por incrível que pareça. Ainda devemos demonstrar o que aconteceria se as pretas jogassem 19...b5 em resposta a 19.b4. Nem nesse caso as pretas passariam maiores apuros. Após 20.Rc6 Kb7 21.Nc5+ Bxc5 22.Rxc5 Nb6, seguido de ...c6 e as pretas são fortes nas casas brancas. 19…g5 20.Nc5 Bxc5 21.Rxc5 Rg8 22.Qe2 h5! 23.Bd2 Se 23.Qxh5? g4! e ...Rh8. 23...h4 24.a4 g4 25.a5 a6! 26.b4 c6 As brancas esgotaram todas as suas energias. 27.Rb1 Qf7 28.Rb3 f4 29.Qe4 f3! As brancas não podem resistir com 30.gxf3 gxf3+ 31.Kf1 Rcf8 (melhor do que 31...Rg1+). 30.Rc1 fxg2 31.Kxg2 Rcf8 Note-se a surpreendente facilidade com que as torres pretas se incorporaram à ação, o que, no meu entender, constitui mais uma prova da enorme vitalidade das peças super-protetoras. 32.Rf1 g3! 33.hxg3 hxg3 34.f4 A 34.Rxg3 Rxg3+ o rei ficaria exposto. 34...Ne7

No caso de 35.Rxg3, segue 35...Nxg5 36.Rxg5 Rxg5+ e ...Nh4+. 35.Be1 Nf5 36.Rh1 Rg4 37.Bxg3 Qg6 38.Qe1 Nxg3! Decisivo, ainda que simples e quase insípido, pois ganha os peões tão expostos na quarta fila. 39.Rxg3 Rfxf4 40.Rhh3 Rxd4 41.Qf2 Rxg3+ 42.Rxg3 Qe4+ 43.Kh2 Qxe5 44.Kg2 Qd5+ 0-1 Uma das minhas partidas favoritas.

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5 - As manobras contra uma debilidade inimiga

As manobras contra uma debilidade inimiga. O ataque combinado em ambas as alas. Existe alguma afinidade entre as duas estratégias? 1 – Os componentes lógicos que justificam as manobras contra uma debilidade

Como introdução às análises que seguem, parece-me conveniente apresentar um esquema das operações a considerar. Imagino o curso de uma operação de manobras mais ou menos assim: uma debilidade inimiga pode ser atacada pelo menos de duas formas. Cada uma dessas tentativas de ataque corresponde a uma defesa adequada. Para que apesar de tudo possamos finalmente conquistar a debilidade inimiga, temos que explorar a maior liberdade de movimento de nossas peças devido a certas condições de terreno, perseguindo-as de várias formas (manobras) e obrigando assim as peças contrárias a adotar posições defensivas incômodas. Eventualmente intervirá alguma obstrução na defesa e a debilidade ficará insustentável. Como vemos por esse esboço, seria errado considerar esse tipo de manobras como um mero exercício sem sentido, movendo os efetivos de um lado para o outro. Pelo contrário, cada lance deve ser planejado antecipadamente até a conquista da debilidade atacada. Os caminhos que conduzem a essa conquista são de natureza complexa.

2 – O terreno. O conceito de pivô em torno do qual se desenvolvem as manobras

O terreno sobre o qual terão lugar as ações deve ser tratado e preparado para que se consiga o êxito do nosso plano. Uma característica dessa ação é que os diferentes movimentos de tropas sempre atravessam por uma casa bem definida (ou linha de demarcação). Vejamos como exemplo o diagrama 207.

Diagrama 207 – As brancas manobram contra o peão de d6 utilizando a casa d5 como pivô em torno da qual giram todas as operações

Nesse caso, a casa d5 é o ponto que as brancas desejam ocupar, convertendo-a em base de manobras. Em conseqüência disso, o ponto d5 pode ser descrito como um posto fortificado nas linhas de comunicação e portanto é correto e adequado considerá-lo como o pivô em torno do qual gira toda a ação de manobras. Graças precisamente ao posto fortificado de d5 se pode levar a bom 239

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termo toda a operação. Todas as peças, inclusive a torre d1 apontam para lá em um momento ou outro. A lei que rege a ação dessas manobras requer, por outro lado, que d5 seja ocupada por peças diferentes, ou seja, que essas se revezem em sua ocupação, criando sempre novas ameaças e contribuindo dessa forma para semear a confusão nas linhas inimigas. A relação entre as peças brancas e o pivô d5 corresponde também ao contato entre as peças super-protetoras e um ponto de importância estratégica, como já foi comentado no capítulo anterior. Nesse caso, as peças estabelecem contato com d5, o que diz de forma clara da força desse ponto. Observe-se igualmente o tema pela forma na qual as peças alternam sua situação no mesmo, por exemplo, a seqüência Ne3-Qd5-Nc4. Essa operação presta bons serviços ao plano geral das manobras. Apresentamos a seguir alguns exemplos típicos desse tipo de manobras.

2.cxd4 Nxd4 3.Bg5 Ne2+ 4.Kf2! (caso contrário 4...Rf7) 4...Rf8+ 5.Rf6 Rxf6+ 6.Bxf6 Re6. 2.Bf2 Rf8 3.Re1 Ref7 4.Rhxe6 Rxf2 5.Re8+ Kb7 6.Rxf8 Rxf8 7.Re7 Agora se iniciam as magníficas manobras contra o peão h7. 7...Rh8 8.Kf2 Kc6 9.g4 Kd6 10.Rf7 a5 11.g5 a4 12.h4 b5 13.Kg3 c5 As pretas ameaçam criar um peão passado com ...b4 e então Rubinstein ataca a debilidade de h7 pelo outro lado. 14.Rf6+! Kc7 15.Rh6 b4 16.cxb4 cxb4 17.axb4 Ra8 18.Rxh7+! A debilidade sucumbiu. 18...Kb6 19.Rf7 a3 20.Rf1 a2 21.Ra1 Kb5 22.g6 Kxb4 23.h5 E as pretas abandonaram. O caso seguinte é bem mais complicado. (b) Dois peões débeis:

(a) Uma debilidade de peão bombardeada da sétima fileira:

Diagrama 209 Kalashnikov-Nimzovitsch (1914)

Diagrama 208 – Rubinstein-Selesniev

1...b6 Era preferível 1...d4, por exemplo: 240

Na posição do diagrama 209, são débeis os peões de c3 e h3. O ponto f4, pivô sobre o qual gira toda a operação contra h3 parece estar ameaçado, mas a atenção é afastada momentaneamente por uma ameaça oportuna do outro lado do tabuleiro, o ponto c3. A partida

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continuou assim: 36...Ke7 Se as brancas se limitassem a não fazer nada, as pretas conseguiriam a vantagem através de um ataque direto, ...Kf7-g6, seguido de ...f5. As brancas então teriam que se defender com f3, concedendo assim ao adversário a oportunidade que esperava para posicionar o bispo em g3, momento em que as ameaças contra toda a linha defensiva das brancas não poderiam ser neutralizadas. Mas as brancas não ficaram quietas e fizeram o que estava em suas mãos para evitar a execução do plano inimigo. 37.Ng2! Dessa forma as brancas esperam efetuar uma troca em massa, que conduziria a um claro empate. A idéia é 38.Bxf4 Nxf4 39.Nxf4 Bxf4 e não há nada mais. O pivô f4 agora não poderia ser mantido, a não ser pela opção de se manobrar na ala oposta. Seguiu: 37...Ra1+ 38.Rc1 Ra2! 39.Ne1! A expedição empreendida pelas pretas em seus lances 37 e 38 obteve êxito, pois agora com a torre em a2 a troca proposta pelas brancas resultaria desvantajosa para os seus interesses. Por exemplo: 39.Bxf4 Bxf4! 40.Rd1 Bd2 41.Ne2 Nf4! e após 42.Ngxf4 gxf4 43.Kg2 Rc2 se desperta um apetite voraz nas pretas. 39...Kf7 As pretas ganharam um tempo! 40.Rc2 Ra3! 41.Ng2 Ra1+ 42.Rc1 Ra2! 43.Ne1 Kg6 44.Rc2 Ra3 45.f3 Não se poderia evitar de modo permanente esse enfraquecimento, pois de outra forma as pretas jogariam ...f5 e se gxf5, ...Kxf5 seguido de ...g4, criando um peão passado. 45...f5 O plano se realiza! O final é tranqüilo. 46.Kf2 Kf6

Abrindo passagem para o cavalo. 47.Bc1 Ra1 48.Ke3 Ng6 49.Nd3 Bg3 Veja-se o comentário ao lance 36 das pretas. 50.Ne2 Ngf4 51.Ng1 Nxd3 52.Kxd3 Bf4 53.Ne2 Bxc1 54.Nxc1 Nf4+ 55.Ke3 Nxh3 Após uma defesa heróica, cai finalmente a fortaleza h3. 56.Ne2 f4+ As brancas abandonaram, pois ...Rf1 ganharia outro peão. (c) O rei como debilidade

Diagrama 210 Nimzovitsch-Kalinsky (1914)

Na posição do diagrama 210, para que o terreno seja operacional, há duas possibilidades de ação. Como pivô temos uma linha divisória. Nessa posição aguda seguiu: 1.Bb3 A resposta a 1.Bc2 f2 2.Rd1 seria 2...Ke6 e as brancas não podem vencer. 1...d4 2.Bd5 Rg4 A 2...f2 segue 3.Bxe4. 3.Rhh5 f2 Agora as brancas dobram as torres na coluna f com ganho de tempo. 4.Rf6+ Ke7 5.Rhf5 Rg1+ 6.Ka2 d3 A posição a que chegamos será 241

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utilizada como pedra angular da correção da nossa tese. Já explicamos no momento apropriado que uma ação de manobras só é possível se forem cumpridas determinadas condições. Essas condições são as seguintes: (a) a presença de um pivô; (b) diversidade de ameaças susceptíveis de serem direcionadas contra a debilidade. O teste nos parece favorável. Ainda que desta vez a debilidade não seja aparente, como um peão concreto, as circunstâncias, que favorecem uma ação de manobra, são idênticas às que já notamos como típicas. A variedade de ameaças nada deixa a desejar, pois as brancas não somente planejam por todos os meios obrigar o rei a colocar-se nas bordas do tabuleiro como também empreender uma caçada real, que leve sua majestade ao centro do tabuleiro. O pivô necessário é a coluna f (linha divisória, a qual o rei não poderá atravessar). A partida continuou assim: 7.Re6+ Kd7 8.Rf7+ Kd8 9.Ref6 d2 Essa posição de mate não pode ser explorada, pois a 10.Rh7 segue 10...f1=Q e uma vez que não é possível 10.Rh6, as manobras prosseguem. 10.Rf8+ Ke7 11.R6f7+ Kd6 12.Bb3 Bb6? Talvez tivesse sido melhor 12...a6 já que daria ao rei uma rota de fuga. 13.Rf6+!! Agora o rei preto tem que encarar uma escolha dramática. Pode regressar para a beirada, onde sua posição seria insustentável, ou sair para campo aberto, onde lhe aguarda outra forma de fatalidade. Seguiu: 13...Ke5 Se 13...Ke7 14.R8f7+ Kd8 15.Rh6, vencendo. 242

14.Re6+! Kd4 15.Rxf2 16.Bxd1 Rxd1 17.Re2! Ganhando o peão e a partida.

d1Q

3 – Jogo combinado em ambas as alas para revelar debilidades ocultas

Diagrama 211 Von Gottshall-Nimzovitsch, Hannover 1926. Ataque combinado em ambas as alas. As debilidades das brancas são as casas c5 e, como se manifestará posteriormente, h3

Uma análise lógica da posição revela o seguinte: o peão branco em c5 deve ser considerado, em vista da posição insegura do bispo em f2, como um peão débil. Por outro lado, não posso concordar em classificar como débil a massa de peões g3 e h3, pois falta espaço (terreno) na ala do rei. As pretas optaram por uma manobra que à primeira vista parece incompreensível. 39...Ke5 40.Rb4 Kd5 A explicação para essa combinação, que entrega um tempo, se baseia no seguinte: com esses lances se chega a uma posição na qual as brancas estão em zugzwang, se a torre voltar a b6, e elas não dispõem de outro lance, pois 41.Rd4+ falha devido a 41...Kxc5 42.Rxa4+? Rxf2+ etc., enquanto 41.h4, como

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veremos, disponibiliza o terreno que antes faltava. 41.h4 Se 41.Rb6 h4 42.gxh4 gxh4 43.Bxg4, segue o intermediário 43...Kxc5 ameaçando a torre. 41...gxh4 42.gxh4 Rh3 43.Rd4+ Ke5 44.Rd8 Bd5 As pretas iniciaram manobras sistemáticas contra o peão h4, com a casa g4 como pivô e na realidade, através dessa casa conseguiram penetrar no campo adversário. O significado da estratégia aqui empregada aparece no seguinte esquema, o qual é aplicável a todos os casos análogos: manobramos inicialmente contra a debilidade evidente, o peão de c5. Através do zugzwang (com uma pequena mescla de ameaças), conseguimos induzir nosso adversário a realizar um deslocamento (avanço do peão a h4). Isso desembocou em uma debilidade, que antes do avanço era só latente, mas que logo se fez manifesta e facilmente atacável. Recapitulando: o jogo em duas alas se baseia em geral na seguinte idéia: atuamos em uma ala, na qual há debilidades evidentes e depois forçamos o adversário para que se manifeste na outra ala, quando soará o tiro de partida para manobrar contra duas debilidades, como na partida anterior Kalashnikov-Nimzovitsch, página 240. Esta é a regra. Uma exceção interessante à regra: chamo a atenção do leitor para um caso em que podemos atuar ainda que a exposição da debilidade na outra ala já tenha se manifestado. Segue um exemplo dessa exposição.

von Holzhausen-Nimzovitsch, Hannover 1926

Diagrama 212 von Holzhausen-Nimzovitsch, Hannover 1926

Na posição do diagrama 212 as pretas se apressaram a expor a debilidade das brancas e jogaram: 32...Rh6 É certo que a verdadeira luta deveria ocorrer na ala da dama (...b5), mas eu sabia que depois de ter aberto a posição com ...b5 o fato de que os peões da ala do rei estivessem avançados seria muito útil para os meus propósitos. 33.h3 Rg6 34.Re2 a6 35.Rf4 b5 36.b3 Rg5 37.g4 Rge5 38.Kc3 a5! A debilidade h3, junto com a possibilidade de desbloquear o peão de e4, poderia fazer decisivas as exigências de terreno e criação de pivô das pretas. Nesse sentido devem ser interpretados os últimos lances. 39.Ref2 a4 Ameaça 40...axb3 seguido de ...bxc4 e invasão das torres pela ala da dama. 40.bxa4 bxc4! 41.Rf8 R5e7 42.Rxe8 Rxe8 43.Nxc4 Nxc4 44.Kxc4 Ra8 O terreno tão desejado foi conquistado! Trata-se das colunas a, b e d. O pivô será o ponto d4. 243

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45.Rf7 Se 45.Kb3? Kd5! 45...Rxa4+ 46.Kb3 Era melhor 46.Kc3. 46...Rb4+ 47.Kc3 Rb7 48.Rf5 Ra7 49.Kc4 Ra4+ 50.Kb3 Rd4 Eis o pivô! 51.Re5 Kd6 52.Re8 Rd3+ 53.Kc4 Rxh3 O uso adequado do terreno não deixou de dar seus frutos, pois caiu a debilidade. 54.Rxe4 Ra3 55.Re2 Ra4+ 56.Kb5 Rxg4 57.a4 Rb4+ As pretas venceram no lance 71.

33...Qb7! Agora só se pode impedir 34…Rc8 com um sacrifício. 34.Rxd4 Se 34.c3 bxc3 35.bxc3 Qb2+ vencendo. 34…exd4 E as pretas venceram após uma dura luta (veja-se a partida completa ao final desse capítulo). 4 – Como manobrar em circunstâncias difíceis

Para concluir o capítulo, comentaremos uma partida inspirada pelo verdadeiro espírito desta forma de manobrar.

Diagrama 213 – Teichmann-Nimzovitsch, San Sebastian 1911

Na posição do diagrama 213 é utilizada uma elegante ameaça de mate para executar com ganho de tempo um ataque para enfraquecer a ala da dama do adversário. 31...Ne6 Ameaçando 32...Rxh2+! 33.Nxh2 Rxh2+ 34.Kxh2 Qf2+ 35.Kh3 Bf4, vencendo. 32.Re2 Pára a ameaça, mas agora as pretas ganham um tempo. 32...Nd4 33.Ree1 Se 33.Rf2 Be3! 244

Diagrama 214 – Lasker-Salve, São Petersburgo 1909

A posição restringida do rei preto é uma debilidade notória, assim como o peão de d6. Mas a sua própria debilidade de d4 e e4 força as brancas a terem uma certa reserva. O terreno que leva até o peão de d6 tem pouca elasticidade. Esse peão só pode ser atacado pela torre de d1 e em diagonal. Algo mais variado parece ser a perspectiva de avanço na ala do rei, já que a dama e a torre podem em qualquer momento mudar de posição nas colunas g e h. Contudo, conseguir que

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essas possibilidades – que não são exatamente impressionantes – se concretizem em uma operação efetiva requer o mais elevado grau de maestria. Lasker a exibiu e a partir da posição do diagrama 214 a partida se desenvolveu assim: 27...Qe8 28.Qf2! Se 28.Nf4 seria possível 28...Nh6. 28...Rf8 29.Qd2 A passagem que bate na casa d5 e impede ...Nh6. 29...Qb8 30.Kh1 Rfe8 31.Rg4! Rg8 Se 31...Nh6 32.Nxf6 com vantagem das brancas. 32.Rd1! Uma vez que desapareceu a pressão sobre e4. 32...Qb4 Dessa forma a dama preta escolhe um mau caminho. Sem dúvida era melhor 32...Qe8, mas seria difícil prever que o círculo de influência da dama ao entrar no campo inimigo seria tão grande. 33.Qf2 Qc3 34.Qh4 Agora a dama branca retoma a sua velha posição, mas muito revitalizada. 34...Nh6 35.Rf4 Nf7 36.Kh2 Rge8 37.Qg3 Rg8 38.Rh4 A 38.Rg4 Nh6 39.Rh4 a continuação poderia ser 39...d5 40.exd5 cxd5 41.Rxd5 Bc6. 38…g5 39.fxg6 Rxg6 40.Qf2 f5 41.Nf4 Rf6 42.Ne2 Qb2 43.Rd2 Qa1 44.Ng3 Kg8 As brancas ameaçavam 45.exf5 Bxf5 46.Nxf5 Rxf5 47.Rxh7+. 45.exf5 Bxf5 46.Nd4 cxd4 47.Nxf5 Kf8 48.Qxd4 Qxd4 49.Nxd4 Ne5 50.Rh5 Ref7 51.c5 dxc5 52.Rxe5 cxd4 53.Rxd4 Rf2 54.Rd8+ Kg7 55.Ra5 E as brancas venceram.

A forma como Lasker conduziu essa partida é impressionante. É digno de se admirar como apesar da pequena quantidade de ameaças de que ele dispõe, consegue dominar todo o tabuleiro, quase eliminando a sua própria debilidade. O estudante pode aprender nessa partida que a presença de uma variedade de alvos de ataque (debilidades inimigas) pode compensar até certo ponto a carência de linhas de jogo com ameaças concretas. Seguem algumas partidas ilustrativas e conclusões que encerram esse capítulo. Partida 44 Teichmann - Nimzovitsch San Sebastian, 1911 Variante Hanhmam

Essa partida, da Variante Hanhmam, ilustra o jogo combinado em ambas as alas. A audácia com a qual as pretas parecem ignorar a sua própria debilidade de d6 é impressionante. 1.e4 e5 2.Nf3 d6 3.d4 Nf6 4.Nc3 Nbd7 5.Bc4 Be7 6.0–0 0–0 7.Qe2 c6 8.Bg5 Era preferível 8.a4. 8...h6 9.Bh4 Nh5 10.Bg3 Nxg3 Também era de se considerar 10...Bf6. 11.hxg3 b5 12.Bd3 a6! A massa de peões pretos é agora de tal constituição (refiro-me à sua estrutura interna) que inspira muito respeito. Observe o avanço em dois tempos, ...c6c5 e às vezes ...d6-d5. 13.a4 As brancas tratam de cortar a raiz da força latente dos peões pretos. 13...Bb7 14.Rad1 Qc7 15.axb5 axb5 16.g4 Rfe8 17.d5 b4 18.dxc6 245

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Bxc6 19.Nb1 Nc5 20.Nbd2 Qc8 A tentativa das brancas de implantar uma batalha aberta pode-se considerar fracassada, uma vez que o peão d6 é facilmente defensável, enquanto os dois bispos em conjunto com a coluna a e a ameaçadora diagonal c8-h3 exercem uma influência tão significativa que desequilibra a balança. 21.Bc4 Uma engenhosa defesa do peão g4 (21...Qxg4?? 22.Bxf7+). 21...g6 22.g3 Kg7 23.Nh2 Bg5! A debilidade de d6 aqui só tem uma importância muito relativa. 24.f3 Se 24.f4? exf4 25.gxf4 Bf6, ganhando um peão. 24...Qc7 Ameaça 25...Na4 e se 25.Rb1 então 25...Bxd2, seguido de 26...Bxe4 e o bispo de c4 está pendurado. 25.Rfe1 Rh8 26.Ndf1 h5 Os lances seguintes conduzem à ocupação das colunas e diagonais mais importantes. 27.gxh5 Rxh5 28.Bd5 Rah8 29.Bxc6 Qxc6 30.Qc4 Qb6 31.Kg2 Lentamente uma debilidade vai germinando, a base das brancas. Com o cavalo preto em d4, a invasão da segunda fileira resultará decisiva. 31...Ne6 Com a mira apontada para d4, mas também planejando uma forte ameaça na ala do rei: 32...Rxh2+ 33.Nxh2 Rxh2+ 34.Kxh2 Qf2+ 35.Kh3 Bf4!, vencendo (36.Rg1 Ng5+ 37.Kg4 Qxf3, ou mesmo 37.Kh4 Qh2+). 32.Re2! Se não fosse pela ameaça mencionada 246

no comentário anterior, as brancas teriam uma defesa adequada em 32.Qd5 Nd4 33.f4. 32...Nd4 Esse lance se faz agora ganhando um tempo. 33.Ree1 Ou mesmo 33.Rf2? Be3! 33...Qb7! O lance 34...Rc8 é imparável. Esse é um belo exemplo de como se pode prestar atenção a várias debilidades. 34.Rxd4 Depois de 34.c3 bxc3 35.bxc3 Qb2+ a debilidade da segunda fileira se faria sentir. 34...exd4 35.Ng4 Ou mesmo 35.Qxd4+ Bf6 36.Qxd6 Rd8. 35...Qb6 36.f4 Be7 37.Rd1 f5 38.Nf2 fxe4 39.Qxd4+ Qxd4 40.Rxd4 d5 41.g4 Bc5 42.Rd1 Rh4 43.Rxd5 Bxf2 44.Kxf2 Rxg4 A fim de manter a sua vantagem, as pretas têm que tratar de combinar o ataque na ala do rei com o jogo no centro. Vejam-se seus lances 40 e 41. 45.Ke3 Rc8 Agora também jogam na ala da dama. 46.Kxe4 Rc4+ 47.Kd3 Rcxf4 O resto é fácil. 48.Ne3 Rg3 49.Re5 Kf6 50.Re8 Kf7 51.Re5 Rf6 52.c4 b3 53.Kd4 Re6 54.Rxe6 Kxe6 55.Nd5 g5 As brancas abandonaram. Essa partida é conhecida na Dinamarca como a “partida clássica de Hanham”.

Partida 45 Lasker - Burn São Petersburgo, 1909 Variante Hanham

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Uma partida das mais complicadas do ponto de vista estratégico. Lasker manobra em uma ala e termina penetrando na outra. O “porque” e o “como” desse procedimento serão vistos nos comentários. 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 a6 4.Ba4 Nf6 5.0–0 Be7 6.Re1 b5 7.Bb3 d6 8.c3 Na5 9.Bc2 c5 10.d4 Qc7 11.Nbd2 Nc6 12.Nf1 0–0? As pretas deveriam tratar de obrigar o adversário a declarar suas intenções no centro com 12...cxd4 13.cxd4 Bg4. 13.Ne3 Bg4 14.Nxg4 A resposta a 14.Nd5 teria sido 14...Qa7 15.Nxe7+ Nxe7!. Com o lance do texto Lasker busca a vantagem do par de bispos. 14...Nxg4 15.h3 Nf6 16.Be3 Nd7 17.Qe2 Bf6 18.Rad1 Ne7 19.Bb1 Nb6 20.a3 Ng6 21.g3 Rfe8 As pretas atuaram conforme seus planos, preparando-se para efetuar o avanço …d5. Lasker agora se vê obrigado a jogar d5, bloqueando seu próprio bispo de casas brancas. A partida então entra em nova fase. 22.d5 Nd7 23.Kg2 Qd8 Em lugar disso, as pretas deveriam ter jogado 23...c4, seguido de ...Nc5. O cavalo teria ficado bem posicionado e, o que é mais importante, exerceria um efeito preventivo, já que as brancas se dispunham a jogar f4. 24.h4 Be7 25.h5 Ngf8 26.Rh1 h6 27.Rdg1 Nh7 O ponto g5 parece bem fortificado. 28.Kf1 Kh8 29.Rh2 Rg8 30.Ne1 Se 30.Nh4, as pretas simplesmente trocariam (30...Bxh4 31.Rxh4) e a partida então se tornaria um pouco rígida. Com sabedoria Lasker evita esse lance e trata de preservar a escassa força

dinâmica latente em sua posição. 30...Rb8 31.Nc2 a5 32.Bd2 Bf6 33.f3 Nb6 34.Rf2 “As brancas tratam de levar o cavalo a e3 e querem dispor do lance f4, caso as pretas joguem ...Bg5”. (Lasker) 34…Nc8 35.Kg2 Qd7 36.Kh1 Ne7 37.Rh2 Rb7 38.Rf1 Re8 39.Ne3 Ng8 40.f4 Bd8 41.Qf3 Lasker conseguiu realizar o avanço f4 em circunstâncias favoráveis. As peças pretas devem se manter na espera frente à ameaça de invasão Nf5, e não estão muito bem situadas no caso de um ataque na ala da dama. Poderíamos dizer que Lasker deixou a ala do rei sob assédio para deslocar as peças adversárias do contato com sua ala da dama, para atacar precisamente nesse setor nas melhores condições possíveis. Ainda devem ser criadas debilidades concretas e seus bispos têm que conseguir espaço para manobrar. A partida pode seguir com c4, ...b4, Bc2 e em seguida Qd1 e Ba4. 41…c4 42.a4 Bb6 43.axb5 Qxb5 O erro decisivo. O caminho correto, como Lasker indicou em seu livro sobre o torneio, era 43...Bxe3 44.Bxe3 Qxb5, seguido de ...a4 e ...Ra8 e a posição das pretas é defensável. 44.Nf5 Qd7 45.Qg4 f6 O cavalo de f5 não pode ser expulso. As pretas agora têm debilidades evidentes em ambas as alas e Lasker as explorará sem maiores dificuldades. 46.Bc2 Bc5 47.Ra1 Reb8 48.Bc1 Qc7 49.Ba4 Qb6 50.Rg2 Rf7 51.Qe2 Qa6 52.Bc6 Ameaçando 53.b4. 52...Ne7 Finalmente as pretas conseguem expulsar o intruso, mas enquanto isso as 247

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brancas foram ganhando terreno na ala da dama. 53.Nxe7 Rxe7 54.Ra4 exf4 Desespero. Seguiu: 55.gxf4 f5 56.e5 Nf6 57.Rxc4 Ng4 58.Rxc5 Qxe2 59.Rxe2 dxc5 60.d6 Ra7 61.e6 Ra6 62.e7 Nf6 63.d7 Nxd7 64.Bxd7 As brancas abandonaram. Essa partida valiosa se caracteriza também pela ação conjunta dos bispos em seu esforço para procurar diagonais abertas. Partida 46

Andersson/Enströn/Oeberg -Nimzovitsch

Upsala, 1921 Partida sob consulta

Essa partida ilustra de forma instrutiva a conexão entre o jogo no centro por um lado e as mudanças para as alas por outro. O êxito de um ataque de ala e sua dependência do estado de saúde do centro ficam aqui perfeitamente claros. Foi uma de quatro partidas sob consulta. 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 O correto é 3.e5. 3...Bb4 4.Bd3 Nc6 5.Nge2 Nge7 6.0–0 0–0 7.e5 Nf5! 8.Be3 f6 Nesse momento as pretas se salvaram de todas suas dificuldades de abertura. 9.Bxf5 exf5 10.f4 Be6 Em cumprimento da lei que estabelece que um peão passado deve ser bloqueado. 11.Ng3 Bxc3! 12.bxc3 Na5! Somente com reticências e após muito ponderar decidi-me por essa mudança para a ala da dama. Parece arriscada, pois a situação no centro de forma alguma é segura (e como sabemos, um dos meus 248

princípios afirma que um ataque de ala só está justificado se o centro é seguro). Contudo, no presente caso as brancas não podem obrigar o adversário a jogar ...fxe5 e se as brancas fizerem exf6, ainda que obtenham a casa e5 (após ...Rxf6), as pretas mobilizam suas reservas e aliviam o perigo. 13.Qd3 Qd7 14.Rf3 g6 15.Ne2 Rf7! 16.h4 h5 17.Kh2! Raf8! As reservas! (Veja o comentário anterior). 18.Rg3 Kh7 19.Ng1! Apontando para g5 ou e5. Como se pode comprovar, os jogadores em consulta são conhecedores da arte das manobras e como adversários devem ser levados muito a sério. 19...Rg7 20.Nf3 Qa4 As pretas finalmente dão seqüência ao ataque anunciado no lance 11. Uma lentidão a seu crédito. 21.exf6 Rxf6 22.Ng5+ Kg8 23.Bg1 Nc4 24.Re1 Bd7!! Essa simples retirada estratégica revela o meu plano defensivo. Como estabelece meu sistema, o ideal que norteia toda operação em uma coluna é a penetração na sétima e oitava fileiras. No entanto, aqui os pontos de invasão (e7 e e8) estão protegidos e a torre de g3 não pode cooperar uma vez que não controla a casa e3. 25.Nf3 Bb5 26.Qd1 Qxa2 27.Qe2 (Veja o diagrama 214 A) 27…Nd6!! Com essa retirada tem início uma manobra concebida para neutralizar o forte controle da coluna e que as brancas exercem. Menos efetivo teria sido 27...Qa3 (com idéia de regressar à casa com o botim) 28.Ne5 Qd6 29.Nxc4 Bxc4 30.Qf2 Re6 31.Re5! e as brancas seguem tendo possibilidades de empate,

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enquanto o lance do texto é vencedor.

Para terminar, dois finais de partida. Ve s t e r g a a r d - N i m z o v i t s c h , Simultânea contra 25 adversários, Vejle (Dinamarca) 1922

Diagrama 214 A – Posição após

27.Qe2 28.Qe5 Ne8! Com esse salto para trás se ameaça o reagrupamento …Rd6 e …Nf6, trocando os postos de torre e cavalo. Se as brancas o impedirem com 29.Ng5 (29...Rd6?? 30.Qxe8+ e mate), sem dúvida serão fortes na coluna e, mas a linha divisória da posição – a dama como cabeça de ponte – impedirá as brancas de explorar a coluna de forma plena. Por exemplo: 29.Ng5 Bc6 30.Rge3 Qxc2, ou mesmo 30.Re2 Qc4 (bloqueio!) 31.Rge3 a5 e ganham, já que não é possível 32.Ne6? devido a 32...Re7 e as brancas não dispõem de outro lance efetivo na coluna e. A partida continuou assim: 29.Nd2 Rd6 30.c4 Bd7 31.Rc3 Nf6 A difícil manobra de reagrupamento foi executada sob o fogo do inimigo. 32.cxd5 Um grave erro, mas mesmo após 32.Qe2 Re6 33.Qd1 Rge7 a posição seria desesperadora para as brancas. 32…Ng4+ As brancas abandonaram.

Diagrama 215 Vestergaard-Nimzovitsch

As pretas ameaçaram atacar na ala da dama, mas depois decidiram-se pela ala do rei como campo de operações. As brancas adotaram uma dura posição defensiva. Era minha vez e após uma longa reflexão me decidi por: 1...b5!! Ouviu-se entre os espectadores um forte murmúrio de assombro. Na ala da dama as pretas não têm efetivos de ataque. 2.cxb5 Rh2 3.Nxh2 Rxh2 4.Bf1 Bxb5 5.Bxb5! Agora se vê a luz do dia. O avanço na ala da dama era uma diversão da atenção contra a ala do rei. 5…Nh3+ 6.Kf1 Qxe3 7.Qe1 Qg1+ 8.Ke2 Qxg2+ E na seqüência, mate em dois. O exemplo seguinte também é característico de uma cooperação surpreendente entre duas diversões separadas. A posição foi colhida em um 249

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torneio de menor expressão, realizado em Leipzig em 1926.

Diagrama 216 – Saifert-Nimzovitsch

1...h4 2.Nxg3 hxg3 3.Rd2 Agora seguiu um forte golpe na ala oposta. 3...a5 Meu adversário parou a tentativa travando a posição. 4.b5 Mas depois de... 4...Bxh3 5.gxh3 Qxh3+ 6.Kg1 d5!! (a chave), foi obrigado a abandonar, pois o efeito do xeque em c5 é catastrófico. A alternativa correta teria sido jogar 4.Bf1 axb4 5.Rb2 c5, com uma posição na qual é possível o empate. Com isso encerramos o livro sobre o jogo posicional para nos dedicar à investigação histórica da “Revolução Enxadrística” que teve lugar entre os anos 1911 e 1914.

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Apêndice - Contribuição à História da Revolução Enxadrística 1-Quadro geral da situação antes do ano 1911. Os primeiros indícios: ataques ao conceito aritmético do centro (partidas comentadas nas publicações Wiener Schachzeitung e Deutsche Schachzeitung). Meu artigo: “A ‘Partida Moderna de Xadrez’ do Dr. Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno?”

Para dizer em poucas palavras: em um livro destinado ao ensino de xadrez e considerando o pouco espaço disponível, não me foi possível escrever uma investigação profunda sobre esse tema e me limitarei a citar ou transcrever os artigos revolucionários da época mencionada em epígrafe e o mesmo posso dizer a respeito das partidas incluídas. Agora que o nosso querido leitor está informado e nós com a consciência tranqüila de tê-lo preparado para isso, podemos nos dedicar a esses papéis amarelecidos pelo tempo. Em primeiro lugar, quero deixar estabelecida uma circunstância que para mim é fundamental: não pretendo criar polêmica. Tudo aquilo que poderia servir para isso foi eliminado dos velhos pergaminhos e se em algum canto dos papéis velhos restou alguma coisa nesse sentido foi devido ao fato de que não é possível prescindir disso sem alterar a verdade histórica. O primeiro avanço contra a velha teoria do centro, que se relacionava com o número de peões que no mesmo se situam, data do ano de 1911 ao comentar

e publicar as minhas partidas contra Salve e Lövenfisch em Carlsbad. Minhas dúvidas sobre a suposta força dos avanços centrais na abertura me levaram a conceber uma nova variante: 1.e4 c5 2.Nf3 Nf6 que surgiu pela primeira vez na partida entre Spielmann e Nimzovitsch, San Sebastian 1911. Posso dizer também que fui o primeiro a levar em consideração o valor da hoje conhecida manobra contra um complexo de casas débeis de uma cor. Observe-se o jogo de abertura em minha partida com Tarrasch (1912): 1.e4 c6 2.d4 d5 3.e5 Bf5 4.Bd3 Bxd3 5.Qxd3 e6 6.Nf3 Qb6! Seguido de ...Qa6. Um plano que supõe jogar contra as casas brancas débeis do adversário. Esta tendência ficou acentuada em minha partida contra Leonhardt (San Sebastian 1912). Não vale a pena registrar aqui as inúmeras piadas e comentários sarcásticos dos quais fui vítima. Basta dizer que ninguém na história do xadrez foi tratado de forma semelhante. O melhor reconhecimento para as minhas novas idéias consistia em depreciá-las ou, no melhor dos casos, em silenciá-las de todas as formas. Em 1913 finalmente estourou a revolução, provocada por um artigo de minha autoria, de caráter profundamente perturbador, que se reproduzirá a seguir na íntegra. Repito que não desejo criar polêmica, razão pela qual dele retirei 251

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todas as farpas. Também quero fazer constar que, quando me refiro ao Dr. Tarrasch, não o faço a título pessoal, mas à escola na qual ele se inscreve. Também eliminei todos os sinais de ênfase e negritos que enfeitavam o texto. Faz anos que se produziu a revolução. Não é necessário proclamá-la a torto e a direito. A única necessidade é ter tranqüilidade para continuar trabalhando. Passemos então ao artigo em questão. “A Partida Moderna de Xadrez” do Dr. Tarrasch tem um conteúdo realmente moderno? Novos conceitos acerca de xadrez moderno e não-moderno Por Aaron Nimzovitsch

(Publicado na revista Wiener Schachzeitung, 1913 – páginas 5-8) A recomposição de partidas publicadas pelo Dr. Tarrasch com o título citado é um livro pedagógico no qual as aberturas estão comentadas de forma estranha. O critério seguido pelo Dr. Tarrasch consiste em agrupar as partidas que ele comenta conforme as aberturas. Em primeiro lugar indica a forma incorreta de jogar e, ao passar para a melhor forma de fazê-lo, nos surpreende ao final com seu rótulo a única maneira correta de jogar. Desejo muito sinceramente que o seu livro tenha uma ampla difusão, pois é metódico e claro, se bem que, no meu entender, o conteúdo do livro do Dr. Tarrasch não se enquadra no que se pode considerar realmente moderno. O Dr. Tarrasch para mim continua sendo o autor de Dreihundert Schachpartien (300 Partidas de Xadrez, Leipzig 1909 – N. do T.), o primeiro que compreendeu a necessidade de se ensinar à enorme 252

massa de amadores e fazer-lhes respeitar os princípios do jogo, regidos por leis. Ainda que ao escrever o mesmo não estivesse à altura da idéia, pois seus comentários ou são uma confusão de variantes ou resultam demasiado profundos (Steinitz), o que é claro se constitui em um erro. É muito provável que o único defeito de Steinitz seja o de ter se adiantado em cinqüenta anos à sua geração e por isso os seus contemporâneos o tenham qualificado de “barroco”. Nesse ponto, não deixa de ser interessante que o Dr. Tarrasch, apesar de ser um dos culpados por essa qualificação tão injusta (e ainda hoje bastante compartilhada), seja também o maior paladino na divulgação do legado de Steinitz. Voltando a Dreihundert Schachpartien, afirmamos que o Dr. Tarrasch aporta poucas idéias originais. Os fundamentos são de Steinitz e portanto sua obra pode ser qualificada de clássica com reservas. Por outro lado, contém uma série de conceitos tão rígidos e expõe os elementos básicos de jogo (como a coluna aberta e o centro) de forma tão isolada em relação aos demais temas, que não nos deixa alternativa senão chegar à conclusão já formulada. No livro há vários exemplos infantis sobre, por exemplo, a exploração da coluna c, ou de como minar alguns peões centrais que avançaram de forma prematura ou que estão defendidos de forma insuficiente (partida com Metger), ou acerca da exploração do par de bispos no apoio ao avanço dos próprios peões para restringir a ação dos cavalos do adversário (partida contra Richter). Também inclui, como não, exemplos que advertem contra “o abandono do

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centro”, sempre deplorável na opinião do Dr. Tarrasch. Nesse sentido, como em tantas outras questões, os conceitos por ele emitidos são de uma rigidez chocante. Eu disse “rigidez” com plena consciência, pois não é coerente com os princípios que proclama. Não se pode esquecer, por outro lado, que o jogo se tornou muito mais complexo e se aprofundou nos conceitos. Novas idéias abrem caminho e em muitas questões, como na relativa ao suposto abandono do centro, as coisas já não são tão monolíticas, tão ortodoxas. O Dr. Tarrasch permanece indiferente e alheio aos novos conceitos e essa indiferença se transmite ao seu livro A Partida Moderna de Xadrez. O que nos diz, por exemplo, sobre a Defesa Francesa? Como sabemos, trata-se de uma abertura na qual o problema do centro mais se ressalta, deixando relegado a um segundo plano todos os demais. Nessa abertura, tanto na disposição fechada que caracteriza a cadeia de peões (e5+d4+c3 e respectivamente f7+e6+d5, seguida geralmente de ...c5), como nos resultados da troca dxc5, ou inclusive na Variante das Trocas (3.exd5 exd5), o tema do centro sempre se encontra em um primeiro plano. O que acabamos de dizer se revela especialmente na variante 3...dxe4, elaborada e praticada com entusiasmo há mais de vinte anos, ainda que os puristas bradem aos céus, escandalizados pelo “abandono do centro”. O êxito da variante foi tamanho que Rubinstein (com ...b7-b6) descobriu uma melhoria que inclusive questiona a resposta 3.Nc3. Foi precisamente essa linha que me incitou a investigar a variante 3.e5, com a

qual – em que pese ter contra mim todos os puristas – conquistei êxitos importantes. Em sua nova obra, o Dr. Tarrasch se coloca na vanguarda dos puristas e ignora por completo a validade do lance 3...dxe4!, que supõe uma concepção muito profunda. A única partida em seu livro na qual se produz essa troca é a de número 187, depois de 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 dxe4? (a interrogação é do Dr. Tarrasch) 4.Nxe4 Bd7 (é sabido que o lance correto é 4...Nbd7), que embora coincida com a forma moderna de jogar (3...dxe4), a idéia nada tem em comum. Sua ignorância da variante se manifesta ao escolher uma partida com a insípida continuação ...Bd7, apesar do abundante material à sua disposição (por exemplo, as numerosas partidas vencidas por Rubinstein com sua variante). Mas o certo é que as pretas não abandonam o centro porque trocam um de seus peões (3...dxe4). O conceito de centro é muito amplo. Permito-me remeter o leitor aos meus comentários sobre a partida Nimzovitsch-Salve, na Deutsche Schachzeitung (1913).

Diagrama I

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Não há dúvida de que os peões, pela sua maior estabilidade, são os efetivos mais estáveis para ocupar o centro, mas as peças podem muito bem substituí-los. Uma pressão exercida sobre o centro inimigo com torres ou bispos pode ter um efeito equivalente. Tal é a concepção verdadeiramente moderna, ou ao menos como eu a entendo. O Dr. Tarrasch concede ao lance 3...dxe4 um ponto de interrogação, baseando-se em que “abandona o centro”. O certo é que as pretas, apesar desse suposto abandono do centro, reforçam sua influência sobre o mesmo, pois em virtude do esvaziamento da casa d5, intensificarão seu controle sobre a coluna d e a grande diagonal branca a8h1, que poderão ocupar com o seu bispo. Tenho que admitir que a rigidez do conceito do Dr. Tarrasch influirá na idéia que o principiante fará do jogo posicional, o que me parece muito pouco recomendável para os jogadores que se iniciam e têm ambições, mas de qualquer forma não está em nossas mãos evitá-lo. Nada mais diremos acerca da variante 3...dxe4. Passemos agora à continuação 3.e5. Essa nova variante também desagrada o Dr. Tarrasch, que ao se referir à minha partida contra Leonhardt disse: “As brancas transformam a partida em um gambito, com todas as possibilidades e contra-possibilidades que se derivam dos gambitos. Era mais correto 3.Nc3”. O fundamento filosófico no qual me baseei para efetuar o avanço 3.e5 me dá o direito de considerá-lo como de minha propriedade intelectual. 254

Diagrama II

O fundamento é esse: com o avanço e5 se altera o plano de ataque da casa d5 a e6, conforme a lei que preconiza que a primeira fase do ataque é imobilizar o objetivo. Pois bem, com o lance e5 se imobiliza o peão e6. São estabelecidas então cadeias de peões que se interferem entre si e que portanto tratarão de destruir uma à outra. Os ataques conseqüentemente se dirigirão contra a base da cadeia, o que significa que as pretas atacarão a casa d4 e as brancas a casa e6. As senhas são ...c5 por parte das pretas e f4-f5 por parte das brancas. As pretas dispõem de um ataque alternativo, mudando para o ponto c3 o projetado para d4 mediante ...c5-c4, o que imobiliza o peão de c3 e seguindo com ...b5-b4. Esse plano responde a uma lei de minha autoria que estabelece o seguinte: “O ataque a uma cadeia de peões pode ser mudado de um elo para o seguinte”. Naturalmente resta decidir em que momento deve-se mudar (se é que se deve) o ataque a outro objetivo. É algo muito difícil de precisar em um plano abstrato e somente podemos nos guiar através de pistas e indícios que se

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depreendem da posição concreta. Já em seu terceiro lance as brancas podem realizar essa mudança. Existe uma tendência na partida a postergar o avanço e4-e5 até que se possa efetuar com ganho de tempo (atacando o Nf6). Isso não me parece prático, porque na realidade as pretas desenvolvem o cavalo por f6 somente como trampolim momentâneo para uma casa mais estável e eficaz. Devo dizer que de modo algum sou um “jogador de gambito”, mas a estratégia restritiva iniciada com o avanço e4-e5 permite assumir uma eventual perda de peão. Assim, meus sacrifícios de peão frente a Spielmann e Leonhardt (San Sebastian 1912) devem ser considerados completamente inovadores. Ao qualificar-me de “jogador de gambito” o Dr. Tarrasch nada mais fez do que demonstrar o quanto está afastado das interpretações do xadrez moderno. Por outro lado e como já o dissemos em várias ocasiões, 3.Nf3 resulta deficiente devido a 3...dxe4!. Passemos agora à variante habitual 3.Nc3 Nf6 4.Bg5 Be7 5.e5 Nfd7 6.Bxe7 Qxe7. Por certo é estranho que falte a Variante Alapin, uma idéia excelente, susceptível de pesquisas atraentes e que não pode ser deixada de lado. Bastaria citar a linha 9...f6 (após 7.Nb5 Nb6 8.c3 a6 9.Na3), ou a importante idéia estratégica ...f5, fixando o peão f das brancas (tendo em mente a continuação ...Nb8-c6-d8-f7, seguida de ...g5). O Dr. Tarrasch tampouco trata com muita simpatia a idéia imaginada por Svenonius na variante normal, 1.e4 e6 2.d4 d5 3.Nc3 Nf6 4.exd5 exd5, para

seguir com Bg5, Bd3 e Ne2, que me parece muito forte. O certo é que o Dr. Tarrasch apenas a cita de passagem. De seus comentários e conceitos do livro, somente os referentes às partidas Tarrasch-Teichmann e TarraschLowtzky podem ser considerados de algum valor teórico com relação a uma das variantes teóricas indicadas por Rubinstein: 4.Bg5, que se esquecendo da posição agressiva do bispo de d3, “abandona” o centro para bloqueá-lo eficazmente com peças (Ne5 etc). Tratam-se, em resumo, de conceitos que me são muito caros, pois eu já os havia praticado em minhas partidas de Karlsbad (1911) contra Lövenfisch e Salve, se bem que a partir da variante 3.e5. Como é lógico, esses breves apontamentos (tão breves como os lapidares aforismos do Dr. Tarrasch sobre a estratégia correta na Defesa Francesa) não são muito sugestivos acerca das variantes mais importantes como: I) 3...dxe4!; II) 3.e5; III) ...Nc6 (Alapin); IV) Svenonius. Agora vamos dar uma olhada na Abertura Espanhola (páginas 3-113 do livro em questão). De novo nos deparamos com o mesmo! O autor supervaloriza a importância do centro, ou seja, da sua ocupação por peões, mostrando pânico frente ao eventual abandono do mesmo. Como já dissemos, trata-se de uma interpretação deficiente e errônea do conceito de “centro”. Como conseqüência de sua interpretação errônea, o Dr. Tarrasch condena sem paliativos a Defesa Steinitz 3...d6? (ponto de interrogação assinado pelo Dr. Tarrasch) e prossegue com 255

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outras muitas (com ou sem 3...a6). Depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 a6 4.Ba4 Nf6 5.0-0 Be7 6.Re1 d6 7.Bxc6+ bxc6 8.d4 exd4 9.Nxd4 Bd7 (diagrama III), o Dr. Tarrasch disse que as brancas têm jogo melhor, devido a que desfrutam de “uma posição mais livre”, o que pode ser aproveitado para empreender vários ataques.

Diagrama III

Se o Dr. Tarrasch, ao invés de se guiar por indícios aparentes, o fizesse considerando o valor intrínseco da situação central, nunca chegaria a conclusões tão superficiais como “posição livre” e jamais preferiria as brancas nessa posição. Analisemos por nossa conta o valor intrínseco da posição. Recapitularemos primeiramente a estrutura de peões centrais. Brancas: e4 e f2. Pretas: d6, c6, c7 e f7. Esse balanço manifesta uma tendência por parte das pretas de minar o centro contrário com ...f5 ou ...d5, assim como o fato de que dispõem da coluna e como plataforma de operações, enquanto para as brancas é a coluna d. As pretas tratarão de situar uma peça em e5 (com a base de d6 para futuras operações na coluna e). As brancas em troca, para 256

operações similares na coluna d (ocupação do ponto d5), se vêem prejudicadas com a colocação de um obstáculo – o peão inimigo de c6. Isso demonstra que as pretas estão mais fortes na coluna e e que as brancas, na coluna d, ou seja, as pretas podem exercer maior pressão sobre o centro das brancas do que essas sobre o centro das pretas. Por outro lado e como comentário marginal, convém observar que da massa compacta de peões das pretas d6+c7+c6 se desprende um potencial que pode se orientar em direção à ala da dama (por exemplo: ...c5, ...a5 contra b3). Pelo exposto, não procede falar em vantagem das brancas. Ainda mais, pelo que se viu no transcurso das partidas Lasker-Janovsky e Lasker-Schlechter, os acontecimentos demonstram que estamos certos. O rigor atual, em definitivo, não permite aceitar uma opinião tão vaga como “posição mais livre”. Hoje em dia é preciso analisar em profundidade a partir do próprio núcleo da posição, pois de nada vale se refugiar em expressões como “jogo livre”, “jogo mais cômodo” etc. Para exceder no que foi dito, busquemos a colaboração de outro exemplo característico. Depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.Bb5 a6 4.Ba4 Nf6 5.0-0 Be7 6.Re1 d6 7.c3 Bg4 8.d4 Nd7 9.d5 (diagrama IV, partida LaskerJanowski), Tarrasch observa o seguinte, bem de acordo com sua linha interpretativa habitual: “Esse lance (9.d5) quase sempre é mau se as pretas têm a possibilidade de jogar ...f5”. Isso é simplesmente falso.

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O valor do lance d4-d5 nada tem a ver com o fato de que Lasker tenha perdido a partida.

Diagrama IV

O avanço ...f5 deve ser considerado apenas como a reação natural contra d4d5 e portanto não há porque temê-lo, como pode demonstrar uma breve análise da posição. Com d5, as brancas de forma similar ao avanço e5 na Defesa Francesa, mudam o ataque de e5 a d6, que pode levar-se a cabo com c4-c5 sem renunciar por isso a outro ataque à cadeia com f4 (análogo a ...c5 na Defesa Francesa) e nada permite concluir que as brancas se prejudiquem com esse avanço, nem tampouco o demonstrou a prática competitiva, um fator pelo qual o Dr. Tarrasch sente clara preferência, apesar de se considerar um teórico. Como conseqüência do avanço d4d5, na partida anterior se chegou à posição do diagrama V. As brancas projetam o avanço c5, enquanto as pretas tentam buscar contrajogo na coluna f (após o avanço ...f5). O centro das brancas (questão essencial) não perdeu nada de seu valor. Ainda que tenham “abandonado” o centro, seu cavalo em e4, bem respaldado pelo seu companheiro, substitui às mil maravilhas o peão de e4 e exerce uma poderosa ação.

Diagrama V - Posição após o lance 22 das brancas

A propósito de d5, se aplicam algumas partidas brilhantes de Maróczy, nas quais esse mestre desenvolvia a excelente estratégia: após o “temível” avanço ...f5, eliminava o intruso quando este já estava apoiado por seu vizinho de g6. Então apareciam no tabuleiro os peões pretos de e5 e f5, oferecendo um belo espetáculo. Mas por serem pendentes, Maróczy os assediava e os destruía sistematicamente. A respeito da melhor defesa (contra a Espanhola) 3...a6 4.Ba4 Nf6 5.0-0 Nxe4(!) – o ponto de exclamação é do Dr. Tarrasch – ainda nos resta algo a dizer. Aqui se menciona a novidade de Schlechter, ...Nxd4 (depois de 5...Nxe4 6.d4 b5 7.Bb3 d5 8.a4? Nxd4), que questionou o valor de 8.a4. Mas isso não significa que a variante tenha perdido a sua força. A forma de tratar, segundo Tarrasch, “a defesa mais adequada”, não se baseia em dispor da coluna a (que não passaria a ser outra “liberdade” a mais), mas no fato de que o peão branco de e5, 257

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após 8.dxe5 Be6, resulta incômodo para as pretas com a possibilidade Nd4 (9.Nd4 Nxd4 10.cxd4), que transforma em atrasado o peão preto de c7. Todas essas coisas foram explicadas pelo senhor Malkin em Schachwelf, apoiando-as em uma análise minuciosa na qual demonstrava que o valor que o Dr. Tarrasch concede a 5...Nxe4 é exagerado. Agora chegamos ao capítulo da Abertura dos Quatro Cavalos, em cuja seleção de partidas não se encontra a Defesa Rubinstein (4...Bc5 5.Nxe5 Nd4) jogada, entre outras, na partida Tarrasch-Rubinstein (San Sebastian 1912), nem tampouco a variante reabilitada por Spielmann, com ...Nce7. É surpreendente ainda a pouca atenção que Tarrasch dá à variante 6.Bxc6, na qual havia introduzido novas continuações de corte moderno que foram acolhidas com simpatia geral e adotadas por, entre outros, Capablanca. Passemos agora ao Gambito da Dama. O trabalho do Dr. Tarrasch, no que se refere à Abertura Espanhola, à Defesa Francesa e à Abertura dos Quatro Cavalos mereceu de nossa parte os comentários que acabamos de realizar. Nesse ponto, no entanto, não podemos fazer outra coisa senão elogiá-lo, pois a classificação é clara, os conceitos levam sua assinatura característica e a escolha das partidas é de muito bom nível. Somente gostaríamos de esclarecer uma coisa: porque o Dr. Tarrasch se empenha em classificar como “ortodoxa” a variante 1.d4 d5 2.c4 e6 3.Nc3 Nf6 que se divide em uma imensidão de possibilidades e que está a um passo de se enquadrar na concepção moderna? 258

Porque, em troca, classifica como “moderna” sua variante 3...c5, que só conduz a partidas pouco dinâmicas e que hoje em dia é considerada praticamente arquivada? Pergunto-me se alguém pode ter interesse em adotar uma variante que lhe dará um peão central isolado, como ocorre com a variante 3...c5, o qual será devidamente bloqueado (pensemos em Bb2) e que permite às brancas desenvolverem de forma eficaz seu bispo do rei através de fianchetto (Bg2). Haverá alguém que se sinta inclinado a adotar essa defesa? Seja como for, as brancas conseguem uma posição cômoda após 1.d4 d5 2.c4 e6 3.Nc3 c5? 4.cxd5 exd5 5.Nf3 Nc6 6.g3 Be6 7.Bg2 Be7 8.0-0 Nf6 e agora podem jogar 9.b3 (diagrama VI).

Diagrama VI

É possível que essa variante seduza alguém, quando 3...Nf6 (que hoje resulta perfeitamente moderna e é injustamente tachada de “ortodoxa” por Tarrasch) dá um jogo livre e vigoroso, com desenvolvimento seguro e sólido? Creio ver porque são infundados seus argumentos contra 3...Nf6. Depois de 1.d4 d5 2.c4 e6 3.Nc3 Nf6! 4.Bg5 Be7

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5.e3 Nbd7 6.Nf3 0-0, surge para as brancas uma posição tal que, baseando-se nos conceitos “jogo livre”, “ganho de tempo” e “desenvolvimento rápido”, resulta em que elas não sabem o que fazer. Por exemplo: 7.Bd3 lhes custaria um tempo devido a 7...dxc4; 7.Rc1 não é apropriado e 7.Qc2, última possibilidade, permite um procedimento seguro adotado por Teichmann em várias partidas: 7...c5! (agora sim esse avanço procede) 8.0-0-0 Qa5!. A idéia “antiga” ...b7-b6 também tem seus méritos, como se pode observar ao estudar a partida Pillsbury-Schlechter (Hastings 1895). Atualmente também tomaram um caráter moderno algumas defesas irregulares contra o Gambito da Dama, dentre as quais só citarei a Defesa Holandesa, que não foi muito bem tratada por Tarrasch. De forma igual é inútil supor que a Variante Hanham seja digna do estudo que mereceu, pois é um espinho que o Dr. Tarrasch tem atravessado na garganta, uma vez que não pode suportar que em tal variante se subordine o conceito sovado “jogo livre de peças”, que para ele é tudo, apesar de uma formação de peões correta. A prática magistral da atualidade tampouco lhe dá razão nesse ponto. Nos últimos tempos, essa profunda forma de jogar, embora arriscada, tem sido respaldada pelo mesmíssimo Capablanca. Procuramos em vão em A Partida Moderna de Xadrez o exemplo clássico da Variante Hanham, a saber a partida Teichmann-Nimzovitsch (San Sebastian 1911), que se inclui em todos os livros de ensino. Diremos, para encerrar, algumas

palavras acerca da Defesa Caro-Kan (1...c6) e da Escandinava (1...d5). Tarrasch classifica a primeira como “indubitavelmente incorreta”, uma vez que 1...c6 “não contribui em nada para o desenvolvimento”, ou seja, volta a demonstrar um critério pouco apropriado na hora de avaliar aberturas modernas. O lance 1...c6 contém um plano ambicioso, que pretende demonstrar que o lance 1.e4 é prematuro. Essa é, ao menos, a parte essencial da sua idéia tomada como fundamento. Não sabemos, é claro, se o inventor do lance 1...c6 chegou a conceber o seu alcance, mas em qualquer caso essa defesa tem um futuro brilhante. Pensando somente em minha inovação revolucionária, depois de 1.e4 c6 2.d4 d5 3.e5 Bf5 4.Bd3 Bxd3 5.Qxd3 e6 6.Nf3 Qb6 7.0-0 (diagrama VII) as pretas seguem com 7...Qa6, prescindindo da ruptura ...c5, empregada desde muito tempo para explorar o complexo de casas de sua cor que as brancas debilitaram através da troca do bispo em d3.

Diagrama VII - Posição após 7.0-0

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Isso já nos permite vislumbrar certas possibilidades da Caro-Kan. É claro que o Dr. Tarrasch não se pronuncia a respeito e considera três partidas suficientes para confirmar sua postura sobre a defesa em questão. Quando se trata da Defesa Escandinava, por sua vez nos brinda com nada menos de dez exemplos (!), em que pese, na realidade, que bastaria a partida Rubinstein-Bernshtein (San Sebastian 1911) na qual o mestre polonês, seguindo uma receita de Lasker, refutou de forma incontestável o lance 1...d5. Não é preciso dizer, é claro, que essa partida se encontra entre as dez escolhidas. Há interesse em comparar a Caro-Kan e a Escandinava, pois ambas supõem uma agressão à casa e4. A primeira com ...c6 reforça adequadamente o avanço ...d5, enquanto a segunda, pela sua agressão imediata 1...d5, “sem perder tempo no desenvolvimento”, não deixa de conseguir “um jogo livre” para suas peças, ainda que... perdido! Através de uma série de aberturas pudemos conhecer as idéias do Dr. Tarrasch, o que por sua vez nos permitiu familiarizar com a sua “rigidez”, que adquire uma categoria “clássica” em Dreihundert Schachpartien (300 Partidas de Xadrez). Mas também pudemos nos dar conta de que às vezes ele pronuncia sentenças monolíticas baseando-se em julgamentos superficiais. Pudemos ver, por exemplo, que seus conceitos limitados sobre a estratégia central não são modernos em absoluto, como assim também sua apreciação da configuração de peões em determinadas posições. Tampouco são modernas suas expressões “jogo livre”, “defesa 260

restringida” e outras, pois não têm uma tradução precisa na filosofia enxadrística. De forma especial, gostaria de observar que jamais estarei de acordo com o Dr. Tarrasch quando diz que o centro foi “abandonado” pela única e exclusiva razão de que se reduziu a quantidade de peões centrais. Ao lado dessas críticas, o livro do Dr. Tarrasch contém muitas virtudes. Com A Partida Moderna de Xadrez a literatura enxadrística não se enriqueceu com idéias modernas, mas sim com algo recomendável e interessante. O iniciante poderá se exercitar no jogo posicional e também o veterano poderá nele encontrar numerosos estímulos. 2 – As teses revolucionárias (a) O centro “elástico”; (b) O caráter inócuo da avalanche de peões; (c) A debilidade de um complexo de casas de determinada cor

Se fizermos uma leitura atenta do artigo anterior, comprovaremos que o mesmo se dirige acima de tudo contra o conceito aritmético do centro, uma vez que consideramos que o que nos parece mais importante é o maior ou menor grau de mobilidade do centro do adversário: paralisado é fraco, bloqueado está semi-perdido. O artigo (junto com outro intitulado “Mein System” - Meu Sistema, publicado na Wiener Schachzeitung) se opõe ainda a conceitos formais relativos aos elementos, como peão atrasado, sinal de ataque etc, fincando o pé no conceito de que realmente é importante o valor intrínseco da posição (baseado em grande parte na estrutura de peões) e não em um jogo mais ou menos livre ou outras considerações formalistas.

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Também se destaca a conveniência de se manobrar contra um complexo de casas debilitadas de uma mesma cor, assim como a idéia de que em um bloqueio sem fissuras é possível sacrificar um peão (até agora se conhecia a relação entre o sacrifício e o ataque, mas não entre sacrifício e bloqueio). Se for levado em consideração ainda o caráter relativamente inofensivo do ataque à baioneta, sobre o qual já chamei a atenção em 1911 (a propósito da partida Spielmann-Nimzovitsch, San Sebastian 1911), o leitor poderá entender minha satisfação por ter descoberto e formulado todos os elementos que caracterizam a escola que mais tarde se denominaria hipermoderna. A atraente idéia de Ricardo Réti de que “o desenvolvimento deve conter planos de luta” é totalmente correta em si, mas não se encaixa no sistema hipermoderno, pois é um aspecto do jogo de xadrez que já era assinalado pelos clássicos. Também convém deixar de lado a proposta do Dr. Tartakower a respeito da “multiplicidade de debilidades”, ao dizer: “um ponto forte do inimigo também pode ser considerado uma debilidade”. Como veremos posteriormente, o conceito se baseia em não levar em consideração as debilidades reflexas. 3 – A teoria revolucionária aplicada à prática revolucionária. A partida de referência do Gambito da Dama ideal

No verão de 1913, joguei com meu discípulo e sparring Giese umas 20 ou 25 partidas sérias, nas quais só se tratava de demonstrar a validade da minha tese oposta à tradicional, de que se prescinde dos peões na ocupação do centro. Não encontramos nenhuma refutação, coisa

que por outro lado acredito que ninguém o tenha conseguido até agora e então me arrisquei a colocar em prática a idéia no torneio nacional de mestres russos. Na seqüência ofereço aos meus leitores uma partida que considero um documento histórico. Eu havia perdido a planilha desta partida, mas a pude recuperar em uma revista de xadrez. Partida 47 Gregory - Nimzovitsch São Petersbrurgo, 1913 Partida de referência do Gambito da Dama

1.d4 Nf6 2.Nf3 e6 3.Bg5 Se 3.c4, teria respondido 3...b6 para dominar de forma permanente a casa d5. 3...h6 4.Bxf6 Qxf6 5.e4 g6 As pretas têm o par de bispos, que tratarão de conservar. 6.Nc3 Qe7! Para poder jogar ...d6 sem ficar exposto ao ataque do adversário com e5, o que abriria linhas de ataque. 7.Bc4 Bg7 8.0–0 d6 9.Qd3 0–0 10.Rae1 a6 11.a4 b6 12.Ne2 A mobilidade do centro das brancas é relativa, pois qualquer avanço seria facilmente neutralizado. Por exemplo: 12.e5 d5!, ou mesmo 12.d5 e5!. 12...c5 Aqui entra em cena um esquema que deverá ficar gravado na mente de todo jogador hipermoderno: a possibilidade de um ataque reiterado contra uma massa de peões. O procedimento é esse: primeiro cortar o fio do avanço ameaçador (coisa que se conseguiu com 6...Qe7!), com o que se transforma a massa em semi-móvel e em seguida 261

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atacá-la, pois como sabemos os alvos imóveis são os ideais para o ataque.

Diagrama VIII – Posição crítica da partida de referência no Gambito da Dama ideal

13.c3 Bd7 14.b3 Era de se considerar 14.Nd2 Bxa4 15.f4, com possibilidades interessantes. 14...Qe8 15.Qc2 b5 16.axb5 axb5 17.Bd3 Qc8! 18.dxc5 dxc5 19.e5 Nc6 20.Bxb5 No caso de 20.Ng3, seguiria 20...b4 21.c4 Be8!, com jogo superior das pretas. 20...Nxe5 21.Nxe5 Bxb5 22.Nf3 Qb7 23.Nd2 Bc6 24.f3 Rfb8 Agora os bispos entram em ação. O resto requer apenas comentários. 25.Ng3 Qa7 26.Rf2 Bd5 27.Kf1 Qa2 28.Qxa2 Rxa2 29.c4 Bd4 30.Rfe2 Bc6 31.Rd1 Rb2 32.Rc1 h5 33.Ke1 Ra8 Ameaça paralisar as brancas por completo com ...Raa2 e se 34.Rb1, então 34...Rxb1+, seguido de 35...Ra1. 34.Nh1 Raa2 35.Nf2 Rxd2 36.Rxd2 Rxd2 37.Kxd2 Bxf2 A vitória não está próxima. As pretas manobram contra c4, reservando-se a possibilidade de penetrar com seu rei (por g3). Mas isso não basta. Devem 262

fazer valer sua maioria de peões, protegendo-se do peão c inimigo que ficará passado. 38.Rb1 Kf8 39.b4 cxb4 40.Rxb4 Ke7 41.Rb8 Bd4 42.Rc8 Bd7 43.Ra8 e5 44.Kc2 Bc6 45.Rc8 Ba4+ 46.Kd3 Bd7 47.Rc7 Kd6 48.Rb7 Bg1 49.h3 h4 50.Rb8 Be6 51.Ra8 Bb6 52.Rh8 Bf2 53.Ra8 Bf5+ 54.Ke2 Bb6 55.Rh8 g5 56.Rg8 f6 57.Rf8 Ke7 58.Rb8 Bd4 59.Rb5 Bg6 60.Ra5 Bf5 61.Ra6 Bc8 62.Rc6 Bd7 63.Ra6 Bc5 64.Kd3 Bf5+ 65.Ke2 e4! No momento certo! 66.Rc6 Bd4 67.Ra6 Be6 68.Ra4 e3 69.Kd3 Bc5 Agora o rei preto se dirige a g3. 70.Ra6 Bxc4+ As brancas abandonaram. 4 – Outras lutas históricas

A partida anterior despertou um grande interesse e muitos colegas, sempre dispostos a imitar as novas idéias, não deixaram escapar a oportunidade de praticar minha inovação no mesmo torneio. Quando Lewitzky perdeu de forma vistosa para Flamberg, os mestres se deram conta de que a aplicação de novos métodos de jogo não é fácil de assimilar, uma vez que exige a devida absorção das idéias intervenientes. Com relação a mim, usei a mesma abertura contra Janowski no torneio de Grandes Mestres de São Petersburgo no ano seguinte, partida que em seus primeiros 18 lances comento também nesse livro. Também adotei a abertura contra o Dr. Bernshtein, com as pretas, cujo desenvolvimento inicial foi o seguinte: 1.d4 Nf6 2.Nf3 e6 3.c4 b6 4.Nc3 Bb7 5.e3 Bb4 6.Qb3 Qe7 7.a3 Bxc3+ 8.Qxc3 d6 9.b4 Nbd7

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A posição das pretas é excelente, com o domínio da grande diagonal b7-e4; por outro lado, a mobilidade do centro das brancas é limitado. 10.Bb2 a5 Isto não está mal, mas era melhor 10...Ne4, seguido de ...f5. 11.Be2 axb4 12.axb4 Rxa1+ 13.Bxa1 0–0 14.0–0 Ne4 15.Qc2 f5 16.Nd2 Nxd2 Aqui era preferível o sofisticado avanço hipermoderno …c7-c5. 17.Qxd2 Ra8 18.Bc3 Qe8 Com 18…Nf6, antecipando-se ao avanço d4-d5, as pretas continuariam bem. 19.d5! e5 Não 19...exd5? devido a 20.Bf3. 20.f4 Bc8 E após uma série de complicações dramáticas a partida terminou empatada. No mesmo torneio até Alekhine adotou minha inovação, ou seja, o Gambito da Dama ideal, conduzindo suas peças a um porto seguro. Não é preciso dizer que isso me causou uma grande satisfação, pois para mim era importante comprovar a correção dos princípios revolucionários. Em seguida comentarei outras partidas históricas. Partida 48 Spielmann - Nimzovitsch San Sebastian, 1911 Defesa Siciliana

Partida modelo sobre o caráter relativamente inócuo da avalanche de peões. 1.e4 c5 2.Nf3 Nf6 Spielmann começou a pensar e após

alguns minutos, quando levantei a cabeça do tabuleiro, vi que o meu querido companheiro de armas estava em um estado de completa perplexidade, totalmente desconcertado. Observava o cavalo e não sabia o que pensar dele. Finalmente jogou tranqüilamente 3.Nc3, descartando a possível caça à raposa que poderia iniciar com 3.e5. No ano seguinte, voltei a jogar 2...Nf6, desta vez com Schlechter. No livro do torneio no qual se jogou essa segunda partida, lemos o seguinte comentário de Tarrasch: “Esse lance não é recomendável, uma vez que o cavalo pode ser atacado de imediato. Por mais que o Sr. Nimzovitsch siga os seus próprios caminhos na abertura, não creio que seja conveniente para o público”. A ironia tem grandes poderes, dentre os quais amargar a vida de jovens de talento. Mas não é capaz de impedir a longo prazo que surjam idéias novas e inovadoras, como aconteceu com as minhas. Os velhos dogmas, como a superada teoria do centro, a adoração pelo jogo aberto e os conceitos puramente formais e irreais ficaram fora de combate. As idéias novas por outro lado, em que pese não serem “recomendáveis para o grande público”, como dizem alguns, transitam com tranqüilidade por um caminho amplo e luminoso. Minha partida com Schlechter teve o seguinte desenvolvimento: 1.e4 c5 2.Nf3 Nf6! 3.e5 Nd5 4.d4. “Por que as brancas não jogaram 4.c4, com o qual o cavalo ficaria em posição desfavorável?”, pergunta-se Tarrasch. No entanto, isso não é correto. Inclusive no caso de 1.e4 Nf6 (Alekhine) 2.e5 Nd5 3.c4 Nb6 263

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4.d4, os avanços sucessivos de peões não fazem outra coisa senão comprometer o jogo das brancas. A partida seguiu: 4...cxd4 5.Qxd4 e6 6.Bc4 Nc6 7.Qe4 d6! 8.exd6 (se 8.Bxd5 exd5 9.Qxd5 dxe5, conservando os bispos e uma maioria compacta de peões) 8...Nf6! 9.Qh4 Bxd6 10.Nc3 Ne5!, e as pretas dispõem de certa liberdade de manobra no centro. 3.Nc3 d5 4.exd5 Nxd5 5.Bc4 e6 6.0–0 Be7 7.d4 Nxc3 8.bxc3 0–0 9.Ne5 Qc7 Agora em breve peões pendentes surgirão do lado das brancas, contra os quais o jogo será direcionado. 10.Bd3 Nc6 11.Bf4 Bd6 12.Re1 cxd4! Essa troca, combinada com …Nb4, é a chave da manobra iniciada com 9...Qc7. 13.cxd4 Nb4 14.Bg3 Nxd3 15.Qxd3 b6 16.c4 Ba6 Apesar da pressão intensa, os peões pendentes conseguiram sobreviver. A posição está equilibrada. 17.Rac1 Rac8 18.Qb3 f6 19.Qa4? Era melhor 9.c5 Bxe5 20.dxe5, que levaria ao empate. 19...fxe5 20.dxe5 Ba3 21.Qxa3 Bxc4 22.Re4 Qd7 23.h3 Bd5 O bispo consolida a sua posição e a vantagem das pretas é evidente. No restante da partida, apenas incluirei comentários. 24.Re2 Qb7 25.f4 Qf7 26.Rec2 Rxc2 27.Rxc2 Qg6 28.Qc3 As brancas não devem abandonar a coluna c, mas no caso de 28.Rc3, seguiria 28...h5! 29.h4 Rxf4. 28...Bxa2! 29.Bh4 Bd5 30.Be7 Re8 31.Bd6 Qe4 32.Qc7 h6 33.Rf2 264

Qe1+ 34.Rf1 Qe3+ 35.Rf2 a5 36.Be7 Qe1+ 37.Rf1 Qe3+ 38.Rf2 Kh8 Frente à ameaça Bf6. 39.Bd8 Qe1+ 40.Rf1 Qe3+ 41.Rf2 Qe1+ 42.Rf1 Qg3 43.Rf2 Rf8 44.Qxb6 Rxf4 45.Be7 a4 Peão passado e ataque de mate. 46.Kf1? Um erro, porém as brancas já estavam perdidas. 46...Qxg2+ As brancas abandonaram. Partida 49 Nimzovitsch - Spielmann San Sebastian, 1912 Defesa Francesa

Partida modelo sobre o tema do sacrifício em função do bloqueio 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.Nf3 Nc6 5.dxc5 Bxc5 6.Bd3 Nge7 7.Bf4! Super-proteção da importante casa estratégica e5. 7...Qb6 8.0–0 Qxb2 Não se pode dizer que seja típico esse sacrifício de peão em altares de ataque. Seu objetivo é manter o ponto forte de e5 como base que justifique ações de bloqueio. Depois da captura, o jogo se faz difícil, pois nele intervêm numerosos fatores, mas o que não se pode negar é que esse esquema se constitui em um feito revolucionário! 9.Nbd2 Qb6 10.Nb3 Ng6 11.Bg3 Be7 12.h4 Também esse avanço não é um lance de ataque, no sentido habitual do termo. Seu significado é: “afaste-se de minha casachave e5”. 12…Qb4 13.a4 a6 14.h5 Nh4 15.Nxh4 Bxh4 16.c3 Qe7 17.Bh2 f5

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Esse lance, que abre linhas para o ataque inimigo, apesar de tudo, deve ser realizado para que se consiga algum espaço. Agora se manifestará o ataque das brancas. 18.exf6 gxf6 19.Nd4 e5 20.Bf5 As brancas desenvolveram um forte ataque e venceram no lance 44: 20...Nxd4 21.Bxc8 Rxc8 22.cxd4 0–0 23.dxe5 fxe5 24.Qxd5+ Qf7 25.Qxf7+ Rxf7 26.Bxe5 Rf5 27.f4 Rxh5 28.Rab1 Be7 29.Kf2 b6 30.Kf3 Rh6 31.Rfd1 Rc4 32.Rd7 Kf7 33.a5 b5 34.Re1 Rcc6 35.Bd4 Rhe6 36.Rh1 h6 37.Rb7 Red6 38.Be5 Re6 39.Ke4 Rc4+ 40.Kf5 Rc5 41.Rd1 b4 42.Rd8 Rxa5 43.Rf8+ Kxf8 44.Kxe6 1–0 Minha partida contra Leonhardt no mesmo torneio seguiu um curso quase idêntico. Nimzovitsch-Leonhardt, San Sebastian 1912 1.e4 e6 2.d4 d5 3.e5 c5 4.Nf3 Posteriormente descobri o lance ainda mais revolucionário 4.Qg4. 4...Qb6 5.Bd3 cxd4 6.0–0 Nc6 7.a3 Nge7 8.b4 Ng6 9.Re1 Be7 10.Bb2 a5 As pretas devolvem o peão. Com 10...a6! teríamos nos encontrado na mesma situação temática, ou seja, o peão de vantagem contra estratégia restritiva. O restante da partida segue como registro. 11.b5 a4 12.Nbd2 Na7 13.Bxd4 Bc5 14.Bxc5 Qxc5 15.c4 dxc4 16.Ne4 Qd5 17.Nd6+ Ke7 18.Nxc4 Qc5 19.Bxg6 hxg6 20.Qd6+ Qxd6 21.exd6+ 1–0 O mesmo tema estratégico, em forma especialmente plástica, também se apresentou em uma partida de 1923.

Diagrama IX - Brinckmann -Nimzovitsch, Kolding 1923 Posição após 19.f4

Na partida Brinckmann-Nimzovitsch, Kolding 1923, chegou-se à posição do diagrama após o lance 19 das brancas. Seguiu: 19...b5!! As pretas sacrificam um peão para conseguir a troca do bispo de d3. Em seguida poderia seguir um bloqueio (mediante o lance ...Nf5). A partida continuou: 20.Bxb5 Rab8 21.Be2 Nb6 Seria mais preciso 21...Ng7 e no caso de 22.h5, então 22...Nb6, seguido da troca em c4 (...Nc4, Bxc4) e a ocupação da casa f5 com o cavalo daria às pretas uma posição vencedora. 22.Kd1 As brancas se salvavam com 22.Bxh5 Nc4 23.Qc2 Nxa3 24.Qd2. 22...Nc4 23.Bxc4 Rxc4 24.Rg5 Ng7 25.h5 Nf5 26.hxg6 fxg6 E as pretas venceram sem maiores dificuldades: 27.Rxf5 exf5 28.Bxa5 Rb3 29.Ke2 Qb7 30.Bb4 Qa6 0–1 265

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5 – Desenvolvimento e consolidação da revolução enxadrística entre 1914 e 1926

Esse tema bastaria para escrever toda uma monografia, mas a falta de espaço nos obriga a uma sábia economia. Em conseqüência, registrarei somente os fatos mais destacados, reservando os detalhes para um pequeno livro posterior. O fato pós-revolucionário mais significativo foi o lance de Alekhine 1...Nf6 em resposta a 1.e4. Não há dúvida de que a idéia que inspira esta inovação não é de todo nova. Em essência, trata-se do caráter inócuo da avalanche de peões, como eu próprio manifestei na linha 1.e4 c5 2.Nf3 Nf6. Mas ainda assim, o lance de Alekhine é surpreendente e é imperioso classificá-lo como brilhante. A tentativa de Réti, imitando meu esquema do centro elástico, também é muito interessante. É provável que após 1.Nf3 d5 2.c4 não seja desfavorável a resposta 2...dxc4. Por exemplo: 3.Na3 c5! (de minha própria colheita) 4.Nxc4 Nc6, com a idéia de colocar os peões em f6 e e5. Também consideramos notável a Defesa Grünfeld: 1.d4 Nf6 2.c4 g6 3.Nc3 d5! 4.cxd5 Nxd5 5.e4 Nxc3 6.bxc3 Bg7, com posterior bombardeio ao centro das brancas, que se iniciará com ...c5. O lance de Sämisch, 7...Ne4, resulta original e engenhoso, embora seja somente um detalhe: 1.d4 Nf6 2.Nf3 e6 3.c4 b6 4.g3 Bb7 5.Bg2 Be7 6.0-0 0-0 7.Nc3 Ne4!. Esse salto madrugador de cavalo tem um caráter anti-clássico bastante notável, ainda que por outro lado tenha encontrado vários imitadores 266

em posições similares, com resultados muito positivos. Com exceção das idéias já discutidas nesse livro, como a super-proteção e profilaxia, nada de novo surgiu entre 1914 e 1926. A tentativa de Tartakower de forjar uma nova idéia revolucionária lamentavelmente fracassou. De todo modo, dado o seu interesse, a comentaremos brevemente. Tartakower considera a luta como uma demonstração de que o jogador hipermoderno pode, a cada instante, considerar os pontos fortes do adversário como debilidades. Assim, “quem tem vontade tem um caminho, a debilidade inimiga”.

Diagrama X - Jacobson-Nimzovitsch, Copenhagen 1923

A partida, a partir da posição do diagrama acima, teve o seguinte desenvolvimento: 34...Bf5 35.Rc1 h5 36.Rc3 a4! 37.Nd1 g5 38.Ne3 Bd7 39.Ke2 f5 40.Kd2 f4 E agora a ala do rei das brancas, que antes parecia tão sólida, se desmorona. 41.gxf4 gxf4 42.Nd1 Kf7 43.Nf2 Rg8 etc. Mas quem leu atentamente esse livro se terá dado conta de que o rei branco padecia de debilidades reflexas. As tropas

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das brancas estavam vinculadas a debilidades (c4 e a2), o que permite opinar que a ala do rei não é segura. A moral da estória é que somente se podem atacar debilidades, por mais que estejam amparadas por muletas. Mas se pode atacar uma debilidade ainda que seja reflexa. Nós, os jogadores hipermodernos, temos que obedecer às leis lógicas, da mesma forma que os jogadores que não o são, com a única diferença de que nós tratamos de insuflar vida nova a dogmas obsoletos. A lógica indica que, para tornar vulnerável a posição adversária, devemos atuar na ala mais fraca. A recomendação “temos que atacar o ponto forte do inimigo” nada mais é do que um erro moderno. Mas o que o jogador deve fazer é ampliar o conceito de debilidade. Um peão, por exemplo, pode estar intacto e ser débil, quando está situado em uma posição má ou se veja afetado por debilidades reflexas, como ocorre no diagrama anterior. Na partida Nimzovitsch-Spielmann (1904), depois de 1.e4 e5 2.Nf3 Nc6 3.d4 exd4 4.Nxd4 Bc5 5.Be3 Qf6 6.Nb5 Bxe3 7.fxe3 Qh4+ 8.g3 Qd8 9.N1c3 a6 10.Nd4 Ne5 11.Bg2 d6 12.0–0 Bg4 13.Nf3 h5? Uma peça forte pode ficar anulada por um defeito da posição, fato que sucedeu às pretas após 13...h5?, pois elas tinham que ter tomado o cavalo das brancas: 13...Bxf3!. Agora as brancas eliminam a peça forte que sustenta a posição do adversário e todo o campo das pretas se vê afetado por debilidades. 14.Nxe5!! Bxd1 Era melhor 14...dxe5. 15.Nxf7 Qe7 16.Nxh8 Bg4 17.Rf7

E o ataque das brancas triunfa. Convém notar que, por lógica, é melhor atacar uma debilidade que por alguma razão se constitua em um ponto nevrálgico da posição inimiga, como por exemplo, a base da cadeia de peões. Chegamos dessa forma ao final da obra, mas antes de nos despedirmos do amável leitor queremos mostrar-lhe uma última partida. Como antecipação de meus propósitos, adianto que em breve publicarei uma coleção de partidas especialmente selecionadas, que servirão de ilustração prática à teoria exposta em Meu Sistema. Partida 50 Nimzovitsch - Olson Copenhagen, 1924 Abertura Holandesa

Nessa partida, sete peões das brancas desenvolvem uma mobilidade coletiva muito maior do que a dos oito peões das pretas. O espírito triunfa sobre a matéria! A expressão mais característica de nossa revolução no tabuleiro reside na vida nova que injeta em dogmas caducos e, uma vez que essa partida é característica, está justificada a sua inclusão em benefício dos nossos leitores. 1.f4 c5 2.e4 Nc6 3.d3 g6 4.c4 Bg7 5.Nc3 b6 6.Nf3 Bb7 7.g4 Pouco a pouco começa a se manifestar a mobilidade coletiva da ala do rei das peças brancas. 7...e6 8.Bg2 Nge7 9.Nb5! Provoca ...a6, pois a não defesa do peão b6 pode ser o motivo de uma combinação enérgica. 9...d6 10.0–0 a6 11.Na3 0–0 12.Qe2 Qd7 13.Be3 Nb4 267

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Se não fosse isso seguiria 14.Rad1 e 15.d4 com vantagem. 14.Nc2! Bxb2 15.Rab1 Bc3 16.Nxb4 Bxb4 Se 16...cxb4, então 17.Bxb6. Recorde-se o comentário ao lance 9 das brancas. 17.Bc1 As brancas arrebataram de seu adversário a grande diagonal de casas pretas. 17...f6 18.Bb2 e5 19.g5 A relação entre sacrifício e bloqueio se manifestaria com 19.f5 g5 20.h4, com um ataque prolongado que compensaria sobejamente o peão de vantagem das pretas. 19...Nc6 Se 19...fxg5 20.Nxg5 (ameaçando Bh3) 20...Nc6 21.f5. 20.gxf6 Qg4 21.fxe5 dxe5 22.Qe3 Qh5 Para defender o peão e5. 23.Ng5 Bc8 24.f7+ Kg7 25.Qf4 Kh6 Lance forçado. 26.Ne6+ exf4 27.Bg7++

Dessa forma me despeço dos meus amáveis leitores.

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Índice de Capítulos Os números se referem às páginas

Parte 1 – Os Elementos Capítulo I – Desenvolvimento, 11 Capítulo II – As Colunas Abertas, 23 Capítulo III – A Sétima e a Oitava Fileiras, 35 Capítulo IV – O Peão Passado, 63 Capítulo V – A Troca, 91 Capítulo VI – Elementos de Estratégia nos Finais, 95 Capítulo VII – A Peça Cravada, 109 Capítulo VIII – O Xeque Descoberto, 125 Capítulo IX – A Cadeia de Peões, 131

Parte 2 – Jogo Posicional 1 – Introdução ao Jogo Posicional e o problema do Centro à Distância, 159 2 – O Peão Dobrado e a Restrição, 185 3 – O peão d isolado e seus descendentes, 211 4 – A Super-proteção, 229 5 – As manobras contra uma debilidade inimiga, 239 Apêndice – Contribuição à História da Revolução Enxadrística, 251

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Índice de Jogadores Os números se referem às páginas

Alapin, 44, 86 Alekhine, 24, 59, 66, 104, 165, 173 Andersson, 248 Bardeleben, von, 128 Barthmann, 235 Becker, 148 Behting, 88 Berger, J., 49, 85 Berndtsson, K., 170 Bernshtein, 42, 93, 193, 194, 220, 262 Billecard, 194 Bjurulf, S. J., 170 Blackburne, 197 Brinckmann, 265 Burn, 246 Capablanca, 103, 168, 182, 196 Cohn, E., 105, 115 Conde Isouard, 112 Druwa, 94 Duque de Brunswick, 112 Duras, 153 Eliasstamm, 43 Enström, R., 248 Fluss, 121 Freymann, von, 89

Giersing, J., 216 Giese, 48, 164 Gottschall, von, 75, 197, 242 Gregory, 261 Grünfeld, 181 Haakanson, 188 Haken, 48 Hansen, 85 Harmonist, 224 Holzhausen, von, 243 Jacobson, 102, 234, 266 Janovsky, 188 Johner, 208 Kalashnikov, W., 240 Kalinsky, 241 Kinch, 216 Kline, 182 Kolsté, Té, 66 Kupchik, 196 Kwdrjawsew, 60 Landau, 60 Lasker, Em.,127, 214, 215, 244, 246 Laue, 231 Lee, 20, 47 Leonhardt, 67, 120, 265 Lövenfisch, 183 Maróczy, 154

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Martínez, 103, 168 Michel, 167, 179, 225 Mieses, 180 Morphy, 112 Nilson, A., 87 Nimzovitsch, 20, 42, 43, 44 (2), 47, 51, 52, 54, 56, 60, 66, 67, 75, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 94, 96, 102, 103, 104, 105, 115, 119, 120, 121 (2), 129, 139, 147, 148, 151, 161, 164, 165, 167 (2), 173, 174, 175, 179, 188 (2), 189 (2), 191, 197 (2), 201, 203, 205, 207, 208, 213, 216, 219, 226, 229, 230, 231, 234, 236, 240, 241, 242, 243, 244, 245, 248, 249, 250, 261, 262, 263, 264, 265 (2), 266, 267 (2) Nisnievitch, 128 Oeberg, O., 248 Olland, 192 Olson, Anton, 267 Opocensky, 151 Paulsen, L., 143, 146 Perlis, 93, 191 Post, 104 Pritzel, 54 Rabinovitsch, 51 Réti, 129, 231 Richter, 223 Rosselli, 93, 189, 207

Rubinstein, 84, 93, 96, 121, 153, 167, 175, 183, 190, 205, 214, 227, 229, 240 Rycknoff, 129 Saëmisch, 52, 189 Salve, 139, 244 Schurig, 231 Seifert, 250 Selesniev, 240 Shoosmith, 201 Spielmann, 103, 190, 230, 263, 264, 267 Süchting, 154 Tarrasch, 49, 56, 85, 114, 143, 146, 147, 180, 215, 223, 224, 235 Tartakower, 129, 181, 219, 225 Taubenhaus, 213, 226 Teichmann, 44, 193, 220, 244, 245 Thomas, 24, 59, 104 Torre, 127 Treybal, 66 Vestergaard, 249 Vidmar, 119 Vliet, van, 46, 203 Yates, 174, 192, 231 Znosko-Borovsky, 46, 227

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