Merece Confiança O Antigo Testamento? Panorama De Introdução. [4ª Edição, 2ª Reimpressão]

Autor: Gleason L. Archer Jr. Com Apêndice Sobre: História da Teoria Documental do Pentateuco A Alta Crítica do Pentateu

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Portuguese Pages 516 [513] Year 1991

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Merece Confiança O Antigo Testamento? Panorama De Introdução. [4ª Edição, 2ª Reimpressão]

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Merece confianca o Antigo Testamento ?

Gleason L Archer, Jr.

Merece Confiança

O ANTIGO TESTAMENTO ?

Merece Confiança

0 ANTIGO TESTAMENTO ? Panorama de Introdução

Gleason L. Archer Jr.

Com Apêndice Sobre: História da Teoria Documental do Pentateuco A Alta Crítica do Pentateuco no Século XX A Autoria do Pentateuco

SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA Caixa Postal 21486 — CEP 04698 São Paulo — SP

Título original: A SURVEY OF OLD TESTAMENT INTRODUCTION-Revised Edition Publicado por Moody Press, Chicago-Illinois, U.S.A. © 1964, 1974

Tradução e Revisão: Gordon Chown

Primeira Edição em Português: 1974 Segunda Edição em Português: 1979 Terceira Edição em Português: 1984 Quarta Edição em Português: 1986 Reimpressão: Outubro 1988 Reimpressão: Agosto 1991

1mpresso nas oficinas da Associação Religiosa 1mprensa da Fé

Direitos para a língua portuguesa adquiridos por SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA Caixa Postal 21486 - CEP 04698 São Paulo - SP

PREFÁCIO O propósito deste PANORAMA DE INTRODUÇÃO AO ANTIGO TESTAMENTO é oferecer um livro didático simples e prático para instruir estudantes de colégios e seminários que não tiveram treinamento anterior na crítica do Antigo Testamento. Ao mesmo tempo, foi planejado para oferecer matéria para discussão dentro deste campo, para ministros e outros estudiosos sérios da Bíblia. Devido à necessidade de se conservar espaço, o autor não fez a tentativa de debater os mais recentes livros e artigos dentro do assunto, preferindo dar-se por satisfeito ao desenvolver aqui os pontos de vista mais representativos e influentes dos líderes reconhecidos no estudo da Introdução do Antigo Testamento. Visando maior clareza, fez-se a tentativa de limitar as discussões às questões principais, tratando destas questões de tal maneira que o principiante possa compreendê-las e apreciá-las. O leitor perceberá que este livro adere consistentemente a um ponto de vista conservador ou evangélico. O autor não pede desculpas por isto, além de esclarecer que é sua convicção pessoal que só o ponto de vista ortodoxo no que diz respeito à Bíblia faz justo juízo do testemunho dado no texto bíblico, só este ponto de vista se condiz com toda a evidência apresentada pelos dados relevantes na sua totalidade. Ao mesmo tempo, um esforço consistente tem sido feito para se tratar com imparcialidade pontos de vista e teorias diferentes, daqueles que optam pela posição liberal ou neo-ortodoxa, apresentando suas premissas e teorias de tal maneira que o leitor possa facilmente compreendê-las e aquilatá-las.

GLEASON'L. ARCHER, Jr.

PREFÁCIO À QUARTA EDIÇÃO EM PORTUGUÊS

Devido à necessidade sentida por algumas pessoas, Edições Vida Nova achou por bem reintroduzir três capítulos que faziam parte da edição original desta obra, colocando-os no final desta edição, sob o título “Apêndice 3”. São eles: Histórico da Teoria Documental do Pentateuco, A Alta Crítica do Antigo Testamento no Século XX e A Autoria do Pentateuco. Os Editores

ÍNDICE Prefácio ...........................................................................................................

5

1. Introdução .......................................................................................................

9

2.

A Inspiração do Antigo Testamento..............................................................

14

PRIMEIRA PARTE

Introdução Geral

3.

Os Manuscritos Hebraicos e as Versões Antigas...........................................

35

4.

A Baixa Crítica do Antigo Testamento........................................................

54

5.

O Cânone do Antigo Testamento..................................................................

69

SEGUNDA PARTE

Introdução Específica

6.

Gênesis (I)......................................................................................................

7.

Gênesis (II)....................................................................................................

113

8.

Êxodo ...........................................................................................................

135

9.

Levítico e Números.......................................................................................

156

10. Deuteronômio..............................................................................................

170

88

11. Josué, Juizes, Rute.......................................................................................

184

12. I e II Samuel, I e II Reis...............................................................................

207

13. Introdução aos Profetas Obadias, Joel e Jonas .........................................

222

14. Amós, Oséias e Miquéias ............................................................................. 246 15. Isaías(I).........................................................................................................

259

16. Isaías(II) ......................................................................................................

274

17. Naum, Sofonias e Habacuque.....................................................................

290

18. Jeremias e Lamentações...............................................................................

298

19. Ezequiel.........................................................................................................

308

20. Daniel (I) ......................................................................................................

319

21. Daniel (II)......................................................................................................

337

22. Livros Históricos Pós-Exilicos: I e II Crônicas, Esdras,

Neemias e Ester............................................................................................

348

23. Profetas Pós-Exílicos: Ageu, Zacarias e Malaquias....................................

369

24. Introdução à Poesia Hebraica .....................................................................

382

25. Salmos...........................................................................................................

389

26. Os Livros de Sabedoria: Jó e Provérbios .................

407

27. Eclesiastes e Cantares de Salomão .............................................................

432

Apêndice

1................................................................................................. 457 2 .............................................................................................. 460 3 ........................................ \ .465

Bibliografia Geral.............................................................................................509 Lista de Abreviaturas....................................................................................... 512 índice de Assuntos......................................................................................... 513 ILUSTRAÇÕES

Equipamento antigo de escrita do Egito .............................................................

19

Rolo de Isaías ......................................................................................................... 37 Professor Baker cortando o Rolo de Cobre ........................................................

40

Fragmentos da Épica de Criação Babilônica........................................................

92

Um “Selo da Tentação”.......................................................................................

114

Décima primeira placa da epopéia de Gilgamés.................................................

116

Estatuetas de soldados egípcios, de túmulos egípcios ....................................

140

O Código de Hamurabi .......................................................................................

174

Duas das Cartas de Amarna..................................................................................

190

Touro de Pedra, do palácio de Sargão II ...........................................................

216

Relevo do palácio de Assurbanípal.....................................................................

239

Prisma de barro, do palácio de Senaqueribe......................................................

276

Uma das Cartas de Laquis.....................................................................................

304

Leão em tijolo esmaltado, da Babilônia.............................................................. 322 Capitel em forma de touro, do palácio de Susã.................................................

363

1 INTRODUÇÃO O Escopo da Introdução. A BÍBLIA SAGRADA não se assemelha a nenhum outro livro no mundo inteiro. É o único livro que se apresenta como sendo a revelação escrita do único Deus verdadeiro, visando a salvação do homem, e que demonstra sua autoridade divina por meio de muitas provas infalíveis. Outros documentos religiosos, tais quais o Alcorão maometano, podem se declarar ser a própria palavra de Deus, mas não contêm as provas de autenticidade que há na Bíblia (por exemplo, o fenômeno de profecias cumpridas). Sendo o registro da santa vontade de Deus para o homem, a Bíblia tem a máxima importância para esclarecer corretamente o sentido verdadeiro das revelações que ela mesma contém. Não seria certo interpretar as palavras das Escrituras como se tivessem sido dadas em nossa época moderna, endereçadas às pessoas da língua portuguesa enfrentando problemas do século vinte. Não há dúvida: a Bíblia de fato traz para nós hoje a mensagem de Deus, e é tão relevante para nós hoje como era relevante para os hebreus da antiguidade. Mas a forma de ser entregue aquela mensagem era uma forma hebraica antiga, e em primeira instância, a mensagem se dirigia a pessoas que enfrentavam as questões e circunstâncias específicas da sua própria época. Não podemos entender os princípios subjacentes e permanentes contidos nestas antigas declarações da parte de Deus, sem, em primeiro lugar, tomar conhecimento dos problemas e desafios com os quais se confrontava o povo de Deus na geração na qual Ele lhe falou. A Introdução ao Antigo Testamento é o termo que se aplica ao estudo sistemático do pano de fundo antigo dentro do qual se deve entender os primeiros trinta e nove livros da Bíblia de forma cor-

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MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO

reta. Trata de assuntos de linguagem, costumes e situações históricas, trata das pessoas, dos lugares e dos acontecimentos aos quais os vários livros da Bíblia fazem alusões, No seu escopo total, abrange os seguintes ramos de estudo: 1. As línguas nas quais o Antigo Testamento originalmente foi escrito, a saber, o hebraico e o aramaico, juntamente com as línguas semíticas cognatas (tais como árabe, assírio, fenício, ugarítico e siríaco), que nos ajudam a entender o significado das palavras empregadas no texto bíblico. 2. A história do povo hebreu e dos países vizinhos com os quais tiveram contatos. 3. A religião e a cultura destas nações não-hebraicas, conforme se nos revelam os antigos autores pagãos, e as descobertas da arqueologia moderna. 4. A autoria dos vários livros da Bíblia, sendo que a questão sobre quem escreveu o livro tem muito a ver com seu significado e com a confiança que se pode depositar nele. 5. A data, ou pelo menos o tempo aproximado, quando cada livro foi composto — sendo que isto frequentemente nos dá uma pista quanto às questões com as quais se confrontava o povo de Deus quando Ele lhes falou. 6. A situação histórica e os problemas contemporâneos com os quais tratavam os autores divinamente inspirados, como portavozes de Deus. 7. O texto original de cada livro, conforme existia antes que lapsos de pena ou outros erros de copistas pudessem ter sido introduzidos na forma do texto que foi preservada até nossos dias. (Isto é conhecido como: a crítica textual). 8. A integridade do texto, isto é, a questão se cada livro foi integralmente elaborado pelo autor que é considerado o do livro no seu todo, ou se as escritas de outros autores se combinavam com o livro original. 9. A história da transmissão do texto, isto é, a maneira pela qual cada livro foi copiado e passado adiante nas várias famílias de manuscritos, e traduzido para as várias línguas antigas dos povos aos quais chegaram o judaísmo e o cristianismo no decurso dos séculos subseqüentes, até que finalmente o próprio texto hebraico (e suas várias traduções em grego, latim, siríaco etc.) chegassem a ser colocados na forma impressa depois da invenção da máquina de impressão.

INTRODUÇÃO

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Como regra geral, as primeiras três divisões da Introdução que acima se descrevem, são debatidas em cursos separados de língua e de história, enquanto a Introdução ao Antigo Testamento como matéria acadêmica se restringe às seis últimas divisões. Além disto, dentro desta Introdução propriamente dita existe duas subdivisões principais: a Introdução Geral e a Introdução Especial. A Introdução Geral trata de assuntos do texto (tanto na língua original na qual foi composto, como nas versões antigas às quais o texto primeiramente se traduzia). Trata também do Cânon, isto é, a questão sobre quais livros eram verdadeiramente inspirados e autoritativos, e o período aproximado da história no qual foram reconhecidos como tais pelo povo de Deus. Dá contas da origem e do alcance do cânon, e da ordem e da preservação dos livros que o compõem. Sendo que a questão da data e da autoria do Pentateuco (os cinco livros de Moisés), é tão profundamente vinculada à teoria do cânon, usualmente se inclui no campo da Introdução Geral. Quanto à Introdução Especial, trata dos livros individuais do Antigo Testamento um por um, descrevendo sua autoria, sua data, seu propósito e sua integridade. Pode também debater a estrutura em geral, e a mensagem básica de cada livro, embora que um tratamento detalhado do seu conteúdo pertença mais a um curso de panorama bíblico do que à Introdução. O Relacionamento entre o Antigo Testamento e o Novo.

Os autores do Novo Testamento consideravam os livros do Antigo Testamento (“a Lei e os Profetas”) como sendo uma unidade composta única (“a Escritura”), em última análise sendo da autoria do próprio Deus, apesar de ter sido escrita por intermédio de autores humanos que registraram a verdade sob a infalível orientação divina (cf. G1 3:8; 2 Pe 1:20). Os apóstolos inspirados consideravam que a intenção do Autor divino das Escrituras hebraicas era o que mais importava; a intenção do autor humano era meramente algo subordinado. Poderia até acontecer que o autor humano de uma profecia do Antigo Testamento não entendesse o pleno significado daquilo que escrevia, embora que suas palavras exprimissem literalmente o propósito do Autor divino que o inspirou (veja 1 Pe 1:10,11). Os escritores do Novo Testamento viam as Escrituras hebraicas inteiras como sendo um testemunho a Cristo Jesus, o Homem que cumpriu toda a Lei; o Sacrifício e o Sumo Sacerdote das ordenanças rituais; o Profeta, Sacerdote e Rei anunciado de antemão pelos profetas; e o Esposo descrito nos

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MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO

livros poéticos. Perceberam o significado profético até nos acontecimentos históricos registrados no Antigo Testamento. Assim, a travessia do Mar Vermelho prenunciava o batismo cristão (1 Co 10:1,2); a conquista de Canaã, levada a efeito por Josué, prefigurava o descanso espiritual no qual os cristãos entram pela fé, (Hb caps. 3 e 4); a chamada de Israel para sair do Egito era uma sombra da experiência do Menino Jesus (Mt 2:15). Em geral, podemos dizer que o Antigo Testamento apresentava a preparação da qual o Novo Testamento foi o cumprimento; era a semente e a planta da qual o Novo Testamento era o fruto glorioso. Precisamente porque Jesus de Nazaré cumpriu tudo aquilo que o Antigo Testamento predisse, Sua vida e seus atos possuíam uma finalidade absoluta, muito diferente do caso de ele ser um mero sábio religioso como muitos outros. Por este motivo também, o Evangelho de Cristo possui uma validade que o distingue de todas as religiões feitas pelos homens. O Antigo Testamento demonstra que Jesus e sua Igreja eram providenciais, a concretização do propósito de Deus; o Novo Testamento comprova que as Escrituras hebraicas constituíam um organismo coerente e integrado, focalizando um único tema grandioso, e exibindo um programa único de redenção. A Família Semítica de Línguas.

Assim como é verdade que a língua grega impôs seu carimbo sobre a revelação do Novo Testamento, e sobre a terminologia na qual a mensagem se exprimia, assim também é verdade que o gênio da língua hebraica determinou o moda de expressar a mensagem do Antigo Testamento. Fazia muita diferença o fato que o grego era exato em exprimir valores em termos de tempo, e que o hebraico enfatiza, principalmente, modos de ação mais do que tempos do verbo. A interpretação adequada da revelação do Antigo Testamento exige um perfeito domínio destes traços peculiares do verbo hebraico e da sintaxe hebraica em geral; senão, surgirão muitos mal-entendimentos das Escrituras, e muitos textos distorcidos. A língua hebraica, de modo consideravelmente generalizado, tinha estas características gramaticais e sintáticas em comum com as demais línguas semíticas. É portanto, de grande importância examinar estas línguas relacionadas com o hebraico, para derivar delas a luz que lançam sobre o estilo hebraico. Além disso, no assunto de vocabulário o estudo das línguas semíticas comparadas é da máxima significação. Frequentemente acontece que uma pala-

INTRODUÇÃO

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vra que só ocorre uma ou duas vezes na Bíblia hebraica, surge como palavra bem comum nalgumas das línguas relacionadas, e pode ser interpretada, com alto grau de exatidão, ao ser comparada com elas. A classificação tradicional das várias línguas semíticas as divide, de acordo com a situação geográfica das nações onde são faladas, em norte, sul, leste e oeste. O Semítico Oriental inclui só uma língua principal, o acadiano, que se divide nos dialetos ligeiramente diferentes do babilônico e assírio. O Semítico Meridional inclui o árabe (que se divide em árabe setentrional, a língua clássica e literária, e árabe meridional com seus sub-dialetos: sabeano, mineano, catabaniano e hadramautiano) e o etiópico (ou Geez), com seu descendente moderno, o amarico. O Semítico Setentrional abrange a família do aramaico, que usualmente se divide entre duas ramificações, a oriental e a ocidental, sendo que a língua siríaca da era cristã é oriental, e a ramificação ocidental é a base do aramaico bíblico que se acha em Daniel e Esdras. O Semítico Ocidental (freqüentemente classificado junto ao aramaico, numa divisão chamada Semítico do Noroeste pelos estudiosos modernos), inclui o ugarítico, o fenício e o cananítico (dialetos do qual são o hebraico e o moabítico). Línguas não-semíticas que exerceram alguma influência sobre a língua hebraica são a língua hamítica do Egito (há, porém, alguns estudiosos que vêem até no egípcio algum relacionamento primitivo ao grupo semítico de línguas); o sumeriano, a fala aglutinativa (sem relacionamento com qualquer outra língua conhecida) da raça antiga, não-semítica, que conquistou e civilizou a Mesopotâmia Baixa, antes dos babilônios; e a língua persa, distantemente relacionada com o grego, da família indo-iraniano. Todas estas línguas contribuíram com uma pequena porcentagem de vocabulário à língua hebraica.

2 A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO Antes de começar um estudo do Antigo Testamento pela alta critica, é-nos apropriado confrontar com a questão básica: que tipo de livro é? Se é meramente um produto do gênio humano,; como muitos outros documentos rios quais têm-se fundamentado várias religiões, então os dados que apresenta precisam ser tratados de uma maneira específica. Isto é, estas escritas sagradas precisam ser aquilatadas em termos puramente literários, e explicações naturalísticas precisam ser achadas para cada aspecto que parece ser sobrenatural (como por exemplo o cumprimento de profecias). Se, de outro lado,os trinta e nove livros do Antigo Testamento são inspirados por Deus, èmpregando instrumentos humanos para registrar a verdade que Ele revelou ao homemi então os dados precisam ser tratados de maneira bem diferérite. Isto quer dizer, que tudo aquilo que possa parecer inconsistente com aquele padrão de exatidão e de veracidade que a inspiração divina pressupõe,1 precisa ser investigado com grande cuidado para se chegar a uma reconciliação satisfatória daquilo que parece ser discrepância. A linha inteira da investigação é, portanto, profundamente influenciada pela premissa com a qual começamos. Evidência em prol da Inspiração Sui-Gêneris da Bíblia

Este não é o lugar para iniciar-se uma discussão completa das evidências cristãs, pois esta seria a área dos livros sobre a apolo1. Permanece porém, uma terceira possibilidade: que -Deus determinou manifestar Sua verdade através duma revelação imperfeita, na qual a verdade misturou-se com o erro.: Mas este tipo de revelação seria inútil, porque exigiría um juízo humano infalível para distinguir a verdade do erro. Ver a seção intitulada “Inerrância dos Autógrafos Originais” neste capítulo.

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A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO

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gética. Não deixa porém, de ser apropriado sugerir aqui, pelo menos de maneira superficial, por que é correto e razoável começar com a premissa de que o Antigo Testamento é uma coletânea de livros inspirados por Deus. Em primeiro lugar, há uma unidade significante que subjaz a coletânea inteira dos trinta e nove livros do Antigo Testamento, revelando uma interconexão orgânica que se impõe no decurso dos muitos séculos que sua composição levou. Estes livros exibem uma unidade marcante de propósito e de programa, que se explica da maneira mais satisfatória como sendo a operação de uma mente única, a mente do próprio Autor divino. (Um debate clássico deste aspecto das Escrituras se acha no segundo capítulo do livro de James Orr: The Problem of The Old Testament — “O Problema do Antigo Testamento”. Apesar de o livro ser antigo, publicado em 1907, a linha de argumentação de Orr nunca foi refutada com sucesso, e permanece válida hoje).2 Em segundo lugar, de todas as religiões universais, só a hebréiacristã oferece uma epistemologia (ou ciência de conhecimentos religiosos) logicamente defensível. O resultado final de quatro mil anos de investigação humana e pesquisa filosófica tem sido de desesperado desacordo e confusão na área inteira da religião, exceto na própria Bíblia. Alguns teoristas insistiram que se deve fabricar um sistema de ética com um vago teísmo, que chamaram de religião mundial. Mas o fato é que as tensões entre o cristianismo, o judaísmo, o hinduísmo, o budismo e o maometismo são tão marcantes como sempre têm sido, só que se emprega hoje maneiras mais brandas de propagação e de defesa do que em épocas anteriores. Ainda dão respostas inteiramente diferentes à pergunta: Que preciso fazer para ser salvo? Contraste-se a situação que impera nos campos da medicina e da ciência. Os muitos séculos de experiências e pesquisas tiveram 2. Naturalmente, é possível tratar os escritos do Antigo Testamento de maneira disseccionista artificial, nos interesses duma teoria de fontes diversas e de autoria conglomerada. Quem se responsabilizou por tais teorias não tem a obrigação de interpretar textos à luz do seu contexto e pano de fundo gerais, mas pelo contrário, pode torcer a interpretação até achar discordâncias e discrepâncias entre as fontes. Pode descobrir assim, pontos de vista divergentes e inconsistências em qualquer obra, que nunca feriam ocorrido à mente dum leitor sem preconceitos, que apenas lê o livro para entender sua mensagem. Mas até o disseccionista dogmático precisa reconhecer afinal, que na forma das Escrituras hebraicas que chegaram até nós, há pouquíssima diferença, se é que há alguma, entre o conceito de Deus e a aliança que aparece na última parte do Antigo Testamento, e o que aparece nas primeiras seções escritas. Não pode haver dúvida que, do ponto de vista de Cristo e dos Apóstolos do Novo Testamento, o Antigo Testamento inteiro representava uma unidade só, falando com uma única voz — “A Escritura Sagrada”.

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como resultado o acordo geral entre todas as nações civilizadas quanto às leis básicas da física e da química. É verdade que a emergência de novos dados toma necessário a revisão constante das teorias e conclusões que os cientistas publicam ano após ano, mas de modo geral o mundo científico permanece substancialmente de acordo, no mundo inteiro. No caso da religião, porém, que trata das questões que são da máxima importância para a raça humana, não apareceu nenhum consenso de opinião. Freqüentemente acontece que dois homens, criados como irmãos no mesmo ambiente do lar, gozando dos mesmos privilégios educacionais, e possuindo o mesmo grau de inteligência, tenham pontos de vista religiosos que são diametralmente opostos entre si. Se fosse possível aos recursos do raciocínio humano e da pesquisa científica levar a resultados válidos no campo da metafísica, então homens de igual educação e esclarecimento chegariam decerto a certa medida de concordância (como é o caso da filologia ou da ciência). Nada, porém, estaria mais longe de ser a verdade no que diz respeito à religião. Dificilmente estaríamos mais perto de um acordo hoje do que estavam nossos antepassados há quatro mil anos; talvez estejamos ainda mais longe, pois o naturalismo ateu não tinha sido inventado nos primórdios da antiguidade. A conclusão lógica é que a investigação humana, mesmo com a metodologia científica mais cuidadosa, chegará a nada mais sólido do que meras conjeturas quando se trata de assuntos da alma e do significado da vida. O homem com suas próprias buscas não consegue achar Deus; o melhor que pode fazer é conjeturar. Como, então, podemos conhecer a Deus, ou saber Sua vontade para nossas vidas? A menos que Ele próprio Se nos revele a nós! Se Ele próprio não nos informa, nunca poderemos saber com certeza as respostas às perguntas que a nós, como seres humanos, mais nos importam. Aqui é importante ressaltar que a Bíblia se nos apresenta como sendo a revelação escrita de Deus. Pretende ser o livro no qual Deus nos dá as respostas às grandes perguntas que preocupam nossa alma, questões que toda a sabedoria e a ciência dos homens é incompetente para solucionar com qualquer grau de certeza. A Bíblia declara acerca de si mesma que é a revelação especial de Deus; temos portanto que reconhecer que reivindica ser o verdadeiro tipo de fonte de onde se deriva um conhecimento de verdade religiosa digno de confiança.3 Chega às nossas mãos com 3. Não há dúvida que há algumas outras escrituras religiosas que fazem a mesma reivindicação acerca de si mesmas, tais como o Corão e o Livro de Mórmon.

A in spe r a ç a o d o a n t ig o t e st a me n t o

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a asserção que as palavras vêm do próprio Deus: "Assim diz o Senhor”. Se Deus existe, e se se preocupa pela nossa salvação, esta é a única maneira (fora de uma revelação divina direta a cada indivíduo de cada geração sucessiva) que poderia, de maneira certeira, transmitir este conhecimento para nós. Tem que ser através de algum registro escrito, exatamente aquilo que a Bíblia é, segundo seu próprio testemunho.4 A Infalibilidade dos Autógrafos Originais

Precisamos, como próximo passo, levantar a pergunta: que tipo de registro este há de ser? Um contendo erros de vários tipos, ou um registro livre de qualquer erro? Se esta revelação escrita contém erros, então dificilmente poderá cumprir seu próprio propósito, o de transmitir aos homens de maneira digna de confiança, a vontade de Deus para a sua salvação. Por que é assim? Porque um erro comprovado numa parte faz surgir a possibilidade de haver erros em outras partes da Bíblia. Se a Bíblia, sob exame, acaba sendo uma mistura de verdade e erro, então fica sendo um livro como qualquer outro. Sem dúvida, há verdades em todos os demais documentos religiosos conhecidos aos homens: o Alcorão, os Vedas, os Upanichades, os Analetas, a Ilíada e a Odisséia, muito embora que esta verdade possa coexistir com uma abundância de erros. O que se deve fazer Deve-se reconhecer, porém, que estes documentos não possuem as credenciais que autenticam a Bíblia como registro verdadeiro da revelação divina. Mais notavelmente, falta-lhes a validez que se comprova pela profecia anterior e seu subseqüente cumprimento, e pela presença em todas as suas partes do Redentor humapo e divino. O Livro de Mónnon é enfraquecido por muitas inconsistências e inexatidões; o Corão, que alegadamente foi ditado de um arquétipo coeterno com Alá, exibe não somente os mais estranháveis erros históricos, mas também pontos de vista mutáveis dum autor humano (Maomé), à luz dos acontecimentos do seu dia. Não há comparação entre a Bíblia e estes outros livros quando se trata da grandeza e da clareza dos pensamentos que transmite, e do poder que exibe ao penetrar na alma humana com consequências que transformam vidas. 4. O que se pode dizer acerca da tradição oral? Não há a possibilidade de a verdade infalível de Deus ter sido transmitida de boca a boca durante sucessivas gerações? Sim, pode ter acontecido assim, e não há dúvida que algumas porções da Bíblia foram conservadas assim até chegar à sua forma autoritativa e final, por escrito. Mas a tradição oral é necessariamente instável de natureza e sujeita a alterações por causa do fator subjetivo: a memória incerta do guardião daquela tradição. O legado da fé foi transmitido oralmente durante os milênios desde Adão até Moisés, na sua maior parte, mas a forma final escrita, lavrada por Moisés, deve ter sido especialmente supervisionada pelo Espírito Santo, para assegurar sua divina veracidade. As próprias Escrituras dãc considerável ênfase ao seu estado escrito, e raramente imputam divina veracidade a mera tradição oral. Embora seja verdade que as palavras pronunciadas por Moisés, os profetas, Jesus e os apóstolos fossem divinamente autorizadas desde o momento de terem sido pronunciadas, não havia outra maneira de conservá-las com exatidão a não ser pela escrituração (i.e., registrando-as por escrito sob a orientação do Espírito Santo).

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MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO

com livros deste tipo, que contêm verdades e erros? A única coisa que se pode fazer é sujeitá-lo à faculdade crítica do raciocínio humano. Dentro dos seus limites apropriados, bem entendido, o poder de raciocínio do ser humano tem uma função legítima e necessária em aquilatar as evidências apresentadas nestes documentos, para descobrir se são consistentes com a alegada origem divina. Neste caso, é uma questão de reconhecer a identidade daquilo que se apresenta como sendo uma revelação, averiguando se é a palavra de Deus ou não. O raciocínio humano é competente, aplicando-se as regras de contradições internas e os demais cânones da lógica, para julgar as evidências, para determinar se os próprios textos e osdados ali registrados se condizem com as reivindicações da sua origem divina. (Já foi demonstrado na Nota 3 que só a Bíblia, em contraste com os demais documentos religiosos, contém evidências decisivas de inspiração e autoridade divinas). Mas é coisa bem diferente quando o raciocínio humano quer emitir seu julgamento sobre a revelação divina como tal, para determinar sua veracidade ou falsidade. Tais julgamentos só poderíam ser válidos se quem julga possui um conhecimento de verdade metafísica que é superior àquele da própria revelação. Noutras palavras, o homem precisaria saber mais sobre Deus e a alma e valores espirituais se quisesse emitir um juízo válido quanto às verdades da Bíblia. Mas isto obviamente não é o caso, conforme foi indicado previamente, e por isto mesmo, o homem depende totalmente da revelação divina para receber este conhecimento tão importante. Per este motivo, a única maneira pela qual esta revelação pode chegar ao homem numa forma que possa ser empregada e merecedora de confiança, sem ter que depender da exatidão do julgamento humano tão falível, seria como revelação infalível. Senão, não podería cumprir seu propósito de ser a manifestação, digna de confiança, da verdade divina.

A Transmissão do Texto não é Necessariamente Infalível Neste ponto precisamos fazer uma distinção. A infalibilidade (ou a isenção de todo erro) só se reivindica necessariamente para os manuscritos originais (os autógrafos) dos livros bíblicos. Forçosamente, eram isentos de todo e qualquer erro, senão, não poderíam ter sido inspirados por Deus, o Deus da verdade, pois n’Ele •não há treva nenhuma. Deus nunca podería ter inspirado um autor humano das Escrituras a escrever algo errado ou falso.5 5. Pode ser levantada a dúvida quanto à infalibilidade das fontes das quais foram copiadas as narrativas bíblicas (tais como as tabelas genealógicas em Gênesis e Crô-

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A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO

Equipamento antigo de escrita do Egito. Escritores bíblicos podem ter empregado algo semelhante

(Cortesia do Museu Britânico)

Mas, que se pode dizer do texto da Bíblia, conforme o possuímos agora? Será que o texto é necessariamente livre de todos os nicas). Se foram consultados arquivos dos templos e registros dos palácios (como era o caso, sem dúvida), e se estes registros foram feitos por homens não inspirados (que provavelmente era o caso), por que não podemos limitar a idéia da infalibilidade das Escrituras à mera exatidão em registrar o arquivo humano, seja sem erros, seja com erros? Noutras palavras, não é possível a presença de erros inspirados nas Escrituras? Esta pergunta deve ser respondida através duma outra: qual é a diferença entre o registro humano falível, e um ser humano que fala de maneira falível? Se as palavras escritas de homens podem ter sido recebidas nas Escrituras, apesar de serem erradas, então, certamente, é lógico que suas palavras faladas podem ter sido aceitas da mesma forma? Quem pode supor que tudo quanto foi falado por Moisés ou Isaías ou Malaquias foi livre de qualquer erro? Não é verdade que apenas ao pronunciar a Palavra do Senhor é que eram infalíveis?; Enquanto Deus fazia uso das suas comunicações orais para revelar Sua verdade, salvaguardando-as do erro até serem registradas por escrito, assim também Deus podia tomar os arquivos humanos, guiando o autor humano a evitar todos os seus erros e escolher apenas aquilo que era a perfeita verdade. Tudo quanto as Escrituras definem como sendo historicamente verdadeiro, sem levar em conta qual foi a fonte da informação, deve ser aceito como sendo digno de confiança. Não faz qualquer diferença essencial se a fonte foi oral ou escrita, vindo duma boca humana falível, ou duma pena humana falível; em qualquer caso, o Espírito Santo eliminava os erros e garantia que só a verdade fosse escriturada. Todas as discrepâncias que vieram até nós no texto tradicional das Escrituras hebraicas se explicam perfeitamente pelos erros na transmissão textual posterior. Não há qualquer necessidade de se apelar a uma teoria de erros já presentes dentro dos autógrafosjoriginais, e assim minar a doutrina da veracidade das Escrituras tomadas em conjunto. !

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erros, de qualquer tipo? Não quando se trata de erros de copistas, pois realmente descobrimos discrepâncias entre as cópias manuscritas que têm chegado até nós, mesmo entre aquelas que datam dos primeiros séculos. Alguns erros de pena decerto se introduziram nas primeiras cópias feitas dos manuscritos originais, e erros adicionais típicos da transmissão do texto conseguiram entrar nas cópias das cópias. É quase inevitável que isto tenha sido o caso. Não há nenhum homem que pode sentar-se e copiar o texto de um livro inteiro sem surgir algum erro de algum tipo. (Quem duvida desta declaração, pode fazer a experiência!). Seria nada menos do que um milagre, garantir a infalibilidade da cópia de um manuscrito original. Aceitando-se o fato que erros se infiltraram em nossos textos conforme os temos em mãos, como podem servir como meio certeiro de desvendar a vontade de Deus? Será que não voltamos ao problema dos livros que contêm uma mistura de verdade e de erro? De modo nenhum, pois há uma grande diferença entre um documento que era errado desde o princípio, e um documento que começou correto mas que depois foi erroneamente copiado. Qualquer pessoa pode ler uma carta de um amigo ou parente, e achar nela errinhos comuns como “em” no lugar de “um”, “por’ no lugar de “para”, e pode, por meio de um processo simples de correção a luz do contexto, facilmente chegar ao verdadeiro sentido daquilo que o autor queria dizer. Só se os erros que entraram no texto são tão sérios que pervertem totalmente o sentido, é que a mensagem desvia-se da verdade. Mas se a carta chegou da parte de um correspondente, que estava confuso, errado ou desejando iludir, então os erros e as falsas informações que contém seriam irremediáveis, e o leitor seria prejudicado por ela. Isto levanta a questão da fidelidade da transmissão do texto bíblico. Há numerosos tipos de erros de manuscrito que o crítico textual pode descobrir nos manuscritos antigos do Antigo Testamento. (Estes serão discutidos no capítulo quatro). Eles são de natureza tão séria que corrompem a própria mensagem, impossibilitando-a de transmitir o verdadeiro significado? Se são, então o propósito de Deus foi frustrado: não conseguiu transmitir Sua revelação de tal maneira que pessoas de gerações posteriores pudessem compreendê-la corretamente. Se não exerceu Sua influência restritiva sobre os escribas que escreveram as cópias normativas e autorativas das Escrituras, então corromperam e falsificaram a mensagem. Se a mensagem foi falsificada, o propósito inteiro de doar à humanidade uma revelação escrita deu em nada, pois Es-

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crituras assim corrompidas seriam uma mera mistura de verdade e de erro, necessariamente sujeitas a julgamentos humanos (quando, de fato, devem julgar o homem).

• Temos alguma evidência objetiva que Deus não tenha permitido que os erros da transmissão do texto tenham corrompido e pervertido sua revelação? Sim, temos, pois um estudo cuidadoso das variações (ou leituras diferentes) dos vários manuscritos mais antigos, revela que nenhuma delas afeta uma única doutrina das Escrituras. O sistema de verdades espirituais, contido no texto geralmente aceito do Antigo Testamento em hebraico, não se altera nem se compromete por nenhuma das variações que têm sido achadas nos manuscritos hebraicos de data mais antiga que foram descobertos nas cavernas do Mar Morto ou em outros lugares. Para averiguar isto, basta examinar o registro das variações bem atestadas que constam na edição de Rudolfo Kittel da Bíblia hebraica. É muito evidente que a vasta maioria delas são tão insignificantes que o sentido da doutrina de cada frase não sofreu qualquer efeito. Deve ser claramente entendido que neste respeito o Antigo Testamento é diferente de qualquer outra obra literária antes da era cristã sobre as quais temos notícia. É verdade que normalmente não possuímos tantos manuscritos diferentes de produções pagãs, vindos de épocas tão separadas no tempo, como é o caso do Antigo Testamento. Mas quando temos muitos manuscritos, como é o caso do Livro dos Mortos, do Egito, então as variações são de natureza mais extensiva e séria. Diferenças bem marcantes aparecem, por exemplo, entre o capítulo 15 no Papiro de Ani, escrito durante a 18.a Dinastia, e o Papiro de Turino, da 26.a Dinastia ou posteriormente. Cláusulas inteiras são inseridas ou omitidas, e o sentido, em colunas correspondentes do texto, em certos casos é inteiramente diferente. Se não houvesse a superintendência divina da transmissão do texto hebraico, não há nenhum motivo específico de não haver semelhantes discrepâncias e mudanças entre os manuscritos hebraicos que têm séculos de diferença entre eles., Posto que as duas cópias de Isaías descobertas na Cayerna N.° 1 de Qumran, perto do Mar Morto, em 1947 eram mil anos mais antigas do que o mais antigo manuscrito datado, previamente conhecido (980 d.C.), foi constatado que eram idênticos, palavra por palavra, à nossa conhecida Bíblia hebraica, em mais do que 95% do texto. As variações, em 5%, consistem mormente de óbvios erros de pena e variações na ortografia. Mesmo aqueles fragmentos de Deuteronômio

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e de Samuel achados perto do Mar Morto, que apontam para uma outra família de manuscritos do que aquela que subjaz nosso texto hebraico aceito, não indicam qualquer diferença em doutrina ou em ensinamentos. Não afetam a mensagem da revelação de maneira nenhuma. 5 •

O Doutrina da Inspiração Afirmada pelas próprias Escrituras

Reivindica a Bíblia infalibilidade para si mesma? Às vezes tem sido levantado o argumento de que as próprias Escrituras não reivindicam sua própria infalibilidade. Mas a investigação cuidadosa demonstra que quando o assunto é ventilador assevera-se o fato de sua absoluta autoridade como sendo a infalível Palavra de Deus.j Mateus 5:18: “Porque em verdade vos digo: Até que o céu e a terra passem, nem um i (a letra menor do alfabeto hebraico) ou um til (um traço que faz a distinção entre certas letras hebraicas) jamais passará da lei (isto é, o Antigo Testamento) até que tudo se cumpra” — palavras de Cristo. Isto indica que não somente os pensamentos transmitidos pelas Escrituras, mas as próprias palavras individuais, como veículos válidos destes pensamentos, e conforme sua própria soletração, são dotadas de verdade infalível, e seguramente serão cumpridas e realizadas. João 10:35: “. . .e a Escritura não pode falhar”, tem as mesmas implicações do versículo supra citado. 2 Timóteo 3:16: “Toda Escritura é inspirada por Deus (theopneustos) e útil para o ensino”. Do contexto do Novo Testamento pode ser facilmente estabelecido que a palavra “escritura” (graphê) se refere ao Canon inteiro dos trinta e nove livros do Antigo Testamento, conforme hoje os temos em mãos. 2 Pedro 3:16 dá a entender que as Epístolas neotestamentárias de Paulo também gozam da mesma situação de Escrituras inspiradas (graphai). Hebreus 1:1,2: “Havendo Deus ... falado... pelos profetas... nos falou pelo Filho”. Estas palavras reivindicam para os escritos dos profetas do Antigo Testamento a mesma infalibilidade que pertence às mensagens do próprio Cristo, registradas no Novo Testamento. 1 Pedro 1:10,11: “Foi a respei ter desta salvação que os profetas (do Antigo Testamento) indagaram e inquiriram, os quais profetizaram acerca da graça a vós outros destinada, investigando atentamente qual a ocasião ou quais as circunstâncias oportunas, in-

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dicadas pelo Espírito de Cristo, que neles estava, ao dar de antemão testemunho sobre os sofrimentos referentes a Cristo, e sobre as glórias que os seguiríam”. Está implícito aqui que o Espírito Santo estava nos autores do Antigo Testamento, e que Ele os guiou para que compusessem palavras de verdade infalível cujo cumprimento era garantido, ainda que os autores humanos não entendessem plenamente tudo aquilo que as palavras divinamente orientadas realmente significassem. Por causa de versículos como estes, precisamos, ao interpretar as Escrituras, procurar estabelecer não somente a intenção do autor humano que escreveu as palavras, mas também (e mais importante) a intenção do Autor divino que orientou a composição das mesmas. 2 Pedro 1:21: “Nunca jamais qualquer profecia (as Escrituras proféticas do Antigo Testamento) foi dada por vontade humana, entretanto homens falaram da parte de Deus movidos (literalmente, levados adiante, como a nau à vela é levada pelos ventos) pelo Espírito Santo”. Naquilo que falavam (conforme está registrado por escrito), estes autores do Antigo Testamento que profetizavam sobre Cristo, foram “levados pela correnteza” à verdade infalível, verdade que não se podia sujeitar a mera interpretação particular (v. 20). Todas essas passagens vão formando a doutrina da inspiração: que a exatidão é inerente em cada parte do Antigo Testamento e também do Novo Testamento, de maneira que, como um todo, e em todas as suas partes, a Bíblia é infalível quanto à sua verdade, e final quanto à sua autoridade. Esta exatidão se estende até assuntos de história e de ciência, e não só à teologia e à ética. Alguns estudiosos, tais como Henry P. Smith e Charles A. Briggs, procuraram fazer uma distinção entre estes dois tipos de verdade, dando vazão à possibilidade de haver falsidade inerente em assuntos de mera história ou ciência. Há duas objeções fatais a esta posição. Em primeiro lugar, o Novo Testamento não admite semelhante distinção: a historicidade de Adão e Eva se implica em 1 Timóteo 2:13,14, (senão, o comentário de Paulo seria totalmente irrelevante), como também em 1 Coríntios 11:8,9; a experiência literal de Jonas, que ficou três dias no estômago do peixe grande é absolutamente essencial, se tem que servir como analogia verídica dos três dias que Cristo passou no túmulo, Mt 12:40. É impossível rejeitar a historicidade destes dois episódios cuja veracidade tem sido frequentemente contestada, sem rejeitar a autoridade do Cristo dos Evangelhos e do Apóstolo Paulo nas Epístolas. Em segundo

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lugar, nem sempre é possível fazer uma nítida separação entre teologia e ética, e entre história e ciência. Há casos cruciais que envolvem ambos estes tipos de verdade, como é o caso do Adão literal e histórico (pois o argumento teológico inteiro de Rm 5:14-19 depende da doutrina de ser Adão o pai da raça humana inteira). Não se pode conceder a presença de erros em matéria de história e de ciência sem acabar aceitando que há falsidade em matéria de doutrina. Pontos de Vista Sub-Bíblicos de Inspiração As pessoas que têm tendências a uma abordagem neo-ortodoxa ao tratar da inspiração das Escrituras usualmente (como é o caso de H. H. Rowley de Manchester) colocam a assim-chamada “mente de Cristo” como padrão de distinção entre verdades e erros de doutrina na Bíblia. Por exemplo, dizem que quando Josué e os israelitas mataram a população inteira de Jerico, era por causa das suas idéias primitivas ou selvagens de justiça, e não por causa do mandamento explícito de Deus conforme se registra em Deuteronômio 20:16-18. Declarações ou julgamentos atribuídos a Deus no Antigo Testamento, mas que parecem por demais severos quando se comparam com os padrões de mansidão, paciência ou amor de Cristo conforme se registram no Novo Testamento, devem ser rejeitados (segundo eles) como sendo meras invenções humanas compostas pelos israelitas no seu estágio primitivo de desenvolvimento religioso. O critério da verdade é a “mente de Cristo”.

Não obstante, a investigação demonstrará que muitas das declarações de Cristo registradas no Novo Testamento entram em choque com esta suposta “mente de Cristo”, de maneira assustadora. Nota-se, por exemplo, Mateus 23:33: “Serpentes, raça de víboras! como escapareis da condenação do inferno?” Outra vez, em Mateus 25:41: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos”. Não temos nenhum outro relatório acreditado daquilo que realmente era a mente de Cristo a não ser suas palavras registradas nos Evangelhos. É fatalmente inconsistente estabelecer um conceito filosófico de qual seria realmente o ponto de vista de Cristo, na base de algumas das suas declarações registradas, e depois rejeitar a autenticidade de outras declarações registradas nas mesmas fontes, simplesmente porque pleiteiam com as preferências pessoais de quem está fazendo este juízo. Tal procedimento vem a ser realmente a imposição de julgamentos humanos sobre a Palavra de Deus escrita, aceitando como

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verdadeira somente aquela porção da Palavra que a mente humana acha aceitável Mas já temos mencionado que o raciocínio humano é um elemento inadequado e desacreditado quanto a atingir conhecimentos religiosos verdadeiros. A Bíblia sempre deve emitir juízos sobre o homem; o homem nunca poderá julgar a Bíblia. Seus poderes de raciocínio devem ser empregados na tarefa de interpretar consistentemente a mensagem da Bíblia, para garantir sua própria compreensão daquilo que Deus quer dizer através das palavras da Escritura. Mas nunca podería emitir seu juízo contrário aos ensinamentos claros das Escrituras, estabelecidos pela exegese; se assim faz, rejeita ao mesmo tempo a autoridade das Escrituras como um todo. Mais tipicamente neo-ortodoxo é o ponto de vista que considera a Bíblia como sendo algo menos do que a Palavra de Deus escrita; seria meramente uma testemunha à Palavra de Deus. Segundo este ponto de vista, a Palavra de Deus seria um princípio dinâmico que opera somente quando há um encontro vivo ou “existencial” entre o crente e Deus. Deus lhe fala poderosamente através das páginas das Escrituras Sagradas, e estabelece um relacionamento pessoal, mais do que instilar uma verdade preposicional na mente do crente. (“Preposicional” aqui significa o tipo de verdade que pode ser declarada em proposições, assim como: “Deus é um Espírito eterno”. Proposições podem ser assimiladas como meros objetos de conhecimento, como fórmulas matemáticas, mas a verdade divina, segundo se argumenta, nunca pode ser assimilada pela mente humana. A verdade divina chega ao homem num encontro íntimo de “Eu-Tu”; é como uma corrente elétrica com seu polo positivo e seu polo negativo como sendo condições para sua existência). Sendo que o texto bíblico foi escrito por autores humanos, e reconhecendo-se que todos os homens são pecaminosos e sujeitos ao erro, deve haver, alegam, erro no texto bíblico. Mas, diz o argumento, o Deus vivo tem a capacidade de falar, mesmo através deste texto parcialmente errôneo, para atrair os crentes para um relacionamento vital com Ele, num encontro salvador. Tal ponto de vista da Bíblia deixa lugar para todos os tipos de erros científicos e históricos, e para todos os juízos adversos da alta crítica racionalista contra a autenticidade dos escritos de Moisés, Isaías, Daniel e todos os demais. Todas essas descobertas da crítica seriam sem dúvida verdadeiras como um relatório exato da origem humana da Bíblia. Apesar disso, Deus resolveu que estas Escrituras, eivadas de erros, seriam a testemunha única autoritativa da Sua revelação, e Ele pode usálas de maneira dinâmica, para “salvar” os homens.

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Assim, nos seus esforços de evitar o efeito dos assaltos da alta crítica, contra a veracidade do registro bíblico, e de salvar o significado da mensagem cristã no meio das objeções científicas contra aquilo que é sobrenatural, os teólogos do movimento neo-ortodoxo se refugiaram num ponto de vista paradoxal da natureza da própria revelação. Sustentam a posição que, pela sua própria natureza, a revelação divina não pode ser registrada em Escrituras. Logo que fica aprisionada em palavras, especialmente palavras que demonstram proposições acerca de Deus e de verdades espirituais, torna-se um objeto das mentes humanas e dos seus poderes cognitivos. Assim, cai sob o controle do homem, e se acha “aprisionada dentro das capas da palavra escrita” A revelação, portanto, não deve ser equacionada à doutrinas reveladas ou a proposições teológicas; muito ao contrário, consiste num encontro direto entre Deus e o homem, como um sujeito se confrontando com outro sujeito. A revelação teria uma analogia coní um encontro pessoal entre seres humanos, que se experimentam mutuamente como personalidades, mais do que uma lista de estatísticas ou itens de informações num cartão de identificação. Dentro deste ponto de vista, pode até se argumentar que nem é matéria de importância se as narrativas registradas nas Escrituras são verazes ou não. Por exemplo, o registro do nascimento virginal, ou da ressurreição corpórea de Cristo, que há nos Evangelhos, muito bem pode deixar de ser fato histórico (pois a teoria científica moderna não deixa vazão para tais acontecimentos miraculosos), mas isto não faria nenhuma diferença significante. Através destas lendas piedosas da Igreja primitiva podemos fazer nosso encontro com Deus e com as realidades supra-históricas para as quais estas histórias apontam. Depender da exatidão infalível do registro escrito da Bíblia seria, segundo esta teoria, um obstáculo à verdadeira fé. O dogma das Escrituras infalíveis operaria como uma muleta malsã para depender dela, pois a verdadeira fé voaria acima dos manifestos erros da Bíblia, para as alturas da verdade transcendental da qual a Bíblia dá testemunho — uma verdade disponível ao crente na medida de haver um encontro pessoal com o Deus vivo. Este ponto de vista neo-ortodoxo se confronta, porém, com uma multidão de dificuldades lógicas. Coloca a autoridade das Escrituras no nível de uma fé que não se pode averiguar. Como poderemos ter a certeza que Deus não nos falou através da narrativa do Alcorão (demonstravelmente cheia de erros e anacronismos), ou do Livro dos Mortos do Egito, ou das Vedas hindus? Por

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que só da Bíblia? A verificação objetiva não somente se rejeita como sendo impossível, mas o próprio desejo da verificação seria condenado como sendo repreensivelmente terreno e racionalístico. É necessário simplesmente crer! Crer em quem ou em quê? Bem, nas Escrituras, é claro. Mas, lastimavelmente, as próprias Escrituras parecem ser totalmente ignorantes desta maneira dos neo-ortodoxos de se tratar de verdades religiosas. A Bíblia positivamente formiga com verdades preposicionais acerca de Deus, verdades que podem ser expressas em declarações credais que a mente humana pode captar intelectualmente. Talvez possa ser dada uma explicação que diz que isto resulta da falibilidade e fraqueza dos homens pecaminosos que escreveram a Bíblia. Mas como é que se chega, além da Bíblia, àquela verdade mais rarefeita, inefável, supra-histórica, de encontros pessoais, que, segundo dizem, jaz além? Bem, por meio de um encontro direto com Deus, é claro! Sim, mas por meio de qual destes encontros? O de Barth? O de Brunner? O de Niebuhr? O de Tillich? Estes gigantes do movimento neo-ortodoxo conservam entre si fortes diferenças de opinião em assuntos teológicos. Alguns, como Barth, chegam a discordar com suas próprias opiniões de década em década. É difícil perceber como a eterna e imutável verdade de Deus pode ser validamente interpretada no célebre Comentário sobre Romanos, quando os pontos de vista de Barth são modificados tão marcadamente como é o caso entre cada edição desta obra de Barth. Quando se enfrenta os fatos, então, este ponto de vista neoortodoxo das Escrituras levanta dificuldades muito mais sérias do que aquelas que quer solucionar. É virtualmente impossível aos teólogos de Crise fazer qualquer afirmação sobre Deus, a fé ou qualquer outro aspecto de verdade religiosa que não depende em última análise das declarações preposicionais da Palavra de Deus escrita. Por exemplo, citemos a máxima de William Temple no assunto das Escrituras Sagradas: “Nenhuma só frase pode ser citada como tendo a autoridade de um pronunciamento distinto do Deus santo”.6 Mas como é que o Arcebispo Temple sabe que existe um único Deus, e não uma plêiade de deuses, conforme ensinam as religiões pagãs? Ou nenhum deus, conforme o marxismo nos ensina? Só podería saber isto, baseado na autoridade da Bíblia escrita, ou de uma Igreja confessante, que demonstravelmente tem confiado na autoridade infalível da Bíblia. Como, igualmente, pode saber que o Deus único é “santo”? Só porque a Bíblia diz isto d’Ele — uma 6. William Temple, Nature, Man and God — “A Natureza, o Homem e Deus”, (1953), p. 350.

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afirmação proposicional! Removendo-se a autoridade de um registro escrito da revelação divina, e as declarações de Temple ou de Brunner ou de qualquer outro ensinador religioso acerca de verdades religiosas seriam reduzidas à condição de meras conjeturas, completamente destituídas de autoridade, alicerçadas nas mesmas bases questionáveis de todas as outras opiniões meramente humanas. Como poderiamos saber que a fé é um princípio importante e salvador, conforme insistem os ensinadores neo-ortodoxos? É só porque assim se nos ensina na Palavra de Deus escrita. Se não fosse assim, haveria a probabilidade de haver a salvação somente através das boas obras, conforme crê a maior parte do mundo não-cristão. Até a própria possibilidade de um encontro entre Deus e o homem só é garantida para nós pelas afirmações das Escrituras, e seus inúmeros relatórios de tais encontros. Senão, a “experiência” inteira de encontros divino-humanos pode ser simplesmente um assunto de alucinações e de auto-sugestões, destituídas de qualquer realidade metafísica. Fica assim demonstrado que cada afirmação religiosa dos aderentes desta escola, depende, em última análise, da veracidade da Palavra de Deus escrita, as Escrituras hebreo-cristãs. Se estas são errôneas em qualquer das suas porções, pode haver erros nas outras porções;, não se podería depositar nelas confiança alguma, nem mesmo as asseverações que os teólogos neo-ortodoxos derivaram delas — e de fato, todas as suas declarações doutrinárias acerca de Deus, de encontros, de fé, foram derivadas destas Escrituras. Em outras palavras, se a autoridade da Bíblia escrita não merece confiança, então nem o discernimento da teologia da Crise tem mais valor do que qualquer mera opinião humana — a não ser que porventura estes teólogos gozem, nas suas próprias pessoas, do próprio atributo de infalibilidade que querem negar no que diz respeito às Escrituras. Isto nos leva para a questão da peculiaridade da fé neo-ortodoxa, aquela fé que levanta vôo até Deus sem os impecilhos do dogma da infalibilidade das Escrituras. O que é a fé, senão confiar em algo ou em alguém? Em que ou em quem descansa esta fé tão exaltada dos neo-ortodoxos? Ostensivamente esta fé é dedicada a Deus, ou nas introspecções derivadas da experiência religiosa quando o crente tem seu encontro com Deus, seja através das páginas das Escrituras, seja nalgum outro contexto. Mas como é que se julga a validez destas introspecções? Sendo que não podem ser averiguadas ao apelar para qualquer autoridade objetiva (seja as Escrituras, seja qualquer ensinador ou igreja infalível), o crente

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não pode apelar à nenhuma autoridade a não ser sua própria. Nem sequer pode ter certeza que Deus existe, se a Bíblia não é uma testemunha objetiva de confiança; só pode confiar na sua própria pessoa. Em outras palavras, o tipo de fé neo-ortodoxa é, em última análise, fé no próprio homem e não em Deus; isto é, a fé do crente se coloca nele mesmo. Sendo que a Bíblia não merece a confiança dele, e muito menos a autoridade humana (pois a própria humanidade implica em falibilidade), então o crente neo-ortodoxo não pode saber nada além da sua própria opinião, e esperar que esta seja correta. Senão, ele está perdido sem a possibilidade de recuperação. Está iludindo-se a si mesmo ao supor que sua fé depende de um Deus fora dele mesmo; destituído de qualquer autoridade objetiva, ele está à mercê de suas próprias impressões e opiniões subjetivas. Nunca pode ter certeza de que suas revelações não são meras alucinações.

Enfrentando as Dificuldades na Bíblia Necessário é reconhecer que o texto das Escrituras, conforme foi transmitido até nós, contém dificuldades ocasionais que aparentemente desafiam a doutrina da infalibilidade da Bíblia. Algumas destas dificuldades se resolvem pelo emprego correto da ciência bíblica. Outras, tais como discrepâncias nas estatísticas e na soletração de nomes, exigem uma emenda textual que vai além dos dados disponíveis da crítica textual. Outras, ainda, são dificuldades lógicas, tais como o que parece ser a aprovação dada em Juizes 11 ao sacrifício da filha de Jefté, quando Deuteronômio 12:31 proibe qualquer sacrifício humano em Israel.

Há dois métodos possíveis para se enfrentar estes problemas. 1) É possível conservar reservas quanto às reivindicações da própria Bíblia no que diz respeito à sua infalibilidade, até que cada dificuldade seja esclarecida. Cada vez que surge uma nova dificuldade, a Bíblia é degradada a uma situação de suspeita, até que o assunto possa ser esclarecido de maneira satisfatória. No ínterim, o crente bíblico fica ansioso, em doloroso suspense e angústia de alma, até que, mais uma vez, a Bíblia fica inocentada da nova acusação que surgiu contra ela. 2) É igualmente possível, mesmo quando confrontado por aquilo que parece ser uma discrepância, conservar a fé na infalibilidade do registro bíblico, esperando com paciência a vindicação que investigações posteriores não deixariam de suprir. O crente, convicto de que só a origem divina explica o fenômeno das Escrituras, toma posição ao lado do

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Jesus de Nazaré, ao crer na infalibilidade da Palavra de Deus escrita, e espera confiantemente num esclarecimento final de todos os problemas que possam surgir. As pessoas que se atêm a este segundo modo de agir talvez possam ser acusadas de subjetivismo ilógico, por agirem na base de uma convicção a priori. Mas esta acusação não é bem fundamentada, pois não se pode nem começar a estudar a Bíblia sem proceder fundamentado nalguma de duas suposições a priori. É necessário começar com a suposição a priori, ou que a Bíblia é um registro falível, ou que é infalível. Não há nenhum meio termo; não se pode ficar numa situação neutra de suspense, insistindo: “Deixe que a Bíblia fale por si mesma”. Em primeiro lugar, precisamos averiguar que tipo de livro é este que tem que falar. É a infalível Palavra de Deus, ou é o produto do homem, passível de erros, possuindo elementos de verdade divina misturados com erros humanos? O procedimento mais lógico é determinar desde o princípio que tipo de livro é a Bíblia. Se apresenta dados tais que obrigam a um reconhecimento que só pode ser de origem divina — e de fato, a Bíblia apresenta tais dados em abundância — então o único caminho razoável, seria tomar a sério as próprias reivindicações de infalibilidade que a Bíblia registra. Se as Escrituras constituem uma autêntica auto-revelação de Deus, as discrepâncias que aparecem precisam ser reconhecidas como sendo só aparentes, e não reais. Ao se conseguir todos os fatos, comprovar-se-á que os alegados erros não são uma realidade concreta. Deve ser mencionado que tal procedimento comumente se segue no assunto das relações humanas, sem que haja quem o critique severamente. Por exemplo, um marido que chegou à conclusão que sua esposa é uma mulher leal e virtuosa, será perseverante em recusar a ter suspeitas contra ela, mesmo se ela tenha sido vista saindo com algum outro homem. Sem tirar conclusões precipitadas, simplesmente aguardará mais informações que esclarecerão a situação e explicarão de maneira satisfatória sua associação com o referido homem. Ele seria estulto e indigno se abandonasse sua convicção da integridade dela até que tenha sido vindicada sua atuação. Só uma pressuposição desde o início, de de que ela é inconstante e indigna de confiança é que justificaria tal reação da parte dele. Da mesma maneira, quem está convicto da autoridade divina da Bíblia seria estulto e indigno se fosse questionar sua infalibili-

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dade até que cada alegação contra ela que surge tenha sido esclarecida. Isto, longe de ser o procedimento científico e objetivo que muitos alegam que é, não é nada mais do que uma política de mudanças ilógicas de um a priori a outro, com vacilações próprias de mentes fracas. Uma contradição genuína e completa nas Escrituras (mormente se pudesse ser demonstrada nos autógrafos originais), seria justo motivo para se abandonar a fé na infalibilidade das Escrituras; mas até que isto tenha sido comprovado, ou, de acordo com as leis da evidência legal, algum erro sério de história ou ciência tenha sido demonstrado, o crente na Bíblia não precisa sentir embaraço ao conservar a suposição que é a infalível Palavra de Deus. É altamente significativo que nenhum erro deste tipo tenha sido comprovado até agora, de maneira que satisfizesse a um foro de justiça, embora que várias tentativas neste sentido tenham sido feitas-7

7. Cf. Harry Rimmer, The Lawsuit against the Bible — “O Processo Contra a Bíblia” (1940). Para mais matéria no assunto das dificuldades na Bíblia, consulte a defesa firme da Bíblia, quanto à sua autoridade e infalibilidade, em Wick Broomall, Biblical Criticism (1957), págs. 11-84.

Primeira Parte INTRODUÇÃO GERAL

3 OS MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS Já não temos acesso aos originais infalíveis dos vários livros das Escrituras hebraicas. As cópias mais antigas que vieram até nós, em certos casos, não chegam dentro de mil anos da data na qual foram originalmente compostas. Não obstante, constituem nossa autoridade primária nos dias atuais, como sendo a inspirada Palavra de Deus, e todas as nossas cópias e traduções das Sagradas Escrituras dependem necessariamente dos manuscritos dos originais hebraicos e aramaicos os mais antigos e melhores que temos disponíveis. Precisamos, pois, passar em revista a evidência escrita na qual se baseiam nossas edições modernas impressas da Bíblia hebraica, para termos alguma idéia do grande e variado corpo de evidências com o qual lida a crítica textual do Antigo Testamento. Os manuscritos hebraicos têm prioridade na escala de valores, é claro, sendo que a revelação divina chegou originalmente a Israel na língua hebraica, e há muito menos probabilidade de corrupção ao copiar manuscritos dentro da mesma língua, do que quando se trata de uma tradução para uma outra língua. Nos casos de ter havido erros de cópia nos manuscritos copiados do hebraico, surge então a possibilidade que as traduções antigas para o grego, o aramaico e o latim nos forneçam uma indicação de qual frase ou palavra hebraica original possa ter sido deturpada nos próprios manuscritos hebraicos. Isto nos leva à necessidade de passar em revista, não somente os manuscritos hebraicos, os melhores e mais antigos, mas também as cópias, as melhores e mais antigas, das antigas traduções e versões. — 35 —

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Os Manuscritos Hebraicos Mais Antigos

A.

OS MANUSCRITOS PRÉ-CRISTÃOS

Principalmente, são as notáveis descobertas nas cavernas do Mar Morto que compõe esta classe de manuscritos. Tecnicamente, são chamadas matéria de Cunrã, sendo que as várias cavernas nas quais foram descobertas se localizam ao longo do leito de Uádi Cunrã, na praia do nordeste do Mar Morto. A identificação técnica destes documentos do Mar Morto consiste de um número que indica a caverna na qual a descoberta foi feita, seguido por uma abreviação do nome do livro propriamente dito, mais uma letra supralinear que indica a ordem na qual o manuscrito específico foi descoberto, em contraste com outras cópias do mesmo livro. Por exemplo, o famoso Rolo do Mar Morto de Isaías — que ainda permanece sendo a única cópia de um livro do Antigo Testamento até agora descoberta e publicada — tem o nome técnico de lQIsa, que quer dizer: o primeiro manuscrito (ou o mais importante) de Isaías descoberto na Caverna N.° 1 de Uádi Cunrã. O assim-chamado Rolo de Isaías da Universidade Hebraica (embora que lQIsa também tenha passado a pertencer à Universidade Hebraica, mediante compra do Mosteiro de São Marcos) tem o nome técnico de lQIsb. Regra geral, os únicos fragmentos bíblicos que até agora têm sido publicados foram descobertos na Caverna 1 e na Caverna 4. Milhares de fragmentos têm sido retirados da Caverna 4, e mais do que 380 manuscritos diferentes têm sido identificados, entre os quais talvez uma centena são do Antigo Testamento.1 Até agora, nada tem sido püblicado da Caverna 2, embora que tenha havido ali descobertas de mais do que 180 fragmentos legíveis (um quarto deles sendo fragmentos bíblicos). As matérias bíblicas da Caverna 3 (famosa pelo Rolo de cobre, um inventário de tesouros sagrados escondidos para protegê-los) que ainda não foram publicadas, e as das Cavernas 5 e 6 são parcas e de mínima importância, segundo se nos infoma. Até agora, tem havido pouca notícia sobre o conteúdo das Cavernas 7, 8, 9 e 10. Quanto à Caverna 11, declara-se que ali se descobriram cinco rolos relativamente completos: uma porção de Levítico, uma seleção dos Salmos, um Targum aramaico de Jó, e um Apocalipse não canônico da Nova Jerusalém.1 2 1.

Ver F. M. Cross em BASOR 141, Fev. 1956, e The Ancient Library of

2.

Millar Burrows, More Light on the Dead Sea Scrolls (1958), págs. 14, 28-30.