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Portuguese Pages 104 Year 1991
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mundo em que vivemos está sempre mudando e nossas vidas também. Porque muda o mundo, nossas vidas mudam; e o mundo muda porque mudam nossas vidas. Ontem era assim; hoje já não é mais; amanhã como será? As coisas que hoje existem nem sempre existiram e não deverão necessariamente existir para sempre. O passado é um tempo distante de nós. E também um tempo diferente do presente, porque a vida está sempre mudando. E o futuro, será diferente?
No século XVI dava-se o nome de brasileiros aos comerciantes de pau-brasil. A quem chamamos de brasi-
leiros, hoje? Durante os séculos XVI, XVII e XVIII, o Brasil foi uma colônia de Portugal. No século XIX não era mais; tornara-se um país independente politicamente.
Durante trezentos anos, as vidas dos habitantes da Colô-
nia estiveram submetidas aos interesses da Metrópole. Nas primeiras décadas do século passado, deixaram de estar, e muitos daqueles habitantes tornaram-se cidadãos de um novo país — o Império do Brasil. O mundo em que aquelas pessoas viviam estava mudando e suas vidas também. Coisa semelhante acontecia, por essa mesma época, com as vidas da maior parte dos habitantes das colônias que os espanhóis haviam criado na América. Ali também estavam surgindo novos países independentes. As vidas dos habitantes das colônias que portugueses e espanhóis haviam criado na América estavam mudando porque mudanças significativas estavam ocorrendo em outras partes do mundo, desde a segunda metade do século XVIII. Na Inglaterra, o aparecimento das primeiras fábricas assinalava a constituição de um novo
3
sistema
econômico
—
o capitalismo
—
e o surgimento
da burguesia industrial e do operariado. Era a Revolução Industrial inglesa.
Na
França,
em
1789,
sob a liderança
da burguesia, o povo pôs fim ao Antigo Regime, isto é, à monarquia absoluta e aos privilégios da nobreza e do clero. Era a Revolução
Francesa.
Pouco
antes, em
1776,
os colonos das Ireze Colônias que a Inglaterra criara no
litoral da América do Norte proclamaram sua independência, pondo em prática, pela primeira vez, as novas idéias de liberdade e felicidade defendidas por muitos europeus. Era a Independência dos EUA. Os contemporâneos reservaram uma palavra para caracterizar essas mudanças tão significativas — revolução. Por meio dela queriam dizer que estava tendo início um tempo novo — um tempo de liberdade política, econômica, de crenças e idéias; de igual-
dade jurídica e de fraternidade; um tempo que não seria mais caracterizado pelo despotismo* dos governantes, pelos privilégios de uma minoria, pelas restrições e proibições mercantilistas. Era o tempo das revoluções burguesas. Mas as vidas dos habitantes das colônias ibéricas na América estavam mudando sobretudo porque se tornara insuportável a exploração metropolitana. Luís dos Santos Vilhena era professor de Grego e de Latim em Salvador. Em 1801 ele comentou que “não é das menores desgraças o viver em colônias”. Os movimentos
tropolitana —
de revolta contra a dominação
me-
como as conjurações Mineira, do Rio de
Janeiro e Baiana, na Colônia portuguesa — expressavam aquela situação,
no final do século XVIII.
Demonstra-
vam algo ainda mais importante. Muitos dos habitantes das colônias queriam mudar suas vidas; queriam ser livres e felizes; queriam ser sujeitos da História que viviam. No início do século XIX, a maior parte das colônias que Portugal e Espanha criaram na América transformaram-se em países independentes. Todavia, havia importantes diferenças entre as mudanças ocorridas na América espanhola e na América por* As palavras com asterisco são definidas no Vocabulário, no final do livro.
4
a
tuguesa. Lá, as lutas pela independência fragmentaram já dividido, dando origem a inúainda mais um território meros países republicanos; aqui, surgiria um Império, que conseguiria preservar a unidade territorial. Na América espanhola, as lutas pela independência foram lideradas quase sempre pelos poderosos proprietários rurais locais: no Brasil, a emancipação política colocou em posição de destaque o próprio herdeiro do trono português — o príncipe D. Pedro. Por que essas diferenças? Como é possível explicar o surgimento de um Império no Brasil, em meio a um conjunto de países republicanos? Por que O mundo em que essas pessoas viviam estava mudando? Como elas utilizaram as pedras do edifício colonial que desmontavam para erguer um novo edifício — O Império do Brasil? Como essas pessoas procuravam explicar o que estava acontecendo? Este livro pretende responder a essas indagações. É também a algumas outras que logo se apresentarão. Caso você decida seguir por suas páginas, compreenderá certamente duas coisas fundamentais: por que a passagem do Brasil da situação de Colônia para a de um Estado independente politicamente, no início do século passado, fez com que mudassem as vidas das pessoas que aqui viviam; e como o Brasil se tornou um Império porque mudara a vida daquelas pessoas. E, ao chegar ao final da leitura, certamente você também terá mudado...
Afinal, quem eram aquelas pessoas? Por que elas decidiram não mais “viver em colônias""? No final do século XVIII, era de aproximadamente três milhões o número de indivíduos que viviam na Colônia portuguesa na América, não contados os denominados índios bravos. Esses indivíduos estavam distribuídos de maneira irregular pelo amplo território que fora delineado pelo Tratado de Madri de 1750.
A maior parte deles localizava-se na faixa litorânea, dedicando-se às atividades relacionadas com a grande lavoura de produtos tropicais. Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro, em primeiro lugar, e Pará e Maranhão, em seguida, eram os pontos principais de concentração demográfica. Para o interior, aquela distribuição apresentava-se de forma muito mais irregular. No extremo norte, o escasso povoamento seguia unicamente o curso dos rios, em busca sobretudo das “*drogas do sertão”. No centro, a atividade mineradora dera origem a núcleos urbanos, agora decadentes. Enquanto nas áreas ligadas à atividade pastoril, tanto do “sertão”? do Nordeste quanto do extremo sul, a ocupação humana, embora apresentasse certa contigúidade* não verificada na região mineradora, também mostrava-se extremamente rala e dispersa. Se no início do século a descoberta das minas provocara o afluxo da população para o centro do território e o surgimento de vilas e cidades, fazendo com que pela primeira vez o povoamento da Colônia deixassé de ser fundamentalmente
litorâneo e rural, a decadência da ati-
vidade mineradora, ao final dos setecentos, provocou um refluxo demográfico para a periferia da região mineradora, estabelecendo-se os grupos humanos, muitas vezes, ao longo dos caminhos que conduziam às “Minas Gerais””, especialmente os que atravessavam o vale do Paraíba.
A dispersão do povoamento era agravada pelas grandes distâncias e pelas deficiências dos meios de transporte e de comunicação.
Nenhuma
estrada fora aberta du-
rante todo o período colonial, servindo-se os habitantes
da Colônia para os seus deslocamentos dos poucos rios navegáveis, dos caminhos abertos pelo gado e das trilhas indígenas. No percurso de São Paulo a Mato Grosso gastava-se quase o mesmo tempo para vir de Lisboa ao Rio de Janeiro. Dispersos pelo vasto território, aqueles indivíduos tinham suas vidas unidas pelos objetivos que a Metrópole portuguesa procurava alcançar com a atividade colonizadora, desde o século XVI: obter metais preciosos e gê-
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neros tropicais para comercializar na Europa, alcançando elevados lucros; e ainda difundir a religião católica. A Colônia portuguesa na América existia, assim, | em função dos interesses da Metrópole. Ela existia para enriquecer o Reino português; para dar poder e prestígio ao soberano
português;
e para
aumentar
O número
de
Eram
os
fiéis da Igreja Católica. E eram justamente esses objetivos que determinavam o lugar e o papel de cada um daqueles habitantes na faina* colonizadora. De um
lado, situavam-se os colonizadores.
comerciantes, os governadores, capitães-generais e magiso trados, os bispos e missionários. Eles monopolizavam carcomércio; procuravam ocupar com exclusividade os gos e funções administrativas, impediam a divulgação de rei idéias e crenças que pudessem ameaçar o poder do de Portugal e da Igreja. Os colonizadores empenhavamé, se por garantir a continuidade da relação colonial, isto da relação que subordinava os interesses da Colônia aos do Estado absolutista e da política mercantilista portuguesa. De outro, estavam os colonos. Eram os senhores de engenho, os fazendeiros, os lavradores, os proprietários de lavras auríferas, os donos de charqueadas*. Eles eram os proprietários, em condições monopolistas, dos meios — escravos, terras, equipamentos — com os quais eram realizadas as atividades produtivas que faziam da Colônia uma colônia de exploração. E havia
ainda
que constituíam
os colonizados.
quase metade
Eram
os escravos,
da população
no final do
século XVIII. Eram ainda os agregados, moradores, capangas,
capatazes
e vadios;
a população
livre e pobre,
que raramente encontrava ocupação produtiva, e por 1sso dela se dizia que “não tem modo certo de vida”. A relação colonial era, fundamentalmente, a relação entre colonizadores e colonos. O pacto colonial os unia, de modo complementar e contraditório, permitindo efetuar-se a colonização.
Colonos e colonizadores se complementavam. Os senhores de engenho produziam o açúcar que era vendido
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com exclusividade pelos comerciantes. Mas também tinham
interesses contraditórios. Os senhores protestavam contra
os elevados preços dos escravos vendidos pelos traficantes negreiros e reclamavam dos preços baixos que os co-
merciantes pagavam pelo açúcar que tinham produzido. O pacto colonial permitia a expansão da colonização. A medida que a colonização avançava — ocupan-
do novas áreas, gerando novas atividades, multiplicando o número de escravos, aumentando a massa de ho-
mens livres e pobres, dando origem a núcleos urbanos e diversificando o contingente de colonos —, a Metrópole intensificava sua exploração e dominação, em proveito dos colonizadores. A medida que o Reino português ia entrando em decadência no cenário europeu, tornavamse insuportáveis para colonos e colonizados as medidas relacionadas com a política colonial: os monopólios, como o da exploração do sal; as proibições, como a da existência de manufaturas e de atividade impressora; os inúmeros tributos e taxações.
Ainda no século XVII, o poeta Gregório de Matos diria: [...] os brasileiros são bestas e estão sempre a trabalhar toda a vida por manterem maganos* de Portugal [...] Quem
seriam
os “brasileiros”
a que
o poeta fazia
referência? Seriam ainda os traficantes de pau-brasil? Quem seriam os “'maganos de Portugal"? Durante o período colonial, em diferentes oportunidades os colonos demonstraram os seus pontos de atrito com a Metrópole. Na Revolta de Beckman, no Maranhão, em 1684, eles lutaram contra o monopólio do comércio exercido abusivamente pela Companhia de Comércio do Estado do Maranhão. Na Guerra dos Mascates, ocorrida em Pernambuco no início do século XVIII, reagiram contra o comerciante reinol*, agente da política centralizadora metropolitana. Todavia, naquelas oportunidades eles ainda não pensavam em romper o pacto que mantinham
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com
os colonizadores.
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Mas as tensões e os conflitos da sociedade colonial não se resumiam aos movimentos contra os comerciantes
reinóis. Nas áreas em que não havia recursos para a compra de escravos africanos, como o Maranhão e São Vi-
cente, os colonos entravam em conflito com os elementos religiosos, contrários à escravização do gentio*. Em di-
versos pontos da Colônia e em muitas ocasiões, os escravos se revoltaram, realizando atentados contra feitores e senhores, fugindo e formando quilombos. A presença daqueles que “'não têm modo certo de vida”, sobretudo nas vilas e cidades, deixava inseguros e intranqúilos colonizadores e colonos. Por toda parte existiam barreiras sociais € raciais, expressando o caráter fortemente hierarquizado da soctedade. Em seu depoimento, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, diria:
/...] o fato de ser alferes influiu para transformarme em conspirador, levado a tanto que fui pelas injustaças que sofri, preterido sempre nás promoções a que tinha direito. Uni as minhas amarguras às do povo, que eram maiores, e foi assim que a idéia de libertação tomou conta de mim. [...] (Apud C.G. Mota, Atitudes de inovação no Brasil — 1789-1801, p. 56.)
O mesmo pode ser observado no depoimento de João de Deus, pardo, alfaiate, que procurava conseguir
adeptos para a Conjuração Baiana, proclamando com a vitória do movimento, seriam todos:
/...] tirados da ta a diferença de cor e outros seriam sem todos os ministérios
que,
miséria em que se achavam, extinbranca, preta e parda, porque uns diferenças chamados e admitidos a e cargos [.../ (Apud C.G. Mota, Atitudes de inD-
vação no Brasil — 1789-1801, p. 60.)
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Entre a Revolta de Beckman e a Guerra dos Masca-
tes, de um
lado,
e as conjurações
Mineira
e Baiana,
de
outro, havia uma diferença fundamental. Os participantes dessas últimas falavam de Liberdade.
Falavam de Fe-
licidade. Alguns, como João de Deus, falavam mesmo de Igualdade. O mundo das pessoas que viviam na Colônia estava mesmo mudando.
A utilização de novas palavras por algumas dessas pessuas, a partir do final do século XVIII, caracteriza-
va essa mudança.
Cada
vez mais
falava-se em
colônia,
decadência, ricos, pobres, plebe, opulência, posse, miséria, classe, casta,
restauração,
felicidade, história, inde-
pendência, revolução, liberdade, república... Os colonizadores não desconheciam tal fato, e por isso ordenavam
o fechamento das sociedades literárias, proibiam a exis-
tência de sociedades secretas, obstavam
a entrada de li-
vros e publicações estrangeiras. À consciência de “viver em colônias”” era adquirida, muitas vezes, pelas notícias de movimentos em outras áreas, como nas colônias inglesas da América do Norte e na França. Os colonos que tinham acesso aos meios de cultura liam e discutiam avidamente as idéias de Rousseau, Raynal, Mably, Morelly, Voltaire, Montesquieu, Turgot e muitos outros. Do cônego Luís Vieira da Silva, um dos conjurados mineiros de 1789, dizia-se que tinha “o diabo em sua livraria”, porque possuía em sua biblioteca obras dos “infames autores franceses””. Buscavam-se no exterior as soluções para os problemas da Colônia. Do es-
trangeiro esperava-se, muitas vezes, a ajuda necessária à vitória dos movimentos contra a dominação metropolitana.
As idéias liberais — “os abomináveis princípios franceses””, como não cansavam de repetir as autoridades portuguesas — serviam de orientação na luta contra os colonizadores. Se na Europa elas se apresentavam. como crítica ao Estado absoluto e à política mercantilista, na Colônia elas eram, antes de tudo, a crítica à relação colonial. Perseguidos pelas autoridades portuguesas, os adeptos das idéias liberais no Brasil organizavam-se em socie10
dades secretas — as lojas maçônicas. Eram eles, quase sempre, elementos dos mais representativos na sociedade colonial: professores, funcionários, comerciantes, fazendeiros, padres.
Todavia, embora fossem importante elemento na lu-
ta contra
a dominação
metropolitana,
as idéias hberais
encontravam grandes obstáculos à sua divulgação. A dispersão do povoamento, as deficiências dos meios de transporte e de comunicação, a ignorância e o analfabetismo da maior parte da população contribuíam para que o conhecimento do pensamento ilustrado europeu fosse privilégio de uma minoria. Por outro lado, nem sempre era desejável uma ampla divulgação dessas idéias e princípios. Se a afirmação dos Direitos do Homem — direito de propriedade, hberdade, igualdade jurídica, representação — vinha ao en-
contro dos interesses de muitos colonos, não convinha a
esses mesmos colonos a extensão desses direitos ao restante da sociedade, isto é, aos colonizados. Os colonos eram colonos não apenas porque estavam em relação com os colonizadores. Mas sobretudo porque eram proprietários de escravos. Quando aderiam às idéias liberais, faziam-no para se libertar da tutela dos colonizadores. Queriam deixar de ser colonos, tornando-se cidadãos; mas não queriam deixar de ser proprietários de escravos. Os colonos sonhavam em formar um novo país, semelhante às “nações civilizadas” da Europa, que haviam vivido as revoluções burguesas. Mas temiam a existência de uma sociedade na qual a igualdade fosse estendida aos que “'não têm modo certo de vida””, isto é, à “plebe'”. Temiam a repetição aqui dos acontecimentos da ilha de São Domingos, onde negros sublevados massacraram
a população
branca;
pareciam
antever
os motins
de Pernambuco, em 1823, ocasião em que se cantava: Marinheiros e caiados* Todos devem se acabar
Porque só pardos e pretos O país hão de habitar. 11
Nos primeiros anos do século XIX, os colonos queriam ser livres e felizes. Eles acreditavam que a liberda-' de residia no rompimento do pacto colonial é a felicidade, na manutenção
da escravidão.
A repressão violenta que as autoridades portuguesas tinham desencadeado sobre os conjurados tornava-os cau-
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telosos. Além do mais, eles temiam a participação da “plebe” urbana. Um acontecimento inesperado imprimiria um sentido original às mudanças que eles imaginavam para as suas vidas.
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CAPÍTULO
1
Adivinhe quem está chegando A abertura dos portos do Brasil s habitantes de Salvador pareciam estar acostumados à chegada de navios portugueses ao porto da cidade. Navios grandes, vindos de longe, de muito longe, de Portugal, da costa da Africa, das Índias,
atravessavam
mares
e oceanos,
trazendo
azeite doce, bacalhau, vinho, tecidos finos, escravos negros; de retorno, levavam açúcar, algodão, tabaco, cou-
ros e aguardentes. Navios menores, vindos de outras capitanias litorâneas, transportando carnes-secas, farinhas e outros produtos.
As vidas dos homens e mulheres de Salvador, fossem livres ou escravos, colonos ou colonizados, estavam inti-
mamente ligadas ao movimento do porto. Por ele chegavam
as mercadorias
que consumiam
e os colonizadores
que administravam a capitania da Bahia de Todos os Santos e governavam suas vidas: governadores, magistrados e religiosos. Pelo porto entravam as notícias do Reino de Portugal e de outras partes da Europa e do mundo, quase sempre censuradas. Por ele saíam os gêneros tropicais produzidos pelos escravos nas propriedades dos colonos e que enriqueciam a Metrópole. Pelo porto circulavam marinheiros, soldados e negociantes, pessoas atare-
fadas e um grande número de vadios.
Todavia, naqueles dias de janeiro de 1808 os habitantes da cidade pareciam estar mais do que nunca curiosos e ansiosos. Os navios que se aproximavam do porto, 15
tocados pelo vento, traziam uma carga diferente e precio-
sa — a família real portuguesa!
E os moradores da cidade pareciam
perguntar uns
aos outros: por que a família real estava vindo para o Brasil, acompanhada por nobres e prelados, fidalgos e uma multidão de funcionários? Alguns comentavam em voz baixa que todas aquelas pessoas — dizia-se que eram mais de dez mil! — estavam fugindo. Comentavam que a família real estava fugindo das tropas francesas que, por ordem do imperador Napoleão I, tinham invadido Portugal. E que isso acontecera porque o príncipe-regente D. João não obedecera às determinações de Napoleão Bonaparte, de fechar os portos portugueses aos navios ingleses. Por não aderir ao Bloqueio Continental, a Corte portuguesa fora obrigada a fugir para a sua colônia americana. Por sorte contara com a proteção da esquadra inglesa, diziam alguns. Por azar, diziam outros.
A cidade recebeu a família real com festas. Seus moradores pareciam pressentir que suas vidas iriam mudar.
Como que confirmando aquele pressentimento, seis dias após a chegada, o príncipe-regente assinou uma importante carta-régia. Conde da Ponte,
do meu Conselho,
Governador e
Capitão General da Capitania da Bahia. Amigo. Eu, Principe Regente, vos envio muito saudar, como aquele que amo. Atendendo à representação, que fizestes subir a minha real presença sobre se achar interrompido e sus-
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penso o comércio desta Capitania, com grave prejuizo dos meus vassalos e da minha Real Fazenda, em razão das críticas e públicas circunstâncias da Europa; e querendo dar sobre este importante objeto alguma providência pronta e capaz de melhorar o progresso de tais danos: sou servido ordenar interina e provisoriamente, enquanto não consolido um sistema geral que efetivamente regule semelhantes matérias, o seguinte. Primo: Que sejam admissíveis nas Alfândegas do Brasil todos e 16
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quaisquer gêneros, fazendas e mercadorias transportadas, ou em navios estrangeiros das Potências, que se conservam em paz e harmonia com a minha leal Coroa, ou
em navios dos meus vassalos, pagando por entrada vinte e quatro por cento; a saber: vinte de direitos grossos e quatro de donativos já estabelecidos, regulando-se a cobrança destes direitos pelas pautas ou aforamentos* por que até o presente se regulam cada uma das ditas Alfândegas, ficando os vinhos, águas ardentes e azeites doces, que se denominam molhados, pagando o dobro dos direitos que até agora nelas satisfaziam. Secundo: Que não só os meus vassalos, mas também os sobreditos estrangeiros possam exportar para os Portos, que bem lhes parecer a benefício do comércio e agricultura, que tanto desejo promover, todos e quaisquer gêneros e produções coloniais, à exceção do Pau-Brasil, ou outros notoriamente estancados*, pagando por saída os mesmos direitos já estabelecidos nas respectivas Capitanias, ficando entretanto como em suspenso e sem vigor todas as leis, cartas régias ou outras ordens que até aqui proibem neste Estado do Brasil o reciproco comércio e navegação entre os meus vassalos e estrangeiros. O que tudo assim deveis executar com o zelo e atividade que de vós espero. Escrita na Bahia aos 28 de janeiro de 1808. Principe. Para o Conde da Ponte. (Apud
R.
Macedo,
História admi-
nistrativa do Brasil, v. 6, p. 31-2.)
Era a abertura dos portos do Brasil ao comércio com todos os países que estivessem em “paz e harmonia'” com o governo de D. João. Era o final do monopólio ou exclusivo comercial que caracterizara as relações entre a Metrópole portuguesa e a Colônia brasileira durante três séculos. Desde então, os produtos exportados pelo Brasil para outros países não tinham mais que passar obrigatoriamente por Portugal, o mesmo acontecendo com todos os artigos que viessem de países estrangeiros para o Bra17
sil. Desde
aquele
momento,
os habitantes
de
Salvador
não mais veriam chegar ao porto apenas navios portugueses. Naquele mesmo ano de 1808 chegaram aos portos do Brasil 90 navios estrangeiros; vinte anos depois, 315, dos
quais 195 eram ingleses. Os comerciantes estrangeiros trouxeram uma infinidade de mercadorias: tecidos, sapatos, talheres, louças e cristais, chapéus, cachimbos, linhos e xales, ferragens, queijo e manteiga, escovas, pentes e navalhas, per-
fumes e sabonetes, velas, barbantes e caixões mortuários. E
ainda muitos outros artigos de utilidade duvidosa para os habitantes do Brasil, como casacos de pele, patins para gelo e carteiras para notas (aqui não havia papel-moeda). Ão mesmo tempo que a introdução dessas mercadorias ia contribuindo para a modificação dos hábitos da população, uma outra mudança ia se processando. Os comerciantes portugueses foram perdendo para os comerciantes estrangeiros, principalmente para os ingleses, a posição exclusiva que ocupavam nas relações comerciais entre o Brasil e Portugal até 1808. Passaram a se dedicar, então,
ao comércio
de abastecimento
interno,
das cidades,
sobretudo ao comércio
como
o Rio de Janeiro
— onde a família real se instalara a 7 de março de 1808.
Junto com as mercadorias chegavam aos portos comerciantes e caixeiros-viajantes estrangeiros, representantes das firmas comerciais de seus países. Um deles foi o inglês John Luccock, que desembarcou no Rio de Janeiro em meados de 1808. Durante dez anos ele permaneceu no Brasil, realizando negócios, procurando enriquecer rapidamente e observando aquela terra e aquela sociedade tão diferentes das de seu país de origem. Luccock redigiu um livro sobre o período em que esteve no Brasil, dando-lhe o nome de Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. Comerciantes franceses também vieram para o Brasil, sobretudo após a derrota de Napoleão Bonaparte em 1815. Foi o caso de Louis François de Tollenare, que esteve em Pernambuco e na Bahia entre 1816 e 1818. Tollenare aproveitava os fins-de-semana para redigir as Notas dominicais, uma espécie de diário onde registrava aquilo que via e acontecia. 18
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Mercado de escravos localizado na rua do Valongo, no Rio de Janeiro.
O monopólio comercial chegara ao fim. É junto com
ele as demais restrições que caracterizavam a relação en-
tre a Metrópole e a Colônia. Durante o período colonial, os colonizadores dificultavam a vinda de estrangeiros para o Brasil, censuravam a entrada de livros, proibiam a existência de imprensa na colônia e controlavam rigidamente a circulação de quaisquer idéias contrárias ao governo absolutista português e à Igreja Católica. A partir de agora aqueles estudiosos europeus interessados em conhecer a fauna, a flora, as riquezas mine-
rais e as populações das regiões tropicais podiam vir ao
Brasil.
Um
desses estudiosos
foi Peter Wilhelm
Lund,
que chegou ao Brasil em 1825 e fixou residência definitiva em Lagoa Santa (MG), onde realizou pesquisas sobre a origem do homem americano. Outro foi o professor de Botânica Auguste de Saint-Hilaire, que entre 1816 e 1822 percorreu os territórios dos atuais estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Eis uma
de suas anotações:
19
Raros são os países que oferecem tantos recursos como o Brasil, e sejam como ele destinados a representar na política papel tão importante; as montanhas encerram em seu seio metais preciosos; os rios cobrem com suas águas diamantes e pedrarias; o açúcar e o trigo, a vinha e o café, as árvores frutíferas da Europa e as da Índia são cultivadas indiferentemente em seu Jértal território; as imensas solidões poderiam receber inúmeros colonos, e seus portos garantem importantes mercados para os produtos do nosso solo e indústrias. No entanto, tão magnífica região [...] ainda está longe de ser conhecida. [...] (Viagem pelas províncias do Rio de Ja-
neiro e Minas Gerais, p. 3.)
Em
outros de seus livros, Saint-Hilaire fez uma ob-
servação que deixou intrigados muitos de seus leitores:
/...] Flavia um pais chamado Brasil; mas absolu-
tamente não havia brasileiros. dice
(Viagem pelo Distrito dos Diamantes e litoral do Brasil, p. 213.)
Entre 1821 e 1829 uma expedição científica russa percorreu o interior do Brasil. Ela foi organizada por Grigory Ivanovitch Langsdorff, membro da Academia de Ciências de São Petersburgo e cônsul-geral da Rússia no Rio de Janeiro. Dessa expedição fazia parte, contratado como desenhista, João Maurício Rugendas. Ao chegar ao Brasil, porém,
Rugendas abandonou
seus compa-
nheiros e passou a viajar por conta própria, desenhando e anotando o que via. A Rugendas não impressionou tanto o número de estrangeiros que então chegava ao Brasil, e sim a continuação do tráfico de escravos negros da Áfri-
ca para o Brasil na época da Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão. E comentou:
20
[...] E, sem dúvida, durante o trajeto da África para a América, que a situação dos negros se revela mais horrível. [...] Seus sofrimentos são de tal ordem que nenhuma descrição seria bastante fiel, embora entre-
gássemos à imaginação mais fértil o encargo de pintar o quadro com suas verdadeiras cores. [...] Embarcamse, anualmente, cerca de 120 mal negros da costa da África, unicamente para o Brasil, e é raro chegarem a seu destino mais de 80 a 90 mail. Perde-se, portanto, cerca de um terço durante uma travessia de dois meses
e meio a três meses. [...] Esses infelizes são amontoados num compartimento cuja altura raramente ultrapassa cinco pés. Esse cárcere ocupa todo o comprimento e a largura do porão do navio; aí são eles reunidos em número de duzentos a trezentos, de modo que para cada homem adulto se reserva apenas um espaço de 5 pês cúbicos. [...] Os escravos são aí amontoados de encontro às paredes do navio e em torno do mastro; onde quer que haja lugar para uma criatura humana, e qualquer que seja a posição que se lhe faça tomar, aproverta-se. [...] Todos, principalmente nos primeiros tempos da travessia, têm algemas nos pés e nas mãos e são presos uns aos outros por uma comprida corrente. Acrescentemos, a essa deplorável situação, o calor ardente do Equador, a fúria das tempestades e a alimentação, a que não estão acostumados, de feijão e carne salgada, a falta de água, finalmente, consequência quase sempre inevitável da cobiça em virtude da qual se aproveita o menor espaço para tornar a carga mais mca, e teremos a razão da enorme mortalidade. [...] (Viagem pitoresca através do Brasil, p. 136.)
Outros desenhistas, escultores, pintores e arquitetos
vieram para o Brasil, como o francês Jean Baptiste Debret. Em
1816, ele embarcou
no Havre com
destino ao
Rio de Janeiro, como integrante da Missão Artística Fran-
21
“ml
cesa, que lecionaria na Academia de Belas-Artes criada por D. João. Em suas aquarelas, Debret fixou cenas do dia-a-dia, as ocupações dos escravos, os grupos indíge-
nas e também os fatos da vida da Corte, como a aclama-
DEBRET
ção do rei Dom João VI.
Feitores castigando negros.
Todavia, nenhum desses artistas retratou a chegada de mais de dois mil suíços ao Rio de Janeiro, em 1818. Eles estavam vindo para o Brasil em consequência da fome que assolara o seu país e atraídos pelas promessas do governo de D. João de doação de lotes de terra,
onde poderiam viver com suas famílias. Após uma longa e sofrida travessia do Atlântico, que em muito se assemelhava à dos navios negreiros, os suíços foram estabelecidos em Morro Queimado, na província do Rio de Janeiro. Ali surgiu a vila de Nova Friburgo. Ali as esperanças de uma vida feliz foram desaparecendo rapidamente: só no primeiro ano, 146 suíços morreram vitimados pelas “febres de Macacu”' — a malária! Reis, rainhas e príncipes; nobres, fidalgos e funcionários; caixeiros-viajantes, artistas e estudiosos; ingleses, 22
suíços, franceses e alemães — quanta gente diferente passara a chegar aos portos do Brasil desde 1608! Mercadorias úteis e outras nem tanto; livros e jornais; idéias de liberdade e de igualdade — quantas novidades! Os habitantes de Salvador pareciam ter mesmo razão quando pressentiram que suas vidas iriam mudar... Embora o tráfico negreiro continuasse, a antiga Colônia tornara-se sede do Império português, tendo sido elevada à categoria de Reino Unido a Portugal e Algarves, em 1815. A cidade do Rio de Janeiro passara a se-
diar a Corte, sendo muitas vezes identificada como uma “nova Lisboa” pelos enciumados moradores de outras
partes do Brasil. Dos velhos países europeus e dos novos países americanos, como os Estados Unidos da América, chegavam representantes diplomáticos.
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Aspecto
da vida cotidiana
dos escravos no Rio de Janeiro.
Desses representantes, o de maior prestígio e importância era Lord Strangford, representante inglês. Seguindo as instruções do governo de Sua Majestade britânica, ele convencera o príncipe-regente D. João 23
a se transferir para o Brasil, em
1807,
mas
não sem an-
tes exigir vantagens econômicas e políticas para os co-
merciantes e o governo ingleses. Por isso, quando a família real deixou Lisboa, Lord Strangford pôde declarar
de modo orgulhoso e arrogante:
Defendi para a Inglaterra o direito de estabelecer
“como Brasil relações de soberano e de vassalo, e de exi-
gir obediência a ser paga como o preço de proteção.
(Apud Caio de Freitas, George Canning eo Brasil, v. 1, p. 94.)
No dia 22 de julho de 1808, Lord Strangford chegava ao Rio de Janeiro.
24
|
CAPÍTULO 2
O
Os novos colonizadores
A preponderância britânica ão logo acomodou-se na cidade, Lord Strangford procurou o governo de D. João com a finalidade de concluir novos acordos políticos e econômicos. Eles deveriam complementar aquelas decisões que haviam sido tomadas ainda na Europa e garantiam inúmeras vantagens ao governo, súditos e comerciantes ingleses. | As negociações foram difíceis e tumultuadas. Somente em fevereiro de 1810 foram assinados os tratados de Aliança e Amizade e Comércio e Navegação, nos quais se afirmava que:
/...] haverá uma sincera e perpétua Amizade entre Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal e Sua Magestade Britânica, e entre seus Elerdeiros e Sucessores, e haverá uma constante e uniwersal Paz e Flarmonia entre Ambos. [.../ (Apud R.
Macedo,
História admi-
nistrativa do Brasil, v. 6, p. 96.)
Por meio dos tratados, o governo britânico assumia o compromisso de: | as
/...] jamais
reconhecer como o Rei de Portugal ou-
tro algum Principe que não seja o Herdeiro e Legítimo Representante da Real Casa de Bragança. [...]
(Apud R. Macedo, História administrativa do Brasil, v. 6, p. 914.)
É o governo de D. João, em contrapartida, assegurava um conjunto de vantagens e privilégios aos ingleses. Como estas:
/...] Conceder a Sua Magestade Britânica o Privilégio de fazer comprar e cortar Madeiras para construção
de Navios de Guerra nos Bosques, Florestas e Matas do Brasil... juntamente com permissão de poder fazer construir, prover ou reparar Navios de Guerra nos Portos e Países daquele Império [...] [...J a Inquisição não será para o futuro estabelecida nos Meridionais Domínios Americanos da Coroa de Portugal [...] [... Juma gradual abolição do Comércio de Escravos [...]
[...] não será permitido continuar o Comércio de Es-
cravos em outra alguma parte da Costa da África que não pertença atualmente aos Dominios de Sua Alteza Real [...] /...] Flaverá reciproca Liberdade de Comércio e Navegação entre os respectivos Vassalos das Duas Altas Partes Contratantes em todos e em cada um dos Territórios e Dominios de qualquer dºElas. Eles poderão negociar, viajar, residir ou estabelecer-se em todos e cada um dos Portos, Cidades, Vilas, Países, Províncias ou Lugares [...| [...J E os Vassalos de Cada uma das Altas Partes Contratantes terão liwre e inquestionável Direito de viajar e de residir nos Temitórios ou Domínios das Outras, de ocupar
Casas e Armazéns, e de dispor da Propriedade Pessoal [...] /...] conceder-lhes o Privilégio de Nomearem e terem
Magistrados Especiais, para obrarem em seu favor como Juizes Conservadores [...] 26
/[...J os Vassalos de Sua Magestade Britânica não serão perturbados, inquietados, perseguidos ou molestados por causa de Sua Religião, mas antes terão perfeia Liberdade de Consciência [...] /...] Todos os Gêneros, Mercadorias e Artigos, quaisquer que sejam da Produção, Manufatura, Indústra ou Invenção dos Dominios e Vassalos de Sua Ma-
jestade Britânica serão admitidos em todos e em cada um dos Portos e Domínios de Sua Álteza Real o Príncipe Regente de Portugal, tanto na Europa como na America, África e Ásia [...|, pagando geral e unicamente Direitos de Quinze por Cento. [...] (Apud R. Macedo, História admi-
nistrativa do Brasil, v. 6, p. 92-106.)
Os antigos colonizadores portugueses protestaram contra tamanhas concessões aos ingleses. Elas punham por terra os antigos monopólios e privilégios que lhes garantiam riqueza, poder e prestígio. Os bispos e padres católicos eram contrários à liberdade de religião para os protestantes. Os magistrados portugueses não concordavam com a existência do Juiz Conservador britânico. Os traficantes negreiros protestavam contra a decisão de abolir gradualmente o tráfico negreiro intercontinental, além de limitá-lo às colônias portuguesas na África. Os comerciantes reinóis sentiamse mais do que nunca ameaçados, porque além de ser garantida ampla liberdade de comércio e navegação, os produtos ingleses somente pagariam 15% de tarifas alfandegárias. Os antigos colonizadores portugueses pareciam não ter dúvidas. Os ingleses estavam se transformando nos novos colonizadores! Maria Graham veio ao Brasil acompanhando seu marido, oficial da Marinha de Guerra inglesa. Em 1822, -no Rio de Janeiro, ela constatou a preponderância dos comerciantes e das mercadorias inglesas; 21
/...] Fui à terra fazer compras [...] Há muitas ca-
sas inglesas, tais como seleiros e armazéns, não diferentes do que chamamos na Inglaterra um armazém italia-
no, de secos e molhados, mas, em geral, os ingleses aqui vendem suas mercadorias em grosso a retalhistas* nati-
vos ou franceses. Os últimos têm muitas lojas de fazen-
das, armarinhos, modistas. Quanto a alfaiates, penso que há mais ingleses do que franceses, mas poucos de uns e outros. Há padarias de ambas as nações, e abundantes tavernas inglesas cujas insígnias com a bandeira da União, leões vermelhos, marinheiros alegres e tabuletas inglesas, competem com as de Greenwich ou Depford. [...] Às ruas estão, em geral, repletas de mercadorias inglesas. À cada porta as palavras Superfino de Londres saltam aos olhos. [...] (Diário de uma viagem ao Brasil, p.
210.)
As mercadorias as partes e em todos do Rio de Janeiro. 1813, John Luccock
inglesas pareciam estar por todas os lugares, e não apenas na cidade Ao passar por Angra dos Reis, em pôde observar:
[...] há muitos índios civilizados que vivem no distrito. Ao passarmos por um de seus aldeamentos encontramos a gente sentada sob tendas colocadas defronte das choças, vestida com tudo de mais fino que a barateza dos artigos ingleses entre eles introduziu. [...] (Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil, p. 180.)
Como também pareciam estar por todas as partes e lugares os súditos de Sua Majestade britânica. Podero-
sos e arrogantes, como Lord Strangford. Ou como o simples guarda-marinha que Luccock viu no Rio de Janeiro, ainda em 1808.
28
/...] Certa vez,
um guarda-marinha,
muito novo
anda, sacou do espadim contra a guarda real, bem junto ao Paço, desafiando toda ela feito um menino. Um português idoso, indignado com o espetáculo, exclamou para os soldados: “Por que não o derrubam?” “Ele é inglês”, foi a resposta, “e desobedeceriamos às ordens do Príncipe se o machucássemos”. [...] Exemplos tais,
de uma atenção gentil e respeitosa, poderiam ser multiplicados em grande número, caso alguma alma cândida que testemunhasse ou ouvisse relatar esses fatos pudesse duvidar da grata consideração que o Regente alimenta por nós e o nosso governo. [...]
MEN
(Id., ibid., p. 65.)
29
CAPÍTULO 3
Para ficar de todo americano A idéia de um
Império americano
o mesmo tempo que os ingleses iam se transformando nos novos colonizadores — controlando o comércio internacional, influenciando as decisões do governo de D. João, impondo a liberdade de culto —, os antigos colonizadores procuravam se adaptar às novas condições surgidas com a instalação da Corte no Rio de Janeiro. Incapazes de competir com os ingleses, os comerciantes reinóis intensificaram sua participação na atividade comercial interna. À instalação no Rio de Janeiro de antigos órgãos administrativos existentes em Lisboa — como a Mesa da Consciência e Ordem — e a criação de alguns novos — como o Banco do Brasil, o Real Horto, as academias de Medicina e Militar — garantiam ocupação à chusma* de funcionários. A Corte portuguesa procurava, assim, proteger os dois segmentos sociais que lhe serviam tradicionalmente de sustentáculo: os funcionários e os comerciantes reinóis. Não obstante, tanto ela quanto eles estavam mudando! Pouco a pouco, uma antiga idéia voltou a tomar força junto aos que gravitavam ao redor da família real, no Rio de Janeiro — a criação de um Império americano. Para muitos daqueles burocratas a situação européia que determinara a vinda da Corte para o Brasil tão cedo não se modificaria. A família real desfrutava de uma paz e tranquilidade no Rio de Janeiro que não conhece30
ra na Europa
agitada
pela Revolução
Francesa,
muito
embora também temesse a presença dos escravos e da plebe nas ruas da cidade. A invasão da Guiana Francesa e a conquista da Banda Oriental do Uruguai, que se transformaria na província Cisplatina, transmitiam à Corte uma sensação de poder militar. E ainda havia o prestígio, expresso nas representações diplomáticas que chegavam ao Rio de Janeiro. Por que não ficar de vez no Brasil? Por que não estabelecer um Império nos trópicos? Conta-se
mesmo
em
que,
1811,
o cônsul
austríaco
no Rio de Janeiro procurou mostrar ao conde da Barca, ministro de Dom João, a inconveniência e o risco de menosprezar Portugal, donde poderia resultar a sua separação. Teria ouvido, então, em resposta, achar-se o governo do príncipe-regente preparado para aquela eventualidade, e que tal não o assustava
/...J e que de coração leve renunciaria à Europa, ficando de todo americano. (Apud
M.
de Oliveira Lima, D.
João FI no Brasil, p. 1020.)
A idéia de um
Império
americano
Novos eram os Interesses e as forças que
não era nova.
a sustentavam,
no Rio de Janeiro. A permanência da Corte no Rio de Janeiro possibi-
litava uma reaproximação entre os antigos colonizadores
e os colonos, inimaginável alguns ános antes. Uma reaproximação que não significava, porém, uma restauração do pacto colonial. Os colonos das áreas próximas ao Rio de Janeiro começaram a produzir gêneros e a criar pequenos animais e aves para o abastecimento da cidade, aliando-se aos comerciantes que, agora, dedicavam-se ao mercado interno. Alguns desses colonos chegaram a construir casas no Rio de Janeiro, nelas permanecendo durante certo período do ano não só para conviver com a “nobreza do Rio de 31
Janeiro”, mas também para usufruir das vantagens materiais que o governo do príncipe proporcionava. Por
sua
transformando
vez,
em
comerciantes
e burocratas
foram
se
proprietários de terras e de escravos,
servindo-se para tal das posições e cargos que ocupavam
junto à administração joanina. Assim, a permanência da Corte no Rio de Janeiro
possibilitava não só uma nova aliança entre colonos e co-
lonizadores, mas sobretudo que ambos utilizassem as influências políticas em proveito de seus negócios particulares. Sesmarias* foram concedidas a comerciantes e funcionários, em regiões de extrema fertilidade; estradas foram abertas, ligando as zonas interioranas à capital e permitindo o escoamento da produção; créditos eram ob-
tidos junto ao Banco do Brasil; no Real Horto era feita a aclimatação de novas espécies vegetais; e em certa oca-
sião o príncipe-regente, pessoalmente, distribuiu mudas de cafeeiro a seus apaniguados*. A muitos contemporâneos não escapava o que acontecia no Rio de Janeiro. Para Debret, a política de concessão de terras era uma espécie de compensação:
/...] As propriedades em Portugal sofreram muito enquanto durou a guerra na Peninsula, porque a presença das tropas inglesas, que aí ficaram como aliadas, foi mais onerosa do que a das francesas, que evacuavam então o pais; para compensar essas desgraças,
o gover-
no do Brasil concedeu às famílias nobres terras em diferentes pontos das cercanias da cidade. O visconde da Seca obteve grande parte das montanhas da Tijuca e
das colinas que descem até à cidade. [...]
(Viagem pitoresca e histórica ao Brasil,
t.2,v.3, p. 14-5.)
Saint-Hilaire tinha opinião diversa:
[...] Nada se equipara à injustiça e à inépeia*
graças as quais fot até agora feita a distribuição das ter32
ras. E evidente que, sobretudo onde não existe nobreza, é do interesse do Estado que haja nas fortunas a menor desigualdade possível. No Brasil, nada haveria mais fácil do que enriquecer certa quantidade de famílias. Era preciso que se distribuísse, gratuitamente, e por pequenos lotes, esta imensa extensão de terras vizinhas a capital, e que ainda estava por se conceder quando chegou o Rei. Que se fez, pelo contrário? Retalhouse o solo pelo sistema das sesmarias, concessões que só se podiam obter depois de muitas formalidades e a propósito das quais era necessário pagar o título expedido. O rico, conhecedor do andamento dos negócios, tinha protetores e podia fazer bons favores; pedia-as para cada membro de sua familia e assim alcançava imensa extensão de terras. [...] O Rei dava terras sem conta nem medida aos homens a quem imaginava dever serviços. [...] Os pobres que não podem ter títulos, estabelecemse nos terrenos que sabem não ter dono. Plantam, constroem pequenas casas, criam galinhas, e quando menos esperam, aparece-lhes um homem rico, com o título que recebeu na véspera, expulsa-os e aproveita o fruto de seu trabalho. [...]
(Segunda viagem do Rio de Janeiro a
Minas Gerais e a São Paulo, p. 23.)
A quem a política Joanina de concessão de terras privilegiava? Certamente, não os colonizados. E muito menos as famílias suíças localizadas em Morro Queima-
do,
um
em
1818.
Quando,
algumas
décadas
mais
representante da Confederação Helvética*
tarde,
veio ao
Brasil para saber o que acontecera com aquelas famílias,
constatou com
amargor:
/...] Não ser a que atnbum a escolha tão infeliz do local da colônia, se à ignorância ou ao desleixo. Estou, entretanto, inclinado a crer que se procedeu de acordo 33
com um frio cálculo e rdérvas preconcebidas, que se podem resumar da seguinte maneira: essas terras não têm para
nós nenhum valor, mas os pobres colonos suíços as tornarão cultiváveis e as aproveitarão, pois a miséria os
obrigará a tal. [...]
J.J. Tschudi,
Viagem às províncias
do Rio de Janeiro e São Paulo, p. 101.)
A política joanina privilegiava, na verdade, os antigos colonizadores, que ao se tornarem proprietários de terras e de escravos,
ko
seus interesses nas áre-
as próximas ao Rio de Janeiro. Por meio da doação de sesmarias, da concessão de créditos, da distribuição de mudas e sementes, do incentivo a novas atividades, ela la reaproximando comerciantes e burocratas dos colonos das zonas vizinhas à capital. Através da abertura de estradas, da distribuição de títulos de nobreza e da concessão de favores, ela propiciava a integração da parte centro-sul do país — tanto do ponto de vista espacial, quanto do aspecto político e social — à Corte. A política joanina propiciava, em suma, a formação de um poderoso bloco de interesses no Rio de Janeiro — interesses econômicos, financeiros, políticos e sociais. E seria justamente esse bloco que apoiaria a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido a Portugal e Algarves, em 1815. Era esse bloco de interesses que sustentava a idéia do estabelecimento de um Império americano. O mundo em que aquelas pessoas viviam estava mudando porque suas vidas estavam mudando. Todavia, a política joanina teria outros efeitos. Ela possibilitaria, pela primeira vez, uma unidade das diferentes regiões da antiga Colônia, tendo como centro aglutinador o Rio de Janeiro. E tal particularidade não escapou a muitos daqueles que viviam essas mudanças, como o inglês John Luccock, que aqui chegara em 1806. Ele observaria, de modo arguto:
[...] em antigos tempos as províncias eram quase que completamente desligadas umas das outras, que talvez
p s
enraizavam
34
não possuissem outro laço comum a não ser a semelhança da língua, o fato de receberem seus respectivos governadores trnenais da mesma Corte e o que provinha do comércio que canalizava suas vistas e anteresses para a mesma cidade da Europa, existindo, ao mesmo tempo, entre algumas dessas províncias, oposições de interesses e entre outras rivalidades declaradas e ostensivas. Ássim foi que, quando a Corte chegou ao Rio, se venficou que as Colônias consistiam de partes tão desconjuntadas que, à menor agitação, estariam prestes a se desmanchar em pedaços. [...] Foi necessária toda a habilidade do Governo e todo o poderoso apoio que recebeu da Inglaterra [...] para manter o Brasil todo dentro dos mesmos laços, para desviar a atenção do povo, de Lisboa para o Rio, para levá-lo a sentir nesta última cidade o centro da sua unidade, a Capital de sua população tão grandemente difusa, a fonte de sua segurança, o foco e a nascente de sua riqueza e de sua honra. [...] (Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil, p. 376.)
Pouco a pouco, a idéia de um parecia se concretizar.
Império americano
35
CAPÍTULO 4
Como este Rio de Janeiro ficou grande! O Rio de Janeiro, sede da Corte om a instalação da família real, o Rio de Janeiro se tornara sede da Corte portuguesa. A cidade — que desde 1763 era a capital da Colônia — foi, da noite para o dia, agitada por inovações que alteraram o seu ritmo de vida. Mas como a cidade se apresentava aos olhos daqueles que vieram na esteira dos que fugiam da Furopa? John Luccock assim identificou seus habitantes:
/[...] Contando as ruas e o número de casas em muitas delas, imaginei que podia haver ao todo quatro mal residências; o número médio de pessoas em cada uma era provavelmente de quinze, perfazendo uma população de sessenta mil, dos quais um terço composto. de brancos ou mulatos claros. [...] Os estrangeiros, que não foram incluídos neste cômputo *, subiam a cerca de dezesseis mal. [...] Essa massa de gente dividia-se, sem grande precisão, provavelmente nas classes seguintes: 1 000 relacionados por várias formas com a Corte. 1 000 funcionários públicos. 1 000 que em geral residiam na cidade, mas tiravam seu sustento principalmente das terras da vizinhança e de navios.
700 padres residentes. 500 advogados. 200 que praticavam a medicina,
36
2 4 1 1
40 000 000 250 100 300 000 000 000
negociantes regulares. retalhistas de variadas espécies. caixeiros, aprendizes e criados de loja. mecânicos. taberneiros, vulgarmente chamados de venderros. pescadores. soldados de linha. marinheiros pertencentes ao porto. negros forros.
1 1 12 000 escravos. 4 000 mulheres como chefes de família.
A fim de perfazer os sessenta mal dever-se-ão somar ainda cerca de vinte e nove mil crianças. [...] (Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil, p. 28-9.)
Para a grande maioria dos estrangeiros que aqui chegaram, o Rio de Janeiro era uma cidade feia, suja, malcheirosa, cortada por ruelas e becos. Um ambiente pouco atrativo, que contrastava vivamente com à beleza de sua exuberante natureza tropical. Um dos nobres da Corte, o conde de Palmela, sublinhava esse contraste numa carta escrita para sua mulher, em 1821:
/...] Há sínios lindíssimos muito perto da cidade e onde moram muitas pessoas da sociedade, e por exemplo o que chamam a Baia de Botafogo é, sem exagero, compa-
rável aos mais belos sítios da Itália ou da Suiça. Falta
gente coisas e seus ção, a
branca, luxo, boas estradas, enfim faltam muitas que o tempo dará, mas não falta, como em Lisboa arredores, água e verduras, pois mesmo nesta esiapior, temos tudo aqui tão verde como na Inglaterra. [...] (Apud Luiz Norton, À Corte de Por-
tugal no Brasil, p. 83.)
O coração da cidade era uma praça, ao redor da qual erguiam-se O Paço dos Governadores, tornado residência da família real, algumas igrejas, como a Capela 37
DEBRET
O centro do Rio de Janeiro,
passado. Atual praça XV,
Real,
o Senado
visto por Debret no início do século
da Câmara
e os sobrados
das famílias
mais importantes. As maneiras de seus habitantes também causavam estranheza a esses estrangeiros, que tudo avaliavam com olhos europeus. À medida que conhecia a cidade, Luccock 1a observando os costumes de seus habitantes. Visitando o matadouro público, comentou:
/...] muitas das cenas que ali ocorrem são altamente comovedoras e, todas elas, de máxima sujeira, já que tentativa alguma se faz para limpar o local, ainda que
em parte. [...] As condições gerais do animal, bem como as manipulações pelas quais passava, tornavam a
carne tão ruim, que só mesmo a necessidade premente ou a sua vista constante e sempre nas mesmas péssimas condições poderia levar a menos delicada das pessoas a provar dela. [...] (Notas sobre o Rio de Janeiro e pontos meridionais do Brasil, p. 30.)
Ele se admirava ainda da influência das superstições religiosas sobre os hábitos alimentares da população:
O carneiro era e continua sendo pouco procurado pelo povo do Brasil; alegam alguns, talvez brincando, 38
que 2sso não é comida própria de cristão, por isso que foi o Cordeiro Divino que tomou consigo os pecados do mundo. [...] Não há bom católico, neste país, que corte uma banana transversalmente, porque seu miolo apresenta a figura de uma cruz. [...] (Id., ibid., p. 30-4.) A raridade do trigo, alimento habitual para os europeus, também por ele foi sentida:
/...] O substituto universal daquilo que nós consideramos o arrimo da vida é um pó chamado Farinha, produto da mandioca. [...] Um prato de farinha com caldo de laranja espremido por cima constitui uma refeação fregiiente entre os vendedores pobres e operários; outros a comem com molho e os negros fazem-na passar por uma ligeira fervura. [...] (Id., ibid., p. 32.) Contudo, a chegada de tantas pessoas transformava a fisionomia da cidade. O comerciante inglês obser-
vou como, em pouco tempo, a área da cidade foi ampliada:
[...] A penetração da cidade em sítios tão recentemente ainda cobertos de matas, surpreendeu a muitos dos seus novos habitantes, enquanto aqueles que se haviam acostumado à sua fisionomia anterior mais espantados ficaram ainda. Um destes últimos exprimiu com singeleza essa idéia; uma preta velha que encontre: perto da igreja de São Lourenço, vinha descendo a encosta sobre a qual se encontra a igreja, frando enquanto caminhava, [...] quando este solilóquio* urrompeu de seus lábios: “Como este Rio de Janeiro ficou grande!”. [...] (Id., ibid., p. 28.) 39
DEBRET
Movimento do largo do Paço, ao final da tarde.
Mas a cidade não apenas se expandia espacialmente; ela mudava também sua aparência, abrindo-se às modas européias. Suas casas perdiam a aparência de reclusão e isolamento. No lugar das rótulas — grades de madeira usadas nas janelas, que mal permitiam a entrada da luz — surgiram janelas envidraçadas. O hábito de se construírem casas cercadas de jardins, trazido pelos ingleses, difundiu-se entre as famílias abastadas, Retornando ao Rio de Janeiro, em 1813, Luccock percebeu essas novas feições:
/[...] As casas particulares revelavam quantidade maior de mobília, seu estilo estava modernizado e adaptado à situação superior de seus possuidores. Sua maneira de vestir-se fizera-se mais respeitável; suas mesas apareciam cobertas de variedade maior; os mercados eram supridos mais e melhor, não somente com os comuns artigos sólidos de primeira necessidade, como ainda de aves, caças e frutas. [...] Daí todos aqueles que 40
tinham pretensões, por minimas que fossem, à elegância,
e mesmo a respeitabilidade, abandonaram não somente as obsoletas ““redes”” como as mais modernas “cadeiras”" em que outrora se faziam carregar pelas ruas, pondo-lhes no lugar veículos de rodas com criados de libré*. E tudo quanto pudesse em algo acrescentar ao conforto e aparência, pareceu a todos digno de obter-se. [...]
DEBRET
(Id., ibid., p. 364.)
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O jantar de um negociante e sua família.
A presença da des famílias, quer quer daquelas que da da família real.
Corte modificou os costumes das grandaquelas que já habitavam a cidade, aí se instalaram atraídas pela chegaCostumes que persistiram por várias
gerações eram, agora, vistos como algo atrasado. Novos espaços sociais surgiram, tornando-se vitrinas de novos comportamentos, à moda européia:
/...] Às distrações do teatro progrediam de par com os assuntos de maior importância. [...] Daí tornar-se 41
moda, para quantos quisessem fazer-se passar por pessoas de destaque, aparecer também ali, e o encantamento, que condenara as senhoras brasileiras à reclusão do lar, quebrou-se. [...] Nas peças que se representavam, ridicularizavam-se as maneiras, vicios, dialeto e outras peculiaridades da colônia, o que corrigiu os gostos do
público. [...]
(Id., ibid., p. 163.) O fim da proibição da existência de gráficas, ainda em 1808, possibilitou o surgimento de jornais e revistas, assim como maior circulação de notícias e idéias. Contudo, a censura não deixou de existir. Nada era impresso sem a autorização dos censores. Falando do primeiro jornal surgido na Corte — a Gazeta do Rio de Janeiro —, o inglês John Armitage ironizava:
/...] Por meio dela só se com toda fidelidade, do estado de cipes da Europa e, de quando em nas eram ilustradas com alguns
informava ao público, saúde de todos os prinquando, as suas págidocumentos de oficio,
noticias dos dias, natalícios, odes, e panegíricos*, da família reinante. Não se manchavam essas páginas com as efervescências da democracia, nem com a exposição
de agravos. À julgar-se do Brasil pelo seu único periódico, devia ser considerado um paraíso terrestre, onde nunca se tenha expressado um só queixume. [...]
(História do Brasil, p. 41.) Ainda assim, poucos eram aqueles que tinham acesso à informação escrita. Um exemplo disso era o pouco desenvolvimento do negócio de livros, na cidade. O inglês Caldleugh observou:
[...J a livraria no Rio de Janeiro é mau negócio. O stock fica muito tempo encalhado. Talvez por isso 42
ape-
o número de livreiros, que era de dois, em 1792,
nas dobrara, em 1820. [...]
(Apud C. de Melo Leitão, O Brasil visto pelos ingleses, p. 174.)
Mudanças também ocorreram no ensino destinado aos filhos das famílias abastadas. Escolas foram criadas,
muitas vezes aproveitando os europeus como professores. Debret mostrava-se entusiasmado com a nova situação, comentando:
/...J a partir de 1820 a educação começou a tomar verdadeiro impulso e os meios de ensino multaplicaram-se de tal maneira de ano para ano que, já hoje, não é raro encontrar-se uma senhora capaz de manter uma correspondência em várias linguas e apreciar a leitura, como na Europa. [...] (Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, t27v. 3, pol8-9.)
Todas essas mudanças
não foram suficientes, contu-
do, para alterar a vida cotidiana dos colonizados. DEBRET
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*
7
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um funcionário a passeio com sua família.
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Na cidade, os escravos negros permaneciam realizando as atividades de sempre. Eram eles que abasteciam de água as casas e carregavam até o mar os barris com dejetos; transportavam mercadorias e passageiros; eram
empregados por seus amos nas oficinas artesanais e como negros de ganho. Nas residências senhoriais, as mu-
lheres escravas eram as amas-de-leite, as criadas, as responsáveis pelos inúmeros serviços domésticos. Não raro, famílias respeitáveis empregavam duas ou três escravas como prostitutas, de modo a garantir uma renda adicional. O trabalho dos escravos permitia a manutenção de
antigos privilégios e interesses, como observou Debret:
/...] Embora pareça estranho que nesse século de luzes se depare ainda no Rio de Janeiro com o costume de transportar enormes fardos à cabeça dos carregadores negros, é indiscutível que a totalidade da população brasileira da cidade, acostumada a esse sistema, que assegura a remuneração diária dos escravos empregados nos serviços de rua, se opõe à introdução de qualquer outro meio de transporte, como seja, por exemplo, o dos carros atrelados. Com efeito, a inovação comprometeria dentro de pouco tempo não só os interesses dos proprietários de inúmeros escravos, mas ainda a própria existência da maior parte da população, a do pequeno capitalista e das viúvas indigentes, cujos negros todas as noites trazem para casa os vinténs necessários muitas vezes à compra das provisões do dia seguinte. [...]
(Id., ibid., t. 1, v. 2, p. 234.) E ainda a permanência de antigos preconceitos, como a de um vizinho de Debret que voltou para casa, certo dia, seguido por um escravo negro carregador:
[..-] cujo enorme cesto continha neste momento um lápis de cera para lacrar e duas penas novas. MRE.
(Id., ibid., p. 159.) 44
As ruds da cidade eram
ocupadas,
ainda,
por uma
população livre e pobre. Eram fnendigos, vadios, elementos que se entregavam a pequenos e esporádicos afazeres, nem sempre lícitos. A presença dos escravos e dos homens livres e pobres na cidade intranquilizava a Corte, deixava em permanente sobressaltoa população livre e proprietária, representava preocupação permanente para a Intendência de Polícia da Corte, tirava o sono daqueles que eram conhecidos como os “branquinhos do Reino”...
45
S
CAPÍTULO
5
Quem vai fazer
a minha barba?
A Revolução Pernambucana de 1817 permanência da família real no Brasil era desejada por aqueles setores sociais — comerciantes, burocratas, proprietários de terras e de escravos — que prosperavam, acumulavam poder e ganhavam prestígio no Rio de Janeiro. Eles sabiam que os favores concedidos pelo soberano português eram a razão fundamental das mudanças que ocorriam em suas vidas. Semelhante opinião não era partilhada pelos habitantes de outras regiões do Brasil. Muito pelo contrário! Passada a euforia inicial motivada pela chegada da família real, eles perceberam que pouco haviam ganho. Perce-
beram
ainda que,
nos últimos
tempos,
chegavam
mes-
mo a perder, sustentando com pesados tributos o luxo da Corte, a política expansionista de D. João, os funcionários ociosos, etc. Por essa razão, cada vez mais comentavam entre si que o Rio de Janeiro se transformara numa “nova Lisboa””, dominada por “portugueses” que oprimiam os ““brasileiros”” das demais partes do país. Esse sentimento era particularmente forte na região nordestina, afetada pela crise das produções açucareira e algodoeira e pela seca de 1816.
Em Recife — capital da província de Pernambuco e um dos principais portos da região — não faltavam motivos de descontentamento. Ninguém mais suportava os tributos e taxações excessivos. Os comerciantes locais
46
e
ni a
ad
Pátio do Terço. se viam prejudicados pelo controle quase monopolista que os reinóis passaram a exercer sobre o comércio varejista. Muitos militares de origem brasileira eram preteridos nas promoções em proveito dos portugueses. Ninguém mais duvidava. Os 'portugueses'' da ““nova Lisboa” exploravam e oprimiam os “patriotas pernambucanos”. Francisco Muniz Tavares, uma destacada figura da sociedade pernambucana, assim se referia a D. João:
/...] Porquanto, que culpa tiveram estes [habitantes de Pernambuco] de que o Príncipe de Portugal sacudido da sua capital pelos ventos impetuosos de uma invasão inimiga, saindo faminto de entre os seus lusitanos, viesse achar abrigo no franco e generoso continente do Brasil, e matar a fome e a sede na altura de Pernambuco? (História da Revolução de Pernambuco em 1817, p. 83.)
47
As idéias liberais alimentavam esse sentimento de revolta. Desde fins do século XVIII, várias sociedades secretas — como as lojas maçônicas Patriotismo, Restau-
ração, Pernambuco do Ocidente e Pernambuco do Orien-
te — serviam como pontos de discussão e difusão das ““in-
fames idéias francesas””.
Nelas, ensaiava-se a resistência
à dominação portuguesa, um espírito patriótico ganhava corpo. Em suas Notas dominicais, o francês Tollenare registrava esse fato:
[...] Falava-se de conciliábulos* feitos sob as for-
mas maçônicas; tinha havido banquetes brasileiros dos
quais se excluia o pão e o vinho da Europa; servia-se com ostentação a farinha de mandioca e a ruim aguardente nacionais; enfim, tinham sido erguidos brindes à independência, contra a tirania real e contra os portugueses da Europa. Toda a cidade sabia dessas circunstâncias sediciosas *; representações reiteradas haviam sido feitas ao governador
Caetano Pinto de Miranda Montenegro; este, porém, homem de le, amigo da paz, infelizmente imprevidente, sem caráter nem energia, não lhes dera importância. [...] (p. 182.)
Entretanto, o agravamento da situação levou o governador a ordenar a prisão de alguns suspeitos envolvidos com a ação das lojas maçônicas.
Foi o suficiente pa-
ra que uma revolta eclodisse, em março de 1817. Os seus líderes prenderam o governador e instauraram um
Governo Provisório. Esse governo pretendia ser um representante de ““todas as classes”, isto é, de todas as profissões. Dele faziam parte o comerciante Domingos José Martins, o advogado José Luís de Mendonça, o capitão Domingos Teotônio Jorge, o padre João Ribeiro e o fazendeiro Manuel Correia de Araújo. Mas onde estavam os representantes das profissões mais humildes? E os escravos?
48
Os líderes do movimento falavam a todo momento
em Liberdade. E com isso queriam dizer que desejavam pôr fim ao domínio português, realizando a “*independência da Pátria”, e não que pretendiam pôr fim à escravi-
dão. No momento em que muitos proprietários de terras e de escravos, que inicialmente haviam apoiado o movi-
mento revolucionário, começaram a retirar o seu apoio porque ouviram dizer que os escravos seriam libertados, o Governo Provisório lançou um manifesto. A sua inten-
ção era tranquilizadora, e revelava as dificuldades da utilização das idéias liberais por uma sociedade baseada no trabalho escravo. Lia-se nele:
Patriotas Pernambucanos! A suspeita tem se insinuado nos proprietários rurais: eles crêem que a benéfica tendência da presente liberal revolução tem por fim à emancipação indistinta dos homens de cor e escravos. /...] Patriotas, vossas propriedades, ainda as mais opugnantes* ao ideal da justiça, serão sagradas; o Governo porá meios de diminuir o mal, não o fará cessar pela força. Crede na palavra do Governo, ela é inviolável, ela é santa. (Apud C.G. Mota, Nordeste 1817,
p. 154.)
Os pernambucanos pretendiam fazer uma revolução. Desejavam dar início a um tempo novo, rompendo com o passado de exploração e opressão. E procuravam vivêlo mudando as formas de tratamento, os hábitos, criando um sentimento de igualdade, mesmo que restrita aos homens brancos. Estando em Pernambuco na época do movimento, Tollenare fez interessantes comentários a respeito disso:
[...] Em lugar de “Vossa mercê”*, diz-se “Vós”, simplesmente; em lugar de Senhor ê-se interpelado pela palavra Patriota, o que equivale a cidadão e ao trata49
mento de tu [...] Às cruzes de Cristo e outras condecorações reais abandonam as botoeiras; fez-se desaparecer as armas e os retratos do rei. (Notas dominicais, p. 195.)
Até mesmo as parcelas mais humildes da população
de Recife adotavam esse tipo de comportamento, rompendo com a hierarquização que distinguia a sociedade colonial. Um português que vivia na cidade, Cardoso Machado, comentava indignado:
/...J até os barbeiros não me quiseram mais fazer a barba, respondiam que estavam ocupados no serviço da pátria, via-me obrigado a fazer a mim mesmo a barba. (Apud C.G. Mota, Nordeste 1817, p. 85.)
Os líderes da revolução enviaram representantes às províncias vizinhas, em busca de adesão ao movimento. Aos pernambucanos se uniram as províncias do Rio Grande do Norte e da Paraíba; os emissários para o Ceará e para a Bahia foram presos. Os pernambucanos procuraram ainda obter o apoio da Inglaterra e dos EUA, infrutiferamente. Tão logo a notícia do movimento chegou ao Rio de Janeiro,
o governo de D. João ordenou
uma
violenta
repressão. Os interesses dominantes no Rio de Janeiro não admitiam que uma sedição ameaçasse a unidade do Império que pretendiam construir. De Salvador partiram as tropas fiéis à Corte. As forças de repressão contaram com a ajuda dos comerciantes portugueses e de vários proprietários de terras e de escravos, que se encontravam temerosos com o rumo dos acontecimentos. À importância que as camadas mais pobres da população iam assumindo no movimento
assustava
as categorias
abastadas
da sociedade.
O mesmo Cardoso Machado sintetizaria o que aconteceu: 50
/...] Cabras, mulatos e crulos andavam tão atrevidos que diziam éramos iguais e que haviam de casar, senão com brancas das melhores. Domingos José Mar-
tins andava de braço dado com eles, armados de baca-
martes*, pistolas e espada nua. [...]
(Id., ibid., p. 85.)
Temia-se a repetição do que ocorrera na ilha de São Domingos,-onde os escravos haviam se insurgido, matando seus senhores e declarando a independência. Uma vez vitoriosa, a repressão foi violenta. Muitos dos líderes receberam a pena de morte. À punição ao movimento deveria ser exemplar, como o demonstra a sentença de alguns dos revoltosos:
/...] Depois de mortos serão cortadas as mãos, e
decepadas as cabeças, a cabeça do 1º réu na Soledade, as mãos no quartel, a cabeça do 2º em Olinda, as mãos no quartel, e a cabeça do 3º em Itamaracá e as mãos
em Goiana, e os restos dos seus cadáveres serão ligados às caudas de cavalos e arrastados até o cemitério. [...] (Apud C.G. Mota, Nordeste 1617,
p. 62.)
De Londres, Hipólito José da Costa — o redator do Correio Brasiliense, um periódico de mais de cem páginas, editado na Inglaterra e que circulava ilegalmente no Brasil — estigmatizava a Revolução Pernambucana de
1817:
[...] Esse acontecimento desastroso produzirá um efeito benéfico: demonstrar ao povo do Brasil que as reformas nunca se devem procurar por meios injustos, quais são os de oposição de força ao governo e efusão de sangue. Os demagogos, em Pernambuco, esperaram ou talvez intentaram persuadir a seus renorantes sequa51
zes* que deviam esperar socorros de potências estrangeiras. Este é o voto absurdo de quem supõe que as revolu-
ções são o meio de melhorar a nação.
(Apud N.W. Sodré, 4 história da imprensa no Brasil, p. 107.)
Hipólito José da Costa também se opunha ao governo absolutista de D. João VI — e por essa razão vivia como que exilado em Londres. Ao que parece, em tempos idos pertencera a uma loja maçônica. Por que se opunha, então, aos pernambucanos? Porque Hipólito desejava a Liberdade, mas temia a Igualdade. Como muitos outros, ele achava que os barbeiros deveriam apenas cuidar das barbas de seus fregueses.
2
CAPÍTULO 6
Queremos nosso rei de volta. Mas constitucional A Revolução do Porto de 1820 s vidas dos portugueses que permaneceram em Portugal também estavam mudando. E, quase sempre, para pior! A vinda da família real para o Brasil significou o agravamento da crise que, havia muito, assolava o Reino português. Ao longo da segunda década do século XIX, os habitantes de Portugal sentiram os efeitos do fato de o centro do Império ter se deslocado para o Brasil. A perda do monopólio do comércio sobre a antiga colônia somavam-se os prejuízos da guerra contra os franceses, que se estendeu até 1814: cidades destruídas, colheitas arrasa-
das, fome, despesas imensas... Em 1820, a Junta responsável pelo governo de Portugal, em uma carta enviada a D. João VI, assim descre-
via a situação do Reino:
/...] Digne-se Vossa Majestade tomar em consideração que Portugal é um reino de pequena extensão e escassamente povoado [...] que o ramo mais útil de sua agricultura, que é o vinho, se acha em decadência pela abertura dos portos do Brasil aos vinhos de todas as na-
ções, que a nossa indústria se paralisou consideravelmen-
te com a tire entrada em Portugal e no Brasil dos produtos ingleses, com cujos preços não pode competir; que 53
o comércio decaiu extraordinariamente não só pela mencionada abertura dos portos do Brasil, que privou Portugal do comércio exclusivo com aquele reino, mas pefa concorrência de todas as nações maritimas sendo muito
para recear que, se as coisas assim continuarem, desapareça brevemente dos mares a bandeira portuguesa. (Apud J.H. Saraiva, História conci-
sa de Portugal, p. 271.)
E ainda havia a incômoda intromissão dos ingleses no governo do Reino, representada pela presença do general Beresford! A insatisfação era geral. Crescia o sentimento de revolta. A necessidade de mudanças urgentes fazia com que surgissem agremiações políticas inspiradas nas idéias liberais. Uma dessas agremiações era o Sinédrio, e de uma de suas reuniões Xavier de Araújo fez o seguinte relato: [...] Fez sobre mim impressão profunda o discurso que Fernandes Tomás me dingiu [...|; pintou-me o estado do Pais, sem rei que o governasse, um general estrangeiro senhor do exército, estrangeiros também governando as províncias, nossa dependência do Brasil [...] “Facaremos nós assim? Devemos continuar neste aviltamento? (Apud J.H. Saraiva, História concisa de Portugal, p. 272.)
Em
1820,
explodiram
revoluções de caráter liberal
em diversas regiões da Europa. O sucesso desses movimentos,
principalmente
o que obrigou
o rei da Espanha
a aceitar uma Constituição, animou os portugueses. Em
agosto desse ano, a tropa da cidade do Porto revoltou-se,
por estar com o pagamento atrasado. Logo, as demais clas-
ses e camadas da população portuguesa aderiram ao movimento. No mês seguinte, ele alcançou Lisboa. O movimento recebeu o nome de Revolução Liberal do Porto.
“José Antônio
de Miranda,
um
fidalgo português,
assim apresentou ao rei as razões do movimento:
54
/...] Tal é, Senhor, o quadro Portugal, como o mais abandonado sofrido, faz dez ou doze anos, sem de Portugal, nem os Ministros de tenham dado algum remédio a suas
geral dos males, que e mísero órfão, tem que os Governadores Vossa Magestade lhe misérias, à sua po-
breza, e à sua nenhuma representação nacional. E, por
isso, a Cidade do Porto, desejando salvar a Pátria e Vossa Magestade, gntou aclamando Vossa Majestade e uma Constituição, que as Cortes, a serem convocadas, farão.
(“Memória constitucional e políti-
ca sobre o estado presente de Portugal e do Brasil”, in R. Faoro,
org., O debate político no processo de independência, p. 39.)
Antes da Revolução do Porto, os portugueses reclamavam: “Queremos nosso rei de volta””. Agora, os revolucionários acrescentavam: “Queremos nosso rei de volta. Mas constitucional”.
Para tanto, os revolucionários convocaram as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, que se reuniram, a partir de janeiro de 1821, em Lisboa. As Cortes Gerais eram a Assembléia da nação portuguesa. Elas foram chamadas Extraordinárias porque não foram convocadas pelo rei, como era de costume sob o regime absolutista, e Constituintes porque
desejavam fazer uma Constituição que limitaria o poder absoluto de D. João VI. Essa era a face liberal da revolução. Mas os revolucionários tinham outras intenções.
Eles queriam que a família real retornasse a Portugal, que Lisboa readquirisse o papel e a importância que perdera para o Rio de Janeiro, que a intromissão inglesa nos negócios do Reino fosse combatida e, principal-
mente, que fosse restabelecido o monopólio comercial sobre o Brasil. Em outras palavras, os revolucionários acreditavam que a restauração de Portugal estava intimamente relacionada à volta do Brasil à condição de colônia. Essa era a face recolonizadora da revolução.
so
Logo a notícia dos acontecimentos de Portugal che-
gou ao Brasil.
Os comerciantes
reinóis ficaram
a favor do movi-
mento, porque também desejavam a recolonização. E foram apoiados pelas tropas portuguesas que aqui estavam.
Juntando suas forças, passaram a exigir o regresso da fa-
mília real a Portugal. Outros apoiaram o movimento porque esperavam que a Constituição que estava sendo elaborada em Portugal fosse aplicada também ao Reino Unido do Brasil, Mas nem todos pensavam assim. Os defensores do absolutismo,
como
o ministro
Tomás
Antônio
de Vila
Nova Portugal, eram favoráveis à permanência do rei no Rio de Janeiro. Para aquele ministro de D. João:
[...J as Cortes são ilegais e é necessário dizer que o são, para que elas não digam aos povos que têm autoridade de dar leis ao trono. [...] (Apud
M.B.N.
da Silva, coord.,
O Império luso-brasileiro (1750-1822),
p. 406.)
E havia ainda os que defendiam a permanência da família real no Brasil, não porque fossem adeptos da monarquia absolutista, e sim porque haviam enriquecido, acumulado poder e ganho prestígio por causa da permanência do Rei no Rio de Janeiro. Eram os comerciantes, funcionários e proprietários de terras e de escravos que gravitavam ao redor do rei, constituindo um poderoso bloco de interesses. No momento em que se manifestaram favoráveis à permanência de D. João VI no Rio de Janeiro, passaram a ser conhecidos como Partido Brasileiro. Seus integrantes não eram necessariamente brasileiros de origem, mas tinham seus interesses no Brasil. Entre muitos partidários da permanência do rei, ganhou força a idéia de separação dos dois reinos. Essa idéia foi sintetizada em um folheto publicado, em francês, no Rio de Janeiro, cujo título era “O rei e a família real devem, nas circunstâncias presentes, voltar a Portu26
al ou ficar no Brasil?”. O autor do folheto defendia a
idéia de que D. João VI poderia:
/...] conservar a totalidade de sua autoridade real no Brasil e aí fundar um Império florescente de grande peso na balança do mundo. (Apud M.B.N. da Silva, coord., O Império luso-brasileiro (1750-1822),
p. 403.)
Diante dos problemas que tanto sua permanência quanto seu regresso trariam, O rei procurava uma solução que conciliasse os diversos interesses. Contudo, as pressões aumentavam a cada dia. Nas províncias do Grão-Pará e da Bahia, a tropa portuguesa revoltou-se, formando Juntas governativas que só obedeceriam às Cortes de Lisboa. Mais uma vez, elas marcavam seu descontentamento
em relação à “nova Lisboa””, conforme pode ser constatado na proclamação feita aos soldados pelo jornal baiano À Idade d'Ouro do Brasil, em fevereiro de 1821:
[...] O despotismo e a traição do Rio de Janeiro maquinam contra nós, não devemos consentir que o Brasu fique nos ferros da escravidão. (Apud M.B.N. da Silva, coord., O Império luso-brasileiro (1750-1822), p. 405.)
A pressão das tropas portuguesas sediadas no Rio de Janeiro foi decisiva para que D. João VI, em fevereiro de 1821, jurasse aceitar a Constituição que iria ser escrita e, poucos dias depois, por um decreto, anunciasse o retorno da família real para Portugal. Essa decisão não agradou aos componentes do Partido Brasileiro, que ainda tentaram impedir a saída da família real da baía de Guanabara, sem sucesso. A 26 de abril de 1821, Dom João VI regressava para Portugal. Atendia às exigências das Cortes, mas também não descontentava aos que defendiam a permanência da família real no Brasil, porque deixava como príncipe-regente do Brasil o seu filho e herdeiro. 57
CAPÍTULO 7
O Dia da Pátria! A emancipação política do Brasil edigidas por José Bonifácio de Andrada e Silva, estas eram algumas das “Instruções do Governo Provisório de São Paulo aos Deputados da Província às Cortes Portuguesas”:
/...] se cuide em legislar e dar providências sobre dois objetos da maior importância para a prosperidade e conservação do Reino do Brasil: 1º sobre a catequização e civilização geral dos índios bravos*; e 2º melhorar a sorte dos escravos favorecendo a sua emancipação
gradual e conversão de homens imorais e brutos em cidadãos ativos e virtuosos [.../ [...] é de absoluta necessidade que além de haver,
em todas as cidades, vilas e freguesias, consideráveis es-
colas de primeiras letras, haja também em cada provincia do Brasil um ginásio ou colégio [.../ (Escritos politicos, p. 18-9.)
Como Reino Unido, o Brasil deveria fazer-se repre-
sentar nas Cortes Gerais, reunidas em Lisboa, desde janeiro de 1821. Para tanto, foram eleitos 72 deputados pelo Brasil. Todavia, somente 49 foram a Lisboa: muitos desistiram da viagem, como os deputados por Minas Gerais; outros chegaram com grande atraso, como os de São Paulo. 58
Não obstante, aqueles que foram a Portugal olhavam sobretudo para a face liberal da Revolução de 1820. Esperavam obter ali importantes decisões para o futuro da
parte americana do Reino Unido, como as propostas por
José Bonifácio. Essas esperanças, contudo, rapidamente se desvaneceram. Em número inferior ao dos deputados portugueses e enfrentando a aguerrida oposição deles, à qual se juntava o ciúme da população portuguesa, os deputados do Brasil raramente conseguiam defender uma idéia ou proposta. Eram até impedidos de falar pelos deputados portugueses ou pela multidão que, nas galerias da Assembléia, os valavam sem cessar. Os deputados portugueses só tinham um propósito: a recolonização do Brasil. E passaram a tomar medidas para que tal se concretizasse. Os órgãos administrativos estabelecidos por D. João VI, no Rio de Janeiro, foram fechados; ordens foram expedidas determinando que as províncias não mais deveriam obedecer ao príncipe-regente, e sim a Lisboa; tropas fiéis às Cortes foram enviadas ao Brasil e transferidas para Portugal as que estavam ligadas a D. Pedro; e o comércio estrangeiro com o Brasil passou a sofrer restrições.
No Rio de Janeiro, o príncipe D. Pedro enfrentava dificuldades financeiras; por isso, quando em dezembro de 1821 chegaram novas ordens de Portugal determinando o seu regresso, ele se preparou para partir. As forças políticas contrárias à política das Cortes, no Rio de Janeiro, uniram-se para impedir que aquela decisão se concretizasse. No dia 9 de janeiro de 1822, no Senado da Câmara do Rio de Janeiro, o juiz de fora José Clemente Pereira expôs para D. Pedro a necessidade de sua permanência no Brasil, ao mesmo tempo que lhe entregava um manifesto com cerca de nove mil assinaturas, colhidas nas câmaras das províncias do Rio de
Janeiro, Minas Gerais e São Paulo:
E E
4
REa
59
Senhor. À saida de Vossa Alteza Real dos Estados do Brasil será o decreto fatal que sancione a independência deste Reino. (Apud J.H. Rodrigues, Independência: revolução e contra-revolução, v. 1
p. 205.)
À resposta afirmativa do príncipe-regente — o Dia do Fico — seguiu-se, na semana imediata, a formação de um novo ministério, chefiado por José Bonifácio. Mas quais eram as forças políticas que, no Rio de Janeiro, defendiam a permanência do príncipe D. Pedro no Brasil? Como elas se apresentavam? Ma
De um
lado,
estavam
os absolutistas,
contrários
às
Cortes de Lisboa porque elas pretendiam fazer de Portugal uma monarquia constitucional. De outro, aqueles que formavam o Partido Brasileiro. Estes estavam divididos em dois grupos: os democratas, que tinham em Joaquim Gonçalves Ledo seu elemento mais representativo, e os aristocratas, liderados por José Bonifácio. Democratas e aristocratas discutiam suas idéias e projetos nas lojas maçônicas — os primeiros predominavam na Grande Oriente, enquanto os últimos dominavam a Apostolado. Eles utilizavam a Imprensa para conquistar um maior número de adeptos: o Revérbero Constitucional Fluminense e o Correio do Rio de Janeiro foram alguns dos jornais dos democratas, ao passo que O Espelho e O Despertador Brasiliense defendiam as idéias dos aristocratas.
Democratas e aristocratas divergiam dos absolutis-
tas, a quem chamavam de “corcundas”' ou “pés-de-chumbo””. Queriam com isso dizer que eles não queriam mudar em um mundo em que tudo mudava, insistindo na defesa do absolutismo e buscando apoio na Santa Aliança, um bloco formado pelos governantes reacionários da Europa após a derrota de Napoleão Bonaparte. Mas democratas e aristocratas divergiam também entre si.
60
+
Para Gonçalves Ledo, era importante a convocação or D. Pedro de uma assembléia constituinte. Em julho
de 1822,
ele lembrava ao príncipe-regente:
fu J a vontade do maior número deve ser a lei de
todos. O maior número pede as eleições diretas, a Lei as deve sancionar*. Só por elas é que se pode dizer que o Povo nomeou os seus representantes; de outro modo são os representantes da porção que se intitula seleta *. [...] Que razões podemos dar, que direito apresentar para roubar aos indivíduos o jus* de nomear aqueles que os hão de representar na fundação daquilo que eles têm de mais caro, quero dizer, direitos naturais e imprescritíveis. [...f (Apud E.V. da Costa, “Introdução
ao estudo da emancipação políti-
ca do Brasil”, in C.G. Mota, Bra-
sil em perspectiva, p. 114.)
Para José Bonifácio, deveria ser convocado um Conselho de Procuradores Provinciais, representativo daquela “porção seleta””. Para ele somente a forma de governo monárquica seria capaz de manter a unidade territorial. Ele temia as eleições diretas, opondo-se às idéias de fundo republicano. Absolutistas,
democratas
e aristocratas
divergiam
entre si. A política recolonizadora das Cortes portuguesas, porém, acabava por uni-los contra aqueles que identificavam como o Partido Português. Após o Dia do Fico, os acontecimentos se precipitaram, como resultado da reação das Cortes e de seus aliados do Partido Português no Rio de Janeiro. Inconformados com a decisão de D. Pedro de permanecer no Brasil, os batalhões portugueses no Rio de Janeiro se revoltaram, mas foram vencidos e expulsos. Quase ao mesmo tempo, novas ordens chegavam de Portugal, provocando a reação do ministério chefiado por José Bonifácio. Com o objetivo de restabelecer as liga-61
ções políticas entre o Rio de Janeiro e as demais províncias, José Bonifácio convocou, no mês de fevereiro, o Conselho dos Procuradores Provinciais. Em maio, ficou
decidido que as ordens chegadas de Portugal só seriam cumpridas no Brasil se recebessem a aprovação de D. Pedro. Por sua vez, os democratas não esmoreciam. Após o oferecimento pela maçonaria ao príncipe do título de Protetor e Defensor Perpétuo do Brasil — do qual D. Pedro recusou a primeira parte, alegando que o Brasil “a s1 próprio se protegia” —, os democratas obtiveram a convocação de uma assembléia constituinte, em junho. A agitação política que marcava a vida do Rio de Janeiro naqueles dias contrastava intensamente com o que se passava nas zonas interioranas. Viajando pelo vale do Paraíba paulista naquela ocasião, o naturalista SaintHilaire anotou:
/...J as revoluções que se operaram em Portugal e no Rio de Janeiro não tiveram a menor influência sobre os habitantes desta zona paulista; mostram-se absolutamente alheios às nossas teorias; a mudança de governo não thes fez mal nem bem, por conseguinte não se tem o menor entustasmo. À única coisa que compreendem é que o restabelecimento do sistema colonial lhes causaria danos, porque se os portugueses fossem os únicos compradores de seu açúcar e café, não mais venderiam suas mercadorias tão caro quanto agora o fazem. (Segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo, p. 81.)
Mas voltemos ao centro dos acontecimentos. No mês de agosto, surgiram disputas políticas na província de São Paulo. José Bonifácio ficou temeroso de que elas enfraquecessem o seu grupo político. Pediu, então, a D. Pedro que viajasse até lá, para pacificar as forças políticas, como já fizera em Minas Gerais, alguns meses antes. 62
Estava D. Pedro em São Paulo quando chegaram
ao Rio
de Janeiro
novas
e contundentes
decisões
das
Cortes; o príncipe deveria se submeter ao rei e às Cortes,
mantendo sua autoridade apenas nas províncias em que já a exercia; um novo ministério deveria ser organizado; a convocação do Conselho de Procuradores deveria ser anulada; o governo de São Paulo deveria ser processado por ter pedido a permanência do príncipe no Brasil, A princesa D. Leopoldina, esposa de D. Pedro, presidiu a reunião do Ministério, tendo sido resolvido que seriam remetidas ao príncipe as ordens chegadas de Lisboa, juntamente com cartas da princesa, dos ministros e de sir Chamberlain, representante inglês no Rio de Janeiro. No dia 7 de setembro de 1822, às margens do riacho Ipiranga, o príncipe recebeu as mensagens vindas do Rio de Janeiro. Ao retirar de seu chapéu as fitas com as cores vermelha e azul das Cortes portuguesas, jogando-as fora, D. Pedro proclamava a separação do Brasil daquelas Cortes. Absolutistas,
democratas
o
e aristocratas saudaram
ato do Ipiranga, por verem nele a possibilidade de concretização imediata de suas idéias e projetos políticos. Para os absolutistas, ele representava a derrota das forças constitucionalistas em Portugal, que comprometiam a continuidade do Estado absolutista português. Para os democratas, significava a possibilidade de implantação no Brasil de um governo constitucional, garantindose assim “a vontade do maior número”. Para os aristocratas a emancipação política era a garantia da preservação das vantagens adquiridas desde a instalação da Corte no Rio de Janeiro. Prosseguindo o seu percurso pelo vale do Paraíba paulista, Saint-Hilaire também observou:
[..j o povo nada ganhou absolutamente com a mudança operada. A maioria dos franceses lucrou com a Revolução que suprimiu privilégios e direitos auferdos* por uma casta* favorecida. Aqui, ler alguma congl
; = E
no
63
sagrava a desigualdade, todos os abusos eram o resultado do interesse e dos caprichos dos poderosos e dos funcionários. Mas são estes homens que, no Brasil, foram os cabeças da revolução. [...] (Id., ibid., p. 94.)
64
CAPÍTULO 8
A chave da opressão A Carta outorgada de 1624 o dia 12 de outubro de 1822, uma multidão con-
centrada no Campo de Santana, no Rio de Janeiro, aplaudiu delirantemente a aclamação de
D. Pedro como Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil. A 1º de dezembro, foi realizada a
65
ee q pre =.
pela Imperial. Aclamado pelo povo e sagrado pelo bispo, D. Pedro tornava-se o primeiro imperador do Brasil. Mas embora D. Pedro fundamentasse a sua soberania em duas fontes diversas de poder, isto somente não bastava para tornar o Brasil um Estado soberano politicamente. Era preciso impor a autoridade do governo de D. Pedro I às províncias que não haviam aderido à independência realizada pelas forças políticas predominantes no Rio de Janeiro. Na Bahia, no Grão-Pará, no Maranhão, no Piauí e na Cisplatina, a presença de tropas portuguesas e de comerciantes reinóis, aliada ao fato de muitos ressentimentos terem sido acumulados contra a “nova Lisboa””, fazia com que as Juntas governativas permanecessem ligadas às Cortes de Lisboa. De 1822 a 1824, lutas terrestres e navais foram travadas, naquelas provincias, entre os que eram favoráveis à Independência e os que permaneceram fiéis ao governo de Portugal. Foi a Guerra de Independência. Tornava-se imprescindível também obter dos demais países o reconhecimento da Independência, o que
an
na Ca-
:
cerimônia de coroação e sagração do Imperador,
DEBRET
O
em
O
É
R
LO A
o
pe
E
grega
UR
a
d
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À
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Pta
Aclamação de D, Pedro | no Campo de Santana.
legitimaria o governo do jovem imperador no plano internacional. Mas isso não era fácil. Na Europa, as forças reacionárias que compunham a Santa Aliança não viam com bons olhos a emancipação política das colônias ibéricas na América. Elas estigmatizaram* a aclamação de D. Pedro como imperador constitucional. E ficaram irri-
tadas quando souberam que as propriedades dos portugueses contrários à independência estavam sendo confiscadas e que o comércio com Portugal fora proibido nos portos brasileiros. Todavia, o novo Império do Brasil podia contar com a aliança da poderosa Inglaterra, representada por George Canning, primeiro-ministro do rei Jorge IV. Em uma carta endereçada a José Bonifácio, Hipólito José da Costa explicava que Mr. Canning:
[...] deriva o seu principal apoio da classe comercial de Londres e Liverpool, e esta classe começa a cla66 “O o
ar =
mar muito forte para que este governo reconheça a Tndependência dos novos governos americanos. (Apud Caio de Freitas, George Canning eo Brasil, p. 176.)
Não por outra razão, Canning acabaria por convencer o governo português a aceitar a soberania do Brasil, em 1825. Uma atitude coerente com o apoio que o governo britânico dera aos EUA, no ano anterior, por ocasião do lançamento da Doutrina Monroe, que afirmava o princípio de não-intervenção européia na América. Contudo, era preciso fazer algo mais. Era preciso organizar politicamente o novo Estado. É esta também não era uma tarefa fácil! As forças políticas que haviam se unido na luta contra as tentativas recolonizadoras das Cortes divergiam agora abertamente sobre como realizar aquela organização. Império ou República; unitarismo ou federalismo; constitucionalismo ou absolutismo? E suas divergências eram alimentadas por aqueles que, alegres, agitados e confusos, percorriam as estreitas ruas da capital do Império, portando em suas roupas laços verde-amarelos e, vez por outra, perseguindo os portugueses que não haviam declarado publicamente sua adesão à independência, DEBRET
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67
Os seguidores de Ledo eram adeptos de uma monarquia na qual o Poder Legislativo fosse o poder principal, por ser ele a expressão da “vontade da maioria”. Foi com esse propósito que eles tinham defendido, antes do Sete de Setembro, a convocação de uma assembléia constituinte e, agora, defendiam o juramento prévio da Constituição pelo imperador. No mês de outubro, o Correio do Rio de Janeiro — jornal ligado aos democratas — atribuiu a D. Pedro I esta declaração:
/[...Jo Brasil precisa e deve ser livre para ser feliz, e se os povos manifestarem geral desejo de serem republicanos, não acharão em mim oposição; antes farei quanto puder para que o consigam e eu me contento em ser seu concidadão.
(Apud N.W. Sodré, À história da imprensa no Brasil, p. 82.)
Os absolutistas — que após o Sete de Setembro haviam unido suas forças às dos integrantes do Partido Português — não podiam concordar com aquelas posturas. E passaram a mover tenaz oposição aos democratas. O mesmo fizeram os aristocratas. José Bonifácio temia o predomínio do Legislativo na nova ordem política, defendendo a prevalência do Poder Executivo. Ele acreditava também que a adoção de um regime federativo conduziria o Império à fragmentação política, como acontecera na América espanhola. Ele não admitia o juramento prévio da Constituição pelo imperador. Lado a lado, absolutistas e aristocratas foram aos poucos eliminando os democratas da cena política. Por determinação do ministro José
Bonifácio, as lojas maçô-
nicas foram fechadas; os jornais dos democratas foram proibidos de circular; muitos dos representantes do grupo de Ledo foram deportados. O espancamento de Luís Augusto
May
—
redator
do jornal 4 Malagueta, ligado aos democratas — motivou uma quadrinha que foi repetida pelas ruas da cidade: 68
Chamam
servis os Andradas.
E calúnia, é falso, é peta:* São liberais a matar, E que o diga o Malagueta.
No dia 3 de maio de 1823,
reuniu-se a Assembléia
Constituinte, sem a presença dos deputados eleitos pelos democratas. Os bacharéis, magistrados, religiosos, militares, alguns poucos médicos, proprietários rurais € funcionários públicos estavam ali como representantes da pequena parcela de eleitores. Eram quase todos inexperientes nos assuntos legislativos, com exceção daqueles que tinham participado das Cortes portuguesas, como Antônio Carlos de Andrada e Nicolau Pereira de Campos Vergueiro. Eles se dividiam em duas facções políticas: o Partido Brasileiro, majoritário, defensor da Monarquia constitucional, limitando os poderes do imperador e dos portugueses, e o Partido Português, defensor da reunião com Portugal, sobretudo após a restauração do absolutismo por D. João VI. Os conflitos entre as duas facções não tardaram, en-
volvendo o próprio imperador. Este expressou a compreensão que tinha do regime constitucional ao dizer, na fala de abertura dos trabalhos da Assembléia, que defenderia a Constituição que seria elaborada “*se fosse digna do Brasil e de mim””. O agravamento do conflito entre as duas facções aproximava o imperador do Partido Português e eníraquecia o Ministério dos Andradas. Estes não só sofriam a oposição do Partido Português como ainda eram olhados com desconfiança por muitos elementos de sua própria facção desde que José Bonifácio apresentara à Assem-
bléia uma
Representação
sobre a Escravatura
Nela, José Bonifácio defendia a seguinte idéia:
no Brasil.
[...] é tempo também que vamos acabando gradualmente até os últimos vestígios da escravidão entre nós, para que venhamos a formar em poucas gerações uma
ER
69
Nação homogênea, sem o que nunca seremos verdadeiramente res, respeitáveis e felizes. [...] (Escritos políticos, p. 49.)
A queda do Ministério dos Andradas, em julho, tornou ainda mais tenso o clima na Assembléia Constituinte. Possuindo a maioria na Assembléia, os deputados do Partido Brasileiro começaram a discutir e a aprovar um projeto de Constituição elaborado por Antônio Car-
los de Andrada,
e que
refletia os seus
interesses.
A
fim
de limitar o papel dos portugueses, estipulou-se que os estrangeiros seriam inelegíveis para os cargos de representação nacional; a fim de evitar a restauração do Rein o Unido, decidiu-se que o imperador não poderia tornarse governante de outro Reino; a fim de garantir o lugar de destaque no processo decisório, fortaleceu-se o poder da Câmara dos Deputados, que seria indissolúvel e teria subordinadas a si as Forças Armadas: e, a fim de excluir da vida política a grande maioria da população, instituluse um sistema eleitoral indireto e censitário, que exigia uma renda mínima equivalente ao valor de 150 alqueires de mandioca. O imperador e os integrantes do Partido Português não aceitavam essas decisões, o que provocou o acirramento dos conflitos. Eles ultrapassaram os limites da Assembléia, ganhando a imprensa, na qual se destacava O jornal O Tamoio, ligado aos Andradas. Em setembro o jornal dizia:
/...] jamais o Tamoio pregou, nem pregará a exterminação de povo algum, e menos a dos portugueses, mas uma coisa é querer exterminá-los, e outra não julgar apropositado* a sua perfeita igualdade em direitos políticos com os brasileiros; ao menos para todos os casos e durante a crise atual. (Apud I.R. de Mattos et al., Brasil — uma história dinâmica, v. 2, p. 21 )
70
Um sentimento de insegurança pairava sobre a Assembléia. Um dos deputados — Carneiro da Cunha — assim o manifestou na sessão de 17 de setembro:
/...] quando para aqui vemos, [...] for para cada um enunciar sua opinião com plena liberdade; aliás parece pouco sólida a estabelecida inviolabilidade dos Deputados. (Anais da Constituinte de 1823, v. 2, Dial)
Em
novembro
de
1823, confirmavam-se
os temores
do deputado. Aproveitando-se de um incidente envolvendo dois oficiais portugueses, D. Pedro I dissolveu a Assembléia Constituinte. E assim justificou seu ato:
Havendo juramento que de do Império, Hei por bem, Brasil,
esta Assembléia perjurado* ao tão solene prestou à Nação, de defender a integridasua independência e a minha dinastia: como Imperador, e Defensor Perpétuo do
dissolver a mesma Assembleia,
e convocar já
uma outra [.../; a qual deverá trabalhar sobre o projeto de Constituição que eu lhe hei de breve apresentar; que será duplicadamente mais liberal, do que o que a extinta Assembléia acabou de fazer. (Coleção das leis do Império do Brasil
de 1823, p. 85.) Contudo,
não foi convocada
uma
nova assembléia,
e sim nomeado um Conselho de Estado, constituído por dez membros escolhidos por D. Pedro I. A 25 de março de 1824 foi outorgada* pelo imperador a Constituição Poli-
tica do Império do Brasil, Ela estabelecia:
[...J o Império é a associação politica de todos os
cidadãos brasileiros;
o seu governo é monárquico, hereditário, constitucional e representativo; 71
são cidadãos brasileiros: os que no Brasil tiverem nascido, quer sejam ingênuos*, ou libertos [...], todos os nascidos em Portugal e suas possessões, que sendo já residentes no Brasil na época em que se proclamou a in-
dependência [...), aderiram a esta. Todavia,
a marca
característica da Carta
de
1824
era a Instituição de um quarto poder político — o Poder Moderador.
[...] O poder moderador é a chave de toda a organização política, e é delegado privativamente ao imperador, [...] para que incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos. [...] Se você consultar o organograma da p. 73, verá como o Poder Moderador — exclusivo do imperador — controlava a organização política do Império. Poderá concluir sobre o caráter centralizador e autoritário da organização política do Império do Brasil. E ainda sobre o caráter excludente da Constituição, que mantinha as eleições indiretas e censitárias.
Na época, muitos chegaram a essas mesmas conclusões. Uns as aprevaram; outros, temerosos, preferiram calar; outros, ainda, protestaram. O protesto mais violento partiu da província de Pernambuco,
onde
completamente
as feridas de
cicatrizadas.
Os
1817
ainda
não
estavam
patriotas pernambuca-
nos não aceitavam a nomeação de um novo presidente
para a província por D. Pedro I:
/...] Morramos todos, arrase-se Pernambuco,
ar-
da a guerra, mas conservemos o nosso presidente, a todo transe! Conservemos a dignidade da soberania dos povos! (Apud I.R. de Mattos et al., Brasil — uma hustória dinâmica, v. 2, p. 24.)
72
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ASSEMBLEIA 1ERAL
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SENADO
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os ministros
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DEPUTADOS
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off Organograma da Constituição Brasileira de 1824. (In: Ilmar Rohl de Mattos et al., Brasil — uma história dinâmica, p. 22.)
E proclamaram uma nova república na América — a Confederação do Equador —, que deveria unir, num mesmo Estado, todas as províncias do norte, desde a Bahia até o Grão-Pará. Sob a liderança intelectual de José da Natividade Saldanha e de frei Joaquim do Amor Divino Rabelo e Caneca, os pernambucanos lutavam por seus ideais: a República, a Federação e a Igualdade. Frei Caneca ensinava a seus compatriotas:
/...] o poder moderador de invenção maquiavélica
é a chave mestra da opressão da nação brasileira e o
garrote* mais forte da liberdade dos povos. [...J
(“Crítica da Constituição outorga-
da”, in: Celina Junqueira,
Ensaios políticos, p. 70.)
org.,
73
É ainda:
/...] os direitos naturais, civis e políticos do homem são a liberdade, a igualdade, a segurança, a propriedade e a resistência à opressão. [...] ( Bases para a formação do pacto
social”, in: Celina Junqueira, org., Ensaios políticos, p. 105.)
Como em 1817, o movimento não ameaçava apenas o governo do Rio de Janeiro, mas também os poderosos interesses locais — os proprietários de terras e de escravos, Os comerciantes reinóis, os funcionários graduados... Uma violenta repressão pôs fim à Confederação do Equador.
CAPÍTULO 9
Constituição, sim; revolução, não! A abdicação de D. Pedro esde a Confederação do Equador, não cessou a oposição à política autoritária de D. Pedro 1. De quase todos os pontos do Império erguiamse vozes contra o predomínio do Partido Português e contra a opressão representada pelo Poder Moderador. Os proprietários de terras e de escravos não admitiam que o imperador tomasse decisões importantes, como a da Convenção concluída com a Inglaterra determinando o final do tráfico negreiro intercontinental no prazo de três anos, sem consultar o Poder Legislativo, onde predominavam. A Carta de 1824, apesar de ter sido outorgada pelo próprio imperador, não era seguida plenamente. A oposição era agravada pela crise econômico-financeira. O rompimento com Portugal não tivera como consequência o aumento das exportações brasileiras, persistindo o declínio dos preços dos principais produtos de exportação no mercado internacional. O governo não apenas necessitava de recursos financeiros para dar prosseguimento à instalação do aparelho de Estado em todo o território, como também para enfrentar as despesas relativas à política de reconhecimento da Independência e à guerra contra as Províncias Unidas do Rio da Prata, iniciada em 1825. Ele não possuía, contudo, muitas fontes de renda. Em um país de economia primário-exportadora, como era o Império do Brasil, a principal fonte é
ENA
75
de arrecadação são as tarifas alfandegárias cobradas sobre os produtos importados. No entanto, os diversos acordos comerciais firmados por ocasião do reconhecimento
da Independência limitavam essas tarifas ao máximo de 15% ad valorem*, o que era muito pouco para as grandes despesas que o governo enfrentava. A solução para a crise econômico-financeira foi ten-
tada através da obtenção de empréstimos externos. Se alguns aplaudiram a solução, muitos outros foram contrá-
rios, como Martim
Francisco de Andrada:
[...] Estou e sempre estive convencido de que a teora dos empréstimos era um abismo, em que mais cedo ou mais tarde deviam ser precipitadas todas as na-
ções; que os governos nunca adotaram,
mar mais facilmente os povos. [...]
senão para opri-
Em 1829, quando foi determinada a liquidação do Banco do Brasil, a crise se agravava. A política de empréstimos e as constantes emissões de papel-moeda provocavam a desvalorização da moeda e a elevação dos preços. E isso atingia principalmente a população das cidades, que acabava por se revoltar. Ela quase sempre dirigia os seus protestos contra os portugueses, que dominavam grande parte do comércio varejista. Os gritos de “'mata português”” e “mata marinheiro”” ecoavam pelas ruas das cidades; eles eram também gritos contra o imperador, que era encarado como o protetor natural dos reinóis. A oposição à política autoritária de D. Pedro I concentrava-se em dois pontos principais: a Câmara dos Deputados e a imprensa. Somente em 1826 foi instalada, pela primeira vez, a Assembléia Geral, formada pela Câmara dos Deputados temporária e pelo Senado vitalício.
Enquanto
aque-
la primeira Câmara era francamente opositora à política do imperador, o Senado mostrava-se favorável às medidas de D. Pedro I, por ter sido constituído por elemen-
76
sin
e
(Finanças do Brasil, p. 116.)
tos por ele escolhidos
nas listas tríplices saídas das elei-
ções provinciais. Tanto na Câmara dos Deputados como na imprensa surgiram dois grupos político-partidários entre os opositores do imperador: os liberais moderados e os liberais exaltados. Os liberais moderados tinham como principais representantes Evaristo da Veiga, redator do jornal 4 Aurora Fluminense, e o deputado Bernardo Pereira de Vasconcelos, bacharel formado em Coimbra. Eles estavam ligados sobretudo aos produtores interioranos, particularmente da Zona da Mata e do sul de Minas, que disputavam com
os comerciantes
reinóis
O abastecimento
da cidade
do Rio de Janeiro. Os liberais moderados defendiam a
conservação da monarquia centralizada, mas entendiam
que o Poder Legislativo deveria ter um peso maior na vida política do Império. Ainda em 1826, discursando na Câmara dos Deputa-
dos,
Vasconcelos
defendia
duas
idéias
fundamentais.
Uma era a revisão dos tratados assinados com Portugal, Inglaterra e França, celebrados antes da reunião da Àssembléia Geral.
Dizia ele:
/...] Seja-me todavia permitido dizer uma só palavra sobre o tratado concluído com uma dessas nações; tratado que tantas amofinações* me tem dado, e tanto que ainda não pude levar ao fim a sua leitura. Conjesso que uma indignação tão forte se apodera de mim, que é tão grande a perturbação do meu espírito, quando sobre ele lanço as minhas vistas, que me vejo necessttado de lançá-lo para longe de mim: falo do tratado com a França.
(Apud I.R. de Mattos et al., Brasil — uma história dinâmica, v. 2, p. 39.)
A outra idéia dizia respeito ao comparecimento dos ministros do Poder Executivo às discussões no Legislatifl
vo dos assuntos referentes às suas pastas, embora pela Constituição de 1824 eles não estivessem obrigados a fazê-lo:
[...] Qual de nós se curvará a um Ministro de Estado? Qual de nós não elevará sua voz (voz poderosa porque é a Nação) para interrogar, refutar e argiiir os Ministros de Estado? Ah! venham eles quanto antes, venham depor perante a representação nacional, venham mostrar ao público suas virtudes ou seus vícios, sua ciência ou sua ignorância: saiam de seus palácios, asilo da sua imbecilidade. (Apud R. Faoro, Os donos do poder,
p. 148.)
Os liberais exaltados defendiam a federação, que daria maior autonomia às províncias do Império. Uns poucos chegavam a defender a instauração de uma república. Suas idéias e propostas eram divulgadas através de jornais como O Repúblico, de Antônio Borges da Fon-
seca, o Tribuno do Povo, de Francisco das Chagas de Oliveira França, e 4 Malagueta, de Luís Augusto May, que
reaparecera em 1828. Dois acontecimentos contribuíram para a intensificação da oposição: a guerra contra as Províncias Unidas do Rio da Prata, de que resultou a perda da província Cisplatina, e a questão da sucessão do trono português. A guerra não só provocava o agravamento da crise financeira, como criava problemas nas relações internacionais. Inglaterra e França protestavam contra o bloqueio do porto de Buenos Aires pela esquadra imperial, por causar prejuízos a seus interesses comerciais. De outra parte, dizia-se que Simón Bolívar iria propor uma intervenção dos países americanos no conflito por julgar que a monarquia brasileira representava, na América, Os interesses recolonizadores da Santa Aliança. A morte de D. João VI, em 1826, colocava a questão da sucessão do trono português, do qual D. Pedro era o herdeiro. Ainda que o imperador tivesse abdicado
78
Cartas TATA
do trono em favor de sua filha, a menina D. Maria da Glória, a oposição acusava-o de permanecer mais Interessado nos assuntos portugueses que nos do Império. Todavia, D. Pedro I não se encontrava sozinho na
luta contra o Partido Brasileiro. Ele era apoiado pelo Partido Português. Muitos proprietários de terras e de escravos também o apoiavam, sobretudo após terem rece-
bido vantagens e títulos honoríficos do imperador. Na Corte, falava-se muito da influência exercida na direção dos negócios públicos pelo “gabinete secreto”” do Chalaca, o conselheiro Francisco Gomes da Silva. Comentavase também que a restauração do absolutismo era tramada por José Clemente Pereira e por uma sociedade secreta denominada Colunas do Trono. Pretendendo contornar a oposição, o imperador chamou o marquês de Barbacena para organizar um novo ministério, em fevereiro de 1829. Ainda que parecesse ceder aos que desejavam um governo parlamentar, D. Pedro I não se afastara dos interesses dos que o apoiavam. Nessa mesma ocasião, ele enviou à Europa a missão diplomática do marquês de Santo Amaro, com O objetivo de obter o apoio da Santa Aliança na reconquista da província Cisplatina e na restauração dos direitos de D. Maria da Glória ao trono de Portugal, usurpados por seu tio e esposo D. Miguel. Em troca; D. Pedro I se propunha
a ajudar a Santa Aliança
na transformação
das
repúblicas americanas em monarquias. Não durou muito, porém, a orientação liberal dada pelo imperador à política interna. As notícias chegadas da França anunciando a queda de Carlos X, de tendências absolutistas, animaram a oposição. O Gabinete de Barbacena foi demitido, e já não se duvidava que tal ocorrera por vingança do Chalaça. Em São Paulo ocorreram distúrbios, dos quais resultou a morte do jornalista italiano João Batista Badaró —
o “Líbero Badaró””. Os com-
ponentes do Partido Português exigiam, cada vez mais, “o imperador sem trambolho”, isto é, sem as Câmaras. Em fevereiro de 1831, o imperador visitou Minas Gerais. A província também mostrava-se agitada, moti79
vando uma proclamação de D. Pedro I aos seus habitantes, na qual dizia:
[...] existe um partido desorganizador que, aproveitando-se das circunstâncias puramente peculiares à
França,
pretende iludir-vos com
invectivas* contra a
Minha Inviolável e Sagrada Pessoa e contra o Governo, a fim de representar no Brasil cenas de horror,
do-o de luto. [...]
cobrin-
(ApudJ. Armitage, História do Bra-
sil, p. 296.)
zena
Ao regressar ao Rio de Janeiro, já na primeira quinde março,
a situação
também
mostrava-se
tensa.
Ocorreram conflitos entre os seus partidários e integrantes mais exaltados do Partido Brasileiro — as Noites das Garrafadas. A oposição chegara às ruas. A situação parecia chegar a um ponto de definição: Reunidos na Chácara da Floresta, no morro do Castelo, residência do padre José Custódio Dias, vinte e três deputados e o senador Vergueiro redigiram um manifesto ao imperador. Nele diziam:
[...] indivíduos sediciosos, à sombra do Augusto Nome de Vossa Majestade Imperial e Constitucional, continuam na execução de seus planos tenebrosos; os ultrajes crescem, a nacionalidade sofre, e nenhum povo tolera, sem resistir, que o estrangeiro venha impor-lhe, no seu próprio pais, um jugo* ignominioso. [...]
O imperador pareceu ouvi-los. Nomeou um novo ministério, formado por políticos mais liberais. As divergências, porém, não cessaram. Ao comparecer, no dia 25 de março, à cerimônia de comemoração do sétimo amiversário da Constituição Imperial, D. Pedro I ouviu
80
o
(ApudJ. Armitage, História do Brasit, p. 302.)
gritos de “Viva o imperador enquanto constitucional!” e “Viva Dom Pedro II!” A oposição ganhava força, paulatinamente. Integran-
tes do grupo exaltado passaram a defender a necessidade de um governo republicano. O moderado Evaristo da Veiga respondia-lhes, afirmando: “Queremos a Constituição, não queremos a revolução”. No dia 5 de abril, o imperador constituiu um novo ministério — o Ministério dos Marqueses —, formado por elementos do grupo que queriam “to imperador sem trambolho”. A oposição liberal reagiu, concentrando o povo no Campo da Aclamação — o local onde D. Pedro fora aclamado Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil. Exigia-se o retorno do gabinete formado por liberais brasileiros, ao que o imperador teria respondido: ““Tudo farei para o povo, mas nada pelo povo””. Pouco tempo depois, sob o comando de Francisco de Lima e Silva, chegava a tropa, unindo-se à população. Um novo emissário foi enviado a São Cristóvão. O imperador fez com que ele esperasse, enquanto mandou chamar o senador Vergueiro; mas este não foi encontrado. Nesse ínterim, o major Luís Alves de Lima e Silva ofereceu ao imperador elementos para resistir aos que se encontravam reunidos no Campo da Aclamação, o que foi recusado. Na madrugada do dia 7 de abril de 1831, D. Pedro I resolveu mandar de volta ao Campo o emissário, levando o ato de sua renúncia ao trono, em favor do filho, o príncipe imperial D. Pedro de Alcântara.
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Jns vão, outros ficam.
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ogo após abdicar do trono do Império do Brasil, D. Pedro I embarcou em um dos escaleres* da nau inglesa Warspite, acompanhado de outros membros da família imperial. Alguns dias depois, já a bordo da fragata Volage, seguiram todos para a Europa. Naquele mesmo ano de 1831, Jean Baptiste Debret — o pintor que retratara tanto a Aclamação quanto a Coroação e Sagração de D. Pedro I — também retornava para a Europa.
Os caixeiros-viajantes John Luccock e Louis Fran-
cois de Tollenare,
o naturalista Saint-Hilaire,
assim co-
mo inúmeros outros comerciantes, viajantes, artistas e estudiosos, tinham retornado às suas terras de origem em diferentes oportunidades. Todos poderiam dizer, porém, que durante o período em que aqui estiveram suas vidas haviam mudado. E o mundo em que viviam também. Dos suíços da colônia de Nova Friburgo que sobreviveram às “febres de Macacu””, a maior parte dispersouse pelo interior da província do Rio de Janeiro, tendo sido localizados por J.J. Tschudi —
o representante que
a Confederação Helvética enviou ao Brasil — algumas décadas depois. Suas vidas também haviam mudado, mas nem sempre de acordo com suas expectativas.
Uns voltavam; outros permaneciam. Os negros africanos continuavam chegando, transportados como escravos pelos tumbeiros dos traficantes portugueses, cada vez
mais perseguidos pelos navios de Sua Majestade britânica, Embora o Brasil tivesse passado da condição de Colô-
nia à de Reino Unido, e de Reino Unido a Império, a vida dos escravos não mudara. Eles continuavam sujei-
tos ao trabalho forçado na lavoura, nas minas, nos serviços urbanos e nos afazeres domésticos. Seu trabalho permanecia enriquecendo, acumulando poder e dando pres-
89
tígio a seus senhores. Suas revoltas e fugas procuravam atestar uma humanidade sempre negada, ao mesmo tempo que colocavam em pânico a população branca, nas fazendas e nas cidades. Nestas, a população livre e pobre permanecia “sem
modo certo de vida”. Suas vidas, não haviam mudado, num mundo
como a dos escravos, que estava mudando.
O mesmo não se poderia dizer, certamente, dos antigos colonizadores e colonos. No Rio de Janeiro e áreas vizinhas, a política joanina possibilitara o enraizamento dos antigos colonizadores; possibilitara ainda uma aliança com os colonos da região, da qual emergiria a força política que concretizaria o rompimento com as Cortes portuguesas em 1822, Em todo o Império, os colonos tornaram-se cidadãos ativos pela Constituição de 1824, isto é, cidadãos com a capacidade de eleger os seus representantes para os cargos do Legislativo. As vidas dos antigos colonos e colonizadores haviam mudado, num mundo em que tudo estava mudando rapidamente.
De modo original, eles transformaram a Colônia no Império do Brasil. De modo original, as trajetórias de suas vidas mostravam como muitas vezes torna-se necessário mudar para que algumas coisas permaneçam. Foi fazendo do Brasil um Império que eles puderam conservar os escravos e as terras que possuíam, manter os cargos administrativos que ocupavam, tornar a religião Católica Apostólica Romana religião do Império e prosseguir prosperando com seus negócios à sombra do Estado. Saint-Hilaire percebera com clareza o que acontecera ao comparar a Revolução Francesa com os acontecimentos do Rio de Janeiro. Um correligionário de José Bonifácio — Vasconcelos Drumond — chegou a conclusão semelhante:
[...] à Independência do Brasil respeitou todos os diretos, mal ou bem adquiridos. Não há exemplo que 86
em nenhum outro pais acontecesse outro tanto no meto de uma revolução. (Apud IR. de Mattos, Saquarema, p. 133.)
O tempo
O
Por que poderiam aqueles que fizeram a Independência dizer que o passado colonial não era apenas um tempo distante, mas também um tempo diferente?
87
VOCABULÁRIO
AD VALOREM
— Conforme o valor (no caso, dos produ-
tos importados).
AFORAMENTO
—
Autorização.
AMOFINAÇÃO — Preocupação.
APANIGUADO — Protegido. APROPOSITADO — Adequado, conveniente. AUFERIDO — Obtido. BACAMARTE — Arma de fogo, de cano curto e largo, reforçada na coronha. CAIADO — Branco. CASTA — Grupo fechado. CHARQUEADA — Lugar onde se prepara o charque — carne de vaca salgada e cortada em mantas. CHUSMA — Multidão.
CÔMPUTO — Contagem.
CONCILIÁBULO — Reunião secreta.
CONTIGUIDADE — Proximidade imediata, contato. DESPOTISMO — Governo absoluto e arbitrário, onde não há leis que limitem o poder do governante. ESCALER — Embarcação miúda, destinada a executar serviços de um navio.
ESTANCADO — Diz-se do produto cuja exploração era monopólio do rei ou das pessoas a quem este delegasse o monopólio. ESTIGMATIZAR — Censurar. FAINA — Trabalho constante. GARROTE — Tormento. GENTIO — Indígena. HELVÉTICA — Referente à Suíça. ÍNDIO BRAVO — Indígena que não entrou em contato com a cultura e os valores dos brancos. INÉPCIA — Falta de inteligência, imbecilidade. INGÊNUO — Filho de escravo nascido livre.
89
INVECTIVA — Insulto, injúria.
Juco
—
Opressão,
sujeição, domínio.
JUS — Direito. LIBRÉ — Uniforme de criado de casa nobre. MAGANO — Pessoa maliciosa, pouco escrupulosa, OPUGNANTE — Contrário. OUTORGADA — Diz-se de uma Constituição que não tenha sido elaborada por representantes cons tituídos pela nação, mas imposta pelo governante.
90
O -.
PERJURADO — Quebrado o Juramento. PETA — Mentira. REINOL — Português nascido em Portugal. RETALHISTA — Comerciante varejista. SANCIONAR — Aprovar, ratificar. SEDICIOSO — Que diz respeito a sedição, revolta, SELETA — Especial, excelente, distinta. SEQUAZ — Partidário, seguidor. SESMARIA — Lote de terra cedido pelo rei de Portu gal. SOLILÓQUIO — Monólogo.
—
PANEGÍRICO — Elogio.
CRONOLOGIA 1806 1807 1808
1809 1810 1814 1815 1816 1817 1818 1819 1820 1821
1822
Decretação do Bloqueio Continental por Napoleão Bonaparte. Convenção Secreta de Londres.
Partida da família real portuguesa para o Brasil. Chegada da família real ao Brasil. Abertura dos portos. Alvará que revoga a proibição às manufaturas. Regulamentação da Imprensa Régia. Criação do Banco do Brasil. Criação de instituições de ensino superior no Rio de Janeiro e em Salvador. Invasão da Guiana Francesa. Assinatura dos tratados de Aliança e Amizade e de Navegação e Comércio. Derrota de Napoleão Bonaparte. Congresso de Viena. Santa Aliança. Elevação do Brasil a Reino Unido a Portugal e
Algarves.
Chegada da Missão Artística Francesa. Início da ocupação da Banda Oriental (Uruguai). Revolução Pernambucana.
Coroação de D. João VI. Criação do Jardim Botânico. Revoltas liberais na Europa. Revolução do Porto.
Regresso de D. João VI. Início da regência de D. Pedro. Supressão da censura à imprensa. (jan.) Dia do Fico. (fev.) Convocação do Conselho de Procuradores das províncias. (mar.) Proibição do desembarque das tropas enviadas pelas Cortes. 91
1823 1824 1825 1826 1828 1829 1830 1831
92
un.) Convocação da Assembléia Constituinte para o Reino do Brasil. (ago.) Manifesto de Gonçalves Ledo aos Povos do Brasil. Manifesto de José Bonifácio às nações amigas. (set.) Declaração de Independência. (out.) Início da Guerra de Independência. (maio) Instalação da Assembléia Constituinte. (nov.) Dissolução da Assembléia Constituinte. Outorga da Constituição do Império do Brasil.
Confederação do Equador. Reconhecimento da independência por Portugal. Início da Guerra da Cisplatina. Morte de D. João VI. Abdicação de D. Pedro do trono português. Final da Guerra da Cisplatina. Falência do Banco do Brasil. Promulgação do Código Criminal. Abdicação de D. Pedro.
Início do período regencial.
PARA
SABER
MAIS
e Para quem quer saber mais, recomendamos a lei-
tura de:
COSTA, Emília Viotti da. “Introdução ao estudo da emancipação política do Brasil”. (V. Bibliografia.) da PRADO JR., Caio. Flistória econômica do Brasil. 6. ed. São Paulo, Brasiliense, 1861. (Capítulos 13 e 14.) da . *O Tamoio e a política dos Andradas na independência do Brasil. In . Evolução política do BraÀ.
sil. 3. ed. São Paulo,
Brasiliense,
1961.
e Para quem quer ir mais longe, sugerimos a consulta aos seguintes trabalhos: da COSTA, Emília Viotti da. “José Bonifácio: mito e histórias e “A consciência liberal nos primórdios do Império”. In: - Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo, Grijalbo, 1977. . DIAS, Maria Odila da Silva. “A interiorização da metrópole (1808-1853)'. In: MOTA, Carlos Guilherme, org. 1822: dimensões. São Paulo, Perspectiva, 1972. - FAORO, R. Os donos do poder. (Capítulos VII e VIII.) (V. Bibliografia.) HOLANDA,
Sérgio
Buarque
— sua desagregação”. In:
de.
“A herança
colonial
- Blistória geral da civili-
zação brasileira. t. II, v. I. São Paulo, Difel, 1965.
- MOTA, Carlos Guilherme. Nordeste 1817. (V. Bibliografia.) QUINTAS, Amaro. “A agitação republicana no Nordeste”. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de, org. Históna geral da civilização brasileira. t. II, v. I. São Paulo, Difel, 1965. e À visão dos contemporâneos acerca do processo de emancipação política pode ser resgatada através dos depoimentos de alguns viajantes, como:
93
1. DEBRET, J.B. Viagem prioresca e histórica ao Brasil. (V. Bibliografia.) 2. LUCCOCK, J. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. (V. Bibliografia.) 3. RUGENDAS, J.M. Viagem pitoresca através do Brasil. (V. Bibliografia.) 4 SAINT-HILAIRE, A. de. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. (V. Bibliografia.) - Segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo (1822). (V. Bibliografia.) 6. TOLLENARE, L.F. de. Notas dominicais. (V. Bibliografia.)
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97
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A emancipação politica do Brasil Ilmar Rohloff de Mattos Luis Affonso Seigneur de Albuquerque
Coordenação: Maria Helena Simões Paes Marly Rodrigues
32º EDIÇÃO
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O Ilmar Rohloff de Mattos e Luis Affonso Seigneur de Albuquerque, 1991. Copyright desta edição:
ATUAL EDITORA LTDA.., 1992. Rua José Antônio Coelho, 785 04011 - São Paulo - SP Tel.: (011) 575-1544
Todos os direitos reservados. Dados Internacionais de Catalogação na « Ublicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Mattos, Ilmar Rohloff de, 1944Independência ou morte : a emancipação
política do Brasil / Ilmar Rohloff de Mattos, Luis
Affonso Seigneur de Albuquerque. — São Paulo: Atual, 1991. — (História em documentos) Bibliografia. ISBN 85-7056-352-3 1. Brasil — História (2º grau) 2. Brasil — História — Independência 1. Albuquerque, Luis Affonso Seigneur de. II. Título. III. Título : A emancipação política do Brasil. IV. Série.
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Índices para catálogo sistemático:
1. Brasil: História : Ensino de2º grau 2. Independência : Brasil : História
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Série História em Documentos
Editoras: Sonia Junqueira /Samira Y. Campedelli Assistentes editoriais: Henrique Félix / Thais H. Falção Botelho Preparação de texto: Renato Nicolai Coordenação de arte: Tania Ferreira de Abreu Revisão: Noé G. Ribeiro / Paulo Sá Diagramação: Irineu Sanches da Silva
Arte: Cláudia Ferreira Produção gráfica: Antonio Cabello Q. Filho / Silvia Regina E. Almeida / José Rogerio L. Simone
Consultoria para o desenvolvimento do projeto: Edgard'Luiz de Barros Projeto gráfico: Ethel Santaella Capa: Avelino Guedes Fotos: Ricardo Yorio
Composição: K.L.N. Fotolito: Binhos/ Linoart
LMLUEO NOS PEDIDOS TELEGRÁFICOS BASTA CITAR O CÓDIGO: AZSH 9060]
SUMÁRIO
Parte I Querendo ser liwre e feliz
1
Parte II Em busca da liberdade e da felicidade 1. Adivinhe quem está chegando 2. Os novos colonizadores 3. Para ficar de todo americano 4. Como este Rio de Janeiro ficou grande! . 5. Quem vai fazer a minha barba? 6. Queremos nosso rei de volta. Mas constitucional 7. O Dia da Pátria! 8. A chave da opressão 9. Constituição, sim; revolução, não!
53 58 65 75
Parte III Uns vão, outros ficam. E a vida continua...
83
Vocabulário Cronologia Para saber mais
Bibliografia
13 15 25 30 36 46
Apêndice 89 91 93
95
Nota do Editor: A qualidade da reprodução
fotográfica de alguns documentos ficou
comprometida pela antiguidade das fontes.
A Marcia Gonçalves e aos nossos
alunos
lImar
Rohloff
de
Mattos
graduou-se em História pela
Títulos da série
Faculdade Nacional de Filo:
REVEGAR É PRECISO
do Brasil. Em 1985, defendeu tese de doutorado na área de
Janaína Amado Ledonias Franco Garcia
E
,
sofia da antiga Universidade
História Social, na Universida-
de de São Paulo, editada em
1987 com o título O tempo
Saquarema. :
sds
randes descobrimentos marítimos europeus
OS SONHADORES DE VILA RICA
A nconi danca Mineira de 1789
SR
AD
Ene olição
DO A LIBERDADE da escravatura no Brasil
E professor de História do
Antonio Torres Montenegro
da Pontifícia Universidade Ca-
A
Brasil nos cursos de História pa
do Rio de Janeiro e da
niversidade Federal
Flumi-
nense, além de professor da
MiPÉRIO
O DO GAL
É
grande lavoura no Brasil — 1850 a 1
a Luiza Martins
|
Ae
UMA TRAMA REVOLUCIONÁRIA?
Do Tenentismo à Revolução de 30
rede publica do estado do Rio
Antonio Paulo Rezende
Autor de inúmeros artigos e
Da Revolução de 30 ao fim do Estado
de Janeiro.
NOS TEMPOS DE GETÚLIO
de alguns livros, entre os quais Brasil — uma história
Sonia de Deus Rodrigues Bercito
Novo
dinâmica.
O BRASIL DA ABERTURA De 1974 à Constituinte
;
Marly Rodrigues
us Affonso Selgneur de Al
INDÚSTRIA, TRABALHO E COTIDIANO
História
Maria Auxiliadora Guzzo de Decca
buquerque graduou-se em pela
Pontifícia
Uni-
versidade Católica do Rio de o RE
Janeiro. E professor do Colé-
gio Bahiense e da rede pública do muni cípio do
Rio
de Ja-
neiro.
Brasil — 1889 a 1930
INDEPENDÊNCIA OU MORTE
A emancipação política do Brasil
Ilmar Rohloff de Mattos
Luiz Affonso Seigneur de Albuquerque
DE GETÚLIO A GETÚLIO
O Brasil de Dutra e Vargas — 1945 a 1954
Francisco Fernando Monteoliva Doratioto José Dantas Filho
DOCE INFERNO ; Brasil no escravidão Açúcar — guerra e
holandês (1580-1654)
Elsa Gonçalves Avancini
A REPÚBLICA BOSSA-NOVA
A democracia populista (1954-1964)
José Dantas Filho Francisco Femando Monteoliva Doratioto
O IMPÉRIO DA BOA SOCIEDADE
A consolidação do Estado imperial brasileiro
lIImar Rohloff de Mattos
Marcia de Almeida Gonçalves
A ORDEM É O PROGRESSO
At:
1910 O Brasil de 18a70
niqunta
Alda Heizer
prt eat
Margarida de Souza Neves
Na coleção História em Documentos, o aspecto mais significativo — comum a todos os volumes — é a ampla utilização de documentos na organização e desenvolvimento dos assuntos de cada livro. “Documento” no sentido mais abrangente: desde Os textos oficiais até os registros, em diferentes linguagens, de experiências humanas no período enfocado: depoimentos, letras de música, textos literários, descrições de viajantes, artigos de jornal, pinturas, charges, fotos.
Dessa forma, os leitores terão oportunidade de um contato mais direto e vibrante com o fazer histórico de cada época. Além disso, percebendo como o autor organiza e interpreta os documentos — e, mais ainda, realizando ele próprio os exercícios propostos —,
o estudante terá condições de conhecer um pouco mais a linguagem e os princípios do trabalho do historiador.
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