Trabalho e Subjetividade : No Capitalismo Contemporâneo 9788580610659


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Trabalho e Subjetividade : No Capitalismo Contemporâneo
 9788580610659

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Nada melhor para o capital do que ter à sua disposição, gratuitamente - aliás, pressuposto da venda da força de trabalho -, milhares de indivíduos pensando, dentro e fora das jornadas de trabalho, sobre o imenso leque de problemas que pode surgir nos processos de trabalho. Nos regulamentos dos planos para sugestões, técnicos graduados ou engenheiros que trabalham nestas vãrias áreas não podem participar da campanha. São campanhas dirigidas para os operadores - aqueles que na fase fordista não deviam pensar - mas que agora, de acordo com as novas exigências da fluidez do capital, são estimulados a ser inteligentes e a participar. Os gestores do capital não pretendem cooptar pensamento acadêmico ou teórico, mas o pensar vivo de quem lida com as máquinas e os processos diariamente. As colaborações restringem-se a aspectos de um saber-fazer adaptativo que melhora procedimentos e equipamentos, mas não os modificam substancialmente. São ideias que isoladamente - não podem produzir saltos técnicos efetivos. São pontuais e não podem transformar os processos como um todo, mas no conjunto permitem embutir saber-fazer hu, . mano em maquinas e equ1pamentos usados como capital fixo. Se as ideias, isoladamente, são paliativas ou secundárias, em conjunto significam um saber-fazer expropriado do trabalhador social que poderá ser implantado na produção a médio ou longo prazo.

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Terezinha Ferrari No todo não há incoerência entre o trabalhador dentro e fora do mercado de trabalho. No lugar do trabalho, ele se propõe a ser crítico, participativo, parceiro, previdente, inteligente. Como cidadão ele é também chamado a ser pacífico, demo­ crático, prevenido, moderno. Dentro e fora dos locais de trabalho, o político reduz-se ao somático e ao psíquico. Dentro e fora do local de trabalho enfrenta uma equação imaginada como real, o enfrentamento homem-máquina. O resultado é o indivíduo formado pela política e pelo trabalho estra­ nhados que quando reconhece a si próprio, o faz em um exclusivo feixe de sensações celulares, egoístas e hedonistas. O traba­ lhador está mais uma vez vivendo este imbróglio quando pensa para o capital, dentro e fora do local de trabaJl10, quando transforma sua casa em lugar de trabalho, quando é levado a decidir na esfera da moralidade individual o que fazer de sua força de trabalho.



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São Paulo, 2014 •

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Terezinl1a Ferrari •

Conselho Editorial Barbara Heller Carlota J. i\il. Cardozo dos Reis Boto Célia i\i1aria Bencdicto Giglio Daniel Revah João Cardoso Pahna Filho Luiza Helena da Silva Christov

Terezinha Ferrari

Editor Sebastião Haroldo de Freitas Corrêa Porto Coordenação Editorial Silvana Pereira de Oliveira Projeto Gráfico e Capa Otávio Oliveira Silva

Trabalho e subjetividade

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

no capitalismo contemporâneo

Ferrari, Terezinha 1'rabalho e subjetividade no capitalisrno contemporâneo I Tcrczinha Ferrari. ·· São Paulo : Porto de Idéias, 2014. Bibliografia. ISBN 978-85-8061-065-9

1. Políticas sociais 2. Solidariedade 3. TrabaU10 e classes trabalhadoras 1. Título. II. Série. 14-02412

CDD-306.3

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Índices para catálogo sistemático: 1. Trabalho : Aspectos sociais 306.3

Todos os direitos reservados à EDITORA PORTO DE IDÉIAS LTDA. Rua Perdões, 10 1 -Aclimação São Paulo - SP - O1529.030 Fone ( 11 ) 3884-3814 ,v,,,,.,·.portodeideias.com.br t,vitter.com/portodeideias Digitalizado com CamScanner

SUMÁRIO APRESENTAÇÃO

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PROLETARIADO HOJE

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A REDUÇÃO DO POLÍTICO AO PSÍQUICO Dinâmicas da inculcação ideológica Qualificação, escolaridade e cultura Máquina programável e qualificação Comércio de ideias: criatividade sob bitola

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GEOGRAFIAS DO LIBERALISMO Náiifragos, o trabalho e o coqueiro O náufrago neoliberal Para além da metáfora: o náufrago e o urbano

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Iridivíduo e sociedade

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REFERÊNCIAS

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O que é a riqueza, senão uma situação em que o honiem não se

reproduz a si niesmo numa forma determinada, limitada, 1nas sim em sua totalidade, se desvencilhando do passado e se integrando no movimento absoluto do tornar-se? Karl Marx (1975)

.. . a liberdade e a igualdade não são simples ideais, mas formas concretas da vida dos liomens, relações concretas entre eles, oi, seja, relações concretas com a sociedade e, mediadas por esta, com a natureza; a realização da liberdade e da igualdade exige, portanto, a necessária transformação das condições sociais das relações hu1nanas. Gyõrgy Lukács (2007)

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APRESENTAÇÃO A origem destes ensaios está nas pesquisas desenvolvidas sobre organização do trabalho na sociedade contemporânea. Os dois primeiros ensaios remetem a dois capítt1los da tese Cidade, Trabalho e Técnica: o mito da produção eni ten1po real. O terceiro, Geografias do Liberalismo é resultado de reflexões sobre a co11dição dos trabalhadores e dos indivíduos como um todo nas sociedades contemporâneas. Há tempos pensan1os em publicar os referidos capítulos da tese. Acompanhando, ao longo dos últimos anos, as n1odificações nos territórios econômicos que giraram em torno da remodelação dos processos industriais e as intervenções anunciadas no universo das políticas dos empregadores para formação e trei11amento dos trabalhadores, concluímos que as reflexões do início da década de 2000 ainda têm sentido. A pesquisa empírica inicialmente recaiu sobre trabalhadores das montadoras automobilísticas do distrito i11dustrial conhecido corno ABC, pertencente à Região Metropolitana de São Palllo. Contribuit1 para a decisão de reescrever sobre a subjetividade formatada pelo capital, com base nessa pesquisa, a perceptível manutenção e espraian1ento da forma e essência dos treinamentos de trabalhadores das fábr icas para os mais diversos lugares de trabalho dos serviços à indústria, aos empregos públicos. Em linhas gerais, a orientação destes programas de treinamento tem como objetivo obter o consentimento, a adesão de todos aos valores dominantes. O interesse em torno dos processos de ocupação pelo capital dos poros dos tempos e dos espaços nas sociedades industriais de natureza liberal, constituídas ao longo dos últimos anos, nos levou à confirmação, apesar das formulações em contrário, da exploração do tempo de trabalho de um proletariado em expansão, hoje, mundial e urbanizado. 1

l. Programa de Pós-Graduação e1n Ciências Sociais, PUC-SP, 2003 . ..\ PRl::.SEr-.:·rAÇ c\C) j 9

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Em busca de níveis mais altos de intensidade e de produtividade, seja pelo desen,ro]vimento de meios e instrumentos específicos de trabalho, sejam pelas ações de natureza geopolíticas a partir dos estados-nação, o capital tem levado aos mais variados cantos do mundo nichos de exploração do trabalho mais ou menos sofisticados, mais ou menos industrializados; processo t ributado e a soldo das corporações capitalistas transnacionais que expandem o binômio urbanização/industrialização desde o campo agroindustrial aos serviços mais simples, bem como aos de pesquisa mais sofisticados desenvolvidos nos identificados como polos tecnológicos ao redor do mundo, seletivamente escolhidos e administrados. Assim con10 a intensificação da apropriação e produção de espaços, os conteúdos sociais deste processo de expansão se objetivam sob a lógica da valorização do valor a qualquer custo. Lógica que subordina as relações e meios essenciais da vida humana à dinâmica da reprodução do mercado, tendendo à segregação e à exclusão dos trabalhadores e de toda a população não proprietária dos melhores atributos sociais até agora conquistados pelas forças produtivas humanas desenvol vidas. Essa exclusão vincula-se ao fato das determinações contemporâneas manifestarem-se econômica e politicamente pelo controle efetivado pela fantasmagoria do dinheiro, da mercadoria, do Estado e dos predicados mais negativos da sociabilidade burguesa. A narrativa tem como eixo a problematização do processo de inculcação ideológica. Em outras palavras, perguntamos como 1nilhares, milhões de pessoas são levadas a realizar adequadamente atividades que lhe são estranhas, atividades cujos fins foram forjados por outros, alheios a essa mesma massa de trabalhadores? Essa intimação exige intensa sofisticação teórica, além de quantidade variada dos 1neios de difusão dessas formulações e dos programas de formação e formatação de consciências. Exigência maior decorrente da expulsão de inúmeras atividades dos lugares típicos de trabalho (fábricas, escritórios, lojas). Muitos são levados a trabalhar "por conta própria': não estabelecendo lll j 'fEREZl:-.:JlA 1-l·RRART

contato diário con1 um lugar de trabalho ou com chefes - em geral, 1nas não só, os pri111eiros a inculcar as regras, os valores necessários para manutenção da regularidade do trabalho. A partir das reengenharias de produção dos últilnos vinte anos, no Brasil e nos demais distritos industriais do n1undo, pulverizou-se um maior número de trabalhadores por toda parte de núcleos urbanos de qualquer tamanl10. Como assalariados regulares, trabalhadores temporários, autônomos, ativos e inativos das cidades e dos campos são levados ao trabalho diário regular? Diante da maior cooperação estabelecida pelo emaranhado de serviços necessários à 111anutenção do sistema do capital, con10 se mantém, em massa, a orientação homogénea de destinos e expectativas? Para os trabalhadores não há outro meio de vida além da venda da única mercadoria que lhe resta, sua força de trabalho. Entretanto, con1 tamanha restrição, como todos vão ao trabalho com a consciência esperançosa de que ajnda é esta a melhor (e única) maneira de viver? Esse eixo de indagação se sustenta na própria realidade do capital que para manter-se, regulando o ritmo de sua autovalorização, precisa expropriar sobre-valor, proletarizando vastas massas de trabalhadores ao redor do mundo. Expropriação e apropriação p rivada qt1e contrastam com o alargamento das possibilidades de uma riqueza baseada na ilinlitada humanidade do devir. A riqueza gerada pelo capital tem con10 finalidade preservar e ampliar a riqueza do próprio capital; entretanto, esse é um fim que contradiz com as dimensões atuais do trabalho social e as imensas possibilidades da satisfação das múltiplas necessidades da população mundial. Essa perspectiva de satisfação é o que alimenta o futuro e o debate. Por ora, para manter todos traball1ando são necessárias intensas campanhas para formatação de consciências que terminam por consentir em atuar na direção do próprio capital. Como componente dessa formatação ocorrem insistentes afirmações sobre a maior capacidade intelectiva dos trabalhadores vis-à-vis os antigos operadores. Supostamente estaríamos todos mais inteligentes que no passado, uma vez Al'RL:!)l N 11\(, ,\() 11

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que lidamos com tecnologias inteligentes qu e manipulam e ~) r occssa m informações. Nossas conclusões constatam as conquistas imensas trazidas pelo conhecimento e pela capacidade produtiva imposta pelo capital. Entretanto, sob essa lógica ilnpositiva, tais conquistas não são usufruídas por todos; e se estamos mais inteligentes, até que ponto os operadores diários de todo tipo de equipamento, máquinas e processos, de fato conhecem, definem ou controlam o que conhecem? A contradição objetiva é que a mesma tendência de expansão das capacidades produtivas promove sua monopolização pelos conglon1erados transnacionais, além de distanciar a ciência embutida nos meios, instrumentos e processos dos seus operadores diretos. En1 paralelo a esse distanciamento esse11cial para o capital, as campanhas de t r einamento e os discursos dos empregadores demandam maior qualificação e intelech1alização. A discussão levada à fren t e nestes ensaios diz respeito ao confronto dessas tendências. Nossas respostas tendem a definir um trabalhador qt1e age com criatividade, mas uma criatividade sob bitola, ao mesmo tempo em que essa bitola confirma o distanciamento da ciência en1butida nos processos produtivos, processos que devem se manter sob estrito controle dos capitalistas e de seus gestores do mesmo modo como controlam a formação e a capacitação de todos. Nesse diapasão, não questionamos a importância da divulgação dos modos de reprodução ideológicos, além da certeza da pertinência da tese geral da redt1ção do político ao psíquico, cujo valor fundan1ental é de Maurício Tragtenberg. Autor que, a partir de seus estudos sobre as teorias da administração ao longo do século XX, destacou o papel dos psicocratas e tecnofrenos como criadores de instrumentos de persuasão e de n1ecanismos de formação e treinamento dos trabalhadores para, exclusivamente, melhor atenderem as demandas de geração de mais-valor e para mais plenamente ocuparem todos os poros dos tempos e dos espaços sociais em nome do capital. 1~ 1 TERFZINII \ 1 I· RR c\RI

No capitalismo contemporâneo os vários segmentos profissionais, de vários níveis e dos diferentes setores produtivos enfrentam cursos de formação, treinamentos cujo fim é a criação de t1ma consciência e comportamentos específicos. O treinan1ento enfrentado, as máquinas e equipam ent os operados de uma determinada maneira não são obras do acaso ou da contingência. Para ma11ter os fins da reprodução da sociabilidade capitalista é preciso formatar consciências adequadas e para tanto são necessários profissionais competentes a soldo do capital. Vamos expor a forja da consciência dos envolvidos diretos com a produção do 1nais valor e dos envolvidos com a manutenção, criação e operação de serviços, cujas funções projetadas para o capital são as de bloquear a dissipação do valor acelerando o ritmo do tempo da apropriação das parcelas do mais-valor global e de reduzir os custos dessa mesma apropriação. Para a efetivação destas funções é preciso que todos se reconheçam corno parte desse sistema. Esse é o ardil, fazer acreditar que é sua a finalidade do outro. Os fins e os meios do traball10 são naturalizados. Psicocratas, tecnofrenos pela ciência do capital e pelos meios disponíveis de difusão parcial da realidade, convencem a todos da at1sência de alternativas diante do fato das coisas serem assim, e se assim elas são é assim que elas devem ser. Se estivermos convencidos disso, negamos as possibilidades das lutas e da transformação social, deixando para os donos do poder traçar os caminhos do presente e nos roubando as possibilidades de construção de outro futuro. O modo de produção como universalidade se patenteia em toda e qualquer expressão singular do cotidiano. São pessoas, tempos, espaços e coisas orientadas pelo capital. É para cu1nprir essa orientação que compete11tes psicocratas e tecnofrenos do sistema são convocados para pensar e aplicar os n1ecanismos mais eficazes para construir o ardil do espírito da colaboração - condição que permite gerar maior sobre-trabalho em todos os poros dos ten1pos e dos espaços produtivos. Poderá nos ser .-\l'Rl·~l~N 1 \(.'A!) l' .\O PSIQUlC L> l-13

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planilhas, desenhos, gráficos etc., atividades que antes eram feitas por vários operadores diferentes. Ela se transfor1nou em uma profissional polivalente. Ademais, é preciso dizer que o fordismo e o toyotismo não se caracterizam somente pelo uso de determinadas máquinas, da organização dos lugares específicos do trabalho ou pela padronização dos movimentos dos trabalhadores. São formas de organização do trabalho que correspondem aos níveis de exigência dos processos de produção de mercadorias pelo capital. Os atuais discursos e ações gerenciais insistem na valorização do eleme11.to humano - embora seja no fordismo ou no toyotismo, polivalente ou especializado, o trabalhador permanece cuidando de detalhes, isto é, fragmentos de trabalho. Para valorizar o elemento hi,mano, criaram a nomenclatura da polivalência contra as antigas especializações. Entretanto, para o capital, ct1jo detern1inante básico é a lucrat ividade - tanto no fordismo como no toyotisn10 - não há qualquer possibilidade de "especialistas técnicos ou controladores de pormenores" teren1 acesso às decisões e estratégias que garantam essa determinação básica - e menos ainda, conforme :Niandel, no capitalismo contemporâneo (tardio). Sob a égide do lucro, os trabalhadores estão inevitavelmente destinados a permanecer em estado embrionário. "Por motivos de sua autopreservação, o capital jamais pode transformar todos os trabalhadores em cientistas" 21• O trabalho de vigiar ou operar uma máquina informática ficou, por um lado, mais fácil (mais leve, n1ais limpo), a tal ponto de se agora operar várias máquinas. Essa relação entre fazer menos, mas, ao operar vários equipamentos, fazer mais, é visível tanto no trabalho administrativo de uma secretária como no trabalho do operador de uma n1áquina no chão de fábrica. O lado difícil, o outro lado da questão, até mesmo reconhecido nas campanhas de treinamento, é o estresse gerado por essa polivalência e o medo provocados pelo cuidado que todos devem ter com várias máquinas mais caras e apresentadas como virtuosas 21. MANOEL, 1982. p. 146, 172. +! J Tt:RE7I~JI'\ FJ·RRAR

e que necessitam de cuidados especiais. O trabalho mais intensificado e concentrado no tempo gera cansaço n1e11tal e físico. Transfor n1ar hoje um operário ou uma secretária em operadores qualificados para trabalhar em equipamentos informatizados leva me11os tempo do q ue a formação técnica anterior, no entanto, um longo período de treinamento é, usado para a construção da subjetividade adequada, isto é, resignada para lidar com essa intensificação do trabalho, com o medo e com o cansaço mental. Segundo o material de treinamento toyotista é advogado o absoluto comprometimento/envolvimento do trabalhador para alcançar a qualidade d o processo, aparentemente sem cl1efes ou chefetes para controlá-lo - cada t1m seria chefe de si próprio -é a proliferação do espírito gestor. 22 Esse material propõe a sincron ia geral em lugar da rapidez isolada - que somente produziria estoques inter mediários (gargalos); procura o aproveitamento n1áxin10 da estrutura material e humana vigente; pretende eliminar o espaço pelo tempo e buscar o zero retrabalho; pretende eliminar os estoques, eliminar absolutamente o redundante, os erros, as perdas para o capital. Segundo os preceitos toyotistas, em qualquer lugar de trabalho, quando o trabalhador estiver esperando a máquina completar o processo antes de inserir novos materiais significa que ele não está agregando n1ais-valor, ele não está trabalhando, portanto, este tempo deve ser o menor possível. Enquanto os operadores esperam, "poderiam estar fazendo algo de produtivo': colaborando para eliminar esse tempo de espera, pensando em alternativas. Se há espera é porque l1ouve atraso, por isto espera é perda. Mas não adianta evitar atraso chegando cedo, os insumos não podem chegar antes. Antecipação também é perda. Qualquer movimento ot1 processo que não adiciona valor é perda (de tempo, de espaço, de força de trabalho, energia prática humana comprada que não pode ser perdida). Perda é "super22. A seguir faremos várias referências a estes n1ateriais, os trechos destacados estarão entre aspas. Optamos por não 1nostrar nomes das e1npresas e dos métodos. Ver também nota nú1nero 52.

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produção, defeitos, estoques, atrasos, movimentos, transporte': Perda é porosidade vazia (de mais trabalho) dos tempos e dos espaços. Set-up é a expressão usada para designar o tempo de espera para a preparação da máquinas, assim, o set-up deve ser reduzido mesmo que seja em alguns segundos, pois quanto menor for o te1upo de preparação da 111áquina para começar a funcionar, menor será o supermercado - estoques intermediários; é matemático, se o set-up for igual a zero, o estoque será igual a zero. Se existe um tempo de preparação da n1áquina, elimine-se esse tempo. Segundo os manuais que circula1n nos locais de trabalho destinados a treinar os trabalhadores, reduzir seis segundos pode não contribuir significativamente para aumentar a produtividade, mas pode constituir-se num desafio que mantém as pessoas motivadas a pensar sempre em constantes melhorias [... ] Os japoneses trocam ferramentas com mais de 10 toneladas em menos de cinco minutos, nós (sic!) gastamos 210 minutos para trocar um dispositivo com pouco mais de 10 quilos. Por isto precisamos, no melhor espírito kaizen, buscar a melhoria contínua visando a eliminação de qualquer atividade ou processo que não adiciona valor ao produto. Os trabalhadores - conscientemente ou não - não passam ilesos por essa saraivada de n1á..umas claras, diretas e objetivas, e aparentemente neutras nos locais de trabalho e fora deles. No cotidiano a tendência é todos assimilare1n os valores e se comportarem como gerentes. É possível ver a sombra de Taylor em sua experiência com Schmidt, na orientação dos movimentos: "esperar não pode, n1ovimentar-se em excesso também não pode, chegar antes também não", afinal, ganl1ar seis segundos no set up pode servir para formar un1a consciência, uma postura diante da vida, diante 46 I TEl~F.ZlNH;-\ FERR.-\RI

tio trabalho. Nesse movimento contínuo, idealmente sincronilado, somam-se os "esforços a fim de eliminar os desperdícios através da interação entre pessoas e equipan1entos buscando a quebra zero, o defeito zero e o acidente zero': O capital é um processo constitt1ído como contradição viva, é uma relação social que para existir deve destrt1ir ou assimilar 1nodifi.cando em sua direção todas as barreiras. Na contemporaneidade, a antiga e inerente tendência do capital de eliminar o espaço pelo tempo tornou-se a máxima absoluta. O zero é o símbolo da imaterialidade do trabalho, do tempo, do espaço, da produção, da ausência do devir. Assim, o máxin10 de produtividade do trabalho deve basear-se na produção com o menor número de trabalhadores; em um tempo de trabalho - necessário - o menor possível, bem como, em um tempo de trabalho - excedente - o n1aior possível. No entanto, tal nível de produtividade, somado a un1 tempo de circulação de mercadorias que tende a zero, somente pode ocorrer no plano da idealidade de tecnocratas capitalistas. No limite, a busca dessa sincronia tão absoluta dos movimentos en1 tempos iguais a zero não seria a a11ulação do próprio ten1po e do espaço? É a absurdidade revestida de racionalidade tecnológica. Taylor invejaria com o seu arcaico cronômetro essa en1preitada que acaba por envolver toda a sociedade. Ensina-se o trabalho em tempo real: "fazer certo na primeira vez"; "fazer o produto certo, no tempo certo, na quantidade certa, na qualidade certa e na sequência ceita': um fazer estipulado pelo "sincronismo total'~ Não é somente o certo, mas o necessário. "Fazer o que é necessário"; "fazer na quantidade necessária". Tudo sem otimizações isoladas, buscando-se, pela sincronia coletiva absoluta (quase virtual), a redução dos tempos e dos movimentos no e dos espaços, controla-se o passado, o presente e o futuro. Sincronia que procura eliminar o espaço no tempo e o ten1po no espaço. Sincronia entre pessoas e equipame11tos em un1 contínuo tal que o processo do trabalho parece evaporar-se, dissolver-se, restando somente como resultado o produto final - e o cansaço. \ REI li (, AI

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O trabalho pela rapidez - sincronizada - com que é feito parece um ato mágico. Não é a rapidez o segredo do mágico? No sonho capitalista, restariam somente as 111ercadorias nas prateleiras para serem consumidas pelos náufragos contemporâneos. Na ditadura do tempo certo e necessário, do fazer sempre certo (na primeira vez), nunca nada sai errado? Nessa ditadura, o trabalhador aparece como tendo a liberdade e a obrigação da criatividade para consertar o qt1e sair errado usando expedientes não previstos no planejamento gerencial - desde que, porém, as metas previstas e as garantias do lucro sejan1 mantidas. Dinâmicas da inculcação ideológica

Ainda na década de 1980, ao tratar os recursos humanos como "prática, teoria e ideologia': Maurício Tragtenberg refletia sobre mecanismos de cooptação do operário, elaborados nas academias estadunidenses - aqt1i, será ilustrativa a recuperação dessas for1nulações críticas. 23 Como pensador da dinâmica e natureza das corporações e da administração de empresas, Tragtenberg tira conclusões fundamentais sobre a atuação dos chamados recursos humanos da administração científica desde sua siste1natização pelos idos da década de 1920. Essas conclusões serão baliza para as próximas reflexões. Desde os anos 1990, no Brasil com mais vigor, primeiramente os operários do chão da fábrica, depois todas as outras catego23. PAES DE PAULA, A. P. Tragtenberg revisitado: as inexoráveis harmonias administrativas. Neste ensaio a autora trunbém conclui sobre a atualidade do pensan1ento de Tragtenberg: "O toyotismo representa uma reedição de teorias e práticas administrativas, que procuran1 se adequar ao dina1nismo das novas formações socioeconômicas. No intuito de obter eficiência e n1anter produtividade, combina técnicas clássicas e práticas participativas, reforçando seu caráter ideológico e sinalizando sua dívida com as antigas escolas de administração. Assin1, as novas teorias administrativas continuan1 reproduzindo a ideologia da 'harmonia administrativa', outrora evidenciada por Tragtenberg, distanciando-se de uma real de1nocratização nas relações de trabalho''. Centro de Doctunentação ~Iaurício Tragtenberg, Departa1nento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá. -18 I fcRE/.ll\ 1. •\ 1-LRR.\!(I

rias profissionais, passaram a viver intensos treinamentos para vestir a camisa da empresa e formatar esse específico modo de sentir dos indivíduos que compõem o proletariado contemporâneo. Profissionais das ciências das humanidades (psicólogos, sociólogos, pedagogos, especialistas nos esportes, administradores, educadores em geral, artistas, antropólogos entre outros) contribuem para a criação de materiais e dinâmicas com o intuito de chegarem o mais eficientemente possível à formatação dessas subjetividades adequadas. Nos períodos de predomínio dos padrões fordistas clássicos, projetos carregados desta intenção eram destinados mais às gerências de nível médio e alto que se ocupavan1 em repassar a cultura da empresa e do sistema aos de baixo. Enxutos os níveis gerenciais, hoje, chega-se diretamente aos operadores através das ca1npanl1as de formação de um modo de ser e de pensar essencialmente antagônico: por um lado um indivíduo egoísta e personalista, e por outro solidário e comunitário. Um modo de ser que persuade e pressupõe a condição de liberdade, mas trata-se, conforme Marx, da liberdade do homen1 enqt1anto mônada isolada, retirado para o interior de si mesmo. Com maior ênfase, desde as décadas de 1930/1940, os estudos da psicologia social de viés funcionalista, principalmente a estadunidense, procuram os meios para alcançar os objetivos de estudar a psique hwnana e st1a interação com grupos e pôr os resultados dessas investigações a serviço da otimização dos tempos e dos espaços de trabalho. Psicocratas e tecnofrenos24 contribuem para a formatação de subjetividades pacificadas. Como resposta às lutas dos trabalhadores configurou-se uma teoria subjetivista adequada aos ventos do individualisn10 do pós-68 e ao alcance da produção informatizada. Assim, st1bjetividades enriquecidas de vida simbólica interior, tornadas mônadas comunicativas isoladas e retiradas para o interior de si mesmas tomaram o lugar da possibilidade de consciências menos resignadas. Não é somente a persuasão discursiva no interior das empresas que garante o êxito quanto à obtenção do consenti24. TRAGTENBERG, 1989. ,\ RLl)l c::\C) !)() l'()l.ÍTIC'C) Af) PSIQUICO] -l9

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mento e envolvimento de operadores de máquinas e processos. Variadas e complexas instâncias concorrem para o êxito desse propósito. No Japão, por exemplo, os motivos do consentimento e do envolvimento eran1 (alguns ainda restam) diversos e de natureza palpável, material como emprego v italício, salários etários etc. Nos Estados Unidos o consentimento e envolvin1ento são egressos de uma sociedade de abundância de mercadorias que só resta consun1ir. O Brasil, eterno país a meio caminho de um futuro democrático e de realização econômica, as condições materiais de abundância são inexistentes e o consentimento e o envolvime11to ocorrem pela asfixia discursiva dos gerentes, seus instrL1tores, professores, padres, bispos, pastores, pais etc. Posta a contrapartida material bem menos generosa, o esforço aqui é mais asfixiante e mecanicamente imposto. Diante da .m iséria geral, o medo é o principal aliado do consenso, da resignação, das parcerias e dos acordos sempre proclamadas em no1ne do futuro e da esperança. Consentimento e envolvimento também são atrelados à intensa ideologia que vem do sisten1a educacional, inclusive das escolas técnicas preparatórias, dos meios de comunicação, da publicidade, das religiões espiritualizantes que submetem e conformam os indi,,íduos à saraivada das máximas ambíguas do vencedor, egoísta e conforn1ista. As intervenções políticas nos locais de moradia insistem no discL1rso comunitário, de um voluntariado consensual e solidário escamoteador das contradições que contribuen1 para criar condições favoráveis para construção desse envolvimento e consentimento. O poder geral de persuasão age desde a infância preparando a todos para sermos funcionários potenciais - gerentes de ocasião - do capital, para sermos proativos e acríticos do mercado. As ideologias específicas revestidas de popularização científica propagam o moderno, o competente e a nossa participação no estranho binômio entre homens e máquinas - situação fantástica em que estas últimas aparecem con10 inteligentes. Tudo nos reduz a elos informacionais da produção e da circulação, envolvidos e eficazes produtores de parcelas exíguas da riqueza geral vistas com olhar 50 I l l·Rl~Zl!\:I IA IT:RR \RI

(sic!) condescendente de subjetividades soberanas imersas no psiquismo exaustivamente fortalecido para suportar o isolamento e o medo. É uma saraivada ideológica que paradoxalmente prepara caminhos sociais díspares. São orientações no geral para o consentimento e o envolvimento para a formação de agentes aptos, bem informados e adequados ao movimento equilibrado e l1armonioso do sistema. Entretanto, ora são levados a agir como se estivessem no melhor dos mundos e pudessem atingir a condição de eficazes capitalistas abrindo seu próprio negócio ora, são levados a dedicar-se absolutamente aos empregos, cuja perda vem sempre acompanhada do medo. Em meio às incoerências entre discurso e realidade, muitos se mantêm por meios de sobrevivência que os levam a uma vida muito curta. Esvaziada da complexidade contraditória do social, subjetividades passam a ser reduzidas a co11juntos de inputs e outputs processados por links e hyperlinks organizados em uma rede biologizada submetida a uma retórica paisagem cognitiva. Percepção, representação, experiência vivida, subjetividade, inteligência, cognição como elementos exclusivos da subjetividade humana são referências das teorias dos recursos humanos que utilizam este mesmo arcabouço teórico no sentido da reconstrução de indivíduos conformados na direção do sentido e dos valores da conquista do sucesso a qualquer custo. A cultura empresarial difundirá por cursos, treinamentos, vivências e dinâmicas essa possibilidade resultando nos mecanismos de envolvimento25 que quebra a resistência até chegar ao consentin1ento político conquistado pela exaustiva persuasão psicológica e pela ausência n1aterial de alternativa de reprodução da vida fora do mercado. Os singulares locais de trabalho não são somente lugares físicos onde o "trabalho excedente cresce às expensas do necessário': são "palco da oposição de classes" e "cenário da inculcação 25. É comum entre os especialistas em recursos humanos a metáfora sobre o envolvimento da galinha para botar o ovo e o co1npron1etimento do po.rco para produzir o bacon. \ Rl·l)l e;:\() 1)0 Pl Ç:l.C) l)C> Pl>LÍTICO \O PSÍQL ICO l .'i3

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e avaliação das perforn1ances individuais. Psicólogos, sociólogos, especialistas, instrutores de treinamento - os psicocratas e os tecnofrenos - projetam programas cultt1rais e artísticos que buscam reconstruir uma subjetividade consentida. A imaturidade política é resultado desse consentimento. Exemplarmente, uma destas campanhas levadas a frente em uma montadora do ABC nos anos de 1990 apropriou-se da lenda de Camelot, do reino de Arthur, onde a espada Excalibur estava encravada en1 uma pedra que somente poderia ser retirada por quem possuísse coração bom, nobre e forte. A ocultação das diferenças fundantes (TRAGTENBERG) apresenta-se no mote da persuasão: "cavaleiros, erguei vossas espadas': Esse mote pretendia a) jogar por terra o qtLe era considerado os m itos da relação conflituosa entre capital e trabalho; b) criar um comprometin1ento dos funcionários com a empresa diante da alta competição global; c) vincular o destino dela a todos os destinos individuais; d) elevar a motivação e o ânimo dos trabalhadores comparando-os a Camelot criar as condições para o reconhecimento do orgulho de pertencer a t1n1a empresa (um reino!) cuja história lendária é de glória, de luta, de honra e lealdade. A linguagem da campanha é lúdica e cruregada de simbolismos emocionais, promovidas por um teatro interativo representando os elen1entos vitais: a terra co1no a realidade palpável, a água como extravasame11to sentimental das emoções, o fogo que queima o desânimo e a preguiça, o ar como con1bustível das realizações humanas. No final as máximas sentenciam: "é na força de trabalho que se distingue a nobreza entre fracos e fortes"; "não se esqueça de sempre cultivar a verdade e1n relação aos outros e a voce mesmo ; nao per1naneça preso ao passado, nem a recordações tristes"; "procure ser humilde em todas as circunstâncias". Os antagonisn1os sociais e políticos são reduzidos ao psíquico, ao lúdico, ao somático e ao fisiológico por n1eio desses projetos de inculcação ideológica. Menos monótonas que palestras, nas quais todos dormiam, as dinâmicas i11terati,ras e o material dift1sor de valores e conceitos, como vídeos repletos de imagens A

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e cores em movimento incessante, possuem uma articulação discursiva própria, além da utilização de filmes de entretenimento para deles extrair sensações e sentime11tos vários considerados válidos para o sucesso das equipes. 28 Elaborar dinâmicas de 28. Em 21 de junho de 2013, a pedjdo da UOL Empregos e Carreiras, especialistas en1 recursos humanos e gestão de pessoas listaram dez filines que Lrazem lições para a vida no trabalho e que podem contribuir positivan1ente para a carreira dos indivíduos liberais dentre e fora da empresa, reproduzindo o discurso de equipe, força de vontade e detern1inação. As alegorias comparam momentos e lições de rnoraJ dos filmes aos episódios corriqueiros da vida cotiruana, conforme segue: "Os Vingadores: [... ] Veja como os vários super -heróis reunidos neste filme conseguiran1 resolver suas diferenças. [...] profissionais precisam formar u1n ti1ne: cada um fazendo sua parte [...]; O Concurso: [... ] Fica a dica: não perca o foco quando quiser atingir seus objetivos e esteja sen1pre preparado para lidar con1 adversidades, pois as coisas poden1 não acontecer como planejado; 007 Operação Skyfall: você falhou na sua última missão[... ] James Bond dá a volta por cima[... ] superando seus medos e enfrentando seus adversários [..,.] No mundo corporativo, a resiliência vale ouro; O Resgate do Soldado Ryan: (... ] cada membro da equipe precisa se sacrificar pelo bem de todos. Assim, conseguem-se os melhores resultados e as maiores vitórias; Coach Carter, um Treino para a Vida:[ ... ] Na carreira, muitas vezes seremos chamados a sair de nossa zona de conforto, e um bom líder fará o que acredita ser melhor para sua equipe e não para si [... ]; Gladiador: [...] a vida corporativa é cheia de altos e baixos, num dia você pode ser o "general"; no outro um "escravo"( ... ]; Limite Vertical: [... ] destaca a in1portância de estar preparado para tomar decisões e assumir suas consequências; Batman, O Cavaleiro Das Trevas Ressurge: [... ] Lembre que você não ten1 poderes sobre-humanos e, como o Batman, pode estar se afastando emocionalmente das pessoas escondido atrás da n1áscara de salvador da pátria no escritório. Aprenda a ouvir, falar, emocionar-se e compartilhar com seus colegas de trabalho e fainília. Tire a máscara e não deixe as tarefas do dia a dia acabarem com sua vida pessoal; Meia Noite Em Paris: [... ]se Steve Jobs ou Bill Gates tivessem ouvido seus críticos não chegariam tão longe [...} você pensa em uma mudança de carreira, veja como o personagem do filme trabalhou seu desejo de trocar a profissão de roteirista para escritor; A Procura da Felicidade: [...] primeiro deve permanecer aprendendo, co1no estagiário, sen, receber salário. O filme traz u1na verdadeira lição de motivação, determinação e disposição para encarar desafios no trabalho e na vida''. Disponível em: http://economia. uol.con1.br/empregos-e-carreiras/album/2013/08/21/dez-fil1nes-que-trazem -licoes-para-a-vida-no-traball10.htn1. Acesso em: 21 jun. 2013. Os filmes Tropa de elite também já foram indicados como estimulantes do trabalho. A RI l)l Ç ..\(> DO PC)LÍTICO AC) l'SÍQl I('() 1 '~

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interação ao ar livre (canoagem, arborismo, jogos, competições esportivas), simt1lar desafios como preparo de alimentos, estimular a criatividade (pintt1ra, criação de máscaras, música, dança) é o papel dos profissionais que se dedicam a extrair o máximo de cada um e criar as condições psíquicas do envolvimento no trabalho. O t1niverso dessa locução é sintomático. É discurso lacunar que transforma a aparência em verdade, pretensamente reeducador dos trabalhadores. Linguagem ordinária (simples) que se opõe à linguagem reflexiva e vislumbra privilegiar o saber intuitivo e participativo (apolítico), no melhor sentido do eu isolado da sociedade, que previne antes de remediar, que pretende valorizar o homem em relação à n1áquina e ao saber tecnicista. É um material singular que sintetiza a ratio dominante. Dirige-se ao traball1ador de qualquer nível ou setor, mas, principalmente, aos que (só!) cuidam de detalhes, os distanciados do poder de decisão ou de 1nodificação em relação ao produto, ao processo 29 r10 qual está trabalhando. Execução, elaboração de detalhes; intervenções que não foram eliminadas pelos atuais modelos de organização que preconizam multitarefas para um trabalhador polivalente e performático. Não há espaço ou estímulo para reflexões transcendentais ou ensaios racionais indagativos. O que importa é o aqui e o agora, o imediato e o útil. Apreendidos e expressados de modo simples por uma linguagem rápida, pedagógica e infantilizada acompanhada sen1pre de ilustrações, desenhos e imagens; é um discurso lacunar que opõe sonho, ficção e utopia a abordagens razoáveis e essenciais. As sensações descritas são sempre empíricas e antropomorfizadas. Ideias, aspirações, lembranças e imagens 11ão operacionais tornam-se desprezíveis, irracionais, perturbadoras ou sem significado.30 Nos ma11uais, cursos e cartilhas de formação para os operadores, a linguagem é clara, direta e pedagógica e buscam uni29. SENNET, 1999. p. 47. 30. MARCUSE, 1969. p. 177. 'i61 T[ l PUI.I f!Cl> AO !""Sl(2l ICO l 611



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sendo criada a dependência do capital frente aos trabalhadores. Esses estariam realizando atividades agora mais cerebrais o que, no limite, mostraria o fim da divisão entre trabalho manual e intelectual, própria da organização fordista do trabalho e do controle imediato que o capital exercia naquele período sobre o trabalho. Harry Braverman, na década de 70 , assinalava que os conceitos de qualificação, instrução, educação são em si mesmos bastante vagos e que se deveria buscar interpretar substancialmente a qualificação. Como Marx indicou que a ciência embutida nas máquinas não existia na consciência do operário, Braverman diante da complexidade do maquinário industrial de meados do século XX concluía na mes1na direção que "quanto mais o trabalhador precisa saber, menos ele ou ela conhece:'39 Haveria possibilidades de autonomia do trabalho por causa das novas tecnologias? Máquinas programáveis em qualquer nível que se as aborde não exigem em si mesmas qualificação ou abstrações superiores. Havia ( e ainda há) sim un1a mistificação em torno das máquinas i11formáticas que as transformam em equipamentos antropomorfizados provocando admiração pela amplitude de sua operacionalidade, rapidez, capacidade de armazenamento e cruzamento de dados. Essa forte propaganda vem no bojo da ascensão dos neocons estadunidense que revestiram de modernidade high tech sua posição política conservadora. No entanto, para além da mística, a operação destes equipamentos (ou mesmo a elaboração de softwares) nada ten1 de excepcionalmente inteligente; compõe-se de ações-reflexo sem reflexão. É preciso, sem dúvida, domínio das linguagens específicas, mas isso não significa que haja, por causa desse domínio, superioridade intelectual do operador ou do programador. Ainda hoje, ora se fala da maior inteligência do trabalhador, ora se reconhece que essa condição seria restrita a uma pequena parcela dos que executam atividades mais complexas, cujos custos e ten1po de formação são mais altos, ora diz-se que o trabaJhador tomou-se 39. BRAVER.i.\1AN, H. 1981. p. 360. 71.l

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mais qualificado, com maior capacidade de abstração, mas as tarefas foram e1npobrecidas. A nosso ver, o debate deveria percorrer o caminho da inserção das mudanças tecnoprodutivas geradas pelo capital resultarem primeiro, na identificação de que em "todo processo de produzir valor, o trabalho superior tem de ser reduzido a trabalho social médio,, 40 - uma variável histórica importante e complicadora é que no capitalismo cor1temporâneo essa redução tem de ser dimensionada em níveis mundiais; segundo, como importante tendência geral as inovações técnicas tendem a incorporar nas máquinas e eqt1ipamentos um tipo de conhecimento, uma ciência que não é socializada, uma vez que é produzida em centros de pesquisa sediados nos países centrais - e seu domínio se torna cada vez mais distanciado do operador último dos equipamentos. O que torna o controle sobre a produção por parte do trabalhador uma tarefa histórica que só pode se objetivar se foren1 consideradas as transformações das condições sociais na sua totalidade. O encapsular de técnicas humanas em equipamentos informáticos (conhecido como tecnologia) impõe un1a auto1nação prescritiva e substitutiva que amplia horizontalmente a massa de informações para desempenho de uma mesma tarefa, sujeitando o conhecimento à mera instrumentação utilitarista", enquanto o "saber vivo do trabalho encampado pela lógica conceituai formalista [... ] o codifica e o congela ao transforn1á- lo em softwares, a mais nova expressão do trabalho morto. 41

As chamadas novas tecnologias, ao contrário das tendências aventadas, possibilitaram um domínio mais completo do capital sobre o trabalho resultando na desvalorização da qualificação do trabalhador. 40. lvIARX, 1985. vol. I, p. 162-163. 41. SOUZA, 1994. p. 20. 1\ REl>l (, \(1 ll(l l'Cll l ílC(> \(l PSI()( IC (J 71

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Outro nível do debate - longe de estar resolvido - é reconhecer que os empregadores estão mais exigentes quanto à escolaridade dos seus funcionários. Essa exigência, em parte, tem a ver com as imposições para aumento dos índices de erradicação do analfabetisn10 (entre outros propósitos), preconizado pela ONU42 - principalmente as grandes empresas tambén1 se colocam ao lado de causas sociais, humanitárias. Entretanto, no mt1ndo real essa imposição e esse humanitarismo convivem com o empobrecimento do sistema educacional e com a contradição, dos processos de trabalho vir se automatizando, dispensando trabalho vivo, ao mesmo tempo em que se exige capacidade cognitiva dos trabalhadores. Realidade bem distante dos propósitos de conglomerados e organizações internacionais e seus intuitos humanitários. Enquanto isso, o Estado que rifou a educação, cumpre seu papel garantindo as condições burocráticas para os empregadores cumprirem como senha utilitarista a primeira seleção com candidatos regularmente diplomados. Recém -empregado, o candidato passará pela vivência profissional no próprio local do trabalho e é aí que a triagem final será feita. Exige-se para ser aceito no emprego maior nível de escolaridade; entretanto a permanência dependerá menos do diploma e mais de outras competências e habilidades demonstradas. O diploma, devidamente legitimado, é somente fator inicial de seleção. São tempos de transformação do trabalhador em colaborador. A escola tradicional (fordista) tinha claros valores e objetivos e forn1ava para o trabalho - a educação bancária de Paulo Freire. Hoje, a escola tenta encontrar os meios para uma formação inclusiva e colaborativa, proposta in1portante, mas que se cl1oca com a realidade do mercado que não é inclusivo, nem colaborativo. No entanto, veiculam-se as ideias correspondentes a um capital humano que postula a responsabilidade da formação ao indivíduo que convive paralelo ao discurso do empresariado 42. Dispo1úvel em: http://\vww.onu.org.br/ onu-avalia-progresso-dos-objetivos-do-mil en i o-e-pede-esforeo-pelo-cumprimento-das-rn etas-ate-2015 /. 72 I TEREZl~H \ •-1::R R \RI

sobre a qualidade da mão de obra. Exigência para fazer crescer a economia e a produtividade. Em última ai1álise, escola e alunos são os culpados pela estagnação, pela falta de crescimento econômico - afinal, dizem que empregos existem, mas não temos ,não de obra qt1alificada. A escola perdeu qualidade na relação ensino-aprendizagem nivelando-se pelo mercado, ao mesmo tempo, o mercado empregador a considera incapaz de formar trabalhadores que, por sua vez, só formalmente escolarizados estão despreparados para cumprir tarefas cada vez 111ais empobrecidas de conteúdo. Diante da insuficiência de emprego formal, com carteira assinada e ganhos razoáveis, apesar do círculo de descaso, estudar aparece ao mesmo tempo como oportunidade única para alcançar algum sucesso, n1as aparece também como uma perda de tempo, e1n razão da procura por um emprego exceder em muito o número de postos de trabalho e a quantidade de vagas a disposição. Muitos diplon1as - mesmo os de nível universitário podem ter sido expedidos, mas os diplomados não encontrarão vagas suficie11tes e, em mt1itos casos, começa-se a trabalhar em funções que não têm vínculos com a formação escolar, co11dição que pode se estender por longos períodos ou, atuab11ente, pela vida inteira. No geral, a escola parece não ter encontrado ainda seu real papel diante das reestruturações unpostas pelo capital nas últimas décadas - leia-se a escola destinada para a maioria, uma vez que a escola privada, cara, tem como muito evidente sua função na sociedade de classes. A relação entre escola, mercado e trabal.h o está marcada por profundos abismos no capitalismo contemporâneo, basicamente nos países pobres e nos países como o Brasil, incluído entre os chamados emergentes. Na sequência de incongruências e desperdícios de forças produtivas, embora haja trabalho de todo tipo disperso pelos territórios econômicos, não há emprego regular para todos. En1 busca de aun1e11to das taxas de lucro, o capital forçou padrões produtivos para usurpação de 1naior tempo de trabalho exce\ RF11l {, \CJ I l(I Plll.1 f ICC 1 \C l !'Sl()l IC. CJ 17"

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dente gerando, em um primeiro momento profundos níveis de desen1prego, depois consolidando um efetivo escasseamento de cn111regos e impondo critérios de entrada altamente seletivos no n1crcado de trabalho, o que deixou e continua deixando milhões se111 possibilidades de encontrar trabalho regular. O resultado tem sido que "na falta de mercado para sita força de trabalho" 43 , muitos jovens passaram a viver das novas possibilidades valorizadoras de suas expressões culturais, entendidas como o único caminho de serem reconhecidos e identificados na sua singularidade étnica ou de gênero, por exemplo, mas em detrimento da sua própria determinação socioeconômica de classe. É tema para análises posteriores o discernimento que a explosão cultural dos últimos vinte anos no Brasil, especialme11te, em suas regiões urbanas metropolitanas, ocorreu à margem da escola, mas está intirna111ente ligada ao patrocínio e fomento do Estado atra,,és de suas políticas públicas. Segundo Paulo Arantes, cultura tornou-se um precioso meio de governo, reunindo as duas funções: não só acalma os nervos, que a esta altura andam à flor da pele (economias emergentes intensificam tanto o trabalho quanto a sL1a falta), corno pode, vez por outra, abrir as portas para o subemprego, intermitente, porém subliniado pela aura artística. (ARANTES, 2012, p. 206) Assegurada pelo Estado, isolada dos ângulos socioeconômicos e da sociabilidade mais ampla, cultura seria o passaporte para a cidadania, do reconhecimento e de identificação dos diversos e diferentes grupos sociais, fundamentalmente os existentes nos amplos territórios urbanos necessários à expansão do capital mesmo que parte destes territórios seja o coração da floresta amazônica. A virada cultural, desenhada material e ideologicamente a partir das décadas de 1960/ 1970 pelas concepções do novo conservadorismo, acabou divulgando que a exploração 43. ARANT ES, Idem, p. 24. "7-1 Tf Rf:.ll~I \

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econômica, ao ser tratada pela categoria do traball10, geraria un1 tipo de co11flito de natureza política que poderia desequilibrar o sistema. A tentativa de eliminação desse perigo deu-se pela inversão entre política e cL1ltura - ao invés de movimentos críticos pautados pela exploração econômica, os meios de difusão insistiram na di,rulgação e incremento da ideia de que atividades cultt1rais poderiam satisfazer o anseio por igualdade e reconhecimento social dos diversos grupos e indivíduos marginalizados do mercado de trabalho formal.

* Enquanto enfrentamos problen1as complexos fazendo cultura, cuja identificação de sua natureza fundamental ainda está em aberto, essencialmente o capital necessita é de uma quantidade crescente, mas "limitada de produtores i11telectuais munidos de qualificações específicas e encarregados de desempenhar tarefas específicas no processo de produção ou circulação" 4" . Entre as idealizações de n1atizes os mais variados, como já citamos em outro momento, as reflexões de Mande! são pertinentes sobre a específica contradição geral característica do modo de produção capitalista, qual seja: [... ] a contradição entre a riqueza social em expansão e o trabalho cada vez n1ais alienado e empobrecido, enquanto essa riqueza social estiver aprisionada pela apropriação privada. [... ] Quanto mais a educação superior se tornar uma qualificação para processos específicos de trabalho, quanto n1ais o trabalho intelectual se tor11ar proletarizado - transformado em mercadoria - tanto mais a mercadoria força de trabalho intelectual será vendida num específico "mercado de trabalho de qualificações intelectuais e científicas" [... ] além da co111panhia inevitável do 44. MANDEL, 1982. p. 184. \ l{[

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