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Portuguese Pages 177 Year 1998
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Título original: Le Symbolisnw du Temple Chritien C Guy T~daniel, Éditeur
Traduçlo: Eduardo Saló Revislo da traduçlo: Ruy Oliveira
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Capa de EdiçOes 70 '
Depósito legal n.• 130482198 ISBN 972-44-0638-S
Todos os direitos reservados para a Ungua portuguesa por . Edições 70
. .. EDIÇÕES 70, LDA. Rua Luciano Cordeiro, 123- 2.• Esq.•- 1069·1 S1 LISBOA I Portugal Telefs: (01) 3158752-3158753 . Fax: (01) 3158429 . · ·, .. • • • • Esta obra esté protegida pela lei. Nlo pode ser reproduzida no todo ou em parte, qualquer que seja o modo utilizado, incluindo fotocópia e xerocópia, sem p~via autorizaçlo do Editor. Qualquer transgresslo i lei dos Direitos do Autor será passfvel de procedimento judicial. •
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«Abri-me as portas da justiça, para que eu entlf! e dê graças ao Senhor! Esta é a porta do Senhor; por onde podem entrar •
os justos ...
A pedra rejeitada pelos construtores tomou-se a pedra angular. Foi o Senhor quem fez isto, e é admirável a nossos olhos.
(Salmo 117)
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. NOTA À SEGUNDA EDIÇÃO FRANCESA ~ •
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Há vários anos que nos chegavam pedidos, de França e do estrangeiro, para a reedição do nosso estudo sob~e o simbolismo do
templo cristão. · . . Com efeito, a actualidade do ensino de que fizemos eco neste livo continua tão viva como na época em que o publicámos pela primeira vez, se não ainda mais. Na vewlade, a situação da arte religiosa, em especial dtJ arquitectura, a que aludimos em /962 na nossa lntKJdução, longe de ter melhorado, agravou-se. O fenómeno não passa, de ~esto, de uma consequência da alarmante deterioração da litu~gia e da teologia na Igreja do Ocidente. Essa .deterioração, que é antiga, acelerJu-se brusccunente nos últimos anos. e está a transformal'-se, ante os nossos olhos, numa verdadeira der10cada. E seria mau se minimizássemos a importancia deste estado de coisas no que se ~efe~ à arte: pois, como já o dissemos mas nunca é de mais tepetir. o domfnio da alfe constitui um campo de actividade privilegiado da subversão, poque a obra de arte é um meio particularmente eficaz para penetrar na alma e agir sob ~e ela, tanto para o mal como para o bem. . Toma-se, poltanto, utgente recordar o que é a verdadeira arte sacra. Até porque estão a su'8ir, em compensaç4o aqui e ali, Deus seja louvado, manifestaç~es cada vez mais vivas de ~esistência à anarquia e à subversão e ouve-se um apelo premente à recuperação dos dados tradicionais. base e condiçao de uma ~estauraçdo. . . · Desde 1962, data da primeira edição, tivemos conhecimento de muitos documentos susceptfveis de escla~ecer ou precisar diversos pontos do simbolismo do templo. Se quiséssemos tê-los todos em conta, teriamos que reescrever todos os capltulos. Mas reescle\ltr um livro e quebrar
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assim, com frequência, o ritmo que o anima e que é o da inspiração inicial constitui um empreendimento sempre a"iscado. Por conseguinte, contentámo-nos em corrigir alguns e"os, acrescentar algumas notas e completar substancialmente a bibliografia. Esta segunda edição foi ainda enriquecida com ilustrações, graças à amabilidade das Éditioru de la Maisnie, a quem agradecemos p10jundamente terem pen1aitido que o presente livm iniciasse uma nova ca"eira. J. H. •
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O problema da arte sacra levanta-se hoje com acuidade; prova de que esta arte .deixou de existir apesar dos esforços laboriosos desenvolvidos por alguns para nos fazer crer no valor das produções mais discutíveis neste domínio. 1àlvez exista hoje uma arte religiosa, mas não uma arte sacra. Na verdade, entre essas duas noções, mais do que uma cambiante, há uma diferença radical. Em compensação, a nossa época é, ao mesmo tempo, paradoxalmente, confrontada com as tnais numerosas revelações e testemunhos jamais vistos, relativos à arte sacra autêntica. Enquanto historiadores da arte, como Mâle e Focillon, inventariavam e analisavam as riquezas das nossas catedrais, etnólogos, historiadores das religiões e arquitectos como· Éliade, Mu,s, Coomaraswamy, Schwaller de Lubicz, Hambidge, Moesse), Ghyka, etc., estudavam os edifícios sagrados do Extremo-Oriente, da Índia, do Egipto e da Antiguidade Clássica, abrindo perspectivas até então insuspeitadas quanto ao próprio significado desses monumentos e à sua .concepção. As suas·conclusões, observadas igualmente nos nossos próprios edifícios religiosos, em particular nos da Idade Média, revolucionariam totalmente as nossas maneiras de os compreende.; deploravelmente dominadas desde a época romântica pelo sentimentalismo, o moralismo e o estetismo, ou seja, por uma concepção individualista e «literária» da arte sacra. Ora, são essas precisamente as características da arte religiosa, e profana, evidentemente, enquanto a verdadeira arte sacra 6 de natureza, não sentimental ou psicológica, mas ontológica e cosmológica. Essa arte sacra surgiu então. já nio à semelhança da arte modema, como resultado dos sentimentos, das fantasias e até do «pensamento» do artista, mas como tradução de uma realidade que ultrapassa lmgamente os limites da
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individualidade humana. É precisamente essa a característica própria da arte sacra: ser uma arte supra-humana. Afigura-se-nos urgente transpor para os factos as consequências desta redescoberta do sentido e dos princípios da arte de construi~ numa época em que se e~guem tantas igrejas que. se porventura satisfazem certos «sriobs•. preocupados cm se situarem na «vanguarda», não satisfazem de modo algum a verdadeira élite intelectual nem a imensa maioria do povo. Para tal, tomar-se-ia necessário antes de mais, recordar a superior dignidade da arte, que ~ a tradução, no plano sensível, da Beleza ideal, porquanto a Beleza é uma for rna do Di vi no, um atributo de Deus, «Um reflexo da Beatitude divina» (F. Schuon), assim como da Verdade divina, fundamento do Ser. Eis a razão por que o Belo ~' segundo a forma platónica, «O esplendor do Verdadeiro». A arte sacra ~ o veículo do Espírito divino; a forrna artística perntite assimilar directantente e não de uma for1na discursiva, através da razão as verdades transcendentes e supra-racionais. Convém não esquecec aliás, que a arte pode igualmente veicular influências nefastas: a fealdade das formas, quando é de uma dete1·nlinada espécie, é uma manifestação de satanismo, esse pólo invertido da Beleza divina, como é o caso de algumas produções da arte religiosa contemporânea mais ou menos derivadas do su•·realismo, cujo carácter «demoníaco» ninguém contesta, e é mesmo afinnado pelos seus próprios autores r>. Para avaliar o verdadeiro alcance da arte sacra, impõe-se captar a sua causa primeira, que é o Verbo criador; uma vez que a criação implica justaanente o dom da fornta, podemos afiJ'It1ar que o Verbo é o Artista supremo, oomo princípio formal que domina o caos ou «luZ», que ilumina as «trevas».A perfeição do Verbo, afil'lna Dionísio, o Areopagita, é «forma enforanante em tudo o que é infol'ane»; ·mas acrescenta:· «Enquanto princípio forntal, não deixa de ser informe em tudo o que tem forma, porque transcende toda a forma». O objectivo da arte consiste precisamente em ~velar a imagem da Natureza divina impressa no criado; mas oculta nele~ realizando objectos visíveis que sejam símbolos do Deus invisível. Por conseguinte, a ane sacra é como que um prolongamento da Encarnação, da descida do divino ao criado e, a esse respeito, poderíamos ala~gar à arte em geral a justificaçlo dos ícones dada pelo ll Concflio de Niceia: «0 Verbo indefinível do Pai • t•• • • • . •. • .A.. •
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Qualquer edifício sagrado é cósmico, ou seja, está feito à imitação do mundo. «A igreja é a imagem do mundo», diz São Pedro Damião. Porque o nosso corpo está ligado ao mundo e temos de orar a Deus na nossa própria condição corporal ~). Esta ·imagem é, antes de mais, «realista», no sentido em que, nas paredes e. colunas da igreja, estão representados a Terra e o Céu, os animais e as plantas, as obras do homem e as diferentes condições sociais, a história natural e a história sagrada, de tal maneira que houve quem dissesse das catedrais que eram enciclopédias visuais. Mas isto é apenas um aspecto exterior e próprio sobretudo dos grandes edifícios daquilo que São Pedro Damião quer dizer. O templo não é apenas uma imagem «realista» do mundo, mas muito mais uma imagem «estrutural», ou seja, reproduz a estrutura íntima e matemática do Universo. E aí reside a fonte da sua beleza sublime. Porque a beleza da for1na, como Platão afirma noFilebo (S 1c) «não é o que o comum entende geralmente por essa designação, como por exemplo a dos objectos vivos ou da sua reprodução, mas algo de rectilíneo e de circular, feito por meio do compasso, do cordel e do esquadro, porquanto essas fortnas não são, como as outras, belas em deterrninadas condições, mas são sempre belas em si». . •
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Precisemos: o templo 6 uma imagem do mundo mas porque o mundo
6 sagrado como obra de Deus. Portanto, o templo explicita a imagem do mundo transcendente, em Deus, que 6 a essência constitutiva do cosmos. ,
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A forma quadrada da Jerusalém celeste (Apoc., 21,12 e ss.), de que atrás falámos, está directamente relacionada com o próprio princípio da arquitectura dos templos. Toda a arquitectura sacra se reduz, na verdade, à operação da «quadratura do círculo» ou transfortnação do círculo em quadrado. A fundação do edifício começa pela orientação, que 6 já de certo modo um rito, porque estabelece uma relação entre a ordem cósmica e a ordem terrestre, ou ainda, entre a ordem divina e a ordem humana. O procedimento tradicional e, pode dizer-se, universal, porquanto se encontra em toda a parte onde existe uma arquitectura sagrada, foi descrito por Vitrúvio e praticado no Ocidente até ao final da Idade Média: os fundamentos do edifício são orientados graças a um gnómon que pernute referenciar os dois eixos (cardo, norte-sul, e decumanus, leste-oeste). No centro do local escolhido, etgue-se um mastto em tomo do qual se traça um círculo lmgo; observa-se a sombra projectada nesse círculo; a distância máxima entre a sombra da manhã e a da tarde indica o eixo leste-oeste; dois círculos centrados nos pontos cardeais .do primeiro indicam, na sua intercepção, os ângulos do quadrado. Este último 6 a quadratura do círculo solar (:Z). Importa fixar de fol'tna precisa as três operações da fundação: o traçado do círculo, o traçado dos eixos cardeais e da orientação e o traçado do quadrado da base, pois são eles que deterrninam o simbolismo fundamental do templo, com os seus três elementos, correspondentes às três operações: o círculo, o quadrado e a cruz, por intertnédio da qual se passa do primeiro para o segundo. O círculo e o quadrado são símbolos primordiais. Ao nível mais . elevado, na ordem metafísica, representam a Perfeição divina nos s·eus • •
(2) Na maior parte das igrejas do Ocidente, o plano da base não 6 um
quadrado, mas um rectângulo ladeado por dois quadrados que foram os braços do transepto e por um terceiro quadrado prolongado por um arredondado que fornta o coro e a ábside. materializando o conjunto a cruz dos eixos cardeais. Mas isto em nada altera o significado profundo do mito da fundação que descrevemos, porque o rectângulo não passa, em geometria, de uma variedade de quadrado e inscreve-se quase sempre, como veremos mais adiante, num círculo director Precisemos igualmente que, se os procedimentos utilizados na época modema para a fundação e a orientação das igrejas não são exactamente os mesmos de outrora. a modificação tão-pouco altera essencialmente o simbolismo atribuído à figura e à posição do edifício, dado que esse simbolismo depende da natureza das coisas e pode evitaP.se por completo, pelo menos na medida em que nio no~ desviemos muito das formas tradicionais da arquitectura, para adoptar formas «aberrantes• ou mesmo «subversivas». Na igreja copta, as quatro entradas são expressamente identificadas com os quatro pontos cardeais; o mesmo se passa . · na igreja grega com as quatro partes do edifício. . .
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dois aspectos: o círculo ou a esfera, dos quais todos os pontos se situam a uma distância igual do centro, que não tem princípio nem fim, representam a Unidade ilimitada de Deus, a Sua Infinitude, a Sua Perfeição, e o quadrado ou o cubo, fot'tna de qualquer base estável, é a imagem da Sua Imutabilidade, da Sua Eternidade~). A um nível inferior, na ordem cosmológica, estes dois símbolos resumem toda a Natureza criada, no seu próprio ser e no seu dinamismo: o círculo é a fortna do céu, mais particularmente da actividade do céu, instrumento daActividade divina, que rege a vida sobre a terra, cuja figura é umquadrado porque, relativamente ao ~ornem, a terra está de certo modo «imóvel», passiva, e «oferecida» à actividade do Céu. Existe aí um duplo simbolismo, simultaneaanente cosmológico e ontológico: o Céu e aTerra ordem cosmológica são as forntas exteriores, a derradeira fase se se quise~ da Manifestação ou Criação, cujos dois pólos são a Essência universal e a Substância universal, representadas na ordem corporal, respectivamente, pelo Céu e pelaTara. O homem é o centro dessa criação, sintetiza-a e estabelece um laço entre o Alto (Essência-Céu) e o Baixo (Substância-Terra): e essa relação é simbolizada precisamente pelo sinal da cruz. Veremos adiante as consequências que podem extrair-se desta verificação. Se transpuserntos este simbolismo «estático» para a sua fortna «dinâmica», veremos que o círculo celeste engendra, no seu movimento, o círculo temporal ('), o qual se desenrola do seu pólo superior (correspondente ao céu) para o inferior (correspondente à terra) ou, se se preferir, da esfera- a fonna menos especificada e mais perfeitaao cubo, a forn1a mais especificada e mais «pesada»; o eixo vertical que os une mede a própria extensão do cosmos e do tempo. É a essa função do círculo no início da criação que faz alusão a Escritura, quando diz pela boca da Sabedoria: «Quando Deus fixava os céus, eu lá estava, e também quando colocava um arco sobre a face do abismo». (Prov 8, 27; cf. Job, 26, 10). Esta relação entre as ordens cósmica e arquitectónica acha-se magnificamente resumida nesta fórrnula lapidar gravada numa das paredes do templo de Ramsés ll: «Este templo é como o céu em todas as suas disposições». Este ponto de vista realça a superioridade do círculo o céu sobre o quadrado a terra. Mas, de outro ponto de vista, o quadrado, que, metafisicamente. simboliza a Imutabilidade divina, é superior ao •
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O círculo 6 também o símbolo do Amor divino. Ver São Dionísio Areopagita (Nomes divinos, 4, 14; Hier. cel., 1, 1) e Dante (Paraúo 33). · 4 ( ) Daí a importância do zodíaco de que falaremos com frequência. . ·
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círculo enquanto imagem do movimento indefinido. Este ponto de vista é aquele que domina na arquitectura, cuja qualidade mestra 6 a «estabilidade», sem excluir, evidentemente, o outro aspecto do simbolismo, como teremos oportunidade de mostrar Deste óltimo ponto de vista que valoriza o «quadrado», pode dizet=-se que a construção.do templo fixa ou «cristaliza» no quadrado os ciclos temporais, movimentos circulares. ' • ' .• · ·. - . , Estes dois pontos de vista aplicam-se perfeitamente à «Jerusalém celeste» do Apocalipse, protótipo do templo cristão. O anjo «mostrou-me a cidade santa de Jerusalém, que descia do c6u, de junto de Deus», diz Sio João (Apoc., 21, 10). E, um pouco adiante: «A cidade 6 quadrangular». Assim, o movimento de descida da cidade refere-se ao primeiro ponto de vista, que preside ao rito de fundação: Jerusalém «desce do céu» (circular) «de junto de Deus», à Terra. onde se apresenta como um quadrado que é o reflexo da actividade do Céu, do mundo divino. Mas, do segundo ponto de vista, esse quadrado representa a cristalização dos ciclos, da evolução ten1poral, ponto de vista amplamente comprovado pelas doze portas dispostas, três a três, nos lados do quadrado, correspondentes aos signos do ZodíacoJ de que aliás voltaremos a falar a propósito da porta da igreja. Trata-se de uma transfor·ntação do ciclo zodiacal consecutiva à paragem da rotação do mundo e à sua fixação num estado final que é a restauração do estado primordial t). Pode, aliás, referir-se a este respeito. a correspondência, nas duas extremidades do ciclo temporal, entre o Paraíso terreno e a Jerusalém celeste: o Paraíso é circular, como reflexo directo do céu, mas dividido pela cruz dos quatro rio.s, sendo o centro assinalado pela Árvore da vida; esta última encontra-se igualmente no centro da Jerusalém celeste, bem como os quatro rios, pois é dito que eles correm da montanha em que pontifica o Cordeiro sobre o Livro selado. A passagem do círculo para o quadrado representa a rotação temporal do mundo e a sua paragem que é ao mesmo tempo a transforrnação desse «século» no «século futuro». . ~ .~ J •
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' · (') Os 12 signos do Zodíaco são por vezes denominados os «doze sóis», ou seja. estações do Sol. Na Jerusalém celeste, esses doze sóis tomaram-se os doze frutos da Árvore da Vida (Apoc. 22, 1-2). Esta forma da Jerusalém celeste é também a do palácio dos imperadores da China, Ming-1ing. Construído l imagem do Império, dividido em nove províncias, dispostas em quadrado com uma no centro, o Ming-1àng tinha nove salas distribuídas paralelamente e 12 aberturas para o exterio.; correspondentes aos 12 meses. As quatro fachadas estavam orientadas segundo os pontos cardeais e as estações:fratava-se pois, de uma projecção terrestre do Zodíaco. ·: , . I.
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Esta relação do círculo com o quadrado ou da esfera com o cubo é na realidade o fundamento da arquitectura sacra, é a partir dele que todo o edifício ~ concebido e realizado. Se, com efeito, passarmos do plano horizontal, de que nos ocupamos até aqui, para o vertical e, ao mesmo tempo, da geometria plana para a geometria no espaço, verificaremos que todo o edifício se cinge ao esquema da cúpula :e do cubo. A cúpula ou abóbada sobrepõe-se ao «cubo» da nave, como o céu físico está «situado» sobre a Terra, razão pela qual, antigamente, a maior parte das abóbadas estava pintada de azul e pontilhada de estrelas. Seguindo a vertical que sobe do pavimento até à abóbada, segundo um movimento inverso ao que presidia ao rito da fundação, passa-se do «cubo» para a «esfera»,·ou seja, do estado terreno para o celeste.Ao deslocar-se nessa direcção o olhar do fiel, encontra aí o símbolo da sua ascensão espiritual. Assim o dinamismo interno do templo serve de suporte e de guia à oração e à tneditação. A linha vertical ~ a direcção do céu. É para o alto que erguemos os olhos para ora~; que elevamos a hóstia para oferece~; e é do alto que desce, como a chuva, a benção divina. É segundo esta dimensão que Deus desce até ao homem e que o homem sobe até Deus. Em alguns edifícios, um portnenor ornamental sublinha a alusão a essa ascensão espiritual: a cúpula do transepto é frequentemente encimada por uma cruz ou uma flecha apontada para o alto, que materializa o eixo da abóbada, o que significa a saída para fora do cosmos, à imitação de Cristo que, aquando da Ascensão, subiu «acima de todos os céus» ~). O esquema abóbada--cubo repete-se nos campanários, seja a torre encimada por uma calote esférica, facto raro no Ocidente, ou por uma «pirâmide» octogonal ou hexagonal, cuja fortna constitui uma fase intel'tnédia da passagem da esfera ao cubo. · .. O elemento esférico e celeste da cúpula e da abóbada reflecte-se, no plano horizontal, no semicírculo da ábside que é, na terra, o lugar mais «celeste», conespondente ao Santo dos Santos do templo de Jerusalém, ao Paraíso e à Igreja triunfante. Para melhor assinalar o carácter celeste da ábside, em Issoire, a parte circular tem esculpidos exteriorrnente os doze signos do Zodíaco. Como esse semicírculo prolonga o rectângulo da nave, vê-se que o plano da base do tipo basilical é uma projecção plana do volume vertical do edifício. O eixo da nave, •
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Por meio dessa cúpula, por vezes substituída por uma torre-lanterna, oconjunto do edifício «toma altura» e identifica-se com a Montanha cósmica que 6 o protótipo do templo hindu. Este aspecto observa-se nitidamente nas igrejas grega, românica e, sobretudo, russa. . ~ ~ · - . · ( )
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da porta ao santuário, é portanto taanbém a projecção plana do eixo vertical. do solo à abóbada, da terra ao céu e~ por esse motivo, representa igualmente a «Via da Salvação». . ._, O mesmo se aplica ao pórtico, que é um rectângulo encimado por um arco. e ao zimbório, que encima o altar e é constituído por uma abóbada apoiada em quatro colunas. Neste último caso. houve o claro sentimento de que a cúpula representa o céu, uma vez que ela aparece por vezes pintada de azul e pontilhada de estrelas, tal como a abóbada da nave. Assim sucede, por exemplo. no zimbório elevado sobre a pia baptismal no Baptistério de Doura (século III). O edifício sagrado apresenta-se, portanto, como uma variação sinfónica do mesmo tema arquitectónico, repetindo-se, acrescentando-se indefinidamente a si próprio, para recordar o simbolismo fundamental do templo: a união do céu e da terra, o «tabernáculo de Deus entre os homens», como o cantou magnificamente São Máximo, o Confesso{ no seu poema sobre Santa Sofia de Edessa: «É uma coisa realmente admirável que, na sua pequenez, (esse templo) se assemelhe ao vasto mundo ... «Eis que a sua cobertura se estende como os céus: sem colunas, · abobadada e fechada; e, por outro lado, (está) ornamentada, com mosaicos de ouro, como o firtnamento com estrelas brilhantes. «E a sua cúpula elevada é comparável aos céus dos céus. E, semelhante a um capacete, a sua parte superior repousa solidamente sobre a parte inferiot , . «Os seus arcos, vastos e esplêndidos, representam os quatro lados do mundo e assemelham-se, além disso, pela variedade das · cores, ao arco glorioso das nuvens.» , ;· A alusão que fizemos ao eixo veJ tical da abóbada obriga-nos a voltar a um aspecto que até agora descurámos: o rito da fundação. Com efeito, dissemos que a primeira operação consistia em traçar no chão um grande círculo director, a partir de um centro marcado por um poste. Este último é, por seu turno, um eixo e representa o eixo vertical futuro do edifício. Verificaremos toda a importância desta observação quando falarmos do altar. Para já, contentemo-nos em considerar a operação propriamente dita. Ela constitui a fixação dç um centro, que, no simbolismo arquitectónico, é encarado como o centro do mundo: trata-se de um omphalos. ~ Na verdade, todos os pontos da superfície terrestre podem ser tomados como o centro do mundo, uma vez que todas as linhas verticais partem de todos os pontos da·terra para o céu, e a distância para os astros é «infinita». Quando o centro é escolhido e relacionado, pela
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orientação, com o ritmo celeste, acha-se realmente assimilado ao Centro do mundo, ao eixo imóve 1 em tomo do qual gira a «roda cósmica». Esse centro, esse eixo, simboliza o Princípio divino que actua no mundo: Deus «motor imóvel». É um ponto sagrado, o lugar em que o homem entra em contacto com a Divindade, razão pela qual todas as cidades santas, como todos os templos, estão simbolicamente situados no «centro do mundo»: é o caso de Jerusalém, que era também um reflexo da Jerusalém celeste ('). A determinação de um centro e a orientação conferem ao edifício todo o seu significado. E é isso que nos pennite justificar o simbolismo cósmico da arquitectura, cujo interesse não parece hoje evidente a muitos espíritos. Sendo uma cruz cardeal orientada e centrada, a igreja sacraliza. realmente o espaço. É o omphalos (centro) da cidade sobre a qual irradia, tal como a catedral é o omphalos da diocese, a igreja primacial o centro da nação, e a basílica papal o centro do Universo. •
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Todas estas considerações serão desenvolvidas mais pormenorizadamente a propósito do altar (pág. 95 c ss.). Parece ter havido, naEclesia Major dos Lugares Santos, exactamente na ábside, umomphalos esférico semelhante ao de Delfos. Ver M. Piganiol, Cahiers atrhiologiques, 1955. Aliás, o lugar em que Cristo foi morto e ressuscitou 6 oomphalos do mundo redimido, segundo Cirilo de Jerusalém (PG 33t 805).
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•· ~-~ A. construção do templo imita a criação do mundo. O mesmo se aplica, de resto, às operações de todas as profissões e de todas as artes, de pontos de vista diferentes, pois está dito que o homem foi colocado na terra ut operatr!tur «para trabalhar», ou sej~ para continuar a criação. Esta, essencialmente, é o cosmos sucedendo ao caos, ou seja, -à ordem, a organização à desordem, à confusão da Génese. Ordo ab chao. É o Espírito que penetra na Substância infortne. Da mesma maneira, o arquitecto fabrica um edifício otgânico a partir da matéria bruta e, nessa realização, imita o Criado~; ao qual se chamou, no seguimento de Platão, o grande Arquitecto do Universo, porque, acrescenta o filósofo, «Deus é um geómetra». A geometria, base da arquitectura, foi, até ao princípio da época moderna, uma ciência sagrada, cuja formulação para o Ocidente vem precisamente do Timeu de Platão e, através deste, remonta aos Pitagóricos (1). ~ • : • ·· O fundamento metafísico desse simbolismo é o seguinte: as for·mas geométricas traduzem a complexidade interna da t}nidade Divina, e a forrnulação passagem da Unidade indivisível à Unidade múltipla
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·No Ocidente, foi por meio de SantoAgostinho que a mística platónica do número foi transmitida aos cl6rigos. No seu tratadoDt Musica, Santo Agostinho .desenvolve a ideia de que o Número orienta a inteligência da percepção, do criado para a realidade divina. Expõe igualmente a teoria segundo a qual a música e a arquitectura são irmãs, ambas filhas do Número e espelhos da harmonia eterna. Os construtores da Idade Média conheceram a analogia entre proporçlo arquitectónica e intervalos musicais e por vezes inscreveram esta analogia na pedra. rJ ··: ··. · . . •' • • . , , '
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metafisica da Criação encontra o seu símbolo mais adequado na série das figuras geométricas regulares contidas no círculo ou dos poliedros regulares contidos na esfera. E isto leva-nos a considerar o papel do Número que, no pensamento tradicional, é muito diferente do «algarismo>> e, em particular, é sempre considerado nas suas relações com a geometria. Para Platão, os cinco poliedros regulares são os arquétipos da criação. O Número, assim concebido, é portanto o modelo do Universo: (Nicomaco de Gerasa). ;. · - Esta matemática explica, ent particular~ aquilo que, à primeira vista, . parece inexplicável ao admirador das cat~drais: o ambiente subtil desses edificios, a harrnonia quase divina e a impressão de perfeição que produzem não dependem de intenções subjectivas, do sentimento religioso ou da afectividade do artista como hoje se pensa , mas das leis objectivas que relevam da geometria platónica transmitida às organizações de construtores. O elemento essencial era para eles a noção de relação e de proporção entre as diferentes partes do edificio. A principal, ainda denominada