Dicionário do Pensamento Kleiniano


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Portuguese Pages 507 [508] Year 1992

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Table of contents :
SUMÁRIO
PREFACIO À 1ª EDIÇÃO
PREFACIO À 2ª EDIÇÃO
1 - TÉCNICA
2 - FANTASIA INCONSCIENTE
3 - AGRESSÃO, SADISMO E PULSÕES
COMPONENTES
4 - COMPLEXO DE ÉDIPO
5 - OBJETOS INTERNOS
6 - FASE DA FEMINILIDADE
7 - SUPEREGO
8 - SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE
9 - MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA
10 - POSIÇÃO DEPRESSIVA
11 - POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE
12 - INVEJA
13 - IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA
VERBERTES GERAIS
A
B
C
D
E
F
G
H
I
J
K
L
M
N
O
P
R
S
T
V
Bibliografia de Publicações Kleinianas
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Dicionário do Pensamento Kleiniano

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HINSHELWOOD

BIBLIOTECA ARTES MEDICAS Psicanálise, Psicologia, Psicopedagogia, Psiquiatria TÍTULOS EDITADOS * * * * * * * * ' * * * * * *

Aberastury. A.; Adolescência Aberastury. A,: Psicanálise da Crança —Teoria e Técnica Aberastury. A.: A Percepção da M orte na Criança e Outros Escritos Aberastury 8, Knobel Adolescência Normal Aberastury £k Salas: A Paternidade — Um Enfoque Psicanalítico Ackerman. Na Diagnóstico e Traramento das Relações Familiares Aimard, Paule: A Linguagem da Criança Ajuriaguerra 6, Marcelli; Manual de Psicopa tologia Infanríl Ajuriaguerra, j.: A Dislexia em Questão Ajuriaguerra. j. A Escrita infantil — Evolução e Dificuldade Albuquerque, T. Lins: Psicologia &. Educação Alencar. Eunice: Psicologia da Criatividade Alexandet. Franz:/Vledícina Psicossomática Alliençle 8. Condenwiri; A Leitura Artdolfi. Mautizio: Por Tra's da Mascara familiar — Um novo Enfoque em Terapia familiar * Andolfi 8. An gelo: Tempo e Mico em Psicoterapía familiar * Anzteu. Didier: A Auro-Análise de Freuet e a Descoberta da Psica­ nálise

* Aucouturier e colaboradores: A Prática Psicomotora * Aucouturier 8. lapierre; Sruno — Psícomotricidade e Terapia 1 Balaban, Naney: O inicio da Wda Escolar * Baranger. W.: Posição e Objeto na Obra de Metanie Klein * Barbizet 8, Duizabo; Neuropsicoiogia * Beilak 8. Smaíi: Psicoterapía de Emergência S, Psicoterapía Breve * Bergeret: Personalidade Normal e Patológica ■ Bergeret 8, Leblaric: Toxicomanias * Bèrgés 8. Lézine; Fesre de Imiração de Cestos * Besteiheim 8, Zelan: Psicanálise da Alfabetização * Bettelheim, Bruno:Sobrevívência * B!anck. G, 8, R,: Psicologia do Ego — Teoria e Praríca * Bleger. josé: Psicologia da Conduta ’ Bleger. josé; Psíco-HIgiene e Psicologia institucional * Bleichmar. Emitce-, O fem inism o Espontâneo da Histeria * Bleichmar. NugO: Depressão.- Um Estudo Pslcanaíirico * Bleichmar. Hugo: Introdução ao Esrudo das Perversões ' Bleichmar. Hugo: Narcisisçno * Bleichmar. Hugo: Angus (ia e Fantasma * BI um, H,; Psicologia Feminina ’ Bossuet. Gérard: O Computador na Escola — O Sistema Logo * Bowlby, John: Uma Base Segura * Brazelton: A Dinâmica d o Bebè ' Brazelton. T,; O Desenvolvimento d o A pego * Brunnet, Lèzine; Desenvolvimento Psicotogíco da I; infância * Bryant 8, BradSey; Problemas de leitura na Criança * Cabral, Lanza 8. Tejera — Educar Vivendo — O C orpo e o Crupo na Escola

■ Calkins. Lucy: A Arre de Ensinar a Escrever * Chasseguer-Smirgeí. j. 8, Cols: Sexualidade Feminina * Chasseguet-Smirgel, j..; As Duas Arvores do jardim * Chasseguet Smirgel: Erica e Esférica da Perversão * Castorina e Cols.: Psicotogia Genética * Chess & Hassibi; Princípios e Prática da Psiquiatria infantil * Chlland. Collete: A Criança, a Família, a Escola * Ctawson. A.: Bender Infantil * Coridemarirv Mabek Dislexia — Manual de Leitura Corretiva ’ Condemarin, Mabel: A Escrita Criativa e Formal * Condemarin. Chadwtck 8. Milícic: Maturidade Escolar ' Craig. Robert: Enrrevisra Clinica e Diagnostica * Cunha, Freitas 8. Raimundo: Psicodiagnósrico * Curtiss. Sandra: A Alegria d o Movim ento na Pré-Escola * Debray, Rostne: B.ebés/Mães em Revolta * Decherf, Gérard; Edipo em Grupo: Psicanálise e G rupos de Crianças * Dejours. C.i O Corpo entre a Biologia e a Psicanálise * DeWald. Paul: Psicoterapía — Uma Abotdagem Dinâmica * Dt Léo; A Interpretação do Desenho Infanríl * Dolto. Frartçoise: A Dificuldade d e Viver * Duarte, Bornholdt 8. Castro: A Prática da Psicoterapía Infantil * Eiguer, Alberto: Um Divã para a Família 1 Eizirik: Psicoterapía d e Orientação Analítica * Eikãim Mony 8. Cols.: Formações e Práticas em Terapia Familiar * Enderle, Carmen: Psicologia da Adolescência * Enderle. Carmen: Psicoiogia d o Desenvolvimento * Etchegoyen. Hofácio: Fundamentos da Técnica Psicanalirica * Fernandes, Alicia; A Inteligência Aprisionada * Ferreiro 8. PalaciO: Novas Perspectivas Sobre os Processos de leitura e Escrita " Ferfeiro 8, Teberoski: Psicogènese da Língua Escrica * Fogel 8 Cols.: Psicoiogia Masculina ’ Gambaroff, Marina: Utopia da Fidelidade * Garma. Angel: A Psicanálise — Teoria, Clinica e Técnica * Gibello. Bernard; A Criança com Distúrbios de inteligência Giovacchtni, P,: Roteiro à Leitura de Freud * Golbert, Clarissa: A Evolução Pskolingüistica e Suas im plicações na Alfabetização * Goodrich et al.; Terapia Feminista da Família * Goodwin, Guze: Diagnóstico da Doença Mental * u ftril ^obetto: Discorrer a Psicanálise , Hetren 8 He nem A Estimulação Psicomotora Precoce , Homstein. L.: Cura Ps/canafitica e Subtimaçâo ■, Horowiiz, M.: Introdução á Psicodlnám/ca V: lerusalinsky, A,: Psicanálise do Autismo . lerusalinsky. A.: Psicanálise e Desenvolvimento Infantil

a\° dicionário do pensamento deiniano *

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Hinshelwood, R. D. Dicionário do pensamento kleiniano / R. D, Hinshelwood ; trad, de José Octavio de Aguiar Abreu. — Porto Alegre : Artes Médicas, 1992. 5 0 7 p .; 23cm.

1.Klein, Melanie — Dicionários 2.Psicanálise — Dicioná­ rios I.Abreu, José Octavio de Aguiar II.Título.

C.D.D. 150.19503 616.891703 C.D.U. 159.964.2KIein,Melanie(03) índices Alfabéticos para o Catálogo Sistemático Klein, M elanie: Dicionários 159.964.2KIein,Melanie(03) (Bibliotecária responsável: Sonia H. Vieira — CRB-10/526)

R.D.HINSHELWOOD



/

*

do

Tradução: JOSÉ OCTAVIO DE AGUIAR ABREU Supervisão da tradução: ELIZABETH LIMA DA ROCHA LIANA PINTO CHAVES Psicanalistas. Membros -da: Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e da comissão editorial para a tradução brasileira das obras de Melanie Klein.

AlHÊS ÍVEDiCAS

PORTO ALEGRE / 1992

A meu pai, que não entendia muito desta maneira de pensar, mas teria ficado orgulhoso de meus esforços.

SUMARIO Prefácio à 1? edição........................... . ......................................................................................................... 11 Prefácio à 2? Edição................................................. ......................... ............................................................13 Introdução.........................................................................................................

...> A -

VERBETES PRINCIPAIS

1 Técnica..................... 2 Fantasia inconsciente.......................................... ;P3 Agressão, sadismo e instintos componentes.......................................................... 4 Complexo de Êdipo.................................................. if-5 Objetos internos............................................................................ 6 Fase da feminilidade........................................................................................ ■i 7 Superego........................................................................................................ £ 8 Situações arcaicas de ansiedade......................................................................................................... 'l 9 Mecanismos primitivos de defesa................................................................................................ Ç-TO Posição depressiva.................................................................................................................................. 11 Posição esquízoparanóide............................................................................ 12 Inveja.......................................................................................................................................................... 13 Identificação projetiva ...........................................................................................................................

B -

23 46 61 71 82

99 109 126 136 152 170 181 193

VERBETES GERAIS

Abraham, Karl................................................................................................................................................ 225 Agressão....................................................................................... Ambivalência.......................................................................................... A m or................................................................................................................................. Análise de crianças......................................................................................... Aniquilamento...................................................................................... Ansiedade........................................................................................................................................................ 234 Ansiedade depressiva............................................................................... Assimilação.................................................................................................................... Atuação na transferência............................................................................................. Autism o........................................................................................................................................................... 24$ Bebês............................................................................................................... Bick, Esther............................................................................................

22

24 24

Bion, Wilfred................. 249 Brincadeira...................................................................................................................................................... 254 Brincar.............. ............................................................................................................................................. 254 Castração......................................................................................................................................................... 256 Cena originária............................................................................................................................................. 257 C isão................................................................................................................................................................ 257 Ciúme................................................................................................................................................................. 260 Clivagem......................................................................................................................................................... 260 C o ito ................................................................................................................................................................ 261 Conhecimento inato..................................................................................................................................... 261 Conter.............................................................................................................................................................. 263 Continuidade genética................................................................................................................................ 270 Contratransferência...................................................................................................................................... 271 C rian ça........................................................................................................................................................... 279 Criatividade................................................................................................................................................... 279 Criminalidade................................................................................................................................................ 281 Culpa................................................................................................................................................................ 282 Culpa inconsciente....................................................................................................................................... 283 Debates sobre as controvérsias (1943-44).............................................................................................. 285 Defesa paranóide contra a ansiedade depressiva................................................................................. 287 Defesa psicológica......................................................................................................................................... 287 Defesas m aníacas........................................................................................... 290 Defesas obsessivas....................................................................................................................................... 292 Denegrimento........................... 293 Dentes........................................................................................ 293 Desenvolvimento......................................................................... 293 Despersonalização............................................................................................................................ 298 Desprezo................................ 299 Dor psíquica................................................................................................................................................... 299 > Ego......................................................................................................................................................... 300 Elementos beta....... ...................................................................................................................................... 302 Elos de ligação...............................................................................................................................(.............. 303 Empatia............................................................................................................................................................ 305 Envenenamento.............. .............................................. 306 Ep-D................................................................................................................................................................. 306 Epistemofilia................................................................................................................................................... 308 Equação sim bólica................................... 311 Equilíbrio psíquico....................................................................................................................................... 316 Escola das Relações O bjetais..................................................................................................................... 317 Estados confusionais..................................................... 323 Estrutura.................................................. 324 Esvaziamento.................................................................................................................................................. 327 Evolução..................................................................................................... 328 Externalização....................................................... 328 Fairbairn, Ronald......................................................................................................................................... 328 Fantasias de masturbação........................................................................................................................... 333 Fator constitucional................................ 334 Feminilidade........................ 336 Jp Fezes................................................................................................................................................................. 337 Figura combinada dos p a is......................................................................................................... 338 ^ Formação de símbolos......................................................... 339 4 ' Fragmentação................................................................................................................................................ 346 Freud, A nna.............. ................................................................................................................................... 347

Função-Alfa.................................................................................................................................................... 347 Grade................................................................................................................................................................ 349 Gratidão.......................................................................................................................................................... 349 Grupo Kleiniano............................................................................................................................................ 349 Heimann, P au la............................................................................................................................................ 351 Id....................................................................................................................................................................... 353 ^Identificação................................................................................... 354 Identificação adesiva................................................................................................................................... 355 fJ|'. Inconsciente ( 0 } ............................................................................................................................................ 357 ífIncorporação..................................................................................................... 357 Inibição........................................................................................................................................................... 358 Instinto de m orte.......................................................................................................................................... 358 Instintos.......................................................................................................................................................... 358 Integração....................................................................................................................................................... 358 Interesse.......................................................................................................................................................... 359 J( Introjeção................................................................... 359 Isaacs, Susan................................................................................................................................................. 361 Jogos........................................ 362 Klein, M elanie.............................................................................................................................................. 362 Libido.............................................................................................................................................................. 363 ,-^Luto................................... 365 S M ãe.................................................................................................................................................................. 365 Mãe~com~pênis.............................................................................................................. 366 Masculinidade........................................................................................................................................... 366 Meio ambiente................................................. i..................................................................................... . 366 Meltzer, Donald......................................................... 366 Memória e desejo ......................................................................................................................................... 367 Modelo econômico....................................................................................................................................... 368 Modificação psíquica........... ...................................................................................... 370 'lí Mudança psíquica......................................................................................... 370 Mundo externo .............................................................................................................................................. 372 ^^Narcisismo........................................................................................................................................................ 373 ^-Márcisismo negativo.......................................................................................... 379 ^ N eg ação............................................................................................... *....................................................... 379 ('O bjeto bom ............................................................................................................................. 380 ■jObjeto externo............................................................. 381 /O bjeto ideal................................................................................................ 382 (Objeto mau................................................................................................................................................... 383 Objeto total.................................................................................................................................................... 384 [Objetos .................................................................................................................. 385 ^Objetos bizarros.......................................................................................... 390 Objetos parciais....................................................................... 391 Observação de bebês.............................................................................................. 394 •ã1- Onipotência............................................................ 396 Organizações patológicas...................... 398 P a i........................................................................................................................................ 404 Paranóia............................ 405 Pavor sem nome......................................-..................................................................................................... 406 P ele.................................................................................................................................................................. 407 Pênis........................ 411 Pensamento............................................. 411 Pensar....................................................................................................................................... 411 Perda........................ 416

Perseguição................................................. Personificação............................................. Perversão....................... .............................. Pesar.................................... ......................... P osição ....................................................... Preconcepção.............................................. Preocupação................................. ............. Pressupostos básicos................................. Problema mente-corpo............................. ^ Projeção................................................... ^ Psicanálise clássica..................................... Psicologia do ego (Psicanálise clássica) '^.Psicose......................................................... ^Pulsão de m orte........................................ y P u lsõ es..................................................... Reação terapêutica negativa................... / Realidade interna................. ..................... ^Realidade psíquica.................................... Realização.............................. ..................... / t Reparação.................................................... >~Reparação maníaca................................... Repressão..................................................... Resistência................................................... Restituição/Restauração.................... Rêverie........................................................ Rosenfeld, Herbert............. ...................... /-Sadism o........................................................ Segai, Hanna.............................................. / S e i o .......................... ....................................

?Self................................................... Sintoma................................................. . Sistemas sociais de defesa....................... Sociedade..................................................... Sonhos.......................................................... Subjetividade........ .............................. . ^Técnica de análise através do brincar,. j -/ T ransferêncía.............................................. Vinculação................................................ Voracidade.................................................. Bibliografia das publicações kleinianas.

417 418 418 420 421 422 422 422 425 427 430 430 439 444 449 452 454 456 456 456 460 460 462 463 464 465 466 467 469 469 470 471 473 473 474 479 479 484 484 485

PREFACIO A lf EDIÇÃO Venho sentindo há algum tempo que a psicanálise se beneficiaria com uma descrição dara e acessível dos conceitos kleinianos e pós-kleinianos, assim como do trabalho das principais figuras dessa corrente. Isso se mostraria par­ ticularmente útil com relação aos textos de Klein, uma vez que são com freqüência considerados obscuros, assim como os de Bion. Seguidamente se diz que essas idéias são apreendidas melhor durante a supervisão, onde são trans­ mitidas à luz do material clínico. Ocorreu~me um dia que K ey w ords [palavras-chave], de Raymond Williams (Fontana, 1976), que rastreia a evolução histórica dos conceitos e estudos cul­ turais, podería servir de modelo para um livro desse tipo, juntamente com The language o f psycho-analysis [vocabulário da psicanálise], de Laplanche e Pontalis (Hogarth, 1983). Partilhei a idéia nesse mesmo dia com Bob Hinshelwood, com quem já vinha trabalhando há algum tempo, servindo-lhe de orientador quanto à história das idéias e sendo supervisado por ele com relação a casos clínicos. Ele me telefonou um dia depois e concordou em em­ preender o projeto. Não tinha idéia de quão ambicioso ele seria, nem de que livro minucioso e abrangente escrevería. Não exagero, mas estou orgulhoso por haver editorado e publicado este livro, que, acredito, constituirá um ponto de referência da psicanálise. Dora­ vante, acho eu, ninguém mais poderá pôr de lado as idéias kleinianas mera­ mente porque elas são de acesso difícil, ao mesmo tempo em que muitos des­ cobrirão, como aconteceu comigo, que sua própria experiência e a de seus pacientes se beneficiarão desta iluminação sutil e em muitos níveis. Sem dúvi­ da, certos ensaios necessitarão de revisão, mas uma base para a clareza e a acessibilidade foi assentada. Eu, de minha parte, sou-lhe grato e admirador.

ROBERT M. YOUNG FAB

R.D.Hinshehvood / 12

PREFÁCIO À 2? EDIÇÃO Esta edição revisada do Dicionário do Pensamento Kleiniano é uma oportunidade feliz para considerarmos o clamor da resposta à segunda edição. Foi extremamente encorajador ter uma resposta tão ampla - e tão favorável, em sua maior parte. Mas nem todos os que responderam formavam um consenso sobre o trabalho e isto deu-me a oportunidade para refletir ainda mais sobre a geo­ grafia da área. Como resultado disso, acrescentei novos materiais e reescrevi várias passagens. Felizmente, a quantidade do que está reescrito e modifi­ cado da primeira edição é muito pequena. Fico satisfeito com isso, tanto pe­ lo prazer de ter produzido uma versão substancialmente aceitável do pensa­ mento kleiniano, quanto porque a quantidade de material a ser relido por aqueles que estudaram a primeira edição não é grande. O mais importante, acerca desta segunda edição, é o material adicional. As principais críticas relacionavam-se a duas questões: certos aspectos do instinto de morte e inveja e os recentes avanços na técnica associada ao nome de Betty Joseph. A primeira destas críticas levou-me a fazer algumas alterações nas entra­ das instinto âe morte, inveja, agressão e perversão, A segunda crítica - de que não valorizei e não representei adequadamen­ te o trabalho de Betty Joseph - foi mais difícil avaliar. A publicação de uma coletânea de seus trabalhos em 1989, editada por Michael Feldman e Elizabeth Spillius, traz esta questão de um modo mais vigoroso. Seu livro é uma coleção admirável de textos sobre um desenvolvimento impressionante no trábalho de um grupo significativo de kleinianos londrinos - trabalho este admi­ rado e reconhecido por todo o grupo kleiniano. Relaciona-se ao fenômeno do "acting-in", como Betty Joseph o chama. Ela o descreve como a manifesta­ ção clínica encontrada com maior frequência dentro do tratamento analítico de certos tipos de pacientes particularmente difíceis, aqueles que são "difíceis de serem alcançados". O "acting-in" é o correlativo clínico dos problemas teó­ ricos chamados pelos analistas kleinianos de "organizações patológicas". Eu dei maior ênfase a este trabalho na presente edição, introduzindo novas entraR.D.Hínshelwood / 13

das, organizações patológicas, e, para cobrir o trabalho de Betty Joseph, alte­ rações psíquicas e equilíbrio psíquico (termos adotados por Feldman e Spillius para dar aos escritos de Betty Joseph maior clareza técnica) e dor psíqui­ ca e acting~in. Também foram necessárias algumas modificações às entradas já existentes de transferência e contratransferência. Consegui explicar de mo­ do mais completo minhas próprias impressões sobre a importância do trabalho de Betty Joseph, quando fui convidado a revisar seu livro para a Free Associations 22. A bibliografia foi atualizada e tentei manter-me em dia com a republicação dos textos anteriormente publicados pelos kleinianos, que parecem for­ mar, atualmente, um importante empreendimento por seus próprios méritos. Sou grato aos amigos e colegas por terem apontado alguns erros meno­ res de ortografia, que foram corrigidos nesta edição. Graças a Selina 0'Grady, poucos desses erros passaram por sua atenta vigilância. Agradeço também a Hanna Segai, pelo tempo que passou comentando e discutindo sobre a pri­ meira edição deste livro; e também por uma correspondência detalhada com Elizabeth Spillius, após sua revisão da primeira edição ("On Kleinian language", Free Associations 18:90-110). E, como sempre, Robert Young encorajoume muito com sua perspicácia sobre os elementos necessários ao trabalho. Robert H inshelwood

14 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

INTRODUÇÃO s conceitos kleinianos versam a respeito de elementos muito primitivos da mente humana, afastados do senso comum e bastante semelhantes às inapreensíveis partículas da física subatômica. Os blocos de construir são poucos, mas erigidos em complexidade fantasticamente rica. Diferentemente das partículas subatômicas, contudo, a matéria da mente é potencialmente cognoscível pelo indivíduo. Hle é uma mente, num sentido diferente da ma­ neira pela qual ele é uma estruturação maciça de elétrons e prótons. Algo dis­ to é cognoscível àqueles que podem inquirir dentro de si mesmos, com ou sem a ajuda de seu próprio analista. É impossível, em palavras escritas, trans­ mitir üm senso de compreensão, mas simplesmente um conhecim ento a res­ peito de conceitos que o leitor deve levar avante, consigo mesmo e sozinho. Grande parte da inacessibilidade ao pensamento kleiniano provém não apenas do fato de ser emoldurado pelas próprias experiências do paciente, mas também do fato de essas experiências serem tão afastadas do pensamen­ to consciente e verbal e também tão difíceis de serem comunicadas por ma­ neira que seja verificável fora da parceria específica analièta-paciente: "A des­ crição de tais processos primitivos padece de uma grande desvantagem, pois essas fantasias surgem em uma época em que o bebê ainda não começou a pensar em palavras" (Klein, 1946, p. 8n). Trata-se de questões que todo tex­ to psicanaíítico tem de enfrentar. Este dicionário não constitui exceção, e ne­ le tentei dedicar-me à descrição de conceitos sem esquivar-me de sua grande complexidade e sua qualidade remota. Em certo grau, as definições podem ser trazidas à luz através da transmis­ são dos embates da discussão da qual elas provieram, mas existe uma dificul­ dade inerente em trazer conceitos psicanaliticos à vida por esta maneira, par­ ticularmente os conceitos kleinianos, que se acham, de modo especial, estrei­ tamente vinculados aos fundamentos clínicos da psicanálise. Em grande par­ te, a teoria kleiniana é teoria clínica, e as teorias que os pacientes têm a res­ peito de suas próprias mentes constituem a base das teorias kleinianas da mente. Esta ênfase em tomar a experiência subjetiva do paciente a sério com freqüência tendeu a causar confusão, especificamente porque a linguagem R.D.Hínshelwooâ / 15

do sujeito e a linguagem do observador representam discursos tradicionalmen­ te separados na psicologia 'científica". Existem várias características principais na formação do pensamento kleiniano: 1. Klein chegou à vida profissional, e à psicanálise, tarde em sua vida, e, de­ vido a isso — bem como, provavelmente, por razões localizadas em sua pró­ pria personalidade — lutou continuamente para estabelecer-se de modo segu­ ro, posição que constantemente lhe fugia. A psicanálise kleiniana continua a ser um corpo de conhecimentos cuidadosamente mantido por um grupo de pessoas (o Grupo Kleiniano) com o mesmo arredio senso de insegurança e uma preocupação sobre o que outros que venham a possuir os conhecimen­ tos possam fazer com eles. O debate com outras escolas de psicanálise foi ou inexistente ou, quando aconteceu, degenerou em disputas de tipo bastan­ te pessoal. 2. Mesmo assim, Klein, como todos os inovadores, foi afortunada em desco­ brir-se de posse de uma nova técnica que lhe permitiu um alcance muito maior em sua área de descobertas do que qualquer pessoa antes dela. Ela vi­ brou com o poder de sua técnica através do brincar e ficou entusiasmada pa­ ra demonstrar a utilidade dela. Mas a novidade e o poder de sua técnica fa­ lharam em dar-lhe a posição segura que buscava; na realidade, aconteceu o inverso: seus resultados excepcionais tornaram-na um membro embaraçoso e divergente da comunidade psicanalítica ortodoxa. 3. Outro elemento de vulto no pensamento de Klein foi a importância conce­ dida às "relações objetais", que lentamente surgiram da ênfase crescente da­ da a um aspecto especial do relacionamento analítico: a transferência. A vi­ da profissional de Klein acompanhou a lenta compreensão da realidade con­ creta das relações objetais internas, o processo de compreendê-las através do brincar das crianças e da loucura dos psicóticos, e por fim a revisão radi­ cal da natureza e do uso da transferência, em resultado dessas descobertas. O pensamento de Klein nem sempre progrediu em uma direção única. As eta­ pas podem ser relacionadas em ordem cronológica aproximada: 1919 1922 1923 1923 1925 c.1925 1926 1926 1927 1928 1930

Importância do conteúdo {antes que a origem pulsional da ansiedade) Terapia através do brincar Fantasia inconsciente Violência e sadismo ná vida de fantasia Abandono do esquema temporal das fases evolutivas Ciclos de perseguição Objetos internos Culpa e superego arcaico Introjeção das imagens fantasiosas dos pais! Simbolização, personificação e externaíização Mecanismos primitivos de defesa

16 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

1933 1935 1935 1946

Pulsão de morte Importância do objeto amado Posição depressiva Perseguição e defesas da posição pré-depressiva {posição esquizo~pa~ ranóide) 1957 Inveja Considerei alguns desses conceitos tão fundamentais que a primeira parte des­ te dicionário (Parte A) consiste em 13 verbetes principais, que tratam desses conceitos básicos. Esses verbetes principais acham-se dispostos em ordem cro­ nológica, Alguns conceitos surgem e se esvanecem (tal como a Fase da Femi­ nilidade); outros permanecem vigorosamente centrais (particularmente Fanta­ sia Inconsciente e O bjetos Internos); um deles (Técnica) concerne ao impor­ tante instrumento de que todas as descobertas provieram. Há possibilidade de esses 13 verbetes serem lidos como capítulos de um trabalho introdutório à psicanálise kleiniana. O ultimo dos verbetes principais (Identificação Projetiva) é o trampolim para a maior parte da evolução com que colegas contribuíram na parte ulterior da carreira de Melanie Klein (1945-60) e subseqüentemente. A segunda parte do dicionário (Parte B) consiste nos verbetes gerais, dis­ postos em ordem alfabética convencional. Todos têm a intenção de propor­ cionar acesso satisfatório, mediante a referência cruzada à matriz dos concei­ tos, e o leitor determinado deve ser capaz de seguir o caminho que lhe inte­ ressa. Os verbetes gerais também ampliam os desenvolvimentos que se deram após Klein. Tal como Freud, ela deixou um legado ricamente dotado para que outros o levassem à frente. Há muitos desenvolvimentos posteriores; em particular: (Í) Desenvolvim entos no conceito de identificação projetiva: diferenciação en­ tre identificação projetiva normal e patológica (Bion, 1959); formação de sím­ bolos e suas anormalidades (Segai, 1957); teorias do conter e do pensar (Bion, 1962, 1970); desenvolvimento do conceito de contratransferênda em uma te­ oria de ação terapêutica (Money-Kyrle, 1956). (ii) M anifestações clínicas da pulsão de m orte: investigação do narcisismo ne­ gativo (Rosenfeld, 1971); estruturação patológica da personalidade (Meltzer, 1968; Joseph, 1975). (iü) O bservação direta de bebês nas primeiras fases da vida: a pele e a identi­ ficação adesiva (Bick, 1968; Meltzer, 1975); autismo (Meltzer et ah, 1975; Tustin, 1981). No curso da redação deste dicionário, fiquei mais do que nunca convenci­ do que os conceitos kleinianos surgiram do contexto do pensamento freudia­ no. Uma certa descrição do arcabouço freudiano foi, portanto, essencial, e tentei avaliar quanto do pano de fundo freudiano é necessário explicar. Pa­ ra alguns leitores, posso ter descrito muita coisa que já lhes é familiar; para R, D, Hinshelwood / 17

outros, muito pouco, e poderão necessitar conhecer mais sobre os anteceden­ tes, caso em que só posso referi-los ao Vocabulário da psicanálise, de Laplanche e Pontalis, e ao Dicionário 'crítico de psicanálise, de Charles Rycroft, ex­ celentemente simples. A tradição kleiniana sempre deu ênfase ao trabalho clínico e pode-se dizer que virtualmente nenhum trabalho kleiniano surge sem uma quantidade subs­ tancial de material clínico a respaldar-lhe os argumentos. Klein, sendo uma observadora tão excepcional no consultório, sempre apoiou-se nessa força quando sentiu, durante os anos de discussão, de 1926 a 1946, que era pressio­ nada a defender seu caso. Sua base foi sempre o conteúdo psicológico das mentes de seus pacientes, tal como surgia no material. E curioso redigir um relato não-clínico do pensamento kleiniano, mas, constitui pilar central do propósito deste dicionário reunir seus fios teóricos. Embora os conceitos kleinianos surjam da psicanálise clássica, eles existem hoje em contraste com a psicologia do ego, atualmente a tradição dominan­ te derivada da psicanálise freudiana clássica. Onde possível, fiz referência aos caminhos divergentes entre estas duas escolas. Finalmente, compilei uma Bibliografia bastante abrangente, para meus pró­ prios fins, ao trabalhar neste dicionário, e, de vez que existe uma fronteira bastante clara entre aqueles que trabalham rigorosamente com a psicanálise kleiniana e aqueles que não o fazem, pareceu valer a pena incluir essa compilação. Fiquei embaraçado com o uso de pronomes da terceira pessoa. O neutro (it) é desagradavelmente impessoal, em minha opinião, para a descrição de uma matéria-prima tão intensamente humana e pessoal. Qualificar constante­ mente o pronome utilizando a expressão "ele ou ela" ou "dele ou dela" leva a um estilo laborioso. Portanto, ocasionalmente utilizei "ele", "a ele" ou "de­ le" onde me podería referir a identidades tanto masculinas quanto femininas, e com isso não se pretende qualquer ofensa. Em verdade, é minha opinião — e da psicanálise em geral — que o gênero não vai além da pele; somos um amálgama de ambos os estereótipos de gênero e o emprego de "ele" ou "ela" reduz a identidade a um objeto parcial, ponto que pode ser esclarecido consultando-se o verbete PAI. Desejo agradecer a meu próprio analista kleiniano, a meus professores de psicanálise e a meus pacientes, com quem aprendi a empunhar esses difíceis instrumentos conceptuais, e também a um certo número de pessoas que me ajudaram na preparação deste livro: Gillian Beaumont, ]oe Berke, Susanna Isaacs Elmhirst, Karl Figlio, Selina 0'Grady, Frank Orford, Hanna Segai, Elizabeth Spillius, Victor Wolfenstein, Bob Young. Devo particularmente assinalar o constante apoio que agradecidamente re­ cebí de Bob Young e o rigoroso teste intelectual a que Karl Figlio submeteu o meu original, algo que tornou o resultado algo muito mais meticuloso do que eu teria doutra maneira conseguido. Na preparação das correções a acrés­ cimos posteriores, tenho de reconhecer a ajuda de muitos colegas e amigos, 18 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

mas, especialmente, o tempo e o interesse concedidos ao Dicionário por Elisabeth Spillius e Hanna Segai. Finalmente, permitam-me agradecer a alguém que nada tem a ver direta­ mente com este dicionário, exceto pelo seguinte importante conselho: Algumas pessoas, quando veem uma palavra, pensam que a primeira coi­ sa a fazer é defini-la. Dicionários são produzidos e, com uma demonstra­ ção de autoridade não menos confiante por ser usualmente limitada no es­ paço e no tempo, algo que é chamado de significado correto é-lhe atribuí­ do. Mas, embora seja possível fazer isto, de modo mais ou menos satisfató­ rio, com certos nomes simples de coisas e efeitos, é não apenas impossível mas também irrelevante no caso de idéias mais complicadas. O que nelas importa não é o significado correto, mas a história e a complexidade dos significados; as mudanças conscientes, ou os usos inconscientemente dife­ rentes, e, com freqüência, aquelas mudanças e diferenças que, mascaradas por uma continuidade nominal, vêm a expressar mudanças radicalmente diferentes e, amiúde, a princípio despercebidas, na experiência e na histó­ ria {Williams, 1972, p.67~8). Tentei, talvez de modo vacilante, manter em mente esta advertência a res­ peito das idéias complexas. Na medida em que lhes tornei clara a complexida­ de, fico em dívida com o conselho de Raymond Williams; na medida em que não o consegui, só posso encaminhar o leitor às fontes originais, a fim de que as explore por si próprio.

Bick, Esther (1968), “The experiertce of the skin in early object relations", Int. ]. Psycho-Artal, 49:484-6; replublícado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected papers o f M artha Harris and Esther Bick, Perth, Clunie, p.114-8. Bion, Wilfred (1959), “Attacks on Hnking", Int. J. Psycho-A nal., 40:308-15; republicado (1967) em W. R. Bion, Second Thoughts, Heinemann, p .93-109. ...........(1962), Leam ing from experience, Heinemann. -------- (1970), Attention and interpretation, Tavistock. Joseph, Betty (1975), "The patient who is difficult to reach", em Peter Giovacchini, (org.), Tactics and techniques in psycho-analysis, vol. 2, Nova Iorque, Jason Aronson, p.205-16. Klein, Melaníe (1946), “Notes on some schizoid mechanisms'', em The wrítings o f M elanie Klein, vol, 3, Hogarth, p.1-24. Meltzer, Donald (1968), “Terror, persecutíon, dread", Int. ]. Psycho-A nal., 49:396-400; repu­ blicado (1973) em Donald Meltzer, Sexual States o f mind, Perth, Clunie, p,99-106. -------- (1975), "Adhesive identifícation", Contem porary Psycho-Analysis, 11:289-310. Meltzer, Donald; Brenner, John; Hoxter, Shirley; Weddell, Doreen e Wittenberg, Isca (1975), Explorations in autism, P,erth, Clunie. Money-Kyrie, Roger (1956), "Normal counter-transference and some of its deviatíons", Int. J. Psycho-Anal., 57:360-6; republicado (1978) em The collected papers o f R oger M oney-Kyrie, Perth, Clunie, p.330-42, Rosenfeld, Herbert (1971), "A clinicai approach to the psycho-analytic theory of the life and death instincts: an investigation into the aggressive aspects of narcissism", Int. }. Psycho-Anal., 52:169-78.

R.D.Hinshehoood / 19

Segai, Hanna (1957), "Notes on symbol-formafcion", Int. ]. Psycho-A nal., 38;391~7; republica­ do (1981) em The w ork o f Hanna Segai, Nova Iorque, Jason Arortson, p.49-65. Tustin, Francês (1981), Àutistic states in children, Routíedge & Kegan Paul. Williams, Raymond (1972), "Ideas of nature", em (1980) Problem s in materialism and culture, Verso, p,67-85.

20 / Dicionário do Pensamento Kleíniano

A Verbetes Principais

)

Àm

TÉCNICA DEFINIÇÃO, O trabalho de Klein com crianças enfatizou a função da fantasia e a sua técnica utilizou brinquedos no setting psicanalítico, para realçar a expressão de fantasias. O brincar, tal como a associação livre, os sonhos e a atuação [acting out] foram encarados como expressões da fantasia. Klein demonstrou que a técnica da interpretação imediata e profunda resultava em uma modificação da ansiedade, achado que apoiou fortemente es­ se tipo de interpretação, enfatizando também a qualidade mutativa das in­ terpretações transferenciais. Todo o material das manifestações verbais do paciente em uma sessão analítica, mesmo em um adulto que está associando livremente, refere-se a aspectos da relação transferenciai com o analista. As associações que se referem a figuras externas da vida do paciente são encaradas como aspecto da transferência que foram escindidos (split offj a fim de reduzir a ansiedade do momento imediato com o analista a um nível tolerável. A contratransferência foi sempre encarada com certa desconfiança por Klein, como também aconteceu com Freud; entretanto, o modelo apresen­ tado por Bion, de uma interação mãe-bebê, trouxe-a para o centro da téc­ nica psicanalítica. A compreensão da contratransferência é equivalente à compreensão que a mãe tem das necessidades corporais de seu bebê e de­ senvolve a capacidade que o padente/bebê tem de compreender a si mes­ mo. Os analistas kleinianos não interpretam um sentimento contra transfe­ renciai sozinho; a própria experiência do analista é interpretada à luz dos relacionamentos descritos no material do paciente. CRONOLOGIA 1918 Trabalho com crianças. 1919 Interpretação de perguntas inconscientes sobre a sexualidade. 1921 Utilização de brinquedos e do brincar (Klein, Melanie, 1920, 'The development of a child"; Klein, Melanie, 1955, "The psychoanalytic play-technique: its history and significance"). R.D.Hínshelioood / 23

1926 Confrontação com Anna Freud (Klein, Melanie, 1926, 'The psychological principies of early analysis"). 1934 Ênfase dada por Strachey à tranferência (Strachey, James, 1934, 'The nature of the therapeutic action of psycho-analysis"). 1956 Ênfase na contratransferência e nos ciclos de identificações projetiva e introjetiva (Money-Kyrle, Roger, 1956, "Normal counter-transference and some of its deviations"; Bion, Wilfred, 1959, "Attacks on linking"). JJreud descobrira a psicologia da infância {principalmente as fases da se. xualidade infantil e a teoria do trauma reprimido) a partir de sua psica­ nálise de adultos [ver 3. AGRE3SAO; L1BIDO], Quando quis conferir suas teorias com crianças reais, pediu a conhecidos e colegas que coletas­ sem observações de seus próprios filhos e filhas. A "histórias clínica" do Pequeno Hans (freud,. 1909) foi uma análise das notas taquigráficas feitas pelo pai, das conversas diárias com Hans, de quatro anos e meio de ida­ de. A "análise” do Pequeno Hans causou duas coisas. Em primeiro lugar, .confirmou as teorias de Freud a respeito do desenvolvimento infantil, mas também, em segundo, o pessimismo dele sobre trabalhar diretamente com crianças pareceu imped.r todos os demais de trabalhar com elas, quer terapeuticamente, quer para fins de pesquisa. Passaram-se outros quinze anos até haver novamente interesse em estudar as crianças, desta vez para con­ ferir as teorias mais recentes do narcisismo (Freud, 1914) [ver NARCÍS1SMO]. Disso surgiu uma tentativa de instituir uma forma de análise de crianças mais terapêutica (antes que de pesquisa) e ela se vinculou primeiramente a educação (Hug-Hellmuth, 1921; Pfister, 1922; Hoffer, 1945). Hug-Belb muth considerava que a melhor utilização da psicanálise era na orientação da educação das crianças — professores psicanalíticos. Klein, contudo, foi a primeira analista a tentar com crianças uma forma rigorosa de psicanáli­ se que excluía todos os elementos pedagógicos.

S

CONTRIBUIÇÃO DE KLEIN Â TÉCNICA PSICANALÍTICA. Todos os desenvohir eníos de Melanie Klein em técnica e prática originam-se de seu interesse primário pela ansiedade, e, em particular, pelo conteúdo da ansiedade: Para ela, foi sempre a pedra de toque, o fio orientador que a conduziu através do labirinto (...) Para Freud a ansiedade era de importância muito grande (...) sua abordagem a ela dava-se, até cerlu ponto, do ângulo fisiológico, como uma condição de tensão que deve se- investiga­ da e entendida, e ele não se interessou pelo conteúdo p‘ .:o!6gjco do medo (fantasias) r.a mesma medida em que Melanie Klein o fez. (Riviere, 1952, p.8) 9Sk A técnica de Klein enfatizava o conteúdo da mente [ver 2. FANTASIA IN­ CONSCIENTE] mais do que as forças propulsores subjacentes — as pul24 / Dicionário do Pensamento Kíeiniano

$Ões —, que os analistas clássicos haviam até alí estudado. Isto conduziu a muitas modificações de grande alcance, que continuam a assinalar a dife­ rença entre a psicanálise kleiniana e a psicanálise ortodoxa (psicologia do ego); I A técnica através do brincar (1) o brincar das crianças foi considerado equivalente à associação livre nos adultos; (2) as interpretações que se dirigem à ansiedade inconsciente modificamna visivelmente; (3) a atividade de brincar é uma forma de externalização, no setting analí­ tica, de preocupações internas, em particular uma preocupação com o re­ lacionamento com objetos que se acredita existirem internamente. II Psicanálise de adultos (1) as associações livres dos adultos vieram a ser vistas com um brincar com objetos (com o analista ou com partes da mente deste); (2) deu-se mais ênfase à criança no paciente adulto; (3) importância da transferência negativa; (4) a "situação total" (isto é, todas as associações) refere-se à transferência para o analista; (5) o analista, suas partes corporais e as funções de sua mente podem ser, todas elas, experienciadas como objetos parciais; (6) o bebê no paciente. I A TÉCNICA ATRAVÉS DO BRINCAR. Melanie Klein viu Freud pela pri­ meira vez em 1918, ao assistir ao Congresso Internacional em Budapeste, em que Freud leu "Linhas de avanço em terapia psicanalítica" (Freud, 1919). Ela deve ter sido inspirada e incentivada a contribuir para os novos desenvolvimentos. Klein começou a praticar psicanálise com crianças por sugestão de seu próprio psicanalista, Ferenczi, em Budapeste, provavelmen­ te em 1917 — seu primeiro sujeito foi um de seus próprios filhos (Petot, 1979). Isto hoje é um tanto chocante; contudo, achava-se de acordo com a análise do Pequeno Hans pelo pai e, em verdade, com a análise feita por Freud em sua própria filha Anna (Young-Bruehl, 1989), assim como a análise que Abraham fez da filha. Essas primeiras tentativas levaram Klein a especializar-se na análise de crianças. O desenvolvim ento da técnica: No decorrer de um período de cerca de cin­ co anos, Klein desenvolveu uma técnica específica, a que deu o nome de técn ica,através do brincar, com a qual podia analisar crianças menores R.D.Hínshehuood / 25

de três anos; dessa maneira, achava ela, podia remontar à área cinza da primeira infância mais longe do que qualquer outro o fizera. A técnica não surgiu de uma vez só, mas através de uma série de eta­ pas, Ela começou reservando tempo para conversar com crianças e respon­ der às perguntas delas, especialmente aquelas relacionadas à vida sexual dos pais, Era franca e aberta, e modelava o que fazia na maneira pela qual Freud abordara o manejo dos problemas com o Pequeno Hans {Freud, 1909). Descobriu que se dava um efeito geralmente positivo na criança con­ frontada com um adulto aberto e totalmente franco, de maneira que o brin­ car e a vida de fantasia eram visivelmente enriquecidos. Entretanto, quando relatou seu trabalho em um encontro da Sociedade Psicanalítica Húngara em Budapeste, em 1919, um colega, Anton von Freund, queixou-se de que ela se dirigia apenas às questões conscientes que estavam intrigando a criança, e não às inconscientes. Suas interpreta­ ções, disse ele, não eram psicanalíticas, ainda que a maneira pela qual for­ mulava suas observações o fosse. Depois disso, ela começou a dirigir-se às questões inconscientes [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE], A princípio, teve muita cautela com as in­ terpretações; ainda assim, ficou estupefata com as mudanças de grande al­ cance que ocorreram, resultando num surgimento bastante espantoso de fantasias e brincadeiras: "(...) de modo inteiramente espontâneo ele come­ çou a falar e, daí por diante, contou histórias fantásticas mais longas ou mais curtas (...) Até então, a criança havia mostrado tão pouca tendência a contar histórias quanto a brincar" (Klein, 1920,' p. 31). Ela parece ter fi­ cado quase alarmada pela repentina e infindável produção de fantasias, não menos, talvez, por descobrir que elas eram com tanta freqüência vio­ lentas. Contudo, a força da técnica foi-lhe imediatamente confirmada. Introdução de pequenos brinquedos (1923): Para realçar a expressão des­ sas fantasias, Klein começou a usar conjuntos muitos pessoais de brinquedos: Em uma sessão em que novamente encontrei a criança respondendo pou­ co e retraída, deixei-a, dizendo-lhe que voltaria em um momento. Fui até o quarto de brinquedos de meus próprios filhos, apanhei alguns brin­ quedos, carrinhos, figurinhas, tijolos de armar, um trem, coloquei-os numa caixa e voltei para o paciente. A criança, que não fora atraída pelo desenho ou outras atividades, ficou interessada nos brinquedos e imediatamente começou a brincar com eles. (Klein, 1955, p. 125). Klein tomou como modelo as interpretações feitas por Freud de um bebê de oito meses, a brincar com um carretei de algodão (Freud, 1920). (1) O brincar como associação livre. A abordagem de Klein à análise de crian­ ças muito pequenas era simples e inovadora: a liberdade de brincar podia substituir as associações livres, e as fantasias expressas no brinquedo eram "a mesma linguagem, o mesmo arcaico e filogeneticamente adquirido mo26 / Dicionário do Pensamento Kkiniano

do de expressão com que estamos familiarizados nos sonhos" {Klein, 1926, p. 134). Cada criança tinha o seu próprio armário e isto permanece sen­ do característica importante da técnica através do brincar. O armário con­ tinha brinquedos pequenos, água e uma bacia, papel, tesoura, cola, etc. Klein observava e, quando necessário, tomava parte no brincar da criança. O n ovo setting: Este era um novo setting que envolvia brinquedos e obje­ tos reais. Assim, a transferência envolvia todos os objetos deste setting, não apenas a analista [ver "a situação total", adiante]. Ela adotou um mé­ todo estrito e ortodoxo, querendo com isso dizer que interpretava exclusi­ vamente o inconsciente e abstinha-se das outras intervenções que Hug-Hellmuth e Anna Freud estavam promovendo nessa ocasião. Ela interpretava os elementos do brincar e respeitava-lhes o valor simbó­ lico, como se fossem elementos de um sonho. Utilizava as palavras comumente empregadas pela criança, mas falava de modo explícito e franco a respeito de assuntos sexuais, partes do corpo e as proeminentes relações agressivas e sádicas, assim como das sexuais amorosas. Parece que Klein era bastante ativa em seu brincar com os pequenos pacientes, dispondose a desempenhar papéis nas fantasias deles, reencenando assim os dramas também representados com brinquedos. Ela interpretava as relações entre objetos como sendo o conteúdo psicológico da mente. Olhando retrospec­ tivamente, contrastou isso com a técnica padrão: (...) era princípio estabelecido que as interpretações fossem dadas de modo muito parcimonioso. Com poucas exceções, os psicanalistas não haviam explorado as camadas mais profundas do inconsciente, sendo tal exploração considerada perigosa em crianças. (Klein, 1955, p, 122). O brincar e relações objetais: Os objetos possuídos pela pequena pessoa dentro do setting analítico deixaram sua marca, não apenas na técnica da psicanálise de crianças, mas também no tipo de observações que Klein co­ meçou a fazer e, subseqüentemente, nas teorias que desenvolveu. O con­ sultório é uma arena em que os brinquedos são manipulados e, necessaria­ mente, dispõem-se em relações espaciais uns com os outros. O senso de um conjunto de relações ativas entre objetos, dentro de um espaço clara­ mente demarcado, já fica aparente no estabelecimento da descoberta, fei­ ta por Klein, das relações objetais. A idéia do mundo interno já fora esti­ pulada por sua escolha de setting [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. Por um acaso feliz, topara com um veículo ideal para trazer à luz a visão das rela­ ções objetais da mente humana [ver 5. ESCOLA DAS RELAÇÕES OBJETAIS]. (2) A interpretação como modifícadora da ansiedade. Klein descobriu que a interpretação modificava a ansiedade. Em uma análise conduzida em 1924, Ruth (quatro anos e três meses) recusava-se a relacionar-se com a analis­ ta e só ficava no aposento se sua irmã mais velha estivesse presente. Du­ rante muitas sessões, Klein foi derrotada em seus esforços para estabelecer R.D.Hinshetwood / 27

contato positivo com a criança: "Vi-me assim forçada a tomar outras me­ didas, medidas que mais uma vez deram prova notável da eficiência da in­ terpretação na redução da ansiedade e da transferência negativa do pacien­ te". Prossegue descrevendo como utilizou material provindo de várias ses­ sões para formular uma interpretação da ansiedade da criança a respeito das entranhas da mãe, e o temor de um bebê por nascer. Ela ficou espanta­ da com a mudança imediata: "O efeito de minha interpretação foi assom­ broso. Pela primeira vez, Ruth voltou sua atenção para mim e começou a brincar de maneira diferente, menos tolhida" (Klein, 1932, p. 26-7). A ansiedade e a transferência negativa: Os aspectos negativos do relaciona­ mento da criança com o analista (transferência negativa) eram de conside­ rável importância, uma vez que o brincar a que Klein assistia achava-se im­ pregnado por fantasias agressivas e pelo temor e alarma a que pareciam dar origem. Tornou-se-lhe óbvio que o ato de interpretação;tinha de, em primeiro lugar e acima de tudo, lidar com os aspectos negativos das fanta­ sias da criança, tanto porque era esse o ponto máximo de ansiedade quan­ to por ela haver descoberto que ele definitivamente mudava os sentimen­ tos pelo analista nessa direção positiva. ísaacs (1939) confirmou o efeito de interpretar o ponto de ansiedade máxima. Nessa ocasião, contudo, ou­ tros analistas de crianças, alarmados por interpretações explícitas e profun­ das, desaprovaram intensamente isso (Anna Freud, 1927) [ver adiante; tam­ bém ANÁLISE DE CRIANÇAS]. (3) O brincar como expulsão. A importância do brincar levou Klein a interes­ sar-se pela sua natureza; através da expulsão, um conflito interno era externalizado e, dessa maneira, tornado mais tolerável. Searl (1929) comen­ tou que "as fantasias são sempre melhores ou piores que a realidade" (p. 289), de maneira que, enquanto tendemos a ser conscientes daquelas que são melhores (devaneios), as que são piores tendem a ser externalizadas, a fim de serem mitigadas. O brincar, portanto, possui um aspecto que é desesperado e é, de fato, uma forma de defesa-expulsão ou projeção [ver PROJEÇÃO]. Esta função do brincar é bastante sombria e pessimista. Ele não é diver­ tido, mas destina-se a fornecer alívio para esses estados persecutórios internos: : Pela divisão de papéis, a criança consegue expelir o pai e a mãe a quem, / na elaboração do complexo de Edipn, absorveu em si mesma e que ago\ ra a estão atormentando internamente, por sua severidade. O resultaI do dessa expulsão é alívio, que contribui em grande medida para o pra1 zer que deriva do jogo. (Klein, 1926, p. 133). Externalização e culpa inconsciente: Freud (1916) demonstrara como crimi­ nosos, com um severo sentimento inconsciente de culpa, externalizam a perseguição [ver CULPA INCONSCIENTE], Isto foi vinculado com o subseqüente desenvolvimento de sua teoria posterior do superego. Freud tam28 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

bém considerara o brincar das crianças e descrevera-o de forma semelhan­ te: "Quando a criança passa da passividade da experiência para a ativida­ de do jogo, ela entrega a experiência desagradável a um de seus companhei­ ros de jogo" (Frèud, 1920, p. 17). Klein considerava-se como dando contri­ buições significativas para a externalização da culpa inconsciente, uma vez que analisava crianças que se achavam na idade (ou antes dela; em que Freud supusera que o superego estava se formando (quatrr a seis am,s de idade) [ver 7. SUPEREGO). II A TÉCNICA KLEINIANA COM ADULTOS. Na técnica kieiniana com a psicanálise de adultos, a idéia, derivada da análise de crianças, de um esta­ do interno externalizado foi desenvolvida muito além. O emprego por Klein da técnica através do brincar e os pressupostos que estão por trás desta influenciaram o desenvolvimento da técnica psicanalítica com adultos. (1) Associações livres como equivalentes ao brincar. Embora o brincar na criança fosse originalmente tomado como equivalente a associações livres no adulto, ele proporcionava uma ênfase nova se as associações livres dos adultos fossem, inversamente, vistas como uma externalização semelhan­ te ao analista. As associações livres podem ser uma forma de atuação [acting ou t] (expulsão) de conflitos internos, estados de mente e pai tes do self. O próprio ato de interpretar pode, por si, oferecer oportunidade para o paciente engajar-se em manobras defensivas, processo que os kleinianos observaram cada vez mais (Joseph, 1975; 0'Shaughnessy, 1981; Reisenberg-Malcolm, 1981; Brenman, 1985) [ver ESTRUTURA; PERVERSÃO]. Esta atuação [acting out] na situação transferenciai é função da identifica­ ção projetiva, em que certos aspectos da experiência e impulsos do pacien­ te são projetados para dentro do analista, aos quais ele pode responder quer (i) reagindo a eles, quer (ii) verbalizando-os. Este aspecto da contratransferência foi progressivamente desenvolvido e sensibilizou grandemen­ te o analista aos aspectos não-verbais das comunicações do paciente [ver CONTRATRANSFERÊNCIA, e adiante). (2) A transferência como fantasia inconsciente. Klein veio a recomendar uma visão muitíssimo mais rigorosa da transferência: De meu trabalho com crianças cheguei a certas conclusões que, até cer­ to ponto, influenciaram minha técnica com os adultos. Tomemos pri­ meiramente a transferência. Descobri que, com crianças, a transferência (positiva ou negativa) é ativa desde o começo da análise, de vez que, por exemplo, até mesmo uma atitude de indiferença oculta ansiedade e hostilidade. Também com adultos descobri que a situação transferen­ ciai acha-se presente desde o início de uma forma ou de outra, e vim, portanto, a fazer uso de interpretações transferenciais cedo na análise, (Klein, 1943) R.D.Hinshelwood / 29

A relação com o analista é vista como possuindo significado para o pacien­ te, de acordo com os impulsos ativos neste, no momento [ver 2 FANTA­ SIA INCONSCIENTE], Externalizaçâo da fantasia inconsciente: Não se trata, portanto, meramen­ te de uma repetição de antigas atitudes, acontecimentos e traumas do pas­ sado; trata-se de uma externalizaçâo da fantasia inconsciente "aqui e agora • ^ primado dos processos (projetivos) de externalizaçâo concede uma importância espacial; assim como temporal, ao conceito de transferência, em oposição a uma importância meramente temporal [ver TRANSFERÊN­ CIA], A tradição kleiniana enfatizou a importância, na transferência, da ansie­ dade e das atitudes negativas no "aqui~e-agora". Strachey (1937) ampliou isto em fundamentos teóricos que derivaram da teoria dos objetos inter­ nos e do superego [ver 5. OBJETOS INTERNOS; 7. SUPEREGO]: Suponhamos que o analista dê a uma paciente uma interpretação no sentido de que, em certa ocasião, ela teve o desejo de que o marido morresse. Ora, o efeito que (de acordo com nossa teoria da interpreta­ ção) se deveria produzir aqui é que a paciente, por ser conscientizada desse particular impulso do id, ficasse em posição de discriminar entre seu objeto real (uma imago paterna, talvez) e pudesse assim ser capaz de efetuar uma correção em sua atitude para com a realidade externa e, em última análise, fazer um reajuste interno. Mas o que na realidade acontece é algo inteiramente diferente. Quando a interpretação é dada, todo o conflito se transfere da situação sobre a qual o analista está fa­ lando para outra situação sobre a aual não está falando. A paciente po­ de, é verdade, concordar que desejou que o marido morresse, mas seus interesses emocionais passaram automaticamente para outro problema, desta vez a respeito do analista e sua interpretação. Ela agora está reple­ ta de sentimentos conflitantes a respeito dele — raiva, temor, desconfian­ ça, gratidão, e muitos mais. E a totalidade deste novo conflito está, de momento, fora da visão e do alcance do analista. (Strachey, 1937, p. 142-3). Estas concepções, por sua vez, fortaleceram a própria ênfase dada por Klein aos objetos internos e coincidiram com sua formulação da posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. (3) A importância da transferência negativa. A importância dos conflitos ime­ diatos no relacionamento com o analista foi mais enfatizada quando uma técnica psicanalítica com esquizofrênicos desenvolveu-se na década de 1940. Rosenfeld (1947) e outros descobriram que uma técnica verdadeira­ mente psicanalítica podia ser usada com pacientes psicóticos, desde que uma atenção suficientemente apropriada, imediata e profunda fosse presta­ da à transferência, especialmente nas fases negativas. 30 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

A transferência negativa havia sido tão proeminente nas crianças que Klein ficou alerta para sua natureza freqüentemente oculta nos adultos, ponto para o qual Abraham (1919) e outros haviam ocasionalmente cha­ mado a atenção. A transferência negativa também é importante em ter­ mos teóricos. De vez que derivados da pulsão de morte são o problema, a agressão e a destrutividade precisam ser trazidas para a transferência, para investigação e interpretação. (4) A situação total como situação transferenciai. A atenção concedida a ma­ nifestações ocultas de aspectos profundamente negativos, assim como posi­ tivos, revela a transferência como um todo: Estamos acostumados a falar da situação transferenciai. Mas mantemos sempre em mente a importância fundamental deste conceito? É minha experiência que, ao desenredar os pormenores da transferencia, e essen­ cial pensar em termos de situações totais transferidas do passado para o presente, assim como de emoções, defesas e relações objetais. (Klein, 1952, p. 55). Klein estabeleceu que o total de todas as associações livres que vem a men­ te de um paciente pode ser referido à transferência, por mais afastado da consciência que o vínculo possa ser: Durante muitos anos a transferência foi entendida em termos de referên­ cias diretas ao analista no material do paciente. Minha concepção da transferência como enraizada nos estágios iniciais do desenvolvimento e em camadas profundas do inconsciente é muito mais ampla e acarre­ ta uma técnica pela qual, de todo o material apresentado, os elementos inconscientes da transferência são deduzidos. (Klein, 1952, p. 55). Isto desenvolveu-se como uma ênfase dada à situação total. A análise clás­ sica, em contraste, desconfia de tais interpretações "profundas" [ver adiante]. Esta ênfase é um marco decisivo da abordagem kleiniana, à qual ela re­ tornou repetidas vezes: O princípio em questão é aquele, muito fundamental, da importância do inconsciente na vida consciente. Quando compreendemos essa dife­ rença fundamental em perspectiva, entendemos por que alguns analis­ tas vêem tão pouco no material de seus pacientes, interpretam tão pou­ co e nem mesmo reconhecem uma situação transferenciai até o próprio paciente expressar algo dela em referência consciente e direta ao analis­ ta. (Riviere, 1952, p. 17) Klein enfatizou como o paciente se afastará do analista com seus impulsos e fantasias agressivos e negativos e os voltará na direção de outras figuras, que aparecerão no relato (ou brincar) do paciente como extrínsecas: R.D.Hínshelwood / 31

(...) o paciente e obrigado a lidar com conflitos e ansiedades reexperienciados em relação ao analista através dos mesmos métodos que utilizou no passado, ou seja, ele se afasta do analista como tentou afastar-se de seus objetos originários; tenta cindir as relações com ele, manten­ do-o seja como figura boa, seja como figura má; desvia alguns dos sen­ timentos e ansiedades experienciados em relação ao analista para outras pessoas de sua vida atual, e isto faz parte da "atuação" [acting out] (Klein, 1952, p. 55-6). Isto repete a atividade primária de cisão do ego infantil [ver CISÃO]. Des­ sa maneira, todas as figuras que aparecem no brincar ou nas associações livres devem ser consideradas como aspectos do analista que foram cindi­ dos [spiit off] e projetados [ver PROJEÇÃO]; trata-se de uma cisão desti­ nada a regular o relacionamento com o analista em níveis controláveis de ansiedade. É esta a importância da situação total (Joseph, 1985). (5) Objetos parciais na transferência. Muitos aspectos da transferência podem ser perdidos, a menos que a totalidade do material que é produzido pos­ sa ser interpretada como uma luz importante que é lançada sobre a transfe­ rência, especialmente sobre os elementos inconscientes: "(...) não nos con­ duz suficientemente longe entendermos que o analista representa o pai ou a mãe reais, a menos que compreendamos qual aspecto dos pais foi revivi­ do (Klein, 1952, p. 54). Nos níveis mais profundos da mente, o bebê ex­ perimenta funções maternas separadas — alimentação, limpeza, ser segura­ do, etc. — como se fossem desempenhadas por objetos separados [ver OB­ JETOS PARCIAIS]; em particular, os aspectos bons da mãe (que alimen­ ta, por exemplo) e seus aspectos maus (mantém o bebê esperando, em esta­ do de desespero, por seu alimento, por exemplo) são atribuídos a objetos separados. A função que a mãe está ou não desempenhando num determi­ nado momento é esclarecida na transferência. O analista "(...) está não apenas representando pessoas reais no presente e passado do paciente, mas também os objetos que o paciente internalizou a partir dos primeiros dias" (Klein, 1943). O genitor internalizado passou por uma distorção na mente do paciente através da "(...) projeção e idealização, e amiúde rete­ ve muito de sua natureza fantasiosa". (Klein, 1952, p. 54). Foi devido a esta técnica, de tomar toda associação na seqüência de pen­ samento de um paciente como se referindo inconscientemente ao analista, que os kleinianos alcançaram sua penetração com os esquizofrênicos. Freud considerara-os inanalisáveis, razão pela qual tentou analisar Schreber a pariir de seu livro de memórias (Freud, 1911). Ele defendeu essa visão por não se achar em posição de compreender a idéia dos aspectos excindidos da transfèrencia. Não apreendeu reaímente o fenômeno da cisão senão muito mais tarde, e a importância deste para a compreensão dos esquizo­ frênicos não foi desenvolvida por Klein até 1946 [ver PSICOSE]. 32 / Dicionário do Pensamento Kieiníano

(6) O bebê no paciente. Estas idéias tornaram-se mais acentuadas quando Bion (1959, 1962) distinguiu entre identificação projetiva normal e anor­ mal [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; CONTER] e demonstrou que o acting out na transferência relacionava-se à contenção dos medos in­ fantis e à dependência. Em sua forma normal, a identificação projetiva tem uma função comunicativa em nível não simbólico. Esta visão do drama transferenciai encenado entre mãe e bebe atraiu a atenção, em anos recen­ tes, para a contratransferência [ver adiante e CONTRATRANSFERENq a ], Através da compreensão e do conter maternos, o bebê e o paciente podem acumular experiências de serem compreendidos, e isto, como Segai diz, "(.,,) é um começo de estabilidade mental" (1975, p. 135). O modelo do continente materno da ação terapêutica torna uma prioridade a compre­ ensão do bebê nos pacientes adultos [ver CRIANÇA]. EFEITOS TERAPÊUTICOS. Klein justificou seu método pelos efeitos notá­ veis que tinha sobre a redução da ansiedade: a dissolução das inibições para brincar, a redução da ansiedade imediata e a mudança para uma rela­ ção mais positiva com o analista: Vi repetidas vezes quão rapidamente as interpretações faziam efeito (...) embora existam numerosas e inequívocas indicações desse efeito: o de­ senvolvimento do brincar, a consolidação da transferencia, a diminui ção da ansiedade, etc., apesar disso, por tempo bastante longo, a crian­ ça não elabora conscientemente as interpretações (...) Minha impressão é de que a interpretação, a princípio, só é assimilada inconscientemen­ te. Apenas mais tarde é que a sua relação com a realidade penetra gra­ dualmente a compreensão da criança (...) a primeira coisa que aconte­ ce na análise é que a relação emocional com os pais melhora; a compre­ ensão consciente só chega quando isto se deu. (Klein, 1926, p. 137) Ela notou que as reações do paciente eram mais importantes que suas res­ postas conscientes. O significado inconsciente da associação que surge ime­ diatamente após uma interpretação é mais importante do que qualquer concordância ou discussão consciente. Klein veio gradualmente a formular os efeitos terapêuticos: (i) o desenvolvimento da percepção [awareness] que o sujeito tem de sua realidade psíquica, e (n) o equilíbrio das correntes de amor e ódio que nele circulam. Ela expressou isto em termos das primeiríssimas ansiedades de que o sujei­ to padece: "(..) minha abordagem ao problema de terminar analises de crianças e de adultos pode ser definida do seguinte modo: a ansiedade persecutória e depressiva deve ser suficientemente reduzida, e assim em minha concepção — pressupõe a análise das primeiras experiencias de lu­ to" (Klein, 1950, p. 45). Nos termos de suas teorias posteriores das posiR.D.Hinshelwood / 33

ções depressiva e esquizoparanóide, isto significava o estabelecimento de um objeto bom interno mais seguro. A interpretação mutativa: Strachey (1934) teve muita influência no desen­ volvimento da teoria de que o efeito terapêutico provém da internalização satisfatória de um objeto bom. Através da cisão, o analista pode ser uma ou outra de duas figuras arcaicas — uma figura excepcionalmente boa ou uma figura fantasiosamente má. A introjeção do analista em qualquer des­ tas formas não resultaria em benefício terapêutico, mas realçaria a cisão dos objetos internos nessas formas excepcional e irrealisticamente boas ou más. Hle elaborou uma teoria de interpretação imediata do aqui-e-agora que retirava o analista dessas distorções transferenciais e capacitava o pacien­ te a introjetar uma imagem mais reaíística — uma mistura de bom e mau. Dessa maneira, o analista, através da interpretação, se torna uma influên­ cia moderada que pode melhorar a situação interna e mediar entre os obje­ tos internos arcaicos e irrealísticos através da formação da base de um no­ vo objeto interno, menos arcaico e mais realista. Essas interpretações são mutativas. A teoria dele, com efeito, é uma teoria de como o objeto externo pode vir a modificar a dureza primaria do superego — e Strachey refere-se ao analista, em verdade, como “superego auxiliar". Ela é um modelo estrutu­ ral de mudança intrapsiquica, em oposição a um modelo econômico [ver MODELO ECONÔMICO]. O pensamento de Strachey engastava-se profundamente no arcabouço kleiniano de idéias e mostrava quão extensamente Klein influenciara os analistas da Sociedade Britânica de Psicanálise. Com efeito, o trabalho de­ le é uma contribuição notável no sentido da sistematização da teoria kleiniana, comparável, em certos aspectos, a teoria de Klein da posição depres­ siva, sobre a qual ela refletia nessa mesma época. É também considerada como importante pedra angular para a compreensão da ação terapêutica da psicanálise (Rosenfeld, 1972; Etchegoyen, 1983). Contratransferência: A ênfase na transferência adquiriu impulso com o correr dos anos e foi suplementada e realçada por uma crescente compreen­ são da transferência. Joseph (1985), na descrição que dá da situação trans­ ferenciai total, trouxe à tona a importância das reações do analista ao pa­ ciente, chegando a descrever em seu trabalho as reações que os membros de um seminário de pós-graduação tiveram com um paciente que lhes era relatado! Klein não acompanhou esta ênfase dada à contratransferência, mas a teoria desta repousa nas descrições que ela fez da posição esquizoparanói­ de, e da identificação projetiva em particular. O analista que se acha em contato com o paciente recebera, na maioria dos casos, a projeção das pró­ prias experiencias do paciente em si mesmo e, então, experienclará quer os sentimentos projetados do paciente em si próprio, quer os resultados 34 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

de sua posição de defesa contra tais sentimentos. Por exemplo, se o pacien­ te projeta culpa, o analista pode sentir culpa, responsabilidade, inadequa­ ção ou, por causa de sua posição de defesa, pode sentir-se autojustificante ou querer protestar [ver CONTRATRANSFERÊNCIA]. O analista acha-se em posição de ter um conhecimento "de primeira mão" a respeito das experiências de seu paciente, embora esse seja um co­ nhecimento que pode ser facilmente encoberto por suas próprias distor­ ções defensivas: No decorrer dos últimos cinqüenta anos, os psicanalistas mudaram a visão que tinham de seu próprio método. É hoje largamente sustenta­ do que, ao invés de serem a respeito da dinâmica intrapsíquica do pacien­ te, as interpretações devem ser a respeito da interação de paciente e ana­ lista em nível intrapsíquico. (0'Shaughnessy, 1983, p. 281) [ver CONTRATRANSFERÊNCIA ]. A situação analítica de transferência e contratransferência é uma interação de processos intrapsíquicos separados, através da introjeção e da projeção. O analista, neste sentido, tem a função de aceitar as próprias experiências do paciente, sendo, assim, mais um ego auxiliar (contrastando com a opi­ nião de Strachey, acima mencionada, em que este descreveu o objeto re­ centemente internalizado, o analista interno, como superego auxiliar). Es­ te ponto de vista começou com Heimann (1950): "Minha tese é que a res­ posta emocional do analista a seu paciente, dentro da situação analítica, representa um dos instrumentos mais importantes para o trabalho (...) um instrumento de pesquisa do inconsciente do paciente" (p. 81). Ela argu­ mentou contra o analista que acredita que deva permanecer petreamente inabaíado por seu paciente. A mente do analista constitui elemento do meio ambiente do paciente, talvez o elemento mais importante: A compreensão que [o analista] tenha das raízes da ansiedade sera rudi­ mentar de início, mas a percepção da ansiedade per se não precisa ser rudimentar. É mediante a disposição de entrar em contato com as ansie­ dades do paciente, de não ser esmagado por elas, de trabalhar com elas, que o analista forja um relacionamento terapêutico operante. (Jaques, 1982, p. 503) A mente do paciente busca uma função continente no analista, o qual, ten­ do experiências e elaborando-as em sua própria mente, é o aspecto impor­ tante da "situação total". Dessa maneira, a mente do analista, suas capaci­ dades e falibilidades, torna-se na análise o decisivo objeto continente que, se reintrojetado pelo paciente em sua própria mente, forma um objeto in­ terno que funciona como base da estabilidade mental [ver CONTER]. Uma interpretação é mutativa na medida em que, psiquicamente, o analís-

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ta trabalha para conter a si próprio como distinto da representação do pa­ pel de uma ou outra figura arcaica (Elmhirst, 1978). Contratransferência normal e anormal: Money-Kyrle (1956) e Bion (1959) formularam o quadro mais claro do conter projetivo e introjetivo das expe­ riências do paciente. Money-Kyrle (1956) elaborou a teoria de Strachey. Enquanto que este olhou para o problema da introjeção, pelo paciente, de seu analista, e descreveu a maneira pela qual as projeções do paciente atribuíam aspebtos primitivos do objeto ao analista, Money-Kyrle descre­ veu a situação desde dois pontos de vista intrapsíquicos: o do paciente e o do analista. Se o paciente projeta sobre o analista e depois reintrojeta o analista distorcido pela projeção, existe também a situação do analista que introjeta a projeção do paciente e o que faz com ela dentro de si, antes de devolvê-la ao paciente, para reintrojeção. Neste processo normal, o ana­ lista aceita em si aquilo que o paciente diz e, sob forma de uma interpreta­ ção, ele calmamente projeta uma versão modificada da comunicação do paciente [ver MEMÓRIA E DESEJO], A conversão da projeção do pacien­ te, embora resida dentro do analista, deve, em circunstâncias normais, achar-se alinhada com a opinião de Strachey, de que a interpretação não apresenta o analista como qualquer dos objetos arcaicos polarizados ("bom" ou "mau"). Money-Kyrle chama isto de contratransferência n orm al Contu­ do, as coisas não são tão diretas. Usos "anormais" do analista surgem a partir da deterioração do processo, com um crescente vigor das projeções para dentro do analista [ver CONTRATRANSFERÊNCIA; LIGAÇÃO]. Há situações em que o processo de introjeção oriundo do paciente cau­ sa problemas para a mente do analista, e então a projeção de volta para o paciente fica empacada. O analista pode sofrer de estados prolongados de aferramento a um paciente introjetado, pensando nele após a sessão de maneira preocupada, etc., ou, então, estados prolongados de projeção em que o seu proprio self infantil é atribuído de modo exagerado ao pacien­ te. Isto exige que o psicanalista se valha de trabalho interno para corrigir a situação. Ele tem, em verdade, de elaborar aquilo que, em si, é perturba­ do por aquilo que o paciente nele projeta [ver CONTRATRANSFERÊNCIA]. Precauções!: Klein, tal como Freud, objetava a este uso da contratrans­ ferência, porque ele poderia constituir uma licença para o analista pojetar defensivamente qualquer de seus sentimentos no paciente, parecendo assim culpar a este por colocar seus sentimentos em mim". E importante relem­ brar este equívoco (Finell, 1986). Os próprios sentimentos do analista são apenas um guia para a experiência do paciente. A dificuldade que o analis­ ta deve ter em distinguir o seu próprio investimento inconsciente no setting significa que ele precisa conferir os seus próprios sentimentos pela uti­ lização dos detalhes das associações do paciente para fazer sentido de sua própria experiência com o paciente.

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No mesmo filão, é possível ao analista fazer intervenções que soam co­ mo interpretações transferenciais, mas de maneira mecânica, e, relaciona todo o material que lhe é apresentado, de maneira vaga, à transferência, tal como "você agora sente isto a meu respeito" ou "vo­ cê está me fazendo isso,í ou repete as palavras do paciente como se fos­ se um papagaio e relaciona-as a sessão. Acho que este tipo estereotipa-^ do de interpretação, que se imagina ser uma interpretação aqui-e-agora, transforma a valiosa contribuição que Strachey fez da interpretação mutativa em algo absurdo. (Rosenfeld, 1972, p. 457). O paciente experiencia esta forma mecânica de interpretar como sendo o analista defendendo-se contra o paciente e as ansiedades que ele, paciente, está projetando. Técnica kteiniana contem porânea: A técnica kleiniana, hoje, enfatiza (i) a situação imediata aqui-e-agora, (ii) a totalidade de todos os aspectos do setting, (iii) a importância de entender o conteúdo da ansiedade, (iv) a conseqüência de interpretar a ansiedade, em vez de apenas as defesas (a cha­ mada interpretação profunda). Estes princípios fundamentais provêm da análise de crianças e foram reforçados pela analise de esquizofrênicos, nas décadas de 1940 e 1950. Nessa época, a percepcção da importância da ci­ são e da identificação projetiva teve uma influência teórica importante so­ bre a prática, realçando o uso amplo e franco de palavras que denotavam objetos parciais (mencionados como seio, pênis, mamilo, etc.) uma mudan­ ça nas últimas duas décadas, baseada na compreensão da identificação pro­ jetiva e do acting out na transferência [ver ATUAÇÃO DENTRO DA SES­ SÃO; MUDANÇA PSÍQUICA], enfocou em vez disso aqueles processos no setting analítico que servem de defesa contra a experiência que o pacien­ te tem de dependência e inveja no aqui-e-agora (Spillius, 1983)*. Graduaímente, ainda que de modo bastante desigual, quatro tendências de mudança emergem (...) nas décadas de 60 e 70: (1) A destrutividade começou a ser interpretada de maneira mais equilibrada. (2) O uso imediato da linguagem de objeto parcial tendeu a ser substituído por uma abordagem mais passo-a-passo das expressões corporais da fanta­ sia inconsciente, (3) O conceito de identificação projetiva começou a ser usado de modo mais direto na análise da transferência. (4) A partir da terceira tendência, aumentou-se a enfase sobre o acting out na trans­ ferência e a pressão aplicada ao analista no sentido de juntar-se a ele. (Spillius, 1983, p. 325). Técnica clássica e técnica kleiniana: O interesse de Klein pela ansiedade levou-a a fazer interpretações que descreviam a situação inicial de ansieda­ de [ver 8. SITUAÇÕES DE ANSIEDADE] e que, portanto, eram profun­ das no sentido de tentarem alcançar a ansiedade subjacente às defesas. R.D.Hinshekoood / 37

Em contraste, a técnica clássica, tal como desenvolvida em Viena, era in­ teiramente diferente. Aqui, a técnica era identificar os impulsos (tal como emergiam no pré-consciente) como derivados das pulsões no inconsciente, identificar para o paciente o impulso imediato — quase à superfície —, que está lutando para aparecer, e interpretar a defensividade final que re­ siste a sua infiltração na consciência. Dessa maneira os analistas clássicos, ao descreverem o derivado mais superficial das pulsões, que ainda não é inteiramente consciente, acreditavam manter uma cooperação baseada em uma transferência positiva (posteriormente denominada aliança de tra­ tamento, Zetzel, 1956) e impedir que uma transferência negativa prejudi­ cial fosse despertada mediante o desafio das defesas além de um certo ní­ vel mínimo, que podia ser controlado (ver Fenicheí, 1941). O método clás­ sico de interpretar a partir da superfície e apenas mover-se cautelosamen­ te, de modo sistemático e mais fundo através das camadas da mente, ba­ seia-se na abordagem "fisiolófica" de Freud da energia mental [ver LIBIDO; MODELO ECONÔMICO], Para um resumo claro da divergência en­ tre as duas técnicas, ver Payne (1946). O DEBATE COM ANNA FREUD. Em 1926, Anna Freud deu uma série de palestras em Viena sobre a sua experiência de análise de crianças. A essên­ cia de suas conferências foi uma crítica do trabalho de Klein e sua técnica através do brincar (Anna Freud, 1927). Embora essas críticas fossem mais tarde um tanto mitigadas, elas constituem a base do abismo profundo exis­ tente entre a técnica, tal como descrita neste verbete, e a técnica clássica que veio a ser adotada pela escola de psicanálise conhecida como psicolo­ gia do ego [ver PSICOLOGIA DO EGO]. Em 1927, o ano seguinte as palestras de Anna Freud, houve um simpó­ sio no 10? Congresso de Psicanálise, em Innsbruck, no qual Anna Freud forneceu um breve resumo de suas conferências e Klein (1927) contestou plenamente as críticas da primeira. Críticas iniciais de Anna Freud. Anna Freud efetuou um certo número de crí­ ticas específicas, formuladas em linguagem intransigente. Transmitiam elas a opinião de que Klein encontrava-se seriamente em erro na sustentação teórica de sua abordagem. Essas críticas podem ser consideradas sob diver­ sos subtítulos: (i) a fase preparatória; (ii) a situação analítica modificada; (iti) a transferência de crianças e (iv) o brincar e associação livre. (a) A fase preparatória: Anna Freud começou apontando que a criança não chega à análise por sua própria vontade, mas sim por causa de outros família, escola —, que sofrem com os sintomas dela. A criança come­ ça sem entendimento de para que serve a analise e o analista tem de engajar-lhe o interesse, mostrando como, de uma forma ou de outra, ele pode ser útil ao pequeno paciente como um aliado. Ela advogava uma "fase pre­ paratória , destinada a vincular a criança ao analista em um apego emocio38 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

nal de tipo afetuoso, isto ia contra a visão sustentada por Klein da impor­ tância de aderir firmemente à principal estratégia psicanalítica da interpreta­ ção do inconsciente. (b) A situação analítica m odificada: Anna Freud achava que o analista não pode mais apresentar-se como figura indistinta ao paciente infantil, mas sim ser uma personalidade por seu próprio direito, se quiser que a criança desenvolva um vínculo afetuoso: "Em concordância com isso, o analista combina em sua própria pessoa duas funções difíceis e diametral­ mente opostas: ele tem de analisar e educar" (Anna Freud, 1927, p. 49). De vez que era prática comum na época o analista apresentar-se como uma tela branca, a fim de não interferir com o desenvolvimento da transfe­ rência do paciente, parecia que uma transferência propriamente dita não podería desenvolver-se em uma análise de crianças e, assim, uma técnica analítica clássica de interpretar as resistências transferenciais não podería avançar. (c) A transferência nas crianças: De acordo com a teoria da transferencia na época, a criança ainda se achava sob os cuidados de seus objetos primá­ rios (pai ou mãe) e como ainda tinha exatamente esses objetos, os primá­ rios, ele ou ela não transferiríam afetos e impulsos a partir desses relacio­ namentos para formar uma "nova edição" com o analista. Desenvolver uma transferência acarretaria afastar a criança de casa para uma escola re­ sidencial de algum tipo. Em verdade, medida dessa ordem é adotada, por exemplo, pela Escola Ortogênica, em Chicago, estabelecida por Bettelheim para crianças gravemente autistas (Bettelheim, 1975; Sanders, 1985). (d) O brincar e associação livre: Anna Freud criticou particularmente a vi­ são de Klein de que o brincar da criança é equivalente à associação livre do adulto. A criança não brinca para esse fim e, portanto, ela considera­ va o método de interpretar de Klein como selvagem, por lhe faltarem asso­ ciações que pudessem confirmar os significados do brincar. Em 1937, Waelder ainda se mostrava crítico da técnica de Klein e acreditava que seus achados resultavam de uma técnica defeituosa, critica repetida, mais recen­ temente, por Greenson (1974). As refutações de Klein. Klein (1927) argumentou exaustivamente contra to­ das essas críticas. Havia um certo grau de impaciência e sarcasmo na ma­ neira pela qual apresentou as suas provas contra Anna Freud: Minha experiência confirmou minha crença de que, se construo a anti­ patia imediatamente como ansiedade e sentimento de transferencia nega­ tiva, e interpreto como tal em conexão com o material que a criança ao mesmo tempo produz, e então a remonto a seu objeto original, a mãe, posso imediatamente observar que a ansiedade diminui. Isto se manifesta pelo começo de uma transferencia mais positiva e, como ela, R.D.Hinshelwood / 39

de um brincar mais vigoroso (...) Pela resolução de alguma parte da transferência negativa, obteremos então, tal como acontece com os adul­ tos, um aumento da transferência positiva, e isto, em concordância com a ambivalência da infância, logo, por sua vez, será sucedido pelo reemergir da negativa. (Klein, 1927, p. 145-6) Ela impiedosamente demonstrou a maneira inconsistente que Apna Freud tinha de lidar com a transferência negativa. Até onde posso entender do livro dela [Anna Freud] (...) ela tenta por todos os meios ocasionar uma transferência positiva, a fim de atender à condição, que considera necessária para seu trabalho, de criar um ape­ go na criança à personalidade dela (...) [Mas] nós temos outra excelen­ te e bem-testada arma, a qual empregamos de maneira análoga à que utilizamos nas análises de adultos (...) Quero dizer que nós interpreta­ mos. (Klein, 1927, p. 145-6). Klein alegou que o método de Anna Freud era não-analítico, e prosseguiu fazendo a acusação suprema que se pode fazer contra outro analista: "Os exemplos que Anna Freud da demonstram, em verdade, uma ausência de análise do complexo de Édipo" (Klein, 1927, p. 141). Sendo o complexo de Edipo o cerne da teoria e prática psicanalísticas, Klein estava alegando que a técnica de Anna Freud não podia ser classificada como psicanálise. Foi levada a esta violenta réplica por haver Anna Freud reivindicado ser mais ortodoxa em sua abordagem teórica. Em resumo, as opiniões de Klein a respeito da abordagem de Anna Freud podem ser sumarizadas sob os mesmos subtítulos: (a) A fase preparatória: Klein defendia que as crianças não precisam ser induzidas ou persuadidas, mas que imediatamente compreenderão (incons­ cientemente) os benefícios da análise desde a primeira interpretação. Argu­ mentou que o sentimento inconsciente que o paciente tem de ser entendi­ do torna-se a sua motivação. (b) A situação analítica m odificada: Klein (1927) utilizou exemplos clíni­ cos pormenorizados, numa tentativa de demonstrar que o setting não tem que ser diferente de outro baseado na interpretação do inconsciente. A in­ terpretação da transferência negativa (sentimentos hostis), enquanto estão sendo demonstrados, tinha resultados espantosos, que capacitavam a crian­ ça a voltar-se imediatamente para o analista. Aferrou-se ela à sua reivindi­ cação de não haver necessidade de mudar a situação analítica, de uma interpretativa para outra que incluísse o ensino ou a tentativa de obter do paciente uma atitude positiva. (c) A transferência nas crianças: Klein também produziu exemplos clínicos em que o analista ou os brinquedos são especiaímente vinculados com os pais e os representam. A evidência de que objetos primários [ver OBJE40 / Dicionário âo Pensamento Kleiniano

TOS PARCIAIS] são representados todo o tempo desta maneira, levou-a a acabar por reconhecê-los como objetos internos, constantemente externalizados em objetos externos, inclusive os genitores reais. Na prática, qual­ quer que fosse a teoria, a resolução de conflitos na transferência analítica resultou em um relacionamento melhor com os pais. Não existe, como Anna Freud supôs, um conflito entre a análise e o lar. Klein concordou que o analista que se dispõe a estabelecer um relacionamento particular com a criança não pode formar uma transferência. Ela e outros analistas ingleses comentaram ironicamente existir algo de autocontraditório entre o desvio de Anna Freud quanto à técnica clássica e sua queixa de não po­ der usar interpretações transferenciais, (d) O brincar e associação íro/e:Klein negou fazer interpretações selvagens do significado dos símbolos no brincar e alegou que sempre obtivera pro­ vas do vínculo existente entre a figura no brinquedo e o objeto primário antes de interpretar, ainda que em seus trabalhos ela com freqüencia não forneça os vínculos reais que surgem nas sessões. A natureza altamente crítica destas trocas de pontos de vista tendeu a polarizar as opiniões em torno de cada um deles, entrincheirando cada um dos lados em suas próprias opiniões. A técnica posterior de Anna Freud. As conferências de 1926 de Anna Freud só foram publicadas na Grã-Bretanha em 1946, fato que conduziu a um certo amargor e à suspeita de que os ingleses estivessem boicotando os vienenses. Na época em que foram publicadas, porém, a técnica de Anna Freud já havia mudado um pouco — e na direção da de Klein. Aquela fez um comentário nesse sentido no prefácio à edição inglesa de seu livro, e Klein, de modo bastante triunfante, comentou isso em uma edição poste­ rior (1948) de seu próprio artigo de 1927. Geleerd (1963) também confir­ mou que a "fase preparatória" não era mais exigida e que grande parte do papel educativo não era necessária. Reconheceu ela que muitas das (...) críticas a Anna Freud [por Klein] são hoje válidas: ex., a prepara­ ção manipulativa da criança para a análise de crianças, como proposta então por Anna Freud, está superada. Uma análise sistemática das defe­ sas e afetos assumiu o seu lugar. (Geleerd, 1963, p. 496) Níveis e profundidade. Apesar disso, Gelleerd mostrou-se profundamente crí­ tica do método de Klein de interpretação, no qual os variados níveis eram constantemente tornados confusos ou escolhidos aparentemente ao acaso, de vez que, na técnica clássica, o nível do impulso ativo oral, anal ou genital — deve ser discernido com exatidão [ver LIBIDO]. Embora o trabalho inicial de Klein se destinasse a tornar claro, com ba­ se em amplas provas clínicas, que as fases da íibido (nível oral, anal ou genital) não são, em realidade, nítidas, a preocupação a respeito do nível R.D.Hinshehvood / 41

da interpretação permaneceu constante (ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. Greenson (1974) mostrou-se muito crítico da alegação feita pelos kíeinianos (por exemplo, Rosenfeld, 1965) de que os esquizofrênicos podiam ser analisados sem mudança na técnica clássica, quando, aparentemente, a téc­ nica kleiniana havia abandonado por inteiro essa técnica. Isto se reflete também nos trabalhos repetidamente críticos de Kernberg (1969, 1980, por exemplo), que foram fulminantes também a respeito de interpretações que são consideradas profundas, por haver perigo de que o paciente as experi­ mente como intrusiva. Não é de surpreender, reivindicam eles, que os kleinianos encontrem com tanta freqüência ansiedade persecutória em seus pa­ cientes: suas interpretações a provocam. Em resposta, Rosenfeld (1987) ten­ tou distinguir, no material clinico, entre aquelas ocasiões em que o pacien­ te é ferido por uma interpretação incorreta e as reações paranóides que derivam de outras fontes. Enfatizou ele também o importante alívio quan­ to a sentimentos paranóides que as interpretações "profundas" corretas po­ dem fornecer. A natureza do brincar. Por haver Anna Freud sido crítica do pressuposto kleiniano da equivalência entre o brincar e a associação livre, Klein começou a ter um interesse de longa duração pela natureza da simbolização. Cons­ tantemente retornou à importância da externalização como simbolizadora do conteúdo das fantasias ansiosas e como forma de voltar-se para novos objetos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Em contraste, os analistas vienenses, que apoiavam Anna Freud, encaravam o brincar como uma ativi­ dade mais inocente, embora Waeíder (1933), seguindo Freud (1920), consi­ derasse o brincar uma repetição, na qual uma situação ou incidente peno­ so é constantemente re-representado, para fins de chegar-se a um acordo com o trauma; a situação de ansiedade é controlada invertendo-se os pa­ péis, de maneira a que o sujeito não seja mais passivo, mas tenha o papel ativo. Anna Freud (1936), mais tarde, adotou a expressão "identificação com o agressor" [ver também 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA] para designar esse processo. Dessa maneira, brincar é mudar o final para um desfecho agradável, ao invés de penoso. A diferença decisiva era que, pa­ ra Klein, a externalização da fantasia é uma manobra defensiva, enquan­ to que, na psicanálise clássica, a fantasia é utilizada para elaborar o trau­ ma [ver DEFESA PSICOLÓGICA]. CONCLUSÕES. Por temperamento, Klein escorava suas opiniões, quando se sentia atacada, valendo-se de suas observações na situação clínica, ao invés de engajar-se na elucidação teórica. Tinha nisto a ajuda de ser, por natureza, uma observadora clínica muito astuta e da boa sorte de ter ido ao encontro de uma técnica poderosa para o trabalho com crianças. Sua técnica foi um bem valioso na sustentação de suas concepções, mas repre­ sentou também um ônus quando ela ingressou em um campo de trabalho 42 / Dicionário áo Pensamento Kteiniano

completamente novo quando ainda tinha pouca experiência. Inevitavelmen­ te, isto fez com que ela fosse contra as concepções de seus colegas mais velhos. Klein nunca intimidou-se de ter uma opinião própria, e isto condu­ ziu a muitas afrontas, amargor e sofrimento em sua carreira profissional, para si mesma e para aqueles que com ela trabalhavam como colegas (Grosskurth, 1986). Há uma diferença marcante entre os textos de Anna Freud e os de Melanie Klein. A primeira abordou o seu trabalho com crianças com base na teoria do desenvolvimento infantil existente na ocasião, en­ quanto que Klein, de modo mais simples, observou as situações clínicas e o efeito de suas interpretações. O poder da técnica original de Klein para a psicanálise de crianças deu ímpeto a todos os desenvolvimentos posteriores de sua teoria e à sua técni­ ca de psicanálise de adultos. Os textos kleinianos continuam a refletir a ênfase clínica; muito poucos trabalhos são publicados sem relatórios deta­ lhados de casos que substanciem seu argumento.

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2

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FANTASIA INCONSCIENTE DEFINIÇÃO. As fantasias inconscientes estão subjacentes a todo processo men­ tal e acompanham toda atividade mental. Elas são a representação mental daqueles eventos somáticos no corpo que abrangem as pulsões, e são sen­ sações físicas interpretadas como relacionamentos com objetos que causam essas sensações. Irrompendo a partir de sua instigação biológica, as fanta­ sias inconscientes são lentamente transformadas por duas maneiras: (i) pe­ la mudança através do desenvolvimento dos órgãos para a percepção à distância da realidade externa, e (ii) pelo surgimento no mundo simbólico da cultura, a partir do mundo primário do corpo. As fantasias podem ser elaboradas para alívio dos estados internos da mente, quer pela manipula­ ção do corpo e suas sensações (fantasias masturbatórias), quer pelo fanta­ siar direto. A fantasia é a expressão mental das noções pulsionais e tam­ bém dos mecanismos de defesa contra essas noções pulsionais. CRONOLOGIA

1920 Fantasia consciente e curiosidade sexual (Klein, Melanie, 1920, "The development of a chiíd"). 1921 Fantasias pre-genitais (Klein, Melanie, 1923, "The role of the school in the libidinal development of the child"). 1925 Fantasias de masturbação (Klein, Melanie, 1925, "A contribution to the psychogenesis of tics"). 1948 Pulsão e fantasia (Isaacs, Susan, 1948, "The nature and function of phahtasy").

A

idéia da fantasia como atividade inconsciente esteve presente, para Klein, desde o início de seu trabalho. Ao interessar-se pelo conteúdo da ansiedade, ela inevitavelmente trouxe as fantasias presentes no brincar para o primeiro plano. A importância da fantasia no pensamento de Klein foi reforçada por dois fatores: (1) A extraordinária inclinação das crianças a produzirem fantasias no seu brincar, e, especialmente, sua elaboração preocupada de teorias sexuais a 46 / Dicionário do Pensamento Klemiano

respeito dos relacionamentos entre os seus próprios órgãos e seus pais [ver 3. AGRESSÃO]. Klein ficou impressionada por esta forma de pensar nar­ rativo com objetos e desafiou a teoria do narcisismo primário. Ferenczi (1921) havia descoberto no sintoma psicológico do tique nervoso uma pro­ va clínica do narcisismo primário. A atividade motora no tique era simples­ mente uma descarga de energia psíquica. Em contraste, Klein (1925) dispôs-se a demonstrar que, mesmo com este protótipo de impulso sem obje­ to, existiam fantasias subjacentes na parte inconsciente das mentes das crian­ ças [ver NARCISISMO]. (2) Os notáveis efeitos que a interpretação tinha sobre a produção de fan­ tasias [ver 1. TÉCNICA]. Klein ficou assombrada com a escala de produ­ ção de fantasias após a liberação da inibição, mas foi suficientemente astu­ ta para dar-se conta de que uma liberação da fantasia e o relaxamento pa­ ra uma atitude mais positiva em relação ao analista eram indicadores tera­ pêuticos decisivos e denotavam um sinal importante de uma mente a fun­ cionar de modo sadio. Esta importância clínica básica da fantasia incons­ ciente permaneceu intocada através de todo o pensamento kleiniano. Houve, contudo, diversas etapas na compreensão de sua importância teórica: (I) a atividade de fantasia nas fases pré-genitais e, em verdade, a partir do nascimento; (II) a fantasia como representação mental de pulsôes biológicas; (III) a fantasia inconsciente e as defesas; (IV) a distinção em re­ lação à teoria clássica freudiana da fantasia (fantasia e realidade), e (V) o papel da fantasia inconsciente no desenvolvimento. I ATIVIDADE ARCAICA DA FANTASIA. Em apoio ao artigo de Freud (1914) sobre o narcisismo, Abraham (1921) e Ferenczi (1921) descreveram casos psicanalíticos de tique nervoso em que nenhum objeto sexual se acha­ va ligado à descarga motora. O tique, portanto, constituía um simples subs­ titutivo para a masturbação. Os impulsos libidinais são simplesmente des­ carregados e satisfeitos. A idéia de uma fase de narcisismo primário ou auto-erotismo, em que não existe relacionamento com objetos como tais, foi confirmada. A coleção de produções fantasiosas trazidas à tona pela nova técnica através do brincar impressionou Klein pela forma que tinha de um pensar narrativo com objetivos, e ela desafiou a teoria do narcisismo primário. Demonstrou que mesmo com o tique nervoso, aparente protótipo de im­ pulso sem objeto, havia fantasias subjacentes na parte inconsciente das mentes das crianças (Klein, 1925). Descobriu ela que podia interpretar ati­ vidades de fantasia que eram simbolicamente representadas pelo tique: fan­ tasias de fazer algo a objetos ou de passivamente permitir que se fizesse algo ao sujeito. Aquelas fantasias acompanhadas pela ação involuntária do tique nervoso foram descritas como sendo fantasias de masturbação, ou masturbatórias [ver FANTASIAS DE MASTURBAÇÃO], e eram inconsR.D.Himhetwood / 47

cientes, ainda que a expressão "fantasia inconsciente" pareça ser quase uma contradição. Tais fantasias (distinguidas na literatura por serem grafa­ das com ph e não com f*) tornam-se evidentes através de derivados de um tipo ou de outro, tal como acontece com o próprio inconsciente. Ficam conhecidas por inferência com base na evidência clínica. Fantasias pré-genitais: Acrescendo-se a esta confiança, havia o fato de que as crianças que Klein analisava tinham fantasias orais e anais a respeito da relação sexual. Tais fantasias pré-genitais não se acham explicadas na teoria freudiana do narcisismo primário, em que não existem outros (obje­ tos) verdadeiros até chegar-se à fase genital. As fantasias que expressou im­ pulsos sádicos horríficos, oriundos de fontes pré-genitais, constituem pro­ va contra o narcisismo primário. II FULSÃO E FANTASIA INCONSCIENTE. ísaacs formulou o conceito de fantasia inconsciente de modo muito claro, em nome do Grupo Kleiníano, em 1943, em artigo destinado a cristalizar as controvérsias existentes entre as concepções de Klein e os psicanalistas clássicos, oriundos de Viena. Ela enunciou o cerne de seu trabalho como "fantasia é o conteúdo primário de processos mentais inconscientes" (ísaacs, 1948, p. 82). Trata-se de uma idéia de longo alcance: toda atividade mental se dá com base em relações fantasiadas com objetos, inclusive a atividade da percepção, fantasiada co­ mo sendo uma incorporação concreta por meio do aparelho perceptual, e os pensamentos como objetos [ver BION], A fantasia inconsciente, sendo a representação mental de noções pulsionais, é o fenômeno psicológico mais próximo da natureza biológica do ser humano. Fantasias primárias: As fantasias inatas, pulsionalmente derivadas, são pri­ mariamente inconscientes. Elas incluem o conhecimento do mamilo e da boca, que o recém-nascido inatamente concebe como sendo para sugar, ísaacs trata de uma objeção comum: Foi algumas vezes sugerido que fantasias inconscientes tal como a de "rasgar em pedacinhos" não surgiríam na mente da criança antes que ela tivesse conquistado o conhecimento consciente de que despedaçar N. do T.t Transcrevemos, para esclarecimento, o verbete FANTASY E PHANTASY, do Di­ cionário crítico de psicanálise, de Charles Rycroft {Rio de janeiro, Imago, 1975. p. 101). Pa­ ra considerações mais extensas a respeito da expressão, ver V ocabulário da Psicanálise", de Laplanche e Pontaüs (São Paulo, Martins Fontes, 1986. p. 228). FANTASY e PHANTASY. Segundo o O xford English dictionary, "no uso moderno, fantasy e phantasy, apesar de sua identidade de som e etimologia, tendem a ser compreendidas co­ mo palavras independentes, sendo o sentido predominante da primeira 'capricho, extravagân­ cia, invenção fantasioa', e o da segunda, 'imaginação, noção visionária"'. Como o conceito psicanalítico se aparenta mais à IMAGINAÇÃO do que ao capricho, os autores psicanalíticos ingleses invariavelmente utilizam phantasy e não fantasy, mas poucos autores am ericanos_ se é que algum — os acompanharam nesse proceder.

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uma pessoa significaria matá-la. Essa opinião não se aplica ao caso. Ela despreza o fato de que tal conhecimento é inerente aos impulsos corpo­ rais, como veículo da pulsão, ao alvo da pulsão, à excitação do órgão, qual seja, neste caso, a boca. (ísaacs, 1948, p. 93-4). (ver CONHECI­ MENTO INATO] Origens som áticas: O inconsciente é constituído por relacionamentos com objetos. Uma fantasia inconsciente é uma crença na atividade de objetos "internos" concretamente sentidos [ver 5. OBJETOS INTERNOS], Este é um conceito difícil de ser apreendido. Uma sensação somática reboca con­ sigo uma experiência mental que é interpretada como um relacionamento com um objeto que deseja causar essa sensação, sendo amado ou odiado pelo sujeito segundo o objeto for bem disposto ou tiver intenções más (is­ to é, uma sensação agradável ou desagradável). Dessa maneira, uma sensa­ ção desagradável é mentalmente representada como um ^relacionamento com um objeto "mau", que pretende ferir e danificar o sujeito. Por exem­ plo, um bebê que está com fome experienciará, digamos, sensações desa­ gradáveis de fome no estômago. Isto se representa mentalmente com o be­ bê sentindo um objeto malevolentemente motivado de modo concreto em sua barriga, o qual quer provocar-lhe aí o desconforto da fome, Quando dizemos, coloquialmente, que estamos sentindo ferroadas de fome no estô­ mago, revertemos a esta forma de experienciar primitiva, animista e con­ creta, embora não suspendamos nosso conhecimento de que a fome é al­ go que tem a ver com nossa fisiologia. O bebê não possui este conhecimen­ to sofisticado, mas está absorvido em interpretações primitivas de sua rea­ lidade (ver REALIDADE INTERNA]. Inversamente, quando é alimentado, a experiência que o bebê tem é de um objeto que nós podemos identificar como mãe ou o leite desta, mas que o bebê identifica como um objeto em sua barriga benevolamente motivado e a causar sensações agradáveis. Após a alimentação, as sensações de plenitude contribuem para a fantasia beatífica de que um maravilhoso e benevolente objeto reside dentro de seu estômago. Reflexos e fantasias: Quando vemos que, nas primeiras instâncias da vida, pode-se fazer com que um bebê vire a cabeça e sugue, quando sua boche­ cha é tocada, podemos pensar nisso como sendo um dote biológico: pulsional e provavelmente um reflexo baseado nas primeiras ligações neuronais em seu pequeno sistema nervoso. Contudo, podemos formular a pergun­ ta de se ele também experiencia esse incidente como um incidente a envol­ ver a pele de sua face, os lábios e um objeto que entra em contato com eles. Se assim for, que tipo de experiência está o bebê tendo? Desta manei­ ra, o biológico e o psicológico são unidos em um único incidente, embo­ ra sejam conceptualmente distinguíveis. ísaacs descreve isto como sendo uma"(...) experiência única e indiferenciada de sugar e fantasiar". (ísaacs, 1948, p, 92n). R.D.Hinshelwood / 49

O crescendo de raiva e medo do bebê, à medida que sua fome permane­ ce insatisfeita, deriva, naturalmente, de reações pulsionais, mas ele o experiencia, à sua própria maneira, como sendo a ameaça crescente de um per­ seguidor cada vez mais hostil, que com sucesso ataca-lhe a barriga e tor­ na o sofrimento cada vez pior, Esta é uma situação temível, e os bebês pa­ recem ter capacidade de sentir medo e raiva desde o começo. É esta cren­ ça de haver, dentro de seu estômago, algo que está malevolentemente ten­ tando prejudicá-lo e destruí-lo que constitui o conteúdo da raiva. Essas fan­ tasias temíveis são o que mais se aproxima de uma manifestação direta da pulsão de morte, experiendada como desviada para um objeto [ver PULSÃO DE MORTE]. III FANTASIAS INCONSCIENTES E DEFESAS Fantasia elaborada: O bebê, desde o início, é assediado por essas situações em que teme ser ferido por algo situado diretamente dentro dele. Em resul­ tado disso, tentará tomar algumas medidas para evitar esse dano e essa si­ tuação. Não há muito o que possa fazer e, na maior parte das vezes, de­ pende da mãe para aliviar a situação, ao apresentar-se como o objeto "bom" igualmente fantástico [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. Entretanto, há certas fantasias que o bebê pode utilizar, fantasias que podem funcio­ nar como defesa, por assim dizer [ver DEFESA PSICOLÓGICA; 9. MECA­ NISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA]. Segai (1964) apontou que a fantasia é não apenas a representação mental de uma pulsão, mas pode também ser elaborada para representar ações defensivas contra a ansiedade [ver 8. SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE]. A fantasia inconsciente do bebê acha-se ligada a sensações corporais, mas, através destas e de sua manipulação, ele pode vir a estimular seu mundo de fantasia para situa­ ções mais toleráveis, A externaíização do objeto "mau" [ver PROJEÇÃO] e a intemalização do objeto "bom" (ver INTROJEÇÃO] são os mecanis­ mos prototípicos de defesa e relacionam-se a processos em que substâncias atravessam as fronteiras do ego. A expulsão dos excrementos, por exem­ plo, dá origem a sensações no ânus e na uretra que são interpretadas co­ mo objetos a passarem do mundo interno para o externo. Mais tarde, a fantasia vem a ficar menos vinculada às sensações corporais, à medida que, com a posição depressiva, o mundo interno vem a ser povoado mais por objetos simbólicos, antes que concretamente reais [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Contudo, remanescentes dos primitivos objetos concretos sobrevivem e são ocasionalmente experienciados como somatizações e con­ dições psicossomáticas. A ansiedade é ainda expressa, e até mesmo experienciada, como 'borboletas no estômago", e a tristeza, como "um nó na garganta". Surgiu uma disposição bastante complexa em que noções pulsionais pri­ márias e mecanismos de defesa são representados por fantasias semelhan­ tes no inconsciente [ver DEFESA PSICOLÓGICA; 9. MECANISMOS PRI­ MITIVOS DE DEFESA]. 50 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

IV. A FANTASIA INCONSCIENTE E A TEORIA FREUDIANA DA FANTA­ SIA. Freud anteriormente descrevera a realização alucinatória de desejos como sendo a atividade mental do bebê que é frustrado. Klein modificou isso e reivindicou ser ela um acompanhamento incessante da atividade da criança em todas as ocasiões. Assim, a teoria kleiniana da fantasia incons­ ciente ampliou radicalmente a de Freud — ou, como Glover (1945) amar­ gamente observou, a depôs. Freud sustentava que as fantasias constituíam gratificações substitutas, quando as noções pulsíonais não encontravam satisfação. Quando a frustração e a tensão crescem, a energia é descarrega­ da de volta no sentido da memória e do aparato perceptual, mais do que em descarga e ação muscular. Dessa maneira, a fantasia só entrava em jo­ go quando a gratificação era suspensa, visão muito mais restrita que a de Klein. Já a partir de um ponto muito inicial em seu trabalho, Klein descreve­ ra uma extraordinária vida de fantasia, que era, na realidade, um acompa­ nhamento do comportamento orientado para a realidade. Os elementos simbólicos do brincar e da encenação expressavam todos os tipos de rela­ ções existentes entre todos os tipos de objetos e pessoas: Para Fritz, quando estava escrevendo, as linhas significavam estradas, e as letras por elas rodavam em motocicletas, a caneta. Exemplifican­ do, "i" e "e" rodam juntas em uma motocicleta que é usualmente dirigi­ da por "i", e amam-se mutuamente com uma ternura inteiramente desco­ nhecida no mundo real. Por sempre rodarem juntas, tornam-se tão se­ melhantes que mal existe alguma diferença entre elas, pois o começo e o fim de ‘T e "e" são os mesmos; apenas no meio o "i" tem um peque­ no sinal e o "e", um buraquinho. (Klein, 1923, p. 64). Estas fantasias dos órgãos genitais masculinos e femininos reunidos no amor são simplesmente parte da experiência de estar na escola. Natural­ mente, fantasias especialmente temíveis na escola podem conduzir a um distúrbio da aprendizagem, por causa do medo. Em uma história clínica, Isaacs (1943b) acentuou: "(•••) quão intimamente a realidade externa e a interna acham-se entrelaçadas nos sintomas, ria história evolutiva e nas re­ ações analíticas" (p. 31). Em sua noção de fantasia inconsciente, Klein e seus seguidores reivindicaram respeitar o conceito de inconsciente de Freud, acrescentando-lhe algo e elaborando-o mais. As fantasias inconscientes, sendo onipresentes, são uma categoria com­ pletamente diferente de eventos. A distinção nas opiniões sobre fantasia é radical, e sobre ela cada analista tem de decidir. Por um lado, temos a vi­ são da psicanálise ortodoxa, de que existe quer realidade, quer fantasia; por outro, a opinião de que a fantasia inconsciente acompanha todas as experiências da realidade. Através de toda a obra de Klein, assim como na de seus colegas, fez-se a investigação da maneira pela qual a fantasia inconsciente interna penetra e dá significado aos "acontecimentos reais" do mundo externo, e, ao mesmo tempo, a maneira por que o mundo exter­ no traz significado sob a forma de fantasias inconscientes. R.D.Hinshelwood. / 51

A teoria freudiana da sedução: A teoria da sedução foi uma tentativa de colocar em forma fisiológica a anormalidade de uma neurose psicológica (Freud, 1896). Um trauma de infância fazia um trauma físico separar-se do circuito elétrico do cérebro, com a subseqüente criação dê tensões. A substituição, por Freud, desta teoria por outra em que o trauma resultava de um acontecimento imaginado (distorcido) introduziu a idéia de fanta­ sia inconsciente. É a fantasia que a criança faz de uma sedução que consti­ tui o trauma perturbador, não o acontecimento físico real em seu corpo. (A idéia que Freud tinha de alguma interferência física com os circuitos elé­ tricos do cérebro sobreviveu na psiquiatria geral sob a forma de tratamen­ tos elétricos e outros tratamentos físicos, ainda que a psicanálise a tenha hoje abandonado [Caper, 1988]). Fantasia ou realidade: A recente controvérsia instigada por Masson (1984) baseia-se na alegação de que Freud reaímente suprimiu sua teoria de uma sedução física que conduzia a um trauma neurológico. A implicação é de que o "acontecimento real" deveria ser resgatado do esquecimento. A natu­ reza alternativa (ou/ou) do problema (ou sedução real ou fantasia), que originaímente expressou o conflito entre fisiologia e psicologia, migrou pa­ ra um conflito entre a realidade externa e o mundo interno (em verdade, sociologia versus psicologia) [ver PROBLEMA MENTE-CORPO; SUBJETI­ VIDADE], com a idéia de uma sutil interpenetração dos mundos externo e interno. V. FANTASIA INCONSCIENTE E DESENVOLVIMENTO. Um outro proble­ ma a causar confusão é que certos mecanismos, especialmente a introjeção e a identificação, resultam em acréscimo de novas habilidades e atributos ao ego. Como todos os outros processos mentais, estas introjeções e iden­ tificações são também representadas por fantasias de incorporação e assi­ milação subjacentes a mecanismos de defesa e impulsos orais primitivos. As fantasias inconscientes a respeito da incorporação ou expulsão, portan­ to, têm influência sobre a experiência do que o sujeito contém e daquilo com que ele se identifica e a que se torna realmente semelhante. Neste sen­ tido, a fantasia é sentida como sendo realidade concreta e, em verdade, seus efeitos são bastante reais. A fantasia inconsciente, neste sentido, é onipotente [ver ONIPOTÊNCIA]. O problema filosófico de como uma entidade biológica pode transformar-se de um mundo de gratificações e necessidades corporais em um mun­ do de gratificações e significados simbólicos permanece sem solução [ver PROBLEMA MENTE-CORPO]. A posição-chave da fantasia inconsciente, situada sobre a linha fronteiriça entre a pulsão fisiológica e a representa­ ção psicológica, levou os kleinianos a buscar com confiança uma maior compreensão dos símbolos em seu trabalho clínico [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. As fantasias a respeito dos conteúdos corporais representam as sensações corpóreas primárias e reais. Subseqüentemente, o bebê emer52 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

ge no mundo social dos símbolos, no qual as fantasias são compostas de objetos não-corporais e imateriais [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. A passagem de uma experiência concretamente sentida de um objeto, construí­ do na fantasia inconsciente, para um objeto simbólico não-físico constitui um passo evolutivo de vulto; ele representa abandonar as formas idiossin­ cráticas e inatas de representação por meio da fantasia inconciente e inves­ tir esses significados em objetos socialmente oferecidos (símbolos). Esta passagem envolve outra mudança, qual seja, a da onipotência da fantasia para um reconhecimento do objeto como separado e diferente da coisa simbolizada (Segai, 1957) [ver EQUAÇÃO SIMBÓLICA], Susan Isaacs, com seus antecedentes acadêmicos e sua formidável capa­ cidade de debate intelectual, lidou com a natureza da fantasia inconscien­ te. Mostrou ela que se tratava da base para uma visão completamente no­ va da natureza da mente como uma pequena sociedade de relacionamen­ tos com objetos. Achando-se intimamente ligada à natureza biológica do homem, a fantasia inconsciente fornece uma ponte clinicamente operacio­ nal para o problema mente-corpo [ver PROBLEMA MENTE-CORPO]. OS DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS: 1934-44. Nenhum outro tópi­ co ocupou mais tempo e gerou mais fúria nos Debates sobre as Controvér­ sias da Sociedade Psícanalítica Britânica que o da "fantasia inconsciente" [ver DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS]. O primeiro conjunto de cinco debates deu-se em reação a um artigo da autoria de Susan Isaacs, "A natureza e a função da fantasia" (posteriormente publicado, em 1948). O artigo era um enunciado claro do conceito, pesadamente apoiado por cita­ ções de Freud e alguns interessantes comentários pescados em textos recen­ tes de Anna Freud, os quais, segundo se alegava, haviam-se deslocado no sentido da posição kíeiniana, após a controvérsia anterior (1926-1927) a respeito da análise de citações [ver 1. TÉCNICA; ANÁLISE DE CRIANÇAS]. Um certo número de temas surgiu da veemência emocional e eles serão resumidos sob sete títulos: (1) o método da inferência; (2) narcisismo pri­ mário; (3) sofisticação no primeiro ano de vida; (4) processo secundário; (5) confusão de termos; (6) conceitos e fantasias, e (7) regressão. (1) O método da inferência. Um dos argumentos utilizados contra Klein foi o de que não havia método de investigar ou conferir a existência de fanta­ sias no primeiro ano de vida, ou a partir do início da vida, como Klein sustentava (Waelder, 1937). Isaacs forneceu relatos detalhados da pesquisa psicológica atual a respeito do primeiro ano de vida, enfatizando especial­ mente o trabalho de Middlemore (1941). Demonstrava este, alegou ela, que sinais de ansiedade e aflição no recém-nascido eram mais variados e mais freqüentes do que sinais de prazer ou contentamento. Os últimos ocor­ riam apenas após a alimentação. Alegou ela que essas proporções muda­ vam após cerca de três a quatro meses, indicando uma mudança da fase R.D.Hinshelwood / 53

paranóide para a posição depressiva, à medida que o amor pelo objeto se torna mais mobilizado. As observações foram contestadas sob fundamen­ tos diversos: (i) que as proporções de momentos ansiosos versus momen­ tos de contentamento estavam incorretas, e que, de vez que a maior por­ ção de tempo nos primeiros meses é ocupada pela alimentação, as ocasiões de contentamento sobrepujavam as ansiosas; (ii) que observações diretas de estados de sentimento em bebês não podem ser corroboradas pela psica­ nálise, método aplicável apenas a crianças muito mais velhas. A réplica de ísaacs (desenvolvida plenamente na versão publicada de seu artigo, em 1948) foi de que todo conhecimento científico era inferencial e que a inferência fora um método suficientemente válido nas descrições que Freud fizera do desenvolvimento das crianças. Apelou ela no sentido de que as conclusões psicanalíticas podiam e precisavam ser testadas em cotejo com a observação direta dos bebês. Continuou a haver protunda dúvida a respeito do método pelo qual os kleinianos adquirem suas teorias, com a suspeita de que o método de interpretação profunda cria, por si, artifícios nas observações. (2) Narcisismo primário. De acordo com os analistas ortodoxos, os primeiros anos de vida são ocupados pela gratificação auto-erótica e narcísica, nas quais qualquer objeto é simplesmente um instrumento para a satisfação pulsional. Existe apenas "prazer sem significado". O amor objetai não apa­ rece até õ terceiro ao quinto ano, e somente então podem existir fantasias de relações com objetos: "A fantasia como corolário imaginário da pulsão assume o lugar do corolário sensório (prazer/sofrimento)" (A. Freud, 1943), opinião que decorre, de maneira ortodoxa, da opinião do próprio Freud de que as qualidades de sofrimento ou prazer eram tudo o que o be­ bê pode apreciar, e não existe capacidade de imaginar as fontes que pro­ porcionam sofrimento ou prazer. Barbara Lantos (1943), contestando as descrições feitas por ísaacs de suas provas de fantasia inconsciente no pri­ meiro ano de vida do bebê, disse: O fato de ele [o bebê] poder reconhecer pessoas, de estar ciente de suas idas e vindas, temeroso de sua perda e de reagir em conseqüência dis­ so, acha-se ligado, em nossa opinião, ao desenvolvimento do aparelho sensório e mental, sem sugerir a existência de fantasias. A disputa, aqui, parece girar em torno da distinção entre o mero registro perceptual e mnêmico de objetos, por um lado, e a capacidade de conce­ ber atividades desejadas com eles ou por eles. O tema torna-se então um debate sobre a época em que o bebê faz ligações entre essas imagens perce­ bidas e relembradas e o reconhecimento emocional delas como fontes ama­ das ou odiadas de prazer ou sofrimento. (3) Sofisticação no primeiro ano de vida. Houve muita disputa a respeito da idade em que uma função tão sofisticada quanto a fantasia começa. 54 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

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Sofisticação retrospectiva: Argumentou-se, contra a concepção de Isaacs, que devido a crianças em idade mais avançada terem realmente essas fanta­ sias, o complexo de Édipo seria afetado por uma regressão. A criança de três ou quatro anos que se ocupa com ansiedades a respeito da relação dos pais e se acha sob a pressão da frustração regride a desejos e impulsos orais, que então dão colorido às suas teorias do que os pais estão fazen­ do juntos. Esta é uma forma de "sofisticação retrospectiva". Foi um dos argumentos mais. acerbos contra a opinião que Klein tinha da fantasia no primeiro ano de vida. Waelder o demonstrou com o comentário de que este argumento não me parece mais convincente do que seria insistir em que o Hamlet ou o Lear, de Shakespeare, já devem ter existido em sua mente na infância" (p, 429). Ernest Jones, contudo, respondeu de modo cáustico (1943): Uma regressão de volta para o nada não tem significado para mim. As­ sim, quando Waelder fala de extraordinárias fantasias canibalísticas se­ rem familiares à idade de três ou quatro anos, mas as atribuí à regres­ são, isto não me transmite absolutamente nada se não significar uma reanimação de fantasias orais correspondentes à idade de, digamos, seis meses; por que uma criança de quatro anos seria subitamente tomada, pela primeira vez, pelo desejo de comer seios ultrapassa minha compre­ ensão. Seu argumento é de que a regressão a fantasias orais deste tipo implica fan­ tasias orais, na fase oral, a que se pode regredir.

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Sofisticação cognitiva: Argumentou-se que as fantasias de despedaçar a mordidas, matar e afogar a mãe, etc., são sofisticadas demais para a men­ te de um bebê que se encontra em seu primeiro ano de idade. Ele não tem possibilidade de saber o que matar e morrer significam nessa idade. Isaacs (1948) deu-se a grande trabalho para descrever o primitivismo das fanta­ sias — não-verbais, não-visuais, uma fantasia somaticamente experienciada — e alegou existir um conhecimento filogeneticamente fornecido. Por isto, quis dizer que na constituição do corpo e seus impulsos já existe um conhecimento inerente ou inato — as sensações corporais são uma forma de postular sob a form a de ação [ver CONHECIMENTO INATO]. Após os furiosos debates da década de 1940, o tema da capacidade da criança para a sofisticação cognitiva permaneceu restrito aos psicólogos acadêmicos e uma boa quantidade de pesquisa acadêmica em psicologia dos bebês foi acumulada (Trevarthen, 1980; Chamberlain, 1987). Os pro­ cessos que Trevarthen chama de "intersubjetividade primária" sugerem exis­ tir uma sofisticação muito precoce nas relações com objetos, o que vai con­ tra os detratores de Klein. A pesquisa também sugere haver um senso de realidade muito bom do contexto emocional dos relacionamentos bebêmãe, o que tende a ir contra as descrições que Klein fez das relações qua­ se solipsísticas com objetos de fantasia. A evidência é de que os bebês são R.D .H inshelw ood

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I realmente mais sofisticados do que tanto Klein quanto seus críticos vienenses alegavam. Lichtenberg (1983) e Stern (1985) começaram a fazer o levan­ tamento desta literatura, em busca de suas implicações psicanalíticas. (4) Processo secundário. Os psicanalistas ortodoxos definem a atividade men­ tal do inconsciente como sendo um processo primário, isto é, um proces­ so que depende da condensação e do deslocamento, tal como acontece na lógica e no simbolismo dos sonhos. Alegam eles que o conceito kleiniano de fantasia inconsciente mostrava sinais de negação, uma concepção de tempo e uma interação de impulsos, todas elas qualidades da atividade mental de processo secundário, que não se imagina ocorrer no inconscien­ te ou, certamente, não no primeiro ano de vida. Anna Freud argumentou contra um "ego arcaico do prazer" integrado que parecia estar implícito na teoria da fantasia inconsciente, que tem de pressupor que um ego tenha as fantasias. Discordando, ísaacs citou passagens de Freud que eram suges­ tivas do ponto de vista dela, de que um aparelho psíquico a possuir ape­ nas um processo primário constitui uma ficção (Freud, 1900) e que existe uma certa organização de funcionamento do inconsciente. Alegou que ad­ mitir desejos orais no primeiro ano, com memória consciente das experiên­ cias, tal como Anna Freud descrevera em seus textos, mas negar a função da fantasia, era teoricamente inconsistente. O debate parece resumir-se em uma disputa um tanto estéril sobre o que Freud reaímente disse, amplia­ do para o que Freud reaímente queria dizer. (5) Confusão de termos. Houve muita preocupação de que a precisão da ter­ minologia psicanaíítica estabelecida estivesse sendo erodída, tal como, por exemplo, a crítica de Anna Freud, descrita antes, a respeito do processo primário e da natureza do inconsciente. Gfover (1945) rejeitou a teoria da fantasia inconsciente porque ela mais ou menos fundia todos os termos psicanaííticos conhecidos em um só, reduzindo assim a nada a teoria psicanalítica. O que se perdia, acreditava ele, incluía os conceitos de progressão das fases libidinais, regressão e fixação, e o complexo de Édipo. Marjorie Brierley também ficou preocupada. Embora concordasse que o argumento de ísaacs, baseado na continuidade genética, fosse poderoso, ampliando o termo "fantasia" para abranger todos os aspectos da ativida­ de mental no passado e como sendo subjacente a toda a atividade mental do paciente no presente, ele obscurecia distinções importantes entre os pri­ meiros estágios e os posteriores — entre, por exemplo, os estágios iniciais do complexo de Édipo e os posteriores [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO] ísaacs contestou isto dizendo que a descoberta de fatores que são impor­ tantes no desenvolvimento de um estado ou organização psíquica particular, tal como o complexo de Édipo, não diminui a importância do conceito desse complexo; em verdade, realça-lhe a compreensão. Por exemplo, dis­ se ela, Klein aumentara grandemente a importância do complexo de Édi56 / D icionário

do Pensam ento Kleiniano

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po ao demonstrar que sua influência era mais precoce e que aspectos im­ portantes do bebê pré-genital estavam relacionados ao complexo. (6) Conceitos e fantasias. Glover descreveu o que chamou de "adição [de Klein] (...) a uma espécie de antropomorfismo psíquico (...) qual seja, q de confundir conceitos do aparelho psíquico com mecanismos psíquicos" (Glover, 1943). Se os mecanismos de introjeção e projeção destinam-se tam­ bém a transmitir o significado das fantasias (de incorporação e expulsão), dá-se então uma fusão da observação objetiva com a experiência subjeti­ va do paciente. Brierley ficou também preocupada com a elisão de experiências com conceitos e argumentou fortemente em favor de manter "a descrição da experiência, do condicionamento objetivo dessa experiência" (Brierley, 1943). Este debate, embora apenas aflorasse no Debate sobre as Controvér­ sias, tem ramificações profundas na filosofia da ciência e na posição espe­ cial daquelas ciências que versam sobre sujeitos humanos, em oposição a objetos inanimados. Heimann (1943), por exemplo, apontou que o tipo de trabalho em que um psicanalista se acha engajado é um caso especial, pois trata-se de uma ciência objetiva do subjetivo [ver SUBJETIVIDADE]. Brierley quis sugerir um nome alternativo, "significado", que daria cla­ reza à distinção entre descrições objetivas e subjetivas, de vez que a fanta­ sia as confunde. O termo "significado" situa a qualidade subjetiva da fan­ tasia inconsciente e mantém-na separada dos aspectos puísionais e objeti­ vos (ver também Rycroft, 1966). Isaacs discordou disto e decidiu apegarse ao termo "fantasia", em parte porque a força do conceito parece residir em abranger ele tanto os aspectos biológicos quanto os psicológicos da ba­ se das funções mentais. Meltzer (1973), contudo, comentou a respeito da necessidade de enfatizar-se esta mudança em metapsicologia: Como o quadro de referência neuropsicológico original de Freud mudou para outro puramente psicológico, a idéia quase fisiológica de "energia psíquica" precisou ser substituída por conceitos puramente mentais de "significado" e "vitalidade", (p, 131) (7) Regressão. Anteriormente a Klein, "fantasia" tinha significado uma regres­ são da libido resultante da frustração e que excita o aparelho perceptual, causando alucinações ou desenvolvendo fantasias para o pensamento. ísaacs reconheceu que a teoria da fantasia inconsciente alterava a importân­ cia da regressão, se as fantasias inconscientes do início da vida forem continuadamente ativas e subjacentes (e derem significado) a todos os estágios desenvolvimentais posteriores. Embora Freud e Abraham, e a psicanálise clássica, sustentassem que as noções puísionais arcaicas exercem suas in­ fluências posteriores como resultado da regressão, Isaacs enfatizou que, ao reconhecer a influência difusa desses estágios iniciais, o funcionamen­ to e o contexto dos mecanismos de defesa muito arcaicos eram vistos nas R.D.Hinshelwood / 57

repetições posteriores [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA]; dessa maneira, a importância da regressão reside em incluir as configura­ ções defensivas nos estágios iniciais a que a regressão se dá. Glover mostrou-se inflexível em afirmar que ampliar o significado do termo fantasia mais além das satisfações regressivas e alucinatórías torna­ va redundantes os outros termos. Uma fantasia inconsciente continuadamente ativa, de um tipo primitivo, parecería pôr fim aos conceitos de pon­ tos de fixação, de regressão da libido ou de regressão das relações objetais desde formas posteriores para anteriores. Fixação permanente: Por reivindicar a importância da fantasia inconscien­ te em todos os estágios, desde o mais remoto, e enfatizar as fantasias ori­ ginárias do estágio oral {incorporação, introjeção, etc.), argumentou-se, a metapsícologia de Klein equivalia a uma fixação permanente nos primei­ ros estágios. Acreditava-se que a ocorrência de fantasias ligadas a impul­ sos orais, anais e genitais eliminaria a regressão compíetamente, de vez que Klein havia se desfeito do conceito de progressão através dessas fases [ver LIBIDO]. A utilização de fantasias contra outras fantasias — por exemplo, o de­ senvolvimento de fantasias genitais como meio de lidar com o sadismo prégenital [ver DESENVOLVIMENTO] em verdade dispensa o modelo econô­ mico da conservação qualitativa de energia [ver MODELO ECONÔMICO]. O enclave de G lover: Glover insistiu em que a idéia de fantasias continuadamente ativas, de tipo primitivo, no inconsciente, não era freudiana. Conceptualizou isso como sendo um enclave de atividade mental primiti­ va que continuava, por alguma maneira separada, no inconsciente. Enfati­ zou a qualidade herética dessas idéias através do argumento de que se preeminencia for dada a esse enclave primário, o complexo de Edipo é auto­ maticamente rebaixado de sua posição psicanaíítica chave. Esta critica do deslocamento do complexo de Édipo será tratada mais adiante [ver 4. COMPLEXO DE EDIPO]. Nenhum outro analista apoiou esta crítica espe­ cífica, e os kleinianos que responderam nos Debates sobre as Controvér­ sias concederam pouco tempo a um debate sério com Glover, pondo de lado suas críticas, de modo geral, como sendo a â hominem. Entretanto, de maneira irônica, o tempo pode ter sido mais gentil com Glover. A idéia de um enclave separado (escindido) retornou, e na literatu­ ra kleiniana, A própria Klein veio a entreter a idéia de existir uma área de objetos arcaicos extremamente primitiva (Klein, 1958) [ver 7. SUPEREGO], Mais tarde, Rosenfeld (1971), em suas investigações das manifesta­ ções clínicas da pulsão de morte, descreveu uma espécie de "máfia" inter­ na que não se acha integrada com o resto da personalidade. Este tipo de estruturação da personalidade tornou-se um foco proeminente do pensa­ mento kleiniano contemporâneo na Grã-Bretanha [ver ESTRUTURA].

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Apesar do calor, do orgulho ferido e da marcação retaliatória de esco­ res nestas discussões, há numerosas questões de fundamental importância. Embora a impressão que se tem ao ler os registros dos Debates sobre as Controvérsias seja a de que o método de debate incisivo e academicamen­ te treinado de Isaacs levou a melhor, de modo geral, em relação a seus oponentes, em verdade essas questões não foram realmente resolvidas. Co­ mo bem se sabe, um "acordo de cavalheiros" foi alcançado na Sociedade Psicanalítica Britânica para o alinhamento dos membros em grupos separa­ dos (os kíeinianos, o Grupo Independente e o Grupo "B" de freudianos ortodoxos) e sua partilha do poder em todas as comissões da Sociedade (Steiner, 1985; Grosskurth, 1986), Ao invés, os Debates serviram para en­ terrar a discussão "científica" entre os grupos, com muito poucos engaja­ mentos subsequentes. Em conseqüência, muitas dessas questões, ainda que para cada uma das partes aparentemente há muito tempo esquecidas, ain­ da se encontram nas raízes das divergências atuais entre os kíeinianos e os psicanalistas clássicos ou da psicologia do ego.

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AGRESSAO, SADISMO E PULSOES COMPONENTES DEFINIÇÃO. Na teoria da sexualidade de Freud há um certo número de compo­ nentes da Hbido: amor oral, anal e genital; heterossexualidade e homosse­ xualidade; sadismo e masoquismo; voyeurismo e exibicionismo. Os impul­ sos libidinais eram uma mistura complexa desses componentes, com dife­ rentes ênfases no sentido de um ou outro deles, em estágios diferentes do desenvolvimento. Klein mostrou que o desenvolvimento seqüencial, tal co­ mo visto a partir da análise de adultos, era grandemente exagerado e que havia uma compressão de todos os componentes no primeiro ano de vida. Isto não obstava uma dominância de fase, em que um dos componentes predomina sobre os outros, mas ela descreveu uma situação em que mais ou menos todos os tipos de impulsos achavam-se presentes na maioria dos estágios. Demonstrou ela que o sadismo tem importância enorme na criança e, nisto, seguiu Abraham, que estudara as fases agressivas do começo da vi­ da. Klein acabou por considerar a agressão, ou a inibição dela, como o fa­ tor decisivo do desenvolvimento e veio a encará-la como a manifestação da pulsão de morte. Outras pulsões componentes que se lhe tornaram im­ portantes foram os impulsos epistemofüicos (ligados ao voyeurismo e ao exibicionismo). CRONOLOGIA

1920 A descoberta de enorme sadismo na criança pequena (Klein, Melanie, 1922, "ínhibitions and difficulties in puberty"; Klein, Melanie, 1927, "'Criminal tendencies in normal children"). 1927 As primeiras origens do superego, da culpa e do remorso (Klein, Me­ lanie, 1933, "The early devélopment of conscience in the child"). 1929 Situações infantis de ansiedade (Klein, Melanie, 1929, "Infantil anxiety-situations reflected in a work of art and in the Creative impulse"). 1932 O sadismo como manifestação da pulsão de morte (Klein, Melanie, 1932, The psycho-analysis o f children). R.D.Himhelwood / 61

1935 A posição depressiva (Klein, Melanie, 1935, “A contribution to the psychogenesis o f manic-depressive States").

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uando Klein com eçou o seu trabalho, em 1918-19, a teoria freudia­ na ortodoxa repousava com pactam ente sobre o m odelo evolutivo cias fases sexuais infantis. Havia diversas pulsões com ponentes na sexuali­ dade e várias fases no desenvolvim ento sexual da infância (Freud, 1905). (a) Os com ponentes — amor oral, anal e genital; heterossexualidade e ho­ mossexualidade; sadismo e masoquismo; voyeurismo e exibicionismo. To­ dos estes grupos podiam fundir-se uns com os outros, e cada um deles pos­ suía um modo ativo e um modo passivo. (b) As fases — (a) primeiro ano, oraiidade; (b) segundo ano, analidade; (c) terceiro ao quinto ou sexto ano, genitalidade; (d) do sexto ano à puber­ dade, a fase de latência, e (e) da puberdade em diante, até o estado adul­ to, a adolescência. Estas fases de amor da libido progridem de modo natu­ ral. Outros componentes da libido aparecem por cima desta cronologia básica. Particularmente importantes eram os componentes sadismo/masoquismo, que Abraham tentou classificar em fases semelhantes. Estas fases de sadismo sobrepunham-se parcialmente às fases oral, anal e genital, em verdade cindindo cada uma delas em duas, estabelecendo assim o que ele chamou de "horário" do desenvolvimento da libido (Abraham, 1924) fver SADISMO; LIBIDO). A CONTRIBUIÇÃO DE KLEIN À TEORIA DAS PULSÕES. No começo de seu trabalho, Klein aceitou a teoria das pulsões componentes, mas, à me­ dida que prosseguia, suas observações de crianças apresentaram diferenças no cronograma evolutivo, elaborado a partir da análise de pacientes adul­ tos. Ela efetuou quatro contribuições principais: (1) Primeira, notou o problema que se punha para as crianças, provoca­ do por sua própria curiosidade (chamou isto de componente epistemofílico, equivalente ao voyeurismo/exibicionismo de Freud). Pensou tratar-se, basicamente, de curiosidade a respeito da cena originária, da sexualidade dos pais e dos órgãos sexuais destes. (2) Segunda, e estreitamente vinculada à primeira, o componente sádico. Esta manifestação chocante de fantasia horrificante nas crianças parecia ser causada pela curiosidade sexual frustrada. Tem, contudo, consequên­ cias profundas, a incluírem o fator subjacente à paranóia e à psicose. O termo "sadismo" assumiu seu significado, nos textos kleinianos, de Freud e, especialmente, de Abraham. Nessa época (por volta de 1923), acredita­ va-se que ele derivasse do impulso sexual perverso, especialmente em ní­ vel oral ou anal. Cada vez mais, no pensamento de Klein, "sadismo" tor­ nou-se sinônimo de qualquer forma extremada de agressão. 62 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

(3) Diferentemente de Abraham, que refinou o cronograma das fases libidinais de modo cada vez mais preciso, Klein descobriu que, quando exa­ minava o desenvolvimento nas crianças, tal como acontecia, as fases não tinham ordem exata e, em verdade, amiúde se sobrepunham de modo parcial. (4) Finalmente, em 1932, Klein liberou as fantasias sádicas que tanto a ha­ viam chocado e tinham levado a seu embate com Freud. O sadismo não era mais visto como componente da libido, mas como pulsão separada, presente desde o nascimento. Nisto, adotava ela a teoria freudiana da pul­ são de morte, mas, enquanto Freud encarava a última como clinicamente silente, Klein reivindicava ser a vida de fantasia sadica das crianças uma manifestação clínica da pulsão de morte. (1) Epistemofilia. Em seu trabalho inicial, Klein mostrou como as interpreta­ ções das perguntas e fantasias da cena originaria feitas pela criança libera­ vam um poderoso surto de fantasia. Encarou isso como sendo a liberação da fantasia inibida a respeito da cena originária. O desejo por saber, a cu­ riosidade, parecia, evidentemente, constituir um poderoso impulso, primi­ tivo e primordial [ver EPISTEMOFILIA]. Ela ficou interessada nisso por duas razões teóricas. Em primeiro lugar, sua técnica, utilizando brinque­ dos e o brincar como símbolos, levou-a a concentrar-se na natureza do sim­ bolismo [ver 1. TÉCNICA; FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Em segundo, descobriu-se confrontada, em alguns casos, com uma ausência maciça de funcionamento simbólico (Klein, 1930); estes levaram-na a supor que pode­ ría ter dado com a natureza da psicose [ver PARANÓIA; PSICOSE]. A inibição da curiosidade era especialmente forte nas crianças psicóti­ cas ou quase psicóticas. Esta descoberta parecia ser de grande importância para compreender os distúrbios da psicose, dos quais se sabia incluírem dificuldades na formação adequada de símbolos. Freud distinguira as repre­ sentações de palavras das representações de coisas (Freud, 1915) e formula­ ra esta hipótese a partir dos distúrbios de esquizofrênicos: Se agora colocarmos esta descoberta [a forma peculiarmente concreta dos símbolos nos esquizofrênicos] ao lado da hipótese de que, na esqui­ zofrenia, os investimentos objetais são abandonados, seremos obriga­ dos a modificar a hipótese, acrescentando que o investimento das repre­ sentações de palavra dos objetos é mantido. (Freud, 1915, p. 201). Klein deu-se conta de que podia examinar as raízes deste problema na crian­ ça, enquanto estava acontecendo. Na busca de expressar fantasias de uma espécie ou outra no brincar ou em qualquer outra atividade simbólica, existe um processo de externalização. A externalização está ligada com o processo de expulsão, ou projeção, como defesa contra intoleráveis conflitos internos e a sádica punição do superego. A crueldade deste tipo de situação interna achava-se incutida em Klein quando ela escreveu: R.D.Hinshelwood / 63

Esta defesa, em conformidade com o grau de sadismo [na situação inter­ na], é de caráter violento e difere fundamentalmente do mecanismo pos­ terior da repressão. Em relação com o próprio sadismo do sujeito, a de­ fesa implica expulsão, enquanto que, em relação ao objeto, implica des­ truição. O sadismo se torna uma fonte de perigo por oferecer ocasião para a liberação da ansiedade e, também, porque as armas utilizadas para destruir o objeto são sentidas pelo sujeito como apontadas também para o seu próprio self (...) o ego ainda não totalmente desenvolvido é defrontado com uma tarefa que, neste estágio, ainda se acha bastante além dele. (Klein, 1930, p. 220). (2) Sadismo. A conexão inicial entre o impulso epistemofílico e o sadismo é muito importante para a totalidade do desenvolvimento mental. Esta pulsão (...) em princípio concerne principalmente ao corpo da mãe, do qual se assume ser a cena de todos os processos e desenvolvimentos sexuais. A criança ainda está dominada pela posição libidinal sádico-anal, que a impe­ le a desejar apropriar-se dos conteúdos do corpo. Ela começa assim a ficar curiosa a respeito do que este contém, a que se assemelha, etc. Dessa ma­ neira, a pulsão epistemofílica e o desejo de apossar-se vêm muito cedo a ser muito intimamente ligados um com o outro. (Klein, 1928, p. 188) Aprender, estava dizendo Klein, representa uma intrusão no corpo da mãe (1931) e, portanto, faz aflorar as ansiedades que surgem da fantasia de pe­ netrar sadicamente a mãe [ver 8. SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE]. A criança espera encontrar dentro da mãe (a) o pênis do pai, (b) excre­ mento e (c) crianças, e iguala estas coisas a substâncias comestíveis. De acordo com as fantasias (ou "'teorias sexuais") mais arcaicas da crian­ ça a respeito do coito dos genitores, o pênis do pai (ou o corpo inteiro deste) se incorpora à mãe durante o ato. Assim, os ataques sádicos da criança têm por objeto tanto o pai quanto a mãe, que, em fantasia, são mordidos, dilacerados, cortados ou calcados aos pés até ficarem em pe­ daços. Os ataques dão origem à ansiedade de que o sujeito seja puni­ do pelos pais unidos e esta ansiedade também se internaliza em conseqüência da introjeção sádico-oral dos objetos, sendo assim já dirigida no sentido do superego arcaico. (Klein, 1930, p„ 219) A prova clara da agressão do bebê foi uma descoberta perturbadora para Klein: A idéia de um bebê de seis a doze meses tentando destruir a mãe por todos os métodos à disposição de suas tendências sádicas — com den­ tes, unhas e excrementos, e com a totalidade de seu corpo, transforma­ do, na fantasia, em todos os tipos de armas — apresenta a nossas men­ tes um quadro horripilante, para não dizer inacreditável. E é difícil, co­ mo sei por minha própria experiência, forçar-se a reconhecer que tal idéia odiosa corresponde à verdade. (Klein, 1932, p. 130). 64 / Dicionário do Pensamento Kieiniano

Por ter sido uma descoberta tão inesperada para si, Klein concentrou-se nela, de modo mais ou menos exclusivo, durante os primeiros quinze anos de sua prática clínica. Círculo vicioso: A preocupação especial com a agressão, e as conseqüências vingativas que despertam medo e mais agressão, são autoperpetuantes. Os ataques aos perseguidores tornam-nos mais daninhos, antes que menos, porque deles se imagina, na fantasia, que estejam ainda mais enraivecidos e dispostos à violência retaliatória: "(.,,) quando os objetos são introjetados, o ataque que sobre eles é lançado com todas as armas do sadismo desperta no sujeito o pavor de um ataque análogo sobre si mesmo, partin­ do dos objetos externos e dos objetos internalizados" (Klein, 1929, p. 212). Este tipo de círculo vicioso representa um estado paranóide de hostilida­ de, com imensa desconfiança de quaisquer figuras "boas" [ver PARANÓIA], (3) Fases pré-genitais. Klein originalmente seguiu Abraham, ao atribuir o sa­ dismo a um período mais tardio no primeiro ano de vida, e tendeu a refe­ rir de volta a essa ocasião as fantasias que encontrou em crianças mais ve­ lhas, como sendo um ponto de fixação. Acabou por chegar à conclusão de que todos os variados impulsos libidinais coincidem, ainda que um ou outro estejam em ascendência em qualquer momento determinado: "As fa­ ses libidinais sobrepõem-se parcialmente a partir dos primeiros meses de vida. As tendências edipianas positivas e invertidas estão, desde seu come­ ço, em interação próxima" (Klein, 1945, p. 416). As fantasias sádicas são em grande parte atribuídas às fases oral e anal, e os impulsos pré-genitais são, em princípio, mais dominantes que os genitais. Dessa maneira, a crian­ ça, em seus primeiros momentos, tem de lutar contra a ansiedade causa­ da por esses impulsos sádicos. Klein veio a achar que havia um certo des­ pertar de impulsos genitais (isto é, no sentido de ambos >s pais, como ca­ sal) desde o primeiro ano de vida, mas, posteriormente, os impulsos geni­ tais se fortalecem e realçam o amor da criança. Com frequência Klein parece escrever como se impulsos pré-genitais (sá­ dicos) se opusessem aos genitais e amorosos: (...) o sadismo é superado quando o sujeito progride para o nível genital. Quanto mais vigorosamente este se instala, mais capaz a criança se torna de amor objetai e mais capaz fica de conquistar seu sadismo por meio da piedade e da simpatia. (Klein, 1929, p, 214) Ela considerava que uma das maneiras pelas quais os impulsos agressivos influenciam o desenvolvimento é promoverem eles um movimento para a frente, por parte do ego, na direção de impulsos (estimulações) genitais, a fim de mobilizar os sentimentos amorosos. Dessa maneira, os sentimen­ tos agressivos podem tanto fortalecer quanto inibir o movimento evoluti­ vo, ou até mesmo, às vezes, o movimento para a frente pode ser impeli­ do de modo prematuro, com conseqüências diferentes. Assim Klein desenR.D.Hinshelwood / 65

volveu a opinião controversa de que era o impacto dos impulsos agressi­ vos nesses estágios muito iniciais que determinava o curso do desenvolvi­ mento ou a sua obstaculização [ver LIBIDO; DESENVOLVIMENTO], Foi com base na evidência das fantasias pré-genitais que eía começou a revisar a visão classica do complexo de Édipo e da origem do superego [ver 4. COMPLEXO EDIPIANO; 7, SUPEREGO], (4) A pulsao de morte. Mais tarde (a partir de 1932), Klein considerou a tota­ lidade do primeiro ano de vida como sendo a época de sadismo máximo. Essa ampliação de suas concepções deu-se em resultado da adoção por eía, em 1932, da pulsão de morte como fonte primária dos impulsos agressivos desde o início: "(•••) um desvio da pulsão de morte para fora influencia as relações da criança com seus objetos e conduz ao desenvolvimento ple­ no de seu sadismo" {Klein, 1932, p. 128), e: (...) suas puísões destrutivas despertaram-lhe ansiedade já nos primei­ ros meses de vida. Em conseqüência, suas fantasias sádicas ficaram liga­ das à ansiedade, e este elo entre ambas dá origem a situações específi­ cas de ansiedade (...) A satisfação libidinal, como expressão de Eros, reforça sua crença em suas imagos dè auxílio e diminui os perigos que o ameaçam do lado da sua pulsão de morte e de seu superego, (Klein 1932, p. 201) [ver PULSÃO DE MORTE], A partir deste ponto, a visão kleiniana da mente e seu desenvolvimento gira em torno do conflito inerente entre a pulsão de morte e a libido (pulsões de vida), e da maneira pela qual o mundo externo pode auxiliar no desenvolvimento da consciência das realidades externas e internas. Quando a pulsão de morte predomina, então a mistura (ou fusão) das puí­ sões resulta em inveja, masoquismo ou outras formas de perversão, e vá­ rios outros estados de agressão patológica. A saúde e o desenvolvimento normal apóiam-se na dominância das pulsões de vida [ver PULSÃO DE MORTE]. Desde o nascimento o bebê reage à experiência de suas próprias necessida­ des através da exigência de satisfações e, em última análise, pela busca de objetos que satisfaçam e pelo amor a eles (pulsões de vida), ou, então, pe­ la obliteração da experiência (ou da percepção do objeto por que se anseia) ou do aparelho perceptual que tem a experiência ou percebe o objeto (pul­ são de morte) [ver 12. INVEJA]. Ao fugir aos efeitos da destrutividade ini­ cial, a pulsão de morte é geralmente projetada (o termo original de Freud foi "desvio") para fora, para um objeto externo que corporifica a ameaça destrutiva ao setf; um elemento de destrutividade é mantido dentro e volta­ do no sentido do objeto externo ameaçador. Posição depressiva: O conflito de sentimentos que originalmente se viu en­ tre os impulsos pré-genitais e genitais veio a ser visto como conflitos entre 66 / Dicionário áo Pensamento Kteiniano

o compiexo de Édipo positivo e negativo, que existe nas fantasias incons­ cientes tanto sob formas pré-genitais quanto genitais [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. Estas elisões confundidoras de categorias teóricas tornaramse menos problemáticas à medida que Klein avançou teoricamente, em 1935, para desenvolver a idéia da posição depressiva, que se tornou cada vez mais proeminente que o complexo de Édipo e as seqüências de fase [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA], por formar o suporte sobre o qual es­ ses passos evolutivos clássicos se realizam. Aniquilação esquizóide: Em 1946, Klein revisou sua teoria do intenso pe­ ríodo sádico e paranóide ao começo da vida (então chamado de posição paranóide). Descobriu ela que impulsos agressivos operavam contra o ego do sujeito, assim como na direção de objetos. A autodestrutividade era co­ mo se a pulsão de morte (a promover o deslizar do indivíduo de volta pa­ ra a dissolução e a morte) não houvesse sido corretamente voltada para fora a partir do nascimento [ver 7. SUPER EGO]. Em sua teoria da pulsão de morte, seguiu Klein a visão de Freud do desvio para fora dessa pulsão. Nos estados esquizóides, dá-se um fracasso inicial nesse desvio [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓÍDE; 12. INVEJA]. Daí o indivíduo esqui­ zóide ter medo de uma força aniquiladora provinda de dentro, e temer por si próprio, assim como a dissolução em fragmentos de seu próprio ego e identidade (Klein, 1946). Nessa ocasião, Klein descreveu o protótipo de um relacionam ento objetai agressivo, em que esses fragmentos do ego po­ dem ser expelidos para dentro de objetos externos [ver 13. IDENTIFICA­ ÇÃO PROJETIVA]. Inveja: Em 1957, Klein efetuou sua última contribuição à sua própria teo­ ria. Tal como suas preocupações muíto iniciais, tinha a ver com as enor­ mes quantidades de agressão sádica nos seres humanos. Não apenas desco­ briu ela, anteriormente, vastas quantidades de agressão em crianças a brin­ car, como posteriormente, em sua carreira, pôde confirmar esse sadismo e essa excessiva agressão em material clínico provindo de pacientes psicóti­ cos adultos. A inveja primária é uma agressão e um sadismo inatos com respeito aos objetos bons ou seus atributos bons, em oposição à agressão mais paranói­ de para com objetos maus que parecem ameaçadores ao sujeito [ver 12. INVEJA]. A inveja e a pulsão de morte são semelhantes no sentido de am­ bos atacarem a vida e os objetos amados. Na inveja, os impulsos da pul­ são de morte acham-se fundidos com as pulsões de vida de maneira tal que a pulsão de morte é dominante. Esta é uma forma patológica de fusão, na qual (a) o objeto é atacado como satisfação da pulsão de morte, e (b) é atacado, ao mesmo tempo, como defesa contra a inveja, pela obliteração do objeto que dá surgimento à necessidade. A destrutividade refere-se a um objeto que excita uma necessidade (e, portanto, amor) e é também a satisfação dessa necessidade. R.D.Hinshelwood / 67

Uma forma primária de inveja parecia representar uma das mais primiti­ vas manifestações dos impulsos agressivos, e Klein achou que, no come­ ço, o bebê era dotado de uma discrepância inata nas quantidades de pulsão de vida e de morte, junto com outras falhas (nos esquizofrênicos), es­ pecialmente a dificuldade em separar entre impulsos agressivos e libidinais (e tolerância fraca da frustração, meio ambiente desfavorável ao desenvol­ vimento, etc.). DEBATE A RESPEITO DA PULSÃO DE MORTE. Não existe disputa real a respeito de existirem fases sádicas na infância, mas sim a respeito da ori­ gem delas na pulsão de morte. Levantaram-se quatro objeções principais à utilidade do conceito de “pulsão de morte": (a) as descrições feitas por Freud haviam sido, em grande parte, especulativas, e ele se referira à pul­ são como clinicamente "silente"; (b) é desnecessário postular a projeção da pulsão de morte como fonte de agressividade, de vez que a frustração da libido já é suficiente para explicar a agressividade; (c) não existem pro­ vas de uma destrutividade autodirigida, a operar dentro da personalidade, e (d) a importância concedida por Klein à pulsão de morte rebaixa a libi­ do de sua importância central na teoria psicanalítica, (a) A pulsão silente: É opinião amplamente sustentada que Freud deparouse com a idéia da pulsão de morte seguindo exemplos biológicos, suas re­ flexões a respeito da mortalidade dos organismos e as tendências univer­ sais para a matéria viva retornar ao estado inanimado e a matéria inanima­ da degenerar em níveis inferiores de organização. Ligar esta segunda lei da termodinâmica, ou entropia, ao modelo de Freud da mente ameaçava trazer uma tonalidade de misticismo à psicanálise. Conseqüentemente, a maioria dos psicanalistas deixou de conceder-lhe lugar sério em seu pensa­ mento clínico. Mostrou-se possível relegar a pulsão de morte ao esqueci­ mento, por haver Freud se referido a ela como sendo "uma pulsão muda e silente". Tal inaudibilidade explicava, para Freud, por que a havia negli­ genciado em seu trabalho anterior. Klein, contudo, argumentou vigorosamente que a "pulsão de morte" constitui um conceito clínico, porque Freud (1920) começara os seus pró­ prios argumentos com dados oriundos do trabalho clínico sobre a transfe­ rência (a compulsão à repetição), dos sonhos de pacientes que sofriam de neuroses traumáticas e da observação de crianças a brincar. Fora em ver­ dade o problema clínico da compulsão à repetição que dera origem à sua escolha de nome para esse trabalho de 1920, qual seja, Além do princípio do prazer. Devido ao fato de os pacientes parecerem ser compelidos a re­ petir experiências penosas, o princípio do prazer é rompido. Tem de haver algo mais além do prazer. (b) Libido frustrada: Igualmente, em sua forma projetada, a pulsão de morte está longe de ser silenciosa, mas é barulhenta e estridente [ver PUL68 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

SÃO DE MORTE], Amiúde se argumenta que os impulsos agressivos não são, em si próprios, prova da pulsão de morte, por poderem ser derivati­ vos de impulsos libidinais que foram frustrados. O argumento, em sua for­ ma mais benigna, é de que é impossível isolar os diferentes componentes pulsionais através da investigação psicanalítica. As discordâncias entre os psicanalistas a respeito da pulsão de morte acham-se repletas de engenho­ sos argumentos a posteriori sobre o ponto, desde ambos os lados [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE; CONTINUIDADE GENÉTICA], (c) Destrutividade interna: Klein demonstrou que, nas crianças, pelo me­ nos, a pulsão de morte não era muda nem silenciosa; existia um sentido em que o ego, ou alguma parte do que ele continha, permanecia dentro, a fim de exercer uma influência mortífera sobre a personalidade. Essa par­ te são os objetos internos "maus", que dão origem, no decorrer do desen­ volvimento, ao superego severo [ver 7. SUPEREGO], Nos adultos, a expe­ riência de um objeto destrutivo dentro do ego é transmitida por um pacien­ te que tem uma fobia por câncer, que representa um objeto interno devorador. Em verdade, o temor generalizado do câncer é similar mente ligado a fantasias inconscientes de um objeto mau concebido de modo sádico-oral. Outras formas de hipocondria podem constituir ilustrações equivalentes. Uma destrutividade interna clinicamente manifesta foi examinada por Rosenfeld (1971) e, recentemente, por muitos outros, em reação à queixa de que os kleinianos não haviam respondido às críticas de sua utilização do conceito da "pulsão de morte". A estrutura dos pacientes fronteiriços ou limítrofes consiste na organização de partes "más" do $elf, que atacam o self "bom" com estratégias sedutoras ou intimidantes [ver ESTRUTURA]. (d) A importância relativa da pulsão de m orte e da libiâo: Em outra dire­ ção, argumentou-se haver Klein afirmado que a pulsão de morte predomi­ na, em influência, sobre a Iibido, e que o impulso a relacionar-se com ob­ jetos deriva da pulsão de morte! Isto seria inteiramente contrário à teoria freudiana. Queixas de que Klein havia abandonado a teoria de Freud da progressão das fases libidinais atingiram um ápice quando os analistas vienenses chegaram a Londres, em 1939 [ver DEBATES SOBRE AS CONTRO­ VÉRSIAS]. A reclamação era demasiadamente excitada, mas é verdade que Klein via os problemas e as inibições do desenvolvimento da Iibido (e do intelecto, também) como devidos à ansiedade causada pelos impul­ sos agressivos. Ela realmente não lançou fora a teoria da Iibido e a seqüência das fases sexuais infantis. Apegou-se a ela formalmente, ao mesmo tem­ po em que apontava para o fato de que as fases não mais progridem co­ mo um horário de estrada de ferro (a própria analogia de Abraham). Elas são comprimidas todo o tempo, mas ainda apresentam uma seqüência de dominância de impulsos' a princípio, os impulsos orais dominam os anais; depois, estes começam a afirmar-se e se tornam dominantes em relação aos orais e genitais. A ênfase de Klein incidia sobre a interferência no de­ R.D.Hinshelwooâ / 69

senvolvimento libidinal por parte do sadismo, que assinala os pontos de fixação da libido. Os problemas, portanto, permanecem. Para os kleinianos, a pulsão de morte não é silente, mas ativa como importante fator que perturba e mo­ difica grandemente a progressão natural do desenvolvimento libidinal atra­ vés das fases iniciais, enquanto que os psicanalistas clássicos minimizam a importância clínica da pulsão de morte e enfatizam o desenvolvimento epigenético da libido e do ego [ver PSICOLOGIA DO EGO]. A que situa­ ções criticamente decisivas na prática clínica levaria a decisão destas ques­ tões é algo que ainda espera receber atenção séria.

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4 COMPLEXO DE ÊDIPO DEFINIÇÃO. As descobertas clínicas de Klein acabaram por modificar a teoria de Freud do complexo de Édipo. Ao enfatizar o conteúdo de fantasia das reações pulsionais, Klein demonstrou especialmente os componentes prégenitais (orais e anais) das fantasias edipianas. Ela tomou isso como pro­ va da origem precoce, pré-genital, do complexo de Édipo. Klein nunca es­ teve à vontade com a teoria de Freud de que o superego era "herdeiro do complexo de Édipo", porque a ocasião em que ele aparecia não combina­ va com suas próprias observações clínicas, de maneira que acabou por ir contra Freud. A terrificante e "psicótica" vida de fantasia arcaica da criança é subja­ cente ao complexo de Édipo clássico e Klein deu ênfase aos primeiros está­ gios do com plexo de É dipo. Achava ela estar dando ênfase à importância do complexo por demonstrar a intensidade dos estágios iniciais subjacen­ tes a ele. Klein também enfatizou a importância do complexo de Édipo negativo (invertido) e a intrincada interação existente entre os complexos positivo e negativo; mais tarde, isto foi absorvido por sua teoria da ambivalência na posição depressiva. Subseqüentemente, sua própria teoria em desenvol­ vimento da ambivalência e da posição depressiva resultou em uma refor­ mulação implícita do complexo de Édipo, fundada em termos da reunião de figuras de fantasia "boas" e "más" (os objetos parciais "bons" e "maus"). Na situação transferenciai de uma psicanálise, isto amiúde tem como conseqüência a relação do paciente com a reunião de partes da mente do analista. CRONOLOGIA 1920 O complexo de Édipo clássico em crianças (Klein, Melanie, 1920, "The development of a child"). 1928 Formas pré-genitais do complexo de Édipo e complexo de Édipo in­ vertido (Klein, Melanie, 1928, "Early stages of the Oedipus complex"). 1932 Desligamento do superego do complexo de Édipo (Klein, Melanie, 1932, The psycho-analysis o f children (Parte II); Klein, Melanie, 1933, "The early development of conscience in the child"). R.D.Hinshelwood / 71

1935 Complexo de Édipo e posição depressiva (Klein, Melanie, 1940, "Mourning and its relation to manic-depressive States"; Klein, Melanie, 1945, "The Oedipus complex in the light of early anxieties").

A

psicanálise ortodoxa da época em que Klein começou o seu trabalho estabelecera que o problema nuclear de todas às neuroses era o com­ plexo de Édipo. Klein nunca questionou isso, mas, encarou o complexo de um ponto de vista cada vez mais divergente. O com plexo de Édipo na década de 1920: Na visão freudiana clássica, o bebê tem em seu corpo sensações sexuais que tenta descarregar como dese­ jos voltados para os pais; ele não tem sucesso nisso e encontra proibições. Isto conduz à masturbação, que atrai proibições semelhantes às anteriores. Freud descrevera isto no nível genital e explorara as teorias (fantasias) se­ xuais da criança e discernira a ansiedade de castração do menininho, devi­ do às ameaças que experimenta por parte do pai; a menininha padece de inveja do pênis. Em artigo publicado em 1918 — por volta da época em que Klein come­ çou a analisar crianças — ele descreveu com extremo cuidado as identifica­ ções que a criança faz com cada um dos pais na relação sexual, e em ida­ de muito inicial (já aos dezoito meses). Nesse caso, estivera tentando elabo­ rar clinicamente algumas das implicações das idéias que publicara, no ano anterior, em 'Luto e melancolia" (Freud, 1917), no qual descrevera, pela primeira vez, o mecanismo da identificação (através da introjeção). Esses artigos devem ter provocado um debate excitado e intenso em todas as so­ ciedades psicanalíticas, exatamente na época em que Klein estava formulan­ do os seus primeiros casos. A CONTRIBUIÇÃO DE KLEIN AO COMPLEXO DE ÉDIPO. O trabalho de Klein com crianças a brincar mostra-lhe a variedade dessas fantasias e as maneiras pelas quais elas pareciam identificar-se com as figuras de brin­ quedo por todos os modos. Este tipo de identificação múltipla parecia pro­ duzir o florescer criativo do próprio brincar, com a criança observando os acontecimentos a partir do ponto de vista de uma das figuras e, depois, de outra [ver 1. TÉCNICA]. Klein enfatizou também as identificações com cada um dos pais, bem como a forma simples do complexo de Édipo, qual seja, ódio por um dos genitores e amor pelo outro. Descobri o que Werner chamava de seus "pensamentos irrequietos". Contou-me que ficava irrequieto a respeito dos animais de Tarzan. Os macacos estão caminhando através da selva; em sua fantasia, caminha atras deles e adapta-se a seu modo de caminhar. As associações mostra­ vam claramente sua admiração pelo pai, que copula com a mãe, e seu desejo de disso participar, como terceira pessoa. Esta identificação, mais uma vez com a mãe e o pai, formava também a base de seus ou­ 72 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

tros numerosos pensamentos "irrequietos", todos os quais podiam ser reconhecidos como .fantasias de masturbação. (Klein, 1925, p. 118) Com base nessas fantasias infantis, Klein efetuou quatro descobertas clíni­ cas principais a respeito do complexo de Édipo no período de 1919 a 1935. Cada uma dessas etapas foi de tal magnitude que a teoria acabou por trans­ formar-se em outra inteiramente diferente: a teoria da posição depressiva. As etapas foram: (1) a qualidade particular do sadismo que se liga às fantasias do casal edipiano, dando origem a grande ansiedade [ver 8. SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE]; (2) as provas clínicas de fantasias pré-genitais e, portanto, de uma origem pré~genital, algo inteiramente diferente da visão de Freud de que o comple­ xo de Édipo surge na fase genital, entre o terceiro e o quinto ano de vida [ver LIBIDO; 7. SUPEREGO]; ) I 4 \

(3) a concepção dos pais edípianos em termos de órgãos individuais — o pênis na vagina (o mamilo no seio) — o que dá origem a uma fantasia atemorizante dos pais eternamente unidos, constituindo uma figura parental combinada [ver FIGURA COMBINADA DOS PAIS], e (4) a ambigüidade dos complexos de Édipo positivo e invertido, que, coexistindo, criam sentimentos ambivalentes para com cada um dos pais [ver 10. POSIÇÃO ‘ DEPRESSIVA].

(1) Ansiedade. Klein contribuiu para a teoria ortodoxa do complexo de Édi­ po através da concentração no conteúdo das ansiedades que surgem das fantasias a respeito dos objetos edipianos (mãe e pai): O menininho que odeia o pai como rival no amor da mãe fará isso com o ódio, a agressão e as fantasias derivadas de suas fixações sádico-orais e sádico-anais (...) Neste caso [de Gerard], o pênis do pai deveria ser cortado fora, a mordidas, cozinhado e comido. (Klein, 1927, p. 172). Observou ela que "(...) tal manifestação de tendências primitivas é invaria­ velmente seguida pela ansiedade" (Klein, 1927, p. 175). Esses impulsos sá­ dicos criam grande temor e remorso em crianças pequenas, que temem o que acontecerá aos pais reais e também a retaliação deles contra a crian­ ça [ver 3. AGRESSÃO; PARANÓIA]. (2) As primeiras origens do complexo de Édipo. Freud considerava os impul­ sos pré-genitais como sendo simplesmente descarregados, enquanto que as fantasias edipianas verdadeiras começavam somente com a fase genital (por volta da idade de três a cinco anos). Klein, contudo, apresentou fanta­ sias edipianas em idades pré-genitais: "(...) as crianças com freqüência de­ monstram, já no começo de seu segundo ano de vida, uma preferência acen­ R.D.Hinshelwooâ / 73

tuada pelo genitor do sexo oposto e outras indicações de tendências edipianas incipientes" (Klein, 1926, p. 129). Impulsos pré~genitais ocorrem nas reações das crianças aos pais e ao relacionamento sexual destes, e seus brin­ quedos giram em tomo de idéias, fantasias e ansiedades ligadas à cena ori­ ginária; na ignorância que a criança tem dos fatos, essas fantasias baseiamse em interpretações de suas próprias necessidades (orais ou anais) e a cruel frustração delas: De acordo com o estágio sádico-oral e sádico-anal que esteja atravessan­ do, a relação sexual vem a significar para a criança um desempenho em que comer, cozinhar, troca de fezes e atos sádicos de todo tipo (es­ pantar, cortar, etc.) desempenham o papel principal. (Klein, 1927, p. 175) Com esta massa de provas clínicas de fantasias pré-genitais, Klein viu-se forçada à conclusão de que o complexo de Edipo surge antes da fase genital. Dessa maneira, os pais estão sempre se alimentando mutuamente, incorporando-se um ao outro, despedaçando-se a mordidas, mexendo um den­ tro do outro, controlando-se mutuamente, mas há também fantasias genitais de penetrar, cortar, cuidar ou proteger um ao outro: (...) a análise dos primeiros anos demonstrou que ela [a criança] desen­ volve essas teorias muito mais cedo do que isso, em uma época em que os impulsos pré-genitais ainda determinam predominantemente o qua­ dro, mesmo que seus impulsos genitais ainda ocultos tenham voz no assunto. Essas teorias são no sentido de que, na cópula, a mãe está con­ tinuamente incorporando o pênis do pai por via da boca, de maneira que o corpo dela acha-se repleto de um grande número de pênis e be­ bês. Todos estes a criança deseja comer e destruir. Ao atacar o interior da mãe, portanto, ela está atacando um grande número de objetos. (Klein, 1933, p. 254) (3) Objetos parciais. Grande parte da vida de fantasia da criança é concebi­ da em termos de objetos parciais; isto equivale a dizer que ela imagina ór­ gãos em relação uns com os outros: objetos imaginados com uma única função, mal visualizados, mas a se reunirem na relação sexual. Em particu­ lar temos o seio da mãe, que se reunirá com o pênis do pai, ou este últi­ mo, dentro da vagina da mãe: "(...) neste estágio inicial de desenvolvimen­ to, o princípio da pars pro toto se aplica, e o pênis também representa o pai em pessoa" (Klein, 1932, p. 132) [ver OBJETOS PARCIAIS]. Envolvi­ dos também nesse mundo de órgãos acham-se os bebês que o corpo criati­ vo da mãe também contém algo que evoca outras fantasias, mais uma vez predominantemente agressivas. Todas estas noções primitivas de ór­ gãos ainda não ligados são provavelmente propensões inatas a imaginar tais coisas: fantasias inconscientes [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE; CONHECIMENTO INATO]. 74 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

A figura parental unificada: Central aos estágios iniciais do complexo de Édipo é o quadro dos pais como um casal unido e atemorizante, abraça­ do em violenta relação sexual que os destruirá e também o bebê (Klein, 1932). Dessa maneira, os pais unificados (ou seus órgãos) destroem-se mu­ tuamente em uma catástrofe mundial para o bebê, que não lhe deixa na­ da; ao mesmo tempo, a figura volta-se sobre ele por causa de suas próprias fantasias onipotentes contra os pais e submete-o às mesmas forças destruti­ vas que o bebê acredita que aqueles desencadeiam um contra o outro (ver FIGURA COMBINADA DOS PAIS]. (4) Complexo de Édipo invertido. Por estar Klein analisando crianças muito pequenas, encontrava-se ela em posição particularmente boa para demons­ trar que o complexo de Édipo não é simplesmente um amor pelo genitor do sexo oposto e um ódio pelo genitor rival do mesmo sexo. Em verdade, ela descobriu sentimentos muito misturados e, portanto, veio a enfatizar o complexo de Édipo invertido, no qual menininhas tanto amam quanto se identificam com a mãe, e os meninos amam o pai e com ele se identifi­ cam, à exclusão do genitor do sexo oposto. Isto se acha de acordo com a visão que Freud tinha da bissexualidade inerente. As oscilações entre com­ plexo edipiano positivo e complexo edipiano invertido tornaram-se de im­ portância crescente e acabaram por contribuir para o desenvolvimento, por parte de Klein, do conceito da posição depressiva (ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].' AS CONSEQUÊNCIAS DAS TEÓRICAS CONTRIBUIÇÕES DE KLEIN. As contribuições de Klein conduziram a diversas direções: (1) a uma nova origem do superego; (2) à qualidade ''secundária'' das ansiedades clássicas ligadas à castração e à inveja do pênis; (3) à teoria da posição depressiva, da perda do objeto amado; (4) bastante mais tarde, o seguidor mais original de Klein, Bion (1962), de­ senvolveu a importante noção de objetos parciais, juntando-se tal qual um continente com os seus conteúdos [ver CONTER]. A dificuldade de Klein foi que suas observações clínicas, efetuadas com crianças, tinham implicações de longo alcance e conflitavam com a obser­ vação clínica dos psicanalistas de adultos. Problemas estavam sempre à espera de quem quer que desafiasse as descobertas do próprio Freud. O mundo psicanalítico da década de 1920 não era clemente e foi somente na década de 1930 que ela pôde desenvolver as suas próprias teorias, independentemente de Freud. Nessa época, a visão que tinha da ansiedade e da situação edipiana havia mudado, em resultado da incorporação, por R.D.Hinshelwood / 75

ela, do conceito de Freud da pulsão de morte em seu entendimento de suas provas clínicas; isto conduziu ao conceito da posição depressiva. (1) O superego arcaico. A agressão evocada nestas fases pré~genitais do com­ plexo cria relações já complicadas com as figuras primárias, antes mesmo que os impulsos genitais assumam. Essas figuras complexas, ambíguas e terríficantes, quando introjetadas tornam-se perseguidores internos. Argu­ mentou Klein que versões internalizadas de genitores que atacam o ego são claramente fenômenos da mesma categoria que o superego, tal como descrito por Freud. Conseqüentemente, este também deve surgir em idade muito anterior à enunciada por Freud (em 1923), quando o apresentou co­ mo "herdeiro do complexo de Édipo" e, portanto, como desfecho princi­ pal desse complexo. Assim, uma origem antiga do superego sugeria uma origem ainda mais antiga de seu precursor, o complexo de Édipo. Como isto se achava de acordo com sua descoberta de fantasias pré-genitais do casal edipiano, acreditou Klein que os fatos clínicos demonstravam que a seqüência geral de eventos definida por Freud podia ser mantida, se fosse adiantada para uma idade anterior do desenvolvimento. Enquanto seguia com suas observações, descobriu-se colocando tanto o superego quanto o complexo de Édipo cada vez mais cedo. A princípio, aferrou-se à seqüênda c[ue Freud havia estabelecido; o superego é o resultado do complexo de Édipo. Contudo, diferentemente da visão de Freud, os dois processos de elaborar o complexo de Édipo e formar o superego não se acham intei­ ramente em seqüência, porque a "(...) análise de crianças muito pequenas demonstra que, assim que o complexo de Édipo. surge, elas começam a ela­ borá-lo e, por esse meio, desenvolvem o superego" (Klein, 1926, p. 133). Depois, os dois processos acabaram por tornar-se tão agrupados no pri­ meiro ano, pouco mais ou pouco menos, de vida que ela finalmente desen­ ganchou um do outro e tornou-os independentes, com o superego adian­ tando-se, de fato, para os primeiros momentos da vida [ver 7. SUPEREGO]. (2) Ansiedade de castração e inveja do pênis. Klein esforçou-se por reforçar todos os aspectos e ansiedades descritos na teoria clássica do complexo de Édipo, e constantamente alegou que sua descoberta dessas fantasias era simplesmente um recheio da teoria aceita. Achava-se portanto em posição de reivindicar que as grandes ansiedades que estivera descrevendo achavamse profundamente envolvidas na qualidade assustadora das ansiedades "or­ todoxas". Dessa maneira, a ansiedade de castração é reforçada e multipli­ cada pelas fantasias que o menino tem de ataques violentos ao corpo da mãe, a fim de destruir o pênis que lá reside, com o terror da retaliação mutilante, paga na mesma moeda, sobre seu próprio pênis. A inveja do pênis nas menininhas acha-se mais claramente relacionada à ansiedade que Klein descreveu como a incursão que a menina faz contra o corpo da mãe como receptáculo do pênis do pai e dos bebês que traz à vida lá. Inveja 76 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

do pênis é um conceito mais estreito que as descrições que Klein faz da variedade de fantasias que assediam a menininha [ver 6. FASE DA FEMI­ NILIDADE]. Apesar da alegação de estar recheando as teorias de Freud com fanta­ sias mais pormenorizadas, observáveis se se trabalha com crianças na oca­ sião em que o complexo de Édipo se acha em seu auge, em verdade as an­ siedades que Klein descrevia não eram as que Freud havia descrito. Klein, na década de 1920, descrevera uma ansiedade nova, a de violentamente invadir o corpo da mãe, e o temor de uma retaliação comparável sobre o corpo da própria criança. Sua lealdade para com Freud, contudo, exigialhe que endossasse a visão dele a respeito das ansiedades principais, apre­ sentando suas próprias descobertas como amplificadores subjacentes da ansiedade de castração e da inveja do pênis. (3) Perda do objeto amado. Freud pensava que os país edipianos tinham de acabar por serem abandonados, e que essa perda era alcançada de modo semelhante às outras perdas, tal como descrevera em 1917: por uma introjeção do objeto. Em 1923, definira o objeto interno que resultava como superego. Por volta do fim da década de 1920, contudo, quando Klein já se instalara no arcabouço apoiador da Sociedade Psicanahtica Britanica, ela ficou mais livre para permitir que suas próprias deduções teóricas se­ guissem avante. Os objetos internos resultantes dos pais edipianos tornaram-se, para Klein, as figuras psicológicas importantes, mais importantes que as exter­ nas, das quais, naturalmente, as internas apesar disso derivam. Acredita­ va que as oscilações entre os complexos de Edipo positivo e negativo no curso do desenvolvimento infantil resultavam em objetos internos amados e objetos internos odiados. Uma confluência acaba por se desenvolver en­ tre as figuras amadas e as odiadas, resultando em um objeto interno (geni­ tor) que é tanto amado quanto odiado, Esta confluência do amor com ata­ ques sádicos dá origem a uma constelação especial de afetos, atitudes, rela­ ções objetais, ansiedades e defesas, à qual Klein deu o nome de posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. A POSIÇÃO DEPRESSIVA. O advento da posição depressiva no pensamen­ to de Klein tornou necessária uma redisposição de suas teorias. Em primei­ ro lugar, ela não mais se referiu com tanta confiança ao desmame como sendo a frustração mais importante, dando ênfase, ao invés, às vicissitudes do objeto interno e à perda temida dele, antes que ao destino do obje­ to externo (o seio real). Em segundo, a volta para o pai, atribuída previa­ mente à reação contra a mãe no desmame, foi vista mais como inerente em frustrações inevitáveis e conflitos de ambivalência em relação à mãe, que se estabelecem desde o início. Este conflito é visto como inerente, ine­ vitável e engastado na natureza conflitiva das pulsões: um conflito entre R.D.Hinshelwood / 77

o complexo edipiano positivo (querer o amor do genitor do sexo oposto contra a rivalidade com o genitor do mesmo sexo) e o complexo de Édipo invertido (amar o genitor do mesmo sexo e com ele identificar-se, vol­ tando-se a oposição no sentido do genitor do sexo oposto). Dessa manei­ ra, existe alguma correspondência entre a reunião dos pais na situação edipiana e a reunião do objeto parcial "bom” com o "mau": Cada objeto, portanto, está por sua vez sujeito a tornar-se às vezes bom e, às vezes, mau. Este movimento para lá e para cá entre vários aspec­ tos das imagos primárias [figuras parentais] implica uma interação estrei­ ta entre os primeiros estágios do complexo de Édipo invertido e positi­ vo. (Klein, 1945, p. 409) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA] R eparação: A importância da reparação aparece também em algumas fan­ tasias edipianas. Há reparação envolvida no realce dos aspectos amorosos da situação edipiana. Os impulsos edipianos genitais representam um mo­ vimento no sentido de um fortalecimento dos sentimentos amorosos; estes são importantes nos atos de reparação, para mitigar a possibilidade triun­ fante de reparação onipotente baseada em mecanismos maníacos [ver RE­ PARAÇÃO], A posição esquizoparanôide: Com a compreensão da cisão da mente infan­ til em partes ou fragmentos, que vem associada à cisão dos objetos, a reu­ nião dessas partes e fragmentos assumiu o papel do objeto edipiano clássi­ co [ver CISÃO; 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÔIDE], Na experiência do bebê, a mãe boa e que satisfaz desaparece quando ele está insatisfeito, e intromete-se um objeto diferente. Em seu mundo externo apenas parcial­ mente percebido, o pai, um irmão ou irmã, um visitante ou o cão da famí­ lia servem tão bem quanto qualquer outra coisa para representar essa ter­ ceira figura intrusa e prejudicial. Neste estágio, contudo, essas figuras são mantidas separadas no tempo, a fim de minimizar a experiência de uma configuração triangular. O bebê, nos momentos em que experiencia o seu objeto bom, acha-se em plena posse dele, uma posse interna e externa. Contudo, à medida que os potenciais cognitivo e emocional se desenvol­ vem, os objetos se reúnem e o desencadeamento da posição depressiva cria uma situação em que o bebê não mais possui o objeto "bom", mas assiste à posse de dois objetos, um pelo outro (Britton, 1989). O complexo de Édipo nesta versão é um complexo que pouco explica os pais reais e sua relação sexual realr pois se fundamenta na maneira pe­ la qual o bebe faz uso dos objetos reais para "escutar" seu próprio mun­ do de fantasia e manipulá-los (defensivamente) para seu próprio alívio [ver DEFESA PSICOLÓGICA]. Esta capacidade de pôr-se de lado e observar um relacionamento entre dois objetos exige a capacidade de suportar o sentimento de ser deixado de fora e, portanto, o impacto pleno do sofrimento edipiano clássico. É 78 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

neste momento que à capacidade de amar e odiar se junta à capacidade de observar e conhecer, uma das grandes características da posição depres­ siva [ver VINCULAÇÃO; 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Dessa maneira, a posição depressiva é mais que a consecução do complexo de Édipo; ela envolve a capacidade de começar a ter um melhor conhecimento dos mun­ dos interno e externo: O ego mais forte e mais coerente (...) repetidamente reúne e sintetiza os aspectos excindidos do objeto e do self (...) Todas estas evoluções conduzem a uma crescente adaptação à realidade externa e interna. (Klein, 1952, p. 75) Partes "m aterna" e “paterna" da mente do analista: Na situação clinica, o uso desta interpretação de “objeto parcial" do complexo de Edipo influen­ ciou grandemente a compreensão da transferência [ver 1. TÉCNICA]. A tentativa que o paciente faz de alcançar o estado de mente do analista com freqüência inclui a maneira pela qual aquele experiencia as partes da men­ te do analista como separadas ou vinculadas. Dessa maneira, o analista pode ser experienciado como compreensivo, mas, ao assim proceder, uma outra parte dele — sua parte mais severa, analisadora, que o paciente sen­ te que o criticará é escindida. Tais aspectos da mente do analista podem ser experiencíados em termos de gênero, como uma parte materna e outra paterna, as quajs o paciente deseja manter separadas. Ou então, de modo semelhante, pode se sentir que falta uma parte que sente e intuitiva do ana­ lista, quando este interpreta (segundo o paciente acredita) utilizando suas próprias funções intelectuais. A reunião das partes da mente do analista pode ser muito resistida e ferozmente atacada pelo paciente. ESTÁGIOS INICIAIS VERSUS PRECURSORES — A DISPUTA. Houve relu­ tância continuda em aceitar as conclusões de Klein de que o complexo de Édipo começava antes da fase genital (fase do primado genital) [ver tam­ bém 7. SUPEREGO]. Foi Fenichel quem a articulou de modo mais claro: É indubitavelmente verdade que, em período muito anterior, a criança se apega ao genitor do sexo oposto e sente ciúme e ódio do outro geni­ tor. Entretanto, estas fases preliminares diferem em certos pontos funda­ mentais do complexo de Édipo à época de seu zênite. As fases prelimina­ res possuem conteúdos (não genitais) diferentes daqueles do verdadei­ ro complexo de Édipo. Ainda estão competindo com tendências autoeróticas e o ódio ciumento ainda existe sem conflito, lado a lado com o amor pelo genitor do próprio sexo do sujeito. (Fenichel, 1931, p. 141-2) O argumento se baseia em não existirem elos entre o ciúme e o amor. Em verdade, Fenichel descreveu um certo número de situações pré-genitais se­ paradas e diferentes: a proibição de impulsos auto-eróticos; o realce da an­ siedade de castração pela perda do seio da mãe (desmame); impulsos amoR.D.Hinsketwood / 79

rosos pré-genitais; a igualação do pênis com o seio ou com as fezes, e a igualação do coito à incorporação oral. Todos estes componentes acabam por influenciar o complexo de Édipo quando a fase genital vem a ser atin­ gida, e pareceriam, na realidade, pesar contra o argumento de Fenichel e em favor da importância dos primeiríssimos estágios do complexo de Édipo. isto se contrapõe à visão kleíniana de estados emocionais contrastantes (o ciúme e o amor, por exemplo), que considerariam a separação como uma não-intçgração secundária (uma cisão dos objetos e do relacionamen­ to) mais do que primária, antes de o ego começar a funcionar como for­ ça integradora. Os analistas freudianos clássicos consideravam as fantasias pré-genitais da relação sexual dos genitores e a situação edipiana como sur­ gindo retrospectivamente, a partir de uma elaboração posterior, na fase genital, do casal edipiano, em termos de impulsos pré-edipianos que eram externados através da regressão. A reivindicação kleiniana de que impul­ sos de todas as fases (oral, anal, genital) tendiam a coincidir parecia abo­ lir o fenômeno psicanalítico da regressão. A reação kleniana foi enfatizar o princípio da continuidade genética [ver CONTINUIDADE GENÉTICA]; os fenômenos no estado adulto, ou mesmo na infancia, decorrem inevitavelmente de algo anterior, argumen­ to que foi utilizado, na mesma época, a respeito do superego arcaico, E a regressão tem de ser regressão de volta a alguma coisa, o que equivale a dizer que as fantasias arcaicas, orais ou anais, de relação sexual dos pais têm de ter existido, para que se possa a elas regredir. A disputa entre re­ gressão à atividade de fantasia de um estágio inicial e elaboração retrospec­ tiva de impulsos anteriores é difícil de ser decidida com base em provas clínicas e, tal como acontece com tantas disputas, esta tendeu a sair de dis­ cussão antes de ter-se chegado à sua resolução. Os embates, a estima ferida e as posições assumidas dos Debates sobre as Controvérsias de 1943 ilustraram as dificuldades de buscar-se uma atitu­ de inteiramente científica em relação a tais tópicos [ver DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS]. A temperatura subiu especialmente a respeito do conceito-chave do complexo de Édipo, por ele ser central à teoria clás­ sica de Freud na ocasião. A acusação de Klein (1927) de que Anna Freud não interpretara o complexo de Édipo (ver 1. TÉCNICA] ocasionou arrou­ bos lancinantes e amargor, expressos de modo sofrido e cuidadoso em cor­ respondência trocada entre o próprio Freud e Ernest Jones, respectivos pa­ tronos das mulheres em disputa (Steiner, 1985) [ver 1. TÉCNICA]. O desenvolvimento da teoria kleiniana do complexo de Édipo, contu­ do, afastou-a da idéia çlássica dos pais "reais" para um mundo de fantasia de objetos parciais na posição esquizoparanóide. Na prática, no consultó­ rio, são o casamento e a devoção do analista à psicanálise, ou a reunião dos pensamentos do analista, ou de partes de sua mente, os casais decisi­ vos a que o paciente psicanalítico responde. Para alguns (os analistas clás­ sicos), a teoria é hoje irreconhecível; para os kleinianos, é a continuidade 80 / Dicionário do Pensamento Kleiniana

entre as fantasias de objetos parciais nos primeiros estágios do com plexo de Édipo e o estágio edipiano posterior (clássico) o que constitui a questão relevante [ver CONTINUIDADE GENÉTICA]. Bion, Wilfred (1962), Learning from experience, Heinemann, Brierley, Marjorie (1934), "Present tendendes in psycho-analysis", Br. ]. Med. P sychol, 14:211-29. Britton, Ronald (1989), “The missing link: parental sexuality in the Oedipus complex", em Ronald Britton, Michael Feldmann e Edna 0'Shaugnessy, The Oedipus com plex today: cli­ nicai implications, Karnac, p. 83-101. Fenichel, Otto (1931), “The pre-genital antecedents of the Oedipus complex", Int. f. PsychoAnal., 12:138-70. Freud, Sigmund (1971), "Mourning and melancholia", em James Strachey, (org.), The'Stan­ dard Edition o f the C om plete Psychological W orks o f Sigmund Freud, 24 vols., Hogarth, 1953-73, vol. 14, p. 67-107. -------- . (1918), “From the history of an infantile neurosis", S.E., 17, p. 3-123, -------- . (1923), “The Ego and the íd", S.E. 19, p. 3-66. Glover, Edward (1933), "Review of Klein's psycho-analysis of children, Int, J. Psycho-Anal., 14:119-29, -------- . (1943), “Contribuíion to the Controversial Discussions 1943-1944 of the British PsychoAnalytical Society" (não publicado). -------- . (1945), “An examination of the Klein System of child psychology", Psychoanal. Stuây Child, 1:1-43. ísaacs, Susan (1943), “Contribution to the Controversial Discussions 1943-1944 of the British Psycho-Analytical Society (não publicado). Klein, Melanie (1920), "The deveiopment of a child", em The writings o f Melartie Klein, vol. 1, Hogarth, p. 1-53. ........ . (1925), “A contribution to the psychogenesis of tics", T he writings o f M elanie Klein, vol. 1, p. 106-27. -------- . (1926), "The psychological principies of early analysis", The writings o f M elanie Klein, vol. 1„ p. 128-38. -------- . (1927), “Criminal tendencies in normal children", The writings o f M elanie Klein, vol. 1, p. 170-85. -.......... (1928), "Early stages of the Oedipus complex", The writings o f Melanie Klein, vol. 1, p. 186-98. -------- . (1932), “The psycho-analysis of children", The writings o f M elanie Klein, vol. 2, ........... (1933), "The early development of conscience in the child", The writings o f M elanie Klein, vol. 1, p. 248-57. -------- . (1940), "Mourning and its relation to manic-depressive States", The writings o f M ela­ nie Klein, vol, 1, p. 344-69. -------- . (1945), "The Oedipus complex in the light of early anxieties", The writings o f M ela­ nie Klein, vol. 1, p. 370-419. -------- . (1952), "Some theoretical conclusions regarding the emotional life of the infant”, The writings o f M elanie Klein, vol. 3, p. 61-93. Kohut, Heinz (1971), The analysis o f the self, Nova Iorque, International Universities Press. Rosenfelfd, Herbert (1971), “A clinicai approach to the psycho-analytic theory of the life and death mstincts: an investigation into the aggressjve aspects of nasrcissism", Int. }. PsychoA n a l, 52:169-78. Steiner, Riccardo (1985), "Some thoughts about tradition and change arising from an exami­ nation of the British Psycho-Analytical Society's Controversial Discussions 1943-1944", Int. J. P sycho-A n al, 12:27-71. Winnicott, Donald (1962), “Providing for the child in health and crisis", em The m aturational processes and the facilitating environment, Hogarth, p. 64-72.

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5 OBJETOS INTERNOS DEFINIÇÃO, Este termo denota a experiência ou fantasia inconsciente de um objeto concreto fisicamente localizado no interior do ego (corpo), que pos­ sui seus próprios motivos e intenções para com o ego e outros objetos. Ele existe dentro do ego, em maior ou menor grau de identificação com este (uma fantasia de absorção ou assimilação pelo ego). A experiência do obje­ to interno é profundamente dependente da experiência que se tem do obje­ to externo, e os objetos internos são, por assim dizer, espelhos da realida­ de. Eles também contribuem de modo significativo, porém, através da pro­ jeção, para a maneira pela qual os objetos externos são, eles próprios, per­ cebidos e experienciados. CRONOLOGIA 1927 Expulsão como meio de administrar o mundo interno (Melanie Klein, 1927, “Criminal tendencies in normal children"). Objetos internos múltiplos (imagos que constroem o superego (Klein, Melanie, 1929a, “Personification in the play of children"). 1935 Perda do objeto interno bom (Klein, Melanie, 1935, "A contribution to the psychogenesis of manic-depressive States"). 1946 Cisão de objetos e do self (Klein, Melanie, 1946, "Notes on some schizoid mechanisms"), idéia de objeto interno é uma das mais importantes descobertas de Klein, mas também uma das mais misteriosas. A experiência que o sujeito tem de um objeto dentro de si proporciona-lhe um senso de existên­ cia e identidade. As nossas relações com objetos abrangem aquilo que so­ mos. A percepção deste fenômeno por parte de Klein começou muito ce­ do. O aprofundamento da teoria, porém, constituiu um processo prolonga­ do, que envolveu um certo número de etapas conceptuais:

A

(1) O objeto introjetado (o termo "objeto" e a maneira por que é usado pelos kleinianos e outros psicanalistas das relações objetais acham-se des­ critos em outra parte [ver OBJETOSJ); 82 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

(2) exíernalização; (3) o mundo interno; (4) o superego; (5) figuras de ajuda; (6) a realidade interna dos objetos, e (7) onipotência e qualidade concreta. (1) O objeto introjetado. Em sua análise de Rita, em 1923, Klein deu-se con­ ta da importância de um objeto introjetado que veio a aterrorizar a crian­ ça. Essa compreensão proveio da elucidação da fantasia envolvida em ri­ tuais da hora de dormir: o "temor de que um camundongo ou um amiguinho* entrassem pela janela e lhe cortassem o seu amiguinho* (órgão genital) a dentadas" (Klein, 1926, p. 132). Este temor do objeto interno perse­ guidor constituía uma proibição violenta, mas não emanava "(...) da mãe real, e sim de uma mãe introjetada" (Klein, 1926, p. 132). Klein descobriu que parte do ritual da hora de dormir envolvia a colocação de um elefan­ te, representando o pai, ao lado da cama: O elefante (a imago paterna) destinava-se a assumir o papel do pertur­ bador, papel que o pai introjetado desempenhara dentro dela desde o tempo em que [quinze meses de idade] quisera usurpar o lugar da mãe junto ao pai, roubar da mãe a criança com que estava grávida, e ferir e castrar os pais. (Klein, 1926, p. 132). (2) Externalização. Klein continuou descrevendo como "(...) o jogo de desem­ penhar um papel serve para separar essas identificações diferentes" ê "(...) a criança alcança êxito em expelir o pai e a mãe que, na elaboração do complexo de Édipo, absorveu dentro de si, e estão agora atormentando~a internamente com sua severidade" (Klein, 1926, p. 133). (3) O mundo interno. Tal como o conceito de superego, o conceito de Freud de mundo interno foi grandemente ampliado por Klein. Ela tentou ilustrar as preocupações dramáticas da mente da criança em um estranho trabalho baseado na resenha que um jornal de Berlim fez de uma opereta de Ravel, representada em Viena (Klein, 1929b). O mundo de pesadelo de uma crian­ ça formava uma espécie de narrativa cheia de perseguidores, temidos e ata­ cados, que é representada no palco com um pungente estado de piedade dela decorrente. Vinculou isto também a um processo de criatividade vi­ sual (a história de um pintor) e esforçou-se por recriar o efeito dramático,

* N. do T .; Em inglês butty, que significa amigo, camarada e também órgão sexual.

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a fim de transmitir a qualidade de um mundo inteiro de fantasia em que a criança se acha envolvida. Já em 1923 estivera absorvida no estudo da maneira pela qual as crian­ ças se preocupavam com os interiores dos corpos, os próprios e o da mãe: A menininha tem um desejo sádico, a originar-se nas etapas iniciais do conflito edipiano, de despojar o corpo da mãe de seus conteúdos, a sa­ ber, o pênis do pai, fezes, crianças, e destruir a mãe, ela própria. Este desejo dá origem à ansiedade de que a mãe, por sua vez, despeje a pró­ pria menininha dos conteúdos de seu corpo (especialmente das crian­ ças) e de que este seja destruído ou mutilado. (Klein, 1929b, p. 217). A criança tem assim uma concepção de objetos dentro de seu próprio cor­ po, retratados, diz Klein aqui, como sendo seus próprios filhos. Não se tra­ ta apenas de meninas; a respeito do rapazinho, diz ela: Contudo, não é apenas seu pênis que ele sente dever preservar, mas tam­ bém os conteúdos bons de seu corpo, as boas fezes e a boa urina, os bebês que deseja desenvolver na posição feminina e os bebês que — em identificação com o pai bom e criativo — deseja produzir, na posi­ ção masculina. (Klein, 1945, p. 412) Por esta atenção concedida ao interior da mãe, Klein denominou este está­ gio de fase da feminilidade [ver ó. FASE DA FEMINILIDADE]. Ela via as crianças como tendo um interesse absorvente, desde muito cedo, pelos seus próprios interiores, os quais sentiam conterem objetos bons e enriquecedores e os quais sentiam estarem ameaçados e, com freqüência, danifica­ dos pelo ataque por parte de objetos maus, quer de dentro de si mesmos, quer do exterior. (4) O superego. Na época em que Klein se achava investigando as idéias das crianças a respeito de um mundo dentro de si mesmas, Freud produziu a sua própria teoria da estrutura da personalidade: id, ego e superego. Em verdade, o superego é o único objeto introjetado e interno que Freud descreveu. O interesse de Klein, então, voltou-se para ligar as observações que estava fazendo dos objetos introjetados das crianças com o novo mo­ delo da mente de Freud. Do brincar de uma menininha, diz ela: Erna com freqüência fez-me ser uma criança, enquanto ela era a mãe ou a professora. Eu tinha então de passar por fantásticas torturas e hu­ milhações (...) era constantemente espionada, pessoas adivinhavam os meus pensamentos, e o pai ou a professora aliavam-se com a mãe con­ tra mim — em verdade, achava-me sempre rodeada por perseguidores. Eu própria, no papel de criança, tinha de constantemente espionar ou­ tras pessoas e atormentá-las (...) Nas fantasias desta criança, todos os papéis em que se engajava podiam ser encaixados em uma só fórmula: o de dois papéis principais — o superego perseguidor e o id ou o ego, 84 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

segundo fosse o caso, ameaçados, mas de maneira alguma menos cruéis. (Klein, 1929a, p.-199-200) Dessa maneira, os dramas encenados na sala de atendimento são igualmen­ te, na interpretação de Klein, dramas internos à mente da criança, e ela engenhosamente os vinculou à estrutura que Freud recentemente descrevera. (5) Objetos internos de ajuda. Contudo, não se tratava apenas do superego duro e aterro rizaaor. Klein também observou figuras de ajuda: George sempre se sentira conscientemente rodeado e ameaçado (por mágicos, bruxas e soldados), mas (...) tentara defender-se contra eles com o auxílio de figuras de ajuda (...) Três papéis principais achavamse representados em seus jogos: o do id e os do superego, em seus as­ pectos persecutórios e seus aspectos de ajuda. (Klein, 1929a, p. 201) "As figuras de ajuda assim inventadas são, a maior parte delas, do tipo extremamente fantasioso" (Klein, 1929a, p. 203). Embora as primeiras im­ pressões que Klein havia obtido da análise infantil fossem de lutas assusta­ doras com perseguidores horríficos, versões distorcidas dos pais, ela ago­ ra "(...) viera a dar-se conta de que o funcionamento de tais imagos, com características fantasiosamente boas e fantasiosamente más, é um mecanis­ mo geral nos adultos, assim como nas crianças" (Klein, 1929a, p. 203). Neste estágio, Klein pensou que as figuras de ajuda eram conjuradas co­ mo defesa contra os perseguidores, e continuou, pela elaboração dessas imagos, a apontar os problem as que decorrem de uma "(...) influência ex­ cessivamente forte exercida por esses tipos extrem ados de imagos, a inten­ sidade da necessidade de figuras bondosas, em oposição às ameaçadoras, a rapidez com que aliados transformam-se em inimigos" (Klein, 1929a, p. 204). Esta visão de "imagos" muito variadas acha-se em nítido contraste com as relações muito limitadas que Freud descreveu existirem entre o su­ perego e o ego e o id. Mais tarde, Klein veio a descrever essas figuras de ajuda como objetos "bons", especialmente o objeto interno bom. O bjetos internos múltiplos: A compreensão dos dois lados do superego — o severo e o de ajuda —, expressos como objetos diferentes, e, depois, dos objetos dos diferentes níveis libidinais (oral, anal e genital) conduziu a uma visão do mundo interno como povoado por grande número de obje­ tos variados, derivados do meio ambiente e das histórias reais do bebê. Por lealdade a Freud, Klein escreveu: "(...) o superego como um todo é constituído pelas várias identificações adotadas nos diferentes níveis [fa­ ses] do desenvolvimento" (Klein, 1929a, p. 204), e, a fim de fazer suas pró­ prias observações conformarem-se à visão de Freud de um amálgama mo­ nolítico de pai e mãe, internamente, descreveu um processo de "(...) sinte­ tizar as identificações em um superego integral". Entretanto, com o correr do tempo, o pensamento kleiniano veio a aceitar que o mundo interno é R.D.Hinshelwood / 85

uma arena cheia de objetos variados, em diversos graus de síntese e separa­ ção, em contextos diferentes e em épocas diferentes. (6) A realidade interna dos objetos. O conceito de objeto interno subseqüentemente tornou-se assunto de grande confusão — e repetidas elucidações. A dificuldade é que os objetos internos descritos a partir das provas, clíni­ cas do brincar das crianças, {e, subseqüentemente, da análise de esquizofrê­ nicos) eram de tipo muito concreto. Naturalmente, é verdade que as crian­ ças (e os adultos, também) têm fantasias muito concretas a respeito do que existe dentro de seus corpos. As fantasias inconscientes desses conteú­ dos, contudo, são muito extraordinárias. Os objetos internos não são "re­ presentações", como poderíam ser em lembranças ou em fantasias conscien­ tes (devaneios). Eles são sentidos como constituindo a substância do cor­ po e da mente. Durante as décadas de 1930 e 40 um grupo de kleinianos formou o que chamaram de Grupo dos Objetos Internos, a fim de tentar esclarecer esse conceito misterioso. Searl (1932, 1933) e Schmideberg (1934) tentaram for­ necer deles relatos descritivos. Karin Stephen afirmou de modo lúcido e categórico: "(...) a crença nesses objetos internos fantasiosos origina-se de experiências corporais reais da mais tenra infância, ligadas a descargas vio­ lentas, amiúde incontroláveis, de tensão emocional" (Stephen, 1934, p. 321). Isaacs (1940) relatou um caso para fins de demonstração, a fim de mostrar as provas clínicas em favor dos objetos internos, e Heímann (1942) relatou com detalhes um caso em que as provas clínicas demonstravam a introjeção de um objeto materno hostil que interferia com a capacidade do ego; as habilidades criativas do paciente retornaram quando pôde ele identificar-se (assimilar) com o objeto. Objeto interno e identificação: O objeto internalizado é normalmente (em­ bora não sempre) sentido como pertencente ao ego. Exemplificando, se ex­ pandirmos as fronteiras do ego para fins de esclarecimento, eu poderia di­ zer que, dentro das fronteiras de minha casa, tenho "minha esposa" ou "meu inquilino". Não se nega a esses objetos a sua própria identidade, mas eles realmente constituem a minha identidade também — como mari­ do, senhorio — por fazerem parte de meu lar. E diferente com outros obje­ tos que entram em minha casa: eu não me referiría ao "meu ladrão" ou ao "meu enxame de abelhas" se qualquer um desses objetos nela se introdu­ zisse. Embora sejam internos em relação às fronteiras de minha casa, eles não são sentidos como pertencendo a ela. O mesmo se aplica às fronteiras do ego: os objetos são normalmente sentidos como pertencentes a (identificados com) ele, mas podem aí residir como objetos estranhos [ver adiante, e ASSIMILAÇÃO]. (7) Onipotência e qualidade concreta. O objeto é, em primeiro lugar, um ob­ jeto em ocional, por provir das sensações que o bebê tem de prazer ou so86 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

frimento. Mas, por serem corporais as sensações, o bebê experiencia tais objetos como entidades concretas reais, tão concretas como seu próprio corpo: as sensações acham-se aí, de maneira que os objetos que as causam devem aí se achar também. Bem de início, os objetos não são conhecidos em termos de seus atributos físicos, mas isto de maneira alguma impede a crença em sua presença física real, porque a criança "conhece" os efeitos deles; suas próprias sensações corporais são prova disso. Heimann (1949) resumiu do seguinte modo a relação corporal com obje­ tos internos: (...) a pulsão busca o objeto (...) A situação se apresentaria então do seguinte modo: sob a influência da fome e de desejos orais, o bebê, por alguma maneira, conjura o objeto que satisfaça esses impulsos. Quan­ do esse objeto, o seio da mãe, lhe é em realidade oferecido, ele o acei­ ta e, em fantasia, o incorpora. (Heimann, 1949, p. 10) A experiência é sentida como sendo concretamente real; a fantasia é onipo­ tente e produz resultados reais no ego, modificando e formando a base pa­ ra o dsenvolvimento do ego. O mundo representacional e o mundo interno: O plano mais arcaico e mais concreto da fantasia é, no desenvolvimento posterior, recoberto pe­ lo mundo de representações do objeto e do self, mas ele nunca é, em reali­ dade, substituído. O mundo concreto do objeto interno persiste como um leito rochoso da personalidade, para vir à superfície em sonhos, no delírio, nas alucinações, na hipocondria e nos estados delirantes menores dos pre­ conceitos e das preferências. A metáfora do "nó na garganta", para desig­ nar um momento emocional de tristeza, corresponde a uma realidade cons­ tituída por uma experiência corpórea real de sensações experimentadas na garganta [ver OBJETOS]. A idéia que Freud tinha das representações (Freud, 1900) é de que elas têm a função de símbolos pessoais, de vez que não se confundem com o objeto externo real. Quando tais representações são confundidas com o objeto externo, em resultado da operação da fantasia onipotente, a experi­ ência é a de um objeto completamente real, a existir dentro do sujeito (Ro~ senfeld, 1964). De modo semelhante, na representação do self, se a fanta­ sia for do tipo onipotente, o self se toma realmente fundido ou confundi­ do com o objeto [ver ASSIMILAÇÃO]. Os objetos internos são concebidos em um nível de desenvolvimento in­ teiramente separado (e anterior) e baseiam-se na fantasia onipotente de in­ corporar um objeto ao ego e identificar-se com ele. Isto resulta em uma mudança radical no ego, por causa da confusão do objeto externo com o próprio introjeto que resulta na qualidade onipotente da fantasia primiti­ va. Da mesma maneira, a projeção onipotente resulta na experiência de uma perda real de partes do mundo interno ou do self, as quais se acredi­ ta se acharem no objeto externo [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA]. R.D.Himhelwooá / 87

OS OBJETOS INTERNOS E O CORPO. O uso que Klein faz do termo “ob­ jeto Ínterno“ refere-se principalmente a esta experiência muito primitiva dos objetos internos como concretamente reais. Schilder e Wechsler (1935), em um estudo empírico piloto, conseguiram extrair de crianças o que elas pensavam que havia dentro de seus corpos e demonstraram uma espanto­ sa variedade de objetos concretamente imaginados. No caso clínico de Schmideberg (1934), os sintomas corporais derivavam de causas psicológi­ cas (sintomas de conversão e hipocondria): “(...) os sintomas de conversão e a ansiedade dela eram em grande parte determinados por sua ansiedade do objeto incorporado. Ela sentia que o objeto perigoso dentro dela acha­ va-se em oposição a seu ego“ (p. 263), e, à medida que a condição da pa­ ciente melhorou, “(...) o contraste entre o objeto incorporado e o ego tor­ nou-se menos poderoso e ela se identificou com o objeto dentro de si" (p, 263). Este modo de experienciar objetos internos é conduzido através de to­ do o desenvolvimento e no decorrer da vida; entretanto, a ele se sobrepõe um conjunto progressivo de modos adicionais de experienciar. A experiên­ cia do corpo, com o desenvolvimento dos receptores de distância, assume as possibilidades de uma apreciação mais objetiva. Isso resulta no que é então chamado de “representações" na mente de objetos internos e exter­ nos. As representações são, portanto, uma capacidade evolutivamente avan­ çada do bebê. Mais tarde, surge a substituição do objeto primário por ou­ tros objetos, e isto é o desenvolvimento da formação de símbolos. Este progresso passo a passo na experiência de objetos foi esboçado por Money^Kyrle (1968), que nele distinguiu três estágios: (i) a crença concre­ ta em um objeto fisicamente presente; (ii) a representação de um objeto na mente e na memória, e (iii) uma representação simbólica em palavras ou outros símbolos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. A passagem da experiência concreta de objetos para uma modalidade mais representacional complementa as concepções de Piaget (1954; ver também Matthews, 1980) e se acha ligada ao fenômeno que Bion chamou de função-alfa [ver PENSAR; FUNÇÃO-ALFA]. A EXPERIÊNCIA DOS OBJETOS. A experiência especial destes objetos inter­ nos primitivos, concretamente sentidos, é obscura, mas podemos tomar como exemplo o bebê que está com fome. Suas sensações corporais, forne­ cidas por sua fisiologia, são também experienciadas, mentalmente, como um relacionamento com um objeto. O desconforto é atribuído à motiva­ ção de um objeto malévolo realmente localizado em sua barriguinha e que tem a intenção de causar-lhe o desconforto da fome. Bion ambiguamente refere-se a este objeto como um “não-seio", reconhecendo que, objetiva­ mente, há uma ausência, mas, para o bebê, não existe tal coisa como uma ausência, e sim simplesmente a presença de algo que causa o sofrimento. Neste exemplo, o objeto acha-se localizado dentro do ego, na barriga. Este objeto interno é “bom" quando o bebê tem a experiência de ser ali­ 88 / Dicionário âo Pensamento Kleiniano

mentado e sente o leite morno proporcionar sensações satisfatórias à barri­ ga [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE], Os objetos internos derivam suas características das noções pulsionais que são ativas (objetos frustran­ tes ou "maus") ou estão sendo satisfeitas (objetos satisfatórios ou "bons"), dependendo das sensações corporais que se encontram no centro de aten­ ção nesse momento. O objeto fica assim limitado à importância de apenas uma espécie: em conexão com as sensações do momento — alimentação, calor, conforto, sujeira, urina, etc. — e também em termos de permitir ao objeto que haja alguma satisfação ou ser frustrante desses impulsos. Cada objeto representa apenas uma fatia muito parcial do mundo do be­ bê e, em verdade, apenas uma parte da pessoa que dele cuida ("mãe"), a qual é o seu mundo externo. Tecnicamente, isto é conhecido como objeto parcial. Somente mais tarde é que a criança pode avançar para um quadro mais complexo de seus objetos, mediante suas percepções mais avançadas, e então os objetos dela vêm a ter intenções múltiplas e sentimentos mistos, assim como atributos físicos e consistência no tempo. Dessa maneira, a característica principal do objeto está na sua motiva­ ção de causar a sensação corporal. Drasticamente reduzidos a uma entida­ de de motivação única, esses objetos são, de um ponto de vista objetivo, na melhor das hipóteses parciais e são conhecidos como objetos parciais [ver OBJETOS PARCIAIS; 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE]. Os primeiros objetos concretos têm apenas atributos emocionais. Isso cria um mundo animístico em que tudo sente e tem intenções. E somente mais tarde, com o desenvolvimento de habilidades perceptuais ulteriores, especialmente os receptores de distância, que um conjunto objetivo de atri­ butos pode vir a ser conhecido e atribuído aos objetos reais emocionalmen­ te já existentes. Somente com grande sofisticação é que o mundo dos obje­ tos com sentimentos e o mundo dos objetos inanimados podem ser final­ mente e com precisão separados, e uma representação na memória, ou fi­ nalmente, em símbolos, pode dar-se. AS PRIMEIRAS RELAÇÕES OBJETAIS. No nascimento, acreditava Klein, o bebê se relaciona com objetos que são primitivamente distinguidos do ego: "existem relações objetais desde o nascimento". Estas relações derivam da capacidade inata que o bebê tem de interpretar as suás sensações corpo­ rais; objetos bons que desejam causar sentimentos agradáveis e prazerosos (uma sensação de estar completo, com o mamilo enchendo-lhe a boca, por exemplo, ou a barriguinha cheia de leite morno), e objetos maus que querem causar sentimentos desagradáveis (o objeto que morde, por exem­ plo, que lhe causa dor na boca quando os dentes começam a romper, ou aquele que lhe rói o estômago, provocando a sensação de fome). Em 1935, Klein chegara ao ponto de postular que processos introjetivos achavam-se ativos e criavam objetos internos desde o nascimento: "(...) desde o início o ego introjeta objetos "bons" e "maus", para ambos os R.D.Hinshelwooá / 89

quais o seio da mãe é o protótipo" (Klein, 1935, p. 262). A introjeção de objetos não mais deveria ser entendida como ocasionada pela perda de um objeto amado, nem, tampouco, como dependente da resolução do con­ flito edipiano. A introjeção e a consecução de um objeto "bom" dentro do ego é uma defesa contra a pulsão de morte. As terríficantes imagos, contudo, (...) são um retrato fantasiosamente distorcido dos objetos reais [genito­ res externos] em que se baseiam, [elas] se instalam não apenas no mun­ do externo, mas também através do processo de incorporação, dentro do ego (...) Muito cedo também o ego tenta defender-se contra os perse­ guidores internalizados pelos processos de expulsão e projeção. (Klein, 1935, p. 262). Isto acontece tanto com os objetos aterrorizantes (agora chamados de "maus") quanto com os úteis, os que ajudam ("bons"). Estes estados de achar-se em relação com objetos fantasiosamente maus ou bons são gera­ dos por círculos maldosos ou benévolos, mediante a projeção repetida do objeto interno fantástico para um objeto externo e uma reintrojeção do objeto distorcido que vem aumentar o interno: "Parece que temos aqui dois círculos, um benévolo e outro maldoso, ambos os quais se baseiam na interação de fatores externos ou ambientais e fatores psíquicos inter­ nos" (Klein, 1936, p. 292). A instalação desses objetos internos fantásti­ cos, iniciada quando do nascimento, acarretava o abandono da tentativa de Klein de colocar suas observações de acordo com a visão que Freud ti­ nha do superego. Concedia-lhe; em verdade, uma liberdade muito maior para explorar as vicissitudes dos objetos internos, e, em 1935 e 1940, ela postulou o esboço geral da posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRES­ SIVA]. Narcisismo: Parte dos resultados obtidos pelo Grupo dos Objetos Internos foi uma nova visão do narcisismo, que Heimann (1952) elaborou a partir da idéia, previamente sugerida por Schmideberg (1931) e Riviere (1936), de que o narcisismo representava a retirada da libido do objeto externo para um objeto interno identificado com o ego [ver NARCISISMO], e não simplesmente para o próprio ego. De fato, em um anterior artigo formativo, Klein (1925) analisara dois meninos com tiques nervosos, dos quais até então se pensara (...) como sendo um sintoma narcísico primário (...) A experiência me convenceu de que o tique não é acessível à influência terapêutica enquan­ to a análise não teve êxito em revelar as relações objetais nas quais se baseia. (Klein, 1925, p. 121) O tique não é apenas uma satisfação auto-erótica como a masturbação, mas "(...) fantasias masturbatórias acham-se também ligadas a ele" (Klein, 1925, p. 124), e postulou Klein que essas fantasias masturbatórias consis­ 90 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

tem em partes do corpo do bebê que se acham envolvidas nos movimen­ tos do tique, e que se acham identificadas com um ou outro dos pais que foi íntrojetado e com o qual o bebê se identificou. Este relacionamento in­ tensamente emocional, composto de introjeção e identificação com obje­ tos, existe desde muito cedo no desenvolvimento; na verdade, desde o nas­ cimento. Quando, por exemplo, um bebê suga o polegar, a psicologia é complicada. Ele já introjetou o seio que alimenta por uma maneira tal que este se acha pelo menos parcialmente seguro dentro do bebê, mediante uma identificação com uma parte do corpo da criança. Neste caso, a iden­ tificação com o seio se dá com o polegar do bebê, de maneira que, quan­ do o chupa, está em relacionamento com o seio internalizado, identifica­ do com uma parte do ego (Heimann, 1952). Assimilação do objeto: Uma das dificuldades do conceito de objetos inter­ nos foi figurar as relações reais existentes entre o objeto íntrojetado, o ego e os outros objetos internos. Freud presumira em 1917 que a introjeção im­ plicava uma identificação do objeto com o ego. Em verdade, ele utilizou o termo "identificação" para descrever a internahzação feita por um pacien­ te maníaco-depressivo de seu objeto ambivalentemente amado. Mais tar­ de, em 1923, descreveu a internalização do superego, que tem um desfecho diferente, uma vez que ele se mantém separado do ego ou destaca-se do ego. Isto parece ser contraditório e foi observado por outros psicanalistas (ex., Rado, 1928) [ver ASSIMILAÇÃO]. O ponto, contudo, é que as des­ crições do brincar de crianças feitas por Klein mostravam que a criança pode, em determinado momento, identificar-se com uma das partes do re­ lacionamento (o superego, digamos) e, em outro, tornar-se a criança culpa­ da e em falta, repreendida pelo superego. Esta disposição fluida das identi­ ficações (identificação introjetiva) sugere que objetos internos acham-se disponíveis para o ego com eles se identificar, e existem como um repertó­ rio de identidades, atitudes, papéis, etc. para o ego, em qualquer ocasião determinada ou em qualquer contexto específico. Há, contudo, certos outros tipos de objetos internos, mais patológicos, que parecem existir como intrusos estranhos (tais como os objetos inter­ nos descritos por Schmideberg, 1934, e Heimann, 1942). Esta última des­ creveu-os (1942) como corpos estranhos que não podem ser assimilados, Klein mais tarde (1946) descreveu este problema, dando reconhecimento ao material clínico de Heimann. Descreveu o ego como tendo sido debilita­ do pela identificação projetiva excessiva, ou seja/ que grande número de fragmentos do self foram localizados em objetos externos, de maneira que o ego se experiencia como um self esvaziado — até mesmo despersonalizado —, fraco e vulnerável. Quando o ego se encontra neste estado, os obje­ tos introjetados, mesmo que sejam sentidos como objetos bons, são experienciados como esmagadores e não é possível haver identificação com eles e, portanto, assimilação pelo ego. R.D.Himhelwood / 91

OS OBJETOS NA POSIÇÃO DEPRESSIVA. Alcançar a posição depressiva é, dessa maneira, mais do que conquistar maior capacidade perceptual. Envolve uma intensa situação emocional, preocupada com os objetos par­ ciais em ocionais, e dá origem a uma mudança e uma agitação emocionais especiais, ou seja, à posição depressiva. A mudança no objeto: A descrição inicial que Klein deu da posição depres­ siva repousava na distinção existente entre objetos parciais e objetos totais: (...) a perda do objeto amado se dá durante aquela fase do desenvolvi­ mento em que o ego efetua a transição da incorporação parcial para a incorporação total do objeto (...) os processos que subseqüentemente se tornam claros, como "'perda do objeto amado", são determinados pelo senso de fracasso que o sujeito experiencia (durante o desmame e nos períodos que o precedem ou seguem) em garantir seu objeto "bom e internalizado" (...) Uma das razões para o seu fracasso é ter sido inca­ paz de superar seu pavor paranóide de perseguidores internalizados. (Klein, p. 267) A posição depressiva surge quando o objeto provoca uma confluência de amor e ódio. Ela é estimulada, portanto, pela integração de objetos bons com maus, de maneira que a angústia de odiar o objeto que é amado põe em risco inteiramente o objeto. "Até que o objeto seja amado como um todo", diz Klein, "sua perda não pode ser sentida como um todo" (1935, p. 264). Com isto ela quer dizer que, anteriormente, a perda era sentida como uma privação ativa por parte de um objeto mau: o objeto bom se torna um perseguidor. Já na posição depressiva, sente-se que o objeto, co­ mo um todo, está faltando, foi perdido, ou danificado, e por ele se anseia. Os objetos internos e o mundo externo: Com o começo da apreciação, do objeto externo como um "objeto total", exige-se do bebê que aceite uma visão mais realista da natureza daquele. O mundo animista dos objetos in­ ternos concretos cede e o mundo interno gradualmente se torna separado com mais precisão. A identificação concreta de partes do self e dos obje­ tos dá lugar a uma capacidade de representar objetos para si próprio, e a posição depressiva introduz uma mudança decisiva na exatidão da percep­ ção do objeto externo (ver MUNDO EXTERNO]. O objeto interno concreto continua a ser ligado a um objeto externo através da projeção e sob a influência das exigências corporais. O objeto externo permanece parcialmente construído a partir de fontes internas; es­ ta parte da construção gradativamente diminui, mas dificilmente se pode dizer que desapareça. De modo igual, a construção do mundo interno dos objetos, mediante a introjeção de objetos externos, continua, talvez com intensidade declinante, através de toda a vida. A importância do objeto bom : Antes de 1935, Klein dera ênfase à impor­ tância do objeto perseguidor que cria os círculos viciosos paranóides [ver 92 / Dicionário áo Pensamento Kleiniano

PARANÓIA], Com a posição depressiva, porém, sua ênfase mudou para a importância do objeto bom, um objeto que é necessário, do qual se de­ pende e ao qual se ama, um objeto que tem de ser mantido. No desenvol­ vimento normal, o indivíduo é protegido das relações desoladas e paranóides com o objeto mau perseguidor por possuir internamente um objeto bom e apoiador. A sensação de ter um objeto bom dentro de si é a base da confiança em si próprio, e os distúrbios da autoconfiança resultam de problemas com a manutenção de um bom objeto interno. Por exemplo, diz Klein de Richard, à medida que sua análise prosseguia: A crença na mãe boa interna era o seu maior suporte. Sempre que es­ sa crença se fortalecia, a esperança, a confiança e um sentimento maior de segurança estabeleciam-se. Quando esse sentimento de confiança era, abalado, fosse por doença, fosse por outras causas, então a depressão e as ansiedades hipocondríacas aumentavam. (Klein, 1945, p. 391) M anutenção do objeto interno: A importância do objeto interno é maior na obra subseqüente de Klein, de vez que a luta para alcançar um bom objeto interno, seguro e estável, dentro de si — um objeto com que se pos­ sa identificar — é vista como sendo o cerne de uma personalidade estável, capaz de suportar grandes distúrbios emocionais. A ampliação dada por Abraham ao trabalho de Freud sobre o luto e a doença maníaco-depressiva demonstrara quão precária é, nos estados patológicos, a posse de obje­ tos introjetados no ego. Esta precariedade jaz no fundo de grande parte dos distúrbios e doenças psicológicas. O objeto bom interno tem de ser sustentado contra as fantasias de ataque e dano que são ocasionadas pelo lado "mau” e malvindo do "objeto total". Luto: A descoberta da posição depressiva capacitou então Klein a efetuar uma contribuição significativa para a natureza do luto. No artigo mais tar­ dio sobre a posição depressiva, de 1940, diz ela: A pungência da perda real de uma pessoa amada é, em minha opinião, grandemente aumentada pelas fantasias inconscientes que o enlutado tem de haver também perdido os seus objetos "bons e internos". Sente então que seus objetos internos "maus" predominam e seu mundo inter­ no fica em perigo de ruptura. Sabemos que a perda de uma pessoa ama­ da leva a um impulso, no enlutado, a restabelecer o objeto amado e perdido (Freud, Abraham). A meu ver, porém, ele não apenas recebe em si (reincorpora) a pessoa que acabou de perder, mas também resta­ belece os seus objetos bons internalizados (em última análise, seus pais amados) (...) Também estes são sentidos como tendo sido arruinados, como estando destruídos, sempre que a perda de uma pessoa amada é experienciada. Logo após, vem a posição depressiva arcaica, e, com ela, ansiedades, culpa e sentimentos de perda e pesar são reativados. Se, por exemplo, uma mulher perde o filho por causa da morte deste, junta­ R.D.Hinshehoooâ / 93

mente com a tristeza e a dor o seu pavor arcaico de ser roubada por uma mãe "má" e retaliadora é reativo e confirmado. (Klein, 1940, p. 353) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. OS OBJETOS INTERNOS E A POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE. A ansie­ dade da posição esquizoparanóide relaciona-se principalmente com o me­ do da fragmentação e perda do ego. Isto se acha intimamente vinculado com o destino do objeto interno — um objeto parcial, altamente instável, oscilando de "bom" para "mau". Se, nesta posição, o objeto é atacado, ele se fragmenta, e o ego é sentido como sendo identicamente fragmentado [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE]. Nas descrições da posição esquizoparanóide há uma delicada sensibilidade quanto ao destino dos ob­ jetos, tanto internos quanto, externos. Temores de que o objeto interno bom seja perdido através de projeções forçadas, como se por engano (jo­ gar fora o bebê junto com a água do banho), ou de que objetos maus se­ jam introjetados juntamente com objetos bons (cavalo de Tróia) constituem ansiedades persistentes nos estágios iniciais. O ESFORÇO PARA COMPREENDER OS OBJETOS INTERNOS. Nem to­ dos os analistas interessados em objetos internos acompanharam Klein em sua concepção de que os objetos internos são características do desen­ volvimento normal do ego, mediante a importância central do objeto inter­ no bom, sua perda e sua reintegração na posição depressiva. Brierley lançou-se em novas linhas: "Os objetos internos apenas se anunciam como tais na prática clinica nos casos em que é óbvio que a síntese normal do ego é deficiente" (Brierley, 1939, p. 241). Defendia aí o argumento de que o aparecimento de um objeto interno constitui sinal de psicopatologia gra­ ve e, com efeito, declarou que ele surge do trabalho com as psicoses maníaco-depressivas e outras psicoses. Baseou sua idéia na teoria de Glover dos núcleos do ego (Glover, 1932). Glover descrevera o ego como se for­ mando a partir de núcleos, cada um deles formado ao redor dos fragmen­ tos separados de sensações corporais que o bebê experiencia. Esses núcle­ os de ego gradualmente se reúnem para integrar-se no ego à medida que o desenvolvimento se dá. Em estados de distúrbios graves, contudo, eles não se integram todos, ou então, sob tensão, pode haver uma regressão a um estado integrado do ego, deixando separados alguns núcleos que dão origem, na teoria de Brierley, ao sentimento de algo separado dentro de si. Brierley, pretendendo apoiar esta teoria, apontou que Klein havia en­ dossado a teoria dos núcleos do ego, de Glover. Entretanto, Klein mais tarde (1946) mudou de opinião [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Aqui, Brierley estivera desenvolvendo idéias a respeito *dos estados anormais'do ego e virtualmente ignorara o objeto descrito por Klein. Fuchs (1937), em um artigo que tomava os analistas ingleses a sério (mas foi ignorado por eles), desenvolveu uma idéia um tanto semelhante. Ten­ 94 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

tou ele esclarecer os fenômenos distinguindo duas formas de identificação, dependendo do caráter dos processos de internalização. Por um lado, há uma forma pré-genital de identificação com um objeto, baseada na introjeção e funcionando como defesa contra a perda real de um objeto interno, conduzindo a uma identificação narcísica; por outro, temos uma identifica­ ção parcial com um objeto, em resultado de impulsos genitais, com preser­ vação do objeto externo e conduzindo a uma identificação histérica. Em teoria correlacionada, Matte-Blanco (1941) formulou a hipótese de que o objeto interno fracassa em ser assimilado se ele foi cindido pela agres­ são; doutra maneira, os objetos são assimilados pelo ego de modo harmo­ nioso e discreto. As diversas tentativas de soluções teóricas não levaram a uma aceitação geral da posição kleiniana, tal como definida por Klein (1935, 1946), ísaacs (1940) e Heimann (1942, 1945). Em verdade, a posição confusa foi apre­ sentada por Alix Strachey (1941), que discerniu três usos separados do ter­ mo "'interno": (a) mental; (b) imaginário e (c) dentro. As publicações kleinianas no transcurso de dez anos indicaram estarem se deslocando no sen­ tido do terceiro destes usos, a crença em algo dentro, embora Brierley ain­ da permanecesse incerta em 1942 e solicitasse que os kleinianos decidissem a qual dos usos propostos por Alix Strachey eles aderiam. Estrutura endopsíquica: Fairbairn, em uma série de artigos escritos na déca­ da de 1940 e coligidos em 1952, começou a descrever um novo modelo es­ trutural da mente, no qual três partes do ego se engajam em relações inter­ nas separadas com três objetos internos [ver FAIRBAIRN], De acordo com ele, o objeto que é introjetado é somente o objeto "mau", internalizado co­ mo meio de controlá-lo. A estrutura foi então descrita em forma estável, à maneira pela qual o modelo estrutural de Freud é fixado. Por ambas as maneiras, o modelo estrutural de Fairbairn contrastava com o modelo flui­ do e subjetivamente descrito de Klein. O bjetos internos e representações: Freud descreveu o estabelecimento das representações quando estava elaborando a teoria dos sonhos (Freud, 1900). Na teoria psicanalítica clássica, o único objeto interno é o superego; todos os outros objetos são "representados" na percepção ou na memória. Mui­ tos analistas, portanto, decidiram que o conceito kleiniano de objetos in­ ternos constitui uma tradução do termo clássico "representação de objeto"; entretanto, assim não é. A distinção entre um objeto concreto experienciado, em fantasia, como ativo dentro da personalidade (corpo) e a represen­ tação, na memória, de um objeto é importante. Eles são distinguidos, no primeiro caso, por uma crença onipotente na presença concreta do objeto e, no segundo, por uma representação que o simboliza para o ego, mas com ele não se confunde [ver REALIDADE INTERNA]. Esta distinção cor­ responde à existente entre equação simbólica e símbolos verdadeiros [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS; EQUAÇÃO SIMBÓLICA]. R.D.Hinshehoood / 95

Sandler e Joffe (1969), explorando a distinção entre "ego" e "representa­ ção do self" feita por Hartmann (1950) e Jacobson (1954) [ver PSICOLO­ GIA DO EGO], desenvolveram o conceito de mundo representacional (San­ dler e Rosenblait, 1962) em um modelo para mapear outros arcabouços conceptuais no arcabouço psicanalítico clássico. Ultimamente, Sandler (1989) vem usando este modelo para entender a expressão "objeto inter­ no", a qual, propôs ele, deveria representar a construção teórica, por par­ te do analista, de uma estrutura subjacente no paciente (antes que denotar um aspecto da experiência deste último). O conceito de "objeto interno" partilha, com o de "fantasia inconscien­ te", o papel dos mais originais e inovativos aspectos do trabalho de Klein, e ambos aprofundam a visão que Freud tinha do inconsciente. O concei­ to de "objeto interno" permanece sendo uma força poderosa para entender os distúrbios mentais mais graves, constituindo uma arma igualmente po­ derosa para os mal-entendidos mais graves existentes entre a escola kleiniana e outras escolas psicanalíticas. Temos hoje uma situação em que o caráter misterioso dos "objetos in­ ternos", que tanto preocupava os analistas nas décadas de 1930 e 1940, foi eclipsado (não solucionado) nas de 1970 e 1980 pelos mistérios da "identificação projetiva". Talvez fosse mais útil, ao tentar-se avaliar os méri­ tos relativos da escola kleiniana e da psicologia do ego, que a distinção entre objetos internos e representações fosse tornada foco de atenção, ao invés das disputas mais usualmente teóricas que se dão a respeito da eficá­ cia do conceito de "identificação projetiva".

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6 FASE DA FEMINILIDADE DEFINIÇÃO, Klein descreveu a relação arcaica com o seio como inerentemen­ te carregada. A princípio, ela tem características orais, e as fantasias — sádicas e paranóídes, de sugar, morder ou ser mordido — resultam na for­ ma mais arcaica de ansiedade. Tanto meninos quanto meninas voltam-se do primeiro objeto (mãe) para o pai e o pênis deste. Neste sentido, eles adotam uma posição de feminilidade. Imaginou-se originaímente que o afastamento do objeto primário, a mãe — ou, no nível primitivo, o seio dela —, fosse uma reação ao desma­ me, mas, posteriormente, Klein percebeu~o como mais fundamemental, e deu-se conta de que, na natureza humana, reside uma profunda ambivalên­ cia, que resulta nas características da posição depressiva. Com o desvio do interesse de determinado objeto para o seguinte vai uma etapa de desen­ volvimento, dando origem à importância do pai, como é característico das teorias de Freud. Alternativamente, o grau de ambivalência pode ser tão grande a ponto de inibir as etapas evolutivas, Klein achava estar des­ crevendo observações importantes que não contradiziam as concepções de Freud, mas eram subjacentes a elas e lhes davam mais significado. CRONOLOGIA

1928 Ansiedade ligada a ataques ao corpo da mãe (Klein, Melanie, 1928, "Early stages of the Oedipus confíict'" Klein, Melanie, 1932, The Psycho-Analysis o f Children). 1945 Fase feminina e posição depressiva (Klein, Melanie, 1945, 'The Oedi­ pus complex in the light of early anxieties").

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or meados da década de 1920, Klein ficou convencida de que sua téc­ nica permitia-lhe novos insights por causa das observações muito mais próximas que podia fazer com crianças pequenas, antes que da extrapola­ ção oriunda da psicanálise de adultos ou crianças mais velhas. Contudo, hesitava em fazer as modificações na teoria psicanalítica ortodoxa do com­ plexo de Édipo e, depois, do superego, modificações que se achavam ímR.DMinshelwood / 99

plícitas em suas observações. Ela tinha de ser incaracteristicamente reticen­ te, mas havia uma contribuição que podia fazer, uma contribuição ao inte­ resse contemporâneo na psicologia feminina. CONTRIBUIÇÕES DE KLEIN À SEXUALIDADE ARCAICA. Na época, dé­ cada de 20, esse era um campo escancarado. Ela não tinha de ficar hesi­ tante a respeito de seus resultados, e não ficou. Anunciou as suas desco­ bertas como comparáveis em importância à ansiedade de castração nos menininhos. Havia duas importantes descobertas: (1) a ferocidade e a freqüência de ataques em fantasia ao corpo da m ãe por parte da menininha (e também pelo menininho), os quais levavam ao medo de perder a mãe e também a temores de retaliações por parte desta; (2) o importante processo de descobrir novos objetos com que se relacio­ nar, com o fito de evitar a penosa constelação de ambivalência e medo que se desenvolveu com um objeto antigo. Voltar-se para o pai como no­ vo objeto representa uma fase normal do desenvolvimento, na qual uma atitude feminina com que se relacionar ao pai é expressa. (1) Ataques à mãe. As primeiras análises conduzidas por Klein começaram a mostrar-lhe uma fantasia particular de violência: Então ela saiu do canto específico que chamava de seu quarto, subiu até mim e fez-me toda sorte de ameaças. Me apunhalaria na garganta, me jogaria no pátio, me queimaria ou me entregaria ao policial. Tentou amarrar minhas mãos e meus pés, levantou a capa do sofá e disse que estava fazendo po-kaki-ku cki [nádegas/fezes] (...) Nessa época, já quise­ ra roubar a mãe, que estava grávida, dos filhos dela, matá-la e tomar seu lugar no coito com o pai. Estas tendências ao ódio e à agressão eram a causa de sua fixação à mãe, assim como de seus sentimentos de ansiedade e culpa. (Klein, 1926, p. 131) Toda esta descoberta foi posteriormente resumida com grande clareza: Minha observação dos casos de Trude, Ruth e Rita (...) levou-me a re­ conhecer a existência de uma ansiedade, ou melhor, de uma situação de ansiedade que é específica às meninas e equivalente à ansiedade de castração sentida pelos meninos.. Esta situação de ansiedade culmina pe­ la idéia que tem a menina de que a mãe destr-uir-lhe-á o corpo, abolirlhe-á os conteúdos e tirará os filhos para fora dele (...) Ela baseia-se nos impulsos de agressão que a criança sente contra a mãe, e em seus desejos, que brotam dos estágios iniciais do conflito edipiano, de matála e roubá-la, (Klein, 1932, p. 31) Quando Klein descobriu estas fantasias ansiosas nas análises de 1923-24, elas eram novas para a psicanálise. O ataque ao corpo da mãe e seus con100 / Dicionário do Pensamento Kiemiano

teüdos mostravam-se vividos na manipulação dos brinquedos na sala de atendimento, Riviere descreveu o efeito do desmame: Em conseqüência de desapontamento ou frustração durante a amamen­ tação ou o desmame, acoplados a experiências durante a cena originá­ ria, que é interpretada em termos orais, um sadismo extremamente in­ tenso se desenvolve dirigido a ambos os pais. O desejo de cortar fora o mamilo a dentadas desloca-se, e desejos de destruir, penetrar e destri­ par a mãe, assim como de devorá-la e aos conteúdos de seu corpo, sucedem-no. Tais conteúdos incluem o pênis do pai, as fezes da mãe e o ab­ dômen dela — todas as suas posses e objetos amados, imaginados co­ mo se achando dentro de seu corpo. O desejo de cortar fora o mamilo a dentadas também se desloca, como sabemos, para o desejo de castrar o pai cortando-lhe fora o pênis a dentadas {Riviere, 1929, p. 309-10). (2) Objetos novos. O resultado da agressão para com a mãe é que a criança se volta para o pai com uma atitude feminina: a fase da feminilidade. A princípio, Klein pensou que esta era impelida por uma afronta real feita à criança pela mãe, qual seja, o desmame. "Encaro a privação do seio co­ mo a causa mais fundamental do voltar-se para o pai" (Klein, 1928, p. 193). Mais tarde, contudo, achou que esta surgia da ambivalência ineren­ te com relação a objetos. Voltar-se para novos objetos é o começo de um dos mais importantes passos evolutivos: a capacidade de substituir objetos primários de interes­ se por símbolos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. O ímpeto de explo­ rar objetos novos e a de alargar o mundo do bebê resulta de lesões, da perda, e das fantasias temerosas que as acompanham. Os símbolos têm a qualidade, portanto, de servir de defesa contra as ansiedades da agressão arcaica e fazem parte da elaboração da posição depressiva [ver 10. POSI­ ÇÃO DEPRESSIVA]. SEXUALIDADE FEMININA. O interesse pelo desenvolvimento das meninas foi muito grande durante a década de 1920. Com a crescente emancipação das mulheres após a Primeira Guerra Mundial e a sua aceitação nas profis­ sões liberais, houve um certo número delas que foram capazes de desafiar a opinião de Freud a respeito da "área escura" do desenvolvimento sexual da menina: Apesar de tudo, a conclusão que até agora se tirou das investigações — equivalente, como o é, a uma asserção de que metade da raça huma­ na não se acha contente com o sexo que lhe foi atribuído e só pode su­ perar esse descontentamento em circunstâncias favoráveis — é decidida­ mente insatisfatória, não apenas para o narcisismo feminino como tam­ bém para a ciência biológica (Horney, 1924, p, 52). R.D.Hínshelwood / 101

Horney lançara um desafio e acompanhou esse ato por dissociações cada vez mais estridentes quanto à visão psicanalítica, dominada pelos homens, a respeito das mulheres (Horney, 1926). Freud (1925, 1931) e Jones (1927) tentaram manter-se à altura, mas o ritmo foi dado por analistas femininas (Lampl de Groot, 1928; Riviere, 1929; Deutsch, 1930; Klein, 1932; Horney, 1932, 1933). Em 1930, Deutsch pronunciou uma série de palestras sobre O desenvol­ vimento psíquico das mulheres no Instituto Psicanalítico de Viena, e Hor­ ney (1933), crescendo de modo mais provocativamente independente, anun­ ciou sua concordância com a descoberta kleiniana da furiosa e retaliatória relação com o interior da mãe. Riviere (1934) aproveitou a oportunidade que lhe foi oferecida pela publicação das N ovas conferências introdutórias de Freud para criticar a opinião deste a respeito da psicologia feminina, no meio de uma resenha sob outros aspectos laudatória. Jones (1935) pas­ sou em revista a "nova compreensão" da psicologia das mulheres em uma conferência que pronunciou na Sociedade Psicanalítica de Viena. Ela foi a primeira de uma série de Conferências de Intercâmbio entre Londres e Viena, organizadas por causa das divergências teóricas existentes entre os dois principais centros da psicanálise na época. E significativo que Jones, ao confrontar as diferenças crescentes e ameaçar com o divórcio, tenha to­ mado a sexualidade feminina como tema central. Estava se atrevendo a le­ var a Viena uma das mais importantes divergências quanto às concepções de Freud que permaneciam internas ao mundo psicanalítico [ver DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS]. O DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DAS MENINAS. Decisivo, co­ mo estágio na evolução de sua obra posterior, foi o interesse de Klein pe­ lo desenvolvimento da criança do sexo feminino. Ela concordava com as muitas críticas feitas a respeito das opiniões de Freud sobre o papel da in­ veja do pênis na evolução da menininha. Segundo a visão dele, uma mu­ lher não é mais do que um homem a quem falta algo, e o desenvolvimen­ to da garotinha é determinado pela penosa desfeita que experimenta quan­ do esta descobre a respeito de seu corpo, e, depois, pela busca do objeto a quem culpar — usualmente a mãe. Crítica a Freud: A visão que Freud tinha das mulheres é historicamente re­ lativa, derivando das relações sociais do século XIX. Na realidade social da época, as mulheres eram social, moral, econômica e anatomicamente inferiores. O enfático coro de protestos contra Freud foi que ele subestimou a per­ cepção que a menininha tem de seu espaço interno e do potencial criador de vida de seu corpo — "a negação da vagina". O relacionam ento anterior com a m ãe: Klein achava-se particularmente concentrada em apresentar uma descrição verdadeiramente psicanalítica 102 / Dicionário âo Pensamento Kleiniano

do desenvolvimento da feminilidade. Tomou isto como sendo o conteúdo das ansiedades da criança, à medida que passa através das diversas contor­ ções e voltas do desenvolvimento pulsional, especialmente nas fases prégenitais. Foi contribuição de Klein demonstrar a importância do relaciona­ mento com a mãe antes do que com o pai, e isto levou alguns autores a contrapor Klein a Freud (ex., Chodorow, 1978). Entretanto, a posição de Klein é na realidadè mais sutil, por ela não negar a atitude denegridora detectável em Freud, mas atribuí-la, ao invés, às fantasias da paciente, que é apanhada entre seus impulsos destrutivos para com as mães e as mulheres e impulsos de amor e identificação. O próprio Freud, em trabalho posterior, admitiu a força dessas correções: Nosso insight desta fase inicial, pré-edipiana, nas meninas chega-nos co­ mo uma surpresa, semelhante à descoberta, em outro campo, da civili­ zação mino-miceneana por trás da civilização da Grécia. Tudo na esfe­ ra deste primeiro apego à mãe pareceu-me tão difícil de apreender na análise — tão cinzenta pela idade, e obscura, e quase impossível de revivificar — que era como se houvesse sucumbido a uma repressão espe­ cialmente inexorável. Mas talvez eu tenha ficado com essa impressão porque as mulheres que se achavam em análise comigo foram capazes de aferrar-se ao próprio apego ao pai em que se haviam refugiado da fase inicial que estava em questão. (Freud, 1931, p. 226) Trata-se de um reconhecimento elegante de sua disposição de, pelo menos, considerar as possibilidades maiores abertas às mulheres analistas nesta es­ fera. Ela reconheceu a volta para uma fase de apego feminino ao pai. O conflito aterrorizante da ansiedade de castração, que leva a proces­ sos de amadurecimento e também à amnésia infantil no menininho, tem o seu equivalente na garotínha. Klein chegou a esta descoberta cedo, em seu trabalho com crianças, e enunciou-a categoricamente como sendo "o equivalente da ansiedade de castração no menininho" em suas conferên­ cias de Londres, em 1925 (ver The psycho-analysis ofchildren, Klein, 1932). Em sua opinião, a menina está muito preocupada com o interior do cor­ po da mãe, atraída para ele pela prova da criatividade da mãe em produ­ zir outras crianças e por assistir à mudança e ao tamanho da barriga da mãe durante a gravidez. O interesse no corpo da mãe é determinado por muitos fatores, e Klein postula uma percepção inerente do pai a residir nas entranhas da mãe [ver FIGURA COMBINADA DOS PAIS]. Trata-se de fantasias complexas, que acarretam relações com partes dos corpos da mãe e do pai, assim como entre estas: seio, barriga, traseiro e pênis [ver OBJETOS PARCIAIS]. Elas não são apenas percepções ou imaginações, mas são sentidas com uma intensidade de emoção de natureza muito mis­ ta. A fantasia do pênis do pai dentro da barriga da mãe, ou do seio desta, cria sentimentos enormemente poderosos de exclusão e raiva, que são experienciados como um relacionamento de ódio, de dano e de ser ferido. R.D.Hinshehoood / 103

Os sentimentos da menininha equivalem a um desejo de entrar, despojar e destruir a barriga da mãe e sua criatividade, e o relacionamento que lá existe com o pênis do pai. Esta fantasia primitiva, misteriosa e inconscien­ te, é então igualada pelo temor de que a mãe e os danificados e irados res­ tos de suas entranhas, de seus filhos e do pênis do pai voltem-se contra ela para destruir o seu próprio corpo e os seus próprios filhos, através, exata­ mente, do mesmo tipo de ataque. A menininha teme a mãe como repleta de objetos danificados e, agora, hostis; ao mesmo tempo, sente a perda da mãe como grande amor e protetora. São as fantasias da garotinha, de destruição mútua das entranhas uma da outra que criam um relacionamento intensamente problemático com a mãe. Ele resulta em uma necessidade, semelhante à do menino, de manter amnésia durante este período de desenvolvimento da infância e coloca em movimento uma prolongada elaboração de sentimentos hostis para com a mãe e os pais unidos. Lança as sementes para as ansiedades da mulher adulta a respeito de sua atração física, ou falta dela, e das devastações do processo de envelhecimento. Os suportes da inveja do pênis; Essas ansiedades terrificantes acham-se sub­ jacentes à crença em um corpo danificado que acaba por se expressar co­ mo o problema clássico da inveja do pênis. A menina padece do temor de existir algo errado com o seu corpo (simbolizado pelo pequeno órgão genital externo), o qual se manifestará nos medos, durante a gravidez, de dar à luz bebês deformados; todos esses medos combinam com as deformi­ dades causadas aos bebês e ao pênis que a menininha atacou em fantasia dentro da mãe. O DESENVOLVIMENTO DOS MENINOS. Seguindo estas descobertas a res­ peito das menininhas e da base da inveja que têm do pênis, Klein estendeu a teoria ao menininho. O reconhecimento, por parte de Freud, da dificul­ dade em estendê-la a um ponto tão atrás quanto o primeiro apego à mãe na garotinha sugere poder ser igualmente verdade que o primeiro apego do menininho à mãe foi de igual modo negligenciado pela teoria psicanalítica clássica — e constituía uma área igualmente cinzenta de dúvida. Klein assim resumiu a fase feminina: Ela tem sua base no nível sádico-anal e concede a esse nível um conteú­ do novo, pois as fezes são agora igualadas à criança pela qual se anseia e o desejo de roubar a mãe aplica-se agora à criança, tanto quanto às fezes. Podemos aqui discernir dois objetivos que se fundem. Um está dirigido para o desejo de ter filhos, sendo a intenção apropriar-se deles, enquanto que a outra meta é motivada pelo ciúme dos futuros irmãos e irmãs cujo aparecimento é esperado e pelo desejo de destruí-los dentro da mãe. (Um terceiro objeto das tendências sádico-orais do menino, den­ tro da mãe, é o pênis do pai.) (Klein, 1928, p. 189-90) 104 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

Dessa maneira, também o menino tem uma fase feminina: Tal como no complexo de castração das meninas, também no comple­ xo de feminilidade do homem existe, no fundo, o desejo frustrado de um órgão especial. As tendências a roubar e destruir estão relacionadas aos órgãos da concepção, gravidez e parto, que o menino presume exis­ tirem na mãe, e, ainda, à vagina e aos seios, a fonte do leite (...) O menino teme o castigo por sua destruição do corpo da mãe, mas, ao la­ do disso, seu medo é de natureza mais geral, e temos aqui uma analo­ gia com a ansiedade associada aos desejos de castração da menina. O menino teme que seu corpo seja mutilado e desmembrado, e este pavor também significa castração (...) Este pavor da mãe é tão esmagador por estar combinado com ele um intenso pavor de castração pelo pai. As tendências destrutivas cujo objeto é o útero são também dirigidas, com sua plena intensidade sádico-oral e sádico-anal, contra o pênis do pai, que se imagina estar localizado lá (...) Dessa maneira, a fase da femini­ lidade se caracteriza por uma ansiedade relacionada ao útero e ao pênis do pai; esta ansiedade sujeita o menino à tirania de um superego que devora, desmembra e castra e que é formado igualmente a partir da imagem do pai e da mãe. (Klein, 1928, p. 190) O suporte da ansiedade de castração: Foi por esta maneira que Klein inves­ tigou os fatores subjacentes à ansiedade de castração. Contudo, ela negli­ genciou completamente o fato de haver brutalmente arrancado o conceito de ansiedade de castração de suas intrincadas ligações teóricas com o com­ plexo de Édipo. Em verdade, suas hipóteses levaram-na ainda mais a mo­ dificar o último (ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. A fase da feminilidade está saturada por uma atenção particular a assun­ tos internos e a uma necessidade específica de mobilizar solidariedades compensadora, amor e identificação com as mulheres e os interesses femininos. Este enfoque do que é interno constituiu uma compreensão importante, que resultou na teoria em grande escala do mundo interno e dos objetos internos. Abrangeu também uma compreensão do desenvolvimento caracterológico do interesse das mulheres por seus interiores corporais e, a pro­ pósito, do interesse dos homens pelos interiores corporais das mulheres. PRIMEIROS ESTÁGIOS DO COMPLEXO DE ÉDIPO. A importância da fa­ se da feminilidade esmaeceu gradualmente após Klein descrever a posição depressiva. Seu interesse nos efeitos da ambivalência nos relacionamentos já não dependia mais tão intensamente de manter-se alinhada com as teo­ rias clássicas. A experiência penosa de atacar a mãe, seus seios, seu cor­ po e tudo o mais dela ficou englobado na ansiedade geral dos ataques ao objeto amado, ou do dano a este. O voltar-se para o pai representava a fase feminina tanto em meninos quanto em meninas, e o relacionamento que se volta para ele é de uma R.D.Hinshelwood / 105

ambivalência inerente. Dessa maneira, a dor e o sofrimento da posição de­ pressiva também se acham envolvidos aqui. Estas ansiedades [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA], experimentadas nos "prinadros estágios do complexo de Édipo", são forças poderosas para a promoção do desenvolvimento, assim como para causar dificuldades e a parada do crescimento (fixações): A gratificação experienciada ao seio da mãe capacita o bebê a voltar seus desejos na direção de novos objetos, primeiro de tudo no sentido do pênis do pai. Um ímpeto específico, contudo, é dado ao novo dese­ jo pela frustração na relação como seio. (Klein, 1945, p. 408) A relação com o seio é dupla. Tanto o aspecto positivo dela como instiga­ ção a desenvolver novas experiências e relacionamentos, quanto os aspec­ tos negativos podem acentuar (os últimos, provavelmente, de modo prema­ turo e ansioso) um passo evolutivo à frente [ver DESENVOLVIMENTO]. Esta atitude dupla (ambivalente) acaba por ser transferida para o pênis: A frustração e a gratificação, desde o início, moldam a relação do be­ bê com um seio bom e amado e um seio mau e odiado. A necessidade de lidar com a frustração e com a agressão que se lhe seguem é um dos fatores que levam a idealizar o seio bom e a mãe boa e, correspondente­ mente, a intensificar o ódio e os temores do seio mau e da mãe má, que se torna o protótipo de todos os objetos perseguidores e assustado­ res. As duas atitudes conflitantes para com o seio da mãe são transferi­ das para a nova relação com o pênis do pai. A frustração sofrida na re­ lação anterior aumenta as exigências e as esperanças em relação à no­ va fonte e estimula o amor pelo novo objeto. (Klein, 1945, p. 408) As duas atitudes conflitantes para com a mãe — com o terceiro objeto (o pai) — são integradas à complexidade dos complexos edipianos coexistentes, positivo e invertido [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. DESENVOLVIMENTO SEXUAL ANORMAL. O desenvolvimento da identi­ dade sexual depende do manejo bem sucedido destas ansiedades persecutórias arcaicas. De acordo com Klein, os desvios do desenvolvimento hete­ rossexual resultam da persistência de intensa ansiedade persecutória e paranóide. Com relação a isto, ela desenvolveu as idéias dos psicanalistas clás­ sicos. Freud atribuira o homossexalismo a uma repulsa por parte do geni­ tor amado do sexo oposto, com a conseqüente volta para o genitor do mesmo sexo como objeto amado. Abraham começou a examinar a homos­ sexualidade em termos das identificações baseadas em introjeções dos pais. Klein encarou o homossexualismo de ambos os pontos de vista. Sua con­ tribuição específica foi de que o voltar-se para um objeto novo e a introjeção satisfatória de um objeto com que se identificar resultavam do equilí­ brio de forças sádicas e forças afetuosas, em uma complicada interação 106 / Dicionário do Pensamento Kíeiniano

com os objetos externos reais: "Quando o temor [do menininho] do pai castrador é mitigado peia confiança no pai bom, ele pode enfrentar seu ódio e rivalidade edipiana" (Klein, 1945, p. 411). Nesta passagem, estava ela transmitindo a idéia de que o menino busca um pai bom que possa introjetar como apoio interno que lhe fortaleça a confiança em si mesmo co­ mo homem e ajude-o a enfrentar o seu próprio ódio pelo pai. Isto por sua vez repousa, em grande medida, em ser o pai real capaz de suportar o ódio do filho sem deixá-lo privado de apoio por parte do primeiro. Em contraste com a visão de Freud de que a homossexualidade latente é subjacente à paranóia — veja-se a análise por ele feita de Schreber, por exemplo (Freud, 1911) — Klein apontou para a possibilidade de que temo­ res paranóides se achem subjacentes ao homossexualismo. Rosenfeld (1949) examinou explicitamente esta revisão. As perversões sexuais, mesmo as sadomasoquistas, foram muito pouco estudadas pelos kleinianos. Tanto Hunter (1954) quanto Joseph (1971) ana­ lisaram fetichistas e demonstraram o voltar-se para um objeto substituto que, sendo inanimado, aliviava um pouco da penosa ambivalência dos ob­ jetos humanos amados. Joseph foi particularmente meticulosa ao definir a necessidade do objeto como sendo uma premência febril de entrar bem dentro dele, uma forma concreta de identificação projetiva. Em geral, as perversões são tipicamente consideradas como possuindo a forma descri­ ta por Rosenfeld (1949), em que o afastamento e o voltar-se para substitu­ tos sexuais derivam de uma ansiedade persecutória paranóide. O interes­ se, portanto, não reside tanto na forma específica da sexualidade perver­ sa, mas na paranóia ou na inveja subjacentes a que o analista remontou o conflito (Gallwey, 1979) [ver PERVERSÃO]. A idéia da fase de feminilidade de meninas e meninos, caracterizada por grande ciúme e agressão, foi importante para Klein na época (as déca­ das de 1920 e 1930), por ser uma hipótese que apontava para a força de sua técnica através do brincar na revelação de maiores detalhes do desen­ volvimento sexual infantil e de suas aberrações subjacentes à psicopatologia da infância (e adulta) com que a psicanálise clássica se havia até então ocupado. Contudo, após Klein haver adotado a pulsão de morte como ten­ do importância igual à Iibido sexual (1932), a atenção concedida por ela ao desenvolvimento dos objetos e identificações sexuais esmaeceu um pou­ co, à medida que a importância da agressão primária vinha para o primei­ ro plano. Entretanto, a fantasia específica de intrusão com dano ao inte­ rior do objeto retornou por conta própria. Em 1957, a teoria da inveja pri­ mária [ver 12. INVEJA] enfatizou-a como sendo uma fantasia inata que representa a pulsão de morte; as conotações específicas com o desenvolvi­ mento sexual, porém, haviam dela se desprendido. Chodorow, Nartcy (1978), The reproduction o f mothering, Berkeley, University of Califórnia Press.

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7 SUPEREGO DEFINIÇÃO, O trabalho de Klein desafiou a teoria clássica do superego, que consistia nos pais internalizados (imagos), que representam os padrões so­ ciais, a capacidade de auto-avaliação e a origem de certos estados de men­ te tais como culpa, falta de valor e auto-estima. Na visão de Klein, o superego pode ser decomposto em um certo número de figuras internas, conhe­ cidas como objetos internos, que se acham em relação consigo mesmos, assim como com o ego. Durante o primeiro período de seu trabalho (1920-32), Klein preocupou-se muito com o superego e as origens deste, que apareciam mais cedo que a teoria de Freud permitia. Ao final, após uma longa e contrafeita aceitação da teoria clássica de Freud, ela desenvol­ veu a sua própria visão, radicalmente diferente das origens daquela instân­ cia no desvio inicial da pulsão de morte. CRONOLOGIA 1926 Culpa inconsciente e o superego severo (Klein, Melanie, 1927, "Cri­ minal tendencies in normal children"). 1929 Objetos internos múltiplos. 1932 O superego e a pulsão de morte (Klein, Melanie, 1932, "Early stages of the Oedipus conflict and of superego formation". (Capitulo 8 de The psycho-analysis o f children)', Klein, Melanie, 1933, "The early development of conscience in the child"). 1935 Culpa e a posição depressiva (Klein, Melanie, 1935, "A contribution to the psychogenesis of manic-depressive States"). esde o inicio de seu trabalho, até 1932, Klein esforçou-se por enten­ der a experiência do remorso e da culpa em seus pacientes infantis, e, a partir de 1923, quando Freud produziu a sua própria teoria do supere­ go como sendo a fonte da culpa, não apenas teve de esforçar-se para enten­ der seus pacientes, mas também descobriu-se em oposição às opiniões orto­ doxas. Ela constantemente tentou incluir as suas descobertas dentro do* ar­ cabouço teórico "correto" do superego, mas cada vez com menos sucesso,

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à medida que o tempo passava. Acabou por romper com a visão ortodo­ xa em 1932, quando adotou o superego como sendo a manifestação da pulsão de morte, visão que permanece, hoje tal como então, oposta à psi­ canálise clássica. Entretanto, a importância do conceito de superego vem diminuindo no pensamento kleiniano desde 1935, quando o conceito da posição depressiva surgiu e tornou-se a sua teoria de culpa em plena escala. O problem a: O problema principal era que Klein, desde o começo de seu trabalho, em 1918, descobrira intensos sentimentos de remorso em crian­ ças, algumas delas contando apenas dois anos e poucos meses. Cinco anos depois, porém, em 1923, Freud descreveu a culpa como se originando do superego, que se forma após o complexo de Édipo na posição genital, con­ cedendo ao superego uma data no desenvolvimento, por volta de quatro a cinco anos. As opiniões de Klein vieram a divergir disso por três manei­ ras principais: (i) as formas arcaicas; (ii) constituintes múltiplos, e (iii) uma história evolutiva específica do superego, de severo para mais suave. REMORSO. Klein datou de 1923 a sua compreensão da importância da cul­ pa {Klein, 1955), época em que analisou Rita, uma criança de apenas dois anos e nove meses: "a causa destes fenômenos comuns era um sentimento de culpa particularmente forte subjacente ao p av o r nocturnus" [terror no­ turno] (Klein, 1926, p. 131). Rita era perturbada por sua própria agressivi­ dade e afetada por remorso e culpa desde a idade de quinze meses, quan­ do os seus sintomas haviam começado. Nesse mesmo ano, 1923, Freud descreveu a culpa como sendo o resulta­ do de um conflito interno entre as pulsões (o id) e o "superego". Durante algum tempo ele estivera ocupado com um fenômeno que chamara de sen­ timento inconsciente de culpa ou necessidade inconsciente de castigo (Freud, 1916, 1920). Com o surgimento de sua teoria do superego no mesmo ano (Freud, 1923), a culpa achava-se claramente na agenda para debate atra­ vés da comunidade psicanalítica [ver CULPA INCONSCIENTE], A teoria freudiana da culpa e do superego. Até esse ponto, Freud não tivera conhecimento de Klein ou de suas provas de remorso arcaico. Ela deve ter ficado ao mesmo tempo emocionada e desalentada pela nova teoria dele; emocionada porque concedia a seu próprio trabalho importância e um ar­ cabouço teorico, alem de permitir-lhe fornecer provas clínicas àquele gran­ de homem, mas desalentada porque a teoria declarava categoricamente que a instância moral interna, o superego, se formava por volta da idade de quatro ou cinco anos. Freud confirmou a importância de suas próprias concepções no ano seguinte, em seu artigo a respeito da dissolução do com­ plexo de Édipo (Freud, 1924b). O molde acl)ava-se então criado para uma nova ortodoxia em psicanálise, a qual persistiu até os dias de hoje. 110 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

O herdeiro do complexo de Édipo. Segundo essa visão, o superego é o "her­ deiro do complexo de Édipo" (Freud, 1923, p. 48} e se forma através da introjeção dos objetos amados edipianos (mãe e pai): a introjeção das "ídentificações primárias". Eles são recebidos dentro do ego (dentro da perso­ nalidade) e estabelecidos como parte da instância autocrítica interna e vigi­ lante. A visão que Freud tinha do superego formou-se baseada em suas descobertas a respeito do luto (1917), por meio da descrição da resolução do complexo de Édipo como sendo um processo de introjetâr os seres ama­ dos (sexuais) da infância, no ato de desistir deles por causa da ansiedade de castração. O resultado disso era um relacionamento interno com uma figura moldada nos genitores, com o mesmo tipo de papel de guardião e censor. O trabalho surgiu de uma colaboração persistente com Abraham (que trabalhava em Berlim), o qual desenvolvera suas próprias concepções em um longo artigo de 1924, ou seja, o ano em que Klein estava fazendo sua própria psicanálise com ele. O esforço de Klein. Uma vez inteiramente elaborada a teoria do superego, Freud ficara então mais capacitado a fazer mais sentido da culpa inconscien­ te, vinculando-a também ao masoquismo (Freud, 1924a). A nova teoria tornou a culpa inconsciente e a necessidade de castigo um tópico de consi­ derável interesse e confusão (ver, por exemplo, Glover, 1926; Fenichel, 1928). Onde existia perplexidade e confusão no mundo psicanalítico, Klein não se achava muito atrás, mostrando como a análise de crianças podia lançar luz sobre os pontos mais escuros. Sua primeira referência ao supere­ go foi feita em 1926 e, no ano seguinte, ela investigou a teoria original de Freud (Freud, 1916), de que a culpa inconsciente era a força propulsora por trás do comportamento criminoso (Klein, 1927). Contudo, o conceito de superego de Freud colocara problemas para Klein em uma ocasião em que ela se achava também em análise com o mais próximo colaborador de Freud, Abraham. Ela nunca questionou a existência do superego; era tudo uma questão de datas. A fonte da culpa, na teoria de Freud, surgia como sendo uma resolução do complexo de Édi­ po por volta da idade de quatro ou cinco anos, e no entanto Klein tinha provas de culpa e remorso em seus pacientes que remontavam ao segun­ do ano de vida. A posição dela na Sociedade Psicanalítica de Berlim, como uma jovem e inexperiente (e talvez bastante difícil) recém-chegada, era precária, espe­ cialmente após a morte, em 1926, de seu próprio mentor e analista Abra­ ham. Em resultado disso, ela insistiu desesperadamente em que não se acha­ va em conflito com Freud e esperançosamente escreveu (em sua primeira referência ao superego): Nos casos que analisei, o efeito inibitório dos sentimentos de culpa era claro desde uma idade muito inicial. O que aqui encontramos correspon­ de ao que conhecemos como superego nos adultos. O fato de presumir­ R.D.Hinshelwood / 111

mos que o complexo de Édipo atinja seu auge por volta do quarto ano de vida e reconhecermos o desenvolvimento do superego como resulta­ do final do complexo não me parece contradizer essas observações de maneira alguma. (Klein, 1926, p. 133) Ela sustentou até 1932 não existir discordância real dela com Freud, opi­ nião ardentemente contestada por Anna Freud no inflamado debate (1926-7) entre as duas mulheres [ver ANNA FREUD; ANÁLISE DE CRIANÇAS* 1. TÉCNICA]. A despeito de suas negativas, Klein alterou de modo significativo a teo­ ria de Freud, e também para ela contribuiu: Estes fenômenos definidos e típicos, cuja existência na forma mais clara­ mente desenvolvida podemos reconhecer quando o complexo de Édipo alcançou o seu auge e que precedem o seu declínio, são meramente o término de uma evolução que ocupa anos. A análise de crianças muito pequenas mostra que, assim que surge o complexo de Édipo, elas come­ çam a elaborá-lo e, por esse meio, a desenvolver o superego. (Klein, 1926, p. 133) Ao que ela estava se referindo aqui era que o superego plenamente desen­ volvido é tudo aquilo que é corretamente reconhecido a partir da distância das análises de adultos, mas também que, do ponto de vista privilegiado da análise de crianças, o processo arcaico de formação do superego podia ser descrito com pormenores muito mais precisos. De fato, antes da nova teoria estrutural de Freud, tinha havido sugestões da existência de instân­ cias “morais" arcaicas dentro da mente: Abraham (1924) descrevera a ini­ bição interna da voracidade oral e Ferenczi (1925) introduzira a idéia de uma "moralidade esfincteriana" que derivava da fase anal. A poio por parte da Sociedade Britânica.* Inconvenientemente, Abraham faleceu em 1925 e a Sociedade Psicanalítica de Berlim teve de escolher en­ tre endossar as concepções dessa desafiadora mas ainda insignificante no­ va analista ou rejeitá-la e a seu trabalho não testado com crianças. Ela já apresentara trabalhos desafiadores e impopulares, tais como, por exemplo, o seu artigo sobre os tiques nervosos (Klein, 1925) [ver 2. FANTASIA IN­ CONSCIENTE]. A Sociedade de Berlim não lhe concedeu o reconhecimen­ to e o apoio imediatos que ela desejava e precisava, de maneira que ficou vulnerável às propostas provindas da Grã-Bretanha. Decidira-se a analisar as formas arcaicas da vida mental e da ansiedade e, com a finalidade de proporcionar-se lugar para fazer isso sem ser importunada, mudou-se pa­ ra Londres (1926), onde lhe foi concedido considerável apoio para suas descobertas (Jones, 1926, 1927; Isaacs, 1929). Não está claro por que Ernest Jones, alguém de alta posição no mundo psicanalítico internacional, tenha feito essas propostas a uma "arrivista" pouco conhecida. Pode ter sido o desejo sub-reptício dele de tentar arran­ 112 / Dicionário do Pensamento Kleirüano

car um pouco da iniciativa científica de Viena para Londres ou pode ter precisado de alguém para tratar um membro jovem de sua própria famí­ lia. Ao continuar sua linha de evolução por trás do fosso defensivo do Canal da Mancha, Klein provocou conflito do outro lado do continente europeu com sua rival, Anna Freud [ver ANNA FREUD), O conflito entre elas atingiu o auge entre 1926 e 1943 e centralizou-se, em primeira instân­ cia, em torno da natureza e do momento da origem do superego, O próprio Jones mostrou-se bastante crítico do conceito de Freud e, pouco tempo após as descrições originais (Freud, 1923), escreveu, numa mistura de obsequiosidade e critica incisiva: Contudo, quando abandonamos essas valiosas generalizações amplas e chegamos a um estudo mais próximo dos problemas neles envolvidos, um considerável número de questões desajeitadas se apresenta. Para mencionar apenas algumas delas neste ponto, como podemos conceber a mesma instituição como sendo tanto um objeto que se apresenta ao id para ser amado, em lugar dos pais, e como uma força que critica o ego? Se o superego surge da incorporação do objeto amoroso abandona­ do, como acontece que ele em verdade com mais frequência derive do genitor do mesmo sexo? Se ele é composto de elementos tirados das pulsões "morais" e não sexuais do ego, tal como devemos esperar do papel que desempenha na repressão das pulsões incestuosas sexuais, donde deriva ele sua natureza sádica, isto é, sexual? (Jones, 1926, p. 304) AS CONCEPÇÕES DIVERGENTES DE KLEIN. As concepções de Klein a respeito do superego divergiam das de Freud em três aspectos principais: (1) a origem do superego é muito anterior à sugerida por Freud; (2) os constituintes do superego são múltiplos e variados, não um amálga­ ma monolítico dos pais edipíanos introjetados, e (3) devido ao curso evolutivo muito mais longo, o superego passa por pro­ cessos de modificação, particularmente uma suavização de sua dureza e uma integração de suas partes contraditórias. (1) A origem do superego. Embora Klein aceitasse a descrição que Freud de­ ra do superego, ela não concordava com sua origem somente no quarto ou quinto ano de vida; suas provas daras dos sentimentos arcaicos de cul­ pa apresentavam as origens do superego como sendo no segundo ano de vida, no máximo. Quais eram essas provas? (a) A prova direta: A análise de crianças pequenas, com menos de quatro a cinco anos, mostrava provas diretas de remorso e culpa. (b) A prova dos sintomas continuados: As fantasias subjacentes envolvi­ das em sintomas podem ser imaginadas como operando na ocasião eirt que os sintomas começaram; por exemplo: R.D.Hinshelwood / 113

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O caso de Rita claramente mostrava que o pavor noctum us que apare­ cera à idade de dezoito meses de idade era uma elaboração neurótica de seu complexo de Édipo (...) [e se achava] muito intimamente vincula­ da a fortes sentimentos de culpa que surgiam desse conflito edipiano arcaico. (Klein, 1932, p. 4) Schmideberg expressa claramente a lógica disso: Presumo que os determinantes para os sintomas que encontrei aos três anos de idade tenham estado continuadamente em operação desde a ocasião em que os sintomas pela primeira vez ocorreram. Isto não é sus­ cetível de prova, mas a mesma presunção foi assumida por Freud quan­ do utilizou os fatores revelados na análise de adultos para explicar sinto­ mas que haviam ocorrido na infância. (Schmideberg, 1934, p, 257-8) (c) A severidade do superego da criança: Algo para que Klein continuada­ mente apontava era a qualidade da culpa, que sugeria um superego extre­ mamente severo, muito mais que nos adultos — único aspecto do trabalho de Klein a que Freud um dia se referiu (Freud, 1930). Exemplificando, Erna experienciara um treinamento de asseio muito precoce aos doze meses de idade, "(...) na realidade efetuado sem qualquer tipo de severidade", mas a menininha o vívenciou "(...) como um ato muito cruel de coerção", do qual os seus sintomas se desenvolveram, indicando "(...) sua sensibilida­ de à atribuição de culpa e o precoce e acentuado desenvolvimento de seu sentimento de culpa" nessa idade (Klein, 1926, p. 136n). Em verdade, Klein demonstrou que, quanto mais jovem a criança, mais severo é o superego, sugerindo que, no desenvolvimento da criança, exis­ te um processo de modificação e suavização contínua de um superego ar­ caico sádico, que persegue a criança com idéias de horripilantes castigos. A implicação é que o superego severo acha-se relacionado a fases pré-genitais do sadismo, tal como descritas e datadas por Abraham (1924). Em 1927, Klein fortaleceu esta visão do superego severo quando, seguin­ do Freud (1916), interessou-se pelas características criminais nas crianças e a relação delas com a culpa e com o sadismo a que a culpa dava origem (Klein, 1927) [ver CRIMINALIDADE]. (d) O superego prê-genital: A quarta forma de prova se acha no caráter pré-genital das fantasias envolvidas, a indicar uma origem nas fases prégenitais. A severidade específica do superego em algumas crianças (Erna, por exemplo) "(...) porta a marca dos impulsos pré-genitais". (Klein, 1929, p. 204). (...) a criança então teme um castigo correspondente à ofensa; o supere­ go se toma algo que morde, devora e corta. A conexão entre a forma­ ção do superego e as fases pré-genitais do desenvolvimento é muito im­ portante, desde dois pontos de vista. Por um lado, o sentimento de cul­ pa liga-se às fases sádico-orais e sádico-anais, que ainda predominam; 114 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

por outro, o superego surge enquanto essas fases se acham em ascendên­ cia, o que explica a sua atividade sádica. (Klein, 1928, p. 187) (2) Os constituintes do superego. O superego, formando-se no contexto de impulsos orais e anais, resulta em várias figuras internalizadas baseadas tanto na mãe quanto no pai: A análise de crianças pequenas revela a estrutura do superego como cons­ tituída por identificações que datam de períodos e estratos muito dife­ rentes da vida mental. Essas identificações são surpreendentemente con­ traditórias em natureza, com a bondade excessiva e a severidade exces­ siva existindo lado a lado. (Klein, 1928, p. 187) Essas imagos (figuras internalizadas baseadas nos país) representam portan­ to, para a criança, atividades orais ou atividades anais dirigidas à própria criança. Essas relações internas podem ser representadas por fantasias de ser alimentada, ser devorada ou mordida, ou de alimentar o objeto (o "ro­ er da própria consciência", por exemplo); o mesmo acontece com os im­ pulsos anais. Klein descreveu esse catálogo de relações em fabuloso deta­ lhe no brincar das crianças com todos os tipos de objetos. A partir de então, o superego é visto como um conjunto completo de objetos internos, cada um deles dotado de funções específicas de fantasia [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE], e a psicanálise kleiniana, na práti­ ca, torna-se cada vez mais uma análise desses objetos internalizados. Isso era dar uma tendência ampliadora ao conceito, em contraste com Freud, que, ao substituir "o ideal do ego pelo superego tendera a resumir os rela­ cionamentos objetais intrapsíquicos à relação existente entre o ego e o su­ perego" (Heimann, 1955, p. 251). A comunidade interna de objetos: A mente da criança acha-se ocupada por muitos "objetos" que poderíam ser chamados de superegos [ver 5. OB­ JETOS INTERNOS]. Klein refere-se a eles como imagos, e a variedade des­ tas concede grande riqueza às características da mente: (...) dois "personagens" principais: o da boneca, que corporificava o id, e o do elefante coibidor, que representava o superego (...) Os "perso­ nagens", tal como no caso de George, consistem em três papéis princi­ pais: o do ego ou do id, o de uma figura que ajuda e o de uma figura que ameaça ou frustra. (Klein, 1929, p. 202-3) Esta variedade é ampliada por uma distinção entre bom e mau: "Vim a dar-me conta de que a operação de tais imagos, com características fantas­ ticamente boas e fantasticamente más, é um mecanismo geral". As imagos são também diferentes em relação ao nível pré-genital que representam: "As imagos adotadas nesta fase inicial de desenvolvimento do ego portam a marca das noções pulsionais pré-genitais, embora sejam na realidade cons­ R,D.Himhelwood / 115

truídas com base em objetos edipianos reais", acrescenta ela lealmente, e continua: Estes níveis iniciais são responsáveis pelas fantásticas imagos que devo­ ram, cortam em pedacinhos, subjugam, e nas quais vemos uma mistu­ ra dos variados impulsos pré-genitais em operação. Acompanhando a evolução da íibido, estas imagos são íntrojetadas sob a influência dos pontos libidinais de fixação. O superego, porém, como um todo, é cons­ tituído pelas várias identificações adotadas nos diferentes níveis de de­ senvolvimento cuja marca portam. (Klein, 1929, p. 204) Figuras de ajuda: Cada vez mais Klein notou que essas figuras incluíam fi­ guras de ajuda, assim como figuras terrificantes e sádicas. As de ajuda cor­ respondem àquelas que proporcionam satisfação dos impulsos pré-genitais. Entretanto, a importância das figuras de ajuda parece ter sido secundária para Klein neste estágio de seu pensamento, de vez que as observações da agressividade no brincar das crianças e da culpa e do remorso por cau­ sa dela haviam sido muito proeminentes e chocantes. Foi somente em 1935 que a importância das figuras internas de ajuda chegou apropriadamente ao primeiro plano e, então, com a introdução da posição depressiva, o ob­ jeto interno bom e a preservação dele tornaram-se o fator mais importan­ te [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. (3) Modificação do superego. A severidade do superego é progressivamente modificada, principalmente através da influência do objeto externo real: Comparado com o estágio precedente, em que o brincar era completa­ mente inibido, isto era um progresso, pois agora o superego não simples­ mente ameaçava de maneira terríficante e sem sentido, mas tentava, com ameaças, impedir as ações proibidas. (Klein, 1929, p. 202) As figuras de ajuda também começam a influenciar. Elas "são, na maior parte, de um tipo extremamente fantasioso". (Klein, 1929, p. 203) e deri­ vam, parcialmente, pelo menos, de um ímpeto para a frente, no sentido dos impulsos genitais, o qual dá acesso a sentimentos mais positivos e à possibilidade de que figuras mais prestativas mitiguem a severidade. A síntese dos objetos internos: Klein estava agudamente ciente da divergên­ cia existente entre suas concepções e as de Freud. Este descrevera um obje­ to reíatívamente unificado por volta da idade de quatro ou cinco anos, e Klein enganchou sua teoria a isso, pensando em termos da reunião das va­ riadas imagos em algum tipo de objeto unitário posteriormente observável como sendo o superego descrito por Freud: "A necessidade de uma sínte­ se do superego surge da dificuldade experienciada pelo sujeito em chegar a um entendimento com um superego constituído de imagos de naturezas tão opostas" (Klein, 1929, p. 205). Esta idéia de um ego impelido na dire­ ção de um esforço unificador sobre os objetos internos parece, nesta oca­ 116 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

sião (1929), achar-se no contexto das próprias preocupações dela a respei­ to de estar divergindo das concepções de Freud. Contudo, a idéia unifica­ dora retorna, de forma muito diferente e vigorosa, em 1935, fazendo par­ te do desenvolvimento a que deu o nome de posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA], O objeto externo: Ao resumir as suas opiniões neste estágio, Klein escreveu: No adulto, é verdade encontramos em ação um superego que é bastan­ te mais severo do que os pais do sujeito foram na realidade (...) na crian­ ça pequena, deparamo-nos com um superego do mais incrível e fantásti­ co caráter (...) Não tenho dúvidas, de minhas próprias observações ana­ líticas, que os objetos reais por trás dessas figuras imaginárias e terrificantes são os próprios pais da criança, e que essas formas apavorantes de uma maneira ou outra refletem as feições do pai ou da mãe, por dis­ torcida e fantasiosa que a semelhança possa ser. (Klein, 1933, p. 249) Aqui, ela estava se enganchando à teoria clássica da origem do superego no caráter dos pais. Entretanto, era a distorção extremada dessas figuras o que a preocupava; a investigação dos processos envolvidos nessa distor­ ção extrema tornou-se a marca distintiva da psicanálise kleiniana. Ao considerar o superego como uma interação de figuras externas introjetadas sob a influência deformante de impulsos sádicos arcaicos, Klein aprofundou a teoria das origens do superego mais além de uma mera cor­ respondência entre algum objeto externo e a introjeção resultante. O superego e o efeito terapêutico: James Strachey (1934) delineou uma te­ oria formal da ação terapêutica da psicanálise baseada na idéia de que o objeto externo, o analista, é introjetado para tornar-se um superego auxi­ liar. A vantagem especial deste novo objeto interno é que, através da fun­ ção de interpretar a transferência, o analista evita ser distorcido pela fanta­ sia inconsciente primitiva e não se identifica então com o objeto interno primitivamente bom ou com o primitivamente mau (as imagos primitivas). Neste caso, o paciente fica então capaz de sustentar um relacionamento objetai interno que não se baseia na autocondenação horrorizada ou na idealização extremada [ver 1. TÉCNICA]. O ABANDONO DA TEORIA CLÁSSICA. O famoso artigo de Strachey foi escrito em um momento decisivo do pensamento, kleiniano. As idéias dele ligavam-se parcialmente à mudança radical de direção que Klein estava efe­ tuando: (1) em 1932, ela abandonara a teoria ortodoxa do superego e a tornara uma manifestação clínica e intrapsíquica da pulsão de morte, e (2) em 1935, publicada a sua teoria da posição depressiva, que tratava da his­ tória evolutiva das imagos primitivas que Strachey estava também conceptualizando. R.D.Hinshelwood / 117

(1) O superego e a pulsão de morte. Klein via-se continuamente empurrada para longe de sua lealdade à teoria clássica. Sua "pequena" modificação da visão de Freud a respeito das origens do superego — ou seja, que o su­ perego surge a partir do momento em que o complexo de Édipo aparece — teve na realidade importância maior do que ela revelou na ocasião [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. Em particular, implicara ela que a introjeção dos pais não vem após a "perda dos objetos amados" da primeira infância, mas que é um processo que prossegue no curso de um relacionamento ati­ vo — e, em verdade, desde o início deste. Esta implicação acha-se muito mais alinhada com as opiniões de Abraham, quais sejam, de que a introje­ ção e a projeção são processos constantemente ativos, ligados a impulsos orais e anais, e são ativos continuadamente, desde o início da vida e atra­ vés desta [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA]. Em 1932, as atitudes haviam se endurecido, com pouca perspectiva de as concepções de Klein e Anna Freud poderem ser reconciliadas. A primei­ ra tinha o patrocínio seguro de Ernest Jones e existe uma correspondência interessante, trocada entre Jones e Freud, a respeito dos conflitos entre suas respectivas protegidas (Steiner, 1985). Dessa maneira, existiam cada vez menos obstáculos a impedir que Klein desse o passo decisivo de aban­ donar a teoria clássica do superego, tal como assentada por Freud. O livro dela, The psycho-analysis o f children [A psicanálise de crianças], publica­ do em 1932, era uma compilação de artigos clínicos (Parte 1), originalmen­ te palestras proferidas em 1925, e capítulos teóricos (Parte 2) sobre as im­ plicações das observações clínicas para as teorias do complexo de Édipo, do desenvolvimento arcaico de meninos e meninas e do superego, reescritos com base em conferências feitas em 1927. A parte teórica fora revisa­ da e é, em alguns aspectos, inconsistente. "É a sua descrição mais comple­ ta de sua primeira série de descobertas e concepções, escrita, porém, em um momento de transição, e apresenta opiniões que só parcialmente con­ cordam com a base teórica principal delas" (Melanie Klein Trust, 1974). Uma das mais decisivas das novas evoluções, introduzida como esboço aqui e ali no texto, era a visão inteiramente nova da origem do superego na pulsão de morte. O superego e a pulsão de morte: Klein elaborou a teoria da origem do su­ perego na pulsão de morte de modo mais sistemático em 1933. Ao romper com as concepções clássicas, ela engenhosamente descobriu, em Freud, passagens que podia alegar estar seguindo. Apoiando-se nas descrições da pulsão de morte por aquele feitas em Além do princípio do prazer (Freud, 1920), ela utilizou a visão dele de que a mais arcaica função do ego é des­ viar para fora a pulsão de morte, no sentido de um objeto do mundo ex­ terno. Este primeiro ato cria o ego: A fim de escapar de ser destruído por sua própria pulsão de morte, o organismo emprega sua libido narcísica, ou de autoconsideração, para 118 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

forçar o primeiro para fora, e dirigi-lo contra seus objetos (...) Diria eu, ademais, que paralelamente a este desvio da pulsão de morte para fora, contra objetos, uma reação intrapsíquica de defesa prossegue con­ tra aquela parte da pulsão que não pôde ser assim externalizada, pois o perigo de ser destruído por esta pulsão de agressão estabelece, penso eu, uma tensão excessiva no ego, que é por este sentida como ansieda­ de (...) Dá-se uma divisão no id, ou níveis pulsionais da psique, atra­ vés da qual uma parte das noções pulsionais é dirigida contra a outra. Esta medida aparentemente muito arcaica de defesa por parte do ego constitui, acho, a pedra fundamental do desenvolvimento do superego, cuja violência excessiva neste estágio inicial seria assim explicada pelo fato de tratar-se de uma ramificação de pulsões destrutivas muito inten­ sas. (Klein, 1933, p. 250) [ver 3. AGRESSÃO; PULSÃO DE MORTE] Desta maneira, apoiando seu caso nas próprias teorias de Freud (embora altamente selecionadas), ela demonstrava a origem arcaica do superego (no nascimento, em verdade), as razões para a sua severidade extremada e a necessidade de revisar a relação do superego com o complexo de Edipo. Assim, o superego surge antes do complexo de Edipo. O intrincado dos argumentos dela destinava-se a resguardá-la contra a critica de que sua teoria não era realmente psicanalística, porque se desvia­ va de Freud. Em verdade, os detalhes exatos da formação do superego que ela descrevia são tão especulativos quanto as teorias de Freud, e, haven­ do neste ponto desvinculado o superego do complexo de Edipo, ela mal re­ tornou de novo a estes argumentos, com a exceção se dando em 1958, ao explorar certos fenômenos nos esquizofrênicos [ver adiante]. De fato, uma vez abandonada por ela a teoria clássica do superego, a importância des­ te, em si próprio, declinou nas teorias de Klein, tornando-se um conceito muito menos saliente. Ao invés dele, Klein colocou em proeminência mui­ to maior a idéia de objetos internos, um mundo muito mais rico, que ela então explorou no seu próprio valor [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. (2) A posição depressiva. Com a perda de sua exatidão, o termo "superego" foi mantido como descrição geral de objetos internos que possuem caráter severo e autocrítico. Com freqüência o seu uso parece ser mais adjetivo: "superegóico". Para o Grupo Kleiniano, "poder-se-ia dizer que o supere­ go não se acha finalmente assentado" (Segai, 1987). Em primeiro lugar, sig­ nifica a integração dos objetos ideais e persecutórios. Em segundo, "signifi­ ca um aspecto dos objetos internos que exerce pressão moral; por exemplo, os pais internos engajados em relação sexual. Não sabemos como isso con­ tribui para o superego, talvez como uma influência sobre a maneira de fa­ zer amor" (Segai, 1987). Searl (1936), em determinada época apoiadora de Klein, fez uma tenta­ tiva de resgatar o conceito de superego através da descrição de uma estru­ tura de dois ideais, baseada parcialmente na descrição feita por Strachey R.D.Hínsheiwood / 119

(1934) de objetos bons e objetos maus. Sugeriu ela fazer a expressão "superego" referir-se ao "ideal negativo" (o imperativo "não farás") e a de "ide­ al do ego" ao positivo ("farás"). Searl, nessa ocasião, já estava se afastan­ do do Grupo Kleiniano e pouco depois demitiu-se da Sociedade Psicanalítica Britânica. A idéia foi ressuscitada muito tempo depois por Meltzer (1967) e Maneia e Meltzer (1981), para fazer distinção entre a posição de­ pressiva (na qual a passagem de figuras internas persecutórias para figuras internas de ajuda predomina) e a inveja (a razão para não se poder livrar de um superego persecutório). O efeito maior do abandono da teoria clássica do superego foi permitir desenvolvimento em direções bastante diferentes, das quais se pode salien­ tar em particular, em 1935, a posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DE­ PRESSIVA]. Isto deu a Money-Kyrle (1951) a possibilidade de utilizar a distinção entre posição depressiva e posição esquizoparanóide para sepa­ rar duas categorias amplas de superego. Ele aplicou esta formulação psicanalítica à Alemanha, nos dias que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, numa tentativa de predizer quais os nazistas capazes de reabilitação e, as­ sim, merecedores de empregos responsáveis (pessoas com um superego mais acentuado, na posição depressiva) e quais os possuidores de um supe­ rego autoritário e sádico, que mais haviam florescido sob o regime nazis­ ta, baseados mais na obediência e na perseguição do que na responsabilida­ de pessoal (funcionamento esquizoparanóide). Grinberg (1978) enfatizou os diferentes tipos de culpa: persecutória (ou severamente punitiva) e de­ pressiva (com possibilidades de reparação) [ver ANSIEDADE DEPRESSI­ VA]. Comum a todos esses textos é a ênfase na seqüência de mudança de afeto no curso do desenvolvimento: (i) perseguição; (ii) culpa persecutória; (iii) culpa e reparação [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA],

OUTROS DESENVOLVIMENTOS (1) Assimilação. Um tema explorado especialmente por Heimann foi a interes­ sante questão de se o objeto externo era introjetado no ego ou no supere­ go (Heimann, 1952) [ver ASSIMILAÇÃO]. Em um tardio e raro resumo das origens do superego, escreveu Klein: O ego, apoiado pelo objeto bom internalizado e fortalecido pela identifi­ cação com ele, projeta uma parte da pulsão de morte naquela parte de si que foi escindida, uma parte que vem a ficar em oposição com o res­ tante do ego e forma a base do superego. (Klein, 1958, p. 240) A importância desta passagem é que ela descreve a introjeção como sen­ do um processo que identifica um objeto externo com o ego. Um proces­ so diferente, porém, foi investigado por Heimann (1955), que relatou o ca­ so de um paciente masoquista cuja excitação por ser espancado nas náde­ 120 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

gas resulta va da introjeção de uma imago paterna odiada e hostil, que se tornava identificada com a parte de seu ego a ser espancada, ou seja, as nádegas. O objeto externo é identificado apenas com uma parte do ego, que é então, por assim dizer, repudiada, não adequadamente assimilada pelo ego, mas, em contraste, esvaziando-o. Esta é uma maneira de descre­ ver, em termos de relaç'ões objetais internas, a natureza e o desenvolvimen­ to específicos da forma severa do superego. O processo contrastante é "uma progressiva assimilação do superego pelo ego" (Klein, 1952, p. 74). Klein mostra-se vaga a respeito deste pro­ cesso: "a capacidade aumentada do ego em aceitar os padrões dos objetos externos (...) acha-se ligada à síntese maior dentro do superego e à assimi­ lação crescente deste último pelo ego" (Klein, 1952, p. 87). O objeto não assimilado é descrito por Klein e Heimann: "os objetos internos agem co­ mo corpos estranhos engastados dentro do s e lf (Klein, 1946, p. 9n). Isto resulta de um enfraquecimento do ego (resultante de identificação projeti­ va excessiva), que não é mais suficientemente forte para assimilar o obje­ to sem ser esmagado e dominado por ele. Riesenberg-Malcolm (1981) des­ creveu uma forma de pseudo-submíssão que disso resulta. O objeto estra­ nho independente, contudo, assemelha-se um tanto ao superego original­ mente descrito por Freud. (2) O superego e a esquizofrenia. O crescente trabalho psicanalítico com es­ quizofrênicos nas décadas de 1940 e 1950 por parte de psicanalistas mais jovens com qualificações médicas (Scott, Rosenfeld, Segai, Bion) — por exemplo, o artigo de Rosenfeld sobre o superego do esquizofrênico (Rosen­ feld, 1952) —- levou Klein a retornar ao seu trabalho anterior com crian­ ças esquizofrênicas e ela descreveu algo que não fora previamente notado. Perseguidores escindiáos: Ela descreveu então objetos extremamente hostis com que os esquizofrênicos se preocupam: Estes objetos extremamente perigosos dão origem, na primeira infância, a conflito e ansiedade dentro do ego; sob a tensão da ansiedade aguda, porém, eles, e outras figuras terrificantes, são escindidos de maneira di­ ferente daquela pela qual o superego se forma e são relegados às cama­ das mais profundas do inconsciente (...) o supergo normalmente se esta­ belece em relação estreita com o ego e partilha aspectos diferentes dos mesmos objetos bons. Isto torna possível ao ego integrar e aceitar o su­ perego em maior ou menor grau. (Klein, 1958, p. 241) Mesmo na época do período de latência, e depois, essas figuras especial­ mente violentas permanecem: (...) a parte organizada do superego, embora muito amiúde severa, é muito mais separada de sua parte inconsciente (...) quando penetramos em camadas mais profundas do inconsciente, descobrimos que figuras R.D.Hinshelwooâ / 121

perigosas e persecutórias ainda coexistem com figuras idealizadas. (Klein, 1958, p. 242) Embora a persistência de um conjunto profundamente inconsciente de obje­ tos originários fosse reconhecida nos esquizofrênicos, isso não era inteira­ mente novo, por se assemelhar a um retorno às descrições de crianças (al­ gumas delas na latência) no primeiro período do trabalho de Klein, e lá Strachey, para mencionar apenas ele, fizera uso (1934) da idéia de objetos arcaicos perseguidores e imagos idealizadas. A persistência de relações, em um estado separado, com objetos especial­ mente arcaicos foi utilizada por Bion na distinção entre partes psicóticas e não-psicóticas de uma personalidade [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJE­ TIVA]. Rosenfeld também levou esta idéia mais além, em termos de uma dominação interna da personalidade por partes cruéis e escindidas, que aterrorizavam as partes boas da personalidade, tal qual uma quadrilha da Máfia (Rosenfeld, 1971); linha semelhante de pensamento foi desenvol­ vida por Sidney Klein ao descrever aspectos autistas e encapsulados de personalidades neuróticas (Sidney Klein, 1980) [ver ESTRUTURA], OBJEÇÕES ÃS MODIFICAÇÕES FEITAS POR KLEIN NO SUPEREGO. De início, Anna Freud (1927) discutiu, em bases teóricas, a descrição fei­ ta por Melanie Klein do superego nos primeiros estágios. Isto preparou a cena para uma prolongada discordância entre kleinianos e freudianos orto­ doxos, que remontavam sua linhagem aos analistas vienenses [ver 1. TÉC­ NICA], Fenichel (1928, 1931) fez uma distinção entre o superego, tal co­ mo descrito por Freud, e os precursores do superego que podem ser encon­ trados nos níveis pré-genitais, semelhante à crítica que fizera quanto à mo­ dificação de Klein no complexo de Édipo [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. A severidade e o sadismo orais e anais, achava ele, podem dar origem a um autocastigo masoquista, mas não podem ser confundidos com o supe­ rego inteiramente formado, que tem um componente "moral" que deriva do amor genital dos pais. Os argumentos de Fenichel referentes aos "pre­ cursores do superego" acompanham seus argumentos similares relativos aos componentes arcaicos, pré-genitais, do complexo de Édipo [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. Os vários objetos das fases pré-genitais que Fe­ nichel estava disposto a aceitar entram na constituição do superego, só se tornando integrados quando o ego começa e a sua função integrante entra em operação. Isto contrasta com a visão de Klein de que os componentes arcaicos são ativamente mantidos separados e manipulados por um ego que tem funções e opera defesas. Mais uma vez a distinção é feita a respeito da ocorrência de um funcio­ namento arcaico de um ego no primeiro ano de vida. Segundo a visão de Fenichel, a datação do superego deve seguir os começos do ego e de suas funções integratívas; para Klein, o superego data do primeiro ato de cisão, quando o ego tem de lidar com a pulsão de morte. Waelder (1937) reite122 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

rou essas objeções, mas, tal como tantas das controvérsias surgidas entre kleinianos e psicanalistas clássicos, a questão morreu sem ser resolvida. Outra questão referia-se à severidade especial do superego, mesmo em adultos e, tipicamente, em criminosos. Freud explicara essa severidade co­ mo sendo resultado da introjeção do superego dos pais, antes que da tota­ lidade das personalidades destes. Contudo, essa explicação simplesmente adiava a questão da natureza do superego em relação ao desenvolvimen­ to dos impulsos do id, e o pensamento de Freud, posteriormente, aproximou-se mais do de Klein (ver nota de rodapé a Klein, 1933, p. 250). Mas a questão aqui refere-se à explicação da severidade como sendo uma dis­ torção retrospectiva, na memória de crianças mais velhas e adultos, do tra­ tamento delas pelos pais, em oposição à observação direta das fantasias e do remorso em crianças de apenas dois anos de idade. O tema veio à su­ perfície com intensidade nos Debates sobre as Controvérsias a respeito da fantasia inconsciente [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE] e discutiu-se se as fantasias de crianças mais velhas e adultos são aquelas que persisti­ ram desde estágios muito iniciais do ego (os primeiros seis meses) ou uma sofisticação retrospectiva resultante da regressão da hostilidade posterior a fantasias orais e anais. As provas fornecidas por crianças muito jovens eram fortes e Waelder (1937) concedeu que a severidade do superego provinha parcialmente de fontes internas, embora permanecesse em oposição à opinião de que isso indicava uma origem anterior do superego. Apesar disso, as discordâncias, de modo geral, não foram corretamente resolvidas, mas tenderam a esma­ ecer e a desaparecer de vista, em parte porque os kleinianos colocavam ênfase menor no superego, à medida que o seu próprio interesse avança­ va para examinar a posição depressiva e, depois, a posição esquizoparanóide e a identificação projetiva. A história do superego faz parte integrante da história de Melanie Klein. Ela o colocou em oposição à opinião ortodoxa, uma posição em que ela esforçou-se por permanecer fiel às suas descobertas, ao mesmo tempo em que sentia prazer por ser ligeiramente escandalosa. Fracassou em seu esfor­ ço por permanecer leal à teoria freudiana ortodoxa na ocasião (década de 1930) e sofreu por causa disso. A sua própria progressão teórica mais ou menos contornou a teoria estrutural freudiana de id, ego e superego. Não é exagerado descrever o desenvolvimento, por Klein, da idéia do supere­ go como sendo uma nova teoria estrutural. O florescer de todo um conjun­ to de objetos internos cria um mundo verdadeiramente interno, povoado por imagos de figuras externas, e o reconhecimento subseqüente de organi­ zações ocultas da personalidade (a parte psicótica, a parte perversa, etc.) que se empenham em relações internas que constantemente destroem ou pervertem as experiências do ego [ver ESTRUTURA], Muitos dos temas sobre os quais a teoria kleiniana divergiu da psicaná­ lise clássica encontram-se na história do conceito de "superego'": a compre­ R.D.Hinshelwood / 123

ensão das fases libidinais iniciais versus sua progressão a ciaramente darse no momento oportuno; a manifestação da pu!são de morte interna à personalidade versus a puísão de morte como algo clinicamente silencioso; o funcionamento arcaico do ego ao nascimento versus o desenvolvimento dele muito mais tarde; o primeiro ato do ego de cisão e desvio (projeção) versus sua função inicial integrativa; a fenomenologia e a experiência sub­ jetiva de objetos internos de diversos tipos, concretamente sentidos, ver­ sus a experiência de representações simbólicas na mente. Esses temas entra­ ram em erupção em acaloradas atmosferas de controvérsia entre Melanie Klein e Anna Freud, entre as sociedades psicanalíticas britânica e vienense e, por fim, entre grupos diferentes dentro da Sociedade Britânica. Tal atmosfera não era propícia à resolução desses debates, de maneira que os temas permanecem conosco, hoje amiúde irreconhecidos por uma nova geração que parece ter herdado o calor mas não a clareza das questões. A disputa ulterior tem tendido a ser conduzida a respeito de desenvolvi­ mentos posteriores na teoria, por ambos os lados (ver 13. IDENTIFICA­ ÇÃO PROJETIVA; PSICOLOGIA DO EGO], sem remontá-los às suas ra­ ízes nas questões anteriores e não solucionadas das décadas de 1920 e 1930. Abraham, Karl (1924), "A short study of the development of the libido", em KarI Abraham (1927), Selected papers on psycho-analysis, p. 418-501. Fenichei, Otto (1928), "The clinicai aspect of the need for punishment", lnt. ]. Psycho-Anal , 9:47-70. -------- . (1931), "The pregenitaí antecedents of the Oedipus complex", Int ] Psycho-Anal 12:412-30. Ferenczi, Sandor (1925), "Psycho-analysis of sexual habits", em (1950) Further contributions to the theory and technique o f psycho-analysis, Hogarth, p. 259-97. Freud, Anna (1927), Psycho-analytic treatment of children, edição inglesa, 1946, Imago, Freud, Sigmund (1916), "Some character-types met with in psycho-analytic work: III Crimi­ nais from a sense of guilt", em James Strachey, (org,), The standard edition of the comple­ te psychological works of Sigmund Freud, 24 vois., Hogarth, 1953-73, voh 14, p.332-3. -------- . (1917), "Mourning and melancholia" S.p, 14, p. 237-60, -------- . (1920), "Beyond the pleasure principie", S.E. 18, p, 3-64. -------- . (1923), " The Ego and the Id",S,E. 19, p. 3-66. , (1924a), "The economic probiem of masochism", S.E. 19, 157-70, . (1924b), "The dissolution of the Oedipus complex", S.E, 19, p. 173-9, -------- . (1930), "Civilization and its discontents", S'.E. 21 , p. 59-145. Glover, Edward (1926), "The neurotic character", lnt. ]. Psycho-Anal,, 7:11-29. Grinberg, Leon (1978), JThe razors edge' in depression and mourning", Int. /. Psycho-Anal , 59:145-54, Heimann, Paula (1952), Certain functions of introjection and projection in early irtfancy", em Melanie Klein, Paula Heimann, Susan Isaacs e Joan Riviere, (orgs.), Developments in psycho-analysis, Hogarth, p. 122-68, . (1955), A combination of defence mechanisms in paranóia", em Melanie Klein, Pau­ la Heimann e Roger Money-Kyrie, (orgs,), New directions in psycho-analysis, Tavistock p. 240-65. Isaacs, Susan (1929), "Privation and guilt", lnt. J. Psycho-Anal, 10 : 335 -4 7 , Jones, Ernest (1926), "The origin and structure of the superego", lnt. }. Psycho-Anal, 7:303-11. . (1927), T h e early development of female sexuality", lnt. J. Psycho-Anal, 8:459-72,

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Klein, Melanie ublicaoo >19; em Martha Harris e Esther Bick, The collected papers o f M artha Harris a ' d Est :rr B e descreveu, por maneira teórica inteiramente nova, como sendo a posição depressiva. Posição depressiva: Trata-se de uma relação nova com a mãe, na qual a própria e excepcionalmente boa e inteiramente bem intencionada mãe (um objeto parcial) torna-se uma figura mista — até mesmo contaminada — e não mais a fonte de perfeição que a criança deseja. E esta nova relação com a mãe que constitui o âmago da posição depressiva: "(...) somente quanto o ego introjetou o objeto como um todo (...) é ele capaz de perce­ ber plenamente a desgraça causada através de seu sadismo" (Klein, 1935, p. 269). O bebê tem de lutar com o fato de que odeia, com a mais ilimita­ da e paranóide intensidade, a mãe que é agora vista também como a mãe amada que o alimenta, cuida e ama. Uma confluência de emoções desse tipo é extremamente perturbadora e pode-lhe opor resistência. As observa­ ções de Klein conduziram-na à opinião de que o bebê flutua entre as rela­ ções paranóides e a posição depressiva. As abordagens constantes a esta última posição gradualmente permitem que a agitação emocional seja do­ minada [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Um catálogo de objetos parciais incluiría: "bebês", "objeto mau", "seio", "nádegas", "criança", "figura combinada dos pais", "fezes", "pai", "obje­ to bom", "leite", "mãe", "mãe-com-pênis", "pênis" e "útero". Ver PAI; OBJETO MAU; FIGURA COMBINADA DOS PAIS. Abraham, Kar! (1924), "A short history of the development of the Iibido", em KarI Abraham (1927), Selected papers on psycho-analysis, Hogarth, p. 418-501. Bíon, Wiifred (1959), "Attacks on linking", Int, J, P sycho-A n al, 40:308-15; republicado (1967) em W. R. Sion, Second thoughts, Heínemann, p. 93-109. Klein, Melanie (1927), "Criminal fendencies in normal children", W M K 1, p. 170-85. -------- . (1929a), "Personification in the play of chiidren", WMK 1, p, 199-209. -------- . (1929b), "Infantile anxiety-situations reflected in a work of art and in the Creative im­ pulse", WMK 1, p. 210-18. -------- . (1935), "A contribution to the psychogenesis of manic-depressive States'', tVMK 1, p. 262-89. -------- . (1936), "Weaning", WMK 1, p. 290-305.

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Observação de bebêsSCSTír. tíí,S

Guerra Mundial era substanciar as opiniões de Freud a respeito da infân­ cia, as quais ele havia formulado por extrapolação retrocedendo desde o estado adulto. O mesmo imperativo começou a ser sentido a respeito das descobertas das experiências do bebê no primeiro ano de vida que haviam provindo da análise, feita por Klein, de crianças mais velhas (de aproxima­ damente dois anos e meio em diante). No começo da década de 1950, fize­ ram-se tentativas para observar esta idade evolutiva. O problema é o de ser um observador externo, sem método direto de tornar-se um ouvinte ao mundo interno do bebê. O estágio de desenvolvi­ mento é uma fase em que a vida simbólica encontra-se em um mínimo e, portanto, as possibilidades de comunicação (que normalmente dependem de símbolos) são igualmente mínimas. O método utilizado com adultos é uma comunicação verbal mútua; com crianças, é o brincar delas que se observa e do qual, às vezes, se participa [ver ANÁLISE DE CRIANÇAS]. Com bebês, torna-se necessário um método novo. O bebê conceptualiza tudo em termos de objetos em relação a seu corpo, as partes deste e as sen­ sações e satisfações diretas delas. Sem alguma forma de comunicação sim­ bólica, é qualquer ingresso no mundo do bebê de algum modo possível? A questão foi furiosamente discutida nos Debates sobre as Controvér­ sias, em 1943. Quando o artigo desse ano de Susan ísaacs ("A natureza e a função da fantasia") foi posteriormente publicado (1948), ela incluiu nele uma exaustiva introdução que tentava validar o processo da inferência psicanalítica: se Freud havia extrapolado, retrocedendo à infância a partir de adultos, então era válido para Klein extrapolar para a primeira infância o seu trabalho com crianças. Klein também efetuou observações diretas de bebês, interpretando, com base em suas próprias descobertas, os tipos de experiências nas mentes de­ les. De modo interessante, quando seu artigo acabou por ser publicado (Klein, 1952), ele demonstrava apenas quanta atenção ela havia concedi­ do ao meio ambiente da mãe e ao estado mental desta como meio ambien­ te primário da criança. Ele efetivamente apoiava do dito "não existe essa coisa chamada bebê" (Winnicott, 1960). Joseph (1948) debateu uma rápi­ da observação, em termos do problema de efetuar uma intervenção tera­ pêutica. À parte estas observações felizes efetuadas por acaso, o interesse em bebês fez um progresso lento.

Com unicação não sim bólica: Quando finalmente se compreendeu que exis­ tem variedades diferentes de identificação projetiva (Bion, 1957) [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA], uma via no sentido de um método de observação de bebês tornou-se possível. A identificação projetiva não é uma forma simbólica de comunicação, mas compreendeu-se que o impac­ to direto de um estado mental sobre outro pode ter um potencial comuni394 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

cativo que é externo ao mundo dos símbolos {''identificação projetiva nor­ mal"). As vezes, os símbolos podem mesmo ser um instrumento utilizado para o fim de efetuar um impacto direto desse tipo (comunicações não-verbais segundo o tom da voz, etc.). Desta maneira, os analistas que estavam se tornando sensíveis ao emprego de suas próprias reações como instru­ mentos de compreensão [ver CONTRATRANSFERÊNCIA] puderam vir a entender um método que não exigia expressões simbólicas do mundo in­ terno. No método de observação de bebês, contudo, o impacto direto dos estados mentais deve ser o daqueles que se dão entre o bebê e a mãe. As­ sim, a mãe tornou-se o veículo para tornar manifestas as interações do be­ bê com os objetos, equivalente às coisas com que a criança brinca na análise. O bservação de bebês: Bick iniciou este trabalho em 1948, como exercício de formação para estudantes de psicoterapia e psicanálise de crianças (por exemplo, Magagna, 1987; Glucksman, 1987; di Ceglie, 1987). Ela começou as observações sistemáticas dos bebês com suas mães em casa em uma ba­ se semanal durante todo o primeiro ano de vida (Bick, 1964, 1968 e, postu­ mamente, 1986). Como se podia esperar, os resultados confirmaram par­ cialmente os resultados da análise de crianças e em parte contribuíram com novos fatos e teorias, algumas das quais permanecem, no presente, um tan­ to fora da corrente principal do pensamento kleiniano [ver BICK], quais sejam, a qualidade passiva de ser mantido unido pelo primeiro objeto e a natureza da identificação adesiva, Bick descreveu as primeiríssimas tentativas de introjetar um objeto que manteria unida a personalidade [ver 1 1 . POSIÇÃO ESQUIZOPARANOIDE]. Percebeu ela, na interação mãe-bebê, que este primeiro objeto era particuíarmente experienciado através do contato epidérmico, e a sensação da pele como objeto continente. Ver PELE; IDENTIFICAÇÃO ADESIVA. Bick, Esther (1964), "Notes on infant observation in psycho-analytíc training", Int. J. PsychoA n a l, 45:558-66; republicado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected pa~ pers o f M artha Harris and Esther Bick, Perth, Clunie, p. 240-56. -------- . (1968), “The experience of the skin ín early object relations", Int. ]. Psycho-Anal., 49:484-6; republicado (1987) em The collected papers o f Martha Harris and Esther Bick, p . 114-8. -------- . (1986), ''Purther considerations of the function of the skin in early object relations". Br. J. Psychother., 2:292-9, Bion, Wíifred (1957), "Dífferentiation of the psychotic from the non-psychotic personalities", Int. }. Psycho-A nal, 38:286-75; republicado (1967), em Secondthoughts, Heinemann, p. 43-64. di Ceglie, Giovanna (1987), "Projective Identification in mother and baby relationship", Br. J. Psychother., 3:239-45. Glucksman, Marie (1987), "Clutching ant straws: an infant's response to lack of maternal containment", Br. J. P sychother., 3:340-9. Isaacs, Susan (1948), "The nature and function of phantasy", Int. J. P sycho-A n al, 29:73-97', republicado (1952) em Melanie Klein, Paula Heimann, Susan Isaacs e Joan Riviere, (orgs.), D evelopm ents in psycho-analysis, Hogarth, p. 66-121.

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/A * |A « Os estágios iniciais da primeira infância são caW n i p O t c r l C l d . racterizados por pensamentos, sentimentos e fantasias onipotentes. Para Klein, a importância da onipotência estava liga­ da a temores de uma destrutividade onipotente e ao fato de que certas ati­ vidades de fantasia, espedalmente as envolvidas nos mecanismos primiti­ vos de defesa (absorver, expelir, aniquilar), têm efeitos profundos e perma­ nentes sobre o desenvolvimento do ego e suas relações objetais característi­ cas. Klein considerava estas fantasias onipotentes [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA] como defesas contra a experiência da separa­ ção, dependência e inveja. Onipotência da fantasia. As fantasias iniciais de receber em si e expelir são experienciadas pelo bebê como reais e a darem origem a uma "alteração do ego" concreta. Esses mecanismos onipotentes iniciais são, portanto, res­ ponsáveis por desenvolvimentos reais no self e no ego. Na fantasia, acredita-se que certos objetos residam dentro e formem uma parte do self: exem­ plificando, um objeto "bom" introjetado, com um conseqüente desenvolvi­ mento real de um sentido de segurança e confiança. A perda concretamen­ te sentida do objeto interno bom tem efeitos opostos. O objeto mau experienciado internamente é sentido como uma ameaça paranóide à vida [ver 5. OBJETOS INTERNOS; OBJETOS]. As fantasias onipotentes ingressam na constituição psicológica por di­ versas maneiras: (i) A onipotência com o defesa: O sentimento de onipotência é importante nos mecanismos primitivos de defesa que se acham envolvidos com o rom­ pimento das fronteiras do ego, de maneira a que as experiências de separa­ ção e inveja sejam evitadas [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DE­ FESA]. (ii) Estados narcísicos: As defesas onipotentes também podem criar confu­ são entre self e objeto, a qual persiste como "relações objetais narcísicas onipotentes" (Rosenfeld, 1987), conduzindo a um estado de narcisismo du­ radouro (Segai, 1983) [ver NARCISISMO]. (iii) Organização narcísica: Estes estados onipotentes podem se tornar orga­ nizados na personalidade, para criar uma forma de narcisismo negativo, 396 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

descrita por Rosenfeld (1987) em termos de partes más onipotentes do self que se engajam em relações intimadoras ou sedutoras a aprisionarem as partes boas do self [ver ESTRUTURA]. Desenvolvimento. Normalmente, a saída para este sentimento de onipotência surge através da experiência de desamparo, por uma maneira mediada por objetos continentes externos, que podem ser introjetados e com eles se esta­ belecer identificação. O abandono da invasão ou incorporação narcísica de objetos constitui passo essencial no desenvolvimento da posição depres­ siva [ver 1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA] e do reconhecimento da realidade dos objetos por seu próprio direito. Onipotência e invasão ambiental. Em contraste, Winnicott considerava a oni­ potência como uma área protegida desde o início que deve resistir à coli­ são, visão que se assemelhava à da teoria clássica do narcisismo primário [ver NARCISISMO]. Sem uma distinção entre ele próprio e a mãe, o be­ bê existe em um estado de "onipotência primária". O papel da mãe, na opinião de Winnicott, é prover a criança de maneira tal que lhe permita continuar com sua crença delirante em sua própria onipotência. Ela, des­ se modo, provê a satisfação necessária (o seio) exatamente no lugar e no momento em que o bebê está alucinando a satisfação de sua própria fo­ me. A segunda tarefa principal de uma mãe, segundo Winnicott, é locali­ zar com exatidão os momentos em que o bebê começa a estar pronto pa­ ra sair de sua onipotência. Ela pode então introduzir um momento de frus­ tração, uma ausência de satisfação, no momento certo e na ocasião corre­ ta. A "mãe suficientemente boa" é o grau certo. A transição desde a onipo­ tência infantil para uma realidade mais exata fracassa se a confrontação com a mãe for feita de modo demasiado brutal e prematuro, e o bebê so­ fre então uma experiência a que Winnicott deu o nome de colisão. Winnicott (1953) descreveu a maneira pela qual o bebê sai fora do esta­ do de narcisismo primário mediante um passo intermediário: ele busca e cria objetos transicionais ou intermediários como estágios de meio de ca­ minho, de maneira que a onipotência infantil nunca tem de ser inteiramen­ te abandonada. Winnicott parece retornar a uma visão mais ortodoxa do narcisismo primário, embora a chame de onipotência primária. O ego, se assim ele pode ser chamado na opinião de Winnicott, tem a função primá­ ria isolada de não experienciar qualquer sentido de si próprio em um mun­ do. O ego não possui mecanismos de defesa que sejam seus e o meio am­ biente fica encarregado de defender esse estado mental de onipotência indiferenciada. Rosenfeld, Herbert (1987), Im passe and interpretation, Tavistock. Segai, Hanna (1983), "Some clinicai implications of Melaníe Klein's work", Int. J. PsychoA nal., 64:269-76,

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Nos últimos anos, pacientes com gra­ ves distúrbios de personalidade foram submetidos a uma investigação mais atenta (Rey, 1979). Joseph (1975, 1978) descreveu os problemas técni­ cos de trabalhar com esses pacientes [ver TRANSFERÊNCIA; CONTRATRANSFERÊNCIA; 1. TÉCNICA]. Eles não parecem ser psicoticamente deficientes demais, mas sim atolados em um nível de distúrbio que não muda, ou muda apenas lentamente, com análises muito longas (Spillius, 1988). Tal como o trabalho efetuado com pacientes psicóticos na geração anterior, e com crianças na geração que precedeu à última, o trabalho com os pacientes acima mencionados deu origem a certos desenvolvimentos teó­ ricos. De um ponto de vista kleiniano, as personalidades fronteiriças ou limí­ trofes apresentam três características principais:

O rg an izaçõ es p ato ló g icas 1

(i) elas ficaram empacadas em alguma posição intermediária entre as posi­ ções esquizoparanóide e depressiva, com uma defensividade complexa tan­ to contra a fragmentação da posição esquizoparanóide quanto contra a culpa e a responsabilidade de posição depressiva (Joseph, 1989) [ver EQUI­ LÍBRIO PSÍQUICO]; (ii) desenvolveram-se no contexto de um excesso de pulsão de morte e in­ veja, mas conseguiram desenvolver certos tipos de relações objetais está­ veis, ainda que estas se organizem em torno da dominância das partes "más" do self sobre as partes "boas" [ver ESTRUTURA; NARCISISMO NEGATIVO]; (iii) a estabilidade da personalidade é especialmente frágil e elas consegui­ ram chegar além da posição esquizoparanóide apenas pelo desenvolvimen­ to de um sistema rígido de defesas, conhecido origínalmente como organi­ zação narcísica (Rosenfeld, 1964), depois, sistema delirante dé defesa (Se­ gai, 1972), organização defensiva (0'Shaughnessy, 1981) e, então, mais re­ centemente, como organização patológica (Steiner, 1982; Spillius, 1988), de vez que sua função e, de modo claro, não apenas defensiva, mas tam­ bém uma adesão rígida a certos tipos de relações objetais e fonte de consi­ derável prazer de tipo patológico e, usualmente, perverso [ver NARC1SISMO; ESTRUTURA]. Vários autores pesquisaram estes "pacientes com um ego fraco que, com mais perseguição que o normal, chegam na primeira infância às fronteiras da posição depressiva, tal como definida por Klein (1935), mas são então incapazes de com ela lidar e, ao invés, formam uma organização defensi­ va" (0'Shaughnessy, 1981, p. 359) [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA; AN398 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

SIEDADE]. 0'Shaughnessy distinguiu as defesas em um desenvolvimento mais normal das da organização defensiva: Diferentemente das defesas — fragmentadas, transitórias em maior ou menor grau, recorrentes —, que fazem parte normal do desenvolvimen­ to, uma organização defensiva é uma fixação, uma formação patológi­ ca (...) Expressas em termos kleinianos, as defesas são parte normal do Hdar com a posição esquizoparanóide e a posição depressiva; já uma organização defensiva, por outro lado, constitui uma organização pato­ lógica fixa em uma ou outra posição ou sobre a linha de fronteira entre elas. (0'Shaughnessy, 1981, p. 363) Ela deu ênfase ao "controle e à transferência estática característica do funcionamento de uma organização defensiva" (0'Shaughnessy, 1981, p. 363), visando a "uma total e perpétua organização de seus relacionamen­ tos internos e externos, de maneira a excluir todo distúrbio" (0'Shaughnessy, 1981, p. 366). A idéia de uma estrutura fixa de defesas provém, direta ou indiretamen­ te, do caso Schreber e da descrição feita por Freud da construção de um delírio organizado no lugar de uma realidade fragmentada e aniquilada (Freud, 1911). Riesenberg-Malcoím (1970) descreveu um caso em que uma fantasia sadomasoquista era continuamente empregada para reconstruir uma atividade mental e um mundo interno organizados, em seguida a uma fragmentação psicótica da personalidade. Segai (1972) descreveu um sistema defensivo rígido semelhante, o qual se destinava a impedir uma psicose em seguida a um colapso psicótico da infância. Subseqüentemente, porém, os kleinianos adicionaram à formulação de Freud dois conceitos (elementos, conforme Spillius (1988) os descreveu): (a) Equilíbrio psíquico: A estase na flutuação normal entre a posição es­ quizoparanóide e a posição depressiva [ver Ep-D], Embora os autores ini­ ciais (Riesenberg-Maícolm, 1970; Segai, 1972) houvessem descrito casos em que a organização defensiva combate um colapso psicótico, ele é ago­ ra encarado como um recuo a partir das ansiedades tanto da posição es­ quizoparanóide quanto da posição depressiva. O desenvolvimento da per­ sonalidade detém-se antes que a posição depressiva tenha sido corretamen­ te alcançada e as defesas organizadas visam à manutenção da imobilida­ de e à retenção de um caráter onipotente. (b) Aspectos agressivos do narcisismo: Sob a dominância da pulsão de morte, a personalidade se estrutura em torno da organização de defesas onipotentes. Estrutura da personalidade. O artigo de Bion (1957) distinguiu entre uma par­ te psicótica da personalidade e outra não-psicótica [ver PSICOSE; 13. IDEN- * TIFICAÇÃO PROJETIVA]. Esse trabalho foi seminal dentro e fora do Gru­ R.D.Hinshelwood / 399

po Kleiniano. Mais tarde, ele descreveu um mundo interno em que a função-alfa fracassa; trata-se de um mundo dominado pelo despojamento de significado de todas as experiências e pela produção de mísseis extrema­ mente persecutórios (elementos-beta), expelidos com a finalidade de elimi­ nar toda a experiência (Bion, 1962) [ver PENSAR; FUNÇÃO-ALFA]. A idéia de partes separadas de uma personalidade isolada dividida segundo o eixo psicose-neurose conquistou considerável peso e foi central para as idéias relativas à estruturação da personalidade [ver ESTRUTURA]. Meltzer (1968) e Money-Kyrle (1969) descreveram conflitos internos entre uma parte do self que era capaz de experíenciar a dependência e relações obje­ tais mais realísticas, e outras partes que assumia uma atitude de deboche para com os benefícios das relações objetais e constantemente distorcia o indivíduo no sentido de atitudes fúteis, desesperantes, destrutivas ou autodestrutivas [ver ESTRUTURA], Money-Kyrle (1969), nesta ocasião, descre­ veu também a luta interna entre as partes sãs e insanas do self. Idealização das partes >!m âs>r do self: Rosenfeld (1971) descreveu a idealiza­ ção do self 'mau" e o narcisismo negativo como sendo proposição geral nesses pacientes ''fronteiriços" [ver NARCISISMO; NARCISISMO NEGA­ TIVO]. Descreveu uma estrutura na qual, tal como na de Meltzer, a pulsão de morte se organiza dentro da personalidade como um objeto, ou gru­ po de objetos, que domina o restante da personalidade. As partes destruti­ vas e autodestrutivas da personalidade exigem ser idealizadas e intimidam ou seduzem as partes amorosas, construtivas e mais realísticas da persona­ lidade a essa idealização. Sxdney Klein reenfatizou em 1980 a importância da descrição original, feita por Bion, do contraste entre psicótico e nãopsicótico dentro da personalidade e descreveu clinicamente o conhecimen­ to inconsciente, por seus pacientes, de estruturas dentro deles próprios a que deu o nome de "autistas". Áreas da personalidade são dominadas pe­ la pulsão de morte e encapsuladas e separadas do restante da personalida­ de, que mantém um estado mais "normal" (neurótico). Estas cápsulas emer­ giam em sonhos como objetos de casca dura, tais como moluscos, etc., e Sidney Klein referiu-se ao conceito de Rosenfeld (1978) de "ilhotas" de psi­ cose que podem ser convertidas em patologia somática. Por volta desta época (1970), Brenman (1985a e b) descreveu um superego cruel que domi­ nava internamente a personalidade da maneira- antes descrita por Bion (1962). A fim de manter uma crença idealizada nos aspectos cruéis, vinga­ tivos e destrutivos da personalidade, argumenta Brenman, é necessária uma grosseira restrição da percepção, uma estreiteza de mente. Isto elimi­ na a compreensão humana e exige "a adoração da onipotência, que é sen­ tida como superior ao amor humano e à capacidade humana de perdoar, o apego à onipotência como defesa contra a depressão e a santificação do ressentimento e da vingança" (Brenman, 1985a, p. 280), Esta supressão da percepção é ilustrada também por Steiner (1985). 400 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

O identificado: Sohn (1985) descreveu o aspecto central das organizações patológicas como sendo uma identificação com um objeto específico, e, em particular, a identificação se dá por projeção onipotente [ver 13. IDEN­ TIFICAÇÃO PROJETIVA]. Rosenfeld (1964) achou que esta identificação oni­ potente se dá também por identificação introjetiva simultânea (o ego se identifi­ ca com os atributos bons e os denega no objeto). Tomar-se o objeto induz o sen­ so de onipotência, ou o realça e o self pode ter o prazer de ser um objeto novo (ver ONIPOTÊNCIA]. A dominância da destrutividade, contudo, traz conseqüências consigo: (i) a desvalorização do objeto, cujas qualidades são expropriadas através desta identificação invasiva, e (ii) a cisão, e, portanto, o enfra­ quecimento do self. O ego se cinde entre o self necessitado e dependente e uma parte mais onipotente. É a última que assume o objeto, adota as qualida­ des dele como suas próprias, infla ainda mais a onipotência, denega a exis­ tência de outras partes, mais fracas, do ego, e pode então acreditar ser o ego total, e um ego melhorado. Ele domina sobre o restante do mundo in­ terno e apaga a existência de um mundo externo separado. A invasão e o controle do objeto, que é então incorporado como uma espécie de satélite do self, é um composto das propriedades do objeto e da arrogância do self, um precipitado a que Sohn dá o nome de identificado. O ego, esvaziado pela cisão, e o objeto, desvalorizado pela apropriação de seus atributos, dão origem a um vazio que é realçado porque o self oni­ potente pode com frequência mudar o seu objeto, transformando-se repeti­ damente em novos objetos, a fim de manter a cisão, a projeção, o contro­ le e a onipotência. Esta falsidade foi em outros lugares descrita como pseudo-aliança (Joseph, 1975), submissão (Riesenberg-Malcolm, 1981a) ou pseudo-integração (Steiner, 1987). Brenman (1985b) explorou mais as múltiplas e rapidamente mutantes identificações com objetos ideais, "um objeto os­ tensivamente total usado como objeto parcial" (Brenman, 1985b, p. 424) fver OBJETOS PARCIAIS]. Pontos de pesquisa em andamento. Estas descrições são suficientemente freqüentes e coerentes para sugerirem uma adição válida ao pensamento kleiniano. Contudo, permanece um certo número de pontos sobre os quais os diversos autores não coincidem. Cisão ou ligação: Steiner (1982) debateu se existe realmente uma cisão cla­ ra entre partes "boas" e "más" da personalidade. Concluiu ele que "esta­ mos lidando aqui não com uma cisão entre bom e mau, mas com as conse­ quências de um colapso na cisão e a remontagem dos fragmentos em uma mistura complexa, sob a dominância de uma estrutura narcísica onipoten­ te" (Steiner, 1982, p. 250). Tanto na parte narcísica e defensiva quanto na parte mais sadia há provas de uma fusão das pulsões, de uma "ligação": Se presumirmos que uma parte destrutiva primitiva do self existe em to­ dos os indivíduos, um determinante importante do resultado será a ma­ R.D.Hinshelwooâ / 401

neira pela qual as partes remanescentes da personalidade lidam com es­ sa destrutividade. Nos pacientes psicóticos, esta parte destrutiva do self domina a personalidade, destruindo e imobilizando as partes saudáveis, No indivíduo normal, a parte destrutiva é menos escindida, de manei­ ra que pode, em maior grau, ser contida e neutralizada pelas partes sa­ dias da personalidade. Permanece uma situação intermediária, em que o equilíbrio é maior, o que resulta, clinicamente, em estados fronteiri­ ços e narcísicos. Aqui, a parte destrutiva do self não pode ignorar com­ pletamente as partes sadias, sendo forçada a levá-las em conta e a ingres­ sar em uma ligação com elas. (Steiner, 1982, p. 242) A ligação cria uma questão complexa, na qual partes sadias da persona­ lidade são induzidas a conscientemente conluiar-se com intuitos sentidos como destrutivos e são assim perversamente utilizadas para mascarar-se como saúde [ver PERVERSÃO], Excitação: Em muitas destas descrições, a organização patológica oferece gratificações perversas de um tipo excitante, nas quais os objetos são oni­ potente e sadomasoquistamente controlados (Meltzer, 1968; RiesenbergMalcolm, 1970; 0'Shaughnessy, 1981; Joseph, 1975, 1982, 1983; BrenmanPíck, 1985), A excitação seduz as partes cooperativas da personalidade pa­ ra longe do desenvolvimento normal e das relações objetais "boas" e curativas: Tecnicamente, é extremamente importante estar claro se o paciente es­ tá-nos falando a respeito de um desespero real e comunicando-nos esse desespero (ou depressão ou medo ou perseguição), que ele quer que com­ preendamos e o ajudemos com ele, ou se está se comunicando de ma­ neira a primariamente criar uma situação masoquista na qual pode ser apanhado. (Joseph, 1982, p. 318) O funcionamento de uma organização patológica distorce as realidades interna e externa de tal maneira (Riesenberg-Malcolm, 1981b; Joseph, 1983) que estes pacientes têm sido às vezes chamados de "perversões de caráter" [ver PERVERSÕES], ainda que possam não apresentar perversões sexuais explícitas. Entretanto, o elemento sadomasoquista destas defesas não é in­ variavelmente relatado, de maneira que resta a ser visto se ele constitui elemento integrante da organização patológica. R elações internas das organizações patológicas: Na descrição que Sidney Klein (1980) fez das partes autistas do self, o paciente parece ser inatingí­ vel porque grande parte da.personalidade acha-se encerrada dentro da par­ te psicótica encapsuíada da personalidade. Em contraste com isso, outros autores consideraram a organização patológica como profundamente im­ plicada em um conflito interno que surge da intimação (Rosenfeíd, 1971) ou sedução (Meltzer, 1968; Riesenberg-Malcolm, 1970) das partes "boas" do self pelas partes "más". Steiner, por sua vez (1982), postulou a existên­ cia de uma ligação entre as partes "más" e "boas" do self. Dessa maneira, 402 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

três inter-relações possíveis entre as partes "boas" e "más" do self foram relatadas: (i) as partes permanecem relativamente não-interatuanies, através da cria­ ção de uma cápsula dura; (ii) as partes acham-se empenhadas, sob a domínância das "más", em evi­ tar todo movimento emocional, ou (iii) a parte "boa" do self, consciente e voluntariamente, conluía-se com a "má", Ainda não está claro se essas inter-relações constituem diferentes formu­ lações teóricas da mesma patologia ou se elas são formulações de diferen­ tes fenômenos clínicos. O bjeto e self: Estas descrições da cisão do ego, ou do self, e seu relaciona­ mento confíitívo resultante às vezes chegam muito perto de soar como um conflito interno entre o self e um objeto interno "mau". Bio (1962), por exemplo, estabeleceu uma ligação específica entre o aparelho para eva­ cuação da experiência, na mente do psicótico, e o superego persecutório. Este vínculo é mencionado também por Brenman: "o superego primitivo e severo está vinculado com uma poderosa organização patológica" (Bren­ man, 1982, p. 304). Embora a organização claramente derive das defesas e impulsos do ego, seu status exato quanto às relações objetais não está claro. Em parte, isto provém da qualidade onipotente das fantasias envolvidas, que criam uma confusão entre self e objeto. A descrição que Meltzer (1973) fez da identifi­ cação projetiva para dentro de objetos internos pode ser uma maneira de descrever esta ocorrência de aparência obscura, na qual partes separadas do self tornam-se, aparentemente, objetos internos não assimilados. Bion, Wilfred (1957), "Dífferentiation of the psychotic fromthe rtonpsychotic personalities", Int. ]. P sycho-A nal, 38:266-75; republicado (1967) em W. R. Bion, Second thoughts, Heinemann, p. 43-64. -------- . (1962), Leam ing from experim ce, Heinemann, Brenman, Eric (1982), "Separation: a clinicai problem", Int. /, P sycho-A n al, 63:303-10. -------- . (1985a), "Cruelty and narrowmindedness", Int. J. P sycho-A n al, 66:273-81. -------- , (1985b), "Hysteria", Int. }. P sy ch o-A n al, 66:423-32. Brenman-Pick, Irma (1985), "Male sexuality: a clinicai study of forces that impede deveiopment", Int. J. P sycho-A n al, 66:415-22. Freud, Sigmund (1911), "Psicho-Analytic Notes on a Autobiographical Account of a Case of Paranóia'', S. E. 12, p, 9-82. jfoseph, Beüh (1975), "The patient who is diffícult to reach", em Peter Giovacchini, (org.) Tactics and techniques in psycho-analytic therapy, vol. 2, Nova Iorque, iason Aronson, p. 205-16. -------- . (1978), "Different types of anxiety and theír handling in the analyüc situation", Int. /. P sycho-A n al, 59:223-8. -------- . (1982), "On addiction to near-death", Int. J. P sycho-A nal, 63:449-56, -------- . (1983), "On understanding and not understanding; some technical issues", Int. }. P sycho-A n al, 64:291-8.

R.D.Hinshelwood / 403

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) _ * Ao nascimento, qualquer experiência que mais tarde se torne ligada C l l com "pai" é, inteiramente, um objeto construído, a aparecer na vida inconsciente de fantasia. Quando o bebê, na posição esquizoparanóide, descobre que não há objeto para satisfazê-lo (quando a mãe, em algum respeito, esteja ausente), ele experiencia um objeto mau [ver OBJETO MAU], Este objeto mau se fantasias de nível genital estiverem operando, será concebido como um casal odiado e temido, empenhado em uma união exclusiva, geraimente de tipo muito violento e danificador [ver FIGURA 404 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

COMBINADA DOS PAIS]. Parte desta união é, então, um objeto parcial que ocupa a mãe (o pênis) ou o seio da mãe {o mamilo), o qual acabará por ser atribuído, mais tarde, a um pai estrito e repressor, quando este for mais conhecido como figura externa por seu próprio direito. Às vezes, pode haver fantasias protetoras que estabelecem o pênis co­ mo guardião do espaço materno e servem para diminuir a ansiedade de im­ pulsos excessivamente violentos no bebê. Num período ligeiramente posterior, quando o bebê pode estabelecer mais figuras (objetos totais) em sua vida, o pai será um objeto para quem voltar-se, por causa do desapontamento com a mãe (de modo típico quan­ do do desmame, achava Klein), quando ele pode ser amado e com ele o bebê pode se identificar. O pai é a primeira oportunidade para explorar-se novos objetos, podendo então aliviar um pouco da intensidade da posi­ ção depressiva. Gênero: Os objetos parciais "mãe", "pênis", "seio", "mamilo", etc. surgem primeiramente como objetos que povoam a fantasia inconsciente e são mais tarde atribuídos a membros da família. É importante lembrar que, embora a atribuição social de gêneros à mãe e ao pai reais parece classifi­ car os objetos parciais entre os pais — "mãe", "seio" à mãe real; "pênis" ao pai — a criança não faz isso. Antes da socialização e da aceitação mais consciente desses atributos de gênero, o bebê experienciará esses objetos parciais em qualquer dos genitores e, depois, apesar das atitudes socializa­ das, pode continuar a existir uma busca ardente pelos aspectos maternais dos homens ou pelos aspectos masculinos das mulheres. De fato, a união dos pais permanece dentro da personalidade e a maturidade consiste em uma capacidade crescente de tolerar, acolher e valorizar ambos os aspec­ tos, abraçados juntos dentro do self. Ver OBJETOS PARCIAIS.

■r^ 1

/ * Desde o início de seu trabalho Klein ficou impressionaâ r â . n O 1 0 [ da pela qualidade violenta do brincar das crianças e da vida humana de fantasia. Ela logo percebeu que as inibições e os pro­ blemas neuróticos nas crianças surgiam do medo intenso que provinha das fantasias de agressão. A prevalência dos sentimentos e das relações obje­ tais paranóides levou-a, em 1935, a contrastar a posição depressiva com uma posição paranóiáe anterior. A ultima expressão foi abandonada em 1946, quando Klein introduziu o termo "posição esquizoparanóide" [ver 1 1 . POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE], O círculo -vicioso paranóiáe: Klein sempre se ocupou com a fonte dessa agressão. As fantasias agressivas conduzem ao medo intenso da retaliação. O medo provoca mais medo e violência, que, por sua vez, causam mais R.D.Hinshehoood / 405

medo de retaliação, Ela retratou isto como um "(...) círculo vicioso domi­ nado pela pulsão de morte, no qual a agressão dá origem à ansiedade e a ansiedade reforça a agresão' (Klein, 1932, p. 150), Ela descreveu a manei­ ra pela qual as crianças podem se ver apanhadas por este círculo vicioso que conduz ao pânico e ao pavor noctumuB {terrores noturnos) e descobriu~se a pensar a respeito da relação entre esses estados e a«psicose paranóide nos adultos. Ela acabou por descobrir, em uma criança gravemen­ te inibida, que esses temores paranóides eram tão intensos que inibiam to­ da a atividade, inclusive a capacidade de criar símbolos. Klein percebeu então que esses crescendos de agressão e medo eram, em verdade, a base para as psicoses {Klein, 1930). Embora Klein estivesse muito cônscia da importância dos sentimentos amorosos e bons [ver AMOR], ela sempre encarou os impulsos agressivos e os círculos viciosos a que dão origem como sendo o distúrbio decisivo que interrompia a capacidade de amar. Ver

12

. INVEJA; PULSÃO DE MORTE; PSICOSE.

Klein, Melanie (1930), "The importance of symbol-formation in the development of the ego" WMK 1, p. 319-32. ' -------- . (1932), "The psycho-artalysis of chiídren", WMK 2.

c o m m foi um íermo usado pela pnmeiX d V UI bCÍIl num eo Este ra vez por Karín Stephen {1941) para

descrever o grau extremado de ansiedade na primeira infância: "um pavor da impotência em face da tensão da pulsão na infância" (p. 161). "Pavor sem nome" ou "pavor inominável" recebeu mais tarde de Bion um signifi­ cado mais pleno e específico para descrever um estado de medo sem sen­ tido que surge no contexto de um bebê com uma mãe incapaz de "rêverie" [ver RÊVERIE], conceito derivado da teoria bioniana do conter [ver CON­ TER], Quando a mãe fracassa em conter os terrores do bebê e torná-los significativos, este "objeto rejeitante da identificação projetiva" [ver PEN­ SAR] é sentido como despindo de significado a experiência e o bebê; este portanto reintrojeta, não um medo de morrer tornado tolerável, mas um pavor sem nome" {Bion, 1962a, p. 116). Com a recorrência repetida deste fracasso projetivo, um objeto interno é formado segundo as mesmas linhas através da introjeção; este objeto destrói o significado e deixa o sujei­ to em um mundo misterioso e sem sentido: Na prática, significa que o paciente sente-se cercado não tanto por obje­ tos reais, coisas-em~si, mas por objetos bizarros que são reais apenas no fato de serem o resíduo de pensamentos e concepções que foram des­ pidas de seu significado e ejetadas (Bion, 1962b, p. 9 9 ) [ver CONTER}.

Um objeto interno que despoja de significado dá surgimento a um superego que edita injunções sem sentido a respeito do comportamento. 406 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

Bion, Wilfred R. (1962a), "A theory of thinking", Int. J. P sy ch o -A m l, 43:306-10; republica­ do (1967) em W. R, Bion, Second thoughts, Heinemann, p. 110-9. -------- . (1962b), Learning from experience, Heinemann. StepHen, Karin (1941), "Aggression in early childhood”, Br. J. M ed. P sy ch o l, 18:178-90,

1

1 Bick (1964) introduziu a observação de bebês como parte da formaC i e ção de estudantes de psicoterapia e psicanálise de crianças [ver OBSER­ VAÇÃO DE BEBÊS]. No decorrer dela, começou a notar fenômenos espe­ cíficos na interação mãe-bebê que concerniam à estimulação da pele. Pare­ cia que o contato epidérmico era o elemento mais proeminente no relacio­ namento mais inicial e nas primeiríssimas introjeções do ego. O primeiro objeto é aquele que dá ao bebê a sensação de existir — de ter uma identidade, poderiamos dizer, em estágio posterior do desenvolvi­ mento. Observações do par mãe-bebê levaram Bick a compreender dois estados mentais opostos para o bebê, quer a sensação de achar-se existin­ do com uma certa coerência, quer o oposto, ou seja, um sentimento de dissolução, descoordenação, aniquilamento. Nos primeiros dias e semanas após o nascimento, pode-se perceber que certos acontecimentos acham-se associados com movimentos inquietos e descoordenados dos membros e com grunhidos, choros e gritos. Eles ocorrem, de modo típico, quando o bebê é despido, seu rosto é lavado ou ele é seguro de modo precário quan­ do se interrompe a alimentação. Outros acontecimentos reduzem a aparen­ te descoordenação e aflição: quando ele é carregado no colo, vestido após um banho, enquanto se o amamenta ou se o enrola em cobertores na ca­ minha. Sustenta-se que estes estados distinguíveis de modo bastante claro correspondem a estados mentais posteriores, que Bick identificou como sendo o sentimento de despedaçar-se (aniquilamento) ou conter [ver CON­ TER]. Para Klein, o bebê, ao nascimento, tem um ego que pode distinguir ob­ jetos separados dele mesmo, mas Bick tinha muito menos certeza de que isso fosse uma capacidade cognitiva herdada: todo o ego podia entrar em colapso e freqüentemente o fazia nos primeiros dias e semanas. Embora Klein (1946) houvesse descrito o despedaçamento do ego, ela não explicou como esse ego extremamente frágil podia íntrojetar e projetar, funções que exigem um grau firme de estabilidade e fronteira do ego. Afinal de contas, Klein havia descrito o medo do aniquilamento como sendo uma experiên­ cia primária do bebê. Em 1946, demonstrara os intricados detalhes das pro­ jeções e introjeções em que o bebê se engaja no processo de manter o ego e um sentido de identidade, bem como de proteger-se do medo do aniquila­ mento [ver 11. POSIÇÃO ESQUÍZOPARANÓIDE]. Bick, contudo, des­ crevia isto dentro de outro arcabouço.

O primeiro objeto: Manter a personalidade unida e impedi-la de despeda­ çar-se em fragmentos é experienciado passivam ente como uma função que é desempenhada inicialmente desde fora: R.D.Hinshehoood / 407

(...) em sua forma mais primitiva, as partes da personalidade são senti­ das como não possuindo força de ligação entre elas, devendo, portan­ to, serem mantidas juntas de uma maneira que é por elas experienciada de modo passivo, com a pele funcionando como froteira. (Bick, 1968, p. 484) De fato, Bick chamou a atenção para o momento mais inicial da existência do ego e expandiu-o. Klein descrevera variadamente o primeiro momento e a primeira função do ego como (i) uma projeção da pulsão de morte (Klein, 1932); (ii) uma introjeção do objeto bom, para formar o cerne do ego (Klein, 1935, 1946) [ver 1 . POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE], e (iii) uma cisão primária do ego destinada a impedir uma inveja indevida (Klein, 1957). Bick demonstrou que o bebê tem de lutar pela capacidade de introjetar e que essa capacidade é uma conquista conjunta do bebê e da mãe: "'O estágio de cisão e idealização primordiais do self e do objeto pode ser visto agora como repousando neste processo inicial de contenção de self e objeto por suas respectivas peles'" (bick, 1968, p. 484). O objeto interno bom, descrito por Klein como cerne do ego nas posi­ ções esquizoparanóide e depressiva, possui uma condição precedente —- a capacidade de introjetar: (...) esta função interna de conter as partes do self depende inicialmen­ te da introjeção de um objeto externo experienciado como capaz de pre­ encher esta função (...) Até que as funções de conter tenham sido introjetadas, não pode surgir o conceito de um espaço dentro do self. A in­ trojeção, ou seja, a construção de um objeto em um espaço interno, é, portanto, prejudicada. (Bick, 1968, p. 484) A primeira realização é conquistar o conceito de um espaço que contenha coisas. Este conceito é alcançado sob a forma da experiência de um obje­ to que mantém unida a personalidade. A pele: O bebê, ao receber o mamilo na boca, tem a experiência de adqui­ rir um objeto desse tipo, um objeto que tapa o buraco na fronteira que a boca parece representar. Com esta primeira introjeção vem a percepção de um espaço no qual objetos podem ser introjetados. Através de suas ob­ servações do bebê, tornou-se claro para Bick que uma vez ele tenha introjetado um objeto continente primário desse tipo, o bebê o identifica com sua pele — ou, para dizê-lo doutro modo, o contato epidérmico estimula a experiência (fantasia inconsciente) de um objeto que contém as partes da personalidade tanto quanto o mamilo na boca o faz. A pele é um ór­ gão receptor extremamente importante na criança pequena*. "(...) às vezes pensamos que em nossa pele como sendo hoss.a mais íntima possessão, en­ quanto às vezes ela é meramente o envólucro de nosso verdadeiro self e do que acha dentro de nós" (Shilder e Wechsler, p. 360).

408 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

Em acréscimo a isso, existem "substitutos" do mamilo: A necessidade de um objeto continente parecería, no estado infantil não integrado, produzir uma busca frenética por um objeto — uma luz, uma voz, um cheiro ou outro objeto dos sentidos — que possa prender a atenção e por esse meio ser experienciado, momentaneamente, pelo menos, como unindo as partes da personalidade. (Bick, 1968, p. 484): Vazamento: Bick descreveu ocasiões em que esta primeira realização do ego sai errada, e forneceu a Meltzer e seus colaboradores no trabalho com crianças autistas (Meltzer et ah, 1975) uma-teoria da ausência de espaço interno, que é característica do autismo. Sem um objeto interno capaz de manter unida a personalidade, o bebê não pode projetar para dentro de um objeto externo que atue como conti­ nente. Então, a personalidade simplesmente vaza sem contenção em um espaço sem limites. O bebê experiencia uma dissolução ou aniquilamento que Bick relacionou especificamente aos horrores do espaço externo: Quando o bebê nasce, ele se vê na posição de um astronauta que foi lançado para o espaço externo sem um traje espacial (...) O terror pre­ dominante do bebê é despedaçar-se ou liqüefazer-se. Pode-se perceber isto no tremor do bebê quando o mamilo lhe é tirado fora da boca, mas também quando suas roupas lhe são retiradas. (Bick, 1986, p. 296). Schmideberg, no primeiro caso inteiramente relatado de uma análise de crianças, também observou o importante "(,..) papel das roupas na supera­ ção da ansiedade paranóide" (Schmideberg, 1934, p. 259). Vazamento e identificação projetiva patológica: Há um contraste com a hipótese de Bíon de que o primeiro objeto é aquele que recebe comunica­ ções primitivas provindas do bebê, ocasionadas pela identificação projeti­ va [ver ELO DE LIGAÇÃO; CONTER]. Bick descreveu uma situação ante­ rior em que a capacidade de gerar fantasias de um espaço continente é, ela própria, adquirida de um objeto. Assim, na opinião dele, a forma comuni­ cativa de identificação projetiva dependería da experiência de um objeto que mantém unida a personalidade derivada de sensações da pele e da bo­ ca. Onde Bion descreveu as experiências posteriores de um bebê que ten­ ta projetar numa mãe que resistia às projeções, Bick descreveu não um cres­ cendo de projeções cada vez mais violentas para forçar o objeto a abrirse e a conter, mas, ao invés, uma situação onde não há objeto algum pa­ ra fornecer a idéia de um continente e onde a identificação projetiva de to­ dos os tipos é impossibilitada. Há então uma fantasia de completa, infor­ me e total dissolução da identidade e da existência. Não existe uma distinção absoluta a ser traçada entre os dois estados descritos por Bion e por Bick, e parece que a última considerava um dos problemas como entrando pelo outro, dependendo de quão seguramente o objeto interno continente foi estabelecido; inversamente, ele pode ser senR.D.Hínshelwooâ / 409

tido pelo bebê como se fosse uma pele parcial, uma pele que tende a desen­ volver "burados". A segunda pele: Bick achou que havia uma reação específica de que o be­ bê se valia quando o objeto continente era, de modo particular, incerta­ mente estabelecido. Para desenvolver um método de manter-se unido, o bebê gera fantasias onipotentes que evitam a necessidade da experiência passiva do objeto: O distúrbio da função primária da pele pode conduzir ao desenvolvi­ mento de uma formação de "segunda pele", mediante a qual a depen­ dência no objete é substituída por uma pseudo-independência, pelo uso inapropriado de certas funções mentais ou, talvez, talentos inatos, pa­ ra o fim de criar um substituto para esse continente epidérmico. (Bick, 1968, p. 484). O desenvolvimento precoce da fala — proporcionando o som da própria voz — e um desenvolvimento muscular que permite que o corpo seja man­ tido palpavelmente rígido e "unido" são exemplos típicos. Symington (1983) e Dale (1983), por exemplo, mostraram quão importantes estes con­ ceitos se tornaram recentemente na moderna psicoterapia infantil, e Syming­ ton (1985) descreveu algumas destas manifestações em um paciente adul­ to. O trabalho com crianças gravemente perturbadas (Bick, 1986) e com criança autistas (Meltzer, 1975; Meltzer et a l , 1975) levou à descoberta de um fenômeno peculiar de "aderir " objetos, na ausência de espaços nos quais se possa projetar. Isto recebeu o nome de adesão ou identificação adesiva {ver IDENTIFICAÇÃO ADESIVA]. Há uma semelhança entre o fenômeno da segunda pele descrito por Bick e o fenômeno do "falso s e l f , descrito por Winnicott (1960). O últi­ mo é um conjunto de características de personalidade, freqüentemente bas­ tante rígidas, que são experienciadas pelo indivíduo como não realmente fiéis a ele próprio, mas desenvolvidas para ocultar sua própria falta de sen­ so de um ser verdadeiro. Esta falta subjacente de identidade acha-se rela­ cionada à experiência do aniquilamento [ver ANIQUILAMENTO]. Segun­ do a opinião de Winnicott, essa experiência provém de um experienciar pre­ maturo de um objeto externo como separado. Na visão de Bick, a mesma expe­ riência de aniquilamento provém da experiência deficiente de um objeto externo que pode ajudar o bebê por manter unida a personalidade dele. As expressões "segunda pele" e “self falso" originam-se de antecedentes teóricos bastante dife­ rentes e, dessa maneira, apontam para implicações diferentes para a prática clí­ nica. Bick, Esther (1964), "Notes on infartt observation in psycho-analytic training", Int. J. PsychaAnal,, 45:558-66; republicado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected papers o f M artha Harris and Esther Bick, Perth, Clunie, p. 240-56. -------- . (1968), "The experience of the skirt in early object relations", Int. /, Psycho-A nal., 49:484-6; republicado (1987) em The collected papers o f Martha Harris and Esther Bick, p. 114-8.

410 / Dicionário áo Pensamento Kleiniano

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^ * O "pênis'.' é um objeto pardal inidalmente concebido, na fantae n l S sia inconsciente, como parte da figura combinada dos pais. O bebê acredita que ele resida dentro do corpo, abdômen ou seio da mãe [ver FI­ GURA COMBINADA DOS PAIS]. A violência da concepção inicial pode ser atribuída ao pai externo, quan­ do ele acaba por ser encontrado [ver PAIj. Com o começo da posição de­ pressiva, o pênis pode ser encarado como um aliado na restauração da mãe danificada. À medida que o desenvolvimento do menininho progride, ele pode encontrar uma grande tranqüilização em seu pênis, se este for iden­ tificado com o pênis restaurador ou o pai. Por outro, pode ser também grandemente temido e até mesmo repudiado, se for identificado com o ob­ jeto violento da fantasia inicial.. Tal como acontece com outros objetos parciais, as características pare­ cem, em certa medida, ser inatamente determinadas e um trabalho tem de ser efetuado para distinguir os objetos externos (neste caso, o pai) mais como eles realmente são [ver CONHECIMENTO INATO]. Ver PAI; OBJETOS PARCIAIS; MASCULINIDADE.

P en sam en to P en sar

Ver PENSAR.

Em seus trabalhos iniciais, a posiçaô clássica de Klein levou-a a enfatizar a importância das lutas infantis para aceitar a ce— R.D.Hinshelwood / 411

na, primária e o doloroso e sub-reptício pensar a respeito dos mistérios da sexualidade dos pais (Klein, 1923). Seu interesse no componente epistemofílico da libido ocasionou algumas modificações de vulto na compreensão da curiosidade e do conhecimento, ambos inerentes desde o começo da vi­ da (Klein, 1930,1931) [ver EPISTEMOFILÍA; CONHECIMENTO INATO]. Embora o interesse de Klein por este aspecto de seu trabalho tenha min­ guado durante certo tempo, ele ganhou um novo ímpeto quando diversos de seus colaboradores começaram a analisar esquizofrênicos e se viram confrontados por distúrbios graves de cogníção. Rosenfeld e Segai produ­ ziram material clínico a analisar o pensamento fraturado e a cisão de per­ sonalidade desses pacientes [ver ELO DE LIGAÇÃO]. Bion, contudo, le­ vou isto mais à frente e deu início a uma ampla viagem teórica, tomando como ponto de partida as dificuldades que os esquizofrênicos têm em efe­ tuar elo de ligação intelecutal (Bion, 1959) [ver ELO DE LIGAÇÃO]. As maneiras anormais pelas quais os esquizofrênicos utilizam o seu aparelho mental levou-o a uma compreensão do pensamento normal. O trabalho de Bion descrevia várias visões diferentes do pensar (Spillius, 1988), todas elas apresentadas em suas duas publicações de 1962: (1) o acasalamento de uma pré-concepção com uma realização; (2 ) o acasala­ mento de uma preconcepção com uma ausência, e (3) um processo que dependia da função-alfa, originalmente proporcionado pela mente mater­ na em um estado de "rêverie"; a mente da mãe forma um objeto capaz de compreensão, que pode ser introjetado para formar a base da função do pensar. O último destes modelos foi o que ele escolheu para elaborar melhor (Bion, 1970) e outros autores o adotaram como sendo uma teoria kleiniana do pensar. (1 ) O acasalamento de uma preconcepção com uma realização. Ao desenvol­ ver sua teoria do pensar, Bion apoiou-se nos conceitos kleinianos da posi­ ção esquizoparanóide e da identificação projetiva. Sua idéia a respeito da ligação dos objetos é que existe uma apreensão inata da ligação de dois objetos e do relacionamento entre eles, baseada na expectativa inata do relacionamento entre boca e mamilo e pênis e vagina. Bion tentou colocar um grau matemático de rigor em seus termos: (a) Preconcepção. Este termo representa um estado de expectativa. É a contrapartida de uma variável na lógica matemática ou de uma incóg­ nita na matemática. Possui a qualidade que Kant atribui a um pensa­ mento vazio, que pode ser pensado mas não pode ser conhecido. (b) Concepção. É o que resulta quando uma preconcepção se acasala com as impressões sensórias apropriadas. (Bion, 1962b, p. 91) Existe uma expectativa inerente da união de dois objetos para constituir um terceiro que é mais que a soma das duas partes. Esse relacionamento é visto por Bion como sendo a propriedade subjacente à construção dos 412 / E)kionário do Pensamento Kleiniano

pensamentos. Descreveu ele (Bion, 1962a, b) uma "'história evolutiva" de um pensamento, que se dá assim: uma preconcepção inata, tal como a ex­ pectativa neural e anatômica que a boca tem de um mamilo, encontra uma realização (o mamilo real entra na boca); o resultado disso é uma con­ cepção. As concepções são os resultados de conjunções satisfatórias [ver PRECONCEPÇÃO]. (2) O acasalamento com uma ausência. Em deferência a Freud, que encara­ va o desenvolvimento do pensamento como surgindo da ausência de uma satisfação, Bion considerou a situação em que uma preconcepção tem dê acasalar-se com a ausência de uma realização: E um "pensamento" o mesmo que a ausência de uma coisa? Se não exis­ te "coisa", é a "não coisa" um pensamento e é por virtude do fato de existir uma não "coisa" que se reconhece que "ela" tem de ser um pensa­ mento? (Bion, 1962b, p. 35) Para o bebê, a ausência de um seio é uma presença tão concreta quanto o seio presente, com o ausente sendo conhecido como "não-seio" [ver OB­ JETO MAU; OBJETOS]. Bion está tentando descobrir a fonte da qualida­ de que alerta a consciência para o fato de "ela" ser é um pensamento, an­ tes que uma realidade ou uma alucinação. Isto depende da capacidade que o ego tenha de tolerar a experiência do objeto mau que o ameaça e a expe­ riência da perda do objeto bom. Se a tolerância for possível, então o ego é capaz de experienciar o "pensamento" de um objeto, ao mesmo tempo em que reconhece a sua ausência real. A capacidade de distinguir o pensa­ mento do objeto em si, ou da alucinação do objeto, constitui um pré-re­ quisito para o pensar [ver EQUAÇÃO SIMBÓLICA; OBJETOS], A criação de um pensamento, então, torna necessário o desenvolvimen­ to de "um aparelho para pensá-lo", e o pensamento é definido, por referên­ cia a Freud, como a capacidade de "construir uma ponte sobre o abismo de frustração que se forma entre o momento em que uma falta é sentida e o momento em que a ação apropriada para satisfazer a falta culmina pe­ la satisfação desta" (Bion, 1962a, p. 112). Relacionamentos desse tipo en­ tre objetos podem ser grosseiramente rompidos pelos ataques edipianos iniciais, pela inveja ou pela privação real grave. O objeto mau: Na circunstância em que a tolerância da frustração não se­ ja suficiente para transpor o abismo, então "a incapacidade de tolerar a frustração desequilibra a balança no sentido da frustração" (Bion, 1962a, p. 112). Ao invés de uma união de preconcepção com a realização negati­ va, uma outra coisa se desenvolve, que recebe o nome de objeto "mau", o qual é então evacuado através do mecanismo da identificação projetiva. Dessa maneira, a frustração e o sofrimento são evitados pela expulsão da frustração e de um fragmento associado do ego (a preconcepção). Isto R.D.Hinshekoood / 413

é um afastamento importante dos acontecimentos que Freud descreve como característicos do pensamento na fase da dominância do princípio da realidade, Aquiio que deveria ser um pensamento, um produto da justaposição, da preconcepção e da realização negativa, torna-se um objeto mau, indistinguível de uma coisa em si, adequada apenas para evacuação, (Bion, 1962a, p. 112} Um aparelho para pensar fracassa então em desenvolver-se e, ao invés, é o uso da identificação projetiva que se desenvolve: O modelo que proponho para este desenvolvimento é o de uma psique que opera segundo o princípio de que a evacuação de um seio mau é sinônimo de obter-se sustento de um seio bom, O resultado final é que todos os pensamentos são tratados como se fossem indistinguíveis de objetos internos maus; a maquinaria apropriada é sentida como sendo não um aparelho para pensar pensamentos, mas como um aparelho pa­ ra livrar a psique de acumulações de objetos internos maus, (Bion, 1962a, p. 112) Função-alfa: Dessa maneira, se tudo corre bem, as impressões sensor ias são convertidas, através do acasalamento com preconcepções, em pensa­ mentos utilizáveis; isto distingue aquelas frustrações toleráveis que podem ser usadas para desenvolver o pensar (elementos-alfa) de outros conteúdos mentais que são sentidos como apropriados apenas para evacuação (elementos-beta) [ver FUNÇÃO-ALFA; ELEMENTOS-BETA]. A função-alfa é o processo (inespecífico) pelo qual o significado se acumula aos dados sensórios O pensar de nível superior: As concepções, uma vez estabelecidas, podem repetir a história das preconcepções, ou seja, elas se tornam preconcep­ ções para realizações ulteriores (ou realizações negativas, de ausência) por uma maneira hierárquica que gera o pensamento refinado e a construção de teorias. A cada etapa as funções de satisfação e frustração desempe­ nham — ou não — seu papel de fazer avançar o aparelho em desenvolvi­ mento do pensar. Esta é uma das dimensões da grade de Bion (Bion, 1963), que foi, ela própria, uma teoria (preconcepção) sistemática, elaborada pa­ ra atender as realizações de tipos reais de pensamentos [ver BION]. (3) Conter. O terceiro modelo do desenvolvimento do pensamento é o de que a capacidade de desenvolver um aparelho para pensar depende da in~ trojeção de um objeto capaz de compreender a experiência do bebê e forne­ cer-lhe significado. O conceito bioniano de identificação projetiva normal [ver CONTER] foi distinguido da identificação projetiva "excessiva", utili­ zada para evacuar acumulações de objetos internos maus. De fato, dada uma experiência suficiente de um objeto externo continente, a identificação projetiva normal é a ocorrência que se pode esperar: 414 / Diáonário do Pensamento Kleímano

Como atividade realística, ela [a identificação projetiva] mostra-se co­ mo um comportamento razoavelmente calculado para despertar na mãe sentimentos dos quais o bebê deseja ver-se livre. Se o bebê sente que está morrendo, ele pode despertar na mãe temores de que esteja morren­ do. Uma mãe bem-equilibrada pode aceitar esses temores e reagir-ihes terapeuticamente, ou seja, de uma maneira que faça o bebê sentir que está recebendo de volta sua própria personalidade assustada, mas sob uma forma que.ele pode tolerar: os medos são administráveis pela per­ sonalidade do bebê. (Bion, 1962a, 115) A mãe é o aparelho para o bebê tolerar a conjunção da preconcepção com uma realização negativa, o não-seio [ver CONTER]. Para desempenhar esta função, a mente da mãe tem de estar em um estado de "rêverie" (ver REVERÍE], que se aproxima do estado de atenção de flutuação livre descri­ to por Freud e, também, na descrição de Bion, da mente que aboliu a me­ mória e o desejo [ver MEMÓRIA E DESEJO; BION). Quando as coisas saem mal, e a mãe fracassa em receber em si as sensações do bebê, este então se vale de esforços cada vez mais violentos de projetar na mãe, de­ senvolvendo assim o "aparelho para livrar a psique de objetos internos maus". Neste caso de fracasso, o bebê tem uma mãe, um objeto interno em formação, que Bion descreveu como um "objeto rejeitante da identifica­ ção projetiva", e, para o bebê, um objeto intencionalmente incompreensivo, com o qual está destinado a identificar-se. Ao invés de o bebê ter as suas frustrações tornadas compreensíveis, ele sente que elas se tornaram ativamente despojadas de significado, um "pavor sem nome" [ver PAVOR SEM NOME]. O elo de ligação continente: Bion (1962) começou a investigar as vicissitudes do relacionamento continente pela descrição da qualidade do elo de li­ gação existente entre a mente continente e os conteúdos colocados nela. Esses elos possuem três potencialidades, "L", "H" e "K", que representam o amor, o ódio e o desejo de conhecer a respeito dos conteúdos. Dessa maneira, a mãe às vezes amará o filho, odia-lo-á ou descobrir-se-á tentan­ do compreender a maneira pela qual ele está experienciando, sentindo e pensando. Para fins do desenvolvimento do pensamento, o elo-K é o mais importante. A ligação da mãe com o bebê por esta maneira desenvolve a capacidade da criança mediante a introjeção do objeto de ligação-K. Entre­ tanto, existem distúrbios com o elo de ligação-K. 0'Shaughnessy (1981) descreveu, com exemplos clínicos, os três importantes tipos de elo de liga­ ção-K: (i) a tentativa de chegar a conhecer o objeto através de suas identi­ ficações projetivas; (íi) o despojamento de significado da experiência proje­ tada do objeto, conduzindo a uma experiência desnuda e sem sentido que dá origem ao bebê sentir um terror interno provindo de um objeto introjetado invejoso que o priva de significado para as suas experiências [do be­ bê] (referimo-nos a isto como "menos-k" ou "-K") e (iii) um estado de auR.D.Hinshehoood / 415

sência de "K" ("não-K"), no qual a capacidade de conhecer foi destruída, dando surgimento a uma condição psicótica paranóide em que o ego foi gravemente enfraquecido pela cisão e projeção de sua capacidade de "K" e enfrenta objetos hostis, para dentro dos quais, em fantasia, fragmentos do ego foram violentamente expelidos [ver EPISTEMOFILIAj. A teoria do pensar de Bion é, em geral, adotada pelos kleinianos co­ mo um todo. Há variações no grau em que é usada (ou mesmo compreen­ dida) e alguns autores a pesquisaram mais por sua própria conta. A mais ambiciosa dessas pesquisas é a de Meltzer (1987). Bion, Wilfred (1959), "Attack on linking", Int. J. Psycho-Anal., 40:308-15; republicado (1967) em W. R. Bion, Second thoughts, Heinemann, p. 93-109. -------- . (1962a), "A theory of thinking", Int. J. P sycho-A n al, 43;30ó-10; republicado (1967) em Second thoughts, p, 110-9, -------- , (1962b), Leam ing from experíence, Heinemann, -------- . (1963), Elements o f psycho-analysis, Heinemann, -------- . (1970), Attention and interpretation, Tavistock. Klein, Melanie (1923), 'T h e role of the school in the libidinal development of the child", WMK 1, p. 59-76. -------- . (1930), 'T he importance of symbol-formation in the development of the ego", WMK 1, p. 219-32. --------. (1931), "A contribution to the theory of íntellectual development", WMK 1, p. 236-47. Meltzer, Donald (1987), Studies in extended m etapsychology, Períh, Cíunie. 0'Shaughnessy, Edna (1981), "A commemorative essay on W. R. Bion's theory of thinking", Journal o f Child Psychotherapy, 7:181-92. Spillius, Elizabeth Bott (1988), M elanie Klein today: Volume 1: M aínly theory, Routledge.

P

1 _ Tanto Freud quando Abraham interessaram-se pelas experiências dos pacientes psicóticos e trabalharam durante uma déca­ da com a análise de pacientes maníaco-depressivos. Freud (1917) acabou por descrever a semelhança existente entre as enfermidades depressivas e o luto e o aspecto central da perda na natureza do problema. Essas perdas ligavam-se com suas opiniões precedentes a respeito da importância espe­ cial da castração no desenvolvimento infantil. Em 1926, quando investiga­ va a natureza da ansiedade, viu um certo número de situações de perda; a perda no nascimento, no desmame, na castração, e assim por diante, atra­ vés do ciclo evolutivo [ver 8. SITUAÇÕES INICIAIS DE ANSIEDADE].

X v I lC lu

Perda do objeto interno: Klein adicionou a isso descrevendo essas perdas como possuindo uma semelhança decisiva por todas elas despertarem an­ siedade mediante a criação de um senso de um objeto bom internalizado inseguro (Klein, 1940) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Com isto, ela fez üm acréscimo significante à teoria de Freud (exposta em 1917), na qual ele ficara impressionado pela aberrante reação de luto do melancóli­ co quando o objeto externo não fora realmente perdido, e desenvolveu o trabalho de Abraham, em que este descrevera a preocupação do maníacodepressivo com objetos perdidos representados por fezes. 416 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

Dessa maneira, Klein desenvolveu a direção em que Abraham e Freud haviam apontado e, por isto, foi criticada por Fairbairn, que censurou os três por absorverem-se demais com a posição depressiva e negligenciarem os processos de cisão manifestos na esquizofrenia (a outra psicose de vul­ to), características que são semelhantes às da histeria, com a qual, natural­ mente, a psicanálise havia começado [ver FAIRBAIRN; 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE]. Ver ANSIEDADE DEPRESSIVA. Freud, Sigmund (1917), "Mourning and melancholia", S. E. 14, p. 737-60. Klein, Melanie{1940), "Mourning and its relation tomanic-depressiveStates", W M K1, p. 344-69.

No início de seus trabalhos, Klein ficou estarreci­ da com o nível de violência apresentado pelo brincar das crianças e logo deu-se conta de que os estados de ansiedade que encontrava em seus filhos, tal como, por exemplo, o pavor noctumus, es­ tavam ligados com o medo dessa violência. O sentimento de uma retalia­ ção pendente afetava grandemente a criança e Klein refletiu que isso cons­ tituía um estado de perseguição não muito inferior à paranóia dos pacien­ tes psicóticos [ver PARANÓIA]. Quando ela descobriu que o nível do sadismo [ver SADISMO] e do te­ mor da retaliação inibiam o brincar, a simbolização e outras formas de desenvolvimento intelectual da criança, Klein estabeleceu a conexão com o distúrbio de pensamento dos pacientes esquizofrênicos. Remontou esse temor da violência e da perseguição aos meses iniciais da vida analisando o pavor noctum us de crianças cujos sintomas haviam começado em seus primeiros meses de vida e confirmou que Abraham e Freud estavam corre­ tos em inferir que pontos de fixação para as psicoses existem desde muito cedo nas fases pré-genitais. Posteriormente (1946), Klein situou a perseguição no contexto da posi­ ção esquizoparanóide, um medo do aniquilamento, mas deixou claro que as pessoas constantemente retornam a estas ansiedades persecutórias, sob certas circunstâncias, através de toda a vida. O tom persecutórío das rela­ ções objetais, contudo, só desaparece gradualmente e as experiências ini­ ciais da posição depressiva acham-se inundadas por uma forma persecutória de culpa. Apenas gradualmente é que o tom muda para uma forma de culpa mais claramente preocupada e reparadora [ver ANSIEDADE DE­ PRESSIVA]. Em verdade, esta forma inicial de culpa pode incentivar um recuo para a posição esquizoparanóide, onde o medo da perseguição é menos angustiante que o desencadeamento da culpa na posição depressi­ va [ver DEFESA PARANÓIDE CONTRA A ANSIEDADE DEPRESSIVA]. Ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE; PARANÓIA. R.D.Hinshehvood / 4 1 7

Klein, Melanie (1946), "Notes on some schizoid mechanisms", WMK 3, p, 1-24.

Klein demonstrou que, em seu brincar, as crianças transformavam seus brinquedos em pessoas, imaginárias ou reais, que eram de importância em sua vida real [ver X. TÉCNICA], e se preocupavam com as relações existentes entre esses objetos personificados. A personificação, sempre presente em todo brincar, levou Klein à opi­ nião de que toda atividade mental é concebida com relacionamentos entre objetos personificados. Ela ficou impressionada com a fluidez e a facilida­ de com que relações, afetos e conflitos podiam ser transferidos para novos objetos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. A crença kleiniana na capaci­ dade de representar pessoas, simbolizar e efetuar uma transferência contras­ tou com a opinião de Anna Freud [ver 1 . TÉCNICA].

P erso n ificação

Ver BRINCAR.

T)

Em suas teorias iniciais, Freud (1905) encarava a pulsão sexual como possuindo vários componentes — sa­ dismo e masoquismo, voyeurismo, homossexualidade. A sexualidade de uma criança é multiplamente perversa (sexualidade polimorfa perversa da infância). Achava ele que isto desaparecia do interesse consciente durante o amadurecimento normal. Nas pessoas que têm prazer nas perversões, contudo, a pulsão infantil permanece e, na neurose, um impulso compo­ nente perverso expressa-se indiretamente, representando um interesse se­ xual perverso mal reprimido. Embora a teoria clássica concedesse grande ênfase à sexualidade perver­ sa e às conseqüências de sua repressão, Klein pouco diz a respeito das per­ versões em particular. É verdade que ela descobriu que uma das pulsões componentes, o sadismo, era especialmente importante, mas não acompa­ nhou isso por uma investigação das perversões sadomasoquístas [ver SA­ DISMO], deixando seus achados onipresentes de sadismo nas crianças cu­ riosamente desvinculadas do sadismo sexual adulto. çr

1 t i VCÍ bdU

Perversões adultas: Klein (1927), contudo, descobriu que os componentes sádicos, muito em primeiro plano nas crianças, combinavam com os tipos de sadismo encontrados na criminalidade adulta. Subseqüentemente, os kléinianos tenderam a considerar todas as perversões como uma manifesta­ ção da pulsão de morte, ou seja, como impulsos que distorcem a sexualidade. Klein descreveu o desenvolvimento precoce dos sentimentos genitais co­ mo sendo um meio de lidar com os terrores dos impulsos pré-genitais. A erotização genital dos impulsos pré-genitais mobiliza os impulsos genitais tranqüilizantes do amor e da criatividade, mas o processo de genitalização 418 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

prematura corre o risco de criar perversões sexuais adultas e estados excita­ dos de destrutividade. O sadomasoquismo e outras perversões, assim como as adicções, repre­ sentam uma maneira de lutar para desenvolver as relações objetais além da posição esquizoparanóide, quando um excesso de destrutividade domi­ na a personalidade [ver ORGANIZAÇÕES PATOLÓGICAS], Hunter (1954) e Joseph (1971) analisaram perversões sexuais (ambas ca­ sos de fetichismo) e demonstraram a importância de voltar-se para um no­ vo objeto, ou, melhor, distanciar-se de um objeto antigo que dera origem a ansiedade demasiada. O paciente de Joseph mostrava identificações pro­ jetivas patológicas e onipotentes com o seu fetiche, através de fisicamente introduzir seu corpo nele. Além disso, Meltzer (1973) descreveu a enorme variedade de conteúdos de fantasia dos impulsos invejosos e sádicos envol­ vidos nas perversões sexuais. Distinguiu ele entre a sexualidade perversa infantil e a adulta e considerou a perversidade polimorfa como uma explo­ ração, até onde a criança é capaz, do mistério de sua própria sexualidade, da sexualidade dos pais, e das possibilidades de identificar-se com eles. Em contraste, a. perversão adulta é motivada por impulsos destrutivos a danificar a sexualidade, especialmente a dos pais e o coito destes. H om ossexualidade: Freud (1911) via o ser humano como inatamente bissexual, mas que um grau indevido de homossexualismo podia ser reponsável pelo desenvolvimento (defensivo) da paranóia. Rosenfeld (1949), contu­ do, explorou a possibilidade de que problemas particularmente agudos na posição esquizoparanóide resultassem em um afastamento genital, por hos­ tilidade, da mãe para o pai. Dessa maneira, a homossexualidade é um meio de lidar com a paranóia indevida. Perversão da transferência: O interesse kleiniano deslocou-se para um inte­ resse técnico na manifestação de impulsos sádicos em relação ao analista (Etchegoyen, 1978; Spillius, 1983). Joseph (1975, 1982) interessou-se de perto pela perversão do relacionamento transferenciai, uma forma de per­ versidade que se acha estreitamente ligada com a reação terapêutica nega­ tiva [ver REAÇÃO TERAPÊUTICA NEGATIVA]. Demonstrou ela (1982) quão importante é determinar se as manifestações que parecem ser ansieda­ de não são realmente uma forma de fruição masoquista do sofrimento e se o que parece ser uma reação paranóide não é realmente uma pseudoparanóia que visa a criar uma situação excitante. Perversão de caráter: Joseph (1975) demonstrou também a maneira pela qual os pacientes engajam-se apenas parcialmente e obtêm grande prazer em manter as partes mais vividas de sua personalidade a uma distancia inatingível do analista. Às vezes, estes relacionamentos perversos na trans­ ferência podem ser acompanhados por um acting out passageiro de impul­ sos sexuais perversos reais (Galíwey, 1979). R.D.Hinshelwood / 419

Rosenfeld (1971) e outros autores chamaram repetidas vezes a atenção para as manifestações de destrutividade e sadismo arbitrários em relação ao analista e para a maneira porque isto é organizado como parte da per­ sonalidade — uma perversão de caráter [ver NARCIS1SMO; ESTRUTU­ RA]. A organização interna da pulsão de morte pode resultar em partes más do self intimidarem as partes "boas'' (por exemplo, Money-Kyrle, 1969; Rosenfeld, 1971) ou em as partes perversas do self poderem seduzir as partes "boas" (Meltzer, 1968; Steiner, 1982) [ver ESTRUTURA]. Steiner (1982) descreveu detalhados materiais clínicos que demonstram as descrições mais gerais, feitas por Joseph (1975), da maneira pela qual partes aparentemente boas do self podem ser assumidas e utilizadas a fim de seduzir, distorcer e perverter o relacionamento com o analista, de ma­ neira que aquilo que aparece como impulsos cooperativos e amorosos ocul­ ta tentativas secretas de controlar e invadir [ver ORGANIZAÇÕES PATO­ LÓGICAS]. Etchegoyen, Horatio (1978), "Some thoughts on transference perversion", lnt. /. Psycho-A­ nal, 59:45-53. Freud, Sigmundo (1905), "Three essays on the theory of sexuality", S.E. 7, p. 125-245, . (1911), "Psycho-analytic notes on an autobiographical account of a case of paranóia", S, E. 12, p. 3-82. Gaüwey, Patríck (1979), "Symbolic dysfunctíon in the perversions: some related clinicai problems", lnt. Rev. Psycho-Anal, 6:155-61. Hunter, Dugmore (1954), "Object relation changes in the analysis of fetishísm", lnt. / PsychoAnal., 35:302-12. Joseph, Betty (1971), "A clinicai, contribution to the analysis of a perversion", lnt. ]. PsychoAnal., 52:441-9. . (1975), "The patient who is difficult to reach", em Peter Giovacchini, (org.), Tactks and techniques in psycho-analytic therapy, vol, 2, Nova Iorque, Jason Aronson, p. 205-16. -------- . (1982), "On addiction to near death", lnt. }. Psycho-Anal, 63:449-56, Klein, Melanie (1927), "Criminal tendencies in normal children", WMK 1, p. 170-85. Meltzer, Donaíd (1968), "Terror, persecütion, dread", lnt. J. Psycho-Anal, 49:396-400; repu­ blicado (1973) em Donald Meltzer, Sexual States o f mind, Per th, Clunie, p. 99-106, -------- . (1973), Sexual States o f mind, Perth, Clunie. Money-Kyrle, Roger (1969), "On the fear of insanity", em (1978) The collected papers o f Roger Money-Kyrle, Perth, Clunie, p. 434-41, Rosenfeld, Herbert (1949), Remarks on the relation of male homosexuality to paranóia, paranoid anxiety and narcissism", lnt. ). Psycho-Anal, 30:36-47; republicado (1965) em Her­ bert Rosenfeld, Psychotic States, Hogarth, p. 34-51. -------- . (1971), "A clinicai approach to the psycho-analytic theory of the life and death instíncts", lnt. /. Psycho-Anal, 52:169-78. Spillius, Elizabeth Bott (1983), "Some developments from the work of Melanie Klein", lnt, ]. Psycho-Anal, 64:321-32. Steiner, John (1982), "Perverse relationships between parts of the self: a clinicai illustration", lnt. J. Psycho-Anal,, 63:241-52.

P e sa r

Ver LUTO

4£0 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

j ^ Klein adotou a expressão "posição" para dar uma ênfase ' O S l Ç a O diferente ao seu modelo de desenvolvimento, Ela queria afastar-se da idéia de estágios ou fases do desenvolvimento, as quais havia demonstrado não serem nítidas, mas sim parcialmente sobrepostas e flutuan­ tes. Uma posição é uma constelação de ansiedades, defesas, relações obje­ tais e impulsos. Ela pela primeira vez começou a utilizar o termo neste sen­ tido em 1935, quando descreveu a posição depressiva [ver 1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Anteriormente, a expressão havia se referido a posições libidinais [ver LÍBIDO]: homossexual, heterossexual, etc. (ver, por exem­ plo, Klein, 1928, p. 186). Posição e relações objetais: O termo "posição" descreve a postura caracte­ rística que o ego assume com relação aos seus objetos. Embora Klein con­ tinuasse a utilizar os termos "oral", "anal", "fálico", etc., estes se referiram cada vez mais a tipos de moções pulsionaís, antes que a estágios, ou seja, referiram-se mais a fantasias inconscientes típicas [ver 2. FANTASIA IN­ CONSCIENTE] do que a períodos estritos de desenvolvimento. De fato, as observações dela levaram-na a modificar consideravelmente o esquema clássico da evolução, por colocar as origens do complexo de Edipo e o superego bem no início do primeiro ano de vida. Ela queria transmitir, com a idéia de posição, um processo muito mais flexível, para lá e para ca, en­ tre uma e outra, do que normalmente se quer exprimir por regressão a pontos de fixação nas fases evolutivas [ver Ep-D]. Queria também trans­ mitir, com a expressão "posição", uma ênfase nos relacionamentos. Traba­ lhando com crianças, ela estava muito mais familiarizada com a maneira pela qual os objetos eram localizados e manipulados pelo ego. Posição ou estrutura defensiva: Em princípio, Klein utilizou o termo "posi­ ção" de modo livre e descreveu uma posição paranóide, uma posição ma­ níaca e uma posição obsessiva, assim como uma posição depressiva. Mais tarde, porém, restringiu o emprego do termo: as posições "paranóide", "ma­ níaca" e "obsessiva" foram abandonadas quando ela reconheceu que elas se referiam simplesmente a estruturas típicas de defesas contra ansiedades; para Klein, estas "posições" denotavam configurações patológicas (Meltzer, 1978). Posteriormente, as duas posições fundamentais — a posição depres­ siva, com ansiedade depressiva, e a posição esquizoparanóide [ver 1 1 . PO­ SIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE], com ansiedade persecutória, tiveram im­ portância evolutiva. Posições psicóticas: A mudança do termo de um emprego patológico pa­ ra um uso evolutivo levou a confusões a respeito do que Klein queria di­ zer. Muitos a entenderam como sugerindo que as crianças eram normalmentè psicóticas. Ela esforçou-se por corrigir isto: Em meu trabalho anterior, descreví as ansiedades psicóticas e os meca­ nismos das crianças em termos de fases de desenvolvimento (...) ContuR.D.Hinshêhvood / 421

do, de vez que no desenvolvimento normal as ansiedades e os mecanis­ mos psicóticos nunca predominam isoladamente (fato que, naturalmen­ te, enfatizei), a expressão "fases psicóticas" realmente não é satisfatória. Estou empregando agora o termo "posição" (...) Parece-me mais fácil associar com esta expressão (...) as diferenças existentes entre as ansie­ dades psicóticas evolutivas da criança e as psicoses do adulto, ex . , 1 a rápida mudança que ocorre de uma ansiedade de perseguição *ou senti­ mento deprimido para uma atitude normal, reviravolta essa que é tão característica da criança (Klein, 1935, p, 276n) O termo "posição", achava ela, indicaria um ponto de atração regressiva no psicótico, antes que a psicose franca. Dessa maneira, chamou-as de po­ sições psicóticas, a serem contrastadas com as posições libidinais, por esta­ rem relacionadas com os métodos primitivos e violentos de lidar com as manifestações da pulsão de morte. Klein, Melanie (1928), "Eariy stages o£ the Oedipus complex", WMK 1, p. 186-98. -------- . (1935), "A contribution to the psychogenesis of manic-depressive States", WbAK 1, p. 262-89. Meltzer, Donald (1978), The kleinian development: Part II, Richard week-by~week, Perth, Clunie,

Ainda que multo menos que os elementos i. X C L U I jovens de outras espécies, o bebê humano nasce com aptidões inerentes [ver CONHECIMENTO INATO], Uma delas é a capacidade de ter experiências psicológicas. Quando se toca no rosto de um bebê a sua cabeça se volta e ele suga. Esta potencialidade está dispo­ nível desde o início, e qualquer potencialidade para experienciar psicologi­ camente esses eventos será também iguaímente inerente. Que tipo de enti­ dade psicológica é essa potencialidade inerente? Presumindo que o recémnascido é capaz de experiências, qual é a experiência do reflexo da crian­ ça de peito antes de ter acontecido pela primeira vez? Bion introduziu a idéia de uma preconcepção, ou seja, uma entidade psicológica à espera de uma realização que se "acasalará" com ela. A preconcepção "inexperienciada", acasalada com uma realização, produz uma concepção e, desta, pensamentos e o pensar podem se desenvolver. Ver CONTER; BION; 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; PENSAR.

P re o cu p a çã o

Ver GRATIDÃO; AMOR.

P re ssu p o sto s b á s ic o s L 422 / Dicionário do Pensamento Kleiniano



0

1948-51; Rioch, 1970), antes de sua formação como analista kleiniano, é com freqüência incluído no cânone kleiniano. Ele subseqüentemente desen­ volveu parte de seus resultados com uma intensa ênfase kleiniana (Bion, 1955 e, posteriormente, 1970), mas "uma interpretação kleiniana dos pres­ supostos básicos não decorrente necessariamente dos dadòs dele, embora sua plausibilidade seja considerável" (Trist, 1987). Meltzer elevou esse tra­ balho descrevendo-o como "(...) as momentosas formulações de Bion so­ bre Grupos de Pressupostos Básicos" (Meltzer, 1984, p. 89), e Wilson (1983) apontou com certos detalhes como o modelo bioniano dos pressu­ postos básicos é uma "metapsicologia de grupos equivalente, em muitos casos, ao sistema imaginado por Freud" (Wilson, 1983, p. 157) e, em parti­ cular, ao modelo topográfico freudiano. Análise do grupo: Bion (1961) lidou com grupos tal como um analista que se senta à cabeceira de um paciente. O "grupo-como-um-todo" exibe uma transferência para o líder grupai sob a forma de uma cultura de grupo que, demonstrou Bion, era permeada por pressupostos tácitos e inconscientes partilhados por todos os membros do grupo. O conjunto de pressupostos sobre a natureza do grupo, de seu líder, da tarefa do grupo e do papel que se espera de seus membros possui três variantes. Os três pressupostos básicos são detectados no tom de sentimento da atmosfera do grupo: (i) primeira, o pressuposto básico dependente (PBD) dá origem a um gru­ po de membros com cada qual dependendo, amiúde com desapontamen­ to, das palavras de sabedoria do líder grupai, como se presumissem que todo conhecimento, saúde e vida acham-se nele localizado e dele devem ser derivados individualmente por cada membro; (ü) segunda, o pressuposto básico de luta/fuga (PBFF), no qual os mem­ bros se reúnem em torno da idéia excitada e violenta de que existe um ini­ migo a ser identificado e que os membros serão conduzidos, em conformis­ ta falange, pelo líder, contra esse inimigo, ou, alternativamente, dele fugi­ rão. Tal inimigo pode ser a própria "neurose" do grupo terapêutico, ou um dos membros do grupo, ou algum objeto adequado fora do grupo (um inimigo externo); (III) finalmente, o pressuposto básico de acasalamento (PBA) permeia o grupo com um tipo misterioso de esperança, amiúde com um acasalamen­ to behaviorístico entre dois dos membros, ou entre um membro e o líder, como se todos partilhassem a crença de que alguma grande nova idéia (ou indivíduo) emergirá da relação sexual do casal (uma crença messiânica). Os grupos de trabalho: Bion contrastou o estado de pressuposto básico de um grupo com o que chagou de grupo de trabalho, no qual os mem­ bros voltam-se para a tarefa conscientemente definida e aceita do grupo. Neste estado, o grupo funciona com um refinamento de processo secundá­ rio e assiste a um exame da realidade dentro e fora do grupo. O apoio de R.D.Hinshelwood / 423

Bion no modelo psicanalítico de um funcionamento refinado da mente ba­ seado em um inconsciente fervilhante foi observado por Wilson (1983). O estado de grupo de trabalho usualmente mostra sinais de estados ativos de pressupostos básicos e Bion imaginou os pressupostos como "valências", que atraíam inevitavelmente pessoas a se reunirem e estabeleciam o senti­ mento de pertencer ao grupo. Bion tentou relacionar as características dos pressupostos básicos aò funcio­ namento das instituições sociais: o exército, por exemplo, representava cla­ ramente o pressuposto de luta/fuga, e a Igreja, acreditava ele, representa­ va o pressuposto de dependência. Via o pressuposto do acasalamento na aristocracia, uma instituição preocupada com a procriação. Esta visão da natureza tríplice dos pressupostos grupais tornou-se disse­ minada fora da psicanálise (de Board, 1978; Pines, 1985). Embora Bion fi­ zesse uma tentativa inicial de relacionar seus achados com o conceito kleiniano da identificação projetiva (Bion, 1955), subseqüentemente ele aban­ donou estas idéias e o seu trabalho com grupos. Mais tarde (Bion, 1970; Menzies Lyth, 1981), porém, reformulou a idéia do pressuposto de acasala­ mento para torná-la mais ou menos básica à vida grupai em geral, ven­ do-a como o método principal para examinar a função continente dos gru­ pos e como uma maneira apropriada de entender o relacionamento existen­ te entre o indivíduo e a sociedade — o místico e o establishment (ver CONTER]. Bion, Wilfred (1948a), "Experiences in Groups I", Human Relatiorts, 1:314-20; republicado em Bion (1961), Experiences in groups, Tavistock, p. 29-40. -------- . (1948b), "Experiences in Groups II", Human Relations, 1:487-96; republicado (1961) em Experiences in groups, p. 41-58. -------- . (1949a), "Experiences in Groups III", Human Relations, 2:13-22; republicado (1961) em Experiences in groups, p, 59-75. --------. (1949b), "Experiences in Groups IV", Human Relations, 2:95-104; republicado (1961) em Experiences in groups, p. 77-91. -------- . (1950a), "Experiences in Groups V", Human 'Relations, 3:3-14; republicado (1961) em Experiences in groups, p, 93-114. -------- , (1950b), "Experiences in Groups VI", Human Relations, 3:395-402; republicado (1961) em Experiences in groups, p. 115-126. --------. (1951), "Experiences in Groups VII", Human Relations, 4:21-8; republicado (1961) em Experiences in groups, p. 127-37. -------- . (1957), "Group-dynamics: a review", em Melanie Klein, Paula Heimann e Roger Money-Kyrle, (orgs.), (1955), New directions in psychoanalysis, Tavistock, p. 440-7; repu­ blicado (1961) em Experiences in groups, p. 141-91, -------- . (1961), Experiences in groups, Tavistock. -------- . (1970), Attention and interpretation, Tavistock, de Board, Robert (1978), The psycho-analysis o f organizations, Tavistock. Meltzer, Donald (1984), "A one-year-old goes to nursery; a parable of confusíng times", Jour­ nal o f Chtld Psychotherapy, 10:89-104; republicado (1986) em Meltzer, Studies in extended metapsychology, Perth, Ciunie, p. 136-53. Menzies Lyth, Isabel (1981), "Bion's contribution to thinking about groups", em James Grotstein, (org.), (1981), Do I dare disturb the universe?, Beverly Hills, Caesura, p. 661-6. Pines, Malcoim, (org.) (1985), Bion and group psychotherapy, Routíedge & Kegan Paul.

424 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

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A relação entre a men~ te e o corpo é uma ques­ tão filosófica, um tema da história das idéias, rintretanto, é também, inevi­ tavelmente, um problema para os psicólogos e tem profundas implicações para os tratamentos psiquiátricos, a quimioterapia e a psicoterapia. Lamen­ tavelmente, o problema permaneceu obstinadamente insolúvel para os filó­ sofos, e a psicologia pode achar-se em posição de prestar informações à filosofia. Desde os primórdios da grande dicotomia cartesiana, os psicólogos esfalfaram-se em discussões infrutíferas no fundo deste "grande vale fendi­ do" da filosofia. Freud não constituiu exceção. Ele se formara segundo o molde da ciência do século XIX, que havia alcançado notáveis resultados nas ciências naturais, inclusive na fisiologia. Por outro lado, havia a tradi­ ção romântica da Naturphilosophie alemã, que enfatizava uma abordagem hegeliana metafísica e introspectiva aos problemas filosóficos. A dicotomia é se se deve abordar a mente desde um ponto de vista objetivo — isto é, o funcionamento do cérebro — ou de um ponto de vista subjetivo: uma psicologia de experiências pessoais. A primeira abordagem encarava a men­ te como um epifenômeno pousado no topo dos processos físicos e fisioló­ gicos básicos que determinam o funcionamento do cérebro: a mente co­ mo um efeito colateral, por assim dizer, da neurofisiologia. Freud foi tenta­ do por esta psicologia fisiológica quando começou a pensar a respeito do inconsciente e das descobertas que estivera fazendo na década de 1890. Ele procurou construir explicações físicas para as idéias e lembranças esqueci­ das de que seus pacientes histéricos sofriam. Seu "Projeto de uma psicolo­ gia científica", postumamente publicado (Freud, 1895 [1940]), constituiu uma tentativa de elaborar um modelo fisiológico para esses eventos psico­ logicamente esquecidos. O projeto, entretanto, foi abandonado, porque "Freud, o neurologista, estava sendo ultrapassado por Freud, o psicólogo" (Strachey, 1957, p. 163). Freud não se sentia à vontade com uma visão fisiológica da relação en­ tre mente e corpo porque ela ia contra suas experiências pessoais dos pacien­ tes com que passara a vida trabalhando; ia também contra a tradição filo­ sófica alemã do humanismo, a qual, de acordo com Bettelheim, pode ser vista claramente ao se repassar os originais de língua alemã dos textos de Freud (Bettelheim, 1983). Freud nunca conseguiu encontrar inteiramente a saída para fora da psicologia fisiológica com que começara, e a mistura de Freud, o neurologista, com Freud, o psicólogo, ê suficientemente mes­ clada para que Sulloway (1979) faça campanha em favor do Freud biólo­ go, tão bem quanto Bettelheim o faz em prol do*1humanista Freud: ambos t

rro b le m a m e n te -co rp o

R.D.Hinshelwood / 425

estão igualmente convencidos e nenhum dos dois é realmente convincente (Young, 1986). Como este último argüiu, o que faltou a Freud (e ainda nos falta hoje) é uma linguagem com a qual possamos falar a respeito da mente e do corpo, e, em verdade, da "pessoa" (Strawson, 1959). Paralelismo psicofísico: A posição de Freud sobre o problema mente-corpo é tecnicamente conhecida, em filosofia, como paralelismo psicofísico, ou seja, existe uma mente e existe um cérebro. Ambos funcionam à sua própria maneira. O funcionamento de uma não é traduzível, de modo exa­ to, no funcionamento do outro. Nem um nem outro tampouco são primá­ rios e determinantes, mas, contudo, tem de se inter-relacionar. Para fins práticos, os dois existem em paralelo (paralelismo psicofísico), sem especi­ ficar qual produz o quê. A fim de progredir como psicólogo, Freud, influen­ ciado por Hughlings Jackson, tomou o fenômeno da mente e deixou de la­ do o problema de como ela se relacionava ao cérebro. Interacionismo: E possível assumir uma posição filosófica ulterior e dizer que a mente surge da atividade do cérebro, o qual, por sua vez, pode ser manipulado por aquela. Membros do Grupo Kleiniano, que estavam con­ siderando a fantasia inconsciente em finais da década de 30 e começos da de 40, chegaram perto de adotar este interacionismo psicofísico. Os processos biológicos se espelham em atividades da mente chamadas de fantasias inconscientes. De igual modo, essas fantasias moldam tanto a pessoa quando o seu mundo social. Nem os eventos físicos nem os psico­ lógicos são primários e torna-se claro, dos textos kleinianos, existir uma presunção de que possam influenciar-se mutuamente. Dessa maneira, estí­ mulos pulsíonais provindos de um estômago vazio, digamos, são mental­ mente representados como uma fantasia inconsciente de uma relação com um objeto (um objeto que causa fome). A mente também pode elaborar uma fantasia inconsciente como uma manobra defensiva contra intensas ansiedades de fantasia (Segai, 1,964). Tais fantasias defensivas elaboradas são iniciadas por manipulação do corpo (masturbação), especialmente nas fases iniciais da primeira infância; assim, por exemplo, a expulsão das fe­ zes pode ser utilizadas para dar início à fantasia de expulsão de um obje­ to interno mau [ver FEZES]. Mais tarde, a manipulação das representa­ ções simbólicas retém vínculos somáticos (corporais). Biologia e psicologia: Fantasias de expulsão ou incorporação criam o sen­ so do self e da identidade, e as fantasias específicas reúnem o caráter espe­ cífico do self, Processos projetivos também criam as percepções do mun­ do social, em torno do qual, por sua vez, mediante processos introjetivos, eles precipitam formas sociais no indivíduo. O desenvolvimento do bebê é um deslocamento para fora de um mundó de, satisfação corporal e para dentro de um mundo de símbolos e satisfação simbólica. Há um movimen­ to progressivo a sair do corpo para dentro do mundo simbólico da mente amadurecida [ver FUNÇÃO-ALFA]. Esse movimento ocorre na geração 426 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

de pensamentos, assim como é o processo de desenvolvimento psicológi­ co. O processo não é explicado pela idéia kleiniana da fantasia inconscien­ te, mas é por ela bem descrito. Os símbolos, sendo inerentes à experiência das partes do corpo, são, portanto, uma capacidade inerente do bebê humano desdç o nascimento. Ele representa para si mesmo suas próprias sensações como sendo relacio­ namentos com objetos [ver 2 . FANTASIA INCONSCIENTE]. De*vez que o objeto possui uma presença para o bebê, independentemente da situação objetiva real, ele se acha em um mundo mental de concepções, sendo já um símbolo. Quando o bebê pode vir a perceber as realidades objetivas, a significação dessa realidade é gerada por um investimento provindo dás representações mentais. Em algum momento resplandecente da história de cada indivíduo, um evento mental vem a manipular um evento corporal. Isto se acha tão cerra­ damente oculto em nossos passados que parece impossível, um milagre. A representação simbólica na mente resulta na manipulação do corpo, pa­ ra criar novas sensações corporais e, em última análise, eventos mentais. Talvez a qualidade sobrenatural de uma idéia deste tipo seja mitigada pe­ lo fato de que os objetos que investigamos fisicamente não são, inicialmen­ te, experienciados como físicos [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. No nível infantil, o objeto não se acha fisicamente presente; o bebê e o seu mundo são objetos emocionais, ou seja, localizações a que se dá importância emo­ cional primitiva. Sua ausência de fisicalidade de maneira alguma diminui a sua qualidade de serem reais para o bebê. A distinção entre mente e cor­ po surge no curso da evolução; ela é gerada psicologicamente. Em termos kleinianos, dá-se um processo inicial de cisão para distinguir, no espaço primitivo infantil, entre o corpo e a mente (Scott, 1948). Não devemos to­ mar como assegurado que tal diferenciação fundamental da pessoa seja in­ variável em seu caráter, de vez que parece provável que uma socialização diferente, em diferentes culturas, dê origem a variações nas concepções ini­ ciais de corpo e mente {Marsella et al.t 1987). Bettelheim, Bruno (1983), Freud and marís soul, Hogarth. Freud, Sigmund (1895), "Project for a scientífic psychology", S.E. 1, p. 283-397. Marsella, Anthony; Devos, George; Hsu, Francss {1987), Culture and self; asian and western perspectives, Tavistock. Scott, W.; Clifford, M. (1948), "Some embryological, neurological, psychiatríc and psychosomatic implications of the body schema", Int, }. Psycho-Anal., 29:141-55. Segai, Hanna (1964), Introduction to the work of Melanie Klein, Heinemann. Strachey, James (1957), "Editor's note to 'The Unconscious"', S.E. 14, p. 161-5, Strawson, P. F. (1959), Individuais; an essay in descriptive metaphysics, Methuen. Sulloway, Franck (1979), Freud; biologist of the mínd, Burnett. Young, Robert (1986), "Freud: scientist and/or humanist", Free Assns, 6:7-35.

A projeção foi pela primeira vez descrita por Freud em 1895 e a história de seu significado desde então tem siR.D.Hinshelwood / 427

do longa. O termo veio primeiramente da óptica e da nova ciência da car­ tografia no século XVI, chegando no século XIX à psicologia da percepção, donde Freud introduziu na psicanálise. Há vários sentidos em que o termo "projeção" é utilizado: (i) percepção; (ii) projeção e expulsão; {iii) externalização de conflitos; (iv) projeção e iden­ tidade, e (v) projeção de partes do self, (i) Percepção: No sentido fisiológico, certas experiências são interpretadas como projetadas fora, mais além do alcance real do órgão perceptual. Des­ sa maneira, embora o impacto dos raios luminosos aconteça fisiologicamente na retina, a interpretação visual é atribuída a alguma distância maior ou menor, na frente dos olhos. De modo semelhante, o cego que caminha com sua bengala branca encontrará um obstáculo mediante as sensações tácteis na palma da mão que está segurando a bengala. Apesar disto, ele com precisão projeta a sua percepção de um objeto para a outra extremidade da bengala. Isto é "projeção", tal como o termo é normalmen­ te empregado na psicologia da percepção. Com base em sensações corpo­ rais, o bebê projeta da mesma maneira um objeto que está causando essas sensações [ver PULSÕES; 5. OBJETOS INTERNOS]. A projeção é, portan­ to, parte de um processo normal de interpretar os dados sensorios do siste­ ma perceptivo [ver FUNÇÃO-ALFAj. (ii) Projeção e expulsão: Freud (1895) já havia notado, a ligação existente entre projeção e paranóia. Abraham (1924), ao investigar a melancolia e a importância, nesta condição, do "objeto perdido" ou do temor de perdêlo, reconheceu que uma importante fantasia era a fantasia anal de expelir fisicamente do corpo um objeto. Ele ligou o impulso à expulsão anal ao mecanismo de projeção. (iii) Externalização de conflitos: Klein achou que o mecanismo de projeção era importante na externalização de conflitos internos no brincar com obje­ tos externos (Klein, 1927). Esta forma de projeção nos atos delinqüentes confirmou a opinião de Freud a respeito dos criminosos que atuam a par­ tir de um sentimento inconsciente de culpa (Freud, 1916). (iv) Projeção e identidade: A projeção tem um papel primordial na existên­ cia do ego: "A projeção (...) origina-se do desvio da pulsão de morte pa­ ra fora e, em minha opinião, ajuda o ego a superar a ansiedade por livrálo do perigo e da maldade" (Klein, 1946, p. 6 ). A projeção é uma das ati­ vidades elementares de fantasia que situam objetos dentro ou fora do ego: (...) expresso na linguagem das moções pulsionais mais antigos — os orais — o julgamento é: — Eu gostaria de comer isto — ou — Eu gosta­ ria de cuspi-lo fora — ou, colocado de modo mais geral: — Eu gostaria de receber isto em mim e manter aquilo fora — o que equivale a dizer Ficará dentro de mim — ou — ficará fora de mim. Como já demons­ 428 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

trei alhures, o ego original do prazer quer introjetar em si tudo o que é bom e ejetar fora de si tudo o que é mau. (Freud, 1925, p. 237) (v) Projeção de partes do self: Um outro sentido em que o termo "proje­ ção" foi usado tanto por Freud (1895) quanto por Klein (1946) foi o de atri­ buir certos estados mentais a outra pessoa. Alguma coisa do ego é percebi­ da em mais alguém. Isto é característico da maneira pela qual os sentimen­ tos homossexuais são evitados, pois são, de modo típico, atribuído a ou­ trem, e Freud construiu uma complexa cadeia de "vicissitudes": "Eu o amo" transforma-se em "Eu o odeio", que se torna "Ele me odeia". O ódio, dessa maneira, é atribuído a outra pessoa. Freud (1914) começou um estu­ do da fenomenologia deste tipo de relacionamento em seu artigo sobre narcisismo, quando descreveu a escolha narcísica de objeto, em contraste com uma escolha anaclítica de objeto. Entretanto, como ele não havia claramen­ te delineado o objeto como um campo de estudo por seu próprio direito, o emprego do termo "projeção" tornou-se confuso e a sua utilização por Klein corporificou esta confusão. O uso, por Klein, do termo "projeção": Klein empregou a expressão "proje­ ção" com muitos dos significados mencionados: (a) projeção do objeto in­ terno; (b) desvio da pulsão de morte; (c) externalização de um conflito in­ terno, e (d) projeção de partes do self. (a) Projeção do objeto interno: Este emprego do termo foi tirado de Abraham (1924); exemplificando, um bebê a chorar de fome experiencia a mãe/ seio/mamadeira ausentes como a presença ativa de um objeto mau e hos­ til que lhe causa as dores da fome [ver 2 . FANTASIA INCONSCIENTE] em sua barriguinha. Através de berros e choros (e, amiúde, da defecação), o objeto vem a ser experienciado como expelido para fora do corpo do bebê, onde é ligeiramente menos aterrorizante. (b) Projeção da pulsão de morte: A visão kleiniana da pulsão de morte projetada (ou desviada) para fora significa existir uma agressão primária internamente dirigida que se volta para fora, contra algum objeto exterior. A projeção de um objeto (isto é, a relocalização do ob jeto) para o lado de fora é um emprego diferente do termo "projeção", distinto da projeção para fora de um impulso (redirecionamento de uma pulsão) no sentido de um objeto externo. (c) Externalização de conflitos: As observações originais de Klein eram de que as crianças atuavam rrum relacionamento entre brinquedos no mun­ do externo, relacionamento no qual era o conflito interno ou relacionamen­ to interno que era projetado para o mundo exterior. Um interesse libidino­ so no comportamento criminoso e sua repressão legal pode constituir um caso comum de externalizar conflitos internos a respeito de certos impul­ sos [ver SISTEMAS SOCIAIS DE DEFESA]. R.D.Hinshelwooá / 429

(d) Identificação projetiva: Esta constitui a visão mais tradicional da proje­ ção, na qual parte da self é atribuída a um objeto. Assim, parte do ego — um estado mental, por exemplo, tal como uma raiva indesejada, o ódio ou outro sentimento mau — é vista em outra pessoa e completamente re­ pudiada (negada). Klein chamou isto de "'identificação projetiva" [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA]. Muitos destes empregos não podem ser completamente distinguidos; a projeção do objeto, o impulso, o relacionamento ou a parte do self envol­ vida são, todos eles, aspectos inextriçáveis do relacionamento objetai. Onipotência: Bion (19S9) distinguiu duas formas de identificação projeti­ va com base no seguinte: uma forma patológica, que é conduzida com onipotência e violência, e uma forma "normal", sem esse grau de violência e com a conseqüente manutenção de um senso de realidade interna e exter­ na. A forma patológica da identificação projetiva, na qual há confusão do self com um objeto, deve ser contrastada com a empatia, na qual o que projeta permanece ciente de sua própria identidade separada [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; EMPATIA]. Abraham, Karl {1924), ''A short study of the development of the libido", em Karl Abraham {1927}, Selected papers on psycho-analysis, Hogarth, p. 418-501. Bion, Wilfred (1959), "Attacks on línking", Int. /. Psycho-Anaí., 40:308-15; republicado (1967) em W. R. Bion, Second thoughts, Heinemann, p, 93-109. Freud, Sígmund (1895), "Draft H — paranóia", S.E. 1, p, 206-12. -------- . (1914), "On narcissísm", S.E. 14, p, 67.102. -------- . (1916), "Some character-types met with in analytic work: III — Criminais from a sense of guilt", S.E. 14, p. 332-3. -------- . (1925), "Negation", S.E. 19, p. 235-9. Klein, Melanie (1927), "Criminal tendencies in normal children", WMK 1, p. 170-85. -------- . (1946), "Notes on some schizoid mechanisms", WMK 3, p. 1-24.

P sican álise clássica P sico lo g ia do ego

Ver PSICOLOGIA DO EGO.

( P c i V a n a l i c o r - l a c c i í - a V psicanálise clássica' tal co' \ 1

D Iv -C lX L C L llO C L l d u i j l L C l / mo se desenvolveu até a épo­ ca do falecimento de Freud em 1939, continuou sendo um estudo especial do ego e resultou na escola dominante de psicanálise, a psicologia do ego. Embora tenha havido afastamentos radicais da tradição freudiana, a psico­ logia do ego conquistou uma posição como herdeira da tradição em sua forma pura, alcançada em parte por virtude dos números. Por haverem os vienenses emigrado em grande parte para os Estados Unidos e por cau­ sa do aumento do interesse pela psicanálise neste país entre a década de 40 e meados dos anos 70, o número de psicanalistas formados segundo a

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tradição dominante superou qualquer outro grupo de psicanalistas situa­ do em outros lugares, A psicologia do ego é o estudo do desenvolvimento e estrutura do ego, após Freud (1923) haver delineado o modelo estrutural, que abrangia um modelo da mente constituído de três instâncias inter-relaeionadas-, o id, o ego e o superego. O conflito interno entre o id pulsional e o superego civi­ lizado coloca o ego em uma posição decisiva de mediação entre eles e, em última análise, expressa a luta entre o indivíduo e a sociedade. Dessa maneira, o funcionamento do ego foi elevado a um lugar de interesse psicanalítico especial, tendência cuja vanguarda foi assumida pelo livro de Anna Freud (1936), O ego e os mecanismos de defesa. A tendência estabeleceu-se como escola de pensamento e prática psicanaíítica com o acrésci­ mo, feito por Hartmann, de um ponto de vista adaptacional explícito, em seu Ego psychology and the problem o f adaptation [A psicologia do ego e o problema da adaptação] (Hartmann, 1939). Este desenvolvimento teórico foi transportado para fora de Viena por causa da ocupação alemã. A consolidação da escola deu-se nos Estados Unidos, embora a figura de proa, Anna Freud, houvesse permanecido em Londres (não sendo portadora de uma qualificação médica, ela teria sido proibida de exercer a psicanálise nos Estados Unidos, mas tinha liberdade de fazê-lo na Grã-Bretanha). Nos Estados Unidos, a tradição vienense en­ controu duas outras influências. Uma foi a importância da psicologia so­ cial no país — corporificada, na psiquiatria, pela orientação cultural de Sullivan, para quem o contexto social, cultural e familiar do paciente cons­ tituíam uma dimensão importante em seu desenvolvimento e psicopatologia, Era um ponto de vista que ressoava como uma corda no aspecto adap­ tacional da psicanálise vienense e tendeu a fortalecer o aspecto interpesso­ al da psicanálise americana. A outra influência foi a dominâncía da psico­ logia behaviorística nos Estados Unidos, pano de fundo que pode ter fei­ to vir à tona o estilo mais mecanicista que a psicologia do ego lá desenvolveu. A psicologia do ego chegou à proeminência principalmente na década de 1950 e, desde então, manteve posição de dominâncía nos Estados Uni­ dos. isso coincidiu com certos resultados da psicologia evolutiva, princi­ palmente o trabalho de Harlow (Harlow e Zimmermann, 1959; Harlow, 1961), que demonstrou importantes efeitos no desenvolvimento de maca­ cos quando estes eram criados com diversos substitutos mecânicos de uma mãe. Bowlby (1969) retomou este trabalho como demonstração de impor­ tância da ligação afetuosa, que seria pulsional de maneira diferente das pulsões orais clássicas (fome) [ver AMOR]. A psicologia do ego não sur­ giu destes trabalhos experimentais, mas sim da psicanálise; suas conclu­ sões, contudo, apontavam em direção semelhante, pois ambos são aspec­ tos do ego e seu desenvolvimento, que residem fora da teoria psicanalítica clássica da redução das pulsões. A teoria das pulsões [ver LIBIDO] sus­ tenta que o organismo sempre se comporta de maneira a reduzir a frustraR.D.Hirtshelwood / 431

ção das pulsões corporais primárias de sobrevivência e sexo. À parte a re­ dução das pulsões, diz a psicologia do ego, existe toda uma área de desen­ volvimento através da qual o ego passa de maneira autônoma (isto é, inde­ pendentemente das pulsões), ou seja, há um reino de desenvolvimento psí­ quico fora das pulsões. Postulou-se uma fonte especial de energia psíqui­ ca dentro do ego, a qual foi separada da energia pulsional do id, potencial­ mente conflitiva. Desde a década de 1960, contudo, tem havido uma percepção das limi­ tações da psicologia do ego, especialmente na área das relações objetais, e desenvolveu-se um interesse por certos psicanalistas britânicos dessa área, notavelmente Fairbairn e Rosenfeld (por causa do trabalho do último com esquizofrênicos) [ver FAIRBAIRN; ROSENFELD]. A escola de psicanálise da psicologia do ego parece ter ultrapassado o seu apogeu.-Ultimamente, um certo grau de crítica tem-se mostrado crescente nos Estados Unidos, baseado na omissão de uma teoria abrangente das relações objetais na psi­ cologia do ego [ver adiante]. Assim como Anna Freud e Hartmann, Kris, Loewenstein e Rapaport fo­ ram expoentes de vulto da psicologia do ego. Rapaport (1958) deu a essên­ cia de um breve resumo histórico desta psicologia, da qual Blanck e Blanck (1974) produziram um levantamento mais definitivo. A teoria da adaptação: A característica central da psicologia do ego é a teoria da adaptação. Partindo de certos aspectos da teoria da ansiedade de Freud (1926), a noção de funções autônomas do ego (particularmente as de síntese) foi desenvolvida, descrevendo a maneira pela qual certas ca­ racterísticas do ego (motilidade, percepção, memória, etc.) acham-se pre­ sentes sem se haverem desenvolvido a partir do id, da vida pulsional ou dos conflitos a que o id dá surgimento. O ego tem a função, independen­ te do id, de adaptar-se ao meio ambiente. Em princípio, a psicologia do ego presume que o ego normal é dotado, de início, de potencialidades que progressivamente se desdobram, a fim de atender satisfatoriamente o meio ambiente de expectativa médica. Dessa maneira, o encontro do indivíduo e do meio ambiente social (a mediação do id e do superego, feita pelo ego) é harmonioso, a menos que nele doutra maneira interfira um meio ambiente inesperado. Esta epigênese do ego que se adapta para enfrentar a sociedade é inteiramente separada do desdobramento epigenético das fa­ ses da libido. Erikson, que definiu os estágios seriais do desenvolvimento característico do ego, voltou-se especificamente para ela (1951). A teoria trata do aspecto do ego e do aspecto social das relações objetais. Ela concebe as pessoas encarregadas de cuidar como os representantes de sua sociedade, como portadores de seus padrões institucionais e tradicio­ nais de cuidado, e, dessa maneira, enfoca a atenção no fato de cada so­ ciedade atender cada fase do desenvolvimento* de seus membros através 432 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

de instituições (cuidado dos pais, escoias, professores, ocupações, etc,) que lhe são específicas, a fim de assegurar que o indivíduo em desenvol­ vimento nela será viável (...) Dessa maneira, não se presume que as normas sociais sejam enxertadas no indivíduo geneticamente associai através de "disciplinas" e "socialização", mas que a sociedade na qual o indivíduo nasce torna-o membro dela por influenciar a maneira pela qual ele resolve as tarefas que lhe são apresentadas por fase dè seu de­ senvolvimento epigenético. (Rapaport, 1958, p. 753) Isto contrasta radicalmente com o modo essencialmente dinâmico pelo qual o indivíduo alcança participação em um grupo com base nas identifi­ cações projetiva e introjetiva. Dessa maneira, a psicologia do ego encara a psicanálise como interessa­ da pelo processo normativo no qual um indivíduo, que socialmente se con­ forma, é benignamente assistido por sua sociedade; a meta psicanalítica é corrigir o processo quando a adaptação sai mal, mediante o apoio aos me­ canismos que permitem ao indivíduo conformar-se com sua sociedade e com a maneira pela qual esta espera que ele solucione os seus próprios pro­ blemas. Os temas que ocuparam os psicólogos do ego foram: (i) as origens do ego a partir de um narcisismo simbiótico primário; (ii) as funções particulares do ego, inclusive as envolvidas em suas áreas livres de conflito (motiíidade, percepção, memória, etc.); (iii) os mecanismos de adaptação (assim co­ mo de defesa) do ego; (iv) o desenvolvimento de uma técnica acurada pa­ ra interpretar o pré-consdente (em oposição ao inconsciente), e (v) uma lealdade ao espírito da busca inicial que Freud fez de uma psicologia cien­ tífica (determinista) (Freud, 1895). CRÍTICAS À PSICOLOGIA DO EGO, Há um certo número de áreas que tem uma influência de discordância radical entre os desenvolvimentos ame­ ricanos e o desenvolvimento kíeiníano. O primeiro ano de vida e fusão: Trata-se da disputa entre narcisismo pri­ mário versus "relações objetais desde o nascimento". A lealdade dos psicó­ logos do ego à teoria freudiana do narcisismo conduziu a diferenças parti­ cularmente obstinadas com os kleinianos. Spitz (1950) e Mahíer (Mahler et al., 1975) interessaram-se pelo primeiríssimo desenvolvimento do ego, quando a mente se forma após um período inicial de narcisismo primário. Spitz reconheceu a existência de ansiedade verdadeira somente aos seis meses de idade. Mahler situou o "nascimento psicológico do bebê" por volta dos nove meses, pouco mais ou menos. Os psicólogos do ego negam que o bebê seja capaz de discriminar as fron­ teiras do ego e distinguir entre objetos bons e maus, como sustenta Klein, e tampouco tem qualquer capacidade para fantasiar antes dos seis a nove meses [ver 2 . FANTASIA INCONSCIENTE]. Esta é uma diferença de opiR.D.Hinshelwood / 433

nião muito importante, de vez que a concepção kleiniana dos mecanismos primitivos de defesa nos primeiros seis meses de vida simplesmente não é aceita pelos psicólogos do ego, que encaram o ego como inexistente nesse estágio [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE; CONTINUIDADE GENÉTI­ CA]. Narcisismo prim ário: Os psicólogos do ego basearam sua opinião de que não existem relações objetais no nascimento nas próprias afirmações de Freud, especialmente em seu artigo sobre narcisismo (Freud, 1914). Ela foi apoiada pelo trabalho experimental de Spitz (1950) e Mahler (Mahler et ah, 1975). Entretanto, houve recentemente um questionamento sério desta posição por alguns psicólogos do ego e Hoffer (1981), por exemplo, ob­ servou: "Se existir qualquer verdade em minha sugestão de que tivemos aqui uma realização alucinatória de desejo, o estado sem objeto da primei­ ra infância não pode mais ser considerado contínuo por qualquer grande extensão de tempo" (citado em Britton, 1982). Stern (1985), examinando recentes resultados de pesquisa da psicologia evolutiva, reconsiderou a ex­ periência subjetiva do bebê nos primeiros meses após o nascimento, con­ cluindo que existe um sofisticado ego cognitivo, afetivo e socialmente inte­ rativo durante o período anteriormente designado como sendo o do narci­ sismo primário. O lugar da destrutividade: Os psicólogos do ego foram estritos na argüição contrária à pulsão de morte como entidade clinícamente útil (Kernberg, 1969; Dorpat, 1983) [ver PULSÃO DE MORTE]. Pontos de observação diferentes (subjetivo versus objetivo): A metapsicologia kleiniana, por definir as experiências e fantasias típicas do paciente e afirmar que elas têm efeitos estruturais e permanentes sobre a personalida­ de, é criticada por (i) reificar os fenômenos, e (ii) confundir o nível de des­ crição da experiência do paciente com o nível da teoria psicanalítica. O problema não é pequeno e não pode simplesmente ser posto de lado co­ mo uma questão de pensamento confuso. A ciência da subjetividade tem de levar em conta o fato de que o objeto de estudo é subjetivo e que o ob­ servador utiliza sua própria subjetividade sob a forma de empatia e intui­ ção, na perseguição de sua compreensão científica. Este tema é debatido alhures [ver SUBJETIVIDADE], mas, suscintamente, a disputa gira em tor­ no de que status dar às próprias teorias do paciente (inclusive as inconscien­ tes) a respeito do funcionaniento de sua mente. Exemplificando, uma fanta­ sia inconsciente de incorporação de um paciente pode ser evidenciada em um sonho como uma absorção de algum objeto representado pelo analis­ ta e isto ser um retrato exatamente congruente com o conceito que o ana­ lista tem de uma introjeção do analista. As fantasias do paciente e as teo­ rias do analista não são mantidas distintas com facilidade. 434 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

A daptação ou integração: O objetivo da terapia psicanalítica em si tem divergido radicalmente entre a psicologia do ego e a psicanálise kleiniana. Na abordagem kleiniana, a meta é integrar aspectos da personalidade que estão ou escindidos um do outro ou que estão em conflito constante um com o outro [ver DESENVOLVIMENTO]. Isto é muito diferente do objeti­ vo que o psicólogo do ego tem de liberar o desdobramento inerente de uma adaptação normativa ao mundo social através de uma aliança amadu­ recida e livre de conflitos com o paciente. Segai argumentou que o ego sempre se desenvolve em relação aos seus objetos e no contexto de seus impulsos nessas relações: Não posso concordar que negligenciemos funções autônomas do ego, tal como a fala. O que eu disse a respeito de meu trabalho sobre o sim­ bolismo e o pensamento de Bion deveríam indicar quanta atenção pres­ tamos a esses processos. O ponto é que nós não as vemos como fun­ ções autônom as do ego, mas sim como funções desenvolvidas em cone­ xão estreita com os relacionamentos objetais. (Segai, 1977, p. 380-1). Bion elaborou uma teoria do pensar baseada nos dois princípios freudia­ nos do funcionamento mental, nos quais os pensamentos e um aparelho pensante são gerados p or um ego em um turbilhão de conflito emocional, esforçando-se por administrar seus objetos (internos e externos) [ver PENSAR]. A opinião radical nos Estados Unidos reparou que "a psicanálise modi­ ficou a sua função na cultura de nossa época" (Marcuse, 1969, p. 190). O desenvolvimento de uma abordagem adaptacional representa uma corren­ te conformista na cultura americana, espedalmente talvez nas partes imi­ grantes. A abordagem adaptacional, ao acentuar um ingresso normaliza­ do e não conflitivo do indivíduo na sociedade, como Erikson o faz [ver acima], tendeu a diminuir os aspectos "negativos" do indivíduo humano que são inerentemente antagônicos à conformidade social, detalhados por Freud em 1930 (Jacoby, 1975). Os mecanismos de defesa contra a sexuali­ dade foram rebaixados como enfoque da análise, em favor dos mecanis­ mos adaptacionais. A aliança de tratamento: O psicólogo do ego dirige-se ao ego do paciente, em seus apuros por ter de manejar os impulsos do id. O ego — e, com ele, o analista — está, por assim dizer, acima do turbilhão das pulsões do id. Acredita-se que o ego, dotado que é de funções autônomas, possua áreas livres de conflito que o psicanalista busca localizar, estabelecendo assim a "aliança de tratamento" (Zetzel, 1956). Em contraste, Klein achava que todas as atividades do ego achavam-se inextricavelmente misturadas com os conflitos existentes entre amor e ódio. Uma aliança positiva com o analista certatrtente existe, mas ela não esta livre das intrusões das partes agressivas, destrutivas e invejosas do self. Em verdade, a parte do ego que se engaja em uma aliança com o analista R.D.Hinshekvood / 435

pode ser o self infantil e dependente, ou seja, a parte do self que é capaz de aceitar a dependência. Esta diferença leva a grandes diferenças em técnica [ver 1. TÉCNICA]. O psicólogo do ego apela ao paciente para que reconheça conscientemen­ te certos conteúdos de seu pré-consciente, derivados pulsionais que se acham mais próximos da superfície da mente do paciente. Desta maneira, o ana­ lista alinha-se com o ego do paciente, em sua luta com os impulsos do id. Klein, ao invés disso, acreditava que, a fim de estabelecer e manter a situa­ ção analítica, o analista deve fornecer interpretações profundas, que locali­ zem o nível de ansiedade. Representações: Os psicólogos do ego concederam muita atenção às descri­ ções, feitas por Freud, da introjeção e da "alteração do ego". Contudo, há uma diferença radical em terminologia que resulta em uma grande má compreensão. Klein via a percepção de um objeto como acompanhada por uma fantasia de incorporação dele que resulta va em um objeto inter­ no: concreto, real, interno e com suas próprias intenções antropomorficamente concebidas. Este existe lado a lado da lembrança refinada em que representações do objeto existem e são reconhecidas como separadas do objeto. A representação do objeto na memória e na consciência é muito diferente de um objeto interno que não é distinguido do objeto externo, É importante não traduzir "objeto interno" por "representação objetai" [ver 5. OBJETOS INTERNOS]. Psicanálise mecanicista: Uma terminologia particularmente objetiva e mecanicista é característica da psicologia do ego, Ela parece ter sido influencia­ da, nos Estados Unidos, pela psicologia behaviorística, com sua ênfase no ego como princípio para adaptação à sociedade. Uma reação ao que parece ser uma visão mecanicista dos seres humanos pode ter levado ao desenvolvimento da psicologia humanística (Hinshelwood e Rowan, 1988). Certos psicanalistas também se levantaram contra a qualidade aparente­ mente desumanizante da psicanálise americana (Bettelheim, 1960; Fromm, 1971; Schafer, 1976): Nos Estados Unidos, naturalmente, "a cura da doença mental" tem si­ do vista como sendo a tarefa principal da psicanálise, tal como a cura da enfermidade corporal o é da medicina. Espera-se que qualquer pes­ soa que faça psicanálise consiga resultados tangíveis — o tipo de resulta­ dos que o médico alcança para o corpo — antes que uma compreensão mais profunda de si mesmo e um controle maior de sua vida (...) de to­ dos os aspectos da teoria freudiana, os mecanismos de ajustamento tor­ naram-se os mais amplamente aceitos nos Estados Unidos. Isto revela a natureza da aceitação americana da psicanálise, particularmente quan­ do se sabe que Freud pouco se importava com o "ajustamento" e não o considerava valioso. A verdade (...) é que o conceito de ajustamento foi injetado no sistema freudiano porque era de importância primordial 436 / Dicionário do Pensamento Kleimano

para o esquema de valores do psicanalista americano e que esta altera­ ção explica a aceitação disseminada na psicanálise nos Estados Unidos. (Bettelheim, 1981. p. 40) Reação às críticas: A psicologia do ego parece ter reagido principaímente à última das críticas que lhe foram feitas, qual seja, o tom mecanicista de sua terminologia. O interesse afastou-se dos mecanismos do ego, no senti­ do das relações objetais e da representação do self: O cerne desses desafios [à psicologia do ego] é que certos temas e aspec­ tos críticos do desenvolvimento da personalidade e da psicopatolõgia, tendo a ver com as relações objetais e o $elf, não se ajustam facilmen­ te ao modelo básico id-ego da teoria tradicional. Exemplificando, as descrições de desenvolvimento psicológico que pareceram mais significantes para muitos clínicos e teóricos recentes não são as que têm a ver com o desenvolvimento psicossexual, mas explicações que enfocam di­ mensões tais como a diferenciação se//-outro, o afastamento quanto à separação-individuação e o grau de autocoesão. (Eagle, 1984, p. 18) Claramente, muitos desses problemas clínicos são dos investigados por Klein e seus colegas ao descreverem a posição esquizoparanóide e a identi­ ficação projetiva [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE; 13. IDENTI­ FICAÇÃO PROJETIVA], mas colocados em uma terminologia estranha. Um certo número de analistas dos Estados Unidos reconheceu isto e pro­ curou fazer acréscimos à psicologia do ego com temas tomados empresta­ dos da teoria das relações objetais [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETI­ VA]. Eagle (1984) descreveu quatro tendências principais: (i) A abordagem com binada: Mahler (Mahler et al., 1975) e, até certo pon­ to, Jacobson (1964) mantêm a teoria tradicional das pulsões, enquanto ten­ tam chegar a uma síntese com uma teoria de relações objetais: Kernberg (1980) e Grotstein (1981), por exemplo. Langs (1978) e Ogden (1982), que adotaram ambos uma forte ênfase relacionai objetai, apesar disso o fazem por uma maneira que ainda mostra traços da abordagem adaptacional in­ terpessoal. Especificamente, utilizaram o conceito de "identificação projeti­ va" para enfocar o entendimento no aspecto interpessoal da ambiência ana­ lítica. (ii) A teoria dos dois fatores: Kohut (1971) e Modell (1975) trabalham tan­ to com a teoria das pulsões quanto com uma teoria das relações objetais, usando cada uma delas quando apropriada com certos pacientes, ou em certos estágios, com determinado paciente. (iii) Rejeição da teoria dos instintos: G. S. Klein*(1976) representa um cer­ to número de psicanalistas norte-americanos que seguiram a abordagem de Fairbairn e abandonaram completamente a teoria das pulsões. R.D.Hinshelwood / 437

(iv) Psicologia do self: O trabalho de Kohut (1971) com pacientes fronteiri­ ços e narcísicos desenvolveu uma psicologia das relações com o self. Par­ tindo da opinião de que o sentimento do self é a primeira luta psicológica com que o bebê se defronta (quando o narcisismo primário abre caminho à percepção de um objeto e da relação com ele), Kohut enfocou não tan­ to a relação com o objeto, mas o selfr que está tendo de fazer o relaciona­ mento. Trata-se de um ponto de vista que se assemelha, em alguns aspec­ tos, à opinião desenvolvida por Klein e também por Winnicott de que a primeira preocupação do bebê é manter seu sentimento de um self contra o medo do aniquilamento. Aqui, a semelhança é maior com Winnicott, a quem Kohut presta reconhecimento por haver descrito a importância do objeto como um espelho usado para desenvolver um retrato do self. Bettelheim, Bruno (1960), The informed heart, Hogarth. -------- . (1983), Freud and marís soul, Hogarth. Bick, Esther (1964), "Notes on infant observation during psycho-analytíc training", int. J. Psycho-Anal, 45:558-66; republicado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected papers of Martha Harris and Esther Bick, Perth, Cluníe, p. 240-56, Blanck, Gertrude e Blanck, Rubin (1974), Ego-psychology: theory and practice, Nova Iorque, Columbia University Press. Bowlby, John (1969), Attachment and Iq s s , Hogarth. Britton, Ronald (1982), "Review of Hoffer's early deveiopment of the child", Int. J. PsychoAnal, 63:389-91. Dorpat, T, L. (1983), "Book review of Grotsteín's splitting and projective Identification", Int. I Psyeho-Anal,, 64:116-19. Eagle, Morris (1984), Recent developments in psycho-analysís, Nova Iorque, McGraw-Hill. Erikson, Erik (1951), Chiídhood and society, Imago. Freud, Anna (1936), The Ego and the mechanisms of defence, Hogarth. Freud, Sigmund (1895), "Project for a scientific psychoiogy", S.E. 1, p. 283-397. -------- . (1914), "On narcissism", S.E, 14, p. 67-102. -------- . (1923), "The Ego and the Id", S.E. 19, p. 3-66. -------- . (1926), "Inhibitions, symptoms and anxiety", S.E, 20, p. 77-175. -------- . (1930), "Civiüzation and Its Discontents", S.E. 21, p. 59-145. Fromm, Erích (1971), The crisis o f psycho-analysis, jonathan Cape. Grotstein, James (1981), Splitting and projective Identification, Nova Iorque, Jason Aronson. Harlow, H. F. (1961), "The development of affectional patterns in infant monkeys", em Brian Foss, (org.), The determinante of infant behaviour, vol. 1, Methuen, p. 75-88. Harlow, H. F. e Zimmermann, R. R. (1959), "Affectional responses in the infant monkey", Science, 130:421-32. Hartmann, Heinz (1939), Ego' psychoiogy and the problem of adaptation, publicado em in­ glês (1958), Nova Iorque, International Universities Press. Hinshelwood, R. D. e Rowan, John (1988), "Is psycho-analysis humanistic?", Br. /. Psychother,, 4:142-7. Hoffer, Wílli (1981), Early development and education o f the child, Hogarth. Isaacs, Susan (1948), 'T he nature and function of phantasy", Int, J. Psycho-Anal, 29:73-97; republicado (1952) em Melanie Klein, Paula Heimann, Susan Isaacs e Joan Riviere, (orgs.), Developments in psycho-analysis, Hogarth, p. 67-121. Jacobson, Edith (1964), The self and the object world, Nova Iorque, International Universi­ ties Press. jacoby, Russell (1975), Social amnésia, Boston, Beacon Press.

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Freud considerava não analisáveis as condições psicóticas inclusive a paranóia, e a psicose maníacodepressiva). Tais pacientes ocupavam-se narcisicamente com seus próprios pensamentos e construções psíquicas, negligenciando completamente o mundo externo, inclusive o analista. Klein, contudo, tinha uma visão dife­ rente do narcisismo [ver NARCÍSISMO] e pôde demonstrar as relações objetais que são típicas dos psicóticos (Klein, 1930a). Estas envolviam graus enormes de sadismo [ver SADISMO] e confirmavam o trabalho pormeno­ rizado de Abraham sobre os pontos de fixação das psicoses [ver ABRAHAM]. O trabalho kleiniano sobre as psicoses possui duas fases:

y

*

S1COS6 (esquizofrenia,

(1) a descoberta, por Klein, da paranóia em crianças, e (2) a exploração, por ela e seus colegas, das descrições dos mecanismos esquizóides (Klein, 1946), através do trabalho direto com esquizofrênicos adultos [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE; 13. IDENTIFICA­ ÇÃO PROJETIVA].

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(1) Paranóia infantil: O brincar das crianças é cheio de atos violentos cometi­ dos em inimigos e do temor da mesma tortura e morte às mãos desses ini­ migos. Klein tomou isto a sério e encarou-o como representando um sadis­ mo real nos anos iniciais da criança. A análise da pequena Erna, por vol­ ta de 1925, mostrou a Klein que crianças pequenas podem padecer de en­ fermidade psicótica: "A medida que a análise progredia, descobri que a grave neurose obsessiva mascarava uma paranóia" (Klein, 1927, p. lóOn). Nessa análise, a própria Klein, no brincar, (...) tinha de passar por fantásticas torturas e humilhações. Se no brin­ quedo alguém me tratava com bondade, geralmente revelava-se que es­ sa bondade era apenas simulada. Os traços paranóicos se mostravam em ser eu constantemente espionada, com as pessoas adivinhando os meus pensamentos. (Klein, 1929, p. 199) Este é um retrato do mundo da criança, no qual não há pessoa que ajude, mas apenas perseguidores em potencial. Ataques retaliatórios feitos aos perseguidores tornam-os mais daninhos do que antes, porque deles se su­ põe, em fantasia, que fiquem ainda mais enraivecidos pela violência retaliatória. Este tipo de círculo vicioso representa um estado paranóide de hostilidade, com uma intensa desconfiança de quaisquer figuras "boas": (...) uma fantasia sobre como ele conseguiría alcançar um lugar melhor na classe. Fantasiou como se emparelharia com os que se achavam aci­ ma dele, os afastaria e mataria, e descobriu, para seu espanto, que ago­ ra eles não mais lhe apareciam como companheiros, como acontecia até há pouco, mas como inimigos. (Klein, 1923, p. 61) A essência do problema que o psicótico enfrenta e fracassa em superar é a qualidade de sadismo excessivo, que conduz a fantasias de temível reta­ liação por parte dos objetos e a uma cessação parcial ou total da vida de fantasia (e da vida interna), de modo integral. Esta visão do estado emo­ cional extremado do psicótico foi seguida, um ano mais tarde (Klein, 1930a), por um artigo sobre a inibição do desenvolvimento intelectual, no qual ela demonstrou que certas palavras tornam-se o ponto principal (ponto de fixação) de fantasias agressivas decisivas que assustam a crian­ ça a um grau tal que essas palavras não podiam ser aprendidas [ver FOR­ MAÇÃO DE SÍMBOLOS]. O circulo vicioso da paranóide: Achando-se além do ego jovem, a tarefa de lidar com os círculos viciosos sádicos da paranóia pode conduzir a uma inibição do processo de expulsão e, portanto, da simbolização. A inibição desta última distorce ou interrompe todo o processo de desenvolvimento do ego e do intelecto: Em Díck havia uma incapacidade completa e aparentemente constitucio­ nal do ego para tolerar a ansiedade (...) O ego deixara de desenvolver 440 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

uma vida de fantasia e de estabelecer uma relação com a realidade. Após um débil começo, a formação de símbolos nesta criança havia chegado a uma parada. (Klein, 1930a, p. 224} O grau de sadismo que ela estava encontrando em tantas crianças não se achava longe do tipo de violência hipotetizado como pontos de fixação para as psicoses. A inibição grave de Dick em seu emprego dos símbolos é um fenômeno típico encontrado no quadro clínico da esquizofrenia: (...) era caracterizado por uma ausência quase completa de afeto e an­ siedade, um grau muito considerável de retraimento quanto à realida­ de, e de inacessibilidade, uma falta de rapport emocional, comportamen­ to negativista, a alternarem-se com sinais de obediência automática, in­ diferença ao sofrimento, perseverança, todos eles sintomas que são ca­ racterísticos da demência precoce. (Klein, 1930a, p. 230) Klein ficou entusiasmada que essas descobertas fossem importantes para a psiquiatria e para o tratamento subseqüente da enfermidade mental gra­ ve (psicose). Asseverou ela que a psicose em crianças é muito mais comum do que até então se imaginava e que freqüentemente passa despercebida mesmo aos pais: Em minha opinião, a esquizofrenia é mais comum na infância do que geralmente se supõe (...) e acho que uma das principais tarefas do analis­ ta de crianças é descobrir e curar a psicose nelas. (Klein, 1930b, p. 235) Defesas psicóticas: Por causa da intensidade e do primitivismo da para­ nóia, Klein acreditou haver descoberto um nível novo de operação mental e o mais inicial dos problemas evolutivos. Pensou ela existirem defesas es­ pecíficas que operam contra esse nível de ansiedade, agressão e medo (em oposição às defesas contra a libido). Deu-lhes o nome de mecanismos pri­ mitivos de defesa ou defesas psicóticas (ver 9. MECANISMOS PRIMITI­ VOS DE DEFESA]. Estes mecanismos incluem a cisão, a negação, a ideali­ zação, a projeção, a introjeção e a identificação. São, na maior parte, inun­ dados pela onipotência e postos em execução com grande violência na fan­ tasia [ver ONIPOTÊNCIA]. Quando Klein descreveu fases "psicóticas" no desenvolvimento das crian­ ças, foi acusada de considerar psicóticas todas as crianças. Entretanto, as descrições dela são claras: crianças que sofrem de esquizofrenia infantil acham-se em poder de impulsos sádicos e inextricavelmente apanhadas nos infindáveis círculos viciosos a que as defesas onipotentes contra o sa­ dismo dão surgimento [ver PARANÓIA]. Ela defendeu-se das críticas com a afirmação de estar meramente descrevendo os pontos de fixação para a psicose. (2) Esquizofrenia, A ênfase original dada por Klein à enfermidade maníacodepressiva foi retificada pelo desafio de Fairbairn a que compreendesse as R.D.Hinshelwooâ / 441

condições esquizóides (Klein, 1946), Ao longo do interesse que desenvol­ veu pelos esquizofrênicos adultos, ela descreveu a identificação projetiva e a posição esquizoparanóide. Todas estas condições achavam-se particu­ larmente ligadas com o problema do sadismo e da retaliação. Durante a década de 40, Klein, juntamente com certos íolegas, estudou a esquizofrenia. Rosenfeld (1947) relatou na totalidade a primeira psicaná­ lise de um esquizofrênico conduzida à maneira kleiniana. Utilizou ele uma técnica rigorosa, restringindo-se à interpretação da transferência (embora algumas das características normais da situação analítica, tal como o uso do divã, fossem dispensadas pelo paciente), e Segai (1950) seguiu-o logo depois com a análise de um esquizofrênico hospitalizado. Esses pacientes demonstraram a importância de entender os mecanismos da cisão e da iden­ tificação projetiva que se acham envolvidos na instabilidade do ego e de seu senso de identidade, na perda de afeto, nas falhas de cognição e no prejuízo da formação normal de símbolos, assim como a importância de uma técnica estrita de análise da transferência [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Cisão e psicose: Rosenfeld descreveu uma paciente esquizóide que se en­ volveu com o marido de sua melhor amiga, quando ele teve um colapso quando a esposa se achava ausente, tendo um segundo filho. Quando o amigo tentou seduzir a paciente, houve um certo desejo consciente disso por parte dela, mas toda a sua ansiedade girava sobre se argumentos dele. Repetiu-me alguns que Dennis representava os próprios com que tinha dificuldade em lidar, e (Rosenfeld, 1947, p. 18)

ela poderia controlar os desejos e de seus argumentos e ficou claro desejos sexuais gananciosos dela, que, portanto, projetava para ele,

Rosenfeld descreveu outros exemplos de cisão, desta vez de um tipo frag­ mentário. Falando de uma hora marcada que a paciente tinha com um ca­ beleireiro, ela havia confundido as horas (...) saindo de casa na hora em que deveria estar lá. Ela não havia es­ quecido que a viagem levava trinta minutos, mas este fato e a ação de viajar haviam-se tornado completamente dissociados um do Outro (...) parecia como se todos os processos de pensamento, ações e impulsos estivessem cindidos em partes inumeráveis, isolados uns dos outros e mantidos em estado de divisão. A paciente referiu-se espontaneamente à condição deles dizendo: — Estou novamente dividida (...) A cisão de pensamentos e ações mostrava-se particularmente em relação à situa­ ção analítica; exemplificando, seu atraso freqüente para a análise origi­ nava-se do fato de ela dividir sua vinda para esta em muitas ações par­ ciais isoladas. Levantar-se, vestír-se, tomar café, pegar o ônibus para a 442 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

análise e a sessão analítica em si eram todos atos que não lhe pareciam ter nada a ver um com o outro. (Rosenfeld, 1947, p. 27) [ver CISÃO] Confusão: Rosenfeld (1965) demonstrou os graus extremos em que os pa­ cientes esquizofrênicos ficam confusos com o analista ou com outros indi­ víduos e foi muito explícito em sua demonstração das experiências concre­ tas que o paciente tem de entrar no analista ou ser ejetado. Partes do pa­ ciente eram experienciadas como onipotentemente localizadas no objeto em que se achavam situadas e, assim, confundidas com ele. Depressão projetada: De modo semelhante, Segai (1956) descreveu afetos que foram escindidos e projetados: (...) no curso do desenvolvimento, os esquizofrênicos atingem a posição depressiva e, achando-a intolerável, lidam com ela através da identifica­ ção projetiva (...) Com freqüência descobrir-se-á que a parte depressi­ va do ego do paciente está projetada no analista, e, a fim de conseguir essa projeção, o paciente vale-se uma cuidadosa encenação da situação analítica. (Segai, 1956, p. 121). Esta observação foi vigorosamente endossada por Klein (1960), que comen­ tou ser por isto que a depressão é tão difícil de ser detectada no esquizofrê­ nico — e, presumivelmente, outros afetos também. Isto explica também a aparente ausência de transferência notada por Freud e o seu próprio pessi­ mismo a respeito dos esquizofrênicos pode ter tido a ver com sentir ele a depressão que os pacientes lhe projetavam. O ego danificado: Com a cisão excessiva do ego, seus impulsos e suas ex­ periências, temos um certo número de conseqüências: "'No que concerne ao ego, a excísão e a expulsão excessivas para o mundo exterior de partes dele mesmo enfraquecem-no de modo considerável'' (Klein, 1946, p. 5). A conjunção de introjeção e cisão era igualmente importante para Klein, de vez que a fantasia resultante é, de modo típico, uma fuga para o obje­ to interno idealizado, a qual, se excessiva, dificulta o desenvolvimento do ego: "(...) o ego pode ser sentido como inteiramente subserviente ao objeto interno e dependente dele: apenas uma carapaça para este" (Klein, 1946, p. 9). "Este ego enfraquecido (...) torna-se também incapaz de assimilar os seus objetos internos e isto conduz a uma sensação de ser esmagado por eles (...) [e] incapaz de tomar de volta para si as partes que projetou no mundo externo" (Klein, 1946, p. 11). A interação desequilibrada entre a císão e os processos introjetivos e projetivos resulta em grosseiros distúr­ bios do ego, que tornam o desenvolvimento ulterior muito inseguro e pro­ porcionam uma propensão à esquizofrenia na vida posterior. Conter a função-alfa: Bion deu alguns passqs teóricos de vulto, com base em sua experiência com a análise de esquizofrênicos (Bion, 1967), Essas R.D.Hinshelwood / 443

formulações completamente originais são descritas com detalhes em outros verbetes [ver BION], de vez que o avanço em teoria provindo do trabalho com esquizofrênicos teve um efeito profundo sobre todo o corpo da teoria e da prática kleinianas. Bion distinguiu uma forma patológica de identifica­ ção projetiva, encontrada em esquizofrênicos e outros pacientes gravemen­ te perturbados, de uma forma mais normal [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; EMPATIA]. Juntamente com outros, ele estabeleceu que a identificação projetiva constitui a base para uma comunicação extremamen­ te primitiva, não-verbal e não~simbóíica, que se dá entre mãe e bebê. Isto tornou-se conhecido como "conter" [ver CONTER] e foi importante para o desenvolvimento da técnica psicanalítica [ver 1. TÉCNICA; CONTRATRANSFERENCIAJ. Bion investigou os processos envolvidos na função continente da mãe [ver RÊVERIE; FUNÇÃO-ALFA] ou do analista com pormenores e demonstrou o que podia sair errado com os objetos-rejeitantes-da~identificação~projetiva [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA* CONTER; PENSAR; FUNÇÃO-ALFA]. Bion, W. R. (1967), Second thoughts, Heinemann. Klein, Melanie (1923), "The role of the school in the libidinal development of the child" WMK 1, p. 59-76. -------- . {1927), "Symposium on child analysis'', WMK 1, p. 139-69. -------- . (1929), "Personification in the play of children", WMK 1, p. 199-209. -------- . (1930a), "The importance of symbol-formation in the development of the ego" WMK 1, p. 219-32. -------- . {1930b), "The psychotherapy of the psychoses", WMK 1, p. 233-5. -------- , (1946), "Notes on some schizoid mechanisms", WMK 3, p. 1-24. -------- . (1960), "A note on depression in the schizophrenic", WMK 3, p. 264-7. Rosenfeld, Herbert (1947), Analysis of a schizophrenic State with depersonalization", ínt, /. P sycho-A n al, 26:130-9; republicado (1965) em Herbert Rosenfeld, Psychotic States, Hogarth, p, 13-33. -------- . (1965), Psychotics states, Hogarth. Segai, Hanna (1950), "Some aspects of the analysis of a schizophrenic", ínt. ]. Psycho-Anal, 31:268-78; republicado (1981) em The work o f Hanna Segai, Nova Iorque, Jason Aronson, p. 101-20. -------- . (1956), "Depression in the schizophrenic", Ínt ]. Psycho-Anal, 37:339-43; republica­ do (1981) em The work o f Hanna Segai, p. 121-9.

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dos impulsos sexuais da infância. Considerou a Iibido como se achando em conflito com a sociedade, mas, mais tarde, percebeu este conflito co­ mo se dando entre a Iibido e as pulsões do ego que buscam em outros amor, aprovação e os meios físicos de sobrevivência [ver ANSIEDADE; LIBIDO]. No decurso do estudo de condições narcísicas tais como as psico­ ses maníaco-depressivas, Freud (1914) deu-se ponta de que o apego 'libidi­ nal a um objeto e o amor por este podem ser devolvidos ao ego, de ma­ neira que este se torna o objeto amado. Neste caso, as pulsões do ego cons444 / Dicionário do Pensamento Kíeiniano

tituem apenas uma versão da libido, voltada para dentro, para o ego co­ mo objeto. Em 1920, introduziu ele uma nova dicotomia, desta vez entre puisões inerentemente opostas. A libido, agora incluindo as puisões do ego (pela sobrevivência e pela vida) encontra oposição de uma pulsão de morte silen­ ciosa e oculta, que exige a dissolução e é o oposto da vida. Tratava-se de um conceito difícil de ser aceito pela comunidade analítica, em parte por­ que Freud achava que as manifestações da pulsão de morte eram silentes, não havendo qualquer maneira boa de investigar-lhe a existência. A pulsão de morte e o superego: Klein, contudo, por volta de 1923, perce­ beu que esse conceito constituía um instrumento poderoso para ela, pois solucionava seu maior problema. Durante longo tempo estivera produzin­ do provas clínicas de que o superego formava-se mais cedo do que qual­ quer outra pessoa havia pensado e era mais severo do que alguém jamais imaginara: em verdade, quanto mais inicial, mais severo ele era [ver 7. SUPEREGO], Havia estado em confrontação direta a respeito disto com analistas vienenses, inclusive Anna Freud, e o próprio Freud tendera a apoiar a filha. Dessa maneira, Klein, possuindo provas clínicas de algo que ia diretamente contra o próprio Freud, achava-se em uma posição difí­ cil. O que ela fez foi tomar o conceito freudiano da pulsão de morte silen­ ciosa e dizer que ela não era tão silente, mas que possuía manifestações clínicas profundas muito visíveis, que são o próprio e duro superego, Es­ te era, então, a manifestação no nascimento da pulsão de morte a operar uma destrutividade no sentido do indivíduo, como Freud mesmo havia ar­ gumentado (Klein, 1933). Ela descobrira um meio de lidar com dois proble­ mas de realce ao mesmo tempo: solver o enigma da origem inicial do supe­ rego e colocar "carnes" clínicas nos ossos da teoria freudiana da pulsão de morte [ver 7. SUPEREGO]. Críticas ao uso feito por Klein do conceito da pulsão de morte: Tem havi­ do muitas críticas bem entrincheiradas da aceitação kleiniana da manifesta­ ção clínica da pulsão de morte. A rejeição direta, mas sucinta da teoria kleiniana a respeito deste ponto, feita por Kernberg (1969) com fundamen­ to em ser a pulsão de morte "clinicamente silenciosa", foi refutada por Rosenfeld (1971), que descreveu, com ilustrações clínicas, a manifestação de uma agressão dirigida para dentro, a que então deu o nome de "narcisísmo negativo" [ver NARCIS1SMO]. Apesar disso, Kernberg repetiu sua cáus­ tica rejeição em 1980: "Os principais expoentes continuaram a aderir a es­ tes conceitos e o fracasso deles em responder às críticas de tais conceitos indica seja sua incapacidade de fazê-lo, seja o seu dogmatismo" (Kernberg, 1980, p. 41) — como se não houvesse notado o considerável volume de material clínico publicado por Rosenfeld e outros kleinianos (Joseph, 1975; Sidney Klein, 1974; Meltzer, 1968, 1976). R.D.Hinshelwooá / 445

Os kleinianos apontaram também que as descrições originais, feitas por Freud, da pulsão de morte, em 1920, incluíam observações clínicas. Freud estava preocupado com as neuroses de guerra, após a Primeira Guerra Mundial, que eram repetições do trauma, amiúde sob a forma de um so­ nhar repetitivo. Observou também a repetição do trauma*na transferência e na formação de sintomas. Ligou isto a suas próprias observações de uma criança a brincar de perder e redescobrir um objeto, e ficou impressiona­ do pela importância de repetir o brinquedo a fim de dominá-lo. Ele intro­ duziu o conceito de compulsão à repetição nesse trabalho (Freud, 1920), a fim de acentuar que existe algo mais além de uma simples busca do pra­ zer na satisfação dos impulsos libidinais. Em uma reformulação recente do conceito kleiniano das manifestações clínicas da pulsão de morte, Segai (1987) descreveu-lhe um certo número de características importantes. De acordo com Freud, a pulsão de morte é cíinicamente silente; contudo, ela é silenciosa apenas com respeito ao fato de que o sofrimento e a ansiedade provêm da premência a viver. O sofri­ mento está no viver; a morte é o esquecimento. A experiência das necessidades pessoais, com que o bebê se defronta a partir do momento do nascimento, conduz a duas reações alternativas: (i) a pulsão a satisfazê-las, que conduz à busca objetai e ao amor, ou (ii) uma pulsão a aniquilar a necessidade, ou a percepção dela, ou o ego que perce­ be. A primeira destas puísões é a manifestção das pulsões de vida; a segun­ da é a da pulsão de morte. A pulsão de morte manifesta-se sob três formas: (i) a destrutividade que visa ao self se funde com as pulsões de vida e é atribuída a um objeto esta é a idéia original, de Freud, do "desvio da pulsão de morte", ou seja, em outras palavras, a projeção, para um obje­ to, do desejo de ferir ou matar o sujeito, sendo, portanto, uma fonte de profunda paranóia [ver 7. SUPEREGO]; (ii) um elemento interno remanescente de destrutividade também fundido com as pulsões de vida e manifesto como raiva e agressão é voltado para o objeto, que, agora, em resultado do "desvio", ameaça o sujeito desde o exterior, e (iü) outro elemento remanescente interno que pode ameaçar e destruir o self que percebe ou a percepção direta dos objetos. Estas formas da pulsão de morte são clinicamente observáveis, mas em cir­ cunstâncias especiais. A pulsão de morte acha-se normaímente em estado de fusão com a libido e as pulsões de vida, e a saúde implica que, nesta fusão, as pulsões de vida tenham ascendência. Em estado de defusão (cer­ tos aspectos dos distúrbios esquizofrênicos da percepção e do pensar), con­ tudo, ou quando a fusão se acha sob a égide da pulsão de morte, em vez 446 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

das pulsões de vida, o funcionamento da pulsão de morte se torna aparen­ te (organizações patológicas, masoquismo e outras perversões). Prazer no sofrim ento: O sofrimento é buscado por uma complexa intera­ ção de razões. Segai apontou para três fatores: (i) tirando fora a morte em si, o sofrimento e a autodestrutividade são uma satisfação direta da pulsão de morte; (ii) o sofrimento é também inerente às ameaças à vida, de maneira que um prazer assassino é concedido à parte do ego que lida com a pulsão de morte se a vida e as fontes da vida são derrotadas; (iii) quando, em uma fusão das pulsões de morte com a libido, a pulsão de morte é a mais forte, então o sofrimento {e a morte) possuira uma qua­ lidade libidinal e erotizada. As diversas condições patológicas que derivam de um excesso de pul­ são de morte — psicose, organizações patológicas, perversões - são prova­ velmente compostas de todos os três fatores, ainda que em proporções va­ riadas [ver PSICOSE; ORGANIZAÇÕES PATOLÓGICAS; PERVERSÕES]. A pulsão de morte e a inveja: A descrição original feita por Klein da inve­ ja mostrava que, em comum com a pulsão de morte, tanto ela quanto es­ ta envolviam ataques à vida e aos objetos das pulsões de vida. Mais recen­ temente, entretanto, analistas kleinianos investigaram com maiores deta­ lhes a relação existente entre a inveja e a pulsão de morte (Segai, 1987). A inveja é ambivalente, de vez que repousa no reconhecimento da necessi­ dade e da satisfação e representa uma fusão da pulsão de morte com as pulsões de vida [ver 12. INVEJA], mas é uma fusão em que o primeiro tem a ascendência. Dessa maneira, quando a experiência da necessidade invo­ ca a exigência de satisfação, ela também invoca uma exigência mais forte a atacar e obliterar a necessidade. O tipo particular de fusão que se acha envolvida na inveja é um tipo em que o objeto é atacado como uma satis­ fação da pulsão de morte e, ao mesmo tempo, como uma defesa contra o experienciamento da inveja, pela extinção do objeto que dá surgimento àquela. Quando há uma dominância das pulsões de vida, os impulsos invejosos são então modificados no sentido do ciúme e, por fim, para formas mais sadias de competitividade, ambição e aspiração. A organização estrutural da pulsão de morte: Embora muitas pessoas te­ nham aceito a potencialidade inata para a agressividade nos seres huma­ nos, Klein e os kleinianos que a sucederam deram ênfase à concepção ori­ ginal freudiana de ser a pulsão de morte uma força dentro da personalida­ de que impulsava no sentido da destruição do ego. No pensamento e na prática kleinianas mais recentes, isto conduziu a um entendimento de uma estrutura de personalidade na qual uma organização interna ataca as par­ tes boas do ego. Rosenfeld, escrevendo com a crítica dos psicólogos do R.D.Hínshelwooâ / 447

ego muitíssimo em mente, investigou num caso clínico a volta da destrutividade contra o self (ego). Deu a isso o nome de narcisismo negativo, por analogia com teoria freudiana da volta da libido para o self, nas descri­ ções que fez do narcisismo [ver NARCISISMO]: Quando os aspectos destrutivos predominam, a inveja é mais violenta e aparece como um desejo de destruir o analista como objeto que é a fonte real da vida e da bondade. Ao mesmo tempo, surgem violentos impulsos autodestrutivos e são estes que quero considerar com mais de­ talhe. Nos termos da situação infantil, o paciente narcísico quer acredi­ tar que deu vida a si mesmo e é capaz de alimentar-se e cuidar de si pró­ prio. Quando é defrontado com a realidade de ser dependente do analis­ ta, a representar os pais, particularmente a mãe, ele preferiría morrer, não existir, denegar o fato de seu nascimento, e também destruir seu progresso analítico e seu insight, que representam a criança nele próprio, a qual ele sente que o analista, representando os pais, criou (...) Como o indivíduo parece determinado a satisfazer um desejo de morrer e desa­ parecer no nada, o que se assemelha à descrição freudiana da pulsão de morte "pura", poder-se-ia considerar estarmos lidando, nestes esta­ dos, com a pulsão de morte em completa defusão. Entretanto, analiticamente pode-se observar que o estado é causado pela atividade de partes invejosas e destrutivas do self, que se tornaram gravemente escindidas expelidas e defundidas do self libidinal e que cuida, e se preocupa, o qual parece haver desaparecido. O todo self integral torna-se identifica­ do com o self destrutivo (...) O paciente amiúde acredita que destruiu para sempre o seu self que cuida, o seu amor (...) Parece que estes pa­ cientes lidaram com a luta entre seus impulsos destrutivos e libidinais tentando livrar-se de seu interesse e amor por seus objetos através da morte de seu self amoroso e dependente e identificando-se quase ir.teiramente com a parte narcísica e destrutiva do self que lhes proporciona um senso de superioridade e auto-admiração. (Rosenfeld, 1971, p.173-4) Existem hoje numerosos trabalhos que descrevem a organização de uma parte da personalidade dedicada à destrutividade [ver ORGANIZAÇÕES PATOLÓGICAS; ESTRUTURA; NARCISISMO] e temos agora muitas descrições de objetos internos e partes do self que são sentidas como más e que possuem um poder perverso e destrutivo sobre as partes boas, exer­ cendo sobre estas uma servidão intimidante. O indivíduo idealiza sua pró­ pria violência e destrutividade, tanto quanto a si próprio quanto em rela­ ção a outras pessoas. Freud, Sigmund (1914), "On narcissism" S.E. 14, p. 67-102. -------- . (1920), "Beyond the pleasure principie", S.E. 18, p.3-64. Joseph, Betty (1975), "The patient who is difficult to reach", em Peter Giovacchini, (org.), Tactics and techniques in psycho-analytic Therapy, vol. 2, Nova Iorque, Jason Aronson, p. 205-16.

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Kernberg, Otto (1969), "A contribution to the ego-psychological critique of the KSeinian school", Int. }. Psycho-Anal., 50:317-33. -------- . (1980), Internai world and externai reality, Nova Iorque, Jason Aronson. Klein, Melanie (1932), "The psycho-analysis of children", WMK 2. ——— . (1933), "The early deveiopment of consciersce in the child", WMK 1, p.248-57. Klein, Sidney (1974), "Transferenceand defencein manicStates", Int. /. Psycho-Anal,, 55:261-8. Meltzer, Donaíd (1968), "Terror, persecution, dread", em Donald Meltzer (1973), Sexual Sta­ tes of mind, Perth, Clunie, p,99-106; previamente publicado em Int. ]. Psycho-Anal., 49:396-400. — — . (1976), "The dèlusion of clarsty of insight", Int. }. Psycho-Anal., 57:141-6, Rosenfeld, Herbert (1971), "A clinicai approach to the psycho-analytical theory of the llfe and death instincts; an investigation into the aggressive aspects of narcissism", Int. }. P sycho-A n al 52:169-78. Segai, Hanna (1987), "The clinicai usefulness of the concept of the death instinct" (não publicado).

No apogeu da ciência do século XIX, Freud viu-se impeli­ do a procurar uma psicologia "científica" que se conformasse a leis de determinismo psíquico análogas às leis da física {Freud, 1985). Determinismo psíquico: A base da teoria mecanicista de Freud era a energia mental das pulsões. As origens da vida e da atividade mental podem ser consideradas como jazendo no corpo biológico e na herança genética expressa no desenvolvimento corporal. As pulsões permanecem sendo o elo entre as origens biológicas do indivíduo e seus embates e desenvolvímentos psicológicos. Freud originalmente encarou as pulsões como surgin­ do da estimulação das chamadas zonas "erógenas" (a boca, o ânus e os órgãos genitais), todas as quais dão surgimento a uma forma especial de estimulação neurológica. Esta estimulação era o componente importante da energia mental. Passou ele então a analisar sua dissipação e descarga como se fosse a carga de um condensador elétrico. A teoria das pulsões de Freud continuou a mudar durante a vida dele e à sua instigação. Especialmente a partir de quando ele começou a ser for­ çado a afastar-se de suas teorias neurológicas {de 1914 em diante), seu inte­ resse na natureza e na atividade do ego começaram a predominar sobre o seu interesse nas pulsões. A teoria especulativa das pulsões anunciada em 1920 {Além do princípio do prazer) tratava das pulsões aceitas por Klein. Através dos anos, muitos esforços foram feitos para afastar-se das limi­ tações da teoria pulsional de Freud. A teoria das relações objetais deu ênfa­ se às vicissitudes do objeto, antes que às pulsões. Fairbairn, por exemplo, aboliu toda referência a pulsões [ver FAIRBAIRN; ID], A psicologia do ego descreveu aspectos de ego que eram independentes dos dotes pulsionais [ver PSICOLOGIA DO EGO], Fantasia inconsciente: Klein retomou a idéia das origens biológicas das pulsões, mas, entretanto, modificou a idéia da energia ^mental e a aborda­ gem mecanicista à sua descarga [ver MODELO ECONÔMICO]. Ao invés, considerou a estimulação do corpo como dando origem aos eventos menR.D.Hinshelwood / 449

tais primários que eram interpretações subjetivas de estímulos corpóreos, tal como provocados por um objeto. Susam Isaacs demonstrou como es­ tas interpretações, conhecidas pelo nome de "fantasias inconscientes", cons­ tituem, com efeito, a substância da mente [ver 2 . FANTASIA INCONS­ CIENTE]. PULSAO E CONFLITO- Freud desenvolvera originalmente a teoria de que a estimulação das zonas erógenas, exigido descarga imediata e total, colo­ cara o ego em conflito com os padrões civilizados da sociedade. Tal confli­ to dava-se essencialmente entre as exigências sexuais da pessoa e as coibições da sociedade, e ele formou a base da teoria psicanalítica inicial. O problema com ela é que não explica porque a sociedade acontece, em pri­ meiro lugar, nem tampouco a influência civilizadora na humanidade. Tentando solucionar este problema, Freud postulou que a conformida­ de social é importante por significar sobrevivência pessoal. A humanida­ de não pode sobreviver sem uma cooperação social imposta. Introduzir esta idéia significava que havia no ser humano alguma força impulsora a sobreviver, e postulou ele um conjunto de pulsões do ego, que garantiam que a pessoa cuidasse de seus próprios interesses quando fosse ameaçada pela condenação social e a perda de amor, nutrição, etc. As pulsões do ego eram assim uma categoria diferente daquelas que surgiam das zonas erógenas, as quais tinham a qualidade especialmente impulsivas do erotis­ mo em sua estimulação. Ele tendeu a aceitar as pulsões do ego como bas­ tante certas e não tratou delas com muitos detalhes. Elas certamente não o interessavam tanto quanto a libido. Nesta visão, o conflito se dava en­ tre dois conjuntos de pulsões, um envolvendo a sobrevivência do indiví­ duo, o outro, a sobrevivência da espécie. Tratava-se de uma idéia que se ajustava bem a uma interpretação especificamente germânica da teoria da evolução (por exemplo, o germeplasma versus o somatoplasma, de Weissmann). A reforçar esta visão, havia a teoria freudiana da ansiedade de castra­ ção. O conflito com a sociedade acarretava uma ameaça (especialmente in­ tensa na fantasia) aos próprios órgãos genitais da criança, e ele permane­ ceu sendo um conflito com o mundo externo, que se opõe aos aspectos libidinais do corpo. Freud parece nunca realmente ter resolvido que priori­ dade dar a esta visões separadas do impacto da sociedade [ver FORMA­ ÇÃO DE SÍMBOLOS]. A partir de 1914, ficou incerto a respeito da distin­ ção entre libido e pulsões do ego; os últimos pareciam ser uma retirada narcísica da libido para o ego como objeto amado (Freud, 1914). A pulsão de morte: A teoria das pulsões de Freud modificou-se radicalmen­ te em 1920. Ele deve ter ficado impressionado pela escala de destruição da Primeira Guerra Mundial e pôde também ter-se sentido mais relaxado após jfung haver deixado o movimento psicanalítico em 1919 e Freud não mais ter de defender de modo tão rígido sua teoria sexual da neurose e 450 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

da civilização. Ele elevou a agressão ao mesmo nível de importância que as pulsões sexuais, mas par uma estranha maneira, qual seja, a de impu­ tar ao ser humano uma pulsão agressiva inata contra a sua própria existên­ cia, a pulsão de morte, que existia de modo paralelo àquelas pulsões dedi­ cadas à promoção da vida. Pôs então de lado a oposição entre pulsões do ego e pulsões sexuais e alinhou-os juntos contra a pulsão de morte. Fez esta aventura teórica com vários fundamentos, tais como, por èxemplo, a teimosa resistência de alguns pacientes em se beneficiarem de boas interpre­ tações analíticas, ou seja, a reação terapêutica negativa, e a propensão dos pacientes neuróticos a repetirem continuadamente e a reexperiençiar novas versões de um trauma provindo de suas infâncias (ou, no caso da neurose de guerra, de seus estados adultos, especialmente em sonhos). Si­ tuou a teoria (e talvez isto mostre os resíduos de sua discussão com a reli­ giosidade de Jung) em um arcabouço íntensamente biológico e físico, a um ponto em que chegou a ser rejeitada como biologia mística [ver PUL­ SÃO DE MORTE]. Plasticidade: Decisiva para a teoria das pulsões de Freud e para todas as teorias psicanalíticas que decorreram dela é a visão de que as pulsões hu­ manas são especialmente plásticas e podem ser canalizadas para uma notá­ vel variedade de impulsos derivados. A sociedade reage, por assim dizer, oferecendo canais para os derivados desviados das pulsões, num processo conhecido pelo nome de "sublimação". Tipicamente, a plasticidade reside na mudança de satisfações físicas e biológicas para canais culturais e sim­ bólicos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Esta mudança de organismo biológico para ser social é, em grande par­ te, um mistério, e as opiniões de Freud dela não oferecem solução, mas sim­ plesmente uma descrição. Fairbairn evitou a questão pela negação de que a mente seja biológica por qualquer maneira que possa ser psicanaíiticamente relevante. Ao dizer que a humanidade busca objetos, ele estabeleceu que a arena biológica não deveria mais ser considerada. Também Klein tornou redundante a questão, mas, sem negar as pulsões, encarou o bebê como estabelecendo relações objetais já no nascimento [ver 5. OBJETOS INTERNOS; 2. FANTASIA INCONSCIENTE]. Desta maneira, foi estabe­ lecido que havia um ser psicológico e social já no início, e que ele não era simplesmente emergente do nível biológico. O problema de entender co­ mo o ser social surge não mais existe, de vez que ele já se encontra la no começo, e a questão é dessa maneira retirada da psicologia e mandada de volta para a filosofia [ver PROBLEMA MENTE-CORPO], As novas teorias: O grande divisor de águas no desenvolvimento teórico de Klein surgiu por volta de 1932 e relacionava-se com a visão que ela ti­ nha do sadismo. Durante os seus trabalhos iniciais, à medida que aquele vinha a ganhar ênfase cada vez maior, ele se tornou uma entidade separa­ da, um conjunto de impulsos que, embora ligado com as fases oral e anal R.D.Hinshelwood / 451

da libido, dava origem a uma fenomenologia clínica separada e a conjun­ tos separados de defesa [ver SADISMO]. Klein finalmente abandonou a ligação entre o sadismo e a libido e mudou explicitamente para a teoria posterior das pulsões, de Freud, que outros analistas não haviam realmen­ te desenvolvido. Em 1932, aceitou ela estar observando as manifestações clínicas de um conflito entre as pulsões de vida e de morte: "(,,.) nos está­ gios inicais do desenvolvimento, a pulsão de vida tem de exercer o seu po­ der ao máximo, a fim de sustentar-se contra a pulsão de morte" (Klein, 1932, p,150). O abraçar da teoria mais recente das pulsões concedeu-lhe mais liberdade de pensamento para desenvolver as suas próprias teorias: da natureza e do desenvolvimento do superego; do sadismo, perseguição e paranóia, como fenômenos coerentes que derivam da pulsão de morte, interatuando com o desenvolvimento da libido; e da qualidade distinta da ansiedade e da culpa na posição depressiva. Freud, Sigmund {1S95), "Project for a sdentific psychology", S.E. 1, p.283-397. -------- . (1914), "On narcissism" S.E. 14, p.67-102. -------- . (1920), "Beyond the pleasure principie", S.E. 18, p.3-64. Klein, Melanie (1932), "The psycho-analysis of chüdren", WMK 2.

R e a çã o terap êu tica n eg ativ a

ra sua consternação, que havia alguns pacientes que reagiam mal às inter­ pretações analíticas: ficavam piores com interpretações boas, antes que melhores. Ele ficou afrontado pelo "{...) hábito [do homem dos lobos] de produzir 'reações negativas7 transitórias; todas as vezes que algo havia si­ do conclusivamente esclarecido, ele tentava contradizer o efeito" (Freud, 1917, p. 69). Desde então tem havido um esforço prolongado para enten­ der este problema. A presunção geral tem sido de que, por correta que te­ nha sido a interpretação que provocou uma reação negativa no paciente, tem de haver uma "mais correta", que entenderia esta reação negativa. Várias tentativas foram feitas para compreender a reação: (i) Culpa: Freud atribuiu-a à culpa, especialmente â culpa inconsciente, que leva a uma necessidade de punição; o paciente alcança esse castigo sob a forma de padecer de má saúde [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE], (ii) Pulsão de morte: Em 1924, Freud especulou sobre o papel da pulsão de morte na reação terapêutica negativa.

(th) Posição depressiva: Riviere (1936) tirou algumas conclusões à luz da posição depressiva de Klein, as quais mostravam a importância das rela­ ções objetais envolvidas na culpa inconsciente: um medo de ser responsá­ vel pelo dano ou pela morte do objeto bom, especialmente do objeto bom internalizado [ver 1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Apontou ela que se inter­ 452 / Dicionário do Pensamento Kleíniano

pretar a um paciente culpado o que se acha errado com ele, isso o fará sen­ tir-se mais culpado ainda, por estar dessa maneira errado. Advogou ela o equilíbrio entre interpretações das partes más do setf e interpretações das partes boas, ponto de vista endossado por Rosenfeld (1967). (iv) Inveja: No mesmo ano (1936), Horney argumentou que a reação tera­ pêutica negativa resultava da inveja do analista, isto é, de um desejo de estragar o trabalho deste último. Sob muitos aspectos, isto remonta a um breve artigo da autoria de Abraham (1919), a respeito de pacientes que não podem suportar o trabalho bem-sucedido do analista. Quando Klein trouxe exatidão à expressão "inveja" [ver 1 2 . INVEJA], a destrutividade foi claramente vista como um impulso extremamente primi­ tivo contra as interpretações do analista. Assim, as melhores interpreta­ ções trazem à tona a reação invejosa mais intensa. Além disso, o pacien­ te invejoso inveja a capacidade que o analista tem de fazer interpretações, assim como estas próprias, ou seja, o paciente inveja um aspecto da men­ te do analista. Bion (1962) descreveu o uso que o paciente faz da identificação projeti­ va para invadir a mente do analista com partes intoleráveis dele próprio, em resultado da inveja que tem da capacidade possuída pelo analista de conter as suas próprias experiências e as de seus pacientes. Rosenfeld (1975) e também Etchegoyen e outros (1987) apontaram a ne­ cessidade de distinguir entre a reação terapêutica negativa que deriva do impulso invejoso de estragar os melhores esforços do analista e a reação (talvez igualmente negativa) ao analista, cujas interpretações estão apenas erradas, por serem defensivas da parte dele. Estrutura do ego: Rosenfeld (1971) descreveu o narcisismo negativo e a organização da personalidade em estados fronteiriços, nos quais os impul­ sos negativos são dirigidos contra a parte melhor do self e contra qual­ quer objeto (inclusive o analista) que se relacione com o lado cooperativo da personalidade. Esta estrutura das personalidades limítrofes tem, desde então, sido frequentemente descrita [ver ESTRUTURA]. O solapamento da análise, amiúde com uma reação terapêutica negativa oculta, conduz a freqüentes impasses de causas aparentemente desconhecidas: o paciente. (...) assume as capacidades do analista através da identificação projeti­ va onipotente, a qual implica um sentimento muito concreto de acharse dentro do analista e, assim, controlando-o, de maneira que toda a criatividade e compreensão do analista possam ser atribuídas ao ego do paciente. (Rosenfeld, 1975, p. 223) Toda a estrutura da personalidade se organiza em torno da inveja e das defesas contra o reconhecimento da capacidade separada do analista [ver NARCISISMO]. R.D.Hinshelwooâ / 453

Abraham, KarI (1919), "A particular form of neurotic resistance against the psycho-analitye method, em Karl Abraham (1927), Selected papers on psycho-analysis, Hogarth, p. 303-11, Bion, Wílfred (1962), Leam ing from experience, Heinemann. Etchegoyen, Horatio; Lopez, Benito e Rabih, Moses (1987), "Envy and how to interpret it', ínt. }. Psycho-A nal., 68:49-61. Freud, Sigmund (1917), "From the history of an infantile neurosis”, S.E. 17, p, 3-123, -------- . (1923), "The Ego and the Id', S.E. 19, p. 3-66. -------- . (1924), T h e economíc probiem of masochism", S.E. 19, p. 157-70. Horney. Karen (1936), 'The probiem of the negative therapeutic reaction”, P sychoanal Q. 5:29-44. Klein, Melanie (1957), "Envy and gratitude", WMK 3, p. 176-235. Riviere, Joan (1936), "A contribution to the analysis of the negative therapeutic reaction', ín t J. P sy ch o-A n al, 17:304-20. Rosenfeld, Herbert (1971), "A clinicai approach to the psycho-analytic theory of the life and death instincts: an investigation into the aggressive aspects of narcissism', Int. /. PsychoA n al.. 52:169-78. . (1975), "Negative therapeutic reaction", em Peter Giovacchini, (org,), Tatícs and techniques in psycho-analytic therapy, vol. 2, Nova Iorque, Jason Aronson p. 217-28, -------- . (1987), Im passe and interpretation, Tavistock, Steiner, John (1987), "Interplay between pathological organizatins and the paranoid-schízoid and depressive positíons", ínt. /. P sycho-A n al, 68:69-80.

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C I I I L í CIVa C 1 1 1 t v T l 1 ICL Freud foi tomar a sério o que pacien­ tes neuróticos e psicóticos lhe diziam, e ele começou com a suposição de eles estarem lhe transmitindo algo compreensível e que era real para eles mesmos. A realidade interna ou psíquica é a convicção da realidade do mundo psíquico que existe inconscientemente e é sentido como situado den­ tro da pessoa.

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Klein elaborou isso com a teoria dos objetos internos; ela efetuou uma descoberta que criou um acréscimo revolucionário ao modelo da men­ te, a saber, que não vivemos em um só mundo, mas em dois, que vive­ mos em um mundo interno que é um lugar tão real para viver quanto o mundo de fora (...) A realidade psíquica podia ser tratada de manei­ ra concreta. (Meltzer, 1981, p. 178). Os objetos internos são experienciados como concretamente reais e inter­ nos ao ego, o que significa uma experiência de dentro do corpo [ver PE­ LE]. Eles são diferentes das imagens e representações que, quando as experienciamos, retêm em sí uma qualidade efêmera (embora possam ser repre­ sentações de coisas concretas). Essa idéia bizarra derivou, em última análi­ se, do trabalho com pacientes psicóticos, mas foi considerada como sen­ do o estado inicial que o bebê tem de experienciar a si mesmo e a seu mun­ do quando do nascimento e antes que possa saber qualquer coisa de obje­ tivo a respeido do mundo que o rodeia. Este é sentido concretamente co­ mo um mundo interno de objetos reais (não imagens ou representações) que se empenham em relações uns com os outros e com o sujeito. 454 / Dicionário do Pensamento Kleíniano

Esta qualidade de realidade interna concreta é muito difícil de ser captu­ rada conscientemente no estado adulto e foram precisos muitos anos de debate através das décadas de 30 e 40 para que a distinção entre objetos internos (introjetados) e representações se tornassem apreensível. A distin­ ção não é, no fundo, uma distinção conceptual, mas sim uma distinção na qualidade de experienciar a si mesmo e à própria atividade mental. Rapaport (1957) tentou distinguir o mundo "interior" das representações mentais do mundo "interno" da estrutura psíquica. Assim, o paciente teria üm mundo de lembranças, idéias, fantasias que ele "representa" a si mes­ mo — o mundo representacional (Sandler e Rosenblatt, 1962) — que tem a qualidade de ser mental e diferente de uma qualidade física. O mundo contrastante da estrutura psíquica é aquele que o analista constrói para si mesmo, a fim de fornecer um retrato objetivo da mente do paciente no ar­ cabouço de uma metapsicologia. A distinção de Rapaport falha, contudo, e de maneira importante. Uma das categorias de fantasias que os pacientes têm é a respeito da estrutura de suas próprias mentes e as funções que as estruturam da maneira que acreditam que ela é. Isto pode ser simplesmen­ te a própria fantasia idiossincrática do paciente, mas o problema, contu­ do, é que se pode demonstrar que tais fantasias têm efeito importante em produzir uma mente que aparece, à observação analítica, como estrutura­ da de acordo com a crença do paciente. Abraham (1924) deu disto um to­ cante exemplo pessoal, ao mencionar a maneira pela qual seus cabelos fica­ ram brancos por ocasião do falecimento de seu pai. O exemplo destinavase a mostrar que a introjeção do objeto perdido era tão intensa (onipoten­ te) que chegou a causar uma mudança real no ego. O pai dele não apenas ingressou no mundo representacional dos objetos mentais, mas tornou-se uma modificação física real, como se o pai realmente houvesse entrado na cabeça de Abraham e alterado-a fisicamente. Se, portanto, as fantasias do paciente a respeito da estrutura e do fun­ cionamento de sua própria mente possuem uma correspondência real com a estrutura e a função psíquicas objetivamente concebidas, então a distin­ ção entre as perspectivas subjetivas do paciente e as perspectivas objetivas do analista se rompe. A observação relatada por Abraham é típica das descrições kleinianas das comunicações de pacientes a respeito da estrutura­ ção de suas mentes. Isto levou à crítica feita a Klein de que ela (i) reificava os fenômenos de fantasias e (ií) confundia os níveis de descrição com os de teoria [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE]. Entretanto, a realida­ de interna do paciente é reificada porque é este que a reifica e funciona co­ mo se realmente houvessem objetos físicos entrando e saindo de seu ego. É este mundo de dentro que tem a qualidade de uma existência física que se quer significar pela expressão "mundo interno"; ele é perceptível ao pa­ ciente, não apenas ao analista. Ver 5. OBJETOS INTERNOS;

2.

FANTASIA INCONSCIENTE. R.D.Himhelwood / 455

Abraham, Karí {1924), "A short study of the development of the libido", em Karl Abraham (1927), Selected papers on psycho-analysis, Hogarth, p, 418-501. Meltzer, Donaid (1981), "The kleinian expansion of Freudian metapsychology', Int. ]. PsychoArmL, 62:177-85. Repaport, David (1957), "A theoretical analysis of the superego concept", em (1967). A collected papers of David Rapaport, Nova Iorque, Basic. Sandler, Joseph e Rosenblatt, Bernard (1962), "The concept of the representational world", Psychoanal. Study Child, 17:128-45.

R ealidade p síqu ica R ealização T ^

Ver REALIDADE INTERNA.

Ver PRECONCEPÇÃO; PENSAR.

) p r » ^ reparação é o elemento mais forte dos impulsos A ^ construtivose criativos. Desde o início, Klein notou a aflição das crianças com sua própria agressividade: "(...) ele mostrava na fantasia, assim como em seus brinquedos, uma retração quanto à pró­ pria agressividade, ou um alarme em relação a ela" (Klein, 1920, p. 58n). A capacidade de apiedar-se e o desejo de restaurar tudo esteve claro para Klein todo o tempo através de sua obra; ao descrever uma ópera que re­ presentava de modo notável a situação infantil de ansiedade típica, escre­ veu ela: "(...) quando o menino sente piedade pelo esquilo ferido e vem em seu auxílio, o mundo hostil se transforma em um mundo amistoso" (Klein, 1929, p. 214). Em seu artigo de 1940, Klein demonstrou existirem várias formas de re­ paração: (i) a reparação maníaca, que traz em si uma nota de triunfo, de vez que se baseia em uma inversão da relação criança-genitor que é humi­ lhante para os pais [ver REPARAÇÃO MANÍACA]; (ii) a reparação ob­ sessiva, que consiste em uma repetição compulsiva de ações do tipo anulatorio, sem um elemento criativo real e destinada a aplacar, com freqüência de maneira mágica, e (iii) uma forma de reparação baseada no amor e no respeito pelo objeto, e que resulta em realizações verdadeiramente criativas. Remorso e am or: Foi uma grande surpresa, de considerável importância para Klein e, em verdade, bastante pungente, quando ela cedo reconheceu, em seus pacientes mais jovens, existir muito sentimento pelas pessoas, brin­ quedos e objetos com que eles brincavam: A impressão que obtive da maneira pela qual mesmo a criança muito pequena combate as suas tendências não sociais é bastante tocante (...) Um momento após havermos visto os impulsos mais sádicos, defrontamo-nos com desempenhos a mostrar a maior capacidade de amor e o

456 / Dicionário do Pensamento Kleinian o

desejo de fazer todos os sacrifícios possíveis para ser amado (...) E im­ pressionante ver, na análise, como essas tendências destrutivas podem ser usadas para sublimação (...) como as fantasias podem ser liberadas para um trabalho muito artístico e construtivo. (Klein, 1927, p. 176) 4

Isto não confirmava a opinião de que as crianças usam os objetos para. a simples satisfação de necessidade, de modo explorador, para a descarga da energia pulsional. Ao invés, as crianças mostravam sentimentos por seus objetos e o seu brincar revela exatamente quais os sentimentos e por que [ver AMOR]. Foi para Klein igualmente surpreendemente — talvez alarmante — nòtar o enorme grau de violência e crueldade com que as crianças lidam com os seus objetos, as quais dão origem ao remorso e à preocupação subseqüentes: (...) podíamos ver a mãe cozinhada e comida, com os dois irmãos divi­ dindo a refeição entre eles (...) mas uma manifestação de tendências pri­ mitivas desse tipo é invariavelmente seguida pela ansiedade e por desem­ penhos que mostram como a criança tenta agora reparar e expiar aquilo que fez. Às vezes, ela tenta consertar os próprios homens, trens, etc,, que acabou de quebrar. Outras vezes, o desenho, a construção, etc., expressam as mesmas tendências reativas. (Klein, 1927, p. 175) Klein mostrou que os impulsos de crueldade se voltam para a piedade e o remorso. O brincar é uma tentativa de restaurar o objeto danificado na fantasia ou, com freqüência, na realidade, como no caso de um brinque­ do pequeno: (...) onde antes um menininho não havia feito nada, a não ser partir em pedaços fragmentos de madeira, ele agora tentara fazer um lapis desses pedaços de madeira. Apanhará pedaços de grafite que tirou de outros lápis que cortou e os colocará em uma fenda grosseira na madei­ ra; depois, coserá um pedaço de tecido em torno da madeira bruta, a fim de fazê-la parecer mais bonita (...) esse lápis feito em casa represen­ ta o pênis do pai, o qual ele destruiu em fantasia, e o seu próprio, de cuja destruição agora tem pavor (...) Quando, no decorrer da análise, a criança começa a apresentar tendências construtivas mais fortes, por todos os tipos de maneiras, em seu brincar e em suas sublimações, ela também apresenta mudanças em sua relação com o pai ou a mãe (...) e estas mudanças assinalam o início de um relacionamento objetai me­ lhorado, de modo geral, e um crescimento do sentimento social. (Klein, 1933, p. 255) Mecanismos obsessivos: Com tanta freqüência a criança mostrava rituais obsessivos para prevenir ou restaurar que Klein chegou em princípio à con­ clusão de que os mecanismos obsessivos eram especificamente desenvolvi­ dos contra as manifestações de agressividade — visão que concordava com a de Freud. O impulso a restaurar, no entanto, parecia muito mais que a R.D.Hinshehuood / 457

prevenção e o desfazer obsessivos. Eie acarretava uma grande preocupação e atividade no sentido de corrigir as coisas e mobilizar extraordinários im­ pulsos criativos. Ela veio a imaginar a reparação como raiz importante de toda atividade criativa: "(...) o desejo de fazer reparação, de consertar o dano psicologicamente feito à mãe e também de restaurar a si mesma achava-se no fundo da premência imperiosa a pintar esses retratos de seus parentes" {Klein, 1929, p. 218). Em grau significativo, o conceito de repa­ ração assumiu, no pensamento de Klein, o lugar das defesas obsessivas. Reparação e sublim ação; A sublimação é a conversão de impulsos libidinais em habilidades refinadas e criativas. A reparação, por outro lado, não é vista desta maneira. De modo característico, Klein ficou interessa­ da no conteúdo psicológico do processo de conversão a que Freud estava se referindo. A reparação está certamente relacionada com os impulsos, mas consiste na fantasia de corrigir os efeitos dos componentes agressivos. Existe alguma sugestão também de que Klein via a reparação como uma fantasia trazida à tona, de modo particular pela agressão, enquanto que a ênfase da sublimação repousa nos componentes libidinais ou sexuais. En­ tretanto, era importante para ela apontar a interação existente entre os im­ pulsos agressivos e os impulosos libidinais: "O curso do desenvolvimento libidinal é assim, em todos os passos, estimulado e reforçado pelo impul­ so à reparação e, em última análise, pelo sentimento de culpa" (Klein, 1945, p. 410). A reparação é o resultado da confluência das noções pulsionais opostas, antes que meramente o deslocamento de um impulso para algum representante socialmente aceitável, tal como acontece na sublimação. Mais tarde, quando Klein relaxou o seu comprometimento com a teoria clássica, a idéia de sublimação desapareceu um pouco, enquanto que a idéia de reparação se desenvolveu e tornou-se a pedra angular dos proces­ sos de maturação que forjam um caminho de saída para a posição depressiva. O altruísmo inerente à reparação é um desvios das noções pulsionais [ver PULSÕES] para canais sociais. Ele é, portanto, uma categoria da su­ blimação, processo identificado por Freud como sendo o meio pelo qual as noções pulsionais podem ser canalizadas para aplicações socialmente construtivas, neste caso, a saber, a culpa canalizada para o reparo. A posição depressiva: Na posição depressiva, a reparação passa a ter um papel central. Primaríamente, o que se pretende é um conserto do mundo interno, mediante a reparação do externo. Ela é uma fonte de energia pa­ ra a energia e a criatividade maduras no mundo externo real [ver CRIATI­ VIDADE]. A reparação é invocada especificamente pelas ansiedades da posição de­ pressiva e, junto com o teste da realidade, constitui um dos principais mé­ todos de superar a ansiedade depressiva. Na posição depressiva, a preocu­ pação é com o destino do objeto amado, "bom", sendo mais do que ape­ nas necessitar garantir a própria sobrevivência da criança mediante a ma­ 458 / Dicionário áo Pensamento Rleiniano

nutenção de uma mãe que a apóie e dela tome conta, embora esse seja um dos aspectos da ansiedade. A reparação surge da preocupação real com o objeto, do anseio por ele. Ela pode envolver grande auto-sacrifício no mundo externo em que objetos danificados foram projetados. Intensos im­ pulsos reparadores são com freqüência responsáveis pelas vidas devotadas a fins humanitários e vividas com grande sacrifício. Trata-se de uma fanta­ sia que pode ser atuada [acted out] com objetos externos, tal como, por exemplo, através do ingresso em uma das profissões humanitárias. Reparação matsucedida: Pode-se interferir com a própria reparação. On­ de defesas maníacas contra as ansiedades depressivas estejam operando de modo intenso, pode haver fantasias extremamente onipotentes e a repa­ ração, portanto, será concebida com onipotência comparável. Esta é uma receita para o fracasso, de vez que imensos esforços são invocados para restaurar objetos extremamente danificados. Estados de depressão clínica podem possivelmente sobrevir, quando se dá identificação com o objeto danificado e o sentimento de fracasso é projetado nos amigos, nos paren­ tes e nos serviços sociais e médicos disponíveis. Esforços desse tipo podem resultar em uma considerável desvalorização da importância do objeto e em uma negação da dependência [ver REPARA­ ÇÃO MANÍACA] ou em um controle e um domínio obsessivos e força­ do dos objetos. Com a desvalorização ou com o controle excessivo, o obje­ to pode ser sentido como havendo sofrido mais dano ainda, o que dá ori­ gem a mais ansiedade depressiva a respeito do dano e dos impulsos destru­ tivos, assim como prejudica o desenvolvimento da criança. Reparação e desenvolvim ento: A reparação, embora se relacione primor­ dialmente com o estado do mundo interno e o objeto bom que constitui o âmago da personalidade, expressa-se usualmente em ações no sentido de objetos situados no mundo externo e que representam o objeto interno danificado ou que, então, podem ser introjetados em fantasia para apoiar o mundo interno. Dessa maneira, ela constitui uma força para a ação cons­ trutiva no mundo externo e suplementa ou suplanta as atitudes positivas de um simples relacionamento amoroso, por estar preocupada com os pro­ blemas e as dificuldades do objeto amado, e de uma maneira tal que se aproxima mais do realismo que o simples relacionamento amoroso com um ser amado idealizado e incontaminado. Ver

10.

POSIÇÃO DEPRESSIVA.

Klein, Melanie {1920), "Inhibitions and difficulties at puberty", WMK 1, p, $4-8. --------■. (1927), "Criminal tendencies in normal children", WMK 1, p. 170-85. -------- . (1929), "Infantüe anxiety-situations refíected in a work of .art and in the Creative im­ pulse', WMK 1, p. 210-18. -------- . (1933), "The early development of consdence in the child", WMK 1, p. 248-57. -------- . (1940), "Mourning and íts relation to manic-depressive States", WMK 1, p. 344-69. -------- . (1945), "The Oedípus compiex in the light of early anxieties", WMK 1, p, 370-419.

R.D.Hinshehvood / 459

Nos estágios iniciais do deseno bebê emprega mecanismos onipotentes para estabelecer a segurança de seu ego. Conseqüentemente, quando a posição depressiva pela primeira vez o atinje [ver 1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA], ele pode experienciar o objeto amado co­ mo irreparavelmente danificado, espelhando a violência extremada de suas fantasias onipotentes. A angústia de querer reparar um objeto tão to­ talmente danificado origina-se do fato de isto ser experienciado como uma tarefa imensamente demandante. Em resultado disso, toda a situação tem de ser subestimada e a tarefa transformada em fácil, como se pudesse ser realizada através de mágica. Mais tarde na vida, até mesmo tensões normais podem provocar a fan­ tasia desdenhosa de que, de qualquer maneira, o objeto não vale a pena que por ele se tenha preocupação. O desdém e a depreciação, porém, são defesas maníacas contra a gravidade da angústia e ajudam o sujeito a sentir-se menos desamparado e dependente de seus importantes objetos bons, que lhe aparecem como danificados, e fazem vir à tona uma responsabilida­ de tão pesada [ver.ANSIEDADE DEPRESSIVA], O resultado final, contu­ do, é que o desprezo danifica os objetos ainda mais e pode, portanto, con­ duzir a um círculo vicioso. s

m an íaca volvimento,

Ver REPARAÇÃO. Originalmente, a repressão foi o mecanismos de defe­ sa descrito por Freud. Mais tarde (1926), porém, ele começou a distinguir outros: "A importância da repressão é reduzida à de 'um método especial de defesa'. Esta nova concepção do papel da repres­ são sugere uma investigação dos outros modos específicos de defesa" (Anna Freud, 1926, p. 46). Uma gama de mecanismos de defesa operados pe­ lo ego tornou-se um campo importante de estudo na psicanálise (A. Freud, 1926; Fenichel, 1945), O material clínico de Klein também chamou a aten­ ção para a operação de outros mecanismos, mas se confrontou particular­ mente com mecanismos de defesa que estavam relacionados com os conte­ údos do ego e do corpo da criança e com os tipos de objetos no mundo que a cercava. Ela começou a pensar neles como sendo mecanismos primi­ tivos de defesa e distinguiu-os da repressão. Em 1930, reivindicou de mo­ do específico: E somente nos estágios posteriores do complexo de Edipo que a defesa contra os impulsos libidinais faz seu aparecimento; nos estágios iniciais, é contra os impulsos destrutivos que os acompanham que a defesa se dirige (...) Esta defesa é de caráter violento,'diferente do mecanismo da repressão. (Klein, 1930, p. 2 2 0 ) [ver 9. MECANISMOS PRIMITI­ VOS DE DEFESA] 460 / Dicionário do Pensamento Kleiniano

Quando, no decurso dos dois anos seguintes, Klein adotou a distinção en­ tre a pulsão de morte e a libido, ela demarcou uma distinção comparável entre mecanismos primitivos de defesa (postados contra a ansiedade que deriva da pulsão de morte) e a repressão (que lida com os conflitos e ansie­ dades libidinais). Violência das defesas: Os mecanismos primitivos de defesa diferem dos "neuróticos" no grau de violência utilizado na obliteração dessa parte da mente consciente. A ênfase de Klein recaiu sobre a repressão (ou cisão, ou negação) de partes da personalidade, enquanto que, na psicanálise clás­ sica, a repressão tende mais a afetar o conteúdo — afetivo ou cognitivo — da mente, antes que a estrutura desta. Os mecanismos primitivos de defesa distorcem ou empobrecem gravemente o ego. Por serem fantasias onipotentes, ocorre uma "alteração do ego" real quando elas operam. Na repressão, que é muito menos violenta, a percepção da realidade interna e externa é mantida de modo muito melhor. As defesas primitivas, contudo, podem afetar a qualidade final da repressão: Os métodos iniciais de cisão influenciam fundamentalmente as manei­ ras pelas quais, em estágio um tanto posterior, a repressão é efetuada, e isto, por sua vez, determina o grau de interação entre consciente e in­ consciente. Em outras palavras, o grau em que as diversas partes da mente são "porosas" em relação umas às outras é determinado, em gran­ de parte, pela força ou fraqueza dos mecanismos esquizóides iniciais. (Klein, 1952, p. 6 6 ) Em sua passagem mais explícita sobre a repressão, afirmou ela: O mecanismos da cisão é subjacente à repressão (tal como se acha im­ plícito no conceito de Freud), mas, em contraste com as formas mais iniciais de cisão, que conduzem a estados de desintegração, a repressão normalmente não resulta em uma desintegração do self. De vez que, neste estágio, existe integração maior dentro das partes consciente e in­ consciente da mente e desde que, na repressão, a cisão predominante­ mente efetua uma divisão entre consciente e inconsciente, nenhuma das duas partes do self acha-se exposta ao grau de desintegração que pode surgir em estágios anteriores. Entretanto, o grau em que os processos de cisão são usados nos primeiros meses de vida influencia vitalmente o emprego da repressão em um estágio posterior, pois, se mecanismos e ansiedades esquizóides iniciais não foram suficientemente superados, o resultado pode ser que, ao invés de uma fronteira fluida entre conscien­ te e inconsciente, surja entre eles uma barreira rígida. (Klein, 1952, p. 87) A relação entre repressão e cisão pode ser iluminada pela idéia de cisão vertical e horizontal. A defesa mais severa, a cisão, divide a mente em duas mentes, por assim dizer (objeto, relacionamento e self em cada par­ te), com cada relacionamento separado coexistindo lado a lado (horizonR.D.Hinshelwood / 461

talmente), enquanto que a repressão atribui parte da mente, agora mais in­ tegrada, a um reino inconsciente, sem destruir a integridade (divisão vertical). A gravidade da cisão diminui à medida que a posição depressiva assu­ me preponderância com a conseqüente aceitação maior das realidades in­ terna e externa: ”(...) à medida que a adaptação ao mundo real aumenta, a cisão é efetuada em planos que gradualmente se tornam cada vez mais proximos da realidade (Klein, 1935, p. 288). A repressão gradativamente emerge com o impacto maior da realidade e a natureza dos objetos exter­ nos reais. Elementos alfa e beta: A distinção feita por Bion (1962) entre elementos alfa e beta [ver FUNÇÃO-ALFA; ELEMENTOS-BETA] constitui um arca­ bouço teórico alternativo para examinar-se a distinção existente entre a re­ pressão e os mecanismos primitivos de defesa, neste caso, a identificação projetiva. A função-alfa é o processo psicológico que gera significado a partir dos dados sensórios brutos. Ela dá origem a conteúdos mentais que podem ser utilizados para pensar e sonhar, sendo a repressão quem com eles lida. Contudo, se a função-alfa falha em sua operação, a mente acu­ mula quantidades de elementos-beta, conteúdos mentais impensáveis, apro­ priados apenas para descarga por meio da identificação projetiva (patoló­ gica), e a mente se desenvolve como se fosse um aparelho para descarre­ gar essas acumulações [ver PENSAR]. Bion, Wüfred (1962), Leaniing from experience, Heinemann. Fenichel, Otio (1945), The psycho-analytic theory o f the neurosis, Routledge & Kegan Paul. Freud, Anna (1936), The Ego and the m echanisms o f defense, Hogarth. Klein, Melanie (1930), 'T he importance of symbol-formation in the development of the ego", WMK 1, p. 219-32. . (1935), A contribution to the psychogenesis of manic-depressive States", WMK 1 p 262-89. . (1952), "Some theoretical condusions regarding the emotional life of the infant", WMK 3, p. 61-93, -------- . (1957), "Envy and gratitude", WMK 3, p. 176-235.

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a resistência na análise como senE t c i I C - x d do a manifestação de uma transferência negativa. Em contraste, a psicanálise clássica considerava a resistência como uma repressão da libido. Trata-se de uma diferença decisiva, que dá origem a tipos de interpretação radicalmente diferentes e expectativas de eficácia te­ rapêutica também radicalmente diferentes. Na opinião de Klein, a resistên­ cia apresentava-se como uma forma de evitar o relacionamento com ela própria ou como uma forma de evitar os jogos com brinquedos: Minha experiência confirmou minha crença de que, se construo a anti­ patia, imediatamente como ansiedade e sentimento transferenciai negati­ vo e a interpreto como tal em conexão com o material que a criança

462 / Dicionário áo Pensamento Kleiniano

ao mesmo tempo produz, remontando-o depois de volta ao seu objeto original, qual seja, a mãe, posso imediatamente observar que a ansieda­ de diminui, isto se manifesta pelo começo de uma transferência mais positiva e, com esta,-de um brincar mais vigoroso (...) Pela resolução de alguma parte da transferência negativa, obteremos então, tal como acontece com os adultos, um aumento da transferência positiva e esta, de acordo com a ambivalência da infância, será em breve, por sua vez, sucedida por uma reemergência da negativa. (Klein, 1927, p. 145-6) Interpretações desse tipo eram "(...) contra a prática costumeira" (Klein, 1955, p. 124) e ela entrou em disputa com Anna Freud a respeito do mane­ jo da resistência e da transferência negativa [ver ANÁLISE DE CRIANÇAS]. Klein estudou as inibições no brincar com grandes detalhes e deu-se con­ ta do impacto enorme dos sentimentos agressivos no desenvolvimento da simbolização e, portanto, na totalidade do funcionamento intelectual [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Mediante sua compreensão da personifica­ ção dos objetos internos e, eventualmente de partes do ego [ver 13. IDEN­ TIFICAÇÃO PROJETIVA], percebeu que estava lidando com o tipo de defensividade que é adotado pelos psicóticos. A resistência psicótica e um ataque à capacidade que tem a mente de pensar e conhecer (a pulsão epistemofílica), mencionado por Bion (1959) como "ataques aos elos. de liga­ ção" [ver VINCULAÇÃO; EPISTEMOFILIA]. A resistência, igualada à transferência negativa, representava uma ma' nifestação clínica da pulsão de morte [ver 3. AGRESSÃO]. O conceito veio a mais ou menos fundir-se com o de reação terapêutica negativa [ver REAÇÃO TERAPÊUTICA NEGATIVA]. Bion, Wiífred (1.959), "Attacks on linking", Int. ]. P sycho-A nal., 30:308-15; republicado (1967) em W. R. Bion, Second thoughts, Heinemann, p. 110-19. Klein, Melanie (1923), "The role of the school in the libidinal development of the child”, WMK 1, p. 59-76. -------- . (1927), "Symposium on child analysis', WMK 1, p. 139-69. -------- . (1955), "The psycho-analytic play technique: its history and significance", WMK 3, p. 122-40.

, . .

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Estes termos foram

Restituição/ restauraçao utilizadosPO rKiem no início de seus trabalhos e seguiam as descrições feitas por Abraham (1924) do impulso a reparar após a agressão. Posteriormente, o termo "re­ paração" tornou-se aceito. Ver REPARAÇÃO; 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA. Abraham, Karl (1924), "A short account of the development of the Hbido', em Karl Abraham (1927), C ollected papers on psycho-analysis, Hogarth, p. 418-501.

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O Dicionário do Pensamento Kléiniano é a primeira exposição completa e didática dos principais conceitos da psicanálise kleiniana e de seus mais recentes desenvolvimentos. Perpassa o trabalho de kleinianos como Bion, Segai, Rosenfeld, Joseph e Meltzer, incluindo uma bibliografia ampla e atualizada. O Dicionário do Pensamento Kléiniano se notabiliza por ser uma obra de referência indispensável para analistas, psicoterapeutas, psicólogos, estudantes e todos que se interessam pela natureza humana. É acima de tudo um livro útil, fruto de muito trabalho e amadurecimento e se constitui em companheiro essencial para a prática e a reflexão. A oportunidade e a magnitude deste trabalho fizeram com que a Artes Médicas se empenhasse em trazê-lo para o leitor de língua portuguesa com o crédito de ser uma tradução autorizada e referendada pelo

Melanie Klein Trust. R. D. Hinshelwood é psicanalista com formação no London Institute of Psycho-Analysís. É fundador e Editor do British

Journal o f Psychotherapy.

Livros por uma melhor qualidade devida