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Estudos Históricos
Através desta "còleção, visa-se a dar .maior divulgação às mais recentes pesquisas realizadas entre nós, nos domínios de Clio, bem como, através de cuidadosas traduções, pôr ao alcance de um maior público ledor as mais significativas produções'da historiografia mundial. No primeiro caso, já foram publicadas várias teses universitárias, que vinham circulando em edições mimeografadas; no segundo, traduções de autores como Pau Mantoux e Manuel Moreno Fraginals. Entre uns e outros,-isto é, entre a historiografia brasileira e a estrangeira, a cpleção também procurará divulgar trabalhos de estrangeiros sobre o •Brasil, Isto é, de "brasiliánistas", bérn como estudos brasileiros mais abrangentes, que expressem a nossa visão de mundo. Em outras etapas, projetam-se coletâneas de textos para o ensino superior. A metodologia da história deverá ser devidamente contemplada. Como se vê, o projetp é ambicioso/e se destina não-apenas aos aprendizes e mestres, do ofício de historiador, mas ao público cultivado em geral, que cada vez mais vai sentindo a necessidade e importância dos estudos históricos.' Nem poderia ser de outra forma: conhecer o passado é a única maneira de.nos libertarmos dele, isto é, destruir os seus mitos.-
Márcia Regina Berbel
A NAÇÃO COMO ARTEFATO DEPUTADOS DO BRASIL NAS CORTES PORTUGUESAS 1821-1822
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(foi !), Manuel Moreno Fraginals Cocheiros e Carroceiros (Homens Livres no Rio de Stttltereí c ha-rai-os), Ana Mana Ha Silva Moura Negro na RIM (A Nova Face da Escravidão), Mjrilene Rosa Nogueira da" Silva I'r?~Capita!isiHo i' Capitalismo (A Formação do Brasil Colonial). Sedi Hirimo O Engenho (cols. U f III), Manuel Moreno Fraginals Raízes da Concentração Industrial cm São Paulo. Wilson Cano Peregrinos, Monges em Castela Medieval, *^ ^ c Guerreiros: Fcitdo-Clcilcaliíino c Reliçiositliide *^ Hilário Franco J ú n i o r O Abastecimento da Capitania ilas Almas Ger.iii no Sèfaia AT///, Mafalda /.emella A Borracha na Amazónia: hxf>amito e Decailcncia (1850-1920), líaib.iu \Vcinsrcin F.itrofta, !-ra>iça e Ceará: Origem do Capita! EsíMHgfirv no Brasil Henise Monteiro Takcya A Siidí-fioidênda do Brasil, Carlos Guilherme Moca & Fernando Novais A Espoa* de f),~ntt01980, Wencesbu Gonçalves Neto A Cit-nci.i ilos Trópicos; 'u Arte Médica no Brasil do Século XVIII, Márcia Moisés Ribeiro A Mísera Sorte: a Escrr.uitLlo Afriaina no Brasil Holandês e -is Guerr.is do Tráfico no Atlântico Sul, 1621'16.i!i~:u d:: afncukuta -.scrai^tr, èraíileirj, Rafael de í t i v n r Marquese
A NAÇÃO COMO ARTEFATO DEPUTADOS DO BRASIL NAS CORTES PORTUGUESAS (1821-1822)
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MÁRCIA REGINA BERBEL
A NAÇÃO COMO ARTEFATO DEPUTADOS DO BRASIL NAS CORTES PORTUGUESAS (1821-1822)
SBD-FFLCH-USP
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EDITORA HUCITEC
São Pauto, 1999
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© Direitos autorais, 1998, de Márcia Regina Bcrhcl. Direitos de publicado reservados pela Editora Hudiec I.ida., Rvia Gil líanes, 713 - 04601-042 São Paulo, Brasil. Telefones: (011) 240-9318, 542-0421 e 543-0653; vendas: (011)530-4532; fac-símilc: (011) 530-5938. c-mail: hufítec&niíiidie.cow.br
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í-oi feito o Depósito Legal. Lditorjção elt-trõnica: Ouripedcs Gnllcnc e Rafael Vitzcl Corria.
Ao Carlos Pugtiesi em memória
C DEDALUS - Acervo - FFLCH-HI
21200043771
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (C.IP) (Sandr.i Regina Virzcl Domineues) B 427 Bcrbcl, Márcia Regina A nação como arccfato: deputados do Brasil nas cortes portuguesas (1821-1822). / Márcia Regina Bcrbcl. - São Paulo : Hucitcc : I:apesp, 1999. 204 p. ; 21 cm. - (Estudos Históricos; 36} Bibliografia: p. 198 I S B N 8S-271-0475-X
CDD - 907.2098104 índice para catálogo sistemático: 1. Brasil : Hiiroriognifia (1821-1822) 907.2098104
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SUMÁRIO
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Agrudecimemos
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Prefácio, ktvánjancw
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Iniroduçáo
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1. CONVOCAÇÃO DAS CORTES: UM APELO NACIONAL
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2. ADESÃO DO BRASIL AO APELO CONSTITUCIONAL
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3. NAÇÃO INTEGRADA E PODERES REGIONAIS
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4. MERCADO INTEGRADO E O IMPÉRIO FEDERATIVO DOS PAULISTAS
Pontes Fontes primárias Bibliografia
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AGRADECIMENTOS
•;; teíjde doutorado que o r i g i n o u a preserue puhlicaçár Io: eblxinda ,v-,b .1 orientação da Pror/Suely R::!;k--; Reis de Queiroz. Acta dv-v^>s.: r* sugestão di1 Lema, o ngor nu realização do trabalho e a generosidade aini n amaduv^c:mento da pesquisadora. Ern Portugal, a Proí.- 1 Maria Helena Carvalho dos Santos orientou o:; cinco meses de pesquisa em arnuivns e bibliotecas de Lisboa, Coimbra e Pdc 1780 - firo^r Janeiro: Pn?. e Terra, 1990, p. 27. Jilcm, Ihiihii, p. 19. Gclliier, Eniest. Nações f nacionatisuio. Lisboa: Gradiva, 1983, [>. 37-64. Hobsbawm. Oji. cit., p. 19.
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INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
rização em massa, ampliaram aatuação cia imprensa, modificaram a língua portuguesa. Como projecos liberais e nacionalistas, prcccndiam integrar-se nos novos tempos e adiantavam propostas para formação c integração nacionais, já cm território brasileiro, ou na atuação de seus representantes nas Cortes de 1821 e 1822, os pró j cios nacionais teriam sentido diverso e não expressariam um sentimento nacionalista. Os deputados do Brasil: abordagens portuguesas e brasileiras Poucos trabalhos ocuparam-se da análise dos discursos dos deputados do Brasil em 1821 /22. Por isso, o* texto de Gomes de Carvalho, publicado pela primeira vez. em 1912, no Porto'', continua sendo a referência mais conhecida. No Brasil ern 1972 dois artigos retomaram o assunto 10 e outros poucos dedicaram-se a análises de bancadas regionais. A Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro publicou alguns textos que auxiliam a compreensão dos episódios de 1820, mas não há um único que se dedique ao conjunto dos deputados do Brasil. Da mesma forma, os diversos dicionários biográficos são parcos em informações sobre os parlamentares. Os que aí figuram, devem-no em geral, às suas atividades no período posterior e a atuação em Lisboa é relaiada em poucas linhas. Em Portugal, excetuando-se o trabalho de Valem i m Alexandre", datado de 1993 e a ser analisado mais à frente ncsia introdução, as recentes pesquisas não privilegiam a participação desses deputados, concentrando suas atenções nos representantes lusos. Nos dois países, a maior parte das referências aos deputados das Cortes cncontra-se no interior de dois temas mais amplos: a revolução de l 820 em Portugal e a Independência no Brasil. A primeira conclusão importante da consulta a esses trabalhos é a constatação do descompasso entre as produções brasileira e portuguesa, quando se trata dos deputados das Cortes inseridos nos dois temas apontados. Em Portugal, a Revolução constitui-sc em verdadeira área de escudos, tanto para a história económica quanto paraadu pensamento político. Em relação ao C*
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Carvalho, M. E. Gomes de. Os deputedot brasileiros ?i.i Cot ta Gemes t L- 182]. Foriu: Uvraria Cliardron-Lello & irmão, 1912. Thomaz. Fernando. Brasileiros nas Cortes Consrímintes de 1821-1822. Li: MOC.Í, Carlos Guilherme. !S22 — tfimensStí. São Paulo: Perspectiva 1972; -j f-aoro, Raymundo. A revolução consiiciicionalisn de 1820 - a representarão brasileira às cor ECS gerais. In: Monccllo, Josué (cm;.}. Hntòria da Indcpcndênria do Brasit Rio de Janeiro: A Casa do Livro, 1972, v. 1. Alexandre, Valciidm, Os sentidas tto Império — (jticsttw nndonai t questão caluniai na ciise IÍQ Antigo Regime português. Porto: Edições Acraniamenco, 1993.
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último, as implicações do vintísmo têm merecido especial atenção dos historiadores portugueses, vários dos quais o consideram como o momento inicia! do liberalismo em Portugal, sinalizando suas contradições e características específicas. Em decorrência dessa perspectiva, diversos trabalhos retomam a ação dos deputados lusos nas Cortes para a avaliação do pensamento liberal. No Brasil, o processo de mudanças iniciado com a revolução do Porto de 1820 não mereceu abordagem específica, constituindo-se em um capítulo da história da Independência. As repercussões do movimento revolucionário e a ação dos deputados aparecem como passos na direção da separação dos dois reinos. Permanece, assim, a perplexidade diante da adesão da maior parte dos representantes do Brasil a um texto constitucional elaborado na sede da antiga metrópole. Há, portanto, pouca aproximação entre as interpretações feitas em Portugal e no Brasil. Pode-se pensar que, partindo de referenciais constituídos no século XIX, logo após a dissociação dos dois reinos da monarquia portuguesa, a separação das histórias dos dois países fez parte do esforço para a afirmação das duas nacionalidades e que os acontecimentos do período em questão, por se situarem no limiar do desligamento, adquiriram o significado de divisor de águas. Em função dessa hipótese, é cabível separar as considerações sobre as duas produções, muito embora nos limitemos u analisar apenas algumas das disparidades notadas. No Brasil, as primeiras e mais importantes abordagens do processo da Independência são encontradas ainda no século XIX c início do século XX, nos trabalhos de João Armitage, Francisco Adolfo Varnhagen e Manuel de Oliveira Lima12. Apesar das enormes diferenças entre esses autores, suas versões cem em comum um aspecto significativo: buscavam ressaltar a importância da Monarquia e da dinastia de Bragança para a consolidação do império brasileiro. Restringiram suas análises às políticas adotadas pelo rei e seus ministros e aos conflitos no seio da família real. Preocupados ern justificara unidade do Estado brasileiro, expressaram na preferência por D.João VI, D. Pedro ou urn dos ministros, o modelo adequado à organização do Estado. Para esses três autores, as Corres formadas a partir da Revolução de 1820 estabeleceram erradamente uma política opressora em relação ao reino do Brasil. Esse teria sido o motivo da insatisfação que levou à ruptura, encabeçada por D. Pedro, segundo Varnhagen e Armimge, ou já semeada por D. João V I , de 1J
Armitagi;, João. Hisióriíi c/y lirasil rleselr u yvivV/f edi chegada éa família de Bragança cm ÍSOS até r. xbekfaçSo cie D. P^dro l t m 1831. Rio de Janeiro: Eugênio Egas c GarcÍJ Júnior, 1943; Varnhagen, Francisco Adolfo. História da Independência, RIHGtt, 1916 e Lima, Manuel de Oliveira. D. Jotw VI no Brasil. Rio iíc Janeiro: José Olímpio, 1945.
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INTRODUÇÃO
acordo com Oliveira Lima. De qualquer forma, a ação do rei ou do príncipe teria sido fundamental para a Independência. Referindo-scà política das Cortes quanto ao Brasil, diz, Armitage: "Não se podia negar que se guiavam por intenções patrióticas, mas infelizmente seu patriotismo tomava direcão.muito.exciusiva [...] quando se tratava dos negócios do Brasil, assuas disposições eram ião aristocráticas, quanto sobre outros tópicos eram democráticas" 13 . Varnhagen atribui a um dos decreros das Cortes o início do processo de Independência: " l odus as moderadas tendências da parte dos brasileiros mudaram de repente, com a chegada especialmente do decreto para retirada do príncipe acompanhado logo do pronto proposto acerca da supressão dos tribunais. De um dia par:1 curro, viu-se exíraoidinariainentc alentada a pequena minoria dos clubes que ousara acenar r ri o cedo com a Independência" 1 : ; Já Oliveira Lima cr.níeru sentido colonialista '.-. política das Cortes: '"Tornavase preciso vingar a njvdurão liberal para que sv pensasse a sério na reconstrução do derrubado edifício económico, mvocando-su o princípio de que num governo a colónia níir: pr-rl': ser livremente irarada ou se não acha exclusivamente à mercê do sob;-r. vi o, CO:ÍSCÍÍUÍÍKÍO propriedade comum da nação, sobre a quaí exerce iii;v;r-:r -f'? .-/:.' "i '.',;wiVí; ti\itic í/XWiíw.r f r "i}ax Lusitatiii' tliíttí l'At!,u:iiqiii- iW_ T L-si- iic liomoranicnti-j f i T i Hisiórui sob ,! orientação do Pn>f. FrcJéric Mauro. Uíiiverslti.' i!c Pní-i/X. Í985-S6. \: III, cap. XII. Itlrm, ilndím. Arriaga, Jc:.:, l í i K h . ;;. "h.- : M;mijib. Oliveira, 'ríh'.ôr>,a -'.t l't>rt;t».ií, \. II. Lisbox Publicações Europj AmJrKs, 19W. Arrlaga, Oj>, aí., p '*0i>.
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INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
aos deputados do Brasil de forma diferenciada. Os do "Sul" são considerados emissários de D. Pedro para a discórdia com os do "Norte", representantes das juntas liberais e defensores das Cortes. Já Oliveira Martins identifica na incompetência das Cortes, "imbuídas nas quimeras jacobinas que a invasão francesa propagara em Portugal", a responsabilidade pela perda do Império no Brasil. As ideias que moviam os trabalhos parlamentares, segundo ele, eram "inteiramente inadequadas ao país". Qualífi-ca, então, as medidas adoçadas em 1821 e 1822 como ridículas: "os quatorze distritos, cm que a colónia estava dividida, seriam outras tantas colónias; e esperavam as Cortes que a destruição da unidade e a volta de D. Pedro para o reino, formalmente exigida, permitiriam restabelecer pouco a pouco o antigo Estado. [...]. Os decretos das Cortes [setembro e outubro de 1821] eram arrogantes: os seus atos, porém, eram nenbuns, nem força tinham para serem alguma coisa"2 . No século XX, surgem autores que lançam críticas sobre os anteriores. Uma das vertentes de análise a ser destacada é a que define os acontecimentos de 1820 como parte de uma "revolução burguesa". Nesta linba, escão J u l i ã o Soares de Azevedo e Fernando Piteira Santos' 8 , para os quais as propostas institucionais vistas nas Cortes representavam os interesses da burguesia, que buscava se afirmar para ''a destruição da ordem feudal" e a superação da crise económica vivida por Portugal. Como episódios de uma revolução burguesa, os acontecimentos que marcaram os anos de 1820 a l 822 expressariam a busca pela união da sociedade portuguesa sob a égide da burguesia. Nesse sentido, Piteira Santos explica a atitude dos constituintes de Portugal quanto ao Brasil: "Não é verdade que a Revolução de 1820, que pretende libertar Portugal de uma situação 'colonial' (a de estar cm risco de se converter numa colónia inglesa e de ser já, pela presença do monarca c da corte no Brasil, 'colónia de uma colónia'), porfia em reduzir o Brasil à condição de colónia? Não há aqui contradição quanto aos objenvos dos revolucionários vintistas: a burguesia comercial quer dominar o Brasil como mercado, dele fazer uma extensão do 'mercado nacional'. Todos os privilégios ou condições particulares que impeçam a circulação das mercadorias ou afastem o burguês da dírcção dos negócios públicos serão objeto da sua hostilidade. E a luta pela liberdade económica, pelo poder político, pela afirmação social da classe burguesa"29.
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Martins. Olivdr.i. O/,, ri!., p.
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Azevedo, JuliSo Soares de. CondiçÕeí tro/ir>i>iirtrh»:o ,;o libcraiii»ia, í-r.iih-iicn Se.im rriinro — u»: j>e>isa»íc/ilo critico. Lisboa: INIC, 1939.
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Pin.i. Am Maria 1-crrcira. De Rtsnsscuii au /W.'./.;/;.',/;-;'.:orinii-ntv . dl., p ívi-^íl. ravjiti. i-[;i:icisci> Muni:'.. rlistOria da Revolução -.:n, IVinambtKu em i H 17. JlIHCii 6V-.18Q, 1897.
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Rego Barreto presumia que das informações dos deputados, "quando entrassem no exercício de suas funções, dependeria provavelmente o êxito do plano que havia imaginado, isto é, passar por zeloso liberal e [...] perpetuar-se no governo da província" 13 . No entanto, a acívidade inicial dos deputados pernambucanos foi marcada pelas denúncias ao "despotismo" de Rego Barreto e pela defesa da formação de uma junta provisória para governar a capitania. Quase todos os eleitos por Pernambuco pertenciam à facção vencida em 1817. Eram eles: João Ferreira da Silva, Manuel Zeferino dos Santos, Inácio Pinto de Almeida c Castro, Félíx José Tavares Lira, que foi o emissário do governo revolucionário cm Bueiros Aires, Francisco Muniz Tavares, um dos principais líderes da revolução, preso na Bahia durante três anos e Domingos Malaquias de Aguiar Pires Ferreira, 'integrante da delegação que foi aos Estados Unidos negociar a compra de armamentos e que, não podendo retornar em virtude do fracasso da revolução, só chegou a Pernambuco às vésperas das eleições para as Cortes14. A cxceção era Pedro de Araújo Lima, que estudou em Coimbra entre os anos de 1813 e 181911. D. Francisco Xavier de Locio c Seiblitz foi eleito como substituto, mas não chegou a tornar posse de suas funções, porque todos os titulares da delegação se fizeram presentes ern Lísboa. Aiém desses, a comarca do Sertão de Pernambuco elegeu três deputados: os titulares José Tcodoro Cordeiro, que não foi para as Cortes por motivos desconhecidos, e Serafim de Sousa Pereira, falecido antes do embarque e substituído por Manuel Féhx de Veras, suplente, que só ingressou nas Cortes em 16 de agosto de 182216. No Ceará, a exemplo de Rego Barreto, o governador recusou-se à formação de uma junta. Só foi deposto em 3 de novembro de 1821, quando se reuniram os eleitores da província, obedecendo ao decreto das Cortes, e formou-se um novo governo. Nesse momento, foram eleitos seis deputados. No entanto, José Inácio Gomes Parente recusou o mandato, alegando doença, e Pedro José Costa Barros também não compareceu às Cortes. Quatro foram para Lisboa e só chegaram em maio de 1822. Tiveram, portanto, participação limitada no.s debates do Congresso e eram os seguintes: António José Moreira que
Idem, ibidein. Costa, Francisco Augusto Pereira da. Dicionário i/iográfict' de pernambucanos ciiebrs. Recife: Tipografia Universal, 1882. Macedo, Joaquim Manoel de. Of. cit., v. II, p. 163. Carvalho, M. E. Gomus de. Of>. cit., p. 103-38.
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também foi cx-revolucionário de 1817- Respondeu a processo e, cm 1821, fez parte do governo provisório contra o capitão-general nomeado por D. João VI1'. Manuel do Nascimento Castro e Silva, secretário do governador da província; Manuel Inácio de Sarnpaio lli ; José Martmiano de Alencar e Padre Manuel Filipe Gonçalves — que não se pronunciaram no Congresso — completavam a delegação cearense em Lisboa, Além deles, Manuel Pacheco Pimentel foi eleito como substituto e não chegou a assumir suas funções. Na Paraíba, o governador também guiou-se pelas'atitudes do capitão pernambucano e a província só formou uma junta provisória cm 3 de fevereiro de 1822. Nessa data, finalmente, realizaram-se as eleições para as Cortes1'1, que escolheram quatro deputados. Dois deles não integraram o Congresso por motivos desconhecidos: Francisco de Arruda Câmara e Vtrgínio Rodrigues Campeio, um dos presos na Bahia pelas atívidadcs revolucionárias de 1817- José da Costa Orne, eleito substituto, só pôde tomar posse nas Cortes em 15 de julho de 1822, quando se evidenciou a ausência dos dois titulares. Francisco Xavier Monteiro da França, que integrou as Cortes em fevereiro de 1822, foi o paraibano que mais se destacou durante os debates. Também ele participara da revolução de 1817 como membro do governo revolucionário211. Alagoas ceve junta própria desde junho de 1821 e, com o antigo governador na presidência, fiel às Cortes de Lisboa, procedeu à escolha dos deputados21. Os três eleitos ingressaram nas Cortes ern 17 de dezembro de 1821. Eram eles: Francisco de Assis Barbosa, Manuel Marques Grangeiro c Francisco Manuel Martins Ramos. Sabemos, somente, que o úlcimo era coronel no momento da eleição. No Maranhão, que tradicionalmente formava uma mesma unidade administrativa com o Pará, o processo de adesão às Cortes também se deu por iniciativa do governador, Marechal Bernardo da Silveira Pinto da Fonseca, que administrava a capitania desde 1819. Ele organizou a junta provisória em abril de 1821, reconhecendo somenrc a autoridade de Lisboa. O processo de escolha dos deputados às Cortes iníciou-sc cm l." de julho, chegando à
Suitiart, Guilherme. Dicionário viu bibliográfico ceantise. Fortaleza: Tipo Litografia a vapor e Tipografia Minerva, de Assis Bezerra, 1910, v. I e lil. Blake, Augusio Vitorino Alves Sacramento. Dicionário bibliográfico brMileiio. Rio de Janeiro: i ipografia Nacional de Imprensa e Imprensa Nacional, 1883-1902, v. VÍI, p.
394. Lima, Manuel de Oliveira. O Movimento da Independência, cit., p. 95. Blake. Op. cit., \. VII, p. 394. Lima, Manuel de Oliveira. Op. cii., p. 96.
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indicação dos eleitos em 5 de agosto22. A província indicou dois deputados. Um deles, Raimundo de Brito Magalhães e Cunha, foi dispensado por problemas de saúde que o impediam de fazer a travessia. O outro, Joaquim António Vieira Belford, assumiu as funções em novembro de 1821. Era desembargador e teve importante papel nos debates sobre o Judiciário. José João Beckman e Caldas foi eleito substituto, mas não seguiu para Lisboa. O Piauí elegeu Domingos da Conceição e Miguel de Sousa Borges Leal, que ingressaram nas Cortes ern julho e agosto de 1822. Ovídio Saraiva Carvalho e Silva era substituto c não precisou ir a Lisboa. Sabemos, somente, que o primeiro era advogado e o segundo pertencia ao clero. A província do Rio Negro escolheu como titular José Cavalcanti de Albuquerque, que integrou as Cortes em 12 de outubro de 1822, e João Lopes da Cunha como substituto, que não foi para Lisboa. Em Sergipe, por causa da resistência do governador cm jurar a Constituição, estendeu-se a autoridade da Junta da Bahia c a província não teve representação própria. Já no Rio Grande do Norte, o Governador José Inácio Borges, deposto pela revolução de 1817 e reconduzido ao cargo pela contra-revolução, proclamou a Constituição em 24 de maio. Em dezembro forrnou-se uma junta provisória, de acordo com o decreto das Cortes, e procedeu-se à eleição dos deputados. No entanto, os três eleitos, António de Albuquerque Monte negro, Gonçalo Borges de Andrada Andrés e Afonso de Albuquerque Maranhão, decidiram não participar das atividades constituintes de Lisboa, declarando-se "partidários da separação definitiva de Portugal" 23 . Nas regiões Norte e Nordeste, portanto, o movimento de adesão às Cortes contou com reações diferenciadas dos governadores locais, todos ligados à Corte joanina. Aos processos do Pará, em janeiro de 1821, c da Bahia, em fevereiro, que implicaram a destituição dos governos do Antigo Regime, seguiu-se o de Pernambuco, que contava com as tentativas de controle do governador, fiel interventor de D. João VI. Enquanto as eleições para deputados no Pará e na Bahia foram feitas a partir da constituição de juntas provisórias alinhadas ao governo de Lisboa, as de Pernambuco ocorreram com a participação Rego Barreto, que se recusava a abandonar o governo da província. A delegação do Pará expressava o alinhamento incondicional ao constitu-
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Silva. Luís Amónio Vieira da. História
Silvcirj, Aiaríco. Euiiclfipcáin brasileira. Edição patrocinai pela fundação Edmundo . Bittencourt. Rio de Janeiro, i 958, t. l x Lima, Manuel J^ Oliveira. Op. cit., p. 96-7.
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cionalísmo de Lisboa. A da Bahia resultou de processo eleitoral que durou meses e possibilitou o envolvimento de setorcs divergentes. Incluía desde um militar comprometido com o governo joanino até participantes do movimento de 1817. E, apesar do controle do governador, os deputados de Pernambuco eram, quase todos, revolucionários que se haviam envolvido com a República tfo Nordeste-. . As juntas do Maranhão, em abril de 1821, do Rio Grande do Norte, cm maio, e de Alagoas, em junho, foram formadas por iniciativa dos antigos governadores. Esses colocaram-se à frente do movimento constitucional e declaravam reconhecer, somente, a autoridade das-Cortes de Portugal. A eleição dos deputados no Maranhão e em Alagoas resultou, portanto, da composição entre os governadores do Antigo Regime e o movimento constitucional. No caso do Rio Grande do Norte, adiando-se o processo eleitoral até dezembro de 1821, quando o conflito entre os governos de Lisboa e Rio de Janeiro já era intenso, prevaleceu a posição de não-participação nas Cortes Constituintes. Os governantes do Ceará, Paraíba e Sergipe, por sua vez, resistiram intransigentemence à formação de juntas governativas. Como resultado, Sergipe ficou sob a esfera da junta baiana e não teve representação nas Cortes. Os governos do Ceará e da Paraíba só foram depostos meses mais tarde, em novembro de 1821 e fevereiro de 1822, respectivamente, quando, finalmente, procedeu-se à eleição dos deputados nas duas províncias. As delegações do Ceará c da Paraíba representaram, então, o movimento de oposição aos antigos governos e contavam, como na Bahia e em Pernambuco, com ex-revolucionários de 1817. Porém, só participaram em Lisboa da fase final dos debates. No geral, as eleições do Norte c Nordeste expressaram, portanto, a vitoriado movimento constitucional. A maioria dos deputados alinhava-se ao liberalismo das Cortes, fosse em razão das ligações regionais mais intensas com Lisboa, como no caso do Pará, fosse em função das reivindicações não satisfeitas em 1817. Rio de Janeiro: desalmhameiKos na Corte No Rio d\ Janeiro, I), João VI c seus ministros começaram a receber notícias sobre a revolução de agosto de 1820 no Porto, a partir do rnès seguinte. Em dezembro, a Corte já sabia da formação de um novo governo em Lisboa e da convocação cie eleições para a Constituinte. Todas as diferenças entre as políticas pretendidas pelos estrategístas da Corte vieram à tona nesse momento, assim como os projetos e insatisfações da população livre do Rio de Janeiro.
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Dentro do ministério de D. João, como se sabe, algumas posturas conrradítórias retardaram as medidas a serem adotadas. Tomás António Vila Nova Portugal, que ocupava a pasta do Reino e era o mais influente dos ministros, aposrava no fracasso da revolução em Portugal, fosse pela falta de adesão interna, fosse pela interferência das potências europeias. Acreditava, portanto, que a estrutura política da monarquia poderia ser conservada tal como estava desde que a revolução fosse sufocada à moda antiga. Chegou a instruir representantes portugueses nas Cortes europeias para articular a intervenção em Portugal e pensou em interferir na Bahia, com a nomeação do Conde de Vila Flor como governador confiável para debelar a possível adesão da província a Lisboa. Sabe-se que a referida nomeação não chegou a acontecer em razão da oposição do Conde dos Arcos, que agora ocupava o Ministério da Marinha c Ultramar. Tomás António era contrariado, sobretudo, pelo Conde de Palmeia, embaixador em Londres, que chegou ao Rio de Janeiro em 20 de dezembro de 1820. influenciado pelos princípios que organizavam o governo inglês, Palmeia, "o ministro da nova era", mostrava-se favorável a uma ação imediata do rei que ditasse a nova Constituição. Com essa iniciativa — pensava ele — seria possível articular a formação de um governo aristocrático baseado em princípios legais que extinguissem as tnsarisfaçÕcs das elites dos dois reinos, e evitar o processo mais amplo de uma Assembleia Constituinte. Marcado por experiências como diplomara na Europa, desacreditava de medidas repressivas, as quais, em sua opinião, contrariavam as tendências dos novos tempos. Antes de chegar ao Rio de Janeiro, passou por Lisboa e Bahia, onde, além de perceber grande desejo de um regime constitucional, tentou articular o almejado apoio para uma reforma das instituições dos dois reinos. As linhas de atuação sugeridas por Palmeia c Tomás António convergiam para o não-reconheci rnenro da Assembleia instalada em Lisboa como instância legítima da monarquia. E concordavam com a necessidade do envio de representantes da família real para negociações em Portugal. De Silvestre Pinheiro Ferreira, secretário de Estado, vinha a clara defesa da opção pelo Brasil, por considerar arriscado um retorno a Lisboa durante o período revolucionário. A presença da família reat no reino ultramarino, que também poderia seguir os rumos da revolução como o resto da América, garantiria a posse da região mais rica do Império. Para ele, era preferível encaminhar qualquer negociação a partir do Rio de Janeiro2'1.
Sobre as divergências cri ire os mimscios da Cone joanina ver, especialmente, Monteiro, Tobias. História do Imfcria: a elaboração àa Independência. Belo Honzonte-Sáo Paulo:
ADESÃO DO BRASIL AO APELO CONSTITUCIONAL
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As notícias sobre a adesão da Bahia ao regime constitucional, e as primeiras manifestações públicas no Rio de Janeiro, levaram ao rccrudescimento das tensões no minísrério e à assinarurado dccrero de 18 de fevereiro de 1821, determinando o retorno de D. Pedro a Porrugal "munido de autoridade e instruções necessárias para pôr em execução as medidas e providências a fim de restabelecer a tranquilidade geral daquele Reino"25. O decreto determinava, ainda, a criação de comissão de pessoas residentes na Corcc c nomeadas pelo rei com o firo de elaborar uma Constituição para .o.-Brasil. Ou seja, D. João VI permaneceria no Rio de Janeiro e confiava-se no Príncipe para interferir no processo revolucionário de Porrugal. Palmeia sugeriu que o mesmo texto reconhecesse as Bases Constitucionais de Portugal, mas a oposição de Tomás António impediu, no momento, que a proposta fosse adotada. Em 23 de fevereiro, novo decreto tornava pública a lisra dos participantes da referida comissão. Além dos minisrros Tomás António, Palmeia e Conde dos Arcos, os demais eram rodos desembargadores e militares que haviam migrado com a Corte cm 1808 e acumulado grandes posses a parrir dos vínculos com a administração do Reino16. O clima de insarisfação tomou conta, então, do Rio dcjanciro, refletindo os inúmeros interesses em jogo. No dia 24, D. João tentava reverter a situação, solicitando a Palmeia redigisse manifesto com reconhecimento das Bases Constitucionais, mas era tarde demais. Na madrugada de 26, as ruas do Rio de Janeiro forarn tornadas por multidão de soldados, comerciantes, pequenos proprietários e outros segmentos sociais da cidade que exigiam suspensão dos decretos. Além do juramento às Bases Constitucionais, reivindicavam mudança do ministério, a parrida da família real para Lisboa e eleição dos deputados fluminenses para as Cortes. E preciso ressalrar que esse movimento era organizado por um dos grupos alijados pela política joanina: os donos de engenhos c lavouras mercantis do Recôncavo da Guanabara e de Campos de Goitacascs, aliados a negociantes atacadistas, burocratas, bacharéis, oficiais militares e comerciantes varejistas.
Itatiaia-Edusp, 1981, p. 23/-9S e Souza, Ot.ívio Tarquinio. História dói jitnd.idores do l inferia, v. i í. A Vida de D. Pedro L Rio de Janeiro: josi: Olympio, p. 13.át.,p. 175-
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farão essa loucura, mas será depois de eu e todos os portugueses estarem feitos em postas; é o que juro a vossa majestade, escrevendo nesta com o meu sangue estas seguintes palavras: 'Juro sempre ser fiel a vossa majestade, à nação e à Constituição portuguesa"'70. Na carta do dia seguinte, escrevia sobre Pernambuco: "Neste momento recebi uma fatal notícia, dada por um brigue americano, de que a vila de Goiana, em Pernambuco, se tinha sublevado, mas que o governo de Pernambuco já tinha tomado medidas acerca do acontecimento, e que da Bahia já tinham partido trezentos c quarenta homens, entre portugueses e baianos"71. Em 9 de novembro, o príncipe referia-se a problemas fora do Rio de Janeiro, dizendo: "Aqui está tudo em perfeito sossego e promete duração; nas outras províncias já não é tanto, e em Pernambuco estão quase em perfeita anarquia, porque já lá não querem portugueses europeus, c o batalhão 2 do Algarve estão dentro do quartel pronto a defender-se no caso de ser atacado por esses que só por fora são constitucionais"72. Lidas e apreciadas pela Comissão de Constituição, as cartas foram apresentadas às Cortes, que se limitaram a agradecer ao rei por tê-las enviado e ao príncipe pela fidelidade expressa. Claramcnrc, esperava-se o desenvolvimento da situação73. Nesse contexto, a chegada de alguns presos da Junta Constitucional da Bahia serviu para aumentar a tensão. Como no caso dos presos de Pernambuco, não havia contra eíes culpa formada, mas acusação, feita pela Junta, de motim com o fito de derrubar o governo em 3 de novembro de 1821. De toda forma, a chegada dos acusados fazia crer em conflitos generalizados nas diversas regiões brasileiras. A Bailia, por sua pronta adesão ao sistema constitucional, era a província de que se esperava um ponto seguro de apoio e ajunta Provincial expressava o elo com as Cortes. Era ela que fazia as acusações aos prisioneiros enviados para Lisboa. A situação diferia, portanto, da referente aos presos de Pernambuco, que recebiam acusações do interventor Rego Barreto. Assim, a Comissão de Constituição, da qual faziam parte Borges de Barros e Fagundes Varela, após ouvir os deputados baianos, emitiu parecer cm que deixava a decisão sobre os presos para os juizes. Estava aí implícito um voto de confiança na Junta do governo baiano. Por outro lado, a mesma
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Santos, Clemente José dos. Documentos, cit., p. 257Idem, ibtdem. Ibidem.
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Diário das Cortes Constituintes, sessão de 18 de dezembro de 1821,
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comissão identificava rivalidades entre portugueses da Europa e do Brasil, até mesmo na Junta Provincial7'1. Diferentemente das situações anteriores, a constatação de "rivalidades" na Bahia não levou à decisão de envio de tropas, como havia acontecido nos casos de Pernambuco e do Rio de Janeiro. Agora, em um momento cm que os conflitos pareciam generalizar-se no remo do Brasil, declarava-se "não querer a união pela força"75. Concluía-se, cm janeiro de 1822, pela necessidade de uma série de medidas que acelerassem a união entre as diversas partes da nação. Propunha-se, então: "1) que a comissão nomeada para regular os interesses comerciais entre os dois hemisférios comece desde já seus trabalhos"; "2) que se nomeie uma comissão com o título de Fazenda do Reino do Brasil, composta dos Srs. Deputados do mesmo reino, e do de Portugal, para apresentar ao Congresso o método de administração interina das rendas da nação em todas as províncias do reino do Brasil, indicando as quantias e o modo por que cias devem contribuir para as despesas e urgências do Estado"; "3) que qualquer sr. deputado do Brasil [...] proponha na comissão de fazenda, quais são os tributos municipais, ou quaisquer outros [...], que devem já levantar-se para aliviar o povo que tenha motivos já hoje não existente"; 4) "se além desse houver qualquer outro" que se indique para a extinção; 5) "que apenas qualquer desses trabalhos estiver pronto se proponha logo às Cortes para entrar em discussão com urgência"; 6) "que as Cortes proclamem aos povos do Brasil mostrando-lhes quais têm sido os artigos já sancionados na Constituição em seu benefício"76. Vários deputados do Brasil pronunciaram-se após a exposição do parecer. Destacou-se a intervenção de Vilela Barbosa, que disse "recear uma tempestade no Brasil", pois os que "atiçam a desordem não são europeus nem brasileiros", mas "portugueses degenerados", "membros da santa aliança para manter o despotismo", motivo pelo qual se fazia necessário "remover o entulho"'7. O deputado do Rio de Janeiro procurava, ainda, um inimigo comurn a todos: o Antigo Regime. Lino Coutinho chamou atenção para as diferenças entre as regiões brasileiras no que se referia aos interesses comerciais a serem discutidos pela comissão e foi complementado por Marcos António, que dizia ser necessária "uma comissão para cada porto do Brasil"78,
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Ibidem, sessão de 10 de janeiro de 1822. Ibidem. Ibidem. Ibidem. Ibidem.
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Cipriano Barata e Borges de Barros argumentaram que, além de se enviar as resoluções da Constituinte para os habitantes do Brasil, se deveria "enviar coisas", ou seja, a extinção de "impostos gravosos que as juntas prometiam extinguir, mas não cumpriam"7'J. A proposta da Comissão foi aprovada e, cm breve, o Congresso pass.r) a discutir as relações comerciais entre os reinos. As notícias recebidas entre os meses de dezembro de 1821 e janeiro de 1822 haviam acrescentado novos elementos às polémicas das Cortes sobre a organização político-administrativa da nação portuguesa. O movimento separatista no Rio de Janeiro, o levante de Goiana em Pernambuco e o episódio dos presos pela Junta da Bahia configuravam um quadro de conflitos generalizados no reino do Brasil. Nem a força dos argumentos, concretizada nas propostas íntegracionistas para a organização das juntas provisórias, nem a força das armas, efetivada com o envio da tropas para o Rio de Janeiro c Pernambuco, haviam sido capazes de evitar a composição desse quadro desanimador. Entre os deputados de Portugal, essa situação levou ao enfraquecimento do grupo de Fernandes Tomás, pois ao final do mês de janeiro prevalecia o esboço de novo projeto de integração para a nação portuguesa sobre o defendido por ele. Já as propostas de Borges Carneiro, expressas nas medidas "para acelerar a união" dos dois reinos, apostavam na "complementaridade" de interesses económicos entre as partes da Monarquia como forma de soldar-lhes a união. Este projeto será rnais bem explicitado nos debates que analisaremos a seguir. Mas, já se pode inferir que, nele, o papel atribuído ao Estado é o de coordenar a pretendida integração económica. Para o grupo "moderado" de Borges Carneiro, a indivisibilidade políticoadministrativa, essencial para os Íntegracionistas, tornava-se, então, secundária. Como vimos, ele chegava a admitir algum nível de centralização política no Reino do Brasil, a partir do Rio de Janeiro. Porém, parecia temer a autonomia provincial tal como propunham os baianos. Destaque-se, também, que essa flexibilização de Borges Carneiro ocorreu no momento em que o governo de D. Pedro começava a ser reconhecido nas províncias meridionais do Brasil. Diferentemente de Fernandes Tomás, o "moderado" de Portugal talvez reconhecesse a necessidade de negociar com um governo que tendia a se fortalecer. E talvez procurasse, então, salvaguardar o que considerava mais importante para o reino de Portugal: as relações Ibidei
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comerciais com os domínios ultramarinos. Se fosse esse o caso, o deputado contava com o apoio dos comerciantes de Lisboa, que, como já referimos, pressionavam as Cortes para conter as rebeliões no Brasil a qualquer custo. A atuação da bancada baiana teve dois momentos marcantes que se caracterizaram pela mesma preocupação: o fortalecimento do poder das províncias, fosse diante do governo do Rio de Janeiro, fosse diante do de Lisboa. Tal preocupação evidenciou-se na indicação de Cipriano Barata e Agostinho Gomes para que se aguardassem os demais deputados do Brasil para a continuidade da legislação sobre o Reino, bem como na proposta de autonomia das províncias no Judiciário. ^rcíjOs baianos transformaram a defesa regional que marcava a atuação dos lí^' pernambucanos em projcto político. A defesa da autonomia provincial, f O, contra a nação integrada, tornou-se unia proposta fcderalísta. Dois aspectos , 0 ,/.- n '- devem ser ressaltados em sua concepção de nação. O primeiro é o da "artificialidade" do pacto e da nação como confecção da política. Cipriano Barata, para defender esse princípio, procurou apoio nas Bases da Constituição e ressaltou o artigo que definia a necessidade de opção das partes para a composição nacional. Tal artigo pressupunha não existir nação antes disso; cia seria formada a partir da aceitação e da negociação entre os representantes das províncias. O mesmo aspecto foi salientado por Lino Coutinho, que utilizou a expressão "artificialidade do sistema político", criado e passível de ser modificado pelos homens. Essa consideração contrariava diretamente a concepção vintista, segundo a qual as leis portuguesas referendavam-se cm "cinco séculos" de direito público. A "artificialidade" do pacto contrapunha-se à ideia de uma nação-tradição, cuja data de origem era impossível detectar. Na expressão de Lino Coutinho, o pacto que formava a nação tinha data, resultava de negociações e mudanças e, portanto, não se ancorava no passado. O segundo aspecto importante dessa concepção é seu carátcr federalista. Nação aparece como uma coleção de "vontades" provinciais, reunidas nas Cortes, que não expressam, portanto, um único e indivisível "corpo nacional". Nada mais justo que a aplicação das leis fosse de inteira responsabilidade das províncias. A Constituição seria elaborada por um Legislativo, expressão das vontades provinciais. As províncias, então, deveriam ter representações dos outros dois poderes constitucionais. Os governos das juntas responderiam pelo Executivo c, como disse Qpriano Barata, cada província deveria (f P /-fer um Supremo Tribunal de Justiça. 'i.^f P1™ a defesa desse ponto de vista, os baianos citaram exemplos significari.- r/jl'J vos: ^ colónias inglesas da Asía e da África. Estas tinham a "maior liberdade e _,^ se uniam à Corte para aprovar decisões locais", como já foi citado.
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O modelo referido é o do império britânico do início do século XIX. Sabemos que, nesse momento, as relações internas desse império passavam por grandes modificações, justamente cm virtude da independência dos Estados Unidos. A crise final entre os colonos americanos c a Inglaterra manifestou-se nas relações constitucionais. Segundo Jean-Jacques Chevallicr, estas relações eram "o fato essencial, porque as colónias americanas [...] recusaram sempre o direito do Parlamento inglês de votar leis para os seus problemas locais, principalmente de lhes cobrar impostos. [...]. Nenhum imposto sem representação. Elas só tinham relações políticas com o governo inglês como tal"80. Os ingleses da América julgavam-se herdeiros dos direitos da nação inglesa. Reconheciam a soberania do rei sobre os domínios da América, mas não a do Parlamento, se ele não contivesse representantes desses domínios. Quando Franklin enviou a Londres o pedido de eliminação da Lei do Selo, afirmou: "A soberania da Coroa, eu entendo; mas a soberania do Parlamento, não entendo". E mais à frente: "A América não faz parte das possessões da Inglaterra, mas das possessões do ReÍ" Bl . TJessa forma, dcfendjajTLAJicj;_e_ss_idadeJ^^s.^ aténxjd^vinculação ao Parlamento inglês. Assim como os outros revolucionários da América do Norte, Jefferson, cm 1775, formulou proposta para o Império que incorporasse as reivindicações americanas. Sugeria o funcionamento de duas Assembleias: "Cada colónia tem duas legislaturas, uma interior e provincial — a Assembleia colonial; outra exterior e imperial: o Parlamento britânico"82. Sabemos que a independência dos Estados Unidos resultou, entre outros fatorcs, do conflito esboçado acima. No.entanto, os ingleses seriam, depois da independência americana, os aprendizes da lição. Introduziriam cm suas possessões certas liberdades, antes reivindicadas pelas colónias da América. Mas a grande lição de 1776 para a Inglaterra foi que a conciliação da liberdade local com a unidade imperial faria a força do Império. A tendência seria a de reforçar os poderes locais, marcando institucionalmcnte a subordinação à metrópole. As mudanças ocorreriam, portanto, de forma legal e constitucional. O modelo fcderalista era um projeto que, durante as primeiras décadas do século XIX, amadurecia sob o trauma da independência dos Estados Unidos.
Chevallicr, Jcan-Jacqucs. L'ét'oltition cie 1'empirc brítannique. Paris: Lês Edidons Internarionalcs, 1930, p. 20-]. Idcm, ibidem, p. 26. Ibidem, p- 27.
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Passaria a integrar o império britânico a partir de 1832, inspirando a Federação do Canadá e o Commonwcalth83. Foi nesse modelo que os deputados baianos de 1821 se apoiaram. Citaram o Império britânico para lembrar a federação americana e sua independência, cm razão da não-incorporação dos poderes locais. Aquela nação "confederada" era diametralmente oposta à nação integrada do grupo de Fernandes Tomas. Poderíamos avançar a seguinte comparação; a primeira era essencialmente americana, ao passo que a segunda era, por definição, europeia. A primeira ressaltava o acordo político entre poderes locais, formados durante a colonização e cristalizados regionalmente. A segunda, inspirada na Revolução Francesa, destacava os scculos de tradição de uma mesma "família" em torno de uma "vontade geral". No entanto, a concepção federalista dos baianos poderia, ainda, ser conciliada com a proposta de integração de mercados, feita por Borges Carneiro. Essa será a tónica dos debates a partir de fevereiro de 1822. Contará, porem, com mais um elemento novo: o programa elaborado pela Junta de São Paulo, apresentado às Cortes a partir do ingresso dos deputados dessa província.
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Os paulistas diante da autonomia provincial no Judiciário .C/m 11 de fevereiro de 1822, as Cortes de Lisboa recebiam, por São Paulo, os deputados Diogo António Feíjó, António Carlos de Andrada e Silva e Nicolau Campos Vergueiro. José Feliciano Fernandes Pinheiro, eleito como titular na mesma época que os primeiros e residente em Porto Alegre, só tomaria posse cm 27 de abril, pois sua partida, preparada separadamente dos outros, demorou alguns meses a se concretizar'. A delegação paulista receberia, ainda, António Manuel da Silva Bueno, em 25 de fevereiro, e José Ricardo Costa Aguiar e Andrada, cm 2 de julho, ambos eleitos como substitutos. Também em fevereiro, um representante da Paraíba ingressava nos trabalhos das Cortes. Era Francisco Xavier Monteiro da França, recém-saído da prisão por ter participado da revolução de 1817 c integrado o governo provisório formado nesse ano. A chegada dos primeiros paulistas, porém, iniciou alteração significativa no conteúdo das discussões do Congresso. Como foi visto, já haviam sido
José Fciiciano cambem procurou o príncipe regente antes de se dirigir a Lisboa c presenciou a sua declaração de 9 de janeiro pela permanência no Río de Janeiro. Em virtude do crescimento das icnsõcs, o deputado chegou a duvidar de sua partida c teria sido aconselhado por José Bonifácio a ficar no Brasil. Pinheiro, José Fcliciano Fernandes. Memórias do Visconde de São Leopoldo, RIHGB, 37. p. 20-1, 1874. Ibidem, p. 28-30.
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debatidos em 31 de janeiro os direitos de recurso de revista e suas instâncias, evidenciando as diferentes concepções sobre o grau de autonomia do Judiciário cabível às províncias ultramarinas. Vimos que a tónica das intervenções da maioria dos representantes brasileiros era a defesa da manutenção da autonomia provincial, prescindindo-se de um centro de decisão no reino do Brasil. Em 9 de fcvecciro retomava-sc o tema geral por meio do debate sobre a esfera de poder que poderia suspender os magistrados. Contrapunham-se, agora, os que entendiam caber somente ao rei tal prerrogativa c os que defendiam existirem no Brasil autoridades locais capazes de realizar a suspensão. Os três paulistas entraram no meio da discussão e dela participaram ativamente. Os discursos de António Carlos reforçaram as posições já defendidas, mas politizaram-nas por meio de comparações significativas. ReferÍndo-se à prerrogativa real, dizia: "Pois então o rei da Suécia não delegava o poder de sancionar as !eís? Em Escócia e Irlanda não acontece o mesmo? [...] na America inglesa os governadores rcspeccivos têm o poder de sancionar as leis por todas as Assembleias". ,O poder real poderia ser delegado sem ameaçar a unidade da nação. Concluía afirmando que, mantendo-se a proposta como estava, "os povos apesar de gozarem os mesmos direitos não hão de ter as mesmas comodidades", o que ameaçaria os próprios dircicos previstos por leí, e "que, se isto assim fosse, a nossa união não durava uni mês; os povos do Brasil são tão portugueses como os povos de Portugal, e por isso hão de ter iguais direitos"2. António Carlos citava corno exemplo, além da Suécia, o império britânico mais uma vez, ultrapassando o tema específico do Judiciário. Para exemplificar a repartição do Executivo, remetia à união da Grã-Bretanha e à federação da América inglesa, relembrando que só essa delegação garantiria a igualdade entre os "povos" do Brasil e os de Portugal, pois se tratava de portugueses nos dois casos. Foi contrariado pelo deputado Trigoso de Portugal, que compreendeu o sentido de suas afirmações: "Os países citados tinham pactos antes de serem unidos; confederaram-se para fazer um Estado"3. Em outro momento, António Carlos sistematizou seus argumentos, opondo-se aos deputados de Portugal: "1) [...] que o poder de suspender ministros é indclegável: este princípio é falso, tanto de direito como de fato. De direito porque quando a sociedade lhe instituí poderes, atende a objcto e índole
Diário eiis Cortes Constituintes, sessão de 11 de fevereiro de 1822. Ibidem.
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desses poderes [...] é o que marca se pode ser ou não delegado o poder. A índole do Poder Legislativo faz com que ele não possa ser delegado. Do Poder Executivo não procede assim [...] não mudam de natureza, são atos de homens, passam a outros atos de homens [...]. Hoje direi também que o rei da Inglaterra delega várias funções, como são as declarações de guerra c os tratados de paz [...]. Um nobre preopinante [...] disse que Portugal fora sempre unido e que estes povos eram nações diferentes; não vejo qua! a ilação que se tire para se negar a possibilidade que se afirmava. O rei da Noruega c da Suécia não é rei? [...]. Hanôver e outras diferentes colónias inglesas nunca foram separadas e entretanto o rcí da Inglaterra delega os seus poderes aos governadores destes povos. [...]. 2) que sendo possível a delegação segundo o direito, era inútil aos povos do Brasil; mas se ela era inútil, para que se estabelece cm Portugal; e se é útil a Portugal, para que se nega ao Brasil? 3) [...] que havia impossibilidade em se aplicar este remédio ao Brasil. Este argumento desaparece cm grande parte, uma vez que seja permitido às junras provinciais [...]. 4) que isto introduziria umaseção entre os dois reinos [...]. Todo mundo sabe que a união de uma nação consiste na união de dois poderes [...] pouco importa que uma ou outra fração de um poder seja exercitada não pelo mesmo chefe, rnas por delegados"'1. Mais uma vez, ele defendia a ideia de repartição do Poder Executivo, lembrando o exemplo da Inglaterra. Este poder poderia ser delegado porque se tratava de "atos de homens", ou seja, era pessoal. Aqui desaparecia o exemplo americano, e o paulista tentava mostrar que um rei não perdia majestade quando transferia parte de seu poder. No caso britânico, a justificativa da transferência não estava na desigualdade entre "povos" ou "nações" da Inglaterra, Escócia e Irlanda, pois o mesmo acontecia com as possessões colonizadas por ingleses. Na verdade, a repartição do Executivo viabilizava o Império, uma vez que colocava os seus "povos" cm condições de igualdade. Sem lançar mão de um exemplo republicano, como o dos Estados Unidos, usado na sessão anterior, ele pretendia provar que seria possível a formulação de urn^cordo que. mantivesse a unidade da nação, sob arnonarquia, respeitando as autonomias régio najsjistc era o "milagre" que as Cortes deveriam fazer. António Carlos reforçava, com csscs__excmplos, a_dcfesa_da.d.ÍYersidad.e entre as partes da Monarquia e argumentava Javoravelmcn te à autonomia - --- ,. __ ___ r _____ .- — -_ -_——i ----—Q ----- — • • • • —— ------- -—— --- -———• delas. Não se distanciava, portanto, dos deputado5_bajanos_gu pcrnambucanos; ao contrário. Já ao encontrp^dgsjirgumcntos utilizadosi por eles, poís defendia a viabilidade da pro pqsta^ reforçando. p.pap_cl_das_ juntas provinciais.
Ibidem, sessão de 13 de fevereiro de 1822.
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No entanto, o discurso que causou maior constrangimento foi o de Vergueiro. Pronunciava-se peio adiamento da discussão, pois primeiro dever-se-iam estabelecer todas as relações entre Portugal e Brasil c depois entrar em minúcias, que eram muitas. Em seguida, numa alusão velada ao temor da desunião dos reinos, afirmava: "O Brasil está pronto a unir-se com Portugal, mas não segundos marcha deste Congresso"5. Ao pronunciar tais palavras foi interrompido por manifestações nas galerias, e o fluminense Varela interveio, solicitando que ele faiasse francamente, pois ali "não eram escravos", mas representantes de uma nação livre. ,/)-'-• ' r Vergueiro, então, continuou: "Exprimo a vontade de meus constituintes; 'jr\y!>}-\s esta união só pode realizar-se debaixo de condições igualmente vantajoij' p*"',o>rí/sãs para uns e outros, c por •isso voto que a responsabilidade i - i - j j dos j ministros • • cjfv empregados no Brasil se faça efctiva naquele mesmo país"1', '-^ Pela primeira vez, um deputado do Brasil ameaçava, embora veíadamcnte, com a possibilidade de separação diante da desigualdade no interior da Monarquia. Curiosamente, Fernandes Tomás declarou que considerava a discussão sem importância. O líder da revolução do Porto relembrou que sua posição inicial era contrária a pedir recurso ao Rei. Se no Brasil existisse outro fórum para qualquer pedido de recurso que não fosse o rei, ele retomaria a discussão exigindo os mesmos direitos cm Portugal. De fato, era favorável a uma restrição ao poder real maior do que a que a Constituição estabelecia e via, nesse momento, uma contraposição dos deputados do Brasil que repunha o problema. ^ J °'~ j" A discussão assumia importância por ressaltar a questão da autonomia das WJ> ,, i juntas provinciais. Não resolvida desde o decreto de setembro, fora retomada - 0>-^ - - momentos e, agora, com a presença jdos paulistas, iu x- IS em vários renovava-se sob -r $•-"•'•
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diferentes. ^,j?_ , , O projeto foi posto cm votação e decidiu-se pela sua manutenção, ou seja, •p-jaO-V1" não haveria em ultramar nenhuma autoridade que pudesse suspender os magistrados. A organização do Judiciário voltaria, ainda, ao debate em 25 de fevereiro. O baiano Borges de Barros apresentou, nessa data, uma indicação para o adiamento — até a chegada de um número maior de delegados do Brasil — da decisão sobre o artigo 6 das Bases da Constituição, que versava sobre o julgamento c punição dos juizes. A sugestão reavivava o debate sobre a representação provincial ou nacional, e a indicação foí reprovada.
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Algumas defesas da proposição, no entanto, merecem ser ressaltadas. Borges de Barros argumentava: "O nosso primeiro fim é acertar, e tratando de países tão variados por suas localidades, devemos encher-nos de ideias locais [...]. (O Brasil não__sc deve olhar como um só_país, são tantos países diferentes quantas asprovíncias do Brasil [...]. As províncias doJirasil podem chamar-se reinos"7. Mais à frente, LSno Coutinho, também deputado da Bahia, diria: "As províncias do Brasil são outros tantos reinos, que não têm ligação uns com os outros, não conhecem necessidades gerais, cada uma governa-se por leis particulares de municipalidade". Para ele, essas províncias haviam atendido o chamado de seus irmãos da Europa, que fizeram "a nação reassumir os seus direitos, direitos de que gozara no princípio da monarquia" c "lembraram que cm outros continentes viviam seus irmãos, que gemiam nos mesmos males, [...] mas os europeus atenderam a si quando fizeram a regeneração"8. Os baianos retomavam, assím, sua concepção federalísta. As diferenças entre os "países" do Brasil crarr^grandcs a_pgnto_de_clcyá-log à qualidade de unidades políticp-administrativas. Chegaram a defender a associação de "reinos" autónomos dentro de uma unidade monárquica. A participação dos paulistas foi, maís uma vez, significativa. Vergueiro discorreu sobre as diferenças entre as províncias brasileiras, ressaltando a importância de Minas Gerais, "a mais populosa e poderosa que temos", e propôs que "sem a pluralidade dos deputados do Brasil", e especialmente sem os de Minas Gerais, "não deve tratar-se negócio nenhum que tenha relação com o Brasil"9. Defendia a indicação de Borges de Barros, citando o exemplo de Minas Gerais. Como sabemos, tratava-se de província que tinha importante articulação corn o príncipe regente e nem sequer enviou seus deputados às Cortes. Finalmente, António Carlos teorizou sobre os argumentos já apresentados: "São diferentes os princípios que regem um corpo homogéneo, dos que devem reger corpos compostos de partes heterogéneas; mormente quando a força repulsiva de um corpo que o impele a formar sistema diferente é tão superior à força centrípeta que o faz tender para o sistema velho, que é preciso um quase milagre de política para conservar esta união"10. Concluía, indagando-se sobre a adesão do Brasil ao Congresso, pois aí estavam repre-
Ibidem, sessão de 6 de março de 1822. Ibidem. ' Ibidein. "' Ibidem, 7 E
Ibielcm. Ibidem.
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, jois ^ços das províncias; do restante não se conhecia a decisão. Os representantes ali instalados, porém, haviam jurado as bases de uma Constituição que reconhecia um reino do Brasil, e essa condição estava ameaçada. A posição do "mais novo dos Andrada" chocava-se diretamente com a concepção integracionista. Segundo ele, o Congresso deveria realizar um "milagre de política" para conservar a união de partes distintas da nação. Tratava-se de rcgcr_umj^corpo cprnrjosto de partes heterogéneas" que cstavam prestes "ã se dissociar. Só a arte da política poderia, uni-las. Não se tratava, portanto, de um "corpo homqgêr^e^Justificado.-eJntegrado por séculos de tradição e uma vontade geral. Ressalte-se que os discursos de António Carlos e Vergueiro tocavam, pela primeira vez, na possibilidade de desunião dos povos do Brasil. Uniram-se às intervenções dos representantes das outras províncias e reivindicaram maior autonomia para os governos locais. Não defenderam a existência de um centro decisório no Brasil, embora esta fosse uma.característica já estabelecida no proicto elaborado cm São Paulo, o qual será analisado adiante. Os exemplos de organização política citados por António Carlos indicavam a possibilidade de união de partes diferentes que conservariam, no entanto, a unidade nacional. As intervenções dos baianos tornaram-se mais agressivas na defesa da autonomia provincial, o que, no entanto, ainda não significava concordância com o programa de São Paulo. As observações de António Carlos, que a princípio se referiam ao Judiciário tinham abrangência maior que se esclareceria com a apresentação do programa feito em sua província. O Império Federativo da Janta de São Paulo: reaçÕes, alternativas e adesões Na sessão de 6 março de 1821 — quando se discutiu a proposta de Borges de Barros para que se adiasse a decisão sobre o julgamento e punição dos juizes até a chegada dos demais representantes do Brasil —, Guerreiro, deputado de Portugal, apresentou a seguinte indicação: "Tendo constado que os ilustres deputados de São Paulo trouxeram instruções dadas pela Tunta da dita província [solicitaria que] eles fossem convidados para as "ii apresentarem • O convite foi feito pelo presidente da sessão c o programa tornava-sc núblico ao ser remetido para a Comissão de Constituição. Os discursos dos
Ibieleni.
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paulistas, que ultrapassavam o âmbito da discussão pontual sobre o Judiciário, c suas repercussões nas atuaçõcs de outros deputados do Brasil, levando os baianos a se referirem a "reinos" do Brasil, chamavam a atenção dos deputados de Portugal. Os representantes de São Paulo traziam um programa elaborado na província e, talvez, suas atitudes no Congresso revelassem os planos aí contidos. Portanto, era necessário conhecer o documento. As instruções aprovadas pela Junta de São Paulo partiam de princípios bastante diferentes do predominantes nas Cortes, embora constituíssem adendo às bases já juradas da Constituição. Em linhas gerais, propunha-se a organização política da nação portuguesa, que se estendia aos dois hemisférios, definida a partir da união de "dois reinos" cm uma monarquia constitucional. Sabemos que a manutenção do estatuto de reino ao Brasil tocava cm um dos pontos fundamentais na formação do vintismo. O nacionalismo de Portugal havia-se constituído contra esse estatuto, sob a crença de que o reíno-europeu se havia transformado em "colónia de uma colónia". E, em sentido oposto, a qualidade de reino para o Brasil era o centro do Programa de São Paulo, pois expressava a articulação dos setores privilegiados pelo estabelecimento da Corte portuguesa no Centro-Sul do Brasil. Os detalhes da proposta dcíxarn claros os pontos de atrito que viriam a se manifestar nas Cortes. Afirmava-se que, embora as Bases da Constituição já estabelecessem os "artigos que mais importam à Nação", restavam outros a serem considerados: "[...] começaremos pelos que dizem respeito à organização de todo o império lusitano; depois passaremos aos que dizem ao reino do Brasil, e acabaremos pelos que tocam a esta província cm particular"12. O Programa era dividido, então, em três capítulos. No primeiro deles, referente aos "Negócios da União", declarava-se a existência de dois reinos e propunham-se: 1} defesa da integridade e indivisibilidade do Reino Unido; 2} igualdade de direitos políticos e civis, respeitando as diferenças dos costumes, território e citcunstâncias; 3) definição quanto à localização da sede da Monarquia, sugerindo a alternância entre os reinos, "pelas séries de reinados em Portugal e no Brasil, ou finalmente no mesmo reinado por certo tempo que se determinar"; 4) o estabelecimento de leis orgânicas que regulassem os negócios de paz e guerra, o comércio, "sem tolher a liberdade de ambos os reinos" e "a fundação de um tcsouro-geral da União diferente dos tesouros particulares dos reinos de Portugal e do Brasil"; 5) formação de uma convenção particular de deputados para reformulação ou alteração
Silva, José Bonifácio Andrada e. Op. cit., p. 14.
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futura dos artigos da Constituição; 6) formação de um corpo de censores para "vigiar" os três poderes (Executivo, Legislativo c Judiciário), sendo que "esses conselheiros serão nomeados cm número igual pelo reino de Portugal c Estados ultramarinos, seja qual for a povoação atual ou futura dos Estados da união"; 7) que os deputados de Portugal e ultramar "sejam sempre em número igual, qualquer que seja para o futuro a população dos Estados da união", a fim de que "haja justiça e igualdade nas decisões das Cortes gerais e ordinárias da nação portuguesa"13. No segundo capítulo, sobre o reino do Brasil, destacam-se os seguintes pontos: 1) a definição de atribuições e poderes no que competisse à categoria de reino e das relações para com o império português; 2) o estabelecimento de "um governo-gera! executivo para o reino do Brasil, a cujo governo central estejam sujeitos os governos provinciais"; 3) a formação desse governo por "emanação e delegação dos eleitores do povo e do Poder supremo Executivo" a ser presidido pelo príncipe herdeiro quando a sede da Monarquia não estivesse no Brasil; 4) o respeito no Código Civil às diferenças de circunstâncias e de população, "composta no Brasil de classes de diversas cores e pessoas, urnas livres e outras escravas", exigindo legislação particular; 5) providências imediatas para catequízação dos índios e melhoramento da sorre dos escravos; 6) "maior instrução e moralidade do povo" para a manutenção de um governo constitucional, devendo-se formar "em cada província do Brasil urn ginásio ou colégio em que se ensinem as ciências úteis para que nunca faltem enrre as classes mais abastadas homens [...] capazes de espalhar pelo povo os conhecimentos"; 7) definição de urna cidade para assento da corte ou regência, "que poderá ser na latitude, pouco mais ou menos, de 15 graus", cm lugar afastado, sadio e fértil, que permitisse a tranquilidade c a defesa. Aí ficariam localizados um Tribunal Supremo de Justiça, um Conselho de Fazenda e uma Direção-Geral de Economia Pública; 8) elaboração de uma nova legislação sobre as sesmarias1'1. Quanto aos "Negócios da Província de São Paulo", o documento remetia ás contribuições feitas pelas Câmaras e sugeria que os deputados fossem consultados para o seu conhecimento. Ainda que ligeiramente, cabe ressaltar alguns aspectos do texto. Elaborado antes do decreto de setembro sobre os governos provinciais, punha em questão várias decisões já tomadas, mas defendia, à sua maneira, a unidade da nação portuguesa. Reconhecia a existência de dois reinos que compunham o "império lusitano" e não se referia aos domínios portugueses da Ásia
13
«
filem, ibiciem, p. 14-17. Ibidem, p. 17-21.
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e da África, que durante os debates posteriores seriam abordados. Até aí, a paridade proposta cm todas as comissões e nas Cortes não estabelecia diferença entre o reino do Brasil e as outras possessões ultramarinas. Ao se referir, porém, à sede da Monarquia, o documento propunha o revezamento entre Portugal e Brasil. Note-se, ainda, que falava cm "Estados" formados no ultramar, não utilizando os termos habituais nas discussões do Congresso, como "povos", "nações" ou "países". Assim, destacava a existência de unidades políticoadministrativas já formadas fora da Europa e não a particularidade de seus habitantes ou de seus territórios. As relações entre os dois reinos eram estabelecidas, nesse programa, com base em estruturas de governo autónomas c interligadas por meio de dois vínculos de natureza distinta: a dinastia de Bragança e as Cortes eleitas parítariamcnte pela nação, ressaltando-se a unidade do Império. A estrutura de governo do reino do Brasil pressupunha pois autonomia no estabelecimento de relações comerciais, na Fazenda, no Judiciário e do Executivo. Uma longa parte do texto, citado aqui parcialmente, se referia à necessidade de ampliação da educação no reino do Brasil e ao ttatamento proposto aos escravos c índios, prevendo sua integração gradativa à sociedade. Nessa parte, cita-se o pensador inglês Bentham, que já havia enviado cartas às Cortes e, sabidamente, era favorável à extinção dos vínculos coloniais dos séculos anteriores. A proposição faz pensar em um plano para a ampliação da participação política, indispensável a "um governo constitucional" c, portanto, em ampliação das bases nacionais da soberania no Brasil. Em nenhum momento, porérn, os portugueses da Europa e do Brasil eram tratados diferentemente. O que se reivindicava era um tratamento legal que atentasse para as específicidades sociais existentes nos dois reinos. A diferenciação só aparece no adendo feito ao Programa no final de dezembro de 1821, após o conhecimento do decteto de setembro sobre os governos provinciais, cm que se limitavam os poderes das juntas nas províncias e invalidava-se a regência de D. Pedro. Os governantes de São Paulo qualificavam, então, com termos bastante agressivos os deputados das Cortes, tais como "déspotas" ou "pequeno número de desorganizado rés", repudiando as medidas propostas e visando justificar as possíveis reações no Brasil. O texto chamava o príncipe a confiar nos "brasileiros" c "nos seus paulistas", declatando a impossibilidade de que "os habitantes do Brasil [...] possam jamais consentir em tais absurdos e despotismo", e não mencionava o termo "nação". Como se tratava, porém, de um adendo, supõe-se que os "habitantes do Brasil" e os "seus paulistas" se consideravam, ainda, integrantes da nação portuguesa.
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Cabe destacar, finalmente, que o Programa de São Paulo não tocava em um aspecto fundamental das discussões nas Cortes: a autonomia dos governos provinciais. A ênfase da proposta recaía sobre a preservação do reino do Brasil e sua unidade, sugerindo a criação de uma série de novos organismos para tal. Em nenhum momento, porém, mencionava os governos provinciais, as relações entre cies e deles com as novas instituições propostas para o Reino e para a Monarquia. Deixava em aberto, portanto, a forma peia qual se efetivaria a unidade interna do Reino. A questão era delicada para os deputados do Brasil cm Lisboa e para as províncias do Norte e Nordeste, principalmente onde a rivalidade com o Rio de Janeiro havia-se aguçado nos anos anteriores. Por isso, ao não explicitar a resolução desse problema, o Programa permitia aos deputados de São Paulo negociar com os das outras províncias as soluções que pudessem conternplá-los. Ao conhecimento das "instruções" de São Paulo vieram somar-se novas notícias sobre a situação do Rio de Janeiro. Em 8 e 12 de março, os deputados das Cortes recebiam três cartas do príncipe regente, redigidas cm 10, 14 c 15 de dezembro, referindo-se à situação das províncias do Sul. Na primeira delas, D. Pedro acusava o recebimento do decreto de setembro e da ordem para o seu regresso, tornando, então, as providências para a eleição de uma junra no Rio de Janeiro, à qual passaria o poder. Na carta do dia 14, informava que a divulgação dos decretos "fez um choque muito grande nos brasileiros e em muitos europeus aqui estabelecidos". No dia 15, dizia: "Hoje soube que por ora não fazem representação, sem que venham as procurações de Minas, São Paulo c outras, e que a representação é deste modo, segundo ouço: 'ou vai, nós nos declaramos independentes, ou fica, e então continuamos a estar unidos e seremos responsáveis pela falta de execução das ordens do congresso; e demais, tanto os ingleses europeus como os americanos ingleses nos protegem na nossa independência no caso de ir Sua Alteza'"15. Na sessão das Cortes de 12 de março, o deputado de Portugal Pereira do Carmo propôs a criação de uma comissão especial para "tratar dos negócios daquela província", pois "já não podemos mais obscurecer o estado a que estão reduzidos os Brasis". Guerreiro, também de Portugal, precisou a proposta, sugerindo que a comissão fosse composta por quinze membros, com deputados de todas as províncias do Brasil, para preparar todos os artigos referentes à "especial união" e projetos de leis voltados à administração pública. António Carlos concordou com o encaminhamento imediatamente, solicitando rapidez.
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Cartas D. Pedro n." 10, 11 c 12, Santos, Gemente José dos, In: Documentou, cit., p. 272-3.
MERCADO INTEGRADO E o IMPÉRIO FEDERATIVO DOS PAULISTAS 137 Vilela Barbosa, porem, apresentou uma objeção, notando novamente a ausência dos deputados de províncias importantes, o que levou Uno Cominho afazer um pronunciamento contrário à formação da comissão: "Tcm-se dito que o Poder Executivo não podia ser delegado, nem dividido; o rncsmo se tem dito sobre o Poder Judicial. Eu quando falei nisso referi vários exemplos, citei mesmo que a Inglaterra, tendo colónias, quis assim mesmo dar uma espécie de Constituição àqueles povos". O baiano afirmava ter a consciência tranquila, pois havia feito as propostas necessárias para a pax nas províncias brasileiras. No entanto, "diziam que o Brasil queria um rcizinho". Agora, não' apoiava a comissão proposta por Guerreiro, pois queria "uma comissão muito grande [...]. O sr. Ribeiro de Andrada diz que não podia tratar aqui há dias de um negócio particular porque faltava a maior parte dos deputados do Brasil! Ora, faltarem deputados para se resolver uni negócio particular c não faltarem deputados para resolver um negócio geral [...]. Não entendo [...]"11 Lino Coutinho notava, pois, provocativamentc, as contradições de António Carlos. O discurso provocou várias declarações. Em primeiro lugar a de António Carlos, justificando a urgência do assunto. Tratava-se de evitar a separação dos dois reinos, pois "o Brasil quer ter um centro de governo entre si; porém a questão deve versar onde deve ser este centro; quero dizer, se nas províncias do Sul, ou do Norte"17. Na resposta ao deputado da Bailia, o paulista trazia à tona o verdadeiro problema: a rivalidade das províncias do Norte e Nordeste com o Rio de Janeiro e regiões vizinhas. A pressão destas últimas sobre o príncipe regente poderia colocar o Norte em posição de desvantagem, caso se consolidasse a unidade do reino. António Carlos apontava para uma negociação, que poderia ser feita dentro da comissão proposta por Guerreiro, uma vez que ela teria representantes de todas as províncias do Brasil. Vilela Barbosa, por sua vez, retomou a palavra para dízer que não pretendia ser contrário à comissão, mas pensava em acelerar a vinda dos deputados ausentes, pois: "Como é que se pode estabelecer essa divisão de que se fala, de províncias do Sul, e do Norte, c tratar desse modo os interesses cm geral do Brasil? [...]. Diz-se que muitos querem uma única autoridade central no Brasil. Por outra parte, o mesmo príncipe real, em outras cartas, tem dito que as províncias do Sul e do Norte, o tinham abandonado, e não queriam reconhecer sua autoridade [...] e agora querem! Eu não entendo isto"18.
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Diário fias Cortes Constituintes, sessão de 12 de março de 1822.
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Ibiâem. Ibidem.
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O baiano Luís Paulino, tomando posição a favor da comissão, argumentou: "As províncias que estão ao sul de Porto Seguro estão em relação entre si. Os deputados que nos faltam [...] têm os interesses ligados às outras províncias, de cujas já cá estão os depurados. Conseguintcrncnte só nos falta ligar o Norte com o Sul; c não tem a comissão senão fazer ver ao Brasil como ele separando-se marchava para a ruína"19. A ausência sugerida pelo baiano rcferia-sc, seguramente, à da bancada de Minas Gerais, cujos interesses, em sua opinião, estariam representados por intermédio dos deputados de São Paulo e Rio de Janeiro. A Comissão foi aprovada e composta por António Carlos, Luís Paulino, Gonçalves Ledo, Belford, Grangeiro e Almeida e Castro, das províncias do Brasil, e Pereira do Carmo, Anes de Carvalho, Ferreira Moura, Guerreiro, Borges Carneiro e Trigoso, de Portugal. Notam-se as ausências dos deputados mais radicais da Bahia e dos inregracionistas de Portugal. O parecer foi apresentado em 18 de março, depois de ouvidas as deputações das províncias brasileiras c os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Marinha20. Começava avaliando as cartas do príncipe e da Junta de Pernambuco, concluindo que a situação do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo era "difícil" e que em Pernambuco havia urn "desgosto surdo". Além da delicada situação nas províncias do Cenrro-Sul, a comissão trabalhara com as recentes informações sobre Pernambuco. Uma carta da Junta daquela província informava que, em 24 de dezembro, as tropas portuguesas haviam chegado e "José Xavier Brcssane Leite, comandante da flotilha, que trazia ordens de Lisboa, ignoradas da Junta, abriu conflito com esta, ciosa de suas funções"21. O comandante das armas indicado por Lisboa, o brigadeiro José Maria de Moura, "mandou prender indivíduos sujeitos à justiça civil c não militar c arvorou-se em informante das coisas políticas da capitania perante as Cortes"22. A Junta de Pernambuco solicitava, então, a retirada das tropas da província. A Comissão enumerava, no mesmo parecer, uma série de medidas que caracterizavam um verdadeiro recuo diante das posições já aprovadas. Resumidamente, os pontos eram os seguintes: que o príncipe ficasse no Rio de Janeiro até a finalização da organização geral do Brasil; que não se instalasse
liidem. Silvestre Pinheiro Ferreira, ministro das Relações Exteriores, fez seu depoimento por escrito, no qual defendeu a quaíidade de Reino pira o Brasil. Ver Ferreira, Silvestre Pinheiro. Cartas sobre a Revolução do Brasil. Ideias Políticas. Rio de Janeiro: Documentário, 1976. Carvalho, M. E. Gomes de. Op. cit., p. 218. Ibidem, p. 219-
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aí uma junta provincial; que se fizesse executar, porém, a extinção dos tribunais, sobretudo a Junta do Comércio; que as juntas da Fazenda do Reino do Brasil se subordinassem às juntas provinciais; que se subordinasse o comandante da força armada cm cada província às juntas provinciais; que se discutisse e se remetesse ao Brasil o projeto sobre relações comerciais; que se especificassem os laços da Fazenda que unificariam os dois reinos; que a dívida passada do Brasil fosse declarada nacional; que a dívida contraída pelo Banco do Brasil fosse declarada pública; que se indicasse às províncias do Brasil que o Congresso não tinha dúvida cm conceder àquele reino um ou dois centros de delegação do Poder Executivo23. Ausentes os intcgracionistas, dispostos a lutar intransigentemente pela indivisibilidade da nação portuguesa, a comissão elaborou uma proposta que expressava vários acordos. Em primeiro lugar, entre o grupo moderado de Portugal, liderado por Borges Carneiro, c os deputados do Brasil. E cm segundo, entre os diversos representantes das regiões brasileiras. O texto admitia a presença do príncipe no Rio de Janeiro até o final dos trabalhos constituintes, na tentativa de aquietar as províncias do Sul e contemplar os seus deputados, mas extinguia os tribunais instalados na cidade, como queriam os do Norte. O reino tería "um ou dois" centros do Executivo, ou seja, se necessário, um no Norte c outro no Sul. Além disso, a autonomia das províncias estava assegurada nesse projeto. Atendendo aos apelos da maior parte dos deputados do Brasil, a nova proposta eliminava o poder paralelo do comandante das armas em cada província, submetendo-o às juntas. Com esta medida, concilíava-se o principal ponto de divergência contido no projeto de setembro de 1821 para o ultramar, motivo de insatisfações nas províncias do Norte e do Sul. E, por fim, como queriam os moderados de Portugal, o texto apontava uma série de medidas económicas, apostando na complementaridade de interesses entre os reinos como forma de integração da nação portuguesa. Como prova de conciliação, na prática, a Comissão deixava em aberto a definição do estatuto de reino para o Brasil, uma decisão que seria adiada até o retorno de D. Pedro, quando o quadro nas províncias do Brasil estaria mais claro e a Constituinte já teria concluído seus trabalhos. A negociação no interior da Comissão, expressa nessa proposta conciliadora, mostrava um novo quadro de tensão entre os deputados do Brasil. As notícias de D. Pedro mostravam que as propostas da Junta de São Paulo, expressas no Programa defendido pelos paulistas nas Cortes, adquiriam
23
Diário das Cortei Constituintes, sessão de 18 de março de 1822.
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^ espaço junto ao príncipe c transformavam o governo do Rio de Janeiro em ' - i uma alternativa viável dentro da Monarquia. Os deputados do Nordeste passaram, então, a demonstrar desconfiança quanto aos de São Paulo, que estariam defendendo a região do Rio de Janeiro c articulando apoiadorcs ao governo de D. Pedro cm detrimento das outras regiões do Brasil. Estariam, assim, cristalizando a situação de diferenciação criada após a transferência da Corte em 1808. Desse modo, a negociação entre as partes no Congresso tornava-se obrigatória. Entre os deputados de Portugal, o recuo implícito no parecer representou uma derrota do grupo intcgracionista de Fernandes Tomás e o fortalecimento das propostas de Borges Carneiro. No entanto, a discussão da proposta estava agcndada para o dia 23 de março, quando, porém, o julgamento da Junta de São Paulo, de que trataremos a seguir, desviou as atenções do tema. As medidas jamais chegaram a ser implementadas, pois o acirramento dos ânimos não deixou espaço para propostas conciliadoras. Obedecendo a solicitação feita por Guerreiro no dia 6 de março, a Comissão de Constituição pronunciou-se sobre as instruções dãjunta dc~Sao~— Paulo no dia 22. O Congresso "estava, ainda,'sob o impacto"das n"qtíaas~dÕ ~ Rio de Janeiro que registravam os pedidos para que D. Pedro permanecesse no Brasil. Do conjunto do texto paulista, foi o adendo final qu.e_gajyanizou as atenções^4p_Cor^gresso. Cautelosamente, a _Comissão_p_cdia_um_adiamento_ para emitÍr_seu._parec_e_r_ejrrvirtude da situação prcocupantc no sul do Brasil^ ^ e considerava melhor aguardar a chegada de_mais informações.- — Esse pedido não era assinado por alguns integrantes do grupo. Dos 'x deputados do Brasil, não assinaram António Carlos, alegando os laços de parentesco com um dos membros da Junta, e Ferreira da Silva, propondo "que se deixasse tal representação em abandono, como se ela não tivesse chegado ao conhecimento do Congresso". Dos de Portugal, não assinaram Ferreira de Moura e Inácio Pinto, que não concordavam com o pedido porque "nenhuma notícia poderia alterar o parecer"2'1. Percebe-se nessas recusas que o adiamento não tinha a anuência do grupo "integradonísta" de Portugal, que interveio exigindo punição para a Junta. ', Fernandes Tomás clamava por providências enérgicas e a certa altura da | sessão fez o discurso que ficou famoso: "Eu entendo que o Brasil há de vír a / se separar de Portugal. Mas cm que tempo isto há de ser? Eu sou fatalista /' tanto quanto pode ser um católico romano; isto há de ser quando Deus
Diário das Cortes Constituintes, sessão de 22 de março de 1822.
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quiser. O que eu sei é que quando isto acontecer há de haver males; [...] para cá [...] e para lá também. Porém, uma nação recupera, ou pode recuperar os males desta espécie; mas não os que nascem dela subscrever à sua infâmia". E rnais à frente: "Ou o Brasil quer estar ligado a Portugal, ou não quer. Se quer há de estar sujeito às leis'que as Cortes fizerem, senão desligue-se. Eu quero declarar assim francamente os meus princípios para mostrar que eles não são princípios de opressão; para que não venham me argumentar que aqueles homens têm uma força muito grande. Se esta força é para sustentar as suas ideias, então é porque não querem estar unidos com Portugal; e se não querem desliguem-sc; este é o direito de todos os brasileiros, e de todas as nações. [...]. É indecoroso às Cortes [...] deixar de decidir nesta matéria com o receio desta separação"25. Embota não se encontre registro no Diário das Cortes, várias versões historiográficas sobre este episódio atribuem a Fernandes Tomás uma frase final: "Adeus Sr. Brasil!". Ela foi dita, com certeza, mais à frente, quando os deputados do Brasil passaram a criticar o discurso do líder da revolução do Porto. Borges Carneiro respondeu a Tomás dizendo que todos na Comissão consideravam a proclamação "insolente, subversiva, anárquica, caluniosa e incitadora à desconfiança", mas preferiam esperar para oferecer "remédios" que sanassem as insatisfações. Depois de aplicados os "medicamentos", então se trataria de julgar os autores do texto. No dia seguinte, daria uma versão provocativa às reaçÕes no sul do Brasil: "A chegada dos decretos das Cortes ao Rio de Janeiro [...] pôs em grande agitação mais de duas mil autoridades e empregados públicos que se ocupavam, prevaricavam e roubavam naqueles empregos, nadando em poder e riqueza"26. Entre os deputados de Portugal não faltou quem lembrasse que as propostas repudiadas por São Paulo haviam sido aprovadas com a presença c concordância de deputados de algumas províncias do Ultramar. Os parlamentares do Brasil manifestaram-se, cm geral, favoravelmente ao adiamento. No entanto, vale destacar algumas argumentações. Muníz Tavares dizia aprovar o parecer só porque desejava a união sincera de Brasil e Portugal, pois caso contrário diria: "Legisladores, levai o ferro e o fogo à província de São Paulo"27. Borges de Barros, discordando do "ferro c fogo" c referindo-se à intervenção de Tomás, afirmou: "O adeus Sr. Brasil é o espírito da representação de
Ibidcm. IbUan. Ibidcm.
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São Paulo", e declarou que vinha para "tratar da união da família portuguesa, mantidos os seus direitos, e não para desunir"28. Vilela Barbosa defendeu a Junta de São Paulo, lembrando que seus integrantes haviam sido eleitos c que sua punição incendiaria a província. Referindo-sc ao discurso de Fernandes Tornas, afirmou que "perder o Brasil é perder a dignidade nacional"29. Somente Bueno, deputado de São Paulo recém-chegado, defendeu o conteúdo do Programa: "No Brasil adotaram-se as mesmas ideias que cm Portugal [...] no governo de São Paulo há erro c má aplicação de princípios, mas não intenção criminosa [...] ele quer que se conserve no Brasil um delegado do Poder Executivo, onde os povos tenham seu recurso [...] e quer o Príncipe, não um usurpador"30. Para ele, as expressões utilizadas no adendo eram indecorosas, mas os princípios poderiam ser verdadeiros. A província não estava representada quando a citada lei fora aprovada, daí a reivindicação de mudanças. Concluía, ressaltando que o texto estava endereçado ao príncipe e não era um documento público. Aprovou-se, finalmente, cm 26 de março, o pedido de adiamento feito pela Comissão por 92 votos contra 22, declarados nominalmente c que registram a discordância do grupo de Fernandes Tomás. O que cabe destacar aqui é que o Programa de São Paulo, associado ao adendo cujo conteúdo atacava dirctarncnte os deputados de Lisboa, nem sequer foi discutido integralmente. As atenções voltaram-se para a defesa das Cortes e, nesse sentido, os integracionistas receberam aigum apoio dos deputados do Nordeste. Por outro lado, à exceção do grupo de Fernandes Tomás, ninguém ousou punir os integrantes da Junta de São Paulo e arcar com os riscos das possíveis reações no sul do Brasil, especialmente depois do conhecimento da correspondência de D. Pedro que evidenciava as dificuldades de um acordo com essa parte do reino ulrramarino. A resolução de adiar o julgamento da Junta de São Paulo representou, então, mais uma derrota do grupo íntcgracionista de Fernandes Tomás, que vinha se somar àquela, mencionada anteriormente, quando se elaborou uma proposta conciliadora para a organização política das províncias de ultramar. Nessa fase dos trabalhos das Cortes, venciam as posições daqueles para quem a conservação da unidade do Império estava acima de qualquer outro
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interesse, como Borges Carneiro c Trigoso. Nas palavras deste último: "É preciso que este Congresso quando se dissolver possa dizer à nação portuguesa: nós quando nos reunimos achamos a nação unida, e quando nos separarmos a deixamos do mesmo modo"31. Borges Carneiro apostava na integração económica das partes da monarquia para garantir a sua unidade, como já citado anteriormente. Vejamos, então, como foram tratadas as relações comerciais entre os dois reinos. Já virnos que, em 10 de janeiro, as Cortes aprovaram um parecer que visava imprimir maior rapidez à elaboração dos novos vínculos económicos e administrativos a serem estabelecidos entre os dois reinos, considerando que esta era a forma acertada de dissipar os conflitos e acelerar a união entre as partes da nação. Como resultado do trabalho da Comissão Especial, nomeada desde o dia 8 de janeiro e composta por Pedro Rodrigues Bandeira, Luís Monteiro, Braamcamp, Alves do Rio c Luís Paulino, aprcsentou-sc em 15 de março um projeto de decreto "para fixar as relações comerciais entre Brasil e Portugal". Para a elaboração do projeto, a Comissão "principiou pedindo informações e a opinião da Comissão para o Melhoramento do Comércio estabelecida em Lisboa [...] composta de membros muito rcspcirávcis do comércio"32. Essa Comissão para o Melhoramento do Comércio fora uma das primeiras impulsionadas pelas Cortes. Criada ern fevereiro de 1821, já havia elaborado um parecer em agosto daquele ano que, evidentemente, criticava as condições de comércio estabelecidas desde 1808, pois teriam "embaraçado o progresso das fábricas e Marinha nacional". Propunha, então, uma série de medidas "com o fim de favorecer a indústria arruinada e decadente do Reino - Unido, c de restaurar a sua perdida navegação". Basicamente, pretendia-se proteger os produtos portugueses no mercado do Brasil da concorrência com os estrangeiros. Propunha-se a abolição dos impostos cobrados na saída dos produtos da "indústria mecânica c artes de Portugal" para o Brasil e os que pagavam na entrada dos portos brasileiros, bem como reservar ao comércio e à marinha de Portugal a melhor parte dos tráficos coloniais, recolocando as cidades do Porto e de Lisboa como entrepostos comerciais33. Em resumo, o documento feito pelos comerciantes de Lisboa visava fazer da monarquia lusa um mercado único, integrado c protegido do exterior. E
31 2a 19 30
Ibidem. Ibiáem. Ibidem.
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32 33
Ibidem. Ibidem, sessão de 15 de fevereiro de 1822. Melhoramento do comércio nesta Cidade de Lisboa, citado por Alexandre, Valerttim. Os sentidos do Império, aí., p. 630-1.
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esta foi a base para a confecção do projeto feito pela Comissão Especial das Cortes. Apresentado em 25 tópicos, estabelecia que: o comércio entre os remos seria considerado tal como o de províncias do mesmo reino e só permitido a navios de construção nacional; nestes casos, os produtos agrícolas e industriais seriam isentos de direitos de saída, pagando 1% para fiscalização; ouro c prata estavam livres de todos os direitos; dever-se-iam estabelecer o mais rapidamente possível a igualdade e a uniformidade de moedas e do sistema de medidas; proibir-se-ia a entrada, cm Portugal, de açúcar, tabaco, algodão, café, cacau, aguardente de cana ou mel, que não fossem do Brasil; inversamente, proibir-se-ia a entrada de vinho, vinagre, aguardente de yinho e sal, que não fossem de Portugal, em território brasileiro; seria fixado limite de preço para a entrada do arroz cm Portugal c azeite no Brasil; os produtos industriais de Portugal estariam livres de tributos no Brasil, e se neste existissem congéneres sujeitos a tributos, eles seriam aplicados aos produtos de Portugal (e reciprocamente para os produtos industriais brasileiros); os produtos estrangeiros pagariam iguais direitos em Portugal e no Brasil; estes produtos poderiam ser levados de uma província a outra sem nova tributação; os produtos saídos do Brasil cm navios estrangeiros seriam tributados: o algodão em 10%, todo o resto em 6%, e a aguardente permaneceria isenta de tributação; os mesmos produtos depositados cm Portugal c reexportados cm navio português pagariam 1%; a fiscalização seria feita pelas juntas provinciais; a descarga de produtos só seria admitida nos portos de livre entrada, onde haveria alfândega: Belém, São Luís, Fortaleza, Natal, Paraíba, Recite, Maceió, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Santos, Santa Catarina Rio Grande de São Pedro; o estabelecimento de outros portos só poderia ser feito pelas Cortes34. . O conjunto de propostas sobre as relações económicas entre as partes da nação portuguesa partia de princípios que contrariavam a proposta de organização política apresentada pela Junta de São Paulo. As províncias ultramarinas eram consideradas "províncias do mesmo remo" que as de Portugal e desaparecia a qualificação de reino do Brasil. Por outro lado, reforçava-se o papel das juntas provinciais, às quais se atribuía a função de fiscalizar e tributar as atividades comerciais. Como declarou Borges Carneiro, dever-se-ia conceder "grande liberdade" ao Brasil na organização política, tendo em vista "estabelecer boas relações comerciais com os povos ultramarinos, relações reciprocamente
úteis para todo o Reino Unido", pois aí estaria a "grande base da união"35. Ou, como disse Pereira do Carmo, também integrante do grupo moderado de Borges Carneiro, o "pacto social" não seria suficiente para "consolidar a indissolúvel união dos portugueses de ambos os hemisférios" c, por isso, seria necessário um "pacto comercial" que buscasse a harmonia dos interesses "pela complementaridade de produções"36. Esse grupo, que era maioria na Comissão, estava disposto a negociar a questão da autonomia na organização política e via nas relações económicas a questão fundamental a ser definida. Os integradonistas, derrotados na nova proposta de organização política, também não deram a tónica na elaboração da proposta para a organização da economia. As primeiras declarações dos deputados de Portugal, favoráveis à proposta, como as de Ferreira Borges e Alves do Rio, destacavam a insuficiência da marinha portuguesa para arcar com todo o transporte comercial, embora fosse necessário fortalecê-la para fazer "florescer a marinha militar". O conjunto de medidas aparecia, então, como defesa do mercado português e como um passo necessário para a defesa militar. Ressaltava a vulnerabilidade do reino de Portugal diante do controle dos mares exercido por outros países, que se expressava, também, na falta de defesa do território. Estava aí implícito o exemplo da Inglaterra, de que agora os representantes de Portugal se serviam como modelo para as novas relações económicas. Os ingleses, "apesar de sua Uberdade política c civil, haviam guardado o seu comércio", o que lhes teria atribuído o papel dominante na economia europeia, além da preponderância bélica. António Carlos recorreu à adaptação de importantes teorias económicas para justificar seu argumento: "O exemplo da Inglaterra, e outros que se apontaram, não provam nada, assim como não prova que o corpo forte cure cicatrizes. As nações são como os homens [...]. Se acaso lançarmos os olhos filosóficos sobre o adiantamento do espírito humano [...] viríamos a concluir o estado cm que se acham as nações, por se desviarem do verdadeiro trilho: e por consequência estes exemplos não provam nada"37. Propugnava que fosse enfocado o caso concreto, pois as teorias teriam sido formuladas em face do estado cm que se encontravam as nações, e a portuguesa "está reduzida ao último estado de marinha, e não pode prosperar porque tem os ingleses que lhe fazem sombra". Como existissem proprietários de navio em Portugal e no Brasil, dcvía-sc incentivar o íncremen-
35 }C 37
das Cortes Constituintes, sessão de 23 de março de 1822.
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Ibidem, sessíío de 31 de janeiro de 1822. Ibidcm, sessão de 4 de janeiro de 1822. Ibiclem, sessão de 2 de abril de 1822.
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to da frota, desde que respeitados os consumidores e os produtores, para que o lucro não viesse a ser somente dos que se responsabilizavam pelo comércio38. Seu raciocínio ficaria mais claro posteriormente, quando, depois de citar a prosperidade dos Estados Unidos como resultado do comércio sem entraves, completou: "[...] é regra: o comércio livre leva ao progresso [...]. O Brasil é exemplo da força destes princípios. Algumas de suas províncias, como a Bahia, que exportavam 25$ de caixas de açúcar, hoje exportam o dobro. Igual sorte teve a província de São Paulo [...]. E diminuiu-se o preço da mercadoria [...]. O decreto de 28/01/1808, infeliz para Portugal, foi o avesso para o Brasil"39. A teoria deveria guiar a prática, mas António Carlos não desejava a "livre introdução de navios nos portos. A segurança é antes do comércio. Precisamos de marinha para proteger o corpo lusitano espalhado nos quatro cantos do mundo e que a inibição da cabotagem crie esta marinha". O que ele propunha era a permissão da entrada de navios estrangeiros nos portos, desde que pagassem altos impostos''0. Em sua opinião, isso fortaleceria a frota portuguesa, a longo prazo, mas não paralisaria o comércio nem a produção, de ímediaco. Afetar a produção no Brasil certamente desagradaria muito os produtores agrícolas. Essa última referência era uma das grandes preocupações de Andrada, pois o estrangulamento do comércio no Brasil levaria à paralisação da produção agrícola. Fazendo referência aos vínculos da proposta com os comerciantes de Lisboa, argumentava que "não se poderia confundir o bem dos negociantes com o bem da nação" e que "todas as classes da sociedade não devem tributar para a mercantil", pois "quando sofre o comércio da nação há sempre particulares que engordam"41. Não se tratava, portanto, de atender às reivindicações dos comerciantes de Lisboa ern prejuízo da exportação e produção do Brasil. A ênfase de Borges Carneiro era outra: "Nada de teorias vãs", pois as restrições ao comércio existiam cm todas as nações c as que mais haviam florescido, como Franca, Inglaterra e Holanda, protegiam seus mercados. Em sua concepção, o "[...] comércio deve servir ao Estado. Hoje os portos do Brasil abertos ao rnundo vão fazer com que nossas fazendas não possam concorrer com as estrangeiras"42.
Ibidem. Ibidem, sessão de 9 de abril de 1822. 4" Ibidem. •" Ibidem.
Em outro momento, deixava claro que essa preponderância do Estado também se inspirava em um modelo: "Consideremos quanto medrou o comércio português com as restrições das leis do previdente Marquês de Pombal, muito semelhantes às do presente projeto de decreto"'13. Segundo ele, o tratado de 1808 havia arruinado o comércio de Portugal e favorecido somente algumas regiões brasileiras44. Assim, o liberal Borges Carneiro mostrava-se pombalino ao falar ern relações comerciais. Fernandes Tomás atuou de modo secundário na polémica. Argumentou favoravelmente ao artigo e contra os "pesados impostos" sugeridos por António Carlos. Buscando, também aqui, radicalizar a questão, via duas opções: "Ou abrem-se os portos aos estrangeiros ou não". O Brasil deveria construir navios, e passaria então a ter negociantes locais. A permissão de entrada a navios estrangeiros condicionada à cobrança de altos impostos levaria ao encarecimento do produto a ser pago pelo consumidor europeu'15. O último argumento de Borges Carneiro foi rebatido por António Carlos, sob alegação de que se deveria pensar para além dos interesses dos comerciantes: "O aumento dos frutos do comércio de urna região beneficia toda a nação". Certamente, a prosperidade do comércio nas regiões brasileiras baratearia os produtos a serem consumidos em Portugal. Cipriano Barata aduziu que a produção brasileira era enorme c não poderia restringír-se ao mercado português. Lino Coutinho, para quem "as nações que fizeram a doutrina do livre comércio não a praticam", tomava assim posição favorável à cobrança de altos impostos dos comerciantes estrangeiros e à retirada de encargos cobrados da atividade produtiva. Salientava um aspecto fundamental da proposta: os produtos do Brasil seriam encontrados nos portos de Portugal por preços iguais c ninguém atravessaria o Atlântico para procurá-los; seria necessário estabelecer urna forma de ressarcir as províncias de tal prejuízo. Borges de Barros alinhou-se com António Carlos: "[...] quisera que o projeto em discussão tão recheado de restrições, e exclusivos, fosse antes cheio de artigos sobre o melhoramento da nossa marinha. Segundo a minha maneira de pensar, e ideias de economia política recebidas, o maior bem que ao comércio fazer se pode é dar-lhe a maior liberdade, facilitar-lhe os transportes e defendê-lo do inimigo . Luís Paulino, que assinava o projeto, pronunciou-se a favor dele e enfati-
38
35
42
Ibidem.
14?
Ibidem. Ibidem. Ibidem.
Ibidem, sessão de 2 de abril de 1822.
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zou a necessidade de fortalecimento da frota, visando à defesa nacional. Vilela Barbosa o secundou, identificando os comerciantes estrangeiros a "agentes da especulação". Já o vigário Marcos António, depois de considerar que, conforme o próprio Adam Smith, a concorrência perfeita não existia e que os Estados Unidos dispensavam urna grande marinha por estarem distantes das guerras europeias, ponderava que "o sistema proibitivo seria desfavorável à riqueza nacional", requerendo a revisão dos alvarás que regulavam o comércio no Brasil desde 1808'17. * Nesse aspecto do projeto, portanto, António Carlos c os baianos Cipriano Barata, Lino Coutinho e Borges de Barros pensaram do mesmo modo. Os outros deputados da Bahia, porém, não tiveram a mesma postura. Luís Paulino defendeu a proposta e Marcos António procurou uma situação intermediária, pedindo a revisão dos tratados de 1808. E, por fim, o fluminense Vilela Barbosa concordou com a proposta da Comissão. Outro ponto de divergência nas Cortes residia nos artigos que determinavam a exclusividade de importação, em cada reíno, dos produtos abundantes no outro. Borges Carneiro discorreu sobre a necessidade de que o Brasil assegurasse consumidores; como não era o único país a oferecer produtos agrícolas, seria beneficiado pela garantia de consumo no mercado português. O deputado ressaltava que o Brasil estava sendo privilegiado no acordo, pois seu mercado era menor que o de Portugal. Caso os artigos não fossem aprovados, porém, Borges Carneiro insinuava uma ameaça de interdição na saída de escravos africanos das possessões portuguesas*48. Na mesma linha de raciocínio, Ferreira Borges ameaçava com a instalação de um "porto franco" em Lisboa, aproveitando a localidade privilegiada da cidade1*5. António Carlos respondeu que o Brasil sairia ganhando na competição com outros países produtores de géneros agrícolas, pois "por desgraça da humanidade o trabalho escravo é feito no Brasil mais barato que cm nenhuma parte". E concluía: "Limito-me a dizer que os géneros especificados no artigo 7 cm retorno do artigo 9 não sejam proibidos nem em um nem em outro país e sejam introduzidos livremente, mas que os nacionais sejam favorecidos50". O artigo foi aprovado, rnas em 29 de abril duas declarações de votos registravam a discordância quanto às regras de exclusividade previstas. Eram assinadas por Ferreira da Silva, Muniz Tavares, Araújo Lima, Assis Barbosa,
Ibidem.
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convocação de uma assembleia luso-brasiliensc, que, investida daquela porção de soberania, que essencialmente reside no povo deste grande e riquíssimo continente, constitua as bases sobre que se devam exigir a sua independência, que a natureza marcara e de que já estava de posse, c a sua união com codas as outras partes integrantes da grande família portuguesa, que cordialmente deseja [ . - . ] . A independência referida no texto é uma imposição da natureza que requeria uma porção de soberania dentro da monarquia lusa c não a afastava da família portuguesa. Somente cm agosto, após o não-reconhecímento da Constituinte no Brasil pelas Cortes de Lisboa, a articulação que envolvia o príncipe regente passaria a se referir a uma nação brasileira. Começava-se a organizar o Império independentemente de Portugal e era necessário localizar as bases sobre as quais seria fundamentado o poder do Estado. Como consequência, nascia nas reflexões dos assessores de D. Pedro uma nação independente da portuguesa. jjuantas nações?
cAíí/1
As diferences concepções sobre a organização nacional do Estado português levaram a utilizações distintas do termo nação nas Cortes portuguesas de 1821 a 1822. As divergências ocorreram entre os deputados do Brasil c de Portugal, mas também no interior das representações de cada reino. Entre as últimas, destacaram-se as propostas de Fernandes Tomás c Borges Carneiro. O primeiro,.expressão maior do nacionalismo português, 'pensava a nação integrada com base nas instâncias político-administrativas: como um corpo homogéneo e soberano, ela deveria ser representada no Estado sem fissuras. O segundo concebia-a como resultante da integração de mercados e atribuía ao Estado a tarefa de coordenar a complementaridade de interesses económicos entre as partes da Monarquia: o corpo homogéneo derivado de interesses comuns se expressaria no Estado a parcír de laços económicos. Esses depucados cinham, porém, importantes convergências. Eram revolucionários de 1820, embora rcfleeissern facetas divergentes do vintismo e expressassem o respeito ao soberano Congresso, que era herdeiro das Cortes tradicionais c representava a "vontade geral" da nação. Juntos haviam derrotado os parlamentares conservadores quando esses quiseram dar ao rei
70
"Decreto do Príncipe D. Pedro convocando uma asscmbléia-gcral constituinte c legislativa de depurados das províncias do Brasil" de 3 de junlio de 1822. /H .'Moraes, Alexandre José de Mello. Of. c/í., t. 2, p. l H.
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poder de veto sobre os trabalhos do Legislativo. Ambos expressavam, portanto, o movimento liberal e nacionalista que se ampliava desde l S15 c forjaram suas propostas contra a definição do Remo Unido. Contrapunham-se assim, ao esboço do império federativo I uso-brasileiro. O que unia as diferentes alas liberais de Portugal era o nacionalismo. A defesa da nação portuguesa contra as intervenções francesa c inglesa associava-se a um sentimento colonial invertido, em razão do estabelecimento da Corte no Rio de Janeiro. A nação pensada pelos vintistas não era, a princípio, luso-brasileira e, ancorada na história e na tradição, deveria ser proprietária í das possessões ultramarinas. Os habitantes do Brasil passaram a ser considerados parte da nação depois de adotadas as Bases Constitucionais de Cádis, mediante diversos acordos que buscavam conservar os domínios coloniais. No entanto, como parte de urna única nação, esses habitantes não poderiam ter privilégios sobre o território em que viviam, pois deveriam dividir com portugueses da Europa a propriedade de tais domínios. Por isso, para as diferentes concepções vintistas, a integração era indis-X pensávcl. Os portugueses do Brasil só poderiam ser aceitos se estivessem ligados aos de Portugal mediante vínculos político-adrninistratívos ou económicos, e impedidos de ter preponderância na Monarquia. Deveriam referendar as Bases da Constituição e associar-se à tradição da família portuguesa, reconhecendo sua origem em Poreugal e o papel de destaque da "Mãe-pátria". í Fernandes Tomás levou essa concepção ao limite quando afirmou que se os brasileiros não se quisessem submeter à "vontade geral" expressa nas Cortes, seria preferível o seu desligamento da monarquia lusa. Para o líder da -_ \J~J revolução do Porto, portanto, se a preservação dos domínios coloniais A-1" y chegasse a comprometer a soberania do Congresso, melhor seria perdê-los. es-f Assim, chegava à contradição básica do vintismo: a defesa liberal da sobera-j y nia da nação cm contraposição ao projeto do Império implementado ate j aquele momento c aos interesses criados nesse percurso. Para os liberais de Portugal, tratava-se de defender a nação portuguesa como um projeto político. Essa nação não era uma comunidade de indivíduos, mas a vontade geral de preservar uma tradição, expressa no Estado. .-• Tanto na concepção de Fernandes Tomás, quanto na de Borges Carneiro, ela seria representada por meio da organização política que conferia soberania ao Congresso c limitava o poder do monarca, sempre com objetivo de/ preservar essa tradição. A definição dos projetos vintistas como nacionalistas ( reside na sua proposição de defender a nação mediante organização política '' que lhe garantisse soberania e justificasse a soberania do Estado. A questão se põe de outra forma quando se refere aos deputados do Brasil.
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Os processos eleirorais para as Cortes expressaram, cm geral, a concordância com o regime constitucional de Lisboa. No entanto, rcfletiram realidades regionais bastante distintas. A adesão do Pará ocorreu de forma incondicional e exprimiu os vínculos diretos da província com o reino de Portugal. Os processos eleitorais do Nordeste, marcados pela experiência republicana de 1817, manifestaram difcrcnciadamente a oposição ao governo de D. João VI e seus representantes nas províncias nordestinas. Os deputados de São Paulo apoiavam o príncipe regente e defendiam Programa que visava à manutenção do Brasil como reino unido a Portugal. Os deputados do Pará, Maranhão c Rio de Janeiro agiram, na maior parte das discussões, de acordo com as propostas de integração feitas pelos repre|Scntantes de Portugal. As bancadas de Pernambuco, Bahia e São Paulo j aprcscnraram proposições divergentes. O aqui denominado "patriorismo" pernambucano significou, cm um primeiro momento, o alinhamento dos deputados da Província com o projeto integracionista de Fernandes Tomás, porque as reivindicações locais foram atendidas: o governador de Pernambuco foi desritufdo, aí formou-se uma junta de governo e se decidiu rever o funcionamento da companhia detentora do monopólio comercial na região. Mas os constituintes pernambucanos passaram, no entanto, a rnanifcsrar discordâncías com a linha geral do Congresso quando se decidiu o envio de tropas para sua província. Essa mudança coincidiu com o ingresso da bancada baiana no Congresso. O desejo de limitar os poderes do Rio de Janeiro passou a ser expresso abertamente e, da mesma forma, se buscava impedir o controle do governo de Lisboa sobre as províncias de ultramar. Propunha-se, então, a total autonomia das províncias, cuja vinculação com a nação portuguesa ocorreria por meio da representação nas Cortes Gerais e da submissão a um mesmo Executivo, exercido pela família de Bragança. O programa apresentado pelos deputados de São Paulo incorporou a defesa regional dos pernambucanos c baianos. O texto não se referia às relações entre as províncias do Brasil, centrando-se na definição dos dois reinos componentes da Monarquia. Foi no interior das discussões das Cortes que os deputados de São Paulo passaram a esclarecer suas posições sobre a autonomia provincial, completando o Programa redigido por José Bonifácio de Andrada e Silva. Assim, a proposta de manutenção do Reino Unido, assinada pela Junta paulista, passaria a ter carátcr explicitamente federativo, permitindo a negociação com os deputados da Bahia e Pernambuco. , Portanto, apesar das diferenças entre os deputados do Brasil, também é | possível verificar um ponto de convergência entre as bancadas de maior i destaque: a^defcsajja^autonomia^provincial^ Desse modo, opunham-se aos integracionismos de Portugal.
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A marca dos localismos, formados durante os séculos de colonização e t bem assinalados por Sérgio Buarque de Holanda, dava sentido às propostas l fcderalistas. A mesma marca moldara o Estado norte-americano e estivera) presente nos processos de formação das repúblicas sul-americanas. l A forma federativa de organização dos estados, recorrente no continente americano, parece, então corresponder aos localismos formados durante a colonização. Por vezes foi também utilizada como recurso de organização política em vários outros locais c épocas, também na Europa, quando surgiu a necessidade de reunir poderes locais díspares71. Ern todos os casos, no entanto, parece esboçar-se um ponto comum: a nação é entendida como idêntica ao Estado. Elajiada rjjais é dp_que_a. o^^njza_cãg_p^Hj:jcp-adrnm^rTa:tivade_diyersas "pátrias" ou de poderesjocais diversos^ A organização federativa das naçÕcíTnão procura íTmdamencação na - -V história ou na tradição, mas nas vantagens da associação nacional. No entanto, como todas as outras propostas de organização nacional, no início do século XIX, rerira a soberania do monarca, rransferindo-a para a nação. No caso do Brasil, a proposta do Império federativo feita pelos paulistas revela preocupações semelhantes. Ela foi amadurecida desde o final do século XVIII e Implementada a partir da transferência da Corte portuguesa para o Brasil. Ressalrou a unidade do rerritório brasileiro e, nas Cortes, a associação das partes cm torno de um representante da dinastia de Bragança. Referia-se a uma nação portuguesa e, posteriormente, à nação brasileira. Mas_o_pontp ^ central^da_|3roposta__ej_a a jnanutenção...do..p_r_ínc_ip_e1.jdepois^irnperadox, na.£> Ínstânciaj^_[Mdercentraltzador_dg Bjasil, e como na seguinf^derinição^O Império foi sendo instrumento para .conciliar realidades polídcas__c_adajy_e7.._ mais conflitantes c divergentes na vida interna do Estado", revelando a . "tendência ao crescimento progressivo do poder do imperador na política interna e às pressões expansionistas na política externa"72. Na proposta dos paulistas, o representante da família real deveria expressar a unidade das partes, agindo sobre elas, a partir de uma Assembéia Constituinte. A preocupação básica expressa nesse projeto era a unidade das províncias do reíno do Brasil. Ela era prioritária fosse diante das reivindicações de autonomia local, fosse diante dos anseios de transferência do poder da cabeça do Estado para o "corpo nacional".
Sobre a Espanha, convém citar o trabalho de Picrrc Vilar, no qual se encontra, ainda, um estudo sobre a utilização dos termos pátria c nação, na Espanha c na América, no período das independências. Ver Vilar, PLerre. Hidalgos, amotinados y gucrrilleros. Barcelona; Crítica, 1982. Bobbio, N.; Matteucci, N, & Pasquino, G. Dicionário de política. Brasília: Unb, 1986, p. 621-6.
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E difícil^ortanto^atribiur sentido nacionalista às propostas aprcscntadasnclos deputados do BrastL_ Baianos e pernambucanos defenderam suas "pátrias", mas não propuseram que cias se transformassem cm "corpos políticos" autónomos, pois acreditavam que deveriam fazer parte da nação portuguesa. Os paulistas apresentaram um programa de defesa do Reino Unido cm que o principal aspecto a ser ressaltado é a autoridade conferida ao príncipe regente, e não a soberania de qualquer "corpo nacional". E os deputados do Rio de Janeiro, Pará e Maranhão, entre outros, alinharam-se com os de Portugal na defesa da nação integrada portuguesa. De diferentes formas, os constituintes do Brasil manifestaram-se favoravelmente a uma única nação, soberana cm face das outras do mundo, e esta era a nação portuguesa. Todos a entendiam, porém, como idêntica ao Estado: reflexo dos acordos que a arte da política poderia realizar.
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A NOVA ATLÂNTIDA DE SPIX E MARTIUS Karen Macknow Lisboa 21x21 cm, 222 páginas, ISBN 85-271-0414-8
A autora perscruta o legado científico, literário e artístico que resulta da fascinante expedição de dois naturalistas bávaros que, a mando da Real Academia de Ciências de Munique, percorreram mais de 10.000 quilómetros de terras e águas do Brasil do início do séculçvXIX. .. . . . . . . ...$.._ -,.... o .-...--'•,_.. SBD/FFLCH/USP
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SEÇÃO DE: HISTÓRIA
TOMBO: 223404
AQUISIÇÃO: DOAÇÃO/ FAPESP PROÇ.98/02578-8 / N.F.N0 305971E/UNESP DATA : 05/07/02
PREÇO: RS 25,00
Disponível nas Melhores Livrarias LIVREIRO: SEU CANAL DE INFORMAÇÃO E CULTURA ' •
Editora Hucitec Ltda. Rua Gil Eanes, 713 — 04601 -042 São Paulo - SP, BRASIL
Tel.: 530-4532 — Fax: 530-5938 E-mail:/Juc/tec@rnand/c.com.br
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cm Lisboa. Desvenda dilemas de homens que, vivendo a crise do Império português, pensam cm várias possibilidades pani a nova constituição da nação. Portuguesa ou brasileira, ela deveria contemplar a intricada gama de interesses regionais consolidada nos séculos anteriores. Do debate entre esses parlamentares já se pode vislumbrar a proposta do Império brasileiro e a nação que ele formaria: uma associação de elites regionais, brancas e civilizadoras, reunida em corno de um herdeiro do trono português. A INDEPENDÊNCIA POLÍTICA DO BRASIL Fernando A. Novais Carlos Guilherme Mota 14x21 cm, 89 páginas, ISBN 85-271 -0321 -4
Os autores questionam neste livro o sentido e os limites históricos do processo de ruptura com a dominação colonial, situando-a nos marcos da Era das Revoluções. Tratam, na perspectiva de uma história de longa duração, da aceleração histórica que projetou o Brasil do Antigo Sistema Colonial — um sistema específico — para os quadros do imperialismo da Inglaterra.
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árcia Regina Berhel é doutora em História Económica pela Universidade de São Paulo e professora da Universidade Estadual Paulista—-Unesp — câmptis de Marília.
Disponível nas Melhores Livrarias LIVREIRO: SEU CANAL DE INFORMAÇÃO E CULTURA Editora Hucitec Ltda. Rua Gil Eanes, 713 — 04601 -042 São Paulo - SP, BRASIL TeL: 530-4532 — Fax: 530-5938 E-maíl: [email protected]
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