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Portuguese Pages 152 [192] Year 2008
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719 C374i Autor: Cauquelin, Anne · 1'ftulo: A invenção da paisagem . N.Cham.
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Ao detectar os sinais que se apresentam sob a idéia de paisagem - a preocupação ecológica, as abordagens distintas da natureza, do real e de sua imagem no mundo contemporâneo -, a autora sugere uma nova forma de pensar a arte e o homem ante as transformações tecnológicas e perceptivas que introdu-
zem outra maneira de perceber o fenômeno artístico: ''Tentei descrever, em A invenção da paisagem, [...] esse aprendizado da realidade do mundo por meio das experiências daqueles que nos cercam e Jegitimam para né>s sua presença, mostrando, paralelamente, o quanto esse tecido
de certezas é ao mesmo tempo frágil e resistente''.
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© 2000, Presscs Univcrsitaircs de Francc. O original desta obra foi publicado em francês com o título L:1nvention du paysage © 2007, Livraria Martins Pontes Editora Ltda., São Paulo, para a presente edição.
Publisher Coordenação editorial Produção editorial Tradução Preparação Revisão
Evandro Mendonça Martins Fontes Anna Dantes Aly11e Ai.uma Marcos Marcionilo Maria do Carmo Zaniní Eliane de Abreu Santoro Regina L. S. Teixeira
-Dados Internacionais de Catalogação n a Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Bras il)
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Cauquelin, Anne A invenção da paisagem J Anne Cauquelin; tradução Marcos Marcionilo. - São Paulo: Martins, 2007. (Coleção Todas as Artes)
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Título original: L'invention du paysage. ISBN 978-85-99102-53-4 1. Arte - Teoria 2. Natureza (Estética) 3. Paisagem na arte 4. Paisagem na literatura l. Título. IT. Série. 07-1485
CDD-111.85
Ín dices para catálogo s istemático: 1. Paisagem : Estética : Ontologia 111.85
Todos os direitos desta edição no Brasil reservados à Livraria M artins Fo1ites Editora Ltda. Av. Dr. Arnaldo, 2076 01255-000 São Paulo SP Brasil Tel. (11) 3116.0000 Fax (11) 3116.0101 info@n1a rtinseditora. con1.. hr
N.Cham.
719 C374i
Autor: Cauquelin, Anne Título: A invenção da paisagem. 8727384 286867 Ex.3 CAC
SUMÁRIO
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Prefácio à segunda edição francesa ............... ................................ 7
UM JARDIM TÃO PERFEITO .................................................. 17 AS FORMAS DE UMA GÊNESE ............................................ 33 1. A natureza ecônoma .................................................................. 44 2. Os jardins do ócio ...................................................................... 61
3. E isso . e" Bºi.z an c10............................ .................. ........................... 67 A
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4. A questão da pintura ................................................................. 76 PAISAGENS IMPLÍCITAS ...................................................... 101 1. Um artifício invisível ................................................................ 108
2. Grande obra e pequenas formas ............................................ 113 O JARDIM DAS METAMORFOSES .................................... 129 1. A paisagem pela janela ............................................................ 136 .. .. . . . . .. .. .. . . . . .. . . .. . . . . . . . . . .. . .. . 143 . . 2 • Os quatro elementos • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •
•
3. A prosa da paisagem .......... .. ·································· ·····...... .. .... 153 4. Jogo de estiJos ........................... ... .. .... .. ....... ·········· ·················· 164
PAISAGENS DE SEGUNDA NATUREZA ............ ..... ......... 175 1."Visão dos anjos, talvez o cimo das árvores ... " .... ................... 177 2. A doadora............ ........ .......................... .. .. .... .... ... ... .... • • • •• • •••••••
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Referências bibliográficas....................... ..................................... 192
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Este livrinho, que as Presses Universitaires de France agora reeditam, propunha-se, dez anos atrás [1990), mostrar de que maneira a paisagem fora per1sada e construída como o equivalente da natureza, no decurso de uma reflexão sobre o estatuto do análogon e no decurso de uma prática pictórica que, pouco a pouco, ia dando forma a nossas categorias cognitivas e, conseqüentemente, a nossas percepções espaciais. Desse modo, a natureza só podia ser percebida por n1eio de seu quadro; a perspectiva, apesar de artificial, torna\ a-se um dado de natureza, e as paisagens em st1a diversidade pare1
cia rn uma justa e poética representação do mundo. Rent1rtciar a essa ilusão me parecia i1ecessário, e por isso co111ecei a i11e dc~fazcr dessas construções tácitas ~1e\1.1s LlLtais fL1i c111l11.1lalia. No cntn11to, se alt1al111c11tc se Jd111itc t1ttc a iliéia de paisage1n e suu percepção depcnden1 da aprc'scntação que se fez delas na pin t11 ra de) ()citicrltc rll) séct1lo \ \', qt1e a paisagen1 só parece "natural" ao preço de un1 artifício perma-
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rc'"lta muito a fã~c r pa ra defender e dar continuidade él essa pcJsíçao e ampliar seu alcance até a época inteira, , . mente contemporanca, no propr10 mcJmento em que estªr-' cm fase de constituição abordagens sensi :elmente diferen tes da natureza, do real e de sua imagem. De fato, parece que a paisagem é continua mente confrontada com um essencialismo que a transforrra em um dado natural. Há algo como uma crença corrum em u~---.a naturalidade da paisagem, crença bem arraigada e cli:íc:~ de erradicar, mesmo sendo ela permarentemente de5:7'e;-tida por numerosas práticas. Antes mesm o de definir quais são essas práticas., ;>::-e11 cntc,
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ciso destacar um traço do mundo contemporâneo que se impõe fortemente: o de uma ampliação das esíeras cie a::vidade outrora limitadas, bem circunscritas .•.\ mesc:a dos territórios e a ausên cia de fronteiras entre os domínios são uma marca bem própria do conte mporâneo; a paisager:''" não foge a essa regra. Sua esfera se amplioit e oferece t:..m panorama bem mais vasto em apoio à tese construti\is:a· ela compreende noções como a de meio ambiente, co::l set:. cortejo de práticas, ao passo que as no\·as tecnologias a~ diovisuais propõem versões perceptuais inéditas ô.e paisagens ''outras''. Longe de essa ampliação relegar a paisage:--l a um segundo plano, ou de recobrir sua imagen1
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tensões dão a ver com muita preci ão o qt1a nto .:i paisa;e11
é fruto de um longo e paciente a~1re11di zad
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quanto ela depende de di,1ersos setores Lie ati,·i1..i.c1\.ie~ . \ ·ott
aqui me limitar à evocação de dt1(.1s espécies de ,1111pliação e a seu impacto sobre a noção e a prática lia pai agen1.
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formaram, ao mesmo tempo, em suas manifestações v isíveis e, simultaneamente, em sua constituição como arte, posso fazer as mesmas afirmações? Pinturas, escultura, fotografia, vídeo e trilhas sonoras compõem paisagens
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pro-
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mestiças, híbridas, nas quais o espectador se sente imerso. Imagens e sons digitais nos filmes e v ideogames, em consoles ou em play stations, os co-1~otv1 com filmadoras ou
webcams, a educação da visão e d a audição, d a co1npreen r11cs,
são das coisas e dos ví11culos que elas i11antê111 e11tre si, tu-
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do isso é atualme11te bem difcreritc do que era típico das ..., . gcraçoes anteriores.
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ANNE CAl.iQUEL11'~
Contudo, o interesse não é constatar isso de um modo qualquer (nostalgia ou triunfalismo), mas reconhecer que, se os conteúdos mudaram, a experiência do mundo passa sempre pelos mesmos caminhos: as paisagens digitais nas quais personagens heróicos evoluem (''a aventura na qual você é o herói''), o ambiente virtual no qual você adentra munido de capacete e luvas não são apenas elementos reais do mundo em que vivemos, mas, ainda por cima, desempenham sua função de aprendizado, assim como outrora a arte pictórica, determinando então um conjunto de valores ordenados em uma visão, ou seja: uma paisagem. A virada - tecnológica - , longe de destruir o ''valor paisagem'', ajuda, inversamente, a demonstrar seu estatuto: com efeito, a tecnologia evidencia a artificialidade de sua constituição como paisagem. Desse modo, a tecnologia põe a paisagem a salvo de um retorno a uma natureza da qual ela, a paisagem, seria o equivalente exato. O fato de em alguns filmes ser necessário muito trabalho (captação de imagens pela câmera, processamento em computador e digitalização, modelagem parcial e montagem, inclusão de cenas, colagem de diferentes técnicas de reprodução) para chegar a uma cena de paisagem que, segundo se pensa, seria possível ver naturalmente sem nada dessa tralha ... revela o trabalho que, sem saber, fazemos quando ''vemos" • uma pa1sagem .
E, não há dúvida, conviria seguir a via que a tecnologia abre no amontoado de n ossas crenças ''naturais'', para melhor penetrar seu enigma.
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UM JARDIM TÃO PERFEITO
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Havia uma luz dourada que ilumina,·a a ,·ila. \·inda do oeste (ela se mesclava com um \·erde, um , ·erde-mar, se é que isso é possível), e em sua maneira oblíqua de alongar penosamente as sombras, torna''ª todas as coisas frágeis como uma última tarde de \rerão, ou como o últi-
mo verao. ' vezes, também, a presença de um animal estranho As suspende o correr tão familiar do tempo, que não tardaria a retomar seu curso, a não ser que, por uma espécie de esquecimento estúpido, arriscássemos ,·irar muito bruscamente a página do livro, ou que uma pala\-ra deslocada
viesse romper o silêncio. A casa, cujas janelas esta,·an1 entreaberta_ apre_sa\·ase a fruir esse brilho amarelo ante de er1trar
110
son1~rio
outubro ou na 11oite, quando, por u111a it1\· rsão de pareis seria ela, a casa, que projetaria a luz d '" alàL _obre o gramado, luz tão n1elancólica qL1ant a do oe~ te 11orén1 n1ais
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A JNVI N('ÀO DA P/\JS/\GEM
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E, de repente, lá cslél a paisagem. Será que ela apare-
cerin scr11 essa abertura, quando o sonho desliza da noite parn a claridade ínfima do dia? Essa dobra, essa imposição silenciosa a ser tomada como única e verídica paisagem no instante dessa aparição, teriam elas atuado para produzir a percepção de tais ou quais paisagens, sob ta] luz, en1 tal momento? Bastaria remeter-se à imagem do jardin1 tão perfeito descrito por minha mãe? Seria ele justamente o paradigma de todas as construções que depois passei a chamar de "paisagens''? , E certo que, ao escutar o relato do sonho de jardim materno, senti tratar-se de um quadro, disposto com arte e fechado pela moldura - as árvores, o muro do fundo, o horizonte que se percebe pela cor do ar. Evidente que esse quadro era a figura perfeita da natureza, tal qual a per-
sforo nen-
os pintores preferidos de minha mãe. Pois teria sido ine-
les/ e
xato atribuir essa imagem, com o ensinamento que pare-
1cem
cia acompanhá-la, a uma pessoa singular e singularmente
fica -
)rtas
011s-
cebíamos em sua aparência amável e tal qual a entregavam
original, mesmo sendo ela minha mãe. Pois havia também, dobrada no sonho de minha mãe, uma visão impressionista (como o jardim de Claude 110net, de Renoir) que contribuía para modelar seu paradigma. Uma cultura completamente literária, que percorre11do
•
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a produção romanesca de Proust a Giraudoux, passando por
te111
Virginia Woolf, trazia consigo algu1nas i1nagens pacíficas a bela vida - e sugeria todo
u111
aparato doméstico co1n o
ritual dos passatempos regrados de ltn1a vez por todas. O
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ANNE CAUQlJELIN
horário das cinco da tarde, parece-me agora, não tinha sido escolhido em vão ou apenas por causa da luz dourada, 0 sonho também fora educado: cinco horas era o instante ern que podíamos nos per1nitir ter prazer, ler, sonhar, atividades proibidas nas p1·imeiras horas do dia. O sonho não infringia as obrigações, respeitava sua letra. E, mesmo que à época eu não tenha me dado perfeitamente conta do poder de inforr11ação (de forn1ação) contido no relato sob a forma ''luz de cinco horas da tarde'~ atribuindo-o a sua única e melancólica beleza, devo confessar que essa pausa ritual das cinco horas ainda cadencia o tempo para mim, como uma respiração repentinamente tornada possível.
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do e vras, jardi1 lecid da ir.
reza sage da e• o rn
Ao mesmo tempo impressionista e clássico: eu podia decifrá-lo com facilidade e também percebia muito facil-
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mente que o sonho de minha mãe não era nada de extraor-
ma1
dinário, a projeção de um gosto fabricado ou a marca de certa cultura, de uma norma. Tratava-se do que era ''preci-
sag cor
so'' amar sob pena de retroceder. E que, aliás, realmente se
na
amava, aderindo-se aos modos do tempo com tocante boa vontade. A paisagem impressionista estava dada e em harmonia com o gosto declarado por Cézanne e, em geral, por toda pintura. Apenas Cézanne não dava espaço a sonhos de jardim, assim como os Poussin, Lorrain e os clássicos por demais afastados da vida tal con10 ela era i111agirlada e
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desejada para que representassem outra coisa alén1 :.te l1111 depósito de cultura para pessoas ''ct1ltas''.
pois, necessário uLin1itir qL1e, se et1 \'ia toda paisagem se constituir por n1eio do 1110Liclo-tela Lio so11ho de Seria,
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26 mos nos banhar na \lcrdade do mundo tal qual ele se =-' O;\
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presos a arrnad1lha cr)ntn I' ..!mp avarn(>S 11,1c) L1111a exterioridade, como acreditávamos . , mas nossas próprias cor1struçõec; intelectuais. Acreditando sair de r1ós mesmos inediantc um êxtase providencial, estávamos n1uito simplesmente admirados com nossos próprios modos de ver. lr1.17 - :..4.1.
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o percurso que tracei nessa tloresta ue:
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o caminho imperioso dos saberes in1F:i(it s J_s :~~:::-..: ~ ~3
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