A Grande Mentira: Expondo as Raízes Nazistas da Esquerda 9788585034139

Qual é a “grande mentira” da esquerda? Que os conservadores são fascistas. Até mesmo, nazistas. Mas, na verdade, essa m

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Portuguese Pages [289] Year 2019

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Table of contents :
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Dedicatória
1 - O Retorno dos Nazistas
2 - Falsificando a História
3 - A Jornada de Mussolini
4 - Um Segredo do Partido Democrata
5 - Os Racistas Originais
6 - Pessoas Descartáveis
7 - Führers Americanos
8 - Políticas de Intimidação
9 - Desnazificação
Referências Bibliográficas
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A Grande Mentira: Expondo as Raízes Nazistas da Esquerda
 9788585034139

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Copyright © Dinesh D’Souza 1997 Publicado originalmente em inglês sob o título: The Big Lie: Exposing the Nazi Roots of the American Left 1a edição 2019 ISBN: 978-85-85034-13-9 Tradução: Elmer Pires Revisão da Tradução: Cesare Turazzi Revisão Geral: Cesare Turazzi e Ulisses Teles Capa e Diagramação: Haas Comunicação Versão eBook: Livro em Pixel

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Flávia de Melo – Bibliotecária – CRB 8 8881) ___________ C999g D´Souza, Dinash 1961 A grande mentira: expondo as raízes nazistas da esquerda / Dinash D ´Souza ; [tradução: Elmer Pires]. - São Paulo: Trinitas, 2019. Tradução de: The big lie: exposing the Nazi roots of the American Left. Bibliografia: p. 263-[296] ISBN 9788585034139 (ebook) 1. Partido Democrata (Estados Unidos) 2. Liberalismo (Estados Unidos) 3. Direita e esquerda (ciência política) 4. Facismo (Estados Unidos) 5. Cultura Política (Estados Unidos). I. Título CDD: 320.513 ___________

Editora Trinitas LTDA São Paulo, SP www.editoratrinitas.com.br

Dedico à minha esposa, Debbie

Uma vida inteira não é o suficiente

Capítulo Um

O Retorno dos Nazistas Embora pareça estar morto, o fascismo pode ressurgir de diferentes formas.1 Walter Laqueur, Fascism: Past, Present, Future [Fascismo: Passado, Presente e Futuro]

Alguns dos casos mais interessantes de Sigmund Freud envolveram pessoas que faziam coisas ruins, más ou destrutivas e depois jogavam a culpa nos outros. Tais casos são, agora, padrão na literatura da psicologia. Hoje em dia, os psicólogos já estão familiarizados com pacientes que, apresentando comportamentos egoístas e viciosos, atribuem suas próprias características ao psicólogo que os assiste. Também são muito comuns, no decorrer da terapia, pacientes que, havendo apresentado hostilidade mórbida contra os próprios pais ou irmãos, apresentam hostilidade mórbida contra o próprio terapeuta. Seguindo um termo criado por Freud, os psicólogos a esse fenômeno chamam de “transferência”. A transferência, cuja injusta tarefa é a de culpar e responsabilizar, é, obviamente, uma forma de mentira. Um caso especial de transferência consiste em “culpar a vítima”. Na literatura relevante da psicologia, aquele que comete algo terrível não deixa a culpa em si mesmo, mas, impressionantemente, culpa a vítima da ofensa. Por exemplo, assassinos em série que alvejam prostitutas podem conceber que elas, na verdade, merecem ser estupradas e assassinadas. “Aquela mulher era uma prostituta. Ela sabia que isso iria acontecer”. Pensar assim possibilita o agressor a considerar-se um anjo da vingança, um instrumento da justiça. Ted Bundy é um bom exemplo para esse tipo de caso. Quando jovem, Bundy foi rejeitado por uma mulher, uma mulher morena. A partir de então, ele alimentou um ódio intenso por aquela mulher, pois ela o fez sentir-se

inferior e inútil. Ted então passou a buscar por morenas jovens em câmpus universitários com o objetivo de raptá-las e assassiná-las, depositando nelas a raiva que sentia e as responsabilizando por aquilo que outra mulher cometeu uma vez. Na mente de Bundy, ele próprio havia sido rejeitado injustamente e transformado numa vítima; daí, por causa de um processo pervertido de deslocamento, ele imputava tal alcunha sobre as mulheres que matava.2 O processo de culpabilizar a vítima é, sim, uma mentira, mas vem a ser uma mentira de categoria especial. Normalmente, a mentira é uma distorção da verdade. Isso se aplica à transferência no sentido geral do termo: as qualidades do paciente são transferidas ao terapeuta. Mas quando o perpetrador culpa a vítima, ele faz mais do que culpar uma parte inocente: ele culpa precisamente a parte que ele mesmo está prejudicando diretamente. Culpabilizar a vítima envolve trocar a posição do criminoso pela da vítima: o bandido transforma-se no mocinho e o mocinho torna-se o bandido. Isso é mais do que uma distorção da verdade; é uma inversão dela. É uma grande, uma grande mentira. A grande mentira é um termo frequentemente atribuído a Adolf Hitler. Hitler supostamente o usava para descrever a propaganda nazista. Em sua autobiografia, Mein Kampf, Hitler contrasta a grande mentira com mentiras pequenas ou ordinárias. “A grande massa”, ele escreve, “torna-se vítima da grande mentira com maior facilidade do que vítima de uma mentira menor, visto que o próprio povo mente acerca das pequenas coisas, mas sentiria vergonha de cometer mentiras de maior proporção. A maioria jamais conceberá uma mentira de tamanha gravidade, e nunca será capaz de acreditar que seja possível imputar a terceiros desaforo tão monstruoso e deturpação tão infame”.3 No entanto, Hitler não está se referindo às grandes mentiras que ele mesmo cometia. Ao invés disso, Hitler faz referência às mentiras alegadamente propagadas pelos judeus. Os judeus, Hitler diz, são os mestres da grande mentira. Agora, importa reconhecer que o Mein Kampf é uma incansável repetição de calúnias e difamações contra os judeus. Eles são acusados de tudo, desde de serem capitalistas a bolcheviques; de serem impotentes a cobiçarem mulheres nórdicas, de culturalmente insignificantes a aspirantes ao domínio mundial. As acusações são contraditórias, não podem ser

simultaneamente verdadeiras. E, ao mesmo tempo que mente sobre os judeus e conspira pela destruição desse povo, Hitler os acusa de mentirosos e de serem aqueles que maquinam a destruição da Alemanha. Hitler emprega a grande mentira enquanto desaprova o seu uso. Ele se retrata como uma pessoa franca e atribui a mentira àqueles sobre quem está mentindo — os judeus. Pode haver um caso mais patológico de transferência e, mais especificamente, de culpabilização da vítima? A grande mentira está de volta, e agora diz respeito ao papel do nazismo e do fascismo na política americana. A esquerda política — apoiada pelos principais meios de comunicação do Partido Democrata — insiste em dizer que Donald Trump é uma versão americana de Hitler ou de Mussolini. O GOP [Partido Republicano dos EUA], dizem eles, é a nova encarnação do Partido Nazista. Essas acusações tornam-se, por quaisquer meios necessários, a base e a racionalização da tentativa de destruir Trump e seus aliados. A “cartada fascista” também é usada a fim de intimidar conservadores e republicanos, para que estes renunciem Trump por medo de serem marcados e manchados. No fim das contas, o nazismo é a forma de ódio irrevogável e o associar-se a ele, o crime de ódio definitivo. Neste livro viro a mesa contra a esquerda democrata e provo que eles — e não Trump — são os verdadeiros fascistas. São eles que usam as táticas de ameaça e opressão nazistas e subscrevem a uma ideologia completamente fascista. As acusações que fazem contra Trump e o GOP são, na verdade, aplicáveis a eles próprios. Aqueles que se autodeclaram oponentes do ódio, são estes os verdadeiros praticantes das políticas de ódio. Por meio de um processo de transferência, os esquerdistas culpam a vítima de ser e fazer o que eles próprios são e fazem. Numa inversão doentia, os verdadeiros fascistas da política americana disfarçam-se de antifascistas e acusam os verdadeiros antifascistas de fascistas.

A Cartada Racial Este é um tópico sobre o qual nunca antes escrevi. Em duas ocasiões, uma vez em 1976 e, novamente, em 1980, Reagan associou, sem cerimônias, o Partido Democrata ao fascismo. A mídia entrou naquele alvoroço já

previsível, sugerindo que, mais uma vez, o velho vaqueiro estava tagarelando. “Reagan Ainda Acredita que Alguém do New Deal Defenda o Fascismo” era o título da matéria no Washington Post.4 Quando Reagan fez suas declarações, eu não tinha ideia do que ele queria dizer. Mas ele sabia. Ele cresceu na década de 1930. Ele estava lá. Ele viu as afinidades entre o fascismo e o New Deal, afinidades sobre as quais falarei melhor em um capítulo mais adiante. Somente agora, décadas depois, compreendo o que Reagan quis dizer. Gostaria de que ele pudesse ter lido este meu livro; Reagan veria que, ao invés de ser culpado de inverdade ou exagero, foi culpado de cometer um enorme eufemismo. Mas, na época, tanto eu como a maioria dos meus companheiros republicanos e conservadores éramos vítimas do paradigma progressista, embebidos em todas as essas instituições culturais, desde a academia a Hollywood, de Hollywood à mídia. Nesse caso, a história que havíamos aceitado, feito otários, era que o fascismo e o nazismo são ideias inerentes “à direita”. A esquerda é realmente boa no inventar e disseminar esses paradigmas. Quando um deles cai, eles simplesmente buscam outro. Em meu livro anterior e também no documentário Hillary’s America, desafio um outro poderoso paradigma esquerdista, o paradigma de que os progressistas e os democratas são o partido da emancipação, da igualdade e dos direitos civis. Demonstrei que, no entanto, em vez disso, eles são o partido da escravidão e da remoção indígena, da segregação e do Jim Crow, do terrorismo racial e da Ku Klux Klan, o partido da oposição ao movimento dos direitos civis da década de 1960. Meu objetivo foi tirar a cartada racial dos democratas — uma jogada que vem surtindo efeito contra os republicanos por toda uma geração. É impressionante o fato de os democratas terem recebido todo o crédito pelo movimento dos direitos civis, sendo que foram os republicanos que os conquistaram, ainda mais por que a oposição a esses direitos veio praticamente toda do Partido Democrata. Os democratas acusam os republicanos — o partido da emancipação e da oposição à segregação, à intolerância e à supremacia branca — de ser o partido da intolerância e da supremacia branca.

Bom, falemos sobre o termo transferência. Essa foi minha introdução à política estratégica da esquerda de transferir a prática do racismo ao partido que vem, no decorrer da História, opondo-se ao racismo em todas as suas formas e vertentes. Os democratas foram tão bem-sucedidos neste golpe que, em 2005, o presidente do Comitê Nacional Republicano, Ken Mehlman, saiu por aí pedindo desculpas a grupos negros por pecados cometidos não pelos republicanos, mas pelos democratas.5 Igualmente espantoso, os democratas nunca admitiram seu histórico racista, nunca assumiram a responsabilidade pelo que fizeram, nunca se desculparam, jamais restituíram um centavo por seus crimes. O que mais me intrigou foi como alguém consegue se safar com tão grande mentira. A resposta é entender como é imperativo dominar todos os grandes porta-vozes da cultura, desde a academia ao cinema, do cinema aos principais meios de comunicação. Com esse arsenal cultural à disposição, grandes mentirosos podem, confiantes, espalhar mentiras e certos de que mais ninguém terá porta-vozes tão grandes a ponto de desafiá-los. Eles conseguem ter suas mentiras ensinadas nas salas de aula, transformadas em filmes e em programas de TV, e enfaticamente distribuídas nos veículos de comunicação do cotidiano público, tudo como a mais pura verdade. É assim que grandes mentiras tornam-se amplamente aceitas, às vezes até mesmo por aqueles que são os próprios alvos das mentiras. Hillary’s America foi recebido com afronta pela esquerda, mas ninguém pôde refutar um único fato do livro ou do documentário. Até mesmo as alegações mais incriminadoras que apresentei provaram ser invulneráveis. Acusei que, em 1860, ano anterior à Guerra Civil, nenhum republicano possuía escravos; todos os quatro milhões de escravos naquela época estavam sob posse democrata. Agora, tamanha generalização poderia ser facilmente refutada com uma simples lista de republicanos detentores de escravos. A esquerda não pôde fazê-lo. Houve certo pesquisador assíduo que, finalmente, pretendeu contestar-me com um único contraexemplo. Ele indicou que Ulysses S. Grant certa feita herdou um escravo da família de sua esposa. Tolerei o argumento, mas o lembrei de que, naquela época, Ulysses S. Grant não era republicano. Temendo não ter resposta substancial para o Hillary’s America, os

principais meios de comunicação entraram numa negação completa. Quem tivesse somente assistido às grandes redes de TV e aos canais abertos, ou ouvido a Rádio Pública Nacional, não faria nem ideia de que o Hillary’s America existe. O livro estava em primeiro lugar na lista dos livros mais vendidos do New York Times, e a filmagem foi o documentário de maior bilheteria do ano. Ambos densos e repletos de materiais diretamente relevantes para o debate eleitoral em curso, no entanto completamente ignorados pela imprensa, totalmente a favor de Hillary. Apesar das manifestações fracassadas e da negação generalizada, o livro e o documentário surtiram efeito. Muitos consideram que ambos tanto motivaram os republicanos quanto persuadiram os hesitantes, ajudando Trump a alcançar a Casa Branca. Não tenho ideia de como medir tamanhos efeitos, mas sei que meu livro e meu documentário ajudaram a moldar a narrativa eleitoral, expondo Hillary como a criminosa que é e os democratas como seus cúmplices, todos culpados de um longo histórico de intolerância e exploração. Pela primeira vez, nas eleições de 2016, os democratas não conseguiram se servir da cartada racial e sair impunes. Mesmo após as eleições, e por consequência do livro e do documentário, agora será ainda mais difícil para os democratas lançarem mão da cartada racial. Eles tentaram, por um breve momento, suspender a nomeação de Jeff Sessions como procurador-geral de Trump. A acusação seria de que ele teria dito coisas racistas há algumas décadas. Sim, mas e quanto ao democrata Robert Byrd, conhecido como a “consciência do Senado”? Décadas atrás, era ele um líder da Ku Klux Klan. Mesmo assim, os Clintons e os Obamas o louvaram quando veio a óbito, em 2010. Os democratas descobriram, para própria consternação, que sua cartada racial passou a ser então um fracasso. Ela não funcionava mais. A festa acabou. Então, agora, os democratas passaram da grande cartada racial, que não mais funciona, para o seu maior trunfo: a cartada nazista. É claro que eles não abandonaram a cartada racial, afinal o racismo era intrínseco ao nazismo. Hitler, com seu ódio incansável pelos judeus — ódio baseado não no que fizeram ou mesmo na religião, mas simplesmente por sua identidade racial e biológica —, é o racista definitivo. Consequentemente, os democratas não esperam apenas sustentar a

alegação nazista contra Trump e o GOP, mas também esperam recuperar a cartada racial com nova roupagem. Como antes, meu objetivo é fazer com esse novo paradigma, o nazista, o que meu livro anterior fez com a antiga narrativa racial, ou seja, destruí-lo por completo. Aqui, refuto a falsa narrativa deles, exponho sua grande mentira e prendo o rabo nazista exatamente onde ele deve ficar — no burro democrata.

Reductio Ad Hitlerum Os temas nazismo e fascismo devem ser abordados com o maior cuidado, não só por envolverem sofrimento e perda de um grande número de vidas, mas também porque os termos em si têm sofrido abusos e sido deturpados sôfrega e promiscuamente em nossa cultura. Não posso melhor ilustrar essa realidade do que com a reação de várias personagens de Hollywood perante a eleição e posse de Trump. “Eu sinto Hitler andando pelas ruas”, disse a atriz Ashley Judd. O cantor John Legend afirmou que a retórica “nível Hitler” de Trump poderia transformar a América na Alemanha nazista. De acordo com um tuíte feito por RuPaul, em 8 de novembro de 2016, “a América ganhou uma gigante suástica tatuada na testa”. A atriz Meryl Streep disse que sua crítica a Trump produziu uma resposta “aterrorizante”. “Isso prepara você para todo tipo de ataques e exércitos dos camisas pardas [...] e você só pode fazer isso se você sente que deve fazer [...] Você não tem muita opção”.6 Essa é Streep fazendo sua melhor cópia de Dietrich Bonhoeffer. No entanto, exatamente de que forma esses tais de camisas pardas a estavam atacando? Acontece que esses ataques foram feitos no Twitter e em outras mídias sociais. Ninguém a espancou de verdade. Os verdadeiros camisas pardas já o teriam feito. Da mesma forma, RuPaul bem provavelmente sabe que, na Alemanha nazista, um drag queen como ele teria sido enviado para algum campo de concentração e morto por eutanásia. Se ele realmente acreditasse que a América havia se transformado na Alemanha nazista, o que se esperaria senão sua saída imediata do país? De alguma forma, RuPaul sabe, assim como todos nós sabemos, que ele está perfeitamente seguro aqui. Alguns conservadores permanecem tranquilos enquanto a esquerda rotula Trump de fascista. O historiador Victor Davis Hanson recorda, perplexo, que

Ronald Reagan e George W. Bush foram ambos, em algum dado momento, ligados pela esquerda a Hitler. Daniel Greenfield devolveu a analogia de Hitler para Goldwater e Nixon em seu artigo na FrontPage Magazine intitulado “Todo Presidenciável Republicano é Hitler”. Um outro livro meu, The End of Racism [O Fim do Racismo], perturbou tanto David Nicholson, do The Washington Post, que ele chegou a ouvir “o pesado marchar de coturnos, embora taciturnos e distantes, ainda se aproximando constantemente”.7 Esses exemplos confirmam o ponto de Hanson, de que comparar uma coisa aos nazistas geralmente não significa nada a não ser representar aquilo que a esquerda desaprova vigorosamente. Estudiosos têm se queixado de que termos como ‘nazista’ e ‘fascista’ praticamente perderam significado na cultura popular. Há muitos anos, o filósofo Leo Strauss, ele próprio refugiado da Alemanha nazista, lamentou por aquilo que chamou de Reductio ad Hitlerum, com isso pretendendo expressar a tendência de querer refutar aquilo que desaprova associando-o a Hitler. O raciocínio é o seguinte: Hitler não gostava de arte moderna, então a crítica à arte moderna é um mal reminiscente dos nazistas. Hitler detestava o comunismo, portanto os anticomunistas continuam seguindo o método de Hitler. Tudo isso, lembrou Strauss, não passa de pura tolice. Na Califórnia, onde a pura tolice abunda, ouve-se falar da “dieta nazi”, do “saudável nazi” e dos “surfistas nazi”. Nesses casos, o nazismo parece tomar uma acepção positiva, indicando compromisso rigoroso. O historiador Anthony James Gregor, um dos principais estudioso do fascismo italiano, diz que o fascismo é comumente atribuído a pessoas declaradamente cristãs, pessoas que buscam por tributações menores, que se opõem a regulamentações governamentais abusivas, que se mostram céticas quanto ao aquecimento global e que parecem indiferentes ao destino das espécies ameaçadas de extinção. “Infelizmente”, ele escreve, “o termo fascismo foi dilatado a ponto de seu uso cognitivo tornar-se mais do que suspeito”.8 Mas a acusação de fascismo e nazismo contra Trump e os republicanos não pode ser tão facilmente descartada. Na verdade, ela não está na mesma categoria que o emprego metafórico, os tropos desdenhosos comparando Reagan a Hitler ou Bush a Hitler. Em primeiro lugar, a acusação contemporânea está bem mais generalizada. Tanto antes quanto depois das

eleições, a analogia nazista não foi apenas um escárnio, mas também foi empregada como descrição. A analogia é, agora, a estrutura central da cobertura sobre Trump dada pela mídia, pela academia e por outros meios, da imigração à política externa e ao comércio, tudo está agrupado sob essa mesma bandeira. Para o escritor Chris Hedges, a presidência de Trump é “o ensaio geral para o fascismo”, significando, provavelmente, que o fascismo, ainda embora não esteja presente, está prestes a se apresentar. Na mesma linha, Ben Cohen viu em Trump “os primeiros passos de um Estado fascista”. Deepak Malhotra insiste na revista Fortune que Trump representa “o espectro do fascismo domiciliar”. Andrew Sullivan advertiu na revista The New Republic que Trump “destruiu o Partido Republicano e criou, em seu lugar, o que parece ser um partido neofascista”. Aaron Weinberg, do HuffPost, diagnosticou o “engatinhar vagaroso do fascismo de Hitler”. Escrevendo para o Salon, o historiador Fedja Buric procurou criticar mudando um pouco o tom, insistindo que “Trump não é Hitler; Trump é Mussolini”. A âncora da MSNBC, Rachel Maddow, revelou que “eu tenho lido muito sobre como era na época quando Hitler se tornou chanceler [...] porque acho possível ser onde estamos agora”. O jurista Juan Cole exclamou o resultado das eleições com a seguinte frase: “Como os EUA se tornaram fascistas”. Ken Burns, cineasta e produtor de documentários, denominou Trump como “fascístico” e “hitleresco”. A reação mais exagerada veio de Sunsara Taylor, ativista de um grupo chamado Refuse Fascism [Rejeite o Fascismo]; ela apareceu no programa de Tucker Carlson para comentar sobre Trump, dizendo que “ele é mais perigoso do que Hitler jamais teria sido”.9 Como segundo ponto, a acusação de fascismo e nazismo é endossada pelos principais personagens do Partido Democrata. O candidato à presidência Martin O’Malley, um democrata, acusou Trump de carregar um “apelo fascista bem para dentro da Casa Branca”. Fazendo menção a Trump, Bernie Sanders invocou parentes que morreram no Holocausto como resultado de “um lunático [...] despertando o ódio racial”. Invocando a memória sombria dos “piores déspotas da História”, a senadora Elizabeth Warren insistiu que Trump representa uma “séria ameaça”.10 Ainda que Obama e Hillary não tenham jogado a cartada fascista ou nazista, ambos não se afastaram dela nem

a repudiaram, assim como nenhuma outra autoridade do Partido Democrata. Afinal, como eles poderiam rejeitá-la? Este é, agora, o lema da oposição por parte da esquerda democrata contra Trump. Em terceiro lugar, alguns líderes estrangeiros parecem já ter aceitado que Trump seja fascista, talvez até nazista. Na Grã-Bretanha, o político do Partido Trabalhista Dennis Skinner advertiu que, se permanecesse em aliança com a América na sequência das eleições de Trump, seu país estaria caminhando “de mãos dadas” com um fascista. No Canadá, o líder do Novo Partido Democrata, Tom Mulcair, usou o rótulo fascista para descrever a proibição temporária de viagens promulgada por Trump. Dois ex-presidentes mexicanos, Enrique Calderon e Vicente Fox, compararam Trump a Hitler, e Fox declarou que o discurso de Trump durante a convenção republicana fez com que ele se lembrasse de “Hitler discursando ao Partido Nazista”. Esses comentários dão confirmação internacional ao que a esquerda americana diz aqui; e alguns deles poderiam até mesmo causar implicações para as relações diplomáticas dos Estados Unidos.11 Em quarto lugar, alguns dos principais republicanos e conservadores ecoaram a acusação da esquerda. Durante um evento filantrópico, o excandidato do Partido Republicano ao cargo de governador, Meg Whitman, comparou Trump a Hitler e a Mussolini. A ex-governadora republicana de Nova Jersey, Christine Todd Whitman, disse o seguinte acerca das máximas da campanha de Trump: “Esse é o tipo de retórica que permitiu Hitler avançar”. Escrevendo para o jornal New York Times, Ross Douthat, uma vez colunista conservador, concluiu que Trump é um “protofascista”. Robert Kagan, historiador neoconservador, não se deu nenhuma reserva. “É assim que o fascismo vem para a América”. Após as eleições, o senador John McCain, candidato à presidência do Partido Republicano em 2008, disse, a respeito da crítica de Trump à mídia, que foi dessa forma que os ditadores do século XX surgiram.12 Trata-se de um padrão sem precedentes. Quando várias pessoas do seu próprio partido dizem que você é um fascista, isso faz com que você realmente pareça um fascista. A esquerda mobiliza uma pilha de especialistas em apoio à equação de que Trump e o GOP estão ao lado do fascismo e do nazismo. A revista Slate entrevistou Robert Paxton, importante historiador do fascismo, sobre os

paralelos entre Trump, de um lado, e Mussolini e Hitler, de outro. Bill Maher deu a deixa para o historiador Timothy Snyder, que vinculou a ascensão de Trump à ascensão de Hitler. “No meu mundo, de onde venho, estamos na década de 1930”. O biógrafo de Hitler, Ian Kershaw, defendeu a mesma posição num jornal britânico. “Os paralelos ao sombrio período entreguerras não devem ser negligenciados”. E o historiador Ron Rosenbaum, autor do livro Explaining Hitler [Explicando Hitler], explicou que Trump chegou ao poder com “visões e perspectivas extraídas de um livro escrito em alemão. Esse livro é o Mein Kampf”.13 Por fim, a acusação de fascismo contra Trump não é um elemento a ser jogado fora; a esquerda apresenta uma infinidade de razões para apoiar tal acusação. O historiador John McNeill fez chegar ao Washington Post a alcunha sobre Trump dos “11 atributos do fascismo”. Escrevendo para o site Alternet, Kali Holloway declarou: “É assustador como Trump se enquadra perfeitamente no famoso guia dos 14 pontos para identificar líderes fascistas”.14 Dessa vez a esquerda e os democratas parecem confiantes de que poderão fazer o rótulo fascista pegar, de modo a desacreditar permanentemente Trump e aqueles que o apoiam.

“Ele Não é o Nosso Presidente” O que me interessa aqui não são os motivos para a esquerda comparar Trump com os fascistas e os nazistas — lidarei com essas motivações no próximo capítulo —, mas o que eles pretendem alcançar com essas comparações. Evidentemente, a esquerda tem o objetivo de tornar a presidência de Trump ilegítima. Essa noção — de que, mesmo tendo vencido honesta e diretamente, Trump, de alguma forma, não merece ser presidente — foi propagada pela primeira vez, inclusive, antes das eleições. Hillary e Obama nunca trataram Trump como um candidato legítimo. Uma vez que Trump foi eleito, a esquerda democrata lançou uma cruzada sem precedentes a fim de impedir que ele tomasse posse. Ela exigiu a recontagem de votos, o que é razoável quando as margens entre os candidatos são muito próximas, como aconteceu na eleição de 2000 entre Bush e Gore. No caso de Trump, as margens atingiram um patamar significativo em todos os sentidos mais cruciais. Houve uma ou duas recontagens, e Trump acabou

ganhando mais alguns votos. Depois a esquerda procurou desacreditar a vitória de Trump ao destacar que Hillary ganhou por voto popular. Novamente, é algo que soa estranho, uma vez que as eleições nos EUA não são decididas pelo voto popular. O sistema político americano é projetado para gerar equilíbrio entre a representação individual e a representação estadual. O objetivo é impedir que grandes estados monopolizem o poder. Por conseguinte, o Colégio Eleitoral dá aos estados maiores mais eleitores, mas garante que os estados menores também tenham influência eleitoral suficiente a ponto de fazer a diferença. Não é imprescindível decifrar as regras precisas do sistema. O ponto principal é que este é um sistema democrático e estas são as regras do jogo acordadas já de longa data. A esse respeito, as regras do Colégio Eleitoral são como as regras de uma partida de tênis, que é decidida não por pontos, mas por sets. Fará sentido se, em uma partida com pontuação final de 6–4, 6–4, 0–6, 1–6, 6–4, o perdedor, embora tenha vencido apenas dois sets de cinco, for premiado por ter feito dois pontos a mais que o vencedor na pontuação geral? É absurdo. Trump prevaleceu pelas regras do jogo, e sua vitória mantém-se claramente inalterada, mesmo perante a observação de que Hillary teria vencido sob algum outro conjunto de regras. Em seguida, a esquerda procurou pressionar diretamente os eleitores a não escolherem Trump no Colégio Eleitoral. Estes relataram opressão, assédio, e até ameaças. Embora a maior parte da situação fosse puro desespero — e os esforços finalmente falharam —, Peter Beinart teceu argumentos complexos para o Atlantic Monthly sobre por que “o colegiado eleitoral deveria proibir à presidência homens feito Trump”. Não importa o que tenham decidido, Beinart insistiu que os eleitores deveriam votar contra Trump, alegando ser ele um “demagogo irresponsável” e que sua vitória criou uma “emergência nacional”.15 Finalmente, a esquerda procurou desacreditar a eleição alegando que os russos a fraudaram. Eles a fraudaram, supostamente, ao invadir o servidor particular de Hillary. Nunca houve provas disso. E por que os russos prefeririam Trump a Hillary? Havendo tomado posse, uma das primeiras decisões de Trump foi lançar um ataque militar contra a Síria, aliada da

Rússia. Então, o próprio conceito de que os russos pesaram a balança a favor de Trump faz pouco sentido. Mas, mesmo que os russos tivessem invadido o servidor de Hillary, não foram eles que escolheram Trump no lugar dela. Ao contrário, os eleitores americanos o fizeram. Portanto, a despeito de qual seja a evidência que os russos possam ter descoberto, no fim das contas foi o povo americano quem determinou seu valor. Foi o povo americano quem julgou tal evidência suficientemente incriminatória, a ponto de dispensar Hillary. Desde que Trump demitiu o diretor do FBI, James Comey, a esquerda — que havia criticado o papel de Comey nas eleições — ficou extremamente exasperada, gerando uma tempestade tão furiosa de acusações que o exdiretor do FBI, Robert Mueller, foi nomeado conselheiro especial para investigar o possível conluio entre a equipe de Trump e a Rússia. Enquanto a responsabilidade de Mueller era descobrir objetivamente os fatos, a agenda sem disfarces da esquerda era usar o inquérito para impedir o desempenho de Trump, aumentar a pressão a fim de acontecer a impugnação de mandato, e (se tudo corresse de acordo com o plano) forçar sua renúncia. Enquanto tudo isso acontecia, eu coçava a cabeça pensando no esforço desesperado da esquerda para suprimir o resultado válido de uma eleição livre. Então percebi que Mussolini e Hitler também chegaram ao poder através de um processo legal — ou ao menos quase legal. Nem Mussolini nem Hitler armaram um golpe. Os camisas negras marcharam em Roma sob uma atmosfera de caos e Mussolini foi convidado pelo rei Victor Emmanuel III a formar um novo governo. Embora nunca tenha obtido maioria popular de eleitores alemães, Hitler era o cabeça do maior partido na Alemanha de 1933 quando feito chanceler pelo presidente Paul von Hindenburg. Algumas semanas depois, o parlamento alemão, o Reichstag, aprovou a Lei de Concessão de Plenos Poderes, o que essencialmente transferia seu poder a Hitler. Em outras palavras, a democracia preparou o caminho para que esses déspotas tomassem o poder. Consequentemente, para os esquerdistas que veem Trump no mesmo caminho de Hitler e Mussolini, a vitória eleitoral não justifica um fascista ou nazista americano ascendendo ao poder.

Agora, cabe dizer que, quando um grande partido político basicamente rejeita o resultado de uma eleição livre, nos encontramos em território inexplorado. Isso já aconteceu uma vez nos Estados Unidos, é claro, em 1860, quando o mesmo partido, o dos democratas, recusou-se a aceitar a eleição de Abraham Lincoln. O desfecho se deu em uma guerra civil sangrenta. Desde Lincoln, então, nenhum presidente americano enfrentou maior resistência à legitimidade do que Trump. Mesmo assim, apesar de algumas discussões vagas sobre a Califórnia deixar a União, a América não está enfrentando um sério movimento de secessão do tipo que se desenvolveu no Sul, em 1860–1861. O que estamos vendo, ao contrário, é a desconfiança do próprio processo democrático por parte daqueles que perderam as eleições de 2016. Do ponto de vista deles, como a democracia poderia ter produzido um resultado tão assustador, tão contrário à razão? Quase setenta legisladores democratas recusaram-se a participar da posse de Trump, uma violação da etiqueta democrática sem precedentes, atitude que teria provocado grande indignação na mídia, caso os republicanos tivessem o feito, por exemplo, com Bill Clinton ou com Barack Obama. Presidente há apenas algumas semanas, mesmo antes de Trump ter feito qualquer coisa que pudesse ser considerada remotamente inconstitucional, Maxine Waters e Tulsi Gabbard, duas representantes do Congresso Democrata, levantaram a questão da impugnação do mandato. O colunista Richard Cohen chegou a sugerir a necessidade de um “golpe constitucional” — basicamente, uma assembleia de oficiais eleitos que, segundo Cohen, têm a autoridade para retirar do cargo um presidente que eles consideram “incapaz de cumprir os poderes e deveres de seu cargo”.16 Ainda mais escandaloso, uma ex-funcionária do Departamento de Defesa do período Obama, Rosa Brooks, levantou a possibilidade de os militares dos EUA se recusarem a obedecer às ordens de Trump e, talvez, até de o expulsarem do cargo. Se Trump ordenasse que os militares fizessem algo que os generais julgassem insano, disse Brooks, então eles deveriam recusar-se a obedecer. E, caso Trump insistisse, Brooks deu a entender, eles deveriam livrar-se dele por meio do golpe militar. Argumento semelhante havia sido desenvolvido antes das eleições no Los Angeles Times por James Kirchick,

da Iniciativa de Política Externa [Foreign Policy Initiative]. Kirchick concluiu seu artigo dizendo: “Trump não é apenas impróprio à presidência, mas um perigo para a América e para o mundo. Os eleitores precisam detê-lo antes que os militares o façam”.17 Embora raramente explícitos, houve também pedidos de assassinato. Pouco depois de Trump tomar posse do mandato presidencial, a jornalista britânica Monisha Rajesh escreveu: “Já é hora de um assassinato presidencial”. Lars Maischak, historiador da Universidade Estadual de Fresno, escreveu em seu twitter: “Para a democracia americana ser salva, Trump deve ser enforcado”. Durante a Marcha das Mulheres em Washington, D.C., a cantora Madonna vociferou: “Sim, estou com raiva. Sim, estou indignada. E, sim, eu pensei muito em explodir a Casa Branca”. A comediante Kathy Griffin publicou explicitamente uma foto sua com a imagem de Trump ensanguentado e decapitado, resultando em uma tempestade de protestos que a obrigou a pedir desculpas. O rapper Snoop Dogg lançou em vídeo uma música chamada “Lavender”, na qual ele aponta uma arma de fogo para a cabeça de um palhaço vestido de Trump e puxa o gatilho, mostrando, na sequência, uma bandeira vermelha e branca em que está escrito BANG. Outro rapper, Big Sean, falou de assassinar Trump com um furador de gelo.18 É difícil saber o quanto levar isso tudo a sério, mas é possível imaginar a reação que viria à tona se alguém falasse dessa maneira contra o antecessor de Trump, Obama. Uma desconfiança do processo democrático semelhante a essa foi fundamental na ascensão fascista ao poder na Itália dos anos 1920 e na ascensão nazista na Alemanha no início dos anos 1930. Aliás, é importante notar que se trata do antigo fascismo e do antigo nazismo. Hoje, quando se pensa em Mussolini ou em Hitler, se pensa em termos da Segunda Guerra Mundial. É impossível pensar sobre o nazismo, por exemplo, sem pensar também no Holocausto. Contudo, é claro, não foi assim que os italianos ou os alemães experimentaram pela primeira vez os fascistas e os nazistas. Ninguém está dizendo que Trump hoje é o Hitler circa 1945. Trump não iniciou uma guerra mundial nem anexou ou invadiu outros países; ele, inclusive, certamente não exterminou seis milhões de judeus. Esta não é a base da crítica progressista por parte dos democratas contra Trump. Ao invés disso, eles o comparam a Mussolini e Hitler antes da guerra, alertando que, se

fora de controle, ele pode acabar fazendo coisas horríveis exatamente como esses dois homens acabaram por fazer. Porém, no início dos anos 1920 e dos anos 1930, eram os fascistas e os nazistas que desprezavam a democracia parlamentar, cujas regras lhes eram incontornáveis e, no modo de pensar fascista e nazista, impraticáveis. Estes foram partidos que declararam líderes democraticamente eleitos como ilegítimos e apoiaram abertamente estratégias que tinham o objetivo de expulsá-los do poder. Então, quem está fazendo isso na América? Não é o Trump. Pelo contrário, são os democratas progressistas que continuam a questionar a validade da presidência de Trump. São os progressistas que, hoje, recusam-se a aceitar os resultados dos procedimentos e regras eleitorais. Eles são os que reagem, como fizeram os fascistas e os nazistas, contra o que julgam ser um sistema democrático defeituoso. Depois, há a questão da violência. Como todos os estudiosos do fascismo e do nazismo sabem, os fascistas e os nazistas gloriavam-se dela. Mas eles não estavam sozinhos: seus rivais políticos, os socialistas e os comunistas, também acreditavam na violência. Naturalmente, essa era uma receita para banhos de sangue nas ruas. Os primeiros dias do fascismo e do nazismo presenciaram confrontos rotineiros entre os grupos políticos rivais. Na Itália, os camisas negras de Mussolini chegaram a lutar corpo a corpo contra os socialistas. Muitas pessoas foram mortas nessas guerras de rua. Hitler descreve, em sua obra Mein Kampf, como seus camisas pardas chegavam a encontros políticos, geralmente realizados em bares e cervejarias, munidos de bastões e porretes. Os comunistas podem nos superar em número, ele escreve, mas, para barrarem nossas reuniões, eles terão de nos matar. No relato de Hitler, há chuvas de golpes e combatentes caindo no chão, e lá ele permanece, prosseguindo com seu discurso, recusando-se a ser intimidado pelo caos que o cerca.19 Esses confrontos do início do fascismo e do nazismo me fazem lembrar dos confrontos entre os seguidores da esquerda e os partidários de Trump durante a campanha. Com isso, não apenas quero dizer que estes são uma reminiscência daqueles. Quero dizer, porém, que os manifestantes contra Trump se veem como que batalhando uma batalha antifascista. Seus cartazes

comparam Trump a Hitler e a Mussolini. Um retrato padrão é Trump com o bigode de Hitler; outro é uma representação de Trump paralelo a Mussolini. Os manifestantes autodenominam-se antifascistas, ou, abreviando, Antifas. O período eleitoral foi dominado por confrontos acalorados, às vezes violentos. Curiosamente, todos ocorreram durante os comícios de Trump; não houve incidentes durante os comícios de Hillary. Em dada ocasião, Trump teve de cancelar um comício em Chicago, pois nem mesmo a polícia conseguiu controlar o caos. Em San José, os esquerdistas atacaram os apoiadores de Trump com ovos, gerando embates enérgicos, inclusive empurra-empurra e pancadaria. Embora esse tipo de coisa tenha sido comum na Itália e na Alemanha durante o início do século XX, não se via algo assim na política norte-americana desde os acessos frenéticos da década de 1960. O próprio Trump parecia impaciente com os desordeiros. Certa vez, ele falou de um manifestante: “Eu gostaria de dar um soco na cara desse sujeito”. Para outro, ele disse: “Nos velhos tempos, eles o arrancariam daqui bem depressa”. Trump já se ofereceu a pagar os honorários de eleitores que tomassem parte contra os manifestantes. No entanto, nenhuma vez Trump pediu que eles perturbassem os comícios de Hillary. Em geral, sua posição era: “Temos manifestantes que são sujos. Eles são realmente perigosos, eles entram aqui e começam a bater em todo mundo”. Quando um grupo de manifestantes latinos tentou interromper o comício que Trump realizava em Miami, ele disse à multidão: “Vocês podem tirá-los daqui, mas não os machuquem”.20 Mais tarde, um grupo chamado Project Veritas lançou evidências gravadas em vídeo de que a campanha de Hillary e os grupos esquerdistas haviam pagado manifestantes para provocar violência nos comícios de Trump. Ainda assim, os principais meios de comunicação culpam Trump pela violência. O argumento parecia ser o de que, mesmo quando a esquerda dá início à confusão, a violência seria uma resposta natural e justificável à retórica incendiária de Trump. A mídia retratou os baderneiros da Antifa como opositores heróicos tentando barrar a ascensão do nazismo na América. Quero, agora, concentrar-me na violência pós-eleitoral, uma vez que é algo bastante incomum na América. Afinal, a eleição acabou e o presidente está

eleito. Houve, entretanto, protestos e perturbações maciças nos eventos referentes à posse presidencial. Esses protestos foram organizados por uma miscelânea, mélange, de grupos, dos quais o mais proeminente parecia ser um chamado Refuse Fascism. De acordo com um dos seus panfletos, “É o caráter fascista do regime de Trump/Pence que o torna ilegítimo e um perigo à humanidade”. O chamado do grupo à resistência foi assinado pelo ator Ed Asner, pelo ativista Bill Ayers, pelas comediantes Margaret Cho e Rosie O’Donnell, pela autora Alice Walker, entre outros.21 A polícia se preparou para uma semana de tumultos por ocasião da posse, e ela estava certa em precaver-se. O problema começou na DeploraBall, uma reunião independente organizada por Mike Cernovich, partidário de Trump e acusado de ser da “direita alternativa” (alt-right). Centenas de manifestantes se reuniram do lado de fora, gritando “escória nazista” e levantando placas nas quais estava escrito “Alt-Reich” [“Reich Alternativo”], enquanto os convidados entravam. Dois homens, um com uma máscara de Hitler e outro com uma máscara de Mussolini, levantaram placas que diziam: “Trump é da Direita Alternativa”. Quando os partidários de Trump gritaram em resposta aos manifestantes, sobreveio o tumulto, os manifestantes começaram a jogar garrafas nos participantes da DeploraBall e nos policiais.22 A posse oficial de Trump, por si, provocou reações muito mais tormentosas vindas da esquerda. Manifestantes, trajados de preto e muitos usando máscaras, arremessaram pedras, tijolos e pedaços de concreto, quebrando vitrines, inclusive a de um McDonald’s, de um Bank of America e de um Starbucks no centro da cidade. Usando latas de lixo e caixas de jornais, eles atearam fogo no meio da rua, viraram carros e os incendiaram. Membros do movimento Black Lives Matter acorrentaram-se a cercas em pontos de controle de segurança, forçando o Serviço Secreto a interditá-los. Com helicópteros sobrevoando a região, a polícia usou sprays de contenção e granadas de atordoamento para conter os manifestantes. No entanto, quando um SUV da polícia tentou dispersar a multidão, os manifestantes atiraram pedras, quebrando a janela traseira do veículo. Ativistas da esquerda se chocaram contra os policiais, que finalmente os dispersaram com spray de pimenta. Mais de duzentas pessoas foram presas. Curioso dizer, onze delas eram jornalistas, que estavam lá supostamente atuando como mídia, mas

aparentemente também participando dos tumultos.23 Simultaneamente, centenas de manifestantes mascarados apareceram na Universidade da Califórnia, em Berkeley, para impedir que um partidário de Trump, Milo Yiannopoulos, fizesse seu discurso. Eles derrubaram barricadas policiais, quebraram janelas, depredaram caixas eletrônicos e atacaram a polícia com fogos de artifício. Eles estavam acompanhados de outras várias centenas de manifestantes, estudantes e esquerdistas da grande Bay Area, carregando placas com frases como “É GUERRA”. O grupo que organizou o protesto foi chamado de By Any Means Necessary [Faça o que for Necessário], e se posicionou como uma organização antifascista. Os manifestantes divulgaram uma declaração dizendo que estavam lutando para impedir que “um grande fascista na ativa” invadisse seu câmpus. “Vamos ser claros: Milo Yiannopoulos não está buscando a liberdade de expressão. Ele está conscientemente liderando a nazificação da Universidade Americana”.24 Na realidade, convenhamos, Yiannopoulos é um provocador, é um comediante e conservador. Ele também é gay e extravagante, que se autodeclara uma “bicha perigosa” e chama Trump de “papaizinho”. Ao mesmo tempo que ataca o islã por suprimir cruelmente mulheres e homossexuais, ele não tem associação nenhuma com o fascismo ou o nazismo. Só posso imaginar como ele se encaixaria na Alemanha de Hitler. Mas não importa, do ponto de vista da oposição, Milo era o nazista e eles estavam protegendo sua comunidade do nazismo. Os manifestantes não tinham a intenção de um proceder pacífico. O objetivo claro era manter Milo do lado de fora. A polícia não pôde lidar com uma manifestação de tamanha proporção, então o evento foi cancelado. Observando os manifestantes com suas roupas pretas, de rostos cobertos, alguns deles brandindo pedaços de pau e bastões, não pude deixar de pensar nos camisas negras italianos e nos camisas pardas nazistas desfilando pelas ruas com seus capacetes, bastões, socos ingleses e correntes. A atmosfera surrealista de Berkeley refletiu, em certo sentido, o surrealismo que caracterizou a política americana desde o início do período eleitoral. Eis, portanto, a ironia. Os manifestantes de Berkeley, assim como os manifestantes contra Trump em D.C., declararam-se antifascistas. Porém, é o

lado deles que impôs censura ao impedir que determinado palestrante discursasse num câmpus universitário. Foram eles também que, mesmo indo contra a lei, impediram aqueles que apoiavam Trump de participar dos eventos de posse. Enquanto os adeptos de Trump cuidam dos próprios afazeres, os esquerdistas só sabem confrontar, assediando-os, ameaçando-os, quebrando e queimando coisas, e se envolvendo em conflitos contra a polícia. Como, então, é que os supostos fascistas agem de forma visivelmente pacífica e legal enquanto os antifascistas se parecem mais com os fascistas a quem eles supostamente estão resistindo?

A Racionalização da Violência A princípio, pensava estar simplesmente testemunhando consequências chocantes de uma eleição chocante. A esquerda não esperava que Trump vencesse. Em 20 de outubro de 2016, a revista American Prospect publicou um artigo intitulado “Trump No Longer Really Running for President” [“Trump já não mais Concorre à Presidência”], cuja intenção era concluir que o “objetivo político real de Trump é tornar impossível o governo para Hillary Clinton”. O resultado das eleições foi, nas palavras do colunista David Brooks, “o maior choque de nossas vidas”.25 Trump venceu contra probabilidades praticamente insuperáveis, entre elas os grandes meios de comunicação que fizeram campanha aberta a favor de Hillary, além da guerra civil dentro do GOP com toda a ala intelectual do movimento conservador recusando-se a apoiá-lo. A princípio, interpretei a revolta impetuosa por parte da esquerda como uma reação atordoada e calorosa, porém momentânea, à maior vitória da história política dos Estados Unidos. Então, duas coisas me fizeram perceber que eu estava errado. Primeiro, a violência não desapareceu. Houve protestos violentos como o “Not My President’s Day” [“Dia de Dizer: Não é o meu Presidente”] por todo o país, em fevereiro; as violentas manifestações de 4 de março nos comícios de Trump na Califórnia, Minnesota, Tennessee e Flórida; as manifestações de abril contra os impostos de Trump, todas supostamente destinadas a forçar Trump a revelar suas declarações de impostos; as manifestações próimpeachment de julho, buscando impulsionar a retirada de Trump do cargo; e as múltiplas, e convulsivas, manifestações em Berkeley.26

Em Portland, os esquerdistas arremessaram pedras, bolas de chumbo, latas de refrigerante, garrafas de vidro e dispositivos incendiários, tornando necessária a intervenção policial sob a chamada “Alerta, alerta, temos um motim”. Mais cedo, no Capitólio Estadual de Minnesota, alguns esquerdistas lançaram bombas de fumaça na multidão pró-Trump enquanto outros preparavam fogos de artifício dentro do prédio, fazendo com que pessoas fossem tomadas pelo medo de um ataque terrorista. No rol de detidos estava Linwood Kaine, filho do candidato à vice-presidência de Hillary, Tim Kaine.27 Mais do mesmo, sem dúvida, está guardado pela esquerda pelos próximos quatro anos. O que isso mostrou é que a esquerda esteve envolvida em violência premeditada; não uma violência ocasionada por surtos de fervor, mas uma violência como estratégia política. Muitos da esquerda justificaram a violência e defenderam o motivo por que a estavam causando. Como, então, em uma sociedade democrática, alguns cidadãos pensam ter o direito de calar outros eleitores e de interromper os resultados de uma eleição sob os ditames da democracia? De acordo com Jesse Benn, ao escrever para o HuffPost, Trump não passa de um fascista do século XXI. Além do mais, “Trump não existe em um vácuo. Ele é a consequência natural da ala republicana, que perdura em racismo [...] e do uso de imigrantes como bodes expiatórios”. A ascensão do fascismo, ele diz, não é um “típico desacordo político entre os partidários”. Historicamente falando, os fascistas só foram contidos por uma “insurreição impetuosa”. Acreditar de forma diferente, ele insiste, é “pôr em risco sua oposição e expor-se à cumplicidade com uma nova era da política fascista nos Estados Unidos”.28 Escrevendo para a Atlantic Monthly, Vann Newkirk insiste que “uma vez que as instituições democráticas não impediram a ascensão de Trump [...] por que as pessoas que ele pretende ludibriar e marginalizar deveriam confiar nas instituições democráticas para as proteger?”. A verdadeira agenda de Trump, argumenta Newkirk, é baseada na violência: a violência da construção do muro, a violência da deportação, a violência de manter as pessoas fora da América por causa de sua religião, a violência de “punir a mulher por abortar”. Por consequência, um voto em Trump significa “um voto a favor da

ampla disseminação da violência”. Diante de uma ameaça fascista à vida e à liberdade, os manifestantes não têm escolha senão usar de força para a própria defesa. A única maneira de cessar a violência é fazer com que Trump desista de sua agenda ou que seus defensores o substituam por “alguém menos virulento”.29 Escrevendo para a Nation, Natasha Lennard inicia com a premissa de que, porquanto Trump representa o fascismo, “é constitutivo ao fascismo exigir um tipo diferente de oposição”. Lennard argumenta que não faz sentido lutar contra o fascismo com argumentos; em vez deles, o fascismo só pode ser interrompido com o uso da força física, do mesmo tipo que foi usada pelas brigadas que combateram Franco na Espanha ou pelos grupos comunistas que lutaram contra os nazistas na década de 1920 e no início dos anos 1930. Os antifascistas, ela conclui, estão empenhados em impedir que os fascistas tenham voz: “a característica essencial do antifascismo é que ele não tolera o fascismo; não se trata de uma plataforma para debates”.30 Escrevendo para a Salon, ainda no período de campanha eleitoral, o ativista Chauncey DeVega começou por admitir que “numa democracia em funcionamento, a violência política deveria, quase sempre, ser condenada”. No entanto, neste caso, DeVega estaria disposto a fazer uma exceção, porque Trump é um “incendiário político” que, além disso, está “do lado errado da História”. Segundo DeVega, a violência da esquerda é “uma resposta às ameaças abertas e implícitas de danos físicos e outros prejuízos e males causados por Donald Trump e por aqueles que o apoiam contra imigrantes hispânicos sem documentação, americanos negros, outras pessoas de cor e muçulmanos”. Observe com cuidado a linguagem usada por DeVega: mesmo que os partidários de Trump não sejam de fato violentos, caso considerados “ameaças abertas ou implícitas”, a esquerda possui justificativas para usar de violência efetiva contra eles.31 Sentimentos como esse também ecoaram no artigo do ativista Kelly Hayes intitulado “No Welcome Mat for Fascism: Stop Whining About Trump’s Right to Free Speech” [Sem Tapete de Boas-Vindas para o Fascismo: Pare de Choramingar pelo Direito de Trump à Liberdade de Expressão].32 De fato, o argumento total de todos esses escritores pode ser resumido em uma única frase: “Não à liberdade de expressão para os fascistas”. Esta frase — percebe-

se — remonta à década de 1960, quando usada pela Nova Esquerda em protestos contra a Guerra do Vietnã. A inspiração para tal lema veio de um professor de Berkeley chamado Herbert Marcuse, boa parte das vezes esquecido em nossos dias, mas um guru para os radicais dos anos 1960; sua base argumentativa, porém, está agora no centro do debate político contemporâneo. Marcuse argumentou que a esquerda é o partido da tolerância, mas que a tolerância não é para todos: só para pessoas tolerantes. Na visão de Marcuse, a esquerda não deve ser tolerante com os intolerantes. As pessoas intolerantes, segundo ele, são basicamente fascistas. Elas se recusam a respeitar o processo democrático; assim, por que deveriam receber o respeito que recusam aos outros? Marcuse então argumenta que, em vez de tolerar esses fascistas de direita, a esquerda deveria reprimi-los, calá-los, e até mesmo espancá-los ou matá-los. Em essência, a esquerda deveria destruir o fascismo por todos os meios necessários, do contrário os fascistas os destruiriam. O argumento de Marcuse ecoa o próprio Hitler, que disse que ou os nazistas destruiriam os judeus ou os judeus destruiriam os nazistas. “Se eles vencerem”, escreve Hitler, “Deus nos ajude! Todavia, se nós vencermos, que Deus os ajude!”. Marcuse mesmo era um refugiado da Alemanha nazista. Ele também fugiu da brutalidade do nazismo. Mas, ao mesmo tempo, ele também viu a eficácia nazista em dispersar seus inimigos e levar o próprio povo alemão à submissão. Marcuse basicamente argumentava que, para derrotar o nazismo na América, seria preciso que a esquerda se valesse de táticas nazistas. Por táticas nazistas não me refiro apenas à violência de estudantes e ativistas irritados. Também me refiro ao que os nazistas chamaram de Gleichschaltung. O termo em si significa “coordenação”, “uniformização”, e refere-se ao esforço nazista de usar a intimidação em todas as instituições culturais da sociedade para que todos se alinhem às prioridades e à doutrina nazistas. Os progressistas na América estão usando seu predomínio — na verdade, seu total monopólio — na área acadêmica, no campo de Hollywood e nos meios de comunicação para impor seu próprio Gleichschaltung. Eles fazem isso não somente por meio da propaganda descarada e da

completa mentira que deixaria Joseph Goebbels orgulhoso, mas também através da batalha implacável e da exclusão forçada das vozes dissidentes de suas instituições culturais, de modo que a voz deles seja o único ponto de vista comunicado à grande maioria dos estudantes e cidadãos. Novamente, do ponto de vista da esquerda, tais intimidações e exclusões são justificadas porque é correto e adequado que os antifascistas usem de repressão contra aqueles que eles consideram fascistas. Todo esse modus operandi — que Marcuse chamou de “tolerância repressiva”, e que está encapsulado na doutrina não à liberdade de expressão para os fascistas — está, agora, no cerne de nosso debate político. Isso levanta duas perguntas importantes. Primeiro, é verdade que os fascistas não merecem ser ouvidos e é justificável negar-lhes direitos civis e constitucionais? Em segundo lugar — a pergunta mais importante —, é verdade que as pessoas que a esquerda chama de fascistas e nazistas são de fato fascistas e nazistas?

Os Verdadeiros Fascistas Essas são as perguntas que pretendo responder neste livro. A primeira pergunta eu deixo para o capítulo final, onde a respondo com um ressonante não. Irônico o bastante, os esquerdistas deveriam gostar da resposta que dou, pois basicamente estou dizendo é que não se pode privá-los de seus direitos civis e constitucionais. Eles são os verdadeiros fascistas, mas ainda assim merecem a plena proteção da constituição e da lei. E também concordo com o princípio de que os fascistas não podem ser combatidos do modo convencional. É preciso especial coragem para derrotar um movimento tão vicioso e perverso. O que se faz necessário para derrotar a esquerda é nada menos que a desnazificação, e no final deste livro mostro como isso pode ser feito. Meio que tendo dado a resposta, respondo agora à outra pergunta, mais abrangente e mais importante: quem são os verdadeiros fascistas da política americana? Essa pergunta raramente é feita de forma séria, e por isso quero dar crédito a dois importantes predecessores notáveis que já araram este solo. Primeiro, o economista Friedrich Hayek, cujo livro The Road to Serfdom [O

Caminho para a Sujeição], publicado pela primeira vez em 1944, fez a afirmação surpreendente de que democracias ocidentais sob o Estado do bem-estar social [Welfare State], tendo derrotado o fascismo, estavam se movendo inexoravelmente na direção fascista. Hayek identificou o fascismo como um fenômeno de esquerda, um primo do socialismo e do progressismo. E alertou: “O surgimento do fascismo e do nazismo não foi uma reação contra as tendências socialistas do período anterior, mas um resultado necessário dessas mesmas tendências”. Embora o livro de Hayek tenha sido escrito num tom pedante e medido, apelando aos progressistas que aprendessem de alguém que testemunhou experiencialmente a ascensão do fascismo na Europa, estudiosos progressistas, como, por exemplo, Herman Finer, puseram-se de imediato a criticar Hayek, acusando-o de exibir um “profundo desprezo hitleriano pelo homem democrático”.33 Se percebida nessa reação a tentativa progressista, que já soa familiar, de se apossar da cartada hitleriana e jogá-la de volta contra Hayek, então já há um vislumbre de como a grande mentira funciona. Aqui está Hayek argumentando como os progressistas estão se movendo em direção a Hitler; porém, sem responder à acusação, não propondo nenhuma evidência que lhes dê algum suporte, a esquerda se volta e acusa Hayek de ser feito Hitler. Jonah Goldberg recebeu praticamente o mesmo tratamento ao seu importante livro Liberal Fascism [Fascismo Liberal]. Goldberg argumenta: “O que chamamos de liberalismo — o edifício remodelado do progressismo americano — é, de fato, um descendente e uma manifestação do fascismo”. Goldberg argumenta que o fascismo e o comunismo, longe de serem opostos, são “concorrentes históricos intimamente relacionados para os mesmos constituintes”. Goldberg nomeia o progressismo de “movimento irmão do fascismo” não menos que o comunismo, o qual exibe uma “semelhança familiar que poucos admitem reconhecer”.34 Goldberg traça inúmeros paralelos entre o progressismo e o fascismo, deixando clara a longa lista esquerdista nas plataformas de Mussolini e de Hitler, para, em seguida, mostrar seu paralelo com o progressismo americano moderno. Goldberg consegue ir fundo, detectando até mesmo o odor do

fascismo nas políticas modernas de ambientalismo progressista, vegetarianismo, medicina holística e políticas pedagógicas. Embora às vezes exagere nas comparações que faz com o fascismo, seu livro vale muito a pena ser lido em virtude da originalidade e abrangência apresentadas. Pois então, mais uma vez, a esquerda, vingativa, colocou-se contra Goldberg, acusando-o de ser, sem contar todas as demais coisas, fascista. Hayek e Goldberg são o ponto de partida para o meu livro. Mas vou muito além e cavo em áreas de pesquisa intocadas por eles. Hayek, por exemplo, afirmou que o fascismo e o nazismo emergiram da esquerda, mas nunca explicou como isso aconteceu. Com base no trabalho de estudiosos como Anthony James Gregor, Renzo De Felice e Zeev Sternhell, conto a fascinante história de como o fascismo e o nazismo emergiram de um debate dentro do socialismo. O problema surgiu quando as profecias centrais do marxismo não se cumpriram. Foi em uma enorme crise que a esquerda caiu, e o marxismo basicamente dividiu-se em dois campos: o primeiro tornou-se o leninismo e o bolchevismo, o outro tornou-se o fascismo e o nazismo. Goldberg associa a esquerda americana ao fascismo, mas não se atreve a fazer ligação equivalente com o nazismo, provavelmente não querendo se arriscar a associar a esquerda com genocídios e campos de concentração. É daí que realmente começo com meu livro. Conforme Goldberg bem sabe, o fascismo e o nazismo são duas coisas diferentes. Hitler praticamente nunca referiu a si mesmo como fascista, e Mussolini nunca se autodenominou nazista ou nacional-socialista. Pretendo demonstrar que há conexões profundas não apenas entre a esquerda e o fascismo, mas também entre a esquerda e o nazismo. De certa forma, os democratas progressistas estão ainda mais próximos dos nazistas alemães do que dos fascistas italianos. Os fascistas italianos, por exemplo, eram muito menos racistas do que o Partido Democrata nos Estados Unidos. Não existem, referindo-se à Itália, paralelos para o terrorismo racial disfarçado do Ku Klux Klan, que também era apoiado pelo Partido Democrata, mas estes são encontrados na Alemanha nazista. As políticas democratas de supremacia branca, segregação racial e discriminação fomentadas pelo Estado eram também estranhas ao fascismo italiano, mas comuns ao Terceiro Reich.

Aqui, por exemplo, está uma passagem do livro The Anatomy of Fascism [A Anatomia do Fascismo], de Robert Paxton: “Pode ser que o fenômeno mais antigo a ser eficientemente ligado ao fascismo seja americano: a Ku Klux Klan”. Muito antes dos nazistas, Paxton salienta, a KKK adotou seu uniforme segregado, de vestimentas e capuzes, e engajou-se no tipo de intimidação e violência que ofereceu “uma prévia contundente do modo como os movimentos fascistas deveriam funcionar na Europa no período entreguerras”.35 Ainda que pareça uma concessão surpreendente quando por um progressista, Paxton protege seu lado político não mencionando que, durante esse período, a Ku Klux Klan era o braço terrorista da família do Partido Democrata. O racismo do Partido Democrata na América não só precedeu o racismo dos nazistas, mas perdurou por muito mais tempo — mais de um século, em comparação com os doze anos do domínio nazista sobre a Alemanha. O racismo do Partido Democrata após a Guerra Civil foi precedido pela defesa da escravidão e pelo apoio às políticas de reassentamento e extermínio de índios americanos por parte desse mesmo partido. Pensamos em conceitos como “genocídio” e “campos de concentração” como exclusivos ao nazismo, mas que termo exceto genocídio usar para descrever o reassentamento em massa dos índios pelo presidente democrata Andrew Jackson? Jackson e seus aliados não buscaram sistematicamente despojar, deserdar e desmembrar os índios como povo? Usando a definição oficial de genocídio dada pelas Nações Unidas, demonstro que, sim, foi um genocídio. Além disso, o que mais seriam as fazendas de escravos senão um tipo particular do campo de concentração? Sim, pode parecer uma analogia ultrajante. Como comparar um sistema de trabalho forçado, por mais injusto que seja, aos campos nazistas, projetados e usados para matar seres humanos? No entanto, como mais adiante será analisado, os campos de concentração também eram campos de trabalho. Nos campos de concentração alemães e nas fazendas de escravos regidas pelos democratas, em ambos o trabalho forçado era empregado com “ferramentas humanas” unicamente no que dizia respeito à produtividade, mas com pouca ou nenhuma consideração pela vida dos trabalhadores, que eram, em ambos os casos, considerados inferiores e até mesmo sub-humanos. A analogia entre dois dos piores sistemas de

confinamento compulsório e de trabalho forçado na história da humanidade não é meramente legítima; ela já passou da hora de ser feita. Além do mais, toda essa questão foi levada a um patamar completamente novo desde a publicação do livro, um marco pioneiro, do historiador Stanley Elkins, Slavery [Escravidão]. Elkins, tecendo paralelos bem elaborados, não só se refere às fazendas de escravos como um “sistema fechado” consanguíneo do campo de concentração, mas também mostra que a escravidão produziu tipos de personalidades estranhamente semelhantes às descritas pelos sobreviventes dos campos nazistas. Logo, a questão é que, mesmo em algumas das instituições e práticas associadas exclusivamente aos nazistas — do genocídio aos campos de concentração —, os democratas, em determinado sentido, foram os primeiros a chegar lá.

Aprendendo com Hitler Neste livro, mostro o que a esquerda aprendeu com os nazistas e também o que, por sua vez, a esquerda lhes ensinou. Acontece que a esquerda forneceu aos nazistas certos esquemas políticos muito importantes, os quais, por sua vez, foram por eles implementados na Europa com disposição assassina. Por exemplo, Hitler disse especificamente que pretendia deslocar e exterminar os russos, os poloneses e os eslavos do mesmo modo como os americanos na era jacksoniana haviam deslocado e exterminado os índios. As leis nazistas de Nuremberg foram diretamente modeladas com base nas leis de segregação e nas leis contrárias ao casamento inter-racial, já implementadas décadas antes no Sul democrata. A esterilização forçada e a eutanásia, cujos objetivos eram eliminar os “defeitos” raciais e produzir uma raça nórdica “superior”, foram outros dois programas que os nazistas tomaram dos progressistas americanos. Não é minha opinião sobre o assunto, esta era a visão dos eugenistas da Alemanha nazista. No início do século XX, a eugenia e o darwinismo social eram muito mais predominantes na América do que na Alemanha. Margaret Sanger e seus companheiros eugenistas e progressistas não tomaram dos nazistas suas ideias de matar aqueles seres indesejáveis — ou de impedir-lhes a concepção. Mas foram os nazistas que as tomaram de seus homólogos americanos, os quais dominavam o campo internacional da eugenia. Há, portanto, uma via de

mão dupla entre o nazismo e a esquerda americana. Essa é uma história que compromete profundamente os heróis do progressismo americano: Woodrow Wilson, Franklin D. Roosevelt e John F. Kennedy. Wilson foi um verdadeiro progenitor do fascismo americano. Eu o chamo de protofascista. Ademais, foi ele um racista que carrega praticamente toda a culpa pelo ressurgimento da Ku Klux Klan, organização que, de acordo com o historiador Robert Paxton, foi a precursora americana mais próxima de um movimento nazista. Mussolini era, o que ficará evidente, avidamente admirado por Franklin D. Roosevelt (FDR), que procurou importar programas fascistas italianos para a América. FDR também colaborou com os piores elementos racistas do solo americano, trabalhando com eles para impedir as leis contrárias ao linchamento, para excluir os negros dos programas do New Deal e nomear um ex-membro da Ku Klux Klan à Suprema Corte. Mussolini, por sua vez, elogiou o livro de FDR, Looking Forward [Olhando Adiante], e basicamente o considerou mais um companheiro fascista. Hitler também o tinha por congênere de espírito, em consonância com o jornal oficial do Partido Nazista, Volkischer Beobachter, e outros impressos da Alemanha nazista que louvavam o New Deal por este ocupar um tipo americano de fascismo. JFK percorreu a Alemanha nazista na década de 1930 e voltou efusivo, tecendo elogios a Hitler e sua teoria da superioridade nórdica. “Cheguei à conclusão”, escreveu JFK em seu diário, “de que o fascismo é o caminho certo para a Alemanha e para a Itália”. Ao visitar a Renânia, JFK fez eco à propaganda nazista da época. “As raças nórdicas parecem definitivamente superiores aos romanos”. A hostilidade a Hitler, insistiu JFK, decorria sobretudo de ciúmes. “Os alemães realmente são muito bons — é por isso que as pessoas conspiram contra eles”. Apesar de ter lutado na Segunda Guerra Mundial, JFK continuou tendo uma queda por Hitler, inclusive até 1945, quando ele o descreveu como “a suma das lendas [...] Hitler emergirá do ódio que agora o rodeia e será considerado uma das figuras mais significativas que já viveu”.36 Tais fatos incriminatórios são do conhecimento de muitos intelectuais progressistas. E foi depois da Segunda Guerra Mundial, quando este grupo

passou a dominar cada vez mais a academia — um domínio completamente consolidado no final da década de 1960 —, que os progressistas reconheceram como seria esmagador se os americanos conhecessem a verdadeira história do progressismo e do Partido Democrata. E se o povo, especialmente o público jovem, soubesse dos vínculos entre figuras progressistas reverenciadas hoje como Wilson, FDR e JFK, de um lado, e, do outro, aquelas repudiadas como Mussolini e Hitler? Chegar a esse conhecimento não simplesmente derrubaria heróis progressistas de seu pedestal, mas, basicamente, sinalizaria o fim do progressismo e do Partido Democrata. Desse modo, os progressistas decidiram contar uma nova história, e esta é a história que hoje vigora. Nesta história, o fascismo e o nazismo, que eram, desde o princípio, reconhecidos como fenômenos de esquerda por ambos os lados do Atlântico, agora foram transportados para os pilares da direita. De repente, Mussolini e Hitler tornaram-se “de direita”, ao contrário daqueles que supostamente os levaram ao poder, que transformaram-se em “conservadores”. A esquerda, então, tornou-se a gloriosa resistência contra o fascismo e o nazismo. Para que a história funcionasse, o fascismo e o nazismo tiveram de ser radicalmente redefinidos. O grande problema era que Mussolini e Hitler identificavam o socialismo como o cerne do fascismo e do weltanschauung nazista. Mussolini era a figura principal do socialismo revolucionário italiano e nunca renunciou sua fidelidade ao sistema. Já o partido de Hitler definiu-se como defensor do “nacional-socialismo”. Assim, os progressistas tiveram de descobrir como transportar esses esquerdistas confessos para a direita e como arrancar o “socialismo” do “nacional-socialismo”. Não foi uma tarefa fácil. Como fazê-lo? Pegando uma deixa dos marxistas, a esquerda resolveu, já na década de 1960, suprimir completamente o fato de que o fascismo e o nazismo eram, ambos, sistemas de pensamento, conjuntos de crenças. De acordo com Denis Mack Smith, historiador de esquerda, “o fascismo italiano não se originou como doutrina, mas como método, como uma técnica para ganhar poder, ainda que, à primeira vista, seus princípios não fossem claros até para os seus próprios membros”. O historiador Ruth Ben-Ghiat, citado constantemente pela mídia que vincula Trump ao fascismo, insiste, no

entanto, que o fascismo é “uma daquelas palavras muito difíceis de definir com precisão”, porque “o regime fascista dizia respeito a tudo quanto era contradição, e esse tipo de ambiguidade permaneceu no fascismo”.37 Na verdade, tais tolices só podem ser sustentadas quando há recusa de levar os próprios fascistas a sério. Conforme o historiador Anthony James Gregor escreve: “Sob a influência desagradável da análise que o marxismo faz do fascismo, as declarações fascistas nunca são analisadas como tais. Elas são sempre “interpretadas”. Os fascistas nunca são compreendidos naquilo que dizem. Por consequência, houve, até o momento, pouquíssimo esforço para fornecer um relato sério do fascismo como ideologia”.38 Entretanto, a esquerda reconheceu no fascismo tendências amorfas que poderiam ser aplicadas com facilidade em outras várias doutrinas políticas: o autoritarismo, o militarismo, o nacionalismo, etc. Pense no seguinte: conhecemos o nome do filósofo do capitalismo, Adam Smith. Também conhecemos o nome do filósofo do marxismo, Karl Marx. Então, rápido, qual o nome do filósofo do fascismo? Pois é, exatamente. Você não sabe. Praticamente ninguém sabe. Meu ponto é: a razão disso não é que não havia pensadores basilares para a formação e estruturação do corpo fascista — seus nomes aparecem neste livro —, mas, sim, que a esquerda teve de livrar-se deles para evitar o confronto com suas inevitáveis propensões socialistas e esquerdistas. Pois então — assim como quando o Hillary’s America surgiu —, os progressistas concordaram entre si dizendo: “Vamos fingir que nada disso existe, pode ser?”. Eis a grande mentira a todo vapor. Se o estatismo e o coletivismo estão no cerne do fascismo, o nacionalsocialismo acrescenta outro ingrediente explosivo — o antissemitismo. Tratase de algo já bem conhecido. O que os progressistas têm cuidadosamente disfarçado, no entanto, é o quanto o antissemitismo nazista surgiu do ódio de Hitler pelo capitalismo. Hitler estabelece uma distinção crucial entre o capitalismo produtivo, que ele consegue suportar, e o capitalismo financeiro, que ele associa aos judeus. Para Hitler, o judeu é o avarento improdutivo no centro do capitalismo financeiro, o empreendedor trapaceiro par excellence. Dificilmente parece ser de “direita”; com efeito, em havendo alguma leve modificação, isso ecoa uma retórica progressista sobre os gananciosos

banqueiros da Wall Street. Nessa condição, os progressistas perceberam a necessidade de esconder a verdadeira base do antissemitismo de Hitler; para tanto, o próprio antissemitismo precisou ser redefinido. Como você pode facilmente perceber, o que está em cena é uma grande, uma grande mentira — uma mentira que continua a crescer e que contém várias mentiras menores —, e é daí que o meu trabalho fica mais fácil. Mas, antes, é preciso compreender a grande mentira em todas as suas dimensões, a fim de nos mantermos livres dela. Uma vez livres, a esquerda estará acabada. O seu poder sobre nós desaparecerá. Eles tinham em mãos a cartada racial e agora têm a cartada nazista, mas não têm nenhuma outra cartada. Se eles a perderem, perderão seu capital moral e estarão expostos ao que realmente são — fanáticos, intolerantes, facínoras, assassinos, vis e egoístas, ladrões da vida e da liberdade. Eles são os verdadeiros descendentes de Mussolini e de Hitler; ao derrotá-los, poderemos finalmente descansar dos fantasmas do fascismo e do nazismo.

Capítulo Dois

Falsificando a História A propaganda é sempre um meio para determinado fim. A propaganda que produz os resultados desejados é boa, todas as demais são ruins.1 Joseph Goebbels, Ministro da Propaganda Nazista Este capítulo expõe a falsificação da história que apoia a acusação de que Trump e o GOP são os fascistas e nazistas do século XXI. Tamanha falsificação é produto de setenta anos de dissimulação e engano progressistas. O engano envolve destacar características ocasionais de Mussolini e Hitler e fingir que eles representam o fascismo no aspecto mais essencial. A dissimulação envolve esconder a verdadeira essência do fascismo — ocultando, inclusive, o próprio nome de seu principal filósofo —, pois, uma vez exposta, torna-se óbvio que Trump e o GOP não podem ser fascistas e que, pelo contrário, o fascismo e o nazismo são ideologias inerentes à esquerda. Na verdade, veremos os paralelos surpreendentes entre os temas centrais do fascismo e do nazismo do século XX, e os temas do progressismo americano do século XXI. Antes de entrar neste tópico, importa esclarecer o que se quer dizer pelos termos “esquerda” e “direita”. O uso político de ambos remonta ao ano de 1789 e à Revolução Francesa. Na Assembleia Nacional em Paris, os partidários da Revolução sentaram-se do lado esquerdo e seus oponentes, do lado direito. É assim que surgiu a origem da “esquerda” e da “direita”. O termo “direita”, neste contexto, refere-se aos defensores do Ancien Régime, desejosos de que a França retornasse à aliança entre a Coroa e a Igreja, que precedeu a revolução. O termo “conservador” passou a descrever a velha guarda, que intentava conservar a monarquia e as prerrogativas da Igreja estabelecida pelo Estado contra a derrubada revolucionária. Logo, de imediato, surge um problema: se isso for o que “direita” e

“conservador” significam, então não há líderes de direita ou conservadores na América. A América nunca passou pela monarquia nem teve uma igreja oficial. Os conservadores americanos modernos não têm a intenção de introduzir nenhum dos dois. Em que sentido, então, os conservadores modernos são de direita? O que é que os conservadores americanos querem conservar? A resposta é bastante simples. Eles querem conservar os princípios da Revolução Americana. Assim, a direita francesa se opunha à Revolução Francesa, ao passo que a direita americana defende a Revolução Americana. Se parece paradoxal usar os termos “conservar” e “Revolução” na mesma frase, é esse paradoxo, no entanto, que define o conservador moderno. A Revolução Americana caracterizou-se por três liberdades básicas: liberdade econômica, ou capitalismo, liberdade política, ou democracia constitucional, e liberdade de expressão e religiosa. Essas são as liberdades que os conservadores americanos procuram preservar em suas formas originais. Como os Pais Fundadores entenderam, a principal ameaça à liberdade vem do governo federal. Consequentemente, nossos direitos são mecanismos de proteção contra a invasão e intervenção excessiva do governo. É por isso que a Declaração dos Direitos dos Estados Unidos se inicia com: “Ao Congresso é proibida a criação de leis”. Tendo posto grilhões ou restrições no governo federal, são garantidos os direitos e liberdades fundamentais, cujo objetivo é dar ao americano o poder da “busca por felicidade”. A felicidade é o fim e os direitos e as liberdades são os meios que conduzem a esse fim. Os americanos de direita são aqueles que, limitando o poder centralizado do Estado, procuram proteger os direitos dos americanos de buscar pela felicidade. “Um despotismo eletivo”, disse Jefferson, “não é aquilo por que lutamos”.2 O Partido Democrata-Republicano de Jefferson precedeu o atual sistema de dois partidos, mas o que ele pensava e sentia vai bem ao encontro do coração daquilo que direitistas e conservadores apoiariam com fervor. Nem mesmo os governos eleitos têm poder ilimitado. Estes devem operar dentro de um domínio específico; quando o ultrapassam, tornam-se uma ameaça à nossa liberdade e, a este respeito, tirânicos. Hoje, não mais é preciso obedecer a uma tirania eleita como os próprios Pais Fundadores

foram obrigados a obedecer à autoridade tirânica da Coroa britânica. Limitando o poder do Estado, os conservadores procuram, entre outras coisas, proteger o direito do povo de reter os frutos do próprio trabalho. Abraham Lincoln, o primeiro presidente republicano da América, posicionou-se ao lado da tradição dos Pais Fundadores quando disse: “Sempre pensei que o homem que planta o milho deve, também, comer o milho”. Lincoln, bem como os Fundadores, não temia que a propriedade privada ou os ganhos privados pudessem causar desigualdade econômica. Em vez disso, ele acreditava que, assim como três dos Pais Fundadores haviam escrito no Artigo 10 do O Federalista, “a proteção de diferentes e desiguais faculdades de aquisição de propriedade” é a “primeira finalidade do governo”.3 Os conservadores americanos também procuram preservar a ordem moral transcendente que, embora não especificada na Constituição, está clara sob a fundação americana. Considere, como um único exemplo, a proposição da Declaração de Independência de que todos somos “criados iguais” e dotados de “direitos inalienáveis”, incluindo o “direito à vida”. Para os conservadores, isso significa que a vida humana é sagrada, dotada da dignidade oriunda da criação divina, tão preciosa que o direito à vida não pode ser vendido, mesmo com o consentimento do comprador e do vendedor; e, por fim, que nenhum governo pode violar o direito à vida sem que esteja perpassando e violando os valores morais e políticos mais basilares da América. Muito já foi dito a respeito da política de “direita”, e quanto à política de “esquerda”? A esquerda na América é definida por sua hostilidade às restrições postas sobre o governo federal pelos Pais Fundadores. É por essa razão que os esquerdistas costumam lamentar as restrições constitucionais sobre o poder do governo, alegando que a Constituição está tristemente desatualizada e pedindo que seja adotada, em vez disso, uma “Constituição viva” — uma Constituição adaptada ao que a esquerda considera progressista. Na verdade, hoje em dia, muitos esquerdistas usam para si o termo “progressista” como rótulo político preferido. Eles costumavam se chamar de “liberais”, termo que pretendia fazer referência à liberalidade, ou à liberdade; já agora eles se valem da palavra “progressista”, um termo que os identifica com o futuro em oposição ao passado.

O termo progresso é, em si, um termo vago, tornando-se necessário, portanto, compreender o que os progressistas querem dizer quando o utilizam. O que eles querem dizer é o progresso em direção a um maior poder e controle do governo. Os progressistas, em outras palavras, são paladinos do poder do Estado centralizado. Três palavras muito ruins no progressismo moderno são “direitos dos estados”. Os progressistas são mais felizes quando o governo federal controla as coisas e ainda mais quando eles mesmos são responsáveis por esse governo federal. Isso é o que garante o “progresso”; sejam quais forem, reveses contra o programa representam “reacionarismo” e “regresso”. Sem espanto nenhum, os esquerdistas chamam de “regressistas” ou “reacionários” os conservadores que resistem à expansão do poder do governo. Mas por que o poder do Estado deve ser tão centralizado? Enquanto os Fundadores consideravam o governo como o inimigo dos direitos, a esquerda progressista considera o governo federal como seu amigo, como aquele que lhe garante tais direitos. Além disso, os progressistas desconfiam do sistema de livre mercado e querem que o governo controle e direcione a economia, não necessariamente nacionalizando ou controlando empresas privadas, mas, no mínimo, regulamentando suas operações e, ocasionalmente, delimitando suas estratégias. Ademais, a esquerda busca autoridade governamental para impor e institucionalizar valores progressistas como o aborto e os direitos iguais para gays e transexuais, tudo sob financiamento do governo federal. A partir do posicionamento acerca do aborto, já se percebe que a esquerda rejeita a ideia de uma ordem moral transcendente, rechaçando-a tão fixamente quanto se opõe ao princípio conservador de um direito inalienável à vida. Então, se a “direita”, na América, significa um governo limitado e não intrusivo com amplo alcance para a busca individual da felicidade, a “esquerda”, na América, significa um poderoso Estado centralizado que implementa valores esquerdistas e é controlado pela esquerda.

Introduzindo a Mentira Munidos desta compreensão dos termos esquerda e direita, agora cabe investigar para saber se acaso Trump e o GOP estão de alguma forma aliados

ao fascismo e ao nazismo; e, caso não estejam, quem está. Não faz sentido começar com os vários especialistas como Bill Maher, Chris Matthews, Michael Kinsley ou Chris Hedges que, em sua própria forma vulgar, igualaram Trump a Hitler. Parece óbvio que nenhum deles sabe nada sobre o fascismo senão por tagarelices durante coquetéis. Típico disso é Matthews, que chamou de “cheiro de fascismo” o fato de Trump ter demitido o diretor do FBI, mesmo que o presidente tenha todo o direito de substituir seu diretor do FBI, como Bill Clinton fez.4 Não mencionarei os demais listados. Mas as coisas tornam-se interessantes quando um grande estudioso progressista do fascismo se envolve. Então, começo com duas entrevistas do historiador Robert Paxton, autor da obra The Anatomy of Fascism, seguidas de uma citação especialmente reveladora desse livro. A primeira entrevista é com a âncora de um programa de esquerda, Amy Goodman, que parecia bastante incomodada por Trump haver retuitado uma citação de Mussolini. A citação dizia: “É melhor viver um dia como leão do que cem anos como ovelha”. Quando exigiram que se retratasse, Trump se recusou. “É uma citação muito boa”, disse ele. “Que diferença faz se foi Mussolini ou outra pessoa?”. Aqui está a marca registrada do destemor de Trump. Ele acha a citação boa e se recusa a ser assustado pela associação supostamente radioativa com Mussolini. Paxton observa com ironia os comentários de Trump: “Eu o considero tolerante demais com esse tipo de oratória política”. Em outra parte da conversa, Paxton observa que, assim como Hitler, “Não faz muito tempo, Trump era motivo garantido de boas gargalhadas. Era visto como um bufão. Tudo o que você tinha de fazer era mostrar o cabelo e chamá-lo de “Donald” e todo mundo ria”.5 Segue-se, portanto, que a transição de bufão para poderoso supostamente liga Trump ao fürhrer. Em sua segunda entrevista, então com Isaac Chotiner da revista Slate, Paxton fica mais enfático: “O uso de estereótipos étnicos e a exploração do medo de estrangeiros vêm diretamente do livro de receitas fascista. Fazer do país uma grande nação outra vez vez soa exatamente como os movimentos fascistas. Preocupações com a queda da nação, este era um dos estados emocionais mais intensos evocados no discurso fascista, e Trump está o usando com toda força. Uma política externa agressiva para barrar este suposto declínio. Nada mais é que um golpe fascista”. Há muito aqui e vou

lidar com isso, mas gostaria de salientar que muitos outros presidentes americanos já falaram sobre o declínio nacional, prometeram restaurar o país e promoveram uma política externa agressiva, sem serem acusados de terem lido o livro de receitas fascista. E então Paxton prossegue: “Li determinado relato que absolutamente me surpreendeu, em que Trump chega a um discurso enquanto sua audiência estava reunida em um hangar; então ele pediu que o avião pousasse no campo, logo depois que fosse feito o taxiamento até o hangar e só então saiu. Foi exatamente o que fizeram em 1932 para a primeira vitória eleitoral de Hitler. Suponho ter sido um acidente, mas, uau!, eis aí a repetição quase perfeita de uma tática das eleições de Hitler”. Perceba, Trump é culpado de usar das mesmas táticas eleitorais de Hitler porque pousou dentro de um avião e por haver uma multidão reunida no hangar o esperando? No lugar de apresentar conteúdo ligando Trump ao fascismo, Paxton concluiu dizendo que Trump “parece mesmo com Mussolini na forma de mexer o queixo”.6 Bom, Paxton ao menos não comenta se Trump tem a mesma simpatia pela comida italiana que Mussolini tinha. Finalmente, volto-me para uma passagem do livro The Anatomy of Fascism, em que Paxton, observando atenciosamente o colapso dos regimes de Hitler e Mussolini na Segunda Guerra Mundial, especula se o fascismo poderia vir para a América e, em caso afirmativo, como seria sua aparência. “A linguagem e os símbolos de um autêntico fascismo americano”, ele escreve, “teriam pouca relação com os modelos europeus originais. Eles teriam de ser tão familiares e de tal maneira encorajadores para americanos fiéis de igual modo a linguagem e os símbolos dos fascismos originais eram familiares e encorajadores a muitos italianos e alemães. Sem suásticas no fascismo americano, mas com Estrelas, Listras, e Cruzes cristãs. Nada de saudações fascistas, mas com recitações em massa jurando lealdade”.7 Observe o que Paxton está comunicando nessa passagem e nas duas entrevistas anteriores. Como bom progressista, ele está dando aos canais da mídia esquerdista o que eles querem. Mesmo às vezes rodeando sem saber muito bem o que dizer — em determinado momento, ele percebe que o individualismo de Trump não é inteiramente consistente com o fascismo —, ele ainda confirma que Trump é, de modo geral, uma espécie de fascista e

protonazista. Em seguida, Paxton definitivamente liga o fascismo com as exibições patrióticas da direita americana. Ele, no entanto, não menciona limitações impostas sobre o governo ou sobre o capitalismo, nem sobre nenhum dos principais aspectos que definem o conservadorismo americano. Em nenhum momento Paxton sugere haver algo a respeito de Obama ou Hillary que espelhe o fascismo ou o nazismo. O fascismo é um termo italiano que significa “agrupamento” [groupism] ou “coletivismo”. Os fasci, na Itália, eram grupos de ativistas políticos que pegaram seu nome dos fasces da Roma antiga — feixes de varas carregados pelos lictores, simbolizando a força unificada dos romanos. O significado central do termo fascismo é que as pessoas são mais fortes como grupo do que como indivíduos. Paxton certamente o sabe, mas acha melhor não mencionar. Na verdade, ele não insinua nenhuma vez que o fascismo possa ser, mesmo remotamente, um fenômeno da esquerda política. E, ao longo dessas entrevistas, é impressionante perceber quão pouco Paxton fala a respeito do que é de fato o fascismo. Ele não cita nem ao menos um pensador fascista, nada que forneça a compreensão fascista do próprio fascismo — tudo o que temos é a interpretação progressista que parece avançar rapidamente a partir de algumas poucas generalizações, como, por exemplo, o declínio nacional e o patriotismo, para, depois, concluir resolutamente. Mais uma vez, não estou dizendo que Paxton não possui um conhecimento maior sobre o assunto. Seu livro mostra que possui. Ele conhece os documentos relevantes; ele faz referência a eles e está familiarizado com os intelectuais fascistas; ele os cita. É isso que torna o seu desempenho tão intrigante. Embora tenha conhecimento, Paxton está dialogando com pessoas ignorantes o suficiente para confirmar os preconceitos delas ao mesmo tempo que mantém sua erudição bona fides. No fim das contas, permita-me dizer, Paxton está participando, conscientemente, da grande mentira. Desta forma, portanto, a grande mentira é disseminada: acadêmicos astutos como Paxton estabelecem a base intelectual, daí a mídia e Hollywood dizem: “Olhe, aqui está um sujeito que realmente tem domínio sobre a área, confirmando que a nossa posição política possui justificativa”. Estranho notar, a área de Paxton não é o nazismo nem o fascismo italiano; é a França de Vichy. Anthony James Gregor é a maior autoridade viva sobre o fascismo,

e Stanley Payne publicou não faz muito tempo seu livro sobre a história do fascismo, obra definitiva da área. Entretanto, a mídia progressista nunca os convida para entrevistas. Por quê? Eis aqui uma citação direta da obra The Ideology of Fascism [A Ideologia do Fascismo], de Gregor: “O movimento em si não foi conservador. Foi revolucionário. Sua clara intenção era destruir todos os artefatos sociais, econômicos e políticos do liberalismo clássico”. E aqui está uma citação de Payne: “O núcleo que, por fim, fundou o fascismo na Itália não decorreu dos nacionalistas de direita, mas da transformação por parte da esquerda revolucionária”.8 Na visão esquerdista, este é um ponto bastante inconveniente. Logo, por que entrevistar Gregor ou Payne quando eles provavelmente não darão base ao que a esquerda tenta provar? É por isso que Paxton é financiado, porque ele esteve disposto a participar desse joguinho. A esquerda lhe oferece celebridade acadêmica, ele lhes diz o que querem ouvir. É assim que funciona a grande mentira.

O Teste Fascista em Trump Agora nos voltemos a algumas características que alegam pertencer ao fascismo e ao nazismo, invocadas pela esquerda no intuito de provar que Trump (e, de vez em quando, o GOP e os conservadores) se assemelha aos fascistas e aos nazistas. Perceba que, em cada caso, a afirmação é completamente falsa e que aproximar Trump do fascismo não faz sentido, praticamente. O que torna as falsidades duplamente interessantes é que elas, na maioria dos casos, são mentiras em dobro. Com isso não quero dizer apenas que Trump e o GOP não são o que a esquerda diz que são, mas que o fascismo e o nazismo também não são o que a esquerda diz que são. Portanto, o acusado é literalmente inocente em dois pontos: ele não fez aquilo do que é acusado e aquilo do que é acusado não é o crime pelo qual foi acusado. Primeiro, lidarei com a maior acusação, então depois tratarei das demais. Racismo e xenofobia: essas são as questões mais polêmicas. Toda a comparação entre Trump e os nazistas ocorre aqui. Elizabeth Warren explica a ascensão de Trump como o produto de “uma feia animosidade do racismo”. James Whitman, historiador, alertou que “o nacionalismo branco mora na Casa Branca”. Jeet Heer, pela revista The New Republic, fez acusações

asseverando que o “racismo e a xenofobia” de Trump exibem suas “raízes fascistas” que, não sendo somente suas, encontram-se cravadas “no Partido Republicano”. Na mesma linha de pensamento, o escritor esquerdista Michael Tomasky faz uma ligação “direta e indiscutível” de “movimentos racistas e xenófobos” com o “GOP de Trump”, concluindo que “eles estão apoiando Trump como pessoas brancas, uma vez que sentem que ele protegerá seus privilégios brancos”.9 A bem da verdade, as evidências para acusar Trump de racismo e xenofobia carecem de veracidade. Talvez, a base mais forte para acusá-lo seja declarando que a esquerda descobriu alguns supremacistas e antissemitas brancos que afirmam apoiar Trump. Um deles, Richard Spencer, liderou uma manifestação enquanto ele e seus poucos seguidores clamavam: “Hail Trump”. Parece ser o melhor que Spencer consegue fazer para imitar Hitler. No entanto, se esses racistas e antissemitas endossam Trump, o próprio Trump não os endossa. O melhor que a esquerda pode fazer é mostrar que Trump retuitou algumas declarações de nacionalistas brancos, mesmo que as declarações em si sejam benignas. Eu retuito pessoas o tempo todo sem saber muito sobre elas. Os termos de uso das mídias sociais não exigem que verifiquemos os antecedentes das pessoas que compartilhamos. Ao longo da história americana, muitos racistas votaram a favor de Lincoln — eles cortejavam avidamente o voto a movimentos anti-imigrantes, ao movimento Know-Nothing [“Não Sei de Nada”] — e de Wilson e FDR, que buscavam ativamente o apoio de eleitores declaradamente racistas. Agora, disso não se pode concluir necessariamente racismo por parte de Lincoln, Wilson e FDR. Como evidencio na minha obra antes dessa, é claro que Lincoln não era. Todavia, mais adiante, neste mesmo livro, provo que Wilson era racista e que FDR estava envolvido com os piores racistas da América. Meu argumento aqui é simplesmente constatar que o voto de um racista por si só não transforma o seu beneficiário num racista. Obviamente, a dúvida ainda permanece: por que esses sujeitos gostam de Trump, se Trump não é racista como eles? O mais provável é que são indivíduos desempregados, fracassados, alguns deles completos dementes. Independentemente do que arroguem ser — fascistas ou seja lá o que for —, eu francamente não acredito que sejam fascistas ou conheçam muito sobre o

fascismo. Hitler teria enviado a maioria deles direto para as câmaras de gás. (Lembre-se de que uma das primeiras categorias de pessoas que Hitler exterminou foram os chamados “dementes”). É bem possível que esse tipo de sujeito tenha votado em Trump esperando que, como presidente, ele trouxesse de volta empregos para a mão de obra desqualificada. Então, mesmo Trump não sendo racista, ainda é possível que os racistas o quisessem por razões que nada têm que ver com o racismo. Trump é racista e xenófobo porque “odeia os imigrantes” e certa vez chamou um juiz federal hispânico de “mexicano”? Sim, eu sei que o juiz em questão é um cidadão americano de descendência mexicana. Eu mesmo sou um cidadão americano de descendência asiática e indiana, então seria o equivalente a me chamar de “indiano-asiático”. Se alguém pretende me insultar me chamando disso, confesso que não ficarei ofendido. Afinal, onde está o problema? Mesmo no caso de pessoas sensíveis demais, Trump, na pior das hipóteses, teria sido insensível. Insensibilidade não é o mesmo que fanatismo. O que Trump declara sobre os muçulmanos não pode ser chamado de racismo simplesmente por ser o Islã uma religião, não uma raça. Pode-se, então, chamar isso de xenofobia ou de palavras antimuçulmanas? Com certeza os próprios muçulmanos não parecem achar que sim. Em maio de 2017, Trump visitou a Arábia Saudita, o país muçulmano mais devoto do mundo, e recebeu as boas-vindas de um herói. O modo como Trump foi recebido na região ganha forte contraste com a recepção recebida por Obama. Ainda que se prostrasse covardemente perante o Islã, Obama costumava ser tratado na região com desprezo e sob suspeita pelos aliados muçulmanos da América. Consideremos a ordem executiva de Trump proibindo vários países de maioria muçulmana de entrar na América. Acontece que esses países são criadouros de terroristas. Também são países cujo controle de quem entra e sai é especialmente difícil; algumas dessas pessoas foram deslocadas de suas casas e comunidades. John Locke diz que, seja qual for a tarefa da qual um governo se encarregue — humanitária ou não —, seu principal dever é o de proteger seus próprios cidadãos de criminosos, sejam eles estrangeiros, sejam nativos. Não se trata de fascismo; trata-se de liberalismo clássico.

Do mesmo modo, o liberalismo clássico sustenta que a sociedade liberal é formada por um pacto social entre os cidadãos que concordam em se unir por certos benefícios e proteções buscadas em comum acordo. Em troca dessas proteções e privilégios, eles desistem do exercício de alguns de seus direitos naturais. A questão aqui é que os direitos naturais pertencem a todos, mas os direitos civis e constitucionais são o produto de um pacto social. Segue-se, portanto, que os direitos civis pertencem apenas aos cidadãos. Estrangeiros que não fazem parte do pacto social americano não têm nenhum direito constitucional. Mais uma vez, Trump negar a estrangeiros ilegais que tenham o direito constitucional de estar aqui é a principal corrente da tradição liberal. Trump não é contra “imigrantes”, simplesmente porque estrangeiros ilegais não são imigrantes. Os esquerdistas no Congresso e a mídia costumam confundir imigrantes legais e ilegais, como faz Andrew Cuomo, governador de Nova Iorque, com palavras de teor tão cômico, “Todos nós somos imigrantes”, e nesta manchete da primeira página do New York Times: “Mais Imigrantes Enfrentam a Deportação Sob Novas Regras”.10 De acordo com essa narrativa da esquerda, minha esposa, Debbie (imigrante vinda da Venezuela) e eu (um imigrante proveniente da Índia) deveríamos viver com medo. Mas é mentira, e Cuomo e os editores do New York Times sabem disso. Trump não tem intenção de nos enviar de volta aos nossos países de origem. A distinção que Trump faz está entre imigrantes legais e infratores da lei que procuram contornar o processo de imigração. Essa não é uma distinção racial. Trump nunca disse que a América é um país de homens brancos ou de negros, ou que os negros não deveriam emigrar para lá. A maioria dos imigrantes hoje em dia vem da Ásia, África e América do Sul, e Trump parece não ver problema nisso. Contraste a posição de Trump com a posição de Hitler. Os judeus da Alemanha eram imigrantes legais ou descendentes de imigrantes legais. Eles eram cidadãos alemães. No entanto, Hitler não os considerava alemães genuínos. As leis de Nuremberg despojaram dos judeus sua cidadania alemã. Então, para Hitler, a fronteira não estava entre imigrantes legais e ilegais. Não estava nem mesmo entre imigrantes e alemães nativos. Pelo contrário, era uma fronteira racial entre nórdicos, ou germânicos arianos, de um lado, e os judeus e demais povos “inferiores”, não arianos, do outro.

Por fim, o antissemitismo. Durante a campanha, Trump condenou a “estrutura de poder global” por “arrancar a própria riqueza do país” e “colocar dinheiro no bolso de um punhado de grandes corporações e entidades políticas”. O senador Al Franken respondeu: “Quando vi o anúncio, pensei que fosse algum tipo de código morse, alguma linguagem secreta. Tinha um quê dos Protocolos dos Sábios de Sião nisso tudo, um ar de conspiração internacional bancária”. Franken está, aqui, invocando o notório tratado antissemita, Os Protocolos dos Sábios de Sião, para acusar Trump de ser antissemita. Nessa mesma linha de pensamento, David Denby, no New Yorker, e Peter Dreier, no jornal esquerdista The American Prospect, comparam Trump ao notável demagogo antissemita, atuante na rádio na década de 1930: o padre Charles Coughlin.11 O que Denby e Dreier não mencionam é: Charles Coughlin era um esquerdista raivoso. Na verdade, Dreier chama Coughlin de “direitista”, pois “ele usou seu programa de rádio para promover teorias de conspiração antissemitas e para apoiar Adolf Hitler e Benito Mussolini”. Mas, claro, a pergunta é: Hitler e Mussolini eram de direita? No decorrer deste livro, você me verá provando que não, eles definitivamente não eram de direita. Dreier está simplesmente cometendo um argumentum ad ignorantiam — argumento baseado na ignorância de seu público. Em suma, ele está se baseando na grande mentira. Denby retrata Coughlin como um oponente de FDR, observando que “não conseguiu impedir que FDR triunfasse politicamente”. Denby omite que, em 1932, Coughlin era partidário entusiasta de FDR e crítico feroz do presidente Hoover e dos republicanos. Na eleição presidencial de 1932, Coughlin apresentou ao país uma escolha simples: “Roosevelt ou a Ruína”. Dada a gigantesca audiência radiofônica de Coughlin, ele é amplamente creditado à ascensão de FDR à presidência. Mais tarde, Coughlin rompeu com FDR — é a isso que Denby está se referindo —, mas só porque, na cabeça dele, achou que FDR houvesse vendido alguns de seus próprios princípios. Em 1935, Coughlin fundou a União Nacional da Justiça Social [National Union of Social Justice] para pressionar FDR com a esquerda. Em seu jornal — provocadoramente chamado Social Justice [Justiça Social] — e em seu programa de rádio,

Coughlin censurou Roosevelt por não ter nacionalizado a Reserva Federal nem os bancos, e por outras supostas concessões à classe capitalista. Trump não poderia ser uma símile moderna do padre Coughlin, pois este era de extrema esquerda. Na verdade, o antissemitismo de Coughlin contrasta radicalmente com o filossemitismo de Trump. E, no caso de Trump, sua posição favorável aos judeus é de difícil surpresa. Uma de suas noras é judia, um genro judeu, que também é um dos seus conselheiros mais próximos, uma filha que ele diz ter se convertido ao judaísmo, e netos judeus. A partir de seu discurso de abril de 2017, em memória ao Holocausto, e com seu discurso de maio no memorial de Yad Vashem, em Israel, nota-se que Trump é, sem remorsos, pró-judaísmo e pró-Israel de uma maneira que seu antecessor, Barack Obama, nunca foi. Nas palavras do primeiro-ministro de Israel, Netanyahu, “Não existe maior defensor do povo judeu e do Estado judaico do que o presidente Donald Trump”.12 Em suma, Trump não é racista, ele não é xenófobo, ele não é antissemita.

As Características do Nazismo Agora é hora de lidar com as outras características que dizem estabelecer a ligação de Trump com o fascismo e com o nazismo. Insanidade: uma das coisas mais estranhas que costumam afirmar sobre Trump é que ele é, literalmente, insano. Os colunistas Andrew Sullivan e Paul Krugman são os dois proponentes mais insistentes dessa tese; Rosie O’Donnell também a ressoa. Dois congressistas democratas introduziram uma legislação para arrancar o poder nuclear das mãos de Trump. Um deles, Ted Lieu, tem um segundo projeto de lei no Congresso, exigindo que Trump passe por acompanhamento psiquiátrico.13 Por que essa insistência de que Trump seja lunático? A conexão subjacente estabelecida é com Hitler e Mussolini. Toda uma geração de comentários progressistas insiste que eles dois eram insanos. Por qual outro motivo ambos matariam tantos milhões de pessoas e alavancariam uma guerra mundial? Quanto a Trump, evidente que ele não é louco. Ele certamente nunca foi diagnosticado com nenhum tipo de doença mental. Trump é altamente bemsucedido nos negócios. Sua esposa é dedicada e seus filhos são extremamente

bem-educados. Ele foi eleito e agora, embora lidando com a oposição mais extrema, continua confiante e seguro. É óbvio que há um método para conferir loucura. Nem Hitler nem Mussolini eram loucos. Homens maus, sim, mas não insanos. Assassinatos a sangue frio não transformam o indivíduo num louco. Há inúmeros assassinos na prisão e no corredor da morte que não são insanos. (Na verdade, caso fossem, eles “seriam absolvidos por motivos de insanidade”). Por outro lado, são inúmeras as pessoas insanas internadas em hospícios que nunca prejudicaram ninguém. Portanto, já basta da insanidade sem sentido. É facílimo inocentar Trump desta culpa, e ainda mais fácil evitar o confronto com o verdadeiro mal de Hitler e Mussolini. Reacionário: Trump e o GOP são frequentemente descritos como “reacionários”, rótulo igualmente usado para desacreditar os conservadores. O texto clássico aqui recebe o título The Reactionary Mind [A Mente Reacionária], do intelectual de esquerda Corey Robin, que identifica a direita americana com a “nostalgia das lutas”, à qual Hitler e Mussolini apelavam. Embora o livro tenha sido publicado em 2012, Matt Feeney o chamou, apenas alguns dias antes da eleição de 2016, de “o livro que previu Trump”.14 Então, nessa visão, Trump e os conservadores são, assim como os fascistas e os nazistas, reacionários extremos. A acusação reacionária é conveniente para a esquerda, afinal associa o conservadorismo e o fascismo ao passado, mas o distingue do progressismo, que está, evidentemente, preocupado com o futuro. O que torna a acusação superficialmente crível é que Trump, à semelhança da maioria dos conservadores, parece querer que a América volte aos bons e velhos tempos. Não era isso que Hitler prometia fazer? Ser o Terceiro Reich não foi uma tentativa reacionária de restabelecer o Primeiro Reich de Carlomagno e o Segundo Reich de Bismarck? Talvez, mas a restauração prometida por Trump está preocupada com a recuperação dos empregos. Trata-se também de tornar o governo menor e menos burocrático. Não se trata de revogar o progresso na América em detrimento dos direitos civis ou do mercado de trabalho para as mulheres. Não se trata de enviar gays de volta ao armário. Assim, o conservadorismo moderno é, também, sobre restaurar os ideais dos Pais Fundadores, e não o então mundo agrário e subdesenvolvido em que estes viveram. A direita,

portanto, busca aplicar princípios antigos — que considera verdades duradouras, ou permanentes — em nossa situação atual, a fim de criar um futuro melhor. Não há nada de reacionário nisso. Tampouco o fascismo de Mussolini e o nacional-socialismo de Hitler eram reacionários no sentido clássico. “Todas as ideias políticas de Hitler”, escreve Stanley Payne em seu livro A History of Fascism [Uma História do Fascismo], “tiveram sua origem no Iluminismo”. O historiador Richard Evans escreve que “nenhum dos eleitores que foi às urnas em apoio a Hitler” procurou “restaurar um passado perdido. Pelo contrário, eles foram inspirados por uma visão vaga e poderosa do futuro”. Essa visão invocava símbolos do passado, mas “não envolvia apenas olhar somente para trás ou para frente, mas tanto para um quanto para outro”.15 Um dos grupos que mais apoiou o fascismo na Itália foi o movimento que se autointitulava “Futuristas”. Liderados por Filippo Marinetti, os futuristas defendiam carros rápidos e novas tecnologias, e se viram como estando na vanguarda das ciências e da arte. Este foi o grupo que encorajou o fascismo e o nazismo ao uso de novos avanços na tecnologia e técnicas atualizadas de mídia e propaganda. O historiador Zeev Sternhell conclui que, longe de ser reacionário, “o quadro conceitual do fascismo [...] era dissidente, vanguardista e de caráter revolucionário”.16 Os fascistas e os nazistas procuraram criar um novo homem e uma nova utopia a partir dos grilhões da velha religião e das velhas lealdades. Toda a disposição do fascismo e do nazismo é capturada na juventude descrita pelo filme Cabaret, que não canta sobre um passado perdido, mas sobre um “amanhã” que “pertence a mim”. O apelo do fascismo era, como seus críticos e entusiastas reconheceram na época, mais progressista e avançado do que retrógrado e reacionário. Autoritarismo: este é ponto muito importante. “Um Autoritário Americano” era o título de uma manchete no Atlantic Monthly, ligando Trump a Mussolini. Após a eleição de Trump, a revista New York expressouse sob o título “A República foi Revogada”. Dois cientistas políticos, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, escrevendo pelo New York Times, disseram que Trump não é o “primeiro político americano com tendências autoritárias”,

mas “é o primeiro [político autoritário] na história americana moderna a ser eleito presidente”. Fazendo paralelos aos déspotas autoritários Hitler e Mussolini, o historiador Timothy Snyder comenta que Trump “não disse praticamente nada a favor da democracia” e que ele ameaça o sistema de controle ao “denegrir juízes”.17 Hitler e Mussolini eram de fato autoritários, mas disso não se pode concluir que o autoritarismo seja igual ao fascismo ou ao nazismo. Lênin e Stalin eram autoritários, mas nem um nem outro era fascista. Muitos ditadores — Franco na Espanha, Pinochet no Chile, Perón na Argentina, Amin em Uganda — foram autoritários, mas não fascistas ou nazistas. Trump certamente carrega um estilo mandão que adquiriu, bem, sendo chefe. Ele esteve na chefia corporativa por toda sua vida, além de ter também desempenhado cargos de chefia na TV. Os republicanos elegeram Trump porque precisavam de alguém durão para combater Hillary; eles já tentaram candidatos insípidos e inofensivos, como Romney, e veja que fim levou. Dito isso, Trump não fez nada para subverter o processo democrático. Enquanto os progressistas continuam a alegar uma trama entre Trump e os russos no propósito de fraudar as eleições, a única evidência de fraude vem do Comitê Nacional Democrata nas prévias eleitorais de 2016 em favor de Hillary sobre Bernie. A fraude não evocou praticamente nenhum dissidente do público democrata nem da mídia, com isso sugerindo apoio, ou pelo menos aquiescência, de todo o movimento progressista e da maioria do próprio partido. Trump demitiu seu diretor do FBI, provocando rumores obscuros no Washington Post sobre o “respeito pelo Estado de Direito” de Trump, ainda que sua ação tenha sido inteiramente legal.18 Ele criticou os juízes, às vezes em termos irrisórios, mas, contrário ao que Timothy Snyder afirma, não há nada antidemocrático nisso. Lincoln criticou o chefe de justiça Taney sobre a decisão Dred Scott, e FDR ficou praticamente apoplético quando a Suprema Corte bloqueou suas iniciativas do New Deal. Criticar a mídia não é ato antidemocrático. A Primeira Emenda não é só uma prerrogativa à imprensa; o presidente também tem direito à liberdade de expressão. Políticos e governantes autoritários minam estruturas legítimas de

autoridade. Trump ou o GOP fizeram isso? Alguns progressistas acusaram a liderança do Senado do Partido Republicano de minar a ordem e o equilíbrio invocando a “opção nuclear” para encerrar um obstrucionismo democrata e confirmar Neil Gorsuch para a Suprema Corte. No entanto, esses progressistas esqueceram-se de mencionar que foi o ex-líder democrata do Senado, Harry Reid, que primeiro invocou a “opção nuclear”; os republicanos, portanto, simplesmente agiram sobre seu precedente. Governos autoritários costumam tentar controlar sua vida particular. Pense na forma como regimes despóticos, nazistas e soviéticos, por exemplo, procuraram regular a maneira de se prestar culto ou o que as pessoas liam ou como conduziam a vida cotidiana. Percebe-se uma mentalidade firmada ao se ler o que determinado ditado nazista dizia: “só o ato de dormir é questão de cunho privado”. Você acha que Trump se preocupa, ainda que remotamente, com seu jeito de viver sua vida particular? Importa para ele qual deidade você adora ou que livros você lê? Claro que não. Governos autoritários lançam medo em seus adversários. O próprio fato de Trump ser esfolado diariamente em inúmeras plataformas midiáticas mostra que seus oponentes sentem-se livres para falar o que pensam. Considere este contraste notável. Hitler aniquilou seus oponentes na infame Noite das Facas Longas, em 30 de junho de 1934. Mussolini silenciou seus críticos tomando controle das imprensas e assassinou Giacomo Matteotti, um de seus proeminentes opositores. Considere o que Trump fez, em contraste, com a cantora Cher, que certa vez disse “alguma merda desagradável” sobre ele. “Eu tirei a merda dela”, Trump se gabou pelo Twitter, “e ela nunca disse nada sobre mim depois disso”.19 Ele manteve o problema no ambiente do Twitter. Esta dificilmente seria a marca de um autoritário. Nacionalismo: se existe uma característica que os progressistas consideram essencial ao fascismo e ao nazismo, esta é o nacionalismo. Ele permite que a esquerda ligue facilmente o nacionalismo fascista ao patriotismo da direita americana. Certo escritor, Mark Rosenberg, falou por muitos da esquerda quando descreveu o discurso inaugural de Trump como “um apelo visceral e emocional para restabelecer parte da grandeza americana no mundo”. Não é exatamente isso que Hitler prometeu — fazer da Alemanha uma grande nação outra vez? Rosenberg concluiu que Trump fez “sem dúvida, o discurso

inaugural mais fascista da história americana”.20 Trump é, sem contestação, nacionalista, e a direita americana moderna também é nacionalista e sente-se confortável com os símbolos do patriotismo tradicional, tais como o brandir da bandeira ou as representações impactantes do hino nacional e do hino “Deus Abençoe a América”. Em contraste, a esquerda moderna é internacionalista — tem pouca paciência com o manifestar do patriotismo tradicional —, o que parece distinguir os esquerdistas dos nazistas, dos fascistas e dos conservadores americanos. No entanto, seria o nacionalismo, ou até mesmo o ultranacionalismo, suficiente para transformar alguém num fascista? Mussolini era mais nacionalista do que, digamos, Churchill ou De Gaulle? George Washington e Abraham Lincoln eram nacionalistas. Os revolucionários franceses eram todos nacionalistas. Nelson Mandela era nacionalista. Castro era nacionalista, ele que criou o lema revolucionário “Pátria ou Morte”. Che Guevara era nacionalista, assim como Pol Pot. Mesmo vivendo na Inglaterra e na África do Sul, Gandhi seguiu à risca seu nacionalismo indiano. Obviamente, não faz sentido chamá-los de fascistas. Embora Lênin tenha professado internacionalismo ao longo de sua vida, à espera de uma revolução comunista global, Stalin modificou o leninismo para invocar o que ele chamou de “A Mãe Rússia” e “O socialismo em um país”. O nacionalismo de Stalin o torna fascista? É óbvio que não. Também vale notar que, se eram nacionalistas — o que eram, sem sombra de dúvida —, Hitler e Mussolini eram nacionalistas de um tipo bem diferente da estirpe dos conservadores americanos. “Mussolini não era um nacionalista tradicional”, escreve o historiador Zeev Sternhell. Anthony James Gregor vai além: “Mussolini se opunha ao patriotismo tradicional e aos apelos nacionalistas”. No início de sua carreira, Mussolini ridicularizou a bandeira italiana e chamou o exército de “organização criminosa destinada a proteger o capitalismo e a sociedade burguesa”. Hitler autodenominava-se nacionalista, mas recusava-se a autodeclarar-se patriota.21 Ambos buscaram um novo tipo de nacionalismo, um que gerasse lealdade não pela nação como nação em si, mas pela nova nação que visavam criar. O nacionalismo fascista chamou cidadãos a subordinarem seus próprios

interesses por completo ao Estado centralizado. Esse tipo de nacionalismo — vamos chamá-lo de nacionalismo estatista ou coletivista — se parece mais com a esquerda americana do que com a direita americana, já que a direita americana mantém, com Reagan, que “o governo não é a solução; o governo é o problema”. Militarismo: outra característica usada regularmente pelos progressistas para vincular Trump ao fascismo e ao nazismo é o seu suposto militarismo. Mesmo antes de ser eleito, a revista Salon alegou que a candidatura de Trump representava “o abraço e a glorificação do militarismo”, precisamente o mesmo tipo de militarismo com que Hitler e Mussolini se envolveram. De acordo com uma manchete de 1º de março de 2017 no Washington Post, “A Presidência de Trump dá Entrada a uma Nova Era do Militarismo”. Invocando o paralelo histórico fascista, a matéria acusa o arranjo militar disposto por Trump de “lançar uma sombra beligerante sobre todo o planeta”.22 Agora, o fascismo e o nazismo eram de fato militaristas. Hitler e Mussolini, ambos veteranos da Primeira Guerra Mundial, foram, junto de seus aliados japoneses, os perpetradores da Segunda Guerra Mundial. Mesmo assim, o historiador Stanley Payne escreve: “costumava-se denominar o fascismo de movimento expansionista e imperialista por definição, embora isso não fique claro a partir da leitura de diversos programas fascistas”. A bem da verdade, “muitos movimentos fascistas tiveram pouco interesse ou até mesmo rejeitaram novas ambições imperiais”, enquanto outros movimentos defendiam a guerra “geralmente defensiva, mas não agressiva”.23 Digo isso não com a intenção de exonerar o fascismo e o nazismo nesse sentido, mas para destacar que não se deve confundir os aspectos incidentais de uma ideologia com suas características centrais. Se os fascistas defendiam o expansionismo militar enquanto floresciam no interregno entre duas guerras mundiais, não se segue que o fascismo seria intrinsecamente militarista ou que o militarismo fosse uma de suas características definidoras. Por analogia, se os fundadores norte-americanos fossem agricultores, não se segue que a agricultura seria central para a fundação dos Estados Unidos. Parece ser rotina aos esquerdistas atribuir os traços acidentais do nazismo e do fascismo

às ideologias em si mesmas. Trump não é militarista. Ele é, decerto, menos militarista do que o seu partido. Claro que Trump quer derrotar o ISIS com força militar, mas isso porque o ISIS é uma organização terrorista que procura destruir os Estados Unidos. No início de abril de 2017, Trump ordenou um ataque contra um aeródromo sírio. Esta aparentemente foi a resposta de um Trump ultrajado ao ver imagens horríveis que mostravam as vítimas de um ataque de gás químico efetuado pelo déspota sírio, Bashar Assad. A medida tomada por Trump surpreendeu tanto críticos quanto partidários, e nenhum deles esperava tamanha intervenção por parte do presidente. A ação de Trump na Síria parece anômala, dada sua postura geral semiisolacionista. Embora o GOP costumasse apoiar a invasão de Bush no Iraque, por exemplo, Trump construiu uma campanha presidencial sobre sua oposição à guerra. Se Trump quisesse anexar o México e fazê-lo parte de um Estados Unidos maior, ele então poderia ser acusado de imitar o Lebensraum de Hitler. Mas nada poderia estar mais longe da mente de Trump, havendo ele delineado a visão de uma América menos intervencionista, uma América que se concentra em seus próprios problemas internos. Capitalismo: por fim, o capitalismo. Admito que é preciso ser um verdadeiro babaca para fazer essa acusação. Ainda assim, eis o ativista acadêmico da esquerda, Cornel West, afirmando que Trump é um fascista e um nazista porque “num movimento neofascista emergente, você tem o domínio dos grandes negócios, que são os grandes bancos e as grandes corporações”.24 O Ocidente está repetindo inconscientemente uma acusação inventada pela máquina de propaganda comunista soviética, de que os fascistas foram levados ao poder pelo financiamento das grandes empresas e que o fascismo é o último suspiro do capitalismo industrial. Foram os comunistas soviéticos que pela primeira vez apareceram com esta ideia, influenciando em seguida os comunistas italianos e alemães, no intuito de impedir o crescimento do fascismo nesses países. Stalin usou o “fascismo” para referir-se a qualquer país ideologicamente oposto à União Soviética. Quando a ruptura sino-soviética ocorreu, os comunistas soviéticos chamaram os comunistas chineses de “fascistas”, ao passo que os comunistas chineses

chamaram os comunistas soviéticos de “fascistas”. Certamente, estamos, aqui, lidando com a terra do faz de conta. Mesmo que a velha mentira soviética de que o fascismo prova ser um subproduto do capitalismo tenha sido totalmente desacreditada — nem mesmo Robert Paxton, progressista que é, não tem nada que ver com ela —, outros da esquerda, além de Cornel West, ainda ecoam a acusação de que Trump é fascista por ser o capitalismo um traço determinante do fascismo. Sim, Trump é capitalista, mas este é mais um exemplo daquilo que o distingue dos fascistas e dos nazistas. “É impensável”, afirma Renzo De Felice em seu livro Fascism [Fascismo], “supor que as grandes forças econômicas da Itália quisessem levar o fascismo ao poder”. O grande poder empresarial, afinal, não apoiou os fascistas de Mussolini nem os nacionalsocialistas de Hitler. Stanley Payne afirma que o partido nazista “foi financiado sobretudo por seus próprios membros”.25 As grandes empresas consideravam os fascistas e os nazistas como radicais perigosos. Entretanto, depois que os radicais chegaram ao poder, corporações alemãs e italianas, não surpreendentemente, optaram por cooperar com eles. Isso é verdade para as grandes organizações em geral: os empresários fazem negócios com aqueles que estão no poder. As grandes forças econômicas da América trabalharam com Obama, e certamente trabalhariam com Hillary, caso tivesse sido eleita. O historiador Anthony James Gregor ressalta que não faz sentido descrever o fascismo italiano como produto do capitalismo tardio mais recente, porque “havia pouquíssimo de moderno acerca da economia italiana na época da Primeira Guerra Mundial”.26 Conforme veremos no próximo capítulo, Mussolini e os primeiros fascistas reconheceram esse fato. Mussolini passou a enxergar o fascismo como Hitler mais tarde passaria a enxergar o nazismo: como um mecanismo para o rápido desenvolvimento econômico que operava através de uma estrutura que, longe de ser capitalista, revelou ser coletivista, estatista e socialista. Como estamos prestes a descobrir — no restante deste capítulo e no próximo — o coletivismo, o estatismo e o socialismo são a essência do fascismo e do nazismo.

O Karl Marx do Fascismo

Para o Fascismo [...] o Estado e o indivíduo são um só.27 Giovanni Gentile, Origins and Doctrine of Fascism [As Origens e a Doutrina do Fascismo] Giovanni Gentile não é exatamente um nome familiar, hoje em dia. Mesmo no círculo de americanos melhor instruídos, seu nome é o de uma figura desconhecida. No entanto, Gentile, cujos dias se passaram na primeira metade do século XX, foi considerado um dos principais filósofos de sua época. Estudioso de Hegel e Bergson e superintendente da Encyclopedia Italiana, Gentile não foi apenas um pensador amplamente divulgado e influente; foi ele também um estadista que serviu numa variedade de importantes cargos governamentais. Por que, então, Gentile desapareceu no nevoeiro da História? Cabe considerar alguns aspectos-chave da filosofia de Gentile.28 Seguindo Aristóteles e Marx, Gentile argumenta que o homem é um animal social. Isso significa que não somos simplesmente indivíduos no mundo. Em vez disso, nossa individualidade é expressa através de nossos relacionamentos: somos estudantes ou empregados, maridos ou esposas, pais e avós, membros desta ou daquela associação ou grupo, e também cidadãos de uma comunidade ou nação. Falar acerca do homem só em seu estado natural é ficção completa; o homem está naturalmente em casa quando em comunidade, na sociedade. De imediato, percebe-se que Gentile é comunitarista, em oposição à teoria do individualismo radical. Isso o distingue de alguns libertários e liberais clássicos, que enfatizam a individualidade em oposição à sociedade. Mas, até agora, Gentile não disse nada de que os conservadores — digamos, conservadores da linha de Reagan — discordariam. Em 1980, Reagan enfatizou a importância de cinco temas: o indivíduo, a família, a igreja, a comunidade e o país. Ele acusou o Estado centralizado — o grande governo — de minar não apenas a individualidade, mas também essas outras instituições. Agora, Gentile contrasta dois tipos de democracia, que diz ele serem “diametralmente opostas”. A primeira é a democracia liberal, que prevê uma sociedade composta de indivíduos formando comunidades que protegem e fomentam seus direitos e interesses individuais, em especial os interesses

econômicos sobre propriedade e comércio. Gentile considera esse arranjo como uma democracia egoísta ou burguesa, termos que usa para significar a democracia capitalista, democracia que foi basilar para a formação da América. No lugar dela, Gentile incentiva um tipo diferente de democracia, “a verdadeira democracia”, na qual indivíduos voluntariamente se subordinam à sociedade e ao Estado. Gentile reconhece que sua crítica à democracia burguesa ecoa a crítica de Marx, sendo ele seu ponto de partida. Como Marx, Gentile quer uma comunidade unificada, uma comunidade que se assemelhe à família, uma comunidade em que estaríamos todos unidos. Lembro-me, por essa ocasião, do discurso principal do governador de Nova Iorque, Mario Cuomo, na Convenção Nacional Democrata de 1984. Cuomo comparou a América com uma grande família, onde, por meio da ação do governo, uns cuidam dos outros da mesma maneira como famílias cuidam de todos os seus membros. Embora Marx e Cuomo aparentemente vejam comunidades políticas na posição de associações naturais e inevitáveis, Gentile enfatiza que tais comunidades devem ser criadas de maneira voluntária, por meio da ação humana, operando como consequência da vontade humana. Elas são, nas palavras de Gentile, uma criação idealista, ou “espiritual”. Para Gentile, o povo por si só é preguiçoso e inerte demais para formar comunidades genuínas; o povo, portanto, precisa ser mobilizado. Bom, até aqui, muitos progressistas modernos concordariam. Falando em termos que Obama e Hillary gostariam de ouvir, Gentile ressalta que líderes e organizadores são necessários para direcionar e canalizar a vontade do povo. Apesar de discordar de Marx no que diz respeito à inevitabilidade histórica, vê-se com clareza que Gentile, até o dado momento, já rompeu com o conservadorismo moderno, com o liberalismo clássico e revelou ser um homem de esquerda. Gentile foi, a bem da verdade, socialista por toda a vida. À semelhança de Marx, ele considerava o socialismo como a condição sine qua non da justiça social, a fórmula definitiva para todos que pagam sua “parcela justa”. No pensamento de Gentile, o fascismo é nada mais que uma fórmula modificada do socialismo, um socialismo que não meramente provém da privação material, mas também da consciência nacional despertada, um socialismo que, em vez de dividir, une as comunidades.

Gentile também compreendia o fascismo como emergindo da luta revolucionária, aquilo que a mídia hoje denomina “protesto” ou “ativismo”. Ao contrário de Marx, ele não compreendia a luta entre a classe trabalhadora e os capitalistas, mas entre o indivíduo egoísta, que tenta viver para si, e o indivíduo totalmente realizado, que voluntariamente se coloca à disposição da sociedade e do Estado. Gentile aparenta ser o antepassado não reconhecido do ativismo de rua da Antifa e de outros grupos esquerdistas. “Uma das principais virtudes do fascismo”, ele escreve, “é o fato de ter sido um movimento que obrigou aqueles que assistiam de suas janelas a descerem para as ruas”. Para Gentile, a ação privada deve ser mobilizada para servir o interesse público, não havendo distinção entre o interesse privado e o interesse público. Compreendidos de maneira correta, ambos os modelos são idênticos e o cidadão esclarecido entende e vive desta forma, tratando a sociedade e o Estado como, em certo sentido, o seu eu maior. Gentile argumenta que a sociedade representa “a própria personalidade do indivíduo despojada de diferenças acidentais [...] onde o indivíduo sente o interesse geral como sendo seu próprio interesse e o deseja, portanto, assim como deseja a vontade geral”. Na mesma linha, Gentile argumenta que as corporações também deveriam servir ao bem-estar público, e não apenas ao bem-estar dos seus proprietários e acionistas. A sociedade e o Estado — para Gentile, ambos eram um e a mesma coisa. Gentile entendia o Estado centralizado como o braço administrativo essencial à sociedade. Ademais, o Estado, por assim dizer, não presta contas aos cidadãos. “A autoridade do Estado não está sujeita à negociação”, ele escreve. “Ela é totalmente incondicional”. O Estado não poderia depender do povo; na verdade, é o povo quem depende do Estado. A “moralidade e religião [...] devem estar subordinadas às leis do Estado”. Quão familiar isso tudo soa para quem já está habituado à ideologia e à retórica da esquerda americana moderna. Gentile insiste que todos os cidadãos devem se submeter à autoridade do Estado, não apenas em questões econômicas, mas em todos os assuntos e áreas da vida. Visto tudo ser de cunho político, o Estado dita a todos como pensar e também o que fazer — não existe esfera privada desregulamentada

pelo Estado. O fascismo, segundo Gentile, é uma “concepção que soma o total da vida [...] Não se pode ser fascista na política sem ser fascista na escola, na família, no ambiente de trabalho”. O Estado deve trabalhar para provocar essa consciência fascista generalizada. Para alcançar tanto, Gentile defendeu que toda a sociedade deveria ser alinhada com a ideologia fascista, o que os nazistas, mais tarde, viriam a chamar de Gleichschaltung. Mesmo não tolerando as táticas brutais do Gleichschaltung nazista, Gentile buscou a mesma conformidade ideológica através da lei e da educação. Segundo Gentile, o governo não deve agir apenas como legislador, mas também como professor, usando as escolas para promulgar seus valores e prioridades. Expressando uma doutrina que provavelmente a maioria dos professores progressistas da América endossaria, Gentile disse: “Nosso trabalho como professores será considerado completo quando nossos alunos falarem a nossa língua”.29 “Tudo está no Estado e nada humano existe nem tem valor fora do Estado”, Mussolini verbaliza isso em La Dottrina del Fascismo [A Doutrina do Fascismo], uma das primeiras declarações doutrinárias do fascismo, mas Gentile a põe por escrito, ou, conforme se pode dizer hoje em dia, um escritor-fantasma a deixou por escrito. Gentile foi, como dá para perceber, o principal filósofo do fascismo. “Foi Gentile”, confessa Mussolini, “quem preparou o caminho para aqueles que, como eu, querem segui-lo”.30 Gentile serviu como membro do Grande Conselho do Fascismo, senador na Câmara Superior do Parlamento italiano e também Ministro da Educação de Mussolini. Mais tarde, depois que Mussolini foi deposto e firmou-se em Salo, Gentile tornou-se, a pedido do Duce, o presidente da Academia Italiana. Ele não era um homem mau. Rejeitou o antissemitismo e trabalhou com judeus mesmo quando isso passou a ser algo controverso na Itália, após a aliança de Mussolini com Hitler. Ele rejeitou muitas das doutrinas mais basilares do fascismo, argumentando que o Estado, apesar de todo-poderoso, deveria procurar persuadir cidadãos, ao invés de forçá-los. Isso é o que ele chamou de “Estado Tutelar”. Em seu apartamento, em 1944, Gentile foi abordado por membros de uma facção rival de esquerda, que atiraram nele à queima-roupa. Mussolini prometeu executar os assassinos, mas a família de Gentile implorou que fossem liberados, pedido que, inesperadamente,

Mussolini acatou. Penso em Gentile mais ou menos como penso em Robert E. Lee, generalchefe dos Estados Confederados. De modo geral, Lee era um bom homem, no entanto, nas palavras de Ulysses Grant, nunca um homem lutou “por tanto tempo e tão valentemente” nem sofreu “tanto por uma causa, ainda que sendo, creio eu, uma das piores pela qual um povo já lutou”. E o mesmo pode ser dito de Gentile: nunca um homem tão decente lutou por um movimento mais horrível. No entanto, embora Gentile tenha sido esquecido, sua filosofia não poderia ser mais relevante, pois ela se compara à filosofia da esquerda americana moderna. Na verdade, o lema revelado por Obama na Convenção Democrata de 2012 — “nós pertencemos ao Governo” — não foi cunhado por Gentile, mas é totalmente congruente com o centro de sua filosofia. Este é o motivo da obscuridade de Gentile — suas ideias, longe de mortas, estão muito bem vivas. Sem entrar em trivialidades, Gentile chega ao cerne das questões. Em muitos aspectos, ele fornece uma base mais profunda e firme para o progressismo americano moderno do que qualquer escritor de hoje. John Rawls, considerado por muitos um guru filosófico do progressismo moderno, assemelha-se a um grão fino em comparação a Gentile, em se tratando de oferecer bases racionais para o forte Estado centralizado. Enquanto Rawls soa abstrato e antiquado nos dias de hoje, Gentile parece estar falando diretamente aos ativistas de esquerda do Partido Democrata, e também àqueles que estão na mídia e nas universidades. Seria de esperar, ingenuamente, ver a esquerda abraçando e celebrando Gentile. Mas isso, é claro, nunca acontecerá. A esquerda precisa desesperadamente esconder a conexão do fascismo com o esquerdismo contemporâneo. Mesmo quando a esquerda vale-se da retórica gentileana, sua fonte jamais deve ser reconhecida publicamente. E uma vez que domina a academia e a cultura popular, a esquerda tem nas mãos a influência para realizar esse truque de desaparecer. É por isso que os progressistas pretendem manter Gentile no lugar onde já o puseram: morto, enterrado e esquecido.

Em Palavras e em Atitudes O fascismo não era conservador em sua inspiração, mas visava criar uma nova sociedade com um novo tipo de ser humano.31

Walter Laqueur, Fascism: Past, Present, Future Para chegar ao cerne de uma ideologia, é imperativo explorá-la na teoria antes de explorá-la na prática. É por isso que comecei com Gentile: ele explica com autoridade o estatismo e o coletivismo que definem o fascismo e, inclusive, o nazismo. De Gentile, passamos para as declarações doutrinárias e à agenda política do fascismo italiano e do nacional-socialismo alemão. Estes também representam o fascismo utópico, pode-se dizer “fascismo no discurso”. Só então faz sentido examinar o que Mussolini e Hitler realmente fizeram, pois o que fizeram foi, necessariamente, uma aplicação daquilo que pretendiam originalmente realizar, mas com adulterações e diluições já previsíveis. No discurso, o fascismo é, necessariamente, comprometido com o fascismo da atitude. Menciono essa distinção desde o princípio porque ela é que se tornou a base para que os esquerdistas pudessem minimizar os princípios fundamentais do fascismo, de modo a camuflar sua semelhança — e, em alguns casos, seu relacionamento — com o progressismo moderno. Mais uma vez, volto-me ao predileto progressista, Robert Paxton, que, em suas entrevistas ao público em geral, enfatiza que, embora o fascismo “soe bastante radical quando no poder, ele se alia a bancos, indústrias, ao exército, às igrejas e assim por diante”. Paxton também salienta que, “quando você lê o programa de Hitler, seus vinte e um pontos, e quando lê o primeiro programa de Mussolini, de 1919, percebe que ambos tiveram pouquíssima relação com o que acabaram fazendo afinal”.32 Paxton conclui que, apesar dos objetivos outrora professados, o fascismo e o nacional-socialismo não podem ser equiparados ao esquerdismo e ao progressismo, porque Mussolini e Hitler não implementaram o escopo completo de suas ideologias. Como contra-argumentação da minha tese, devo dizer que, embora verdade, este é um ponto extremamente inconvincente. Obviamente, toda teoria deve acomodar as realidades da situação; fazê-lo não mina a teoria em sua posição de ser uma visão do modo como as coisas deveriam ser. Lincoln posicionava-se contra a escravidão, mas, se disposto a vencer a guerra, manter estados fronteiriços na União era-lhe uma necessidade política. Consequentemente, quando assinada, a Proclamação da Emancipação foi

aplicada apenas sobre áreas em rebelião contra os Estados Unidos que ainda não haviam sido ocupadas pelo Exército da União. Salientar isso não significa provar que Lincoln, na verdade, não era contra a escravidão, uma vez que não a proibiu por todo o país. Para segundo exemplo, cito Lênin. Marxista e comunista fervoroso, Lênin comprometeu-se a banir o capitalismo de toda a União Soviética, e ele o fez. A economia soviética, no entanto, entrou em colapso; assim, no início da década de 1920, ele próprio consentindo, Lênin aceitou medidas capitalistas para resolver o problema. Ele permitiu a propriedade privada, incluindo fazendas privadas; ele permitiu que as empresas e os agricultores mantivessem alguns dos seus ganhos; ele chegou mesmo a incentivar o investimento por parte de empresas estrangeiras na União Soviética. Lênin não entendeu sua Nova Política Econômica como traição ao comunismo, mas a considerou uma forma de estabilizar a economia e, também, de exercer controle político sobre o país, para que assim pudesse verdadeiramente institucionalizar o comunismo. Contudo, apesar de articular-se temporariamente para longe do socialismo, alguém realmente poderia afirmar que Lênin não foi um socialista? Agora, voltemo-nos para Mussolini, que, na teoria, era um estatista completo. Uma das frases favoritas de Mussolini era “Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”.33 Aqui, ouvem-se os ecos de Gentile e também os ecos de um progressismo esquerdista moderno levados às últimas consequências. Mussolini, em outras palavras, parece dizer aquilo que vai ao encontro das fantasias secretas do progressista moderno. Mussolini levava o estatismo tão ao extremo que, atrevo dizer, chegava a ser mais estatista do que Barack Obama, mesmo quando este confessou ao New York Times que invejava os líderes comunistas chineses quanto à extensão de seus poderes.34 Mussolini era tão estatista que considerava positivo o termo “totalitário”. Para Mussolini, a palavra não significava o que Orwell retrata em 1984. Mussolini não tinha a intenção de esmagar o povo italiano com um coturno. Em vez disso, o totalitarismo, para ele, significava que o Estado cuidaria de tudo e de todos. Mussolini buscava uma Itália em que o Estado — encarnado nele — viria a exercer controle total sobre todos os aspectos da vida dos

cidadãos. Mussolini, contudo, nunca teve o coração para ser verdadeiramente totalitário. Em parte porque era ele, bom, vejamos, italiano. Seu totalitarismo sempre foi italiano, ou seja, meia-boca. Ele meio que prendia seus oponentes, ele meio que controlava a mídia, e meio que tinha um Parlamento em suas mãos, mas lhe faltava o escrutínio que caracterizava seus mais sombrios companheiros totalitários, Stalin e Hitler. Ao longo de seu reinado de vinte anos, Mussolini matou poucos de seus próprios cidadãos e permitiu que as pessoas, incluindo os judeus, deixassem a Itália. Stalin e Hitler nunca sonhariam em permiti-lo. Que tipo de controle totalitário se pode ter sobre as pessoas se elas forem livres para arrumar suas coisas e dizer saionará? Muito embora o totalitarismo de Mussolini fosse um tanto anêmico, não o foi seu socialismo. A agenda original dos fascistas, tal como delineada em Fasci di Combattimento em Milão, em 1919, incluía sufrágio universal, redução da idade de voto para dezoito anos, abolição do senado elitista, obrigatoriedade das oito horas por dia trabalhadas, programa extenso de serviços públicos, participação dos trabalhadores na gestão industrial, nacionalização dos órgãos de defesa, direito a seguro-saúde e pensão por velhice para todos os cidadãos, confisco estatal de terras não cultivadas, tributação progressiva, imposto de 85% sobre os lucros da guerra e fortes políticas anticlericais, incluindo a exclusão da instrução religiosa nas escolas e apropriação governamental da propriedade de instituições religiosas. Mussolini foi capaz de decretar parte dessa agenda, em particular um programa de serviços públicos, incomparável para a Europa da época. Os fascistas construíram pontes, canais, estradas, estações ferroviárias, escolas, hospitais e orfanatos. Drenaram pântanos, recuperaram terras, plantaram florestas, legaram universidades e institutos de pesquisa. Mussolini também expandiu os serviços sociais num programa que, confessou ele com franqueza, equiparava-se ao New Deal de Franklin D. Roosevelt, até mesmo chegando a superá-lo. (Mais sobre isso será explorado em um capítulo posterior). Mesmo assim, apesar de tudo, grande parte do programa socialista original de Mussolini permaneceu na gaveta. A razão para tanto é que Mussolini, ao contrário de Hitler e Stalin, nunca teve poder absoluto. Ele foi nomeado pelo rei Vítor Emanuel III, que também

tinha o poder para depô-lo, decisão que viria por fim a tomar. Ainda que governando, Mussolini tinha de trabalhar com as estruturas de poder existentes, incluindo membros da classe dominante tradicional. Embora detestasse a Igreja Católica, Mussolini entendeu que lhe fazer oposição tornaria seu governar mais difícil; então, em 1929, ele entrou em concordata com o Vaticano, acordo que exigiu de Mussolini sua abdicação do controle absoluto sobre o sistema educacional. O poder de Mussolini alternava entre altos e baixos, dependendo das circunstâncias. Ele não era o governante absoluto da Itália quando chegou ao poder, mas depois que Giacomo Matteotti, político socialista, foi assassinado por fascistas, Mussolini fez a aposta arriscada e bem-sucedida de assumir o controle ditatorial. Mussolini evidentemente estava no auge de seu poder durante meados da década de 1930, de modo que, durante esse período, assegurou que o Estado tivesse controle sobre todas as atividades industriais e sobre praticamente todas as finanças e o crédito. No entanto, uma vez aliado à Alemanha, Mussolini teve de, novamente, operar dentro da estrutura estabelecida por Hitler. Conforme mais adiante neste livro, Mussolini abraçou parcialmente um racismo e um antissemitismo nos quais ele não acreditava de fato e que não caracterizavam sua carreira quando ele próprio estava à frente das tomadas de decisão. Em 1943, as forças dos Aliados pisaram na Itália. Por meio da ação do rei e do Grande Conselho do Fascismo, Mussolini foi deposto do poder. Hitler, entretanto, resgatou-o do cativeiro e restabeleceu-o, então na posição de governante em Saló, ao norte da Itália, território este que, na época, estava sob controle alemão. Lá, por breve período, Mussolini pôde fazer o que bem entendesse; ele era independente. Daí, o que Mussolini fez? Fundou, como ele mesmo disse, o único governo genuinamente socialista do mundo, com a possível exceção da União Soviética.35 Mussolini tentou implementar o que ele chamou de “verdadeiro socialismo”, afirmando que “elementos plutocráticos e partes do clero” o impediram de antes implementá-lo na Itália. Em Saló, Mussolini esboçou um programa socialista que ia mais além de tudo aquilo que ele já havia tentado implementar na Itália. O novo programa

de novembro de 1943 exigiu que o Estado controlasse todas as partes críticas da economia — energia, matérias-primas, todos os serviços sociais mais essenciais —, deixando apenas poupanças privadas, casas e bens próprios nas mãos do cidadão. O setor público deveria ser administrado por comitês de gestão em que os trabalhadores teriam papel fundamental. Os sindicatos também faziam parte do corpo legislativo fascista. O passo seguinte, declarou o conselheiro de Mussolini, Ugo Spirito, seria abolir toda a propriedade privada. Estranho dizer, o conselheiro mais próximo de Mussolini em Saló era Nicola Bombacci, amigo e discípulo de Lênin que, em 1921, foi cofundador do Partido Comunista Italiano. O período de Mussolini em Saló, embora de curta duração, prova que ele nunca abandonou seus ideais esquerdistas originais. Ele, até o último momento, manteve-se estadista, coletivista e socialista ferrenho.

O Programa Nacional-Socialista Existe em Hitler, também, um socialista aplicado que, pouco depois de assumir a liderança do Partido dos Trabalhadores Alemães, mudou o nome deste para Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (PNSTA). Com declaração após declaração, Hitler não poderia ter sido mais claro sobre seus compromissos socialistas. Ele disse, por exemplo, num discurso de 1927, que “Somos socialistas. Somos inimigos do sistema de exploração capitalista atual [...] e estamos determinados a destruir tal sistema sob a condição que for”.36 De início, o Partido Nazista ofereceu um programa que consistia em vinte e cinco pontos, incluindo a nacionalização das grandes corporações e dos fideicomissos, controle estatal sobre bancos e crédito; a apreensão de terras sem compensação para uso público, a divisão de grandes propriedades para formar unidades menores, o confisco dos lucros de guerra; incluía também acusar banqueiros e outros credores por usura, a abolição dos rendimentos mediante serviço não declarados, a participação dos trabalhadores nos lucros em todas as grandes empresas, um sistema de pensão mais abrangente, prestando maiores benefícios, e um sistema de saúde e educação gratuitos para todos. Lendo o programa nazista inconsciente das fontes, seria facilmente

perdoável confundi-lo com o programa do Partido Democrata de 2016 ou mesmo com alguma plataforma democrata elaborada conjuntamente por Bernie Sanders e Elizabeth Warren. É claro que um pouco da linguagem está desatualizada. Os democratas não podem falar sobre “usura” nos dias de hoje; eles teriam de substituir esse termo por “a ganância de Wall Street”. Seja como for, está tudo lá. Tudo o que precisa fazer é riscar a palavra “nazista” e escrever, em seu lugar, o termo “democrata”. Progressistas como Paxton, que reconhecem o conteúdo esquerdista do programa nazista, tentam distanciá-lo de Hitler, associando-o a uma suposta facção de esquerda dentro do Partido Nazista, o qual Hitler viria a eliminar mais tarde. Essa facção foi liderada pelos irmãos Strasser, Otto e Gregor. Otto Strasser foi expulso do Partido Nazista em 1930 e exilado na Checoslováquia. Gregor Strasser foi morto por ordens de Hitler em 30 de junho de 1934, durante a Noite das Facas Longas. Os Strassers, contudo, escreveram o programa nazista original em parceria com o próprio Hitler. Os irmãos foram figuras-chave no Partido Nazista durante a década de 1920. O partido expulsou Otto Strasser por causa de suas ameaças de fundar seu próprio partido dissidente, o que acabou por fazer. Gregor Strasser repudiou publicamente seu irmão e permaneceu no Partido Nazista. Hitler nomeou-o chefe do partido nas regiões norte e ocidental da Alemanha; lá, tornou-se o segundo com maior autoridade, permanecendo abaixo apenas do próprio Hitler, que em nenhum momento repudiou os princípios que ele mesmo e os irmãos Strasser avançaram desde o início. Sendo assim, por que Hitler matou Gregor Strasser? Uma pista pode ser encontrada nos escritos de Joseph Goebbels, aliado íntimo de Strasser, que se tornou o confidente de Hitler e ministro da propaganda. Num dos registros de seu diário, Goebbels fez uma pergunta simples sobre o nacional-socialismo: “O que é prioridade e o que vem em segundo lugar?”. Goebbels responde: “Em primeiro lugar, vem o socialismo; depois, então, a libertação nacional”.37 A resposta de Hitler foi o oposto: primeiro vem a libertação alemã e depois, então, o socialismo. Goebbels, atraído pela pessoa de Hitler, sucumbiu às prioridades dele. Gregor Strasser não, criticando Hitler por trair

o socialismo revolucionário, mesmo tendo Hitler assegurado que o socialismo viria depois que a Alemanha consolidasse seu poder militar. Strasser não estava persuadido. Em última análise, Hitler ficou cansado das críticas de Strasser e o executou, eliminando um rival perigoso para o processo em andamento. Strasser acreditava que Hitler poderia ter tanto o nacionalismo quanto o socialismo, pois, ao contrário de Mussolini, Hitler desfrutava de poder quase absoluto para fazer o que quisesse. No entanto, o que Hitler desejava fazer, antes das demais coisas, era começar uma guerra. Em essência, seu objetivo era: em primeiro lugar, subjugar a Europa, ou ao menos a maior parte dela; em segundo lugar, expulsar ou eliminar os judeus; e, em terceiro lugar, implementar o socialismo na Alemanha enquanto institucionalizava a subordinação e a escravidão para todos os demais povos. A visão de Hitler era a de que o socialismo seria bom demais para qualquer povo que não fosse verdadeiramente ariano; consequentemente, ele não estava prestes a institucionalizar o socialismo antes de realizar suas duas primeiras tarefas. Assim, Hitler também fez um acordo com o Vaticano e tentou apaziguar-se com os cristãos. Ele precisava do apoio de católicos bávaros e luteranos espalhados pela Alemanha. Hitler também precisava de grandes negócios, tanto para manter a economia alemã acelerada como para fornecer-lhe o vasto estoque de materiais de guerra, sabendo que precisaria disso sob o objetivo de invadir a Europa Oriental, a França e a Rússia. Hitler alcançou seu objetivo de colocar praticamente todos os setores da economia sob o controle do Estado. Ele lançou enormes conglomerados estatais, como o Reichwerke Hermann Göring, mas também adiou vários outros objetivos do programa nazista. Esse adiamento e suas pechinchas com velhos inimigos de modo nenhum prova que ele deixou de ser socialista ou um verdadeiro nazista. À semelhança de Lincoln, Hitler tinha uma guerra que vencer com sucesso, para realizar por completo suas ambições originais. No entanto, para Hitler, ao contrário de Lincoln, a guerra não terminou bem. Assim, o fascismo e o nazismo, então ainda em 1945, acabaram numa pilha de cinzas da História. Levou muito mais tempo para o comunismo soviético entrar em colapso. Pode-se ver, nesses dois exemplos, uma lição desanimadora para a esquerda americana moderna. O coletivismo parecer ter

sido testado duas vezes e provado em ambas ser um fracasso. Mas não é bem essa toda a verdade. O comunismo soviético foi testado e falhou por sua própria conta. Já o fascismo e o nazismo, entretanto, foram destruídos pelo lado de fora, pela guerra. Consequentemente, pode-se dizer que, como planos ideológicos para a sociedade, o fascismo e o nacional-socialismo ainda não fracassaram, porque nunca foram completamente experimentados. No progressismo moderno, portanto, vê-se uma tentativa de reavivamento e ressurreição. Obviamente, este avivamento deve estar sob um nome diferente, e a esquerda certamente precisará de alguma camuflagem antifascista. (Vejam, não temos nenhum fascista por aqui! Você não percebe que estamos lutando contra o fascismo?) Mesmo assim, para pessoas que sabem como reconhecê-los, a esquerda de hoje ainda é o partido do fascismo e do nacional-socialismo, velhas ideologias marchando agora em um diferente continente sob novas cores e diferentes roupagens; um fascismo para o século XXI.

Capítulo Três

A Jornada de Mussolini O conflito entre o fascista ou o nacional-socialista e os outros partidos socialistas deve ser amplamente considerado como o tipo de conflito que necessariamente surgirá dentre facções socialistas rivais.1 Friedrich Hayek, The Road to Serfdom Em 23 de março de 1919, um dos socialistas mais famosos da Itália fundou um novo partido, o Fasci di Combattimento, termo que significa “esquadrão de combate fascista”. Este foi o primeiro partido fascista oficial e, portanto, sua fundação representa o verdadeiro nascimento do fascismo. Da mesma forma, esse homem foi o primeiro fascista. O termo “fascismo” remonta ao ano de 1914, quando ele mesmo fundou o Fasci Rivoluzionari d’Azione Internazionalista, movimento político cujos membros autodenominavam-se fascisti, ou fascistas. Em 1914, este pai fundador do fascismo já era, ao lado de Vladimir Lênin na Rússia, Rosa Luxemburg na Alemanha e Antonio Gramsci na Itália, um dos marxistas mais conhecidos do mundo. Seus companheiros marxistas e socialistas o reconheceram como grande líder do socialismo. Sua decisão de tornar-se fascista foi controversa, mas ele recebeu a aprovação de Lênin, que continuou a considerá-lo um fiel revolucionário socialista. E era assim também que ele mesmo se via. Naquele mesmo ano, tendo apoiado o envolvimento italiano na Primeira Guerra Mundial, ele seria expulso do Partido Socialista Italiano por “heresia”, não significando, porém, que por isso havia deixado de ser socialista. Era prática comum para os partidos socialistas a expulsão de companheiros socialistas dissidentes, daqueles que discordavam de alguns pontos importantes da linha do partido. Este então rejeitado pelo partido insistiu que fora expulso por ter feito uma “revisão do socialismo do ponto de vista

revolucionário”.2 Pelo resto de sua vida — até ter seu corpo morto e exposto numa praça da cidade de Milão —, ele confirmou os princípios centrais do socialismo, os quais via refletidos de melhor forma no fascismo. Quem, então, era esse homem? Era o futuro líder da Itália fascista, aquele que os italianos chamavam de Il Duce, Benito Mussolini. As credenciais socialistas de Mussolini eram impecáveis. Criado em família socialista, com a idade de dezoito anos, em 1901, declarou publicamente suas convicções. Aos vinte e um anos, já era marxista ortodoxo, familiarizado não só com os escritos de Marx e Engels, mas também com os mais influentes marxistas alemães, italianos e franceses do período fin de siècle. Tais quais outros marxistas ortodoxos, Mussolini rejeitou a fé religiosa e escreveu panfletos anticatólicos repudiando o catolicismo de sua nação. Mussolini embarcou em uma carreira ativa de escritor, editor e dirigente político. Exilado na Suíça entre 1902 e 1904, colaborava semanalmente com o Partido Socialista Italiano lançado lá; também escreveu para Il Proletario, periódico semanal socialista publicado em Nova Iorque. Em 1909, Mussolini fez outra estada temporária em Trento — na época, parte da Áustria-Hungria —, onde trabalhou para o Partido Socialista e editou seu jornal. Ao retornar, no ano seguinte, à sua cidade natal, Forli, ele editou o periódico semanal socialista La Lotta di Classe. Tão vastos foram seus escritos sobre o marxismo, a teoria socialista e a política contemporânea que sua produção agora preenche sete volumes. Mussolini não era apenas um intelectual; ele organizou greves de trabalhadores em nome do movimento socialista dentro e fora da Itália e foi duas vezes preso por seu ativismo. Em 1912, Mussolini foi reconhecido como líder socialista no Congresso Socialista de Reggio Emilia e designado para o conselho administrativo do Partido Socialista Italiano. No mesmo ano, aos vinte e nove anos, tornou-se editor da Avanti!, publicação oficial do partido. Do ponto de vista da narrativa progressista — narrativa que comecei a desafiar no capítulo anterior —, a mudança de Mussolini, do socialismo marxista para o fascismo, deve vir como uma grande surpresa. No paradigma progressista, o socialismo marxista é o extremo do lado esquerdo do espectro,

ao passo que o fascismo é o extremo do lado direito. A incredulidade progressista torna-se ainda maior quando se percebe que Mussolini não era mais outro mero socialista; ele era, reconhecidamente, o líder do movimento socialista na Itália. Além disso, ele não simplesmente pegou o bonde do fascismo; ele o criou. Hoje em dia pensamos em Adolf Hitler como o representante mais famoso do fascismo. No entanto, conforme mencionei anteriormente, Hitler não se considerava fascista. Ao invés disso, ele se considerava nacional-socialista. As duas ideologias estão relacionadas na medida em que ambas são baseadas no coletivismo e no poder centralizado no Estado. Elas emergem, pode-se dizer, de um ponto de partida em comum. No entanto, também são distintas; por exemplo, o fascismo não tinha conexão intrínseca com o antissemitismo da mesma maneira como o nacional-socialismo o tinha. Seja como for, Hitler ainda era um obscuro dirigente na Alemanha quando Mussolini ascendeu ao poder e, após sua famosa Marcha sobre Roma, estabeleceu o primeiro regime fascista do mundo, na Itália, em 1922. Hitler admirava muito Mussolini e almejava ser como ele. Segundo Hitler, Mussolini era “o principal estadista do mundo, a quem ninguém pode, nem mesmo remotamente, comparar-se”.3 Hitler tomou inspiração da bemsucedida Marcha sobre Roma guiada por Mussolini para o seu fracasso na ocasião do Putsch de Munique, realizado em novembro de 1923. Logo que chegou ao poder, Hitler manteve um busto de Mussolini em seu escritório; e certo alemão chegou a chamá-lo de “Mussolini da Alemanha”.4 Mais tarde, quando os dois homens conheceram-se pela primeira vez, Mussolini não ficou muito impressionado com Hitler, passando a considerálo com mais respeito só depois de 1939, quando Hitler conquistou a Áustria, a Polônia, a Checoslováquia, a Bélgica, a Noruega e a França. Hitler continuou a defender Mussolini como “esse estadista incomparável” e “um dos Césares”, além de confessar que, sem o fascismo italiano, não existiria o nacional-socialismo alemão: “Os camisas pardas provavelmente não existiriam sem os camisas negras”.5 Assim como Mussolini, Hitler era homem da esquerda, sem contar que também era líder socialista e cabeça da classe trabalhadora, fundador do

Partido Socialista dos Trabalhadores Alemães, cujo programa provou ser muito semelhante ao do partido fascista de Mussolini. Hitler, entretanto, chegou ao poder na década de 1930, ao passo que o governo de Mussolini abrangeu a maior parte da década de 1920. Durante esses anos, Mussolini foi muito mais famoso do que Hitler, reconhecido inclusive como o pai fundador do fascismo. Portanto, qualquer descrição da origem do fascismo não deve se concentrar em Hitler, mas em Mussolini. Este, sim, Mussolini, é o fascista original e prototípico.

Do Socialismo ao Fascismo Como então — retornando ao paradigma progressista — os progressistas retratam a conversão de Mussolini do socialismo ao fascismo, ou, mais precisamente, seu abraçar simultâneo de ambas as ideologias? O problema é aprofundado pelo fato de que Mussolini não estava sozinho. Centenas de líderes socialistas, inicialmente na Itália mas posteriormente na Alemanha, na França e em outros países, também tornaram-se fascistas. Na verdade, vou além ao dizer que todas as principais figuras da fundação do fascismo eram homens de esquerda. “Os primeiros fascistas”, diz Anthony James Gregor, “eram quase todos marxistas”.6 Citarei alguns exemplos. Jean Allemane, famoso por seu papel no caso Dreyfus, uma das grandes figuras do socialismo francês, viria a tornar-se fascista anos mais tarde. Assim também foi com o socialista Georges Valois. Marcel Deat, fundador do Parti Socialiste de France, acabou abandonando o partido e, em 1936, deu início a um partido pró-fascismo. Tempos depois, ele passou a colaborar com o nazismo durante o regime de Vichy. Jacques Doriot, comunista francês, moveu seu Parti Populaire Français para o campo fascista. Henri de Man, teórico socialista belga, transformou-se num teórico fascista. Na Inglaterra, Oswald Mosley, parlamentar socialista do Partido Trabalhista, por fim rompeu com o Partido Trabalhista por não o considerar suficientemente radical. Mais tarde, ele fundou a União Britânica dos Fascistas e tornou-se o principal simpatizante nazista do país. Na Alemanha, Gerhart Hauptmann, dramaturgo socialista, abraçou Hitler e produziu peças durante o período do

Terceiro Reich. Após a guerra, passou para o comunismo e encenou suas produções na Berlim Oriental, dominada pela União Soviética. Na Itália, o filósofo Giovanni Gentile passou do marxismo para o fascismo, assim como uma série de dirigentes sindicais italianos: Ottavio Dinale, Tullio Masotti, Carlo Silvestri e Umberto Pasella. Agostino Lanzillo, escritor socialista, juntou-se ao Parlamento de Mussolini como membro do Partido Fascista. Nicola Bombacci, um dos fundadores do Partido Comunista Italiano, tornou-se o principal assessor de Mussolini em Saló. O discípulo de Gentile, Ugo Spirito, que também serviu a Mussolini em Saló, passou do marxismo para o fascismo e depois de volta ao marxismo. Como Hauptmann, Spirito tornou-se simpatizante do comunismo após a Segunda Guerra Mundial e pediu uma nova “síntese” entre o comunismo e o fascismo. Outros que fizeram a mesma jornada do socialismo ao fascismo serão nomeados neste capítulo. Uma coisa que ficará muito clara é que tais não são histórias de “conversão”. Esses homens não “mudaram” do socialismo para o fascismo. Ao contrário, eles tornaram-se fascistas da mesma forma pela qual os socialistas russos tornaram-se bolcheviques leninistas. Tais quais seus homólogos russos, aqueles socialistas acreditavam estar crescendo no fascismo, amadurecendo no fascismo, uma vez que consideravam o fascismo a forma mais bem pensada e prática do socialismo para o novo século. O progressismo simplesmente não consegue explicar a fácil mudança do socialismo para fascismo. Sendo assim, os progressistas costumam manter silêncio completo sobre toda essa relação histórica, a qual lhes é profundamente embaraçosa. Em todos os artigos comparando Trump a Mussolini, procurei em vão por referências ao antigo marxismo de Mussolini e seu apego ao socialismo de toda uma vida. Tanto por ignorância quanto por esquemas, essas referências não se fazem presentes. Os relatos biográficos progressistas, no entanto, que não podem evitar o passado socialista de Mussolini, recorrem e acusam-no — como o Partido Socialista da Itália fez em 1914 — de ter “se vendido” ao fascismo por dinheiro e poder. Outros relatos afirmam que, independentemente das convicções originais de Mussolini, o próprio fato de seus fascistas terem lutado contra os marxistas e os socialistas tradicionais mostra claramente que Mussolini não permaneceu socialista, nem mesmo de esquerda.

Mas essas explicações não fazem sentido. Quando se “vendeu”, Mussolini foi banido. Ele não tinha dinheiro, não tinha poder. Nem tampouco qualquer um dos primeiros fascistas abraçou o fascismo por esse motivo. Pelo contrário, eles passaram para o fascismo porque viram nele o único meio de resgatar o socialismo e torná-lo viável. Em outras palavras, a deserção deles estava dentro do socialismo — eles procuravam criar um novo tipo de socialismo, um que realmente causasse aderência das massas e produzisse a revolução dos trabalhadores que Marx anteviu e antecipou. As lutas ferozes entre facções socialistas e esquerdistas são uma característica reconhecida da história do socialismo. Na Rússia, por exemplo, houve confrontos sangrentos entre rivais bolcheviques e mencheviques. Mais tarde, os bolcheviques dividiram-se em leninistas e trotskistas, e Trotsky acabou morto por ordens de Lênin. Todos eram figuras da esquerda. O que essas rivalidades sangrentas provam é que as piores divisões e conflitos às vezes surgem entre pessoas ideologicamente muito parecidas e que diferem em pequenos — embora não tão pequenos aos olhos delas — pontos doutrinários. Neste capítulo, traçarei o desenvolvimento do fascismo, mostrando exatamente como este surgiu de uma divisão doutrinária dentro da comunidade de socialistas marxistas. Em suma, vou provar que o fascismo é exclusivamente um produto da esquerda. Este não é um caso de esquerdistas que passaram para a direita. Não, os fascistas estavam no extremo esquerdo do movimento socialista. Eles não se viam como desprezando o marxismo, mas como que o salvando da obsolescência. Do ponto de vista deles, o marxismo e o socialismo eram inertes demais e, portanto, precisavam ser ajustados mais para a esquerda. Em outras palavras, eles consideravam o fascismo mais revolucionário do que o socialismo tradicional. Em grande parte, essa narrativa por si só é um capítulo não contado na história das ideias. Eu a escavei de obras densamente acadêmicas dos principais historiadores do fascismo, para colocá-la ao alcance de uma audiência geral. Conforme esses estudiosos enfatizam, não foi assim que o fascismo terminou, mas como começou. Hoje o fascismo é pensado em termos das extremas perversidades da Segunda Guerra Mundial, mas o movimento fascista não teria atraído um grande número de seguidores se

fosse, originalmente, visto dessa forma. Deve haver um apelo lógico e emocional que hoje nos é invisível. Tento mostrar, aqui, a força dessa lógica e dos tais apelos originais. Meu objetivo é produzir uma genealogia no sentido do termo que Nietzsche escreveu em sua Genealogia da Moral. Nietzsche buscava desacreditar a moral cristã ao relatar sua origem, revelando suas supostas raízes basilares. Meu objetivo é mostrar as origens fundacionais do fascismo, e não tanto a fim de desacreditá-lo — dificilmente seria necessário fazê-lo em nossa época —, mas para estabelecer, de uma vez por todas, a grande mentira que é tornar o fascismo um fenômeno de direita. Sem essa mentira, a afirmação de que Trump e o GOP são fascistas simplesmente desmorona.

A Crise do Marxismo O fascismo surgiu da profunda crise enfrentada pelo marxismo no início do século XX. Portanto, partamos dela. Lembre-se de que Marx não pediu que os trabalhadores do mundo se levantassem e se rebelassem contra a classe burguesa ou capitalista. Em vez disso, ele previu que isso aconteceria. Marx se via como uma espécie de profeta, predizendo o que viria a acontecer. Para Marx, não importava se alguém fosse a favor do comunismo ou contra ele; de qualquer forma, a chegada do comunismo seria inevitável. Como sabia disso? Marx era um materialista histórico. Ele não recebeu suas profecias de Deus; ele as recebeu por meio do estudo daquilo que ele considerava ser os fundamentos materiais da História. De acordo com Marx, a História é dividida em duas classes: a classe trabalhadora, ou o proletariado, e a classe capitalista, ou a burguesia. Em essência, a classe capitalista tornase rica ao explorar continuamente a classe trabalhadora. Portanto, é previsível que, em dado momento, este conflito fique tão severo que seja inevitável a derrubada revolucionária da classe capitalista por parte dos trabalhadores. Marx considerava seu trabalho “estritamente científico” e, também, “estritamente realista”. Seu ajudante, Engels, falou das “leis gerais do movimento”. Marx e Engels alegaram saber até as condições precisas em que essa revolta ocorreria. Primeiro, aconteceria nos países capitalistas mais avançados. Especificamente, Marx esperava que o comunismo chegasse

primeiramente à Alemanha ou à Inglaterra. Em seguida, ele esperava que se espalhasse para outros países europeus e, finalmente, por todo o mundo. Em segundo lugar, Marx insistia que os sinais de uma revolução iminente seriam o crescente empobrecimento da classe trabalhadora e a crescente alienação de seus empregadores e da sociedade. Parece meio cômico, em retrospecto, que pessoas altamente inteligentes aceitaram toda essa ladainha marxista — os pressupostos infundados, o pretensioso absurdo verborrágico — como um evangelho. Mas é certo que assim a acolheram. Contudo, no início do século XX, tornou-se óbvio para a maioria das pessoas — até mesmo para muitos marxistas — que nada do que Marx havia previsto estava realmente acontecendo. Não só não havia sinais de revolução na Alemanha ou na Inglaterra, mas também as classes trabalhadoras nessas nações pareciam cada vez melhores e com notória estabilidade. Por exemplo, na Alemanha e na Inglaterra, a renda per capita, ajustada pela inflação, praticamente dobrou no ínterim entre as previsões de Marx e o início do século XX.7 Em suma, a barganha capitalista parecia estar funcionando; o proletariado e a burguesia estavam se dando muito bem. O socialismo parecia ainda menos provável na América, escreveu Werner Sombart, economista alemão, porque todos estavam muito confortáveis. Nas palavras de Sombart, todas as utopias revolucionárias falham quando se trata de ter carne assada e torta de maçã que pôr no prato. A crise do marxismo pode ser percebida em uma única carta escrita por Eduard Bernstein, alemão exilado na Inglaterra, pupilo e protegido mais próximo de Engels. Já em 1898, Bernstein escreveu: “Tentei, ao estender os ensinamentos marxistas, deixá-los de acordo com as realidades práticas [...] Mas, em terminada minha atuação, disse a mim mesmo — isso não pode continuar. É inútil tentar conciliar o irreconciliável. É preciso esclarecer com exatidão onde Marx está certo e onde ele está errado”.8 A necessidade de revisões fundamentais no marxismo tornou-se ainda mais óbvia nas primeiras décadas do século XX. Em 1917, houve uma revolução comunista, mas, entre todos os lugares possíveis, ela ocorreu na Rússia, um dos países menos desenvolvidos da Europa. Para os marxistas, aquela

revolução sobreveio de surpresa. Marx insistia que a revolução na Rússia, na Ásia ou na África eram impossíveis sem que essas regiões passassem por etapas do desenvolvimento capitalista. A trajetória histórica de Marx passou do feudalismo ao capitalismo e, então, ao comunismo. Em outras palavras, é preciso tornar-se capitalista antes de tornar-se comunista. Não menos do que os outros poderiam ver, os marxistas perceberam que a revolução russa não foi uma revolta do proletariado contra uma classe capitalista, mas uma operação militar organizada por revolucionários profissionais contra uma ditadura czarista. Os revolucionários não eram da classe trabalhadora, mas principalmente provenientes da intelligentsia — advogados, jornalistas, ativistas sociais. Não era o que Marx havia previsto. Quanto ao tipo de revolução que Marx previu, a revolta da classe trabalhadora, nunca houve uma revolução que fosse proletária em qualquer sentido inteligível do termo. Como os marxistas reagiram a esses acontecimentos surpreendentes e, para eles, inclusive, perturbadores da História? A maioria dos partidos marxistas oficiais na Europa reagiu feito gado, de uma estupidez bovina. O marxismo caiu em uma espécie de torpor intelectual. Muitos da liderança marxista basicamente ignoraram o mundo como tal e continuaram a esperar o mundo como ele deveria ser. Karl Kautsky e Rosa Luxemburg foram líderes influentes do Partido Social-Democrata alemão, o principal partido socialista do mundo, e mais tarde do Partido Social-Democrata Independente da Alemanha. A posição deles era que a revolução realmente chegaria à Alemanha, assim que as condições estivessem maduras. No entanto, como Eduard Bernstein, muitos dos marxistas e socialistas mais inteligentes reconheceram que se tratava de um sonho socialista. As condições em toda a Europa estavam ficando menos maduras. A cada década, a condição de vida dos trabalhadores melhorava consideravelmente. E como explicar a Rússia? Marx ficaria chocado. Então um grande debate surgiu entre os marxistas, socialistas e esquerdistas, daí surgindo duas novas tensões do socialismo marxista, que dominariam o novo século. A primeira era o bolchevismo, ou leninismo. A outra era o fascismo, ou nacional-socialismo. Comecemos por Lênin, líder revolucionário da revolução russa. Lênin era, tal qual Mussolini, um revolucionário intelectual e também revolucionário

prático. Ele, como Mussolini, começou no socialismo marxista ortodoxo e permaneceria, até o fim de sua vida, leal à essência da doutrina marxista. No entanto, Lênin sabia que também deveria explicar por que o comunismo havia chegado à Rússia, mas não aos países capitalistas avançados como a Alemanha ou a Inglaterra. Sua explicação, oferecida em seu livro chamado O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo, é engenhosa. Basicamente, Lênin argumenta que o capitalismo havia “exportado” sua própria crise, através do colonialismo e do imperialismo, para o Terceiro Mundo. Em outras palavras, os capitalistas no Ocidente estavam subornando sua classe trabalhadora ao explorar os pobres em outros países. Isso, argumenta Lênin, não foi algo que Marx previu. Por conseguinte, Lênin afirma, não deveríamos esperar uma revolução na principal metrópole do capitalismo, na Europa Ocidental, mas sim na periferia. A Rússia era simplesmente o primeiro caso de revoluções socialistas ocorrendo pelo mundo subdesenvolvido previstas por Lênin. Além disso, ele sabia que sua revolução bolchevique não era uma revolução da classe trabalhadora. Ele percebeu não haver registros disso, exceto a partir de uma revisão de Marx. Em seu livro mais famoso, Que Fazer?, Lênin insiste que Marx havia sido muito complacente em esperar que a revolução ocorresse por si só. De certo modo, Marx havia depositado confiança demais nos trabalhadores. Lênin os considerava ignorantes e oprimidos demais para dar início ao que quer que fosse. Segundo Lênin, as revoluções futuras exigiriam uma vanguarda profissional de combatentes militantes, lideradas por pessoas como ele, para instigar a consciência de classe na sociedade e derrubar a classe dominante em nome da classe trabalhadora. Esses militantes não precisavam ser proletários; eles poderiam ser intelectuais, artistas, até membros da burguesia. No dizer do cientista político Joshua Muravchik, do ponto de vista de Lênin “a revolução proletária não precisava ser realizada por proletários; ela poderia ser realizada em favor deles”.9 No final das contas, Lênin esperava que as coisas se tornassem bem parecidas com o que Marx havia previsto. Lênin concordava com Marx sobre a revolução comunista ser um evento internacional. Por fim, ela seria um

fenômeno mundial. Além disso, seria dirigida pelas diferenças de classes, vistas em todos os países. Assim, o comunismo não pode ficar restrito a um único país; de fato, como Marx disse certa vez, o operário não tem país. Lênin também esperava que, quando a revolução finalmente ocorresse, o próprio Estado desapareceria. Este foi o tema central de seu livro O Estado e a Revolução, no qual ele previa que da revolução do proletariado seguiria uma ditadura do proletariado, a qual, por sua vez, seria seguida do desaparecimento completo de qualquer tipo de Estado. Em outras palavras, na utopia comunista, todos na sociedade possuirão conjuntamente os meios de produção e não haverá a necessidade de um Estado. Esse pequeno pedaço de artifício ideológico marxista fica especialmente risível quando é posta sob consideração a União Soviética de Lênin, com seu Estado militarizado e inchado, confiscando a riqueza do povo e governando com um cetro de ferro sobre sua vida. À medida que desprezava o povo russo em nome da ideologia socialista, Lênin, em total insensatez, continuava a prever o desaparecimento de todo o aparelho do Estado comunista. Nota-se que as inovações de Lênin sobre o marxismo não foram bem recebidas pela principal corrente dos marxistas europeus, como Kautsky e Luxemburgo, que o acusaram de corromper os ensinamentos marxistas e minar toda a lógica do próprio marxismo. Lênin não se importou, afinal sabia que ele próprio representava o futuro. O leninismo sobreviveria à “crise do marxismo” e mudaria o mundo. E o que aconteceu com Kautsky e Luxemburgo? Ele desapareceu nos arquivos mofados da história marxista e ela foi feita nota de rodapé — executada pelo regime de Weimar, em 1919, por ter se associado a uma insurreição armada que por fim fracassou. Na Itália, um homem de temperamento muito semelhante ao de Lênin, não menos cruel e prático, ponderava sobre a mesma crise que o déspota soviético. Ele estava acompanhado nessa busca por todo um movimento de socialistas revolucionários, sobretudo na Itália, mas também na França e na Alemanha. Eles chegariam a conclusões bem diferentes da de Lênin e vislumbrariam um tipo de futuro socialista bastante distinto. Mesmo assim, juntos, lançaram um movimento, o fascismo, que rivalizaria com o comunismo soviético em seu alcance global e trágica destruição.

O Mito da Violência Revolucionária A resposta fascista à “crise do marxismo” tomou um rumo diferente do de Lênin, embora mantivesse algumas semelhanças de abordagem. Essa mudança é mais interessante para o propósito aqui exposto, uma vez que o fascismo de Mussolini exerce maior relevância sobre o progressismo americano do que o bolchevismo de Lênin. No entanto, aqui devemos ver a trajetória de Mussolini junto ao percurso dos demais, porque ele não agiu sozinho. O fascismo italiano — o primeiro fascismo — surgiu como síntese de dois movimentos socialistas: o movimento nacionalista e o movimento sindicalista revolucionário. Ambos foram construídos sobre os fundamentos de um homem, Georges Sorel.10 Não obstante marxista francês, Sorel partiu da premissa de que as previsões de Marx falharam: “Sabemos que as coisas simplesmente não acontecem como Marx supôs em 1847”. O problema para Sorel foi o determinismo histórico de Marx. Em suas palavras: “Prometem-nos ciência, mas recebemos apenas palavras. Não nos são dados novos meios de atuação no mundo”. Em outras palavras, aos olhos de Sorel, a revolução não apenas acontece para a classe trabalhadora; ela deve ser causada pela própria classe trabalhadora. Mas como? Neste ponto Sorel vai além de Marx e mergulha no domínio da psicologia. O ser humano, diz ele, é motivado por poderosas aspirações internas, aspirações que demonstram não ser inteiramente racionais. Sorel as chama de “mitos”; por mitos ele quer dizer ideias poderosas que reúnem grandes grupos de pessoas com o objetivo de agir. Ele ressalta que as Cruzadas foram conduzidas pelo mito da santa missão de reconquistar Jerusalém. Os mitos não são “descrições das coisas”, insiste Sorel, “mas expressões da vontade”. Assim como Lênin, Sorel considerava a classe trabalhadora inerte, incapaz de dar-se à revolução por si só. Ela precisava era de líderes que infundiriam suas lutas de classes com mitos poderosos, e esses mitos, por sua vez, unificariam o proletariado e o levaria à ação. Sorel parece clamar por algo semelhante à vanguarda revolucionária de Lênin, um líder, ou grupo de líderes, que despertaria a consciência da classe trabalhadora. Eis o conceito

de “conscientização”, que é comum ao leninismo e ao fascismo inicial, e também uma característica importante do progressismo americano moderno. A conscientização parte do princípio de que o lugar onde a revolução ocorre é na mente humana. A consciência — não a circunstância — determina se você é verdadeiramente revolucionário. O intelectual autoconscientizado pode considerar-se um dos proletários. O homem trabalhador que rejeita a revolução pode ser diagnosticado como sofrendo de “falsa conscientização”. A Nova Esquerda, na década de 1960, estava obcecada com a conscientização. Saul Alinsky, um mentor para Obama e Hillary, dedicou grande parte dos seminários e treinamentos que ministrou para a conscientização. Hoje em dia já é rotina para o movimento Black Lives Matter e para outros grupos de esquerda promover seminários de conscientização como parte do treinamento para protestos. Isso tudo substitui a noção de Marx de inevitabilidade histórica, reconhecendo que as pessoas não se perturbam por iniciativa própria; suas queixas e intempéries lhes devem ser criadas, ou pelo menos interpretadas; o povo, de modo a levantar e agir, precisa ser instigado. Embora reconhecesse estar revisando Marx, Sorel insistia que sua revisão estava inteiramente no espírito de Marx. O marxismo não estava errado, ele apenas exigia uma “obra de conclusão”, a qual seria realizada “pelos métodos marxistas”. O problema era que o marxismo havia sido corrompido por marxistas cegos demais para entender que a revolução não estava acontecendo no curso normal dos acontecimentos; eram também pessoas inertes e preguiçosas demais para que o proletariado fosse levado à ação. Sorel concordava com Marx em afirmar que a divisão central da sociedade é uma divisão de classes — uma divisão entre trabalhadores e capitalistas. “A luta de classes é o alfa e o ômega do socialismo”. A luta de classes era “o que realmente havia de verdadeiro no marxismo, de poderosamente original, superior a todas as fórmulas”. Sorel insistia que Marx, em seus primórdios, falava menos em termos de inevitabilidade da revolução e mais em termos de motivar os trabalhadores e estimulá-los à ação. Então, em certo sentido, Marx acertou desde o início. A ação que Sorel queria ver era uma greve geral. Este era o “mito”, ou a causa, que levaria os trabalhadores ao agir decisivo. Por greve geral Sorel não

imaginava uma série de confrontos de trabalhadores contra capitalistas espalhados em várias indústrias, mas sim uma única greve nacional que, de uma só vez, derrubaria o sistema capitalista. Assim como Lênin, Sorel percebeu que tal greve dificilmente poderia ser pacífica, pela simples razão de que os capitalistas nunca desistiriam de seu poder sem antes batalhar por ele. Sorel, portanto, aprovava uma greve geral como meio de revolução violenta. De modo algum ele era alérgico à violência; na verdade, sua principal obra se chama Reflexões sobre a Violência. Sorel falou da violência como sendo “bela” e “heroica”. Para ele, a violência era uma espécie de higienização saudável — uma remoção dos detritos sociais. Percebe-se aqui, no início do fascismo, do leninismo e, mais tarde, do progressismo americano, essa mesma glorificação da violência dando apoio à revolta e ao protesto. Para todas essas ideologias, bater nas pessoas é uma forma importante de purgar a sociedade de seus males longevos. Sorel permaneceu marxista por toda sua vida. Ele dedicou seu livro Reflexões sobre a Violência a Lênin, e deu boas-vindas à revolução russa. Embora nunca tenha se autodenominado fascista, Sorel estava ciente de que os fascistas haviam sido influenciados por seu trabalho, e jamais os reprovou. Assim como tantos que viriam a segui-lo, Sorel viu o fascismo como continuação e concretização do socialismo, a conclusão, termo que ele usou, do “papel histórico” da esquerda. Mussolini ficou bastante impressionado com Sorel. “As massas”, ele escreve, “não podem ser os protagonistas da História — elas são o seu instrumento”.11 Naturalmente, ele se considerava o tipo de líder que invocaria os mitos coletivos, que, por sua vez, conduziriam o proletariado à ação. Tal qual Sorel, Mussolini afirmava a necessidade, e até mesmo a beleza, da violência no papel de consumação da revolução. Em outras palavras, o socialismo das palavras teria de, por fim, resultar no socialismo das atitudes. Os revolucionários da esquerda deviam realmente assumir o controle do país; e, para fazê-lo, obviamente teriam de quebrar alguns crânios.

Trata-se da Nação, seu Idiota!

Em 1911, a Itália invadiu Trípoli e Cirenaica no objetivo de arrancar a província da Líbia do Império Otomano. Observando a campanha italiana, Mussolini descobriu algo surpreendente. Ele notou que a classe trabalhadora italiana respondia mais poderosamente ao apelo da nação do que jamais teria respondido ao apelo de classes, percepção que se fortificou alguns anos mais tarde, quando a Itália entrou na Primeira Guerra Mundial ao lado da GrãBretanha e da França. Mussolini viu que os socialistas italianos lutaram pela Itália, os socialistas franceses lutaram pela França, e os socialistas alemães lutaram pela Alemanha. A importância desta descoberta não pode ser suficientemente relatada. Socialista imbuído de conceitos de classe marxistas, Mussolini acreditava que a associação de classes era o principal motor da História. Determinado, acreditava que as pessoas estavam principalmente ligadas à classe a que pertenciam. Elas morreriam por sua classe, se desafiadas a fazê-lo. Isso se aplicaria igualmente aos trabalhadores e à burguesia. Na segunda década do século XX, Mussolini viu que não era esse o caso. O povo não daria a vida pela classe pertencente, mas a daria pela nação. A princípio, Mussolini recusou-se a acreditar nisso. Marx insistia que as alianças de classe eram fundamentais e que o nacionalismo era invenção da classe dominante burguesa. Na verdade, Marx repudiava o antigo patriotismo, cuja ostentação de bandeiras e parafernálias ele considerava um ardil da classe dominante burguesa para manter a classe trabalhadora sob controle. Ele acreditava que o patriotismo era uma estratégia para reprimir o conflito de classes. Mussolini concordava com isso. Ele se opôs vigorosamente à guerra da Líbia e ridicularizou demonstrações do patriotismo italiano. A bandeira italiana, disse ele com palavras que permaneceram na História, não passava de um “pano” que merecia ser “plantado em monturos”.12 Em 1914, ano da Grande Guerra, Mussolini começava a pensar de forma diferente. Sua mudança de coração surgiu principalmente a partir da observação pessoal e direta do que realmente unia a classe trabalhadora, ou seja, seu apego à Itália em vez de seu apego a este grupo chamado proletariado. Mussolini observou que, nas trincheiras, “ninguém mais falava de retornar à sua aldeia ou região. Todos falavam sobre voltar para a

Itália”.13 Todavia, a mudança de Mussolini também foi influenciada por um grupo de socialistas revolucionários que já defendia a nação acima das classes. Estes eram os nacionalistas, cujos personagens mais proeminentes eram Roberto Michels, Enrico Corradini e Alfredo Rocco. Mais tarde, todos eles tornaram-se fascistas. Michels, socialista alemão até antes de se mudar para a Itália, juntou-se primeiro ao Partido Socialista Italiano e depois ao Partido Fascista de Mussolini. Corradini e Rocco eram ativistas do socialismo; Corradini foi o principal motor da Associação Nacionalista Italiana, à qual Rocco mais tarde juntou-se. Finalmente, este grupo fundiu-se e formou o partido fascista. Corradini foi nomeado por Mussolini para servir no Senado italiano e ligou-se ao governo de Mussolini em 1928. Rocco foi eleito fascista para a Câmara dos Deputados e, mais tarde, como ministro da justiça de Mussolini, tornou-se um importante arquiteto do código penal do Estado fascista. Havendo sido ex-aluno de Max Weber na Alemanha, Michels defendeu o nacionalismo por meio de um exame sociológico sobre o que fazia grupos se juntarem. Ele concordou com Marx que o homem não é uma criatura solitária e que, desde o princípio da História, os povos coalescem em grupos sociais. Contudo, Michels argumentava que a instituição humana mais forte, fora a família, não era a classe social, mas, no lugar dela, a tribo. No dizer dele, as tribos são os ancestrais das nações modernas e as nações são estruturas construídas sobre costumes compartilhados e sobre a história compartilhada. Elas, as nações, é que controlam as lealdades mais profundas dos povos. Michels chamava as nações de “comunidades da volição”. Corradini e Rocco foram além, argumentando que não fazia sentido falar sobre diferença de classes em um país agrícola subdesenvolvido como a Itália. Aqui, disseram eles, não há diferenças acentuadas entre a classe trabalhadora e a classe capitalista. Aqui, todo o país é pobre e praticamente todos têm de lançar das mãos ao trabalho. Em certo sentido, todos os italianos pertencem a uma única classe de luta. Suas lealdades, portanto, não surgiram da classe, mas de um apego comum a memórias partilhadas e participação compartilhada no modo de vida italiano. Em outras palavras, o que os italianos tinham em comum era a etnia.

Eis a base do nacionalismo, característica importante do fascismo. Reconheçamos, no entanto, que este é o nacionalismo étnico — um nacionalismo de identidade étnica. Como tal, ele está na raiz não só do fascismo, mas também na do progressismo moderno, cuja afirmação e celebração da identidade étnica servem de base para a motivação e participação política. Havendo refletido sobre a etnia, pressupondo ser ela a identidade compartilhada dos operários italianos, Corradini e Rocco concluíram que o nacionalismo étnico era o mito estimulante dos trabalhadores. Apenas uma dedicação sacrificial à nação italiana, ambos argumentaram, permitiria que a Itália ultrapassasse a frágil unificação do Risorgimento e conquistasse um “segundo Risorgimento”, que então tornaria a Itália um país verdadeiramente maduro e desenvolvido. Corradini também viria a reforçar que os italianos que se encontravam na miséria por vezes precisavam ir para o exterior na busca por trabalho, onde acabavam sendo explorados por sua mão de obra em países ricos como Inglaterra, França e Alemanha. Diante disso, Corradini propôs uma revisão do conceito marxista de divisão de classes. A divisão real, disse ele, era entre nações ricas e nações pobres. A Alemanha, a Inglaterra e a França eram países plutocráticos — nações formadas por capitalistas — e a própria Itália, o país inteiro, poderia ser considerado uma “nação proletária”, uma nação de trabalhadores explorados.14 Em última análise, os nacionalistas revolucionários propuseram que a própria Itália precisaria unir-se e revoltar-se contra a exploração capitalista e globalista dos países europeus solidificados na riqueza, que engordaram não só por ocasião do trabalho italiano, mas também com colônias e conquistas estrangeiras, com as quais haviam ampliado seu “espaço vital”. Esse era chamado de spazio vitale na Itália; os alemães o chamavam de Lebensraum. Os nacionalistas defenderam o spazio vitale para a Itália crendo ser esse o único meio através do qual a Itália se ergueria e sairia da posição de nação proletária. Na opinião dos adeptos do socialismo nacionalista mas, então, derradeiramente fascistas, a Itália também precisava de seu próprio “espaço

vital”, necessidade esta que poderia demandar ou campanhas de colonização no exterior ou uma guerra dentro da própria Europa, para ampliar a influência e o poder da Itália e, com isso, permitir o seu povo de juntar-se à comunidade das nações abastadas. Ao contrário de Mussolini, os nacionalistas apoiaram a intervenção italiana na Líbia em 1911 e também a participação italiana na Primeira Guerra Mundial. Mussolini acompanhou com avidez esses nacionalistas e — primeiro com relutância, mas, finalmente, com entusiasmo — veio a concordar com eles.

A Síntese Fascista De um lado, na Itália, os nacionalistas faziam lobby pela lealdade socialista tendo por base a etnia, de outro, na Alemanha, um grupo buscava a unidade socialista com base na raça. Bom representante desse grupo foi o marxista Ludwig Woltmann, que procurou integrar o materialismo científico de Marx à ciência evolucionista de Darwin.15 Woltmann basicamente argumenta que a luta darwinista por sobrevivência não ocorre entre criaturas individuais, mas — dentro das comunidades humanas — entre as raças. Esse Rassenkampf, ou conflito racial, como ele propôs, naturalmente resultaria no triunfo das raças superiores e na eliminação das raças inferiores. Woltmann foi uma das inspirações para a origem do nacional-socialismo de Hitler. Note que, desde o princípio, o nacional-socialismo alemão, por tornar a raça primária — fazendo frente à fidelidade pela nação —, difere do fascismo italiano. Interessante também perceber que o progressismo americano moderno obcecou-se pela raça. Hoje, se alguém propor a remoção de categorias raciais do censo, a oposição mais ferrenha provavelmente virá dos progressistas, os quais fazem eco ao que Cornel West coloca no título de um de seus livros, Race Matters [A Raça é Fundamental]. Mussolini não teria concordado com isso, mas Woltmann sim, como qualquer outro membro devoto do Partido Nazista. Mussolini não acreditava em raça, nem era ele a princípio nacionalista; na verdade, ele era um sindicalista revolucionário. O termo sindicalismo referese às associações ou sindicatos a que os trabalhadores pertenciam. Eram organizações de trabalhadores autônomos que, embora se assemelhassem a tais, não eram sindicatos, porque estes eram organizados regionalmente, e

não por corporação ou função e cargo. Marxistas devotos que eram, os sindicalistas revolucionários concordavam com Marx em que a primazia pertencia às associações de classe e que elas deveriam ser o princípio organizador da revolução socialista. Muito em consonância com essa ênfase na classe, conceito tão importante para Marx, os sindicalistas, fortemente influenciados por Sorel, procuraram reunir os sindicatos trabalhistas através de uma greve geral que derrubaria a classe dominante e estabeleceria o socialismo na Itália. Foi isso que fez deles “revolucionários”. Eles pretendiam fomentar a revolução, não a esperar acontecer. Eles foram considerados as pessoas mais inteligentes e dedicadas do Partido Socialista Italiano e ocuparam sua ala esquerdista. Os grandes nomes do sindicalismo revolucionário foram Giuseppe Prezzolini, Angelo O. Olivetti, Arturo Labriola, Filippo Corridoni, Paolo Orano, Michele Bianchi e Sergio Panunzio. A maioria deles era de escritores ou dirigentes sindicais. Todos eram socialistas e, em pouco tempo, todos se tornariam fascistas, apesar de Labriola ter se oposto ao regime de Mussolini quando este chegou ao poder, e Corridoni, morto na Primeira Guerra Mundial, não ter vivido para presenciá-lo. Eles reconheciam Mussolini como seu líder. Ele os conhecia bem e conspirava com eles em reuniões e comícios. Ele lia seus livros e artigos, além de contribuir publicando em revistas criadas e organizadas por eles, como a Avanguardia Socialista, fundada por Labriola, principal periódico do pensamento sindicalista. Mussolini também analisou e publicou os principais sindicalistas em suas próprias editorações de nicho socialista. Concordes com todos os demais socialistas revolucionários, os sindicalistas tinham pouca fé em procedimentos parlamentares democráticos e, de acordo com Sorel e Lênin, buscavam por um líder carismático, alguém que inspirasse os trabalhadores à ação, à atitude. Mussolini, mais do que qualquer outra pessoa, encaixava-se nos requisitos, este quem liderou os sindicalistas em uma união com os nacionalistas a fim de formar o novo híbrido socialista, chamado de fascismo na Itália e (com algumas modificações) de nacionalsocialismo na Alemanha. Os sindicalistas organizaram três greves gerais na Itália, a saber, em 1904,

em 1911 e em 1913. Mussolini as apoiava. A greve de 1904 começou em Milão e se espalhou por todo o país. Cinco milhões de trabalhadores abandonaram seus empregos. A nação ficou paralisada: não havia transporte público, ninguém conseguia comprar nada. Mesmo assim, a greve terminou sem causar a queda do governo ou a instauração do socialismo. O próprio Mussolini organizou a segunda greve geral, em 1911, em especial por tratá-la na forma de protesto contra a guerra que a Itália travou com a Líbia. Outro fracasso e Mussolini foi preso por cinco meses. No ano seguinte, Filippo Corridoni, compatriota de Mussolini, tentou outra greve geral, que, novamente, foi mais um fracasso. Tantas tentativas seguidas de fracasso fizeram com que Mussolini e seus companheiros sindicalistas, desistindo do princípio de classes do socialismo e do conceito de greve geral, olhassem para nacionalistas como Corradini, Rocco e Michels, visando daí uma melhor abordagem. Da colaboração dos sindicalistas e nacionalistas surgiu a nova síntese fascista, que substituiu a categoria marxista tradicional de classes pela então nova categoria, a de uma nação. A luta revolucionária, doravante, não seria uma guerra de classes, mas uma batalha que diria respeito à nação. A guerra revolucionária não seria uma luta entre as classes — ricos e pobres —, mas uma luta de nações ricas contra nações pobres, em que as nações proletárias derrubariam a hegemonia dos países plutocráticos. Com efeito, o mito da greve geral foi substituído pelo mito da guerra revolucionária, uma guerra que os fascistas conceberam como uma “guerra de redistribuição”.16 À primeira vista, pode parecer que o conceito de guerra colonial, ou mesmo mundial, vá diretamente contra Marx. Mas como Angelo O. Olivetti — sindicalista que passou ao fascismo, mas depois, por mais curioso que pareça, ao judaísmo — salientou, o próprio Marx havia apoiado o colonialismo como mecanismo necessário ao desenvolvimento de países atrasados. Além disso, tanto Marx quanto Engels não hesitaram em promover os interesses alemães — ambos apoiaram a guerra nacionalista de Bismarck contra a França e suas reivindicações petulantes contra a Rússia czarista. Após a morte de Marx, Engels apoiou a anexação de Schleswig, que fazia parte da Dinamarca, pela Alemanha. Os fascistas enfatizaram tudo isso como forma de salientar que seu nacionalismo era consistente com o marxismo e

que eles permaneceram, no fim de tudo, bons socialistas. A síntese fascista não considerava a Itália uma sociedade dividida pelo conceito de classe, mas sim um país unificado no qual todos os setores da sociedade poderiam unir-se. Os fascistas substituíram a antiga divisão marxista entre capitalistas improdutivos e trabalho produtivo pela categoria única de nação produtiva. Mussolini a isso deu o nome de Fascio Nazionale, uma união nacional. “Tornamo-nos”, disse Mussolini, “e permaneceremos uma nação de produtores”.17 Já se podia vislumbrar, ainda na Itália, a fusão que mais tarde daria ao fascismo de Hitler seu nome distintivo. Quando combinadas as duas ideias de “nação” e “socialismo”, o resultado é o nacional-socialismo. Mussolini nunca usou o termo “nacional-socialismo” e, indignado, o repudiou quando este foi associado a Hitler e à Alemanha nazista. Não obstante, Mussolini havia criado o primeiro nacional-socialismo, e despojado das conotações raciais alemãs. Sua era a visão de uma nação organizada aos moldes socialistas, uma nação em que todos partilhariam dos benefícios e em que todos contribuiriam com a sua devida parte. Essa linguagem, é claro, carrega traços de Obama; vê-se uma congruência óbvia entre a unificação fascista e a insistência progressista moderna de que a América é uma comunidade única e que todos devem se unir para cada um contribuir com sua própria “parcela justa”. Por fim, a síntese fascista acrescentou o novo elemento do Estado como braço executivo encarregado de definir e defender o bem geral da nação. Esse é o ponto em que Giovanni Gentile, discutido no capítulo anterior, emergiu como principal filósofo do fascismo. Gentile foi o grande apóstolo do Estado centralizado. Para ele, o Estado era a nação e a nação era o Estado. A identidade e o bem-estar estão todos subordinados à nação, mas também sob a vara do todo-poderoso Estado centralizado. Entendo por que Mussolini adorava tudo isso; ele compreendeu que era aquela a base intelectual para, bem, ele próprio. Marx, lembremos, havia predito o desaparecimento do Estado. Estranho notar, da mesma forma Lênin. Mas, longe de desaparecer, o Estado expandiuse e ampliou-se num monstro totalitário sob ele. Não bastando, sua teoria

continuava a invocar o desaparecimento do Estado. Nesse sentido, o fascismo é a primeira ideologia de esquerda do século XX a afirmar explicitamente a necessidade de um poderoso Estado centralizado. Em meados da mesma época, no entanto, e derrotados pelos fascistas por um fio, na América uma ideologia estreitamente relacionada se desenvolvia, pedindo também um poderoso Estado centralizado. Essa ideologia era, naturalmente, o progressismo. Os fascistas, assim como os progressistas, buscavam uma transformação radical da sociedade, que é a própria antítese do liberalismo clássico ou do conservadorismo americano moderno. A única revolução com a qual os conservadores americanos se aliam é a revolução americana, a revolução que estabeleceu o capitalismo burguês, coisa que os fascistas e os progressistas procuram transformar e derrubar. As raízes do fascismo expõem por completo a conexão existente entre o fascismo e a esquerda política dos Estados Unidos, e também a antítese entre o fascismo e a direita política dos Estados Unidos. Fascistas e progressistas, ambos enxergavam no Estado centralizado o desenvolvimento lógica de tudo o que eles representavam. O problema não é falar sobre a nação dos produtores e os interesses da nação, mas quem decide quais são seus verdadeiros interesses? Os socialistas afirmam ser a favor da redistribuição equitativa da renda e da riqueza, mas quem determina o que é equitativo e quem faz a verdadeira redistribuição? A essas perguntas, os fascistas responderam: nós determinamos, por meio do instrumento do poderoso Estado centralizado. E essa também é, na América, a resposta que os progressistas de hoje dão. Além disso, os fascistas adotaram uma política econômica estritamente paralela e, em muitos demais aspectos, também idêntica ao progressismo atual. A essa política Mussolini deu o nome de “corporativismo”, mas um termo mais descritivo seria capitalismo estatal. Mussolini imaginava um poderoso Estado centralizado dirigindo as instituições do setor privado, fazendo com que, à força, a prosperidade privada deste fosse posta em consonância com a prosperidade nacional. Não é exatamente assim que os progressistas consideram o controle do governo federal sobre bancos, companhias financeiras, companhias de seguro, plano de saúde, energia e

educação? Embora a esquerda americana de hoje não se atreva a invocar o nome de Mussolini, aquele que no meio dela for honesto terá de admitir que Mussolini e seus companheiros fascistas é que foram os precursores da esquerda americana atual; foram aqueles que lhe abriram o caminho.

Capítulo Quatro

Um Segredo do Partido Democrata Nos pensamentos de Hitler para o futuro, a Alemanha lidaria com os eslavos da mesma forma como os norte-americanos lidaram com os índios. Ele disse, certa vez, que o rio Volga, na Rússia, seria o Mississippi da Alemanha.1 Timothy Snyder, Bloodlands: Europe Between Hitler and Stalin [Terras de Sangue: a Europa Entre Hitler e Stalin]

Em 1924, sentado na prisão de Landsberg, Adolf Hitler teve uma grande ideia. Sabemos que ele a teve lá porque foi lá é que ele estruturou a maior parte do pensamento estratégico que guiou suas ações posteriores. Hitler salientou os frutos daquelas reflexões em sua autobiografia, Mein Kampf, e também em discursos e gravações subsequentes, que hoje já estão disponíveis. Por exemplo, Hitler’s Table Talk (Conversas à Mesa com Hitler) é um extenso arquivo de declarações privadas de Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, gravadas por um ajudante, Heinrich Heim, agindo sob as ordens do secretário de Hitler, Martin Bormann. Antes de examinar sua ideia, revisemos o contexto por trás. Hitler, veterano da Primeira Guerra Mundial, estava, junto de muitos alemães, sofrendo sob a derrota de seu país e com os vexatórios termos impostos pelo Tratado de Versalhes, incluindo o confisco das poucas colônias da Alemanha, que também foi forçada a devolver a Alsácia e Lorena à França. Hitler, inclusive, sabia que a Grã-Bretanha e a França eram grandes potências com colônias por todo o mundo. Havia pouco território para a Alemanha, um retardatário no colonialismo, um país atrasado no ato de conquistar e ocupar. Hitler também tinha um problema em seu próprio quintal, os judeus. Todavia, a “solução final”, envolvendo o extermínio dos judeus, chegaria muito mais tarde, quando Hitler começaria a articular a uniformização, o

alinhamento nazista por meio de eventos como a notória Conferência de Wannsee, que ocorreu em 20 de janeiro de 1942. Nesse momento, Hitler simplesmente procurava uma maneira de lidar com cerca de setecentos e cinquenta mil judeus que, na época, viviam na Alemanha. Uma ideia era isolar os judeus para os guetos e forçá-los a viver em comunidades segregadas como subcidadãos. Outra era expulsar os judeus, deslocá-los para a colônia francesa de Madagascar, no Oceano Índico, ao longo da costa da África, ou apenas forçar-lhes a ida para algum outro país. Por fim, cerca de quinhentos mil judeus viriam a deixar a Alemanha no período entre a ascensão de Hitler ao poder, em 1933, e o início da Segunda Guerra Mundial, em 1939.2 Enquanto ponderava tais problemas, a América tomou a atenção de Hitler, cujo conhecimento a respeito era escasso. Nunca fora à América, e a desprezava. “Meus sentimentos contra o americanismo”, diria ele mais tarde, em 1942, “são sentimentos de ódio e profunda repugnância”. Por quê? Ele afirmou: “Tudo sobre o comportamento da sociedade americana revela que ela é metade judaica e metade enegrecida”. Ademais, a América é “um país onde tudo é construído sobre o dólar”. Para Hitler, a América representava o pior caso do capitalismo desenfreado dos judeus.3 Hitler, apesar disso, tinha um interesse genuíno em certos aspectos da história americana. Quando menino, foi cativado por uma série de romances escritos por Karl May, romancista alemão, em que caubóis eram retratados no oeste americano. Hitler não era o único fã de May; os romances eram amados também por Albert Einstein, Albert Schweitzer e milhões de outros alemães. May era o J. K. Rowling de sua época, escrevendo histórias amplamente populares de dois amigos do Velho Oeste: um topógrafo alemão, chamado Old Shatterhand, e seu companheiro, Apache Winnetou. O tema geral dos romances era a trágica desaparição dos índios do Continente, o heroísmo indígena dando lugar à inevitabilidade do assentamento e do progresso dos brancos.4 Hitler também se interessava nas lições da Guerra Civil americana. Mais uma vez, embora seu conhecimento se derivasse principalmente de fontes impressionistas e novelísticas, a escassez dele não o impediu de tirar

conclusões muito firmes. O historiador Ira Katznelson relata: “Hitler denegria os negros, admirava o racismo americano e lamentava a derrota do Sul em 1865. [...] Como outros líderes nazistas, Hitler, em 1937, estava fascinado por Vom Winde verweht, a versão alemã do filme E o Vento Levou. Este épico melodramático da Guerra Civil e da Reconstrução dos EUA foi líder de vendas. Sem surpresa nenhuma, agora o filme também provava ser de grande sucesso. Nervoso, enquanto aguardava o início da invasão da URSS, numa ação que daria início à Operação Barbarossa, Joseph Goebbels passou algumas horas após a meia-noite, em 22 de junho de 1941, assistindo a uma versão alemã de pré-lançamento com um grupo de amigos convidados”.5 É óbvio que tudo isso ocorreu muito mais tarde. Voltemos à prisão de Landsberg e à grande ideia de Hitler. Ele entendeu, Hitler escreve em Mein Kampf, que a Alemanha não precisava imitar os britânicos e os franceses na busca por colônias no exterior instauradas na Ásia, África e América do Sul. Quem quer governar um bando de pessoas pardas e negras? Além disso, dizia Hitler, o clima nesses lugares não é adequado para um assentamento feito por alemães nórdicos. Deixe os britânicos e os franceses ficarem com a Ásia e com a África. “Para a Alemanha”, dizia Hitler, “a única possibilidade de levar a cabo uma política territorial saudável consiste na aquisição de novas terras na própria Europa [...] terras dentro de nosso próprio continente”.6 Hitler chamou seu plano de Lebensraum e encontrou um importante precedente histórico para isso nos Estados Unidos da América. Hitler sabia que, no século XIX, o homem branco havia dizimado basicamente a maior parte dos habitantes de origem continental norte-americana, os nativos americanos. Investida essa tomada através de políticas implacáveis de ruptura de tratados, guerras promovidas contra os índios, eliminando a resistência, deslocando-os e realocando-os forçosamente, capturando suas terras para o assentamento branco. Ele basicamente decidiu adotar o mesmo plano para que assim conseguisse fixar os alemães em grandes partes do Continente Europeu. Como o próprio Hitler disse em um discurso de 1928, os americanos “dizimaram milhões de peles-vermelhas e os reduziram a poucas centenas de milhares, mantendo agora o modesto restante deles sob observação dentro de uma gaiola”. Longe de opor-se a este precedente, Hitler pretendia imitá-lo.

No dizer do historiador Norman Rich: “A política dos Estados Unidos de expansão para o oeste, no decorrer da qual o homem branco impiedosamente impugnou as populações indígenas “inferiores”, serviu de modelo para toda a concepção do Lebensraum de Hitler”.7 Obviamente, Hitler sabia que a terra que ele tinha em mente — a Polônia, grande parte do Leste Europeu e grande parte da Rússia Europeia — estava ocupada, respectivamente, por poloneses, eslavos, alguns outros povos da Europa Oriental e por russos. Para Hitler, esses eram os seus “índios”. Ele decidiu que o destino deles seria o mesmo que os nativos americanos tiveram: Hitler travaria guerras contra esses povos, assassinaria a resistência, viria a deslocá-los e realocá-los, e conquistaria suas terras. Para os remanescentes, Hitler tinha outro plano, também derivado da história americana: escravizá-los e alistá-los no trabalho forçado em benefício dos cidadãos brancos arianos da Grande Alemanha. O conceito de Lebensraum, Hitler confessou, “dominará toda a minha existência”. Não estou supondo que sua ideia fosse proveniente apenas da América; havia escritores alemães conclamando um lebensraum desde a virada do século anterior. Por exemplo, em 1900, Ludwig Woltmann, antropólogo alemão, defendeu, por motivos raciais, um lebensraum. A “raça alemã”, disse ele, “foi escolhida para dominar a Terra”. Woltmann teve sua ideia não a partir de uma superlotação alemã — a Alemanha não estava superlotada —, mas de um conceito de territorialidade derivado do reino animal e aplicado à sociedade humana.8 Woltmann era um darwinista social progressista, e o darwinismo social progressista, conforme veremos mais adiante neste livro, foi um importante progenitor do fascismo e do nazismo. O programa específico de Hitler de Lebensraum, no entanto, parece ter sido inspirado pelas políticas e práticas do Partido Democrata na América do século XIX. A analogia não termina por aí. Aqui está uma passagem bastante expressiva do livro escrito pelo historiador John Toland, Adolf Hitler: The Definitive Biography [Adolf Hitler: Biografia Definitiva]: “O conceito de campos de concentração engendrado por Hitler, bem como a praticidade do genocídio, devia muito, afirmou ele, aos seus estudos sobre a história da Inglaterra e dos Estados Unidos. Ele admirava os campos para prisioneiros bôeres na África do Sul e para índios no Velho Oeste, sem contar que, muitas

vezes, enquanto em seu círculo interno, elogiava a América por sua eficiência no extermínio dos vermelhos selvagens — mediante a fome e o combate desigual —, aqueles que não podiam ser domesticados pelo cativeiro”.9 O mesmo tema é enfatizado ainda com mais força no livro de Timothy Snyder, Terras de Sangue: A Europa Entre Hitler e Stalin. Snyder revela que, sob o esquema chamado Generalplan Ost, Hitler procurou “deportar, matar, absorver ou escravizar” entre trinta e quarenta e cinco milhões de poloneses, ucranianos e eslavos. Os nazistas pretendiam criar, em suas terras, comunidades agrícolas alemãs com quinze a vinte mil pessoas. Snyder escreve: “A colonização faria da Alemanha um império continental capaz de rivalizar com os Estados Unidos, seria outro Estado de fronteira resistente baseado no colonialismo exterminador e no trabalho escravo [...] Na visão de Hitler, ‘No Oriente, um processo semelhante se repetirá pela segunda vez, como quando na conquista da América’”.10

Uma Pré-História do Nazismo Tiremos as implicações disso. Primeiro, a esquerda gosta de retratar Hitler como se fosse de extrema direita. Mas observe, aqui, como ele se aliou sem restrições com as políticas a favor da remoção dos índios e da pró-escravidão oriundas do Partido Democrata. Hitler claramente estaria muito mais confortável com o presidente democrata Andrew Jackson ou o senador democrata John C. Calhoun do que com, vejamos, Abraham Lincoln. Note, ademais, que, em parte, Hitler odiava tanto a América por ter sido ela capitalista demais. Hitler identifica os Estados Unidos do capitalismo e da corrupção capitalista com os judeus. Falarei mais a respeito disso depois. Uma segunda implicação está no fato de aqui, na América, tendermos a ser muito provincianos acerca de nossa história. Não conseguimos imaginar o quanto os acontecimentos na América, como a remoção e a escravidão de índios, influenciaram os acontecimentos em todo o Atlântico; aliás, tanto quanto não reconhecemos como os acontecimentos europeus exercem impacto aqui. Este livro tem por objetivo corrigir tal provincianismo. Não quero dizer que, sem a influência americana, Hitler não teria invadido a Polônia nem a Rússia, ou que ele não teria orquestrado os campos de

concentração. É para dizer, no entanto, que o exemplo americano desempenhou um papel em mostrar-lhe como isso poderia ser feito e em darlhe a confiança, com base na História, de que algo assim já havia sido realizado. Este capítulo, sobre a escravidão e a remoção dos índios, e o próximo, sobre o racismo, a segregação e o terrorismo racial, têm por objetivo fornecer uma pré-história do nazismo e do Holocausto. Uso o termo “pré-história” precisamente no mesmo sentido que o historiador Gotz Aly, que, em recente publicação, fornece o que ele chama de a “pré-história do Holocausto”.11 O antissemitismo racial na Alemanha, no final do século XIX e no início do século XX, Aly mostra, precede e prepara o caminho para o Holocausto. Embora, é claro, os antissemitas do final do século XIX e início do século XX não tenham matado seis milhões de judeus, ainda assim lideraram massacres contra eles e adotaram leis discriminatórias que ofereceram uma previsão horrível das coisas que estavam por vir. Hitler mais tarde viria a basear-se nessa cultura antissemita para recrutar alemães visando a “Solução Final”. Assim, também, minha pré-história pretende não apenas prefigurar os horrores do fascismo alemão, mas mostrar a suscetibilidade histórica do Partido Democrata na América aos apelos e às práticas fascistas. Muito antes do surgimento do fascismo em si, eles inventaram algumas dessas práticas aqui. Não é de admirar que, quando o fascismo de fato surgiu, como demonstro mais adiante, os democratas tenham se sentido em casa. Então, para colocar da maneira mais clara possível, pode-se dizer que o DNA nazista estava no Partido Democrata desde o início. Os democratas — não os nazistas — são os criadores da política de ódio. Neste capítulo, tomo alguns dos “conceitos-chave” do nazismo — Lebensraum, campos de concentração, genocídio — e mostro que, por meio do apoio do Partido Democrata à remoção indígena e à plantação da escravidão, estes já estavam sob aplicação nos Estados Unidos muito antes de serem aplicados na Alemanha nazista. Percebo que, fazendo esse tipo de comparação, me arrisco a atiçar até mesmo a indignação de alguns conservadores, que dirão, de praxe: “Você está comparando os Estados Unidos com a Alemanha Nazista?”. Na verdade, não. Estou apenas

comparando as práticas do Partido Democrata com as do Partido NacionalSocialista dos Trabalhadores Alemães. A ideia de que a “América” é responsável pelas atrocidades do Partido Democrata é parte da grande mentira que estou tentando expor neste livro. Em segundo lugar, arrisco-me a ofender a sensibilidade dos judeus e de outros que acreditam na singularidade do Holocausto. De acordo com esse ponto de vista, o Holocausto é único e nada pode ser comparado a ele. Concordo em grande parte. Todavia, ainda que o Holocausto seja singular, nem tudo que Hitler e os nazistas fizeram o foi. Mesmo o genocídio não é singular. As Nações Unidas publicaram uma definição funcional de “genocídio” reconhecidamente extraída do exemplo dos nazistas. Não obstante, o alvo da definição é ajudar a identificar outros casos de genocídio que possam ocorrer em todo o mundo. Mas espere um minuto, você me diz. Como posso comparar, por exemplo, a escravidão do Sul Democrata aos campos de concentração alemães? O primeiro existiu para o trabalho forçado, já os últimos foram construídos para o extermínio em massa. Na verdade, os campos de concentração eram campos de trabalho forçado. Certo estudioso, Marc Buggeln, intitulou um estudo recente de Slave Labor in the Nazi Concentration Camps [Trabalho Forçado nos Campos de Concentração Nazistas]. Outro trabalho recentemente publicado, organizado por Alexander Von Plato dentre outros, foi chamado de Hitler’s Slaves [Os Escravos de Hitler].12 A representação dos campos em ambos os estudos é muito semelhante à representação da vasta rede de campos de trabalho stalinistas, apresentada na obra Arquipélago Gulag, escrita por Alexander Solzhenitsyn. Os estudiosos da Alemanha nazista fazem distinção entre os campos de concentração, que existiam para detenção e trabalho forçado, e os campos de extermínio, concebidos com o propósito exclusivo de matar pessoas. Dachau, Buchenwald, Mauthausen, Flossenberg, Bergen-Belsen e Ravensbruck foram campos de concentração para trabalho forçado, todos localizados na Alemanha. (Ravensbruck foi um campo para mulheres, com prisioneiras e guardas mulheres). Treblinka, Sobibor, Belzec e Chelmno — todos estabelecidos na Polônia ocupada pelos alemães — foram campos de extermínio. Auschwitz e Majdanek tinham ambos os papéis: uma parte

campo de trabalho, outra parte campo de extermínio. Alguns estudiosos argumentaram que mesmo os campos de trabalho serviam de campo de extermínio, uma vez que as taxas de mortalidade eram elevadas e os nazistas tinham uma política implícita de “extermínio lento” ou “extermínio mediante o trabalho”. Certamente, matar pessoas, em particular os mais velhos, os doentes e os “encrenqueiros”, era um tipo de rotina para os guardas em campos de trabalho forçado. Às vezes os internos dos campos de trabalho já destinados à execução eram transportados até um campo de extermínio para ali serem mortos. Buggeln calculou a taxa de mortalidade em campos de trabalho e a considerou consistentemente alta, embora fosse significativamente menor no caso de prisioneiras judias, nos campos para mulheres. A maioria dos estudiosos, no entanto, concorda que a distinção entre campos de extermínio e campos de trabalho é importante. O procedimento habitual consistia em enviar os prisioneiros para um ou para outro: aquele era uma sentença de morte, ao passo que este era uma possível sentença de morte. É claro que, no caso dos campos nazistas, bem como nos campos soviéticos, nem Hitler nem Stalin se importavam pessoalmente com quantos trabalhadores morriam. Entretanto, os campos soviéticos, como no caso dos campos nazistas, são corretamente chamados de campos de trabalho forçado, em oposição aos campos de extermínio, porque eles existiam com a finalidade de extrair trabalho dos presos, mesmo sob o risco de morte por tanto trabalhar. No caso de Hitler, o trabalho foi considerado necessário para alimentar a máquina de guerra alemã. Trabalhadores forçados nos campos trabalhavam principalmente para o setor de defesa, para a Luftwaffe e para o conglomerado estatal Hermann Göring Reichwerke. Alguns trabalharam para empresas privadas contratadas para o Estado alemão, como a Siemens, gigante da energia, a empresa de armamentos Bussing e a Volkswagen, fabricante de aeronaves e automóveis. De acordo com Rudolf Hoss, comandante de Auschwitz, o lema de seu chefe, Heinrich Himmler, para os campos passou a ser “Armamentos! Prisioneiros! Armamentos!”.13 A dependência nazista do trabalho forçado tornou-se ainda maior à medida

que a guerra se desenrolava e a oferta de trabalho nacional ficava cada vez mais escassa. Digno de nota dizer que, a essa altura, os nazistas pediram aos oficiais do campo de concentração que reduzissem as taxas de mortalidade para que mais trabalho pudesse ser aproveitado dos prisioneiros. Himmler, na verdade, autorizou que familiares enviassem quantidades de alimentos para parentes em campos de concentração e ordenou a pena de morte para os membros da SS que roubassem desses alimentos.14 Buggeln observa que a taxa de mortalidade caiu em 1943 e permaneceu baixa até o final da guerra quando, num irromper de fúria niilista, o corpo nazista fez uma matança até mesmo dentro dos campos de trabalho, para livrar-se dos cativos antes que os Aliados chegassem. Entre 1943 e 1945, os nazistas forçaram os internos dos campos a esvaziarem os escombros, a reconstruírem estradas e trilhas bombardeadas por aviões americanos e britânicos, e a cavar valas antitanque para retardar o avanço das tropas aliadas. Assim, os campos de trabalho zumbiam dada sua atividade na última fase da Segunda Guerra Mundial. Em contraste com os campos de trabalho, os campos de extermínio, também conhecidos como campos da morte, desde o início não possuíam instalações de trabalho. Eram centros modernos de execução industrial, cujo objetivo único era o de matar pessoas em câmaras de gás ou por fuzilamento. No geral, havia entre quinze mil e vinte mil campos de concentração de maior jurisdição e subcampos abaixo destes na Alemanha e na Europa ocupada pelos alemães. Havia um número muito menor de campos de extermínio, mas nenhum deles na Alemanha, já que o regime queria esconder sua existência do povo alemão. A maioria deles foi construída na fase pósguerra, desde 1942, enquanto os campos de concentração estavam em operação desde 1933, quando os nazistas ascenderam ao poder. Lembre-se daquelas imagens que retratam sobreviventes emaciados após serem libertos de campos como Dachau e Auschwitz, em 1945. Cem mil pessoas sobreviveram ao Auschwitz, que, houvesse sido apenas um campo de extermínio, reteria para si número próximo de zero. Sem contar que a maioria dos sobreviventes em Dachau e Auschwitz não eram judeus, mas alemães sem nenhuma ligação com a etnia judia e europeus do Leste Europeu. Isso porque se costumava matar os judeus nos campos de extermínio.

A maioria desses judeus, aliás, não era de judeus alemães. Apenas um quarto de um milhão de judeus permaneceu na Alemanha em 1939. Portanto, não havia como Hitler matar cerca de seis milhões de judeus alemães, pois não havia tantos judeus alemães para matar. Mas a população de judeus expandiu-se amplamente sob o controle de Hitler e suas conquistas sobre a Polônia, a Europa Oriental e a Rússia. Conclui-se que a maioria dos judeus mortos nos campos de extermínio provinham dessas regiões. No dizer de Timothy Snyder em sua obra Terras de Sangue: A Europa entre Hitler e Stalin, “A vasta maioria dos judeus mortos no Holocausto nunca viu um campo de concentração […] As pessoas passavam a noite nos campos […] A maioria dos que foram levados para os campos de concentração alemães sobreviveu. O destino dos internos em campos de concentração, por mais horrível que fosse, era distinto do daqueles milhões que foram intoxicados com gás, fuzilados ou morreram de fome”.15 Não é irracional, portanto, comparar dois tipos de sistemas de trabalho forçado, um na América e outro na Alemanha. Na verdade, a noção de considerar as fazendas de escravos um tipo de campo de concentração é bastante familiar para estudiosos americanos, pelo menos desde a publicação do livro Slavery, em que Stanley Elkins, estudioso em escravidão, dá ao assunto um tratamento especialmente provocador. Elkins conhece muito bem a verdade do ditado acadêmico de que “no analogy travels on all fours”, isto é, que nenhuma analogia veste a mesma roupa. Isso significa que não há duas coisas exatamente idênticas; portanto, ao fazer comparações frutíferas, devese notar mais as semelhanças do que as diferenças. Em fazendo isso, o resultado pode ser uma melhor compreensão dos fenômenos de ambos os lados da comparação. Mais uma vez, não estou afirmando que o lebensraum de Andrew Jackson era idêntico ao de Hitler, mas sim que um foi prenúncio e inspiração do outro. Não estou dizendo que os campos de trabalho escravo do Sul democrata eram idênticos aos campos de concentração alemães; estou dizendo que os democratas são capazes de atrocidades parecidas com as atrocidades nazistas, não tanto contra os judeus quanto contra os poloneses, os eslavos e os russos. Eu sei que os nazistas mataram um número muito maior de pessoas do que os democratas. Também é verdade, porém, que as

atrocidades nazistas duraram doze anos, ao passo que as atrocidades democratas vêm ocorrendo desde que o partido foi fundado, em 1828.

O Falso e o Verdadeiro Genocídio Os internos dos campos de concentração nazistas perceberam que, naquele meio, havia um tipo estranho e particular de prisioneiro, o chamado muselmann. Ninguém sabe como o termo se originou, pois literalmente significa “muçulmano”. Mesmo assim, muselmann, nesse contexto, refere-se ao preso emocionalmente destruído pela experiência do campo de concentração, uma pessoa que o historiador Wolfgang Sofsky define como estando “entre a vida e a morte”.16 Os muselmanneres caminhavam como se estivessem atordoados; eles não reagiam a conversas, a ordens, nem mesmo a agressões físicas. Eles tinham dificuldade de enxergar além do que estivesse bem à frente. Esses presos literalmente perderam a vontade de viver e simplesmente existiam como os personagens zumbis do seriado The Walking Dead. Para mim, o prisioneiro muselmann é uma metáfora trágica do que aconteceu aqui, na América, com os índios. É evidente que não quero comparar literalmente os índios nativos com zumbis humanos. Alguns deles tiveram muito sucesso e se adaptaram bem à vida americana. O que quero dizer, na verdade, é que, como comunidade, os índios parecem ser uma versão americana do muselmanner. Eles perderam sua personalidade moral de origem e ainda têm dificuldade de substituí-la por outra coisa. Não me refiro apenas às condições patéticas da reserva indígena americana — a pobreza, o crime, as elevadas taxas de alcoolismo e suicídio, a redução de um povo convicto e pretensioso a indivíduos operando cassinos e fabricando bugigangas. Pense nisso: enquanto a cultura negra tem forte presença na América atual, a cultura indígena é ignorada, esquecida, praticamente inexistente. Mesmo após o Holocausto, a cultura judaica prospera em Israel, na América e em todo o mundo. Em contraste, os índios americanos parecem ainda ter de suportar o choque que originou o deslocamento e a potencial obliteração deles como povo. David Stannard, historiador de esquerda, intitula sua história dos índios de American Holocaust [O Holocausto Americano]. A partir do título, é

perceptível que Stannard não defende o conceito de Holocausto na posição de algo singular. Na verdade, ele afirma: “A destruição dos índios das Américas foi, de longe, o ato mais maciço de genocídio na história do mundo”. Stannard considera um holocausto toda a história dos nativos americanos, o que ele chama de “uma série ininterrupta de campanhas de genocídio”, as quais tiveram início com a chegada de Colombo, em 1492.17 Observemos Stannard cuidadosamente, porque ele toca em um ponto importante, mas temos de entender bem que ponto é esse. Ele afirma que, sim, existiu um holocausto, mas nada, mesmo em se tratando dos índios, comparável ao Shoah (O Holocausto) dos judeus. Ele afirma que os índios foram vítimas de genocídio — e, afinal, veremos que ele está certo em assim chamar. Por genocídio, no entanto, ele não se refere enfaticamente ao verdadeiro genocídio, mas inventa um falso genocídio, para evitar de acusar Andrew Jackson e o Partido Democrata do verdadeiro. Stannard começa com uma estatística impressionante: dos dez a doze milhões de índios nativos que uma vez povoaram o continente americano, de 90% a 95% morreram por consequência da exposição ao homem branco. Trata-se de um evento catastrófico, seja como for, mas ainda assim Stannard admite que a maioria dessas mortes resultou de pragas e epidemias transmitidas inconscientemente pelos europeus aos índios. Do que quer que chamem esses acontecimentos, não é factível chamá-los de genocídio, porque genocídio envolve a intenção de exterminar uma população. Colombo não tinha essa intenção, nem os Pais Fundadores. No entanto, Stannard concentra muito de seu ataque sobre eles, afinal lhe é ideologicamente importante jogar a culpa do genocídio indígena no “Ocidente” e na “América”. Stannard, portanto, recusa-se propositadamente a distinguir as mortes indígenas causadas por epidemia das mortes indígenas causadas pelo massacre deliberado ou reassentamento. Ambos, ele insiste, contam em favor do genocídio. Esse é o falso genocídio de Stannard. Acredito ser esse o tipo de recusa medíocre, a recusa de fazer distinções, que provoca o tipo de resposta conservadora que se encontra no ensaio de Guenter Lewy: Were American Indians the Victims of Genocide? [“Os Índios Americanos Foram Vítimas de

Genocídio?”].18 O ensaio, publicado pela primeira vez no periódico Commentary, agora disponível on-line, vai em defesa de Colombo e dos Pais Fundadores. Lidando diretamente com Stannard, Lewy levanta vários pontos válidos, observando, por exemplo, que os próprios índios eram tão implacáveis quanto as tropas de Andrew Jackson nas guerras indígenas. Ele afirma que os homens de Jackson simplesmente tiveram melhor treinamento e melhor munição. Lewy, porém, caiu aqui em uma armadilha progressista, cuja astúcia também me pegou no início da minha carreira. Basicamente, para defender “o Ocidente” e a “América”, Lewy se envolve no que se pode chamar de a estratégia de minimização do genocídio. Na verdade, não há necessidade dela, porque nem “o Ocidente” nem a “América” são culpados de genocídio; pelo contrário, Andrew Jackson e o Partido Democrata são. Infelizmente, Lewy, em sua posição de defender a América, acaba minimizando o que Jackson e os democratas fizeram. Sim, embora admita que os índios foram extensivamente dizimados, ninguém deve ser culpabilizado. Além disso, não se tratou, na prática, de um genocídio. Encontremos algum termo mais favorável. Até aqui não foi genocídio? Comecemos com a Resolução 96 (I) das Nações Unidas, que coloca o termo “genocídio” na lei internacional. Ela prossegue, “Na presente Convenção, entende-se por genocídio qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como: a) assassinato de membros do grupo; b) dano grave à integridade física ou mental de membros do grupo; c) submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial; d) medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; e) transferência forçada de menores de um grupo para outro”.19 Observe que a definição do termo não exige que um grupo seja reduzido à extinção (mesmo os judeus não estão extintos). O genocídio, para sê-lo, também não requer um número de mortes na magnitude do Holocausto. O genocídio é a tentativa de destruir um grupo como um todo ou em parte. Ademais, o genocídio não exige a satisfação de todas as medidas específicas mencionadas; qualquer uma delas já é suficiente. Levando essa definição em

consideração, voltemo-nos às ações de Andrew Jackson e do Partido Democrata no período de 1828 ao ano de 1860.

Já Eram Trevas Quando Ele Acabou de Matá-los Andrew Jackson tinha um problema com índios, cujo povo, em sua concepção, formava uma “nação dentro de uma nação”. Eles eram estrangeiros ocupando o solo americano — uma terra destinada à ocupação branca e ao assentamento branco. Assim, sua presença constituía malignidade e ameaça. Não importava que toda a América, América do Norte e do Sul, fosse, originalmente, a terra deles. Os Estados Unidos estavam crescendo. O crescimento exigia expansão. A expansão exigia que os nativos fossem embora. Em suma, do ponto de vista de Jackson, era preciso que eles fossem persuadidos a abandonar suas terras ancestrais, ou evacuados à força ou mesmo mortos. Este era o lebensraum no estilo Partido Democrata. Mas foram os aliados democratas de Jackson, como o governador Lewis Cass, que lhe estabeleceram as bases. “Nós falamos deles aquilo que eles são”, disse Cass sobre os índios. Ele continuou: “Eles desconhecem um sistema de governo. Não têm nenhum tipo de código penal, nenhum tribunal, nenhum oficial, nenhuma punição. Indiferente às consequências, o índio é filho do impulso. Sem barreiras morais, segundo suas próprias paixões, ele assim procede. Percorrer as florestas à vontade, caçar, atacar seus inimigos, passar o resto de suas vidas em indolência apática e estar pronto para morrer — essas são as principais ocupações de um índio”.20 Aqui, portanto, aparece o primeiro critério para se considerar o genocídio: alvejar um grupo racial e étnico específico. Cass condena os índios em termos raciais bastante semelhantes àqueles que os nazistas usavam contra judeus, ciganos e outras populações do Leste Europeu consideradas inferiores. Aqui também há casos de transferência e culpabilização da vítima — acontece que Cass tenta culpar os índios pela própria remoção que estava prestes a sobrevir. Veja, essas pessoas são indignas da civilização; são elas é que nos estão fazendo lançá-las fora de suas terras. O próprio Jackson não seguiu por esse caminho. Ele professou ser amigo dos índios, insistindo estar, na verdade, forçando-os a sair de suas terras para

mantê-los “livres da influência mercenária do homem branco e da perturbação que autoridades locais dos estados poderiam causar”. Eles poderiam viver em outro lugar, em terras longínquas, onde o governo federal de Jackson poderia “exercer um controle paternal acima dos interesses”.21 Jackson costumava assinar as cartas que escrevia aos índios como “Vosso Pai”, deixando implícito ter uma devoção paterna ao bem-estar deles. Convém lembrar que ele adotou um índio órfão como seu filho. Jackson declarava-se partidário dos índios assim como ele e seus companheiros democratas donos de escravos diziam-se preocupados, em primeiro lugar, com o bem-estar de seus próprios escravos. Mas as profissões de paternalismo daqueles dias até o presente, devemos agora ser capazes de enxergar, são um estratagema destinado a explorar o povo de maneira cruel, insistindo que os democratas estiveram fazendo infinitos favores. Tudo o que podemos dizer sobre tantas declarações pretensiosamente transparentes é: com amigos como os democratas, quem precisa de inimigos? Para um amigo dos índios, Jackson parecia extraordinariamente propenso a matá-los. Na realidade, seu apelido era “matador de índios”, o que tomou por elogio. Em Horseshoe Bend, no território do Mississippi (agora sul do Alabama), Jackson e suas tropas encurralaram um grupo de várias centenas de refugiados do povo Creek, que procuravam abrigo do conflito militar entre a milícia de Jackson e um grupo separatista dos combatentes do povo Creek, chamado Red Sticks. As forças de Jackson aniquilaram os refugiados. Como Jackson escreveu em uma carta à sua esposa, Rachel: “Já estava escuro quando terminamos de matá-los”. Jackson estimou que, além dos 557 cadáveres, encontrou 300 índios “submergidos em seus próprios túmulos de água”. Os homens de Jackson arrancavam o nariz dos índios mortos enquanto contavam os corpos. Depois, houve poucos arrependimentos; um dos soldados de Jackson riu-se de ter matado um menino de “cinco ou seis anos de idade” porque “ele se tornaria indígena um dia”.22 Veja aqui um critério distinto para o genocídio: a matança desenfreada dos membros de um grupo racial distinto no objetivo de destruí-lo como um todo ou em parte. A Lei pela Remoção Indígena, estruturada por Jackson — sua principal

prioridade ao assumir a presidência, em 1829 —, mais tarde veio a servir de base para a infame Trail of Tears [Trilha das Lágrimas]. Seu discurso em dezembro de 1830 no Congresso sobre a implementação da Lei a apresentou como benéfica para os índios, alegando que assim “os capacitaria a buscar a felicidade da maneira como eles a viam e sob suas próprias instituições rústicas” e os pouparia do destino das “tribos que ocuparam os países que hoje constituem os Estados orientais, agora aniquiladas ou dissolvidas para abrir espaço para os brancos”.23 No entanto, ao longo de sua carreira, Jackson combinou engano, ameaças e assassinatos para expulsar índios da Flórida, Alabama, Mississippi e Tennessee. Várias tribos — a Chickasaw, a Choctaw, a Creek e a Seminole — foram forçadas a evacuar. A Cherokee, no entanto, resistiu. Jackson declarou: “Toda a nação Cherokee deve ser flagelada”. Ele prendeu o líder cherokee eleito, John Ross, e incendiou o jornal da tribo, The Cherokee Phoenix. Jackson encontrou um grupo rival do Cherokee — não representante da tribo — e o subornou para aprovar um tratado falso em que o povo Cherokee concordava em abandonar suas terras e se mudar para o oeste do Mississippi. Porém, quando o prazo da realocação chegou, a grande maioria da tribo não havia abandonado suas casas. Apenas quatro mil cherokees partiram para o território indígena designado mais a oeste, mil estavam escondidos e dezessete mil permaneceram. Consequentemente, os democratas no Congresso e a Casa Branca decidiram expulsá-los. Essencialmente, eles forçaram uma nação inteira a se mudar sob a mira de armas. A realocação forçada desses dezessete mil do povo Cherokee tornou-se, nas palavras de Stanford, uma “marcha da morte” comparável à Marcha da Morte de Bataan, de 1942 — uma das atrocidades japonesas da Segunda Guerra Mundial. Os democratas enviaram tropas para atacar casas cherokees, capturando os moradores e aprisionando-os em campos de detenção. As cabanas foram incendiadas, o gado roubado ou executado, os homens, mulheres e crianças brutalizados. Certo voluntário da Geórgia, que mais tarde veio a servir no Exército Confederado, comentou: “Lutei na Guerra Civil e vi homens mortos e despedaçados aos milhares, mas a remoção Cherokee foi a operação mais cruel que já conheci”.

Os campos eram miseráveis pastos cercados, onde a fome e a doença reinavam. Essa doença não pode ser comparada às pragas que antes perseguiram as populações indígenas das Américas porque aquelas foram acidentais — o homem branco não tinha ideia de que havia trazido consigo doenças das quais os índios não eram imunes —, enquanto estas eram o produto da política e da ação oficial do governo democrata. Por causa da escassez de registros, os estudiosos não sabem quantos cherokees morreram. As estimativas variam de dois mil a oito mil — estimativa de Stannard. Se ele estiver certo, é o equivalente a quase metade dos dezessete mil cherokees que permaneceram em suas terras e mais de um terço dos que restauram na nação Cherokee.24 Enquanto isso, na Califórnia, o Poder Legislativo e o Executivo controlados pelos democratas montaram uma guerra contra a população indígena. Peter Burnett, governador democrata, não hesitou em chamá-la de “guerra de extermínio”, que “deve continuar a ser travada entre as raças até que os índios sejam extintos”. Aqui, novamente, temos uma clara expressão da intenção genocida. O objetivo claro era matar os índios através de expedições de milícias e do desencadeamento de multidões de vigilantes democratas, e levar o restante dos índios para as montanhas a fim de que suas terras pudessem ser subtraídas. Funcionou — a população indígena do estado foi amplamente eliminada. Mais recentemente, estudiosos encontraram evidências de que o Serviço de Saúde Indígena (SSI) realizou uma estratégia de longa data de esterilização de mulheres indígenas, e, em alguns casos, tirou delas os seus filhos e os colocou para adoção em casas de brancos. Lembre-se de que este é um dos critérios específicos para o genocídio sê-lo de fato, na definição da ONU. Era de se esperar que coisas assim tivessem acontecido antes de a ONU emitir seus princípios a respeito do genocídio, talvez antes da era nazista, mas na verdade continuou durante a década de 1970. Em estudo recente, Jane Lawrence estima que 25% de todas as mulheres nativas americanas (índias) com idade entre quinze e quarenta e quatro anos foram esterilizadas pela SSI na década de 1970. Elas foram enganadas e assinaram termos de consentimento maquinados por administradores progressistas que insistiam que o objetivo era reduzir a incidência da pobreza dos índios americanos ao

manter a população indígena sob controle.25 Esse, então, é o genocídio perpetrado por Andrew Jackson e seus sucessores democratas progressistas. Os biógrafos esquerdistas de Jackson, como Sean Wilentz, procuram minimizar as atrocidades do político. Seus argumentos parecem insinuar que, comparativamente falando, o genocídio de Jackson e de seus sucessores democratas foi um pequeno genocídio; mas um pequeno genocídio continua sendo genocídio. Perceba que designações assim não são meramente numéricas. Muitos ditadores, embora tenham matado grande número do próprio povo, não são contados com aqueles que cometeram genocídio, porque não visavam especificamente uma população separada e distinta. Além disso, Stalin e Mao parecem ter matado mais do seu próprio povo do que Hitler matou judeus, mas ainda assim a atrocidade deste é geralmente aceita como maior por causa da intenção e do desejo de acabar com toda uma população étnica. Não faz muito, progressistas — rompendo com historiadores democratas que celebram Andrew Jackson — exigiram que o rosto de Jackson fosse removido da cédula de vinte dólares. Como vemos no decorrer deste livro, os progressistas costumam ser os perpetradores, não os críticos, da matança em massa. O mais controverso — dado que Jackson esteve na cédula de vinte dólares desde 1928, ainda com Calvin Coolidge na presidência — é que o presidente Trump tem um retrato de Jackson no Salão Oval, bem como uma reprodução em miniatura sobre sua mesa da estátua equestre de Jackson em Lafayette Park. Trump visitou a fazenda que pertencia a Jackson e depois falou com admiração do fundador do Partido Democrata. Ele não é o único presidente republicano a fazê-lo. Theodore Roosevelt o fez e meu ex-chefe, Ronald Reagan, também visitou a fazenda e pendurou o retrato de Jackson no Salão Oval. Aqui, devo admitir, coloco-me ao lado dos progressistas. E fico feliz, que o horrível democrata, Jackson, será substituído por uma heroína republicana, Harriet Tubman, na cédula de vinte dólares, em 2020. Trump, como Reagan, é ex-democrata, e imagino que seu entusiasmo por Jackson seja parcialmente impulsionado pela hagiografia anterior do Partido Democrata de Jackson e,

em parte, pela atual calúnia de Jackson nas mãos de muitos progressistas de esquerda. Mas é verdade que mesmo os progressistas ocasionalmente podem acertar — nesse caso, penso eu, eles acertaram.

Os Campos de Escravos e os Campos Nazistas Agora passemos da remoção indígena para a escravidão. À primeira vista, parece difícil comparar uma fazenda de escravos americana do século XIX com os campos de concentração alemães do século XX. Estes eram criações industriais modernas, aqueles pareciam ecos antiquados de uma era passada. No entanto, em 1959, o historiador Stanley Elkins revolucionou a história comparada de ambas as instituições. Assim como Marc Buggeln usou o conceito de trabalho escravo para elucidar o sistema do campo de concentração, Elkins usou o conceito de campo de concentração para elucidar o estudo daquele sistema escravagista. Elkins parte de uma compreensão assustadora. Ele entendeu que, até hoje, os retratos estereotipados da escravidão sulista não só perduram na literatura, mas também na experiência contemporânea. É possível enxergar, em outras palavras, as subservientes “casas de negros” e os rebeldes “negros do campo” sobre os quais os escravos e donos de escravos falavam. Em outras palavras, os estereótipos não eram ficções racistas, que não seriam tão persistentes, diz Elkins, a não ser que tivessem ao menos um núcleo de verdade. Elkins encontrou um estereótipo particularmente instigante: o do cafuzo [Sambo] extravagante, desencanado, semi-idiota. Elkins observa: “Seu comportamento era cheio de tolices infantis e sua conversa inflada de exageros pueris”. O cafuzo, em outras palavras, é uma criatura infantil que não amadureceu, jamais atingiu a hombridade. O cafuzo é personagem persistente na literatura e no teatro do início do século XX. De onde veio o cafuzo, indaga Elkis? Aqui ele não está se referindo ao cafuzo literário ou artístico, mas ao real, à personalidade negra real que corresponde a esse personagem estranho e ridículo. Ao pensar nisso, Elkins teve uma súbita epifania. Ele lembrou que, nos campos de concentração alemães, os internos descobriram, após o choque inicial do deslocamento, que as regras do mundo exterior não se aplicavam

ali. Olhando ao redor, eles viram que os prisioneiros sobreviventes desistiram completamente da dignidade e responsabilidade que, estivessem do lado de fora, lhe caberiam. Eles se transformaram em seres infantis, quase como crianças, em sua dependência e conformidade com as autoridades. “O humor deles foi atingido por uma tolice e eles riam feito crianças quando algum deles soltava um pum”.26 Em suma, aqui, num cenário tão distante e pouco familiar, apareceu algo como o personagem cafuzo, tão vividamente identificado como habitante da fazenda de escravos democrata. Ademais, Elkins observa, havia, nos campos nazistas, judeus e outros presos que foram designados Kapos, isto é, prisioneiros postos na função de supervisionar os esquadrões de trabalho chamados Kommandos, sem contar que exerciam também o papel de escreventes ou eram aqueles que registravam a rotina diária sob a supervisão da equipe da SS alemã. Os sobreviventes dos campos disseram em entrevistas que os Kapos basicamente assumiram o papel dos nazistas. Eles eram tão severos quanto, ou até mesmo mais rígidos; alguns deles chegaram a se vestir e a falar como tais. Em suma, eles assumiram o papel daqueles que os oprimiam. Logo, eis aqui um segundo tipo, não o cafuzo, mas não menos desfigurado e estranho. Como isso pôde acontecer? Elkins percebeu que as fazendas de escravos democratas na América e os campos de concentração nazistas tinham algo em comum. Ambos eram sistemas fechados em que os internos viviam num mundo separado, em grande parte selado do mundo exterior. Consequentemente, teoriza Elkins, o ritmo ordinário dos escravos nas fazendas e dos internos dos campos de concentração foi corrompido e transtornado a tal ponto que acabou criando novas personalidades — personalidades anormais e distorcidas, sem paralelo no mundo normal. No caso do cafuzo como personagem peculiar, Elkins nota que ele simplesmente não existia na América do Sul, cujo sistema sustentava a escravidão, mas sem o cafuzo. E por quê? Porque, respondeu Elkins, a escravidão sul-americana não era um sistema fechado. Mesmo os escravos da fazenda viviam em um mundo mais amplo, sob a proteção de seus senhores da Coroa espanhola e da Igreja Católica. Nas fazendas democratas do Sul dos EUA, em contraste, o escravo adulto era despojado de suas responsabilidades masculinas usuais — homens maduros eram tipicamente chamados de

“garotos” —, resultando nessa criatura infantilizada chamada cafuzo, a qual Elkins chama de a “perpétua criança”.27 Toda a comunidade de estudiosos do escravagismo logo percebeu que o livro de Elkins havia levado o debate a um novo patamar. Quase duas décadas após ser publicado, a editora da Universidade de Illinois lançou a obra The Debate Over Slavery: Stanley Elkins and His Critics [O Debate Sobre a Escravidão: Stanley Elkins e Seus Críticos], em que os principais estudiosos da área responderam à tese de Elkins, que depois devolveu com uma réplica. O falecido Eugene Genovese, talvez o mais conhecido estudioso em escravidão da América, considera o livro de Elkins “um dos ensaios históricos mais influentes da nossa geração”.28 Voltarei à tese, mas primeiro quero abordar um assunto que Elkins evitou. Ele insistiu que não tinha a intenção de fazer uma análise comparada das duas instituições em sua realidade, entre a fazenda de escravos e os campos de concentração nazista. O autor não entra em questões como itinerário, dieta, administração, de que modo eram tratados os escravos cativos e os internos, ou as ideologias subjacentes que sustentavam ambos os sistemas. Elkins deixa implícito que eram regimes tão diferentes que, na maioria dos aspectos, seriam incomparáveis. Discordo. E suspeito que Elkins não tenha se aventurado por desconhecer parcialmente os campos de concentração nazistas. (Ele certamente não desconhecia as fazendas de escravos). Elkins parece derivar boa parte do que sabe a respeito dos campos de concentração a partir do trabalho do sociólogo Bruno Bettelheim, ele mesmo um sobrevivente de Buchenwald e Dachau e autor de um estudo inovador, Individual and Mass Behavior in Extreme Situations [O Comportamento Individual e das Massas em Situações Extremas]. No entanto, Bettelheim não tentou produzir uma pesquisa abrangente sobre os campos, mas simplesmente destacou a transformação do comportamento humano em condições de sobrevivência extrema. Meu propósito de chegar aonde Elkins temeu pisar não é miná-lo, mas avançar ainda mais a sua tese, para mostrar que ele realmente subestimou os paralelos. Acomodações e alimentos: a estrutura física dos campos de concentração

nazistas, e não a das fazendas, aproximava-se mais do sistema carcerário. O típico campo de concentração tinha um quartel, uma oficina, um escritório administrativo, uma enfermaria, uma prisão e um crematório. (O comandante e a equipe da SS residiam fora das instalações). Já as fazendas de escravos eram construídas de forma um tanto diferente. Elas geralmente consistiam na mansão do senhor de escravos — a chamada Casa-Grande —, senzalas em ruínas, possivelmente uma oficina e campos para plantação de arroz ou algodão. Os campos nazistas eram segregados por sexo, enquanto as senzalas se formavam com habitações familiares contendo homens, mulheres e crianças. Não obstante, o conteúdo físicos tangível de cada compartimento ou habitação era bastante semelhante em ambos os casos: nada mais do que um leito e um cobertor, um banheiro ou um penico e, quem sabe, uma cadeira. Para o campo de Ravensbruck, a historiadora Sarah Helm relata que as únicas provisões eram um prato, um copo, alguns utensílios, uma escova de dentes, um pedaço de sabão e uma pequena toalha.29 Em termos de alimentação, os escravos estavam bem melhores, já que recebiam porções regulares de carne e vegetais, enquanto os presos nos campos nazistas recebiam pouco mais que uma sopa de aveia rala, pão e água. Elie Wiesel, aprisionado em Auschwitz e depois em Buchenwald, conta que sua ingestão diária consistia em uma “tigela de sopa” e uma “crosta de pão velho”. Em Ravensbruck, as mulheres pareciam estar numa situação um pouco melhor; aos domingos, elas recebiam um “bocado de geleia, um tablete de margarina e uma salsicha”, e também eram autorizadas a pegar dinheiro de casa e comprar bolachas e biscoitos na loja da instalação local.30 A desnutrição, problema episódico no regime escravo democrata, foi crônica nos campos de concentração nazistas. Seja a fazenda de escravos dos democratas, seja o campo de concentração nazista, ambos os regimes eram selados do mundo exterior, demarcados, em alguns casos, por uma cerca alta ou arames farpados, vigiados por guardas, nos campos, ou capatazes, nas fazendas, às vezes auxiliados por cães treinados. Em ambos os casos, os cativos ficariam lá por toda a vida; aqueles que entravam nunca mais sairiam, fato para ambos os sistemas. Assim, Elkins não poderia estar mais certo de que esses eram sistemas fechados, mundos

para si mesmos, completamente separados do mundo exterior. Rotina de trabalho: aqui o termo “trabalho escravo” aplica-se igualmente ao sistema das fazendas democratas e dos campos de concentração. O trabalho começava com o nascer do sol e acabava ao anoitecer: era contínuo, persistente e incessante. Enquanto a maioria dos escravos trabalhavam em plantações de algodão, a maior parte dos cativos nos campos de concentração trabalhava em locais de construção e pedreiras. Durante a maior parte do tempo que passou em Auschwitz, Elie Wiesel trabalhou na construção “onde, por doze horas diárias, arrastava pedras pesadas”.31 Em ambos os sistemas o trabalho era principalmente braçal, não qualificado ou pouquíssimo qualificado, embora também houvesse tarefas que exigiam habilidade especializada como soldagem, carpintaria, alvenaria e eletricidade, serviços atribuídos a um pequeno subconjunto de prisioneiros um pouco mais qualificados. Escravos e prisioneiros eram obrigados a trabalhar. O tempo trabalhado dos escravos costumava ser de seis dias por semana, exceto na época de plantação, e recebiam folga em virtude do feriado de Natal, que normalmente era comemorado com música e um banquete. Os prisioneiros nazistas trabalhavam todos os dias, sem feriados, sem festa. Se desse uma pausa no trabalho, o escravo provavelmente seria açoitado; agora, se um prisioneiro nazista parasse, ele provavelmente seria espancado ou baleado. Obviamente, em nenhum dos casos os trabalhadores eram pagos, embora os proprietários de escravos e os capatazes por vezes oferecessem incentivos para trabalhar, incluindo ao permitir que escravos ficassem com parte da produção. O único pagamento que os prisioneiros dos campos nazistas recebiam era a chance de viver e trabalhar por mais um dia. Os limites do poder absoluto: os democratas senhores de escravos não possuíam, por lei, poder absoluto sobre seus escravos. Em todos os estados sulistas, o assassinato de um escravo era proibido. Na maioria dos estados, formas extremas de mutilação e ferimento também eram proibidas. Mas os donos de escravos tinham o poder de facto, porque teriam o direito de reivindicar invariavelmente que o escravo resistira à autoridade ou inventariam alguma outra desculpa, medidas nas quais os tribunais acabavam acreditando.

Com açoites e outras punições, os senhores de escravos democratas possuíam uma autoridade praticamente desenfreada. Em 1829, no caso Estado vs Mann, o juiz Thomas Ruffin decidiu o caso em que determinado dono foi acusado de ferir gravemente seu escravo. Ruffin, embora democrata, era relativamente humanitário, e disse que sua consciência se revoltava ao permitir que o abuso ficasse impune. Apesar disso, declarou, ele precisava unir-se ao senhor de escravos porque o “objetivo da escravidão é o lucro do senhor” e a tarefa do escravo é “labutar duro para que outro possa colher os frutos”.32 Tal sistema só poderia sobreviver se a vontade do senhor fosse, praticamente falando, absoluta. Ironicamente, o que mais protegia os escravos, se seus senhores democratas tendessem à crueldade ou ao assassinato, era a própria posição de posse, bem ou propriedade. Wolfgang Sofsky defende esse ponto em seu livro The Order of Terror [A Ordem do Terror], um estudo sobre a vida nos campos de concentração. Sofsky observa que, ao contrário dos escravos, as vítimas dos campos de concentração “não eram propriedade pessoal desse ou daquele senhor, mas detentos de uma instituição. Eles não pertenciam a ninguém”. Assim, “os prisioneiros não tinham valor nem preço”. Em contraste, “o escravo tinha valor e preço de mercado. O dono não adquire para si escravos a fim de matá-los, mas tem por objetivo colocá-los para trabalhar em benefício próprio”.33 Os escravos custavam entre 1 200 e 1 500 dólares no período entre 1830 e 1860. Isso significa que os senhores democratas tinham grande investimento em seus escravos. Os donos não desejavam danificá-los, cujo valor, afinal, decairia; em outras palavras, não desejavam fazê-lo pelo mesmo motivo que você não gostaria de danificar seu próprio carro. Por mais marginal que fosse a proteção do escravo de seu senhor democrata, os internos do campo nazista não tinham proteção de seus algozes, que tinham total discrição para brutalizá-los e matá-los. Por razão disso, não há sequer comparação quanto ao nível de perigo que sentiam os presos do campo de concentração em relação aos escravos. Estes temiam seus senhores e capatazes, mas não estavam em constante risco de morte; aqueles, sim, estavam. O perigo era maior, é claro, para os judeus, mas todos os presos sentiam com força esse medo.

Assim como com a escravidão, a escassa proteção que os presos dos campos nazistas conseguiram foi por ocasião da utilidade que tinham para o regime nazista. Quando as condições do campo melhoraram, Buggeln conta: “tinha pouco que ver com o considerar a humanidade” e era, na verdade, “um reflexo daquilo que se exigia da mão de obra” no regime. É conveniente lembrar que, Buggeln comenta, no fim da guerra, os nazistas pediram aos oficiais da SS que alimentassem melhor os trabalhadores dos campos de concentração, que lhes dessem roupas de inverno apropriadas e permitissem oito horas de sono, sem interrupção. Foram regras que chegaram a se aplicar mesmo aos judeus, dando a entender que, prevendo o fim, os nazistas estavam tão desesperados por trabalhadores que se “dispuseram a rescindir temporariamente de uma das principais exigências ideológicas do nazismo — livrar o Terceiro Reich dos judeus”.34 Rebeliões e fugas: certa feita, Andrew Jackson ofereceu a recompensa de cinquenta dólares a quem capturasse um fugitivo de sua fazenda “e dez dólares a mais por cada cem chicotadas, até totalizar trezentas, a quem as aplicasse ao fugitivo”.35 Fugas eram comuns na rotina dessas fazendas. Os donos procuravam leis — A Lei do Escravo Fugitivo — que obrigassem os estados livres a devolver fugitivos. O senhorio passou a empregar patrulheiros a fim de impedir que os escravos tentassem escapar e contratavam caçadores para recuperar fugitivos. Os jornais democratas anunciavam “cachorros negreiros” para farejar fugitivos escondidos nas florestas ou nos pântanos. Rebeliões por parte dos escravos eram um tanto incomuns, e é por isso que sabemos sobre as poucas existentes, tais como as rebeliões levantadas por Nat Turner e Denmark Vesey. No entanto, mesmo estas falharam e os autores foram capturados e executados. “Pouquíssimos prisioneiros escaparam dos campos”, relata Sofsky em seu estudo The Order of Terror.36 Sofsky conta algumas centenas de fugitivos, em si um pequeno milagre, já que os campos eram grandes fortalezas. Sofsky salienta que as filiais menores ofereciam melhores chances de fuga, embora até mesmo ali fosse necessário grande planejamento. Ademais, civis da população local poderiam entregar o fugitivo de volta aos campos. Quanto às rebeliões, Sofsky contabiliza apenas três: uma em Treblinka,

outra em Sobibor, em 1943, e outra em 1944, em Auschwitz. A revolta de Treblinka envolveu um ataque às cercas perimetrais, por onde em média duzentos prisioneiros fugiram, perseguidos por guardas da SS em caminhões e a cavalo. Sofsky estima “ser improvável que mais de cinquenta ou sessenta dos que escaparam tenham sobrevivido para presenciar o fim da guerra”. A rebelião de Sobibor foi um fracasso e resultou em cerca de cem presos executados. Da mesma forma na rebelião de Auschwitz, todos os fugitivos, conseguindo matar três oficiais da SS e ferir outros doze, foram caçados e mortos.37 A mensagem essencial é a seguinte: com regimes fechados profundamente opressivos como os campos nazistas e as fazendas dos democratas, os oprimidos, por mais motivados que estivessem em se rebelar e derrubar o sistema, simplesmente não conseguiam fazê-lo. Ainda que desejosos, mas sem poder. Em última análise, tanto as fazendas de escravos quanto o regime dos campos de concentração nazistas tiveram de ser derrubados pelo lado de fora, pela invasão militar externa. Os Aliados e o Exército dos Estados Unidos, cada qual tendo seu papel, foram os libertadores dos prisioneiros e dos escravos. Ideologias de inferioridade: o termo “escravo” [slave] deriva-se, na verdade, do termo “eslavo” [slav]. Por certo os escravos do regime nazista eram em grande parte eslavos e, em termos raciais, brancos. Mesmo assim os nazistas consideravam os eslavos — bem como consideravam os judeus e os russos — como Untermenschen, ou sub-humanos. Dentro dos campos nazistas, havia uma hierarquia de inferioridade que determinava o tratamento dos presos: os prisioneiros alemães eram considerados os mais elevados e tratados melhor, enquanto os judeus — especialmente os judeus não alemães — eram considerados os mais inferiores e tratados da pior forma. Os nazistas não apenas desenharam uma simples demarcação entre captores e cativos; havia também subcategorias que estabeleciam uma hierarquia ou gradação entre as populações cativas. Entre os democratas donos de escravos, em contraste, havia uma única linha racial. Nem todos os proprietários de escravos eram brancos — havia, inclusive, um número substancial, embora proporcionalmente pequeno, de proprietários negros. Mas todos os escravos eram negros. Conquanto ambos, nazistas e

democratas, tenham aplicado um código racial em seus sistemas de escravidão, o código nazista era mais variado e multifacetado do que o dos democratas. É curioso perceber que os nazistas não precisaram defender sua ideologia, pois não enfrentaram nenhum tipo de questionamento interno. Os democratas, no entanto, enfrentaram oposição, primeiro do Partido Whig e depois do Partido Republicano, sem contar a forte oposição do pequeno grupo de republicanos conhecidos como abolicionistas. Isso posto, os democratas desenvolveram uma ideologia abrangente pró-escravidão, na qual tinham a cara de pau de afirmar que a escravatura era boa não só para o dono, mas também para seu escravo. George Fitzhugh, escritor democrata, argumentou que o escravos eram como animais, nascidos para serem dominados por seus donos e que “a equitação lhes faz bem”. Outros democratas, como o senador John C. Calhoun, insistiram que a escravidão foi uma “escola civilizatória”, embora, aparentemente, não fosse uma escola na qual alguém pretendesse se graduar.38 Convém, nesse ponto, desfavorecer os democratas em comparação aos nazistas. Mesmo estes não tiveram a audácia e a desonestidade intelectual de sugerir que os Untermenschen e os judeus eram, de alguma forma, beneficiados com o regime nazista.

Legado Duradouro Volto-me a Elkins agora, para resumo e uma única observação final. Resumindo, mesmo como um sistema fechado, a escravidão, tendo sido de longa duração, produziu ao longo desse tempo uma cultura afro-americana distinta. Eugene Genovese, em sua obra Roll, Jordan, Roll, bem como na crítica mais compreensiva que faz a Elkins, destaca esse ponto. Os escravos, por exemplo, desenvolveram um repertório de canções, histórias e relacionamentos — às vezes relacionamentos vitalícios — que, em última análise, ajudaram a formar uma identidade negra nos Estados Unidos. Aqui não existe nenhum paralelo com os campos de concentração, em parte por causa da natureza do ambiente e em parte porque duraram apenas doze anos, de 1933 a 1945. Em geral, os prisioneiros dos campos não estabeleceram relacionamentos íntimos, em parte porque era algo

desencorajado pelos guardas e em parte porque os prisioneiros perceberam que a pessoa com quem foi feita a amizade na semana anterior poderia ser sumariamente executada na semana seguinte. Assim, as únicas mudanças comportamentais que os campos nazistas produziram estavam na natureza do adaptar-se depressa à vida nos campos. Segue-se disso, portanto, o fato de o legado cultural da escravidão ter ultrapassado a escravidão, enquanto o legado cultural dos campos de concentração — incluindo as peculiares desfigurações de personalidade que Elkins detectou — provou ser um fenômeno temporário. O fenômeno do muselmanner parecido com zumbis, substituto nazista dos Kapos — tudo desapareceu. Não faz sentido dizer que os judeus ou os europeus do Oriente atualmente apresentam quaisquer das características que se desenvolveram dentro desse sistema temporariamente fechado. No caso do negro americano, no entanto, a situação é bastante diferente. Embora terminada em 1865, a escravidão perdurou por mais de duzentos anos, e teve o seu maior alcance durante a era da supremacia democrata no Sul, desde a década de 1820 até a década de 1860. Muitas das características da antiga fazenda de escravos — a moradia em ruínas, a família quebrada, o alto índice de violência usada para manter a ordem, poucas oportunidades e escassas perspectivas de avanço, o senso generalizado de niilismo e desespero — são evidentes em cidades urbanas governadas por democratas como Oakland, Detroit, Baltimore e Chicago. “Havia uma subclasse distinta de escravos”, escreve o cientista político Orlando Patterson, “que vivia de forma fútil ou perigosa. Era o negro incorrigível, de quem a classe de donos de escravos sempre reclamava. Eles fugiam. Eram ociosos. Mentiam compulsivamente. Eles pareciam imunes ao castigo”. Em seguida, Patterson chega ao clímax: “Pode-se traçar a subclasse, como fenômeno social persistente, neste grupo”.39 A esquerda não gosta de Patterson por ser ele um estudioso negro oriundo do oeste da Índia e propenso a proferir verdades politicamente incorretas. Pessoas mentirosas não gostam disso. Mas quantas mentiras você pode contar? Quem pode negar que os negros ainda vivem sob os efeitos daquilo que os democratas lhes fizeram? Hoje os negros sofrem uma taxa de

ilegitimidade na família de aproximadamente 80%. Não estou dizendo que tudo se deve à escravidão, mas quem pode dizer que, em parte, não se deve ao legado da escravatura? A taxa de criminalidade entre os negros é muito maior, com altos índices de homicídio de negros contra negros. Quem pode dizer que não é a consequência, ao menos parcial, da desvalorização que a vida negra sofreu nas mãos do senhorio democrata? W. E. B. Du Bois, estudioso democrata, certamente o fez. São perguntas, e não respostas, embora pense que Du Bois tenha acertado nesses pontos. Se assim for, significa que o progresso que fizemos na erradicação dos campos de concentração e da escravidão não está nada completo. Certamente, ambas as instituições foram derrotadas pela guerra e permanentemente encerradas. Contudo, o legado de um deles continua. Enquanto o legado nazista alemão mantém-se sobretudo na memória, o legado dos democratas senhores de escravos na América ainda retém cicatrizes feias na vidas de muitos afro-americanos.

Capítulo Cinco

Os Racistas Originais Foi com a instituição das Leis de Nuremberg, em 1935, que a Alemanha tornou-se um regime racista de pleno direito. As leis americanas foram os principais precedentes estrangeiros para tal legislação.1 George Fredrickson, Racism: A Short History [Racismo: uma Breve História]

Em 5 de junho de 1934, pouco depois da ascensão de Hitler ao poder, as principais figuras por trás das Leis de Nuremberg reuniram-se para determinar o que elas deveriam de fato declarar. Entre os presentes estavam Bernhard Losener, principal formulador do texto escrito da legislação de Nuremberg, Franz Gurtner, ministro da Justiça do Reich, Roland Freisler, secretário estadual do Ministério da Justiça e mais tarde presidente do “Tribunal Popular” nazista, e Karl Klee, juiz presidente do Tribunal Criminal. Uma das fontes mais eruditas dos nazistas era o jovem advogado Heinrich Krieger, que havia estudado na Universidade de Arkansas e cuja pesquisa sobre a legislação racial dos EUA formou a base da obra do Ministério da Justiça nazista. O ambiente era de seriedade, até mesmo de gravidade, e um estenógrafo estava presente para realizar a transcrição. O encontro foi significativo, uma vez que os nazistas sabiam desde então que estavam construindo pela primeira vez no mundo um Estado racista. E determinados estavam a fazê-lo com precisão alemã, ou seja, determinados a fazê-lo corretamente. Nas palavras de Michael Burleigh em seu livro The Racial State [O Estado Racial]: “O Terceiro Reich tornou-se o primeiro Estado da História mundial cujo dogma e prática eram o racismo”.2 Não faz muito que o jurista James Whitman estudou essa transcrição e

ficou surpreso com o que encontrou. Conforme Whitman escreve em seu livro, Hitler’s American Model [O Modelo Americano de Hitler], “A reunião envolveu longas discussões sobre a legislação dos Estados Unidos da América”. A reunião abriu com Gurtner apresentando um memorando sobre a legislação racial dos EUA e, à medida que avançava, Whitman observa: “Os participantes voltavam para o exemplo dos EUA repetidamente”. Basicamente, os nazistas estavam interessados em três coisas da América: leis acerca do casamento inter-racial, leis que restringiam a imigração com base na raça e as Leis de Jim Crow. Os nazistas compreenderam que as leis dos EUA de segregação e miscigenação aplicadas aos negros e às leis de imigração aplicavam-se a outros grupos étnicos minoritários nos Estados Unidos. Mas as leis não — Krieger observou de forma otimista com um “até agora” — se aplicavam aos judeus. No entanto, os nazistas estavam convencidos de que poderiam aplicar essas mesmas leis, ainda que com modificações adequadas ao contexto. Especificamente falando, eles estavam formulando leis para lidar com judeus enquanto também pensavam nos ciganos e outras populações “indesejadas”. Os nazistas presentes na reunião dividiam-se em duas alas, às quais Whitman dá o nome de “moderados” e “radicais”. Os moderados insistiam que era impraticável e absurdo ter leis que proibissem o casamento interracial entre, digamos, alemães nórdicos, ou “arianos”, e judeus. Tais leis, segundo eles, praticamente nunca existiram por todo o mundo. Além disso, as novas leis deviam basear-se em alguns precedentes alemães e o único encontrado era o de leis contra a bigamia e a poligamia. Em vez de testar e aplicar essas leis, que tratavam da questão à parte de múltiplas esposas, este grupo propôs simplesmente usar “uma campanha de conscientização pública e esclarecimento” para desencorajar os alemães nórdicos de casarem-se ou de coabitarem com os judeus. A isso os radicais responderam não haver necessidade de alarde, porque decerto havia precedentes para as leis que proibiam o casamento inter-racial. Esse precedente veio dos Estados Unidos; cerca de trinta estados americanos proibiam o casamento inter-racial. Freisler admitiu que a América era única ao passar esse tipo de lei que proibia a “mestiçagem”, não obstante insistiu que o exemplo da jurisprudência americana no tocante à questão racial “lhes

serviria perfeitamente”. Além do mais, havia nos EUA a Lei da Imigração de 1924, que estabelecia cotas para a imigração com base na raça, concedendo tratamento preferencial aos brancos e discriminando os pardos e os negros que desejavam mudar-se para a América em busca de cidadania. Havia também toda uma rede de leis de segregação que separava os brancos dos negros — escolas separadas, acomodações de hotel separadas, bebedouros separados e assim por diante. Os nazistas as colocaram na categoria de “indivíduos sem direitos de cidadania”. Em outras palavras, os nazistas estavam entusiasmados com a criação americana, base para duas categorias de cidadania: cidadãos de primeira classe e cidadãos de segunda classe. Isso, eles sabiam, tinha aplicabilidade direta à incumbência de elaborar as Leis de Nuremberg. Os moderados então questionaram: por que separar os judeus? Talvez, diziam eles, as Leis de Nuremberg devam simplesmente proibir o casamento inter-racial entre pessoas de diferentes raças. Erich Mobius, médico nazista afiliado ao Ministério do Interior, indicou que evitar referências específicas aos judeus melhoraria a reputação internacional da Alemanha. No que diz respeito a esse ponto, os radicais opuseram-se, defendendo que a Alemanha deveria tomar coragem a partir do exemplo americano. Klee disse que, assim como a legislação americana sobre questões raciais e de imigração reconhecia especificamente a inferioridade de certas raças, em particular a dos negros, a legislação alemã também deveria reconhecer especificamente a inferioridade do povo judeu. Em ambos os casos, disse Klee, tratava-se simplesmente de uma “proteção racial”, salvar a maioria nativa branca da ameaça e da contaminação impostas por raças inferiores. Logo a reunião tocou em uma questão persistente: quem é judeu? Os moderados insistiam que não era fácil de identificar a etnia de uma pessoa, dada a realidade das raças mestiças. Seria preciso ser cem por cento judeu ou ser metade judeu já bastaria? Nesse ponto os radicais destacaram que as leis de segregação do Sul baseavam-se na chamada one drop rule, isto é, a “regra de uma única gota”. Em outras palavras, ter qualquer ascendência negra discernível — teoricamente, mesmo uma única gota de sangue negro — faria do indivíduo alguém negro.

No entanto, diz Whitman, até mesmo os nazistas radicais consideraram esta uma posição extremista. Admitiu-se a “dureza humana” dos regulamentos americanos e questionou-se: como alguém poderia considerar negro aquele indivíduo “de aparência predominantemente branca”? Os radicais foram obrigados a recuar de propor algo tão extremo para o caso dos judeus. “Para eles”, Whitman observa sarcasticamente, “o racismo americano às vezes era simplesmente desumano”.3 Por fim, mas sem surpresa, os radicais prevaleceram e seu triunfo refletiuse nas infames Leis de Nuremberg de 1935. Essas leis — oficialmente denominadas Lei da Proteção do Sangue Alemão e a Lei da Cidadania do Reich — foram, de fato, modeladas a partir das leis americanas de antimiscigenação, das leis de imigração e das Leis de Jim Crow. Elas proibiam o casamento e a relação sexual entre judeus e “cidadãos de sangue ou parentesco alemão”. Aos judeus foi negada a cidadania alemã; eles agora eram considerados estrangeiros residentes, não privados de todos os direitos em geral, mas certamente de todos os direitos políticos. Como Burleigh observa: “As Leis de Nuremberg oficialmente transformaram os judeus em cidadãos de segunda classe”, exatamente como a maioria dos negros foi considerada nos Estados Unidos.4 Convém notar que os nazistas radicais rejeitaram a “regra de uma única gota” e determinaram que, para ser considerado judeu, o indivíduo teria de ter três avós judeus. Aqueles que eram um quarto ou metade judeu só seriam assim considerados se praticassem o judaísmo ou se casassem com outros judeus; do contrário, seriam contados como alemães. Assim os nazistas foram por uma linha mais leve quanto à definição da identidade racial do que seus precedentes dos EUA. “No que diz respeito a este alcance contido, escreve o historiador George Fredrickson, “o antissemitismo alemão era menos rigoroso com a pureza racial do que a supremacia branca americana”.5

Transferindo a Culpa Meu plano de origem para este capítulo era demonstrar o desenvolvimento paralelo entre o racismo no Partido Democrata, na América, e o racismo, um tipo especial, o antissemitismo, na Alemanha nazista. Eu não fazia ideia de que o racismo dos democratas realmente havia

moldado e influenciado as políticas da Alemanha nazista. Sabia, sim, que um precedeu o outro, mas não que um ajudou a causar o outro. Sou agradecido, portanto, a Whitman e a outros por me mostrarem as relações causais entre esses dois tipos de fanatismo. Minha gratidão é restringida, no entanto, por reconhecer que esses estudiosos são quase todos praticantes da grande mentira. Whitman constantemente aponta o dedo culpando “a América”. Ele escreve: “A legislação americana permaneceu um constante ponto de referência nazista”. Os nazistas “voltaram-se repetidas vezes ao exemplo americano”. E conclui, “a supremacia branca americana proporcionou, para nossa vergonha coletiva, alguns materiais bastante efetivos para o nazismo da década de 1930”. Whitman quer para a América um lugar seguro “na História mundial do racismo”.6 Ira Katznelson, outro praticante da grande mentira, revela um tom diferente em seu livro Fear Itself [O Medo Em Si]. Como Whitman, Katznelson tem dizeres reveladores sobre como os nazistas pareciam favoráveis ao racismo dos democratas. Ele escreve: Quando os americanos se queixaram do antissemitismo nazista, os representantes do partido responderam citando os preconceitos raciais do Sul, reivindicando um parentesco. O Volkischer Beobachter, mais antigo jornal do Partido Nazista, costumava desprezar os africanos e os afro-americanos. Como grande parte da imprensa alemã, o jornal frequentemente imprimia charges depreciando os negros, lembrando aos leitores que as acomodações públicas do Sul eram segregadas, satisfazendo-se ao relatar que negros, bem como os judeus alemães, não podiam dormir nos vagões-dormitórios Pullman nem exercer o direito ao voto. Quando o Partido Nazista começou a se mobilizar [...] Der Weltkampf, seu periódico ideológico, reproduziu os discursos do Mago Imperial da Ku Klux Klan sobre miscigenação. Falar de linchamento tinha espaço favorito. Neues Volk celebrou o linchamento ocorrido no Sul para proteger as mulheres brancas do desejo desenfreado dos negros. O Volkischer Beobachter publicou muitas histórias gráficas em apoio ao

linchamento como ferramenta para proteger a pureza sexual branca. O periódico da SS, Schwarze Korps, afirmou que, se linchamentos ocorressem na Alemanha como no Sul dos EUA, o mundo inteiro se queixaria com indignação.7 Quão cativante tudo isso. Katznelson mostra como os nazistas estavam conscientes e entusiasmados com o fanatismo no Atlântico, que eles acreditavam ser paralelo e reforçar seu próprio fanatismo. Ainda assim, note que, do mesmo modo como Whitman culpa “a América”, Katznelson culpa “o Sul”. Nenhum deles diz: “os democratas”. Nenhum dedo de culpa jamais identifica “os progressistas”. Eles nunca apontam para “a esquerda”. Eis algo significativo, porque toda a legislação de segregação no Sul foi aprovada por uma legislatura democrata, firmada no poder por um governador democrata e executada por delegados democratas e autoridades municipais e estaduais democratas. A maioria das leis antimiscigenação foi aprovada em estados democratas. Os progressistas aprovaram a (racista) Lei da Imigração de 1924 e a celebraram como uma vitória da ciência e do planejamento progressistas. A Ku Klux Klan foi criada pelos democratas e serviu durante trinta anos, nas palavras do estudioso progressista Eric Foner, de “braço terrorista domesticado do Partido Democrata”. O que Whitman poderia dizer em resposta? Ele poderia afirmar que culpa “a América” porque os próprios nazistas citavam leis e precedentes americanos. Certamente, os nazistas, vendo os Estados Unidos a milhares de quilômetros de distância, poderiam ter pensado que as políticas racistas no país eram, de alguma forma, o resultado de um consenso nacional. A Alemanha nazista chegou, em determinado momento, a ter este consenso. Mas não na América, como Whitman e Katznelson indubitavelmente sabem. Eles entendem que as políticas racistas neste país emergiram de uma grande luta entre dois partidos e duas ideologias rivais, datados da época da escravidão e da Guerra Civil. Isso posto, a grande mentira aqui envolve Whitman e Katznelson transferindo a culpa dos verdadeiros culpados — os progressistas e os democratas — para um “Sul genérico” e uma “América” ainda mais genérica. Ao fazê-lo, ambos esperam por dois resultados. Primeiro, esperam que os

conservadores caiam nessa armadilha e corram em defesa do Sul e da América. Isso faria dos conservadores os defensores do racismo, da segregação e do terrorismo racial. Com certeza, meu antigo colega da AEI (American Enterprise Institute), Josh Muravchik, lamenta que Whitman tente relacionar as políticas nazistas às políticas americanas. Muravchik não nega que os nazistas tenham apelarado para exemplos americanos. Pelo contrário, ele pergunta, qual é o problema? Em outras palavras, que diferença faz? Ele escreve: “Suponha, por um momento, que os nazistas não tivessem encontrado inspiração nenhuma em exemplos americanos. Não existiriam as leis de Nuremberg? Se não houvesse modelo americano, um judeu a menos teria morrido nas mãos de Hitler?”.8 Muravchik faz uma boa observação. Minha resposta às suas perguntas é que, com as Leis de Nuremberg, as coisas podem parecer um pouco diferentes, mas o veneno contra os judeus e outras populações-alvo teria continuado sem cessar. Ninguém está dizendo que os nazistas aprenderam a odiar os judeus através dos exemplos americanos de racismo, ou que os Estados Unidos motivaram os nazistas a matar mais judeus. Antes, a questão é que os nazistas descobriram uma maneira de institucionalizar seu antissemitismo usando um precedente legal já existente no Atlântico. A esse respeito, o racismo estabelecido neste país ajudou a estabelecer o racismo naquele outro. Ah!, infelizmente, por toda sua ingenuidade, Muravchik ficou preso em um racismo reducionista, na vã tentativa de exonerar a América. Ele está indo exatamente aonde Whitman e Katznelson esperavam que este fosse. O que ele deveria fazer, em vez disso, é mostrar que não foi “a América” que fez tudo isso — mas, sim, os democratas. Inconscientemente, Muravchik acaba por encobrir o racismo do Partido Democrata, deixando a esquerda salvaguardada. Os praticantes da grande mentira, como Whitman e Nelson, têm um segundo objetivo. Convém notar que se trata de transformar vilões em heróis. Tirando a culpa dos democratas e progressistas então pretendem pavimentar o caminho para que esses mesmos democratas se ofereçam como solução ao

racismo. À medida que a grande mentira se desenrola, de alguma forma as pessoas que envenenaram a água reaparecem vestidas dos encarregados de tratar a água. É uma fraude incrível. Vejamos como Whitman, em artigo recente, tenta impingir as atrocidades democratas louvadas pelos nazistas a Trump e ao GOP: “Oitenta anos depois, ressurge um movimento político americano dedicado à proposição de que a América deve voltar às origens brancas nacionalistas. Existem novas leis em muitos estados outrora sob as leis de Jim Crow que limitam o acesso ao direito de voto. E proibições que colocam em prática aquilo que mais uma vez parece considerar alguns pretensos imigrantes como ‘indesejados’. Há figuras poderosas em Washington que parecem dispostas a devolver-nos ao que aconteceu aqui. É momento de lembrar-se do passado e permanecer vigilante”.9 Tolices extremamente vergonhosas de mais outro estudioso que um dia já foi responsável! Para ver o quão enganosa é esta retórica, é conveniente pesquisar a profunda relação entre o racismo nazista e o racismo democrata. Cumpre, em primeiro lugar, analisar como o antissemitismo nazista, que, a princípio, parece dramaticamente distinto do fanatismo democrata, na verdade brota da mesma fonte, o que chamo de socialismo herrenvolk, supremacista. Em segundo lugar, veremos como o terrorismo racial da Ku Klux Klan antecipa, e até mesmo fornece o modelo operacional, o culto fascista da violência, testemunhado na década de 1930 durante o alvoroço assassino de Kristallnacht — Noite dos Cristais — e durante outras depredações das tropas nazistas de assalto especializado, as Stosstruppen. Por fim, veremos como Hitler e a classe governante democrata do Sul chegaram a lamentar a violência aleatória e caótica contra minorias específicas. Tendo uma vez consentido, Hitler posteriormente repreendeu o que veio a chamar de “antissemitismo emocional” dos camisas pardas e pediu que fosse substituído pelo “antissemitismo racional” da política do governo.10 Os democratas do Sul chegaram ao mesmo parecer, lamentando os linchamentos, a KKK e, no lugar, institucionalizando, tal como os nazistas, uma repressão organizada da segregação e da discriminação, ambas patrocinadas pelo Estado.

O Fascismo Como Conceito Não Racista Começo com o fenômeno do racismo fascista, mas aqui enfrento um paradoxo. Parece que tal coisa não existe. “Racismo fascista” soa oximoro. Apesar do embuste praticamente infindável do progressismo taxando o fascismo de racista, não há nada intrinsecamente racista no fascismo. É o que se percebe pelo exemplo de Mussolini e do fascismo italiano, que, já analisado, é o fascismo autêntico e original. Mussolini pouco tinha contra os negros e absolutamente nada contra os judeus. De fato, ele partilhou do preconceito europeu, um tanto genérico, contra a África como sendo primitiva e incivilizada, o que redundou numa visão inferior da civilização negra. Mas quase não havia negros na Itália. Quanto aos judeus, Mussolini parecia gostar deles. A amante e biógrafa de Mussolini, Margherita Sarfatti, que o acompanhou em sua jornada do socialismo ao fascismo, era judia. Havia judeus no início do movimento fascista com quem Mussolini trabalhava e confraternizava, em particular junto de Angelo O. Olivetti. “Antes do final da década de 1930”, escreve o historiador Anthony James Gregor, “Mussolini nunca deixou traçar qualquer evidência de antissemitismo”. Comum para a época, Mussolini falava sobre nações em termos de raça. À semelhança de muitos contemporâneos, ele usava expressões como “a raça italiana”. Em 1923, Mussolini disse: “Antes de amar os franceses, os ingleses, os hotentotes, eu amo os italianos. Isto é, amo aqueles da minha própria raça, aqueles que falam o meu idioma, que partilham dos meus costumes, que partilham comigo da mesma história”. Nesse contexto, enfatiza Gregor, a raça não é uma questão de cor de pele, mas de um modo de vida compartilhado. O orgulho da própria raça refere-se a “uma nova consciência nacional”. Os italianos de todas as origens étnicas, cristãos e judeus, podem partilhar desse mesmo “orgulho racial”. Mussolini coloca o seu carinho pelos italianos acima não só dos “hotentotes” negros, mas também acima dos franceses e ingleses brancos. Vemos aqui, penso eu, o tipo de orgulho nacionalista que Donald Trump reflete e fomenta; assemelhase, inclusive e curiosamente, também com o sentimento de Mussolini, um tanto ausente de fanatismo racial.

Todavia, Mussolini sucumbiu ao antissemitismo depois de entrar em aliança com Hitler. Os estudiosos concordam que este foi um antissemitismo estratégico, não proveniente do coração; um antissemitismo com fins de demonstrar solidariedade política. Em 1938, o governo de Mussolini emitiu o Manifesto Racial Fascista. O documento, promulgado com o objetivo de publicar a proximidade do fascismo com o nazismo, acabou por revelar a distância entre ambos. O documento proibiu o casamento com judeus, declarou-os inassimiláveis e sancionou leis discriminatórias contra eles. Essa foi a parte que vergonhosamente cedeu ao racismo nazista. “Muitos intelectuais fascistas”, escreve Gregor, “representados da melhor forma por Giovanni Gentile, consideraram a legislação moralmente censurável”. Mussolini, no entanto, sentiu que lhe cabia adotá-la. Apesar disso, Mussolini não seguiu Hitler por completo, pois sabia que a doutrina acerca da superioridade nórdica fazia com que outros grupos, incluindo os italianos, fossem racialmente inferiores. Não é de surpreender que Mussolini tenha a abominado em absoluto. Mesmo durante sua aliança com Hitler, jamais apoiou publicamente a doutrina que um dia havia descartado por completo. Apesar de suas concessões ao antissemitismo, o Manifesto Racial Fascista rejeitava a doutrina biológica da superioridade nórdica — e decerto rejeitava todas as doutrinas biológicas de superioridade —, afirmando, ao contrário disso, a união e a solidariedade dos italianos como uma única raça. O paradoxo, sem dúvida, é que, se ser “italiano” for uma raça, então os judeus italianos seriam parte dela. Mussolini parece ter mantido essa visão de forma privada. Gregor nos diz que, durante o domínio de vinte anos de Mussolini, “há evidências escassas, caso ainda haja alguma, de que qualquer judeu tenha morrido nas mãos dos fascistas pelo simples fato de ser judeu”. Pelo contrário, nas palavras de Gregor, “milhares de judeus foram assistidos pelos fascistas a escapar da destruição nacional-socialista”. Entre os líderes europeus Mussolini foi exemplar e prestou socorro aos judeus, ajudando-os a fugir de Hitler. Por sua vez, Hitler queria que Mussolini entregasse aos nazistas os judeus da França, da Croácia, da Iugoslávia, Grécia, Albânia e do Norte da África sob ocupação italiana. Mussolini comunicou às autoridades

diplomáticas e militares que nenhum judeu deveria ser levado. E nenhum deles foi.11 Meu propósito ao discorrer a respeito não é eximir o regime fascista de racismo — embora eu, no interesse da exatidão histórica, esteja satisfeito por tê-lo feito —, mas sim mostrar que os fascistas de Mussolini eram bem menos racistas do que os nacional-socialistas de Hitler e o Partido Democrata na América. Esses dois últimos refletiram o racismo profundo e permanente que é a ênfase deste capítulo.

O Judeu Como Capitalista Ganancioso Voltemo-nos agora ao racismo nazista, e aqui levanto duas questões. Primeira, o racismo nazista, em sua forma característica antissemita de ser, era de direita ou de esquerda? E segunda, o que a causou? Com isso não me refiro ao que havia nos judeus que gerava tanto ódio em Hitler e nos nazistas, mas ao que havia em Hitler e nos nazistas para que eles odiassem tanto os judeus. O objetivo é chegar à raiz psicológica do antissemitismo e examinar suas semelhanças e diferenças com o racismo democrata dos Estados Unidos. A verdadeira origem do ódio nazista para com os judeus é retomada em um livro importante e recente do historiador alemão Gotz Aly. Este enfatiza o aspecto secular e racial do antissemitismo, distinguindo-o da antiga hostilidade religiosa contra o povo judeu por este ter rejeitado o Messias e participado da crucificação. O antigo antissemitismo, ele ressalta, sempre teve uma porta de escape: os judeus podiam escapar ao converter-se ao cristianismo. O antissemitismo moderno, no entanto, define os judeus não como grupo religioso, mas como grupo racial — uma vez que suas falhas são biológicas, e não confessionais —, não havendo, portanto, uma porta de escape. Logo, o que deve ser feito com os judeus? Esta era a Judenfrage — a questão judaica —, que, desde meados do século XIX, ganhava espaço e passou a ser tratada como uma questão legítima e importante. Algo aparentemente precisava ser “feito” em relação aos judeus, e os antissemitas apresentaram-se como aqueles com soluções prontas. Aly chega a uma conclusão surpreendente: o antissemitismo moderno está

enraizado não em considerar o povo judeu inferior, mas em reputá-lo por bem-sucedido. Os judeus são odiados porque são mais trabalhadores, mais criativos, mais educados e mais ricos do que outros alemães. Em outras palavras, o antissemitismo está ancorado no pior dos sete pecados capitais, isto é, a inveja. Normalmente o racismo envolve depreciar o indivíduo ao considerá-lo inferior. Aly no entanto mostra que o antissemitismo envolve admirar os judeus e desprezá-los por aquilo que conquistaram. No fim, o antissemitismo une-se ao racismo típico ao declarar essas conquistas um resultado da perversidade. Os antissemitas retratam os judeus como espertalhões, astutos, guiados pelo dinheiro, “usurpadores” e “vigaristas”. Em suma, o sucesso dos judeus é retratado não como consequência do empreendedorismo ou do esforço, mas como consequência da depravação moral judaica. Aly mobiliza várias provas com o objetivo de argumentar, das quais ofereço apenas alguns exemplos. Wilhelm Marr, revolucionário esquerdista, fundador da German League of Anti-Semites [Liga Alemã Antissemita] em 1879, aquele que cunhou o termo ‘antissemitismo’, descreveu sua motivação nas palavras “um grito de dor de alguém reprimido” e criticou os judeus por superarem os alemães comuns. Ele disse: “Nós não mais estamos em patamar de igualdade para o desafio desta tribo estrangeira”. O historiador Heinrich von Trietschke, outro antissemita do século XIX, descreve os judeus que migraram do Leste Europeu para a Alemanha como “uma invasão de jovens e ambiciosos vendedores de calças” que procuram fazer com que seus “filhos e netos dominem o mercado financeiro da Alemanha”. Trietschke contrasta o trabalho honesto e o “velho amor ao trabalho” dos alemães com uma sorrateira lucratividade dos gordos e gatunos judeus. E Aly ainda seleciona outras, muitas outras fontes antissemitas da década de 1880 até a década de 1930.12 Aqui eu gostaria de concentrar-me numa fonte que Aly não usa muito: Hitler. No início de sua carreira, Hitler participou de uma palestra do economista alemão de esquerda Gottfried Feder, que mais tarde passaria ao nacional-socialismo. A palestra de Feder foi intitulada “Como e por quais meios o capitalismo deve ser eliminado?”. Hitler ficou impressionado com a

distinção de Feder entre “capitalismo produtivo” e “capitalismo financeiro”. Feder argumentou que tal distinção fugiu a Marx, ele que simplesmente não era radical o bastante. Feder viu-se erguendo uma crítica a Marx do ponto de vista da esquerda. Feder argumentou que o capitalismo produtivo consiste em fazer coisas de valor real, mas o capitalismo financeiro consiste na usura, ou seja, na fraude. Para ainda maior entusiasmo de Hitler, Feder associou o capitalismo produtivo ao alemão honesto e o capitalismo financeiro ao judeu abominável. Hitler escreve em seu livro Mein Kampf: “Logo que ouvi a primeira palestra de Feder, sobreveio-me o pensamento de que eu acabara de encontrar o caminho para uma das premissas mais essenciais à fundação de um novo partido”.13 Hitler colocou a distinção de Feder em prática em sua infame palestra de 20 de agosto de 1920, “Por que Somos Antissemitas”. Aqui, Hitler identifica os judeus com duas características abomináveis: dinheiro e materialismo. Hitler argumenta que os judeus acumulam riqueza “sem empregar o suor e o esforço exigidos de todos os demais mortais”. O domínio judeu das finanças internacionais, afirma Hitler, “corrompe todo o trabalho honesto”. O nacional-socialismo, ele declara, entrou em cena ao “despertar, aumentar e incitar a antipatia instintiva do nosso povo pelos judeus”.14 Observe que a distinção então feita por Feder e Hitler de dois tipos de capitalismo — capitalismo produtivo e capitalismo financeiro — é precisamente a distinção feita hoje pela esquerda democrata na América. Os democratas raramente protestam contra o “capitalismo produtivo”. Quando a esquerda democrata denunciou a General Mills ou a Procter and Gamble? Em vez disso ela foca sua cólera em direção ao “capitalismo financeiro”, nos supostos crimes dos bancos e da Wall Street. Hitler teria acrescentado mais uma só palavra nesta injúria da esquerda: “judeus”. As seguintes passagens são da obra Hitler’s Table Talk, declarações privadas de Hitler feitas durante a Segunda Guerra Mundial e transcritas por um assessor nazista do alto escalão. Como já era de esperar, ele ataca os judeus. Agora prestemos atenção no porquê desse ataque. “O judeu não tem interesse nenhum nas coisas do espírito [...] Antes as palavras eram usadas

para expressar pensamentos; ele [o judeu] as usou para inventar a arte de disfarçar pensamentos. O judeu é tido por dotado. Seu único dom é o de fazer malabarismo com a propriedade de outrem e enganar a todos. Suponha que eu encontre, por acaso, um quadro que acredite ser de Ticiano. Digo ao proprietário o que penso a respeito e proponho um valor. Em caso semelhante, o judeu começa declarando que a imagem não tem valor, compra-a por uma merreca e a revende com lucro de 5.000%”. Discursando durante um jantar em 29 de março de 1942, Hitler elogia a Liga Hanseática da Idade Média por manter os preços fixos a despeito das vicissitudes da oferta e demanda: “É assim que o preço do pão se mantém o mesmo por quatrocentos anos, o da cevada — e, consequentemente, da cerveja — por mais de quinhentos anos, e tudo isso apesar de todas as mudanças monetárias”. Já em contraste, nas palavras de Hitler: “Assim que se liberou aos judeus a bisbilhotice nos guetos afora, o senso de honra e lealdade no comércio começou a dissolver. Na verdade, o judaísmo [...] tornou a fixação dos preços dependente das leis dos fatores de oferta e demanda — fatores que, em outras palavras, nada tem que ver com o valor intrínseco do produto”.15 De acordo com o argumento acima, evidente fica que, para Hitler e para os demais, o antissemitismo está em grande parte enraizado no anticapitalismo. Os judeus são os capitalistas par excellence. “Desde a sua concepção”, escreve Aly, “o antissemitismo foi direcionado contra as políticas econômicas liberais e contra o capitalismo como um todo e, em particular, contra o capital financeiro e as bolsas de valores”.16 Aly demonstra que o antissemitismo surgiu da mesma fonte que o esquerdismo e o socialismo. O antagonismo esquerdista ao empreendedorismo como forma de “lucro” injusto e ao financiamento como forma de “ganância” e “aproveitamento” transforma-se na representação antissemita do judeu como explorador injusto e trapaceiro ganancioso. Os esquerdistas e os socialistas realmente pensam assim? Aqui está uma passagem do ensaio de Marx, de 1844, Sobre a Questão Judaica: “Consideremos o verdadeiro judeu, o judeu mundano, não o judeu do Sabá, como Bauer faz, mas o judeu de todos os dias. Não procuremos o segredo do judeu em sua religião. Qual é a base secular do judaísmo? A necessidade

prática, o interesse próprio. Qual é a religião mundana do judeu? O regateio, a falcatrua, a barganha. Qual é o deus mundano? O dinheiro. Muito bem, então! Emancipar-se do regateio, da falcatrua, da barganha e do dinheiro, por consequência emancipando-se do judaísmo real e prático, seria a autoemancipação do nosso tempo”. Portanto, os esquerdistas e os socialistas podem pensar e realmente pensam dessa maneira. Para Marx, o socialismo representa a humanidade emancipando-se do capitalismo judaico. O capitalismo judeu é o verdadeiro inimigo. Aly mostra que este é o impulso central do antissemitismo, não apenas o antissemitismo dos nazistas, mas o antissemitismo que precedeu e lançou as bases para o nazismo na Alemanha durante a metade do século passado. O que os antissemitas concluem disso? Ao demonizar o capitalismo e seu representante, o povo judeu, eles conseguem restringir e proibir o capitalismo, além de restringir e proibir o judeu de participarem plenamente da economia. Ao remover a ameaça que o sucesso judaico representa, os antissemitas conseguem eliminar os judeus como concorrentes e melhorar as perspectivas do seu próprio sucesso. Ao confiscar os frutos do sucesso judeu, eles agora podem distribuí-los entre si. À parte desses benefícios materiais, há também um benefício psicológico que não deve ser perdido de vista. O antissemitismo oferece a pessoas com menos desempenho uma solução para o seu próprio senso interior de inferioridade. Pessoas assim podem então convencer-se de que, ainda que não sejam tão inteligentes ou tão diligentes quanto os judeus, são de fato moralmente superiores. No caso, os judeus os vencem no jogo da vida justamente por serem inferiores e perversos demais. O antissemitismo é fonte de autoestima aos ignorantes e preguiçosos. É também uma fonte, estranho dizer, de igualdade e solidariedade. Aly a reconhece. “O desejo por igualdade social está selado no antissemitismo alemão”.17 Como isso é possível? Em vez da antiga divisão entre aqueles que obtêm sucesso e aqueles que fracassam — em outras palavras, entre vencedores e perdedores — o antissemitismo cria uma nova divisão: entre judeus, na parte inferior, e brancos ou nórdicos, na superior. Todo alemão

branco ou nórdico, por menos instruído e incompetente que seja, está agora acima de todo judeu. E do mesmo modo como todos os judeus pertencem igualmente ao mesmo grupo inferior, todos os brancos ou nórdicos pertencem igualmente ao mesmo grupo superior. O antissemitismo, portanto, promete uma espécie de igualdade entre brancos, ou nórdicos. O antissemitismo é, a este respeito, um tipo de socialismo branco ou nórdico, um socialismo que atrai sobretudo os perdedores à corrida da vida. Nesse sentido, como veremos, isso reflete de perto o racismo dos democratas.

O Apelo Oculto do Racismo Passemos agora ao racismo dos democratas e progressistas da década de 1860 até a década de 1930. O racismo de então, obviamente, voltava-se principalmente contra os negros. Devo logo dizer que, em essência, com seu volume e veemência, o racismo dos democratas e progressistas supera não só o racismo fascista italiano, que era marginal, mas também o antissemitismo alemão. Somente o antissemitismo do período nazista coincide com o racismo dos democratas. A vil injúria do Der Sturmer, jornal antissemita do antigo aliado de Hitler, Julius Streicher, está praticamente no mesmo patamar da vil injúria dos democratas racistas. Considere o que os democratas costumavam falar dos negros antes da Segunda Guerra Mundial. Eis aqui James Vardaman, senador democrata, respondendo a Theodore Roosevelt, presidente republicano, durante um jantar de negócios, em 1901, com o mais importante líder negro norteamericano, Booker T. Washington: “Sou tão contrário a Booker T. Washington, com todos os seus reforços anglo-saxões, quanto sou contrário ao cabeça de coco, negro cor de chocolate, Andy Dotson, que engraxa os meus sapatos todas as manhãs”. Benjamin Tillman, outro senador democrata, ainda acrescentou: “Agora que Roosevelt comeu com aquele negro em Washington, teremos de matar mil negros para fazê-los voltar ao seu devido lugar”.18 Aqui está o senador Theodore Bilbo, aliado íntimo do presidente democrata Franklin D. Roosevelt, durante uma de suas campanhas de reeleição, defendendo a violência por parte de seus partidários brancos no intuito de impedir que os negros pudessem votar: “Os brancos têm

justificativas para chegar a qualquer tipo de extremo no objetivo de evitar que os negros votem. Você e eu sabemos qual é a melhor maneira de impedir o voto por parte dos negros. Você faz isso na noite anterior à eleição. Não preciso dizer mais nada. Os homens de sangue forte sabem o que quero dizer”.19 Eis o democrata Robert Byrd, a “consciência do Senado”, tratado como celebridade por Obama, Hillary, e Bill quando falecido em 2010, falando durante a guerra sobre sua relutância em lutar num exército racialmente integrado: “Sou leal ao meu país e nada faço além de reverenciar sua bandeira, MAS jamais me submeterei a lutar sob essa mesma bandeira com um negro ao meu lado. Antes prefiro morrer mil vezes e ver essa antiga glória pisoteada na sujeira para nunca mais ascender a ver nossa amada terra degradada por raças mestiças, um retrocesso às espécies mais negras das terras selváticas”.20 E aqui estão alguns dos livros publicados por democratas progressistas no início do século XX: The Negro a Beast [O Negro: uma Besta], de Charles Carroll (1900); The Negro: A Menace to American Civilization [O Negro: uma Ameaça à Civilização Americana], de Robert Shufeldt (1907); The American Negro as a Dependent, Defective and Delinquent [O Negro Americano como Dependente, Deficiente e Delinquente], de Charles McCord (1914); e novamente Shufeldt, em 1915, com o título America’s Greatest Problem: The Negro [O Maior Problema Americano: o Negro]. Como parte da grande mentira, os progressistas gostam de passar a impressão de que esse racismo é de algum modo característica intrínseca da história americana, que de alguma forma faz parte de sua psique e remonta à fundação da América. Derrick Bell, jurisconsulto esquerdista, afirmou que “o racismo é um componente integral, permanente e indeformável dessa sociedade”. Em White Racism [O Racismo Branco], Joel Kovel sustenta que “o racismo é, em última instância, indivisível do resto da vida americana”. Cornel West, historiador e ativista de esquerda, insiste que a América é “cronicamente racista”.21 Todavia, estudaremos o período da Fundação em vão, pois o tipo de extremismo intolerável que define a retórica e a prática democratas vem do

século XIX e do início do século XX. Considere o argumento que os progressistas normalmente dão para provar o racismo de Thomas Jefferson. Aqui está a evidência do crime, encontrada em Notes on the State of Virginia [Notas sobre o Estado da Virgínia], de Jefferson: “Pondero, portanto, em forma de suspeita, se os negros, quer originalmente uma raça distinta, quer tornados distintos pelo tempo e pela circunstância, são inferiores aos brancos no que diz respeito ao corpo e à mente”.22 Jefferson nem sequer tem certeza de que os negros originalmente constituem uma raça. Ele passa por uma “suspeita”, mas tão só uma suspeita de que os negros possam ser menos inteligentes do que os brancos. Nenhum dos outros Pais Fundadores concordaram com ele. Hamilton, por exemplo, estava convencido de que a inferioridade negra era o resultado das condições sob as quais os negros viviam e que melhores circunstâncias remediariam o problema. Além disso, nem os Pais Fundadores nem seus sucessores implementaram programas racistas, como segregações gerais patrocinadas pelo Estado, nem criaram instituições, de exemplo a Ku Klux Klan, com o propósito de aterrorizar e exterminar negros. Essas foram invenções de uma era posterior e de um novo partido fundado na década de 1820, o Partido Democrata. Quanto ao racismo democrata, à semelhança do que perguntamos ao antissemitismo alemão, perguntemos: o que eles ganharam com isso? Como o racismo ajudou a manter a hegemonia do Partido Democrata no Sul por quase três gerações após a Guerra Civil? Essas questões estabelecem o propósito político do racismo. Ao contrário da grande mentira progressista, o racismo não existe apenas como uma característica inexplicável da sociedade americana desde o princípio; não, mas é fabricado, encorajado e usado para fins partidários pelo próprio partido que perpetua a grande mentira. O racismo, é claro, precedeu o Partido Democrata; entretanto, em certo sentido, os democratas inventaram o racismo político no início do século XIX intentando salvaguardar a escravidão dos investidas republicanas e abolicionistas. O ataque ocorreu desta forma: todos os homens são criados iguais; os negros são homens; portanto, os negros não devem ser escravizados. Republicanos como Lincoln admitiram que os Pais Fundadores permitiram temporariamente a escravidão porque não havia outra maneira de

haver união. Apesar disso, Lincoln discursou sobre o direito à vida e à liberdade, enumerados na Declaração de Independência, nos quais os Fundadores “desejam absolutamente proclamar o direito para que, disto, sua execução possa resultar o mais rápido que as circunstâncias permitam”.23 Democratas progressistas no século XX, de fato, atacaram os Pais como equivocados, ou consideraram suas idéias retrógradas. Mas, no século XIX, os democratas tomaram um rumo diferente. Eles negaram que os negros fossem seres humanos, ou seja, negaram aos negros sua plena humanidade. Assim, a defesa democrata tomou a seguinte forma: todos os homens são criados iguais; os negros são sub-humanos, isto é, não são totalmente humanos; portanto, somos escusados ao escravizá-los. E assim o racismo surgiu no Partido Democrata, como uma racionalização da escravidão. Em nenhum lugar o racismo foi mais claramente expresso do que nas palavras do democrata jacksoniano Roger Taney, presidente da Suprema Corte, em sua notória decisão no Caso Dred Scott. Taney fez sua infame declaração asseverando que os negros “não têm direitos os quais o homem branco deva respeitar”.24 Essa mesma doutrina racista serviu de base para que o democrata do Norte Stephen Douglas fizesse sua defesa da soberania popular — isto é, que cada estado e território deve decidir por si se deseja ou não a escravidão — e para a alegação do democrata do Sul, John C. Calhoun, defendendo a escravidão como bem positivo. Mesmo após o fim da escravidão, os democratas descobriram que o racismo lhes era muito útil. Na verdade, confiando no escravagismo mais do que nunca, eles construíram toda uma ideologia e estrutura da supremacia branca a fim de estabelecer domínio sobre a política do Sul. E mais adiante veremos como o fizeram. Mas, antes, pergunto: como eles fizeram funcionar? O que a proposta de uma supremacia branca oferecia que convencesse os eleitores brancos do Sul a continuar reelegendo os democratas? Posso responder voltando momentaneamente à escravidão propriamente dita e respondendo a uma pergunta que os historiadores levantaram acerca da Guerra Civil. Por que a maioria dos brancos pobres, aqueles que não possuíam escravos, lutou ao lado dos Confederados? Sim, é certo o porquê de os proprietários de escravos terem lutado: para proteger sua “propriedade”.

Mas como eles convenceram os brancos que não possuíam escravos a tomar partido? Há uma pista num discurso dado em 1860 por John Townsend, democrata senhor de escravos. Falando em nome da secessão a um grupo chamado 1860 Association, Townsend abordou diretamente a questão de como o sistema escravagista beneficiava os brancos não possuintes de escravos. Ele sustentava que “agora, no Sul, a cor branca confere ao homem branco título de nobreza em suas relações com os negros”. Ainda que um indivíduo negro “fosse imensamente superior em riquezas, o homem branco, mesmo pobre, não possuinte de nem sequer um escravo, lhe é superior aos olhos da lei, podendo servir e comandar a milícia, podendo presidir sobre o júri para decidir sobre os direitos dos mais ricos da terra, podendo dar seu testemunho no tribunal e podendo votar igualmente ao lado do mais abastado senhor de escravos na escolha de seus governantes”.25 Aí está. O que o senhorio escravagista democrata ofereceu ao branco pobre é precisamente o que o Partido Democrata ofereceu ao eleitor branco do Sul, isto é, a oportunidade de pertencer a uma aristocracia de cor. Ao traçar uma linha precisa entre o branco e o negro, colocando todos os brancos acima da linha e todos os negros abaixo dela, os democratas poderiam assegurar ao homem branco mais pobre, mais preguiçoso e mais estúpido que ainda estaria acima do homem negro mais rico, mais trabalhador e mais inteligente. Além do quê, enfatiza Townsend, existe uma suposta igualdade de orgulho entre os membros da classe alta bem como existe uma suposta igualdade de degradação entre os membros da classe inferior. Portanto, o racismo, agora entendemos, cumpre a mesma exata função psicológica do antissemitismo. Ambos reforçam o que podemos chamar de “socialismo herrenvolk” — a igualdade social da classe mestre. E é assim que o racismo compensou o homem branco com autoestima, reforçando com fortes cordas o estrangulamento político do Partido Democrata no Sul, desde a Guerra Civil até a década de 1960.

Terrorismo Racial: Lá e Aqui Nesta seção final pretendo mostrar como os democratas e os nazistas desencadearam orgias de violência terrorista contra, respectivamente, negros

e judeus, passando da então violência caótica de massas para a consagração e o fortalecer de instituições sistemáticas do racismo. Começo por notar uma estreita semelhança entre a Ku Klux Klan (KKK) e os camisas pardas da Alemanha nazista. Interessante notar que, durante seu auge nas décadas de 1920 e de 1930, as duas organizações tinham aproximadamente o mesmo tamanho, com membresias variando de três a cinco milhões. A KKK e os camisas pardas também visavam o mesmo tipo de pessoas. Por exemplo, ambas direcionavam sua violência não apenas às minorias raciais, mas também a adversários políticos. O início da KKK, por exemplo, matou tantos republicanos brancos quanto negros. Além disso, mesmo que o principal alvo minoritário fosse os negros, a KKK era também anticatólica e antissemita — fato evidenciado no linchamento de Leo Frank, em 1915. Enquanto concentravam seu ódio racial contra os judeus, os camisas pardas também eram racistas contra os ciganos — os povos de Roma e sinti, cujas origens remontam à Índia — e os negros, como visto na invectiva contra negros em panfletos e publicações dos camisas pardas. Os americanos, em visita à Alemanha na década de 1930, costumavam perceber a semelhança entre a KKK e os camisas pardas. E os alemães familiarizados com a América faziam precisamente o mesmo paralelo. Eis um trecho do Neues Volk, boletim de propaganda do Departamento NacionalSocialista da Política Racial: “O que é a justiça do linchamento senão a resistência natural da Volk a uma raça estrangeira que tenta levar vantagem?”.26 O artigo compara massacres contra judeus aos linchamentos realizados por grupos como a Ku Klux Klan. O artigo conclui que os dois visavam basicamente o mesmo objetivo. Mas, novamente, ambos os países chegam a uma mudança, e mais uma vez os democratas e os nazistas ficam cara a cara. A partir da década de 1890, os poderes governantes do Partido Democrata procuraram substituir o terrorismo racial da KKK por uma discriminação fomentada pelo Estado, refletida em uma estrutura abrangente de leis de segregação. Essas leis desrespeitavam os negros e os forçavam à parte mais inferior da sociedade sulista. De forma semelhante, cerca de três décadas depois, os nazistas passavam do terrorismo racial dos camisas pardas às leis de Nuremberg e a outras medidas para despojar os judeus, privá-los de seus direitos e rebaixá-

los à parte mais inferior da sociedade. Agora, convém investigar as semelhanças entre a Ku Klux Klan e os camisas pardas da Alemanha nazista. A KKK originalmente começou como uma espécie de sociedade obscura. Membros brancos da KKK invadiam à noite casas de negros com o objetivo de assustá-los. Às vezes, os membros da KKK cercavam um homem negro na rua e tiravam suas calças à força. Da mesma forma os camisas pardas, que oprimiam os judeus, rebaixando-os e humilhando-os; uma das táticas favoritas era lhes tirar as roupas ou raspar a metade da barba deles. Ambas, a KKK e os camisas pardas, usavam vestuário específico e desenvolveram estilos que refletiam, pelo menos aos olhos modernos, o mais nobre estilo espalhafatoso e brega. Parte do atrativo da KKK era montar cavalos vestidos com trajes elaborados, chamar-se de “Kleagle”, ou “grande dragão”, ir até os “kloncliums” ultrassecretos e participar da queima de cruzes à noite. Da mesma forma os camisas pardas, que usavam camisas, calças, botas e chapéus marrons. Seus uniformes exibiam suásticas e outras insígnias, eles marchavam a passos largos, e sua saudação consistia em levantar um dos braços e esticá-lo com a palma da mão voltada para baixo. Ambos os grupos tinham elaboradas hierarquias de organização e autoridade. Os camisas pardas cultivavam a mesma aura secreta de seitas que a KKK. Ambos eram grupos paramilitares crentes na eficácia da violência. Quando a KKK liderava um linchamento, associados e famílias costumavam aparecer para assistir. Para aumentar a emoção do público, membros da KKK incendiavam cruzes e às vezes forneciam comida e bebida para que todos pudessem ser entretidos. Assim também os camisas pardas, que consideravam a violência não um mal necessário, ou, nas palavras do personagem Sollozzo em O Poderoso Chefão — “sangue custa muito caro” —, mas, sim, uma bela limpeza, uma reforma social a ser realizada e apreciada periodicamente. Os camisas pardas, bem como a KKK, retratavam-se os defensores da justiça social. Mesmo sendo assassinatos extrajudiciais, os membros da KKK os consideravam acertos judiciais contra ofensores negros que não careciam de julgamento. Assim também os camisas pardas se viam na posição de punindo judeus por crimes que haviam sido cometidos, mas não registrados

nem detectados. Os camisas pardas, bem como os membros da KKK, consideravam-se vigilantes, ou “soldados políticos”, encarregados de superar o sistema de justiça disfuncional e agindo de forma decisiva para corrigir as coisas. Na Kristallnacht — a Noite dos Cristais —, em novembro de 1938, os camisas pardas incendiaram sinagogas, vandalizaram casas, escolas e empresas dos judeus, mataram aproximadamente cem deles e levaram muitos outros para campos de concentração. Esse incidente, horrível por si só, que Goebbels disse ter sido provocado pelas atrocidades cometidas pelos próprios judeus, parece uma misteriosa reconstituição da rebelião racial de Tulsa, provocada pela Ku Klux Klan em 1921. Nesse incidente, supostamente em retaliação por um cruel estupro de uma mulher branca cometido por um homem negro, milhares de democratas racistas causaram alvoroço em bairros negros, queimando casas, saqueando empresas, matando dezenas de pessoas, detendo centenas e deixando milhares de negros sem teto. Por fim, no entanto, democratas e nazistas levantaram-se contra o tipo de violência aleatória nas ruas representado pela KKK e pelos camisas pardas. Cabe entender como isso se desenrolou, primeiro no caso dos democratas e depois no caso dos nazistas. O historiador Joel Williamson afirma que os democratas usaram a KKK para ajudá-los na consolidação do poder do partido no Sul. Uma vez consolidado, os poderes governantes do Partido Democrata decidiram reduzir a ênfase na KKK e implementar, em vez dele, um sistema formal de segregação e discriminação patrocinado pelo Estado, este que viria a institucionalizar a supremacia branca. O terrorismo agora, em certo sentido, não seria tão importante, afinal estaria incorporado à lei.27 Assim, os democratas institucionalizaram, por toda a região do Sul, um sistema abrangente de discriminação contra os negros patrocinado pelo Estado. Porque apoiada pela força da lei, era algo muito mais desagradável do que a discriminação factual contra os negros em outras partes do país. Os negros foram sistematicamente excluídos de praticamente todos os cargos governamentais, exceto dos baixos e mais humildes. Esta discriminação fomentada pelo Estado persistiu por três quartos de um século, desde a década de 1880 até a década de 1960.

No Sul, a segregação implementada pelos democratas era tão profunda que se baseava na “regra da única gota”, significando basicamente que qualquer herança negra fazia de alguém negro. Alguns historiadores remontam a regra da única gota ao período da escravidão, o que está errado. Durante a escravidão, havia uma regra diferente: a posição de escravo era passada através da mãe.28 Quer dizer, se um democrata dono de escravos tivesse relações sexuais com uma escrava e gerasse uma criança, ela se tornaria escrava, porque sua mãe já estava sob a escravidão. Uma regra muito conveniente, pensando a respeito do ponto de vista dos democratas senhores de escravos. No entanto, sob o domínio da escravatura, se o escravo negro gerasse um filho com uma mulher branca livre — decerto algo extremamente raro —, essa criança também seria livre. De acordo com a regra da única gota, contudo, a prole de todos esses concubinatos seria contada como negra. Na prática, é claro, havia negros de pele clara que conseguiam burlar a regra e se “passar” por brancos. Mas a própria regra exigia 100% de brancura para se poder estudar em uma escola para brancos, beber em um bebedouro para brancos ou mesmo desfrutar da seção de brancos numa praia pública. Essa, como visto antes, é a regra que até mesmo os nazistas acharam um tanto extremista e repulsiva. Curiosamente, enquanto as Leis de Nuremberg são agora história, a “regra da única gota” está presente, não só como uma questão da lei, mas também como uma questão de identidade pessoal. Pense em Obama: ele é metade branco e metade negro, mas se identifica como negro. Muitos afroamericanos são de ascendência branca, mas consideram-se negros. Por quê? Por causa da regra da única gota. Se alguma delas se declarasse branca — ou recusasse a se classificar racialmente —, grupos de esquerda como o Caucus Negro e o Centro Legal da Carência do Sul as condenariam. O Departamento do Censo dos EUA até hoje conta negros e brancos de acordo com a regra da única gota e a utiliza para implementar uma série de ações afirmativas e outros programas baseados na raça.

Dos Tumultos Causados pelos Camisas Pardas às Leis de Nuremberg Percebe-se que os nazistas seguiram precisamente os mesmos passos

históricos dos democratas em relação ao uso da violência nas ruas. No final da década de 1920 e no início dos anos 1930, os camisas pardas de Hitler — liderados pelo extravagante homossexual Ernst Röhm — governavam as ruas da mesma maneira como uma gangue do interior da cidade governaria um bairro. Hitler, aliado íntimo de Röhm, encorajou o uso da violência por parte de suas tropas. No entanto, uma vez que chegou ao poder em 1933, Hitler considerou Röhm uma ameaça. Röhm tinha seus camisas pardas, mas Hitler agora tinha as forças armadas e as SS sob a supervisão de Heinrich Himmler. No desejo de que a força militar se concentrasse no governo e sob seu controle absoluto, Hitler enviou Theodor Eicke, comandante em Dachau, e outro oficial para executar Röhm. Alguns especialistas progressistas insinuam que Hitler mandou matar Röhm por ele ser homossexual. Um verdadeiro absurdo. Hitler não queria o líder da gangue rival espalhando violência aleatória pelas ruas, mas, pelo contrário, queria ser ele o único a chefiar gangues que espalhavam a violência sob a tutela do próprio Estado. Anteriormente, Hitler havia falado que o “antissemitismo racional” substitui o “antissemitismo emocional”. Goebbels, convocando o povo alemão, agora invoca tamanha distinção para que todos eles “desistam estritamente de todo tipo de retaliação, seja da forma que for, contra os judeus”. Eis o incrível exemplo de um líder nazista que exorta à moderação no que diz respeito a manifestar o antissemitismo publicamente. No entanto, é claro, Goebbels pretendia com isso algo ainda mais traiçoeiro. Ele prometeu: “Os judeus receberão a resposta final pelas vias da legislação, através de determinações e decretos legais”.29 Em 1935, sete anos antes de a Solução Final ser fixada pelos nazistas, Hitler defendeu a emigração e a guetização como soluções provisórias para o problema judaico. Os judeus, disse Hitler, devem ser “removidos de todas as profissões, devem ser guetizados, restritos a um determinado território, onde possam vagar de acordo com seu caráter enquanto o povo alemão os observa, como são observados os animais na natureza”.30 Começando em 1933, primeiro ano do Terceiro Reich, os nazistas também começaram a excluir sistematicamente os judeus dos cargos públicos. Hitler

adicionou uma “cláusula ariana” à lei de serviço civil que efetivamente proibia os judeus de cargos no governo. Logo os judeus também foram removidos e excluídos do jornalismo, da agricultura, do ensino e do teatro. Em 1938, os judeus não podiam investir em aplicações financeiras nem exercer profissões no ramo do direito e da medicina. Essa combinação de segregação e discriminação contra os judeus, patrocinada pelo Estado, reflete o que os democratas fizeram aos afro-americanos. Óbvio dizer, as leis raciais nazistas foram o equivalente preciso das leis raciais do Partido Democrata. Não significa apenas que a primeira forneceu precedente para a última; ambos os conjuntos de leis tinham o mesmo propósito funcional. Assim como as leis de segregação e discriminação serviam para complementar e, em alguns aspectos, substituir a violência sem rumo espalhada pela Ku Klux Klan, também as Leis de Nuremberg e a legislação discriminatória dos nazistas tinham por destino complementar e, em alguns aspectos, a substituir a violência sem rumo espalhada pelos camisas pardas. A esse respeito, como em tantos outros, os nazistas e os democratas assemelham-se tanto que cada vez mais difícil fica separar um do outro.

Capítulo Seis

Pessoas Descartáveis Mais crianças nascidas dos qualificados, menos filhos nascidos dos inaptos — eis o ponto nevrálgico do controle de natalidade.1 Da revista Birth Control Review [Analisando o Controle de Natalidade], organizada por Margaret Sanger

Como o comportamento altamente anormal e patológico por parte de algumas pessoas veio a lhes parecer normal? O comportamento que é monstruoso ou bestial para os seres humanos é, certamente, bastante habitual no reino animal. Por exemplo, é normal que um gorila entre numa caverna, capture determinada fêmea, atordoe-a com golpes, arraste-a sangrando para sua própria toca e acasale-se com ela. Em se tratando de animais, às atitudes desse tipo não sobrevém nenhuma condenação moral; são as vias da natureza. Contudo, em se tratando de seres humanos, agindo dessa forma a pessoa prova ser doente, moralmente anestesiada, profundamente perturbada. Então como o ser humano passa ao domínio do inconsciente, do inconcebível? A História mostra que, por vezes, o ser humano o faz sem nenhuma consciência do horror que está cometendo. Hannah Arendt a isso chamou de “a banalidade do mal”, o mal que aos perpetradores, e até a muitos observadores, soa absolutamente natural. Disso se levanta uma possibilidade assustadora: é possível que nós daqui, na América, estejamos fazendo ou tolerando coisas completamente vis e horríveis? Que garantia temos de que coisas assim não nos pareceriam normais, da mesma forma como pareciam aos olhos daqueles que praticavam monstruosidades no passado? Josef Mengele — como tantos outros nazistas — não parecia anormal quando chegou ao campo de Auschwitz, na primavera de 1943, como médico e cientista pesquisador. Era homem viciado em trabalho, cheio de rigor e

escrúpulos obsessivos, traços, afinal, comuns a muitos alemães. Estudante de medicina, Mengele costumava assistir às palestras de Ernst Rudin, um dos mais importantes intelectuais da eugenia, estudioso que inspirou Mengele com a doutrina nazista da evolução social, que viria a ser estabelecida mediante a criação de um novo tipo de ser humano.2 Mengele todavia nunca se considerou ativista político. Ao contrário, era ele um pesquisador, com especial interesse em pesquisas no ramo dos estudos de gêmeos. Anteriormente havia trabalhado sob a direção de Otmar von Verschuer, respeitado geneticista, diretor do Instituto Kaiser Wilhelm de Antropologia, Hereditariedade Humana e Eugenia. O Instituto Kaiser Wilhelm era reconhecido na Alemanha e em todo o mundo por realizar um trabalho pioneiro no campo da hereditariedade e da genética. Verschuer escreveu uma carta de recomendação para Mengele, o que o ajudou a garantir sua nomeação em Auschwitz. O interesse de Mengele era a hereditariedade: esperava que, ao estudar a anatomia dos gêmeos — tanto gêmeos idênticos, que compartilham os mesmos genes, quanto gêmeos fraternos, que compartilham metade dos genes —, ele poderia desemaranhar a importância relativa da natureza e do crescimento no desenvolvimento humano. Mengele também queria estudar anões, mutantes e outras anormalidades a fim de entender até que ponto seus traços seriam transmitidos à próxima geração. Em Auschwitz, Mengele encontrou de pronto um suprimento de amostras laboratoriais para suas experiências, em especial crianças. Eram crianças judias, crianças ciganas, filhos de eslavos e russos capturados na guerra. Porque considerava esses cativos como os mais inferiores dos inferiores, espólios da guerra, pessoas descartáveis, Mengele decidiu que eles seriam utilizados em seus experimentos. Assim iniciou-se seu regime macabro de torturas e testes, tratamento de eletrochoque, injeções no tórax e injeções intraoculares. Mengele extraía globos oculares e os enviava dentro de pequenas caixas próprias do exército, grafadas com “Materiais de Guerra — Urgente”, tendo por destinatário o Instituto Kaiser Wilhelm, no objetivo de estudos posteriores. Ele também enviava partes de corpos para Verschuer e para um colega de pesquisas, Julius Hallervorden, nazista e atuante no campo de pesquisas da área cerebral, no Instituto de Psiquiatria Max Planck, em

Munique. Mengele determinou-se a abrir novos caminhos na pesquisa de gêmeos. Para este fim, certa feita ele costurou um par de gêmeos ciganos para ver se deles poderia criar gêmeos siameses. Mengele também realizava autópsias em gêmeos fraternos e idênticos. Mas para que seus dados fossem úteis, ele precisava que os gêmeos morressem ao mesmo tempo. Somente mortes simultâneas permitiriam uma comparação de cadáveres significativa. E assim ele prestava bastante atenção aos vários pares de gêmeos em cativeiro; se um morresse de fome ou doença, não hesitava em aplicar uma injeção letal no outro. Basicamente, era ele um assassino em série vestido com jaleco de laboratório. Ao longo de tudo, Mengele jamais demonstrou a menor consciência de que estivesse fazendo algo de errado. Mais tarde, na década de 1970, ele explicaria a seu filho, Rolf, que os presos de Auschwitz viriam a morrer de qualquer maneira e que seu papel era simplesmente o de separar os sadios dos doentes, além de promover a causa da ciência através de experimentos com amostras humanas úteis.3 A pesquisa de Mengele era legal; era sancionada pelo Estado, e foi por uma causa progressista. Assim, deste ponto de vista, do que Mengele precisaria se envergonhar?

A Esquerda e o seu Próprio Mengele Hoje os crimes de Mengele são considerados impensáveis, inconcebíveis. Concordamos prontamente com o lema diante do Holocausto: “Nunca mais”. Há o consenso de ter sido este um evento que não pode jamais ser repetido; aliás, cremos que não está se repetindo, pois esperaríamos que, assim fosse, ele aconteceria da mesma forma. Procuramos, hoje, é por outro sujeito executando gêmeos e aplicando hediondas injeções intraoculares. Como esse tipo não aparece, a maioria se convence de que Mengele e os nazistas foram uma aberração histórica. No entanto, o nazismo foi o produto de um tempo e lugar. Mas já agora os tempos mudaram,o lugar não é mais o mesmo. No que Robert Paxton observou anteriormente, um fascismo americano, caso surja, não será suscetível aos coturnos marchando, braços levantados em saudações nazistas e aos cânticos de Heil Hitler. E poderá não visar os judeus, mas, sim, algum

outro grupo. O fascismo americano seria uma insígnia no uniforme da América, um fascismo de apetrecho, inventado por progressistas e esquerdistas americanos no lugar dos progressistas e esquerdistas alemães. O Mengele da América faria coisas não menos horríveis do que o próprio Mengele, mas sua causa seria protegida por uma nova e elegante ideologia da ciência e do progresso. Na verdade, o Mengele americano existe, seu nome é Kermit Gosnell. Desde 1979, Gosnell geriu uma clínica de aborto chamada Women’s Medical Society, na zona oeste da Filadélfia. Lá, ele realizava abortos induzidos de gestação tardia e, inclusive, indução ao aborto por dilatação e evacuação, principalmente em mulheres pobres. Se, por algum erro, a criança nascesse viva, Gosnell a matava no processo que ele chamava de “morte fetal garantida”. Sua técnica favorita consistia em sedar o bebê prematuro e, em seguida, cravar uma tesoura no pescoço e cortar sua medula espinhal. Por três décadas, Gosnell matou centenas, isso se não foram milhares, de crianças dessa maneira, muito mais do que Mengele matou durante o período de dois anos em Auschwitz.4 Se Gosnell é a analogia americana de Mengele, existe também o Instituto Kaiser Wilhelm da América: seu nome é Planned Parenthood. Gosnell não trabalhou lá, mas nem Mengele trabalhou para o Instituto Kaiser Wilhelm. Ambos, todavia, tiveram legitimidade institucional para cumprir seu trabalho, recebida do apoio e defesa de organizações como o Planned Parenthood e o Instituto Kaiser Wilhelm. Ambos se consideravam pioneiros trabalhando na fronteira científica e progressista; Gosnell deu continuidade à visão da Planned Parenthood exatamente da mesma forma como Mengele se via avançando a visão do Instituto Kaiser Wilhelm. Parece exagero, e mesmo errado, comparar a principal instituição da eugenia nazista com a Planned Parenthood? De modo nenhum. Em alguns aspectos, a conduta desta última chega a ser pior. Enquanto a organização se apresenta como um promotor benigno do “controle de natalidade”, seu modus operandi foi revelado por uma série de vídeos gravados secretamente mostrando funcionários dispostos a vender membros extraídos de fetos abortados, resultado da organização nacional da indústria de aborto. Estes funcionários não expressaram repulsa ou remorso moral pela prática.

Em maio de 2017, um novo vídeo apareceu, com abortistas filiados à Planned Parenthood admitindo cenas macabras. Um falou de garantir a morte usando “um segundo conjunto de fórceps para segurar o corpo no colo do útero e retirar uma ou duas pernas”. Outro confessou, para o riso dos demais, que, fato recente, durante determinado procedimento abortivo “um globo ocular caiu no meu colo, foi nojento”. Um terceiro confessou que, quando as empresas de células-troncos quiserem comprar cérebros, “vamos permitir o sofrimento se prolongar ao máximo, e então tentar basicamente extraí-lo ou, na verdade, bom, pegar tudo e manter o material separado do tecido para que nada se perca”.5 O Instituto Kaiser Wilhelm, considerando-se uma organização de pesquisa de alto nível, nunca fez nada, nem mesmo remotamente, parecido com isso. Os progressistas querem distanciar-se de Gosnell, mesmo continuamente defendendo ferozmente a Planned Parenthood. Em certo sentido, a esquerda está desistindo de um dos seus pioneiros enquanto tenta salvar a instituição principal que dará seguimento a esse tipo de trabalho. Tchau-tchau, Gosnell; avante, Planned Parenthood. E caso alguém pergunte se o projeto eugenista do Instituto Kaiser Wilhelm persiste ainda hoje, sim, persiste. Como veremos, embora adequadamente modificado, o Instituto agora ganha cores sob a bandeira da International Planned Parenthood. De volta a Gosnell e Mengele. Na narrativa progressista, Gosnell “foi longe demais”. Mas é o mesmo que dizer que Mengele foi longe demais. Mengele seria aceitável aos olhos progressista se simplesmente tivesse se contido um pouco? Na verdade, como a esquerda sabe, Mengele e Gosnell simplesmente trilharam o caminho que os progressistas, em seus respectivos países, lhes prepararam. Ambos acreditavam estar livrando-se de pessoas descartáveis, tudo em prol da causa do progresso. A causa de Mengele estava “dentro” do círculo esquerdista e progressista da Alemanha; a causa de Gosnell está “dentro” do círculo esquerdista e progressista da América atual. Escrevendo para a revista Slate, o colunista e progressista William Saletan pergunta: qual foi exatamente o crime que Gosnell cometeu? O que ele fez de tão mal assim? Do ponto de vista da esquerda, não poderia ser apenas um aborto de gestação tardia, afinal são muitos os esquerdistas e partidários da Planned Parenthood que apoiam esse método abortivo. Saletan cita Steph

Herold e Susan Yanow, ambos defensores dos direitos reprodutivos, argumentando que “as mulheres não são obrigadas a tomar uma decisão enquanto não se sentirem prontas” e devem ser autorizadas a optar pelo aborto, até mesmo no oitavo ou no nono mês de gestação. Da mesma maneira, Marge Berer, organizadora da Reproductive Health Matters, insiste que, independentemente dos limites de tempo e períodos, “quem pensa ter o direito de proibir o aborto à mulher, que seja a uma única mulher, não pode reivindicar para si a posição pró-escolha”.6 Aqui, então, está a ideologia da Planned Parenthood, instituição que, tão certo quanto a ideologia eugenista ajudou a criar Mengele, ajudou a criar Gosnell. Gosnell foi julgado e condenado por três acusações de homicídio de crianças em sua clínica. Estes foram apenas os casos mais gritantes que o Estado decidiu processar. Gosnell hoje cumpre uma sentença perpétua por homicídio em primeiro grau. Já na minha opinião, ele merece a pena de morte para pagar por todas as crianças que assassinou. Se capturado após a guerra, Mengele certamente teria sido executado. Mas, fugindo para a Argentina, tornou-se, ironicamente, um abortista.7 E, em 1979, com a idade de sessenta e sete anos, em São Paulo, Brasil, morreu acometido de um acidente vascular cerebral.

Os Primeiros Campos de Extermínio Examinamos até o momento o que há de paralelo entre nazistas e democratas em questões como a escravidão, a remoção e aniquilação dos índios, e o racismo, questões, até certo ponto, passadas. Certo, o passado continua aqui, mas não da mesma forma. O racismo, por exemplo, não é o mesmo hoje como há meio século ou há um século. Com efeito, os democratas substituíram suas velhas fazendas no campo por novas, agora urbanas, chamadas guetos para negros, bairros para latinos e reservas para índios americanos. Eles transformaram milhões de minorias em pessoas descartáveis, cujas vidas não lhes interessam e cuja principal utilidade é depender. Conseguindo angariar votos, os democratas continuam felizes e a utilidade das minorias permanece em prática. Mas ainda assim existem diferenças importantes entre as novas “fazendas” e as do passado. Os escravos precisavam trabalhar, as populações

minoritárias de hoje não precisam. E, na verdade, os democratas preferem que seja assim, afinal o que eles querem são eleitores que dependam deles até nas necessidades mais básicas da vida. Além do mais, mesmo que, por assim dizer, cativos do pacto fáustico oferecido pelos democratas, estes que dependem podem escolher deixar a fazenda. Quanto aos escravos, se simplesmente tentassem, eles seriam caçados, capturados e levados de volta ao cativeiro. Logo, as colônias urbanas não constituem escravidão no sentido tradicional; e, enquanto a antiga escravidão das fazendas e do senhorio podem ser comparadas aos campos de concentração, segundo já vimos, as colônias urbanas de hoje, também sob poder dos democratas, não podem. Neste capítulo e em capítulos subsequentes serão examinados paralelos e conexões entre os nazistas e a esquerda democrata; não são uma “história antiga”, mas, antes, são coisas que se aplicam às ações da esquerda hoje. Isso, por si só, é um enigma. Como é possível que os democratas da esquerda continuem com práticas remontando aos nazistas? São práticas provavelmente rechaçadas por associarem-se com o nazismo. Então como a esquerda, que agora finge ser o partido antifascista e antinazista, afasta-se das políticas e práticas fascistas e nazistas? Trata-se de uma manobra que parece exigir não apenas audácia, mas também extrema desenvoltura. Tal desenvoltura, com certeza, exige algumas grandes mentiras. A esquerda precisa de alguma forma pegar suas próprias paridades e equivalências com os nazistas e jogar a culpa na direita. O que, entretanto, é insuficiente, porque a esquerda quer continuar fazendo as coisas que costumava fazer quando estava em estreita aliança com o nazismo. Para fugir disso, os esquerdistas precisam coligar um novo nome às suas práticas, para camuflar o elo com o passado. A esquerda também precisa de uma nova estratégia e de um novo programa que de alguma forma consiga alcançar, ainda que não plenamente, o máximo possível daquele velho objetivo. Essa, portanto, é a história de como a esquerda aprendeu a ser tão astuta. Comecemos por examinar o crime que une os nazistas com os democratas — ou, nesse caso, mais precisamente, com os progressistas — antes de analisarmos como a esquerda descobriu um modo de evitar a culpa e, de fato, prosseguir com seus crimes, apesar do mau cheiro e do odor pútrido que acompanharam a descoberta das atrocidades em questão. Há não

primeiramente o Holocausto, evento que entrou em cena mais tarde, mas o crime que lhe serviu de exórdio, o que por vezes é chamado pelos estudiosos de o “ensaio geral” para o Holocausto. Em 1933, ano em que os nazistas assumiram o poder, eles emitiram a “Lei para a Prevenção de Filhos com Doenças Hereditárias”, que exigia a esterilização forçada de pessoas consideradas “inaptas”, incluindo imbecis, esquizofrênicos, maníaco-depressivos, cegos e surdos, pessoas diagnosticadas com deformidades físicas ou mentais e viciados em drogas e substâncias alcoólicas. Cerca de trezentos e cinquenta mil alemães foram esterilizados sob essa lei, entre 1933 e 1939. Em 1939, no início da Segunda Guerra Mundial, a lei de esterilização foi complementada e, até certo ponto, suplantada por uma nova lei eutanásica. Nessa época, os nazistas tinham sob seu comando uma rede de campos de concentração, incluindo campos de extermínio, onde os prisioneiros eram exterminados por fuzilamento ou gás letal. Sob o programa chamado T4, entre 1939 e 1941, os nazistas diagnosticaram cerca de duzentos mil alemães com insanidade ou doenças incuráveis. Eles foram então eutanasiados em câmaras de gás.8 Estas foram as primeiras câmaras de gás, usadas não para matar propriamente judeus, mas os portadores de doenças físicas e transtornos mentais. Elas foram as pessoas descartáveis originais. “As câmaras de gás não foram projetadas para campos de concentração”, escreve o historiador Timothy Snyder, “mas para a matança clínica do programa de eutanásia”. Essas primeiras câmaras de gás eram menores e menos desenvolvidas, menos industriais do que as construídas e usadas posteriormente no assassinato de judeus, ciganos e outros povos, numa proporção muito maior. No entanto, os procedimentos revelaram-se muito semelhantes. As vítimas passavam por exame médico, no que as obturações de ouro da boca eram removidas; depois elas eram submetidas ao processo de eutanásia mediante gás venenoso, tipicamente monóxido de carbono bombeado por caminhões. Em relação aos quatro dos mais famosos campos de extermínio, Snyder comenta: “1,6 milhão de judeus mortos em Treblinka, Chelmni, Belzec e Sobibor foram asfixiados por monóxido de carbono”. Em Auschwitz, os

nazistas usaram o gás cianeto de hidrogênio Zyklon B para matar mais um milhão de judeus. Snyder diz que os supervisores das operações em Treblinka, Belzec e Sobibor eram todos veteranos do programa nazista de eutanásia.9 Assim, esse programa e a Solução Final do Partido Nazista estão indissoluvelmente ligados. Convém notar que mesmo a linguagem comum tem sido distorcida e manipulada. A esse respeito, uma grande mentira já vigorava desde os nazistas. A palavra ‘eutanásia’ significa “morte por misericórdia”. O termo refere-se às pessoas velhas demais ou doentes e sentindo tanta dor que recebem a morte como alívio. Nessas circunstâncias, e com seu consentimento, ou, incapazes de consentir, com o consentimento de familiares, elas são sacrificadas como um ato de misericórdia ou compaixão. Mas, como o historiador Michael Burleigh ressalta, a morte por misericórdia não tinha nada que ver com a cartilha nazista; a eutanásia não passava de “um termo cosmético para o assassinato”.10

Aprendendo com os Progressistas Quem então é o responsável por esses crimes horríveis, crimes que abriram a porta para os horrores ainda maiores do Holocausto? Os nazistas, é claro. Mas de onde eles tiraram a ideia para tanto? A resposta: dos progressistas americanos. Não dos “democratas” desta vez, mas, especificamente, dos “progressistas”. Por progressismo refiro-me ao movimento de esquerda do início do século XX que buscava reformar as leis trabalhistas e as condições de trabalho, mas um movimento também obsessivamente preocupado com a melhoria social por meio do restringir da imigração baseado-se na raça e através da eliminação das pessoas chamadas inferiores, inaptas e descartáveis. Sim, alguns republicanos eram progressistas também, mas moderados. Exemplo típico é Theodore Roosevelt, que, anote isso, tornou-se um ardente progressista somente quando deixou o Partido Republicano, depois de dois mandatos presidenciais. Daí, ele voltou a concorrer pelo Partido Progressista, ou, como foi apelidado, Partido Bull Moose. Não bastasse, o progressismo suave de Roosevelt manteve-se em contraste com o duro progressismo do democrata Woodrow Wilson, que estava enraizado numa filosofia racista e

eugenista. Embora seja plausível conceber Wilson, se estivesse vivo na época, abraçando as leis nazistas de esterilização forçada, é inconcebível pensar em Roosevelt fazendo o mesmo. Logo, não acuso todos os progressistas, mas somente aqueles da esquerda que, juntos, deram forma ao corpo antepassado, político e espiritual dos progressistas que hoje estão no páreo. Os progressistas da esquerda americana não apenas superaram os nazistas, dando início a programas de encarceramento forçado e esterilização em massa, mas também lhes mostraram um modo de implementá-los. Os nazistas reconheceram o papel pioneiro da esquerda americana no que diz respeito à formação dos seus próprios programas de contracepção e matança. Os progressistas, por sua vez, parabenizaram-se pela influência que exerceram sobre os nazistas. Tudo isso então foi varrido para baixo do tapete por uma geração progressista subsequente, de modo a esconder a culpa da esquerda e permitir que os programas eugenistas atuais continuem esterilizados de qualquer associação com o nazismo. “A América liderou o caminho da legalização e fomentação de esterilizações eugênicas forçadas”, escreve a historiadora Angela Franks.11 Os progressistas tiveram seu primeiro sucesso no ano de 1907, quando o estado de Indiana aprovou uma lei que exigia a esterilização de “criminosos crônicos, lesados, deficientes mentais e estupradores”. Durante os próximos trinta anos, vinte e seis outros estados passaram leis semelhantes. No início da década de 1930, quando os nazistas chegaram ao poder, os estados americanos já esterilizavam de duas a quatro mil pessoas por ano. No total, cerca de sessenta e cinco mil pessoas foram esterilizadas contra a própria vontade por consequência da legislação eugênica dos progressistas nos Estados Unidos. Por volta da mesma época, os progressistas persuadiram os estados de todo o país a aprovar leis restritivas proibindo o casamento de brancos com negros. Essas leis eram baseadas em um princípio que pressupunha a inferioridade negra, apoiadas por pressões sociais que desencorajavam todas as minorias, incluindo nativos americanos e hispânicos, de casarem-se com brancos. Para os progressistas, essas leis e costumes de segregação tinham o mesmo propósito das leis de esterilização forçada: proteger os genes raciais

da inundação e contaminação por pessoas “inúteis” e “incapazes”. O terceiro argumento desse mesmo projeto embasava-se no restringir da imigração. Os progressistas entenderam que, em primeiro lugar, se mantivessem fora essas pessoas supostamente degradadas, não seria necessário segregá-las, esterilizá-las ou restringir suas perspectivas de casamento. Em 1924, os progressistas receberam uma grande vitória com a aprovação da Lei da Imigração, que restringia bruscamente a imigração ao preferir os norte-europeus ou “nórdicos” e discriminando os imigrantes da Ásia, África, América do Sul e até mesmo os vindos da Europa Central e Meridional. Os progressistas hoje culpam Trump de apoiar políticas racistas de imigração, sendo que foram os próprios progressistas que, na verdade, implementaram tais políticas e até hoje nunca reconheceram ou pediram desculpas. A peça central da iniciativa progressista na América, no entanto, era a eugenia. Originalmente, ela foi concebida na Inglaterra pelo primo de Charles Darwin, Francis Galton. Tentando aplicar a teoria de Darwin da sobrevivência do mais apto na espécie humana, Galton cunhou o termo “eugenia” para descrever um projeto que melhoraria a humanidade mediante a seleção genética. “Embora concebida na Inglaterra”, escreve Angela Franks, “a eugenia nasceu de fato na América, onde um programa político e legal bem-sucedido foi desenvolvido” para melhorar o que os progressistas chamaram de estoque genético americano.12 Isso, nota-se, vai muito além da sobrevivência do mais apto. Os progressistas na América fundaram muitas organizações pelo eugenismo, entre elas o Eugenics Record Office em Cold Spring Harbor, Long Island, a National Conference on Race Betterment e a American Breeders Association. Entre os principais eugenistas estavam Charles Davenport, fundador do Escritório de Arquivos da Eugenia; Harry Laughlin, primeiro superintendente do Escritório de Arquivos da Eugenia; Leon Whitney, secretário executivo da Sociedade Americana de Eugenia; Madix Grant, presidente da Sociedade de Zoologia de Nova Iorque e administrador do Museu Americano de História Natural; Paul Popenoe, editor do periódico Journal of Heredity; Eugene Gosney, diretor da Fundação para a Melhoria Humana; e o progressista filantropo Clarence Gamble.

Laughlin, talvez o mais influente eugenista na América, desenvolveu um programa de esterilização em massa que visava como primeiro passo cobrir 10% da população. Em suma, ele queria esterilizar onze milhões de pessoas. Laughlin pretendia compensar essas reduções na população, em suas palavras, “incentivando a intensa fecundidade entre os mais dotados”. Nada tão ambicioso quanto o projeto de 10% de Laughlin se concretizou, mas sua estratégia de conseguir que mulheres se submetessem à esterilização patrocinada pelo Estado foi implementada. Basicamente, os educadores progressistas e as autoridades de saúde começariam classificando as mulheres sem educação formal e de classe baixa — a maioria delas negras, hispânicas ou ameríndias — como “inaptas” ou “imbecis” congênitas. A polícia era chamada e as mulheres eram então presas ou segregadas da população em geral, aparentemente para evitar que contaminassem outros. Em alguns casos, as mulheres eram postas em cativeiro por tempo indeterminado, com o objetivo de impedi-las de reproduzir durante os seus anos fecundos. Após o encarceramento ou confinamento forçado, as mulheres poderiam optar por serem esterilizadas e retornar a uma vida normal. Diante da escolha entre segregação e prisão de um lado ou esterilização do outro, muitas mulheres submetiam-se à esterilização. Consequentemente, os funcionários do serviço social progressista classificavam as esterilizações como “voluntárias” em vez de coagidas. Os eugenistas progressistas na América também introduziram a ideia de eutanásia como uma alternativa ao encarceramento e à esterilização forçada. O principal defensor da matança de pessoas indesejáveis, inaptas, foi Paul Popenoe, geneticista atuante na Califórnia, que argumentou em seu compêndio Applied Eugenics [Eugenia Aplicada], no qual, em se tratando de débeis congênitos ou pessoas que praticavam crimes recorrentes, escreve: “o primeiro método que se tem é a execução”.13 Popenoe propôs “câmaras letais” para realizar essas execuções. A sugestão de Popenoe havia sido controversa desde o início. No fim das contas, os progressistas rejeitaram a eutanásia, desconsiderando-a como

programa viável para fins de eliminar pessoas descartáveis, mas ainda afirmavam o princípio de que elas deveriam ser eliminadas de outras formas. Entretanto, onde os progressistas americanos traçaram uma linha, os nazistas avançaram com seu próprio programa de eutanásia, em grande parte alinhado pelas ideias que Popenoe propôs originalmente. Os progressistas a favor do eugenismo na América mediaram-se com seus homólogos europeus em conferências internacionais. Veja bem como o eugenismo atraía a esquerda política não só na América, mas também na Inglaterra e na Alemanha. Na Inglaterra, por exemplo, entre os paladinos da eugenia estavam Fabian George Bernard Shaw, que era socialista, H. G. Wells, romancista utópico e esquerdista, e John Maynard Keynes, economista progressista. Na Alemanha, o principal teórico marxista, Karl Kautsky, fomentava o eugenismo assim como seu companheiro socialista, Eduard David. Outro socialista de notável presença, o médico alemão Alfred Ploetz, defendia a eugenia desde a década de 1880 e viveu tempo suficiente para ver seu sonho eugenista realizado na Alemanha nazista. Ploetz e seu companheiro socialista, Ernst Rudin, fundaram a Sociedade da Higiene Racial. Rudin mais tarde foi feito o maior estruturador do programa do eugenismo nazista e participante dos departamentos superiores de saúde do regime nazista, criados para decidir quem deveria ser esterilizado à força. Os mais importantes nazistas em prol do eugenismo da década de 1930 — Rudin, Fritz Lens e Eugen Fischer — eram todos homens de esquerda que interagiam de perto com os progressistas dos Estados Unidos. Nas conferências internacionais pelo eugenismo, os alemães eram tipicamente considerados a segunda comunidade eugenista mais avançada do mundo; os americanos eram os mais avançados. É provável que a mais significativa dessas conferências tenha sido o Terceiro Congresso Internacional pela Eugenia, que ocorreu em 1932 no Museu de História Natural de Nova Iorque. Um ano antes de os nazistas ascenderem ao poder, a imprensa alemã falou, com entusiasmo, acerca do “progresso” das políticas eugenistas dos Estados Unidos. “A Alemanha certamente desenvolveu seu próprio corpo de conhecimento eugenista”, escreve Edwin Black, no livro The War Against the Weak [A

Guerra Contra os Fracos]. “No entanto, os leitores alemães ainda tinham por forte modelo as conquistas do eugenismo americano — os tribunais biológicos, a esterilização forçada, a detenção de pessoas socialmente inaptas, debates a respeito da eutanásia”. Aos olhos dos progressistas americanos, mesmo antes dos nazistas, “uma raça superior de nórdicos era cada vez mais vista como a solução final para os problemas do eugenismo pelo mundo”. E no que os nazistas puseram em prática suas políticas eugenistas, os progressistas norte-americanos caíram em inveja, com um deles protestando que “os alemães estão nos dando uma surra no nosso próprio jogo”.14

Refreando as “Ervas Daninhas Humanas” Uma personagem sombria intimamente relacionada ao movimento eugenista é a fundadora da Planned Parenthood, Margaret Sanger. Na verdade, os principais eugenistas evitavam Sanger, considerada por eles uma pessoa de credenciais acadêmicas fracas e pessoalmente excêntrica. Apesar dos pedidos frequentes de Sanger, eles mantinham recusa a falar em suas conferências ou a convidá-la para que se juntasse aos seus conselhos. Entre eles, alertavam-se à suspeita de que Sanger levaria a causa eugenista ao descrédito. Mesmo assim, ao longo de sua vida, Sanger defendeu descaradamente o eugenismo e procurou desesperadamente a aprovação dos líderes da causa eugenista. Uma amostra do cortejo persistente de Sanger com os pesos-pesados da eugenia está em seus seus convites anuais enviados a Charles Davenport, pedindo que ele discursasse em suas várias conferências. Davenport recusouse repetidas vezes. Desesperada por “conseguir” Davenport, Sanger instou seu colega de trabalho, Edward East, amigo de Davenport, que convencesse Davenport a juntar-se ao conselho da Birth Control League [Liga de Controle de Natalidade], Massachusetts. Davenport novamente disse não. Finalmente, depois de muito suplicar, Davenport concordou com participar de uma mesaredonda sobre eugenia e controle de natalidade durante a Conferência Internacional Neomalthusiana e de Controle de Natalidade de 1925. Esse foi o único assentimento que Sanger conseguiu de Davenport. Ocorre que foi mais um ceder à perseguição obstinada do que um empenho por formar alianças.

Para destacar a ávida defesa eugenista de Sanger, cabe considerar dois documentos reveladores: seu artigo “My Way to Peace” [Meu Caminho para a Paz], de janeiro de 1932, e seu artigo “America Needs a Code for Babies” [A América Precisa ter um Código de Controle para Bebês], de 27 de março de 1934. Neste último, Sanger convoca o governo a estabelecer um código “para a melhor repartição dos bebês [...] para proteger a sociedade contra a propagação e o aumento dos inaptos”. Esse código deveria declarar, dizia ela, que “nenhuma mulher deveria ter o direito legal de ter filhos e nenhum homem de ser pai sem uma permissão à paternidade”. Além disso, “nenhuma permissão à paternidade deveria ser válida para mais de uma concepção”. Quanto aos inaptos, Sanger insiste que “Diversos grupos de pessoas socialmente inaptas, como, por exemplo, os doentes mentais e os criminosos, não são suficientemente sensíveis à educação ou à pressão moral da comunidade”. Sanger identifica que cinco milhões de americanos cumpriam seus critérios de degeneração mental ou moral”. Ela declarou morbidamente: “Para tais pessoas, a esterilização é indicada”, mas “em caso de dúvida”, elas devem ser “rigorosamente isoladas, que assim evitemos a perpetuação de suas aflições geradas pela reprodução”. Em seu artigo de 1932, Sanger pede a fundação de “fazendas e propriedades onde os segregados seriam ensinados a trabalhar sob instrutores competentes” e impedidos de reproduzir “por toda a vida”.15 Sanger era, à semelhança de muitos progressistas do seu tempo, uma racista declarada que considerava os negros como pessoas baixas e sem educação, merecedoras da segregação e esterilização forçada. Sob convite, Sanger aceitou discursar acerca da ramificação feminina da Ku Klux Klan em Nova Jersey e estabeleceu um projeto especial, chamado Negro Project, a fim de pressionar pessoas negras de baixa renda a se inscreverem em programas de controle de natalidade e esterilização. Em carta a seu amigo e sócio, Clarence Gamble, Sanger explica por que contratou ministros negros para serem seus embaixadores na comunidade negra. “Nós não queremos que a notícia de que nosso desejo é exterminar a população negra se espalhe, e o ministro é o homem que pode dispersar essa ideia, caso algo venha a acontecer com algum de seus membros mais rebeldes”.16 A militância de Sanger é tão flagrante e persistente que é claro quão

desonestas são as tentativas de seus biógrafos progressistas quando negam o papel central que o eugenismo exerceu em sua ideologia. No livro de Linda Gordon, Woman’s Body, Woman’s Right [O Corpo da Mulher, o Direito da Mulher], o qual consiste numa história do movimento de controle de natalidade na América, a autora tenta distinguir a eugenia de Sanger, supostamente modesta, benigna e de esquerda, da eugenia supostamente extremista, maligna e de direita que emergiu com o nazismo.17 Tamanha distinção não passa da mais pura ficção e depende inteiramente da suposição de que o nazismo fosse, de alguma forma, de direita. Como já entendemos, isso faz parte da grande mentira. Com efeito, a eugenia de Sanger e a eugenia nazista eram farinha do mesmo saco, fato percebido por ela própria. Percebe-se isso em dois dos associados próximos de Sanger, Clarence Gamble, que financiava os projetos de Sanger e falava em suas conferências, e Lothrop Stoddard, que publicava nas revistas de Sanger e atuava no conselho da Liga Americana de Controle de Natalidade, a organização precursora do Planned Parenthood. Stoddard foi o autor mais vendido de um folheto notório, The Rising Tide of Color Against White World Supremacy [A Crescente Maré da Cor Contra a Supremacia do Mundo Branco], retratando a antiga raça nórdica como sendo pisada através da imigração e do casamento inter-racial por multidões degeneradas de outras raças inferiores. Tanto Lothrop quanto Gamble tornaram-se ávidos simpatizantes do nazismo, procurando importar programas de esterilização nazistas em toda a sua magnitude para a América. Gamble proclamava que o programa nazista “garantiria à Alemanha um lugar na história das raças” e insistia que “estabeleceria o padrão que outras nações e outros grupos raciais deveriam seguir”.18 Stoddard viajou para a Alemanha, onde encontrou-se com os principais eugenistas raciais do regime nazista, Eugen Fischer e Fritz Lenz. Também teve encontro com os principais oficiais nazistas, Heinrich Himmler e Joachim von Ribbentrop, e até mesmo conseguiu uma cobiçada audiência com Hitler. O livro de Stoddard escrito em 1940, Into the Darkness [No Interior da Escuridão], é um louvor ao eugenismo nazista e de Hitler. Esses eram os círculos que Sanger frequentava e o tipo de pessoas com quem ela se associava. Agora cabe mencionar a própria Sanger. Em abril de 1933, a revista Birth

Control Review, editada por Sanger, publicou um artigo “Esterilização Eugênica, uma Necessidade Urgente”, escrito por Ernst Rudin, maior estruturador do programa nazista de esterilização e mentor de Joseph Mengele, e também reimprimiu um livreto que ele escreveu para os eugenistas britânicos. Escrevendo em 1938, enquanto o projeto de esterilização do regime nazista estava em pleno andamento, Sanger pediu que os Estados Unidos fizessem o que os nazistas estavam fazendo. “Na indústria animal, o gado inferior não tem permissão para reproduzir”, disse Sanger. “Nos jardins, as ervas daninhas são mantidas podadas”. A América, concluiu Sanger, deve aprender com os alemães e cumprir o próprio mandato da natureza de livrar-se das “ervas daninhas humanas”.19

O Exemplo Americano para Hitler Adolf Hitler parece nunca ter ouvido falar de Margaret Sanger. Quando preso em Landsberg, no entanto, ele já seguia o darwinismo social, ideologia que daria forma não só à sua filosofia social, mas também à sua política externa. Por exemplo, ele via nações envolvidas em uma luta darwiniana por sobrevivência com apenas os mais fortes, ou mais aptos, destinados a sobreviver. O historiador Richard Weikart escreve no livro From Darwin to Hitler [De Darwin a Hitler] que “Hitler valeu-se extensamente do pensamento proveniente do darwinismo social para construir sua própria filosofia racista”.20 Enquanto na prisão, Hitler comentou sobre como os progressistas na América haviam passado leis de imigração baseadas na raça que davam tratamento preferencial aos brancos, mas discriminavam pessoas negras, amarelas e pardas. Mesmo entre os brancos, as leis preferiam os imigrantes do norte da Europa — os países nórdicos — aos do leste e do sul da Europa, julgados inferiores pelos progressistas. Hitler aprovava completamente as premissas por trás dessa legislação progressiva. “O germano que habita no continente americano”, escreveu Hitler em Mein Kampf, “e que se manteve racialmente puro e sem mistura, surgiu para dominar o continente; ele permanecerá mestre desde que não seja vítima da corrupção do sangue”. Uma maneira de preservar a pureza dos nórdicos na América era, é claro, restringir a entrada de outros povos. Hitler invocou o

exemplo americano para explicar o porquê de ser favorável às leis contra a mistura racial na Alemanha. Hitler também pretendia, ao tomar o poder, purgar a Alemanha do que ele considerava ser uma raça inferior, invocando, para tanto, as leis de imigração progressistas da América, objetivando mostrar como lá já haviam adotado, por meio das leis de imigração, o mesmo princípio geral. Embora não gostasse de admitir a liderança americana — ele queria que a Alemanha liderasse em todas as frentes —, Hitler admitiu, mesmo com raiva, que a imigração era uma área onde os nazistas teriam de alcançar os progressistas norte-americanos. Em Mein Kampf, Hitler escreve: “Há hoje um Estado em que pelo menos fracos avanços rumo a uma melhor concepção são visíveis. Claro que não é o modelo de nossa República Alemã, mas da União Americana, na qual é feito grande esforço para consultar a razão, pelo menos parcialmente. Ao recusar, por princípios, a imigração, considerando elementos de precariedade na saúde, simplesmente excluindo certas raças da naturalização, professa-se, no início lentamente, uma visão peculiar do conceito de estado Völkisch”. Uma vez que Hitler tivesse entendido a política de imigração como um mecanismo para manter as pessoas descartáveis de fora, ele então entenderia, em primeiro lugar, a eugenia como um mecanismo para impedir que elas se reproduzissem e nascessem. “A exigência de que pessoas com deficiências sejam impedidas de propagar descendência igualmente defeituosa”, escreveu Hitler, “é uma exigência da mais clara razão. Se executada sistematicamente, representa o ato mais humano da humanidade”.21 Perceba como Hitler, seguindo o progressismo clássico, apresenta suas ideias não como um ataque ao humanitarismo, mas como sua melhor execução. Hitler comunicou sua familiaridade com a legislação do progressismo eugenista dos Estados Unidos. E mais uma vez reconheceu, com certa irritação, que, também nesse ponto, progressistas e socialistas na Alemanha teriam de seguir seus homólogos nos Estados Unidos. “Estudei com grande interesse e afinco as leis de vários estados americanos em relação à prevenção da reprodução de pessoas cuja progênie provavelmente não teria valor ou seria prejudicial à linhagem racial”.

Interessante dizer, Hitler sabia que havia conservadores religiosos na América que se opunham a tais leis por serem draconianas e excessivas. Ele os desprezava, chamando-os de “mentirosos” e “hipócritas”. Não bastasse, também agiu para rapidamente refutar tais objeções. “Eventuais excessos”, disse Hitler, “não constituem prova da incorreção dessas leis. Isto unicamente nos exorta à maior conscientização possível”.22 Hitler por vezes é caracterizado pela esquerda como conservador, dedicado ao casamento e à família tradicional. Vejamos o que Hitler realmente diz com seu livro Mein Kampf acerca do propósito que o casamento carrega: “O casamento não pode ser um fim em si mesmo, mas deve servir àquele propósito mais elevado, o aumento e a preservação das espécies e da raça. Este somente é o seu significado e sua incumbência”.23 Por consequência, o casamento não é primariamente um meio de unir pessoas que se amam e darlhes as alegrias da paternidade; ao contrário, o casamento existe, em grande parte, para servir aos objetivos coletivos do Estado e das espécies. Nenhum tradicionalista concordaria com isso, mas muitos progressistas concordaram e ainda concordam. Por meio de onde Hitler se familiarizou com as fontes americanas? Enquanto na prisão, Hitler lia com avidez os folhetos e compêndios da didática eugenista, que citavam extensivamente Davenport, Popenoe e outros progressistas do eugenismo. Hitler compartilhou suas ideias com seu companheiro de cela, Rudolf Hess, mais tarde uma figura proeminente do Terceiro Reich, a mesma que popularizou o lema “O nacional-socialismo é nada mais do que a biologia aplicada”.24 O próprio Hitler foi especialmente influenciado pelos escritos de Leon Whitney, da Sociedade Americana de Eugenia, e Madison Grant, autor de vários livros que exaltam a superioridade racial nórdica e criticam a corrupção dela por raças menores. Para próprio deleite, Hitler observou que esses americanos não meramente defendiam a superioridade racial europeia ou branca, mas especificamente a superioridade germânica ou nórdica. Durante a década de 1930, Whitney em certa ocasião visitou Grant, na época presidente de um comitê eugenista de imigração. Whitney foi para mostrar a Grant uma carta que havia acabado de receber de Hitler solicitando

uma cópia do livro de Whitney intitulado The Case for Sterilization [Em Defesa da Esterilização]. Para não ser ultrapassado, Grant pegou sua própria carta de Hitler em que era elogiado por escrever a obra The Passing of the Great Race [A Morte da Grande Raça], livro que Hitler chamou de sua própria “bíblia” eugenista.25 O que isso mostra é que os eugenistas progressistas na América não estavam apenas cientes, mas também orgulhosos de associar-se com Hitler. Pouco depois de os nazistas implementarem seus programas de esterilização e eutanásia, Paul Popenoe elogiou Hitler por basear “solidamente suas esperanças de uma regeneração biológica na aplicação de princípios biológicos da sociedade humana”. O jornal Eugenic News, de Harry Laughlin e Charles Eugen, chamou o programa nazista de “o marco histórico que registra o controle das nações mais avançadas do mundo sob um aspecto importante do controle da reprodução humana”. Se esses comentários parecem praticamente incompreensíveis hoje, o historiador Stefan Kuhl explica que os eugenistas do progressismo “entendiam as políticas nazistas como a realização direta de seus objetivos científicos e demandas políticas”.26 Outro exemplo do entusiasmo progressista com o programa de esterilização de Hitler envolve Charles Goethe, fundador da Sociedade de Eugenismo do Norte da Califórnia, que, ao retornar à Alemanha após viajar em busca de fatos, em 1934, escreveu uma carta de felicitações ao colega Eugene Gosney, chefe da Human Betterment Foundation [Fundação em prol do Aperfeiçoamento Humano], sediada em San Diego. “Você desejará saber”, disse Goethe por carta, “que seu trabalho desempenhou papel poderoso na definição das opiniões do grupo de intelectuais que estão por trás de Hitler neste programa que definirá toda uma era. Durante todo o processo, percebo que suas opiniões foram tremendamente estimuladas pelo pensamento americano e, em particular, pelo trabalho da Human Betterment Foundation. Desejo que você, meu querido amigo, carregue consigo este pensamento pelo resto de sua vida”.27

Cobrindo Rastros Foi Hitler, aponta o historiador George Fredrickson, que “prejudicou o

nome do racismo”.28 Na verdade, Fredrickson enfatiza que o próprio termo “racismo” não passou a ter uso genérico antes da década de 1930, então em conexão com a ascensão do Terceiro Reich. Enquanto os antigos progressistas deleitavam-se na ocasião de associar-se com Hitler, a partir da Segunda Guerra Mundial eles passaram a trabalhar com afinco para encobrir pistas e enterrar todo tipo de conexão entre a causa progressista e a causa nazista. Um importante documento, neste enorme projeto que é a grande mentira, é o livro do historiador Richard Hofstadter, Social Darwinism in America [O Darwinismo Social na América]. Interessante notar, o livro foi publicado em 1944, antes que os Aliados libertassem os campos de concentração e as atrocidades nazistas fossem totalmente expostas. Mesmo em 1944, no entanto, ter associação com os nazistas tornou-se algo politicamente radioativo, e daí que Hofstadter começou a trabalhar para redefinir o darwinismo social, romper vínculos com o eugenismo progressista e vinculálo à direita política. Hofstadter, esquerdista uma vez já membro do Partido Comunista, disse que se juntou ao partido porque “não gostava do capitalismo”. Mesmo depois de romper com o partido, ele manteve animosidade. “Odeio o capitalismo e tudo aquilo que o acompanha”.29 A estruturação da grande mentira, agora por parte de Hofstadter, implicava redirecionar o darwinismo social e transformá-lo no fundamento filosófico do livre mercado, ou capitalismo laissez-faire. Isso garantiria que, no futuro, a culpa do darwinismo social pudesse ser colocada sobre “a direita”. Hofstadter construiu seu argumento em torno da frase do sociólogo inglês Herbert Spencer, “a sobrevivência do mais apto”. Esta, insistiu Hofstadter, é a essência do capitalismo laissez-faire. Precisamente falando, esse aspecto visceral da ideologia darwiniana, prossegue Hofstadter, é o que os empresários americanos mais acham conveniente no darwinismo social. Hofstadter dedicou grande parte do seu livro a Spencer e ao sociólogo americano William Sumner, que, de fato, invoca a retórica da sobrevivência do mais apto para defender o capitalismo. Sumner, no entanto, foi praticamente o único a fazê-lo. Hofstadter parecia

incapaz de localizar outros exemplos da América, nem preocupado estava com indagar empresários americanos. Houvesse feito, certamente teria descoberto que a maioria não tinha ouvido falar do darwinismo social. Se homens assim tivessem alguma base filosófica para a profissão, muito mais provável que fosse em Adam Smith ou Friedrich Hayek, não em Charles Darwin ou Herbert Spencer. No fim de seu livro, Hofstadter faz algumas rápidas referências à conexão entre o darwinismo social e a eugenia. Mesmo assim ele deixa uma clara impressão de que se tratava de uma menor associação e amplamente inesperada; em certo ponto, ele chama a eugenia americana de “capricho”.30 Era, porém, como já notamos, muito mais do que isso. Hofstadter não diz nada a respeito da forma como o eugenismo dos progressistas inspirou leis de esterilização e modelou programas eutanásicos na América, coisas que reconhecidamente forneceram estrutura para programas de esterilização e de eutanásia ao regime nazista. Os progressistas foram depressa louvar a grande mentira de Hofstadter, proclamando seu livro uma obra-prima, fator que o ajudou a tornar-se modelo a ser seguido sobre o assunto. Desde então, mesmo os historiadores simpatizantes de Hofstadter — como o historiador progressista Eric Foner, ex-aluno de Hofstadter na Universidade Columbia — reconhecem que as teorias do livro Social Darwinism in America [O Darwinismo Social na América] são profundamente falhas. A obra, contudo, continua a definir a sabedoria convencional para a esquerda. Trabalhos subsequentes lidando com a eugenia, como o livro In the Name of Eugenics [Em Nome da Eugenia], de Daniel Kevles, fazem apenas poucas referências aos fundamentos progressistas do eugenismo e aos estreitos laços entre eugenistas do Partido Progressista e eugenistas do Partido Nazista. Mesmo a obra The Nazi Connection [A Interligação Nazista], escrita por Stefan Kuhl, que documenta a íntima influência do eugenismo norteamericano sobre a eugenia nazista, recai sobre o engano de Hofstadter de que a própria eugenia é, em grande medida, uma causa direitista. Assim, a influência de Hofstadter continua viva, na medida em que seu trabalho ainda apoia e avança a grande mentira.

Em circunstâncias ordinárias, o engodo promulgado por Hofstadter teria sido suficiente. Por meio dos seus esforços, a esquerda teria enterrado o programa eugenista e transferido o estigma do darwinismo social para a direita política. Com essa manobra, no entanto, a esquerda pretenderia continuar com sua agenda eugenista. Consequentemente, era necessário redefinir a própria eugenia, para que ela então pudesse se passar por algo diferente. Mas até mesmo isso não seria suficiente. Dando outro nome à eugenia e ainda visando explicitamente populações minoritárias, aos velhos moldes nazistas, a esquerda demonstraria óbvio relacionamento com o nazismo. O desafio à esquerda era formular uma nova agenda, uma que renomeasse a eugenia e incorporasse seu programa em um quadro novo e mais amplo. A historiadora Angela Franks nota que esse quadro começou sob o nome de “controle populacional”, nas décadas de 1960 e 1970.31 Inclusive, mesmo alguns eugenistas de renome do regime nazista como Otmar von Verschuer declararam-se pesquisadores do controle populacional e foram reintegrados na comunidade progressista que ativamente promovia a causa. Todavia, durante as últimas décadas, a eugenia tem marchado sob uma nova bandeira, a bandeira “pró-escolha”. Margaret Sanger, eugenista ávida, hoje é celebrada pela Planned Parenthood como preciosa defensora da “escolha”. É dificílimo de encontrar nos folhetos da Planned Parenthood referências à eugenia e ao papel pioneiro que Sanger exerceu na organização. Tudo isso faz parte da grande mentira; a verdadeira Sanger opunha-se à escolha. Fácil notar, ela defendia que as populações ricas, educadas e “aptas” deveriam ter mais filhos, já as mais pobres, sem instrução e “inaptas” deveriam ter menos. Sanger, à semelhança de Hitler, acreditava que escolhas reprodutivas deveriam satisfazer os interesses maiores da sociedade e das espécies. Sendo que Sanger rejeitava a “escolha”, como a agenda pró-escolha da Planned Parenthood continua a avançar os objetivos originais de Sanger? Afinal, uma verdadeira agenda pró-escolha parece transferir a decisão do aborto para a mãe. Perceba a profunda tragédia que é o aborto; não se trata de uma mãe meramente matando uma criança, mas de uma mãe matando a sua própria criança. O papel do Estado é simplesmente autorizar o assassinato,

torná-lo legal. Embora a mãe faça a escolha, sua escolha não é feita no vácuo; a Planned Parenthood faz propaganda ávida em prol do aborto e também lobby em favor do financiamento federal para o procedimento abortivo. Se o governo não pagar, a esquerda insiste, então as mulheres pobres terão dificuldade de abortar. Com o subsídio do governo, no entanto, a esquerda pode garantir não só que a população mais pobre possa realizá-los, mas — o que é de fato o caso — também que a maioria dos abortos neste país seja realizada pelas proles minoritárias e mais pobres. Inacreditável dizer, o antigo desejo eugenista é mais uma vez satisfeito, mas desta vez no quadro supostamente neutro da “escolha”. Para entender o radicalismo do apoio da esquerda ao aborto financiado pelo governo federal, basta considerar que o aborto como direito não é mencionado na Constituição. No entanto, ainda que fosse considerado direito constitucional, nenhum dos outros direitos fundamentais é financiado pelo governo. Ainda que a Primeira Emenda disponha o direito à livre expressão e à livre prática da religião, ainda assim nenhum deles é subsidiado pelo governo. A Segunda Emenda garante o direito de portar armas, mas o governo não as paga. É direito constitucional o reunir-se em grupos para determinados fins, mas o Estado não subsidia tal direito. Assim, a esquerda quer um tipo de apoio federal para a causa do aborto que nenhum desses direitos fundamentais recebe. Ademais, o apoio federal transforma o aborto, que antes era um homicídio sancionado pela força estatal, num assassinato patrocinado pelo Estado. Até hoje, mais de cinquenta milhões de crianças não nascidas foram mortas na América após a decisão da Suprema Corte em 1973, no caso Roe vs Wade. Verdade seja dita: trata-se de um genocídio numa escala que supera o Holocausto nazista. O que é o aborto, senão uma eutanásia para bebês? Desse modo a esquerda prosperou além dos sonhos mais selvagens de Sanger, mesmo após desenterrá-la com seus registros eugenistas e transformá-la em ícone cultural, da forma como Mengele gostaria de ser lembrado. Quão orgulhosos e até mesmo invejados Sanger e os nazistas seriam se estivessem vivos para contar história. Para os progressistas, a grande mentira valeu muitíssimo a pena.

Onde a esquerda obteve essa nova estratégia eugenista? Pensei muito acerca disso, então finalmente entendi. Eles a conseguiram desenterrando o próprio passado, a partir de uma abordagem democrata centenária, o método de lidar com a escravidão. “Escolha”, afinal, era a palavra de ordem dos democratas do Norte liderados pelo senador Stephen Douglas, de Illinois. Douglas lançava mão de sua doutrina da “escolha” para apoiar a instituição da escravatura sulista enquanto, ao mesmo tempo, era ainda capaz de garantir aos eleitores do Norte que ele próprio não estava defendendo a escravidão. Cabe lembrar o significado central da infame doutrina de Douglas acerca da “soberania popular”. Ele defendia que cada estado, cada território e cada comunidade tinham de decidir por si se queriam ou não a escravidão. Douglas dizia não endossar pessoalmente a escravidão, mas que sua opinião sobre o assunto era irrelevante. Vivemos em um país grande, dizia ele, em que as pessoas possuem opiniões diferentes. Portanto, concordemos em discordar e coloquemos o poder de decisão nas mãos de cada estado ou comunidade. Dessa forma o direito de escolha passa a ser supremo. A soberania popular, em outras palavras, é uma ideologia pró-escolha. O argumento de Douglas é idêntico na forma, e quase idêntico na substância, à ideologia pró-escolha agora empregada pela esquerda para defender o aborto como direito. Toda a cadência da retórica de Douglas é completa e estranhamente familiar. Claro que a esquerda de hoje fala em termos de escolha individual, enquanto Douglas falava em termos de cada comunidade fazendo uma escolha por si mesma. Mas essa é a única diferença, e ela é insignificante. No mais, as duas posições formam a mesma posição. Ouvimos hoje da esquerda a mesma afirmação de “escolha” que Douglas asseverava há quase um século, mas sem considerar o conteúdo de tal escolha. Assim como Douglas ignorou os direitos dos escravos, presumindo que eles não teriam interesse pela própria liberdade, de igual maneira a esquerda ignora o direito à vida da prole em desenvolvimento, pressupondo que eles não têm interesse por viver ou morrer. O feto de hoje, tal qual o escravo de antigamente, é considerado uma ferramenta para benefício e conveniência de outra pessoa. Ele ou ela não é um ser humano, ou ao menos é um ser humano, mas totalmente descartável. Nesse sentido, a mentalidade nazista, letal e

desumanizadora, perdura.

Capítulo Sete

Führers Americanos Muitas passagens no livro do presidente Roosevelt poderiam ser escritas por um nacional-socialista. Supõe-se que ele tenha uma afinidade considerável com a filosofia do nacional-socialismo.1 Crítica do Völkischer Beobachter, jornal nazista, ao livro de Franklin D. Roosevelt intitulado Looking Forward

No início da década de 1930, a administração recém-inaugurada de Roosevelt tomou uma decisão fatídica. Decidiu não tentar fazer da América um país socialista. O socialismo, é claro, exigiria uma nacionalização extensiva da indústria. Com efeito, o governo assumiria o setor privado: bancos, setores de comunicação, energia, saúde, educação e assim por diante. Estritamente falando, o socialismo envolve trabalhadores que detêm os meios de produção. Ao tentar superar a Grande Depressão, Franklin D. Roosevelt (FDR) e sua equipe progressista claramente rejeitaram o caminho socialista. Mas que caminho eles escolheram então? Aqui a narrativa esquerdista entra em cena. De acordo com os biógrafos progressistas de FDR, ele escolheu um “caminho intermediário” entre o socialismo e o capitalismo, o caminho do bem-estar social. Ao fazê-lo, transformou o progressismo no salvador do capitalismo americano. O progressismo — esta história conta — resgatou a economia americana e supriu os meios para vencer a Segunda Guerra Mundial. Nesse rumo, FDR é o herói canonizado do progressismo americano. Os presidentes democratas subsequentes, de Lyndon Johnson a Obama, procuraram expandir o poder do Estado, invocando o modelo de FDR. A Grande Sociedade de Johnson ergueu-se conscientemente com base no New Deal de FDR. E os funcionários de Obama, ao longo de oito anos, nunca se cansaram de ressoar FDR, não só para pressionar o programa Obamacare,

mas também para comparar as ações de Obama na onda da crise hipotecária de 2008 às ações de FDR na onda da quebra do mercado de ações de 1929. Em essência, Obama fez com que o governo federal adquirisse as indústrias bancárias e financeiras — novamente, não uma nacionalização real, mas um capitalismo gerido pelo Estado, no qual o governo efetivamente controlava essas indústrias e ditava-lhes o que fazer. Por meio do programa Obamacare, os progressistas estabeleceram o controle estatal sobre o setor de cuidados de saúde, um sexto de toda a economia. Por meio dos poderes de regulamentação da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (APA) e de outras agências, o governo federal manipula ativamente — embora ainda não controle — a indústria de energia. Durante a campanha de 2016, Hillary e Bernie avançaram propostas que aumentariam o controle do governo sobre o ensino superior. Por meio do sistema de escolas públicas, o governo, é claro, já controla grande parte do ensino fundamental e secundário. Embora os progressistas continuem a retratar essas medidas como um “caminho intermediário” entre o socialismo e o capitalismo, há um nome técnico para tanto: fascismo. Isso é o que fascistas como Giovanni Gentile e Mussolini realmente defendiam. Eles não eram favoráveis à propriedade do Estado socialista; Gentile e Mussolini sabiam que seus companheiros socialistas não tinham ideia de como gerir as indústrias. Em vez disso, eles defendiam o capitalismo estatal, colocando a força industrial do setor privado às ordens do Estado. Os nazistas tinham seu próprio termo para isso, Gemeinnutz vor Eigennutz, que significa o bem comum acima do bem individual. FDR, como a maioria dos progressistas modernos, compreendeu este sentimento e o compartilhou. Agora, a essa altura, convém dar uma pausa para reconhecer uma erupção progressista. Como é possível supor — prossegue o argumento — algum tipo de fascismo em se tratando de FDR? Não foi ele quem lutou contra os fascistas? Não foi a América, sob a liderança de FDR, que derrotou Hitler e os nazistas? Do ponto de vista da esquerda, é absolutamente imoral a qualquer um que se dê ao respeito alegar uma relação entre o sagrado FDR e os fascistas e nazistas, que eram genocidas. Hitler assassinou milhões de judeus, mas FDR os libertou dos campos de morte e trouxe de volta para casa

os sobreviventes do Holocausto judeu. “Ele salvou a América da Grande Depressão e dos nazistas”. É assim que FDR é lembrado. E é por isso que historiadores progressistas, como Arthur Schlesinger Jr. e William Leuchtenburg, o consideram um dos maiores presidentes, se não o maior. Mesmo alguns da direita caíram nesse discurso. “Como FDR Salvou o Capitalismo” [How FDR Saved Capitalism] é o título de um artigo de Seymour Martin Lipset para o periódico Hoover Digest. A revista Economist resume o legado de FDR na seguinte manchete: “O Homem que Salvou seu País e o Mundo”.2 Desta perspectiva, longe de ser fascista ou nazista, FDR deve ser visto como o precursor dos progressistas de hoje que se autodenominam antifascistas. Essa narrativa progressista contém uma molécula de verdade em meio a um sistema inteiro de absurdos. Concordo, FDR é o precursor dos progressistas que hoje autodenominam-se antifascistas. Contudo, simplesmente insisto que tanto FDR quanto sua progênie moderna estão muito mais próximos do fascismo e do nazismo do que eles se permitem admitir. FDR é aquele que colocou a esquerda moderna em seu caminho fascista. Para entender isso, é preciso começar por dissipar o miasma da criação de mitos progressistas. Em primeiro lugar, FDR não derrotou Hitler. Pode-se dizer que a América sob FDR, e mais tarde sob Truman, derrotou o Japão Imperial tomando a liderança na batalha pelo Pacífico e, finalmente, soltando as duas bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki. Mas, como o historiador Richard Evans escreve em seu livro The Third Reich in History and Memory [O Terceiro Reich na História e na Memória], “a União Soviética foi a força decisiva na derrota da Alemanha”.3 Evans nota que a Wehrmacht foi destruída em seu fracassado esforço de dominar Moscou e Stalingrado e pelo subsequente contra-ataque soviético. No máximo, FDR ajudou a acelerar a derrota final de Hitler, abrindo uma nova frente no teatro europeu, fornecendo ao exército soviético auxílio Lend-Lease (Empréstimo e Arrendamento) e remessas de suprimento militar americano. Nada disso é para depreciar o heroísmo da “maior geração” dos Estados Unidos; é, no entanto, para não dar louvor a FDR onde o crédito não lhe é devido.

De fato, a América libertou os cativos dos campos de concentração alemães, mas estes eram campos de trabalho, e é portanto que neles havia sobreviventes, embora a maioria não fosse de judeus. Como o historiador Timothy Snyder mostra em seu livro Terras de Sangue: A Europa Entre Hitler e Stalin, a América não libertou nenhum campo de extermínio; todos estavam no território ocupado pelos soviéticos. “O Exército Vermelho libertou Auschwitz”, escreve Snyder, “e também libertou os campos de Treblinka, Sobibor, Belzec, Chelmno e Majdanek. As forças americanas e britânicas não presenciaram nenhum dos principais locais de extermínio”.4 Praticamente não havia sobreviventes desses campos, nem os soviéticos poderiam preservá-los, já que os alemães destruíram as estruturas antes de evacuá-los. Em segundo lugar, FDR e a Grande Depressão. Atualmente, mesmo os historiadores progressistas como Ira Katznelson admitem que FDR não salvou os Estados Unidos da Grande Depressão, que só crescia mais e mais profundamente durante seu mandato. “Mesmo quando a recuperação econômica começou”, escreve Katznelson, “esta provou ser fútil, permanecendo bem abaixo dos níveis do fim da década de 1920 pela maior parte da década de 1930”.5 O que verdadeiramente levantou a América da depressão econômica não foi a política do New Deal, mas sim o vigor empreendedor, a proeza em manufatura e a pura ética trabalhista dos americanos na era pós-guerra. É claro que FDR levou a América à luta contra a Alemanha de Hitler e a Itália de Mussolini, mas isso dificilmente prova que ele, FDR, não teve afinidades com o nazismo ou com o fascismo. Por analogia, Martinho Lutero liderou os protestantes em uma luta contra a Igreja Católica, mas a partir disso é possível concluir que Martinho Lutero não teve afinidades com o cristianismo? Pelo contrário, Lutero e seus seguidores eram cristãos devotos, não menos que os católicos. A Reforma foi uma luta intramuros entre dois grupos de cristãos em contenda — uma luta, pode-se dizer, dentro da casa da cristandade. Da mesma maneira, a luta entre as facções xiitas e sunitas dificilmente prova que uma ou outra não seja islâmica. Ambas são islâmicas e, de fato, suas crenças teológicas são praticamente idênticas. A principal diferença

repousa sobre a linha de sucessão de Maomé. No entanto, esta diferença, aparentemente supérflua, não impediu o surgimento de conflitos sangrentos entre as duas facções muçulmanas. E mais outro caso, na Rússia, os conflitos amargos entre leninistas e trotskistas no início do século XX refletiram uma disputa intramuros dentro do mesmo campo ideológico. Como mostram esses exemplos, lutas incessantes e amargas podem surgir entre parentes ideológicos. É o mesmo que acontece entre familiares do mesmo sangue. Assim, também, a luta entre FDR, Hitler e Mussolini foi uma batalha intramuros, uma guerra por poder entre líderes esquerdistas, antes amigáveis uns com os outros, todos de uma ideologia coletivista partilhada. Mas, para melhor entendimento, antes é preciso remover as barreiras visuais do período que sucedeu à Segunda Guerra Mundial, empecilhos postos pela historiografia de esquerda. Faz-se necessário recuperar o mundo de FDR antes da guerra, antes que tudo fosse reduzido a estilhaços e detritos — quero dizer, detritos ideológicos —, varridos progressivamente numa operação de limpeza progressista. Ouçamos aqueles em quem FDR e o seu cérebro confiam e o que os aliados ideológicos realmente disseram a respeito do fascismo e do nazismo; é preciso ouvir também o que os fascistas e nazistas — Mussolini e Hitler inclusos — falaram sobre FDR. Essa investigação produz uma imagem completamente diferente daquela construída por livros didáticos progressistas e pela grande mídia. Antes de embarcar nessa pesquisa, gostaria de visualizar uma das minhas conclusões, respondendo à seguinte pergunta: o progressismo é realmente um meio termo entre o socialismo e o capitalismo? Claro que não, nem mais do que o fascismo. O absurdo total do caminho intermediário, “do meio”, faz parte da grande mentira. Na realidade, o socialismo, o fascismo e o progressismo são três formas semelhantes de esquerdismo — embora não idênticas. Todas as três marcham na mesma direção, longe do capitalismo liberal; logo não há tal coisa como uma via intermediária. Das três vias esquerdistas, uma delas, o socialismo, vem desaparecendo, conquanto ainda galgada, ao menos em teoria, nas principais universidades americanas. Quanto à doutrina fascista, o fascismo formal está morto, contudo demonstrarei neste capítulo que o fascismo continua a permear todo o progressismo americano moderno. A economia progressista é

essencialmente idêntica à fascista; todo o conceito fascista de governo e sua exigência de que o indivíduo sujeite-se ao Estado são a cause célèbre da esquerda americana atual. É algo tão real hoje quanto na década de 1930. A esse respeito, FDR foi quem inventou o fascismo americano, nosso duce, ou führer, ainda que seu caminho tenha sido pavimentado por Woodrow Wilson, seu antecessor proto-fascista. Teço meu argumento expondo as decisões de Wilson e de FDR, permeadas de elementos fascistas, exibindo a admiração mútua, durante a década de 1920 e 1930, entre os americanos progressistas, de um lado, e os fascistas italianos e alemães nazistas, do outro. Ao longo deste processo, devo descortinar as grandes mentiras progressistas. Exemplo é quando o historiador William Leuchtenburg defende que “O Estado Corporativo de Mussolini não enxerga a existência de um seguimento americano”.6 Como mais adiante será exposto, nada poderia estar mais distante da verdade.

Aconteceu Aqui Voltando aos Estados Unidos, vinda de Roma, onde trabalhava de correspondente para o jornal New York Times, Anne McCormick notou algo muito marcante. A atmosfera em Washington dois meses após a posse do presidente Franklin D. Roosevelt (FDR), ela escreveu para o Jornal em 7 de maio de 1933, “é uma estranha reminiscência da Roma nas primeiras semanas após a Marcha dos camisas negras”. McCormick achava aquilo estranho, porém agradável. E mencionou a semelhança não para criticar o então presidente, mas para louvá-lo. Do que ela mais gostou em FDR foi que ele estava agindo feito Mussolini e modelando o Estado do New Deal conforme o fascismo italiano. Em Roma, McCormick ganhou a reputação de ser um dos muitos correspondentes estrangeiros progressistas apaixonados pelo regime de Mussolini. Ela costumava relatar acerca da “solidariedade” que os italianos sentiam pelo “impulso” à ditadura de Mussolini. “É possível perceber”, escreveu algumas semanas após a incursão ao território etíope comandada por Mussolini, “uma manifestação notável — uma nação movendo-se numa espécie de transe —, encantada, convicta de ser invencível em força”. Quanto a McCormick, o historiador John Diggins escreve no livro Mussolini and

Fascism [Mussolini e o Fascismo] que “por quase vinte anos ela carregou um caso de amor político com uma Itália idealizada e por seu nobre líder”. De volta à América, McCormick sentia igual paixão por FDR, cuja administração, escreveu ela, “prevê uma federação de indústria, trabalho e administração pública segundo os moldes do Estado Corporativo tal como existe na Itália”. O Congresso havia aprovado uma legislação que “conferiria ao presidente a autoridade de ditador”. Era “uma espécie de poder unânime de procuradores” em que “todos os demais poderes — indústria, comércio, finanças, trabalho, do fazendeiro ao chefe de família, estado e cidade — praticamente abdicam em seu favor”. O estado de espírito nacional, bem como o de McCormick, era a favor da ditadura. “A América hoje literalmente pede ordem. Ninguém está lá muito incomodado com a ideia de uma ditadura”.7 Ao mesmo tempo, outros na mídia comparavam FDR com o novo líder da Alemanha, Adolf Hitler. Hitler, tal qual FDR, ascendeu ao poder por meio do processo democrático. Claro que até então ele havia se tornado, como Mussolini, um ditador, termo que não tinha o mau cheiro que tem agora. McCormick e outros não hesitaram em chamar FDR de ditador ou mesmo exortá-lo a tornar-se um. Os ditadores eram vistos como figuras resolutas, que de fato faziam as coisas acontecer. Eles alegavam representar a vontade genuína e o espírito de seu povo. A visão da esquerda na Alemanha, na Itália e nos Estados Unidos era a de que sociedades estruturadas funcionariam melhor sob a mão firme de um único líder. “Hitler é a Alemanha e a Alemanha é Hitler”, gostava de dizer Rudolf Hess. Esta era a expressão clássica do que se pode chamar de princípio da infalibilidade da liderança, ou Führerprinzip. Da mesma forma os italianos gostavam de dizer que “Mussolini é a Itália e a Itália é Mussolini”. FDR e os progressistas apreciavam essa forma de pensar. O Führerprizip na Alemanha e seu equivalente na Itália refletiam de perto a própria visão de FDR — ecoada na mídia progressista —, de que FDR é a América e a América é FDR. Esse sentimento por parte de McCormick e outros não era uma visão de outliers, de alguns poucos caprichosos. Pelo contrário, era o sentimento

progressista como um todo e, até certo ponto, a principal linha de pensamento durante a era inicial de FDR. Até mesmo as revistas Saturday Evening Post e Fortune falavam em termos semelhantes. Atente-se à recepção concedida ao extravagante ministro das Forças Aéreas de Mussolini, Italo Balbo, na ocasião em que veio à América, em 1933, para participar da Feira Mundial de Chicago. Balbo havia sido um dos primeiros camisas negras da Itália. Tendo crescido em sua região natal, Ferrara, foi um dos primeiros a aderir ao Partido Fascista e um dos principais organizadores da Marcha sobre Roma. Nada disso impediu que Balbo fosse apresentado na capa da revista Time de 26 de junho de 1933, com um artigo anexo apresentando os triunfos fascistas na tecnologia de aviação como um exemplo ao qual a América poderia seguir. No dia 20 de julho de 1933, o presidente Roosevelt ofereceu um almoço na Casa Branca em honra a Balbo e condecorou-o com a Cruz de Voo Distinto. Balbo disse ao presidente que voltaria para casa, mas FDR o convenceu a ficar mais tempo e fazer um tour por todo o país. De acordo com o New York Times, o “Ministro das Forças Aéreas deixou a Casa Branca com o rosto cheio de sorrisos”. Os assessores de FDR organizaram para Balbo um enorme desfile no centro de Nova Iorque, após o qual discursou sobre as virtudes do regime fascista para 65 mil democratas no complexo Madison Square Garden. Balbo ecoou Mussolini ao dizer: “A existência do sentimento antifascista no exterior é um mito”, um mito “desmascarado pela recepção entusiasta que meu esquadrão aéreo recebeu na América”.8 Enquanto os grandes meios de comunicação progressistas estimulavam o sentimento público em favor do regime de Mussolini, os progressistas das universidades de elite da América cortejavam Adolf Hitler. Sete meses após a queima de livros na Alemanha, em 1933, a Universidade Columbia convidou o embaixador alemão para discursar no câmpus, onde foi introduzido pelo presidente da universidade, Nicholas Murray Butler. Paul Hollander, cientista político, relata que a Universidade Columbia “mantinha relações amigáveis com instituições acadêmicas e representantes da Alemanha nazista”.9 Em 1934, o presidente de Harvard, James Conant, ofereceu um chá em sua

casa para Ernst Hansfstaengl, chefe do Gabinete de Imprensa Nazista sob o Ministério da Propaganda de Joseph Goebbels. Hansfstaengl era amigo íntimo de Hitler e jantava em sua casa com frequência. Hitler gostava de escutar Hansfstaengl interpretando no piano as vibrantes marchas de futebol de Harvard. Ele gostava em especial da parte final com o grito de guerra: “Harvard, Harvard! Rah! Rah! Rah!”. Hitler deu a Hansfstaengl o afetuoso apelido de “Putzi”, cujo filho, Egon, referia-se calorosamente a Hitler como “tio Dolf”. Durante a ascensão de Hitler ao poder, Hansfstaengl ajudou a financiar a publicação do livro Mein Kampf e também a compra do Völkischer Beobachter, que veio a tornar-se o jornal oficial do Partido Nazista. Embora certo rabino de Boston estivesse incitando um protesto de judeus, o periódico estudantil Harvard Crimson repudiava os críticos e ainda pedia que Hansfstaengl, ex-aluno de Harvard, recebesse um diploma honorário “apropriado para sua alta posição” no governo de “uma grande e profunda nação”.10 Naquele mesmo ano, os mais importantes professores, administradores e líderes estudantis de Harvard visitaram o navio de guerra nazista Karlsruhe quando este atracou no porto de Boston, hasteando a bandeira da suástica. O grupo de Harvard também participou de uma recepção de gala em que o capitão do navio de guerra tecia elogios a Hitler. Em 1936, Harvard enviou uma delegação acadêmica para comemorar o aniversário da Universidade de Heidelberg. O evento foi boicotado pelas universidades britânicas por ser altamente politizado, no sentido de apresentar o nazismo de forma positiva. Presentes, misturando-se com a delegação de Harvard, estavam o teórico nazista Alfred Rosenberg, o ministro da Propaganda, Joseph Goebbels e o líder da SS, Heinrich Himmler.11 Na frente cultural, outro admirador de FDR, o compositor Cole Porter, compôs uma melodia cativante em 1934 com a seguinte letra: “Você é o maior! Você é o grande Houdini! Você é o maior! Você é Mussolini”. Não é assim que a música é cantada hoje, pois Porter mais tarde viria a mudar a letra, quando os progressistas perceberam que lhes seria embaraçoso, assim como seria para qualquer um na América, ter ligações com Mussolini. Daí Cole Porter associou-se à grande mentira. Suas letras originais, junto das

obras de McCormick, do circuito percorrido por Balbo e da conexão Harvard-Hitler, têm, como consequência dos esforços progressistas, simplesmente desaparecido na neblina da História.

O Proto-Fascista Embora este capítulo concentre-se em FDR — nosso führer norteamericano não reconhecido —, a história estaria incompleta sem começar com o presidente progressista que o precedeu quase duas décadas, Woodrow Wilson. FDR, lembre-se disso, era o secretário da Marinha na administração de Wilson, mas durante o mandato e os anos subsequentes jamais discordou publicamente de qualquer ação de Wilson descrita aqui. Na verdade, FDR e sua equipe falaram abertamente do New Deal como continuação das políticas de Wilson. Conforme mostro, esse foi um caso do proto-fascismo de Wilson, caso esse maturado no fascismo mais desenvolvido da era FDR. Wilson, é claro, precedeu Mussolini e Hitler. É por isso que eu o chamo de proto-fascista. Não digo que ele teria sido fã do verdadeiro fascismo, mas que foi um precursor, visto que seu regime revela tensões fascistas mesmo antes de haver um nome oficial a descrevê-las. Para entender o proto-fascismo, considere o debate acadêmico que discute se o filósofo Nietzsche era ou não proto-fascista. Nietzsche morreu na década de 1880, então, obviamente, não existe associação direta entre ele e o fascismo. Estivesse vivo na época, provavelmente teria ficado horrorizado com Hitler e Mussolini. Nietzsche detestava o nacionalismo alemão nem era ele antissemita. Por outro lado, Nietzsche foi um dos pensadores favoritos de Mussolini, que, em sua época, disse “A ambição por poder na Europa é representada unicamente pelo fascismo”. Hitler visitou os arquivos de Nietzsche em Weimar e lá, desejoso de expôr o entusiasmo que tinha pelo filósofo, foi fotografado por seu fotógrafo pessoal, Heinrich Hoffman. Hitler também enviou a Mussolini uma edição, até então recente, das obras completas de Nietzsche, com dedicatória autografada. Esse passou a ser um dos bens mais preciosos de Mussolini. Se Nietzsche rejeitava explicitamente o nacionalismo e o antissemitismo, o que é que havia nele para despertar tamanho interesse nesses homens? Nietzsche falava em termos de criar não apenas um übermensch, ou super-

homem, mas uma raça de super-homens, uma raça superior para governar o mundo. Nietzsche também falava do untermenschen, os povos inferiores que deveriam ser eliminados ou exterminados por meio da guerra ou da eugenia numa inevitável luta por poder. Assim fica fácil entender por que tais ideias eram apelativas a Hitler. Livre das restrições morais do cristianismo — as quais Hitler e Mussolini também criticavam —, Nietzsche deleitava-se ao pensar em povos, que ele então considerava inferiores, sendo apagados da terra. “Que venha uma tempestade”, ele escreve em Vontade de Potência, “e derrube da árvore esta fruta podre e devorada por vermes”. Mais uma vez, vislumbre os nazistas e os camisas negras vibrando. E logo, cortesia de Hitler e Mussolini, a tempestade chegou. Por isso, posso entender por que Hitler e Mussolini apreciavam Nietzsche; e, qualificando-o adequadamente, eu o considero proto-fascista.12 Da mesma forma era Wilson. O que ele, um discípulo de Hegel, mais gostava no filósofo alemão era a apoteose hegeliana de um Estado todopoderoso. Tendo estudado sob mentores alemães, o modelo de governo de Wilson foi extraído da experiência militarista da Prússia de Bismarck. Wilson ridicularizava os Pais Fundadores — primeiro presidente americano a fazê-lo —, chamando suas ideias sobre direitos individuais, poder descentralizado e freios e contrapesos de simplórias e obsoletas. Wilson preferia um modelo de poder centralizado com ele próprio no leme e toda a sociedade em obediência inerte a ditames do esquerdismo progressista. Como Giovanni Gentile reconheceria ser este, mesmo sem ainda ser chamado pelo nome, o significado essencial do fascismo. É certo que dar a Wilson o título de proto-fascista soará absurdo àqueles que, criados sob a fúria progressista, aprenderam que Wilson é um campeão da democracia global e defensor do direito à autodeterminação a todos. Com efeito, Wilson teve a chance de promover ambos, mas, no fim das contas, não fomentou nenhum. Houvesse lutado ativamente pela autodeterminação da Alemanha logo após a Primeira Guerra Mundial, Wilson poderia ter impedido a Segunda Guerra. Uma das queixas mais amargas de Hitler — atingindo acorde ressonante com seus companheiros alemães — era a de que seu país jamais teria buscado

a paz na Primeira Guerra se soubesse que seria quase que completamente privado de seus direitos à autonomia e à autodeterminação. A maioria dos historiadores reconhece que termos mais sensatos do que os que foram impostos à Alemanha em Versalhes poderiam ter impedido a ascensão de Hitler ao poder, assim prevenindo uma Segunda Guerra Mundial. Wilson poderia ter insistido e logrado êxito, mas não o fez. Portanto, atenue-se o disparate retórico de Wilson diante da realidade histórica. Não cabe concentrar-se apenas no que Wilson disse, mas em duas coisas que ele fez. Primeiro, não só nos moldes fascistas, mas também nos do nacional-socialismo, Wilson pôs em prática políticas racistas sobre todo o governo federal e ajudou a reviver a inativa organização terrorista e racista, Ku Klux Klan. Em segundo lugar, Wilson suprimiu as liberdades civis dos americanos de uma maneira nunca antes vista; seria necessário ir à Itália de Mussolini e à Alemanha nazista para encontrar comparações mais próximas. Os progressistas estão conscientes disso e, com tanto, confessam profunda confusão. Escrevendo no Christian Science Monitor, Randy Dotinga enumera “5 fatos surpreendentes” acerca de Wilson, um dos quais que ele era “atrasado e intolerante quando se tratava de raça”. Dado o progressismo de Wilson, Dotinga acredita ser esta “a maior contradição de todas”. Aqui, Dotinga, um jornalista, ecoa historiadores como Arthur Link, editor dos artigos de Wilson, e John Milton Cooper, que exercia posição semelhante sobre o então presidente. Cooper, por exemplo, classifica o comportamento intolerante e tirânico de Wilson de “intrigante”, um “mistério”, perguntandose como “uma pessoa tão arguta e cheia de ideias como Wilson deixou isso acontecer”.13 A essa altura, espero que meus leitores estejam sorrindo, percebendo o território da grande mentira em que estamos pisando. A mentira está na pretensão de que existe algo estranho ou anômalo em relação a um progressista como Wilson ser racista, supressor das liberdades constitucionais e proto-fascista. O objetivo deste livro está em demonstrar que esse é o curso previsível, se não inevitável, do progressismo e da esquerda. Wilson, óbvio dizer, era racista, como a maioria de seus antecessores democratas desde Andrew Jackson. E, é claro, ele estava envolvido em supressões das liberdades individuais aos moldes fascistas; é assim que os coletivistas de

todos os tipos costumam proceder uma vez que assumem o poder. O racismo de Wilson pode ser destacado pelo cumprimento da segregação em todo o governo federal. Muitos não percebem que, embora as legislaturas estaduais dominadas pelo Partido Democrata tenham difundido a segregação por toda a região do Sul, o governo federal de Washington, D.C. não havia se segregado desde o fim da Guerra Civil. Wilson então reverte a situação e institui a segregação em basicamente todas as divisões do governo federal. As ações de Wilson foram amargamente protestadas pelo principal portavoz da América negra, Booker T. Washington, que era republicano. Quando um grupo de líderes negros, incluindo a jornalista republicana Ida B. Wells, confrontou Wilson, ele disse que deveriam agradecer-lhe, afinal a segregação era, em grande parte, para o benefício dos negros. Wilson era, como Chris Myers Asch escreve no Washington Post, um “supremacista branco descarado”.14 Seus aliados mais próximos no Congresso eram democratas, e ainda mais racistas do que o próprio Wilson. Quando a questão sobre os Estados Unidos juntarem-se à Sociedade das Nações chegou ao Congresso, James Reed, senador democrata, irrompeu: “Imagine submeter questões envolvendo a própria vida dos Estados Unidos a um tribunal em que se senta um negro da Libéria, um negro de Honduras, um negro da Índia”.15 Como bom internacionalista e progressista, Wilson era, é claro, a favor da Sociedade das Nações, mas também impediu que posturas racistas fossem sentenciadas no Tratado de Versalhes e nunca pronunciou nem ao menos uma palavra condenatória sobre a violência retórica racial contra negros e outras minorias por parte de seus companheiros progressistas. Wilson também ajudou a reviver a Ku Klux Klan. Curiosamente, esse foi o resultado de uma única exibição do filme The Birth of a Nation [O Nascimento de uma Nação], de David W. Griffith, que retrata a Ku Klux Klan como a salvadora do Sul. Apesar da tecnologia restrita da época, o filme agora é reconhecido como uma obra-prima cinematográfica. Eu o considero como um dos filmes de propaganda mais poderosos já produzidos. A esse respeito, ele prenunciou os brilhantes filmes de propaganda de Leni Riefenstahl, Victory of Faith [Vitória da Fé] e Triumph of the Will [Triunfo

da Vontade], ambos retratando Hitler como o salvador da Alemanha. A pedido de Griffith, Wilson fez com que o filme The Birth of a Nation fosse exibido na Casa Branca, com o seu gabinete e outros amigos de influência presentes. Após a exibição, de acordo com Griffith, Wilson descreveu o filme como “terrivelmente verdadeiro” e “é como escrever a História com raios”. Já hoje alguns progressistas questionam se Wilson realmente disse isso, pois não há corroboração suficiente em seus arquivos. Contudo, também não há motivo para duvidar da veracidade de Griffith nesse ponto. Imediatamente após a exibição, houve um reavivamento da Klan por todo o país, o que testemunhou tanto o poder do filme quanto do evidente endosso de Wilson. Anteriormente, a KKK estava sobretudo no Sul democrata; depois, então, de acordo com o historiador David Chalmers, a KKK espalhou-se do “estado de Maine ao da Califórnia”. De repente, havia ramificações da KKK em Oregon, Colorado, Wisconsin, Ohio, Pensilvânia e Nova Jersey.16 Com isso não quero dizer que era esse o desejo de Wilson, mas a maioria dos historiadores concorda que a exibição do filme na Casa Branca conferiu à Ku Klux Klan nova legitimidade e popularidade. Durante a Primeira Guerra Mundial, Wilson criou um Ministério da Propaganda, servindo de precursor a ministérios similares criados por Mussolini e Hitler. Quanto ao assédio e à intimidação da imprensa e da oposição política que precisou enfrentar, Jonah Goldberg escreve que a operação de Wilson foi mais efetiva — em outras palavras, implacável — do que a de Mussolini. Os capangas de Wilson até viraram seu veneno contra cidadãos comuns, encorajando crianças a espionar seus pais e vizinhos, e vizinhos a espionar outros vizinhos. Eles incentivavam vigilantes a ameaçar e até espancar inconformistas ideológicos. Numa frase que facilmente poderia ter sido dita por Hitler ou Mussolini, Wilson insistia que “a conformidade será a única virtude e qualquer homem que se recuse a conformar-se terá de pagar o preço”. É difícil imaginar um sentimento mais intolerante. Em consonância, a administração de Wilson reprimiu de forma geral as liberdades civis, posturas

que fariam com que o macartismo da década de 1950 parecesse brincadeira de criança; em essência, qualquer crítica ao governo, até mesmo proferida em particular a um amigo, poderia levar a pessoa para a cadeia. E, de fato, dezenas de milhares de americanos foram detidos e presos sob as famosas Palmer Raids. Goldberg escreve: “Mais pessoas foram detidas ou encarceradas em alguns poucos anos sob o governo de Wilson do que sob Mussolini durante toda a década de 1920”. Goldberg conclui que, durante a Primeira Guerra Mundial sob Woodrow Wilson, “a América tornou-se um país fascista”.17

Olhando para Mussolini Se Wilson pode ser considerado o proto-führer dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt tornou-se, ao menos por certo tempo, o real führer da América. Tal terminologia não é originária minha, mas quem a cunhou foi simplesmente o principal jornal da Alemanha, Frankfurter Zeitung, em um artigo que comparava FDR com Hitler. O termo führer não significa nada mais do que “líder” ou “líder supremo”, e o Frankfurther Zeitung não usou o termo com intuito de insultar. Apesar de crítico das políticas de Hitler até ser finalmente forçado à complacência, o jornal elogiava o estilo de liderança do führer alemão. A publicação, ao referir-se a FDR como führer americano, tinha por intenção o elogio. Pretendo vindicar esse termo como aplicado a FDR mediante uma demonstração de duas partes. Nesta seção, examino o entusiasmo de FDR por Mussolini, não algo exclusivo a ele em si, mas que representava um maior movimento de progressistas americanos que olhavam para o fascismo italiano como modelo para a América. Alguns da esquerda chegaram a buscar em Hitler o conceito de liderança. E o entusiasmo foi recíproco: tanto Hitler quanto Mussolini elogiaram FDR e viram no New Deal progressista uma realização, pelo menos parcial, dos ideais do fascismo e do nacionalsocialismo. Convém dar uma espiada pela fechadura dessa sociedade de admiração mútua. Menciono, desde o início, que FDR, pessoalmente, não tinha nenhuma simpatia por Hitler. Mas ele a tinha por Mussolini. Em carta ao jornalista

John Lawrence, admirador de Mussolini, FDR confessou: “Não me importo em dizer, com confiança, que venho mantendo um contato bastante próximo com esse admirável cavalheiro italiano”. Em junho de 1933, FDR escreveu a seu embaixador italiano, Breckinridge Long — outro admirador de Mussolini —, referindo-se ao déspota fascista: “Não há dúvida de que ele realmente se interessa pelo que estamos fazendo. Grande é meu interesse e estou profundamente impressionado com o que ele realizou e com seu propósito evidentemente honesto de restaurar a Itália”.18 Do ponto de vista de FDR, Mussolini teve um início precoce na expansão do poder do Estado, iniciando da maneira como o próprio FDR pretendia começar. A Itália sob Il Duce parecia ter avançado mais adiante na estrada progressista do que a América. Então FDR pediu aos líderes de seu brain trust, grupo de conselheiros especialistas, que visitassem a Itália e estudassem as políticas fascistas de Mussolini, de modo a descobrir quais delas poderiam ser integradas ao New Deal. FDR também enviou três integrantes do seu Comitê de Gestão Administrativa à Roma para examinar a estrutura administrativa e organizacional do governo ditatorial de Mussolini. Novamente, com o objetivo de reorganizar a própria gestão de FDR. Rexford Tugwell, um dos conselheiros mais próximos de FDR, retornou da Itália notando que “é certo afirmar que as mesmas pessoas que se opõem a Mussolini são as mesmas que também se opõem a FDR”. Mesmo assim, “ele parece ter feito enorme progresso”. Tugwell ficou especialmente impressionado ao ver como os fascistas italianos conseguiram superar a oposição política, da imprensa e concretizar o que tinha de ser feito. Ele cita favoravelmente a Carta del Lavoro, documento do fascismo italiano produzido em 1927, que, aparentemente, impressionou-o muito mais do que a Constituição americana. O fascismo, ele conclui, “é o pedaço de maquinaria social mais limpo, mais organizado e eficiente que já vi. É algo de me dar inveja”.19 Essa devoção bajuladora ao fascismo, por mais repulsiva que aparente ser nos dias de hoje, naquela época era característica, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, ao sentimento que líderes esquerdistas tinham por Mussolini. Na Inglaterra, George Bernard Shaw, socialista fabiano, louvou Mussolini pelo cumprimento de ideais socialistas. Em 1932, H. G. Wells, romancista

utópico e esquerdista, rogou por um “fascismo liberal” para o Ocidente, enfatizando a necessidade de “nazistas esclarecidos”. Encontraríamos, na Alemanha e na França, hinos semelhantes aos do fascismo italiano compostos por progressistas.20 A esquerda americana, no entanto, estava ainda mais consagrada ao fascismo italiano do que a esquerda europeia. Ida Tarbell, jornalista de esquerda, entrevistou Mussolini, em 1926, para a revista McCall, e retornou cheia de louvores e elogios. Muckraker Lincoln Steffens, notório em apoio à União Soviética, mais conhecido por ter dito dela “Eu vi o futuro e ele funciona”, também elogiou Mussolini por sua simpatia com a esquerda, dizendo com entusiasmo que “Deus formou Mussolini da costela da Itália”. Steffens não demonstrava preocupação diante da privação das liberdades civis que o fascismo impunha, afirmando que a verdadeira liberdade seria “uma medida do nosso senso de segurança”. Durante a Grande Depressão, FDR disse aos americanos que eles não tinham “nada que temer, exceto o próprio medo”. Do mesmo modo Steffens, considerando Mussolini alguém que tentava abolir o medo.21 Horace Kallen, escritor progressista, um dos primeiros defensores do multiculturalismo, disse que era um “grande erro” julgar o fascismo como meramente tirânico, observando que era, na justiça social, “não muito diferente da revolução comunista”. Ambos os sistemas, disse ele, deram aos cidadãos um senso de unidade; seria, assim, dever nosso abordá-los com paciência e julgá-los apenas por seus resultados. Para Charles Beard, historiador progressista — conhecido por atacar os Pais Fundadores, chamando-os de capitalistas egoístas e territoriais —, a mão pesada de Mussolini era uma de suas características positivas. Beard admirava o ditador fascista por causar, “pela força do Estado, a organização mais compacta e unificada de capitalistas e trabalhadores que o mundo já viu”.22 Herbert Croly, editor da revista New Republic, parabenizou Mussolini por “despertar em toda uma nação o crescimento da energia moral” e subordinar os cidadãos “a um propósito comum profundamente vivenciado”. Outro editor da New Republic, George Soule, prestou louvores ao New Deal por ter-se enamorado das políticas de Mussolini: “Estamos experimentando a economia do fascismo”. Essa emblemática revista do progressismo

americano louvou o regime de Mussolini durante a década de 1920, chegando a publicar artigos de intelectuais fascistas como Giuseppe Prezzolini, que escreveu que o verdadeiro socialismo seria tornado real não na Rússia pelos bolcheviques, mas na Itália pelos camisas negras.23 Em 1934, William Pepperell, economista de esquerda, viajou de suas instalações na Universidade Columbia para o Congresso Internacional de Filosofia em Praga, onde descreveu o New Deal sob a bandeira do “Fascismo Fabiano”, considerado por William um híbrido criativo do socialismo com o fascismo. Alguns anos mais tarde, em 1938, em visita ao governador Philip La Follette, certo jornalista descobriu que esse fundador do Partido Progressista de Wisconsin tinha duas fotografias emolduradas em seu escritório: uma de Louis Brandeis, juiz da Suprema Corte, e outra de Benito Mussolini. La Follette admitiu que esses eram seus dois heróis pessoais.24 Alguns da esquerda foram ainda mais longe e elogiaram o nazismo. A escritora Gertrude Stein insistiu, em 1937, que o candidato mais digno ao Prêmio Nobel da Paz era Adolf Hitler. Lawrence Dennis, diplomata de Relações Internacionais e autor, exaltava o nazismo por produzir “uma fórmula de solidariedade nacional dentro dos laços espirituais e da disciplina de ferro em que a elite e as massas, de qualquer nação que seja […] possam cooperar para o bem comum”. Dennis pediu que os americanos abraçassem o fascismo, reconhecendo que este poderia parecer muito diferente na América se comparado com o da Itália ou da Alemanha. Em 1936, Dennis participou do Congresso do Partido de Nuremberg, onde compartilhou seus entusiasmos com o ideólogo nazista Alfred Rosenberg e com outro aliado já há tempos de Hitler, Rudolf Hess.25 W.E.B. Du Bois, intelectual progressista afro-americano, disse que a ditadura de Hitler era “absolutamente necessária à ordem do Estado”. Hitler, diz Du Bois, “mostrou uma saída para a Alemanha” ao fazer de seu país um “conteúdo e um todo próspero”. Em 1937, ele escreveu: “Atualmente, em alguns aspectos, há mais democracia na Alemanha do que houve nos anos passados”. Du Bois inclusive contrastou o racismo americano, considerado por ele irracional, com o antissemitismo nazista, segundo ele uma estrutura baseada no “preconceito arrazoado ou no temor financeiro”.26

Com Elogios de Hitler Até agora, vimos o que a esquerda americana, dentro e fora da administração de FDR, pensava dos fascistas e dos nazistas. Mas o que os fascistas e os nazistas pensavam deles? Começo com a análise de Mussolini do livro de FDR, Looking Forward. Mussolini notou que o livro consistia num bom repúdio ao liberalismo clássico. O New Deal, acrescentou ele, era “ousadamente intervencionista no campo da economia” com base na ideia de que “o Estado não mais deixa a economia aos seus próprios artifícios” e que, a esse respeito, as políticas de FDR “relembram o fascismo”. Consequentemente, a tentativa de FDR de fazer com que toda a economia funcionasse para o bem comum, comentou Mussolini, “pode lembrar as bases do corporativismo fascista”. Na verdade, toda a abordagem de FDR “assemelha-se à do fascismo”.27 FDR tinha contato com Mussolini antes mesmo de assumir a presidência. Por sua vez, Mussolini a princípio voltava-se muito mais a FDR do que a Hitler. Na verdade, a imprensa italiana, bem como a mídia americana, costumava comparar Mussolini a FDR. Quando visitou Mussolini, em 1926, o jornalista Irving Cobb disse: “Sabe como muitos americanos chamam Vossa Excelência? De Roosevelt italiano”. Mussolini ficou emocionado. “Com isso”, respondeu, “fico muito feliz e orgulhoso. Pois muito admiro Roosevelt”. Mussolini cerrou os punhos. “Roosevelt teve força — teve a coragem de fazer o que viu ser necessário”.28 Nesse momento, Mussolini está elogiando FDR basicamente por ser, tal qual ele próprio, um forte homem político. Na Alemanha, a imprensa nazista também tinha coisas positivas a dizer a respeito de FDR. No livro Hitler’s American Model — obra já mencionada anteriormente —, o jurista e progressista James Whitman constata “o estranho fato de os nazistas frequentemente elogiarem Franklin D. Roosevelt e o governo do New Deal no início dos anos 1930”. Um alerta da grande mentira! Na verdade, esse fato é meramente chamado “estranho” porque estudiosos como Whitman têm camuflado as afinidades ideológicas entre a esquerda americana e os nazistas. Portanto, descarte a falsa perplexidade de Whitman. Ainda mais interessante é a documentação que ele faz de hinos entusiastas louvando FDR, publicados na revista à juventude de Hitler, Will

and Power [Vontade e Poder], além de fotografias retratando um heroísmo de FDR na Berlin Illustrated Magazine [Revista Ilustrada de Berlim], revista controlada pelos nazistas, acompanhadas de um artigo sobre “O New Deal fascista”.29 Em 11 de maio de 1933, o jornal do Partido Nazista, Volkischer Beobachter, em artigo intitulado “As Medidas de Roosevelt para a Retomada Ditatorial”, elogiou FDR por “realizar experimentos audaciosos. Nós, também, tememos diante da mera possibilidade de falha. Nós, também, como nacional-socialistas que somos, estamos olhando para a América”. Analisando favoravelmente o livro de FDR, o jornal Völkischer Beobachter concluiu que, mantendo uma “aparência fictícia de democracia”, na realidade o “curso político fundamental de FDR [...] é completamente modulado por um forte nacional-socialismo”. Em 21 de junho de 1934, o mesmo jornal comentou: “Roosevelt adota tendências nacional-socialistas em suas políticas socioeconômicas” e comparou seu estilo de liderança com o próprio Führerprinzip ditatorial de Hitler.30 Hitler mesmo disse a um correspondente do New York Times que via FDR trilhando o mesmo caminho que o dele. “Tenho simpatia pelo Sr. Roosevelt”, disse Hitler, “pois ele marcha em direção aos próprios objetivos acima do Congresso, acima da influência de poderes e da burocracia”. Hitler, bem como Mussolini, via em FDR um companheiro ditador. Hitler acrescenta que era o único líder na Europa que “compreendia genuinamente os métodos e motivações do presidente Roosevelt”.31 Hitler comentou com William Dodd, embaixador dos Estados Unidos na Alemanha, que o fato de FDR insistir para que os cidadãos americanos colocassem o bem comum acima do próprio bem pessoal “era a quintessência da filosofia também do Estado alemão, o qual encontra sua força de ser no lema ‘O Bem Público Transcende o Interesse do Indivíduo’”. Mesmo em 1938, o sucessor de Dodd, Hugh Wilson, informou a FDR que Hitler continuava seu fã: “Hitler disse ter observado com interesse os métodos que você, Senhor Presidente, tenta adotar para os Estados Unidos ao enfrentar alguns dos mesmos problemas que ele enfrentou quando assumiu o cargo”.32

Ecco Un Ditatore! Por fim, demonstro como FDR chegou assustadoramente perto de tornar-se um ditador fascista durante seu longo mandato no governo, de 1932 a 1945. Se não um déspota em maior escala, FDR chegou perto mais do que qualquer outra pessoa na história dos EUA. A essa altura do livro, já antevejo a indignação que isso provocará na esquerda. Mas é também hora de, calmamente, ignorá-la. A indignação em si é uma tática para proteger a grande mentira. “Como você pode dizer isso?” e “Como você ousa?”. Ouso, porque é verdade. Analisados há pouco, os fascistas italianos e até mesmo os nazistas reconheceram as tendências ditatoriais de FDR e também a consanguinidade ideológica que havia entre as políticas dos três. Herbert Hoover, antecessor republicano de FDR, percebeu paralelos bastante íntimos entre o New Deal e o fascismo. O socialista Norman Thomas, do outro extremo político, percebeu o mesmo. E, em 1933, o colunista mais respeitado da América, Walter Lippmann, disse a FDR que ele não tinha “nenhuma alternativa, senão assumir poderes ditatoriais”.33 Portanto, não estou falando invencionices; FDR foi amplamente considerado um ditador fascista, ou futuro ditador, por muitos de seus contemporâneos. Não digo que era o caso de um ditador aos moldes de Hitler, afinal FDR nunca teve o aquele mesmo poder absoluto nem, é claro, matou seus oponentes, nem enviou judeus a câmaras de gás, nem iniciou uma guerra mundial. Então, ao retratá-lo na posição de führer americano, quero dizer que FDR era führer da maneira americana, e não do jeito alemão. Melhor comparação pode ser feita entre FDR e Mussolini; ambos se julgavam uma espécie de comandante da nação, superando as restrições da democracia enquanto ainda funcionavam dentro das limitações políticas impostas por seus respectivos sistemas. Os poderes legais de FDR permaneceram abaixo dos de Mussolini; e não por ele ter “se contido”, mas, pelo contrário, por ter sido constrangido pelo sistema constitucional dos Estados Unidos, que impediu esse perigoso homem de trazer o fascismo na íntegra à América. Considere uma das principais iniciativas de FDR, peça central do New Deal: a National Recovery Act [Lei de Recuperação da Indústria Nacional

(LRIN)]. Em essência, a lei sentenciou à morte o livre mercado nos Estados Unidos. Acontece que essa lei dava ao governo federal a força para criar alianças trabalhistas e de gestão em cada indústria, a fim de estabelecer objetivos de produção, de salário, de precificação e até mesmo de horas mínimas e máximas trabalhadas. Eram acordos que seriam analisados por um Conselho Consultivo da Indústria gerido pelo governo, que daria satisfação ao próprio FDR. Além disso, a legislação da LRIN aumentou os impostos sobre o rendimento, sobre as empresas e expandiu o eminente poder de domínio do governo usado para confiscar terras privadas e transferi-las ao uso público. De acordo com o conselheiro de FDR, Rexford Tugwell, a LRIN foi projetada para “eliminar a anarquia do sistema competitivo”.34 Jamais havia se contemplado — e muito menos decretado — uma intervenção governamental na economia dos EUA nessa escala. Na época, a LRIN era amplamente reconhecida em todo o espectro político como um projeto fascista. Escrevendo para a revista North American Review, Roger Shaw, escritor progressista, afirmou que a LRIN era “uma nítida adaptação americana do Estado Corporativo italiano”. Victor F. Calverton, escritor marxista, destacou esse mesmo ponto escrevendo para o periódico Modern Monthly: “A LRIN tem feito parte do trabalho que o fascismo europeu se propôs a executar”. E o próprio secretário do Interior de FDR, Harold Ickes, admitiu: “O que estamos fazendo neste país é, em certa medida, o mesmo que está sendo feito na Rússia e até mesmo na Alemanha de Hitler”. Mussolini mesmo, ao ouvir falar da LRIN, fez um único e intenso comentário,“Ecco un ditatore!”, que significa “Eis um ditador!”.35 O homem que FDR escolheu para gerir a LRIN, o General Hugh Johnson, era ele fascista, um que tinha prazer de associar-se àquilo que ele chamou de “o brilhante nome” de Mussolini. Johnson carregava consigo um exemplar do pequeno livro-propaganda The Structure of the Corporate State [A Estrutura do Estado Corporativo], escrito em italiano por um dos acólitos do Il Duce, Raffaello Vigone, e traduzido para o inglês pela União Britânica de Fascistas, partido fundado por Oswald Mosley, em 1933. Johnson gostava de citar especialmente as seções sobre como o fascismo passava por cima do aparato confuso da democracia em direção à plena autoridade do Estado centralizado. Sob Johnson, a LRIN publicou um panfleto, Capitalism and Labor Under

Fascism [O Capitalismo e o Labor sob o Fascismo], que admitiu: “os princípios fascistas são muito semelhantes aos que estavam em evolução na América”.36 Para o desgosto de FDR, sua LRIN foi derrubada pela Suprema Corte em decisão histórica no caso Schechter Poultry Corp vs Estados Unidos, em março de 1935. Outras iniciativas do New Deal também foram transtornadas. A Suprema Corte estava inquieta com a forma como FDR procurou passar por cima dos direitos da propriedade privada e contratuais. Tais direitos — que podem ser vistos sob a cobertura da liberdade econômica —, desde os Pais Fundadores, são considerados tão basilares quanto outros direitos fundamentais, como os direitos à liberdade de expressão, de religião e de assembleia. Atuando em seu papel de protetor dos direitos das minorias — parte do nosso sistema de freios e contrapesos —, a Suprema Corte barrou FDR de reverter 150 anos de liberdade econômica. Daí o que FDR fez? Em 1937, ele apresentou a Lei de Reforma do Processo Judiciário, um infame projeto que ficou mais conhecido por “aparelhamento do judiciário” [Court Packing]. Basicamente, FDR ameaçou aumentar o número de juízes da Suprema Corte, de nove para até quinze. Isso lhe daria a chance de nomear até seis juízes a mais, dando-lhe uma grande maioria. A mentalidade por trás disso pode ser vista no que o principal assessor de FDR, Harry Hopkins, disse a uma audiência de ativistas do New Deal em Nova Iorque. “Desejo garantir”, disse ele, “que teremos advogados que declararão legal tudo aquilo que vocês quiserem fazer”. Essa foi a abordagem de FDR: se quer fazer algo, diga estar de acordo com a lei; e, se a Suprema Corte discordar, expanda-a. É perceptível o clássico desprezo do fascismo pelo papel distintivo da Suprema Corte como fiscal dos direitos das minorias em um sistema de equilíbrio. Em pânico, a Suprema Corte fez uma rápida mudança e cedeu a FDR, um movimento que os progressistas chamaram, um tanto quanto maliciosamente, de the switch in time that saved nine, isto é, “porque o tempo mudaram, nove se salvaram”. Esse pequeno gracejo foi cunhado para desviar a atenção da enormidade daquilo que FDR fez, que basicamente ameaçava destruir nosso Sistema Constitucional, a menos que obtivesse o que queria — e assim ele conseguiu o que queria. As ações de FDR aqui — na tênue penumbra entre o

legal e o ilegal — são diretamente comparáveis ao que era feito na Alemanha nazista e na Itália fascista, táticas de intimidação usadas para forçar o judiciário à conformidade. A rendição da Suprema Corte significou, em substância, o fim da liberdade econômica como direito constitucional. Não, FDR não conseguiu reviver a LRIN naquele momento, e ter violado os direitos de propriedade e contratuais, por meio dos vários programas do New Deal, foi uma atitude relativamente modesta. Em essência, FDR nos deu o Estado do Bem-Estar Social, e não pense que com isso eu que o denomino um conceito fascista por si só. O Estado do Bem-Estar Social na Alemanha, por exemplo, originou-se do progressismo moderado e conservador de Otto von Bismarck e antecedeu o fascismo em mais de meio século. No entanto, não esqueça que foi a esquerda — os socialistas, os fascistas e os progressistas — que vastamente aprofundaram o Estado do Bem-Estar Social. Meu objetivo aqui, entretanto, é dizer que FDR estabeleceu as bases para que futuras administrações progressistas minassem continuamente a liberdade econômica. O Governo Leviatã que temos agora não se deve totalmente ao que FDR fez, mas ele quem o iniciou. Antes dele, tínhamos liberdade econômica como direito constitucional. Depois dele, não mais. O principal impulso da economia fascista envolve a expansão do poder estatal centralizado à custa dos direitos individuais e da liberdade da esfera privada. Assim, nesse sentido, as ações de FDR, com a destruição da liberdade econômica, são fascistas. Ainda que intimidasse a Suprema Corte, FDR não precisava intimidar o Poder Legislativo, já que o seu partido, o Partido Democrata, controlava o Congresso. FDR convenceu seus aliados democratas à passada do controle praticamente absoluto sobre uma grande área da economia nacional. Em substância, FDR já não mais tinha de consultar o Congresso e poderia prosseguir por iniciativa própria em grandes áreas das tomadas de decisão. Com efeito, invocando os gritos de “emergência econômica” durante a Grande Depressão e depois de “emergência nacional” durante a Segunda Guerra Mundial, FDR pôde assumir poderes quase ditatoriais. Da mesma forma Mussolini, que subverteu o Poder Legislativo e convenceu seu Parlamento, flexível e maleável, a entregar-lhe o poder. O

Parlamento italiano não precisava nem mesmo congregar durante o reinado de Mussolini, pois ele, na prática, tomava quase todas as decisões. Assim também Hitler, que na vigília do incêndio do Reichstag, em 1933, convenceu o Parlamento alemão a aprovar a Lei de Concessão de Plenos Poderes, que lhe confiava a autoridade legislativa, tornando-o, portanto, de forma aparentemente legal, o supremo governante da Alemanha nazista. Tal como FDR, esses ditadores fascistas não apenas derrubaram o sistema, mas, mais que isso, persuadiram-no e pressionaram-no a dar-lhes uma autoridade essencialmente absoluta. Como FDR lançou mão de tamanha autoridade? Mais uma vez, aos moldes do clássico despotismo fascista, ele a usou para intimidar empresas privadas e cidadãos comuns à submissão diante de suas iniciativas estatais. O exemplo mais evidente foi o programa Blue Eagle de FDR, simbolizado pela imagem de uma águia azul. Hoje em dia, ninguém reconheceria esse símbolo, cuidadosamente pulverizado da História pelos progressistas. Mas, na época, era o símbolo mais reconhecido na América, amplamente comparado ao símbolo da suástica da Alemanha nazista. O objetivo do programa Blue Eagle consistia em forçar as empresas à submissão “voluntária” às iniciativas de FDR. As empresas que se submetiam penduravam o símbolo da Águia Azul em suas lojas ou o exibiam mediante publicidade corporativa. O governo ativamente estimulava o público a comprar apenas das lojas Blue Eagle e a boicotar as empresas que não exibiam o símbolo. Os capangas de FDR organizavam manifestações do estilo de Nuremberg para chicotear o público em um frenesi contra aqueles que se decidissem contra a submissão ao Blue Eagle. Novamente, essa era precisamente a função do símbolo da suástica: juntamente da saudação “Heil Hitler!”, servia para notificar a conformidade com as políticas do regime nazista. O historiador Aryeh Unger tem um termo direto para isso; ele o chama de “compulsão voluntária”. Certo admirador alemão de Hitler na década de 1930 a isso deu o nome de “trabalhar para o Führer”.37 Todos prestavam lealdade orientando suas ações em função de Hitler, entrando nos eixos com ele. FDR empregou precisamente a mesma compulsão voluntária para que todo o país trabalhasse em função do führer americano.

Como Hitler e Mussolini, FDR estabeleceu uma máquina de propaganda maciça dentro do governo e, ao mesmo tempo, procurou restringir a liberdade da imprensa. Na Alemanha, os jornalistas eram praticamente obrigados a fazer união com o Ministério da Propaganda. Do mesmo modo a Itália, que dispunha de seu Sindicato Nacional Fascista de Jornalistas ao qual era preciso pertencer para ser um jornalista de “boa reputação”. A abordagem de FDR foi apenas um pouco mais sutil. Ele nomeou um de seus escudeiros mais devotos como presidente da Comissão Federal de Comunicações (CFC). Sob esse capanga, a CFC exigiu que as estações de rádio enviassem transcrições de todos os programas que lidassem com “assuntos públicos” para passar pela autorização da Comissão. A CFC também deixava claro que criticar o governo poderia levar a uma revogação de licença de transmissão. Muitos âncoras de rádios progressistas estavam bastante ansiosos para servir como animais de estimação de FDR, da mesma maneira como a nossa mídia convencional tornou-se voluntariamente serviçal de Obama e Hillary. Henry Bellows, da CBS, disse a FDR que valorizava a “cooperação” entre o governo e sua rede e “como um democrata ao longo da vida, queria garantir seus melhores esforços para fazer com que essa cooperação fosse bem-sucedida”. A CBS e a NBC baniram críticas ao New Deal de suas estações durante a década de 1930 e o início dos anos 1940. Apenas poucas estações resistiram, mas para salvar suas licenças, elas logo foram obrigadas a entrar na linha.38

Um Pacto com o Racismo Por fim, FDR acolheu-se e fez negócios com os piores racistas da América. Não estou dizendo que o próprio FDR era racista. Não sei se sim ou se não. Mas sei que ele trabalhou em estreita colaboração com os racistas do Partido Democrata. Um lado ajudava a avançar a agenda do outro. Por esse aspecto, FDR de fato aproxima-se mais do nazismo do que do fascismo, já que o racismo não era uma marca dos fascistas de Mussolini, mas sim dos nacionalsocialistas de Hitler. Novamente, esse é um aspecto de FDR que os progressistas trabalharam arduamente para manter fora dos livros didáticos e da consciência nacional. Primeiro, FDR nomeou Hugo Black, antigo membro da Ku Klux Klan, à

Suprema Corte. Black, completamente desqualificado — sua única experiência no ramo judiciário formava-se de dezoito meses como juiz de um tribunal municipal — levava a reputação de apaixonado entusiasta do New Deal, endossando publicamente o plano de FDR de aumentar o número de juízes em seu projeto de aparelhar o judiciário. Membro ainda ativo, Black chegou a discursar em comícios e liderar manifestações da KKK por todo o seu estado de origem, o Alabama. Conquanto FDR afirmasse desconhecer os fatos, é difícil de entender como isso seria possível, uma vez que Black os listou em seu currículo. Quando certo jornal de Pittsburgh expôs quão profundamente Black era próximo da KKK — advogado da KKK que construiu petições abertamente racistas aos júris —, houve grande furor. FDR, por sua vez, ficou ao lado de Black, que mais tarde, lembrando o ocorrido, escreveu: “O presidente Roosevelt disse que não havia porquê de eu me preocupar por ter sido membro da Ku Klux Klan. Disse também que alguns de seus melhores amigos e apoiadores eram fortes membros dessa mesma organização. Ele nunca, de nenhuma maneira, por palavra ou atitude, indicou qualquer dúvida sobre o fato de minha estadia na KKK, nem demonstrou qualquer crítica contra mim por ter sido eu membro da organização”.39 Além disso, FDR apoiou democratas racistas no Congresso em seus esforços de frustrar leis contrárias ao linchamento. Essa foi uma condição fundamental que os racistas colocaram perante o então presidente. Eles disseram que não apoiariam os programas do New Deal, a menos que FDR apoiasse os esforços para bloquear as leis contrárias ao linchamento investidas pelos republicanos. Então FDR foi e convenceu até mesmo democratas e progressistas do Norte a apoiar suas contrapartidas do Sul, que buscavam prevenir que tais leis chegassem à votação.40 Eis um dos legados mais vergonhosos da presidência de FDR, algo praticamente não mencionado em biografias escritas por progressistas. Somado a isso, FDR fez um acordo com os democratas racistas, o de cortar negros da maioria dos programas do New Deal, incluindo benefícios do Seguro Social e seguro-desemprego. Ele executou essa parte escrevendo exceções nos programas, exceções que excluíam do programa as ocupações, como trabalho agrícola e serviço doméstico, em que os negros concentravam-

se com maior força. FDR também deixou a administração desses programas ao arbítrio local, permitindo que os funcionários democratas locais rotineiramente negassem benefícios aos negros.41 Foi em 1954, quando os republicanos controlaram a presidência, a Câmara e o Senado, que eles finalmente eliminaram as exclusões que negavam o Seguro Social e outros benefícios a muitos negros. FDR também deu continuidade à segregação no governo federal, embora ele tivesse o poder unilateral de reduzi-la ou suspendê-la. Os republicanos e negros pediam com regularidade pelo fim da segregação nas Forças Armadas e pela promoção por mérito. FDR mantinha sua recusa. Os programas de habitação de FDR [Federal Housing Authority] impulsionaram a habitação segregada, seu Corpo de Preservação Civil [Civilian Conservation Corps] era segregado, até mesmo o centro de pesquisa de bombas atômicas, em Oak Ridge, no Tennessee, era segregado, e os jornalistas negros eram rotineiramente excluídos das conferências de imprensa do presidente.42 Novamente, exceto a crédulos da grande mentira, nada disso é “surpresa”; trata-se de algo totalmente de acordo com a história racista do Partido Democrata. Por fim, FDR internou mais de 120 000 nipo-americanos no que ele mesmo chamou de ‘campos de concentração’ durante todo o envolvimento da América na Segunda Guerra Mundial. Esses campos — que funcionavam como prisões com censo diário e toques de recolher — eram cercados de arame farpado e protegidos pela polícia militar. Sim, a América estava em guerra contra o Japão. Mas a América também estava em guerra contra a Alemanha e a Itália. Drasticamente menor foi o número de germanoamericanos ou de ítalo-americanos feito alvo do governo e forçado a se mudar das regiões costeiras dos Estados Unidos. É difícil não concordar com os nipo-americanos que contam ter sido marginalizados por FDR da mesma maneira como Hitler marginalizou os judeus.

Embusteiros à Esquerda O primeiro embusteiro na tentativa de encobrir os laços de FDR com o

fascismo foi, ironicamente, o próprio FDR. No dia 29 de abril de 1938, em mensagem ao Congresso, FDR disse que “eventos infelizes no exterior” ensinaram a América uma simples verdade: “A liberdade de uma democracia não será segura se o povo tolerar o crescimento do poder privado a ponto de este tornar-se mais forte do que o próprio Estado democrático. Isso, em essência, é o fascismo — o indivíduo, um grupo ou qualquer outro poder privado de controle tomando posse do governo”.43 Até o momento, conseguimos reconhecer a grande mentira em pleno andamento. O fascismo não é o controle privado do governo; é o controle governamental do setor privado. Ao aumentar o poder do Estado centralizado em paralelo com os fascistas, FDR finge que o faz para salvar a democracia americana do controle fascista sobre o governo imposto por interesses do setor empresarial privado. FDR inverte o significado do fascismo, assim fazendo com que seus oponentes republicanos pareçam fascistas e ele, portanto, o antifascista. Hoje, tamanha inversão é simplesmente demais para qualquer indivíduo acreditar. Portanto, o historiador Ira Katznelson tenta encobrir FDR usando uma abordagem mais delicada, uma forma superior de embuste, pode-se dizer. Num capítulo anterior, demonstrei como Katznelson contribui para a grande mentira ao jogar a culpa das atrocidades racistas do Partido Democrata sobre o Sul. Junto de FDR, Katznelson emprega um modo de defesa diferente. Ele admite abertamente as tendências racistas e ditatoriais de FDR. O comando de FDR, ele diz, carregava as “mais profundas imperfeições”. Graças a FDR, “Taparam-se os olhos quando a insensibilidade e a brutalidade seguiram adiante”. Os negócios que ele fez com os fanáticos de seu próprio partido foram um “acordo podre”. Entretanto, no fim, Katznelson apoia a linha do fascismo ditatorial de FDR, porque, em suas palavras, “Com isso, o New Deal tornou-se possível”.44 O objetivo de Katznelson é convencer os progressistas e a esquerda de que FDR foi um nobre estadista, disposto a sujar as mãos para conseguir algo grande. Diz Katznelson, considere os limites sob os quais FDR operou; ao contrário da Alemanha nazista, “não houve uma lei americana para concessão

de plenos poderes”.45 (Se Katznelson preferiria que houvesse é questionável). Logo FDR teve de trabalhar com o Congresso; ele precisou operar por dentro do sistema político americano para aprovar o New Deal, por isso fazendo os acordos que fez. Acredito que Katznelson não tenha percebido que, a fim de salvar FDR da acusação de fascismo, ele próprio construiu um argumento fascista clássico. Não me refiro à implicação por parte de Katznelson de que os fins justificam os meios. Essa afirmação, por si só, é preocupante. Realmente valeu a pena um cenário com negros sendo linchados e sistematicamente discriminados por décadas, isso tudo no propósito de impulsionar um punhado de programas do New Deal? Bom, ao menos na minha concepção, digo que não. No entanto, independentemente da resposta, o impulso fascista do argumento de Katznelson está em outro lugar. O tema central do fascismo — e aqui podemos nos lembrar do filósofo do fascismo, Giovanni Gentile, endossado pelo fundador oficial do fascismo, Benito Mussolini — é o impulso do Estado centralizado. Na visão de mundo fascista, como Mussolini nunca se cansava de dizer, o Estado é tudo, e tudo mais está subordinado ao Estado. Diante disso, todas as medidas são permitidas — por mais brutais e pesadas, por mais inconsistentes que sejam com a liberdade privada ou com o sistema constitucional de freios e contrapesos — quando se tem por fim expandir o controle e o poder do Estado centralizado. Mesmo perplexo e duvidoso quanto às táticas fascistas que FDR usava para armar os tribunais, usurpar a autoridade do Congresso e fomentar as formas mais repulsivas de racismo, Katznelson lhes é favorável, pois, afinal, estas ajudaram a alcançar o objetivo fascista de FDR, que era expandir o poder centralizado. E esse é o fascismo à esquerda com o qual vivemos agora, tanto no impulso ideológico perpétuo da esquerda para ampliar o poder do governo quanto na vontade da esquerda de usar quais sejam as táticas mais desprezíveis e fundamentais necessárias para sair de determinado lugar e chegar a outro. FDR não só foi o führer primitivo da América; ele também ajudou a criar exércitos de camisas pardas da esquerda americana, que ainda hoje permanecem presentes.

Capítulo Oito

Políticas de Intimidação A legitimação da violência contra um inimigo interno demonizado nos aproxima do coração do fascismo.1 Robert Paxton, The Anatomy of Fascism

Meio ano depois, o choque da eleição de Trump ainda não foi totalmente absorvido pela esquerda. Batalhas políticas amargas e incessantes levantamse entre Trump e seus adversários. Trata-se de uma resistência, em proporção e veemência, que jamais presenciei. Os adversários não querem apenas frustrar Trump, para vencê-lo e humilhá-lo; eles também querem tirá-lo de lá. A mensagem oculta dos inimigos de Trump é a seguinte: é um fato para nós, e não podemos descansar até que tenhamos expurgado esse fascista e seus apoiadores dos corredores do poder. Mas de onde é que tamanha oposição de fato vem? Onde está seu epicentro? É tentador supor que venha do Partido Democrata. No entanto, os democratas são minoria no Parlamento e no Congresso, e os republicanos dominam as legislaturas estaduais e as governadorias. Apesar de os democratas oporem-se tenazmente, o partido em posição minoritária uma só coisa pode fazer. Ninguém, contudo, pode reduzir a profundidade e a ferocidade do movimento contrário a Trump, de modo que o centro da resistência deve estar em outro lugar. Alguns dos chamados trumpsters comentam, na calada das redes sociais, sobre a existência de um deep state, um “Estado profundo”, “obscuro”, um Estado secreto dentro de um Estado de oposição, naturalmente montado contra um presidente “de fora”, um intruso, que prometeu “drenar o pântano”. Esses aliados de Trump direcionam o dedo para ratos secretos do pântano, principalmente em várias agências de inteligência do governo, da NSA à CIA, da CIA ao FBI. É certo que há resistência burocrática a Trump

dentro do governo, mas isso é algo com que ele consegue lidar como chefe desse mesmo governo. O verdadeiro poder da esquerda não se deriva de nenhuma conspiração secreta, mas sim de um Estado dentro de um Estado, que está bem à vista. A esquerda não precisa confiar no FBI, na CIA e na NSA, afinal já possui três das instituições mais poderosas da nossa sociedade. A esquerda domina a academia, Hollywood e a mídia. Esses são os três megafones mais poderosos da nossa cultura, os principais instrumentos para disseminar informações ao público, em especial aos jovens. Em uma sociedade democrática, quem controla o fluxo de informações, esse também controla a opinião pública, a qual, finalmente, decide todas as questões. Esse Estado dentro do Estado é a arma mais forte e mortal do progressismo e do Partido Democrata. Sem ela, progressistas e democratas não teriam chegado tão longe nem erguido essa oposição implacável e impetuosa contra Trump. Enquanto a vitória de Trump e o domínio político do GOP são temporários, o Estado dentro do Estado da esquerda é permanente. A esquerda essencialmente domina a academia, Hollywood e a mídia. É algo que fica claro quando se pergunta como seria possível mudá-los. Praticamente impossível. Hollywood é uma cultura incestuosa no íntimo e altamente autoperpetuadora. Inclusive há um grupo conservador em Hollywood, Friends of Abe, mas que, além de se reunir em segredo, tem alguns de seus membros disfarçados. Recentemente, um dos raros conservadores sinceros em Hollywood, Tim Allen, suscitou certo furor quando disse a Jimmy Kimmel: “Bom, você é atropelado se não acredita no que todos acreditam”. Allen acrescenta: “É como na Alemanha de 1930”. Pouco tempo depois, a ABC chegou e cancelou seu programa, Last Man Standing, apesar dos seis anos de alta avaliação positiva.2 Se acontece com uma grande estrela como Allen, pode acontecer com qualquer um, obviamente. Depois do meu documentário em 2016, Obama’s America [A América de Obama], membros do Friends of Abe disseram-me que ficaram felizes com a produção, uma vez que eles teriam perdido a carreira em Hollywood se o filme fosse produzido pelo grupo. Na verdade, algumas pessoas de dentro de Hollywood ajudaram-me com a produção, e todos insistiram em usar pseudônimos nos créditos.

A academia contrata seu próprio pessoal e de forma ampla não presta satisfação a nenhuma força externa; pais, órgãos legislativos estaduais e exalunos exercem um impacto meramente periférico sobre o que acontece lá. Claro, conservadores conseguem ter uma cadeira ou enviar um palestrante para essa ou aquela universidade, mas o impacto dessas medidas é, certamente, apenas marginal. Afinal, a esquerda domina os departamentos de humanas e ciências sociais de praticamente todas as universidades; e, quanto mais seletiva for a universidade, maior será a extensão desse domínio. Em relatório recente, a Oregon Association of Scholars, grupo conservador, mostra que as universidades sistematicamente “arrancam” professores conservadores e se recusam a contratar novos. Curioso notar, o mecanismo usado para arrancá-los está nas declarações sobre diversidade. Os esquerdistas dentro das universidades insistem que os conservadores não têm compromisso com a diversidade. Assim, tal fator torna-se o pretexto para os progressistas erradicarem a pouca diversidade intelectual e ideológica que resta no câmpus.3 Não bastasse ser deprimente, também é uma situação improvável de mudar. E para mudá-la, os conservadores teriam de começar várias centenas de câmpus próprios, o que é impossível. A mídia convencional não é menos ideologicamente insular. Na verdade, a mídia de direita não é uma refutação, mas uma constatação da grande mídia. A mídia independente de direita existe desde que os conservadores foram sistematicamente excluídos das redes de TV, redes a cabo, como a CNN e a HBO, e dos jornais, como o New York Times, The Washington Post e Los Angeles Times. O canal de direita Fox News tem uma grande audiência em comparação a outras redes a cabo, mas está sob cerco constante; e, de qualquer forma, sua audiência é uma pequena fração da audiência da ABC, CBS e NBC. Estações de rádio conservadoras, mesmo com todo o seu alcance, são coletivamente menores do que a Rádio Pública Nacional, que é um órgão estatal da esquerda política. Isso quer dizer que a esquerda pode trabalhar em conjunto para divulgar amplamente sua mensagem, e o faz com naturalidade. É assim que grandes mentiras são contadas e, em seguida, amplamente aceitas como verdade incontestável. Normalmente, a mentira se origina na academia, onde um acadêmico de esquerda a inventa e outros acadêmicos de esquerda a

celebram. Em seguida, a mídia a adota, invocando a teoria acadêmica para dar-lhe validade e, ato contínuo, a ecoa na mente popular como uma verdade comprovada. Então, periodicamente, Hollywood converte essa narrativa em seriados de TV ou longas-metragens e cria um apoio emocional para a causa, ao mesmo tempo em que faz tudo parecer maneiro e moderno. Por fim, as três instituições aliam-se contra quem questiona a grande mentira, procurando desacreditá-los, arruiná-los e, de preferência, expulsá-los da vida pública.

Cultura de Intimidação Como chegamos até aqui? Afinal de contas, as coisas nem sempre foram assim. A velha Hollywood, da década de 1930 à década de 1950, era dominada por imigrantes judeus que acreditavam no sonho americano e na América como força para o bem no mundo. Conservadores como Reagan, John Wayne e Jimmy Stewart tinham lugar naquela Hollywood. Mas nenhum deles teria vez na atual. A mídia sempre se inclinou para a esquerda, mas nem mesmo durante o caso Watergate foi tão agressiva e proselitista com suas pautas esquerdistas quanto é agora. De certa forma, a máscara de objetividade caiu por completo; o New York Times de hoje nem sequer finge cobrir notícias de forma neutra ou equilibrada. Quando eu era aluno em Dartmouth, no início da década de 1980, ainda havia liberais clássicos da antiga leva no corpo docente. Agora eles já se foram. Naquela época, como jovem que apoiava Reagan, eu podia debater questões políticas com professores e estudantes de esquerda. É claro que a Ivy League era de esquerda, mas não de maneira monolítica. Hoje, ao contrário, os pontos de vista conservadores foram basicamente erradicados. Hoje em dia, os jovens não rejeitam o conservadorismo; eles nem mesmo sabem o que é isso. Se questionados acerca do “que conservadores batalham para preservar?”, alunos até mesmo de nossos melhores câmpus olharão boquiabertos e confusos. Vivemos, hoje, numa das culturas mais fechadas, excludentes e repressivas da História Moderna. De certa forma, a esquerda não precisa promover uma caça às bruxas contra conservadores e atormentá-los; eles simplesmente não os contratam, em primeiro lugar. Quando palestrantes conservadores se apresentam em universidades, eles frequentemente são impedidos de falar por

manifestantes violentos de esquerda ou calados por ativistas portando megafones. Esquerdistas rasgaram meus cartazes na Universidade Trinity, San Antonio, onde palestrei recentemente. Já eu usei a ação deles a meu favor, publicando aqueles atos de intolerância nas mídias sociais. Como resultado, mil pessoas apareceram para a minha palestra, e a tentativa esquerdista de frustrá-la falhou. Mas quando Gavin McInnes, polêmico podcaster de direita, foi à Universidade de Nova Iorque (UNI), em fevereiro de 2017, os antifascistas de lá apareceram em massa para agredir McInnes e os alunos que o convidaram; eles desferiram golpes contra os conservadores e atingiram o próprio McInnes com spray de pimenta. “Estou assustado, a UNI convidando um disseminador do ódio”, disse a ativista Tamara Fine. “Ele é um fascista”. McInnes tentou falar, mas foi abafado pelos manifestantes. Então ele interrompeu a palestra e deixou o local, enquanto os manifestantes que estavam do lado de fora gritavam e brigavam com a polícia local.4 Em abril de 2017, a especialista conservadora Heather MacDonald foi impedida de falar na Universidade de Claremont McKenna. Cerca de duzentos e cinquenta manifestantes barraram sua entrada ao auditório, muitos deles berrando “fascista” enquanto alguns outros repetiam “a vida negra importa”. As autoridades da Universidade citaram razões de segurança para cancelar o evento público de MacDonald. Como alternativa, foi sugerido que a palestra fosse dada somente aos organizadores do evento e transmitida ao vivo nas redes sociais. “Decidiram que eu daria a palestra ao vivo para um salão praticamente vazio”, disse MacDonald.5 Lembre-se de que estas são vozes conservadoras a serem importadas para o câmpus. Não existe nenhum conservadorismo primitivo entre o corpo docente dessas instituições. Mesmo assim, em ocasiões raras, quando um conservador aparece, ele ou ela é vexado e às vezes agredido e perseguido. Essa é a América em que vivemos agora. Nossa cultura é uma cultura de abuso e humilhação ritualísticos, em que as vozes dissidentes são perseguidas, envergonhadas e aterrorizadas, em alguns casos não só para silenciá-las quanto para destruir-lhes a carreira e a vida. A demonização é a cultura corrente da esquerda nos dias de hoje. Por essa razão, por sinal, é que

muitos republicanos são tão tímidos no Congresso; eles estão aterrorizados com o poder da mídia de humilhá-los de tal forma que seus próprios apoiadores terão de sepultá-los. Em contraste, manifestantes que usam de violência e criminosos são celebrados na academia, na mídia e em Hollywood como ícones do idealismo e mártires de uma grande causa. Considere o caso de Bill Ayers e Bernardine Dohrn, chefes do serviço meteorológico Weather Underground, ambos anteriormente citados na lista dos mais procurados do FBI. Mesmo não se arrependendo do passado terrorista contra a própria pátria, ambos foram reabilitados e reintegrados na comunidade progressista. Ayers e Dohrn são agora professores ilustres, Ayers na Universidade de Illinois, Chicago, e Dohrn na Faculdade Northwestern de Direito. No universo progressista, facínoras também transformam-se em celebridades. Che Guevara, assassino comunista e diretor de um campo de prisioneiros políticos, ele que ordenou a execução de presos políticos e causou caos em Cuba, na África e na América do Sul, provocando problemas na Bolívia antes de ser morto, foi feito herói, venerado pelos progressistas, destacado em inúmeras camisetas e cartazes de dormitórios universitários. Trayvon Martin, arruaceiro que brigou violentamente com um homem, o mesmo que então atirou nele em defesa própria, imediatamente foi feito mártir da causa progressista. O presidente Obama validou a santidade do rapaz dizendo que, no lugar de Trayvon, poderia ter sido seu próprio filho. De onde vem toda essa loucura? Melhor dizendo, como nossas instituições culturais — da academia à mídia, da mídia à indústria do cinema e da música — tornaram-se tão profundamente pervertidas? A explicação mais corrente, oferecida por Allan Bloom no livro The Closing of the American Mind [A Oclusão da Mente Americana], depois continuada por Jonah Goldberg na obra Liberal Fascism, diz que todos esses traços vêm da década de 1960. Como relata Bloom, na primavera de 1969, esquerdistas armados e vestidos com uniformes militares invadiram os escritórios da administração da Universidade Cornell. Eles também tomaram o controle da união estudantil e a da estação de rádio local. Esta foi uma tomada de controle no estilo fascista. Walter Berns, cientista político que, na época, ensinava na Cornell e amigo de Bloom, leu para os manifestantes excertos de discursos de Mussolini, ao

que eles aplaudiram descontroladamente, sem saber que estavam aplaudindo o fascismo. Muitos conservadores aceitam o relato de Bloom de que foi a covarde submissão da administração e do corpo docente às demandas dos criminosos esquerdistas que simbolizaram a subsequente renúncia ideológica da universidade americana à esquerda política. Alguns, é claro, não se entregaram; eles apoiaram a tomada do poder e abraçaram as demandas dos criminosos. Um desses colaboradores foi James Perkins, presidente da Cornell — ex-partidário do New Deal no Escritório de Administração de Preços de FDR —, ele próprio um esquerdista. Assim também eram muitos dos jovens professores nos departamentos de ciências humanas e sociais. Um grupo de professores — principalmente liberais clássicos da velha guarda — resistiu às demandas “irredutíveis” dos estudantes. Em sua maioria democratas, eles acreditavam, no entanto, nos propósitos de uma educação liberal e não tinham nenhuma intenção de permitir que os alunos universitários criminosos lhes ditassem o que e como ensinar. Daí os bandidos fizeram uma oferta irrecusável: submeter-se ou morrer. E eles se submeteram. Apenas alguns docentes não esmoreceram — incluindo Bloom — e quase todos deixaram a Universidade Cornell pouco tempo depois. A esse respeito, em Cornell e em outros lugares, houve de fato uma rendição. Hoje, em Cornell e em outras universidades, os manifestantes esquerdistas não precisam assumir o establishment; eles são o establishment. Atualmente a esquerda não precisa fazer demandas curriculares; ela controla o comitê curricular. Não há necessidade de a esquerda queimar ou proibir livros politicamente contestáveis; eles simplesmente não os prescrevem. Assim, hoje, os esforços dos progressistas visam excluir as poucas e raras vozes de oposição que ameaçam impedir a consolidação de um completo monopólio sobre a informação e a opinião dentro das universidades. Portanto, o que Bloom explica a respeito da década de 1960 diz muito, mas, por si só, é insuficiente. Então surge a seguinte pergunta: de onde os criminosos de Cornell tiraram a ideia de tomar o controle conforme os moldes fascistas? Quem lhes ensinou essas táticas que persistem até hoje? Mostro, aqui, que os verdadeiros antepassados dos ativistas de Cornell e seus sucessores são os mestres da opressão, da intimidação e do terror — os

nazistas. Ao longo desse livro venho lidando com paralelos entre a esquerda americana e os nazistas, mas esse é o ponto em que a esquerda de hoje mais se parece com seu análogo nazista. Foram os nazistas que criaram um Estado dentro do Estado e inventaram a sistematização do controle cultural, as técnicas de propaganda, de opressão e intimidação agressivas que agora servem de modus operandi para a esquerda progressista.

O Gleichschaltung Progressista O termo nazista para tanto era Gleichschaltung, o que significa alinhar toda a sociedade às prioridades esquerdistas do nazismo. Em seu cerne, o Gleichschaltung é uma doutrina de uniformizar a política e controlar a sociedade; é a forma original do politicamente correto. O Gleichschaltung opera em grande parte por meio da pressão externa e da intimidação, mas os nazistas o consideravam mais bem-sucedido quando redundava em Selbsgleichschaltung, ou um tipo de “cooperação espontânea”, quando as pessoas colocavam-se voluntariamente debaixo do domínio do regime nazista. Aqui, argumento que a esquerda americana vem tentando fazer algo semelhante ao aproximar a sociedade do progressismo. Cabe ponderar dois casos paralelos em que a propaganda cultural foi usada para transformar um marginal num ícone ideológico. Horst Wessel, jovem de vinte e um anos, membro dos camisas pardas, era conhecido por sua sangrenta luta contra os esquerdistas do Partido Comunista e contra os rivais dos nazistas. Wessel também era artista. Mudou-se para uma vizinhança boêmia de classe baixa e compôs um poema de dezesseis linhas para o jornal nazista local. Os comunistas assassinaram Wessel em meio a uma disputa envolvendo a proprietária de seu apartamento tentando expulsar a namorada do jovem rapaz, uma ex-prostituta, chamada Erna Jaenicke. Ordinariamente falando, este seria um episódio sórdido que melhor teria sido se caído no esquecimento. Mas Goebbels usou a mídia nazista para retratar Wessel como mártir. Um grupo de nazistas colocou o poema de Horst Wessel em uma antiga melodia alemã, e assim nasceu a canção de Horst Wessel. Seu funeral foi uma enorme manifestação nazista, com milhares de pessoas de luto e com o próprio Goebbels discursando. Em meio a lágrimas e

aplausos, Goebbels declarou: “Onde quer que haja uma Alemanha, você, Horst Wessel, também estará lá”.6 Em seguida todos entoaram em alta voz a canção de Horst Wessel, que se tornou uma espécie de hino nazista, cantado durante a década de 1930 e durante a guerra para gerar entusiasmo no público e nas tropas.7 Esse falso martírio é a base para os hinos progressistas entoados a facínoras e criminosos de hoje, de Che Guevara a Bill Ayers e Trayvon Marker. Da mesma forma para a esquerda e para os nazistas, parece não haver nada que seu próprio lado não possa fazer e depois sair ileso. De certa forma, quanto pior a ofensa, mais duro a esquerda luta para legitimá-la. Os facínoras da esquerda não só tornam-se heróis culturais, mas também aqueles que os criticam de alguma forma transformam-se nos vilões da história. É a história de Horst Wessel sendo repetida vez após vez. Suponho que a única diferença seja que ainda não existe uma canção para Trayvon Martin, e que Goebbels nunca afirmou que, no lugar de Horst Wessel, poderia ter sido seu próprio filho. No entanto, mesmo quando abraça a propaganda nazista e suas táticas de opressão, a esquerda insiste, engraçado dizer, afirmando que suas ações são em nome do antinazismo. É daí que a respeitabilidade moral vem. É assim que os facínoras fascistas podem ser retratados por seus aliados progressistas na mídia e em Hollywood como sendo bonzinhos. Por contraste, os seus alvos — as vítimas dos abusos e opressões fascistas — são retratados como fascistas que merecem ser humilhados e abusados dessa maneira. Se agora você começou a sentir que isso tudo não passa de uma construção horrivelmente doentia e invertida, você está certo. Pois, sim, realmente é. Como as coisas chegaram a tal ponto? Essa incrível história começa com um filósofo nazista que, por acaso, é um dos grandes filósofos do século XX, Martin Heidegger. Ela continua com um dos alunos judeus de Heidegger, Herbert Marcuse, que, curioso notar, aprendeu a sua mais importante lição com os nazistas e a trouxe para a América. Por razões que serão reveladas em breve, Marcuse ensinou a esquerda dos anos 1960 a imitar os fascistas enquanto posava de antifascista. Finalmente, voltamo-nos para outro refugiado do nazismo, que, no entanto,

em sua juventude, trabalhou com os nazistas e agora lidera, de maneira semelhante a Mussolini e Hitler no passado, sua própria milícia privada. Note que Trump não possui uma milícia privada, mas que esse sujeito a tem. No caso dele, bem como no de Marcuse, a selvageria fascista deriva sua legitimidade moral e respeitabilidade pública de uma falsa pose antifascista. Seu nome é George Soros.

O Nazista Predileto da Esquerda Desde a publicação de sua magnum opus, Ser e Tempo, a filosofia de Martin Heidegger passou ao ramo de ampla influência. Especificamente, é ela que fornece fundamentação intelectual para toda uma série de causas progressistas. Primeiro, o ataque radical de Heidegger à metafísica ocidental, de Platão até a então presente, inspiraram o movimento acadêmico esquerdista chamado de desconstrucionismo. O questionamento fundamental de Heidegger em relação à tecnologia é invocado pelos chamados ecologistas radicais do movimento ambientalista. Sua oposição ao capitalismo e ao materialismo — ambos associados ao “americanismo” — impulsionou os ânimos do anticapitalismo e do antiamericanismo esquerdista. O ataque de Heidegger ao individualismo e seu entusiasmo pelas comunidades sob o conceito de sangue e solo ajudaram a fornecer base à política de identidade moderna em que negros, hispânicos e outros reivindicam uma identidade única baseada no pertencimento a um determinado grupo étnico. Por fim, o ateísmo de Heidegger — sua afirmação feita em Ser e Tempo de que somos seres mortais e devemos encontrar o nosso propósito não em uma ordem transcendente, mas dentro da força de nossa moralidade humana — fortificou a base secular e não religiosa do progressismo moderno. À luz disso, seria surpreendente — ou simplesmente apropriado? — o fato de Heidegger admirar Hitler e ser membro ativo do Partido Nazista? Heidegger foi nomeado reitor da Universidade de Friburgo apenas alguns meses após Hitler ser feito chanceler da Alemanha, em 1933. Mais tarde, naquele mesmo ano, na véspera da votação de Reichstag, Heidegger fez seu Rektoratsrede, ou o pronunciamento do reitor, em que se pronunciava a favor do “ressurgimento” alemão de Hitler. Ao mesmo tempo, Heidegger circulou um manifesto de acadêmicos alemães que pleiteava lealdade a Hitler e ao Estado nacional- socialista, estabelecendo-se assim como um dos principais

coordenadores do Gleichschaltung nazista. Em seu então infame discurso como reitor, Heidegger ridicularizou a noção de liberdade intelectual, dizendo que não passava de uma falsa liberdade a ser subordinada aos objetivos maiores da nova Alemanha de Hitler. Heidegger declarou que a verdadeira educação não está meramente relacionada aos livros, mas também envolve a participação no Ministério do Trabalho da Alemanha Nazista. Em suas palavras, “o Estado nacional-socialista é um Estado dos trabalhadores”. O discurso de Heidegger foi seguido de uma emocionante interpretação da canção de Horst Wessel e de pessoas gritando Sieg Heil. Tempo depois, Heidegger discursou sobre “a verdade e a grandeza interior” do nazismo. Mesmo depois da Segunda Guerra Mundial, quando os crimes monstruosos do nazismo já eram inegáveis, Heidegger manteve silêncio no tocante ao que os nazistas fizeram aos judeus e a outras populações cativas. Apesar de cúmplice do nazismo, muitos progressistas correram para defendê-lo. Primeiro, dizem que Heidegger foi nazista por apenas um breve período de tempo, na década de 1930; e que, em meados dessa mesma década, já começava a distanciar-se do nazismo. Em segundo lugar, os progressistas salientam que muitos dos mais brilhantes alunos de Heidegger, como Karl Lowith, Herbert Marcuse e Hannah Arendt, com quem teve um caso extraconjugal, eram judeus; assim, ele não poderia ter sido antissemita. Talvez, dizem esses defensores esquerdistas, Heidegger estivesse brevemente apaixonado pelo nazismo, mas logo viu o erro de aliar-se àquele partido. O próprio Heidegger seguiu essa linha após a Segunda Guerra Mundial, na qual minimizava seu compromisso com o Partido Nazista. Heidegger dizia que suas palestras sobre Nietzsche, no final da década de 1930 e início da década de 1940, eram, se interpretadas corretamente, críticas ao nazismo. No entanto, neste ponto, Heidegger foi insincero. As chamadas críticas ao nazismo, se é que existiram, foram tão obscuras que nem mesmo o leitor mais cuidadoso as decifraria. A insinceridade de Heidegger, na verdade completamente desonesta, pode ser comparada, aqui, aos eugenistas do Partido Nazista, que, tendo participado dos projetos de esterilização e eutanásia durante o reinado de Hitler, depois tentaram cobrir suas pegadas negando o passado e silenciosamente entrando no movimento de controle

populacional. O problema para Heidegger e muitos de seus apologistas de esquerda é que muita coisa veio à tona, expondo o relacionamento íntimo e permanente de Heidegger com o nazismo. Esse é o homem que, extasiado, disse de Hitler: “Somente o Führer é a realidade presente e futura das leis alemãs. O Führer despertou essa vontade em todo o povo e consolidou-a em uma solução única”.8 Heidegger não só abraçava os nazistas, mas também via o próprio nazismo como decorrente de sua filosofia, uma expressão política dos temas inovadores de Ser e Tempo. Além do mais, a recente publicação dos cadernos negros de Heidegger [black notebooks], escritos durante um período de quarenta anos, de 1931 até o início da década de 1970, mostra como ele foi um antissemita no decorrer da vida. Diante desse assustador conjunto de provas, muitos dos defensores esquerdistas de Heidegger mudaram sua linha de apologética. Agora eles afirmam que, embora um filósofo possivelmente comprometido ao Partido Nazista, isso não faz dele um filósofo nazista. A esse respeito, a esquerda distingue Heidegger dos fomentadores intelectuais e teóricos da doutrina nazista como Alfred Rosenberg, ideólogo do Partido. O objetivo da esquerda aqui é descartar o homem Heidegger por sua política desprezível, mas retê-lo Heidegger, o filósofo, como inspiração para toda uma série de causas esquerdistas. Bom, é verdade, Heidegger não foi um filósofo do nazismo, assim dizendo, igual Giovanni Gentile foi do fascismo. Mas não se deduz disso que o nazismo de Heidegger não estivesse enraizado nas premissas de sua filosofia. Basicamente, o pensamento de Heidegger emergiu de uma distinção entre a sociedade tribal, ou Gemeinschaft, e a sociedade comercial, ou Gesellschaft. Essa distinção não se originou com Heidegger — foi adotada pela primeira vez pelo sociólogo alemão Ferdinand Toennies —, mas sua obra se construiu a partir dela. Essencialmente, Heidegger apoiou o nazismo como atestação do conceito “solo e sangue” da Gemeinschaft tribal. Ele detestava a Gesellschaft cosmopolita, uma vez que a julgava uma erosão dos laços da sociedade tribal. Heidegger associava a Gesellschaft à América, um país baseado em comércio

e negócios. Ele também associava a Gesellschaft aos judeus. Em seus cadernos negros, Heidegger chama os judeus de “sem mundo”, pelo que ele quer dizer que judeus são pessoas sem lugar, sem terra, unidos continentes afora, no que ele enxergava a mais imunda caça por renda e comércio. Mesmo nesse breve relato, nota-se como as afinidades de Heidegger com o nazismo emergem das profundezas de seus compromissos filosóficos. Karl Lowith, um dos alunos de Heidegger, protestou contra o esforço feito para evitar a conexão entre a filosofia de Heidegger e seu nazismo, indicando que, décadas atrás, o próprio Heidegger havia entendido sua filosofia como um guia ao nazismo; portanto, não faria sentido aos discípulos de Heidegger fingir que entenderam Heidegger melhor do que o próprio Heidegger.9 Apesar de tudo, seus acólitos progressistas recusam-se a atender os protestos de Lowith. Em publicação recente, Sheldon Wolin, cientista político esquerdista, ataca seus companheiros progressistas por agora serem defensores tão persistentes e iludidos de um pensador nazista.10 Wolin se propõe a resolver um mistério: como, pergunta ele, um nazista de direita confesso virou o queridinho da esquerda acadêmica e política contemporânea? É claro, a essa altura, já se sabe que não se trata de mistério coisa nenhuma. O nazismo é de esquerda, não de direita. Assim, não é um enigma que as mesmas convicções da esquerda — ódio a Deus, ao capitalismo tecnológico e ao “americanismo” —, convicções que conduziram Heidegger ao nazismo, sejam, precisamente, bem aquilo que o tornam atraente aos esquerdistas de hoje. O que Wolin quer então? Basicamente, ele quer que seus camaradas progressistas retornem à grande mentira. Wolin percebe que simplesmente não há como vencer enquanto se encobre um entusiasta nazista, por mais nobre que seja sua linhagem filosófica. Wolin urge aos companheiros esquerdistas que se livrem de Heidegger, denunciando-o e fazendo com que ele não seja feito um deles. Se pudesse me colocar no lugar de Wolin e expor seu argumento em minhas próprias palavras, eu diria o seguinte: “Tá, e se Heidegger fosse um de nós? Mussolini também foi um de nós. Significa que devemos tentar redimir Mussolini? Vamos, esquerdistas. Progredimos tanto culpando a direita pelo nazismo. Continuemos a dissertar que Heidegger foi de direita e fiquemos longe dele. Não acabemos com a nossa farsa agora, e só

para salvar Heidegger”. A urgência que Wolin usa para instar com a esquerda que se separe de Heidegger talvez se explique pelo fato de que o maior projeto de Heidegger e o maior projeto da esquerda moderna são exatamente o mesmo. Heidegger insistia que tudo era político e é no que a esquerda de hoje também acredita. Heidegger dizia que a liberdade de expressão e a liberdade acadêmica eram mitos. O que realmente importava era a comunidade maior. A esquerda pensa o mesmo, mais uma vez. Heidegger favorecia não só o debate como a doutrinação ideológica aberta sobre a juventude. Soa familiar? Heidegger conhecia e, evidentemente, apoiava a opressão e a expulsão de judeus e outros “indesejáveis” do câmpus alemão. A esquerda de hoje tem uma nova categoria de indesejáveis; dessa vez não são judeus, mas os conservadores. Por fim, o objetivo de Heidegger era, de modo geral, atingir a conformidade ou unidade ideológica, e, embora a esquerda fale muito de diversidade dentro dos câmpus, é bastante óbvio que a dita diversidade não passa de cobertura para a unidade e a conformidade ideológica, exatamente do tipo que Heidegger buscou no seu tempo e para o seu país. Ainda mais do que a maioria dos outros professores na Alemanha, Heidegger acedeu com entusiasmo ao Gleichschaltung de Hitler. Na verdade, ele buscou a liderança acadêmica do Gleichschaltung nas universidades alemãs. Não funcionou, os nazistas descobriram que ele era um típico intelectual incompetente e deram a posição a outra pessoa. Ocorre que o Gleichschaltung de Heidegger é precisamente o que a esquerda tenta hoje, não apenas com as universidades da América, mas com toda a cultura americana. Por consequência, Wolin não quer o odor nazista de Heidegger permeando o amplo projeto bem-sucedido da esquerda de criar um Estado dentro de um Estado.

As Táticas Básicas dos Camisas Pardas Em 1925, Theodor Lessing, filósofo judeu, falou contra o clima político repressivo da Alemanha Weimar. Embora mirasse explicitamente a covardia do regime de Weimar sob Paul von Hindenburg, seu verdadeiro alvo era o poder emergente do nazismo, criticando o governo por ceder-lhe espaço. Os nazistas imediatamente reconheceram a ameaça representada por Lessing. A

juventude hitlerista da Universidade de Hanôver formou um “comitê contra Lessing”. Eles encorajaram os alunos a boicotar suas palestras. Uma juventude de nazistas então fazia-se presente e interrompia as aulas de Lessing, que foi forçado a desistir de sua ocupação acadêmica no ano seguinte. Descrevendo o que aconteceu, Lessing reconhece que nada poderia ter feito para evitar que fosse “calado, ameaçado e denegrido” por ativistas estudantis. Conforme o relato, ele estava indefeso “contra as vozes assassinas de jovens que não aceitam responsabilidades individuais, uma juventude que se apresenta como porta-voz de um grupo ou de um ideal impessoal, sempre falando de um tipo nobre de “nós”, só que distribuindo insultos pessoais [...] e reivindicando que tudo aquilo que acontece é em nome do verdadeiro, do bom e do belo”.11 Década de 1920, eis o fascismo no estilo alemão. Em março de 2017, Charles Murray, célebre cientista político — ex-colega meu no Instituto American Enterprise —, marcou de palestrar sobre as divisões de classe na sociedade americana em um bastião progressista, a Universidade de Middlebury, em Vermont. Centenas de manifestantes compareceram ao lado do Centro Estudantil McCullough, onde Murray estava programado para falar e dialogar com a cientista política de Middlebury, Allison Stanger. Murray é libertário e tende ao Partido Republicano, ainda que não seja fã de Donald Trump. Ao contrário de Lessing, que ensinava na universidade onde foi assediado, Murray não leciona em Middlebury, praticamente desprovido de um corpo docente e gerencial conservador. (Stanger é uma democrata moderada e afiliada ao grupo New America Foundation). De qualquer forma, a discussão pretendia ser acadêmica e esclarecedora, dando aos alunos uma perspectiva que nunca tiveram. Mas os manifestantes de Middleburry não tinham interesse nenhum nisso. Os ativistas enfrentaram Murray e Stanger, atacando-a em dado momento. Dentro então do Wilson Hall, os manifestantes viraram as costas para Murray e começaram a gritar, berrar e a vaiá-lo. Murray percebeu que simplesmente não podia ser ouvido. Funcionários da universidade escoltaram Murray e Stanger para outro local, onde o diálogo, por razões de segurança, foi exibido via televisão através de circuitos internos.

De acordo com Bill Burger, porta-voz da Middlebury, Murray e Stanger foram, após o evento, “confrontados fisicamente, e violentamente, por um grupo de manifestantes”, mascarados no estilo característico da Antifa. Murray e Stanger abaixaram-se no interior do veículo de um dos administradores, mas os manifestantes atacaram o carro, golpeando-o, balançando-o e tentando evitar que o automóvel se movesse. “Em dado momento”, disse Burger, “uma grande placa de trânsito foi jogada na frente do carro. Então finalmente alguns guardas conseguiram abrir caminho e permitiram que o veículo saísse do câmpus”. De acordo com Burger, “durante o confronto fora do Centro Estudantil McCullough, um dos manifestantes puxou o cabelo da professora Stanger e torceu seu pescoço. Ela foi atendida no hospital Porter mais tarde e está usando um colar cervical”. Murray elogiou os seguranças do câmpus pela proteção que proveram, mas descreveu o que passou como uma “ação assustadora e violenta de uma multidão”.12 Meados de 2017, eis o tão aclamado antifascismo progressista no estilo americano. Por que esse aparente antifascismo por parte dos progressistas se parece tanto com o fascismo ao qual pretende se opor? Indo mais a fundo, o que é o antifascismo conforme o termo agora é usado pela esquerda americana? A fim de resposta, cabe recorrer aos fundadores do chamado movimento antifascista da esquerda progressista, o sociólogo Herbert Marcuse e seu companheiro, Theodor Adorno, ambos da Escola de Frankfurt, ou do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt sobre o Meno, Alemanha. Por cerca de um ano ou pouco mais, temos ouvido muito sobre a Escola de Frankfurt. Aqui estão dois artigos recentes: um de Sean Illing no site Vox, intitulado “Quer Entender a Era Trump? Leia a Escola Frankfurt”; o outro, de Alex Ross para a revista New Yorker, intitulado “A Escola Frankfurt Sabia que Trump Estava Chegando”.13 Ambos esquerdistas, o que eles querem é que vejamos a relevância da Escola de Frankfurt — e eles estão certos, mas não pelas razões que pensam. O homem que se tornou a figura mais influente da Escola de Frankfurt, Herbert Marcuse, foi aluno de Heidegger em Freiburgo, onde também passou a ser seu assistente. Marcuse, jovem marxista, atraiu-se por Heidegger pelo

que viu nele um revolucionário igual a Marx. Um dos temas centrais de Marx, a alienação, também é central para Heidegger. Ambos foram homens de esquerda que desprezaram o capitalismo tecnológico. Em sua obra, Marcuse procurou incorporar Marx a Heidegger. A Stanford Encyclopedia of Philosophy [Enciclopédia de Filosofia de Stanford] expressa o projeto de Marcuse como uma tentativa de criar um “marxismo heideggeriano”.14 Marcuse reconheceu o crescente fascismo de Heidegger, o que, por si só, não foi um problema. O fascismo, como já mencionado, não é inerentemente antissemita. Marcuse sabia que o ódio de Heidegger pelo individualismo, pelo capitalismo e pelo “americanismo” era partilhado por fascistas e marxistas. Precisamente por essa razão, Marcuse acreditava que uma fusão do socialismo marxista com o fascismo heideggeriano resultaria numa síntese lógica. Percebe-se no projeto intelectual do jovem Marcuse uma confirmação daquilo que demonstrei anteriormente, as raízes esquerdistas e socialistas do fascismo. Mas Marcuse percebeu que Hitler era um profundo antissemita. Como judeu, Marcuse compreendia o perigo que o nacional-socialismo alemão lhe representava pessoalmente. Logo Marcuse rompeu com Heidegger e fugiu do país. Depois juntou-se à Escola de Frankfurt, formada em 1922, mas a maioria dos seus estudiosos durante a era de Hitler foi exilada para viver e trabalhar no exterior, uma vez que eram judeus em território alemão. Um dos colegas de Marcuse foi Theodor Adorno. Ambos vieram para os Estados Unidos. Adorno trabalhou no Instituto de Pesquisa Social, filial da Escola de Frankfurt em Nova Iorque, e depois se mudou para a Califórnia, onde permaneceu por vários anos antes de retornar à Europa, em 1949. Marcuse trabalhou na Universidade Columbia e mais tarde se mudou, durante a Segunda Guerra Mundial, para Washington, D.C. a trabalho em duas agências do governo: o Departamento de Informações de Guerra e depois o Escritório de Serviços Estratégicos, precursor da CIA. Posteriormente Marcuse ensinou na Universidade Brandeis e depois na Universidade da Califórnia em San Diego, onde permaneceu até a sua morte, no ano de 1979.

A Enganosa Origem do “Antifascismo”

Estes dois homens exerceram enorme influência sobre a cultura acadêmica, sobre a cultura popular e deram ao progressismo suas credenciais antifascistas. Mas não no início. A princípio, a Escola de Frankfurt tentou vender seus vários rótulos de marxismo e socialismo na América, mas encontraram poucos compradores. Quem queria ouvir um grupo de alemães enfadonhos balbuciar sobre os males da cultura de consumo capitalista? Embora tal retórica fosse comum nos partidos socialistas e nos movimentos da Europa, os americanos não reagiram bem. Aqui as pessoas gostam de lindas casas, carros e piscinas no quintal. Assim Marcuse e Adorno colocaram suas cabeças para trabalhar e tiveram uma epifania conjunta. Eles perceberam que poderiam vender a si próprios como antifascistas. Afinal de contas, esta era a era após a Segunda Guerra Mundial. A América havia acabado de guerrear contra os nazistas. O nazismo, logo depois da guerra, tornou-se a própria medida do mal. Marcuse e Adorno perceberam que tudo associado ao nazismo ou ao fascismo seria automaticamente manchado. E eles se propuseram a estabelecer esse fato óbvio para uso político em favor da esquerda política. Não se sabia muito a respeito do fascismo e do nazismo fora da cobertura superficial dos jornais e das rádios. Academia e mídia, ambas reconhecidamente desconheciam o que atraía tantas pessoas ao fascismo e ao nazismo, ainda mais com o antissemitismo que os permeava. Marcuse e Adorno eram intelectuais alemães. Ambos judeus, era de se esperar que conhecessem o antissemitismo e o destino dos judeus. Eram, ademais, refugiados da Alemanha nazista, o que lhes possibilitaria reclamar a oportunidade de falar sobre o nazismo “de dentro”, por assim dizer. A estratégia de marketing funcionou. Marcuse foi contratado pelo governo dos EUA para prover informações sobre como combater o nazismo ideologicamente. Após a guerra, Marcuse foi instrumental na formação de programas de reeducação na Alemanha, alguns visando explicitamente erradicar o que restasse da lealdade ao nazismo das pessoas. Ao lado de Adorno, Marcuse também moldou a considerada educação antifascista nos Estados Unidos. A obra de Adorno e Marcuse foi adotada pelo Comitê Judaico Americano, sentindo naturalmente que esses dois judeus alemães exilados conheceriam precisamente a natureza do nazismo, do fascismo e do

antissemitismo, sabendo como superá-las. Na verdade, nem o governo dos EUA nem o Comitê Judaico Americano perceberam que Adorno e Marcuse tinham sua própria agenda: não lutar contra o fascismo per se, mas promover o marxismo e uma agenda política de esquerda. O marxismo e o fascismo são, conforme já visto, bastante próximos; são ideologias coletivistas da esquerda. Seus inimigos comuns são, é claro, o livre mercado e as diversas instituições do setor privado, incluindo a igreja e a família tradicional. Marxismo e fascismo, ambos procuraram livrar-se do capitalismo e recriar a ordem social. Assim também Marcuse, Adorno e a Escola de Frankfurt. Portanto, a Escola de Frankfurt decidiu reembalar o fascismo como forma de capitalismo e tradicionalismo moral. Com efeito, eles reinventaram o fascismo como fenômeno da direita política. Nesta interpretação estapafúrdia, o fascismo foi transformado em duas coisas que os verdadeiros fascistas desprezavam: livre mercado e apoio a uma ordem moral tradicional. Resoluta e determinada, a Escola de Frankfurt, tornando o povo menos apegados às principais instituições econômicas e sociais da sociedade americana, lançou um programa maciço para erradicar o fascismo nascente nos Estados Unidos. O documento clássico sobre este ponto é a famosa Escala F de Adorno. O F vem de fascismo. Adorno esboçou-a em seu livro The Authoritarian Personality [A Personalidade Autoritária], escrito em 1950. O argumento de base consistia em afirmar que o fascismo é uma forma de autoritarismo e que a pior manifestação do autoritarismo é a repressão voluntariosa. Adorno argumentou que o fascismo desenvolve-se cedo e que podemos encontrá-lo no apego dos jovens à superstição religiosa e aos valores convencionais pertencentes à classe média de família, sexo e sociedade.15 Cínico, Adorno produziu essa lista de perguntas, objetivando detectar afinidades fascistas: “A obediência e o respeito pela autoridade são as virtudes mais importantes que uma criança deve aprender [...] A homossexualidade é uma forma particularmente doentia de delinquência [...] Nenhum insulto à própria honra deve ficar impune [...] Não importa seu modo aparente de agir, os homens estão interessados em mulheres por apenas uma razão”. Resumindo, uma resposta positiva já faria da pessoa um fascista

em ascensão. A lógica subjacente à posição de Adorno estava ali para garantir que o fascismo alemão e italiano seriam, em seu cerne, caracterizados pela repressão interna tanto psicológica quanto sexual. No entanto, um momento de reflexão mostra por que sua posição não tem sentido. De modo geral, a sociedade, no que dizia respeito à religião, à família e à sexualidade, era bastante semelhante em todos esses países, permitindo-se a variações moderadas. Talvez alguém argumente, não sem especulações, que os alemães da época eram mais rígidos do que, por exemplo, os franceses, mas quem argumentaria que os italianos eram mais oprimidos do que, digamos, os ingleses? Assim a Escala F de Adorno não tinha poder para explicar por que o fascismo chegou ao poder na Alemanha e na Itália, mas não em outros lugares. A maioria dos verdadeiros fascistas, observa objetivamente o historiador Anthony James Gregor no livro The Ideology of Fascism, “não teria atingido pontuações especialmente altas”.16 A única pergunta que de fato teria descoberto afinidades fascistas — “Você apoia o aumento do poder do Estado centralizado sobre os indivíduos, as famílias, as igrejas e sobre todo o setor privado?” —, Adorno deixou de fora da Escala F, provavelmente por ocasião de que progressistas e democratas a isso responderiam positivamente. Dado o absurdo patente do antifascismo de Adorno com sua Escala F obviamente fraudulenta e pseudocientífica, por que os principais meios de comunicação da academia americana apaixonaram-se por ela? Por que acompanharam Adorno e declararam seu trabalho como sendo a base definitiva da educação antifascista? Abreviando a resposta, até mesmo naquela época a academia tinha fortes inclinações progressistas; além do mais, os progressistas estavam em busca de como encobrir a cumplicidade progressista com o fascismo e com o nazismo. Os progressistas já começavam a enterrar aquilo que os associava com Mussolini e Hitler. Ato contínuo, ocultavam também o vínculo de FDR com o fascismo e com o nazismo. Em meio a tudo isso, os progressistas perceberam, para admiração e alívio, que ali estava um intelectual, judeu da

Alemanha, afirmando que o fascismo era um fenômeno de direita. Óbvio dizer, o que ele fazia era ligar o fascismo aos conservadores que apoiavam o capitalismo e afirmavam a religião e a família tradicional. Tratava-se de uma mentira — os verdadeiros fascistas detestavam essas instituições e intentavam destruí-las —, mas uma mentira politicamente conveniente. Dessa forma, com prazer os progressistas aderiram à falácia e a brindaram; e o brinde perdura. Em 2005, por exemplo, Alan Wolfe, sociólogo progressista, admitiu falhas na obra de Adorno, mas elogiou seu livro The Authoritarian Personality como “mais relevante agora”, pois “parece capturar o prisma por que muitos políticos da direita cristã enxergam o mundo”.17 O valor de Adorno é que ele capacita muitos a dizer: “Abaixo o fascismo! Agora, vamos nos livrar do conservadorismo e expor esse pessoal maligno da direita”.

O Pervertido Sexual como Antifascista Agora, cumpre passar de Adorno para um réu sob ainda maiores acusações, Marcuse, que fez duas contribuições significativas para conferir ao progressismo sua reputação antifascista, cada uma delas significativa por direito próprio. A primeira delas é, em certo sentido, derivada. Ela procede de um pensamento corolário de Adorno. Se o fascismo é definido pela repressão interna tanto psicológica como sexual, conforme Adorno defendia, o antifascismo significa o oposto — significa libertação interna tanto psicológica como sexual. Esta é a mensagem do primeiro livro importante de Marcuse, Eros e Civilização. Marcuse defendeu a liberdade sexual ao inverter o famoso argumento que Freud apresenta em sua obra O Mal-Estar na Civilização. Freud argumenta que as civilizações se constroem reprimindo impulsos eróticos e sexuais. Esses impulsos estão transbordando e, se não controlados, terão o poder de produzir o caos social. Mas quando controlados, quando, por assim dizer, adiada a gratificação, pode-se daí canalizar as energias e voltálas a iniciativas produtivas. Marcuse argumenta o contrário, que a sociedade capitalista tecnológica moderna estabeleceu elaborados sistemas de controle dos órgãos sexuais, o que Marcuse chama de “o sacrifício da libido”. Marcuse não só culpa o

sistema do livre mercado por, supostamente, codificar e comercializar o sexo — transformando-o em mercadoria —, mas além disso culpa os costumes religiosos e sociais de repressão e escravização dos instintos sexuais. Triste em constatar, Marcuse notou que existe atualmente na América uma “canalização da sexualidade na reprodução monógama” e um “tabu sobre perversões”. Despojada e involuntariamente cômico, Marcuse torna público que essa “sexualidade reprimida” indiciava o emergente fascismo americano. Se permanecer presa, “tamanha sexualidade será manifesta nas formas mais hediondas e tão bem conhecidas”, incluindo as “orgias sádicas e masoquistas” dos prisioneiros e “guardas do campo de concentração”. O mantra de Marcuse era “acabe com isso tudo”. Liberte a libido. Libere tudo. Marcuse denominou o que ele promoveu de “sexualidade polimórfica”.18 Celebrando a mais absoluta perversão, tal mantra não poderia estar mais perfeitamente preciso do que na década de 1960, quando uma geração de jovens ativistas alienou-se dos pais, dos pastores e das normas da sociedade. Eles estavam buscando por um guru do sexo, e Marcuse tornou-se seu apóstolo da liberdade sexual, descrição de si mesmo que rejeitava formalmente — ele gostava de posar de intelectual desinteressado —, mas também entendia que, precisamente, tal era a base para sua posição de celebridade na contracultura dos anos 1960. Marcuse supria os jovens de bases formuladas para suas aventuras genitais: era isso que os filhos da revolução sexual mais gostavam nele. Basicamente, Marcuse fez da boêmia sexual sua valente manifestação do antifascismo. Assim como seu colega Adorno, Marcuse estava por criar uma grande fraude. Os enfadonhos boêmios da década de 1960 não faziam ideia, mas Marcuse certamente sabia que os nazistas e os fascistas italianos eram eles mesmos — quase que unanimemente — boêmios. O próprio Hitler foi pintor e artista antes de entrar para a política. Richard Evans, historiador, não hesita em chamá-lo de “boêmio”.19 Obcecado pela música, costumava participar do Festival de Bayreuth. Segundo Hitler, a música de Wagner refletia o triunfo da arte sobre a vida. Ele também era vegetariano. Hitler tinha uma amante secreta chamada Eva Braun, com quem só casou um dia antes de ambos cometerem suicídio. No caso deles, o voto “até que a morte nos separe” foi,

literalmente, uma questão de horas. Hitler desprezava o cristianismo considerando-o uma espécie de doença e costumava comentar que buscaria por fim erradicá-lo no Terceiro Reich. “O cristianismo puro”, dizia Hitler, “conduz simplesmente à aniquilação da humanidade [...] Sejamos os únicos imunes a esta doença”. Embora reconhecesse não convir politicamente o ataque aberto ao cristianismo, Hitler o chamou, em particular, de “invenção de cérebros doentes: não se poderia imaginar nada mais sem sentido”. Sobre o cristianismo, palavras de Hitler: “A catástrofe para nós é a de estarmos amarrados a uma religião que se revolta contra todas as alegrias dos sentidos”.20 Himmler, segundo braço direito de Hitler e comandante da SS, era ateu e tinha sua secretária, Hedwig Potthast, como amante. Embora por vezes retratado como rígido tradicionalista moral, nada poderia estar mais longe da verdade: Himmler imaginava fazendas de procriação humana em que os tipos arianos selecionados se reproduziriam de forma promíscua com mulheres arianas selecionadas para reprodução. Nas palavras da historiadora Sarah Helm, “um constante fornecimento de crianças arianas perfeitas”. Himmler também era entusiasta da alimentação natural e fervoroso defensor da agricultura orgânica. Ele insistia no cultivo de alimentos orgânicos em campos de concentração; certa feita, parou em Auschwitz simplesmente para visitar a horta que lá havia. Muitos dos principais nazistas condenavam o congestionamento das cidades e afirmavam o valor de viver em comunhão com a natureza. O historiador Stanley Payne escreve que, no nazismo, encontram-se “as primeiras grandes expressões do ambientalismo moderno”.21 Goebbels também, ateu e galanteador, com uma série de romances notórios, sendo um com Lida Baarova, atriz tcheca. Ele escreveu uma peça e um romance autobiográfico, sem contar que se supunha romanesco, e escreveu sua tese de doutorado na Universidade de Heidelberg sobre o Romantismo alemão. Antes de entrar na política, Goebbels queria ser artista e escritor. Se vivo hoje, seria fácil imaginá-lo vivendo nas redondezas de Greenwich Village e ensinando línguas românicas na Universidade Columbia ou na Universidade de Nova Iorque.

O mesmo com Mussolini, boêmio que escreveu uma peça e se considerava talentoso violinista. Também era ateu e, apesar de casado, homem promíscuo que, dado à jactância, ostentava sua promiscuidade. Richard Evans, historiador, nota que “Mussolini gastou um bom tempo com a própria vida sexual; sua imagem oficial como homem de família, amoroso e fiel existia em paralelo a uma imagem não oficial do homem de impulsos priápicos incontroláveis”.22 Burgueses religiosos e tradicionalistas morais é que esses homens não foram. Progressistas e esquerdistas ocasionalmente procuram defender Adorno e Marcuse e provar o tradicionalismo moral dos fascistas, alegando que estes eram contra os homossexuais. É verdade que os homossexuais foram, mais tarde, um dos grupos capturados e presos nos campos de concentração, mas isso nada teve que ver com questões morais. Em vez disso, baseava-se na ideia nazista de que era imperativo que a Alemanha multiplicasse sua população nórdica ou ariana, e a homossexualidade, por sua vez, era vista como impedimento a esse processo. Dois homossexuais, ambos notoriamente extravagantes, do Partido Nazista — o especialista jurídico do partido, Helmut Nicolai, e Achim Gerke, que serviu no Ministério do Interior de Hitler — foram purgados em 1935 com base nessa alegação. Extensamente reconhecido nas décadas de 1920 e de 1930, um número significativo de camisas pardas nazistas, incluindo o líder do grupo, Ernst Röhm, era “como tantos dos primeiros nazistas”,23 homossexuais. William Shirer conta que o líder dos camisas pardas de Munique, Edmund Heines, não só era um assassino condenado, mas também homossexual. Os comunistas e os democratas sociais zombavam dos camisas pardas nazistas, chamando-os de nomes como a Irmandade dos Efeminados na Casa Parda. Himmler e Goebbels, temerosos de que uma reputação gay prejudicasse as perspectivas políticas do Partido Nazista, exortaram Hitler a reduzir a presença homossexual entre os camisas pardas. Mas Hitler se recusava, afirmando que essas coisas diziam respeito “puramente à esfera privada”. Os camisas pardas, enfatizava ele, não eram uma “ordem da moral social”, mas, sim, um “grupo de guerreiros”. Por que então, perguntou Hitler, ele deveria se importar com o que seus homens faziam no quarto depois de cumprir com o dever?24

Os camisas pardas só se tornaram um problema quando ameaçaram substituir, como brigada de execução do país, a polícia alemã e as Forças Armadas. Hitler precisava do exército e da polícia, e assim concordou, ainda que relutante, em suprimi-los. Quando apareceu no Hotel Hanselbauer para prender Röhm e seus principais tenentes, Hitler se viu no meio de uma orgia homossexual. Na primeira porta que abriu, deparou-se com Heines nu na cama com um jovem de dezoito anos, comandante das tropas dos camisas pardas. Hitler lhe disse: “Se não estiver vestido dentro de cinco minutos, atirarei em você aqui mesmo”. Heines saltou de debaixo dos lençóis e fez a saudação Heil Hitler. Quando os homens de Hitler abriram a porta de Röhm, o cabeça dos camisas pardas, fingiu ser aquela uma atitude muito casual. Hitler simplesmente disse: “Você está preso”. Uma a uma, as portas se abriam e as duplas dos camisas pardas saíam depressa, despidos de várias formas.25 Essa era a atmosfera nazista daqueles dias, o que mais se parece com a atmosfera da Village Voice ou a Convenção Nacional Democrata do que com a National Review ou com a atmosfera da Casa Branca de Trump.

Intolerância Repressiva Marcuse era ativo em todas as frentes. Em seu livro One Dimensional Man [O Homem Unidimensional], ele critica o capitalismo americano por reduzir todos os valores aos valores do mercado e os seres humanos a consumidores manipulados pela publicidade corporativa. A solução de Marcuse consistia em combater a publicidade corporativa com a propaganda política, visando motivar a consciência pública e mobilizá-la contra o capitalismo. Marcuse também escreveu seu An Essay on Liberation [Um Ensaio sobre a Libertação], mostrando à esquerda na América como ela poderia ajudar as revoluções socialistas no Vietnã, Cuba e mundo afora: em essência, ajudaria ao tornar-se parte de uma guerrilha de resistência nos Estados Unidos. Mais uma vez, música aos ouvidos de ativistas de esquerda na década de 1960. Sem dúvida eles pensaram: “Quer dizer que eu também posso me juntar a uma guerrilha à lá Che Guevara bem aqui, em Ann Arbor, Michigan?”.

Aqui, desejo concentrar-me na ideia de que Marcuse provavelmente seja melhor lembrado como alguém que não poderia ser mais pertinente nos dias de hoje, o que bem se percebe a partir de um famoso ensaio escrito por ele, intitulado Repressive Tolerance [Tolerância Repressiva]. Este, publicado em 1970, junto de vários outros em um livro chamado A Critique of Pure Tolerance [Crítica da Tolerância Pura]. Sigamos o argumento do ensaio, pois ele fornece a base para a intolerância viciosa que a esquerda atualmente desencadeia contra todas as formas de dissidência em nossa cultura. O assédio, a opressão e o terrorismo contra conservadores no câmpus universitário, a ridicularização dos republicanos na mídia, a profanação da bandeira americana, a interrupção dos comícios de Trump — todo esse comportamento recebe sua justificativa moral no notório ensaio de Marcuse. Ele começa admitindo que, se nada mudar no cenário em questão, virtudes liberais clássicas como a tolerância e a liberdade de expressão são desejáveis. Mas, segundo ele, dada a estrutura de classe da sociedade, em que os grupos governantes têm a maior parte do poder e os grupos desprotegidos têm pouco, “os limites da tolerância estão lotados”. Estender tolerância a grupos intolerantes, Marcuse argumenta, “na verdade protege as já consagradas máquinas de discriminação”. Portanto, Marcuse argumenta que um princípio geral de tolerância liberal — tolerância em relação a todos os pontos de vista — deve ser abandonado: “A tolerância não pode ser indiscriminada e igual no que diz respeito ao conteúdo daquilo que é expresso, nem em palavras nem em ações; a tolerância não pode proteger palavras de falsidade nem atitudes erradas, estas manifestando que contradizem e neutralizam as possibilidades de libertação”. Na sociedade, Marcuse insiste: “Certas coisas não podem ser ditas, certas políticas não podem ser propostas, certos comportamentos não podem ser permitidos, sem fazer da tolerância um instrumento para a continuação da servidão”. Marcuse não era nada menos que contundente sobre o que defendia: “revogue-se sistematicamente a tolerância para com opiniões regressivas e repressivas”. O que especificamente Marcuse procurava reprimir? Ele cita “a retirada da

liberdade de expressão e do direito de assembleia de grupos e movimentos que promovem políticas agressivas, armamento, chauvinismo, discriminação racial e religiosa, ou que se opõem à ampliação dos serviços públicos, segurança social, assistência médica, etc”. Além disso, Marcuse acrescenta que sua “abordagem poderia exigir novas e rígidas restrições aos ensinos e práticas nas instituições educacionais”, incluindo a supressão de certos tipos de “pesquisa científica”. Sem rodeios, Marcuse clama por “intolerância contra os movimentos de direita e tolerância aos movimentos de esquerda”. Ele confessa que seu objetivo é “mudar o equilíbrio entre a direita e a esquerda, restringindo a liberdade da direita”, para, assim, “fortalecer os oprimidos contra os opressores”. O argumento de Marcuse resume-se nesta frase: sem tolerância para com o intolerante. Na década de 1960, os acólitos de Marcuse entoaram uma máxima semelhante: “Abaixo a liberdade de expressão para os fascistas”. Marcuse lembra seus leitores de que, quando os fascistas planejavam um massacre, “os discursos dos líderes fascistas e nazistas eram o prólogo imediato ante o massacre”. No entanto, ele diz: “Poderia ter sido possível interrompê-lo enquanto ainda estivesse na posição de mensagem propagada, antes que fosse tarde demais”. Na verdade, se desde antes não houvesse tolerância para com os nazistas, “a humanidade poderia ter evitado Auschwitz e uma guerra mundial”. Marcuse convida companheiros esquerdistas e progressistas a dar à direita na América o que se pode chamar de tratamento fascista ou nazista — uma forte dose de repressão e intolerância.26 À primeira vista, “restringir a liberdade de expressão para fascistas” soa irrepreensível. Mas basta refletir um pouco que a ideia torna-se problemática. Debaixo da Constituição, não são os direitos iguais a todos os cidadãos e, assim sendo, não têm eles os mesmos direitos à liberdade de expressão, à livre assembleia, e assim por diante? Se assim for, os fascistas também têm tais direitos. Então, com base em que os fascistas na América podem ter seus direitos negados? Visto ter isso em mente, Marcuse obviamente não acredita nos direitos iguais em pé de igualdade para todos os cidadãos; nem seus seguidores de hoje, pelo visto.

Além disso, Marcuse não prova nem sequer por um instante que os grupos que ele pretende reprimir são de fato fascistas. O alvo de Marcuse não são nazistas, mas sim patriotas, republicanos e conservadores. O significado verdadeiro de seu ensaio é o seguinte: não à liberdade de expressão para patriotas e conservadores! Nenhuma tolerância para capitalistas e cristãos! Já era esperado, fascistas e nazistas, eles mesmos procuravam minar as instituições da democracia liberal como a liberdade de expressão e a tolerância, ato congênere aos ensinamentos de Marcuse. Lutar contra o fascismo com intolerância é uma coisa. Mas lutar contra o liberalismo clássico e o conservadorismo americano moderno com intolerância é, a bem da verdade, fascismo. Stanley Payne, historiador — que não é conservador —, sem dúvida entendeu a mensagem. Em seu livro A History of Fascism, Payne analisa o argumento de Marcuse sobre a tolerância repressiva e conclui: “Em vez de apresentar uma interpretação do fascismo, Marcuse parece simplesmente refletir o tipo de pensamento que, desde o princípio, formou o próprio fascismo”.27 Em outras palavras, quem quiser saber como é um fascista, que comece com Marcuse. Às vezes me pergunto como é que Marcuse, um refugiado da Alemanha nazista, poderia tão sofisticamente recomendar as mesmas táticas nazistas das quais fugiu. Lendo Marcuse — sua admiração maquiavélica pelo uso astuto da força, sua exaltação do poder nietzschiano —, acho que descobri. Qualquer que fosse sua repulsa ao antissemitismo nazista, Marcuse entendeu que o uso de táticas terroristas da Alemanha nazista era efetivo. Eles conseguiram, os nazistas derrotaram seus adversários e os subjugaram. Resumidamente, eles produziram o seu próprio Gleichschaltung. Então, Marcuse imaginou, por que nós, que também somos de esquerda, não aplicamos algumas dessas mesmas táticas triunfantes nos Estados Unidos? O objetivo último de Marcuse nesse ensaio é bastante claro. Ele pretende capacitar progressistas e esquerdistas ao uso de todo tipo de tática, desde a discriminação até a repressão e a violência direta, a fim de erradicar sua oposição conservadora. Não se preocupe com ser intolerante, ele diz, mas lembre-se somente de que a luta é contra a intolerância! Percebe-se assim como grupos facínoras de esquerda, Black Lives Matter, Antifa e todos os demais, recebem suas táticas de guerrilha contra a moral.

Há, na tese de Marcuse, um corolário final que geralmente passa desapercebido. Marcuse não só autoriza o que for preciso para o uso de táticas opressoras e terroristas contra a direita. Ele também garante aos esquerdistas que o escape é certo, eles podem fazer o que quiser e sair ilesos, afinal são eles é que estão do lado da humanidade e da libertação. Vale considerar por um instante o porquê de o comportamento predatório de Bill Clinton ser rotineiramente desculpado pela esquerda, mesmo por supostas feministas que ficariam loucas se um republicano ou conservador fizesse algo remotamente parecido. É útil lembrar que Bill não foi um mero galanteador; muitas mulheres o acusaram de assédio, tentativas de agressão e até mesmo estupro. A explicação óbvia para tamanha imunidade é que Bill está politicamente ao lado dos anjos, ou seja, ele está no campo progressista e, portanto, não há limites quanto ao nível de proteção que lhe é permitido. A mídia de esquerda foi meticulosamente protetora ao falar do filantropo democrata Jeffrey Epstein e de sua ilha, onde eram organizadas orgias, muito menos mostrou interesse em cobrir as perversidades de Anthony Podesta com suas práticas de “spirit cooking”*. Mesmo o caso de Anthony Weiner com escândalos envolvendo meninas menores de idade não seria problema para a esquerda, desde que não causasse maiores alardes e tornasse Wiener politicamente calamitoso. Concluo esta parte sobre Marcuse voltando-me aos artigos esquerdistas mencionados anteriormente; estes insistem que os escritos da Escola de Frankfurt são de necessidade crítica para entender Trump e nosso momento atual. Acredito eu que possamos ver agora que de fato são. Deles não se entende Trump e o GOP como fascistas perigosos. Pelo contrário. Eles mostram é que Marcuse, Adorno e os demais eram fraudes intelectuais e políticas. Artistas vigaristas de esquerda, uma classe que criou sua própria versão da grande mentira e deu uma bela demonstração de como orquestrar uma vingança nos moldes fascistas enquanto posando de antifascistas.

A Violência de Risco de George Soros Finalmente, voltemo-nos para o terceiro facínora da trilogia, investidor e magnata dos negócios, George Soros. Como Heidegger e Marcuse, ele também faz parte do Gleichschaltung progressista e todos os três parecem

fazer isso da mesma maneira. De origem húngara, Soros passou ao patamar de bilionário por meio de astutos investimentos globais e manipulações da moeda; seu grupo Quantum Fund é um dos primeiros fundos de hedge, ou fundo de cobertura, privados do mundo. Ao mesmo tempo que Heidegger e Marcuse podem ser considerados intelectuais por trás do fascismo progressista, Soros com certeza é seu maior financiador. Soros é o que mais financia cerca de duzentos grupos esquerdistas, incluindo Planned Parenthood, MoveOn.org e várias organizações ambientalistas e de direitos humanos de esquerda. Todos são resolutamente opostos a Trump e ao GOP. A Marcha das Mulheres, propagada pela mídia como uma erupção espontânea contra Trump, foi subsidiada em peso pela rede de Soros. Ele também apoia os chamados grupos antifascistas e a organização Black Lives Matter. Em 2015, por exemplo, a ONG Open Society de Soros doou 650 mil dólares em apoio à manifestação do grupo Black Lives Matter logo após o assassinato de Freddie Gray, em Baltimore. Este ano, o Pacto pela Justiça Global [Alliance for Global Justice], grupo apoiado por Soros, doou 50 mil dólares para os criminosos militantes associados ao grupo Refuse Fascism.28 Como Soros vê seu papel na formação da América e do mundo? Que ele fale por si mesmo. “Eu me imaginei como um tipo de deus”, nas palavras de Soros. “Para falar a verdade, carrego comigo, desde a infância, algumas fantasias messiânicas bastante potentes”. Quando o jornal britânico Independent pediu-lhe que explicasse essa estranha afirmação, Soros disse: “É uma espécie de doença quando você se considera um tipo de deus, o criador de tudo, mas agora estou confortável, desde que aceitei e comecei a agir assim”.29 Seria necessário voltar às declarações de Hitler após suas primeiras vitórias para ouvir palavras de tamanho calão, das quais até os déspotas mais descarados costumam se abster. E, neste caso, o que viria a ser a agenda desse “deus”? Em outras palavras, o que os grupos financiados por Soros realmente fazem? Um deles, o Revolutionary Love Project [Projeto de Amor Revolucionário], envia ativistas a audiências públicas em determinadas prefeituras e os mune de roteiros sobre como humilhar deputados e senadores republicanos. A ideia toda é criar uma impressão artificial — e, em seguida, exagerada nos meios

de comunicação — de que há uma onda de oposição pública a Trump e ao GOP. Outra tática favorita dos grupos financiados por Soros é o falso ataque racista. Houve dezenas desses dentro dos últimos anos, principalmente nos câmpus universitários. Esquerdistas pintam frases racistas nas paredes ou nos banheiros e depois, já posto o alvoroço, eles próprios, os perpetradores, organizam manifestações em protesto contra o que eles afirmam ser um ressurgir do ódio, e tudo inspirado por Trump.30 Soros não apenas financia o ativismo como financia a violência disruptiva. Seus esquadrões fantasiados e empunhando bastões equivalem a um exército particular. Ele criou uma milícia paga de marginais muito semelhante aos camisas negras, na Itália, e aos camisas pardas, na Alemanha nazista. A estratégia de Soros é lançar dezenas, até mesmo centenas de grupos, e depois ver quem dá conta. Tomando emprestado do capital de risco, meu termo para o que Soros faz é violência de risco, operada através de manifestantes pagos. O manifestante remunerado é fenômeno novo na política americana. Na década de 1960, havia manifestantes de esquerda, até mesmo os violentos, mas ninguém era alugado por hora. Os grupos de Soros, pelo contrário, lançam anúncios de ‘contrata-se’ para arruaceiros, marginais e ladrões. Vi um anúncio no Craigslist oferecendo quinze dólares por hora para manifestantes; a vaga, causar problemas. Daí os esquerdistas podem imaginar que estão lutando contra Hitler e recebendo por vandalismo. Infelizmente o anúncio não menciona se Soros também oferece plano de saúde. David Brock, administrador de vários grupos financiados por Soros, dentre eles o Media Matters, é seu escudeiro por excelência. Conheço Brock desde os velhos tempos, quando ele professava ser conservador. Já naquela época, Brock era conhecido como um homem desprezível e desonesto. Ele se gabava por não ter escrúpulos, de estar disposto a mentir por uma causa. Tendo sido exposto, confessou. No entanto, longe de tentar limpar o que havia feito, ele se apresentou à esquerda como alguém disposto a oferecer sua inescrupulosidade pela causa deles. Brock fingiu ter sido forçado àquela “conversão” política, causada pelos conservadores de Reagan que desaprovavam sua homossexualidade. A bem da verdade, sua postura homossexual era bem conhecida entre nós, jovens

reaganitas, e não tínhamos nenhum problema com isso, desde que Brock mantivesse discrição pública, o que ele fazia. Apesar dos pesares, quando Brock perdeu o rumo e vendeu seus serviços para a esquerda, parte da aceitação que conseguiu estava ligada à homossexualidade. E-mails divulgados pela Wikileaks mostram Neera Tanden, ativista de esquerda e chefe do Centro em prol do Progresso Americano, descrevendo Brock como alguém “obscuro” e uma “ameaça”.31 Com Brock, mas também com tantos jovens nazistas, a maldade e o oportunismo parecem andar juntos. Seja qual for a posição política, todos os que conhecem Brock podem ver quão bem ele se encaixaria com os antigos camisas pardas homossexuais. De vez em quando consigo imaginá-lo em posição de sentido e saudando de braço erguido sempre que Soros entrar pela porta. Posso parecer grosseiro, até mesmo insensível, no uso dessa linguagem quando falo sobre Soros, judeu que, afinal de contas, refugiou-se do nazismo. Além do mais, Soros afirma ser devoto do filósofo Karl Popper; uma rede deste grande magnata, a Open Society Institute, recebeu seu nome por causa de um dos livros mais conhecidos do filósofo. Popper é um paladino das ideias clássicas liberais de liberdade de expressão e debate aberto, o que faz com que ele e Soros estejam em um relacionamento bastante estranho. Vasculhei o trabalho de Popper para descobrir o que Soros viu nele, mas não achei nada. Sou forçado a concluir que tamanho apreço por Popper é completa fachada. Isso faz com que Soros possa fingir ser amigo da liberdade enquanto maquina miná-la.

O Onzeneiro de Hitler Soros adora jogar a cartada nazista, como, por exemplo, quando após o 11 de setembro depreciou o procurador-geral do presidente Bush, John Ashcroft, por questionar o patriotismo de seus críticos — uma tática que Soros comparou aos nazistas. “Isso me fez lembrar da Alemanha sob o comando dos nazistas”, Soros disse, “é o tipo de conversa que Goebbels costumava usar para alinhar os alemães. Lembro bem, eu tinha treze ou catorze anos. Foi o mesmo tipo de propaganda”.32 Essa referência à juventude torna a transcrição de uma entrevista com Soros, ao ar em 1998 pela rede CBS no programa Sixty Minutes,

especialmente reveladora. Aqui está o que Soros contou ao entrevistador Steve Kroft sobre esses dias fatídicos na Alemanha de Hitler: Kroft: Você é um judeu húngaro. Soros: Hum... Kroft: . . . que escapou do Holocausto. Soros: Hum... Kroft: . . . se… se passando por cristão. Soros: Isso. Kroft: E você viu muitas pessoas sendo levadas para os campos de extermínio. Soros: Isso. Eu tinha catorze anos. Diria que foi quando o meu caráter foi formado. Kroft: De que maneira? Soros: De um jeito que faz você pensar no futuro. É necessário entender e antecipar os eventos quando se está sob ameaça. Foi um tremenda ameaça do mal. Quero dizer — foi uma experiência muito pessoal do mal. Kroft: Meu entendimento é que você saiu com este seu protetor, ele jurando que você era o afilhado dele por adoção. Soros: Sim. Sim. Kroft: Saiu e, mesmo assim, ajudou no confisco de propriedade dos judeus. Soros: Sim. Isso mesmo. Sim. Kroft: Quero dizer, isso. . . essa parece uma experiência que enviaria muitas pessoas para o divã por muitos, muitos anos. Foi difícil? Soros: Não, de jeito nenhum. Talvez, quando criança, você não — você não veja a conexão. Mas foi, assim — não, não me causou absolutamente nenhum tipo de problema. Kroft: Sem sentimento de culpa. Soros: Nenhum.

Kroft: Por exemplo, “eu sou judeu e aqui estou, vendo essas pessoas partindo. Eu poderia tão facilmente estar lá. Eu deveria estar lá”. Nada disso? Soros: Bom, claro que eu, que eu poderia estar do outro lado ou eu poderia ser aquele de quem o objeto está sendo tirado. Mas não faria sentido eu não estar lá, porque — bem, na verdade, é cômico dizer, é como no mercado — se eu não estivesse lá, é claro que não estaria fazendo aquilo, mas outra pessoa estaria — alguém estaria tirando de qualquer forma. E foi assim mesmo — se eu estivesse lá ou não, eu não passava de um espectador, a propriedade estava sendo tomada. Então, eu... não fiz o papel de tirar essa propriedade. Assim eu não tenho sentimento de culpa.33 O que me interessa aqui não é aquilo que o jovem Soros fez — não pretendo impor peso demasiado à conduta de alguém com catorze anos de idade —, mas sim como o Soros já maduro interpreta retroativamente suas ações do passado como um rapazote que confiscava a mando de Hitler. Evidentemente, Soros acredita que acompanhar uma autoridade do governo fascista em colaboração com os nazistas no propósito de cumprir mandados de confisco aos judeus para roubar seus bens e propriedades não seja algo de que se deva sentir-se culpado ou arrependido. Por quê? Pois, assim como uma transação de mercado, o resultado teria acontecido de qualquer forma. Quem já disse isso antes? Ah, sim, claro. Lembre-se da resposta de Josef Mengele quando confrontado por seu filho, Rolf, acerca de seus crimes. Mengele insistiu que não era responsável pelo que aconteceu em Auschwitz, dado que os cativos lá já estavam sentenciados à morte. Eis então Soros montando o que pode ser chamado de Defesa Mengele. A única diferença é que Mengele não se safou, enquanto a explicação de Soros parece totalmente satisfatória para a esquerda política. Numa breve biografia de Soros para a revista New Yorker, Jane Mayer nota que Soros uma vez descreveu 1944 — o ano em que Hitler despachou mais de 500 mil judeus para campos de extermínio — como “o ano mais feliz da minha vida”. Mayer acrescenta que este foi o ano em que o pai de Soros salvou sua família fornecendo-lhes falsos documentos de identidade.

Aparentemente, o pai de Soros fez o mesmo por outras famílias judias, embora tenha vendido os papéis e, assim, lucrado com esse esforço. Mayer perguntou a Soros sobre o ocorrido e este disse: “Eu tive a sorte de ter um pai que entendeu que não estávamos no estado normal das coisas, e se seguir as regras convencionais, você morre. Muitos judeus não tomaram medidas evasivas. O que aprendi durante a guerra é que, às vezes, você pode perder tudo, mesmo a sua vida, ao não correr riscos”.34 Mais uma vez, Soros se esquiva do problema. Justamente por não ser uma época normal, parece não ser razoável ganhar dinheiro ajudando seus companheiros judeus a sair da Alemanha. Soros não enxerga assim. Ele não vê nada de errado com o que seu pai fez. Pelo contrário, ele o vê como um herói pessoal. Ele parece culpar os judeus não tão visionários quanto seu pai. Por que aqueles que pensaram à frente não deveriam se beneficiar daqueles que não o fizeram? E, mais uma vez, Soros, de maneira rude, associa toda a questão a decisões de mercado e de investimento: vejam o que acontece quando os tipos corretos de riscos não são tomados! Percebe-se em Soros o tipo de amoralismo padrão que o coloca na mesma categoria de Heidegger e Marcuse. Estes três homens foram profundamente íntimos do nazismo, com toda uma visão formada em resposta a essa relação. Consequentemente, o movimento esquerdista que eles moldaram na América também é produto desse engajamento. Somos vítimas dessa possessão demoníaca. Em certo sentido, o fascismo deixou esses três homens loucos, e agora eles estão tentando deixar todos nós loucos também. Veja como esse trio, Heidegger, Marcuse e Soros, colocou seus talentos e recursos por trás das causas esquerdistas truculentas. Heidegger apoiou abertamente os nazistas. Marcuse e Soros promovem táticas nazistas em nome de uma esquerda supostamente antifascista. Juntos, esse trio horrendo desempenhou um papel importante na destruição das universidades, na propaganda esquerdista da mídia e nas táticas dos camisas pardas usadas pelos progressistas de hoje.

Capítulo Nove

Desnazificação Este não é o fim. Não é nem o começo do fim. Mas é, talvez, o fim do começo.1 Winston Churchill, 10 de novembro de 1942

Em 1945, as forças americanas, britânicas e soviéticas convergiram na Alemanha nove meses após os Aliados chegarem à Normandia. Escondido em seu bunker em Berlim, Hitler, acompanhado de sua nova esposa, Eva Braun, viu que a derrota era, agora, fait accompli, um fato consumado. Em 30 de abril de 1945, ele fez sua resolução final. Rejeitando o conselho de companheiros leais do Partido, de fugir da cidade, Hitler e Braun retiraram-se em privado. Lá, Eva Braun engoliu cianeto. Hitler fez o mesmo, ao mesmo tempo que — para certificar-se do resultado — deu um tiro na própria cabeça. Seus partidários queimaram o corpo de Hitler de tal forma que este ficou irreconhecível, evitando assim que fosse recuperado pelos Aliados. Três dias antes, Mussolini vestiu um disfarce, entrou num carro esporte Alfa Romeo e tentou fugir da Itália com a amante, Claretta Petacci. O disfarce não funcionou; as características de Mussolini eram distintas demais. Sua amante e ele foram presos na fronteira com a Suíça. Ambos fuzilados no dia seguinte por guerrilheiros locais. O corpo de Mussolini acabou pendurado de cabeça para baixo na Praça de Loreto, em Milão. No espaço de alguns dias, Mussolini e Hitler morreram, e assim o fascismo e o nazismo chegaram a um fim ignominioso. Por mais difícil que seja de acreditar, o fascismo está de volta, não na Europa, mas nos Estados Unidos. Parafraseando o livro de Sinclair Lewis, It Can’t Happen Here [Aqui Não Pode Acontecer], sim, está acontecendo aqui. Por meio do implacável ataque contra Trump de todos os lados, a esquerda está, basicamente, tentando dar um golpe fascista. Por um golpe fascista refiro-me ao exercício do poder pelos meios não eletivos pertencentes à esquerda — principalmente a mídia esquerdista —, para reverter o resultado e

o mandato de uma eleição livre. Se o golpe for bem-sucedido, a América, de fato, deixará de ser uma democracia. Os fascistas — vestidos com trajes antifascistas — provarão que são totalmente capazes de anular a vontade do eleitorado. De certa forma, não fará mais sentido realizar eleições, pois a esquerda poderá estabelecer poder de veto sobre os resultados. Deixemos que essa concepção seja absorvida. Se realmente acreditamos que a América está enfrentando uma ameaça fascista — se reconhecemos que o argumento deste livro está correto —, então segue-se que não podemos fazer as coisas como antes. Em outras palavras, a política normal e despreocupada está amplamente obsoleta. Não faz sentido prosseguir como se o que está acontecendo não estivesse acontecendo. Em vez disso, devemos encarar a realidade da situação e elaborar uma resposta adequada ao perigo que estamos enfrentando. Neste capítulo final, mostro como fazer isso. O velho fascismo foi derrotado por força militar externa. Foi necessária uma guerra mundial com dezenas de milhões de vítimas para que isso acontecesse. O novo fascismo pode ser vencido de dentro, sem força militar. Os historiadores concordam que, se os italianos e os alemães tivessem respondido de forma diferente, eles poderiam ter impedido Mussolini e Hitler de chegar ao poder. Por exemplo, os militares e a polícia italianos eram muito mais fortes do que os camisas negras de Mussolini e, assim, poderiam ter frustrado sua marcha triunfal em Roma. Em vários estágios do ascender ao poder, Hitler poderia ter sido barrado e seus camisas pardas, dispersos ou presos. Em outras palavras, os compatriotas de Mussolini e Hitler poderiam ter parado o fascismo e o nazismo antes que fosse tarde demais. Por que eles não impediram tudo aquilo? Falando sobre a Itália, o historiador Renzo De Felice diz que a classe dominante italiana cometeu o erro catastrófico de continuar com a política normal: “Eles agiram em completa falta de imaginação política e com uma total incapacidade de assumir verdadeiras responsabilidades. Eles adotaram uma política de constitucionalizar o fascismo ao mesmo tempo que tentavam derrotá-lo”. Segundo o historiador Anthony James Gregor escreve, essa complacência “nasceu de uma indisposição de levar a doutrina fascista a sério”.2 Essa mesma complacência e covardia caracterizaram a formação e o

estabelecimento político na Alemanha. Hindenburg, Reichstag e os partidos políticos rivais tentaram “harmonizar” Hitler, sem reconhecer que ele não estava jogando com as mesmas regras deles. Ao fazê-lo, as mesmas pessoas que tinham a capacidade de parar Hitler foram as que facilitaram a sua assunção do poder absoluto e a influência do nazismo sobre toda a sociedade. Então veio o dilúvio, pelo qual a maioria desses facilitadores foram varridos. O apaziguar de Hitler continuou no fronte da política externa. Aqui, a figura-chave foi o primeiro-ministro da Inglaterra, Neville Chamberlain. Para Hitler, Chamberlain era simbolizado por seu guarda-chuva. Hitler concluiu que Chamberlain era fraco. Já não era mais, pensou ele, o desafiador Sir Francis Drake. Se tivessem lutado contra Hitler desde o princípio, a GrãBretanha e a França poderiam tê-lo derrotado. Ao acarinhá-lo, deram-lhe assim uma chance de fortalecer-se, até que a própria França foi invadida e a Inglaterra quase reduzida a escombros. Harmonizar o fascismo, ao que parece, carrega consigo um custo muito alto, custo este que pode incluir a própria sobrevivência.

Dialogando com Gregos e Troianos Hoje, os conservadores e o Partido Republicano, agora poderes governantes da nação, também estarão em grande risco se buscarem apaziguar o fascismo da esquerda política. É certo que o fascismo da esquerda atual difere em um aspecto importante do fascismo da esquerda de Hitler e Mussolini. Ao menos os antigos fascistas usavam o nome; autointitulavam-se do que eram de verdade. Nossa esquerda fascista, ao contrário, pretende passar por antifascista. Eu sei, é loucura. As mesmas pessoas que defendem o Estado centralizado carregam uma longa história de racismo e terrorismo racial, usaram o poder do governo contra os seus oponentes políticos enquanto puderam e continuam se valendo da opressão cultural e da desordem causada nas ruas para impor sua ideologia, insistindo que são eles os antifascistas. Ao mesmo tempo, reconhecendo que o fascismo e o nazismo são, agora, rótulos tóxicos — os rótulos mais tóxicos da cultura ocidental — esses autodenominados antifascistas impuseram o rótulo fascista à direita. Ainda mais loucos, eles chamam de fascistas aqueles mesmos que defendem um

governo limitado e os direitos individuais, pessoas que não chegariam nem mesmo a sonhar com usar o poder do Estado contra seus críticos ou se envolver em opressão e exclusão culturais nos moldes fascistas. A este respeito, a esquerda é como o irmão maldoso que bate no seu rosto e depois começa a lamuriar por você bater nele. Assim sendo, estamos numa situação bizarra, onde os verdadeiros fascistas fingem ser antifascistas enquanto acusam os verdadeiros antifascistas de fascismo. O mecanismo da esquerda para produzir essa inversão é a grande mentira. A grande mentira não consiste apenas em consertar os rótulos fascistas e nazistas no que dizem respeito a Trump e à direita — essa é a parte superficial da mentira, descartei-a em um único capítulo — mas, mais profundamente, visa esconder as raízes fascistas e nazistas próprias da esquerda americana. Ainda hoje, os planos e as táticas da esquerda são profundamente moldados pelo fascismo e pelo nazismo. Para esconder essa relação óbvia, a esquerda mente em todas as frentes, quero dizer, ela mente sobre quem eram os fascistas e os nazistas, e, depois, mentem sobre quem ela própria é. É conveniente analisar esse processo em andamento. Assim é que a esquerda mente sobre os nazistas, para criar um contraste falso entre os nazistas e ela. A esquerda diz que os nazistas eram capitalistas, ao passo que a esquerda era anticapitalista. Os nazistas eram cristãos; a esquerda, secular. Os nazistas eram antiaborto, já a esquerda apoiava o direito a abortar. Os nazistas eram refreados e sexualmente convencionais, mas os esquerdistas boêmios e sexualmente liberais. De fato, em cada um desses pontos, as posições da esquerda e dos nacional-socialistas são essencialmente as mesmas: anticapitalistas, anticristãos (na crença e na ética sexual) e contrários ao direito à vida. Agora, vejamos a grande mentira funcionando do outro lado. É assim que a esquerda mente sobre si mesma, para camuflar sua afinidade ideológica e tática com os nazistas. A esquerda diz que os nazistas eram o partido do racismo, mas a esquerda o partido do antirracismo. O Partido Nazista escravizou o povo, já a esquerda é o partido contra a escravidão. Os nazistas perpetraram o genocídio e o terrorismo raciais, ao passo que a esquerda jamais faria algo do tipo. Os nazistas eram violentamente intolerantes às

visões dissidentes, a esquerda era incrivelmente tolerante. Porém, com efeito, na América, o Partido Democrata é que foi o partido da escravidão, da segregação, do racismo e da Ku Klux Klan. E continua a ser o partido das políticas de identidade racial até hoje, ao passo que os republicanos foram fundados como um partido contrário à escravidão, favorecendo uma sociedade livre de preconceitos raciais; são tolerantes à antiga maneira americana, educada e respeitosa, que discursos politicamente corretos progressistas não suporta. Evidentemente, qualquer estratégia para derrotar a esquerda fascista deve começar por desmascarar, como fiz neste livro, as dimensões completas da grande mentira. Os chamados antifascistas devem ser expostos como fascistas que são. Os esforços da esquerda de expulsar Trump por qualquer meio possível devem ser reconhecidos pelo que são: uma tentativa de golpe fascista. Nós, acusados de fascistas, devemos entender que somos os verdadeiros antifascistas. Estamos vindicando os resultados de uma eleição livre cujo mandato desejamos pôr em prática. Esse é o ponto de partida; a partir daqui, podemos chegar a algum lugar. Para crédito de Trump, ele sabe que algo está acontecendo, que ele precisa fazer as coisas de maneira diferente e que deve tomar medidas decisivas contra uma extrema, e às vezes violenta, esquerda que se considera “a resistência”. Trump reconhece que a luta não é meramente legal e política; ela é, também, cultural. Por isso é que Trump, enquanto ajusta os juízes da Suprema Corte, assina ordens executivas, opera para revogar o programa Obamacare e trabalha para aprovar a reforma tributária, também coloca seu perfil multitarefa em prática ao trabalhar no ataque contra Meryl Streep, o programa Saturday Night Live e contra o elenco da peça Hamilton, Broadway, isso sem mencionar o “fracassado” New York Times e a “baixa audiência” da CNN. Independentemente de suas falhas, Trump é, agora, o homem mais destemido do país. Ao contrário de praticamente todos os republicanos passados, ele se recusa a caminhar dentro dos parâmetros estabelecidos pela esquerda. Longe de ser intimidado pelos ataques culturais esquerdistas, ele parece fazer bom proveito de seu alto e rixoso palanque, bem como de seus megafones nas mídias sociais, repelindo ataques. Sendo ele próprio um ícone

da cultura pop, sabe bem como fazê-lo. Trump é um personagem chamativo que, quanto mais recebe ataques, mais cresce. A esquerda já digeriu isso. Tendo ridicularizado e zombado dele antes, agora a esquerda está com muito medo; e muito da astúcia dos esquerdistas se dedica a descobrir uma maneira de destruí-lo. Para prevalecer — talvez até mesmo sobreviver —, Trump precisa de aliados. E onde eles estão? Felizmente, há seguidores de Trump fortemente comprometidos com seu governo, mas eles por si não conseguem levar as ideias de Trump à vitória. A única maneira de fazê-lo é com um movimento conservador e um GOP unificados. A má notícia é que grande parte da intelectualidade conservadora e da estrutura geral do GOP continuam num conto de fadas. Alguns ainda têm suas armas políticas voltadas para Trump. Os chamados Never Trumpers [Trump Jamais] parecem ter aceitado a grande mentira da esquerda de que Trump é o fascista. Como vencer com uma equipe tão confusa e desorientada? Em geral, a direita e o GOP nacional recusam-se a levar a sério ou mesmo a compreender e reconhecer os perigos das doutrinas fascistas da esquerda. Como desfazer os elementos fascistas da ideologia progressista e reduzir o poder do Estado centralizado? Eles não fazem ideia. Na verdade, o corpo de elite republicano não vê problema em podar programas do governo, mas também não está tão certo de se quer ou não erradicá-los completamente. Como combater o Gleichschaltung progressista, que busca impor uma uniformidade de pensamento em toda a cultura? Superando-o. Mas não, esses republicanos preferem ir junto dos bandidos na esperança fúnebre de acabar não se tornando um dos alvos. Como responder ao vandalismo de rua da esquerda? Acovardar-se e fugir da luta é a única coisa que esse corpo conhece. Desnorteados, sem estrutura óssea e ocos, esses republicanos procuram, acomodando o fascismo de esquerda, moderá-lo. Suas ações já estão tendo o efeito oposto. O fascismo da esquerda não mostra sinais de diminuição. Na verdade, ele se fortalece. Tendo dominado a cultura, a esquerda tem seus ideais decididamente focadas em dominar o país. Seu objetivo é livrar-se de Trump — quanto mais cedo, melhor — e também usar a nódoa fascista para desacreditar permanentemente o GOP. Em última análise, a esquerda procura fazer o que todos os fascistas fazem: efetivamente

eliminar toda a oposição. Eles querem nos desacreditar e nos reduzir a pessoas sem casta, destruindo nossas carreiras e, se por fim conseguirem, devastando nosso espírito. Depois, eles começam com o familiar processo fascista de “reeducar”, até o ponto em que não apenas deixamos de resistir, mas, na verdade, lhes prestamos reverência. Que a lição seja aprendida a partir da História e que não se cometa o mesmo erro que os italianos e os alemães cometeram. É preciso extirpar o fascismo antes que ele se torne imparável de dentro para fora; e, então, realizar uma desnazificação interior, exatamente como os Aliados fizeram no pós-guerra da Itália e da Alemanha. Nossos avós e bisavós erradicaram o fascismo de fora para dentro, mas, evidentemente, não o destruíram de uma vez por todas. Podemos erradicá-lo de dentro e, finalmente, colocá-lo nos vestígios da História.

A Agenda Antifascista Como seria uma agenda antifascista? Aqui, minha abordagem é simples. Primeiro, identifico a doutrina ideológica central do fascismo de esquerda; então, recomendo medidas políticas para desfazê-la, movendo as coisas na direção oposta. Em seguida, volto-me ao Gleichschaltung progressista na arena cultural, onde a esquerda reforça um alinhamento nos moldes fascistas através do politicamente correto e das grandes mentiras. Mostro como quebrar esse monopólio institucional, acabar com a arregimentação do pensamento e explodir a grande mentira. Por fim, volto-me à depredação fascista da esquerda, que se destina não apenas a forçar a oposição, mas também a intimidar adversários em potencial e aterrorizá-los em submissão. Aqui, mantenho-me firme e mostro como a direita deveria combater fogo com fogo. Modificando uma frase de Marcuse, frase que aplico agora à própria progênie ideológica dele, “Não ao tratamento leve com fascistas”. Em seu cerne, o fascismo é a construção do Estado Leviatã todo-poderoso. Como Mussolini deixa claro em sua Autobiografia, “O fundamento do fascismo é a concepção do Estado. O fascismo concebe o Estado como absoluto, em comparação com o qual todos os indivíduos ou grupos são relativos, apenas para serem concebidos em sua relação com o Estado. Para nós, fascistas, o Estado não é apenas uma realidade viva do presente; ele

também está ligado ao passado e ao futuro e, assim, transcendendo os limites breves da vida individual, representa o espírito imanente da nação”.3 Acredito que, se algum líder democrata dissesse isso na convenção nacional do partido, substituindo a palavra ‘fascismo’ por ‘progressismo’, a plateia toda se levantaria aplaudindo. De acordo com a descrição de Mussolini, teóricos fascistas como Giovanni Gentile falaram do Estado fascista como um único corpo e de indivíduos como células dentro desse corpo. Cada célula isolada não tem significado; as células são valiosas apenas na medida em que servem o corpo. Nas palavras de Gentile, “a vontade legítima dos cidadãos é essa vontade que corresponde à vontade do Estado”.4 Na esfera econômica, como já vimos, o Estado fascista, por meio de mandatos e de regulamentação, controla as operações das corporações e entidades privadas e, em especial, dos setores críticos como bancos, saúde, energia e educação. E esse estado Leviatã, é claro, também é o principal plano ideológico do progressismo americano moderno. Assim, o projeto antifascista é desmantelar o Estado Leviatã. Não estou sugerindo que conservadores ou republicanos devam livrar-se do Estado. Não seria algo possível nem desejável. Pelo contrário, é preciso restaurar o governo aos limites no poder e na esfera de atuação delineados pela Constituição. Sob comando progressista, o Estado agigantou-se; tornou-se voraz e tirânico. É necessário matar a besta de fome, arrancar alguns de seus órgãos e diminuí-la de tamanho. Mas como? O primeiro passo, claro, é livrar-se do legado de Obama. Isso significa derrubar o programa Obamacare, com o qual os progressistas confiscam um sexto da economia dos EUA, e substituí-lo por um sistema de saúde que restaure a gestão de regime privado e incentive a iniciativa privada. Em segundo lugar, revogar a lei Dodd-Frank e devolver as indústrias bancárias e de investimento ao controle privado. Em terceiro lugar, deve-se funilar os requisitos mínimos para beneficiados, de modo que cestas básicas cheguem à pequena população que realmente precisa. Obama aumentou deliberadamente o número de pessoas beneficiadas por cestas básicas, pois assim as torna mais dependentes do governo americano. Trump e os republicanos, no entanto, devem ir além de revogar o que

Obama fez. Eles devem passar uma reforma fiscal abrangente, o que idealmente envolve uma redução acentuada na taxa de imposto corporativo e uma taxa fixa para impostos de renda de pessoa física na faixa de 15% a 20%. Por que não ter uma forma de impostos simplificada para pessoa física, uma com poucas deduções que possam ser preenchidas numa única página? A redução e a simplificação de impostos são duas das melhores maneiras de refrear o Leviatã e, portanto, constituir um golpe de mestre antifascista. A direita também deveria reduzir abruptamente os regulamentos federais, privatizar as funções do governo ao máximo e vender as grandes extensões de terra que o governo atualmente possui sem nenhum motivo aparente. Uma das características essenciais tanto do fascismo quanto do nazismo foi eliminar a autonomia regional, transferindo todo o poder para o centro. Na Alemanha, William Shirer escreve: “Hitler conseguiu o que Bismarck, Wilhelm II e a Alemanha de Weimar nunca se atreveram a tentar — ele aboliu os poderes separados dos estados e os sujeitou à autoridade central do Reich”. O ministro do Interior de Hitler declarou, sem rodeios: “Os governos estaduais de agora em diante são meramente órgãos administrativos do Reich”.5 Aqui, na América, refletindo o que os nazistas fizeram, a esquerda progressista tem trabalhado há mais de meio século para fortalecer a autoridade do governo federal em detrimento dos estados. Este projeto foi realizado, em parte, em nome da uniformidade administrativa e, em parte, em nome da eliminação de um suposto racismo, implícito no conceito de direitos dos estados. Afinal, os direitos dos estados foram o grito de secessão e de posterior segregação e mais tarde da discriminação fomentada pelo Estado. Esse ataque esquerdista aos direitos dos estados é uma fraude. Em primeiro lugar, a razão pela qual os Pais Fundadores criaram um sistema de dupla soberania, no qual os poderes separados são atribuídos ao governo federal e aos estados, é precisamente por que eles não queriam — e os povos dos estados soberanos, que, em grande parte, tinham governo sobre si próprios, não aceitariam — uma uniformidade maçante e potencialmente tirânica de regras para todos os cidadãos. Em vez disso, eles queriam o que o economista Friedrich Hayek chamou de uma “estrutura de utopias concorrentes”, cada estado experimentando regras diferentes. Dessa forma, o povo poderia ver o

que funciona melhor. Caso não fosse do agrado a forma como as coisas são executadas no estado em questão, a pessoa poderia simplesmente mudar-se para outro estado. Em suma, os Pais Fundadores desejavam a verdadeira diversidade, e isso é o que a esquerda — ao impor um conjunto nacional de regras — procura erradicar. Sim, os direitos dos estados foram invocados para defender a escravidão e a segregação, mas lembre-se de quem impôs isso — o Partido Democrata. Assim, os democratas hoje professam defender os direitos dos estados para evitar as atrocidades que cometeram. Pode-se dizer que eles estão tentando salvar o país de si mesmos. Acredito que o lema deles seja “Impeça-nos antes antes que nos tornemos racistas contra vocês mais uma vez”. Ao contrário da propaganda de esquerda, não há nada de errado com o conceito de direitos dos estados. O problema se encontra com a ideologia do Partido Democrata, e o remédio para prevenir futuras atrocidades democratas é nunca, em nenhuma circunstância, votar em um democrata. Trump e os republicanos precisam restaurar a integridade da divisão dos poderes constitucionais original, devolvendo grandes extensões do poder federal aos estados. Reconheço que este é um projeto de longo prazo que durará mais que a presidência de Trump, porque a esquerda, com a vergonhosa cumplicidade dos tribunais, distorceu completamente o arranjo constitucional. Ainda assim, digo, que comece a restauração.

Feito Para Durar Mesmo que Trump e o GOP executem tais coisas, como, todavia, sustentálas? Como ter uma vitória feita para durar? Uma maneira de sustentar tudo isso é certificando-se de que haverá uma Suprema Corte constituída por pessoas de nossa equipe. Durante as audiências de Gorsuch, os republicanos continuaram insistindo que Gorsuch é um bom constitucionalista. Não vejo problema nisso. Mas a pergunta à qual gostaria de ter respondido é outra — Gorsuch é um bom republicano? Espero que a equipe de Trump a pondere antes de nomear o sujeito. É por isso que, além de sua filosofia do direito, a ideologia política de Gorsuch e o compromisso do GOP são importantes. Na última década, uma maioria decisiva de juízes da Suprema Corte foi nomeada pelos republicanos.

No entanto, o Tribunal permanece precariamente equilibrado entre a esquerda e a direita. Como isso é possível? Acontece que a esquerda pode contar, numa certeza euclidiana, com quatro votos. Os republicanos, pelo contrário, estão sempre no limbo. Em quem o juiz Kennedy vai votar? E, mesmo quando ele vota em favor da direita, muitas vezes surge a questão: “Sim, nós conseguimos Kennedy! Ops, mas agora perdemos Roberts”. Enquanto os republicanos chegam à Suprema Corte tentando decifrar a intenção original dos legisladores ou visando solenemente os precedentes, os democratas buscam servir a causa democrata. Nossos homens estimam a Constituição e tentam evitar até mesmo a aparência de partidarismo. Tal como acontece com Roberts, eles fazem o impossível para defender o programa Obamacare e deixar ao Congresso a incumbência de revogá-lo, enquanto a equipe democrata envolve-se precisamente com ativismo judicial para promulgar uma agenda esquerdista. Nossa equipe é completamente a favor de preservar o precedente, na verdade manter as coisas no lugar, já os democratas são completamente a favor de sempre puxar sardinha para a esquerda. Em suma, há uma desproporção do compromisso ideológico entre nós e eles, cujo resultado final é o constante bloqueio da jurisprudência da Suprema Corte ao longo do tempo em favor da esquerda. A única maneira de barrar tal efeito é nomeando republicanos ideologicamente comprometidos a lutar contra democratas ideologicamente comprometidos. É óbvio que pode haver todos os tipos de discursos pomposos possíveis sobre teorias de interpretação constitucional. Mas, no fim, trata-se de uma simples questão, de saber se as nossas leis serão aceitas e as leis deles derrubadas ou se as leis deles serão aceitas e as nossas derrubadas. É melhor — digo eu — que as nossas sejam mantidas e que as deles caiam. Tanto com a legislação quanto com a Suprema Corte, só conseguiremos o que desejamos ganhando eleições. Uma das lições da história recente é que mesmo as mudanças aparentemente duradouras no governo — veja o Obamacare — podem ser desfeitas quando outro partido retorna ao poder. A América tem vivido sob um governo dividido desde 1980; quando um partido controla a presidência, o outro normalmente controla o Congresso. É difícil consolidar alguma coisa, em especial consolidar mudanças que durem.

Mudanças duradouras só ocorrem na política americana quando o mesmo partido controla a presidência, o Congresso e os tribunais. Por sinal, não há nada de fascista sobre isso; trata-se de maiorias políticas criadas através de eleições e consentimento popular, como o que aconteceria em qualquer sistema parlamentar. Curioso notar, o domínio de um partido foi a regra, e não a exceção, na história dos EUA. De 1820 a 1860, o Partido Democrata foi o partido majoritário, controlando a maior parte da presidência, do Congresso e da Suprema Corte. De 1865 a 1932, período após a Guerra Civil, os republicanos tornaram-se a maioria. De 1932 a 1980, os democratas voltaram a ser a maior parte. Não quer dizer que, durante essas eras, o partido minoritário tenha sido excluído do governo — por vezes, a propósito, chegou a vencer a presidência —, mas mesmo assim o partido majoritário estabeleceu e controlou a agenda. Eisenhower era republicano e não tinha intenção de reverter o New Deal; e, ainda que quisesse, não teria tido sucesso. Aquela era a época do domínio democrata, cuja maré varreu Eisenhower. Durante esse tempo, os democratas, começando com FDR, criaram uma mudança semipermanente na estrutura do governo. Trump deve aspirar por fazer o mesmo na direção oposta. Significa que Trump e os republicanos devem trabalhar para construir uma aliança governamental permanente do GOP. Eles não a têm agora. E como obtê-la? Primeiro, Trump precisa garantir que tanto sua retórica como suas políticas estejam consistentemente direcionadas a consolidar e expandir seu apoio à classe trabalhadora — não apenas à classe trabalhadora branca, mas a todos os trabalhadores em geral. Operários são fundamentais para o Partido Democrata; sem eles, é muito difícil para a esquerda garantir uma maioridade eleitoral. Trump recebeu uma nova oportunidade aqui com o que Tom Perez, presidente do Comitê Nacional Democrata, já deixou claro ser um desejo seu, purgar o Partido Democrata dos eleitores e candidatos pró-vida. Em segundo lugar, Trump e o GOP devem fazer de tudo para ganhar os votos das minorias. Como o partido da aspirante classe média, não há motivo para que o GOP não obtenha 20% do voto dos negros, 50% dos votos hispânicos e a grande maioria dos votos ásio-americanos. Se os republicanos conseguissem chegar a esse patamar, os democratas jamais venceriam outras eleições de âmbito nacional. Os republicanos já têm muitas das políticas

corretas — uma ênfase em empregos e crescimento econômico —, mas o que falta é ter “organizadores comunitários” conservadores nessas comunidades para mostrar como as políticas republicanas podem reviver as cidades do interior da América e proporcionar oportunidades para todos. Esses grupos de divulgação republicana precisam ser tão dedicados quanto os “organizadores comunitários” da esquerda, que tentam inflamar as queixas comunitárias e convencer os eleitores minoritários de que seu único amigo é um grande governo (o qual é, muito pelo contrário, a fonte da maioria dos problemas). Durante a campanha, Trump investiu contra isso — demonstrando, em especial, os enormes fracassos das políticas democratas, estas que, no caso, deveriam beneficiar as comunidades minoritárias —, mas é necessário que haja um esforço republicano combinado para acompanhar as propostas do presidente e defender a livre escolha dos pais no que se refere à educação (ensino domiciliar ou escolar), o incentivo ao desenvolvimento socioeconômico em zonas urbanas, e também políticas “broken windows”, ou “janelas quebradas”, mais rígidas, de modo a garantir ruas mais seguras. O sonho americano ainda é, claramente, um atrativo aos olhos imigrantes — e deveria ser tão atraente também para os grupos minoritários que aqui já estão. Ganhar eleitores das minorias é crucial para criar a maioria republicana, uma duradoura, que possa, finalmente, derrubar o fascismo da esquerda.

O Fim da Gleichschaltung Finalmente, agora chegou a vez de analisar o semblante mais repulsivo do fascismo progressista; a saber, seu empenho em estabelecer a uniformidade de pensamento e de sentimento por todo o país. O projeto da esquerda aqui reflete aquilo que Joseph Goebbels declarou a respeito do Gleichshaltalung nazista: “O nacional-socialismo não só é uma doutrina política; é uma perspectiva universal e toda abrangente sobre os tópicos do coletivo. Esperamos que chegue o dia quando ninguém mais terá de referir-se ao nacional-socialismo, uma vez que este haverá se transformado no ar que respiramos. O povo precisa internalizar essa disposição mental, as pessoas devem apossar-se dessa postura. Tão somente quando isso for assimilado é que uma nova inclinação terá surgido na cultura”.6 A esquerda, buscando precisamente esta mesma conformidade de

pensamento e sentimento sobre toda a sociedade americana, tem seu próprio Gleichshaltalung não meramente “ateando fogo nas ruas”, mas também através de uma longa guerrilha por meio das instituições. Havendo cercado boa parte delas, a esquerda agora pode usar a academia, a mídia e Hollywood — seu Estado dentro do Estado — para, sem reservas em ato contínuo, disseminar a propaganda fascista. Concorrente a isso, tamanha propaganda expele conservadores e vozes dissidentes destas mesmas instituições. Seus marginais fascistas — autointitulando-se “ativistas” — não hesitam em assediar, intimidar e espancar aqueles que vierem a representar ameaça ao Gleichshaltalung da esquerda atual. Esse é um tipo de fascismo que exige da direita um novo tipo de reação. Até agora os conservadores contentaram-se em documentar e lastimar as tendências e predisposições da academia, da mídia e de Hollywood. Postura que não chega nem perto de ser suficiente. É preciso romper com esse monopólio da informação. É imperativo abrir um novo espaço para pontos de vista rivais e dissidentes. É necessário criar instituições culturais que façam rivalidade. E é preciso parar esses marginais que vão às ruas para não fazer nada além de causar tumulto. Isso tudo exigirá da direita nova criatividade, nova resolução, uma nova disposição para fazer uso da força física prescrita na lei. Quem disser que a força física está fora de cogitação não entende o que significa deter o fascismo. O primeiro passo é, para nós da direita, cultivarmos uma nova mentalidade. Devemos aprender a decifrar aquilo que lemos, vemos e ouvimos. Quando vemos na CNN, por exemplo, sendo dito que Trump pende a um péssimo início de mandato, devemos aprender a reconhecer que isso significa que Trump pende a um ótimo início de mandato — pois aquilo que é ruim no ponto de vista da CNN, na verdade é bom no nosso ponto de vista. Devemos nos habituar a tratar como falso tudo o que a academia progressista, a mídia progressista e o Hollywood progressista nos apresentam. Obviamente não no sentido concreto da coisa, mas num sentido mais profundo, de que os fatos estão sendo manipulados a serviço de uma metanarrativa fascista. Em suma, devemos estar sempre alertas para a grande mentira em todas as suas formas. Segundo passo, devemos usar todo o arsenal à nossa disposição, da mídia conservativa às mídias sociais, para esfolar em público a academia,

Hollywood e a mídia por seu partidarismo e exclusivismo unilaterais. Trump já vem agindo a este respeito, e é essa uma das coisas que eu mais amo nele. Gostaria de vê-lo indo mais a fundo nessa direção política, cortando os fundos federais para a Rádio Pública Nacional e para o Serviço Público de Transmissão dos EUA. Ambos são órgãos de propaganda da esquerda fascista. Quando as universidades estatais expulsam palestrantes conservadores, os legisladores republicanos deveriam mover-se depressa para cortar o financiamento federal e estatal dessas instituições. Em locais como Berkeley, onde o reitor universitário, o prefeito e a polícia local parecem conspirar para sufocar os direitos da Primeira Emenda da Constituição, Trump deveria enviar a Guarda Nacional até lá, bem do jeito como Eisenhower fez em 1957, para impedir outro grupo de democratas fanáticos de reprimir os direitos constitucionais dos estudantes negros. É lógico que a esquerda vai berrar. Mas deixe-os berrando. É para isso que estamos aqui. Note que não estamos tentando persuadir os fascistas de esquerda. Nada seria mais inútil. Pelo contrário, o que estamos por fazer é reduzi-los o máximo possível. Também estamos alertando o público de que aquilo que eles recebem da esquerda não é mero “conhecimento”, “notícias”, “entretenimento”, mas propaganda política mascarada de conhecimento, de notícias e de entretenimento. Este é o significado original das #FakeNews. Uma vez que o povo americano passe a enxergar tudo isso, o poder dos megafones da esquerda será dissolvido. E a partir daí é que então a política americana se tornará genuinamente competitiva. Estamos, aqui e agora, lutando contra todo o aparato da cultura geral contra nós. Terceiro, ao longo do tempo temos de criar nossas próprias instituições para fazer rivalidade. É claro, eu sei que não conseguiremos dar início a milhares de novos câmpus, mas a boa notícia é que, com a ajuda da tecnologia, não precisamos. Em vez disso, o que devemos fazer é criar as melhores universidades on-line, para que batam de frente com o melhor que a academia progressista pode oferecer. Se descobrirmos um jeito de providenciar uma educação de alta qualidade por uma fração do que é cobrado pelo ensino superior atual, nós podemos revolucioná-lo e desafiar, talvez até substituir, sua estrutura de poder vigente.

Também precisamos produzir nossos próprios filmes — não meramente documentários, mas também longas-metragens. Dentro de poucos anos, superei Michael Moore nos gráficos de produção de documentários, obtendo, sucessivamente, a segunda, a sexta e a oitava maior arrecadação vinda de documentários políticos de todos os tempos. Mas isso está longe de ser o suficiente. Hollywood comunica a maior parte de suas mensagens ideológicas via comédias românticas, filmes de suspense, de terror e animações para toda a família. O chefão de Hollywood não é Michael Moore; é Stephen Spielberg. Precisamos competir em todos os gêneros do cinema. Além do mais, temos de construir canais de comunicação que consigam ir mais longe do que o alcance relativamente limitado das rádios e do canal Fox News. Pense no seguinte. No mundo da comédia da TV, a esquerda tem Bill Maher, Jon Stewart, Stephen Colbert e John Oliver. Até o momento, temos pouquíssimos para competir com eles, e muitos jovens não só adquirem desses palhaços seu próprio estilo e senso de humor como também sua própria instrução política. A solução, obviamente, é que precisamos ter nossos próprios palhaços. Isto certamente levará tempo — Maher e companhia começaram com apresentações locais, fazendo seus eight days a week, “oito dias por semana”, ao estilo Beatles. Nós deveríamos ao menos já ter começado. Pense em quão valiosas seriam as doações feitas por conservadores se fossem para alguns daqueles projetos inovadores, e não tudo para as já tão conhecidas ONGs partidárias ou para as ONGs sem fins lucrativos ou para as think tanks, que há muito tempo já chegaram aos limites da eficácia. Só tomando tais medidas, com criatividade e abrangência exaustivas, é que conseguiremos alcançar a verdadeira desnazificação, uma vez que isso trará fim ao Gleichschaltung da esquerda. Devemos também lidar com as brigadas de Soros, e com isso estou falando dos marginais de rua que usam táticas de terror e de opressão para nos calar e nos apagar. Quando eles expulsarem algum de nossos palestrantes de determinado câmpus universitário, devemos enviar outros dez palestrantes e acompanhados de uma segurança pesada. Se eles destroem nossos cartazes e nossas placas, devemos do mesmo modo destruir os cartazes e placas deles. Alguns “trumpsters” abraçaram medidas defensivas como rastrear a

identidade dos Antifas mascarados em protestos para revelar seus nomes nas mídias sociais ou amarrá-los em postes e placas de trânsito com fita adesiva. Reconheço ser este um ativismo republicano atípico, mas com certeza isso dá o troco aos tirânicos de esquerda. E o mais importante, não podemos hesitar em romper a lei e a polícia sobre esses camisas pardas da esquerda. Reagan deu bom exemplo disso enquanto ainda governador da Califórnia, em 1960. Toda perturbação violenta de hoje deveria ser agressivamente julgada. O Partido Democrata, lembremo-nos, usou a Ku Klux Klan como um de seus executores políticos. A KKK não saiu da ativa por livre e espontânea vontade. Primeiro ela foi combatida por Ulysses Grant, presidente republicano, durante o período de Reconstrução dos EUA, e mais tarde pela aplicação legítima das leis com o FBI. Quando os “protestos” da Antifa chegam ao patamar de violência, crime, tumulto ou até mesmo terrorismo nacional, os culpados também devem ser julgados pela força completa da lei. Para fins de jurisprudência, cerca de duzentos esquerdistas — dos quais muitos eram jornalistas — que perturbaram com violência a cerimônia de posse presidencial foram acusados de perturbação pública, crime que pode chegar a dez anos de prisão.7 A esquerda queria nos fazer acreditar que tumultos e desordens são formas nobres de protesto político e que, de certa forma, a lei não se aplica ao caso deles. Como já é típico, casos assim caem nas mãos de juízes progressistas, que liberam os manifestantes mediante uma pena simbólica ou, afinal, nem chegam a penalizá-los. Nas confusões causadas em Berkeley foi ainda pior: apesar do turbilhão de violência, quase não houve prisões, uma vez que a polícia permaneceu inerte. Mas ninguém deveria estar acima da lei. Se juízes e júris passassem a decretar de cinco a dez anos de prisão a esses casos, todo esse absurdo rapidamente diminuiria.

Quid Pro Quo Por fim, chego à questão que tem me preocupado desde a posse de Trump: como parar o uso que a esquerda faz dos poderes governamentais contra a oposição? Sob o governo Obama, a esquerda usou os poderes do Estado — o serviço da Receita Federal Internal Revenue Service (IRS), o FBI, o Departamento de Justiça e os programas de espionagem do governo — contra

seus críticos conservadores. Como quando a IRS perseguiu grupos do movimento Tea Party com vigilância secreta e hostilização de jornalistas dissidentes como Sharyl Attkisson e James Rosen; inclusive eu fui seletivamente acusado de exceder as lei de financiamento de campanha. Nenhum americano jamais foi sentenciado e encarcerado durante as noites por oito meses pelo que eu fiz. Esse uso do poder governamental como armamento contra dissidentes é um comportamento puramente fascista. Gentile o descreve como uma etapa no desenvolvimento do fascismo, quando este “não mais é uma revolução contra o Estado, mas um Estado revolucionário mobilizado contra resíduos e restos internos que obstruem sua evolução e estruturação”. O próprio Hitler chamou esse tipo de retaliação do Estado fascista de uma forma de “terror físico e espiritual”. Segundo Hitler, o proveito de tamanho terror está em que os alvos desse mesmo horror “não estão preparados nem moralmente nem mentalmente a esse tipo de ataque”. Eles então são pegos de surpresa “até que os nervos da pessoa alvejada entrem em colapso”. De acordo com Hitler, o objetivo de tão grande terror é produzir submissão, alinhamento e conformidade política: “O adversário derrotado, na maioria dos casos, desespera-se de ter sucesso em manter resistência”.8 Como alguém que experimentou em primeira mão este uso da intimidação fomentada pelo Estado, eu sei quão ruim tudo isso é. Estou convencido de que alguns da equipe de Obama com quem tive de lidar se encaixariam muito bem no célebre Tribunal do Povo da Alemanha Nazista. Não devemos pensar que, porque estamos na América, nós estamos imunes a esse tipo de pessoa. Também temos a nossa escória da humanidade, e alguns dessa escória usam crachá. Fortemente munidos de poder estatal, justamente como as autoridades nazistas também eram, eles são muito mais perigosos do que criminosos comuns e têm à disposição tribunais, presídios e a força da Swat. Assim eu me sinto severamente tentado a propor que Trump use este mesmo aparato mortal contra a esquerda. Por que não mover o IRS, o FBI e a Agência de Segurança Nacional contra a esquerda da mesma forma como Obama fez com o Tea Party. Por que não colocar a IRS para investigar Michael Moore do mesmo modo como a administração de Obama usou o FBI para me investigar? Afinal das contas, se não fizermos a eles o que eles

fazem contra nós, como é que conseguiremos detê-los? Eles não só pararão de nos assediar e aterrorizar quando virem que nós também conseguimos assediá-los e aterrorizá-los? Pessoalmente falando, eu amaria ver Obama dormindo no beliche que usei onde fiquei confinado. E há precedentes para esta abordagem que estou indicando. No período da Guerra Civil, Lincoln soube que soldados do Exército Confederado estavam matando tropas de soldados negros capturados da União ou os vendendo como escravos em vez de tratá-los como prisioneiros de guerra com direitos legais. Lincoln imediatamente emitiu a Ordem de Retaliação. Ela dizia: “É, portanto, ordenado que, para cada soldado dos Estados da União assassinado, em violação das leis de guerra, um soldado insurgente seja executado; e, para cada soldado escravizado pelo inimigo ou vendido como escravo, um soldado insurgente seja submetido ao trabalho pesado nos serviços públicos”.9 Apesar do evidente rigor daquele comando, Lincoln sabia que era o único modo de mudar o comportamento do Exército Confederado. E mudou. No entanto, eram tempos de guerra e, pensando bem, estamos em situações diferentes. Não estamos em guerra civil, ao menos ainda não estamos, e não queremos nos tornar instrumentos da ilegalidade. Por sorte, não precisa ser assim, pois há uma melhor solução — uma solução que funcionou. Em novembro de 2016, nós expomos a bandidagem de Obama e de Hillary perante o povo Americano, o povo Americano disse “chega!” e livrou-se daqueles idiotas. Foi um bom começo. O próximo passo é investigar e processar os abusos de poder durante a administração Obama. Os esquerdistas bradarão por vendeta política — a única vendeta que eles querem é para o próprio lado deles —, mas estamos fazendo nada mais que responsabilizar Obama, Holder, Lynch, Hillary e Lerner por suas ações. Em suma, para esmagar o fascismo da esquerda, não precisamos combater ilegalidade com ilegalidade; precisamos, contudo, ser firmes e resolutos, compreendendo o tipo de pessoas com quem estamos lidando. Nós, conservadores e republicanos, estamos à altura do desafio? Sim, creio que estamos. Olhe para a nossa história. Somos o partido que batalhou uma grande guerra para pôr fim na escravidão, que combateu linchamentos e

segregação, que apagou a Ku Klux Klan, que fez oposição à eugenia e à esterilização forçada, que resistiu ao fascismo incipiente dos marginais e vândalos em 1960. Em suma, somos o partido que, por um século e meio, tem lutado contra o fascismo da esquerda política. Já vencemos antes, podemos vencer novamente. Temos agora o poder para impedi-los de continuar. Precisamos apenas pegar e fazer. Nas palavras de um lema vindo dos anos 1960, “Se não agora, quando? Se não nós, quem?”.

Capítulo Um

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31 DEVEGA, Chauncey. Donald Trump is Not the Victim. Salon, 3 jun. 2016. Disponível em: http://www.salon.com/2016/06/03/donald_trump_is_not_the_victim_the_rights_laughable_spin_a 32 HAYES, Kelly. No Welcome Mat for Fascism. Truthout, 14 mar. 2016. Disponível em: http://www.truth-out.org/opinion/item/35204-no-welcome-mat-for-fascismstop-whining-about-trump-s-right-to-free-speech. 33 HAYEK, Friedrich. The Road to Serfdom. Chicago: University of Chicago Press, 2007. p. 59. FINER, Herman. Road to Reaction. Boston: Little, Brown and Company, 1945. p. ix. 34 GOLDBERG, Jonah. Liberal Fascism. New York: Doubleday, 2007. p. 2, 7. 35 PAXTON, Robert. The Anatomy of Fascism. New York: Vintage Books, 2004. p. 49. 36 PATERSON, Tony. A Berliner in 1963—But Did Former President John F. Kennedy Once Admire Adolf Hitler? Independent, 23 maio 2013. Disponível em: http://www.independent.co.uk/news/world/world-history/a-berliner-in-1963-butdid-former-us-president-john-f-kennedy-once-admire-adolf-hitler-8629991.html. HALL, Allan. How JFK Secretly Admired Hitler. Daily Mail, 23 maio 2013. Disponível em: http://www.dailymail.co.uk/news/article-2329556/How-JFKsecretly-ADMIRED-Hitler-Explosive-book-reveals-Presidents-praise-Nazistravelled-Germany-Second-World-War.html. 37 SMITH, Denis Mack. Mussolini. New York: Vintage Books, 1982. p. 138. ALEXANDER, Neta. Is He Fascist? Haaretz, 2 abr. 2017. Disponível em: http://www.haaretz.com/us-news/1.780456. 38 GREGOR, Anthony James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 13.

Capítulo Dois

Falsificando a História 1 RIESS, Curtis. Joseph Goebbels. London: Fonthill, 2015. p. 64-65. 2 JEFFERSON, Thomas. Notes on the State of Virginia. Ed. William Peden. New York: W. W. Norton, 1982. p. 120. 3 BORITT, Gabor; CUOMO, Mario; HOLZER, Harold (Ed.). Lincoln on Democracy. New York: HarperCollins, 1990. p. 3. HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. The Federalist. New York: Barnes and Noble, 2006. p. 53. 4 BARAGONA, Justin. Chris Matthews Reacts to Trump Firing Comey: ‘A Little Whiff of Fascism Tonight. Mediaite, 9 maio 2017. Disponível em: http://www.mediaite.com/tv/chris-matthews-reacts-to-trump-firing-comey-a-littlewhiff-of-fascism-tonight/. 5 GOODMAN, Amy. Father of Fascism Studies: Donald Trump Shows Alarming Willingness to Use Fascist Terms and Styles. Democracy Now, 15 mar. 2016. Disponível em: https://www.democracynow.org/2016/3/15/father_of_fascism_studies_donald_trump.

6 CHOTINER, Isaac. Is Donald Trump a Fascist? Slate, 10 fev. 2016. Disponível em: http://www.slate.com/articles/news_and_politics/interrogation/2016/02/is_donald_trump_a_fascis 7 PAXTON, Robert. The Anatomy of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 376. 8 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 376. PAYNE, Stanley G. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press, 1995. p. 66. 9 GREENWOOD, Max. Warren: Trump Win Partly a Result of ‘An Ugly Stew of Racism. 19 abr. 2017. The Hill, 19 abr. 2017. Disponível em: http://thehill.com/blogs/blog-briefing-room/news/329640-warren-trump-winpartially-a-result-of-an-ugly-stew-of-racism. WHITMAN, James. Why the Nazis Loved America. Time, 21 mar. 2017. Disponível em: http://time.com/4703586/nazis-america-race-law/. HEER, Jeet. Trump’s Fascist Roots Lie in the Republican Party. New Republic, 10 dez. 2016. Disponível em: https://newrepublic.com/minutes/133623/trumps-fascistroots-lie-republican-party. TOMASKY, Michael. GOP: A Neo-Fascist White Identity Party? Daily Beast, 13 dez. Disponível em: http://www.thedailybeast.com/articles/2015/12/14/gop-a-neo-

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22 NIOSE, David. Our Memorial Day Collision Course with Fascism. Salon, 30 maio 2016. Disponível em: http://www.salon.com/2016/05/30/our_memorial_day_collision_course_with_fascism_donald_tru THAROOR, Ishaan. The Trump Presidency Ushers in a New Age of Militarism. Washington Post, 1 mar. 2017. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/news/worldviews/wp/2017/03/01/the-trumppresidency-ushers-in-a-new-age-of-militarism/?utm_term=.843868bacc08. 23 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press, 1995. p. 11. 24 DEMOCRACY NOW. Cornel West on Donald Trump: This is What Neo-Fascism Looks Like. Democracy Now, 1 dez. 2016. Disponível em: https://www.democracynow.org/2016/12/1/cornel_west_on_donald_trump_this. 25 FELICE, Renzo De. Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 63. MOSSE, George. The Fascist Revolution. New York: Howard Fertig, 1999. p. 22. PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press, 1995. p. 168. 26 GREGOR, A. James. Mussolini’s Intellectuals. Princeton: Princeton University Press, 2005. p. 5. 27 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 25. 28 Além dos escritos de Gentile, minha narrativa fica em dívida especialmente com o livro de A. James Gregor: Giovanni Gentile: Philosopher of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2008. 29 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 28, 31, 55, 57, 67, 87. 30 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 207, 223. 31 LAQUEUR, Walter. Fascism: Past, Present and Future. New York: Oxford University Press, 1996. p. 13. 32 DEMOCRACY NOW. Father of Fascism Studies: Donald Trump Shows Alarming Willingness to Use Fascist Terms and Styles. Democracy Now, 15 mar. 2016. Disponível em: https://www.democracynow.org/2016/3/15/father_of_fascism_studies_donald_trump. CHOTINER, Isaac. Is Donald Trump a Fascist? Slate, 10 fev. 2016. Disponível

em: http://www.slate.com/articles/news_and_politics/interrogation/2016/02/is_donald_trump_a_fascis 33 GREGOR, A. James. Giovanni Gentile: Philosopher of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2008. p. 63. 34 LANDLER, Mark; COOPER, Helene. Obama Seeks a Course of Pragmatism in the Middle East. New York Times. 10 mar. 2011. Disponível em: http://www.nytimes.com/2011/03/11/world/africa/11policy.html. 35 SMITH, Dennis Mack. Mussolini. New York: Vintage Books, 1982. p. 312. 36 TOLAND, John. Adolf Hitler. New York: Anchor Books, 1992. p. 224-225. 37 ULLRICH, Volker. Hitler. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 193.

Capítulo Três

A Jornada de Mussolini 1 HAYEK, F. A. The Road to Serfdom. Chicago: University of Chicago Press, 2007. p. 145. 2 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton University Press, 1994. p. 208. 3 SHIRER, William. The Rise and Fall of the Third Reich. New York: Simon & Schuster, 2011. p. 298. 4 ULLRICH, Volker. Hitler. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 125. 5 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. Intro. H. R. Trevor-Roper. New York: Enigma Books, 2000. p. xxiv, 10. 6 GREGOR, A. James. The Faces of Janus. New York: Encounter Books, 2002. p. 105. 7 MURAVCHIK, Joshua. Heaven on Earth. New York: Encounter Books, 2002. p. 105. 8 ______. ______. p. 101. 9 ______. ______. p. 108. 10 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton University Press, 1994. p. 39-66. 11 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 159. 12 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press,

1995. p. 84. 13 GREGOR, A. James. Young Mussolini and the Intellectual Origins of Fascism. Berkeley: University of California Press, 1979. p. 20. 14 GREGOR, A. James. Mussolini’s Intellectuals. Princeton: Princeton University Press, 2005. p. 33. 15 Para uma melhor discussão acerca de Woltmann, veja A. James Gregor em seu livro: Marxism, Fascism and Totalitarianism. Standford: Standford University Press, 2000. p. 183-186. 16 GREGOR, A. James. Giovanni Gentile. New Brunswick: Transaction Publishers, 2008. p. 100. 17 GREGOR, A. James. Young Mussolini and the Intellectual Origins of Fascism. Berkeley: University of California Press, 1979. p. 215.

Capítulo Quatro

Um Segredo do Partido Democrata 1 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. 160. 2 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 54. 3 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. New York: Enigma Books, 2000. p. 188. 4 GILBERT, Alan. The Cowboy Novels that Inspired Hitler. Daily Beast, 20 ago. 2016. Disponível em: http://www.thedailybeast.com/the-cowboy-novels-thatinspired-hitler. 5 KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright Publishing, 2003. p. 282283. 6 HITLER, Adolf. Mein Kampf. Boston: Houghton Mifflin, 1999. p. 139. 7 RICH, Norman. Hitler’s Foreign Policy. In: MARTEL, Gordon (Ed.). The Origins of the Second World War Reconsidered: The A.J.P. Taylor Debate After TwentyFive Years. Boston: Allen & Unwin, 1986. p. 136. WHITMAN, James. Hitler’s American Model. Princeton: Princeton University Press, 2017. p. 9-10. 8 ULLRICH, Volker. Hitler: Ascent, 1889-1939. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 665. EVANS, Richard. The Coming of the Third Reich. New York: Penguin Books, 2005. p. 111. 9 TOLAND, John. Hitler: the Definitive Biography. New York: Anchor Books, 1992. p. 702.

10 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. 160. 11 ALY, Gotz. Why the Germans? Why the Jews? New York: Henry Holt, 2014. p. 2. 12 BUGGELN, Marc. Slave Labor in Nazi Concentration Camps. New York: Oxford University Press, 2014. PLATO, Alexander Von; LEH, Almut; THONFELD, Christoph (Ed.). Hitler’s Slaves. New York: Berghahn Books, 2010. 13 BUGGELN, Marc. Slave Labor in Nazi Concentration Camps. New York: Oxford University Press, 2014. p. 22. 14 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 244. 15 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. xiii, 256, 76, 382. 16 SOFSKY, Wolfgang. The Order of Terror. Princeton: Princeton University Press, 1993. p. 199. 17 STANNARD, David. American Holocaust. New York: Oxford University Press, 1992. p. x, 147. 18 LEWY, Guenter. Were American Indians the Victims of Genocide? History News Network, set. 2004. Disponível em: http://historynewsnetwork.org/article/7302. 19 UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS OFFICE OF THE HIGH COMMISSIONER. “Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide”. 9 dez. 1948. Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/ProfessionalInterest/Pages/CrimeOfGenocide.aspx. 20 INSKEEP, Steve. Jacksonland. New York: Penguin Books, 2015. p. 203-204. 21 ______. ______. p. 205. 22 JACKSON, Andrew. Andrew Jackson to Rachel Jackson, March 28, 1814 [carta]. In: OWSLEY, Harriet et. al. (Colab.). The Papers of Andrew Jackson. Knoxville: University of Tennessee Press, 1980. v. 3, p. 54. BALL, Timothy Horton; HALBERT, Henry Sale. The Creek War of 1813 and 1814. Montgomery: White, Woodruff & Fowler, 1895. p. 276-277. 23 “Andrew Jackson’s Speech to Congress on Indian Removal”. 6 dez. 1830. Disponível em: https://www.nps.gov/museum/tmc/MANZ/handouts/Andrew_Jackson_Annual_Message.pdf. 24 STANNARD, David. American Holocaust. New York: Oxford University Press, 1992. p. 123-124. 25 LAWRENCE, Jane. The Indian Health Service and the Sterilization of Native American Women. In: MIHESUAH, Devon A (Ed.). American Indian Quarterly.

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Capítulo Cinco

Os Racistas Originais 1 FREDRICKSON, George. Racism: A Short History. Princeton: Princeton University Press, 2002. p. 123-124. 2 BURLEIGH, Michael. The Racial State. Cambridge: Cambridge University Press, 2013. p. 23. 3 WHITMAN, James Q. Hitler’s American Model. Princeton: Princeton University Press, 2017. p. 1, 80, 95, 104, 127, 160. WHITMAN, James Q. When the Nazis Wrote the Nuremberg Laws, They Looked to Racist American Statutes. Los Angeles Times, 22 fev. 2017. Disponível em: http://www.latimes.com/opinion/op-ed/la-oe-whitman-hitler-american-race-laws20170222-story.html. 4 BURLEIGH, Michael. The Racial State. Cambridge: Cambridge University Press, 2013. p. 45. 5 FREDRICKSON, George. Racism: A Short History. Princeton: Princeton University Press, 2002. p. 124. 6 WHITMAN, James. Hitler’s American Model. Princeton: Princeton University Press, 2017. p. 50, 138, 145. 7 KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright, 2013. p. 283. 8 MURAVCHIK, Joshua. Did American Racism Inspire the Nazis? Mosaic, 19 mar. 2017. Disponível em: https://mosaicmagazine.com/observation/2017/03/didamerican-racism-inspire-the-nazis/. 9 WHITMAN, James. Why the Nazis Loved America. Time, 21 mar. 2017. 10 ULLRICH, Volker. Hitler: Ascent 1889-1939. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 84. 11 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 246-248. ______. Mussolini’s Intellectuals. Princeton: Princeton University Press, 2005. p. 214-217. 12 ALY, Gotz. Why the Germans? Why the Jews? New York: Henry Holt and Company, 2014. p. 70, 77-78. 13 HITLER, Adolf. Mein Kampf. Trad. Ralph Manheim. Boston: Houghton Mifflin, 1999. p. 210. 14 ULLRICH, Volker. Hitler: Ascent 1889-1939. New York: Alfred A. Knopf, 2016.

p. 102-103. 15 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. Intro. H. R. Trevor-Roper. New York: Enigma Books, 2000. p. 117-118, 373-374. 16 ALY, Gotz. Why the Germans? Why the Jews? New York: Henry Holt and Company, 2014. p. 72. 17 ______. ______. p. 8. 18 FRANKLIN, John Hope. From Slavery to Freedom. New York: Alfred A. Knopf, 1967. p. 341. HIGGINBOTHAM, A. Leon. Groundwork: Charles Hamilton and the Struggle for Civil Rights. Intro. Genna Rae McNeil. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1983. p. xvi. 19 KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright, 2013. p. 90. 20 ______. When Affirmative Action Was White. New York: W. W. Norton, 2005. p. 81. 21 BELL, Derrick. Faces at the Bottom of the Well: The Permanence of Racism. New York: Basic Books, 1992. p. 1, 3, 10, 52. KOVEL, Joel. White Racism. New York: Columbia University Press, 1984. p. xi, 32. WEST, Cornel. Keeping Faith: Philosophy and Race in America. New York: Routledge, 1993. p. 236. 22 JEFFERSON, Thomas. Notes on the State of Virginia. New York: W. W. Norton, 1982. p. 143. 23 LINCOLN, Abraham. Speech on the Dred Scott Decision. Springfield, Illinois, 26 jun. 1857. In: CUOMO, Cuomo; HOLZER, Harold (Ed.). Lincoln on Democracy. New York: HarperCollins, 1990. p. 90-91. 24 Dred Scott v. Sandford, 60 U.S. 393 (1856). 25 TOWNSEND, John. The Doom of Slavery in the Union: Its Safety Out of It. [Enviado para a Vigilant Association de Edisto em 29 out. 1860]. Disponível em: http://civilwarcauses.org/townsend.htm. 26 WHITMAN, James. Hitler’s American Model. Princeton: Princeton University Press, 2017. p. 59-60. 27 WILLIAMSON, Joel. The Crucible of Race. New York: Oxford University Press, 1984. 28 STAMPP, Kenneth. The Peculiar Institution. New York: Vintage Books, 1984. p. 193.

29 ULLRICH, Volker. Hitler: Ascent 1889-1939. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 672. 30 BURLEIGH, Michael. The Racial State. Cambridge: Cambridge University Press, 2013. p. 82.

Capítulo Seis

Pessoas Descartáveis 1 SANGER, Margaret (Ed.). Intelligent or Unintelligent Birth Control?. Birth Control Review, maio 1919. Disponível em: https://lifedynamics.com/app/uploads/2015/09/1919-05-May.pdf.WEIKART, Richard. From Darwin to Hitler. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 135. 2 POSNER, Gerald; WARE, John. Mengele. New York: Cooper Square Press, 200. p. 9. 3 ______. ______. p. 279. 4 KLIFF, Sarah. The Gosnell Case: Here’s What You Need To Know. Washington Post, 15 abr. 2013. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/news/wonk/wp/2013/04/15/the-gosnell-caseheres-what-you-need-to-know/?utm_term=.61910f9f415c. 5 DESANCTIS, Alexandra. A Shocking New Undercover Video Exposes the Grisly Reality of Ripping Apart Fetuses. National Review, 25 maio 2017. Disponível em: http://www.nationalreview.com/article/447939/undercover-video-center-medicalprogress-exposes-gruesome-abortion-practices.

6 SALETAN, William. The Baby Butcher. Slate, 20 jan. 2011. Disponível em: http://www.slate.com/articles/health_and_science/human_nature/2011/01/the_baby_butcher.html 7 NASH, Nathaniel. Mengele an Abortionist, Argentine Files Suggest. New York Times, 11 fev. 1992. Disponível em: http://www.nytimes.com/1992/02/11/world/mengele-an-abortionist-argentine-filessuggest.html. 8 EVANS, Richard. The Third Reich in History and Memory. New York: Oxford University Press, 2015. p. 21. 9 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. xv, 257, 261, 382. 10 BURLEIGH, Michael. The Racial State. Cambridge: Cambridge University Press, 2013. p. 142. 11 FRANKS, Angela. Margaret Sanger’s Eugenic Legacy. Jefferson, NC: McFarland & Co., 2005. p. 180. 12 ______. ______. p. 70. 13 POPENOE, Paul; JOHNSON, Roswell Hill. Applied Eugenics. New York: Macmillan, 1918. p. 184.

14 BLACK, Edwin. The War Against the Weak. Washington, D.C.: Dialog Press, 2013. p. xvii, 258. 15 SANGER, Margaret. My Way to Peace. Discurso, 17 jan. 1932. In: Margaret Sanger Papers. Disponível em: https://www.nyu.edu/projects/sanger/webedition/app/documents/show.php? sangerDoc=129037.xml. ______. America Needs a Code for Babies. Discurso, 27 mar. 1934. In: Margaret Sanger Papers. Disponível em: https://www.nyu.edu/projects/sanger/webedition/app/documents/show.php? sangerDoc=101807.xml. 16 “Letter From Margaret Sanger to Dr. C. J. Gamble, December 10, 1939”. Genius. Disponível em: https://genius.com/Margaret-sanger-letter-from-margaret-sanger-todr-cj-gamble-annotated. 17 GORDON, Linda. Woman’s Body, Woman’s Right: Birth Control in America. New York: Penguin Books, 1990. 18 KUHL, Stefan. The Nazi Connection. New York: Oxford University Press, 1994. p. 34. 19 SANGER, Margaret. Human Conservation and Birth Control. Discurso, 3 mar. 1938. In: Margaret Sanger Papers. Disponível em: https://www.nyu.edu/projects/sanger/webedition/app/documents/show.php? sangerDoc=220126.xml. 20 WEIKART, Richard. From Darwin to Hitler. New York: Palgrave Macmillan, 2004. p. 9. 21 HITLER, Adolf. Mein Kampf. Trad. Ralph Manheim. Boston: Houghton Mifflin, 1999. p. 286, 439-440. 22 WAGENER, Otto. Hitler: Memoirs of a Confidant. New Haven: Yale University Press, 1987. p. 145-146. 23 HITLER, Adolf. Mein Kampf. Trad. Ralph Manheim. Boston: Houghton Mifflin, 1999. p. 252. 24 BLACK, Edwin. The War Against the Weak. Washington, D.C.: Dialog Press, 2013. p. 270. 25 ______. ______. p. 259. 26 KUHL, Stefan. The Nazi Connection. New York: Oxford University Press, 1994. p. 36, 46. 27 ______. ______. p. 277. 28 FREDRICKSON, George. Racism. Princeton: Princeton University Press, 2002. p.

2. 29 FONER, Eric. Introduction. In: HOFSTADTER, Richard. Social Darwinism in America. Boston: Beacon Press, 1992. p. x-xi. 30 HOFSTADTER, Richard. Social Darwinism in America. Boston: Beacon Press, 1992. p. 161. 31 FRANKS, Angela. Margaret Sanger’s Eugenic Legacy. Jefferson, NC: McFarland & Co., 2005. p. 141.

Capítulo Sete

Führers Americanos 1 “Volkischer Beobachter, May 11, 1933”. In: GOLDBERG, Jonah. Liberal Fascism. New York: Doubleday, 2007. p. 148. SCHIVELBUSCH, Wolfgang. Three New Deals. New York: Henry Holt, 2006. p. 19. 2 LIPSET, Seymour Martin; MARKS, Gary. How FDR Saved Capitalism. Hoover Digest, 30 jan. 2001. Disponível em: http://www.hoover.org/research/how-fdrsaved-capitalism. The Man Who Saved His Country and the World. The Economist, 30 out. 2008. Disponível em: http://www.economist.com/node/12502823. 3 EVANS, Richard. The Third Reich in History and Memory. New York: Oxford University Press, 2015. p. 302. 4 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. xiv. 5 KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright Publishing, 2013. p. 38. 6 WHITMAN, James Q. Corporatism, Fascism and the First New Deal. Faculty Scholarship Series. Yale Law School, 1991. Disponível em: http://digitalcommons.law.yale.edu/fss_papers/660/. 7 DIGGINS, John P. Mussolini and Fascism: The View from America. Princeton: Princeton University Press, 1972. p. 47-48. BOAZ, David. Hitler, Mussolini, Roosevelt. Reason, out. 2007. Disponível em: http://reason.com/archives/2007/09/28/hitler-mussolini-roosevelt. KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright Publishing, 2013. p. 123. 8 ______. ______. p. 58-59, 67. 9 HOLLANDER, Paul. From Benito Mussolini to Hugo Chavez. Cambridge: Cambridge University Press, 2016. p. 109. 10 KERSHAW, Ian. Hitler, 1889-1936: Hubris. New York: W. W. Norton, 2000. p. 261. SEDGWICK, John. The Harvard Nazi. Boston, mar. 2005. Disponível em: http://www.bostonmagazine.com/2006/05/the-harvard-nazi/. GRYNBAUM, Michael. Nazi in Our Midst. Harvard Crimson, 10 fev. 2005. Disponível em: http://www.thecrimson.com/article/2005/2/10/nazi-in-our-midsttheres-bound/. 11 HOLLANDER, Paul. From Benito Mussolini to Hugo Chavez. Cambridge: Cambridge University Press, 2016. p. 109.

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GOLDBERG, Jonah. Liberal Fascism. New York: Doubleday, 2007. p. 11. DIGGINS, John P. Mussolini and Fascism: The View from America. Princeton: Princeton University Press, 1972. p. 213. 24 SCHIVELBUSCH, Wolfgang. Three New Deals. New York: Henry Holt, 2006. p. 37. DIGGINS, John P. Mussolini and Fascism: The View from America. Princeton: Princeton University Press, 1972. p. 221. 25 TOLAND, John. Adolf Hitler. New York: Anchor Books, 1992. p. 409. DENNIS, Lawrence. The Coming American Fascism. New York: Noontide Press, 1993.

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New York: Doubleday, 2007. p. 156. 37 SCHIVELBUSCH, Wolfgang. Three New Deals. New York: Henry Holt, 2006. p. 98. KERSHAW, Ian. Hitler, 1889-1939: Hubris. New York: W. W. Norton, 2000. p. 529.

38 SCHIVELBUSCH, Wolfgang. Three New Deals. New York: Henry Holt, 2006. p. 79. RUSSELL, Thaddeus. The Surprising History of What Europe’’s Dictators Thought of the New Deal. Alternet, 4 ago. 2011. Disponível em: http://www.alternet.org/story/151563/the_surprising_history_of_what_europe’s_dictators_though 39 BALL, Howard. Hugo L. Black. New York: Oxford University Press, 1996. p. 9899. LEUCHTENBERG, William. A Klansman Joins the Court. Crosskey Lecture. University of Chicago Law School, 1973. Disponível em: http://chicagounbound.uchicago.edu/crosskey_lectures/1/. 40 KATZNELSON, Ira. When Affirmative Action Was White. New York: W. W. Norton, 2005. p. 167-168. 41 ______. ______. p. 22-23. 42 ______. ______. p. 24. 43 ROOSEVELT, Franklin D. Message to Congress on the Concentration of Economy Power. Discurso, 29 abr. 1938. Disponível em: https://publicpolicy.pepperdine.edu/academics/research/faculty-research/newdeal/roosevelt-speeches/fr042938.htm. 44 KATZNELSON, Ira. When Affirmative Action Was White. New York: W. W. Norton, 2005. p. 7, 486. 45 ______. ______. p. 48.

Capítulo Oito

Políticas de Intimidação 1 PAXTON, Robert O. The Anatomy of Fascism. New York: Vintage Books, 2004. p. 84. 2 ROSEN, Ben. Tim Allen, Conservatives in Hollywood, and Nazi Germany. Christian Science Monitor, 22 mar. 2017. Disponível em: http://www.csmonitor.com/USA/Politics/2017/0322/Tim-Allen-conservatives-inHollywood-and-Nazi-Germany-video.NUSSBAUM, Daniel. ABC Cancels Conservative Tim Allen Sitcom ‘Last Man Standing’ Despite Strong Ratings. Breitbart News, 11 maio 2017. Disponível em: http://www.breitbart.com/bighollywood/2017/05/11/abc-cancels-conservative-tim-allen-sitcom-last-manstanding/. 3 KRAYDEN, David. Universities ‘Weed Out’ Right-wing Scholars, Says Report. Daily Caller, 14 abr. 2017. Disponível em: http://dailycaller.com/2017/04/14/universities-weed-out-right-wing-scholars-saysreport/. 4 BERENSON, Tessa. 11 Arrested While Protesting Conservative Comedian Speaking at New York University. Time, 3 fev. 2017. Disponível em: http://time.com/4659339/new-york-university-protests-arrests-gavin-mcinnes/. 5 BLUME, Howard. Protesters Disrupt Talk by Pro-Police Author, Sparking Free Speech Debate at Claremont McKenna College. Los Angeles Times, 9 abr. 2017. Disponível em: http://www.latimes.com/local/lanow/la-me-ln-macdonaldclaremont-speech-disrupted-20170408-story.html. 6 RIESS, Curt. Joseph Goebbels. London: Fonthill, 2015. p. 75. 7 EVAN, Richard. The Coming of the Third Reich. New York: Penguin Books, 2005. p. 266-268. 8 WOLIN, Richard (Ed.). The Heidegger Controversy: A Critical Reader. Cambridge: Harvard University Press, 1993. p. 47, 49. 9 ______. p. 182. 10 WOLIN, Sheldon. The Seduction of Unreason. Princeton: Princeton University Press, 2004. 11 ALY, Gotz. Why the Germans? Why the Jews? New York: Henry Holt, 2014. p. 175-176. 12 ADDISON INDEPENDENT. Middlebury College Professor Injured by Protesters

as She Escorted Controversial Speaker. Addison Country Independent, 6 mar. 2017. Disponível em: http://www.addisonindependent.com/201703middleburycollege-professor-injured-protesters-she-escorted-controversial-speaker. 13 ILLING, Sean. If You Want to Understand the Age of Trump, You Need to Read the Frankfurt School. Vox, 27 dez. 2016. Disponível em: https://www.vox.com/conversations/2016/12/27/14038406/donald-trump-frankfurtschool-stuart-jeffries-marxism-critical-theory. ROSS, Alex. The Frankfurt School Knew Trump Was Coming. New Yorker, 5 dez. 2016. Disponível em: http://www.newyorker.com/culture/cultural-comment/thefrankfurt-school-knew-trump-was-coming. 14 “Herbert Marcuse”. Stanford Encyclopedia of Philosophy, 18 dez. 2013. Disponível em: https://plato.stanford.edu/entries/marcuse/. 15 ADORNO, Theodor W. et. al. The Authoritarian Personality. New York: Harper & Bros., 1950. 16 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 2526. 17 WOLFE, Alan. The Authoritarian Personality Revisited. Chronicle of Higher Education, 7 out. 2005. Disponível em: http://www.chronicle.com/article/TheAuthoritarian/5104. 18 MARCUSE, Herbert. Eros and Civilization. Boston: Beacon Press, 1974. p. xv, 3, 199, 202. 19 EVANS, Richard. The Coming of the Third Reich. New York: Penguin Books, 2005. p. 189. 20 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. Intro. H. R. Trevor-Roper. New York: Enigma Books, 2000. p. 142, 144-146. 21 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 101. PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press, 1995. p. 33. 22 EVANS, Richard. The Third Reich in History and Memory. New York: Oxford University Press, 2015. p. 146. 23 SHIRER. William. The Rise and Fall of the Third Reich. New York: Simon & Schuster, 2011. p. 35. 24 KERSHAW, Ian. Hitler, 1889-1936: Hubris. New York: W. W. Norton, 2000. p. 348. 25 EVANS, Richard. The Third Reich in Power. New York: Penguin Books, 2005. p. 32.

26 MARCUSE, Herbert. Repressive Tolerance. In: WOLFF, Robert Paul; JR., Barrington Moore; MARCUSE, Herbert. A Critique of Pure Tolerance. Boston: Beacon Press, 1970. p. 81-123. 27 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press, 1995. pp. 454. 28 KLEIN, Aaron. Hacked Soros Memo: $650,000 to Black Lives Matter. Breitbart News, 16 ago. 2016. Disponível em: http://www.breitbart.com/biggovernment/2016/08/16/hacked-soros-memo-baltimore-riots-provide-uniqueopportunity-reform-police/. NASH, Charlie. Refuse Fascism Group Behind Berkeley Riot Received $50 K from George Soros. Breitbart News, 5 fev. 2017. Disponível em: http://www.breitbart.com/milo/2017/02/05/refuse-fascism-group-behind-berkeleyriot-funded-george-soros/. 29 EHRENFELD, Rachel. George Soros: The ‘God’ Who Carries Around Some Dangerous Demons. Los Angeles Times, 4 out. 2004. Disponível em: http://articles.latimes.com/2004/oct/04/opinion/oe-ehrenfeld4. 30 KLEIN, Aaron. Soros-Financed Groups Provided Scipr for Anti-Trump Town Halls. Breitbart News, 28 fev. 2017. Disponível em: http://www.breitbart.com/biggovernment/2017/02/28/soros-groups-provide-word-word-anti-trump-scriptprotesters-use-lawmakers/. TWITCHY. 7 Fake Hate Crimes That the Media Blamed on Trump and His Supporters. Twitchy, 17 nov. 2016. Disponível em: http://twitchy.com/twitchys3831/2016/11/17/7-fake-hate-crimes-that-the-media-blamed-on-trump-and-hissupporters/. BROWN, Elizabeth Nolan. There Is No Violent Hate Crimewave in Trump’s America. Reason, 16 nov. 2016. Disponível em: http://reason.com/blog/2016/11/11/election-night-hijab-attack-false. 31 BOROSAGE, Robert. The Poisonous Politics of David Brock. Nation, 19 jan. 2017. Disponível em: https://www.thenation.com/article/the-poisonous-politics-ofdavid-brock/. 32 MAYER, Jane. The Money Man. New Yorker, 18 out. 2004. Disponível em: http://www.newyorker.com/magazine/2004/10/18/the-money-man. 33 SOROS, George. Sixty Minutes, CBS, 20 dez. 1998. Entrevista concedida a Steve Kroft. 34 MAYER, Jane. The Money Man. New Yorker, 18 out. 2004. Disponível em: http://www.newyorker.com/magazine/2004/10/18/the-money-man.

Capítulo Nove

Desnazificação 1 CHURCHILL, Winston. The End of the Beginning. London, ENG: discurso, 10 nov. 1942. The Churchill Society. Disponível em: http://www.churchill-societylondon.org.uk/EndoBegn.html. 2 FELICE, Renzo De. Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 58. GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p. 167. 3 MUSSOLINI, Benito. My Autobiography. Mineola, NY: Dover Publications, 2006. p. 236-237. 4 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 53. 5 SHIRER, William. The Rise and Fall of the Third Reich. New York: Simon & Schuster, 2011. p. 200. 6 EVANS, Richard. The Third Reich in Power. New York: Penguin Books, 2005. p. 211. 7 PARK, Madison. More Than 200 Protesters Indicted on Rioting Charges from Inauguration Day. CNN, 22 fev. 2017. Disponível em: http://www.cnn.com/2017/02/22/politics/trump-inauguration-protestersindictment/. 8 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p. 20. SHIRER, William. The Rise and Fall of the Third Reich. New York: Simon & Schuster, 2011. p. 22-23. 9 LINCOLN, Abraham. Selected Speeches and Writings. New York: Vintage Books, 1992. p. 386/; .