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Portuguese Pages 671 [686] Year 2006
SISTEMA NACIONAL , DA ECONOMIA POLITICA Friedrich List
Tradução de EDU ARDO DE SoUSA FERREIRA
e
KARIN PAUL FERREIRA
Prefácio de EDUARDO DE SoUSA FERREIRA
FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN Serviço de Educação e Bolsas
Tradução do original alemão intitulado
DAS NATIONALE SYSTEM DER POLITISCHEN ÓKONOMIE de Friedrich List (Edição popular com base na edição do próprio autor e nas notas à margem no original manuscrito)
A publicação d es ta obra foi apoiada por um subsídio do Goethe Institut
Reservados todos os direitos de harmonia com a lei. Edição da Fundação Calouste Gulbenkian Av. de Berna. Lisboa
2006
NOTAS PRÉVIAS SOBRE A HISTÓRIA DA OBRA
"O Sistema Nacional da Economia Política. Dr. Friedrich List. Primeiro Volume. O Comércio Internacional, a Política Comercial e a União Aduaneira Alemã" surgiu por mão da famosa editora Cotta, na Primavera de 1841. Este volume constitui a única obra abrangente e completa, dedicada à economia que List publicou em vida. Outlines of Arnerican Politicai Economy, um pequeno rascunho da teoria, publicado em 1827, em Filadélfia, em forma de doze cartas, coincide já, na sua orientação geral, com o Sistema Nacional, embora sem ter ainda o desenvolvimento conceptual do período posterior. A segunda obra sistemática de List, Das Natürliche System der Politischen Ókonomie, escrita em Dezembro de 1837 e apresentada em francês como obra premiada pela Académie des sciences morales et politiques de Paris, redescoberta em 1925 e publicada pela primeira vez em 1927, é, na sua estrutura global, idên"tica ao Sistema Nacional. Mas a extensão do sistema parisiense dificilmente alberga metade da obra alemã: os capítulos de História, em especial a abordagem aos sistemas dos teóricos franceses e ingleses, são muito mais curtos, a teoria das forças produtivas, no seu afastamento da "Teoria do Valor", ainda não surge completamente desenvolvida, e o quarto livro do Sistema Nacional - "A Política " falta de todo. Em compensação, a teoria dos estádios foi des-
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crita na situação "académica" parisiense de forma exaustiva e numa minuciosidade únicas. É aí que reside o valor especial e permanente da obra premiada. Contudo, pelo alcance e desenvolvimento de todas as partes, o Sistema Nacional permanece como a obra principal definitiva. Imediatamente após o seu aparecimento, o Sistema Nacional granjeou reconhecimento e críticas numa medida invulgar. Na Alemanha permaneceria a obra mais polémica da economia nacional até à Primeira Guerra Mundial. List propôs-se como objectivo delinear uma teoria da produção numa base nacional e não do ponto de vista das empresas individualmente, ou seja, mostrar, como o "capital mental nacional" - as instituições sociais, jurídicas, culturais e políticas - influencia a economia e como ambos os campos se ligam internamente enquanto 'forças" que se impulsionam reciprocamente. As qualidades mentais e políticas são forças mais importantes e mais duradouras para "atingir a riqueza" do que a riqueza do "mundo das mercadorias" alcançada em dado momento. "A História ensina [... ] que os indivíduos criam a maior parte das suas forças produtivas a partir das instituições e das condições sociais." E a limitação do "trabalho produtivo" a actividades que entram directamente como factor no preço das mercadorias é poderosamente anulada. A objecção principal era e continua a ser que a noção de forças produtivas ultrapassa os factores meramente económicos e, apesar disso, pretende ser a teoria económica mais correcta. O parecer dos eruditos da época foi significativamente discrepante. Bruno Hildebrand 1, o nobre criador intelectual da 1
Ver, quanto a este autor e suas obras, bem como aos citados mais adiante, o comentário relativo ao Sistema Nacional
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política social alemã, explicou assim o mérito de List: List forçou os economistas alemães a estudarem História. Mas ao mesmo tempo afirma, baseando-se apenas numa das menos importantes formulações da teoria dos estádios, que o pensamento de List é completamente desligado da História. Uma luz · especialmente pequena, e cujo nome não deve ser novamente despertado, queria "núma linguagem tão pouco digna[ ...] em presença de ideias tão erradas, abster-se de uma condenação pública deste livro, se nós entretanto não tivéssemos podido presenciar que a mesma goza das boas graças do público ... " A crítica do homem é um livro de 228 páginas. Wilhelm Roscher, cabeça da Escola Histórica, mais antiga, concorda com aquela opinião, ao mesmo tempo que critica a teoria de List, "respeitando", no entanto, "o sentido prático ao mais alto grau". E continua: "Um livro inteligente deste género não pode ser suficientemente bem-vindo no nosso país [... ] Quisesse Deus que tivéssemos mais obras destas[ .. .)Podemos responder que ele é o teórico da grande união aduaneira. " E Roscher termina com a afirmação: "Afasto-me do autor com a maior consideração e estima. Se o seu livro fosse de menor significado, eu tê-lo-ia julgado com menos severidade. Não duvido de que a obra sobreviverá ao seu século." Os seus contemporâneos não conseguiram furtar-se ao poder vivo e à linguagem nova nas ciências económicas, mesmo quando, como aquele homem "sóbrio"- que não foi o .. único-, escreveram livros inteiros para injuriar List. O efeito não reside apenas na riqueza dos pensamentos e na elementar colocação da pergunta: por que motivo alguns Estados ascenconstante do volume 6 da edição-padrão Friedrich List, Schriften, Reden, Briefe, Editora Reimar Hobbing, Berlim, 1930.
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deram da pobreza à riqueza e ao poder, e por que motivo outros voltaram a cair depois de alcançarem certa altura; reside também, e principalmente, na originalidade de List, no Jacto de não partir de formulações abstractas de perguntas. Os seus artigos e escritos, que pe1jazem cerca de um milhar, surgiram todos em situações em que List pretendia agir na qualidade de autor e político. As questões da actualidade são abordadas com um espínto de iniciativa apaixonado e, graças ao seu extenso conhecimento e à sua ampla visão do mundo, inseridas em grandes contextos históricos e políticos, político-económicos e teóricos. Esta vontade de passar directamente para a acção dá aos trabalhos do grande autor da Suábia a força linguística e a clareza de estilo, que só teria a perder com "certezas" cientificas, e a singular vivacidade de expressão que, na nossa ciência, conferem aos seus escritos um valor duradouro, deles Jazendo monumentos da língua e da história alemãs. Nisso List encontra-se acima de todos os especialistas do seu tempo e a linguagem possui uma força criadora, porque as suas palavras são inspiradas pelo incansável empenho pessoal nas próprias convicções e por uma elevada vontade política. A poderosa unidade do pensamento, da vontade e da força expressiva levou Levin Schücking a dizer à beira da sua sepultura: "Ele era a iniciativa em pessoa. " Os antecedentes e a composição do Sistema Nacional ocorrem em solo francês. List · era totalmente alemão, mas igualmente europeu e não só. O conceito das "nações ambiciosas", que englobava sobretudo a Alemanha com a Holanda, a França, a Monarquia do Danúbio e também a América do Norte, e que, para ele, constituía uma unidade vivida, fizera dele um cidadão do ·mundo. Quando, em Filadélfia, Paris, 8
Bruxelas ou em Viena e na Hungria, trabalhava pelos interesses destes países, agia, tal como na Saxónia ou na Turíngia, por uma causa comum que era simultaneamente um interesse alemão. No período inicial e médio de criação, esta "aliança " ideal encontra-se perante a Inglaterra, à qual dirige igualmente o seu amor, assim como toda a sua luta. As. consequências destruidoras das exportações britâ~Jicas a preços mais vantajosos para os pequenos Estados alemães transformaram List, na sua atitude de defesa, no político de economia dos Estados alemães e, pouco depois, da União Aduaneira Alemã. O efeito intelectual sobre o pensamento económico dos países continentais, e especialmente na sua pátria, da teoria inglesa do com~rcio livre - que, naquela altura, nem a própria Inglaterra seguia - empurrou List para a formulação da sua contrateoria histórica e nacional dqs forças produtivas e do desenvolvimento por estádios. Assim, as realidades inglesas foram os motivos indutores com que o alemão da Suábia cresceu na sua vontade apaixonada de forma a conseguir um equivalente para a Alemanha. Assim, List escreveu a sua ambiciosa teoria da política económica, na qual as diferentes etapas de desenvolvimento dos países- da Inglaterra, como dos Estados ambiciosos e dos Estados produtores de matérias-primas -ocupavam lugar especial e conservavam a sua própria política económica traçada. A teoria das forças produtivas e do desenvolvimento por estádios é a tentativa gigante de ligar a "ciência e a prática", passando por juízos históricos, a uma nova teoria unitária. Uma tal tentativa só podia ser levada a cabo por um autodidacta "sem ensino formal", mas que fosse um pensador criativo e se distinguisse por uma vontade apaixonada. E, na verdade, a obra é um monumento ao seu espírito na história 9
alemã, com grande efeito prático no seu tempo, assim como uma contínua advertência aos teóricos da economia de que os processos puramente económicos são sempre abstracÇões teóricas ... para a teoria desligados da unidade e do todo da vida social e política. Nao temos um segundo pensador assim eloquente que sublinhasse com tanta insistência como Friedrich List, com a sua teoria abrangente das forças produtivas, a dependência da prosperidade económica dos factores educação, justiça, invenções científicas, até ao Estado e à política. List permanece uma advertência, mesmo quando a teoria, para ser útil como ciência . especial, é obrigada a trabalhar com conceitos "mais exactos". Face a toda a crítica dos especialistas, permanece a peculiaridade desta obra no seu valor próprio como criação de uma teoria da economia que transcende o campo económico. Desde 1819, List entregou-se de alma e coração à ambição da unidade alemã, promoveu a construção do caminho-de-ferro com a experiência ganha com a iniciativa das terras virgens adquirida na América e fomentou, com autoridade, a formação da união aduaneira através da sua teoria político-comercial. Voltemos à história do aparecimento do Sistema Nacional em Paris. Como se esclareceu, para o patriota alemão List, não constituía nenhuma contradição o facto de se encontrar noutro país a trabalhar na sua aliança continental. Pela sua actividade bem sucedida como autor e pela sua colaboração prática ·na concretização do início de um "sistema de caminhos-de-ferro da Saxónia como base de um sistema ferroviário que se estendesse a toda a Alemanha", como consta do título de um dos seus escritos mais conhecidos, List foi despachado com um "presente de honra", sem encontrar lugar de posição social na primeira grande sociedade de caminhos-de-ferro. 10
Decepcionado com este fracasso, partiu, no Outono de 1837, para a Bélgica e para a França, para trabalhar novamente como consultor dos governos para a construção europeia dos caminhos-de-ferro. Mas, entretanto, deparou-se, pouco depois, em Paris, com um prémio da Academia sobre política aduaneira e comércio livre. E o programa redigido por Charles Dupin, cujas Forces Productives de la France ele há muito apreciava, levou-o a aproveitar a oportunidade. Assim, escreveu em poucas semanas o seu primeiro sistema da economia política. Com efeito, o trabalho recebeu grandes elogios por parte da Academia, mas não o prémio, que teria dado ao autor reconhecimento e peso públicos, não só na França. O manuscrito permaneceu por imprimir e sem ser utilizado e, mais tarde, seria mencionado por List apenas superficialmente. Até à publicação das cartas, em 1933, ignorava-se também que List, na mesma altura, entregou ainda à Academia outra obra premiada sobre meios de transporte, que permanece desaparecida. Para Liste para a posteridade, a não publicação do "Sistema Natural" teve a consequência positiva de o fazer alargar os seus estudos de História e desenvolver as suas ideias sistemáticas em Paris, até estar completamente madura uma nova obra abrangente. Assim surgiu o Sistema Nacional, enquanto, ao mesmo tempo, eram publicados pela editora Cotta artigos sistemáticos de maior extensão, análises autónomas e precur. saras daquela obra. Primeiro planeou-se publicar a nova obra nas línguas francesa e alemã- muitos capítulos da versão francesa encontram-se no Arquivo de Reutlingen; mas depois, com uma separação interior da França, orientou-se para a União Aduaneira Alemã, cuja continuação, naquela altura, ainda não estava 11
assegurada. De 1838 até ao início de 1840 deveria ser redigida, em Paris, a totalidade do sistema alemão. Não se pense que ·. List se tornou, por esta, altura um teórico coleccionador de material. Sabemos que o "Sistema Natural" estava concluído em quatro, cinco semanas. Sobre as etapas da escrita do Sistema Nacional não possuímos qualquer informação precisa, uma vez que uma parte dos papéis de Paris se perdeu na viagem de regresso à Alemanha. Mas conhecemos a extensa actividade literária que List desenvolveu nestes anos a partir de Paris e com destino à Alemanha. Centenasde artigos publicados no Augsburger Allgemeinen Zeitung, os ensaios, mais extensos, na revista Deutsche Vierteljahreschrift e também a tradução anónima das "Ideias Napoleónicas" de Louis Bonaparte recaem sobre a época parisiense. Os artigos de List sobre a política aduaneira foram sendo divulgados à medida que ele se afirmava, desde 1833, através da sua colaboração na construção do caminho-de-ferro Leipzig-Dresden, depois, através da sua revista Das Eisenbahnjournal (de 1835 até 1837), como porta-voz e especialista dos grandes empreendimentos económicos do seu tempo. A sua influência sobre a construção das linhas ferroviárias alemãs atingiu o apogeu em 1840141 e trouxe-lhe o título de Doutor ·. h. c. da Universidade de Jena. Quando, na Primavera de 1840, List regressou a Leipzig - depois escolhendo Augsburg para uma estada prolongada - , podia considerar-se o porta-voz reconhecido em questões de caminhos-de-ferro; após as publicações preparatórias, com a obra-prima pronta no bolso, podia reconhecer-se como o criador de uma nova teoria económica; e, na sua aplicação à União Aduaneira Alemã, como o líder intelectual da política económica alemã. E a construção da unidade económica de 12
mercado era, na altura, o único ponto importante da política alemã em geral. List preparara cuidadosamente a sua nova aparição na pátria. Se, enquanto cientista, precisava de extenso reconhecimento público, enquanto indivíduo particular, queria negociar com soberanos e governos como se fosse ·. detentor de um alto cargo público. O facto de o ter conseguido sempre de forma admiravelmente ampla, desde os anos passados na América, é significativamente mérito da sua pessoa e constituiu uma condição da sua eficácia. O nome de List estava em todas as bocas, e o Sistema Nacional, quando foi posto à venda, em Maio de 1841, pôde contar com o maior interesse dos cientistas e dos homens que lideravam a economia e a vida pública, e ainda com a simpatia de uma vasta camada de eruditos. "Ele foi o primeiro economista nacional alemão que transformou a ciência numa causa do povo", afirmava Hildebrand. Passados apenas alguns meses, o livro estava esgotado; apareceram novas edições em 1842 e1844 e, nos últimos anos de vida, List preparou a quarta edição. Após a sua morte, em 1850, um seu amigo, o historiador Ludwig Hiiusser, publicou o Sistema Nacional como volume especial das obras completas numa edição de dois mil exemplares, o dobro da edição anterior. Independentemente das inúmeras impressões parciais posteriores, a editora Cotta publicou, em 1877, uma quinta edição incompleta e uma impressão completa como sexta edição. Em 1883 surgiria a sétima edição, com a preciosa "Introdução Histórica e Crítica " de Eheberg, que reapareceria em 1925, pela mão da velha editora, e enriquecida com uma bibliografia. Entre 1904 a 1928, a Editora Fischer publicou cinco edições para uso académico, e em 1930 a obra surgiu com o texto revisto, anexos e comentário, formando o sexto volume 13
da edição académica dos escritos, discursos e cartas, organizada pela "List Gesellschaft", fundada em 1926. A principal obra de List permaneceu, assim1 sem interrupção, no mercado editorial, como a única obra de economia da primeira metade do século XIX. A primeira h-adução integral do Sistema Nacional edi·. tou-se logo em 1843, na Hungria. Em 1851 e 1857 saíram as edições francesas de Richelot, o primeiro historiador da União Aduaneira Alemã. As edições em língua inglesa foram publicadas em Filadélfia em 1856, em Melbourne em 1860, em Londres em 1885, e uma edição simultânea saiu em Londres, Nova Iorque e Bombaim em 1904 e 1909. A tradução súeca apareceu em 1888, uma russa em 1891, a que se seguiram duas edições em língua chinesa, em 1927 e 1929. À informação externa sobre o Sistema Nacional, além da história prévia, do aparecimento e divulgação da obra, pertence também a questão, nada fácil, de saber se permaneceu ou não Úma obra parcial, incompleta. O título das três edições, de que o próprio List tratou, diz-nos inequivocamente, que do Sistema só existe o primeiro volume: "O Comércio Internacional, a Política Comercial e a União Aduaneira Alemã". Também a preparação de uma quarta edição no exemplar da edição do próprio autor apresenta apenas correcções estilísticas, faltando, como nas edições anteriores, toda e qualquer referência a um volume de continuação. Mas noutros locais são conhecidos muitos planos de continuação. Todavia, coloca-se a questão de saber se o Sistema Nacional, tal como existe, é uma obra incompleta. Segundo os conhecimentos actuais sobre os trabalhos e a atitude de List após 1841, tal hipótese pode, na generalidade, ser negada. Apenas permanece em aberto se List, caso tivesse tido vagar,
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escreveria um volume de continuação. Com isso não deve dizer-se que a força criativa de List se encontrava esgotada os trabalhos que se seguiram podem mesmo considerar-se o ponto alto de toda a sua obra. Trata-se aqui simplesmente da questão mais restrita de uma continuação directa do Sistema Nacional. A afirmação de que a teoria sistemática de List se encontra completa na principal obra publicada simplesmente não é posta em questão por tudo o que sabemos a partir de cartas, material de arquivo e da revista da União Aduaneira no que se refere a eventuais planos de continuação. Mas, por outro lado, a recusa muito tardiamente declarada de escrever outros volumes não pode ser vista como resolução inequívoca da questão. Depreende-se logo do título que, durante a escrita, List pensava numa obra. constituída por vários volumes. A editora Cotta, após o êxito do primeiro volume, pressionou de imediato a continuação, sobre a qual também List se pronunciou várias vézes nos dois anos seguintes. Os planos mais tardios, que se es tendem a.té aos últimos meses da sua vida, possuem outro carácter. Essencialmente, List tencionava no princípio desenvolver a política comercial da União Aduaneira Alemã num segundo volume e discuti-la com os numerosos críticos. Mas só em Dezembro de 1843, quando foram escritas as 12 valiosas "Cartas sobre as Grandes Questões Actuais" é que se encontra o indício concreto de que estas e outros artigos poderiam servir de preparação para um segundo volume. Antes, List apenas pensara de forma mais concreta na política agrária para o terceiro volume. O grande ensaio "A Situação Agrária, a Economia Anã e a Emigração", de 1842, cujo texto integral só seria publicado em 1928, foi para ele, durante muito tempo, 15
como a execução parcial do terceiro volume do Sistema Nacional. Já nos seus primeiros tempos de funcionário, List ocupou-se intensamente da questão - tão premente naquele tempo como hoje - do parcelamento agrícola e da reunião de parcelas. A publicação parcial, em 1842, na revista Vierteljahreschrift da editora Cotta, encontrara também ampla divulgação como edição especial para um congresso. De forma semelhante à obra principal, com uma abordagem histórica e através de comparações internacionais, surgiu um pequeno volume completo, com quase um terço das dimensões do primeiro volume. Mas List rewsou o conselho da editora Cotta para uma edição integral c nfaltam outros pontos de r~ferência que confirmem que tenha feito mais alguma coisa para este "terceiro volume". Além disso, a agricultura ocupava o seu firme lugar sistemático na teoria dos estádios. No entanto, List debruçou-se ainda sobre esta área em artigos isolados e, através da sua actividade pública na Áustria e na Hungria em 1844 e 1845, as questões agrárias, na sua relação cmn a "reforma económica da Hungria " e com a emigração alemã, tornaram-se-lhe novamente actuais. Permanece assim em aberto se List~ caso tivesse vivido mais tempo, teria regressado à elaboração de um volume separado do Sistema Nacional. A discussão com os críticos, evidente em muitos locais da revista da União Aduaneira, teria constituído um alargamento lógico do primeiro volume; daí que uma parte tivesse sido inserida na edição de 1930, como anexo. O ímpeto da actividade que, após a permanência em Paris, irradiava para todos os lados, também não deixou a List mais do que algumas semanas de sossego para a elaboração de
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uma obra sistemática de ambos os trabalhos de Paris. Assim, a continuação da sua teoria encontra-se nos artigos e nos ensaios da revista da União Aduaneira que publicou em cadernos semanais entre 1843 e 1846. Nas negociações preliminares · com a editora Cotta, Ust manifestou interesse pelo subtítulo "Sobre o Desenvollámento do Sistema Nacional da Economia Política". Nas centenas de contribuições surgidas nesta revista, através das quais List se tornou definitivamente a autoridade reconhecida nas questões da União Aduaneira .e da politica económica, desenha-se logo desde o início uma transformação estrutural do seu pensamento. É por esta razão que uma simples continuação do Sistema parece problemática e praticamente impossível. O próprio List não tinha consciência disso, uma vez que a sua aspiração em relação ao desenvolvimento económico e nacional continuou inalterada. Daí que tivesse mantido quase até ao fim da vida o plano de escrever pelo menos mais dois volumes do seu Sistema. Disso há muitas indicações de conteúdo variado. A observação mais conforme com os escritos destes anos encontra-se numa carta dirigida ao político húngaro V. Pulszky, de 13 de Março de 1846. Este plano tardio parece diferente dos anteriores. O segundo volume deveria tratar da "Política do Futuro" e o terceiro deveria surgir sob o título "Dos Efeitos das Instituições Políticas ·. sobre a Riqueza e o Poder das Nações ". Esta divisão em três partes mostra o carácter permanente do pensamento de List num claro desdobramento. Mas "os efeitos das instituições políticas sobre a riqueza ... ", aos quais seriam de acrescentar os factores sociais, traduzir-se-iam, mais uma vez, num tratamento especial da teoria das forças produtivas. Nas publicações e no material de arquivo destes anos não se 17
encontram trabalhos preparatórios directos para uma versão nova e para um alargamento deste tema em volume próprio. Aqui encontramos uma manifestação esclarecedora, mas nenhum plano actual de trabalho. Não se passa o mesmo com o segundo volume ·deste plano. "A Política" era já o título da última parte do sistema editado. Num manuscrito do Arquivo de Reutlingen fala-se da preparação de um "sistema do futuro político", e todos os . esforços dos últimos anos de List desembocam numa "ciência do futuro" que abranja política e economia da mesma forma e que coloque de lado o especialista em economia como consultor do estadista. E para o volume "Política do Futuro", Líst escreveu realmente grandes trabalhos preparatórios, especialmente os seis ensaios sob o título "A Unidade Nacional Político-Económica dos Alemães", publicados na revista da União Aduaneira de Novembro de 1845 a Janeiro de 1846. Sem qualquer dúvida, a carta a V. Pulszky refere-se especialmente a estes artigos, que com todo o direito podem ser considerados como o legado de List aos alemães. Mas estes ensaios e os escritos de 1846 que se lhes seguiram são tão diferentes na estrutura e no objectivo que não podem funcionar como "continuação" do Sistema Nacional. A orientação do Sistema Nacional baseia-se na ideia da "aliança contine~Jtal", na unidade político-comercial dos Estados do continente contra danos causados pela supretnacia económica do império insular. Desde 1843, e em parte desde antes, esta opinião esteve sujeita a uma transformação, através da qual a ordenação da Alemanha na teoria dos estádios se torna diferente e a estrutura geral é alterada. A teoria dos ·. estádios está ligada 4 diferenciação entre uma potência de supremacia e um grupo de potências de segunda e terceira 18
categorias capazes de "seguirem o seu exemplo " e de atingirem o mesmo desenvolvimento de todas as forças produtivas que a "nation prédominante", o termo usado na obra premiada. Para este estádio é indispensável o comércio Livre. Também nos estádios iniciais, o comércio livre dá aos países fornecedores de . matérias-primas o impulso para um avanço no desenvolvimento. No período de desenvolvimento industrial, as "nações qualificadas " necessitam de direitos proteccionistas e, posteriormente, também elas desembocam no comércio livre mundial. Daí resulta uma visão económica fechada do mundo, de um progresso económico geral para uma "humanidade" uniforme no sentido do século XVIII, na qual estava decididamente · cimentado o pensamento de List. Foi uma prestação intelectual e uma beleza o facto de, com a teoria dos estádios, poder ser afirmada a verdade da "escola inglesa" tanto para os estádios iniciais como para a etapa final. Adam Smith não dá só a "economia privada dos indivíduos " e a "teoria cosmopolita da humanidade": a sua doutrina constitui, ao mesmo tempo, a verdadeira economia política para o estádio da Inglaterra. Mas o comércio livre mundial como objectivo geral não era para List mais do que a conclusão intelectual do Sistema: concretamente, ele vê a liberdade aduaneira apenas como a norma político-económica da Inglaterra. A aliança continental pertence às ideias de maior alcance de List. Antes de tudo foi dirigida contra a Inglaterra. Mas já nos parágrafos do Sistema Nacional provavelmente escritos em último lugar, List vê "num futuro não muito longínquo, a necessidade natural ", sentida também pela Inglaterra, de se unir ao continente. "Aquilo a que hoje se chama Comunidade Económica Europeia é, para List, uma união aduaneira europeia ou aliança continental", consta do discurso de Salin em 19
Francoforte, em 1 de Março de 1959. "O facto de que a ideia da aliança continental regressará sempre de novo" foi referido por List com convicção. Salin diz directamente que "a Comunidade Económica Europeia agora existente foi vista, desejada e defendida por List". Apesar desta convicção de longa duração, nos anos seguintes, algumas características do pensamento de List modificam-se. A teoria dos estádios assinala às "nações qualificadas" o objectivo de se tornarem no "que se tornou a Inglaterra". Não têm todas elas, especialmente a ·Alemanha, "não como é, mas como será", as mesmas bases materiais e territoriais para este caminho? A equiparação de todo o grupo não passa por cima das diversas possibilidades das nações isoladas? Assim se desloca a constelação, na qual foi integrada a obra principal. Nos anos seguintes, List vê para a Alemanha um caminho próprio de desenvolvimento através de uma coligação com os países do Danúbio, e este bloco, como grande mercado interno livre, dispõe de direitos alfandegários para o exterior e deve, como parceiro júnior, entrar numa aliança política dura. doura com a Grã-Bretanha. Paz económica e aliança política com a Inglaterra - constituem uma outra estrutura que não podia ser acrescentada, como volume de continuação, ao Sistema Nacional com a sua luta de concorrência contra a Inglaterra. Além disso, os "Olhares para o Futuro" de List são uma concepção genial, mas também um complexo, que, como ideia criativa, se transformou em palavra e forma, e se escusa a uma moldagem economico-sistemática. O próprio List falara muitas vezes de uma "política do futuro" e na carta de 13 de Março de 1846, mencionou os artigos já publicados como partes de um segundo volume.
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Porém, quase simultaneamente, chegara o momento da viragem total. Em 30 de Março, List escreve ao ministro bávaro V. Abel, dizendo que outros artigos (da unidade político-económica nacional dos alemães) "aparecerão tão pouco como o segundo e terceiro volumes do meu Sistema". Assim, no mesmo mês em que foi formulado o plano de continuação em três partes é expressa a intenção de desistir em absoluto da continuação. Tal aconteceu quando List tomou a decisão de viajar para Inglaterra e de defender pessoalmente as suas intenções. Assim terminaram dramaticamente os planos que durante anos acalentara de continuar o Sistema Nacional em vários volumes. É certo que as reflexões objectivas aqui apresentadas não foram a razão da renúncia. Temos de aceitar as citações das cartas como última manifestação. Assim, estava certo o instinto de List ao manter até ao fim a decisão de publicar a sua obra teórica sem alterações . . Por fim, pode dizer-se o seguinte: a situação agrária como possível continuação ficou, em todo o caso, esquecida. O terceiro volume do último plano não foi começado. A "Política do Futuro", devido ao seu carácter diferente, é impensável como segundo volume. List continuou incansavelmente a escrever até à última viagem; não existe, no entanto, qualquer indicação de que pensou modificar a obra ou fundi-la num novo todo. Também nos parece não existir para tal nem possibilidade nem necessidade. Nos escritos posteriores, a teoria das · forças produtivas permanece o factor principal. Na sua validade, a teoria histórica dos estádios e a política comercial não são revogadas pela viragem política. Só a Alemanha, como centro de uma união aduaneira continental mais ampla, aparece noutra posição perante a potência imperial, colonial e 21
naval que é a Inglaterra. List viu assegurada a estabilidade duradoura de ambos os países como "nações irmãs" politicamente unidas. A conservação inalterada da obra pelo autor é o único ponto importante. Por conseguinte, o "Sistema Nacional, Primeiro Volume" permanece a teoria cientifica geral ao longo de todo . o período da sua actividade literária e pública. Os ensaios posteriores, de elevado valor intrínseco, ocupam o seu lugar na criação de List como aplicação política dos princípios fundamentais do Sistema Nacional. Artur Sommer
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PREFÁCIO À EDIÇÃO PORTUGUESA
Salazar foi, curiosamente, dos raros economistas com conhecimento em Portugal da obra de List. Não tanto como professor de economia na Universidade de Coimbra 1, mas como político, Salazar ocupou-se de List, o que se manifesta numa publicação sua na União NacionaP, na qual chega à conclusão que, não tendo List n1uitos seguidores da sua teoria, na prática seria o contrário, dado que nos últimos cinquenta anos tinha triunfado em quase todo o lado o proteccionismo defendido por List3. Mas o nome de List chegou a Portugal bem cedo, em 1844, três anos após a publicação da sua obra principal que agora se dá pela primeira vez a público em língua portuguesa, o "Sistema Nacional da Economia Política". Na realidade, a primeira vez de que há notícia de tal é numa carta do comerciante alemão C. Schuster residente em Portugal e que se dirige a List chamando à
1 As a ulas d e António de Olive ira Salazar em Coimbra fo ra m publicad as p o r Albe rto Menano em 1927. 2 Sa l aza r, A. 0 :: Pe que na His tó ria das Doutrinas Económi cas, e ditado pe la União Nacional e m Lisboa, em 1945 . 3 Jd. pág. 48.
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a tenção do interesse em fa zer ligações directas de navegação a vapor da Península Ibérica à red e d e. ca minh os-de-ferro da Europa central 4 . Mas este fenómeno não reflecte de forma algum a o acompa nhamento, em Portugal, da literatura económica da Europa. Só muito mais tarde e de forma parca se encontra pontualmente o reflexo da discussão teórica na Europa, com influência principal da França: lê-se Jean-Baptiste Say, mas já se não ouve falar em Ricardo. E é através do francês que se toma um relativo conhecimento de List pela tradução francesa de Richelot de 1857. É só no fim do século XIX que José Frederico Laranja, da Universidade de Coimbra, toma em consideração directamente a obra de List e se refere à Escola Histórica de que este é precursor. E ao longo dos anos vão alguns autores divulgando as ideias de List, como é o caso de Marnoco e Souza, mas não deixa de ser relevante o facto de os economistas portugueses não citarem nem comentarem o capítulo quinto do seu livro qüe se refere expressamente a Portugal e em especial ao Tratado de Methuen. No século XX, nos anos 30, Francisco António Corrêa do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF- hoje ISEG) compara List com Adam Smith em relação ao seu tempo e no mesmo Instituto Yer Bastien, C. und Ferreira, Eduardo de Sousa "Die List-Rézeption in Portugal" in: Eugen Wendler (Hrsg.) Die Vereinigung des Europaischen Kontinents, Schaffer-Poescher Verlag, Stuttgart, 1996. 4
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A. Li no Neto discute nas sua s aul as as ideias d e List, nomeadam ente no quadro ·d a d icotomia co mércio livre-proteccio ni smo5. . Eco no mi stas actuais cons ideram List p recursor d a econo mi a d e rn ercad o social e o primeiro 'visionário ' d a Eu ropa unida. Refl exo d esta persp ecti va é a publicação, pe lo Director do Friedrich-List-Institut, dum liv ro sobre a rece pção da obra de List em cada um dos múltiplos países da Europa com o sugestivo título "A ·Unificação do Continente Europeu" 6 e que inclui a recepção de List em Portugal nos séculos XIX e XX 7 • Friedrich List não é uma mera figura da história das teorias económicas e do proteccionismo. Nas suas viagens pelo Mundo e, nomeadamente a estadia nos Estados Unidos, ultrapassou os que seguiam a Escola Clássica. Ele pode ser considerado o percursor e mesmo fundador da Escola Histórica que se vem confrontar com a Escola Clássica inglesa. Adam Smith levantou a questão da origem da riqueza das nações e respondeu ao mesmo tempo com as leis da natureza da vida económica às quais se devia permitir o desenvolvimento. E desde então o mundo científi co teve duas opções: ou conformar-se com isso, ou procurar uma outra explicação. List tentou nada menos d o que dar uma outra explicação e fê-lo com o
s Ide m, pp . 441-449. Eugen We ndle r (Hrsg.) Di e Ve reinig ung d es Euro pa isch e n Ko ntinents, Schaffe r-Poescher Verl ag, Stuttg art, 1996. 7 Bas ti an, C. und Ferreira, Eduardo de Sous a, ide m .
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seu "sistema nacional da economia política" onde, por um lado, expôs a sua crítica a Adam Smith e, por outro, apresentou as suas próprias teses relativas ao desenvolvimento económi co de uma nação. A crí ti ca a Smith, feita com todo o respeito por ele, referia-se, na sua essência à equiparação dos interesses da economia privada aos interesses económicos nacionai s, daí d eriva ndo a teoria do comércio livre defendida pela Escola Clássica; no capítulo décimo primeiro da sua obra ele explica que o sistema da Escola se baseia "numa ide ia verdadeira - uma ideia que terá que ser reco nhecida e desenvolvida pela ciência; se quer cumprir o seu destino de iluminar a prática -uma ideia que a prática não pode entender mal se não se quiser enganar no caminho. Porém, a Escola deixou de tomar em consideração a natureza das nacionalidades e os seus interesses e situações específicos, harmonizando-a com a ideia dil união universal e da paz perpétua ." Os principais elementos do seu 'sistema nacional ' com os quais combate a Escola Clássica são a noção de es tádios de desenvolvimento, a função orientadora do Estado, o fomento das forças produtivas e as tarifas alfand egárias para protecção d a industrialização. Co mo base para a sua argu mentação List faz uma aná li se histórica da evolução da economia para mostrar a re lação entre desenvolvimento económico e formação ou d ecad ên cia das nações. Es te processo va i-lhe permitir ti ra r a 'li ção da História'- título do d écimo capítulo do livro, - oposta aos princípios abstractos deduti vos da Esco la C lássica de A. Smith e seus precursores.
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A teoria dos estádios de desenvolvimento baseia-se numa perspectiva histórico-evolucionista . "A ideia de base é extremamente simples e por isso mesmo imponente. Procura-se em todo o desenvolvimento histórico identificar >, , «níveis>>, e para cada fase ou estádio construir uma teoria que só deve explicar o quotidiano económico precisamente nessa fa se e só nessa fase tem de ser válida. (... ) "8 Parte-se .do princípio que a evolução da sociedade traz consigo uma alteração d e tudo desde o próprio home m até às instituições e justificação de reivindicações económico-políticas. A evolução surge como o fen óm eno fundamental e o estudo da evolução como a tarefa mais relevante da economia política . List desenvol ve com isso objectivos político-económicos. Compete ao Estado conduzir a economia através da criação das respectivas condições prévias até a economia chegar ao estádio mai s alto. Esta teoria desenvolve-a List orientando-se pela situação na Inglaterra e na Alemanha, aquela no quinto estádio (agricultura-manufactura-comércio), esta no quarto (agricultura-manufactura). Competiria assim ao Estado conduzir a Alemanha ao quinto estádio. Esta s Eucken, Walter, Die Gru ndlagen der Na tio na lõ konom ie, Sp ringer Ve rlag, Berli n, Gõ ttin gen, H ei d e lberg, 1959,
p. 38.
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ideia vincou, de tal forma que mesmo quando posteriormente surgiram críticas a estes esquemas evolutivos, a própria crítica continuava apegada à ideia de evolu ção. Só no século XX se entra numa nova fase em que a ideia de evolu ção recuou, não se tendo em mira a sucessão dos estádios mas sim perceber a divers idade d o funcionamento das economias9 . Para conduzir as nações a estádios superiores, List propõe como instrumento a tarifa alfandegária proteccionista, ele que é a favor do com ércio livre. Só que considera o proteccionismo imprescindível na fase de "construção" qu e permita pôr a nação em condições d e concorrência com a Ingla terra. Esta ideia n ão é necessa riamente origin al d e List, pois já Alexander Hamilton a concebera em 1791 com o meio d e apoiar a formação da indústria na cional a merica na, mas é List que, na Europa, a faz avançar já quando a apresenta à Assembleia Federal. A ideia tinha-o impressionado precisamente aquando da sua permanência nos Estados Unidos entre 1825-1830 e ele d esenvolveu-a no seu "sistema nacional". Importante pareceu-lhe o apoio com tal instrumento às indústrias, que · Hamilton chamou "infant industries", com dificuldades de arranque em sectores industriais novos e que precisam de ser protegidas até chegarem à capacidade de concorrência. Cada começo de uma nova produção traz custos de arranque. Uma tarifa protectora terá a fun ção d e aliviar esses c ustos com que se deparam as e mpresas com a nova combinação de factores de produção. De notar, contudo, a posição de List como 9
Id e m, pp. 38-40.
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defensor do comércio livre, no que ele se identifica com a Escola Clássica . Nomeadamente ele rejeita toda a tarifa alfandegária proteccionista da agricultura, como expõe de forma detalhada no capítulo vigésimo "A Força da Manufactura e o Interesse da Agricultura". A sua posição perante a indústria é a excepção que o põe em oposição à Escola Clássica à qual critica o facto de não reconhecer que, eni concorrência livre com nações de manufactura mais avançadas, a nação menos avançada, sem medidas proteccionistas da indústria, nunca conseguirá desenvolver completamente a indústria com independência nacional 1D. Mas o facto de as tarifas protectoras serem necessárias não é uma abertura incondicional ao . proteccionismo. List definiu bem quais as condições necessárias para a sua aplicação: medidas de protecção podem ser justificadas somente para fomentar e proteger a força manufactureira interna e apenas em nações que, devido a um território extenso, bem delimitado, a uma população grande, à posse de recursos naturais, a uma agricultura já muito avançada, a um alto grau de civilização e formação política, são vocacionadas para defender o mesmo nível que as primeiras nações agrícola-manu-
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List, Fri edrich, Das Nationale System der Politischen Óko no mie, Ky klos-Ve rlag Basel, J. C. B. Mohr (Paul Siebeck) Tübingen, 1959, p . 219 e segts . Apesa r d a po lé mica co ns tante co ntra os re presentantes d a Esco la Cl áss ica, a fund am e ntação d ada po r Lis t pa ra as ta rifas p roteccio nistas não dife re d e fo rma essencial da formu lação d e ]. St. Mil! nos seus "Principi es", publicados e m 1848.
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factureiro-comerciais, que as maiores potências marítimas e territoriais. A protecção é dada ou pela total proibição de certos artigos manufacturados, ou por altas tari fas aduaneiras que equivalem a uma proibição total ou, pelo menos, parcial ou por tarifas aduaneiras de importação moderadas. Nenhuma destas formas de protecção é absolutamente boa ou absolutamente condenável, dependendo das condições particulares da nação e do estado da sua indústria, qual delas deve ser aplicada. 11 Estas limitações explicam o porquê do carácter provisório que tais medidas, segundo List, devem assumir. Contudo, não deixa de haver dificuldade em definir o tempo de aplicação desta protecção. List não o faz e também tem, na prática, sido difícil definir quando se considera a indústria apta a entrar em concorrência sem protecção. Além de ser, logo de início, difícil de definir quais os ramos de indústria a proteger. O argumento das tarifas proteccionistas foi concebido por Hamilton mais directamente para a protecção da indústria dos Estados Unidos. Mas nessa altura esta nação era praticamente uma colónia em ascensão e, precisamente por isso, aquilo que foi concebido para os Estados Unidos revelou-se aplicável a outras colónias e países ainda de fraca economia em desenvolvimento. E foi essa a razão pela qual, mais tarde, a sua divulgação se generalizou após a primeira guerra mundial nos inícios do século XX. Tinha havido uma perturbaç~o da 11
Li st, F. Idem, pp. 273-274.
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di v isão inte rnaciona l do traba lh o devido à guerra . Aquel e "equilíbrio" na troca internaciona l de produtos industriais das na ções manufacture iras por matérias-primas e produtos agrícolas coloniais da "zona quente", como List lhes chama, fora alterado devido ao aumento da procura de produtos ligados ao armamento, diminuindo assim o volume do comércio mundial de produtos coloniais. Quando, após a guerra, ·as nações industrializadas qui seram voltar ao método comercial antigo e já com experiência da troca de produtos manufacturados contra matérias-primas e produtos alimentares coloniais, depararam-se com nações que, precisamente pelas condições criadas durante a guerra, tinham tomado a iniciativa de criar indÓ.strias próprias e não se mostravam agora dispostas a expôr à rude concorrência do comércio internacional as suas novas indústrias montadas com grande esforço e com altos custos. E foi neste quadro que se deu um reviver da doutrina de List, na medida em que quase todas essas nações com "infant industries" adoptaram a política da protecção alfandegária à sua indústria, na expectativa de poderem chegar t.~m dia à capacidade de concorrência no comércio internacional. A política de protecção de certos ramos novos de indústria seria assim ainda útil para o que se chama hoje 'países em desenvolvimento'. Samuelson defende, aliás, a ideia de que, hoje em dia, tal protecção alfandegária não se deve aplicar a certos ramos de produção mas sim na generalidade a 'jovens economias' . Mais original é em List a teoria das forças produtivas, a pesar de os fundamentos para tal teoria terem sido 31
elaborados, já antes, por A. Müller no seu desenvolvimento do romantismo político. Ao contrário dos Clássicos, a economia é entendida como uma globalidade e não como a soma de sujeitos económicos. A perspectiva é histórica ligada a maneiras de ver sociológicas e religiosas, uma "Weltanschauung". Ao contrário dos Clássicos que não consideram as forças culturais fonte do progresso e da produção, não é só a criação de bens materiais que é produtiva, mas sim também a criação de bens culturais, imateriais - a política, a ciência, a arte. Segundo a teoria orgânica do Estado e da economia, a globalidade tem primazia perante parte, isto é, o Estado, a Sociedade, a Economia perante os indivíduos; cada indivíduo não pode prescindir do outro. Fomentado pelo romantismo político, o historicismo impõe-se também na teoria económica, recusando o método dedutivo da Escola Clássica e, apoiando-se naquilo que é captável empiricamente, seguindo o caminho da indução. List é indubitavelmente o principal percursor deste caminho, numa perspectiva de política económica nacional. 12 o ·eixo da sua confrontação com a teoria de Adam Smith está na teoria das forças produtivas. Sendo o seu desenvolvimento originalmente feito por List, ela ·é de difícil compreensão dada a forma não directa e não sistemática como ele a expõe. Apesar de lhe dedicar um capítulo específico - o capítulo décimo segundo, Teoria das Forças Produtivas e a Teoria de Valor- a exposição é 12
Hauser, Ka rl, Friedrich Lis t in: Starbatty, Joachim
(Hrsg.), Klassiker des Ókon o mischen Oe nkens, Erster Band, Verlag C. H. Beck, München 1989, p. 243.
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fragmentária nunca chegando a uma definição. Talvez a forma mais precisa de entender a sua ideia seja a que expõe no início do capítulo: " As origens da riqueza são uma coisa completamente diferente da riqueza em si. Um indivíduo pode possuir riqueza, ou seja valores de troca, mas se não tiver a força para produzir mais objectos valiosos do que aqueles que consome, empobrece. Um indivíduo pode ser pobre, mas se tiver a força para criar uma soma maior de objectos valiosos do que os que consumir, enriquecerá. A força de produzir riqueza é, por isso, imensamente mais importante do que a riqueza em si; ela garante não só a propriedade e o aumento do adquirido, mas também a substituição do perdido. Isto é ainda mais o caso quando se trata de nações inteiras, que não podem viver de rendas, como os privados." 13 Walter Eucken faz uma análise crítica da forma como List apresenta a sua teoria das forças produtivas: "Se não se traça uma fronteira dos dados clara e se a análise teórica não pára nesta fronteira, não se consegue encadear a intuição histórica com o pensamento teórico. Dá-se uma funesta confusão entre ambos .. . O facto de muitas vezes não se utilizar a designação 'dados' e se falar por exemplo de 'factores dados', 'elementos simples' ou também de 'forças produtivas' não é essencial. Essencial é porém que a concepção que se tem dos dados é muitas vezes incompleta." E Eucken argumenta, neste seguimento, que "aquilo a que Friedrich List chama 'forças produtivas' são dados, que ele descreve contudo de 13
List, Friedrich, idem, pp. 143-144.
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maneira diferente e mais circunstanciada . 'É difícil imaginar uma lei ou instituição pública que não exerça uma influência maior ou menor sobre o incremento ou a redução das forças produtivas' . Até este ponto, List tem razão. Erra porém quando reclama uma 'teoria' das forças produtivas que ele pretende colocar ao lado da teoria do valor. Por teoria das forças produtivas ele entende uina teoria que explique a formação de dados concretos. - Toda a tentativa de elaboração de uma tal teoria está condenada ao fracasso, dado que a formação de dados concretos apenas é acessív~l à compreensão histórico-individual."14 Como exemplo Eucken apresenta, a seguir, a questão de saber porque é que a Alemanha de então referindo-se aos anos de trinta - tem uma certa população com certas capacidades e um certo grau de forma·. ção, ou porque é que ali existe uma certa ordem social e jurídica. A oposição de List à Escola Clássica centra-se numa não aceitação duma teoria estática onde domina a teoria do valor, tomando ele como centro o desenvolvimento económico. E é aqui que dá preponderância à organização da Sociedade, ao Estado e à Nação, dado que não se pode partir do princípio de que as forças do mercado, só por si, estejam em condições de garantir o desenvolvimento económico, antes requeiram condições específicas de enquadramento. As leis e regras válidas para a economia privada não são válidas para uma nação no seu conjunto. Em linguagem de hoje, dir-se-ia que as leis da microeconomia não são, per se, generalizáveis com vali14 Eucken, W., idem, pp. 162 e 262 sgts.
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dade para a macroeconomia. List critica o engano da Escola Clássica neste aspecto, recorrendo aos exemplos típicos dados por Adam Smith: "Como! A sabedoria da economia privada seria também sabedoria na economia nacional? Estará na natureza do indivíduo tomar em consideração as necessidades de futuros séculos, como faz parte da natureza da Nação e do Estado? ... Não! Na economia nacional pode ser sabedoria o que na economia privada seria tolice, e vice-versa, pela simples razão de que uma alfaiate não é uma nação, e uma nação não é um alfaiate; porque uma família é algo completamente diferente duma associação de milhões de famílias, uma casa algo muito diferente do que um vasto território nacional." 15 · Como Salazar afirmou, não tendo tido List muitos seguidores dc:t sua teoria, na prática ele teve sucesso, dado que nos últimos cinquenta anos -Salazar escreve nos anos quarenta - se tinha divulgado, na generalidade dos países, o proteccionismo. O que é .aliás válido para muitos países e em várias épocas após aquela afirmação de Salazar. Contudo, na realidade, a sua doutrina perdeu um certo impacto após a sua morte, dado que a teoria do comércio livre encontrou grande divulgação, mesmo na Alemanha e na política alfandegária. No último quartel do século dezanove, Ludwig Bamberger, um dos mais reconhecidos nomes da política económica e financeira, declarava no Reichstag que na Alemanha nenhuma escola económica e nenhum professor de fama
1"
List, F., id, págs. 167-168.
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apoiava as tarifas alfandegárias proteccionistas. 16 Apesar de, nessa altura, ser dominante na Alemanha a Escola Histórica que representava uma atitude positiva . em relação à doutrina de List, este não era, na generalidade, aceite como o economista do género de um Adam Smith alemão. Sendo embora reconhecido, distingUiu-se mais como pioneiro do Zollverein e, nesse aspecto como dos mais relevantes defensores da unificação da Alemanha. Para além disso, era indubitavelmente reconhecido, tanto na Alemanha como na Europa em geral relembramos a carta do comerciante alemão C. Schuster, sediado em Portugal, a List-e nos Estados Unidos como o arquitecto da importância da rede dos caminhos-deferro para o desenvolvimento das nações e, em especial, do comércio internacional. Gustav Schmoller, no centenário do nascimento de List apresenta-o mais como líder alemão do que como homem da ciência. "Pelas suas viagens e inúmeras conversas e negociações com políticos · e pessoas de grande influência do seu tempo acrescentaramse aos seus estudos históricos e de economia nacional o conhecimento do mundo e das pessoas, o que o elevou muito acima do horizonte de todos os teóricos que pela Alemanha caminhavam nas pegadas de Adam Smith. Assim ele se transformou no maior e mais produtivo { gitador da Alemanha no século XIX."17 Mas - independentemente da crítica marxista da economia política - são os primeiros princípios duma economia nacional histórica de Friedrich List que canse16
17
Hãuser, K., idem, pp. 244 e 299. Idem, p. 237.
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guem vencer a fobia perante o Estado, esta característica da economia a que List chan1a cosmopolita como oposta à economia política, atribuindo List ao Estado uma função clara neste Sistema. 18 Mais tarde, é verdade, a teoria económica assim como a prática não se libertaram mais do complexo que o Estado seja uma instituição diametralmente oposta .ao funcionamento da economia. Mas não é possível ignorar que o Estado tem uma função essencial e não periférica e uma função equilibradora no Sistema, nomeadamente se se trata de analisar o desenvolvimento do domínio e do poder em vez da mera economia e produtividade. Eduardo de Sousa Ferreira
JS Backhaus, J. et al (Hrsg.), Partiz ipation in Betrieb und Gesellscba ft, Campus Verlag, Frankfurt/New York 1978, p ..12 e sgts.
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PREFÁCIO
Se, como se diz, o prefácio deve conter a história da origem dum livro, então terei que descrever neste quase metade da minha vida; porque passaram mais de vinte e três anos desde que me surgiu a primeira dúvida sobre se a teoria dominante da economia política estaria correcta e desde que me · esforço para investiga,r os respectivos erros e as razões a eles subjacentes. Lastimável seria eu, de facto, se no fim se chegasse à conclusão de que, durante este longo tempo, só andei à caça de fantasmas, visto que nem por sobreestimar as minhas forças nem por ambição desmedida fui induzido a escolher . um objectivo tão difícil e a tê-lo perseguido com tanta constância. Foi a minha profissão que me deu para isso a primeira razão; foi o destino que a mim, ao renitente, estimulou com força irresistível a continuar a perseguir o caminho começado da dúvida e da investigação. Os contemporâneos alemães lembrar-se-ão da enorme quebra no bem-estar da Alemanha ocorrida no ano de 1818. Naqu ela altura, eu devia preparar aulas de economia política. Tinha aprendido tão bem como os outros o. que se pensava e escrevia sobre o assunto, mas não me satisfazia ensinar aos jovens a situação actual da ciência, também lhes queria ensinar como se podia fomentar, através do caminho da economia, a riqueza, a cultura e o poder da Alemanha. A teoria indicava o princípio da liberdade comercial. Este princípio parecia-me razoável, e também provado pela experiência, se se tomassem em consideração as canse39
quências do desarmamento das províncias alfandegárias francesas e da união dos três reinos do império insular. Só que, naquela altura, as consequências surpreendentes do sistema continental e os resultados destruidores do seu desarmamento ainda estavam · dema-siado próximos para que pudesse tê-los ignorado; parecia-me que estavam em flagrante contradição com aquelas observações e, no intento de perceber a razão destas contradições, ocorreu-me a seguinte ideia: que a teoria seria verdade, apenas se todas as nações seguissem mutuamente o princípio da liberdade comercial, tal corno tinha sido mutuamente seguido por aquelas províncias. Este pensamento conduziu-me ao conceito da nacionalidade e então compreendi: a teoria, à força de ver muita humanidade, muitos indivíduos, não teria visto as nações. Ficou claro para mim que a concorrência livre entre duas nações muito avançadas na cultura só podia ter resultados benéficos se ambas estivessem a um nível aproximadamenté igual de formação industrial; e que uma nação que, por infeliz destino, estivesse muito atrasada na sua indústria, comércio e navegação, possuindq, de resto, os recursos mentais e materiais para a sua formação, tinha primeiro de se tornar capaz por esforço próprio antes de poder concorrer livremente com nações mais avançadas. Numa palavra: descobri a diferença entre a economia cosmopolita e política. Ocorreu-me a ideia: a Alemanha tinha que abolir as suas alfândegas provinciais e tentar conseguir, através de um sistema de comércio comum, aquele grau de formação industrial e comercial que outras nações teriam atingido através da sua política comercial. Mas em vez de perseguir esta ideia através do estudo, o meu sentido prático levava-me a introduzi-la na vida. Ainda era ;ovem. 40
É preciso voltarmos em espírito ao período de 1819 para poder explicar as minhas tentativas posteriores. Governantes e governados, nobres e cidadãos, funcionários públicos e eruditos - todos naquela época, na Alemanha, estavam cheios de propostas e projectos para novas formas políticas. A Alemanha parecia-se com um edifício destruído pela guerra cujos proprietários, acabando de recuperar a propriedade, ganhando o seu controlo, estão prestes a instalar-se novamente. Uns exigiam a ordem anterior com todas as velhas tralhas e instrumentos; outros, instituições razoáveis .e instrumentos totalmente novos. Aqueles que ouviam equilibradamente razão e experiência exigiam compromissos entre as antigas exigências e as novas necessidades. Em todo o lado havia contradição e guerra de opiniões, em todo o lado se formavam associações e uniões para atingir fins patrióticos. A própria Constituição da União era uma nova forma que, esboçada com pressa, parecia um embrião mesmo aos mais esclarecidos e pensadores entre os diplomatas, uma Constituição cujo desenvolvimento para um corpo bem organizado foi intencionado pelos seus autores e que ficava reservado aos progressos do tempo. Um artigo especifico da Constituição (o décimo nono) tinha expressamente deixado espaço para a configuração de um sistema nacional de comércio. Parecia-me que este artigo podia ser um fundamento, sobre o qual se deveria construir a futura prosperidade industrial e comercial da pátria alemã, e esta convicção guiou-me até à ideia de criar uma associação de comerciantes e fabricantes alemães 1, cujo fim deveria ser o desarmamento das 1 Nas anteriores edições do Léxico de Conversação, (Expressão usada no século XIX para o que hoje se chama Enciclopédia) [Nota do Tradutor] o Sr. J. M. Elch de
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alfândegas provinciais alemãs e a implementação do sistema comercial alemão comum. É sabido como se fez esta associação
Kaufbeuren é dado como o fundador desta associação. Quanto a mim, não só é me atribuída uma participação menor na fundação da mesma e nas suas aspirações posteriores, como também me censuram ter agido com grande negligência na gestão dos seus negócios. Quando, depois de ter voltado à pátria alemã, procurei o autor daquele artigo, foi-me indicado o nome que me fez perceber esta versão, porque era dum indivíduo em grande dívida para com o Sr. J. M. Elch e que parece tanto maior neste assunto quanto mais se diminuem as minhas aspirações. Não sofrendo muito de grande ambição, não achei que valesse a pena levantar reclamações contra o artigo. Ultimamente, no entanto, reconheço a inevitável necessidade de falar publicamente deste assunto. Como é sabido, a Faculdade de Direito de Jena honrou-me há pouco com o título de doutor, e o correspondente do Allgemeine Zeitung de Augsburgo em Jena observou na ocasião que tinha ~ido eu o primeiro a avançar a ideia de uma associação dos Estados alemães com o fim de um sistema alfandegário comum alemão. Contra essa observação, chegou à redacção do mencionado jornal a seguinte reclamação: "A reportagem de Jena com data de 1 de Dezembro de 1S40 no Allgemeine Zeitung n. 12 344, conforme a qual o senhor Friedrich List pronunciou a primeira ideia do comércio livre no interior e para o exterior, deve ser corrigida, no sentido de que a honra desta ideia pertence ao comerciante (grossista) J. M. Elch de Kaufbeuren, o qual, na Feira da Páscoa de Francoforte no ano de 1819 convidou, através duma carta circular, vários comerciantes de todos os Estados alemães a assinarem uma petição planeada sobre este assunto a ser entregue na ilustre assembleia dos Estados. O acaso fez com que, alguns dias mais
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e a sua influência na formação de uma união entre os dois governantes, iluminados e de elevado espírito, da Baviera e de Wurttemberga, e mais tarde da União Aduaneira Alemã.
tarde o professor List de Tübingen se deslocasse a Francoforte e, entusiasmado pela ideia, se encarregasse de redigir a petição, função que desempenhou com mestria e pela qual ficou famoso. Depois de · a associação · ter sido constituída, o professor List foi eleito seu representante, e viajou na companhia do Sr. Schnell de Nuremberga, entretanto falecido, para visitar as cortes alemãs, com o fim de junto delas promover as aspirações da associação." Tenho que mencionar a história da fundação desta associação com breves palavras para reduzir as pretensões do Sr. Elch ou dos seus porta-vozes, à medida adequada. É verdade que, na primavera de . 1819, assuntos privados me levaram a Francoforte do Meno, mas também é verdade que a ideia de uma tal associação já tinha tomado forma na minha cabeça muito antes dessa viagem. Ainda vivem pessoas com quem falei a respeito, antes e durante a viagem, e entre a correspondência do falecido Freiherrn von Cotta deveria haver provas escritas. Chegado a Francoforte, contei o meu plano ao Sr. Schnell de Nuremberga, que me tinha sido recomendado como um comerciante compreensivo e patriótico. Schnell aceitou o plano com fervor, falou-me dos senhores Bauerreis em Nuremberga, Weber em Gera, Arnoldi em Gotha, que lhe tinham apresentado queixas sobre a nova tarifa alfandegária prussiana, e disse que o assunto seria tanto mais do agrado dos · comerciantes e fabricantes presentes na Feira em Francoforte, quanto um senhor Elch de Kaufbeuren, o comerciante de linho, estava prestes a juntar assinaturas para uma petição a ser entregue na Assembleia Federal Alemã, na qual se pediam medidas para eliminar as limitações do comércio interior na
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Como consultor da Associação Alemã de Comércio tinha uma posição difícil. Toda e qualquer protecção alfandegária
Alemanha. A meu pedido, apresentado ao Sr. Elch por Schnell, Elch comunicou-me a minuta duma petição à Assembleia Federal Alemã (ou os materiais para isso) que, se não estou em erro, ainda se encontra entre os meus papéis. Ali falava-se sobretudo dos obstáculos que a Áustria há pouco tinha levantado contra a exportação de pano da Suábia Superior para a Itália- tudo descrito com muita simplicidade e no estilo de Comptoir. Conforme tínhamos combinado, chamámos ainda outros fabricantes para as nossas consultas, nomeadamente os senhores Leisler e Blachiere de Hanau, Hartrnann de Heidenheim, Herose de Aarau, etc. Mas ainda não se falava da fundação de uma associação comercial. Só quando se redigiu a petição a ser entregue na Assembleia Federal Alemã e este projecto foi aceite com grande aplauso, apareci com as minhas outras propostas. Ninguém poderá negar que todas as propostas referentes à fundação e organização da associação foram feitas apenas por mim, e precisamente o pouco tempo em que as apresentei prova que nelas já tinha pensado anteriormente. Agora peço que releiam a reclamação acima a favor do senhor Elch. Ficarão surpreendidos por a razão da contradição entre mim e o senhor Elch não estar propriamente nos factos, mas somente na diferença total da nossa lógica. Como sendo seu mérito, o Sr. Elch menciona que teria sido o primeiro a pronunciar a "ideia