Labirintos da alma
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.Oswaldo Giacoia júnior

LABIRINTOS .

..

DA ALMANietzsche e a auto-supressão da moral

EDI1DRADA

UNICAMP

Digitali7ado com CamScanne.r

OSWALDO GIACOIA JÚNIOR

LABIRINTOS DA ALMA Ni etzsche e a auto-supressão da moral

SBD-FFLCH-USP

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Oigi tnli1odo e.om CamSr.nnn,er

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FICHA CATALOGRÁFICA ELADORADA PELA DIBLIOTECA CENTRAL DA UNICAM,P G346L

Giacoia Júnior, Oswaldo Labirintos da alma: Nietzsche e a auto-supressão da moral / Oswaldo Giacoia J úni or. - - Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1997. (Coleção Repertórios)

1. Nietzsche, Friedrich Wilhelm, 1844-1900 Crítica e interpretação. 2. Filosofia alemã. 3. Cristianis11no - Filosofia. 4. M oral. 1. Título.

20. CDD - 193 261.5 - 170

ISBN 85-268-0413-8

Índices para catálogo si:stemático: 1. 2. 3. 4.

Filósofo alemão 193 Filosofia alemã 193 Cristianismo - Filosofia Moral 170

261.5

Coleção Rcpertórioi; Co,pyright © by Oswaldo Giacoia Júnior Projeto Gráfico Camila Cesarirzo Costa Eliana Keste11bawn Coordenação Editorial Carmen Silvia P. Te.ixeira

)



Produção Editorial Sandra Vieira Alves Preparação de Originais Valdir Pereira Gomes . . Revisão S im one Ligabo Gonçalves Vilma Apa recida Albino

Edito ração Eletrônica Ulí.rses Ferreira da Silva Sílvia Helena P. C. Gmiçalves

1997 Editora da Unicamp Caixa Postal 6074 C idad e Universitária - Barão Gemido CEP 13083 -970 - Campinas - S P - Brasil Fone: (019) 788.2015 Fone/Fax: (0 19) 788.2170

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DEDALUS - Acervo - FFLCH-FIL

21000055843

Para Sirlei e Rachel, um novo corneço, um primei ro movimento, um sagrado dizer sim, com todo amor.

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"No horizonte do infi ni to - nós abandonamos a terra, tomamos o navio! Nós destroçamos as pontes às nossas costas - mais ainda, destroçamos a terra às nossas costas! Agora, pois, naviozinho! Tem cautela! Ao redor de ti se este nde o oceano; ele nem sempre brame, é verdade, e por vezes se estende como seda e ouro e so nh os de bondade. Porém horas virão em que reconhecenís que ele é infinito e que não há nada mais terrível que a infinitude. Oh, pobre do pássaro que se sentiu li vre e agora se choca contra as paredes desta gaiola! Ai, se te acomete a saudade da 'terra', como se lá tivesse hav ido m·ais liberdade - e já não há mais terra nen huma." F. Nietzsche, A Gaia Ciênciá, afori smo nº 124

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SUMÁRIO

Prefácio ............................................................................................... 11 Introdução ............................................................................................ 13

:)• A CRISE DA CULTURA COMO ESCALADA DO NIILISMO (DE ONDE PROCEDE O MAIS SINISTRO DOS HÓSPEDES?) ..... 19 Introdução .............. ..........................................................................

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1. O C ristianismo como Décadence-Religion e a essência do Niilismo ....................................................................................... 20 2. A Aujhebung (sup ressão) do Niilismo europeu .......................... 35

Bibliografia .. ............... :................................. .-................................... 45

NOTAS PARA UMA INTERPRETAÇÃO DA FIGURA HISTÓRICA DE JESUS DO PONTO DE VISTA D' O ANTICRISTO DE NIETZSCHE .............................................. .. 47 Introdução .... .. ..................................... ............................................. :. 47

1. Considerações gerais sobre Budismo e Cristianismo enquanto re ligiões da decadência .... .. ............................................ 49

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...

2. Sobre as origens do Cristianismo: Jesus e seus judeus .............. 53 3. Jesus de Nazaré e o Cristianismo eclesiástico ............................ 65

Conclusão ..... .................................. ...... ........ .................................... 84 Apêndice .............................................................................................. 87 Notas .................................................................................................. 96

Bibliografia........................................................................................ 1OI

~r NOTAS SOBRE O TEMA DA AUTO-SUPRESSÃO DA MORAL... 103 Notas ............................................................................................... 124

-n"EXCURSO 1-A VONTADE DE VERDADE COMO EXPERIMENT0 .................................................................. 127 ~

)

EXCURSO II - A PROBIDADE INTELECTUAL COMO DERRAD EIRA VIRTUDE ................... :............................ 139 Notas .................................................................. ...·.......................... 149 Bibliografia ........................................................................ ............. 151

·'

SADE E NIETZSCHE: AS VERTIGENS DA CONSCIÊNCIA MORAL ................................................................ 157 Notas ...................... ......................................................................... 176

Bibliografia ............. .. ... ......................................... ......................... 179 EPÍLOGO ...................................................... .................................... 181 N otas ............................................................................................... 188

Oigitolízodo com ComSc~nnc r

PREFÁCIO

Os ensaios aqui reunidos forani compostos em ocasiões diversas e recebem, por ocasião desta publicação, uma versão ampliada, en riquecida de novos resultados que se seguiram à sua elaboração inicial e provisória. Algumas de suas partes foram anteriormente publicadas, de modo esparso e nos termos daquela versão inicial, de maneira que sua integração no conjunto deste trabalho ce rtamente importará num aprofundamento e ampliação de seu alcance. De toda maneira, os ensaios não encerram a pretensão de se apresentar como uma interpretação exaustiva do conjunto da filosofia de Nietzsche, mas de sugerir algumas hipóteses hermenêuticas que poderiam contribuir para uma abordagem filosoficamente consistente e produtiva do pensamento nietzscheano, tomando como pomo de partida constelações de temas e problemas investidos de uma relevância fundamental no contexto do derradeiro período de seu filosofa,: Este trabalho se apresenta também como um resultado, ainda parcial, ainda incipiente, de pesquisa que realizo sob patrocínio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, tendo por objeto o projeto nietzscheano de reversiio do plato11ismo e transvaloração dos valores. Sem o in estimável apoio dessa prestigiosa instituição não teria sido possível seque r a publicação das hipóteses de interpretação que compõem os presentes ensaios. ·

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Dentre os inúmeros amigos e familiares a quem gostaria de expressar minha mais profunda gratidão e reconhecimento, menciono apenas o nome do D,: Luiz Roberto Monzani, a cujo estimulo ge11eroso e invencível poder de· convencimento devo a ousadia desta publicação. Aos outros, falta a menção por excesso de zelo, mas a eles permaneço o mais penhoradamente grato. Campinas, fevereiro de 1996.

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INTRODUÇÃO

Os ensaios reu nidos no presente vo lume guardam uma relativa indepe ndê'ncia mútua, embora se remetam a um núc leo teórico comum, do qual retiram sua significação mais profunda, dele se irradiando para descrever percursos distin tos. Compará-los-ia a caminhos que possibilitam trajetóri as variadas, algumas vezes acidentadas, cruzando-se e m determinados momentos, distanciandose em outros, remetendo todos a um foco comum: a inteligibi li- ~ dade da cpnstelação de ternas~ problemas que constituem o centro nevrálgico da filosofia de Nietzsc he-;~ P e nso poder descrevê- lo como radical crítica genealógiça da modernidade. Se a oposição de Nietzsche ao " homem moderno", às "idéias modernas", à "cultura (Bildung) moderna", se ma nifesta de modo dec idido desde cedo em sua obra, a ponto de se transformar em proje to filosófico que gan ha expressão na série de panfletos denominad os Considerações Extemporâneas, essa oposição se intens ifica ao longo da trajetória filosófica de Nietzsche, at ing indo sua cul minân cia com . Q p_rojeto derradeiro de transvaloração de todos os valores ( Umwertung aller Werte). E, por serem os valores morais cristãos as supremas referências axio lógicas que determinam o horizonte normativo e a substância ética da m o dernidade, essa transvaloração de todos os va lores - também compreend ida por ~e~ autor co mo transvaloração . ou r_e versão do p laton is mo - não pode de ixar de se determinar e autocomp ree nd e r como yefutação defi niti va da moral c ri stã e, por

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conseqüênc ia, pelo m e nos do ponto de vista de N ie tzsc he, como superação do platonismo, de que o Cristianismo representa uma variante e uma extensão. Os cami nhos diversos qu e o leitor poderá percorrer por meio destes e nsaios, nos quais não fo i de todo possível evitar alg uns cruzamentos e sobreposições, pretendem, p or consegui nte, demandar a esse núcleo, ao cerne da crítica nietzscheana do " h omem moderno", "id_é ias moden~as"; como já d_U:Q,_~~~9-o_g~~ esse núcle~ constituído pelo tema da~~~ d!! m oral cristã-oc ide~ ta~l, _s uperação que não p oderia se realizar senão pela via da c rí tica h1stonco-genealógica, já que, para Nie tzsche, conforme pretendo que fique demonstrado por meio de análise e interpretação dos textos, somente uma refutação histórica pode se pretender definitiva. Ora, segundo o juízo do própno Nietzsche, o mome nto de s ua mais amadurecid a re fl exão acerca d a refutação histórico-genealógica do Cri_stian_i~mo e do platonismo se deixa e nun ciar, em sua linguagem própria e segundo uma metódica igualmente à altura de sua elevação espi ri tual, no contexto teórico de sua derradeira fil osofia. Pretendo sustentar ;qui o ponto de vista segu ndo o qual o eixo teórico, extremame nte denso e problemático, que articula a temática da refu tação histórico-genealógica da moral cristã com aquela relativa à transvaloração de todos os valores, se deixa adequadamente com preender a partir de uma leitura dos derradeiros escritos de Nietzsche e, de maneira especial, de , O Antir:i.zaç_ão_d.Q..o.utro_como con_dição da autovalor_açi_o_q_u~ §_j nterpretada por Nietzsche como tendo ocorri do de modo paradig111áti ~.9.!1-ª hi stória de Israel. É isso que diferencia o tipo decadencial dos judeus da "ingênua dec ad ênª eia" que N ietzsche, também paradigmaticamente, fi gura no Budismo: a astúcia de autoconservação que leva a adi vinhar nos ma is pro fund os in sti ntos da decadência um poderosíssimo aliado para com bater e triun fa r sob re "o mundo", tra nsformando em dominantes os instintos decadentes e esgo tad os, ass im como suas expressões em termos dos va lores. Essa astúcia cons titui o e le mento tipicamente judeu que será prolongado no Cris tiani smo hi stóri co, diferenciando-o do Cristianismo o ri g in á ri o de J es us de Nazaré. Como

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se cxp_Iicitar.~ a seguir, é e~. virtude de um semelhante non plus ultra de ~rd1l e rch~a~ncnto esp1ntu~I que o rabinismo paulino reinterpreta a v1?a e a pra~1s. de Jesus, cr!ando, a partir dessa reinterpretação, aquilo que sena a base e a seiva do. Cristianismo eclesiástico. Que Isrnel tenha, a esse preço, triunfado contra seus antigos sen hores e opressores impondo-lhes valo res que, desde então, se tornaram_!izado com ComSconnor

mo processo de desnaturalização dos valores levado a efeito pelo sacerdote judeu; desse modo, a s imbólica d o Cristianismo aparece, para Nietzsche, como genial reprodução do mesmo paradigma de fals ificação da " naturalidade" .

Neni a moral nem a religião, no Cristianismo, tem algum ponto de contato com a efetividade. Somente causas ima. ginárias ( "Deus", "alma", "eu", "espírito", "a vontade livre", ou ainda "a !]ão-livre"); somente efeitos imagin~rios ("pecado", "redenção", "clemência", "castigo", "re111issão dos pecados"). Uma transação entre seres imaginários ("Deus", "espíritos", "almas"); uma ciência -- .... i1::ag inária da natureza (antropocêntrica, total ausência do conc~ito de causas naturais); uma psicologia imaginária (somente mal-entendidos sobre si, interpretações dé sentinientos gerais agradáveis ou desagradáveis, por exemplo, estados do nervus sympathicus,_ com auxílio de ling_E,Egens simf?ólicas da idiossincrasia moral-religj.9sa ..=-:_•_grr~pefldim.~r~to~•! "remorso de consciência", "tenta__são do diabo", "a proxin!~cjq~e_ cje_D:.t!! "); uma teologia imagl!!ária ("o ! !! ino de Deus", o "juízo final", a "vida eterna"). 31

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Trazer à luz as circu nstâncias e condições de onde pode se originar este mundo de ficção impli ca, para Nietzsche, recons tituir a autêntica hi stória da primeira comunidade cristã, das operações e práticas que tornaram possível s ua preservação no interior de Israel; implica, sobretud o, aos olhos de Nietzsche reconstituir a história de um imenso mal-entendido da figura de Jesus de Nazaré. Ora, este é, confessadamente, o problema que interessa o autor de A.:

Aquilo que a mim interessa é o tipo psicológico do Redentor. Este tipo poderia estar contido, com efeito, nos Evangelhos, aínda quando muito mutilado e sobrecarregado com traços estranhos: conw o de Francisco de Assis está contido em suas lendas, apesar delas. Não .a verdade acerca do que ele fez, disse, da maneira como,

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em realidade, morreu: porém o problema de se seu tipo é. imaginável em absoluto, se está "transmitido ". 32 Aquilo que o A. procura recompor é, portanto, o tipo ps icológico do Jesus históri co, fazendo-o a partir de um pri ncípio metodológico que se desdobra numa operação d upl a: de um lado, tratase de restaurar os traços mutilados de seu tipo psicológico; de outro lado, trata-se de despoj,í- lo de elementos que a ele são estranhos e que foram acrescidos por camadas diversas de interpretação. Esse princípio metodológico está condicionado por uma questão filosófica prévia: trata-se de saber se o tipo psicológico do Redentor nos é ainda representável, se ele fo i, em absoluto, transmitido. Não se trat~, pois, de uma recon stituição "o bjetiva" da verdade hi stórica acerca do que ele disse ou fez, nem mesmo a respeito de como ele morreu; a "autên ti ca" figura histórica de Jes us de Nazaré estaria fixada em seu tipo psicológico - suposto que esse tivesse s ido transmitido - uma vez despojado dos traços estranhos e incongrue ntes com que a trad ição o teria desfigurado. Apesar da s·o lidez e do refinamento da erud ição hermenêutica, dos recursos impressionantes da filologia histórica do A. , o prob lema de N ietzsche não é o de revisi tar o tema da prova científi ca da verdade dos Evangelhos. A despeito de sua fecunda frcqüentação da hi stori ogra fi a, 33 Nietzsche a e la antepõe uma objeção de princ/ pio: a ele não interessam as "co ntradições da tradição" .

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Como é possível, em absoluto, "tradições" as - _,,..denominar ,.. lendas de santos? As histórias de santos são a lite ratura - -- --mais ambígua que existe: cpJicar a elas C!,_!!?étodo ciel_!t!.:_ _ fico, se não existem outro.:i..s!.?~umentos!. pf!rec~:!~':J'ma__

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_ empresl!...Eondenada j ~ntemão:: 1~1e ra ociosida_