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Portuguese Pages 1522 Year 2003
c0Jíreíto 6Jnstítucíonal_L_ __1 e Teoria da Constituição 7.ª Edição (11.ª Reimpressão)
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ALMEDINA
TÍTULO.
Direito Constitucional - 7. ª Edição
AUTOR.
José Joaquim Gomes Canotilho
EDITOR.
Edições Almedina DESIGN
EXECUÇÃO GRÁFICA. TIRAGEM. DEPÓSITO LEGAL.
BangDesign Gráfica de Coimbra 2000Ex 203651/03 Biblioteca Nacional de Portugal- Catalogação na Publicação CANOTIIHO, J J Gomes, 1941-
Direito constitucional e teoria da comstituição. - 7" ed., 11 reimp. (Manuais universitários) ISBN 978-972-40-2106-5
CDU 342 378
Toda a reprodução des/a obm, seja por fotocópia ou outro qualquer processo, sem prévia autorização escrita do Edito,; é ilícita epassível de procedimento judicial contra o infracto1: Reserv_ados todos os direi/os para a Língua Porluguesa EDIÇOESAIMEDINA- COhlfBRA-PORTUGAL
O livro e o Ambiente A defesa do Ambiente é, boje, uma tarefa de todos os cidadãos. Os pequenos passos, as iniciativas modestas podem ser importantes para a consciencialização dos problemas ecológicos e ambientais. O Autor, a Editora Almedina e a Gráfica de Coimbra assumem aqui a sua cumplicidade. Este «Direito Constitucional e Teoria da Constituição, é impresso em papel ecológico "amigo do ambiente" totalmente livre de cloro. ·
Ao Professor Konrad Hesse Aos meus colegas e alunos brasileiros
Nota
Prévia à 1. ª edífão
O Direito Constitucional cuja 1. ª edição remonta há precisamente 20 anos termina aqui. Este Direito Constitucional e Teoria da Constituição é um livro novo. As partes mais estáveis do Direito Constitucional como a história do constitucionalismo e os traços estruturais do direito positivo vigente ainda se mantêm. Não poderíamos, porém, publicar uma nova edição com uma mensagem teórica e política-constitucional substancialmente diferente. A estrutura do livro pretende tornar clara a dinâmica jurídico-constitucional - história constitucional, doutrina constitucional, metódica constitucional e teoria da constituição. O desafio dialógico e comunicativo também se pode descodificar - recuperar a teoria da constituição que, nos tempos mais recentes, é objecto de profunda erosão provocada pelas teorias filosóficas da justiça e pelas teorias sociológicas do direito. Além disso, o direito constitucional deve olhar sem preconceitos o direito constitucional europeu e interrogar-se sobre a necessidade de novas categorias político-organizatórias nos contextos globalizantes. Mesmo no âmbito do direito constitucional positivo, afiguram-se-nos indispensáveis algumas alterações importantes quanto à compreensão do texto constitucional de 1976 e quanto ao recorte doutrinal de determinadas matérias (exs.: tribunais, estado de direito democrático, direito regional, fontes de direito). A teoria da constituição inserida na última parte do livro é, na sua quase totalidade, uma proposta discursiva completamente nova. Algumas sugestões nela avançadas carecem de um estudo mais aprofundado a que procuraremos dedicar o nosso ano sabático de 1998. A reelaboração teórica teve em conta, naturalmente, as inovações introduzidas pela quarta revisão de 1997. O livro é dedicado ao Professor Konrad Hesse. No momento em que esta narrativa constitucional sugere a relativização da cultura jurídica germânica e uma maior abertura aos quadrantes jurídicos e constitucionais norte-americanos, é justo deixar aqui a homenagem ao Professor que orientou o início da nossa viagem pelo mundo da constituição. Um gesto de gratidão é também devido aos colegas, magistrados, advogados e alunos do Brasil. Perante a saturação do discurso constitucional nas universidades portuguesas, é de inteira justiça dizer que os maiores e mais estimulantes incentivos para a nossa investigação têm agora o seu epicentro nos espaços crítico-públicos brasileiros.
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Devemos confessar ainda que as nossas preocupações teóricas andam hoje por outras galáxias do saber (complexidade dos fenómenos sociais e científicos, auto-organização). Quem nos impeliu para esta nova aventura foi o Engenheiro Francisco Correia Guedes, da Universidade Autónoma de Lisboa. A ele devo a explicação de conceitos como constitutional boot-strapping e metodologia fuzzy. Ao reconhecer a minha dívida para com este homem não posso deixar de fazer a seguinte e angustiada pergunta: o ensino universitário português ainda será "universitário"? Gostaríamos, por fim, de deixar registado o nosso agradecimento ao Dr. Mário Barata. Além da revisão do texto, prestou-nos um inestimável auxílio na tradução de algumas fórmulas e expressões enraízadas nos quadrantes jurídicos norte-americanos.
Coimbra, Outubro de 1997
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Nota Prévia à 7. ª edição Quando o nosso editor nos informou de que seria necessário preparar uma nova edição ou, pelo menos, uma reedição, pensámos inicialmente em optar por esta última hipótese. Várias razões apontavam nesse sentido. Em primeiro lugar, não tinhamos propostas de radical alteração da estrutura e estilo deste livro. Em segundo lugar, o direito constitucional vai, em breve, ser confrontado com os desafios do direito constirncional europeu. Acabámos, porém, por nos decidir a favor de uma nova edição. Existiam matérias expostas segundo parâmetros jurídico-constitucionais entretanto alterados (ex.: fiscalização preventiva de convenções internacionais) e matérias que careciam de explicitação textual (ex.: controlo da constitucionalidade nos processos de fiscalização concreta). Havia ausências e omissões importantes relativamente a problemas de grande relevância prática (ex.: o conceito de intervenções restritivas ao lado do conceito de leis restritivas). Por último, alguma legislação recente deu concretização a princípios jurídicos jurídico-constitucionais de capital importância na teoria dos direitos fundamentais (ex.: Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais). Esta edição foi preparada num ano triste. Um a um foram morrendo amigos queridos - João Amaral, Aníbal Almeida, Marques dos Santos, Barros Moura. Eles compreenderão a dedicatória deste livro. Ab amicis honesta petamus. Coimbra, Setembro de 2003
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Síglas de Revistas e Obras Colectívas ACP AnDCP AnDP e Est. Pol. An. lb. Am. Je AIJ C AJIL Ac. Doutr. Anib. Jusconst. -
Archiv für die Zivilistische Praxis Anuario de Derecho Constitucional y Parlamentario Anuario de Derecho Publico y Estudios Políticos Anuario Ibero americano de justicia Constitucional Annuaire Internationale de justice Constitutionnelle American journal ofInternational Law Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo Anuário Ibero Americano de justicia Constitucional AÔR- Archiv des ojfentlichen Rechts Ac TC - Acórdãos do Tribunal Constitucional APSR - American Política! Science Review ARSP - Archiv fiir Rechts-und Sozialphilosophie BFDC - Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra BMDC - Boletin Mexicano de Derecho Comparado BFD-UNED - Boletin de la Facultad de Derecho - UNED BMJ - Boletim do Ministério da justiça Cap. Cons. Const - Les Cahiers du Consei Constitutionel CDCP - Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política CC - Constitutional Commentary CuC - Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional CUDP - Cuadernos de Derecho Publico DD - Democrazia e Diritto DJ - Direito e justiça DJAP - Dicionário jurídico da Administração Pública Doe. Adm. - Documentación Administrativa Dir - O Direito DÓV - Die Ôjfentliche Verwaltung
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Direito Co11stituciona/
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DVBL - Deutsches Verwaltungsblatt ED - Estado e Direito EdD - Enciclopedia dei Diritto EuGRZ - Europdische Grundrechte Zeitschrift Fo lt. - Foro italiano Fundamentos. Cuadernos Monográficos de Teoria dei Estado, Derecho Publico e Historia Constitucional G. Cost. - Giurisprudenza Costituzionale JCP - ]urisclasseurs Periodique JiaoR - Jahrbuch für internationales und ausldndisches ojfentliches Recht JÔR- jahrbuch des ojfentlichen Rechts der Gegenwart JUS - ]uristische Schulung JZ - ]uristenzeitung NDI - Novíssimo Digesto Italiano NJW - Neue ]uristische Wochenschrift NVwZ - Neue Zeitschrift for Verwaltungsrecht ÔZÔR- Ôsterreichische Zeitschrift für ojfentliches Recht Pens.Const. - Pensarniento Constitucional ParPGR- Pareceres da Procuradoria Geral da República POLIS - Revista de Ciência Política PS - Political Studies PVS - Politische Vierteljahreszeitschrift QC - Quaderni costituzionali PD - Politica dei Diritto RA - Revue Adrninistratif RaDP - Rassegna di Diritto Pubblico RAE - Revista de Assuntos Europeus RAP - Revista de Administración Publica RbrDP - Revista brasileira de Direito Público RbrEP - Revista brasileira de Estudos Políticos RDA - Revista de Direito Administrativo RD Cost - Rivista di Diritto Costituzionale RDCI - Revista de Direito Constitucional e Internacional RD Publico - Revista de Direito Público RCAD I - Recuei/ des Cours de l'Académie de Droit International RCP - Revista de Ciência Política
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RD E - Revista de Direito e Economia RD ES - Revista de Direito e Estudos Sociais RFDL - Revista da Faculdade de Direito de Lisboa RDP - Revista de Derecho Político RDPSP - Revue du Droit Public et de la Science Politique REDA - Revista espaiíola de derecho administrativo REDC - Revista Espaiíola de Derecho Constitucional REP - Revista de Estudios Políticos RFSP - Revue Française de Science Politique RFDC - Revue Française de Droit Constitutionnel RFD/UG - Revista de la Facultad de Derecho de la Universidad de Granada RIDC - Revue Internationale de Droit Comparé RIEJ - Revue interdisciplinaire d'études juridiques RFDL - Revista da Faculdade de Direito de Lisboa RHI - Revista de História das Ideias RIL - Revista de Informação Legislativa RJ - Revista Jurídica AFDL RLJ - Revista de Legislação e jurisprudência RMP - Revista do Ministério Público ROA - Revista da Ordem dos Advogados RIFO - Rivista Internazionale di Filosofia dei Diritto RTDC - Rivista Trimestra/e de Diritto Civile RTDP- Rivista Trimestra/e di Diritto Pubblico RTD PC - Rivista Trimestra/e di Diritto e Procedura Civile Rth - Rechtstheorie RVAP - Revista Vasca de Administración Publica Subjudice WDStRL - Veroffintlichungen der Vereinigung der deutschen Staatsrechtslehrer VRÜ - Verfassung und Recht in Übersee ZAoVR - Ôsterreichische Zeitschrift for ausldndisches Recht und Volkerrecht ZSR - Zeitschrift for schweizerisches Recht THEMIS - Revista da Faculdade de Direito da UNL TJ - Tribuna da justiça
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Capítulo Introdutório -~·-- - - - - · - - · - - · - - -
O Ensíno e a Teoría
~ O ensino e a teoria 11. Orientação profissional e discurso académico . 2. "Leitura dogmárica" e "leitura teorética" 3. "Leitura estrmurante" e "discurso historicistà' e "comparatístico" ' 4. Orienração geral 5. Os destinatários do discurso
_!! - Como se ensína e o que se ensína 1. Lance de olhos em redor do ensino do direito constitucional
2. As "modas" e as práticas: o "novo" e o "novíssimo" direito constitucional
l 111 - Os estudantes chegam ca,regados de memórias constitucíonaís
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1. Uma presença difusa j 2. O entendimento do "dito textual" e sistematização
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/V; Wsão global da literatura sobrr díreíto constítudonal ! A)
Direito constitucional português
/ B) Direito constitucional alemão
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_ _C_o~p~tulo l n t r e d 1 1 t d r i ~
C) Direito constitucional argentino
D) Direito constitucional austríaco E) Direito constitucional brasileiro F) Direito constitucional espanhol G) Direito constitucional norte-americano
H) Direito constitucional francês I)
Direito constitucional holandês
J)
Direito constitucional inglês
L) Direito constitucional italiano
M) Direito constitucional mexicano N) Direito constitucional suíço
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I - O ensino e a teoría
1. Orientação profissional e discurso académico Este trabalho pretende ser um livro novo de direito constitucional. "Novos constitucionalismos" e novos "desenhos" para as instituições políticas obrigam ao repensamento dos problemas de direito constitucional. Isso não impede que ele continue a ser estruturado com a finalidade de fornecer uma abordagem universitária dos principais tópicos de direito constitucional. Pretende-se, pois, problematizar uma disciplina jurídica cada vez mais considerada como uma disciplina estruturalmente formativa para todos aqueles que desejam aprender os fundamentos básicos da organização da "cidade". Tratando-se, como se trata, de uma ciência enquadrada na ciência geral do direito, terá sentido perguntar desde já: qual o paradigma formativo subjacente a esta mensagem científica? A resposta é esta: o autor permanece fiel ao paradigma formativo da Faculdade de Direito de Coimbra, desde há muito preocupada em formar juristas críticos e consciências pensantes e não meros oficiais de diligências jurídicas. Esclareça-se este ponto. A ciência jurídica ensinada nas "Escolas de Direito" oscila entre duas orientações fundamentais: a "orientação profissional" e a "orientação académicà'. A primeira procura fornecer um saber colocado directamente ao serviço do jurista prático e das suas necessidades. A segunda, sem perder a dimensão praxeológica (irrenunciável ao direito), visa proporcionar um discurso com um nível teorético-científico (no plano dos conceitos, da construção, da argumentação) que compense a "cegueirà' do mero militarismo e evite a unidimensionalização pragmaticista do saber jurídico. A preferência por uma "orientação académicà' de modo algum afasta a preocupação de se procurar fornecer aos alunos os conhecimentos indispensáveis ao posterior alicerçamento das leges artis da profissão. O ensino universitário não deve, porém, antecipar ou substituir quer os estágios profissionais quer a riqueza da vida.
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2. "Leitura dogmáticà' e "leitura teoréticà'
O paradigma formativo convencionalmente apelidado de "orientação académica" justificará o frequente recurso à teoria e à dogmática. Adiantemos o sentido destes conceitos. A dogmática constitucional procura auxiliar o jurista constitucional, fornecendo-lhe esquemas de trabalho, regras técnicas, modos de argumentação e de raciocínio indispensáveis à "solução" ou "decisão", justa e fundamentada, dos "casos" ou "problemas" jurídico-constitucionais. A teoria visa proporcionar uma reflexão sobre o modo e a forma como o direito constitucional e a ciência do direito constitucional compreendem o seu objecro de estudo e cumprem as respectivas tarefas nos planos pedagógico e científico. A iluminação de muitos problemas jurídico-constitucionais carece de um background explicativo e justificativo que só pode ser fornecido por uma reflexão teórica sobre o próprio direito constitucional. Vários exemplos poderiam ser aqui trazidos à colação. Não é possível, por exemplo, discutir o conceito de constituição sem se falar em "teorias da constituição". Seria metodologicamente empobrecedora uma análise dos direitos fundamentais sem uma exposição das "teorias dos direitos fundamentais". No mesmo sentido, abordar o princípio democrático sem o suporte teórico das "teorias da democracià' implicaria o esquecimento da força sinergética das "ideias sobre a democracià'. A necessidade da "dogmática" e da "teorià' não implica qualquer distanciação perante as necessidades da prática e da vida. Mas compreenda-se a mensagem aqui insinuada. Sem as teorias de Newton não se teria chegado à Lua - assim o diz e demonstra Sagan; sem o húmus teórico, o direito constitucional dificilmente passará de vegetação rasteira, ao sabor dos "ventos", dos "muros" e da eficácia. Mas o inverso também tem os seu perigos: a hipertrofia teorética (e filosófica) pode insinuar a transformação de modelos teorético-constitucionais e filosóficos em verdadeiras normas jurídicas, esvaziando ou minando a efectividade e validade do direito constitucional. Por outras palavras: a fuga para o céu dos conceitos e teorias pode acarretar a diminuição da capacidade de reflexão do direito relativamente aos problemas concretos das mulheres, dos homens e de todos os seres vivos da nossa comunidade. Um "direito ex cathedrà', um direito reduzido a teorias abstractas, esquece que os problemas dos homens e da polis se situam no terreno da experiência humana e não nas alturas abstractas de um "saber sábio" do direito. Em síntese: procura-se um direito "bem pesado" não dissolvido nem nas pressões utilitaristas de um "direito descartável" nem nas nebulosas abstractas das teorias que esquecem o lugar das coisas e o mundo dos homens.
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3. "Leitura estruturante" e "discurso historicistà' e "comparatístico" O direito constitucional é um intertexto aberto. Deve muito a expenencias constitucionais, nacionais e estrangeiras; no seu "espírito" transporta ideias de filósofos, pensadores e políticos; os seus "mitos" pressupõem as profundidades dos arquétipos enraizados dos povos; a sua "gravitação" é, agora, não um singular movimento de rotação em torno de si mesmo, mas sim um gesto de translação perante outras galáxias do saber humano. No entanto, o direito constitucional não se dissolve na "história", na "comparatísticà', nos "arquétipos; é um direito vigente e vivo e como tal deve ser ensinado. A compreensão acabada de referir explica o recurso a padrões estruturais expositivos, ordenadores dos principais módulos problemáticos. A captação dos padrões básicos procura superar um modelo expositivo histórico-político e político-constitucional, demasiado onerado com factores genéticos e nem sempre imune à dissolução em fragmentários "factos políticos". Esta "estratégia expositivà' não dispensa alguns esclarecimentos complementares. O primeiro destina-se a lembrar a indispensabilidade da memória na compreensão dos problemas político-constitucionais. Como alguém afirmou (R. Baumlin), a "história das constituições é a história apaixonada dos homens". Esta "paixão" e esta "histórià' marcam muitos capítulos da evolução do direito constitucional. Saber "histórià' é um pressuposto inelirninável do "saber constitucional". Assim, e para darmos apenas alguns exemplos, não é possível compreender o constitucionalismo sem conhecer a história das revoluções americana e francesa; sem o enquadramento histórico da cena política inglesa - dos "João Sem Terrà', dos "Tudors", dos "Stuarts", dos "Cromwells" - será inintelegível o fenómeno do parlamentarismo; o apagamento da memória do nosso século liberal - desde a Revolução de 1820 ao regicídio do príncipe Luis Filipe em 1908, passando pelas lutas liberais - terá corno consequência a opacidade de qualquer discurso em torno das constituições portuguesas. Em termos mais concretos e tendo como ponto de referência o constitucionalismo português: quem não conhecer, nas suas linhas essenciais, os fenómenos históricos do "vintismo", do "cartismo" e do "setembrismo", dificilmente compreenderá as mutações e constâncias das experiências constitucionais portuguesas. Na ausência de uma cadeira de História do Constitucionalismo, cuja falta é cada vez mais sentida no plano formativo, procurar-se-á fornecer algumas pistas históricas referentes à "memórià' dos temas e dos problemas. Isto não dispensará certamente o estudo da história portuguesa em geral e o da história das constituições portuguesas em particular. A segunda consideração liga-se ao interesse do direito constitucional comparado, da teoria comparativa de governos, dos "direitos constitucionais euro-
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Capitulo
/11trod11tOrío
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peus". O presente discurso incide sobre o direito constitucional português. É este o objecto da disciplina de Direito Constitucional. A ausência de estudos em torno da teoria comparativa de sistemas políticos obrigará muitas vezes a informações de direito estrangeiro, sem que com isto se pretenda substituir a vantagem metodológica da existência de reflexões autónomas cujo objecto fosse uma teoria comparada de formas de estado e formas de governo, ou, de um modo mais globalizante, de sistemas políticos.
4. Orientação geral Este livro tem ideias mas não transporta uma ideologia fechada. Da mesma forma, pressupõe convicções (éticas, políticas, culturais) mas, de modo algum, sugere ou insinua qualquer fundamentalismo. A existir um traço orientador, ele é basicamente este: esforço de compreensão e de alicerçamento de uma teoria e de uma doutrina de direito constitucional constitucionalmente adequadas, isto é, aptas a compreender e explicar os problemas fundamentais do direito constitucional português sob o olhar vigilante das exigências do direito justo e amparadas num sistema de domínio político-democrático materialmente legitimado. Só assim o direito constitucional fornecerá o impulso para uma atitude crítica relativamente aos conteúdos do direito "posto" e "imposto", erguendo-se como limite contra quaisquer transcendências ("fundamentos últimos", "essências", "naturezas") clara ou encapuçadamente conducentes a fundamentalismos ideológicos, filosóficos ou religiosos.
5. Os destinatários do discurso O leitor menos desprevenido terá já intuído as ambições deste livro de estudo. Não sendo uma "introdução" ou urnas "lições", procura fornecer materiais de estudo aos alunos das faculdades de direito. Estando muito longe de ser um tratado, não deixa, segundo supomos, de fornecer sugestões e insinuações incentivadoras de um melhor e mais profundo conhecimento dos problemas. O ideal seria um livro como a Economia de Samuelson e Nordhaus concebido, nas próprias palavras dos autores, como um livro que pode ser utilizado "tanto por um caloiro como pelo aluno do curso mais avançado". À míngua de talento e saber para elaborar um livro assim, fique, pelo menos, um leque de sugestões. Urna destas sugestões prende-se com os momentos de aprendizagem. A primeira parte dedicada à explicação do constitucionalismo e à exposição do direito constitucio-
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Direito Co11.., ln ,loL.KJ1,l,.\.RlG{JTz/Kli::1~íSTARCK Dia r[{fl"!ítlü:he VerUJidtwng zwúch,,., (ioerzg~b,rng ,md ncht~dirher Koatrol!e, 1985, pp. 36 e ss; CiU~AH;LLl, izúoni di dirillv C(!stituao,,,tú, vol. li, 5.• ex!., J',id.ov:i, !981, pp. '.9 e: ss. Enm l'Ós, Nu:;u I'l.ÇAl\ílA. "fü,.serva de AN,11!\S MACHADO, "Tomemos a sério a separação das igrejas do Esrado", in &11istt1 do Ministério Público, 58 (1994), pp. 45 e ss. 26 Cfr. J\c. TC n.º 326/86, de 25-11. DR, li, 18-11-86.
~ ; / · · " ... c_e_n_s_ri_t1_tc_i_o1_1o_l_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __
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ao interesse específico da região. Note-se, porém, que não existindo aqui qualquer delimitação material de competências constitucionalmente estabelecida, as normas regionais de desenvolvimento dependem da iniciativa do legislador nacional e do maior ou menor grau de concretização por este conferido às leis de bases. Daí que os decretos legislativos de desenvolvimento estejam subordinados às bases, podendo apenas actuar, desenvolver, integrar, secundum ou praeter legem, mas nunca contra legem (cfr. infra). O poder de desenvolvimento legislativo regional das leis de bases é, no entanto, um poder constitucionalmente garantido, não estando facultado ao legislador nacional excluí-lo ou admiti-lo.
D. Leís de Autorização Legislativa / - Reoírne oeral ó
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1. Considerações de natureza dogmática
Um outro tipo de leis em relação ao qual a doutrina costumava questionar a sua natureza jurídica é constituído pelas chamadas leis de delegação ou autorização 27 . Mediante estas leis, o órgão legislativo (poder legislativo) habilita ou autoriza o órgão executivo a emanar actos normativos com força de lei. Antes de nos debruçarmos sobre alguns problemas pontuais do direito constitucional positivo, começaremos por aludir a algumas questões de natureza jurídica-dogmática relativas às leis de delegação. a) Natureza formal ou material
Relativamente ao problema da natureza memmente formal ou formal-material das leis de autorização ou de delegação, julga-se superada a velha doutrina germânica segundo a qual estas leis deveriam ser qualificadas como meramente formais. Elas não continham verdadeiras normas jurídicas, isto é, normas gerais e abstractas, válidas no confronto de todos os sujeitos. Permaneciam com um conteúdo meramente interno, insusceprível de ser invocado perante os juízes e praticamente submetido ao jogo das forças políticas. li Sobre o tema da delegação legislaci,•a cfr. G,\RCT >\ DF. ENTERIUA, Le,gislación Delegada, Potmad &gltrmemmia y Contml J11diâal, l'vladrid, 1970, pp. 53 e ss; LtG>'IOI A, La delega legislativa, Milão, 1956; CF.RV,TI, La cM~~a legisl,uiva, Milão, 1972; M. P.l'ffl\ONO, Le /er,gi delegatcl in parlamento. Amtliú comparata, Pado,a, 1981. 1:'.ntre nós, cfr., por último, JORCE lvlIRA.'lllJI, J'imçiies, 61gãos e ados do Esr.rdo, pp. 455 e ss; Manual, V, pp. 310 e ss.
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lndi,·idul'lizarão , o_nti/í. ou de normas i. Embora possuam uma força activa atenuada, pois a sua dinâmica densificadora depende da emanação de decreto-lei ou decreto legislativo regional autorizados, elas contêm ou podem conter disposições de carácter material - inovador ou simplesmente revogatório -, alterando o ordenamento pré-existente 34 . Por outro lado, o carácter de materialidade das leis de autorização conexiona-se com os seus efeitos externos, pois a autorização legislativa deve tornar previsível e transparente para o cidadão as hipóteses em que o Governo ou a assembleia legislativa regional farão uso da autorização e ainda o conteúdo (objccto, sentido, extensão, alcance) que, com fundamento na autorização, virão a ter as normas autorizadas.
4. O objecto das leis de autorização A concessão de autorizações legislativas integra-se na competência legislativa da AR (CRP, are. 165.º). Por isso, também as autorizações legislativas devem, cm princípio, coincidir com o objecto próprio da função legislativa do Parlamento. Além de estarem excluídas desta função as funções de fiscalização ou de controlo, que são indelcgáveis (cfr. arts. 162.º e 163.º), subtraem-se também ao poder de autorização as matérias de competência política (art. 161. º), mesmo quando a forma de exercício desta competência é a forma de lei (cf. Ac. TC 472/95). Dada a configuração do ins[ituto da autorização, deve afastar-se a hipótese de leis de autorização versando sobre matérias não reservadas. Discme-se também se não deverá ser excluída do ohjecto das leis de autorização a emanação de leis de medida, já que, neste caso, haveria apenas a manifestação de wna função legislativa aparente. As leis de medida, incidindo direcr.a e concretamente na esfera jurídica do
·11 Cfr. I'. MoDUC.NO, f.egge - Ordiw1mento Giuridico -Pluralità degli Ordin,1mmti, Milano, 1985. Fncrc nós, cfr. GOME~ CANOTII.HO/JOKGF. LF.!Tt, A fru"011stitucionalidade d,1 lei dos despedimentos, Coimbra, 1988, p. 69; ]ORCE MIRANDA, Funções, ó,-gãos e actos do Estado, cit., p. 472; Manual, V, pp. 30.3 e ss. N