AR1 (Análise real - Volume 1: funções de uma variável) 9788524403620


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Table of contents :
Capa
Conjuntos Finitos e Infinitos
Números naturais
Conjuntos finitos
Conjuntos infinitos
Conjuntos enumeráveis
Exercícios
Números Reais
R é um corpo
R é um corpo ordenado
R é um corpo ordenado completo
Exercícios
Seqüências de Números Reais
Limite de uma seqüência
Limites e desigualdades
Operações com limites
Limites infinitos
Exercícios
Séries Numéricas
Séries convergentes
Séries absolutamente convergentes
Testes de convergência
Comutatividade
Exercícios
Algumas Noções Topológicas
Conjuntos abertos
Conjuntos fechados
Pontos de acumulação
Conjuntos compactos
O conjunto de Cantor
Exercícios
Limites de Funções
Definição e primeiras propriedades
Limites laterais
Limites no infinito, limites infinitos, expressões indeterminadas
Exercícios
Funções Contínuas
Definição e primeiras propriedades
Funções contínuas num intervalo
Funções contínuas em conjuntos compactos
Continuidade uniforme
Exercícios
Derivadas
A noção de derivada
Regras operacionais
Derivada e crescimento local
Funções deriváveis num intervalo
Exercícios
Fórmula de Taylor e Aplicações da Derivada
Fórmula de Taylor
Funções convexas e côncavas
Aproximações sucessivas e método de Newton
Exercícios
A Integral de Riemann
Revisão sobre sup e inf
Integral de Riemann
Propriedades da integral
Condições de integrabilidade
Exercícios
Cálculo com Integrais
Os teoremas clássicos do Cálculo Integral
A integral como limite de somas de Riemann
Logaritmos e exponenciais
Integrais impróprias
Exercícios
Seqüências e Séries de Funções
Convergência simples e convergência uniforme
Propriedades da convergência uniforme
Séries de potências
Funções trigonométricas
Séries de Taylor
Exercícios
Sugestões e Respostas
Conjuntos Finitos e Infinitos
Números Reais
Seqüências de Números Reais
Séries Numéricas
Algumas Noções Topológicas
Limites de Funções
Funções Contínuas
Derivadas
Fórmula de Taylor e Aplicações da Derivada
A Integral de Riemann
Cálculo com Integrais
Seqüências e Séries de Funções
Sugestões de Leitura
Índice Remissivo
Contra-capa
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AR1 (Análise real - Volume 1: funções de uma variável)
 9788524403620

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Análise Real volume 1 Funções de Uma Variável

Lima, Elon Lages Análise real volume 1. Funções de uma variável / Elon Lages Lima. 1 ed. Rio de Janeiro : IMPA, 2014. 198 p. : il. ; 23 cm. (Coleção matemática universitária) Inclui bibliografia. e-ISBN 978-85-244-0362-0 1. Análise matemática. I. Título. II. Série. CDD-517

COLEÇÃO MATEMÁTICA UNIVERSITÁRIA

Análise Real volume 1 Funções de Uma Variável

Elon Lages Lima

INSTITUTO NACIONAL DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA

Copyright  2014 by Elon Lages Lima Impresso no Brasil / Printed in Brazil Capa: Rodolfo Capeto, Noni Geiger e Sérgio R. Vaz.

Coleção Matemática Universitária Comissão Editorial: Elon Lages Lima S. Collier Coutinho Paulo Sad

Títulos Publicados: • Análise Real, vol. 1: Funções de uma Variável – Elon Lages Lima • EDP. Um Curso de Graduação – Valéria Iório • Curso de Álgebra, Volume 1 – Abramo Hefez • Álgebra Linear – Elon Lages Lima • Introdução às Curvas Algébricas Planas – Israel Vainsencher • Equações Diferenciais Aplicadas – Djairo G. de Figueiredo e Aloisio Freiria Neves • Geometria Diferencial – Paulo Ventura Araújo • Introdução à Teoria dos Números – José Plínio de Oliveira Santos • Cálculo em uma Variável Complexa – Marcio G. Soares • Geometria Analítica e Álgebra Linear – Elon Lages Lima • Números Primos: Mistérios e Recordes – Paulo Ribenboim • Análise no Espaço Rn – Elon Lages Lima • Análise Real, vol. 2: Funções de n Variáveis – Elon Lages Lima • Álgebra Exterior – Elon Lages Lima • Equações Diferenciais Ordinárias – Claus Ivo Doering e Artur Oscar Lopes • Análise Real, vol. 3: Análise Vetorial – Elon Lages Lima • Álgebra Linear. Exercícios e Soluções – Ralph Costa Teixeira • Números Primos. Velhos Mistérios e Novos Recordes – Paulo Ribenboim Distribuição: IMPA Estrada Dona Castorina, 110 22460-320 Rio de Janeiro, RJ e-mail: [email protected] http://www.impa.br

Pref´ acio A finalidade deste livro ´e servir de texto para um primeiro curso de An´ alise Matem´ atica. Os assuntos nele tratados s˜ ao expostos de maneira simples e direta, evitando-se maiores digress˜ oes. Assim, espero facilitar o trabalho do professor que, ao adot´ a-lo, n˜ao precisar´a perder muito tempo selecionando os t´opicos que ensinar´ a e os que vai omitir. Turmas especiais, estudantes com mais experiˆencia, leitores que desejem uma apresenta¸c˜ao mais completa ou alunos em busca de leituras complementares poder˜ ao consultar o “Curso de An´ alise”, vol. 1, que trata de mat´eria semelhante sob forma mais abrangente e ´e aproximadamente duas vezes mais longo. Os leitores que tenho em mente s˜ ao alunos com conhecimento equivalente a dois per´ıodos letivos de C´alculo, de modo a terem familiaridade com as id´eias de derivada e integral em seus aspectos mais elementares, principalmente o c´alculo das fun¸c˜oes mais conhecidas e a resolu¸c˜ao de exerc´ıcios simples. Espero, al´em disso, que eles tenham uma no¸c˜ao razoavelmente clara do que seja uma demonstra¸c˜ao matem´ atica. A lista de pr´e-requisitos termina dizendo que o leitor deve estar habituado `as nota¸c˜oes costumeiras sobre conjuntos, tais como x ∈ A, A ⊂ B, A ∪ B e A ∩ B, etc. Uma parte importante do livro s˜ ao seus 268 exerc´ıcios. Eles servem para fixa¸c˜ao da aprendizagem, desenvolvimento de alguns temas esboc¸ados no texto e como oportunidade para o leitor verificar se realmente entendeu o que acabou de ler. Solu¸c˜oes de 194 desses exerc´ıcios, de forma completa ou resumida, s˜ ao apresentadas no cap´ıtulo final. Naturalmente, gostaria que o recurso `as solu¸c˜oes que ofere¸co fosse feito ´ somente depois de um s´erio esfor¸co para resolver cada problema. E precisamente esse esfor¸co que, bem ou mal sucedido, conduz ao ˆexito no processo de treinamento. O processamento do manuscrito, pelo sistema TEX foi feito por Maria Celano Maia e Solange Villar Visgueiro, sob a supervis˜ao de Jonas de Miranda Gomes, ao qual devo v´arios conselhos e opini˜ oes sensatas

durante a prepara¸c˜ao do livro. A revis˜ao do texto foi feita por Levi Lopes de Lima, Ricardo Galdo Camelier e Rui Tojeiro. A todas estas pessoas, meus agradecimentos cordiais. A publica¸c˜ao deste livro foi financiada pela CAPES, a cujo Diretor Geral, professor Jos´e Ubyrajara Alves, muito devo pelo apoio e compreens˜ao demonstrados. Rio de Janeiro, agosto de 1989 Elon Lages Lima

Pref´ acio das edi¸c˜ oes posteriores As sucessivas edi¸c˜oes deste livro se beneficiaram de sugest˜oes e corre¸c˜oes feitas por diversos colegas e estudantes que o utilizaram. A todos esses colaboradores, dentre os quais destaco Lorenzo Diaz, Florˆencio Guimar˜ aes, Aryana Cavalcante e Carlos Eduardo Belchior, meus agradecimentos, extensivos a Rogerio Dias Trindade, que redigitou todo o texto para a d´ecima edi¸c˜ao e a Maria Celano Maia e Priscilla Pomateli, que fizeram a revis˜ao final. A d´ecima primeira edi¸c˜ao recebeu mais alguns acr´escimos e esclarecimentos. Rio de Janeiro, mar¸co de 2011 Elon Lages Lima

Conte´ udo 1 Conjuntos Finitos e Infinitos 1 N´ umeros naturais . . . . . . 2 Conjuntos finitos . . . . . . 3 Conjuntos infinitos . . . . . 4 Conjuntos enumer´aveis . . . 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . .

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1 1 4 6 7 9

2 N´ umeros Reais 1 R ´e um corpo . . . . . . . . . . . 2 R ´e um corpo ordenado . . . . . 3 R ´e um corpo ordenado completo 4 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . .

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12 12 13 16 20

3 Seq¨ uˆ encias de N´ umeros Reais 1 Limite de uma seq¨ uˆencia . . . 2 Limites e desigualdades . . . 3 Opera¸c˜oes com limites . . . . 4 Limites infinitos . . . . . . . . 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . .

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23 23 27 28 31 34

4 S´ eries Num´ ericas 1 S´eries convergentes . . . . . . . . . 2 S´eries absolutamente convergentes 3 Testes de convergˆencia . . . . . . . 4 Comutatividade . . . . . . . . . . . 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . .

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38 38 40 42 44 46

5 Algumas No¸ c˜ oes Topol´ ogicas 1 Conjuntos abertos . . . . . 2 Conjuntos fechados . . . . . 3 Pontos de acumula¸c˜ao . . . 4 Conjuntos compactos . . . .

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49 49 50 53 54

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3

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´ CONTEUDO

5 6

Cap. 0

O conjunto de Cantor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

56 59

6 Limites de Fun¸ c˜ oes 1 Defini¸c˜ao e primeiras propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . 2 Limites laterais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Limites no infinito, limites infinitos, express˜oes indeterminadas 4 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

63 63 68 70 73

7 Fun¸ c˜ oes Cont´ınuas 1 Defini¸c˜ao e primeiras propriedades . . . . . 2 Fun¸c˜oes cont´ınuas num intervalo . . . . . . 3 Fun¸c˜oes cont´ınuas em conjuntos compactos 4 Continuidade uniforme . . . . . . . . . . . . 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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75 75 78 81 83 87

8 Derivadas 1 A no¸c˜ao de derivada . . . . . . . 2 Regras operacionais . . . . . . . 3 Derivada e crescimento local . . . 4 Fun¸c˜oes deriv´ aveis num intervalo 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . .

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90 91 93 95 97 100

9 F´ ormula de Taylor e Aplica¸ c˜ oes da Derivada 1 F´ormula de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . 2 Fun¸c˜oes convexas e cˆoncavas . . . . . . . . . . 3 Aproxima¸c˜oes sucessivas e m´etodo de Newton 4 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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104 104 108 113 118

10 A Integral de Riemann 1 Revis˜ ao sobre sup e inf . . . . 2 Integral de Riemann . . . . . 3 Propriedades da integral . . . 4 Condi¸c˜oes de integrabilidade 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . .

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121 121 123 127 131 134

11 C´ alculo com Integrais 1 Os teoremas cl´assicos do C´alculo Integral . . 2 A integral como limite de somas de Riemann 3 Logaritmos e exponenciais . . . . . . . . . . . 4 Integrais impr´ oprias . . . . . . . . . . . . . . 5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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137 137 141 143 147 151

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´ CONTEUDO

Se¸c˜ ao 1

12 Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸ c˜ oes 1 Convergˆencia simples e convergˆencia uniforme 2 Propriedades da convergˆencia uniforme . . . . 3 S´eries de potˆencias . . . . . . . . . . . . . . . 4 Fun¸c˜oes trigonom´etricas . . . . . . . . . . . . 5 S´eries de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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156 156 159 164 167 169 172

13 Sugest˜ oes e Respostas 1 Conjuntos Finitos e Infinitos . . 2 N´ umeros Reais . . . . . . . . . 3 Seq¨ uˆencias de N´ umeros Reais . 4 S´eries Num´ericas . . . . . . . . 5 Algumas No¸c˜oes Topol´ ogicas . 6 Limites de Fun¸c˜oes . . . . . . . 7 Fun¸c˜oes Cont´ınuas . . . . . . . 8 Derivadas . . . . . . . . . . . . 9 F´ormula de Taylor e Aplica¸c˜oes 10 A Integral de Riemann . . . . . 11 C´ alculo com Integrais . . . . . 12 Seq¨ uˆencias e S´eries de Fun¸c˜oes

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175 175 176 177 179 180 182 182 184 186 187 189 191

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Sugest˜ oes de Leitura

193

´ Indice Remissivo

194

5

1 Conjuntos Finitos e Infinitos Neste cap´ıtulo, ser´a estabelecida com precis˜ao a diferen¸ca entre conjunto finito e conjunto infinito. Ser´ a feita tamb´em a distin¸c˜ao entre conjunto enumer´avel e conjunto n˜ao-enumer´avel. O ponto de partida ´e o conjunto dos n´ umeros naturais.

1

N´ umeros naturais

O conjunto N dos n´ umeros naturais ´e caracterizado pelos seguintes fatos: 1. Existe uma fun¸c˜ao injetiva s : N → N. A imagem s(n) de cada n´ umero natural n ∈ N chama-se o sucessor de n. 2. Existe um u ´nico n´ umero natural 1 ∈ N tal que 1 6= s(n) para todo n ∈ N. 3. Se um conjunto X ⊂ N ´e tal que 1 ∈ X e s(X) ⊂ X (isto ´e, n ∈ X ⇒ s(n) ∈ X) ent˜ao X = N. Estas afirma¸c˜oes podem ser reformuladas assim: 1’. Todo n´ umero natural tem um sucessor, que ainda ´e um n´ umero natural; n´ umeros diferentes tˆem sucessores diferentes. 2’. Existe um u ´nico n´ umero natural 1 que n˜ao ´e sucessor de nenhum outro. 3’. Se um conjunto de n´ umeros naturais cont´em o n´ umero 1 e cont´em tamb´em o sucessor de cada um dos seus elementos, ent˜ao esse conjunto cont´em todos os n´ umeros naturais.

2

Conjuntos Finitos e Infinitos

Cap. 1

As propriedades 1, 2, 3 acima chamam-se os axiomas de Peano. O axioma 3 ´e conhecido como o princ´ıpio da indu¸ca ˜o. Intuitivamente, ele significa que todo n´ umero natural n pode ser obtido a partir de 1, tomando-se seu successor s(1), o sucessor deste, s(s(1)), e assim por diante, com um n´ umero finito de etapas. (Evidentemente “n´ umero finito” ´e uma express˜ao que, neste momento, n˜ao tem ainda significado. A formula¸c˜ao do axioma 3 ´e uma maneira extremamente h´abil de evitar a peti¸c˜ao de princ´ıpio at´e que a no¸c˜ao de conjunto finito seja esclarecida.) O princ´ıpio da indu¸c˜ao serve de base para um m´etodo de demonstra¸c˜ao de teoremas sobre n´ umero naturais, conhecido como o m´etodo de indu¸ca ˜o (ou recorrˆencia), o qual funciona assim: “se uma propriedade P ´e v´alida para o n´ umero 1 e se, supondo P v´alida para o n´ umero n da´ı resultar que P ´e v´alida tamb´em para seu sucessor s(n), ent˜ao P ´e v´alida para todos os n´ umeros naturais”. Como exemplo de demonstra¸c˜ao por indu¸c˜ao, provemos que, para todo n ∈ N, tem-se s(n) 6= n. Esta afirma¸c˜ao ´e verdadeira para n = 1 porque, pelo axioma 2, tem-se 1 6= s(n) para todo n logo, em particular, 1 6= s(1). Supondo-a verdadeira para um certo n ∈ N, vale n 6= s(n). Como a fun¸c˜ao s ´e injetiva, da´ı resulta s(n) 6= s(s(n)), isto ´e, a afirma¸c˜ao ´e verdadeira para s(n). No conjunto N dos n´ umeros naturais s˜ ao definidas duas opera¸c˜oes fundamentais: a adi¸ca ˜o, que associa a cada par de n´ umeros (m, n) sua soma m + n, e a multiplica¸ca ˜o, que faz corresponder ao par (m, n) seu produto m · n. Essas opera¸c˜oes s˜ ao caracterizadas pelas seguintes igualdades, que lhes servem de defini¸c˜ao: m + 1 = s(m); m + s(n) = s(m + n), isto ´e, m + (n + 1) = (m + n) + 1; m · 1 = m;

m · (n + 1) = m · n + m. Noutros termos: somar 1 a m significa tomar o sucessor de m. E se j´a conhecemos a soma m + n tamb´em conheceremos m + (n + 1), que ´e o sucessor de m + n. Quanto `a multiplica¸c˜ao: multiplicar por 1 n˜ao altera o n´ umero. E se conhecemos o produto m · n, conheceremos m · (n + 1) = m · n + m. A demonstra¸c˜ao da existˆencia das opera¸c˜oes + e · com as propriedades acima, bem como sua unicidade, se faz por indu¸c˜ao. Os detalhes ser˜ao omitidos aqui. O leitor interessado pode

Se¸c˜ ao 1

N´ umeros naturais

3

consultar o “Curso de An´ alise”, vol. 1, ou as referˆencias bibliogr´aficas ali contidas, onde s˜ ao demonstradas (por indu¸c˜ao) as seguintes propriedades da adi¸c˜ao e da multiplica¸c˜ao: associatividade:

(m + n) + p = m + (n + p), m · (n · p) = (m · n) · p;

distributividade: m · (n + p) = m · n + m · p;

comutatividade: lei do corte:

m + n = n + m, m · n = n · m;

n + m = p + m ⇒ n = p, n · m = p · m ⇒ n = p.

Como exemplo, provemos a lei do corte para a adi¸c˜ao. Usaremos indu¸c˜ao em m. Ela vale para m = 1 pois n + 1 = p + 1 significa s(n) = s(p), logo n = p pela injetividade de s. Admitindo-a v´alida para m, suponhamos que n + m + 1 = p + m + 1. Ent˜ao, novamente pela injetividade de s, tem-se n+m = p+m donde, pela hip´ otese de indu¸c˜ao, n = p. Dados os n´ umeros naturais m, n, escreve-se m < n quando existe p ∈ N tal que n = m + p. Diz-se ent˜ao que m ´e menor do que n. A nota¸c˜ao m ≤ n significa que m < n ou m = n. Prova-se que m < n, n < p =⇒ m < p (transitividade) e que, dados m, n ∈ N quaisquer, vale uma, e somente uma, das trˆes alternativas: m = n, m < n ou n < m. A lei do corte pode ser utilizada para provar um fato sempre admitido e raramente demonstrado, que ´e o seguinte: para qualquer n ∈ N, n˜ao existe p ∈ N tal que n < p < n + 1. Para mostrar isto, suponhamos por absurdo que um tal p ∈ N exista. Ent˜ao teremos p = n+q e n+1 = p+r, com q, r ∈ N. Da´ı resulta que p + 1 = n + 1 + q = p + r + q e (cortando p) 1 = r + q. Isto ´e um absurdo pois, pela defini¸c˜ao de adi¸c˜ao, a soma de dois n´ umeros naturais ´e sempre o sucessor de algum n´ umero, logo n˜ao pode ser 1. Este resultado ´e usado na demonstra¸c˜ao de uma das principais propriedades da rela¸c˜ao de ordem m < n entre os n´ umeros naturais, que ´e o princ´ıpio da boa-ordena¸ca ˜o, abaixo enunciado e provado. Todo subconjunto n˜ ao vazio A ⊂ N possui um menor elemento, isto ´e, um elemento n0 ∈ A tal que n0 ≤ n para todo n ∈ A. A fim de provar esta afirma¸c˜ao, para cada n´ umero n ∈ N, chamemos de In o conjunto dos n´ umeros naturais ≤ n. Se 1 ∈ A ent˜ao 1 ser´a o menor elemento de A. Se, por´em, 1 ∈ / A, ent˜ao consideremos o conjunto X dos n´ umeros naturais n tais que In ⊂ N−A. Como I1 = {1} ⊂ N−A, vemos que 1 ∈ X. Por outro lado, como A n˜ao ´e vazio, concluimos que

4

Conjuntos Finitos e Infinitos

Cap. 1

X 6= N. Logo a conclus˜ao do axioma 3 n˜ao ´e v´alida. Segue-se que deve existir n ∈ X tal que n + 1 ∈ / X. Ent˜ao In = {1, 2, . . . , n} ⊂ N − A mas n0 = n + 1 ∈ A. Portanto n0 ´e o menor elemento do conjunto A, pois n˜ao existe n´ umero natural entre n e n + 1.

2

Conjuntos finitos

Continuaremos usando a nota¸c˜ao In = {p ∈ N ; p ≤ n}. Um conjunto X diz-se finito quando ´e vazio ou ent˜ao existem n ∈ N e uma bije¸c˜ao f : In → X. Escrevendo x1 = f (1), x2 = f (2), . . . , xn = f (n) temos ent˜ao X = {x1 , x2 , . . . , xn }. A bije¸c˜ao f chama-se uma contagem dos elementos de X e o n´ umero n chama-se o n´ umero de elementos, ou n´ umero cardinal do conjunto finito X. O Corol´ario 1 abaixo prova que o n´ umero cardinal est´a bem definido, isto ´e, n˜ao depende da particular contagem f . Lema. Se existe uma bije¸ca ˜o f : X → Y ent˜ ao, dados a ∈ X e b ∈ Y , existe tamb´em uma bije¸ca ˜o g : X → Y tal que g(a) = b. Demonstra¸ c˜ ao: Seja b′ = f (a). Como f ´e sobrejetiva, existe a′ ∈ X ′ tal que f (a ) = b. Definamos g : X → Y pondo g(a) = b, g(a′ ) = b′ e ´ f´acil ver que g ´e uma g(x) = f (x) se x ∈ X n˜ao ´e igual a a nem a a′ . E bije¸c˜ao.

Teorema 1. Se A ´e um subconjunto pr´ oprio de In , n˜ ao pode existir uma bije¸ca ˜o f : A → In . Demonstra¸ c˜ ao: Suponha, por absurdo, que o teorema seja falso e considere n0 ∈ N, o menor n´ umero natural para o qual existem um subconjunto pr´oprio A ⊂ In0 e uma bije¸c˜ao f : A → In0 . Se n0 ∈ A ent˜ao, pelo Lema, existe uma bije¸c˜ao g : A → In0 com g(n0 ) = n0 . Neste caso, a restri¸c˜ao de g a A − {n0 } ´e uma bije¸c˜ao do subconjunto pr´oprio A − {n0 } sobre In0 −1 , o que contraria a minimalidade de n0 . Se, ao contr´ario, tivermos n0 ∈ / A ent˜ao tomamos a ∈ A com f (a) = n0 e a restri¸c˜ao de f ao subconjunto pr´oprio A − {a} ⊂ In0 −1 ser´a uma bije¸c˜ao sobre In0 −1 , o que novamente vai contrariar a minimalidade de n0 . Corol´ ario 1. Se f : Im → X e g : In → X s˜ ao bije¸co ˜es ent˜ ao m = n. Com efeito, se fosse m < n ent˜ao Im seria um subconjunto pr´oprio de In , o que violaria o Teorema 1, pois g −1 ◦ f : Im → In ´e uma bije¸c˜ao. Analogamente se mostra que n˜ao ´e poss´ıvel n < m. Logo m = n.

Se¸c˜ ao 2

Conjuntos finitos

5

Corol´ ario 2. Seja X um conjunto finito. Uma aplica¸ca ˜o f : X → X ´e injetiva se, e somente se, ´e sobrejetiva. Com efeito, existe uma bije¸c˜ao ϕ : In → X. A aplica¸c˜ao f : X → X ´e injetiva ou sobrejetiva se, e somente se, ϕ−1 ◦ f ◦ ϕ : In → In o ´e. Logo podemos considerar f : In → In . Se f for injetiva ent˜ao pondo A = f (In ), teremos uma bije¸c˜ao f −1 : A → In . Pelo Teorema 1, A = In e f ´e sobrejetiva. Reciprocamente, se f for sobrejetiva, formemos um conjunto A ⊂ In escolhendo, para cada y ∈ In , um elemento x ∈ In tal que f (x) = y. Ent˜ao a restri¸c˜ao f : A → In ´e uma bije¸c˜ao. Pelo Teorema 1, temos A = In . Isto significa que, para cada y ∈ In , ´e u ´nico o x tal que f (x) = y, ou seja, f ´e injetiva. Corol´ ario 3. N˜ ao pode existir uma bije¸ca ˜o entre um conjunto finito e uma sua parte pr´ opria. Com efeito, sejam X finito e Y ⊂ X uma parte pr´opria. Existem n ∈ N e uma bije¸c˜ao ϕ : In → X. Ent˜ao o conjunto A = ϕ−1 (Y ) ´e uma parte pr´opria de In . Chamemos de ϕA : A → Y a bije¸c˜ao obtida por restri¸c˜ao de ϕ a A. Se existisse uma bije¸c˜ao f : Y → X, a composta g = ϕ−1 ◦ f ◦ ϕA : A → In seria tamb´em uma bije¸c˜ao, contrariando o Teorema 1. O Corol´ario 3 ´e uma mera reformula¸c˜ao do Teorema 1. Teorema 2. Todo subconjunto de um conjunto finito ´e finito. Demonstra¸ c˜ ao: Provaremos inicialmente o seguinte caso particular: se X ´e finito e a ∈ X ent˜ao X −{a} ´e finito. Com efeito, existe uma bije¸c˜ao f : In → X a qual, pelo Lema, podemos supor que cumpre f (n) = a. Se n = 1 ent˜ao X − {a} = ∅ ´e finito. Se n > 1, a restri¸c˜ao de f a In−1 ´e uma bije¸c˜ao sobre X − {a}, logo X − {a} ´e finito e tem n − 1 elementos. O caso geral se prova por indu¸c˜ao no n´ umero n de elementos de X. Ele ´e evidente quando X = ∅ ou n = 1. Supondo o Teorema verdadeiro para conjuntos com n elementos, sejam X um conjunto com n + 1 elementos e Y um subconjunto de X. Se Y = X, nada h´a o que provar. Caso contr´ario, existe a ∈ X com a ∈ / Y . Ent˜ao, na realidade, Y ⊂ X − {a}. Como X − {a} tem n elementos, segue-se que Y ´e finito. Corol´ ario 1. Dada f : X → Y , se Y ´e finito e f ´e injetiva ent˜ ao X ´e finito; se X ´e finito e f ´e sobrejetiva ent˜ ao Y ´e finito.

6

Conjuntos Finitos e Infinitos

Cap. 1

Com efeito, se f ´e injetiva ent˜ao ela ´e uma bije¸c˜ao de X sobre um subconjunto f (X) do conjunto finito Y . Por outro lado, se f ´e sobrejetiva e X ´e finito ent˜ao, para cada y ∈ Y podemos escolher um x = g(y) ∈ X tal que f (x) = y. Isto define uma aplica¸c˜ao g : Y → X tal que f (g(y)) = y para todo y ∈ Y . Segue-se que g ´e injetiva logo, pelo que acabamos de provar, Y ´e finito. Um subconjunto X ⊂ N diz-se limitado quando existe p ∈ N tal que x ≤ p para todo x ∈ X. Corol´ ario 2. Um subconjunto X ⊂ N ´e finito se, e somente se, ´e limitado. Com efeito, se X = {x1 , . . . , xn } ⊂ N ´e finito, pondo p = x1 +· · ·+xn vemos que x ∈ X ⇒ x ≤ p logo X ´e limitado. Reciprocamente, se X ⊂ N ´e limitado ent˜ao X ⊂ Ip para algum p ∈ N, segue-se pois do Teorema 2 que X ´e finito.

3

Conjuntos infinitos

Diz-se que um conjunto ´e infinito quando n˜ao ´e finito. Assim, X ´e infinito quando n˜ao ´e vazio nem existe, seja qual for n ∈ N, uma bije¸c˜ao f : In → X. Por exemplo, o conjunto N dos n´ umeros naturais ´e infinito, em virtude do Corol´ario 2 do Teorema 2. Pelo mesmo motivo, se k ∈ N ent˜ao o conjunto k · N dos m´ ultiplos de k ´e infinito. Teorema 3. Se X ´e um conjunto infinito, ent˜ ao existe uma aplica¸ca ˜o injetiva f : N → X.

Demonstra¸ c˜ ao: Para cada subconjunto n˜ao-vazio A ⊂ X, escolhemos um elemento xA ∈ A. Em seguida, definimos f : N → X indutivamente. Pomos f (1) = xX e, supondo j´a definidos f (1), . . . , f (n), escrevemos An = X − {f (1), . . . , f (n)}. Como X ´e infinito, An n˜ao ´e vazio. Definimos ent˜ao f (n + 1) = xAn . Isto completa a defini¸c˜ao de f . Para provar que f ´e injetiva, sejam m, n ∈ N, digamos com m < n. Ent˜ao f (m) ∈ {f (1), . . . , f (n − 1)} enquanto f (n) ∈ X − {f (1), . . . , f (n − 1)}. Logo f (m) 6= f (n).

Corol´ ario. Um conjunto X ´e infinito se, e somente se, existe uma bije¸ca ˜o ϕ : X → Y sobre um subconjunto pr´ oprio Y ⊂ X.

Se¸c˜ ao 4

Conjuntos enumer´ aveis

7

Com efeito, sejam X infinito e f : N → X uma aplica¸c˜ao injetiva. Escrevamos, para cada n ∈ N, f (n) = xn . Consideremos o subconjunto pr´oprio Y = X − {x1 }. Definamos a bije¸c˜ao ϕ : X → Y pondo ϕ(x) = x se x n˜ao ´e um dos xn e ϕ(xn ) = xn+1 (n ∈ N). Reciprocamente, se existe uma bije¸c˜ao de X sobre um seu subconjunto pr´oprio ent˜ao X ´e infinito, em virtude do Corol´ario 3 do Teorema 1. Se N1 = N − {1} ent˜ao ϕ : N → N1 , ϕ(n) = n + 1, ´e uma bije¸c˜ao de N sobre seu subconjunto N1 = {2, 3, . . . }. Mais geralmente, fixando p ∈ N podemos considerar Np = {p+1, p+2, . . . } e definir a bije¸c˜ao ϕ : N → Np , ϕ(n) = n + p. Fenˆ omenos desse tipo j´a tinham sido observados por Galileu, que foi o primeiro a notar que “h´ a tantos n´ umeros pares quantos n´ umeros naturais”, mostrando que se P = {2, 4, 6, . . . } ´e o conjunto dos n´ umeros pares ent˜ao ϕ : N → P , dada por ϕ(n) = 2n, ´e uma bije¸c˜ao. Evidentemente, se I = {1, 3, 5, . . . } ´e o conjunto dos n´ umeros ´ımpares, ent˜ao ψ : N → I, com ψ(n) = 2n − 1, tamb´em ´e uma bije¸c˜ao. Nestes dois u ´ltimos exemplos, N − P = I e N − I = P s˜ ao infinitos, enquanto N − Np = {1, 2, . . . , p} ´e finito.

4

Conjuntos enumer´ aveis

Um conjunto X diz-se enumer´ avel quando ´e finito ou quando existe uma bije¸c˜ao f : N → X. Neste caso, f chama-se uma enumera¸ca ˜o dos elementos de X. Escrevendo f (1) = x1 , f (2) = x2 , . . . , f (n) = xn , . . . tem-se ent˜ao X = {x1 , x2 , . . . , xn , . . . }. Teorema 4. Todo subconjunto X ⊂ N ´e enumer´ avel.

Demonstra¸ c˜ ao: Se X ´e finito, nada h´a para demonstrar. Caso contr´ario, enumeramos os elementos de X pondo x1 = menor elemento de X, e supondo definidos x1 < x2 < · · · < xn , escrevemos An = X − {x1 , . . . , xn }. Observando que An 6= ∅, pois X ´e infinito, definimos xn+1 = menor elemento de An . Ent˜ao X = {x1 , x2 , . . . , xn , . . . }. Com efeito, se existisse algum elemento x ∈ X diferente de todos os xn , ter´ıamos x ∈ An para todo n ∈ N, logo x seria um n´ umero natural maior do que todos os elementos do conjunto infinito {x1 , . . . , xn , . . . }, contrariando o Corol´ario 2 do Teorema 2. Corol´ ario 1. Seja f : X → Y injetiva. Se Y ´e enumer´ avel ent˜ ao X tamb´em ´e. Em particular, todo subconjunto de um conjunto enumer´ avel ´e enumer´ avel.

8

Conjuntos Finitos e Infinitos

Cap. 1

Com efeito, basta considerar o caso em que existe uma bije¸c˜ao ϕ : Y → N. Ent˜ao ϕ ◦ f : X → N ´e uma bije¸c˜ao de X sobre um subconjunto de N, o qual ´e enumer´avel, pelo Teorema 4. No caso particular de X ⊂ Y , tomamos f : X → Y igual `a aplica¸c˜ao de inclus˜ ao. Corol´ ario 2. Seja f : X → Y sobrejetiva. Se X ´e enumer´ avel ent˜ ao Y tamb´em ´e. Com efeito, para cada y ∈ Y podemos escolher um x = g(y) ∈ X tal que f (x) = y. Isto define uma aplica¸c˜ao g : Y → X tal que f (g(y)) = y para todo y ∈ Y . Segue-se da´ı que g ´e injetiva. Pelo Corol´ario 1, Y ´e enumer´avel. Corol´ ario 3. O produto cartesiano de dois conjuntos enumer´ aveis ´e um conjunto enumer´ avel. Com efeito, se X e Y s˜ ao enumer´aveis ent˜ao existem sobreje¸c˜oes f : N → X e g : N → Y , logo ϕ : N × N → X × Y , dada por ϕ(m, n) = (f (m), g(n)) ´e sobrejetiva. Portanto, basta provar que N × N ´e enumer´avel. Para isto, consideremos a aplica¸c˜ao ψ : N × N → N, dada por ψ(m, n) = 2m · 3n . Pela unicidade da decomposi¸c˜ao de um n´ umero em fatores primos, ψ ´e injetiva. Segue-se que N × N ´e enumer´avel. Corol´ ario 4. A reuni˜ ao de uma fam´ılia enumer´ avel de conjuntos enumer´ aveis ´e enumer´ avel. Com efeito, dados X1 , X2 , . . . , Xn , . . . enumer´aveis, existem sobrejec¸S˜oes f1 : N → X1 , f2 : N → X2 , . . . , fn : N → Xn , . . . . Tomando X = ∞ c˜ao f : N×N → X pondo f (m, n) = fn (m). n=1 Xn , definimos a sobreje¸ O caso de uma reuni˜ao finita X = X1 ∪ · · · ∪ Xn reduz-se ao anterior porque ent˜ao X = X1 ∪ · · · ∪ Xn ∪ Xn ∪ · · · . O Teorema 3 acima significa que o enumer´avel ´e o “menor” dos infinitos. Com efeito, ele pode ser reformulado assim: Todo conjunto infinito cont´em um subconjunto infinito enumer´ avel. Exemplo 1. O conjunto Z = {. . . , −2, −1, 0, 1, 2, . . . } dos n´ umeros inteiros ´e enumer´avel. Uma bije¸c˜ao f : N → Z pode ser definida pondo f (n) = (n − 1)/2 para n ´ımpar e f (n) = −n/2 para n par. Exemplo 2. O conjunto Q = {m/n; m, n ∈ Z, n 6= 0} dos n´ umeros ∗ racionais ´e enumer´avel. Com efeito, escrevendo Z = Z − {0}, podemos definir uma fun¸c˜ao sobrejetiva f : Z × Z∗ → Q pondo f (m, n) = m/n.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

9

Exemplo 3. (Um conjunto n˜ao-enumer´avel.) Seja S o conjunto de todas as seq¨ uˆencias infinitas, como s = (0 1 1 0 0 0 1 0 . . . ), formadas com os s´ımbolos 0 e 1. Noutras palavras, S ´e o conjunto de todas as fun¸c˜oes s : N → {0, 1}. Para cada n ∈ N, o valor s(n), igual a 0 ou 1, ´e o n-´esimo termo da seq¨ uˆencia s. Afirmamos que nenhum subconjunto enumer´avel X = {s1 , s2 , . . . , sn , . . . } ⊂ S ´e igual a S. Com efeito, dado X, indiquemos com snm o n-´esimo termo da seq¨ uˆencia sm ∈ X. Formamos uma nova seq¨ uˆencia s∗ ∈ S tomando o n-´esimo termo de s∗ igual a 0 se for snn = 1, ou igual a 1 se for snn = 0. A seq¨ uˆencia s∗ n˜ao pertence ao conjunto X porque seu n-´esimo termo ´e diferente do n-´esimo termo de sn . (Este racioc´ınio, devido a G. Cantor, ´e conhecido como “m´etodo da diagonal”.) No cap´ıtulo seguinte mostraremos que o conjunto R dos n´ umeros reais n˜ao ´e enumer´avel.

5

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

N´ umeros naturais

1. Usando indu¸c˜ao, prove: (a) (b)

1 + 2 + · · · + n = n(n + 1)/2;

1 + 3 + 5 + · · · + 2n − 1 = n2 .

2. Dados m, n ∈ N com n > m, prove que ou n ´e m´ ultiplo de m ou existem q, r ∈ N tais que n = mq + r e r < m. Prove que q e r s˜ ao u ´nicos com esta propriedade. 3. Seja X ⊂ N um subconjunto n˜ao-vazio tal que m, n ∈ X ⇔ m, m + n ∈ X. Prove que existe k ∈ N tal que X ´e o conjunto dos m´ ultiplos de k. 4. Prove que, no segundo axioma de Peano, a palavra “´ unico” ´e redundante (admitindo-se, naturalmente, os demais axiomas). 5. Prove o princ´ıpio de indu¸c˜ao como uma conseq¨ uˆencia do princ´ıpio da boa ordena¸c˜ao. 6. Prove a lei de corte para a multiplica¸c˜ao: mp = np ⇒ m = n.

10

Conjuntos Finitos e Infinitos

Se¸ c˜ ao 2:

Cap. 1

Conjuntos finitos

1. Indicando com card X o n´ umero de elementos do conjunto finito X, prove: (a) Se X ´e finito e Y ⊂ X ent˜ao card Y ≤ card X. (b) Se X e Y s˜ ao finitos ent˜ao X ∪ Y ´e finito e card(X ∪ Y ) = card X + card Y − card(X ∩ Y ). (c) Se X e Y s˜ ao finitos ent˜ao X × Y ´e finito e card(X × Y ) = card X · card Y. 2. Seja P(X) o conjunto cujos elementos s˜ ao os subconjuntos de X. Prove por indu¸c˜ao que se X ´e finito ent˜ao card P(X) = 2card X .

3. Seja F(X; Y ) o conjunto das fun¸c˜oes f : X → Y . Se card X = m e card Y = n, prove que card F(X; Y ) = nm .

4. Prove que todo conjunto finito n˜ao-vazio X de n´ umeros naturais cont´em um elemento m´ aximo (isto ´e, existe x0 ∈ S tal que x ≤ x0 ∀ x ∈ X).

5. Prove o Princ´ıpio das Casas de Pombo: se m > n n˜ao existe fun¸c˜ao injetiva f : Im → In . (quando m > n, para alojar m pombos em n casas ´e preciso que pelo menos uma casa abrigue mais de um pombo). Se¸ c˜ ao 3:

Conjuntos infinitos

1. Dada f : X → Y , prove: (a)

Se X ´e infinito e f ´e injetiva ent˜ao Y ´e infinito.

(b)

Se Y ´e infinito e f ´e sobrejetiva, ent˜ao X ´e infinito.

2. Sejam X um conjunto finito e Y um conjunto infinito. Prove que existe uma fun¸c˜ao injetiva f : X → Y e uma fun¸c˜ao sobrejetiva g : Y → X.

3. Prove que o conjunto P dos n´ umeros primos ´e infinito.

4. Dˆe exemplo de uma seq¨ uˆencia decrescente XT1 ⊃ X2 ⊃ · · · ⊃ Xn ⊃ · · · de conjuntos infinitos cuja interse¸c˜ao ∞ n=1 Xn seja vazia.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

11

5. Prove que o conjunto X ´e infinito se, e somente se, n˜ao ´e vazio nem existe, seja qual for n ∈ N, uma aplica¸c˜ao sobrejetiva f : In → X. Se¸ c˜ ao 4:

Conjuntos enumer´ aveis

1. Defina f : N × N → N pondo f (1, n) = 2n − 1 e f (m + 1, n) = 2m (2n − 1). Prove que f ´e uma bije¸c˜ao.

2. Prove que existe g : N → N sobrejetiva tal que g −1 (n) ´e infinito, para cada n ∈ N.

3. Exprima N = N1 ∪ N2 ∪ · · · ∪ Nn ∪ · · · como uni˜ ao infinita de subconjuntos infinitos, dois a dois disjuntos. 4. Para cada n ∈ N, seja Pn = {X ⊂ N; card X = n}. Prove que Pn ´e enumer´avel. Conclua que o conjunto Pf dos subconjuntos finitos de N ´e enumer´avel. 5. Prove que o conjunto P(N) de todos os subconjuntos de N n˜ao ´e enumer´avel. 6. Sejam Y enumer´avel e f : X → Y tal que, para cada y ∈ Y , f −1 (y) ´e enumer´avel. Prove que X ´e enumer´avel.

2 N´ umeros Reais

O conjunto dos n´ umeros reais ser´a indicado por R. Faremos neste cap´ıtulo uma descri¸c˜ao de suas propriedades que, juntamente com suas conseq¨ uˆencias, ser˜ao utilizadas nos cap´ıtulos seguintes.

1

R´ e um corpo

Isto significa que est˜ao definidas em R duas opera¸c˜oes, chamadas adi¸ca ˜o e multiplica¸ca ˜o, que cumprem certas condi¸c˜oes, abaixo especificadas. A adi¸c˜ao faz corresponder a cada par de elementos x, y ∈ R, sua soma x + y ∈ R, enquanto a multiplica¸c˜ao associa a esses elementos o seu produto x · y ∈ R. Os axiomas a que essas opera¸c˜oes obedecem s˜ ao: Associatividade: para quaisquer x, y, z ∈ R tem-se (x+y)+z = x+(y+z) e (x · y) · z = x · (y · z).

Comutatividade: para quaisquer x, y ∈ R tem-se x+y = y+x e x·y = y·x.

Elementos neutros: existem em R dois elementos distintos 0 e 1 tais que x + 0 = x e x · 1 = x para qualquer x ∈ R.

Inversos: todo x ∈ R possui um inverso aditivo −x ∈ R tal que x + (−x) = 0 e, se x 6= 0, existe tamb´em um inverso multiplicativo x−1 ∈ R tal que x · x−1 = 1. Distributividade: para x, y, z ∈ R quaisquer, tem-se x·(y+z) = x·y+x·z.

Se¸c˜ ao 2

R´ e um corpo ordenado

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Dos axiomas acima resultam todas as regras familiares de manipula¸c˜ao com os n´ umeros reais. A t´ıtulo de exemplo, estabeleceremos algumas delas. Da comutatividade resulta que 0 + x = x e −x + x = 0 para todo x ∈ R. Analogamete 1·x = x e x−1 ·x = 1 quando x 6= 0. A soma x+(−y) ser´a indicada por x − y e chamada a diferen¸ca entre x e y. Se y 6= 0, o produto x·y −1 ser´a representado tamb´em por x/y e chamado o quociente de x por y. As opera¸c˜oes (x, y) 7→ x − y e (x, y) 7→ x/y chamam-se, respectivamente, subtra¸ca ˜o e divis˜ ao. Evidentemente, a divis˜ao de x por y s´ o faz sentido quando y 6= 0, pois o n´ umero 0 n˜ao possui inverso multiplicativo. Da distributividade segue-se que, para todo x ∈ R, vale x · 0 + x = x · 0 + x · 1 = x(0 + 1) = x · 1 = x. Somando −x a ambos os membros da igualdade x · 0 + x = x obtemos x · 0 = 0. Por outro lado, de x · y = 0 podemos concluir que x = 0 ou y = 0. Com efeito se for y 6= 0 ent˜ao podemos multiplicar ambos os membros desta igualdade por y −1 e obtemos x · y · y −1 = 0 · y −1 , donde x = 0. Da distributividade resultam tamb´em as “regras dos sinais”: x · (−y) = (−x) · y = −(x · y) e (−x) · (−y) = xy. Com efeito, x · (−y) + x · y = x · (−y + y) = x · 0 = 0. Somando −(x · y) a ambos os membros da igualdade x · (−y) + x · y = 0 vem x · (−y) = −(x · y). Analogamente, (−x) · y = −(x · y). Logo (−x) · (−y) = −[x · (−y)] = −[−(x · y)] = x · y. Em particular, (−1) · (−1) = 1. (Observa¸c˜ao: a igualdade −(−z) = z, acima empregada, resulta de somar-se z a ambos os membros da igualdade −(−z) + (−z) = 0.) Se dois n´ umeros reais x, y tˆem quadrados iguais, ent˜ao x = ±y. Com efeito, de x2 = y 2 decorre que 0 = x2 − y 2 = (x + y)(x − y) e, como sabemos, o produto de dois n´ umeros reais s´ o ´e zero quando pelo menos um dos fatores ´e zero.

2

R´ e um corpo ordenado

Isto significa que existe um subconjunto R+ ⊂ R, chamado o conjunto dos n´ umeros reais positivos, que cumpre as seguintes condi¸c˜oes: P1. A soma e o produto de n´ umeros reais positivos s˜ ao positivos. Ou + + + seja, x, y ∈ R ⇒ x + y ∈ R e x · y ∈ R .

P2. Dado x ∈ R, exatamente uma das trˆes alternativas seguintes ocorre: ou x = 0, ou x ∈ R+ ou −x ∈ R+ .

14

N´ umeros Reais

Cap. 2

Se indicarmos com R− o conjunto dos n´ umeros −x onde x ∈ R+ , a condi¸c˜ao P2. diz que R = R+ ∪ R− ∪ {0} e os conjuntos R+ , R− e {0} s˜ ao dois a dois disjuntos. Os n´ umeros y ∈ R− chamam-se negativos. Todo n´ umero real x 6= 0 tem quadrado positivo. Com efeito, se + x ∈ R ent˜ao x2 = x · x ∈ R+ por P1. Se x ∈ / R+ ent˜ao (como x 6= 0) + −x ∈ R logo, ainda por causa de P1., temos x2 = (−x) · (−x) ∈ R+ . Em particular 1 ´e um n´ umero positivo porque 1 = 12 . Escreve-se x < y e diz-se que x ´e menor do que y quando y −x ∈ R+ , isto ´e, y = x + z onde z ´e positivo. Neste caso, escreve-se tamb´em y > x e diz-se que y ´e maior do que x. Em particular, x > 0 significa que x ∈ R+ , isto ´e, que x ´e positivo, enquanto x < 0 quer dizer que x ´e negativo, ou seja, que −x ∈ R+ . Valem as seguintes propriedades da rela¸c˜ao de ordem x < y em R: O1. Transitividade: se x < y e y < z ent˜ao x < z. O2. Tricotomia: dados x, y ∈ R, ocorre exatamente uma das alternativas x = y, x < y ou y < x. O3. Monotonicidade da adi¸ca ˜o: se x < y ent˜ao, para todo z ∈ R, tem-se x + z < y + z. O4. Monotonicidade da multiplica¸ca ˜o: se x < y ent˜ao, para todo z > 0 tem-se xz < yz. Se, por´em, z < 0 ent˜ao x < y implica yz < xz. Demonstra¸ c˜ ao: O1. x < y e y < z significam y −x ∈ R+ e z −y ∈ R+ . Por P1. segue-se que (y − x) + (z − y) ∈ R+ , isto ´e, z − x ∈ R+ , ou seja, x < z. O2. Dados x, y ∈ R, ou y − x ∈ R+ , ou y − x = 0 ou y − x ∈ R− (isto ´e, x − y ∈ R+ ). No primeiro caso tem-se x < y, no segundo x = y e no terceiro y < x. Estas alternativas se excluem mutuamente, por P2. O3. Se x < y ent˜ao y − x ∈ R+ , donde (y + z) − (x + z) = y − x ∈ R+ , isto ´e, x + z < y + z. O4. Se x < y e z > 0 ent˜ao y − x ∈ R+ e z ∈ R+ , logo (y − x) · z ∈ R+ , ou seja, yz − xz ∈ R+ , o que significa xz < yz. Se x < y e z < 0 ent˜ao y − x ∈ R+ e −z ∈ R+ , donde xz − yz = (y − x)(−z) ∈ R+ , o que significa yz < xz. Mais geralmente, x < y e x′ < y ′ implicam x + x′ < y + y ′ . Com efeito (y + y ′ ) − (x + x′ ) = (y − x) + (y ′ − x′ ) ∈ R+ . Analogamente, 0 < x < y e 0 < x′ < y ′ implicam xx′ < yy ′ pois ′ yy − xx′ = yy ′ − yx′ + yx′ − xx′ = y(y ′ − x′ ) + (y − x)x′ > 0.

Se¸c˜ ao 2

R´ e um corpo ordenado

15

Se 0 < x < y ent˜ao y −1 < x−1 . Para provar, nota-se primeiro que x > 0 ⇒ x−1 = x · (x−1 )2 > 0. Em seguida, multiplicando ambos os membros da desigualdade x < y por x−1 y −1 vem y −1 < x−1 . Como 1 ∈ R ´e positivo, segue-se que 1 < 1 + 1 < 1 + 1 + 1 < . . . . Podemos ent˜ao considerar N ⊂ R. Segue-se que Z ⊂ R pois 0 ∈ R e n ∈ R ⇒ −n ∈ R. Al´em disso, se m, n ∈ Z com n 6= 0 ent˜ao m/n = m · n−1 ∈ R, o que nos permite concluir que Q ⊂ R. Assim, N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ R. Na se¸c˜ao seguinte, veremos que a inclus˜ ao Q ⊂ R ´e pr´opria.

Exemplo 1. (Desigualdade de Bernoulli.) Para todo n´ umero real n x ≥ −1 e todo n ∈ N, tem-se (1 + x) ≥ 1 + nx. Isto se prova por indu¸c˜ao em n, sendo ´ obvio para n = 1. Supondo a desigualdade v´alida para n, multiplicamos ambos os membros pelo n´ umero 1 + x ≥ 0 e obtemos (1 + x)n+1 = (1 + x)n (1 + x) ≥ (1 + nx)(1 + x) = 1 + nx + x + nx2 = 1 + (n + 1)x + nx2 ≥ 1 + (n + 1)x. Pelo mesmo argumento, vˆe-se que (1 + x)n > 1 + nx quando n > 1, x > −1 e x 6= 0. A rela¸c˜ao de ordem em R permite definir o valor absoluto (ou m´ odulo) de um n´ umero real x ∈ R assim: |x| = x se x > 0, |0| = 0 e |x| = −x se x < 0. Noutras palavras, |x| = max{x, −x} ´e o maior dos n´ umeros reais x e −x. Tem-se −|x| ≤ x ≤ |x| para todo x ∈ R. Com efeito, a desigualdade x ≤ |x| ´e ´ obvia, enquanto −|x| ≤ x resulta de multiplicar por −1 ambos os membros da desigualdade −x ≤ |x|. Podemos caracterizar |x| como ou ´nico n´ umero ≥ 0 cujo quadrado ´e x2 . Teorema 1. Se x, y ∈ R ent˜ ao |x + y| ≤ |x| + |y| e |x · y| = |x| · |y|.

Demonstra¸ c˜ ao: Somando membro a membro as desigualdades |x| ≥ x e |y| ≥ y vem |x| + |y| ≥ x + y. Analogamente, de |x| ≥ −x e |y| ≥ −y resulta |x|+|y| ≥ −(x+y). Logo |x|+|y| ≥ |x+y| = max{x+y, −(x+y)}. Para provar que |x · y| = |x| · |y|, basta mostrar que estes dois n´ umeros tˆem o mesmo quadrado, j´a que ambos s˜ ao ≥ 0. Ora o quadrado de |x · y| ´e (x · y)2 = x2 · y 2 , enquanto (|x| · |y|)2 = |x|2 |y|2 = x2 · y 2 .

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N´ umeros Reais

Cap. 2

Teorema 2. Sejam a, x, δ ∈ R. Tem-se |x − a| < δ se, e somente se, a − δ < x < a + δ. Demonstra¸ c˜ ao: Como |x − a| ´e o maior dos dois n´ umeros x − a e −(x − a), afirmar que |x − a| < δ equivale a dizer que se tem x − a < δ e −(x − a) < δ, ou seja, x − a < δ e x − a > −δ. Somando a, vem: |x − a| < δ ⇔ x < a + δ e x > a − δ ⇔ a − δ < x < a + δ. De modo an´ alogo se vˆe que |x − a| ≤ δ ⇔ a − δ ≤ x ≤ a + δ. Usaremos as seguintes nota¸c˜oes para representar tipos especiais de conjuntos de n´ umeros reais, chamados intervalos: [a, b] = {x ∈ R; a ≤ x ≤ b}

(−∞, b] = {x ∈ R; x ≤ b}

[a, b) = {x ∈ R; a ≤ x < b}

[a, +∞) = {x ∈ R; a ≤ x}

(a, b) = {x ∈ R; a < x < b}

(a, b] = {x ∈ R; a < x ≤ b}

(−∞, b) = {x ∈ R; x < b}

(a, +∞) = {x ∈ R; a < x}

(−∞, +∞) = R

Os quatro intervalos da esquerda s˜ ao limitados, com extremos a, b: [a, b] ´e um intervalo fechado, (a, b) ´e aberto, [a, b) ´e fechado a ` esquerda e (a, b] ´e fechado a ` direita. Os cinco intervalos `a direita s˜ ao ilimitados: (−∞, b] ´e a semi-reta esquerda fechada de origem b. Os demais tˆem denomina¸c˜oes an´ alogas. Quando a = b, o intervalo fechado [a, b] reduzse a um u ´nico elemento e chama-se um intervalo degenerado. Em termos de intervalos, o Teorema 2 diz que |x − a| < ε se, e somente se, x pertence ao intervalo aberto (a − ε, a + ε). Analogamente, |x − a| ≤ ε ⇔ x ∈ [a − ε, a + ε]. ´ muito conveniente imaginar o conjunto R como uma reta (a “reta E real”) e os n´ umeros reais como pontos dessa reta. Ent˜ao a rela¸c˜ao x < y significa que o ponto x est´a `a esquerda de y (e y `a direita de x), os intervalos s˜ ao segmentos de reta e |x − y| ´e a distˆ ancia do ponto x ao ponto y. O significado do Teorema 2 ´e de que o intervalo (a − δ, a + δ) ´e formado pelos pontos que distam menos de δ do ponto a. Tais interpreta¸c˜oes geom´etricas constituem um valioso aux´ılio para a compreens˜ ao dos conceitos e teoremas da An´ alise.

3

R´ e um corpo ordenado completo

Nada do que foi dito at´e agora permite distinguir R de Q pois os n´ umeros racionais tamb´em constituem um corpo ordenado. Acabaremos agora

Se¸c˜ ao 3

R´ e um corpo ordenado completo

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nossa caracteriza¸c˜ao de R, descrevendo-o como um corpo ordenado completo, propriedade que Q n˜ao tem. Um conjunto X ⊂ R diz-se limitado superiormente quando existe algum b ∈ R tal que x ≤ b para todo x ∈ X. Neste caso, diz-se que b ´e uma cota superior de X. Analogamente, diz-se que o conjunto X ⊂ R ´e limitado inferiormente quando existe a ∈ R tal que a ≤ x para todo x ∈ X. O n´ umero a chama-se ent˜ao uma cota inferior de X. Se X ´e limitado superior e inferiormente, diz-se que X ´e um conjunto limitado. Isto significa que X est´a contido em algum intervalo limitado [a, b] ou, equivalentemente, que existe k > 0 tal que x ∈ X ⇒ |x| ≤ k. Seja X ⊂ R limitado superiormente e n˜ao-vazio. Um n´ umero b ∈ R chama-se o supremo do conjunto X quando ´e a menor das cotas superiores de X. Mais explicitamente, b ´e o supremo de X quando cumpre as duas condi¸c˜oes: S1. S2.

Para todo x ∈ X, tem-se x ≤ b; Se c ∈ R ´e tal que x ≤ c para todo x ∈ X ent˜ao b ≤ c.

A condi¸c˜ao S2 admite a seguinte reformula¸c˜ao: S2´.

Se c < b ent˜ao existe x ∈ X com c < x.

Com efeito, S2´ diz que nenhum n´ umero real menor do que b pode ` ser cota superior de X. As vezes se exprime S2´ assim: para todo ε > 0 existe x ∈ X tal que b − ε < x. Escrevemos b = sup X para indicar que b ´e o supremo do conjunto X. Analogamente, se X ⊂ R ´e um conjunto n˜ao-vazio, limitado inferiormente, um n´ umero real a chama-se o ´ınfimo do conjunto X, e escreve-se a = inf X, quando ´e a maior das cotas inferiores de X. Isto equivale `as duas afirma¸c˜oes: I1. Para todo x ∈ X tem-se a ≤ x; I2. Se c ≤ x para todo x ∈ X ent˜ao c ≤ a.

A condi¸c˜ao I2 pode tamb´em ser formulada assim:

I2´. Se a < c ent˜ao existe x ∈ X tal que x < c.

De fato, I2´ diz que nenhum n´ umero maior do que a ´e cota inferior de X. Equivalentemente: para todo ε > 0 existe x ∈ X tal que x < a+ε. Diz-se que um n´ umero b ∈ X ´e o maior elemento (ou elemento m´ aximo) do conjunto X quando b ≥ x para todo x ∈ X. Isto quer dizer que b ´e uma cota superior de X, pertencente a X. Por exemplo, b ´e o elemento m´ aximo do intervalo fechado [a, b] mas o intervalo [a, b) n˜ao possui maior elemento. Evidentemente, se um conjunto X possui

18

N´ umeros Reais

Cap. 2

elemento m´ aximo este ser´a seu supremo. A no¸c˜ao de supremo serve precisamente para substituir a id´eia de maior elemento de um conjunto quando esse maior elemento n˜ao existe. O supremo do conjunto [a, b) ´e b. Considera¸c˜oes inteiramente an´ alogas podem ser feitas em rela¸c˜ao ao ´ınfimo. A afirma¸c˜ao de que o corpo ordenado R ´e completo significa que todo conjunto n˜ao-vazio, limitado superiormente, X ⊂ R possui supremo b = sup X ∈ R. N˜ ao ´e necess´ario estipular tamb´em que todo conjunto n˜ao-vazio, limitado inferiormente, X ⊂ R possua ´ınfimo. Com efeito, neste caso o conjunto Y = {−x; x ∈ X} ´e n˜ao-vazio, limitado superiormente, logo possui um supremo b ∈ R. Ent˜ao, como se vˆe sem dificuldade, o n´ umero a = −b ´e o ´ınfimo de Y . Em seguida veremos algumas conseq¨ uˆencias da completeza de R. Teorema 3. i) O conjunto N ⊂ R dos n´ umeros naturais n˜ ao ´e limitado superiormente; ii) O ´ınfimo do conjunto X = {1/n; n ∈ N} ´e igual a 0; iii) Dados a, b ∈ R+ , existe n ∈ N tal que n · a > b.

Demonstra¸ c˜ ao: Se N ⊂ R fosse limitado superiormente, existiria c = sup N. Ent˜ao c − 1 n˜ao seria cota superior de N, isto ´e, existiria n ∈ N com c − 1 < n. Da´ı resultaria c < n + 1, logo c n˜ao seria cota superior de N. Esta contradi¸c˜ao prova i). Quanto a ii), 0 ´e evidentemente uma cota inferior de X. Basta ent˜ao provar que nenhum c > 0 ´e cota inferior de X. Ora, dado c > 0, existe, por i), um n´ umero natural n > 1/c, donde 1/n < c, o que prova ii). Finalmente, dados a, b ∈ R+ usamos i) para obter n ∈ N tal que n > b/a. Ent˜ao na > b, o que demonstra iii).

As propriedades i), ii) e iii) do teorema acima s˜ ao equivalentes e significam que R ´e um corpo arquimediano. Na realidade, iii) ´e devida ao matem´ atico grego Eudoxo, que viveu alguns s´eculos antes de Arquimedes. Teorema 4. (Intervalos encaixados.) Dada uma seq¨ uˆencia decrescente I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ · · · de intervalos limitados e fechados In = [an , bn ], existe pelo menos um n´ umero real c tal que c ∈ In para todo n ∈ N. Demonstra¸ c˜ ao: As inclus˜ oes In ⊃ In+1 significam que a1 ≤ a2 ≤ · · · ≤ an ≤ · · · ≤ bn ≤ · · · ≤ b2 ≤ b1 .

Se¸c˜ ao 3

R´ e um corpo ordenado completo

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O conjunto A = {a1 , a2 , . . . , an , . . . } ´e, portanto, limitado superiormente. Seja c = sup A. Evidentemente, an ≤ c para todo n ∈ N. Al´em disso, como cada bn ´e cota superior de A, temos c ≤ bn para todo n ∈ N. Portanto c ∈ In qualquer que seja n ∈ N. Teorema 5. O conjunto dos n´ umeros reais n˜ ao ´e enumer´ avel. Demonstra¸ c˜ ao: Mostraremos que nenhuma fun¸c˜ao f : N → R pode ser sobrejetiva. Para isto, supondo f dada, construiremos uma seq¨ uˆencia decrescente I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ · · · de intervalos limitados e fechados tais que f (n) ∈ / In . Ent˜ao, se c ´e um n´ umero real pertencente a todos os In , nenhum dos valores f (n) pode ser igual a c, logo f n˜ao ´e sobrejetiva. Para obter os intervalos, come¸camos tomando I1 = [a1 , b1 ] tal que f (1) < a1 e, supondo obtidos I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In tais que f (j) ∈ / Ij , olhamos para In = [an , bn ]. Se f (n + 1) ∈ / In , podemos simplesmente tomar In+1 = In . Se, por´em, f (n + 1) ∈ In , pelo menos um dos extremos, digamos an , ´e diferente de f (n + 1), isto ´e, an < f (n + 1). Neste caso, tomamos In+1 = [an+1 , bn+1 ], com an+1 = an e bn+1 = (an + f (n + 1))/2. Um n´ umero real chama-se irracional quando n˜ao ´e racional. Como o conjunto Q dos n´ umeros racionais ´e enumer´avel, resulta do teorema acima que existem n´ umeros irracionais e, mais ainda, sendo R = Q ∪ (R − Q), os irracionais constituem um conjunto n˜ao-enumer´avel (portanto formam a maioria dos reais) porque a reuni˜ao de dois conjuntos enumer´aveis seria enumer´avel. Evidentemente, n´ umeros irracionais podem ser exibidos explicitamente. No Cap´ıtulo 3, Exemplo 15, veremos que a fun¸c˜ao f : R → R+ , dada por f (x) =√x2 , ´e sobrejetiva. Logo existe um n´ umero real positivo, indicado por 2, cujo quadrado ´e igual a 2. Pit´ agoras e seus disc´ıpulos mostraram que o quadrado de nenhum n´ umero racional pode ser 2. (Com efeito, de (p/q)2 = 2 resulta 2q 2 = p2 , com p, q inteiros, um absurdo porque o fator primo 2 aparece um n´ umero par de vezes na decomposi¸c˜ao de p2 em fatores primos e um n´ umero ´ımpar de vezes em 2q 2 .) Corol´ ario. Todo intervalo n˜ ao-degenerado ´e n˜ ao-enumer´ avel. Com efeito, todo intervalo n˜ao-degenerado cont´em um intervalo aberto (a, b). Como a fun¸c˜ao f : (−1, 1) → (a, b), definida por f (x) = 1 e uma bije¸c˜ao, basta mostrar que o intervalo aberto 2 [(b − a)x + a + b], ´ (−1, 1) ´e n˜ao-enumer´avel. Ora, a fun¸c˜ao ϕ : R → (−1, 1), dada por

20

N´ umeros Reais

Cap. 2

ϕ(x) = x/(1 + |x|), ´e uma bije¸c˜ao cuja inversa ´e ψ : (−1, 1) → R, definida por ψ(y) = y/(1 − |y|), pois ϕ(ψ(y)) = y e ψ(ϕ(x)) = x para quaisquer y ∈ (−1, 1) e x ∈ R, como se pode verificar facilmente. Teorema 6. Todo intervalo n˜ ao-degenerado I cont´em n´ umeros racionais e irracionais. Demonstra¸ c˜ ao: Certamente I cont´em n´ umeros irracionais pois do contr´ario seria enumer´avel. Para provar que I cont´em n´ umeros racionais, tomamos [a, b] ⊂ I, onde a < b podem ser supostos irracionais. Fixemos n ∈ N tal que 1/n < b − a. Os S intervalos Im = [m/n, (m + 1)/n], m ∈ Z, cobrem a reta, isto ´e, R = m∈Z Im . Portanto existe m ∈ Z tal que a ∈ Im . Como a ´e irracional, temos m/n < a < (m + 1)/n. Sendo o comprimento 1/n do intervalo Im menor do que b − a, segue-se que (m + 1)/n < b. Logo o n´ umero racional (m + 1)/n pertence ao intervalo [a, b] e portanto ao intervalo I.

4

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

R´ e um corpo

1. Prove as seguintes unicidades: (a) (b) (c) (d)

Se Se Se Se

x + θ = x para algum x ∈ R, ent˜ao θ = 0; x · u = x para todo x ∈ R ent˜ao u = 1; x + y = 0 ent˜ao y = −x; x · y = 1, ent˜ao y = x−1 .

2. Dados a, b, c, d ∈ R, se b 6= 0 e d 6= 0 prove que a/b + c/d = (ad + bc)/bd e (a/b)(c/d) = ac/bd. 3. Se a 6= 0 e b 6= 0 em R, prove que (ab)−1 = a−1 b−1 e conclua que (a/b)−1 = b/a. 4. Prove que (1 − xn+1 )/(1 − x) = 1 + x + · · · + xn para todo x 6= 1. Se¸ c˜ ao 2:

R´ e um corpo ordenado

1. Para quaisquer x, y, z ∈ R, prove que |x − z| ≤ |x − y| + |y − z|. 2. Prove que | |x| − |y| | ≤ |x − y| para quaisquer x, y ∈ R. 3. Dados x, y ∈ R, se x2 + y 2 = 0 prove que x = y = 0.

4. Prove por indu¸c˜ao que (1 + x)n ≥ 1 + nx + [n(n − 1)/2]x2 se x ≥ 0.

Se¸c˜ ao 4

Exerc´ıcios

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5. Para todo x 6= 0 em R, prove que (1 + x)2n > 1 + 2nx. 6. Prove que |a − b| < ε ⇒ |a| < |b| + ε.

P 7. Use o fato de que o trinˆ omio do segundo grau f (λ) = ni=1 (xi + λyi )2 ´e ≥ 0 para todo λ ∈ R para provar a desigualdade de CauchySchwarz n n n X X 2  X  2 xi yi ≤ xi yi2 . i=1

i=1

i=1

Prove ainda que vale a igualdade se, e somente se, existe λ tal que xi = λyi para todo i = 1, . . . , n, ou ent˜ao y1 = · · · = yn = 0.

8. Se a1 /b1 , . . . , an /bn pertencem ao intervalo (α, β) e b1 , . . . , bn s˜ ao positivos, prove que (a1 +· · ·+an )/(b1 +· · ·+bn ) pertence a (α, β). Nas mesmas condi¸c˜oes, se t1 , . . . , tn ∈ R+ , prove que (t1 a1 + · · · + tn an )/(t1 b1 + · · · + tn bn ) tamb´em pertence ao intervalo (α, β). Se¸ c˜ ao 3:

R´ e um corpo ordenado completo

1. Diz-se que uma fun¸c˜ao f : X → R ´e limitada superiormente quando sua imagem f (X) = {f (x); x ∈ X} ´e um conjunto limitado superiormente. Ent˜ao p˜oe-se sup f = sup{f (x); x ∈ X}. Prove que se f, g : X → R s˜ ao limitadas superiormente o mesmo ocorre com a soma f + g : X → R e tem-se sup(f + g) ≤ sup f + sup g. Dˆe um exemplo com sup(f + g) < sup f + sup g. Enuncie e prove um resultado an´ alogo para inf. 2. Dadas as fun¸c˜oes f, g : X → R+ limitadas superiormente, prove que o produto f · g : X → R+ ´e uma fun¸c˜ao limitada (superior e inferiormente) com sup(f ·g) ≤ sup f ·sup g e inf(f ·g) ≥ inf f ·inf g. Dˆe exemplos onde se tenha < e n˜ao =. 3. Nas condi¸c˜oes do exerc´ıcio anterior mostre que sup(f 2 ) = (sup f )2 e inf(f 2 ) = (inf f )2 . 4. Dados a, b ∈ R+ com a2 < 2 < b2 , tome x, y ∈ R+ tais que x < 1, x < (2 − a2 )/(2a + 1) e y < (b2 − 2)/2b. Prove que (a + x)2 < 2 < (b − y)2 e b − y > 0. Em seguida, considere o conjunto limitado X = {a ∈ R+ ; a2 < 2} e conclua que o n´ umero real c = sup X cumpre c2 = 2. 5. Prove que o conjunto dos polinˆ omios com coeficientes inteiros ´e enumer´avel. Um n´ umero real chama-se alg´ebrico quando ´e raiz

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N´ umeros Reais

Cap. 2

de um polinˆ omio com coeficientes inteiros. Prove que o conjunto dos n´ umeros alg´ebricos ´e enumer´avel. Um n´ umero real chama-se transcendente quando n˜ao ´e alg´ebrico. Prove que existem n´ umeros transcendentes. 6. Prove que um conjunto I ⊂ R ´e um intervalo se, e somente se, a < x < b, a, b ∈ I ⇒ x ∈ I.

3 Seq¨ uˆ encias de N´ umeros Reais

Neste cap´ıtulo ser´a apresentada a no¸c˜ao de limite sob sua forma mais simples, o limite de uma seq¨ uˆencia. A partir daqui, todos os conceitos importantes da An´ alise, de uma forma ou de outra, reduzir-se-˜ ao a algum tipo de limite.

1

Limite de uma seq¨ uˆ encia

Uma seq¨ uˆencia de n´ umeros reais ´e uma fun¸c˜ao x : N → R, que associa a cada n´ umero natural n um n´ umero real xn , chamado o n-´esimo termo da seq¨ uˆencia. Escreve-se (x1 , x2 , . . . , xn , . . . ) ou (xn )n∈N , ou simplesmente (xn ), para indicar a seq¨ uˆencia cujo n-´esimo termo ´e xn . N˜ ao se confunda a seq¨ uˆencia (xn ) com o conjunto {x1 , x2 , . . . , xn , . . . } dos seus termos. Por exemplo, a seq¨ uˆencia (1, 1, . . . , 1, . . . ) n˜ao ´e o mesmo que o conjunto {1}. Ou ent˜ao: as seq¨ uˆencias (0, 1, 0, 1, . . . ) e (0, 0, 1, 0, 0, 1, . . . ) s˜ ao diferentes mas o conjunto dos seus termos ´e o mesmo, igual a {0, 1}. Uma seq¨ uˆencia (xn ) diz-se limitada superiormente (respectivamente inferiormente) quando existe c ∈ R tal que xn ≤ c (respectivamente xn ≥ c) para todo n ∈ N. Diz-se que a seq¨ uˆencia (xn ) ´e limitada quando ela ´e limitada superior e inferiormente. Isto equivale a dizer que existe k > 0 tal que |xn | ≤ k para todo n ∈ N.

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Seq¨ uˆ encias de N´ umeros Reais

Cap. 3

Exemplo 1. Se a > 1 ent˜ao a seq¨ uˆencia (a, a2 , . . . , an , . . . ) ´e limitada inferiormente por´em n˜ao superiormente. Com efeito, multiplicando ambos os membos da desigualdade 1 < a por an obtemos an < an+1 . Segue-se que a < an para todo n ∈ N, logo (an ) ´e limitada inferiormente por a. Por outro lado, temos a = 1 + d, com d > 0. Pela desigualdade de Bernoulli, para todo n > 1 em N vale an ≥ 1 + nd. Portanto, dado qualquer c ∈ R podemos obter an > c desde que tomemos 1 + nd > c, isto ´e, n > (c − 1)/d.

Dada uma seq¨ uˆencia x = (xn )n∈N , uma subseq¨ uˆencia de x ´e a res′ tri¸c˜ao da fun¸c˜ao x a um subconjunto infinito N = {n1 < n2 < · · · < nk < · · · } de N. Escreve-se x′ = (xn )n∈N′ ou (xn1 , xn2 , . . . , xnk , . . . ), ou (xnk )k∈N para indicar a subseq¨ uˆencia x′ = x|N′ . A nota¸c˜ao (xnk )k∈N mostra como uma subseq¨ uˆencia pode ser considerada como uma seq¨ uˆencia, isto ´e, uma fun¸c˜ao cujo dom´ınio ´e N. Lembremos que N′ ⊂ N ´e infinito se, e somente se, ´e ilimitado, isto ´e, para todo n0 ∈ N existe nk ∈ N′ com nk > n0 .

Exemplo 2. Dado o n´ umero real a < −1, formemos a seq¨ uˆencia (an )n∈N . Se N′ ⊂ N ´e o conjunto dos n´ umeros pares e N′′ ⊂ N ´e o conjunto dos n´ umero ´ımpares ent˜ao a subseq¨ uˆencia (an )n∈N′ ´e limitada apenas inferiormente enquanto a subseq¨ uˆencia (an )n∈N′′ ´e limitada apenas superiormente. Diz-se que o n´ umero real a ´e limite da seq¨ uˆencia (xn ) quando, para todo n´ umero real ε > 0, dado arbitrariamente, pode-se obter n0 ∈ N tal que todos os termos xn com ´ındice n > n0 cumprem a condi¸c˜ao |xn − a| < ε. Escreve-se ent˜ao a = lim xn . Esta importante defini¸c˜ao significa que, para valores muito grandes de n, os termos xn tornam-se e se mantˆem t˜ao pr´oximos de a quanto se deseje. Mais precisamente, estipulando-se uma margem de erro ε > 0, existe um ´ındice n0 ∈ N tal que todos os termos xn da seq¨ uˆencia com ´ındice n > n0 s˜ ao valores aproximados de a com erro menor do que ε. Simbolicamente, escreve-se: a = lim xn

. ≡ . ∀ ε > 0 ∃ n0 ∈ N ; n > n0 ⇒ |xn − a| < ε.

Acima, o s´ımbolo . ≡ . significa que o que vem depois ´e a defini¸c˜ao do que vem antes. ∀ significa “para todo” ou “qualquer que seja”. ∃ significa “existe”. O ponto-e-v´ırgula quer dizer “tal que” e a seta ⇒ significa “implica”.

Se¸c˜ ao 1

Limite de uma seq¨ uˆ encia

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Conv´em lembrar que |xn − a| < ε ´e o mesmo que a − ε < xn < a + ε, isto ´e, xn pertence ao intervalo aberto (a − ε, a + ε). Assim, dizer que a = lim xn significa afirmar que qualquer intervalo aberto de centro a cont´em todos os termos xn da seq¨ uˆencia, salvo para um n´ umero finito de ´ındices n (a saber, os ´ındices n ≤ n0 , onde n0 ´e escolhido em fun¸c˜ao do raio ε do intervalo dado). Em vez de a = lim xn , escreve-se tamb´em a = limn∈N xn , a = limn→∞ xn ou xn → a. Esta u ´ltima express˜ao lˆe-se “xn tende para a” ou “converge para a”. Uma seq¨ uˆencia que possui limite diz-se convergente. Caso contr´ario, ela se chama divergente. Teorema 1. (Unicidade do limite.) Uma seq¨ uˆencia n˜ ao pode convergir para dois limites distintos. Demonstra¸ c˜ ao: Seja lim xn = a. Dado b 6= a podemos tomar ε > 0 tal que os intervalos abertos I = (a − ε, a + ε) e J = (b − ε, b + ε) sejam disjuntos. Existe n0 ∈ N tal que n > n0 implica xn ∈ I. Ent˜ao, para todo n > n0 , temos xn ∈ / J. Logo n˜ao ´e lim xn = b. Teorema 2. Se lim xn = a ent˜ ao toda subseq¨ uˆencia de (xn ) converge para o limite a. Demonstra¸ c˜ ao: Seja (xn1 , . . . , xnk , . . . ) a subseq¨ uˆencia. Dado qualquer intervalo aberto I de centro a, existe n0 ∈ N tal que todos os termos xn , com n > n0 , pertencem a I. Em particular, todos os termos xnk , com nk > n0 tamb´em pertencem a I. Logo lim xnk = a. Teorema 3. Toda seq¨ uˆencia convergente ´e limitada. Demonstra¸ c˜ ao: Seja a = lim xn . Tomando ε = 1, vemos que existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn ∈ (a − 1, a + 1). Sejam b o menor e c o maior elemento do conjunto finito {x1 , . . . , xn0 , a − 1, a + 1}. Todos os termos xn da seq¨ uˆencia est˜ao contidos no intervalo [b, c], logo ela ´e limitada. Exemplo 3. A seq¨ uˆencia (2, 0, 2, 0, . . . ), cujo n-´esimo termo ´e xn = 1 + (−1)n+1 , ´e limitada mas n˜ao ´e convergente porque possui duas subseq¨ uˆencias constantes, x2n−1 = 2 e x2n = 0, com limites distintos. Exemplo 4. A seq¨ uˆencia (1, 2, 3, . . . ), com xn = n, n˜ao converge porque n˜ao ´e limitada. Uma seq¨ uˆencia (xn ) chama-se mon´ otona quando se tem xn ≤ xn+1 para todo n ∈ N ou ent˜ao xn+1 ≤ xn para todo n. No primeiro caso,

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Seq¨ uˆ encias de N´ umeros Reais

Cap. 3

diz-se que (xn ) ´e mon´ otona n˜ ao-decrescente e, no segundo, que (xn ) ´e mon´ otona n˜ ao-crescente. Se, mais precisamente, tivermos xn < xn+1 (respect. xn > xn+1 ) para todo n ∈ N, diremos que a seq¨ uˆencia ´e crescente (respectivamente, decrescente). Toda seq¨ uˆencia mon´otona n˜ao-decrescente (respect. n˜ao-crescente) ´e limitada inferiormente (respect. superiormente) pelo seu primeiro termo. A fim de que ela seja limitada ´e suficiente que possua uma subseq¨ uˆencia limitada. Com efeito, seja (xn )n∈N′ uma subseq¨ uˆencia limitada da seq¨ uˆencia mon´otona (digamos, n˜ao-decrescente) (xn ). Temos xn′ ≤ c para todo n′ ∈ N′ . Dado qualquer n ∈ N, existe n′ ∈ N′ tal que n < n′ . Ent˜ao xn ≤ xn′ ≤ c. O teorema seguinte d´a uma condi¸c˜ao suficiente para que uma seq¨ uˆencia convirja. Foi tentando demonstr´a-lo ao preparar suas aulas, na metade do s´eculo 19, que R. Dedekind percebeu a necessidade de uma conceitua¸c˜ao precisa de n´ umero real. Teorema 4. Toda seq¨ uˆencia mon´ otona limitada ´e convergente. Demonstra¸ c˜ ao: Seja (xn ) mon´otona, digamos n˜ao-decrescente, limitada. Escrevamos X = {x1 , . . . , xn , . . . } e a = sup X. Afirmamos que a = lim xn . Com efeito, dado ε > 0, o n´ umero a − ε n˜ao ´e cota superior de X. Logo existe n0 ∈ N tal que a − ε < xn0 ≤ a. Assim, n > n0 ⇒ a − ε < xn0 ≤ xn < a + ε e da´ı lim xn = a. Semelhantemente, se (xn ) ´e n˜ao-crescente, limitada ent˜ao lim xn ´e o ´ınfimo do conjunto dos valores xn . Corol´ ario. (Teorema de Bolzano-Weierstrass.) Toda seq¨ uˆencia limitada de n´ umeros reais possui uma subseq¨ uˆencia convergente. Com efeito, basta mostrar que toda seq¨ uˆencia (xn ) possui uma subseq¨ uˆencia mon´otona. Diremos que um termo xn da seq¨ uˆencia dada ´e destacado quando xn ≥ xp para todo p > n. Seja D ⊂ N o conjunto dos ´ındices n tais que xn ´e um termo destacado. Se D for um conjunto infinito, D = {n1 < n2 < · · · < nk < · · · }, ent˜ao a subseq¨ uˆencia (xn )n∈D ser´a mon´otona n˜ao-crescente. Se, entretanto, D for finito seja n1 ∈ N maior do que todos os n ∈ D. Ent˜ao xn1 n˜ao ´e destacado, logo existe n2 > n1 com xn1 < xn2 . Por sua vez, xn2 n˜ao ´e destacado, logo existe n3 > n2 com xn1 < xn2 < xn3 . Prosseguindo, obtemos uma subseq¨ uˆencia crescente xn1 < xn2 < · · · < xnk < · · · .

Se¸c˜ ao 2

Limites e desigualdades

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Exemplo 5. A seq¨ uˆencia cujo n-´esimo termo ´e xn = 1/n ´e mon´otona, decrescente, limitada. Temos ent˜ao lim 1/n = inf{1/n; n ∈ N} = 0, pelo Teorema 3, Cap´ıtulo 2. Exemplo 6. Seja 0 < a < 1. A seq¨ uˆencia (a, a2 , . . . , an , . . . ), formada pelas potˆencias sucessivas de a, ´e decrescente, limitada pois multiplicando 0 < a < 1 por an resulta 0 < an+1 < an . Afirmamos que limn→∞ an = 0. Com efeito, dado ε > 0, como 1/a > 1 seguese do Exemplo 1 que, dado arbitrariamente ε > 0 existe n0 ∈ N tal que (1/a)n0 > 1/ε, ou seja, an0 < ε. Segue-se que lim an = inf{an ; n ∈ N} = 0.

2

Limites e desigualdades

Seja P uma propriedade referente aos termos de uma seq¨ uˆencia (xn ). Diremos que “para todo n suficientemente grande xn goza da propriedade P ” para significar que “existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn goza da propriedade P ”. Teorema 5. Seja a = lim xn . Se b < a ent˜ ao, para todo n suficientemente grande, tem-se b < xn . Analogamente, se a < b ent˜ ao xn < b para todo n suficientemente grande. Demonstra¸ c˜ ao: Tomando ε = a − b, temos ε > 0 e b = a − ε. Pela defini¸c˜ao de limite, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ a−ε < xn < a+ε ⇒ b < xn . A outra afirma¸c˜ao se prova analogamente. Corol´ ario 1. Seja a = lim xn . Se a > 0 ent˜ ao, para todo n suficientemente grande, tem-se xn > 0. Analogamente, se a < 0 ent˜ ao xn < 0 para todo n suficientemente grande. Corol´ ario 2. Sejam a = lim xn e b = lim yn . Se xn ≤ yn para todo n suficientemente grande ent˜ ao a ≤ b. Em particular se xn ≤ b para todo n suficientemente grande ent˜ ao lim xn ≤ b. Com efeito, se fosse b < a ent˜ao tomar´ıamos c ∈ R tal que b < c < a e ter´ıamos, pelo Teorema 5, yn < c < xn para todo n suficientemente grande, contradizendo a hip´ otese. Observa¸ c˜ ao. Se fosse xn < yn n˜ao se poderia concluir a < b. Basta tomar xn = 0, yn = 1/n. Teorema 6. (Teorema do sandu´ıche.) Se lim xn = lim yn = a e xn ≤ zn ≤ yn para todo n suficientemente grande ent˜ ao lim zn = a.

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Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

Cap. 3

Demonstra¸ c˜ ao: Dado arbitrariamente ε > 0, existem n1 , n2 ∈ N tais que n > n1 ⇒ a − ε < xn < a + ε e n > n2 ⇒ a − ε < yn < a + ε. Seja n0 = max{n1 , n2 }. Ent˜ao n > n0 ⇒ a − ε < xn ≤ zn ≤ yn < a + ε ⇒ zn ∈ (a − ε, a + ε), logo lim zn = a.

3

Opera¸c˜ oes com limites

Teorema 7. Se lim xn = 0 e (yn ) ´e uma seq¨ uˆencia limitada (convergente ou n˜ ao) ent˜ ao lim(xn · yn ) = 0.

Demonstra¸ c˜ ao: Existe c > 0 tal que |yn | ≤ c para todo n ∈ N. Dado arbitrariamente ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ |xn | < ε/c. Ent˜ao n > n0 ⇒ |xn · yn | = |xn | · |yn | < (ε/c) · c = ε, logo lim(xn · yn ) = 0.

Exemplo 7. Se xn = 1/n e yn = sen(n) ent˜ao (yn ) n˜ao converge mas, como −1 ≤ yn ≤ 1, tem-se lim(xn yn ) = lim(sen(n)/n) = 0. Por outro lado, se lim xn = 0 mas yn n˜ao ´e limitada, o produto xn ·yn pode divergir (tome xn = 1/n, yn = n2 ) ou convergir para um valor qualquer (tome xn = 1/n e yn = c · n). Para uso posterior, observemos que, segundo resulta diretamente da defini¸c˜ao de limite, tem-se lim xn = a ⇔ lim(xn − a) = 0 ⇔ lim |xn − a| = 0. Teorema 8. Se lim xn = a e lim yn = b ent˜ ao: 1. 2. 3.

lim(xn ± yn ) = a ± b.

lim(xn · yn ) = a · b. a xn = se b 6= 0. lim yn b

Demonstra¸ c˜ ao: 1. Dado arbitrariamente ε > 0, existem n1 , n2 ∈ N tais que n > n1 ⇒ |xn − a| < ε/2 e n > n2 ⇒ |yn − b| < ε/2. Seja n0 = max{n1 , n2 }. Ent˜ao n > n0 ⇒ n > n1 e n > n2 , logo |(xn + yn ) − (a + b)| = |(xn − a) + (yn − b)| ≤ |xn − a| + |yn − b| < ε/2 + ε/2 = ε. Portanto lim(xn + yn ) = a + b. Mesmo argumento para xn − yn . 2. Temos xn yn −ab = xn yn −xn b+xn b−ab = xn (yn −b)+(xn −a)b. Pelo Teorema 3, (xn ) ´e limitada. Al´em disso, lim(yn − b) = lim(xn − a) = 0. Segue-se do Teorema 7 e da parte 1. que lim(xn yn − ab) = lim[xn (yn − b)] + lim[(xn − a) · b] = 0, donde lim(xn yn ) = ab.

Se¸c˜ ao 3

Opera¸c˜ oes com limites

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3. Vale xn /yn −a/b = (xn b−yn a)/yn b. Como lim(xn b−yn a) = ab−ba = 0, basta provar que (1/yn b) ´e uma seq¨ uˆencia limitada para concluir que lim(xn /yn − a/b) = 0 e portanto que lim(xn /yn ) = a/b. Ora, pondo c = b2 /2, temos 0 < c < b2 . Como lim yn b = b2 , segue-se do Teorema 5 que, para todo n suficientemente grande, tem-se c < yn b e portanto 1/yn b < 1/c, completando a demonstra¸c˜ao. Exemplo 8. Se xn > 0 para todo n ∈ N e lim(xn+1 /xn ) = a < 1 ent˜ao lim xn = 0. Com efeito, tomemos c ∈ R com a < c < 1. Ent˜ao 0 < xn+1 /xn < c para todo n suficientemente grande. Segue-se que 0 < xn+1 = (xn+1 /xn )xn < c · xn < xn logo, para n suficientemente grande, a seq¨ uˆencia (xn ) ´e mon´otona limitada. Seja b = lim xn . De xn+1 < c·xn para todo n suficientemente grande resulta, fazendo n → ∞, que b ≤ c · b, isto ´e, (1 − c) · b ≤ 0. Como b ≥ 0 e 0 < c < 1, conclu´ımos que b = 0. Exemplo 9. Como aplica¸c˜ao do exemplo anterior, vˆe-se que, se a > 1 e k ∈ N s˜ ao constantes ent˜ao nk an n! = lim = lim n = 0. n→∞ an n→∞ n! n→∞ n lim

Com efeito, pondo xn = nk /an , yn = an /n! e zn = n!/nn vem yn+1 /yn = a/(n + 1), logo lim(yn+1 /yn ) = 0 e, pelo Exemplo 8, lim yn = 0. Temos k tamb´em xn+1 /xn = 1 + n1 · a−1 , portanto (pelo Teorema 8) lim(xn+1 / xn ) = 1/a < 1. Segue-se do Exemplo 8 que lim xn = 0. Finalmente, zn+1 /zn = [n/(n + 1)]n , donde lim(zn+1 /zn ) = 1/e. (Veja Exemplo 13, abaixo.) Como 1/e < 1, segue-se que lim zn = 0. Exemplo 10. Dado a > 0, mostremos que a seq¨ uˆencia dada por xn = √ n a = a1/n tem limite igual a 1. Com efeito, trata-se de uma seq¨ uˆencia mon´otona (decrescente se a > 1, crescente se a < 1), limitada, portanto existe L = limn→∞ a1/n . Tem-se L > 0. Com efeito, se 0 < a < 1 ent˜ao a1/n > a para todo n ∈ N, donde L ≥ a. Se, por´em, a > 1 ent˜ao a1/n > 1 para todo n ∈ N, donde L ≥ 1. Consideremos a subseq¨ uˆencia (a1/n(n+1) ) = (a1/2 , a1/6 , a1/12 , . . . ). Como 1/n(n + 1) = 1/n − 1/(n + 1), o Teorema 2 e o item 3 do Teorema 8 nos d˜ao L = lim a1/n(n+1) = lim

a1/n a1/(n+1)

=

L = 1. L

Exemplo 11. Seja 0 < a < 1. A seq¨ uˆencia cujo termo geral ´e xn = 1 + a + a2 + · · · + an = (1 − an+1 )/(1 − a) ´e crescente, limitada, pois

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Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

Cap. 3

xn < 1/(1 − a) para todo n ∈ N. Al´em disso, limn→∞ (1/(1 − a) − xn ) = limn→∞ an+1 /(1 − a) = 0, portanto limn→∞ xn = limn→∞ (1 + a + · · · + an ) = 1/(1 − a).

A igualdade acima vale ainda quando se tem −1 < a < 1, isto ´e, |a| < 1. Com efeito, o argumento se baseou no fato de que limn→∞ an = 0, que persiste quando se tem apenas |a| < 1, pois lim |a|n = 0 ⇔ lim an = 0.

Exemplo 12. A seq¨ uˆencia cujo termo geral ´e an = 1 + 1 +

1 1 + ··· + 2! n!

´e evidentemente crescente. Ela tamb´em ´e limitada pois 2 ≤ an ≤ 1 + 1 +

1 1 1 + + · · · + n−1 < 3. 2 22 2

Escreveremos e = lim an . O n´ umero e ´e uma das constantes mais importantes da An´ alise Matem´ atica. Como vimos, tem-se 2 < e ≤ 3. Na realidade, vale e = 2, 7182, com quatro decimais exatas. Exemplo 13. Consideremos a seq¨ uˆencia cujo termo geral ´e bn = (1 + 1/n)n = [(n + 1)/n]n . Pela f´ormula do binˆ omio: n · 1 n(n − 1) 1 n(n − 1)(n − 2) . . . 1 1 bn = 1 + + + ··· + 2 n 2! n n! nn     1 1 1 1 2 1 1 n − 1 = 1+1+ 1− + 1− 1− +· · ·+ 1− . . . 1− . 2! n 3! n n n! n n

Logo bn ´e uma soma de parcelas positivas. O n´ umero dessas parcelas, bem como cada uma delas, cresce com n. Portanto a seq¨ uˆencia (bn ) ´e ´ claro que bn < an . (Ver Exemplo 12.) Segue-se que bn < 3 crescente. E para todo n ∈ N. Afirmamos que lim bn = lim an = e. Com efeito, quando n > p vale bn ≥ 1 + 1 +

1 1 1 2 p − 1 1 1− + ··· + 1− 1− ... 1 − . 2! n p! n n n

Fixando arbitrariamente p ∈ N e fazendo n → ∞ na desigualdade acima obtemos limn→∞ bn ≥ 1 + 1 + 1/2! + · · · + 1/p! = ap . Como esta desigualdade vale para todo p ∈ N, segue-se que limn→∞ bn ≥ limp→∞ ap = e. Mas j´a vimos que bn < an para todo n ∈ N. Logo lim bn ≤ lim an . Isto completa a prova de que lim bn = e.

Se¸c˜ ao 4

Limites infinitos

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Exemplo 14. Consideremos a seq¨ uˆencia cujo n-´esimo termo ´e xn = √ 1/n n n = n . Temos xn ≥ 1 para todo n ∈ N. Esta seq¨ uˆencia ´e decrescente√a partir do seu terceiro termo. Com efeito, a desigualdade √ n n > n+1 n + 1 ´e equivalente a nn+1 > (n+1)n , isto ´e, a n > (1+1/n)n , o que ´e verdade para n ≥ 3 pois, como vimos acima, (1 + 1/n)n < 3 para todo n. Portanto existe L = lim n1/n e tem-se L ≥ 1. Considerando a subseq¨ uˆencia (2n)1/2n temos: L2 = lim[(2n)1/2n ]2 = lim[21/n · n1/n ] = lim 21/n · lim n1/n = L (Cfr. Exemplo 10.) Como L 6= 0, de L2 = L resulta L = 1. Conclu´ımos √ portanto que lim n n = 1. Exemplo 15 (Aproxima¸co ˜es sucessivas da raiz quadrada.) O seguinte m´etodo iterativo para obter, com erro t˜ao pequeno quanto se deseje, valores aproximados para a raiz quadrada de um dado n´ umero real a > 0, j´a era conhecido pelos babilˆ onios 17 s´eculos antes da era crist˜a. Toma√ se arbitrariamente um valor inicial x1 > a e define-se indutivamente xn+1 = [xn + a/xn ]/2. Para mostrar que a seq¨ uˆencia (xn ) assim obtida √ converge para a, come¸camos observando que, para qualquer x ∈ R, √ √ a < x ⇒ (a/x) < a < x. (Multiplique ambos os membros da √ √ desigualdade a < x por a.) Em seguida notemos que, pondo y = [x + a/x]/2, y ´e a m´edia aritm´etica dos n´ umeros a/x e x, logo ´e menor √ do que x e maior do que a m´edia geom´etrica desses n´ umeros, que ´e a. √ Logo a < y < x. Portanto temos uma seq¨ uˆencia decrescente x1 > x2 > · · · > xn > xn+1 > · · · , √ cujos termos s˜ ao todos maiores do que a. Esta seq¨ uˆencia converge para um n´ umero real c. Fazendo n → ∞ na igualdade xn+1 = [xn + a/xn ]/2 √ obtemos c = [c + a/c]/2, donde c2 = a, isto ´e, lim xn = a. Vemos ent˜ao que todo n´ umero real a > 0 possui uma raiz quadrada real. Mais ainda, o processo iterativo xn+1 = [xn + a/xn ]/2 fornece rapidamente √ boas aproxima¸c˜oes para a, como se pode verificar tomando exemplos concretos.

4

Limites infinitos

Dada uma seq¨ uˆencia (xn ), diz-se que “o limite de xn ´e mais infinito” e escreve-se lim xn = +∞, para significar que, dado arbitrariamente A > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 implica xn > A.

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Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

Cap. 3

Analogamente, lim xn = −∞ significa que, para todo A > 0 dado, pode-se achar n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn < −A. Deve-se enfatizar que +∞ e −∞ n˜ao s˜ ao n´ umeros e que, se lim xn = +∞ e lim yn = −∞, as seq¨ uˆencias (xn ) e (yn ) n˜ao s˜ ao convergentes. Como lim xn = +∞ ⇔ lim(−xn ) = −∞, limitaremos nossos coment´arios ao primeiro caso. Se lim xn = +∞ ent˜ao a seq¨ uˆencia (xn ) n˜ao ´e limitada superiormente. A rec´ıproca ´e falsa. A seq¨ uˆencia dada por xn = n + (−1)n n ´e ilimitada superiormente por´em n˜ao se tem lim xn = +∞, pois x2n−1 = 0 para todo n ∈ N. Mas se (xn ) ´e n˜ao-decrescente ent˜ao (xn ) ilimitada ⇒ lim xn = +∞. No Exemplo 1, ao mostrar que as potˆencias a, a2 , a3 , . . . de um n´ umero a > 1 formam uma seq¨ uˆencia ilimitada superiormente, provouse, na realidade, que lim an = +∞. Teorema 9. (1) Se lim xn = +∞ e (yn ) ´e limitada inferiormente ent˜ ao lim(xn + yn ) = +∞. (2) Se lim xn = +∞ e existe c > 0 tal que yn > c para todo n ∈ N ent˜ ao lim(xn yn ) = +∞. (3) Se xn > c > 0, yn > 0 para todo n ∈ N e lim yn = 0 ent˜ ao xn lim = +∞. yn xn = 0. (4) Se (xn ) ´e limitada e lim yn = +∞ ent˜ ao lim yn Demonstra¸ c˜ ao: (1) Existe c ∈ R tal que yn ≥ c para todo n ∈ N. Dado arbitrariamente A > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn > A − c. Segue-se que n > n0 ⇒ xn +yn > A−c+c = A, logo lim(xn +yn ) = +∞. (2) Dado arbitrariamente A > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn > A/c. Logo n > n0 ⇒ xn yn > (A/c) · c = A, donde lim(xn yn ) = +∞.

(3) Dado A > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ yn < c/A. Ent˜ao n > n0 ⇒ xn /yn > c · A/c = A e da´ı lim(xn /yn ) = +∞.

(4) Existe c > 0 tal que |xn | ≤ c para todo n ∈ N. Dado arbitrariamente ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ yn > c/ε. Ent˜ao n > n0 ⇒ |xn /yn | < c · ε/c = ε, logo lim(xn /yn ) = 0. As hip´ oteses feitas nas diversas partes do teorema anterior tˆem por objetivo evitar algumas das chamadas “express˜ oes indeterminadas”. No

Se¸c˜ ao 4

Limites infinitos

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item (1) procura-se evitar a express˜ao +∞−∞. De fato, se lim xn = +∞ e lim yn = −∞ nenhuma afirma¸c˜ao geral pode ser feita sobre lim(xn + yn ). Este limite pode n˜ao existir (como no caso em que xn = n + (−1)n e yn = −n), pode ser igual a +∞ (se xn = 2n e yn = −n), pode ser −∞ (tome xn = n e yn = −2n) ou pode assumir um valor arbitr´ ario c ∈ R (por exemplo, se xn = n + c e yn = −n). Por causa desse comportamento err´atico, diz-se que +∞ − ∞ ´e uma express˜ao indeterminada. Nos itens (2), (3) e (4), as hip´ oteses feitas excluem os limites do tipo 0×∞ (tamb´em evitado no Teorema 7), 0/0 e ∞/∞, respectivamente, os quais constituem express˜oes indeterminadas no sentido que acabamos de explicar. Outras express˜oes indeterminadas freq¨ uentemente encontradas 0 ∞ 0 s˜ ao ∞ , 1 e 0 . Os limites mais importantes da An´ alise quase sempre se apresentam sob forma de uma express˜ao indeterminada. Por exemplo, o n´ umero e = limn→∞ (1 + 1/n)n ´e da forma 1∞ . E, como veremos mais adiante, a derivada ´e um limite do tipo 0/0. Agora, uma observa¸c˜ao sobre ordem de grandeza. Se k ∈ N e a ´e um n´ umero real > 1 ent˜ao limn→∞ nk = limn→∞ an = limn→∞ n! = limn→∞ nn . Todas estas seq¨ uˆencias tˆem limite infinito. Mas o Exemplo 9 nos diz que, para valores muito grandes de n temos nk ≪ an ≪ n! ≪ nn , onde o s´ımbolo ≪ quer dizer “´e uma fra¸c˜ao muito pequena de” ou “´e insignificante diante de”. Por isso diz-se que o crescimento exponencial supera o polinomial, o crescimento fatorial supera o exponencial com base constante mas ´e superado pelo crescimento exponencial com base ilimitadamente crescente. Por outro lado, o crescimento de nk (mesmo quando k = 1) supera o crescimento logar´ıtmico, como mostraremos agora. No Cap´ıtulo 11 provaremos a existˆencia de uma fun¸c˜ao crescente log : R+ → R, tal que log(xy) = log x + log y e log x < x para quaisquer √ √ √ x, y ∈ R+ . Da´ı resulta que log x = log( x · x) = 2 log x, donde √ log x = (log x)/2. Al´em disso, log x = log(1 · x) = log 1 + log x, donde log 1 = 0. Como log ´e crescente, tem-se log x > 0 para todo x > 1. Vale tamb´em log(2n ) = n · log 2, portanto limn→∞ log(2n ) = +∞. Como log ´e crescente, segue-se limn→∞ log n = +∞. Provaremos agora que lim

n→∞

log n = 0. n

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Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

Cap. 3

√ √ √ Para todo n ∈ N, temos log n < n. Como log n = 21 log n, √ segue-se que log n < 2 n. Dividindo por n resulta que 0 < log n/n < √ log n 2/ n. Fazendo n → ∞ vem lim = 0. n→∞ n

5

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Limite de uma seq¨ uˆ encia

1. Uma seq¨ uˆencia (xn ) diz-se peri´ odica quando existe p ∈ N tal que xn+p = xn para todo n ∈ N. Prove que toda seq¨ uˆencia peri´odica convergente ´e constante. 2. Dadas as seq¨ uˆencias (xn ) e (yn ), defina (zn ) pondo z2n−1 = xn e z2n = yn . Se lim xn = lim yn = a, prove que lim zn = a. 3. Se lim xn = a, prove que lim |xn | = |a|.

4. Se uma seq¨ uˆencia mon´otona tem uma subseq¨ uˆencia convergente, prove que a seq¨ uˆencia ´e, ela pr´opria, convergente. 5. Um n´ umero a chama-se valor de aderˆencia da seq¨ uˆencia (xn ) quando ´e limite de uma subseq¨ uˆencia de (xn ). Para cada um dos conjuntos A, B e C abaixo ache uma seq¨ uˆencia que o tenha como conjunto dos seus valores de aderˆencia. A = {1, 2, 3}, B = N, C = [0, 1]. 6. A fim de que o n´ umero real a seja valor de aderˆencia de (xn ) ´e necess´ario e suficiente que, para todo ε > 0 e todo k ∈ N dados, exista n > k tal que |xn − a| < ε.

7. A fim de que o n´ umero real b n˜ao seja valor de aderˆencia da seq¨ uˆencia (xn ) ´e necess´ario e suficiente que existam n0 ∈ N e ε > 0 tais que n > n0 ⇒ |xn − b| ≥ ε. Se¸ c˜ ao 2:

Limites e desigualdades

1. Se lim xn = a, lim yn = b e |xn − yn | ≥ ε para todo n ∈ N, prove que |a − b| ≥ ε.

2. Sejam lim xn = a e lim yn = b. Se a < b, prove que existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn < yn .

3. Se o n´ umero real a n˜ao ´e o limite da seq¨ uˆencia limitada (xn ), prove que alguma subseq¨ uˆencia de (xn ) converge para um limite b 6= a.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

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4. Prove que uma seq¨ uˆencia limitada converge se, e somente se, possui um u ´nico valor de aderˆencia. 5. Quais s˜ ao os valores de aderˆencia da seq¨ uˆencia (xn ) tal que x2n−1 = n e x2n = 1/n? Esta seq¨ uˆencia converge? 6. Dados a, b ∈√R+ , defina indutivamente as seq¨ uˆencias (xn ) e (yn ) √ pondo x1 = ab, y1 = (a + b)/2 e xn+1 = xn yn , yn+1 = (xn + yn )/2. Prove que (xn ) e (yn ) convergem para o mesmo limite. 7. Diz-se que (xn ) ´e uma seq¨ uˆencia de Cauchy quando, para todo ε > 0 dado, existe n0 ∈ N tal que m, n > n0 ⇒ |xm − xn | < ε. (a) Prove que toda seq¨ uˆencia de Cauchy ´e limitada.

(b) Prove que uma seq¨ uˆencia de Cauchy n˜ao pode ter dois valores de aderˆencia distintos. (c) Prove que uma seq¨ uˆencia (xn ) ´e convergente se, e somente se, ´e de Cauchy. Se¸ c˜ ao 3:

Opera¸ co ˜es com limites

1. Prove que, para todo p ∈ N, tem-se limn→∞



n+p

n = 1.

2. Se existem ε > 0 e k ∈ N tais que ε ≤ xn ≤ nk para todo n sufici√ entemente grande, prove que lim n xn = 1. Use este fato para calp √ √ √ √ cular limn→∞ n n + k, lim n n + n, lim n log n e lim n n log n. √ 3. Dado a > 0, defina indutivamente a seq¨ uˆencia (xn ) pondo x1 = a √ e xn+1 = a + xn . Prove que (xn ) ´e convergente e calcule seu limite r q √ L = a + a + a + ··· √ √ 4. Seja en = (xn − a)/ a o erro relativo na n-´esima etapa do c´alculo √ de a. Prove que en+1 = e2n /2(1 + en ). Conclua que en ≤ 0, 01 ⇒ en+1 ≤ 0, 00005 ⇒ en+2 ≤ 0, 00000000125 e observe a rapidez de convergˆencia do m´etodo.

5. Dado a > 0, defina indutivamente a seq¨ uˆencia (xn ) pondo x1 = 1/a e xn+1 = 1/(a + xn ). Considere o n´ umero c, raiz positiva da 2 equa¸c˜ao x +ax−1 = 0, u ´nico n´ umero positivo tal que c = 1/(a+c). Prove que x2 < x4 < · · · < x2n < · · · < c < · · · < x2n−1 < · · · < x3 < x1 ,

36

Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

Cap. 3

e que lim xn = c. O n´ umero c pode ser considerado como a soma da fra¸ca ˜o cont´ınua 1 1

a+

1

a+ a+

1 a + ···

6. Dado a > 0, defina indutivamente a seq¨ uˆencia (yn ), pondo y1 = a e yn+1 = a + 1/yn . Mostre que lim yn = a + c, onde c ´e como no exerc´ıcio anterior. 7. Defina a seq¨ uˆencia (an ) indutivamente, pondo a1 = a2 = 1 e an+2 = an+1 + an para todo n ∈ N. Escreva xn = an /an+1 e prove que lim xn = c, onde c ´e o u ´nico n´ umero positivo tal que 1/(c + 1) = c. O termo a chama-se o n-´ esimo n´ umero de Fi√ n bonacci e c = (−1 + 5)/2 ´e o n´ umero de ouro da Geometria Cl´ assica. Se¸ c˜ ao 4:

Limites infinitos √ 1. Prove que lim n n! = +∞.

2. Se lim xn = +∞ e a ∈ R, prove que i hp p log(xn + a) − log xn = 0. lim n→∞

3. Dados k ∈ N e a > 0, determine o limite lim

n→∞

n! · nk · an

Supondo a > 0 e a 6= e calcule an · n! n→∞ nn lim

e

nk · an · n! · n→∞ nn lim

(Para o caso a = e, ver exerc´ıcio 9, se¸c˜ao 1, cap´ıtulo 11.) 4. Mostre que limn→∞ log(n + 1)/ log n = 1.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

37

5. Sejam (xn ) uma seq¨ uˆencia arbitr´ aria e (yn ) uma seq¨ uˆencia crescente, com lim yn = +∞. Supondo que lim(xn+1 −xn )/(yn+1 − yn ) = a, prove que lim xn /yn = a. Conclua que se lim(xn+1 −xn ) = a ent˜ao lim xn /n = a. Em particular, de lim log(1 + 1/n) = 0, conclua que lim(log n)/n = 0. 6. Se lim xn = a e (tn ) ´e uma seq¨ uˆencia de n´ umeros positivos com lim(t1 + · · · + tn ) = +∞, prove que

t1 x1 + · · · + tn xn = a. t1 + · · · + tn x1 + · · · + xn , tem-se ainda lim yn = a. Em particular, se yn = n lim

4 S´ eries Num´ ericas

Uma s´erie ´e uma soma s = a1 + a2 + · · · + an + · · · com um n´ umero infinito de parcelas. Para que isto fa¸ca sentido, poremos s = limn→∞ (a1+ · · ·+an). Como todo limite, este pode existir ou n˜ao. Por isso h´a s´eries convergentes e s´eries divergentes. Aprender a distinguir umas das outras ´e a principal finalidade deste cap´ıtulo.

1

S´ eries convergentes

Dada uma seq¨ uˆencia (an ) de n´ umeros reais, a partir dela formamos uma nova seq¨ uˆencia (sn ) onde s1 = a1 ,

s2 = a1 + a2 ,

...,

sn = a1 + a2 + · · · + an , etc.

umeros sn chamam-se as reduzidas ou somas parciais da s´erie P Os n´ an . A parcela an ´e o n-´esimo termo ou termo geral da s´erie.P Se existir o limite erie an ´e n→∞ sn , diremos que a s´ P s = lim P∞ convergente e s = an = a = a + a + · · · + a + · · · 1 2 n n=1 n P ser´a chamado a soma da s´erie. Se lim sn n˜ao existir, diremos que an ´e uma s´erie divergente. ` vezes ´e conveniente considerar s´eries do tipo P∞ an , que comeAs n=0 c¸am com a0 em vez de a1 . Exemplo 1. Como j´a vimos (Exemplos 11 e 12, Cap´ıtulo 3), quando |a| < 1 a s´erie geom´etrica 1 + a + a2 + · · · + an + · · · ´e convergente, com

Se¸c˜ ao 1

S´ eries convergentes

39

soma igual a 1/(1 − a), e a s´erie 1 + 1 + 1/2! + · · · + 1/n! + · · · tamb´em converge, com soma igual a e. Exemplo 2. A s´erie 1 − 1 + 1 − 1 + · · · , de termo geral (−1)n+1 , ´e divergente pois a soma parcial sn ´e igual a zero quando n ´e par, e igual a 1 quando n ´e ´ımpar. Portanto n˜ao existe lim sn . P Exemplo 3. A s´erie 1/n(n+1), cujo termo geral ´e an = 1/n(n+1) = 1/n − 1/(n + 1), tem n-´esima soma parcial       1 1 1 1 1 1 + − + ··· + − =1− · sn = 1 − 2 2 3 n n+1 n+1 P Portanto lim sn = 1, isto ´e, 1/n(n + 1) = 1. P Se an ≥ 0 para todo n ∈ N, as reduzidas da s´erie an formam P uma seq¨ uˆencia n˜ao-decrescente. Portanto uma s´erie an , de termos n˜ao-negativos, converge se, e somente se, existe uma constante k tal que N. Por isso usaremos a nota¸c˜ao P a1 + · · · + an ≤ k para todo n ∈ P an < +∞ para significar que a s´erie an , com an ≥ 0, ´e convergente. ′ uˆencia de (an ) ent˜ao P Se an ≥ 0 para todo P n′ ∈ N e (an ) ´e uma subseq¨ an < +∞ implica an < +∞. P Exemplo 4. (A s´erie harmˆ onica.) A s´eP rie 1/n ´e divergente. De fato, P P se 1/n = s fosse convergente ent˜ao 1/2n = t e 1/(2n − 1) = u tamb´em seriam convergentes. Al´em disso, + un , fazendo Pcomo s2n = tn P n → ∞ ter´ıamos s = t + u. Mas t = 1/2n = (1/2) 1/n = s/2, portanto u = t = s/2. Por outro lado   1 1 1 1 1  u − t = lim (un − tn ) = lim 1 − + − + · · · + − n→∞ n→∞ 2 3 4 2n − 1 2n   1 1 1 1 = lim + + + ··· + > 0, n→∞ 1.2 3.4 5.6 (2n − 1)2n logo u > t. Contradi¸c˜ao. P P Teorema 1. (Crit´ erio de compara¸ c˜ ao.) Sejam an e bn s´eries de termos n˜ ao-negativos. Se existem c > 0 e n ∈ N tais que a n ≤ P0 Pcbn para todo n > n0 ent˜ ao aPconvergˆencia de P bn implica a de an enquanto a divergˆencia de an implica a de bn . Demonstra¸ c˜ ao: Sem perda de generalidade, podemos P supor P an ≤ cbn para todo n ∈ N. Ent˜ao as reduzidas sn e tn , de an e bn respectivamente, formam seq¨ uˆencias n˜ao-decrescentes tais que sn ≤ ctn para

40

S´ eries num´ ericas

Cap. 4

todo n ∈ N. Como c > 0, (tn ) limitada implica (sn ) limitada e (sn ) ilimitada implica (tn ) ilimitada, pois tn ≥ sn /c. P Exemplo 5. Se r > 1, a P s´erie 1/nr converge. Com efeito, seja c a ∞ 2 n soma da s´erie etrica n=0 ( 2r ) . Mostraremos que toda reduzida P geom´ sm da s´erie 1/nr ´e < c. Seja n tal que m ≤ 2n − 1. Ent˜ao     1 1 1 1 1 1 sm ≤ 1 + + r + + r+ r+ r + 2r 3 4r 5 6 7   1 1 + ··· + , + ··· + n (2n−1 )r (2 − 1)r n−1 X  2 i 4 2n−1 2 < c. sm < 1 + r + r + · · · + (n−1)r = 2 4 2r 2 i=0

que

Como a s´erie harmˆonica diverge, resulta do crit´erio de compara¸c˜ao P 1/nr diverge quando r < 1 pois, neste caso, 1/nr > 1/n.

Teorema 2. O termo geral de uma s´erie convergente tem limite zero. P Demonstra¸ c˜ ao: Se a s´erie an ´e convergente ent˜ao, pondo sn = a1 + · · · + an , existe s = limn→∞ sn . Consideremos a seq¨ uˆencia (tn ), com t1 = 0 e tn = sn−1 quando n > 1. Evidentemente, lim tn = s e sn − tn =an . Portanto lim an = lim(sn − tn )= lim sn − lim tn =s − s=0. O crit´erio contido no Teorema 2 constitui a primeira coisa a verificar quando se quer saber se uma s´erie ´e ou n˜ao convergente. Se o termo geral n˜ao tende a zero, a s´erie diverge. A s´erie harmˆonica mostra que a P condi¸c˜ao lim an = 0 n˜ao ´e suficiente para a convergˆencia de an .

2

S´ eries absolutamente convergentes

Uma s´erie verge.

P

an diz-se absolutamente convergente quando

P

|an | con-

Exemplo 6. Uma s´erie convergente cujos termos n˜ao mudam de sinal ´ePabsolutamente convergente. Quando −1 < a < 1, a s´erie geom´etrica ∞ n e absolutamente convergente, pois |an | = |a|n , com 0 ≤ |a| < 1. n=0 a ´ P P O exemplo cl´ aP ssico de uma s´erie convergente an tal que |an | = +∞ ´e dado por (−1)n+1 /n = 1 − 1/2 + 1/3 − 1/4 + · · · . Quando tomamos a soma dos valores absolutos, obtemos a s´erie harmˆonica, que diverge. A convergˆencia da s´erie dada segue-se do

Se¸c˜ ao 2

S´ eries absolutamente convergentes

41

Teorema 3. (Leibniz.) Se uma seq¨ uˆencia mon´ otona decrescente P(an ) ´en+1 que tende para zero ent˜ ao (−1) an ´e uma s´erie convergente.

Demonstra¸ c˜ ao: Seja sn = a1 − a2 + · · · + (−1)n+1 an . Ent˜ao s2n = s2n−2 + a2n−1 − a2n e s2n+1 = s2n−1 − a2n + a2n+1 . Logo as reduzidas de ordem par formam uma seq¨ uˆencia n˜ao-decrescente (pois a2n−1 −a2n ≥ 0) e as de ordem ´ımpar uma seq¨ uˆencia n˜ao-crescente (pois −a2n + a2n+1 ≤ 0). Al´em disso, como s2n = s2n−1 − a2n , temos s2n−1 − s2n = a2n ≥ 0. Isto mostra que s2 ≤ s4 ≤ · · · ≤ s2n ≤ · · · ≤ s2n−1 ≤ · · · ≤ s3 ≤ s1

e lim s2n = lim s2n−1 pois lim an = 0. Logo (sn ) converge e o teorema est´a provado. P Exemplo 7. Pelo Teorema 3, a s´erie (−1)n+1 log(1 + 1/n) ´e convergente. Mas elaP n˜ao ´e absolutamente P convergente pois a reduzida de ordem n da s´erie log(1 + 1/n) = log[(n + 1)/n] ´e 4 n + 1 3 + log + · · · + log 2 3 n = log 2 + log 3 − log 2 + log 4 − log 3 + · · · + log(n + 1) − log n

sn = log 2 + log

= log(n + 1).

Portanto lim sn = +∞. Uma s´erie convergente cionalmente convergente.

P

an tal que

P

|an | = +∞ chama-se condi-

O teorema seguinte pode ser interpretado assim: se tomarmos uma s´erie convergente cujos termos s˜ ao todos ≥ 0 e, de uma maneira completamente arbitr´ aria, trocarmos os sinais de alguns dos seus termos (mesmo um n´ umero infinito deles), obteremos ainda uma s´erie convergente. Teorema 4. Toda s´erie absolutamente convergente ´e convergente. P Demonstra¸ c˜ ao: Seja |an | convergente. Para cada n ∈ N, definamos os n´ umeros pn e qn , pondo pn = an se an ≥ 0 e pn = 0 se an < 0; analogamente, qn = −an se an ≤ 0 e qn = 0 se an > 0. Os n´ umeros pn e qn chamam-se, respectivamente, a parte positiva e a parte negativa de an . Ent˜ao pn ≥ 0, qn ≥ 0, pn + qn = |an | (em particular, pn ≤ |an | e qn ≤ |an |) e pn − qn = an . (Note que, para cada n ∈ N,Ppelo menos P um dos n´ umeros pn , qn ´e zero.) Pelo Teorema 1, as s´eries pn e qn

42

S´ eries num´ ericas

Cap. 4

P P s˜ a o convergentes. Logo ´ e convergente a s´ e rie a = (pn − qn ) = n P P pn − qn . P Dada a s´erie an , definimos acima os n´ umeros, pn = max{anP , 0} e qn = max{−an , 0}, a parte positiva e a parte negativa de a . Se an n P P ´e condicionalmente convergente, deve-se ter pn = +∞ e qn = +∞. Com efeito, se apenas uma destas duas s´ e ries (digamos, a primeira) P P P convergisse, ter´ ıamos a = p − q = s − ∞ = −∞. E se ambas, n n P P Pn P P qn , convergissem, ter´ıamos |an | = pn + qn < +∞ e P pn e an seria absolutamente convergente.

3

Testes de convergˆ encia

P Teorema 5. Seja bn uma s´erie absolutamente convergente, com bn 6= 0 para todo n ∈ N. Se a seq¨ uˆencia P(an /bn ) for limitada (em particular, se for convergente) ent˜ ao a s´erie an ser´ a absolutamente convergente. Demonstra¸ c˜ ao: Se, para algum c > 0, tivermos |an /bn | ≤ c seja qual for n ∈P N ent˜ao |an | ≤ c|bn |. Pelo crit´erio de compara¸c˜ao (Teorema 1), a s´erie an ´e absolutamente convergente.

Corol´ ario. (Teste de d’Alembert.) Seja an 6= 0 para todo n ∈ N. Se existir uma constante c tal que |an+1 /an | ≤ c < 1 para todo n suficientemente grande (em particular, se lim |an+1 /an | < 1) ent˜ ao a P s´erie an ser´ a abolutamente convergente.

Com efeito, se, para todo n suficientemente grande vale |an+1 |/|an | ≤ c = cn+1 /cn , ent˜ao |an+1 |/cn+1 ≤ |an |/cn . Assim a seq¨ uˆencia de n´ umeros n˜ao-negativos |an |/cn ´e n˜ao-crescente a partir de uma certa ordem, logo P n ´e limitada. Como aPs´erie c ´e absolutamente convergente, segue-se do Teorema 5 que an converge absolutamente. No caso particular de existir lim |an+1 /an | = L < 1, escolhemos um n´ umero c tal que L < c < 1 e teremos |an+1 /an | < c para todo n suficientemente grande (Teorema 5 do Cap´ıtulo 3). Ent˜ao reca´ımos no caso j´a demonstrado. Observa¸ c˜ ao. Quando se aplica o teste de d’Alembert, usualmente se procura calcular lim |an+1 /an | = L. Se L > 1 ent˜ao a s´erie diverge pois se tem |an+1 /an | > 1, donde |an+1 | > |an | para todo n suficientemente grande e da´ı resulta que o termo geral an n˜ao tende para zero. Se PL = 21, o teste ´e inconclusivo. A s´ erie pode convergir (como no caso 1/n ) P ou divergir (como no caso 1/n).

Se¸c˜ ao 3

Testes de convergˆ encia

43

2 − 3n + 1). Considerando a s´ Exemplo erie converP 8.2 Seja an = 1/(n 2 2 2 gente (1/n ), como P lim[n /(n −3n+1)] = lim[1/(1−3/n+1/n )] = 1, conclu´ımos que an ´e convergente.

Exemplo 9. Segue-se P do Exemplo ıtulo 3 e do teste de P 9 do Cap´ P d’Alembert que as s´eries (an /n!), (n!/nn ) e (nk /an ), esta u ´ltima com a > 1, s˜ ao convergentes.

Teorema 6. (Teste de Cauchy.) Quando existe um n´ umero real c tal p n que |an | ≤ c 1, a s´erie an diverge. Com efeito, neste caso, tem-se p n |an | > P1 para todo n suficientemente grande, donde |an | > 1, logo a s´erie an diverge pois seu termo geral n˜ ao tende a zero. Quando P L = 1, a s´erie pode divergir (como no caso 1/n) ou convergir (como P 1/n2 ). √ n n Exemplo 10. P Seja an = (log n/n) . Como an = log n/n tende a zero, a s´erie an ´e convergente. O teorema seguinte relaciona os testes de d’Alembert e Cauchy.

Teorema 7. Seja (an ) uma seq¨ uˆenciapcujos termos s˜ ao diferentes de zero. Se lim |an+1 |/|an | = L ent˜ ao lim n |an | = L.

Demonstra¸ c˜ ao: Para simplificar a nota¸c˜ao, suporemos que an > 0 para todo n ∈ N. Dado ε > 0, fixemos n´ umeros positivos K, M tais que L − ε < K < L < M < L + ε. Existe p ∈ N tal que n ≥ p ⇒ K < an+1 /an < M . Multiplicando membro a membro as n − p desigualdades K < ap+i /ap+i−1 < M , i = 1, . . . , n − p, obtemos K n−p < an /ap < M n−p para todo n > p. Ponhamos α = ap /K p e β = ap /M p√ . Ent˜ao √ √ K n α < an < M n β. Extraindo ra´ızes, vem K n α < n an < M n β para √ todo n√> p. Levando em conta que L − ε < K, M < L + ε, lim n α = 1 e lim n β =√1, conclu´ımos que existe n0 > p tal que n > n0 ⇒ L − ε < √ √ K n α e M n β < L + ε. Ent˜ao n > n0 ⇒ L − ε < n an < L + ε, o que

44

S´ eries num´ ericas

Cap. 4

prova o teorema quando L > 0. Se L = 0, basta considerar M em vez de K e M . √ Exemplo 11. Resulta do√Teorema 7 que lim n/ n n! = e. Com efeito, √ pondo an = nn /n! vem n/ n n! = n an . Ora   an+1 n+1 n (n + 1)n+1 n! (n + 1)(n + 1)n n! = · n = · n = , an (n + 1)! n (n + 1) · n! n n √ logo lim(an+1 /an ) = e, e da´ı lim n an = e.

4

Comutatividade

P Uma s´erie an diz-se comutativamente convergenteP quando, para qualquer bije¸c˜ao ϕ : N → N, pondo bn = aϕ(n) , a s´erieP bn ´e convergente. (Em particular, tomando ϕ(n) = n, vemos que an ´e convergente.) P Resulta do que mostraremos a seguir que se a ´ e comutativamente n P P convergente ent˜ao bn = an qualquer que seja a bije¸ c˜ao ϕ. Esta ´e a P maneira precisa de afirmar que a soma an n˜ao depende da ordem das parcelas. Mas isto nem sempre ocorre. Exemplo 12. A s´erie 1−

1 1 1 + − + ··· 2 3 4

converge para a soma s > 0, mas n˜ao comutativamente. Com efeito, temos s 1 1 1 1 = − + − + ··· . 2 2 4 6 8 Podemos ent˜ao escrever 1 1 1 1 1 1 1 + − + − + − + ··· 2 3 4 5 6 7 8 s 1 1 1 1 = 0 + + 0 − + 0 + + 0 − + ··· · 2 2 4 6 8 s=1−

Somando termo a termo vem 1 1 1 1 1 1 1 1 3s =1+ − + + − + + − + ··· . 2 3 2 5 7 4 9 11 6 A s´erie acima, cuja soma ´e 3s/2, tem os mesmos termos da s´erie inicial, cuja soma ´e s, apenas com uma mudan¸ca na sua ordem.

Se¸c˜ ao 4

Comutatividade

45

P Teorema 8. Se an ´e absolutamente convergente ao para toda P Pent˜ bije¸ca ˜o ϕ : N → N, pondo bn = aϕ(n) , tem-se bn = an . Demonstra¸ c˜ ao: Supomos inicialmente an ≥ 0 para todo n. Escrevamos sn = a1 + · · · + an e tn = b1 + · · · + bn . Para cada n ∈ N, os n´ umeros ϕ(1), . . . , ϕ(n) pertencem todos ao conjunto {1, 2, . . . , m}, onde m ´e o maior dos ϕ(i). Ent˜ao tn =

n X i=1

aϕ(i) ≤

m X

aj = sm .

j=1

Assim, para cada n ∈ N existe m ∈ N tal que tn ≤ sm . Reciprocamente, (considerando-se ϕ−1 em vez de ϕ) para cada m ∈ P N existe P n ∈ N tal que sm ≤ tn . Segue-se lim tn =P lim sn , isto ´e, bn = an . No P que P caso geral, temos an = pn − qn , onde pn ´e a parte positiva e qn a parte negativa de an . Toda reordena¸c˜ao (bn ) dos termos an determina uma reordena¸c˜ao (un ) para os pn e uma reordena¸c˜ao (vn ) dos qn , de modo que un ´e a parte a parte P negativa de P positiva P e vnP bn . PeloPque acabamos de ver, un = pn e vn = qn . Logo P P P an = un − vn = bn . O teorema seguinte implica que somente as s´eries absolutamente convergentes s˜ ao comutativamente convergentes. Teorema 9. (Riemann.) Alterando-se convenientemente a ordem dos termos de uma s´erie condicionalmente convergente, pode-se fazer com que sua soma fique igual a qualquer n´ umero real pr´e-fixado. P Demonstra¸ c˜ ao: Seja an a s´eP rie dada. Fixado o n´ umero c, come¸camos a somar os termos positivos de an , na sua ordem natural, um a um, parando quando, ao somar an1 , a soma pela primeira vezP ultrapasse c. (Isto ´e poss´ıvel porque a soma dos termos positivos de an ´e +∞.) A esta soma acrescentamos os termos negativos, tamb´em na sua ordem natural, um a um, parando logo que, ao somar an2 (< 0), o total resulte inferior a c (o que ´e poss´ıvel porque a soma dos termos negativos ´e −∞). Prosseguindo analogamente, obtemos uma nova s´erie, cujos termos s˜ ao P os mesmos de an , numa ordem diferente. As reduzidas desta nova s´erie oscilam em torno do valor c de tal modo que (a partir da ordem n1 ) a diferen¸ca entre cada uma delas e c ´e inferior, em valor absoluto, ao termo ank ondeP houve a u ´ltima mudan¸ca de sinal. Ora, limk→∞ ank = 0 porque a s´erie an converge. Logo as reduzidas da nova s´erie convergem para c.

46

5

S´ eries num´ ericas

Cap. 4

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

S´ eries convergentes √ P P √ 1. Dadas as s´eries an e bn , com an = n + 1 − n e bn = log(1 + n1 ), mostre que lim an = lim bn = 0. Calcule explicitamente as n-´esimas reduzidas sn e tn destas s´eries e mostre que lim sn = lim tn = +∞, logo as s´eries dadas s˜ ao divergentes. P 2. Use o crit´erio de compara¸c˜ao paraPprovar que 1/n2 ´e convergente, a partir da convergˆencia de 2/n(n + 1).

3. Seja sn a n-´esima reduzida da s´erie harmˆonica. Prove que para n = 2m tem-se sn > 1 + m ı que a s´erie harmˆonica ´e 2 e conclua da´ divergente. P 1 4. Mostre que a s´erie ∞ n=2 n log n diverge. P 1 5. Mostre que se r > 1 a s´erie ∞ n=2 n(log n)r converge. P log n converge. 6. Prove que a s´erie n2 P 7. Prove: se a1 ≥ · · · ≥ an ≥ · · · e an converge ent˜ao lim nan = 0. n→∞

Se¸ c˜ ao 2: S´ eries absolutamente convergentes P 1. P Se an ´e convergente e an ≥ 0 para todo n ∈ N ent˜ao a s´erie an xn ´e absolutamente convergente para todo x ∈ [−1, 1] e X X an sen(nx), an cos(nx) s˜ ao absolutamente convergentes para todo x ∈ R.

2. A s´erie 1 − 21 + 23 − 31 + 24 − 14 + 52 − 15 + 26 − 61 + · · · tem termos alternadamente positivos e negativos e seu termo geral tende para zero. Entretanto ´e divergente. Por que isto n˜ao contradiz o Teorema de Leibniz? P 3. Dˆe exemplo de uma s´erie convergente an e de uma seq¨ uˆencia P limitada (xn ) tais que a s´erie an xn seja divergente. Examine o que ocorre se uma P das hip´ oteses seguintes for verificada: (a) (xn ) ´e convergente; (b) an ´e absolutamente convergente. 4. Prove que ´e convergente a s´erie obtida alterando-se os sinais dos termos da s´erie harmˆonica, de modo que fiquem p termos positivos (p ∈ N fixado) seguidos de p termos negativos, alternadamente.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

47

P 5. Se ∞ e absolutamente convergente e lim bn = 0, ponha cn = n=0 an ´ a0 bn + a1 bn−1 + · · · + an b0 e prove que lim cn = 0. P P 2 6. Se an ´e absolutamente convergente, prove que an converge. P P 2 P 2 an bn converge absolutabn convergem, prove que 7. Se an e mente. P 8. Prove: uma s´erie an ´e absolutamente convergente se, e somente se, ´e limitado o conjunto de todas as somas finitas formadas com os termos an . Se¸ c˜ ao 3:

Testes de convergˆ encia

p 1. Prove que se existir uma infinidade de ´ındices n tais que n |an | ≥ 1 P ent˜ao a s´erie an diverge.PSe an 6= 0 para todo n e |an+1 /an | ≥ 1 para todo n > n0 ent˜ao an diverge. Por outro lado, a s´erie 1/2 + 1/2 + 1/22 + 1/22 + 1/23 + 1/23 + · · · converge mas se tem an+1 /an = 1 para todo n ´ımpar. 2. Se 0 < a < b < 1, a s´erie a+b+a2 +b2 +a3 +b3 +· · · ´e convergente. Mostre que o teste de Cauchy conduz a este resultado mas o teste de d’Alembert ´e inconclusivo. P 3. Determine se a s´erie (log n/n)n ´e convergente usando ambos os testes, de d’Alembert e Cauchy.

4. Dada uma seq¨ uˆencia de n´ umeros positivos xn com lim xn = a, √ prove que limn→∞ n x1 x2 . . . xn = a. 5. Determine para quais valores de x cada uma das s´eries abaixo ´e convergente: X X X X X nk xn , nn xn , xn /nn , n!xn , xn /n2 . Se¸ c˜ ao 4:

Comutatividade

1. Se uma s´erie ´e condicionalmente convergente, prove que existem altera¸c˜oes da ordem dos seus termos de modo a tornar sua soma igual a +∞ e a −∞.

2. Efetue explicitamente uma reordena¸c˜ao dos termos da s´erie 1 − 1/2 + 1/3 − 1/4 + 1/5 − · · · de modo que sua soma se torne igual a zero.

48

S´ eries num´ ericas

Cap. 4

3. Diz-se que a seq¨ uˆencia (an ) ´e som´ avel, com soma s, quando, para todo ε > 0 dado, existe um subconjunto finito J0P⊂ N tal que, para todo J finito com J0 ⊂ J ⊂ N, tem-se |s − n∈J an | < ε. Prove: (a) Se a seq¨ uˆencia (an ) ´e som´avel ent˜ao, para toda bije¸c˜ao ϕ : N → N, a seq¨ uˆencia (bn ), definida por bn = aϕ(n) , ´e som´avel, com a mesma soma. (b) P Se a seq¨ uˆencia (an ) ´e som´avel, com soma s, ent˜ao a s´erie an = s ´e absolutamente convergente. P (c) Reciprocamente, se an ´e uma s´erie absolutamente convergente, ent˜ao a seq¨ uˆencia (an ) ´e som´avel.

5 Algumas No¸c˜ oes Topol´ ogicas

A Topologia ´e um ramo da Matem´ atica no qual s˜ ao estudadas, com grande generalidade, as no¸c˜oes de limite, de continuidade e as id´eias com elas relacionadas. Neste cap´ıtulo, abordaremos alguns conceitos topol´ogicos elementares referentes a subconjuntos de R, visando estabelecer a base adequada para desenvolver os cap´ıtulos seguintes. Adotaremos uma linguagem geom´etrica, dizendo “ponto” em vez de “n´ umero real”, “a reta” em vez de “o conjunto R ”.

1

Conjuntos abertos

Diz-se que o ponto a ´e interior ao conjunto X ⊂ R quando existe um n´ umero ε > 0 tal que o intervalo aberto (a − ε, a + ε) est´a contido em X. O conjunto dos pontos interiores a X chama-se o interior do conjunto X e representa-se pela nota¸c˜ao int X. Quando a ∈ int X diz-se que o conjunto X ´e uma vizinhan¸ca do ponto a. Um conjunto A ⊂ R chamase aberto quando A = int A, isto ´e, quando todos os pontos de A s˜ ao interiores a A. Exemplo 1. Todo ponto c do intervalo aberto (a, b) ´e um ponto interior a (a, b). Os pontos a e b, extremos do intervalo fechado [a, b] n˜ao s˜ ao interiores a [a, b]. O interior do conjunto Q dos n´ umeros racionais ´e vazio. Por outro lado, int[a, b] = (a, b). O intervalo fechado [a, b] n˜ao ´e uma vizinhan¸ca de a nem de b. Um intervalo aberto ´e um conjunto

50

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

aberto. O conjunto vazio ´e aberto. Todo intervalo aberto (limitado ou n˜ao) ´e um conjunto aberto. O limite de uma seq¨ uˆencia pode ser reformulado em termos de conjuntos abertos: tem-se a = lim xn se, e somente se, para todo aberto A contendo a existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ xn ∈ A. Teorema 1. a) Se A1 e A2 s˜ ao conjuntos abertos ent˜ ao a interse¸ca ˜o A1 ∩ A2 ´e um conjunto aberto. b) Se (ASλ )λ∈L ´e uma fam´ılia qualquer de conjuntos abertos, a reuni˜ ao A = λ∈L Aλ ´e um conjunto aberto.

Demonstra¸ c˜ ao: a) Se x ∈ A1 ∩ A2 ent˜ao x ∈ A1 e x ∈ A2 . Como A1 e A2 s˜ ao abertos, existem ε1 > 0 e ε2 > 0 tais que (x − ε1 , x + ε1 ) ⊂ A1 e (x − ε2 , x + ε2 ) ⊂ A2 . Seja ε o menor dos dois n´ umeros ε1 , ε2 . Ent˜ao (x − ε, x + ε) ⊂ A1 e (x − ε, x + ε) ⊂ A2 logo (x − ε, x + ε) ⊂ A1 ∩ A2 . Assim todo ponto x ∈ A1 ∩ A2 ´e um ponto interior, ou seja, o conjunto A1 ∩ A2 ´e aberto. b) Se x ∈ A ent˜ao existe λ ∈ L tal que x ∈ Aλ . Como Aλ ´e aberto, existe ε > 0 tal que (x − ε, x + ε) ⊂ Aλ ⊂ A, logo todo ponto x ∈ A ´e interior, isto ´e, A ´e aberto. Exemplo 2. Resulta imediatamente de a) no Teorema 1 que a interse¸c˜ao A1 ∩ · · · ∩ An de um n´ umero finito de conjuntos abertos ´e um conjunto aberto. Mas, embora por b) a reuni˜ao de uma infinidade de conjuntos abertos seja ainda aberta, a interse¸c˜ao de um n´ umero infinito de abertos pode n˜ao ser aberta. Por exemplo, se A1 = (−1, 1), A2 = (−1/2, 1/2), . . . , An = (−1/n, 1/n), . . . ent˜ao A1 ∩ A2 ∩ · · · ∩ An ∩ · · · = {0}. Com efeito, se x 6= 0 ent˜ao existe n ∈ N tal que |x| > 1/n logo x ∈ / An , donde x ∈ / A.

2

Conjuntos fechados

Diz-se que um ponto a ´e aderente ao conjunto X ⊂ R quando a ´e limite de alguma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X. Evidentemente, todo ponto a ∈ X ´e aderente a X: basta tomar xn = a para todo n ∈ N. Chama-se fecho de um conjunto X ao conjunto X formado por todos os pontos aderentes a X. Tem-se X ⊂ X. Se X ⊂ Y ent˜ao X ⊂ Y . Um conjunto X diz-se fechado quando X = X, isto ´e, quando todo ponto

Se¸c˜ ao 2

Conjuntos fechados

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aderente a X pertence a X. Seja X ⊂ Y . Diz-se que X ´e denso em Y quando Y ⊂ X, isto ´e, quando todo b ∈ Y ´e aderente a X. Por exemplo, Q ´e denso em R. Teorema 2. Um ponto a ´e aderente ao conjunto X se, e somente se, toda vizinhan¸ca de a cont´em algum ponto de X. Demonstra¸ c˜ ao: Seja a aderente a X. Ent˜ao a = lim xn , onde xn ∈ X para todo n ∈ N. Dada uma vizinhan¸ca qualquer V ∋ a temos xn ∈ V para todo n suficientemente grande (pela defini¸c˜ao de limite), logo V ∩ X 6= ∅. Reciprocamente, se toda vizinhan¸ca de a cont´em pontos de X podemos escolher, em cada intervalo (a − 1/n, a + 1/n), n ∈ N, um ponto xn ∈ X. Ent˜ao |xn − a| < 1/n, logo lim xn = a e a ´e aderente a X. Pelo teorema acima, a fim de que um ponto a n˜ao perten¸ca a X ´e necess´ario e suficiente que exista uma vizinhan¸ca V ∋ a tal que V ∩ X = ∅. Corol´ ario. O fecho de qualquer conjunto ´e um conjunto fechado. (Ou seja, X = X para todo X ⊂ R.)

Com efeito, se a ´e aderente a X ent˜ao todo conjunto aberto A contendo a cont´em algum ponto b ∈ X. A ´e uma vizinhan¸ca de b. Como b ´e aderente a X, segue-se que A cont´em algum ponto de X. Logo qualquer ponto a, aderente a X, ´e tamb´em aderente a X, isto ´e, a ∈ X. Teorema 3. Um conjunto F ⊂ R ´e fechado se, e somente se, seu complementar A = R − F ´e aberto.

Demonstra¸ c˜ ao: Sejam F fechado e a ∈ A, isto ´e, a ∈ / F . Pelo Teorema 2, existe alguma vizinhan¸ca V ∋ a que n˜ao cont´em pontos de F , isto ´e, V ⊂ A. Assim, todo ponto a ∈ A ´e interior a A, ou seja, A ´e aberto. Reciprocamente, se o conjunto A ´e aberto e o ponto a ´e aderente a F = R − A ent˜ao toda vizinhan¸ca de a cont´em pontos de F , logo a n˜ao ´e interior a A. Sendo A aberto, temos a ∈ / A, ou seja, a ∈ F . Assim, todo ponto a aderente a F pertence a F , logo F ´e fechado. Teorema 4. a) Se F1 e F2 s˜ ao fechados ent˜ ao F1 ∪ F2 ´e fechado.

b) Se (Fλ )λ∈L ´e uma ao a T fam´ılia qualquer de conjuntos fechados ent˜ interse¸ca ˜o F = λ∈L Fλ ´e um conjunto fechado.

52

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

Demonstra¸ c˜ ao: a) Os conjuntos A1 = R − F1 e A2 = R − F2 s˜ ao abertos, pelo Teorema 3. Logo, pelo Teorema 1, A1 ∩ A2 = R − (F1 ∪ F2 ) ´e aberto. Novamente pelo Teorema 3, F1 ∪ F2 ´e fechado. S b) Para cada λ ∈ L, Aλ = R − Fλ ´e aberto. Segue-se que A = λ∈L Aλ ´e aberto. Mas A = R − F . Logo F ´e fechado. Exemplo 3. Seja X ⊂ R limitado, n˜ao-vazio. Ent˜ao a = inf X e b = sup X s˜ ao aderentes a X. Com efeito, para todo n ∈ N, podemos escolher xn ∈ X com a ≤ xn < a + 1/n, logo a = lim xn . Analogamente, vˆe-se que b = lim yn , yn ∈ X. Em particular, a e b s˜ ao aderentes a (a, b).

Exemplo 4. O fecho dos intervalos (a, b), [a, b) e (a, b] ´e o intervalo [a, b]. Q ´e denso em R e, para todo intervalo I, Q ∩ I ´e denso em I. Uma reuni˜ao infinita de conjuntos fechados pode n˜ao ser um conjunto fechado; com efeito, todo conjunto (fechado ou n˜ao) ´e reuni˜ao dos seus pontos, que s˜ ao conjuntos fechados. Uma cis˜ ao de um conjunto X ⊂ R ´e uma decomposi¸c˜ao X = A ∪ B tal que A ∩ B = ∅ e A ∩ B = ∅, isto ´e, nenhum ponto de A ´e aderente a B e nenhum ponto de B ´e aderente a A. (Em particular, A e B s˜ ao disjuntos.) A decomposi¸c˜ao X = X ∪ ∅ chama-se a cis˜ ao trivial. Exemplo 5. Se X = R−{0}, ent˜ao X = R+ ∪R− ´e uma cis˜ ao. Dado um n´ umero irracional α, sejam A = {x ∈ Q; x < α} e B = {x ∈ Q; x > α}. A decomposi¸c˜ao Q = A ∪ B ´e uma cis˜ ao do conjunto Q dos racionais. Por outro lado, se a < c < b, ent˜ao [a, b] = [a, c] ∪ (c, b] n˜ao ´e uma cis˜ ao.

Teorema 5. Um intervalo da reta s´ o admite a cis˜ ao trivial. Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos, por absurdo, que o intervalo I admita a cis˜ ao n˜ao trivial I = A ∪ B. Tomemos a ∈ A, b ∈ B, digamos com a < b, logo [a, b] ⊂ I. Seja c o ponto m´edio do intervalo [a, b]. Ent˜ao c ∈ A ou c ∈ B. Se c ∈ A, poremos a1 = c, b1 = b. Se c ∈ B, escreveremos a1 = a, b1 = c. Em qualquer caso, obteremos um intervalo [a1 , b1 ] ⊂ [a, b], com b1 − a1 = (b − a)/2 e a1 ∈ A, b1 ∈ B. Por sua vez, o ponto m´edio de [a1 , b1 ] o decomp˜oe em dois intervalos fechados justapostos de comprimento (b − a)/4. Um desses intervalos, que chamaremos [a2 , b2 ], tem a2 ∈ A e b2 ∈ B. Prosseguindo analogamente, obteremos uma seq¨ uˆencia de intervalos encaixados [a, b] ⊃ [a1 , b1 ] ⊃ · · · ⊃ [an , bn ] ⊃ · · · com bn − an = (b − a)/2n , an ∈ A e bn ∈ B para todo n ∈ N. Pelo Teorema 4, Cap´ıtulo 2, existe d ∈ R tal que an ≤ d ≤ bn para todo n ∈ N. O ponto d ∈ I = A∪B n˜ao pode estar em A pois d = lim bn ∈ B, nem em B pois d = lim an ∈ A. Contradi¸c˜ao.

Se¸c˜ ao 3

Pontos de acumula¸c˜ ao

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Corol´ ario. Os u ´nicos subconjuntos de R que s˜ ao simultaneamente abertos e fechados s˜ ao ∅ e R. Com efeito, se A ⊂ R ´e aberto e fechado, ent˜ao R = A ∪ (R − A) ´e uma cis˜ ao, logo A = ∅ e R − A = R ou ent˜ao A = R e R − A = ∅.

3

Pontos de acumula¸c˜ ao

Diz-se que a ∈ R ´e ponto de acumula¸ca ˜o do conjunto X ⊂ R quando toda vizinhan¸ca V de a cont´em algum ponto de X diferente do pr´oprio a. (Isto ´e, V ∩ (X − {a}) 6= ∅.) Equivalentemente: para todo ε > 0 tem-se (a − ε, a + ε) ∩ (X − {a}) 6= ∅. Indica-se com X ′ o conjunto dos pontos de acumula¸c˜ao de X. Portanto, a ∈ X ′ ⇔ a ∈ X − {a}. Se a ∈ X n˜ao ´e ponto de acumula¸c˜ao de X, diz-se que a ´e um ponto isolado de X. Isto significa que existe ε > 0 tal que a ´e o u ´nico ponto de X no intervalo (a − ε, a + ε). Quando todos os pontos do conjunto X s˜ ao isolados, X chama-se um conjunto discreto. Teorema 6. Dados X ⊂ R e a ∈ R, as seguintes afirma¸co ˜es s˜ ao equivalentes: (1) a ´e um ponto de acumula¸ca ˜o de X; (2) a ´e limite de uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a};

(3) Todo intervalo aberto de centro a cont´em uma infinidade de pontos de X.

Demonstra¸ c˜ ao: Supondo (1), para todo n ∈ N podemos achar um ponto xn ∈ X, xn 6= a, na vizinhan¸ca (a−1/n, a+1/n). Logo lim xn = a, o que prova (2). Por outro lado, supondo (2), ent˜ao, para qualquer n0 ∈ N, o conjunto {xn ; n > n0 } ´e infinito porque do contr´ario existiria um termo xn1 que se repetiria infinitas vezes e isto forneceria uma seq¨ uˆencia constante com limite xn1 6= a. Pela defini¸c˜ao de limite, vˆe-se portanto que (2) ⇒ (3). Finalmente, a implica¸c˜ao (3) ⇒ (1) ´e ´obvia. Exemplo 6. Se X ´e finito ent˜ao X ′ = ∅ (conjunto finito n˜ao tem ponto de acumula¸c˜ao). Z ´e infinito mas todos os pontos de Z s˜ ao isolados. Q′ = R. Se X = (a, b) ent˜ao X ′ = [a, b]. Se X = {1, 1/2, . . . , 1/n, . . . } ent˜ao X ′ = {0}, isto ´e, 0 ´e o u ´nico ponto de acumula¸c˜ao de X. Note que todos os pontos deste conjunto X s˜ ao isolados (X ´e discreto). Segue-se uma vers˜ao do Teorema de Bolzano-Weierstrass em termos de ponto de acumula¸c˜ao.

54

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

Teorema 7. Todo conjunto infinito limitado de n´ umeros reais admite pelo menos um ponto de acumula¸ca ˜o. Demonstra¸ c˜ ao: Seja X ⊂ R infinito limitado. X possui um subconjunto enumer´avel {x1 , x2 , . . . , xn , . . . }. Fixando esta enumera¸c˜ao, temos uma seq¨ uˆencia (xn ) de termos dois a dois distintos, pertencentes a X, portanto uma seq¨ uˆencia limitada, a qual, pelo Teorema de Bolzano-Weierstrass, possui uma subseq¨ uˆencia convergente. Desprezando os termos que est˜ao fora dessa subseq¨ uˆencia e mudando a nota¸c˜ao, podemos admitir que (xn ) converge. Seja a = lim xn . Como os termos xn s˜ ao todos distintos, no m´ aximo um deles pode ser igual a a. Descartando-o, caso exista, teremos a como limite de uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a}, logo a ∈ X ′ .

4

Conjuntos compactos

Um conjunto X ⊂ R chama-se compacto quando ´e limitado e fechado. Todo conjunto finito ´e compacto. Um intervalo do tipo [a, b] ´e um conjunto compacto. Por outro lado, (a, b) ´e limitado mas n˜ao ´e fechado, logo n˜ao ´e compacto. Tamb´em Z n˜ao ´e compacto pois ´e ilimitado, embora seja fechado (seu complementar R − Z ´e a reuni˜ao dos intervalos abertos (n, n + 1), n ∈ Z, logo ´e um conjunto aberto). Teorema 8. Um conjunto X ⊂ R ´e compacto se, e somente se, toda seq¨ uˆencia de pontos em X possui uma subseq¨ uˆencia que converge para um ponto de X. Demonstra¸ c˜ ao: Se X ⊂ R ´e compacto, toda seq¨ uˆencia de pontos de X ´e limitada, logo (por Bolzano-Weierstrass) possui uma subseq¨ uˆencia convergente, cujo limite ´e um ponto de X (pois X ´e fechado). Reciprocamente, seja X ⊂ R um conjunto tal que toda seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X possui uma subseq¨ uˆencia que converge para um ponto de X. Ent˜ao X ´e limitado porque, do contr´ario, para cada n ∈ N poder´ıamos encontrar xn ∈ X com |xn | > n. A seq¨ uˆencia (xn ), assim obtida, n˜ao possuiria subseq¨ uˆencia limitada, logo n˜ao teria subseq¨ uˆencia convergente. Al´em disso, X ´e fechado pois do contr´ario existiria um ponto a ∈ / X com a = lim xn , onde cada xn ∈ X. A seq¨ uˆencia (xn ) n˜ao possuiria ent˜ao subseq¨ uˆencia alguma convergindo para um ponto de X pois todas suas subseq¨ uˆencias teriam limite a. Logo X ´e compacto.

Se¸c˜ ao 4

Conjuntos compactos

55

Observa¸ c˜ ao. Se X ⊂ R ´e compacto ent˜ao, pelo Exemplo 3, a = inf X e b = sup X pertencem a X. Assim, todo conjunto compacto cont´em um elemento m´ınimo e um elemento m´ aximo. Ou seja, X compacto ⇒ ∃ x0 , x1 ∈ X tais que x0 ≤ x ≤ x1 para todo x ∈ X. O teorema a seguir generaliza o princ´ıpio dos intervalos encaixados.

Teorema 9. Dada uma seq¨ uˆencia decrescente X1 ⊃ X2 ⊃ · · · ⊃ Xn ⊃ · · · de conjuntos compactos n˜ ao-vazios, existe (pelo menos) um n´ umero real que pertence a todo os Xn . Demonstra¸ c˜ ao: Definamos uma seq¨ uˆencia (xn ) escolhendo, para cada n ∈ N, um ponto xn ∈ Xn . Esta seq¨ uˆencia est´a no compacto X1 , logo possui uma subseq¨ uˆencia (xn1 , xn2 , . . . , xnk , . . . ) convergindo para um ponto a ∈ X1 . Dado qualquer n ∈ N, temos xnk ∈ Xn sempre que nk > n. Como Xn ´e compacto, segue-se que a ∈ Xn . Isto prova o teorema. Encerraremos nosso estudo dos conjuntos compactos da reta com a demonstra¸c˜ao do teorema de Borel-Lebesgue. Chama-se cobertura de um conjunto X a umaSfam´ılia C de conjuntos Cλ cuja reuni˜ao cont´em X. A condi¸c˜ao X ⊂ λ∈L Cλ significa que, para cada x ∈ X, deve existir (pelo menos) um λ ∈ L tal que x ∈ Cλ . Quando todos os conjuntos Cλ s˜ ao abertos, diz-se que C ´e uma cobertura aberta. Quando L = {λ1 , . . . , λn } ´e um conjunto finito, diz-se que X ⊂ Cλ1 ∪S· · · ∪ Cλn ´e uma cobertura finita. Se L′ ⊂ L ´e tal que ainda se tem X ⊂ λ′ ∈L′ Cλ′ , diz-se que C ′ = (Cλ′ )λ′ ∈L′ ´e uma subcobertura de C. Teorema 10. (Borel-Lebesgue.) Toda cobertura aberta de um conjunto compacto possui uma subcobertura finita.

Demonstra¸ c˜ ao: Tomemos inicialmente uma cobertura aberta [a, b] ⊂ S λ∈L Aλ do intervalo compacto [a, b]. Suponhamos, por absurdo, que C = (Aλ )λ∈L n˜ao admita subcobertura finita. O ponto m´edio do intervalo [a, b] o decomp˜oe em dois intervalos de comprimento (b − a)/2. Pelo menos um destes intervalos, o qual chamaremos [a1 , b1 ], n˜ao pode ser coberto por um n´ umero finito de conjuntos Aλ . Por bisse¸c˜oes sucessivas obteremos uma seq¨ uˆencia decrescente [a, b] ⊃ [a1 , b1 ] ⊃ [a2 , b2 ] ⊃ · · · ⊃ [an , bn ] ⊃ · · · de intervalos tais que bn − an = (b − a)/2n e nenhum [an , bn ] pode estar contido numa reuni˜ao finita dos abertos Aλ . Pelo Teorema 4, Cap´ıtulo 2, existe um n´ umero real c que pertence a todos os intervalos [an , bn ]. Em particular, c ∈ [a, b]. Pela defini¸c˜ao de cobertura,

56

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

existe λ ∈ L tal que c ∈ Aλ . Como Aλ ´e aberto, temos [c − ε, c + ε] ⊂ Aλ para um certo ε > 0. Tomando n ∈ N tal que (b − a)/2n < ε temos ent˜ao c ∈ [an , bn ] ⊂ [c − ε, c + ε], donde [an , bn ] ⊂ Aλ , logo [an , bn ] pode ser coberto por apenas um dos conjuntos S Aλ . Contradi¸c˜ao. No caso geral, temos uma cobertura aberta X ⊂ λ∈L Aλ do compacto X. Tomamos um intervalo compacto [a, b] que contenha X e, acrescentando aos Aλ o novo aberto Aλ0 = R − X, obtemos uma cobertura aberta de [a, b], da qual extra´ımos, pela parte j´a provada, uma subcobertura finita [a, b] ⊂ Aλ0 ∪ Aλ1 ∪ · · · ∪ Aλn . Como nenhum ponto de X pode pertencer a Aλ0 , temos X ⊂ Aλ1 ∪ · · · ∪ Aλn e isto completa a demonstra¸c˜ao. Exemplo 7. Os intervalos An = (1/n, 2), n ∈ N, S constituem uma cobertura aberta do conjunto X = (0, 1] pois (0, 1] ⊂ n∈N An . Entretanto, esta cobertura n˜ao possui subcobertura finita pois, como A1 ⊂ A2 ⊂ A3 ⊂ · · · ⊂ An ⊂ · · · , toda reuni˜ao finita de conjuntos An ´e igual `aquele de maior ´ındice, logo n˜ao cont´em (0, 1]. O Teorema de Borel-Lebesgue, cuja importˆ ancia ´e inestim´avel, ser´a utilizado neste livro uma s´ o vez, no Cap´ıtulo 10, se¸c˜ao 4. (V. Teorema 7 daquele cap´ıtulo.) Pode-se provar, reciprocamente, que se toda cobertura aberta de um conjunto X ⊂ R possui uma subcobertura finita ent˜ao X ´e limitado e fechado. (Cfr. “Curso de An´ alise”, vol. 1, pag. 182.)

5

O conjunto de Cantor

O conjunto de Cantor, que descreveremos agora, tem as seguintes propriedades: ´ compacto. 1) E 2) Tem interior vazio (n˜ao cont´em intervalos). 3) N˜ ao cont´em pontos isolados (todos seus pontos s˜ ao pontos de acumula¸c˜ao). ´ n˜ao-enumer´avel. 4) E O conjunto de Cantor K ´e um subconjunto fechado do intervalo [0, 1], obtido como complementar de uma reuni˜ao de intervalos abertos, do seguinte modo. Retira-se do intervalo [0, 1] seu ter¸co m´edio aberto (1/3, 2/3). Depois retira-se o ter¸co m´edio aberto de cada um dos intervalos restantes [0, 1/3] e [2/3, 1]. Sobra ent˜ao [0, 1/9] ∪ [2/9, 1/3] ∪

Se¸c˜ ao 5

57

O conjunto de Cantor

[2/3, 7/9] ∪ [8/9, 1]. Em seguida, retira-se o ter¸co m´edio aberto de cada um desses quatro intervalos. Repete-se o processo indefinidamente. O conjunto K dos pontos n˜ao retirados ´e o conjunto de Cantor. 0

0

1/9

2/9

1/3

2/3

1/3

2/3

1

7/9

8/9

1

Figura 1: Construindo o conjunto de Cantor.

Se indicarmos comSI1 , I2 , . . . , In , . . . os intervalos abertos omitidos, veremos que F = R− ∞ e um conjunto fechado logo K = [0, 1]∩F n=1 In ´ ´e limitado e fechado, ou seja, o conjunto de Cantor ´e compacto. Para mostrar que K tem interior vazio, observamos que depois da n´esima etapa de sua constru¸c˜ao restam apenas intervalos de comprimento 1/3n . Portanto, dado qualquer intervalo J ⊂ [0, 1] de comprimento c > 0, se tomarmos n tal que 1/3n < c, o intervalo J estar´a mutilado depois da n-´esima etapa da forma¸c˜ao de K. Assim, K n˜ao cont´em intervalos. Os pontos extremos dos intervalos omitidos nas diversas etapas da constru¸c˜ao do conjunto de Cantor, tais como 1/3, 2/3, 1/9, 2/9, 7/9, 8/9, etc, pertencem a K, pois em cada etapa s˜ ao retirados apenas pontos interiores aos intervalos que restaram na etapa anterior. Eles constituem um conjunto enumer´avel E, sem pontos isolados. Com efeito, seja c ∈ K extremidade de algum intervalo, digamos (c, b), omitido de [0, 1] para formar K. Quando (c, b) foi retirado, restou um certo intervalo [a, c]. Nas etapas seguintes da constru¸c˜ao de K, restar˜ao sempre ter¸cos finais de intervalo, do tipo [an , c], com an ∈ E. O comprimento c − an tende a zero, logo an → c e assim c n˜ao ´e ponto isolado de E. Suponhamos agora que c ∈ K n˜ao seja extremo de intervalo retirado de [0, 1] durante a constru¸c˜ao de K. (At´e agora, n˜ao sabemos se de fato tais pontos existem, mas veremos logo mais que eles constituem a maioria dos pontos de K.) Provemos que c n˜ao ´e isolado em K. Com efeito, para cada n ∈ N, c pertence ao interior de um intervalo

58

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

[xn , yn ] que restou depois da n-´esima etapa da constru¸c˜ao de K. Temos xn < c < yn com xn , yn ∈ K e yn − xn = 1/3n . Logo c = lim xn = lim yn ´e ponto de acumula¸c˜ao de K. Fica ent˜ao constatado que K n˜ao possui pontos isolados. Provaremos agora que o conjunto de Cantor K n˜ao ´e enumer´avel. Dado qualquer subconjunto enumer´avel {x1 , x2 , . . . , xn , . . . } ⊂ K, obteremos um ponto c ∈ K tal que c 6= xn para todo n ∈ N. Para isso, com centro num ponto de K, tomamos um intervalo compacto n˜aodegenerado I1 tal que x1 ∈ / I1 . Como nenhum ponto de K ´e isolado, I1 ∩ K ´e um conjunto infinito, compacto sem pontos isolados. Em seguida, com centro em algum ponto de K interior a I1 , tomamos um intervalo compacto n˜ao-degenerado I2 ⊂ I1 tal que x2 ∈ / I2 . Prosseguindo analogamente, obtemos uma seq¨ uˆencia decrescente de intervalos compactos I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ · · · tais que xn ∈ / In e In ∩ K 6= ∅. Sem perda de generalidade, podemos supor que In tem comprimento < 1/n. Ent˜ao o ponto c, pertencente a todos os In (cuja T∞existˆencia ´e garantida pelo Teorema 4 do Cap´ıtulo 2) ´e u ´nico, isto ´e, n=1 In = {c}. Escolhendo, para cada n ∈ N um ponto yn ∈ In ∩ K, teremos ent˜ao |yn − c| ≤ 1/n, donde lim yn = c. Como K ´e fechado, segue-se que c ∈ K. Por outro lado, para todo n ∈ N temos c ∈ In , logo c 6= xn , concluindo a demonstra¸c˜ao. Os pontos do conjunto de Cantor tˆem uma caracteriza¸c˜ao interessante e u ´til em termos de sua representa¸c˜ao em base 3. Dado x ∈ [0, 1], representar x na base 3 significa escrever x = 0, x1 x2 x3 . . . , onde cada um dos d´ıgitos xn ´e igual a 0, 1 ou 2, de tal modo que x=

x1 x2 xn + 2 + ··· + n + ··· · 3 3 3

A fim de que se tenha x = 0, x1 x2 . . . xn 000 . . . ´e necess´ario e suficiente que x seja um n´ umero da forma m/3n , com m, n inteiros e m ≤ 3n . Por exemplo 17/27 = 0, 122000 . . . na base 3. Quando o denominador da fra¸c˜ao irredut´ıvel p/q n˜ao ´e uma potˆencia de 3 ent˜ao a representa¸c˜ao de p/q na base 3 ´e peri´ odica. Por exemplo, 1/4 = 0, 020202 . . . e 1/7 = 0, 010212010212 . . . na base 3. Os n´ umeros irracionais tˆem representa¸c˜ao n˜ao-peri´ odica. Na primeira etapa da forma¸c˜ao do conjunto de Cantor, ao retirar-se o intervalo aberto (1/3, 2/3) ficam exclu´ıdos os n´ umeros x ∈ [0, 1] cuja representa¸c˜ao na base 3 tem x1 = 1, com a u ´nica exce¸c˜ao de 1/3 = 0,1, que permanece. Na segunda etapa, foram exclu´ıdos os n´ umeros dos in-

Se¸c˜ ao 6

Exerc´ıcios

59

tervalos (1/9, 2/9) e (7/9, 8/9) ou seja, aqueles da forma 0, 01x3 x4 . . . ou da forma 0, 21x3 x4 . . . (com exce¸c˜ao de 1/9 = 0, 01 e de 7/9 = 0, 21, que permanecem). De um modo geral, podemos afirmar que os elementos do conjunto de Cantor s˜ ao os n´ umeros do intervalo [0, 1] cuja representa¸c˜ao x = 0, x1 x2 . . . xn . . . na base 3 s´ o cont´em os algarismos 0 e 2, com exce¸c˜ao daqueles que contˆem um u ´nico algarismo 1 como algarismo significativo final, como x = 0, 20221, por exemplo. Se observarmos que 0, 0222 · · · = 0, 1 poderemos sempre substituir o algarismo final 1 pela seq¨ uˆencia 0222 . . . . Por exemplo: 0, 20201 = 0, 20200222 . . . . Com esta conven¸c˜ao, pode-se afirmar, sem exce¸c˜oes, que os elementos do conjunto de Cantor s˜ ao os n´ umeros do intervalo [0, 1] cuja representa¸c˜ao na base 3 s´ o cont´em os algarismos 0 e 2. Da´ı resulta facilmente que o conjunto de Cantor ´e n˜ao-enumer´avel (vide Exemplo 3, Cap´ıtulo 1) e que 1/4 = 0, 0202 . . . pertence ao conjunto de Cantor.

6

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Conjuntos abertos

1. Prove que, para todo X ⊂ R tem-se int(int X) = int X e conclua que int X ´e um conjunto aberto. 2. Seja A ⊂ R um conjunto com a seguinte propriedade: “toda seq¨ uˆencia (xn ) que converge para um ponto a ∈ A tem seus termos xn pertencentes a A para todo n suficientemente grande”. Prove que A ´e aberto. 3. Prove que int(A ∪ B) ⊃ int A ∪ int B e int(A ∩ B) = int A ∩ int B quaisquer que sejam A, B ⊂ R. Se A = (0, 1] e B = [1, 2), mostre que int(A ∪ B) 6= int A ∪ int B. 4. Para todo X ⊂ R, prove que vale a reuni˜ao disjunta R = int X ∪ int(R − X) ∪ F , onde F ´e formado pelos pontos x ∈ R tais que toda vizinhan¸ca de x cont´em pontos de X e pontos de R − X. O conjunto F = fr X chama-se a fronteira de X. Prove que A ⊂ R ´e aberto se, e somente se, A ∩ fr A = ∅. 5. Para cada um dos conjuntos seguintes, determine sua fronteira: X = [0, 1], Y = (0, 1) ∪ (1, 2), Z = Q, W = Z.

60

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

6. Sejam I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ T · · · intervalos limitados dois a dois distintos, cuja interse¸c˜ao I = ∞ ao ´e vazia. Prove que I ´e n=1 In n˜ um intervalo, o qual nunca ´e aberto. Se¸ c˜ ao 2:

Conjuntos fechados

1. Sejam I um intervalo n˜ao-degenerado e k > 1 um n´ umero natural. n Prove que o conjunto dos n´ umeros racionais m/k pertencentes a I, cujos denominadores s˜ ao potˆencias de k com expoente n ∈ N, ´e denso em I. 2. Prove que, para todo X ⊂ R, vale X = X ∪ fr X. Conclua que X ´e fechado se, e somente se, X ⊃ fr X.

3. Para todo X ⊂ R, prove que R − int X = R − X e R − X = int(R − X). 4. Se X ⊂ R ´e aberto (respectivamente, fechado) e X = A ∪ B ´e uma cis˜ ao, prove que A e B s˜ ao abertos (respectivamente, fechados).

5. Prove que se X ⊂ R tem fronteira vazia ent˜ao X = ∅ ou X = R.

6. Sejam X, Y ⊂ R. Prove que X ∪ Y = X ∪Y e que X ∩ Y ⊂ X ∩Y . Dˆe exemplo em que X ∩ Y 6= X ∩ Y .

7. Dada uma seq¨ uˆencia (xn ), prove que o fecho do conjunto X = {xn ; n ∈ N} ´e X = X ∪ A, onde A ´e o conjunto dos valores de aderˆencia de (xn ).

Se¸ c˜ ao 3:

Pontos de acumula¸ c˜ ao

1. Prove que, para todo X ⊂ R, tem-se X = X ∪ X ′ . Conclua que X ´e fechado se, e somente se, cont´em todos os seus pontos de acumula¸c˜ao. 2. Prove que toda cole¸c˜ao de intervalos n˜ao-degenerados dois a dois disjuntos ´e enumer´avel. 3. Prove que se todos os pontos do conjunto X ⊂ R s˜ ao isolados ent˜ao pode-se escolher, para cada x ∈ X, um intervalo aberto Ix , de centro x, tal que x 6= y ⇒ Ix ∩ Iy = ∅.

4. Prove que todo conjunto n˜ao-enumer´avel X ⊂ R possui algum ponto de acumula¸c˜ao a ∈ X.

5. Prove que, para todo X ⊂ R, X ′ ´e um conjunto fechado.

Se¸c˜ ao 6

Exerc´ıcios

61

6. Seja a um ponto de acumula¸c˜ao do conjunto X. Prove que existe uma seq¨ uˆencia crescente ou uma seq¨ uˆencia decrescente de pontos xn ∈ X com lim xn = a. Se¸ c˜ ao 4:

Conjuntos compactos

1. Prove que o conjunto A dos valores de aderˆencia de uma seq¨ uˆencia (xn ) ´e fechado. Se a seq¨ uˆencia for limitada, A ´e compacto, logo existem l e L, respectivamente o menor e o maior valor de aderˆencia da seq¨ uˆencia limitada (xn ). Costuma-se escrever l = lim inf xn e L = lim sup xn . 2. Prove que uma reuni˜ao finita e uma interse¸c˜ao arbitr´ aria de conjuntos compactos ´e um conjunto compacto. 3. Dˆe exemplo de uma seq¨ uˆencia decrescente de conjuntos fechados n˜ao-vazios F1 ⊃ · · · ⊃ Fn ⊃ · · · e uma seq¨ uˆencia decrescente de conjuntos limitados n˜ao-vazios L1 ⊃ · · · ⊃ Ln ⊃ · · · tais que ∩Fn = ∅ e ∩Ln = ∅.

4. Sejam X, Y conjuntos n˜ao-vazios, com X compacto e Y fechado. Prove que existem x0 ∈ X, y0 ∈ Y tais que |x0 − y0 | ≤ |x − y| para quaisquer x ∈ X, y ∈ Y . 5. Um conjunto compacto cujos pontos s˜ ao todos isolados ´e finito. Dˆe exemplo de um conjunto fechado ilimitado X e um conjunto limitado n˜ao-fechado Y , cujos pontos s˜ ao todos isolados. 6. Prove que se X ´e compacto ent˜ao os seguintes conjuntos tamb´em s˜ ao compactos: a) S = {x + y; x, y ∈ X};

b) D = {x − y; x, y ∈ X};

c) P = {x · y; x, y ∈ X};

d) Q = {x/y; x, y ∈ X} se 0 ∈ / X.

Se¸ c˜ ao 5:

O conjunto de Cantor

1. Determine quais dentre os n´ umeros 1/m, 2 ≤ m ≤ 10, pertencem ao conjunto de Cantor. 2. Dado arbitrariamente a ∈ (0, 1], prove que existem x < y pertencentes ao conjunto de Cantor, tais que y − x = a.

62

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

Cap. 5

3. Prove que a soma da s´erie cujos termos s˜ ao os comprimentos dos intervalos omitidos para formar o conjunto de Cantor ´e igual a 1. 4. Prove que os extremos dos intervalos removidos formam um subconjunto enumer´avel denso no conjunto de Cantor.

6 Limites de Fun¸c˜ oes

A no¸c˜ao de limite, que estudamos no Cap´ıtulo 3 no caso particular de seq¨ uˆencias, ser´a agora estendida `a situa¸c˜ao mais geral onde se tem uma fun¸c˜ao f : X → R, definida num subconjunto qualquer X ⊂ R.

1

Defini¸c˜ ao e primeiras propriedades

Sejam X ⊂ R um conjunto de n´ umeros reais, f : X → R uma fun¸c˜ao real cujo dom´ınio ´e X e a ∈ X ′ um ponto de acumula¸c˜ao do conjunto X. Dizse que o n´ umero real L ´e limite de f (x) quando x tende para a, e escrevese limx→a f (x) = L, quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se obter δ > 0 tal que se tem |f (x) − L| < ε sempre que x ∈ X e 0 < |x − a| < δ. Simbolicamente: lim f (x) = L . ≡ .∀ ε > 0 ∃ δ > 0; x ∈ X, 0 < |x−a| < δ ⇒ |f (x)−L| < ε.

x→a

Informalmente: limx→a f (x) = L quer dizer que se pode tornar f (x) t˜ao pr´oximo de L quanto se queira desde que se tome x ∈ X suficientemente pr´oximo, por´em diferente, de a. A restri¸c˜ao 0 < |x − a| significa x 6= a. Assim, no limite L = limx→a f (x) n˜ao ´e permitido `a vari´avel x assumir o valor a. Portanto, o valor f (a) n˜ao tem importˆ ancia alguma quando se quer determinar

64

Limites de Fun¸c˜ oes

Cap. 6

L: o que conta ´e o comportamento de f (x) quando x se aproxima de a, sempre com x 6= a. Na defini¸c˜ao de limite ´e essencial que a seja um ponto de acumula¸c˜ao do conjunto X mas ´e irrelevante que a perten¸ca ou n˜ao a X, isto ´e, que f esteja ou n˜ao definida no ponto a. Num dos exemplos mais importantes de limite, a saber, a derivada, estuda-se limx→a q(x), onde a fun¸c˜ao q(x) = [f (x) − f (a)]/(x − a) n˜ao est´a definida para x = a. Nas condi¸c˜oes f : X → R, a ∈ X ′ , negar que se tem limx→a f (x) = L equivale a dizer que existe um n´ umero ε > 0 com a seguinte propriedade: seja qual for δ > 0, pode-se sempre achar xδ ∈ X tal que 0 < |xδ −a| < δ e |f (xδ ) − L| ≥ ε.

Teorema 1. Sejam f, g : X → R, a ∈ X ′ , limx→a f (x) = L e limx→a g(x) = M . Se L < M ent˜ ao existe δ > 0 tal que f (x) < g(x) para todo x ∈ X com 0 < |x − a| < δ. Demonstra¸ c˜ ao: Seja K = (L + M )/2. Pondo ε = K − L = M − K temos ε > 0 e K = L + ε = M − ε. Pela defini¸c˜ao de limite, existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ1 ⇒ L − ε < f (x) < K e x ∈ X, 0 < |x − a| < δ2 ⇒ K < g(x) < M + ε. Portanto, pondo δ = min{δ1 , δ2 } vem: x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ f (x) < K < g(x), o que prova o teorema.

Observa¸ c˜ ao. A hip´ otese L < M n˜ao pode ser substituida por L ≤ M no Teorema 1. Observa¸ c˜ ao. Para o Teorema 1 e seus corol´arios, bem como para o Teorema 2 abaixo, valem vers˜oes an´ alogas com > em lugar de < e vice-versa. Tais vers˜oes ser˜ao usadas sem maiores coment´arios. Corol´ ario 1. Se limx→a f (x) = L < M ent˜ ao existe δ > 0 tal que f (x) < M para todo x ∈ X com 0 < |x − a| < δ. Corol´ ario 2. Sejam limx→a f (x) = L e limx→a g(x) = M . Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ X − {a} ent˜ ao L ≤ M . Com efeito, se fosse M < L existiria δ > 0 tal que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ g(x) < f (x), uma contradi¸c˜ao.

Teorema 2. (Teorema do sandu´ıche.) Sejam f, g, h : X → R, a ∈ X ′ e limx→a f (x) = limx→a g(x) = L. Se f (x) ≤ h(x) ≤ g(x) para todo x ∈ X − {a} ent˜ ao limx→a h(x) = L. Demonstra¸ c˜ ao: Dado arbitrariamente ε > 0, existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ1 ⇒ L − ε < f (x) < L + ε e x ∈ X,

Se¸c˜ ao 1

Defini¸c˜ ao e primeiras propriedades

65

0 < |x − a| < δ2 ⇒ L − ε < g(x) < L + ε. Seja δ = min{δ1 , δ2 }. Ent˜ao x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ L − ε < f (x) ≤ h(x) ≤ g(x) < L + ε ⇒ L − ε < h(x) < L + ε. Logo limx→a h(x) = L. Observa¸ c˜ ao. A no¸c˜ao de limite ´e local, isto ´e, dadas as fun¸c˜oes f, g : X → R e dado a ∈ X ′ , se existir uma vizinhan¸ca V do ponto a tal que f (x) = g(x) para todo x 6= a em V ∩ X ent˜ao existe limx→a f (x) se, e somente se, existe limx→a g(x). Al´em disso, se existirem, esses limites ser˜ao iguais. Assim, por exemplo, no Teorema 2, n˜ao ´e necess´ario supor que vale f (x) ≤ h(x) ≤ g(x) para todo x ∈ X − {a}. Basta que exista uma vizinhan¸ca V do ponto a tal que estas desigualdades valham para todo x 6= a pertencente a V ∩ X. Observa¸c˜ao an´ aloga para o Teorema 1 e seu Corol´ario 2. Teorema 3. Sejam f : X→R e a∈X ′ . A fim de que seja limx→a f (x)=L ´e necess´ ario e suficiente que, para toda seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X −{a} com lim xn = a, tenha-se lim f (xn ) = L. Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos, primeiro, que limx→a f (x) = L e que se tem uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a} com lim xn = a. Dado arbitrariamente ε > 0, existe δ > 0 tal que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ |f (x)−L| < ε. Existe tamb´em n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ 0 < |xn −a| < δ (pois xn 6= a para todo n). Por conseguinte, n > n0 ⇒ |f (xn ) − L| < ε, logo lim f (xn ) = L. Reciprocamente, suponhamos que xn ∈ X − {a} e lim xn = a impliquem lim f (xn ) = L e provemos que se tem lim f (x) = L.

x→a

Com efeito, negar esta igualdade implicaria em afirmar a existˆencia de um n´ umero ε > 0 com a seguinte propriedade: qualquer que seja n ∈ N podemos achar xn ∈ X tal que 0 < |xn − a| < 1/n mas |f (xn ) − L| ≥ ε. Ent˜ao ter´ıamos xn ∈ X − {a}, lim xn = a sem que fosse lim f (xn ) = L. Esta contradi¸c˜ao completa a demonstra¸c˜ao. Corol´ ario 1. (Unicidade do limite.) Sejam f : X → R e a ∈ X ′ . Se limx→a f (x) = L e limx→a f (x) = M ent˜ ao L = M . Com efeito, basta tomar uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a} com lim xn = a, o que ´e assegurado pelo Teorema 6 do Cap´ıtulo 5. Ent˜ao teremos L = lim f (xn ) e M = lim f (xn ). Pela unicidade do limite da seq¨ uˆencia (f (xn )), vem L = M .

66

Limites de Fun¸c˜ oes

Cap. 6

Corol´ ario 2. (Opera¸ co ˜es com limites.) Sejam f, g : X → R, a ∈ X ′ , com limx→a f (x) = L e limx→a g(x) = M . Ent˜ ao lim [f (x) ± g(x)] = L ± M ;

x→a

lim [f (x) · g(x)] = L · M ;

x→a

lim

x→a

f (x) L = , se M 6= 0. g(x) M

Al´em disso, se limx→a f (x) = 0 e g ´e limitada numa vizinhan¸ca de a, tem-se limx→a [f (x) · g(x)] = 0. Com efeito, dada qualquer seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a} com lim xn = a, pelo Teorema 8 do Cap´ıtulo 3 valem lim[f (xn ) ± g(xn )] = lim f (xn )±lim g(xn ) = L±M , lim f (xn )·g(xn ) = lim f (xn )·lim g(xn ) = L · M e tamb´em lim[f (xn )/g(xn )] = lim f (xn )/ lim g(xn ) = L/M . Finalmente, se existem uma vizinhan¸ca V de a e uma constante c tal que |g(x)| ≤ c para todo x ∈ V ent˜ao, como xn ∈ V para todo n suficientemente grande, a seq¨ uˆencia g(xn ) ´e limitada; logo, pelo Teorema 7 do Cap´ıtulo 3, tem-se lim f (xn )·g(xn ) = 0, pois lim f (xn ) = 0. O Corol´ario 2 segue-se portanto do teorema. Teorema 4. Sejam f : X → R, a ∈ X ′ . Se existe limx→a f (x) ent˜ ao f ´e limitada numa vizinhan¸ca de a, isto ´e, existem δ > 0 e c > 0 tais que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ |f (x)| ≤ c. Demonstra¸ c˜ ao: Seja L = limx→a f (x). Tomando ε = 1 na defini¸c˜ao de limite, resulta que existe δ > 0 tal que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ |f (x) − L| < 1 ⇒ |f (x)| = |f (x) − L + L| ≤ |f (x) − L| + |L| < |L| + 1. Basta ent˜ao tomar c = |L| + 1. O Teorema 4 generaliza o fato de que toda seq¨ uˆencia convergente ´e limitada. Exemplo 1. Se f, g : R → R s˜ ao dadas por f (x) = c e g(x) = x (fun¸c˜ao constante e fun¸c˜ao identidade) ent˜ao, para todo a ∈ R, tem-se evidentemente limx→a f (x) = c e limx→a g(x) = a. Segue-se do Corol´ario 2 do Teorema 3 que, para todo polinˆ omio p : R → R, p(x) = n a0 + a1 x + · · · + an x , tem-se limx→a p(x) = p(a), seja qual for a ∈ R. Analogamente, para toda fun¸c˜ao racional f (x) = p(x)/q(x), quociente de dois polinˆ omios, tem-se limx→a f (x) = f (a) desde que seja q(a) 6= 0. Quando q(a) = 0, o polinˆ omio q(x) ´e divis´ıvel por x − a. Escrevemos ent˜ao q(x) = (x − a)m q1 (x) e p(x) = (x − a)k p1 (x) onde

Se¸c˜ ao 1

Defini¸c˜ ao e primeiras propriedades

67

m ∈ N, k ∈ N ∪ {0}, q1 (a) 6= 0 e p1 (a) 6= 0. Se for m = k ent˜ao vale limx→a f (x) = p1 (a)/q1 (a) porque f (x) = p1 (x)/q1 (x) para todo x 6= a. Se for k > m ent˜ao tem-se limx→a f (x) = 0 pois f (x) = (x − a)k−m [p1 (x)/q1 (x)] para todo x 6= a. Se, entretanto, tivermos k < m, ent˜ao f (x) = p1 (x)/[(x − a)m−k · q1 (x)] para todo x 6= a. Neste caso, o denominador de f (x) tem limite zero e o numerador n˜ao. Isto implica que n˜ao pode existir limx→a f (x). Com efeito, se f (x) = ϕ(x)/ψ(x), com limx→a ψ(x) = 0, e existe L = limx→a f (x) ent˜ao existe limx→a ϕ(x) = limx→a (f (x) · ψ(x)) = L · 0 = 0. Trata-se, portanto, de um fato geral: quando limx→a ψ(x) = 0, s´ o pode existir limx→a [ϕ(x)/ψ(x)] no caso em que se tenha tamb´em limx→a ϕ(x) = 0 (embora esta condi¸c˜ao, por si s´ o, n˜ao seja suficiente para a existˆencia de lim[ϕ/ψ]). Exemplo 2. Seja X = R − {0}. Ent˜ao 0 ∈ X ′ . A fun¸c˜ao f : X → R, definida por f (x) = sen(1/x) n˜ao possui limite quando x → 0. Com efeito, a seq¨ uˆencia de pontos xn = 2/(2n − 1)π ´e tal que lim xn = 0 mas f (xn ) = ±1 conforme n seja ´ımpar ou par, logo n˜ao existe lim f (xn ). Por outro lado, se g : X → R ´e definida por g(x) = x · sen(1/x), tem-se limx→0 g(x) = 0, pois | sen(1/x)| ≤ 1 para todo x ∈ X e limx→0 x = 0. Os gr´ aficos dessas duas fun¸c˜oes s˜ ao mostrados na Figura 2 abaixo.

Figura 2

Exemplo 3. Seja f : R → R definida por f (x) = 0 quando x ´e racional e f (x) = 1 quando x ´e irracional. Dado qualquer a ∈ R, podemos obter uma seq¨ uˆencia de n´ umeros racionais xn 6= a e uma seq¨ uˆencia de n´ umeros irracionais yn 6= a com lim xn = lim yn = a. Ent˜ao lim f (xn ) = 0 e lim f (yn ) = 1, logo n˜ao existe limx→a f (x).

68

Limites de Fun¸c˜ oes

Cap. 6

Observa¸ c˜ ao. Dois dos limites mais importantes que aparecem na An´ ax lise s˜ ao limx→0 (sen x/x) = 1 e limx→0 (e −1)/x = 1. Para estabelecˆe-los ´e necess´ario, entretanto, que se tenha feito um desenvolvimento rigoroso das fun¸c˜oes trigonom´etricas e da fun¸c˜ao exponencial. Isto ser´a feito nos Cap´ıtulos 11 e 12. Sem embargo, continuaremos utilizando essas fun¸c˜oes e suas inversas (como o logaritmo) em exemplos, antes mesmo daqueles ´ que esses exemplos ajudam a fixar a aprendizagem mas n˜ao cap´ıtulos. E interferem no encadeamento l´ ogico da mat´eria aqui apresentada. Ao leitor interessado, esclarecemos que uma apresenta¸c˜ao rigorosa por´em elementar dos logaritmos e da fun¸c˜ao exponencial pode ser encontrada no livrinho “Logaritmos” mencionado nas Sugest˜oes de Leitura ao final deste livro.

2

Limites laterais

Seja X ⊂ R. Diz-se que o n´ umero real a ´e um ponto de acumula¸ca ˜o ′ , quando toda vizinhan¸ ca de a a ` direita para X, e escreve-se a ∈ X+ cont´em algum ponto x ∈ X com x > a. Equivalentemente: para todo ′ ´ e necess´ario e ε > 0 tem-se X ∩ (a, a + ε) 6= ∅. A fim de que a ∈ X+ suficiente que a seja limite de uma seq¨ uˆencia de pontos xn > a, pertencentes a X. Finalmente, a ´e um ponto de acumula¸c˜ao `a direita para o conjunto X se, e somente se, ´e um ponto de acumula¸c˜ao ordin´ario do conjunto Y = X ∩ (a, +∞). Analogamente se define ponto de acumula¸ca ˜o a ` esquerda. Por defini′ significa que, para todo ε > 0, tem-se X ∩ (a − ε, a) 6= ∅, ou c¸˜ao, a ∈ X− seja, a ∈ Z ′ onde Z = (−∞, a) ∩ X. Para que isto aconte¸ca, ´e necess´ario e suficiente que a = lim xn , onde (xn ) ´e uma seq¨ uˆencia cujos termos ′ ∩ X ′ diz-se que a ´ xn < a pertencem a X. Quando a ∈ X+ e um ponto − de acumula¸ca ˜o bilateral de X. ′ por´ Exemplo 4. Se X = {1, 1/2, . . . , 1/n, . . . } ent˜ao 0 ∈ X+ em 0 ∈ / ′ ′ ′ X− . Seja I um intervalo. Se c ∈ int I ent˜ao c ∈ I+ ∩ I− mas se c ´e um ′ se ´ dos extremos de I ent˜ao tem-se apenas c ∈ I+ e o extremo inferior e ′ c ∈ I− se ´e o extremo superior de I.

Exemplo 5. Seja K o conjunto de Cantor. Sabemos que todo ponto a ∈ K ´e ponto de acumula¸c˜ao. Se a ´e extremo de algum dos intervalos omitidos numa das etapas da constru¸c˜ao de K ent˜ao vale apenas uma ′ ou a ∈ K ′ . Se entretanto a ∈ K n˜ das alternativas a ∈ K+ ao ´e extremo −

Se¸c˜ ao 2

Limites laterais

69

′ ∩ K ′ como se conclui do argumento de intervalo omitido ent˜ao a ∈ K+ − usado no Cap´ıtulo 5, se¸c˜ao 5. ′ . Diz-se que o n´ Sejam f : X → R, a ∈ X+ umero real L ´e limite a ` direita de f (x) quando x tende para a, e escreve-se L = limx→a+ f (x) quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se obter δ > 0 tal que |f (x) − L| < ε sempre que x ∈ X e 0 < x − a < δ. Simbolicamente:

lim f (x) = L . ≡ . ∀ ε > 0 ∃ δ > 0; x ∈ X ∩ (a, a + δ) ⇒ |f (x) − L| < ε.

x→a+

Analogamente se define o limite a ` esquerda L = limx→a− f (x), no ′ : isto significa que, para todo ε > 0 dado caso de f : X → R com a ∈ X− arbitrariamente, pode-se escolher δ > 0 tal que x ∈ X ∩ (a − δ, a) ⇒ |f (x) − L| < ε. As propriedades gerais dos limites, demonstradas na se¸c˜ao 1, se adaptam facilmente para os limites laterais. Basta observar que o limite `a direita limx→a+ f (x) se reduz ao limite ordin´ario limx→a g(x), onde g ´e a restri¸c˜ao da fun¸c˜ao f : X → R ao conjunto X ∩(a, +∞). E analogamente para o limite ` a esquerda. Por exemplo, o Teorema 3 no caso de limite `a direita se exprime assim: “A fim de que seja limx→a+ f (x) = L ´e necess´ ario e suficiente que, para toda seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X com xn > a e lim xn = a, se tenha lim f (xn ) = L.” ′ ∩ X ′ , existe lim Como se vˆe facilmente, dado a ∈ X+ x→a f (x) = L − se, e somente se, existem e s˜ ao iguais os limites laterais

lim f (x) = lim f (x) = L.

x→a+

x→a−

Exemplo 6. As fun¸c˜oes f, g, h : R − {0} → R, definidas por f (x) = sen(1/x), g(x) = x/|x| e h(x) = 1/x n˜ao possuem limite quando x → 0. Quanto aos limites laterais, temos limx→0+ g(x) = 1 e limx→0− g(x) = −1 porque g(x) = 1 para x > 0 e g(x) = −1 se x < 0. As fun¸c˜oes f e h n˜ao possuem limites laterais quando x → 0, nem `a esquerda nem `a direita. Por outro lado, ϕ : R − {0} → R, definida por ϕ(x) = e−1/x , possui limite ` a direita, limx→0+ ϕ(x) = 0, mas n˜ao existe limx→0− ϕ(x) pois ϕ n˜ao ´e limitada para valores negativos de x pr´oximos de zero. Exemplo 7. Seja I : R → R a fun¸c˜ao “parte inteira de x ”. Para cada x ∈ R, existe um u ´nico n´ umero inteiro n tal que n ≤ x < n + 1; p˜oe-se

70

Limites de Fun¸c˜ oes

Cap. 6

ent˜ao I(x) = n. Se n ∈ Z ent˜ao limx→n+ I(x) = n e limx→n− I(x) = n − 1. Com efeito, n < x < n + 1 ⇒ I(x) = n enquanto n − 1 < x < n ⇒ I(x) = n − 1. Por outro lado, se a n˜ao ´e inteiro ent˜ao limx→a+ I(x) = limx→a− I(x) = I(a) pois neste caso I(x) ´e constante numa vizinhan¸ca de a. Uma fun¸c˜ao f : X → R chama-se mon´ otona n˜ ao-decrescente quando para x, y ∈ X, x < y ⇒ f (x) ≤ f (y). Se x < y ⇒ f (x) ≥ f (y), f diz-se mon´ otona n˜ ao-crescente. Se vale a implica¸c˜ao mais estrita x < y ⇒ f (x) < f (y) dizemos que a fun¸c˜ao f ´e crescente. Finalmente, se x < y ⇒ f (x) > f (y), dizemos que f ´e uma fun¸c˜ao decrescente.

Teorema 5. Seja f : X → R uma fun¸ca ˜o mon´ otona limitada. Para todo ′ e todo b ∈ X ′ existem L = lim a ∈ X+ f x→a+ (x) e M = limx→b− f (x). − Ou seja: existem sempre os limites laterais de uma fun¸ca ˜o mon´ otona limitada. Demonstra¸ c˜ ao: Para fixar as id´eias, suponhamos f n˜ao-decrescente. Seja L = inf{f (x); x ∈ X, x > a}. Afirmamos que limx→a+ f (x) = L. Com efeito, dado arbitrariamente ε > 0, L + ε n˜ao ´e cota inferior do conjunto limitado {f (x); x ∈ X, x > a}. Logo existe δ > 0 tal que a + δ ∈ X e L ≤ f (a + δ) < L + ε. Como f ´e n˜ao-decrescente, x ∈ X ∩ (a, a + δ) ⇒ L ≤ f (x) < L + ε, o que prova a afirma¸c˜ao feita. De modo an´ alogo vˆe-se que M = sup{f (x); x ∈ X, x < b} ´e o limite `a esquerda M = limx→b− f (x). Observa¸ c˜ ao. Se a ∈ X n˜ao ´e necess´ario supor que f seja limitada no Teorema 5. Com efeito, suponhamos, para fixar id´eias, que f seja ′ . Ent˜ mon´otona n˜ao-decrescente e a ∈ X+ ao f (a) ´e uma cota inferior do conjunto {f (x); x ∈ X, x > a} e o ´ınfimo deste conjunto ´e limx→a+ f (x). ′ ent˜ Analogamente, se a ∈ X− ao f (a) ´e uma cota superior do conjunto {f (x); x ∈ X, x < a}, cujo supremo ´e o limite `a esquerda limx→a− f (x).

3

Limites no infinito, limites infinitos, express˜ oes indeterminadas

Seja X ⊂ R ilimitado superiormente. Dada f : X → R, escreve-se lim f (x) = L,

x→+∞

quando o n´ umero real L satisfaz `a seguinte condi¸c˜ao: ∀ ε > 0 ∃ A > 0; x ∈ X, x > A ⇒ |f (x) − L| < ε.

Se¸c˜ ao 3Limites no infinito, limites infinitos, express˜ oes indeterminadas

71

Ou seja, dado arbitrariamente ε > 0, existe A > 0 tal que |f (x) − L| < ε sempre que x > A. De maneira an´ aloga define-se limx→−∞ f (x) = L, quando o dom´ınio de f ´e ilimitado inferiormente: para todo ε > 0 dado, deve existir A > 0 tal que x < −A ⇒ |f (x) − L| < ε. Valem os resultados j´a demonstrados para o limite quando x → a, a ∈ R, com as adapta¸c˜oes evidentes. Os limites para x → +∞ e x → −∞ s˜ ao, de certo modo, limites laterais (o primeiro ´e um limite `a esquerda e o segundo `a direita). Logo vale o resultado do Teorema 5: se f : X → R ´e mon´otona limitada ent˜ao existe limx→+∞ f (x) se o dom´ınio X for ilimitado superiormente e existe limx→−∞ f (x) se o dom´ınio de f for ilimitado inferiormente. O limite de uma seq¨ uˆencia ´e um caso particular de limite no infinito: trata-se de limx→+∞ f (x), onde f : N → R ´e uma fun¸c˜ao definida no conjunto N dos n´ umeros naturais. Exemplo 8. limx→+∞ 1/x = limx→−∞ 1/x = 0. Por outro lado, n˜ao existe limx→+∞ sen x nem limx→−∞ sen x. Vale limx→−∞ ex = 0 mas n˜ao existe limx→+∞ ex , no sentido da defini¸c˜ao acima. Como fizemos no caso de seq¨ uˆencias, introduziremos “limites infinitos” para englobar situa¸c˜oes como esta. Em primeiro lugar, sejam X ⊂ R, a ∈ X ′ , f : X → R. Diremos que limx→a f (x) = +∞ quando, para todo A > 0 dado, existe δ > 0 tal que 0 < |x − a| < δ, x ∈ X ⇒ f (x) > A. 2 Por √ exemplo, limx→a 1/(x − a) = +∞, 2pois dado A > 0, tomamos δ=1/ A. Ent˜ao 0 0, existe δ > 0 tal que x ∈ X, 0 < |x − a| < δ ⇒ f (x) < −A. Por exemplo, limx→a −1/(x − a)2 = −∞. Evidentemente, as defini¸c˜oes de limx→a+ f (x)=+∞, limx→a− f (x)= +∞, etc. n˜ao apresentam maiores dificuldades e s˜ ao deixadas a cargo do leitor. Tamb´em omitiremos as defini¸c˜oes evidentes de limx→+∞ f (x) = +∞, limx→−∞ f (x) = +∞, etc. Por exemplo, 1  1  = +∞, lim = −∞, x→a− x − a x→a+ x − a lim ex = +∞, lim xk = +∞ (k ∈ N). lim

x→+∞

x→+∞

Deve-se observar enfaticamente que +∞ e −∞ n˜ ao s˜ ao n´ umeros

72

Limites de Fun¸c˜ oes

Cap. 6

reais, de modo que as afirma¸c˜oes limx→a f (x) = +∞ e limx→a f (x) = −∞ n˜ao exprimem limites no sentido estrito do termo.

Observa¸ c˜ ao. Valem para lim(f + g), lim(f · g) e lim(f /g) resultados an´ alogos aos do Cap´ıtulo 3 (v. Teorema 9) sobre limites de seq¨ uˆencias.

Observa¸ c˜ ao. Admitindo limites infinitos, existem sempre os limites laterais de uma fun¸c˜ao mon´otona f : X → R em todos os pontos a ∈ X ′ , ou mesmo quando x → ±∞. Tem-se limx→a+ f (x) = L, L ∈ R se, e somente se, para algum δ > 0, f ´e limitada no conjunto X ∩ (a, a + δ). Se, ao contr´ario, f ´e ilimitada (digamos superiormente) em X ∩(a, a+δ) para todo δ > 0 ent˜ao limx→a+ f (x) = +∞. Em aditamento aos coment´arios feitos na se¸c˜ao 4 do Cap´ıtulo 3, diremos algumas palavras sobre as express˜oes indeterminadas 0/0, ∞ − ∞, 0 × ∞, ∞/∞, 00 , ∞0 e 1∞ . Vejamos, por exemplo, 0/0. Como a divis˜ao por zero n˜ao est´a definida, esta express˜ao n˜ao tem sentido aritm´etico. Afirmar que 0/0 ´e indeterminada tem o seguinte significado preciso: Sejam X ⊂ R, f, g : X → R, a ∈ X ′ . Suponhamos que limx→a f (x) = limx→a g(x) = 0 e que, pondo Y = {x ∈ X; g(x) 6= 0}, ainda se tenha a ∈ Y ′ . Ent˜ao f (x)/g(x) est´a definida quando x ∈ Y e faz sentido indagar se existe limx→a f (x)/g(x). Mas nada se pode dizer em geral sobre este limite. Dependendo das fun¸c˜oes f , g, ele pode assumir qualquer valor real ou n˜ao existir. Por exemplo, dado qualquer c ∈ R, tomando f (x) = cx e g(x) = x, temos limx→0 f (x) = limx→0 g(x) = 0, enquanto limx→0 f (x)/g(x) = c. Por outro lado, se tomarmos f (x) = x · sen(1/x), (x 6= 0) e g(x) = x, teremos limx→0 f (x) = limx→0 g(x) = 0, mas n˜ao existe limx→0 f (x)/g(x). Pelo mesmo motivo, ∞ − ∞ ´e indeterminado. Isto quer dizer: podemos achar fun¸c˜oes f, g : X → R, tais que limx→a f (x) = limx→a g(x) = +∞, enquanto limx→a [f (x)−g(x)], dependendo das nossas escolhas para f e g, pode ter um valor arbitr´ ario c ∈ R ou pode n˜ao existir. Por exemplo, se f, g : R − {a} → R s˜ ao dadas por f (x) = c +

1 (x − a)2

e

g(x) =

1 , (x − a)2

ent˜ao limx→a f (x) = limx→a g(x) = +∞ e limx→a [f (x) − g(x)] = c. Analogamente, se f (x) = sen

1 1 + x − a (x − a)2

e

g(x) =

1 , (x − a)2

Se¸c˜ ao 4

Exerc´ıcios

73

n˜ao existe limx→a [f (x) − g(x)]. Mais um exemplo: dado qualquer n´ umero real c > 0 podemos achar fun¸c˜oes f, g : X → R, com a ∈ X ′ e limx→a f (x) = limx→a g(x) = 0, f (x) > 0 para todo x ∈ X, enquanto limx→a f (x)g(x) = c. Basta, por exemplo, definir f, g : (0, +∞) → R pondo f (x) = x, g(x) = log c/ log x. Neste caso, vale f (x)g(x) = c para todo x 6= 0. (Tome logaritmos de ambos os membros.) Portanto limx→0 f (x)g(x) = c. Ainda neste caso, podemos escolher f e g de modo que o limite de f (x)g(x) n˜ao exista. Basta tomar, digamos, f (x) = x e g(x) = log(1 + | sen x1 |) · (log x)−1 . Ent˜ao f (x)g(x) = 1 + | sen x1 |, portanto n˜ao existe limx→0 f (x)g(x) . Estes exemplos devem bastar para que se entenda o significado de “express˜ ao indeterminada”. O instrumento mais eficaz para o c´alculo do limite de express˜oes indeterminadas ´e a chamada “Regra de L’Hˆ opital”, que ´e objeto de infind´ aveis exerc´ıcios nos cursos de C´alculo.

4

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Defini¸ c˜ ao e primeiras propriedades

1. Sejam f : X → R, a ∈ X ′ e Y = f (X − {a}). Se limx→a f (x) = L ent˜ao L ∈ Y .

2. Sejam f : X → R e a ∈ X ′ . A fim de que exista limx→a f (x) ´e suficiente que, para toda seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X − {a} com lim xn = a, a seq¨ uˆencia (f (xn )) seja convergente. 3. Sejam f : X → R, g : Y → R com f (X) ⊂ Y , a ∈ X ′ e b ∈ Y ′ ∩ Y . Se lim f (x) = b e lim g(y) = c, x→a

y→b

prove que limx→a g(f (x)) = c, contanto que c = g(b) ou ent˜ao que x 6= a implique f (x) 6= b.

4. Sejam f, g : R → R definidas por f (x) = 0 se x ´e irracional e f (x) = x se x ∈ Q; g(0) = 1 e g(x) = 0 se x 6= 0. Mostre que limx→0 f (x)=0 e limy→0 g(y)=0, por´em n˜ao existe limx→0 g(f (x)). 5. Seja f : R → R definida por f (0) = 0 e f (x) = sen(1/x) se x 6= 0. Mostre que para todo c ∈ [−1, 1] existe uma seq¨ uˆencia de pontos xn 6= 0 tais que lim xn = 0 e lim f (xn ) = c.

74

Limites de Fun¸c˜ oes

Se¸ c˜ ao 2:

Cap. 6

Limites laterais

′ (respectivamente, a ∈ X ′ ) se, e somente se, 1. Prove que a ∈ X+ − a = lim xn ´e limite de uma seq¨ uˆencia decrescente (respectivamente, crescente) de pontos pertencentes ao conjunto X.

2. Prove que limx→a+ f (x) = L (respectivamente, limx→a− f (x) = L) se, e somente se, para toda seq¨ uˆencia decrescente (respectivamente, crescente) de pontos xn ∈ X com lim xn = a tem-se lim f (xn ) = L. 3. Seja f : R − {0} → R definida por f (x) = 1/(1 + a1/x ), onde a > 1. Prove que limx→0+ f (x) = 0 e limx→0− f (x) = 1. ′ . Se existir uma seq¨ uˆencia 4. Sejam f : X → R mon´otona e a ∈ X+ de pontos xn ∈ X com xn > a, lim xn = a e lim f (xn ) = L ent˜ao limx→a+ f (x) = L.

5. Dada f : R − {0} → R, definida por f (x) = sen(1/x)/(1 + 21/x ), determine o conjunto dos n´ umeros L tais que L = lim f (xn ), com lim xn = 0, xn 6= 0. Se¸ c˜ ao 3:

Limites no infinito, limites infinitos, etc.

1. Seja p : R → R um polinˆ omio n˜ao constante, isto ´e, para todo x ∈ R, p(x) = a0 +a1 x+· · ·+an xn , com an 6= 0 e n ≥ 1. Prove que, se n ´e par ent˜ao limx→+∞ p(x) = limx→−∞ p(x) = +∞ se an > 0 e = −∞ se an < 0. Se n ´e ´ımpar ent˜ao limx→+∞ p(x) = +∞ e limx→−∞ p(x) = −∞ quando an > 0 e os sinais dos limites s˜ ao trocados quando an < 0. 2. Seja f : R → R, definida por f (x) = x sen x. Prove que, para todo c ∈ R, existe uma seq¨ uˆencia xn ∈ R com limn→∞ xn = +∞ e limn→∞ f (xn ) = c. 3. Seja f : [a, +∞) → R limitada. Para cada t ≥ a indiquemos com Mt o sup e mt o inf de f no intervalo I = [t, +∞). Com ωt = Mt − mt indicaremos a oscila¸ca ˜o de f em I. Prove que existem limt→+∞ Mt e limt→+∞ mt . Prove que existe limx→+∞ f (x) se, e somente se, limt→+∞ ωt = 0.

7 Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

A no¸c˜ao de fun¸c˜ao cont´ınua ´e um dos pontos centrais da Topologia. Ela ser´a estudada neste cap´ıtulo em seus aspectos mais b´asicos, como introdu¸c˜ao a uma abordagem mais ampla e como instrumento para aplica¸c˜ao nos cap´ıtulos seguintes.

1

Defini¸c˜ ao e primeiras propriedades

Uma fun¸c˜ao f : no ponto a ∈ X obter δ > 0 tal Em s´ımbolos, f

X → R, definida no conjunto X ⊂ R, diz-se cont´ınua quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se que x ∈ X e |x − a| < δ impliquem |f (x) − f (a)| < ε. cont´ınua no ponto a significa:

∀ ε > 0 ∃ δ > 0; x ∈ X, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε. Chama-se descont´ınua no ponto a ∈ X uma fun¸c˜ao f : X → R que n˜ao ´e cont´ınua nesse ponto. Isto quer dizer que existe ε > 0 com a seguinte propriedade: para todo δ > 0 pode-se achar xδ ∈ X tal que |xδ − a| < δ e |f (xδ ) − f (a)| ≥ ε. Em particular, tomando δ sucessivamente igual a 1, 1/2, 1/3, . . . e escrevendo xn em vez de x1/n , vemos que f : X → R ´e descont´ınua no ponto a ∈ X se, e somente se, existe ε > 0 com a seguinte propriedade: para cada n ∈ N pode-se obter xn ∈ X com |xn − a| < 1/n e |f (xn ) − f (a)| ≥ ε. Evidentemente, |xn − a| < 1/n para todo n ∈ N implica lim xn = a.

76

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

Diz-se que f : X → R ´e uma fun¸ca ˜o cont´ınua quando f ´e cont´ınua em todos os pontos a ∈ X. A continuidade ´e um fenˆ omeno local, isto ´e, a fun¸c˜ao f : X → R ´e cont´ınua no ponto a ∈ X se, e somente se, existe uma vizinhan¸ca V de a tal que a restri¸c˜ao de f a V ∩ X ´e cont´ınua no ponto a. Se a ´e um ponto isolado do conjunto X, isto ´e, se existe δ > 0 tal que X ∩ (a − δ, a + δ) = {a}, ent˜ao toda fun¸c˜ao f : X → R ´e cont´ınua no ponto a. Em particular, se X ´e um conjunto discreto, como Z por exemplo, ent˜ao toda fun¸c˜ao f : X → R ´e cont´ınua. Se a ∈ X∩X ′ , isto ´e, se a ∈ X ´e um ponto de acumula¸c˜ao de X, ent˜ao f : X → R ´e cont´ınua no ponto a se, e somente se, limx→a f (x) = f (a). Ao contr´ario do caso de um limite, na defini¸c˜ao de fun¸c˜ao cont´ınua o ponto a deve pertencer ao conjunto X e pode-se tomar x = a pois, quando isto se d´a, a condi¸c˜ao |f (x) − f (a)| < ε torna-se 0 < ε, o que ´e ´obvio. Teorema 1. Sejam f, g : X → R cont´ınuas no ponto a ∈ X, com f (a) < g(a). Existe δ > 0 tal que f (x) < g(x) para todo x ∈ X ∩ (a − δ, a + δ).

Demonstra¸ c˜ ao: Tomemos c = [g(a)+f (a)]/2 e ε = g(a)−c = c−f (a). Ent˜ao ε > 0 e f (a) + ε = g(a) − ε = c. Pela defini¸c˜ao de continuidade, existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que x ∈ X, |x − a| < δ1 ⇒ f (a) − ε < f (x) < c e x ∈ X, |x − a| < δ2 ⇒ c < g(x) < g(a) + ε. Seja δ o menor dos n´ umeros δ1 e δ2 . Ent˜ao x ∈ X, |x − a| < δ ⇒ f (x) < c < g(x), o que prova o teorema.

Corol´ ario 1. Seja f : X → R cont´ınua no ponto a ∈ X. Se f (a) 6= 0, existe δ > 0 tal que, para todo x ∈ X ∩ (a − δ, a + δ), f (x) tem o mesmo sinal de f (a). Com efeito, para fixar id´eias suponhamos f (a) < 0. Ent˜ao basta tomar g identicamente nula no Teorema 1. Corol´ ario 2. Dadas f, g : X → R cont´ınuas, sejam Y = {x ∈ X; f (x) < g(x)} e Z = {x ∈ X, f (x) ≤ g(x)}. Existem A ⊂ R aberto e F ⊂ R fechado tais que Y = X ∩ A e Z = X ∩ F . Em particular, se X ´e aberto ent˜ ao Y ´e aberto e se X ´e fechado ent˜ ao Z ´e fechado. Com efeito, pelo Teorema 1, para cada y ∈ Y existe um S intervalo aberto Iy , de centro y, tal que {y} ⊂ X ∩Iy ⊂ Y . Da´ı resulta y∈Y {y} ⊂  S S ⊂ Y . Pondo A = I (X ∩ I ) ⊂ Y , ou seja: Y ⊂ X ∩ y y y∈Y y∈Y S I , o Teorema 1, Cap´ ıtulo 5 assegura que A ´ e um conjunto aberto. y y∈Y

Se¸c˜ ao 1

Defini¸c˜ ao e primeiras propriedades

77

Al´em disso, de Y ⊂ X ∩ A ⊂ Y conclu´ımos que Y = X ∩ A. Quanto ao conjunto Z, temos Z = X − {x ∈ X; g(x) < f (x)}. Pelo que acabamos de ver, existe B ⊂ R aberto tal que Z = X − (X ∩ B) = X ∩ (R − B). Pelo Teorema 3 do Cap´ıtulo 5, F = R−B ´e fechado, portanto Z = X ∩F como se pretendia mostrar. Teorema 2. A fim de que a fun¸ca ˜o f : X → R seja cont´ınua no ponto a ´e necess´ ario e suficiente que, para toda seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X com lim xn = a, se tenha lim f (xn ) = f (a). A demonstra¸c˜ao segue exatamente as mesmas linhas do Teorema 3, Cap´ıtulo 6, por isso ´e omitida. Corol´ ario 1. Se f, g : X → R s˜ ao cont´ınuas no ponto a ∈ X ent˜ ao s˜ ao cont´ınuas nesse mesmo ponto as fun¸co ˜es f + g, f · g : X → R, bem como a fun¸ca ˜o f /g, caso seja g(a) 6= 0. O dom´ınio da fun¸c˜ao f /g, bem entendido, ´e o subconjunto de X formado pelos pontos x tais que g(x) 6= 0. Existe δ > 0 tal que X ∩ (a − δ, a + δ) est´a contido nesse dom´ınio.

Exemplo 1. Todo polinˆ omio p : R → R ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua. Toda fun¸c˜ao racional p(x)/q(x) (quociente de dois polinˆ omios) ´e cont´ınua no seu dom´ınio, o qual ´e o conjunto dos pontos x tais que q(x) 6= 0. A fun¸c˜ao f : R → R, definida por f (x) = sen(1/x) se x 6= 0 e f (0) = 0, ´e descont´ınua no ponto 0 e ´e cont´ınua nos demais pontos da reta. A fun¸c˜ao g : R → R, dada por g(x) = x · sen(1/x) se x 6= 0 e g(0) = 0, ´e cont´ınua em toda a reta. A fun¸c˜ao ϕ : R → R, definida por ϕ(x) = 0 para x racional e ϕ(x) = 1 para x irracional, ´e descont´ınua em todos os pontos da reta por´em suas restri¸c˜oes a Q e a R − Q s˜ ao cont´ınuas porque s˜ ao constantes. Se definirmos ψ : R → R pondo ψ(x) = x · ϕ(x) veremos que ψ ´e cont´ınua apenas no ponto x = 0. Teorema 3. Sejam f : X → R cont´ınua no ponto a ∈ X, g : Y → R cont´ınua no ponto b = f (a) ∈ Y e f (X) ⊂ Y , de modo que a composta g ◦ f : X → R est´ a bem definida. Ent˜ ao g ◦ f ´e cont´ınua no ponto a. (A composta de duas fun¸co ˜es cont´ınuas ´e cont´ınua.) Demonstra¸ c˜ ao: Dado ε > 0 existe, pela continuidade de g no ponto b, um n´ umero η > 0 tal que y ∈ Y , |y − b| < η implicam |g(y) − g(b)| < ε. Por sua vez, a continuidade de f no ponto a assegura que existe δ > 0 tal que x ∈ X, |x − a| < δ implicam |f (x) − b| < η. Conseq¨ uentemente, x ∈ X ∩ (a − δ, a + δ) ⇒ |g(f (x)) − g(b)| = |(g ◦ f )(x) − (g ◦ f )(a)| < ε, o que prova o teorema.

78

2

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

Fun¸c˜ oes cont´ınuas num intervalo

Teorema 4. (Teorema do valor intermedi´ ario.) Seja f : [a, b] → R cont´ınua. Se f (a) < d < f (b) ent˜ ao existe c ∈ (a, b) tal que f (c) = d.

Demonstra¸ c˜ ao: Consideremos os conjuntos A = {x ∈ [a, b]; f (x) ≤ d} e B = {x ∈ [a, b]; f (x) ≥ d}. Pelo Corol´ario 2 do Teorema 1, A e B s˜ ao fechados, logo A ∩ B = A ∩ B = A ∩ B. Al´em disso, ´e claro que [a, b] = A ∪ B. Se for A ∩ B 6= ∅ ent˜ao o teorema est´a demonstrado porque se tem f (c) = d para qualquer c ∈ A ∩ B. Se, entretanto, fosse A ∩ B = ∅ ent˜ao [a, b] = A ∪ B seria uma cis˜ ao n˜ao trivial (porque a ∈ A e b ∈ B), o que ´e vedado pelo Teorema 5 do Cap´ıtulo 5. Logo, deve ser A ∩ B 6= ∅ e o teorema est´a provado. Corol´ ario. Se I ⊂ R ´e um intervalo e f : I → R ´e cont´ınua ent˜ ao f (I) ´e um intervalo. Isto ´e ´ obvio se f ´e constante. Caso contr´ario, sejam α = inf f (I) = inf{f (x); x ∈ I} e β = sup f (I) = sup{f (x); x ∈ I}. Se f (I) for ilimitado, tomaremos α = −∞ e/ou β = +∞. Para provar que f (I) ´e um intervalo (aberto, fechado ou semi-aberto) cujos extremos s˜ ao α e β, tomemos d tal que α < d < β. Pelas defini¸c˜oes de inf e sup, existem a, b ∈ I tais que α ≤ f (a) < d < f (b) ≤ β. Pelo Teorema 4 existe c ∈ [a, b], logo c ∈ I, tal que f (c) = d. Assim d ∈ f (I). Isto prova que (α, β) ⊂ f (I). Como α ´e o inf e β ´e o sup de f (I), nenhum n´ umero real menor do que α ou maior do que β pode estar em f (I). Portanto f (I) ´e um intervalo cujos extremos s˜ ao α e β. Observa¸ c˜ ao. Se I = [a, b] ´e um intervalo compacto ent˜ao f (I) ´e tamb´em um intervalo compacto, pelo Teorema 7, a seguir. Mas se I n˜ao ´e fechado ou ´e ilimitado, f (I) pode n˜ao ser do mesmo tipo que I. Por exemplo, seja f : R → R dada por f (x) = sen x. Tomando sucessivamente os intervalos abertos I1 = (0, 7), I2 = (0, π/2) e I3 = (0, π) temos f (I1 ) = [−1, 1], f (I2 ) = (0, 1) e f (I3 ) = (0, 1]. Exemplo 2. Como aplica¸c˜ao, mostraremos que todo polinˆ omio p : R → R, de grau ´ımpar, possui alguma raiz real. Seja p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn com n ´ımpar e an 6= 0. Para fixar as id´eias, suporemos an > 0. Pondo an xn em evidˆencia podemos escrever p(x) = an xn · r(x), onde r(x) =

a0 1 a1 1 an−1 1 · n+ · n−1 + · · · + · + 1. an x an x an x

Se¸c˜ ao 2

Fun¸c˜ oes cont´ınuas num intervalo

79

´ claro que limx→+∞ r(x) = limx→−∞ r(x) = 1. Logo limx→+∞ p(x) = E limx→+∞ an xn = +∞ e limx→−∞ p(x) = limx→−∞ an xn = −∞ (porque n ´e ´ımpar). Portanto o intervalo p(R) ´e ilimitado inferior e superiormente, isto ´e p(R) = R. Isto significa que p : R → R ´e sobrejetiva. Em particular, deve existir c ∈ R tal que p(c) = 0. Evidentemente, um polinˆ omio de grau par, como p(x) = x2 + 1, por exemplo, pode n˜ao ter raiz real. √ Exemplo 3. (Existˆencia de n a.) Fixado n ∈ N, a fun¸c˜ao f : [0, +∞) → [0, +∞), definida por f (x) = xn , ´e crescente (portanto injetiva), com f (0) = 0 e limx→+∞ f (x) = +∞. Sua imagem ´e, portanto, um subintervalo ilimitado de [0, +∞), contendo seu extremo inferior, igual a zero. Logo f ([0, +∞)) = [0, +∞), isto ´e, f ´e uma bije¸c˜ao de [0, +∞) sobre si mesmo. Isto significa que, para todo n´ umero real a ≥ 0, existe um u ´nico √ n´ umero real b ≥ 0 tal que a = bn , ou seja, b = n a. No caso particular de n ´ımpar, a fun¸c˜ao x 7→ xn ´e uma bije¸c˜ao de R sobre R, de modo que, neste caso, todo n´ umero real a possui uma raiz n-´esima, que ´e positiva quando a > 0 e negativa se a < 0. Exemplo 4. O Teorema 4 ´e do tipo dos chamados “teoremas de existˆencia”. Sob certas condi¸c˜oes, ele assergura a existˆencia de uma raiz para a equa¸c˜ao f (x) = d. Uma de suas mais simples aplica¸c˜oes ´e a seguinte. Seja f : [a, b] → R uma fun¸c˜ao cont´ınua tal que f (a) ≤ a e b ≤ f (b). Nestas condi¸c˜oes, existe pelo menos um n´ umero c ∈ [a, b] tal que f (c) = c. Com efeito, a fun¸c˜ao ϕ : [a, b] → R, definida por ϕ(x) = x − f (x), ´e cont´ınua, com ϕ(a) ≥ 0 e ϕ(b) ≤ 0. Pelo Teorema 4, deve existir c ∈ [a, b] tal que ϕ(c) = 0, isto ´e, f (c) = c. Um ponto x ∈ X tal que f (x) = x chama-se um ponto fixo da fun¸c˜ao f : X → R. O resultado que acabamos de provar ´e a vers˜ao unidimensional do conhecido “Teorema do ponto fixo de Brouwer”. Outra aplica¸c˜ao do Teorema 4 se refere `a continuidade da fun¸c˜ao inversa. Sejam X, Y ⊂ R e f : X → Y uma bije¸c˜ao. Supondo f cont´ınua, pode-se concluir que sua inversa f −1 : Y → X tamb´em seja cont´ınua? A resposta ´e, em geral, negativa, como mostra o seguinte exemplo. Exemplo 5. Sejam X = [−1, 0] ∪ (1, 2] e Y = [0, 4]. A fun¸c˜ao f : X → Y , definida por f (x) = x2 , ´e uma bije¸c˜ao de X sobre Y , a qual ´e obviamente cont´ınua (ver Fig. 3). Sua inversa g : Y → X ´e dada por √ √ g(y) = − y se 0 ≤ y ≤ 1 e g(y) = y se 1 < y ≤ 4. Logo g ´e descont´ınua no ponto y = 1. (Pois limy→1− g(y) = −1 e limy→1+ g(y) = 1.)

80

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

Figura 3

Mostraremos agora que se uma bije¸c˜ao f : I → J, entre intervalos, ´e cont´ınua, ent˜ao sua inversa f −1 : J → I tamb´em ´e cont´ınua. Na se¸c˜ao 3, abaixo, veremos que a inversa de uma bije¸c˜ao cont´ınua tamb´em ´e cont´ınua se o dom´ınio ´e compacto. (No Exemplo 5, o dom´ınio de f n˜ao ´e um intervalo nem ´e um conjunto compacto.) Teorema 5. Seja I ⊂ R um intervalo. Toda fun¸ca ˜o cont´ınua injetiva f : I → R ´e mon´ otona e sua inversa g : J → I, definida no intervalo J = f (I), ´e cont´ınua. Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos, inicialmente, que I = [a, b] seja um intervalo limitado e fechado. Para fixar as id´eias, seja f (a) < f (b). Mostraremos ent˜ao que f ´e crescente. Do contr´ario existiriam pontos x < y em [a, b] com f (x) > f (y). H´ a duas possibilidades: f (a) < f (y) ou f (a) > f (y). No primeiro caso, temos f (a) < f (y) < f (x) logo, pelo Teorema 4, existe c ∈ (a, x) com f (c) = f (y) assim contradizendo a injetividade de f . No segundo caso, vem f (y) < f (a) < f (b) portanto existir´ a c ∈ (y, b) com f (c) = f (a), outra contradi¸c˜ao. Logo f ´e mesmo crescente. Agora seja f : I → R cont´ınua e injetiva no intervalo arbitr´ ario I. Se f n˜ao fosse mon´otona, existiriam pontos u < v e x < y em I tais que f (u) < f (v) e f (x) > f (y). Sejam a o menor e b o maior dos n´ umeros u, v, x, y. Ent˜ao f , restrita ao intervalo [a, b], seria cont´ınua, injetiva por´em n˜ao mon´otona, contradizendo o que acabamos de provar. Finalmente, consideremos a inversa g : J → I da bije¸c˜ao cont´ınua crescente f : I → J. Evidentemente, g ´e crescente. Sejam a ∈ I um ponto arbitr´ ario e b = f (a). Para provar que g ´e cont´ınua no ponto b,

Se¸c˜ ao 3

Fun¸c˜ oes cont´ınuas em conjuntos compactos

81

come¸camos supondo a interior a I. Ent˜ao, dado ε > 0, podemos admitir que (a − ε, a + ε) ⊂ I. Assim, f (a − ε) = b − α e f (a + ε) = b + β, onde α > 0 e β > 0. Seja δ = min{α, β}. Como g ´e crescente, y ∈ J, b − δ < y < b + δ ⇒ b − α < y < b + β ⇒ g(b − α) < g(y) < g(b + β) ⇒ a − ε < g(y) < a + ε. Logo g ´e cont´ınua no ponto b. Se, entretanto, a ´e uma extremidade de I, digamos a inferior, ent˜ao b = f (a) ´e a extremidade inferior de J. Dado arbitrariamente ε > 0 podemos supor a + ε ∈ I e teremos f (a + ε) = b + δ, δ > 0. Ent˜ao y ∈ J, b − δ < y < b + δ ⇒ b ≤ y < b + δ

⇒ a ≤ g(y) < g(b + δ)

⇒ a ≤ g(y) < a + ε

⇒ a − ε < g(y) < a + ε logo g ´e, ainda neste caso, cont´ınua no ponto b. Corol´ ario. Para todo n ∈ N, a fun¸ca ˜o g : [0, +∞) → [0, +∞), definida √ por g(x) = n x, ´e cont´ınua. Com efeito, g ´e a inversa da bije¸c˜ao cont´ınua f : [0, +∞) → [0, +∞), definida por f (x) = xn . No caso particular de n ´ımpar, f : R → R dada por f (x) = xn ´e uma bije¸c˜ao cont´ınua e sua inversa g : R → R, ainda indicada com a nota¸c˜ao √ g(x) = n x, ´e cont´ınua em toda a reta. Sejam X ⊂ R e Y ⊂ R. Um homeomorfismo entre X e Y ´e uma biej¸c˜ao cont´ınua f : X → Y cuja inversa f −1 : Y → X ´e tamb´em cont´ınua. O Teorema 5 diz, portanto, que se I ´e um intervalo ent˜ao toda fun¸c˜ao cont´ınua e injetiva f : I → R ´e um homeomorfismo entre I e o intervalo J = f (I).

3

Fun¸c˜ oes cont´ınuas em conjuntos compactos

Muitos problemas em Matem´ atica e nas suas aplica¸c˜oes consistem em procurar pontos de um conjunto X nos quais uma certa fun¸c˜ao real f : X → R assume seu valor m´ aximo ou seu valor m´ınimo. Antes de tentar resolver um desses problemas, ´e necess´ario saber se realmente tais pontos existem. Para come¸car, a fun¸c˜ao f pode ser ilimitada superiormente (e ent˜ao n˜ao possui valor m´ aximo) ou inferiormente (e n˜ao ter´ a valor m´ınimo). Entretanto, mesmo limitada, f pode n˜ao assumir valor m´ aximo em X, ou m´ınimo, ou nenhum dos dois.

82

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

Exemplo 6. Sejam X = (0, 1) e f : X → R dada por f (x) = x. Ent˜ao f (X) = (0, 1) logo, para todo x ∈ X existem x′ , x′′ ∈ X com f (x′ ) < f (x) < f (x′′ ). Isto significa que, para nenhum x ∈ X, o valor f (x) ´e o maior nem o menor que f assume em X. Noutro exemplo, podemos tomar g : R → R, g(x) = 1/(1 + x2 ). Temos 0 < g(x) ≤ 1 para todo x ∈ R. Como g(0) = 1, vemos que g(0) ´e o valor m´ aximo de g(x) para todo x ∈ R. Mas n˜ao existe x ∈ R tal que g(x) seja o menor valor de g. Com efeito, se x > 0 basta tomar x′ > x para ter g(x′ ) < g(x). E se x < 0, toma-se x′ < x e se tem novamente g(x′ ) < g(x).

Figura 4: Gr´ afico da fun¸c˜ ao g(x) =

1 . 1 + x2

O teorema seguinte assegura a existˆencia de valores m´ aximos e m´ınimos de uma fun¸c˜ao cont´ınua quando seu dom´ınio ´e compacto. Teorema 6. (Weierstrass.) Seja f : X → R cont´ınua no conjunto compacto X ⊂ R. Existem x0 , x1 ∈ X tais que f (x0 ) ≤ f (x) ≤ f (x1 ) para todo x ∈ X. Estabeleceremos o Teorema de Weierstrass como conseq¨ uˆencia do

Teorema 7. A imagem f (X) de um conjunto compacto X ⊂ R por uma fun¸ca ˜o cont´ınua f : X → R ´e um conjunto compacto.

Demonstra¸ c˜ ao: De acordo com o Teorema 8 do Cap´ıtulo 5, devemos provar que toda seq¨ uˆencia de pontos yn ∈ f (X) possui uma subseq¨ uˆencia que converge para algum ponto em f (X). Ora, para cada n ∈ N temos yn = f (xn ), com xn ∈ X. Como X ´e compacto, a seq¨ uˆencia (xn ) possui uma subseq¨ uˆencia (xn )n∈N′ que converge para um ponto a ∈ X. Sendo f cont´ınua no ponto a, de limn∈N′ xn = a conclu´ımos que, pondo b = f (a), temos b ∈ f (X) e, al´em disso, limn∈N′ yn = limn∈N′ f (xn ) = f (a) = b, como quer´ıamos demonstrar.

Se¸c˜ ao 4

Continuidade uniforme

83

Demonstra¸ c˜ ao: (do Teorema 6.) Como foi visto na se¸c˜ao 4 do Cap´ıtulo 5, o conjunto compacto f (X) possui um menor elemento f (x0 ) e um maior elemento f (x1 ). Isto quer dizer que existem x0 , x1 ∈ X tais que f (x0 ) ≤ f (x) ≤ f (x1 ) para todo x ∈ X. Corol´ ario. Se X ⊂ R ´e compacto ent˜ ao toda fun¸ca ˜o cont´ınua f : X → R ´e limitada, isto ´e, existe c > 0 tal que |f (x)| ≤ c para todo x ∈ X. Exemplo 7. A fun¸c˜ao f : (0, 1] → R, definida por f (x) = 1/x, ´e cont´ınua por´em n˜ao ´e limitada. Isto se d´a porque seu dom´ınio (0, 1] n˜ao ´e compacto. Teorema 8. Se X ⊂ R ´e compacto ent˜ ao toda bije¸ca ˜o cont´ınua f : X → Y ⊂ R tem inversa cont´ınua g : Y → X.

Demonstra¸ c˜ ao: Tomemos um ponto arbitr´ ario b = f (a) em Y e mostremos que g ´e cont´ınua no ponto b. Se n˜ao fosse assim, existiriam um n´ umero ε > 0 e uma seq¨ uˆencia de pontos yn = f (xn ) ∈ Y com lim yn = b e |g(yn ) − g(b)| ≥ ε, isto ´e, |xn − a| ≥ ε para todo n ∈ N. Passando a uma subseq¨ uˆencia, se necess´ario, podemos supor que lim xn = a′ ∈ X, pois X ´e compacto. Tem-se |a′ − a| ≥ ε. Em particular, a′ 6= a. Mas, pela continuidade de f , lim yn = lim f (xn ) = f (a′ ). Como j´a temos lim yn = b = f (a), da´ı resultaria f (a) = f (a′ ), contradizendo a injetividade de f . Exemplo 8. O conjunto Y = {0, 1, 1/2, . . . , 1/n, . . . } ´e compacto e a bije¸c˜ao f : N → Y , definida por f (1) = 0, f (n) = 1/(n − 1) se n > 1, ´e cont´ınua mas sua inversa f −1 : Y → N ´e descont´ınua no ponto 0. Logo, no Teorema 8, a compacidade de X n˜ao pode ser substitu´ıda pela de Y .

4

Continuidade uniforme

Seja f : X → R cont´ınua. Dado ε > 0, para cada x ∈ X pode-se achar δ > 0 tal que y ∈ X, |y − x| < δ implicam |f (y) − f (x)| < ε. O n´ umero positivo δ depende n˜ao apenas do ε > 0 dado mas tamb´em do ponto x no qual a continuidade de f ´e examinada. Nem sempre, dado ε > 0, pode-se encontrar um δ > 0 que sirva em todos os pontos x ∈ X (mesmo sendo f cont´ınua em todos esses pontos). Exemplo 9. Seja f : R−{0} → R definida por f (x) = x/|x|, logo f (x) = 1 se x > 0 e f (x) = −1 para x < 0. Esta fun¸c˜ao ´e cont´ınua em R − {0} pois ´e constante numa vizinhan¸ca de cada ponto x 6= 0. Entretanto,

84

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

se tomarmos ε < 2, para todo δ > 0 que escolhermos, existir˜ ao sempre pontos x, y ∈ R − {0} tais que |y − x| < δ e |f (y) − f (x)| ≥ ε. Basta tomar x = δ/3 e y = −δ/3. Exemplo 10. A fun¸c˜ao f : R+ → R, definida por f (x) = 1/x, ´e cont´ınua. Mas, dado ε, com 0 < ε < 1, seja qual for δ > 0 escolhido, tomamos um n´ umero natural n > 1/δ e pomos x = 1/n, y = 1/2n. Ent˜ao 0 < y < x < δ, donde |y − x| < δ por´em |f (y) − f (x)| = 2n − n = n ≥ 1 > ε. Uma fun¸c˜ao f : X → R diz-se uniformemente cont´ınua no conjunto X quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se obter δ > 0 tal que x, y ∈ X, |y − x| < δ implicam |f (y) − f (x)| < ε. Uma fun¸c˜ao uniformemente cont´ınua f : X → R ´e cont´ınua em todos os pontos do conjunto X. A rec´ıproca ´e falsa, como se vˆe nos Exemplos 9 e 10 acima. A continuidade de uma fun¸c˜ao f : X → R no ponto a ∈ X significa que se pode tornar f (x) t˜ao pr´oximo de f (a) quanto se deseje, contanto que se tome x suficientemente pr´oximo de a. Note-se a assimetria: o ponto a est´a fixo e x se aproxima dele, a fim de que f (x) se aproxime de f (a). Na continuidade uniforme, pode-se fazer com que f (x) e f (y) se tornem t˜ao pr´oximos um do outro quanto se queira, bastando que x, y ∈ X estejam tamb´em pr´oximos. Aqui, x e y s˜ ao vari´aveis e desempenham pap´eis sim´etricos na defini¸c˜ao. Outra distin¸c˜ao entre a mera continuidade e a continuidade uniforme ´e a seguinte: se cada ponto x ∈ X possui uma vizinhan¸ca V tal que a restri¸c˜ao de f a X ∩ V ´e cont´ınua, ent˜ao a fun¸c˜ao f : X → R ´e cont´ınua. Mas, como mostram o Exemplo 9 e o Exemplo 10 acima, se cada ponto x ∈ X possui uma vizinhan¸ca V tal que f ´e uniformemente cont´ınua em X ∩ V , da´ı n˜ao se conclui necessariamente que f : X → R seja uniformemente cont´ınua no conjunto X. Isto se exprime dizendo que a continuidade ´e uma no¸c˜ao local enquanto a continuidade uniforme ´e um conceito global. Exemplo 11. Uma fun¸c˜ao f : X → R chama-se lipschitziana quando existe uma constante k > 0 (chamada constante de Lipschitz da fun¸c˜ao f ) tal que |f (x) − f (y)| ≤ k|x − y| sejam quais forem x, y ∈ X. A fim de que f : X → R seja lipschitziana ´e necess´ario e suficiente que o quociente [f (y) − f (x)]/(y − x) seja limitado, isto ´e, que exista uma constante k > 0 tal que x, y ∈ X, x 6= y ⇒ |f (y) − f (x)|/|y − x| ≤ k. Toda

Se¸c˜ ao 4

Continuidade uniforme

85

fun¸c˜ao lipschitziana f : X → R ´e uniformente cont´ınua: dado ε > 0, tome-se δ = ε/k. Ent˜ao x, y ∈ X, |x − y| < δ ⇒ |f (y) − f (x)| ≤ k|x − y| < k · ε/k = ε. Se f : R → R ´e um polinˆ omio de grau 1, isto ´e, f (x) = ax + b, com a 6= 0, ent˜ao f ´e lipschitziana com constante k = |a| pois |f (y) − f (x)| = |ay + b − (ax + b)| = |a| · |y − x|. A fun¸c˜ao f do Exemplo 10 evidentemente n˜ao ´e lipschitziana pois n˜ao ´e uniformemente cont´ınua. Entretanto, para todo a > 0, a restri¸c˜ao de f ao intervalo [a, +∞) ´e lipschitziana (e, portanto, uniformemente cont´ınua), com constante k = 1/a2 . Com efeito, se x ≥ a e y ≥ a ent˜ao |f (y) − f (x)| = |y − x|/|yx| ≤ |y − x|/a2 = k|y − x|. Teorema 9. A fim de que f : X → R seja uniformemente cont´ınua ´e necess´ ario e suficiente que, para todo par de seq¨ uˆencias (xn ), (yn ) em X com lim(yn − xn ) = 0, tenha-se lim[f (yn ) − f (xn )] = 0.

Demonstra¸ c˜ ao: Se f ´e uniformemente cont´ınua e lim(yn − xn ) = 0 ent˜ao, dado arbitrariamente ε > 0, existe δ > 0 tal que x, y ∈ X, |y−x| < δ implicam |f (y) − f (x)| < ε. Existe tamb´em n0 ∈ N tal que n > n0 implica |yn − xn | < δ. Logo n > n0 implica |f (yn ) − f (xn )| < ε e da´ı lim[f (yn ) − f (xn )] = 0. Reciprocamente, suponhamos v´alida a condi¸c˜ao estipulada no enunciado do teorema. Se f n˜ao fosse uniformemente cont´ınua, existiria um ε > 0 com a seguinte propriedade: para todo n ∈ N poder´ıamos achar pontos xn , yn em X tais que |yn − xn | < 1/n e |f (yn ) − f (xn )| ≥ ε. Ent˜ao ter´ıamos lim(yn − xn ) = 0 sem que fosse lim[f (yn )−f (xn )] = 0. Esta contradi¸c˜ao conclui a prova do teorema. Exemplo 12. A fun¸c˜ao f : R → R, dada por f (x) = x2 , n˜ao ´e uniformemente cont´ınua. Com efeito, tomando xn = n e yn = n + 1/n temos lim(yn − xn ) = lim(1/n) = 0 mas f (yn ) − f (xn ) = n2 + 2 + 1/n2 − n2 = 2 + 1/n2 > 2, logo n˜ao se tem lim[f (yn ) − f (xn )] = 0. Teorema 10. Seja X ⊂ R compacto. Toda fun¸ca ˜o cont´ınua f : X → R ´e uniformemente cont´ınua. Demonstra¸ c˜ ao: Se f n˜ao fosse uniformemente cont´ınua, existiriam ε > 0 e duas seq¨ uˆencias (xn ), (yn ) em X satisfazendo lim(yn − xn ) = 0 e |f (yn ) − f (xn )| ≥ ε para todo n ∈ N. Passando a uma subseq¨ uˆencia, se necess´ario, podemos supor, em virtude da compacidade de X, que lim xn = a ∈ X. Ent˜ao, como yn = (yn − xn ) + xn , vale tamb´em lim yn = a. Sendo f cont´ınua no ponto a, temos lim[f (yn ) − f (xn )] = lim f (yn ) − lim f (xn ) = f (a) − f (a) = 0, contradizendo que seja |f (yn ) − f (xn )| ≥ ε para todo n ∈ N.

86

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Cap. 7

√ Exemplo 13. A fun¸c˜ao f : [0, +∞) → R dada por f (x) = x, n˜ao ´e lipschitziana. Com efeito, multiplicando o numerador e o denominador √ √ √ √ √ √ por y + x, vemos que ( y − x)/(y − x) = 1/( y + x). To√ √ mando x 6= y suficientemente pequenos, podemos tornar y + x t˜ao √ √ pequeno quanto se deseje, logo o quociente ( y− x)/(y−x) ´e ilimitado. Entretanto, f ´e lipschitziana (portanto uniformemente cont´ınua) no in√ √ √ √ tervalo [1, +∞), pois x, y ∈ [1, +∞) ⇒ x + y ≥ 2 ⇒ | y − x| = √ √ |y − x|/( y + x) ≤ 21 |y − x|. Tamb´em no intervalo [0, 1], embora n˜ao seja lipschitziana, f ´e uniformemente cont´ınua porque [0, 1] ´e compacto. Da´ı resulta que f : [0, +∞) → R ´e uniformemente cont´ınua. Com efeito, dado ε > 0, existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que x, y ∈ [0, 1], |y − x| < δ1 ⇒ |f (y) − f (x)| < ε/2 e x, y ∈ [1, +∞), |y − x| < δ2 ⇒ |f (y) − f (x)| < ε/2. Seja δ = min{δ1 , δ2 }. Dados x, y ∈ [0, +∞) com |y − x| < δ, se x, y ∈ [0, 1] ou x, y ∈ [1, +∞) temos obviamente |f (y) − f (x)| < ε. Se, digamos, x ∈ [0, 1] e y ∈ [1, +∞) ent˜ao |y − 1| < δ e |1 − x| < δ logo |f (y) − f (x)| ≤ |f (y) − f (1)| + |f (1) − f (x)| < ε/2 + ε/2 = ε. Teorema 11. Toda fun¸ca ˜o f : X → R, uniformemente cont´ınua num conjunto limitado X, ´e uma fun¸ca ˜o limitada. Demonstra¸ c˜ ao: Se f n˜ao fosse limitada (digamos superiormente) ent˜ao existiria uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X tais que f (xn+1 ) > f (xn ) + 1 para todo n ∈ N. Como X ´e limitado, podemos (passando a uma subseq¨ uˆencia, se necess´ario) supor que a seq¨ uˆencia (xn ) ´e convergente. Ent˜ao, pondo yn = xn+1 , ter´ıamos lim(yn − xn ) = 0 mas, como f (yn ) − f (xn ) > 1, n˜ao vale lim[f (yn ) − f (xn )] = 0, logo f n˜ao ´e uniformemente cont´ınua. O Teorema 11 d´a outra maneira de ver que f (x) = 1/x n˜ao ´e uniformemente cont´ınua no intervalo (0, 1], pois f ((0, 1]) = [1, +∞). Teorema 12. Se f : X → R ´e uniformemente cont´ınua ent˜ ao, para cada a ∈ X ′ (mesmo que a n˜ ao perten¸ca a X), existe limx→a f (x).

Demonstra¸ c˜ ao: Fixemos uma seq¨ uˆencia de pontos an ∈ X − {a} com lim an = a. Segue-se do Teorema 11 que a seq¨ uˆencia (f (an )) ´e limitada. Passando a uma subseq¨ uˆencia, se necess´ario, podemos supor que lim f (an ) = b. Afirmamos agora que se tem lim f (xn ) = b seja qual for a seq¨ıˆencia de pontos xn ∈ X − {a} com lim xn = a. Com efeito, temos lim(xn − an ) = 0. Como f ´e uniformemente cont´ınua, seguese que lim[f (xn ) − f (an )]=0, logo lim f (xn )= lim f (an ) + lim[f (xn ) − f (an )]=b.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

87

Exemplo 14. O Teorema 12 implica que 1/x em R+ , bem como x/|x| e sen(1/x) em R − {0}, n˜ao s˜ ao uniformemente cont´ınuas.

5

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Defini¸ c˜ ao e primeiras propriedades

1. Sejam f, g : X → R cont´ınuas no ponto a ∈ X. Prove que s˜ ao cont´ınuas no ponto a as fun¸c˜oes ϕ, ψ : X → R, definidas por ϕ(x) = max{f (x), g(x)} e ψ(x) = min{f (x), g(x)} para todo x ∈ X. 2. Sejam f, g : X → R cont´ınuas. Prove que se X ´e aberto ent˜ao o conjunto A = {x ∈ X; f (x) 6= g(x)} ´e aberto e se X ´e fechado ent˜ao o conjunto F = {x ∈ X; f (x) = g(x)} ´e fechado. 3. Uma fun¸c˜ao f : X → R diz-se semi-cont´ınua superiormente (scs) no ponto a ∈ X quando, para cada c > f (a) dado, existe δ > 0 tal que x ∈ X, |x − a| < δ implicam f (x) < c. Defina fun¸ca ˜o semicont´ınua inferiormente (sci) no ponto a. Prove que f ´e cont´ınua no ponto a se, e somente se, ´e scs e sci nesse ponto. Prove que se f ´e scs, g ´e sci no ponto a e f (a) < g(a) ent˜ao existe δ > 0 tal que x ∈ X, |x − a| < δ ⇒ f (x) < g(x). 4. Seja f : R → R cont´ınua. Prove que se f (x) = 0 para todo x ∈ X ent˜ao f (x) = 0 para todo x ∈ X. 5. Prove que f : R → R ´e cont´ınua se, e somente se, para todo X ⊂ R, tem-se f (X) ⊂ f (X). 6. Sejam f, g : X → R cont´ınuas no ponto a. Suponha que, em cada vizinhan¸ca V de a, existam pontos x, y tais que f (x) < g(x) e f (y) > g(y). Prove que f (a) = g(a). 7. Seja f : X → R descont´ınua no ponto a ∈ X. Prove que existe ε > 0 com a seguinte propriedade: ou se pode achar uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ X com lim xn = a e f (xn ) > f (a) + ε para todo n ∈ N ou acha-se (yn ) com yn ∈ X, lim yn = a e f (yn ) < f (a) − ε para todo n ∈ N.

88

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas

Se¸ c˜ ao 2:

Cap. 7

Fun¸ co ˜es cont´ınuas num intervalo

1. Uma fun¸c˜ao f : X → R diz-se localmente constante quando todo ponto de X possui uma vizinhan¸ca V tal que f ´e constante em V ∩ X. Prove que toda fun¸c˜ao f : I → R, localmente constante num intervalo I, ´e constante. 2. Seja f : I → R uma fun¸c˜ao mon´otona, definida no intervalo I. Se a imagem f (I) ´e um intervalo, prove que f ´e cont´ınua. 3. Diz-se que uma fun¸c˜ao f : I → R, definida no intervalo I, tem a propriedade do valor intermedi´ ario quando a imagem f (J) de todo intervalo J ⊂ I ´e um intervalo. Mostre que a fun¸c˜ao f : R → R, dada por f (x) = sen(1/x) se x 6= 0 e f (0) = 0, tem a propriedade do valor intermedi´ario, embora seja descont´ınua. 4. Seja f : I → R uma fun¸c˜ao com a propriedade do valor intermedi´ ario. Se, para cada c ∈ R, existe apenas um n´ umero finito de pontos x ∈ I tais que f (x) = c, prove que f ´e cont´ınua. 5. Seja f : [0, 1] → R cont´ınua, tal que f (0) = f (1). Prove que existe x ∈ [0, 1/2] tal que f (x) = f (x + 1/2). Prove o mesmo resultado com 1/3 em vez de 1/2. Generalize.

Se¸ c˜ ao 3:

Fun¸ co ˜es cont´ınuas em conjuntos compactos

1. Seja f : R → R cont´ınua, tal que limx→+∞ f (x) = limx→−∞ f (x) = +∞. Prove que existe x0 ∈ R tal que f (x0 ) ≤ f (x) para todo x ∈ R.

2. Seja f : R→R cont´ınua, com lim f (x)= + ∞ e lim f (x)= − ∞. x→+∞

x→−∞

Prove que, para todo c ∈ R dado, existe entre as ra´ızes x da equa¸c˜ao f (x) = c uma cujo m´ odulo |x| ´e m´ınimo.

3. Prove que n˜ao existe uma fun¸c˜ao cont´ınua f : [a, b] → R que assuma cada um dos seus valores f (x), x ∈ [a, b], exatamente duas vezes.

4. Uma fun¸c˜ao f : R → R diz-se peri´ odica quando existe p ∈ R+ tal que f (x + p) = f (x) para todo x ∈ R. Prove que toda fun¸c˜ao cont´ınua peri´ odica f : R → R ´e limitada e atinge seus valores m´ aximo e m´ınimo, isto ´e, existem x0 , x1 ∈ R tais que f (x0 ) ≤ f (x) ≤ f (x1 ) para todo x ∈ R.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

89

5. Seja f : X → R cont´ınua no conjunto compacto X. Prove que, para todo ε > 0 dado, existe kε > 0 tal que x, y ∈ X, |y − x| ≥ ε ⇒ |f (y) − f (x)| ≤ kε |y − x|. (Isto significa que f cumpre a condi¸c˜ao de Lipschitz contanto que os pontos x, y n˜ao estejam muito pr´oximos.) Se¸ c˜ ao 4:

Continuidade uniforme

1. Se toda fun¸c˜ao cont´ınua f : X → R ´e uniformemente cont´ınua, prove que o conjunto X ´e fechado por´em n˜ao necessariamente compacto. 2. Mostre que a fun¸c˜ao cont´ınua f : R → R, dada por f (x) = sen(x2 ), n˜ao ´e uniformemente cont´ınua. 3. Dada f : X → R uniformemente cont´ınua, defina ϕ : X → R pondo ϕ(x) = f (x) se x ∈ X ´e um ponto isolado e ϕ(x) = limy→x f (y) se x ∈ X ′ . Prove que ϕ ´e uniformemente cont´ınua e ϕ(x) = f (x) para todo x ∈ X.

4. Seja f : R → R cont´ınua. Se existem

lim f (x) e

x→+∞

lim f (x),

x→−∞

prove que f ´e uniformemente cont´ınua. Mesma conclus˜ao vale se existem os limites de f (x) − x quando x → ±∞.

5. Sejam f, g : X → R uniformemente cont´ınuas. Prove que f + g ´e uniformemente cont´ınua. O mesmo ocorre com o produto f · g, desde que f e g sejam limitadas. Prove que ϕ, ψ : X → R, dadas por ϕ(x) = max{f (x), g(x)} e ψ(x) = min{f (x), g(x)} x ∈ X s˜ ao uniformemente cont´ınuas.

8 Derivadas

Sejam f : X → R e a ∈ X. O quociente q(x) = [f (x) − f (a)]/(x − a) tem sentido para x 6= a, logo define uma fun¸c˜ao q : X − {a} → R, cujo valor q(x) ´e a inclina¸ca ˜o da secante (reta que liga os pontos (a, f (a)) e (x, f (x)) no gr´ afico de f ) em rela¸c˜ao ao eixo x. Se imaginarmos x como o tempo e f (x) como a abcissa, no instante x, de um ponto m´ ovel que se desloca sobre o eixo x, ent˜ao q(x) ´e a velocidade m´edia desse ponto no intervalo de tempo decorrido entre os intantes a e x. De um modo geral, o quociente q(x) ´e a rela¸c˜ao entre a varia¸c˜ao de f (x) e a varia¸c˜ao de x a partir do ponto x = a. No caso em que a ∈ X ′ ∩ X ent˜ao ´e natural considerar limx→a q(x). As interpreta¸c˜oes deste limite, nos contextos acima, s˜ ao respectivamente a inclina¸c˜ao da tangente ao gr´ afico de f no ponto (a, f (a)), a velocidade instantˆanea do m´ ovel no instante x = a ou, em geral, a “taxa de varia¸c˜ao” da fun¸c˜ao f no ponto a. Esse limite ´e uma das no¸c˜oes mais importantes da Matem´ atica e suas aplica¸c˜oes. Ele ser´a o objeto de estudo neste cap´ıtulo.

Se¸c˜ ao 1

1

A no¸c˜ ao de derivada

91

A no¸c˜ ao de derivada

Sejam f : X → R e a ∈ X ∩ X ′ . A derivada da fun¸c˜ao f no ponto a ´e o limite f (a + h) − f (a) f (x) − f (a) f ′ (a) = lim = lim · x→a h→0 x−a h Bem entendido, o limite acima pode existir ou n˜ao. Se existir, diz-se que f ´e deriv´ avel no ponto a. Quando existe a derivada f ′ (x) em todos os pontos x ∈ X ∩ X ′ diz-se que a fun¸c˜ao f : X → R ´e deriv´ avel no conjunto X e obt´em-se uma nova fun¸c˜ao f ′ : X ∩ X ′ → R, x 7→ f ′ (x), chamada a fun¸ca ˜o derivada de f . Se f ′ ´e cont´ınua, diz-se que f ´e de classe C 1 . Outras nota¸c˜oes para a derivada de f no ponto a s˜ ao df df Df (a), · (a) e dx dx x=a

Teorema 1. A fim de que f : X → R seja deriv´ avel no ponto a ∈ X ∩X ′ ´e necess´ ario e suficiente que exista c ∈ R tal que a+h ∈ X ⇒ f (a+h) = f (a) + c · h + r(h), onde limh→0 r(h)/h = 0. No caso afirmativo, tem-se c = f ′ (a). Demonstra¸ c˜ ao: Seja Y = {h ∈ R; a + h ∈ X}. Ent˜ao 0 ∈ Y ∩ Y ′ . Supondo que f ′ (a) exista, definimos r : Y → R pondo r(h) = f (a + h) − f (a) − f ′ (a) · h. Ent˜ao f (a + h) − f (a) r(h) = − f ′ (a), h h logo limh→0 r(h)/h = 0. A condi¸c˜ao ´e, portanto, necess´aria. Reciprocamente, se vale a condi¸c˜ao, ent˜ao r(h)/h = [f (a + h) − f (a)]/h − c, logo limh→0 (f (a + h) − f (a))/h − c = limh→0 r(h)/h = 0, portanto f ′ (a) existe e ´e igual a c. Corol´ ario. Uma fun¸ca ˜o ´e cont´ınua nos pontos em que ´e deriv´ avel. Com efeito, se f ´e deriv´avel no ponto a ent˜ao f (a+h) = f (a)+f ′ (a)· h + [r(h)/h]h com limh→0 [r(h)/h] = 0, logo limh→0 f (a + h) = f (a), ou seja, f ´e cont´ınua no ponto a. Observa¸ c˜ ao. Para toda fun¸c˜ao f , definida nos pontos a e a + h, e todo n´ umero real c, pode-se sempre escrever a igualdade f (a + h) = f (a) + c · h + r(h), a qual meramente define o n´ umero r(h). O que o Teorema 1

92

Derivadas

Cap. 8

afirma ´e que existe no m´ aximo um c ∈ R tal que limh→0 r(h)/h = 0. Este n´ umero c, quando existe, ´e igual a f ′ (a). O Teorema 1 diz tamb´em que, quando f ′ (a) existe, o acr´escimo f (a + h) − f (a) ´e a soma de uma “parte linear” c · h, proporcional ao acr´escimo h da vari´avel independente, mais um “resto” r(h), o qual ´e infinitamente pequeno em rela¸c˜ao a h, no sentido de que o quociente r(h)/h tende a zero com h. Quando a ∈ X ´e um ponto de acumula¸c˜ao `a direita, isto ´e, a ∈ ′ , pode-se tomar o limite f ′ (a) = lim X ∩ X+ x→a+ q(x). Quando existe, + este limite chama-se a derivada a ` direita de f no ponto a. Analogamente, ′ , tem sentido considerar o limite ` a esquerda f−′ (a) = se a ∈ X ∩ X− limx→a− q(x). Se existe, ele se chama a derivada a ` esquerda de f no ponto a. ′ ∩ X ′ , isto ´ Caso seja a ∈ X ∩ X+ e, caso a ∈ X seja ponto de − acumula¸c˜ao bilateral, a fun¸c˜ao f ´e deriv´avel no ponto a se, e somente se, existem e s˜ ao iguais as derivadas `a direita e `a esquerda, com f ′ (a) = ′ ′ f+ (a) = f− (a). O Teorema 1 (com limh→0+ r(h)/h e limh→0− r(h)/h) vale para derivadas laterais. E seu corol´ario tamb´em. Por exemplo, se existe a derivada ` a direita f+′ (a) ent˜ao f ´e cont´ınua a ` direita no ponto a, isto ´e, f (a) = limh→0+ f (a + h). ′ ∩ X ′ e existem ambas as derivadas Em particular, se a ∈ X ∩ X+ − ′ ′ laterais f+ (a) e f− (a) ent˜ao f ´e cont´ınua no ponto a. (Mesmo que essas derivadas laterais sejam diferentes.) Exemplo 1. Uma fun¸c˜ao constante ´e deriv´avel e sua derivada ´e identicamente nula. Se f : R → R ´e dada por f (x) = ax + b ent˜ao, para c ∈ R e h 6= 0 quaisquer, [f (c + h) − f (c)]/h = a, logo f ′ (c) = a. Para n ∈ N qualquer, a fun¸c˜ao f : R → R, com f (x) = xn , tem derivada f ′ (x) = n · xn−1 . Com efeito, pelo binˆ omio de Newton, f (x + h) = (x + h)n = xn + h · n · xn−1 + h2 · p(x, h), onde p(x, h) ´e um polinˆ omio em x e h. Portanto [f (x + h) − f (x)]/h = n · xn−1 + h · p(x, h). Segue-se que f ′ (x) = limh→0 [f (x + h) − f (x)]/h = n · xn−1 .

Exemplo 2. A fun¸c˜ao f : R → R, definida por f (x) = x · sen(1/x) quando x 6= 0, f (0) = 0, ´e cont´ınua e possui derivada em todo ponto x 6= 0. No ponto 0, temos [f (0 + h) − f (0)]/h = [h · sen(1/h)]/h = sen(1/h). Como n˜ao existe limh→0 sen(1/h), segue-se que f n˜ao ´e deriv´avel no ponto x = 0, onde nenhuma derivada lateral tampouco existe. Por outro lado, a fun¸c˜ao g : R → R, definida por g(x) = x · f (x), isto ´e, g(x) = x2 sen(1/x), x 6= 0, g(0) = 0, ´e deriv´avel no ponto x = 0 porque limh→0 [g(0 + h) − g(0)]/h = limh→0 h · sen(1/h) = 0. Logo g ′ (0) = 0.

Se¸c˜ ao 2

Regras operacionais

93

Quando x 6= 0, as regras de deriva¸c˜ao conhecidas d˜ao g ′ (x) = 2x · sen(1/x)−cos(1/x). Note-se que n˜ao existe limx→0 g ′ (x). Em particular, a fun¸c˜ao derivada, g ′ : R → R, n˜ao ´e cont´ınua no ponto 0, logo g n˜ao ´e de classe C 1 . Exemplo 3. A fun¸c˜ao ϕ : R → R, dada por ϕ(x) = |x|, ´e deriv´avel em todo ponto x 6= 0. Com efeito, ϕ(x) = x se x > 0 e ϕ(x) = −x se x < 0. Logo ϕ′ (x) = 1 para x > 0 e ϕ′ (x) = −1 se x < 0. No ponto 0 n˜ao existe a derivada ϕ′ (0). De fato, existem ϕ′+ (0) = 1 e ϕ′− (0) = −1. A fun¸c˜ao I : R → R, definida por I(x) = n quando n ≤ x < n + 1, n ∈ Z, ´e deriv´avel, com I ′ (x) = 0, nos pontos x ∈ / Z. ′ ′ Se n ´e inteiro, existe I+ (n) = 0 mas n˜ao existe I− (n). Com efeito, se 1 > h > 0, tem-se I(n + h) = I(n) = n mas para −1 < h < 0 vale I(n + h) = n − 1, I(n) = n. Portanto limh→0+ [I(n + h) − I(n)]/h = 0 e limh→0− [I(n + h) − I(n)]/h = limh→0− (−1/h) n˜ao existe. Exemplo 4. (A Regra de L’Hˆ opital.) Esta regra constitui uma das mais populares aplica¸c˜oes da derivada. Em sua forma mais simples, ela se refere ao c´alculo de um limite da forma limx→a f (x)/g(x) no caso em que f e g s˜ ao deriv´aveis no ponto a e limx→a f (x) = f (a) = 0 = g(a) = limx→a g(x). Ent˜ao, pela defini¸c˜ao de derivada, f ′ (a) = limx→a f (x)/(x − a) e g ′ (a) = limx→a g(x)/(x − a). Supondo g ′ (a) 6= 0, a Regra de L’Hˆ opital diz que limx→a f (x)/g(x) = f ′ (a)/g ′ (a). A prova ´e direta: f (x) lim f (x) f (x) f ′ (a) (x−a) x→a (x−a) lim = lim g(x) = · = g(x) x→a g(x) x→a g ′ (a) lim (x−a) (x−a) x→a

Como ilustra¸c˜ao, consideremos os limites limx→0 (sen x/x) e limx→0 (ex − 1)/x. Aplicando a Regra de L’Hˆ opital, o primeiro limite se reduz a 0 cos 0 = 1 e o segundo a e = 1. Conv´em observar, entretanto, que estas aplica¸c˜oes (e outras an´ alogas) da Regra de L’Hˆ opital s˜ ao indevidas pois, ′ para utiliz´a-la, ´e necess´ario conhecer as derivadas f (a) e g ′ (a). Nestes dois exemplos, os limites a calcular s˜ ao, por defini¸c˜ao, as derivadas de sen x e ex no ponto x = 0.

2

Regras operacionais

Teorema 2. Sejam f, g : X → R deriv´ aveis no ponto a ∈ X ∩ X ′ . As fun¸co ˜es f ± g, f · g e f /g (caso g(a) 6= 0) s˜ ao tamb´em deriv´ aveis no

94

Derivadas

Cap. 8

ponto a, com (f ± g)′ (a) = f ′ (a) ± g ′ (a),

(f · g)′ (a) = f ′ (a) · g(a) + f (a) · g ′ (a) e  ′ f ′ (a) · g(a) − f (a) · g ′ (a) f (a) = · g g(a)2

Demonstra¸ c˜ ao: Veja qualquer livro de C´alculo. Teorema 3. (Regra da Cadeia.) Sejam f : X → R, g : Y → R, a ∈ X ∩ X ′ , b ∈ Y ∩ Y ′ , f (X) ⊂ Y e f (a) = b. Se f ´e deriv´ avel no ponto a e g ´e deriv´ avel no ponto b ent˜ ao g ◦ f : X → R ´e deriv´ avel no ponto a, com (g ◦ f )′ (a) = g ′ (f (a)) · f ′ (a). Demonstra¸ c˜ ao: Pelo Teorema 1, se a + h ∈ X tem-se f (a + h) − f (a) = f ′ (a) · h + r(h),

r(h) = 0. h→0 h

onde

lim

Pondo k = f (a + h) − f (a), tem-se ainda g(f (a+h))−g(f (a))=g ′ (f (a))·(f (a+h)−f (a))+s(k), com lim

k→0

s(k) =0. k

A continuidade de f no ponto a assegura que h → 0 implica k → 0. (Note-se que k ´e fun¸c˜ao de h.) Assim, g(f (a + h)) − g(f (a)) = g ′ (f (a)) · f ′ (a) · h + g ′ (f (a)) · r(h) + s(k) = g ′ (f (a)) · f ′ (a) · h + σ,

onde σ = g ′ (f (a)) · r(h) + s(k). Vemos que σ = σ(h) ´e fun¸c˜ao de h. Pelo Teorema 1, concluiremos que g ◦ f ´e deriv´avel no ponto a, com (g ◦ f )′ (a) = g ′ (f (a)) · f ′ (a), se mostrarmos que lim σ(h) h = 0. Ora, h→0

r(h) s(k) σ(h) = g ′ (f (a)) · + . h h h Mas

s(k) s(k) k s(k) f (a + h) − f (a) = , = · . h k h k h

Portanto lim

h→0

s(k) h

= 0 e conseq¨ uentemente, lim

h→0

σ(h) h

= 0.

Se¸c˜ ao 3

Derivada e crescimento local

95

Corol´ ario. Seja f : X → Y uma bije¸ca ˜o entre os conjuntos X, Y ⊂ R, −1 com inversa g = f : Y → X. Se f ´e deriv´ avel no ponto a ∈ X ∩ X ′ e g ´e cont´ınua no ponto b = f (a) ent˜ ao g ´e deriv´ avel no ponto b se, e somente se, f ′ (a) 6= 0. No caso afirmativo, tem-se g ′ (b) = 1/f ′ (a). Com efeito, se xn ∈ X − {a} para todo n ∈ N e lim xn = a ent˜ao, como f ´e injetiva e cont´ınua no ponto a, tem-se yn = f (xn ) ∈ Y − {b} e lim yn = b. Portanto, b ∈ Y ∩ Y ′ . Se g for deriv´avel no ponto b, a igualdade g(f (x)) = x, v´alida para todo x ∈ X, juntamente com a Regra da Cadeia, fornece g ′ (b) · f ′ (a) = 1. Em particular, f ′ (a) 6= 0. Reciprocamente, se f ′ (a) 6= 0 ent˜ao, para qualquer seq¨ uˆencia de pontos yn = f (xn ) ∈ Y − {b} com lim yn = b, a continuidade de g no ponto b nos d´a lim xn = a, portanto g ′ (b) ´e igual a  −1 g(yn ) − g(b) yn − b lim = lim yn − b g(yn ) − g(b)   f (xn ) − f (a) −1 1 = ′ · = lim xn − a f (a) Exemplo 5. Dada f : R → R deriv´avel, consideremos as fun¸c˜oes g : R → R e h : R → R, definidas por g(x) = f (x2 ) e h(x) = f (x)2 . Para todo x ∈ R tem-se g ′ (x) = 2x · f ′ (x2 ) e h′ (x) = 2f (x) · f ′ (x). Exemplo 6. Para n ∈ N fixo, a fun¸c˜ao g : [0, +∞) → [0, +∞), dada por √ √ n ′ n n−1 g(x) = x, ´e deriv´avel no intervalo (0, +∞) com g (x) = 1/(n x ). Com efeito, g ´e a inversa da bije¸c˜ao f : [0, +∞) → [0, +∞), dada por f (x) = xn . Pelo corol´ario acima, pondo y = xn , temos g ′ (y) = 1/f ′ (x) n−1 6= 0, isto ´ ′ (y) = 1/nxn−1 = se f ′ (x) = nx e, se x 6= 0. Assim, g√ p   n n ′ n−1 1/ n y e, mudando de nota¸c˜ao, g (x) = 1/ n xn−1 . No ponto √ x = 0, a fun¸c˜ao g(x) = n x n˜ao ´e deriv´avel (salvo quando n = 1). Por exemplo, a fun¸c˜ao ϕ : R → R, dada por ϕ(x) = x3 , ´e um homeomorfismo, √ cujo inverso y 7→ 3 y n˜ao possui derivada no ponto 0.

3

Derivada e crescimento local

As proposi¸c˜oes seguintes, que se referem a derivadas laterais e a desigualdades, tˆem an´ alogas com f+′ trocada por f−′ , com > substitu´ıdo por 0 tal que x ∈ X, a < x < a+δ implicam com f+′ (a) > 0, ent˜ f (a) < f (x).

Demonstra¸ c˜ ao: Temos limx→a+ [f (x) − f (a)]/(x − a) = f+′ (a) > 0. Pela defini¸c˜ao de limite ` a direita, tomando ε = f+′ (a), obtemos δ > 0 tal que x ∈ X, a < x < a + δ ⇒ [f (x) − f (a)]/(x − a) > 0 ⇒ f (a) < f (x). Corol´ ario 1. Se f : X → R ´e mon´ otona n˜ ao-decrescente ent˜ ao suas derivadas laterais, onde existem, s˜ ao ≥ 0.

Com efeito, se alguma derivada lateral, digamos f+′ (a), fosse negativa ent˜ao o (an´ alogo do) Teorema 4 nos daria x ∈ X com a < x e f (x) < f (a), uma contradi¸c˜ao.

Corol´ ario 2. Seja a ∈ X um ponto de acumula¸ca ˜o bilateral. Se f : X → R ´e deriv´ avel no ponto a, com f ′ (a) > 0 ent˜ ao existe δ > 0 tal que x, y ∈ X, a − δ < x < a < y < a + δ implicam f (x) < f (a) < f (y).

Diz-se que a fun¸c˜ao f : X → R tem um m´ aximo local no ponto a ∈ X quando existe δ > 0 tal que x ∈ X, |x − a| < δ implicam f (x) ≤ f (a). Quando x ∈ X, 0 < |x − a| < δ implicam f (x) < f (a), diz-se que f tem um m´ aximo local estrito no ponto a. Defini¸c˜oes an´ alogas para m´ınimo local e m´ınimo local estrito.

Quando a ∈ X ´e tal que f (a) ≤ f (x) para todo x ∈ X, diz-se que a ´e um ponto de m´ınimo absoluto para a fun¸c˜ao f : X → R. Se vale f (a) ≥ f (x) para todo x ∈ X, diz-se que a ´e um ponto de m´ aximo absoluto. ′ Corol´ ario 3. Se f : X → R ´e deriv´ avel a ` direita no ponto a ∈ X ∩ X+ ′ e tem a´ı um m´ aximo local ent˜ ao f+ (a) ≤ 0.

Com efeito, se fosse f+′ (a) > 0 ent˜ao, pelo Teorema 4, ter´ıamos f (a) < f (x) para todo x ∈ X `a direita e suficientemente pr´oximo de a, logo f n˜ao teria m´ aximo local no ponto a.

Corol´ ario 4. Seja a ∈ X um ponto de acumula¸ca ˜o bilateral. Se f : X → R ´e deriv´ avel no ponto a e possui a´ı um m´ aximo ou m´ınimo local ent˜ ao ′ f (a) = 0. Com efeito, pelo Corol´ario 3 temos f+′ (a) ≤ 0 e f−′ (a) ≥ 0. Como = f+′ (a) = f−′ (a), segue-se que f ′ (a) = 0.

f ′ (a)

Se¸c˜ ao 4

Fun¸c˜ oes deriv´ aveis num intervalo

97

Exemplo 7. Do Teorema 4 e seu Corol´ario 2 n˜ao se pode concluir que uma fun¸c˜ao com derivada positiva num ponto a seja crescente numa vizinhan¸ca de a. (A menos que f ′ seja cont´ınua no ponto a.) Tudo o que se pode garantir ´e que f (x) < f (a) para x < a, x pr´oximo de a, e que f (x) > f (a) se x est´a pr´oximo de a, com x > a. Por exemplo, seja f : R → R dada por f (x) = x2 sen(1/x) + x/2 se x 6= 0 e f (0) = 0. A fun¸c˜ao f ´e deriv´avel, com f ′ (0) = 1/2 e f ′ (x) = 2x sen(1/x)−cos(1/x)+ 1/2 para x 6= 0. Se tomarmos x 6= 0 muito pequeno com sen(1/x) = 0 e cos(1/x) = 1 teremos f ′ (x) < 0. Se escolhermos x 6= 0 pequeno com sen(1/x) = 1 e cos(1/x) = 0, teremos f ′ (x) > 0. Logo existem pontos x arbitrariamente pr´oximos de 0 com f ′ (x) < 0 e com f ′ (x) > 0. Segue-se do Corol´ario 1 que f n˜ao ´e mon´otona em vizinhan¸ca alguma de 0. Exemplo 8. No Corol´ario 1, mesmo que f seja mon´otona crescente e deriv´avel, n˜ao se pode garantir que sua derivada seja positiva em todos os pontos. Por exemplo, f : R → R, dada por f (x) = x3 , ´e crescente mas sua derivada f ′ (x) = 3x2 se anula para x = 0. Exemplo 9. Se f : X → R tem, digamos, um m´ınimo local no ponto a ∈ X, n˜ao se pode concluir da´ı que seja f ′ (a) = 0. Em primeiro lugar, f ′ (a) pode n˜ao existir. Este ´e o caso de f : R → R, f (x) = |x|, que possui um m´ınimo local no ponto x = 0, onde se tem f+′ (0) = 1 e f−′ (0) = −1, em conformidade com o Corol´ario 3. Em segundo lugar, mesmo que f seja deriv´avel no ponto a, este pode n˜ao ser um ponto de acumula¸c˜ao ´ o caso da fun¸c˜ao f : [0, 1] → R, bilateral e a´ı pode ocorrer f ′ (a) 6= 0. E ′ ′ f (x) = x. Temos f (0) = f (1) = 1 embora f tenha um m´ınimo no ponto x = 0 e um m´ aximo no ponto x = 1. Um ponto c ∈ X chama-se ponto cr´ıtico da fun¸c˜ao deriv´avel f : X → ′ ∩ X′ ´ R quando f ′ (c) = 0. Se c ∈ X ∩ X+ ınimo ou − e um ponto de m´ de m´ aximo local ent˜ao c ´e cr´ıtico, mas a rec´ıproca ´e falsa: a bije¸c˜ao crescente f : R → R, dada por f (x) = x3 , n˜ao pode ter m´ aximo nem m´ınimo local mas admite o ponto cr´ıtico x = 0.

4

Fun¸c˜ oes deriv´ aveis num intervalo

Mesmo quando ´e descont´ınua, a derivada goza da propriedade do valor intermedi´ario, como se ver´a a seguir. Teorema 5. (Darboux.) Seja f : [a, b] → R deriv´ avel. Se f ′ (a) < d < ′ ′ f (b) ent˜ ao existe c ∈ (a, b) tal que f (c) = d.

98

Derivadas

Cap. 8

Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos inicialmente d = 0. A fun¸c˜ao cont´ınua f , pelo Teorema de Weierstrass, atinge seu valor m´ınimo em algum ponto c do conjunto compacto [a, b]. Como f ′ (a) < 0, o Teorema 4 assegura a existˆencia de pontos x ∈ (a, b) tais que f (x) < f (a), logo esse m´ınimo n˜ao ´e atingido no ponto a, isto ´e, a < c. Por motivo an´ alogo tem-se c < b. O Corol´ario 4 ent˜ao nos d´a f ′ (c) = 0. O caso geral reduz-se a este considerando a fun¸c˜ao auxiliar g(x) = f (x) − dx. Ent˜ao g ′ (x) = f ′ (x) − d, donde g ′ (c) = 0 ⇔ f ′ (c) = d e g ′ (a) < 0 < g ′ (b) ⇔ f ′ (a) < d < f ′ (b). Exemplo 10. Seja g : [−1, 1] → R definida por g(x) = −1 se −1 ≤ x < 0 e g(x) = 1 se 0 ≤ x ≤ 1. A fun¸c˜ao g n˜ao goza da propriedade do valor intermedi´ario pois assume apenas os valores −1 e 1 no intervalo [−1, 1]. Logo n˜ao existe f : [−1, 1] → R deriv´avel tal que f ′ = g. Por outro lado, a fun¸c˜ao h : [−1, 1] → R, dada por h(x) = 2x sen(1/x) − cos(1/x) se x 6= 0, h(0) = 0, que possui uma descontinuidade bastante complicada no ponto x = 0, ´e a derivada da fun¸c˜ao f : [−1, 1] → R, f (x) = x2 sen(1/x) se x 6= 0, f (0) = 0. No Cap´ıtulo 11, veremos que toda fun¸c˜ao cont´ınua g : [a, b] → R ´e derivada de alguma fun¸c˜ao f : [a, b] → R e, no Exerc´ıcio 4.1 deste cap´ıtulo, o leitor ´e convidado a mostrar que se g : [a, b] → R ´e descont´ınua somente num ponto c ∈ (a, b) onde existem os limites laterais limx→c− g(x) e limx→c+ g(x) ent˜ao g n˜ao pode ser a derivada de uma fun¸c˜ao f : [a, b] → R. Teorema 6. (Rolle.) Seja f : [a, b] → R cont´ınua, com f (a) = f (b). Se f ´e deriv´ avel em (a, b) ent˜ ao existe c ∈ (a, b) tal que f ′ (c) = 0.

Demonstra¸ c˜ ao: Pelo Teorema de Weierstrass, f atinge seu valor m´ınimo m e seu valor m´ aximo M em pontos de [a, b]. Se esses pontos forem a e b ent˜ao m = M e f ser´a constante, da´ı f ′ (x) = 0 qualquer que seja x ∈ (a, b). Se um desses pontos, digamos c, estiver em (a, b) ent˜ao f ′ (c) = 0.

Teorema 7. (Teorema do Valor M´ edio de Lagrange.) Seja f : [a, b] → R cont´ınua. Se f ´e deriv´ avel em (a, b), existe c ∈ (a, b) tal que f ′ (c) = [f (b) − f (a)]/(b − a).

Demonstra¸ c˜ ao: Consideremos a fun¸c˜ao auxiliar g : [a, b] → R, dada por g(x) = f (x) − dx, onde d ´e escolhido de modo que g(a) = g(b), ou seja, d = [f (b) − f (a)]/(b − a). Pelo Teorema de Rolle, existe c ∈ (a, b) tal que g ′ (c) = 0, isto ´e, f ′ (c) = d = [f (b) − f (a)]/(b − a).

Se¸c˜ ao 4

Fun¸c˜ oes deriv´ aveis num intervalo

99

Um enunciado equivalente: Seja f : [a, a+h] → R cont´ınua, deriv´avel em (a, a + h). Existe um n´ umero θ, 0 < θ < 1 tal que f (a + h) = f (a) + f ′ (a + θh) · h. Corol´ ario 1. Uma fun¸ca ˜o f : I → R, cont´ınua no intervalo I, com derivada f ′ (x) = 0 para todo x ∈ int I, ´e constante. Com efeito, dados x, y ∈ I quaisquer, existe c entre x e y tal que f (y) − f (x) = f ′ (c)(y − x) = 0 · (y − x) = 0, logo f (x) = f (y). Corol´ ario 2. Se f, g : I → R s˜ ao fun¸co ˜es cont´ınuas, deriv´ aveis em ′ ′ int I, com f (x) = g (x) para todo x ∈ int I ent˜ ao existe c ∈ R tal que g(x) = f (x) + c para todo c ∈ I. Com efeito, basta aplicar o Corol´ario 1 `a diferen¸ca g − f . Corol´ ario 3. Seja f : I → R deriv´ avel no intervalo I. Se existe k ∈ R tal que |f ′ (x)| ≤ k para todo x ∈ I ent˜ ao x, y ∈ I ⇒ |f (y) − f (x)| ≤ k|y − x|. Com efeito, dados x, y ∈ I, f ´e cont´ınua no intervalo fechado cujos extremos s˜ ao x, y e deriv´avel no seu interior. Logo existe z entre x e y tal que f (y) − f (x) = f ′ (z)(y − x), donde |f (y) − f (x)| = |f ′ (z)| |y − x| ≤ k|y − x|. Corol´ ario 4. A fim de que a fun¸ca ˜o deriv´ avel f : I → R seja mon´ otona n˜ ao-decrescente no intervalo I ´e necess´ ario e suficiente que f ′ (x) ≥ 0 para todo x ∈ I. Se f ′ (x) > 0 para todo x ∈ I ent˜ ao f ´e uma bije¸ca ˜o −1 crescente de I sobre um intervalo J e sua inversa g = f : J → I ´e deriv´ avel, com g ′ (y) = 1/f ′ (x) para todo y = f (x) ∈ J. Com efeito, j´a sabemos, pelo Corol´ario 1 do Teorema 4, que se f ´e mon´otona n˜ao-decrescente ent˜ao f ′ (x) ≥ 0 para todo x ∈ I. Reciprocamente, se vale esta condi¸c˜ao ent˜ao, para quaisquer x, y em I, temos f (y) − f (x) = f ′ (z)(y − x), onde z ∈ I est´a entre x e y. Como f ′ (z) ≥ 0, vemos que f (y) − f (x) ≥ 0, isto ´e, x < y em I ⇒ f (x) ≤ f (y). Do mesmo modo se vˆe que, supondo f ′ (x) > 0 para todo x ∈ I, tem-se f crescente. As demais afirma¸c˜oes seguem-se do Teorema 5, Cap´ıtulo 7 e do Corol´ario da Regra da Cadeia (Teorema 3). Exemplo 11. O Corol´ario 3 ´e a fonte mais natural de fun¸c˜oes lipschitzianas. Por exemplo, se p : R → R ´e um polinˆ omio ent˜ao, para cada subconjunto limitado X ⊂ R, a restri¸c˜ao p|X ´e lipschitziana porque a derivada p′ , sendo cont´ınua, ´e limitada no compacto X. Como toda fun¸c˜ao lipschitziana ´e uniformemente cont´ınua, segue-se do Teorema 12,

100

Derivadas

Cap. 8

Cap´ıtulo 7 que se f : (a, b) → R tem derivada limitada ent˜ao existem os limites laterais limx→a+ f (x) e limx→b− f (x). A fun¸c˜ao f : R+ → R, dada por f (x) = sen(1/x), n˜ao pode ter derivada limitada em nenhum intervalo do tipo (0, δ) pois n˜ao existe limx→0+ f (x).

5

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

A no¸ c˜ ao de derivada

1. A fim de que f : X → R seja deriv´avel no ponto a ∈ X ∩ X ′ ´e necess´ario e suficiente que exista uma fun¸c˜ao η : X → R, cont´ınua no ponto a, tal que f (x) = f (a) + η(x)(x − a) para todo x ∈ X.

2. Sejam f, g, h : X → R tais que f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) para todo x ∈ X. Se f e h s˜ ao deriv´aveis no ponto a ∈ X ∩ X ′ , com f (a) = ′ ′ h(a) e f (a) = h (a) prove que g ´e deriv´avel nesse ponto, com g ′ (a) = f ′ (a). ′ ∩ X ′ . Se x < a < 3. Seja f : X → R deriv´avel no ponto a ∈ X ∩ X+ n − yn para todo n e lim xn = lim yn = a, prove que limn→∞ [f (yn ) − f (xn )]/(yn − xn ) = f ′ (a). Interprete este fato geometricamente.

4. Dˆe exemplo de uma fun¸c˜ao deriv´avel f : R → R e seq¨ uˆencias de pontos 0 < xn < yn , com lim xn = lim yn = 0 sem que entretanto exista o limite limn→∞ [f (yn ) − f (xn )]/(yn − xn ).

5. Seja f : X → R deriv´avel num ponto a ∈ int X. Prove que limh→0 [f (a + h) − f (a − h)]/2h = f ′ (a). Dˆe um exemplo em que este limite existe por´em f n˜ao ´e deriv´avel no ponto a. Se¸ c˜ ao 2:

Regras operacionais

1. Admitindo que (ex )′ = ex e que limy→+∞ ey /y = +∞, prove que 2 a fun¸c˜ao f : R → R, definida por f (x) = e−1/x quando x 6= 0 e f (0) = 0, possui derivada igual a zero no ponto x = 0, o mesmo ocorrendo com f ′ : R → R, com f ′′ e assim por diante.

2. Seja I um intervalo aberto. Uma fun¸c˜ao f : I → R diz-se de classe C 2 quando ´e deriv´avel e sua derivada f ′ : I → R ´e de classe C 1 . Prove que se f (I) ⊂ J e g : J → R tamb´em ´e de classe C 2 ent˜ao a composta g ◦ f : I → R ´e de classe C 2 .

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

101

3. Seja f : I → R de classe C 2 com f (I) = J e f ′ (x) 6= 0 para todo x ∈ I. Calcule a derivada segunda de f −1 : J → R e mostre que f −1 ´e de classe C 2 . 4. Seja I um intervalo com centro 0. Uma fun¸c˜ao f : I → R chama-se par quando f (−x) = f (x) e ´ımpar quando f (−x) = −f (x), para todo x ∈ I. Se f ´e par, suas derivadas de ordem par (quando existem) s˜ ao fun¸c˜oes pares e suas derivadas de ordem ´ımpar s˜ ao fun¸c˜oes ´ımpares. Em particular, estas u ´ltimas se anulam no ponto 0. Enuncie resultado an´ alogo para f ´ımpar. 5. Seja f : R → R deriv´avel, tal que f (tx) = tf (x) para quaisquer t, x ∈ R. Prove que f (x) = f ′ (0)·x, qualquer que seja x ∈ R. Mais geralmente, se f : R → R ´e k vezes deriv´avel e f (tx) = tk · f (x) para quaisquer t, x ∈ R, prove que f (x) = [f (k) (0)/k!] · xk , para todo x ∈ R. Se¸ c˜ ao 3:

Derivada e crescimento local

1. Se f : R → R ´e de classe C 1 , o conjunto dos seus pontos cr´ıticos ´e fechado. Dˆe exemplo de uma fun¸c˜ao deriv´avel f : R → R tal que 0 seja limite de uma seq¨ uˆencia de pontos cr´ıticos de f , mas ′ f (0) > 0. 2. Seja f : I → R deriv´avel no intervalo aberto I. Um ponto cr´ıtico c ∈ I chama-se n˜ ao-degenerado quando f ′′ (c) ´e diferente de 0. Prove que todo ponto cr´ıtico n˜ao-degenerado ´e um ponto de m´ aximo local ou de m´ınimo local. 3. Se c ∈ I ´e um ponto cr´ıtico n˜ao-degenerado da fun¸c˜ao f : I → R, deriv´avel no intervalo aberto I, prove que existe δ > 0 tal que c ´e ou ´nico ponto cr´ıtico de f no intervalo (c − δ, c + δ). Conclua que, se f ´e de classe C 1 , ent˜ao num conjunto compacto K ⊂ I, onde os pontos cr´ıticos de f s˜ ao todos n˜ao-degenerados, s´ o existe um n´ umero finito deles. 4. Prove diretamente (sem usar o exerc´ıcio anterior) que se o ponto cr´ıtico c da fun¸c˜ao f : I → R ´e limite de uma seq¨ uˆencia de pontos cr´ıticos cn 6= c e f ′′ (c) existe, ent˜ao f ′′ (c) = 0.

5. Prove que o conjunto dos pontos de m´ aximo ou de m´ınimo local estrito de qualquer fun¸c˜ao f : R → R ´e enumer´avel.

102

Derivadas

Se¸ c˜ ao 4:

Cap. 8

Fun¸ co ˜es deriv´ aveis num intervalo

1. Seja g : I → R cont´ınua no intervalo aberto I, exceto no ponto c ∈ I. Se existem os limites laterais limx→c− g(x) = A e limx→c+ g(x) = B, com A 6= B ent˜ao nenhuma fun¸c˜ao deriv´avel f : I → R tem derivada f ′ = g. 2. Seja f : R+ → R definida por f (x) = log x/x. Admitindo que (log)′ (x) = 1/x, indique os intervalos de crescimento e decrescimento de f , seus pontos cr´ıticos e seus limites quando x → 0 e quando x → +∞. 3. Fa¸ca um trabalho an´ alogo ao do exerc´ıcio anterior para a fun¸c˜ao g : R+ → R, definida por g(x) = ex /x, admitindo que (ex )′ = ex . 4. Supondo conhecidas as regras de deriva¸c˜ao para as fun¸c˜oes seno e cosseno, prove que sen : (−π/2, π/2) → (−1, 1), cos : (0, π) → (−1, 1) e tg = sen/cos : (−π/2, π/2) → R s˜ ao bije¸c˜oes com derivadas 6= 0 em todos os pontos e calcule as derivadas das fun¸c˜oes inversas arcsen : (−1, 1) → (−π/2, π/2), arccos : (−1, 1) → (0, π) e arctg : R → (−π/2, π/2). 5. Dada f deriv´avel no intervalo I, sejam X = {f ′ (x); x ∈ I} e Y = {[f (y) − f (x)]/(y − x); x 6= y ∈ I}. O Teorema do Valor M´edio assegura que Y ⊂ X. Dˆe um exemplo em que Y 6= X. Prove que Y = X e conclua que sup X = sup Y , inf X = inf Y .

6. Seja f : (a, b) → R limitada e deriv´avel. Se n˜ao existir limx→a+ f (x) ou limx→b− f (x), prove que, para todo c ∈ R, existe x ∈ (a, b) tal que f ′ (x) = c. 7. Seja f : [a, b] → R cont´ınua, deriv´avel no intervalo aberto (a, b), com f ′ (x) ≥ 0 para todo x ∈ (a, b). Se f ′ (x) = 0 apenas num conjunto finito, prove que f ´e crescente. 8. Use o princ´ıpio dos intervalos encaixados para provar diretamente (sem usar o Teorema do Valor M´edio) que se f : I → R ´e deriv´avel, com f ′ (x) = 0 em todos os pontos x do intervalo I, ent˜ao f ´e constante. 9. Com a mesma t´ecnica do exerc´ıcio anterior, prove que uma fun¸c˜ao f : I → R, deriv´avel, com |f ′ (x)| ≤ k para todo x no intervalo I cumpre a condi¸c˜ao de Lipschitz |f (y) − f (x)| ≤ k|y − x| se x, y ∈ I.

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

103

10. Seja f : [a, b] → R cont´ınua, deriv´avel em (a, b), exceto possivelmente no ponto c ∈ (a, b). Se existir limx→c f ′ (x) = L, prove que f ′ (c) existe e ´e igual a L. 11. Seja f : [a, b] → R uma fun¸c˜ao com derivada limitada em (a, b) e com a propriedade do valor intermedi´ario (cfr. Exerc´ıcio 2.3, Cap´ıtulo 7). Prove que f ´e cont´ınua. 12. Se f : I → R cumpre |f (y) − f (x)| ≤ c · |y − x|α com α > 1, c ∈ R e x, y ∈ I arbitr´ arios, prove que f ´e constante.

13. Prove que se f ´e deriv´avel num intervalo e f ′ ´e cont´ınua no ponto a ent˜ao, para quaisquer seq¨ uˆencias de pontos xn 6= yn nesse intervalo, com lim xn = lim yn = a, tem-se lim[f (yn )−f (xn )]/(yn − xn ) = f ′ (a).

9 F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada As aplica¸c˜oes mais elementares da derivada, ligadas a problemas de m´ aximos e m´ınimos, e ` a regra de L’Hˆ opital, se encontram amplamente divulgadas nos livros de C´ alculo. Aqui exporemos duas aplica¸c˜oes, a saber: o estudo das fun¸c˜oes convexas e o m´etodo de Newton.

1

F´ ormula de Taylor

A n-´esima derivada (ou derivada de ordem n) de uma fun¸c˜ao f no ponto a ser´a indicada com a nota¸c˜ao f (n) (a). Para n = 1, 2 e 3 escreve-se f ′ (a), f ′′ (a) e f ′′′ (a) respectivamente. Por defini¸c˜ao, f ′′ (a) = (f ′ )′ (a) e assim sucessivamente: f (n) (a) = [f (n−1) ]′ (a). Para que f (n) (a) tenha sentido, ´e necess´ario que f (n−1) (x) esteja definida num conjunto do qual a seja ponto de acumula¸c˜ao e seja deriv´avel no ponto x = a. Em todos os casos que consideraremos, tal conjunto ser´a um intervalo. Quando existe f (n) (x) para todo x ∈ I, diz-se que a fun¸c˜ao f : I → R ´e n vezes deriv´ avel no intervalo I. Quando f ´e n − 1 vezes deriv´avel numa vizinhan¸ca de a e existe f (n) (a), dizemos que f : I → R ´e n vezes deriv´ avel no ponto a ∈ I. Dizemos que f : I → R ´e uma fun¸c˜ao de classe C n , e escrevemos f ∈ C n , quando f ´e n vezes deriv´avel e, al´em disso, a fun¸c˜ao f (n) : I → R ´e cont´ınua. Quando f ∈ C n para todo n ∈ N, dizemos que f ´e de classe ´ conveniente considerar f como sua pr´opria C ∞ e escrevemos f ∈ C ∞ . E

Se¸c˜ ao 1

F´ ormula de Taylor

105

“derivada de ordem zero” e escrever f (0) = f . Assim, f ∈ C 0 significa que f ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua. Exemplo 1. Para n = 0, 1, 2, . . . seja fn : R → R definida por fn (x) = xn |x|. Ent˜ao fn (x) = xn+1 se x ≥ 0 e fn (x) = −xn+1 se x ≤ 0. Cada uma das fun¸c˜oes fn ´e de classe C n pois sua n-´esima derivada ´e igual a (n + 1)!|x|. Mas fn n˜ao ´e n + 1 vezes deriv´avel no ponto 0, logo n˜ao ´e de classe C n+1 . As fun¸c˜oes mais comumente encontradas, como polinˆ omios, fun¸c˜oes racionais, fun¸c˜oes trigonom´etricas, exponencial e logaritmo, s˜ ao ∞ de classe C . Seja f : I → R definida no intervalo I e n vezes deriv´avel no ponto a ∈ I. O polinˆ omio de Taylor de ordem n da fun¸c˜ao f no ponto a ´e o polinˆ omio p(h) = a0 + a1 h + · · · + an hn (de grau ≤ n) cujas derivadas de ordem ≤ n no ponto h = 0 coincidem com as derivadas de mesma ordem de f no ponto a, isto ´e, p(i) (0) = f (i) (a), i = 0, 1, . . . , n. Ora, as derivadas p(0) (0), p′ (0), . . . , p(n) (0) determinam de modo u ´nico o polinˆ omio p(h) pois p(i) (0) = i!ai . Portanto, o polinˆ omio de Taylor de ordem n da fun¸c˜ao f no ponto a ´e p(h) = f (a) + f ′ (a) · h +

f ′′ (a) 2 f (n) (a) n h + ··· + h . 2! n!

Se p(h) ´e o polinˆ omio de Taylor de ordem n da fun¸c˜ao f : I → R no ponto a ∈ I ent˜ao a fun¸c˜ao r(h) = f (a + h) − p(h), definida no intervalo J = {h ∈ R; a + h ∈ I}, ´e n vezes deriv´avel no ponto 0 ∈ J, com r(0) = r′ (0) = · · · = r(n) (0) = 0. Lema. Seja r : J → R n vezes deriv´ avel no ponto 0 ∈ J. A fim de (i) que seja r (0) = 0 para i = 0, 1, . . . , n, ´e necess´ ario e suficiente que limh→0 r(h)/hn = 0. Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos inicialmente que as derivadas de r no ponto 0 sejam nulas at´e a ordem n. Para n = 1, isto significa que r(0) = r′ (0) = 0. Ent˜ao limh→0 r(h)/h = limh→0 [r(h) − r(0)]/h = r′ (0) = 0. Para n = 2, temos r(0) = r′ (0) = r′′ (0) = 0. Pelo que acabamos de ver, isto implica limx→0 r′ (x)/x = 0. O Teorema do Valor M´edio assegura que para todo h 6= 0, existe x no intervalo de extremos 0 e h tal que r(h)/h2 = [r(h) − r(0)]/h2 = r′ (x) · h/h2 = r′ (x)/h. Por conseguinte, limh→0 r(h)/h2 = limh→0 r′ (x)/h = limh→0 [r′ (x)/x](x/h) = 0 pois h → 0 implica x → 0 e, al´em disso, |x/h| ≤ 1. O mesmo argumento permite passar de n = 2 para n = 3 e assim por diante. Reciprocamente, suponhamos que limh→0 r(h)/hn = 0. Da´ı resulta, para

106

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada

Cap. 9

i = 0, 1, . . . , n, que limh→0 r(h)/hi = limh→0 (r(h)/hn )hn−i = 0. Portanto r(0) = limh→0 r(h) = limh→0 r(h)/h0 = 0. Al´em disso, r′ (0) = limh→0 r(h)/h = 0. Quanto a r′′ (0), consideremos a fun¸c˜ao auxiliar ϕ : J → R, definida por ϕ(h) = r(h) − r′′ (0)h2 /2. Evidentemente, vale ϕ(0) = ϕ′ (0) = ϕ′′ (0) = 0. Pela parte do lema j´a demonstrada segue-se que limh→0 ϕ(h)/h2 = 0. Como ϕ(h)/h2 = r(h)/h2 − r′′ (0)/2 e sabemos que limh→0 r(h)/h2 = 0, resulta que r′′ (0) = 0. O mesmo argumento permite passar de n = 2 para n = 3 e assim por diante. Teorema 1. (F´ ormula de Taylor infinitesimal.) Seja f : I → R n vezes deriv´ avel no ponto a ∈ I. A fun¸ca ˜o r : J → R, definida no intervalo J = {h ∈ R; a + h ∈ I} pela igualdade f (a + h) = f (a) + f ′ (a) · h +

f (n) (a) n f ′′ (a) 2 · h + ··· + · h + r(h), 2 n!

cumpre limh→0 r(h)/hn = 0. Reciprocamente, se p(h) ´e um polinˆ omio n de grau ≤ n tal que r(h) = f (a + h) − p(h) cumpre limh→0 r(h)/h = 0 ent˜ ao p(h) ´e o polinˆ omio de Taylor de ordem n de f no ponto a, isto ´e, p(h) =

n X f (i) (a) i=0

i!

· hi .

Demonstra¸ c˜ ao: A fun¸c˜ao r, definida pela f´ormula de Taylor, ´e n vezes deriv´avel no ponto 0 e tem derivadas nulas nesse ponto, at´e a ordem n. Logo, pelo Lema, vale limh→0 r(h)/hn = 0. Reciprocamente, se r(h) = f (a + h) − p(h) ´e tal que lim r(h)/hn = 0 ent˜ao, novamente pelo Lema, as derivadas de r no ponto 0 s˜ ao nulas at´e a ordem n, logo p(i) (0) = f (i) (a) para i = 0, 1, . . . , n, ou seja, p(h) ´e o polinˆ omio de Taylor de ordem n da fun¸c˜ao f no ponto a. Exemplo 2. Seja f : I → R n vezes deriv´avel no ponto a ∈ int I, com f (i) (a) = 0 para 1 ≤ i < n e f (n) (a) 6= 0. Se n ´e par ent˜ao: f possui um m´ınimo local estrito no ponto a caso f (n) (a) > 0 e um m´ aximo (n) local estrito quando f (a) < 0. Se n ´e ´ımpar ent˜ao a n˜ao ´e ponto de m´ınimo nem de m´ aximo local. Com efeito, neste caso podemos escrever a f´ormula de Taylor como # " (n) (a) r(h) f + n . f (a + h) − f (a) = hn n! h

Se¸c˜ ao 1

F´ ormula de Taylor

107

Pela defini¸c˜ao de limite, existe δ > 0 tal que, para a+h ∈ I e 0 < |h| < δ a soma dentro dos colchetes tem o mesmo sinal de f (n) (a). Como a ∈ int I, podemos tomar este δ de modo que |h| < δ ⇒ a + h ∈ I. Ent˜ao, quando n ´e par e f (n) (a) > 0, a diferen¸ca f (a + h) − f (a) ´e positiva sempre que 0 < |h| < δ, logo f possui um m´ınimo local estrito no ponto a. Analogamente, se n ´e par e f (n) (a) < 0, a diferen¸ca f (a + h) − f (a) ´e negativa quando 0 < |h| < δ, logo f tem um m´ aximo local no ponto a. Finalmente, se n ´e ´ımpar, o fator hn tem o mesmo sinal de h, logo a diferen¸ca f (a + h) − f (a) muda de sinal juntamente com h, portanto f n˜ao tem m´ aximo nem m´ınimo local no ponto a. Exemplo 3. (Novamente a Regra de L’Hˆ opital.) Sejam f, g : I → R n vezes deriv´aveis no ponto a ∈ I, com derivadas nulas neste ponto at´e a ordem n − 1. Se g (n) (a) 6= 0 ent˜ao f (x) f (n) (a) = (n) · x→a g(x) g (a) lim

Com efeito, pela f´ormula de Taylor, temos # " # " (n) (a) (n) (a) r(h) s(h) n g n f + n + n , e g(a + h) = h f (a + h) = h n! h n! h s(h) r(h) = lim n = 0. Portanto n h→0 h h→0 h

onde lim

f (n) (a) r(h) + n (n) f (x) f (a + h) n! h = f (a) · lim = lim = lim (n) x→a g(x) h→0 g(a + h) h→0 g g (n) (a) (a) s(h) + n n! h A f´ormula de Taylor infinitesimal ´e assim chamada porque s´ o afirma algo quando h → 0. A seguir daremos outra vers˜ao dessa f´ormula, onde ´e feita uma estimativa do valor f (a+h) para h fixo. Ela ´e uma extens˜ao do Teorema do Valor M´edio, de Lagrange. Como naquele teorema, trata-se de um resultado global, onde se sup˜oe que f seja n vezes deriv´avel em todos os pontos do intervalo (a, a + h). Teorema 2. (F´ ormula de Taylor, com resto de Lagrange.) Seja f : [a, b] → R n vezes deriv´ avel no intervalo aberto (a, b), com f (n−1) cont´ınua em [a, b]. Existe c ∈ (a, b) tal que f (b) = f (a) + f ′ (a)(b − a) + · · · +

f (n−1) (a) f (n) (c) (b − a)n−1 + (b − a)n . (n − 1)! n!

108

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada

Cap. 9

Pondo b = a + h, isto quer dizer que existe θ, com 0 < θ < 1, tal que f (a + h) = f (a) + f ′ (a) · h + · · · +

f (n−1) (a) n−1 f (n) (a + θh) n h + h . (n − 1)! n!

Demonstra¸ c˜ ao: Seja ϕ : [a, b] → R definida por ϕ(x) = f (b)−f (x)−f ′ (x)(b−x)−· · ·−

f (n−1) (x) K (b−x)n−1 − (b−x)n , (n − 1)! n!

onde a constante K ´e escolhida de modo que ϕ(a) = 0. Ent˜ao ϕ ´e cont´ınua em [a, b], diferenci´ avel em (a, b), com ϕ(a) = ϕ(b) = 0. Vˆe-se facilmente que K − f (n) (x) ϕ′ (x) = (b − x)n−1 . (n − 1)! Pelo Teorema de Rolle, existe c ∈ (a, b) tal que ϕ′ (c) = 0. Isto significa que K = f (n) (c). O Teorema 2 se obt´em fazendo x = a na defini¸c˜ao de ϕ e lembrando que ϕ(a) = 0.

2

Fun¸c˜ oes convexas e cˆ oncavas

Se a 6= b, a reta que liga os pontos (a, A) e (b, B) no plano R2 ´e o conjunto dos pontos (x, y) ∈ R2 tais que y =A+

B−A (x − a) b−a

y=B+

B−A (x − b). b−a

ou, equivalentemente,

Quando se tem uma fun¸c˜ao f : X → R, definida no conjunto X ⊂ R, e s˜ ao dados a, b ∈ X, o segmento de reta que liga os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)), pertencentes ao gr´ afico de f , ser´a chamado a secante ab. Seja I ⊂ R um intervalo. Uma fun¸c˜ao f : I → R chama-se convexa quando seu gr´ afico se situa abaixo de qualquer de suas secantes. Em termos precisos, a convexidade de f se exprime assim: a 0, conclu´ımos que a = b, logo o ponto fixo a ∈ X ´e u ´nico. √ Exemplo 5. A fun¸c˜ao f : R → R, dada por f (x) = 1 + x2 , n˜ao ′ possui √ ponto fixo pois′ f (x) > x para todo x ∈ R. Sua derivada f (x) = 2 x/ x + 1 cumpre |f (x)| < 1, logo tem-se |f (y) − f (x)| < |y − x| para quaisquer x, y ∈ R. Este exemplo mostra que a condi¸c˜ao |f (y) − f (x)| < |y − x| sozinha n˜ao basta para se obter um ponto fixo. Exemplo 6. A fun¸c˜ao f : [1, +∞) → R dada por f (x) = x/2, ´e uma contra¸c˜ao mas n˜ao possui ponto fixo a ∈ [1, +∞). Isto mostra que, no m´etodo das aproxima¸c˜oes sucessivas, ´e essencial verificar que a condi¸c˜ao f (X) ⊂ X ´e satisfeita. Neste exemplo, n˜ao se tem f ([1, +∞)) ⊂ [1, +∞). Exemplo 7. f : (0, 1) → (0, 1), dada por f (x) = x/2, tem derivada f ′ (x) = 1/2 mas n˜ao possui ponto fixo pois (0, 1) n˜ao ´e fechado. Um exemplo importante de aproxima¸c˜oes sucessivas ´e o chamado m´etodo de Newton para a obten¸c˜ao de valores aproximados de uma raiz da equa¸c˜ao f (x) = 0. Neste m´etodo, tem-se uma fun¸c˜ao f : I → R, de classe C 1 no intervalo I, com f ′ (x) 6= 0 para todo x ∈ I, toma-se um

Se¸c˜ ao 3

Aproxima¸c˜ oes sucessivas e m´ etodo de Newton

115

valor inicial x0 e p˜oe-se f (x0 ) , f ′ (x0 ) f (x1 ) x2 = x1 − ′ , f (x1 ) .. . f (xn ) xn+1 = xn − ′ , etc. f (xn ) x1 = x0 −

Se a seq¨ uˆencia (xn ) convergir, seu limite a ser´a uma raiz da equa¸c˜ao f (x) = 0 pois, fazendo n → ∞ na igualdade xn+1 = xn −

f (xn ) , f ′ (xn )

resulta a = a − f (a)/f ′ (a), donde f (a) = 0.

O m´etodo de Newton resulta da observa¸c˜ao de que as ra´ızes da equa¸c˜ao f (x) = 0 s˜ ao os pontos fixos da fun¸c˜ao N = Nf : I → R, definida por N (x) = x −

f (x) · f ′ (x)

O n´ umero N (x) = x − f (x)/f ′ (x) ´e a abscissa do ponto em que a tangente ao gr´ afico de f no ponto x encontra o eixo horizontal. A id´eia que motiva o m´etodo de Newton ´e que, se a tangente aproxima a curva ent˜ao sua interse¸c˜ao com o eixo x aproxima o ponto de interse¸c˜ao da curva com esse eixo, isto ´e, o ponto x em que f (x) = 0. (Veja Fig. 7.) ´ f´acil dar exemplos em que a seq¨ E uˆencia (xn ) de aproxima¸c˜oes de Newton n˜ao converge: basta tomar uma fun¸c˜ao, como f (x) = ex , que n˜ao assuma o valor zero. E, mesmo que a equa¸c˜ao f (x) = 0 tenha uma raiz real, a seq¨ uˆencia (xn ) pode divergir, caso x0 seja tomado longe da raiz. (Veja Fig. 8.)

116

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada

Cap. 9

Figura 7: Como a inclina¸c˜ ao da tangente ´e f ′ (x0 ) = f (x0 )/(x0 − x1 ), segue-se que

x1 = x0 − f (x0 )/f ′ (x0 ).

Existem, evidentemente, infinitas fun¸c˜oes cujos pontos fixos s˜ ao as ra´ızes da equa¸c˜ao f (x) = 0. A importˆ ancia de N (x) reside na rapidez com que as aproxima¸c˜oes sucessivas convergem para a raiz a da equa¸c˜ao f (x) = 0 (quando convergem): cada xn+1 = N (xn ) ´e um valor aproximado de a com cerca do dobro dos algarismos decimais exatos de xn . (Veja Exemplo 9.)

Figura 8: A fun¸c˜ ao f : [−1/2, 1/2] → R,dada por f (x) = x− x3 , anula-se para x = 0. √ Valores aproximados desta raiz pelo m´etodo de Newton, come¸cando com x0 = 5/5, s˜ ao sucessivamente x0 , −x0 , x0 , −x0 , etc. O m´etodo n˜ ao converge.

Mostraremos agora que se f : I → R possui derivada segunda cont´ınua f ′′ : I → R, com f ′ (x) 6= 0 para todo x ∈ I, ent˜ao cada ponto

Se¸c˜ ao 3

Aproxima¸c˜ oes sucessivas e m´ etodo de Newton

117

a ∈ int I onde f (a) = 0 tem uma vizinhan¸ca J = [a − δ, a + δ] tal que, come¸cando com qualquer valor inicial x0 ∈ J, a seq¨ uˆencia de pontos xn+1 = N (xn ) converge para a. Com efeito, a derivada N ′ (x) = f (x)f ′′ (x)/f ′ (x)2 se anula no ponto x = a. Como N ′ (x) ´e cont´ınua, se fixarmos arbitrariamente k ∈ (0, 1) obteremos δ > 0 tal que J = [a − δ, a + δ] ⊂ I e |N ′ (x)| ≤ k < 1 para todo x ∈ J. Afirmamos que x ∈ J ⇒ N (x) ∈ J. De fato, x ∈ J ⇒ |N (x)−N (a)| ≤ k|x−a| ≤ |x−a| ≤ δ ⇒ N (x) ∈ J. Portanto, N : J → J ´e uma contra¸c˜ao. Logo a seq¨ uˆencia x1 = N (x0 ), xn+1 = N (xn ) converge para o u ´nico ponto fixo a ∈ J da contra¸c˜ao N . √ Exemplo 8. (C´ alculo aproximado de n c.) Dados c > 0 e n ∈ N, √ consideremos o intervalo I = [ n c, +∞) e a fun¸c˜ao f : I → R, dada por f (x) = xn − c. Como f ′ (x) = nxn−1 , a fun¸c˜ao de Newton N : I → R assume a forma N (x) = n1 [(n − 1)x + c/xn−1 ]. Assim, para todo x > 0, N (x) ´e a m´edia aritm´etica dos n n´ umeros x, x, . . . , x, c/xn−1 . Como a √ √ m´edia geom´etrica desses n´ umeros ´e n c, conclu´ımos que N (x) ≥ n c para todo x > 0. Em particular, x ∈ I ⇒ N (x) ∈ I. Al´em disso, n ′ N ′ (x) = n−1 n (1 − c/x ), logo 0 ≤ N (x) ≤ (n − 1)/n para todo x ∈ I. Tudo isto mostra que N : I → I ´e uma contra¸c˜ao. Portanto, tomando-se qualquer x0 > 0, temos N (x0 ) = x1 ∈ I e as aproxima¸c˜oes sucessivas √ xn+1 = N (xn ) convergem (rapidamente) para n c. Exemplo 9. (O m´etodo de Newton converge quadraticamente.) Considere f : I → R de classe C 2 no intervalo I, com |f ′′ (x)| ≤ A e |f ′ (x)| ≥ B para todo x ∈ I, onde A e B s˜ ao constantes positivas. Vimos acima que, tomando a aproxima¸c˜ao inicial x0 suficientemente pr´oxima de um ponto a onde f (a) = 0, a seq¨ uˆencia de aproxima¸c˜oes de Newton xn+1 = ′ xn − f (xn )/f (xn ) converge para a. Agora usaremos o Teorema 2 para estabelecer uma compara¸c˜ao entre os erros |xn+1 − a| e |xn − a|. Existe um n´ umero d entre a e xn , tal que 0 = f (a) = f (xn ) + f ′ (xn )(a − xn ) + Ent˜ao f ′ (xn )xn − f (xn ) − f ′ (xn )a =

f ′′ (d) (a − xn )2 . 2

f ′′ (d) (xn − a)2 . 2

Dividindo por f ′ (xn ) obtemos: xn −

f (xn ) f ′′ (d) − a = (xn − a)2 f ′ (xn ) 2f ′ (xn )

118

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada

isto ´e, xn+1 − a =

Cap. 9

f ′′ (d) (xn − a)2 . 2f ′ (xn )

A Da´ı vem imediatamente |xn+1 −a| ≤ 2B |xn −a|2 . Quando |xn −a| < 1, o 2 quadrado |xn − a| ´e muito menor, o que exibe a rapidez de convergˆencia no m´etodo de Newton. Por exemplo, se f (x) = xn − c temos

n−1 dn−2 f ′′ (d) ≤ = (n − 1) · n−1 ′ 2f (xk ) 2xk 2xk √ Portanto, para calcular n c, onde c > 1, podemos come¸car com x0 > 1 √ √ n e teremos sempre |xk+1 − n c| ≤ n−1 c|2 . Para n ≤ 3 vem 2 |xk − √ √ 2 n n |xk+1 − c| ≤ |xk − c| . Logo, se xk tem p algarismos decimais exatos, xk+1 tem 2p.

4

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

F´ ormula de Taylor

1. Use a igualdade 1/(1−x) = 1+x+· · ·+xn +xn+1 /(1−x) e a f´ormula de Taylor infinitesimal para calcular as derivadas sucessivas, no ponto x = 0, da fun¸c˜ao f : (−1, 1) → R, dada por f (x) = 1/(1−x). 2. Seja f : R → R definida por f (x) = x5 /(1 + x6 ). Calcule as derivadas de ordem 2001 e 2003 de f no ponto x = 0. 3. Seja f : I → R de classe C ∞ no intervalo I. Suponha que exista K > 0 tal que |f (n) (x)| ≤ K para todo x ∈ I e todo n ∈ N. Prove P f (n) (x0 ) (x − x0 )n . que, para x0 , x ∈ I quaisquer vale f (x) = ∞ n=0 n! 4. Dˆe uma demonstra¸c˜ao de que f ′′ ≥ 0 ⇒ f convexa usando a f´ormula de Taylor com resto de Lagrange. 5. Seja f : I → R de classe C 2 no intervalo I. Dado a ∈ I, defina a fun¸c˜ao ϕ : I → R pondo ϕ(x) = [f (x) − f (a)]/(x − a) se x 6= a e ϕ(a) = f ′ (a). Prove que ϕ ´e de classe C 1 . Mostre que f ∈ C 3 ⇒ ϕ ∈ C 2. 6. Seja p : R → R um polinˆ omio de grau n. Prove que para a, x ∈ R quaisquer tem-se p(x) = p(a) + p′ (a)(x − a) + · · · +

p(n) (a) (x − a)n . n!

Se¸c˜ ao 4

Exerc´ıcios

119

7. Sejam f, g : I → R duas vezes deriv´aveis no ponto a ∈ int I. Se f (a) = g(a), f ′ (a) = g ′ (a) e f (x) ≥ g(x) para todo x ∈ I, prove que f ′′ (a) ≥ g ′′ (a). Se¸ c˜ ao 2:

Fun¸ co ˜es cˆ oncavas e convexas

1. Sejam f : I → R e g : J → R fun¸c˜oes convexas, com f (I) ⊂ J, e g mon´otona n˜ao-decrescente. Prove que g ◦ f : I → R ´e convexa. Dˆe outra demonstra¸c˜ao supondo f e g duas vezes deriv´aveis. Por meio de um exemplo, mostre que se g n˜ao ´e mon´otona n˜ao-decrescente o resultado pode n˜ao ser v´alido. 2. Se f : I → R possui um ponto cr´ıtico n˜ao degenerado c ∈ int I no qual f ′′ ´e cont´ınua, prove que existe δ > 0 tal que f ´e convexa ou cˆoncava no intervalo (c − δ, c + δ). 3. Examine a convexidade da soma e do produto de duas fun¸c˜oes convexas.

4. Uma fun¸c˜ao f : I → R, definida no intervalo I, chama-se quaseconvexa (respectivamente, quase-cˆ oncava) quando, para todo c ∈ R, o conjunto {x ∈ I; f (x) ≤ c} (respectivametne, {x ∈ I; f (x) ≥ c}) ´e vazio ou ´e um intervalo. Prove que toda fun¸c˜ao convexa (respectivamente, cˆoncava) ´e quase-convexa (respectivamente, quasecˆoncava) e que toda fun¸c˜ao mon´otona ´e ao mesmo tempo quaseconvexa e quase-cˆ oncava. 5. Prove que f : I → R ´e quase-convexa se, e somente se, para x, y ∈ I e t ∈ [0, 1] quaisquer, vale f ((1 − t)x + ty) ≤ max{f (x), f (y)}. Enuncie o resultado an´ alogo para f quase-cˆ oncava. 6. Seja f : [a, b] → R uma fun¸c˜ao cont´ınua quase-convexa, cujo valor m´ınimo ´e atingido no ponto c ∈ [a, b]. Prove que se c = a ent˜ao f ´e mon´otona n˜ao-decrescente, se c = b, f ´e mon´otona n˜aocrescente e, finalmente, se a < c < b ent˜ao f ´e mon´otona n˜aocrescente em [a, c] e n˜ao-decrescente em [c, b]. Enuncie resultado an´ alogo para f quase-cˆ oncava. Conclua da´ı que a fun¸c˜ao cont´ınua f : [a, b] → R ´e quase-convexa se, e somente se, existe c ∈ [a, b] tal que f ´e mon´otona n˜ao-crescente no intervalo [a, c] e mon´otona n˜ao-decrescente em [c, b]. 7. Para cada n ∈ N, seja fn : I → R uma fun¸c˜ao convexa. Suponha que, para todo x ∈ I, a seq¨ uˆencia de n´ umeros (fn (x))n∈N convirja.

120

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada

Cap. 9

Prove que a fun¸c˜ao f : I → R, definida por f (x) = limn→∞ fn (x) ´e convexa. Prove resultado an´ alogo para fun¸c˜oes quase-convexas, cˆoncavas e quase-cˆ oncavas. 8. Seja f : [a, b] → R uma fun¸c˜ao cont´ınua convexa tal que f (a) < 0 < f (b). Prove que existe um u ´nico ponto c ∈ (a, b) com f (c) = 0. Se¸ c˜ ao 3:

Aproxima¸ co ˜es sucessivas e m´ etodo de Newton

1. Sejam I = [a − δ, a + δ] e f : I → R tal que |f (y) − f (x)| ≤ k|y − x|, onde 0 ≤ k < 1. Se |f (a) − a| ≤ (1 − k)δ, prove que existe um u ´nico x ∈ I com f (x) = x. 2. Defina f : [0, +∞) → [0, +∞) pondo f (x) = 2−x/2 . Mostre que f ´e uma contra¸c˜ao e que, se a ´e seu ponto fixo, −a ´e a raiz negativa da equa¸c˜ao x2 = 2x . Use o m´etodo das aproxima¸c˜oes sucessivas e uma calculadora para obter o valor de a com 8 algarismos decimais exatos. 3. Seja I = [a − δ, a + δ]. Se a fun¸c˜ao f : I → R ´e de classe C 2 , com f ′ (x) 6= 0, |f (x)f ′′ (x)/f ′ (x)2 | ≤ k < 1 para todo x ∈ I e |f (a)/f ′ (a)| < (1 − k)δ, prove que, seja qual for o valor inicial x0 ∈ I, o m´etodo de Newton converge para a u ´nica raiz x ∈ I da equa¸c˜ao f (x) = 0. 4. Dado a > 1, considere a fun¸c˜ao f : [0, +∞) → R, dada por f (x) = 1/(a + x). Fixado qualquer x0 > 0, prove que a seq¨ uˆencia definida indutivamente por x1 = f (x0 ), . . . , xn+1 = f (xn ), converge para a raiz positiva c da equa¸c˜ao x2 + ax − 1 = 0. (Cfr. Exerc´ıcio 3.5, Cap´ıtulo 3.) 5. Prove que 1,0754 ´e um valor aproximado, com 4 algarismos decimais exatos, da raiz positiva da equa¸c˜ao x6 + 6x − 8 = 0. 6. Seja f : [a, b] → R convexa, duas vezes deriv´avel. Se f (a) < 0 < f (b) prove que, come¸cando com um ponto x0 ∈ [a, b] tal que f (x0 ) > 0, o m´etodo de Newton converge sempre para a u ´nica raiz x ∈ [a, b] da equa¸c˜ao f (x) = 0. √ 7. Prove que as aproxima¸c˜oes de n c dadas pelo m´etodo de Newton formam, a partir do segundo termo, uma seq¨ uˆencia decrescente.

10 A Integral de Riemann

As no¸c˜oes de derivada e integral constituem o par de conceitos mais importantes da An´ alise. Enquanto a derivada corresponde a` no¸c˜ao geom´etrica de tangente e ` a id´eia f´ısica de velocidade, a integral est´a ´ um associada ` a no¸c˜ao geom´etrica de ´area e `a id´eia f´ısica de trabalho. E fato not´ avel e de suma importˆ ancia que essas duas no¸c˜oes, aparentemente t˜ao diversas, estejam intimamente ligadas.

1

Revis˜ ao sobre sup e inf

Demonstraremos aqui alguns resultados elementares sobre supremos e ´ınfimos de conjuntos de n´ umeros reais, para uso imediato. Dada uma fun¸c˜ao limitada f : X → R, lembremos que sup f = sup f (X) = sup{f (x); x ∈ X} e inf f = inf f (X) = inf{f (x); x ∈ X}. Todos os conjuntos a seguir mencionados s˜ ao n˜ao-vazios. Lema 1. Sejam A, B ⊂ R tais que, para todo x ∈ A e todo y ∈ B se tenha x ≤ y. Ent˜ ao sup A ≤ inf B. A fim de ser sup A = inf B ´e necess´ ario e suficiente que, para todo ε > 0 dado, existam x ∈ A e y ∈ B com y − x < ε. Demonstra¸ c˜ ao: Todo y ∈ B ´e cota superior de A, logo sup A ≤ y. Isto mostra que sup A ´e cota inferior de B, portanto sup A ≤ inf B. Se valer a desigualdade estrita sup A < inf B ent˜ao ε = inf B − sup A > 0 e y − x ≥ ε para quaisquer x ∈ A, y ∈ B. Reciprocamente, se sup A =

122

A Integral de Riemann

Cap. 10

inf B ent˜ao, para todo ε > 0 dado, sup A − ε/2 n˜ao ´e cota superior de A e inf B + ε/2 n˜ao ´e cota inferior de B, logo existem x ∈ A e y ∈ B tais que sup A − ε/2 < x ≤ sup A = inf B ≤ y < inf B + ε/2. Segue-se que y − x < ε. Lema 2. Sejam A, B ⊂ R conjuntos limitados e c ∈ R. S˜ ao tamb´em limitados os conjuntos A + B = {x + y; x ∈ A, y ∈ B} e c · A = {cx; x ∈ A}. Al´em disso, tem-se sup(A + B) = sup A + sup B, inf(A + B) = inf A + inf B e sup(c · A) = c · sup A, inf(c · A) = c · inf A, caso seja c ≥ 0. Se c < 0 ent˜ ao sup(c · A) = c · inf A e inf(c · A) = c · sup A.

Demonstra¸ c˜ ao: Pondo a = sup A e b = sup B, para todo x ∈ A e todo y ∈ B tem-se x ≤ a, y ≤ b, logo x + y ≤ a + b. Portanto, a + b ´e cota superior de A + B. Al´em disso, dado ε > 0, existem x ∈ A e y ∈ B tais que a − ε/2 < x e b − ε/2 < y, donde a + b − ε < x + y. Isto mostra que a + b ´e a menor cota superior de A + B, ou seja, que sup(A + B) = sup A + sup B. A igualdade sup(c · A) = c · sup A ´e ´obvia se c = 0. Se c > 0, dado qualquer x ∈ A tem-se x ≤ a, logo cx ≤ ca. Portanto ca ´e cota superior do conjunto c · A. Al´em disso, dado qualquer n´ umero d menor do que ca, temos d/c < a, logo existe x ∈ A tal que d/c < x. Segue-se que d < cx. Isto mostra que c · a ´e a menor cota superior de c · A, ou seja, que sup(c · A) = c · sup A. Os casos restantes enunciados no lema s˜ ao provados de modo an´ alogo. Corol´ ario. Sejam f, g : X → R fun¸co ˜es limitadas. Para todo c ∈ R s˜ ao limitadas as fun¸co ˜es f + g, cf: X → R. Tem-se al´em disso, sup(f + g) ≤ sup f + sup g, inf(f + g) ≥ inf f + inf g, sup(cf ) = c · sup f , e inf(cf ) = c · inf f quando c ≥ 0. Caso c < 0, tem-se sup(cf ) = c · inf f e inf(cf ) = c · sup f . Com efeito, sejam A = f (X), B = g(X), C = (f + g)(X) = {f (x) + g(x); x ∈ X}. Evidentemente C ⊂ A + B, logo sup(f + g) = sup C ≤ sup(A + B) = sup A + sup B = sup f + sup g. Al´em disso, sup(cf ) = sup{c · f (x); x ∈ X} = sup(cA) = c · sup A, quando c ≥ 0. Os demais casos enunciados no corol´ario se provam de modo an´ alogo.

Observa¸ c˜ ao. Pode-se ter efetivamente sup(f + g) < sup f + sup g e inf(f + g) > inf f + inf g. Basta tomar f, g : [0, 1] → R, f (x) = x e g(x) = −x. Lema 3. Dada f : X → R limitada, sejam m = inf f , M = sup f e ω = M − m. Ent˜ ao ω = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X}.

Se¸c˜ ao 2

Integral de Riemann

123

Demonstra¸ c˜ ao: Dados x, y ∈ X arbitr´ arios, para fixar id´eias seja f (x) ≥ f (y). Ent˜ao m ≤ f (y) ≤ f (x) ≤ M , donde |f (x) − f (y)| ≤ M − m = ω. Por outro lado, para todo ε > 0 dado podemos achar x, y ∈ X tais que f (x) > M − ε/2 e f (y) < m + ε/2. Ent˜ao |f (x) − f (y)| ≥ f (x) − f (y) > M − m − ε = ω − ε. Assim, ω ´e a menor das cotas superiores do conjunto {|f (x)−f (y)|; x, y ∈ X}, o que prova o lema. Lema 4. Sejam A′ ⊂ A e B ′ ⊂ B conjuntos limitados de n´ umeros reais. Se, para cada a ∈ A e cada b ∈ B, existem a′ ∈ A′ e b′ ∈ B ′ tais que a ≤ a′ e b′ ≤ b, ent˜ ao sup A′ = sup A e inf B ′ = inf B.

Demonstra¸ c˜ ao: Evidentemente, sup A ´e uma cota superior de A′ . Al´em disso, se c < sup A existe a ∈ A com c < a, logo existe a′ ∈ A′ com c < a ≤ a′ , portanto c n˜ao ´e cota superior de A′ . Assim, sup A ´e a menor cota superior de A′ , isto ´e, sup A = sup A′ . Um racioc´ınio an´ alogo demonstra o resultado para inf B e inf B ′ .

2

Integral de Riemann

Uma parti¸ca ˜o do intervalo [a, b] ´e um subconjunto finito de pontos P = {t0 , t1 , . . . , tn } ⊂ [a, b] tal que a ∈ P e b ∈ P . A nota¸c˜ao ser´a sempre usada de modo que a = t0 < t1 < · · · < tn = b. O intervalo [ti−1 , ti ], de comprimento ti − Pti−1 , ser´a chamado o i-´esimo intervalo da parti¸c˜ao P . Evidentemente, ni=1 (ti − ti−1 ) = b − a. Sejam P e Q parti¸c˜oes do intervalo [a, b]. Diz-se que Q refina P quando P ⊂ Q. A maneira mais simples de refinar uma parti¸c˜ao ´e acrescentar-lhe um u ´nico ponto. Dada uma fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R, usaremos as nota¸c˜oes m = inf{f (x); x ∈ [a, b]} e

M = sup{f (x); x ∈ [a, b]}.

Em particular, temos m ≤ f (x) ≤ M para todo x ∈ [a, b]. Se P = {t0 , t1 , . . . , tn } ´e uma parti¸c˜ao de [a, b], as nota¸c˜oes mi = inf{f (x); ti−1 ≤ x ≤ ti }, Mi = sup{f (x); ti−1 ≤ x ≤ ti } e ωi = Mi − mi indicar˜ao o ´ınfimo, o supremo e a oscila¸ca ˜o de f no i-´esimo intervalo de P . Quando f ´e cont´ınua, mi e Mi s˜ ao valores efetivamente assumidos por f em [ti−1 , ti ]. Em particular, neste caso existem xi , yi ∈ [ti−1 , ti ] tais que ωi = |f (yi ) − f (xi )|.

124

A Integral de Riemann

Cap. 10

A soma inferior de f relativamente `a parti¸c˜ao P ´e o n´ umero s(f ; P ) = m1 (t1 − t0 ) + · · · + mn (tn − tn−1 ) =

n X i=1

mi (ti − ti−1 ).

A soma superior de f relativamente `a parti¸c˜ao P ´e, por defini¸c˜ao, S(f ; P ) = M1 (t1 − t0 ) + · · · + Mn (tn − tn−1 ) =

n X i=1

Mi (ti − ti−1 ).

Evidentemente, m(b − a) ≤ s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) ≤ PM (b − a) seja qual for a parti¸c˜ao P . Al´em disso, S(f ; P ) − s(f ; P ) = ni=1 ωi (ti − ti−1 ). Quando f estiver clara no contexto, pode-se escrever simplesmente s(P ) e S(P ) em vez de s(f ; P ) e S(f ; P ) respectivamente.

Figura 9: A soma inferior e a soma superior.

No caso em que f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b], os n´ umeros s(f ; P ) e S(f ; P ) s˜ ao valores aproximados, respectivamente por falta e por excesso, da ´ area da regi˜ ao limitada pelo gr´ afico de f , pelo intervalo [a, b] do eixo das abscissas e pelas verticais levantadas nos pontos a e b desse eixo. Quando f (x) ≤ 0 para todo x ∈ [a, b], essas somas s˜ ao valores aproximados de tal ´ area, com o sinal trocado. A integral inferior e a integral superior da fun¸c˜ao limitada f: [a, b]→R s˜ ao definidas, respectivamente, por Z

¯

a

b

f (x) dx = sup s(f ; P ), P

Z¯ b a

f (x) dx = inf S(f ; P ), P

Se¸c˜ ao 2

Integral de Riemann

125

o sup e o inf sendo tomados relativamente a todas as parti¸c˜oes P do intervalo [a, b]. Teorema 1. Quando se refina uma parti¸ca ˜o, a soma inferior n˜ ao diminui e a soma superior n˜ ao aumenta. Ou seja: P ⊂ Q ⇒ s(f ; P ) ≤ s(f ; Q) e S(f ; Q) ≤ S(f ; P ).

Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos inicialmente que a parti¸c˜ao Q = P ∪ {r} resulte de P pelo acr´escimo de um u ´nico ponto r, digamos com tj−1 < ′ ′′ r < tj . Sejam m e m respectivamente os ´ınfimos de f nos intervalos [tj−1 , r] e [r, tj ]. Evidentemente, mj ≤ m′ , mj ≤ m′′ e tj − tj−1 = (tj − r) + (r − tj−1 ). Portanto s(f ; Q) − s(f ; P ) = m′′ (tj − r) + m′ (r − tj−1 ) − mj (tj − tj−1 )

= (m′′ − mj )(tj − r) + (m′ − mj )(r − tj−1 ) ≥ 0.

Para obter o resultado geral, onde Q resulta de P pelo acr´escimo de k pontos, usa-se k vezes o que acabamos de provar. Analogamente, P ⊂ Q ⇒ S(f ; Q) ≤ S(f ; P ). Corol´ ario 1. Para quaisquer parti¸co ˜es P , Q do intervalo [a, b] e qualquer fun¸ca ˜o limitada f : [a, b] → R tem-se s(f ; P ) ≤ S(f ; Q).

Com efeito, a parti¸c˜ao P ∪ Q refina simultaneamente P e Q, logo s(f ; P ) ≤ s(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; Q).

Corol´ ario 2. Dada f : [a, b] → R, se m ≤ f (x) ≤ M para todo x ∈ [a, b] ent˜ ao Z¯ b Z b f (x) dx ≤ f (x) dx ≤ M (b − a). m(b − a) ≤ ¯

a

a

Com efeito, as desigualdades externas s˜ ao ´obvias e a do meio resulta do Corol´ario 1 e do Lema 1. Corol´ ario 3. Seja P0 uma parti¸ca ˜o de [a, b]. Se considerarmos as somas s(f ; P ) e S(f ; P ) apenas relativas a `s parti¸co ˜es P que refinam Rb Rb P0 , obteremos os mesmos valores para a f (x) dx e ¯a f (x) dx. ¯

Com efeito, basta combinar o Teorema 1 e o Lema 4.

Uma fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R diz-se integr´ avel quando sua integral inferior e sua integral superior s˜ ao iguais. EsseR valor comum b chama-se a integral (de Riemann) de f e ´e indicado por a f (x) dx.

126

A Integral de Riemann

Cap. 10

Rb No s´ımbolo a f (x) dx, x ´e o que se chama uma “vari´avel muda”, Rb Rb Rb isto ´e, a f (x) dx = a f (y) dy = a f (t) dt, etc. R ` vezes prefere-se a nota¸c˜ao mais simples b f . A justificativa para As a a nota¸c˜ao mais complicada ser´a vista noR Teorema 2, Cap´ıtulo 11. b Quando f ´e integr´avel, sua integral a f (x) dx ´e o n´ umero real cujas aproxima¸c˜oes por falta s˜ ao as somas inferiores s(f ; P ) e cujas aproxima¸c˜oes por excesso s˜ ao as somas superiores S(f ; P ). O Teorema 1 diz que essas aproxima¸c˜oes melhoram quando se refina a parti¸c˜ao P . Geometricamente, quando f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b], a existˆencia de Rb ao limitada pelo gr´ afico de f , pelo segmento a f (x) dx significa que a regi˜ [a, b] do eixo das abscissas e pelas verticais levantadas pelos pontos a e b ´e mensur´avel (isto ´e, possui ´area) e o valor da integral ´e, por defini¸c˜ao, Rb a´ area dessa regi˜ ao. No caso geral, tem-se a ´area externa ¯a f (x) dx e a Rb ´area interna a f (x) dx, que podem ser diferentes, como veremos agora. ¯

Exemplo 1. Seja f : [a, b] → R definida por f (x) = 0 se x ´e racional e f (x) = 1 quando x ´e irracional. Dada uma parti¸c˜ao arbitr´ aria P , como cada intervalo [ti−1 , ti ] cont´em n´ umeros racionais e irracionais, temos mi = 0 e Mi = 1, logo s(f ; P ) = 0 e S(f ; P ) = b − a. Assim, f n˜ao ´e Rb Rb f (x) dx = 0 e ¯ f (x) dx = b − a. integr´avel, pois ¯

a

a

Exemplo 2. Seja f : [a, b] → R constante, f (x) = c para todo x ∈ [a, b]. Ent˜ao, seja qual for a parti¸c˜ao P , temos mi = Mi = c em todos os intervalos, logo s(f ; P ) = S(f ; P ) = c(b − a). Assim f ´e integr´avel, com Rb Rb Rb f (x) dx = f (x) dx = ¯ f (x) dx = c(b − a). a

¯

a

a

Teorema 2. (Condi¸ c˜ ao imediata de integrabilidade.) Seja f : [a, b] → R limitada. As seguintes afirma¸co ˜es s˜ ao equivalentes: (1) f ´e integr´ avel.

(2) Para todo ε > 0, existem parti¸co ˜es P , Q de [a, b] tais que S(f ; Q)− s(f ; P ) < ε. (3) Para todo ε > 0, existe uma ˜o P = {t0 , . . . , tn } de [a, b] tal P parti¸ca que S(f ; P ) − s(f ; P ) = ni=1 ωi (ti − ti−1 ) < ε.

Demonstra¸ c˜ ao: Sejam A o conjunto das somas inferiores e B o conjunto das somas superiores de f . Pelo Corol´ario 1 do Teorema 1, tem-se s ≤ S para toda s ∈ A e toda S ∈ B. Supondo (1), vale sup A = inf B.

Se¸c˜ ao 3

Propriedades da integral

127

Logo, pelo Lema 1, podemos concluir que (1) ⇒ (2). Para provar que (2) ⇒ (3) basta observar que se S(f ; Q) − s(f ; P ) < ε ent˜ao, como a parti¸c˜ao P0 = P ∪ Q refina ambas P e Q, segue-se do Teorema 1 que s(f ; P ) ≤ s(f ; P0 ) ≤ S(f ; P0 ) ≤ S(f ; Q), donde se conclui que S(f ; P0 ) − s(f ; P0 ) < ε. Finalmente, (3) ⇒ (1) pelo Lema 1.

Exemplo 3. Seja f : [a, b] → R definida por f (x) = c quando a < x ≤ b Rb e f (a) = A. Afirmamos que f ´e integr´avel, com a f (x) dx = c(b − a). Para fixar id´eias, suponhamos c < A. Ent˜ao, dada uma parti¸c˜ao qualquer P = {t0 , t1 , . . . , tn } temos m1 = c, M1 = A e mi = Mi = c para 1 < i ≤ n. Portanto S(f ; P ) − s(f ; P ) = (A − c)(t1 − t0 ). Dado arbitrariamente ε > 0, tomamos uma parti¸c˜ao P com t1 − t0 < ε/(A − c) e obtemos S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε. Logo f ´e integr´avel. Al´em disso, como s(f ; P ) = c(b − a) para toda parti¸c˜ao P , temos Z b f (x) dx = c(b − a). ¯

a

Mas, sendo f integr´avel, resulta que Z b Z b f (x) dx = c(b − a). f (x) dx = a

¯

a

Evidentemente, um resultado an´ alogo vale quando f (x) = c para x ∈ [a, b), ou quando f (x) = c para todo x ∈ (a, b).

3

Propriedades da integral

Teorema 3. Seja a < c < b. A fun¸ca ˜o limitada f : [a, b] → R ´e integr´ avel se, e somente se, suas restri¸co ˜es f |[a, c] e f |[c, b] s˜ ao integr´ aveis. Rb Rc Rb No caso afirmativo, tem-se a f (x) dx = a f (x) dx + c f (x) dx. Demonstra¸ c˜ ao: Sejam A e B respectivamente os conjuntos das somas inferiores de f |[a, c] e f |[c, b]. Vˆe-se facilmente que A+B ´e o conjunto das somas inferiores de f relativamente `as parti¸c˜oes de [a, b] que contˆem o ponto c. Pelo Corol´ario 3 do Teorema 1, ao calcular a integral inferior de f , basta considerar as parti¸c˜oes desse tipo, pois elas s˜ ao as que refinam P0 = {a, c, b}. Pelo Lema 2, Z b Z c Z b f (x) dx. f (x) dx + f (x) dx = sup(A + B) = sup A + sup B = ¯

a

¯

a

¯

c

128

A Integral de Riemann

Cap. 10

Analogamente se mostra que Z¯ b

f (x)dx =

Z¯ c

f (x)dx +

a

a

b

Z

¯

f (x)dx.

c

Logo Z¯ b a

f−

Z

¯

a

b



f =

Z¯ c a

f−

Z

¯

a

c





f + 

Z¯ b c

f−

Z

¯

c

b



f .

Como as duas parcelas dentro dos parˆenteses s˜ ao ≥ 0, sua soma ´e zero se, e somente se, elas s˜ ao ambas nulas. Assim, f ´e integr´avel se, e somente se, suas restri¸c˜oes f |[a, c] e f |[c, b] o s˜ ao. No caso afirmativo, vale a Rb Rc Rb igualdade a f = a f + c f .

Exemplo 4. Diz-se que f : [a, b] → R ´e uma fun¸ca ˜o-escada quando existem uma parti¸c˜ao P = {t0 , . . . , tn } de [a, b] e n´ umeros reais c1 , . . . , cn tais que f (x) = ci quando ti−1 < x < ti . (Note-se que nada se diz sobre os valores f (ti ).) Segue-se do Teorema 3 e do Exemplo 3 que toda fun¸c˜ao Rb P escada ´e integr´avel e a f (x) dx = ni=1 ci (ti − ti−1 ). Rb Rc Rb Conven¸ c˜ ao. A igualdade a f (x) dx = a f (x) dx + c f (x) dx faz sentido apenas quando a < c < b. A fim de torn´a-la verdadeira sejam quais forem a, b, c ∈ R, Rfaremos duas conven¸c˜oes, Rque ser˜ao adotadas R a doraa b vante. Primeira: a f (x) dx = 0. Segunda: a f (x) dx = − b f (x) dx. Aceitas estas conven¸c˜oes, vale para toda fun¸c˜ao integr´avel f a igualdade acima. Para verific´a-la, h´a seis possibilidades a considerar: a ≤ b ≤ c, a ≤ c ≤ b, b ≤ a ≤ c, b ≤ c ≤ a, c ≤ a ≤ b e c ≤ b ≤ a. Em cada caso, basta admitir a integrabilidade de f no intervalo maior. Teorema 4. Sejam f, g : [a, b] → R integr´ aveis. Ent˜ ao: (1) A soma f + g ´e integr´ avel e Z b Z b Z b g(x) dx. f (x) dx + [f (x) + g(x)]dx = a

a

a

(2) O produto f ·g ´e integr´ avel. Se c ∈ R,

Rb a

c·f (x) dx = c·

Rb a

f (x) dx.

(3) Se 0 < k ≤ |g(x)| para todo x ∈ [a, b] ent˜ ao o quociente f /g ´e integr´ avel. Rb Rb (4) Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b], ent˜ ao a f (x) dx ≤ a g(x) dx.

Se¸c˜ ao 3

Propriedades da integral

129

Rb Rb (5) |f | ´e integr´ avel e a f (x) dx ≤ a |f (x)| dx.

Demonstra¸ c˜ ao: Dada uma parti¸c˜ao arbitr´ aria P de [a, b], se indicarmos com m′i , m′′i e mi respectivamente os ´ınfimos de f , g e f + g no i-´esimo intervalo de P , teremos m′i + m′′i ≤ mi , pelo Corol´ario do Lema Rb 2, logo s(f ; P ) + s(g; P ) ≤ s(f + g; P ) ≤ a (f + g) para toda parti¸c˜ao ¯

P . Se tomarmos duas parti¸c˜oes P e Q teremos ainda

s(f ; P ) + s(g; Q) ≤ s(f ; P ∪ Q) + s(g; P ∪ Q) ≤

Z

¯

b

(f + g).

a

Por conseguinte, Z

¯

b

f+

a

Z

¯

b

g = sup s(f ; P ) + sup s(g; Q) P

a

Q

= sup[s(f ; P ) + s(g; Q)] ≤ P,Q

Z

¯

b

(f + g). a

Isto prova a primeira das desigualdades abaixo. A terceira se demonstra de modo an´ alogo e a segundo ´e ´obvia: Z

¯

b

f+ a

Z

¯

a

b

g≤

Z

¯

b

a

Z¯ b Z¯ b Z¯ b (f + g) ≤ (f + g) ≤ f + g. a

a

a

Quando f e g s˜ ao integr´aveis, as trˆes desigualdades se reduzem a igualdades, o que prova (1). (2) Seja K tal que |f (x)| ≤ K e |g(x)| ≤ K para todo x ∈ [a, b]. Dada uma parti¸c˜ao P , sejam ωi′ , ωi′′ e ωi respectivamente as oscila¸c˜oes de f , g e f · g no i-´esimo intervalo [ti−1 , ti ]. Para quaisquer x, y ∈ [ti−1 , ti ] temos: |f (y) · g(y) − f (x) · g(x)| = |(f (y) − f (x))g(y) + f (x)(g(y) − g(x))|

≤ |f (y) − f (x)| |g(y)| + |f (x)| |g(y) − g(x)|

≤ K(ωi′ + ωi′′ ).

P P P Da´ı ωi (ti −ti−1 ) ≤ K ·[ ωi′ (ti −ti−1 )+ ωi′′ (ti −ti−1 )]. A integrabilidade de f · g segue-se ent˜ao da integrabilidade de f e g, pelo Teorema 2.

130

A Integral de Riemann

Cap. 10

Quanto a cf , sua integrabilidade resulta do que acabamos de provar. Al´em disso, se c ≥ 0, temos s(cf ; P ) = c · s(f ; P ) para toda parti¸c˜ao P , donde, pelo Lema 2, Z b Z b Z b Z b f. f =c· cf = c · cf = a

¯

a

¯

a

a

Rb Rb Rb Caso c < 0, temos s(cf ; P ) = c · S(f ; P ), logo a cf = a cf = c ·a¯ f = ¯ Rb c · a f. (3) Como f /g = f · (1/g), basta provar que 1/g ´e integr´avel se g ´e integr´avel e 0 < k ≤ |g(x)| para todo x ∈ [a, b]. Indiquemos com ωi e ωi′ respectivamente as oscila¸c˜oes de g e 1/g no i-´esimo intervalo de ε > 0, podemos tomar P de modo que P uma parti¸c˜ao P . Dado ωi (ti − ti−1 ) < ε · k 2 . Para quaisquer x, y no i-´esimo intervalo de P tem-se 1 1 |g(x) − g(y)| ωi g(y) − g(x) = |g(y)g(x)| ≤ k 2 , P ′ ωi (ti − ti−1 ) < ε, logo 1/g ´e portanto ωi′ ≤ ωi /k 2 . Segue-se que integr´avel. (4) Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b] ent˜ao s(f ; P ) ≤ s(g; P ) e Rb Rb S(f ; P ) ≤ S(g; P ) para toda parti¸c˜ao P , donde a f (x) dx ≤ a g(x) dx. (5) A desigualdade evidente | |f (y)| − |f (x)| | ≤ |f (y) − f (x)| mostra que a oscila¸c˜ao de |f | em qualquer conjunto n˜ao supera a de f . Logo, f integr´avel ⇒ |f | integr´avel. Al´em disso, como −|f (x)| ≤ f (x) ≤ |f (x)| para todo x ∈ [a, b], resulta de (4) que Z b Z b Z b |f (x)| dx, f (x) dx ≤ |f (x)| dx ≤ − a

a

a

Rb Rb ou seja, a f (x) dx ≤ a |f (x)| dx.

Corol´ ario. Se f : [a, b] → R ´e integr´ avel e |f (x)| ≤ K para todo x ∈ Rb [a, b] ent˜ ao a f (x) dx ≤ K(b − a).

Observa¸ c˜ ao. Se uma fun¸c˜ao integr´avel f : [a, b] → R ´e tal que f (x) ≥ 0 Rb para todo x ∈ [a, b] ent˜ao a f (x) dx ≥ 0. Isto resulta de (4) acima. Mas Rb ´e poss´ıvel ter f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b], com a f (x) dx = 0 sem que f seja identicamente nula. Basta tomar f (x) = 1 num conjunto finito de

Se¸c˜ ao 4

Condi¸c˜ oes de integrabilidade

131

pontos em [a, b] e f (x) = 0 nos pontos de [a, b] fora desse conjunto finito. Pelo Exemplo 4, f ´e integr´avel e sua integral ´e zero. Entretanto, se f Rb ´e cont´ınua e f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b] ent˜ao a f (x) dx = 0 implica f identicamente nula. Com efeito, se existisse algum ponto x0 ∈ [a, b] onde f (x0 ) = c > 0, existiria um intervalo n˜ao-degenerado [α, β], com x0 ∈ [α, β] ⊂ [a, b] tal que f (x) > c/2 para todo x ∈ [α, β]. Ent˜ao, Rb Rβ como f (x) ≥ 0, ter´ıamos a f (x) dx ≥ α f (x) dx > 2c (β − α) > 0, uma contradi¸c˜ao.

4

Condi¸c˜ oes de integrabilidade

Teorema 5. Toda fun¸ca ˜o cont´ınua f : [a, b] → R ´e integr´ avel.

Demonstra¸ c˜ ao: Dado ε > 0, pela continuidade uniforme de f no compacto [a, b], existe δ > 0 tal que x, y ∈ [a, b], |y − x| < δ implicam |f (y) − f (x)| < ε/(b − a). Seja P uma parti¸c˜ao de [a, b] cujos intervalos tˆem todos comprimento < δ. Em todo intervalo [ti−1 , ti ] de P existem xi , yi tais que mi = f (xi ) e M Pi = f (yi ), donde ωi = f (yi ) − f (xi ) < ε/(b − a). Conseq¨ uentemente ωi (ti − ti−1 ) < ε. Pelo Teorema 2, f ´e integr´avel.

Teorema 6. Toda fun¸ca ˜o mon´ otona f : [a, b] → R ´e integr´ avel.

Demonstra¸ c˜ ao: Para fixar id´eias, seja f n˜ao-decrescente e n˜ao-constante. Dado ε > 0, seja P = {t0 , . . . , tn } uma parti¸c˜ao de [a, b] cujos intervalos tˆem todos comprimento < ε/[fP (b) − f (a)]. Para cada i = 1, . . . , n temos ωi = f (ti ) − f (ti−1 ) portanto ωi = f (b) − f (a) e X X ε · ωi = ε. ωi (ti − ti−1 ) < f (b) − f (a) Logo f ´e integr´avel.

As considera¸c˜oes a seguir s˜ ao um preparativo para o Teorema 7, que engloba os Teoremas 5 e 6 como casos particulares. Se a < b, indicaremos com |I| = b − a o comprimento do intervalo (fechado, aberto ou semi-aberto) I cujos extremos s˜ ao a e b. Diz-se que o conjunto X ⊂ R tem medida nula quando, para todo S ε > 0 dado, existe uma cobertura finita ou infinita enumer´avel XP⊂ Ik de X por intervalos abertos Ik cuja soma dos comprimentos ´e |Ik | < ε. Na defini¸ S c˜ao de conjunto de medida nula, os intervalos Ik da cobertura X ⊂ Ik s˜ ao tomados abertos a fim de permitir o uso do Teorema

132

A Integral de Riemann

Cap. 10

de Borel-Lebesgue, quando necess´ario. Deve-se observar S por´em que se, para todo ε > 0, existir uma cobertura enumer´avel X ⊂ Ik por meio de intervalos limitados Ik (abertos ou n˜ao), com Σ|Ik | < ε, ent˜ao X tem medida nula. Com efeito, sendo assim, para todo k ∈ N tomamos um intervalo aberto JS a uma coberk ⊃ Ik com |Jk | =!Ik | + ε/2k, o que nos d´ tura aberta X ⊂ Jk , com Σ|Jk | = Σ|Ik | + Σ(ε/2k) = Σ|Ik | + ε < 2ε, logo X tem medida nula. Exemplo 5. Todo conjunto enumer´avel X = {x1 , . . . , xk , . . . } tem medida nula. Com efeito, dado arbitrariamente ε > 0, seja S Ik o intervalo P aberto de centro xk e comprimento ε/2k+1 . Ent˜ao X ⊂ Ik e |Ik | = ε/2 < ε. Em particular, o conjunto Q dos n´ umeros racionais tem medida nula. Teorema 7. Se o conjunto D dos pontos de descontinuidade de uma fun¸ca ˜o limitada f : [a, b] → R tem medida nula ent˜ ao f ´e integr´ avel.

Demonstra¸ c˜ aS o: Dado Pε > 0, existem intervalos abertos I1 , . . . , Ik , . . . tais que D ⊂ Ik e |Ik | < ε/2K, onde K = M − m ´e a oscila¸c˜ao de f em [a, b]. Para cada x ∈ [a, b] − D, seja Jx um intervalo aberto de centro x tal que a oscila¸c˜ao de f |(Jx ∩ [a, b]) ´e menor do que ε/2(b S −a). Pelo Teorema de Borel-Lebesgue, a cobertura aberta [a, b] ⊂ k Ik ∪  S possui uma subcobertura finita [a, b] ⊂ I ∪ · · · ∪ I ∪ Jx1 ∪ J 1 m x x · · · ∪ Jxn . Seja P a parti¸c˜ao de [a, b] formada pelos pontos a e b e os extremos desses m + n intervalos que perten¸cam a [a, b]. Indiquemos com [tα−1 , tα ] os intervalos de P que est˜ao contidos em algum I k e com [tβ−1 , tβ ] os demais P intervalos de P , cada um dos quais est´a contido em algum Jxi . Ent˜ao (tα − tα−1 ) < ε/2K e a oscila¸c˜ao de f em cada intervalo [tβ−1 , tβ ] ´e ωβ < ε/2(b − a). Logo X X S(f ; P ) − s(f ; P ) = ωα (tα − tα−1 ) + ωβ (tβ − tβ−1 ) X X ε(tβ − tβ−1 ) < K(tα − tα−1 ) + 2(b − a) Kε ε · (b − a) < + = ε. 2K 2(b − a) Logo f ´e integr´avel. A rec´ıproca do Teorema 7 ´e verdadeira. A fim de demonstr´a-la, faremos uso da oscila¸c˜ao ω(f ; x) da fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R no ponto x ∈ [a, b], assim definida: para cada δ > 0, seja ω(δ) = Mδ − mδ ,

Se¸c˜ ao 4

Condi¸c˜ oes de integrabilidade

133

onde Mδ e mδ s˜ ao respectivamente o sup e o inf de f em [a, b]∩[x−δ, x+δ]. A fun¸c˜ao ω(δ) ´e ≥ 0, limitada e n˜ao-decrescente, logo existe o limite ω(f ; x) = lim ω(δ), que chamaremos a oscila¸ca ˜o de f no ponto x. Segueδ→0

se imediatamente da defini¸c˜ao de fun¸c˜ao cont´ınua que ω(f ; x) > 0 se, e somente se, a fun¸c˜ao f ´e descont´ınua no ponto x. Se x ´e um ponto interior do intervalo I ⊂ [a, b] ent˜ao ω(f ; x) ≤ ω(f ; I), onde ω(f ; I) = sup ·f (x) − inf f (x). Mas se x ´e um dos extremos de I, pode ocorrer que x∈I

x∈I

seja ω(f ; x) > ω(f ; I). Este ´e, por exemplo, o caso quando f : [−1, 1] → R ´e dada por f (x) = 1 para −1 ≤ x < 0 e f (x) = 0 quando x ≥ 0. Tomando I = [0, 1] e x = 0, temos ω(f ; I) = 0 e ω(f ; x) = 1. Com esses preliminares esclarecidos, passemos `a Rec´ıproca do Teorema 7. O conjunto D dos pontos de descontinuidade da fun¸ca ˜o integr´ avel f : [a, b] → R tem medida nula. Demonstra¸ c˜ ao: Para cada k ∈ N, seja Dk ={x∈[a, b]; ω(f ; x)≥1/k}. Ent˜ao D = ∪Dk , logo basta mostrar que cada Dk tem medida nula. Fixemos k e tomemos ε > 0. Sendo f integr´avel, existe uma parti¸c˜ao P = {t0 < t1 , < · · · < tk } de [a, b] tal que Σωi ·(ti −ti−j ) < ε/k, onde ωi ´e a oscila¸c˜ao de f em [ti−j , ti ]. Indicando com [tα−i , tα ] os intervalos de P que contˆem pontos de Dk em seu interior, temos ωα ≥ 1/k para cada α e Dk = [∪(tα−1 , tα )] ∪ F , onde F ´e o conjunto (finito) das extremidades dos (tα−1 , tα ) que perten¸cam a Dk . Ent˜ao 1 Σ(tα − tα−1 ) ≤ Σωα · (tα − tα−1 ) ≤ Σωi (ti − ti−1 ) < ε/k, k logo Σ(tα − tα−1 ) < ε. Assim, para todo ε > 0 dado, ´e poss´ıvel cobrir Dk com um conjunto finito F mas uma reuni˜ao finita de intervalos cuja soma dos comprimentos ´e < ε. Segue-se que Dk tem medida nula. Exemplo 6. O conjunto de Cantor K (se¸c˜ao 5 do Cap´ıtulo 5), embora n˜ao-enumer´avel, tem medida nula. Com efeito, se pararmos na n-´esima etapa de sua constru¸c˜ao, veremos que o conjunto de Cantor est´a contido na reuni˜ao de 2n intervalos, cada um tendo comprimento 1/3n . Dado ε > 0, podemos tomar n ∈ N tal que (2/3)n < ε, e concluiremos que a medida de K ´e zero. Podemos considerar a fun¸c˜ao f : [0, 1] → R, definida pondo-se f (x) = 0 se x ∈ K e f (x) = 1 se x ∈ / K. Como [0, 1] − K ´e aberto, a fun¸c˜ao f ´e localmente constante, e portanto cont´ınua, nos pontos x ∈ / K. Como K n˜ao possui pontos interiores, f ´e descont´ınua em

134

A Integral de Riemann

Cap. 10

todos os pontos de K. Pelo Teorema 7, f ´e integr´avel. Dada qualquer parti¸c˜ao P de [0, 1] todos os intervalos de P contˆem pontos que n˜ao pertencem a K, pois int K = ∅. Assim, Mi = 1 e S(f ; P ) = 1 para toda R1 R 1 parti¸c˜ao P . Segue-se que 0 f (x) dx = ¯0 f (x) dx = 1.

Exemplo 7. Se S a < b, o intervalo [a, b] n˜ao tem medida nula. Com efeito, se [a, b] ⊂ Ik ´e uma cobertura (que podemos supor finita) por intervalos Ik , tem-se sempre Σ|Ik | ≥ b − a. De fato, os pontos a, b e mais as extremidades dos Ik que estejam contidas em [a, b] formam uma parti¸c˜ao P = {a = t0 < t1 < · · · < tm = b} tal que cada intervalo (ti−1 , ti ) est´a contido em algum P Ik . Se escrevermos i ⊂ k para significar (ti − ti−1 ) ≤ |Ik |. Portanto que (ti−1 , ti ) ⊂ Ik , teremos i⊂k

b − a = Σ(ti − ti−1 ) =

5

" X X k

i⊂k

#

(ti − ti−1 ) ≤ Σ|Ik |.

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 2:

Integral de Riemann

1. Defina f : [0, 1] → R pondo f (0) = 0 e f (x) = 1/2n se 1/2n+1 < n Rx 1 ≤ 1/2 , n ∈ N ∪ {0}. Prove que f ´e integr´avel e calcule 0 f (x) dx.

2. Seja Rf : [−a, a] → R integr´avel. Se f ´e uma fun¸c˜aoR´ımpar, prove a a que −a f (x) dx = 0. Se, por´em, f ´e par, prove que −a f (x) dx = Ra 2 0 f (x) dx. 3. Seja f : [a, b] → R definida pondo f (x) = 0 se x ´e irracional e f (x) = 1/q se x = p/q ´e uma fra¸c˜ao irredut´ıvel e q > 0. (Ponha f (0) = 1 caso 0 ∈ [a, b].) Prove que f ´e cont´ınua apenas nos pontos Rb irracionais de [a, b], que ´e integr´avel e que a f (x) dx = 0. 4. Seja f : [a, b] → R uma fun¸c˜ao integr´avel, com f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b]. Se f ´e cont´ınua no ponto c ∈ [a, b] e f (c) > 0, prove que Rb a f (x) dx > 0.

5. Seja f : [a, b] → R definida pondo f (x) = x quando x ´e racional e f (x) = x + 1 quando x ´e irracional. Calcule as integrais (inferior e superior) de f . Usando uma fun¸c˜ao integr´avel g : [a, b] → R em vez de x, defina agora ϕ(x) = g(x) se x ´e racional e ϕ(x) = g(x)+1

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

135

para x irracional. Calcule as integrais (inferior e superior) de ϕ em termos da integral de g. Se¸ c˜ ao 3:

Propriedades da integral

1. Seja f : [a, b] → R integr´ R x avel. Prove que a fun¸c˜ao F : [a, b] → R, definida por F (x) = a f (t) dt, ´e lipschitziana.

2. Prove que se f, g : [a, b] → R s˜ ao integr´aveis ent˜ao s˜ ao tamb´em integr´aveis as fun¸c˜oes ϕ, ψ : [a, b] → R, definidas por ϕ(x) = max{f (x), g(x)} e ψ(x) = min{f (x), g(x)}. Conclua da´ı que s˜ ao integr´aveis as fun¸c˜oes f+ , f− : [a, b] → R dadas por f+ (x) = 0 se f (x) ≤ 0, f+ (x) = f (x) se f (x) > 0; f− (x) = 0 se f (x) ≥ 0 e f− (x) = −f (x) se f (x) < 0 (supondo ainda f integr´avel).

3. Prove que se f, g : [a, b] → R s˜ ao cont´ınuas ent˜ao Z

a

b

f (x)g(x) dx

2



Z

a

b

2

f (x) dx ·

Z

b

g(x)2 dx.

a

(Desigualdade de Schwarz.) Se¸ c˜ ao 4:

Condi¸ co ˜es suficientes de integrabilidade

1. Prove que a fun¸c˜ao f do Exerc´ıcio 2.3 ´e integr´avel. 2. Prove que o conjunto dos pontos de descontinuidade de uma fun¸c˜ao mon´otona ´e enumer´avel e conclua da´ı que o Teorema 6 decorre do Teorema 7. 3. Seja D o conjunto dos pontos de descontinuidade de uma fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R. Se D′ (conjunto dos pontos de acumula¸c˜ao de D) ´e enumer´avel, prove que f ´e integr´avel. 4. Uma fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R, que se anula fora de um conjunto de medida nula, pode n˜ao ser integr´avel. Nestas condi¸c˜oes, supondo f integr´avel, prove que sua integral ´e igual a zero. 5. Diz-se que um conjunto X ⊂ R tem conte´ udo nulo quando, para todo ε > 0 dado, existe uma cobertura X ⊂ I1 ∪ · · ·P ∪ Ik , por meio k de um n´ umero finito de intervalos abertos, com j=1 |Ij | < ε. Prove: (a) Se X tem conte´ udo nulo, o mesmo ocorre com seu fecho X.

136

A Integral de Riemann

Cap. 10

(b) Existem conjuntos de medida nula que n˜ao tˆem conte´ udo nulo. (c) Um conjunto compacto tem medida nula se, e somente se, tem conte´ udo nulo. (d) Se uma fun¸c˜ao limitada g : [a, b] → R coincide com uma fun¸c˜ao integr´avel f : [a, b] → R exceto num conjunto de conte´ udo nulo, prove que g ´e integr´avel e sua integral ´e igual `a de f . 6. Se um conjunto X ⊂ [a, b] n˜ao tem medida nula ent˜ao existe ε > 0 tal que, para toda parti¸c˜ao P de [a, b], a soma dos comprimentos dos intervalos de P que contˆem pontos de X em seu interior ´e maior do que ε. 7. Seja ϕ : [a, b] → R uma fun¸c˜ao positiva (isto ´e, ϕ(x) > 0 para todo x ∈ [a, b]). Existe α > 0 tal que o conjunto X = {x ∈ [a, b]; ϕ(x) ≥ α} n˜ao tem medida nula. Rb 8. Se a fun¸c˜ao ϕ : [a, b] → R ´e positiva e integr´avel, ent˜ao a ϕ(x) dx > 0. Conclua que se f, g : [a, b] → R s˜ ao integr´aveis e f (x) < g(x) Rb Rb para todo x ∈ [a, b] ent˜ao a f (x) dx < a g(x) dx. (Use os exerc´ıcios 6. e 7.) 9. Seja p : [a, b] → R integr´avel, com p(x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b]. Rb Prove que se a p(x) dx = 0 ent˜ao o conjunto dos pontos x ∈ [a, b] tais que p(x) = 0 ´e denso em [a, b]. Se f : [a, b] → R ´e qualquer fun¸c˜ao integr´avelR que se anula num conjunto denso de pontos em b [a, b], prove que a f (x) dx = 0.

11 C´ alculo com Integrais

Este cap´ıtulo ´e a continua¸c˜ao do anterior. Naquele, foi definida a integral e foram estabelecidas condi¸c˜oes gerais que asseguram a integrabilidade de uma fun¸c˜ao. Neste, ser˜ao provadas as regras para o manuseio eficiente das integrais, entre elas o chamado Teorema Fundamental do C´alculo, uma movimentada via de m˜ ao dupla que liga derivadas a integrais. Em seguida, usaremos a integral para dar uma defini¸c˜ao adequada do logaritmo e da exponencial. O cap´ıtulo termina com uma breve discuss˜ ao das integrais impr´oprias.

1

Os teoremas cl´ assicos do C´ alculo Integral

Para come¸car, estabeleceremos a conex˜ao entre derivada e integral. Teorema 1. (Teorema Fundamental do C´ alculo.) Seja f : I → R cont´ınua no intervalo I. As seguintes afirma¸co ˜es a respeito de uma fun¸ca ˜o F : I → R s˜ ao equivalentes: (1) F ´e uma integral R x indefinida de f , isto ´e, existe a ∈ I tal que F (x) = F (a) + a f (t) dt, para todo x ∈ I.

(2) F ´e uma primitiva de f , isto ´e, F ′ (x) = f (x) para todo x ∈ I.

138

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

Demonstra¸ c˜ ao: (1) ⇒ (2). Se x0 , x0 +h ∈ I ent˜ao F (x0 +h)−F (x0 ) = R x0 +h R x +h f (t) dt e h · f (x0 ) = x00 f (x0 ) dt, portanto x0 1 F (x0 + h) − F (x0 ) − f (x0 ) = h h

Z

x0 +h

x0

[f (t) − f (x0 )] dt.

Dado ε > 0, pela continuidade de f no ponto x0 , existe δ > 0 tal que t ∈ I, |t − x0 | < δ implicam |f (t) − f (x0 )| < ε. Ent˜ao 0 < |h| < δ, x0 + h ∈ I implicam Z x0 +h F (x0 + h) − F (x0 ) 1 − f (x0 ) ≤ |f (t) − f (x0 )| dt h |h| x0 1 < · |h| · ε = ε. |h| Isto mostra que F ′ (x0 ) = f (x0 ). (2) ⇒ (1). Seja F ′ = Rf . Como acabamos de ver, se fixarmos x a ∈ I e definirmos ϕ(x) = a f (t) dt, teremos ϕ′ = f . As duas fun¸c˜oes F, ϕ : I → R, tendo a mesma derivada, diferem por uma constante. Como ϕ(a) = 0, essa constante ´e F (a). Portanto F (x) = F (a) + ϕ(x), Rx isto ´e, F (x) = F (a) + a f (t) dt para todo x ∈ I.

Coment´ arios. (1). Foi provado acima que toda fun¸c˜ao cont´ınua possui uma primitiva. Mais precisamente:R se f : [a, b] → R ´e integr´avel ent˜ao x F : [a, b] → R, definida por F (x) = a f (t) dt, ´e deriv´avel em todo ponto x0 ∈ [a, b] no qual f seja cont´ınua, e tem-se F ′ (x0 ) = f (x0 ). Nesse ponto Rb tamb´em ´e deriv´avel a fun¸c˜ao G : [a, b] → R, dada por G(x) = x f (t) dt. Rb Tem-se G′ (x0 ) = −f (x0 ). Com efeito, F (x) + G(x) = a f (t) dt = constante, logo F ′ (x0 ) + G′ (x0 ) = 0. 1 (2). Ficou tamb´em provado que se F : [a, b] → R xR ´e′ de classe C (isto ´e, tem derivada cont´ınua) ent˜ao F (x) = F (a) + a F (t) dt. Em particular, Rb Rb F (b) = F (a) + a F ′ (t) dt. Isto reduz o c´alculo da integral a f (x) dx `a Rb procura de uma primitiva de f . Se F ′ = f ent˜ao a f (x) dx = F (b) − F (a).

(3). O mesmo argumento da demonstra¸c˜ao de que (2) ⇒ (1) no Teorema 1 serve para provar que se a fun¸c˜ao integr´avel f : [a, b] → R ´e cont´ınua no R x ponto c ∈ [a, b] ent˜ao a fun¸c˜ao F : [a,′ b] → R, definida por F (x) = e deriv´avel no ponto c, com F (c) = f (c). a f (t) dt ´

Se¸c˜ ao 1

Os teoremas cl´ assicos do C´ alculo Integral

139

Teorema 2. (Mudan¸ ca de vari´ avel.) Sejam f : [a, b] → R cont´ınua, g : [c, d] → R com derivada cont´ınua e g([c, d]) ⊂ [a, b]. Ent˜ ao Z

g(d)

f (x) dx =

Z

d

c

g(c)

f (g(t)) · g ′ (t) dt.

Demonstra¸ c˜ ao: Pelo Teorema 1, f possui uma primitiva F : [a, b] → R R g(d) e vale g(c) f (x) dx = F (g(d)) − F (g(c)). Por outro lado, a Regra da Cadeia nos d´a (F ◦ g)′ (t) = F ′ (g(t)) · g ′ (t) = f (g(t)) · g ′ (t) para todo t ∈ [c, d]. Logo F ◦ g : [c, d] → R ´e uma primitiva da fun¸c˜ao cont´ınua Rd t 7→ f (g(t)) · g ′ (t). Portanto c f (g(t)) · g ′ (t) dt = F (g(d)) − F (g(c)). Isto prova o teorema. Observa¸ c˜ ao. O Teorema 2 ´e uma boa justificativa para a nota¸c˜ao R g(d) Rb Rb avel em g(c) f (x) dx, faza f (x) dx, em vez de a f . Para mudar a vari´ se x = g(t). A diferencial de x ser´a dx = g ′ (t) dt. Estas substitui¸c˜oes d˜ao Z Z g(d)

d

f (x) dx =

g(c)

c

f (g(t)) · g ′ (t) dt.

A troca nos limites de integra¸c˜ao ´e natural: quando t varia de c a d, x = g(t) varia de g(c) a g(d). b ´ tradicional no C´ E alculo a nota¸c˜ao F a = F (b) − F (a).

Teorema 3. (Integra¸ c˜ ao por partes.) Se f, g : [a, b] → R tˆem derivadas cont´ınuas ent˜ ao Z b Z b b f (x) · g ′ (x) dx = f · g a − f ′ (x) · g(x) dx. a

a

Demonstra¸ c˜ ao: Basta notar que f · g ´e primitiva de f · g ′ + f ′ · g e integrar esta soma usando o Teorema Fundamental do C´alculo.

Teorema 4. (F´ ormula do Valor M´ edio para integrais.) Sejam f, p : [a, b] → R, f cont´ınua, p integr´ avel, com p(x) ≥ 0 para todo Rb x ∈ [a, b]. Existe um n´ umero c ∈ [a, b] tal que a f (x)p(x) dx = f (c) · Rb a p(x) dx.

Demonstra¸ c˜ ao: Para todo x ∈ [a, b], temos m ≤ f (x) ≤ M , onde m ´e o ´ınfimo e M o supremo de f em [a, b]. Como p(x) ≥ 0, segue-se que Rb m·p(x) ≤ f (x)·p(x) ≤ M ·p(x) para todo x ∈ [a, b]. Seja A = a p(x) dx.

140

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

Rb Das u ´ltimas desigualdades resulta m·A ≤ a f (x)p(x) dx ≤ M ·A. Como Rb a fun¸c˜ao A · f ´e cont´ınua, temos a f (x)p(x) dx = A · f (c) para algum c ∈ [a, b], o que prova o teorema. Corol´ ario. Seja f : [a, b] → R cont´ınua. Existe c ∈ [a, b] tal que Z b f (x) dx = f (c) · (b − a). a

Lema. Se ϕ : [0, 1] → R possui derivada de ordem n cont´ınua ent˜ ao n−1 X ϕ(i) (0) Z 1 (1 − t)n−1 ϕ(1) = + ϕ(n) (t) dt. i! (n − 1)! 0 i=0

c˜ ao: Para n = 1, esta f´ormula reduz-se a ϕ(1) = ϕ(0) + RDemonstra¸ 1 ′ ϕ (t) dt, v´ a lida pelo Teorema Fundamental do C´alculo. Para n = 2, 0 a integra¸c˜ao por partes fornece Z 1 Z 1 1 ′′ ′ ϕ′ (t) dt = −ϕ′ (0) + ϕ(1) − ϕ(0), (1 − t)ϕ (t) dt = (1 − t)ϕ (t) 0 + 0

0

logo



ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) +

Z

0

1

(1 − t)ϕ′′ (t) dt.

Para n = 3, novamente a integra¸c˜ao por partes nos d´a 1 Z 1 Z 1 (1 − t)2 ′′′ (1 − t)2 ′′ (1 − t)ϕ′′ (t) dt ϕ (t) dt = ϕ (t) + 2 2 0 0 0 ϕ′′ (0) =− + ϕ(1) − ϕ(0) − ϕ′ (0), 2 logo Z 1 (1 − t)2 ′′′ ϕ′′ (0) + ϕ (t) dt. ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ′ (0) + 2 2 0 O padr˜ ao indutivo est´a claro. O lema vale para todo n. Teorema 5. (F´ ormula de Taylor com resto integral.) Se f : I → R possui derivada n-´esima cont´ınua no intervalo cujos extremos s˜ ao a, a + h ∈ I ent˜ ao f (n−1) (a) n−1 f (a + h) = f (a) + f ′ (a) · h + · · · + h (n − 1)!  Z 1 (1 − t)n−1 (n) f (a + th)dt hn . + (n − 1)! 0

Se¸c˜ ao 2

A integral como limite de somas de Riemann

141

Demonstra¸ c˜ ao: Definindo ϕ : [0, 1] → R por ϕ(t) = f (a + th), tem-se (i) (i) ϕ (0) = f (a)hi . O Teorema 5 resulta do lema acima. Corol´ ario. (F´ ormula de Taylor com resto de Lagrange.) Se f : I → R ´e de classe C n no intervalo cujos extremos s˜ ao a, a + h ∈ I ent˜ ao existe θ ∈ [0, 1] tal que f (a + h) = f (a) + f ′ (a) · h + · · · +

f (n−1) (a) n−1 f (n) (a + θh) n h + ·h . (n − 1)! n!

Com efeito, chamando de A a integral do enunciado do Teorema 5, resulta do Teorema 4 que existe θ ∈ [0, 1] tal que A = f (n) (a+θh)

Z

1 0

(1 − t)n−1 f (n) (a + θh) dt = · (n − 1)! n!

Observa¸ c˜ ao. Esta demonstra¸c˜ao ´e mais natural do que a dada no Teorema 2, Cap´ıtulo 9, por´em exige mais de f .

2

A integral como limite de somas de Riemann

A norma de uma parti¸c˜ao P = {t0 , . . . , tn } ⊂ [a, b] ´e o n´ umero |P | = maior comprimento ti − ti−1 dos intervalos de P . Teorema 6. Seja f : [a, b] → R limitada. Para todo ε > 0 dado, existe Rb δ > 0 tal que |P | < δ ⇒ S(f ; P ) < ¯ f (x) dx + ε. a

Demonstra¸ c˜ ao: Suponhamos inicialmente f (x) ≥ 0 em [a, b]. Dado ε > 0, existe uma parti¸c˜ao P0 = {t0 , . . . , tn } de [a, b] tal que S(f ; P0 )
0 dado,

Se¸c˜ ao 3

Logaritmos e exponenciais

pode-se obter δ > 0 tal que | pontilhada P ∗ com |P | < δ.

143

P (f ; P ∗ ) − I| < ε seja qual for a parti¸c˜ao

Teorema 7. Se f : [a, b] → R ´e integr´ avel ent˜ ao Z

b

f (x) dx = lim

|P |→0

a

X

(f ; P ∗ ).

Demonstra¸ c˜ ao: Segue-se do Teorema 6 que se f ´e integr´avel ent˜ao lim s(f ; P ) = lim S(f ; P ) =

|P |→0

|P |→0

Z

b

f (x) dx.

a

P Como se tem s(f ; P ) ≤ (f ; P ∗ ) ≤ S(f ; P ), resulta imediatamente que Rb P lim|P |→0 (f ; P ∗ ) = a f (x) dx.

Observa¸ c˜ ao. Vale a rec´ıproca do Teorema 7, mas ´e menos interessante. (Veja “Curso de An´ alise”, vol. 1, pag. 333.)

3

Logaritmos e exponenciais

Seja a um n´ umero real maior que 1. Costuma-se definir o logaritmo de um n´ umero real x na base a como o expoente y = loga x tal que ay = x. Ou seja, a fun¸c˜ao loga : R+ → R costuma ser definida como a inversa da fun¸c˜ao exponencial y 7→ ay . Isto requer o trabalho preliminar de estabelecer o significado e as propriedades das potˆencias ay , onde y ´e um n´ umero real qualquer, o que ´e poss´ıvel fazer rigorosamente. Mas achamos mais simples definir primeiro o logaritmo e, a partir deste, a exponencial, como faremos agora. Definiremos a fun¸c˜ao log : R+ → R pondo, para cada x > 0, Z x Z x 1 dt log x = dt = · 1 t 1 t Rb O Rn´ umero log x ´e chamado o logaritmo de x. Lembrando que a f (x) dx = a − b f (x) dx, vemos que log x < 0 se 0 < x < 1, log 1 = 0 e log x > 0 quando x > 1. A fun¸c˜ao log ´e mon´otona crescente, deriv´avel, com (log)′ (x) = 1/x, (log)′′ (x) = −1/x2 , etc. Segue-se que log ´e infinitamente deriv´avel, isto ´e, log ∈ C ∞ . Vˆe-se tamb´em que log ´e uma fun¸c˜ao cˆoncava.

144

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

Teorema 8. Para quaisquer x, y ∈ R+ tem-se log(xy) = log x + log y. R xy Rx R xy c˜ ao: log(xy) = 1 dt/t = 1 dt/t + x dt/t = log x + RDemonstra¸ xy x dt/t. Quando s varia de 1 a y, o produto xs Rvaria de x a R yxy. Logo a xy mudan¸ ca de vari´avel t = xs nos d´a dt = xds e x dt/t = 1 xds/xs = Ry ds/s = log y, o que prova o teorema. 1

Corol´ ario 1. Para todo n´ umero racional r tem-se log(xr ) = r · log x. Com efeito, segue-se do Teorema 8 que log(xn ) = n · log x quando n ∈ N. De xn · x−n = 1 resulta 0 = log(xn · x−n ) = log(xn ) + log(x−n ) = n · log x + log(x−n ), donde log(x−n ) = −n log x. Isto prova o corol´ario para r ∈ Z. No caso geral, r = p/q onde p, q ∈ Z. Por defini¸c˜ao, (xp/q )q = xp . Da´ı, pelo que j´a provamos, q · log(xp/q ) = p · log x, donde log(xp/q ) = (p/q) log x. Corol´ ario 2. log : R+ → R ´e sobrejetiva. Como log ´e cont´ınua, sua imagem ´e um intervalo, portanto basta mostrar que log ´e ilimitada superior e inferiormente, o que decorre das igualdades log(2n ) = n · log 2 e log(2−n ) = −n · log 2.

Sendo uma fun¸c˜ao crescente, log ´e uma bije¸c˜ao de R+ sobre R. Sua inversa, exp : R → R+ ´e chamada a fun¸ca ˜o exponencial. Por defini¸c˜ao, exp(x) = y ⇔ log y = x, ou seja, log(exp(x)) = x e exp(log y) = y. Existe um u ´nico n´ umero real cujo logaritmo ´e igual a 1. Ele ´e indicado pelo s´ımbolo e. Mostraremos logo mais que e coincide com o n´ umero introduzido nos Exemplos 12 e 13 do Cap´ıtulo 3. Por enquanto, sua defini¸c˜ao ´e e = exp(1). Teorema 9. A fun¸ca ˜o exponencial exp : R → R+ ´e uma bije¸ca ˜o cres∞ cente, de classe C , com (exp)′ (x) = exp(x) e exp(x + y) = exp(x) · exp(y) para x, y ∈ R quaisquer. Al´em disso, para todo r ∈ Q tem-se exp(r) = er . Demonstra¸ c˜ ao: Pela regra de deriva¸c˜ao da fun¸c˜ao inversa, para cada x ∈ R, com exp(x) = y, tem-se (exp)′ (x) = 1/(log)′ (y) = y = exp(x). Assim exp′ = exp, donde exp ∈ C ∞ . Dados x, y ∈ R, sejam x′ = exp(x) e y ′ = exp(y), logo x = log x′ e y = log y ′ . Ent˜ao exp(x + y) = exp(log x′ + log y ′ ) = exp[log(x′ y ′ )] = exp(x) · exp(y). Se r ´e racional, o Corol´ario 1 do Teorema 8 nos d´a log(exp(r)) = r = r · 1 = r · log e = log(er ), donde exp(r) = er , pela injetividade de log. A igualdade exp(r) = er para r ∈ Q, juntamente com a rela¸c˜ao exp(x + y) = exp(x) · exp(y) nos indicam que exp(x) se comporta como

Se¸c˜ ao 3

Logaritmos e exponenciais

145

uma potˆencia de base e e expoente x. Poremos ent˜ao, por defini¸c˜ao, ex = exp(x), para todo x ∈ R. Com isto, passa a ter significado a potˆencia ex para x real qualquer. Com esta nota¸c˜ao, temos ex+y = ex · ey , e0 = 1, e−x = 1/ex , x < y ⇔ ex < ey ,

log(ex ) = x, elog y = y, para quaisquer x ∈ R, y > 0.

Temos ainda lim ex = +∞ e lim ex = 0, como se vˆe facilmente. x→+∞

x→−∞

Pelo Teorema do Valor M´edio, para todo x > 1 existe c tal que 1 < c < x e log x = log x − log 1 = (log)′ (c)(x − 1) = (x − 1)/c. Segue√ se que log x < x para todo x ≥ 1. Como log x = 2 log x, temos √ √ 0 < log x < 2 x, donde 0 < log x/x < 2/ x para todo x > 1. Como √ limx→+∞ (2/ x) = 0, segue-se que limx→+∞ log x/x = 0, fato que tinha sido provado no final do Cap´ıtulo 3 supondo x = n ∈ N. Por outro lado, dado qualquer polinˆ omio p(x), tem-se lim p(x)/ex = 0.

x→+∞

Para provar isto, basta considerar o caso em que p(x) = xk . Ent˜ao escrevemos ex/k = y, donde x = k · log y. Evidentemente, x → +∞ se, e somente se, y → +∞. Portanto    x  log y lim = lim k =0 x→+∞ ex/k y→+∞ y e da´ı

 x k xk = lim = 0. x→+∞ ex/k x→+∞ ex lim

Se c e k s˜ ao constantes reais, a fun¸c˜ao f (x) = c · ekx tem derivada = k · c · ekx = k · f (x). Esta propriedade de possuir derivada proporcional a si mesma ´e respons´ avel por grande parte das aplica¸c˜oes da fun¸c˜ao exponencial. Mostraremos que essa propriedade ´e exclusiva das fun¸c˜oes desse tipo.

f ′ (x)

Teorema 10. Seja f : I → R deriv´ avel no intervalo I, com f ′ (x) = k · f (x). Se, para um certo x0 ∈ I, tem-se f (x0 ) = c ent˜ ao f (x) = c · ek(x−x0 ) para todo x ∈ I.

146

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

Demonstra¸ c˜ ao: Seja ϕ : I → R definida por ϕ(x) = f (x) · e−k(x−x0 ) . Ent˜ao ϕ′ (x) = f ′ (x)e−k(x−x0 ) −kf (x)·e−k(x−x0 ) = 0. Logo ϕ ´e constante. Como ϕ(x0 ) = c, tem-se ϕ(x) = c para todo x ∈ I, ou seja, f (x) = c · ek(x−x0 ) .

Como a derivada da fun¸c˜ao f (x) = ex ´e ainda f ′ (x) = ex , temos = 1. Segue-se da defini¸c˜ao de derivada que limx→0 (ex − 1)/x = 1. Dados a > 0 e x ∈ R, definiremos a potˆencia ax de modo que seja v´alida a f´ormula log(ax ) = x · log a. Para isto, tomaremos esta igualdade como defini¸c˜ao, ou seja, diremos que ax ´e o (´ unico) n´ umero real cujo logaritmo ´e igual a x · log a. Noutras palavras, ax = ex log a . A fun¸c˜ao f : R → R, definida por f (x) = ax , tem as propriedades esperadas. √ A primeira ´e que, para x = p/q ∈ Q (onde q >√0), f (x) = q ap . Com √ efeito, f (x) = exp((p/q) log a) = exp(log q ap ) = q ap . Tem-se ax+y = ax · ay , a0 = 1, a−x = 1/ax e (ax )y = axy . A fun¸c˜ao f (x) = ax tem derivada f ′ (x) = ax · log a, portanto ´e de classe C ∞ . A derivada f ′ ´e positiva se a > 1 e negativa se 0 < a < 1. Logo f ´e crescente no primeiro caso e decrescente no segundo. Quando a > 1, tem-se limx→+∞ ax = +∞ e limx→−∞ ax = 0. Se 0 < a < 1, os valores destes limites s˜ ao trocados. Se 0 < a 6= 1, f (x) = ax ´e uma bije¸c˜ao de R sobre R+ , cuja inversa indica-se com loga : R+ → R. Para cada x > 0, loga x chama-se o logaritmo de x na base a. Assim y = loga x ⇔ ay = x. Voltamos `a defini¸c˜ao cl´ assica. Quando a = e, vale loge x = log x. O logaritmo que definimos no come¸co desta ´ o chamado logaritmo natural. Para todo se¸c˜ao tem, portanto, base e. E x > 0, temos elog x = x = aloga x = eloga x·log a , f ′ (0)

portanto log x = loga x · log a, ou seja, loga x = log x/ log a. Desta u ´ltima f´ormula resultam propriedades de loga x an´ alogas `as de log x, 1 como loga (xy) = loga x + loga y ou (loga )′ (x) = x·log a· Para finalizar esta se¸c˜ao, mostraremos que e coincide com o n´ umero definido nos Exemplos 12 e 13 do Cap´ıtulo 3. A derivada da fun¸c˜ao log x ´e igual a 1/x. No ponto x = 1 esta derivada vale 1. Isto significa que lim

x→0

log(1 + x) = 1, x

Se¸c˜ ao 4

Integrais impr´ oprias

147

ou seja, lim log[(1 + x)1/x ] = 1.

x→0

Como (1 + x)1/x = exp{log[(1 + x)1/x ]}, vem lim (1 + x)1/x = exp(1) = e.

x→0

Pondo y = 1/x, conclu´ımos que limy→∞ (1 + 1/y)y = e. Em particular, limn∈N (1 + 1/n)n = e.

4

Integrais impr´ oprias

S˜ao de dois tipos: integrais de fun¸c˜oes ilimitadas (definidas num intervalo limitado por´em n˜ao fechado) e integrais de fun¸c˜oes definidas num intervalo ilimitado. O teorema seguinte descarta um caso trivial. Teorema 11. Seja f : (a, b] → R limitada, tal que a restri¸ca ˜o f |[c, b] ´e integr´ avel para cada c ∈ (a, b]. Ent˜ ao, seja qual for o valor que se atribua Rb a f (a), obt´em-se uma fun¸ca ˜o integr´ avel f : [a, b] → R, com a f (x) dx = Rb limc→a+ c f (x) dx. Demonstra¸ c˜ ao: Seja K tal que a ≤ x ≤ b ⇒ |f (x)| ≤ K. Dado ε > 0, tomemos c ∈ (a, b] com K · (c − a) < ε/4. Como f |[c, b] ´e integr´avel, existe uma parti¸c˜ao P de [c, b] tal que S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε/2. Ent˜ao Q = P ∪ {a} ´e uma parti¸c˜ao de [a, b] tal que S(f ; Q) − s(f ; Q) ≤ 2K(c − a) + S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε. Logo f : [a, b] → R ´e integr´avel. A integral indefinida F : [a, b] → R, Rb F (x) = x f (t) dt cumpre a condi¸c˜ao de Lipschitz |F (y) − F (x)| ≤ K|y − x| logo ´e (uniformemente) cont´ınua, donde F (a) = lim F (c) = c→a+ Rb lim c f (x) dx. c→a+

Resultado an´ alogo vale para f : [a, b) → R. Basta, portanto, considerar f : (a, b] → R ilimitada. Suporemos Rb tamb´em f cont´ınua. A integral impr´ opria a f (x) dx ´e definida como Z b Z b f (x) dx = lim f (x) dx. a

ε→0+ a+ε

148

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

Em cada intervalo fechado [a + ε, b], f ´e cont´ınua, logo integr´avel. O problema ´e saber se existe ou n˜ao o limite acima. Se ele existir a integral ser´a convergente; se n˜ao existir o limite a integral ser´a divergente. Evidentemente, o caso de uma fun¸c˜ao cont´ınua ilimitada f: [a, b) → R Rb R b−ε se trata de modo semelhante, pondo-se a f (x) dx = lim a f (x) dx. ε→0+

Finalmente, o caso de f : (a, b) → R cont´ınua reduz-se aos anteriores Rb Rc Rb tomando c ∈ (a, b) e pondo a f (x) dx = a f (x) dx + c f (x) dx.

Exemplo 1. Seja f : (0, 1] → R dada por f (x) = 1/xα . Supondo α 6= 1, temos  Z 1 Z 1 1 − ε1−α dx x1−α 1 dx = lim = lim = lim α ε→0+ 1 − α ε→0+ ε xα ε→0+ 1 − α ε 0 x ( +∞ se α > 1 = 1 se α < 1. 1−α

Quando α = 1, temos Z

1 0

dx = lim ε→0+ x

Z

1 ε

1 dx = lim log x = lim (− log ε) = +∞. ε→0+ ε→0+ x ε

R1 Portanto 0 dx/xα diverge se α ≥ 1 e converge para (1 − α)−1 se α < 1. R1 √ Em particular, α = 1/2 d´a 0 dx/ x = 2. √ Exemplo 2. Seja f : [0, 1) → R, f (x) = 1/ 1 − x2 . Ent˜ao Z 1 Z 1−ε p p 2 dx/ 1 − x = lim dx/ 1 − x2 ε→0+ 0 0 1−ε = lim arcsen x 0 ε→0+

= lim arcsen(1 − ε) ε→0+

= arcsen 1 =

π · 2

Quando f : (a, b] → R cumpre f (x) ≥ 0 para todo x ∈ (a, b] ent˜ao Rb a integral a f (x) dx converge se, e somente se, existe k > 0 tal que Rb Rb c˜ao ϕ(ε) = a+ε f (x) dx a+ε f (x) dx ≤ k para todo ε ∈ (0, b−a) pois a fun¸ Rb ´e n˜ao-crescente. Se existir uma fun¸c˜ao g : (a, b] → R tal que a g(x) dx seja convergente e 0 ≤ f (x) ≤ k · g(x) para todo x ∈ (a, b] ent˜ao

Se¸c˜ ao 4

Integrais impr´ oprias

149

Rb f (x) dx converge pois, neste caso, ϕ(ε) ≤ k · a g(x) dx para todo ε ∈ (0, b − a). p R1 Exemplo 3. A integral I = 0 dx/ (1 − x2 )(1 − k 2 x2 ) converge se k ∈ R cumpre k 2 < 1. √ Com efeito, como 0 ≤ xp≤ 1, temos 1 − k 2 ≤ 2 2 1 − k x . Pondo K = 1/ 1 − k 2 segue-se que 1/ (1 − x2 )(1 − k 2 x2 ) ≤ √ √ R1 K/ 1 − x2 portanto I ≤ 0 K/ 1 − x2 = K π/2. Rb Diz-se que a integral impr´opria a f (x) dx ´e absolutamente converRb gente quando a |f (x)|dx converge. Como no caso de s´eries, a converRb Rb gˆencia de a |f (x)|dx implica a de a f (x) dx. Com efeito, dada f : (a, b] → R cont´ınua, definamos sua parte positiva e sua parte negativa f+ , f− : (a, b] → R pondo, para a < x ≤ b: Rb a

f+ (x) = max{f (x), 0} e f− (x) = max{−f (x), 0}. Ent˜ao f+ (x) = 12 [|f (x)| + f (x)] e f− (x) = 12 [|f (x)| − f (x)] de modo que f+ e f− s˜ ao cont´ınuas. Al´em disso, temos f+ (x) ≥ 0, f− (x) ≥ 0, f = f+ − f− e |f | = f+ + f− , donde f+ ≤ |f | e f− ≤ |f |. Segue-se desRb tas desigualdades que se a f (x) dx ´e absolutamente convergente ent˜ao Rb Rb Rb Rb f+ (x)dx e a f− (x)dx convergem. Logo a f (x)dx = a f+ (x)dx − a Rb e convergente. a f− (x) dx ´ O crit´erio de compara¸cR˜ao assume ent˜ao a seguinte forma: se f, g : b [a, b) → R s˜ ao cont´ınuas e a g(x) dx converge ent˜ao a condi¸c˜ao |f (x)| ≤ Rb k · g(x) para todo x ∈ [a, b) implica que a f (x) dx ´e (absolutamente) convergente. Por exemplo, se f : [a, b) → R ´e cont´ınua e existem constantes k > 0 e α < 1 tais que |f (x)| ≤ k/(b − x)α para todo x ∈ [a, b) Rb ent˜ao a integral a f (x) dx ´e (absolutamente) convergente. Tratemos agora de integrais sobre intervalos ilimitados. Dada f : [a, +∞) → R cont´ınua, define-se a integral impr´opria de f pondo: Z A Z +∞ f (x) dx. f (x) dx = lim a

A→+∞ a

Se o limite acima existir, a integral diz-se convergente. Do contr´ario, ela diz-se divergente. Uma defini¸ c ˜ a o an´ a loga ´ e dada quando Rb Rb f : (−∞, b] → R. Ent˜ao −∞ f (x)dx = lim B f (x)dx. Finalmente, B→−∞

para f : (−∞, +∞) → R, toma-se um ponto arbitr´ ario a ∈ R (geral-

150

C´ alculo com Integrais

mente a = 0) e p˜oe-se Z Z +∞ f (x) dx = −∞

Cap. 11

a

f (x) dx + −∞

Z

+∞

f (x) dx. a

Exemplo 4. Seja f : [1, +∞) → R, f (x) = 1/xα . Se α 6= 1 tem-se Z A Z ∞ dx dx A1−α − 1 1 = , logo = α α 1−α x α−1 1 x 1 R +∞ converge se α > 1. Por outro lado, se α ≤ 1, 1 dx/xα diverge. Isto contrasta com a integral da mesma fun¸c˜ao no intervalo (0, 1]. R +∞ Exemplo 5. 0 dx/(1 + x2 ) = π/2. Com efeito, arctg x ´e uma primitiva de 1/(1 + x2 ). Por conseguinte Z +∞ π dx = lim (arctg A − arctg 0) = · 2 A→+∞ 1+x 2 0 R +∞ Diz-se que uma integral a f (x) dx ´e absolutamente convergente R +∞ quando a |f (x)|dx converge. Como no caso de intervalos limitados, R +∞ prova-se que, neste caso, a f (x) dx converge. Vale portanto ˜o: se f, g : [a, +∞) → R s˜ ao R ∞ o crit´erio de compara¸ca cont´ınuas, se a g(x) dx converge e se existe k > 0 tal que |f (x)| ≤ R +∞ k · g(x) para x ≥ a ent˜ao a f (x) dx converge (absolutamente). Em R +∞ particular, se |f (x)| ≤ k/xα com α > 1 ent˜ao a f (x) dx ´e (absolutamente) convergente. R +∞ Exemplo 6. Seja a > 0. A integral a dx/x2 converge e, como se vˆe facilmente, seu valor ´e 1/a. Mesmo se n˜ao soub´essemos que a derivada de arctg x ´e 1/(1 + x2 ), concluir´ıamos, por compara¸c˜ao, que R +∞ dx/(1 + x2 ) ´e convergente pois 1/(1 + x2 ) ≤ 1/x2 . a

Exemplo 7. (A fun¸ca ˜o gama.) Trata-se da fun¸c˜ao Γ : (0, +∞) → R, R +∞ definida para todo t > 0 pela integral Γ(t) = 0 e−x xt−1 dx. Para mosR 1 R +∞ trar que a integral acima converge, a decompomos na soma 0 + 1 . R1 A integral 0 e−x xt−1 dx converge porque e−x xt−1 ≤ 1/x1−t . A seR +∞ gunda parcela, 1 e−x xt−1 dx converge porque e−x xt−1 ≤ 1/x2 para todo xsuficientemente grande. Com efeito, esta desigualdade equivale  x t+1 x t+1 ax e ≤ 1. Ora, como sabemos, limx→+∞ x e = 0, logo existe a > 0 tal que x > a ⇒ xt+1 ex ≤ 1. A fun¸c˜ao gama estende a no¸c˜ao de

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

151

fatorial, pois Γ(n) = (n − 1)! para todo n ∈ N, como se vˆe integrando por partes. R +∞ Exemplo 8. A integral de Dirichlet I = 0 (sen x/x)dx converge, mas n˜ao absolutamente. Com efeito, para todo n ∈ N seja an = R (n+1)π ´ claro que | sen x/x|dx. Ent˜ao I = a0 − a1 + a2 − a3 + · · · . E nπ a0 ≥ a1P ≥ a2 ≥ · · · e que lim an = 0. Logo, pelo Teorema de Leibniz, ∞ a s´erie (−1)n an (e conseq¨ uentemente a integral) converge. Por n=0 R +∞ P∞ outro lado, 0 | sen x|/x dx ´e a soma da s´erie n=0 an , cujo termo an ´e a ´ area de uma regi˜ ao que cont´em um triˆ angulo de base π/2 e altura 2/(2n + 1)π. A ´ area desse triˆ angulo P ´e igual a 1/2(2n + 1). Como s´erie harmˆonica diverge, segue-se que an = +∞. (Prova-se que Ra +∞ (sen x/x)dx = π/2.) 0 Uma aplica¸c˜ao bastante conhecida das integrais impr´oprias ´e o crit´erio de convergˆencia de s´eries num´ericas contido no seguinte teorema, cuja demonstra¸c˜ao pode ser encontrada em qualquer livro de C´alculo.

Teorema 12. Seja f : [a, +∞) → R cont´ınua, mon´ otona, n˜ ao-decresP cente. Para todo n´ umero natural n ≥R a, seja an = f (n). A s´erie an +∞ converge se, e somente se, a integral a f (x) dx converge.

5

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Os teoremas cl´ assicos do C´ alculo Integral

1. Seja f : [a, b] → R integr´avel, cont´ınua `a direita no Rponto x0 ∈ x [a, b). Prove que F : [a, b] → R, dada por F (x) = a f (t) dt, ´e deriv´avel ` a direita no ponto x0 , com F+′ (x0 ) = f (x0 ). Enuncie fato an´ alogo com “esquerda” em lugar de “direita”. Dˆe exemplos com f integr´avel, descont´ınua no ponto x0 , nos quais: (a) Existe F ′ (x0 ); (b) N˜ ao existe F ′ (x0 ). 2. Seja f : [a, b] → R deriv´avel, com f ′ integr´avel. que, para R x Prove ′ quaisquer x, c ∈ [a, b], tem-se f (x) = f (c) + c f (t) dt. Conclua que o Teorema 5 vale com “integr´avel” em vez de “cont´ınua”.

3. Seja f : [a, b] → R deriv´avel, com f ′ (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b]. Se {x ∈ [a, b]; f ′ (x) = 0} tem conte´ udo nulo, prove que f ´e crescente.

152

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

4. Dada f : [a, b] → R com derivada cont´ınua, prove o Teorema do Valor M´edio (Teorema 7 do Cap´ıtulo 8) como conseq¨ uˆencia da f´ormula de mesmo nome para integrais (Corol´ario do Teorema 4, deste cap´ıtulo). 5. Sejam f : [a, b] → R cont´ınua e α, β : I → [a, b] deriv´aveis. Defina R β(x) ϕ : I → R pondo ϕ(x) = α(x) f (t) dt, para todo x ∈ I. Prove que ϕ ´e deriv´avel e ϕ′ (x) = f (β(x)) · β ′ (x) − f (α(x)) · α′ (x). 6. Sejam f : [0, 1] → R a fun¸c˜ao do Exerc´ıcio 2.3 do Cap´ıtulo 10 e g : [0, 1] → R definida por g(0) = 0 e g(x) = 1 se x > 0. Mostre que f e g s˜ ao integr´aveis por´em g ◦ f : [0, 1] → R n˜ao ´e integr´avel. 7. Dada f : [a, b] → R com derivada integr´avel, seja m = (a + b)/2. Rb Prove que f (a) + f (b) = [2/(b − a)] a [f (x) + (x − m)f ′ (x)] dx. 8. Sejam f, p : [a, b] → R tais que f ´e cont´ınua, p ´e integr´avel e p(x) > 0 para todo x ∈ [a, b]. Prove que se Z b Z b p(x) dx, f (x)p(x) dx = f (a) a

a

ent˜ao existe c ∈ (a, b) tal que f (a) = f (c). Vale um resultado an´ alogo com f (b) em lugar de f (a). Conclua que no Teorema 4 pode-se tomar c ∈ (a, b) e que no Corol´ario do Teorema 5 pode-se exigir que θ ∈ (0, 1). [Veja Exerc´ıcio 9, Se¸c˜ao 4, Cap´ıtulo 10.] 9. O Exerc´ıcio 3, Se¸c˜ao 4 do Cap´ıtulo 3 deixa em aberto o c´ alculo de

n!en · n→∞ nn Na realidade, a f´ormula de Stirling diz que, pondo xn = n!en /nn e √ wn = 2πn, tem-se lim xn /wn = 1, portanto lim xn = +∞. Uma demonstra¸c˜ao mais simples para o fato de que lim xn = +∞ pode ser feita segundo as etapas abaixo indicadas: A. Integrando por partes, mostre que Z n log x dx = n log n − n + 1 = An (digamos). lim

1

B. Se Bn ´e a soma superior da fun¸c˜ao log x relativamente `a parti¸c˜ao {1, 2, . . . , n} do intervalo [1, n], mostre que An ≤ Bn =

n X k=2

log k = log n!

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

153

C. Uma melhor aproxima¸c˜ao superior para a ´area An pode ser dada considerando-se, para cada k = 2, . . . , n a tangente ao gr´ afico de y = log x pelo ponto x = k −1/2. O trap´ezio com base no intervalo [k −1, k] do eixo x, com dois lados verticais e lado igual a Pinclinado n essa tangente tem ´ area log(k − 1/2). Seja Cn = k=2 log(k − 1/2) a soma das ´ areas desses trap´ezios. Mostre que An < Cn < Bn para todo n > 1. D. Mostre que se tem Bn − Cn =

n X k=2

[log k − log(k − 1/2)] =

n X

1/2θk ,

k=2

onde k − 1/2 ≤ θk ≤ k.

E. Conclua que

lim(Bn − An ) ≥ lim(Bn − Cn ) =



1X 1 = +∞. 2 θk k=2

F. Observe que Bn − An = log n! − n log n + n − 1 = log(n!en−1 n−n ), portanto lim xn = +∞. Se¸ c˜ ao 2:

A integral como limite de somas de Riemann

1. Com aux´ılio de somas de Riemann prove a validez dos seguintes limites: n 1 1 P (a) lim p+1 ip = , n→∞ n p + 1 i=1 n 1 P iπ  2 (b) lim sen = · n→∞ n i=1 n π 2. Dada f : [a, b]P → R, limitada ou n˜ao, faz sentido considerar a soma de Riemann (f ; P ∗ ),P para toda parti¸c˜ao pontilhada P ∗ . Prove que, se existe lim|P |→0 (f ; P ∗ ), ent˜ao f ´e uma fun¸c˜ao limitada. P 3. Prove a rec´ıproca do Teorema 7: se existir lim|P |→0 (f ; P ∗ ) = L Rb ent˜ao a fun¸c˜ao limitada f : [a, b] → R ´e integr´avel e a f (x) dx = L.

154

C´ alculo com Integrais

Cap. 11

4. Sejam f, g : [a, b] → R integr´aveis. Para toda parti¸c˜ao P = {t0 , . . . , tn } de [a, b] sejam P ∗ = (P, ξ) e P # = (P, η) pontilhamentos de P . Prove que Z b X lim f (x)g(x) dx. f (ξi )g(ηi )(ti − ti−1 ) = |P |→0

a

5. Dadas f, g : [a, b] → R, para cada parti¸c˜ao pontilhada P ∗ de [a, b] define-se a soma de Riemann-Stieltjes X X (f, g; P ∗ ) = f (ξi )[g(ti ) − g(ti−1 )]. Prove: se f ´e integr´avel e g possui derivada integr´avel ent˜ao Z b X ∗ lim f (x)g ′ (x) dx. (f, g; P ) = |P |→0

a

6. Dada f : [a, b] → R, seja, para cada n ∈ N, n

M (f ; n) =

(b − a) 1X f (a + ih), h = , n n i=1

a m´edia aritm´etica dos valores f (a + h), f (a + 2h), . . . , f (a + nh) = f (b). Prove que se a fun¸c˜ao f ´e integr´avel ent˜ao 1 lim M (f ; n) = n→∞ b−a

Z

b

f (x) dx.

a

Por este motivo, o segundo membro desta igualdade se chama o valor m´edio da fun¸ca ˜o f no intervalo [a, b]. Z b a + b 1 7. Se f : [a, b] → R ´e convexa, prove que f f (x) dx. ≤ 2 b−a a Se¸ c˜ ao 3:

Logaritmos e exponenciais

1. Sejam f : R → R e g : R+ → R fun¸c˜oes cont´ınuas, n˜ao identicamente nulas, tais que f (x + y) = f (x) · f (y) e g(uv) = g(u) + g(v) para quaisquer x, y ∈ R e u, v ∈ R+ . Prove que existem a ∈ R e b ∈ R tais que f (x) = eax para todo x ∈ R e g(x) = b · log x para todo x ∈ R+ .

Se¸c˜ ao 5

Exerc´ıcios

155

2. Prove que a seq¨ uˆencia cujo n-´esimo termo ´e xn = 1 + 1/2 + · · · + 1/n − log n ´e decrescente e limitada, logo converge. (Seu limite ´e conhecido como a constante γ de Euler-Mascheroni, cujo valor aproximado ´e 0, 5772.) 3. Prove que limx→0 x · log x = 0. 4. Prove que, para todo x ∈ R, tem-se lim 1 + n→∞

Se¸ c˜ ao 4:

Integrais impr´ oprias

x n = ex . n

1. Verifique a convergˆencia ou divergˆencia das integrais Z 3 Z 1 Z 1 dx dx dx √ · , , 3 2 1 − cos x x x −3 −1 0 2. Verifique a convergˆencia ou divergˆencia das integrais Z +∞ Z +∞ Z +∞ dx xdx dx √ , , · 6 1 + x 1 − ex (1 + x) x 0 1 −∞ 3. Mostre que

R +∞ 0

R +∞

4. Mostre que 0 seja ilimitada.

sen(x2 ) dx converge mas n˜ao absolutamente. x·sen(x4 ) dx converge, embora a fun¸c˜ao x·sen(x4 )

5. Seja f : [a, +∞) → R cont´ınua, positiva, mon´otona n˜ao-crescente. R +∞ Prove que se a f (x) dx converge ent˜ao limx→+∞ x · f (x) = 0.

6. Seja f : [a, +∞) → R integr´avel em cada intervalo limitado [a, x]. Prove que a integral impr´opria Z x Z +∞ f (t) dt f (x) dx = lim a

x→+∞ a

existe se, e somente se, ε > 0 dado, existe A > 0 tal que R y para todo A < x < y implica x f (t) dt < ε. (“Crit´erio de Cauchy”.)

7. Prove o Teorema 12.

12 Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes Em v´arios problemas da Matem´ atica e das suas aplica¸c˜oes busca-se ´ freq¨ uma fun¸c˜ao que cumpra certas condi¸c˜oes dadas. E uente, nesses casos, obter-se uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes f1 , f2 , . . . , fn , . . . , cada uma das quais cumpre as condi¸c˜oes exigidas apenas aproximadamente, por´em com aproxima¸c˜oes cada vez melhores. Ent˜ao a fun¸c˜ao-limite dessa seq¨ uˆencia dever´a cumprir as tais condi¸c˜oes, caso aconte¸ca o melhor. Isto leva ao estudo de limites de seq¨ uˆencias de fun¸c˜oes. Muitas vezes cada fun¸c˜ao da seq¨ uˆencia obt´em-se da anteriorPsomando-se uma fun¸c˜ao gn . Neste caso, tem-se uma s´erie de fun¸c˜oes gn . Seq¨ uˆencias e s´eries de fun¸c˜oes ser˜ao estudadas neste cap´ıtulo. Para seq¨ uˆencias e s´eries de n´ umeros h´a apenas uma no¸c˜ao de limite. Mas para fun¸c˜oes h´a v´arias. Aqui examinaremos as duas no¸c˜oes mais comuns de convergˆencia, que definiremos a seguir.

1

Convergˆ encia simples e convergˆ encia uniforme

Diz-se que uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R (n = 1, 2, . . . ) converge simplesmente para a fun¸c˜ao f : X → R quando, para todo x ∈ X, a seq¨ uˆencia de n´ umeros f1 (x), . . . , fn (x), . . . converge para f (x). Assim, fn → f simplesmente em X quando, dados ε > 0 e x ∈ X, existe n0 ∈ N (dependendo de ε e de x) tal que n > n0 ⇒ |fn (x) − f (x)| < ε.

Se¸c˜ ao 1

Convergˆ encia simples e convergˆ encia uniforme

157

Graficamente, em cada reta vertical que passa por um ponto x ∈ X fica determinada uma seq¨ uˆencia de pontos (x, f1 (x)), . . . , (x, fn (x)), . . . interse¸c˜oes dessa reta com os gr´ aficos de f1 , . . . , fn , . . . . Estes pontos convergem para (x, f (x)), interse¸c˜ao da reta vertical com o gr´ afico de f . Exemplo 1. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : R → R, onde fn (x) = x/n, converge simplesmente para a fun¸c˜ao f : R → R que ´e identicamente nula. Com efeito, para todo x ∈ R fixado, tem-se lim (x/n) = 0. n→+∞

Um tipo de convergˆencia de fun¸c˜oes mais restrito do que a convergˆencia simples, ´e a convergˆencia uniforme, que definiremos agora. Uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R converge uniformemente para a fun¸c˜ao f : X → R quando, para todo ε > 0 dado, existe n0 ∈ N (dependento apenas de ε) tal que n > n0 ⇒ |fn (x) − f (x)| < ε seja qual for x ∈ X. No plano R2 , dado ε > 0, a faixa de raio ε em torno do gr´ afico de f ´e o conjunto F (f ; ε) = {(x, y) ∈ R2 ; x ∈ X, f (x) − ε < y < f (x) + ε}. Dizer que fn → f uniformemente em X significa que, para todo ε > 0, existe n0 ∈ N tal que o gr´ afico de fn , para todo n > n0 , est´a contido na faixa de raio ε em torno do gr´ afico de f .

Figura 10: O gr´ afico de fn est´ a contido na faixa F (f ; ε).

Exemplo 2. Nenhuma faixa de raio ε em torno do eixo das abcissas (gr´ afico da fun¸c˜ao identicamente nula) pode conter o gr´ afico de uma

158

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

fun¸c˜ao fn : R → R, fn (x) = x/n. Logo a seq¨ uˆencia (fn ) do Exemplo 1 n˜ao converge uniformemente para zero em R. Por outro lado, se X ⊂ R ´e um conjunto limitado, digamos com |x| ≤ c para todo x ∈ X, ent˜ao fn → 0 uniformemente em X. Com efeito, dado ε > 0, basta tomar n0 > c/ε. Ent˜ao n > n0 ⇒ |fn (x)| = |x|/n < c/n0 < ε. Exemplo 3. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes cont´ınuas fn : [0, 1] → R, fn (x) = xn , converge simplesmente para a fun¸c˜ao descont´ınua f : [0, 1] → R, f (x) = 0 se 0 ≤ x < 1, f (1) = 1. A convergˆencia ´e uniforme em todo intervalo da forma [0, 1 − δ], 0 < δ < 1 mas n˜ao ´e uniforme em [0, 1]. Estas duas afirma¸c˜oes decorrem de fatos gerais (a saber, os Teoremas 1 e 2 abaixo) mas podem ser facilmente provadas a partir da defini¸c˜ao. Com efeito, escrevendo a = 1−δ, temos 0 < a < 1 logo limn→+∞ an = 0. Dado ε > 0, seja n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ an < ε. Ent˜ao n > n0 ⇒ 0 < fn (x) ≤ an < ε para todo x ∈ [0, a]. Portanto fn → 0 uniformemente no intervalo [0, 1−δ]. Por outro lado, tomando ε = 1/2, afirmamos que, seja qual for n0 ∈ N, existem pontos x ∈ [0, 1) tais que |fn0 (x) − f (x)| ≥ 1/2, ou seja, xn0 ≥ 1/2. Basta observar que limx→1− xn0 = 1. Logo existe δ > 0 tal que 1 − δ < x < 1 ⇒ xn0 > 1/2. Isto mostra que fn n˜ao converge uniformemente para f no intervalo [0, 1].

x x2

x3 x4

Figura 11: As fun¸c˜ oes fn (x) = xn convergem simplesmente no intervalo [0, 1] para uma fun¸c˜ ao descont´ınua.

Exemplo 4. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes cont´ınuas fn : [0, 1] → R, fn (x) = xn (1 − xn ) converge simplesmente para a fun¸c˜ao identicamente nula.

Se¸c˜ ao 2

Propriedades da convergˆ encia uniforme

159

Estapconvergˆencia n˜ao ´e uniforme. Com efeito, para todo n ∈ N temos fn ( n 1/2) = 1/4. Logo, para ε < 1/4, nenhuma fun¸c˜ao fn tem seu gr´ afico contido na faixa de raio ε em torno da fun¸c˜ao 0. Por outro lado, se 0 < δ < 1, temos fn → 0 uniformemente no intervalo [0, 1 − δ] pois xn → 0 uniformemente nesse intervalo e 0 ≤ xn (1 − xn ) ≤ xn .

1 4

f1

f2 f3 0

1 Figura 12

P As considera¸c˜oes feitas nesta se¸c˜ao incluem a soma f = fn de uma s´erie de fun¸c˜oes fn : X → R. Neste importante caso particular, tem-se f = lim sn , onde sn (x) =Pf1 (x) + · · · + fn (x) para todo n ∈ N e todo x ∈ X. Dizer que a s´erie fn converge uniformemente significa, portanto, que a seq¨ uˆencia (sn ) converge uniformemente e equivale a afirmar que a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes rn : X → R (“restos” da s´erie), definidas por rn (x) = fn+1 (x) + fn+2 (x) + · · · , converge uniformemente para zero. Com efeito, basta observar que rn = f − sn .

2

Propriedades da convergˆ encia uniforme

Teorema 1. Se uma seq¨ uˆencia de fun¸co ˜es fn : X → R converge uniformemente para f : X → R e cada fn ´e cont´ınua no ponto a ∈ X ent˜ ao f ´e cont´ınua no ponto a. Demonstra¸ c˜ ao: Dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ |fn (x) − f (x)| < ε/3 para todo x ∈ X. Fixemos um n´ umero natural n > n0 . Como fn ´e cont´ınua no ponto a, existe δ > 0 tal que x ∈ X, |x − a|
0, ponhamos Xn = {x ∈ X; |fn (x)−f (x)| ≥ ε} para cada n ∈ N. Como fn e f s˜ ao cont´ınuas, cada Xn ´e compacto. A monotonicidade da convergˆencia, por sua vez, implica X1 ⊃ X2 ⊃ X3 ⊃ · · · . Finalmente, como limn→∞ fn (x) = f (x) para todo x ∈ X, T vemos que ∞ X = ∅. Segue-se do Teorema 9, Cap´ıtulo 5, que n=1 n algum Xn0 (e portanto todo Xn com n > n0 ) ´e vazio. Isto significa que n > n0 ⇒ |fn (x) − f (x)| < ε seja qual for x ∈ X. Exemplo 6. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes cont´ınuas fn : [0, 1] → R, fn (x) = xn , converge monotonicamente para a fun¸c˜ao (cont´ınua) identicamente nula no conjunto n˜ao-compacto [0, 1) mas a convergˆencia n˜ao ´e uniforme. Com efeito, dado 0 < ε < 1, para todo n ∈ N existem pontos x ∈ [0, 1) tais que xn > ε, pois lim xn = 1 > ε. x→1−

Se¸c˜ ao 2

Propriedades da convergˆ encia uniforme

161

Teorema 3. (Passagem ao limite sob o sinal de integral.) Se a seq¨ uˆencia de fun¸co ˜es integr´ aveis fn : [a, b] → R converge uniformemente para f : [a, b] → R ent˜ ao f ´e integr´ avel e Z b Z b fn (x) dx. f (x) dx = lim n→∞ a

a

Noutras palavras:

Rb a

limn fn = limn

Rb a

fn se a convergˆencia ´e uniforme.

Demonstra¸ c˜ ao: Dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ |f (x) − fn (x)| < ε/4(b − a) para todo x ∈ [a, b]. Fixemos m > n0 . Como fm ´e integr´avel, existe uma parti¸c˜ao P de [a, b] tal que, indicando com ωi as oscila¸c˜oes de f e fm no intervalo [ti−1 , ti ] de P , e ωi′ respectivamente P ′ tem-se ωi (ti − ti−1 ) < ε/2. Mas, para x, y ∈ [ti−1 , ti ] quaisquer, vale: |f (y) − f (x)| ≤ |f (y) − fm (y)| + |fm (y) − fm (x)| ε + |fm (x) − f (x)| < ωi′ + · 2(b − a)

Portanto ωi ≤ ωi′ + ε/2(b − a). Segue-se que X X X ωi (ti − ti−1 ) ≤ ωi′ (ti − ti−1 ) + [ε/2(b − a)] (ti − ti−1 ) ε ε < + = ε. 2 2 Isto mostra que f ´e integr´avel. Al´em disso, Z b Z b Z b fn (x) dx = [f (x) − fn (x)]dx f (x) dx − a

a



Z

a b

a

|f (x) − fn (x)|dx

(b − a)ε n0 . Conseq¨ uentemente, limn→∞ a fn (x)dx = a f (x)dx. ≤

Observa¸ c˜ ao. Se cada fn ´e cont´ınua, a demonstra¸c˜ao se simplifica consideravelmente pois f ent˜ao ´e cont´ınua, donde integr´avel. Exemplo 7. Se uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes integr´aveis fn : [a, b] → R converge simplesmente para f : [a, b] → R, pode ocorrer que f n˜ao seja integr´avel. Por exemplo, se {r1 , r2 , . . . , rn , . . . } for uma enumera¸c˜ao

162

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

dos n´ umeros racionais de [a, b] e definirmos fn como a fun¸c˜ao que assume o valor 1 nos pontos r1 , . . . , rn e ´e zero nos demais pontos de [a, b] ent˜ao (fn ) converge simplesmente para uma fun¸c˜ao f : [a, b] → R tal que f (x) = 1 se x ∈ Q ∩ [a, b] e f (x) = 0 se x ´e irracional. Evidentemente, cada fn ´e integr´avel mas f n˜ao ´e. Exemplo 8. Mesmo quando a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes integr´aveis fn : [a, b]→R converge simplesmente para a fun¸c˜ao integr´avel f : [a, b]→R, Rb Rb pode ocorrer que limn→∞ a fn (x) dx 6= a f (x) dx. Por exemplo, para cada n ∈ N, seja fn : [0, 1] → R definida por fn (x) = nxn (1 − xn ). Ent˜ao fn (1) = 0 e 0 ≤ fn (x) < nxn se 0 ≤ x < 1. Ora, limn→∞ nxn = 0 se 0 ≤ x < 1. (Pelo Exemplo 8, Cap´ıtulo 3, pois limn→∞ (n+1)xn+1 /nxn = x < 1.) Portanto (fn ) convergeR simplesmente em [0, 1] para a fun¸c˜ao 1 identicamente nula. Entretanto 0 fn (x) dx = n2 /(n + 1)(2n + 1), por R1 R1 tanto limn→∞ 0 fn (x) dx = 1/2, enquanto 0 lim fn = 0. n→∞ Para que se tenha a derivada do limite igual ao limite das derivadas, em vez de supor que fn → f uniformemente, deve-se postular que a seq¨ uˆencia das derivadas convirja uniformemente. Teorema 4. (Deriva¸ c˜ ao termo a termo.) Seja (fn ) uma seq¨ uˆencia 1 de fun¸co ˜es de classe C no intervalo [a, b]. Se, para um certo c ∈ [a, b], a seq¨ uˆencia num´erica (fn (c)) converge e se as derivadas fn′ convergem uniformemente em [a, b] para uma fun¸ca ˜o g ent˜ ao (fn ) converge em [a, b] uniformemente para uma fun¸ca ˜o f , de classe C 1 , tal que f ′ = g. Em ′ ′ resumo: (lim fn ) = lim fn desde que as derivadas fn′ convirjam uniformemente. Demonstra¸ c˜ ao: Pelo Teorema Fundamental doR C´alculo, para cada x n ∈ N e todo x ∈ [a, b] temos fn (x) = fn (c) + c fn′ (t) dt. Fazendo n → ∞ vemos, pelo R x Teorema 3, que existe f (x) = limn→∞ fn (x) e vale f (x) = f (c) + c g(t) dt. Al´em disso, pelo Teorema 1, g ´e cont´ınua logo (novamente em virtude do Teorema Fundamental do C´alculo) f ´e deriv´avel e f ′ (x) = g(x) para todo x ∈ [a, b]. Em particular, f ′ ´e cont´ınua, isto ´e, f ´e de classe C 1 . Resta apenas provar que a convergˆencia fn → f ´e uniforme. Ora, Z x |fn′ (t) − g(t)| dt. |fn (x) − f (x)| ≤ |fn (c) − f (c)| + c

Como fn′ → g uniformemente, resulta da´ı que fn → f uniformemente.

Se¸c˜ ao 2

Propriedades da convergˆ encia uniforme

163

Exemplo 9. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn (x) = sen(nx)/n converge uniformemente para zero em toda a reta. Mas a seq¨ uˆencia de suas derivadas fn′ (x) = cos(nx) n˜ao converge, sequer simplesmente, em intervalo algum. (Todo intervalo cont´em um n´ umero da forma x = mπ/p, com m, p inteiros. Ent˜ao cos(nx) assume infinitas vezesP os valores 1 e −1.) Os teoremas acima, no caso de uma s´erie fn , assumem as seguintes formas: P 1. Se fn converge uniformemente para f e cada fn ´e cont´ınua no ponto a ent˜ao f ´e cont´ınua no ponto a.

2. Se cada termo fn : X → RP´e uma fun¸c˜ao cont´ınua, com fn (x) ≥ 0 para todo x ∈ X e a s´erie fn converge para uma fun¸c˜ao cont´ınua f : X → R no compacto X ent˜ao a convergˆencia ´e uniforme. P 3. Se cada fn : [a, b] → R ´e integr´avel e fn converge uniformeRbP fn (x) dx = mente para f : [a, b] → R ent˜ao f ´e integr´avel e a PRb a fn (x) dx. P ′ 4. Se cada fn : [a, b] → R ´e de classe C 1 , se fn converge uniformeP menteP em [a, b] e se, para algum c ∈ [a, b], a s´erie fn (c) converge 1 ent˜aP o fn converge P ′ uniformemente para uma fun¸c˜ao de classe C ′ fn = fn . e P∞ 2 2 n ao fun¸c˜oes Exemplo 10. A s´erie n=0 x /(1 + x ) , cujos termos s˜ cont´ınuas, definidas em toda a reta, converge para a soma 1 + x2 , para todo x 6= 0. No ponto x = 0, todos os termos da s´erie se anulam, logo sua soma ´e zero. Segue-se que a s´erie dada converge simplesmente em toda a reta mas a convergˆencia n˜ao ´e uniforme, pois a soma ´e uma fun¸c˜ao descont´ınua. O teorema b´asico sobre convergˆencia uniforme de s´eries de fun¸c˜oes, demonstrado a seguir, n˜ao tem an´ alogo para seq¨ uˆencias.

Teorema 5. (Teste uˆencia de fun¸co ˜es P de Weierstrass.) Dada a seq¨ fn : X → R, seja an uma s´erie convergente de n´ umeros reais an ≥ 0 tais que |fP an para todo n ∈ N e todo x ∈ X. Nestas condi¸co ˜es, n (x)| ≤ P as s´eries |fn | e fn s˜ ao uniformemente convergentes. Demonstra¸ c˜ ao: Pelo crit´erio P P de compara¸c˜ao, para todo x ∈ X a s´erie |fn (x)| (e portanto a s´ e rie fn (x)) ´e convergente. Dado ε > 0, existe P n0 ∈ N tal que n>n0 an < ε. Pondo X X fk (x), |fk (x)| e rn (x) = Rn (x) = k>n

k>n

164

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

P tem-se imediatamente |r (x)| ≤ R (x) ≤ n n k>n ak < ε para todo P P n > n0 . Logo |fn | e fn s˜ ao uniformemente convergentes.

3

S´ eries de potˆ encias

As fun¸c˜oes mais importantes da An´ alise podem ser expressas como somas de s´eries da forma f (x) =

∞ X

n=0

an (x − x0 )n = a0 + a1 (x − x0 ) + · · · + an (x − x0 )n + · · · .

Estas s´eries, que constituem uma generaliza¸c˜ao natural dos polinˆ omios, s˜ ao chamadas de s´eries de potˆencias. Para simplificar a nota¸c˜ao, trataremos de preferˆencia o caso em que x0 = 0, isto ´e, as s´eries de potˆencias do tipo ∞ X

n=0

an xn = a0 + a1 x + · · · + an xn + · · · .

O caso geral reduz-se a este pela mudan¸ca P de vari´avel y = x − n x0 . Os resultados que obtivermosP para as s´eries ∞ n=0 an x podem ser ∞ facilmente adaptados para o caso n=0 an (x − x0 )n . P O primeiro fato a destacar sobre uma s´erie de potˆencias ∞ n=0 an (x− x0 )n ´e que o conjunto dos valores de x para os quais ela converge ´e um intervalo de centro x0 . Esse intervalo pode ser limitado (aberto, fechado ou semi-aberto), igual a R ou at´e mesmo reduzir-se a um u ´nico ponto. Isto ser´a demonstrado logo a seguir. Antes vejamos um exemplo que ilustra todas essas possibilidades. P n Exemplo 11. Pelo testePde d’Alembert, a s´erie x /n! converge para todo valor de x. A s´erieP [(−1)n /(2n + 1)]x2n+1 converge se, e somente se, x ∈ [−1, 1]. A s´erie [(−1)n+1 /n]xn converge se x ∈ (−1, 1] e diverge fora desse intervalo. O conjunto dos pontos x ∈ R para os quais a s´erie P n geom´eP trica x converge ´e o intervalo aberto (−1, 1). Finalmente, a s´erie nn xn converge apenas no ponto x = 0. P Dada uma s´erie de potˆencias an xn , a localiza¸c˜ao dos pontos x para os quais ela converge se faz por meio do teste de Cauchy (Teorema 6, Cap´ ıtulo uˆencia p  4), o qual p˜oe em evidˆencia o comportamento da seq¨ n |an | .

Se¸c˜ ao 3

S´ eries de potˆ encias

165

p  P Se a seq¨ uˆencia n |an | ´e ilimitada ent˜ao a s´erie an xn converge apenas quando x = 0. pCom efeito, para todo x 6= 0 a seq¨ uˆencia de p e ilimitada e o mesmo ocorre com |an xn |, n´ umeros n |an xn | = |x| n |aP n| ´ logo o termo geral da s´erie anp xn n˜ao tende a zero. Se, entretanto, a seq¨ uˆencia n |an | ´e limitada ent˜ao o conjunto p R = {ρ > 0; n |an | < 1/ρ para todo n ∈ N suficientemene grande}

´e n˜ao-vazio. Na realidade, ´e f´acil ver que se ρ ∈ R e 0 < x < ρ ent˜ao x ∈ R. Logo R ´e um intervalo, do tipo (0, r), (0, r] ou (0, +∞), onde rP= sup R. O n´ umero r ´e chamado o raio de convergˆencia da s´erie an xn . (Convencionaremos escrever r = +∞ quandoPR for ilimitado.) O raio de convergˆencia r da s´erie de potˆencias an xn goza das seguintes propriedades: P 1) Para todo x ∈ (−r, r) a s´erie an xn converge absolutamente. p Com efeito, tomandopρ tal que |x| p < ρ < r temos n |an | < 1/ρ, e conseq¨ uentemente n |an xn | = |x| n |a Pn | < n|x|/ρ < 1, para todo n ∈ N suficientemente grande. Logo an x converge absolutamente, pelo teste de Cauchy. P 2) Se |x| > r ent˜ao a s´eriep an xn diverge. Com efeito, neste caso | < 1/|x| para todo n suficientemente |x| ∈ / R, logo n˜ao se tem n |anp grande. Isto significa que n |an | ≥ 1/|x|, e conseq¨ uentemente n |an x | ≥ 1, para infinidade de valores de n. Logo o termo P uma geral da s´erie an xn n˜ao tende a zero, e ela diverge. P 3) Se x = ±r, nada se pode dizer em geral: a s´erie an xn pode convergir ou divergir, conforme o caso. p 4) Se existir L = limn→∞ n |an | ent˜ao r = 1/L. (Entendendo-se que r = +∞ se L =p 0.) Com efeito, para todo ρ ∈ R existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ n |an | < 1/ρ. Fazendo n → ∞ obtemos L ≤ 1/ρ, donde ρ ≤ 1/L. Segue-se que r = sup R ≤ 1/L. Supondo, por absurdo, que fosse r < 1/L, tomar´ıamos c tal que rp< c < 1/L, donde L < 1/c. Pela defini¸c˜ao de limite, ter´ıamos n |an | < 1/c para todo n suficientemente grande, donde c ∈ R e da´ı c ≤ r, uma contradi¸c˜ao. Logo r = 1/L. Podemos resumir a an´ alise feita acima no P Teorema 6. Uma s´erie de potˆencias an xn , ou converge apenas para x = 0 ou existe r, com 0 < r ≤ +∞, tal que a s´erie converge absolutamente no intervalo aberto (−r, r) e diverge fora do intervalo fechado

166

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

[−r, r]. Nos extremos −r e r, a s´erie pode convergir ou divergir. Se p n existir L = lim |an | ent˜ ao r = 1/L. O n´ umero r chama-se p o raio de convergˆencia da s´erie. Al´em disso, tem-se 0 < ρ < r ⇔ n |an | < 1/ρ para todo n ∈ N suficientemente grande. Observa¸ c˜ ao. Segue-se do Teorema 7, Cap´ıtulo 4, que se os coeficientes an forem diferentes deP zero e existir lim |an+1 |/|an | = L, ent˜ao o raio de convergˆencia da s´erie an xn ´e r = 1/L. P Teorema 7. Uma s´erie de potˆencias an xn converge uniformemente em todo intervalo compacto [−ρ, ρ], onde 0 < ρ < raio de convergˆencia. P Demonstra¸ c˜ ao: A s´erie an ρn ´e absolutamente convergente e, para todo x ∈ [−ρ, ρ], tem-se |an xn | ≤P|an |ρn . Pelo teste de Weierstrass (Teorema 5), segue-se que a s´erie an xn converge uniformemente no intervalo [−ρ, ρ]. P Corol´ ario. Se r > 0 ´e o raio de convergˆ da s´erie an xn , a fun¸ca ˜o P encia n f : (−r, r) → R, definida por f (x) = an x , ´e cont´ınua. P Exemplo 12. A s´erie an xn pode n˜ao convergir uniformemente em todo o intervalo (−r, P nr), onde r ´e o raio de convergˆencia. Isto ´e claro no caso da s´erie x /n!, cujo raio de convergˆencia ´e infinito, para a P qual rn (x) = k>n xk /k! > xn+1 /(n + 1)! quando x ´e positivo. Dado ε > 0, n˜ao importa qual n se tome, ´e imposs´ıvel ter rn (x) < ε para todo x positivo. Teorema 8. (Integra¸ c˜ ao termo a termo.) Seja r o raio de converP gˆencia da s´erie de potˆencias an xn . Se [α, β] ⊂ (−r, r) ent˜ ao β

X an  an xn dx = (β n+1 − αn+1 ). n+1 α P Demonstra¸ c˜ ao: A convergˆencia de an xn ´e uniforme no intervalo [α, β] pois se escrevermos ρ = max{|α|, |β|} < r teremos [α, β] ⊂ [−ρ, ρ]. Logo ´e permitido integrar termo a termo, pelo Teorema 3. Z

X

Teorema 9. (Deriva¸ c˜ ao termo Seja r o raio de conP a termo.) n . A fun¸ a x ca ˜o f : (−r,P r) → R, vergˆencia da s´erie de P potˆencias ∞ n=0 n ∞ ∞ n ′ definida por f (x) = e deriv´ avel, com f (x) = n=0 an x , ´ n=1 n · n−1 ′ an x e a s´erie de potˆencias de f (x) ainda tem raio de convergˆencia r. P Demonstra¸ c˜ ao: Seja r′ o raio de convergˆencia da s´erie n≥1 nan xn−1 , P P a qual converge se, e somente se, x · n≥1 nan xn−1 = n≥1 nan xn con-

Se¸c˜ ao 4

Fun¸c˜ oes trigonom´ etricas

167

verge. Logo r′ ´e tamb´em o raio de convergˆencia desta u ´ltima s´erie. Abreviemos a express˜ao “para todo n suficientemente grande” por “n ≫ p 1”. Se 0 < ρ < r ent˜ao, tomando c com 0 < ρ < c < r, √ temos n |an | < 1/c, n ≫ 1. Por outro lado, como lim n n = 1, vale √ n n < c/ρ, n ≫ 1. Multiplicando as duas u ´ltimas desigualdades, vem p n |nan | < 1/ρ, n ≫ 1. Portanto, 0 < ρ < r ⇒ 0 < ρ < r′ . Como ´e ´ obvio que 0 < ρ < r′ ⇒P0 < ρ < r, P conclu´ımos que r = r′ . Asn sim, as s´eries de potˆencias n≥0 an x e n≥1 nan xn−1 tˆem o mesmo raio de convergˆencia. Fixado qualquer x ∈ (−r, r), tomamos ρ tal que |x| < ρ < r. Ambas as s´eries convergem uniformemente em [−ρ, ρ] logo, P pelo Teorema 4, temos f ′ (x) = n≥1 nan xn−1 .

Corol´ ario 1. Seja r o raio de convergˆencia da s´erie dePpotˆencias P an xn . A fun¸ca ˜o f : (−r, r) → R, definida por f (x) = an xn , ´e ∞ de classe C . Para quaisquer x ∈ (−r, r) e k ∈ N tem-se X n(n − 1) . . . (n − k + 1)an xn−k . f (k) (x) = n≥k

Em particular, ak = f (k) (0)/k!. Portanto, a0 +P a1 x + · · · + an xn ´e o polinˆ omio de Taylor de ordem n da fun¸c˜ao f (x) = an xn em torno do ponto x = 0.

Corol´ ario 2. (Unicidade c˜ ao em S´ erie de Potˆ enP Pda representa¸ n n cias.) Sejam an x e bn x s´eries de potˆencias convergentes no intervalo (−r, r) P e X ⊂ (−r, P r) num conjunto tendo 0 como ponto de n acumula¸ca ˜o. Se an x = bn x para todo x ∈ X ent˜ ao an = bn para todo n ≥ 0. Com efeito, a hip´ c˜oes f, g : (−r, r) → R, dePotesenassegura que P as fun¸ finidas por f (x) = an x e g(x) = bn xn , tˆem as mesmas derivadas, f (n) (0) = g (n) (0), n = 0, 1, 2, . . . . Logo an = f (n) (0)/n! = g (n) (0)/n! = bn para todo n ≥ 0.

4

Fun¸c˜ oes trigonom´ etricas

Mostraremos agora, de modo sucinto, como se podem definir precisamente as fun¸c˜oes trigonom´etricas sem apelo `a intui¸c˜ao geom´etrica. As s´erie de potˆencias c(x) =

∞ X (−1)n

n=0

(2n)!

x2n

e

s(x) =

∞ X (−1)n x2n+1 (2n + 1)!

n=0

168

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

tˆem raio de convergˆencia infinito logo definem fun¸c˜oes c : R → R e s : R → R, ambas de classe C ∞ . ´ imediato que c(0) = 1, s(0) = 0, c(−x) = c(x) e s(−x) = −s(x). E Derivando termo a termo, vem s′ (x) = c(x) e c′ (x) = −s(x). A fun¸c˜ao f (x) = c(x)2 + s(x)2 tem derivada igual a 2cc′ + 2ss′ = −2cs + 2cs = 0, logo ´e constante. Como f (0) = 1, concluimos que c(x)2 + s(x)2 = 1 para todo x ∈ R. De maneira an´ aloga se provam as f´ormulas de adi¸c˜ao s(x + y) = s(x)c(y) + c(x)s(y), c(x + y) = c(x)c(y) − s(x)s(y). Basta fixar y ∈ R e definir as fun¸c˜oes f (x) = s(x + y) − s(x)c(y) − c(x)s(y) e g(x) = c(x + y) − c(x)c(y) + s(x)s(y). Tem-se f ′ = g e g ′ = −f . Da´ı resulta que f 2 + g 2 tem derivada identicamente nula, logo ´e constante. Como f (0) = g(0) = 0, segue-se que f (x)2 + g(x)2 = 0 para todo x ∈ R. Portanto f (x) = g(x) = 0 para todo x ∈ R e as f´ormulas est˜ao provadas. Afirmamos agora que deve existir algum x > 0 tal que c(x) = 0. Do contr´ario, como c(0) = 1, ter´ıamos c(x) > 0 para todo x > 0 e, + como c ´e a derivada de s, a fun¸c˜ao s seria crescente R x na semi-reta R . Ent˜ao, para R x qualquer x > 1 valeria c(x) = c(1) − 1 s(t)dt > 0, donde ´ltima desigualdade resultando de s c(1) > 1 s(t)dt > s(1)(x − 1), a u ser crescente. Mas a desigualdade c(1) > s(1)(x − 1) para todo x > 1 ´e absurda. (Note que s(1) > 0 pois s ´e crescente.) Logo deve existir algum x > 0 para o qual c(x) = 0. O conjunto dos n´ umeros x ≥ 0 tais que c(x) = 0 ´e fechado porque c ´e cont´ınua. Logo possui um menor elemento, o qual n˜ao ´e zero porque c(0) = 1. Chamaremos π/2 este menor n´ umero positivo para o qual se tem c(π/2) = 0. Veremos agora que as fun¸c˜oes c(x) e s(x) s˜ ao peri´ odicas, com per´ıodo 2π. Com efeito, a segunda f´ormula de adi¸c˜ao d´a: c(2x) = c(x)2 − s(x)2 = 2c(x)2 − 1, logo c(π) = −1 e c(2π) = 1 e da´ı s(π) = s(2π) = 0. Novamente as f´ormulas de adi¸c˜ao mostram que s(x + 2π) = s(x) e c(x + 2π) = c(x), o que prova a alega¸c˜ao feita. As nota¸c˜oes usuais para estas fun¸c˜oes s˜ ao c(x) = cos x e s(x) = sen x.

Se¸c˜ ao 5

S´ eries de Taylor

169

Este pequeno resumo justifica o uso das fun¸c˜oes sen x e cos x em An´ alise. A partir da´ı se definem as demais fun¸c˜oes trigonom´etricas da maneira habitual: tg x = sen x/ cos x, sec x = 1/ cos x, etc. Em particular, limx→0 sen x/x = 1 porque, sendo sen 0 = 0, este limite ´e a derivada de sen x no ponto x = 0, a qual ´e igual a cos 0, ou seja, 1.

5

S´ eries de Taylor

P Quando a s´erie de potˆencias an (x − x0 )n tem raio de convergˆencia r > 0, diz-se que ela ´e a s´erie de Taylor, em torno P do ponto nx0 , da fun¸c˜ao f : (x0 − r, x0 + r) → R, definida por f (x) = an (x − x0 ) . Esta denomina¸c˜ao se deve ao fato de que a soma dos primeiros n + 1 termos desta s´erie constitui o polinˆ omio de Taylor de ordem n de f no ponto x0 . Veremos agora as s´eries de Taylor de algumas fun¸c˜oes conhecidas. ` vezes a s´erie de Taylor de uma fun¸c˜ao em torno do ponto x0 = 0 As chama-se “S´erie de Maclaurin” mas n˜ao adotaremos esta terminologia. 1. Fun¸ co ˜es seno e cosseno Suas s´eries de Taylor em torno do ponto x = 0 s˜ ao sen x = x −

x3 x5 + − ··· 3! 5!

e

cos x = 1 −

x2 x4 + − ··· 2! 4!

em virtude da pr´opria defini¸c˜ao dessas fun¸c˜oes. 2. Fun¸ c˜ ao 1/(1 − x)

A s´erie de potˆencias 1 + x + x2 + · · · ´e uma s´erie geom´etrica. Ela converge para a soma 1/(1−x) quando |x| < 1, e diverge quando |x| ≥ 1. Logo ´e a s´erie de Taylor da fun¸c˜ao f : (−1, 1) → R, definida por f (x) = 1/(1 − x). P Segue-se que 1 − x + x2 − · · · = n≥0 (−1)n xn ´e a s´erie de Taylor da fun¸c˜ao 1/(1 + x), convergente para |x| < 1 e divergente se |x| ≥ 1. P Tamb´em resulta da´ı que 1 − x2 + x4 − · · · = n≥0 (−1)n x2n ´e a s´erie de Taylor da fun¸c˜ao g(x) = 1/(1 + x2 ) em torno do ponto x = 0. Neste caso, a fun¸c˜ao g : R → R est´a definida para todo x ∈ R por´em sua s´erie de Taylor converge apenas no intervalo (−1, 1). (Este fenˆ omeno est´a ligado ao fato de que a fun¸c˜ao de vari´ a vel complexa g(z) = 1/(1 + z 2 ) √ n˜ao est´a definida nos pontos z = ± −1, ambos de valor absoluto igual a 1.)

170

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

Se desejarmos desenvolvimentos finitos poderemos escrever respectivamente 1 xn+1 = 1 + x + · · · + xn + , x 6= 1. 1−x 1−x 1 (−1)n+1 xn+1 = 1 − x + · · · + (−1)n xn + , x 6= −1. 1+x 1+x (−1)n+1 x2n+2 1 2 n 2n = 1 − x + · · · + (−1) x + , x ∈ R. 1 + x2 1 + x2 Em cada uma das express˜oes acima, a u ´ltima parcela ´e o resto da f´ormula de Taylor. Com efeito, se chamarmos r, s e t essas u ´ltimas parcelas, vemos facilmente que r(x) s(x) t(x) = lim n = lim 2n = 0. n x→0 x x→0 x x→0 x lim

3. Fun¸ c˜ ao exponencial P∞ n para todo x ∈ R, logo a fun¸c˜ao A s´erie n=0 x /n! converge P ∞ n f : R → R, definida por f (x) = e de classe C ∞ . Derin=0 x /n!, ´ vando termo a termo, vemos que f ′ (x) = f (x). Como f (0) = 1, segue-se do Teorema 10, Cap´ıtulo 11, que f (x) = ex para todo x ∈ R. Portanto ex = 1 + x +

x2 x3 + + ··· 2! 3!

´e a s´erie de Taylor da fun¸c˜ao exponencial em torno do ponto x = 0. 4. Fun¸ c˜ ao logaritmo Como log x n˜ao tem sentido para x = 0, consideraremos a fun¸c˜ao log(1 R x + x), definida para todo x > −1. Por defini¸c˜ao, log(1 + x) = erie de Taylor de 1/(1 + x), 0 dt/(1 + t). Integrando termo a termo a s´ vista cima, obtemos log(1 + x) = x −



X x2 x3 x4 xn (−1)n+1 + − + ··· = , 2 3 4 n n=1

s´erie de Taylor de log(1 + x), convergente no intervalo aberto (−1, 1), pois 1 ´e seu raio de convergˆencia. Acontece que, pelo Teorema de Leibniz (Teorema 3, Cap´ıtulo 4) esta s´erie converge tamb´em para x = 1 (mas diverge para x= − 1). Seria interessante saber se a fun¸c˜ao f : (−1, 1]→R,

Se¸c˜ ao 5

S´ eries de Taylor

171

P definida por f (x) = n≥1 (−1)n+1 xn /n, a qual coincide com log(1 + x) quando |x| < 1, tamb´em coincide com log(1 + x) no ponto x = 1. Isto ´e verdade, conforme mostraremos agora. Com efeito, integrando termo a termo o desenvolvimento finito de 1/(1 + x) visto acima, obtemos (indo at´e a ordem n em vez de n + 1): log(1 + x) = x −

x2 x3 xn + − · · · + (−1)n−1 + rn (x), 2 3 n

onde rn (x) = (−1)n

Z

0

R1

x

tn dt. 1+t

1 · Para x = 1, temos |rn (1)| ≤ 0 = n+1 Portanto limn→∞ rn (1) = 0. Segue-se que

tn dt

(−1)n−1 1 1 + − ··· + + ··· 2 3 n Esta ´e uma express˜ao interessante de log P 2 como soma de uma s´erie aln+1 xn /n representa ternada. Ela mostra que a s´erie de Taylor ∞ n=1 (−1) log(1 + x) no intervalo (−1, 1]. log 2 = 1 −

5. Fun¸ c˜ ao arctg x Sabe-se do C´ alculo que a fun¸c˜ao tg : (−π/2, π/2) → R ´e uma bije¸c˜ao C ∞ , com derivada positiva, e que sua inversa arctg : R → (−π/2, π/2) tem derivada igual a 1/(1 + x2 ), para todo x ∈ R. O desenvolvimento de tg x em s´erie de Taylor ´e complicado, enquanto o de arctgR x ´e bem mais x simples, por isso o exporemos agora. Temos arctg x = 0 dt/(1 + t2 ), para todo x ∈ R. Quando |x| < 1, podemos integrar termo a termo o desenvolvimento de Taylor de 1/(1 + x2 ) visto acima, obtendo arctg x = x −



X x3 x5 x2n+1 x2n+1 (−1)n + − · · · + (−1)n + ··· = · 3 5 2n + 1 2n + 1 n=0

Este argumento (integra¸c˜ao termo a termo) garante a validez da igualdade acima quando −1 < x < 1. Acontece que a s´erie em quest˜ao con´ natural, portanto, esperar verge tamb´em nos pontos x = 1 e x = −1. E que o desenvolvimento de arctg x em s´erie de Taylor seja v´alido em todo o intervalo fechado [−1, 1]. Para ver isto, integramos o desenvolvimento finito de 1/(1 + x2 ) obtendo arctg x = x −

x3 x5 x2n−1 + − · · · + (−1)n−1 + rn (x), 3 5 2n − 1

172

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

onde rn (x) = (−1)n

Rx

t2n 0 1+t2

Cap. 12

dt.

Para todo x ∈ [−1, 1] temos Z |x| |x|2n+1 1 t2n dt = |rn (x)| ≤ ≤ , 2n + 1 2n + 1 0 logo limn→∞ rn (x) = 0, portanto vale a igualdade arctg x =

∞ X

n=0

(−1)n

x2n+1 2n + 1

para todo x ∈ [−1, 1]. Em particular, para x = 1, obtemos a f´ ormula de Leibniz π 1 1 1 = 1 − + − + ··· 4 3 5 7

6

Exerc´ıcios

Se¸ c˜ ao 1:

Convergˆ encia simples e convergˆ encia uniforme

1. Mostre que a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : [0, +∞) → R, dadas por fn (x) = xn /(1 + xn ), converge simplesmente. Determine a fun¸c˜ao limite, mostre que a convergˆencia n˜ao ´e uniforme. 2. Prove que a seq¨ uˆencia do exerc´ıcio anterior converge uniformemente em todos os intervalos do tipo [0, 1 − δ] e [1 + δ, +∞), 0 < δ < 1. P n n 3. Prove que a s´erie ∞ n=1 x (1 − x ) converge quando x pertence ao intervalo (−1, 1]. A convergˆencia ´e uniforme em todos os intervalos do tipo [−1 + δ, 1 − δ], onde 0 < δ < 1/2.

4. A fim de que a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R convirja uniformemente, ´e necess´ario e suficiente que, para todo ε > 0 dado, exista n0 ∈ N tal que m, n > n0 ⇒ |fm (x) − fn (x)| < ε qualquer que seja x ∈ X. (Crit´erio de Cauchy.) 5. Se a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R converge uniformemente para f : X → R, prove que f ´e limitada se, e somente se, existem K > 0 e n0 ∈ N tais que n > n0 ⇒ |fn (x)| ≤ K para todo x ∈ X.

6. Se a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R ´e tal que f1 ≥ f2 ≥ · · · ≥ fn ≥ · · · e fn → 0 uniformemente em X, prove que a s´erie P (−1)n fn converge uniformemente em X.

Se¸c˜ ao 6

Exerc´ıcios

173

P P 7. Se |fn (x)| converge uniformemente em X, prove que fn (x) tamb´em converge uniformemente em X. Se¸ c˜ ao 2:

Propriedades da convergˆ encia uniforme

1. Se fn → f e gn → g uniformemente no conjunto X, prove que fn + gn → f + g uniformemente em X. Prove ainda que se f e g forem limitadas ent˜ao fn · gn → f · g uniformemente em X. Finalmente, se existir c > 0 tal que |g(x)| ≥ c para todo x ∈ X, prove que 1/gn → 1/g uniformemente em X.

2. Seja p : R → R um polinˆ omio de grau ≥ 1. Mostre que a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : R → R, dadas por fn (x) = p(x)+1/n, converge uniformemente para p em R por´em (fn2 ) n˜ao converge uniformemente para p2 . √ 3. Seja a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : [0, 1] → R, onde fn (x) = sen(nx)/ n. Prove que (fn ) converge uniformemente para 0 mas a seq¨ uˆencia das derivadas fn′ n˜ao converge em ponto algum do intervalo [0, 1]. 4. Mostre que a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes gn (x) = x + xn /n converge uniformemente no intervalo [0, 1] para uma fun¸c˜ao deriv´avel g e a seq¨ uˆencia das derivadas gn′ converge simplesmente em [0, 1] mas g ′ n˜ao ´e igual a lim gn′ . 5. Seja g : Y → R uniformemente cont´ınua. Se a seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R converge uniformemente para f , com f (X) ⊂ Y e fn (X) ⊂ Y para todo n ∈ N, prove que g ◦ fn → g ◦ f uniformemente em X. Analise tamb´em a quest˜ ao mais simples fn ◦g → f ◦g.

6. Sejam X compacto, U aberto e f : X → R cont´ınua tal que f (X) ⊂ U . Se uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R converge uniformemente para f , prove que existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ fn (X) ⊂ U. 7. Se uma seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes cont´ınuas fn : X → R converge uniformemente num conjunto denso D ⊂ X, prove que (fn ) converge uniformemente em X. 8. A seq¨ uˆencia de fun¸c˜oes fn : [0, 1] → R, fn (x) = nx(1 − x)n , converge, por´em n˜ao uniformemente. Mostre que, apesar disso, vale Z 1 Z 1   fn . lim fn = lim 0

n→∞

n→∞

0

174

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

Cap. 12

9. Dada uma seq¨ up ˆencia de fun¸c˜oes fn : X → R, suponha que exista n c ∈ R tal que |fn (x)| ≤ c < 1 para ∈ X e todo n ∈ N P todo x P suficientemente grande. Prove que |fn (x)| e fn (x) convergem uniformemente em X. 10. No exerc´ıcio anterior, suponha que f1 ´e limitada, p que fn (x) 6= 0 para todo x ∈ X e todo n ∈ N e, em vez de n |fn (x)| ≤ c < 1, suponha que |fn+1 (x)/fn (x)| ≤ c < 1 para todo x ∈ X e todo n ∈ N suficientemente grande. Obtenha a mesma conclus˜ao. Se¸ c˜ ao 3:

S´ eries de potˆ encias

P 1. Seja r o raio de convergˆencia da s´erie de potˆencias an (x−x0)n . + Prove que se r ∈ R ent˜ao r = 1/L, onde p  L ´e o maior valor n |an | . Assim temos, r = de aderˆencia da seq¨ uˆencia limitada p  1/ lim sup n |an | . p 2. Se lim n |an | = L, prove que as s´eries de potˆencias ∞ X

2n

an x

4.

5.

6.

an x2n+1

n=0

n=0

3.

e

∞ X

√ tˆem ambas raio de convergˆencia igual a 1/ L. Determine o raio de convergˆencia de cada uma das s´eries seguintes: X 2 X √ X log n n n xn . an xn , a n xn e P n Prove que a fun¸c˜ao f : (−r, r) → R, dada por f (x) = ∞ n=0 an x , onde r ´e o raio de convergˆencia desta s´erie, ´e uma fun¸c˜ao par (respectivamente, ´ımpar) se, e somente se, an = 0 para todo n ´ımpar (respectivamente, par). (Ver Exerc´ıcio 2.4, Cap. 8.) P n Seja ∞ erie de potˆencias cujos coeficientes s˜ ao detern=0 an x uma s´ minados pelas igualdades a0 = a1 = 1 e an+1 = an + an−1 √ . Mostre que o raio de convergˆencia desta s´erie ´e igual a (−1 + 5)/2. Prove que a fun¸c˜ao f (x) =

∞ X

n=0

(−1)n

1 x 2n (n!)2 2

f′ est´a bem definida para todo x ∈ R e que f ′′ + + f = 0 para x todo x 6= 0.

13 Sugest˜ oes e Respostas Cada uma das doze se¸c˜oes deste cap´ıtulo tem o mesmo t´ıtulo de um dos doze cap´ıtulos anteriores e cont´em solu¸c˜oes para exerc´ıcios propostos naquele cap´ıtulo. Em cada uma delas, a nota¸c˜ao p.q significa o q-´esimo exerc´ıcio da se¸c˜ao p do cap´ıtulo correspondente.

1

Conjuntos Finitos e Infinitos 1.2. O conjunto A dos m´ ultiplos de m maiores do que n n˜ ao ´e vazio pois (n + 1)m ∈ A. Seja (q + 1)m o menor elemento de A. Se n n˜ ao ´e m´ ultiplo de m, qm < n < (q + 1)m, logo n = qm + r, com r < m. Reciprocamente, se n = qm + r com r < m ent˜ ao (q + 1)m ´e o menor elemento de A, logo q est´ a determinado univocamente, juntamente com r = n − mq. 1.3. Seja k o menor elemento de X. Se n ∈ X ent˜ ao n ≥ k. Assim, ou n ´e m´ ultiplo de k ou n = qk + r com r < k. Ora, n e qk pertencem a X, logo r ∈ X, o que ´e absurdo pois k ´e o menor elemento de X. Assim todo n ∈ X ´e m´ ultiplo de k. 1.4. Provar que 1 ´e o u ´nico n´ umero natural que n˜ ao ´e sucessor de qualquer outro equivale a mostrar que, pondo X = {1} ∪ s(N), tem-se X = N. Isto, por´em, resulta diretamente do axioma da indu¸c˜ ao pois 1 ∈ X e se n ∈ X ent˜ ao s(n) ∈ s(N), logo s(n) ∈ X. 1.5. Seja X ⊂ N tal que 1 ∈ X e n ∈ X ⇒ n + 1 ∈ X. Se X 6= N, tome k = menor elemento de N − X. Como 1 ∈ X, tem-se k = p + 1, com p < k logo p ∈ X. Sendo p + 1 = k ∈ / X, chega-se a uma contradi¸c˜ ao. 1.6 Primeiramente, provemos a monotonicidade da multiplica¸c˜ ao: m < n ⇒ mp < np. De fato, m < n significa n = m + r, r ∈ N, logo np = (m + r)p = mp + rp e da´ı mp < np. Em seguida notemos que, se mp = np n˜ ao se pode ter m < n

176

Sugest˜ oes e Respostas

2.1. 2.2.

2.3.

2.5.

3.3.

3.4. 3.5.

4.1.

4.2. 4.3. 4.4.

4.5. 4.6.

2

Cap. 13

(pois isto implicaria mp < np) nem n < m pelo mesmo motivo. Deve ser ent˜ ao m = n, o que prova a lei de corte para a multiplica¸c˜ ao. Podemos supor Y ⊂ X = In . Se fosse card Y = m > n, existiria uma bije¸c˜ ao entre Im e sua parte pr´ opria Y . Se Y = X ∪ {a} onde a ∈ / X ent˜ ao P(Y ) ´e formado pelas partes de Y que n˜ ao contˆem a mais as que contˆem a. As primeiras constituem P(X) e as outras s˜ ao em mesmo n´ umero que as primeiras, logo P(Y ) = 2.P(X). Esta ´e a base da indu¸c˜ ao sobre o n´ umero de elementos. Se X = X ′ ∪ {a}, a ∈ / X ′ ent˜ ao para cada fun¸c˜ ao f ′ : X ′ → Y h´ a n maneiras de estendˆe-la a uma fun¸c˜ ao f : X → Y , correspondentes ` as n imagens poss´ıveis f (a) ∈ Y . Logo card F (X; Y ) = card F (X ′ ; Y ) × n. Isto fornece a base para a indu¸c˜ ao em m. Se existisse um tal f , ela seria uma bije¸c˜ ao entre seu dom´ınio Im e sua imagem A = f (Im ), a qual est´ a contida em In , logo ´e um subconjunto pr´ oprio de Im (pois n < m). Mas isto ´e vedado pelo Teorema 1. Use a id´eia de Euclides: supondo P finito, considere o produto de todos os n´ umeros primos, some 1 a esse produto e obtenha uma n´ umero n, o qual n˜ ao pode ser primo, mas deve possuir um divisor primo. Chegue a uma contradi¸c˜ ao. Tome umeros naturais maiores do que n. Ent˜ ao T Xn = N − In = conjunto dos n´ X significa que a ´ e maior do que todos os n´ u meros naturais. a∈ ∞ n n=1 Se existir, para algum n ∈ N, uma f : In → X sobrejetiva ent˜ ao X ´e finito, pelo Corol´ ario 1 do Teorema 2. Portanto, se X ´e infinito n˜ ao existe f : In → X sobrejetiva. A rec´ıproca ´e inteiramente ´ obvia. Para a injetividade de f use a unicidade da decomposi¸c˜ ao em fatores primos. Para a sobrejetividade, dado um n´ umero par k ∈ N, seja m o maior n´ umero natural tal que k ´e divis´ıvel por 2m . Ent˜ ao k = 2m · ℓ, onde ℓ ´e ´ımpar, logo ℓ = 2n − 1. Tome g = π ◦ ϕ, onde ϕ : N → N × N ´e sobrejetiva e π(m, n) = n. Use o exerc´ıcio anterior. A fun¸c˜ ao f : Pn → Nn = N × · · · × N, definida por f (X) = (m1 , . . . , mn ) se X = S {m1 < m2 < · · · < mn }, ´e injetiva, portanto Pn ´e enumer´ avel, logo Pf = ∞ em ´e. n=1 Pn tamb´ Interprete cada subconjunto X ⊂ N como uma seq¨ uˆencia de zeros e uns, na qual o n-´esimo termo ´e 1 se n ∈ X e 0 se n ∈ / X. S X = y∈Y f −1 (y).

N´ umeros Reais 2.2. x = x − y + y ⇒ |x| ≤ |x − y| + |y| ⇒ |x| − |y| ≤ |x − y|. Analogamente, |y| − |x| ≤ |x − y|, logo | |x| − |y| | = max{|x| − |y|, |y| − |x|} ≤ |x − y|. 2.5. N˜ ao use indu¸c˜ ao. Escreva (1 + x)2n = (1 + 2x + x2 )n e use a desigualdade de Bernoulli. 2.6. Segue-se de 2.2. P P 2 P 2 xi . 2.7. Note que f (λ) = aλ2 + bλ + c, onde a = yi , b = 2 xi yi , c =

Se¸c˜ ao 3

Seq¨ uˆ encias de n´ umeros reais

177

3.3. Seja A = sup f . Tem-se f (x) ≤ A, donde f (x)2 ≤ A2 , para todo x ∈ X, logo √ sup(f 2 ) ≤ A2 . Por outro lado, se c < A2 ent˜ ao c < A, logo existe x ∈ X √ com c < f (x) ≤ A e da´ı c < f (x)2 ≤ A2 . Portanto sup(f 2 ) = A2 . 3.4. De x < (2 − a2 )/(2a + 1) resulta a2 + 2ax + x < 2. Como x < 1, tem-se x2 < x, logo (a + x)2 = a2 + 2ax + x2 < a2 + 2ax + x < 2. Por outro lado, de y < (b2 − 2)/2b vem b2 − 2by > 2 e da´ı resultam (b − y)2 = b2 − 2by + y 2 > 2 e b(b − 2y) > 2, donde b − y > b − 2y > 0. Estes fatos dizem que se X = {a > 0; a2 < 2} ent˜ ao c = sup X n˜ ao pertence a X nem ao conjunto Y = {b > 0; b2 > 2}. Logo c2 = 2. 3.5. A correspondˆencia que associa ao polinˆ omio p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn a lista (a0 , a1 , . . . , an ) ´e uma bije¸c˜ ao entre o conjunto Pn dos polinˆ omios de n+1 coeficientes inteiros e grau ≤ n e o produto cartesiano Z = Z × · · · × Z, S logo Pn ´e enumer´ avel. Da´ı o conjunto P = ∞ omios com n=0 Pn dos polinˆ coeficientes inteiros ´e enumer´ avel. Para cada n´ umero alg´ebrico α, escolha, de uma vez por todas, um polinˆ omio pα de coeficientes inteiros que tenha α como raiz. A correspondˆencia α 7→ pα define uma fun¸c˜ ao do conjunto A dos n´ umeros alg´ebricos reais no conjunto enumer´ avel P , tal que a imagem inversa de cada elemento de P ´e finita. Logo A ´e enumer´ avel. 3.6. Sejam α = inf I e β = sup I, convencionando que α = −∞ (respect. β = +∞) se I for ilimitado inferiormente (respect. superiormente). Basta provar que (α, β) ⊂ I. Ora x ∈ (α, β) ⇒ α < x < β ⇒ (pela defini¸c˜ ao de inf. e sup.) existem a, b ∈ I com a < x < b, logo, pela hip´ otese, x ∈ I.

3

Seq¨ uˆ encias de N´ umeros Reais 1.2. Dado ε > 0, existem n1 , n2 ∈ N tais que n > n1 ⇒ |xn − a| < ε e n > n2 ⇒ |yn − a| < ε. Tome n0 = max{2n1 − 1, 2n2 }. Se n = 2k − 1, ent˜ ao n > n0 ⇒ 2k − 1 > 2n1 − 1 ⇒ k > n1 ⇒ |zn − a| < |xk − a| < ε. Se n = 2k, ent˜ ao n > n0 ⇒ 2k > 2n2 ⇒ k > n2 ⇒ |zn − a| = |yk − a| < ε. Portanto lim zn = a. 1.3. Basta notar que | |xn | − |a| | ≤ |xn − a|. 1.5. Para o conjunto B, tome uma decomposi¸c˜ ao N = N1 ∪ N2 ∪ · · · onde os Nk s˜ ao infinitos 2 a 2 disjuntos e ponha xn = k se n ∈ Nk . Para o conjunto C, tome uma enumera¸c˜ ao x1 , x2 , . . . , xn , . . . dos n´ umeros racionais do intervalo [0, 1]. 1.6. Para a suficiˆencia, tome sucessivamente ε igual a 1, 1/2, 1/3, . . . e obtenha n1 < n2 < n3 < · · · com |xnk − a| < 1/k. 2.3. Existe ε > 0 tal que |xn − a| ≥ ε para um conjunto infinito N′ de valores de n. Por Bolzano-Weierstrass, a subseq¨ uˆencia (xn )n∈N′ possui uma subseq¨ uˆencia convergente: N′′ ⊂ N′ e limn∈N′′ xn = b. Tem-se |b − a| ≥ ε logo b 6= a. 2.4. Seja a o u ´nico valor de aderˆencia de (xn ). Tem-se lim xn = a em virtude do exerc´ıcio anterior. 2.5. A seq¨ uˆencia dada tem o u ´nico valor de aderˆencia 0 mas n˜ ao converge pois ´e ilimitada. 2.6. Seja a < b. Como a m´edia aritm´etica ´e maior do que a m´edia geom´etrica, temse a < x1 < x2 < · · · < y2 < y1 < b. Logo existem x = lim xn e y = lim yn . Fazendo n → ∞ em yn+1 = (xn + yn )/2 vem y = (x + y)/2, donde x = y.

178

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

2.7. (a) Tomando ε = 1, vˆe-se que existe n0 ∈ N tal que |xm − a| < 1 para todo m > n0 , onde a = xn0 +1 . Ent˜ ao os termos da seq¨ uˆencia pertencem ao conjunto {x1 , . . . , xn0 } ∪ [a − 1, a + 1], que ´e limitado. ao existem (b) Se limn∈N′ xn = a e limn∈N′′ xn = b com |a − b| = 3ε > 0 ent˜ ´ındices m e n arbitrariamente grandes tais que |xm − a| < ε e |xn − b| < ε. Como 3ε = |a − b| ≤ |a − xm | + |xm − xn | + |xn − b| < 2ε + |xm − xn |, donde |xm − xn | > ε, conclui-se que (xn ) n˜ ao ´e uma seq¨ uˆencia de Cauchy. (c) Segue-se dos itens anteriores e do exerc´ıcio 2.4. √ √ 3.1. Observe que 1 < n+p n < n n. 3.3. A seq¨ uˆencia ´e crescente pois x1 < x2 e, supondo xn−1 < xn vem x2n = a + xn−1 < a + xn = x2n+1 donde xn < xn+1 . Al´em disso, se c ´e a raiz positiva da equa¸c˜ ao x2 − x − a = 0, ou seja, c2 = a + c, tem-se xn < c para todo n. Isto ´e verdade para n = 1 e, de xn < c resulta x2n+1 = a + xn < a + c = c2 logo xn+1 < c. Portanto existe lim xn . Fazendo n → ∞ na igualdade x2n+1 = a+xn vˆe-se que lim xn = c. 3.5. Note que x2 = 1/(a + x1 ) e x3 = 1/(a + x2 ) = (a + x1 )/(a2 + ax1 + 1). Tem-se x1 > c = 1/(a + c) > 1/(a + x1 ) = x2 . Al´em disso, x1 > x2 = 1/(a + x1 ) ⇒ x1 (a + x1 ) > 1 ⇒ (multiplicando por a e somando x1 ) ⇒ x1 (a2 + ax1 + 1) > a + x1 ⇒ x1 > (a + x1 )/(a2 + ax1 + 1), logo x1 > x3 > c > x2 . Analogamente se vˆe que x1 > x3 > c > x4 > x2 , e assim por diante. Portanto existem lim x2n−1 = ξ e lim x2n = η. A rela¸c˜ ao xn+2 = (a + xn )/(a2 + axn + 1), por passagem ao limite, fornece ξ = (a+ξ)/(a2 +aξ +1) e η = (a+η)/(a2 +aη +1), logo ξ 2 + aξ − 1 = 0 e η 2 + aη − 1 = 0. Como ξ e η s˜ ao positivos, vem ξ = η = c.

3.6. Observe que yn+1 = a + xn .

3.7. Basta observar que xn+1 = 1/(1 + xn ). 4.1. Pelo Exemplo A > 0, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ √ 9, dado arbitrariamente √ n! > An ⇒ n n! > A logo lim n n! = +∞. √ √ √ √ 4.2. Lembre que A − B = (A − B)/( A + B). 4.3. Pondo tn =

n! nk ·an

, obtemos tn+1 /tn =

n+1 1 )k a·(1+ n

, portanto lim tn+1 /tn =

+∞. Segue-se do Exemplo 8 que lim tn = +∞. Pondo xn = (an · n!)/nn , obtemos xn+1 /xn = a · (n/(n + 1))n , portanto lim(xn+1 /xn ) = a/e. Segue-se do Exemplo 8 que lim xn = +∞ se a > e e lim xn = 0 se a < e. Quanto a yn = nk · xn = (nk · an · n!)/nn , evidentemente lim yn = +∞ se a > e. Quando a < e, o quociente yn+1 /yn = [(n + 1)/n]k · (xn+1 /xn ) tem limite a/e < 1, logo lim yn = 0. 4.4. Observe que [log(n + 1)/ log n] − 1 = log(1 + 1/n)/ log n tende a zero.

4.5. Sejam Xn = xn+1 − xn e Yn = yn+1 − yn . Dado ε > 0, existe p ∈ N tal que, para todo k ∈ N, os n´ umeros Xp /Yp , . . . , Xp+k /Yp+k pertencem ao intervalo (a−ε, a+ε). Segue-se do Exerc´ıcio 2.8, Cap´ıtulo 2, que (Xp +· · ·+Xp+k )/(Yp + · · · + Yp+k ) ∈ (a − ε, a + ε), ou seja, (xp+k+1 − xp )/(yp+k+1 − yp ) ∈ (a − ε, a + ε) para este valor fixo de p e todo k ∈ N. Divida numerador e denominador por yp+k+1 , fa¸ca k → ∞ e conclua que lim(xn /yn ) = a.

4.6. Conseq¨ uˆencia imediata do exerc´ıcio anterior.

Se¸c˜ ao 4

4

S´ eries num´ ericas

179

S´ eries Num´ ericas 1.1. Observe que bn = log n+1 = log(n + 1) − log n. n 1.4. Agrupe os termos um a um, dois a dois, quatro a quatro, oito a oito, etc. e compare com a s´erie harmˆ onica. 1.5. Use o m´etodo do Exemplo 5. √ 1.6. Para n suficientemente grande, log n < n. 1.7. Observe que n·a2n ≤ an+1 +· · ·+a2n ≤ an+1 +· · · = s−sn → 0, logo n·a2n → 0 e da´ı (2n)a2n → 0. Tamb´em n·a2n−1 ≤ an +· · ·+a2n−1 ≤ an +· · · = s−sn−1 → 0, logo n · a2n−1 → 0 donde 2n · a2n−1 → 0 e (2n − 1)a2n−1 → 0. Assim, quer n seja par quer seja ´ımpar, vale limn→∞ n · an = 0. 2.4. Observe que s2p < s4p < s6p < · · · < s5p < s3p < sp , que 2np ≤ i ≤ 1 = (2n + 1)p ⇒ s2np ≤ si ≤ s(2n+1)p e, finalmente, que s(2n+1)p − s2np < p · 2np 1 → 0. 2n P 2.5 Sejam |bn | ≤ B para todo n ≥ 0 e |an | = A. Dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n ≥ n0 ⇒ |bn | < ε/2A e |an | + |an+1 | + · · · < ε/2B. Ent˜ ao n > 2n0 ⇒ |cn | = |a0 bn + · · · + an0 bn−n0 + an0 +1 bn−n0 −1 + · · · + an b0 | ε ≤ (|a0 | + · · · + |an0 |) + (|an0 +1 | + · · · + |an |) · B 2A ε A·ε + B = ε, portanto lim cn = 0. < 2A 2B 2.7. Pela desigualdade de Cauchy-Schwarz, !2 n ∞ ∞ X X X ≤ |ai | |bi | a2i · b2i i=1

2.8.

3.3.

3.4. 3.5. 4.1.

i=1

i=1

para todo n ∈ N. P Se an ´e absolutamente convergente ent˜ ao qualquer soma finita S de termos an est´ a compreendida entre p e −q, onde, na nota¸c˜ ao da demonstra¸c˜ ao do P P Teorema 4, p = pn e q = qn . Reciprocamente, se as somas finitas de termos an P formamPum conjunto limitado ent˜ ao, em particular, as reduzidas das s´ e ries p q a o limitadas, logo estas duas s´eries s˜ ao convergentes n e n s˜ P e an converge absolutamente. N˜ ao h´ a dificuldade em usar teste de Cauchy. O teste de d’Alembert leva n o log(n+1) n a log(n+1) n = · · . O primeiro fator tem limite zero, a n+1 an n+1 n+1 log n o segundo tem limite 1/e, logo basta provar que o terceiro fator ´e limitado. Para n ≥ 3, temos [(n + 1)/n]n < n portanto (n + 1)n < nn+1 e, tomando logaritmos, n · log(n + 1) < (n + 1) log n, donde log(n + 1)/ log n < (n + 1)/n. Ent˜ ao (log(n + 1)/ log n)n < [(n + 1)/n]n < e, portanto lim(an+1 /an ) = 0. Ponha zn = x1 x2 . . . xn e use o Teorema 7. −1 < x < 1, x = 0, −∞ < x < +∞, x = 0, −1 ≤ x ≤ 1. Some os primeiros termos positivos at´e que, pela primeira vez, a soma seja ≥ |primeiro termo negativo| +1 e depois some um s´ o termo negativo. Em seguida some os termos positivos, em sua ordem, at´e que a soma pela primeira vez seja ≥ |segundo termo negativo| +2 e a´ı some um s´ o termo negativo. Prossiga. Essa ordena¸c˜ ao dos termos faz a soma da s´erie ficar +∞. Analogamente para −∞.

180

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

4.2. Ap´ os cada termo positivo ponha os 4 primeiros negativos ainda n˜ ao usados. 4.3. (a) Dado ε > 0, seja J ⊂ N finito tal que J ⊂ J ⊂ N, J finito, impliquem 1 1 P |s − n∈J an | < ε. Tome J0 ⊂ N finito tal que ϕ(J0 ) = J1 . Ent˜ ao J ⊃ J0 ⇒ ϕ(J) ⊃ ϕ(J0 ) = J1 . Portanto J0 ⊂ J ⊂ N, J finito implicam X X X bn = s − aϕ(n) = s − am < ε. s − n∈J

n∈J

m∈ϕ(J)

P (b) Por simplicidade, para cada J ⊂ N finito, seja sJ = n∈J an . Tendo em vista o Exerc´ıcio 2.8, basta provar que o conjunto das somas sJ , J ⊂ N finito, ´e limitado. Ora, P dado ε = 1, existe J0 ∈ N finito tal que J ⊃ J0 ⇒ |s − sJ | < 1. Escrevendo α = n∈J0 |an |, vˆe-se que, para todo J ⊂ N finito, vale |s − sJ | = |s − sJ∪J0 + sJ0 −J | < 1 + α, logo sJ pertence ao intervalo de centro s e raio 1 + α. P P P (c) Sejam s = an = u − v, u = pn , v = P qn , como na demonstra¸ c˜ ao P do Teorema 4. Para J ⊂ N finito, sejam s a p J = n , uJ = n e n∈J n∈J P vJ = n∈J qn , donde sJ = uJ − vJ . Dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que, pondo J0 = {1, . . . , n0 }, J ⊃ J0 ⇒ |u − uJ | < ε/2, |v − vJ | < ε/2, logo J ⊃ J0 ⇒ |s − sJ | ≤ |u − uJ | + |v − vJ | < ε.

5

Algumas No¸c˜ oes Topol´ ogicas 1.1. Para todo a ∈ int X existe, por defini¸c˜ ao, ε > 0 tal que (a − ε, a + ε) ⊂ X. Basta provar que (a − ε, a + ε) ⊂ int X. Se y ∈ (a − ε, a + ε), seja δ o menor dos n´ umeros positivos y−(a−ε), (a+ε)−y. Ent˜ ao (y−δ, y+δ) ⊂ (a−ε, a+ε) ⊂ X, logo y ∈ int X. 1.2. Se A n˜ ao fosse aberto, existiria um ponto a ∈ A que n˜ ao seria interior. Ent˜ ao, para cada n ∈ N, poder-se-ia encontrar xn ∈ (a − 1/n, a + 1/n), xn ∈ / A. Da´ı lim xn = a. Contradi¸c˜ ao. 1.5. fr X = {0, 1}, fr Y = {0, 1, 2}, fr Z = R, fr W = W . 1.6. Sejam an < bn as extremidades de In . Ent˜ ao a1 ≤ a2 ≤ · · · ≤ an ≤ · · · ≤ bn ≤ · · · ≤ b2 ≤ b1 . Se α = sup an e β = inf bn , ent˜ ao α = β ⇒ ∩In = {α} pois a interse¸c˜ ao n˜ ao ´e vazia. Se α < β ent˜ ao α < x < β ⇒ an < x < bn para todo n logo (α, β) ⊂ I. Por outro lado c < α ⇒ c < an para algum n ⇒ c ∈ / In ⇒ c ∈ / I. Analogamente β < c ⇒ c ∈ / I. Portanto (α, β) ⊂ I ⊂ [α, β]. Isto garante que I ´e um intervalo cujos extremos s˜ ao α e β. Como os In s˜ ao dois a dois distintos, pelo menos uma das seq¨ uˆencias (an ) e (bn ), digamos a primeira, tem uma infinidade de termos distintos. Ent˜ ao, para todo n ∈ N existe p ∈ N tal que an < an+p ≤ α < β ≤ bn logo α ∈ (an , bn ) ⊂ In . Portanto α ∈ I e I n˜ ao ´e um intervalo aberto. 2.1. Segue-se do Teorema 2 que D ⊂ X ´e denso em X se, e somente se, h´ a pontos de D em todo intervalo (x − ε, x + ε) com x ∈ X. Se n ´e t˜ ao grande que kn > 1/ε, os intervalos [m/kn , (m + 1)/kn ] tˆem comprimento 1/kn < ε logo, se m ´e o menor inteiro tal que x + ε ≤ (m + 1)/kn certamente m/kn ∈ (x − ε, x + ε). 2.2. Se a ∈ X ent˜ ao ou a ∈ X ou toda vizinhan¸ca de a cont´em pontos de X e de R − X (a saber, o pr´ oprio a) logo a ∈ fr X.

Se¸c˜ ao 5

Algumas no¸c˜ oes topol´ ogicas

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2.3. Dizer que a ∈ / int X significa afirmar que toda vizinhan¸ca de a cont´em pontos que n˜ ao est˜ ao em X, isto ´e, que a ∈ R − X. 2.4. Sejam X aberto e a ∈ A arbitr´ ario. Para todo ε > 0 suficientemente pequeno, (a − ε, a + ε) ⊂ X. Se nenhum desses intervalos estivesse contido em A, cada um deles conteria pontos de B e da´ı a ∈ A ∩ B, contradi¸c˜ ao. Logo existe ε > 0 tal que (a − ε, a + ε) ⊂ A e A ´e aberto. Analogamente para B. Se X ´e fechado e a ∈ A ent˜ ao a ∈ X. Mas n˜ ao pode ser a ∈ B pois isto faria A ∩ B 6= ∅. Logo a ∈ A e A ´e fechado. Analogamente para B. 2.5. Se fr X ´e vazia ent˜ ao X ⊃ fr X e X ∩ fr X = ∅, logo X ´e fechado e aberto. 2.6. De X ⊂ X ∪Y e Y ⊂ X ∪Y vem X ⊂ X ∪ Y e Y ⊂ X ∪ Y logo X ∪Y ⊂ X ∪ Y . ao a = lim zn com zn ∈ X ∪Y . Para infinitos Reciprocamente, se a ∈ X ∪ Y ent˜ ao a ∈ Y ). Logo valores de n, zn est´ a em X (donde a ∈ X) ou em Y (e ent˜ a ∈ X ∪ Y . Portanto X ∪ Y ⊂ X ∪ Y . Al´em disso, de X ∩ Y ⊂ X e X ∩ Y ⊂ Y seguem-se X ∩ Y ⊂ X e X ∩ Y ⊂ Y donde X ∩ Y ⊂ X ∩ Y . Se X = [0, 1) e Y = (1, 2] ent˜ ao X ∩ Y = ∅ logo ∅ = X ∩ Y ⊂ X ∩ Y = [0, 1] ∩ [1, 2] = {1}. ao ou a ∈ X 2.7. Evidentemente, X ∪ A ⊂ X. Reciprocamente, se a ∈ X, ent˜ ou, caso contr´ ario, toda vizinhan¸ca de a cont´em algum xn 6= a. Ponha n1 = menor n ∈ N tal que |xn − a| < 1, e uma vez definidos n1 < · · · < nk com |xni − a| < 1/i, ponha nk+1 = menor n ∈ N tal que |xn − a| < 1/(k + 1) e < |xnk − a|. Ent˜ ao lim xnk = a ∈ A. 3.2. Escolha em cada intervalo I da cole¸c˜ ao um n´ umero racional rI . A correspondˆencia I 7→ rI ´e injetiva. Como Q ´e enumer´ avel, a cole¸c˜ ao ´e enumer´ avel. 3.3. Para cada x ∈ X existe εx > 0 tal que (x − εx , x + εx ) ∩ X = {x}. Seja Ix = (x − εx /2, x + εx /2). Dados x 6= y ∈ X, seja, digamos, εx ≤ εy . Se z ∈ Ix ∩ Iy ent˜ ao |x − z| < εx /2 e |z − y| < εy /2, logo |x − y| ≤ |x − z| + |z − y| < εx /2 + εy /2 ≤ εy , donde x ∈ Iy , contradi¸c˜ ao. 3.4. Pelos dois exerc´ıcios anteriores, todo conjunto cujos pontos s˜ ao todos isolados ´e enumer´ avel. 3.5. Se a n˜ ao ´e ponto de acumula¸c˜ ao de X ent˜ ao existe um intervalo aberto I contendo a, tal que I ∩ X ⊂ {a}. Nenhum ponto de I pode ser ponto de acumula¸c˜ ao de X. Logo R − X ′ ´e aberto. Da´ı, X ′ ´e fechado. 4.1. Se a ∈ / A ent˜ ao, pelo Exerc´ıcio 1.7 do Cap´ıtulo 3, existe ε > 0 tal que nenhum ponto do intervalo (a − ε, a + ε) pertence a A. Logo A ´e fechado. 4.3. Fn = [n, +∞) e Ln = (0, 1/n). 4.4. Seja α = inf{|x − y|; x ∈ X, y ∈ Y }. Existem seq¨ uˆencias de pontos xn ∈ X e yn ∈ Y tais que lim |xn −yn | = α. Passando a uma subseq¨ uˆencia, se necess´ ario, pode-se admitir que lim xn = x0 ∈ X. Como |yn | ≤ |yn − xn | + |xn |, segue-se que (yn ) ´e uma seq¨ uˆencia limitada. Passando novamente a uma subseq¨ uˆencia, vem lim yn = y0 ∈ Y . Logo |x0 − y0 | = α. 4.5. Todo conjunto infinito limitado X admite um ponto de acumula¸c˜ ao a. Se X ´e compacto, a ∈ X. Os exemplos s˜ ao X = N e Y = {1, 1/2, . . . , 1/n, . . . }. ´ f´ 4.6. E acil provar que os conjuntos dados s˜ ao limitados. Para mostrar que S ´e fechado, suponha que lim(xn + yn ) = z, xn , yn ∈ X. Existe N′ ⊂ N infinito ao, como yn = (xn + yn ) − xn , existe tal que limn∈N′ xn = x0 ∈ X. Ent˜ ao limn∈N′ yn = y0 ∈ X e da´ı z = limn∈N′ (xn +yn ) = x0 +y0 ∈ S. A demonstra¸c˜ para D, P e Q se faz de modo an´ alogo.

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Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

5.1. Pertencem ao conjunto de Cantor os n´ umeros 1/3 = 0, 1 = 0, 0222 . . . ; 1/4 = 0, 0202 . . . ; 1/9 = 0, 01 = 0, 00222 . . . e 1/10 = 0, 00220022 . . . (desenvolvimentos na base 3). 5.2. Mostre primeiro que, dado um n´ umero da forma a = m/3n (que na base 3 tem desenvolvimento finito), existem x, y ∈ K tais que x − y = a. Depois note que, sendo K compacto, o conjunto D dos n´ umeros |x − y|, com x, y ∈ K, ´e compacto. Como as fra¸c˜ oes m/3n s˜ ao densas em [0, 1], segue-se que D = [0, 1]. 5.4. Os extremos dos intervalos omitidos s˜ ao os pontos de K que tˆem desenvolvimento finito em base 3. Os demais pontos de K s˜ ao limites destes. (Exemplo: 0, 20202 · · · = lim xn , onde x1 = 0, 2; x2 = 0, 20; x3 = 0, 202 etc.)

6

Limites de Fun¸c˜ oes 1.2. Basta provar que se xn , yn ∈ X − {a} e lim xn = lim yn = a ent˜ ao lim f (xn ) = lim f (yn ). Para tal, defina (zn ) pondo z2n−1 = xn e z2n = yn . Tem-se lim zn = a, logo (f (zn )) converge e da´ı lim f (xn ) = lim f (yn ) pois (f (xn )) e (f (yn )) s˜ ao subseq¨ uˆencias de (f (zn )). 1.5. Tome a ∈ R com sen a = c e ponha xn = 1/(a + 2πn). 2.1. Basta notar que se lim xn = a e xn > a para todo n ∈ N ent˜ ao (xn ) possui uma subseq¨ uˆencia decrescente (convergindo para a, naturalmente). 2.2. O mesmo que para o exerc´ıcio anterior. 2.5. O intervalo [−1, 1]. Com efeito, se −1 ≤ c ≤ 1, tome uma seq¨ uˆencia de n´ umeros xn < 0 com lim xn = 0 e sen(1/xn ) = c para todo n. (Como no Exerc´ıcio 1.5.) Ent˜ ao f (xn ) = c/(1 + 21/xn ) tem limite c. 3.1. Escreva p(x) = xn [(a0 /xn ) + (a1 /xn−1 ) + · · · + (an−1 /x) + an ]. 3.2. Quando 2πn − π2 ≤ x ≤ 2πn + π2 , a fun¸c˜ ao x sen x assume todos os valores de π − 2πn a π2 + 2πn. Dado c ∈ R, existe n0 ∈ N tal que π2 −2πn ≤ c ≤ 2πn + π2 2 para todo n ≥ n0 . Logo, para todo n ≥ n0 , existe xn ∈ 2πn − π2 , 2πn + π2 tal que xn sen xn = c. Ent˜ ao lim xn = +∞ e lim f (xn ) = c. 3.3. Mt e mt s˜ ao fun¸c˜ oes mon´ otonas de t (n˜ ao-crescente e n˜ ao-decrescente, respectivamente), ambas limitadas. Logo existem limt→+∞ Mt = L, limt→+∞ mt = l e limt→+∞ ωt = L − l. Como mt ≤ f (t) ≤ Mt para todo t ≥ a, se lim ωt = 0 ent˜ ao existe limx→+∞ f (x) = L = l. Reciprocamente, se limx→+∞ f (x) = A ent˜ ao, para todo ε > 0 exise t ≥ a tal que A − ε < f (x) < A + ε para todo x > t, logo Mt − mt ≤ 2ε. Segue-se que lim Mt = lim mt e lim ωt = 0.

7

Fun¸c˜ oes Cont´ınuas 1.1. Observe que ϕ(x) = 21 [f (x) + g(x) + |f (x) − g(x)|] e ψ(x) = 12 [f (x) + g(x) − |f (x) − g(x)|]. 1.2. A = A1 ∪ A2 onde A1 = {x ∈ X; f (x) < g(x)} e A2 = {x ∈ X; f (x) > g(x)} e F = F1 ∩ F2 onde F1 = {x ∈ X; f (x) ≤ g(x)} e F2 = {x ∈ X; f (x) ≥ g(x)}. 1.5. Se f ´e descont´ınua no ponto a ∈ R existem ε > 0 e uma seq¨ uˆencia (xn ) com lim xn = a e |f (xn ) − f (a)| ≥ ε para todo n ∈ N. Ent˜ ao, pondo X =

Se¸c˜ ao 7

1.7.

2.1.

2.2.

2.4.

2.5.

3.1

3.2. 3.3

3.4 3.5

Fun¸c˜ oes cont´ınuas

183

/ f (X), logo f (X) 6⊂ f (X). A rec´ıproca {x1 , . . . , xn , . . . }, tem-se a ∈ X e f (a) ∈ ´e evidente. Certamente existem ε > 0 e uma seq¨ uˆencia de pontos zn ∈ X tais que lim zn = a e |f (zn ) − f (a)| > ε para todo n ∈ N. Existe um conjunto infinito {n1 < n2 < · · · < nk < · · · } de ´ındices n para os quais a diferen¸ca f (zn ) − f (a) tem o mesmo sinal (digamos, positivo). Ent˜ ao, escrevendo xk = znk , temos f (xk ) > f (a) + ε para todo k ∈ N. Fixe a ∈ I. Pondo A = {x ∈ I; f (x) = f (a)} e B = {x ∈ I; f (x) 6= f (a)} tem-se I = A ∪ B. Como f ´e localmente constante, todo x ∈ A tem uma vizinhan¸ca disjunta de B, logo x ∈ / B. Assim A ∩ B = ∅. Analogamente, A ∩ B = ∅, portanto I = A ∪ B ´e uma cis˜ ao. Como a ∈ A, segue-se que A 6= ∅ donde A = I e f ´e constante. Suponha f n˜ ao-decrescente. Dado a ∈ int I, sejam ℓ = limx→a− f (x) e L = limx→a+ f (x). Se f ´e descont´ınua no ponto a ent˜ ao ℓ < L. Tomando x, y ∈ I com x < a < y e z 6= f (a) tal que ℓ < z < L, tem-se f (x) < z < f (y) mas z ∈ / f (I), logo f (I) n˜ ao ´e um intervalo. (Racioc´ınio an´ alogo se a ´e uma das extremidades de I.) Se f ´e descont´ınua no ponto a ∈ I, existem ε > 0 e uma seq¨ uˆencia de pontos xn ∈ I tal que lim xn = a e (digamos) f (xn ) > f (a) + ε. Fixando c ∈ (f (a), f (a) + ε), a propriedade do valor intermedi´ ario assegura, para cada n ∈ N, a existˆencia de zn entre a e xn tal que f (zn ) = c. Evidentemente o conjunto dos zn assim obtidos ´e infinito. Contradi¸c˜ ao. Defina ϕ : [0, 1/2] → R pondo ϕ(x) = f (x+1/2)−f (x). Ent˜ ao ϕ(0)+ϕ(1/2) = 0 logo existe x ∈ [0, 1/2] tal que f (x) = f (x + 1/2). No outro caso tome ψ : [0, 2/3] → R, ψ(x) = f (x+1/3)−f (x) e note que ψ(0)+ψ(1/3)+ψ(2/3) = 0 logo ψ muda de sinal e portanto se anula em algum ponto x ∈ [0, 2/3]. Fixe arbitrariamente a ∈ R. Existe A > 0 tal que a ∈ [−A, A] e |x| > A ⇒ f (x) > f (a). A restri¸c˜ ao de f ao conjunto compacto [−A, A] assume seu valor m´ınimo num ponto x0 ∈ [−A, A]. Como f (x0 ) ≤ f (a), segue-se que f (x0 ) ≤ f (x) para todo x ∈ R. Basta observar que o conjunto das ra´ızes x da equa¸c˜ ao f (x) = c ´e fechado e (como limx→+∞ f (x) = +∞ e limx→−∞ f (x) = −∞) limitado. Como o intervalo [a, b] s´ o tem dois pontos extremos, ou o valor m´ınimo ou o valor m´ aximo de f (digamos, este) ser´ a assumido num ponto c interior a [a, b] e noutro ponto d ∈ [a, b]. Ent˜ ao existe δ > 0 tal que nos intervalos [c − δ, c), (c, c + δ] e (caso d n˜ ao seja o extremo inferior do intervalo [a, b]) [d − δ, d) a fun¸c˜ ao assume valores menores do que f (c) = f (d). Seja A o maior dos n´ umeros f (c − δ), f (c + δ) e f (d − δ). Pelo Teorema do Valor Intermedi´ ario, existem x ∈ [c − δ, c), y ∈ (c, c + δ] e z ∈ [d − δ, d) tais que f (x) = f (y) = f (z) = A. Contradi¸c˜ ao. Tome x0 , x1 ∈ [0, p], pontos em que f |[0, p] assume seus valores m´ınimo e m´ aximo. Caso contr´ ario, existiria ε > 0 com a seguinte propriedade: para todo n ∈ N, haveria pontos xn , yn ∈ X com |xn − yn | ≥ ε e |f (xn ) − f (yn )| > n|xn − yn |. Passando a subseq¨ uˆencias, ter-se-ia lim xn = a ∈ X e lim yn = b ∈ X com |a − b| ≥ ε e +∞ = lim[|f (xn ) − f (yn )|/|xn − yn |] = |f (b) − f (a)|/|b − a|. Contradi¸c˜ ao.

184

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

ao cont´ınua f : X → 4.1. Se X n˜ ao ´e fechado, tome a ∈ X − X e considere a fun¸c˜ R, definida por f (x) = 1/(x − a). Como n˜ ao existe limx→a f (x), f n˜ ao ´e uniformemente cont´ınua. Por outro lado, N n˜ ao ´e compacto mas toda fun¸c˜ ao f : N → R ´e p uniformemente cont´ınua. √ 4.2. Tome xn = (n + 1/2)π e yn = nπ. Ent˜ ao lim(xn − yn ) = 0 mas |f (xn ) − f (yn )| = 1 para todo n ∈ N. 4.3. Para todo x ∈ X, tem-se ϕ(x) = f (x) pela continuidade de f . Al´em disso, se x ¯∈X ex ¯ = lim xn , xn ∈ X ent˜ ao ϕ(¯ x) = lim f (xn ). Dado ε > 0, existe δ > 0 tal que x, y ∈ X, |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < ε/2. Se x ¯, y¯ ∈ X e |¯ x − y¯| < δ, tem-se x ¯ = lim xn , y¯ = lim yn com xn , yn ∈ X. Para todo n ∈ N suficientemente grande tem-se |xn − yn | < δ logo |f (xn ) − f (yn )| < ε/2 e da´ı |ϕ(¯ x) − ϕ(¯ y )| = lim |f (xn ) − f (yn )| ≤ ε/2 < ε. Portanto ϕ : X → R ´e uniformemente cont´ınua. 4.4. Seja L = limx→+∞ f (x). Dado ε > 0 existe B > 0 tal que x ≥ B ⇒ |f (x)−L| < ε/4. Ent˜ ao x ≥ B, y ≥ B ⇒ |f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − L| + |L − f (y)| < ε/4 + ε/4 = ε/2. Analogamente, existe A > 0 tal que x ≤ −A, y ≤ −A ⇒ |f (x) − f (y)| < ε/2. Por outro lado, como [−A, B] ´e compacto, existe δ > 0 tal que x, y ∈ [−A, B], |x−y| < δ ⇒ |f (x)−f (y)| < ε/2. Se x < −A e y ∈ [−A, B], com |x − y| < δ, tem-se |f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − f (−A)| + |f (−A) − f (y)| < ε/2 + ε/2 = ε, porque | − A − y| < |x − y| < δ. Analogamente, x > B, y ∈ [−A, B] e |x − y| < δ implicam |f (x) − f (y)| < ε. Logo f ´e uniformemente cont´ınua.

8

Derivadas 1.1. Escreva f (x) = f (a)+f ′ (a)(x−a)+r(x) como no Teorema 1 e defina η : X → R (a) pondo η(x) = f ′ (a) + r(x)/(x − a) = f (x)−f se x 6= a e η(a) = f ′ (a). A x−a continuidade de η no ponto a segue-se do Teorema 1. 1.3. Note que f (yn ) − f (a) f (xn ) − f (a) f (yn ) − f (xn ) = tn · + (1 − tn ) , yn − xn yn − a xn − a onde 0 < tn < 1 para todo n. Basta tomar tn = (yn −a)/(yn −xn ). Na defini¸c˜ ao de derivada, as secantes que tendem para a tangente no ponto (a, f (a)) passam todas por este ponto. Aqui, ambas extremidades variam. 1.4. Tome f (x) = x2 sen(1/x), se x 6= 0 e f (0) = 0. Ponha xn = 1/πn e yn = 1/(n + 1/2)π. 1.5. Recaia no Exerc´ıcio 1.3. O exemplo pedido pode ser a fun¸c˜ ao f (x) = x sen(1/x) ou qualquer fun¸c˜ ao par (f (−x) = f (x)) que n˜ ao possua derivada no ponto x = 0. 2.1. Pela Regra da Cadeia, as derivadas sucessivas de f para x 6= 0 s˜ ao o pro2 duto de e−1/x por um polinˆ omio em 1/x. No ponto x = 0 tem-se f ′ (0) = 2

limh→0

e−1/h h

= 0, como se vˆe escrevendo 1/h = y. Supondo f ′ (0) = · · · =

f (n) (0) = 0 tem-se f (n+1) (0) = limh→0 2

limh→0 Q(1/h) · e−1/h = 0.

1 h

f (n) (h) = limh→0

P (1/h) h

2

· e−1/h =

Se¸c˜ ao 8

Derivadas

185

2.5. Derive k vezes em rela¸c˜ ao a t a igualdade f (tx) = tk·f (x) e obtenha f (k) (tx) · xk (k)

= k!f (x). Fa¸ca t = 0 e conclua que f (x) = f k!(0) xk . 3.1. Tome f (x) como no Exemplo 7. 3.2. Para fixar id´eias, suponha f ′′ (c) > 0. Pelo Corol´ ario 2 do Teorema 4, existe δ > 0 tal que c − δ < x < c < y < c + δ ⇒ f ′ (x) < 0 < f ′ (y). Ent˜ ao c − δ < x < c ⇒ f (x) > f (c) pois se fosse f (x) ≤ f (c), como a derivada f ′ (x) ´e negativa, o valor m´ınimo de f no intervalo [x, c] n˜ ao seria atingido nem no ponto x nem no ponto c mas num ponto z ∈ (x, c) portanto f ′ (z) = 0, contrariando o fato de z pertencer a (c − δ, c). Analogamente se mostra que c < y < c + δ ⇒ f (y) > f (c). Logo c ´e um ponto de m´ınimo local. Se fosse f ′′ (c) < 0, c seria ponto de m´ aximo local. 3.3. Pelo Corol´ ario 2 do Teorema 4, existe δ > 0 tal que c − δ < x < c < y < c + δ ⇒ f ′ (x) < 0 < f ′ (y), logo c ´e o u ´nico ponto cr´ıtico de f no intervalo (c − δ, c + δ). ′



(c) 3.4. f ′′ (c) = limn→∞ f (ccnn)−f = 0 pois f ′ (cn ) = f ′ (c) = 0 para todo n. −c 3.5. Seja M o conjunto dos pontos de m´ aximo local estrito de f . Para cada c ∈ M fixemos rc < sc racionais tais que rc < c < sc e x ∈ (rc , sc ), x 6= c ⇒ f (x) < f (c). Se d ∈ M ´e diferente de c ent˜ ao os intervalos (rc , sc ) e (rd , sd ) s˜ ao diferentes porque d ∈ / (rc , sc ) ou c ∈ / (rd , sd ). Com efeito, d ∈ (rc , sc ) ⇒ f (d) < f (c) e c ∈ (rd , sd ) ⇒ f (c) < f (d). Como Q ´e enumer´ avel, a correspondˆencia c 7→ (rc , sc ) ´e uma fun¸c˜ ao injetiva de M num conjunto enumer´ avel. Logo M ´e enumer´ avel. 4.1. Suponha A < B. Tome ε > 0 com A + ε < B − ε. Existe δ > 0 tal que c − δ ≤ x < c < y ≤ c + δ ⇒ g(x) < A + ε < B − ε < g(y). Em particular, g(c − δ) < A + ε e g(c + δ) > B − ε mas, tomando d 6= g(c) no intervalo (A + ε, B − ε), n˜ ao existe x ∈ (c − δ, c + δ) tal que g(x) = d. Pelo Teorema de Darboux, g n˜ ao ´e derivada de fun¸c˜ ao alguma f : I → R. 4.5. Um exemplo ´e f (x) = x3 . Como cada ponto de X ´e limite de pontos de Y tem-se X ⊂ Y e da´ı X ⊂ Y . Por outro lado, Y ⊂ X pelo Teorema do Valor M´edio, logo Y ⊂ X. 4.6. As hip´ oteses implicam que f ′ (x) ´e ilimitada superior e inferiormente. Com efeito, se fosse f ′ (x) ≥ A para todo x ∈ (a, b), a fun¸c˜ ao g(x) = f (x) − A · x teria derivada ≥ 0, logo seria mon´ otona, limitada, logo existiriam os limites de g(x) (e conseq¨ uentemente os de f (x)) quando x → a e x → b. Analogamente, n˜ ao se pode ter f ′ (x) ≤ B para todo x ∈ (a, b). Assim, dado qualquer c ∈ R, existem pontos x1 e x2 em (a, b) tais que f ′ (x1 ) < c < f ′ (x2 ). Pelo Teorema de Darboux, existe x ∈ (a, b) com f ′ (x) = c. 4.7. Sabe-se que f ´e n˜ ao-decrescente. Se n˜ ao fosse crescente, existiram x < y em [a, b] com f (x) = f (y) e ent˜ ao f seria constante e f ′ seria igual a zero no intervalo [x, y]. 4.8. Supondo, por absurdo, que existissem a < b em I com |f (b) − f (a)| = α > 0, em pelo menos uma das metades do intervalo [a, b], digamos [a1 , b1 ], ter´ıamos |f (b1 )−f (a1 )| ≥ α/2. Prosseguindo analogamente chegar-se-ia a uma seq¨ uˆencia de intervalos [a, b] ⊃ [a1 , b1 ] ⊃ · · · ⊃ [an , bn ] ⊃ · · · com bn − an = (b − a)/2n e |f (bn ) − f (an )| ≥ α/2n . Se an ≤ c ≤ bn para todo n, vale |f ′ (c)| = lim |f (bn ) − f (an )|/(bn − an ) ≥ α/(b − a) > 0.

186

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

4.10. Para todo x 6= c em (a, b) existe z entre x e c tal que [f (x)−f (c)]/(x−c) = f ′ (z). Portanto f ′ (c) = limx→c [f (x) − f (c)]/(x − c) = limx→c f ′ (z) = L. 4.11. Como f ′ ´e limitada, existem limx→a+ f (x) e limx→b− f (x). Para que valha a propriedade do valor intermedi´ ario para f , tais limites devem ser iguais a f (a) e f (b) respectivamente. (Cfr. solu¸c˜ ao de 4.1.) 4.12. |f (x) − f (a)|/|x − a| ≤ c · |x − a|α−1 . Como α − 1 > 0, segue-se que f ′ (a) = 0 para todo a ∈ I. Logo f ´e constante. 4.13. Observe que [f (yn ) − f (xn )]/(yn − xn ) = f ′ (zn ) com zn entre xn e yn , logo zn → a. Pela continuidade de f ′ no ponto a, o quociente tende para f ′ (a).

9

F´ ormula de Taylor e Aplica¸c˜ oes da Derivada 1.1. Seja f (x) = 1/(1 − x), −1 < x < 1. Pondo p(h) = 1 + h + · · · + hn e r(h) = hn+1 /(1 − h) tem-se r(h) = f (h) − p(h). Como p(h) ´e um polinˆ omio de grau n e limh→0 r(h)/hn = 0, segue-se que p(h) ´e o polinˆ omio de Taylor de f no ponto 0, logo f (i) (0) = i! para i = 0, 1, . . . , n. 1.2. Como f (x) = x5 − x11 + · · · + (−1)n x6n+5 + (−1)n+1 x6n+11 /(1 + x6 ), segue-se que f (i) (0) = 0 se i n˜ ao ´e da forma 6n + 5 enquanto que f (i) (0) = (−1)n i! se i = 6n + 5. Logo f (2001) (0) = 0 e f (2003) (0) = (−1)333 · (2003)! = −2003! 1.3. Tem-se f (x) = pn (x) + rn (x) onde pn (x) ´e o polinˆ omio de Taylor de ordem n de f em torno do ponto x0 e, pela f´ ormula do resto de Lagrange, existe z entre x e x0 tal que rn (x) = f (n+1) (z)(x − x0 )n+1 /(n + 1)!, logo |rn (x)| ≤ K|x − x0 |n+1 /(n + 1)!. Segue-se que limn→∞ rn (x) = 0 para todo x ∈ I e o resultado fica estabelecido. 1.4. Veja “Curso de An´ alise”, vol. 1, p´ agina 287. 1.5. Se f ∈ C 2 , escreva f (x) = f (a) + f ′ (a)(x − a) +

1.7.

2.2. 2.3.

− a)2 + r(x), onde ′′

limx→a r(x)/(x − a) = lim r (x)/(x − a) = 0. Ent˜ ao ϕ(x) = f ′ (a) + f 2(a) (x − ′ ′′ ′ a) + r(x)/(x − a) e ϕ (x) = f (a)/2 + r (x)/(x − a) − r(x)/(x − a)2 , logo limx→a ϕ′ (x) = f ′′ (a)/2. Segue-se do Exerc´ıcio 4.10 do Cap´ıtulo 8 que ϕ ∈ C 1 . Para f ∈ C 3 , proceda de modo an´ alogo. Pela F´ ormula de Taylor Infinitesimal, pondo x = a + h, ou seja x − a = h, Pn (i) i pode-se escrever p(a + h) = i=0 (p (a)/i!)h + r(h), onde r(h) tem suas primeiras n derivadas nulas no ponto 0. Como r(h) ´e um polinˆ omio de grau ≤ n (diferen¸ca entre dois polinˆ omios), segue-se que r(h) ´e identicamente nulo. Seja ϕ(x) = f (x) − g(x). Ent˜ ao ϕ : I → R ´e duas vezes deriv´ avel no ponto a, com ϕ(x) ≥ 0 para todo x ∈ I e ϕ(a) = ϕ′ (a) = 0. Ent˜ ao ϕ(x) = r(x) ϕ′ (a)(x − a) + 21 ϕ′′ (a)(x − a)2 + r(x) com limx→a (x−a) ı ϕ(x) = 2 = 0. Da´  ′′ r(x)  ′′ (x − a)2 ϕ 2(a) + (x−a) . Se fosse ϕ (a) < 0 existiria δ > 0 tal que, para 2 0 < |x − a| < δ, a express˜ ao dentro dos colchetes, e conseq¨ uentemente ϕ(x), seria < 0. Contradi¸c˜ ao. Logo deve ser ϕ′′ (a) ≥ 0, isto ´e, f ′′ (a) ≥ g ′′ (a). Para fixar id´eias, seja f ′′ (c) > 0. Existe δ > 0 tal que c − δ < x < c + δ ⇒ f ′′ (x) > 0. Ent˜ ao f ´e convexa no intervalo (c − δ, c + δ). A soma de duas fun¸c˜ oes convexas ´e convexa mas o produto, nem sempre. Exemplo: (x2 − 1) · x2 . 2

1.6.

f ′′ (a) (x 2



Se¸c˜ ao 10

A integral de Riemann

187

2.4. Se f ´e convexa, seja X = {x ∈ I; f (x) ≤ c}. Dados x, y ∈ X e x < z < y, tem-se z = (1 − t)x + ty, com 0 ≤ t ≤ 1. Ent˜ ao f (z) = f ((1 − t)x + ty) ≤ (1 − t)f (x) + t(f (y)) ≤ (1 − t)c + tc = c, logo z ∈ X. Assim, X ´e um intervalo e f ´e quase-convexa. 2.5. Sejam c = max{f (x), f (y)} e z = (1 − t)x + ty com 0 ≤ t ≤ 1. Ent˜ ao f (x) ≤ c, f (y) ≤ c e z pertence ao intervalo cujos extremos s˜ ao x, y. Logo f (z) ≤ c. 2.6. Se o m´ınimo de f ´e atingido no ponto a ent˜ ao, dados x < y em [a, b], tem-se x ∈ [a, y] logo f (x) ≤ max{f (a), f (y)} = f (y) portanto f ´e n˜ ao-decrescente. Analogamente, se o m´ınimo de f ´e atingido no ponto b ent˜ ao f ´e n˜ ao-crescente. Da´ı se segue que se f atinge seu m´ınimo no ponto c ∈ (a, b) ent˜ ao f ´e n˜ aocrescente em [a, c] e n˜ ao-decrescente em [c, b]. 2.8. A existˆencia de c decorre do Teorema do Valor Intermedi´ ario. Resta provar a unicidade. Se existissem c1 , c2 tais que a < c1 < c2 < b e f (c1 ) = f (c2 ) = 0, seria c1 = ta + (1 − t)c2 com 0 < t < 1. Pela convexidade de f , viria ent˜ ao 0 = f (c1 ) ≤ tf (a) + (1 − t)f (c2 ), donde tf (a) ≥ 0, contradi¸c˜ ao. 3.1. Basta provar que x ∈ I ⇒ f (x) ∈ I. Ora x ∈ I ⇒ |x − a| ≤ δ ⇒ |f (x) − a| ≤ |f (x) − f (a)| + |f (a) − a| ≤ k|x − a| + (1 − k)δ ≤ kδ + (1 − k)δ = δ ⇒ f (x) ∈ I. 3.2. a = 0, 76666469. 3.3. Use o Exerc´ıcio 3.1. 3.4. Note que |f ′ (x)| ≤ 1/a < 1.

10

A Integral de Riemann

2.1. Dado ε > 0 existe n ∈ N tal que 1/2n < ε/2. A restri¸c˜ ao f1 , de f ao intervalo [1/2n , 1], ´e uma fun¸c˜ ao-escada, portanto integr´ avel. Existe ent˜ ao uma parti¸c˜ ao P1 deste intervalo tal que S(f1 ; P1 ) − s(f1 ; P1 ) < ε/2. A parti¸c˜ ao P = P1 ∪ {0} do intervalo [0, 1] cumpre S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε. Ra R0 ao 2.2. Se f ´e ´ımpar, basta provar que −a f (x)dx = − 0 f (x)dx. Ora, a cada parti¸c˜ P de [0, a] corresponde uma parti¸c˜ ao P de [−a, 0], obtida trocando-se os sinais dos pontos de divis˜ ao. Como f (−x) = −f (x), se no intervalo [ti−1 , ti ] de P o inf e o sup de f s˜ ao mi e Mi , ent˜ ao, no intervalo [−ti , −ti−1 ], o inf e o sup de f s˜ ao, respectivamente, −Mi e −mi . Portanto S(f ; P ) = −s(f ; P ) e ao. Analogamente s(f ; P ) = −S(f ; P ). Da´ı resulta imediatamente a proposi¸c˜ para o caso de f par. 2.3. Evidentemente, f ´e descont´ınua nos racionais. Seja c ∈ [a, b] irracional. Dado ε > 0, o conjunto dos n´ umeros naturais q ≤ 1/ε, e portanto o conjunto dos pontos x = p/q ∈ [a, b] tais que f (x) = 1/q ≥ ε, ´e finito. Seja δ > 0 a menor distˆ ancia de c a um desses pontos. Ent˜ ao x ∈ (c − δ, c + δ) ⇒ 0 ≤ f (x) < ε e f ´e cont´ınua no ponto c. Toda soma inferior s(f ; P ) ´e zero pois todo intervalo Rb n˜ ao-degenerado cont´em n´ umeros irracionais. Logo a f (x)dx = 0. Quanto ` a ¯

integral superior, dado ε > 0, seja F = {x1 , . . . , xn } o conjunto dos pontos de [a, b] para os quais se tem f (xi ) ≥ ε/2(b − a). Com centro em cada xi tome um intervalo de comprimento < ε/2n, escolhido de modo que esses n intervalos sejam 2 a 2 disjuntos. Os pontos a, b, juntamente com os extremos desses

188

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

intervalos que estejam contidos em [a, b], constituem uma parti¸c˜ ao P tal que R¯b S(f ; P ) < ε. Logo a f (x)dx = 0. 2.4. Seja m = f (c)/2. Existe δ > 0 tal que f (x) > m para todo x ∈ [c − δ, c + δ]. Ent˜ ao, para toda parti¸c˜ ao PR que contenha os pontos c − δ e c + δ, tem-se b s(f ; P ) > 2mδ. Segue-se que a f (x)dx ≥ s(f ; P ) > 0. 2.5. Para toda parti¸c˜ ao P de [a, b] vale s(ϕ; P ) = s(g; P ) e S(ϕ; P ) = S(g; P ) + Rb Rb Rb Rb (b − a). Logo a ϕ(x)dx = a g(x)dx e ¯a ϕ(x)dx = a g(x)dx + (b − a). Em ¯

particular, para g(x) = x,

Rb

¯

(b − a). 3.1. Para x, y ∈ [a, b],

a

Rb ϕ(x)dx = (b2 − a2 )/2 e ¯a ϕ(x)dx = (b2 − a2 )/2 +

Z |F (x) − F (y)| =

y x

f (t) dt ≤ M · |x − y|,

onde M = sup{|f (t)|; t ∈ [a, b]}. 3.2. ϕ = 12 [f +g+|f −g|], ψ = 21 [f +g−|f −g|], f+ = max{f, 0} e f− = − min{f, 0}. 3.3. A desigualdade de Schwarz para integrais resulta R b do fato de que, no espa¸co vetorial das fun¸c˜ oes cont´ınuas em [a, b], hf, gi = a f (x)g(x)dx define um produto ´ interno. Para os leitores n˜ ao familiarizados ainda com Algebra Linear, esta desigualdade pode ser provada com o argumento usado no ıcio R b Cap´ıtulo 2, Exerc´ 2.7, considerando o trinˆ omio do segundo grau p(λ) = a (f (x) + λg(x))2 dx. 4.1. O conjunto dos pontos da descontinuidade de f ´e Q∩[a, b], portanto enumer´ avel e conseq¨ uentemente de medida nula. 4.2. Dada a fun¸c˜ ao mon´ otona f : [a, b] → R, basta provar que o conjunto D dos pontos de descontinuidades de f em (a, b) ´e enumer´ avel. Para cada x ∈ D, sejam ax o menor e bx o maior dos trˆes n´ umeros limy→x− f (y), limy→x+ f (y) e f (x). Como f ´e descont´ınua no ponto x, tem-se ax < bx . Al´em disso, como f ´e mon´ otona, se x 6= y em D ent˜ ao os intervalos abertos (ax , bx ) e (ay , by ) s˜ ao disjuntos. Para cada x ∈ D escolha um n´ umero racional r(x) ∈ (ax , bx ). A fun¸c˜ ao x 7→ r(x), de D em Q, ´e injetiva logo D ´e enumer´ avel. 4.3. Todos os pontos do conjunto D − D′ s˜ ao isolados, logo este conjunto ´e enumer´ avel, em virtude do Exerc´ıcio 3.4, Cap´ıtulo 5. Segue-se que D ´e enumer´ avel, pois D ⊂ (D − D′ ) ∪ D′ . 4.4. A fun¸c˜ ao f : [0, 1] → R, igual a 1 nos racionais e 0 nos irracionais, anula-se fora de um conjunto de medida nula mas n˜ ao ´e integr´ avel. Por outro lado, se f : [a, b] → R ´e integr´ avel e igual a zero fora de um conjunto de medida nula, ent˜ ao em qualquer subintervalo de [a, b] o ´ınfimo de |f | ´e zero, logo Rb Rb |f (x)|dx = 0 donde a f (x)dx = 0. a ¯

4.5. (a) Se X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik ent˜ ao X ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jk , onde aberto P Jj ´e o intervalo P de mesmo centro e comprimento dobro de Ij . Logo |Ij | < ε ⇒ |Jj | < 2ε. udo nulo. Segue-se que X tem conte´ (b) Todo conjunto de conte´ udo nulo ´e limitado, logo o conjunto Q, que tem medida nula, n˜ ao tem conte´ udo nulo. Al´em disso, Q ∩ [a, b], embora seja limitado, tem medida nula mas n˜ ao tem conte´ udo nulo, em virtude do

Se¸c˜ ao 11

C´ alculo com integrais

189

item (a), pois seu fecho ´e [a, b], cujo conte´ udo n˜ ao ´e nulo. (c) Use Borel-Lebesgue. (d) A diferen¸ca g − f : [a, b] → R ´e igual a zero exceto num conjunto X, de conte´ udo nulo. Seja M = supX |g − f |. Todas as somas inferiores de |g − f | s˜ ao zero. Quanto ` as somas superiores, dado ε > 0, existem intervalos abertos I1 , . . . , Ik tais que X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik e |I1 | + · · · + |Ik | < ε/M . Sem perda de generalidade, podemos supor que os intervalos Ij est˜ ao contidos em [a, b]. As extremidades desses intervalos, juntamente com a e b, formam uma parti¸c˜ ao P de [a, b]. Os intervalos dessa parti¸c˜ ao que contˆem pontos de X s˜ ao os Ij . Como Rb P |Ij | < ε/M , segue-se que S(|g−f |; P ) < ε. Conseq¨ uentemente ¯a |g−f | = 0. Da´ı g − f ´e integr´ avel e sua integral ´e zero. Finalmente, g = f + (g − f ) ´e Rb Rb integr´ avel e a g = a f .

11

C´ alculo com Integrais

1.2. Dada qualquer parti¸c˜ ao PP= {t0 , . . . , tn } do intervalo cujos extremos s˜ ao c e x, tem-se f (x) − f (c) = [f (ti ) − f (ti−1 )]. Use o Teorema do Valor M´edio em cada f (ti ) − f (ti−1 ) e conclua que s(f ′ ; P ) ≤ f (x) − f (c) ≤ S(f ′ ; P ) para qualquer parti¸c˜ ao P . 1.3. Sabe-se que f ´e n˜ ao-decrescente. Se f n˜ ao fosse crescente existiriam x < y em [a, b] com f (x) = f (y). Ent˜ ao f seria constante e f ′ seria nula no intervalo [x, y], que n˜ ao tem conte´ udo nulo. Rb 1.4. f (b) − f (a) = a f ′ (x)dx = f ′ (c) · (b − a), a < c < b. R β(x) R α(x) 1.5. Fixando c ∈ (a, b) tem-se ϕ(x) = c f (t)dt − c f (t)dt. Basta ent˜ ao R α(x) considerar ϕ(x) = f (t)dt. Ora, ϕ = F ◦ α, onde F : [a, b] → R ´ e dada por c Rx F (x) = c f (t)dt. Usar a Regra da Cadeia. 1.7. Use integra¸c˜ ao por partes. 2.2. Basta provar que se f ´e ilimitada ent˜ ao, para toda parti¸c˜ ao PPe todo n´ umero A > 0 existe uma parti¸c˜ ao pontilhada P ∗ = (P, ξ) tal que | (f ; P ∗ )| > A. Com efeito, dada P , em pelo menos um dos seus intervalos, digamos [ti−1 , ti ], f ´e ilimitada. Fixando primeiro os P pontos ξj nos demais intervalos, pode-se escolher ξi ∈ [ti−1 , ti ] de modo que | (f ; P ∗ )| > A. P 2.3. Dado ε > 0, existe P = {t0 , . . . , tn } tal que | (f ; P ∗ ) − L| < ε/4 seja qual for o modo de pontilhar P . Fixe P e a pontilhe de 2 modos. Primeiro escolha em cada [ti−1 , ti ] um ponto ξi tal que f (ξi ) < mi +ε/4n(ti −ti−1 ), obtendo P ∗ com P ∗ # P(f ; P #) < s(f ; P ) + ε/4. Analogamente, P obtenha PP tal∗ que S(f ; P ) − ε/4 < # s(f ; P ) < (f ; P ) − (fP ; P ) + ε/2. P Mas, como P(f ; P ). Da´ı S(f ; P ) −P | (f ; P ∗ ) − L| < ε/4 e | (f ; P # ) − L| < ε/4, vale (f ; P # ) − (f ; P ∗ ) < Rb ε/2. Logo S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε e f ´e integr´ avel. Evidentemente a f (x)dx = L, pelo Teorema 7. P P P 2.4. f (ξi )g(ηi )(ti − ti−1 ) = f (ξi )g(ξi )(ti − ti−1 ) + f (ξi ) · [g(ηi ) − g(ξi )](ti − ti−1 ). A segunda parcela do segundo membro tende a zero quando |P | → 0 pois |f (ξi )| ≤ M . Rb 2.7. Pelo Exerc´ıcio  12.6,  − a) = limn→∞ M (f ; n). Como Pn a f (x)dx/(b P f ´e convexa, M (f ; n) ≥ f n i=1 (a + ih) onde h = (b − a)/n. Ora, n1 n i=1 (a + ih) =

190

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

n−1 n

· a+b + nb → (a + b)/2 quando n → ∞. 2 3.1. Para todo x ∈ R, f (x) = f (x/2 + x/2) = f (x/2)2 ≥ 0. Se existisse c ∈ R com f (c) = 0 ent˜ ao f (x) = f (x − c)f (c) = 0 para todo x ∈ R. Logo f (x) > 0 qualquer que seja x. Al´em disso, f (0) = f (0 + 0) = f (0) · f (0), logo f (0) = 1. Tamb´em f (−x)f (x) = f (−x + x) = f (0) = 1, portanto f (−x) = f (x)−1 . Da´ı f (p · x) = f (x)p para todo p ∈ Z. E, para todo q ∈ N, f (x) = f (x/q+· · ·+x/q) = f (x/q)q , donde f (x/q) = f (x)1/q . Ent˜ ao, para todo r = p/q ∈ Q, com q ∈ N, tem-se f (r) = f (p/q) = f (1/q)p = f (1)p/q = f (1)r . Seja f (1) = ea . Segue-se que f (r) = ear para todo r ∈ Q. Como f ´e cont´ınua, tem-se f (x) = eax para todo x ∈ R. A segunda parte se prova de modo an´ alogo (v. Corol´ ario 1 do Teorema 8) ou usando o fato de que exp e log s˜ ao inversas uma da outra. 3.2. Como xn − xn+1 = log(1 + 1/n) − 1/(n + 1), basta observar que, no intervalo [1, 1 + 1/n] o m´ınimo da fun¸c˜ ao 1/x ´e n/(n + 1) logo log(1 + 1/n) = R 1+1/n 1 n 1 dx/x > n n+1 = n+1 · 1 3.3. Pondo x = 1/y, tem-se limx→0 x · log x = limy→∞

− log y = 0. y 1/y x

3.4. Pondo x/n = y, vem (1 + x/n)n = (1 + y)x/y = [(1 + y) ] logo limn→∞ (1 + x/n)n = limy→0 [(1 + y)1/y ]x = ex . 4.1. Divergente, divergente e convergente. 4.2. As trˆes convergem. P n e o valor absoluto de 4.3. A integral em quest˜ ao vale ∞ n=0 (−1) an onde an ´ √ Z (n+1)π

√ nπ

sen(x2 ) dx.

p √ Como | sen(x2 )| ≤ 1, tem-se 0 < an ≤ (n + 1)π − nπ logo lim an√= 0. Na integral cujo ca a mudan¸cp a de vari´ avel x = u2 + π, n+1 , fa¸ √ valor absoluto ´e ap √ 2 + π, note que u (n + 1)π ≤ x ≤ (n + 2)π ⇔ nπ ≤ u ≤ dx = udu/ p √ (n + 1)π e que 0 < u/ u2 + π < 1 e conclua que an+1 < an . Pelo Teorema de Leibniz, a integral ao | sen(x2 )| na metade p converge. A concavidade da fun¸c˜ √ do intervalo [ nπ, (n + 1)π] mostra que an ´e maior do que a metade daP ´ area do triˆ angulo is´ osceles de base neste intervalo e altura 1. Logo a s´ e rie an R +∞ diverge e a integral 0 | sen(x2 )|dx tamb´em. √ 4.4. O m´etodo ´e o mesmo do exerc´ıcio anterior. Escrevendo a = 4 nπ e b = p R b 4 (n + 1)π tem-se a |x sen(x4 )|dx < ´ area do retˆ angulo cuja base ´e o intervalo [a, b] e cuja altura mede b. Como b4 − a4 = π = (b − a)(a3 + a2 b + ab2 + b3 ), essa ´ area vale b(b − a) = bπ/(a3 + a2 b + ab2 + b3 ) logo tende√a zero quando n → ∞. Pondo c4 = (n + 2)π, a mudan¸ca de vari´ avel x = 4 u4 + π mostra Rc Rb 2 4 4 u du logo an+1 < an = que an+1 = b |x sen(x )|dx = a |u sen(u )| √ 4 (u4 +π)2 Rb P ∞ n |x sen(x4 )|dx. Pelo Teorema de Leibniz, a s´erie n=0 (−1) an converge a para o valor da integral em quest˜ ao. Rx 4.5. Seja ϕ(x) = a f (t)dt, x ≥ a. Por hip´ otese, existe L = limx→+∞ ϕ(x). Logo, dado ε > 0, existe A > 0 tal que x > A ⇒ L−ε < ϕ(x)R < L. Da´ı x > 2A ⇒ L− x ε < ϕ(x/2) < ϕ(x) < L, donde ε > ϕ(x) − ϕ(x/2) = x/2 f (t)dt ≥ (x/2) · f (x) pois f ´e n˜ ao-crescente. Logo limx→+∞ (x/2)f (x) = 0 e o resultado segue-se.

Se¸c˜ ao 12

Seq¨ uˆ encias e s´ eries de fun¸c˜ oes

191

Rt 4.6. Defina ϕ : [a, +∞) → R pondo ϕ(t) = a f (x)dx. Para t ≥ a, sejam Mt = sup{ϕ(x); x ≥ t}, mt = inf{ϕ(x); x ≥ t} e ωt = Mt − mt . Ent˜ ao ωt = sup{|ϕ(y) − ϕ(x)|; x, y ≥ t}. (Cfr. Lema 3, Se¸c˜ ao 1, Cap´ıtulo 10.) A condi¸c˜ ao enunciada equivale a afirmar limt→+∞ ωt = 0. O resultado segue-se ent˜ ao do Exerc´ıcio 3.3, Cap´ıtulo 6.

12

Seq¨ uˆ encias e S´ eries de Fun¸c˜ oes

1.1. Tem-se lim fn = f , onde f (x) = 0 se 0 ≤ x < 1, f (1) = 1/2 e f (x) = 1 se x > 1. 1.2. A convergˆencia fn → f ´e mon´ otona tanto em [0, 1 − δ] como em [1 + δ, +∞). Pelo Teorema de Dini, a convergˆencia ´e uniforme em [0, 1−δ] porque este intervalo ´e compacto. No outro intervalo, basta observar que cada fn ´e crescente, logo fn (1 + δ) > 1 − ε ⇒ fn (x) > 1 − ε para todo x ≥ 1 + δ. 1.3. Seja ao x |x| ≤ a < 1. E |x| ≤ a < 1 ⇒ P∈ [−1 +i δ, 1 −Pδ] significa P a =i 1 − δ. iEnt˜ i n a = 2a /(1 − a). Logo, para todo |x| ≤ 2 |x (1 − x )| ≤ 2 i≥n i≥n i≥n P i ε > 0 existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ i≥n |x (1 − xi )| < ε, o que assegura a convergˆencia uniforme. A afirma¸c˜ ao inicial ´e clara. 1.4. A necessidade da condi¸c˜ ao ´e evidente. Quanto ` a suficiˆencia, observar que, para todo x ∈ X, a seq¨ uˆencia de n´ umeros reais fn (x), n ∈ N, ´e de Cauchy logo, pelo Exerc´ıcio 2.7 do Cap´ıtulo 3, existe limn→∞ fn (x) = f (x). Isto define numa fun¸c˜ ao f : X → R e fn → f simplesmente. Para provar que a convergˆencia ´e uniforme, tome ε > 0 e obtenha n0 ∈ N tal que m, n > n0 ⇒ |fm (x) − fn (x)| < ε/2 para todo x ∈ X. Fixe n > n0 e fa¸ca m → ∞ nesta desigualdade. Conclua que n > n0 ⇒ |f (x) − fn (x)| ≤ ε/2 < ε para todo x ∈ X. 1.5. Se fn → f uniformemente em X ent˜ ao, dado ε = 1, existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ | |fn (x)| − |f (x)| | ≤ |fn (x) − f (x)| < 1 para todo x ∈ X. Logo n > n0 ⇒ |fn (x)| < |f (x)| + 1 e |f (x)| < |fn (x)| + 1. Da´ı segue-se o resultado. 1.6. Adapte a demonstra¸c˜ ao do Teorema de Leibniz (Teorema 3, Cap´ıtulo 4). P∞ 1.7. Para todo x ∈ X, a s´erie n=1 fn (x) converge, logo faz sentido considerar rn (x) = fn (x) + fn+1 (x) + · · · . Como |rn (x)| ≤ Rn (x) = |fn (x)|P + |fn+1 (x)| + · · · , segue-se que limn→∞ rn (x) = 0 uniformemente em X, logo fn converge uniformemente. 2.1. Note que |fn (x) + gn (x) − (f (x) + g(x))| ≤ |fn (x) − f (x)| + |gn (x) − g(x)|, que |fn (x)gn (x) − f (x)g(x)| ≤ |fn (x)| |gn (x) − g(x)| + |g(x)| · |fn (x) − f (x)|, e que |1/gn (x) − 1/g(x)| = (1/|g(x)gn (x)|) · |gn (x) − g(x)|. √ 2.3. Como fn′ (x) = n·cos(nx), s´ o existe limn→∞ fn′ (x) quando limn→∞ cos(nx) = 0. Levando em conta que cos(2nx) = cos2 (nx) − sen2 (nx), fazendo n → ∞ obter-se-ia 0 = −1. Logo limn→∞ fn′ (x) n˜ ao existe, seja qual for x ∈ [0, 1]. 2.6. O conjunto f (X) ´e compacto, disjunto do conjunto fechado R − U . Pelo Exerc´ıcio 4.4 do Cap´ıtulo 5, existe ε > 0 tal que x ∈ X, y ∈ R − U ⇒ |f (x) − y| ≥ ε, logo x ∈ X, |f (x) − z| < ε ⇒ z ∈ U . Tome n0 ∈ N tal que |fn (x) − f (x)| < ε para todo n > n0 e todo x ∈ X. Ent˜ ao fn (X) ⊂ U se n > n0 . 2.7. Dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que m, n > n0 ⇒ |fm (d) − fn (d)| < ε/2 para todo d ∈ D, logo |fm (x) − fn (x)| ≤ ε/2 < ε para todo x ∈ X porque x ´e limite

192

2.8. 2.9. 2.10. 3.1.

3.2.

3.3. 3.4. 3.5.

Sugest˜ oes e Respostas

Cap. 13

de uma seq¨ uˆencia de pontos de D. Pelo crit´erio de Cauchy (Exerc´ıcio 1.4), (fn ) converge uniformemente em X. Integre fn por partes e fa¸ca n → ∞. Adapte a demonstra¸c˜ ao do teste de Cauchy, usando, se desejar, o Teorema 5. Adapte a demonstra¸c˜ ao do teste de d’Alembert, usando, se desejar, o Teorema 5. Sejam a, b tais que a < 1/r < b. Ent˜ / R portanto pao r < 1/a, logo 1/a ∈ existem infinitos ´ındices n tais que a ≤ n |an |. Al´em disso, 1/b < r, logo existe ρ ∈ R tal que 1b < ρ < r. Assim, para todo n suficientemente grande, tem-se p n |an | < 1/ρ < umero finito de ´ındices n p b. Noutras palavras, apenas um n´ ´eptal que b ≤ n |an |. Da´ı resulta que 1/r ´e valor de aderˆencia da seq¨ uˆencia n |an | e nenhum n´ umero maior do que 1/r tem a mesma propriedade. P P Tem-se an x2n = bn xnponde b2n = an e b2n−1 = 0. Assim os termos de ordem ´ımpar da seq¨ uˆencia n |bn | s˜ ao iguais a zero e os de ordem par formam a qp p √  n |an |, cujo limite ´e L. Portanto, a seq¨ uˆencia n |bn | tem dois seq¨ uˆencia √ valores 0 e L. Pelo exerc´ıcio anterior, o raio de convergˆencia √ P de2naderˆencia: de an x ´e 1/ L. Racioc´ınio an´ alogo para a outra s´erie. P n2 n O raio de convergˆencia de a x ´e +∞ se |a| < 1, ´e 0 se |a| > 1, e ´e igual a 1 se |a| = 1. Use o Corol´ ario 2 do Teorema 9 (unicidade da representa¸c˜ ao em s´erie de potˆencias). Veja o Exerc´ıcio 3.7, Cap´ıtulo 3.

Sugest˜ oes de Leitura Para aprofundar e complementar alguns dos t´ opicos abordados neste livro, a referˆencia natural ´e: 1. E. L. Lima, Curso de An´ alise, vol. 1, (11a¯ edi¸c˜ ao), Projeto Euclides, IMPA, 2004. Para uma apresenta¸c˜ ao de logaritmos, na mesma ordem de id´eias do texto, por´em em n´ıvel bem mais elementar, com numerosos exemplos e aplica¸c˜ oes, veja-se: 2. E. L. Lima, Logaritmos, Sociedade Brasileira de Matem´ atica, Rio de Janeiro, 1994. Outros livros que muito podem ajudar a compreender os assuntos aqui estudados, tratando-os de outras maneiras e tocando em pontos que n˜ ao foram aqui considerados s˜ ao: 3. R. G. Bartle, Elementos de An´ alise Real, Editora Campus, Rio de Janeiro, 1983. 4. D. G. Figueiredo, An´ alise I, L.T.C., Rio de Janeiro, 1995 (2a¯ edi¸c˜ ao). 5. P. R. Halmos, Teoria Ingˆenua dos Conjuntos, Ed. USP, S˜ ao Paulo, 1970. ´ 6. A. Hefez, Algebra, vol. 1, Cole¸c˜ ao Matem´ atica Universit´ aria, IMPA, Rio de Janeiro, 1997 (2a¯ edi¸c˜ ao). ´ 7. L.H. Jacy Monteiro, Elementos de Algebra, Ao Livro T´ecnico S.A., Rio de Janeiro, 1969. 8. W. Rudin, Princ´ıpios de An´ alise Matem´ atica, Ed. UnB. e Ao Livro T´ecnico, Rio de Janeiro, 1971. 9. M. Spivak, C´ alculo Infinitesimal, 2 volumes, Editorial Revert´e, Barcelona, 1970. S˜ ao recomend´ aveis ainda: 10. R. Courant, Differential and Integral Calculus, vol. 1, Interscience, N. York, 1947. (Em inglˆes.) 11. O. Forster, Analysis 1, Vieweg, Braunschweig, 1987. (Em alem˜ ao.) 12. S. Lang, Analysis I, Addison-Wesley, Reading Massachussets, 1969. (Em inglˆes.)

´Indice Remissivo

194

´Indice Remissivo Adi¸c˜ao de n´ umeros naturais, 2 de n´ umeros reais, 12 Associatividade, 12 Axiomas de Peano, 2

Contra¸c˜ao, 113 Convergˆencia de s´eries, 38 de seq¨ uˆencias, 25 mon´otona, 160 simples, 156 uniforme, 157 Corpo arquimediano, 18 ordenado completo, 18 Crit´erio de Cauchy, 35 Crit´erio de Cauchy para convergˆencia uniforme, 172 para integrais impr´oprias, 155 Crit´erio de compara¸c˜ao para integrais, 150 para s´eries, 39

Boa ordena¸c˜ao, 9 Cis˜ao, 52 Cobertura, 55 aberta, 55 Comutatividade, 12 Condi¸c˜ao de integrabilidade, 126, 135 Conjunto aberto, 49 compacto, 54 de Cantor, 56 de conte´ udo nulo, 135 de medida nula, 131 denso, 51 discreto, 53 enumer´avel, 7 fechado, 50 finito, 4 infinito, 6 limitado, 6, 17 Constante de Euler-Mascheroni, 155 Constante de Lipschitz, 84 Contagem, 4

Deriva¸c˜ao termo a termo, 162, 166 Derivada, 91 de ordem n, 104 lateral, 92 Desigualdade de Bernoulli, 15 de Schwarz, 135 Diferen¸ca, 13 Distributividade, 12 195

196 Divis˜ao, 13 Elemento m´ aximo, 17 neutro, 12 Enumera¸c˜ao, 7 Express˜ ao indeterminada, 73 F´ormula de Leibniz para π, 172 de Taylor com resto integral, 140 de Taylor infinitesimal, 106 de Taylor, com resto de Lagrange, 107 do valor m´edio para integrais, 139 Fecho, 50 Fra¸c˜ao cont´ınua, 36 Fronteira, 59 Fun¸c˜ao n vezes diferenci´ avel, 104 cˆoncava, 111 cont´ınua, 76 cont´ınua ` a direita, 92 convexa, 108 de classe C 1 , 91 de classe C 2 , 100 de classe C n , 104 deriv´avel, 91 derivada, 91 descont´ınua, 75 escada, 128 exponencial, 144 gama, 150 integr´avel, 125 lipschitziana, 84 localmente constante, 88 mon´otona, 70

´Indice Remissivo

par e ´ımpar, 101 peri´ odica, 88 semi-cont´ınua, 87 trigonom´etrica, 167 uniformemente cont´ınua, 84 Homeomorfismo, 81 Inclina¸c˜ao, 90 Indu¸c˜ao, 2 ´Infimo, 17 Integra¸c˜ao por partes, 139 termo a termo, 166, 171 Integral, 125 absolutamente convergente, 149, 150 de Dirichlet, 151 impr´opria, 147 indefinida, 137 inferior e superior, 124 Interior, 49 Intervalo, 16 Intervalos encaixados, 18 Inverso aditivo e multiplicativo, 12 lim inf e lim sup, 61 Limite de uma fun¸c˜ao, 63 de uma seq¨ uˆencia, 24 lateral, 69 Logaritmo, 143, 146 M´ aximos e m´ınimos, 96 M´etodo da diagonal, 9 de indu¸c˜ao, 2 de Newton, 114 M´ odulo, 15

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Maior do que, 14 Maior elemento, 17 Menor do que, 3, 14 Monotonicidade da adi¸c˜ao, 14 da multiplica¸c˜ao, 14 Mudan¸ca de vari´avel, 138 Multiplica¸c˜ao de n´ umeros naturais, 2 de n´ umeros reais, 12 N´ umero alg´ebrico, 21 cardinal, 4 de Fibonacci, 36 de ouro, 36 inteiro, 8 irracional, 19 negativo, 14 positivo, 13 primo, 10 racional, 8 transcendente, 22 Norma de uma parti¸c˜ao, 141 Opera¸c˜oes com limites, 65 Oscila¸c˜ao, 74, 123 Parte positiva e parte negativa, 41, 149 Parti¸c˜ao, 123 Parti¸c˜ao pontilhada, 142 Passagem ao limite sob o sinal da integral, 160 Polinˆ omio de Taylor, 105 Ponto aderente, 50 cr´ıtico, 97, 101 de acumula¸c˜ao, 53, 68

197 fixo, 79 interior, 49 isolado, 53 Primitiva, 137 Produto de n´ umeros, 2, 12 Propriedade do Valor Intermedi´ario, 88 Raio de convergˆencia, 165 Recorrˆencia, 2 Reduzida de uma s´erie, 38 Refinamento, 123 Regra da Cadeia, 94 de L’Hˆ opital, 93 Reta, 108 S´erie, 38 absolutamente convergente, 40, 165 comutativamente convergente, 44 condicionalmente convergente, 41 convergente e divergente, 38 de fun¸c˜oes, 156 de potˆencias, 164 de Taylor das fun¸c˜oes cl´assicas, 169 geom´etrica, 38 harmˆonica, 39 Seq¨ uˆencia, 23 convergente e divergente, 25 crescente e decrescente, 26 de Cauchy, 35 limitada, 23 mon´otona, 25

198 peri´ odica, 34 som´avel, 48 Soma de n´ umeros naturais, 2 de n´ umeros reais, 12 de Riemann, 142 de Riemann-Stieltjes, 154 de uma s´erie, 38 inferior, 124 parcial, 38 superior, 124 Subseq¨ uˆencia, 24 Subtra¸c˜ao, 13 Sucessor, 1 Supremo, 17 Teorema de Bolzano-Weierstrass, 26 de Borel-Lebesgue, 55 de Darboux, 97 de Dini, 160 de Leibniz, 41 de Riemann, 45 de Rolle, 98 de Weierstrass, 82 do ponto fixo de Brouwer, 79 para contra¸c˜oes, 114 do sandu´ıche, 27, 64 do Valor Intermedi´ario, 78 do Valor M´edio de Lagrange, 98 Fundamental do C´ alculo, 137 Termo destacado, 26 geral de uma s´erie, 38 Teste de Cauchy, 43 de d’Alembert, 42

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de Weierstrass, 163 Transitividade, 14 Tricotomia, 14 Unicidade da s´erie de potˆencias, 167 do limite, 25, 65 Valor absoluto, 15 de aderˆencia, 34 m´edio de uma fun¸c˜ao, 154 Velocidade, 90 Vizinhan¸ca, 49