A Sociedade contra o Estado [1 ed.]

A noção de sociedade contra o Estado é desenvolvida pelo filósofo e etnólogo francês Pierre Clastres (1934-1977) nos esc

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Portuguese Pages 160 Year 1978

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PIERRE CLASTRES

A Sociedade contra o Estado

11fr8nd8co alves

A Sociedade contra o Estado

A Sociedade contra o Estado reúne vários ensaios de Pierre Clastres sobre a filosofia política das sociedades indígenas sul-americanas. O objetivo do autor, contudo, é aceder, através desta fi- . losofia, aos fundamentos singulares da conce~ao ocidental de poder. Crítica da Antropología, vai denunciar a inanidade explicativa dos esquemas evolucionistas e etnocentricos que, acompanhando o movimento da domin~o ocidental, vio erigir a noyio de Estado como critério de classific~ao básico do "desenvolvimento" político. Ás sociedades "sem Estado", Clastres vai opor as sociedades contra o Estado sociedades que excluem o poder coercitivo, o rejeitam para a esfera da Natureza, impedem astuciosamente o monopólio da violencia legítima por indivíduos ou grupos. Trata-se portan'to de estabelecer urna determinayao positiva na caracterizayio de algumas sociedades nao-ocidentais, isto é, perceber até que ponto elas desenvolveram alternativas a secular equayaO Estado-poder-violencia que subjaz a filosofia política do Ocidente. Na verdade, Clastres vai apontar a formayio do Estado como o corte, a diferenya radical que introduz as sociedades na História - e considera a autonomizayao do Poder como logicamente anterior a forma~o de classes sociais economicamente fundadas. Apontando a impossibilidade de utilizayao de conceitos como "estrutura política", "nível político", no estudo de sociedades nio-ocidentais - onde o autor se insere no movimento geral de questionamento antropológico das categorías ociden-

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A SOCIBDADE CONTRA O ESTADO

1

COLE~A.O

CISNCIAS SOCIAIS

Coorden~ao

Roberto Osvaldo Cruz Theo Araújo Santiago

Biblioteca Digital Curt Nimuendajú - Coleção Nicolai www.etnolinguistica.org

Pierre Clastres

ASOCIEDADE CONTRA O ESTADO Pesquisas de Ahtropologia Política Tradu~ao

de

'fheo Santiago

LIVRARIA FRANCISCO ALVES EDITORA S.A.

©

1~74 by. Les .J;:ditiens de Minuit

Título original: La saciété aontte l'Eiat Rechere~s d'ar:iJhropol'ogie. potitique

Capa_: ·c ecília Jucá Impresso no Brasil

Printed in Brazil

Fíoha. Catalq~áfica (Preparada pelo Centro de Cata1o$a~ao-na-fo~te do Sindicato NaciPnal dQS Editotes de Livros, RJ) €lastres, Pierre C551s A Sodeda,de contra o Estado: pesquisas de antropólogia ppl.ítfoa.;. ttadu!ráO de Theo 'Santiago. Río de· Jajleiro, F. Alv:es, 1978. . . .. ( e·" ,1en atrasó se recúpera e; a_s laeunas se preenchein.; existe. ag().t-q. urna quantidade suficiente de textos é d_escri9o~s para que se· possa fajar de U!lla Antropología Políti~a"' men;sur~t seus resUltados e i't~fletir sobre a natureza do poder, Sdb~e suas origens,. enfitn,, sobre as transfortna~es que a história Jhe impoe segundo os tipos de sociedade onde éle·· se exerce. Projeto a•m.. eici()SO, mas. tarefa neees:sá.r ia realizada pela notável obra de-i J. W. Lapierre: Essái..sur le f ondernenl d.Y. pouvoir polit,ique [En~aio sobre o 'fundame17:to do poder político]. 1 Trata-se aí de um empreendimcnto, tanto mais digno de interess~ quanto nesse livro ·se en.contta prhneira:mente :reunida e e.xplorada uma ~a.ssa ~e i1iforma~6es ~oncem~ílle nao só as sociedades humanas, mas também ifs especies at1imáis sociais, e segue-s,e que o autor é um filósofo cuja reflexao se e~erce sobre os dados fornecidos pelas modernas diseiplinas que s'a0 '~a S.oeiologia Animal" e_a ~~~ª

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Trata-se aqui da questao do poder político ·e, muito legitimamente, J. W. Lapierre se pe.rgunta antes de tudo se es.se ~ato humano resp.0nde a uma necessidade vital, se el~. se de~envolve a partir q~ um eniaizamento biol@gico, s,e, e:ni ou_tros termos, o poder encontra o se.u lp,gar ·de .n.&seimento e a su.a raz~o ele ser na natureza e nao n.a cultut.a. Or a, ao t~rnio de urna discussao pacient~ e erudita sobíe os mais recentes tr,abalhos de b'iología aiiimal, discuss-ao nada académica allás,, se bem qqe se possa prever-ihe o ·resultado, a resposta é clara: "O exame crítico _·dos oenhe.cimentos adquiridos sóbre os fenoníenos soc'iais entre os animais e especialmente sobre o seu processo de auio-regula~ao social nos mostr0u a auséncia de, qualquer forma, . me:smo embrionária, de poder p0lítico . .. " (p. 222). Tendo desbravado esse campo e a~segurad.o que a pesgúis'a ñao precisará esfor9at-sé · por e$se ládo, o autor volta-s,~ para as ,cíen:i. cias da cult'Ut~ e. da história~ a fim de interrbgar - se.gao que, por s~u tamanho,. é a mai.S importante da sua ihvestigagao - ''·as f0,tmas 'a;réaicas' dó poder 'política nas soeietlades hUí11a:nas-" . As tefl~.xóes que ·s e seguem encontraram seu impulso mais particularmente na leitura dessas páginas consagradas, dir-se-á, a0 poder ·e ntre: os. s.elvagens.

O leque das ;sociedades "Consideradas é impFessionante; sufieientemente aberto .em todo caso para tirar do leitor exigente qualquer duvida eventual quanio ao caráter eJa\J;stivo da am0stragem, Já que a a,iáUse ~e f~ sob.t,"e exemplQs tomados .na Áftic·~, nas ttés Anféripa&., na OC'eania, Sibéria etc. Em ,suma, urna coleta quase completaJ pela sua varíe-

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dade geográfica e tipológica, daquilo que o mundo "primitivo" podía oferecer de diferen9as em compara9ao com o horizonte nao-arcaico, sobre o qual se desenha a figura do poder político em nossa culmra. Isso prova o alcance do debate e a seriedade que requer o exame de sua conduta. ~ fácil imaginar que essas dezenas de sociedades '~arcaicas" só possuem em comum a simples determina9ao de .seu arcaísmo, determina9ao negativa - como. o indica_M. L~pierre - estabelecida pela _falta de escrita e pela economia dita de subsistencia. As sociedades arcaicas podem entao diferir profundamente entre si. De fato, nenhuma se assemelha a outra e estamos longe da triste repeti~ao que tornarla desinte.. ressantes todos os selvagens. Cumpre portante intro.duzir um mínímo de ordem nessa multiplicidade a fim de permitir a compara9ao entre as unidades que a compoem, e é por isso que M. Lapierre, mais ou menos aceitando as clássicas classifica9oes propostas pela Antropología anglo-sax:onia para a África, percebe cinco grandes tipos ''partindo d.as sociedades arcaicas nas quais o poder político está mais desenvolvido para chegar finalmente aquelas que quase nao apresentam, ou mesmo nao apresentam, poder propriamente político" (p. 229). Ordenam-se entao as culturas primitivas em urna tipología baseada em suma na . maior ou menor "quantidade" de poder político que cada urna delas oferece a observa9ao, quantidade essa que pode tender a zero, " . .. certos agrupamentos humanos, em condi9oes de vida determinadas que lhes permitiam subsistir em pequenas 'sociedades fechadas', puderam absterse de poder político" (p. 525). Reflitamos sobre o próprio princípio dessa classifica~ao. Qual é o seu critério? Como se define aquilo que, presente em maior ou menor quantidade, permite a designa~ao de tal lugar a tal sociedade? Ou, em outros termos, que se entende, mesmo a título provisório, por poder político? A questao é, vamos admiti-1.o, de importancia, já que, no intervalo que se supoe separar sociedades sem poder e sociedades com poder, deveriam semelhantemente t.er lugar a essencia e o fundamento do poder. Ora, seguindo as minuciosas análises de M. Lapierre, nao se tem a impressáo de assistir a urna ruptura, a urna descontinuidade, a um salto radical que, arrancando os grupos humanos de sua estagna9áo prépolítica, os transformasse em sociedad.e civil. Pode-se dizer entao que, e aquelas de sinal - , a passagem é entre as sociedades de sinal progressiva, contínua e da ordem da quantidade? Se assim é, a própria possibilidade de classificar sociedades desaparece, pois entre os dois extremos - sociedades com Estado e sociedades sem poder - figurará a infinidade de graus intermediários, fazendo, no máximo, de cada sociedade particular urna classe do sistema. É aliás ao que chegaria todo projeto taxionomico desse tipo, a medida que se aprimora o conhecimento das sociedades arcaicas e que se desvendam melhor as suas diferen... 1

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consegµínte~. de·s~entinuidade entre

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tan1o num eas:0 como no eutto, na hip@tese da nao-po:cler e poder ou naquela d;i eontinuidaae~ parece ·clar-0 que nenhuma classifiaa~ao das s©ciedades ~yipµieas n0s. pos:sa esG1areoer sobre a natureza do poaer polític0 ou sobre as cll:©unst~ncias do seu surgimento, e que o enigma pel'Siste. ~m .s eu mistétib. HO poQ.er se realiza numa relakao soei~l caracterís.tica: coruandoobediencia"' (p. 44). Da:.í resulta de s~ída que as so·o iedades, onde nao se bbserva essa rela~ao esse.ttcial~ sa0 s·o ciedades sem poder. Voltar:em0s· a ísso. O que c:onvém ressaltar prlmeiratnente é Q ttaaicionalis:m o dessa conaep9ao que exprime.. com bastante fideiidade o espírito da pesquisa etn0l6.gica.: a saber, a certeza jan.iais posta em dú:vida de que. o poder político ·se dá somente em uma rel~~ao que se i;,ésolve, deffuitiv~mente, .num,.a re1a~ao de coer~a,o. o·e softe que sobre e·sse ponto, entre Nietzsche" Max Weber ( 0 poder tle Estado como monop6lio 40 u.so leg~ti.nlo d.a v:iólenoia) ou a Etnolo-gia contempor~nea~, o parentesco é mais pró:~imo de· que parecé e as linguage-ns p9ueo se difetem a partir de um me.s ino fundo: a verdade e o se-r do podet c-onsi'stern na viol@ncia e nao se ,ode pensar no p.oder se,m o seu predieaclo~. a vio.leneia (p. t1). Talv·e z seja efet:iv:amente· assim, caso em ·que. a Etnologia nao é culpada d.e aceitar se:m discussao o que. o O.cjd~nte pensa desde sempre. ),t.tas· é. necess·ário precisamente assegl\rat-se ·dis~o e verüic·a r no seu próp.rio terreno o dás sociedade-s arcaicas - ~e., qu~dó nao há coer~áo ou víolepcia,. nao se pode falat de poder. O que ocorre coro o·s íhdíos da Amérjca? Sabe,..se que com e:xce~·ao das altas culturas do México, da América Centtal e dos Andes todas as sociedades indígenas sao arcaicas: elas ignoram a escrita e Hsubs1stem'~ do ponto de- vista. €eon0.mico... Por outro lado 1 todas, ou